Os Pontos Convergentes Entre a Arte e a Propaganda

6
Os pontos convergentes entre a arte, a literatura e a propaganda Thomas Hohl Nenhuma obra de arte possui um significado fixo e determinado. Ao contrário, é precisamente no caráter polissémico da obra, que reside seu valor. Por outro lado, o significado de uma obra que representa ambigüidades de interpretações pode ser tão objetivo e claro quanto um preciso e unívoco. A arte, como diz Ernest Ficher, jamais se limitaria a mera descrição da realidade social. Ao contrario, é função do artista interpretar essa realidade através de sua visão do mundo e de manifestar suas concepções políticos ideológicos. Para a formação da imagem deve-se criar condições para que os componentes racionais e emocionais se apresentem integrados e isso se dará através da criação do visual da campanha : Escolha das cores a serem utilizadas, estudo dos formatos, quantidade e qualificação de materiais a serem encomendados e harmonização de todos estes elementos. Segundo Rene Huygue, estamos vivendo num mundo de sinais, onde não somos mais o que desejamos ser, mas o que a maciça propaganda faz com que sejamos. Os símbolos e as imagens criadas pela propaganda podem trazer varias convicções, como por exemplo, a de que se deve adquirir isto ou aquilo. Parece evidente que a propaganda pode ter influência muito maior que a literatura, pois enquanto esta representa uma forma de sugerir os aspectos mais complexos e menos aparentes do comportamento, o estereótipo tratado pela propaganda geralmente acentua um aspecto bem visível do comportamento ou da vida social, com a exclusão de todos os pontos contraditórios. Essa diferença explica bem o constante desentendimento entre a literatura e a propaganda . Se a primeira procura os aspectos mais conflitantes da vida individual e social , a segunda limita tais aspectos através da valorização exclusiva de um ponto de vista ou de uma aparência. O que aproxima a literatura da propaganda é o fato do escritor querer ser lido por um grande número de leitores e o publicitário quer ultrapassar os limites impostos pela sua área de atuação. O estilo de escrever, a originalidade de seu trabalho e a proposta de ser apresentado ao seu público são alguns componentes importantes na qualidade literária . Alias, sua importância consiste precisamente no caráter inovador que apresenta a um certo público. No entanto, é preciso estar atento para não torna-lo inteiramente isolado . Caso contrario, perderia sua função. Sem dúvida é impossível compreender a existência de um valor estético que permaneça restrito a um minoria. A sua criação indica um passo indispensável , no entanto, quando se generaliza, tornando-o do

description

Thomas Hohl

Transcript of Os Pontos Convergentes Entre a Arte e a Propaganda

Page 1: Os Pontos Convergentes Entre a Arte e a Propaganda

Os pontos convergentes entre a arte, a literatura e a propaganda

Thomas Hohl

Nenhuma obra de arte possui um significado fixo e determinado. Ao contrário, é precisamente no caráter polissémico da obra, que reside seu valor. Por outro lado, o significado de uma obra que representa ambigüidades de interpretações pode ser tão objetivo e claro quanto um preciso e unívoco.

A arte, como diz Ernest Ficher, jamais se limitaria a mera descrição da realidade social. Ao contrario, é função do artista interpretar essa realidade através de sua visão do mundo e de manifestar suas concepções políticos ideológicos.

Para a formação da imagem deve-se criar condições para que os componentes racionais e emocionais se apresentem integrados e isso se dará através da criação do visual da campanha : Escolha das cores a serem utilizadas, estudo dos formatos, quantidade e qualificação de materiais a serem encomendados e harmonização de todos estes elementos.

Segundo Rene Huygue, estamos vivendo num mundo de sinais, onde não somos mais o que desejamos ser, mas o que a maciça propaganda faz com que sejamos. Os símbolos e as imagens criadas pela propaganda podem trazer varias convicções, como por exemplo, a de que se deve adquirir isto ou aquilo. Parece evidente que a propaganda pode ter influência muito maior que a literatura, pois enquanto esta representa uma forma de sugerir os aspectos mais complexos e menos aparentes do comportamento, o estereótipo tratado pela propaganda geralmente acentua um aspecto bem visível do comportamento ou da vida social, com a exclusão de todos os pontos contraditórios.

Essa diferença explica bem o constante desentendimento entre a literatura e a propaganda . Se a primeira procura os aspectos mais conflitantes da vida individual e social , a segunda limita tais aspectos através da  valorização exclusiva de um ponto de vista ou de uma  aparência. O que aproxima a literatura da propaganda é o fato do escritor querer ser lido por um grande número de leitores e o publicitário quer ultrapassar os limites impostos pela sua área de atuação.

O estilo de escrever, a originalidade de seu trabalho e a proposta de ser apresentado ao seu público são alguns componentes importantes na qualidade literária . Alias, sua importância consiste precisamente no caráter inovador que apresenta a um certo público. No entanto, é preciso estar atento para não torna-lo inteiramente isolado . Caso contrario, perderia sua função. Sem dúvida é impossível compreender a existência de um valor estético que permaneça restrito a um minoria. A sua criação indica um passo indispensável , no entanto, quando se generaliza, tornando-o do conhecimento da sociedade, parece tão importante como o ato de criar, mas não basta ser um novo valor da sociedade, é necessário que seja aceito.

O conhecimento teórico do romance se torna mais pertinente quando o objeto central a ser analisado é a literatura dirigida ao grande publico . Vale ressaltar que os valores autênticos diferem de um romance para outro, isso ocorre pois estes se organizam no plano de sua própria obra formando o conjunto de seu universo.

Entretanto , para o grande público, as teorias intelectuais só adquirem sentido quando se transformam em formulas simples ou em estereótipos, isto é, quando   perdem suas características significativas para entender  a literatura é necessário considerar as diferenças  individuais, pois isto levará a uma riqueza maior das  interpretações contraditórias.

Page 2: Os Pontos Convergentes Entre a Arte e a Propaganda

Para Waldenyr Caldas a estrutura dos textos na paraliteratura, repousa basicamente no voyerismo, já que  o leitor só consome signos e representações do real e do  imaginário e em situações maniqueistas, sem a analise  social e política do universo abordado.

O meio acadêmico vê a paraliteratura como um produto de mal gosto destinado para um publico semi-culto. Entretanto , numa análise sociológica , há uma grande penetração que possui a mesma importância que os produtos que veiculam ideologias ou que são consagradas pela critica especializada O discurso da paraliteratura de imaginação constitui uma  forma de interpretação do mundo, estabelecendo, não propriamente, uma contradição entre a linguagem reconhecida como literária e não-literária, mas somente as diferenças entre a literatura culta e a paraliteratura. Trata-se apenas de uma interpretação de suas contradições e das condições em que foram produzidas.

As comparações da paraliteratura e da cultura de massa sua inevitáveis. As estórias em quadrinhos , os jornais e até mesmo as telenovelas são pequenas partículas formadoras do universo paraliterário dessa forma pode-se  incorpora-la na cultura de massa.

Em relação as artes plásticas, a Pop Art cumpriu esse papel . Esta começou como um nova forma de expressão, procurando exprimir a tensão dinâmica e os aspectos condicionados do ser humano da cidade.

Rauschenberg utilizou em seus trabalhos, colagens de fotos, recortes de anúncios de propaganda, imagens ajustadas a pintura, acrescentando a elas objetos banais. Procurou focalizar as imagens estereotipadas da sociedade industrial, mostrando a visão subjetiva da arte.

A Arte Pop, como todo trabalho que mescla pintura, com escultura e com técnicas variadas (fotografia, material impresso e colagens), visa ironizar. Esta é justamente um forma de se comunicar com  um publico maior, rompendo com o isolacionismo de outrora, saindo de sua interioridade-Atelie habitual em seu modo de fazer artístico para se articular em torno do coletivo-urbano.

A Arte, qualquer que seja, é sempre uma forma de expressão consciente ou inconsciente. A propaganda, por sua vez, jamais é uma expressão, mas sim uma representação. A arte propõe sempre uma visão transcendente do homem e a propaganda dispõe dele.

Entretanto, a arte caminhou em direção a sociedade de consumo, diante disso, percebe-se que as influencias entre a arte e a propaganda ocorrem no mesmo sentido.

Os meios de comunicação criaram um iconografia urbana (garrafas de Coca-Cola, 7UP, rostos de estrelas de cinema e Hambúrgueres) que algum artistas incorporaram em suas obras (Claes Oldenburg trabalhou com objetos tridimensionais, produtos de consumo de massa , centrando sua atenção para a imagem publicitaria). Inversamente, o tratamento formal dado pela experimentação plástica a esses materiais são aproveitados pelos meios de comunicação em novas mensagens. Esses mesmos meios tomaram elementos à sensibilidade popular (imagens técnicas de representação) e os incluíram em sua comunicação, por seu lado os movimentos populares extraíram elementos das  culturas de massa e se adaptaram para produzir mensagens que expressaram seus interesses.

A sociedade moderna conserva de fato o objeto artístico ao mesmo tempo que nega a possibilidade da arte e, com isso, a promessa de autonomia que sempre encerra. A obra de arte subsiste, embora não como foi concebida, mas como produto. As manifestações artísticas  assumiram a arte como um ritual conformista, desde a Pop Art e Minimal Art até a Arte Conceitual.

A publicidade, por sua vez, incide sobre a ansiedade, mostrando que o modo de vence-la é consumir. De acordo com os mitos da publicidade, os que não possuem o   poder de gastar dinheiro tornam-se literalmente homens sem rosto. Quem tem , é digno de ser 

Page 3: Os Pontos Convergentes Entre a Arte e a Propaganda

amado. Por isso a arte é tão útil a publicidade, pois detona riqueza e espiritualidade ao mesmo tempo que luxo  e valor cultural. A publicidade se apropriou das relações ou implicações entre a obra de arte e o espectador proprietário, procurou persuadi-lo, transformando-o em espectador comprador ( " Modos de Ver" de John Berger, Sven Blomberg, Cris Fox e Richard Holllis).

A sociedade se fragmentou em faixas de mercado, criando um produto cultural fragmentado, cuja única expressão de domínio é o consumo. Se a produção cultural  estiver presa ao circulo vicioso do consumo e se a  cultura estiver fragmentada de tal modo em faixas de  mercado, tornará a arte cada vez mais dependente do mercado.

A cultura de massa, cujo objetivo é o lucro, vai destinar seus produtos aos diversos níveis de gostos , estratificando o consumo cultural. No campo da produção cultural , a arte e a literatura , ditas cultas, são produzidas pela classe dominante para si mesma e a paraliteratura e a arte pop são destinadas  a parte semi-letrada da sociedade.

Segundo Antônio Cândido, pertencemos a uma massa cujas reações obedecem ao condicionamento do momento e do meio que vive.

 

Bibliografia

Amaral, Aracy Abreu - Arte Para Que ? – Preocupação da Arte Brasileira , Editora Nobel.Amaya, Mario – Por Art - A Survey of New Super-Realism, Studio Vista Publishers.Arnheim, Rudolf – Arte & Percepção Visual, Editora Pioneira.Berger, John – Modos de Ver Blomberg, SuemFox, CrisHollis, RichardCaldas, Waldernyr – A Literatura da Cultura de Massa/ Uma análise Sociológica, Lua Nova Editora.Defina, Gilberto – Teoria e Pratica da Analise Literária , Editora Pioneira.Espinalt, Carlos M. – Manual da Propaganda Moderna, Hemus Editorial.Leite, Dante Moreira – Psicologia e Literatura, Editora Universidade de São Paulo.Marcondes Filho, Ciro – Política e Imaginário nos meios de Comunicação de Massa no Brasil, Summus EditorialPires, Orlando – Manual de Teoria e Técnica da Literatura, Editora Presença.Valle, Roberto do Arte Hoje, Editora Nobel .

Arte moderna seduz a alma do negócioTese de doutorado mostra a influência exercida pelos movimentos artísticos na publicidade dos anos 70 e 80

MANUEL ALVES FILHO

A linguagem adotada pela propaganda brasileira entre os anos de 1975 e 1984 sofreu forte influência da arte do século XX, notadamente os anúncios publicados em revistas. Dentre os vários movimentos artísticos que contribuíram para a construção do discurso gráfico, dois marcaram especialmente a produção do período: a Pop Art e a Minimal Art. A constatação faz parte da tese de doutorado defendida recentemente por Carlos Roberto Fernandes junto ao Instituto de Artes (IA) da Unicamp, onde também é docente. O trabalho,

O trabalho de René Magritte intitulado “No Limiar da Liberdade” e a peça publicitária da Hydra, ao lado: elementos inspiradores

Page 4: Os Pontos Convergentes Entre a Arte e a Propaganda

intitulado “Interface Arte/Propaganda no Brasil (1975-1984) a partir da análise de Anúncios em Revistas, nos Anuários do Clube de Criação de São Paulo”, constitui um estudo amplo e original sobre as técnicas empregadas na elaboração de 716 peças publicitárias, todas elas concebidas antes do advento da informatização do mercado. A banca examinadora recomendou a tese para publicação.

Carlos Fernandes, que também é dirigente da Coordenadoria de Desenvolvimento Cultural (CDC) da Unicamp, conta que decidiu analisar as obras contidas nos anuários do Clube de Criação de São Paulo por causa da singularidade da publicação. “Trata-se de um empreendimento de sucesso, que já está na sua 28ª edição. Os trabalhos presentes nos anuários são de reconhecida qualidade e passaram pelo crivo dos próprios profissionais de propaganda, especialistas nessa área da Comunicação”, explica. O docente do IA afirma que não se ateve apenas às peças publicitárias premiadas, pois elas não seriam representativas do conjunto da produção do período. Já a opção pela década de 1975 a 1984 está relacionada com o fato de os anúncios terem sido concebidos sem o auxílio do computador. “São o resultado do trabalho feito em prancheta, sem grandes recursos de trucagens e com muito suor. Os processos empregados, apesar de possibilitarem ótimas impressões finais, ainda estavam longe da qualidade técnica de hoje”, diz.

Para evidenciar as técnicas empregadas na elaboração das peças publicitárias, Carlos Fernandes desenvolveu uma metodologia própria. Primeiramente, separou os anúncios por grupos, que foram definidos pela sua composição plástica. Depois, o docente do IA considerou os elementos visuais e estruturais das obras e avaliou que experiências ocorridas no campo das artes plásticas deram contribuição à linguagem adotada pela propaganda. “Foi possível constatar uma clara influência da arte do século XX nos trabalhos analisados. Além de contribuições esporádicas de vários movimentos artísticos, duas correntes forneceram a base para a constituição da linguagem da propaganda no período: a Pop Art e a Minimal Art, cujos elementos estão presentes em 44% das obras estudadas”, afirma.

A relação entre a propaganda e Pop Art, reforça Carlos Fernandes, está expressa tanto na quantidade quanto nas estruturas formais dos anúncios. “O motivo parece óbvio: no princípio, a propaganda é geradora da Pop Art e está na formação do seu principal articulador, o artista Andy Warhol, que tinha experiência em produção gráfica e conhecia os procedimentos técnicos da fotolitografia e serigrafia”, comenta. Assim como a Pop Art, afirma, diversas peças publicitárias valeram-se do estilo figurativo e do recurso da repetição para vender um determinado produto, ainda que este não aparecesse necessariamente na obra. “A importância, segundo este conceito, está mais no símbolo do que no produto propriamente dito”, esclarece o autor da tese.

A influência da Minimal Art também pôde ser identificada na estrutura das peças publicitárias, de acordo com o docente do IA. O movimento artístico, destaca Carlos Fernandes, propõe uma arte sem representação. O minimalismo, como o nome sugere, é caracterizado pela “limpeza”, pela dispensa de “cenarização” e até mesmo pelo descompromisso com a história, elementos presentes em várias obras analisadas na tese, que foi orientada pelo professor Adilson Ruiz, também do IA. O fato de os anúncios analisados terem sido produzidos sem o suporte da informática não agrega, necessariamente, valor adicional a eles, na opinião de Carlos Fernandes. De acordo com o especialista, o conceito sempre é mais

importante do que o instrumental utilizado. “O computador só dá mais tempo para quem tem os conceitos bem organizados”, diz.

Primórdios – De acordo com Carlos Fernandes, é impossível demarcar um período a partir do qual estabeleceu-se a interface arte/propaganda no Brasil. De maneira geral, afirma o autor da tese, a publicidade sempre se apropriou de referências proporcionadas pelas diversas atividades humanas. “Isso inclui a arte, na medida em que ela se propõe banal”, afirma. E acrescenta: “a propaganda, nesse caso, influencia e é influenciada, tendo como objetivo a sedução”. Conforme a pesquisa conduzida pelo docente do IA, a publicidade brasileira começa a tomar forma em meados do século 19.

O professor Carlos Roberto Fernandes: Pop Art e Minimal Art estão presentes em 44% das obras estudadas

Propaganda da empresa Hoechst faz clara citação da Pop-Art de Andy Warhol: composição em grade com repetição de fotografias

Page 5: Os Pontos Convergentes Entre a Arte e a Propaganda

O excesso de oferta de determinados produtos, que não encontravam procura adequada nos mercados próximos, obrigou os produtores a contratarem agentes nos grandes centros urbanos, para que estes promovessem a venda de suas mercadorias. Esses agentes eram, inicialmente, profissionais autônomos que representam o produtor. Eles compravam espaço nos jornais para a publicação de anúncios. Posteriormente, com o aumento das solicitações de atendimento, organizaram-se em empresas, dando início a uma atividade mais planejada. “Dessas empresas surgiram as agências de propaganda, as tetravós das agências tais como as que conhecemos hoje”, conta Carlos Fernandes.Antes disso, afirma o autor da tese, os anúncios impressos já eram comuns nos jornais brasileiros, sendo contratados diretamente pelo produtor, comerciante ou profissional liberal. “Os primeiros anúncios veiculados em jornais eram constituídos apenas de texto e não passam de composições tipográficas. O tipógrafo era, na maioria das vezes, quem decidia sobre as características principais do anúncio, uma vez que detinha as informações das possibilidades e limitações do processo”, esclarece o docente do IA. Atualmente, conforme Carlos Fernandes, a publicidade brasileira tem a sua qualidade reconhecida internacionalmente, o que pode ser constatado pelos prêmios que tem recebido ao longo dos anos.

 

O trabalho de René Magritte intitulado “No Limiar da Liberdade” e a peça publicitária da Hydra, ao lado: elementos inspiradores