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SERGIO CAMPOS DE ALMEIDA
O AVANÇO DA PRIVATIZAÇÃO NA EDUCAÇÃO SUPERIOR BRASILEIRA: O ProUni como uma nova estratégia para a transferência de recursos públicos para o setor privado.
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Educação da Universidade Federal Fluminense, como requisito parcial para obtenção do Grau de Mestre. Campo de Confluência: Educação Brasileira.
Orientação: Prof.a Dr.a Angela Carvalho de Siqueira
Niterói – RJ
2006
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SERGIO CAMPOS DE ALMEIDA
O AVANÇO DA PRIVATIZAÇÃO NA EDUCAÇÃO SUPERIOR BRASILEIRA: O ProUni como uma nova estratégia para a transferência de recursos públicos para o setor privado.
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Educação da Universidade Federal Fluminense, como requisito parcial para obtenção do Grau de Mestre. Campo de Confluência: Educação Brasileira.
Aprovada em outubro de 2006
BANCA EXAMINADORA
____________________________________________________ Prof.a Dr.a Angela Carvalho de Siqueira – Orientadora
UFF - Universidade Federal Fluminense
_____________________________________________________ Prof.a Dr.a Kátia Regina de Souza Lima UFF - Universidade Federal Fluminense
_____________________________________________________
Prof.a Dr.a Deise Mancebo UERJ - Universidade do Estado do Rio de janeiro
Niterói – RJ
2006
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À minha esposa Rosangela e aos meus filhos, Thayana e Thiago. Responsáveis diretos pela minha determinação na busca da concretização de meus ideais.
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AGRADECIMENTOS
À minha orientadora Angela Siqueira, pela valiosa participação através
de sua competência e dedicação. Sendo diretamente responsável pela
conclusão deste trabalho.
Às professoras Kátia Lima e Deise Mancebo, pelas reflexões críticas na
ocasião da qualificação do projeto que originou esta pesquisa.
Aos professores e funcionários técnico-administrativos envolvidos no
programa de pós-graduação da Faculdade de Educação da
Universidade Federal Fluminense.
Por fim, aos meus pais, que propiciaram condições para que eu tivesse
acesso a educação.
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SUMÁRIO
LISTA DE TABELAS E ILUSTRAÇÕES ................................................. p.6
LISTA DE SIGLAS / ABREVIATURAS ................................................... p.7
RESUMO .................................................................................................... p.9
ABSTRACT ............................................................................................... p.10
1. INTRODUÇÃO ...................................................................................... p.11
1.1 – Breve Histórico sobre a Criação das Universidades .................... p.13
1.2 – Educação Superior no Brasil: uma retrospectiva ......................... p.19
2. A EDUCAÇÃO SUPERIOR BRASILEIRA NO CONTEXTO DA
REFORMA DO ESTADO DOS ANOS 1990 ...................................... p.37
2.1 – Reforma no Campo Educacional .................................................. p.41
2.2 – Um Retrato da Expansão do Setor Privado Através do Censo da Educação Superior .......................................................................... p.57
3. REFORMA DA EDUCAÇÃO SUPERIOR NO GOVE RNO LULA E O
PROGRAMA UNIVERSIDADE PARA TODOS ............................... p.62
3.1 – Aspectos da Reforma da Educação Superior no Governo Lula ... p.63
3.2 – O Programa Universidade para Todos – ProUni .......................... p.77
3.2.1 – Antecedentes do Financiamento Público ao Setor Privado: Creduc, Fies e as Isenções Fiscais e Previdenciárias ............. p.79
3.2.2 – O ProUni como Novo Instrumento de Transferência de
Recursos Públicos para o Setor Privado ................................ p.86
4. CONCLUSÃO .................................................................................... p.106 5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................ p.117
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LISTA DE TABELAS E ILUSTRAÇÕES
TABELA I - Número de Instituições de Educação Superior, por Categoria
Administrativa - 1992 – 2002 .................................................................... P.58
GRÁFICO I - Comparação entre o número de vagas oferecidas e ociosas de
acordo com a categoria administrativa ....................................................... P.97
TABELA II - Alíquotas e Base de Cálculo dos Tributos Federais por
Categoria de IES ........................................................................................ P.99
QUADRO I - Paralelo entre o Projeto de Lei, a MP 213/04 e a Lei 11.096 que
instituiu o ProUni ..................................................................................... P.111
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LISTA DE SIGLAS / ABREVIATURAS
ABMES – Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior ABI – Associação Brasileira de Imprensa ABRUC – Associação Nacional das Universidades Comunitárias ANAFI – Associação Nacional de Faculdades e Institutos Superiores ANDES – Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior ANDIFES – Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior ANECEU – Associação Nacional dos Centros Universitários ANPEd – Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação ANUP – Associação Nacional das Universidades Particulares BID – Banco Interamericano de desenvolvimento BIRD – Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento BM – Banco Mundial C&T – Ciência e Tecnologia CAPES – Fundação Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior CEA – Comissão Especial de Avaliação CF – Constituição Federal CNBB – Conferência Nacional dos Bispos do Brasil CNE – Conselho Nacional de Educação CFE – Conselho Federal de Educação CNAS – Conselho Nacional de Assistência Social CNPq – Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico COFINS – Contribuição Social para Financiamento da Seguridade Social CONAES – Comissão Nacional de Avaliação da Educação Superior CPMF – Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira Creduc – Crédito Educativo CRUB – Conselho de Reitores das Universidades Brasileiras CSLL – Contribuição Social sobre o Lucro Líquido EAD – Educação à Distância ENADE – Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes ENC – Exame Nacional de Cursos ENEM – Exame Nacional do Ensino Médio FHC – Fernando Henrique Cardoso Fies – Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior FMI – Fundo Monetário Internacional FNDE – Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação FUB – Fundação Universidade de Brasília FUNDEF – Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valorização do Magistério GTI – Grupo de Trabalho Interministerial IES – Instituições de Ensino Superior IFES – Instituições Federais de Ensino Superior Inep – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira INSS – Instituto Nacional de Seguridade Social IPM – Inquérito Policial Militar IPTU – Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana
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IRPJ – Imposto sobre Renda e Proventos de Qualquer Natureza ISS – Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza ITA – Instituto Tecnológico da Aeronáutica ITR – Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural LDB – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional MARE – Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado MEC – Ministério da Educação MCT – Ministério de Ciência e Tecnologia MP – Medida Provisória NTE – Núcleo de Tecnologia Educacional OAB – Ordem dos Advogados do Brasil PAIUB – Programa de Avaliação Institucional das Universidades Brasileiras PARU – Programa de Avaliação da Reforma Universitária PEC – Proposta de Emenda Constitucional PFL – Partido da Frente Liberal PIB – Produto Interno Bruto PICD – Programa de Incentivo à Capacitação Docente e Técnica PIS – Programa de Integração Social PL – Projeto de Lei PMDB – Partido do Movimento Democrático Brasileiro PNE – Plano Nacional de Educação PPA – Plano Plurianual PPP – Parcerias Público-Privadas PROINFO – Programa Nacional de Informática na Educação ProUni – Programa Universidade para Todos PSDB – Partido da Social Democracia Brasileira PT – Partido dos Trabalhadores PUC – Pontifícia Universidade Católica SBPC – Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência SEED – Secretaria de Educação à Distância SEMESP – Sindicato das Entidades Mantenedoras de Ensino Superior do Estado de São Paulo SESu – Secretaria de Educação Superior SINAES – Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior UDF – Universidade do Distrito Federal UERJ – Universidade do Estado do Rio de Janeiro UFF – Universidade Federal Fluminense UFMG – Universidade Federal de Minas Gerais UFRJ – Universidade Federal do Rio de Janeiro UFRRJ – Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro UnB – Universidade de Brasília UNE – União Nacional dos estudantes UNESCO – Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura UNICAMP – Universidade Estadual de Campinas Unip – Universidade Paulista USAID – Agência para o Desenvolvimento Internacional do Departamento de Estado dos Estados Unidos da América USP – Universidade de São Paulo
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RESUMO
Através de uma pesquisa bibliográfica, foi abordada a criação do Programa Universidade para Todos – ProUni como uma nova forma de transferência de recursos públicos para as instituições de educação superior de caráter privado. O pano de fundo foi a reforma do Estado e da educação superior brasileira implementada a partir do início dos anos 1990, que em consonância com as diretrizes de organismos internacionais, em especial do Banco Mundial, continuam sendo os alicerces da Reforma Universitária do governo Lula, ora em curso. Atualmente a educação superior brasileira – que já teve como forma organizacional a universidade com predominância de instituições públicas – apresenta uma variedade de formas organizacionais e de oferta de cursos em institutos isolados. Essa caracterização da educação superior no Brasil foi proveniente de políticas educacionais que buscavam favorecer a grupos privados. Políticas essas preconizadas, com grande intensidade, pelas idéias de “privatização, publicização e terceirização” que foram utilizadas para nortear a delimitação do Estado, sobretudo no período correspondente aos dois mandatos de FHC. A enorme expansão do setor privado na educação superior brasileira neste período, evidenciada neste trabalho através da análise dos dados do Censo da Educação Superior, conjugada com o aumento do desemprego e achatamento salarial, provocou um crescimento significativo de inadimplência e vagas ociosas nas instituições de educação superior privadas. Este fato, associado à procura por ensino superior das camadas de baixa renda, incentivada pela grande propaganda da educação como principal fator de ascensão social, virá então fundamentar a proposta do MEC de estatização de vagas nas instituições particulares, em troca da renúncia fiscal. Como uma operação de salvamento para o setor privado, apesar de mascarado por um discurso demagógico de “democratizar” o acesso ao ensino superior, o governo Lula implementou o ProUni. Além de relacionar o ProUni com outras formas de transferência de recursos públicos através de fontes diretas e indiretas para as instituições privadas de educação superior, a considerar Creduc, Fies e renúncias fiscais e previdenciárias, esta pesquisa também associou o Programa Universidade para Todos com alguns aspectos da Reforma Universitária, com a Lei de Inovação Tecnológica e com o decreto que regulariza as fundações de apoio, contextualizando-o como corolário das Parcerias Público-Privadas na educação superior brasileira. Em termos conclusivos foi possível inferir que o governo Lula vem colocando em andamento um projeto de reforma da educação superior que deixa claramente especificado duas estratégias: desobrigar o Estado no financiamento das universidades públicas criando mecanismos para que estas captem recursos junto ao “mercado” e criar mecanismos que permitam a transferência de recursos públicos direta ou indiretamente para as instituições de ensino superior privadas.
Palavras-chave : Educação Superior Reforma Educacional ProUni
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ABSTRACT
Using a bibliographical research this master thesis studied the creation of the University for All Program – ProUni (from its Portuguese acronym - Programa Universidade para Todos), dealing with this program as a new way of transferring public monies to private higher education institutions. The background of this study was the State Reform and higher education reforms implemented since the early 1990s, both attuned with multilateral institutions guidelines, in special the World Bank, and that continued to be the basis of higher education Reform within Lula’s government. Currently, Brazilian higher education – which already had the University as its main organizational model – presents a variety of organizational models and courses within non-university type institutions. This Brazilian higher education’s feature came from educational policies aiming to benefit private providers. The referred policies were supported by “privatization, responsiveness and partnership’s ideas” that were used to guide State reconfiguration, mainly during Fernando Henrique Cardoso’s two-term government. The private sector large expansion, in this period, within the Brazilian higher education system - pointed out in this dissertation work, based on Brazilian higher education census’ data analysis - along with the rise of unemployment rates and wage decrease, produced a significant growth of overdue tuitions and fees as well as idle admissions within private higher education institutions. This fact, combined with the low income groups pursue of higher education, fostered by huge propaganda of education being the main factor to social change, will then provide the basis for the Brazilian Minister of Education (MEC) to create state seats in private institutions, in exchange for fiscal exemption. In this scenario, Lula’s government implemented the ProUni as an operation to rescue the private sector, disguised by a demagogic discourse of higher education “democratization.” The ProUni was also associated with other ways of direct and indirect transfer of public resources to private higher education institutions, such as the Creduc, Fies, and fiscal and social security exemptions. This research also connected the ProUni with some aspects of higher education reform (such as the Technological Innovation Law and the Decree aiming at regulating “supporting foundations” within public higher education institutions), seen this program as a public-private partnership corollary. Concluding, it was possible to affirm that Lula’s government is carrying out a higher education reform project that has two clear strategies: discharge the State of financing public universities by establishing mechanisms to make these institutions gain money from the “market”, and create instruments allowing the direct or indirect transfer of public resources to private higher education institutions. Key words: Higher education, education reform, ProUni
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1 - INTRODUÇÃO
Através de um estudo crítico da política educacional para a educação superior no
Brasil, sobretudo a partir do início da década de 1990, e com o intuito de participar do
debate da proposta da Reforma na área da educação superior, ora em curso, contribuindo
para a discussão sobre o papel da educação pública, gratuita e de qualidade, na construção
da democracia do país, o principal objetivo deste trabalho é estudar a proposta do
Programa Universidade para Todos – ProUni como uma nova forma de privatização da
educação superior no Brasil.
Para o desenvolvimento desse estudo, se faz necessário compreender a relação
complexa e dinâmica da política pública para o ensino superior no governo Lula, no que
diz respeito ao ProUni e a sua articulação com a reforma do Estado, e em especial com o
modo de operar a política fiscal e os mecanismos de renúncia tributária. Esse programa de
concessão de bolsas de estudos integrais e parciais para estudantes de instituições privadas
de ensino superior, em troca de renúncia fiscal, surge acompanhado pela retórica de justiça
social e de inclusão das camadas sociais menos favorecidas, cujo principal indicador é o
baixo percentual de alunos com idade entre 18 e 24 anos freqüentando o ensino superior.
Mas, na verdade, tal discurso encobre a pressão das associações representativas dos
interesses do segmento privado, justificada pelo alto grau de vagas ociosas.
Mais especificamente, esta pesquisa procura estudar as forças interessadas na
criação do ProUni, quer sejam do setor privado quanto do setor público. Além disso, a
intenção do texto é examinar e comparar a proposta do ProUni com os processos anteriores
de financiamento público ao setor privado, a considerar: Creduc, Fies e isenção de
contribuições e impostos para instituições filantrópicas. É importante também estabelecer
uma relação entre os benefícios que o programa pode trazer para os vários grupos
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envolvidos no processo e com isso, desvelar o discurso e as estratégias do governo para
convencimento e adesão da população.
Do ponto de vista metodológico, trata-se de uma pesquisa bibliográfica
desenvolvida a partir de material já elaborado, constituído principalmente de livros,
artigos, leis, decretos e censos. A opção por esse tipo de pesquisa reside no fato de que
uma das principais vantagens de uma pesquisa fundamentada em análises documentais é
permitir ao investigador a cobertura de uma gama de informações muito mais ampla do
que aquela que poderia se pesquisar diretamente. Esta propriedade torna-se particularmente
importante em função do objeto em estudo requerer dados muito dispersos pelo espaço
(Gil, 1996, p.50).
A presente pesquisa está estruturada basicamente em quatro capítulos. Na
introdução será traçado um breve histórico sobre o surgimento das universidades, os
diferentes modelos e a criação tardia da educação superior no Brasil. No segundo capítulo,
objetiva-se entender a reforma do Estado e da educação superior brasileira dos anos 1990,
através de pressupostos que incorporam as diretrizes do Banco Mundial compreendendo:
redução de custos e racionalização do gasto público para assegurar a estabilidade do Plano
Real, melhoria da eficiência do aparelho do Estado e descentralização dos serviços
retirando do Estado as atividades que supostamente possam ser desenvolvidas por outras
instituições. Tais pressupostos aparecem detalhados no Caderno n0 1 (1997, p.7) editado
pelo Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado – Mare, de autoria do ex-
ministro Luiz Carlos Bresser Pereira, no primeiro mandato do governo Fernando Henrique
Cardoso. No terceiro capítulo, discute-se a reforma da educação superior no governo Lula
que já está sendo elaborada e colocada em prática através de Medidas Provisórias e leis
que estão em consonância com os interesses e proposições dos organismos e grupos
internacionais, em detrimento das necessidades e anseios da sociedade brasileira, embora o
discurso governamental seja de que a Reforma Universitária será amplamente discutida
antes de ser implementada. Nesse capítulo, haverá ênfase especial ao Programa
Universidade para Todos - ProUni especificamente relacionado à transferência de recursos
públicos para o setor privado. E é dentro dessa proposta que este trabalho de pesquisa
busca responder as seguintes indagações: a) Qual o significado do ProUni para as
instituições públicas e privadas de educação superior? b) Quais os vínculos do ProUni com
a proposta de Reforma do Estado? c) Como o ProUni vem atender ou não esta Reforma? d)
Há alguma correlação entre o ProUni e outras propostas de reforma para a educação
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superior, em especial de transferência de recursos públicos para o setor privado? e) De que
forma o ProUni se enquadra nas parcerias público-privadas? f) Na área da pesquisa, há
alguma relação entre o ProUni, a Lei de Inovação Tecnológica e o Decreto que regulariza
as fundações de apoio?
Buscando subsídios para o entendimento da atual situação da educação superior no
Brasil, onde as instituições privadas apresentam predominância em relação às públicas, se
faz necessário um breve histórico da trajetória da educação superior no Brasil, objetivando
constatar dois pontos fundamentais: em primeiro lugar mostrar que a educação superior
brasileira teve sua gênese nas instituições privadas, que adotavam como modelo
organizacional os institutos isolados, e que posteriormente a predominância passou a ser
das instituições públicas, tendo como forma organizacional a universidade. Por intermédio
de políticas educacionais que buscavam favorecer a grupos privados, essa predominância
volta a ser das instituições particulares, que substituíram o modelo organizacional de
universidade para o de institutos isolados e mais recentemente para uma variedade de
formas organizacionais e de oferta de cursos. Em segundo lugar, é importante destacar que
as instituições de educação superior brasileiras, sobretudo as universidades, foram
influenciadas pelas concepções francesa e norte-americana. A primeira no que tange a uma
formação profissional de alto nível e voltada para o mercado de trabalho e a segunda no
que toca a uma visão tecnicista e pragmática da formação, afastando-se assim, da
concepção alemã de universidade, que se caracteriza por uma sensível preocupação com a
formação humana integral e com a pesquisa.
Objetivando uma melhor contextualização de tais concepções, será realizado a
seguir um breve histórico do surgimento e do processo evolutivo das universidades,
baseado principalmente nos trabalhos realizados por Verger (1990) e Charle & Verger
(1996).
1.1 – Breve Histórico Sobre a Criação das Universidades
As primeiras universidades surgiram na Europa ocidental no início do século XIII.
Não se pode atribuir a nenhuma delas sua data precisa de nascimento, mas pode-se
considerar praticamente contemporâneas as universidades de Bolonha, Paris e Oxford.
A universidade medieval se organizou através do modelo corporativo (Universitas
Scholarum et Magistrorum). As corporações de professores e estudantes são a base da
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nova instituição. Os estudantes se agrupavam de acordo com seus países de origem
(ingleses, alemães, franceses, italianos, espanhóis e portugueses), isso acabou provocando
conflitos que se traduziram na partida voluntária de grupos de mestres e de estudantes.
Assim, novas universidades nasceram por desmembramento, mas somente duas delas
mostraram-se duráveis: Cambridge, nascida de uma migração de Oxford e Pádua, fundada
pelos doutores e estudantes foragidos de Bolonha.
As primeiras universidades não obedeceram a um modelo único. Na região norte da
Europa (Paris e Oxford), as universidades eram associações de mestres. As disciplinas
dominantes eram as Artes Liberais (Gramática, Retórica, Lógica, Aritmética, Música,
Astronomia, Geometria) e a Teologia. Nas regiões mediterrâneas, as universidades foram
associações de estudantes e a disciplina-mestra era o Direito, secundariamente a medicina
sob a influência da cultura árabe.
A expansão das universidades dá-se ao longo do século XIII na França (Toulose),
na Inglaterra (Cambridge), na Itália (Siena, Pávia, Nápoles), na Espanha (Salamanca,
Valência, Valladolid) e em Portugal (Coimbra).
O que se pode resgatar do modelo medieval é uma concepção de instituição
universitária com três elementos básicos: centralmente voltada para uma formação
teológico-jurídica que responde às necessidades de uma sociedade dominada por uma
cosmovisão católica; com uma organização corporativa em seu significado originário
medieval; e preservando sua autonomia face ao poder político e à Igreja institucionalizada
local (Trindade, 2000, p.13).
Os séculos XIV e XV marcam uma nova fase na história das universidades
medievais. Novas universidades não pararam de surgir e, pouco a pouco, expandiram-se
por todos os países.
O fenômeno mais original desse período foi o aparecimento das primeiras
universidades no mundo germânico e na Europa central.
Tudo irá mudar depois do Grande Cisma (1378 – 1417), rompimento confessional
que dividirá a Europa em duas dominações rivais. Essa crise acelerou a emergência dos
Estados e das Igrejas nacionais. Havia menos de trinta universidades realmente ativas em
1378; em 1500, haverá mais que o dobro. Três países, principalmente, aproveitaram-se
desse desenvolvimento: a França, onde oito fundações provinciais vieram juntar-se aos
centros antigos, a Espanha (cinco fundações depois de 1450) e, sobretudo a Alemanha que,
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com doze universidades, cuja maioria era bastante ativa, criadas entre 1378 e 1500 torna-se
o país da Europa com a rede mais densa (Charle & Verger, 1996, p.24).
Nos séculos XVI e XVII, as universidades continuaram a ser criadas. Em 1790
eram aproximadamente 150 instituições. Entretanto, nem todos os países foram
beneficiados com essas novas fundações, por exemplo, não houve nenhuma na Inglaterra
nem em Portugal. As novas universidades foram relativamente numerosas na Espanha,
França, Alemanha e Itália.
Enfim, a instituição universitária começou a firmar-se fora da Europa, nas colônias
americanas.
Na América Latina, as mais antigas fundações foram as de São Domingos, a de
Lima e a do México, quase sempre controladas por ordens religiosas (Dominicanos e
Jesuítas), ensinando principalmente Teologia e Direito Canônico. As universidades da
América Latina eram claramente fundações coloniais e missionárias: vinte delas foram
estabelecidas antes da independência, com maior ou menor sucesso, nas principais colônias
espanholas. No Brasil, não houve nenhuma. Na América do Norte, as primeiras
universidades, sob a forma de colégios, foram antes de tudo o fruto de interesses locais:
tratava-se de formar pastores e administradores de que necessitavam as colônias inglesas;
os primeiros colégios foram Harvard, Williamsburg e Yale; em 1776 havia nove deles
(ibid, p.42).
O contexto societário que engendra a universidade moderna se faz sob forte
impulso do desenvolvimento das ciências, do Iluminismo e do Enciclopedismo que, no
plano político e social, encontrará seu leito nos efeitos radicais da Revolução de 1789,
dentro e fora da França.
O século das luzes se inicia sob a influência de Newton, que vai assegurar às
universidades inglesas um avanço científico proeminente. O movimento cientifico e
experimental se difunde por todos os países e universidades, desde a universidade de
Moscou fundada em 1755, até a de Coimbra, renovada pela reforma pombalina em 1772,
passando pela Universidade de Göttingen, na Alemanha (Trindade, 2000, p.15).
Uma das principais características desse período é o surgimento de modelos
divergentes e modernizados de organização universitária na Alemanha e na França.
As universidades alemãs foram muito afetadas pelos acontecimentos ligados à
Revolução e ao domínio napoleônico no início do século XIX.
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Em 1789, havia na Alemanha 35 universidades com 7.900 estudantes dos quais
40% estavam reunidos nas quatro maiores (Halle, Göttingen, Iena e Leipzig). A Prússia
funda três novas universidades: a de Berlim, em 1810, e as de Bonn e Breslau, em 1818.
Essas três universidades recentes irão figurar entre as mais importantes da Alemanha na
segunda metade do século XIX, pois a ausência de tradição anterior facilita sua adaptação
intelectual e institucional às novas necessidades intelectuais e sociais. Essa transformação
se liga às idéias desenvolvidas pela corrente neo-humanista de W. von Humboldt, Fichte e
Schleiermacher (liberdade de aprender, liberdade de ensinar, recolhimento e liberdade do
pesquisador e do estudante, enciclopedismo) experimentadas inicialmente em Berlim. Tais
concepções influenciam progressivamente (devido aos movimentos de professores e de
estudantes e à importância da Prussia no conjunto das universidades alemãs) as
universidades mais antigas e tradicionalistas. Elas fundam o que se convencionou
denominar modelo universitário alemão.
Na França, após a Revolução Francesa, a universidade napoleônica rompe com a
tradição das universidades medievais e renascentistas e organiza-se, pela primeira vez,
subordinada a um Estado Nacional.
A reconstrução do ensino superior na França foi feita simultaneamente com
algumas inovações do século XVIII, mas em oposição às aberturas da fase radical da
Revolução, e com as características das universidades decadentes do século XVIII. Três
preocupações predominaram: oferecer ao Estado e à sociedade pós-revolucionária os
quadros necessários para a estabilização de um país conturbado; controlar estritamente sua
formação em conformidade com a nova ordem social; e impedir o renascimento de novas
corporações profissionais. Esse despotismo esclarecido, apesar das acomodações, explica a
predominância do modelo da escola (mesmo quando esta se chama faculdade), a tirania do
diploma do Estado, abrindo o direito para uma função ou para o exercício de uma profissão
precisa, a importância das classificações e dos concursos, mesmo nas fileiras que não as
impliquem forçosamente, a regulamentação precisa dos programas uniformes, o monopólio
da colação de graus pelo Estado. A única recriação de uma corporação é a da universidade
que engloba o pessoal docente secundário e superior, mas trata-se de uma corporação
estritamente supervisionada e integrada na hierarquia dos corpos que formam o Estado
Novo. Tal sistema implica uma estrita divisão do trabalho, uma especialização das
formações; em suma, uma nítida divergência em relação ao ideal universitário de
Humboldt (Charle & Verger, 1996, p.76).
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Nos Estados Unidos, em 1776, ano da declaração da independência, existiam
apenas dez instituições de ensino superior, todas implantadas no nordeste.
O ensino superior dos Estados Unidos anterior à Guerra de Secessão permanece
muito próximo do período colonial baseado em uma imitação estrita das universidades
inglesas. Entretanto, o ideal democrático do país estimula a multiplicação das instituições,
especialmente nos Estados do oeste e do sul. A Carolina do Norte cria a primeira
universidade estatal em 1789, aberta efetivamente em 1795. Na véspera da Guerra de
Secessão, existiam 21 delas. A educação propriamente profissional para os trabalhos de
Direito e de Medicina é realizada por aprendizados no seio do grupo de pares ou por
instituições particulares exteriores aos colleges como na Inglaterra. Os professores são
inicialmente transmissores de um saber recebido e a pesquisa continua sendo, nessa época,
muito marginal ou um simples prolongamento do ensino.
O período entre 1860 e 1940 foi caracterizado pelos historiadores da educação
como o da diversificação, da expansão e da profissionalização do ensino superior. Nesse
período o ensino superior torna-se fundamentalmente para a promoção social dos
indivíduos, para a afirmação nacional, para o progresso científico e econômico nacional e
internacional, para a formação das elites e, além disso, dos quadros sociais e até para a
evolução das relações entre os sexos com o início da feminização dos estudos superiores.
É no decorrer desse período que se forma um verdadeiro sistema universitário
americano, ligado às outras grandes transformações do país. A educação, valor central da
sociedade americana, encontra nesse empreendimento um novo ponto de aplicação para
unificar uma nação desarmônica, formar as novas elites necessárias a uma sociedade
urbana e industrial e afirmar o poderio internacional de um país em vias de ultrapassar a
velha Europa. O antigo modelo de college, tomado de empréstimo à Inglaterra, subsiste,
mas é cada vez menos adaptado a essas novas necessidades. Funda-se toda uma série de
novas instituições em razão de aplicações profissionais: escolas de ensino agrícola, Land-
Grant colleges, State Normal Schools para a formação de professores. Elas serão pouco a
pouco absorvidas pelas novas universidades públicas. O utilitarismo e a crença no
progresso econômico explicam a introdução precoce de cursos que, na Europa, devido aos
preconceitos herdados da sociedade pré-capitalista, não são considerados dignos da
universidade. É a voga, notadamente, das formações de finança e de business como
Wharton School of Finance inaugurada em 1881 na Universidade de Pensilvânia; a mais
célebre de todas, a Harvard Business School, data de 1908 (ibid, p.94).
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A flexibilidade de combinações de disciplinas (organizadas por departamentos e
não por cátedras, como na Europa), possibilitou a coexistência de populações estudantis
particularmente heterogêneas e a sobrevida de instituições aliando formação técnica,
profissional e geral ou científica e atraindo desse modo clientelas e contribuições
financeiras múltiplas, garantia de sua prosperidade sob a palmatória autoritária de
presidentes chefes de empresa. Essa força dos executivos universitários, a fraca
intervenção do Estado e a posição subordinada dos professores, apesar de seus esforços
para atingir o nível de qualificação europeu, diferenciam profundamente o “modelo
universitário americano” dos modelos germânicos e franceses contemporâneos (ibid, p.95).
É importante destacar ainda, em relação ao modelo norte-americano, a crescente
importância da pesquisa no seio das universidades a partir do início do século XX. Assiste-
se à reedificação dos estudos de Medicina e em outras áreas fundam-se laboratórios e
institutos. Os titulares de ph.D. tornam-se cada vez mais numerosos. A prosperidade
financeira das instituições graças às fundações e às doações dos antigos alunos, é um outro
elemento decisivo da atividade de pesquisa universitária nos Estados Unidos, pois
possibilitou a aquisição de modernos equipamentos científicos além de propiciar a
abundância dos meios (bibliotecas, acomodações profissionais, etc.). Essa libertação da
norma européia passa a ser notada com a diminuição do fluxo de estudantes e professores
para a Europa. Isso tudo acabou provocando uma massificação do sistema universitário
americano: os estudantes ultrapassam a casa dos 100 mil às vésperas da Segunda Guerra
Mundial.
Complementando resumidamente, cabe o registro feito por Dilvo Ristoff, de que
três características básicas definem o modelo norte-americano de educação superior: a) a
sua orientação pública, b) a sua estadualização administrativa, c) e sua diversidade de
objetivos acadêmicos (Ristoff, 2000 – p.75). É a partir destas características, tomadas em
seu conjunto, que podemos melhor entender o esforço dos Estados Unidos no sentido de
construir o seu sistema de educação superior. Os estados e a União americana, uma vez
definidas as grandes linhas a serem seguidas, e estabelecidos os grandes objetivos
nacionais da educação superior, passam aos dirigentes das instituições a obrigação de
buscarem junto aos agentes sociais a forma mais eficaz e eficiente de atingir os objetivos
propostos. Em suma: a orientação geral, a definição das metas maiores e o compromisso de
sustentação financeira são fundamentalmente dos estados e da União. À instituição, na sua
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individualidade, cabe a obrigação de exercer bem as suas funções e de através de processos
avaliativos regulares e formais, prestar contas à sociedade (ibid, p.86).
As três concepções de universidade aqui destacadas (Alemã, Francesa e Norte-
americana), assim como as suas influências no caso brasileiro, serão notadas ao longo
desta pesquisa.
1.2 – Educação Superior no Brasil: uma retrospectiva. Na institucionalização das universidades latino-americanas o ritmo foi bastante
diferenciado. Na América espanhola, a universidade se implantou desde 1538 (Santo
Domingo) e, até fins do século XVII, constituiu apenas uma rede de doze instituições, de
norte a sul do continente. Dentre os países da América Latina é o Brasil que possui a
universidade de origem mais recente, porém, isso não significa que não tenha tido ensino
superior durante o Brasil Colônia, Império e inícios da República.
Na colônia, o ensino superior era ministrado em colégios jesuítas (cursos de
filosofia e de teologia) e, depois da expulsão dessa ordem religiosa do reino português, em
1759, os conventos franciscanos substituíram-nos no Rio de Janeiro e em São Paulo. A
Igreja católica era, então, uma instituição privada que se mesclava ao Estado pelo regime
do padroado.
A transferência da sede do reino português para o Brasil, em 1808, propiciou a
criação de instituições estatais de ensino superior, germes das atualmente existentes
Universidades Federais do Rio de Janeiro e da Bahia, ao mesmo tempo em que se
reduziram os cursos dos conventos aos limites da formação clerical (Cunha,1985).
Após a independência, o Império reforçou e multiplicou esse modelo de modo que,
em 1889, quando da proclamação da República, todo ensino superior no país era estatal,
centralmente mantido e controlado.
Com sua matriz ideológica formada pelo liberalismo e pelo positivismo, os
primeiros governos republicanos não pretendiam manter a exclusividade do Estado no
ensino superior (nem mesmo com a inclusão dos governos estaduais do regime federativo).
Por outro lado, os laços estreitos entre o professorado das faculdades estatais com os novos
ocupantes do poder não recomendavam a passagem ao setor privado das unidades de
ensino superior existentes (Cunha, 2000, p.39).
A solução encontrada para resolver esse conflito latente foi à legitimação do ensino
superior não federal (isto é, estadual e privado) em igualdade de condições com o federal
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mediante o mecanismo do reconhecimento dos cursos. Os cursos deveriam ser
reconhecidos, para isso, seus currículos tinham de ser iguais aos das instituições federais,
situação comprovada mediante inspeção regular pelo Ministério da Justiça e Negócios
Interiores.1
Antes de 1920, nenhuma universidade existiu no país, pelo menos com duração
significativa. Para isso contribuiu, primeiro a proibição de Portugal; depois, a assimilação
do julgamento francês da universidade como uma instituição essencialmente
comprometida com o regime. Este julgamento, compartilhado por liberais e positivistas,
prevaleceu sobre os projetos de criação de universidades, inclusive no período imperial.
A partir de 1920, foram criadas as primeiras instituições de ensino superior que
tiveram o nome de universidade. Eram três instituições privadas, uma em Manaus, outra
em São Paulo e uma no Paraná. Essas não tinham antecedentes. Foram criadas por
iniciativas privadas e previam a existência de várias faculdades. Mas elas não perduraram,
por diversas razões. A de Manaus, por causa do esgotamento do ciclo da borracha. Sobrou
a Faculdade de Direito, que sobreviveu e está na Universidade Federal do Amazonas. Em
São Paulo quando o governo do Estado criou a sua Faculdade de Medicina, que hoje faz
parte da USP, os estudantes daquela universidade particular migraram pela garantia do
diploma credenciado, muito importante para o exercício legal da medicina. Com essa
migração, a instituição, cujo coração institucional, econômico e financeiro era a sua
Faculdade de Medicina, foi imediatamente inviabilizada. E a Universidade do Paraná foi
extinta por outras razões. Mais tarde, num momento da política federal de contenção do
crescimento do ensino superior, impediu-se o reconhecimento de qualquer curso em
cidades com menos de mil habitantes, ou que fossem capital de um Estado com menos de
um milhão de habitantes. Mas Curitiba e o Paraná, na época, não tinham isso. E curso não
reconhecido não interessava a ninguém. Então, sobraram algumas faculdades como cursos
livres, mais tarde reconhecidos, e hoje estão na Federal do Paraná (Cunha, 2001, p.5).
No entanto, as primeiras universidades bem sucedidas que tivemos foram criadas
pela reunião de faculdades preexistentes, federais ou mesmo estaduais ou privadas, que
foram federalizadas. A Faculdade de Medicina, a Escola Politécnica e a Faculdade de
Direito do Distrito Federal (que foi originada a partir da federalização de duas privadas)
resultariam na Universidade do Rio de Janeiro. A segunda universidade foi a de Minas
1 Salvaguardando um curto período de dois anos, ao início da República, onde não havia no país um ministério especializado nos negócios da educação. Órgão desse tipo somente veio a ser criado em 1930.
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Gerais, em 1927. Novo processo de agregação: Medicina, Engenharia e Direito, e mais
duas, Farmácia e Odontologia. Então, o Estatuto das Universidades Brasileiras, de abril de
1931, vai consagrar, ou generalizar, o que foram eventos singulares no processo de criação
de universidade. Seria preciso, via de regra, uma reunião, autorizada pelo Estado, de pelo
menos três de uma lista de quatro faculdades preexistentes credenciadas: Engenharia,
Medicina, Direito ou, ainda, uma de Filosofia, Ciências e Letras, a primeira menção oficial
a esse tipo de faculdade (ibid, p.6).
A revolução de 1930 foi o marco referencial para a entrada do Brasil no mundo
capitalista de produção. A nova realidade brasileira passou a exigir uma mão-de-obra
especializada e para tal era preciso investir na educação. Sendo assim, em 1930, foi criado
o Ministério da Educação e Saúde Pública e, em 1931, o governo provisório sanciona
decretos organizando o ensino secundário e as universidades brasileiras. Esses decretos
ficaram conhecidos como “Reforma Francisco Campos”. O Decreto 19.851, de 11 de abril,
institui o Estatuto das Universidades Brasileiras que dispõe sobre a organização do ensino
superior no Brasil e adota o regime universitário.
Em 1934 a nova Constituição (a segunda da República) dispõe, pela primeira vez,
que a educação é direito de todos devendo ser ministrada pela família e pelos Poderes
Públicos. Ainda em 1934, por iniciativa do governador Armando Salles de Oliveira, foi
criada a Universidade de São Paulo. A primeira a ser criada e organizada segundo as
normas do Estatuto das Universidades Brasileiras de 1931. Em 1935 o Secretário de
Educação do Distrito Federal, Anísio Teixeira, cria a Universidade do Distrito Federal,
com uma Faculdade de Educação na qual se situava o Instituto de Educação.
A Universidade de São Paulo (USP) foi criada em 1934 num contexto marcado por
importantes transformações sociais, políticas e culturais, pelo decreto estadual n0 6.283, de
25 de janeiro de 1934, por decisão do governador de São Paulo, Armando de Salles
Oliveira. Teve como mentor intelectual Júlio Mesquita Filho, então diretor do jornal O
Estado de S. Paulo, que publicava ostensivamente artigos e estudos favoráveis à criação de
uma Universidade em São Paulo e sobre os problemas do ensino superior e universitário no
Brasil (USP, 2003).
A USP começou com algumas escolas já existentes, sendo a mais antiga a
Faculdade de Direito, que data de 1827, e com a criação da Faculdade de Filosofia,
Ciências e Letras, instituição à qual caberia a missão de integrar o conhecimento literário,
humanístico e científico da nova universidade, e que mais tarde se subdividiria em
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unidades autônomas. Vários professores estrangeiros, especialmente da França, Itália e
Alemanha, foram convidados para lecionar na nova instituição (ibid).
A Universidade do Distrito Federal – UDF é instituída no Rio de Janeiro, capital da
República, pelo Decreto Municipal n0 5.513/35, como parte de um programa integrado de
Instrução Pública para o Distrito Federal, liderado por Anísio Teixeira, entre 1931 e 1935.
À frente da Secretaria de Instrução Pública, nesse período, Anísio organiza uma rede
municipal que vai da escola primária a universidade, e faz dela, junto com seus
colaboradores, um poderoso campo cultural que interfere na vida urbana e, ao mesmo
tempo, produz conhecimentos sobre ela. Brandiam contra essa instituição, principalmente,
os argumentos ideológicos de que ela seria uma universidade esquerdista (Fávero, 1980).
Apesar de ter existido por um período inferior a quatro anos, a UDF marca
significativamente a história da universidade no Brasil, principalmente pela dimensão
cultural atribuída a ela.
A UDF surge sob uma definição precisa e original do papel e das funções da
universidade. O decreto que a institui justifica a necessidade de sua instalação e define
como seus fins:
“promover e estimular a cultura a concorrer para o aperfeiçoamento da comunidade brasileira; encorajar a pesquisa científica, literária e artística; propagar as aquisições das ciências e das artes pelo ensino regular de suas escolas e pelos cursos de extensão popular; formar profissionais e técnicos em diversos ramos e prover a formação do magistério em todos os seus graus”.
Com essas preocupações, os primeiros anos da UDF são dedicados à organização
de seus cursos e de seu corpo docente. Busca-se na Europa professores para aquelas áreas
nas quais se considerava não haver, no Brasil, profissionais suficientemente preparados.
Ao ser instalada, em 1935, a Universidade do Distrito Federal surge como um
divisor de águas em meio à agitação que marca o país naquele momento e às disputas pelo
controle dos rumos da educação nacional. As oposições delineadas em nível oficial são
mais decisivas. A oposição à UDF é mais profunda do que deixam prever as falas dos que
estão no poder (ibid).
A partir de 1935, o regime político tenta exterminar toda experiência democrática,
em matéria de educação no país, Após o golpe de 1937, uma das grandes preocupações do
Estado foi colocar a educação a serviço da ideologia vigente.
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As diretrizes ideológicas que vão nortear a educação no período são facilitadas pelo
caráter fortemente centralizador do Estado. Na ideologia estadonovista existe a
preocupação de favorecer a formação de uma elite que deva contribuir para a manutenção
do estabelecido (ibid, p.91).
Nesse período, tanto a educação como as instituições escolares se tornam vítimas
de uma organização monolítica do Estado, sem nenhuma autonomia. Todo o ensino é
organizado, centralizado e fiscalizado como qualquer serviço público.
A Universidade do Brasil começou a ser organizada em 1935. O ministro Gustavo
Capanema insiste sobre o dever da União ampliar e melhorar a Universidade Federal
(Universidade do Rio de Janeiro). Para o ministro, o país não dispunha ainda de
verdadeiras Universidades, não tinha uma tradição universitária, e as poucas instituições
existentes não correspondiam às exigências do ensino que pretendiam ministrar e às
pesquisas a desenvolver.
O governo central sente necessidade de criar espaços dentro do sistema de ensino
para regulamentar toda sua organização e funcionamento, submetendo-o ao seu controle
direto. A política educacional, a partir do Estado Novo, não se limita apenas a decretar a
legislação e ditar normas para sua implantação, mais que isso, ela visa transformar o
sistema de ensino em um instrumento eficaz de manipulação dentro do sistema instituído.
Nessa linha, toda ênfase recai no caráter nacional da Universidade do Brasil,
devendo a mesma ser mantida e dirigida pela união. Quatro aspectos são lembrados para
que a Universidade do Brasil garanta esse caráter de “Universidade Nacional”.
1 – A universidade deveria ser um padrão, no sentido de que, nas linhas
fundamentais de sua estrutura, instalações, administração e funcionamento, seria
apresentada como exemplo de boa organização.
2 – Deveria ser um ativo centro de pesquisas científicas, de investigações técnicas,
de atividades filosóficas, literárias e artísticas, a fim de tornar-se o mais alto centro de
expressão de nossa cultura intelectual.
3 – Deveria ser freqüentada por estudantes de todo o país.
4 – Deveria constituir-se no mais sólido reduto, onde seriam guardadas as tradições,
firmados os princípios e diretrizes que assegurassem à nação brasileira a continuidade, o
progresso, o equilíbrio e a liberdade.
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Contudo, o que se verificou a partir de 1937 foi que ela seria transformada em
perfeito “aparelho ideológico do Estado” (ibid, p.96).
Por outro lado, é bom lembrar que em julho de 1935 uma portaria ministerial
nomeou uma comissão para estudar a organização da Universidade do Brasil. O então
ministro da Educação insistiu em que a Universidade do Brasil “deveria ser perfeita”, e
que seria necessária à criação de uma cidade universitária. Os trabalhos, desde o início,
foram presididos pelo ministro Gustavo Capanema, entretanto é conveniente ressaltar que
esta comissão era constituída por pessoas que refletiam, em matéria de educação, uma
heterogeneidade ideológica.
O programa foi esboçado e uma das primeiras questões resolvidas foi a de
concentrar todas as escolas, faculdades e institutos, constituintes da então Universidade do
Rio de Janeiro, em um único campus. Nesta tomada de posição alguns princípios supostos
pesaram:
1 – centralização das fontes bibliográficas;
2 – o reconhecimento de que na Universidade o ensino não pode ficar alheio à
pesquisa científica, consequentemente, o intercâmbio entre professores era imprescindível;
3 – a conveniência de intercâmbio entre estudantes;
4 – a vantagem de intercâmbio de material científico;
5 – a possibilidade de centralização de alguns serviços;
6 – a centralização do esporte;
7 – a possibilidade de maior ação da reitoria que manteria sob suas vistas imediatas
todos os órgãos que lhe eram subordinados.
É conveniente frisar que a comissão nem sequer tocou em um problema
fundamental: a cátedra vitalícia, que institucionalmente foi responsável por uma série de
problemas e pelo atraso do nosso ensino universitário.
O segundo passo dado foi o da escolha do terreno necessário, para a construção da
Cidade Universitária. Apesar de vários estudos, anteprojetos e projetos, a Cidade
Universitária terminou sendo construída numa área constituída por um conjunto de ilhas,
integradas numa única – a ilha do Fundão – por meio de aterros hidráulicos, o que
encareceu muitíssimo a construção.
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Promulgada a lei N0 452, de 5 de julho de 1937, organizando a Universidade do
Brasil, a recém-organizada instituição passa a ser constituída não mais pela justaposição de
três estabelecimentos de ensino superior, mas por 15 escolas ou faculdades, recebendo a
denominação de Nacionais: Faculdade Nacional de Filosofia, Ciências e Letras; Faculdade
Nacional de Educação; Escola Nacional de Engenharia; Escola Nacional de Minas e
Metalurgia; Faculdade Nacional de Química; Faculdade Nacional de Medicina; Faculdade
Nacional de Odontologia; Faculdade Nacional de Farmácia; Faculdade Nacional de
Direito; Faculdade Nacional de Política e Economia; Escola Nacional de Veterinária;
Escola Nacional de Arquitetura; Escola Nacional de Belas Artes e a Escola Nacional de
Música.
Vale observar que tanto a Escola Nacional de Agronomia, como a Nacional de
Veterinária, nunca chegaram, de fato, a ser integradas na Universidade do Brasil e, após
várias transformações, passaram a fazer parte da Universidade Rural, criada em 1943.
Com a finalidade de haver cooperação nas atividades desenvolvidas pelos
estabelecimentos de ensino, passaram a fazer parte integrante da Universidade do Brasil
alguns institutos já existentes e outros criados pela lei N0 452/37: Museu Nacional;
Instituto de Física; Instituto de Eletrotécnica; Instituto de Hidro-aero-dinâmica; Instituto de
Mecânica Industrial; Instituto de Ensaios e Materiais; Instituto de Química e
Eletroquímica; Instituto de Metalurgia; Instituto de Nutrição; Instituto de Eletro-
Radiologia; Instituto de Biotipologia; Instituto de Psicologia; Instituto de Criminologia;
Instituto de Psiquiatria; Instituto de História e Geografia e o Instituto de Organização
Política e Econômica.
De acordo com esse dispositivo, o Hospital das Clínicas faria parte integrante da
Universidade do Brasil, destinando-se ao ensino. Como instituições complementares,
foram incorporados também o Colégio Universitário e a Escola Ana Néri.
A partir do Golpe de 1937, as pressões políticas sobre as instituições universitárias,
não apenas haviam alterado os rumos da USP, esvaziando a Faculdade de Filosofia,
Ciências e Letras e fechando a Universidade do Distrito Federal, mas todas as instituições
de ensino superior no país passaram a ser ordenadas por meio de uma legislação imposta
de cima para baixo, cuja tônica era a inibição de novas formulações ou de diferentes
propostas que fugissem ao modelo consagrado pelo Ministério de Educação e Saúde.
A formação de quadros onde se recrutavam elementos destinados ao magistério,
bem como às altas funções da vida pública do país e o preparo de profissionais para o
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exercício de atividades que demandem estudos superiores, contribuíram para conciliar os
interesses de formação de mão-de-obra no país com tendências conservadoras dominantes.
O reitor como os diretores dos estabelecimentos de ensino, seriam escolhidos pelo
Presidente da República, dentre os respectivos catedráticos. Era expressamente proibido
aos professores e alunos da Universidade formar, oficialmente ou coletivamente, dentro da
Universidade, qualquer atitude de caráter político-partidário ou comparecer as atividades
universitárias com uniforme ou emblemas de partidos políticos. É importante observar,
também, que em pleno regime discricionário foi criada a União Nacional dos Estudantes
(UNE), cuja finalidade era congregar todos os estudantes do Brasil para a defesa de seus
interesses (Fávero, 1980, p.102).
Em 1939, com a extinção da UDF, vários de seus institutos foram “anexados” à
Universidade do Brasil, por meio de incorporação à recém-organizada Faculdade Nacional
de Filosofia, que na visão do ministro Capanema, esta deveria ser o “estabelecimento
Federal do ensino destinado à preparação do magistério secundário”.
Segundo Capanema, a Faculdade Nacional de Filosofia deveria constituir dentro da
Universidade do Brasil grande centro de estudos, processados com disciplina e vigor em
todos os domínios da cultura intelectual pura. Deveria ser a grande força de animação,
enriquecimento e de orientação de nossos trabalhadores intelectuais. E, desta forma,
transcendendo os limites do ensino, entraria ela a influir, de modo mais amplo, no destino
nacional.
Na realidade, a UDF foi extinta sumariamente, sendo o ministro Capanema um dos
principais responsáveis pela destruição desse centro de estudos universitários.
De acordo com o Decreto Lei N0 1.190 de 4 de abril de 1939 (art. 10), a Faculdade
Nacional de Filosofia teria tríplice objetivo:
1 – preparar trabalhadores intelectuais para o exercício das altas atividades culturais
e de ordem desinteressada ou técnica;
2 - preparar candidatos ao magistério de ensino secundário e normal;
3 - realizar pesquisas nos vários domínios da cultura e que constituem objeto de seu
ensino.
No entanto, é o segundo objetivo que vai caracterizar, daí para frente, o trabalho
das Faculdades de Filosofia. A partir de 1939, a tendência profissionalizante dos seus
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cursos é acentuada, sendo relegada a um plano secundário e adjetivo sua função
eminentemente cultural e científica dentro da Universidade.
Embora a lei afirmasse ser livre a abertura de escolas superiores, criadas e mantidas
tanto pelos poderes públicos como por particulares (Decreto-Lei N0 421/38, art. 10), era
necessária a autorização do Governo Central para que um curso superior fosse organizado
e entrasse em funcionamento, mesmo se integrado a uma Universidade.
Tanto para a concessão de autorização, como para o reconhecimento, o governo
ouvia previamente o Conselho Nacional de Educação, cujas exigências eram:
a) capacidade financeira de entidade para manter satisfatoriamente o
funcionamento do curso;
b) aparelhamento administrativo regular;
c) obediência às exigências mínimas fixadas pela legislação federal quanto à
organização administrativa e didática;
d) capacidade moral e técnica do corpo docente que atuasse no curso;
e) fixação do limite de matrícula para cada série do curso, levando em
consideração a capacidade das instalações;
f) condições culturais necessárias ao bom funcionamento do curso;
g) real necessidade do curso sob o ponto de vista profissional ou manifesta
utilidade de natureza cultural.
Esses critérios constantes da legislação estadonovista devem ser analisados e
compreendidos dentro da política educacional do período, onde o controle político-
ideológico feito pelo Estado tornou-se cada vez mais rígido (ibid, p.107).
Quanto à capacidade financeira, muitos supunham ser suficiente à entidade
mantenedora apresentar um grande patrimônio, mesmo sem a capacidade financeira
necessária para manter um ensino de nível superior. No que se refere a instalações
adequadas, o Decreto-Lei falava em instalações apropriadas, fato contrariado pela
realidade. Algumas escolas ocupavam escolas primárias ou médias, quando não
pensionatos e quartéis. Em alguns casos, havia instalações de fachada. Apareciam apenas
nos dias de fiscalização, para o inspetor ver; depois sumiam, porque já tinham cumprido
sua função (ibid, p.108).
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Quanto à capacidade técnica de corpo docente, embora houvesse exigências legais
nesse sentido, os problemas eram bastante sérios. Entre outros, encontramos, em processos
de reconhecimento de escolas, candidatos ao magistério que não possuíam um título sequer
correlacionado com a matéria a ser lecionada, bem como aqueles que, possuidores de
títulos e que poderiam ser reconhecidos como pessoas de capacidade técnica, não
apresentavam nenhum preparo para as cátedras que vinham regendo ou pretendiam reger
(ibid, p.109).
Surgia, então uma indicação do conselho, em que se procurava explicitar o que este
órgão entendia por capacidade técnica:
“A capacidade técnica não se demonstrará pela simples posse do diploma expedido por curso superior onde se ministre o ensino da disciplina, mas há de ser comprovada, segundo cada caso, em espécie, por um ou mais destes meios: trabalhos publicados sobre a especialidade, que este conselho apreciará; exercício técnico-profissional, no qual a especialidade tenha direta aplicação, cursos de pós-graduação e de especialização ou de aperfeiçoamento, na disciplina ou parte essencial da disciplina, ou de disciplina que tenha direta afinidade com a especialidade que o candidato pretenda ensinar; exercício anterior do magistério da disciplina, com eficiência, em outro curso superior autorizado ou reconhecido, ou em instituto com mandato universitário”.
A partir daí surgem novos problemas. Começam a tomar vulto, por exemplo, as
congregações de fachada ou de professores que apresentam todas as credenciais, dão o seu
nome, mas não lecionam na escola, sendo as aulas ministradas por outros que, com raras
exceções são capacitados para exercer tais funções (ibid, p.110).
Quanto à fixação do limite de matrícula, essa determinação aparece antes do Estado
Novo, em outros dispositivos legais relativos ao ensino superior. Entretanto, o Decreto-Lei
N0 421/38 exige, como condição, tanto para a autorização de funcionamento de novos
cursos superiores, como para seu reconhecimento a fixação do “limite de matrícula, para
cada série do curso, à vista da capacidade das instalações”.
Quanto às condições culturais necessárias ao bom funcionamento do curso e real
necessidade do meio, até 1940 a legislação estabelecia uma distinção entre necessidade e
utilidade do curso. O Decreto-Lei N0 2076 de março daquele ano acaba com a distinção
entre necessidade e utilidade para a autorização de um curso, passando apenas a exigir que
o mesmo represente “uma real necessidade para o meio”.
Para uma visão quantitativa da expansão do ensino no Estado Novo, é interessante
ressaltar que até a promulgação da República, foram fundados 14 estabelecimentos de
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ensino superior. Da Proclamação da República até a Revolução de 1930, quando se dá a
queda da República Velha, foram criados mais 72 estabelecimentos desse nível,
perfazendo, então, o total de 86. E, finalmente, da Segunda República até 1945, foram
criadas mais 95 escolas de nível superior.
Segundo Fávero (1980, p.112) até o final do Estado Novo, o país contava com
cinco Universidades: a Universidade do Brasil, a Universidade Rural do Brasil (ambas com
dependência administrativa Federal), a Universidade de Minas Gerais, a Universidade de
São Paulo e a Universidade de Porto Alegre, estas com dependência administrativa
Estadual. Cunha (1982, p.14) observa ainda a existência da Universidade Católica do Rio
de Janeiro, esta de caráter privado.
Durante toda a década de 1950, faculdades estaduais e privadas foram federalizadas
e reunidas, formando universidades, mantidas e controladas pela União, empreendimentos
esses determinados por leis, no que se empenharam diversos protagonistas, inclusive as
elites locais e os mantenedores privados, devidamente compensados na transferência do
patrimônio e na incorporação de seu pessoal nos quadros do funcionalismo federal (Cunha,
1982). As instituições privadas foram beneficiadas por dispositivos da Constituição de
1934 e das que se lhe seguiram, inclusive na de 1988, em vigor, isentando-as de todos os
impostos (federais, estaduais e municipais) sobre o patrimônio, a renda e os serviços
prestados.
O projeto da criação da Universidade de Brasília - UnB surgiu em contraposição ao
modelo tradicional de universidade instituído na década de 1930 no Brasil, modelo que
estava sendo questionado por setores das próprias instituições de ensino e pesquisa e por
aqueles que pensavam em uma universidade voltada para as transformações que requeria a
sociedade brasileira naquele momento. Na concepção de seus criadores, deveria ser uma
universidade que, junto ao humanismo, a livre criação cultural, fosse integrada à ciência e
à tecnologia modernas. No conjunto, seriam modificados os padrões de conhecimento
presentes no ensino superior brasileiro. A decisão política de sua criação foi comunicada
pelo presidente Juscelino Kubitschek de Oliveira em 21 de abril de 1960, dia da
inauguração da nova capital, quando o então presidente encaminhou mensagem ao
congresso solicitando autorização para que ela fosse instituída. Durante esse ano e no
seguinte foram promovidos debates e reuniões formais e informais sobre a concepção e
estrutura da Universidade em criação. Essas reuniões foram lideradas por Darcy Ribeiro e
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contaram com a participação de vários intelectuais e cientistas que contribuíram para
definir o projeto (UnB, 2003).
Em 15 de dezembro de 1961, o presidente João Goulart sancionou a lei que
autorizava o Poder Executivo a instituir a Fundação Universidade de Brasília – FUB, que
seria a mantenedora da futura Universidade. Em 15 de Janeiro de 1962, através do decreto
n0 500, foi instituída a FUB, aprovado seu estatuto e a estrutura da Universidade. A partir
desse momento havia uma determinação legal e a tarefa seria estabelecer as condições
práticas de funcionamento.
A instalação da Universidade, em 1962, em seu período inicial, coincidiu com uma
conjuntura política especial no país. Em janeiro do ano anterior, Jânio Quadros havia
tomado posse, após obter uma enorme votação nas eleições, quando sua campanha
empolgou uma grande parte da população, com a bandeira da moralidade administrativa.
Sua renúncia no mesmo ano estabeleceu uma crise na sucessão presidencial, resolvida
momentaneamente com um arranjo entre a elite política e os militares, implantando o
sistema parlamentarista de governo, que possibilitou a posse de João Goulart. Até 1964, a
tendência foi de aprofundamento da crise política, que incidia sobre a governabilidade do
país.
Durante este período, as forças políticas progressistas levantaram a bandeira das
reformas estruturais que deveriam ser efetuadas para a transformação da sociedade. Eram
as reformas agrária, urbana, bancária e outras. Entre elas, a luta pela reforma universitária
ganhou as ruas com um movimento estudantil bem organizado e com grande espaço de
mobilização. A principal questão levantada pelos estudantes era a democratização da
universidade, reivindicando a ampliação da representação estudantil para 1/3 nos órgãos
colegiados, fundamentalmente nos conselhos universitários, que mantinham as decisões
máximas internamente. A modernização do sistema universitário era colocada como uma
das premissas para o desenvolvimento do país, argumento que havia sido usado para a
criação da UnB.
Darcy Ribeiro foi professor de Antropologia da Faculdade Nacional de Filosofia da
Universidade do Brasil. Foi ele o idealizador da Universidade de Brasília, e seu primeiro
reitor. Foi substituído, na Reitoria da UnB, a partir de junho de 1963, por Anísio Teixeira,
para assumir o ministério da Educação e Cultura do regime parlamentarista (Rodrigues,
2001, p.115).
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Anísio Teixeira havia sido, em 1935, o idealizador da Universidade do Distrito
Federal, e foi responsável, enquanto diretor do INEP (Instituto Nacional de Estatísticas e
Pesquisas em Educação), pela presença de Darcy Ribeiro como coordenador da Divisão de
Estudos e Pesquisas Sociais do Centro Brasileiro das Pesquisas Educacionais (eram estes
os cargos que eles ocupavam, quando da criação da UnB) (ibid).
Ambos tiveram um importante papel no cenário educacional brasileiro dos anos da
república populista (1945-1964), um contexto marcado por influências cada vez maiores
dos Estados Unidos, em detrimento das influências européias que caracterizam as décadas
anteriores. O modelo organizacional norte-americano, no campo educacional, ganhara
corpo em projetos como o do ITA (Instituto Tecnológico da Aeronáutica) e o da UnB,
paradigmas que influenciaram a Reforma Universitária de 1968 (ibid).
O ITA iniciou suas atividades em 1947, no Rio de Janeiro, passando, a partir de
1950, a funcionar plenamente na sede de São José dos Campos. A estrutura do ITA
introduziu inovações, como a não-existência da cátedra vitalícia (os professores eram
contratados pela legislação trabalhista).
Outras iniciativas importantes da política federal disseram respeito à pesquisa e à
capacitação docente: foram criados o CNPq (Conselho Nacional de Pesquisa) e a CAPES
(Campanha Nacional de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), o primeiro em
janeiro, a segunda em junho de 1951.
Algumas ações, então, já se vinham esboçando no quadro nacional, mais foi a
criação da UnB a que, em maior grau, apresentou reformulações inovadoras. O contexto
era altamente propício: a nova Capital a demandar uma Universidade nova. Alguns
segmentos da sociedade reclamavam mudanças para a Universidade brasileira, pois, desde
sua implantação, ela ainda não conseguira erguer-se como uma instituição nova. Tinham-
se, na verdade, aglomerados de faculdades autônomas, reunidas sob o signo Universidade.
O sistema de cátedras corroborava a manutenção de uma não-integração universalizante
(ibid, p.116).
A proposta de Darcy Ribeiro critica o modelo anterior (agrupamento de faculdades;
manutenção da cátedra), considerando-o um sistema que segrega o aluno, ao ministrar-lhe
apenas ensino profissionalizante e ao isolá-lo dos inscritos em outros cursos.
As críticas de Darcy Ribeiro se estendem também: ao ensino seriado, que dava
pouca flexibilidade à atualização necessária dos conteúdos universitários; à escolha prévia
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e definitiva da carreira que o aluno seguiria; ao pequeno número de vagas que as
universidades ofereciam; às precárias instalações físicas, etc. (ibid).
Na Universidade de Brasília, as vagas seriam proporcionais aos secundaristas de
cada Estado e os alunos morariam na Universidade. A previsão total, ao final de dez anos,
era da ordem de 10 mil alunos, 15 mil residentes e 600 mil metros quadrados construídos
(ibid).
Formulou-se, para a cidade e para a Universidade, a implantação do novo: a cidade
capaz de funcionar como “integradora da vida brasileira”; a Universidade sendo capaz de
“atrair as inteligências mais promissoras”, e prestar-lhes um ensino de graduação e de
pós-graduação que o “desenvolvimento requer imperiosamente”.
Não restam dúvidas sobre o quanto às propostas de Brasília e de sua Universidade
foram inovadoras, cada qual em suas respectivas áreas. O quanto elas representaram de
ruptura, sempre com projetos bem ambiciosos.
O golpe militar foi fatal para a Universidade de Brasília, a mais importante
iniciativa governamental no campo do ensino superior. A idéia de que a UnB era um foco
de subversão seria reforçada a partir da instalação do regime militar. As novidades da
Universidade de Brasília fizeram com que sobre ela recaíssem as iras dos reitores das
universidades tradicionais e de muitos catedráticos que difamavam a nova universidade
como “antro de marxistas”. Esses últimos se sentiam ameaçados pela sua estrutura, na qual
os privilégios do regime da cátedra vitalícia não eram reconhecidos: na Universidade de
Brasília, obrigada pela lei a ter cátedras, estas foram redefinidas, deixando de ser um cargo
para ser um grau universitário.
Nove dias depois do golpe de Estado, em 9 de abril de 1964, a mais jovem e mais
moderna de nossas universidades, que reunia professores dos mais competentes em seus
campos de conhecimento, assim como estudantes de todo o país, selecionados por meio de
exames vestibulares especiais, foi ocupada por tropas da polícia militar de Minas Gerais.
Efetuaram-se prisões de professores e alunos e foi instaurado um inquérito policial militar
(IPM) para apurar a subversão no campus, arquivado posteriormente por falta de
consistência das denúncias (UnB, 2003).
Após a ocupação foram destituídas as autoridades universitárias e nomeado o
professor Zeferino Vaz, da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, como interventor e,
logo em seguida, ele tomou posse como membro do Conselho Diretor da FUB. Eleito seu
presidente, foi conduzido automaticamente como reitor.
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Contudo, é importante ressaltar que mesmo antes da intervenção, nem tudo na
Universidade de Brasília funcionava da melhor maneira. Havia várias questões passíveis de
críticas, como por exemplo: o reconhecimento, pelo estatuto e regimento, de que o ensino
superior seria pago pelos estudantes, com gratuidade apenas para os “carentes”; o modelo
de isolamento da Faculdade de Educação resultante da fragmentação da tradicional
Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras; a rede de órgãos colegiados e de coordenações,
propiciando a diluição das responsabilidades e o surgimento, em contrapartida, de
dirigentes autoritários; dentre outras.
O plano original da UnB foi alterado, extinguindo unidades inteiras e alterando as
remanescentes. No entanto, a sobrevivência da estrutura inovadora da Universidade de
Brasília foi garantida inicialmente pela reforma da Universidade Federal de Minas Gerais,
que, então, se desenvolvia pela liderança do reitor Aluísio Pimenta e mais tarde pela
Universidade Estadual de Campinas que preservou a estrutura da UnB, por iniciativa de
Zeferino Vaz, paradoxalmente o primeiro dos reitores-interventores da Universidade de
Brasília. Outras também o fizeram, o que mostra vitoriosa a resistência contra a ditadura,
na própria sobrevivência, e até na multiplicação, da estrutura daquela que foi, até hoje, a
mais importante realização da intelectualidade brasileira no campo do ensino superior.
Os burocratas do regime autoritário, na busca por uma universidade da estrutura,
que melhor lhe convinha, procuraram fazer com que todas as universidades federais
adaptassem sua estrutura ao figurino da Universidade de Brasília, utilizando para tanto, um
importante motivo: o princípio da “não-duplicação de meios para fins idênticos ou
equivalentes”. Na verdade, é bom lembrar, que quando as faculdades isoladas foram
justapostas para formar as universidades, elas mantiveram a estrutura anterior. Provocando,
com isso, onerosas e injustificáveis duplicações. A organização de departamentos foi a
maneira encontrada para juntar no mesmo espaço da universidade todos os professores,
pesquisadores, laboratórios e outros recursos de um mesmo campo do conhecimento. Não
para que, eles ficassem isolados uns dos outros, mas para que, a partir de seu
departamento, cada uma das grandes especialidades prestasse serviço a toda universidade.
Para viabilizar a transição dos estudantes pelas disciplinas dos diversos
departamentos da universidade, em busca da integralização dos seus também diversos
currículos, os planejadores educacionais do regime autoritário importaram da universidade
norte-americana outro regime – o regime de créditos. A idéia era que os estudantes fossem
colecionando os créditos correspondentes às diversas disciplinas, lançando-os em seus
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históricos escolares, como se fossem depósitos em uma conta bancária, até que tivessem o
número exigido de créditos para se formarem. Aliás, nas universidades particulares, ao
invés de depósitos em contas bancárias, seria melhor dizer débitos. As instituições
particulares de ensino superior encontram no regime de créditos um excelente meio de
cobrar dos alunos conforme a “consumação” do curso: os que fazem mais créditos (cursam
mais disciplinas ou disciplinas que valem mais créditos) pagam mais: o preço do curso já é
cobrado pela universidade em função do número de créditos. O nome certo deveria ser
regime de débitos... (Cunha, 2002, p.82).
Em julho de 1968, em meio ao crescimento dos protestos de amplos setores sociais
contra a ditadura (estudantes, profissionais liberais, operários), o governo organizou um
grupo de trabalho para elaborar um anteprojeto de reforma universitária. Sancionada a
chamada Lei da Reforma Universitária (Lei n0 5.540/68), esta determinava, dentre outras
coisas, que todas as instituições de ensino superior se adaptassem ao modelo, já ensaiado
no sistema federal. Mesmo as universidades estaduais, como a Universidade de São Paulo,
de longa tradição, como as faculdades particulares que, então, se multiplicavam, tiveram de
se enquadrar aos novos dispositivos.
Cumpre informar que nem todas as determinações da Lei da Reforma Universitária
derivaram diretamente da política educacional da ditadura, algumas demandas de
professores e estudantes foram incorporadas, como por exemplo, a extinção da cátedra
vitalícia e a universidade como padrão de organização do ensino superior.
Nesse momento, já tinha começado o crescimento do setor privado no ensino
superior. Os empresários do ensino implantados no Conselho Federal de Educação criaram
facilidades para que as escolas particulares proliferassem, sem instalações adequadas, sem
laboratórios e bibliotecas, com “professores-fantasmas”. A própria lei da reforma
universitária de 1968 que dizia ser o modo de organização preferencial do ensino superior
a universidade, foi atropelada pela política educacional implícita da ditadura. O resultado
de tudo isso foi que o ensino superior brasileiro é, hoje, dos mais heterogêneos que
existem.
Ainda que não fosse política nem economicamente necessária, as afinidades
eletivas entre os grupos privatistas que lutaram pela aprovação da Lei de Diretrizes e Bases
da Educação Nacional (1961) e os militares que perpetraram o golpe de Estado (1964)
possibilitaram o crescimento do ensino superior a um ritmo até então desconhecido. O
Conselho Federal de Educação, constituído por uma maioria de dirigentes de instituições
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privadas e de seus prepostos, pôs fim ao processo de federalização de estabelecimentos de
ensino superior. Ademais, as normas de criação de cursos, ampliação de vagas e concessão
do “status” universitário foram sendo afrouxadas, na medida mesma da demanda dos
interessados. Subsídios governamentais completaram esse quadro, fosse diretamente, na
forma de transferência de recursos para projetos diversos, a fundo perdido ou a juros
negativos, fosse indiretamente, pelo crédito educativo, sistema de bolsas de estudo
restituíveis, que consiste no pagamento da mensalidade das faculdades diretamente pela
Caixa Econômica Federal.
As universidades públicas desenvolveram-se bastante durante o regime militar,
quando foram construídos campi suburbanos, por vezes monumentais, instituído o trabalho
docente em tempo integral, como regra, criada a pós-graduação articulada à carreira dos
professores e providas linhas de financiamento à pesquisa científica e tecnológica.
Na transição para a democracia (1985/90), correlativamente à tolerância do governo
federal diante das demandas de atenuação do mecanismo de cooptação na escolha de
dirigentes das universidades federais por ele mantidas, seus orçamentos passaram a ser
ainda mais controlados do que jamais foram.
Uma característica do ensino superior brasileiro é a gratuidade de todo o ensino
superior oferecido pelas instituições públicas. Embora a gratuidade existisse de fato desde
os anos 1950, ela só passou a ser garantida de direito pela Constituição de 1988.
Entretanto, as características das universidades públicas em desenvolver atividades de
ensino, pesquisa e extensão (incluindo a manutenção de hospitais, fazendas, teatros,
museus, etc.), implica num custo necessariamente elevado para sua operação. O governo,
para suprir a demanda pelo ensino de graduação, abriu espaço para a expansão do ensino
superior privado, em sua maioria, de baixa qualidade.
Estabelecendo uma relação entre a educação superior brasileira e os modelos
universitários segundo as concepções francesa-napoleônica, norte-americana e
humboldtiana mencionados anteriormente, é importante registrar que hoje esses modelos
convivem em um sistema de ensino superior brasileiro extremamente diversificado, ainda
que, muitas vezes, predomine um determinado tipo, em uma determinada instituição. Nas
instituições isoladas predomina o modelo de formação de profissionais, e nas
universidades públicas ainda que, todavia, o modelo seja acentuado, convive com o
humboldtiano e com o norte-americano.
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Ainda que jamais se tenha firmado no país um modelo típico de universidade
brasileira, segundo Sguissardi (2000, p. 33), pode-se inferir que, a cada época, esta se
apresentou com muitos traços de algum modelo ideal ou idealizado dentre os
predominantes nos países centrais. Hoje, entretanto, talvez seja mais seguro afirmar que
ocorre uma contraditória superposição de modelos universitários e, simultaneamente, o
trânsito para uma universidade – “pública” e privada – neoprofissional, heterônoma e
competitiva. Esse novo conceito de universidade que visa configurar as novas relações
entre Estado e Sociedade irá se configurar a partir do ajuste neoliberal da economia e da
reforma do Estado dos anos 1990, que adquire melhores contornos conceituais e de
organização a partir do Plano Diretor da Reforma do Estado (1995), da Lei de Diretrizes e
Bases (Lei n0 9.394/96), da Lei das Fundações (Lei n0 8959/94), da Legislação (diversas
medidas provisórias, leis, decretos) sobre os Fundos Setoriais e do conjunto de PECs
(Proposta de Emenda Constitucional), decretos, portarias, projetos de lei (da Autonomia,
da Inovação Tecnológica, entre outras) etc.
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2 – A EDUCAÇÃO SUPERIOR BRASILEIRA NO CONTEXTO DA
REFORMA DO ESTADO DOS ANOS 1990.
Diante das transformações em curso desde a década de 1970, no atual estágio de
universalização do capitalismo, o capital entrou em territórios geográficos onde
anteriormente não operava, reorganizando socialmente as estruturas outrora organizadas
segundo racionalidade de natureza diferente da do capital, pressionando por um largo
movimento de reformas institucionais. Em acréscimo, passou a organizar esferas sociais e
políticas que se realizavam sob as diretrizes da lógica pública, instituindo, dessa forma,
novas relações entre o público e o privado, o que, articulado ao movimento geográfico já
citado, marcou mudanças estruturais na reprodução da formação econômico-social
capitalista. (Silva Jr, 2002, p.110). Isso põe em marcha as reformas, em particular, e na
esfera da educação, a reforma educacional brasileira da segunda metade dos anos 1990.
A década de 1980 foi considerada como a “década perdida” para a economia
brasileira e vivemos, àquela época, um intenso processo de redemocratização do país: uma
visível contradição, cuja síntese parece ter sido a profunda e larga mudança nas estruturas
sociais produzida durante a década de 1990. Um processo que se iniciou com o governo
Fernando Collor de Mello, teve uma transição fecunda no governo da Itamar Franco, mas
consolidou-se com Fernando Henrique Cardoso.
Na década de 1990, com a assunção da Presidência da República por Fernando
Henrique Cardoso, o Brasil acentua seu ajuste estrutural, inserindo-se na nova ordem
mundial. Com legitimidade política e eleitoral, o presidente transforma o Brasil no país das
reformas e o submete, apesar de suas peculiaridades, ao figurino do capital, com
participação decisiva dos organismos multilaterais, tendo destaque especial o Banco
Mundial.
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As reformas do Estado no atual estágio do capitalismo mundial tendem para um
desmonte do Estado intervencionista na economia e provedor direto nos setores sociais. A
universalização do capitalismo e a divisão do planeta em megablocos econômicos impõem
uma reforma dos Estados que propicie a expansão do mercado e de sua lógica, sob o
discurso da auto-regulação, bem como possibilitam, a racionalidade mercantil na esfera
pública, como é possível depreender das propostas da reforma administrativa preconizada
por Fernando Henrique Cardoso. Desta forma, na transição do fordismo para o presente
momento histórico do capitalismo mundial, o Estado de bem-estar social dá lugar a um
Estado gestor, que carrega em si a racionalidade empresarial das empresas capitalistas
transnacionais, tornando-se as teorias organizacionais, antes restritas aos muros das
fábricas, as verdadeiras teorias políticas do Estado moderno. A inserção do Brasil nesse
processo provoca também uma transformação no aparelho de Estado, que, de interventor e
estruturador da economia desde a década de 1930, passa, na década de 1990, a um Estado
modernizado e gestor, entretanto, mantendo a economia em favor do capital nacional e
internacional (ibid, p.62).
Tendo como pano de fundo a influência de organismos internacionais, os
pressupostos da Reforma, compreendem: redução de custos e racionalização do gasto
público para assegurar a estabilidade do Plano Real, melhoria da eficiência do aparelho do
Estado e descentralização dos serviços, retirando do Estado as atividades que possam ser
desenvolvidas por outras instituições. Tais pressupostos aparecem detalhados no Caderno
n0 1 (1997, p.7) editado pelo Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado –
Mare, de autoria do ex-ministro Luiz Carlos Bresser Pereira, a partir da indicação de quatro
componentes básicos:
a) a delimitação do tamanho do Estado, reduzindo suas funções através da
privatização, terceirização e publicização, que envolve a criação das
organizações sociais;
b) a redefinição do papel regulador do Estado através da desregulamentação;
c) o aumento da governança, ou seja, a recuperação da capacidade financeira e
administrativa de implementar decisões políticas tomadas pelo governo através
do ajuste fiscal;
d) o aumento da governabilidade ou capacidade política do governo de intermediar
interesses, garantir legitimidade e governar.
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A delimitação do tamanho do Estado é claramente expressa pelas idéias de
“privatização, publicização e terceirização”, que, segundo Bresser Pereira (1997, p.14),
são essenciais para que o Estado torne-se “mais barato, mais eficiente na realização de
suas tarefas, para aliviar o seu custo sobre as empresas nacionais que concorrem
internacionalmente”. Delimitar o tamanho do Estado é deixar a seu cargo apenas as
chamadas funções essenciais, como justiça, segurança interna e relações exteriores,
repassando para o setor privado a saúde, a educação, a previdência e a assistência.
As funções do Estado, a partir da Reforma, ficam assim estabelecidas:
a) Núcleo Estratégico – compreende os Poderes Executivo, Legislativo, Judiciário
e o Ministério Público;
b) Atividades Exclusivas – serviços que só o Estado pode realizar, como
regulamentar, fiscalizar e fomentar;
c) Serviços não-exclusivos – produção de bens e serviços, como escolas,
universidades, centros de pesquisa científica e tecnológica, creches,
ambulatórios, hospitais, entidades assistenciais, museus, emissoras de rádio e
TV educativas e culturais, deslocadas do núcleo exclusivo do Estado e
compreendidas como atividades competitivas que podem ser controladas pelo
mercado;
d) Produção de bens e serviços para o mercado – compreende o segmento
produtivo e o mercado financeiro.
É precisamente no núcleo “serviços não-exclusivos” que o governo FHC estabelece
as premissas da Reforma do Estado na sua relação com a sociedade e o mercado, a partir
dos seguintes objetivos: 1- transferir os serviços não-exclusivos para entidades
denominadas de organizações sociais; 2- buscar autonomia e flexibilidade na prestação
desses serviços; 3- buscar a participação da sociedade mediante o controle desses serviços
através dos conselhos de administração, com centralidade na figura do cidadão-cliente; 4-
fortalecer a parceria entre Estado e sociedade através do contrato de gestão (Simionatto,
1998, p.5)
As Organizações Sociais são “entidades públicas de direito privado que celebram
um contrato de gestão com o Estado e assim são financiadas parcial ou mesmo totalmente
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pelo orçamento público”. As dotações do Estado deverão estar previstas na Lei
Orçamentária e serem aprovadas pelo Congresso. Administradas através do “contrato de
gestão”, com metas de desempenho que assegurem a efetividade de seus serviços, as
Organizações Sociais possuem as mesmas características do setor privado, sendo elas as
instituições que tornarão possível a expansão da ordem privada. Sua extinção pelo não
cumprimento das metas estabelecidas ou por outros motivos será de competência do
Congresso Nacional (ibid).
Simionatto (1997), contribui ainda com esta questão quando observa que
“a sociedade civil, compreendida como um dos mecanismos institucionais de controle das ações governamentais, é articulada em torno de organizações filantrópicas e comunitárias, organizações não-governamentais e instituições do gênero o que fortalece as estratégias de desmonte dos institutos de representação coletivos, remetendo-se a ela a responsabilidade no encaminhamento de projetos que dêem conta dos complicadores das novas expressões da ‘questão social’. Ignorada pelo Estado enquanto esfera de interlocução e atravessada pela racionalidade do mercado, a sociedade civil, representa, em última instância, os interesses de instituições privadas que controlam o Estado e negam a existência de projetos de classe diferenciados. Tomada em sentido transclassistas, é convocada, em nome da cidadania, a realizar parcerias de toda ordem, sendo exemplares os projetos de ‘refilantropização’ das formas de assistência, que, em cada país, sob a ótica da descentralização, assume características semelhantes na condução dos programas focalizados de combate à pobreza” (Simionatto,1997, p.6).
Ao lado da delimitação do tamanho do Estado, inclui-se a privatização do Estado,
onde o mercado é defendido como o locus da garantia da eficiência e da eficácia não
obtidas no espaço público, e como esfera que propicia um controle “mais geral, mais
difuso e automático”. Por isso é compreendido como “o melhor dos mecanismos de
controle, já que através da concorrência obtêm-se, em princípio, os melhores resultados
com os menores custos” (Pereira, 1997, p.26).
A aliança de FHC com as elites econômicas arcaicas e patrimonialistas que sempre
dominaram na realidade brasileira, é denominada por Bresser Pereira como “uma grande
coalizão de centro-esquerda e centro-direita”, capaz de conduzir o Estado rumo ao século
XXI. A nova categoria aqui utilizada é o Estado Social-Liberal, revestida do enganoso
sentido de que é
“social porque continuará a proteger os direitos sociais e a promover o desenvolvimento econômico” e “liberal, porque o fará usando mais os controles de mercado e menos os controles administrativos, porque
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realizará seus serviços sociais e científicos principalmente através de organizações públicas não-estatais competitivas, porque tornará os mercados de trabalho mais flexíveis, porque promoverá a capacitação dos seus recursos humanos e de suas empresas para a inovação e a competição internacional” (Sader, Telles,2 1997 apud Simionatto, 1998, p.4).
Os fundamentos dessa matriz de Estado, contudo, indicam claramente a
mercantilização dos direitos sociais e não a sua defesa; indicam uma retratação do Estado
de direito conseguido com a luta das forças democráticas brasileiras; indicam uma
instrumentalização dos direitos pela racionalidade econômica; indicam um retrocesso na
construção democrática e no exercício da cidadania (ibid).
2.1 – Reforma no Campo Educacional.
Com efeito, o governo instalado em janeiro de 1995 empreendeu uma intensa
atividade reformadora no campo educacional, sem esperar pela promulgação da LDB. Para
tanto, o MEC foi particularmente ativo na elaboração de uma série de projetos de reforma
da Constituição, de medidas provisórias, de projetos de lei e de decretos, cuja lógica não
foi explicitada previamente, nem mesmo na proposta de governo do candidato Fernando
Henrique Cardoso.
Tal fato aponta na direção da constatação de que um texto legal não é apenas um
aglomerado de artigos, parágrafos, alíneas, etc., elaborados apenas tecnicamente. Mas sim,
um conjunto de intencionalidades explícitas ou não no próprio texto, do que se deseja
adotar politicamente em determinada área (Siqueira, 1995, p.15). Nesse sentido, através do
estudo dos instrumentos jurídicos citados a seguir, pode-se constatar a dimensão de política
pública do processo de privatização – em especial da educação superior, foco principal
deste trabalho -, da natureza empresarial do processo da expansão da oferta de vagas nesse
nível de ensino, e do caráter altamente centralizador do MEC na definição dessa política.
Embora existam vários dispositivos legais que estruturam a educação superior
brasileira, são merecedores de destaque por delinearem o seu funcionamento: a
Constituição Federal de 1988, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDB -
2 SADER, Emir. “Direitos e cidadania na era da globalização”. In. BÓGUS, L. e PAULINO, A.Y. (orgs). Políticas de Emprego, Políticas de População e Direitos Sociais. São Paulo, Educ, 1997. TELLES, Vera. “Direitos sociais e direitos dos trabalhadores: por uma ética da cidadania”. In. BÓGUS, L. e PAULINO, A.Y. (orgs). Op. Cit.,1997.
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Lei n0 9.394 de dezembro de 1996, o Decreto n0 2.306 de agosto de 1997 e o Decreto n0
3.860 de julho de 2001 que dispõe sobre a organização do ensino superior, a avaliação de
cursos e instituições, e dá outras providências.
A partir da década de 1990, as propostas de reforma para as universidades públicas
têm provocado uma crescente privatização das mesmas, além de promover uma expansão
desenfreada da rede privada de ensino superior. Essa enorme expansão, deve-se, dentre
outras razões, à escassez de recursos governamentais investidos no sistema público de
educação, transferindo-se para o setor privado a responsabilidade de ampliação das
matrículas no nível superior.
A política neoliberal do Estado para as universidades brasileiras apresenta como
características a falta de investimentos no campo da pesquisa científica e tecnológica e um
abandono em relação ao ensino universitário público. Observa-se também, uma crescente
intervenção do Estado e do MEC nas universidades, via sistema de avaliação e outras
medidas autoritárias, ferindo a autonomia das instituições universitárias, inseridas no texto
legal do Art. 207 da Constituição Federal de 1988.
Constituição Federal de 1988 (Capítulo III – Da Educação, da Cultura e do Desporto. Seção I – Da Educação). Art.207 – As universidades gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial, e obedecerão ao princípio de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão.
A Constituição Federal de 1988 antecipa o caráter privatista da política do Estado
para a educação superior, ao assegurar a destinação de recursos públicos para a iniciativa
privada, mesmo restringindo-os àquelas instituições que comprovem (formalmente)
finalidade não-lucrativa.
Constituição Federal de 1988 (Capítulo III – Da Educação, da Cultura e do Desporto. Seção I – Da Educação). Art.213 – Os recursos públicos serão destinados às escolas públicas, podendo ser dirigidos a escolas comunitárias, confessionais ou filantrópicas, definidas em lei, que: inciso I – comprovem finalidade não lucrativa e apliquem seus excedentes financeiros em educação; inciso II – assegurem a destinação de seu patrimônio a outra escola comunitária, filantrópica ou confessional, ou ao Poder Público, no caso de encerramento de suas atividades.
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§ 10 – Os recursos de que trata este artigo poderão ser destinados a bolsas de estudo para o ensino fundamental e médio na forma da lei, para os que demonstrarem insuficiência de recursos, quando houver falta de vagas e cursos regulares da rede pública na localidade da residência do educando, ficando o Poder Público obrigado a investir prioritariamente na expansão de sua rede na localidade. § 20 – As atividades universitárias de pesquisa e extensão poderão receber apoio financeiro do Poder Público.
Em relação ao artigo acima mencionado, Neves (2002, p.138) observa que “a
limitação da destinação de recursos públicos só a instituições sem fins lucrativos é
relativizada pela permissão de atribuição de subsídios públicos à pesquisa e à extensão
em instituições superiores privadas”. No entanto, é importante destacar que o texto
constitucional, no seu artigo 207, assegura a fragmentação acadêmica da educação
superior, quando este limita às universidades o princípio da indissociabilidade entre ensino,
pesquisa e extensão, deixando margem à permanência de instituições superiores voltadas
apenas para o ensino.
A Lei 9.394/96 resultou de um parto difícil. Os interesses envolvidos no palco das
discussões eram fortes, contraditórios e, não raro, inconciliáveis. Do projeto inicial do
Deputado Octávio Elísio em 1988 ao substitutivo do Senador Darcy Ribeiro, afinal
aprovado em 1996, passaram-se oito longos anos que funcionaram como cenários fecundos
de despistes de interesses.
O Projeto de Lei e Diretrizes e Bases para a Educação Nacional (n0 1257/88)
apresentado por iniciativa do professor e ex-deputado Octávio Elísio, foi sucessivamente
alterado, através de longo e amplo processo de debates e negociação, contando com a
participação de inúmeros setores da sociedade civil organizada (OAB, ABI, CNBB,
ANDES, ANPEd, UNE, empresários do ensino, defensores da escola pública, etc.). O
referido projeto deu origem ao substitutivo do deputado Jorge Hage, depois ao parecer da
deputada Ângela Amim e, finalmente, foi aprovado no âmbito da Câmara, em 28/09/93,
depois de cumprir todos os trâmites legais e passar por inúmeros obstáculos, materializou-
se no substitutivo do senador Cid Sabóia.
Em que pesem críticas que possam ser feitas ao substitutivo do senador Cid Sabóia,
ele foi o projeto possível. Da proposta original do deputado Octávio Elísio até o
substitutivo Sabóia muitos debates e embates ocorreram, sendo o projeto paulatinamente
modificado. Contudo, o substitutivo do senador Cid Sabóia foi aquele que guardou maior
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semelhança com o texto original, que fora construído através de um longo, participativo e
árduo processo de construção democrática (Siqueira, 1995, p.15).
Apoiado pelo então ministro da educação José Goldenberg e pelo ex-ministro
Marco Maciel, o senador Darcy Ribeiro enviou ao Senado, em 1992, um outro projeto de
LDB. Esse novo projeto, agora de “gabinete”, foi considerado pelo executivo como “mais
enxuto” e “menos detalhista”. Tal fato criou um constrangimento, com as duas Casas do
Legislativo (Câmara e Senado) apresentando projetos distintos para a educação nacional,
ou “Constituição do Ensino”, como à época foi denominada. Nesse clima, o projeto que
conseguisse primeiro a aprovação na respectiva Casa Legislativa passaria a ter
precedência.
Instalado o governo Fernando Henrique Cardoso, foi nomeado Ministro da
Educação o economista Paulo Renato Souza, ex-reitor da Unicamp e ex-diretor do Banco
Interamericano de Desenvolvimento. A primeira e mais importante opção da nova equipe
dirigente do MEC foi no tocante à LDB. Diante dos dois projetos, optou por apoiar o do
senado, já que o texto de Darcy Ribeiro, além de menos minucioso, tinha em seu autor
maior receptividade para modificar a versão original para adequar-se às políticas
governamentais. No entanto, ao invés de buscar incluir dispositivos específicos, o MEC
preferiu que o projeto deixasse de tratar dos temas que seriam objeto de projetos de lei
específicos, ou que o fizesse de modo bastante genérico, permitindo articulações com as
medidas em curso de aplicação. Assim, enquanto o projeto de LDB do Senado prosseguia
na tramitação parlamentar, pelas comissões e pelo plenário, ele foi sendo adaptado, com
admirável plasticidade, às políticas elaboradas pelo Poder Executivo (Cunha, 1997, p.66).
No que diz respeito à educação superior e a promulgação da Lei de Diretrizes e
Bases da Educação Nacional, cabe destacar a afirmação de Neves (2002, p.139) de que “a
LDB aprovada em uma conjuntura socio-econômica e política mais claramente definida
em prol dos interesses burgueses, dá mais um passo no sentido da sedimentação do
processo de empresariamento da educação superior”. Tal afirmação fica caracterizada no
Art. 7, que acrescenta mais uma condição de funcionamento da rede privada de ensino.
Além do cumprimento das normas gerais da educação nacional e da autorização pública de
funcionamento, a LDB através do artigo supracitado exige que as instituições privadas de
ensino tenham capacidade de autofinanciamento, ressalvado o previsto no Art. 213 da
Constituição Federal.
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A LDB avança em relação à Constituição quando define os tipos de instituições
privadas de ensino enquadrando-as nas categorias de: particulares em sentido estrito,
comunitárias, confessionais e filantrópicas (Art. 20). Eis o texto legal:
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – Lei N0 9.394, de 1996 (Lei Darcy Ribeiro). Art.20 – As instituições privadas de ensino se enquadrarão nas seguintes categorias: I – particulares em sentido estrito, assim entendidas as que são instituídas e mantidas por uma ou mais pessoas físicas ou jurídicas de direito privado que não apresentem as características dos incisos abaixo; II – comunitárias, assim entendidas as que são instituídas por grupos de pessoas físicas ou por uma ou mais pessoas jurídicas, inclusive cooperativas de professores e alunos que incluam na sua entidade mantenedora representantes da comunidade; III – confessionais, assim entendidas as que são instituídas por grupos de pessoas físicas ou por uma ou mais pessoas jurídicas que atendem a orientação confessional e ideologias específicas e ao disposto no inciso anterior; IV – filantrópicas, na forma da lei.
As definições mencionadas no artigo acima, no entanto, não são claras. Esta falta de
clareza abre um precedente para que uma parte significativa de instituições de ensino
superior consideradas sem fins lucrativos se autodenominarem, simultaneamente, de
comunitárias, confessionais e filantrópicas. Essa imprecisão, observa Neves (2002, p.140),
“tem ajudado a que grandes empresas de ensino superior, por serem julgadas filantrópicas, continuem a receber subsídios públicos. Talvez a imprecisão resida no fato de ser difícil explicar como em uma sociedade capitalista, a iniciativa privada não tenha como horizonte a obtenção de lucro”.
O viés privatizante da LDB também aparece nos artigos 44 e 45. O primeiro
introduz mais um tipo de curso de nível superior, o curso seqüencial por campo de saber e
o segundo assegura o oferecimento da educação superior em instituições públicas ou
privadas.
Art. 44 – A educação superior abrangerá os seguintes cursos e programas:
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I – cursos seqüenciais por campo de saber, de diferentes níveis de abrangência, abertos a candidatos que atendam aos requisitos estabelecidos pelas instituições de ensino; II – de graduação, abertos a candidatos que tenham concluído o ensino médio ou equivalente e tenham sido classificados em processo seletivo; III – de pós-graduação, compreendendo programas de mestrado e doutorado, cursos de especialização, aperfeiçoamento e outros, abertos a candidatos diplomados em cursos de graduação e que atendam às exigências das instituições de ensino; IV – de extensão, abertos a candidatos que atendam aos requisitos estabelecidos em cada caso pelas instituições de ensino. Art. 45 – A educação superior será ministrada em instituições de ensino superior, públicas ou privadas, com variados graus de abrangência ou especialização.
Os cursos seqüenciais foram regulamentados pelo Parecer CES 672/98 do Conselho
Nacional de Educação - CNE, transformado na resolução n0 1, de 27 de janeiro de 1999.
Segundo este texto normativo, os cursos seqüenciais por campos de saber constituem um
conjunto de atividades sistemáticas de formação, alternativas ou complementares aos
cursos de graduação. As instituições de ensino têm a liberdade de definir os requisitos de
acesso, entretanto, os candidatos devem possuir certificados de conclusão de ensino médio.
Estes cursos conferem qualificação técnica, profissional ou acadêmica e, também, poderão
habilitar nos campos das ciências, das humanidades e das artes (neste último caso – campo
das artes – o candidato pode ser, dispensado excepcionalmente, do certificado de conclusão
do ensino médio). A norma prevê dois tipos de cursos seqüenciais: i) os de formação
específica, com destinação coletiva, conduzindo a diploma; ii) os de complementação de
estudos com destinação coletiva ou individual, conduzindo a certificado. Os cursos
seqüenciais de formação estão sujeitos a processos de autorização prévia, tal qual acontece
com todos os cursos de graduação. Enquanto os de complementação de estudos
independem de prévia autorização. Os primeiros terão duração mínima de 1.600 horas e os
segundos terão carga horária, proposta curricular e prazo de integralização fixados pela
instituição que os ministre. Para ambos os tipos de cursos, aplicam-se as normas vigentes
para os cursos de graduação quanto à verificação de freqüência e ao aproveitamento. Por
fim, cabe registrar que os cursos seqüenciais de complementação de estudos com
destinação individual somente serão acessados por candidatos interessados em cumprir
disciplinas que definam um campo de saber (combinação de disciplinas através de um
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processo de penetração e de fusão mútuas) e nas quais haja vaga em cursos de graduação
reconhecidos (Carneiro, 1998, p.127). A linha privatista da LDB em relação à educação
superior, neste caso fica aparente porque as instituições públicas, em geral universitárias,
estão voltadas para a execução de cursos de graduação e de pós-graduação.
Três meses depois da promulgação da LDB, é regulamentado o Sistema Federal de
Educação através do Decreto n0 2.207, de 15 de abril de 1997. Este decreto é revogado em
19 de agosto desse mesmo ano pelo Decreto n0 2.306, mantendo, na sua essência, as
diretrizes estabelecidas no decreto anterior.
O Decreto n0 2.306 dirige-se prioritariamente à regulamentação das atribuições das
instituições superiores privadas de ensino. Nesse sentido, chama a atenção logo de
imediato a “admissão aberta e franca” das instituições educacionais superiores com fins
lucrativos. Ou seja, a educação como um negócio, hoje tão incentivada pelos organismos
internacionais e por nossos governantes e intelectuais orgânicos da burguesia, tem neste
texto de lei sua expressão definitiva (Neves, 2002, p.141).
O caráter empresarial fica mais uma vez explicitado no Artigo 70 deste mesmo
decreto, quando este afirma que
“as instituições classificadas como particulares em sentido estrito com fins lucrativos, ainda que de natureza civil, quando mantidas e administradas por pessoa física, a submissão ao regime de legislação mercantil, quanto aos encargos fiscais, parafiscais e trabalhistas, como se comerciais fossem, equiparados seus mantenedores e administradores ao comerciante em nome individual”.
A organização acadêmica é mencionada no Art. 8, que classifica as instituições de
ensino superior do sistema federal em universidades, centros universitários, faculdades
integradas, faculdades e institutos superiores ou escolas superiores. No entanto, o referido
decreto define apenas os dois primeiros casos. No que diz respeito as universidades, o
Art.9 reforça o princípio da indissociabilidade das atividades de ensino, de pesquisa e de
extensão, atendendo ao disposto no Art. 207 da Constituição Federal e no Art. 52 da Lei n0
9.394, de 1996. E, em relação aos centros universitários, o Art. 12 define essas instituições
de ensino superior como sendo pluricurriculares, abrangendo uma ou mais áreas do
conhecimento, que se caracterizam pela excelência do ensino oferecido, comprovada pela
qualificação do seu corpo docente e pelas condições de trabalho acadêmico oferecidas à
comunidade escolar, nos termos das normas estabelecidas pelo Ministro de Estado da
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Educação e do Desporto para o seu credenciamento. O parágrafo primeiro deste artigo
estende aos centros universitários credenciados autonomia para criar, organizar e extinguir,
em sua sede, cursos e programas de educação superior, assim como remanejar ou ampliar
vagas nos cursos existentes.
Quanto a distinção entre universidades e centros universitários, Saviani (1998,
p.14) observa que
“os centros universitários são um eufemismo das universidades de ensino, isto é, uma universidade de segunda classe, que não necessita desenvolver pesquisa, enquanto alternativa buscada pelo atual governo para viabilizar a expansão, e, por conseqüência, a ‘democratização’ da universidade a baixo custo, em contraposição a um pequeno número de centros de excelência, isto é, as ‘universidades de pesquisa’ que concentrariam o grosso dos investimentos públicos, acentuando o seu caráter elitista”.
Ainda em relação à organização acadêmica das instituições de educação superior, é
importante destacar a colaboração de Neves (2002, p.141 – 142) quando observa que
“ao não explicitar a natureza das demais instituições, o decreto permite inferir, por exemplo, que das faculdades integradas, das faculdades e institutos superiores ou escolas superiores o governo não exige ensino de qualidade, já que só dos centros universitários é exigida a excelência do ensino oferecido, comprovada pela qualificação do corpo docente e pelas condições de trabalho acadêmico oferecidos à comunidade escolar. Acrescenta ainda que para essas instituições, sem excelência de ensino, estaria reservado o papel de certificar a mão-de-obra necessária aos padrões de qualidade das empresas competitivas internacionalmente e amortecer a pressão da demanda cada vez mais expressiva das camadas médias e de pequena parcela das massas populares por acesso à escolarização de nível superior”.
Embora aponte detalhes não especificados no Decreto n0 2.306, o Decreto n0 3.860
de 9 de julho de 2001 reforça as mesmas tendências do anterior. No entanto, alguns pontos
deste novo decreto são merecedores de destaque.
Em lugar dos cinco tipos de instituições de ensino superior, estabelecidos
anteriormente, o novo decreto irá colocá-las em apenas três subgrupos sem alterar a sua
natureza: I – universidades; II – centros universitários e III – faculdades integradas,
faculdades, institutos e/ou escolas superiores. Porém, a novidade em relação ao Decreto n0
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2.306 diz respeito ao estabelecimento da definição de faculdades integradas. Elas são agora
definidas como instituições com propostas curriculares em mais de uma área do
conhecimento, organizadas para atuar com regimento comum e comando unificado
(Art.12). É digno de destaque que esta definição nada esclarece a respeito da qualidade do
ensino a ser ministrado.
As principais mudanças dizem respeito ao aumento da presença da burocracia do
MEC na avaliação das empresas educacionais. A partir de então, a avaliação dos cursos e
instituições de ensino superior será organizada e executada pelo Inep (Instituto Nacional de
Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira), compreendendo as seguintes ações: I –
avaliação dos principais indicadores de desempenho global do sistema nacional de
educação superior, por região e unidade da federação, segundo as áreas do conhecimento e
a classificação das instituições de ensino superior, definidos no Sistema de Avaliação e
Informação Educacional do Inep; II – avaliação institucional do desempenho individual
das instituições de ensino superior; III – avaliação dos cursos superiores, mediante a
análise dos resultados do Exame Nacional de Cursos e das condições de oferta de cursos
superiores (Art.17).
É importante ainda ressaltar que além das leis, também são importantes
instrumentos de definição e implementação de políticas públicas o Planejamento Político-
Estratégico (1995/1998), do Ministério da Educação e do Desporto, e o Plano Nacional de
Educação - PNE, aprovado pelo Congresso Nacional e sancionado, em 9 de janeiro de
2001.
O planejamento político-estratégico do MEC para 1995-1998 inicia o processo de
planejamento do governo FHC para a área educacional, no momento em que a proposta
neoliberal de sociedade e de educação passa a ser implantada mais sistematicamente
(Neves, 2002, p.144). Nesse sentido, elege como pontos principais: a) a prioridade do
governo federal para o ensino fundamental obrigatório; b) a valorização da escola e de sua
autonomia e a responsabilidade para com o aluno, a comunidade e a sociedade; c) a
promoção da modernização gerencial em todos os níveis e modalidades de ensino, assim
como nos órgãos de gestão; d) utilização e disseminação de modernas tecnologias
educacionais; e) a progressiva transformação do MEC em um organismo eficaz de
formulação, coordenação e acompanhamento de políticas públicas na área educacional, e a
conseqüente redução de seu papel executivo; f) a articulação de políticas e de esforços
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entre os três níveis da federação, de maneira a obter resultados mais eficazes (Brasil, 1995,
p.4).
Especialmente quando se propõe a ser um organismo de formulação, coordenação e
acompanhamento de políticas educacionais, reduzindo o seu papel de executor, o MEC
aponta, já em 1995, para o formato que iria tomar o processo de privatização da educação
superior. Na íntegra, diz o documento:
“cabe ao MEC um papel político-estratégico na coordenação da política nacional de educação: estabelecer rumos, diretizes e fornecer mecanismos de apoio às instâncias estaduais e municipais da administração pública e ao setor privado” (ibid).
Mantendo o foco na direção da educação superior, é digno de destaque a proposta
do MEC em eleger como prioridade a implantação da autonomia na rede federal de ensino
e a definição de novas formas de relacionamento com as demais instituições de ensino
superior, especialmente as estatais e as comunitárias, criando mecanismos de fomento à
melhoria da qualidade de ensino. Nesse sentido, Neves (2002, p.145-146) observa que
“o fato do plano privilegiar a parceria na educação superior com as instituições estaduais e comunitárias, o MEC parece já ter traçado uma divisão entre as instituições que poderiam oferecer ensino de qualidade em instituições universitárias (de ensino e pesquisa) e as demais instituições não-universitárias, em geral empresariais”.
A proposta propõe o fortalecimento da educação superior como elemento
estratégico para o desenvolvimento nacional, no entanto, desmonta o princípio da
indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão, quando reconhece a diversidade e
heterogeneidade do sistema de ensino superior e a necessidade de formulação de políticas
diversificadas para a promoção da consolidação de centros de excelência em pesquisa e
pós-graduação, para o estímulo à criação de mestrados stricto sensu profissionalizantes,
além da simplificação das exigências burocráticas para reconhecimento de cursos e
credenciamento de instituições privadas.
A maioria das mudanças introduzidas encontram-se claramente definidas neste
instrumento de planejamento, cabe destacar: 1) a extensão do sistema de avaliação para
abranger o ensino de graduação, através de exames de final de curso e avaliação por
comissões especiais; 2) o estabelecimento de um sistema de recredenciamento periódico
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das instituições, baseado em processos avaliativos; 3) a flexibilização do Programa de
Incentivo à Capacitação Docente e Técnica (PICD); 4) a valorização dos modelos
institucionais alternativos de formação para o mercado de trabalho, especialmente a
formação de professores para o ensino básico; 5) o incentivo às relações com o setor
produtivo, o estímulo ao ensino superior à distância, a reorganização do financiamento do
Programa de Crédito Educativo e o estabelecimento de medidas para promover a
ampliação e a readequação da pós-graduação em sentido lato (Brasil, 1995, p.27-29). É
bom lembrar ainda, que nem tudo que o plano previu foi totalmente executado, a
autonomia dos hospitais universitários e a ampliação da oferta de vagas nos cursos
noturnos públicos por exemplo, foram diretrizes não executadas.
O planejamento estratégico do MEC pretendia atingir suas metas durante o
primeiro governo de Fernando Henrique Cardoso, porém muitas delas só vieram a se
viabilizar durante o seu segundo governo, que manteve a mesma direção política em
relação à educação e o mesmo ministro, o economista Paulo Renato Souza.
No campo da legislação e das normas que regulamentam as diferentes políticas
públicas, vários são os instrumentos postos à disposição da sociedade nos níveis municipal,
estadual e federal. Nesse sentido, a norma mais abrangente que visa a estabelecer um
conjunto de diretrizes e metas que tem por finalidade balizar e orientar não apenas o
sistema educacional do país, mas sua própria política educacional é o Plano Nacional de
Educação – PNE.
A idéia de um Plano Nacional de Educação remonta aos ideais lançados por um
grupo de vinte e seis educadores, que em 1932 propuseram um manifesto ao povo e ao
governo que ficou conhecido como “Manifesto dos Pioneiros da Educação”. Dentre os
vários conteúdos do Manifesto que resultaram em artigos da Constituição de 1934, a
fixação de um Plano Nacional de Educação foi contemplada no artigo 150, quando este
registra ser de competência da União “Fixar o plano nacional de educação, compreensivo
ao ensino de todos os graus e ramos, comuns e especializados; e coordenar e fiscalizar a
sua execução em todo território do País”. O artigo 152 atribuía ao Conselho Nacional de
Educação a incumbência de “elaborar o plano para ser aprovado pelo Poder Legislativo,
sugerindo ao Governo as medidas que julgasse necessárias para a melhor solução dos
problemas educacionais bem como a distribuição adequada de fundos especiais”. Com
exceção da Carta de 37, produto do golpe de Estado que instalou o Estado Novo, todas as
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demais constituições incluíram a idéia de um Plano Nacional de Educação (Mendonça,
2002, p.14).
O primeiro PNE elaborado, no entanto, surgiu em 1962 já na vigência da primeira
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei n0 4.024, de 1961. Proposto como
iniciativa do Ministério da Educação e Cultura e não como projeto de lei, foi aprovado pelo
Conselho Federal de Educação. Era basicamente um conjunto de metas quantitativas e
qualitativas a serem atingidas no prazo de oito anos. Em 1965, sob a influência do golpe
militar de 1964, o plano sofreu uma revisão, quando foram introduzidas normas
descentralizadoras e estimuladoras da elaboração de planos estaduais. Em 1966, uma nova
revisão, que se chamou Plano Complementar de Educação, introduziu importantes
alterações na distribuição dos recursos federais, beneficiando a implantação de ginásios
orientados para o trabalho e o atendimento de analfabetos com mais de dez anos. Em 1967,
ressurgiu, no âmbito do MEC, a idéia de uma lei criadora de um PNE, mas essa intenção
não chegou a se concretizar (Saviani, 1998, p. 73-78).
Os fundamentos legais em vigor para a fixação de um PNE estão expressos na
Constituição de 1988 e na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, 9.394/96. A
Constituição Federal de 1988 traz novamente a idéia de um plano nacional de longo prazo,
com força de lei, capaz de conferir estabilidade às iniciativas governamentais na área de
educação. O art. 214, transcrito a seguir, contempla esta obrigatoriedade.
A lei estabelecerá o plano nacional de educação, de duração plurianual, visando à articulação e ao desenvolvimento do ensino em seus diversos níveis e à integração das ações do Poder Público que conduzam à: I – Erradicação do analfabetismo; II – Universalização do atendimento escolar; III – Melhoria da qualidade de ensino; IV – Formação para o trabalho; V – Promoção humanística, científica e tecnológica do País.
Por outro lado, a lei n0 9.394 de 1996, determina nos artigos 9 e 87,
respectivamente, que cabe à União, a elaboração do Plano, em colaboração com os
Estados, o Distrito Federal e os Municípios, e institui a Década da Educação. Estabelece,
ainda, que a União encaminhe o Plano ao Congresso Nacional, um ano após a publicação
da citada lei, com diretrizes e metas para os dez anos posteriores, em sintonia com a
Declaração Mundial sobre Educação para Todos.
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Atendendo aos textos legais, foram apresentados ao Congresso Nacional dois
projetos de lei. Um advindo de entidades educacionais, conhecido como “PNE da
Sociedade Brasileira”, elaborado em dois Congressos Nacionais de Educação, com ampla
participação de educadores e sob a coordenação de entidades educacionais. Outro,
apresentado pelo executivo, elaborado pelo MEC.
Em atenção às normas regimentais, o projeto da Sociedade Brasileira teve primazia,
sendo o projeto de lei originado no MEC anexado ao primeiro no dia 13/03/1998, iniciando
sua tramitação pelas diferentes comissões. Depois de audiências públicas, a elaboração do
parecer final foi feita por meio de um projeto substitutivo redigido pelo deputado Nelson
Marchezan. Em 30/11/1999, o plano foi aprovado na Comissão de Educação, Cultura e
Desporto. Em abril de 2000, o texto foi aprovado pelo plenário da Câmara Federal
seguindo, logo após, para o Senado Federal, sendo aprovado, na íntegra, na Comissão de
Educação e tendo sido seu relator o senador José Jorge. Finalmente, em 14/02/2000, o
projeto de lei que institui o PNE foi aprovado no plenário do Senado Federal. Em
09/01/2001, após a imposição de vetos parciais, o PNE foi sancionado pelo presidente da
República por meio da Lei 10.172/2001 (Mendonça, 2002, p.17).
Em síntese, o Plano tem como objetivos declarados: a elevação global do nível de
escolaridade da população; a melhoria da qualidade do ensino em todos os níveis; a
redução das desigualdades sociais e regionais no tocante ao acesso e à permanência, com
sucesso, na educação pública e a democratização da gestão do ensino público, nos
estabelecimentos oficiais, obedecendo aos princípios da participação dos profissionais da
educação na elaboração do projeto pedagógico da escola e a participação das comunidades
escolar e local em conselhos escolares ou equivalentes.
Segundo Neves (2002, p.147), “estes objetivos, pelo seu grau de generalização,
não permitem caracterizar com exatidão os princípios neoliberais para a educação
escolar”. Essas características começam a ser claramente identificáveis quando da
apresentação das prioridades, diretrizes e metas para aspectos específicos da educação.
São as seguintes as prioridades educacionais estabelecida pelo plano:
a) garantia de ensino fundamental obrigatório de oito anos para todas as crianças
de 7 a 14 anos, assegurando o seu ingresso e permanência na escola e a
conclusão desse ensino;
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b) garantia de ensino fundamental a todos os que a ele não tiveram acesso na idade
própria ou que não o concluíram;
c) ampliação do atendimento nos demais níveis de ensino – a educação infantil, o
ensino médio e a educação superior;
d) valorização dos profissionais da educação;
e) desenvolvimento de sistemas de informação e de avaliação em todos os níveis e
modalidades de ensino.
É importante destacar que na terceira prioridade, o plano estabelece para a educação
superior a ampliação do atendimento, ou seja, maior acesso, que nesse plano, significa
garantia crescente de vagas e, simultaneamente, oportunidade de formação que
corresponda às necessidades das diferentes faixas etárias, assim como, nos níveis mais
elevados, às necessidades da sociedade, no que se refere as lideranças científicas e
tecnológicas, artísticas e culturais, políticas e intelectuais, empresariais e sindicais, além
das demandas do mercado de trabalho. Faz parte dessa prioridade a garantia de
oportunidades de educação profissional complementar à educação básica, que conduza ao
permanente desenvolvimento de aptidões para a vida produtiva, integrada às diferentes
formas de educação, ao trabalho, à ciência e à tecnologia.
Nesse sentido, Neves (2002, p.148), observa que
“ficam aí definidas as funções econômica e ético-política da educação superior: preparar mão-de-obra qualificada para o mercado de trabalho e lideranças sociais sintonizadas com as mudanças qualitativas ocorridas no mundo capitalista na atualidade. O plano preocupa-se, simultaneamente, em adequar o homem brasileiro deste início de século à forma capitalista de trabalho e de vida”.
O Plano Nacional de Educação, em seu diagnóstico sobre as necessidades da
sociedade contemporânea, reconhece o papel relevante das universidades e dos centros de
pesquisa, quando registra que
“nenhum país pode aspirar a ser desenvolvido e independente sem um forte sistema de educação superior. Num mundo em que o conhecimento sobrepuja os recursos materiais como fator de desenvolvimento humano, a importância da educação superior e de suas instituições é cada vez maior. Para que estas possam desempenhar sua missão educacional, institucional e social, o apoio
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público é decisivo. A importância que neste plano se deve dar às Instituições de Ensino Superior (IES), mormente à universidade e aos centros de pesquisa, erige-se sobre a constatação de que a produção de conhecimento, hoje mais do que nunca, e assim tende a ser cada vez mais, é a base do desenvolvimento científico e tecnológico e que este é que está criando o dinamismo das sociedades atuais”.
O PNE menciona a necessidade e a importância da pesquisa científica e tecnológica
mas, em suas metas, aponta para outra direção. Paradoxalmente, logo após este enunciado,
o PNE, estabelece para o sistema de educação superior a coexistência de um conjunto
diversificado de instituições que atendam a diferentes demandas e funções, embora
reconheça nas universidades o seu núcleo estratégico. Apontando para uma diversificação
das instituições de ensino e, por consequência, fugindo de um padrão único de qualidade, o
PNE verga-se às reformas educacionais promovidas sob a influência dos organismos
internacionais de financiamento, tendo como base a reforma constitucional promovida pela
União a partir dos anos 1990 e a regulamentação dos dispositivos da Carta Magna,
especialmente, a LDB e os vários decretos editados pelo Executivo (Leher, 2000).
Ao propalar a necessidade de adaptação das instituições superiores de ensino ao
mercado, o PNE defende o conceito de diferentes instituições a partir de diferentes
vocações. Essa diferença, no entanto, abala os alicerces da concepção de universidade
forjada na autonomia e na indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão, fixada pela
Constituição Federal de 1988, em seu artigo 207. Nesse sentido, o que o PNE faz é
aprofundar o confronto legal estabelecido pela LDB, ao admitir a existência de centros
universitários voltados apenas para o ensino, mas gozando de prerrogativas antes apenas
afetas à universidade. Na medida em que algumas dessas instituições voltam-se
exclusivamente para o ensino, dispensando-se das atividades de pesquisa e extensão, o que
é transformada é a própria natureza da universidade, conquistada pelas reivindicações
históricas dos educadores (Mendonça, 2002).
Quanto ao atendimento, o plano estabelece que 30% dos jovens entre dezoito e
vinte e quatro anos dêem continuidade aos estudos de nível médio freqüentando uma
instituição de ensino superior, com 40% desse atendimento educacional em instituições
públicas, recomendando que, para que esse percentual seja atingido, a União e os estados
estabeleçam parcerias. Essa meta percentual mereceu veto da presidência da República,
sob a alegação de que não está em consonância com o texto constitucional que exige, no
seu art. 165, § 40, que os planos e programas nacionais, regionais e locais sejam elaborados
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em acordo com o Plano Plurianual - PPA e com a Lei Orçamentária, além do que, a Lei de
Responsabilidade Fiscal seria contrariada pelo impacto imediato causado pela ampliação
de vagas públicas para o ensino superior. Em termos práticos, o veto presidencial reforça a
previsão de que esta expansão se daria, prioritariamente, nas instituições superiores não-
universitárias da rede privada de ensino.
Em relação ao financiamento e gestão da educação brasileira, o PNE fixa diretrizes
em quarenta e quatro metas. O plano previu a elevação dos gastos públicos com educação
para 7% do Produto Interno Bruto brasileiro em dez anos, na razão de 0,5% anuais nos
quatro primeiros anos e 0,6% no quinto ano. Os orçamentos das três esferas
governamentais (Federal, estadual e municipal) devem ser orientados para cumprir
vinculações constitucionais e, em dois anos, serem alocados valores por aluno, em todos os
níveis e modalidades de ensino, que correspondam a padrões de qualidade definidos
nacionalmente. No entanto, esta meta foi vetada pelo presidente FHC, sob a alegação que
isso acarretaria um acréscimo em torno de 5 bilhões de reais por ano, sem qualquer
indicação de fonte de arrecadação ou forma de compartilhamento entre a União, os estados
e os municípios, e alegando mais uma vez a inconformidade com o PPA e com o interesse
público, o veto é imposto (ibid, p.41). As alegações são frágeis pois os governos podem
fazer – e o fazem o tempo todo – remanejamento (legal e ilegal) de verbas3. Além disso, o
PPA será inevitavelmente bastante alterado pelo simples fato de o próprio governo preferir
remunerar o capital financeiro a investir nos setores sociais, fragilizando qualquer meta de
qualquer plano (Davies, 2001, p.8).
Em termos conclusivos, pode-se aferir que não há dúvida quanto ao caráter
privatista e empresarial da política definida pelos governos FHC. Neves (2002, p.150)
reforça tal afirmação ao observar que o PNE, antevendo a ampliação da pressão popular
pelo aumento de vagas, em decorrência do aumento acelerado do número de egressos da
educação média, reconhece a “contribuição do setor privado” na expansão da oferta, uma
vez que este setor já oferece a maior parte das vagas na educação superior. Propõe, ainda: a
extensão de diferentes prerrogativas de autonomia às instituições não-universitárias
públicas e privadas, com base no sistema de avaliação; o favorecimento aos
3 Exemplos dessas movimentações são as Emendas Constitucionais e leis que, de iniciativa do governo, vêm retirando recursos da educação. A Emenda Constitucional que criou o Fundo Social de Emergência, em 1994, e posteriormente prorrogada até dezembro de 1999, com o nome de Fundo de Estabilização Fiscal (FEF), resultou na perda de bilhões de reais para a educação pública em âmbito federal, estadual e municipal, pois desvinculou 20% dos impostos federais destinados à manutenção e desenvolvimento do ensino (MDE), assim como 20% do salário-educação (Davies, 2001, p.2).
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estabelecimentos não-universitários que atendam clientelas com demandas específicas de
formação, em especial a tecnológica, a de profissional liberal e a de magistério, e também
o incentivo à criação de cursos seqüenciais e de cursos modulares.
As questões que envolvem os problemas educacionais apontadas nos diagnósticos
do Plano Nacional de Educação poderiam ser objeto de intensa campanha de mobilização
nacional. O compromisso com a qualidade e com a democratização da educação brasileira
exige que a sua organização reafirme os princípios liberais do direito de todos à escola
pública, gratuita, laica e de qualidade.
2.2 – Um Retrato da Expansão do Setor Privado Através do Censo da
Educação Superior.
Ainda em relação a educação superior, o período correspondente aos dois mandatos
de FHC foi caracterizado, sobretudo, pela enorme expansão do setor privado. Tal expansão
pode ser nitidamente observada através do Censo da Educação Superior, que trata-se de um
levantamento de dados realizado anualmente pelo Inep, com a finalidade de fazer uma
radiografia da educação superior no Brasil. Esses dados são obtidos através de
questionários respondidos pelas instituições de ensino superior por meio da Internet.
Com base em um conjunto de dados, apresentados de maneira detalhada, o Censo
da Educação Superior oferece uma visão das tendências desse nível de ensino. Fazendo
uma análise dos dados referentes ao período 1992-2002, percebe-se que o número de
Instituições públicas de ensino superior diminuiu de 227 unidades existentes em 1992 para
195 em 2002, diminuição ocorrida, sobretudo nas instituições estaduais e municipais,
enquanto que no setor privado, considerando o mesmo período, este número aumentou de
666 para 1.442 unidades. Observa-se ainda, que o crescimento das IES privadas se deu de
forma mais acentuada na segunda gestão do governo Fernando Henrique Cardoso, ou seja,
no período de 1998 a 2002. Somente nesse intervalo de tempo, foram criadas 678 novas
instituições de caráter privado, praticamente dobrando o número de IES particulares
existentes no início deste período. Com isso, fica nítida a opção do governo FHC em
incentivar a privatização desse nível de ensino, desobrigando o Estado para com a
educação superior.
A tabela apresentada a seguir (tabela I) mostra a distribuição percentual do número
de IES, por categoria administrativa, considerando o período mencionado acima.
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Tabela I
Número de Instituições de Educação Superior, por Categoria Administrativa.
1992 - 2002
Ano
Total
Pública
%
Privada
%
1992 893 227 25,4 666 74,6
1994 851 218 25,6 633 74,4
1996 922 211 22,9 711 77,1
1998 973 209 21,5 764 78,5
2000 1.180 176 14,9 1.004 85,1
2002 1.637 195 11,9 1.442 88,1
Fonte: MEC/INEP/DAES
Censo da Educação Superior – Sinopse Estatística
Resumo Técnico 2002
A realidade empresarial dá a educação superior uma nova concepção, muito
diferente das universidades baseadas no tripé ensino-pesquisa-extensão. Se,
historicamente, essa educação superior atendia a uma lógica estratégica na qual as
universidades, em sua maioria públicas, eram os pilares de uma política de
desenvolvimento científico e tecnológico, na década de 1990, sobretudo, essa lógica passa
a ser a do mercado.
O que norteia a instalação de um novo estabelecimento de ensino não é o
desenvolvimento nacional, mas as possibilidades de ser lucrativo ao seu dono. Orientada
por estudos de mercado, que determinam onde há demanda pelos cursos, a partir da
identificação de locais em que existem mais jovens egressos do ensino médio com
possibilidades de arcar com os custos para o diploma, a distribuição das instituições passa
a se concentrar nos grandes centros financeiros do país.
O ensino superior também deixa de ter sua expansão baseada nas universidades,
que representam menos de 10% das instituições privadas. O investimento para a instalação
e o custo de manutenção de uma universidade são bem maiores do que em faculdades, daí
a explicação para a maioria das instituição privadas de ensino superior serem
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estabelecimentos isolados. Maiores investimentos e custos significam mensalidades mais
altas, o que torna o “produto” menos competitivo.
Para as iniciativas empresariais, o que vale é oferecer um produto vendável para
mais pessoas e com margens de lucro vantajosas, ainda que com baixa qualidade de ensino.
A pesquisa e a extensão, por exemplo, características não-obrigatórias nas faculdades, mas
importantes na formação do profissional, são deixadas de lado.
Em relação ao número de cursos de graduação presencial, os dados do Censo da
Educação Superior – 2002 mostram que o crescimento do número desses cursos é ainda
mais vertiginoso: foram criados, nos últimos cinco anos da gestão de FHC, 1.490 novos
cursos ao ano, ou 124 ao mês ou 4 ao dia. A expansão ocorreu, principalmente, na rede
privada, que passou de 3.980 cursos registrados em 1998 para 9.147 cursos em 2002,
concentrando 63,5% do total. Contudo, é importante destacar que embora tenha ocorrido
uma diminuição no número de IES públicas neste período, o número de cursos oferecidos
por essas instituições aumentou de 2.970 para 5.252.
No que se refere ao número de matrículas nos cursos de graduação presencial, o
referido Censo registra quase 3,5 milhões de alunos em 2002, um acréscimo de cerca de
800 mil alunos em relação a 2000. Destaca-se a participação do setor privado no número
total de matrículas, atingindo em 2002 a casa dos 70%. A explosão de matrículas nas
particulares fez com que elas subissem no ranking das maiores instituições do país. No
final do segundo governo de FHC, entre as dez maiores universidades do país em alunos
matriculados na graduação seis são privadas, três estaduais e apenas uma federal.
A grande expansão de instituições privadas e cursos, evidentemente promoveram
um significativo aumento na oferta de vagas para ingresso na educação superior. Segundo
o Censo da Educação Superior – 2002, em um período de seis anos o número de vagas
oferecidas pelas IES privadas praticamente triplicou, passou de pouco mais de 500.000 em
1997 para quase 1.500.000 no final de 2002.
A demanda daqueles que, oprimidos pela desigualdade social e econômica, buscam
na educação superior, a promessa de melhores condições de vida, fez com que o número de
inscrições nos processos seletivos aumentasse de forma bastante expressiva.
Os dados do Censo revelam que em 2002 houve um total de 4.984.409 inscrições,
sendo 2.627.200 (52,7%) nas IES públicas e 2.357.209 (47,3%) nas IES privadas. É
importante observar que o número de inscrições não corresponde exatamente ao número de
pessoas que se candidatam a uma vaga no ensino superior, pois o mesmo aluno pode se
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inscrever para mais de uma instituição, em função dos processos seletivos ocorrerem
isoladamente.
A evolução do número de inscrições em comparação com o de vagas oferecidas,
permite a observação que no conjunto das IES houve uma diminuição na relação
candidato/vaga, o que pode ser atribuído à já destacada grande expansão de instituições e
cursos e ao aumento de vagas nas IES existentes. Como um todo, é possível inferir que
ficou mais fácil ingressar na educação superior, no entanto, é importante lembrar, que tal
inferência não se sustenta junto às IES públicas e gratuitas; com efeito, enquanto a relação
candidato/vaga nas IES privadas decresceu de 2,2 em 1998 para 1,6 em 2002, nas IES
públicas esta relação cresceu ano a ano desde o início da década de 90, que era de 6,2,
chegando em 2002 a 8,9 candidatos por vaga, incluídos aí todos os processos seletivos.
Os dados do Censo da Educação Superior em relação ao número de ingressos,
mostram que o número de calouros nas instituições públicas aumentou de 149.726 em
1992 para 280.491 em 2002. Já nas instituições privadas, considerando o mesmo período, o
crescimento foi bem mais acentuado, em 1992 ingressaram 261.184 alunos e em 2002 esse
número atingiu a marca de 924.649 estudantes. Observa-se ainda que nas IES públicas o
crescimento ocorreu de modo ordenado e gradual, enquanto que nas IES privadas a maior
variação ocorreu a partir da segunda metade da década de 1990. Se considerarmos o
período de 1996 a 2002, perceberemos que o número de ingressos nas IES privadas
praticamente triplicou. Isso reitera a constatação de que as IES privadas se expandiram e se
expandem, não só porque existe uma demanda pelo ensino superior, mas também, e,
sobretudo, porque os governos não têm procurado atender a toda a demanda em
instituições públicas, desviando-a para as IES privadas.
Finalmente cabe destacar que o número de alunos por professor, cresceu tanto nas
instituições públicas quanto nas privadas, revelando em 2002 uma média de 15,3 alunos
por professor, contra 12,9 em 1998. Nas instituições privadas essa relação ficou em 16,9
alunos/professor, mantendo-se estável desde 1998. Já nas instituições públicas o número
cresceu de 9,6, em 1998, para 12,5, em 2002. É provável que a forte presença de
programas de mestrados e doutorados nas universidades públicas, pela natureza singular do
trabalho, e a maior quantidade de alunos em sala de aula por parte das IES privadas,
explique a diferença nos números. Para uma compreensão mais precisa desses números é
necessário considerar as diferenças de natureza e de vocação das instituições, ou seja;
diferenciar as universidades públicas que procuram obedecer ao princípio da
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indissociabilidade de ensino, pesquisa e extensão, das instituições privadas que exploram
fundamentalmente o ensino, na grande maioria dos casos com fins lucrativos. Em outras
palavras, é importante evitar a tentação de produzir inferências e generalizações
unicamente em função de seus indicadores relativos às atividades de ensino de graduação.
Os números do Censo é bom lembrar, não registram a produção docente relativa às
atividades de pesquisa, extensão e pós-graduação stricto sensu, que em muitas instituições
consomem parte significativa do esforço docente.
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3 – REFORMA DA EDUCAÇÃO SUPERIOR NO GOVERNO LULA E
O PROGRAMA UNIVERSIDADE PARA TODOS.
É fato por si mesmo significativo que, transcorridas duas décadas desde a transição
democrática, o sistema brasileiro de educação superior continue regido por um estatuto
legal herdado do regime autoritário. No governo Lula a “Reforma Universitária” foi
inserida na agenda das prioridades nacionais depois de várias décadas de retardamento do
debate na Nova República. Não obstante, é sempre bom destacar que hoje, o sistema de
educação superior brasileiro está fragmentado: banalizou-se o conceito de universidade e
expandiram-se as instituições privadas com critérios frouxos de regulação e supervisão. A
combinação entre uma forte expansão do setor privado sem qualquer planejamento e um
sistema público com universidades de pequeno porte em termos latino-americanos é uma
das principais questões que não pode deixar de ser abordada pela Reforma da Educação
Superior do governo Lula.
A eleição de Luiz Inácio Lula da Silva em outubro de 2002 despertou grandes
expectativas na centro-esquerda. Para muitos, a sua eleição proclamou uma nova época de
mudanças progressivas que, mesmo não sendo revolucionárias, definiam o “fim do
neoliberalismo”. No entanto, o que tem-se observado é um continuísmo e em alguns
pontos até um aprofundamento da política praticada por seus mais recentes antecessores,
que, uma vez eleitos, esqueceram-se total ou parcialmente das promessas de campanha e
adotaram as orientações dos organismos internacionais, em especial do Banco Mundial, e
do “mercado”. Mais uma vez, as expectativas de mudanças estruturais na sociedade e na
educação, não se realizaram.
O ensino superior brasileiro passa por uma crise sem precedentes; déficit de
professores, ausência de condições estruturais, cortes constantes de verbas e inexistência
de bolsas suficientes de pesquisa e extensão formam o cotidiano das instituições públicas.
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Nas privadas, graves problemas mobilizam a atenção de professores, estudantes e da
comunidade; faltam condições estruturais apropriadas para a manutenção de diversos
cursos e núcleos, tornando a qualidade do ensino oferecido objeto de questionamento.
Cristóvam Buarque, primeiro ministro da educação do Governo Lula, sempre
esteve mais preocupado com a educação básica, em especial com alfabetização, e de fato,
não desejava o ensino superior na sua pasta. Mesmo assim, alguns projetos reformando
aspectos do ensino superior foram apresentados no legislativo e por outros setores do
executivo durante a sua gestão.
Serão abordados a seguir, alguns aspectos da reforma da educação superior no
governo Lula, no entanto a questão do Programa Universidade para Todos – Prouni, será
enfatizada mais adiante como um sub-item deste capítulo.
3.1 – Aspectos da Reforma da Educação Superior no Governo Lula.
A Reforma Universitária do Governo Lula da Silva se inicia, em caráter oficial,
com a criação de um Grupo de Trabalho Interministerial -GTI que tinha como objetivos
principais, analisar a situação da educação superior brasileira e apresentar um plano de
ação visando a reestruturação, desenvolvimento e democratização das Instituições Federais
de Ensino Superior - IFES. O GTI foi composto por 12 membros, com representantes do
Ministério da Educação, da Casa Civil, da Secretaria Geral da Presidência da República, do
Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, do Ministério da Ciência e Tecnologia e
do Ministério da Fazenda (Otranto, 2002, p.1).
O relatório final do GTI, divulgado em dezembro de 2003, intitulado “Bases para o
enfrentamento da crise emergencial das universidades brasileiras e roteiro para a reforma
da universidade brasileira”, é composto de quatro partes, enfocando: ações emergenciais;
autonomia universitária; complementação de recursos (financiamento) e as etapas para a
implementação da Reforma Universitária.
Inicialmente o documento reconhece a situação de crise em que se encontra a
educação superior brasileira, em especial as universidades federais, mas atribui o problema
à crise fiscal do Estado, sem maiores aprofundamentos de sua origem. Em seguida, procura
demonstrar que a crise já está atingindo também as IES privadas, que passaram por enorme
expansão nos últimos anos e agora encontram-se ameaçadas pelo risco da inadimplência
generalizada do alunado e de uma crescente falta de confiabilidade de seus diplomas. Após
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esse preâmbulo, aponta as soluções: a) um programa emergencial de apoio ao ensino
superior, especialmente às universidades federais; b) uma reforma universitária mais
profunda.
Pelo termo “reforma mais profunda” passa a reposição do quadro docente, a
ampliação de vagas para estudantes, a educação à distância, a autonomia universitária e o
financiamento.
A ampliação do quadro docente é articulada à ampliação de vagas para estudantes
de graduação nas universidades federais que, segundo o relatório do GTI, seria necessário
chegar a 2,4 milhões de vagas no sistema federal até 2007. O documento menciona a
necessidade da abertura de concursos para preencher as vagas de professores e servidores,
mas mesmo assim, o GTI apresenta com alternativa para fazer frente à demanda, a criação
de novas bolsas da CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível
Superior) para aproveitar aposentados e recém doutores nas atividades de ensino de
graduação. Na seqüência, propõe o aumento da carga horária dos professores em sala de
aula, o aumento do número de alunos por turma e a educação à distância. Essas propostas
foram amplamente defendidas e assumidas, no que foi possível, por Fernando Henrique
Cardoso, em seus dois governos, e agora são defendidas e assumidas pelo governo Lula.
A ênfase no ensino de graduação, no aumento da carga horária do professor em sala
de aula e na ampliação do número de alunos por turma, priorizam a quantidade em
detrimento da qualidade do ensino e remetem a uma nova concepção de universidade
voltada apenas para o ensino, bem diferente daquela, que explicitada na Constituição
Federal, deveria obedecer ao princípio da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e
extensão.
O relatório do Grupo de Trabalho Interministerial aponta a educação à distância
como um caminho viável e necessário para a universidade pública brasileira. Segundo o
documento a educação presencial, mesmo com a ampliação de recursos, não tem condições
de aumentar as vagas de forma maciça em curto e médios prazos.
Para os efeitos pretendidos, a educação à distância é compreendida como atividade
pedagógica que é caracterizada por um processo de ensino-aprendizagem realizado com
mediação docente e a utilização de recursos didáticos sistematicamente organizados,
apresentados em diferentes suportes tecnológicos de informação e comunicação, os quais
podem ser utilizados de forma isolada ou combinadamente, sem a freqüência obrigatória
de alunos e professores, nos termos do art. 47, § 30, da LDB.
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Art. 47 – Na educação superior, o ano letivo regular, independe do ano civil, tem, no mínimo, duzentos dias de trabalho acadêmico efetivo, excluído o tempo reservado aos exames finais, quando houver. § 30 – É obrigatória a freqüência de alunos e professores, salvo nos programas de educação à distância.
Nesse sentido, ficam incluídos nessa definição os cursos semipresenciais ou
presenciais-virtuais, ou seja, aqueles cursos em que, pelo menos, oitenta por cento da carga
horária correspondente às disciplinas curriculares não seja integralmente ofertada em
atividades com freqüência obrigatória de professores e alunos.
As bases legais para a modalidade de educação à distância foram estabelecidas
especificadamente no art. 80 da LDB vigente. Eis o artigo transcrito na íntegra:
Art. 80 – O Poder Público incentivará o desenvolvimento e a veiculação de programas de ensino à distância, em todos os níveis e modalidades de ensino, e de educação continuada. § 10 – A educação à distância, organizada com abertura e regime especiais, será oferecida por instituições especificamente credenciadas pela União. § 20 – A União regulamentará os requisitos para a realização de exames e registro de diplomas relativos a cursos de educação à distância. § 30 – As normas para produção, controle e avaliação de programas de educação à distância e a autorização para sua implementação, caberão aos respectivos sistemas de ensino, podendo haver cooperação e integração entre os diferentes sistemas. § 40 – A educação à distância gozará de tratamento diferenciado, que incluirá:
I – custos de transmissão reduzidos em canais comerciais de radiodifusão sonora e de sons e imagens; II – concessão de canais com finalidades exclusivamente educativos; III – reserva de tempo mínimo, sem ônus para o Poder Público, pelos concessionários de canais comerciais.
Para definir políticas e diretrizes, coordenar ações e dar institucionalidade à idéia, o
MEC criou a Secretaria de Educação à Distância / SEED, que, dentre outros, desenvolve o
programa de apoio ao emprego da informática nas escolas públicas brasileiras, oferecido
em estreita articulação com as Unidades Federadas. O PROINFO objetiva o
desenvolvimento de competências necessárias a professores e alunos para o uso apropriado
da informática. Para tanto, foram instalados Núcleos de Tecnologia Educacional / NTE,
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cada um deles responsável pelo suporte técnico de 50 escolas. Tanto as Escolas Técnicas
Federais como algumas Instituições de Ensino Superior têm-se associado ao PROINFO,
oferecendo cursos de capacitação de professores e de pessoal de suporte técnico.
O documento do Banco Mundial de 1999 intitulado “Estratégia para o Setor
Educacional”, além de defender a transferência de recursos públicos para as instituições
privadas e que o sistema de educação superior dos países periféricos deve contar com
poucas universidades de pesquisa, seguidas por universidades de formação profissional de
quatro anos, institutos isolados e Centros vocacionais e/ou de formação técnica com
duração de dois anos, também advoga em favor da educação à distância quando registra
que:
“As escolhas que os países fazem agora terão ramificações a longo prazo. Os que responderem rapidamente farão progresso, os que não [o fizerem], se arriscam a ficar para trás. As disparidades educacionais entre os países já são grandes - muitos ainda estão lutando para fornecer livros básicos, quadro-negro e prédios escolares, enquanto outros estão adotando rapidamente novas tecnologias de informação e de educação” (World Bank, 1999).
A educação à distância no Brasil foi regulamentada pelo decreto n0 5.622,
publicado no Diário Oficial da União de 20 de dezembro de 20054, com normatização
definida na Portaria Ministerial n0 301, de 07 de abril de 1988. Em 3 de abril de 2001, a
Resolução n0 1 do Conselho Nacional de Educação estabeleceu as normas para a pós-
graduação lato e stricto sensu.
Voltando a direcionar o foco para a análise do relatório do GTI, é importante
destacar que o documento ao se referir a educação à distância, sugere ter como meta até
2007 o atendimento de 500 mil alunos por esse tipo de educação. Considerando que,
segundo o mesmo relatório, a educação superior deveria sofrer uma ampliação de 600 mil
vagas no mesmo período, tal fato sugere que apenas 100 mil estudantes seriam atendidos
em cursos presenciais, o que abriria, definitivamente, o mercado da educação à distância às
multinacionais e aos governos que exportam tais serviços e vêm exercendo pressão nos
chamados “mercados emergentes de serviços” (Otranto, 2004, p.3). Por fim, cabe destacar
a contribuição de Lima (2004, p.41) quando observa que
4 O decreto n0 5.622 revogou o decreto n0 2.494, de 10 de fevereiro de 1998, e o decreto n0 2.561, de 27 de abril de 1998.
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“desde o governo neoliberal de Fernando Henrique Cardoso a educação à distância tem sido utilizada como mais uma estratégia de privatização das universidades públicas, ‘maquiada’ com o discurso da democratização do acesso a esse nível de ensino”.
Um outro ponto de importância relevante mencionado no relatório do GTI é a
questão da autonomia universitária, cuja concepção, embora seja um preceito que deveria
ser auto-aplicável de acordo com Constituição Federal que, em seu art. 207 garante que “as
universidades gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão
financeira e patrimonial”, o governo não entende desta forma, para ele, há necessidade de
leis para sua regulamentação. A autonomia financeira defendida nos documentos
governamentais é instrumental e pragmática, uma vez que é entendida como uma
prerrogativa da universidade captar recursos no mercado. Já a autonomia de gestão
financeira e patrimonial envolve, dentre outras, a liberdade de cada instituição propor e
executar seu orçamento e gerenciar, como bem lhe aprouver, de acordo com suas
necessidades, os recursos que o Poder Público é obrigado a repassar-lhe para fazer frente
às suas necessidades. Não prescinde, então, do financiamento das universidades pelo
Estado (ibid, p.4).
A “garantia” de autonomia universitária está presente em praticamente todos os
documentos que fundamentam a proposta do governo Lula da Silva. No Relatório do
Grupo de Trabalho Interministerial há uma relação explícita entre a crise que assola as
universidades públicas e as “amarras legais que impedem cada universidade de captar e
administrar recursos, definir prioridades e estruturas de gastos e planejamento” (p.9). Por
esse motivo, segundo o relatório, “a imediata garantia de autonomia às universidades é
um passo necessário para enfrentar a emergência” (p.9).
O discurso sedutor, parece, no primeiro olhar, que vai ao encontro dos anseios das
comunidades universitárias. Entretanto, no decorrer da leitura do relatório observa-se que o
enfoque principal é a autonomia financeira, ou seja, a liberação da universidade para captar
recursos no mercado, sem amarras legais. Isso daria um enorme alívio financeiro ao Estado
que seria obrigado somente, a complementar esses recursos e não mais teria, como tem
hoje, a obrigação de manter financeiramente as universidades públicas (Otranto, 2004,
p.4). Esse foi o conceito de autonomia universitária que permeou as propostas dos
governos FHC e, agora, fundamenta a Reforma Universitária de governo Lula.
O Relatório, embora estabeleça meta de ampliação no número de matrículas nas
Instituições Federais de Ensino Superior (IFES), não propõe aumento de recursos para
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atingi-las, mas sim a concessão da “autonomia para garantir às universidades federais o
uso mais racional de recursos, maior eficiência no seu gerenciamento e liberdade para
captar e aplicar recursos extra-orçamentários” (p.3), o aumento do número de alunos por
turma, a maior dedicação do professor à sala de aula, o uso de ensino à distância, a
concessão de verbas vinculadas à formação de profissionais em áreas estratégicas, e a
regulamentação das relações entre as IFES e as fundações de apoio. Nas considerações
preliminares do relatório, fica claro o significado da autonomia financeira mencionada
acima e o papel das fundações de apoio: “com esses dois instrumentos – autonomia e
Fundação de Apoio – as universidades federais certamente disporiam de condições não só
para aumentar a captação de recursos, mas também para gerenciar com mais eficiência e
previsibilidade os recursos que conseguir captar” (p.14). Ou seja, na falta de verbas do
MEC, as IFES teriam autonomia para se “virar” no mercado, através das fundações de
apoio (Davies, 2004, p.4).
Como forma de “outorgar autonomia às IFES”, o relatório apresenta várias outras
alternativas de financiamento que, no entanto não foram aprovadas por todos os membros
do GTI, cabe destacar: a) retirada dos R$ 2,8 bilhões de gastos com os inativos da folha do
MEC, b) contribuição voluntária de ex-alunos para as universidades federais, c)
contribuição não voluntária através de alíquota adicional no imposto de renda de ex-
alunos, d) destinação de uma parte da CPMF para as IES públicas, e) incentivo fiscal para
o ensino superior, f) fundos empresariais para o ensino superior, g) troca da dívida pública
por investimento em educação.
Uma outra idéia, mais do que uma proposta concreta, que o MEC recentemente tem
veiculado para o financiamento das IFES é a criação de um Fundo de Manutenção do
Ensino Superior, constituído por uma parcela (75%) dos 18% dos impostos que o governo
federal é obrigado a aplicar em manutenção e desenvolvimento do ensino. Cabe lembrar
que esta não é uma idéia nova, pois já foi lançada no governo FHC. O problema básico
dessa idéia é que ela não garante o financiamento estável e continuado das IFES, sobretudo
se elas expandirem as suas matrículas e ampliarem as suas atividades em pesquisa e
extensão, como consta do discurso do governo. A fragilidade deste fundo ou de qualquer
outro que dependa de impostos é que desde a Constituição Federal de 1988 o governo
federal tem preferido criar ou ampliar as chamadas “contribuições”, para não dividir tais
receitas com Estados e municípios e desvinculá-las de despesas obrigatórias
constitucionalmente, como a educação e, mais recentemente, a saúde. É sabido que a
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proporção de tais contribuições na receita orçamentária da União cresceu
exponencialmente desde 1988, em detrimento da proporção dos impostos. Portanto, este
fundo não é garantia estável e crescente do financiamento do ensino superior federal
(Davies, 2004, p.5).
Em termos práticos, essas propostas objetivam reduzir os gastos da União com a
educação superior substituindo-os por outras fontes de financiamento. Paradoxalmente, o
relatório do GTI (2003, p.11) afirma que o MEC “se propõe a assegurar um fluxo regular
adicional de recursos para aquelas instituições universitárias que aceitem aderir a um
Pacto de Educação para o Desenvolvimento Inclusivo”.
O Pacto, segundo o relatório, deveria contemplar prioritariamente as universidades
federais e as demais instituições públicas estaduais e municipais. No entanto, o Pacto inclui
ainda instituições privadas (comunitárias ou particulares), “quando o setor público não for
capaz de atender a toda demanda” (p.12). Nesta ressalva fica caracterizada a
intencionalidade de favorecimento ao setor privado, pois, o setor público não tem e não
terá condições de atender toda a demanda. Visto que, na grande maioria dos cursos, não há
vagas ociosas e, nos vestibulares, a relação candidato/vaga é alta.
Em 23 de janeiro de 2004, o presidente Lula da Silva anunciou que Tarso Genro
seria nomeado ministro da Educação, em substituição a Cristóvam Buarque, com a
explícita tarefa de realizar a reforma da educação superior. Em relação a tal nomeação cabe
destacar a ressalva feita por Lima (2004, p.36-37) quando afirma que:
“Apesar de considerar que cada gestor imprime sua identidade ao trabalho que realiza, acredito que o discurso ‘pela universidade pública’ e sobre a necessária construção de consensos e acordos para a construção da reforma universitária encobre a proposta de privatização das universidades públicas através da retomada ‘envernizada’ do conceito de público não-estatal e da diversificação das fontes de financiamento das universidades públicas brasileiras”.
Em 6 de fevereiro de 2004, o ministro Tarso Genro instalou o Grupo Executivo da
Reforma do Ensino Superior, com o objetivo de elaborar um pré-projeto de reformulação
da universidade. O grupo executivo foi presidido pelo então secretário executivo do MEC,
Fernando Haddad, ex-assessor especial do Ministério do Planejamento e coordenador na
elaboração do Projeto de Lei sobre Parcerias Público-Privadas (Lima, 2004, p.40).
O governo Lula vem construindo a reforma universitária a passos largos, embora o
discurso governamental é de que a Reforma Universitária seria amplamente discutida antes
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de ser implementada. Pode-se constatar que em consonância com os interesses e
proposições dos organismos e grupos internacionais, em detrimento das necessidades e
anseios da sociedade brasileira, a mesma já está sendo elaborada e colocada em prática
através de Medidas Provisórias ou Leis, como por exemplo a Lei n0 10.861, de 14 de abril
de 2004, que instituiu o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior – SINAES.
Buscando uma breve historiografia dos antecedentes da avaliação institucional no
Brasil, é importante destacar que as experiências de avaliação metódica do Sistema
Universitário se iniciaram no Brasil, na década de 1980, com o “Programa de Avaliação da
Reforma Universitária – PARU” e com as experiências de universidades como da UnB e
da Unicamp. Essas experiências inspiraram o “Programa de Avaliação Institucional das
Universidades Brasileiras – PAIUB”, o qual tentava conciliar avaliação interna com
externa, tendo como princípio que o papel da avaliação é prioritariamente emancipatório.
Segundo a proposta do PAIUB
“a avaliação de desempenho da Universidade Brasileira é uma forma de rever e aperfeiçoar o projeto acadêmico e sócio-político da instituição, promovendo a permanente melhoria da qualidade e pertinência das atividades desenvolvidas. A utilização eficiente, ética e relevante dos recursos humanos e materiais da universidade traduzida em compromissos científicos e sociais, assegura a qualidade e a importância dos seus produtos e a sua legitimação junto à sociedade” (PAIUB, 1993).
Os pontos fundamentais desses objetivos seriam: a idéia de que a universidade
deveria ter um projeto, a visão de que a qualidade deveria ser promovida, e de que as ações
da universidade teriam de ser baseadas na ética e no compromisso social (Rothen, 2004,
p.5). No PAIUB, tinha-se como pressuposto que a avaliação das IES decorria das seguintes
exigências da universidade contemporânea: a) um processo contínuo de aperfeiçoamento
do desempenho acadêmico; b) uma ferramenta para o planejamento e gestão universitária;
c) um processo sistemático de prestação de contas à sociedade.
A concepção de que a universidade prestaria contas à sociedade não implica, na
proposta do PAIUB, que o processo de avaliação inicie-se fora da IES. Ao contrário,
inicia-se dentro dos seus muros, respeita a autonomia universitária. Apesar de o PAIUB ser
uma política de Estado, a adesão das instituições era voluntária, isto é, foram estimuladas a
elaborar projetos de auto-avaliação (ibid).
No documento básico do PAIUB encontra-se a idéia de que toda avaliação é
institucional, isto é, que a avaliação é indissociável de suas várias dimensões. Contudo é
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proposto que a avaliação inicie-se pelo ensino de graduação, devido ao impacto que esse
nível de ensino promove na sociedade.
O PAIUB não foi formalmente extinto, ele foi relegado a um segundo plano pelo
MEC no início da primeira gestão de FHC, quando da adoção do Provão (1997). Os novos
procedimentos de avaliação das IES foram implantados gradualmente por atos legislativos,
não sendo publicado documento algum explicitando uma proposta de avaliação (Rothen,
2004, p.5).
No final de 1995, foi editada a Medida Provisória n0 1.159 de 26 de outubro de
1995, que foi transformada na Lei n0 9.131, de 24 de novembro de 1995. Por esse ato
legislativo, é alterada a LDB de 1961 em dois pontos: extingue o Conselho Federal de
Educação e cria o Conselho Nacional de Educação, e prevê ainda ser de competência do
MEC a avaliação periódica dos cursos de graduação. O único instrumento de avaliação
previsto nessa Lei foi o Provão. Apenas em 10 de outubro de 1996 foi expedido o Decreto
n0 2.021 regulamentando os procedimentos da avaliação. O Art. 10 do Decreto determina:
Art. 10 – O processo de avaliação dos cursos e instituições de ensino superior compreenderá os seguintes procedimentos: I – análise dos principais indicadores de desempenho global do sistema nacional de ensino superior, por região e unidade da federação, segundo as áreas do conhecimento e o tipo ou a natureza das instituições de ensino; II – avaliação do desempenho individual das instituições de ensino superior, compreendendo todas as modalidades de ensino, pesquisa e extensão; III – avaliação do ensino de graduação, por curso, por meio da análise das condições de oferta pelas diferentes instituições de ensino e pela análise dos resultados do Exame Nacional de Cursos; IV – avaliação dos programas de mestrado e doutorado, por área do conhecimento.
O processo de avaliação da pós-graduação (mestrado e doutorado) antecede ao
Decreto e é de responsabilidade da CAPES; o Decreto apenas manteve o que já estava
consolidado. A avaliação do desempenho global ocorreu a partir do “censo anual do ensino
superior”. O desempenho individual das instituições foi o último procedimento implantado,
e foi realizado com o objetivo de fornecer subsídios para o (re)credenciamento de
universidades e centros universitários. A avaliação do ensino de graduação acontecia no
momento do reconhecimento dos cursos de graduação.
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A redução da avaliação à autorização do funcionamento das instituições foi fruto da
concepção de “Estado Avaliador” adotado pelo MEC e pela sua estratégia de implantar um
sistema de avaliação sem discutir o modelo “ideal” de universidade (Rothen, 2004, p.6).
No discurso oficial, o Provão era apresentado como um dos instrumentos na avaliação das
IES. Contudo, foi o instrumento quase exclusivo, tanto que o resultado dessa avaliação era
amplamente divulgado, o que não sucedia com o resultado das outras avaliações. Essa
valorização é coerente com a concepção de que apenas compete ao Estado avaliar as
instituições e estimular a concorrência entre elas, no caso pela divulgação de rankings, o
que permitiria ao “mercado consumidor” de educação escolher as “melhores” instituições
(ibid, p.7).
O Provão era um exame de verificação que avaliava o curso com base no
pressuposto de que o desempenho dos alunos em uma prova é igual à qualidade do curso.
Obrigatório a todos os alunos e aplicado apenas aos concluintes dos cursos, o Provão
atribui conceitos que não permitem definir um padrão de qualidade para os cursos, gerando
assim, informações distorcidas e equivocadas, que são transmitidas à população. Um
conceito “A” não quer dizer excelente e um conceito “E” não quer dizer péssimo. Um
exemplo disso pode ser verificado nos resultados de 2002: a nota 41,3 em Administração é
“A”, já a nota 48,6 em Odontologia é “E” (Inep,2003b). O resultado do Provão também
depende da postura do avaliado, sendo bastante afetado em caso de boicote. Além disso, o
seu custo é muito elevado5 e sua abrangência muito restrita. Em 2002, o Provão avaliou
cerca de cinco mil cursos dos aproximadamente 14 mil existentes na época. Na área de
Engenharia, por exemplo, avaliou quatro habilitações (Engenharia Mecânica, Elétrica,
Civil e Química), enquanto que o Conselho Federal de Engenharia, Arquitetura e
Agronomia já tinha catalogado mais de 100 habilitações de Engenharia. Dessa forma, o
Provão não consegue avaliar a diversidade do sistema e o seu crescimento. Para conseguir
abranger todo o sistema, os recursos financeiros teriam que ser muito superiores, com
resultados que não correspondem ao investimento realizado.
A partir do trabalho da Comissão Especial de Avaliação - CEA, designada por
portaria da Secretaria de Educação Superior – SESu em 28 de abril de 2003, o Sistema
Nacional de Avaliação da Educação Superior - SINAES foi construído,
5 O custo do Provão, em 2002, foi cerca de R$ 35 milhões (Inep, 2003).
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“com a finalidade de analisar, oferecer subsídios, fazer recomendações, propor critérios e estratégias para a reformulação dos processos e políticas de avaliação da Educação Superior e elaborar a revisão crítica dos seus instrumentos, metodologias e critérios utilizados” (Inep,2003b).
Regulamentado pela portaria n0 2.051 de 9 de julho de 2004, é formado por três
componentes principais: a avaliação das instituições, dos cursos e do desempenho dos
estudantes. O SINAES se propõe a avaliar os seguintes aspectos que giram em torno desses
três eixos: o ensino, a pesquisa, a extensão, a responsabilidade social, o desempenho dos
alunos, a gestão da instituição, o corpo docente, as instalações e vários outros aspectos.
Assim como nos sistemas de avaliação anteriores, o SINAES também possui uma
série de instrumentos complementares: autoavaliação, avaliação externa, Exame Nacional
de Desempenho dos Estudantes – ENADE, avaliação dos cursos de graduação e
instrumentos de informação (censo e cadastro). Os processos avaliativos são coordenados e
supervisionados pela Comissão Nacional de Avaliação da Educação Superior – CONAES,
que é composta por representantes do Ministério da Educação, do Instituto Nacional de
Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira – Inep, da Fundação Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES, do corpo docente das
Instituições de Educação Superior, do corpo técnico administrativo das Instituições de
Educação Superior, do corpo discente das Instituições de Educação Superior e por
representantes com “notório saber científico, filosófico e artístico”.6 Cabe aqui a
observação que na composição da CONAES a maioria dos integrantes é indicada pelo
próprio governo.
A operacionalização do SINAES é de responsabilidade do Inep, e a sua criação
supostamente objetiva, identificar mérito e valor das instituições, áreas, cursos e
programas, nas dimensões de ensino, pesquisa, extensão, gestão e formação. Pretende
também melhorar a qualidade da educação superior, orientar a expansão da oferta e
promover a responsabilidade social das IES, respeitando a identidade institucional e a
autonomia.
A criação do SINAES encontra respaldo legal na LDB. A lei n0 9.394/96, de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional, em seu artigo 90, inciso VI, explicitou a
responsabilidade da União em “assegurar processo nacional de avaliação do rendimento
escolar no ensino fundamental, médio e superior, em colaboração com os sistemas de
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ensino, objetivando a definição de prioridades e a melhoria da qualidade do ensino”. A
proposta do CONAES, de acordo com suas diretrizes, é viabilizar uma avaliação
institucional como centro do processo avaliativo, integrando diversos instrumentos com
base em uma concepção global e o respeito à identidade e à diversidade institucionais,
levando em conta a realidade e o objetivo de cada IES, ressalvando o que há de comum e
universal na Educação Superior e as especificidades das áreas do conhecimento.
A avaliação dos cursos de graduação, tem o objetivo de identificar as condições de
ensino oferecidas, perfil do corpo docente, instalações físicas e organização didático-
pedagógica. Já a avaliação do desempenho dos estudantes dos cursos de graduação,
realizada pelo Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes - ENADE, tem a finalidade
de aferir o desempenho dos estudantes em relação aos conteúdos programáticos, suas
habilidades e competências. Segundo a lei de criação do SINAES, este exame será
aplicado por meio de procedimentos amostrais, ao final do primeiro e do último ano do
curso, com uma periodicidade máxima trienal. O ENADE será acompanhado de
instrumento de levantamento do perfil dos estudantes (questionário sócio-econômico) e
será considerado componente curricular obrigatório dos cursos. O ENADE substituiu o
Exame Nacional de Cursos - ENC, mais conhecido como “Provão”, implantado ainda na
gestão de FHC.
O ENADE, apesar de buscar superar as limitações dos critérios de atribuição dos
conceitos no “Provão”, mantém o objetivo, implícito de classificar os cursos, pois prevê a
mesma escala de cinco níveis de conceitos a serem atribuídos a cada curso. Tornando-se
assim possível o estabelecimento de ranking. Além disso, utiliza-se de uma prova de
caráter nacional, supostamente para avaliar o desempenho de alunos que estudaram
conteúdos locais e diferenciados.
Em termos conclusivos é importante ressaltar que, de acordo com a posição da
ANPEd (Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em Educação), a avaliação
deve ser um processo múltiplo que vise à construção da qualidade e da excelência não
excludentes, mediante a identificação dos acertos e das dificuldades, com a finalidade de
melhoria institucional e construção de instituições comprometidas com o desenvolvimento
científico e social. Deve ser objeto de questionamento qualquer desenvolvimento
avaliativo fundamentado em critérios de produtividade empresarial, que quantifique a
6 Os nomes dos membros do CONAES estão disponíveis em { HYPERLINK http://portal.mec.gov.br/conaes/index }. Acesso em 08 de setembro de 2006.
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atividade docente, funcione como mecanismo de distribuição de recursos para o
desenvolvimento de projetos de pesquisa ou para a distribuição de incentivos salariais ao
corpo docente, elegendo a “competitividade” como mola mestra do trabalho acadêmico.
Ainda na visão da ANPEd, a avaliação de ser entendida como um processo amplo, que
deve abranger todos os segmentos e níveis institucionais e contribuir para a transformação
do sistema de educação superior, o que colide frontalmente com qualquer concepção que
se proponha a utilizar os resultados avaliativos para mera hierarquização de docentes,
estudantes ou de instituições (ANPEd, 2004). Por fim, é necessário instituir mecanismos
que remetam à construção de uma nova cultura avaliativa de natureza formativa, capaz de
firmar ao mesmo tempo, em todas as instituições, públicas ou privadas, a consciência de
sua função pública e de seu compromisso público inarredável com a sociedade brasileira.
Até o momento, existem quatro versões do projeto de lei da reforma da educação
superior. Divulgadas respectivamente, em: dezembro de 2004, maio de 2005, julho de
2005 e maio de 2006; essas versões confirmam a opção duradoura e amadurecida pelo
fornecimento e mercantilização da educação superior através de instituições privadas (Cea,
2006).
Realizando uma breve análise da última versão do projeto, observa-se inicialmente
que é sacramentada a aliança do governo com as instituições privadas que oferecem
serviços educacionais. No campo conceitual, por exemplo, o projeto no seu Art. 3 define
que a educação é um “bem público”, aberto à livre iniciativa desde que atenda ao
“interesse social” a ser aferido por meio do sistema de avaliação. É importante ressaltar
que no Art. 4 o projeto estabelece que um dos principais critérios para comprovar o
compromisso social da instituição é a oferta de educação à distância por meio das
tecnologias da informação e da comunicação.
Em consonância com as versões anteriores, o projeto estabelece que os cursos
superiores de graduação e de pós-graduação podem ser presenciais ou a distância. Mas,
chama a atenção o Art. 6 que permite a possibilidade de cursos de mestrado e doutorado
profissionais (sem dissertações e teses) a distância que, pela primeira vez na história da
educação brasileira , conforme o Art. 48, poderão ser reconhecidos por instituições
privadas (ANDES, 2006).
O projeto também opera a privatização quando alça os centros universitários ao
escopo legal e conforme o Art. 8, as filantrópicas e confessionais são classificadas no
bastante aceitável conceito de “comunitárias” e poderão receber (mais) recursos públicos
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para o financiamento da pesquisa e da extensão (ANDES, 2006). No mesmo sentido o
projeto, no Art. 44, admite cursos tecnológicos de dois anos e graduação nos demais cursos
em três anos. O aligeiramento dos cursos é uma exigência do capitalismo hoje.
Outro ponto digno de destaque é que as instituições que desejarem ser convertidas
em universidade (obtendo autonomia e a possibilidade de estabelecer campus fora da sede)
somente necessitam assegurar 8 cursos de graduação, 3 mestrados e 1 doutorado (que
somente precisa estar pronto 8 anos após a promulgação da lei). Para criar uma
“universidade especializada” as facilidades são ainda maiores: 6 cursos de graduação (pode
ser no campo de designação da instituição), um mestrado e um doutorado (Art. 12 e Art.
48). Já o Centro Universitário sequer precisam de pós-graduação, segundo o Art. 16
bastam 8 cursos de graduação.
Em relação as IES públicas o projeto promove um retrocesso. A definição
sistemática de financiamento: a subvinculação de 75% dos 18% da receita líquida de
impostos na melhor das hipóteses irá congelar os recursos nos patamares atuais. Segundo o
Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior – ANDES,
“indicadores do TCU sobre o orçamento de 2005 confirmam que hoje essa sub-vinculação daria algo como R$ 7,2 bilhões. Contudo, o orçamento executado deste ano foi cerca de R$ 8 bilhões (aproximadamente 20% inferior ao de 2002, o último ano do trágico período Cardoso). Assim, mesmo com o pagamento dos aposentados e pensionistas por verbas do Tesouro teríamos na melhor das hipóteses o desastroso e destrutivo orçamento de 2002. E isso por um prazo de 10 anos, findos os quais haveria uma nova sistemática de financiamento, algo semelhante à Proposta de Emenda Constitucional n. 370/96 de Cardoso que, coincidentemente, também previa um prazo de 10 anos para que as universidades pudessem caminhar com os próprios pés. O peso do passado e das condicionalidades do Banco Mundial seguem oprimindo o cérebro dos operadores da gerência Lula da Silva” (ANDES, 2006).
Somente esse quadro já seria suficiente para configurar que o projeto desfavorece a
universidade pública. Mas outros indicadores também podem ser elencados, como por
exemplo, o violento retrocesso que ocorre com a questão da escolha de dirigentes das
universidades federais. Na melhor tradição autoritária do governo empresarial-militar tem-
se a confirmação das famigeradas listas tríplices para livre escolha presidencial, uma
excrescência já tida como superada pela comunidade acadêmica.
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Em um contexto mais amplo em relação a reforma da educação superior do
governo Lula e termos conclusivos cabe aqui a contribuição de Lima (2004, p.43) quando
destaca que:
“A direção política desta reforma proposta pelo governo Lula constitui-se no relançamento ‘requentado’ das propostas privatizantes que a Unesco, o Banco Mundial, o Fundo Monetário Internacional, o Banco Interamericano de Desenvolvimento e o governo neoliberal de Fernando Henrique Cardoso apresentaram ao longo da década de 1990”.
Acrescenta ainda que
“Utilizando um discurso maquiado por um ‘novo humanismo’, pela construção de consensos e do pacto social, esta proposta de reforma da educação superior retoma e aprofunda os pontos centrais da lógica neoliberal para a educação”.
A seguir, serão abordados outros aspectos da reforma da educação superior do
governo Lula ainda não mencionados neste trabalho, com ênfase especial ao Programa
Universidade para Todos – Prouni.
3.2 - O Programa Universidade para Todos – ProUni.
Conforme visto nos capítulos anteriores, a ascensão das políticas neoliberais na
década de 1990, cujos eixos centrais foram o ajuste fiscal e a implantação de um Estado
mínimo, assistiu-se a um progressivo processo de privatização de empresas estatais e de
serviços públicos. Como conseqüência houve uma considerável diminuição dos
investimentos públicos em educação em todos os níveis, inclusive no campo da educação
superior.
O apoio oficial às Instituições de Ensino Superior (IES) privadas tem se
concretizado, não só por omissão, mas também pelo financiamento público direto e
indireto a elas ao longo das últimas décadas. A transferência de recursos públicos é
comprovada através da isenção de impostos e da contribuição previdenciária, além da
concessão de subvenções, tais como, bolsas de estudo, empréstimos subsidiados, crédito
educativo, Fies e mais recentemente com a edição do Programa Universidade para Todos -
ProUni.
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Vários fatores influenciaram a expansão da participação do setor privado na
educação superior brasileira. Dentre eles, e sem dúvida um dos principais, foi a questão do
financiamento das instituições de ensino superior privadas através do emprego de recursos
públicos diretos e indiretos.
Como já foi mencionado neste trabalho, entende-se por IES privadas todas as que
não são de propriedade do poder público (federal, estadual e municipal): as privadas com
objetivos declaradamente empresariais (lucrativos) e as confessionais, comunitárias e
filantrópicas, que alegam não ter fins lucrativos. Embora juridicamente existam distinções
entre elas, consideramos todas privadas porque não pertencem ao poder estatal e geram
lucro, mesmo que este lucro não seja contabilizado como tal. Segundo Nicholas Davies
(2002, p.153), um exemplo dessa distinção são as universidades comunitárias, que se
definem como públicas não-estatais e sem fins lucrativos, mas que dão lucro (ainda que
escamoteado com outro termo), sem o qual tais comunitárias não sobreviveriam, a não ser
que recebessem doações vultosas de pessoas ou entidades filantrópicas ou caridosas, o que
não acontece, pelo menos na escala necessária à sua manutenção.
As universidades confessionais, por sua vez, procuram diferenciar-se das demais,
de modo a poderem reivindicar a dotação de recursos públicos com legitimidade. Neste
sentido, elas criaram a Associação Nacional das Universidades Comunitárias – ABRUC,
que já conquistou espaços políticos importantes no âmbito do Conselho de Reitores das
Universidades Brasileiras – CRUB e representação própria nas comissões consultivas do
MEC, assim como na indicação de nomes para o Conselho Nacional de Educação. Elas
procuram construir sua identidade com base nos seguintes elementos principais: estão
organizadas sob o regime jurídico de fundação de direito privado ou, ainda, de sociedade
civil; seu patrimônio pertence a uma “comunidade”, sem depender de famílias, de
empresas ou de grupos com interesses econômicos; não distribuem dividendos,
bonificações, participações ou parcelas de seu patrimônio a sócios da sociedade
mantenedora. Com esses critérios, elas pretendem se diferenciar das universidades privadas
propriamente ditas, que por sua vez, organizaram-se na Associação Nacional das
Universidades Particulares – ANUP, a qual procura mostrar que os critérios que pretendem
distingui-las das comunitárias são mais subjetivos do que objetivos (Cunha, 2000, p.47).
As fontes públicas de financiamento das IES privadas sempre foram e ainda são
muito importantes, ainda que nem sempre visíveis e facilmente mensuráveis. Durante as
décadas de 1940 a 1970, várias universidades, sobretudo as confessionais católicas,
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contavam com imunidades, diversas formas de isenção e substanciais subvenções públicas,
que chegavam a representar mais de 50% dos seus orçamentos.
As mensalidades, cuja importância proporcional não é possível de ser avaliada,
embora sejam a fonte mais visível de financiamento, não são a única fonte de sustentação
das IES privadas. Várias fontes diretas (subsídios, bolsas, subvenções, empréstimos,
crédito educativo, Fies) e indiretas (principalmente as isenções fiscais e previdenciárias) de
recursos públicos para as IES privadas provavelmente somam bilhões de reais por ano e
reduzem, indiretamente, as despesas delas, contribuindo significativamente para a sua
manutenção e expansão. Sem tais fontes diretas e indiretas, as IES privadas perderiam uma
fatia substancial de seu mercado, pois as mensalidades teriam de ser bem maiores do que já
são para cobrir os custos e/ou manter a alta taxa de lucratividade do setor (Davies, 2002,
p.154).
3.2.1 – Antecedentes do Financiamento Público ao Setor Privado:
Creduc, Fies e as Isenções Fiscais e Previdenciárias.
Uma das principais fontes diretas de canalização de recursos públicos para as IES
privadas foi o crédito educativo - Creduc. Criado pelo governo militar em 1975, o Creduc
consistiu num empréstimo para o pagamento de mensalidades e manutenção de estudantes
supostamente carentes matriculados nas IES privadas. Financiado com recursos públicos
sob a responsabilidade da Caixa Econômica Federal, o programa, embora justificado como
auxílio aos estudantes pobres, serviu para subsidiar as privadas que, sem o programa,
perderiam uma parcela de sua clientela. Além de subsidiar instituições particulares, o
programa trouxe grandes prejuízos aos cofres públicos, pois uma grande proporção dos
empréstimos não foi paga pelos estudantes após a conclusão do curso. Segundo o MEC, a
inadimplência do Creduc chegou a 60%, gerando um saldo devedor de aproximadamente
450 milhões de reais, num total de 150 mil contratos.
Em 1999, o Creduc foi substituído pelo Fundo de Financiamento ao Estudante do
Ensino Superior - Fies, através da MP n0 1.827, de 27/05/1999, reeditada 25 vezes até se
transformar na lei n0 10.260, em 12/07/2001.
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O Fies é um programa de financiamento governamental destinado ao estudante,
regularmente matriculado em curso de graduação não-gratuito, que não tem condições de
arcar integralmente com os custos de sua formação.
Somente podem participar os cursos que tenham avaliação positiva junto ao MEC,
e que tenham sido devidamente cadastrados no Fies, com oferta de vagas, pelas respectivas
instituições de ensino superior. Terão direito ao financiamento os estudantes aprovados
pelas Comissões Permanentes de Seleção e Acompanhamento do Fies. O estudante que já
possui curso superior pode financiar seu curso atual com o Fies, desde que não tenha sido
beneficiado pelo antigo programa de crédito educativo, entretanto, o programa prioriza
atendimento àqueles que não têm um curso de graduação completa.
Segundo a Lei n0 10.260, os estudantes selecionados pelo Fies, com base em
critérios sócio-econômicos, poderiam financiar até 70% do valor da mensalidade cobrada
pela instituição de ensino. No entanto, a partir de setembro de 2005, o Fies, passou a
financiar 50% do valor da mensalidade. Os outros 50% são pagos pelo aluno diretamente à
Instituição de Ensino. Enquanto cursa a faculdade, o beneficiado se compromete a pagar, a
cada três meses, o valor de R$ 50,00 (cinqüenta reais), que vai sendo abatido do saldo
devedor. A taxa de juros é de 9% ao ano, fixa. Após a formatura, o financiamento começa
a ser amortizado. Nos doze primeiros meses (“Fase I”), a prestação será igual a 50% da
última mensalidade financiada (o mesmo valor que o estudante já desembolsava para a
IES). Depois ("Fase II”), o saldo devedor é dividido em prestações iguais, por um prazo de
uma vez e meia o período de utilização. O Fies, portanto, é um financiamento de longo
prazo. Por exemplo, um curso de quatro anos, que tenha sido financiado desde o primeiro
semestre, vai gerar, após sua conclusão, prestações durante sete anos – um ano da “Fase I”,
mais seis anos da “Fase II” (4 x 1,5).
O estudante que consegue obter o financiamento do seu curso universitário pelo
programa do Fies tem que cumprir algumas obrigações. Em primeiro lugar, deve estar
regularmente matriculado no curso, não podendo afastar-se da faculdade por um período
superior a um ano. O Fies exige, também, que o estudante obtenha, após ingressar no
programa, um bom desempenho acadêmico com, no mínimo, 75% de aprovação nas
disciplinas cursadas. Segundo o MEC, o Fies já financiou mais de 318 mil estudantes em
todo o país.7 Os contratos assinados até 2004 atingiram cerca de 2,8 bilhões de reais. Em
7 O Fies encerrou o exercício de 2004 com 318.679 estudantes beneficiados, sendo que deste total, 6745 já liquidaram seus contratos (MEC, 2005).
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relação ao antigo programa de crédito educativo a média de atendimento do Fies é maior:
cerca de 64 mil alunos por ano contra a média de 22 mil de alunos por ano do Creduc.
O Fies tem apresentado uma aceitação maior do que o Creduc, seja por parte dos
estudantes, seja por parte das instituições de ensino superior. Quanto a estas, basta verificar
o número de campi /unidades administrativas participantes do programa, que passou de
745 em 1999 para 1.105 instituições de ensino credenciadas em 2004 (MEC, 2005). No
entanto, é importante destacar que tal acréscimo na aceitação, foi influenciado por algumas
medidas implementadas na administração do Fies, como por exemplo a suspensão da
exigência de fiador.
É importante destacar também, a engenharia financeira adotada. Ao contrário do
programa de crédito educativo, no qual as instituições de ensino superior recebiam em
espécie, no Fies elas recebem, em contrapartida aos “serviços educacionais prestados”,
certificados de emissão do Tesouro Nacional, destinados ao pagamento de obrigações
previdenciárias junto ao Instituto Nacional de Seguridade Social – INSS. Assim, segundo
dados do MEC, dos 2.781 bilhões de reais repassados em certificados, 2.377 bilhões foram
recolhidos ao INSS até o fim do exercício de 2004 (ibid).
Em relação às fontes indiretas de recursos públicos para as IES privadas, são
merecedoras de destaque as isenções fiscais e previdenciárias, que foram e sem dúvida são
as principais.
Considerando inicialmente as isenções fiscais, é importante destacar que as mesmas
foram previstas nas Constituições Federais desde 1934. O Art. 154 da CF de 1934, por
exemplo, estipulava que “os estabelecimentos particulares de educação gratuita primária
ou profissional, oficialmente considerados idôneos, serão isentos de qualquer tributo”. As
Constituições Federais de 1946, 1967 e 1988 ampliaram esse alcance para as instituições
de educação de todos os níveis de ensino.
O Art. 31 da CF de 1946 proibia União, Estados, Distrito Federal e Municípios de
lançarem impostos sobre “templos de qualquer culto, bens e serviços de partidos políticos,
instituições de educação e de assistência social, desde que as suas rendas fossem
aplicadas integralmente no país para os respectivos fins”, proibição mantida no Art. 20 da
CF de 1967, que vedava imposto sobre “o patrimônio, a renda ou os serviços de partidos
políticos e de instituições de educação ou de assistência social, observados os requisitos
fixados em lei”. A isenção permaneceu na CF de 1988, no seu Art. 150, que determina:
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Constituição Federal de 1988. Art. 150 – Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: Inciso VI, alínea c – instituir impostos sobre patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei.
Cabe a observação de que o único acréscimo significativo na CF de 1988, não
constante de nenhuma CF anterior, foi o de que as instituições de educação não tivessem
fins lucrativos.
Esta exigência, entretanto, fez com que algumas instituições que se
autodenominavam sem fins lucrativos, encobrissem seus lucros como “contribuição a
entidades mantenedoras”. Enquanto nas instituições confessionais os lucros eram (e são)
lançados como contribuição à ordem provincial, nas IES privadas e não-confessionais os
lucros eram repassados como despesas às mantenedoras, que os utilizavam para pagar
altíssimos salários a seus proprietários, ampliação das instalações, aquisição de imóveis,
aviões, e em “fartos gastos em lobby junto ao Poder Público” (Velloso8 apud Davies, 2002,
p.157).
Em relação a questão da renúncia fiscal, é de fundamental importância a realização
de um breve histórico da renúncia fiscal no Brasil, e para isso será utilizado como
referência básica o estudo realizado por Lopreato & Carvalho (2005).
A partir do final dos anos 1960, o governo militar valeu-se intensamente da política
de incentivos e isenções fiscais como forma de apoiar a atuação privada no projeto de
desenvolvimento nacional, beneficiando ampla gama de setores em diferentes áreas. Em
relação ao ensino superior, o mecanismo de renúncia fiscal tornou-se fator central no
financiamento do segmento privado. A lei n0 5.172, de 25 de outubro de 1966, que instituiu
o Código Tributário Nacional, em concordância com a Constituição Federal de 1967,
determinava a não incidência de impostos sobre a renda, o patrimônio e os serviços dos
estabelecimentos de ensino de qualquer natureza. Em outras palavras, as organizações
privadas de ensino superior gozaram do privilégio, desde a sua criação, de imunidade
fiscal, não recolhendo aos cofres públicos a receita tributária devida.
8 VELLOSO, Jacques. A nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação e o financiamento do ensino: pontos de partida. Educação e Sociedade, n.30, ago. 1988.
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O instrumento mostrou-se fundamental para o crescimento intensivo dessas
estruturas na prosperidade econômica, garantindo, especialmente, a continuidade da
atividade da empresa educacional no período de crise, por meio da redução do impacto
sobre custos e despesas inerentes à prestação de serviços. Apesar de existirem requisitos
restritivos para as entidades educacionais terem acesso à imunidade fiscal, na prática
grande parte delas no ensino superior usufruiu e vem usufruindo desse benefício. A
instituição de ensino ou mantenedora, na forma de associação civil ou fundação, tida como
sem fins lucrativos, poderia receber por seus produtos e serviços, devendo, porém,
reinvestir o superávit na manutenção e na expansão das atividades educacionais.
As entidades de ensino superior consideradas sem fins lucrativos são imunes ao
Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana - IPTU e ao Imposto sobre
Serviços de Qualquer Natureza - ISS, ambos de competência do poder municipal, além do
Imposto sobre Renda e Proventos de Qualquer Natureza - IRPJ e do Imposto sobre a
Propriedade Territorial Rural - ITR, no caso dos imóveis localizados em zonas rurais,
ambos de competência da União.
O Programa de Integração Social - PIS, instituído pela lei complementar n0 7, de 7
de setembro de 1970, foi outro tributo federal que teve uma forma diferenciada de
cobrança entre as instituições com fins lucrativos, sem fins lucrativos e filantrópicas. A
contribuição para o PIS daquelas com fins lucrativos prestadoras de serviços calcula-se,
atualmente, sobre o seu faturamento ou receita bruta, de maneira não cumulativa, com
alíquota de 1,65%. Para as sem fins lucrativos e as filantrópicas, a cobrança do tributo
corresponde a 1% sobre a folha de pagamento.
A lei n0 7.689, de 15 de dezembro de 1988, instituiu a Contribuição Social sobre o
Lucro Líquido - CSLL, destinada ao financiamento da seguridade social. Sua base de
cálculo é o valor do resultado do exercício antes da provisão para o imposto de renda e a
alíquota atual é de 9%. As entidades sem fins lucrativos e beneficentes são isentas da
cobrança do tributo.
Por fim, a lei complementar n0 70, de 30 de dezembro de 1991, instituiu a
Contribuição Social para Financiamento da Seguridade Social - COFINS, voltada
exclusivamente às despesas com atividades das áreas de saúde, previdência e assistência
social. Ela é, atualmente, de 7,6% e incide, de forma não cumulativa, sobre o faturamento
mensal. Para as instituições sem fins lucrativos, a alíquota é de 3% e mantém a forma de
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cálculo da legislação original. A isenção da COFINS restringe-se às entidades de
assistência social.
Segundo Lopreato & Carvalho (2005, p.100), os impactos microeconômicos da
renúncia fiscal repercutem no processo de expansão ao longo das três últimas décadas. A
imunidade do IPTU permite à instituição adquirir um maior número de imóveis para alojar
mais cursos e alunos, sem ônus tributário sobre as despesas operacionais, servindo
inclusive de estímulo à ampliação do ativo imobilizado. A imunidade do ISS e a isenção da
COFINS estimulam o aumento de matrículas e, consequentemente, o crescimento
acelerado da receita operacional bruta, já que não há ônus tributário sobre a ampliação da
prestação de serviços. Finalmente, a imunidade do Imposto de Renda e a isenção da CSLL
possibilitam a continuidade da atividade educacional e evidenciam a saúde financeira. O
resultado positivo viabiliza o financiamento bancário, o auxílio externo e a obtenção de
recursos de agências de fomento.
Na década de 1990, houve significativa alteração legislativa, estabelecida pelo Art.
20 da LDB/96 (já transcrito anteriormente neste trabalho na p.45). A medida sofreu severas
críticas das associações de classe defensoras dos interesses privados: a diferenciação
institucional intra-segmento privado. Até então, todas as instituições particulares de ensino
usufruíam imunidade tributária sobre a renda, os serviços e o patrimônio. A partir daí,
passaram a ser classificadas em privadas lucrativas e sem fins lucrativos (confessionais,
comunitárias e filantrópicas). As primeiras deixaram de se beneficiar diretamente de
recursos públicos e indiretamente da renúncia fiscal, ao passo que as demais
permaneceram imunes ou isentas à incidência tributária. A mudança legislativa tornou
possível ampliar a arrecadação da União e dos municípios.
Outra importante fonte indireta de transferência de recursos públicos para as IES
privadas, é a isenção da contribuição previdenciária patronal. Durante longo tempo, as
entidades filantrópicas de modo geral estiveram isentas da sua contribuição (a chamada
cota patronal) para a previdência social, por força de legislação ordinária específica.
Em 1988, a Constituição incluiu a isenção no seu texto (Art. 195, parágrafo
sétimo), nos seguintes termos: “São isentas de contribuição para a seguridade social as
entidades beneficentes de assistência social que atendam às exigências estabelecidas em
lei”. Como já foi visto anteriormente, a alínea c do inciso VI do artigo 150 veda à União,
Estados, Distritos Federal e Municípios a incidência de impostos sobre o “patrimônio,
rendas ou serviços das instituições sociais”. A contribuição social de que trata o Art. 195,
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parágrafo sétimo, não é imposto e não incide sobre patrimônio, renda ou serviços das
entidades assistenciais, porém sobre a remuneração dos que lhes prestam serviços. Trata-
se, portanto, de imunidades com objeto e alcance distintos. Sendo assim, as entidades
beneficentes de assistência social são contempladas com duas imunidades (impostos e a
contribuição à seguridade social, chamada ”cota patronal”); as instituições de educação
foram contempladas apenas com a imunidade de impostos.
Cabe destacar que toda entidade assistencial é filantrópica, mas nem toda entidade
filantrópica é assistencial. As filantrópicas que não sejam também beneficentes de
assistência social não fazem jus à isenção da contribuição, nos exatos termos em que
prevista no Art. 195, parágrafo sétimo, da Constituição Federal.
A confusão entre filantropia e assistência social está associada ao fato de,
anteriormente, a legislação ordinária isentar as entidades filantrópicas da contribuição para
a previdência social. A partir da Constituição de 1988, entretanto, o quadro modificou-se: a
Constituição isenta apenas as entidades beneficentes de assistência social de contribuir
para a seguridade social. Contudo, isso ainda não foi posto em prática, pois a legislação
ordinária inclui como beneficiárias da isenção não apenas as entidades assistenciais, mas
também entidades de saúde e de educação, em um elástico universo.
A Constituição de 1988 refere-se às entidades filantrópicas no Art. 199, parágrafo
primeiro, nos seguintes termos: “As instituições poderão participar de forma
complementar do sistema único de saúde, segundo diretrizes deste, mediante contrato de
direito público ou convênio, tendo preferência as entidades filantrópicas e as sem fins
lucrativos”.
Portanto, o que a Constituição assegura às entidades filantrópicas é a preferência
em relação à celebração de contratos ou convênios relativos à prestação de assistência à
saúde integrada ao sistema único de saúde. Já a isenção à contribuição à seguridade social
é específica para as “entidades beneficentes de assistência social”.
A confusão entre filantropia e assistência social aumenta ainda pelo fato de a
legislação ordinária e decretos regulamentares condicionarem o reconhecimento da isenção
à obtenção do Certificado de Entidade de Fins Filantrópicos, concedido pelo Conselho
Nacional de Assistência Social - CNAS, órgão do Instituto Nacional de Seguridade Social -
INSS, como se a finalidade filantrópica fosse o mesmo que finalidade assistencial. O
conceito de assistência social está associado às noções de necessidade, gratuidade e
universalidade. As entidades filantrópicas podem prestar serviços úteis e com freqüência
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valiosos, mas nem sempre essenciais; a assistência social tem por objetivo atender as
necessidades vitais das pessoas carentes. O Art. 203 da CF de 1988 reforça esta idéia ao
assinalar: “a assistência social será prestada a quem dela necessitar”.
Enfim, em termos práticos, o que temos é que as IES privadas detentoras do
certificado de entidades de fins filantrópicos, deixam de recolher 20% da cota patronal
sobre a folha de pagamento devida ao INSS, que, acrescida aos anexos e a Contribuição
Social para Financiamento da Seguridade Social - COFINS, totalizam uma “economia” de
até 30% da folha de pagamento. Esta isenção significou e significa ainda, também, o
financiamento público à previdência/aposentadoria de empregados das IES privadas, tendo
em vista que eles recolhem a sua contribuição (correspondente a 1/3), mas não as IES onde
trabalham, cuja cota eqüivaleria a 2/3, como acontece nas empresas privadas que cumprem
a lei. Em outras palavras, o buraco deixado pelo não-recolhimento da cota patronal das IES
privadas será financiado pelo conjunto dos contribuintes previdenciários (empregados e
empregadores – na verdade, apenas pelos empregados, uma vez que os empregadores, se
privados, repassam tais custos para os preços dos produtos e serviços) à
previdência/aposentadoria dos empregados das IES privadas. Temos, assim, mais um
exemplo da clássica socialização do prejuízo e privatização do lucro (Davies, 2002, p.169).
3.2.2 – O ProUni como Novo Instrumento de Transferência de Recursos
Públicos para o Setor Privado.
Em maio de 2004 foi enviado ao Congresso Nacional o ProUni – Programa
Universidade para Todos, considerado pelo governo como uma das propostas para
“democratizar” o acesso ao ensino superior e regulamentar a situação das IES filantrópicas
e suas contrapartidas ao governo. O projeto original prevê que as Instituições de Ensino
Superior consideradas filantrópicas deverão converter os 20% de “gratuidade” previstos na
lei em vagas (bolsas integrais) para alunos com até um salário mínimo de renda familiar
per capita. No caso de universidades com fins lucrativos, destinarão 10% das vagas em
bolsas integrais em troca da isenção de quatro tributos: Imposto de Renda - IR,
Contribuição Social sobre o Lucro Líquido - CSLL, Contribuição para Programa de
Integração Social - PIS e a Contribuição Social para Financiamento da Seguridade Social -
COFINS.
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O MEC, através da exposição de motivos para o Projeto de Lei, justifica a
implantação do Programa Universidade para Todos, como sendo uma forma de criar novas
vagas no ensino superior para cotista sem nenhum investimento adicional por parte do
governo, pois a renúncia fiscal correspondente a R$ 50 milhões, seria muito inferior ao
montante para gerar o mesmo número de vagas em IES públicas, estimado em R$ 350
milhões. Em outras palavras, a justificativa é meramente econômica: seria supostamente
mais barato criar vagas nas instituições privadas que nas públicas. Uma outra justificativa
também presente na exposição de motivos do PL, seria a existência de um grande número
de vagas ociosas nas IES privadas, estimada em 37,5%. Uma terceira justificativa seria
“separar o joio do trigo” entre as filantrópicas, as quais, para continuarem gozando do
título de filantropia e, pois, da isenção da contribuição previdenciária patronal, teriam de
atender aos novos requisitos (MEC, 2004).
Procurando se defender da crítica de que o Prouni representaria transferência de
recursos públicos para as IES privadas, o então ministro da educação Tarso Genro em
consonância com o ministro da fazenda Antônio Palocci, na já referida exposição de
motivos do PL, alega que a renúncia de tributos pagos pelas IES não-filantrópicas seria
compensada pelo aumento da arrecadação de tributos pagos por uma minoria de
filantrópicas que seriam levadas a alterar seu regime jurídico, com base na suposição de
que essa minoria que não cumpre as exigências relativas à filantropia seria induzida a
“transformar sua natureza jurídica em sociedade de fins econômicos”, passando a pagar a
“quota patronal para a previdência social de forma gradual, durante o prazo de cinco
anos, na razão de vinte por cento do valor devido a cada ano, cumulativamente, até atingir
o valor integral das contribuições devidas” (MEC, 2004). Ou seja, se optarem pela sua
transformação em “sociedade de fins econômicos”, as filantrópicas poderão reter para si o
patrimônio acumulado às custas de todas essas isenções públicas ao longo dos anos,
infringindo, assim, a Constituição federal de 1988, que, no inciso II do art. 213, estipula
que, no caso de encerramento de suas atividades, elas teriam de destinar seu patrimônio “a
outra escola comunitária, filantrópica ou confessional ou ao poder público” (Davies,
2004, p.6). A alegação do governo, então, é que assim estaria não só criando vagas no
ensino superior para alunos carentes, sem gastar um centavo, como também recuperando
“a dignidade do conceito de filantropia, já que, hoje, a falta de transparência do cálculo de gratuidade a ser aplicado em assistência social por parte das instituições de ensino superior filantrópicas, confessionais e
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comunitárias é tamanha que uma minoria de instituições que se valem dessa opacidade para se desincumbir dos tributos devidos sem atender a suas obrigações sociais maculam a imagem de todo um setor cuja ação é imprescindível para o desenvolvimento social do País”(MEC, 2004).
Cabe a observação que, embora o discurso seja muito bonito, o Projeto de Lei não
esclarece como pretende combater a falta de transparência e os inúmeros artifícios que as
“falsas” filantrópicas praticaram e ainda praticam para burlar as exigências legais, com a
cumplicidade dos próprios órgãos governamentais.
Com o argumento de que seria impossível aplicar o programa em 2005 se ele não
começasse imediatamente o Governo publicou em 13/09/2004 no “Diário Oficial” da
União a Medida Provisória (MP n0 213/04) que cria o Prouni e em 13 de janeiro de 2005 é
sancionada a Lei n0 11.096 que institui o Programa Universidade para Todos – ProUni. O
texto legal traz modificações em relação ao projeto inicial enviado ao Congresso.
Focalizando a formulação do ProUni entre abril de 2004 e janeiro de 2005, com o
objetivo de extrair alguns elementos para a compreensão do jogo de interesses tanto no
Poder Legislativo como no Executivo, se faz necessário traçar um paralelo entre os três
documentos – Projeto de Lei (PL), Medida Provisória (MP) e a Lei. Entre a formulação do
PL e a promulgação da Lei transcorreu-se um período de apenas nove meses. No entanto, é
possível perceber mudanças significativas nos três documentos.
Originalmente, o “Programa Universidade para Todos – Prouni”, foi submetido ao
Congresso Nacional pelo Projeto de Lei n0 3.582, em maio de 2004, acompanhado de
pedido de Urgência Constitucional, retirado posteriormente para viabilizar a aprovação da
Lei de Diretrizes Orçamentárias (Lei n0 10.934, de 11 de agosto de 2004). Na Câmara, o
projeto recebeu 292 emendas, mas antes mesmo da votação em Congresso, o governo
fechou um acordo com diversas instituições privadas que se comprometeram a assinar o
termo de adesão ao Programa e a ceder vagas para alunos “carentes” já em 2005. Segundo
dados divulgados pela Imprensa, até aquele momento, 37 instituições já haviam aderido ao
Programa em troca da isenção fiscal (Lopreato & Carvalho, 2005, p.95).
Segundo a exposição de motivos que acompanhou a MP, “toda a atuação política
relativa ao marco regulatório do ensino superior foi orientada de forma a buscar a
formação de um amplo consenso, incorporando reivindicações e sugestões de todos os
setores envolvidos”. Entretanto, não corroboram com a afirmação “formação de um amplo
consenso” os métodos como as reformas do governo Lula vêm sendo encaminhadas, assim
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como o excessivo números de medidas provisórias editadas desde 2003. Na referida
exposição de motivos os ministros Tarso Genro, da Educação, e Antônio Palocci, da
fazenda, mencionam que a MP em questão incorpora “as reivindicações das mantenedoras
de instituições de ensino superior”. De fato, o conteúdo da MP absorveu muitas dessas
reivindicações, pois as modificações realizadas no PL original transformou-a numa versão
muito mais próxima do que defende os empresários da educação, sobretudo quando
permite a transferência de patrimônio acumulado com investimento estatal para o setor
privado.
Tomando como referência a comparação dos três documentos (PL, MP e a Lei)
feita por Lopreato & Carvalho (2005, p.96-99), cabe destacar inicialmente que no PL
somente seriam concedidas bolsas integrais para alunos cuja renda per capita não
ultrapassasse um salário mínimo. Na MP, além do aumento no limite de renda para um
salário mínimo e meio, passou a vigorar a concessão, também, de bolsas parciais de 50%
para alunos com renda per capita que não ultrapassasse três salários mínimos. Com base
na lei, foram estabelecidas ainda bolsas de estudos parciais de 25% para os bolsistas com
as mesmas condições sociais daqueles com direito à metade de gratuidade. A possibilidade
de bolsas parciais permite aos estabelecimentos particulares maior flexibilidade para
compor a receita comprometida com o programa.
Outro ponto digno de destaque é o fato de que no PL a bolsa de estudos seria
destinada apenas aos estudantes que cursaram o ensino médio completo em escola da rede
pública e a professores da rede pública de educação básica. Na MP, o público-alvo do
ProUni é mais amplo: abrange também egressos das instituições privadas na condição de
bolsista integral e estudantes portadores de necessidades especiais. Quanto aos professores
de rede pública, o texto da MP é mais específico, pois se destina aos cursos de licenciatura
e pedagogia, e independe da condição social. Na Lei, sofre uma alteração semântica,
quando se refere a portadores de deficiência, e acresce para professores da rede pública,
que teriam direito à bolsa, o curso normal superior.
Em relação a seleção dos candidatos ao ProUni, no PL restringia-se ao desempenho
e perfil sócio-econômico do Exame Nacional do Ensino Médio - ENEM, sendo que o
documento afirmava, até mesmo, a dispensa de processo seletivo específico. Já na MP e na
Lei, passa a existir ainda um segundo processo seletivo, com critérios a serem
determinados pela instituição de ensino superior, ao passo que o resultado do ENEM torna-
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se apenas uma pré-seleção. O documento final parece conferir aos estabelecimentos
particulares maior autonomia para selecionar seus estudantes bolsistas.
A proporção bolsa integral/aluno também sofreu alteração nos dois documentos que
sucederam o Projeto de Lei. No PL institui-se a proporção de uma bolsa integral para cada
nove alunos regularmente matriculados, independentemente de a instituição ter ou não
finalidade lucrativa. Para as entidades beneficentes de assistência social é fixada a
proporção de uma bolsa integral para cada quatro alunos pagantes. Na MP, ainda existe a
alternativa para aquelas sem fins lucrativos e não filantrópicas: a proporção de uma bolsa
para cada dezenove pagantes e, adicionalmente, bolsas parciais de 50%, até o equivalente a
10% de receita anual efetivamente recebida. Para as beneficentes, a MP determinou que a
proporção será de um bolsista integral para cada nove pagantes e até, no mínimo, o
equivalente a 20% de sua receita bruta composta por bolsas parciais de 50% e programas
de assistência social.
Com a promulgação da lei, estabeleceu-se que, durante a vigência de 2005, as
regras serão idênticas àquelas definidas na MP, para os estabelecimentos com ou sem fins
lucrativos não beneficentes, com exceção da inclusão da alternativa para os privados
lucrativos de conceder bolsas parciais que englobem 10% da receita auferida. Entretanto, a
partir de 2006, o documento é bastante generoso para ambos: amplia a relação de
estudantes pagantes por bolsas concedidas e reduz o comprometimento da receita bruta
com os benefícios. Para aqueles com ou sem fins lucrativos e não filantrópicos, a
concessão de uma bolsa integral para cada 10,7 alunos pagantes ou, de forma alternativa,
uma bolsa integral para cada 22 pagantes, com quantidades adicionais de bolsas parciais
(50% e 25%), até atingir 8,5% da receita bruta.
Segundo Lopreato & Carvalho (2005, p.97) a medida provisória n0 213/04 do
ProUni teve o texto alterado por proposta dos deputados do PFL, com apoio do PSDB e
por pressão dos atores políticos representantes das instituições privadas no Congresso
Nacional. No texto modificado pela Câmara Federal, aquelas com ou sem fins lucrativos
teriam de destinar 7% de vagas para o programa. O ministro da Educação, Tarso Genro,
afirmou ter sido decisiva nesse processo a participação do reitor de uma das maiores
instituições privadas de educação superior, a Universidade Paulista - Unip. Observa-se
então que a redação final do documento refletiu o jogo político, no qual o MEC teve de
ceder e acomodar os interesses privados.
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No caso das entidades beneficentes, o documento manteve as mesmas regras de
proporcionalidade de bolsas e o comprometimento da receita bruta. Houve uma alteração
quanto à renda familiar per capita: enquanto na MP a bolsa integral seria concedida a
alunos com até três salários mínimos, na Lei prevalecem as mesmas faixas de renda para
bolsa integral e parcial (50% e 25%) das demais instituições de ensino superior.
Ainda cabe destacar que o critério de desempenho institucional balizado pelo
Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior - SINAES foi afrouxado. No PL,
previa-se a desvinculação da instituição que apresentasse resultado insatisfatório por dois
anos consecutivos ou três intercalados, no período de cinco anos. Na MP e com a
ratificação da Lei, desvincula-se o curso mal avaliado por três avaliações consecutivas,
cujas bolsas passam a ser redistribuídas pelos demais cursos da mesma escola.
Houve também uma alteração significativa nos documentos quanto à relação entre
o ProUni e o Financiamento ao Estudante do Ensino Superior - Fies. Enquanto, no PL,
estaria vedado o credenciamento de instituições no Fies que não aderissem ao programa, na
MP ratificada pela lei, a redação foi atenuada ao estabelecer a prioridade na distribuição
dos recursos disponíveis no financiamento estudantil às participantes do programa. Por
último, caberia comentar que o PL fixava uma multa de, no máximo, 1% do faturamento
anual do exercício anterior à data da infração para a instituição de ensino superior
particular que descumprisse as regras do ProUni. Já na MP e na Lei, deixa de constar
qualquer sanção pecuniária para o desrespeito às regras do programa.
As alterações no texto legal parecem conduzir à flexibilização de requisitos e
sanções e à redução da contrapartida das instituições particulares. Tais evidências sugerem,
segundo Lopreato & Carvalho (2005, p.98), que durante a tramitação no Congresso
Nacional, houve atuação efetiva dos atores sociais representados pelas associações de
interesses do ensino superior particular, entre elas, Associação Brasileira de Mantenedoras
de Ensino Superior (ABMES), Associação Nacional da Universidades Particulares
(ANUP), Associação Nacional dos Centros Universitários (ANACEU), Associação
Nacional de Faculdades e Institutos Superiores (ANAFI) e Sindicato das Entidades
Mantenedoras de Ensino Superior do Estado de São Paulo (SEMESP). Após as
modificações introduzidas pela MP, esses atores manifestaram-se, publicamente, na forma
de adesão antecipada. Além de uma intensa campanha na mídia, matérias pagas vêm sendo
veiculadas nos principais jornais de circulação do país, em apoio ao programa. Nos debates
no âmbito do Projeto de Reforma do Ensino Superior, os representantes dos interesses
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privados bem como o governo tem enaltecido a importância do ProUni, sob o argumento
da democratização do ensino.
Até o momento, o ProUni tem sofrido duas críticas básicas. A primeira vem das
instituições de ensino privadas com status de filantrópicas. Seus dirigentes argumentam
que a obrigatoriedade de oferta de bolsas integrais levará a uma redução no total de
estudantes beneficiados com bolsas de qualquer espécie. Portanto, o programa
governamental seria mais excludente que a presente situação.
A partir da publicação da MP, algumas filantrópicas começaram a declarar nos
meios de comunicação que estariam dispostas a deixar o status de entidades de assistência
social para tornarem-se instituições com fins lucrativos. Desse modo poderão, por
exemplo, distribuir os lucros e remunerar seus diretores, o que é proibido como
filantrópica.
A lógica de tal atitude reside no fato de que para as instituições lucrativas e sem
fins lucrativos não-beneficentes, as regras mostram-se bem mais flexíveis. Para aquelas
que aderirem ao programa, a isenção dos tributos federais é a mesma para instituições já
isentas ou imunes a alguns deles. Além disso, há a possibilidade da escolha de bolsas
integrais e/ou parciais, por meio de duas opções de adesão: uma com base na concessão de
bolsas integrais e outra envolvendo a redução significativa das bolsas integrais e a receita
bruta como parâmetro para a concessão de bolsas parciais de 50% e 25%. Ainda cabe
destacar que para essas instituições a adesão ao ProUni é voluntária. Já para as entidades
beneficentes de assistência social, as regras revelam-se bem mais rigorosas. A adesão ao
ProUni, e a concessão de bolsas integrais são obrigatórias. As demais modalidades de
“gratuidade” (bolsas parciais e programas de assistência social) podem ser usadas para
compor o total de 20% da receita bruta. O percentual é o requisito mínimo que caracteriza
a natureza jurídica desse tipo de instituição (Lopreato e Carvalho, 2005, p.98-99).
Contrapondo a posição das instituições filantrópicas, vale registrar a opinião de
Fabrício Soares, reitor da Unidade Baiana de Ensino, Pesquisa e Extensão – UNIBAHIA,
instituição de educação superior de caráter privado, e vice-presidente da Associação
Brasileira das mantenedoras do Ensino Superior (Abmes), associação esta que abrange,
atualmente, no seu quadro de associados, 309 mantenedoras e 448 instituições de ensino
superior (IES) mantidas de todo o território nacional. Segundo o reitor o Programa
Universidade para Todos dá início a uma grande transformação no ensino superior. “Em 30
anos atuando na área educacional, talvez este seja o programa que eu tenha visto que vai
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trazer um maior incremento à inclusão social nas universidades”. Para ele, a meta do
MEC deve ser superar o índice atual de 9% de estudantes entre 18 e 24 anos no ensino
superior. “Neste sentido, a proposta do MEC é ousada e merece nosso apoio. Ficamos
atrás de países como o Paraguai em matéria de universitários neste intervalo de idade, o
que é uma estatística ridícula”, critica.9
A segunda crítica vem dos defensores do ensino gratuito oferecido pelo Estado que
condenam qualquer destinação de recursos públicos a entidades particulares, pois crêem
que o melhor seria revertê-los às instituições públicas. Segundo Miranda (2004), “o
Programa Universidade para Todos mascara de fato, a via autoritária trilhada pelo
governo federal para comprar vagas na rede privada de ensino superior”, observa ainda
que “cabe a nossa luta organizada, exigindo a anulação da compra de vagas na rede
privada de ensino superior, e a instauração imediata de discussão que garanta qualidade
e dignidade à universidade pública”.
É digno de destaque também, o posicionamento em relação ao Prouni, da
Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior
(Andifes), que reúne os reitores das universidades públicas federais, divulgado na imprensa
em maio de 2004 através de um documento denominado: Manifesto sobre a criação de
vagas públicas nas universidades particulares, dentro o programa “Universidade Para
Todos”.
“O que garante a inclusão social duradoura não é a simples (e absolutamente necessária) expansão da oferta de vagas, mas a qualidade e a pertinência da formação. O poder público não pode patrocinar a oferta de oportunidades desiguais de acesso à educação superior. Aos pobres, negros, pardos, índios e a tantos outros setores excluídos da educação superior, deve-se oferecer oportunidade igual de formação qualificada, o que se faz através do fortalecimento da educação pública e da ampliação da oportunidade de acesso republicano – ‘pela porta da frente’ – à formação superior”. (ANDIFES10 apud Mancebo, 2004, p.86).
Em agosto de 2004, a Andifes propôs ao MEC a expansão e modernização das
universidades públicas, destacando-se a meta de duplicação, em quatro anos, do número de
alunos (graduação e pós-graduação), bem como a da produção científica realizada nas
9 Declaração publicada na “Folha Dirigida” em 22/10/2004 em artigo cujo título era “ProUni dará autonomia às particulares”. Disponível em: { HYPERLINK http://www.andes.org.br/imprensa }. Acesso em 29/07/2006.
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instituições públicas. As universidades públicas federais, baseadas na tríade indissolúvel
ensino, pesquisa e extensão, respondem pela maioria da pesquisa científica de base feita
no país, cuja produção de conhecimento é condição necessária para a nossa independência
tecnológica, desenvolvimento econômico-social e capacidade científica. Ademais, as
graduações dessas instituições atendem cerca de 700 mil alunos, com um orçamento de
802 milhões de reais. Somados aos 100 milhões de reais da verba orçamentária da
Secretaria de Ensino Superior, é ainda inferior ao dinheiro público destinado à rede privada
(ANDIFES, 2004).
Segundo Deise Mancebo (2004, p.87), um outro aspecto que merece destaque
crítico refere-se ao que o ProUni oculta.
“Na medida em que o programa vem tomando um lugar central na Reforma Universitária, acaba por confundir a todos quanto às funções da universidade. Ele reduz a universidade a um dos seus aspectos – o ensino, dedicado sobretudo, à formação profissional. Esta, sem dúvida, é uma das importantes missões da universidade, a qual, no entanto, como instituição, tem papel social muito mais abrangente”. Observa ainda que “é preciso valorizar a pesquisa, restabelecendo não só as condições de sua autonomia, como as condições materiais de sua realização”.
Contrapondo tais opiniões, é importante mencionar a posição declaradamente
privatista do ex-ministro do governo FHC, Paulo Renato Souza. Em entrevista ao jornal O
Estado de São Paulo, em 16 de dezembro de 2005, o referido ex-ministro sugere que o
Ministério da Educação poderia aumentar o número de bolsas do ProUni se fizesse uma
negociação clara com as instituições particulares, pagando por determinado número de
vagas, de acordo com o número de inscritos no programa.
O ex-ministro e hoje proprietário de uma empresa de consultoria privada na área de
educação, vê no programa uma “boa iniciativa” para dar mais acesso ao ensino superior
mas lamenta as poucas bolsas previstas para 2006: menos de 150 mil para 1 milhão de
candidatos potenciais. Segundo Paulo Renato “apareceriam muito mais vagas se o governo
comprasse as vagas de que precisa, escolhendo as instituições de acordo com a
necessidade de cada região”.
Paulo Renato não vê problema na compra de vagas, desde que seja feita de modo
transparente e criterioso, e não da forma “disfarçada” como vê ocorrer atualmente no
10 ANDIFES. Manifesto sobre a criação de vagas públicas nas universidades particulares, dentro do programa “Universidade Para Todos”. Disponível em: { HYPERLINK http://www.andifes.org.br }. acesso em: 15 de maio de 2004.
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programa. Segundo ele “o ProUni é compra de vaga nas particulares, mas não mostram
isso e o fazem de uma forma velha e antiga, que levou a fraudes de todo o tipo”.
A forma atual limita a oferta de vagas, segundo o ex-ministro, já que as instituições
devem disponibilizar até 8,5% de suas vagas aos bolsistas do ProUni, em troca de isenções
fiscais. Observa ainda que “o MEC aposta numa grande oferta de vagas ociosas, mas não
há sobra de vagas nas instituições para incluir no programa. As universidades e
faculdades abrem vagas por terem autorização do MEC, mas muitas nem pretendiam ter
estas vagas e nem chegam a instalá-las”, explica o ex-ministro consultor.
Na compra direta das vagas, diz Paulo Renato, as faculdades e universidades podem
planejar e oferecer tantas quanto o governo pretende garantir aos estudantes de baixa renda
em cada região do país. A disputa por uma bolsa ficaria menos difícil, sem a necessidade
de uma seleção tão restritiva, que exige dos candidatos uma média de 65 pontos no Exame
Nacional do Ensino Médio - Enem, como ocorreu no ano de 2004. Uma oferta maior de
vagas daria, segundo o ex-ministro, chances a mais estudantes que terminam o ensino
médio e desistem de entrar no ensino superior por questões financeiras. A seleção abarcaria
mais candidatos com pontuação mediana no Enem, que não foram tão bem no exame
porque pararam de estudar há vários meses ou anos justamente porque precisavam
trabalhar. “A cada ano, um terço dos estudantes que concluem o ensino médio não entra
no ensino superior, e a minha hipótese é de que a razão seja econômica, são pessoas que
não têm recursos para pagar uma faculdade e vão trabalhar”, avalia Paulo Renato. “O
desafio do ensino superior é ser capaz de receber estes estudantes, e aí é uma questão
orçamentária, de quanto se tem para investir”. Cerca de 1 milhão das quase 2,2 milhões de
pessoas que fizeram o Enem-2005 já concluíram o ensino médio há algum tempo e são
potencialmente interessados em obter uma bolsa integral ou parcial (50%) do ProUni para
cursar o ensino superior em uma instituição particular. Com 150 mil bolsas, a maioria não
conseguirá. “É difícil saber que impacto terá, mas, para as pessoas que vão ficar de fora,
será uma grande frustração porque o programa lhe deu esperança”, conclui o ex-ministro.
Cabe registrar também a posição do presidente da Ordem dos Advogados do Brasil
– OAB, Roberto Busato, em relação a maneira de como o governo vem implantando o
ProUni. Na ocasião da publicação da medida provisória, considerou ser esse um exemplo
de mau uso desse instrumento, em entrevista publicada no jornal Folha de São Paulo em
14/09/2004, considerou que “esse caso mostra claramente o cipoal que o governo montou
contra si próprio. Nem mesmo um projeto de lei de sua autoria consegue tramitar de
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forma eficiente dentro do Congresso, pelo excesso de medidas provisórias”. E completou:
“O governo está realmente prostituindo o instituto da medida provisória”.
Por último, é importante registrar a opinião de Gustavo Petta, presidente da União
Nacional dos Estudantes (UNE). Inicialmente, isto é, na ocasião da edição do Projeto de
Lei que instituiria o ProUni, seu posicionamento era de que, “o governo deveria criar um
programa de regulamentação do ensino superior privado e não aumentar o número de
concessões fiscais para o setor”. Acrescentando ainda que “a entidade terá uma postura
crítica com relação ao ProUni”.11
No entanto, na ocasião em que foi editada a MP 213 o posicionamento de Gustavo
Petta foi de defesa da implementação do Programa, ressalvando apenas a quantidade de
bolsas viabilizadas. Segundo ele,
“É muito interessante ter um programa de caráter inclusivo desse tipo. Há muito tempo queríamos uma iniciativa como essa que resultasse na inclusão de mais pessoas de baixa renda nas universidades (...). Nossa contestação é, principalmente, quanto ao número de bolsas. O fato de o governo exigir que universidades concedam bolsas é algo positivo, mas o texto da MP fala que as instituições filantrópicas devem conceder 10% de bolsas e uma outra porcentagem pequena ligada a trabalhos na instituição ou desenvolvimento de projetos. O projeto de lei previa concessão de 20% de bolsas integrais”.12
No governo Lula, o ProUni surge acompanhado de um discurso de justiça social e
de inclusão das camadas sociais menos favorecidas, cujo principal indicador é o baixo
percentual de alunos com idade entre 18 e 24 anos freqüentando o ensino superior.13 Mas,
na verdade, esse discurso encobre a pressão das associações representativas dos interesses
do segmento privado, justificada pelo alto grau de vagas ociosas.
A expansão das entidades privadas de ensino superior nos últimos anos resultou na
criação de um número excessivo de vagas, que, segundo informações recentes do Inep, é
superior ao número de formandos no ensino médio. Tal fenômeno mostra uma inversão da
tendência verificada anteriormente. A demanda potencial por ensino superior não se
restringe ao número de concluintes do ensino médio. Contudo, é muito difícil estimar o
11 Declaração disponível em: { HYPERLINK http://www.andes.org.br/imprensa/ultimas }. Artigo intitulado “Presidente da UNE critica proposta”. Acesso em: 29/07/2006. 12 Declaração disponível em: { HYPERLINK http://www.universia.com.br/html/materia }. Artigo publicado em 14/09/2004 intitulado “UNE aprova ProUni mas questiona quantidade de bolsas”. Acesso em 01/10/2006. 13 Segundo o Inep/MEC, hoje, apenas 9% dos jovens brasileiros entre 18 e 24 anos estão cursando o ensino superior, número bem abaixo da Argentina, por exemplo, que tem 32% e do Canadá com 62%.
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número de pleiteantes. No cálculo incluem-se não apenas parte dos recém-formados, como
também aqueles que retornam tardiamente aos bancos escolares, além disso, um mesmo
aluno pode se inscrever em mais de um vestibular em cursos e instituições distintas.
Segundo dados do Inep/MEC fornecidos através do resumo técnico do Censo da
Educação Superior - 2004, o sistema de educação superior, como um todo, em 2004,
ofereceu 2.320.421 vagas. Do total de vagas oferecidas, 2.011.929 (86,7%) são
pertencentes ao setor privado; 131.675 (5,7%) ao setor estadual; 123.959 (5,3%) ao setor
federal; e 52.858 (2,3%) ao setor municipal. Inscreveram-se para disputar estas vagas
5.053.992 candidatos, isto equivale a dizer que o Brasil teve em 2004 uma média de 2,2
candidatos por vaga. Das 2.320.421 vagas oferecidas, apenas 1.303.110 foram preenchidas,
ficando ociosas um total de 1.017.311 vagas, ou 43,8% das vagas oferecidas. Considerando
apenas o setor privado, das 2.011.929 vagas oferecidas na educação superior, ingressaram
1.015.868 (50,5%) estudantes, ficando ociosas praticamente a metade das vagas oferecidas.
No setor público federal, como nos anos anteriores, o percentual de vagas ociosas é
bastante pequeno (menos de 1%); no setor público estadual as vagas ociosas chegam a
4,7% e nas municipais a 26,4%.
O gráfico abaixo mostra a relação entre o número de vagas oferecidas/vagas ociosas
nos setores público e privado, de acordo com os dados acima mencionados.
GRÁFICO I
Comparação entre o número de vagas oferecidas e ociosas de acordo com a categoria
administrativa
Fonte: MEC/INEP/DAES
Censo da Educação Superior – Sinopse Estatística
Resumo Técnico 2004
0
500.000
1.000.000
1.500.000
2.000.000
2.500.000
Privado público
vagas oferecidas
vagas ociosas
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Em relação as vagas ociosas nas IES privadas, há que se considerar ainda a hipótese
defendida por alguns de que tais vagas na realidade não existiriam. A tese se sustenta no
alicerce de que o investidor privado, porque tem demonstrado competência gerencial,
costuma dosar o que está “autorizado a oferecer”, de acordo com as leis, com o que “pode
e deve oferecer”, para manter sua estabilidade econômico-financeira e níveis de qualidade
de ensino. Collaço & Neiva (2005), contribuem nesse sentido, observando que “em
qualquer lugar do mundo, a iniciativa privada, inclusive quando atua no campo do ensino,
opera segundo uma lógica e uma racionalidade diversas das que movem o poder público”.
A situação das vagas ociosas colocou os estabelecimentos particulares diante de um
quadro de incerteza, sobretudo quando considerados individualmente. Lopreato &
Carvalho (2005, p.101) observam que
“aqueles que demandam ensino superior percebem que a qualidade das instituições privadas é bastante diversificada e que os serviços educacionais oferecidos não são homogêneos. Entidades tradicionais e aquelas cujas estratégias de marketing são mais agressivas terão, provavelmente, menor incerteza quanto ao preenchimento da vagas oferecidas do que as demais”.
Esse fato ganha maior relevância, quando se leva em conta o grau de
inadimplência/desistência. A queda nos rendimentos reais e o nível elevado de desemprego
dificultam a sustentação dos gastos com as mensalidades pelos assalariados. O ProUni
surge, assim, como uma operação de salvamento para o setor privado. As grandes
empresas educacionais, que atendem as elites, não têm muito interesse no programa – não
querem ofertar vagas para alunos de baixo poder aquisitivo que sequer vão poder pagar
50% das bolsas. No entanto, as instituições de menor qualidade, que contam com um alto
índice de inadimplência, o programa é uma espécie de “tábua de salvação” em um setor
que vive uma crise profunda.
Retomando a questão das isenções fiscais, Lopreato & Carvalho desenvolveram um
quadro comparativo simplificado das entidades com fins lucrativos, sem fins lucrativos
(confessionais e comunitárias) e filantrópicas, antes e depois da adesão ao ProUni.
Discrimina-se a base de cálculo e as alíquotas dos principais tributos federais nas três
categorias de estabelecimentos particulares.
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Tabela II
Alíquotas e Base de Cálculo dos Tributos Federais por Categoria de IES.
Tributos
Lucrativa
Confessional /
Comunitária
Filantrópica
Atual ProUni Atual ProUni Atual ProUni
IRPJ 25% x lucro - - - - -
CSLL 9% x lucro - - - - -
Cofins 7,6% x receita -
3% x receita - - -
PIS 1,65% x receita -
1% x folha -
1% x folha -
INSS (patronal) 20% x folha 20% x folha 20% x folha 20% x folha - -
Fonte: Legislação Brasileira
Elaboração: Lopreato & Carvalho
As instituições mais beneficiadas são aquelas com fins lucrativos, já que ficam
isentas, a partir da adesão ao programa, de praticamente todos os tributos que recolhiam.
Além disso, a contrapartida em número de bolsas é muito baixa, elas permanecem com o
mesmo status institucional e continuam não se submetendo a fiscalização e
regulamentação governamental.
Aquelas sem fins lucrativos deixam de recolher a COFINS e o PIS. O impacto
sobre a rentabilidade deve ser importante, uma vez que a isenção da COFINS estimula o
aumento de matrículas e, consequentemente, o crescimento da receita operacional bruta, já
que não há ônus tributário sobre a ampliação da prestação de serviços. A isenção do PIS
para as confessionais/comunitárias tem impacto muito pequeno sobre a folha salarial.
Já as beneficentes apenas são favorecidas com a isenção do PIS, cujo ônus fiscal é
pouco representativo. Tal contexto leva a compreender as alegações das filantrópicas em se
tornar lucrativas. A troca de imunidade por isenção fiscal por dez anos renováveis por
iguais períodos não traz grandes conseqüências. Os tributos municipais podem ser
barganhados com os poderes locais e as alíquotas variam muito entre os municípios. O
INSS patronal, de acordo com o explicitado na legislação do ProUni, pode ser suavemente
parcelado nos cinco primeiros anos.
No que diz respeito às finanças públicas, segundo Lopreato & Carvalho (2005,
p.102) o impacto principal do ProUni é a redução potencial da receita tributária. O valor da
renúncia fiscal dependerá do nível de adesão e do tipo de instituição que vier a participar
do programa. Por um lado, as lucrativas – que representam, de acordo com os dados do
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Inep, cerca de 22% das particulares e 52% das matrículas – tendem a aderir em maior
número. Por outro, se parte significativa das filantrópicas deixar o status de entidade de
assistência social, poderá haver um aumento da arrecadação previdenciária. Diante dessas
razões torna-se muito difícil precisar o valor da renúncia fiscal, mas pode-se afirmar que o
montante não será desprezível.
Quanto a oferta de vagas, para o ano de 2005, primeira edição do ProUni, o
Ministério da Educação ofereceu 112.416 bolsas, das quais 72.016 integrais e 40.400
parciais de 50% do valor da mensalidade. As vagas foram abertas em 1.131 instituições de
ensino superior não-públicas. É digno de registro que após duas prorrogações no prazo de
inscrição, cerca de 15 mil bolsas parciais não foram preenchidas. Segundo o MEC, o
motivo teria sido a incapacidade dos estudantes de pagar 50% dos preços estipulados pelas
instituições de ensino. A solução encontrada pelo então ministro da educação Tarso Genro
foi integrar o ProUni ao Programa de Financiamento Estudantil, assim os bolsistas parciais
do ProUni pagariam a outra metade da mensalidade com os empréstimos contratados via
Fies.
Para 2006, na gestão de Fernando Haddad como ministro da educação, foram
abertas 130 mil novas bolsas, cerca de 18 mil a mais do que as vagas oferecidas em 2005.
Para o primeiro semestre, foram destinadas 90.241 bolsas, sendo 62.305 integrais e 27.936
parciais, no valor de 50%, distribuídas em 1.388 instituições de ensino de todo o país. As
bolsas restantes ficam para o segundo semestre do ano, quando um novo processo de
seleção será aberto.
Cabe destacar que durante as discussões da implantação do ProUni, o governo Lula
aprovou o projeto das Parcerias Público-Privadas, que significa romper os limites entre o
público e o privado. O corolário das Parcerias Público-Privadas na educação seria o ProUni
e a Lei de Inovação Tecnológica.
Embora o projeto de lei n0 2546/2003, versando sobre as Parcerias Público-
Privadas, tenha tramitado no Congresso Nacional por pouco mais de um ano, recebeu cerca
de 500 emendas e, finalmente, em 30 de dezembro de 2004, o projeto, já bastante
modificado, foi transformado na lei 11.079. A modalidade de ajuste entre a administração
pública e os particulares preconizada pela nova lei não é novidade na prática
administrativa. Inúmeros são os exemplos de parcerias que foram e são feitas, embora não
com esse nome. E isto desde os tempos do império, em que, por exemplo, as ferrovias
públicas eram financiadas por acionistas privados.
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Do ponto de vista normativo, também a nova lei não constitui novidade. A
colaboração entre o público e o privado é tratada na Constituição brasileira em várias
oportunidades. Por exemplo: 1) O Art. 194 prevê a participação da sociedade e dos poderes
públicos nas iniciativas referentes à seguridade social; 2) O Art. 197 estabelece que as
ações e os serviços de saúde devem ser executados diretamente ou através de terceiros e
também por pessoa física ou jurídica de direito privado; 3) O Art. 199 afirma que a
assistência à saúde é livre a iniciativa privada, embora saúde seja definida como serviço
público essencial; 4) O Art. 204 prevê para a assistência social “a participação da
população por meio de organizações representativas, na formulação das políticas e no
controle das ações em todos os níveis”. Assim, nos regimes de contratação existentes, as
parcerias público-privadas já eram possíveis no nosso sistema constitucional.
Segundo a lei 11.079, existirão quatro diferentes formas de delegação da prestação
de serviços públicos a particulares: a “concessão de serviço público” (denominada pela
nova lei de “concessão comum”); a “concessão de serviço público precedida de obra
pública”, a “permissão de serviço público” e a “parceria público-privada”.
A parceria público-privada não é novo gênero de concessão. Dependendo do
objeto, será uma “concessão de serviço público” ou uma “concessão de serviço público
precedida de obra pública”. A inovação trazida pela nova lei é a peculiaridade de haver
contraprestação pecuniária do parceiro público, que se soma às tarifas cobradas do usuário.
Os compromissos assumidos pelo Brasil com os organismos internacionais, não
permitem praticamente nada em termos de investimento. O fato é que o país vem gastando
grandes somas para atender às exigências de superávit primário, ficando sem recursos da
poupança interna para financiar investimentos. Desse modo, o modelo das parcerias
público-privadas procura seguir fórmulas preconizadas pelas instituições financeiras, como
o Banco Mundial, o Fundo Monetário Internacional e o Banco Interamericano de
Desenvolvimento. Estes organismos têm induzido países em desenvolvimento a
beneficiarem, cada vez mais, empresas privadas, a maior parte delas de capital estrangeiro,
especialmente na exploração de serviços públicos potencialmente lucrativos. O apoio às
parcerias público-privadas vem mencionado expressamente nos documentos do Banco
Mundial com relação ao Brasil, especificamente no chamado Documento de Assistência ao
Brasil 2004/2007, enfatizado como importante alvo de reformas preconizadas pelo Banco
no Primeiro Empréstimo Programático para o Crescimento Eqüitativo e Sustentável,
oferecido ao Brasil e anunciado em 19 de fevereiro de 2004 (WorldBank, 2005).
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Emblematicamente, o Plano Plurianual do Brasil, para o mesmo período (2004-2007),
insere as parcerias público-privadas e prevê recursos para as mesmas.
A Lei que regulariza as parcerias público-privadas não diz respeito apenas à
educação, mas sim permite a concessão de serviços de “interesse público” a qualquer
empresa privada, englobando desde infra-estrutura (energia, petróleo, saneamento,
estradas, etc.) até a educação, segundo o texto legal “esta Lei se aplica aos órgãos da
Administração Pública direta, aos fundos especiais, às autarquias, às fundações públicas
(...)”. É bom lembrar que as universidades são hoje autarquias ou fundações públicas.
Com isso, fica legalizado e envio de verbas públicas para as empresas privadas
nacionais ou multinacionais, tanto através de investimentos diretos quanto de isenção de
impostos. Na educação, as parcerias público-privadas são a espinha dorsal da reforma
universitária ora em curso. É a partir dessa modalidade que funciona o ProUni, onde o
Estado “incentiva” as instituições privadas através de isenções fiscais. É também sobre as
parcerias público-privadas que se debruça o centro da lógica, que estabelece o fim dos
limites entre o que é público e o que é privado, incorporando todas as universidades a um
mesmo sistema nacional, permitindo que as particulares e públicas tenham o mesmo
tratamento perante o Estado, com a mesma autonomia e garantindo até que as privadas
recebam financiamento direto do Estado.
Ainda sobre esse aspecto, é importante mencionar a Lei de Inovação Tecnológica
(Lei n0 10.973 de 02 de dezembro de 2004), ainda em fase de regulamentação, que vem
sendo excluída das discussões sobre a Reforma da Educação Superior, mas que poderá
afetar a universidade em profundidade. A Lei tem como objetivo fundamental a
transferência de tecnologia das universidades públicas para as empresas privadas, através
de parcerias. É um tipo de parceria público-privada ainda mais ampla do que o ProUni,
pois não se trata apenas de relação com “faculdades” e sim com qualquer tipo de empresa
privada.
Com esta Lei, fica prevista a criação de parcerias entre as empresas privadas e as
universidades com o intuito de desenvolver tecnologia. Segundo o Art. 4 do texto legal as
universidades poderão
“compartilhar seus laboratórios, equipamentos, instrumentos, materiais e demais instalações com microempresas e empresas de pequeno porte em atividades voltadas à inovação tecnológica, para a consecução de atividades de incubação, sem prejuízo de sua atividade finalística”.
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Cabe ainda a observação de que estas empresas não estariam utilizando apenas a
estrutura física, mas também o pessoal da universidade (estudantes, servidores técnicos-
administrativos e professores). Em síntese, a Lei abre espaço para que as empresas possam
entrar nas universidades públicas, colocando a pesquisa, um dos pontos do tripé da
formação superior, a serviço do mercado e do lucro.
A referida lei permite que pesquisadores de universidades públicas trabalhem em
empresas privadas, prevendo assim, a transferência de tecnologia das universidades e
centros de pesquisa para as empresas. Segundo o Art. 8 do documento,
“o servidor, militar ou o empregado público envolvido na prestação de serviço (...) poderá receber retribuição pecuniária, diretamente da ICT ou de instituição de apoio com que esta tenha firmado acordo, sempre sob a forma de adicional variável e desde que custeado exclusivamente com recursos arrecadados no âmbito da atividade contratada”.
Tal fato poderá aprofundar um processo em que unidades, grupos e mesmo
instituições terão condições de trabalho, regimes de funcionamento e salários
diferenciados. Nesse sentido, os principais problemas quanto à sua regulamentação ficam
por conta da mercantilização do conhecimento e do arrefecimento do potencial crítico de
que a universidade deve dispor.
A Lei também autoriza, em seu Art. 28, que essas empresas recebam recursos do
orçamento do Estado e isenção de impostos: “a união fomentará a inovação na empresa
mediante a concessão de incentivos fiscais com vistas na consecução dos objetivos
estabelecidos nesta Lei”. Isto é, a universidade passa a ser usada tanto pelas empresas,
quanto por professores para gerar lucros, uma inversão total da lógica de uma universidade
pública financiada pelo Estado. Além disso, as descobertas científicas fruto das pesquisas
não serão propriedade da universidade e nem do pesquisador, mas dividido com a empresa
privada; segundo o Art. 5 da Lei, “a propriedade intelectual sobre os resultados obtidos
pertencerá às instituições detentoras do capital social, na proporção da respectiva
participação”.
Outro documento legal, também digno de registro, é o Decreto n0 5.205 de 14 de
setembro de 2004 que regulamenta as relações entre as instituições federais de ensino
superior e de pesquisa científica e tecnológica e as fundações de apoio. O Art. 10 do
referido decreto registra que
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“as instituições federais de ensino superior e de pesquisa científica e tecnológica poderão celebrar com as fundações de apoio contratos ou convênios, mediante os quais essas últimas prestarão às primeiras apoio a projetos de ensino, pesquisa e extensão, e de desenvolvimento institucional, científico e tecnológico, por prazo determinado”.
Dentre as atividades de apoio a que se refere o artigo, inclui-se o gerenciamento de
projetos de ensino, pesquisa e extensão, e de desenvolvimento institucional, científico e
tecnológico. Para os fins deste Decreto, entende-se por desenvolvimento institucional os
programas, ações, projetos e atividades, inclusive aqueles de natureza infra-estrutural, que
levem à melhoria das condições das instituições federais de ensino superior e de pesquisa
científica e tecnológica para o cumprimento da sua missão institucional, devidamente
consignados em plano institucional aprovado pelo órgão superior da instituição.
Na realidade as fundações de apoio foram criadas como forma alternativa de
captação de recursos por parte das universidades, já que as verbas públicas são
insuficientes. As fundações prestam serviços de pesquisa, extensão ou outros a empresas
privadas, e transferem parte deste dinheiro para as universidades. O problema é que as
pesquisas realizadas pelas fundações estão a serviço do lucro e do que interessa às
empresas. Para realizar seus projetos, as fundações usam toda a infraestrutura da
universidade e o próprio nome da instituição para fins particulares. O maior exemplo disso
são os cursos pagos de curta duração, oferecidos por estas instituições.
Um bom número de professores trabalha nos projetos e cursos das fundações, onde
recebem por seus serviços prestados valores maiores que seus próprios salários, e acabam
abandonando as pesquisas e as aulas das universidades, se tornando ardorosos defensores
das fundações. O Decreto em questão legalizou toda esta situação, permitindo que as
fundações de apoio ganhem um novo impulso através de medidas, como por exemplo a Lei
de Inovação Tecnológica citada anteriormente, que aprofundarão a privatização interna das
universidades.
Dentro deste contexto, o governo Lula coloca em andamento um projeto de reforma
universitária que deixa claramente especificado duas estratégias: desobrigar o Estado no
financiamento das universidades públicas criando mecanismos para que estas captem
recursos junto ao mercado e criar mecanismos que permitam a transferência de recursos
públicos direta ou indiretamente para as instituições de ensino superior privadas. Para as
públicas o governo aprova o Decreto das fundações e a Lei de Inovação Tecnológica e para
as privadas o governo aposta no ProUni.
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Em termos conclusivos cabe aqui a contribuição de Siqueira (2004, p.68) quando
registra que, em termos de educação superior pública,
“a expansão de vagas prevista no setor público coloca extrema ênfase no ensino à distância, em contratos de parceria – nos quais se retira da universidade a autonomia acadêmica (de escolha de cursos, programas etc.), de gestão administrativa (prazos) e financiamento (limita-se o uso de recursos a determinado projeto) – , e insiste na autonomia entendida como liberdade para captar recursos, que seriam administrados por fundações”.
Em termos de educação superior privada, observa que
“há uma clara tendência a montar um esquema para salvar os empresários do ensino, com transferência de recursos públicos de forma direta (bolsas) ou indireta (abatimento de tributos)”.
Por fim, como é possível perceber, o governo Lula está agindo em sintonia com as
propostas dos organismos internacionais, incorporando o discurso da falta de recursos, do
uso dos parcos recursos beneficiando os ricos em detrimento dos mais pobres, e assim
justificando a adoção do bordão do “alívio à pobreza” (Siqueira, 2004, p.68) e de políticas
focalizadas, extinguindo o conceito de universalidade dos direitos humanos sociais.
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4 - CONCLUSÃO
A educação superior no Brasil, ao longo de sua trajetória histórica, foi influenciada
tanto pela concepção francesa de universidade, de caráter profissionalizante, quanto pela
alemã, preocupada com uma formação integral e com a pesquisa, sobretudo quando da
predominância das universidades públicas de ensino, pesquisa e extensão. Atualmente,
vem prevalecendo o modelo norte-americano, ampliando o predomínio das instituições de
ensino superior mantidas pelo setor privado,
Na segunda parte da introdução deste trabalho, quando foi realizado um breve
histórico sobre a trajetória da educação superior no Brasil, ficou constatado que a educação
superior brasileira teve sua gênese nas instituições privadas, tendo como base
organizacional os institutos isolados, e que posteriormente a predominância passou a ser
das instituições públicas, tendo como forma organizacional a universidade. Por intermédio
de políticas educacionais que buscavam favorecer a grupos privados, essa predominância
volta a ser das instituições de ensino superior particulares, que substituíram o modelo
organizacional de universidade para o de institutos isolados e mais recentemente para uma
variedade de formas organizacionais e de oferta de cursos.
O modelo organizacional universitário de educação superior no Brasil se sustenta
no tripé de ensino, pesquisa e extensão. Esse modelo, adotado sobretudo pelas instituições
públicas, influenciou nos processos de criação das universidades e encontra-se expresso na
legislação que organiza a educação superior no Brasil.
Contudo especialmente a partir dos anos 1990, foi desencadeado um processo de
Reforma do Estado e da Educação Superior Brasileira, sendo alguns aspectos dessa
reforma destacados no segundo capítulo deste estudo. Ficou constatado que com
legitimidade política e eleitoral, o presidente Fernando Henrique Cardoso transformou o
Brasil no país das reformas e o submeteu, apesar de suas peculiaridades, ao figurino do
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capital, com participação decisiva dos organismos multilaterais, tendo destaque especial o
Banco Mundial.
Através da análise do Caderno n0 1 editado pelo Ministério da Administração
Federal e Reforma do Estado – Mare, de autoria do ex-ministro Luiz Carlos Bresser
Pereira, foi possível observar que os pressupostos da Reforma que compreendem: a
redução de custos e racionalização do gasto público para assegurar a estabilidade do Plano
Real, a melhoria da eficiência do aparelho do Estado e a descentralização dos serviços,
retirando do Estado as atividades que possam ser desenvolvidas por outras instituições,
estão diretamente relacionados a questão da delimitação do tamanho do Estado, que foi
claramente expressa pelas idéias de “privatização, publicização e terceirização”. Segundo
tais pressupostos, delimitar o tamanho do Estado é deixar a seu cargo apenas as chamadas
funções essenciais, como justiça, segurança interna e relações exteriores, repassando para o
setor privado a saúde, a educação, a previdência e a assistência.
Ao lado da delimitação do tamanho do Estado, inclui-se a privatização do Estado,
onde o mercado é defendido como o locus da garantia da eficiência e da eficácia não
obtidas no espaço público. Nesse sentido cabe destacar a colaboração de Chauí (2001,
p.20), quando afirma que
“diferentemente da forma keynesiana e social-democrata que, desde o fim da Segunda Guerra, havia definido o Estado como agente econômico que regula mercado, e agente fiscal que emprega a tributação para promover investimentos nas políticas de direitos sociais, agora, o capitalismo dispensa e rejeita a presença estatal não só no mercado, mas também nas políticas sociais, de sorte que a privatização tanto de empresas quanto de serviços públicos também se tornou estrutural. Disso resulta que a idéia de direitos sociais como pressuposto e garantia dos direitos civis ou políticos tende a desaparecer, pois o que era um direito converte-se num serviço privado regulado pelo mercado e, portanto, torna-se uma mercadoria acessível apenas aos que têm poder aquisitivo para adquiri-la”.
A imposição dessas transformações, alteraram significativamente a identidade das
Instituições de Educação superior brasileiras, sobretudo as de caráter privado, que
passaram a se organizar para o atendimento das demandas do “mercado” e captar recursos
alternativos.
O governo FHC empreendeu uma intensa atividade reformadora no campo
educacional, sem esperar pela promulgação da LDB. Para tanto, o MEC foi
particularmente ativo na elaboração de uma série de projetos de reforma da Constituição,
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de medidas provisórias, de projetos de lei e de decretos. As propostas de reforma para as
universidades públicas provocaram uma crescente privatização das mesmas e promoveram
uma grande expansão da rede privada de ensino superior. Essa expansão ficou claramente
demonstrada no final do segundo capítulo, quando foram analisados os dados do Censo da
Educação da Superior. A política neoliberal do Estado para as universidades brasileiras, no
período correspondente aos dois mandatos de Fernando Henrique Cardoso, apresentou
como características a falta de investimentos no campo da pesquisa científica e tecnológica
e um abandono em relação ao ensino universitário público. Observou-se também, neste
período uma crescente intervenção do Estado e do MEC nas universidades, via sistema de
avaliação e outras medidas autoritárias, ferindo a autonomia das instituições universitárias.
Com a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei n0
9.394/96, tendo como ministro da educação o economista Paulo Renato Souza, observou-
se o viés privatizante da educação superior brasileira em vários artigos, desde a exigência
de que as instituições privadas de ensino tenham capacidade de autofinanciamento até a
introdução de mais um tipo de curso de nível superior, o curso seqüencial por campo de
saber, que não atende as características das instituições públicas, em geral universidades,
voltadas para a execução de cursos de graduação e de pós-graduação
Foram também analisados neste trabalho dois outros importantes instrumentos de
definição e implementação de políticas públicas no período em questão: o Planejamento
Político-Estratégico (1995/1998), do Ministério da Educação e do Desporto, e o Plano
Nacional de Educação – PNE. No que diz respeito à educação superior, foi constatado que
o planejamento político-estratégico desmontou o princípio da indissociabilidade entre
ensino, pesquisa e extensão, quando reconheceu a diversidade e heterogeneidade do
sistema de ensino superior e a necessidade de formulação de políticas diversificadas para a
promoção da consolidação de centros de excelência em pesquisa e pós-graduação, para o
estímulo à criação de mestrados stricto sensu profissionalizantes, além da simplificação
das exigências burocráticas para reconhecimento de cursos e credenciamento de
instituições privadas. Em relação Plano Nacional de Educação – PNE, A análise realizada
ainda no capítulo 2 desta pesquisa, demonstrou que, embora mencionasse a necessidade da
importância da pesquisa científica e tecnológica, em suas metas, o Plano apontou para
outra direção. Ainda que reconheça nas universidades o seu núcleo estratégico, o PNE
estabeleceu para o sistema de educação superior a coexistência de um conjunto
diversificado de instituições que buscam atender a diferentes demandas e funções. Desse
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modo, é razoável admitir que o PNE vergou-se às reformas educacionais promovidas sob a
influência dos organismos internacionais de financiamento. Além disso, ao serem
analisados os objetivos do PNE quanto ao atendimento, financiamento e gestão da
educação superior brasileira, constatou-se claramente o caráter privatista e empresarial da
política definida pelos dois mandatos de FHC.
Como última análise da reforma da educação superior nos anos 1990 cabe destacar
a contribuição de Neves (2002, p.150) quando observa que
“todas essas diretrizes, ao se dirigirem mais especificamente à expansão das atividades de ensino, reforçam a diretriz governamental de certificar a mão-de-obra especializada para exercer tarefas complexas no mercado de trabalho. A educação mais restritiva, resultante de uma escolarização voltada para certificação da mão-de-obra, tenderá predominantemente a formar cidadãos aptos a realizar tarefas complexas de mais baixo nível no mercado e de ocupar cargos de gerência na produção, no aparelho estatal e na sociedade civil, mas dificilmente formará um cidadão capaz de pensar, de estudar, de criar e de controlar quem dirige”.
No capítulo 3, foi trabalhada a questão da reforma da educação superior no governo
Lula, ora em curso. Em um primeiro momento, tomou-se como objeto de análise o
relatório do Grupo de Trabalho Interministerial -GTI que tinha como objetivos principais,
analisar a situação da educação superior brasileira e apresentar um plano de ação visando a
reestruturação, desenvolvimento e democratização das Instituições Federais de Ensino
Superior - IFES. Ficou nítida a influência de organismos mundiais, em especial do Banco
Mundial, no relatório GTI sobretudo quando este apontou a educação à distância como um
caminho viável e necessário para a universidade pública brasileira. A educação à distância,
assim como o aligeiramento dos cursos em universidades de formação profissional de
quatro anos, institutos isolados e Centros vocacionais e/ou de formação técnica com
duração de dois anos, foram questões preconizadas pelo documento do Banco Mundial de
1999 intitulado “Estratégia para o Setor Educacional”.
Um outro ponto de importância relevante mencionado no relatório do GTI,
abordado nesta pesquisa, foi a questão da autonomia universitária. Através da análise do
documento, observou-se que o enfoque principal foi a autonomia financeira, ou seja, a
liberação da universidade para captar recursos no mercado, “sem amarras legais”. Nesse
sentido, cabe aqui a consideração que esse foi o conceito de autonomia universitária que
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permeou as propostas dos governos FHC, e que agora, fundamenta a Reforma
Universitária do governo Lula.
Apesar do discurso governamental de que a Reforma Universitária seria
amplamente discutida antes de ser implementada, ficou constatado ainda no capítulo 3
deste trabalho, que a mesma já está sendo elaborada e colocada em prática através de
Medidas Provisórias ou Leis, como por exemplo a Lei n0 10.861, que instituiu o Sistema
Nacional de Avaliação da Educação Superior – SINAES, que por sua vez possui uma série
de instrumentos complementares: autoavaliação, avaliação externa, Exame Nacional de
Desempenho dos Estudantes – ENADE (que substituiu o antigo “Provão”) e avaliação dos
cursos de graduação e instrumentos de informação (censo e cadastro). A avaliação é um
dos pilares da Reforma Universitária do governo Lula sendo o SINAES o mecanismo de
regulação-supervisão do governo para adequar as instituições públicas e privadas a essa
reforma.
Até o momento, existem quatro versões do projeto de lei da reforma da educação
superior. Divulgadas respectivamente, em: dezembro de 2004, maio de 2005, julho de
2005 e maio de 2006. Realizando uma breve análise da última versão do projeto, foi
possível constatar que o projeto é congruente com as medidas até agora encaminhadas pelo
MEC no governo Lula que robustecem o ensino privado em detrimento da educação
pública, como o SINAES/ENADE, o ProUni, a educação à distância (EAD) e fizeram
avançar a mercantilização da educação nas instituições públicas, a exemplo da
intitucionalização das fundações de apoio privadas nas IFES e a Lei de inovação
tecnológica. Segundo o ANDES (2006), “é possível afirmar que o projeto encerra um
ciclo de contra-reformas que naturaliza a irresponsável tendência de privatização e
mercantilização da educação superior brasileira”.
O foco principal deste trabalho foi abordado na segunda parte do capítulo 3, quando
foi tratada a questão do Programa Universidade para Todos – ProUni. Tendo como pano de
fundo os antecedentes do financiamento público ao setor privado: Creduc, Fies e as
isenções fiscais e previdenciárias; o ProUni foi abordado como uma nova forma de
transferência de recursos públicos para as instituições de educação superior privadas.
Em primeiro lugar, ficou constatado que foi alardeada a existência de um aumento
significativo de vagas ociosas, no segmento privado da educação superior, associado à
procura por ensino superior das camadas de baixa renda. Esses fatores foram utilizados
pelo governo e por empresários para fundamentar a proposta do MEC de estatização de
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vagas nas instituições particulares, em troca da renuncia fiscal. E foi nesse sentido,
mascarado por um discurso demagógico de “democratizar” o acesso ao ensino superior,
que o governo encaminhou ao Congresso Nacional, em maio de 2004, o Programa
Universidade para Todos – ProUni. Com o argumento de que seria impossível aplicar o
programa em 2005 se ele não começasse imediatamente o Governo publicou em
13/09/2004 no “Diário Oficial” da União a Medida Provisória (MP n0 213/04) que cria o
Prouni e em 13 de janeiro de 2005 foi sancionada a Lei n0 11.096 que institui o Programa
Universidade para Todos – ProUni. Além da questão das vagas ociosas há que se
considerar também o grau de inadimplência/desistência. A queda nos rendimentos reais e o
nível elevado de desemprego dificultam a sustentação dos gastos com as mensalidades
pelos assalariados. O ProUni surge, assim, como uma operação de salvamento para o setor
privado.
O texto legal trouxe várias modificações em relação ao projeto inicial enviado ao
Congresso. Objetivando extrair alguns elementos para a compreensão do jogo de
interesses, tanto no Poder Legislativo quanto no Executivo, houve então a necessidade de
traçar um paralelo entre os três documentos – Projeto de Lei (PL), Medida Provisória (MP)
e a Lei. Esta comparação foi realizada no capítulo em questão tomando como referência o
trabalho de Lopreato & Carvalho (2005, p.96-99). O quadro a seguir traz resumidamente
os aspectos abordados.
Quadro I
Paralelo entre o Projeto de Lei, a MP 213/04 e a Lei 11.096 que instituiu o ProUni
Renda per capita
PL
Somente seriam concedidas bolsas integrais para alunos cuja renda per capita não ultrapassasse um salário mínimo.
MP
Aumento no limite de renda para um salário mínimo e meio, passou a vigorar a concessão, também, de bolsas parciais de 50% para alunos com renda per capita que não ultrapassasse três salários mínimos.
LEI
foram estabelecidas ainda bolsas de estudos parciais de 25% para os bolsistas com as mesmas condições sociais daqueles com direito à metade de gratuidade.
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Destinação da bolsa de estudos
PL
Aos estudantes que cursaram o ensino médio completo em escola da rede pública e a professores da rede pública de educação básica.
MP
Abrange também egressos das instituições privadas na condição de bolsista integral e estudantes portadores de necessidades especiais. Quanto aos professores de rede pública, o texto da MP é mais específico, pois se destina aos cursos de licenciatura e pedagogia, e independe da condição social.
LEI
Acresce para professores da rede pública, que teriam direito à bolsa, o curso normal superior.
Seleção dos candidatos
PL
Desempenho e perfil sócio-econômico do Exame Nacional do Ensino Médio – ENEM.
MP
Critérios a serem determinados pela instituição de ensino superior. O resultado do ENEM torna-se apenas uma pré-seleção.
LEI
Não houve alteração em relação a MP.
Proporção bolsa integral/aluno
PL
Uma bolsa integral para cada nove alunos regularmente matriculados, independentemente de a instituição ter ou não finalidade lucrativa. Para as entidades beneficentes de assistência social é fixada a proporção de uma bolsa integral para cada quatro alunos pagantes.
MP
Existe a alternativa para as instituições sem fins lucrativos e não filantrópicas: a proporção de uma bolsa para cada dezenove pagantes e, adicionalmente, bolsas parciais de 50%, até o equivalente a 10% de receita anual efetivamente recebida. Para as beneficentes, determinou que a proporção será de um bolsista integral para cada nove pagantes e até, no mínimo, o equivalente a 20% de sua receita bruta composta por bolsas parciais de 50% e programas de assistência social.
LEI
Para as instituições com ou sem fins lucrativos e não filantrópicas, a concessão de uma bolsa integral para cada 10,7 alunos pagantes ou, de forma alternativa, uma bolsa integral para cada 22 pagantes, com quantidades adicionais de bolsas parciais (50% e 25%), até atingir 8,5% da receita bruta.
Fonte: Lopreato & Carvalho (2005, p.96-99)
As alterações no texto legal parecem conduzir à flexibilização de requisitos e à
redução da contrapartida das instituições particulares. Tal afirmação se sustenta nas
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seguintes considerações: a) a possibilidade de bolsas parciais permite aos estabelecimentos
particulares maior flexibilidade para compor a receita comprometida com o programa; b) o
documento final parece conferir aos estabelecimentos particulares maior autonomia para
selecionar seus estudantes bolsistas; c) a diminuição do percentual de bolsas integrais.
Houve também uma alteração significativa nos documentos quanto à relação entre o
ProUni e o Financiamento ao Estudante do Ensino Superior – Fies, no sentido de
estabelecer prioridade na distribuição dos recursos disponíveis no financiamento estudantil
às IES participantes do programa. Diante disso, é bastante razoável admitir que as
modificações realizadas no PL original transformou-o numa versão muito mais próxima do
que defende os empresários da educação, sobretudo quando permite a transferência de
patrimônio acumulado com investimento estatal para o setor privado.
Na seqüência, Observou-se que até o momento, o ProUni tem sofrido duas críticas
básicas. A primeira vem das instituições de ensino privadas com status de filantrópicas e a
segunda vem dos defensores do ensino gratuito oferecido pelo Estado que condenam
qualquer destinação de recursos públicos a entidades particulares, pois crêem que o melhor
seria revertê-los às instituições públicas.
As instituições filantrópicas alegam que para as instituições lucrativas e sem fins
lucrativos não-beneficentes, as regras mostram-se bem mais flexíveis, e nesse sentido
declaram que estariam dispostas a deixar o status de entidades de assistência social para
tornarem-se instituições com fins lucrativos. Desse modo poderão, por exemplo, distribuir
os lucros e remunerar seus diretores, o que é proibido como filantrópica. Além disso, há a
possibilidade da escolha de bolsas integrais e/ou parciais, por meio de duas opções de
adesão: uma com base na concessão de bolsas integrais e outra envolvendo a redução
significativa das bolsas integrais e a receita bruta como parâmetro para a concessão de
bolsas parciais de 50% e 25%.
Contrapondo a essas críticas formuladas pelas filantrópicas, foi registrado neste
trabalho de pesquisa as opiniões de alguns atores que corroboram a implantação do
programa, por exemplo do vice-presidente da Associação Brasileira das mantenedoras do
Ensino Superior (Abmes), Fabrício Soares. Cabe também mencionar a posição
declaradamente privatista do ex-ministro do governo FHC, Paulo Renato Souza, que
chegou ao extremo, quando sugeriu que o governo realizasse uma negociação clara com as
instituições particulares, pagando por determinado número de vagas, de acordo com o
número de inscritos no programa.
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Em relação aos defensores do ensino gratuito oferecido pelo Estado, é importante
novamente ressaltar a opinião da ANDIFES contestando que o poder público não pode
patrocinar a oferta de oportunidades desiguais de acesso à educação superior. E também
vale lembrar a observação de Mancebo (2004, p.87) de que o ProUni reduz a universidade
a um dos seus aspectos – o ensino, dedicado sobretudo, à formação profissional.
Retomando a questão das isenções fiscais, e estabelecendo um quadro comparativo
das entidades com fins lucrativos, sem fins lucrativos (confessionais e comunitárias) e
filantrópicas, antes e depois da adesão ao ProUni, ficou constatado que as instituições mais
beneficiadas são aquelas com fins lucrativos, já que ficam isentas, a partir da adesão ao
programa, de praticamente todos os tributos que recolhiam. Além disso, a contrapartida em
número de bolsas é muito baixa, permanecem com o mesmo status institucional e
continuam não se submetendo à fiscalização e regulamentação governamental.
Durante as discussões da implantação do ProUni, o governo Lula aprovou o projeto
das Parcerias Público-Privadas, que significa romper os limites entre o público e o privado,
fazendo com que a iniciativa privada substitua o papel do Estado em muitas de suas
funções. O corolário das Parcerias Público-Privadas na educação seria o ProUni e a Lei de
Inovação Tecnológica. As parcerias público-privadas são os alicerces da reforma da
educação superior ora em curso. É a partir dessa modalidade que funciona o ProUni, onde
o Estado “incentiva” as instituições privadas através de isenções fiscais. As parcerias
público-privadas que incorporam todas as universidades a um mesmo sistema nacional,
permitindo que as particulares e públicas tenham o mesmo tratamento perante o Estado,
com a mesma autonomia e garantindo até que as privadas recebam financiamento direto do
Estado.
Ainda sobre esse aspecto, este trabalho mencionou a Lei de Inovação Tecnológica
que vem sendo excluída das discussões sobre a Reforma da Educação Superior, mas que
poderá afetar a universidade em profundidade. A Lei tem como objetivo fundamental a
transferência de tecnologia das universidades públicas para as empresas privadas, através
de parcerias e abre espaço para que as empresas possam entrar nas universidades públicas,
colocando a pesquisa, um dos pontos do tripé da formação superior, a serviço do mercado
e do lucro. Além disso, a referida lei também permite que pesquisadores de universidades
públicas trabalhem em empresas privadas, prevendo assim, a transferência de tecnologia
das universidades e centros de pesquisa para as empresas.
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Outro documento legal, também registrado neste trabalho de pesquisa foi o Decreto
n0 5.205 de 14 de setembro de 2004 que regulamenta as relações entre as instituições
federais de ensino superior e de pesquisa científica e tecnológica e as fundações de apoio,
foi observado que na realidade as fundações de apoio foram criadas como forma
alternativa de captação de recursos por parte das universidades, já que as verbas públicas
são insuficientes. As fundações prestam serviços de pesquisa, extensão ou outros a
empresas privadas, e transferem parte deste dinheiro para as universidades. O problema é
que as pesquisas realizadas pelas fundações estão a serviço do lucro e do que interessa às
empresas. Para realizar seus projetos, as fundações usam toda a infra-estrutura da
universidade e o próprio nome da instituição para fins particulares. Além disso é digno de
destaque também que um bom número de professores trabalha nos projetos e cursos das
fundações, onde recebem por seus serviços prestados valores maiores que seus próprios
salários, e acabam abandonando as pesquisas e as aulas das universidades, se tornando
ardorosos defensores das fundações.
Dentro deste contexto, o governo Lula coloca em andamento um projeto de reforma
universitária que deixa claramente especificado duas estratégias: desobrigar o Estado no
financiamento das universidades públicas criando mecanismos para que estas captem
recursos junto ao mercado e criar mecanismos que permitam a transferência de recursos
públicos direta ou indiretamente para as instituições de ensino superior privadas. Para as
públicas o governo aprova o Decreto das fundações e a Lei de Inovação Tecnológica e para
as privadas o governo aposta no ProUni.
Direcionando novamente o foco para a questão do ProUni, é importante destacar
como última análise, que em relação ao discurso do governo de que a geração de vagas nas
IES privadas apresenta um custo menor do que nas públicas, é sempre bom lembrar que as
públicas realizam atividades (pesquisa, atendimento médico em hospitais universitários e
manutenção de fazendas, por exemplo) que, justamente por serem mais dispendiosas, não
atraem o interesse da imensa maioria das privadas, que preferem se concentrar apenas no
ensino, atividade mais viável econômica e comercialmente. Convenientemente, o discurso
do governo não aponta este e nem muitos outros fatores, que não estariam incluídos em um
raciocínio puramente economicista influenciado pela perspectiva neoliberal de contenção
de gastos sociais. Tal raciocínio parece inspirar a idéia da renúncia fiscal em troca de vagas
para grupos “socialmente desfavorecidos” em instituições privadas, supostamente mais
baratas de que as públicas. Desse modo, pode-se inferir que é vazio e demagógico o slogan
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“Universidade para Todos”, pois, além de reduzir a educação superior apenas ao seu
aspecto econômico, o programa não se destina a todos, sendo apenas uma típica medida
neoliberal de focalização dos gastos públicos em grupos supostamente mais carentes, e não
de sua universalização. O ProUni , nesse sentido altera significativamente o sentido da
educação como direito público.
Finalmente, cabe mencionar, que como uma dissertação de mestrado, o tempo e o
escopo do projeto não permitiram ir além de compreender e dissertar sobre o tema
escolhido. Contudo, o ProUni, bem como a Lei de Inovação Tecnológica, propostas ainda
recentes, merecem um acompanhamento mais aprofundado, podendo tornarem-se uma
pesquisa em nível de doutorado.
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documentos\atualizações 2006\Trabalho e Educação\Dissertações Modelo: C:\Documents and Settings\Universidade\Dados de
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