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OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSENA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE
Artigos
Versão Online ISBN 978-85-8015-080-3Cadernos PDE
I
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POLITICAS PÚBLICAS AFIRMATIVAS DE COTAS RACIAIS: A
DESCONTRUÇÃO DAS RESISTÊNCIAS NO ESPAÇO ESCOLAR
Roberto Carlos Markovicz1
Wanirley Pedroso Guefi2
RESUMO Este artigo tem objetivo de avaliar os propósitos que me levaram a pensar o projeto. Finalmente, repensar os objetivos de compreender o real motivo das resistências em relações às políticas de cotas raciais no âmbito do espaço escolar. Aqui refletindo os métodos e recursos educacionais aplicados na implementação do projeto no espaço escolar, mediante a utilização de textos, filmes e recortes de jornais, como também apresentar as dificuldades em que ocorreram as ações para o público alvo (os alunos). Em termos de desfecho, a proposta inicial visava adquirir respostas à ansiedade e questionamentos em relação às resistências no espaço escolar, mostrando as diversas formas de desconstruir as resistências onde, em grupo de trabalho em rede com os professores cursistas, foram apresentadas muitas contribuições nesse sentido. Tais contribuições conduziram a uma reflexão sobre tanta resistência por parte dos alunos e dos professores, por se tratar de uma política afirmativa que resgata uma dívida que a sociedade tem historicamente para com os negros e, por outro lado, as políticas excludentes do Estado em relação às populações marginalizadas do âmbito educacional.
PALAVRAS-CHAVE: Políticas públicas. Ações afirmativas. Resistências. Cotas
raciais.
INTRODUÇÃO
O principal objetivo é o de entender acerca das políticas públicas afirmativas e
de cotas raciais, os reais motivos de tanta resistência por parte da comunidade
escolar, principalmente entre alunos e professores. Ao longo dos anos, fui
percebendo grande resistência, tanto por parte dos professores como dos alunos,
quando entrava nas questões relacionadas às políticas afirmativas. Vários foram os
argumentos usados pelos alunos como também por muitos professores como: “no
meu tempo não existia cotas e nem ENEM, também não existiam as bolsas de apoio
aos alunos, que dirá sobre as cotas raciais”. A meritocracia era citada a todo instante
como um grande argumento.
1 Professor de História na RedeEstadual de Ensino do Estado do Paraná. E-mail:
[email protected] 2 Professora no Departamento de Teoria e Prática de Ensino do Setor de Educação da Universidade
Federal do Paraná. E-mail: [email protected].
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Aqui, apresento alguns intelectuais que foram utilizados para o trabalho nas
diversas fases do projeto como: Kanbelege Munanga (2001; 2005), Célia Marinho
(2003; 2004), Florestan Fernandes (1964; 1972), principalmente na fundamentação
teórica. No meu entendimento de muitos anos em sala de aula, percebi que, quando
se trabalha com um viés histórico e bem preparado, as resistências entre os alunos
diminui, apresentando a realidade presente onde se quebra a ideia de igualdade,
onde desiguais não pode competir com iguais, diante do quadro presente do negro e
do índio.
Neste texto são apresentadas as nove ações do projeto de intervenção
pedagógica desenvolvido com alunos do 2º ano do ensino médio, em colégio da
rede estadual de ensino do Paraná. Para dessas ações tiveram interrupção
temporária, devido à greve de professores estaduais ocorrida após o episódio do dia
29 de abril de 2015. Aqui pretendo detalhar algumas argumentações por parte de
nossos alunos em oposição às políticas de cotas raciais. Outro fato muito importante
para o projeto foi a contribuição dos cursistas do GTR 2015, dando outro rumo para
o título do artigo que consiste em “A desconstrução da Resistência no Espaço
Escolar”.
DESENVOLVIMENTO
É importante analisar que, nos primeiros anos da história do Brasil, os
escravos trazidos da África não se reconheciam como negros, tampouco
vislumbravam o continente africano em sua totalidade, de forma homogênea. Mas,
eles tinham esse sentimento de pertença somente às suas regiões de origem,
específicas, ou seja, se reconheciam enquanto bantos ou sudaneses (Nagôs) e
outros. No entanto, não se viam como africanos.
Entre os séculos XVI e XIX, os habitantes das regiões africanas não se
percebiam em absoluto como “negros”. Ocorreu uma construção branca, já que os
povos africanos enxergavam a si mesmos como pertencentes a grupo étnicos bem
diferenciados e, em certos casos, reaproximadamente hostis (BARROS, 2009, p.39-
40).
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Na verdade, quem pela primeira vez avaliou estes povos a partir de sua identidade étnica e continental enquadrado em um lugar único foi o próprio homem “branco” europeu, já que esta questão não se colocava para negros africanos da época (BARROS, 2009, p.40). O “branco” colonizador e seus descendentes aumentavam, séculos após séculos, não pelo ingresso de novos contingentes europeus, mas, principalmente, pela multiplicação de mestiços e mulatos. Os negros, por sua vez, cresceram passo a passo com os brancos, mas, ao contrário destes, só o fizeram pela introdução anual maciça de enormes contingentes de escravos, destinados tanto a repor os desgastados no trabalho, como a aumentar o estoque disponível para atender a novos projetos produtivos (RIBEIRO, 1998, p.160).
Barros (2009) pontua que essa visão eurocêntrica do continente e do povo
africano começou a fazer parte do imaginário coletivo, dando estímulo ao tráfico
negreiro e à exploração de uma nova força de trabalho, submetida às mais
degradantes condições, com as devidas bênçãos da igreja Católica. O negro passou
a ser visto como uma realidade única e monolítica e, com o tempo, foi levado a
enxergar a si mesmo também desta maneira. Assim sendo, a desconstrução da
diversidade de etnias negras e das realidades culturais africanas, mergulhando-as
dentro de uma grande raça localizada em um espaço geográfico único e
imaginariamente homogêneo e a simultânea visão desta parte da humanidade como
“inferior” ao mesmo tempo em que se encarava o continente africano como lugar
exterior à civilização constitui o fundo ideológico da montagem do sistema escravista
no Brasil (BARROS, 2009.p 45- 46).
A teoria da inferioridade racial e o ‘medo branco’
Após construírem socialmente o conceito de ‘raça’ negra e de um continente
africano homogeneizado, desnudo de diferenças tribais e étnicas e dotado de uma
unicidade ímpar, cabia agora aos colonizadores, para efeito de justificar sua
dominação e exploração sobre os negros, atestarem ‘cientificamente’ a inferioridade
desta mesma ‘raça’. Os negros eram vistos como inferiores do ponto de vista mental,
cognitivo e sociocultural. Foram, inclusive, reiteradas pela Igreja Católica, que dizia
que a única salvação dos negros africanos era a conversão ao catolicismo. “A
instrução dos escravos na doutrina cristã e nos bons costumes completaria a obra
de sujeição ‘interior do negro ao branco’”. (AZEVEDO, 2004, p.47).
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Aqui, segundo o cursista 04 aponta, a questão teórica com sua prática,
considerando essa abordagem muito importante, até porque, para muitos alunos,
essa realidade não foi assimilada muitas vezes com uma violência praticada contra
seres humanos que foram tratados como ‘animais’ e/ou ‘produto’ com finalidade
apenas comercial. Essa falta de percepção de nossos alunos em perceberem as
atrocidades contra a população negra naquela época.
Esta falta de percepção por parte dos alunos na identificação das atrocidades
ocorridas pude comprovar na Ação 04, onde apresentei o filme “La Amistad” para os
alunos. Na minha exposição oral, inicialmente, falei que trata de um filme verídico,
onde procura retratar a realidade da época e não se trata de obra de ficção. Três
alunos questionaram se isso aconteceu com os negros, principalmente o que
acontecia no cotidiano: falta de água, violência e muitos negros disputavam um prato
de comida, além de jogarem os negros ao mar, principalmente os mais rebeldes ou
os que estavam doentes. O interessante que eles tinham que identificar e comentar
as formas de resistência que ocorriam naquela época, o que gerou certo espanto
entre os alunos.
É, certamente, resultado da construção ideológica que se desenvolveu, a
partir da política de dominação europeia através do imperialismo e do colonialismo,
com a criação do conceito de raça e de outros conceitos como “Missão Civilizatória”
e “Darwinismo Social” entre outras, como justificativas para suas barbáries. Portanto,
trabalhar esses aspectos e trazer à luz, todas as contribuições culturais, religiosas,
tecnológicas, etc., que os negros trouxeram para o Brasil, é sim uma oportunidade
de desconstruir o paradigma da superioridade europeia e da inferioridade das outras
civilizações. Eu sempre reforço com meus alunos que quando falamos de cultura,
não existe cultura superior e nem cultura inferior, o que existe são culturas
diferentes.
Aproveitando os textos sugeridos para o aprofundamento teórico seria
interessante iniciar um debate em relação ao termo raça, perguntando aos alunos e
alunas o que eles entende por raça, que significado essa palavra tem para eles e
elas, depois fazê-los entrar em contato, através de uma aula expositiva ou lendo o
texto que pode ser resumido, com a argumentação feita por Kabengele Munanga
sobre como o termo, que surgiu nas ciências biológicas, foi apropriado por
estudiosos das ciências humanas para classificar as pessoas e como essa
classificação estava carregada de preconceito ao passo que separa as pessoas ou
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os grupos sociais em superiores e inferiores, após trazer a contribuição do
antropólogo Franz Boas a partir do conceito de relativismo cultural que propõe
reconhecermos a diversidade sem impor valores e normas às diferentes culturas.
Outra questão apontada pelo cursista 04 está relacionada ao Ensino
Religioso, trabalhando a Diversidade Cultural e Religiosa e uma das formas de
desconstruir essa ideologia racista é exatamente mostrando a riqueza da cultura,
seja através da música, da dança, da religiosidade ou da capoeira. Porém, ainda é
muito forte o preconceito de muitos alunos com relação a vários aspectos
relacionados aos negros, na religiosidade ainda mais quando tratamos do
Candomblé e outras religiões de matriz africana. Ainda podemos incluir as lendas
africanas que são de uma grande riqueza.
A Lei 10.639, promulgada em 09 de janeiro de 2003, no início do governo
Lula, e, desde aquela data se tornou obrigatória a inclusão nos currículos dos
estabelecimentos de ensino fundamental e médio de conteúdos relacionados à
História da África e a Cultura Afro-Brasileira, até então praticamente inexistente, ou
pouco trabalhada no espaço escolar.
Aqui, vou comentar uma exposição do cursista 08 sobre a lei 10.639/2003. A
escola é o lugar de construção não só do conhecimento, mas também da identidade,
de valores, de afetos, enfim, é onde o ser humano, sem deixar de ser o que é se
molda de acordo com sua sociedade. O Brasil, formado a partir das heranças
culturais europeia, indígenas e africanas, não contempla, de maneira equilibrada,
essas três contribuições. Lendo o projeto de intervenção pedagógica, vejo que a
necessidade maior é de se no sistema educacional. Por isso, ter como meta a
efetiva realização das prerrogativas dessa lei é essencial que a lei 10.639/2003
contribui para desmitificar a história e a cultura africana e abriu cominhos que podem
ser traçados pela escola no tratamento da diversidade étnico-racial, visando a
prática pedagógica que incorpore essa questão de maneira mais contextualizada
sem hierarquizar ou inferiorizar as diferenças.
Em referência a lei 10.639/2003, outro comentário da cursista 10, na qual
trabalhar a lei é uma necessidade. Porém, uma das preocupações em relação a
aplicação, é o despreparo dos trabalhadores da educação sobre o assunto. Um dos
exemplos e que algumas escolas apenas comemoram datas como o “dia da
consciência negra” e “13 de maio”, não refletindo sobre o real significado destas
datas, perdendo-se assim a oportunidade de instigar os sobre o tema.
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Outro ponto de vista abordada pela cursista 06, é que alguns professores se
abstêm de ensinar a cultura africana por achar desnecessário, e repassam de
maneira superficial, sem esquecer que o negro africano fez parte da miscigenação
de raças que temos hoje no Brasil, e que fazem parte da história da população
brasileira, além de trazer tradições, costumes, religiões, que são esquecidas em
grande parte.
Outro ponto de fundamental importância é o caráter pedagógico e a ênfase na
questão curricular das instituições escolares. O currículo expressa o conflito de
interesses e os valores dominantes que guiam a escolarização. Como destaca Jean
Claude Forquin (1993), nem todos os elementos culturais são igualmente desejáveis
e percebidos como de mesmo valor. A transmissão cultural pressupõe a ideia de
uma permanência, mesmo que relativa, e a percepção do que é considerado valioso.
Desta forma, emergem algumas questões: Que a cultura selecionada é essa?
De quem é esse conhecimento considerado valioso para integrar os currículos,
dentro de uma vasta gama de possibilidades? O conhecimento corporificado no
currículo é transmitido como se fosse o conhecimento universal. Entretanto, os
currículos não veiculam simplesmente o conhecimento acumulado pela humanidade:
eles são seletivos, têm sido predominantes eurocêntricos ou distorcem a história e
cultura africanas e dos negros brasileiros.
Outra abordagem que advém da lei refere-se à presença do negro nos livros
didáticos. Principalmente, em relação à História do Brasil, apontam que os livros
analisados apresentam o negro como escravizado e, em alguma medida, uma forte
resistência contra esta situação.
Na reflexão sobre a escravidão nos livros didáticos, algumas questões são
ressaltadas: fatores determinantes da escravidão dos africanos, castigos aos
escravizados, iconografia sobre o negro, fim da escravidão e a substituição do
trabalho dos escravizados pelo trabalho livre.
O período da escravidão, nos textos dos livros didáticos, também está
presente em sua iconografia. Uma imagem que simboliza a representação do negro
nesses materiais se refere ao seu cativeiro. As ilustrações nos livros didáticos são
destacadas por Mariléia Cruz (2000), que constatou ilustrações sobre a escravidão
em quase todos os livros que fazem referência aos negros.
A resistência negra à escravidão é demonstrada nos livros didáticos
relacionados à História do Brasil, particularmente a partir dos anos de 1980. Andrea
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Carvalho (2006), por exemplo, destaca que, nos livros analisados, a resistência dos
africanos e seus descendentes, está centrada nos Quilombos, particularmente no de
Palmares. Ressalta que além de os livros não abordarem outras formas de
resistência, os textos possibilitam interpretações equivocadas. Uma amostra desta
situação é a percepção de que os africanos foram passivos à escravidão.
POLÍTICAS PÚBLICAS AFIRMATIVAS
Ellis Cashmore (2000) considera que as políticas afirmativas:
“São medidas temporárias e especiais, tomadas ou determinadas pelo Estado, de forma compulsória ou espontânea, com o propósito especifico de eliminar as desigualdades que foram acumuladas no decorrer da história da sociedade”. Estas medidas têm como principais “beneficiários” os membros dos grupos que enfrentaram preconceitos (2000, p. 31).
Na percepção de Álvaro Cruz (1998), as ações afirmativas podem ser
interpretadas.
As ações sendo afirmativas estão diretamente relacionadas a todas as maneiras de se efetivar, de forma concreta, o principio da igualdade jurídica. [...] Por meio delas, possibilitará aos grupos minoritários o reconhecimento formal através de uma forma de “tutela positiva” advinda do Estado legislador, com o objetivo especifico de corrigir as desigualdades históricas. (CRUZ, 1998, p.147).
Contudo, nos Estados Unidos, começou a se configurar um campo de luta
pela igualdade racial no país, a partir da década de 1960. Ondas de protestos contra
o sistema vigente de segregação trouxeram para a cena líderes como Martin Luther
King, Malcom X, Rosa Parks e grupos como os Panteras Negras, que apresentavam
diferentes propostas de ação política e que marcaram definitivamente a luta racial
nos Estados Unidos.
Portanto, na América, Martin Luther King, o maior ícone na luta dos negros
americanos contra a segregação racial, se fez conhecido pelo seu feliz pensamento
“a liberdade jamais e dada pelo opressor ela tem que ser conquistada pelo oprimido”
e ainda de forma eloquente continua “Eu tenho um sonho, o sonho de ver meus
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filhos julgados por sua personalidade, não pela cor de sua pele” (BROWN &
SCHLOREDT, 1989).
A partir deste contexto nos Estados Unidos, surgem as Políticas Publicas
afirmativas para os negros, sob o governo do presidente Richard Nixon (1969-1974),
no final do decênio de 1960. Devemos considerar o aparecimento das cotas naquele
país como fruto da força e da ressonância social conquistada pelos direitos civis,
iniciados em meados da década anterior.
Após o assassinato de Martin Luther King, em 1968, as manifestações pelos
direitos dos negros americanos recrudesceram em todo o país. A situação de caos e
violência nas cidades americanas acordou Nixon, um conservador republicano, nada
afeito à luta pelos direitos civis, a implantar as políticas de cotas, beneficiando o
ingresso de negros nas universidades e no mercado de trabalho.
Segundo Munanga (2001), o contexto sociopolítico dos Estados Unidos na
década de 60, que resultava em um quadro de racismo e segregação explícita,
propiciaram as condições histórico-objetivas para implementação das Políticas
Afirmativas.
Em países onde o racismo ultrapassa certos limites, como os Estados Unidos da América, o acesso ao mercado de trabalho, ao ensino de qualidade ou à mídia colocava-se como um problema difícil de ser enfrentado por negros. Por isso, surgiram em alguns países políticas governamentais que buscam favorecer a inclusão de afrodescendentes obrigando os empregadores a planificar suas medidas contratação, as universidades a implantarem regimes de Cotas, e as mídias a reservarem em seus programas, certa porcentagem de participação às minorias (MUNANGA, 2001, p. 31).
De acordo com Munanga (2001), no que diz respeito às cotas raciais:
O sistema de Cotas estadunidense foi institucionalizado sob o critério objetivo da “gota de sangue”, ou seja, para ser “considerado negro” e, portanto, beneficiário das políticas afirmativas, era necessário apenas uma gota de “sangue negro” na ascendência do indivíduo, mesmo que esse fosse louro de olhos azuis. Dos Estados Unidos as políticas de afirmação ganharam o mundo: Inglaterra, Canadá, Índia, Alemanha, Austrália, Nova Zelândia e Malásia são alguns países que adotaram (MUNANGA, 2001.).
Segundo o cursista 04, fazendo comentário sobre a lei 12.711/2012 e Lei
12.990/14 e, relacionando com o Projeto de Intervenção Pedagógica nos traz para a
reflexão e debate, sobre o tema, “cotas raciais”, vou ater-me à legislação
especificamente à Lei 12.711/2012 (Lei das Cotas nas Universidades) e a Lei
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12.990/14. Obviamente, o Estado, historicamente, não moveu esforços para criar um
arcabouço jurídico, com o objetivo de reparar prejuízos causados a uma importante
e produtiva população desse país. Evidentemente, estou fazendo referências aos
negros, historicamente renegados. Não o fez, porque não havia interesse e também
faltava representatividade dessa população nas instâncias públicas para fazerem a
defesa de seus interesses. As conquistas alcançadas foram fruto da organização e
lutas históricas travadas pelos negros contra a discriminação e o preconceito.
Esse movimento de luta dos negros contra a segregação racial, nos Estados
Unidos, influenciou o surgimento de movimentos semelhantes e com o mesmo
objetivo em outros países. Aqui no Brasil, podemos destacar o surgimento do
Movimento Negro, que contribuiu significativamente, para a criação de uma
legislação de inclusão social e de combate ao racismo e preconceito. A Constituição
Federal de 1988 é resultado de um avanço importante nesse sentido. Contudo,
ainda não havia uma legislação específica para os negros. A lei 12.711/2012 (Lei
das Cotas nas Universidades) preenche essa lacuna e repara um erro histórico. Pois
“formaliza juridicamente um direito” negado durante séculos e socialmente e a Lei
12.990/14 determina a reserva de 20% das vagas em concursos para a
administração pública federal e indireta, para autarquias, agências reguladoras,
fundações pública, empresas públicas e sociedades de economia mista controladas
pela União. Podem concorrer às vagas da cota racial todos que se declarem pretos
ou pardos no ato da inscrição no concurso, conforme os critérios do Instituto de
Geografia Estatística (IBGE).
Constatamos, portanto, que após vários séculos de atraso, nosso país
começa a dar os primeiros passos em busca da igualdade racial. Contudo, os
avanços na legislação, não significam efetivamente avanços na construção de uma
cultura de igualdade racial. Nossa sociedade ainda precisa “conhecer e entender” o
processo histórico e cultural que se consolidou na “consciência” de nossa sociedade
e para mudar essa realidade é necessário se construir um novo paradigma e o
caminho mais viável é, sem dúvida alguma, através da educação.
Segundo a cursista 12, entende que a política de cotas não vai resolver o que
aconteceu no passado, mas é visível a ligação entre a escravidão e a desigualdade
social existente atualmente, em minha opinião a política de cotas vem no sentido de
minimizar, não eliminar, um problema atual que é a pequena presença da população
negra nas instituições de ensino superior mesmo esta representando metade da
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população negra do país. A percepção é que alunos negros não se sentem
pertencentes aos espaços de ensino superior e tudo tem a ver com as teorias raciais
desenvolvidas no século XIX sobre a população negra, teorias que também eram
usadas como justificativas para a escravidão e que estão no imaginário de muitas
pessoas até hoje.
Contudo, reafirmando a importância da Constituição Federal de 1988, Maliska
afirma que:
A leitura do caput do art. 5º: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros...” pressupõe a leitura do art. 3º que dispõe que “constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I – construir uma sociedade livre, justa e solidária; II – garantir o desenvolvimento nacional; III- erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV – promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação” [...]. Uma Constituição que reconhece que há discriminação e desigualdades na sociedade não pode legitimar leis e políticas públicas que tratam todos os cidadãos de igual forma, mantendo e reproduzindo a situação de desigualdade social. (MALISKA, 2009, p. 64).
A ação 01 desenvolvida com os alunos quando apresentei o projeto de Cotas
Raciais, onde ficou patente a resistência por parte dos mesmos em relação as
políticas afirmativas e a utilização de argumentos como: todos são iguais perante a
lei, é um princípio inteligente, mas, e aí onde entra os desiguais, nesse caso Maliska
responde que os desiguais não podem ser tratado de maneira igual, outro
argumento muito utilizado é o da meritocracia, como pode tirar a vaga daquele que
tem competência e capacidade sem levar em conta a situação socioeconômica de
cada aluno, outro argumento usado e de as Cotas para os negros iriam inferiorizar
ou baixando a autoestima do negro.
Nesse sentido, o juiz federal William Douglas justifica o motivo de haver se
tornado a favor das cotas para negros, a partir do ato comparativo entre o que a
sociedade assegura a meninos e meninas pobres e negros e os recursos
educacionais e materiais disponibilizados para a sua própria filha, concluindo que “o
assunto demanda de todos nós uma posição consistente, uma que não se prenda
apenas a teorias e comece a resolver logo os fatos do cotidiano”.
Na atividade da ação 09, ficou patente para alguns alunos a questão da
desigualdade social e as condições da escola pública e a comparação com a escola
privada. Nesse caso, a questão da meritocracia cai por terra, onde se compara a
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própria escola dos alunos e algumas particulares e as condições para competir de
forma desigual, e como imaginar os alunos das escolas públicas da periferia, tenho
plena convicção que a reflexão veio aos alunos, haja vista, que esta ação foi
aplicada junto com a professora de língua portuguesa e a participação foi intensa e
muitos questionamentos.
Considerações finais
A implementação do projeto está em entender os motivos pelos quais os
professores e alunos resistem as políticas públicas afirmativas de cotas raciais. Aqui
reside o título do meu artigo “Desconstruindo as resistências no espaço escolar”,
onde relacionei algumas ideias dos cursistas do GTR. Pude perceber que a maioria
dos cursistas entende que é muito difícil trabalhar com o tema de Cotas Raciais.
Alguns colegas enfatizaram a necessidade de se trabalhar no espaço escolar mais
frequentemente, inclusive trabalhando com leis que tratam do tema de Cotas
Raciais, articulando com o viés histórico.
Outros cursistas colocaram a necessidade de melhor preparo e capacitação
dos professores para trabalhar a lei 10.639/2003. Observa-se que algumas escolas
que tem uma equipe multidisciplinar atuante nas questões étnico-raciais,
contribuindo para atuar nas situações-problemas, envolvendo questões raciais no
ambiente escolar, quer seja com professores ou alunos.
É necessário um trabalho mais cotidiano com os alunos sobre as Cotas
Raciais, haja vista, que existem incompreensão por parte dos mesmos, desconstruir
alguns pensamentos, por exemplo, que todos são iguais, sabemos que nem os
próprios alunos de escola pública não são iguais perante os alunos de escolas
particulares, outra ideia que os alunos negros não teriam condições de acompanhar
o conhecimento trabalhado e ficariam atrás ou abandonariam os estudos
universitário e até diante das políticas de Cotas Raciais se sentiriam inferiorizados
ou discriminados pelos próprios alunos cotistas. Outros mencionaram que muitos
professores não apresentam interesse em trabalhar o tema da cultura afro-brasileira,
somente em ocasião como: 13 de maio ou 20 de novembro, também apontaram que
o racismo se combate no cotidiano e não em datas festivas.
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Um fator importante é que esta geração de professores, ao terem recebido a
sua formação nas Universidades, como é o meu caso, tiveram acesso a pouco
material ou texto para o estudo da cultura africana e sem referenciais, como se
professores e intelectuais negros não existissem, aspecto este que tomei
consciência fora da Universidade. Outro ponto fundamental é trabalhar com teatro,
sugestões de filmes interessantes, expor documentário e murais com
personalidades de negros influentes na sociedade brasileira, apresentando sempre
os aspectos positivos e os negativos podem ficar com os materiais didáticos.
REFERERÊNCIA BIBLIOGRAFICA AZEVEDO, Célia Marinho de. Abolicionismo: Estados Unidos e Brasil, uma história comparada (século XIX). São Paulo. Annablume, 2004. ________________________. Onda negra, medo branco: o negro no imaginário das elites século XIX. São Paulo, Annablume. 2003 BARROS, José D Assunpção. A construção social da cor: diferença e desigualdade na formação da sociedade brasileira. Petrópolis: vozes, 2009. CARVALHO, A. A. de Moraes Cândido de. As imagens dos negros em livros didáticos de História. Dissertação (Mestrado em Educação), Universidade de Santa Catarina: Santa Catarina, 2006. CRUZ, Álvaro Ricardo de Souza, O direito às diferenças, ações afirmativas. In: CASHMORE, Ellis. Dicionário de relações étnicas e raciais. São Paulo: Selo Negro Edições,2000. CRUZ, Mariléia dos Santos. A história da disciplina de estudos sociais a partir das representações. In: CASHMORE, Ellis. Dicionário de relações étnicas e raciais. São Paulo: Selo Negro Edições,2000. MALISKA, Marcos Augusto. Análise da constitucionalidade das cotas para negros em universidades públicas. In: BERTÚLIO, Dora Lúcia de Lima. Cotas Raciais no ensino superior: entre o jurídico e o político. Curitiba: Juruá, 2009. MUNANGA, Kabengele. Políticas de ação afirmativa em benefício da população negra no Brasil: um ponto de vista em defesa das cotas. Sociedade e Cultura, v. 4, n. 2, jul./dez.2001, p. 31-43. Disponível em: [http://redalyc.uaemex.mx/redalyc/pdf/703/70311216002.pdf> Acesso em 16 de Mai. 2014.
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