O projeto político pedagógico a saída para a escola

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    SECRETARIA EXECUTIVA DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCAORua Siqueira Campos, 304 Santo Antnio Recife PE CEP 50010-010

    FONE : (081) 21226408/ FAX: (081) 21226367

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    O projeto poltico pedaggico: a sada para a escola

    Antnio Joaquim Severino*

    Introduo

    A idia que pretendo defender nesta fala a de que a educao s pode realizar-se atravs demediaes prticas que se desenvolvem a partir de um projeto educacional, vinculado, por sua vez,a um projeto histrico e social, e que a instituio escolar o lugar por excelncia desse projeto, noque concerne a sua dimenso educacional. Isto quer dizer que a instituio escolar deve instaurar-secomo espao-tempo, como instncia social que sirva de base mediadora e articuladora de outrosdois tipos de projetos que tm a ver com o ser humano: de um lado, o projeto poltico da sociedade

    e, de outro, os projetos pessoais dos sujeitos envolvidos na educao. A instituio escolar se dcomo lugar do entrecruzamento do projeto coletivo da sociedade com os projetos pessoais eexistenciais de educandos e educadores. ela que viabiliza que as aes pedaggicas doseducadores se tornem educacionais, na medida em que os impregna das finalidades polticas dacidadania que interessa aos educandos. Se, de um lado, a sociedade precisa da ao dos educadorespara a concretizao de seus fins, de outro, os educadores precisam do dimensionamento poltico doprojeto social para que sua ao tenha real significao como mediao do processo humanizadordos educandos.

    Com esta reflexo de cunho terico sobre a educao, pretendo trazer alguns elementos para adiscusso do lugar e do papel da escola na sociedade brasileira atual, defendendo como corolrio

    que, mais do que nunca, a escola continua sendo uma necessidade histrica para essa sociedade, vista de suas condies concretas. Mas esta contribuio da escola s tornar-se- efetiva se a escolase constituir como locus de um projeto educacional.

    Projeto tomado aqui no sentido de um conjunto articulado de propostas e programas de ao,delimitados, planejados, executados e avaliados em funo de uma finalidade, que se pretendealcanar e que previamente delineada mediante a representao simblica dos valores a seremefetivados. O projeto educacional pode ser metaforicamente representado pelo campo de foragravitacional criado por um im. O ncleo, no caso, uma intencionalidade, ou seja, um sentido,uma significao, que articula todas as aes, todas as medidas, todas as prticas, desenvolvidas portodos os sujeitos que se encontram no mesmo campo. essa intencionalidade que evita afragmentao das prticas especializadas e diferenciados dos mltiplos sujeitos envolvidos:educadores, administradores, educandos, servidores, tcnicos, especialistas, comunidade imediata,etc. a unio convergente em torno dessa significao catalizadora do projeto da instnciaeducacional que articula e legitima a integrao das atividades prprias do trabalho pedaggico, ainterdisciplinaridade dos componentes curriculares, que fundamenta as decises e medidas decunho administrativo que precisam ser tomadas e executadas no contexto da vida escolar. naintencionalidade nuclear do projeto educacional que se encontram as razes e as referncias bsicasdos objetivos que vo nortear a proposta pedaggica da instituio de ensino que queira realizar,com eficcia e qualidade, o seu trabalho educativo.

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    Mesmo quando as condies histrico-sociais de uma determinada sociedade esto deterioradas,marcadas pela degradao, pela opresso e pela alienao, como o caso da sociedade brasileira, o

    projeto educacional se faz ainda mais necessrio, devendo se construir ento como um projetofundamentalmente contra-ideolgico, ou seja, desmascarando, denunciando e criticando o projetopoltico opressor e anunciando as exigncias de um projeto poltico libertador.

    A educao como mediao universal da existncia histrica

    Mas toda sociedade precisa de educao. No preciso insistir muito nessa exigncia de cunhohistrico-antropolgico. A nossa uma espcie que precisa da aprendizagem. E em cada etapa desua histria, a humanidade carece incessantemente de se refazer, reaprendendo-se. Assim, aeducao se d como mediao universal da existncia histrica dos homens, uma vez que atravsdela que as novas geraes se introduzem ao trplice universo das prticas que viabilizam essaexistncia: a prtica produtiva, representada pelo trabalho transformador da natureza fsica e criadordos bens naturais de reposio da vida; a prtica social, representada pela participao na conduoda vida poltica da sociedade e a prtica simbolizadora, representada pela produo e fruio dacultura simblica.

    Com efeito, o homem visto de uma perspectiva histrico-antropolgica, um ser de relaes: ele serelaciona com a natureza, com os outros homens e consigo mesmo. Sua existncia se defetivamente atravs de atividades, atravs da ao, da prtica, atravs de mediaes nas quais essasrelaes se concretizam e tomam forma real.Assim, a verdadeira essnciado homem no mais se constitui sob a forma de uma entidade

    metafsica nem sob a forma de uma pura realidade fisico-biolgica. O homem tem um jeitoespecificamente humano de realizar sua humanidade. Ele , de fato, um ser em permanenteconstruo, que vai se fazendo no tempo pela mediao de sua prtica, de sua ao histrica. assim um ser que vai se criando no espao social e no tempo histrico. No apenas uma realidadedada, pronta e acabada, mas um sujeito que vai construindo aos poucos sua prpria realidade. Elano lhe dada sequer como um programa rgido, tal como ocorre no plano natural do cdigo genticodos seres vivos.

    Assim, de um primeiro ngulo, os homens estabelecem relaes com a natureza material, da qualrecebem seu organismo fsico-biolgico e da qual retiram todos os elementos e recursos para amanuteno de sua existncia material e para sua sobrevivncia, tanto como indivduos quanto

    como espcie. O conjunto das atividades desenvolvidas no mbito destas relaes constitui ouniverso do trabalho, a esfera da produo tcnica e econmica.O desenvolvimento dessas relaes com a natureza leva os homens a estabeleceremsimultaneamente relaes entre si, ultrapassando o nvel puramente transitivo das relaes gregriasque prevalecem entre os demais seres vivos. Instauram a estrutura social, as instituies sociais,estabelecendo um ordenamento entre si. Especificam relaes entre indivduos e grupos,decorrentes inicialmente da especificao das tarefas que se tornaram necessrias para a produodos bens no processo do trabalho. Por isso, ao lado das relaes tcnicas de produo, os homensvo implementar relaes inter-individuais, relaes de troca e de intercmbio entre si.

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    Formam assim a sociedade, entendida no mais como apenas o somatrio dos indivduos mas o seuagrupamento tecido por uma srie de relaes diferenciadas e diferenciadoras.

    Mas o processo de constituio da especificidade histrico-antropolgica do ser humano no seesgota a: concomitantemente ao processo de desenvolvimento das relaes produtivas e dasrelaes propriamente sociais, os homens desenvolvem igualmente um outro plano de relaes, odas relaes simblicas, criando, por assim dizer, um universo de relaes consigo mesmos. ouniverso das representaes simblicas. Os homens praticam um recurso prprio, uma sofisticaodos instintos vitais, um processo atravs do qual podem se representar simbolicamente as demaisrelaes, ultrapassando novamente o nvel puramente transitivo dos instintos biolgicos. Constitui-se assim o universo da conscincia subjetiva, a esfera da subjetividade, onde os homens seapreendem como sujeitos e se do inclusive a prpria identidade de indivduos autnomos.So estes trs planos que constituem as efetivas mediaes da existncia humana, j que o homem

    s pode existir efetivamente na exata medida em que vai se relacionando com a natureza, atravs dotrabalho; com a sociedade, atravs da prtica social, e consigo mesmo, pelo cultivo da prpriasubjetividade. E estas trs dimenses atuam de maneira integrada, interligada e complementar noprocesso real da vida das pessoas. Assim, o trabalho o elemento fundamental para a configuraode sua existncia, mas o trabalho s pode se dar no contexto de uma sociedade e impregnado poruma inteno subjetivada; mas a prtica social pressupe a esfera do econmico e as ordenaesarticuladas pelas representaes simblicas, enquanto que toda atividade simbolizadora pressupeas esferas do social e do econmico para terem objetividade.Estando assim colocadas as mediaes atravs das quais a existncia humana vai se constituindohistoricamente, possvel ento compreender o lugar que ocupa a educao. Trata-se de umprocesso social de trabalho que se constitui fundamentalmente de atividades que se situam nombito da prtica simblica, ou seja, um processo social cujas atividades de trabalho se doefetivamente por mediaes simblicas, mas com objetivos convergentes de inserir os indivduoseducandos no trplice universo do trabalho, da sociabilidade e da cultura simblica.

    Tornar vivel a existncia dos homens, numa dada realidade histrica e social, significa hojeconstruir a efetiva cidadania. garantir a todos os indivduos humanos, sem qualquer forma dediscriminao, as condies para o exerccio pleno de todas essas trs prticas, de modo a que possaser um produtor e fruidor dos bens naturais, dos bens sociais e dos bens culturais de sua sociedade.Com efeito, a condio da cidadania exige o efetivo compartilhar das mediaes existenciais, porsua vez realizveis atravs dessas trs modalidades de prticas reais. Mas, desde que esse

    compartilhar ocorra de modo construtivo, pois essas prticas so igualmente mediadoras dadesumanizao dos homens, j que tambm nelas que os homens podem se degradar, seremoprimidos e se alienar. Assim, o trabalho, condio bsica para uma existncia humanizada, podeser igualmente o lugar e a causa da instaurao de uma existncia degradada, aviltada, totalmentedesumanizada, quando as condies de sua realizao sejam deterioradas; do mesmo modo, ainsero num grupo social e a necessria sociabilidade pode se transformar num processo deopresso, quando prevalecem as relaes de poder e dominao entre as pessoas, seja no mbitodos pequenos grupos, seja no mbito dos grandes grupos societais.

    Como entender ento a educao numa sociedade historicamente determinada? Como uma prxishumana, ou seja, prtica intencionalizada, fecundada pela significao simblica j fruto do prprio

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    pensamento, que se efetiva como mediao para a construo da cidadania, enquanto contribuindopara a integrao dos homens nesse trplice universo do trabalho, da sociabilidade e da cultura

    simblica. Sem dvida, como especificamente prtica simblica, a educao s pode mesmo

    utilizar ferramentas simblicas, mas sua finalidade transcende essa especificidade: ela visa semprecontribuir para as novas geraes se realizem nos trs planos de sua existncia histrica geral.

    A escola necessria....

    a partir dessa exigncia que se pode compreender a importncia da escola para a construo dacidadania. Com efeito, para que a prtica educativa real seja uma prxis, preciso que ela se d nombito de um projeto. A escola o lugar institucional de um projeto educacional. Isto quer dizer

    que ela deve instaurar-se como espao-tempo, como instncia social que sirva de base mediadora earticuladora dos outros dois projetos que tm a ver com o agir humano: de um lado, o projetopoltico da sociedade e, de outro, os projetos pessoais dos sujeitos envolvidos na educao.Todo projeto implica uma intencionalidade bem como suas condies reais, objetivas, deconcretizao, j que a existncia dos homens se d sempre no duplo registro daobjetividade/subjetividade, de modo que esto sempre lidando com uma objetividade subjetivada ecom uma subjetividade objetivada.

    Defrontamo-nos aqui com a complexa e intrincada questo das relaes do processo educativo como processo social que o envolve por todos os lados. o que vem sendo colocado sob o enfoque dateoria do reprodutivismo da educao, segundo a qual a escola nada mais faria do que reproduzir asrelaes de dominao presentes no tecido social na medida em que, como instncia que lida comos instrumentos simblicos, reproduziria os valores hegemnicos da sociedade, inculcando-os nasnovas geraes. A escola vista ento como privilegiado aparelho ideolgico do Estado que, porsua vez, no um representante dos interesses universais da sociedade mas to somente de gruposprivilegiados e, consequentemente, dominantes.Recoloca-se ento a questo da dialtica objetividade/subjetividade. Em se tratando de processoque lida fundamentalmente com ferramentas simblicas, a educao ambgua, ambivalente, umavez que a subjetividade lugar privilegiado de alienao. Acresce-se a isso que se trata de mltiplassubjetividades envolvidas, o que potencializa a fora da alienao frente aos dados da objetividadecircundante.

    Com efeito, a prtica da educao pressupe mediaes subjetivas, a interveno da subjetividadede todos aqueles que se envolvem no processo. Dessa forma, tanto no plano de suas expressestericas como naquele de suas realizaes prticas, a educao implica a prpria subjetividade esuas produes. Mas a experincia subjetiva tambm uma riqussima experincia das iluses, doserros e do falseamento da realidade, ameaando assim, constantemente, comprometer sua prpriaatividade. No sem razo, pois, o exerccio da prtica educativa exige, da parte dos educadores,uma atenta e constante vigilncia frente aos riscos da ideologizao de sua atividade, seja eladesenvolvida na sala de aula ou em qualquer outra instncia do plano macro-social do sistema deeducao da sociedade.

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    O procedimento da conscincia, no seu desempenho subjetivo, no tem a inflexibilidade mecnica elinear dos instintos. Ao representar e ao avaliar os diversos aspectos da realidade, a conscincia

    facilmente os falseia. A representao simblica da realidade, que lhe cabia fazer, perde ento seucarter objetivo e se impregna de significaes que no mais correspondem realidade e a visoelaborada pelo sujeito fica falseada. Com efeito, na sua atividade subjetiva, a conscincia deveriavisar e dirigir-se realidade objetiva, atendo-se a ela; no entanto, quanto mais autnoma e livre emrelao mecanicidade dos instintos, mais frgil se torna frente objetividade e mais suscetvel desofrer interferncias perturbadoras. conscincia subjetiva pode ocorrer de se projetar numaobjetividade no-real, apenas projetada, imaginada, ideada. como se estivesse imaginando ummundo inventado, invertido. E assim a conscincia, alienando-se em relao realidade objetiva,constri contedos representativos com os quais pretende explicar e avaliar os vrios aspectos darealidade e que apresenta como sendo verdadeiros e vlidos, aptos no s a explic-los mas tambma legitim-los. Mas, alienada, a conscincia no se d conta de que tais contedos nem sempre esto

    se referindo adequadamente ao objeto. Na verdade, tais contedos --- idias, representaes,conceitos, valores --- so ideolgicos, ou seja, tm obviamente um sentido, um significado, mas queest descolado do real objetivo, pois referem-se de fato a um outro aspecto da realidade que, noentanto, fica oculto e camuflado. Ocorre um falseamento da prpria apreenso pela conscincia, umdesvirtuamento de seu proceder, decorrente sobretudo da presso de interesses sociais que,intervindo na valorao da prpria subjetividade, altera a relao de significao dasrepresentaes.

    Esses interesses/valores que intervm e interferem na atividade cognoscitiva e valorativa daconscincia nascem das relaes sociais de poder, das relaes polticas, que tecem a sociedade. para legitimar determinadas relaes de poder que a conscincia apresenta como objetivas,universais e necessrias, portanto supostamente verdadeiras, algumas representaes que, narealidade social, referem-se de fato a interesses de grupos particulares, em geral, gruposdominantes, detentores do poder no interior da sociedade.

    A fora do processo de ideologizao , sem dvida, uma dos maiores percalos da prticaeducativa, por que ela atua no seu mago. Mas, a possibilidade da interferncia da ideologia noinvalida nem inviabiliza a escola. O simples fato do reconhecimento do poder ideologizador daeducao testemunha igualmente o valor da subjetividade, seu poder de doao de significaes. Oque cabe, no entanto, escola, na sua auto-constituio como centro de um projeto educacional, ter presente essa ambivalncia de sua prpria condio de agncia educativa, e investir na

    explicitao e na crtica desses compromissos ideolgicos, etapas preliminares para que possatornar seu projeto elemento de transformao da escola tambm em lugar de elaborao de umdiscurso contra-ideolgico e, consequentemente, de instaurao de uma nova conscincia social ede mesmo de novas relaes sociais; a educao pode se tornar tambm numa fora transformadoraso social, atuando portanto contra-ideologicamente.

    Educar contra-ideologicamente utilizar com a devida competncia e criticidade, as ferramentas doconhecimento, as nicas de que efetivamente o homem dispe para dar sentido s suas prticasmediadoras de sua existncia real. Por mais ambguos e fragilizados que sejam esses recursos dasubjetividade, eles so instrumentos capazes de explicitar verdades histricas e de significar, comum mnimo de fidelidade, a realidade objetiva onde o homem desenvolve sua histria.

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    O que se impe a adequada explorao do conhecimento, poderosa estratgia do homem paranortear-se no espao social e no tempo histrico.

    Da a relevncia do conhecimento em suas dimenses cientfica e filosfica, mbitos nos quais h apossibilidade efetiva de se assegurar a competncia e a criticidade necessrias no caso de utilizaode nossa subjetividade.

    A escola se caracteriza, pois, como a institucionalizao das mediaes reais para que umaintencionalidade possa tornar-se efetiva, concreta, histrica, para que os objetivos intencionalizadosno fiquem apenas no plano ideal, mas ganhem forma real.

    Assim sendo, a escola se d como lugar do entrecruzamento do projeto poltico coletivo dasociedade com os projetos pessoais e existenciais de educandos e educadores. ela que viabiliza asaes pedaggicas dos educadores se tornem educacionais, na medida em que se impregna das

    finalidades polticas da cidadania que interessa aos educandos. Se, de um lado, a sociedade precisada ao dos educadores para a concretizao de seus fins, de outro, os educadores precisam dodimensionamento poltico do projeto social para que sua ao tenha real significado comomediao da humanizao dos educandos. Estes encontram na escola um dos espaos privilegiadospara a vivificao e efetivao de seu projeto.

    A escola se faz necessria para abrigar e mediatizar o projeto educacional, imprescindvel para umasociedade autenticamente moderna. A especificidade do trabalho pedaggico exige umainstitucionalizao de meios que vinculem educadores e educandos. A escola no pode sersubstituida pelos meios de comunicao de massa, toda relao pedaggica depende de umrelacionamento humano direto. Toda situao de aprendizagem, para ser educacional, no basta sertecnicamente operativa, precisa ser pedaggica, ou seja, relacionar pessoas diretamente entre si.Alis, a fecundidade didtica dos meios tcnicos j dependente da incorporao de significadosvalorativos pessoais.

    Para que se possa falar de um projeto impregnado por uma intencionalidade significadora, impe-seque todas as partes envolvidas na prtica educativa de uma escola estejam profundamenteintegrados na constituio e vivenciao dessa intencionalidade. Do mesmo modo que no campomagntico, todas as partculas do campo esto imantadas, no mbito de um projeto educacional,todas as pessoas envolvidas precisam compartilhar dessa intencionalidade, adequando seusobjetivos parciais e particulares ao objetivo abrangente da proposta pedaggica decorrente do

    projeto educacional. Mas, para tanto, impe-se que toda a comunidade escolar seja efetivamenteenvolvida na construo e explicitao dessa mesma intencionalidade. um sujeito coletivo quedeve instaur-la; e nela que se lastreiam a significao e a legitimidade do trabalho em equipe ede toda interdisciplinaridade, tanto no campo terico como no campo prtico.Ao investir na constituio da cidadania dos indivduos, a educao escolar est articulando oprojeto poltico da sociedade --- que precisa ter seus membros como cidados --- e os projetospessoais desses indivduos que, por sua vez, precisam do espao social para existir humanamente.Por outro lado, em sociedades histricas passando por momentos de determinao alienadora, deopresso e de explorao, implementando projeto poltico voltado para interesses egosticos degrupos particulares hegemnicos, como o caso de nossa sociedade brasileira atual, torna-se aindamais precria a fora da instituio escolar nesse seu trabalho de construo da cidadania, uma vez

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    que o projeto educacioanl autntico estaria necessariamente em conflito com o projeto poltico dasociedade que, ao oprimir a maioria dos indivduos que a integram, compromete at mesmo a

    possibilidade de o educador construir seu projeto pessoal. Esbarramos a nos limites impostos pelamanipulao, pela expropriao e pela alienao dos seres humanos. Muitas vezes, investir naconstruo de um projeto educacional pura prtica de resistncia.

    Mas, mesmo nesse caso, a escola se torna ainda mais necessria, impondo-se um investimentosistemtico com vistas a sua sustentao e com vistas ao desenvolvimento de um projetoeducacional eminentemente contra-ideolgico, ou seja, desmascarando, denunciando, criticandoesse projeto poltico, no se conformando com ele, no o aceitando passivamente.As armas de que dispem os educadores so prioritariamente aquelas fornecidas peloconhecimento. atravs do conhecimento, crtica, competente e criativamente produzido, que oseducadores, na condio de intelectuais, podero aturar como tcnicos e como polticos.

    Concluso

    De todas essas consideraes, impe-se concluir que, na atual situao historico-social brasileira, smesmo um sistema universalizado de ensino estar em condies de enfrentar o desafio daconstruo da cidadania. Universalizao esta absolutamente imprescindvel para tanto. Se verdade que possam existir, hipoteticamente, variadas modalidades de mediaes da educao,historicamente tambm verdadeiro que a escola se revela como sua mediao potencialmentemais eficaz para a universalizao da educao. Isso implica, sem nenhuma dvida, a constituiode uma grande e qualificado sistema pblico de ensino.

    Da os profundos equvocos que vm atravessando a poltica educacional brasileira das ltimasdcadas, ao estender a privatizao exacerbada e sem critrios tambm aos assim chamadosservios educacionais. Trata-se de prtica duplamente perversa. De um lado, desconhece aincapacidade econmica da maioria da populao brasileira de se integrar no processo produtivo deuma economia de mercado, que pressupe um patamar mnimo de condies objetivas para que osagentes possam dela participar. Abaixo desse nvel, essa participao se situar necessariamentenuma esfera de marginalidade econmica. De outro lado, a perversidade do sistema se manifestaigualmente no fato da precria qualidade de educao que sobra para a populao que dela maisprecisa, tanto nas escolas/empresas quanto nas escolas pblicas ainda mantidas, ou seja, taleducao ofertada no habilitar essa populao ao ponto de lhe viabilizar a ruptura do crculo deferro de sua opresso. Apenas uma elite vinculada aos segmentos dominantes est dispondo de uma

    educao qualificada, sem dvida alguma capaz de habilit-a para continuar no exerccio dadominao.

    preciso ficar bem claro que um sistema universal de educao identificado com os interesses dotodo da sociedade no se confunde com o modelo estatal/modelo privado de jurisdio do sistemageral de ensino de um pas. O sentido do pblico aquele abrangido pelo sentido do bem comumefetivamente universal, ou seja, que garanta ao universo dos sujeitos o direito de usufruir dos bensculturais da educao, sem nenhuma restrio. A questo bsica no a da referncia jurdica demanuteno dos sub-sistemas de ensino mas a do seu efetivo envolvimento com o objetivo daeducao universalizada. As instituies particulares de ensino tambm no podem, pois eximir-se

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    de um comprometimento que leve em conta um projeto poltico-social identificado com asnecessidades objetivas do todo da populao.

    O equvoco radical est em se entenderem e sobretudo em se vivenciarem apenas como instnciasdo mercado, onde os bens simblicos da cultura transformam-se em bens puramente econmicos,esvaziados de todo contedo humano e humanizador.

    Bibliografia

    ENGUITA, Mariano F.A face oculta da escola: educao e trabalho no capitalismo. Porto Alegre,Artes Mdicas, 1989.

    FRANCO, M. Laura B. e ZIBAS, Dagmar (orgs.). Final de sculo: desafios da educao naAmrica Latina. So Paulo, Cortez, 1990.

    GIROUX, Henry. Teoria crtica e resistncia na educao. Petrpolis, Vozes, 1986.

    QUEIROZ, Jos J.Educao hoje: tenses e polaridades. So Paulo, FECS/USF, 1997.

    SEVERINO, Antnio J.Educao, ideologia e contra-ideologia. So Paulo, EPU, 1986.

    SEVERINO, Antnio J. Filosofia. So Paulo, Cortez, 1992. 212 p. (Col. Magistrio 2o. Grau)

    SEVERINO, Antnio J. Filosofia da Educao. So Paulo, FTD, 1994. (Col. Ensinar & Aprender).

    SEVERINO, Antnio J. A escola de 1o. grau: organizao e funcionamento. In:Idias. So Paulo.FDE. (11):61-70. 1991.

    SEVERINO, Antnio J. O diretor e o cotidiano da escola. Idias. So Paulo, FDE. (12):79-89.1992.

    SEVERINO, Antnio J. A formao profissional do educador: pressupostos filosficos eimplicaes curriculares.Revista da ANDE. So Paulo. (17):29-40, 1991.

    * Professor titular de Filosofia da Educao, na Faculdade de Educao, da USP; bacharel e mestreem Filosofia, pela Universidade Catlica de Louvain, Blgica; doutor em Filosofia, pelaPUC de So Paulo.

    Texto entregue no Seminrio de Planejamento das Aes Pedaggicas nas Escolas da RedeEstadual em 07/02/2008.