No aeroporto

8
Texto: AEROPORTO Carlos Drummond de Andrade Esta situação de aprendizagem foi elaborada a partir de algumas deficiências constatadas nos alunos do 9º. ano fundamental, conforme segue: ORGANIZAR EM SEQUÊNCIA LÓGICA ITENS DE INFORMAÇÃO EXPLÍCITA, DISTRIBUÍDOS AO LONGO DE UM TEXTO. INFERIR INFORMAÇÃO PRESSUPOSTA OU SUBENTENDIDA EM UM TEXTO LITERÁRIO, COM BASE NA SUA COMPREENSÃO GLOBAL. Os procedimentos de leitura especificados abaixo estão embasados, principalmente, no texto de Roxane Rojo: Letramento e capacidades de leitura para a cidadania. Segundo ROJO, “... ser letrado e ler na vida e na cidadania é muito mais que isso: é escapar da literalidade dos textos e interpretá-los, colocando-os em relação com outros textos e discursos, de maneira situada na realidade social, é discutir com textos, replicando e avaliando posições e ideologias que constituem seus sentidos; é enfim, trazer o teto para a vida e colocá-lo em relação com ela. Mais que isso, as práticas de leitura, na vida são muito variadas e dependentes do contexto, cada um deles exigindo certas capacidades leitoras e não outras.” Algumas capacidades de compreensão ou estratégias indicadas por ROJO, também foram seguidas, como: a) “Ativação de conhecimentos de mundo: previamente à leitura ou durante o ato de ler, o leitor está constantemente colocando em

Transcript of No aeroporto

Page 1: No aeroporto

Texto: AEROPORTO

Carlos Drummond de Andrade

Esta situação de aprendizagem foi elaborada a partir de algumas

deficiências constatadas nos alunos do 9º. ano fundamental, conforme

segue:

ORGANIZAR EM SEQUÊNCIA LÓGICA ITENS DE INFORMAÇÃO

EXPLÍCITA, DISTRIBUÍDOS AO LONGO DE UM TEXTO.

INFERIR INFORMAÇÃO PRESSUPOSTA OU SUBENTENDIDA EM

UM TEXTO LITERÁRIO, COM BASE NA SUA COMPREENSÃO

GLOBAL.

Os procedimentos de leitura especificados abaixo estão

embasados, principalmente, no texto de Roxane Rojo: Letramento e

capacidades de leitura para a cidadania.

Segundo ROJO, “... ser letrado e ler na vida e na cidadania é muito

mais que isso: é escapar da literalidade dos textos e interpretá-los,

colocando-os em relação com outros textos e discursos, de maneira

situada na realidade social, é discutir com textos, replicando e avaliando

posições e ideologias que constituem seus sentidos; é enfim, trazer o teto

para a vida e colocá-lo em relação com ela. Mais que isso, as práticas de

leitura, na vida são muito variadas e dependentes do contexto, cada um

deles exigindo certas capacidades leitoras e não outras.”

Algumas capacidades de compreensão ou estratégias indicadas por

ROJO, também foram seguidas, como:

a) “Ativação de conhecimentos de mundo: previamente à leitura ou

durante o ato de ler, o leitor está constantemente colocando em

Page 2: No aeroporto

relação seu conhecimento amplo de mundo com aquele exigido e

utilizado pelo autor no texto”;

b) “Antecipação ou predição de conteúdos ou propriedades de

textos: o leitor não aborda o texto como uma folha em branco. A

partir da situação de leitura, de suas finalidades, da esfera de

comunicação em que ele se dá; do suporte do texto (livro, jornal,

revista, out-door etc); de sua disposição na página; de seu título, de

fotos. legendas e ilustrações, o leitor levanta hipóteses tanto sobre

o conteúdo como sobre a forma do texto ou da porção seguinte de

texto que estará lendo. Esta estratégia opera durante toda a leitura

e é também responsável por uma velocidade maior de

processamento do texto, pois o leitor não precisará estar preso a

cada palavra do texto, podendo antecipar muito de seu conteúdo.

[...].”

PROCEDIMENTOS DE LEITURA:

A primeira coisa a fazer é situar tipificação do gênero textual, no

caso, gênero literário; o subgênero: narrativo, e dentro do

narrativo, o subgênero “crônica”:

Page 3: No aeroporto

1. GÊNERO NARRATIVO: subgênero: CRÔNICA – escritura sobre

fatos do cotidiano, do banal, do comum, situalização de um

acontecimento flash.

No texto lido, o uso da palavra literária, da variedade padrão,

eleva a narração da banalidade, do corriqueiro, construindo a

literariedade textual.

Essa palavra literária é confirmada pelo efeito de ‘poetização’,

uma espécie de sublimação do fato comum; ou transmutação do

conteúdo ordinário em Beleza estética.

2. A LINGUAGEM: literária, que vira estilo, marca drummondiana

Uso da norma-padrão

Exemplos: “quadrimotor”/ “vã”/ “parco”/ “plausível”/

“hóspede ameno”/ “ostensivo”/ “abonar”/ “importuno”/

“apraz”/ “ritos sacros”/ “pupilas”/ “puído”

Ação: decodificação da linguagem, auxílio vocabular ao aluno;

a palavra contextualizada.

3. LEITURA DE SUPERFÍCIE: o ato de ler e compreender o que se

lê:

Um narrador vai acompanhar o amigo ao aeroporto Galeão, no

Rio de Janeiro, e no tempo de espera começa a refletir sobre

aquele momento de despedida sem muitas palavras de Pedro, e

a reflexão se expande para os acontecimentos que ocorreram

durante os dois meses e meio em que o amigo Pedro esteve

hospedado em sua casa, destacando aos poucos o perfil do

amigo.

Depois da partida do avião, o narrador sente o aeroporto vazio.

Pedro, agora, está no azul do céu, voando para outro destino.

Tudo fica vazio. A vida esvazia-se sem Pedro.

Page 4: No aeroporto

4. LEITURA DE PROFUNDIDADE (pinçar elementos significativos

para a CONSTRUÇÃO DO AMIGO PEDRO:

5. O sistema linguístico: emissão de sílabas, não pronuncia palavras,

sua comunicação é por gestos e expressões - mesmo assim se faz

comunicar admiravelmente.

6. O SORRISO: durante a estada na casa do narrador (dois meses

e meio), este pode constatar que o amigo Pedro sorri porque ver

o ser humano lhe dá prazer:

ri sem motivo

Page 5: No aeroporto

sorriso como “arma” para desarmar pessoas ao seu redor

Sorriso especial, “revelador de boas intenções”, tanto no

ocidente quanto no oriente ou em trechos da rua onde vive o

narrador

Sorriso sem malícia

Sorriso com falta de dentes

Todos (fornecedores, vizinhos e desconhecidos) ficavam

agradecidos pelo sorriso encantador

7. Os OLHOS:

Olhos azuis que encantam qualquer um

A pureza do azul afastava suspeitas intencionalidades de

seus atos

8. O COMPORTAMENTO DE PEDRO:

Pedro dá trabalho/ vai se formando uma identidade em si

mesmo e no outro

Pedro requeria exigências como: horários/

comida/sabonetes/criados/ tudo especial

Comportamento merecedor de distinções:

Não era egoísta.

Não era importuno

Não se zangava

Sempre sorria; seu sorriso e presença compensavam tudo:

providências, privilégios

Recebia tudo com naturalidade, porque sabia-se merecedor

9. O DORMIR

Dormia tanto à noite quanto durante o dia e isso acarretava o

respeito das pessoas a seu sono:

O dormir acarretou mudança de hábitos nas pessoas: falar

baixo, a família trocou os concertos de Bach pelo

aborrecimento ou tortura da TV; andava-se na ponta dos pés

ou descalço e no escuro, para não importuná-lo, nem

interromper os sonhos de Pedro

Page 6: No aeroporto

Essas horas de sono eram respeitadas como “rito sacro”

(como expressão do sagrado)

10. A INCONTINÊNCIA URINÁRIA – situação que jamais zangava o

narrador, mesmo que não respeitasse os cômodos e urinasse

em toda a parte (coisa perdoável)

11. Os OBJETOS E O ATO DE EXPLORAÇÃO

Pedro não podia ver objetos que imediatamente queria para

ele: óculos, relógio de pulso, copos, xícaras, vidros em geral,

artigos de escritório, botões de punho ou botões comuns

Pegava as coisas, olhava-as e depois as punha na boca – era

sua mania

Costumava destruir os objetos como o fez com a lâmpada do

escritório

Apesar de seu interesse por objetos, não era um

colecionador

PEDRO CONSTRUÍDO:

A textualidade cria suspense sobre Pedro; o grupo de elementos

significativos é que vai montar Pedro, confirmar Pedro: ele é um

bebê que modifica o comportamento de todos na casa, revelado no

último parágrafo:

“Viajou meu amigo Pedro. Fico refletindo na falta que faz um amigo

de um ano de idade a seu companheiro já vivido e puído. [...]”

CORRELAÇÕES DE SENTIDO: A discursividade do texto revela o

relacionamento de um adulto vivido, na maturidade, com um bebê, e as

descobertas sobre o outro ser pequenino. Aponta como o eu do narrador

se correlaciona com o eu de Pedro e, ao mesmo tempo, como a família se

relaciona com a criança. Releva também o valor da amizade que

significava mais que tudo em relação a Pedro, uma amizade feita de

poesia e jogos do cotidiano. E, depois, o sentimento de ausência de

quando se despede da criança, o vazio da vida sem a criança.

Partindo do princípio de que todo texto está rodeado de intertextos que

com ele dialoga em vários tipos de gêneros, o procedimento de

Page 7: No aeroporto

correlação intertextual. Como a todo texto subjaz um discurso ou

discursos sociais, históricos, econômicos, filosóficos, psicanalíticos,

míticos, comportamentais, etc, todo discurso se expande a diálogos com

outros discursos, estabelecendo interdiscursos. Abaixo esta correlação:

INTERTEXTUALIDADE E INTERDISCURSIVIDADE

O texto dialoga com outros textos de qualquer gênero que apresente o

relacionamento de adultos com bebês: outras crônicas, contos, romances

(gênero literário); filmes (como Dois solteirões e um bebê), telenovelas,

publicidades, textos informativos (revistas especializadas em bebês),

publicidades, fotografias, são alguns exemplos – abrangentes do mesmo

tema (intertexto ou dom mesmo discurso ideológico (interdiscurso)

ÙLTIMA AÇÃO COM OS ALUNOS: Produção de Texto

A partir da leitura completa do texto com os alunos e também abarcando

os intertextos e interdiscursos, chegou a vez da criação de um texto. O

ato de redigir (redação) terá embasamento em tudo que foi analisado

sobre o texto “Aeroporto”, assim os alunos poderão fazer a interpretação

escrita sobre o texto, destacando ideologias textuais.

Conclusão: Acreditamos que o desenvolvimento desta situação de

aprendizagem em aulas auxiliará os alunos a refletir detalhadamente sobre um

texto, a fim de averiguar como se constroem passo a passo os sentidos do

texto e suas correlações com intertextos e interdiscursos.

Page 8: No aeroporto

Referências bibliográficas:

ANDRADE, Carlos Drummond de. Cadeira de balanço.In: Poesia completa e

prosa. Rio de Janeiro: Aguilar, 1973.

BAKHTIN, M. O discurso no romance. In: Questões de literatura e de estética

– A teoria do romance, p.71-210. São Paulo: Hucitec/EdUNESP, 1988.

ROJO, Roxane. Letramento e capacidades de leitura para a cidadania. São

Paulo:SEE:CENP, 2004.