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Universidade Estadual de Santa Cruz O ENSINO DE FÍSICA TÉRMICA UTILIZANDO HISTÓRIA EM QUADRINHOS Franklin José Bomfim Ramos Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação da Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC) no Curso de Mestrado Nacional Profissional em Ensino de Física (MNPEF), como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Mestre em Ensino de Física. Orientador: Prof. Dr. George Kouzo Shinomiya ILHÉUS BA 2018

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Universidade Estadual de Santa Cruz

O ENSINO DE FÍSICA TÉRMICA UTILIZANDO

HISTÓRIA EM QUADRINHOS

Franklin José Bomfim Ramos

Dissertação de Mestrado apresentada ao

Programa de Pós-Graduação da

Universidade Estadual de Santa Cruz

(UESC) no Curso de Mestrado Nacional

Profissional em Ensino de Física

(MNPEF), como parte dos requisitos

necessários à obtenção do título de

Mestre em Ensino de Física.

Orientador: Prof. Dr. George Kouzo Shinomiya

ILHÉUS – BA

2018

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R175 Ramos, Franklim José Bomfim. O ensino da física térmica utilizando história em quadrinhos / Franklim José Bomfim Ramos. – Ilhéus : UESC, 2018. 84f. : il. + anexos. Orientador : George Kouzo Shinomiya. Dissertação (Mestrado) – Universidade Estadual de Santa Cruz. Mestrado Profissional em Ensino de Física. Inclui referências.

1. Física – Estudo e ensino. 2. Termodinâmica – Estudo e ensino. 3. História em quadrinhos na educação. 4. Física e História em quadrinhos. I. Shinomiya, George Kouzo. II. Título. CDD – 530.07

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Dedico esta dissertação a Silvana, minha esposa.

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Agradecimentos

Inúmeras são as pessoas que contribuíram para a concretização

deste projeto, umas mais diretamente, outras na torcida e fé. Também

importantes, pois a fé nos leva a acreditar que é possível, que podemos.

Com fé raciocinada eu agradeço a Deus, nosso pai cósmico, pela

subjetiva coragem para não desistir ante as quilométricas idas e vindas da

UESC sob a Sua proteção.

Com amor e carinho muito obrigado a Silvana, minha esposa, pelo

equilíbrio da balança, nos incontáveis dias e noites cuidando de três filhos

pequenos com a minha ausência presente, quando eu estava em casa

dedicado ao mestrado ou na Universidade. Parceria de sucesso profissional e

pessoal.

A meus pais, o porto em que aporto; aos corações que conforto, com

indizível sentimento de gratidão e ternura pela dedicação e inquestionável

apoio de sempre. Mil palavras de obrigado regadas com muito amor.

Aos colegas/amigos de mestrado, companheiros de jornada, em cuja

nave todos somos comandantes do nosso destino, torcendo um pelo outro para

que exerçamos o nosso ofício com dedicação e ética.

Quero agradecer com imensa alegria aos primos Neto, Vilma, Carol,

Robert e tia Tânia, pessoas queridas sem as quais a estada em Itabuna e

Ilhéus seria mais custosa. Valeu família!

Obrigado aos professores Fabiane, Zé Geraldo e Zolacir, cada um à

sua maneira soube nos mostrar como melhorarmos a nossa prática docente,

como tornar a física mais viva e encantadora. Pelos mesmos motivos quero

agradecer ao professor Maxwell pelas excelentes idéias e diálogos durante a

construção desse produto educacional, sem os quais a elaboração seria mais

árdua.

À CAPES, pelo apoio financeiro. Mesmo tendo chegado com meses

de atraso e só para metade dos mestrandos, devo agradecer, pois sem ele o

custeio de tudo que envolve fazer este mestrado seria mais dispendioso.

Ao meu orientador, George, que, com paciência e

encaminhamentos, soube burilar arestas de um trabalho que aos poucos se

tornou um Produto Educacional que pode contribuir para uma melhor qualidade

do ensino de Física.

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RESUMO

O ENSINO DE FÍSICA TÉRMICA UTILIZANDO

HISTÓRIA EM QUADRINHOS

RAMOS, F. J. B. O Ensino de Física Térmica Utilizando Histórias em

Quadrinhos. Dissertação (Mestrado) – Universidade Estadual de Santa Cruz,

Ilhéus, 2018.

Este trabalho tem como objetivo principal propor uma metodologia de ensino

utilizando o recurso da História em Quadrinho (HQ) por se tratar de material

lúdico, agradável e de fácil acesso. As HQ tem se mostrado um recurso de

ensino-aprendizagem que possibilita ao professor ministrar aulas fora do

tradicionalismo lousa e pincel. Assim, procuramos desenvolver um produto

educacional cuja motivação para o aprendizado de termodinâmica começa com

uma HQ. De início fizemos inúmeras leituras, selecionando HQ cujo tema

pudesse ser o catalisador de uma aula de física. As histórias escolhidas

compõem uma sequência de física térmica, começando pelos conceitos de

calor, temperatura e condução térmica; em seguida utilizamos outra HQ para

discutir escalas termométricas e gráficos de temperatura; por fim fazemos uso

de outra HQ para discutirmos a 1ª e a 2ª lei da Termodinâmica.

Queremos aqui disponibilizar para o professor mais um recurso com o qual ele

possa se apropriar e implementar em sua sala de aula a fim de tornar o ensino

de Física Térmica mais atraente, alegre e problematizador, sem perder o rigor

científico de que a física necessita.

Palavras-Chave: Ensino de Física, Física Térmica, História em Quadrinho.

ILHÉUS – BA

2018

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ABSTRACT

O ENSINO DE FÍSICA TÉRMICA UTILIZANDO

HISTÓRIA EM QUADRINHOS

RAMOS, F. J. B. The Teaching of Thermal Physics Using Comics. Dissertation

(Masters) - State University of Santa Cruz, Ilheus, 2018.

The main objective of this work is to propose a teaching methodology using the

Comic Book feature (HQ) because it is a playful, pleasant and easily accessible

material. The HQ has shown to be a teaching-learning resource that allows the

teacher to teach classes outside the traditional slate and brush. Thus, we seek

to develop an educational product whose motivation for learning

thermodynamics begins with a HQ. At first we did numerous readings, selecting

HQ whose theme could be the catalyst for a physics class. The chosen histories

compose a sequence of thermal physics, beginning with the concepts of heat,

temperature and thermal conduction; then we used another HQ to discuss

thermometric scales and temperature graphs; finally we make use of another

HQ to discuss the first and second law of thermodynamics. We want to make

available to the teacher another resource that he can appropriate and

implement in his classroom in order to make the teaching of Thermal Physics

more attractive, joyful and problematizing, without losing the scientific rigor that

physics needs.

Keywords: Physics Teaching, Thermal Physics, Comic History

ILHÉUS – BA

2018

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Índice de Figura

Figura 1: As cobranças, de Ângelo Agostini, fonte: MOYA, 1986, pag. 19, apud Souza, 2014, p.

4. ................................................................................................................................................20

Figura 2: Franjinha faz experimentos para verificar a Lei do Gato e do Pão com manteiga.

Magali; edição 29, 2009. Editora Panini. ....................................................................................27

Figura 3: Do Contra gira em torno da bola enquanto a mesma permanece imóvel para um

observador externo. ...................................................................................................................28

Figura 4: Temperatura Exagerada. primeira página. ..................................................................45

Figura 5: Cranicola se sente aquecido pelo cobertor, confundindo isolante térmico com fonte

de energia térmica. ....................................................................................................................46

Figura 6: Penadinho interpõe um travesseiro entre Cranicola e a pedra para impedir que ele

perca calor para ela. ...................................................................................................................47

Figura 7: Cranicola é levado para um ambiente de temperatura mais elevada e ele passa a

absorver calor do ambiente. ......................................................................................................48

Figura 8: Penadinho sugere que dormir de cobertor o manterá aquecido. ...............................49

Figura 9: Demonstração de equívoco conceitual. O cobertor é isolante térmico. .....................49

Figura 10: Cranicola reclama do calor absorvido do fogo no ambiente. ....................................51

Figura 11: Cranicola perde calor para a pedra............................................................................51

Figura 12: O travesseiro funciona como isolante térmico ..........................................................52

Figura 13: Cascão argumenta que o termômetro está quebrado pois indica uma temperatura

ambiente muito acima da habitual. ...........................................................................................55

Figura 14: Nimbus percebe que se o termômetro veio de outro país, provavelmente ele deve

estar graduado em outra escala de temperatura, a escala Fahrenheit. .....................................56

Figura 15: Cascão mostra o termômetro para Nimbus. .............................................................56

Figura 16: Cascão não se atenta para a unidade de medida no termômetro e por isso se

confunde ao interpretar a medida. ............................................................................................58

Figura 17: conclusão de que o termômetro está graduado na escala Fahrenheit. .....................59

Figura 18: Relação entre as escalas Celsius, Fahrenheit e Kelvin, com seus respectivos pontos

de fusão e ebulição da água. ......................................................................................................60

Figura 19: Gráfico linear representando a função da temperatura T = f(X). ...............................61

Figura 20: Transformando. Cascão monta uma oficina para transformar os brinquedos dos

colegas. ......................................................................................................................................64

Figura 21: Cascão recolhe o brinquedo de Cebolinha para transformá-lo em outro brinquedo.

...................................................................................................................................................65

Figura 22: Cascão transforma o carrinho de boneca de Magali em uma penteadeira. .............66

Figura 23: Cascão transforma o brinquedo de Dudu e Franjinha lhe dá os parabéns pela

iniciativa. ....................................................................................................................................67

Figura 24: O colegas de Cascão querem seu brinquedo como era antes, porém Franjinha

esclarece que não tem como reverter o processo. ....................................................................68

Figura 25: A história acaba com Franjinha ressaltando a importância de se reaproveitar coisas

no dia a dia. ................................................................................................................................69

Figura 26: Exemplo de transformação mantendo-se a matéria prima dos materiais .................69

Figura 27: Franjinha ressaltando que os cientistas transformam coisas sempre. ......................70

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Figura 28: experimento utilizado por Joule para encontrar o equivalente mecânico do calor...71

Figura 29: Dudu e Cebolinha exigem que o processo seja revertido, fato que contraria a 2ª Lei

da Termodinâmica. ....................................................................................................................73

Figura 30: A Lei do Gato. Magali questiona por que a manteiga sempre cai virada para baixo

no pão com manteiga.................................................................................................................77

Figura 31: A Lei do Gato. Franjinha é procurado por Magali para solucionar o dilema do pão

com manteiga. ...........................................................................................................................79

Figura 32: A Lei do Gato. Franjinha planeja um experimento confrontando a tendência do gato

cair com as patas viradas para o chão com a tendência da manteiga no pão cair virada para o

chão............................................................................................................................................80

Figura 33: A Lei do Gato. Franjinha expõe os detalhes e a vantagem de se fazer o experimento.

...................................................................................................................................................81

Figura 34: A Lei do Gato. Mingau participando do experimento ................................................82

Figura 35: A Lei do Gato. Franjinha percebe que o experimento não saiu como previsto pois o

gato comeu o pão. .....................................................................................................................83

Figura 36: A história é finalizada com Franjinha servindo macarrão à Magali............................84

Figura 37: No referencial da bola, Do Contra gira em torno dela. ..............................................85

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Índice de Tabela Tabela 1: Média das turmas onde foi e onde não foi utilizada a HQ para iniciar uma aula de

Termodinâmica ..........................................................................................................................35

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Conteúdo Índice de Figura .........................................................................................................................8

Índice de Tabela .........................................................................................................................10

INTRODUÇÃO .............................................................................................................................12

Objetivos ................................................................................................................................15

A TECNOLOGIA EDUCACIONAL DA HQ .......................................................................................16

As HQ como recurso didático .................................................................................................16

História da HQ no Brasil .........................................................................................................18

O ensino por investigação ......................................................................................................22

A CONSTRUÇÃO DO PRODUTO ..................................................................................................26

Projeto Inicial .........................................................................................................................26

Seleção das Histórias em Quadrinho ......................................................................................30

A Implementação do Produto ................................................................................................31

CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................................................36

REFERÊNCIA ...............................................................................................................................38

Anexos ........................................................................................................................................40

Anexo A: O produto Educacional................................................................................................41

O ensino de física térmica utilizando história em quadrinhos ....................................................42

Introdução ..............................................................................................................................42

Aula 1: O que é Calor? Ou por que quando eu estou com febre eu sinto frio? ......................44

Aula 2: Temperatura, medida e escalas. ................................................................................55

Aula 3: Termodinâmica, 1ª e 2ª Lei ........................................................................................63

1ª Lei da Termodinâmica ....................................................................................................69

2ª Lei da Termodinâmica ....................................................................................................72

Anexo B ......................................................................................................................................77

Anexo C ......................................................................................................................................85

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INTRODUÇÃO

O processo de ensino-aprendizagem é verificado em uma ação

biunívoca entre quem facilita o conteúdo e quem pretende aprendê-lo, uma vez

que “quem ensina aprende ao ensinar e quem aprende ensina ao aprender”

(Freire, 1996). Neste sistema é imprescindível que o professor/facilitador saiba

qual recurso utilizar para melhor alcançar seu intento, para não tornar a sua

aula um exercício enfadonho e repetitivo onde o aluno é obrigado a decorar

definições e fórmulas que, para ele, pouco ou nada fazem sentido, e não têm

relação nenhuma com o seu cotidiano e seus anseios de vida.

O ensino de Física não deve estar motivado pelo conhecimento

desta disciplina por si só, aprender por aprender, porém deve

ser compreendido como um instrumento para a compreensão do mundo. Não se trata de apresentar ao jovem a Física para que ele simplesmente seja informado de sua existência, mas para que esse conhecimento transforme-se em uma ferramenta a mais em suas formas de pensar e agir (PCN+, Ensino Médio)

A Física é a ciência que tem, por definição, o objetivo de estudar a

Natureza na sua intimidade, através das forças que a governam e da energia

que a permeia. Uma vez que a natureza também é objeto de estudo de várias

outras ciências, é imprescindível o estudo da física de maneira contextualizada,

inter-relacionada com outras disciplinas e áreas do conhecimento, a fim de

facilitar o aprendizado do aluno e a compreensão de que é possível acessar o

mundo físico através de diversas linguagens, a partir das quais o físico, o

químico e o biólogo estudarão o mesmo fenômeno sob seu ponto de vista.

Mesmo ciente da necessidade de uma educação interdisciplinar e

mesmo compreendendo que o conhecimento histórico é importante no sentido

de demonstrar que as ciências progridem gradativamente devido às

contribuições de diversos pesquisadores que persistiram, entre tentativas, erros

e acertos, defrontamo-nos ainda com a dúvida acerca do principal recurso

didático utilizado pelo professor, o livro didático. Será que este recurso é

suficiente e exclusivo para favorecer o entendimento das Ciências Naturais

conforme aqui proposto?

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Para que o professor consiga ministrar uma aula que faça sentido

para o aprendente, ele deve ter à sua disposição recursos variados para

facilitar o aprendizado do conteúdo a ser ensinado, diversas tecnologias

educacionais que, quando bem utilizadas, podem aperfeiçoar o ensino e

melhorar o aprendizado. Entende-se por tecnologia educacional não

exatamente qualquer ferramenta eletroeletrônica que, por si só, sem a

intervenção planejada e intencional do professor nada faz de construtivo para o

processo de ensino, e que, sobretudo, não desloca o estudante de um estado

de menor para um de maior conhecimento.

Entendemos como Tecnologia Educacional todo e qualquer recurso

utilizável pelo professor (computador, retroprojetor, jogos, aplicativos digitais,

revistas, etc.) que possibilite ao estudante conhecimentos e habilidades para

resolver seus próprios problemas, para criar suas próprias estratégias de

raciocínio que lhe possibilitará enxergar relações e fazer conexões entre os

diversos caminhos do conhecimento. Uma tecnologia educacional só o é se o

professor dela fizer uso com intuito de promover saberes que qualifiquem o

indivíduo a uma condição psicossocial mais íntegra, mais autônoma no sentido

de torná-lo detentor do conhecimento.

Portanto, seja qual for a tecnologia utilizada pelo professor, ela deve

ter o papel de mediar o conhecimento entre ele e o aluno, entre o aluno e ele,

pois sem esta mediação, qualquer recurso, em si, não passa de objeto inerte e

sem utilidade. Nas palavras de Carvalho e Melo (2004, p. 49)

[...] De fato alterações substanciais em uma dada Tecnologia Educacional ocorrem na medida que a incorporação efetiva de mídias e publicações acontecem por ação mediada. Nesta perspectiva a inserção de novas mídias dedicadas à educação pode trazer re-significados conceituais e operacionais pedagógicos, pressupondo a tomada de consciência dos mediadores, contando com suas competências e habilidades para a gestão dos processos de ensino-aprendizagem.

Deste modo vimos nas Histórias em Quadrinhos um recurso

educacional potencialmente relevante e motivador para o ensino de física, com

o encanto da arte visual que motiva e desperta a curiosidade, pois possuem

linguagem coloquial, de fácil compreensão e sem o propósito de serem

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científicas, fato que as tornam mais acessíveis aos jovens, de modo geral.

Outro fator relevante nos conteúdos das HQs é a rapidez com que passam a

mensagem, sem delongas nem subjetividades, pois, de acordo com Caruso e

Freitas (2009, p. 359),

em uma sociedade que passa por mudanças cada vez mais velozes e na qual a imagem se impõe de forma marcante, a rápida decodificação dos quadrinhos é um elemento facilitador do aprendizado, pois é fácil notar a diminuição do poder de concentração dos jovens em uma atividade específica, principalmente se ela diz respeito aos estudos.

Dizer que a HQ tem linguagem coloquial e informal, por vezes se

utilizando de gírias e conceitos do senso comum não significa dizer que o

conhecimento científico será negligenciado ou que o cuidado com as definições

da Física ficará em segundo plano. Não, pois é justamente neste ponto que se

torna imprescindível a intervenção do professor enquanto mediador do

conhecimento, aquele que, utilizando-se de um recurso não formal, com

características artísticas como HQ, consegue tornar o ensino de Física

encantador e significativo com igual profundidade nas explicações, tendo a

vantagem de, agora, obter a devida atenção dos alunos.

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Objetivos

Espera-se com este trabalho municiar o professor de física com um

recurso didático-pedagógico para o ensino de tópicos de física térmica e com

isso tornar este conhecimento mais compreensível e prazeroso para o

estudante.

O ensino de Física Térmica por meio de HQ objetiva também

despertar o interesse dos alunos em continuar aprendendo, questionando e

elaborando suposições físicas para suas perguntas e dúvidas.

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A TECNOLOGIA EDUCACIONAL DA HQ

As HQ como recurso didático

As HQs têm se mostrado um recurso de ensino-aprendizagem que

possibilita ao professor ministrar aulas fora do tradicionalismo lousa e pincel.

Sem tecer críticas a esta modalidade de ensino, pois quando feita com

eficiência e no momento oportuno tem sua necessidade e importância,

entretanto queremos aqui disponibilizar para o professor mais um recurso com

o qual ele possa se apropriar e, espera-se, implementar em sua sala de aula a

fim de tornar o ensino de Física Térmica mais atraente, alegre e

problematizador, sem perder o rigor científico de que a física necessita

O uso da HQ em uma aula de Física acrescenta o aspecto lúdico na

prática pedagógica do professor desta disciplina, acostumado, em muitos

casos, às aulas expositivas onde o quadro é preenchido com fórmulas e

exercícios repetitivos onde o aluno é unicamente treinado a passar nas provas,

sem refletir sobre os conflitos que motivaram os assuntos que ele estuda, sem

perceber a relação entre as leis da física e o desenvolvimento da tecnologia,

por exemplo.

Desta maneira, o ensino de Física que já requer certo rigor

matemático, quando ministrado por esses professores, deixa de despertar no

indivíduo o amor pela ciência, a curiosidade para o mundo que o cerca e passa

a ser vista como uma disciplina inútil para sua vida, odiosa, cuja linguagem é

inacessível para ele.

Espera-se do professor de Física a compreensão de que esta

ciência deve ser parte intrínseca da cultura humana, presente em suas

diversas manifestações, tais como representações artísticas ou literárias, peças

de teatro, letras musicais e qualquer ação humana na qual a ciência sirva de

alicerce para melhoria a melhoria na qualidade de vida do ser (PCN+ - FÍSICA,

p. 15). Através deste prisma de observação, reconhecer fenômenos físicos

abordados em uma HQ, mesmo que de maneira sutil aos olhos não treinados,

implica em aproveitar aquela história como um aporte didático para, no mínimo,

fomentar a discussão do que há de científico ou exagerado na fábula da arte.

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A prática da leitura através das HQ faz parte da infância da maioria

dos estudantes, nas escolas do ensino fundamental onde os professores

aproveitam o encanto das figuras para despertar nas crianças o gosto pela

leitura a fim de descobrir o contexto e as explicações nas quais os

personagens estão inseridos. De acordo com Schnor et al,(2017, p. 2),

O uso didático de histórias em quadrinhos foi rejeitado por muito tempo. Mas nas últimas décadas do século XX elas começaram a fazer parte das práticas pedagógicas. “Inicialmente, elas eram utilizadas para ilustrar aspectos específicos das matérias que antes eram explicados por um texto escrito” (RAMA; VERGUEIRO, 2004, p. 20). Depois começaram a aparecer de forma tímida em livros didáticos.

É comum, em adultos, a permanência do gosto pelos quadrinhos,

pois este tipo de texto remonta à sua infância, está em sua memória afetiva,

fato que contribui para o uso da HQ de maneira pedagógica, sem causar

estranhamento por parte do estudante, ao contrário, criando empatia e afeição

com a nova proposta, pré-requisitos necessários para o ensino-aprendizagem

de qualquer disciplina e mais especificamente de Física. Quando o ensino

conta com o apoio da HQ, o público alvo já a recebe com a sensação familiar

de já conhecer aquela arte, de quem já entende o que está sendo proposto

pelo professor, antes mesmo das explicações formais contextualizadas a partir

das historinhas.

A leitura das HQs requer do indivíduo mais do que a compreensão

dos textos lá inseridos, circunscritos em balões que representam as falas dos

personagens, requer também a compreensão das imagens que representam os

personagens com suas falas, sentimentos, ações e reações; interpretações de

sons e sentimentos através de onomatopéias, isto é, os nomes dados aos sons

e grunhidos produzidos pelos seres e objetos. Os sentidos aguçados pela

leitura de HQ vão além dos comumente necessários em leitura de texto

didático e acadêmico, pois a dimensão da arte sequencial vai além da

compreensão lógico-racional, é onde o lúdico “toca” o indivíduo e lhe encanta,

convidando-o a tomar conhecimento e fazer parte do seu enredo.

Quando dizemos que a arte dos quadrinhos, utilizando-se de

recursos textuais e pictóricos, componentes da linguagem em sentido amplo,

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comunica-se com o indivíduo de maneira multissensorial, queremos ratificar o

que Fioresi e Cunha (2016, p. 1) elucidaram quando disseram que

a interligação do texto com a imagem, existente nas histórias em quadrinhos amplia a compreensão de conceitos, na medida em que ocorre a interligação texto/imagem nos quadrinhos e representa mais do que o simples acréscimo de uma linguagem a outra como acontece, por exemplo, nos livros ilustrados.

Portanto acreditamos na possibilidade de se ensinar Física através

deste recurso didático não formal, no tocante à inter-relação entre

desenvolvimento cognitivo e percepção artística para a mútua evolução do

conhecimento e da sensibilidade através do viés pedagógico.

História da HQ no Brasil

Sabe-se que as HQ não foram criadas com intuito pedagógico, para

serem utilizadas em sala de aula, porém como meio de comunicação

informativo ou de sátira da vida cotidiana da sociedade em questão. A

comunicação através de imagens remonta às civilizações primitivas conforme

Eisner (1999, apud Souza, 2014, p. XXIII)

Para Eisner (1999) e outros teóricos das artes sequenciais, as primeiras artes sequenciais (histórias em quadrinhos ou narrativas gráficas) vêm dos homens da caverna, que usavam imagens primitivas como forma de linguagem. Os contadores de história das tribos de civilizações antigas eram professores, que preservando o conhecimento passavam-na de geração para geração. (Souza, 2014, p. XXIII)

As primeiras HQ no Brasil surgiram em 1864, intitulado “as

aventuras de Nhô Quim, Ou Impressões de Uma Viagem à Corte”, publicadas

por Ângelo Agostini na revista Vida Fluminense. Eram recortes semanais cuja

temática retratava em tom de ironia e, por vezes, chacota o que estivesse em

voga no cenário político-social da época, bem como a tendência da população

reproduzir os costumes europeus, como mostrado na historinha abaixo. (Figura

1).

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Note que ainda não se utilizava o uso de balões sobrepostos aos

personagens para representar os diálogos; cada quadro possuía uma narrativa

no rodapé da imagem explicando a ação do personagem. A história em

questão retrata um cobrador que após bater à porta de seu credor é recebido

com inúmeras desculpas para não saldar a dívida. Pelas roupas do devedor e

pelo fato de o mesmo ter um criado, pode-se inferir que se trata de pessoa de

classe social elevada para os padrões da época, entretanto, impossibilitado de

liquidar a dívida. Este é o fato ironizado por Ângelo Agostini através da HQ.

Segundo Aragão, (2002, p.122. apud Souza, 2014, p. 4),

trata-se de um convite à reflexão e à análise de uma nacionalidade ainda em construção, de uma cidade que se desejava metrópole e flertava com a revolução industrial, mas que tinha um pé bem fincado no roçado, nas plantações, e que dali retirava seu sustento.

Em 1905 surgiram novos quadrinhos publicados na revista “O Tico-

Tico” e vinte e cinco anos mais tarde o jornal Gazeta lançou a Gazeta infantil

ou Gazetinha que vigorou até os anos 50, quando surgiram as HQ dos

cartunistas Maurício de Souza e Ziraldo Alves Pinto, criando personagens

tipicamente brasileiros que divertem crianças e adolescentes até os dias de

hoje.

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Figura 1: As cobranças, de Ângelo Agostini, fonte: MOYA, 1986, pag. 19, apud Souza, 2014, p. 4.

Os primeiros personagens de Maurício de Souza foram o cachorro

Bidu e Franjinha, seu dono, em tiragens de jornais em São Paulo em 1954. Na

sequência surgem os personagens Chico Bento (1961), em homenagem a um

tio avô que nem chegou a conhecer e mais tarde cria as personagens Mônica e

Magali (1963), inspirado em suas duas filhas homônimas.

Nos anos seguintes Maurício de Souza cria mais personagens:

Cebolinha, Cascão, Zé Luiz, Titi, Xaveco, Marina, Piteco, Horácio, Penadinho,

Papa Capim, Nimbus, Do Contra e muitos outros que passam a integrar a

Turma da Mônica, ganhando notoriedade para além das fronteiras do Brasil até

chegar à Terra do Sol Nascente.

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De acordo com Rama e Vergueiro, (2004, p. 10, apud Crosciati,

2013, p. 3)

a evolução da indústria tipográfica e o surgimento de grandes cadeias jornalísticas, [...] criaram as condições necessárias para o aparecimento das histórias em quadrinhos como meio de comunicação em massa.

As revistas em quadrinhos da Turma da Mônica, especificamente,

têm grande distribuição nacional, são amplamente aceitas por todos os jovens

em todas as regiões do país, fáceis de serem encontradas em todas as bancas

de revistas e têm preço relativamente acessível, portanto, “as HQ fazem parte

do universo dos meios de comunicação, que cada vez mais influenciam a

formação da criança” (PALHARES, 2008, p. 11).

Não obstante o ensino por meio da HQ torna-se atraente, devido “ao

seu caráter globalizador, pois trazem temas em que não é necessário ter um

conhecimento prévio ou especifico, pode ser compreendida por qualquer aluno”

(Schnor, Fialho, Laurindo, 2017, p. 4). Assim, é preciso estimular o aprendente

a continuar buscando o conhecimento além das fronteiras dos quadrinhos, de

maneira ativa, participativa, investigativa, no sentido de propor ideias e

confrontar o que se pensava saber com o que se pretende saber. Desta

maneira o conhecimento será construído por diversos co-autores em sala de

aula, na qual cada estudante não se limitará à observação do fato reproduzido

em seu caderno (SOUZA, 2014).

A ciência não é obra de um só artista e nem um edifício

completamente pronto para o qual observadores externos ficam a olhar sem

interagir ou contribuir com o mesmo, não é obra estanque e nunca será

enquanto os estudantes, de diversos níveis escolares, forem educados para

serem homens e mulheres pensantes, co-criadores da realidade que os

cercam, seres pesquisadores de diversas áreas que aprenderam a não aceitar

de pronto qualquer conhecimento que lhe chegue verticalizado, de maneira

desrespeitosa e indiferente aos seus anseios e às suas dúvidas.

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O ensino por investigação

O professor pode, portanto, utilizar o método de ensino por

investigação, pois assim os estudantes serão questionados em suas

convicções científicas, podendo levantar hipóteses e propor soluções para os

problemas. Dessa maneira os conteúdos não serão dispostos sumariamente no

quadro ou projetados através de multimídia, à revelia do estudante que observa

passivamente como um telespectador anônimo e alheio ao desenrolar de um

saber que parece não ser para ele. De acordo com Vieira, (2012, p. 21)

Entende-se o ensino por investigação como uma abordagem de ensino que reproduz parcialmente a atividade científica, permitindo que os alunos questionem, pesquisem e resolvam problemas, levantando hipóteses e investigando até chegarem a explicação desses fenômenos.

Desse modo, neste tipo de ensino, o professor não assume o papel

de depositante do conhecimento como se o estudante fosse uma caixa vazia e

inerte, porém, assume a postura de educador e parceiro dando

encaminhamento a suas aulas com perguntas, questionamentos, problemas,

com a finalidade de, à semelhança de um maestro que rege uma orquestra no

compasso dos acordes pré-estabelecidos, encaminhar os estudantes às

informações pretendidas e aos conceitos científicos. A intenção é sensibilizar o

estudante, atrair seu interesse, envolvê-lo cognitiva e afetivamente (VIEIRA,

2012), conduzindo-o de maneira sutil pelos caminhos da ciência a ponto de

parecer que o conhecimento partiu única e exclusivamente dele. Assim

acontecendo, o aprendizado provocará a certeza de que o conhecimento

científico é acessível e pode ser obtido de forma divertida e prazerosa.

O ensino por investigação não é aquele de respostas prontas,

acabadas e inquestionáveis, onde o estudante sequer tem a oportunidade de

contradizê-las com outro argumento que fomentaria o diálogo construtivo em

busca de outro patamar de conhecimento. É, ao contrário, a interação dialógica

entre docente e discente como duas pessoas, seres humanos que estão em

busca de mais conhecimento, onde o primeiro tem a função de facilitador,

aquele de mais experiência que indicará o caminho e a metodologia que levará

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o segundo à apropriação do conhecimento e da ciência que lhe foi

compartilhada.

Esta atividade investigativa, centrada no aluno, tem como finalidade

formar cidadãos autônomos no trato com a ciência e a pesquisa. Não no

sentido de formar pesquisadores do ponto de vista da academia, pois, de

acordo com Carvalho (2014, p.9),

(...) é importante deixar claro que não há expectativa de que os alunos vão pensar ou se comportar como cientistas, pois eles não têm idade, nem conhecimentos específicos nem desenvoltura no uso das ferramentas científicas para tal realização. O que se propõe é muito mais simples – queremos criar um ambiente investigativo em salas de aula de Ciências de tal forma que possamos ensinar (conduzir/mediar) os alunos no processo (simplificado) do trabalho científico para que possam gradativamente ir ampliando sua cultura científica, adquirindo, aula a aula, a linguagem científica.

Desse modo, os problemas levantados pelo professor devem levá-

los a buscar respostas e argumentos que corroborem suas hipóteses; ensiná-

los a “sistematizar raciocínios como “se”/”então”/”portanto” ou o raciocínio

proporcional, isto é, se uma das variáveis cresce, a outra também cresce ou se

uma delas cresce, a outra decresce” (Carvalho, 2014), percebendo pela

observação dos fatos ou leitura do material as relações de dependência entre

as grandezas estudadas.

O estudante que aprende a investigar aprende também a observar,

refletir, fazer suposições, construir explicações e analisar dados em tabelas e

gráficos. No ensino de Física por investigação, seja através de leitura de textos,

experimentos em laboratório, discussão de temas ou debates, é comum o

aprendente interagir com os colegas, entrar em contato com o objeto de

estudo, com a natureza, sempre sob o olhar cuidadoso do professor que

assume o papel de incentivador do conhecimento pela busca curiosa e astuta,

por vezes meticulosa, por vezes divertida.

Dessa maneira, ressaltamos que se o professor se dispõe a utilizar

as HQ como ferramenta pedagógica para o ensino de Física ou qualquer outra

disciplina, deve fazê-lo de maneira proveitosa, sem subutilizar este material de

apoio rebaixando-o a uma mera revistinha de entretenimento, onde o aluno

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perderia a oportunidade de, com a ajuda dela, adentrar o mundo científico e

investigativo com o prazer e a sutileza que esta arte sequencial detém.

Assim como qualquer outro recurso didático, o uso, por si só, das

HQ em sala de aula não garante uma educação de qualidade. É preciso que o

professor saiba como utilizá-las de maneira adequada para que tais HQ sejam

aproveitadas em suas potencialidades imagéticas, informativas, lúdicas e

gráficas, caso contrário elas não passarão de um instrumento de diversão à

parte da aula e do conteúdo que se pretende discutir. De acordo com Schnor,

Fialho, Laurindo (2017, p. 4), “é importante ressaltar que cada idade possui

necessidades de ensino e aprendizagem diferentes, portanto, a maneira como

os quadrinhos serão trabalhados em sala de aula é indispensável”.

Nesse sentido, é necessário, antes de mais nada, que o professor

estabeleça com muita clareza no seu plano de ensino, quais encaminhamentos

serão dados a partir das falas dos personagens, o que pretende ensinar e

quais problemas serão discutidos com os alunos.

Segundo Palhares (2008, p.13)

É fundamental que o professor mantenha o controle do desenvolvimento do processo. Seja permitindo que o aluno tenha o contato com a HQ de forma mais livre, indo e vindo na leitura, pulando páginas, ou seja, controlando o ritmo, a velocidade e o momento em que o aluno entra em contato com os quadrinhos que, ele, professor deseja. O importante é que o professor tenha claro quais as possíveis reações que os alunos terão no contato com a HQ dependendo da forma como ele lê a mesma.

É importante salientar também que o professor deve ter em mente

as possíveis interpretações, objeções e conclusões que os alunos farão a partir

da leitura dos quadrinhos para poder conduzi-los, no momento oportuno, à

amarração entre os conceitos científicos discutidos dentro do conteúdo

programático da disciplina e os conceitos discutidos nas historinhas (Palhares,

2008).

O uso da HQ deve ser feito com muito critério e responsabilidade,

não é uma ferramenta para passar o tempo, porém sim, de grande utilidade na

otimização do ensino-aprendizagem, além do que, o professor precisa deixar

claro para o estudante que houve preparo e intenção ao se utilizar esta arte

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sequencial para que o mesmo não se sinta enganado, demonstrando falta de

interesse com a nova proposta. (SCHNOR; FIALHO; LAURINDO, 2017).

Ao utilizar a arte dos quadrinhos em sala de aula o professor não

pode perder de vista qual o seu real objetivo, qual seja, ensinar Física de modo

a fazer compreender a relação das HQs com a ciência, tecnologia e sociedade,

no sentido de que o estudante, parceiro desse processo de ensino-

aprendizagem, não mais enxergue o mundo de maneira isolada, porém

compreenda que todos os fenômenos que o cercam corroboram as explicações

da Física discutidas em sala de aula.

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A CONSTRUÇÃO DO PRODUTO

Projeto Inicial

Vamos aqui discorrer como nasceu a idéia de construir um produto

que pudesse melhorar o ensino de física através das histórias em quadrinhos.

Em um primeiro momento, pretendíamos elaborar uma seqüência de ensino

que utilizasse HQ para o ensino de física, sem ter como foco um assunto

específico, porém, que o assunto fosse aquele cuja história encontrada se

adequasse à proposta. Por exemplo, se encontrássemos uma historinha cujo

tema estivesse relacionado com movimento relativo, este geraria uma

sequência de ensino e aprendizagem sobre tal conteúdo, podendo ser a

próxima sequência de ensino e aprendizagem de qualquer outro assunto,

dentro de qualquer outro eixo temático da Física, desde que a HQ se

adequasse ao novo conteúdo.

Pois bem, o trabalho que se seguiu foi ler e pesquisar diversas

revistinhas, procurando por assuntos e temas que pudessem, sob a ótica de

um professor de física, ser relacionados com algum conteúdo de física, de

preferência os tópicos que seriam trabalhados futuramente em sala de aula.

Optamos pelas revistas da turma da Mônica por ter maior capilaridade, grande

divulgação e ser acessível em todas as bancas de revistas.

A 1ª HQ encontrada foi na revista da Magali, nº 29 de 2009,

intitulada “A Lei do Gato”, na qual Magali está sentada à mesa tomando seu

café da manhã e, inesperadamente, seu pão com manteiga cai no chão com a

manteiga virada para baixo. Sua mãe diz que isso sempre acontece e ela lhe

pergunta por que. Como a mãe não sabia a resposta, Magali então procura

Franjinha, o cientista da turma, para solucionar o problema. Franjinha,

observando que Mingau, o gato de Magali, ao cair de cima da estante, chega

ao chão com as patas viradas para baixo, explica que esta é a Lei do gato e

então tem a seguinte ideia de um experimento: amarrar um pão com manteiga

nas costas do gato, soltar o animal de certa altura e verificar qual será a nova

situação final do movimento. Quem ficará embaixo, a manteiga ou as patas do

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gato? Com esta HQ o professor poderia discutir os processos de investigação

da ciência, método dedutivo e indutivo e ainda discutir a necessidade de se

estabelecer leis gerais, com base em modelos, que servem para melhor

compreensão dos fenômenos naturais, bem como fazer previsões em

situações análogas. Para conhecer esta HQ na íntegra, veja o anexo B.

Figura 2: Franjinha faz experimentos para verificar a Lei do Gato e do Pão com manteiga. Magali; edição 29, 2009. Editora Panini.

A 2ª HQ encontrada foi na revista do Cebolinha, intitulada: “Sozinho

no mundo”, ISSN-01042734, nº 69. Trata-se de uma história do personagem

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Do Contra, cujo título é “Do Contra e a bola”, representada por três quadros. No

primeiro é retratada a cena em que Cascão está andando, em linha reta, com

uma bola girando em seu dedo indicador, no segundo quadro temos o menino

Luca, também andando em linha reta com uma bola girando em seu dedo

indicador e no último quadro, temos Do Contra com uma bola imóvel em seu

dedo indicador e ele girando em torno dela. Veja quadro abaixo.

Figura 3: Do Contra gira em torno da bola enquanto a mesma permanece imóvel para um observador externo.

Note que com esses três quadros o professor poderia iniciar uma

aula sobre movimento relativo e referencial. Poderia discutir também os

modelos Geocêntrico e Heliocêntrico, começando com a pergunta: A Terra gira

em torno do Sol ou o Sol gira em torno da Terra? Se a Terra gira em torno do

Sol, por que você vê o contrário, isto é, o Sol despontando, pela manhã, em

uma extremidade no horizonte e à tarde se escondendo na outra extremidade?

A partir das respostas dos alunos caberia a discussão (não trivial) de por que o

sistema geocêntrico de Aristóteles e Ptolomeu durou tantos séculos, sendo

substituído a partir das observações e modelos de Copérnico, Kepler, Galileu,

Giordano Bruno e outros. Caso o professor queira utilizar esta HQ segundo

nossa proposta inicial, ela está na íntegra no anexo C.

Após muitas leituras e pesquisas de HQ da Turma da Mônica,

conseguimos reunir mais três histórias cujos temas tinham em comum o eixo

temático Física Térmica. A primeira, podendo ser utilizada para iniciar os

conceitos de calor, temperatura e condução térmica, pois apresentam

afirmações do tipo “estou com frio”, “este agasalho é quentinho”, “esta pedra é

muito fria”, etc. Trata-se da HQ do personagem Penadinho, intitulada

“Temperatura Exagerada”, na qual Cranicola, que mora em cima de uma pedra,

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ao ar livre, começa a se queixar do frio intenso naquela noite. Penadinho, para

ajudá-lo, adota algumas medidas utilizando-se de vários recursos, tais como

envolver o pescoço do amigo com um cachecol, colocar-lhe uma touca na

cabeça, introduzir um travesseiro entre Cranicola e a pedra, quando este se

queixa do frio desta. Durante os quadros, vários diálogos vão sendo

construídos entre os dois personagens, fomentando as intervenções do

professor a fim de criar com os alunos conceitos do que venha a ser calor e

temperatura e como o primeiro se manifesta. Para mais esclarecimentos, veja a

aula 1 no Produto Educacional.

A próxima história relacionada com física térmica apresenta uma

discussão entre os personagens Nimbus e Cascão sobre um termômetro que

está graduado em Fahrenheit, fato desconhecido de Cascão. Assim, Cascão

reclama que seu tio havia lhe dado o aparelho com defeito, pois o mesmo

estava indicando a temperatura ambiente de 77 graus (sem a unidade de

medida). Quando Cascão afirma que o tio veio “dos isteites”, Nimbus conclui

que o Termômetro estava graduado em outra escala de temperatura, não usual

aqui no Brasil, a escala Fahrenheit.

Vê-se que esta HQ tem enorme potencial para se iniciar o assunto

sobre medidas e escalas de temperatura; quais escalas existem, como elas

surgiram, quais são sua vantagens ou desvantagens e a conversão entre elas.

De iníco, podemos questionar os estudantes se existe alguma relação entre a

medida marcada naquele termômetro e a obtida na escala Celsius, utilizada

aqui no Brasil. Para mais detalhes sobre esta HQ e como utilizá-la em sala de

aula, veja a aula 2 no produto educacional.

E por fim, a última história encontrada, cujo título é “Transformando”,

remete ao estudo da Termodinâmica, especificamente a 2ª Lei da

Termodinâmica por se tratar de transformação. É uma historinha em que

Cascão monta uma oficina para reaproveitar os brinquedos dos colegas

transformando-os em outros brinquedos. Ao longo do tempo, alguns ficam

entediados com o novo brinquedo e exige de Cascão que traga o brinquedo

antigo de volta, desfazendo a transformação. Cascão então explica que não dá,

não tem como voltar e fazer o caminho inverso, contando com o apoio de

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Franjinha, o cientista da turma, que ratifica a explicação exemplificando que

uma omelete não vai voltar a se transformar em um ovo.

É possível iniciar uma discussão com os estudantes a partir dos

argumentos de que o caminho da transformação só tem um sentido de maneira

natural e que mesmo ao se transformar, a essência material de cada

brinquedo, isto é, a matéria prima, continuava a ser a mesma, tal qual a energia

que mesmo se transformando continua a se conservar. Veja mais detalhes

dessa HQ e de como utilizá-la na aula 3 no produto educacional.

Seleção das Histórias em Quadrinho

Quando nos deparamos com essas cinco histórias em quadrinhos, a

dúvida vigente era se ficaria melhor elaborar uma seqüência de ensino que

contemplasse todas as histórias ou um planejamento para cada história,

adequada a cada série e cada unidade? Sim, pois note que, a depender do

assunto que for próximo do tema abordado pela HQ, a série escolar pode variar

do primeiro para segundo ano do Ensino Médio, nesse caso, qual seria o foco

do Produto Educacional? O professor que viria a acessá-lo teria qual objetivo

em mente?

Não nos parecia muito claro e objetivo fazer uma seqüência para

cada eixo temático, à semelhança de uma colcha de retalhos que pode ser

usada como isolante térmica nas noites frias, porém cada retalho emendado,

de material diferente, tem específica condutibilidade térmica, não garantindo a

homogeneidade da função para a qual a colcha foi designada, ou seja, um

produto com diversas sequências de aulas com assuntos diferentes e para

séries diferentes não nos indicava que o professor encontraria ali um recurso

didático que lhe proporcionaria começo, meio e fim, harmoniosamente, de um

plano de curso.

Após algumas discussões e reflexões, optamos por elaborar uma

sequência de ensino para um único eixo temático: a termodinâmica. Pois bem,

assim nasceu a idéia de elaborarmos um Produto Educacional que ajudasse o

professor de física no ensino de temas de física térmica, começando pelas

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definições de calor e temperatura, seguindo com o estudo de escalas e

finalizando com abordagens da termodinâmica, no tocante à sua 1ª e 2ª Lei,

conforme já explicitado.

A HQ “Transformando” foi implementada no Colégio Modelo Luís

Eduardo Magalhães, em Porto Seguro, na Bahia, em duas turmas do 2º ano

vespertino, nos dias 12 e 13 de setembro de 2017. Apesar de não termos tido a

oportunidade de implementar as outras histórias, “Temperatura Elevada” e

“Fahrenheit”, cujos temas antecedem Termodinâmica, pois quando as

encontramos os assuntos de Calorimetria e Termometria já haviam sido

ministrados, elaboramos um material que contempla e complementa o início

dos conteúdos de física térmica, no tocante às definições de calor e

temperatura. Assim, acreditamos que o professor conseguirá utilizá-lo como um

facilitador de suas aulas, não só para este conteúdo, pois ele pode, a partir

desse exemplo, ampliar o seu olhar para outras historinhas que remetem a

outros conteúdos da física. Hoje em dia uma banca de revista é rica na oferta

de títulos, principalmente em HQ.

A Implementação do Produto

O produto então foi elaborado pensando nas turmas do 2º ano do

Ensino Médio, entretanto, com a linguagem que buscamos dar, sem nos

atermos, num primeiro momento, às equações, deixando-as para a posteriori,

quando os estudantes estiverem profundamente familiarizados com os

conceitos e fundamentos do assunto. Dito isto, acreditamos que este Produto

Educacional pode ser utilizado como ferramenta pedagógica em qualquer série

onde o professor queria ministrar aula dos assuntos nele abordados. Além

disso, ele pode estender a metodologia utilizada, adaptando outras HQ´s em

outros tópicos da Física, ou de outras áreas do conhecimento.

Os alunos demonstraram imediato interesse ao perceberem que

leríamos uma HQ e que, a princípio, a física seria discutida de forma mais

animada, lúdica. Ao olhar desatento e não habilidoso com a ciência de uma

criança ou adolescente, uma historinha como essa nada teria a ver com física,

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não o faria lembrar-se de nenhum assunto estudado por esta disciplina,

portanto cabe ao professor, enquanto facilitador do conhecimento, mostrar os

caminhos subjetivos que levarão ao entendimento da física através de diversos

meios didáticos de comunicação.

A aula foi iniciada sem dizer aos alunos qual seria o assunto. A HQ

foi projetada em PowerPoint e lida com eles, ora por mim, ora por eles. O clima

foi de descontração, deixando-os se envolver com a HQ, rir à vontade, voltar

slides quando pediam e fazer graça com algumas cenas. O intuito foi se

afastar, aparentemente, de uma aula de física, no sentido tradicional da

palavra.

Após a leitura e compreensão da HQ, comecei a perguntar-lhes o

que tinham entendido, o que mais chamou a atenção e por que eu estava

usando aquela historinha. Em seguida procedi ao diálogo indagando-os sobre o

título da história, conforme exposto na aula três do Produto, e eles

descreveram que Cascão transformava os brinquedos velhos em outros.

Os alunos participaram, ajudando com exemplos de transformação e

tipos de energia o que tornou mais fácil a discussão e compreensão da Lei de

conservação, mesmo ressaltando que ela, a energia, pode, e vai, se

transformar em outras modalidades e que nessa transformação haverá sempre

uma parcela não aproveitada. Esta aula aconteceu em dois horários de

cinqüenta minutos cada. No segundo horário foi feita uma atividade com os

alunos: um questionário teórico com perguntas e situações onde foi pedido

para eles explicarem o que se pedia.

Nesse segundo momento a intenção foi verificar até que ponto eles

haviam compreendido a ampla abrangência da Termodinâmica e se eles

conseguiam enxergar suas leis em diversas situações aparentemente não

físicas. Uma das questões trás um poema com versos que falam de amor,

porém com sentido e termos extraídos da física, dessa maneira busca-se

compreender até que ponto os alunos percebem a física para além de seus

limites formais, disciplinar para percebê-la interdisciplinarmente.

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Exercícios de aprendizagem

1) João Pedro, físico e poeta, em seu livro de realismo fantástico, “Os sonhos

de Alice”, brinca com a implacável tendência do universo à desordem,

tendência essa que permite distinguirmos o passado do futuro. Para isso,

João Pedro nos convida a imaginar um filme de um ovo quebrando sendo

passado de trás para a frente. Uma pessoa desinformada, ao entrar na sala

nesse exato momento e vir pedaços de casca e gema se juntando para

formar um ovo, vai entender na hora que o filme está sendo passado de trás

para a frente. Isso ocorre porque, quando o filme é apresentado do futuro

para o passado, a tendência natural do ovo se inverte.

Explique, do ponto de vista da termodinâmica, por que parece ser

impossível que as cascas quebradas voltem a ser ovo.

2) O poema abaixo faz referência a uma importante lei da Termodinâmica. Cite

essa lei e explique o seu significado.

Dilatação do Tempo

Amar para sempre parece tão impalpável quanto o comprimento do infinito. Como acreditar nas declarações de eternidade Se tudo está em movimento, Se a vida é dinâmica. A máquina do amor desperdiça energia à medida que funciona. É a lei. Diante da impossibilidade de prever, Da imprevisibilidade do tempo É melhor amar em ciclos Aumentando o rendimento do tempo.

Franklin Ramos

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3) (UNEB) A segunda Lei da Termodinâmica pode ser considerada como uma

variação do principio da degradação da energia, porque:

a) a geração de calor por atrito a partir de trabalho mecânico constitui um

processo reversível.

b) a energia utilizável do universo aumenta proporcionalmente com o

decorrer do tempo.

c) é impossível converter integralmente calor em outra forma de energia.

d) é possível construir máquina térmica que opere segundo o ciclo de

Carnot, com rendimento 100%.

e) o fenômeno natural evolui espontaneamente para o estado de menor

desordem, diminuindo a eficiência em degradar energia térmica.

4) Muitos já devem ter assistido ao famoso filme “O Curioso Caso de Benjamin

Button”, no qual é contada a história de uma criança que nasceu com a

aparência de um velho, fazendo com que muitos acreditem que ele viverá

pouco tempo, mas a cada ano que passa ele fica mais novo, deixando

todos perplexos. A história contada no filme é ficção e viola a 2ª Lei da

termodinâmica. Explique por que?

A aula de termodinâmica foi ministrada em quatro turmas de 2º ano.

Em duas turmas foi utilizada a HQ, 2º ano A e 2º ano C; e duas turmas não foi

utilizado o recurso da HQ: 2º ano B e 2º ano D. Ao corrigir a atividade e atribuir

uma nota de 0 a 10, verificou-se que a média das notas das turmas foi maior

naquelas onde utilizamos a HQ. Abaixo mostramos a tabela de média das

notas dos alunos.

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Tabela 1: Média das turmas onde foi e onde não foi utilizada a HQ para iniciar uma aula de Termodinâmica.

Notas dos alunos da 2ª série vespertino do Colégio Modelo Luís Eduardo Magalhães na implementação do produto educacional.

12 e 13 de setembro de 2017

2º Ano B Sem o uso de HQ

24 alunos Média da turma 0-10

5,62

2º ano D Sem o uso de HQ

25 alunos Média da turma 0-10

2,80

2º ano A Com o uso da HQ

30 alunos Média da turma 0-10

6,25

2º ano C Com o uso de HQ

19 alunos Média da turma 0-10

6,57

Podemos notar que os alunos que tiveram a aula ministrada por

meio da HQ apresentaram um desempenho superior àqueles que não a

tiveram. O exato motivo que explica este fato, não podemos dimensionar nem

experienciar, porém cabe-nos fazer algumas considerações: 1) Os estudantes

que tiveram acesso às HQs se mostraram mais atentos ao dialogo do

professor, procurando sempre fazer a conexão entre o enredo da história e a lei

física que a explica. 2) A participação deles durante a leitura da HQ também

pode ser notada, uma vez que nesta proposta eles não eram mera platéia de

um monólogo onde o professor seria o protagonista em cena, mas parceiros de

uma construção coletiva sem coadjuvantes e muitos protagonistas. 3) A

curiosidade em saber o final da história era motivo de ansiedade e interação

entre eles que, por vezes, disputavam entre si quem tinha entendido mais a HQ

ao responder as perguntas do professor.

Por estas características e emoções despertadas nos estudantes

durante o envolvimento com a HQ podemos inferir que o ensino por meio desta

deve ter como resultado um maior desempenho e aprendizado desses alunos,

pois uma vez tendo mais interesse e prazer durante a aula, fica mais fácil de

perceber que o conteúdo ensinado é importante e significativo.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Quem se propõe a ser professor de Física deve ter em mente as

dificuldades que enfrentará. Duas delas referem-se à resistência e à dificuldade

dos estudantes, que por motivos diversos não cabe aqui elencá-los, mas que

afetam suas habilidades necessárias para se compreender esta disciplina em

suas nuances, seja a habilidade com a leitura e interpretação que os ajudará a

raciocinar em torno de um problema, cercando-se das hipóteses e

questionamentos que os conduzirão pelos caminhos do resultado, seja a

habilidade com os cálculos e raciocínio lógico que lhe permitirá a compreensão

de leis e padrões na Física que lhe possibilitará inferir sobre as regularidades

previsíveis presentes na natureza.

De que forma podemos melhorar a prática pedagógica do professor

de Física? Como demonstrar para o estudante que a Física é atraente e

compreensível para todos, nem mais nem menos que quaisquer outras

disciplinas como Português, Arte, História, Geografia, etc., e que é possível se

aprender qualquer assunto de qualquer disciplina, mesmo não optando por ela

como opção de carreira?

A escolha das Histórias em Quadrinhos no ensino de Física, mais

especificamente para ensinar física térmica, teve esta motivação, por isso

buscamos elaborar um material a partir do qual qualquer professor possa tê-lo

não só como roteiro de aula, mas também como um produto palpável e pronto

para ser implementado em suas turmas de Física do Ensino médio ou de

Ciências do Ensino Fundamental se assim o desejar e o material contemplar o

assunto que estiver sendo abordado em sala de aula.

A forma como foi produzido e a linguagem utilizada permite que

mesmo no Ensino Fundamental seja compreensível e atraente, pois a maior

preocupação foi com a fundamentação dos conceitos de Física por meio das

HQ, uma vez que caberá ao professor dar sequência às suas aulas,

aprofundando os assuntos conforme julgar necessário à sua turma.

Quando utilizamos as HQ, em duas turmas do 2º ano, para ministrar

a aula de Termodinâmica, com ênfase na 2ª Lei, obtivemos dos alunos

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resultados satisfatórios de participação, compreensão, protagonismo e alegria

nas discussões que permeavam os temas, em detrimento às outras duas

turmas onde as HQ não foram utilizadas como recurso para o mesmo assunto,

fato que nos levou a acreditar na eficácia deste produto como um recurso

didático-pedagógico que melhorará o ensino da Física no tocante à Termologia.

O acervo de revistinhas de Histórias em Quadrinhos é vasto,

acessível em todas as bancas de revistas e não para de crescer, com materiais

nacionais como a Turma da Mônica, Turma do Pererê, e importados como as

revistas da Walt Disney, da Marvel, os Mangás, etc., por isso esperamos que

este produto também incentive os professores, de diversas áreas, a continuar

pesquisando HQ e criando suas próprias aulas com novos assuntos. O Ensino

de Física e os estudantes só terão a ganhar com este desenvolvimento, pois

ficará mais fácil de enxergar esta ciência mais presente no seu dia-a-dia.

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REFERÊNCIA

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Fioresi, C. A.; Cunha, M. B. Processo Para Elaboração De Histórias Em Quadrinhos: Um Estudo Com Estudantes Do Ensino Médio. XVIII Encontro Nacional de Ensino de Química (XVIII ENEQ) Florianópolis, SC, Brasil – 25 a 28 de julho de 2016.

Freire, Paulo.; Pedagogia Da Autonomia: Saberes Necessários À Prática Educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996, Coleção Leitura.

Gonçalves, D. C., Andrade, M. F., HISTÓRIAS EM QUADRINHOS COMO RECURSO DIDÁTICO PARA O ENSINO DE FÍSICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS. Programa de Pós-Graduação da Universidade Federal de Santa Catarina - Campus Araranguá no Curso de Mestrado Nacional Profissional em Ensino de Física (MNPEF). Setembro de 2026. Oliveira, J. G., Física Em Tirinhas: Uma Proposta Para A Sala De Aula. Universidade do Estado do Rio de Janeiro . UERJ, Centro de Tecnologia e Ciências, Instituto de Física, Departamento de Física Nuclear e Altas Energias 2005. Monografia.

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Schnor, C. E. P.; Fialho, J. S. Uso De HQ No Ensino De Língua Portuguesa. Revista Pandora Brasil - Nº 83 - Junho 2017 - ISSN 2175-3318 - "Letras em Foco”

SBF; PCN+ - ENSINO MÉDIO: Orientações Educacionais Complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais. Disponível em http://www.sbfisica.org.br/arquivos/PCN_FIS.pdf, acessado em 10 de junho de 2016.

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Testoni, L. A., Souza, P. H. de, Nakamura, E., Paula, S. M. de. Histórias Em Quadrinhos Nas Aulas De Física: Uma Proposta De Ensino Baseada Na Enculturação Científica. Atas do IX Encontro Nacional de Pesquisa em Educação em Ciências – IX ENPEC Águas de Lindóia, SP – 10 a 14 de Novembro de 2013.

Vieira, F. A. da C. Ensino por Investigação e Aprendizagem Significativa Crítica: análise fenomenológica do potencial de uma proposta de ensino, 2012.

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Anexos

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Anexo A: O produto Educacional

Universidade Estadual de Santa Cruz

PRODUTO EDUCACIONAL

O ENSINO DE FÍSICA TÉRMICA UTILIZANDO

HISTÓRIA EM QUADRINHOS

Franklin José Bomfim Ramos

Orientador: Prof. Dr. George Kouzo Shinomiya

ILHÉUS – BA

2018

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O ensino de física térmica utilizando história em quadrinhos

Introdução

Este produto tem o objetivo de ensinar física térmica tendo como

material catalisador da aula o recurso da História em Quadrinho (HQ). Para

tanto foram selecionadas algumas HQ cujo conteúdo pudesse suscitar algum

tópico da física térmica.

Em um primeiro momento procuramos desenvolver o estudo sobre o

conceito de calor, a diferença entre calor e temperatura, transferência de calor,

o que de fato acontece quando nos envolvemos com agasalhos quando

sentimos frio. A primeira HQ deve nos levar a questionar o estudante a respeito

de algumas afirmações do senso comum e pouco refletidas do ponto de vista

da ciência, tais como: “este cobertor é muito quentinho”, “fecha a porta para o

frio não entrar”, “vista um casaco para se proteger do frio”; como se o frio fosse

algo físico e material que chegasse aos corpos, esfriando-os, retirando deles o

calor. Idéias como essas estão presentes no dia-a-dia nas falas das pessoas

sem ao menos causar estranheza em quem as ouve.

Cabe ressaltar que a idéia do calor e do frio como algo material que

permeia os corpos não é inédita, o primeiro a lançar um olhar

metodologicamente científico no calor, no sentido de medi-lo e tentar defini-lo

foi o médico escocês James Black (1728-1799). Ele imaginou que o calor era

uma espécie de fluido chamado calórico que interpenetrava nos corpos,

passando do de maior temperatura para o de menor temperatura até que

ambas se igualassem. Para comprovar sua idéia ele misturou certa quantidade

de água em ebulição com outra quantidade igual de água gelada e verificou

que a temperatura de equilíbrio se deu aproximadamente na média entre as

duas temperaturas iniciais. Ele explicou esse resultado dizendo que o excesso

de fluido (calórico) tinha sido distribuído uniformemente entre as duas

quantidades de água.

Este conceito de calor durou até meados do século XIX quando

James Prescott Joule (1818-1889) realizou o experimento do equivalente

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mecânico do calor, demonstrando que a energia mecânica pode ser convertida

em térmica e vice-versa, estabelecendo, por fim, que o calor nada mais é que

uma forma de energia. Voltaremos a este tópico mais tarde, na aula de

Termodinâmica.

Em relação à pergunta “o que é temperatura?”, é comum se ouvir de

alunos, a resposta de que é a medida do calor. É natural confundir a sensação

térmica com o “estar quente” ou “estar frio”, como se estes fossem conceitos

absolutos, quantitativos e precisos, ao invés de relativos e facilmente

confundíveis, bastando para isso que se pergunte a um grupo pequeno de

pessoas se aquele ambiente em que se encontram está frio ou está quente

para se perceber que, não raro, as respostas variam entre “está bom”, “está

agradável”, “está quente”, a depender da sensibilidade e gosto de cada um.

Entender a temperatura como um estado de agitação que está

relacionado com o movimento das moléculas e átomos que compõem a

matéria, isto é, com sua energia cinética média, e que, portanto, é quantitativo

e preciso é fundamental para diferenciá-la de calor, haja vista que a absorção

ou liberação de calor pelo material pode fazer variar sua temperatura, para

mais ou para menos, respectivamente.

A segunda HQ tem como foco central o ensino de escalas de

temperatura, uma vez que retrata um episódio em que Cascão está confuso

com um termômetro que não está graduado na escala Celsius, mas ele não

sabe disso. É preciso que um amigo, Nimbus, ao saber que o termômetro foi

trazido de outro país deduza que o mesmo esteja graduado em outra escala e,

assim, esclareça a Cascão do motivo da confusão e que o aparelho não está

quebrado.

Uma vez discutida a diferença entre calor e temperatura, cabe, com

essa HQ, fazer as seguintes perguntas: como fazer para medir a temperatura?

Será que todos os países a medem da mesma forma? Existe uma medida

absoluta de temperatura? O objetivo desta HQ é iniciar uma aula que poderá

desencadear uma discussão sobre a confecção de escalas e também na

relação entre as diversas escalas utilizadas hoje em dia: Celsius, Fahrenheit e

Kelvin, esta última chamada de escala absoluta, pois não admite valores

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negativos por se relacionar com a energia cinética das moléculas e átomos. O

zero absoluto, ou zero kelvin, equivalente a -273,15 ºC seria a temperatura

onde os átomos deixariam de vibrar.

A terceira HQ remete ao estudo da Termodinâmica, especificamente

à sua 2ª Lei por se tratar de transformação. É uma historinha em que Cascão

monta uma oficina para reaproveitar os brinquedos dos colegas transformando-

os em outros brinquedos. Ao longo do tempo alguns ficam entediados com o

novo brinquedo e exige de Cascão que traga o brinquedo antigo de volta,

desfazendo a transformação. Cascão então explica que não dá, não tem como

voltar e fazer o caminho inverso, contando com o apoio de Franjinha, o

cientista da turma, que ratifica exemplificando que uma omelete não vai voltar a

se transformar em um ovo.

A porta está aberta para se iniciar o estudo da termodinâmica,

questionando os alunos se a natureza se comportaria do mesmo jeito que os

brinquedos transformados por Cascão. Note que, quando um brinquedo era

transformado em outro, continuava a ser brinquedo, fato que pode ser

relacionado com a 1ª lei da termodinâmica, uma vez que a energia total do

universo se conserva. Mesmo ocorrendo varias transformações de uma

modalidade de energia em outras, no balanço geral das energias, a quantidade

que se tinha antes, deverá ser a mesma depois das transformações, conforme

preconiza a primeira lei. Contudo, o produto enérgico final não mais se

apresentará integralmente tal qual se apresentava antes das transformações,

corroborando o que estabelece a 2ª lei da termodinâmica, ao formalizar que é

impossível a uma máquina térmica, retirar energia de uma fonte quente e

transformá-la integralmente em trabalho. Sempre haverá uma parcela de

energia não aproveitada pela máquina, o que chamamos popularmente de

desperdício.

Aula 1: O que é Calor? Ou por que quando eu estou com febre eu sinto

frio?

A aula deve ser iniciada com a leitura da HQ. Devido ao seu caráter

lúdico, espera-se que os estudantes, neste momento, se deixem envolver pela

historinha, pois o caráter lúdico da HQ pode proporcionar uma mudança de

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atitude com relação à aula de física, normalmente rotulada de difícil e chata.

Nesse sentido, a linguagem simples e alegre da HQ possibilita uma mudança

de postura que facilita o acesso à aprendizagem.

A história pode ser projetada através do projetor multimídia e/ou

fotocopiada e distribuída para os alunos, a depender dos recursos disponíveis

e da metodologia de trabalho que o professor escolher. Sugerimos trabalhar

com os alunos em grupos, pois assim é possível que a interação entre eles

desperte para novas indagações, o que certamente enriquecerá a discussão.

De início recomendamos que se leia a história inteira sem

interrupções nem explicações físicas e só após retome em partes com as

indagações que proporemos adiante.

Figura 4: Temperatura Exagerada. primeira página.

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Figura 5: Cranicola se sente aquecido pelo cobertor, confundindo isolante térmico com fonte de energia térmica.

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Figura 6: Penadinho interpõe um travesseiro entre Cranicola e a pedra para impedir que ele perca calor para ela.

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Figura 7: Cranicola é levado para um ambiente de temperatura mais elevada e ele passa a absorver calor do ambiente.

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A partir da leitura da HQ, o professor volta para alguns quadros

ressaltando a informação através de algumas perguntas aos estudantes:

Neste quadro (Fig. 8) é possível investigar a intenção de Penadinho

ao dormir de cobertor. Pergunte aos alunos:

1- Por que Penadinho estava dormindo de cobertor?

2- Por que o cobertor nos dá a sensação de aquecimento?

Alguns alunos responderão que o cobertor aquece ou que ele estava

usando cobertor por que o mesmo é quentinho, conforme dito na figura 2

abaixo em relação ao cachecol.

É natural pensar dessa forma, faz parte do senso comum, uma vez

que com o uso de agasalhos nos sentimos mais aquecidos, entretanto, este

calor que sentimos não vem do agasalho, vem do nosso próprio corpo. O

agasalho ou cobertor funciona como isolante térmico, impedindo que o calor

Figura 8: Penadinho sugere que dormir de cobertor o manterá aquecido.

Figura 9: Demonstração de equívoco conceitual. O cobertor é isolante térmico.

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saia do nosso corpo para o ambiente, isto é, impedindo a troca de calor com o

ambiente. Tanto melhor será o cobertor quanto mais isolante ele for. Vale

ressaltar que um bom isolante térmico é o material que dificulta a transferência

de calor entre dois meios, criando uma barreira entre eles e impedindo a

tendência natural do equilíbrio térmico. O ar seco é um bom isolante térmico,

pois possui baixa condutividade térmica, conseqüentemente materiais muito

porosos, com muitos espaços de ar entre suas estruturas, como cobertores de

lã, são também bons isolantes térmicos.

O isolamento do cobertor envolto no corpo humano que irradia calor

cria uma região de efeito estufa entre o corpo e o material isolante, análogo ao

que acontece com o planeta Terra: a camada de ozônio bloqueia a onda

térmica que é irradiada pelo planeta, refletindo-a de volta para o solo

favorecendo o seu aquecimento.

Não se esqueça de reforçar para os alunos, portanto, que o cachecol

no pescoço de Cranicola não teve a função de aquecê-lo, mas sim de isolá-lo,

isto é, impedir que o calor produzido pelo nosso corpo saia para o ambiente.

Cranicola também afirma que a pedra está muito fria, mas se tanto

ele quanto a pedra estão ao ar livre há muito tempo, será que a pedra está

mesmo mais fria que ele?

Aproveite este quadro para desenvolver o conceito de sensação

térmica e transferência de calor por condução. Se ele está sentindo a pedra

fria, então está havendo transferência de calor dele para a pedra. Pergunte aos

alunos:

3- O calor está indo da pedra para Cranicola ou de Cranicola para a

pedra?

Ouça varias possíveis respostas. Se alguém disser da pedra para

Cranicola, replique com outra pergunta:

4- Se o calor está indo da pedra para Cranicola, então por que ele

não está se sentindo aquecido? Será mesmo que está indo da pedra para o

indivíduo? Quem sente frio é quem ganha calor ou perde calor?

Neste momento a maioria dirá o contrário, que o calor está saindo do

Cranicola e indo para a pedra, por isso que ele está sentindo frio.

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Aproveite esta fala dos alunos para retomar o último quadro da

historinha e perguntar:

5- E agora, nesta cena, o calor está indo de onde para onde?

Naturalmente eles dirão que do fogo para o Cranicola. Diante dessas

falas e conclusões discutidas é conveniente construir uma definição para o

calor, de forma sutil e processual, como sendo a energia térmica que irradia do

corpo de maior temperatura para o corpo de menor temperatura. Portanto, o

frio é uma sensação de perda de calor para outro corpo ou ambiente de

temperatura mais baixa e a sensação de calor, como no quadrinho do inferno,

é a absorção de calor vinda de outro corpo ou ambiente de maior temperatura.

Porém cabe perguntar: quão eficaz é esta transferência de calor?

Qual a celeridade da troca de calor entre dois corpos em contato térmico?

Recupere o quadro abaixo onde será possível discutir fluxo de calor,

uma vez que os alunos já compreenderam o sentido da transferência térmica:

do corpo de maior temperatura para o de menor temperatura.

Figura 10: Cranicola reclama do calor absorvido do fogo no ambiente.

Figura 11: Cranicola perde calor para a pedra

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6- Pergunte se é possível estabelecer uma relação entre a

quantidade de calor cedido por Cranicola à pedra e o tempo em que esta

cessão ocorreu?

7- Será que se a pedra absorvesse certa quantidade de calor de

Cranicola em um longo tempo, um dia, por exemplo, a sensação de frio seria a

mesma que se esta absorção de calor se desse em 1 segundo?

Procure analisar as respostas e para aqueles que responderam que

em menor tempo a sensação seria maior, pergunte se esta é uma relação

direta ou inversa com o tempo?

A taxa de transferência de energia térmica por unidade de tempo é

exatamente o que chamamos de fluxo de calor, representado pela letra () e

dado por = Q/t. Portanto, ratifique que, no caso da interação entre Cranicola

e a pedra, o fluxo de calor pode ter sido alto por dois motivos: um é o curto

intervalo de tempo em que a transferência ocorreu, outro pode ter sido a

diferença de temperatura entre os dois. Para resolver o problema do fluxo de

calor entre o crânio e a pedra, Penadinho inseriu um travesseiro entre os dois,

conforme visto na figura 5. O travesseiro tem área (A), espessura (e) e está na

interface entre duas temperaturas diferentes, a de Cranicola (T1) e a da pedra

(T2), com T1 > T2. Será que com um travesseiro mais alto, mais espesso, com

(e) maior, o fluxo de calor será maior ou menor? Pergunte aos alunos e espere

que eles concluam. Caso eles não consigam imaginar a dependência do fluxo

com o inverso da espessura, faça uma experiência de pensamento,

imaginando que duas pessoas estão deitadas sobre a cerâmica de suas casas

no inverno. A primeira está sobre um lençol de algodão e a segunda está sobre

um colchão. Qual das duas possivelmente reclamará mais do frio? Eles dirão

Figura 12: O travesseiro funciona como isolante térmico

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que foi a primeira, pois o lençol é mais fino. Feito isso, retome a pergunta do

travesseiro explicando que a espessura dificulta o fluxo de calor entre dois

meios, conforme eles puderam concluir.

Desta forma pode-se estabelecer que o fluxo de calor () é

diretamente proporcional à área da superfície de contato (A), à diferença de

temperatura entre os dois meios (T) e inversamente proporcional à espessura

do material na interface (e): A.T/e. E se trocarmos o travesseiro por uma

tábua de madeira, com a mesma área e a mesma espessura, nas mesmas

condições de temperatura, o fluxo de calor será o mesmo? Se colocarmos uma

chapa de zinco de iguais dimensões no lugar da tábua, obteremos o mesmo

resultado? A resposta é não, pois o fluxo de calor por condução depende de

uma constante intrínseca ao material utilizado na separação, chamada de

coeficiente de condutibilidade térmica e representada pela letra K.

Finalmente podemos concluir que o fluxo de calor através do

travesseiro sob Cranicola pode ser calculado por 𝜙 = 𝑘𝐴(𝑇1−𝑇2)

𝑒.

Agora chegou o momento de refazer aos alunos a pergunta proposta

no inicio da aula:

8- Por que sentimos frio quando estamos com febre?

A febre é o aumento de temperatura do corpo devido a alguma

infecção. Com a temperatura do corpo maior que a ambiente, o fluxo de calor

do corpo para o meio se dá de maneira mais rápida, fazendo com que

tenhamos a sensação de que está frio, quando na verdade não está, apenas

estamos perdendo calor mais rápido. Recomenda-se banho frio, nesses casos,

para diminuir a temperatura do corpo humano, reduzindo a diferença de

temperatura entre o corpo e meio ambiente e, por conseguinte, reduzindo o

fluxo de calor.

Exercícios para retomada do conteúdo

1) Por que você não pode ter certeza se está com febre alta tocando

sua própria testa?

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Resposta: o seu corpo inteiro está aproximadamente à mesma temperatura,

sendo assim, o fluxo de calor entre sua mão e sua testa quase não ocorrerá,

impedindo que você tenha a sensação de que está mais quente. Seria preciso que

houvesse uma diferença considerável de temperatura entre sua mão e a outra

parte do corpo em que tocasse para notar rapidamente a elevação da temperatura.

2) Em regiões desérticas, quentes durante o dia e frias durante a noite,

as paredes das casas frequentemente são feitas de argila. Por que é

importante que as paredes de argila sejam grossas?

Resposta: uma parede com a espessura apropriada mantém a casa aquecida

durante a noite por meio da diminuição do fluxo de dentro para fora, enquanto

durante o dia ela mantém frio o interior da casa devido à diminuição do fluxo de

calor de fora para dentro.

3) Identifique, entre as frases abaixo, a(s) errada(s) do ponto de vista

físico e depois corrija-a(s).

a) O refrigerante permanece gelado dentro de uma caixa de

isopor, pois ela não deixa o frio escapar.

b) A sensação de frio que sentimos ao tocar uma colher se deve

à perda de calor de nossa mão para a colher.

c) Uma sopa quente esfria com o tempo, pois fornece calor para

o meio ambiente.

Resposta: está errada a alternativa (a). O refrigerante permanece gelado dentro

de uma caixa de isopor, pois ela evita a troca de calor entre o refrigerante e o meio

externo.

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Aula 2: Temperatura, medida e escalas.

Nesta aula, procuraremos introduzir o conceito de temperatura,

ressaltando sua diferença para o calor, muitas vezes confundida pelos alunos,

conforme verificado na aula anterior.

Inicia-se a aula pela leitura da História em Quadrinho que segue, a

qual pode ser projetada em projetor multimídia e/ou distribuída aos alunos

fotocopiada. Segue-se a mesma recomendação da aula anterior: primeiro leia a

HQ com os alunos ou deixe que eles leiam e depois retome com as devidas

discussões.

É importante não perder de vista que na aula anterior a discussão se

deu em torno do conceito de calor, pois se preciso for, deverá ser retomada a

fim de esclarecer ainda mais o conceito de temperatura.

Figura 13: Cascão argumenta que o termômetro está quebrado pois indica uma temperatura ambiente muito acima da habitual.

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Figura 14: Nimbus percebe que se o termômetro veio de outro país, provavelmente ele deve estar graduado em outra escala de temperatura, a escala Fahrenheit.

Aproveite o primeiro quadro para investigar o conceito de

termômetro: Termo-metro.

1. Pergunte aos alunos o que para eles remete a palavra termo?

Figura 15: Cascão mostra o termômetro para Nimbus.

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Observe as respostas. Provavelmente alguns dirão que tem a ver

com calor, outros, temperatura.

Para que se usa um termômetro? É notório que utilizamos para

medir temperatura. Entretanto, o que seria a temperatura? Que grandeza é

essa que se pode medir com uma espécie de régua graduada? Esta medição é

direta ou indireta?

É importante notar que para se medir a temperatura de um corpo, é

necessário que o termômetro entre em contato com o corpo, espera-se algum

tempo e só então se observa a temperatura. Então podemos perguntar:

2. Por que esperar alguns minutos para conferir a temperatura no

termômetro?

Se os alunos tiverem dificuldade para responder a essa pergunta,

estimule com outra referente à aula anterior: o que acontece quando dois

corpos, de temperaturas diferentes, estão em contato térmico? Eles concluirão

que haverá troca de calor entre eles até atingirem o equilíbrio térmico. E com o

termômetro, não é a mesma coisa? Desta maneira está respondida à pergunta

do por que esperar alguns minutos antes de retirar o termômetro do corpo e

verificar a temperatura.

Note que ainda não concluímos o que é temperatura. O objetivo é

alcançar a discussão dos efeitos da troca de calor pela matéria. Ou seja, o que

acontece com os átomos da matéria quando ela cede ou absorve calor? Uma

vez que já definimos calor como sendo uma modalidade de energia e que a

energia não é criada nem destruída, porém transformada, a pergunta é:

3. Sabendo-se que os átomos estão em constante movimento de

translação, o que aconteceria com este movimento na medida em que

eles liberam energia na forma de calor? Em outras palavras, a

velocidade de translação dos átomos de um sólido, por exemplo,

aumenta, diminui ou permanece constante quando este material cede

calor para o meio ambiente?

A intenção é direcionar os alunos para a compreensão do fenômeno

e, por fim, à construção de uma definição para a grandeza temperatura. Após a

pergunta 3 é possível concluir que a temperatura tem relação intrínseca com o

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grau de movimento dos átomos e que, portanto, corpos que absorvem calor

tem seus átomos mais agitados, o que faz com que a temperatura se eleve e

corpos que cedem calor para outros tem seus átomos em menor agitação,

diminuindo assim a temperatura. A transformação de energia que ocorreu na

troca de calor foi energia térmica (calor) em energia cinética de translação

relacionada à velocidade média dos átomos, verificando assim, a conservação

de energia. Assim, átomos que absorvem calor aumentam energia cinética,

átomos que cedem calor perdem energia cinética.

A questão agora é entender de quais formas eu posso medir a

temperatura. Ou ainda, será que existe um padrão de medida preferida por

todos os países?

Através do quadro ao lado nota-se que Cascão utiliza uma

informação que parece ser uma unidade de medida para o número 77. Ao

declarar 77 graus para a temperatura ambiente, Nimbus conclui que está muito

quente, caso esta seja a temperatura em unidade de medida utilizada no Brasil.

Pergunte aos alunos em qual unidade de medida eles medem a

temperatura do próprio corpo. Se não todos, pelo menos alguns responderão

que é o grau Celsius, então, será que o termômetro de Cascão está medindo

nesta unidade?

O desapontamento de cascão com o termômetro só é esclarecido

quando ele afirma que o mesmo veio de outro país, dos “isteites”, fato que leva

o seu amigo a indagar de qual país veio. Ao saber que veio dos Estados

Unidos, ele conclui que o aparelho não estava quebrado, pois a unidade de

Figura 16: Cascão não se atenta para a unidade de medida no termômetro e por isso se confunde ao interpretar a medida.

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medida de temperatura naquele país não era a mesma usada aqui no Brasil,

porém era a escala Fahrenheit.

Feita esta discussão, pode-se esclarecer que um termômetro nada

mais é do que uma escala graduada, uma régua onde são registrados os

comprimentos atingidos pelo material que dilata dentro do tubo de vidro. A

dilatação varia linearmente com a temperatura, por isso podemos atribuir um

número que representa a temperatura para cada posição da escala. O

comportamento linear da temperatura facilita-nos a criar uma escala a partir de

dois pontos fixos, duas temperaturas Ta e Tb e suas subdivisões.

São três as escalas de temperatura mais conhecidas mundialmente:

Celsius, Kelvin e Fahrenheit. Estabelecendo-se duas temperaturas de

referência para as três escalas, no caso, os pontos de fusão e ebulição da

água, à pressão de 1,0 atm, por exemplo, pode-se deduzir uma relação entre

elas.

Figura 17: conclusão de que o termômetro está graduado na escala Fahrenheit.

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Figura 18: Relação entre as escalas Celsius, Fahrenheit e Kelvin, com seus respectivos pontos de fusão e ebulição da água.

A maneira de se obter uma equação de conversão serve para

quaisquer escalas, mesmo arbitrárias, nas quais sejam dadas duas

temperaturas fixas de referência.

𝑪 − 𝟎

𝟏𝟎𝟎 − 𝟎=

𝑭 − 𝟑𝟐

𝟐𝟏𝟐 − 𝟑𝟐=

𝑲 − 𝟐𝟕𝟑

𝟑𝟕𝟑 − 𝟐𝟕𝟑=

𝑻𝑿 − 𝑻𝒊𝒏𝒇𝒆𝒓𝒊𝒐𝒓

𝑻𝒔𝒖𝒑𝒆𝒓𝒊𝒐𝒓 − 𝑻𝒊𝒏𝒇𝒆𝒓𝒊𝒐𝒓= 𝒄𝒐𝒏𝒔𝒕𝒂𝒏𝒕𝒆

Considerando apenas as escalas conhecidas e simplificando a

equação, obtemos,

𝑪

𝟓=𝑭 − 𝟑𝟐

𝟗=𝑲 − 𝟐𝟕𝟑

𝟓

Note que esta é uma equação do primeiro grau e que, portanto,

obedece à relação f(x) = ax + b. É importante salientar esta propriedade para

os alunos, ressaltando o comportamento linear das temperaturas que nos

possibilita relacioná-las em um gráfico do tipo T=f(X), como mostrado abaixo.

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Para verificar esta dependência linear entre duas escalas de

temperatura, peça aos estudantes que utilize a equação de conversão entre as

escalas Celsius e Fahrenheit, por exemplo, e transforme três temperaturas

quaisquer de uma escala para outra e depois marque os valores

correspondentes em um gráfico de Celsius por Fahrenheit (CxF). Em seguida

peça que eles, a partir do gráfico, utilizando o que aprenderam em matemática,

quando viram função do primeiro grau, no primeiro ano, obtenham a função da

reta.

A intenção em retomar o conhecimento aprendido anteriormente é

mostrar que não existem fórmulas novas, como muitos alunos imaginam,

porém são as mesmas da matemática aplicadas em situações físicas

diferentes. Não há por que decorar um monte de fórmulas como se a física

fossem as equações à revelia dos fenômenos que as corroboram e lhes dão

sentido.

Abaixo selecionamos alguns exercícios para retomada do conteúdo,

como sugestão de início de atividades. O professor fique à vontade para

explorar outros exercícios, material de concursos e ENEM, pertinentes à sua

proposta de ensino.

Figura 19: Gráfico linear representando a função da temperatura T = f(X).

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Exercícios para retomada do conteúdo

1) O termômetro que Cascão estava usando indicava 77 ºF. Informe

para ele a temperatura que o termômetro marcava em ºC.

𝑪

𝟓=

𝑭−𝟑𝟐

𝟗

𝑪

𝟓=𝟕𝟕 − 𝟑𝟐

𝟗

𝑪

𝟓=𝟒𝟓

𝟗

𝑪 = 𝟓.𝟓

𝑪 = 𝟐𝟓 º𝑪

O que podemos concluir que não está tão quente assim.

2) Dois copos de água idênticos, com temperaturas de 10ºC e 20ºC, são

misturados. A temperatura resultante é 15 ºC. Como isso ocorre?

Resposta: dois ou mais corpos com temperaturas diferentes, em contato, trocarão

energia térmica até o equilíbrio térmico. Portanto, a água de maior temperatura (20

ºC) cederá calor para a água mais fria (10ºC). A primeira diminuirá de temperatura e

a segunda terá sua temperatura elevada até que elas atinjam o equilíbrio térmico,

isto é, até que ambas estejam com igual temperatura. Como o material era o

mesmo (água) e as quantidades eram idênticas (mesma massa), a temperatura de

equilíbrio térmico será um valor intermediário entre 10ºC e 20 ºC, dado pela média

aritmética. Portanto 15ºC.

3) Suponha que você aqueça 1 L de água no fogo por um certo tempo, e

que sua temperatura se eleve em 2ºC. Se você colocar 2 L de água

no mesmo fogo pelo mesmo tempo, em quanto se elevará a

temperatura?

Resposta: a temperatura se elevará em 1ºC, pois existe o dobro de moléculas de

água em 2 L e cada uma delas receberá, em média, metade da energia da fonte

térmica que é a mesma.

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Aula 3: Termodinâmica, 1ª e 2ª Lei

A HQ que segue retrata uma situação onde se verifica o esforço de

Cascão em reaproveitar os brinquedos de seus amigos transformando-os em

outros brinquedos. O dilema começa a aparecer quando alguns dos colegas

pretendem obter o mesmo brinquedo de volta, exigindo que Cascão desfaça o

que fez, como se voltasse no tempo.

Aproveitamos esta história para discutir a 1ª e a 2ª Lei da

Termodinâmica, no tocante à conservação da energia e à impossibilidade de se

transformar integralmente uma modalidade de energia em outra,

respectivamente, o que se configura na prerrogativa da 2ª Lei da

Termodinâmica.

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Figura 20: Transformando. Cascão monta uma oficina para transformar os brinquedos dos colegas.

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Figura 21: Cascão recolhe o brinquedo de Cebolinha para transformá-lo em outro brinquedo.

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Figura 22: Cascão transforma o carrinho de boneca de Magali em uma penteadeira.

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Figura 23: Cascão transforma o brinquedo de Dudu e Franjinha lhe dá os parabéns pela iniciativa.

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Figura 24: O colegas de Cascão querem seu brinquedo como era antes, porém Franjinha esclarece que não tem como reverter o processo.

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Figura 25: A história acaba com Franjinha ressaltando a importância de se reaproveitar coisas no dia a dia.

1ª Lei da Termodinâmica

Comece a aula a partir do título da HQ. Indague aos alunos o que

eles entendem da palavra transformar. Por que a historinha se chama

transformando? Eles dirão que é por que Cascão transformava brinquedos em

outros. Entretanto saliente que nos “novos” brinquedos ainda estava presente

parte da matéria prima dos primeiros, como no quadro do carrinho de boneca

transformado em penteadeira e do triciclo transformado em robô-bicicleta,

mostrado abaixo:

Figura 26: Exemplo de transformação mantendo-se a matéria prima dos materiais

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Aproveite a fala de Franjinha, destacada no quadro ao lado, para

ressaltar que não só os cientistas transformam coisas o tempo todo, isto é,

manipulam a matéria, mas a própria natureza também o faz.

Como é sabido dos alunos, visto em séries anteriores, através da Lei

de Lavoisier, que na Natureza nada se cria, nada se perde, tudo se transforma,

podemos pensar não em termos de massa, como supôs o pai da química

moderna, mas em termos de energia e assegurar que a energia total do

universo se conserva, mesmo sofrendo varias transformações.

Pergunte aos alunos de onde vem a energia luminosa da lâmpada

que está na sala. Após a resposta, pergunte de onde vem a energia elétrica

nos fios e assim sucessivamente, procurando chegar na potencial gravitacional

e na solar como fonte primária da energia na Terra. Argumente com eles que

as energias se transformaram, não integralmente como discutiremos mais

tarde, e que é possível inferir que a soma de todas as parcelas transformadas é

igual ao produto inicial da fonte energética.

Explique para os alunos que a conservação da energia faz parte de

uma das leis da física, a 1ª Lei da Termodinâmica a qual foi finalizada com o

experimento de joule do equivalente mecânico do calor.

Mostre através de projetor ou desenhe a imagem abaixo a fim de

explicar aos alunos como se deu o desenvolvimento da evolução do conceito

de calor que culminou na primeira lei. A intenção de James Prescott Joule era

verificar se existia alguma relação entre calor, e energia mecânica e, caso

Figura 27: Franjinha ressaltando que os cientistas transformam coisas sempre.

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existisse, medir a quantidade de calor equivalente à energia mecânica

produzida.

O calor até então era concebido como um fluido material chamado

de calórico que verteria do corpo de maior temperatura para o de menor

temperatura. Aquele que receberia calor deveria ficar, portanto mais pesado,

uma vez que receberia fluido e aquele que doaria deveria ficar mais leve, além

de só poder doar em uma quantidade finita visto que se algo contém fluido e o

doa, não pode fazê-lo infinitamente. Seria como imaginar um recipiente

fechado de onde se tira água sem repô-la e nunca seca. Este tipo de raciocínio

levou pesquisadores contemporâneos de Joule, como conde de Rumford e

Julius Mayer a questionarem a teoria do calórico.

O aparato experimental de Joule tinha a finalidade de verificar a

equivalência entre energia mecânica e calor. Quando os pesos desciam de

uma altura h fazendo girar as paletas dentro de um recipiente com água,

verificava-se, por meio de um termômetro que ocorria variação de temperatura.

Joule conseguiu calcular quanto de caloria a água estava absorvendo e quando

de energia potencial gravitacional os pesos estavam perdendo. A parcela de

Figura 28: experimento utilizado por Joule para encontrar o equivalente mecânico do calor.

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energia mecânica não conservada só poderia estar indo para a água em forma

de caloria que Joule chegou à relação aproximada de 1 cal = 4,2 Nm (J).

Em outras palavras e em linguagem moderna podemos escrever que

a quantidade de calor (Q) absorvida pela água é igual ao trabalho (W) realizado

pelos pesos mais a variação da energia interna (U) das moléculas de água:

Q = W + U

Note que nesta equação simples está demonstrado o princípio de

conservação e transformação da energia. De um lado da igualdade tem-se a

energia térmica recebida pelo fluido, do outro lado da igualdade a origem dessa

energia mais a parcela de energia química representada pela energia interna

das moléculas. Ou seja, o calor estava vindo do trabalho realizado pelos blocos

em movimento, da energia mecânica dos mesmos.

A intenção deste trabalho é utilizar a HQ para iniciar o estudo de

física térmica, não pretendemos aqui aprofundar o conteúdo nas minúcias do

cálculo que envolvem a primeira Lei. Aconselhamos o professor a fazê-lo em

outro momento, pois uma vez que o interesse dos alunos ao novo

conhecimento já foi despertado, ficará mais fácil aplicar a Primeira Lei às

máquinas térmicas e às transformações gasosas.

2ª Lei da Termodinâmica

Vamos construir agora uma linha de raciocínio para iniciarmos o

estudo da 2ª Lei da termodinâmica.

Uma forma de resgatar a atenção dos alunos para o enredo da HQ é

perguntá-los em que momento os amigos de Cascão começaram a ficar

contrariados com ele? Note que a confusão começou quando queriam desfazer

a transformação. Recupere estas informações através dos quadros seguintes,

releia os diálogos com os alunos e questione sobre a possibilidade de fazer

algo que foi transformado voltar a ser o que era, exatamente igual.

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Figura 29: Dudu e Cebolinha exigem que o processo seja revertido, fato que contraria a 2ª Lei da Termodinâmica.

1) Quando Dudu e Cebolinha quiseram seus brinquedos como antes, qual

foi a resposta de Franjinha?

“quando se transforma uma coisa é quase impossível ela voltar ao que

era antes!!”,

“um omelete pode voltar a ser um ovo?!”

“O papel pode voltar a ser árvore?!”

2) Apesar de a energia se conservar, após uma transformação eu consigo

obter toda a energia que existia antes da transformação?

A 2ª Lei da termodinâmica vem estabelecer como as transformações

ocorrem e impor um sentido para o fluxo de energia.

Relembre com os alunos que apesar de a 1ª Lei da Termodinâmica

garantir que a energia total do universo se conserva, a 2ª Lei estabelece que a

energia não se conserva do mesmo jeito, porém que nas sucessivas

transformações sempre resultará uma parcela de energia não aproveitada. A

energia química do combustível que o carro transforma em energia mecânica

(trabalho) também gera calor nos atritos das engrenagens do motor e com o ar.

A energia elétrica que é transformada em luminosa pela lâmpada também é

transformada em térmica, pois a mesma se aquece liberando calor para o meio

ambiente, chamado de fonte fria em uma máquina térmica.

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Portanto uma das formas de enunciar a 2ª Lei da Termodinâmica

pode ser dizendo que é impossível retirar energia de uma fonte e

transformá-la integralmente em trabalho, isto é, em outro tipo de energia

sem que haja desperdício. Tanto melhor será a transformação quanto menor

for o desperdício, em outras palavras, quanto menos a máquina térmica

desperdiçar energia para a fonte fria, maior será a sua eficiência ou

rendimento.

Explique para os alunos que o rendimento (𝜂) pode ser entendido

como um balanço energético, uma taxa de energia aproveitada, chamada de

trabalho ou energia útil (W), em relação à energia total disponível (Q), daí

podermos escrever

𝜂 =𝑊

𝑄

Ora, fica evidente que, se em toda transformação sempre há

desperdício, então o trabalho (W) será sempre menor que a energia total (Q), o

que nos leva a concluir que 0 ≤ 𝜂 < 1, ou seja, o rendimento nunca será 100%,

corroborando o estabelecido pela 2ª Lei da Termodinâmica.

Desta maneira pode-se iniciar o conceito de entropia como uma

tendência de a energia ir para um estado de menor qualidade ou maior

desordem, do ponto de vista atômico. Uma fruta evolui de verde para madura e

apodrecida, não o contrário. A energia quando se transforma espontaneamente

de uma forma em outra, sempre será para um estado de maior desordem,

nesse sentido dizemos que a entropia está aumentando. Ninguém evolui da

velhice para a juventude, mesmo que aparentemente pareça mais jovem.

Fica a cargo do professor em outra aula aprofundar as discussões

da 2ª Lei da Termodinâmica e aplicá-la aos motores a diesel, álcool e gasolina,

explicar sobre o ciclo de Carnot etc. Nesse primeiro momento tivemos o

interesse em iniciar as discussões que suscitariam debates mais profundos.

Esta aula ocorreu em dois horários de 50 minutos cada e após essas

discussões foi distribuído aos alunos um questionário discursivo para

aprimoramento de conteúdo.

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Exercícios para retomada de conteúdo

1) João Pedro, físico e poeta, em seu livro de realismo fantástico, “Os sonhos de Alice”, brinca com a implacável tendência do universo à desordem, tendência essa que permite distinguirmos o passado do futuro. Para isso, João Pedro nos convida a imaginar um filme de um ovo quebrando sendo passado de trás para a frente. Uma pessoa desinformada, ao entrar na sala nesse exato momento e vir pedaços de casca e gema se juntando para formar um ovo, vai entender na hora que o filme está sendo passado de trás para a frente. Isso ocorre porque, quando o filme é apresentado do futuro para o passado, a tendência natural do ovo se inverte. Explique, do ponto de vista da termodinâmica, por que parece ser impossível que as cascas quebradas voltem a ser ovo.

Resposta: do ponto de vista da 2ª Lei da Termodinâmica, é impossível se

caminhar do estado de maior desordem para o estado de maior ordem. Em processos naturais

a entropia é sempre crescente.

2) O trecho grifado no poema ao lado faz referência a uma importante lei da física. Cite essa lei e explique o seu significado.

Resposta: a 2ª Lei da

Termodinâmica estabelece que é impossível uma

máquina retirar calor de uma fonte e transformá-

lo integralmente em trabalho, sem que haja

desperdício.

3) Muitos já devem ter assistido ao famoso filme “O Curioso Caso de Benjamin Button”, no qual é contada a história de uma criança que nasceu com a aparência de um velho, fazendo com que muitos acreditem que ela viverá pouco tempo, mas a cada ano que passa ela fica mais nova, deixando todos perplexos. A história contada no filme é ficção e viola a 2ª Lei da termodinâmica. Explique por que?

Dilatação do Tempo

Amar para sempre parece tão impalpável quanto o comprimento do infinito. Como acreditar nas declarações de eternidade Se tudo está em movimento, Se a vida é dinâmica. A máquina do amor desperdiça energia à medida que funciona. É a lei. Diante da impossibilidade de prever, Da imprevisibilidade do tempo É melhor amar em ciclos Aumentando o rendimento do tempo.

Franklin Ramos

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4) (Enem) A invenção da geladeira proporcionou uma revolução no

aproveitamento dos alimentos, ao permitir que fossem armazenados e transportados por longos períodos. A figura apresentada ilustra o processo cíclico de funcionamento de uma geladeira, em que um gás no interior de uma tubulação é forçado a circular entre o congelador e a parte externa da geladeira. É por meio dos processos de compressão, que ocorre na parte externa, e de expansão, que ocorre na parte interna, que o gás proporciona a troca de calor entre o interior e o exterior da geladeira.

Nos processos de transformação de energia envolvidos no funcionamento da geladeira,

a) a expansão do gás é um processo que cede a energia necessária ao resfriamento da parte interna da geladeira.

b) o calor flui de forma não espontânea da parte mais fria, no interior, para a mais quente, no exterior da geladeira.

c) a quantidade de calor cedida ao meio externo é igual ao calor retirado da geladeira.

d) a eficiência é tanto maior quanto menos isolado termicamente do ambiente externo for o seu compartimento interno.

e) a energia retirada do interior pode ser devolvida à geladeira abrindo-se a sua porta, o que reduz seu consumo de energia.

Resposta: o calor é transmitido espontaneamente do corpo de maior temperatura para o de menor temperatura. Já nos refrigeradores acontece o inverso de modo forçado, ou seja, o calor flui de forma não espontânea da parte mais fria, no interior, para a mais quente, no exterior da geladeira. Letra b.

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Anexo B A Lei do Gato. HQ onde Franjinha faz experimentos para investigar

por que o pão com manteiga sempre cai com a manteiga virada para baixo.

Esta HQ está como material extra, fora do eixo Física Térmica, como sugestão

para o professor se quiser expandir esta metodologia de ensino com outros

assuntos e outra série, por exemplo.

Aqui sugerimos ao professor que utilize esta HQ para discutir com os

estudantes a metodologia de pesquisa e investigação da ciência, procurando

demonstrar que uma Lei física nasce, comumente, de um modelo que procura

reproduzir com maior aproximação possível, o fenômeno observado na

natureza.

Figura 30: A Lei do Gato. Magali questiona por que a manteiga sempre cai virada para baixo no pão com manteiga.

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Figura 31: A Lei do Gato. Franjinha é procurado por Magali para solucionar o dilema do pão com manteiga.

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Figura 32: A Lei do Gato. Franjinha planeja um experimento confrontando a tendência do gato cair com as patas viradas para o chão com a tendência da manteiga no pão cair virada para o chão.

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Figura 33: A Lei do Gato. Franjinha expõe os detalhes e a vantagem de se fazer o experimento.

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Figura 34: A Lei do Gato. Mingau participando do experimento

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Figura 35: A Lei do Gato. Franjinha percebe que o experimento não saiu como previsto pois o gato comeu o pão.

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Figura 36: A história é finalizada com Franjinha servindo macarrão à Magali.

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Anexo C Do Contra e a bola. Nesta história o professor pode iniciar uma

discussão sobre movimento relativo e referencial, uma vez que nos dois

primeiros quadros têm-se uma bola girando em relação aos personagens que a

equilibra em seu próprio dedo indicador e no último quadro é mostrada uma

bola parada em relação ao ambiente com o personagem girando ao seu redor.

Quem está girando? Cascão ou a bola? Em relação ao que? No

caso do último quadrinho, Do Contra está mesmo girando em relação à bola?

Existe algum referencial no qual a bola giraria em torno de Do Contra?

Questionamentos como esses podem ser discutidos e respondidos a partir

dessa HQ, por isso a disponibilizamos para o professor como um recurso a

mais que ele pode explorar com outra série, inclusive.

Figura 37: No referencial da bola, Do Contra gira em torno dela.