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Aprender AO LONGO DA VIDA Nº9 | NOVEMBRO 2008 | TRIMESTRAL ISSN 1645-9784 4,00 (IVA incluído) A APRENDIZAGEM TEM DE SER FEITA COM GOSTO E MOTIVAÇÃO UM PROJECTO DE APOIO ÁS MULHERES SOBREVIVENTES QUANDO A FOTOGRAFIA ESTÁ AO LADO DO CORAÇÃO ENTREVISTA ANTÓNIO CÂMARA REPORTAGEM VIOLÊNCIA DOMÉSTICA REPORTAGEM Ar.Co NUNCA É TARDE PARA APRENDER

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AprenderAO LONGO DA VIDA

Nº9 | NOVEMBRO 2008 | TRIMESTRAL ISSN 1645-9784

€ 4,00 (IVA incluído)

A APRENDIZAGEMTEM DE SER FEITA COM GOSTOE MOTIVAÇÃO

UM PROJECTO DE APOIO ÁSMULHERES SOBREVIVENTES

QUANDO A FOTOGRAFIAESTÁ AO LADO DO CORAÇÃO

ENTREVISTAANTÓNIO CÂMARA

REPORTAGEMVIOLÊNCIADOMÉSTICA

REPORTAGEMAr.Co

NUNCA É TARDEPARAAPRENDER

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“PROGRAMADOS PARA APRENDER”

É incontornável revisitar Paulo Freire. Se somos “seres programados paraaprender”, condicionados mas não determinados, então nunca é, obvia-mente, tarde para aprender. Não existindo aprendizagem desvinculada da

vida, enquanto há vida há aprendizagem. Como seres humanos não paramos denos educar. Aqui reside, segundo Freire, a nossa vocação para a humanização,para o “ser mais”, uma vez que somos os únicos que no planeta nos sabemosseres inacabados, incompletos. O ideal de educação permanente, ou ao longo davida, funda-se nestes pressupostos, hoje tantas vezes esquecidos. Como Freireescreveu no seu livro Política e Educação, a educação permanente não é simples-mente uma exigência política, ideológica ou económica; é mais radicalmente aconsequência da finitude do ser humano e da consciência que ele tem dessafinitude. É também por esta razão que a educação e a aprendizagem conhecemuma multiplicidade de modalidades, formas e métodos, não podendo ser aprisio-nadas em esquemas reducionistas e de vistas curtas. Segundo o pedagogobrasileiro, aprendemos não apenas pela razão, mas também pela emoção, pelocorpo, pela experiência vivida. E não apenas para o mundo do trabalho, mastambém para a crítica desse mundo e para a sua transformação. Nos tempos quevivemos parece inaceitável que a educação e a aprendizagem “virem as costas”aos problemas do trabalho, da economia e do emprego, o que não significa queaceitem a amputação das suas dimensões ético-políticas, de compreensãocrítica da realidade, de aprofundamento da cidadania democrática. Não podem,por essa razão, adoptar uma posição de mera adaptação, mais ou menospassiva, “de joelhos”, perante os chamados imperativos da economia, das qualifi-cações para o crescimento económico e para o aumento da competitividade.Nem reduzir a educação e a aprendizagem ao longo da vida à formação profissio-nal contínua, por mais relevante que esta seja. Existem outros desafios de grandemagnitude a serem enfrentados pela educação de adultos e ao longo da vida, nopresente e no futuro. Nos mais variados contextos sociais, nas margens dossistemas formais, com menos visibilidade e prestígio social, fora da agenda polí-tica, podemos encontrar, por vezes mais vivo e genuíno, o ideal de educação aolongo de toda a vida, de troca de saberes, intercâmbio de conhecimentos eexperiências, diálogo e discussão dos problemas, e até de intervenção política esocial, como no caso de algumas universidades seniores ou da terceira idade.Iniciativas de educação e aprendizagem orientadas para a convivialidade, asolidariedade humana, a compreensão crítica dos problemas contemporâneos,isto é, para a “procura da sabedoria”.

LLiiccíínniioo LLiimmaa

F IC HA TÉCNIC A

Editor: AAssssoocciiaaççããoo ““OO DDiirreeiittoo ddee AApprreennddeerr”” Director: LLiiccíínniioo LLiimmaa | Director Adjunto: RRuuii SSeegguurroo Coordenador editorial: LLuuiiss LLeeiirriiaaRedacção: AAnnaa SSiillvveeiirraa,, CCrriissttiinnaa PPoorrtteellllaa,, DDaanniieellaa SSiillvveeiirraa ee GGuuiioommaarr BBeelloo MMaarrqquueess..Fotografia: MMiigguueell BBaallttaazzaarr,, PPaauulloo FFiigguueeiirreeddoo | Ilustrações: LLuuiiss MMiigguueell CCaassttrrooColaboraram neste número: AAllbbeerrttoo MMeelloo,, AAnnaa MMaarriiaa CCaanneellaass,, MMaarriiaa EEmmíílliiaa BBrreeddeerrooddee SSaannttooss,, PPaauullaa GGuuiimmaarrããeess ee SSuussaannaa LLaattttkkee..Redacção: Rua do Chão da Feira, Nº11 - 2ºDto. 1100-143 LisboaEdição gráfica: AAtteelliieerr GGrrááffiiccooss àà LLaappaa, Rua S. Domingos à Lapa, Nº6. 1200-835 LisboaImpressão: PPrroovvaa FFiinnaall LLddaa.., Rua do 4 da Infantaria, Nº27, Letra D. 1350-268 Lisboa

APRENDER ao Longo da Vida publicação trimestral da Associação"O Direito de APRENDER" Apartado 30005, 1350-999 Lisboa · Telefone: 969 593 912www.direitodeaprender.com.pt e-mail: [email protected]

N.º reg. título: 124340 | NIF: 506687449 | ISSN 1645-9784 | Dep. Legal 211075/04 | Tiragem: 5000 exemplaresAs opiniões expressas nos textos assinados são da exclusiva responsabilidade dos autores. A reprodução parcial ou total, carece de autorização prévia.

ÍNDICE EDITORIAL

02 APRENDER

ReportagemO Outro lado da Lua 3Entrevista António CâmaraA aprendizagem requer esforço mas tem de ser feita com gosto e motivação 8Dossier Nunca é tarde para aprender 16ReportagemAlargar a sabedoria em tempo de reforma 18Debate: Uma velhice activa portadora de sabedoria 22ReportagemA informática chega aos 80 30Artigos A educação de adultos no séc XXI:Desafios contemporâneos em prospectiva 34Educação de Adultos na Alemanha:Desenvolvimento histórico e desafios actuais 41

Reportagem

Quando a fotografia está

ao lado do coração 48

Livros e Net 54

Notícias 57

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AO LONGO DA VIDA 3

Texto Guiomar Belo Marques # Ilustrações Luís Miguel Castro

Em média, 60 mulheres morrem todos os anos em Portugal na sequência de maus-tratos. Uma emcada três, segundo dados da estrutura de Missão contra a Violência Doméstica, sofre alguma forma deviolência durante a vida. Fenómeno silencioso e silenciado ocorre em todos os estratos sociais, faixasetárias, religiões e etnias. Procurando dar uma resposta positiva junto de mulheres sobreviventes,numa perspectiva de formação informal, o projecto Escalada (Climbing Up), desenvolvido ao abrigo doprograma Sócrates Grundtvig, promoveu a cooperação entre diferentes países da Europa comunitáriae elaborou um Manual que já começou a aplicar.

O OUTRO LADODA LUA

QUEIXAS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA

REPORTAGEM

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4 APRENDER

Atrás de portas fechadas e em segredo,as mulheres são sujeitas a violência porparte dos seus companheiros, estãodemasiado envergonhadas e receosas para odenunciarem e quando o fazem, rarasvezes são levadas a sério.

Amnistia Internacional

A o fim de vários anos (poucosou muitos são sempre de-masiados), uma todavia di-minuta percentagem de

mulheres quotidianamente maltratadaspelos seus companheiros arranja cora-gem e procura ajuda. O medo, que inva-de e se instala nestas mulheres quevivem como caminhando numa cordabamba, é a grande arma dos seus agres-sores. Primeiro, fomentam a inseguran-ça residente nas flutuações de humor,depois, vão reduzindo a sua presa a umfarrapo, sonegando-lhe a auto-estima, aautonomia, a capacidade valorativa,subjugando-a. Confusa e desvalorizadaperante si mesma, primeiro, porque elea manipula nesse sentido, e depois pornão conseguir libertar-se, a mulher podejamais resolver o seu conflito. O medo éuma arma poderosíssima usada cobar-demente por quem o gera.

Matilde, que por acaso não se chamaassim, mas faz de conta, era professoranuma escola particular também fre-

quentada pelo seu filho. Os colegas nãoconseguiam entender muito bem comoela dava tantas quedas em casa e nadalhe acontecia na escola, sem jamais sus-peitarem da verdade. No entanto, algonão batia certo. Uma sensação sublinha-da no olhar e no com-portamento dofilho, o adiar perma-nente de ambos emvoltarem para casa, o modo excessiva-mente voluntarioso dela para toda equalquer tarefa que a escola lhe solici-tasse fora de horas. Foi através do filhoque a direcção da escola acabou por des-cobrir o que estava a passar-se e pôdeajudar Matilde.

Sandra tinha dois filhos pequenitosquando viu o anúncio de uma cam-panha da APAV (Associação Portuguesade Apoio à Vítima). Vivia numa aldeiado sul de Portugal, não trabalhava e,pouco tempo depois de casar, o sonhode uma vida feliz esfumou-se a golpesde pontapés e bofetadas, ameaças e per-seguições. Conseguiu, através de umavizinha, fazer um telefonema e contar oque estava a viver. Ele passava a vida apedir desculpas, a coisa acalmava, maspassados uns dias lá saltavam os gritos eos murros. Nunca tocou nos filhos, masquase a matou por duas vezes. Sandraseguiu as instruções que lhe deram dooutro lado do fio e fugiu para um refú-gio que a APAV lhe arranjou, bem

Ele passava a vida a pedirdesculpas, a coisaacalmava, mas passadosuns dias lá saltavam osgritos e os murros. Nunca tocou nos filhos,mas quase a matou porduas vezes.

IDADES VÍTIMA/AGRESSOR

2004 2005INSTITUIÇÕES INTERVALO DE IDADES VÍTIMA AGRESSOR VÍTIMA AGRESSOR

APAV 26-45 2508 1803 2177 2480PSP 25-64 6641 7100 6100 7048GNR >= 25 6547 6913 7634 812

INSTITUIÇÕES 2004 2005

APAV 12539 12809PSP 8453 9615GNR 7088 8377

QUEIXAS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA

REPORTAGEM

CRIMES 2004 2005

Maus-tratos Psíquicos 4378 4160Maus-tratos Físicos 4188 4125Ameaçãs / Coacção 289 2579Difamação / Injúrias 1384 1324Violação 169 162Abuso Sexual 138 105Homicídio – 8

TIPOS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA

NOTA: Todos os dados da APAV aqui apresentados foram recolhidos em entrevistas realizadas e retirados do Relatório de 2004 da APAV, disponível em http://www.apav.pt/pdf/totaisnacionais2004.pdf e do Relatório de 2005 da APAV, disponível em http://www.apav.pt/pdf/totais_nacionais_2005.pdf

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DISTRIBUIÇÃO TERRITORIAL DAS QUEIXAS

2004 2005INSTITUIÇÕES PSP GNR APAV PSP GNR APAV

Aveiro 396 634 192 244 710 291Beja 65 68 31 69 76 39Braga 343 738 299 322 886 560Bragança 98 105 32 129 115 75Castelo Branco 100 212 58 94 242 75Coimbra 265 308 307 454 377 407Évora 102 107 27 95 85 65Faro 164 240 800 209 308 1365Guarda 45 142 32 52 118 51Leiria 298 355 18 347 526 205Lisboa 1765 672 2570 2864 625 4300Portalegre 85 97 24 58 71 37Porto 1892 1249 736 2116 1577 1815Santarém 250 302 154 200 390 238Setúbal 879 535 564 771 676 834Viana Castelo 31 301 35 16 365 48Vila Real 89 129 223 65 132 415Viseu 58 574 100 63 716 160Região Autonoma da Madeira 808 – 69 709 – 1Região Autonoma dos Açores 720 – 19 939 – 166Outros Países – – 19 – – 27

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6 APRENDER6 APRENDER

REPORTAGEM

distante da sua morada. Mesmo assim omedo não lhe desaparecia do corpo. Eleera muito esperto e bem capaz de adescobrir, dizia. Já o fizera antes comsucesso, embora em casas de familiarese conhecidos aos quais ele tentara con-vencer dos exageros dela, justificando osseus actos com uma “cabeça perdida”casual.

Em Violência Doméstica – Manual paraos Media: Informar para Mudar, TeresaRosmaninho caracteriza as etapas dociclo da violência doméstica, pese em-bora o facto de os casos terem semprecontornos específicos. A primeira, defini-da como fase de “acumulação de tensão”,é aquela durante a qual as discussõessobem de intensidade e as agressões sãoainda verbais. A segunda é a da “explosãoviolenta”, ou seja, é quando o homempassa à “acção”, insultando e batendo namulher, partindo objectos, embria-gando-se, intercalando estas atitudes comum silencio que pode durar dias, em que,no fundo, ele faz a sua primeira grandedemonstração de poder e superioridade.Depois vem a terceira fase, chamada de“lua-de-mel”, porque o homem exibe umarre-pendimento convincente, deixando amulher confusa com promessas demudança, lágrimas e remorsos. Ao fim deum tempo por ele definido, inicia-se afase de “escalada e reinício do ciclo”, ouseja, depois de perdoado pela mulher,que consegue, entretanto, recuperaralguma autonomia, ele retoma a violên-cia para reafirmar o seu poder e controlosobre ela.

Caracterização

Ao contrário daquilo que algumaspessoas menos informadas supõem, aviolência doméstica ocorre nos laresmenos suspeitos. Ou seja, tende-se asupor que este é um fenómeno de inci-dência predominante nas classes maisdesfavorecidas, mas tal não correspondeà realidade, embora nas classes média ealta a sofisticação tenda a ser maior, talcomo a suspeição de quem convive como casal é também menor. Embora comcontornos que podem aparentementeser diferentes, as causas e os efeitos sãoem tudo similares.

De acordo com um estudo nacionalde 1997, da autoria de Lourenço, Lisboae Pais, sintetizado por Isabel Dias ereferido no relatório da campanha daAmnistia Internacional, “Acabar com aViolência Sobre as Mulheres”, “é nosespaços periurbanos (56,3%) e urbanos(55,4%) que se encontra uma maiorpercentagem de mulheres vítimas deviolência; é nos escalões etários mais jo-vens que se concentram as mulheres quesão vítimas de facto de violência, no-meadamente no dos 18-24 anos e nodos 25-34 anos; a violência afectamulheres com níveis de instruçãoelevados e baixos; é entre as operáriasque se encontram mais actos de vio-lência, seguidas pelas que são quadrossuperiores ou exercem profissões liberaise pelas empregadas de escritório eserviços; as mulheres vítimas de violên-cia encontram-se em todos os estratossociais (…); a violência física é mais

frequente nas mulheres dos estratossociais mais baixos; a violência sexual émais frequente entre as mulheres dosestratos sociais altos; a violência psicoló-gica vítima mais de metade das mulheresportuguesas, sendo a mais transversal, namedida em que aumenta onde todos osoutros tipos de violência se manifestamcom maior incidência (…); é no espaçocasa/família que as mulheres afirmamter sido mais vezes vítimas de violência;são os homens os principais autores dosactos de violência cometidos contra asmulheres, distribuindo-se aqueles poruma faixa etária ampla, que vai dos 25aos 54 anos; têm uma relação de proxi-midade afectiva com a vítima sendo,geralmente, o marido ou companheiro”.

O projecto Escalada

Integrando ONGs de seis países daUnião Europeia (Grécia, Itália, Romé-nia, Reino Unido, Polónia e Portugal),no nosso país tem sido a Associação deMulheres Contra a Violência (AMCV) aparceira directamente envolvida noprojecto. Além de pretender avaliar adimensão do fenómeno a nível euro-peu, o projecto procurou seguir um ca-minho pragmático de apoio às mulhe-res sobreviventes de violência e, em con-junto, as organizações dos diferentespaíses juntaram saberes, experiências ediversidades locais para elaborarem ummanual base destinado a orientarformações informais em todos os países.Com 233 páginas, é como um farolorientador das formações, quer estas se

Além de pretender avaliar a dimensão do fenómeno a níveleuropeu, o projecto procurou seguir um caminho pragmático deapoio às mulheres sobreviventes de violência e, em conjunto, asorganizações dos diferentes países juntaram saberes, experiênciase diversidades locais para elaborarem um manual base destinadoa orientar formações informais em todos os países.

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destinem a mulheres sobreviventes deviolência, quer a agentes que possam,por sua vez, formar outros no sentido deos sensibilizar para o problema e os aju-dar a saber detectar situações, entender eapoiar estas mulheres. Disponível naInternet, em http://www.amcv.org.pt/amcv_files/pdfs/Produto%20Educativo%20Europeu.pdf, trata-se de umaferramenta susceptível de ser usada porqualquer país e que contempla amplaspossibilidades de aplicação.

Em Maio de 2006, este Guia de Educa-ção Não Formal para Mulheres Sobre-viventes de Violência foi testado nosvários países que integraram o Escalada.Sandra Paulos, formadora, explica queesta formação “avançou com dez mulhe-res e depois reduziu para sete. Erammulheres que estavam a fazer atendimen-to na AMCV e que tinham vontade defazer a formação. A mais nova tem uns18 ou 19 anos e a mais velha 50 e qual-quer coisa”. A divulgação da acção foifeita não só nesta ONG mas também jun-to dos seus parceiros nacionais. “Houvealguns aspectos que foram adaptados”,esclarece esta psicóloga clínica, “como ostempos de duração, por exemplo. Umadas coisas que detectámos foi que muitasmulheres não podiam fazer formaçãopor não haver solução para as suas crian-ças durante o tempo em que elas estavamocupadas, de forma que agora já temosesse aspecto contemplado”.

Apesar de o projecto já ter terminado,tal como previsto, o balanço é positivo.Além da elaboração da excelente ferra-menta que é o manual, ele possibilitou

troca de experiências e perspectivas deevolução entre os seis países, melhorentender como se resolvem certos pro-blemas, a adequação de determinadosaspectos dos serviços, comparação daslegislações, das estatísticas, das históriasde vida das mulheres.

Ser Mulher

Como verdadeiro sucedâneo doEscalada, o projecto Ser Mulher, tambémele desenvolvido com parcerias nacio-nais, envolve a Roménia e a Polónia, quetal como Portugal prosseguiram de umpara outro projecto, e ainda a Alemanha,Malta, Itália, agora representada por umoutro parceiro, e a Suécia.

“Este projecto começou após a pri-meira formação, em Outubro de 2006,mas neste caso mais virado para os pro-fissionais, principalmente na área daEducação, também podendo ser adapta-do às polícias, aos médicos, aos advoga-dos, etc.”, explica Petra Viegas, formadaem Desenvolvimento Comunitário eSaúde Mental e também ela formadoradesde o Escalada. “O objectivo destaacção é precisamente o de melhorar aintervenção cidadã destas pessoas, aju-dando as mulheres a encaminharem-se”.Até ao momento, já foram feitas duasformações e uma outra de teste, estandoprevistas mais duas acções no próximoano. Também as dirigidas às sobreviven-tes continuarão a ser regulares até 2010.

Ao contrário daquilo quealgumas pessoas menosinformadas supõem, aviolência doméstica ocorrenos lares menos suspeitos. Ou seja, tende-se a supor queeste é um fenómeno deincidência predominante nasclasses mais desfavorecidas,mas tal não corresponde àrealidade.

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Vencedor do Prémio Pessoa 2006, director-executivo da YDreams, professor catedrático daFaculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa, António Câmaraacredita que a capacidade de pensar livremente, a capacidade de crítica, a capacidade degestão do tempo e a autonomia, são coisas que em Portugal falham absolutamente. Nestemomento está entusiasmado com o projecto FABRICARTE, um conceito que o apaixona eque vai permitir que as pessoas possam materializar as suas ideias.

ANTÓNIOCÂMARA

A APRENDIZAGEM REQUER ESFORÇO,MAS TEM DE SER FEITA COM GOSTO E MOTIVAÇÃO

Entrevista: Rui Seguro # Fotografias: Paulo Figueiredo

8 APRENDER

ENTREVISTA

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TTeennddoo eemm ccoonnttaa aa ssuuaa eexxppeerriiêênncciiaa ccoommoo pprrooffeessssoorruunniivveerrssiittáárriioo ee aa lliiggaaççããoo aa uummaa ddaass eemmpprreessaass mmaaiissiinnoovvaaddoorraass ccrriiaaddaa eemm PPoorrttuuggaall,, qquuaaiiss ddeevveemm,, nnaa ssuuaaooppiinniiããoo,, sseerr aass ccoommppeettêênncciiaass aaccttuuaaiiss??

Se analisarmos a educação em termos globais, verifica-seque há diferenças abissais, basicamente na evolução ao longoda vida, das pessoas que saem de um número muito limitadode escolas, comparadas com as outras. A educação nessas es-colas preza vários elementos fundamentais, mais associados àformação do que à informação, e que infelizmente não estãopresentes na maioria dos currículos universitários e secun-dários, em todo o mundo e em particular em Portugal.

E porque é que isso acontece? Porque a educação foi basea-da na criação de uma autonomia, na criação de uma culturade base humanista extremamente forte, e também de umacultura científica, mas sobretudo na capacidade de as pessoasse adaptarem e aprenderem ao longo da vida. E essas caracte-rísticas não estão presentes, infelizmente na maior parte doscursos em Portugal, porque esses cursos privilegiam a infor-mação acima de tudo. Há um conjunto de cadeiras que temosde aprender, aprendemos normalmente sempre pelo mesmométodo, temos de estudar, temos de ir a exame, somos testa-dos no exame e passamos ou não passamos.

Há excepções, de vez em quando temos alguns projectos,mas a grande maioria das cadeiras é baseada em exames. É umensino baseado em infecção. Somos infectados, e chegamosao exame e testamos a infecção. E como é uma infecção, geral-mente gera anticorpos, e esses anticorpos impedem-nos deaprender ao longo da vida.

Como é óbvio, as pessoas que saem da universidade prepa-radas desta forma têm naturais dificuldades para se adaptar àevolução constante. O sociólogo Richard Sennett diz: é oespectro da inutilidade. A pessoa chega à meia-idade e estáabsolutamente fora, não tem as capacidades que são requeri-das para se adaptar a uma evolução tecnológica constante, e ébasicamente inútil; e a maioria dessas pessoas são libertadasdas empresas. Li numa estatística que este ano vamos ter nodesemprego 40 mil gestores de meia-idade.

Atingimos o espectro da inutilidade e isso causa problemassociais gravíssimos. Em Portugal, temos outro problema socialque é uma bomba, o insucesso escolar dos 16 aos 24 anos, maisde metade não acaba a escola. Isso obriga a repensar a educaçãoinicial e a ter programas de educação ao longo da vida.

Nunca fomos educados para pensar criativamente. Temosimensos talentos criativos, apesar da escola, e não por causada escola. Quando eu andava no Técnico, desisti de ir às aulas,

porque achei que se fosse consumia todo o meu tempo e deuma forma não inteligente. Achei que era muito melhor jogarténis e ir ao cinema. Hoje, quando sou professor, é irónicoque eu seja professor na universidade, na primeira aula digo:se não querem vir às aulas não venham, vão jogar ténis, vãoao cinema, aprendem mais.

Mas isso é um ponto importante. As competências, a capa-cidade de pensar livremente, a autonomia, a capacidade decrítica, a capacidade de gestão do tempo, é algo que em Portu-gal falha absolutamente. Todos os miúdos holandeses, noequivalente ao 3º ano, têm uma cadeira chamada “processo”onde inclusive se treinam a gerir reuniões. Em Austin, na Dell,todas as salas de reunião têm um aviso: nenhuma reuniãonesta empresa pode durar mais do que 50 minutos, nenhumareunião pode ter lugar antes das 8.30 ou às 18h, cada reuniãotem de ter uma agenda, tem de ter um coordenador, tem deter uns princípios, tem de ter um followup. Se é preciso discutirmais assuntos marca-se outra reunião.

Em Portugal, temos horas sem fim de reuniões e a falsa ideiade que isso é que é trabalhar. E para chegarmos à conclusão deque é preciso um código, a melhor forma de fazer isso eraescrever um livro, que está traduzido, “O que não se aprende naescola”.

E, obviamente, há as competências mais específicas doscargos. Uma pessoa é programador e passa a gestor de projec-tos, tem de aprender sobre gestão de projectos. São essas duasimportantes componentes, a formação base que uma empresacomo a nossa tem de dar, e depois a formação específica.

Eu sei que o Governo tem o programa Novas Oportunida-des, e que está atento a essa situação, mas é algo que, porexemplo, as universidades deviam fazer de forma muito maispró-activa. Nos Estados Unidos a maior parte das universida-des tem um fortíssimo programa de educação ao longo davida.

10 APRENDER

ENTREVISTA

AS COMPETÊNCIAS, A CAPACIDADE DEPENSAR LIVREMENTE, A AUTONOMIA, A CAPACIDADE DE CRÍTICA, A CAPACIDADEDE GESTÃO DO TEMPO, É ALGO QUE EMPORTUGAL FALHA ABSOLUTAMENTE.

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António Câmara, vencedor do Prémio Pessoa2006, sonhava ser tenista quando estudavaengenharia, mas acabou por se destacar comopioneiro na investigação em informação geográfica.Desse seu trabalho de investigação, resultou acriação da YDreams, uma empresa de sucesso naárea do software para multimédia, realidade virtuale computação móvel.

A par de director executivo da empresa, quefundou em 2000, António Câmara, 52 anos, éprofessor catedrático da Faculdade de Ciências eTecnologia da Universidade Nova de Lisboa.Licenciado em Engenharia Civil pelo InstitutoSuperior Técnico (IST) em 1977, fez pós-graduaçãonos Estados Unidos, onde obteve os graus de MS ce PhD em engenharia de Sistemas Ambientais peloVirgina Tech.

Esteve associado ao MIT (Instituto de Tecnologiado Massachusetts), como pós-doutorado em 1983,e posteriormente como professor visitante (1988-89), tendo em 1992 recebido o título de agregadopela Universidade Nova de Lisboa. Orientou já 25doutoramentos e 35 mestrados no âmbito deprojectos de investigação na área da informaçãogeográfica e tem mais de 150 publicaçõesinternacionais, entre as quais se destaca o livroEnvironmental Systems, editado pela OxfordUniversity Press (2002).

Liderou, além disso, três dezenas de projectos deinvestigação científica financiados pela Fundaçãopara a Ciência e Tecnologia, National ScienceFoundation, NATO e União Europeia.

QQuueemm éé AAnnttóónniioo CCââmmaarraa

DDaass iinntteerrvveennççõõeess ee aarrttiiggooss sseeuuss qquuee llii,, ssuurrggee qquuaassee sseemmpprreeuummaa iiddeeiiaa,, qquuaassee ddiirriiaa uummaa ppaallaavvrraa mmáággiiccaa qquuee aabbrree ttuuddoo ––mmoottiivvaaççããoo..

Acho que há muito a aprender em Portugal. Onde é que hámaior motivação nas escolas, em Portugal? Nas escolas demúsica, um miúdo que esteja a aprender música vai faltar?Não lhe passa pela cabeça.

O mesmo se passa no desporto. Os miúdos gostam defazer desporto a sério. Eu tenho um filho de 12 anos, não lhepassa pela cabeça faltar a um treino. Quanto a ir para a escolatodos os dias, há uma questão no ar em aberto. Acho que ébom aprender com essas escolas. Porque é que essas escolassão motivadoras e as outras não?

Acho que um dia o ensino vai mudar radicalmente, e come-ça a haver experiências nesse sentido. Tem havido várias aolongo do tempo e a questão está no balanço. Apesar de tudo,a escola foi bem sucedida a formar profissionais durante anose anos, com o ensino por infecção; e depois houve uma tenta-tiva de mudança radical em detrimento das disciplinas e agre-diu-se as disciplinas e há toda a discussão sobre esse tema. E háa linha dura, que acha que devemos ter exames de 4ª classe,que os exames devem ser mais apertados, que devem chumbarmais pessoas. E há outra linha contrária, que muitas vezes estáno outro extremo.

Como em todas as coisas, tem de haver bom senso. As pes-soas têm de aprender. Eu acho que muito para além dos exa-mes. Os exames devem ser só testar o que a pessoa sabe e nãotestar aquilo que não sabe – que é basicamente o que aconte-ce. Isso é um fenómeno muito típico na universidade portu-guesa. Tem de haver um misto, o ensino tem de ter estas duascomponentes, as disciplinas e a verdade científica, se existeverdade científica, mas depois também toda a componente deformação; e nesta, motivação e crítica.

Quando eu chego a uma aula, a primeira coisa que tenhode fazer é motivar os alunos, é pô-los à vontade, vamos explo-rar, mas tentem ver isto de uma forma diferente e muitas vezessubversiva. Esta atitude falta em geral na escola e nas pessoas.Mas o truque é olhar desta forma para a experiência noensino. Sempre encarei o ensino assim. E aprendi muito como desporto e a lógica da música, o puro gozo que as pessoastêm que ter quando aprendem.

MMaass ssee nnaa eessccoollaa aa mmoottiivvaaççããoo éé ddiiffíícciill,, ppaarraa aass ppeessssooaassaadduullttaass nnããoo oo sseerráá mmaaiiss??

É muito mais difícil, porque as pessoas estão em circuns-tâncias familiares muitas vezes complicadas e pessoais. A vida

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12 APRENDER

é muito mais complexa. O nível de energia é menor, há maissolicitações, sem dúvida. Quais são as experiências ao longoda vida mais bem sucedidas? São aquelas que retiram aspessoas do ambiente normal e as colocam em ambientes con-fortáveis e estimulantes. Todas as pessoas adorariam, no seucampo, ir para um sítio fantástico e aprender com pessoasfantásticas.

Na universidade tentámos fazer experiências ao longo davida, mas eram aulas ao fim da tarde, as pessoas tinham queatravessar a ponte, correr, depois jantavam tarde, quem vaifazer isso? Mas se olharmos para a nossa Faculdade de Econo-mia, da Nova, que tem os cursos de Gestão e que são numpalácio no meio de Lisboa e tem uns coffee breaks óptimos euns almoços óptimos, aquilo é um sucesso. Muito tem a vercom a qualidade da experiência. Essa qualidade da experiên-cia acaba por ser motivante. E esse é o desenho da experiênciaque é verdadeiramente importante.

O actual presidente da universidade da Virgínia fez umestudo sobre a educação no mundo em 1988, quando já seantecipava a chegada da Internet. Foi um estudo fantástico echegou à conclusão de que o futuro da universidade era serum conjunto de pares. Portanto, o resultado final daquilo era:com a Internet vai haver muito menos experiências nas aulas,mas o ensino vai sofrer uma transformação fantástica, pode-mos ir para os bares e falar com os professores e ter os meiostodos de projecção e interacção, mas estamos num bar, esta-mos eventualmente a ouvir música, estamos num ambienteestimulante. Acho que um dia as universidades terão algumassalas de aulas e serão esplanadas.

AA IInntteerrnneett eessttáá aa mmuuddaarr mmuuiittaa ccooiissaa eemm rreellaaççããoo aaoo aacceessssooaaoo ccoonnhheecciimmeennttoo.. MMaass lleemmbbrroo--mmee qquuee ddiissssee vváárriiaass vveezzeessqquuee rreessiissttee ààss tteeccnnoollooggiiaass,, ee ttaammbbéémm qquuee qquuaannddoo ppaassssoouuppoorr BBoossttoonn,, oo eessppaaççoo eerraa ttããoo eessttiimmuullaannttee qquuee nneemmpprreecciissaavvaa lleerr.. CCoommoo eennccaarraa aa rreellaaççããoo ddaass ppeessssooaass ccoomm aammááqquuiinnaa ee aa iimmppoorrttâânncciiaa ddoo ccoonnvvíívviioo??

É óbvio que a Internet é fantástica. Para nós, é indescrití-vel pensar que há 13 anos em Portugal, qualquer pessoa,para ter acesso ao conhecimento produzido na altura, tinhade se meter num avião. Aos miúdos da escola nem lhes passapela cabeça que há 14 anos, se queriam fazer um revisão deliteratura tinha de ir a Londres. É fantástico, hoje em dia,estarmos em qualquer lado e podermos ter acesso a toda ainformação.

Obviamente quando digo que resisti imenso aos telemó-

veis, como resisto ao Messenger, é porque são factores deinterrupção. Isso é contraproducente em relação à produtivi-dade. A fase da vida em que fui mais produtivo foi aquela emque tirava um dia por semana para não fazer nada. Era umluxo.

Na altura era só professor universitário, uma carreira únicade que tenho imensas saudades, tinha um dia por semanasem fazer nada. E ao longo do dia as ideias brotavam. Eranatural, eu pensava, era estimulado, aliás o Google tem issocomo política: numa semana os empregados só trabalhamquatro dias e têm um dia para não fazer nada, mas fazer o quelhes apetece, que pode ser nada. Mas, para não fazer nada, nãose pode ter interrupções. É impossível estar um dia inteiro aresponder a 20 telefonemas, a 10 e-mails e estar no MSN. Éimpossível. Não se produz. Acho que esse é o lado negro dastecnologias.

Em relação aos ambientes, tem a ver com algo muito im-portante, que é a informação por osmose. Isso é muito curio-so, porque acontece não só na parte profissional, tradicional,como até no desporto. No MIT - Massachusetts Institute ofTechnology, em Boston, tem-se acesso aos melhores indivíduosdo mundo, todos os dias, em qualquer área. Quando elesfalam, falam muitas vezes de coisas que ainda nem sequerpublicaram. É completamente diferente estar aqui em Portu-gal, onde estamos a ler um livro já publicado e se calhar já foidesenvolvido há seis, oito ou se calhar há mais meses.

Esse ambiente é de tal forma estimulante, que nem é pre-ciso ler, eu estou ali a ouvir o que está a ser criado no mundo.Em Portugal não temos esse ambiente, temos uma dispersãodas escolas. Enquanto na maior parte dos países há os campusuniversitários, aqui não, está tudo disperso. Essa dispersãonão ajuda à informação por osmose. Mesmo aqui no campussó o facto de haver cantina e as pessoas se encontrarem lá já éum factor decisivo. É por isso que todo este edifício é baseadoem espaços totalmente abertos, de forma a que a interacçãoseja máxima. Se as pessoas querem trabalhar a sério e nãoconseguem fazê-lo aqui, podem fazê-lo em casa, mas aqui háesta enorme vantagem.

Penso que se passarmos isto para a escala urbana, umexemplo típico é a praça. Se vai às cidades europeias com pra-ças, as antigas, aí é que as pessoas se encontravam e falavam.Uma das coisas criticas que hoje temos no novo urbanismoportuguês é que esquecemos as praças. Onde estão as praças?Fenómeno idêntico é o ambiente estimulante. É dez vezesmais estimulante uma praça do que uma avenida.

ENTREVISTA

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MMaass nnããoo aacchhaa qquuee ccoonnvvíívviioo éé aallggoo qquuee ssee eessttáá aa ppeerrddeerr?? Um dos problemas da Internet é esse: os miúdos, hoje em

dia, preferem fazer jogos online com miúdos do mundo intei-ro a estarem fisicamente com outras pessoas. É óbvio que oconvívio está a perder-se. Agora em Austin descobriram umnovo conceito de centro comercial: the domain, isto é o futuro.Basicamente é uma rua com duas praças e lojas e cafés. Foi areinvenção do passado, é muito curioso, toda a gente adora. Édeprimente.

UUmmaass vveezzeess aalltteerrnnaa aallgguumm ooppttiimmiissmmoo ccoomm uumm cceerrttoo ppeessssiimmiissmmoo..

Portugal é um país, como todos os locais na Terra, que temos pontos positivos e os pontos negativos. De facto, temosuma história péssima. Se olharmos para os últimos tempos, étrágico. Estamos a melhorar nos últimos 30 anos, mas a nossaherança é dramática. Trezentos anos de inquisição, 50 anos deum regime obscuro. Incrivelmente difícil sair do espartilhomental que estes séculos nos criaram.

Muitas vezes sinto que criámos um sistema absolutamentenapoleónico, em que a face mais visível é a justiça portuguesa,mas que ainda está presente em vários outros sectores dasociedade, disfarçados por alguns fenómenos que dão espe-rança para o futuro. O multibanco! O multibanco é um saltoqualitativo, é um oásis. Quando eu olho para o país assim,fico deprimido mas tive sempre o privilégio de ar aulas a umajuventude incrivelmente idealista, que são os engenheiros doambiente. Aí fico optimista. Continuo a dar aulas só para meencher de optimismo. Chego à aula e vejo alunos que queremmudar o mundo. E por constatar que temos uma enorme

vantagem, somos um país pequeno, é muito mais fácil mudarum país pequeno do que mudar um país enorme.

Começamos a ter a mente colectiva apontada na direcçãocerta, e de uma forma quase consensual e, a partir daqui, ascoisas podem acontecer. Se olharmos para a Finlândia, tinhatudo, estava com a mente certa, mas teve uma sorte enormecom a Nokia que apostou nos telemóveis quando eles eramimpraticáveis. E dois anos depois, a União Europeia aprovaum standard e a Nokia explode. A Nokia é metade do produtointerno bruto da Finlândia. E foi inteligente, ajudou a criarum ecossistema de empresas incrivelmente robustas. Nóspodemos não ter a sorte da Nokia, mas podemos ter acesso avárias empresas, provavelmente não tão grandes como aNokia, mas que todas elas vão ter um impacto na sociedadeportuguesa. Não sou só eu a pensar isso, há muitos colegasque vêm da universidade e criaram empresas e têm pelomenos esse sonho e, como dizia o meu professor Rómulo deCarvalho, o sonho comanda a vida.

JJuullggoo qquuee uumm pprroobblleemmaa ddee PPoorrttuuggaall ttaammbbéémm éé eessssaa qquueessttããooddee,, ppootteenncciiaallmmeennttee,, tteerr ppeessssooaass ccoomm ccaappaacciiddaaddee mmaass qquueeddeeppooiiss eennccoonnttrraamm ddiiffiiccuullddaaddeess ppaarraa iimmpplleemmeennttaarr iiddeeiiaass..SSoommooss uumm ppoovvoo ddaaddoo aa aallgguumm eemmpprreeeennddeeddoorriissmmoo,, mmaass ééppeeqquueennoo.. OO eemmpprreeeennddeeddoorriissmmoo éé aaqquuiilloo aa qquuee aannttiiggaammeenntteessee cchhaammaavvaa ““ooss nneeggóócciiooss””..

A questão que temos em Portugal existiu ao longo de sécu-los. Há um talento, mas para exprimi-lo à escala global é pre-ciso ter componentes que não temos. O que se passa nas em-presas portuguesas é que não temos – e isso sentimos no sectortecnológico – o marketing e as vendas, e se calhar não temos o

UM DOS PROBLEMAS DA INTERNET É ESSE: OS MIÚDOS, HOJE EM DIA, PREFEREM FAZER JOGOSONLINE COM MIÚDOS DO MUNDO INTEIRO A ESTAREM FISICAMENTE COM OUTRAS PESSOAS. É ÓBVIO QUE O CONVÍVIO ESTÁ A PERDER-SE.

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capital para ter o marketing e as vendas que nos permitamfacilmente criar empresas globais como a Nokia. A Nokia dáum salto porque começou a vender no mundo inteiro, comum knowhow verdadeiramente diferente e com uma interfacemuito focada no utilizador; mas depois teve, para o seu desen-volvimento, força de marketing e vendas globais. Nenhumaempresa portuguesa tem isso e tem uma enorme dificuldadeem ter, porque para ter é preciso as pessoas, e nós não temosas pessoas treinadas em marketing e vendas, nunca vendemosnenhuma, não temos nenhuma marca global, a não ser o Cris-tiano Ronaldo e o Mourinho. Não temos a capacidade de terainda esse tipo de pessoas. Há uma forma de as adquirir, queé basicamente o que as equipas de futebol têm feito: contratarno exterior.

HHáá uunnss aannooss ffaallaavvaa--ssee qquuee eessttáávvaammooss aavvaannççaaddooss nnaa áárreeaa ddooGGPPSS,, mmaass ddeeppooiiss nnaa HHoollaannddaa ssuurrggee aa eemmpprreessaa TToommTToomm qquueeddoommiinnaa eessttee mmeerrccaaddoo,, eennqquuaannttoo nnóóss……

Há 14 anos tínhamos mais do que isso, tínhamos o GoogleEarth que exibimos na Expo 98, no Pavilhão do Território.Havia o Portugal Digital onde se viajava pelo mundo inteiro,nós estávamos avançadíssimos. No YDreams fizemos os mapaspara a Telecel, para telemóveis, em 2000. E a questão está exac-tamente aí, é que a TomTom, que até nem tinha competênciatecnológica por aí além, foi capaz de ter a visão do negócio.Contrataram o especialista da Hewlett Packard e a partir desseconhecimento começaram a vender, no mundo inteiro, osmapas, depois perceberem que tinham de fazer os sistemas denavegação, mas tinham a rede de distribuição da HP, uma redede distribuição manual. Eles tinham pessoas que sabiam demarketing e vendas a nível global, e nós não.

Mas há uma forma de resolver isso, é ir buscar essas pessoas;e esse tem sido o nosso trabalho neste momento. Seguindoessas pessoas, fazem-se e treinam-se gerações de portugueses afazê-lo. Foi o que se passou na Holanda, está há gerações egerações a fazer isso. Os ingleses também. Nós não temos essacomponente. Nós não temos essa tradição global, mas temosde a ter senão nunca mais passamos do estado actual. Ideiasboas há em Portugal há séculos, temos tipos fantásticos.

GGoossttaavvaa qquuee mmee ffaallaassssee aaggoorraa ddee uumm pprroojjeeccttoo eemm qquuee eessttááeennvvoollvviiddoo,, qquuee jjuullggoo eessttaarr aaiinnddaa nnoo iinníícciioo,, qquuee ssee cchhaammaaFFAABBRRIICCAARRTTEE ee qquuee vvaaii ssuurrggiirr nnoo BBaarrrreeiirroo..

Fomos desafiados pela Câmara do Barreiro para pensar nonovo espaço que permitisse ao Barreiro criar um motor, nãopara voltar ao passado, mas para criar um futuro que tivesse

como base uma indústria onde se fazem produtos, e que mo-tivasse não só a juventude mas todas as idades, que estivessecompletamente aberta. Olhámos para muito do que se passavano mundo inteiro e idealizámos um modelo que tem quatrocomponentes fundamentais. Primeira, o que chamamos con-tágio. É basicamente uma biblioteca, adaptada aos tempos dehoje, mas é na biblioteca que as pessoas podem descobrir.

Segunda, uma outra componente pelo contágio, é a experi-mentação. As pessoas lêem, mas não contactam com o mun-do tangível, portanto é necessário experimentá-los. Assim háum segundo núcleo que é a experimentação. Em Portugaltemos tido vários casos de experimentação nos Centros deCiência Viva, que têm provado ser úteis. Queremos expandiresse conceito.

Mas há uma terceira fase que está completamente ausentedos centros comunitários e até das escolas, que é o saber fazer.Ouvimos que havia no MIT uma cadeira chamada “como fazerqualquer coisa”, entrámos em contacto com o professor NeilGershenfeld, que hoje em dia tem o conceito de “Fab Lab”,que basicamente é algo permite, em qualquer parte, fabricarquase tudo. É um conjunto de peças. Neste momento há em25 países. Candidatámo-nos e ele aceitou, nós sendo pratica-mente os representantes e os activadores dos “Fab Labs”. E oBarreiro teria essa componente. Qualquer pessoa podia chegarlá e fabricar quase tudo. Obviamente há um processo deaprendizagem, a parte da concepção, mas a pessoa tinha osinstrumentos absolutamente novos, são muito assentes emnovas formas de impressão.

Uma quarta unidade - temos o contágio, a experimentação,a criação - é a difusão. Quando eu criar um produto ou umapeça de arte, quero difundi-la, podemos imaginar que hágalerias, que há empresas que vendem os produtos, que háuma ligação para o exterior. Neste momento, temos a con-cepção toda feita por cada uma das fases, estamos a estabele-cer parcerias com instituições que vão financiar.

Muitos locais do país querem este conceito, que tem de seradaptado à realidade local. Além disso, este conceito faz umaponte para as pessoas que sabiam fazer. Isto no Barreiro émuito importante. Há muitos tipos de operários que sabiamfazer, no Barreiro e noutros lados. Queremos trazer todas ascompetências.

Achámos que havia duas linhas fundamentais num edifíciodestes. Em primeiro lugar a música, a música é uma indústriaglobal gigantesca e em que vai ser seguramente possível desen-volver produtos novos no mercado. Veja-se o sucesso do iPod.

Vamos olhar para a música sobre todas as boas perspec-

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tivas, criação artística, criação de produtos para a música. Eoutra foi o desporto. O desporto é outra industria imensa.

E portanto esse edifício terá os espaços musicais e terá osespaços desportivos associados. E depois terá a possibilidadede as pessoas desenvolverem produtos para um e outro cam-po ou fazerem exibições, ou fazerem espectáculos. Este é oconceito que nos apaixona e que, neste momento, queremoscriar aqui e noutros lados. Temos tido reuniões noutros sítiosem que as indústrias são absolutamente diferentes. Os objec-tivos e a tradição local são diferentes. Esta combinação datradição local e as perspectivas futuras é muito importante. Aoutra componente importantíssima é a ligação ao investimen-to e ao financiamento, porque é isso que vai permitir queessas ideias se materializem, e nós estamos neste pensamentointegrado desde o início.

CCoommoo vvêê aa qquueessttããoo ddee uummaa cceerrttaa ddeessvvaalloorriizzaaççããoo ddaassaapprreennddiizzaaggeennss iinnffoorrmmaaiiss ee qquuaall aa iimmppoorrttâânncciiaa ddoo iinnffoorrmmaall..

Acho que a aprendizagem, como tudo na vida, é pessoal ecada pessoa tem uma noção muito clara do que retira doprocesso de aprendizagem. Essa avaliação, em muitos casos,se for honesta, desvaloriza muito o que se aprendeu formal-mente e valoriza injustamente aquilo que se aprende infor-malmente. A questão está em que as outras pessoas exterioresa nós nem sempre valorizam a aprendizagem informal.

Curiosamente, essa foi uma das preocupações no YDreams,desde o início. Aqui olhamos imenso para a aprendizageminformal, aliás estimulamos as pessoas a escreverem os currícu-los para valorizarem a sua aprendizagem informal. Eu prefiroum tipo que tenha tido como hobby ter uma horta fantástica etenha sido um aluno médio, a um tipo que só foi um alunobom. Porque o que fez a horta teve paixão, teve dedicação, teveexperiência prática e essa é uma questão fundamental da nossaperspectiva. É muito melhor ter alguém que sentiu o que é apaixão e que fez algo, porque é um padrão que ele depois trans-fere para a actividade se, de facto, essa actividade o motivar.

OO sseeuu ccaassoo ccoonnccrreettoo éé ssiiggnniiffiiccaattiivvoo.. AA ssuuaa ffoorrmmaaççããoo ééeennggeennhheeiirroo cciivviill.. NNoo eennttaannttoo ddiirriiggee uummaa eemmpprreessaa,, jjááeessppaallhhaaddaa ppeelloo mmuunnddoo,, nnaa áárreeaa ddaa tteeccnnoollooggiiaa.. CCoommoo éé qquueeaaccoonntteeccee eessssaa eevvoolluuççããoo??

É importante dizer o seguinte: um dos problemas que existena nossa educação, é que somos forçados a escolher muitocedo. Quando fui forçado a escolher o campo que queriaestudar, era absolutamente imaturo. O meu interesse, na altura,nem era estudar, eu era jogador de ténis na selecção nacional dejuniores. Vim para a engenheira civil porque conhecia váriaspessoas na engenharia civil que estavam bem na vida.

É óbvio que nunca me senti um engenheiro civil tradicio-nal. A engenharia civil também tem essa vantagem, é de talmaneira vasta que muitas das pessoas que são engenheiroscivis acabam não fazendo engenharia civil, mas a grandetransformação que se deu na minha vida foi quando fui estu-dar para os Estados Unidos e tive professores absolutamenteabertos e radicais e que me levaram noutras direcções abso-lutamente diferentes. Aí percebi que todo o nosso ensinotinha sido convergente, toda a gente queria que déssemosuma resposta certa e o mundo é muito mais aberto que isso.E que é muito mais estimulante estar num ambiente divergen-te em que basicamente o que procuramos é ver todas as res-postas possíveis e, se possível, ter respostas diferentes e inespe-radas. Isso, para mim, foi uma abertura total, e foi isso quemais me influenciou na vida. Quando olho em retrospectiva,acho que há fundamentos importantes que se aprendem, e eutive uma educação fantástica no Liceu Pedro Nunes; para aaltura, nalgumas áreas, não em todas, essa educação manteve-se mas, depois, o que mais me influenciou foi a aquisição deuma nova atitude, a atitude de abertura. E essa atitude é im-portantíssima no mundo de hoje e justamente na aprendiza-gem ao longo da vida. Temos de estar abertos ao que está aacontecer, não podemos estar totalmente agarrados aopassado, é bom que tenhamos umas estacas, boas fundaçõesmas depois temos de estar abertos. Nunca imaginei ter umafirma que faz o que nós fazemos. Hoje estamos à beira de irpara uma área absolutamente diferente, baseada em químicae materiais de que não sabemos nada, mas estamos abertos àsideias e às oportunidades e penso que essa é uma das mensa-gens fundamentais. Aprendizagem requer esforço. Nada éfeito sem esforço, mas tem de ser feito com gosto e motivação.

Nota: Neil Neil Gershenfeld, criou a cadeira

“How to Make Almost Anything” (http://ocw.mit.edu/OcwWeb/Media-

Arts-and-Sciences/MAS-863How-to-Make—Almost—

AnythingFall2002/CourseHome/) que se transformou num sucesso no

MIT. A revista “Make” (http://makezine.com/) da O´Reilly tem

dinamizado iniciativas com objectivos semelhantes.

ACHO QUE A APRENDIZAGEM, COMO TUDONA VIDA, É PESSOAL E CADA PESSOA TEMUMA NOÇÃO MUITO CLARA DO QUE RETIRADO PROCESSO DE APRENDIZAGEM. ESSA AVALIAÇÃO, EM MUITOS CASOS, SE FOR HONESTA, DESVALORIZA MUITO O QUE SE APRENDEU FORMALMENTE E VALORIZA INJUSTAMENTE AQUILO QUE SE APRENDE INFORMALMENTE.

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O dossier desta edição é dedicadoà aprendizagem dos adultos na Terceira Idade, nas suasdiversas modalidades e facetas. O tema é tanto mais actual quantoexiste hoje uma procura crescentedeste tipo de aprendizagens: de 1975 a 2000 a esperança devida ampliou-se de 70 anos para os 90, e a população adulta que sereforma já tem um nível muitosuperior de formação. No debate,Carlos Consiglieri, Maria da GraçaPinto e Luís Jacob discutem asUniversidades da Terceira Idade. E a nossa reportagem foi aoInstituto Politécnico de Leiriaconhecer a sua experiência de formação sénior; foi também ao Centro de Solidariedade Socialda Zebreira testemunhar comoidosos de mais de 80 anosaprendem a navegar na Internet.

Nunca é tarde para aprender

DOSSIER

Aprender09A miolo 1/15/09 1:28 PM Page 17

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DOSSIER

uando dobrou acasa dos 60, o empre-sário José Ascensocomeçou a ponderar

passar a sua empresaao filho, mas desagra-

dava-lhe a ideia de ficardesocupado. Antigo aluno do CursoIndustrial, pensou em voltar a estudar eapesar de inicialmente não saber exac-tamente por onde seguir, uma coisa eracerta: tinha de ser algo que tivesse a vercom História. Por isso, quando tomouconhecimento do Programa IPL 60+que teve início a 3 de Março de 2008,então com 64 anos, decidiu inscrever-senas disciplinas de História Regional eLocal, História da Literatura Portuguesae Antropologia. “Começámos um pou-co tarde e por isso optei por não teravaliação, mas se no próximo semestrelectivo continuar, gostava de prosseguirna área da História e TICs e quero seravaliado, para testar os meus conheci-mentos e levar a coisa mesmo a sério”,explica.

Luís Marcelino começou por se apo-sentar e só depois ponderou que rumodar ao tempo que, aos 62 anos, sentiusobrar-lhe todos os dias. “Era impor-tante fazer exercício mental, como ir aoginásio. Não aprender mais nada seriaum percurso que me conduziria a um

envelhecimento precoce”. Depois de ter,ainda em jovem, frequentado o 1º anode Direito, acabaria por abandonar aUniversidade ao ingressar nos quadrosda GNR. “Talvez por ter a ver com aminha vida profissional, decidi escolhera área da Protecção Civil e assim apro-fundar alguns conhecimentos que pos-suía, mas agora de um modo mais cien-tífico”. Frequentou, então, Economiapara a Protecção Civil, Biologia e Siste-mas de Informação Geográfica e conse-guiu, segundo palavras suas, “safar-se aduas delas, mas a Economia não. Secalhar até foi a que mais trabalhei, masfaltavam-me, claramente, bases. Comodecidi ser avaliado, foi útil, até, paraconseguir ter uma consciência crítica deque não é tão fácil quanto isso. Vou vol-tar no 2º Semestre e vou repetir Econo-mia”. Apesar de sentir que será difícildecorar fórmulas matemáticas, porque“já não tenho paciência”, considera que,no conjunto, as três disciplinas que fre-quentou o ajudaram a melhor compre-ender o mundo, ou pelo menos a ver-tente económica do mesmo, que tantatinta faz correr na comunicação socialem notícias que lhe são agora bem maisinteligíveis.

Ao longo de 38 anos, DeolindaDuarte, actualmente com 60, exerceu aprofissão de empregada de escritório,

Alargar a sabedoria emtempo de reforma

No Instituto Politécnico de Leiria, a formação séniorfaz-se em contexto universitário. Aproveitam tanto osmais velhos como os mais novos. Uma experiênciaenriquecedora para todos, sem qualquer perturbaçãono funcionamento do ensino formal. Uma experiência a ter em conta.

Texto: Guiomar Belo Marques # Fotografias: Paulo Figueiredo

Q OOss sséénniioorreess ffoorraammeesssseenncciiaaiiss nnooeessttíímmuulloo ddooss jjoovveennss,,aattéé ppeellaass iinntteerrvveennççõõeessqquuee ffaazziiaamm.. MMaassttaammbbéémm ppaarraa aapprrooffeessssoorraa ffoorraammmmuuiittoo iimmppoorrttaanntteess,,ppeellaa aajjuuddaa qquuee ddeerraammàà eevvoolluuççããoo ddaa ttuurrmmaa..

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sempre na mesma empresa. Com umaenergia que faz inveja a muitos jovens, hátrês anos que vive a vida de reformadaem permanente actividade. Frequenta oprograma Viver Activo que a autarquialeiriense faculta aos jubilados, venderoupa, faz voluntariado no Banco Ali-mentar Contra a Fome e fez o 1º Semes-tre na área da Saúde, mais concretamenteas disciplinas de Toque Terapêutico,Enfermagem e o Cuidar em Casa eNutrição. Pragmática nas suas opções,explica que escolheu esta área “porqueachei que era muito útil, já que na nossaidade caminhamos para dar e recebermuitos cuidados”. Sem interesse em seravaliada, pois o seu objectivo é, no fun-do, a par de estar ocupada um poucomais, quis transformar esta aprendiza-gem num saber de utilidade prática. “Voucontinuar na área da Saúde e a frequentaras aulas de Dança”, conclui.

Viabilizar dinâmicas deinterajuda

O Programa de Formação Sénior IPL

60+, destinado a adultos maiores de 50anos, enquadra-se no Plano Estratégico2007-2011 do Instituto Politécnico deLeiria e permite aos inscritos a frequên-cia semestral de até três disciplinas dequalquer dos cursos existentes no Insti-tuto. Integrando as turmas do EnsinoRegular, estes alunos sénior usufruemdos espaços académicos existentes nasdiferentes instalações do pólo universi-tário, como bar/cantinas (pagando pre-ços de funcionário) ou Bibliotecas, ten-do ainda acesso gratuito à Internet e aum e-mail pessoal. Aqueles que optampor ser submetidos a avaliação recebemos créditos atribuídos à disciplina, deacordo com o Processo Bolonha, já quesão submetidos às mesmas provas dosdemais alunos do IPL.

“Este Programa nasceu da ideia de secriar uma Universidade para a 3ª Idade,mas queríamos apostar mais na compo-nente de Formação, o que foi possívelgraças a Bolonha. Com o apoio da direc-ção do IPL, decidimos avançar no 2ºSemestre do ano lectivo de 2007/08,embora com algumas angústias relativa-mente à receptividade”, explica IsabelVarregoso, coordenadora do projecto, ea responsável por fazer a ligação entre oIPL e os diversos parceiros envolvidos,que incluem professores, três voluntá-rios, alunos sénior, funcionários, etc.

Paralelamente a este programa, fun-ciona o Projecto Teclar, Ensinar e Apren-der entre Gerações com Tecnologias,que os maiores de 60 partilham, nestecaso, com crianças do 1ºCiclo e tem porobjectivo permitir uma aprendizagemutilitária das Tecnologias de Informaçãotendo contado, no passado semestre,com a frequência de 17 adultos, talcomo o IPL 60+ contou com 13, tendoo mais novo 51 anos e o mais velho 74.

“Os adultos que frequentam o Pro-grama IPL 60+ pagam uma propina,obrigatória por Lei, de 25euros mensais,que se destina a fazer face às despesasmínimas e que se procurou fosse o maisreduzida possível, apesar de, mesmoassim, haver sempre quem não possasequer pagar isso”, esclarece esta coorde-nadora. “Estamos a ver se arranjamos

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DOSSIER

No balanço final daexperiência, professores,alunos e voluntáriosestavam de acordorelativamente a trêsquestões: que devemreunir-se em conjunto maisvezes, que o projecto deveter maior visibilidade, eque é importanteresolverem-se diversasquestões práticas.

Isabel VarregosoCoordenadora

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soluções, que poderão passar por cincoou seis bolsas por ano, destinadas aquem não tem possibilidades de pagaros 25 euros.

Na sala de aulaSusana Faria, professora de Sociologia

da Comunicação do curso de RelaçõesHumanas e Comunicação Organizacio-nal, teve, no último semestre, quatro alu-nos sénior, que não necessitou de avaliarpor todos terem optado por essa moda-lidade. “Era uma avaliação por frequên-cia, mas se fosse um trabalho talvez elesse tivessem entusiasmado a fazer”, escla-rece. Apesar de se tratar de uma turmacom 90 alunos, onde coabitaramestudantes dos 1º e 2º Anos do Curso,devido às adaptações curriculares subse-quentes ao Processo de Bolonha, Susananão tem dúvidas de afirmar tratarem-sede jovens “um bocadinho imaturos paraos quais os quatro séniores foramessenciais no estímulo de parte deles, atépelas intervenções que faziam. Mastambém para mim foram muito impor-tantes, pela ajuda que deram na evo-lução da turma. Como não tinhamavaliação, não puderam testar os seuspróprios hábitos de estudo e percebermelhor as suas dificuldades. No entanto,a riqueza deste projecto está precisa-mente no conjunto. Eu própria só per-cebi isso posteriormente. Aliás, curio-samente, eles distribuíam-se pela sala,ou seja, não se sentavam uns ao pé dosoutros. É uma situação completamentediferente das dos trabalhadores-estu-dantes, porque são pessoas com outradisponibilidade e até entusiasmo. Paradar um exemplo concreto, posso referir,entre outros, o 25 de Abril, que foi ummomento que eles viveram e os maisnovos não, tal como eu também não”.

Distribuídos por turmas e cursosdiversos, os treze pioneiros do Programareuniram-se em conjunto apenas algu-mas vezes, encontros que a coordena-dora pretende intensificar no futuro. Noentanto, o facto de as reuniões teremsido escassas, não os impediu de recebe-rem todo o apoio de que foram necessi-tando. Todas as terças-feiras podiam

contar com a ajuda de Adriana Alves,uma estagiária do Curso de EducaçãoSocial que também resolveu regressaraos estudos já depois de ser mãe,encarregue de pôr a rede funcionar efazer o atendimento. “Procurava resol-ver dúvidas, ajudá-los, saber o que lhesdesagradava, o que achavam estar bem.A preocupação foi sempre a de trabalharcom eles e não para eles, até devido àdiversidade de disciplinas que eles têm”,explica. “Como eles se sentavam separa-

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Susana FariaProfessora

Adriana AlvesEstagiária

dos nas aulas, perguntei-lhes qual a ra-zão e responderam que estavam aquipara aprender, e como os demais sénio-res tinham um modo de pensar muitopróximo, queriam perceber como pen-savam os mais jovens, até para melhorentenderem, também, o modo de osfilhos pensarem. Portanto, fomos aju-dando-os a integrarem-se na vida acadé-mica e eles foram-se integrando esentindo-se alunos como os outros.”

No claramente positivo balanço finalda experiência por todos vivida pela pri-meira vez, professores, alunos e volun-tários estavam de acordo relativamentea três questões: que devem reunir-se emconjunto mais vezes, que o projecto de-ve ter maior visibilidade, e que é impor-tante resolverem-se diversas questõespráticas, como, por exemplo, a de pos-suírem um cartão de aluno da IPL.

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22 APRENDER

EEmm PPoorrttuuggaall éé iinnddiissccuuttíívveell oo ssuucceessssoo ddaass UUnniivveerrssiiddaaddeess ddaaTTeerrcceeiirraa IIddaaddee.. EEllaass ccoonnttiinnuuaamm aa pprroolliiffeerraarr ee aaiinnddaa mmaaiissiimmppoorrttaannttee:: eellaass nnaasscceemm ddaass iinniicciiaattiivvaass ddaass pprróópprriiaass ppeessssooaass,,sseemm oo aappooiioo ddoo EEssttaaddoo.. CCoommoo jjuussttiiffiiccaamm eessttee ssuucceessssoo??

Carlos Consiglieri -- Posso relatar a minha experiência. Dehá cinco anos a esta parte tenho estado ligado a cinco ou seisentidades nesta área e portanto tenho uma visão um poucoprecisa desta realidade. De qualquer maneira, quero dizer que oaparecimento destas estruturas – chamo-lhes assim porque háentidades que têm o nome de academias, outras escolas e, por-tanto, para não haver realmente uma confusão, prefiro chamar--lhes estruturas – veio ao encontro de uma necessidade, e pode

dizer-se que resultou de duas coisas importantíssimas queforam as medidas de pré-reforma e reforma que se vieram aestabelecer na sociedade portuguesa, no momento em quemuita gente, ainda válida, se viu em situações de desocupação.Ora, essas pessoas ainda têm uma atitude activa, querem partici-par, têm a noção da importância da cultura, da prática lúdica,do desporto, de actividades, de passeios, de convívios.

Do confluir destas duas situações, ocorreu este “boom” aque estamos a assistir. Estamos no início de um processo quevai muito longe. É verdade que talvez haja necessidade de sefazer alguma regulamentação, de reflectir em encontrosnacionais à volta desta questão.

Não quero dizer que não tenha uma grande satisfação em

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Uma velhice activa, portadora desabedoria

A primeira Universidade da Terceira Idadeapareceu numa universidade tradicionalem 1974, mas só mais recentemente éque ficaram reunidas as condições para acriação deste tipo de estruturas em grandequantidade. É que hoje o número depessoas que envelhece, e a esperança devida são claramente maiores: em 1975morria-se aos 70 anos, hoje morre-se aos90. Além disso, hoje a maior parte daspessoas que se reforma, no mínimo sabeler e escrever. A Revista Aprender aoLongo da Vida debate neste número asUniversidades da Terceira Idade comCarlos Consiglieri, Maria da Graça Pinto eLuís Jacob.

estar na RUTIS (Rede de Universidades da Terceira Idade) e estatem respondido sempre, pronta e muito simpaticamente, aosnossos anseios, mas penso que o debate tem de ir mais longe,tem de ser mais amplo e partir das organizações e não das estru-turas do Estado, na perspectiva de arregimentar, de estruturar.Isto tem de ser obviamente criativo. Tem de ser livre, ter um cres-cimento que esteja em confluência com o desejo das pessoas.

E é muito fácil levá-las a esta situação. Por exemplo, aUNISBEN (Universidade Internacional de Benfica) está naárea de Lisboa onde não havia nenhuma estrutura. Havia umauniversidade já com vários anos, mas as pessoas acorreram demaneira pronta, e posso dizer que os telefonemas são diáriose para o próximo ano já temos mais de cem alunos e as

inscrições só vão abrir em Setembro. Há uma vontade, umdesejo de participar, mas a estrutura de recepção, a estrutura deresposta tem de ser também aberta. Não se pode dizer aosutentes, “Veja os horários que estão afixados e escolha o quemais lhe convier”. Na minha leitura isto é talvez o pior que sepossa fazer. O que se tem de fazer é, desde logo, o encaminha-mento de cada pessoa, dando-lhe aquela relação humana queessas estruturas devem ter. Na nossa universidade temos doisdias por semana em que não damos aulas. Um dia é só paravisitas. Organizam-se grupos que vão para a rua, vão passear,conviver. Outro dia é só para debates. Debates sobre asmatérias, debates sobre os professores, debates sobre temas,debates com pessoas que não são os professores.

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Maria da Graça Pinto -- Há umacoisa que é preciso realçar com umacerta veemência: estamos perante umgrupo muito heterogéneo. As formaçõessão diferentes, as experiências são dife-rentes, os saberes são diferentes, o queeles procuram é diferente. Esta popula-ção tem outras exigências, busca outrascoisas e acho que a oferta tem muito deir ao encontro do que eles procuram. Eo facto de este tipo de experiência e deiniciativas cativar vai muito ao encontrodo facto de, parte dessas pessoas, terentrado na reforma. Até ali tinha estadoactiva e depois há aquela transição paraum isolamento. E eles sabem que pararé morrer. Querem estar activos, do

ponto de vista físico e do ponto de vistamental. Em Espanha, os GovernosAutónomos subsidiam as pessoas quequerem frequentar estas actividades.

Luís Jacob -- Porque é que as Uni-versidades da Terceira Idade cresceramtanto? A primeira apareceu dentro deuma numa universidade tradicional em74. Porque é que entre 1975 e 2001 sósurgiram 15 UTI’s? Porque não estavamreunidas as condições para isso. Quecondições são essas? O envelhecimentoda população em 2000 é quantitativo equalitativo. O número de pessoas quehoje envelhece e a esperança de vida éclaramente maior, em 75 morria-se aos70 anos hoje morre-se aos 90, ganhou-se 10/15 anos. As pessoas que em 75morriam, eram analfabetas ou por láperto. Hoje em dia não, a maior partedas pessoas que se reforma, no mínimosabe ler e escrever.

Por isso houve uma massa crítica quenão existia em 75, em 80 e em 90 e hojeclaramente existe. E há o papel dosmeios de comunicação, hoje as Univer-sidades da Terceira Idade são conheci-das. Felizmente, desde 2000, a própriacomunicação social começa a olhar paraos seniores não já com aquela imagemdo velhinho no lar, mas também comopessoas, activas e com potencial. Toda amovimentação através da comunicaçãosocial é boa para as universidades. Sem-pre que sai uma notícia sobre a UTI’s ousobre as universidades, nós somos con-tactados por alguém que quer criar umauniversidade. As universidades senioressão um modelo muito simples de criar,precisa de uma sala, precisa de profes-sores voluntários, precisa de um grupode pessoas e avança. Não é burocrático,ao contrário de todos os outros projec-tos, tem uma estrutura altamente infor-mal e isso faz com que em pouco tempose crie uma universidade.

Depois, a própria existência de umaRUTIS, que tem um modelo. Das 106 es-truturas que existem, metade teve algumapoio da RUTIS.

Em relação à questão que a Maria daGraça colocou sobre Espanha. Há trêsmodelos, as aulas da terceira idade, asuniversidades populares e as universida-des da terceira idade. As universidadespopulares são abertas a toda a gente,qualquer pessoa pode lá ir e aprender.

São fortemente financiadas pelos gover-nos autónomos. Temos as aulas da ter-ceira idade que é o nosso modelo deuniversidade da terceira idade, professo-res voluntários, sem certificação, etc. Hácerca de 500 em Espanha. Depois temosas universidades da terceira idade, quesão desenvolvidas pelas universidadestradicionais e que se aproximam umbocadinho do modelo da Universidadedo Porto.

Maria da Graça Pinto -- Mas pensoque não têm essa limitação de exigiremuma licenciatura.

Luís Jacob -- Algumas têm, outras não.Mas têm um nível de habilitações. Podenão ser licenciatura. Enquanto as aulasda terceira idade são como as nossas,

Licenciado em Educação Social, fezdoutoramento na Universidade deCoimbra sobre EnvelhecimentoActivo. É presidente executivo daRede de Universidades da TerceiraIdade (RUTIS); criou, em 2001, aUniversidade Sénior de Almeirim(USAL).

É professora catedrática daFaculdade de Letras da Universidadedo Porto, com Doutoramento emPsicolinguística e Neurolinguística.Interessada no tema doenvelhecimento cognitivo e davelhice activa, coordena, desde2006, um programa de estudosuniversitários para seniores, namesma faculdade.

DOSSIER

24 APRENDER

Maria da Graça Pinto

Luís Jacob

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qualquer pessoa é bem vinda, as ligadasàs universidades da terceira idade têmalgum tipo de limitações. Qual é a gran-de diferença entre elas? É a parte social,ou a parte educativa, ou seja: as aulas nasuniversidades da terceira idade emPortugal são acima de tudo uma respostasocial, visam tirar as pessoas de casa,combater o isolamento, visam pôr aspessoas activas, participativas. O grandeobjectivo é promover a inclusão socialseja de que forma for, seja através da pin-tura, do teatro, da visita, tirá-las de casa epô-las activas. Os programas universi-tários para adultos destinam-se a um gru-po de pessoas, restrito, com uma forma-ção superior, em que as pessoas vão maispara um aumento de conhecimentos.

Carlos Consiglieri -- Criamos uni-versidades mas temos de ter a certeza deque o que estamos a fazer tem algummérito e tem algum controle. No casoda universidade Unisben fizemos proto-colos com a Escola Superior de Educa-ção de Benfica, com a Escola Superior deComunicação Social de Benfica e comoutras universidades, como psicologiano “campus” universitário. Fizemos pro-tocolos e vêm fazer-nos inquéritos, cadaum com os seus métodos, cada um comos seus objectivos, e que depois nóscruzamos com os resultados, para sabero que estamos a fazer.

No ano lectivo passado, fizemos qua-tro inquéritos destes, o que nos dá umagarantia e uma série de informaçõessobre o que corre bem e o que corremal, sobre o interesse das pessoas. Fize-mos inquéritos extensos aos alunos queestavam também a fazer trabalhos paraa sua própria universidade. Nesta fasepenso que é importantíssimo ter algunselementos, o feedback daquilo que é onosso trabalho e esse método pode serextremamente útil: pôr turmas, discipli-nas, grupos ao serviço dessas universi-dades. Os resultados ajudam-nos muito.Este ano, por exemplo estamos a modi-ficar e estruturar certas e determinadascoisas, práticas e conteúdos.

Tivemos, com a Faculdade de Psicolo-gia e com um grupo de teatro da Facul-dade de Psicologia, jogos com os gruposde pessoas com idade superior a 55 anos.Foi feita uma série de questionários edepois aulas práticas na própria Facul-dade de Psicologia. Constituímos vários

grupos que vieram de lá interessadíssim-os por essas práticas. Fizemos um proto-colo com o teatro de Almada levando aspessoas em camioneta ao teatro efalando com os actores, eles explicandoas encenações. Criando, portanto, umaprática real. Tudo isto são formas deavaliarmos o nosso próprio trabalho e odesenvolvimento das nossas aulas.

Maria da Graça Pinto -- É evidenteque há transmissão de conhecimentosmas há, sobretudo, um grande inter-câmbio de saberes. Os meus alunosfizeram uma visita a Salamanca e virama quantidade de alunos que existia numdos anfiteatros. Na altura disse-lhes, secompararem um pouco vão ver que nãopodem estar tão sossegadinhos nacadeira se estiverem em Salamanca numanfiteatro com tanta gente. De facto,eles são muito activos. É realmente umarecolha de conhecimentos mas é tam-bém uma troca de conhecimentos. Elesestão sempre a interpelar o próprio sa-ber, daí a importância que têm as expe-riências, as trocas de saberes – é o queestá em jogo, no fundo.

UUmmaa qquueessttããoo qquuee lleevvaannttaa sseemmpprreeaallgguummaa ccrriissppaaççããoo éé aa ddaa tteerrmmiinnoollooggiiaa..UUnniivveerrssiiddaaddeess oouu AAccaaddeemmiiaass,, TTeerrcceeiirraaIIddaaddee oouu SSéénniioorr.. AA ppeerrgguunnttaa qquuee eeuu vvoossddiirriijjoo éé aa sseegguuiinnttee:: EEssttaa éé uummaa qquueessttããooiimmppoorrttaannttee?? AA mmáá eessccoollhhaa ddaaddeessiiggnnaaççããoo tteemm ccrriiaaddoo bbaarrrreeiirraass àà ssuuaaiimmpplleemmeennttaaççããoo??

Maria da Graça Pinto -- Penso que aterminologia começou metaforicamente.Um grupo de pessoas de idade foiassistir a uma coisa que estava a ser feitacom jovens, e é bem provável que al-guém tenha dito: “temos aqui a universi-dade da terceira idade”, e a partir daí fi-cou o termo. Sou professora catedrática,sou de uma universidade tradicional, enão me aflige absolutamente nada. Seassusta alguns, assusta os menos infor-mados. Este termo é mundial, criticadoem todo o sítio. É evidente que passounalguns sítios a instituto, academia, paratirar esse peso da universidade. Quanto àterceira idade, também é um termo queestá a mudar. No fundo o que isto signi-fica é a evolução do movimento em si.

Luís Jacob -- É muito curioso. As mais

antigas chamam-se todas universidadesda terceira idade, as mais novas, já sãotodas universidades séniores.

Carlos Consiglieri –– Quando seestá a falar em academia, há um sentidomais elitista da sua composição inicial.Não sei se essas pessoas pensam queacademia é um termo mais pomposo emais emblemático do que universidade.Falando com aquelas academias, em Lis-boa, sinto essa ideia, mas está a desvane-cer-se. Provavelmente vai perder forçanos próximos tempos.

Luís Jacob -- Eu penso que o nomeUniversidade pode afastar, mas, nessecaso, estou de acordo com a Graça. Pode

É presidente do conselho geral daEmpresa de Gestão deEquipamentos e Animação Culturalde Lisboa (EGEAC) e do AteneuComercial de Lisboa e vice-presidente da Voz do Operário.Licenciado em Economia Política,colaborou com várias universidades,como a de Lisboa, onde foi professorna Faculdade de Direito, ou a doPorto, onde reorganizou os serviçossociais.

Carlos Consiglieri

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ser por ignorância, mas acima de tudoatrai.

Notei muito isso quando fui aAlmeirim. Quando as pessoas usavam at-shirt ou a pasta, a dizer UniversidadeSénior de Almeirim. “Eu vou para auniversidade” – isso é uma coisa especta-cular para a auto-estima. Na Nazaré, aspessoas que andam na universidade sãoas senhoras ligadas à pesca. Há poucotempo fui ao encerramento de um cursoe elas próprias tinham uma parábolaque os directores da universidade nãoconheciam a gozar umas com as outras,“então tu vais para a universidade, tu ésuma peixeira, andas a vender peixe eandas na universidade. Mas eu ando nauniversidade para aprender.” Gosto maisdo termo universidade para universal,aberta a toda a gente, aberta a pessoasque não têm dinheiro, aberta a pessoasque não têm habilitações. Gosto muitodo termo universidade.

Os alunos das universidades e opróprio funcionamento das universida-des da terceira idade, embora haja umpadrão mais ou menos igual, é muito,muito heterogéneo. Temos universida-des claramente elitistas. Temos a univer-sidade da Nazaré – mais popular que auniversidade da Nazaré é difícil – ou ado Gavião ou a de Serpa. São universi-dades em que a maior parte dos alunostem poucas habilitações. Vamos para oPorto, e temos universidades claramenteelitistas.

Carlos Consiglieri -- As universida-des que são elitistas perdem. Mas não háque tomar nenhuma atitude em relaçãoa isto. É deixar desenvolver, e quem qui-ser chamar academias chama. Na práticaé um falso problema.

PPaasssseemmooss aa oouuttrraa qquueessttããoo,, aa qquueessttããooggeerraacciioonnaall.. HHáá UUnniivveerrssiiddaaddeess qquuee sseeaassssuummeemm ccoommoo sseennddoo ddiirriiggiiddaass aaoossmmaaiiss iiddoossooss,, ee hháá oouuttrraass qquuee tteennttaammaabbrriirr--ssee aa uumm lleeqquuee mmaaiiss aallaarrggaaddoo ddeeiiddaaddeess.. NNaa pprrááttiiccaa ccoommoo lliiddaarr ccoommssiittuuaaççõõeess ddiiffeerreenntteess?? UUmmaass qquuee ttêêmmddiissppoonniibbiilliiddaaddee ddee tteemmppoo ee oouuttrraass qquueettrraabbaallhhaamm.. UUmmaass qquuee pprreecciissaamm ddee sseerrcceerrttiiffiiccaaddaass,, ee oouuttrraass qquuee ddiizzeemm jjáá nnããoopprreecciissaarr ddee cceerrttiiffiiccaaççããoo nneennhhuummaa......

Carlos Consiglieri -- Na Unisbennão aceitamos como alunos pessoas que

sabemos que estão ainda a trabalhar.Porque sabemos que só querem infor-mática e inglês. A esses dizemos que vãopara uma escola aprender essas matérias.

O intergeracional tem sido uma gran-de dificuldade, no meu ponto de vista,

de pôr em prática. Quais são as geraçõesque nos interessam? A primeira geraçãoque nos interessa, tenho discutido isso,são os avós e os netos. Vamos trataragora dois grupos que são importantes.Quais são as preocupações de grandeparte das pessoas que estão nas universi-dades? E quais são os impedimentosque têm? São os netos, que não têmainda o esquema de ATL’s conveniente eadequado, e isso tem sido um embaraçopara a frequência nas aulas. Por outrolado, propúnhamo-nos fazer essa jun-ção, mas começa a haver aqui variadíssi-mos problemas. Primeiro, as instalações

para fazer esta conexão não podem seras mesmas que servem para os da tercei-ra idade terem aulas; depois o problemaé que as pessoas que estão neste mo-mento a dar aulas não têm em si capa-cidade para também acorrerem a essediálogo de gerações. Há uma grandedificuldade porque se levantam novosproblemas e não estão amadurecidos.Ainda não resolvemos os problemascom os seniores, quanto mais agora apa-recerem problemas intergeracionais. Aexperiência diz que tem sido muito difí-cil estabelecer esta relação. Se a inter-geracionalidade é entre os 40, os 60 e os80 e os 70, isso é uma coisa; mas oentendimento que fazemos na Unisbené de que seria muito interessante con-frontar os avós com os netos, em certosmomentos, em certos acontecimentos. Éhaver momentos em que as duas gera-ções se reúnem, em festas, aconteci-mentos, e isso nós temos tentado fazer,mas sem grande sucesso.

Luís Jacob -- Acho que a intergeracio-nalidade é uma falsa questão, tem umpouco a ver com o nome. A maior partedas universidades aceita pessoas commais de 50 anos. O aluno mais velho deque temos conhecimento tem 96 anos.Entre os 50 e os 96 há quatro ou cincogerações, não podemos ver a intergera-cionalidade apenas entre os 20 os 50 –uma pessoa com 50 é claramente dife-rente de uma pessoa com 80. Por issonão se pode dizer que as universidadesnão têm, elas próprias, intergeração.

E há a questão dos professores, temosmuitos professores com 20, 30, 40 anos.Se cada universidade tem, em média, 20professores, e se desses 20, 10 ou 12 sãojovens, o problema das intergeraciona-lidade perde-se por aí. Por isso, não con-cordo quando dizem que as universid-ades são para seniores.

Algumas universidades perguntaramaos alunos o que achavam de abrir asuniversidades a pessoas com de menosde 50 anos. Houve um não rotundo.Houve um referendo e 80% dos alunosrespondeu que não queria.

Maria da Graça Pinto -- Eu achotambém que os próprios objectivos sãodiferentes. Falou em formação contínua.Formação contínua não tem nada a vercom este tipo de formação. Esta é mais a

A RUTIS tem respondidosempre, pronta e muitosimpaticamente, aos nossosanseios, mas penso que odebate tem de ir mais longe,tem de ser mais amplo epartir das organizações e nãodas estruturas do Estado, naperspectiva de arregimentar,de estruturar. Isto tem de serobviamente criativo. Tem deser livre, ter um crescimentoque esteja em confluênciacom o desejo das pessoas.

CCaarrllooss CCoonnssiigglliieerrii

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dita aprendizagem ao longo da vida einformal. Mesmo que se esteja numainstituição, ela é informal neste sentido.Existe um programa, mas depois esseprograma é virado de pernas ao ar. Nãose consegue dar esse programa e apren-de-se muito com o saber dos alunos.

Carlos Consiglieri -- Mas há umproblema importante, é que muitos dosnossos alunos, com 60, 70, 80 anosgostam de dizer aos seus netos, aos quetêm 10, 12, 14 anos, que estão a estudare gostam de os levar lá e gostam que elestenham um conhecimento daquilo quese passa na escola. Quando fazemosuma festa, muitas pessoas levam os ne-tos, até filhos, com 20, 30 anos, para ver,para estarem informados, e eu acho queisso é extremamente importante.

Luís Jacob -- A intergeracionalidadefaz-se fora de portas e há imensos exem-plos disso. Lembro-me de um caso con-creto, estávamos a dar a Guerra noGolfo. Uma vez encontrei um miúdocom 12 anos que me disse: “oh doutorLuís, o que é que estão a dar lá na escolados velhos que no outro dia, estávamosa ver o telejornal e a minha avó falou-me da Guerra do Golfo e dos mísseis. Aminha avó, que só falava das doenças,esteve a explicar-me o que eram osmísseis”. O orgulho com que o miúdofalava da avó, a avó antigamente só sequeixava das dores das costas e derepente dá-lhe uma lição sobre osmísseis e ele pensou: “a minha avó é umespectáculo”.

Maria da Graça Pinto -- E fala-se àboca cheia da história das depressões queacabam quando os adultos começam aentrar nesses sítios. Uma aluna que esta-va farta de andar por vários sítios, a certaaltura veio ter comigo a agradecer-memuito por eu ter tido esta iniciativa, por-que se sentia realmente bem. As pessoasvêm felizes, satisfeitas. “Só temos aulasoutra vez em Outubro? Mas nós que-remos ter aulas antes. Ai tanto tempo deférias!” Isto é um estímulo que se sente.

Acho que não se deve confundir for-mação contínua com isto, que no fundoé esta aprendizagem ao longo da vida,porque os objectivos são diferentes. Unssão para certificação, até porque precisamno trabalho, outros para actualização de

conhecimentos, aqui não é tanto a actua-lização de conhecimentos, é a reactua-lização, é um remexer daquilo que temoscá dentro. É evidente que há um avanço,mas é um remexer, é um reactualizaraquilo que a pessoa tem, e acho que isso

é importante porque vamos começar aver as coisas de outra forma.

Por outro lado, há uma outra coisamuito interessante. Como eu gosto destahistória do conhecimento cognitivo, àsvezes falo com os meus alunos de 20anos, eu que já tenho mais de 50, já po-dia frequentar o programa e pergunto-lhes: sentem alguma diferença no ensinode professores jovens e de professoresmenos jovens? Alguns dizem-me quesim e eu pergunto-lhes o que preferem.Porque eu também sinto que os novos,em termos de pensamento, vão muitopela auto-estrada, e os mais velhos já vão

por atalhos. É o pensamento associativoque começa a entrar em jogo. Por isso éque, às vezes, nos perdemos nas aulas.Um aluno pergunta uma coisa e nósvamos por ali fora. Aquele indivíduo quevai para a universidade com curiosidadegosta, aquele indivíduo que não vai paraa universidade com curiosidade nãogosta, perde-se. Os alunos seniores vãotodos por atalhos, eles gostam é mesmode atalhar por tudo o que é sítio. Masisso é próprio. À medida que envelhe-cemos sentimos isso.

Carlos Consiglieri -- Mas tambémreflectir sobre os momentos actuais.Uma notícia do telejornal discutida naaula, uma notícia sobre a corrupção, porexemplo: o que é a corrupção, porqueexiste? As pessoas estão desejosas de re-flectir sobre estas questões. Uma dasdisciplinas mais em voga é cidadania, etodos os temas que estão à volta disso.Esta disciplina chega a ter 80 alunos!

Mas o problema é que as pessoas co-locam questões sobre o tipo de pedago-gia que vai ser adoptado. Como é que seconduz uma aula numa estrutura destas?É debitar matéria? É realmente permitirque os alunos intervenham e coloquemas suas questões? É dar alguma matéria edepois ter algum tempo para discutir? Épedir a alunos que introduzam proble-mas na aula seguinte? Há variadíssimasmaneiras de colocar estas questões.

E a outra coisa que eles não tiveramna escola, e que marca a diferença dotempo e dos estilos, é as pessoas tam-bém perceberem os dias que estão a vi-ver e os problemas que estão a viver. Eesses problemas ligam-se à cidadania, àcarestia da vida, a certas e determinadasquestões. As disciplinas da saúde, quer aconvencional quer as chamadas alterna-tivas, têm muitos alunos e têm muitointeresse – na minha universidade, adisciplina mais frequentadas é esta.

SSeerriiaa iimmppoorrttaannttee ffaazzeerr uumm mmaannuuaall??AAcchhaamm qquuee ddeevvee sseerr ddeeffiinniiddoo uumm ppeerrffiillddee ccoommppeettêênncciiaass ppaarraa ooss pprrooffeessssoorreessddaass uunniivveerrssiiddaaddeess ddaa tteerrcceeiirraa iiddaaddee??CCoommoo eennccaarraamm aass qquueessttõõeessrreellaacciioonnaaddaass ccoomm ooss ffoorrmmaaddoorreess??DDeevveerrããoo tteerr ffoorrmmaaççããoo eessppeeccííffiiccaa??

Luís Jacob -- A que é que chama for-madores? Os animadores? Aí também

AO LONGO DA VIDA 27

A palavra sabedoria cobremuito esta aprendizagem aolongo da vida e agerontagogia. Ela nãoprocura, como a formaçãocontínua, a ciência; procura asabedoria, procura ir aoencontro deste acumular desaberes que a pessoa vaiadquirindo e que vai fazendocom que, a certa altura,comece a relativizar, a olharpara as coisas de uma outraforma.

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entramos na questão quente, que é aterminologia. Não gosto muito de cha-mar professores, gosto mais de chamaranimadores, porque eles no fundo sãoanimadores.

Um dos grandes projectos que temosé fazer um manual. Só não sabemosmuito bem por onde pegar-lhe. Quere-mos fazer um manual simples para en-tregar àquela pessoa. Qual é o perfil doformador? Há professores, e a maiorparte não são professores, nunca tive-ram qualquer competência pedagógica,formativa. Há pessoas novas, há pessoasvelhas. Acho que era importante dar aessas pessoas, e já algumas universi-dades me têm feito sentir isso, um guia,um manual a dizer: atenção que estepúblico é diferente.

Maria da Graça Pinto -- Tenho umlivro quase a sair que toca um boca-dinho nessa parte da gerontagogia.

Luís Jacob -- O que é importante quesaiba uma pessoa de 30 anos que foiconvidada para dar aulas numa univer-sidade da terceira idade?

Maria da Graça Pinto -- Essa pessoateria de ter conhecimento sobre o que éo envelhecimento. E da forma como opensamento evolui. E daquilo que, nofundo, uma pessoa daquela idade bus-ca. Porque, senão, é uma decepção. Nãopode ir para ali completamente forma-tado. É preciso ter essa sensibilidadepara o que é o envelhecimento, mas umenvelhecimento num sentido muitopositivo, não o envelhecimento pejora-tivo. Uma velhice construtiva e activa,portadora, no fundo, de sabedoria.

A palavra sabedoria cobre muito estaaprendizagem ao longo da vida e agerontagogia. Ela não procura, como aformação contínua, a ciência; procura asabedoria, procura ir ao encontro desteacumular de saberes que a pessoa vaiadquirindo e que vai fazendo com que,a certa altura, comece a relativizar, aolhar para as coisas de uma outra forma.Ainda hoje, falando sobre os terceirosciclos de Bolonha, o médico me pergun-tava: “está reformada, acabou de sereformar. Está preocupada?” Eu tenhode relativizar, se me preocupo com issonão faço mais nada na vida. Isto temtambém um bocado a ver com o tipo de

pensamento, que vinha já do Piaget, oconcreto, o formal e depois o pós-for-mal. Nem toda a gente chega ao formalnem aos cem anos e há gente do pós-formal já aos vinte. Isto é tudo muitorelativo. O que é preciso é estar sensi-

bilizado para este tipo de coisas. Estetipo de cursos devia ter por detrás asciências da educação.

Carlos Consiglieri -- Posso dizer-lhe que temos um doutorado em ciên-cias da educação que é nosso professor.Temos a professora Teresa Santo Cristoque esteve na comissão de avaliação doministério, que é nossa professora e queé uma pessoa que está no activo.

Uma das potencialidades de tudoisto é que quem ensina deve ser olhadapela sua experiência e pela sua capaci-dade, seja de que nível for. Tenho secre-

tárias de direcção que falam inglês e quesão belíssimas professoras de inglês,tenho professoras do ensino secundário,tenho professores universitários, tenhomédicos que nunca deram aulas. Temosaqui um conjunto variado.

E é essa potencialidade que se devemanter, que se deve desenvolver. Nãoquer dizer que não possa haver formasde discutir com este universo, formaspedagógicas e tentar melhorar os pa-drões de desempenho. Acho que isso épossível e deve ser aconselhado. Quantoaos manuais, estou de acordo com oque o Dr. Jacob disse, mas, pessoalmen-te, quero dizer que gostaria de ver nessesencontros que preconizei, encontrosnacionais ou regionais, uma discussãomais profunda e afastar a ideia deformadores neste tipo de assuntos.

Deve começar-se por sessões desensibilização, as tais coisas que eu faço,debates, etc. mas penso que se deveprocurar transmitir experiências. Porqueas pessoas daquela idade gostam deconhecer a experiência dos outros,assentam todo o seu conhecimento nasua própria experiência e partem dessaexperiência para o entendimento daexperiência dos outros. E isto é o funda-mental, isso é o enriquecimento dogrupo. Se vamos fazer um manual queestabeleça regras e que tenha algumasdificuldades, não sei se não estamos aafastar as pessoas.

Luís Jacob -- Então retiro o manual eponho aquilo que a Graça disse, que ésensibilização. O meu manual temquatro ou cinco folhas, para que aquelapessoa que vai, pela primeira vez, daraulas numa universidade sénior tenhaatenção a estes pormenores.

Maria da Graça Pinto -- Acho que éum pouco isso, não é entregar a pessoaàs feras. Por isso é que os alunos, quantomais preparação têm, mais sentemquem tem ou não jeito e vêem nitida-mente a sensibilidade de cada um. Hápessoas que vão para professores e quenão têm jeito nenhum. Isso dependemuito. Eu não sou uma boa conversa-dora, mas sinto que seguro os alunoscom muita facilidade. Mas é essa histó-ria, não somos todos feitos para fazer omesmo, mas uma sensibilização paraeste tipo de população, acho que sim.

DOSSIER

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Uma vez encontrei ummiúdo com 12 anos que medisse: “Oh doutor Luís, o queé que estão a dar lá na escolados velhos que no outro dia,estávamos a ver o telejornal ea minha avó falou-me daGuerra do Golfo e dosmísseis. A minha avó, que sófalava das doenças, esteve aexplicar-me o que eram osmísseis”. O orgulho com queo miúdo falava da avó, a avóantigamente só se queixavadas dores das costas e derepente dá-lhe uma liçãosobre os mísseis e elepensou: “a minha avó é umespectáculo”.

LLuuííss JJaaccoobb

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Luís Jacob -- Nós estamos à frente deBolonha muitos e muitos anos, porquehá a avaliação natural. A avaliaçãonatural é esta: o professor não é bom, osalunos deixam de ir. Depois, é o alunoque faz o seu próprio currículo, queescolhe as disciplinas, por vários moti-vos, e um deles é claramente o professor.

UUmmaa úúllttiimmaa qquueessttããoo.. JJuullggoo qquuee aassaabboorrddaaggeennss aaooss aassssuunnttooss ssããoo ffeeiittaass ddeemmaanneeiirraa ddiiffeerreennttee aaooss 2200 ee aaooss 6600..AAooss 2200,, eessttuuddaa--ssee oo qquuee nnooss oobbrriiggaamm eeaaooss 6600,, oo qquuee qquueerreemmooss..

Maria da Graça Pinto -- Depende.Vamos imaginar que, de facto, aspessoas não estão face à matéria damesma maneira. Neste momento, está apôr-se as pessoas de 60 anos nas UTI’s, eos de 20 anos na Universidade conven-cional. Mas nós podemos tê-los juntos.E dizia-me o meu dentista, a minhamulher agora quis tirar um curso deFilosofia e é a melhor aluna. Não perce-be porque é que os alunos mais novosnão se interessam nada pela matéria. Eudisse, por amor de Deus, veja a idade,não têm a mesma idade. Um indivíduode 20 anos não pode olhar para a maté-ria da mesma maneira que olha umapessoa com 50 e tal. Não pode olhar.Eu, por exemplo, deixei de continuar aaprender italiano porque me irritava aprofessora, não era velha, mas já meestava a chatear aquele tipo de ensino. Apessoa torna-se muito selectiva, exigen-te. Esta história do programa dos estu-dos universitários para seniores é paradeterminadas pessoas que não encon-traram aquilo que encontraram ali,porque já estão mais exigentes. É exacta-mente essa a ideia da heterogeneidade.

Luís Jacob -- A minha posição é esta:as universidades da terceira idade sólhes vão trazer uma resposta social.Quem quiser uma resposta mais educa-tiva, terão de ser as universidades e ospolitécnicos a dar. E não confundir ascoisas. As universidades da terceira ida-de são abertas a toda a gente, indepen-dentemente do meio, das habilitações,as pessoas vão lá para conviver. As uni-versidades da terceira idade têm umpapel importantíssimo. Haverá sempreuma minoria que quer mais e acho quesão as universidades que vão fornecer

isso. Quer o modelo da do Porto ou a deLeiria. Eu tenho falado com alguns poli-técnicos que dizem: vocês aproveitemesse mercado que aí está. Tive uma dis-cussão teórica, em Bragança, onde douaulas. Eles queriam fazer uma universi-dade da terceira idade no politécnico.

Não faz sentido. Porque o lugar de umauniversidade da terceira idade não é nopolitécnico, é fora. Vocês querem fazeroutra coisa, há outros modelos, façamcomo aqui ao lado, em Espanha, vão láver como é que se faz. Agora não quei-ram meter uma universidade no politéc-nico de Bragança com 300 alunos. Nãofaz sentido, tenham 30.

Luís Jacob -- É como digo: quandovamos no comboio, temos a 1ª classe etemos a 2ª classe. Aqui também, temosclaramente de fazer nichos de mercadopara cada uma das pessoas. Há umapessoa que tem a 4ª classe, nunca foi aoteatro, não lhes vamos dar uma discipli-na de literatura americana, não faz sen-tido nenhum.

Isso é uma coisa que também natu-ralmente acontece nas universidadestradicionais. Qualquer pessoa se podeinscrever, mas naturalmente as pessoasescolhem as disciplinas onde se revêemmais. Quando há um professor que émais exigente, quais são os alunos quevão a essa disciplina? São os alunos quetêm mais habilitações. Eu tinha umadisciplina em Almeirim que era Litera-tura Americana, tinha oito alunos. Cla-ramente quem eram aqueles alunos? Amaior parte eram antigos professores. ACidadania vai toda a gente. A Saúde vai

toda a gente. Ou seja, naturalmente aspessoas acabam por fazer os seus grupose eu acredito que em cada universidadeda terceira idade haja um grupo, uns10%, que quer mais do que aquilo que auniversidade lhe dá.

Maria da Graça Pinto -- O que é umfacto é que a heterogeneidade aqui éuma realidade.

Luís Jacob -- As universidades maisheterogéneas são aquelas que são maisvivas, aquelas universidades que sefecham um bocadinho sobre si. Há ummovimento relativamente recente quesão os Rotários. Os Rotários estão a criaruma série de universidades da terceiraidade, é um movimento das universida-des seniores. O que se nota é que sãoelitistas. E por isso acho que perdem.Quando junto uma pessoa com a 4ªclasse que sempre viveu no campo comuma pessoa que foi bancária, há umganho. O grupo ganha com isso. Aquelapessoa que ia, digamos, entre aspas,mais desleixada para a universidade,quando sabe que há pessoas importan-tes na universidade, trata da sua imagem,esmera-se. Por exemplo, em Almeirim,no primeiro ano olhávamos para os alu-nos e dizíamos, esta é do campo. Hoje,quando vamos a um passeio, já nãosabemos muito bem distinguir quem équem, ou seja, houve ali uma evolução.

Maria da Graça Pinto -- E até podeacontecer o contrário, aqueles que eramsenhores doutores começarem a sermenos snobes.

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D ona Hortênsia dos SantosTeixeira tem dois grandesprazeres na vida, fazerrenda e estar ao computa-dor, mas confessa preferir

o segundo. Com 80 anos, aprendeu re-centemente a trocar e-mails e fotografiascom o seu irmão imigrado na França eos netos que vivem em Lisboa. Na Web,procura informações sobre a doença deParkinson, a enfermidade que a aflige.Ela faz parte do grupo de 15 idosos doCentro de Solidariedade Social PadreJosé Filipe Rodrigues, localizado naZibreira, concelho de Torres Novas, queparticipam do projecto Click@vô. “Oscentros de dia e lares de terceira idadenão têm que ser antecâmaras da morte,mas sítios vivos, onde as pessoas sãorespeitadas integralmente”, referiu

Teresa Coelho, directora técnica docentro.

O Click@vô começou em Outubrode 2005 com o objectivo de ensinar osidosos do centro a usarem o compu-tador. A IBM integrou-se ao projecto for-necendo cinco computadores portáteisno âmbito do seu Programa de Doaçãode Equipamentos Usados. “A experiên-cia foi 100% positiva”, avalia MargaridaHenriques, educadora social do centro.Ela explica que a aproximação dos ido-sos aos computadores começou pelointeresse que tinham em comunicar-secom familiares distantes, muitos deles aviver no Canadá ou França, através doMessenger e e-mail. “Temos doze caixasde e-mail criadas, das quais três a come-çar e nove activas. Diariamente há seisidosos que vão consultar ou conversar

com familiares ou amigos”, conta Mar-garida. “Temos coisas fantásticas, comoalguém que vê a fotografia da bisnetaacabada de nascer ou do casamento doneto e chora copiosamente”, acrescentaTeresa.

Além de Margarida, os novos “inter-nautas” contam com o apoio voluntáriode Fernando Zagalo, reformado da IBMapós 30 anos de trabalho na área dehardware e software, e, no Verão, de jo-vens integrantes do programa de ocupa-ção dos tempos livres do Instituto Por-tuguês da Juventude (IPJ). Este é o casode Ana Cláudia Caetano, de 18 anos,voluntária do Click@vô em Agosto de2007. É com estas palavras que resume asua permanência no Centro de Solida-riedade Social: “Foi uma boa experiên-cia porque aprendi muito com os ido-

DOSSIER

Se é verdade que os jovens demonstram mais apetência para as novastecnologias, não é verdade que estas sejam inacessíveis aos mais velhos.Facto provado pela experiência de um Centro de Solidariedade Socialna Zibreira, em que idosos com mais de 80 anos aprenderam a trocar e-mails e navegar na Web.

Texto: Cristina Portella # Fotografias: Paulo Figueiredo

A INFORMÁTICA CHEGA AOS 80

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sos; fizeram com que reflectíssemos umpouco sobre a nossa vida”. Para ela, aexperiência também foi positiva para osidosos: “Acho que eles conseguiram per-ceber que a idade que têm não é impe-dimento para acompanharem as novastecnologias”. Dos 15 participantes doClick@vô - de um total de 39 utentes docentro de dia –, a maioria são mulheresna faixa etária dos 80 aos 89 anos.

De volta à escola

Como uma coisa puxa outra – e, nocaso da troca de e-mails, a necessidadede ler e escrever –, os idosos que aderi-ram ao Click@vô acabaram por mani-festar interesse em retornar, bem maisde meio século depois da primeira expe-riência, aos bancos escolares. “Inicial-

mente, propuseram-me que arranjassealguém que viesse aqui fazer um cursode alfabetização, mas eu rejeitei de ime-diato, porque acho que as pessoas, porterem idade, não têm que fazer as coisasde maneira diferente. O importante erair à escola. Estamos a falar de um pú-blico que não teve esta oportunidade, eque ainda tem esta mágoa”, conta TeresaCoelho.

Quando, no início do ano lectivo de2007/2008, abriram-se inscrições naEscola Secundária de Alcanena para afrequência de um Curso de Alfabetiza-ção, o Centro de Dia da Zibreira apro-veitou a oportunidade para matricular15 utentes. As aulas de começaram emNovembro de 2007. “A maior motivaçãodeles foi de facto poderem voltar àescola. Não esqueço do ar de felicidade

e de vaidade com que chegavam, cadaum com a sua pasta, e iam tão direitoquanto podiam”, relembra Ana PaulaCarvalho, professora de Português eLatim da escola de Alcanena e respon-sável pelo curso de alfabetização. Ela euma professora de arte – “ideal para meajudar porque outra das dificuldadesdos idosos é a motricidade fina” – tra-balharam durante um ano para, comodefine a directora do centro, “pagar umadívida de 70 anos”. “Foram meninos emeninas arrancados da escola para iremtrabalhar”, lembra Teresa. Algunstinham frequentado a escola até oterceiro ano, mas outros não tinhampassado do primeiro.

As aulas decorreram duas vezes porsemana, às 2as e 4as feiras de manhã,com duração de 90 minutos. Para além

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destas duas manhãs, os alunos dedica-ram sempre outras duas na realizaçãodos trabalhos de casa no Centro de Dia,normalmente às 3as e 5as feiras. “Nãotínhamos experiência e ficamos naexpectativa de ver o que acontecia. A pri-meira coisa que percebi é que é precisouma atenção individualizada paraconseguir ajudá-los, porque esta é umaturma diferente, uma turma que muitasvezes tem dificuldades auditivas, nãopodemos estar a falar para a turmaporque senão metade não ouve; têmmuitas dificuldades de visão, temos queestar ali ao pé, escrever letras grandes,para conseguirem ver; não funcionacomo uma aula que eu costumo dar, emque falo para 20 alunos e todos me ou-vem, escrevo no quadro e todos vêem”,descreve Ana Paula.

Ao chegar a Junho de 2008, concluí-do o primeiro ano escolar, a professoraavalia que o objectivo de alfabetizá-losfoi cumprido. “Tenho casos de sucessode pessoas que ficaram a conhecer todasas letras, que lêem e escrevem o que

vêem escrito, mas têm muita dificuldadeem escrever o que pensam; algumas têmautonomia para escrever o que pensam.O caso de menos sucesso foi o de umaaluna com 91 anos, que conseguiu a-prender, não todas as letras do alfabeto,aprendeu várias vogais e várias consoan-tes; o principal problema dela é a motri-cidade, ela nunca conseguiu fazer algoque fosse circular. Mas houve sucesso emtermos de auto-estima. Ela sentia-sefelicíssima por tudo que era capaz defazer e dizia que tinha mostrado ao filhoo que fez e que ele tinha ficado muitoadmirado. Ela vai continuar no próximoano.” Sim, porque as aulas estão a pros-seguir neste ano lectivo de 2008/2009.“Eles vão retomar cada um de acordocom a evolução que fez até a altura”,explica Ana Paula.

Mas há um outro aspecto que, apesarde não contar directamente para aavaliação do projecto, mereceu referên-cia por parte de Ana Paula e TeresaCoelho. Elas contam que, inicialmente,os alunos regulares da Escola Secundá-

ria de Alcanena ficaram muito admira-dos quando viram chegar carrinhascheias de idosos para assistirem às aulas.“Pediam-nos para ir à sala de aula ver osalunos mais velhos. Tivemos váriasvisitas de alunos e depois até tivemosprojectos de inter-ajuda de idosos ejovens. Nós não podemos dizer aosjovens que têm de respeitar os idosos seeles não os conhecem”, comentou AnaPaula. “Mesmo que não tivessem se co-municado muito, criou-se ali uma zonade respeito mútuo”, acrescentou Teresa.“Eles já foram como nós”, comentavamos jovens referindo-se aos seus colegasmais velhos. “Eles entravam à mesmahora na escola, saíam à mesma hora,partilhavam os intervalos. Os alunos ti-veram que respeitar o passo dos idosos.”

O Click@migo

Dar continuidade a essa integraçãoentre jovens e idosos é um dos objectivosde um novo projecto do Centro de Soli-dariedade Social da Zibreira na área da

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Ana Paula CarvalhoProfessora

Fernando ZagaloVoluntário

Teresa CoelhoDirectora Técnica do Centro

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informática, chamado Click@migo Aideia surgiu quando, em parceria com oCentro de Formação Profissional deTomar, o centro organizou no ano passa-do um curso de RVCC (Reconhecimen-to, Validação e Certificação de Com-petências) para funcionários e morado-res da Zibreira. Para viabilizar a inicia-tiva, Teresa Coelho entrou em contactocom a directora da Divisão de Comuni-cações e Programas Externos da IBM-Portugal, Conceição Zagalo, para solici-tar-lhe o empréstimo de computadorespara a formação em tecnologias da infor-mação. A IBM concordou e emprestouquinze computadores portáteis duranteo período da formação de seis meses.

Embora o curso se tenha realizado naJunta de Freguesia de Zibreira, a forma-ção em informática foi dada pelo volun-

tário Fernando Zagalo no Centro deDia. “Foi aí que pensei no Click@migopara trazer a juventude para cá”, contaTeresa. Com o Click@migo, a institui-ção passará a ter um espaço dotado dedez computadores com acesso à Internetsempre ao dispor dos utentes, bemcomo da comunidade local, o que per-mitirá trazer diariamente vários elemen-tos do exterior ao centro, nomeadamen-te jovens. “Faz muito bem aos idosos eaos jovens”, resume Teresa. Além defranquear acesso à Internet à comuni-dade, é intenção do centro oferecer cur-sos de iniciação à informática, Office ePower Point, entre outros, aos interessa-dos. No fecho desta edição, este projectoestava em fase de implementação, masjá tinha assegurado a doação pela IBMde dez portáteis usados.

Enquanto isso, novos equipamentosinformáticos – como monitores LCD ecâmaras web – e novos softwares –como o Skype, que permite chamadasbaratas do computador para telefonesfixos e celulares – estão a ser planeadospara os utentes do Centro de Dia. Paracombater a inactividade dos idosos, ocentro adopta várias iniciativas: educa-ção física três vezes por semana, tra-balhos manuais, passeios à praia ou aFátima e até concursos de Carnaval. Masa Internet tornou-se o passatempo pre-dilecto de alguns idosos. Como DonaHortênsia, de quem falamos no iníciodeste artigo. “Ela é absolutamente vicia-da em computador”, comenta TeresaCoelho. Às 8 da manhã está a dizer àfilha: “Vai me pôr ao centro de dia queeu quero ir para a Net”.

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ARTIGO

Novas finalidades para a educação de adultos?

Dizem-nos que a nossa sociedade se tornou num local deaprendizagem, na qual os indivíduos devem conhecer com oobjectivo de tornar a economia mais produtiva e competitiva.Nestes tempos de Modernidade líquida, pretende-se que osadultos sejam aquilo que Zygmunt Bauman (2005) designade mísseis expeditos, capazes de identificar as suas debilidadesem termos educativos, formativos e de aprendizagem e de assolucionar. Estes mísseis surgem como alternativa aos mísseisbalísticos da Modernidade que se orientavam para um único edeterminado alvo. Ao contrário dos mísseis balísticos, os mís-seis expeditos aprendem enquanto fazem o seu percurso e,uma vez que não possuem um destino pré-definido, são capa-zes de identificar alvos móveis, que apresentam formasvariadas em função das características e condições de desen-volvimento dos mercados, no contexto da globalização e deeconomias cada vez mais contingentes e imprevisíveis.

Podemos afirmar que os mísseis expeditos seguem uma

“racionalidade instrumental”, uma versão mais líquida efluida de racionalidade que não parte do pressuposto de queo fim é um dado conhecido, seguro e imutável num tempodeterminado, mas que assenta na possibilidade de calcular emanipular os meios. Mesmo sendo mísseis expeditos, nãoconseguem manter-se confinados a um alvo pré-seleccionado;escolhem os seus alvos enquanto fazem o seu percurso. Estesmísseis guiam-se preferencialmente pelo que consideramconseguir obter, de acordo com as suas capacidades técnicas;procuram assim seleccionar alvos potenciais que podem serencontrados à sua volta e para os quais se encontram melhorequipados para atingir. (Bauman, 2005: 17-18)

De acordo com esta análise, na actualidade os adultosdevem recorrer a estratégias de cálculo e avaliação que lhespermitem escolher os objectivos dos seus percursos educativose formativos enquanto percorrem estes caminhos, podendoalterar as finalidades destes percursos se as condições doscontextos nos quais vivem se alterarem. Neste caso, os adultostornam-se mais diligentes e eficazes se estiverem preparados

A EDUCAÇÃO DEADULTOS NO SÉC. XXI:DESAFIOSCONTEMPORÂNEOSEM PROSPECTIVATexto: Paula Guimarães, Universidade do Minho

Na actualidade, a educação de adultos, enquanto campo de práticas e disciplina, enfrenta diversosdesafios, com os quais os educadores e os educandos, adultos em processos educativos eformativos, se confrontam quotidianamente. Destes, destacam-se os que aqui são apontados que,por se revelarem particularmente prementes e determinantes, poderão num futuro próximocondicionar o modo como olhamos para a educação de adultos.

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com “equipamento” de cariz generalista, um conhecimentodespolitizado e desfocalizado de qualquer categoria de fins;devem, por tal, evitar se centrar em alvos previamente escolhi-dos e devem estar atentos ao surgimento de outros alvos que nocaminho possam ser considerados mais apropriados. Assim, osmísseis expeditos não podem deixar de estar equipados comuma ferramenta básica que consiste em “aprender a aprender”,de preferência “aprender a aprender depressa”, conseguindoesquecer rapidamente o que se aprenderam antes. O conhe-cimento tem um valor num contexto e momento determinado;é por tal temporário, sobretudo utilitário e descartável, de usare deitar fora quando já não se precisa dele. Neste tempos demodernidade líquida, os mísseis balísticos teriam de sersubstituídos pelos mísseis expeditos, pois na actualidade

(…) a formação de cada pessoa e da sua personalidade éimpensável num outro figurino que não seja aquele que prevêum processo inacabado, contínuo e perpétuo de re-formação.(Bauman, 2005: 19)

Neste âmbito, o desafio consiste em re-politizar a educação

de adultos e a acção dos educandos e educadores numa so-ciedade que parece ser geradora de desigualdades cada vezmais complexas. Até porque as políticas públicas em desen-volvimento hoje em dia em muitos países estão a redefinir aeducação de adultos, muitas vezes em função da aprendiza-gem ao longo da vida e dos pressupostos de uma racionali-dade instrumental; torna-se assim mais importante problema-tizar o que os adultos e educadores são na actualidade, comopensam e como agem.

Repolitizar a educação de adultos?

Porque a tradição mais radical deste campo de práticassempre foi marginal ao desenvolvimento das políticas públi-cas, a educação de adultos foi em muitos momentos capaz deagir nas margens, por entre contradições, tensões e lacunasdessas mesmas políticas. Talvez as alternativas radicais à polí-tica instituída possam ainda ser criadas dialecticamente nasmargens que vão surgindo. Contudo, parece que esta tarefa

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hoje se revela mais difícil devido ao agendamento da aprendi-zagem ao longo da vida e da formação efectuado por muitosEstados, pela União Europeia e por outras instâncias interna-cionais. Em resultado da articulação da aprendizagem aolongo da vida com a globalização dos mercados, o empregotornou-se mais escasso e precário e a educação de adultos temsido utilizada para servir a formação profissional instrumen-tal de acepção restrita e instrumental. Neste quadro, as mar-gens, nas quais a educação de adultos actuava, constituíram-se em objectos de controlo e vigilância.

Quanto à identidade dos educandos, agora mísseis expedi-tos, e dos próprios educadores, daqueles que apoiam e orien-tam os adultos em processos educativos e formativos, elaatomiza-se e dispersa-se em resultado das forças centrífugasda política. O desafio então para os educandos e educadoresrevela diferentes facetas.

No caso dos educandos trata-se de aproveitar as oportuni-dades educativas e formativas existentes, quer sejam estas deeducação formal (educação básica ou outra), não-formal (deformação, de animação, de desenvolvimento, etc.) e informal,evitando constituir-se exclusivamente como consumidor,cliente, elemento de um grupo em risco de exclusão social ouno alvo de certas políticas. Ser um educando não-alienado eemancipado, problematizador e capaz de transformar-se emudar as condições de vida é uma finalidade essencial.

No caso dos educadores, há que manter um grau de coe-rência em termos de identidade e de trabalho levado a cabo eactuar em diversos domínios da educação de adultos, nãosurgindo exclusivamente como técnicos, responsáveis pelaformação, formadores, mediadores, orientadores ou consulto-res, mas procurando articular diversas facetas de uma inter-venção ela própria alargada a diferentes domínios. Os educa-dores não poderão por isso deixar de ter presentes os valores,as finalidades, os processos e as possibilidades educativas eformativas em jogo em sociedades cada vez mais complexas.

No caso dos educadores de adultos radicais, encontrar for-mas de repensar os valores democráticos, redefinir e reforçarformas de intervenção que visem promover a justiça social,bem como encontrar modos de acção que “marquem a dife-rença”, em particular no caso de grupos desfavorecidos, margi-nalizados e com menos poder surgem também como finalida-des fundamentais. E talvez seja ainda e sobretudo em organiza-

ções da sociedade civil e em movimentos sociais que essesespaços educativos formais e informais emergem e permitem odesenvolvimento de aprendizagens de cariz radical, embora sesaiba que hoje em dia é cada vez menos provável que os profis-sionais da educação de adultos tenham contacto com estesgrupos e movimentos. O desafio neste caso é ambicioso epassa por articular a identidade (profissional) do educador deadultos com as forças sociais e económicas da mudança, assimcomo por dar sentido e fomentar as transformações indivi-duais e sociais, pois a educação é política, como dizia PauloFreire.

Tempo de trabalho e de não-trabalho: qual lugar da educação de adultos?

Os tempos que hoje vivemos revelam mudanças determi-nantes na economia e no trabalho que não podem ser esque-cidas. Se, por um lado, o aumento da idade com que se entrano mercado de trabalho veio prolongar o tempo passado emorganizações educativas, também é verdade que nosreformamos cada vez mais tarde. Estas circunstâncias têm sidomarcadas por mudanças no emprego, que parece faltar cadavez mais ou tornar-se mais flexível, mudanças estas associadasà crise fiscal e à crise do Estado-providência.

Neste quadro, a construção de um verdadeiro sistema deaprendizagem ao longo da vida requer uma arquitecturatotalmente diferente daquela que os sistemas educativos hojeapresentam, bem como exige novos sistemas de segurançasocial e, especificamente, de pensões. Mas as pessoas sentem-se assustadas com esta necessidade e não estão mobilizadaspara controlar as suas vidas. É neste domínio que parece sernecessário repensar o significado da educação (de adultos) edo trabalho, assim como do papel do Estado, rever o que seentende por trabalho e por não-trabalho, por tempo útil àeconomia e tempo útil a outros sectores, bem como tempo“realmente útil” aos adultos. Tomando a educação de adultosem sentido lato, a necessidade de manter as pessoas em esta-do de serem úteis ao sistema e, portanto, garantirem o seuemprego, adquirindo em permanência conhecimentos ecapacidades que possam “trocar” no mercado de trabalho, éessencial. Esta preocupação vai muito para além de umaformação adaptativa e instrumental e, num contexto em que

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A tradição mais radical deste campo de práticas sempre foimarginal ao desenvolvimento das políticas públicas, a educação deadultos foi em muitos momentos capaz de agir nas margens, porentre contradições, tensões e lacunas dessas mesmas políticas.

ARTIGO

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se regista uma progressiva escassez de empregos, terá queassentar em formas de “emprego plural”, de trabalho integra-do em percursos de vida activa. De resto, esta será uma vidaque não se constituirá exclusivamente por um único empregopara toda a vida, mas uma vida que inclua percursos diversifi-cados, compostos por períodos de trabalho remunerado, porconta de outrem, independente, como empresário, trabalho atempo inteiro e a tempo parcial, com outras formas detrabalho, seja este voluntário, de intervenção social e cívica, dematernidade e de paternidade, de ocupação de tempos livres,de educação e formação, de expressão artística, etc. Estes tem-pos, alternados entre períodos de salário mais elevado comforte constrangimento no tempo próprio, com períodos desalário mais baixo e maior liberdade de gestão do tempo, po-dem permitir uma outra concepção de educação de adultos.

Nestas sociedades, o trabalho apresentaria novos contor-nos, integrando sentidos que favorecessem a expressão decapacidades pessoais articuladas com a satisfação de necessi-dades de carácter social, económico e politico globais, condu-zindo a novas formas de trabalho para alem daquelas exigidaspelo emprego e deixando à educação de adultos um lugar dedestaque na ocupação de tempos de trabalho “útil” à eco-nomia, mas, sobretudo, “realmente útil” aos próprios adultos.

Para alguns autores, parece que a educação de adultos podeassumir neste contexto um papel importante na construção de

sociedades de bem-estar mais coesas, nas quais o Estadoexpresse de modo mais evidente a responsabilidade públicapela educação de adultos e pela inclusão social e nas quais oconhecimento possua uma utilidade e validade que esteja paraalém do que é imediato. Como afirma G. Esping-Andersen

(..) sabemos que os conhecimentos, a educação e ascapacidades cognitivas – assim como outras variáveis menostangíveis como são as redes sociais e o capital cultural –constituem as melhores garantias para se conseguir sair dascondições desfavoráveis nas quais se possam encontrar e promovera mobilidade. (Esping-Andersen, 2001: 117)

O investimento sistemático e regular na educação de adul-tos terá que ser considerado, pois a descontinuidade e a escas-sez de recursos são problemas que têm condicionado umaintervenção efectiva e com impacto. Porém, a educação deadultos neste âmbito não pode deixar de ter em consideraçãoalguns valores, como aqueles que se prendem com a justiçasocial e a igualdade. Por esta razão, aumentar e promover aparticipação e a igualdade de oportunidades não podemdeixar de ser aspectos a considerar na reconstrução das socie-dades de bem-estar e na redefinição do papel da educação deadultos. Por estas razões, afirma o autor mesmo que a cons-trução de um novo Estado de bem-estar deverá incorporar um

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forte compromisso com a igualdade, em termos de oportuni-dades de vida, que não se limite às tradicionais garantias deigualdade, aqui e agora, para todos e do mesmo modo. Daraos cidadãos uma segunda e, talvez, uma terceira oportuni-dade constitui uma responsabilidade da sociedade.

Há lugar para a educação de adultos não-formal de base popular e social?

A educação de adultos teve e tem ainda uma base populare social não menosprezável. Esta base situa-se muitas vezespara além das políticas públicas, para além do que são numcerto momento as modalidades mais visíveis, frequentementereferidas pelos governantes e avaliadas segundo padrões deinstâncias nacionais e internacionais. Num contexto em queas ofertas promovidas por estas políticas dão-nos a ilusão deque a educação de adultos se resume a algumas iniciativaspúblicas, parece importante recuperar a base popular e social.Neste quadro, torna-se importante procurar mecanismos que,localmente, permitam à educação de adultos estar mais pertodos adultos que dela (mais) necessitam, bem como permitir aapropriação de espaços alternativos e marginais relativamenteàs politicas públicas, lugares não-formais ou informais quefavoreçam a preservação das tradições (também as mais radi-cais) da educação de adultos.

Nestes espaços é importante criar iniciativas educativas nasquais as pessoas possam ser mais autónomas e emancipadas.No fundo, consiste em construir lugares nos quais os adultosaprendam e conheçam coisas que lhes permitam tambémlevar a cabo práticas de produção directa, que favoreçam asatisfação imediata de algumas das suas necessidades básicas.Esta possibilidade permitiria posicionar as pessoas de outromodo face à produção, ao consumo, ao dinheiro, aos poderesdominantes da economia e da finança, levando a que aeducação se apresentasse como um recurso esclarecedor dadistinção entre tempo “útil” (exclusivamente à economia) etempo “realmente útil” (sobretudo para os adultos, tornando-os mais independentes).

Este novo entendimento da utilidade do tempo contradiz aposição hegemónica que, na actualidade, a economia e da

finança possuem. Esta redefinição, que é também política,terá que envolver também um novo sentido de espaço públicoocupado pela educação de adultos e do seu papel, bem comoda cidadania. Esta seria uma cidadania baseada na vidacolectiva, na importância de viver quotidianamente em socie-dade e no respeito pelo outro. A construção de uma democra-cia de melhor qualidade seria neste domínio essencial, já nãocentrada na promoção dos direitos básicos (em muitas cir-cunstâncias já conseguidos em muitos países capitalistas,como no caso de certos direitos políticos e sociais), mas nagarantia de direitos que poderiam ser designados de pós-básicos, no que respeita ao emprego e a outros direitos sociaise cívicos, numa “vivência diária baseada na acção”.

A educação de adultos e as transformaçõesdemográficas: problemas que exigem outrasrespostas?

Outros desafios ainda se relacionam com as alterações de-mográficas às quais hoje em dia assistimos, nomeadamente oenvelhecimento da população e o surgimento de “novos” gru-pos sociais – a 3ª e a 4ª idade – com necessidades e proble-mas educativos específicos. Neste âmbito, a nossa concepçãode adulto, ou as diversas concepções de adulto que podem seridentificadas nos diversos países, terão que ser repensadas,bem como terão que ser revistos os modos de intervenção naeducação de adultos, podendo estes estar mais apoiados nosmeios de informação e comunicação já disponíveis. Aqui,talvez valesse a pena pensar a contribuição da educação tam-bém a partir de redes virtuais, ligando locais distintos e distan-tes, conectando pessoas em diversos contextos e lugares.

Ainda e para além do envelhecimento da população emmuitos países ocidentais, há que registar novos problemascom os quais estas sociedades se confrontam, como as migra-ções e a diversidade cultural. A coexistência de diferentes gru-pos sociais e culturais num mesmo espaço, quer estejamos apensar num país ou num conjunto de países ligados porrazões económicas e políticas, como acontece com a UniãoEuropeia, é hoje uma realidade que torna a vida em sociedademais complexa. Esta situação levanta problemas que não po-

É necessário repensar o significado da educação (de adultos) e dotrabalho, assim como do papel do Estado, rever o que se entende portrabalho e por não-trabalho, por tempo útil à economia e tempo útil aoutros sectores, bem como tempo “realmente útil” aos adultos.

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dem ser ignorados pela educação de adultos, até porque cadavez mais frequentemente encontramos adultos culturalmentemuito diferentes entre si (e provavelmente com interesses emotivações distintas e nem sempre compatíveis) numa mes-ma iniciativa educativa.

Estas transformações demográficas ligam-se ainda a outrasrelacionadas com a preservação do ambiente. A pertença a ummesmo planeta sublinha a interdependência solidária entre aspessoas e os povos. Nas sociedades, a relação entre o global eo local, no contexto da eco-esfera no seu todo, terá que serrepensada, constituindo-se simultaneamente num temafulcral para a educação de adultos neste Século que há poucose iniciou. Neste ponto, valerá a pena considerar a emergênciade movimentos sociais de carácter mais alargado e global,assim como a emergência de uma “sociedade civil global” ou“sociedade civil planetária” para as quais pode contribuir aeducação de adultos, mas também sobre as quais a educaçãode adultos não poderá deixar de reflectir criticamente.

ReferênciasBauman, Zymunt (2005). “Learning to Walk in Quicksands”. In Agnieska

Bron; Ewa Kurantowicz; Henning Salling Olesen & Linden West, Org., ‘Old’

and ‘New’ Worlds of Adult Learning. Wroclaw: Wydawnictwo Naukowe,

European Society for Research on the Education of Adults, pp. 17- 26.

Crowther, Jim & Martin, Ian (2005). “Is there any Space left for ‘Really

Useful Knowledge’ in the Knowledge Society?”. In Agnieska Bron; Ewa

Kurantowicz; Henning Salling Olesen & Linden West, Org., ‘Old’ and ‘New’

Worlds of Adult Learning. Wroclaw: Wydawnictwo Naukowe, European Society

for Research on the Education of Adults, pp. 442-451.

Esping-Andersen, Gosta (2001). “?Burocratas o arquitectos? La

reestruturación del Estado benefactor en Europa”. In U. Beck; J. Le Grand; H.

Glennerster : G. Esping Andersen & S. Paugam, Presente y Futuro del Estado de

Bienestar: El Debate Europeu. Madrid: Miño y Dávila Editores, pp. 85-120.

Agradeço a contribuição dos colegas Licínio C. Lima, AlbertoMelo, António Fragoso, Almerindo Janela Afonso, RosannaBarros, Jim Crowther, Susanne Lattke, Edmée Ollagnier, Barry J.Hake e Andreas Fejes que me permitiram construir este texto evalorizar o seu conteúdo.

Aumentar e promover a participação e aigualdade de oportunidades não podemdeixar de ser aspectos a considerar nareconstrução das sociedades de bem-estare na redefinição do papel da educação deadultos.

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EDUCAÇÃO DE ADULTOS NA ALEMANHA:

DESENVOLVIMENTOHISTÓRICO E DESAFIOSACTUAIS

Desenvolvimento histórico1

A s raízes históricas da noção de educação deadultos remontam ao Iluminismo, cujos objec-tivos, tais como os definiu Immanuel Kant, em1784, continuam a ser amplamente aceites naeducação de adultos: “O Iluminismo é a emer-

gência do ser humano a partir de uma imaturidade auto-infligida. A imaturidade é a incapacidade de usar o nossopróprio intelecto sem a orientação de outrem. Esta imaturi-dade é auto-infligida quando a sua causa não está na falta deinteligência, mas na falta de determinação e coragem para ausar sem orientação por parte de outrem. Sapere aude!”2.

A história social da educação de adultos está ligada à lutada burguesia contra o feudalismo, e do proletariado contra aburguesia. De acordo com os respectivos interesses de classe,a ideia de Iluminismo tornou-se um objectivo da educaçãoque se organizou, tanto para a burguesia como para o prole-tariado, durante o séc. XIX.

Uma terceira origem da educação de adultos alemã, que jáse pode discernir no séc. XIX, é a educação contínua dos tra-balhadores de empresas industriais e comerciais. A educaçãode adultos estruturada conheceu uma expansão significativanos anos da República de Weimar (1919-1933), quandomuitas das Escolas Superiores Populares (Volkshochschulen)que ainda hoje existem foram fundadas como instituições

Quando falamos de educação de adultos na Alemanha, estamos a falar de um campo muitovasto e heterogéneo, que se caracteriza por uma variedade de actores, instituições e ofertas,por um lado, e, por outro lado, por uma relativa falta de regulamentações vinculatórias porparte do estado. O próprio conceito de “educação de adultos” não é uniforme, antes assumefacetas diversas em contextos variados.

Texto: Susanne Lattke (Deutsche Institut für Erwachsenenbildung - DIE - Instituto Alemão de Educação para Adultos) Tradução: Daniela Silveira

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independentes de educação popular liberal3. Entre 1933 e1945, as diferentes tendências da educação de adultos tiveramde alinhar-se com a ideologia nazi ou Nacional-Socialista.Depois da Segunda Guerra Mundial, a educação de adultos foiencorajada pelos poderes aliados vitoriosos, nas zonas oci-dentais de ocupação, especialmente como veículo de reedu-cação democrática.

Durante as décadas de 60 e 70, seguiu-se um debate políti-co especialmente intenso, sobre o papel e a função da educa-ção de adultos e sobre medidas e regulamentações políticasapropriadas que se deveriam tomar para apoiar e promover aeducação de adultos (por exemplo: Deutscher Ausschuss 1960,Deutscher Bildungsrat 1970). O objectivo então amplamenteaceite, e reiterado numa série de relatórios de peritos e dedocumentos políticos, era estabelecer uma clara responsabili-dade do estado pela educação de adultos e desenvolver estecampo como um sólido e estável “quarto” sector do sistemaeducativo, em igualdade de condições com o ensino primário,secundário e superior. Este “quarto sector” deveria incluir,como subdomínios, a formação profissional contínua, a edu-cação política e a educação de adultos geral / liberal, sendoestes subdomínios, em princípio, considerados de igual im-portância e valor. O termo abrangente que foi introduzido nadécada de 70 para este sector, e que desde então se conso-lidou, foi “Educação Contínua” (Weiterbildung)4. O termomais antigo, “Educação de Adultos” (Erwachsenenbildung),acabou por ficar associado à educação liberal e política,mantendo essa conotação desde aí. Embora ambos os termospossam também ser usados hoje como sinónimos, é maiscomum falar de “Weiterbildung”, quando o contexto é profis-sional, e de “Erwachsenenbildung” quando está em causa umcontexto de educação geral ou cívica.

Como resultado do debate político nas décadas de 60 e 70,lançaram-se várias iniciativas e diplomas legais para fortalecero sector da educação contínua, que definiram profundamenteo sector até aos nossos dias. Actualmente, porém, o optimis-mo reformista dos anos 70 já terminou há muito e as priori-dades políticas, no que diz respeito à educação de adultos,mudaram significativamente. O primeiro resultado impor-

tante dos debates foi a introdução de Leis de Educação deAdultos na maioria dos estados federais da Alemanha5, de1975 em diante, que regulamentaram a atribuição de fundospúblicos a instituições reconhecidas como promotoras deeducação de adultos. As definições contidas nestes diplomasreflectem – com diversas ênfases – duas dimensões da funçãoda educação de adultos: a dimensão individual do desenvol-vimento e capacitação pessoal, por um lado, a dimensãosocial de preparar os adultos para agirem como membrosúteis e responsáveis da sociedade, por outro6.

Muitos estados (“Länder”) também aprovaram leis sobrelicenças pagas para formação, que estabeleceram um direitoindividual dos trabalhadores a um dado período de tempo,fora do local de trabalho e sem perda de salário, visando a suaparticipação em actividades educacionais, onde se incluemactividades de educação geral ou política. A vontade políticade fortalecer o sector da educação contínua implicou tambémuma crescente preocupação com a profissionalização destedomínio, o que levou à criação de um número considerávelde programas de licenciatura especializada em universidadesalemãs, a partir dos anos 70.

Antes do início das reformas do processo de Bolonha, cercade 40 universidades alemãs já ofereciam cursos de Diplom ouMagister7 em educação de adultos/contínua. Estes programaspreparavam os estudantes para um emprego a tempo inteirocom tarefas de docência, desenvolvimento curricular e/ou degestão em instituições de educação de adultos, ou seja, numadas cerca de mil Volkshochschulen alemãs. Os conteúdos da suaformação incidiam especialmente na teoria e métodos daeducação de adultos, temas organizacionais e institucionais, eno enquadramento jurídico e político. Falta agora ver em quemedida e de que forma estes programas irão sobreviver dentroda nova estrutura de programas de Licenciatura (1º Ciclo) ouMestrado (2º Ciclo), em conformidade com a “Reforma deBolonha”. De qualquer modo, uma série de programas deMestrado, especializados em educação de adultos, já se ini-ciou neste momento, e mais estão a ser planeados, incluindoprogramas de Mestrado Europeu8.

Nas décadas de 60 e 70, houve um debate intenso sobre o papel e afunção da educação de adultos. O objectivo era estabelecer uma clararesponsabilidade do estado pela educação de adultos e desenvolver estecampo como um sólido e estável “quarto” sector do sistema educativo, emigualdade de condições com o ensino primário, secundário e superior.

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Tendências recentes

Após 1980, o envolvimento do estado em (e o seu finan-ciamento para) educação de adultos/contínua estagnou,numa primeira fase, para depois declinar gradualmente,iniciando-se uma tendência – que ainda se encontra actual-mente em curso – para a “privatização” desta área. À medidaque o estado recua, relativamente a regulamentações abran-gentes e a aspirações de financiamento no domínio da educa-ção contínua, vem concentrando a sua acção na promoção demedidas de apoio, tais como o desenvolvimento de sistemasde informação e de sistemas de gestão da qualidade, a cons-trução de estruturas de cooperação e de funcionamento emrede ou o financiamento de projectos-piloto sobre temas prio-ritários, a fim de desenvolver e testar boas práticas inovadoras.O campo da educação contínua, como consequência, vemassumindo de forma crescente as características de um qual-quer outro ramo de negócio, o que força as instituições pro-motoras a aprenderem a sobreviver sob as condições compe-titivas do mercado.

No que diz respeito aos tipos e conteúdos da educaçãocontínua, as dimensões profissionais e de cunho empresarialtêm-se tornado cada vez mais importantes durante as duasúltimas décadas, também devido à reunificação da Alemanhae à consequente necessidade de uma actualização das quali-ficações e competências da força de trabalho na década de 90.No campo da educação geral de adultos, por outro lado, asofertas em expansão são as que visam dar orientação aosadultos e a permitir-lhes enfrentar problemas ou crises indivi-duais da vida – uma tendência que reflecte a crescente com-plexidade e individualização da vida na moderna “sociedadede risco”.

Finalmente, se o campo da educação contínua e de adultosse torna cada vez mais “privatizado”, a aprendizagem de adul-tos em sim mesma tem-se tornado, ao mesmo tempo, mais“individualizada”. Isto é perceptível na crescente importânciaque é dada, tanto por teóricos como por práticos, ao tema daaprendizagem “autodirigida” e, mais recentemente, à aprendi-zagem informal como alternativa e/ou suplemento da oferta

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de cursos organizados. No entanto, esta tendência não impli-ca necessariamente uma perda de relevância para as institui-ções de educação de adultos. Significa antes que o perfil destasterá de mudar e que novas tarefas e campos de actividadeterão que adicionar-se aos tradicionais, especialmente nasáreas de aconselhamento ao aprendente e de validação daaprendizagem.

Os Actores – Instituições e Promotores de Educação de Adultos

Embora a educação de adultos/contínua esteja longe de serum quarto sector “em igualdade de condições” com os secto-res da escola ou do ensino secundário, a sua estrutura institu-cional está relativamente bem desenvolvida na Alemanha,existindo uma enorme variedade de promotores e actoresnestas áreas.9 Alguns dos mais importantes são:– As já mencionadas Escolas Superiores Populares

(Volkshochschulen), que existem em quase todas as cidadese vilas. A sua oferta cobre todo o leque da educação contí-nua, mas tem uma maior ênfase na educação geral (com oensino de línguas estrangeiras a constituir a maior parte),educação política e cultural. Para além destas Escolas Supe-riores, existe também um grande número de centros resi-denciais de educação de adultos, que se desenvolveram deacordo com o modelo dinamarquês do séc. XIX.

– Os centros educativos dirigidos por sindicatos oferecemformação para membros das comissões de trabalhadores erepresentantes dos sindicatos, bem como seminários polí-ticos para sindicalistas. A educação política é também ofe-recida por centros de educação geridos pelas fundações dospartidos políticos.

– Quer a Igreja Evangélica quer a Católica têm redes nacio-nais de centros educativos, muitas vezes residenciais. A suaoferta inclui, por exemplo, educação familiar e para a saú-de, e cursos de qualificação para trabalho social voluntário.Também organizam numerosas actividades educacionais anível paroquial.

– As empresas de formação cresceram consideravelmente em

número desde a década de 80. Visam um público de rendi-mentos superiores, disponibilizando ofertas especialmentenas áreas das línguas estrangeiras e tecnologias de infor-mação e comunicação (TIC).

– Os principais actores que oferecem formação profissionalcontínua são as organizações educacionais dos váriossectores da economia, universidades estatais de educaçãocontínua, os núcleos empresariais (Câmaras de Indústria eComércio, Câmaras de Agricultura, Câmaras de Artesa-nato) e, de uma forma crescente, as próprias empresas.Muitas grandes companhias estabeleceram entretanto osseus próprios centros internos de formação.

– As instituições de ensino superior são obrigadas por lei aoferecer educação de adultos e contínua, e possuem muitasvezes os seus próprios centros de educação de adultos oude educação contínua, apresentando estruturas, objectivose perfis diferenciados.

– Desde os anos 70, desenvolveu-se um grande número degrupos de acção de cidadãos e iniciativas voluntárias, comuma oferta “alternativa” de educação de adultos em camposespecíficos. Estes grupos e, desde a década de 80, os cha-mados “novos movimentos sociais” (movimento da paz,movimento feminista, etc.), tiveram um enorme cresci-mento e geraram uma atenção pública crescente quanto àeducação política contínua, mas que hoje em dia já decaiu.Em alguns estados alemães, estes grupos organizaram-se anível de todo o território. Há também centros educativosmais pequenos, dedicados a temas específicos, tais comopolítica europeia, ecologia e protecção ambiental, etc.

Os Actuais Desafios – Aprendizagem ao longo da vida para todos

A definição e adopção, por toda a Europa, de uma política

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de aprendizagem ao longo da vida, que foi também adoptadapelo governo alemão, foi a mudança recente mais significativapara a educação de adultos, que está agora a ser discutida comreferência a um contexto mais amplo. De um processo deaprendizagem ao longo da vida – considerado como “englo-bando todos os processos de aprendizagem formal, não-formal e informal, em todos os tipos de contextos e de am-bientes, da infância à terceira idade”10, a maior parte é real-mente ocupada pela aprendizagem na idade adulta. Se acei-tarmos a necessidade (muito reclamada) de aprendizagem aolongo da vida para todos, então torna-se claro que a educaçãode adultos, em particular, ficou aquém das expectativas. Asestatísticas sobre participação mostram que uma parte consi-derável da população adulta na Alemanha (até um terço) nãose envolve de todo em actividades de aprendizagem, formaisou informais. Só muito recentemente, em 2007, houve umaligeira tendência de subida nos números da participação, aprimeira a ocorrer desde 1997. Mas continua a ser verdadeque a participação diminui bruscamente depois dos 45 anos,e é geralmente mais baixa entre os grupos com escolaridadeinferior e entre os que vivem em condições sociais desfavorá-veis. Assegurar o acesso igual a oportunidades de aprendiza-gem, assim como a formas de validação da aprendizagem atéentão escondida, é portanto uma prioridade no actual pro-grama político.

A crescente divisão social resultante das desigualdades eco-nómicas e a consequente marginalização dos grupos commenores oportunidades representam desafios-chave face aosistema educativo como um todo. A educação de adultos échamada a desempenhar o seu papel, para chegar até estesgrupos com ofertas adequadas, ajudando-os a participar emtodas as grandes áreas da vida em sociedade. Observa-se estasituação, de forma particularmente intensa, em pessoas comum historial de migração, que foram até à data claramentesub-representadas na educação contínua. Entre outras medi-das, isto significa expandir a cooperação com organizações deimigrantes e aumentar a proporção de migrantes no corpodocente dos estabelecimentos de educação de adultos.

Outro desafio, estreitamente ligado ao anterior, é a neces-

sidade de um corpo docente qualificado, que seja capaz deatender às diferentes necessidades de aprendizagem dos dife-rentes grupos, incluindo em especial os grupos ameaçadospela exclusão social. Actualmente, o campo da aprendizagemde adultos é altamente afectado pelas mudanças políticas eestruturais. A pressão para realizar grandes poupanças, a queas instituições estão continuamente expostas, levou recente-mente a despedimentos em larga escala. A posição social docorpo docente da educação de adultos está a tornar-se igual-mente insegura, como mostra um estudo recente encomen-dado pelo Ministério Federal da Educação e Pesquisa (WSF2005). A combinação de baixos salários com pesadas cargasde trabalho está a tornar cada vez mais difícil recrutar umapróxima geração de trabalhadores adequados. A educaçãocontínua tem pois que se tornar mais atractiva como profis-são, no futuro. Há também uma necessidade considerável demais formação em exercício para o corpo docente, na educa-ção contínua.

Se o actual corpo docente activo na educação de adultosrecebeu alguma educação pertinente – e não há qualquerobrigação legal para tal – possuirá certamente um conheci-mento teórico da especificidade da aprendizagem de adultose será capaz de utilizar métodos de ensino apropriados paratrabalhar com alunos adultos, uma vez que estes temas foramincluídos nos já mencionados programas de licenciatura dasuniversidades ou em outras ofertas de formação actualizadapara educadores de adultos, desde há muito tempo. Surgem,porém, novas exigências, em mutação constante, ao corpodocente da educação de adultos, como por exemplo a cres-cente necessidade de aconselhamento e orientação, o desafiopara incluir as novas tecnologias nos processos educativos ouos sistemas de reconhecimento e validação da aprendizagem(informal), para as quais os programas de formação existentesnão estão ainda convenientemente sintonizados.

Outro resultado da emergência do enquadramento daaprendizagem ao longo da vida é a necessidade da educaçãode adultos funcionar cada vez mais em rede. Se a finalidade éde construir um sistema eficaz e acessível de aprendizagem aolongo da vida para todos, não só será necessário melhorar e

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Após 1980, o envolvimento do estado em (e o seu financiamentopara) educação de adultos/contínua estagnou, numa primeirafase, para depois declinar gradualmente, iniciando-se umatendência – que ainda se encontra actualmente em curso – paraa “privatização” desta área.

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aumentar consideravelmente a cooperação entre os diferentesactores no campo da educação de adultos, como será tambémindispensável procurar ligações e pontes mais próximas entrea educação contínua e os outros sectores do sistema educati-vo, incluindo o desenvolvimento de mecanismos de validaçãode aprendizagens anteriores.

Neste artigo, foi apenas possível considerar alguns dosdesafios especialmente relevantes para a educação de adultos,e para os quais são necessárias soluções práticas. Isto significa,por sua vez, que outros aspectos importantes – i.e., financia-mento, qualidade, dimensão internacional, etc. – foram aquinegligenciados. Para concluir, será feita referência apenas auma preocupação final, que nos leva de volta ao(s) concei-to(s) tradicional(ais) de educação de adultos: a preocupaçãode que o objectivo tripartido da aprendizagem ao longo davida – promover, ao mesmo tempo, a empregabilidade, acidadania activa e o desenvolvimento pessoal – que é justifica-damente enfatizado em todos os documentos políticos, sejade facto levado a sério e que o actual enfoque predominantena empregabilidade e nas competências úteis, do mero pontode vista do trabalho, não se torne demasiado redutor, à custadas outras duas dimensões.

1 Ver Nuissl/Pehl 2004, Portrait of Continuing Education in Germany. Bielefeld,p. 12 ss.

2 “Ousar saber!”3 “liberal” como sinónimo de “não profissional”.4 O Conselho Alemão de Educação definiu “educação contínua”, no seu

Plano Estrutural para o Sistema Educativo 1970, como “uma continuaçãoou um regresso à aprendizagem organizada depois da conclusão de umafase inicial de educação de duração variável… A conclusão da fase inicialde educação é geralmente assinalada pelo início de um empregoremunerado” (Deutscher Bildungsrat 1970, p. 197)

5 Na República Federal da Alemanha, a responsabilidade pública pelasquestões educacionais pertence ao governo dos estados (os “Länder”) enão ao governo federal.

6 Como exemplo, apresenta-se um excerto da Lei da Baviera sobrePromoção da Educação de Adultos (EbFöG) de 24.07.1974: “Art. 1º.Noção e função da educação de adultos: 1. A educação de adultos(Educação Contínua) é um grande sector independente do sistema deeducação e goza dos mesmos direitos dos outros sectores. 2. O seuobjectivo é promover uma responsabilização e determinação individuais.3. Oferece oportunidades para aprofundar, renovar ou expandir aeducação adquirida na escola, universidade ou durante a formaçãoprofissional inicial. A oferta abrange os campos pessoal, social, político eprofissional. Permite a aquisição de conhecimentos e competênciasadicionais, promove a capacidade de julgamento e o poder de decisão daspessoas, contribui para o erradicação de preconceitos e conduz as pessoasa uma melhor compreensão dos processos sociais e políticos como basepara uma participação individual responsável. 5. Promove odesenvolvimento das capacidades criativas do indivíduo.”

7 “Diplom” e “Magister” distinguem-se das licenciaturas em ensino. OMagister é um nível geral, especialmente adoptado nas ciências humanas esociais; enquanto o Diplom se utiliza principalmente nas ciências e ciênciasaplicadas, tal como engenharia. Os alunos que estudam para a docênciaescolar têm de completar programas que levam a uma licenciatura“Staatexamen” (exame de estado).

8 Por exemplo, o “Mestrado Europeu em Educação de Adultos” daUniversidade de Duisburg-Essen (www.emae-network.org/UDE).

9 Mais pormenores e informações sobre as instituições e os cursosoferecidos em Nuissl/Pehl 2004, op. cit.

10 É a definição apresentada em “A Estratégia de Aprendizagem ao Longo daVida”, que foi adoptada pelos ministros da Educação alemães em 2004(Bund-Länder-Kommission für Bildungsplanung und Forschungsförderung2004, p. 13).

Se aceitarmos a necessidade deaprendizagem ao longo da vida para todos,então torna-se claro que a educação deadultos ficou aquém das expectativas. Asestatísticas sobre participação mostramque uma parte considerável da populaçãoadulta na Alemanha (até um terço) não seenvolve em actividades de aprendizagem,formais ou informais.

LINKS:German Institute of Adult Education, Homepage: www.die-bonn.de (in German and English)Online collection of laws and regulation applying to adult education in Germany: www.die-bonn.de/service/oekonomie_recht/recht.asp (in German)Online data base on university degree programmes in “Adult/Continuing Education” in Germany: www.die-bonn.de/service/hochschulen/ (in German)Homepage Federal Project “Profilpass”: www.bildungspass.de/en/index.html (in German and English)Homepage Federal Programme “Learning Regions – Providing Support for Networks”: www.lernende-regionen.info/dlr/index.phpHomepage Federal Programme “Lifelong Learning”: www.blk-lll.de/Homepage Federal Programme “Quality Certification in Continuing Education”: http://www.artset-lqw.de/html/startseite.html (in German)

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QUANDO AFOTOGRAFIA ESTÁAO LADO DO CORAÇÃO

Ar.Co

48 APRENDER

Texto Cristina Portella # Fotografias Miguel Baltazar

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P rincipalmente se o curso emquestão é feito no Ar.Co, Cen-tro de Arte & ComunicaçãoVisual. “O nosso objectivo ésempre descobrir pela práti-

ca, e não pela teorização”, explica JoséSoudo, professor de fotografia do Ar.Co hácerca de 30 anos.

Porque no Ar.Co, a teoria só vem depois:“O aluno é que descobre por si o fun-cionamento dos meios, e descobriu-os por-que os fez, entre aspas, com as suas mãos,com a sua cabeça. Quando tiver de teorizaralguma coisa, esta será mais entendida.Esse processo tem dado provas, não sóaqui nesta instituição como em outras, queperfilam pela teoria da descoberta ouprocesso demonstrativo, chamamo-loassim”.

Muitos dos seus alunos vêem na foto-grafia uma actividade lúdica, “carregadade estereótipos que precisavam desmistifi-car, reaprender, para realinhar conheci-mentos”. Outros têm uma perspectivaprofissionalizante – embora o Ar.Co nãoseja uma escola profissional. Mas háainda outros que querem ser artistas –“conceptualistas, pensadores, intervenien-tes, o que quer que seja”. “Vêm aqui à pro-cura de um know how que os permitagrandes passos, passos muito largos”, dizJosé.

E o que pensa o Ar.Co das pretensõesdos seus alunos? O professor responde:“Pretendemos que a nossa formação bási-ca suporte estruturalmente todas essas

intenções. Do amador mais amador, quenão quer passar disso mesmo, até o artis-ta, mais artista plástico, que veja nafotografia uma intervenção pessoal”. Econseguem-no? A história da escola, fun-dada em 1973 e que não se limita àfotografia, mas envolve outras artes, comoescultura, pintura, desenho, joalharia,vidro, cerâmica, design gráfico, cinema eilustração, diz-nos que sim. Paralelamentea esses cursos de carácter oficinal, hátambém módulos teóricos, de história daarte, história da fotografia e de todas asoutras artes.

Janela ou espelho?O que se pretende com a oficina de

fotografia? “A aprendizagem da fotografiaestá fundamentada em três pressupostosmuito simples: temos de trabalhar a luz, ascâmaras fotográficas e os materiais fotos-sensíveis. Tudo isto não tem utilidademaior que não seja cumprir finalidades, ecada pessoa que aqui vem traz alguma

REPORTAGEM

AO LONGO DA VIDA 49

Método de aprendizagem

José Soudo compara o método deensino no Ar.Co como o descascar deuma cebola, através de camadas. “Oaluno vai sentindo cada vez mais oestímulo de buscar objectivos dentro desi. Muitas vezes nem os traz, ou vê-osde uma forma muito difusa.” Ele contaque já aconteceu irem para lá alunosque diziam “eu adorava serfotojornalista”, mas mudaram de ideias.O contrário também aconteceu:“Vinham numa perspectiva maisartística e começam a descobrirvertentes mais comunicacionais. Ouseja, as pessoas vão-se desbravando acada momento.”

Cada turma é composta por umgrupo necessariamente reduzido, entre12 a 15 alunos. “Quando muitopodemos ter uma turma de 18 alunos.Achamos que é injusto sobrelotar asturmas. Preferimos – isto é, a direcçãodo Ar.Co – ter défice financeiro mastermos as turmas contidas.” Logo nasprimeiras aulas são ensinados os meiosfotossensíveis, sejam eles analógicos(que vão às químicas) ou digitais(revelam-se no computador). Os doisprimeiros anos são os maisestruturantes e os mais procurados.

Apesar da vertente marcadamenteoficinal, o curso não dispensa as aulasde história da fotografia, dada por JoséSoudo desde 1983, quando substituiu oprofessor António Sena. As aulas sãodadas a partir do nível 2, ou seja, nosegundo semestre do ano. No primeirosemestre a formação é dada emHistória das Artes. “Nós nãopretendemos que a fotografia seja vistacomo coisa à parte. Primeiro damosuma visão global das artes, e depoisfaço a ponte entre as artes e afotografia. A fotografia tem umaconexão tão completa com as outrasartes gráficas que justifica fazer uminput com a pintura, com a gravura... Etem de facto essas correlações todas.”

O que leva as pessoas a fazerem um curso de fotografia? O que aprendem nesse curso, além da óbvia actividade de captar uma imagem e fixá-la através de um suporteanalógico ou digital? As respostas a essas perguntas podem ser tão diversascomo as técnicas fotográficas.

Eu diria que o processo deaprendizagem é importante.A pessoa sozinha só aprendeprocessos técnicos, mas nãoaprende a reflectir sobre osconteúdos. E isso é que éestruturante.(José Soudo)

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finalidade e objectivo. Nem sempre serãocumpridos, mas isso tem a ver com opercurso de cada um”, analisa Soudo. Per-cursos como o de Susana Maria MoraisMonteiro Dinis, que há 17 anos iniciou ocurso de fotografia no Ar.Co com a convic-ção de tornar-se publicitária e com a metade transformar a fotografia num comple-mento desta opção profissional.

Como também acontece com muito alu-nos de fotografia – e não só no Ar.Co –Susana inverteu o seu projecto inicial.“Acabei por não seguir publicidade, e simfotografia”, conta ela. Depois de cursar ostrês níveis do Ar.Co, começou a dar aulasde fotografia em cursos profissionalizan-tes, mas a fotografia que sempre lhe inte-ressou tinha um carácter mais intimista,autoral. “Há quem veja a fotografia comouma janela, e eu vejo como um espelho,uma forma de falar de mim, que poderáser mais abstracta ou mais realista.”Actualmente, Susana mudou de actividadeprofissional e possui um bar-café no mira-douro de Santa Catarina, em Lisboa. Masos seus interesses em fotografia perma-necem os mesmos.

“Muitas vezes convido os meus alunosa esta reflexão: a fotografia é um docu-mento íntimo, e muitos de nós andamoscom a fotografia da namorada na carteiraou no telemóvel. Por outro lado, é umacoisa que se vende em galerias a preçoselevadíssimos, como um objecto. Entreesses dois extremos há a fotografia comimensas finalidades. Com uma funçãoapenas lúdica, como um documento paraa comunicação social, de aplicação nasciências médicas, na investigação cientí-fica ou na arqueologia. Tem tantas verten-tes que podemos dizer que talvez seja adisciplina mais transversal nas nossasvidas nos séculos XX-XXI”, analisa JoséSoudo.

Reflexão fotográficaSe para Susana a fotografia é um

espelho – e o processo de aprendizagemfoi fundamental para estruturar essaopção –, para muitos outros é uma janelainformal. “O aluno aqui não é sacrificadoporque tem uma visão da fotografia ama-dorística. Gosta de fotografar a namorada,o filho, etc. Temos é que ajudá-lo a ter asua própria maneira de estar na fotografia.E isso não pode ser por intuição, tem deser por reflexão”, explica José Soudo.

Para ele, não há fotografia má, mas

tudo depende do estágio do fotógrafo. Aospoucos, a exigência vai aumentar, e tam-bém a capacidade de suportar a crítica e aautocrítica. “Eu diria que o processo deaprendizagem é importante. A pessoasozinha só aprende processos técnicos,mas não aprende a reflectir sobre osconteúdos. E isso é que é estruturante.Sabe dominar a luz, sabe dominar a câma-ra, os materiais fotossensíveis, mas nãosabe utilizá-los do ponto de vista criativo.”“Mal de nós”, diz ele, “se ficamos agarra-dos às técnicas. Executamos bem, masexecutamos sem alma. A escola podeajudar a tornar o tempo de amadurecimen-to mais curto.”

É deste ponto de vista estruturante queveio à procura, não no Ar.Co, mas no cursode fotografia do Instituto Politécnico deTomar, o fotógrafo Carlos Alberto DuarteAlves. Com 65 anos, reformado após 30anos de trabalho no jornal Cidade deTomar e abalado por um enfarte, ele resol-veu “aprender fotografia”. “Havia muitacoisa que eu fazia empiricamente; foi umamaneira diferente de ver a fotografia. Porexemplo: eu via a fotografia de autor e nãome dizia nada. Agora, aprendi a ver ascoisas de outra maneira. Embora eu possanão gostar, já entendo o que o autor querfazer”, explica.

Carlos Alberto reuniu um arquivo foto-gráfico, parcialmente digitalizado, dosseus anos de fotojornalismo – quando fezfotografia social, como a denomina – queguarda como se fosse – e de facto o é – umtesouro. “Não vendo a ninguém, por preçonenhum. Quando eu morrer, que os meusfilhos façam dele o que quiser.”

Uma arte contraditória“Eu diria que a arte fotográfica é uma

arte carregada de contradições, que come-çaram logo no início da fotografia”, defineo professor. Formalmente, o início seria em

REPORTAGEM

Há quem veja a fotografia comouma janela, e eu vejo como umespelho, uma forma de falar demim, que poderá ser maisabstracta ou mais realista.(Susana Dinis)

50 APRENDER

Susana Dinis

REPORTAGEM

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PODE NÃO ACONTECERfotografia digital impressa em papel fotográfico (Lambda)dimensões: 85*69 cmexposições: Galeria Monumental, 2004, Lisboa

www.susanadinis.no.sapo.pt

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52 APRENDER

1839, quando a Academia de Ciências deFrança propõe que a tecnologia desenvol-vida por Louis-Jacques-Mendé Daguerrefosse comprada e oferecida ao mundo gra-tuitamente. Mas José Soudo, numa espé-cie de desmontagem com os seus alunos,faz esta técnica recuar a períodos bastan-te anteriores. “O nosso remoto fica, em ter-mos muitos credíveis, nos séculos XV eXVI. Mas depois começamos a andar paratrás e a descobrir métodos de trabalhoequiparáveis ao que podia ser um trabalhocom câmara fotográfica, não sendo ainda,pois são câmara para utilização paradesenho.” Um “andar para trás” que podechegar a Platão, com a sua Alegoria daCaverna.

Mas mesmo no século XIX, o século dosprecursores, Daguerre não foi o único adesenvolver a fotografia, havia muitosoutros a fazê-lo praticamente em simultâ-neo. Como Hippolyte Bayard, com a inven-ção do negativo – e a possibilidade defazer várias cópias positivas, o que nãoacontecia com o daguerrótipo. Até quaseao final do século XIX, a fotografia contavacom vários processos, quase tantosquanto os fotógrafos que os manejavam.“Até aquilo ser estabilizado são quase 80anos de evolução”, conta José Soudo.

“O século XX estabiliza a técnica do su-porte fotossensível em cima do acetato, doplástico, aquilo que vulgarmente chama-mos de rolo fotográfico. O que é que temde ganhos? A rapidez do processo.” É tam-bém a partir dos finais do século XIX edurante todo o século XX, o século da ima-gem, que se dá a democratização do aces-so à fotografia. “Com 300 ou 400 eurosactuais tinha-se uma câmara da Kodak em1886”, aponta o professor. “Já não era ofotógrafo que tinha de fazer tudo. Atéentão ele tinha de preparar as emulsões,perceber de química e saber construir a

sua própria máquina fotográfica. O lemada Kodak era: faça o click que a gente fazo resto. Com a democratização da foto-grafia, todos nós nos sentimos fotógrafos.”

O perigo do “delete”No final do século XX surgem os proces-

sos electrónicos, ou digitais. “Então esta-mos novamente no início da fotografia,nesse sentido histórico. Cada sistemadigital é um sistema, a Nikkon tem um, aFuji tem outro, ou seja, não há processosestáveis. Quanto à evolução, é uma dificul-dade extrema prever seja o que for para ofuturo”, diz José Soudo. Para ele, essastécnicas condicionam mais o mercado deconsumo do que a fotografia em si. “Eudiria que, no momento actual, a fotografiadigital, pela sua rapidez, é útil para quemprecisa de rapidez, como fotojornalista.Não sendo jornalista, a fotografia rápidanão é uma necessidade, é um gosto.”

Mas aquela imagem que surge instan-taneamente na parte traseira da máquinadigital é apenas virtual, porque precisa sertrabalhada no computador. “Com um agra-vante: qualquer dia não haverá memóriafutura, porque as pessoas habituam-se ao‘delete’ – vêem a imagem, não gostam ejogam fora. Mas um mau documento hojepode ser um excelente documento daqui acem anos”, alerta Soudo.

“Nós, Ar.Co, não valorizamos nem des-valorizamos a existência da fotografiadigital. A fotografia faz-se com meiosópticos e a câmara, tudo o que se está afazer com o processo ultra-rápido digitaltem alguma correlação com o que se fazno laboratório.” Por isso é que os alunosaprendem a revelar e ampliar os negativosno laboratório, no “velho” processo doséculo XX. É uma prática pedagógica, dizele, carregada de emoção: “Um aluno quenão passa por isso, por esse lado quasemisterioso da fotografia... Esse lado deafectividade que se cria é muito estrutu-rante. Uma pessoa que tenha passado porum laboratório nunca mais vai esquecer.Enquanto uma pessoa que só lida com oecrã... Queremos fazer sentir ao aluno quea fotografia é sempre a mesma coisa. Luze câmara. Faz-se com o olhar, faz-se com acâmara e nada mais. E depois é associar oolhar à lente. E o lado afectivo tem deestar ali associado. Tivemos um aluno quedefinia a escola como uma escola queensinava a pôr a fotografia ao lado docoração.”

Carlos Alves

Eu via a fotografia de autor enão me dizia nada. Agora,aprendi a ver as coisas de outramaneira. Embora eu possa nãogostar, já entendo o que o autorquer fazer.(Carlos Alves)

REPORTAGEM

Título: "DE ESPERANÇAS"Fotografia digital impressa em jacto de tinta, plastificadaDimensões: 30x45 cm.Exposições:Colectiva dos Alunos doInstituto Politécnico de Tomar- 2008, Casa dos Cubos, Tomar

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L IVROS

Pretendendo alargar os horizontes de visibilidade dasperspectivas e práticas relativas à educação de adultose intervenção comunitária apresentadas numa edição

publicada em 1999, a presente obra reúne textos deprofessores, estudantes e ex-alunos da licenciatura emEducação de Adultos e IntervençãoComunitária, da Universidade do Minho.Cada um dos textos deste livro constitui umtestemunho das práticas educativas queprocuram concretizar os processos através dosquais se vai construindo e concretizando aeducação de adultos e a intervençãocomunitária, enquanto modo de(trans)formação de pessoas e comunidades.

A obra está organizada em dois capítulos:Educação de Adultos e IntervençãoComunitária – Perspectivas e Problemas eEducação de Adultos e IntervençãoComunitária – Projectos e Práticas,relativamente aos quais saliento dez textos,cinco do primeiro capítulo e cinco do segundo, pelaoportunidade e actualidade das temáticas abordadas.

No texto “Da importância do silêncio – uma prática deeducação do adultos e intervenção comunitária”, de IsabelSaraiva, a autora reflecte sobre o papel do educador, numcontexto de intervenção comunitária, a partir de umaexperiência em África.

Em “Centro Comunitário da Casa da Infância – aeducação não-formal no desenvolvimento pessoal, social ecomunitário”, Hellen Antunes evindencia as potencialidadesda intervenção dos licenciados em Ciências da Educação emassociações de desenvolvimento local.

“CRVCC – um centro de novasoportunidades” é um texto de Susana IsabelAmbrósio que realça a importância destasestruturas na prossecução de efectiva políticade aprendizagem ao longo da vida.

“Práticas de educação e formação de adultosnuma organização local: da tradição pelaformação standart a um modelo de abertura àeducação popular” de Fátima Marques eManuela Cunha e “Cursos de educação eformação de adultos na Associação Sol do Ave– o papel do mediador nos cursos EFA” deSílvia Manuela Castro, são dois textos quepartindo de contextos diferentes, apresentamabordagens esclarecedoras e críticas dos cursos

EFA.Em “A Associação Humanitária Habitat e o projecto

Bairro Habitat” Maria Lisete Remoaldo relata a experiênciade intervenção numa comunidade pobre, com baixos níveisde escolarização, a habitar um bairro recém construído.

ANA CANELAS

Este é o site da European Associationfor Education Adults – EAEA, uma ONGeuropeia que reúne 130 organizações de41 países que trabalham no campo daaprendizagem de adultos. Destas 130organizações, duas são portuguesas: aANOP - Associação Nacional de Oficinasde Projectos e a Entre-Serras - Associaçãode Desenvolvimento do Concelho dePampilhosa da Serra.

O site da EAEA está em doze línguasdiferentes, entre as quais as maisacessíveis a grande parte dos portugueses

(espanhol, francês e inglês).Infelizmente não está disponível emportuguês.

O site da EAEA é produzido peloGabinete de Informação de Helsínquiada EAEA e dá informações sobreactividades, projectos, legislação nova,programas, conclusões de váriasconferências, etc. Como é actualizado dedois em dois dias, ele é um dos sitesonde se pode obter uma informaçãodetalhada e actualizada relacionada coma Educação de Adultos na Europa.

NET

http://www.eaea.org/

Educação de Adultos e Intervenção Comunitária IIMaria Conceição Antunes (coordenação)Almedina – Colecção de Ciências da Educação e Pedagogia, 257 pp. 2007

54 APRENDER

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OO qquuee éé EEAAEEAA?? A EAEA é uma associação

transnacional, sem fins lucrativos, cujopropósito é o de articular e representaras organizações europeias que estãodirectamente envolvidas na educação deadultos.

As principais actividades do EAEA são:– Promover a educação para adultos e

actuar com as ONG’s que trabalhamneste campo. Apoiar os seusmembros e as suas redes.

– Desenvolver reflexão sobre a naturezae a importância da educação deadultos e sobre as maneiras de

melhorar o leque de oportunidades ede qualidade.

– Promover a aprendizagemcompartilhada através dointercâmbio de informações,conhecimentos e experiências entreos membros.

– Organizar seminários informativos ede actividades de sensibilização sobreos programas da UE edesenvolvimentos políticos.

– Organizar formação sobre as fontes definanciamento europeu para adultos.

– Publicar relatórios e boletinsinformativos.

A EAEA tem quatro escritórios aoserviço dos seus membros:

O principal é em Bruxelas, e é o centrodas actividades EAEA, coordenando oseu programa de trabalho Ela mantémestreito contacto com as instituições daUE e organizações internacionais.

O Gabinete de Informação eDocumentação em Helsínquia éresponsável pelos serviços deinformação, enquanto o de Madrid éresponsável pelo desenvolvimento ecoordenação de projectos da Educaçãode Adultos na área do Mediterrâneo, ode Budapeste é da Europa Oriental.

Há títulos que atraem leitores para os livros queencabeçam – e, muitas vezes os desiludem porqueprometem mais do que o texto dá. E há títulos

infelizes que assustam e repelem os leitores – e depois osrespectivos livros acabam por ser uma agradável surpresa.

É este último, manifestamente, o caso dolivro em apreço, com um títulodesnecessariamente longo, complicado, poucoimagético. E, no entanto, o livro que encabeçaé interessante, bem fundamentado, de leituraagradável e francamente inovador. Bastasublinhar que trata sobretudo dumapopulação que só muito recentementecomeçou a emergir nas atenções deinvestigadores e investidores: os “velhos”, os“idosos” ou, como na linguagem maismoderna da autora, os “seniores”.

A obra é constituída pelos seguintescapítulos: I – “Das Universidades da TerceiraIdade em Portugal a partir de 1976 e dacriação do Programa de Estudos Universitários para Senioresna Universidade do Porto em 2006”; II – “Educação aolongo da vida e longevidade”; III – “A literacia e oenvelhecimento cognitivo”; IV – “Os computadores vistospelas crianças e pelos seniores. Alguns pensamentos sobre o

uso e a influência das Novas tecnologias da Informação e daComunicação ao longo da vida”; V – “A linguagem e oenvelhecimento”.

Ao longo destes capítulos e através destas váriasproblemáticas, analisam-se e desmontam-se certos mitos

relativos aos seniores, designadamente no querespeita ao “declínio cognitivo”, combate-se aideia dos seniores como um grupo homogéneoe defende-se a importância da escolaridade eda aprendizagem ao longo da vida. Umcapítulo é ainda dedicado aos possíveis efeitosbenéficos do uso das NTIC, designadamenteatravés de programas deliberadamenteproduzidos para reduzirem as dificuldades deaprendizagem, estimularem a “inteligênciafluida” e a “memória episódica” de forma aque “o processamento da informação nova nãose torne mais problemático do que o uso deestruturas do conhecimento pré-existentes.” Etermino com esta hipótese de imensa

pertinência, actualidade e optimismo bem fundamentado.

MARIA EMÍLIA BREDERODE SANTOS

Da aprendizagem ao longo da vida ou do exemplo de uma relação ternária:agora, antes, depois,PINTO, Maria da Graça L. Castro Ed. Da Faculdade de Letras da Universidade do Porto, 156 pp. 2008

AO LONGO DA VIDA 55

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L IVROS

NET

56 APRENDER

Sob este título, a Agência Nacional para a Qualificação(ANQ) acaba de publicar o 1º número da sua colecção“Perspectivas e Reflexões”.

A obra é da autoria de Helena Luísa Martins Quintas,Professora na Universidade do Algarve, e centra-se sobre osCursos Educação-Formação de Adultos, que aautora tem acompanhado desde uma primeiraexperiência, a cargo da Sª Casa da Misericórdiade Castro Marim, desenvolvida no início dadécada.

A tese de doutoramento, que serve de baseao presente livro, foi agora reformulada demodo a servir como material de formação paraos educadores envolvidos neste tipo de cursospara pessoas adultas.

Principais componentes do Índice:- Da modernidade à pós-modernidade- Modelos de educação e formação de

adultos- O formador de pessoas adultas- O formando- O currículo- Planificação curricular- Estudo empírico- Resultados do estudo

- Práticas de construção curricular em contexto de educaçãoe formação de adultos

- Desenvolvimento profissional de formadores de adultos- Conclusões- Bibliografia

O estudo é ilustrado com excertos deentrevistas, quer com formandos quer comformadores. Diz uma formanda: “Eu, noprincípio, nem conseguia olhar para os colegasquando apresentava os trabalhos e hoje fui capaz deencarar a situação de confronto de uma forma queeu não julguei vir a conseguir. Porque eu pensavaque as pessoas eram de uma certa forma e eraassim que morriam. Eram, eram, já não mudavam.Mas estava enganada. Mudam e eu vi o exemploem mim” (p. 125). E, nas palavras de umaformadora: “Estamos a trabalhar com adultos eeles têm uma visão do que querem saber muito

clara, não aceitam o que lhes queremos impingir, sabem o quequerem aprender e o que querem estudar são os temas que lhesinteressam.” (p. 149).

ALBERTO MELO

Educação de adultos: vida no currículo e curriculo na vidaHelena Luísa Martins QuintasEd. ANQ Agência Nacional para a Qualificação, I.P, 174 pp. 2008

Organismo democrático dasociedade civil, o Instituto deCooperação para a Educação

de Adultos – ICEA – reúne as forçasvivas da educação e formação deadultos no Quebeque, há mais de 60anos, com o fim de promover o direitoe as possibilidades de aprender aolongo da vida.

As actividades que o ICEAdesenvolve visam impulsionar nasociedade canadiana francófona ummovimento de reconhecimento,promoção, vigilância e democratizaçãoem matéria de educação e de formação

contínuas das pessoas adultas. Atravésde consultas públicas, campanhas desensibilização da população em geral edos políticos eleitos, assim como deacções colectivas, o ICEA dá visibilidadeàs preocupações diversificadas dos seusmembros, no seio de uma vasta rede.Associando-se, como parceiro ou comocolaborador, a diversas iniciativas outornando-se membro de organizaçõescom finalidades semelhantes, o ICEAcontribui para tornar efectivo o direitode aprender e dá aos seus membrosmais possibilidades de beneficiarem dasmúltiplas vantagens do conhecimento

especializado e partilhado.Para o ICEA, e na sequência da

Declaração da UNESCO, o direito deaprender é:- o direito de ler e de escrever,- o direito de questionar e de reflectir,- o direito à imaginação e à criação,- o direito de ler o próprio meio e de

escrever a sua história,- o direito de desenvolver

competências individuais ecolectivas.

O Instituto de Cooperação para a Educação de Adultos no Canadáhttp://www.icea.qc.ca

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N OTÍCIAS

AO LONGO DA VIDA 57

Para assegurar uma melhorvivência em conjunto, a Europaalargada dentro de um mundo

globalizado exige a compreensãomútua entre os povos. Para tal, torna-senecessário explorar as vantagens dadiversidade cultural, do multilinguismoe da cidadania activa.

A mobilidade é considerada comoum dos meios de assegurar o diálogoentre culturas, dado que poderácontribuir para o entendimento erespeito recíprocos entre os diferentespaíses, etnias e religiões e para a

eliminação de barreiras como onacionalismo e a xenofobia.

No âmbito do ProgramaAprendizagem ao Longo da Vida1, oPrograma Grundtvig, destinado àEducação de Adultos, é um dosprogramas sectoriais que temcontribuído para a promoção deactividades de cooperação e demobilidade entre sistemas de ensino ede formação, a nível europeu,procurando incentivar o diálogointercultural nas suas várias vertentes.

A implementação do Programa

Grundtvig, em Portugal, tempossibilitado às instituições deeducação de adultos portuguesas aparticipação activa em projectos deparceria com outras instituições dediferentes países e o desenvolvimentode trabalhos com um valoracrescentado europeu no âmbito dasquestões relacionadas com a educaçãode adultos.

Deste modo, as instituiçõeseuropeias têm a oportunidade decooperar entre si, partilhandoexperiências e boas práticas,possibilitando o conhecimento e acomparação de diferentes realidades, aavaliação e a comparação dosdiferentes sistemas de educação formale não-formal, a aquisição de novosmétodos de trabalho, a consolidaçãode novas abordagens, a melhoria demetodologias de ensino, adaptados àsnecessidades dos adultos, e a partilhade recursos à escala europeia.

Também os educadores de adultosportugueses têm beneficiado daspotencialidades deste Programa queratravés da participação em projectos deparceria quer através da participaçãoem actividades de mobilidadeindividual noutros países europeus emque contactam com contextos erealidades diversas.

Segundo os beneficiários, aexistência deste Programa permite atroca de experiências entre diferentesinstituições, possibilita o alargamentode horizontes e, por vezes, colmatalacunas de formação contínua existentesa nível nacional. Também o contactocom diferentes realidades educativas epedagógicas promove o espírito críticoface ao trabalho desenvolvido, dávisibilidade ao trabalho dos educadoresde adultos e das respectivas instituiçõesa nível europeu e pode contribuir para aintrodução de novos conceitos,metodologias, estratégias e abordagensnas instituições de educação de adultos.

O conhecimento de diferentesculturas e da realidade nacional decada país, a familiarização com adiversidade cultural e o confronto entresemelhanças e diferenças nos diversospaíses, desenvolve o espíritointercultural, promove a tolerância e orespeito e fomenta uma cidadaniaeuropeia activa.

O diálogo intercultural através da mobilidade / O Programa Grundtvig e o seu impacto

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N OTÍCIAS

58 APRENDER

OMontepio assinalou o “DiaInternacional da Poupança”com a celebração de dois

protocolos de cooperação orientadospara a prevenção do endividamento e oapoio às famílias na gestão dos seusrecursos financeiros – Protocolo com aAssociação Nacional de Jovens para aAcção Familiar (ANJAF), e para apromoção do diálogo intercultural, daintegração e da facilitação do acesso dacomunidade ucraniana em Portugal aosprodutos e serviços financeirosdisponibilizados pelo Montepio –Protocolo com a Associação dosUcranianos em Portugal “SOBOR”.

A iniciativa, definida no âmbito dapolítica de Responsabilidade Social doMontepio e enquadrada no “AnoEuropeu do Diálogo Intercultural”,procura fundar parcerias privilegiadasque contribuirão para a criação denovas bases de relação entre oMontepio e as comunidadesacompanhadas pelas associações

signatárias dos protocolos.O protocolo firmado com a

Associação Nacional de Jovens para aAcção Familiar (ANJAF) permitirá:

Desenvolver o programa deeducação financeira criado peloMontepio junto dos jovens, adultos eseniores que integram as acções deformação promovidas pela ANJAF;

Difundir conhecimentos sobreeducação financeira que apoiem aprevenção do endividamento e umamelhor gestão familiar dos recursosfinanceiros.

O protocolo firmado com aAssociação dos Ucranianos em Portugal“SOBOR” permitirá:

Reconhecer a importância dacomunidade ucraniana em Portugal;

Disponibilizar produtos e serviçosdo Montepio em condições quefacilitem o acesso e a relação destacomunidade imigrante com aactividade financeira.

Site da Aprender

Osite da Associação “Direito deAprender” foi criado poucotempo depois da constituição

da nossa associação, e tem sidopermanentemente actualizado nodecorrer destes últimos cinco anos. Aolongo deste período, as visitas nuncapararam de crescer, e em Junhopassado já ultrapassámos as 6 000visitas mensais.

Esperamos que apreciem o novografismo e as novas secções. Mas estareformulação não visa só uma alteraçãode imagem. Pretendemosessencialmente promover uma maiorparticipação de todos os que nosvisitam.

Assim, para além de existir umfórum para que qualquer pessoa possacolocar questões ou debater ideias, étambém mais fácil e directo comentar oque é apresentado em qualquer dassecções.

Era importante que todos aquelesque se interessam pela educação eformação de adultos participassem: osque estão no terreno partilhassem assuas preocupações e experiências; osque investigam e estudam nesta áreatrouxessem as suas reflexões para odebate.

Os nossos sócios vão encontrarnesta reformulação um acesso à versãocompleta de todos os números daAprender ao Longo da Vida em pdf e aum fórum exclusivo dos associados.

Ficamos a aguardar pela vossa visitae o envio de sugestões de forma amelhorar ainda mais o nosso site.

Montepio assinala “Dia Internacional da Poupança”com protocolos na área da Educação e da Integração das Minorias

Page 59: Nº9 | NOVEMBRO 2008 | TRIMESTRAL Aprender · escreveu no seu livro Política e Educação , a educação permanente não é simples- mente uma exigência política, ideológica ou

www.direitodeaprender.com.pt

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