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    VEIGA, M. Rosrio; TAVARES, Martha Caractersticas das paredes antigas. Requisitos dos

    revestimentos por pintura. Actas do EncontroA indstria das tintas no incio do sculo XXI. Lisboa, APTETI,

    Outubro de 2002.

    CARACTERSTICAS DAS PAREDES ANTIGAS. REQUISITOS DOS REVESTIMENTOS POR

    PINTURA

    Maria do Rosrio VeigaEng Civil, Doutorada pela FEUP, Investigadora Auxiliar do LNEC

    Martha TavaresRestauradora, Mestre em Histria da Arte e Restauro, Assistente Bolseira do LNEC

    RESUMO

    As paredes dos edifcios antigos, anteriores ao advento do beto armado, tinham uma constituio e

    um modelo de funcionamento muito diferentes das actuais.

    Um aspecto particularmente importante est relacionado com a proteco contra a humidade. Com

    efeito, as paredes dos edifcios actuais so construdas de forma a impedir, tanto quanto possvel, a

    penetrao da humidade. Pelo contrrio, o modelo de funcionamento das paredes antigas, mais

    espessas e porosas, sem cortes de capilaridade, admitia a entrada de gua para o interior da alvenariamas evitava uma permanncia prolongada, procurando promover a sua fcil e rpida sada para o

    exterior.

    As intervenes de conservao e reabilitao a realizar sobre edifcios antigos devem respeitar os

    modelos de funcionamento originais, sob pena de provocar patologia mais grave que a que se pretende

    reparar.

    Os revestimentos de paredes, pela sua grande exposio s aces externas e pelo seu papel de

    proteco das alvenarias, so dos elementos mais sujeitos degradao, pelo que so dos maisfrequentemente abrangidos nas intervenes. A sua importncia na imagem dos edifcios

    determinante, pelo que, tambm por isso, existe uma grande presso para os renovar.

    No entanto, as mesmas razes que levam a repar-los ou substitu-los, justificam tambm um grande

    cuidado nessas intervenes, surgindo como fundamental um bom conhecimento da constituio e

    funcionamento dos revestimentos antigos.

    Na presente comunicao aborda-se o comportamento gua das paredes antigas, descrevem-se

    sinteticamente os revestimentos antigos e referem-se as caractersticas fundamentais a que devem

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    obedecer os revestimentos de substituio, nomeadamente no que se refere a rebocos e tintas.

    Apresentam-se os resultados de uma campanha experimental sobre vrios tipos de tintas minerais,

    com formulaes vocacionadas para revestimento de edifcios antigos, concluindo-se com uma anlise

    da sua adequabilidade para esse efeito.

    1. INTRODUOAs paredes dos edifcios antigos, anteriores ao advento do beto armado, tinham uma constituio e

    um modelo de funcionamento muito diferentes das actuais. Embora, naturalmente, os mtodos

    construtivos de paredes tenham evoludo ao longo do tempo e sejam muito diferentes de regio para

    regio, existem aspectos bsicos comuns no seu funcionamento: as paredes exteriores acumulavam a

    funo resistente com a funo de proteco contra os agentes climticos e as aces externas emgeral; os materiais usados na constituio das paredes eram mais porosos e deformveis que os

    usados actualmente e a capacidade de resistncia e de proteco era assegurada essencialmente

    atravs da espessura.

    Um aspecto particularmente importante est relacionado com a proteco contra a humidade. Com

    efeito, as paredes dos edifcios actuais so construdas de forma a impedir, tanto quanto possvel, a

    penetrao da gua do exterior, razo pela qual se executam cortes de capilaridade junto s

    fundaes, se usam revestimentos impermeabilizantes, caixilharia preferencialmente estanque e

    coberturas e remates cuidados. Pelo contrrio, o modelo de funcionamento das paredes antigas, maisespessas e porosas, sem cortes de capilaridade, admitia a entrada de gua para o interior da alvenaria

    mas evitava uma permanncia prolongada, procurando promover a sua fcil e rpida sada para o

    exterior. Assim, a ascenso capilar da gua atravs das fundaes (naturalmente, em quantidade

    moderada), fazia parte do funcionamento normal da parede, que rapidamente promovia a sua expulso

    por evaporao [1, 2].

    As intervenes de conservao e reabilitao a realizar sobre edifcios antigos devem respeitar os

    modelos de funcionamento originais, sob pena de provocar patologia mais grave que a que se pretende

    reparar. Para isso, essencial manter os materiais e solues originais, ou, quando necessrio,

    substitu-los por outros compatveis, se possvel com as caractersticas determinantes para o seu

    comportamento semelhantes s dos materiais e solues pr-existentes [3].

    Os revestimentos de paredes, pela sua grande exposio s aces externas e pelo seu papel de

    proteco das alvenarias, so dos elementos mais sujeitos degradao, pelo que so dos mais

    frequentemente abrangidos nas intervenes. A sua importncia na imagem dos edifcios

    determinante, pelo que, tambm por isso, existe uma grande presso para os renovar.

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    No entanto, as mesmas razes que levam a repar-los ou substitu-los, justificam tambm um grande

    cuidado nessas intervenes, surgindo como fundamental um bom conhecimento da constituio e

    funcionamento dos revestimentos antigos.

    Para alm das questes funcionais, no nos esqueamos que a conservao e o restauro dascamadas exteriores dos edifcios (as mais visveis!) tm que ser encarados no mbito dos conceitos

    gerais da conservao. Sendo elementos fundamentais da arquitectura, so testemunhos do passado

    e merecem ser preservadas a sua histria, tcnica e esttica (figs. 1 e 2).

    2. REVESTIMENTOS ANTIGOSNas paredes antigas rebocadas os revestimentos eram geralmente constitudos pelas seguintes

    camadas principais:

    Regularizao e proteco:

    Emboo Reboco (propriamente dito) 1 Esboo

    Proteco, acabamento e decorao:

    Barramento (ou guarnecimento) Pintura, em geral mineral

    As camadas de regularizao e proteco eram constitudas por argamassas de cal e areia,

    eventualmente com adies minerais e aditivos orgnicos. Normalmente, as camadas internas tinham

    granulometria mais grosseira que as externas e a deformabilidade e porosidade iam aumentando das

    camadas internas para as externas, promovendo assim um bom comportamento s deformaes

    estruturais e gua. Cada uma das camadas principais referidas podia, por sua vez, ser constituda

    por vrias subcamadas. Com efeito, para a mesma espessura total, camadas finas em maior nmero

    permitiam uma melhor capacidade de proteco [2] e uma durabilidade superior.

    Os barramentos ou guarnecimentos [4] eram constitudos por massas finas de cal e p de pedra,tambm geralmente aplicadas em vrias subcamadas, com finura crescente das mais interiores para as

    mais exteriores. Estas camadas eram muito importantes para a proteco do reboco, verificando-se

    que, quando se destacam, se assiste a uma degradao rpida do reboco subjacente.

    A colorao das superfcies era conferida pela incorporao de pigmentos minerais na ltima camada

    de barramento, ou por camadas posteriores de pintura, em geral com base em cal, aditivada com

    pigmentos minerais e outras adies minerais.

    1 No restante desta comunicao usar-se- o termo reboco no significado que em geral lhe dado actualmente, derevestimento de argamassa no seu conjunto, ou seja, do conjunto das camadas de emboo, reboco e esboo.

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    3. CARACTERSTICAS DAS ARGAMASSAS DE REBOCO DE SUBSTITUIO

    Tendo em conta os aspectos referidos, recomenda-se que os rebocos existentes sejam, tanto quantopossvel, mantidos e reparados pontualmente e que, quando o tipo e grau da degradao seja tal que

    torne necessria a sua substituio, se usem rebocos de cal.

    Diversos estudos de investigao, nacionais e estrangeiros, apontam composies possveis e

    metodologias para a formulao de argamassas a usar para obter rebocos compatveis, dos quais se

    destacam, no mbito nacional, os produzidos ou com colaborao do LNEC [3, 5, 6, 7, 8].

    De um modo geral os rebocos recomendados devem verificar os requisitos fundamentais estabelecidos

    no quadro 1.

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    Quadro 1 REQUISITOS DOS REBOCOS A USAR EM EDIFCIOS ANTIGOS

    Caractersticas mecnicas aos 90 d (MPa)Comportamento

    Ensaios clss

    Argamassa Resistncia traco

    Rt

    Resistncia compresso

    Rc

    Mdulo deelasticidade

    E

    Aderncia ao suporte

    Ra(MPa)

    Comportamento s

    foras desenvolvidaspor retracorestringida

    Frmx (N) *G (N.mm)

    Permencia aovapor de gua

    (m)

    Coeficiente dcapilaridade C

    (kg/m2.h1/2)

    Requisito geral, aaplicar quando seconhecerem as

    caractersticas dosuporte

    Caractersticas mecnicas semelhantess das argamassas originais e inferioress do suporte.

    Resistncia aoarrancamento (Ra)inferior resistncia traco do suporte:a rotura nunca deve

    ser coesiva pelosuporte.

    Fora mximadesenvolvida por

    retraco restringida(Frmx) inferior

    resistncia tracodo suporte.

    Capilaridade e permeabilidadeao vapor de gua semelhantes

    s argamassas originais esuperiores s do suporte.

    Reboco exterior 0,2 0,7 0,4 2,5 2000-50000,1 0,3

    ou com roturacoesiva pelo reboco

    < 0,08 < 12; > 8

    Reboco interior 0,2 0,7 0,4 2,5 2000-50000,1 0,3 ou com

    rotura coesiva peloreboco

    < 0,10 -

    Juntas 0,4 - 0,8 0,6 3,0 3000-60000,1 0,5 ou com

    rotura coesiva pelaargamassa

    < 70> 40

    < 0,10 < 12; > 8

    * Fr max Fora mxima devida retraco restringida; G Energia de rotura por traco

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    4. REPINTURA DOS PARAMENTOS EXTERIORES DOS EDIFCIOS ANTIGOS

    4.1 Principais caractersticas das tintas a usar

    A repintura dos edifcios antigos um dos grande problemas com que os tcnicos da rea daconservao e restauro se deparam hoje em dia. Repintar um edifcio com produtos

    inadequados pode comprometer a superfcie do edifcio, muitas vezes at de maneira

    irreversvel, impossibilitando eventuais intervenes futuras e afectando seriamente a sua

    durabilidade.

    Verifica-se que as tintas plsticas, acrlicas ou de PVA, encontradas hoje em dia no mercado,

    funcionam de forma inadequada sobre paredes de edifcios antigos. Devido sua composio

    qumica, quando aplicadas formam um filme, que tem uma aco impermeabilizante nas

    paredes, alterando o seu comportamento global gua. Estas tintas apresentam tambm, emgeral, uma aderncia deficiente s superfcies frgeis e muitas vezes com baixa coeso

    superficial dos rebocos de cal, sejam eles antigos ou de substituio. Assim, surgem facilmente

    vrios tipos de degradao na camada pictrica, tais como, empolamento, fissurao e

    destacamento (figs. 3 e 4).

    Os rebocos e as paredes, sujeitos a um perodo de permanncia da gua mais elevado, sofrem

    tambm maior degradao. Um dos mecanismos mais significativos dessa degradao a

    cristalizao de sais, sob a forma de criptoflorescncias, quer entre a superfcie externa do

    reboco e a camada de pintura contribuindo para a perda de aderncia da tinta - quer no interior

    da camada de reboco, provocando a perda de coeso do reboco, que se torna pulverulento.

    Neste processo, devido, quer ao mecanismo referido relacionado com os movimentos da gua,

    quer falta da proteco dada pelas camadas externas, ao destacamento da pintura segue-se a

    perda de coeso e a desagregao do reboco e, em seguida, a degradao da prpria alvenaria

    (perda de coeso da argamassa de juntas e dos tijolos cermicos, quando esse o caso).

    Um outro ponto importante e polmico, que deve ser estudado com todo o rigor cientfico, a

    escolha da cor [9, 10]. A cor do edifcio histrico a imagem esttica de um monumento, de uma

    rua, de um centro histrico, que de grande importncia para a definio do seu valor enquanto

    patrimnio e para a autenticidade da sua imagem histrica e urbana. A manuteno da cor

    original permite preservar a riqueza cromtica e tcnica existente em cada regio.

    O recurso a tcnicas actuais de anlise estratigrfica permite estudar as cores das vrias

    camadas de pintura que o edifcio teve ao longo do tempo e fazer uma opo bem fundamentada

    (figs. 5 e 6).

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    Os estudos realizados [11, 12, 13] conduzem concluso de que uma tinta adequada para

    paramentos exteriores de edifcios antigos deve ter em conta os seguintes factores:

    Comportamento gua:

    Permeabilidade ao vapor de gua a tinta no deve introduzir uma resistncia significativa evaporao da gua contida nos suportes e argamassas.

    Impermeabilidade gua a tinta deve fornecer alguma proteco contra a chuva,atrasando a sua penetrao na parede. No entanto, no deve ser muito impermevel, j que,

    nesse caso, pode favorecer a cristalizao de sais na camada antecedente [11].

    Resistncia s aces externas (durabilidade):

    Resistncia aos cidos ambientais a gasolina e os combustveis em geral produzemgases sulfurosos que se transformam em cidos em contacto com a gua e podem atacar

    quimicamente a tinta.

    Resistncia alcalinidade do suporte os suportes so, geralmente, bastante alcalinos,pelo que as tintas a usar sobre eles devem resistir bem a esse tipo de ambiente, mesmo na

    presena de gua.

    Resistncia aos raios ultravioleta a tinta deve possuir uma cor estvel quando exposta aosol.

    Resistncia s variaes climticas as tintas devem manter-se inalteradas, do ponto devista qumico, da cor e da aderncia ao suporte durante vrios anos de exposio s

    variaes climticas normais em cada regio: calor/chuva, chuva/frio, calor/frio; a escala de

    tempo dos edifcios antigos, principalmente dos monumentos, diferente da dos edifcios

    correntes actuais, pelo que se exige uma maior durabilidade aos materiais usados nas

    reparaes.

    Resistncia aos fungos e micro-organismos as tintas devem ter alguma resistncia fixao e desenvolvimento de fungos e outros micro-organismos.

    Semelhana esttica:

    Aspecto esttico da superfcie pintada a imagem da arquitectura histrica no deve serperdida na sua textura e cor .

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    4.2 Meios tradicionais e modernos para pintar os edifcios antigos: os revestimentos

    minerais

    Pelo que foi exposto anteriormente, as tintas para paredes de edifcios antigos de alvenaria

    rebocada com argamassas de cal area no devem formar filme, recomendando-se as de basemineral, pela melhor compatibilidade apresentada com os materiais constituintes da parede.

    Apresentam-se em seguida algumas opes que melhor se adaptam a edifcios antigos.

    Tintas de cal

    A pintura com cal, ou caiao, obtida pela aplicao do leite de cal (suspenso de cal em

    gua) puro ou aditivado com pigmentos inorgnicos. O tipo de cal extremamente importante,

    dependendo dela a coeso da camada de carbonato de clcio que constitui a caiao.

    Recomenda-se a utilizao de cal area em pasta, bem apagada, em vez da cal area em p,

    para garantir maior poder de cobertura, melhor aderncia ao suporte e maior durabilidade. A

    aplicao da caiao feita em camadas de pequena espessura, com a parede hmida, para

    no fissurar, sobre uma camada de reboco spera. A relao cal/pigmento/gua tem de ser feita

    com preciso. De facto, uma grande quantidade de gua faz migrar com mais facilidade a cal

    para a superfcie, o mesmo acontecendo com o pigmento, ao passo que uma quantidade de

    gua insuficiente dificulta a aplicao da cal e a sua homogeneidade. A tinta de cal pode ser

    aditivada com uma resina acrlica, aps testes e escolha da resina adequada e da quantidade

    apropriada, para dar maior durabilidade e resistncia a esta tinta. No entanto, o uso de umaquantidade excessiva de resina pode endurecer e tornar quebradia a camada de pintura e

    reduzir significativamente a sua permeabilidade ao vapor de gua [12].

    Barramentos

    O barramento uma tcnica de revestimento usada desde a antiguidade e teve o seu apogeu

    durante o perodo Barroco, onde inmeros palcios e monumentos tiveram as suas paredes

    revestidas com recurso a esta tcnica. Entretanto, este revestimento continuou a ser usado ao

    longo dos anos. uma ptima soluo de acabamento exterior, devido sua durabilidade ecapacidade de proteco. O barramento composto por cal, p de pedra ou areia de

    granulometria fina, pigmento inorgnico e gua. O pigmento diludo em gua e misturado

    massa de cal, adicionando-se em seguida a areia ou o p de pedra a esta mistura. A aplicao

    feita com a parede hmida, para no fissurar, sobre uma camada de reboco spero [4]. No

    entanto, esta tcnica difcil de dominar actualmente, exigindo pessoal especializado,

    principalmente no caso dos barramentos coloridos. Alm disso, pela mo-de-obra que exige,

    resulta muito caro, pelo que apenas se pode encarar a sua aplicao em grandes superfcies em

    edifcios com valor histrico ou arquitectnico considervel.

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    Tintas de silicatos

    As pinturas com tintas de silicatos, conhecidas desde a antiguidade clssica, foram j

    encontradas nos frescos que adornam as runas de Pompeia e Herculano [14].

    Com o passar dos anos e com o avano da industria qumica, estas tintas, baseadas em silicatos

    de potssio, foram sendo modificadas, para se obterem produtos mais fceis de aplicar. Hoje em

    dia as tintas de silicatos so constitudas basicamente por: gua, um aglutinante inorgnico

    (silicato de potssio), um aglutinante orgnico (polmero ou emulso acrlica), cargas (calcite,

    caulino, etc.) e pigmentos (inorgnicos). Segundo a Norma DIN 18363, a quantidade de

    polmero ou emulso acrlica no deve ser superior a 5%, a fim de manter o carcter inorgnico

    da tinta.

    5. ESTUDO EXPERIMENTAL COM TINTAS MINERAIS: CAIAES E TINTAS DESILICATOS

    5.1 Objectivos do estudo experimental realizado

    Estando ciente que a pintura para edifcios antigos tem levantado no meio tcnico e cientfico

    algumas questes, principalmente relativas escolha do tipo de tinta, desenvolveu-se, no

    Departamento de Edifcios do LNEC, um estudo experimental sobre dois diferentes tipos de

    tintas consideradas, partida, compatveis com as argamassas antigas de cal area: as

    caiaese as tintas de silicatos[12, 13]. Tendo como objectivo fazer uma caracterizao fsica eavaliar o desempenho destas pinturas sobre uma argamassa de cal, foram realizados os

    seguintes ensaios: permeabilidade ao vapor de gua, absoro de gua por capilaridade,

    avaliao da resistncia introduzida pelo revestimento secagem do suporte, envelhecimento

    artificial acelerado e envelhecimento natural.

    Apresenta-se em seguida um resumo dos principais resultados obtidos.

    5.2 Absoro de gua por capilaridade

    Pretendeu-se analisar a resistncia introduzida pelos diferentes tipos de pintura absoro de

    gua da argamassa de reboco.

    O ensaio foi realizado com base no projecto de Norma Europeia prEN 1015-18, utilizando

    cilindros de argamassa de cal area com 0,20 m de dimetro e 20 mm de espessura, sem

    pintura e com os vrios tipos de pintura estudados.

    Na figura 7 apresenta-se o grfico que corresponde, em cada instante, quantidade de gua

    absorvida pelos provetes, desde o incio do ensaio at s 48 horas; no quadro 2 apresenta-se o

    coeficiente de capilaridade mximo de cada revestimento, ao longo das 48 h de ensaio.

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    Fig. 7 - Absoro de gua por capilaridade

    Quadro 2 - Resultados dos ensaios de determinao do Coeficiente de Capilaridade

    mximo

    Tintas de silicatos

    Argamassasem pintura Caiaosimples

    Caiao

    aditivadacomresina

    Caiaoaditivada

    comresina ecasena

    A B C

    Tempo deensaio (h) 1 1 1 8 8 24 8

    Caracte-rstica

    Coeficiente de Capilaridade mximo (kg/m2.h)

    Branco 5,14 4,80 - - 1,22 0,81 1,42Amarelo

    Ocre - - - - 1,05 1,21 1,26

    VermelhoOcre - - 4,46 0,83 - - -

    Anlise dos resultados

    Observou-se que a quantidade de gua absorvida s 48 horas de ensaio varia com o tipo de

    tinta, mas tambm com a cor, o que natural, j que os diferentes pigmentos introduzem

    caractersticas diferentes.

    Absoro de gu a

    0

    20

    40

    60

    80

    1 00

    1 20

    1 40

    1 60

    0 1 0 20 30 40 50 60

    Tempo (h)

    Absorogua(g)

    Silicato A Branco

    Silicato B Branco

    Silicato C Branco

    Silicato A Ocre

    Silicato B Ocre

    Silicato C Ocre

    Caiao simples Branca

    Caiao com resina

    VermelhaCaiao com resina e

    casena VermelhaArgamassa sem pint ura

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    Duas das caiaes absorveram uma maior quantidade de gua que as tintas de silicatos. No

    entanto, a caiao aditivada com resina e casena retardou de forma significativa a absoro de

    gua pela argamassa de suporte, ultrapassando mesmo as tintas de silicatos. Assim, esta

    caiao pode alterar significativamente o comportamento gua da parede. A evoluo no

    tempo dos coeficientes de capilaridade confirmam estas concluses. Para as caiaes e para aargamassa sem pintura, os valores atingem o pico mximo com 1 hora de ensaio. Entretanto,

    para a caiao aditivada com resina e casena, o pico mximo foi atingido apenas com 8 horas

    de ensaio, o mesmo acontecendo com as tintas de silicatos, com excepo da tinta de silicato B,

    que s atingiu o pico mximo s 24 horas de ensaio. Desta forma, verifica-se que as tintas de

    silicatos retardam a absoro de gua pelo reboco, assim como a caiaoaditivada com resina e

    casena.

    5.3 Permeabilidade ao vapor de gua

    Pretendeu-se analisar a resistncia introduzida pelos diferentes tipos de pintura evaporao da

    gua atravs do conjunto do revestimento: reboco mais pintura.

    Este ensaio foi realizado segundo a Norma Europeia EN 1015-19, usando provetes semelhantes

    aos usados para a capilaridade (ver 5.2). No quadro 3 apresentam-se os resultados do ensaio,

    expressos em termos da espessura da camada de ar de difuso equivalente.

    Quadro 3 - Resultados dos ensaios de Permeabilidade ao vapor de gua

    Tintas de silicatosArgamass

    a sempintura

    Caiaosimples

    Caiaoaditivada

    comresina

    Caiaoaditivada

    comresina ecasena

    A B C

    Caracte-rstica

    Permencia ao vapor de gua Espessura da camada de ar de difuso equivalenteSD (m)

    Branco 0,14 0,15 - - 0,17 0,19 0,19Amarelo

    Ocre - - - - 0,18 0,19 0,21

    VermelhoOcre - - 0,16 0,16 - - -

    Anlise dos resultados

    Os provetes pintados com caiaes apresentaram maior permeabilidade ao vapor de gua, com

    valores muito prximos da argamassa sem pintura. As tintas de silicatos apresentaram

    diferenas entre tintas e cores, sendo a tinta de silicatos A a que apresentou uma maior

    permeabilidade ao vapor de gua. No entanto, em todos os casos os valores obtidos no se

    distanciam excessivamente dos da argamassa sem pintura.

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    5.4 Resistncia introduzida pelo revestimento secagem do suporte

    Este ensaio teve como objectivo avaliar a influncia da pintura na secagem do suporte e foi

    realizado de acordo com a Ficha de Ensaio do LNEC FE Pa 38.

    Anlise dos resultados

    Os resultados deste ensaio indiciam que as tintas de silicatos demoraram mais a atingir o valor

    mximo de secagem que as caiaes, podendo concluir-se que as caiaes no dificultam a

    secagem das paredes, enquanto as tintas de silicatos a atrasam moderadamente.

    5.5 Envelhecimento artificial acelerado (ciclos calor/chuva/gelo/degelo)

    Este ensaio teve como objectivo observar a resistncia das pinturas s variaes de condies

    climticas (calor/frio;chuva/calor;chuva/gelo) e foi realizado de acordo com um mtodo de ensaioadaptado no LNEC [15], com base num ensaio definido pelo CSTB [16].

    Anlise dos resultados

    A anlise dos resultados foi feita por comparao visual, tendo sido analisadas as alteraes de

    cor e outras degradaes (figs. 8 e 9). Nas caiaes de cor branca a cor manteve-se estvel,

    verificando-se um pequeno desgaste da camada de carbonato de clcio, enquanto as caiaes

    de cores amarelo e vermelha se apresentaram bastantes esmaecidas e as caiaes aditivadas

    com resina e resina e casena, para alm do esmaecimento da pintura, apresentaram manchasde vrias tonalidades, aparentemente relacionadas com a presena da resina.

    A tintas de silicatos tiveram um bom comportamento quanto degradao cromtica,

    apresentando apenas um ligeiro esmaecimento da pintura aps 30 dias de ensaio.

    5.6 Envelhecimento artificial acelerado Xenotest

    Este ensaio foi realizado segundo a Norma ISO 11341, sobre dois provetes de cada produto,

    constitudos por placas de fibrocimento revestidos com uma camada de argamassa de 10 mm deespessura. Teve como objectivo observar a resistncia das pinturas s variaes climticas e

    radiao ultra-violeta do sol.

    Anlise dos resultados:

    A anlise do resultado foi feita por observao visual, medio da diferena da cor E, do ndice

    de brancura WI, e do ndice de amarelecimento YI. As tintas de silicatos e as caiaes sofreram

    alteraes diferenciadas, no que diz respeito ao ensaio de envelhecimento artificial Xenotest. As

    caiaes apresentaram uma camada esbranquiada (carbonato de clcio) sobre a pintura. Astintas de silicatos A e B de cores Amarelo Ocre e Vermelho Ocre, alm de alterao de cor,

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    apresentaram manchas brancas e brilhantes sobre a camada pictrica, aps 1000 horas de

    ensaio.

    5.7 Envelhecimento Natural

    Este ensaio teve como objectivo observar a resistncia das pinturas s condies ambientais

    naturais. Foi realizado sobre muretes de alvenaria de tijolo construdos na Estao de Ensaio

    Natural de Revestimentos de Paredes do LNEC, revestidos com uma argamassa de cal area.

    Mtodo de ensaio

    Os muretes foram pintados com as caiaes e as tintas de silicatos. Aps aplicao e secagem

    das tintas, as cores de cada pintura foram identificadas atravs de um cdigo de leitura da cor

    NCS index edition 2 1995. A segunda leitura dos ndices NCS foi realizada aps 1 ano de

    exposio. Para as caiaes houve ainda tempo de se realizar uma terceira leitura, aos 2 anos,

    para verificar a diferena de cor e outras anomalias.

    Anlise dos resultados

    Aps um ano de exposio natural as superfcies dos muretes pintados com caiaes e com

    tintas de silicatos mantiveram-se praticamente inalteradas, ocorrendo apenas um ligeiro

    esmaecimento da cor para ambos os tipos de pintura.

    Aps dois anos de exposio natural as superfcies dos muretes pintados com caiaesapresentaram um esmaecimento um pouco mais acentuado que no ano anterior. As caiaes de

    cores Branca e Amarelo Ocre mostraram-se mais estveis, ocorrendo apenas um pequeno

    esmaecimento da cor, que as Vermelho Ocre, que apresentaram um maior esmaecimento da

    cor. A caiao com resina de cor Vermelho Ocre apresentou ainda manchas sobre a camada

    pictrica, enquanto que na caiao com resina e casena de cor Vermelho Ocre surgiu uma

    grande quantidade de manchas, claras e escuras e de pequenos destacamentos da pintura.

    6. CONCLUSES

    Os revestimentos por pintura de base mineral apresentam um desempenho funcional positivo

    face s aces especficas para edifcios antigos, o que foi comprovado pelos ensaios

    realizados.

    Tanto as caiaes como as tintas de silicatos apresentaram, em geral, um comportamento

    gua compatvel. Com efeito, mostraram alguma capacidade de proteco contra a gua do

    exterior, provocando um atraso na penetrao, que pode ser suficiente para permitir a secagem

    parcial antes de atingir a alvenaria, e permitindo, por outro lado, uma secagem fcil e rpida,

    quando as condies exteriores forem favorveis evaporao.

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    Quanto ao envelhecimento natural e artificial, detectaram-se algumas diferenas: as tintas de

    silicatos mostraram-se mais resistentes que as caiaes, como era esperado devido sua

    composio qumica.

    No que diz respeito ao aspecto esttico, que , no caso do patrimnio histrico - trate-se demonumentos, de centros histricos de cidades, ou, de um modo geral, de edifcios com valor

    patrimonial -, de grande importncia para conservar a imagem dos centros urbanos, quer as

    caiaes quer as tintas de silicatos apresentam textura e brilho semelhantes aos originais. No

    entanto, as tintas de silicatos apresentam um maior poder de cobertura, dotando a superfcie de

    cor uniforme, ao contrrio do que acontece com as caiaes, que tm alguma transparncia. No

    caso dos edifcios antigos, em geral os revestimentos originais mantinham visveis todas as

    irregularidade das paredes com uma tonalidade cheia de nuances, logo as tintas de silicatos

    afastam-se um pouco da imagem original (figs. 10 e 11), o que, nalguns casos, pode ser um

    factor contra.

    No entanto, a escolha do tipo de tinta deve ter ainda em conta outros factores:

    A cal, em presena dos gases sulfurosos presentes na poluio atmosfrica, degrada-se,dando origem formao de sulfatos, que so solveis na gua da chuva. Assim, em

    edifcios situados em grandes centros urbanos, muito expostos poluio atmosfrica, a

    opo pela caiao praticamente invivel, sendo prefervel o uso das tintas de silicatos,

    devido sua durabilidade e estabilidade cromtica.

    Em edifcios multifamiliares e, de um modo geral, em conjuntos edificados com algumadimenso, aconselhvel a utilizao de tintas de silicatos, devido maior durabilidade em

    relao s caiaes, no que se refere s aces climticas e s radiaes ultra-violeta.

    A caiao deve ser fabricada e aplicada com bastante rigor: deve ser usada uma cal de boaqualidade, sendo prefervel o uso da cal em pasta, que produz uma caiao com uma maior

    estabilidade cromtica e melhor aderncia e coeso, que a caiao com cal em p; caso se

    adicione pigmento caiao, este deve ser mineral e ter boa resistncia aos raios UV e IV; aadio de resina acrlica caiao confere-lhe maior coeso e poder de aderncia, desde

    que usada de maneira correcta (percentagem e tipo de resina), para no alterar as

    caractersticas fsicas da caiao.

    Todos estes aspectos implicam que, para se obter uma boa caiao, necessrio dispor de

    aplicadores experientes na tecnologia de preparao e aplicao tradicionais da cal, mas

    tambm com formao que lhes permita assimilar alteraes introduzidas recentemente

    (como as adies de resinas) para procurar assegurar um melhor desempenho. Assim, a

    indisponibilidade deste tipo de mo-de-obra pode inviabilizar a opo por uma soluo decaiao, apontando de novo a via das tintas de silicatos.

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    Finalmente, necessrio recordar que o valor histrico e arquitectnico do edifcio, ouconjunto, objecto da interveno, determinante na escolha da tinta a usar na repintura. De

    facto, embora os critrios funcionais, relacionados com as caractersticas analisadas, devam

    sempre ser cumpridos, os critrios esttico e de respeito pelos materiais e solues originais

    podem ter um peso maior ou menor conforme o valor patrimonial do edifcio e, portanto,conforme for maior ou menor a necessidade de preservao e respeito histrico.

    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS

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    Avaliao experimental da capacidade de proteco de argamassas de reboco com

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    3. VEIGA, M. Rosrio et al. Metodologias para Caracterizao e Conservao deArgamassas de revestimento de Edifcios Antigos. Relatrio final do Projecto

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    4. GONALVES, Teresa Guarnecimentos tradicionais para paredes exteriores deedifcios antigos. Lisboa, LNEC, Janeiro de 1996. Relatrio 11/96-NCCt.

    5. MARGALHA, M. Goreti - O uso da cal em argamassas no Alentejo. vora, Universidade devora, 1997 (dissertao de Mestrado).

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    2001, Proceedings. Guimares, Universidade do Minho, Novembro de 2001.

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    12.GONALVES, Teresa; TAVARES, Martha. - Estudo experimental de caiaes paraparamentos exteriores de edifcios antigos, Lisboa, LNEC,1999. Relatrio 126/99, NCCt.

    13.TAVARES, Martha; VEIGA, M do Rosrio; EUSBIO, Isabel. Uma soluo actual paraacabamento de paramentos exteriores de edifcios antigos: As tintas de silicatos,

    Lisboa, LNEC. Relatrio em fase de publicao.

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    15.VEIGA, M. Rosrio; CARVALHO, Fernanda - Some performance characteristics of limemortars for use on rendering and repointing of ancient buildings. Comunicao

    apresentada 5th International Masonry Conference. Londres, October 1998. Lisboa, LNEC,

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    Paris, (341), Cahier 2669-4, juillet-aot 1993.