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O NEGRO E SUA PRESENÇA NO CANCIONEIRO POPULAR SUL BRASILEIRO

Autor: José Francisco dos Santos Silveira1

Orientador: Marcio Antônio Both da Silva2

RESUMO

Com a finalidade de valorizar a luta do povo negro do estado do Rio Grande do Sul, bem como a inclusão da cultura afro-brasileira, transmitida pelo cancioneiro popular, pretende-se ao longo deste estudo, contribuir com a comunidade escolar do Colégio Estadual Professor Vicente de Carli – Ensino Fundamental e Médio, da cidade de Francisco Beltrão (PR). A análise que aqui se propõe tem por meta compreender a história dos negros no Rio Grande do Sul tendo por suporte algumas músicas e poemas do cancioneiro popular rio-grandense. O referido estudo envolveu os educandos da 2ª série “A”, período matutino do Ensino Médio, e foi realizado mediante pesquisa bibliográfica, utilizando-se de informações contidas em livros, jornais e sites especializados, proporcionando maior compreensão relativa à escravidão, lutas, sobrevivência e valores dado a relevância do tema. A investigação buscou comparar duas visões distintas, no que tange à figura do negro, retratadas nas músicas e poesias do cancioneiro popular sul brasileiro.

Palavras-chave: Letras; músicas; cultura afro-brasileira; cancioneiro popular Rio-grandense.

ABSTRACT

Aiming at the enhancement of the struggle of black people in the state of Rio Grande do Sul, as well as the inclusion of African-Brazilian culture, spread by popular songs, throughout this study intends to contribute to the school community of State College

1 Professor PDE 2010, Graduado em Estudos Sociais pela URCAMP, História pela FAFI (Palmas - PR), Pós-graduado em Metodologia do Ensino de História pela FAFI (Palmas – PR) e em Supervisão Escolar (Francisco Beltrão – PR).2 Professor dos cursos de Graduação e Pós-Graduação em História da Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE). Doutor em história pela Universidade Federal Fluminense (UFF).

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Professor Vicente de Carli – Elementary and High School, the town of Francisco Beltrão (PR). The analysis proposed here, is aimed at understanding the history of blacks in Rio Grande do Sul with support for some songs and poems of the folk songs Rio Grande. The study involved the students in the 2nd grade “A”, the morning of high school, and was conducted through literature search, using information contained in books, newspapers and specialized websites, providing greater understanding relating to slavery, struggle, survival values and given the importance of the topic. The study aimed to compare two different views, with respect to the black figure, portrayed in music and poetry of the southern Brazilian folk songs.

Keywords: Literature, music, afro-Brazilian culture, popular songbook Rio Grande do

Sul.

1 INTRODUÇÃO

O presente estudo tem como proposta fomentar uma discussão abordando como

é contada a história do negro e da escravidão no estado do Rio Grande do Sul, bem

como criar um contra ponto com a história que é cantada através das músicas do

cancioneiro popular.

A partir da referida abordagem faz-se necessário breve retrospecto indicando

como se desenrolou a pesquisa acadêmica de estudos comparativos nas últimas

décadas no Brasil.

Segundo Schwartz (2001, p. 26),

[...] os trabalhos acadêmicos na década de 1960 contribuíram para elaboração contínua de estudos comparativos da escravidão e incentivou a intensificação do interesse pela escravidão no Brasil. Nas duas décadas passadas, a historiografia da escravidão no Brasil passou por mudança significativa da orientação, método e interpretação.

A pesquisa que se propõe, neste artigo, parte de uma análise procedida na

história oficial chamando a atenção para a preponderância de pontos de vista e visões

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diferenciadas, presentes nas músicas e poesias do cancioneiro popular rio-grandense.

Destaca-se que o objeto de estudo a ser apresentado neste trabalho centra-se na

análise de determinadas letras e poesias do cancioneiro popular sul brasileiro (ver

anexos), bem como contraposições, sem ter a pretensão de classificá-las como mais ou

menos importantes, no que tange a outras formas de produção intelectual.

Cabe destacar que esta proposta de estudo ganha mais importância ainda, se

levar em conta a implantação da Lei 10.639, de 2003, que modificou a lei 9394, de 20

de Dezembro de 1996, determinando a inclusão da História da cultura afro-brasileira e

Africana no currículo escolar do Ensino Médio e Fundamental na rede pública e

particular de ensino. Segundo Passos (2009, s.p.), com esta Lei:

[...] buscou-se corrigir uma injustiça histórica e abriu mais espaço para a discussão sobre a discriminação racial e incentivou o maior contato com a riqueza da cultura africana e afro-brasileira e a sua contribuição na consolidação da nossa sociedade, estimulando a reflexão sobre a condição do negro no contexto histórico, social e econômico brasileiro, e principalmente reconhecer e valorizar nos colocando no mesmo patamar das demais culturas a sua contribuição o fomentando o reconhecimento e valorização da sua identidade.

Por ser oriundo do Rio Grande do Sul, o pesquisador desde cedo convive com o

telurismo3, o amor às coisas da terra expressa no cancioneiro popular sul-brasileiro

perpetuando-se além-fronteiras. Trouxe consigo tal anseio, suscitando o desejo de

desenvolver tal temática na escola onde atua, o Colégio Estadual Vicente de Carli –

Ensino Fundamental e Médio. Já que o Sudoeste do Paraná, e em particular Francisco

Beltrão (sua área de atuação), foi edificado majoritariamente por gaúchos, e sabendo-

se que seus descendentes (atualmente, a maioria dos alunos são descentes de

gaúchos) também buscam no cancioneiro respostas a perguntas advindas de tal

processo migratório.

No tocante à temática abordada, via conteúdos que fazem referência às

questões tais como Guerra dos Farrapos, processo migratório gaúcho para o Paraná,

3 Telurismo [De telu (i) + -ismo] S.m. 1. Influência do solo de uma região nos costumes, caráter etc, dos habitantes. (Novo Aurélio – Século XXI, 1999, p. 1939).

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entre outros, há plena ressonância no envolvimento dos alunos que, através da

utilização de instrumentos musicais, bem como da demonstração de seus dotes

artísticos, mediante apresentações ligadas às questões pertinentes ao tema proposto e

pelo fato da grande maioria trazer como herança familiar resquícios de nativismo, que

se ampliaram pelo exercício e gosto de frequentar Centros de Tradições Gaúchas

(CTG), são sensíveis e receptivos às poesias e músicas ligadas à já referida questão

em estudo.

É através da inclusão da cultura afro-brasileira e da luta do povo negro

transmitida pelo cancioneiro popular que se pretende contribuir com a comunidade

escolar, através da pesquisa e intervenção, a fim de compreender como se

estabeleceram as relações de escravidão e luta pela sobrevivência retratada nas

músicas e poesias do cancioneiro popular rio-grandense.

Esta pesquisa busca analisar os retratos de uma história de luta e sofrimento

especificamente do povo negro, escravizado no decurso do tempo. Busca-se também

fomentar a discussão sobre as diferentes formas de expressar tal situação que ora

tende a referendar uma historicidade oficial, e ora contrapõe-se a ela, levando em conta

a vertente donde provém o referido poema ou letra musical elencada como objeto de

análise, pois a essência das mensagens quando analisadas superficialmente, não se

deixa entrever. Quando analisados mais detidamente mostram correntes e linhas de

pensamento bem delineadas não sem propósito de influenciar as mentes dos ouvintes

levando-os a gostar, por vezes, ingenuamente de uma melodia que perpetua verdades

tidas como absolutas e que, no mínimo, precisam ser vistas como discutíveis. Para

tanto, serão analisadas poesias de autores tradicionalistas, tais como: Jaime Caetano

Braun e Euclides Fagundes Neto.

O primeiro, poeta, nascido em Timbauva (hoje Bossoroca) Rio Grande do Sul,

em 30 de Janeiro de 1924 vindo a falecer em 8 de Julho de 1999. Lançou diversos

livros de poesia4, gravou vários trabalhos musicais individualmente e conjuntamente

com outros intérpretes. Deste autor será analisado o poema "Órfão de Mãe Preta.”

4BRAUN, Jayme. Caetano. Galpão de Estância. Porto Alegre, RS: Editora Sulina, 1986; ___. De fogão em fogão. Porto Alegre, RS: Editora Sulina,1973; ___. Potreiro de guachos. Porto Alegre, RS: Editora Sulina, 1985; ___. Paisagens perdidas. Porto Alegre, RS: Editora Sulina,1987.

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Outro compositor elencado é Euclides Fagundes Neto, mais conhecido como

Neto Fagundes nascido no Alegrete, em 15 de Agosto de 1963, cantor, compositor

apresentador de TV e radialista. Atualmente apresenta o programa "Galpão Crioulo"

(RBS TV), ao lado do seu tio Nico Fagundes. Deste autor, a análise recai sobre a

composição por ele interpretada “Escravo de Saladeiro”. Existem diferenças na forma

como Jaime Caetano Braun e Neto Fagundes contam, por meio de suas canções e

poemas, determinadas histórias do negro e da sua presença no Rio Grande do Sul.

A intenção é aprofundar e entender o porquê de tais diferenças. Busca-se,

portanto, encontrar nas canções, ferramentas para interpretar a história e a presença do

negro no Rio Grande do Sul. Por um lado há a apresentação do drama do negro, no

embate junto a seu desejo emancipatório; por outro, a tendência de referendar uma

História oficial, dando conotação por vezes, de acomodação e subserviência, sem

contestação mínima pelos poetas, no referido processo.

2 O NEGRO E SUA PRESENÇA NO CANCIONEIRO POPULAR SUL BRASILEIRO

O estudo da História deve reconstruir a ação e a intenção dos homens no

desenvolvimento de suas atividades, em diferentes espaços e tempos, como nos

demonstra o professor Henrique Antunes Cunha, quando argumenta da impossibilidade

de se conhecer a história do Brasil, sem antes conhecer a história dos povos que

originaram a nação brasileira.

[...] O argumento principal para o ensino da História Africana está no fato da impossibilidade de uma boa compreensão da história brasileira sem o conhecimento das histórias dos atores africanos, indígenas e europeus. As relações trabalho-capital realizadas no escravismo brasileiro são antes de tudo, relações entre africanos e europeus. A exclusão da História Africana é uma dentre as várias demonstrações do racismo brasileiro. (CUNHA 1997, p.67)

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A presença do negro em solo gaúcho é reportada pelos livros antes mesmo da

chegada de muitos outros povos que vieram colonizar esta região do Brasil. Conforme

afirma Boschi (2007, apud COSTA 2010),

[...] a história, não deve ser compreendida como uma simples sucessão de fatos interligados, mas sim que ela é uma disciplina em permanente construção, e por estar nesse processo contínuo, não admite uma definição única. [...] Boschi, trata de duas questões muito importantes: a primeira, a história é uma construção e nos somos os sujeitos que a constroem; e a segunda, que o conhecimento histórico esta sendo sempre revisto, não é estático e nem uno.

A presença dos povos africanos e seus descendentes estão fortemente

imbricados com a própria história rio-grandense. O negro chegou a esta região na

condição de cativo, trazido por expedições colonizadoras ou integrando tropas militares.

Faziam o serviço braçal nas estâncias e nas cidades, e, segundo o escritor Mário

Maestri (2006), a presença do povo negro no estado do Rio Grande do Sul, em meados

do século XIX, chegou a 40% de toda a população da província. A importância do

trabalho germinal do africano e afro descendente escravizado durante um século e

meio de escravismo sul-rio-grandense é quase desconhecida pela historiografia.

Considerando as variadas formas de organização social, num processo

permanente de transformações, e sendo a ação humana a mola propulsora da História

e do desenvolvimento, segundo Boschi (2007, apud COSTA 2010),

[...] a Ciência História, pode ser uma ferramenta que pode proporcionar questões para a busca da compreensão da sociedade atual, revisando o passado e suas fontes de estudo. [...] a busca pela identidade, e pela memória não são ferramentas de exclusão, e sim, de uma busca pelo entendimento do outro, da cultura diversa e sua compreensão na busca por um convívio mais harmônico entre todos.

Cardoso (2003, p.135), em seu livro “Capitalismo e Escravidão no Brasil

Meridional: o negro na sociedade escravocrata no Rio Grande do Sul”, analisa a

questão do negro no estado rio-grandense embasando sua argumentação no sentido

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de que a ideia da existência de uma sociedade utópica foi mais inventiva do que tenha

se caracterizado na prática. De acordo com as interpretações que sustentaram

ideologicamente a construção do mito de uma sociedade sem conflitos, no Rio Grande

do Sul, o escravo era tratado com maior benevolência. Esse ponto de vista explica o

fato de serem, como relatam e querem alguns historiadores – Jorge Salis Goulart, por

exemplo – os escravos mais bem tratados no Rio Grande do Sul do que nas demais

províncias do Brasil.

Pode-se observar também, a história da trajetória negra em muitas obras

literárias, entre elas, "Casa Grande & Senzala", de Gilberto Freyre, que lança, para sua

época, um novo olhar sobre o negro perpetuado na história da sociedade brasileira.

Olhar que, por seu turno, não deixa de ser carregado de problemas. A partir de uma

análise da formação da sociedade brasileira, descreve como se dava a relação senhor -

escravo dentro do engenho, ressaltando a benevolência e a solidariedade que

permeavam esse universo, criando, dessa forma, o mito da democracia racial e

deixando de dar a devida atenção aos conflitos que atravessavam as relações entre

senhores e escravos ou, em última análise, entre brancos e negros. Para sustentar sua

teoria, Freyre (1988) afirma que brancos e negros eram "duas metades

confraternizadas, que se enriquecem mutuamente de valores e experiências diversas".

Escravos domésticos eram tratados como familiares, pessoas da casa, parentes

pobres; sentavam-se à mesa, passeavam com os senhores. O autor analisa, ainda, a

presença negra na história do Brasil, como esteio indispensável para a colonização

portuguesa.

Os escravos vindos das áreas de cultura negra mais adiantada foram um elemento ativo, criador, e quase que se pode acrescentar nobre na colonização do Brasil; degradados apenas pela sua condição de escravos. Longe de terem sido apenas animais de tração e operários de enxada, a serviço da agricultura, desempenharam uma função civilizadora. Foram a mão direita da formação agrária brasileira, os índios, e sob certo ponto de vista, os portugueses, a mão esquerda (FREYRE, 2002, p.364).

Ainda na visão de Cardoso (2003, p.307 e 316), “o abolicionismo e o movimento

pela imigração não levaram os brancos a redefinir socialmente as representações sobre

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os negros. Esses movimentos foram controlados pelas classes dominantes [...]”. A

relação senhor - escravo modificou-se com a abolição e muitos negros vagaram a esmo

pelo estado gaúcho. A liberdade os deixou na “[...] condenação à miséria e a condições

morais subumanas de vida”. Cardoso (2003), em sua obra, retrata as condições da

formação societária do negro no Brasil no período anterior e posterior à abolição da

escravatura, e argumenta que o escravo, embora deixando a sociedade de castas para

inserir-se na sociedade de classes, continuou alienado à sua condição inicial e sem

representatividade social.

Com relação à subserviência as quais os negros encontravam-se efetivamente

submetidos, por serem os mesmos produtos do modelo vigente, conseguiram diante

das condições de abandono, demonstrar em diversos aspectos de sua vida e de sua

cultura, reações criativas à situação em que viviam conforme aponta Schwartz, com

relação ao mínimo dos mínimos no que tange a seus momentos de “folga”.

Os escravos tinham permissão de usar esses períodos de ‘folga’ em benefício próprio, recebiam incentivos de constituir irmandades religiosas e de participar nas formas culturais da sociedade mais ampla (SCHWARTZ, 2001, p.94).

Ao utilizar os domingos, os feriados religiosos e, às vezes, dias reservados ao descanso, os escravos podiam suplementar a dieta com a produção de suas próprias hortas, vender o excedente nos mercados locais ou ao proprietário, e guardar o dinheiro ganho para fazer compras ou poupar para acabar comprando a própria liberdade, ou a de um ente querido (SCHWARTZ, 2001, p.99).

Portanto, enganam-se quem pensa que a escravidão é um problema do passado

e que deve ser apenas mais um legado histórico para a humanidade. As recentes

descobertas de trabalho forçado na agricultura e no garimpo em condições de cativeiro

em diversas partes do país em pleno século XXI demonstram que a escravidão ainda

persiste no Brasil, ou seja, “as forças da ganância e do poder que tornaram tal

instituição durável antes de 1888 não desapareceram, porém simplesmente se

transformaram num contexto moderno” (SCHWARTZ, 2001, p. 57).

No século XVIII e XIX formou-se no Estado do Rio Grande do Sul a literatura dita

“gauchesca”, a qual teve sua origem na região do Rio da Prata, literatura anônima,

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porém, rica em detalhes da vida popular, e surgida pelo cantar das gentes simples dos

pampas gaúchos que, através da tradição e vocabulário próprio, transmitem em seus

cancioneiros obras repletas de fatos e situações marcantes do período escravocrata do

Estado rio-grandense, numa época efervescente de nativismo e tradicionalismo por

agregação de mão-de-obra escrava, negra e gaúcha, contemporaneamente registrados

nos poemas e canções.

Com relação ao aparecimento de uma literatura específica, segundo Pozenato

(1974, p.32-33), não foi à crítica, mas a transmissão oral, a partir das cidades da

fronteira e, particularmente, por sua circulação nas fazendas e nos povoados que se

determinou a interferência de uma obra literária na constituição da outra, ou seja, a

história oral transmitida nas narrativas pelos partícipes, os dramas, referentes a gama

de problemas enfrentados face o processo em andamento, bem como os avanços no

que tange ao desejo do ideal libertário, embora lento e gradual, portanto, se de um lado,

houve o embate no que tange ao desejo pela alteração da condição cativa, por outro

lado, gradativamente, a literatura foi se consolidando na pesquisa e no registro de tais

anseios.

2.1 AS LEIS Nº10.639/03 E Nº11.645/08

A lei de Diretrizes de Bases (LDB), Nº 9394/96, sancionada em 20 de Dezembro

de 1996, traz em seu Art. 26: “[...] § 4º O ensino da História do Brasil levará em conta as

contribuições das diferentes culturas e etnias para a formação do povo brasileiro,

especialmente das matrizes indígena, africana e europeia.”.

Foi a primeira ordenação jurídica a incluir, entre outros temas, no Currículo

Escolar estudos sobre as diferentes culturas e etnias que contribuíram para a formação

do povo brasileiro. Cabe ressaltar que seu texto base foi alterado pela Lei Nº 10.639/03,

passando a dar obrigatoriedade ao estudo da temática “História e cultura afro-brasileira”

no currículo oficial da rede de ensino, sofrendo nova modificação em 10 de Março de

2008, pela Lei Nº 11.645/08 sendo sua redação atualizada nos seguintes termos:

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“Art. 26-A.5 Nos estabelecimentos de ensino fundamental e de ensino médio, públicos e privados, torna-se obrigatório o estudo da história e cultura afro-brasileira e indígena.

§ 1o O conteúdo programático a que se refere este artigo incluirá diversos aspectos da história e da cultura que caracterizam a formação da população brasileira, a partir desses dois grupos étnicos, tais como o estudo da história da África e dos africanos, a luta dos negros e dos povos indígenas no Brasil, a cultura negra e indígena brasileira e o negro e o índio na formação da sociedade nacional, resgatando as suas contribuições nas áreas social, econômica e política, pertinentes à história do Brasil.

§ 2o Os conteúdos referentes à história e cultura afro-brasileira e dos povos indígenas brasileiros serão ministrados no âmbito de todo o currículo escolar, em especial nas áreas de educação artística e de literatura e história brasileiras.”

Salienta Vaz (2008) que a aprovação dessas leis decorre de uma série de

demandas do Movimento Social Negro Brasileiro e aponta para um novo momento das

relações do Estado com os movimentos sociais organizados e a Educação. Essas leis

têm se constituído numa das principais iniciativas das ações afirmativas adotadas no

Brasil e que tem contribuído para a disseminação do estudo da história da África, dos

africanos e dos indígenas e contribuido significativamente para a formação da nação

brasileira.

Segundo a autora acima mencionada, essas leis contribuem para um movimento

de construção e redimensionamento curricular e ação educativa, salientando a

importância do contexto e sua diversidade cultural, sinalizando assim um modelo

educacional que prioriza a diversidade cultural presente na sociedade brasileira.

De acordo com Vieira e Silvério, (2008, p.15)

[...] As Leis 10639/03 e 11645/08 inscrevem se como políticas públicas educacionais que visam combater o racismo existente no sistema, bem como identificar as preciosas contribuições e valorizar o patrimônio artístico, arquitetônico, científico, cultural, moral, musical, religioso, tecnológico etc e, sobretudo, humanístico, presente nos modos de vida das populações negras e indígenas. Estas Leis rompem com larga tradição na educação brasileira que jamais se mostrou sensível às diferenças representadas pelas dimensões étnico-raciais da população brasileira desde os primórdios. Mas, concomitantemente,

5 Ver: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2008/lei/l11645.htm

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apontam para a construção de uma sociedade em que marcadores de diferença, como a pertença étnico-racial, não constituam centralidade para a desigualdade, como àquela que se assiste, infelizmente, nos dias de hoje.

Este estudo é voltado para a análise da história do negro no período escravista

rio-grandense retratada nas letras musicais do cancioneiro popular gaúcho,

previamente delimitada (ver anexos), com intuito de motivar a leitura, desenvolver

habilidades de compreensão e entendimento das ‘entrelinhas’ das letras analisadas,

juntamente com a produção escrita, uma vez que, mesmo sendo independentes, a

leitura e a escrita estão interligadas.

As atividades, por parte do professor-investigador, iniciaram com pesquisa

bibliográfica, para fundamentação teórica, em livros e artigos tais como: Capitalismo e

escravidão no Brasil meridional (CARDOSO, 2003), Casa-grande e senzala (FREYRE,

2002), O escravo no Rio Grande do Sul: trabalho resistência e sociedade (MAESTRI,

2006), Escravos roceiros e rebeldes (SCHWARTZ, 2001), O regional e o universal na

literatura gaúcha (POZENATO, 1974), bem como leituras de poemas e composições de

autores e intérpretes, as quais versam sobre o objeto de estudo anteriormente

apresentado, narrando à história do trabalho escravo no Rio Grande do Sul via

cancioneiro popular gaúcho (em anexo), além de textos extraídos do Jornal Correio do

Povo, (28 de Julho 2009 disponíveis no site deste jornal)6.

Esta prática foi aplicada aos alunos do 2º Ano do Ensino Médio Regular, do

Colégio Estadual Vicente de Carli – Ensino Fundamental e Médio, do município de

Francisco Beltrão, região Sudoeste do Paraná. As ações implementadas na escola

tiveram como objetivo o estudo das estruturas das letras musicais do cancioneiro

popular sul brasileiro. Após leitura e discussão dos textos informativos, (anexo) foram

analisadas as letras dos poemas que fazem referência ao tema proposto, visando o

aprimoramento da criticidade, no que tange a leitura das entrelinhas nos referidos

poemas.

O comportamento dos alunos durante a leitura e a escrita foi observado no início

e durante a aplicação de todo o projeto. Para avaliar o nível de compreensão dos

textos, foram propostas atividades comparativas entre as letras musicais estudadas,

6 Ver: http://www.defender.org.br/negros-alicercaram-formacao-do-rs/

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através de questionamentos e produção textual escrita. Essas atividades tiveram

caráter investigatório e serviram de base para a seleção e aplicação de estratégias de

compreensão leitora. Para facilitar a compreensão, houve o debate e a critica às letras

musicais do cancioneiro gaúcho previamente selecionado e anexado ao final deste

artigo.

As atividades com os alunos iniciaram com pesquisa sobre a história do trabalho

escravo no Rio Grande do Sul e o cancioneiro popular gaúcho, situando o aluno no

tempo e no espaço em que as letras musicais estudadas foram compostas,

comparando-as com os símbolos, as concepções e valores da época atual. Esta

pesquisa foi desenvolvida através de textos selecionados previamente e indicação de

sites na Internet, desencadeando-se a partir de slides7, os quais discorrem sobre a

cultura negra sul brasileira. Na continuidade, buscou-se subsídio no texto retirado do

Jornal Correio do Povo (28 de Julho 2009), “Negros alicerçaram formação do RS”, por

Silvana Losekan. O livro Casa-grande e Senzala (Freyre), foi apresentado na forma de

vídeo8, tendo como proposta maior a observância dos fatos da formação social colonial

brasileira, bem como o conflito proposto pelo autor, entre os senhores de engenho e os

jesuítas. No que tange a compositores e intérpretes, anteriormente elencados neste

trabalho, solicitou-se pesquisa sobre suas biografias, bem como a audição de suas

obras.

As atividades propostas foram direcionadas através de questionamentos e

indicações do professor que, posteriormente, organizou junto com os alunos discussões

referente à história do trabalho escravo no Rio Grande do Sul expressas no cancioneiro

popular gaúcho.

Após o estudo do poema, “Órfão de Mãe Preta” (Braun), e da música “Escravo

de Saladeiro” (Neto), (anexos) desenvolveram-se atividades de compreensão e análise

de seus personagens bem como dos símbolos que permeiam estes textos. Foram

propostas reconstruções, mudando o foco narrativo, a exemplo, a atenção mais

aguçada sobre a forma com a qual expressa seu intento o negro Venâncio, no poema

“Órfão de Mãe Preta” (Braun), no sentido da não existência de subserviência plena, já

7 Ver: http://www.slideshare.net/claudioknierim/contribuio-dos-negros-na-cultura-do-riogrande-do-sul-brasil),8 Ver: http://www.youtube.com/watch?v=EdKoK7mHsQ8,

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que o autor evoca seu direito, tendo em vista a “Negra Donata”, outrora, ter sido ama de

leite do “patrãozinho”. No mesmo sentido, o não comprometimento aparente com a

ideologia dominante, ao expressar em sua poesia a dor sentida pelo negro durante sua

vivência, evocando a capacidade do mesmo apresentar, algum senso de justiça frente à

cobrança de tal dividendo. Por outro lado, em observância a música “Escravo de

Saladeiro” (Neto), foi percebido resquício de parcialidade na abordagem sobre sua

temática, o qual se manifesta nitidamente nas duas últimas frases da referida canção,

ao evocar a situação de que: “Já é hora, negro forte que os homens se dêem as mãos/

e se ouça de sul a norte que somos todos irmãos”, indicando, ao que parece, relativo

processo de acomodação, nas relações de trabalho, como fim último.

No decorrer da aplicação dessas estratégias os alunos foram observados e

avaliados no sentido de averiguar se aquelas foram eficientes ou não. Também

ocorreram debates entre os alunos com o intuito de perceber se houve ou não diferença

na sua prática leitora das entrelinhas existentes nas letras analisadas do cancioneiro

gaúcho. Tais debates ocorreram após apresentações por parte dos alunos e do

professor de poemas e músicas anteriormente mencionadas, mediante uma “roda de

viola”, tendo como conteúdo primordial a análise dos dois poetas anteriormente

mencionados bem como suas peculiaridades na abordagem da temática trabalhada.

Na sequência, serão relatadas as experiências que foram vivenciadas, as

dificuldades encontradas, os benefícios que estas atividades trouxeram para os alunos.

Os depoimentos dos alunos quanto à mudança que perceberam na prática do uso da

linguagem no cotidiano foram considerados como um dos instrumentos de avaliação e

obtenção dos resultados que constam neste artigo. Outros instrumentos utilizados

foram as investigações diárias, através da observação direta, e a análise das produções

escritas desses alunos, ambas feitas pelo professor investigador. No que tange as

produções escritas, anteriormente mencionadas, salienta-se o enfoque sobre a questão

da contribuição dos negros no vocabulário gaúcho ou gauchesco. “Eles trouxeram

palavras e expressões diferentes mudando totalmente o vocabulário gaúcho, como por

exemplo, as palavras cacimba, cambota, capanga, japona, sanga, muitas das palavras

e expressões são usadas até hoje”. (Iago F. Gaspan nº 11, 2º A Mat.) Também a

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reflexão sobre a música “Escravo de Saladeiro” no que argumenta Jákson Dalla Libera

Palenti (nº 12 do 2º A Mat.).

“A música descreve a história dos negros que trabalhavam no sol, sem descanso que eram açoitados nos palanques e eram maltratados pelos seus chefes.Os negros não terão futuro e eles morrem pouco a pouco como se fossem gado, eles morrem de fome e pelos seus maus tratos. Eles são humilhados pela sua ascendência e pela sua cor.Eu acho que os negros por terem a cor negra não terem os mesmos direitos que os brancos, eles são pessoas normais e tem que ser vistos com os mesmos olhos que as pessoas brancas são vistas, mas muitas coisas mudaram e os negros não são mais escravizados”.

3 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

Ao dar início às atividades desenvolvidas com os alunos do 2º Ano A Matutino,

do Ensino Médio Regular, do Colégio Estadual Vicente de Carli – Ensino Fundamental

e Médio, do município de Francisco Beltrão, PR, realizou-se reunião com os pais destes

educandos, professores da turma em questão, equipe pedagógica e direção, para

explanar o referido projeto, a temática a ser trabalhada, objetivos, aplicação, e os

critérios utilizados para a avaliação.

As atividades foram desenvolvidas de maneira seqüencial, a partir dos textos

que serviram de base para o entendimento da temática e posteriormente o estudo dos

poemas. Para tal, cada atividade elencada como objeto de estudo teve o tempo

estipulado em uma hora/aula e as atividades referentes a elas ocorreram em horário

contrário, portanto, noutra aula. Na maioria dos casos, a discussão ou atividades

propostas e desenvolvidas na referida turma, iniciavam-se logo após a apresentação do

conteúdo em sala de aula. A primeira proposta desenvolvida inaugurou a referida

aplicabilidade com a leitura do texto de Silvana Losekan, “Negros alicerçaram formação

do Rio Grande do Sul”9 (anexo), o mesmo aprofunda o conhecimento acerca da cultura

negra e da formação étnica rio-grandense.

9 Ver: http://www.defender.org.br/negros-alicercaram-formacao-do-rs/

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Após a leitura, realizou-se uma plenária com os alunos para discutir as questões

relacionadas à chegada do negro no estado do Rio Grande do Sul, os “alicerces” que o

negro trouxe consigo ao estado, bem como sua contribuição para o tradicionalismo

gaúcho. Para encerrar esta discussão foram solicitados relatos que os alunos

conheciam sobre as tradições gaúchas. Destes, além dos já mencionados, cabe

ressaltar o acirramento dos ânimos pertinente à questão culinária e ao samba. Da

primeira, o paradoxo sobre o alimento e sua proveniência, para alguns, grotesco por ter

em sua composição derivados de “porco”; para outros, a certeza de que tal incremento

potencializava o valor nutricional. Com relação ao samba, cabe destacar a

convergência da discussão para o papel da mulher negra, por muitos vista ainda como

objeto, em particular a pobre e periférica e, em se tratando de carnaval, para nutrir uma

indústria destinada à exportação para o deleite dos chamados “gringos”. De maneira

que, segundo os alunos, é consenso a luta do negro no cambiar do tempo em busca de

seu espaço, não sem embates para tal.

A próxima atividade consistiu na análise da obra Casa Grande & Senzala. Esta

obra foi apresentada aos alunos por meio de vídeo10, a escolha do mesmo deu-se pelo

fato do material ter sido criado pelo estudante Cláudio Fuzita Jr., do 2º Ano (série

similar a aplicabilidade do projeto), do Colégio Nossa Senhora da Ressurreição, na

cidade de Catanduva-SP, trabalho solicitado por sua professora da disciplina de

História, contemplando de maneira didática e resumida o paralelo entre o modelo

escravo índio e o modelo escravocrata negro no Brasil, na ótica de Freyre. O conteúdo

do vídeo trata basicamente sobre fatos da formação social colonial brasileira, o conflito

entre os senhores de engenho e jesuítas. Uma vez que os primeiros queriam escravos

para o trabalho e os jesuítas escravos para Deus. Entre outras questões, há uma crítica

por parte de Freyre no sentido de que os escravos herdaram dos colonizadores

portugueses indolência para o trabalho.

10 Ver: http://www.youtube.com/watch?v=EdKoK7mHsQ8

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Figura 1: Trabalho sobre Casa Grande & Senzala.Fonte: Arquivo do autor, 2011.

O referido vídeo mostra essa abordagem, com nítida tendência a um processo

de acomodação social, onde por vezes evidencia-se a subserviência como algo natural,

sem contestação por parte dos envolvidos, no decurso do tempo, contudo, movimentos

contrários fizeram-se presentes mediante revoltas e rebeliões em grau menor ou maior,

variando de acordo com o local e circunstâncias. É interessante analisar que tal postura

já foi alvo de inúmeras críticas por parte da historiografia Contemporânea, no que tange

ao entendimento relativo à questão da indolência do negro com relação ao trabalho.

Historiadores, entre eles Cardoso (2003, p.307) que assim se posiciona, dando

embasamento para o citado acima:

“[...] o abolicionismo e o movimento pela imigração não levaram os brancos a redefinir socialmente as representações sobre os negros. Esses movimentos foram controlados pelas camadas dominantes que, assim, conseguiram orientar, na direção de seus interesses, a reintegração da ordem existente”.

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Para Schwartz (2001, p. 89), “Os escravos eram uma força de trabalho, e os

trabalhos forçados prestados a outros orientavam praticamente todos os aspectos de

sua situação”. Mesmo diante das condições escravistas, os negros, conseguiram

demonstrar em diversos aspectos de sua vida e de sua cultura reações criativas à

situação em que viviam. Ao término do vídeo, os alunos realizaram uma análise das

situações abordadas, principalmente, dando relevância à observação acima citada.

Dando sequência, no dia 05 de outubro de 2011, realizou-se a leitura do recorte

da Página do Gaúcho11, que contém informações sobre a vida e obra do poeta e

cantador Jayme Caetano Braun (Anexo B), em que os alunos pesquisaram e relataram

em tópicos as etapas da vida e obra deste poeta e cantador.

No dia 13 de outubro, os trabalhados continuaram sendo direcionados a Jayme

Caetano Braun. Os alunos ouviram a poesia Órfã de Mãe Preta12 (Anexo C), declamada

pelo próprio autor, o referido poema versa basicamente sobre a “visita” do negro

Venâncio às dependências da casa de seu então patrão (leia-se dono), o qual, ao

anunciar-se, dá a notícia da morte de parto da também escrava Vincença, ficando seu

rebento na orfandade e sem infraestrutura mínima para sobreviver, dadas as

adversidades pertinentes à condição do nascituro, traduzido assim na primeira estrofe:

“Patrão é o negro Venâncio que pede vossa licença/ Pra vos dize que a Vicença morreu

de parto, patrão/ e ao ir pra baixo do chão não tinha nada de seu/, só deixo quando

morreu este negrinho chorão”. Na continuidade argumenta sobre a proximidade do

acometido de infortúnio com a família do receptor: “Neto da negra Donata/ escrava do

vosso avô/, a negra que amamentou” [...]. Dentro desta ótica foi proposto trabalho de

questionamento para pequenos grupos, com base no roteiro a seguir: a) Há

subserviência plena no pedido de cuidado para com o negrinho enfocado pelo

personagem Venâncio? Justifique; b) Que relação há entre a forma de escravidão

descrita pelo poeta na referida poesia e o modo escravocrata que você conhece?

Justifique sua resposta; c) Em seu entendimento, Jayme Caetano Braun compromete-

se com a ideologia dominante ou apresenta em sua poesia toda a dor sentida pelo

negro durante sua vivência e apresentando algum senso de justiça?

11 Ver: http://www.paginadogaucho.com.br/jayme/zh/cc-2.htm12 Ver: http://pealeio3.com.sapo.pt/.

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Executadas as atividades propostas, os educandos foram unânimes em perceber

a conotação de “altivez” imbricada na ousadia, a qual corresponde fato relevante, dadas

as circunstâncias, em que o referido achava-se submetido; houve também

entendimento que tal modelo escravocrata é díspar com relação aos demais, a

exemplo, para tal raciocínio, o modelo encontrado nas sociedades de regadio. Com

relação ao comprometimento do poeta com alguma ideologia, foi averiguado que sua

mensagem alude a uma situação hipotética, porém passível de verdades para seu

tempo, sendo sua narrativa desprovida de “segundas intenções”.

Ao dar continuidade ao trabalho, em 19 de outubro, a pesquisa foi direcionada

para outro autor, Euclides Fagundes Neto13, sendo pesquisada sua vida e obra no site

oficial deste, acessado pelos alunos no Laboratório Digital do colégio.

Posteriormente, a música de sua autoria, Escravo de Saladeiro14, foi ouvida

(Anexo C). A já referida letra e a genealogia do autor foram utilizadas como suporte

para o debate no grande grupo, com vistas à temática do negro, enfocada na referida

composição. No tocante à mensagem da mesma percebe-se posicionamento mais

brando, por vezes contraditório, nas relações entre os donos dos meios de produção e

os que nela labutam, estimulando o ouvinte a crer num processo de acomodação

consensual entre as partes envolvidas, a exemplo, o aludido na segunda estrofe, na

segunda linha: [...] “É fácil ver tua pata na marca em sangue no chão./ O boi que

morre te mata pouco a pouco meu irmão”. Na terceira estrofe, nas últimas duas linhas

há mais uma evidência do exposto acima: [...] “Já é hora negro forte que os homens se

dêem as mãos/, e se ouça de sul a norte que somos todos irmãos”. Questões como a

imparcialidade na abordagem das temáticas tratadas, a ideologia presente na música

deste cantor e compositor e as diferenças existentes entre os dois autores estudados

foram abordadas. Fez-se um quadro comparativo das semelhanças e diferenças que

estes autores apresentam sobre o negro no Rio Grande do Sul. O resultado advindo do

referido quadro apontaram para posicionamentos antagônicos na abordagém da

temática. Os educandos enfatizaram que o primeiro trata da questão de forma mais

concisa, denunciando as agruras sofridas pelo negro no seu fazer histórico.

13 Ver: http://www.osfagundes.com.br/osfagundes/Os_Fagundes.html.14 Ver: http://www.youtube.com/watch?v=9IL65aEP35Q.,

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Argumentaram, de posse do visto e ouvido, que para tal houve uma constante luta,

pois para conquistarem qualquer benefício ou avanço social foi a “duras penas”. Por

outro lado, com base no segundo autor, foi consensual na verificação de sua

abordagem, haver resquícios que referendam a história oficial, escrita pela elite

dominante, disseminada pelos veículos de comunicação de massa, ao estilo “Pão e

circo” da Roma Antiga.

Para finalizar os trabalhos, os alunos, divididos em grupos expuseram os

resultados das pesquisas utilizando como recursos para a apresentação: o mural, a TV

Pendrive, interpretação ao violão e dramatização. O resultado foi gratificante, pelo

interesse e pelo avanço obtido, bem como pelo engajamento de todo o corpo docente e

dicente, facilitando portanto, a realização do referido intento, pois, como anteriormente

mencionado, na sua grande maioria descendem de gaúchos.

O ápice das atividades foi a realização da roda de viola com os alunos

envolvidos no projeto, cujos comentários são descritos a seguir: “Nunca as aulas de

História foram tão boas. Gostei muito de participar deste projeto” (Aluna do 2º Ano “A”);

“O professor explicou tudo muito bem e as atividades foram gostosas, envolveu toda a

turma e houve uma cooperação muito boa entre nós” (Aluno do 2º Ano “B”); “Adorei a

roda de viola. Nunca pensei que pudesse ficar legal como ficou” (Aluno do 2º Ano “B”).

A questão central do exposto acima residia no desejo de que o referido projeto

viesse a contribuir para a construção do conhecimento sistematizado. As evidências

indicam que as atividades propostas atingiram os objetivos, pois houve interesse

crescente dos envolvidos durante, e após a sua realização. Percebeu-se isso nos bate-

papos informais, na continuidade do convívio nas rodas de viola e, principalmente, ter

este tema como subsídio, algo que normalmente passa “a lo largo” por várias razões,

entre elas o exíguo tempo referente à quantidade de horas-aulas semanais

contempladas na grade curricular para uma 2ª Série, (atualmente a grande maioria

encontra-se no dito “Terceirão”). Outra questão importante residiu em oportunizar a

leitura de outras vertentes bem como o contraponto estabelecido entre poetas e poetas

que narraram e narram a saga do povo negro desde os primórdios da formação cultural

rio-grandense.

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O encerramento dos trabalhados foi exposto a toda comunidade escolar, bem

como a apresentação da roda de viola com as músicas relacionadas ao tema de

estudo.

4 CONCLUSÃO

Ao término das atividades, pode-se perceber que, para oportunizar uma

educação que respeite as diferenças, livre de preconceito e discriminação, é preciso

que educadores estejam comprometidos com a necessidade do embasamento teórico

sobre o desenvolvimento do ser humano em sua plenitude. As questões levantadas

nesta pesquisa envolveram os fatores sociais, a escravidão, as influências deixadas

pelo negro nas tradições gaúchas e a ideologia nas entrelinhas das letras das músicas

do cancioneiro popular gaúcho analisadas.

O projeto foi dinâmico e teve o sucesso almejado. No que tange aos objetivos

propostos neste trabalho, estes foram alcançados de forma satisfatória, levando-se em

consideração o pouco tempo disponível para sua aplicação. Ao finalizar este trabalho,

como requisito para o curso em questão, PDE, motivou a transmissão de

conhecimentos advindos de leituras específicas, aulas presenciais, além de orientações

individuais, para meu público alvo, que foram os alunos da Escola Estadual Professor

Vicente de Carli – Ensino Médio, bem como, aos demais interessados no tema. Com

esta atividade almeja-se um acréscimo na compreensão das diferenças e semelhanças

apresentadas pelos autores no que tange à trajetória do negro no Rio Grande do Sul.

5 REFERÊNCIAS

BRASIL, Ministério da Educação. Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana. Brasília, DF, Outubro de 2004.

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BRASIL. PRESIDÊNCIA DA REPUBLICA. Lei 10639 de 9 de Janeiro de 2003. Disponível em: http:// www.planalto.gov.br/ccivil/leis . Acesso em fev. de 2012.

BRASIL. PRESIDÊNCIA DA REPUBLICA. Lei 11645 de 10 de Março de 2008. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2008/lei/l11645.htmAcesso em fev. de 2012.BRASIL. PRESIDÊNCIA DA REPUBLICA. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9394.htm. Acesso em fev. de 2012.

CARDOSO, Fernando Henrique. Capitalismo e escravidão no Brasil meridional: o negro na sociedade escravocrata do Rio Grande do Sul. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003.

COSTA, Júlio César Virgínio da, Para que serve a História? O que faz o historiador?, Revista Brasileira de História & Ciências Sociais; Volume 2 - Número 3 - Julho de 2010, ISSN: 2175-3423; Disponivel em: http://www.rbhcs.com/index_arquivos/Resenha.ParaqueserveHistoria.pdf. Acesso em abr. de 2012.

CUNHA Junior, H. Educação popular afro-brasileira. In: LIMA, I; ROMÃO, J.; org. Série Pensamento Negro em Educação nº. 05. SC: Editora Núcleo de Estudos Negros (NEN), 1997.

FREYRE, Gilberto. Casa-grande e senzala. Rio de Janeiro: Record, 2002.

_________. Casa grande & senzala: formação da família brasileira sob o regime da economia patriarcal. 34 ed. Rio de Janeiro: Record, 1998.

HOLANDA FERREIRA, Aurélio Buarque de. Novo Aurélio – Século XXI – Dicionário da língua portuguesa. 3a. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999.

MAESTRI, Mário. O escravo no Rio Grande do Sul: trabalho, resistência e sociedade. 3. ed. rev. atual. Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2006.

POZENATO, José Clemente. O regional e o universal na literatura gaúcha. Porto Alegre: Movimento, 1974.

SCHWARTZ, Stuart B. Escravos, roceiros e rebeldes. Trad. Jussara Simões. Coleção História. Bauru (SP): EDUSC, 2001.

VAZ, Vera Regina de Souza. Disponível em: http://amigonerd.net/trabalho/46390-monografia-discriminacao-racial-x-dificuldade. Acesso em mar. de 2012.

VIEIRA, Paulo Alberto dos Santos ; SILVERIO, Valter Roberto.Tempos Presentes. Políticas Públicas contra as desigualdades Étnico-Raciais na Educação Brasileira: As Leis 10639/03 e 11645/08. In: IV Simpósio Internacional - O Estado e as Políticas

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Educacionais no Tempo Presente, 2008, Uberlândia. Resumos. IV Simpósio Internacional - O Estado e as Políticas Educacionais no Tempo Presente. Uberlândia : EdUFU, 2008. p. 112-112

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ANEXO A

VAMOS LER:

NEGROS ALICERÇARAM FORMAÇÃO DO RS

Notícias • Rio Grande do Sul • 28 de julho de 2009 por Silvana Losekan

Antes de muitos povos se estabelecerem no Rio Grande do Sul, o negro já pisava em solo gaúcho. A presença de africanos e descendentes se confunde com a própria história rio-grandense. O negro não veio ao Sul em processo formal de colonização, mas na condição de cativo, trazido por expedições colonizadoras ou integrando tropas militares. Fez o trabalho braçal em estâncias e em centros urbanos. A etnia chegou a oscilar, no século XIX, entre 30% e 40% da população da província, conforme o escritor Mário Maestri. As charqueadas, concentradas em Pelotas e Rio Grande, se valeram dos escravos.Conforme a cartilha ‘O Negro no Rio Grande do Sul’, elaborada pela Fundação Palmares, do Ministério da Cultura, a etnia circulava pelo Estado antes do início oficial da colonização, em 1737. Participou da fundação de Laguna (Santa Catarina) e da Colônia de Sacramento, em terras uruguaias, mas que, no final do século XVII, pertencia ao território português. Integrou a frota de João de Magalhães, em 1725, que viajou de Laguna a São José do Norte, um dos primeiros registros oficiais da presença negra no RS. ‘Encontramos negros na Guerra Guaranítica (1750) e nos conflitos de fronteira com os espanhóis do Prata, na década de 1770, como lanceiros em ação militar. Tinha mão de obra negra escravizada nas lavouras de trigo de açorianos e portugueses, na feitoria do Linho-Cânhamo, em Canguçu (1783-89) e em São Leopoldo (1789-1824)’, diz a cartilha, redigida pelo escritor e poeta Oliveira Silveira, com pesquisa do historiador Jorge Eusébio Assumpção.Mesmo na condição escrava, e depois jogada à própria sorte, quando da abolição da escravidão, a população negra foi um dos alicerces da formação do RS. Recenseamento geral do Império brasileiro, de 1872, confirmava que 34,6% da população gaúcha era negra, sobretudo no Sul do Estado. Os negros marcaram presença não só no Litoral e nas regiões de Pelotas e Metropolitana da Capital, mas também em cidades como Rio Pardo, Cachoeira do Sul, Santa Maria e outras do Centro, avançando para as Missões, Campanha e Fronteira-Oeste. O traço cultural do negro no RS deriva, na essência, dos povos Bantos, oriundos da África (Congo, Angola, Moçambique), que trouxeram a música, a culinária e sua religião. Segundo pesquisadores da Fundação Palmares, a capoeira, de origem africana, chegou ao Estado no início do século XX, tanto quanto o samba. Na culinária, eles apresentaram a feijoada e recriaram o mocotó, iguaria feita nas regiões das charqueadas a partir das sobras de animais.Fonte: Correio do PovoDisponível no site: http://www.defender.org.br/negros-alicercaram-formacao-do-rs/Acesso em 25 de julho de 2011.

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ANEXO B

Página do Gaúcho – Jayme Caetano Braun

Por Lisana Bertussi

O poeta Jayme Caetano Braun nasceu em Bossoroca, perto de São Luiz Gonzaga, no dia 30 de janeiro de 1924. Filho de João Aloísio Braun e Euclides Caetano, casou-se em primeiras núpcias, em 1947, com Nilda Jardim, com quem teve dois filhos, Marco Antônio e José Raimundo. Em segundas núpcias, em 1988, casou-se com Aurora de Souza Ramos, com quem teve um filho, Cristiano. Em sua cidade natal, foi radialista. Tornou-se funcionário do Instituto de Seguridade Social do Estado do Rio grande do Sul (Ipasa) e diretor da Biblioteca Pública do Estado de 1959 a 1963.

Poeta regionalista gaúcho, Braun publicou livros de poesia e um dicionário de regionalismos, Vocabulário

Pampeano - Pátria, Fogões e Legendas. Também gravou discos e CDs, nos quais declamava seus poemas, acompanhado por Lúcio Yanel, Glênio Fagundes e Noel Guarany. Como letrista de músicas regionalistas, que podem ser consideradas verdadeiros poemas por sua elaboração estética e temática regionalista, foi premiado em muitos festivais. Em alguns, atuou também como apresentador.

Recebeu homenagem e destaque especial do festival Sesmaria da Canção, de Osório, em 1997. Entre seus prêmios, estão o Troféu Laçador de Ouro e o Troféu Simões Lopes Neto (maior honraria concedida pelo governo do Estado), ambos em 1997. Emprestou seu nome a Centros de Tradições Gaúchas (CTGs) de diversas localidades. Algumas de suas canções foram gravadas por cantores e conjuntos de outros Estados, como Originais do Samba.

O talento de Jayme Caetano Braun como poeta e letrista foi reconhecido no Uruguai, na Argentina, no Paraguai e na Bolívia. Excelente repentista, conhecido como El Payador, ocupa por isso um lugar de destaque na literatura regionalista do Rio Grande do Sul.

Tem, na sua poesia, a expressão estilizada da autenticidade e espotaneidade da fala do homem rural, da zona da Campanha. Sobre sua obra, afirmou Walter Spalding: "A poesia desse poeta missioneiro é um dos maiores e melhores repositórios de palavras e expressões gauchescas, valendo por isso seus livros um tesouro. Grande parte das que usa e que são de uso comum nas Missões e outras partes do Rio Grande jamais foram dicionarizadas". Seus poemas são, em geral, longos e épicos, para ser declamados de viva voz.

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O costume campeiro de contar casos também está presente em seus "romances", poemas narrativos, como Bochincho, extremamente popularizado, um dos textos mais declamados nas festas gauchescas. Seu vocabulário regional representa rico acervo para estudo dos dialetos rurais gaúchos.

Artesão de belas imagens, também compôs poemas lírico-amorosos, e sua temática ia desde a expressão de um forte telurismo quase místico pelo pago, a objetos de seu universo - o galpão, o lenço, a faca, o cavalo, as chilenas -, as apologias sobre a história do Estado e o realismo social, em poemas nos quais os anti-heróis são desvalidos da sorte e oprimidos pelo sistema capitalismo. Suas composições têm um percurso nítido: vão dos poemas longos grandiloqüentes, feitos para declamação, aos poemas curtos e densos de suas últimas obras, nos quais a elaboração poética é maior e mais cuidadosa, acompanhando os modelos da modernidade.

Jayme Caetano Braun expressou um desejo no poema Índio Vago: "Um dia, quando eu morrer / Esse é o fim de cada qual / Hão de estar meu pingo velho / Com seu relincho cordial / E o meu cusquinho brasino / Chorando meu funeral". Certamente, junto do pingo velho e do cusquinho brasino, estamos todos nós a chorar a perda de um tão grande inventor de novos modos de olhar o universo gauchesco, forte marca de nossa identidade regional.

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LivrosGalpão de Estância (poesia, Editora Gráfica Porto Seguro, 1954)

De Fogão em Fogão (poesia, La Salle, 1958)

Potreiro de Guaxos (poesia, Champagnat, 1965)

Bota de Garrão (poesia, Sulina, 1979)

Brasil Grande do Sul (poesia e relato, Sulina, 1986)

Paisagens Perdidas (poesia, Sulina, 1987)

Vocabulário Pampeano - Pátria, Fogões e Legendas (dicionário de regionalismos, Martins Livreiro Editor, 1987)

Payador e Troveiro (poesia, Tchê, 1992)

50 Anos de Poesia (antologia poética, Martins Livreiro Editor, 1996)

Discos e CDsPayador, Pampa e Guitarra - 1974

Payadas e A Volta do Payador - 1984

Troncos Missioneiros - 1987

Poemas Gaúchos - 1993

Pajadas - 1993

Paisagens Perdidas - 1994

Jayme Caetano Braun - 1996

Acervo Gaúcho - 1998

Fonte: Disponível em: http://www.paginadogaucho.com.br/jayme/zh/cc-2.htm Acessado em 25 de julho 2011.

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ANEXO C

CANCIONEIRO POPULAR GAÚCHO – LETRAS PARA ANÁLISE

Escravo de Saladeiro

Neto FagundesComposição: Neto Fagundes

Escravo de saladeiro me dói saber como foiTrabalhando o dia inteiro sangrando o mesmo que o boiA faca que mata a vaca o coice o laço que vemO tronco a soga e a estaca tudo é teu negro também

(A dor do charque é barata o sal te racha o garrãoÉ fácil ver tua pata na marca em sangue no chãoO boi que morre te mata pouco a pouco meu irmão)

Pobre negro sem futuro touro olhando humilhadoO teu braço de aço escuro sustentou o meu estadoJá é hora negro forte que os homens se dêem as mãosE se ouça de sul a norte que somos todos irmãos.

Órfão de Mãe Preta

Jayme Caetano Braun

“Patrão! É o negro VenâncioQue pede vossa licença,Pra vos dizê que a VicençaMorreu de parto, patrãoE ao ir pra baixo do chãoNão tinha nada de seu,Só deixô quando morreuEste negrinho chorão.

Neto da negra DonataEscrava do vosso avô,A negra que amamentou “Vacês” tudo, patrãozinho.Por isso eu “truxe” o negrinhoAfim que “vacê” o ajeitePois mais do que “ropa” e leite,

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Ele “percisa” carinho.

A Vincença, “miseráve”,Morreu sem le botá nomeE aqui está, roxo de fomeO pobre entinho bendito,Sem força nem pra dá um gritoE os “óinho” cheio d’água“Refretindo” a triste mágoaDe tê ficado solito.

Me alembrei que a patroinhaHá “poco” ganhô “famia”.Patrão, quem sabe ela cria,Como paga de um favor,Esse entinho sofredôPialado da sorte ingrata,Pois é neto da Donata,Que foi vossa mãe de cor.

Não fique bravo, patrão,Nem tome por desaforo.Mas “óie” que ouvindo o choroDesse negrinho mijadoO índio mais calejadoTem vontade de sê “bão”E chega a pedir perdãoDe tudo quanto é pecado.

“Adiscurpe”, meu patrãoEu sinto o que “vacê” sente“Contemprando” esse viventeQue as lágrimas nos arrancaMas vai vê que o choro estancaE o negrinho da VicençaNem vai achá diferençaEntre mãe preta e mãe branca.Já vô simbora, patrão!Nosso “Sinhô” o abençoe E ao mesmo tempo perdoeAqueles que tudo tendoPassam a vida, não vendo,Cegados pela luxúria,A miséria e a penúriaDos que já nascem sofrendo.”

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APÊNDICE A

Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais

Art. 1° A presente Resolução institui ais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana, a serem observadas pelas Instituições de ensino, que atuam nos níveis e modalidades da Educação Brasileira e, em especial, por Instituições que desenvolvem programas de formação inicial e continuada de professores.

Art. 2° As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africanas constituem-se de orientações, princípios e fundamentos para o planejamento, execução e avaliação da Educação, e têm por meta, promover a educação de cidadãos atuantes e conscientes no seio da sociedade multicultural e pluriétnica do Brasil, buscando relações étnico-sociais positivas, rumo à construção de nação democrática.

Art. 3° A Educação das Relações Étnico-Raciais e o estudo de História e Cultura Afro-Brasileira, e História e Cultura Africana será desenvolvida por meio de conteúdos, competências, atitudes e valores, a serem estabelecidos pelas Instituições de ensino e seus professores, com o apoio e supervisão dos sistemas de ensino, entidades mantenedoras e coordenações pedagógicas, atendidas as indicações, recomendações e diretrizes explicitadas no Parecer CNE/CP 003/2004.

Art. 4° Os sistemas e os estabelecimentos de ensino poderão estabelecer canais de comunicação com grupos do Movimento Negro, grupos culturais negros, instituições formadoras de professores, núcleos de estudos e pesquisas, como os Núcleos de Estudos Afro-Brasileiros, com a finalidade de buscar subsídios e trocar experiências para planos institucionais, planos pedagógicos e projetos de ensino.

Art. 5º Os sistemas de ensino tomarão providências no sentido de garantir o direito de alunos afro-descendentes de freqüentarem estabelecimentos de ensino de qualidade, que contenham instalações e equipamentos sólidos e atualizados, em cursos ministrados por professores competentes no domínio de conteúdos de ensino e comprometidos com a educação de negros e não negros, sendo capazes de corrigir posturas, atitudes, palavras que impliquem desrespeito e discriminação.

Art. 6° Os órgãos colegiados dos estabelecimentos de ensino, em suas finalidades, responsabilidades e tarefas, incluirão o previsto o exame e encaminhamento de solução para situações de discriminação, buscando-se criar situações educativas para o reconhecimento, valorização e respeito da diversidade.

§ Único: Os casos que caracterizem racismo serão tratados como crimes imprescritíveis e inafiançáveis, conforme prevê o Art. 5º, XLII da Constituição Federal de 1988.

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Art. 7º Os sistemas de ensino orientarão e supervisionarão a elaboração e edição de livros e outros materiais didáticos, em atendimento ao disposto no Parecer CNE / CP 003/2004.

Art. 8º Os sistemas de ensino promoverão ampla divulgação do Parecer CNE / CP 003/2004 e dessa Resolução, em atividades periódicas, com a participação das redes das escolas públicas e privadas, de exposição, avaliação e divulgação dos êxitos e dificuldades do ensino e aprendizagens de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana e da Educação das Relações Étnico-Raciais.

Art. 9º Esta resolução entra em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário.

Roberto Cláudio Frota Bezerra

Presidente do Conselho Nacional de Educação.

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APÊNDICE B

Lei nº 11.645/2008

Altera a Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, modificada pela Lei no 10.639, de 9 de janeiro de 2003, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena”.

Art. 26 A

Nos estabelecimentos de ensino fundamental e de ensino médio, públicos e privados, torna-se obrigatório o estudo da história e cultura afro-brasileira e indígena.

Parâmetros Curriculares Nacionais

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ANEXOS

LEI Nº 10.639, de 9 de janeiro de 2003.

Mensagem de veto

Altera a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira”, e dá outras providências.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA

Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

Art. 1º A Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, passa a vigorar acrescida dos seguintes Arts. 26-A, 79-A e 79-B:

“Art. 26-A. Nos estabelecimentos de ensino fundamental e médio, oficiais e particulares, torna-se obrigatório o ensino sobre História e Cultura Afro-Brasileira”.

§ 1º O conteúdo programático a que se refere o caput deste artigo incluirá o estudo da História da África e dos Africanos, a luta dos negros no Brasil, a cultura negra brasileira e o negro na formação da sociedade nacional, resgatando a contribuição do povo negro nas áreas social, econômica e política pertinentes à História do Brasil.§ 2º Os conteúdos referentes à História e Cultura Afro-Brasileira serão ministradas no âmbito de todo o currículo escolar, em especial nas áreas de Educação Artísticas e de Literatura e História Brasileiras.§ 3º (VETADO)”

“Art. 79-A (VETADO)”

“Art. 79-B. O calendário escolar incluirá o dia 20 de novembro como ‘Dia Nacional da Consciência Negra’.”

Art. 2º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Brasília, 9 de janeiro de 2003; 182º da Independência e 115º da República.

Presidência da República

Casa Civil

LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA

Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque

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Resolução nº1, de 17 junho de 2004

CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO/ CONSELHO PLENO/ DF

RESOLUÇÃO Nº 1, de 17 de junho de 2004

Institui Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana.

O Presidente do Conselho Nacional de Educação, tendo em vista o disposto no art.9º, § 2º, alínea “c”, da Lei 9.131, publicada em 25 de novembro de 1995, e com fundamentação no Parecer CNE/ CP 3/2004, de 10 de março de 2004, homologado pelo Ministro da Educação em 19 de maio de 2004, e que a este se integra, resolve:

Art. 1º A presente Resolução institui Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana, a serem observadas pelas Instituições de ensino, que atuam nos níveis e modalidades da Educação Brasileira e, em especial, por Instituições que desenvolvem programas de formação inicial e continuada de professores.

§ 1º As Instituições de Ensino Superior incluirão nos conteúdos de disciplinas e atividades curriculares dos cursos que ministram a Educação das Relações Étnico-Raciais, bem como o tratamento de questões e temáticas que dizem respeito aos afro-descendentes, nos termos explicitados no Parecer CNE/ CP 3/2004.

§ 2º O cumprimento das referidas Diretrizes Curriculares, por parte das instituições de ensino, será considerado na avaliação das condições de funcionamento do estabelecimento.

Art. 2º As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africanas constituem-se de orientações, princípios e fundamentos para o planejamento, execução e avaliação da Educação, e têm por meta, promover a educação de cidadãos atuantes e conscientes no seio da sociedade multicultural e pluriétnica do Brasil, buscando relações étnico-sociais positivas, rumo à construção de nação democrática.

§ 1º A Educação das Relações Étnico-Raciais tem por objetivo a divulgação e produção de conhecimentos, bem como de atitudes, posturas e valores que eduquem cidadãos quanto à pluralidade étnico-racial, tornando-os capazes de interagir e de negociar objetivos comuns que garantam, a todos, respeito aos direitos legais e valorização de identidade, na busca da consolidação da democracia brasileira.

§ 2º O Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana tem por objetivo o reconhecimento e valorização da identidade, história e cultura dos afro-brasileiros, bem

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como a garantia de reconhecimento e igualdade de valorização das raízes africanas da nação brasileira, ao lado das indígenas, européias, asiáticas.

§ 3º Caberá aos Conselhos de Educação dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios desenvolver as Diretrizes Curriculares e Nacionais instituídas por esta Resolução, dentro do regime de colaboração e de autonomia de entes federativos e seus respectivos sistemas.

Art. 3º A Educação das Relações Étnico-Raciais e o estudo de História e Cultura Afro-Brasileira, e História e Cultura Africana serão desenvolvidos por meio de conteúdos, competências, atitudes e valores, a serem estabelecidos pelas instituições de ensino e seus professores, com o apoio e supervisão dos sistemas de ensino, entidades mantenedoras e coordenações pedagógicas, atendidas as indicações, recomendações e diretrizes explicitadas no Parecer CNE/ CP 003/2004.

§ 1º Os sistemas de ensino e as entidades mantenedoras incentivarão e criarão condições materiais e financeiras, assim como proverão as escolas, professores e alunos de material bibliográfico e de outros materiais didáticos necessários para a educação tratada no “caput” deste artigo.

§ 2º As coordenações pedagógicas promoverão o aprofundamento de estudos, para que os professores concebam e desenvolvam unidades de estudos, projetos e programas, abrangendo os diferentes componentes curriculares.

§ 3º O ensino sistemático de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana na Educação Básica, nos termos da Lei 10639/2003, refere-se, em especial, aos componentes curriculares de Educação Artística, Literatura e História do Brasil.

§ 4º Os sistemas de ensino incentivarão pesquisas sobre processos educativos orientados por valores, visões de mundo, conhecimentos afro-brasileiros, ao lado de pesquisas de mesma natureza junto aos povos indígenas, com o objetivo de ampliação e fortalecimento de bases teóricas para a educação brasileira.

Art. 4º Os sistemas e os estabelecimentos de ensino poderão estabelecer canais de comunicação com grupos do Movimento Negro, grupos culturais negros, instituições formadoras de professores, núcleos de estudos e pesquisas, como os Núcleos de Estudos Afro-Brasileiros, com a finalidade de buscar e trocar experiências para planos institucionais, planos pedagógicos e projetos de ensino.

Art. 5º Os sistemas de ensino tomarão providências no sentido de garantir o direito de alunos afro descendentes de freqüentarem estabelecimentos de ensino de qualidade, que contenham instalações e equipamentos sólidos e atualizados, em cursos ministrados por professores competentes no domínio de conteúdos de ensino e comprometidos com a educação de negros e não negros, sendo capazes de corrigir posturas, atitudes, palavras que impliquem desrespeito e discriminação.

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Art. 6º Os órgãos colegiados dos estabelecimentos de ensino, em suas finalidades, responsabilidades e tarefas, incluirão o previsto, o exame e encaminhamento de solução para situações de discriminação, buscando-se criar situações educativas para o reconhecimento, valorização e respeito da diversidade.

§ Único: Os casos que caracterizem racismo serão tratados como crimes imprescritíveis e inafiançáveis, conforme prevê o Art. 5º, XLII da Constituição Federal de 1988.

Art. 7º Os sistemas de ensino orientarão e supervisionarão a elaboração e edição de livros e outros materiais didáticos, em atendimento ao disposto no Parecer CNE/CP 003/2004.

Art. 8º Os sistemas de ensino promoverão ampla divulgação do Parecer CNE/ CP 003/ 2004 e desta Resolução, em atividades periódicas, com a participação das redes das escolas públicas e privadas, da exposição, avaliação e divulgação dos êxitos e dificuldades do ensino e aprendizagem de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana da Educação das Relações Étnico-Raciais.

§ 1º Os resultados obtidos com as atividades mencionadas no caput deste artigo serão comunicados de forma detalhada ao Ministro da Educação, à Secretaria Especial de Promoção da Igualdade Racial, ao Conselho Nacional de Educação e aos respectivos Conselhos Estaduais e Municipais de Educação, para que encaminhem providências, que forem requeridas.

Art. 9º Esta resolução entra em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário.

Roberto Cláudio Frota Bezerra

Presidente do Conselho Nacional de Educação

Presidência da República

Casa Civil

Subchefia para Assuntos Jurídicos

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LEI Nº 11.645, DE 10 MARÇO DE 2008.

Altera a Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, modificada pela Lei no 10.639, de 9 de janeiro de 2003, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena”.

O PRESIDENTEDAREPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

Art. 1o O art. 26-A da Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, passa a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 26-A. Nos estabelecimentos de ensino fundamental e de ensino médio, públicos e privados, torna-se obrigatório o estudo da história e cultura afro-brasileira e indígena.

§ 1o O conteúdo programático a que se refere este artigo incluirá diversos aspectos da história e da cultura que caracterizam a formação da população brasileira, a partir desses dois grupos étnicos, tais como o estudo da história da África e dos africanos, a luta dos negros e dos povos indígenas no Brasil, a cultura negra e indígena brasileira e o negro e o índio na formação da sociedade nacional, resgatando as suas contribuições nas áreas social, econômica e política, pertinentes à história do Brasil.

§ 2o Os conteúdos referentes à história e cultura afro-brasileira e dos povos indígenas brasileiros serão ministrados no âmbito de todo o currículo escolar, em especial nas áreas de educação artística e de literatura e história brasileiras.” (NR)

Art. 2o Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Brasília, 10 de março de 2008; 187o da Independência e 120o da República.

LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA

Fernando Haddad

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