Paulina Chiziane, Símbolo Feminino

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Paulina Chiziane: o símbolo feminino na literatura moçambicana Paulina Chiziane é agora uma mulher do mundo, mas esse percurso foi longo e teve um princípio. Esse princípio chama-se “Balada de Amor ao Vento”, uma verdadeira viagem na realidade moçambicana. Eduardo Quive, escritor moçambicano, apresenta aqui uma breve resenha da obra desta autora do Moçambique. Paulina Chiziane: o símbolo feminino na literatura moçambicana Eduardo Quive Escritor moçambicano e integra o Movimento Literário Kuphaluxa Baladas de levaram Paulina para o vento Paulina Chiziane é agora uma mulher do mundo, mas esse percurso foi longo e teve um princípio. Esse princípio chama-se “Balada de Amor ao Vento”, uma verdadeira viagem na realidade moçambicana e caracteristicamente o perfil da Paulina para quem acompanha as suas obras. Esta obra retrata, desde a juventude à idade madura, o cenário em que a Sarnau e o Mwando, protagonistas desta eloquente estória de amor, percorrem os dias, os meses, os anos, os encontros e os desencontros, a dolorosa separação, o desespero, o sofrimento, a alegria, as lágrimas e os sorrisos, numa atmosfera que nos envolve e, nos comove. "Tu foste para mim vida, angústia, pesadelo. Cantei para ti baladas de amor ao vento. Eras para mim o mar e eu o teu sal. No abismo, não encontrei a tua mão." Mas haverá um reencontro? Serão Sarnau e Mwando capazes de apagar um tão longo e trágico passado? Existirá ainda para eles um futuro a partilhar? Voltarás a conseguir esboçar no rosto o teu lindo sorriso, há muito perdido no tempo? Abrirás enfim os braços para neles abrigares o amor? Ouvirás a melodia que o vento espalha no universo? Texto retirado da contracapa da obra editada em 1990 e reeditada em 2003 pela editora moçambicana, Ndjira. Na segunda viagem, a escritora a voar nos “Ventos do Apocalipse”,

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O artigo escrito por Eduardo Quive trata da relevância da escritora Paulina Chiziane e de suas obras para a realidade e o empoderamento feminino na África, principalmente me Moçambique, de onde é natural.

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Paulina Chiziane: o smbolo feminino na literatura moambicana

Paulina Chiziane agora uma mulher do mundo, mas esse percurso foi longo e teve um princpio. Esse princpio chama-se Balada de Amor ao Vento, uma verdadeira viagem na realidade moambicana. Eduardo Quive, escritor moambicano, apresenta aqui uma breve resenha da obra desta autora do Moambique.

Paulina Chiziane: o smbolo feminino na literatura moambicanaEduardo QuiveEscritor moambicano e integra o Movimento Literrio KuphaluxaBaladas de levaram Paulina para o ventoPaulina Chiziane agora uma mulher do mundo, mas esse percurso foi longo e teve um princpio. Esse princpio chama-se Balada de Amor ao Vento, uma verdadeira viagem na realidade moambicana e caracteristicamente o perfil da Paulina para quem acompanha as suas obras. Esta obra retrata, desde a juventude idade madura, o cenrio em que a Sarnau e o Mwando, protagonistas desta eloquente estria de amor, percorrem os dias, os meses, os anos, os encontros e os desencontros, a dolorosa separao, o desespero, o sofrimento, a alegria, as lgrimas e os sorrisos, numa atmosfera que nos envolve e, nos comove.

"Tu foste para mim vida, angstia, pesadelo. Cantei para ti baladas de amor ao vento. Eras para mim o mar e eu o teu sal. No abismo, no encontrei a tua mo."

Mas haver um reencontro? Sero Sarnau e Mwando capazes de apagar um to longo e trgico passado? Existir ainda para eles um futuro a partilhar? Voltars a conseguir esboar no rosto o teu lindo sorriso, h muito perdido no tempo? Abrirs enfim os braos para neles abrigares o amor? Ouvirs a melodia que o vento espalha no universo? Texto retirado da contracapa da obra editada em 1990 e reeditada em 2003 pela editora moambicana, Ndjira. Na segunda viagem, a escritora a voar nos Ventos do Apocalipse, lanada pela editora Caminho, em 1999 e reeditada, em 2006.

Guerra, destruio, misria, sofrimento, humilhao, dio, superstio, morte. Este o cenrio dantesco, boscheano, que encontramos nas pginas deste romance. A escritora consegue levar-nos ao mago do mais baixo dos mais baixos degraus de degradao do ser humano.

Com ela percorremos as vinte e uma noites de pesadelo e tormentos que foi o xodo dos sobreviventes de uma aldeia.

"Se o homem a imagem de Deus, ento Deus um refugiado de guerra, magro e com o ventre farto de fome. Deus tem este nosso aspecto nojento, tem a cor negra da lama e no toma banho semelhana de ns outros, condenados da terra. O Diabo, sim, esse deve ser um janota que segura os freios da vida dos homens que sucumbem." Ndjira.

J O Stimo Juramento, lanada em quatro edies, concentra-se num fenmeno que muito caracterstico nas famlias moambicanas, mais hoje, ainda que de forma oculta.

Feitios, tabus, magia negra, fantasia e muito pnico, a vida que nos demonstrada por esta autora, baseando-se numa famlia de condies mdias, e cheia de muitos problemas, que se supe que seja obra de feitiaria. Nesta obra, o personagem David, sem se aperceber, entrega-se a magia negra e as tradies mais antigas das famlias moambicanas, sobrevivendo do curandeirismo e atos assustadores para o seu crescimento econmico.

Por outro lado o seu filho enfrenta uma maligna doena que se manifesta de uma maneira estranha, e assim vai se fazendo esta obra, desvendando estes mistrios que nos levam a delirar a cada pgina. Estas so algumas ideias trazidas em termos da nossa percepo da qualidade bibliogrfica daPaulina Chiziane, que brindou as mulheres, j em 2002 com seis reedies que tomaram o mundo. Por ltimo, nos trouxe O Alegre Canto da Perdiz que exalta, igualmente, a vida de uma mulher bonita que encanta at homens brancos e As Andorinhas que relata a estria de alguns Heris Moambicanos, como Eduardo Mondlane.

PrmiosEm termos de prmios,Paulina Chiziane, no nos remete a vrias viagens, tendo vencido em 2003. o Prmio Jos Craveirinha, pela obra Niketche: Uma Histria de Poligamia.

Mas em termos de acontecimentos mais marcantes na carreira desta escritora, destaca-se a sua designao, pela Unio Africana (UA), como embaixadora da paz para frica em Julho de 2010.

Sobre o feminismo da Paulina ChizianeEu sou uma mulher e falo das mulheres

Muitas vezes tem se chegado a concluso de que Paulina Chiziane feminista, entretanto, em entrevista com o Kuphaluxa, a escritora no deu importncia, simplesmente escusou-se de assumir ou negar esta postura.

Estou me nas tintas... que o chamem. Eu sou uma mulher e falo de mulheres, ento eu sou feminista? simplesmente conversa de mulher para mulher, no para reivindicar nada, nem exigir direitos disto ou daquilo, porque as mulheres tm um mundo s delas e isso que eu escrevi, e espero que isso no traga nenhum tipo de problemas, porque h ainda pessoas que no esto habituadas e no conseguem ver as coisas com iseno.

Na mesma entrevista, a escritora, falou ainda da sua postura feminina, principalmente, argumentando o factor mulher no auge das atenes no mundo africano.

Ser mulher muito complicado, e ser escritora uma ousadia. Como uma ousadia a mulher sair de madrugada ir a praia comprar peixe para vir cozinhar. A mulher est circunscrita num espao e quando salta essa fronteira sofre represlias, h quem no as sente de uma forma directa, mas a grande maioria...

sempre uma dificuldade, porque primeiro, eu tenho de provar que sou capaz, depois tenho de conquistar um espao. Eu tenho que trabalhar muito para mostrar que no foi por acaso que as coisas aconteceram. Mas agora estou numa fase mais estvel em que as pessoas j no se assustam e, de certa maneira, j no implicam; mas para chegar at este ponto teve de ser uma batalha. Disse Paulina.

Sobre a escrita e a literatura moambicana, a escritora disse que escrever uma maneira de estar no mundo.

Eu preciso de meu espao, por isso que eu escrevo. Em primeiro lugar eu escrevo para existir, eu escrevo para mim. Eu existo no mundo e a minha existncia repete-se nas outras pessoas. E neste caso um livro, que depois ser lido.

Acho que est a ganhar uma dinmica maior nos ltimos anos, h autores que comeam a apostar muito seriamente e apresentam propostas novas. E h novos talentos, tantos, mas o que falta uma mo, por exemplo aqui em Quelimane h um movimento muito grande.

Verdade ou no, Paulina Chiziane um dos smbolos do romancismo literrio moambicano, at hoje, a nica mulher que tem se identificado com este gnero, mas no assumindo, como me referi, na introduo deste texto.

No sou romancista, sou apenas contadora de estrias. Estrias longas e curtas, inspiro-me nos Nkariganas em volta da lereira, que os nossos avs contam-nos. Diz sempre a escritora.

BiografiaPaulina Chizianenasceu no distrito de Manjacaze, provncia de Gaza, a 4 de Junho 1955. uma escritora moambicana, que apesar de ser identificada como romancista, nunca assumiu esta identidade do gnero literrio e classifica-se como uma contadora de estrias longas. Com as suas aves formadas nos subrbios da cidade de Maputo, Paulina, nasceu numa famlia protestante onde se falavam as lnguas Chope e Ronga. Aprendeu a lngua portuguesa na escola de uma misso catlica. Comeou os estudos de Lingustica na Universidade Eduardo Mondlane sem, porm, ter concludo o curso. Iniciou a sua atividade literria em 1984, com contos publicados na imprensa moambicana, como, a Revista Tempo e Domingo.