O Plano Secreto Da Dell - IstoÉ Dinheiro
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O plano secreto da Dell Saiba em primeira mão detalhes da discreta ofensiva da gigante dos computadores para entrar em mercados inéditos
Por Roberta Namour
"Apresentamos a Dell para mais pessoas, em locais onde nunca havíamos
estado”
Michael Dell, presidente mundial
Numa manhã quente de verão, de 1984, a rotina da Universidade do Texas, em
Austin (EUA), foi perturbada por uma montanha de sucata que atravessou todo o
campus rumo a um minúsculo dormitório de calouros. Com um empréstimo de US$
1 mil conseguido com os avós, Michael Dell tinha acabado de comprar todo o
estoque encalhado de PCs de uma loja de informática. Foi dali, e aos 19 anos, que
o jovem franzino criou a Dell Computers. Sua estratégia era simples: customizar
máquinas e vender diretamente ao consumidor sem a necessidade de lojas
intermediárias. Em quatro anos, a empresa já faturava US$ 80 milhões.
Hoje é um colosso de US$ 61 bilhões. Mas o modelo revolucionário que projetou a
companhia não foi suficiente para manter a feroz concorrência à distância. O foco
engessado na venda direta de desktops e datacenters fez Michael Dell tropeçar. E
em 2006, a companhia foi ultrapassada pela HP na liderança mundial de
computadores. A Dell chegou a se desfazer de antigos dogmas e levou seus
produtos ao varejo. Mas a desaceleração do mercado, com a crise econômica,
atrapalhou os planos de uma virada triunfal. Pressionado, aos 44 anos, Michael
Dell revolucionou seu modelo de negócios. Dois anos depois, o resultado.
Uma Dell que ninguém conhece chega discretamente a hospitais, escolas e até às
Forças Armadas. Com exclusividade para a DINHEIRO, Raymundo Peixoto,
diretor-geral da Dell no Brasil, revela detalhes dessa ofensiva. "Computadores, há
vários no mercado. Queremos ir adiante da relação transacional com o cliente e
atender todas as suas necessidades." O grande trunfo da companhia é levar a
segmentos inéditos a boa e velha fórmula de personalização de computadores,
que a consagrou no passado. A Dell quer ainda se desvincular da imagem de uma
companhia de hardware para ser vista como uma provedora de soluções
integradas.
"Nós tivemos um aumento significativo na nossa competitividade, reestruturamos a
cadeia de suprimentos, aumentamos nosso portfólio de produtos e apresentamos
a Dell para mais pessoas, em locais onde nunca havíamos estado", disse Michael
Dell recentemente.
A solução educacional Classe
Conectada foi projetada para tornar as
salas de aulas interativas
Apelidado de MedKart, equipamento
desenvolvido pela Dell agiliza o
atendimento médico de emergência no
hospital Incor, em São Paulo
A Dell quer se desvincular da imagem de hardware para ser vista como uma
provedora de soluções
Mas não se deixe iludir. O que a Dell quer com tudo isso é vender mais e mais
computadores - mas computadores com maior valor agregado, seja quem for o
cliente. Dessa forma, a empresa espera crescer mais do que o mercado este ano.
Ou seja, pretende superar a expectativa de retração de 2% nas vendas globais de
PCs e ultrapassar os 10% de crescimento em vendas de desktops esperados para
o ano no Brasil. Qual a fórmula? Vender soluções que tragam computadores
integrados. O setor de serviços já corresponde a 9% do faturamento global da
companhia e é o segmento que mais cresce no Brasil.
Dentro dessa estratégia, poucas subsidiárias apresentam resultados tão vistosos
como a brasileira. Ela atingiu recentemente o topo do mercado de pequenas e
médias empresas, com 13% de participação - já era líder no mercado corporativo
de desktops e de notebooks, com 43% e 29% de market share, respectivamente.
Em servidores, ocupa o topo do mercado há 17 trimestres seguidos. A companhia
está prestes a inaugurar um escritório em São Paulo para aumentar sua presença
na região sudeste.
A experiência nacional é motivo de orgulho para a matriz e tem despertado cada
vez mais a curiosidade dos executivos de fora. De todas as regionais, a do Brasil é
a recordista em número de visitas. O CEO, Michael Dell, deve desembarcar por
aqui nos próximos meses. De acordo com o anuário Informática Hoje, a Dell do
Brasil fatura US$ 534 milhões.
No ano passado, pela primeira vez, a receita gerada fora dos EUA superou as
vendas do mercado americano. "O Brasil tem um peso especificamente importante
para a Dell", garante Peixoto. A companhia aposta que nos próximos cinco anos o
País terá o quarto maior mercado de computadores, atrás apenas dos EUA, da
China e da Índia.
Uma das primeiras ações da silenciosa invasão da Dell em novos mercados foi
apelidada de MedKart, um equipamento voltado para agilizar o atendimento
médico de emergência no hospital Instituto do Coração (Incor), em São Paulo.
Quando o barulho das rodas do MedKart vai ficando mais audível, os pacientes da
ala de tratamento intensivo do hospital sabem que a visita médica se aproxima. De
leito em leito, o doutor chega empurrando seu maquinário.
O equipamento, diariamente esterilizado, é composto por um notebook da Dell,
com sistema de prontuário eletrônico integrado, um teclado e um mouse laváveis,
e um scanner portátil. A pintura é antieletrostática e a bateria possui autonomia
para até seis horas de uso. Pela leitura do código de barras, localizado na pulseira
de identificação do paciente, a engenhoca mostra no computador todo o seu
histórico hospitalar. Isso permite ao médico tomar decisões com agilidade. "Não
havia nada disponível no mercado com essas características", lembra Marcos
Gutierrez, diretor de TI do Incor.
"A Dell, através do programa de incentivo do Ministério da Ciência e Tecnologia,
tornou isso possível." O carrinho hi-tech foi projetado pela Dell, em parceria com
outras empresas. A experiência faz parte da nova estratégia da companhia de
trabalhar junto aos clientes para criar soluções que atendam as suas
necessidades. "O ciclo de vendas fica mais longo, mas as encomendas
aumentam", afirma Peixoto.
Várias empresas e uma só Dell A subsidiária brasileira usa o modelo de gestão que valoriza a diversidade e recebe elogios até de Michael Dell
ROBERTA NAMOUR
"Os funcionários se sentem valorizados e retribuem com ideias frescas",
Raymundo Peixoto, diretor-geral no Brasil
Ao menos uma vez por mês, Raymundo Peixoto, diretor-geral da Dell no Brasil, se
reúne com um grupo de mulheres. Não se trata de nenhuma prática feminista. Ao
contrário. Peixoto é líder do Wise, time de funcionárias que discute a inserção
feminina na empresa. A iniciativa tem o incentivo de Michael Dell e da própria
esposa de Peixoto e faz parte da política de gestão da gigante de computadores.
Com o intuito de criar um ambiente de trabalho aberto e diversificado, a Dell
implantou uma série de ações diferenciadas. Para estimular a integração, dá voz a
minorias. Para melhorar a produtividade e cortar gastos, adotou o sistema de
home office. E para difundir a consciência ambiental, promove programas de
proteção ao meio ambiente.
"Acreditamos que essas ações trazem maior comprometimento dos funcionários
com a empresa. Eles se sentem valorizados e retribuem com ideias frescas",
afirma Peixoto. Aos 45 anos, seis deles dedicados ao comando da Dell no Brasil, o
animado pernambucano é responsável por propagar um clima de positivismo entre
os funcionários brasileiros. Clima esse que já contaminou até o CEO da
companhia. Michael Dell se declara fã do bom humor da equipe brasileira. "Ele diz
que temos um ambiente de muita energia e um grupo bem alinhado", conta.
O estímulo à descontração é uma prática comum entre as empresas de tecnologia
para incentivar a criatividade. O Google ficou conhecido por inserir atividades
recreativas no horário de trabalho. A Microsoft liberou o uso de bermuda e chinelo
pelos funcionários. Mas para Raymundo Peixoto, o caminho para um ambiente
produtivo está no diálogo aberto, "por mais absurdas que as ideias possam
parecer", afirma. "A raiz da criatividade é ter pensamentos divergentes", afirma a
professora Tania Casado, da FIA (Fundação Instituto de Administração).
O executivo dá como exemplo de eficácia desse modelo a execução de um projeto
para o Banrisul, Banco do Estado do Rio Grande do Sul. A empresa tinha menos
de dois meses para instalar mais de 10 mil computadores nos escritórios do banco.
"Nunca tínhamos feito isso antes", lembra. Peixoto reuniu funcionários de todas as
áreas da Dell para encontrar uma solução que pudesse tornar o prazo viável.
"Desenhamos juntos e fizemos acontecer." Resoluções do dia a dia também são
decididas remotamente. Só em São Paulo, cerca de 60 funcionários da companhia
trabalham de casa.
"Antes me incomodava com o barulho de cachorro ou de crianças chorando em
reuniões com funcionários em home office", lembra Peixoto. "Agora acho
supernatural e é até um motivo de descontração." A integração de minorias
também é uma das preocupações da Dell. No Brasil, três grupos foram formados
para discutir melhores práticas nesse sentido. A comunidade DellTA reúne as
pessoas portadoras de deficiências para buscar formas de atender melhor cada
necessidade. Cerca de 20 representantes dos setores de Segurança e Saúde,
Brigada de Incêndio e RH também participam das reuniões.
Já o Pride, foi criado por funcionários homossexuais com o objetivo de promover a
tolerância e o respeito à diversidade de orientação sexual dentro da companhia e
conta com 30 integrantes. Uma das conquistas da equipe foi incluir seus parceiros
homossexuais no programa de benefícios da empresa. O último grupo,
comandado por Peixoto, é o Wise, que apoia o desenvolvimento de carreira das
mulheres na empresa.
Ao todo, fazem parte 40 membros. "É uma prática louvável do ângulo de
responsabilidade social, mas para reverter isso em produtividade é preciso aliar a
outras iniciativas, como manter um ambiente aberto ao diálogo", alerta Tania. A
união da equipe brasileira também dá mostras de sua eficiência fora do ambiente
de trabalho. Mensalmente os funcionários se envolvem em iniciativas de
assistência à comunidade. Um grupo de Porto Alegre, por exemplo, se juntou para
recolher lixo do Rio Guaíba. "A preocupação com o meio ambiente está no DNA da
companhia", conta Peixoto.