Novo modelo proposto Ed. 50

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ANO XIII • Nº 50 • outubro de 2012 / março de 2013 Revista de Conjuntura Publicação do Conselho Regional de Economia do Distrito Federal Alexandre Schwartsman, economista e ex-diretor do Banco Central, fala sobre a “matriz” econômica do juro baixo e câmbio alto, entre outras questões da economia brasileira ARTIGOS O IDH mede mesmo o Desenvolvimento Humano? Paulo de Martino Jannuzzi e Luiz Cláudio Costa A marcação a mercado em fundos de pensão Luciano Fazio O protecionismo que sufocou a indústria nacional encontra agora outra vítima: o setor de serviços Marília D’Orazio de Matos Câmbio, juros e inflação: reflexões sobre o ajuste fino nas políticas econômicas para o desenvolvimento Elder Linton Alves de Araujo A macroeconomia da estagnação com pleno emprego no Brasil José Luis Oreiro Brasil Negativado: empresas e famílias Reinaldo Gonçalves Estagflação e as perspectivas para 2013 José Luiz Pagnussat É viável a implantação do orçamento impositivo no Brasil? José Matias Pereira ENTREVISTA ISSN 1677-0668 O economista Hélio Socolik comentou questões de concursos da ANTAQ, Banco Central e Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental NOTAS, RESENHAS E INFORMES

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Novo modelo proposto Ed. 50

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ANO XIII • Nº 50 • outubro de 2012 / março de 2013

Revista deConjunturaPublicação do Conselho Regional de Economia do Distrito Federal

Alexandre Schwartsman, economista e ex-diretor do Banco Central, fala sobre a “matriz” econômica do juro baixo e câmbio alto, entre outras questões

da economia brasileira

artigosO IDH mede mesmo o Desenvolvimento Humano?

Paulo de Martino Jannuzzi e Luiz Cláudio Costa

a marcação a mercado em fundos de pensãoLuciano Fazio

O protecionismo que sufocou a indústria nacional encontra agora outra vítima: o setor de serviços

Marília D’Orazio de Matos

Câmbio, juros e inflação: reflexões sobre o ajuste fino nas políticas econômicas para o desenvolvimento

Elder Linton Alves de Araujo

A macroeconomia da estagnação com pleno emprego no Brasil José Luis Oreiro

Brasil Negativado: empresas e famílias Reinaldo Gonçalves

Estagflação e as perspectivas para 2013 José Luiz Pagnussat

É viável a implantação do orçamento impositivo no Brasil? José Matias Pereira

ENtrEVista

ISSN 1677-0668

O economista Hélio Socolik comentou questões de concursos da ANTAQ, Banco Central e

Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental

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Aluno e aluna de

de qualquer período ou sérieCiências Econômicas

As opiniões expressas nos artigos e entrevistas são de responsabilidade exclusiva de seus autores e entrevistados e não refletem necessariamente

a do Corecon-DF.

11 O IDH mede mesmo o

Desenvolvimento Humano?Paulo de Martino Jannuzzi e

Luiz Cláudio Costa

14A marcação a mercado em

fundos de pensão Luciano Fazio

30O protecionismo que sufocou a

indústria nacional encontra agora outra vitima: o setor de serviços

Marília D’Orazio de Matos

34Câmbio, juros e inflação: reflexões

sobre o ajuste fino nas políticas econômicas para o desenvolvimento

Elder Linton Alves de Araujo

46A macroeconomia da estagnação

com pleno emprego no Brasil José Luis Oreiro

53Brasil Negativado: empresas e famílias

Reinaldo Gonçalves

61Estagflação e as perspectivas para 2013

José Luiz Pagnussat

70É viável a implantação do orçamento

impositivo no Brasil? José Matias Pereira

3Editorial

4 Entrevista

Alexandre Schwartsman

73 Questões de concursos de

economiaHélio Socolik

ÍndicePublicação do Conselho Regional de

Economia do Distrito Federal

ANO XIII • Nº 50 • outubro de 2012 / março de 2013

ConjunturaRevista de

Nesta edição

Artigos

Editor responsávelJosé Luiz Pagnussat

Conselho editorial

Carlos Eduardo de Freitas, Elder Linton Alves de Ataújo, José Fernando Cosentino Tavares, José Roberto Novaes de Almeida, Humberto Vendelino Richter, Maurício Barata de Paula Pinto, Newton

Ferreira da Silva Marques, Mario Sergio Frenandez Sallorenzo, Jusçanio Umbelino de Souza, Cartlito Roberto Zanetti, Júlio Miragaya

Jornalista responsável/ Redação e editoração eletrônica: Camila Fiorese (Reg. DRT/DF: 7851)

Revisão: Letícia Sallorenzo

Tiragem: 4.000

Periodicidade: trimestral

As matérias assinadas por colaboradores não refletem, necessariamente, a posição da entidade. É permitida a reprodução total ou parcial dos artigos desta edição, desde que citada a fonte.

CONSELHO REGIONAL DE ECONOMIA DA 11ª REGIÃO - DF

Presidente: Carlos Eduardo de Freitas Vice-presidente: Carlito Roberto Zanetti

Conselheiros efetivos

Gilson Duarte Ferreira dos Santos, Carlito Roberto Zanetti, Paulo Roberto Amorim Loureriro, Jusçanio Umbelino de Souza, Maria Cristina de Araújo , Evilasio da Silva Salvador , Carlos Eduardo

de Freitas, José Luiz Pagnussat, Maurício Barata de Paula Pinto

Conselheiros suplentes

Bento de Matos Félix, Jucemar José Imperatori, César Augusto Moreira Bergo, Roberto Bocaccio Piscitelli, Mônica Beraldo Fabrício da Silva, Humberto Vendelino Richter, Newton Ferreira sa Silva

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Delegado eleitor efetivo: Jusçanio Umbelino de Souza

Delegado eleitor suplente: Mario Sergio Fernandez Sallorenzo

Conselheiros federais efetivos pelo DF: Roberto Bocaccio Piscitelli

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Publicação do Conselho Regional de Economia do Distrito Federal Conjuntura

Revista de

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outubro de 2012 / março de 2013

A economia brasileira se encontra numa situação típica de estagflação, com baixo crescimento do Produto

Interno Bruto (PIB), nos últimos seis trimestres, além de inflação resistente e em ascensão no acumulado de

12 meses. O PIB fechou o ano de 2012 com crescimento de apenas 0,9%, colocando o Brasil entre os países

de menor crescimento da América Latina. A inflação fechou o ano de 2012 em 5,84% e em março de 2013

superou o limite da meta no acumulado de 12 meses, com o IPCA alcançando 6,59%.

O desempenho da economia em 2012 contrariou todas as expectativas de um ano

atrás. As projeções para o crescimento do PIB eram de 3,5% (relatório Focus) a 4,5%

(Governo); e as projeções para a inflação se situavam em torno do centro da meta (4,5%).

As contradições da economia brasileira revelam ainda que o baixo crescimento do PIB não afetou a expan-

são do emprego, com o Brasil fechando 2012 com um dos menores índices de desemprego de sua história

(5,5%); as vendas no comércio varejista - restritas cresceram 8,4%; crescimento da renda das classes média e

baixa; e redução da pobreza e da desigualdade social.

O cenário atual é de inflação com relativa estabilidade no topo da meta e a

produção não apresenta sinais consistentes de retomada do crescimento. A economia

vem alternando meses de reação e de queda, como ilustra o Índice de Atividade

Econômica do Banco Central (IBC-Br), que indicou crescimento de 1,29% em janeiro e queda de 0,59% em

fevereiro deste ano.

O debate sobre as possíveis explicações para a estagflação e as contradições da

economia brasileira tem sido criativo, tanto pelas autoridades governamentais como por articulistas e ana-

listas de mercado. Um primeiro grupo de analistas, que se alinha com o governo, explica o baixo crescimento

do PIB pelos choques adversos e arrola uma lista de fatores: a crise econômica mundial; a quebra da safra de

2012, em função da seca; os estoques elevados na indústria, carregados de 2011; entre outros fatores. Nessa

análise a inflação se manteve alta em 2012 por conta do choque de preços agrícolas, dada a quebra da safra de

grãos brasileira e americana; e do impacto da forte alta do salário mínimo e da desvalorização do real. Segun-

do esse diagnóstico a inflação recuará naturalmente com a normalização da oferta agrícola, a estabilização do

câmbio e o aumento menor do salário mínimo.

Outro grupo de analistas explica a estagflação pelas incertezas provocadas com

as crescentes intervenções do governo: com mudanças regulatórias, intervenções no

câmbio, as manipulações dos resultados fiscais, a maior tolerância com a inflação.

E, há ainda analistas que destacam os problemas metodológicos no cálculo do PIB, que estariam subestimando

o desempenho da economia; o esgotamento dos fatores de produção, com o pleno emprego da mão-de-obra e a

insuficiência de infraestrutura e de energia; e que o Brasil estaria sofrendo o problema da “doença holandesa”, com a

sobrevalorização do câmbio.

Os artigos desta edição da Revista de Conjuntura incluem também outras

análises do problema de estagnação com pleno emprego, com destaque para o artigo do professor José Luis

Oreiro “A macroeconomia da estagnação com pleno emprego no Brasil”; do professor Elder Linton Alves

de Araujo “Câmbio, juros e inflação: reflexões sobre o ajuste fino nas políticas econômicas para o desenvol-

vimento”; do professor Reinaldo Gonçalves “Brasil Negativado: empresas e famílias”; e a entrevista com o

ex-diretor do Banco Central, Alexandre Schwartsman, entre outros destaques. Fica o convite para a leitura e a

participação no debate.

EditorialPublicação do Conselho Regional de Economia do Distrito Federal

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aENTREVISTA

Alexandre Schwartsman

Carlos Eduardo de Freitas - O governo tem alardeado as vantagens da sua nova “matriz” econômica do juro baixo e câmbio alto. O que acha dessa nova “matriz” e de suas consequências?

Alexandre Schwartsman: Havia uma crença de que o problema de crescimento do

Brasil era justamente a ausência de duas coisas. A partir do momento em que tivesse

o câmbio alto e o juro baixo, a economia iria crescer de uma forma muito mais vigoro-

sa, e aí está ficando claro que não era esse o problema. A forma como eu vejo é que a

desaceleração do crescimento do Brasil, o fracasso dessa nova matriz econômica, está

relacionada a outra ordem de dificuldades que só ficou mais clara para mim recente-

mente. O Brasil enfrenta limites muito estreitos à sua capacidade de crescimento. Li-

mites que de alguma forma nós deixamos de perceber no período mais recente

(2004 -2011), em que a economia vinha numa trajetória de crescimento razoavel-

mente sólida, com velocidade de cruzeiro na ordem de 4% ou 4,5%. Enfim, minha

percepção era de que a capacidade de crescimento do PIB potencial brasileiro

seria alguma coisa da ordem de 4% ou 4,5% a.a.

Em retrospecto, era uma visão excessivamente otimista, porque deixou de

considerar alguns fenômenos importantes que ocorreram no período. O funda-

mental e principal deles é que esse crescimento da ordem de 4,5% veio acompa-

nhado de uma redução muito expressiva da taxa de desemprego. Nós tínhamos

uma taxa de desemprego em 2003/2004 em torno de 12% da força de trabalho,

que veio se reduzindo de forma ininterrupta ao longo do tempo, e no ano passa-

O presidente do Corecon-DF, economista Carlos Eduardo de Freitas, entrevistou o economista Alexandre Schwartsman. Esteve

também presente à entrevista o conselheiro do Corecon-DF, economista e professor José Luiz Pagnussat. A infra-estrutura de áudio e a editoração ficaram a cargo da assessora de imprensa,

jornalista Camila Fiorese.

Alexandre Schwartsman é formado em economia pela Universidade de São Paulo

(USP). É doutor em economia pela Universidade da Califórnia, Berkeley, e ex-diretor

de Assuntos Internacionais do Banco Central (2003-2006). Foi economista-chefe

para a América Latina do ABN Amro Real (2006-2008), do Grupo Santander Brasil

(2008-2011), da BBA Corretora (2001-2002) e do Indosuez (1999-2001). Schwartsman

trabalhou ainda como analista do Unibanco e do Grupo Pão de Açúcar.

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do chegou, na média do ano, em 5,5%. Então, quase que por definição, essa taxa

de crescimento não pode ser potencial, porque a taxa de crescimento potencial

é aquela que mantém a taxa de crescimento constante, e o desemprego vinha

caindo ao longo desse período.

Na verdade, nós vínhamos crescendo mais rápido porque estavávamos apro-

veitando o fato de que havia mão-de-obra desempregada abundante no país, e

basicamente nós crescemos pela incorporação de trabalhadores desemprega-

dos, e só secundariamente, em função do crescimento da produtividade. Esse é

o fato principal do crescimento brasileiro. A grande maioria dos trabalhos que

eu tenho visto e também as minhas contas sugerem que alguma coisa entre 2/3

e 3/4 do crescimento do PIB brasileiro dos últimos anos se deu pela incorpora-

ção de mão-de-obra previamente desempregada, o restante 1/3 ou 1/4 vindo do

crescimento da produtividade.

Crescimento da produtividade aí não é só do trabalho, é a produtividade total dos fa-

tores, que traz embutidos investimento, a melhora de qualidade de mão-de-obra, enfim

todas as variáveis que nós não conseguimos medir tão precisamente com essa conta

simples. Isso sugere o seguinte, a partir do momento em que se chega numa situação

próxima ao pleno emprego, como estamos vivendo hoje, a capacidade de crescimento

da economia se reduz, ou seja, a oferta acaba sendo fator limitante do crescimento. Não é

um consumo insuficiente, não é um câmbio baixo e juro alto, mas reflete em alguma me-

dida de disponibilidade de mão-de-obra para poder crescer de acordo coma expansão

populacional ou transição demográfica etc. Nenhum dos dois é particularmente sólido.

Essa percepção não está presente no diagnóstico do governo sobre a desaceleração

do crescimento, o que ajuda explicar a migração do antigo regime de política econômica

para o regime atual. A economia começa a enfrentar as dificuldades para crescer, e de

acordo com o diagnóstico do governo, isso é um problema de demanda, de juro alto,

de câmbio baixo e de consumo insuficiente. Então o que nós temos que fazer são medi-

das para reativar o lado da demanda. Obviamente o tripé em política econômica impõe

restrições a isso. Se o câmbio flutua, ele deveria estar reagindo a coisas como preços de

commodities etc. Eventualmente ele poderia apreciar, o governo perceberia isso como

uma restrição à sua vontade de depreciar o câmbio. Ele quer incentivar o consumo, então

ele percebe a taxa de juros como uma restrição; agora a taxa de juros deixa de ser usada

para controlar a inflação, ela tem que ser usada para estimular o consumo, e a política

fiscal também tem que ser usada para estimular o crescimento, não mais para servir de

suporte para a política monetária, no sentido de ajudar manter a inflação na meta.

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Então eu vejo essa transição de política econômica como uma reação a um diagnós-

tico equivocado a respeito da desaceleração do crescimento. Quer dizer, o problema de

oferta é percebido erroneamente como o problema de demanda, e aí o governo usa o

arsenal para reativar a demanda e tem que abandonar a matriz macroeconômica que

prevalecia antes. Moral da história, ele não consegue crescimento porque não mira na

variável correta e começa a ameaçar a estabilidade, particularmente no que diz respeito

à questão inflacionária, expressa numa inflação que não converge para a meta, mesmo

com a mudança do IPCA no ano passado, que deu de presente para o governo alguma

coisa entre 0,6% e 0,7% a menos de inflação.

Com isso, são gerados outros agravantes, porque o governo se sente limitado para

usar o arsenal tradicional. A política monetária, política fiscal, ou mesmo a taxa de câmbio

para conter o processo inflacionário... o governo tem que recorrer a outro tipo de política.

Então recorre às desonerações tributárias, ao controle de preços de combustíveis, como

forma de fazer intervenções pontuais em alguns preços importantes e evitar que a taxa

de inflação alcance o teto do intervalo de tolerância da meta. Em consequência, gera ou-

tro tipo de distorção microeconômica que começa a aparecer. O cerne dessa mudança de

política econômica está exatamente nesse processo. Enquanto não for reconhecido que

as limitações de crescimento estão do lado da oferta, a tendência é exacerbar o desvio

da matriz econômica anterior e com agravantes, com problemas na seara microeconô-

mica na medida em que o governo, para lidar com aquestão inflacionária, ou mesmo

para tentar acelerar o crescimento,começa usar de uma mão mais pesada em termos de

intervenção direta.

Carlos Eduardo de Freitas: A sua análise é bastante completa. Concordo com você, há

um problema de oferta, as medidas deveriam ser de estímulo ao investimento, à pou-

pança e à inovação.

Enquanto não for reconhecido que as limitações de crescimento estão do lado da oferta, a tendência é exacerbar o desvio da matriz

econômica anterior e com agravantes, com problemas na seara microeconômica na medida em que o governo, para lidar com a

questão inflacionária, ou mesmo para tentar acelerar o crescimento, começa usar de uma mão mais pesada

em termos de intervenção direta .

Alexandre Schwartsman ‘‘

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Carlos Eduardo de Freitas - O governo parece considerar “tecnicamente correta” a taxa de câmbio de R$ 2,00, conforme você mesmo aponta  em seu artigo de 20 de fevereiro na Folha de São Paulo. Mas a inflação está girando em torno de 6% a.a., apreciando a taxa de câmbio real. Afinal, em sua opinião, o regime é de taxa nomi-nal fixa ou de taxa real fixa?

Alexandre Schwartsman: Eu acho que é um regime que estava se encaminhando para

um regime de bandas nominais, falavam de R$ 2 a R$ 2,10/US$, agora a banda está es-

treitando bastante. É um problema de cobertor curto, que se origina de uma percepção

de uma taxa de câmbio fora de lugar.

Da forma como entendo, para definir a taxa de câmbio de equilíbrio temos que pensar

em equilíbrio interno e externo. O equilíbrio externo é um pouco mais difícil de definir, e

que reflete de alguma forma em um déficit de conta corrente que seja percebido como

sustentável. Se pensarmos no que aconteceu nos últimos anos no Brasil, onde houve um

déficit externo na casa de 2% a 2,5% do PIB, o passivo externo do país veio numa trajetó-

ria de redução forte, se estabilizou a níveis baixos, ou seja, não tem nenhuma indicação

que aquela taxa de câmbio que se observava lá atrás, até 2011, e o governo começar essa

mudança mais radical de regime cambial, era uma taxa que do ponto de vista do equilí-

brio externo estava razoavelmente ok.

Do ponto de vista do equilíbrio doméstico, temos que observar o que está aconte-

cendo com a inflação. O equilíbrio doméstico vai ser definido como o hiato que está em

torno de zero, ou a inflação próxima à meta.

A taxa de câmbio de equilíbrio é a consistente com equilíbrio externo, como definido

acima (não necessariamente no sentido de ter uma conta corrente zerada), assim como

equilíbrio interno, isto é, inflação ao redor da meta. Se a taxa de câmbio é congruente

com estas duas condições, deve ser a taxa de câmbio de equilíbrio.

Como são percebidos os desvios disso? Se não há um desequilíbrio externo, mas uma

taxa da inflação que desvia persistentemente pra abaixo do desejável, trata-se de uma

indicação forte de que a taxa de câmbio estaria sobrevalorizada.

Uma taxa de câmbio muito apreciada requer um hiato de produto elevado para as

contas externas, mas que, ao mesmo tempo, está derrubando a inflação. Enfim, um caso

nítido de câmbio sobrevalorizado. Caso a taxa de câmbio gerasse certo equilíbrio exter-

no, mas ao mesmo tempo uma aceleração da inflação, aí teríamos uma taxa de câmbio

subvalorizada.

O histórico do Brasil, se pensarmos do ponto de vista das definições de uma taxa de

câmbio que seja consistente com o equilíbrio externo e interno, não sugeriria, pelo me-

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nos até 2010 e começo de 2011, que tivéssemos uma taxa de câmbio excessivamente

apreciada. Se ela estivesse excessivamente valorizada, nós estaríamos vendo a inflação

cair de uma forma muito rápida, o que não foi o caso, ou então déficits externos crescen-

tes, e não era o que estava acontecendo, pelo menos até recentemente. Com base nisto,

creio não haver indicação de que houvesse uma taxa de câmbio fundamentalmente de-

sequilibrada lá atrás.

O que ocorreu, na prática, foi uma medida de proteção ao setor industrial. A alteração

no regime cambial não resultou de evidências fortes de que a taxa de câmbio estivesse

excessivamente apreciada do ponto de vista do equilíbrio externo e interno, mas para

proteger o setor industrial.

A percepção dentro do governo é que este seria supostamente o setor mais dinâmico

da economia e que valeria a pena protegê-lo para obter um crescimento mais rápido,

mas isso não foi o que aconteceu. Eu acho que o diagnóstico está claramente equivoca-

do a esse respeito, mas o fato é que nós migramos para um regime diferente de câmbio

sem muita base.

Carlos Eduardo de Freitas - Também vem sendo anunciada a queda da relação Dívida Pública/PIB para cerca de 35% do PIB. Só que os investimentos não reagem, e aparen-temente continuam a diminuir. Não é um paradoxo que com melhora tão importante da relação “Dívida/PIB” os investimentos não tenham crescido?

Alexandre Schwartsman: A dívida líquida deixou de ser um guia confiável de política

fiscal. Acho que, quando foi criado o conceito lá atrás, havia bons motivos para se

considerar a dívida líquida ao invés da bruta, isto é, tomamos o endividamento total do

governo e abatemos alguns ativos do Tesouro ou do Banco Central. O principal dentre

esses ativos eram as reservas internacionais, de fato um ativo valioso.

As reservas servem como um seguro no mercado internacional e também permitiram

uma mudança positiva no perfil do endividamento do governo. Hoje, quando o câmbio

desvaloriza, o governo ganha mais nas reservas do que ele perde em outras contas. Então

isso elimina aquele problema de medo de flutuação, ao contrário do que ocorria até 2006,

quando desvalorização da moeda elevava a dívida em reais e afetava as contas fiscais.

A questão é que as regras de política fiscal no Brasil foram definidas em termos de

dívida líquida por um lado e superávit primário por outro, o que abriu uma possibilidade

extraordinária de arbitragem regulatória.

Concretamente, o governo pode hoje tomar recursos no mercado e emprestar

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para o BNDES porque isso não sensibiliza a dívida líquida, ou seja, ele pode aumentar

indefinidamente a dívida bruta, porque uma contrapartida a um endividamento que é

feito por esse lado, é o empréstimo que é feito para o BNDES do outro, aí não aparece na

dívida líquida.

Adicionalmente há um subsídio nessa operação, que é a diferença do juro do mercado

para o juro a que estes recursos são repassados para o BNDES, tipicamente TJLP. Ocorre

que esse subsídio não aparece nas contas primárias, só na conta de juros. Como o BNDES

empresta esses recursos com spread sobre a TJLP, obtém lucro e distribui dividendos. Na

verdade, essa operação, paradoxalmente, melhora o primário sem afetar a dívida líquida,

mesmo piorando o déficit total e elevando a dívida bruta. É a pedra filosofal.

O governo pode se endividar indefinidamente, tem um resultado fiscal que, no frigir

dos ovos, é pior, porque o que ele paga de juros não compensa o que ele ganha de

dividendos no BNDES, mas como os critérios são o superávit primário e a dívida líquida,

temos a impressão que estamos no melhor dos mundos.

Então, a partir de um olhar mais crítico, percebemos que esses conceitos não estão

refletindo de fato o que está acontecendo do ponto de vista de política fiscal. Nós

temos que olhar a dívida bruta. Nesse caso, o progresso é bem menos impressionante.

A dívida caiu basicamente até 2010, depois ela passou a crescer e está em torno de 60%,

voltou para os níveis que esteve em 2006/2007. Quando nós analisamos estes números,

notamos uma deterioração importante nas contas públicas. Então, não chega a ser

paradoxal que o investimento caia, pelo contrário. Se observarmos pela ótica correta do

que está acontecendo na política fiscal, era exatamente isso que deveria acontecer com

o investimento.

Carlos Eduardo de Freitas - A resistência do nível de emprego se deve a que fatores,

considerando a mediocridade do crescimento econômico registrado?

Alexandre Schwartsman: Isso é um quebra-cabeça, não vou dizer que eu tenho uma

resposta para isso, mas a resposta literal para essa história é uma indicação de que haveria

um crescimento negativo de produtividade. Concretamente, o emprego no ano passado

cresceu um pouco mais de 2% e o PIB deve ter crescido um pouco menos do que 1%. Se

formos então tomar os números ao pé da letra, a produtividade do trabalho caiu, mas

prefiro não tomar os números a valor de face neste caso.

Eu tenho certa dificuldade de acreditar que a produtividade tenha tido uma queda

dessa magnitude, mesmo considerando que atualmente nós estejamos raspando o tacho

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do ponto de vista do emprego, ou seja, já estamos no ponto de se contratarem os traba-

lhadores menos qualificados.

Sinceramente, eu não tenho uma resposta muito clara sobre isso. Creio que existe um

tanto de entesouramento de trabalhadores, isto é, empresas têm a percepção de que

se passa por uma desaceleração temporária e, como há escassez de gente qualificada,

se ela mandar embora seus trabalhadores, terá dificuldades de recontratá-los à frente e,

portanto, os segura. Não sei, porém, se isso explica tudo. Talvez haja outros fatores, como

a própria dificuldade de se medir o setor de serviços.

Temos uma economia na qual o setor de serviços tende a ter um desempenho supe-

rior ao setor industrial. Face a uma expansão de demanda, não há alternativa no setor de

serviços que não seja a produção. Não há como importar a grande maioria de serviços.

Enquanto havia mão-de-obra disponível, era possível fazer as duas coisas, podia-se

aumentar a produção de serviços e a produção industrial simultaneamente. Quando o

mercado de trabalho apertou, a prioridade acabou sendo o setor de serviços, e obviamen-

te o preço do setor de serviços tem que subir, e se vê a inflação de serviços crescendo à

frente da inflação de bens, principalmente duráveis e semiduráveis. De qualquer forma, a

tendência é que o setor de serviços cresça à frente do setor de bens.

Por outro lado, é mais difícil de medir o setor de serviços, nós sabemos das dificuldades

em qualquer lugar do mundo, e no Brasil não é diferente, é mais difícil medir mesmo, e às

vezes nós não estamos medindo 100% do que está acontecendo no setor de serviços. Por

enquanto é só uma especulação, ainda não tenho nada de muito concreto para apoiar

essa minha tese.

Carlos Eduardo de Freitas: Você está dizendo que o setor de serviços pode estar se ex-

pandindo numa razão mais robusta do que nós realmente estamos medindo. Também

tem um pouco de demografia, a taxa de crescimento da população vem caindo e em

algum momento deve bater na população em idade ativa, não é?

Alexandre Schwartsman: Então está sim por trás, volta para aquele tema da ca-

pacidade de crescimento. De uma forma grosseira, o produto cresce ou porque

você põe mais gente para trabalhar ou porque se aumenta o produto por unidade

de pessoa empregada, então a expansão vai depender do crescimento da popula-

ção em idade ativa e do crescimento da produtividade. A questão demográfica afe-

ta o primeiro fator e a desaceleração do crescimento da PIA reflete precisamente isto.

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A recente divulgação do 23º Relatório de Desenvolvimento Humano pelo

Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) abre uma boa

oportunidade para discussão sobre os avanços obtidos e dos desafios a enfrentar

em relação à agenda das Políticas Públicas do Brasil e de outros países. Neste ano,

a divulgação do relatório ganhou mais repercussão no Brasil, dentre outras razões

pelos apontamentos técnicos apresentados pela Ministra do Desenvolvimento Social

e Combate à Fome, Tereza Campello, e do Ministro da Educação, Aloízio Mercadante.

Contudo, boa parte dos pesquisadores e jornalistas que têm discutido os

resultados apresentados no Relatório sobre o Índice de Desenvolvimento Humano

(IDH) alcançado pelo Brasil, não trata adequadamente a argumentação apresentada

pelos ministros nem as conhecidas limitações e incorreções da medida empregada

pelo PNUD para avaliar o bem estar social do Brasil ou de qualquer outro país.

Há pelo menos dez anos, as limitações conceituais e fragilidades metodológicas

do indicador são discutidas no meio acadêmico brasileiro e internacional. E desde

2010 esse debate vem sendo realizado de forma sistemática por equipes técnicas de

vários ministérios, inclusive com a participação do escritório do PNUD no Brasil.

O uso de dados defasados no cômputo do IDH brasileiro é um fato. Ao se pesquisar

o anexo estatístico do Relatório pode-se verificar que diversos países (como Canadá

e Nova Zelândia) têm seus dados referenciados para os anos mais recentes, de 2010

para cá. No caso do Brasil, o indicador “anos esperados de escolaridade” refere-se ao

ano de 2005. Outros indicadores apresentados no Relatório estão com defasagem

semelhante ou pior. É o caso das taxas de frequência escolar nos três níveis de ensino,

bem como das taxas de pobreza e de extrema pobreza, do índice de Gini e do gasto

público em políticas sociais.

A não atualização dos dados brasileiros não se justifica, principalmente se

considerarmos que a própria Divisão de Estatísticas Oficiais das Nações Unidas

considera o Sistema Estatístico Brasileiro como referência internacional em termos

de qualidade, amplitude e atualidade das informações produzidas.

ArtigoO IDH mede mesmo o Desenvolvimento Humano?

Luiz Cláudio Costa e Paulo de Martino Jannuzzi

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Outro fato que merece atenção no tratamento dos indicadores educacionais

brasileiros é a não consideração das mudanças na legislação brasileira ao longo

dos últimos dez anos quanto à formação escolar, como a ampliação do ciclo escolar

básico de oito para nove anos e a determinação de que crianças com cinco anos

devam estar na pré-escola (e não no ensino fundamental). Da mesma forma, não se

considera as crianças da antiga Classe de Alfabetização (CA), que com a mudança

de legislação, são crianças do primeiro ano do ensino fundamental. Eisso equivale

a 4,6 milhões de crianças brasileiras que estão efetivamente na escola e não foram

consideradas. Assim, ao contrário do que se faz para outros países como Argentina,

Nova Zelândia, Estados Unidos, deixa-se de computar no IDH brasileiro as crianças

que já estão na escola desde os cinco anos. A defasagem temporal e tais equívocos

metodológicos no cálculo dos indicadores “escolaridade média” e o já citado “anos

esperados de escolaridade” acabam levando à subestimativa do IDH atual e da

avaliação do progresso do Desenvolvimento Humano do Brasil nos últimos dez anos,

já que o esforço dos países nas políticas educacionais foi o principal fator a explicar a

evolução do IDH em âmbito internacional entre 2001 e 2011.

Limitação conceitual do que se entende por Desenvolvimento Humano é talvez

o mais grave problema do IDH. Na proposta do PNUD, parte-se do pressuposto

de que é possível avaliar conceitos complexos e multifacetados como o Bem-

Estar Social, as Condições de Vida ou o Desenvolvimento Humano assim como se

mensura a produção econômica: por meio de um indicador-resumo como o Produto

Interno Bruto, resultado da soma de bens e serviços medidos em uma mesma

métrica. Em detrimento da transparência metodológica e inteligibilidade pública,

Desenvolvimento Humano é mensurado pela combinação de quatro indicadores,

reduzidos a um índice com variação entre 0 e 1, por meio de procedimentos

metodológicos questionáveis e arbitrários. Pretende-se que a medida sirva como

instrumento de avaliação de Políticas Sociais quando abarca em seu cômputo uma

medida de produção econômica (a renda nacional bruta) e apenas três indicadores

sociais � esperança de vida, escolaridade média e anos esperados de escolaridade –

medidas pouco ou nada sensíveis às principais ações, programas e iniciativas em curso

pelo mundo afora, que visam à superação da fome e da pobreza, à ampliação de vagas

em creches e do acesso à escola, à melhoria da qualidade dos serviços de educação

e saúde, à expansão da infraestrutura urbana, ao combate à violência e mortalidade

juvenil, à inclusão produtiva de segmentos populacionais mais vulneráveis ou, de

modo geral, à promoção mais equânime da renda e do acesso a serviços públicos. No

curto prazo, ao contrário do que imaginavam seus propositores, o IDH acaba sendo

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outubro de 2012 / março de 2013

Luiz Cláudio Costa Presidente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira. Professor do da Universidade Federal de Viçosa.

Paulo de Martino Jannuzzi [email protected]

Secretário de Avaliação e Gestão da Informação do

Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à

Fome (MDS). É graduado em Matemática, mestre em

Administração Pública e doutor em Demografia. É

Professor da Escola Nacional de Ciências Estatísticas do

Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e tam-

bém da Escola Nacional de Administração Pública (ENAP).

mais sensível às variações do Produto Interno Bruto que propriamente a qualquer

inovação mais significativa em Políticas Sociais.

Com tantos equívocos factuais, imprecisões metodológicas e limitações

conceituais, o IDH contribui pouco para a necessária e legítima discussão sobre a

efetividade das Políticas Públicas no Brasil. A medida traz mais confusão e sombra

do que esclarecimento e luz para essa questão. O Brasil dispõe de um conjunto

amplo de indicadores sociais, pesquisas e estudos avaliativos, produzidos pelo IBGE,

IPEA, universidades e Ministérios, que podem contribuir de forma muito mais rica

e produtiva para a avaliação do esforço governamental, dos avanços, retrocessos e

iniquidades persistentes da realidade social brasileira.

O próprio Relatório do PNUD traz em toda edição anual análises comparativas

internacionais de temáticas relacionadas ao Desenvolvimento Humano, como os

desafios da �Equidade Social e Desenvolvimento Sustentável� em 2011 e o �Progresso

Humano nos países do Sul� nesse ano. Precisamos valorizar no debate público essa

parte do Relatório.

O volume de recursos, amplitude e cobertura de nossas políticas sociais requerem

debates mais qualificados, densos e consistentes que as repetidas, simplórias e, às

vezes, mirabolantes análises de rankings pautadas exclusivamente por esse IDH

calculado de forma imprecisa e incorreta.

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ArtigoA marcação a mercado em fundos de pensão

Luciano Fazio

1. Introdução

Em 2002, norma da autoridade monetária alterou os critérios de registro e avaliação

de títulos, valores mobiliários1 e de instrumentos financeiros derivativos, exigindo a

sua contabilização pelo valor de mercado do dia, a chamada Marcação a Mercado

(MaM). Anteriormente, era admitida a precificação desses ativos financeiros pela curva

do papel2.

A mudança das regras em um cenário de elevação das taxas de juros provocou

expressiva depreciação de alguns títulos e cotas de fundos de investimentos (FI). Em

junho de 2002, houve um movimento atípico de saques. Os FI registraram diminuição

de R$ 21,6 bilhões (6,38% de seu patrimônio). Ao mesmo tempo, houve aumento

incomum de novas aplicações em caderneta de poupança e em Certificados de

Depósitos Bancários (CDB). Um dos motivos dessa anormal troca de posições de

mercado, sem dúvida, foi a escassa compreensão da MaM por parte dos aplicadores,

especialmente os pequenos investidores, boa parte dos quais até então não tinha

sequer cogitado a possibilidade de que títulos de renda fixa poderiam sofrer perdas

de valor por motivos diferentes do risco de solvência do agente emissor do papel.

À época, a exigência da precificação pela MaM não alcançou os títulos e valores

mobiliários das Entidades Fechadas de Previdência Complementar (EFPC), conhecidas

como Fundos de Pensão, que continuaram submetidas ao disposto pelo Conselho de

Gestão da Previdência Complementar (CGPC) na Resolução CGPC nº 04, de 30.01.2002.

Essa norma, até hoje em vigor, prevê duas possibilidades de registro e precificação:

a) A Marcação a Mercado (MaM) para os títulos e valores mobiliários que a Entidade

classifica como títulos para negociação;

1 Título mobiliário é um titulo de propriedade (ação) ou de crédito (obrigação) emitido por um ente público ou privado com características e direitos padronizados.2 Hoje, só excepcionalmente os Fundos de Investimento podem classificar seus ativos na categoria de títulos a mantidos até o vencimento e precificá-los na curva do papel. Um exemplo dessa exceção é constituído pelos fundos exclusivos, aqueles com apenas um cotista.

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Artigo b) A Marcação na Curva (MnC) para os títulos e valores mobiliários classificados pelo

Fundo de Pensão na categoria de títulos mantidos até o vencimento, “para os quais

haja intenção e capacidade financeira da entidade de mantê-los em carteira até o

vencimento”.

Em 2011, a Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc)

chegou a propor que os recursos garantidores dos planos de benefícios da EFPC

aplicados em títulos e valores mobiliários fossem obrigatoriamente contabilizados

pelo método da MaM. Pela proposta, ainda não apreciada no Conselho Nacional de

Previdência Complementar (CNPC), órgão regulador do sistema, a Entidade não mais

teria a faculdade de classificar os títulos mobiliários como “títulos mantidos até o

vencimento” e precificá-los pela curva do papel.

O presente estudo visa analisar didaticamente as diferenças entre os métodos de

avaliação e registro dos títulos mobiliários, bem como suas justificativas, com vistas a

subsidiar a tomada de decisões dos Fundos de Pensão e a participação ao atual debate

em cada Entidade e no sistema, e se subdivide em seções:

a) A inicial que explica conceitos do mercado financeiro e da precificação de ativos;

b) A segunda que analisa a avaliação de títulos e valores mobiliários em planos de

benefícios, considerando a modelagem dos planos (benefício definido, contribuição

definida e contribuição variável);

c) A terceira onde o tema é abordado sob o enfoque da previsibilidade perseguida

pelos planos de previdência;

d) A quarta que contextualiza a marcação a mercado nos Fundos de Pensão no

atual cenário brasileiro de redução da taxa básica de juros;

e) A última seção onde a precificação dos títulos mobiliários nos Fundos de Pensão é

apresentada, para além de sua dimensão técnica, também como exigência de tomada

de decisões e definição de estratégias de gestão.

‘‘ ‘‘A mudança das regras em um cenário de elevação das taxas de juros provocou

expressiva depreciação de alguns títulos e cotas de fundos de investimentos (FI).

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2. Breves explicações gerais

O fundo de investimento (FI) constitui uma modalidade de investimento que reúne

vários aplicadores. Gerido por profissionais e aplicado em ativos de investimento

diversos, inclusive outros FI, o patrimônio do FI é dividido em cotas, adquiridas por

aplicadores, que são proprietários do fundo, proporcionalmente ao quantitativo de

cotas em seu poder.

As instituições financeiras oferecem o FI como opção de aplicação para seus

clientes. Em geral, essas instituições se limitam a administrar o fundo, e para tanto

cobram uma taxa de administração dos cotistas (aplicadores). O FI tem personalidade

jurídica própria, diferente daquela da instituição financeira que o gere. Receitas e

despesas, bem como o resultado do fundo, são rateadas entre os cotistas.

Em geral, o preço dos títulos mobiliários é definido para a data de seu vencimento,

quando o agente emissor do título pagará ao comprador o valor pactuado. Em razão

disso, é necessário definir regras de precificação do papel para datas anteriores. Es-

sas definições são fundamentais tanto para a contabilização do ativo quanto para a

administração de FIs nas quais, pela existência de diversos aplicadores, pode haver

subscrição e resgate de cotas do fundo a qualquer momento. A Marcação a Mercado

(MaM) e a Marcação na Curva (MnC) são os dois métodos básicos de precificação dos

títulos e valores mobiliários antes do vencimento:

a) Na MnC, o registro do título é realizado pelo valor da aquisição acrescido dos

rendimentos líquidos auferidos entre a aquisição e a data do cálculo. Tais rendimen-

tos são apurados com base na rentabilidade pro-rata-die equivalente à taxa de juros

que expressa o rendimento auferido entre a aquisição e o vencimento do papel. Por

exemplo, um título que renda 10% ao ano seria atualizado diariamente por 0,0378%

ao dia útil até o seu vencimento. Por esse método, também chamado de precificação

pela curva do papel, a valorização do título entre a data da compra e o vencimento é

previsível e evolui de forma uniforme (linear) com relação ao tempo.

b) Na MaM, o preço do título é dado pelo valor de sua negociação no mercado

secundário na data da avaliação. Para a hipótese de que, na referida data, não tenha

havido negociação, são definidos procedimentos de estimativa desse valor. Por esse

método, a evolução do preço título entre a aquisição e o vencimento não é totalmente

previsível, dependendo de fatores de mercado.

3 A volatilidade é uma medida de quanto um ativo financeiro (seja ele uma ação, um título ou a cota de um fundo de investi-mento) pode ter variações de valor, em intensidade e frequência. Como as variações de valor implicam possibilidade de perda, a volatilidade é um dos parâmetros mais utilizados para mensurar o risco: quanto mais volátil um ativo, tanto maior é seu risco.

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No vencimento, independentemente da precificação pelo método MaM ou MnC, o

valor do título mobiliário será o mesmo. Antes dessa data, no entanto, as duas metodo-

logias podem fornecer valores muito diferentes.

Exemplo: Supomos ter adquirido por R$ 100,00 um título de renda fixa, com prazo de dois

anos e taxa de juros nominal de 10% ao ano. Pela MnC, no final do 1º ano o valor dele será

de R$ 110,00 e no vencimento R$ 121,00 (a cada ano o rendimento é exatamente de10%).

Imaginemos, contudo, que no final do 1º ano a taxa de juros de mercado seja reduzida

para 5% ao ano. O valor presente (VP) do título negociado no mercado será dado pela fórmu-

la VP = 121/(1+0,05)=115,24, com uma valorização de 15,24% no primeiro ano. Em contra-

partida, no segundo ano a rentabilidade do título será de apenas 5%, pois no resgate o preço

pago será o valor pactuado de R$ 121,00. Nessa hipótese, no final do primeiro ano, pela MnC

haveria uma subavaliação do título em relação à realidade de mercado.

Se vice-versa, no final do 1º ano, a taxa de juros de mercado aumentar para 22% ao ano,

o título passará a ser negociado por R$ 99,18 (desvalorização de 0,82%) e pela MnC o título

seria superavaliado nessa data. Contudo, se mantido em carteira até o vencimento, ele será

resgatado por R$ 121,00 (ganho de 22% no segundo ano).

No mercado financeiro, em geral, a MnC é avaliada como inadequada em ra-

zão da possibilidade de transferências patrimoniais entre os cotistas que resga-

tam suas cotas antes do vencimento e os demais. Em um FI que adotar a MnC, se

o valor da cota pela curva for superior ao seu valor de mercado (superavaliação),

o cotista que resgatar suas cotas é beneficiado em relação ao cotista que perma-

necer no fundo. Por outro lado, se o valor da cota pela curva for inferior ao preço ne-

gociado no mercado (subavaliação), o cotista que solicitar o resgate tem prejuí-

zo e aquele que se mantiver no fundo é beneficiado. A MaM é defendida por utilizar

o valor efetivamente pago pelo mercado no dia, evitando precificações artificiais.

Diferentes métodos de avaliação e registro de títulos e valores mobiliários apre-

sentam preços diferentes, em razão da volatilidade3 do preço dos ativos financeiros.

A volatilidade do preço das ações de empresas negociadas em bolsa de valores é de

fácil compreensão, pois o valor desses ativos é definido no pregão de compra e venda,

sendo explicado pela lei da oferta e procura.

4 Por ‘benefício programado’ entende-se aquele em que a data de início é previsível, conforme as regras do regulamento do plano, a exemplo do benefício que pode ser concedido a partir da data em que o participante se aposentar por tempo de contribuição ou alcançar determinada idade. Há também o ‘benefício de risco’, que é aquele cuja data de início não é progra-mável, dependendo de evento alheio à vontade e ao controle do participante, tal como sua invalidez ou morte, entre outros.

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No caso de títulos de renda fixa, as oscilações de preço são pouco intuitivas. Ao contrá-

rio, o senso comum sugere erroneamente que o termo “renda fixa” signifique ausência de

variações e total previsibilidade de valor desses papéis, esquecendo que o valor presente

de um titulo de renda fixa depende basicamente da taxa de juros utilizada como taxa de

desconto para apurar seu valor presente, em conformidade com as regras da matemática

financeira. Ao par que a taxa de juros diminui, aumenta o valor presente do papel cujo va-

lor é contratado para o vencimento. Por outro lado, o aumento da taxa de juros provoca

redução do valor presente do referido papel.

3. A marcação a mercado e os planos de benefícios da EFPC

Em geral, para justificar a MaM em fundos de pensão, faz-se referência às semelhan-

ças entre um FI e um plano de benefícios previdenciários. Em particular, ao fato que o FI

aplica recursos de vários cotistas e o plano de benefícios administra recursos de vários

participantes.

No entanto, no plano de benefícios a finalidade da aplicação dos recursos é previden-

ciária, ou seja, voltada para o médio e longo prazo, enquanto geralmente um FI não tem

tal finalidade e seu horizonte temporal é mais limitado.

A natureza de longo prazo dos planos de benefícios das EFPC é também garantida

por meio de:

a) Restrições à retirada dos recursos das contribuições pessoais do participante, o que

acaba incentivando a permanência no plano. Em particular, o prévio fim do vínculo em-

pregatício com o patrocinador ou associativo com o instituidor para realizar o resgate e,

ainda, o próprio valor resgatável que, na maioria dos planos de benefícios, é muito infe-

rior ao montante acumulado em nome do participante até a data do resgate com vistas

à futura concessão do benefício;

b) A lei nº 11.053, de 2004, que faculta a opção pelo regime regressivo, no qual os

benefícios complementares e o resgate têm tributação exclusiva e com alíquotas decres-

centes à medida que aumenta a permanência do participante no plano de benefícios.

5 O ALM é uma ferramenta de gestão conjunta de ativos e passivos que, com base em simulações de situações futuras, subsidia a tomada de decisões relativas aos investimentos, com vistas à maximiza-ção dos rendimentos dos ativos, sem deixar de respeitar as restrições legais ou de políticas internas, inclusive aquelas relativas ao risco e à liquidez necessária para honrar os passivos. 6 Plano saldado é um plano fechado à adesão de novos participantes cujo benefício pleno progra-mado foi proporcionalizado na data-base do Saldamento, com o cancelamento das contribuições normais, sendo assegurado o direito acumulado até a data-base do Saldamento.

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Ainda, antes de propor as mesmas regras dos FI’s aos planos de benefícios das EFPC,

faz-se necessário analisar também outros elementos, entre os quais a modelagem do

plano de benefícios.

3.1 Planos de contribuição definida

É definido plano de benefícios de caráter previdenciário na modalidade de Contribui-

ção Definida, o simplesmente plano CD.

art. 3º da Resolução CGPC nº 16, de 22.11.20054:

(...) aquele cujos benefícios programados têm seu valor permanentemente ajustado

ao saldo de conta mantido em favor do participante, inclusive na fase de percepção

de benefícios, considerando o resultado líquido de sua aplicação, os valores aporta-

dos e os benefícios pagos”.

Os planos CD são os mais parecidos com os fundos de investimentos, por estarem

estruturados em contas individuais de titularidade dos participantes, cotistas dos inves-

timentos do plano de benefícios. As contribuições do participante e do patrocinador em

nome dele resultam em subscrições de novas cotas. E o valor da cota varia com base no

rendimento líquido dos investimentos do plano.

Comparativamente com outros planos dos Fundos de Pensão, o grande limite do

plano CD é de não poder garantir ao participante um benefício programado vitalício

de valor constante, o que aumenta a frequência de escolhas de utilização da poupança

previdenciária diferentes da concessão de benefício. Assim, quando o participante pre-

encher as condições de efetuar “retiradas”, o plano deve estar preparado à saída total dos

recursos (por meio de resgate, portabilidade ou utilização do saldo de conta para adqui-

rir uma renda vitalícia no mercado de seguros ou das Entidades Abertas de Previdência

Complementar) ou, ainda, à possível concessão do benefício programado de renda certa

‘‘ ‘‘Para subsidiar a decisão sobre a metodologia de precificação dos ativos

de investimentos, é fundamental considerar a natureza previdenciária

do plano de benefícios.

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(com número predeterminado de pagamentos mensais, a critério do participante). Por

isso, o Fundo de Pensão que administra o plano tem relativa dificuldade em determinar

a parcela de seu patrimônio (em particular de títulos e valores mobiliários e de cotas de

FI’s) a ser mantida até o vencimento. Isso desaconselha o administrador do plano a clas-

sificar grandes volumes dos recursos garantidores do plano CD na categoria de títulos

mantidos até o vencimento e precificá-los pela curva do papel.

Pela importância do controle da evolução do saldo de conta de plano CD, tanto na

fase de acumulação, quanto na fase de pagamento de benefícios, é fundamental que o

participante seja informado sobre os critérios efetivamente utilizados para a precificação

da cota do plano, discriminando os ativos precificados pela MaM e pela MnC.

3.2 Planos de benefício definido

O plano de benefícios na modalidade de Benefício Definido (BD), utilizando os termos

da Resolução CGPC 16/2005 acima citada, é:

“(...) aquele cujos benefícios programados têm seu valor ou nível previamente estabelecidos,

sendo o custeio determinado atuarialmente, de forma a assegurar sua concessão e manu-

tenção”

Ao contrário dos planos CD, os planos BD não se assemelham a um fundo de investi-

mento, pois:

a) O montante aportado por determinado participante (e o correspondente aporte

do patrocinador) não é creditado em uma conta de titularidade individual e não serve

de base para o cálculo do valor do benefício, constituindo tão somente a parte que lhe

cabe no custeio mutualista do plano.

b) O valor do benefício é preestabelecido em regulamento. Em geral, para garantir ao

participante aposentado rendimentos mensais de valor igual à média salarial dos últimos

36 meses de atividade laboral, somando o provento do INSS e o benefício complementar.

c) Quase sempre, o valor resgatável pelo participante (importância à qual o

participante faz jus no momento de sua desvinculação do plano de benefícios)

corresponde apenas ao total de suas contribuições pessoais atualizadas mone-

tariamente por meio da aplicação da variação de um índice de inflação. Ou seja,

também nesse caso não são utilizados os métodos da MnC ou da MaM, pois a

7 Pelo menos, essa era a perspectiva do patrocinador, antes que se tornasse comum o empregado se aposentar por tempo de contribuição e continuar no emprego. A nova situação, em geral, exige iniciativas adicionais do empregador para garantir os mesmos efeitos.

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importância resgatável não é remunerada pelo rendimento da aplicação dos re-

cursos do plano.

Em resumo, o plano BD não tem cotistas distintos, os recursos que garantem

os benefícios pertencem ao plano e a relação entre seus participantes é regida

por um pacto mutualista (constituído pelas regras regulamentares) que define

o valor das contribuições, a concessão e o valor dos benefícios, o resgate e a

portabilidade. Tal pacto admite explicitamente a possibilidade de que parte das

contribuições de determinado participante não seja destinada futuramente ao

pagamento de benefício em prol do mesmo participante. Ou seja, em plano BD,

por seu próprio desenho, pode ocorrer transferência de riqueza entre os partici-

pantes do plano.

Assim, em um plano BD, a escolha da metodologia de avaliação e registro dos

títulos e valores mobiliários não responde ao objetivo de evitar transferências

de riqueza entre participantes, mas guarda relação com a correta precificação

dos ativos que garantem o pagamento dos benefícios contratados. A escolha da

MnC ou da MaM tem impacto no resultado do plano, podendo, em alguns casos,

desdobrar em déficit ou superávit.

Geralmente, em um plano BD é razoavelmente previsível a época na qual o

participante irá requerer a concessão do benefício programado em razão dos

pré-requisitos estabelecidos em regulamento, entre os quais se destacam: a ca-

rência mínima de meses de contribuição ao plano (em sua maioria, os regula-

mentos determinam entre 60 e 120 contribuições mensais mínimas), a conces-

são da aposentadoria da Previdência Social e/ou o atingimento de determinada

idade mínima (frequentemente 55 anos de idade). Ainda, como a maioria dos

planos BD atualmente tem atingido sua maturidade, são relativamente escassos

os pedidos de resgate e portabilidade.

Em consequência desse quadro, o administrador do plano BD tem relativa

facilidade em compor uma carteira de ativos garantidores com características

muito parecidas àquelas das obrigações previdenciárias do plano em termos de

volume e liquidez. Em geral, são escolhidos títulos e valores mobiliários de dife-

rentes durações, de forma que o plano disponha de recursos líquidos justamente

8 O superávit de um plano se divide em duas parcelas: a Reserva de Contingência, até o limite de 25% das reservas matemáticas e destinada à garantia dos benefícios, e a Reserva Especial, constituída pelos volumes que excederem a Reserva de Contingência e que é destinada à revisão do plano de benefícios.

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quando tiver de honrar o pagamento de benefícios e/ou outros compromissos

previsíveis.

Com frequência, essa administração dos ativos “de olho” nos passivos do pla-

no de benefícios nas EFPC se dá por meio de instrumentos desenvolvidos para o

mercado financeiro e adaptados aos Fundos de Pensão, conhecidos como Asset-

-Liability Management (ALM)5. Sem entrar no mérito de como é realizada, a gestão

conjunta de ativos e passivos permite que boa parte dos títulos mobiliários seja

mantida até o vencimento e justifica sua marcação na curva.

No atual sistema das EFPC, os planos saldados6 são casos particulares de

planos BD, nos quais são conhecidos os valores exatos de todos os benefícios,

mesmo daqueles ainda a conceder, e as reservas de coberturas dos benefícios já

foram integralizadas. Essa situação aumenta a previsibilidade do fluxo de paga-

mento de benefícios e facilita a gestão conjunta de ativos e passivos do plano,

nos termos ilustrados. Assim, nos planos saldados é ainda mais justificável a clas-

sificação de boa parte dos títulos e valores mobiliários na categoria de “títulos

mantidos até o vencimento”.

3.3 Planos de contribuição variável

O atual sistema de previdência complementar prevê uma terceira modalida-

de de plano de benefícios, denominado de Contribuição Variável (CV). A defini-

ção de plano CV consta no art. 4º da Resolução CGPC nº 16, de 22.11.2005:

“Entende-se por plano de benefícios de caráter previdenciário na modalidade de con-

tribuição variável aquele cujos benefícios programados apresentem a conjugação das

características das modalidades de contribuição definida e benefício definido”

E permite inúmeros arranjos que mesclam características de plano BD e de

plano CD. Por consequência, as observações acima expostas para planos CD e

planos BD podem ser aplicadas parcialmente aos planos CV, em termos que po-

dem ser precisados apenas quando for especificado de qual plano CV se trata.

Atualmente, a maioria dos planos CV no sistema das EFPC adota uma mo-

delagem de contribuição definida (CD) para a fase contributiva. Ela termina na

data de concessão do benefício de prestação continuada, quando o valor inicial

9 Em plano de Contribuição Definida (CD), no qual o benefício programado é constantemente ajus-tado ao saldo de conta individual, supondo que não haja benefícios de risco desenhados em outra modalidade, o compromisso do plano para com o participante é sempre igual ao montante de recur-sos de cobertura do participante o plano é permanentemente equilibrado (resultado igual a zero).

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do benefício programado é calculado com base no saldo de conta individual

do participante, nas estimativas de sua sobrevida e do período de pagamento

da pensão complementar por morte aos eventuais dependentes, bem como na

estimativa de rendimento futuro dos investimentos do plano (taxa real de juros).

Na data da concessão do benefício de prestação continuada, a conta individual

do participante é encerrada e seu saldo é transferido para um fundo mútuo para

a garantia dos benefícios concedidos, de forma que, no tocante à fase de paga-

mento, o plano adota a modelagem de benefício definido (BD).

Para um plano CV estruturado da forma acima mencionada, valem as obser-

vações formuladas para planos CD com relação à fase contributiva. E aquelas

formuladas para os planos BD, pelo que diz respeito à fase de pagamento dos

benefícios.

4. Marcação a mercado e previsibilidade

Para subsidiar a decisão sobre a metodologia de precificação dos ativos de

investimentos, é fundamental considerar a natureza previdenciária do plano de

benefícios. Os participantes, os patrocinadores e o Fundo de Pensão querem um

instrumento que proporcione proteção e rendimentos ao participante (e sua fa-

mília) no período pós-laboral e, para isso, se dispõem a cooperar em um projeto

de longo prazo que requer planejamento por parte de cada ator envolvido. E o

planejamento é facilitado quando há previsibilidade.

Para o participante, é evidente o interesse de conseguir planejar a data

de início de recebimento do benefício complementar, bem como conhecer

com antecedência seu valor e seu custo. Nesse sentido, em termos de priori-

dades, se destacam a previsibilidade e a segurança, bem como o desejo de

minimizar a volatilidade e o risco. Em particular, a preocupação com segu-

rança, em geral, se sobrepõe àquela da maximização dos rendimentos da

poupança previdenciária. Isso fica evidente na escassa preferência por per-

fis de investimentos agressivos em Plano Gerador de Benefício Livre (PGBL) e

Vida Geradora de Benefício Livre (VGBL), produtos previdenciários individuais

ofertados por seguradoras e Entidades Abertas de Previdência Complementar.

Assim, se tivesse a oportunidade de escolher “a priori”, até o partici-

pante de plano CD, possivelmente, aceitaria “perder” algum rendimento

em razão da adoção da MnC na precificação de boa parte dos títulos e va-

lores mobiliários que compõem o portfólio de seu plano de benefícios,

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não apenas porque essa eventual “perda” seria compensada por eventu-

al “ganho” em outras situações, mas também pelo fato de que a MaM lhe

traz um aumento da volatilidade que complica seu planejamento pessoal.

De fato, em geral, o participante, inclusive o de um plano CD, prefere decidir a

data de entrada em gozo de benefício programado com base na sua própria ida-

de e no tempo de serviço. E se organiza para não depender excessivamente da

mutável conjuntura do mercado financeiro para que seu benefício programado

atinja o valor desejado (ou necessário) para que ele possa finalmente requerê-lo.

Para o patrocinador, entre as vantagens da previdência complementar, além

de conseguir contratar e reter os melhores profissionais, há também a possibi-

lidade de planejar o turn-over, considerando-se que os empregados tendem a

rescindir o vínculo de emprego tão logo preencham os pré-requisitos para a

aposentadoria da Previdência Social, quando não têm o receio de que seus ren-

dimentos na inatividade sejam insuficientes às necessidades7. Para tanto, funda-

mental é a previsão de eventos futuros: a evolução do valor da remuneração ao

longo do período laboral do participante, a data da aposentadoria e o tempo de

sobrevida do participante ao se aposentar, a composição do núcleo familiar do

participante e a rentabilidade futura dos investimentos do plano, entre outros.

Sob esse enfoque, os planos BD proporcionam mais previsibilidade a partici-

pantes e patrocinadores, em relação aos planos CD, no qual o participante assume

os riscos do plano sozinho, o que reduz drasticamente as condições de minimizá-

-los (a mitigação dos riscos se dá principalmente pela sua assunção por um amplo

grupo de pessoas e pelo patrocinador, em uma lógica mutualista). Por isso, o parti-

cipante de plano CD poderá optar por permanecer mais tempo no emprego visan-

do constituir uma poupança previdenciária maior. Com isso, a data de início de sua

aposentadoria torna-se menos previsível, ainda quwe o patrocinador desejasse

conhece-la com antecedência. Também em plano BD, o aumento da volatilidade

acarretada pela MaM não é interessante para os participantes, patrocinadores e

administradores, pois, além de trazer apreensão, pode afetar o resultado. Em caso

de déficit, haverá necessidade de contribuições adicionais, o que eleva o custo

do plano. Por outro lado, também o superávit, quando de valor expressivo, pode

ser avaliado como uma falha da administração, pois significa um superdimen-

sionamento do aporte contributivo cobrado de participantes e patrocinadores.

Em suma, o administrador do plano busca o equilíbrio, que reflete a capaci-

dade de estimar corretamente o custo do plano e de estabelecer seu adequado

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financiamento. Ainda, as oscilações no preço dos ativos de investimentos, acarre-

tadas pela MaM, em tese, tornam mais complexa a tarefa administrativa do ges-

tor, pois podem implicar em déficit ou superávit do plano e, eventualmente, na

necessidade de ajustes (equacionamento de déficit ou destinação de parte do

superávit), que talvez não existisse quando da utilização da MnC.

5. A marcação a mercado e a redução das taxas de juros

Toda e qualquer alteração metodológica de avaliação e registro de valor de

determinado ativo, por implicar alteração de preço, gera ganhadores e perdedo-

res.

Hoje, na quase totalidade dos casos, a maior parte do patrimônio do plano

de benefícios de EFPC é composta por títulos e valores mobiliários, em carteira

própria ou em fundos de investimentos, de forma que toda e qualquer alteração

da metodologia de precificação provoca impactos não desprezíveis no resultado

do plano.

Considerando-se que a maior parte desses títulos foi adquirida em épocas em

que o emissor, público ou privado, oferecia remuneração mais elevada do que a

atual, sua transferência da categoria de “títulos mantidos até o vencimento” (pre-

cificação pela MnC) para a categoria “títulos para negociação” (precificação pela

MaM) tem impacto equivalente ao cálculo do valor presente por meio de taxa de

juros menor daquela anteriormente utilizada, implicando aumento de seu valor

presente. Isso implica também aumento imediato do resultado do plano, acom-

panhado, contudo, da provável redução de resultado nos exercícios futuros, em

razão da redução dos rendimentos futuros dos ativos ora marcados a mercado,

conforme o exemplo didático apresentado na seção 2 deste texto.

Em plano CD, no qual os recursos garantidores são segregados em contas

individuais, a comentada antecipação de rendimentos futuros não implicaria

transferência de riqueza entre participantes do plano.

Em planos BD, entretanto, existe a possibilidade de que essa alteração de cri-

tério de precificação dos ativos de investimentos traga vantagens e desvanta-

gens de forma não homogênea entre os participantes. Quem ganharia e quem

perderia?

Em planos BD, há várias situações possíveis. Senão, vejamos:

Se a precificação pela MaM sanar (ou amenizar) uma situação deficitária do

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plano de benefícios, os ‘ganhadores’ serão aqueles que não terão mais o ônus de

sanar a insuficiência de ativos para a garantia dos benefícios contratados.

Se a MaM aumentar o resultado de modo que o plano de benefícios utilize

sua reserva especial8, os ganhadores serão os beneficiados pela revisão do plano

de benefícios, de acordo com as alternativas permitidas pela Resolução CGPC

nº 26, de 29.09.2008. Ou seja, ganhará quem tiver suas contribuições normais

reduzidas (ou suspensas) ou seu benefício melhorado ou, ainda, quem receber

eventual reversão de valores, conforme opção escolhida pelo Fundo de Pensão.

Por outro lado, em geral, serão ‘perdedores’ os participantes que não fizerem

jus ao ganho, pois, se a MaM de títulos mobiliários provocar aumento presente

do resultado do plano, como contrapartida, reduzirá os rendimentos futuros a

serem auferidos até o vencimento.

Mesmo que, na data da marcação a mercado dos títulos mobiliários do

plano de benefícios, todos os participantes tenham um ganho, a redução de

rendimentos futuros os atingirá de forma diferenciada, em razão do perío-

do em que cada um deles permanecerá vinculado ao plano de benefícios.

De fato, admitida como correta a premissa de que a redução da taxa de ju-

ros brasileiros não seja temporária, mas constitua uma tendência estrutural da

economia nacional, o participante que permanecer no plano até o vencimento

dos títulos (a princípio, aquele mais jovem) sofrerá maior impacto em relação a

quem “sair” do plano antes do vencimento (aquele com idade mais avançada).

6. As tomadas de decisões relativas à marcação a mercado

A Resolução CGPC nº 4, de 30.01.2002, que regula a avaliação e registro dos

títulos e valores mobiliários integrantes das carteiras próprias das EFPC e das

carteiras de fundos de investimentos exclusivos destas Entidades, legitima as

duas metodologias básicas de precificação: a MnC e a MaM. Ou seja, a Resolução

permite que os administradores dos Fundos de Pensão realizem escolhas,

justificadas com base na modelagem do plano, no perfil de seus compromissos

e de seus ativos de investimento, bem como na estratégia desenhada pelos

gestores para administrar o plano.

A norma determina, contudo, que os gestores tomem sua decisão de forma

responsável, considerando a capacidade financeira do plano de benefícios de

manter os títulos e valores mobiliários até o vencimento, que caracteriza como

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“capacidade de atendimento das necessidades de liquidez” do plano de benefícios,

“em função dos direitos dos participantes, das obrigações da entidade e do perfil

do exigível atuarial de seus planos de benefícios”. Ainda, afirma que a capacidade

financeira deve ser “evidenciada pelo demonstrativo de resultado de avaliação

atuarial – DRAA”, estudo periódico realizado pelo atuário do plano que permite

apurar o custo do plano, o montante de recursos para garantir sua solvência e

equilíbrio, consideradas a base normativa, o perfil dos participantes e as premissas

sobre eventos futuros.

A Resolução também impede alterações de método a qualquer momento

(“somente poderá ser efetuada por ocasião da elaboração dos balanços anuais”), e,

ainda, determina que:

Art. 6º (...)

§ 2º A transferência da categoria títulos mantidos até o vencimento para a categoria

títulos para negociação somente poderá ocorrer por motivo isolado, não usual,

não recorrente e não previsto, ocorrido após a data da classificação, de modo a

não descaracterizar a intenção evidenciada pela entidade fechada de previdência

complementar quando da classificação nesta categoria.

As exigências do órgão regulador relativas à transferência da categoria de

“títulos mantidos até o vencimento” para a categoria “para negociação” visam

impedir, entre outros objetivos, que a Entidade a realize para obter determinado

resultado do plano de benefícios. Ainda, ajudam os Fundos de Pensão a realizar uma

discussão profunda sobre o tema, de modo que sejam formuladas justificativas

objetivas e transparentes, inclusive para os participantes do plano de benefícios.

A Resolução CGPC nº 04/2002 ainda prevê a manutenção na EFPC de

documentação a ser apresentada ao órgão de fiscalização e que apresente os

critérios adotados para a avaliação e registro dos títulos e valores mobiliários

dos planos administrados. Também dá poderes à Superintendência Nacional

de Previdência Complementar (Previc) para determinar a reclassificação dos

títulos, quando forem verificadas inconsistências nos procedimentos adotados

na Entidade. Ou seja, atualmente o sistema prevê mecanismos para garantir a

necessária transparência de procedimentos e corrigir eventuais equívocos por

parte do Fundo de Pensão no tocante à precificação de seus ativos.

Mesmo que a Resolução CGCP nº 04/2002 determine que a alteração da

metodologia de precificação dos títulos e valores mobiliários seja realizada

por motivo isolado, não usual e não recorrente, não há dúvida que, na atual

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conjuntura de redução da taxa de juros dos títulos públicos e dos títulos de

renda fixa no mercado brasileiro, a MaM tem como importante consequência

amenizar o impacto no resultado provocado pela redução da taxa de juros em

planos BD (e em planos CV, que adotam a modelagem BD na fase de pagamento

de benefícios)9.

Com efeito, a redução da taxa de juros real adotada nas projeções atuariais

do plano de benefícios aumenta o valor presente dos benefícios futuros e, por

consequência, reduz o resultado do plano. Por outro lado, nos dias de hoje, a MaM

de ativos precificados na MnC tende a provocar um aumento do valor presente

dos recursos garantidores do plano.

Sem dúvida, o gestor, que geralmente é avaliado com base no resultado do

plano de benefícios, tem plena consciência de que a adoção da MaM em lugar

da MnC para a precificação de parte (ou da totalidade) dos títulos e valores

mobiliários minimiza a diminuição do resultado do plano provocada por uma

redução da taxa real de juros do plano de benefícios. Ele também sabe que a

alteração de metodologia não pode ser decidida para manipular o resultado do

plano.

Os participantes e os patrocinadores têm a responsabilidade de promover um

debate profundo sobre a necessidade e oportunidade da Marcação a Mercado,

sem desconsiderar que escolhas apresentadas como de natureza técnica, não

raramente atendem também a outros interesses, diferentes daqueles previstos

na Resolução CGPC nº 04/2002. A eles cabe exigir que o assunto seja tratado com

foco na liquidez necessária, ao longo do tempo, para pagar os compromissos do

plano de benefícios, a partir da análise que deve integrar o Demonstrativo de

Resultado da Avaliação Atuarial (DRAA) do plano, nos termos do parágrafo 3º do

art. 1º da Resolução CGPC 04/2002.

Até hoje, a maioria das EFPC tem utilizado a categoria de títulos mantidos

até o vencimento e aquela de títulos para negociação no mesmo plano de

benefícios, e não classificam todos os seus títulos e valores mobiliários em uma

única categoria. A gestão dos planos, geralmente, constrói carteiras de títulos

mantidos até o vencimento para pagamentos de benefícios no médio e longo

prazo, mas também classifica alguns ativos “para a negociação”, para fazer frente

aos compromissos de curto prazo e a eventuais compromissos não previstos.

A adoção conjunta da MaM e MnC, em conformidade com a orientação do

órgão regulador dos Fundos de Pensão, tem sido uma medida de sucesso até o

momento.

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A proposta de que as EFPC classifiquem obrigatoriamente todos seus títulos

e valores mobiliários na categoria de títulos para negociação e os precifiquem

por meio da MaM vai de encontro à atual regulação da matéria. Em uma primeira

leitura, ela parece:

a) Adotar para os planos de benefícios critérios e procedimentos do sistema

financeiro, minimizando a atenção às suas especificidades previdenciárias;

b) wReduzir o poder de decisão dos gestores dos planos de benefícios das

EFPC.

Até hoje, contudo, não foi dado amplo conhecimento das justificativas da

proposta de introdução dessa obrigatoriedade.

Nosso entendimento é de que as disposições da Resolução CGPC nº 04/2002

são adequadas às necessidades das EFPC e à boa administração dos planos de

benefícios.

Pela relevância do assunto e do órgão que sugeriu alteração da norma

regulatória, o tema merece explicações e debates mais aprofundados.

Referências bibliográficas

BRASIL. Ministério da Previdência Social. Fundos de Pensão: coletânea de nor-

mas. Brasília: MPS, SPC, 2011. 538 p.

FAZIO, Luciano. Do Novo Critério de Contabilização dos Fundos de

Investimento, em “Tributação em Revista” nº. 39, Brasília (DF): jan/mar de 2002,

7 p.

Luciano [email protected] previdenciário de entidades, com destaque para a

Associação Nacional dos Participantes de Fundos de Pensão -

Anapar. Graduado em Matemática e especialista em Previdência e

Gestão de Fundos de Pensão, pela Fundação Getúlio Vargas

(FGV – Núcleo Brasília), já foi técnico do Depto. Intersindical de

Estatística e Estudos Sócio-Econômicos - Dieese e consultor da

presidência da Fundação dos Economiários Federais – Funcef.

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ArtigoO protecionismo que sufocou a indústria nacional encontra

agora outra vitima: o setor de serviços.

Marília D’Orazio de Matos

O setor industrial no Brasil se desenvolveu em virtude das condições de

sua formação social e econômica, organizada segundo o modelo exportador

de produtos primários, como o café, que eram responsáveis pela geração de

importante parcela da renda nacional, enquanto as importações eram a fonte

do suprimento da demanda interna. Nesse cenário, a economia brasileira era

condicionada ao comportamento da demanda externa por commodities, o que

consolidou a importância do setor agrícola.

No período de 1929 a 1945, instaurou-se uma tecnologia simples, com pouco

capital e mão-de-obra intensiva. Conseguiu ampliar o mercado interno1 a partir

da substituição de bens não duráveis de consumo final, mas, nas relações de

troca, o Brasil começou a perder vantagens.

Então, sob uma visão neoclássica, as falhas de mercado teriam que ser

corrigidas. Em seus primórdios, foi adotada a ideia de Prebisch e Singer (1950)

de que, com o tempo, é natural a deterioração do valor dos produtos primários

nas relações de troca. Em uma sucinta revisão das políticas industriais adotadas,

observa-se que a cultura de uso de uma linha protecionista se consolidou no

Brasil.

(1950-1960) Política de Substituição da Importação – PSI

A produção nacional de bens de consumo duráveis e de alguns produtos

intermediários começou a entrar em cena a partir de 1945, estimulada pela Política

de Substituição de Importações (PSI)2, e que causou a demanda por bens de capital

1 Romero, 1976.2 Durante as décadas de 1950 e 1960, a Comissão Econômica Para a América Latina (Cepal) preconi-zava que o desenvolvimento dos países do terceiro mundo passava necessariamente por um amplo programa de substituição de importações. No Brasil, a PSI foi implementada com o objetivo de desen-volver o setor manufatureiro e resolver os problemas de dependência de capitais externos.3 Romero, 1976.

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e exigências de investimentos. Quando surgiu maior necessidade de produção de

bens industriais complexos, percebeu-se que o mercado, a tecnologia instalada e o

estoque de capital eram recursos escassos.

A PSI havia deixado no modelo de industrialização três sequelas que constituíram

grandes empecilhos para o desenvolvimento econômico do país: custos de produção

elevados; estrutura de mercados pouco competitivas e insuficiente absorção de força

de trabalho3.

(1970-1980) Grandes investimentos estatais em infraestrutura

A forte presença estatal predominante em setores de infraestrutura criou entraves

para a inovação tecnológica. O país teve que se apoiar em associações com empresas

estrangeiras – via efeito de transferência de escala de produção. Esse mecanismo

ficou conhecido como Modelo de Desenvolvimento Econômico Associado e implicou

um novo arranjo de interdependência econômica.

A partir daqui, a vinculação da economia nacional ao mercado internacional não

se limita apenas ao sistema de importações e exportações, mas também ao grande

volume de investimentos estrangeiros.

(1990-2000) Perda de competitividade

A abertura comercial da década de 1990 trouxe impactos para o mercado e para

o consumo, mas não impulsionou a produtividade. Quando houve a abertura da

economia, alguns setores se modernizaram muito. Importação de insumos com

tecnologia mais recente afeta positivamente o crescimento4, mas inovação deve ser

um exercício contínuo – e grande parte da nossa economia ficou menos competitiva.

O excesso de protecionismo proporcionou à indústria doméstica uma zona de

conforto e o excesso de tributos e de burocracia aliados à infraestrutura precária

fizeram com que a nossa capacidade de produzir ficasse mais cara do que a de outros

países (custo Brasil)5.

(2000 em diante) Medidas protecionistas

O aumento da renda e a ascensão da classe média deram certo ímpeto ao

comércio no Brasil. Com o real valorizado, a relação custo-benefício deixou evidente

a preferência pelos importados. Imposto de Importação, barreiras não tarifárias como

índice de nacionalização, conteúdo local, contingenciamento, exame de similaridade,

4 [CONNOLLY (2003)]. http://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/comissoes/comissoes-permanen-tes/cctci/Eventos/apresentacoes/eventos-2012/sm-2012.05.22-e-23-desindustrializacao/22.05.2012/ibre-fgv-mauricio-canedo-pinheiro.5 Estado de S. Paulo. Efeito da redução do IPI será cada vez menor, alerta Miguel Jorge. (01/08/2012).

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‘‘ ‘‘Há evidência abundante na literatura econômi-ca de uma forte correlação positiva entre a aber-tura da economia e o investimento e os ganhos de produtividade. O comércio internacional au-

menta o potencial de desenvolvimento.

licenciamento prévio de importação, preferência nas compras governamentais.

O governo se utiliza dessa gama de ferramentas para conter as importações,

contrariando as práticas benquistas no comércio internacional e confortando os

baixos níveis de investimento e competitividade.

Tais medidas – em especial o aumento discriminatório do IPI na importação

de veículos – reforçam os efeitos negativos sobre a credibilidade do Brasil para os

investidores estrangeiros, que desde o processo de liberalização comercial dos

setores energéticos e de telecomunicações, iniciado nos anos 1990 pelo programa

de privatizações, testemunham a falta de êxito da competitividade no país.

Setores demasiadamente protegidos entram em uma zona de conforto caracterizada

por preço alto e baixa competitividade, em comparação com o resto do mundo. No caso do Brasil,

essa situação é verificada pelo baixo desempenho da indústria, que se deve principalmente a

fatores estruturais, como baixos graus de investimento.

O protecionismo traz consequências castradoras quanto à capacidade de competição

dos produtos e serviços brasileiros, tanto no mercado interno como externo, e repercussões

negativas para os investidores, consumidores e para as políticas produtiva e comercial brasileiras.

Há evidência abundante na literatura econômica de uma forte correlação positiva entre a

abertura da economia e o investimento e os ganhos de produtividade. O comércio internacional

aumenta o potencial de desenvolvimento.

Agora, o setor de Serviços, que hoje representa quase 70% da economia no Brasil, começa a

ganhar maior relevância e cobrir o tom defasado da indústria brasileira. Mas a história vem se

repetindo, e o Brasil parece não ter aprendido com as lições do passado. A informalidade e a

baixa qualificação do setor têm sido encobertas por um movimento protecionista semelhante

ao que ocorria antes da liberalização de 1990, quando as indústrias nacionais se mostraram

relativamente atrasadas se comparadas ao nível de tecnologia mundial.

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Marília D’Orazio de [email protected]

Economista Sócia da Barral M Jorge Consultores Associados.

Proteger um setor, intensivo em capital humano, como o de serviços, trará consequências

muito piores do que o que ocorreu com a indústria. O ritmo global de uso do conhecimento nas

atividades econômicas está tornando o processo produtivo gradativamente mais intensivo em

capital humano. A rapidez da difusão das informações exige mais investimento em educação

e inovação tecnológica, de forma que a habilidade humana é crescentemente crucial para a

obtenção de vantagens competitivas. As transações financeiras internacionais crescem em um

ritmo mais acelerado que o crescimento do comércio internacional.

Intervenções setoriais só fazem sentido para corrigir falhas de mercado significativas. Mesmo

quando alguma forma de proteção é justificada, deve ser temporária e sua redução paulatina

deve ser prevista.

Se a política industrial objetiva estimular a inovação, a pressão competitiva é a

melhor maneira. Faz mais sentido fomentar os investimentos em P&D a proteger

o mercado doméstico, pois, neste caso, o setor tende a se estabelecer em uma

zona de conforto.

A âncora do desenvolvimento econômico no Brasil é o consumo. Esse modelo

de crescimento é sustentado pelo mercado de consumo de massa e deveria

estar acompanhado do aumento da produtividade, que só pode se manter com

a formação bruta de capital fixo e investimento em inovação.

Mas é mais cômodo para o setor privado nacional, que parece pensar somente

no curto prazo, fechar as portas do comércio para o resto do mundo, a se esforçar

em ganhar competitividade. Também para o governos, fechar o mercado é

preferível a implementar políticas consistentes – e de longo prazo.

Enquanto isso, a massa consumidora, que sustenta o País, assiste a uma reprise

que não teve sucesso: o protecionismo que desacelerou nossa indústria agora

quer emperrar o ganho de competitividade do nosso setor de serviços.

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ArtigoCâmbio, juros e inflação: reflexões sobre o ajuste fino

nas políticas econômicas para o desenvolvimento

Elder Linton Alves de Araujo

O Brasil vem, nos últimos anos, adotando e consolidando a estratégia de estabilidade

macroeconômica. A manutenção da inflação dentro do intervalo da meta, a redução da

dívida pública em relação ao PIB e a busca de menor volatilidade cambial são sinais de

melhora na coordenação das políticas econômicas, em especial a monetária, a fiscal e a

externa. Com isso, vive-se em uma fase na qual se faz cada vez mais necessário o ajuste

fino dessas políticas, com vistas ao desenvolvimento sustentável, aqui entendido como

o crescimento econômico aliado à inclusão social e à preservação ambiental.

Os desafios se amplificam quando se considera um ambiente de persistência da

crise financeira internacional que reduz o espaço para a expansão das exportações. Ao

mesmo tempo, cria uma forte concorrência dos produtos importados redirecionados

para o Brasil, devido à perda de mercados tradicionais, especialmente na Europa e nos

EUA. Isso está acirrando a concorrência entre países, na busca de mercados alternativos,

notadamente entre os principais mercados emergentes.

A dificuldade dos países centrais em reativar suas economias tem levado à

manutenção das taxas de juros internacionais em patamares baixos, próximos de zero,

levando a um excesso de liquidez mundial e à desvalorização do dólar e do euro e à

consequente valorização das moedas dos emergentes.

Com o Brasil não tem sido diferente. A valorização do real ajuda no combate à

inflação, reforça o país para enfrentar a crise com um montante robusto de reservas

internacionais, mas gera produção focada em produtos primários (exportação de

commodities) e à redução da produção industrial interna. Vive-se uma espécie de

paradoxo: facilidades de liquidez e de financiamento e dificuldades de reativação da

atividade econômica.

Em um complexo ambiente em que: permanecem os efeitos da crise internacional;

ficam mais estreitos os raios de manobra da política fiscal; o nível de atividade

responde mais lentamente que o esperado frente aos estímulos; e que a inflação

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dá sinais de resiliência em patamar elevado, próximo do limite superior da meta;

cabe então examinar esses fatores condicionantes de um necessário ajuste fino das

políticas econômicas para se gerar condição para “desatar esse nó” e recolocar o país

na trilha do crescimento, sem perder as conquistas da consolidação da estabilidade

macroeconômica, da inclusão social e dos avanços na área ambiental.

O processo de consolidação da estabilidade macroeconômica

A estabilidade atual, observada nos principais fundamentos econômicos do País, foi

conseguida após um longo processo, com a combinação de várias soluções aplicadas,

desde medidas pontuais até os chamados “pacotes” ou planos econômicos, ortodoxos

e heterodoxos.

O Brasil passou os anos 1980 (a chamada “década perdida”) com a adoção de

planos econômicos para controlar principalmente a dívida externa, a inflação e

a dívida pública. Os problemas eram de curtíssimo prazo, ligados à escassez de

recursos. Além dos acordos com o Fundo Monetário Internacional (FMI) para

se obter recursos para saldar os pagamentos da dívida externa, foram

realizados ajustes fiscais, mudanças de moeda, congelamento de preços e

salários, dentre outras medidas para o reordenamento macroeconômico.

Esse esforço só mostrou resultado anos depois, com a renegociação da

dívida externa e a acumulação de reservas internacionais, em ambiente de

melhor disponibilidade de recursos externos, ainda que a custos elevados.

Dívida externa líquida (% do PIB) e Dívida externa pública (% do total)

Fonte: Banco Central / Obs. Dívida externa líquida = dívida externa total – reservas internacionais

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Nos anos 1990, com a abertura comercial e a inserção na globalização

econômica e financeira, o Brasil teve mais acesso aos mercados, inclusive

financeiros, e passou a equacionar os problemas da dívida externa (no

âmbito do Plano Brady, que permitiu a renegociação e securitização de

bônus soberanos com aval do Tesouro dos EUA) e, com isso, melhores

condições para o combate à inflação.

Nesse período, o mecanismo mais comum utilizado pelos países era a

chamada “âncora cambial”, cuja modalidade mais radical era o atrelamento

direto da moeda nacional ao estoque de reservas internacionais do país,

especialmente ao dólar, como foi o caso do regime de conversibilidade

utilizado na Argentina. O Brasil optou por uma combinação de medidas

que, em 1993 e 1994, resultou no Plano Real, o qual combinava três fases:

uma preliminar, de ajuste fiscal, para saneamento das contas públicas;

uma segunda, a chamada Unidade Real de Valor – URV, que funcionava

como âncora cambial, na tentativa de limpar a memória inflacionária e

dar credibilidade à nova moeda; e a terceira fase, de implantação da nova

moeda, onde as reservas internacionais, as importações e o aumento da

produção agrícola (“âncora verde”) passaram a dar poder de compra à

moeda implantada, o Real.

Ainda ao longo dos anos 1990, as crises internacionais passaram a

pressionar a forma de controle inflacionário com base na âncora cambial,

com sistemas de bandas e desvalorização controlada, cujo montante de

reservas mostrou-se insuficiente frente aos ataques especulativos à moeda

nacional. Foi assim na crise do México em 1994 e 1995, na crise da Ásia em

1997 e da Rússia em 1998.

O Brasil não ficou imune a essas crises, e fazia o combate por meio de

aumento de juros para evitar saída de capital. Nesse quadro, o país dependia

de renovações dos acordos de ajuda financeira do FMI. Em 1999, o Brasil

estava sob ataque especulativo e decidiu-se modificar o sistema cambial

para flutuante ou livre. Passou-se também a adotar o sistema de metas

para a inflação, como foco no ajuste via política monetária, com respaldo

no ajuste fiscal. Nesse caso, a geração de superávits primários ajudaria na

estabilização e redução da dívida pública nos anos seguintes.

O controle da inflação, desde então, permitiu a retomada de alternativas de

crescimento econômico com base no aproveitamento de oportunidades de exportação,

estratégia que funcionou relativamente bem até 2005. Em seguida, a estratégia de

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reforçar o mercado interno evitou que o país tivesse queda no PIB até 2008, quando

se intensificou a atual crise internacional. Essa estratégia mostrou-se bem-sucedida

também para enfrentar o auge da crise nos anos de 2008 e 2009: manteve o nível de

emprego e renda, mesmo com a retração da produção industrial, que foi compensada

pela manutenção da atividade de comércio e serviços, e também da agropecuária.

Para tanto, a política fiscal foi usada de forma anticíclica, com incentivos à produção e

ao consumo, por meio da redução de tributos, tais como as menores alíquotas de IPI para

materiais de construção, produtos da linha branca (fogão, geladeira, máquina de lavar),

eletrônicos (microcomputadores, tv etc.) e veículos, dentre outros.

Aproveitou-se a liquidez internacional para ampliar o financiamento do investimento,

com a importação de bens de capital e a atração de investimentos estrangeiros diretos.

Como resultado, o ano de 2010 foi de grande crescimento do PIB, chegando a 7,5%. A

inflação, nesse período, permaneceu dentro do intervalo da meta. Houve, também,

redução da dívida pública. Mesmo quando foi necessário o aumento dos juros, este ficou

em patamares menores.

Em 2011 e 2012, no entanto, houve forte desaceleração da economia brasileira, o que

persiste em 2013. Do lado externo, o novo recrudescimento da crise internacional, com

o problema fiscal dos países da União Europeia, notadamente Grécia, Irlanda, Espanha e

Portugal, juntamente com a dificuldade de retomada da produção nos países centrais,

criou dificuldades adicionais para a estratégia exportadora dos mercados emergentes.

Para o Brasil, a consequência veio em duas frentes: dificuldades para a indústria na

Dívida líquida do setor público (% do PIB)

Fonte: Banco Central

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exportação de manufaturados e aumento da concorrência de produtos importados,

especialmente os chineses. Além disso, a redução do ritmo de crescimento chinês fez

com que se reduzisse o volume de exportação brasileira de commodities (especialmente

do complexo soja) e de minério de ferro.

Nesse ambiente, a inflação tem permanecido dentro da meta, embora próxima do

limite superior do intervalo de confiança. Nas estimativas do FMI, poderá ficar em patamar

acima da média internacional e também da média dos principais mercados emergentes,

como é o caso quando se compara com os chamados Brics. A dívida pública permanece

em trajetória declinante e em patamares baixos, quando comparada a outros países, mas

reduz-se o espaço fiscal para as políticas de incentivo, com queda na arrecadação e do

superávit primário. As reservas continuam robustas, mas tem ficado estreito o mercado

para as exportações, que estão cada vez mais “primarizadas”, com foco em commodities.

Mesmo com as intervenções pontuais do governo e a mudança de patamar de

R$ 1,50 para $ 2,00 por dólar, o câmbio mantém-se com tendência de valorizar-se,

com a entrada de investimentos diretos e de portfólio, que permitem reservas em

níveis elevados. Parte dessa valorização cambial tem sido compensada com venda

de contratos de swap cambial pelo Banco Central. Como visto, é cada vez menor o

espaço ou raio de manobra para as medidas de política econômica de forma a não se

perder a estabilidade macroeconômica conquistada em longo processo de ajuste. E

tem se intensificado o debate se o país poderá manter o tripé da estabilidade: metas

de inflação, câmbio livre e responsabilidade fiscal.

Ajustes na Taxa Básica de Juros Selic

Desde a adoção do sistema de metas para a inflação em 1999, a definição da meta

para a Selic, nas reuniões periódicas do Comitê de Política Monetária do Banco Central

(Copom/BC), tem como objetivo nortear as expectativas dos agentes econômicos com

vistas manter a inflação sob controle. O sistema pressupõe contribuições da política

fiscal no sentido de manter a trajetória declinante da dívida pública. Pressupõe também

que os efeitos dos choques externos e da volatilidade cambial sejam dissipados e que

não contaminem os preços domésticos.

O que se tem visto nos últimos anos é que o Brasil tem apresentado resultados

macroeconômicos consistentes e com isso reduzido o nível do risco-país, o que

pode ser visualizado tanto na queda do spread over treasury do EMBI+ (atualmente

abaixo de 200 pontos base), quanto na redução do spread do credit default swaps –

CDS para bônus de 5 anos. Em várias atas do Copom, tem-se dito que esses fatores

têm permitido a redução gradual da chamada taxa de juros neutra. Isso significa que

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outubro de 2012 / março de 2013

o controle de inflação pode ser feito com doses menores de aumento de juros, ou

seja, menor necessidade de sacrifício de crescimento econômico para conter a alta

dos preços. Se considerada a trajetória de tendência da Selic, observa-se redução dos

patamares de juros. Para exemplificar, os picos de juros têm ficado em patamares

menores, e, no atual ciclo, a taxa de juros básica tem sido reduzida sistematicamente

e atingiu o seu menor patamar, de 7,25% (desde outubro de 2012). Verifica-se, em

paralelo, a redução dos juros reais.

Nota-se também que o crescimento real da economia está mais próximo do chamado

PIB potencial, que permite crescimento sem pressões inflacionárias. Todavia, mesmo

com esse ambiente favorável, com os juros mais baixos, não se observa a retomada

firme do crescimento. Internamente, percebe-se o mercado de trabalho aquecido e

manutenção de demanda, mas a atividade econômica se mantém mais forte apenas nos

serviços. A indústria tem sido afetada por fatores externos, especialmente a retração da

economia nos principais mercados destinatários das exportações brasileiras, mesmo

com a tentativa de diversificação buscada nos últimos anos. No caso da agropecuária,

adversidades climáticas afetaram a safra de 2012 e espera-se recuperação em 2013,

com as boas perspectivas climáticas e de preços internacionais.

Taxa de juros - Meta Selic (% a.a.)

Fonte: Banco Central

Efeito cambial

A contínua consolidação macroeconômica do Brasil permitiu a atração de capitais,

seja de investimentos diretos estrangeiros, seja de aplicações em carteira/portfólio

(ações, debêntures, títulos públicos e privados), e favoreceu a formação de reservas

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internacionais robustas, hoje da ordem de quase US$ 400 bilhões. Essa entrada

de recursos permitiu inclusive a quitação antecipada das obrigações do governo

brasileiro com o FMI e a redução da dívida externa pública, tornando o Brasil um país

credor externo líquido. Ao mesmo tempo, abriu espaço para as empresas brasileiras

buscarem recursos mais baratos no exterior. Atraiu também mais investidores ao País.

De um lado, essa entrada de capitais gerou, no sistema de câmbio flutuante, um

movimento de valorização da moeda nacional, que, por sua vez, permitiu o aumento

de importações, o que levou ao favorecimento tanto da favoreceu tanto a expansão de

investimentos e o financiamento do déficit em transações correntes quanto à redução

de inflação pela maior concorrência dos produtos estrangeiros com os nacionais.

Reservas internacionais - Liquidez internacional (US$ Bilhões)

Fonte: Banco Central

Por outro lado, essa valorização cambial tem se refletido na perda de competitividade

dos produtos nacionais. A queixa dos empresários é de que o Brasil estaria passando

por um período de desindustrialização e de redução do valor agregado das

exportações. Com isso, desde 2011, há uma maior intervenção do Banco Central no

sentido de se impedir o que foi considerado como valorização excessiva da moeda

nacional, em grande parte resultante da grande liquidez internacional gerada pela

redução dos juros nos países centrais, em combate à crise internacional. O caso do

dólar é emblemático, pois, sendo moeda de referência, está com juros próximos de

zero e faz com que investidores busquem alternativas mais rentáveis, porém, ao

mesmo tempo seguras, em mercados emergentes como o Brasil. Em paralelo, os

mercados emergentes buscam compradores alternativos para suas exportações.

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outubro de 2012 / março de 2013

Uma ferramenta nesse sentido tem sido a desvalorização cambial, que incentiva

exportações. Porém, como o mundo permanece em crise, a demanda é reduzida,

isso gera forte competição entre os exportadores e esse fenômeno chegou a

ser considerado uma forma de “guerra cambial”. Um agravante nesse processo é

que o êxito na implantação de medidas de estímulo e o sucesso no aumento das

exportações implicam maior volume de divisas para o país e contribui para se ter

câmbio valorizado. Esse quadro cria um potencial círculo vicioso, dado o ambiente de

crise internacional e de juros baixos.

Um debate sobre esse tema tem levado em conta as medidas de controle cambial e de

manutenção artificial de níveis de taxa de câmbio dos países. No caso brasileiro, o regime

cambial é flutuante, mas percebe-se cada vez mais atuação do Banco Central, ora para

evitar valorização considerada excessiva, ora para promover desvalorizações competitivas.

O mercado financeiro considera tal procedimento uma “flutuação suja”, ou seja, o câmbio é

livre mas o Banco Central intervém sem deixar claro qual nível cambial se está buscando.

Uma defesa governamental nesse sentido tem sido a proteção da moeda nacional frente

à “guerra cambial”. Nesse ambiente, o mercado fica testando limites até onde o BC tolera a

flutuação, seja para os movimentos de valorização, seja para desvalorização.

Taxa de câmbio R$/US$ - Nominal e real (cesta de moedas) – Índice: jun/1994 = 100

Fonte: Banco Central

Além dos aspectos acima mencionados sobre os efeitos no comércio internacional, a

desvalorização cambial traz um potencial risco inflacionário, uma vez que encarece os

produtos importados. Além disso, uma eventual expansão de exportações pode reduzir

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a oferta interna de produtos nacionais, e isso traz pressão sobre os preços domésticos. O

debate então se desloca para um ajuste fino entre os níveis da taxa de câmbio e da taxa

de juros que evite que a inflação aumente. Na atualidade, esse aspecto ganha relevância

com o aparente dilema que surge entre o recente movimento de desvalorização cambial

e a redução das taxas de juros.

As taxas de juros mais baixas, por sua vez, têm permitido a redução do pagamento

de juros da dívida pública, que tem compensado o menor superávit primário de 2012

ocasionado pela queda de arrecadação e manutenção de fortes incentivos à atividade

econômica, como a redução de IPI para veículos e linha branca.

Observa-se também que se reduziu o efeito pass-through do câmbio para a inflação.

Em parte, isso está ligado ao excesso de estoque em vários setores, o que impede

aumento de preços e comprime margens dos empresários. Todavia, na medida em que

a economia recupera seu ritmo, o efeito do repasse de desvalorização cambial para os

preços tradeables poderá voltar a se ampliar, combinado como um eventual impacto dos

serviços e bens non tradeables, cujos preços tendem a se elevar na fase de maior dinâmica

da atividade econômica. No caso dos serviços, partirão de um patamar elevado, em torno

de 8%, e, portanto, acima do limite superior da meta de inflação (6,5%).

Impactos nas projeções de mercado

Essas questões quanto à sustentabilidade do tripé da estabilidade macroeconômica

repercutem nas estimativas de mercado, especialmente quanto ao câmbio, juros e

inflação. Eventuais suspeitas de que o governo não possa cumprir a meta de superávit

primário têm ensejado aumento dos juros futuros, procurando antever o movimento do

BC para evitar pressão inflacionária. Por outro lado, esse mesmo aumento de juros provoca

valorização cambial, que contribui para arrefecer a inflação futura. Novamente fica claro

o espaço estreito de ação das políticas econômicas combinadas, de forma a ter o menor

sacrifício possível da atividade econômica.

De acordo com o levantamento de mercado realizado pelo BC e divulgado por meio do

Boletim Focus, a inflação para os próximos doze meses apresentou comportamento de

alta até o início do segundo semestre, Atualmente, as expectativas arrefeceram. Muitos

analistas apostavam que o Copom/BC pararia o movimento de redução da meta Selic no

patamar de 7,5%, mas houve novo recuo de 0,25 p.p. na reunião de outubro e sinalização

de que a taxa ficaria nesse patamar de 7,25% a. a. por um período longo. Nas duas reuniões

seguintes, o patamar de juros foi mantido em 7,25%. Essa correção também pode ser vista

nas expectativas de swap DI x pré 360 dias, que mostram Selic abaixo de 7,5% a.a. e certa

estabilização da taxa real de juros ex ante no patamar próximo de 2,0% a.a.

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A mediana das expectativas de mercado para a inflação (IPCA) para os próximos 12

meses, que vinha se elevando ao longo do ano e se aproximando de 6%, também passou

a apresentar recuo desde agosto de 2012, voltando a subir no final do ano e no início

de 2013. No início do ano, índice situava-se em torno de 5,5% (Relatório Focus / BC, de

08/02/2013). Como resultado, as expectativas foram corrigidas para 2013, prevendo

inflação elevada (5,71%). O recuo da inflação é esperado somente para 2014 (5,50%). Esse

movimento mostra uma lenta convergência para o centro da meta (4,5%).

No caso do câmbio, ele ficou estável em torno de R$/US$ 2,05. Isso sugere que os

analistas estão vendo com cautela os novos movimentos de desvalorização cambial

coordenados pelo BC, e que a autoridade monetária segurará o nível da taxa de

câmbio próximo de R$/US$ 2,00. E, assim, estará evitando nova valorização do real

em magnitude significativa.

Nas atas das reuniões do Copom/BC, a explicação para o atual movimento dos juros é

que o ambiente internacional tem viés deflacionário no médio prazo, e que as pressões

domésticas têm se acomodado com o menor ritmo da atividade econômica do País. A

influência da questão fiscal continua relevante para apontar se continua ou não o esforço

de redução da relação dívida pública e PIB.

Quanto à inflação observada, no caso dos serviços nota-se acomodação em patamar

elevado, o que traz preocupações para o momento da retomada do ritmo da economia.

No caso da inflação de alimentos , esta esteve ligada ao clima e aos preços de commodities,

que mostram sinais de acomodação com as perspectivas de boa safra em 2013.

IPCA – Expecatativa 12 meses à frente (mediana de mercado, % a.a.)

Fonte: Banco Central/Focus

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Por ora, a sustentação da demanda via consumo está funcionando razoavelmente, com a

redução dos estoques estimulada pela desoneração tributária e pela manutenção do nível

de emprego, renda e crédito. O que preocupa é a demora na retomada do investimento

privado. Isso aponta para pouca confiança do empresário em relação à aceleração do

crescimento econômico. Além disso, o investimento público, apesar de crescente, ainda

tem sido insuficiente para prover toda a infraestrutura necessária para o crescimento

sustentado, com ampliação do potencial e com menores pressões inflacionárias.

Nesse ambiente, a meta de inflação tem sido a síntese da coordenação das políticas

econômicas no Brasil. Logo, seus pressupostos devem sempre ser reafirmados para que

se consolide a credibilidade do sistema e se reduza os custos do combate à inflação.

Mesmo com as dificuldades apontadas, as perspectivas de médio e longo prazo mostram

confiança dos agentes econômicos na manutenção e aprimoramento dessa sistemática.

IPCA – meta de inflação, valores anuais observados e projeção de mercado

Fonte: : IBGE e Banco Central. Obs. Projeções de mercado a partir de 2013 (Focus de 08/02/2013).

Considerações finais

O Brasil vive um momento em que se pode retomar o planejamento e se buscar soluções

duradouras e criativas para seus grandes desafios. Dentre os pontos fortes, destaca-se a

manutenção da estabilidade macroeconômica, considerada pilar do desenvolvimento

sustentável do País, ou ainda, condição sine qua non para que o Brasil entre de fato no

rol dos países desenvolvidos. Diante disso, a reafirmação do tripé da consolidação fiscal,

do câmbio flutuante e do controle da inflação por meio do sistema de metas permanece

no centro das atenções para que não se perca este esteio do desenvolvimento do País.

Passamos os anos de 1980 e 1990 praticamente resolvendo problemas de curtíssimo

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Elder Linton Alves de Araujo [email protected], graduado pela UCB. Mestre em Economia pela Unicamp. Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. Professor do UDF Centro Universitário. Membro do Corecon-DF.

*Opiniões do autor e não refletem necessariamente o posicionamento oficial das entidades a que está vinculado.

prazo, ligados à escassez de divisas, inflação alta e falta de recursos para os investimentos

públicos. O início do Sec. XXI trouxe esperanças ao País com a paulatina consolidação

dos esforços de planos econômicos que domaram a dívida externa, a dívida pública e a

inflação.

Os desafios agora são de outra magnitude, com retomada do crescimento econômico, o

atendimento das crescentes demandas sociais, a restauração e ampliação da infraestrutura,

a redução do “custo Brasil” e a obtenção de ganhos de qualidade, competitividade e

produtividade, por meio da inovação tecnológica e aprimoramento do capital humano. O

espaço de coordenação das políticas públicas tem ficado cada vez mais estreito e exigido

o devido ajuste fino. Os brasileiros têm a oportunidade de serem criativos para encontrar

as melhores soluções possíveis no sentido de se garantir a estabilidade macroeconômica

conquistada e avançar no desenvolvimento econômico, social e ambiental. Consolidando

nossa democracia, podemos e devemos encontrar níveis de juros e câmbio que garantam inflação sob

controle sem que se comprometa, além do necessário, a atividade econômica e seus reflexos sociais. Isso

tudo envolve a busca de alternativas de inserção social, de geração de emprego e renda, na cooperação

entre setor público e iniciativa privada, enfim, na união de todos, com visão estadista, em torno de uma

estratégia de desenvolvimento do País.

Referências bibliográficasBanco Central do Brasil - BC. Relatórios de Inflação. Brasília, 2012.

____________. Atas do Copom. Brasília, 2012 e 2013.

____________. Notas para a Imprensa: Setor Externo. Brasília, 2012 e 2013.

____________. Notas para a Imprensa: Política Fiscal. Brasília, 2012 e 2013.

____________. Notas para a Imprensa: Política Monetária e Crédito. Brasília, 2012 e 2013.

CAVES, R. E. FRANKEL, J. A. & JONES, R. W. Economia Internacional: Comércio e Transações Globais. São Paulo,

Saraiva, 2001.

Fundação Centro de Estudos do Comércio Exterior – FUNCEX. Boletim de Comércio Exterior, Rio de Janeiro,

2012.

Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior – MDIC. Estatísticas de Comércio Exterior.

Brasília, 2012.

Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE – Indicador Conjuntural – IPCA. Rio de Janeiro, 2012 e

2013.

VASCONCELOS, M. A. S. de. Economia: Micro e Macro. 4ª Ed., São Paulo, Atlas, 2009.

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A macroeconomia da estagnação com pleno emprego no Brasil

José Luis Oreiro

Os dados divulgados em novembro de 2012 pelo IBGE a respeito do PIB do terceiro

trimestre de 2012 confirmam as análises feitas anteriormente por mim em diversos

artigos publicados na grande imprensa: a economia brasileira encontra-se numa

situação de estagnação. Após crescimento de 2,7% em 2011, ela deverá crescer

menos do que 1% em 2012 e apresentar um incremento inferior a 3% em 2013. O

comportamento pífio do PIB ocorre, contudo, num contexto em que a média móvel

dos últimos 12 meses da taxa de desemprego nas regiões metropolitanas continua

sua trajetória de queda, encontrando-se hoje num valor próximo a 5,5% da força de

trabalho, menos da metade do valor observado em dezembro de 2003 (figura 1).

Curiosamente, a estagnação da economia brasileira se dá num contexto de “pleno

emprego” da força de trabalho.

Artigo

Figura 1 - Taxa de desemprego (período de referência de 30 dias), das pessoas de 10 anos ou mais de idade, por regiões metropolitanas

Fonte: Ipeadata

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Para economistas de formação puramente Keynesiana, o fenômeno da estagnação

com pleno emprego é aparentemente incompreensível. Isso porque a obtenção de

um nível de emprego elevado seria um sinal claro de que o nível de demanda efetiva

prevalecente na economia é muito alto, o que deveria se refletir positivamente na

disposição dos empresários em realizar grandes projetos de investimento. Nesse

contexto, haveria uma correlação negativa entre a taxa de desemprego e a taxa de

investimento, o que tornaria impossível a ocorrência de uma situação de estagnação

e pleno emprego.

A compreensão da lógica da estagnação com pleno emprego exige um arcabouço

teórico mais abrangente do que a teoria keynesiana “fundamentalista”. De fato, a

efetiva compreensão desse fenômeno exige a utilização daquilo que podemos

denominar de abordagem Keynesiano-Estruturalista, a qual consiste na síntese entre

a teoria macroeconômica de inspiração Keynesiana com a Teoria Estruturalista do

Desenvolvimento.

Na teoria estruturalista do desenvolvimento, o crescimento de longo prazo

depende da composição setorial da produção, mais especificamente da participação

da indústria de transformação no PIB. Isso porque a indústria é o motor de crescimento

de longo prazo das economias capitalistas, uma vez que ela é a fonte ou a principal

difusora do progresso técnico para a economia como um todo, é o setor com

maiores encadeamentos para frente e para trás na cadeia produtiva, é a fonte das

economias estáticas e dinâmicas de escala e o setor cujos produtos possuem a maior

elasticidade renda de exportação, o que permite o relaxamento da restrição externa

ao crescimento (Oreiro e Feijó, 2010). Sendo assim, o crescimento da economia no

longo prazo é extremamente dependente do crescimento da produção industrial.

A partir desse referencial teórico, podemos constatar que a estagnação recente da

economia brasileira é decorrência da estagnação da produção industrial. Com efeito, a

média móvel dos últimos 12 meses da produção física da indústria de transformação

ficou estagnada ao longo do ano de 2011, apresentando uma nítida tendência

de queda ao longo do ano de 2012 (Figura 2). A estagnação/queda da produção

industrial foi acompanhada pela estagnação/queda da produtividade do trabalho

na indústria (decorrência da lei de Kaldor-Verdoorn). Como a indústria é o setor da

economia que utiliza mais intensamente máquinas e equipamentos, não é surpresa

se verificar que a estagnação/queda da produção industrial tem sido seguida por

uma forte contração da formação bruta de capital fixo da economia brasileira a partir

do segundo trimestre de 2011.

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aFigura 2 - Evolução da produção física da indústria geral

(média móvel dos últimos 12 meses)

Fonte: Ipeadata

Qual a razão da estagnação da produção industrial? Essa situação não se deve a

uma suposta escassez de demanda agregada, haja vista que as vendas no varejo,

conforme podemos visualizar na figura 3, mantêm uma nítida tendência de elevação

e, mais importante, o faturamento da indústria também continua aumentando, apesar

da estagnação da produção física, conforme verificamos na figura 4.

Figura 3 - Vendas no varejo ampliado e produção física da indústria

Fonte: Ipeadata

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Por fim, mas não menos importante, o grau de utilização da capacidade

produtiva da indústria, embora tenha tido uma queda nos últimos meses,

continua em patamares historicamente elevados, conforme podemos

constatar na figura 4.

Figura 4 - Faturamento e produção física da indústria brasileira (média móvel dos últimos 12 meses)

Fonte: Ipeadata

A explicação para esses fatos é que a indústria brasileira não está conseguindo ter

acesso à demanda doméstica, uma vez que tal acesso depende da sua competitividade,

a qual vem sendo corroída de forma sistemática pelo crescimento dos salários na frente

da produtividade do trabalho e pela apreciação da taxa real de câmbio. De fato, a relação

custo unitário do trabalho/taxa real efetiva de câmbio aumentou nada menos do que 60%

entre dezembro de 2001 e dezembro de 2011, conforme se verifica na figura 5.

A perda de competitividade da indústria somada com uma expansão ainda robusta

da demanda doméstica, em função dos efeitos combinados do crescimento dos salários

e das medidas de estímulo do governo, acaba atuando como elemento catalisador do

processo de substituição da produção doméstica por importações, a qual se expressa

na brutal elevação do coeficiente de penetração das importações, que passou de

10% em 2003 para 21% em 2012, conforme se constata na figura 6. A substituição da

produção doméstica por importações explica o aparente paradoxo do aumento do

faturamento da indústria num contexto de estagnação da produção física, uma vez

que a indústria brasileira está se transformando crescentemente numa maquiadora.

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Por fim, o ritmo robusto de expansão da demanda doméstica, alimentado pelo

crescimento dos salários na frente da produtividade do trabalho e pelas políticas de

estímulo à demanda por parte do governo, atua no sentido de aumentar a demanda

por serviços – altamente intensivos em mão-de-obra – razão pela qual a estagnação da

produção industrial se faz acompanhar por um elevado nível de emprego.

Figura 6 - Coeficente de penetração da indústria de transformação (2003/T4 - 2012/T2)

Fonte: Ipeadata

Figura 5 - Custo unitário do trabalho / Taxa real efetiva de câmbio da indústria de transformação. (Dez/01 - Dez /11)

Fonte: Ipeadata

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A lógica do ciclo vicioso da estagnação com pleno emprego no Brasil pode ser

visualizada na figura 7.

Figura 7 – O ciclo vicioso da estagnação com pleno emprego

Fonte: Elaboração própria

Nesse contexto, constata-se que as medidas de estímulo à demanda agregada

feitas pelo Ministério da Fazenda e pelo Banco Central são ineficazes para lidar com

o problema de estagnação com pleno emprego, porque não atuam no sentido de

eliminar a perda de competitividade da indústria brasileira. Na verdade, tais medidas

podem piorar o problema à medida que, ao atuarem no sentido de manter a taxa de

desemprego num nível baixo, reforçam a tendência dos salários reais em crescer na

frente da produtividade do trabalho, contribuindo assim para a tendência de aumento

do custo unitário do trabalho.

A restauração da competitividade da indústria requer uma mudança na “arquitetura

macroeconômica”, ao invés de medidas pontuais, como vem sendo feito até o momento

pelo Ministério da Fazenda. Em particular, é necessário instituir um regime de política

macroeconômica1 que gere endogenamente uma taxa de câmbio competitiva a médio

e longo prazo, e um crescimento dos salários reais em linha com a produtividade do

trabalho, ao mesmo tempo em que viabiliza um aumento significativo do investimento

público em obras de infraestrutura. 1 A esse respeito ver Oreiro (2012).

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Referências bibliográficas

OREIRO, J. L. C. Novo-Desenvolvimentismo, crescimento econômico e regimes de

política macroeconômica. Estudos Avançados (USP. Impresso), v. 26, p. 29-40, 2012.

OREIRO, J. L. C.; FEIJÓ, C. A. . Desindustrialização: conceituação, causas, efeitos e

o caso brasileiro. Revista de Economia Política (Impresso), v. 30, p. 219-232, 2010.

José Luis [email protected] Professor do Departamento de Economia da Universidade de Brasília, Pesquisador Nível I do CNPq e Diretor de Relações Institucionais da Associação Keynesiana Brasileira. E-mail: [email protected]. Página pessoal: www.joseluisoreiro.ecn.br.

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ArtigoBrasil Negativado: empresas e famílias

Reinaldo Gonçalves

A “negatividade” é informada por indicadores de desempenho da economia

brasileira que abarcam o país, o governo, as empresas e as famílias. A expressão

“negativado” significa estar com sinal, carga, resultado ou potencial negativo. Isto é,

precisamente, o que tem ocorrido com a economia brasileira nos últimos anos. O Brasil

Negativado envolve o país, o governo, as empresas e as famílias.1 Neste artigo, o foco de

análise é o aumento da negatividade como resultado da política de crédito fortemente

expansionista no contexto de taxas de juros muito elevadas, fraco desempenho da

renda, inoperância da atividade fiscalizadora e abuso de poder econômico por parte

dos sistemas bancário e financeiro.2

1. Empresas

Os dados do Banco Central são conclusivos: houve extraordinária expansão do

crédito, principalmente, a partir de 2007. O valor total das operações de créditos das

pessoas jurídicas aumentou 2,6 vezes, de R$ 223 bilhões em 2002 para R$ 594 bilhões

em 2012 (valores constantes de 2012), o que representa crescimento médio anual de

9,8%, ou seja, quase o triplo do crescimento da renda (Tabela 1).

O Brasil Negativado no setor empresarial é evidente quando se verifica que a

inadimplência (atrasos superiores a 90 dias) cresceu 5,3 vezes (de R$ 7,8 bilhões em

2002 para R$ 41,7 bilhões em 2012, taxa de 18,3% a.a.). De fato, a taxa de inadimplência

das empresas duplica visto que aumenta de 3,4% em 2002 para 6,9% em 2012. Há

evidente tendência de aumento desta taxa.

Nos últimos anos as empresas tornam-se cada vez mais negativadas visto

que a relação dívida das empresas / excedente operacional bruto aumenta de

26,0% em 2002 para 40,3% em 2012. Não é por outra razão que, considerando

as elevadas taxas de juros cobrados no Brasil, há transferência de renda do

1 Para análise detalhada, ver Reinaldo Gonçalves, Brasil Negativado, Brasil Invertebrado: Legado dos Governos do PT. Disponível: http://www.ie.ufrj.br/hpp/mostraArtigos.php?idprof=77&cat=1. Acesso: 20 de março de 2013.2 Para análise detalhada, ver Reinaldo Gonçalves, Desenvolvimento às Avessas. Verdade, má-fé e ilusão no atual modelo brasileiro de desenvolvimento. Rio de Janeiro: LTC, 2013.3 GONCALVES, Reinaldo. Dominação financeira. Rio de Janeiro: Corecon-RJ. Jornal dos Economistas, No. 277, pp. 12-13, agosto 2012.

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Tabela 1 - Empresas - dívida e inadimplência: 2003-2012 (valores constantes de 2012, R$ milhões; coeficientes em %)

Fonte: Banco Central e IBGE. Elaboração do autor. Notas: A taxa de inadimplência é a média dos atrasos acima de 90 dias sobre operações de crédito para pessoas jurídicas em sete tipos de operações de crédito sobre as quais o Banco Central informa dados: operações com juros prefixados - conta garantida, operações com juros prefixados - desconto de duplicatas, operações com juros prefixados - capital de giro, operações com juros prefixados - aquisição de bens, operações com juros prefixados - vendor, operações com juros prefixados - hot money, operações com juros prefixados - nota promissória. Dívida total das pessoas jurídicas é o saldo total das operações de crédito (média anual). Para o cálculo do valor constante (2012) o deflator usado é o IPCA. Inadimplência é a estimativa do valor total das operações de crédito para pessoas jurídicas com atraso de pagamento maior do que 90 dias. A estimativa do valor da inadimplência total é calculada aplicando a taxa média de inadimplência dos sete tipos de operações sobre o valor total das operações de crédito (média anual) para pessoas jurídicas. EOB = Excedente operacional bruto (renda das empresas). IBGE, Contas Nacionais.

Dívida total

InadimplênciaTaxa de

inadimplênciaDívida, índice 2002 = 100)

Inadimplência, índice

2002 = 100

Dívida PJ / EOB

Ativos totais 50 maiores bancos

/ Ativos totais das 500 maiores

empresas

2002 233.039 7.830 3,4 100 100 26,0 0,99

2003 215.270 6.477 3,0 92 83 22,2 1,05

2004 225.110 5.982 2,7 97 76 21,7 0,97

2005 244.155 6.267 2,6 105 80 22,8 1,09

2006 274.571 9.429 3,4 118 120 24,2 1,17

2007 320.194 12.212 3,8 137 156 26,5 1,35

2008 422.717 13.251 3,1 181 169 33,7 1,45

2009 461.858 25.846 5,6 198 330 36,0 1,75

2010 480.528 28.458 5,9 206 363 34,0 1,74

2011 534.110 34.938 6,5 229 446 36,7 1,78

2012 593.961 41.179 6,9 255 526 40,3 -

excedente econômico do setor produtivo para o setor financeiro. A relação entre

os ativos totais dos 50 maiores bancos e os ativos totais das 500 maiores empresas

aumenta continuamente de 0,97 em 2004 para 1,78 em 2011. Na realidade,

trata-se, aqui, do fenômeno da dominação financeira que é marcante no Brasil.3

2. Famílias

O Brasil Negativado inclui não somente as empresas como também as famílias. É

neste ponto que se verifica a mais forte expressão do legado negativo das políticas

econômicas, inclusive, com forte impacto social.

A dívida das pessoas físicas aumentou de R$ 113 bilhões em 2002 para US$ 545

bilhões em 2012 (valores constantes de 2012). A dívida per capita (adultos), por seu

turno, cresceu de R$ 1.026,00 em 2002 para R$ 3.457,00 em 2012; ou seja, 3,4 vezes

maior (Tabela 2). O extraordinário aumento do endividamento é evidente: a razão

dívida per capita / salário médio subiu de 5,1% em 2002 para 16,6% em 2012; e, neste

mesmo período, a razão dívida total das pessoas físicas / renda total do trabalhador

cresceu de 12,1% para 29,2%.

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outubro de 2012 / março de 2013

Tabela 2 - Dívida das pessoas físicas (PF) – indicadores: 2002-2012 (valor em R$ milhões, valor constante 2012; coeficientes em %)

Fonte:Banco Central e IBGE. Elaboração do autor. Notas: O deflator é o IPCA. O per capita refere-se à população adulta. Salário médio: Rendimento médio nominal habitual principal, média das regiões metropolitanas. IBGE, Pesquisa Mensal de Emprego. Renda do trabalhador é a soma dos salários e do rendimento misto bruto. Dados para 2009-2012 são estimativas que se baseiam na relação média constante entre estas remunerações e o PIB (média 2008-09 = 42,1%). IBGE, Contas Nacionais. Taxa de inadimplência: proporção percentual do valor das operações de crédito para pessoas físicas (PF) que têm atrasos superiores a 90 dias.

Dívida PFDívida

per capita (R$)

Dívida PF per capita

/ Salário médio

Dívida PF / Renda do

trabalhador

Atraso total

Inadimplência per capita

(R$)

Inadimplência per capita

Taxa de

inadim-

plência

2002 133.350 1.026 5,1 12,1 8.494 65 100 6,4

2003 133.921 1.011 5,4 11,7 8.409 63 97 6,3

2004 152.298 1.128 6,2 12,9 7.887 58 89 5,2

2005 196.720 1.429 7,8 15,7 9.002 65 100 4,6

2006 245.820 1.751 9,3 18,1 13.711 98 149 5,6

2007 289.624 2.023 10,5 19,8 15.301 107 164 5,3

2008 329.677 2.259 11,4 20,9 17.708 121 186 5,4

2009 359.687 2.417 11,9 21,9 21.444 144 220 6,0

2010 420.942 2.775 13,5 23,5 19.019 125 192 4,5

2011 498.172 3.221 15,2 27,0 24.007 155 237 4,8

2012 545.221 3.457 16,6 29,2 33.881 215 329 6,2

Tabela 3 -Inadimplência de pessoas físicas: 2002-2012 (R$ milhões, constante 2012)

Fonte: Banco Central. Elaboração do autor. Notas: Crédito pessoal inclui crédito consignado. O item “outras operações” inclui: financiamento imobiliário, cartão de crédito (rotativo e parcelado), adiantamento a depositantes, renegociação de dívidas, desconto de cheques e de recebíveis. Cartão de crédito (rotativo e parcelado) e financiamento imobiliário responderam por 60% e 30%, respectivamente, do valor total de “Outras operações” em 2012. Para este tipo aplicou-se a mesma taxa média de inadimplência dos 4 tipos de operações para os quais o Banco Central divulga dados.

Cheque especial

Crédito pessoalAquisição de

veículosAquisição de outros bens

Outras operações

TotalValor total, índice

2002 = 100

2002 1.401 3.750 1.376 671 1.295 8.494 100

2003 1.161 3.454 1.498 904 1.392 8.409 99

2004 983 3.533 1.393 847 1.132 7.887 93

2005 956 4.473 1.201 1.131 1.241 9.002 106

2006 1.488 6.298 2.468 1.559 1.899 13.711 161

2007 1.733 6.549 3.045 1.810 2.164 15.301 180

2008 1.782 7.729 3.805 1.974 2.417 17.708 209

2009 2.306 9.602 5.043 1.605 2.887 21.444 253

2010 1.924 9.211 4.480 1.072 2.333 19.019 224

2011 1.933 11.412 6.559 1.218 2.885 24.007 283

2012 2.453 15.412 10.491 1.265 4.260 33.881 399

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4 Trata-se do rendimento médio real habitual - pessoas ocupadas - RMs - calculado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, Pesquisa Mensal de Emprego (IBGE/PME). O rendimento médio real efetivo - pessoas ocupadas - RMs – cresceu 11,2% em 2002-12. 5 Naturalmente, há redundância nestas estimativas visto que a mesma pessoa pode estar inadimplente em diferentes tipos de operações de crédito. Não se pretende maior rigor com estas estimativas e, sim, destacar o aumento da gravidade do problema de endividamento das famílias. A convicção do autor é que os dados subestimam significativamente o número de pessoas efetivamente “negativadas”.

O resultado não poderia ser outro: aumento extraordinário da inadimplência. De fato,

o valor total da inadimplência aumentou de R$ 8,5 bilhões em 2002 para R$ 33,9 bilhões

em 2012; ou seja, quintuplicou em 10 anos. A inadimplência per capita (adultos) aumenta

3,3 vezes. Neste ponto vale destacar que o salário médio real nas regiões metropolitanas

aumenta somente 10% no período 2002-12.4

Os dados do Banco Central mostram que a taxa média de inadimplência manteve-

se relativamente estável (5,5%) ao longo de 10 anos. Entretanto, vale ressaltar que

há aumento extraordinário do valor total da inadimplência (4 vezes em 2002-2012)

(Tabela 3). Os maiores aumentos de inadimplência são em operações de crédito pessoal

(inclusive, crédito consignado) e aquisição de veículos.

No que se refere ao número de pessoas negativadas, estimativas preliminares

indicam que o número total aumenta 3 vezes em 10 anos, de 2,8 milhões em 2002 para

8,6 milhões em 2012 (Tabela 4).5 Portanto, trata-se de aproximadamente 6 milhões

a mais de pessoas negativadas. Isto resulta de um conjunto de fatores: oportunismo

político-eleitoral (2009-11); política de expansão absurda da oferta de crédito; taxas

de juros também absurdas; baixo crescimento do salário real; enormes necessidades

da população; baixo nível de educação; inoperância fiscalizadora do Banco Central;

e práticas de abuso do poder econômico por parte dos bancos. O resultado é que o

número de brasileiros que formam o “exército de negativados” ao longo dos últimos

anos é maior do que a população de dezenas de países.

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outubro de 2012 / março de 2013

Tabela 4 Inadimplência de pessoas físicas - Estimativa do número de pessoas (em mil): 2002-2012

Fonte: Banco Central. Elaboração do autor. Notas: A estimativa do número de pessoas inadimplentes supõe os seguintes valores médios das operações de crédito: cheque especial = R$ 3.000,00; crédito pessoal - R$ 4.000,00; aquisição de veículos = R$ 20.000,00; aquisição de outros bens = R$ 1.000,00; outras operações = R$ 2.000,00, em valores constantes de 2012, e iguais em todos anos do período. Vale notar que o salário médio real nas regiões metropolitanas aumentou somente 10% no período 2002-2012. Portanto, é razoável a hipótese de manutenção do nível médio de endividamento ao longo deste período.

Cheque especial

Crédito pessoalAquisição de

veículosAquisição de outros bens

Outras operações

Total

Número de pessoas inadim-plentes, índice

2002 = 100

2002 467 938 69 671 648 2.792 100

2003 387 864 75 904 696 2.925 105

2004 328 883 70 847 566 2.693 96

2005 319 1.118 60 1.131 620 3.248 116

2006 496 1.574 123 1.559 950 4.702 168

2007 578 1.637 152 1.810 1.082 5.259 188

2008 594 1.932 190 1.974 1.209 5.900 211

2009 769 2.400 252 1.605 1.444 6.470 232

2010 641 2.303 224 1.072 1.167 5.406 194

2011 644 2.853 328 1.218 1.442 6.486 232

2012 818 3.853 525 1.265 2.130 8.590 308

3. “Nova classe média” negativada

As questões da expansão do crédito e da mobilidade social têm estado

associadas ao surgimento de uma “nova classe média”.

Tabela 5 - Fragilidade social, pobreza e carências da “nova classe média” no Brasil: Percentual dos domicílios, 2008-2009

Fonte: Dados do IBGE, Pesquisa de Orçamento Familiar, 2008-09. Uchoa e Kerstenetzky (2012) Tabelas 6 e 7. Notas: Renda domiciliar total, com valores em R$ constantes maio 2011. “Nova classe média”: de R$ 1.200 até R$ 5.174,00; “nova classe média” baixa: de R$ 1.200 até R$ 2.525,00. (nd) não disponível.

Critérios"nova classe

média" (a)

"nova classe média" baixa

(b)

não tem cartão de

crédito65,0 72,9

não tem cheque

especial82,9 90,5

não tem plano de

saúde71,4 80,8

não tem educação

superior71,4 97,1

só tem ensino

fundamental53,2 nd

analfabetos 9,1 nd

domicílios com

apenas 1 ou

nenhum banheiro

75,1 84,3

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Na realidade, a associação de uma classe C de rendimentos com a classe

média é certamente abusiva visto que totalmente desvinculada de qualquer

categorização sociologicamente séria de macroposições de classes. De fato,

os estratos de renda considerados como “nova classe média” estão fortemente

marcados por fragilidade social e características (pobreza e carências) que os

colocam muito distantes de qualquer categoria sociologicamente consistente de

classe média. Na Tabela 5 constata-se, por exemplo, que no conjunto dos 31,5

milhões de domicílios da “nova classe média”, 82,9% não tem cheque especial,

65,0% não tem cartão de crédito, 75,1% e 71,4% não tem plano de saúde nem

educação superior, e 75,1% dos domicílios conta com apenas 1 ou nenhum

banheiro. E mais: 9,1% dos chefes de domicílios são analfabetos!

A fragilidade social e as carências são particularmente agudas no grupo da

“nova classe média” baixa (renda domiciliar total entre R$ 1.200 e R$ 2.525,00).

Para ilustrar, 90,5% não têm cheque especial e 97,1% não têm curso superior.

Na realidade, estudos sociológicos mostram claramente a verdadeira e

pequena importância relativa da classe média no Brasil (Santos, 2002). Como

mostra o Gráfico 1, a classe média assalariada corresponde a aproximadamente

5% da população brasileira. A pequena burguesia e a classe capitalista são

23,4% e 2,4%, respectivamente. O restante (aproximadamente 60%) é a classe

trabalhadora. Portanto, malabarismos estatísticos e abusos conceituais que

informam uma “nova classe média” devem ser descartados.

Fonte e notas: Santos (2002), tabela 2.6 (última coluna), p.117. Dados referem-se a 1996. (*) Classe trabalhadora outros inclui: auto-emprego voluntário, trabalhador doméstico e trabalhador excedente.

Gráfico 1 -Distribuição das macroposições de classe das pessoas de referência do domicílio (%)

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outubro de 2012 / março de 2013

4. Síntese

Nestes primeiros anos do século XXI a evidência é conclusiva: fraco desempenho

da economia brasileira (investimento e renda); números negativos das contas

externas e das contas públicas; e crescente endividamento das empresas e

das famílias (Carcanholo, 2010; Filgueiras et al, 2010; Gonçalves, 2013). O Brasil

Negativado abarca o país, o governo, as empresas e as famílias. Este texto trata

do endividamento e da inadimplência das empresas e das famílias. Em relação às

empresas, todos os indicadores mostram tendência de aumento extraordinário

do endividamento e da inadimplência.

No que se refere às famílias, a evidência também é clara: extraordinário

aumento, medido em milhões, de pessoas endividadas e inadimplentes. Este

fenômeno resulta de um conjunto de fatores: oportunismo político-eleitoral;

política de expansão absurda da oferta de crédito; taxas de juros também

absurdas; baixo crescimento do salário real; enormes necessidades da população;

baixo nível de educação; inoperância fiscalizadora do Banco Central; e práticas de

abuso do poder econômico por parte dos bancos. O resultado é que o número de

brasileiros que entraram para o “exército de negativados” ao longo dos últimos

anos é maior do que a população de dezenas de países. Portanto, não parece

ser exagero considerar este grave problema como verdadeiro flagelo social que

gera enorme perda de bem-estar na população mais carente e, inclusive, tornam

ineficazes algumas políticas de expansão do consumo doméstico.

A mobilidade social via “nova classe média” é uma ficção. Os estratos de renda

incluídos nesta categoria estão fortemente marcados por fragilidade social e

características (pobreza e carências) que os colocam muito distantes de qualquer

categoria sociologicamente consistente de classe média. A classe média

assalariada ainda é relativamente pequena no país. Para aumentar ainda mais a

fragilidade social, o Brasil negativado abarca cada vez mais as famílias. Além de

ser forte entrave à expansão da economia, a negatividade das famílias implica

ainda maior esgarçamento do tecido social. Portanto, legado evidentemente

negativo das políticas econômicas dos últimos anos.

Referências bibliográficas

BOSCHETTI, Ivanete et al. Capitalismo em Crise. Política Social e Direitos. São Paulo: Editora

Cortez, 2010.

CARCANHOLO, Marcelo. Inserção externa e vulnerabilidade da economia brasileira no

governo Lula. In: CORECON-RJ. Os Anos Lula. Contribuições para um Balanço Crítico 2003-2010.

Rio de Janeiro: Editora Garamond, p. 109-132, 2010.a.

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CORECON-RJ. Os Anos Lula. Contribuições para um Balanço Crítico 2003-2010. Rio de

Janeiro: Editora Garamond, 2010.

DEDECCA, Cláudio S. A redução da desigualdade no Brasil: uma estratégia complexa. In:

IPEA. Desigualdade da Renda. Uma Análise da Queda Recente. Brasília: IPEA, p. 299-330, 2011.

DEDECCA, Cláudio S. Nova classe média: não a temos, mas poderemos tê-la. Rio de Janeiro,

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DELGADO, Guilherme. Desenvolvimento, dependência e distribuição de renda. Rádio

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FILGUEIRAS, Luiz et al. Modelo Liberal Periférico e bloco de poder: política e dinâmica

macroeconômica nos governos Lula. In: CORECON-RJ. Os Anos Lula. Contribuições para um

Balanço Crítico 2003-2010. Rio de Janeiro: Editora Garamond, p. 35-70, 2010.

FILGUEIRAS, Luiz; GONÇALVES, Reinaldo. A Economia Política do Governo Lula. Rio de

Janeiro: Ed. Contraponto, 2007.

GONÇALVES, Reinaldo. A dominação do capital financeiro no Brasil. Revista da Sociedade

Brasileira de Economia Política, No. 19, p. 25-43, 2006.

GONÇALVES, Reinaldo. Governo Lula e o nacional-desenvolvimentismo às avessas. Revista

da Sociedade Brasileira de Economia Política, São Paulo, No. 31, p. 5-30, fevereiro 2012.

GONÇALVES, Reinaldo. Desenvolvimento às Avessas. Verdade, má-fé e ilusão no atual

modelo brasileiro de desenvolvimento. Rio de Janeiro: LTC, 2013.

PINTO, Eduardo C. Bloco no poder e Governo Lula: Grupos econômicos, política econômica

e novo eixo sino-americano. Tese de Doutorado, Instituto de Economia, UFEJ, 2010.

SALVADOR, Evilásio et al. Financeirização, Fundo Público e Política Social. São Paulo: Cortez,

2012.

SANTOS, José Alcides F. Estrutura de Posições de Classe no Brasil. Mapeamento, mudanças

e efeitos na renda. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2002

TEIXEIRA, Gerson. Agravamento do quadro de concentração da terra no Brasil? Boletim

DATALUTA, julho 2011.

UCHÔA, Christiane; KERSTENETZKY, Celia. É a “nova classe média” média. Niterói:

Universidade Federal Fluminense. Centro de Estudos sobre Desigualdade e Desenvolvimento.

Texto para Discussão No. 66, outubro 2012.

Reinaldo Gonçalves [email protected], professor titular do Instituto de Economia da Universidade

Federal do Rio de Janeiro”.

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outubro de 2012 / março de 2013

ArtigoEstagflação e as perspectivas

para 2013

José Luiz Pagnussat

O crescimento do Produto Interno Bruto brasileiro em 2012 foi de apenas 0,9%, fato que

frustrou todas as previsões divulgadas no decorrer do ano. A estagnação se iniciou no segundo

semestre de 2011 e se manteve por todo o ano de 2012, apesar do esforço do governo no sentido

de reverter o pessimismo do setor produtivo, com medidas de incentivo ao investimento e de

proteção aos setores em dificuldades.

Com a economia estagnada e a retomada da inflação configurou-se um quadro de

estagflação no Brasil. A partir de junho de 2012, a inflação acumulada de 12 meses apresentou

uma trajetória ascendente, fechou o ano em 5,84% e superou o teto da meta em março de

2013, quando atingiu 6,59%.

As contradições da economia brasileira se revelam ainda em outros indicadores. No

mercado de trabalho o Brasil vem batendo recordes de emprego, apesar da estagnação. O

desemprego fechou o ano de 2012 em 5,5%, o menor dos últimos 30 anos e um dos menores

da história. As vendas no varejo mantêm trajetória de acelerado crescimento, fecharam

2012 com crescimento de 8,4%. A ascensão das classes C, D e E é expressiva e a redução das

desigualdades de renda não tem antecedentes. Por outro lado, a credibilidade do país continua

elevada, com o Investimento Estrangeiro Direto (IED) se mantendo acima de US$ 65 bilhões (foi

de US$ 66,7 bilhões em 2011 e US$ 65,3 bilhões em 2012).

Este artigo pretende sintetizar os principais argumentos do debate sobre as razões da

estagflação e das contradições da economia brasileira e apresentar alguns dados ilustrativos

do setor produtivo e da inflação.

O debate sobre a estagflação

O debate sobre as causas da estagflação e das contradições da economia brasileira indica

uma multiplicidade de fatores.

O economista Armando Castelar Pinheiro, em artigo publicado no jornal Valor Econômico

no dia 05/04/2013, tenta agrupar as explicações em duas visões. A primeira, que ele chama de

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“governamental”, mas que também se alinha à interpretação de muitos analistas de mercado;

indica quatro fatores para o baixo desempenho da economia em 2012:

“A quebra da safra agrícola, por questões climáticas; a contração em 36% na produção de ônibus

e caminhões, reflexo de mudanças regulatórias; o ajuste de estoques na indústria, que fez a produção

cair, enquanto as vendas iam bem; e a crise internacional, em especial na Europa, que levou à retração

dos investimentos.”

Nessa análise, o autor sintetiza que a inflação se manteve alta em 2012 por conta do choque

de preços agrícolas, causado pela quebra da safra de grãos brasileira e americana, em função

da seca; da forte alta do salário mínimo; e da desvalorização do real. Para essa visão, em 2013, a

inflação recua naturalmente com a supersafra brasileira e a tendência de boa safra americana; a

alta mais moderada do salário mínimo; e o câmbio estável; além das medidas do governo para

redução das tarifas de energia elétrica e a redução dos impostos da cesta básica.

Na visão «alternativa», sintetizada por Pinheiro, as causas do fraco desempenho do PIB em

2012 são domésticas. O argumento é que o crescente intervencionismo estatal gera incerteza

e explica a forte contração do investimento. Ele lista ainda as “mudanças regulatórias” e “po-

líticas de controle de preços”; “o stop and go da política cambial”; e acrescenta

que “pesaram a maior tolerância com a inflação, a perda de transparência da

política fiscal e a pressão sobre os bancos privados”. Destaca ainda a “dificuldade

em deslanchar o investimento governamental e as concessões na infraestru-

tura”. Essa visão é pessimista quanto à reativação da economia e a redução da

inflação.

Além desses fatores, alinhados pelo autor, pode-se destacar também o

debate sobre os problemas metodológicos no cálculo do PIB, que estaria sendo

subestimado por erros no cálculo do produto do setor financeiro e por não

captar a real participação do setor serviços na economia. Alguns economistas

estimam que esta subestimativa do produto poderia elevar o crescimento

do PIB de 2012 para até 2,5%. O argumento é que é inconsistente o impacto

negativo da redução dos juros no produto do setor financeiro e, por outro lado,

o cálculo do PIB não estaria captando o dinamismo do setor de serviços com as

‘‘ ‘‘As contradições da economia brasileira se revelam ainda em outros indicadores. No

mercado de trabalho o Brasil vem batendo recordes de emprego, apesar da estagnação.

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outubro de 2012 / março de 2013

mudanças estruturais da economia brasileira e a ascensão das classes de renda

mais baixas a um novo padrão de consumo de serviços.

Outro grupo de analistas dá destaque para as limitações de fatores de

produção, com a economia brasileira se aproximando do pleno emprego da

mão-de-obra, além das limitações impostas pela precariedade da infraestrutura

produtiva, em especial as más condições das estradas, as filas nos portos e os

apagões sucessivos dentre outros gargalos de infraestrutura.

Outra explicação é que o Brasil estaria enfrentando o problema da

“doença holandesa”, dado que o aumento expressivo da demanda externa por

commodities, como o minério de ferro e grãos, associado à chamada “guerra

cambial”, resultante de políticas monetárias expansionistas dos países ricos,

implicam entradas maciças de divisas no País, tanto pelas exportações dos

produtos como pela entrada de capital financeiro produtivo e especulativo. Isso

valoriza demais o câmbio e afeta negativamente os setores de manufaturados.

Sem esgotar a análise, todos os argumentos apresentados têm sua

racionalidade, entretanto é necessário um olhar mais cuidadoso nos dados da

economia para entender o fenômeno. Comecemos pela análise da inflação.

Inflação resistente

A inflação se mostra resistente apesar da retração da demanda e estagnação

da economia. O IPCA de janeiro de 2013 (0,86%) foi o mais alto desde dezembro

de 2004, mas em fevereiro e março observa-se uma tendência de redução

dos índices mensais. Entretanto, a inflação dos alimentos continua elevada,

fechou 2012 em 9,86% e, no primeiro trimestre de 2013, já supera a meta do

ano: alcançou 4,64% (13,48% em 12 meses) e contribuiu com 57% da inflação

do trimestre. Os problemas climáticos também causaram impacto à produção

do início do ano, em especial a de hortaliças, tubérculos e feijão. O cenário

da inflação dos alimentos, entretanto, é de acentuada queda no decorrer do

ano, com a normalização do abastecimento de hortigranjeiros e a entrada da

supersafra, já em início de colheita e com estimativa de crescimento de 12%

(grãos).

O setor de serviços tem sido outro vilão da inflação. O grupo Despesas

Pessoais subiu 10,17% em 2012 e 2,67% no primeiro trimestre de 2013.

A inflação dos serviços e despesas pessoais resulta do crescimento da

demanda, dado o crescimento da renda das classes C e D, mas também

decorre do repasse dos custos da mão-de-obra para os preços. Este

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índice foi fortemente influenciado pelo aumento real do salário mínimo

em 2012 e expansão do crédito, o que não deve ocorrer em 2013.

No primeiro trimestre de 2013 o principal vilão da inflação foi o grupo

Educação (6,37%), em função dos reajustes das mensalidades e da necessidade

de aquisição de material escolar para o início das aulas. Por outro lado, a

habitação teve deflação (-2,08), revelando a tendência de ajustes nos preços

do setor.

Os dados indicam que a persistência da inflação resulta em boa parte

dos choques de oferta adversos, disseminados pela ainda elevada indexação,

formal e informal, de preços, salários e contratos.

Em síntese, a inflação resulta de vários fatores: tem uma componente

inercial (setores da economia ainda indexados); choque de oferta (problemas

climáticos na produção agropecuária); elevação do câmbio; expectativas; mas

também tem uma forte componente de demanda (expansão do crédito, salário

mínimo, etc).

O presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, desagregou as

contribuições para a inflação observada em 2012 (apresentação em abril de

2013 na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado Federal), destacando

que a Inflação livre representou 49,7% do IPCA obtido de 5,84%; a inflação

administrada, 13,5%; repasse cambial, 10,2%; inércia, 5,8%; choque de oferta,

12,5%; e expectativa, 8,3%.

A multiplicidade de fatores que afetam a inflação reduz a eficácia dos

instrumentos que o governo vem utilizando para segurar a escalada dos preços.

A elevação dos juros não neutraliza todas as causas da inflação (pouco eficaz),

sacrifica o crescimento e eleva o custo da dívida pública (pouco eficiente). O

controle do câmbio diminui a inflação pelo crescimento das importações e

redução das exportações, impõe sacrifícios à indústria e traz riscos cambiais

no médio prazo (pouco eficiente e pouco eficaz). A redução dos gastos não

controla a inflação, dado que o orçamento discricionário é pequeno, e se resume

basicamente aos investimentos do governo. A redução dos investimentos em

infraestrutura afeta as expectativas do setor produtivo e amplia os gargalos da

economia (pouco eficiente e pouco eficaz).

O economista Bráulio Borges, adepto dessa visão, em artigo publicado tam-

bém no Jornal Valor Econômico, em 08/02/2013, defende que para analisar a

dinâmica inflacionária brasileira é adequado expurgar os choque de oferta e

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outubro de 2012 / março de 2013

observar o núcleo de inflação. Simula um exercício e constata que essa me-

dida de núcleo indica inflação, em 2012, próxima da meta (4,7%).

Para o autor, “caso o Brasil queira reduzir sua inflação para algo entre 3%

e 4% de forma sustentável, a utilização apenas da política monetária pode

ser contraproducente”. Ressalta a baixa eficácia da política de juros e o custo

elevado de um crescimento econômico muito baixo. Defende a redução da

indexação e propõe: o fim dos reajustes do salário mínimo acima da inflação;

a “desindexação dos contratos de índices como o IGP-M”; e “seguir mudando

a sistemática de reajustes de vários preços monitorados (alguns deles ainda

são indexados aos IGPs e não repassam parte dos ganhos de produtividade

para os consumidores)”. Defende ainda o aprofundamento de “medidas que

reduzam os custos de produção (como desoneração de impostos ou encargos

e melhoria da infraestrutura)”.

O fato é que a inflação brasileira não reflete apenas a temperatura da

economia, mas também os choques de oferta, a indexação e outros fatores.

Baixo crescimento econômico

O Índice de Atividade Econômica do Banco Central (IBC-Br) proxy do PIB mensal,

iniciou o ano com crescimento de 1,43% em janeiro e recuo de 0,52% em fevereiro.

A produção industrial teve movimento parecido: cresceu em janeiro 2,5% e

caiu em fevereiro 2,5%. O destaque em janeiro foi a produção de bens de capital,

que registrou alta expressiva (8,2%), refletiu a alta de 5,2% do refino de petróleo

e produção de álcool e de 5,7% da fabricação de máquinas e equipamentos, com

destaque para a demanda por caminhões e ônibus. Esse segmento cresceu cerca de

23% no mês.

O fraco desempenho da produção industrial e do comércio varejista em fevereiro

contribuiu para o recuo do IBC-Br, frustrando o início promissor do ano que parecia

reagir às medidas do governo de estímulo ao investimento.

O investimento (formação bruta de capital fixo) foi o grande vilão de 2012, com

queda de 4,0%. Pela ótica da oferta, a produção agropecuária (-2,3%) foi o pior

desempenho de 2013, explicado pelos problemas climáticos. Mas as projeções para

2013 são bastante favoráveis, com elevado crescimento do setor, em especial na

produção de grãos (12,0%). A retomada dos investimentos é determinante para o

crescimento sustentável da economia.

A retração da indústria em fevereiro ocorreu na maior parte dos segmentos

analisados pela Pesquisa Industrial Mensal (PIM), do IBGE. A variação negativa

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ocorreu em 15 das 27 atividades abrangidas pela pesquisa. O destaque negativo foi

a queda na produção de veículos automotores (-9,1%), eliminando a alta observada

em janeiro (6,2%). Outro destaque negativo foi a queda de produtos farmacêuticos

(-10,8%) e de refino de petróleo e produção de álcool (-5,8%). Os destaques positivos

foram a produção de “outros equipamentos de transporte” (9,6%) e de máquinas e

equipamentos (1,7%). O desempenho da indústria de máquinas e equipamentos, que

acumula alta de 9,2% no primeiro bimestre do ano, é um bom indicador de retomada

dos investimentos, mas observa-se uma concentração na produção para o setor

agrícola, com a supersafra em início de colheita.

O Gráfico 1 ilustra a volatilidade da produção industrial, que alterna meses de

retomada do crescimento com meses de acentuada queda.

Gráfico 1 - Produção industrial: variação em relação ao mês imediatamente anterior (dados dessazonalizados) - %

Fonte: Pesquisa Industrial Mensal - PIM/IBGE

O gráfico 2 apresenta dados dessazonalizados trimestrais do PIB, fornecidos

pelo IBGE. Confirmam a estagnação da economia nos últimos seis trimestres e

revelam a lenta retomada do crescimento a partir do segundo trimestre de 2012.

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Gráfico 2 - PIB a preços de mercado - crescimento real em relação ao trimestre anterior (dados dessazonalizados) - %

Fonte: IBGE

Setor Externo

O saldo comercial brasileiro de 2012 teve queda de 34,8%, passando de US$ 29,8

para US$ 19,4 bilhões. As exportações caíram 5,3%, resultado da queda dos preços

(-4,9) e redução da quantidade exportada (-0,3). As importações também caíram, mas

em menor proporção (-1,4%). O principal vilão foi a exportação de minério de ferro,

que caiu de 41,8 para 31,0 bilhões de dólares (- 25,9%) e explica a maior parte do

recuo do saldo comercial. Além disso, houve queda na exportação de café (-28,5%,

passou de US$ 8,0 para US$ 5,7 bilhões) e açúcar (-13,2%).

O quadro externo brasileiro piorou no primeiro trimestre de 2013. A balança

comercial apresentou déficit de US$ 5,2 bilhões. Em 2012, em igual período, o saldo

comercial era positivo de US$ 2,4 bilhões.

As exportações no primeiro trimestre tiveram queda de 3,1%, e as importações,

crescimento de 6,9%, em relação a igual trimestre de 2012.

O dado positivo foi que o crescimento das importações ocorreu nos setores

de bens de capital (5,4%) e matérias-primas e intermediárias (3,8%), o que indica

reativação da economia, enquanto que os bens de consumo tiveram queda nas

importações (-5,1%). Os combustíveis e lubrificantes foram responsáveis pela maior

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parcela das importações (18,3% do total) e apresentaram elevada alta (29,1%), em

parte resultado do registro atrasado de importações de petróleo e derivados.

Entre os principais produtos de exportação que tiveram queda no primeiro

trimestre, se destacam: petróleo em bruto (-45,1%), soja (grão -21,4% e farelo -7,8%),

café em grão (-17,8%) e algodão em bruto (-7,8%). Registra-se, por outro lado, o

bom desempenho no trimestre dos itens minério de ferro (+6,4%), automóveis de

passageiros (+10,4%), carne bovina (+32,7%), carne de frango (+8,8%), açúcar (em

bruto +44,9% e refinado +34,0%) e milho em grão (+437,5%).

O principal mercado dos produtos brasileiros no primeiro trimestre foi a China (US$

7,7 bilhões), que apresentou crescimento moderado de 2,3% em relação ao primeiro

trimestre de 2012; seguido dos Estados Unidos (US$ 5,3 bilhões), Argentina (US$ 4,1

bilhões), Países Baixos (US$ 3,1 bilhões) e Japão (US$ 1,8 bilhão). A maior queda nas

exportações no trimestre foi para o mercado americano (-24,0%), seguido da América

Latina e Caribe (-12,2%) e União Europeia (-11,8).

Estes dados indicam relativo impacto da crise internacional sobre o comércio

exterior brasileiro, mas refletem também o alinhamento de preços de commodities,

que estavam excepcionalmente elevados. O desvio da tendência da balança comercial

observado no primeiro trimestre foi provocado basicamente pelo aumento das

importações de combustíveis e lubrificantes e queda nas exportações de petróleo e

derivados e referem-se a uma distorção temporária, e não tendência. As projeções do

saldo comercial para o ano continuam positivas.

As expectativas de mercado divulgadas no relatório Focus do Banco Central,

no início de abril, projetam o saldo comercial de US$ 11,0 bilhões para o ano. As

projeções do Bradesco, publicadas no final de março, são mais otimistas para o

saldo comercial (US$ 17,4 bilhões) com crescimento das exportações (6,7%) e das

importações (10,8%). Tais projeções indicam melhora do setor externo no ano de

2013, considerando que no acumulado de doze meses (abr/2012 a mar/2013) houve

queda nas exportações (6,8%) e relativa estabilidade das importações (-0,3%), com

o saldo comercial em US$ 11,9 bilhões, queda de 59,2% em relação aos US$ 29,1

bilhões observados nos doze meses anteriores.

As expectativas para o déficit em transações correntes estão entre US$ 66 e 68

bilhões e para o Investimento Estrangeiro Direto (IED) em torno de US$ 60 bilhões.

Isso indica relativa estabilidade nas contas externas.

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Conclusão

A economia brasileira se encontra numa situação típica de estagflação, com baixo

crescimento do PIB nos últimos seis trimestres e inflação resistente e em ascensão no

acumulado de 12 meses.

O fato positivo é que a economia vem reagindo lentamente há três trimestres

e deve manter esta trajetória de ascensão no primeiro trimestre de 2013, com

cenário positivo para o restante do ano. A inflação, que ultrapassou o teto da meta,

também vem indicando reversão e, como foi visto, deve apresentar uma tendência natural

e convergente para o centro da meta. Os choques de oferta que tiveram impacto

negativo na economia têm quadro inverso, com a agricultura colhendo uma

supersafra; o câmbio relativamente estabilizado; os preços internacionais estáveis e

em processo de acomodação; tampouco vai se repetir o aumento real excessivo do

salário mínimo ocorrido em 2012, em razão da fórmula de cálculo do reajuste.

O impacto vindo da crise internacional deve arrefecer com o maior crescimento da

China e dos EUA e a acomodação do quadro europeu. O cenário é de melhoria para

a economia brasileira com o PIB retomando o crescimento próximo do potencial,

apesar da antecipação do período eleitoral.

José Luiz [email protected]

Economista (UCB). Mestre em economia (UnB). Conselheiro do Conse-

lho Regional de Economia do DF. Professor da Enap - Escola Nacional de

Administração Pública e da UDF - Centro Universitário do Distrito Fe-

deral. Ex-presidente do Corecon-DF (1990, 1994 e 2009/10), do Cofecon

(1996) e da ANGE (1999/2001).

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ArtigoÉ viável a implantação do orçamento impositivo no Brasil?

José Matias Pereira

A política e o processo orçamentário no Brasil, traduzido na definição do Plano

Plurianual (PPA), da lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e da Lei Orçamentária

Anual (LOA) ainda se apresenta como um modelo em construção. A sua linguagem

técnica complexa e um caráter procedimental específico dificulta a sua compreensão

e por decorrência gera baixo interesse da sociedade pelo tema. O seu ritual lógico

e sistemático compreendido pelo planejamento, gerência e controle é definido de

forma detalhada na Constituição Federal. Nesse modelo de execução orçamentária,

não se impõe ao governo a obrigatoriedade de executar tudo o que foi definido na

lei orçamentária anual.

Por sua vez, a recente decisão da Comissão de Constituição e Justiça e de

Cidadania da Câmara dos Deputados, que aprovou a admissibilidade da Proposta

de Emenda à Constituição (PEC) no. 565/2006, que torna obrigatória a execução do

Orçamento Geral da União, incluiu o tema como prioritário na agenda política do país.

Como não poderia deixar de ser, acendeu a luz amarela nas relações entre os Poderes

Executivo e Legislativo. O fator motivador dessa iniciativa do parlamento em propor o

orçamento impositivo tem sua origem na seletividade imposta pelo poder executivo

para a execução das emendas dos parlamentares inseridas na lei orçamentária anual.

É válido ressaltar que, no mundo contemporâneo, poucos são os países, com

destaque para os Estados Unidos, que possuem parlamentos com estrutura e

condições de implantar o orçamento impositivo. Em que pese o orçamento brasileiro

não ser impositivo, a maior parte da LOA é executada de forma obrigatória – como, por

exemplo, as despesas com pessoal, benefícios previdenciários, transferências a

estados e municípios, pagamento de juros e amortização da dívida pública, além da

maior parcela das despesas de custeio. Ficam pendentes nesse universo uma parte

do custeio, e os investimentos públicos, nos quais prevalece uma discricionariedade

relativa, visto que inúmeros projetos dependem de investimentos executados ao

longo de vários anos.

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Diante desse cenário, pode-se formular a seguinte pergunta: é viável a

implantação de um modelo de orçamento impositivo no Brasil? É preciso lembrar

que, além das complexas questões conceituais que envolvem a aprovação do

orçamento impositivo, é necessário ressaltar a dimensão política que envolve disputa

de poder. O orçamento não é um processo para si mesmo, mas é parte de arranjos

governamentais e institucionais mais amplos (Schick, 1998).

Observa-se que a maioria das propostas em tramitação no parlamento sobre o

orçamento impositivo propõe a implantação de um modelo intermediário entre o

que atualmente está em vigor (o orçamento autorizativo), e o extremo, que obrigaria

o governo a executar integralmente a programação orçamentária definida pelo

Congresso Nacional. Nesse modelo intermediário, a não execução de parte da

programação implicaria a anuência do Congresso.

A aprovação do orçamento impositivo no Brasil apresenta-se como um jogo no

qual haverá ganhadores e perdedores. O deslocamento do eixo do poder em matéria

orçamentária do Poder Executivo para o Legislativo exigiria uma mudança significativa

no capítulo da Constituição que trata das finanças públicas, pois a incorporação

pelo Congresso da responsabilidade pela programação em matéria orçamentária

é uma medida indispensável para garantir o seu cumprimento. Os parlamentares,

especialmente os de oposição e os dissidentes, seriam os grandes beneficiados

dessa alteração, visto que as emendas parlamentares seriam executadas de forma

impositiva, sem levar em consideração a postura e o partido do legislador. Do ponto

de vista político, as decisões, que no modelo atual são adotadas de maneira unilateral

pelo Executivo, passariam a depender de autorização do Legislativo, o que implicaria

mais negociações com o Parlamento e levaria a mais conflitos e mais concessões aos

partidos políticos.

É inegável que a inclusão do debate sobre a implantação do orçamento impositivo

na agenda política do país é salutar, pois irá contribuir para deixar evidente para a

sociedade brasileira a relevância do tema “orçamento público”. Deve-se alertar,

entretanto, que a aprovação do orçamento impositivo, caso conduzida de forma

‘‘ ‘‘

Diante desse cenário, pode-se formular a seguinte pergunta: é viável a implantação de um modelo de

orçamento impositivo no Brasil?

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açodada, se apresenta como um risco potencial que poderá afetar a governança

pública, e em última instância, levar a administração pública a uma semiparalisia.

É oportuno destacar, por fim, que a adoção do orçamento impositivo no Brasil não

será uma tarefa fácil, diante das barreiras que precisam ser superadas, notadamente

as reformas política e eleitoral, que deveriam preceder sua implantação. O excessivo

número de legendas políticas com representação no Congresso, a questão de

financiamento das campanhas políticas, entre outros, são obstáculos que necessitam

ser levados em consideração nesse debate. Fica evidente, diante desses aspectos

apontados, que o exame da viabilidade da implantação do orçamento impositivo,

pelas alterações que irá provocar no funcionamento das instituições e na gestão

pública, merece uma discussão aprofundada junto aos segmentos representativos da

sociedade brasileira.

José Matias Pereira [email protected] e advogado, é professor de administração pública e pesquisador associado do Programa

de Pós-Graduação em Contabilidade da Universidade de Brasília. É doutor em Ciências Políticas (UCM -

Espanha) e pós-doutor em Administração pela FEA/USP. Autor, entre outros, Finanças Públicas: Foco na

política fiscal, no planejamento e orçamento público, 6. ed., Atlas, 2012. 72

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1- (Agente de Regulação da ANTAQ, 2009) Com relação à aplicação dos conceitos

básicos de microeconomia, julgue os itens subsequentes.

I- O gráfico que relaciona a demanda de determinado bem com o preço de outro bem, que

seja substituto ou concorrente do primeiro, apresenta uma inclinação crescente.

II- Um servidor recém-nomeado da ANTAQ foi testado pelo seu supervisor, que lhe pediu

que desenhasse um gráfico da curva de oferta de transportes aquaviários, demonstrando

uma elevação na quantidade ofertada decorrente do aumento de preço desse tipo de

serviço. Nessa situação hipotética, para atender corretamente à solicitação recebida, o

referido servidor deve apresentar um gráfico com deslocamento da curva de oferta para

a direita.

Comentários:

I- Se aumentar o preço de um determinado bem, digamos o da maçã, sua quantidade

procurada deve, pela lei da procura, normalmente cair. Em consequência deve aumentar a

demanda por pera, se considerarmos que maçã e pera são bens substitutos ou concorrentes.

A reta que representa o preço da maçã (aumento) e a demanda por pera (também aumento)

terá, portanto, inclinação positiva.

Resposta: Verdadeiro.

II- A elevação no preço do serviço de transporte aquaviário deve, pela lei da oferta,

normalmente elevar a quantidade ofertada. A reta que representa o preço do transporte e a

correspondente quantidade ofertada reúne todos os pontos dessa relação e apresenta uma

relação positiva. O deslocamento da curva de oferta somente se dá quando varia algum

fator exógeno, que não o preço, como por exemplo um aumento de custos que faça com

que a mesma quantidade ofertada de transporte determine um preço maior, o que faria

deslocar a curva de oferta para cima.

Resposta: Falso.

QUESTÕES DE CONCURSOS DE ECONOMIA

Seleção das questões e comentários: Econ. Hélio Socolik

concuros

2- (Analista do Banco Central do Brasil, 2010) Em um mundo de apenas dois bens, as

preferências de um consumidor são representadas pela função utilidade U (x,y) = x0,6

y0,4. Se o preço do bem x for 5, o do bem y for 10 e a renda do consumidor for 500, em

equilíbrio, esse consumidor

a) gastará metade de sua renda com o bem x.

b) gastará 200 unidades de sua renda com o bem x.

c) gastará 100 unidades de sua renda com o bem y.

d) comprará 60 unidades do bem x.

e) comprará 40 unidades do bem y.

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Comentários:

Em equilíbrio o consumidor vai adquirir quantidades dos dois bens no ponto em que a relação

entre as utilidades parciais for igual à relação dos preços dos dois bens. Em termos matemáticos,

temos Umgx / Umg = px / py. Tem-se que Umgx é a derivada parcial de U em relação a x, Umgy

é a derivada parcial de U em relação a y e px e py os preços. Fazendo os cálculos e simplificando

a expressão, chega-se à relação y = 3x. A outra expressão que devemos usar é a da restrição

orçamentária do consumidor. A questão diz que a renda do consumidor é igual a 500. Como o

consumidor utiliza a renda na aquisição dos dois bens e dados os preços px = 5 e py = 10, tem-

se que 500 = 5x + 10y. Temos, então, duas equações com as incógnitas x e y. Daí que achamos

as quantidades x = 60 e y = 20. Examinando cada opção da questão, temos que a despesa com

o bem x é igual a px.x = 5.60 = 300, que elimina as opções a e b. A despesa com o bem y é igual

a py.y = 10.20 = 200, que elimina a opção c. Como as quantidades são x = 60 e y = 20, a opção

correta é a d.

Resposta: d

3- (Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental, 2009) Em relação aos

conceitos relacionados a uma economia monetária, é incorreto afirmar que:

a) um banco cria meios de pagamentos quando compra bens ou serviços do público pagando

com moeda corrente.

b) os bancos podem alterar o multiplicador bancário alterando os seus recolhimentos

voluntários junto ao Banco Central.

c) alterando os recolhimentos compulsórios, o Banco Central consegue controlar os

coeficientes de comportamento bancário “c” e “d”.

d) o valor do multiplicador da base monetária pode se alterar independente das intenções do

Banco Central.

e) quanto maior o coeficiente “papel moeda em poder do público/M1”, menor será o

multiplicador da base monetária.

Comentários:

A afirmativa incorreta é a c, porque os coeficientes c e d não são controlados pela autoridade

monetária, e sim controlados pelo detentor de meios de pagamento, que escolhe as parcelas

que deve reter sob a forma de papel-moeda (c) ou depósitos à vista nos bancos (d). As demais

estão corretas. Em a, o banco, quando compra bens ou serviços do público, entrega moeda

e adquire um ativo não monetário, aumentando realmente os meios de pagamento. Em b, o

multiplicador bancário realmente se altera porque os recolhimentos voluntários fazem parte

das reservas dos bancos e sua variação interfere com os recursos que os bancos têm à disposição

para emprestar. Em d, alterações nos coeficientes c ou d, de iniciativa do público, alteram o

multiplicador sem interferência da autoridade monetária, pois significam os montantes que

o público deseja manter sob a forma de depósitos nos bancos. E em e, quanto mais o público

retiver papel moeda em seu poder, ou seja, menos realizar depósitos nos bancos, menos

moeda os bancos poderão transformar em empréstimos, reduzindo, portanto, o multiplicador.

Resposta: c.Rev

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Conselho Regional de Economia da 11ª Região-DFSCS Qd. 04, Ed. Embaixador, Sala 202

CEP 70300-907 - Brasília -DF Tels: (61) 3225-9242 / 3223-1429

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