OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE NA … · alcançando sucesso escolar, mobilidade social...
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OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSENA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE
Artigos
Versão Online ISBN 978-85-8015-080-3Cadernos PDE
I
O INDIVÍDUO NEGRO NA SOCIEDADE E O PAPEL DA ESCOLA NA DESCONSTRUÇÃO DO RACISMO
Mario Bertoldo1
Sandra Terezinha Malysz2
Resumo: A Lei n. 10.639 de 9 de Janeiro de 2003 estabelece a obrigatoriedade do ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana na Educação Básica. Deste então intensificaram-se os debates sobre a discriminação etnica ao povo negro, o que não significa que o preconceito tenha sido superado. Neste contexto, este caderno temático, resultado do projeto de pesquisa e ensino do Programa de Desenvolvimento Educacional do Paraná – PDE, objetiva promover com alunos do Ensino Médio, um debate sobre as relações étnico-raciais na escola, a fim de identificar as práticas estigmatizadoras e preconceituosas contra os afrodescendentes, buscando uma educação com respeito às diferenças. Para isso, partimos da discussão da Lei nº 10.639/ 2003, de textos sobre a temática e propostas de atividades diversificadas que convidam os envolvidos a reflexão e posicionamento crítico. Esperamos com esse trabalho que o preconceito e a discriminação racial, legado da escravidão no Brasil, bem como as suas formas de manutenção, fora e dentro do espaço escolar venham ser eliminadas e que, ao mesmo tempo, venham ser reconhecidas e valorizadas as contribuições do povo negro para o desenvolvimento cultural, econômico e social do Brasil. Palavras-chave: Discriminação; Lei n. 10.639/2003; Negro; Racismo na escola.
INTRODUÇÃO
A escola é a instituição que se certifica como um lugar de construção do
conhecimento e, a educação escolar contribui com os processos de sociabilização e
de formação dos indivíduos, articulando as relações interpessoais entre os agentes
que integram o cotidiano da escola.
Para Munanga (2005,p.50), considerando a escola como parte da organização
social, o preconceito e a discriminação também se mostram presentes na comunidade
escolar, “envolvendo um universo composto de relações raciais e pessoais entre
estudantes, professores, direção e funcionários” podendo ser fortalecida pelos
ideários repassados pelos livros didáticos ou por políticas educacionais
1 Professor de Geografia Seed- Pr. [email protected] 2 Mestre em Geografia pela Universidade Estadual de Maringá. Professora do Curso de Geografia da Unespar,
Campus de Campo Mourão. Orientadora do trabalho. E-mail: [email protected].
despreocupadas com a formação humana, influenciando diretamente na forma como
o conhecimento é transmitido, bem como na trajetória dos estudantes.
E se não bastasse, alguns educadores, possíveis transformadores da
sociedade, que não recebendo em sua formação cidadã e educacional o preparo
necessário para lidar com os desafios de conviver com a diversidade étnico-racial e
com as manifestações de discriminação resultante dela, reproduzem na sua pratica
escolar, discursos preconceituosos, devido à insuficiência de informações e de
conhecimento sobre o assunto.
Na maioria dos casos, praticam a política de avestruz ou sentem pena dos “coitadinhos”, em vez de uma atitude responsável que consistiria, por um lado, em mostrar que a diversidade não constitui um fator de superioridade e inferioridade entre os grupos humanos, mas sim, ao contrário, um fator de complementaridade e de enriquecimento da humanidade em geral; (MUNANGA, 2005,p.15)
Em razão das várias formas de expressão do racismo em nossa sociedade, a
população negra vai descobrindo, ao longo de sua história de vida que, mesmo
alcançando sucesso escolar, mobilidade social ascendente e por muito que possa
fazer suas experiências, embora exitosas, por si só não são capazes de limitar o
fenômeno do racismo.
Diante deste contexto, como negar tais pratica no ambiente escolar? Não
podemos esquecer que somos frutos de uma educação eurocêntrica e que podemos,
a serviço desta, reproduzir, estando de acordo ou não, os preconceitos que estão
presentes em nossa sociedade.
Como lidar com a questão racial na escola? Como lutar contra o racismo velado
nos estabelecimentos escolares? E como propor práticas pedagógicas para acabar
com padrões de discurso dominante no espaço escolar?
É necessário apurar o olhar para situações que, de uma forma ou de outra,
estimulam manifestações preconceituosas no ambiente escolar. É importante
desconstruir, desmitificar e desmistificar ideologias deturpadoras sobre cor e raça e
estimular o pensamento crítico, respeitoso e solidário de toda comunidade escolar.
Sendo assim, com este trabalho se propôs um debate sobre as relações étnico-
raciais na escola, almejando descontruir o racismo e o preconceito ao povo negro,
com a identificação e mitificação dos discursos de superioridade racial e das praticas
preconceituosas contra os afrodescendentes, permitindo desmistificar a imagem do
povo negro, perturbada pela historiografia tradicional, reconhecendo a contribuição do
povo negro para o desenvolvimento Brasil.
Para o desenvolvimento deste trabalho optou-se pelo metodo histórico,
considerando o contexto histórico do tema de pesquisa e sua relação com fatos da
atualidade. Utilizou-se a pesquisa-ação, propondo uma participação efetiva do
pesquisador no objeto da pesquisa, utilizando coleta de dados e construção de
material didático e pedagógico, aplicação de projeto de ensino com alunos do Ensino
Médio e análise dos resultados obtidos.
De forma efetiva, o trabalho desenvovolvido despertou para uma
desconstrução do racismo na sociedade e no espaço escolar. As discussões
acaloradas com alunos do Ensino Médio, apontaram para a necessidade constante
da abordagem da temática dentro e fora da escola propiciando ao aluno cidadão a
responsabilidade de contribuir para a eliminação das discriminações e para a
emancipação dos grupos discriminados.
1. A CONSTRUÇÃO DO RACISMO NO BRASIL E A ESCRAVIDÃO COMO DESIGUALDADE
Discutir o racismo não implica somente na disposição e no empenho de criar
ações afirmativas contra o preconceito e a discriminação racial em relação à
população negra. Embora a promulgação da Lei 10.639/2003, que formula o currículo
educacional para o respeito e a valorização da cultura afro-brasileira e africana e da
Lei 12.288 de 2010, que institui o Estatuto da Igualdade Racial, tenha contribuindo
muito para nortear as discussões, principalmente no âmbito escolar, muito se precisa
fazer para que essa lei não fique só no papel.
É preciso não banalizar os direitos e as conquistas dos movimentos
organizados na luta contra a discriminação e preconceito racial. Ao permitir a
banalização da lei e dos movimentos afirmativos, corremos o risco de “naturalizar” o
racismo, negando suas manifestações e seus múltiplos efeitos.
“Então as pessoas começam a considerar nossos discursos e nossas propostas práticas como se fossem uma paisagem a que estamos tão acostumados que nem damos mais atenção. A luta antirracista no Brasil não pode ser banalizada desta maneira”. (PRAXEDES apud AFROPRESS, 2014).
Banalizar a lei e as ações afirmativas é ignorar a sua existência e causa, é tratar
sem importância suficiente às questões pertinentes a desigualdade racial.
Apesar da maioria da população não se assumir como racista, no Brasil, o
preconceito racial, de fato, existe. O racismo no nosso país se manifesta na esfera
pessoal e institucional, de maneira explicita ou velada, sendo esta ultima, talvez a mais
difícil de combater. Ele é praticado todos os dias no trabalho, no lazer, nas repartições
de serviços públicos e privados, nas escolas e na esfera familiar e, sendo disfarçado,
na sua forma perversa não se mostra exposto à sociedade, mas agride da mesma
maneira, pelos olhares, comentários e atitudes maldosas. Esse tipo de
comportamento da sociedade coloca a pessoa observada em situação de não
pertencimento e merecimento. As situações preconceituosas são refletidas no acesso,
permanência e no desempenho escolar, nos desafios no mercado de trabalho e,
consequentemente nas condições socioeconômicas.
De modo geral, dados concretos mostram a fragilidade do povo negro no Brasil
como consequência do preconceito racial. É conhecido no panorama das
desigualdades brasileiras que a desigualdade racial é considerável no país. Pretos e
pardos tem menos da renda domiciliar per capta que brancos; as mulheres negras
além de sofrerem discriminação racial, sofrem o sexismo e discriminação no mercado
de trabalho, chegando a ganhar metade do salário de um homem negro; a população
negra é a mais necessitada de programas e ações voltadas para a segurança
alimentar e nutricional, dada a vulnerabilidade a e falta de acesso aos recursos
financeiros, como consequência gera deficiências nutricionais. A população negra,
principalmente a quilombola é a que mais sofre racismo institucional quando necessita
de atendimento à saúde. Com relação à educação, os estudantes negros são os que
apresentam menor rendimento escolar e os que mais evadem do sistema educacional.
Dentre os motivos, destacamos a necessidade de estar no mercado de trabalho,
devido a sua situação socioeconômica, por preconceitos e discriminação da raça e
cor e por causa de estereótipos criados pela própria comunidade escolar ou pelas
manifestações do racismo presente na escola.
O racismo é uma construção social elaborada em diferentes época e lugares.
Trata-se de uma teoria de pureza racial ou de separação das mesmas, respaldada em
uma falsidade cultural ou científica.
O racismo no Brasil começou no período colonial e se justificava por um
conjunto de estereótipos negativos em relação ao povo negro que, amparava uma
visão hierárquica da sociedade. A escravidão, que os privou de liberdade desde o
período da colônia, também rotulou como desiguais por excelência, tirando sua
dignidade, impondo rigores, privações de direitos e discriminação racial. Os
trabalhadores negros, no período da escravidão no Brasil (sec. XVI ao XIX) eram
considerados como propriedades de outro ser humano, para tanto, necessitavam ser
marcados com ferro ardente para legitimar o pertencimento e, nessa visão, deixava
de ser um humano e passava a “ser coisa ou objeto”.
Trazidos em grupos vindos da África Equatorial (Bantos) e, também da África
Ocidental (Sudaneses) desde o início do século XVI trabalhadores africanos, aqui
escravizados, tiveram importante papel na economia do Brasil. Trabalhando na
derrubada do pau-brasil, na agricultura da cana-de-açúcar, cultivando café, extraindo
minérios, participando ativamente nos conflitos em favor da defesa dos interesses
de Portugal, os negros foram pouco valorizados e pouco reconhecidos como
participantes da estruturação econômica e como parte importante na composição
cultural da sociedade Brasileira.
O racismo colonial também ganhou força graças ao papel da igreja católica,
que nesse tempo tinha muito poderes, mas não os usou para intervir contra a
escravidão, pelo contrário, como aborda Costa (2007,p.33) “durante a escravidão,
religiosos se aprofundaram em sermões e publicações sobre métodos de
administração dos escravos”. Acreditava também que trazendo negros da África para
o Brasil seria mais fácil cristianizá-los, legitimando, assim, o racismo no Brasil.
A legitimação para a escravidão também foi justificada por uma interpretação bíblica feita pela igreja. Por esta, os africanos seriam um povo amaldiçoado, descendente de Cam, filho de Noé, que teria cometido um pecado grave ao espiar o pai nu. (COSTA, 2007,p.33)
Conforme Passos (2008) “A igreja Católica Apostólica Romana vai corroborar
a maldição de Cam3 em acordos políticos, bulas papais, práticas escravocratas como
o tráfico, catequese, na beatificação de pessoas que tiveram visões imbuídas de
racismo”. Esta passagem bíblica, da maldição de Cam, foi muito usada ao longo da
história por alguns membros das religiões judaica e cristã para justificar o racismo e a
3 “[...] E viu cão, o pai de Canaã, a nudez do seu pai [Noé], e fê-lo saber a ambos os seus irmãos fora [...] E despertou Noé do seu vinho e soube o que seu filho menor lhe fizera. E disse: Maldito seja Canaã; servo de servos seja ao seus irmãos” BIBLIA, (Genesis 9: 20-26).
escravidão dos negros africanos, considerando-os malditos por natureza, justificando
os males, as doenças e a pobreza, presente naquele continente.
O racismo enquanto ideologia racial, só ocorre no período final do século XIX,
coincidindo com a abolição da escravatura e com o nascimento da República, marcos
de grande importância para o Brasil, mas que, não foram capazes de promover ações
em defesa das oportunidades para a população negra, não os incluindo enquanto
cidadãos com direitos econômicos, sociais e políticos. Também não garantiu acesso
aos serviços básicos de educação, saúde e a assistência social. Por outro lado,
Hasenbalg (1979), afirma que implicou no desajustamento psicológico, cultural, e
social e econômico de um grupo historicamente oprimido.
A consolidação de uma ideologia racista neste período político se fortaleceu
com a difusão do chamado “racismo científico”, baseado no património genético, mas
que se valeu da manifestação de poder, em termos políticos, para restringir o acesso
ao espaço público para uma população com interesses distintos. O “racismo
científico”4, determinante para indicar as potencialidades do indivíduo, justificaria, no
Brasil, a classificação do índio e do negro como seres inferiores, inatos e limitados, e
permitiu a disseminação da chamada naturalização das desigualdades raciais.
Conforme comenta Theodoro (2008) “não mais separados pelo direito de propriedade,
pela história, religião ou cultura, as raças se separariam por desigualdades naturais”
Essa desigualdade entre raças, respaldada pelo “racismo científico”
determinavam as potencialidades individuais de cada ser, justificando que a
participação dos negros na sociedade não podia ser concebida a não ser com
restrições. Dessa forma, ampliaram-se os preconceitos quanto à participação do
negro nos espaços públicos e acentuaram-se os mecanismos discriminatórios.
A hierarquia racial já difundida na sociedade brasileira pelas práticas
discriminatórias aliada a uma visão estereotipada do negro, somou à ideia de que a
miscigenação melhoraria um padrão genético desse brasileiro, levando-o a um padrão
aceitável de cor. Para Theodoro (2008), o ser branco possuía confiança e positividade
e a mistura ou mestiçagem, que levasse ao branqueamento podia significar uma
evolução para uma raça menos degenerada, purificada e aperfeiçoada. O
4 Essa expressão de Skidmore é utilizada para definir as teorias científicas que defendiam a superioridade da raça branca ou ariana, em detrimento das raças inferiores. SKIDMORE, Thomas E. Fato e mito: descobrindo um problema racial no Brasil. Cadernos de Pesquisa. São Paulo, n. 79, nov., 1991, p. 6
branqueamento da população seria uma espécie de “esperança para nação” já que o
fim da escravidão anunciava um período de incerteza diante do futuro.
É importante salientar que a elite colonial brasileira compartilhava um conjunto
de estereótipos negativos em relação ao negro. Nesse contexto, o elemento branco
era dotado de uma positividade que se acentuava quanto mais próximo estivesse da
cultura europeia. Portanto:
A miscigenação se transformou em assunto privilegiado no discurso nacionalista brasileiro após 1850, vista como mecanismo de formação da nação desde os tempos coloniais e base de uma futura raça histórica brasileira, de um tipo nacional, resultante de um processo seletivo direcionado para o branqueamento da população. (SEYFERTH, 1998 apud LOPES, 2003 p.43)
Além dos ideários retratados acima, o branqueamento roubaria do negro a sua
importância numérica, seria uma forma de reprimir movimentos sociais de direito, bem
como, amansar os ânimos dos “degenerados negros” marcados pelo sofrimento da
escravidão preconceituosa e racista. Hasenbalg (1979) acrescenta que o contínuo de
cor implicou na fragmentação da identidade racial dos não-brancos.
Parafraseando Hofbauer (2000), o branqueamento abafaria as reações
coletivas, dividindo aqueles que poderiam se organizar em torno de uma
reinvindicação comum induzindo as pessoas procurem se apresentar no cotidiano
como mais “branco” possível.
Assim o Estado brasileiro investiu pesadamente em programas incentivo à
imigração europeia. A ideia era mostrar para as nações europeias que o país estava
aberto aos imigrantes e que aqui existia uma boa relação entre brancos e negros,
contribuindo para ressaltar a supervalorização do branco europeu em relação ao
negro.
Foi apenas a partir de meados do século XX que a ideia de transformação do
“negro” em “branco” começo a perder sua força. A interpretação da sociedade
brasileira utilizando a dimensão biológica de raça vai deixando de prevalecer e passa
a ganhar força uma visão cultural e social de população, baseada no ideário da
“democracia racial”.
O termo “democracia racial” segundo Theodoro (2008) designa a inexistência
de distinções raciais no Brasil. Essa ideia dissemina a igualdade de oportunidade para
todas as raças representadas no país. O mulato, fruto da “política do branqueamento”,
comprovaria a mistura entre os diferentes, testemunhando, para um país não racista.
Essa imagem de universalização de oportunidades, invertida do mundo real,
passaria a ocultar os mecanismos de opressão que cercearam os direitos dos negros
desde o período da escravização e passam a maquiar a real desigualdade entre
negros e brancos.
O fenômeno da mistura das raças teria possibilitado a formação de uma nação
e, conforme Theodoro (2008,p.51) “assentada em uma interpretação benevolente do
passado escravista em uma visão otimista da tolerância e da mestiçagem. A
“democracia racial” reinventa uma história de boa convivência e paz social que
caracterizaria o Brasil.” O mito da democracia racial contribuiu, portanto, para ocultar
o conflito racial e a enorme desigualdade social entre negros e brancos.
Primeiro, desarticulava e/ou evitava qualquer movimento de retaliação dos manumitidos [alforriados] contra ex-senhores, uma espécie de acerto de contas derivados do acúmulo de ódio racial. Segundo, minou qualquer possibilidade de o Estado Brasileiro implementar políticas compensatórias em benefício de ex-excravos e seus descendentes[...]. Terceiro, Isentava os ex-senhores de qualquer responsabilidade sobre o destino dos manumitidos, nas condições em que se construiria um mercado livre de trabalho. (DOMINGUES, 2005,p. 118)
O que passou a ser entendido naquele momento é que a desigualdade
verificada não era resultado das injustiças raciais históricas, mas sim das
diferenciações de ordem social e econômica, o que minimizaria a responsabilidade da
elite brasileira de ter contribuído para uma situação de marginalização e descaso por
tanto tempo.
O historiador, sociólogo e antropólogo Gilberto Freyre (2004), no
livro “Sobrados e Mucambos”, colaborou para disseminação da ideia de neutralidade
racial ao acreditar que a valorização do mulato, miscigenado, frente à sociedade
poderia acendê-lo a patamares de maiores possibilidades, acreditando que um padrão
“ideal” de comportamento pudesse levá-lo a emancipação.
A partir de então o negro passa a ser visto como homem livre e com os mesmos
benefícios recebidos pelos brancos. Acreditava-se que o pertencimento racial ou de
cor seriam acobertados pelo mérito individual, portanto, podia ser responsabilizado
pelo fracasso nas “oportunidades” lhe oferecida.
E é também esse novo contexto valorativo que pode nos explicar a nova posição do mestiço nele. Foi nas necessidades abertas por um mercado incipiente, em funções manuais e mecânicas rejeitadas pelos brancos, assim como pelas necessidades de um aparelho estatal em desenvolvimento que mestiços puderam afirmar seu lugar social. Neste último caso, por se tratar de colocações de alta competitividade, disputando posições com os brancos, é que Gilberto fala da “cordialidade” e do sorriso fácil, típico do mulato em ascensão, como a “compensar” o dado negativo da cor. Essa “compensação”, ao mesmo tempo em que reafirma o racismo mostra que o empecilho não era absoluto e sim relativo, superável pelo talento individual, ou seja, mostra que havia espaço para formas de reconhecimento social baseadas no desempenho diferencial e não apenas em categorias adscritivas de cor (SOUZA, 2000,p.94).
O progressivo avanço das teses sobre a democracia racial levou à modificação
dos debates sobre a questão racial no Brasil. O projeto nacional de branqueamento
foi deixado de lado, dando lugar a construção da sociedade, levando em consideração
à ideia de cultura da população brasileira, contribuindo para a formação de uma nação.
De fato a discussão sobre desigualdade ou diferenciação, racial desaparece de
público, contudo o preconceito racial, velado ou não, continuariam atuantes na
sociedade brasileira durante todo o período e interferindo no acesso às oportunidades,
restringindo o acesso sistema educacional, ao mercado de trabalho, aos espaços
públicos e às manifestações culturais e religiosas. Assim a raça é colocada em
posição subalterna. É como diz Fernandes (1972, p.67):
“Embora o “indivíduos de cor” participem (em algumas regiões segundo proporções aparentemente consideráveis), das “conquistas do progresso”, não se pode afirmar, objetivamente, que eles compartilhem coletivamente das correntes de mobilidade social vertical vinculada à estrutura, ao funcionamento e ao desenvolvimento da sociedade de classe”.
O ideal da democracia racial permanece sem muita contestação por muito
tempo com um fator consolidador da nação. E, confirmando os fatos, o
desenvolvimento econômico, a urbanização a ampliação do acesso à educação formal
e as atividades culturais verificadas no decorrer do século XX, não foram suficientes
para redução das desigualdades raciais no país.
A desigualdade e a discriminação racial continuam sendo um fenômeno
presente na organização da social brasileira. Embora o fortalecimento da identidade
da raça negra com seus movimentos organizados tenha contribuído para o
enfrentamento da discriminação racial e, alguns indicadores apontem para os
impactos positivos das politicas universais, dados mostram a necessidade urgente de
ações afirmativas contra a discriminação e a favor da igualdade racial no Brasil. É
percebido que o preconceito e a discriminação racial atuam conjuntamente,
restringindo a igualdade de oportunidade e mantendo a população negra nas piores
posições da sociedade brasileira.
Em muitos discursos os argumentos, que servem basicamente para
desconstruir o movimento negro, afirmam que o processo de discriminação é mais
dirigido aos pobres do que aos negros. É surpreendente a legitimidade que se adquire,
justificando que preconceito no Brasil é de classe e não de raça e o pobre sim, seria
o maior merecedor das ações afirmativas do governo. O que muitos se esquecem,
parafraseando Theodoro (2008) é que a maioria representativa da classe pobre
brasileira é negra e que a imagem do pobre no Brasil está relacionada a negritude.
Nesse sentido, o racismo, o preconceito e a discriminação operariam integrados em
um processo de “naturalização” do racismo e, consequentemente da pobreza.
Essa “naturalização” se transforma em tolerância extrema de uma classe sobre
a outra, que entende ser natural a existência do racismo e da miséria, independente
da raça que ambos representam, e não tem nenhuma responsabilidade em combatê-
los.
O enfrentamento da pobreza e a oferta de melhores condições de educação,
de trabalho e cidadania definem as reinvindicações do movimento negro brasileiro.
Durante a década de 1980 a população negra tinha acesso restrito aos serviços
básicos de sobrevivência, como lembrado no Boletim Políticas sociais –
acompanhamento e análise do Ipea:
Efetivamente, em 1987, uma em cada cinco crianças negras não tinha acesso à escolarização elementar, e 63% não tinham acesso à educação média. Os serviços e benefícios dos sistemas de saúde e de previdência social, à mesma época, eram igualmente inacessíveis à maior parte deste segmento da população, inserido em relações de trabalho informais. Finalmente, não havia qualquer sistema de garantia de renda para a população mais pobre, e as pensões não contributivas eram apenas incipientes. (BRASIL. 2008,p.249)
Nesse período pouco se falava sobre os direitos da população negra, e as
poucas políticas públicas existentes recaiam no âmbito social e não racial. Ou seja:
No final da década de 1980 pouco se discutiu sobre a necessidade de políticas específicas para melhorar os patamares de inserção e integração da população negra à sociedade. [...] A universalização do acesso ás políticas sociais que excluíam importantes contingentes da população pobre, composta majoritariamente de negros, era ainda uma pauta relevante (THEODORO,2008,p.61).
Somente a partir de 1988, com a promulgação da Constituição Federal é que o
Estado brasileiro universaliza os direitos políticos, sociais e de saúde a todos os
cidadãos, ampliando os direitos previdenciários e de atendimento aos serviços sociais,
bem como dos direitos dos trabalhadores rurais e urbanos. Outra ação que ganha
destaque é a formulação de políticas para promoção da igualdade racial; política de
combate ao racismo institucional; política de ações afirmativas para o acesso ao
ensino superior e para combater as desigualdades no ensino fundamental e médio.
Essas mudanças e a ampliação das coberturas políticas repercutiram
positivamente na redução das desigualdades entre brancos e negros, no que diz
respeito aos benefícios. A partir desse momento a discriminação e o preconceito
racial passaram a estar presentes cada vez mais como foco das discussões politicas
sociais.
No entanto, apesar de todo esse movimento favorável, ainda é percebível as
desigualdades históricas entre brancos e negros. A lei legitima os direitos
conquistados, mas é preciso entender que ela não é uma resposta somente para as
questões sociais brasileiras, é preciso entender que para a legitimação de uma nação
com espaço de interação de indivíduos e democrático por garantia, precisa
reconhecer na prática os direitos raciais de seu povo.
2. METODOLOGIA
O desenvolvimento deste artigo, resultou de um projeto de pesquisa e ensino,
que se caracterizou por três momentos distintos: pesquisa, elaboração de material
didático e implementação da proposta.
Levando em consideração o método histórico com a contextualização histórica
do tema, partimos de uma abordagem geral para compreensão das questões locais e
pontuais e da realidade vivenciada, considerando o procedimento técnico da
pesquisa-ação. Nessa forma de pesquisa, quando o pesquisador e os participantes
estão envolvidos com o objeto da pesquisa, de modo cooperativo, com objetivos e
metas em comum, os resultados alcançados são mais efetivos pois despertam para
uma consciência critica e participativa sendo concebida e realizada em estreita
associação objetivando a resolução de um problema coletivo.
Foram realizadas pesquisas sobre a temática em estudo, considerando a
pesquisa bibliográfica e pesquisa de campo, bem como os textos construídos pelos
professores do curso GTR (Grupo de Trabalho em Rede da SEED).
A partir dos dados coletados foi produzido um caderno temático intitulado “O
Indivíduo Negro na Sociedade e o Papel da Escola na Desconstrução do Racismo”,
(BERTOLDO e MALYSZ, 2015) isto é, uma coletânea de textos e propostas de
atividades referente às relações étnico-raciais.
A implementação do projeto foi realizada com uma turma do 1º ano do ensino
médio do período matutino, envolvendo 35 alunos do Colégio Estadual Professora
Ivone Soares Castanharo de Campo Mourão-Pr., com um total mínimo de 32 horas
aulas distribuídas em etapas distintas:
Etapa 1- Os alunos estudaram conteúdos específicos sobre a história e cultura
afro-brasileira nas aulas de Geografia. A eles foram apresentados trechos de livros,
artigos de revistas e jornais, e também vídeos e músicas. E como resposta,
analisaram os conteúdos discutindo criticamente em grupos, e apresentaram suas
conclusões para os demais alunos da sala.
Etapa 2- Foram ministradas palestras para reforçar os conteúdos aos alunos e
para sensibiliza-los sobre o tema em questão, principalmente com relação às
situações de preconceitos e discriminação e os reflexos disso para a população negra.
Etapa 3- Os alunos foram orientados na elaboração de trabalhos de pesquisa
e cartazes, abordando temas como a contribuição cultural do negro para o
desenvolvimento do Brasil, considerando as danças, os esportes, a gastronomia, a
ciência, as produções literárias, etc., bem como os indicadores de desenvolvimento
da população negra em vários momentos histórico do país. Para tanto analisaram
trechos de livros, artigos de revistas, sites da internet. Posteriormente os alunos,
munidos desses resultados, entregaram os trabalhos de pesquisa para apreciação do
professor, apresentaram oralmente, debatendo seus textos entre grupos, e exibiram
cartazes pela sala de aula, mostrando os resultados.
Etapa 4- Levantamento de informações junto aos alunos, tendo como
procedimento a abordagem direta: Juntamente com os alunos do projeto, professor
orientador e equipe pedagógica, foi produzido e aplicado, para todos os alunos do
período matutino, um questionário para a coleta de dados através de perguntas
estruturadas. As perguntas foram objetivas: “marque (X) na alternativa” e discursivas,
para que o entrevistado respondesse “Qual é a sua opinião”. Apresentou-se também
algumas questões para saber se os alunos sofreram ou sofrem algum tipo de
preconceito e que tipo de preconceito são alvos; se conhecem a história da cultura
afro-brasileira e, em que frequência os professores trabalham essa temática em sala
de aula. (Apendice A).
Etapa 5 - Tabulação e apresentação de dados, onde os alunos lançaram mão
de cálculos estatísticos, tabelas e gráficos.
Etapa 6- Exposição dos trabalho em forma de mural no “Projeto 100% Cultura”
realizado anualmente na escola para a comunidade.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Em um primeiro momento, os estudantes envolvidos diretamente no projeto o
receberam com bastante receio . A temática entendida como polêmica deixou-os
intrigados, a quantidade de aulas a ser ocupadas e as tarefas a serem desenvolvidas
provocaram certo rumor de descontentamento. Porém, para alguns alunos, logo no
primeiro momento, o projeto despertou algumas curiosidades.
Questionados sobre a intimidade com a temática muitos alunos relataram um
grande desconhecimento das questões raciais no país, e foram sinceros em dizer
que essa temática é pouco discutida em sala de aula, e quando é abordada, a
pontualidade dos projetos não permitem uma discussão profunda. Disseram também
que ouvem falar sobre preconceito racial somente quando os meios de comunicação
veiculam atitudes preconceituosas contra os artistas de televisão. Outros alunos
responderam desconhecer o preconceito racial no Brasil,.
Todos esses relatos foram importantes para a implementação do projeto e a
polêmica do tema transformou-se em desafios a serem vencidos.
O material didático, elaborado como proposta para implementação foi de suma
importância e os alunos munidos desse recurso puderam ter informações sobre
temas importantes da história do Brasil. Receberam informações essenciais sobre a
escravização dos negros e as justificativas para o sofrimento e para o abandono
após a abolição da escravidão. O caderno temático contemplou uma diversificação
de textos, imagens e atividades, em uma perspectiva crítica para discussão do
racismo e conhecimento da histórica diferenciação social e das lutas para a
emancipação do povo negro no Brasil. A partir desses referenciais tiveram condições
de responder varias questões pertinentes a temática e socializar suas conclusões.
Após a discussão da temática, os alunos juntamente com o professor
elaboraram um questionário para verificar situações de preconceito e discriminação
racial na escola. O objetivo era compreender como os demais alunos do colégio
entendiam o preconceito e a discriminação racial e diagnosticar, pelos dados
coletados, possíveis atos preconceituosos dentro do espaço escolar.
Foram entrevistados 341 alunos do período matutino, envolvendo estudantes
de oitavos e nonos anos do ensino fundamental, e todos os estudantes do ensino
médio matriculado no ano de 2015.
Analisando o resultado dos questionamentos, considerando o preconceito
étnico racial no espaço escolar ( Figura1), conclui-se que uma grande maioria dos
alunos entende que ele existe mas que não é discutido, se tornando encoberto ou
velado, onde não se consegue separar as atitudes sutis de discriminação do próprio
discriminador.
Figura 1 - Preconceito étnico racial no espaço escolar
Um número significativo dos adolescentes consultados (13%), alegou que o
preconceito não existe. Este fato pode revelar, como já dito acima, a necessidade de
trabalhar com os alunos, não somente da história do racismo, mas também, as
manifestações resultante dele, de identificar na sutileza do dia a dia os discursos
preconceituosos com relação a cor e a raça.
59%24%
13%
4% existe o preconceitovelado e não discutido
existe preconceito mais édiscutido
não existe preconceito
não responderam
A maioria dos adolescentes já presenciou e continua presenciando atitudes
racistas (61%), enquanto 38,4%, não presenciaram ou desconhecem tais atitudes
(Figura 2). Revelando mais uma vez que o racismo é velado mas não menos
prejudicial.
Figura 2 - Presença de atitudes racistas
Entre os jovens que presenciaram atitudes racista 49, 8% salientaram que a
maioria dessas atitudes envolviam alunos, 9,2%, assinalaram que tais atitudes
envolviam os professores e funcionários e muitos outros não responderam a este
questionamento (Figura 3).
Figura 3 - Presença de atitudes racistas onde os alunos são alvos
Percebe-se nesse contexto que o racismo está sim, presente na escola,
envolvendo tanto os alunos, quanto os educadores. Os alunos relataram que além de
algumas brincadeiras maliciosas e depreciativas praticadas entre eles aos
afrodescendentes, alguns educadores reproduzem na sua pratica escolar, discursos
preconceituosos.
61,50%21,40%
17%
já presenciaram econtinuam presenciando
não presenciaram e nãopresenciam
desconhecem essasatitudes
49,80%
41%
9,20%racismo envolvendoalunos
não responderam
racismo envolvendoeducadores
Mais da metade dos alunos não percebem a diferença de tratamento entre
brancos e negros, parte dos professores. No entanto, isto não revela a inexistência do
preconceito, mas sim a falta de percepção do mesmo, já que 30% dos entrevistados,
constatam a diferença dada no tratamento. Conversando com alguns destes alunos,
eles acrescentaram que os professores algumas vezes se aproximam mais dos alunos
de pele clara, ajudando-os nas tarefas escolares. Porém quando se aproximam dos
alunos negros ou mulatos não demostraram a mesma paciência e dedicação na
correção das tarefas (Figura 4).
Figura 4. Diferença no tratamento entre brancos e negros no espaço escolar
Essa “não percepção” de 60,8% dos alunos, em relação a diferença de
tratamento entre brancos e negros na escola, pode estar relacionada a banalização
da diferença, que é muito pior. É necessário que os educadores não naturalizem o
racismo, pois se assim acontecer estarão negando as suas manifestações e seus
múltiplos efeitos.
Com a implementação da Lei 10.639/03 das Diretrizes Curriculares para a
Educação das Relações Étnico-Raciais e para o ensino de História e Cultura Afro-
brasileira e africana, pensou-se em referendar os referenciais históricos e culturais,
que contribuíram e contribuem para o desenvolvimento do Brasil, isto é perceber os
costumes e as tradições do continente africano, recriados no cotidiano dos grupos
negros brasileiros e entendê-los como patrimônio da construção social do país.
Sendo assim os professores de todas as disciplinas precisam estar atentos e, em
especial nas áreas de Educação Artística e de Literatura e História Brasileiras.
Dessa forma verificou-se que somente 29,9% dos professores efetivamente
trabalham efetivamente essa temática, a maioria trabalha raramente (Figura 5).
30,40%
60,80%
8,80% percebem essa diferença
não é perceptível
desconhecem essasatitudes
Figura 4 - As questões raciais são trabalhadas pelos professores
Os alunos responderam que dentre os professores que trabalham essa
temática, uma grande maioria o fazem somente quando percebem uma situação
evidente de preconceito (Figura 6) ou em projetos em datas pontuais, para
participação de feiras no espaço coletivo da escola.
Figura 5 - Frequência com que as questões raciais são trabalhadas
Fazendo parte desse processo educativo e, dividindo com a família, igreja e
sociedade o papel de formar cidadão, a escola, reproduz na sua prática, vários
preconceitos contidos nessas esferas sociais que se manifestam por atitudes
discriminatórias, sendo por causa de gênero, pela orientação sexual, pela religião
professada, pela situação socioeconômica e principalmente por causa da etnia ou
raça dos sujeitos envolvidos, resultando na marginalização, na desvalorização e na
exclusão social de muitos.
Sendo assim, os costumes, as crenças podem contribuir com a manutenção
das atitudes racistas no espaço escolar como consta no resultado da pesquisa (Figura
7), onde um a grande maioria dos alunos (67,4%) disseram que sim, que a sociedade
29,90%
21,40%
38,70%
10,90% sim
não
raramente
não responderam
5,10%
78,80%
16,10%
disseram que sempre
sãotrabalhadas emsituações evidentes depreconceitos
são trabalhadas somenteem projetos
está arraigada em tradições, dogmas e preconceitos que veem a população negra
estereotipada, como ela é retratada em livros didáticos numa visão folclorizada
relacionando-as a lugares como a cozinha, caracterizada pela culinária e à dança,
pela capoeira e, menosprezada principalmente pela sua manifestação religiosa.
Figura 7 - Os costumes, as crenças podem contribuir com a manutenção de atitudes racistas
Os resultados alcançados com esse trabalho mostraram, na realidade que o
racismo e a discriminação estão sempre presentes, em algumas ocasiões, explicito e
chocante e em outras, sutil e acobertado.
De fato, pelos relatos dos alunos nos questionários e pela interpretação dos
textos produzidos pelos alunos em sala, a discussão sobre desigualdade ou
diferenciação racial desaparece de público, contudo o preconceito racial, velado ou
não, continuam atuantes na sociedade e no espaço. É como diz Fernandes (1972,
p.67):
“Embora o “indivíduos de cor” participem (em algumas regiões segundo proporções aparentemente consideráveis), das “conquistas do progresso”, não se pode afirmar, objetivamente, que eles compartilhem coletivamente das correntes de mobilidade social vertical vinculada à estrutura, ao funcionamento e ao desenvolvimento da sociedade de classe”.
Alguns alunos questionados, relataram a existência de atitudes
preconceituosas em sala de aula e no ambiente escolar: relataram o não
pertencimento de alguns alunos a determinados grupos, atitude justificada pelo
padrão de beleza e de comportamento estabelecido. Relataram também xingamentos,
apelidos depreciativos e piadas maldosas contra os alunos de cor de pele escura ou
parda. Muitos outros, não familiarizados com o tema, relataram a inexistência de
67,40%
23,60%
9%disseram que sim
disseram que não
desconhecem
distinções étnico raciais no espaço escolar e outros fugiram à temática dando mais
ênfase ao preconceito sexual, social e ao buliing, tanto falado na atualidade.
O que foi constatado é que pouco se comenta sobre as questões étnicas e
raciais na escola e na sociedade. Os alunos perceberam que a intensidade das
discussões vai diminuindo ao passo que a etnia negra vai deixando de ser expressiva
em determinada região do país, e em se tratando da nossa região, de maioria de
pessoas de cor de pele branca, percebe-se um esvaziamento das ações afirmativas
raciais. Mesmo assim, não podemos deixar que esta temática venha ser discutida
somente quando situações reais de preconceito, divulgada midiaticamente, venham
acontecer. Precisamos prevenir essas possíveis ocorrências, bem como suas
terríveis consequências.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O Projeto “O Indivíduo Negro na Sociedade e o Papel da Escola na
Desconstrução do Racismo” assumiu a tarefa apurar o olhar para situações que
estimulam atitudes preconceituosas no ambiente escolar e que causam danos e
sofrimento a esses discriminados.
Nele, propomos uma reflexão para a desconstrução de ideologias
deturpadoras sobre cor e raça e o estimulo para o pensamento crítico, respeitoso e
solidário de toda comunidade escolar. Acreditamos que o desafio foi proposto, e pela
atenção e retorno participativo dos alunos, pudemos perceber que o objetivo foi
alcançado.
A educação escolar tem esse compromisso, não sendo precípuo, mas de
grande importância para a construção de uma sociedade que respeita o ser humano
e procura romper com barreiras que historicamente foram impostas aos
afrodescendentes.
O trabalho sobre as questões étnicas raciais, realizado no ambiente escolar
oportunizou aos alunos conhecerem um pouco mais sobre a diversidade brasileira,
mostrou importância de respeitar as diferenças de cor e raça, valorizar as
manifestações culturais, e entender que o racismo existe, independente do grau de
percepção por parte dos estudantes, necessitando ser combatido.
A Constituição Federal brasileira atual trouxe consigo muitos dispositivos em
prol da igualdade, mas compreendendo as desigualdades raciais no Brasil como
produto de um processo colonizador, validado por hierarquias sociais o seu
enfrentamento não deve ficar restrito a ações implementadas pelo poder público.
Embora o poder público, por força de lei, possa impedir que o preconceito e a
discriminação, possam continuar acontecendo. Esse enfrentamento também deve
ser feito por diferentes organizações da vida social, no âmbito da promoção da
igualdade e da não discriminação racial.
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THEODORO, Mario. As Políticas Públicas e a Desigualdade Racial no Brasil 120 anos após a abolição.2ª edição, Brasilia: IPEA, 2008.
_________________________________________________________
APÊNDICE
Questionário para diagnóstico da discriminação e preconceito étnico-racial na escola.
Colégio Estadual Professora Ivone Soares Castanharo. Projeto PDE: 2014-2015
Questionário para diagnóstico da discriminação e preconceito étnico-racial na escola.
Professor: Mário Bertoldo
Nome: (opcional)____________________________________________________
Sexo: masculino ( ) feminino ( )
Raça/ cor ___________________________________________
Idade/anos: 13 a 15( ) 16 a17 ( ) Acima de 18( )
Ensino Fundamental, série - Série: 8ª( ) 9ª( ) Ensino Médio, série: 1º( ) 2º( ) 3º( )
01) Em relação ao preconceito racial na escola:
( ) ele existe, porém é ignorado ou velado
( ) existe, e é discutido.
( ) não existe
02) Você já presenciou alguma atitude racista na
escola?
( ) sim ( ) não ( ) desconheço
Caso afirmativo:
( ) envolvendo alunos,
( ) envolvendo professores e funcionários 03) Existe algum tipo de preconceito em sua
sala de aula?
( ) sim ( ) não ( ) desconheço
Que tipo: ............................................................................
04) Você já sofreu algum tipo de preconceito na
escola?
( ) sim ( ) não ( ) desconheço
Que tipo: ...............................................................................
05) Em relação ao ambiente escolar, você
percebe diferenças no tratamento dado a
brancos e a negros?
( ) sim ( ) não ( ) desconheço
06) As questões relacionadas ao racismo ou ao
preconceito com relação à pessoa negra são
trabalhadas pelos professores em sala de aula?
( ) sim ( ) não
( ) raramente ( ) desconheço 07) Caso a resposta da questão 06 for (sim),
responda com que frequência essas questões
são trabalhadas.
( ) sempre
( ) quando o preconceito fica evidente.
( ) somente em projetos
08) Você acredita que a linguagem usada no dia-
a- dia na sociedade e no espaço escolar pode
reforçar o racismo e a discriminação?
( ) sim ( ) não ( ) desconheço