O Poder Do Saber

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Este é o resumo, que se pode relatar, do que sentiu e compreendeu Adônis, na primeira fase da iniciação: "O Poder do Saber." O PODER DE OUSAR. — A segunda fase da iniciação corresponde ao ousar no terror. Adônis sentiu que se achava num estado de angústia indefinível. Encontrava-se frente a frente com sua consciência, enfrentando todos os seus atos do passado, que, com o correr do tempo, formaram um mundo separado dos demais, onde habitam seres de horripilante semelhança entre si. Porém, todos vivem e se alimentam em seu próprio ventre, devorando-o, como os filhos da aranha devoram sua própria mãe. O que sentia não era medo, nem terror, porém angústia e dor intensas. Tudo era trevas; não obstante percebia até os menores movimentos e detalhes daqueles seres. Naquele mundo tudo era destruição e remorso. Intuitivamente sentiu que todos aqueles seres formavam parte de seu ser e que o acompanhavam havia séculos e séculos. Enquanto meditava, naquele estado desolador, subitamente apareceu-lhe um fantasma — empregamos esta denominação na falta de outra melhor — cuja cabeça era bem parecida com a do jovem iniciado. Aquela sombra estava coberta de formas capazes de fazer gelar o sangue do mais valente dos homens. Aquelas formas vivas emanavam cores e odores que horrorizavam: umas pareciam ganchos, outras serpentes, lanças; outras assumiam formas desconhecidas no nosso mundo terrestre. Aquele fantasma se arrastava como um réptil e ria de maneira infernal. Quem seria capaz de desenhar a figura daquele monstro? Que pincel poderia reproduzir o aspecto horrível daquele olhar? Porém, o terror de Adônis chegou ao auge, quando ouviu dizer-lhe, aquela figura dantesca: — Abraça-nos, Pai nosso, somos vossos filhos... Por que viestes a nós, se não quereis prodigalizar-nos o vosso amor e carinho? Por que temeis vossos queridos filhos? Vós sacrificastes todos os prazeres para fazer-nos uma visita. Vinde, Pai, vinde, nosso amor por vós é grande. Não nos credes, pai? Pois recordai conosco, consultai vossa boa memória: somos entidades vivas, nascidas de vós, e em vós vivemos. Somos filhos de vossa mente e de vossa vontade. Somos as sementes oriundas da vossa energia criadora. Olhai esta e vossa filha, a fornicação; este é o egoísmo, aquele é a ira; os outros são o ódio, o roubo, a gula, a mentira, a hipocrisia, a paixão... Ultimamente, pai, nos abandonastes para rasgar o véu das trevas e agora viestes ao nosso reino... Pedi-nos o que for do vosso agrado, pois somos os arquivos da vossa memória milenária e todos os mistérios das idades estão escritos em nós... Beijai-nos, querido pai! E aquele monstro, ao mesmo tempo infernal e humano, arrastava-se para Adônis ou pelo menos assim o acreditava ele. Há certos minutos de tempo que são mais longos do que a eternidade. Adônis se sentia desfalecer, mais de arrependimento do que de medo. Diante dele, desfilaram todas as suas vítimas de todos os tempos. Lia efetivamente naqueles seres demoníacos o seu passado e sentia que eram seus filhos e sua obra. — Então, é este o inferno — dizia a si mesmo. — Estes são os demônios atraídos, por meus pensamentos, para esta região... - Que horror! — Tirai-nos daqui e voltai conosco ao mundo exterior, à procura do gozo e do prazer. Já temos sede e fome... — disse o fantasma. — Jamais! É suficiente o que já fiz! — acreditou dizer Adônis. Mas antes de terminar a frase, ouviu ele gritos desesperados que clamavam:

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Este é o resumo, que se pode relatar, do que sentiu e compreendeu Adônis, na primeira fase da iniciação: "O Poder do Saber."O PODER DE OUSAR. — A segunda fase da iniciação corresponde ao ousar no terror. Adônis sentiu que se achava num estado de angústia indefinível. Encontrava-se frente a frente com sua consciência, enfrentando todos os seus atos do passado, que, com o correr do tempo, formaram um mundo separado dos demais, onde habitam seres de horripilante semelhança entre si. Porém, todos vivem e se alimentam em seu próprio ventre, devorando-o, como os filhos da aranha devoram sua própria mãe. O que sentia não era medo, nem terror, porém angústia e dor intensas. Tudo era trevas; não obstante percebia até os menores movimentos e detalhes daqueles seres. Naquele mundo tudo era destruição e remorso. Intuitivamente sentiu que todos aqueles seres formavam parte de seu ser e que o acompanhavam havia séculos e séculos.Enquanto meditava, naquele estado desolador, subitamente apareceu-lhe um fantasma — empregamos esta denominação na falta de outra melhor — cuja cabeça era bem parecida com a do jovem iniciado. Aquela sombra estava coberta de formas capazes de fazer gelar o sangue do mais valente dos homens. Aquelas formas vivas emanavam cores e odores que horrorizavam: umas pareciam ganchos, outras serpentes, lanças; outras assumiam formas desconhecidas no nosso mundo terrestre. Aquele fantasma se arrastava como um réptil e ria de maneira infernal. Quem seria capaz de desenhar a figura daquele monstro? Que pincel poderia reproduzir o aspecto horrível daquele olhar? Porém, o terror de Adônis chegou ao auge, quando ouviu dizer-lhe, aquela figura dantesca:— Abraça-nos, Pai nosso, somos vossos filhos... Por que viestes a nós, se não quereis prodigalizar-nos o vosso amor e carinho? Por que temeis vossos queridos filhos? Vós sacrificastes todos os prazeres para fazer-nos uma visita. Vinde, Pai, vinde, nosso amor por vós é grande. Não nos credes, pai? Pois recordai conosco, consultai vossa boa memória: somos entidades vivas, nascidas de vós, e em vós vivemos. Somos filhos de vossa mente e de vossa vontade. Somos as sementes oriundas da vossa energia criadora. Olhai esta e vossa filha, a fornicação; este é o egoísmo, aquele é a ira; os outros são o ódio, o roubo, a gula, a mentira, a hipocrisia, a paixão... Ultimamente, pai, nos abandonastes para rasgar o véu das trevas e agora viestes ao nosso reino... Pedi-nos o que for do vosso agrado, pois somos os arquivos da vossa memória milenária e todos os mistérios das idades estão escritos em nós... Beijai-nos, querido pai!E aquele monstro, ao mesmo tempo infernal e humano, arrastava-se para Adônis ou pelo menos assim o acreditava ele.Há certos minutos de tempo que são mais longos do que a eternidade. Adônis se sentia desfalecer, mais de arrependimento do que de medo. Diante dele, desfilaram todas as suas vítimas de todos os tempos. Lia efetivamente naqueles seres demoníacos o seu passado e sentia que eram seus filhos e sua obra.— Então, é este o inferno — dizia a si mesmo. — Estes são os demônios atraídos, por meus pensamentos, para esta região... - Que horror!— Tirai-nos daqui e voltai conosco ao mundo exterior, à procura do gozo e do prazer. Já temos sede e fome... — disse o fantasma.— Jamais! É suficiente o que já fiz! — acreditou dizer Adônis.Mas antes de terminar a frase, ouviu ele gritos desesperados que clamavam:— Salva-nos destes tormentos!Olhou e viu muitas almas desesperadas que estavam ali, condenadas por ele... E sentiu, então, que ele havia criado este inferno e nele havia colocado aqueles seres, por seus pensamentos e desejos.Num primeiro impulso, quis correr para salvá-los... Porém, vendo a desigualdade da luta, começou a estudar um meio de anular todos aqueles males. Enquanto pensava, via aproximar-se dele, cada vez mais, aquela aparição horrível que lhe suplicava um beijo e o convidava a voltar à vida material e mundana.— Para trás! — julgou ele gritar. — Tu és minha obra e, assim como te criei, posso também destruir-te.Ouviu, então, a voz interna que estava acostumado a ouvir. Elevou seu pensamento aquela voz silenciosa e invocou. Percebeu que de seu coração se abriu uma porta pela qual saíram seres de luz.. . e, ajudado por eles, empreendeu sua obra salvadora.Não se pode dizer quanto tempo esteve dedicado a esses trabalhos... O arrependimento e o amor foram seus guias, e começou a ver, pouco a pouco, a destruição daqueles seres demoníacos, quando dirigia para eles aquele manancial de luz que brotava do seu coração.

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Enquanto isso, lançava um olhar retrospectivo ao seu passado, desde o momento atual até a mais remota antigüidade do mundo. Tudo isto estava escrito no seu sistema nervoso do Grande Simpático e desfilava diante dele, como uma projeção cinematográfica.Naquele inferno verificou a Lei que toda dor causada aos outros redunda em sofrimento para quem a causou, porque ali teve de identificar-se com seus habitantes, sofrendo as conseqüências dos seus atos. Foi horrível o tormento.. . Porém, a invocação e a consciência divina alivia toda dor.Nesse mundo aprende o Iniciado como anular o trabalho dos magos negros, que utilizam os anjos das trevas para influenciar e dominar o mundo com as armas do mal. Muitos oferecimentos tem o aspirante nessa região: de poder, de fortuna, etc., se consentir em aliar-se ao demônio interno, porém a voz interna nunca o abandona.Uma vez triunfante sobre essas tentações, o invadem sentimentos de justiça e sacrifício. Nessas esferas sente a dor causada por ele e busca o remédio para aliviá-la. Tem que salvar do tormentoso sofrimento as almas que, por sua causa, sofrem, nesse lugar, o indizível. Adônis via suas vidas passadas, que desfilavam como caravanas diante do seu olhar interno, com todos os horrores sofridos. Viu suas relações anteriores com Arist6teles, com Astaruth, com Eva, com seus pais, irmãos, amigos e inimigos... Em distintos lugares e ocasiões havia se encontrado com eles e com outros mais: na Espanha, na França, na Grécia, no Egito, na Caldéia, na índia, etc... A falta de espaço não nos permite relatar essas relações, que por si só constituiriam assunto para vários livros... Só podemos dizer que, em diversas vidas anteriores, Adônis e Aristóteles foram muito conhecidos no mundo do saber e da espiritualidade. Na Espanha, Aristóteles foi governante do país e Adônis foi um médico filósofo, cujo saber representou um importante papel na Igreja romana. Na França, como pai e filho, foram muito conhecidos no século VI. Na Grécia, Mestre e discípulo, no fim do século IV antes de Cristo. E assim sucessivamente nos demais lugares e países, sempre houve uma relação íntima entre os dois.Adônis via tudo isso no seu sistema simpático que, como uma imensa galeria, reunia todos os fatos desde o Gênese até o momento atual. Tudo estava diante dele, porém não era possível trazer tudo à mente, nem guardar tudo na memória. Naquele estado assemelhava-se a um namorado que sente em seu peito o fogo consumidor da paixão amorosa, porém não pode expressá-lo com palavras, porque não as encontra adequadas.E enquanto meditava na maneira de conservar na memória tudo o que se apresentava diante dele, produziu-se um fenômeno inesperado. Sentiu na raiz de sua espinha dorsal um movimento estranho. Depois julgou ver uma espécie de vapor que invadia aquela região e logo se transformava em fogo. Porém um fogo sem fumaça, como o produzido por uma centelha elétrica; e, finalmente, este fogo transformou-se numa luz mais brilhante que a do Sol.Intuitivamente compreendeu que aquele fogo-luz era emanado do seu sêmem e que ia se produzir um fenômeno desconhecido para ele. Sentiu uma profunda veneração por aquela luz-fogo e, com todo o amor de sua alma e do seu Espírito, a adorou... E compreendeu muitas coisas. Aquela luz foi subindo, perfurando sua espinha dorsal; porém, ao contrário do que sucedeu nas vezes anteriores, não sentiu dor alguma e sim uma sensação agradável.Era aquela luz que dava vida aos anjos que pululavam nela ou eram os anjos que acendiam e formavam aquela luz? Ninguém poderá resolver esse problema, uma vez que ambos possuem uma só natureza. Aquela luz invadiu, por fim, todo o seu sangue e o novo iniciado acreditou ver, em redor de si, uma espécie de couraça luminosa que impedia toda relação com o mundo exterior. E quando desapareceram diante dele, como por encanto, todos os demônios e fantasmas do inferno, o jovem sentiu-se só consigo mesmo. Diante daquela maravilha, sentiu-se forte e valoroso, com uma penetração única para compreender as coisas e com um atrevimento que nunca havia experimentado antes. Avivou-se sua imaginação de tal maneira que podia atravessar o passado e o futuro à vontade. Sentiu que era a fonte de uma saúde inesgotável e que era capaz de dar de beber a todo o mundo desta fonte, e ardia de desejo de o fazer.