O DIA ALAGOAS - Campus 06

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CULTURA CULTURA CULTURA CULTURA CULTURA CULTURA CULTURA CULTURA CULTURA Alagoas l 4 a 10 de maio I ano 02 I nº 062 l 2014 l redação 82 3023.2092 I e-mail [email protected] CAMPUS CAMPUS CAMPUS CAMPUS Dois dedos de prosa A temática negra foi parca- mente estudada em Alagoas, especialmente em face do viés iberista, que esteve presente nos que inauguraram os estudos da área social do estado, especialmente os folclo- ristas. Não é hora de detalhar e pontuar a história do pensa- mento social em Alagoas, o que faremos em algum dos textos que publicaremos ao longo deste suplemento. Faz tempo, chamamos a atenção para este viés, incapaz de produzir sobre o negro, salvo como ressonân- cia da história branca. Especialmente na medida em que se tem a ideia de movi- mento negro, é que a temática vai sendo trabalhada. Condi- ções da história negra emer- gem claramente e assumem posição de relevo na preocu- pação acadêmica. Existem alguns momentos centrais, como a tese de Ulisses Rafael, trabalhos de Bruno César Cavalcanti, alguma coisa deste pobre escriba que vos fala e, sobretudo, passos em direção ao resgate de memória e defesa pública, especialmente da reli- gião. É assim que reaparece o Maracatu em outro contexto e isto é trabalhado pelo Cadu, jovem pesquisador, ainda fazendo seu mestrado, mas que mostra, em seu traba- lho de conclusão de curso, a sua grande vocação para a pesquisa. Vamos ler e discutir seu texto; ele não somente se debruça a escrever; é partici- pante de todo uma ordem de manifestações culturais que se fazem em Maceió. Luiz Sávio de Almeida Aqui, abril de 2014 F ormado em Ciências Sociais pela UFAL com a defesa da monografia “A Reinvenção do Maracatu em Alagoas no Século XXI”. Atualmente é mestrando em Antropologia pela UFS, pesquisando o tema do maracatu em Alagoas. É Músico e membro do Maracatu Coletivo AfroCaeté, desde 10 de fevereiro de 2009. Percussionista da banda Dona Maria. Como Produ- tor Cultural, realizou São João 2013 Forró dos Mercados, Ano Novo Polo Clima Bom, Carnaval Alternativo 2014, venceu editais: Teatro Deodoro, Quintas noArena, blocos de carnaval 2014 com o Bloco SURURU na Lama. É o organizador do FEMUFAL, analista de projetos culturais, consultoria, elaboração, gerenciamento e coordenação de editais culturais. Cadu Ávila Quem é quem? A REINVENÇÃO DO MARACATU EM ALAGOAS NO SÉCULO XXI Rodrigues

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Alagoas l Ano 2 | 4 a 10 de maio | 2014. Campus é o caderno de cultura de O DIA ALAGOAS.

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CULTURA CULTURA CULTURA CULTURA CULTURA CULTURA CULTURA CULTURA CULTURA

Alagoas l 4 a 10 de maio I ano 02 I nº 062 l 2014 l redação 82 3023.2092 I e-mail [email protected]

CAMPUSCAMPUSCAMPUSCAMPUS

Dois dedos de prosa

A temática negra foi parca-m e n t e e s t u d a d a e m

Alagoas, especialmente em face do viés iberista, que esteve presente nos que inauguraram os estudos da área social do estado, especialmente os folclo-ristas. Não é hora de detalhar e pontuar a história do pensa-mento social em Alagoas, o que faremos em algum dos textos que publicaremos ao longo deste suplemento. Faz tempo, chamamos a atenção para este viés, incapaz de produzir sobre o negro, salvo como ressonân-cia da história branca.

Especialmente na medida em que se tem a ideia de movi-mento negro, é que a temática vai sendo trabalhada. Condi-ções da história negra emer-gem claramente e assumem posição de relevo na preocu-pação acadêmica. Existem alguns momentos centrais, como a tese de Ulisses Rafael, trabalhos de Bruno César Cavalcanti, alguma coisa deste pobre escriba que vos fala e, sobretudo, passos em direção ao resgate de memória e defesa pública, especialmente da reli-gião.

É assim que reaparece o Maracatu em outro contexto e isto é trabalhado pelo Cadu, jovem pesquisador, ainda fazendo seu mestrado, mas que mostra, em seu traba-lho de conclusão de curso, a sua grande vocação para a pesquisa. Vamos ler e discutir seu texto; ele não somente se debruça a escrever; é partici-pante de todo uma ordem de manifestações culturais que se fazem em Maceió.

Luiz Sávio de AlmeidaAqui, abril de 2014

Formado em Ciências Sociais pela UFAL com a defesa da monografia “A Reinvenção do Maracatu em Alagoas no Século XXI”. Atualmente é

mestrando em Antropologia pela UFS, pesquisando o tema do maracatu em Alagoas. É Músico e membro do Maracatu Coletivo AfroCaeté, desde 10 de fevereiro de 2009. Percussionista da banda Dona Maria. Como Produ-tor Cultural, realizou São João 2013 Forró dos Mercados, Ano Novo Polo Clima Bom, Carnaval Alternativo 2014, venceu editais: Teatro Deodoro, Quintas no Arena, blocos de carnaval 2014 com o Bloco SURURU na Lama. É o organizador do FEMUFAL, analista de projetos culturais, consultoria, elaboração, gerenciamento e coordenação de editais culturais.

Cadu ÁvilaQuem

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A REINVENÇÃO DO MARACATU EM ALAGOAS NO SÉCULO XXI

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CAMPUS2 O DIA ALAGOAS l 4 a 10 de maio I 2014

redação 82 3023.2092e-mail [email protected]

CNPJ 07.847.607/0001-50 l Rua Pedro Oliveira Rocha, 424 B - Farol - Maceió - Alagoas - E-mail: [email protected] - Fone: 3023.2092

Para anunciar,ligue 3023.2092

EXPEDIENTE Eliane PereiraDiretora-Executiva

Deraldo FranciscoEditor-Geral

Flávio NobreDiretor Comercial

L. Sávio de AlmeidaCoordenador

Luhanoa RochaArticulação

Francisco RibeiroCotidiano

Cícero RodriguesIlustração

Jobson PedrosaDiagramaçãoODiaAlagoas

Em nosso Estado, pode-mos pensar um traço sócio--histórico para o maracatu divido basicamente em três momentos, extraídos da obser-vação dos documentos e textos aos quais tive acesso até o fim da pesquisa para a construção de um texto monográfico, em 2011.

O primeiro momento é a existência antes do Quebra de Xangô de 1912, que foi evento aterrorizante de perseguição aos Terreiros de Xangô da pequena cidade de Maceió, no inicio do século passado. Nossa afirmação tem a base nos estudos de Ulisses Neves (2012) e de Cavalcanti (2010), antropólogos contemporâ-neos, e também no folclorista dos meados do século XX, Duarte (1975) , que relata em seu catálogo da Coleção Perse-verança, os fatos da persegui-ção que sofreu Tia Marcelina dentro de sua casa de Xangô, na ocasião do Quebra. Os grupos que praticavam os toques nos xangôs e nos locais festivos profanos foram obri-gados, pela força das armas, a pararem de exercer suas ativi-dades ritualísticas e brincan-tes. Assim sendo, os maracatus possivelmente pararam seus tambores após o Quebra. Outro fato interessante que acontece até os anos de 1911 é o apareci-mento de mestres de maracatu na literatura de jornais do perí-odo, um deles é Manoel Inglês, líder de um grupo e de festas na cidade, também é braço direito do então Governador Eucli-des Malta, que foi símbolo e motivador das perseguições aos terreiros. Essa associação entre o governador e os grupos da época pode ter ajudado ao arrefecimento dessa expressão de cultura popular.

Ao ler o livro de Ulis-ses Neves intitulado ‘Xangô Rezado Baixo’ (2012), uma passagem chama-me muita atenção e ajuda a pensar na

análise do período pós-Quebra de Xangô. Para onde foram os maracatus e terreiros? Deixam de tocar os tambores por medo da perseguição? O referido autor afirma que os tambores saíram dos rituais, mas iniciou--se assim a modalidade ‘xangô rezado baixo’, vejamos:

“A essa altura, já não mais se ouviam os atabaques na cidade, ausentes, inclusive, da exposição realizada na rua Pernambuco Novo . Depois disso nunca, mais se teve notí-cia da presença de maracatus nos carnavais de Maceió; seus mestres, confundidos não sem razão, com os babalori-xás dos terreiros perseguidos, já não se encontravam mais na cidade. A grande maioria buscou refúgio nos estados vizinhos e até em locais mais distantes, como a Bahia e o

Rio de Janeiro. As manifesta-ções populares integradas por negros passaram a ser vistas com certa desconfiança, prin-cipalmente os xangôs, os quais continuaram a ser desenvolvi-dos pelos poucos remanes-centes daquelas antigas casas, que insistiram em permane-cer no local mantendo suas atividades religiosas; mais por temerem as punições dos orixás que as das autoridades policiais. Resultou daí essa nova modalidade de rito mais discreta, reservada e sem a exuberância de outrora, a qual se convencionou chamar de ‘Xangô rezado baixo’, assim denominado por dispensar o uso de tambores e zabumbas.” (2012: 42-43)

Com a explicação de Ulis-ses Neves (2012), entendemos claramente que o período do

xangô rezado baixo, em essên-cia, foi o momento de saída dos tambores do estado de Alagoas, motivados, principalmente, pela repressão que o Quebra gerou e que o novo gover-nador da época, Fernandes Lima, que antes era opositor de Euclides Malta, legitimava. O medo das autoridades poli-ciais é claro na citação acima, e que a forma de resistência era o silêncio nos rituais. Porém, para os maracatus, que eram expressões profanas de parte da religião, e portanto carna-valescas, naquele período, não fazia sentido sua existência sem tambores.

A perseguição às Casas de Xangô foi tamanha que, no Centenário do Quebra, em 2012, o Governo de Alagoas pediu desculpas aos terreiros publicamente em um grande

ato político na Praça dos Martírios, um dos roteiros do Quebra. Com as atividades de celebração do Centenário do Quebra, muitas perguntas surgiram sobre os maracatus alagoanos, entre elas a de sua existência antes do Quebra e sua relação com o mesmo para o desaparecimento da expres-são cultural. Além de ser um fato, sem dúvidas, o ataque aos terreiros foi uma razão fortíssima para a diminuição das atividades carnavalescas ligadas aos xangôs da cidade, essas questões se transforma-ram em objeto de pesquisa no Mestrado de Antropologia.

Os maracatus só reapare-cem em 1940, quase trinta anos após o episódio do Quebra e serão narrados pelos folclo-ristas alagoanos depois da metade do século passado.

Traço sócio-histórico

Cadu Ávila

Mú s i c a e d a n ç a . D e s t a

forma, busquei entender os grupos de cultura popu-lar que conhecemos como Maracatu. Construído entre a dança e a música, neste segundo (ritmo), é uma das manifestações artísticas e culturais mais ricas do país, com uma diversidade infin-dável de baques, podendo ser desenvolvido como mara-catu de orquestra (rural ou

baque solto) e Maracatu de baque virado (nação), além dos vários grupos percussi-vos e bandas, tal qual Nação Zumbi, que se utiliza da influ-ência direta do Maracatu em composições modernas embaladas pela distorção das guitarras e suas performances nos grandes palcos do Brasil.

Nesse sentido, é possível encontrá-lo em diversos esta-dos e com diferentes forma-ções de ritmos e danças. A dança, no Maracatu nação, por exemplo, é bem represen-tada pela calunga – boneca de

caráter religioso que compõe o corpo de dançantes – que é parte integrante do cortejo real no desfile para mostrar a cidade e ao carnaval a beleza desta cultura popular. Já seu ritmo feito pelos batuquei-ros e/ou Maracatuzeiros utiliza-se de Agogôs, Gongês, Xequerês e/ou Abê, Alfaias e Caixas, contagiando a todos em longos e animados corte-jos carnavalescos. Com essas características, os grupos envolvem cerca de 50 pessoas em uma apresentação.

“A Reinvenção do Mara-

catu em Alagoas no Século XXI” foi o tema da monogra-fia para conclusão do curso de Bacharel em Ciências Sociais no ano de 2011. A monogra-fiia está focada na atualidade do maracatu em Alagoas, observando a “reinvenção” depois da oficina ofertada por Wilson Santos em 2007, até a coroação do Maracatu Nação Acorte de Airá, que aconteceu em novembro de 2011. Neste intervalo de tempo, os três maiores grupos que surgiram depois desta oficina, foram: Maracatu Baque Alagoano;

Coletivo AfroCaeté e Mara-catu Nação Acorte de Airá. Em cinco anos de ativida-des, hoje começam a surgir novos grupos e atividades na capital alagoana e também em Penedo,tais como: Mara-catu Nação Raízes da Tradi-ção, Maracatodos, Batuque Yá, Projeto Tambores – Penedo/UFAL. Este aspecto da reinvenção demostra a capacidade de criação e potencialidade de reunir pessoas em diversos grupos, nos levando a pensar em uma cena do maracatu.

Coletivo Afro-Caeté na prévia carnavalesca de 2014

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A ideia de reinvenção do maracatu nasceu da leitura do livro ‘Invenção das Tradições’, formação de Eric Hobsbawm e Terence Ranger (2012), onde definem e estudam e as tradi-ções. Uma problemática que o primeiro autor, Hobsbawm, trabalha em diversos espaços e utiliza-se dos estudos sobre Estado Nação para identificar como estão sendo formadas as identidades nacionais e, por consequência, suas tradi-ções. Para Eric (2012, p.16): “Em suma, inventam-se novas tradições quando ocorrem transformações suficiente-mente amplas e rápidas tanto do lado da demanda quanto da oferta”. E foi o que aconte-ceu com o maracatu na cidade. Rapidamente após a oficina do ritmo, se modificou a oferta e a demanda do consumo do maracatu, houveram mudan-ças de comportamento, criação de público, novas atividades e posturas em grandes eventos já existentes na cidade, como o Jaraguá Folia, prévia de carnaval que começou a contar com a presença dos maracatus desde 2009.

A referência ao passado que os grupos assumem é apenas pontual, não se busca a volta ou retorno do que exis-tia há cem anos. Liga-se a uma linha temporal mais no intuito de legitimidade e construção de identidade cultural a ser valorizada entre a população, e nesse sentido, identifica-se perfeitamente com as ideias de invenção do autor, pois: “Consideramos que a invenção de tradições é essencialmente um processo de formalização e ritualização, caracterizado por referir-se ao passado, mesmo que apenas pela imposição da repetição.” (2012: 15). Ora, e assim não estamos vendo os grupos se apresentarem e

participarem da construção do carnaval, ou prévia, da cidade, como também de eventos durante o ano todo que se repe-tem sempre com o argumento de que é tradição realizá-los, estamos diante de uma inven-ção, que prefiro chamar de Re-invenção, pois, a expressão encontra-se em uma terceira fase de aparecimento na cena cultural local.

A apropriação das perfor-mances dos ritmos afro-alago-anos, mais especificamente o maracatu, pelos diferentes grupos, geram diferentes signi-ficados, oriundos, obviamente, da forma de ver o mundo que cada grupo adota para si. Não representando neces-sariamente formas opostas ou conflitantes, apenas apre-sentando a sua nova cara na atualidade e possibilidades de expansão para todo o Estado. As identidades expressas em apresentações e características de formação social demostram uma grande potencialidade do maracatu neste novo período, que não cabe aqui neste espaço, nem por minha humilde pessoa, alavancar tal debate. Como relata Hobsbawm:

“Não nos cabe analisar aqui até que ponto as novas tradições podem lançar mão de velhos elementos, até que ponto elas podem ser forçadas a inventar novos acessórios ou linguagens, ou ampliar o velho vocabulário simbólico”. (Hobsbawm, 2012: 19)

Logo, essas novas tradi-ções inventadas no século XXI para o maracatu em Alagoas estão livres para serem novas, criarem e recriarem ativida-des e elementos que acrescen-tem à cultura local, nascendo dela talvez um sentimento de pertença novo, que possibilite várias gerações se utilizarem dessa expressão cultural.

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A Reinvenção do Maracatu

Maracatu Nação A Corte de Airá

Maracatu Baque Alagoano

Maracatu Nação A Corte de Airá

O segundo momento encontra-se nos estudos de Brandão (1982) e Duarte (1975), que, durante os meados de 1950 até o fim de 1970, apresen-taram textos sobre a expressão aqui estudada. Em resumo, são reflexões da observação destes intelectuais alagoanos sobre suas infâncias e relatam apre-sentações e grupos de mara-catus pela cidade de Maceió. Descreveram também o fim destas apresentações no perí-odo. O estudo dos dois autores revela muito do debate sobre a origem do maracatu como expressão cultural no Brasil, as fusões com outras modalidades de cultura como as congadas e coroações de reis realizadas em épocas natalinas nas cidades do Nordeste. Duarte (1975), por exemplo, chega a narrar o fim do gênero popular em seu livro, ‘O folclore negro das Alagoas – áreas da cana-de-açúcar pesquisa e interpretação’, da seguinte forma: “Desapareceu de vez do carnaval alagoano o maracatu” (2010: 351). Sua afir-mação está ligada ao momento vivenciado tanto na cultura como as definições e deriva-ções de conceitos folcloristas

adotados pelo autor, tornando legítima e rica fonte de informa-ções seus textos para os estu-diosos da atualidade. E assim, o maracatu mais uma vez, some do cenário alagoano e de nosso carnaval.

E, por fim, o terceiro momento, o que poderia ser entendido como a volta, iden-tifico como a ‘Reinvenção do Maracatu em Alagoas no século XXI’ , que acontece depois da oficina do ritmo em 2007. A “reinvenção”, diferente do que se pensava inicialmente, não foi diretamente ligada aos aconteci-mentos culturais com Pernam-buco. Talvez o clima de sucesso provocado através do grupo pernambucano Nação Zumbi, na década de 1990, possa ter criado condições de identifica-ção entre a juventude de Alagoas e o ritmo do maracatu, de certo aspecto formando público.

Porém, o passo inicial para o novo momento foi o convite de facilitar uma oficina de percus-são no Festival de Música do Ceará, atividade em nível de Nordeste, recebido pelo percussionista Wilson Santos. A estadia em Fortaleza permi-tiu a Wilson quebrar com o que

ele chamava de “bairrismo” , pois se deparou com uma cena percussiva grande em fortaleza que estava diretamente ligada ao maracatu. Suas indagações a Marcelo Santos, liderança desse movimento na cidade, sobre os ritmos do Ceará e por que tocar algo de fora foram importan-tes e criaram as condições para fazer algo em Alagoas com o ritmo. Passado o evento, reali-zou a oficina de percussão com o ritmo do maracatu em Maceió, que contou com a inscrição de cerca de 40 pessoas. A movi-mentação chamou a atenção pela diversidade de origens sociais e pela capacidade de se “re-inventar”. Após a realiza-ção da oficina, nasceu o “Grupo Percussivo Baque Alagoano”, que posteriormente mudou de nome para “Maracatu Baque Alagoano”. Dois anos após o surgimento do Baque, nasceu o segundo grupo desta nova fase, o Coletivo AfroCaeté, um tipo de dissidência em relação ao primeiro grupo. Em junho do mesmo ano, 2009, nasceu o Maracatu Nação A Corte de Airá, com sede no bairro do São Jorge, especificamente na Grota do Arroz.

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Na época da oficina, a conjuntura era de dispersão entre aqueles que fazem a percussão em Alagoas, moti-vada por falta de organização dos músicos, como também por pouca ou quase nenhuma política pública para o setor. Ficando a cargo dos grupos, a luta pela existência, manu-tenção e consolidação de seus espaços, entre esses cami-nhos, diversas identidades foram formadas. Essa busca de significados e identidades define diferenças e pontos em comum entre os grupos que formam o Novo Maracatu Alagoano, como também nos mostrou o processo de “re-invenção” das tradições

dentro dessa modalidade cultural.

O diferencial que suas atividades provocam na cena musical e cultural local é perceptível, desde as primeiras apresentações do Maracatu Baque Alagoano passando pelo cortejo unifi-cado do Coletivo AfroCaeté e do Maracatu A Corte de Ariá na prévia de carnaval em Maceió, até a Coroação de Maracatu Nação Acorte de Airá em 18 de novembro de 2011, nota-se a força e fertilidade que o maracatu carrega no Estado alago-ano. Grupos formados por jovens, com novas formas de vestir e tocar, dançando

animadamente o carnaval e/ou as prévias da cidade. Está na capacidade de realização destes a sua própria força de se “re-inventar”, a cultura e a identidade local também estão sendo reviradas por tais ações, nossa alagoanidade está obtendo novas refe-rências do trabalho cultural percussivo.

Concluo este texto certo que estamos vivenciando um momento histórico para o Maracatu em Alagoas, a “Re-invenção” desta tradi-ção no século XXI, com novas formas, ideias, pessoas, estru-turas etc. Este mesmo Mara-catu “re-inventado” perpassa de uma “circularidade”

particular e interessante que nos mostra o quanto pode--se criar coisas novas sem estar diretamente preso ao passado de forma cristali-zada em algum tipo de tradi-ção. Quando apareceu de um popular, o percussionista Wilson Santos, oferecendo um meio não tradicional – a oficina – para a transmissão dos conhecimentos do Mara-catu, transcendendo origens de conhecimento tradicional passado apenas pela heredi-tariedade. Em outras pala-vras, o maracatu em Alagoas foi “re-inventado” com novas bases sociais, culturais e econômicas, recheado de uma “circularidade” ímpar

mergulhada em parcerias, conflitos e ações coletivas bem sucedidas.

A intenção desse estudo não foi prever o ponto de chegada dos grupos, nem definir segmentações entre estes, seja de percussão ou de dança. Propôs a sistematizar as ideias, concepções, estru-turas sociais, políticas, iden-tidades, impactos e conflitos culturais que envolvem os agentes da cena do maracatu alagoano contemporâneo. Não resta dúvida da força que o Maracatu Alagoano promete apresentar para a próxima década que se apro-xima. Viva a Cultura Popular Alagoana!

A dispersão antes da oficina

BRANDÃO, Théo. Folclore de Alagoas II. Maceió: Edufal, 1982.

CAVALCANTI, Bruno César. Bons e sacudidos: o carnaval negro e seus impasses em Maceió. In BARROS, Rachel R; CAVANCANTI, Bruno C;

FERNANDES, Clara S (Orgs) Kulé Kulé visibilidades negras. Maceió – AL: Edufal, 2006, pp. 26-40.

DUARTE, Abelardo. Folclore Negro das Alagoas: áreas de cana--de-açúcar – pesquisa e interpretação

/ Abelardo Duarte. – 2. Ed. – Maceió: EDUFAL, 2010.

ERIC HOBSBAWM, Terence Ranger (organizadores). A Inven-ção das Tradições. Tradução Celina Cardim Cavalcante. – [Ed. Especial].

– Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2012.

RAFAEL, Ulisses Neves. Xangô rezado baixo: religião e política na primeira república – São Cristóvão: Editora UFS, 2012.

Referências

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