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Ajustes na nutrição e alimentação das tilápias

No atual desenvolvimento da tilapicultura no Brasil, falar sobre a importância da nutrição e alimentação no desempenho e saúde das tilápias pode até parecer preciosismo. Mas ainda há muitos piscicultores em nosso país com dificuldades na definição de um programa nutricional e alimentar e na avaliação da relação custo/benefício das rações disponíveis no mercado. Uma dúvida freqüente nas fazendas é se o manejo alimentar empregado é o mais adequado. Portanto, nada mais oportuno do que começar 2007 apresentando estratégias de alimentação que possam melhorar ainda mais o desempenho dos cultivos de tilápia, que é hoje a espécie mais produzida na aqüicultura nacional.

Por: Fernando Kubitza, Ph.D.Especialista em nutrição e produção de peixesAcqua Imagem Serviços [email protected]

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Alimentação de Tilápia

Os equívocos têm início já na produção dos alevinos. No intuito de fornecer a melhor nutrição possível, o produtor lança mão de rações com níveis de proteína muito acima das exigências nutricionais estabelecidas para pós-larvas e alevinos de tilápia. As conseqüências disso serão discutidas oportuna-mente. Na recria e engorda em tanques de terra os complica-dores são outros na hora de definir a estratégia alimentar. Com pouca compreensão da relação entre a densidade de plâncton e a biomassa estocada, há produtores que se excedem nas taxas de alimentação sob baixa estocagem (1 a 2 tilápias/m2), não tirando proveito da contribuição do alimento natural. Outros utilizam densidades elevadas e, para isso, investem em aeração e dis-põem de renovação de água, mas ainda insistem em usar rações baratas de baixa densidade nutricional, e que acabam resultando em pior conversão alimentar, menores taxas de crescimento e maior acúmulo de gordura visceral.

Outro complicador em tanques de terra é a dificuldade que muitos tilapicultores têm em estabelecer e manter uma ade-quada densidade de plâncton e implementar um eficiente manejo nutricional e alimentar. Geralmente os peixes são alimentados em excesso e acabam ficando preguiçosos no aproveitamento do alimento natural. Nos cultivos de tilápia em tanques-rede o manejo nutricional é um pouco mais uniforme, pois não há muita margem para brincadeiras e experimentações. Isso, no entanto, não impede que cada produtor experimente e encontre estratégias de alimentação que melhor sirvam às características do seu empreendimento, sem é claro prejudicar o desempenho dos peixes. Ainda assim, tenho visitado muitos produtores que já trabalham com tanques-redes há anos e uma das grandes ques-tões é se o manejo alimentar que empregam está adequado.

Em oportunidades anteriores nesta revista foram apresen-tadas matérias específicas sobre a nutrição e o manejo alimentar no cultivo de tilápias (Panorama da Aqüicultura, 1999 – Ed.52 e 53; Panorama, 2000 – Ed.60). Não por mera coincidência, estas matérias sempre acompanharam momentos importantes na tilapicultura nacional. O primeiro deles foi o início do cultivo da tilápia em tanques-rede no reservatório de Xingó no Rio São Francisco, marcado pelo Festival da Tilápia de Paulo Afonso (maio, 1999), que teve repercussão nacional e foi o estopim da tilapicultura em tanques-rede no Nordeste do Brasil. O segundo, foi o Simpósio Internacional sobre a Aqüicultura de Tilápias (ISTA – setembro, 2000) realizado no Rio de Janeiro, e que deve ser considerado um importante marco na difusão da tecnologia de cultivo de tilápias em nosso país.

Nos anos que seguiram até o momento houve um grande avanço no cultivo de tilápias. Primeira-mente pelo papel dos fabricantes de rações em ofertar produtos de qualidade para assegurar o sucesso dos cultivos intensivos (particularmente em tanques-rede, que até então vinha sofrendo grandes prejuízos com desequilíbrios nutricionais e doenças decorrentes da má nutrição). Segundo, pelos investimentos feitos em anos recentes na industrialização e comercialização da tilápia, com foco na exportação e na popularização deste peixe no mercado interno. A tilápia é hoje a espé-

cie mais produzida na aqüicultura nacional (seguramente cerca de 100 mil toneladas anuais) e um produto comum de se encontrar nas principais redes de supermercados do país, com poucas exceções. E, na lembrança deste autor, de 2000 até o momento, nada mais foi escrito nesta revista especificamente sobre o manejo nutricional e alimentar no cultivo de tilápias. Portanto, nada mais oportuno do que começar 2007 discutindo importantes aspectos do manejo nutricional e alimentar na produção de tilápias e apresentando estratégias de alimentação que possam ser de utilidade para a melhoria do desempenho dos cultivos.

Os cuidados com a nutrição dos reprodutores

Ao contrário do que muita gente imagina, não são o hormônio, o álcool, a ração e a mão de obra usada na reversão os principais componentes do custo de produção de alevinos. Mas sim, as despesas com a formação e manutenção dos re-produtores que, em uma situação normal, chegam a representar algo entre 30 e 60% deste custo, dependendo do sistema de produção de alevinos adotado. Portanto, descuidos no manejo dos reprodutores que prejudiquem a produção e a qualidade das pós-larvas e alevinos, amplificam em muito o custo de pro-dução. Entre estes descuidos está a má nutrição. Deficiências na nutrição comprometem não apenas a produção de ovos e pós-lavras, mas também o desenvolvimento, a sobrevivência e a qualidade dos alevinos.

Em diversas espécies de peixes já foram investigados os efeitos negativos da má nutrição sobre o desempenho repro-dutivo e a qualidade dos ovos e pós-larvas. No caso particular das tilápias, são resumidas aqui algumas informações. As rações para reprodutores de tilápia do Nilo devem ter entre 28 e 40% de proteína (Wee e Tuan, 1988; Siddiqui et al 1998; Al-Hafedh et al 1999). Baixa ingestão de proteína resulta em atraso na maturação sexual e baixa produção de ovos. Além da importância da nutrição protéica, é de conhecimento geral o impacto negativo de deficiências em vitaminas, minerais e ácidos graxos na eficiência reprodutiva de diversas espécies de peixes. Com tilápia, em particular, há um estudo digno de discussão neste artigo (Tabela 1).

Tabela 1 - Efeito da deficiência de vitamina C na ração dos reprodutores sobre a eclosão dos ovos e a qualidade das pós-larvas de Tilápia de Moçambique (Oreochromis mossambicus). Adaptado de Soliman et al 1986

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Alimentação de Tilápia

Reprodutores de tilápia de Moçambique alimentados com ração desprovida de vitamina C produziram ovos e larvas de baixa qualidade. A cada 1.000 ovos gerados pelas fêmeas mal nutridas, apenas 540 eclodiram (taxa de eclosão de 54%), resultando na produção de 540 pós-larvas. Destas, 57% (307 pós-larvas) apresentaram deformidades corpo-rais que comprometiam o seu desenvolvimento, restando apenas 132 pós-larvas aparentemente sadias (43% das que nasceram). Já para fêmeas bem nutridas, a cada 1.000 ovos produzidos, eclodiram 880 pós-larvas sadias (6,7 vezes mais pós-larvas sadias). As pós-larvas produzidas por ma-trizes que receberam ração com vitamina C apresentaram peso médio de 7,25mg (45% mais pesadas) do que as pós-larvas oriundas de fêmeas mal nutridas, com peso médio de 5mg. Ambos os grupos de pós-larvas foram submetidos a um período de crescimento de 35 dias, o equivalente à fase de reversão sexual. Durante este período as pós-larvas receberam ração nutricionalmente completa.

O interessante de notar é que, mesmo fornecendo uma adequada nutrição na fase de re-versão sexual, as pós-larvas oriundas de matrizes mal nutridas apresenta-ram baixa sobrevivência (1,8%) e crescimento (peso médio final de 0,03g), contra uma sobrevivência de 86,4% e peso médio final de 0,24g para as pós-larvas oriundas de ma-trizes bem nutridas. Este exemplo nos dá uma boa idéia do impacto da deficiência de uma única vitamina na ração dos reprodutores sobre a viabilidade dos ovos e a qualidade e a sobrevivência das pós-larvas. Deficiências de outras vitaminas e minerais com importantes funções fisiológicas na reprodução e no de-senvolvimento embrionário e larval podem comprometer seriamente a produção de alevinos.

Recomendações quanto ao manejo nutricional e alimentar na reprodução

Durante alguns anos tenho acompanhado o trabalho de diversos produtores de alevinos, não apenas de tilápias, mas também de peixes nativos, em diversas regiões do país. E, em muitas oportunidades, me deparei com situ-ações de baixa produção e qualidade de ovos (baixa taxa de fecundação e eclosão) e de pós-larvas, as quais foram corrigidas com a simples troca da ração que vinha sendo usada, confirmando o grande impacto da nutrição sobre a reprodução. Com espécies nativas, que desovam em uma época definida no ano, errar na nutrição dos reprodutores significa comprometer toda uma safra, porém com a tilápia, os erros com a nutrição podem ser rapidamente reparados.

Tilápias estão constantemente formando, enriquecendo seus ovos e desovando para atender a demanda reprodutiva imposta nos sistemas intensivos. Assim, mudanças na nutrição resultam em rápida resposta na produção e na qualidade dos ovos e das pós-larvas.

Minha recomendação aos produtores de alevinos de ti-lápia começa com o uso de rações nutricionalmente completas com pelo menos 32% de proteína na alimentação das matrizes. Estas rações devem ser usadas mesmo quando os reprodutores são estocados em tanques de terra com água verde (presença de fitoplâncton) e a uma baixa densidade (0,4 a 0,6kg de repro-dutor/m2). Rações de boa qualidade usadas na recria e engorda em tanques-rede geralmente suprem bem as necessidades nutricionais dos reprodutores. No entanto, em sistemas mais intensivos de reprodução (como a coleta de ovos em hapas) o uso de rações com 40% de proteína pode aumentar em 20 a 50% a produção de ovos e pós-larvas, além de melhorar a qualidade de ovos e conferir maior resistência das pós-larvas durante a reversão sexual, comparativamente ao uso de rações com 28

e 32% de proteína. Vale a pena avaliar isso, usando uma boa ração para peixes carnívoros. No entanto, o produtor deve estar ciente de que o fato de uma ração ter 40% de proteína não assegura que a mesma seja melhor do que uma com 32%. Importam a qualidade da proteína (digestibilidade e balanço em aminoá-cidos) e dos ingredientes, bem como o enriquecimento mineral e vitamínico e a qualidade do processo ao qual a ração foi submetida, dentre muitos outros fatores que podem interferir no valor nu-tritivo das rações. Na produção de ovos e pós-larvas em hapas os resultados da troca de uma ração podem ser avaliados rapidamente, desde que haja um registro preciso do número de ovos e pós-larvas coletados em cada hapa.

Quanto ao manejo alimentar dos reprodutores, algumas particularidades

devem ser compreendidas. Durante a reprodução as fêmeas se alimentam pouco, comparativamente aos machos, pois estão ocupadas com a incubação e proteção dos ovos e pós-larvas. Grande parte da farra na alimentação é feita pelos machos. Quando não é desejável que os reprodutores cresçam muito rápido, a taxa de alimentação deve ficar próxima dos níveis de manutenção (em torno de 0,4 a 0,5% do PV/dia). Assim, a ração deve ser fornecida de forma restrita. Uma boa estra-tégia é fornecer dia sim, dia não, uma quantidade de ração não superior a 1% da biomassa dos machos, em uma única refeição no dia. Dividir a alimentação em várias refeições pequenas não é recomendável quando se faz uma alimenta-ção restrita. Isso pode favorecer os peixes mais vorazes em detrimento dos mais tímidos, acentuando assim as diferenças de tamanho entre os machos.

"Deficiências de vitaminas e minerais

com importantes funções fisiológicas na reprodução e no desenvolvimento

embrionário e larval podem comprometer

seriamente a produção de alevinos"

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Quando se deseja que os reprodutores ganhem peso, a taxa de alimentação diária deve ficar entre 0,8 e 1% da biomassa total estocada (machos e fêmeas). Uma única refeição diária deve ser oferecida, para que todos os peixes tenham oportunidade de se alimentar. As fêmeas ganham peso durante a reprodução. Porém, este ganho de peso seria maior se elas fossem mantidas separadas dos machos, em descanso dentro de hapas ou de tanques. Se o interesse é aumentar rapidamente o tamanho das fêmeas, estas devem passar um tempo sem reproduzir e devem ser alimentadas diariamente entre 1 a 2% do PV dividido em duas refeições diárias.

Em meio à reprodução, os reprodutores devem ser alimentados preferencialmente antes das 10-11 horas, pois grande parte das desovas das tilápias ocorre em horários de muita luz (11 às 14 horas). Assim, não queremos muito alvoroço com peixes brigando pela ração no momento mais íntimo dos casais, principalmente se a reprodução é feita em hapas. Evite alimentar os peixes ao final do dia, para que eles não entrem o período noturno com a barriga cheia e possam sofrer mais com uma eventual queda nos níveis de oxigênio.

Proteína na ração das pós-larvas e alevinos durante a reversão sexual

Uma revisão nas pesquisas sobre a nutrição de pós-larvas e alevinos de tilápia do Nilo indica que, para pós-larvas e alevinos até cerca de 1g (fase de reversão sexual), os níveis adequados de proteína geralmente ficam entre 40 e 45%. Para alevinos de 1g a 10g os níveis de proteína na ração que resultaram em máximo crescimento ficaram entre 30 e 38% (Tabela 2).

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Tabela 2 - Níveis de proteína para máximo crescimento de pós-larvas e alevinos de tilápia do Nilo (Adaptado de Kubitza 2000; El-Sayed, sem data; Rotta et al 2003)

O interessante é que, mesmo com muitas informações disponíveis sobre as exigências protéicas para pós-larvas e alevinos de tilápia, a partir de 2002 diversas empresas de rações disponibilizaram e recomendaram rações com mais de 50% de proteína para a larvicultura de tilápias e outras

espécies de peixes. Seguindo estas orientações, muitos produ-tores de alevinos, com o intuito de oferecer a melhor nutrição possível e assim melhorar o crescimento e a condição dos seus alevinos, vêm utilizando estas rações na reversão sexual.

Em 2003 realizei um teste comparativo entre duas rações comerciais em pó para pós-larvas e alevinos: uma com 40% de proteína e outra com 55% (Tabela 3).

O principal motivo que me levou a realizar este teste foi o grande número de consultas que vinha recebendo, na ocasião, de produtores de alevinos de tilápia que se queixavam basicamente da baixa resistência dos alevinos que estavam produzindo. Havia alta mortalidade de alevinos ao final da reversão, particularmente após o manuseio, a depuração e o transporte. Muitos relataram que os alevinos, ainda durante a reversão, desenvolviam man-chas esbranquiçadas na pele. Um elo em comum entre estes produtores era o uso de rações comerciais com mais de 50% de proteína. Assim, estoquei alevinos de tilápia do Nilo (linha-gem tailandesa) com cerca de 0,3g em aquários de 50 litros (4 aquários para cada tipo de ração e 100 alevinos por aquário). Forneci quantidades iguais de ração (4 vezes ao dia) a todos os aquários durante um período de 20 dias.

Tabela 3 - Desempenho de alevinos de tilápia do Nilo (linhagem tailandesa) em aquários alimentados com duas rações comerciais (dados do autor)

Alimentação de pós-larvas de tilápia em hapa de reversão sexual

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Alimentação de Tilápia

Os aquários receberam aeração e troca contínua de água de forma a manter condições de qualidade de água semelhantes em todos os aquários. Os alevinos alimentados com a ração de 40% apresentaram um peso médio final de 1,6g contra 1,4g nos alevinos que receberam a ração de 55%. A conversão alimentar de 0,9 contra 1,2. Um resultado surpreendente, não acham? Principalmente considerando que, na ocasião, a ração de 40% custava cerca de R$ 1,20/kg contra R$ 1,80/kg da ração com 55% de proteína.

O leitor não deve concluir com isso que toda a ração com 40% de proteína é melhor que qualquer ração de 55% de proteína. O que deve concluir é que é preciso avaliar o resultado de desempenho e o custo benefício das rações que estão disponíveis no mercado. Mas, nesta questão de rações com alta proteína na alimentação de pós-larvas, eu não fui o único que experimentou tal resultado. Pesqui-sando na internet (aliás, esta é uma excelente ferramenta para os produtores e técnicos na busca de informações sobre tilápias e outros peixes), encontrei a íntegra do trabalho do Dr. Carmino Hayashi e colaboradores da Universidade Estadual de Maringá – PR. Eles haviam verificado que o nível de 38,6% de proteína digestível (41% de proteína bruta) proporcionou maior crescimento em pós-larvas de tilápia do Nilo (Tabela 4) e também registraram uma ligeira redução no crescimento e na sobrevivência dos peixes ofertando rações com níveis mais elevados de proteína.

catfish americano Ictalurus punctatus. Resultados de estudos como estes e a observa-

ção de problemas práticos no campo devem fazer os produtores questionarem o real benefício do uso de rações com altos níveis de proteína na reversão sexual de tilápias. Ainda mais diante do atual manejo da ali-mentação empregado pela maioria dos produtores, no qual se aplicam altas taxas de alimentação diária (acima de 30% do PV/dia) e um grande número de refeições (muitas vezes mais do que 8 refeições/dia). Com tanta ração e refeições assim, sobra proteína (aminoácidos), ainda mais quando são usadas rações com altos níveis protéicos.

Em outro estudo, um pouco mais antigo, realizado desta feita com alevinos de tambaqui também foi verificado que o aumento excessivo nos níveis de proteína prejudicou o crescimento e a conversão alimentar (Tabela 5). Lim et al. (1979) também verificaram uma ligeira redução no cresci-mento do milk fish com rações com 50 e 60% de proteína, comparado ao uso de rações de 40% e atribuíram isso à in-suficiente quantidade de energia de origem não protéica nas rações com alta proteína. Prather e Lovell (1973) também sugeriram que rações com altos níveis de proteína e baixa quantidade de energia não protéica podem ser tóxicas ao

Tabela 4 - Efeito dos níveis de proteína na ração sobre o desempenho de alevinos de tilápia do Nilo (Adaptado de Hayashi et al 2002)

Tabela 5 - Influência dos níveis de proteína bruta (PB) sobre o ganho de peso (GDP), a conversão alimentar (Conv. alim.) e a composição em gordura na matéria seca (MS) de juvenis de tambaqui (Adaptado de Meer et al 1995)

Rações com 50% ou mais de proteína também estão sendo usadas durante a fase de recria em tanques-rede, com tilápias de 5 a 20g. Recomendo fortemente aos produtores de alevinos reavaliar as estratégias nutricio-nais, até por que hoje se paga entre R$ 1,90 e 2,50/kg pelas rações com mais de 50% de proteína contra R$ 1,40 e 1,60/kg nas rações com 40%. Para justificar esta diferença de preço, um grande adicional em crescimento e sobrevivência ao manuseio e transporte

deveria ser esperado usando rações com alta proteína. O produtor tem que avaliar isso, pois cada fabricante tem sua fórmula, seus procedimentos de controle de qualidade de ingredientes, suplementações minerais e vitamínicas específicas, formas diferentes de pro-cessamento, dentre muitas outras variáveis que deter-minam a qualidade de uma ração. Os parâmetros que possibilitam avaliar isso (crescimento, tolerância ao manuseio e transporte e custo de ração por milheiro de alevino produzido) somente podem ser apurados com uma cuidadosa experimentação.

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pia Sugestão de manejo alimentar na reversão sexual

No box abaixo seguem resumidas minhas recomen-dações sobre a qualidade das rações e o manejo da alimen-tação durante a reversão sexual de tilápias. Informações mais detalhadas sobre o assunto poderão ser encontradas no livro Tilápia (Kubitza, 2000).

Manejo alimentar na recria e engorda de tilápias

O produtor deve ter em mente um importante funda-mento no manejo da alimentação: quanto mais próximo da máxima capacidade de consumo um peixe for alimentado, maior será o crescimento, porém, pior será a conversão alimentar. Com tilápias pequenas (até 20 a 30g), o pro-dutor deve buscar máximo crescimento, em detrimento da conversão alimentar. Isso é conseguido alimentando os peixes próximo da máxima capacidade de consumo em cada refeição. Por outro lado, quando os peixes ficam maiores e o consumo de ração significativo (o que ocorre com tilápias acima de 150 a 200g), o produtor deve priori-zar a conversão alimentar em detrimento do crescimento. Isso é alcançado alimentando os peixes de forma restrita, entre 80 a 90% do máximo consumo. Um modo prático de se atingir isso é usar a regra dos 15 minutos que tenho indicado para muitos produtores. Esta regra também deve ser aplicada no cultivo de tilápias em tanques de terra.

Usando a regra dos 15 minutos, o tratador poderá deter-minar a quantidade adequada de alimento que deve ser fornecida aos peixes, visando otimizar o crescimento e maximizar a efici-ência alimentar. Atenção para não usar peletes demasiadamente grande. Quando isso ocorre, a tilápia demora mais tempo para consumir a ração por uma limitação física, e assim fica a im-pressão após 20 minutos de que os peixes estão saciados, devido à sobra de ração que ficou na superfície.

• Estabilidade na superfície da água (flutuabilidade) - rações em pó que permanecem mais tempo na superfície d´água apresen-tam menores perdas de nutrientes, ficam mais tempo à disposição dos peixes e possibilitam uma melhor visualização do consumo e ajuste da oferta de ração. A flutuabilidade das rações em pó depende basicamente do tipo de ingrediente usado na fórmula e do grau de moagem da ração. Também o produtor irá notar que uma ração que flutua bem antes de ser impregnada com o álcool, pode não flutuar tão bem após a evaporação do álcool.

• Uso da extrusão no processo de fabricação - submeter a mistura ao processo de extrusão e a uma nova moagem aumentam os custos de fabricação. No entanto, melhora o valor nutricional da ração (devido ao aumento na disponibilidade e digestibilidade dos nutrientes de

Regra dos 15 minutos

Durante uma refeição deve-se observar o tempo necessário para o consumo da ração fornecida. Se durante as refeições de um dia a ração ofertada demorou mais de 20 minutos para ser consumida, nas refeições do dia seguinte deve ser reduzida a quantidade de ração em cada refeição. Se, por outro lado, a ração fornecida foi consumida em menos de 10 minutos, no dia seguinte a quantidade de ração por refeição deve ser aumentada. Assim, o produtor deve buscar fornecer em cada refeição o que os peixes são capazes de consumir em cerca de 15 minutos.

O acúmulo de gordura visceral, freqüentemente notado pelos produtores, está muito relacionado com a qualidade das rações. Rações com excessiva relação energia/proteína (àque-las com níveis protéicos baixos, geralmente abaixo de 28%), assim como rações desbalanceadas em aminoácidos essenciais, podem resultar em peixe demasiadamente gordo. No entanto, é no manejo da alimentação onde reside a causa mais comum do acúmulo de gordura corporal. Peixes alimentados em excesso, mesmo com uma ração bem balanceada, acumulam grande quantidade de gordura, particularmente nas vísceras. E isso, somente o produtor pode prevenir.

Cultivo em tanques-rede

No cultivo de tilápias em tanques-rede é muito fácil com-parar os resultados de diferentes rações e estratégias alimentares, de modo que o produtor pode rapidamente ajustar o manejo nu-tricional e alimentar e, até mesmo mudar de fornecedor de ração. Apesar de muitos produtores terem suas estratégias particulares de alimentação (número de refeições, quantidade fornecida, tamanho dos peletes e níveis de proteína para cada fase), é inquestionável a necessidade do uso de rações nutricionalmente completas, visto que as exigências nutricionais devem ser totalmente atendidas através da ração. Há alguns anos era comum observar desordens nutricionais em tilápias cultivadas em tanques-rede. Felizmente hoje a maioria dos fabricantes dispõe de rações nutricionalmente completas de alta qualidade especificamente desenhadas para atender às exigências do cultivo intensivo da tilápia tanto em tanques-rede como em sistemas de alto fluxo ou de recirculação. Na tabela 6 segue a minha recomendação de manejo nutricional para tilápias nestes sistemas de cultivo.

• Proteína entre 40 e 45% e moagem fina, com partículas menores que 0,5mm;

• Suplementação extra de vitaminas e minerais - para compensar as perdas por lixiviação na água. Esta suple-mentação adicional é uma prática de grande parte dos fabricantes. No entanto, muitas vezes o próprio produtor pode se encarregar disso na propriedade, adicionando premix vitamínico e mineral completo e, até mesmo, fortificando as rações com mais vitamina C (até cerca de 1g/kg).

Recomendações sobre a qualidade das rações e o manejo da alimentação

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Alevinos de Tilápia

Na Fase 1a do berçário geralmente são estocados alevi-nos pós-reversão entre 0,3 e 1,0g. A alimentação deve ser feita com ração farelada com 40%PB. Quando os peixes atingem cerca de 5g de peso médio (10 a 20 dias mais ou menos, dependendo do tamanho inicial e da temperatura da água), deve ser feita uma classificação para descarte dos peixes do fundo do lote. Os peixes com peso entre 3 e 8g (média de 5g) vão para a Fase 1b do berçário. Na primeira semana da Fase 1b ainda deve ser fornecida a ração em pó 40%PB, porém deve ser iniciada a oferta de peletes de 2mm de 35-36%PB. Como os peixes maiores e vorazes geralmente são os que se alimentam primeiro, procure fornecer primeiro os peletes de 2mm na quantidade que os peixes forem capazes de consumir (visualizar a sobra de ração nos anéis de alimentação). Em seguida, deve ser ofertada a ração farelada, para que os menores peixes do lote ainda possam se alimentar adequadamente e também crescer. Após esta primeira semana, a alimentação deve seguir exclusivamente com peletes de 2mm. No final desta fase (peixes próximos a 30g) é possível iniciar o forneci-mento de peletes de 3-4mm com 32%PB. Durante as fases de berçário, em cada refeição o produtor deve alimentar os peixes próximo à saciedade. No entanto, não deve haver muito desperdício (sobras) de ração.

Na Fase 2 - recria os peixes passam a ser alimentados com ração contendo 32% de proteína e peletes de 3-4mm, em quantidades entre 5 e 3% do peso vivo/dia, dividida em 3 ou 2 refeições. A quantidade de ração fornecida deve ser reajustada de acordo com a resposta alimentar. Use a regra dos 15 minutos. Na Fase 3 – terminação os peixes são alimentados com peletes de 3-4mm contendo 32% de proteína, em quantidade entre 3 e 2% do peso vivo ao dia. Não é necessário mais do que duas refeições ao dia. O tamanho dos peletes deve ser aumentado de acordo com o tamanho dos peixes. Quando os peixes atingem cerca de 300 a 400g, podem ser usados peletes de 5-6m, mantendo assim até um peso de 600g. Para tilápias acima de 800g podem ser fornecidos peletes de 8mm. Use a regra dos 15 minutos para ajuste da oferta de ração. Quando os peixes atingem cerca de 300 a 400g muitos produtores optam pelo uso de ração com 28% de proteína, acreditando que com isso haverá uma redução no custo de produção. Geralmente a diferença de preço entre uma ração com 28%PB e outra com 32%PB não é muito grande (cerca de 10%) e não compensa a redução no ganho de peso, o aumento na conversão alimentar e o maior tempo necessário para terminação da tilápia. Além disso, rações com baixa proteína geralmente promovem maior deposição de gordura visceral.

alguns ingredientes), confere maior homogeneidade na composição das partículas da ração (o que reduz a seletividade alimentar pelas pós-larvas), minimiza as perdas de nutrientes por dissolução na água e reduz a carga microbiológica da ração (pois alguns ingredientes, em particular os de origem animal, podem apresentar elevada contagem de bactérias nocivas ao desempenho e saúde dos peixes).

Estratégia de alimentação

• Quantidade de ração ofertada diariamente - Semana 1 – 25-30% do PV (peso vivo)/dia; Semana 2 – 20-25%; Semana 3 – 15-20%; e Semana 4 – 10-15% do PV/dia. Estas quantidades devem ser divididas em 5 a 6 refeições/dia. Não se prenda tanto ao percentual do peso vivo, pois o consumo de ração é regulado por diversos fatores, entre eles a

temperatura da água, o oxigênio, as infestações por parasitos, a composição e palatabilidade da ração, entre outros tantos, tor-nando difícil precisar exatamente o que será consumido. Portanto, tome como base a resposta dos peixes. Daí a importância de usar uma ração de boa flutuabilidade na água, que permita visualizar as sobras e, assim o ajuste na quantidade ofertada.

• Como fornecer: a quantidade diária acima sugerida deve ser dividida em 5 ou 6 refeições/dia. Em uma refeição, evite jogar toda a ração de uma vez só nos hapas ou tanques. Divida em pelo menos 3 parcelas, de forma que as pós-larvas tenham tempo de consumir as partículas antes que estas atinjam o fundo dos hapas e tanques. Anéis de alimentação ajudam a visualizar o consumo e não deixam que a ração escape através da malha dos hapas.

Tabela 6 - Recomendações quanto ao manejo nutricional e alimentar da tilápia em tanques-rede, sistemas de alto fluxo ou de recirculação

Recomendações complementares: A indicação apresentada nesta tabela sobre a quantidade de ração a ser fornecida diariamente deve ser usada como uma referência. O consumo real dos peixes pode ser afetado pela temperatura da água, por infestações parasitárias, pela qualidade da água nas unidades de cultivo, entre outros fatores. Assim, o tratador deve ficar atento ao consumo dos peixes e ajustar a quantidade de ração com base na resposta alimentar (presença de sobras ou velocidade de consumo). Use a regra dos 15 minutos na Fase 2 e Fase 3. Na Fase 1 procure alimentar próximo a saciedade em cada refeição.

Alimentação de tilápias em tanques-rede no reservatório de Xingó - Rio São Francisco

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22 Panorama da AQÜICULTURA, novembro/dezembro, 2006

Cultivo tanques de terra

No cultivo de tilápias em tan-ques de terra a estratégia nutricional e alimentar para cada fase de cultivo deve ser ajustada em função do estoque de peixes no tanque (biomassa) e da dis-ponibilidade de plâncton (notadamente o fitoplâncton). O produtor de tilápia deve ter em mente que o plâncton chega a contribuir com 50 a 70% do crescimento das tilápias em tanques com água verde e baixa renovação de água. Mesmo em tanques com alta densidade de tilápias, porém com água verde, esta contribuição ainda pode chegar a cerca de 30%. O plâncton contribui para o balanceamento da dieta das tilápias, fornecendo aminoácidos essenciais, ácidos graxos, minerais e vitaminas que podem estar ausentes ou em quantidades limitantes nas rações. Por isso, dificilmente são observados sinais de deficiências nutricionais em tilápias cultivadas em tanques de terra com águas verdes. Portanto, promover a formação do plâncton (deixar a água verde) é o primeiro dever de casa para quem cria tilápia em tanques de terra. As próprias tilápias contribuem para isso, realizando uma forte predação sobre os organismos do zooplâncton, que são importantes consumidores de algas. Controlando o zo-oplâncton, a população de algas do fitoplâncton tende a aumen-

tar. Tilápias também exploram intensivamente algas de maior porte que compõem o fitoplâncton, favorecendo a proliferação de algas de menor tamanho (conhecidas como nanoplâncton), que são ainda mais eficientes em termos de produção de massa planctônica. As algas do nanoplâncton também são aproveitadas pela tilápia, graças a sua habilidade em secretar, na faringe, um muco que auxilia na aglutinação destas minúsculas algas, concentrando-as para o consumo. Esta reciclagem de nutrientes do alimento natural e a constante oferta de ração aportam diaria-mente nutrientes importantes para a manutenção do plâncton.

Mesmo com esta facilidade, muitos produtores têm fa-lhado na formação e manutenção do plâncton. Diversos erros de manejo contribuem com isso. O mais comum deles é o excesso de renovação de água nos tanques. Isso se deve ao equivocado conceito de muitos produtores e técnicos de que, se não tiver água renovando constantemente, faltará oxigênio aos peixes. Assim, com o excesso de renovação de água, há uma diluição dos nutrientes e o plâncton não se desenvolve. Quando os pei-xes são alimentados com ração, os nutrientes excretados nas fezes e através das brânquias são suficientes para manter uma adequada biomassa de plâncton (se não houver uma renovação excessiva de água). Troca de água na recria e engorda de tilápias em tanques de terra somente faz sentido quando se atinge uma

determinada biomassa de peixes (a partir de mais ou menos 600g/m2 ou 6.000 kg/ha). Ou melhor, quando se atinge uma determinada taxa de alimentação (acima de 80kg/ha/dia). O disco de Secchi é uma ferramenta útil para determinar quando a água deve ser renovada. A transparên-cia da água em tanques de tilápia deve ser mantida entre 20 e 30cm. Quando a transparência cai abaixo de 20cm, é o momento de começar a renovar um pouco de água. Quando a transparên-cia retorna a valores entre 20 e 30cm a troca de água deve ser interrompida. Além da excessiva troca de água, ou-tras condições impedem a formação de adequado plâncton: a baixa alcalinidade da água (corrigida através da calagem); a presença de argila em suspensão na água (devido a enxurradas, aeração mal aplicada, dentre outros fatores) e a esto-cagem inicial de uma biomassa pequena de peixes. Esta última condição é algo muito comum quando os produtores não adotam o sistema de produção por fases. Por exemplo, quando se estoca 2 a 3 alevinos de tilápia de 1g nos tanques de terra, a biomassa que na estocagem é de apenas 2 a 3g por m2, permanece baixa durante um longo período. Assim,

a quantidade de ração aplicada no tanque é muito pequena, não fornecendo nutrientes suficientes para manter uma adequada

"Estamos em 2007 e muitos produtores estocam pequenos alevinos e esperam

meses para colher os peixes de tamanho de mercado, sem nenhum manejo intermediário.

O conhecimento de noções básicas de

qualidade de água e de planejamento da produção fariam uma

grande diferença nestas pisciculturas"

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Alimentação de Tilápia

massa de plâncton. Além do atraso no crescimento, tal prática implica em ineficiente uso do espaço na piscicultura.

Muitos produtores ainda conduzem seus cultivos em uma única fase (estocam pequenos alevinos e esperam meses para colher os peixes de tamanho de mercado, sem nenhum manejo intermediário). O conhecimento de noções básicas de qualidade de água e de planejamento da produção faria uma grande diferença nestas pisciculturas.

Diferente do cultivo em tanques-rede, onde as condições de qualidade de água se mantêm relativamente constantes, nos tanques de terra, além das diferentes condições de disponibili-dade de alimento natural e das diferentes taxas de estocagem (e biomassa) de peixes, ainda ocorrem variações diárias em impor-tantes parâmetros de qualidade da água (oxigênio dissolvido, temperatura, gás carbônico, pH e amônia tóxica), que interfe-rem no consumo de alimento dos peixes. Isso faz do manejo alimentar das tilápias em tanques de terra uma arte. Uma arte que precisa ser assimilada e aprimorada dia a dia.

Para auxiliar nesta arte, deixo aqui uma referência: fiquem atentos à coloração das fezes da tilápia. Este é o mais eficiente indicador para a adequação do manejo alimentar em tanques com plâncton. O produtor atento irá notar na superfície da água a presença das fezes. Fezes de coloração marrom-esver-deada indicam que o peixe está explorando o alimento natural em conjunto com a ração fornecida. Se as fezes são de cor verde

intenso, é possível que a quantidade de ração fornecida esteja abaixo do adequado. Já quando as fezes se apre-sentam com coloração bege-marrom, muito pouco tom de verde, seguramente a oferta de ração está excessiva (ou pode não haver plâncton na água, no caso de águas transparentes ou barrentas).

Peixes que recebem muita ração ficam preguiço-sos em explorar o alimento natural (fitoplâncton). Na tabela 7 são apresentadas as estratégias de alimentação que tenho indicado para a recria e terminação de tilápias em tanques de terra com plâncton. Essa estratégia está adaptada às rações comerciais disponíveis no mercado (tamanho de peletes e níveis de proteína).

No cultivo de tilápias em tanques de terra com plâncton, conforme a biomassa de peixes aumenta em cada fase do cultivo, a disponibilidade de alimento na-tural por peixe (ou por quilo de peixe) diminui. Assim, o lógico seria iniciar uma fase com uma ração menos concentrada em nutrientes e finalizar cada fase com uma ração mais concentrada em nutrientes. Por exemplo, no berçário se a água estiver bem verde, no início poderia ser usada uma ração farelada com 30-32% de proteína, passando gradualmente para uma ração mais rica em proteína e na forma de peletes 2mm (32-36% de proteína) quando os peixes se aproximam de 5g. No entanto, geral-

Tabela 7 - Recomendações para o manejo alimentar de tilápias em tanques com água verde (plâncton)

Recomendações complementares: Promova rapidamente a formação do plâncton (mantenha a água fechada; calagem quando necessário; adubação inicial 5kg uréia/1.000m2 nas primeiras 2 a 3 semanas. Também pode ser feito o uso de farelos e estercos de aves e suínos em conjunto com a uréia nas primeiras semanas, não ultrapassando uma taxa de aplicação de 5kg de matéria seca por 1.000m2/dia).

Mantenha a água verde com transparência entre 20 e 30cm (se estiver fazendo adubação, pare de adubar quando a transparência chegar aos 30cm). Renove um pouco de água se a transparência cair abaixo de 20cm.

Na recria e engorda, enquanto a biomassa for menor que 200g/m2 (2.000kg/ha) forneça ração apenas uma vez ao dia em quantidade equivalente à metade da taxa de alimentação indicada nesta tabela. Quando a biomassa superar 200g/m2, alimente como indicado na tabela. Fique atento à coloração das fezes dos peixes e ajuste a taxa de alimentação com base nesse indicativo. Fezes marrons: reduza a oferta de ração; fezes verdes: aumente a oferta de ração; fezes marrom-esverdeadas: mantenha a alimentação como está.

Lembre-se que, com o aumento na biomassa de peixes do início ao final de cada fase de cultivo, a disponibilidade de alimento natural por quilo de peixe diminui. Assim, não reduza a qualidade da ração no final de cada fase de cultivo, pois os peixes precisam de um alimento ainda melhor nestes momentos.

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mente o produtor não encontra uma ração em pó com 30-32% de proteína. Duas alternativas ao produtor: moer peletes com 30 a 32% de proteína ou fornecer uma ração em pó com 40% de proteína de forma limitada (alimentação restrita).

Outra consideração importante no cultivo de tilápia em tanques com plâncton: na fase de terminação, principalmente da metade para o final da fase, o consumo de ração fica muito alto e há uma tendência dos produtores em comprar rações mais baratas, geralmente com baixo teor protéico (menos de 28%), acreditando que isso reduzirá o custo de produção. Neste momento a biomassa de peixes está alta e a disponibilidade de alimento natural diminui. Usar uma ração de baixa proteína, principalmente em situações em que se espera produzir mais do que 15-20 toneladas de tilápia por hectare, pode ser um tiro pela culatra. Principalmente se a ração for desbalanceada em aminoácidos essenciais e tiver baixo enriquecimento mineral e vitamínico (o que, geralmente, é uma regra nas rações de baixa proteína e de preços extremamente atrativos disponíveis no mercado). Mesmo o uso de uma boa ração com 28% de proteína nesta fase final pode não trazer vantagens em termos de redu-ção do custo de produção (exceto quando a biomassa final não ultrapassa 800g/m2 ou 8 toneladas/ha e há plâncton disponível). A economia no preço da ração é da ordem de 10%. No entanto é comum a conversão alimentar se elevar em mais de 15 a 20% quando se troca uma ração de 32% por uma de 28% de proteína. Assim, economiza 10% no preço de compra. No entanto, usa-se 15 a 20% mais ração por quilo de peixe produzido. Além disso, o crescimento um pouco mais lento do peixe com a ração de 28% de proteína requer um tempo adicional de cultivo de cerca de 30 (para tilápias até 600g) a 60 dias (no caso de tilápias de 1kg). O produtor deve lembrar que tempo é dinheiro e esta extensão da

engorda onera o custo de produção.No cultivo de tilápia, todo dia é dia de aprendizado e revisão

de conceitos e procedimentos. É natural que a tecnologia de cultivo, assunto do interesse de muitos pesquisadores e produtores em todo o mundo, passe por aprimoramentos e ajustes finos diariamente. E nem sempre estes novos avanços estão disponíveis de forma pronta e mastigada ao setor produtivo. Assim, os produtores e técnicos de-vem estar sempre abertos para rever seus conceitos e estratégias de produção, bem como estabelecer uma rotina ou hábito diário de busca de informações que lhe permitam expandir seus conhecimentos. Seja via internet, livros, revistas, seminários, cursos, entre outros.

A experimentação cuidadosa na propriedade também pos-sibilita grande aprendizado e identificação de correções no manejo da produção. Não devemos, também, nos esquecer que muito pode ser aprendido com os seus funcionários e os funcionários dos seus vizinhos e amigos tilapicultores, que estão dia a dia envolvidos dire-tamente com a produção e enfrentando problemas muito parecidos com os seus. Ouvir a experiência destas pessoas pode ser um hábito muito prazeroso e de integração de sua equipe de funcionários com a equipe de outras pisciculturas e até com você mesmo. Ainda mais quando estas reuniões informais são acompanhadas de um saboroso filé de tilápia e uma cerveja bem gelada.

Nunca se esqueçam de valorizar o material humano que têm em suas mãos. Lembrem-se de que pela mão dos seus trata-dores, passa, na forma de ração, pelo menos 50% do seu capital de giro. Assim, estimule-os a serem os melhores possíveis. Premiem quem merece. Finalmente, deixo aqui meus votos de que 2007 seja um ano de mudanças de atitude, de busca inces-sante por mais aprendizado e de resultados cada vez melhores nos cultivos. Esta somatória de evolução e sucesso contribuirá com a expansão da tilapicultura em nosso país.

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