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71 sociedade mais ampla. Vizinhos, amigos, novos conhecidos têm muitas oportunidades durante o ano de ir conhecendo esse universo afro-descendente, costurado pelo fio do Congado. Os ternos, independente da Irmandade fazem um campeonato de futebol, alternam os fins de semana para se visitarem nas feijoadas com samba que ocorrem nos quartéis e tem um roteiro de festas de Congado na região onde participam como convidados dos ternos das outras cidades e algumas vezes como dançadores. Desses encontros de ternos, as visitas a outras cidades têm um caráter mais preciso que os outros, pois não tem inspiração apenas na sociabilidade e lazer. A idéia de ir se divertir na casa dos outros não se aplica a visitas oficiais, onde os congadeiros acabam vestindo suas indumentárias, assumindo seus papeis e participando ativamente da festa do Congo na cidade do outro. 5.1.6.1. Campeonato de Futebol O campeonato de futebol começou há poucos anos. Durante uns dois meses do 1º semestre de cada ano os ternos se encontram aos domingos pela manhã nos campos de futebol. Em 2006 a pelada foi no campo de futebol perto do terno de Catupé Azul Claro, no bairro Dona Zumira; esse ano 2007 foi num outro campo no bairro Daniel Fonseca. Duas duplas por dia disputam o campeonato, até chegarem ao vencedor. Esse campeonato é mais uma maneira de se encontrar, conversar e distrair. Nem todos os ternos participam como time, mas todos os dançadores aparecem para jogar mesmo que seja no time do outro. Ser torcedores é função de muitas mulheres e crianças. Enquanto uns correm atrás da bola, fazem a defesa, outros tomam uma cerveja e outros aproveitam para vendê-las. 5.1.6.2. Feijoada O encontro da Feijoada também é outra maneira de se encontrar. Cada terno marca o seu fim de semana e convida os outros ternos, mas também os conhecidos que não dançam Congado para ouvirem samba e comerem feijoada. Normalmente a feijoada é paga e o samba é gratuito. No ano de 2007, no terno Moçambique Estrela Guia contou com 1500 pessoas. Nem todos os ternos fazem esse tipo de evento. 5.1.6.3. Visitas as festas das outras cidades Ao contrário do futebol e da feijoada as visitas as festas das outras cidades podem ser tratadas como uma tradição. Entre as cidades que hoje convidam os ternos de Uberlândia a visitarem-nas nos dias de Congado estão Ibiá, Serra de Salitre, Romaria, c a r a c t e r í s t i c a s

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sociedade mais ampla. Vizinhos, amigos, novos conhecidos têm

muitas oportunidades durante o ano de ir conhecendo esse universo

afro-descendente, costurado pelo fio do Congado. Os ternos,

independente da Irmandade fazem um campeonato de futebol,

alternam os fins de semana para se visitarem nas feijoadas com samba

que ocorrem nos quartéis e tem um roteiro de festas de Congado na

região onde participam como convidados dos ternos das outras cidades

e algumas vezes como dançadores.

Desses encontros de ternos, as visitas a outras cidades têm

um caráter mais preciso que os outros, pois não tem inspiração apenas

na sociabilidade e lazer. A idéia de ir se divertir na casa dos outros

não se aplica a visitas oficiais, onde os congadeiros acabam vestindo

suas indumentárias, assumindo seus papeis e participando ativamente

da festa do Congo na cidade do outro.

5 . 1 . 6 . 1 . C a m p e o n a t o d e F u t e b o l

O campeonato de futebol começou há poucos anos. Durante

uns dois meses do 1º semestre de cada ano os ternos se encontram

aos domingos pela manhã nos campos de futebol. Em 2006 a pelada

foi no campo de futebol perto do terno de Catupé Azul Claro, no

bairro Dona Zumira; esse ano 2007 foi num outro campo no bairro

Daniel Fonseca. Duas duplas por dia disputam o campeonato, até

chegarem ao vencedor. Esse campeonato é mais uma maneira de se

encontrar, conversar e distrair. Nem todos os ternos participam como

time, mas todos os dançadores aparecem para jogar mesmo que

seja no time do outro. Ser torcedores é função de muitas mulheres e

crianças. Enquanto uns correm atrás da bola, fazem a defesa, outros

tomam uma cerveja e outros aproveitam para vendê-las.

5 . 1 . 6 . 2 . F e i j o a d a

O encontro da Feijoada

também é outra maneira de se

encontrar. Cada terno marca o

seu fim de semana e convida os

outros ternos, mas também os

conhecidos que não dançam

Congado para ouvirem samba e

comerem fei joada.

Normalmente a feijoada é paga

e o samba é gratuito. No ano de

2007, no terno Moçambique

Estrela Guia contou com 1500

pessoas. Nem todos os ternos

fazem esse tipo de evento.

5.1.6.3. Visitas as festas

das outras cidades

Ao contrário do futebol e da

feijoada as visitas as festas das

outras cidades podem ser

tratadas como uma tradição.

Entre as cidades que hoje

conv idam os ternos de

Uberlândia a visitarem-nas nos

dias de Congado estão Ibiá,

Serra de Sali tre, Romaria,

car acterís ticas

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Formiga, Monte Alegre,

Ituiutaba, Olímpia, Patrocínio,

Araxá, Estrela do Sul ,

Catalão, Araguari, entre outras

menos f reqüentes. Essas

cidades são, na maioria das

vezes, lugares de onde veio

grande parte dos congadeiros

de Uberlândia, excluindo

Romaria e Olímpia.

Romaria, pois é uma

cidade de peregrinação

religiosa de devoção a Nossa

Senhora da Abadia. A cidade se

tornou referência de múltiplas

práticas culturais e tem o apoio

da paróquia para a realização

das festas populares religiosas

na localidade. No último fim de

semana de maio de cada ano,

é o Encontro de Congo,

Congados e Moçambiques da

região em Romaria/MG. Em

Olímpia, a festa é em agosto, e

a visita se dá por causa de um

festival de Folclore há mais de

20 anos f reqüentado pelos

congadeiros de Uberlândia.

As outras cidades citadas acima fazem parte de um roteiro

próprio de cada terno, que tem referência nas cidades de origem.

Isso significa que os convites não são direcionados para toda a

comunidade congadeira de Uberlândia. Normalmente, eles são

feitos diretamente de um terno para o outro, reportando um

parentesco de grupo, uma memória própria desses, ou uma nova

aliança que está sendo firmada.

A migração para Uberlândia da população afro-descendente

desde a última década do século XIX até meados de 1970 fica

registrada na história de vida dos mais velhos das famílias dos

ternos, que visitam suas antigas moradas no dia da festa de

Congado da cidade de seus parentes. Os dançadores de hoje

revivem esse registro a partir das festas que seguem durante o

ano. Assim, viajam no tempo de sua tradição, nutrindo-se dos

antigos fundamentos, fazendo novas alianças e reinventando outras,

juntos com os soldados das outras cidades.

Uma das primeiras festas do ano é a de Ituiutaba, segundo

fim de semana do mês de maio. Dois componentes do Marinheirão

de Uberlândia, Elias (2º capitão) e Zé Pedro ( 3º capitão) dançam

no terno de Moçambique Lua Branca de Ituiutaba. Há muitos anos

eles ajudam o capitão Cláudio a levar a tradição e é com o terno

Lua Branca que muitos dançadores do Marinheirão de Uberlândia

vão ao Encontro de Congado de Romaria.

A festa da cidade de Monte Alegre/MG, a 50km de Uberlândia,

acontece no dia de Nossa Senhora de Fátima, coincidentemente

no 13 de maio, dia da Abolição. O sr. Zé Caetano (entrevista,

2000), capitão do terno Azul Claro de Monte Alegre conta que seu

avô foi para Uberlândia de carro de boi para ajudar a formar o

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Congado de Uberlândia. Monte Alegre tem fama de ter uma das

melhores festas, pois ainda se pode ouvir um batido lento e marcado,

como o de antigamente.

Depois, os congadeiros são convidados para irem a Ibiá/MG,

cidade também de muita tradição. Muitos congadeiros de Uberlândia

vieram dessa região, como é o caso do Sr. Charqueada, que veio de

Cruzeiro da Fortaleza. A festa de Congado em Ibiá realiza-se no

segundo fim de semana de julho.

Em agosto ocorre a festa em Formiga/MG, de onde vieram os

capitães e dançadores do terno Catupé do Martins. O sr. Sebastião

Matinada (entrevista, 200) conta: Chega lá em Formiga cê vê como é

que é. Cê acerta lá no seu serviço, tantos dias. A gente sai sempre

na sexta feira a noite e retorna na terça. É 450 Km. Donizete (antigo

dançador do Catupé do Martins) conta fui lá dezessete anos lá, sem

pará. O terno do Sr. Zacarias de Formiga foi quem deu origem ao

terno Catupé do Martins, por intermédio de Zé Matinada, que foi

dançador no terno de Formiga e 1o capitão

no de Uberlândia/MG.

As relações nem sempre são

diretas, como o caso do Catupé do

Martins e do terno de Formiga; elas são

construídas constantemente. A

própria festa é local para um novo

conhecimento, que numa

conversa identifica uma raiz

comum e, então, o convite pode

vir a se tornar uma tradição

(Hobsbawn, 1991).

Preferencialmente, no

agradecimento ao almoço é que

são feitos os conv ites de

reafirmação coletiva das relações

identitárias entre as festas da

região.

A forma de agradecer o

almoço e o convite para participar

da festa da outra cidade se dá

na cantoria e no tocar dos

instrumentos. O próprio

ritual pós-almoço é um

jeito de reafirmar o convite

para o próximo ano e a

visita recíproca na festa de

Uberlândia. Assim,

refazem a história, vivendo

a memória nas práticas

congadeiras.

Setembro tem em

Serra de Salitre/MG e em

outubro ela se realiza em

car acterís ticas

Agradecimentos ao almoço no quartel do terno VilãoFantástico.Serra de Salitre. 2001. Foto: Larissa Gabarra

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Araguari/MG e Catalão/GO;

depois, em novembro, tem no Rio

Paranaíba e assim, os

congadeiros passam o ano todo

cumprindo um roteiro de

encontros de Congado em toda

região. O mapa a seguir mostra

parte do trajeto que os

congadeiros de Uberlândia fazem

durante o ano para louvar de N.S.

do Rosário e São Benedito em

homenagem aos seus reis e

rainhas Congo nas outras

cidades.

5.2. A Festa

A Congada é a festa de

apogeu do Congado e se realiza

durante três dias: sábado,

domingo e segunda-feira. Ela

acontecia no segundo fim de

semana de novembro. A partir de

2003, ano de Nossa Senhora do

Rosário, ela começou a ser

realizada no segundo fim de

semana de outubro, através de

um acordo entre a Irmandade e a

Igreja Católica. No mesmo ano foi aberta a Igreja de São Benedito no

bairro Planalto e no mês de maio, desde então, faz-se uma festa para

São Benedito de apenas um dia.

O espírito festivo tem a capacidade de envolver todos em

algo extremamente distinto do cotidiano de opressão que a rotina

impõe. E é, nesse momento, pois, que a explosão coletiva daquilo

que lhes é mais íntimo coloca em evidência o choque cultural do

mundo ocidental do trabalho idealizado pelo branco e o mundo da

essência da existência do negro.

Através da festa e das atitudes que lhes são atribuídas, o

congadeiro cria mecanismos de valorização da auto-estima e projeta

seus desejos nas negociações com a sociedade civ i l . Ao

reivindicar a utilização das ruas e praças para sua expressão

durante as noites de campanha e novena e ao procurar a

subvenção financeira municipal para a realização dos 3 dias

de festa, os congadeiros não se ausentam da discussão

polít ica e se fazem presentes em espaços normalmente

ocupados por brancos.

No anexo 16.3. (Gabarra, 2004) a seqüência dos três

dias de festa em formato de fotonovelas.

5.2.1. 1º Dia: Concentração e Preparação

O primeiro dia é o sábado. Todos os dançadores se

reúnem no quartel e começam a preparação efetiva da festa.

Armam a tenda para cobrir o terreiro, afinam os instrumentos

que ainda não estão prontos, dão acabamento nos estandartes,

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car acterís ticas

Tra

j eto

s d

as

vis

it as

às

fes

tas

de

Co

ng

ad

o n

a re

giã

o.

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nos enfeites de cabeça,

nas faixas da cintura das

indumentárias. Deixam

as comida pré-prontas:

p i cam cebolas,

descascam alhos, lavam

o ar r oz e o f e i j ão.

Preparam o a l tar de

Nossa Senho ra do

Rosário e São Benedito.

O dia todo desde muito cedo até muito tarde o movimento de

entra e sai dos soldados, devotos e simpatizantes não para

nos quartéis.

5.2.2. 2º Dia

O segundo dia é o mais movimentado, pois é quando a

programação na porta da Igreja do Rosário é mais intensa e por isso

é o dia que os ternos visitantes vêm à cidade. Logo pela manhã tem

a alvorada, depois os ternos vão buscar as bandeiras de Nossa

Senhora e de São Benedito na casa do presidente da Irmandade do

Rosário. Já na porta da Igreja, levantam-se os mastros, em seqüência

vem o desfile e o trança fita, o encontro com os ternos visitantes, o

almoço, o reinado/cortejo, procissão, missa e troca de reis e rainhas.

Depois é a volta para os quartéis, marchando e cantando, jantam e

vão descansar para o último dia, segunda feira.

5 . 2 . 2 . 1 A l v o r a d a

Na porta da Igreja do

Rosário, às 6horas da manhã

está tudo fechado e vazio. Pode-

se encontrar alguns

pesquisadores rondando a igreja.

Os barraqueiros de bebidas e

comidas também podem estar

por lá montando suas tendas.

Nos quartéis, os

dançadores estão tomando café,

a postos só esperando o show

pirotécnico. Depois desse, a

formação da marcha é feita, a

madrinha começa a rezar a saída

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do terno do quartel, as cozinheiras

vêm participar. A madrinha passa

a bandeirinha por cima da cabeça

de todos os dançadores, das

cozinheiras e de quem estiver por

ali e quiser a benção da santa.

Então, ela entrega a bandeira à

criança que vai a frente do terno.

E saem todos em marcha em

direção a casa do presidente da

Irmandade no bairro Aparecida.

5 . 2 . 2 . 2 . B u sca e

L evan t a r o s M ast ro s

Dos bairros mais longínquos

os ternos vêm para a região

central da cidade, a maioria

ainda passa como era tradição

no inicio do século XX na porta

da casa do presidente da

Irmandade, hoje Sr. Deny, para

cumprimentá-lo e seguir em

marcha para a porta da Igreja

do Rosário. Dois dos ternos de

Moçambique, os responsáveis pelo levantamento do mastro, ao

cumprimentarem o Sr. Deny pegam as imagens dos Santos, Nossa

Senhora do Rosário e São Benedito, que serão colocadas nas pontas

dos mastros que estão na Igreja esperando pelo momento da abertura

da festa.

Normalmente, os Moçambiques que chegam primeiro se

responsabilizam pelo mastro Nossa Senhora do Rosário e o

Moçambique Princesa Isabel pelo de São Benedito. Na porta da Igreja

muitos ternos já chegaram e aplaudem o momento. Os mastros

são levantados com a performance dos Moçambiques, que ao redor

do mastro dançam com seus cajados, erguendo aos céus a imagem.

car acterís ticas

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5.2.2.3. Desfile e Encontro com os outros ternos

Os ternos vão chegando pela Av. Floriano Peixoto, desde a

praça do Fórum até a praça Rui Barbosa onde fica Igreja do Rosário

(centro comercial da cidade). São 8 ou 9 quarteirões que são

fechados para o transito de veículos e abertos para o transito de

congadeiros. Durante esse trajeto os ternos se encontram com os

da própria cidade de Uberlândia e com os das cidades vizinhas, que

vieram retribuir a visita feita no momento da festa da sua cidade.

Vão se intercalando e se cumprimentando através dos repentes

das cantigas e das performances que se alternam em grandes

evoluções e pequenas marchas. É criado, assim, um desfile de

diferentes cores e ritmos em uma grande harmonia até a porta da

Igreja, onde individualmente, os ternos procuraram fazer a melhor

performance do ritual.

5 . 2 . 2 . 4 . T r a n ç a F i t a

O trança fita é um ritual feito apenas pelos

ternos de Marinheiro. Quando esses ternos chegam

à praça, Marinhei rão de São Benedito e

Marinheirinho de Nossa Senhora do Rosário, eles

já vão soltando as fitas que estão enroladas no

mastro para começar a dança. Depois cada

dançante (homem e mulher) pega uma fita. Num

conjunto de 20 componentes eles dançam em dois

sentidos distintos e assim trançam as fitas no

mastro. O mastro fica todo colorido, quase que

num bordado, com as tiras de fita que os

dançadores costuraram com o

próprio corpo. Todo encoberto, o

capitão apita e a dança recomeça

desfazendo o trançado, até o

mastro voltar a ser só da cor que

está pintado. Depois o terno

recolhe o mastro, sai da porta da

Igreja e volta com ele para o

quartel.

O Trança Fita é uma

forma de homenagem que esse

grupo presta à festa, eles a

realizam na porta da igreja, na

casa do Reinado de N. S. do

Rosário e S. Benedito e nas

casas que visitam no 3º dia.

Trança Fita na porta da Igreja do Rosário.Década de c.1970. Acervo: Arquivo Público

Municipal de Uberlândia

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5 . 2 . 2 . 5 . A l m o ç o

Seguem en tão em

marcha, cada terno para seu

quartel, acompanhado pelo

terno visitante com o qual fez

a aliança naquele ano ou há

mui tos anos atrás. Alguns

ternos ainda passam na casa

de algum dev oto que está

cumpr indo promessa, que

se rv e um l anche em

agradecimento.

No quartel, o almoço

sempre com mui ta fartura:

arroz, fei jão, farofa de j i ló,

salada de batata e cenoura,

macarrão, almôndegas, frango

com quiabo entre outras.

Servem comida para

m ais de 500 pessoas

dependendo do quarte l . A

comida nunca acaba e nunca

é negada a ninguém. Uma breve

cesta de ½ hora e seguem em

marcha novamente em direção

a casa do reinado.

5 . 2 . 2 . 6 . R e i n a d o e o C o r t e j o

A marcha da tarde ocorre em direção a casa dos Reis e

Rainhas. Em Uberlândia existem dois casais, o Rei e Rainha de

São Benedito e o Rei e Rainha de Nossa Senhora do Rosário,

portanto duas casas. Nesse momento, os ternos se dividem entre

um casal e outro, normalmente por alguma afinidade pessoal, ou

simplesmente pela proximidade do quartel e da casa dos reis.

Quando chegam de frente para casal, fazem uma performance

cantada e dançada para homenageá-lo.

Cada tipo de terno tem um tipo de dança diferente, uns pulam

com os instrumentos, levantando os aos céus e descendo-os a terra,

outros formam corredores de cajados, outros trançam as fitas.

Depois que cada terno homenageia o casal, seguem em

direção a cozinha onde é oferecido um lanche para todos os

dançadores e acompanhantes. Antes de irem embora agradecem o

lanche e se despedem com mais performances.

Mas o momento mais importante simbolicamente para todo

o ritual é o momento em que o moçambiqueiro puxa o Rei e acontece

paralelo às homenagem dos outros ternos ao Rei e Rainha. Apenas

o terno de Moçambique pode puxar o Rei. Como explicam: é o

seguinte, nois somo congadeiro, congadeiro não puxa Rei, quem

puxa Rei é moçambique. Agora o moçambique não veio, então nois

tivemo que puxa o Rei, agora o Rei não é obrigado a i com nois.

Ocê canta para ele. É igual arruma uma namorada, tem dois home

ali rodiando a mulher, o que canta ela mais bonito ela vai com ele.

O moçambiqueiro é a corte, são os soldados de elite, do

reinado é ele que tem a autorização do ritual para pegar o Rei e levá-

car acterís ticasQuartel do Catupé do Martins. 2000. Foto: Larissa Gabarra

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lo até a porta da Igreja. No momento

que o moçambiqueiro canta para o Rei,

pode acontecer de chegar outro terno

também de moçambique e os dois

disputarem no canto o Rei. O impasse,

ou melhor, o passo em direção a um dos

dois ternos é o Rei que decide. Se não

vem nenhum moçambiqueiro honrar o Rei

esse pode ser levado para a porta da

igreja pelo Congo ou Caputé.

Depois de conquistado o Rei por

um dos moçambiques, o Rei sai da casa

acompanhado do terno, e em forma de

cortejo. Os outros ternos que vão chegando, ou que ainda não saíram,

ou que encontram com o Rei no caminho se reúnem aos que ali já

estão e formam um grande cortejo até a porta da Igreja do Rosário.

5.2.2.7. Missa, Procissão e Troca de Reis e Rainhas

Na porta da Igreja, os Reis são entregues a Irmandade que os

acompanha até o andor dos santos. Dali os reis assistem a missa,

feita ao ar livre. Todos os ternos já estão na praça e a missa segue

cheia de momentos cênicos. Inicialmente forma-se a procissão com

as imagens dos Santos. O andor de São Benedito carregado pelos

congadeiros é acompanhado pelo Rei e Rainha de São Benedito e o

andor de Nossa Senhora do Rosário pelo Rei e Rainha de Nossa

Senhora do Rosário. Muitas pessoas brancas participam da procissão

que anda uns 8 quarteirões, o padre, atualmente Baltazar, o sacristão

e alguns coroinhas com os castiçais vão à frente, depois vem os

andores, a população em geral

com suas velas acesas e por

ultimo os ternos de Congado: os

Moçambiques, os Congos, os

Caputés e os Marinheiros e

Marujos. Essa ordem é

estabelecida através da hierarquia

entre as diferentes tradições que

o mito de Nossa Senhora do

Rosário ajuda a reafirmar.

No ano de 1999 a ordem

era: Marinheiro de Nossa Senhora

do Rosário (Marinheirinho),

Marinheiro de São Benedito

(Marinheirão), Congo Camisa

Verde, Congo Branco, Congo

Marinheirão homenageia os reis e rainhas de São Beneditono terreiro da família Chatão. 2002. Foto: Larissa Gabarra