Nº 387 Edição Brasil

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ESPECIAL: AS MELHORES CIDADES PARA FAZER NEGÓCIOS BRASIL brasil.americaeconomia.com N º 387 MAIO/2010 R$ 8,90 VIVA O POPULAR MERCADO DE CARROS COMPACTOS IMPULSIONA NOVO CICLO DE INVESTIMENTOS BILIONÁRIOS NO BRASIL SOFT POWER INFLUÊNCIA DO BRASIL NO EXTERIOR MEXICANO NA NET A ESTRATÉGIA DE SLIM NA TV PAGA BM&FBOVESPA UMA PLATAFORMA REGIONAL

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AméricaEconomia: Revista de Economia e Negócios Latino-americana

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ESPECIAL: AS MELHORES CIDADES PARA FAZER NEGÓCIOS

BRASIL brasil.americaeconomia.com

Nº 387 MAIO/2010 R$ 8,90

VIVA O POPULARMERCADO DE CARROS COMPACTOS IMPULSIONA NOVO

CICLO DE INVESTIMENTOS BILIONÁRIOS NO BRASIL

SOFT POWERINFLUÊNCIA DO BRASIL NO EXTERIOR MEXICANO NA NETA ESTRATÉGIA DE SLIM NA TV PAGA BM&FBOVESPAUMA PLATAFORMA REGIONAL

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NegóciosSony Ericsson

Novos celulares para sair da má fase

Locaweb nas nuvens

Negócios na América Latina

TV a cabo

O que o mexicano Slim quer na NET?

Capa – Setor Automotivo

Projetos bilionários de investimento

A virada do Sul

Como as têxteis voltaram ao lucro

Entrevista

Fabio Hering – presidente da Cia. Hering

Rumo ao Oriente

A experiência brasileira na Índia

Pão de Açúcar x Casas Bahia

Revisão de acordo gera incertezas

1820242834363842

SeçõesPortal

Carta ao Leitor

Cartas

Índice de Empresas

Pistas

Negócio Fechado

Movimentos

Opinião – John C. Edmunds

I-biz

Clics & Chips

Linha Direta

1011121213144476788082

DebatesLogística reversa

Aumento do consumo requer legislação

Soft power

A infl uência internacional do Brasil

Arbitragem internacional

Empresários defendem-se da América Latina

Nova presidente

Os desafi os de Laura Chinchilla, da Costa Rica

Democracia vertical

As lições que a China tem para dar

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FinançasPlataforma de negócios

BM&FBovespa quer projeção internacional72

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NESTA EDIÇÃO

ESPECIAL Ranking das melhores cidades para fazer negócios na AL50

Ilustração de capa: Julio Ramos

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O CALIBRE 1904 MC É O RESULTADO DE UM SÉCULO DE PAIXÃO E BUSCA DA EXCELÊNCIA

TÉCNICA PELA CARTIER. INTEGRANDO UM MECANISMO AUTOMÁTICO CRIADO,

DESENVOLVIDO E FABRICADO PELA MAISON, O RELÓGIO CALIBRE DE CARTIER ELEVA A

TRADIÇÃO RELOJOEIRA A UM PATAMAR MAIS EXIGENTE DE SOFISTICAÇÃO E PERFEIÇÃO.

1904 MC MOVIMENTO MANUFACTURE

BOUTIQUE CARTIER

RUA HADDOCK LOBO, 1567 - SÃO PAULO - TEL. (11) 3081 0051

CONCESSIONÁRIOS AUTORIZADOS

BERGERSON 0800 643 8999 (PR, SC) • CRISTOVAM JOALHEIROS (17) 3234 2402 (SP) • DRYZUN 0300 115 0100 (SP)

FRATTINA JOALHEIROS (11) 3062 3244 (SP) • GRIFITH (61) 3361 5848 (DF) • MERITUM (19) 3251 7761 (SP) • NATAN (81) 3467 5097 (PE)

SARA JÓIAS (21) 3202 4500 (RJ, RS) • TALENTO JÓIAS (31) 3071 4600 (MG) • TÂNIA JÓIAS (85) 3244 0065 (CE)

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10 AméricaEconomia Maio, 2010

LEIA NO PORTALEDIÇÃO: AINÁ VIETRO ([email protected])

brasil.americaeconomia.com

PORTAL

Siga o site da AméricaEconomia no Twitter: twitter.com/AEBrasil

MERCOSUL TERÁ LIVRE COMÉRCIO COM O EGITONos próximos meses, o Brasil e demais integrantes do Mercosul – Argentina, Paraguai e Uruguai – devem iniciar um acordo de livre comércio com o Egito. Acompanhado de empresários que visitaram o país em meados de abril, o ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Miguel Jorge, disse que a intenção é fortalecer o comércio para enfrentar a concorrência da Ásia e da Europa. A assinatura do convênio deve acontecer durante a reunião de cúpula entre os presidentes dos quatro países do Mercosul, em julho.

BB PAGA US$ 480 MILHÕES POR BANCO PATAGONIA O Banco do Brasil está fi ncando suas garras no exterior. Prova disso é que, no dia 21 de abril, anunciou a compra de 366.825.016 ações ou 51% do argentino Banco Patagonia, ao preço de US$ 1,3076 cada uma. O total da transação foi de US$ 480 milhões. Caso o acordo seja aprovado, será feita uma OPA (ofer-ta pública de ações) na Argentina dos papéis remanscentes do Patagonia. Segundo o comunicado enviado ao mercado, o Patagonia tinha US$ 2,57 bilhões em ativos no fi m de 2009. Já o Banco do Brasil fechou o ano passado com US$ 407,11 bilhões.

A América Latina está engordando a um ritmo alarmante, ame-

açando colapsar o sistema público de saúde nas próximas

décadas. Reportagem exclusiva de AméricaEconomia.com

mostra que essa ameaça afeta a maioria dos países, so-

bretudo o México. Para exemplifi car o avanço das conse-

quências da obesidade, em 1993, cerca de 7% da popula-

ção sofria de diabetes; em 2000, eram 10%; em 2009, esse

percentual foi para 15%. O Ministério da Saúde mexicano estima que, em

cinco anos, mais de 30% da população sofrerá de algum tipo de diabe-

tes. A reportagem indica os custos dessa evolução em vários países e as

pressões feitas às empresas do setor alimentício para que se envolvam na

batalha em favor de uma alimentação de melhor qualidade.

CONTINENTE OBESO

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UMA RELAÇÃO DELICADAPeter Hakim (foto), presidente do Diálogo Interamericano e conselheiro editorial de Améri-caEconomia Internacional, ana-lisa em artigo exclusivo como a maior integração entre Brasil e México, responsáveis por quase dois terços da econo-mia da América La-tina, poderia im-pulsionar toda a rede de acor-dos comerciais já existentes na região.

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Maio, 2010 AméricaEconomia 11

CARTA AO LEITOR

QUANTO MENOR, MELHOR

O Brasil começou 2010 acelerando forte. Se a afi rmação não é

unanimidade, a indústria automotiva, pelo menos, não tem

do que se queixar. No primeiro trimestre, o país superou a Alema-

nha em número de licenciamentos de veículos leves: foram 750

mil, contra 670 mil no país que é símbolo mundial desse segmento.

Com isso, conquistamos outro posto: o de quarto maior mercado

de automóveis do mundo, atrás apenas de China, Estados Unidos

e Japão. E, segundo analistas do setor, por pouco tempo: estudos

apontam que, se a economia brasileira mantiver o atual ritmo de

crescimento, abocanharemos o terceiro lugar em 2016.

Em nossa reportagem de capa, mostramos o ciclo de investi-

mentos bilionários por parte de fabricantes e fornecedores de au-

topeças, o crescimento espantoso da participação das montadoras

asiáticas no mercado brasileiro e a aposta cada vez maior do setor

em veículos compactos, que já representam quase 80% do market

share nacional.

Seguindo a trilha dos investimentos no Brasil e na América

Latina, trazemos, com exclusividade, um estudo da AméricaEco-

nomia Intelligence que traça um mapa das melhores cidades para

fazer negócios. Para nossa surpresa, a pesquisa revelou que, quan-

do o assunto é o poder de atrair negócios e investimentos, nem

sempre as maiores levam vantagem.

A queda de braço entre a família Klein e o megaempresário

Abilio Diniz; uma entrevista com Fabio Hering, que comanda uma

das empresas têxteis mais tradicionais do país, a Cia. Hering; os

desafi os da nova presidente da Costa Rica, Laura Chinchilla; e os

riscos e as virtudes da infl uência internacional do Brasil são outros

assuntos desta edição.

Boa leitura.

José Roberto Maluf

ASSINATURAS Central de AtendimentoTel: 55 11 3038-1493, de 2a a 6a feira, das 8h às 20h. Site: www.assineamericaeconomia.com.br. E-mail: [email protected] Cartas: Rua Butantã, 500 – 2o andar – CEP 05424-000 – São Paulo/SP

Valores de assinatura: Por 1 ano: R$ 96,00 / Por 2 anos: R$ 182,00Pagos em até 5x no cartão de crédito ou em até 3x no boleto bancário (preço válido para as vendas realizadas pela Central de Atendimento e pelo website da revista). Em caso de descontinuação da publicação, a Spring Editora-Produtora LTDA. garante aos assinantes desta publicação a restituição, em reais, da parte do valor já pago correspondente aos exemplares não entregues, devidamente corrigido monetariamente. Ao fazer sua assinatura, exija a credencial do vendedor e pague sempre com cheque nominal, mediante recebimento da primeira via de nosso pedido de assinatura.

PUBLISHERJosé Roberto Maluf

CONTEÚDODiretora de Redação Tatiana EngelbrechtEditora Executiva Solange MonteiroDiretora de Arte/Projeto Gráfi co Janaína DinizRepórteres Graziele Dal-Bó e Roberta PregnacaEditora do Site Ainá VietroRevisão Assertiva Produções EditoriaisProdução Gráfi ca Eduardo KepplerInfografi a Anna Luiza Aragão Colaborador Andre Carvalho (assistente de arte)

COMERCIALIZAÇÃOGerente de Publicidade Sidney EspósitoExecutivos de ContasNagibe José Adaime – [email protected]ério Ferreira – [email protected]

MARKETINGMarcia Leonardi, Elisangela Silva, Rafael Borsanelli

ADMINISTRATIVO/FINANCEIRODiretor Executivo Eduardo ColturatoGerente Financeiro Edison Arduino

PROJETOS ESPECIAISTania Macena

CIRCULAÇÃOGabriela Beraldo

Pré-impressão First PressPeriodicidade Mensal (Maio de 2010)CTP, impressão e acabamento IBEP Gráfi ca

Circulação auditada por

SPRING EDITORA-PRODUTORARua Ferreira de Araújo, 202, 7o andar – CEP: 05428-000 São Paulo/SP – Tel.: 11 3097-7666Site: www.springcom.com.brE-mail: [email protected]

AMÉRICAECONOMIA INTERNACIONALDiretor Elias Selman CarranzaVice-presidente Executiva Gloria Landabur C.Diretora Internacional de Marketing Mica Selman Diretor Editorial Felipe Aldunate M.Editores Fernando Chevarría (Lima), Juan Pablo Rioseco e Víctor Herrero (Santiago), Karen Correa (Guaiaquil)Diretor de Arte Álvaro Araya Urquiza Editor de Fotografi a Miguel CandiaDiretor de Circulação Marcial DelcortoGerente de Produção Constanza del Río Moreno

AMÉRICAECONOMIA INTELLIGENCE(Estudos e Projetos Especiais)Diretor Jaime Contreras SoriaCoordenadora Geral Daniela GonzálezPesquisador Sênior Andrés AlmeidaAnalista Paulina Saavedra

AMÉRICAECONOMIA.COMDiretor de Estratégia Digital Rodrigo GuaiquilEditor Lino Solis de OvandoWebmaster José Fuentes

ESCRITÓRIOSBuenos Aires +5411 4383-8410 Cidade do México +5255 5254-2400 Costa Rica +506 225-6861Lima +511 610-7272 Miami +305 648-9071 Panamá +507 271-5327Santiago +562 290-9400 Uruguai +5982 901-9052

Chairman Robert R. Paradise

BRASILbrasil.americaeconomia.com

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12 AméricaEconomia Maio, 2010

CARTAS ÍNDICE DE EMPRESAS

Os números referem-se à primeira vez em que as empresas são citadas em cada reportagem. NEGÓCIO VERDEGostei muito da reportagem sobre compen-

sação de emissões de carbono em eventos,

(“Pegadas Lucrativas”, AméricaEconomia No

384, fevereiro, 2010). Ajuda a conscientizar

as empresas de que existem meios de cuidar

do meio ambiente. Mesmo que seja inevitá-

vel a emissão, é importante divulgar que há

empresários focados em compensar os da-

nos causados pela poluição, e ainda lucrar

com isso. Um bom exemplo de economia

sustentável. VALDINEI MARCOS DA SILVA – SANTA CATARINA, BRASIL

MUITO OTIMISMO?Interessante o especial sobre as projeções de

diretores de fi nanças para o fi nanciamento

de suas empresas (“Em Busca do Capital”,

AméricaEconomia No 385, março, 2010). É

estimulante ler esses líderes bem informa-

dos sobre o que está se passando. Entretan-

to, chama a atenção o excesso de otimismo,

talvez porque falem em nome de empresas

especialmente bem-sucedidas e que, geral-

mente, têm acesso a recursos mesmo em

meio a crises profundas. PABLO CARDENAL – BUENOS AIRES, ARGENTINA

COPO MEIO CHEIOEscrevo para pedir um favor: falar ao mundo

que o México não é um país com problemas

da forma com que se diz. O México é um país

cheio de oportunidades, que teve sérias difi -

culdades em 2009, mas que tem enfrentado

seus problemas com resultados que melho-

ram seu potencial de crescimento. Há uma

tendência global em falar mal do México e

ressaltar apenas o que há de ruim. O Méxi-

co é um país bonito, agradável, onde se pode

trabalhar seriamente, tal como tenho feito

com minha empresa nos últimos 15 anos.

AARON CONNELLY – CIDADE DO MÉXICO, MÉXICO

Cartas para a redação: [email protected]

3M 50

Acer 47

Adidas 47, 50

Advent 14

AmBev 14

Anchor Ethanol 79

Apple 18

ArcelorMittal 44

Arla Foods 79

Arnold & Porter 65

Asus 47

Ativa 27

AviChina 30

Bain Consulting 34

Banco Banif 26

Banco do Brasil 10, 73

Banco Votorantim 73

Bethia 13

BM&FBovespa 72

Bosch 30

Boston Scientifi c 51

Bradesco 73

BrandAnalytics 33

Brasfanta 14

BTG Pactual 73

Café Punta del Cielo 46

Casas Bahia 42

Caterpillar 50

Celfi n Capital 13

Chadbourne & Parke 64

Chery 30

Citibank 73

Citroën 30

Claro 25

ConocoPhillips 64

Converge Com. 25

CSM Worldwide 29

Curtis Mallet 65

Dafra Motos 41

Dalila 34

De Smet Ballestra 79

Dell 19, 47, 50, 58

Delphi 30

Demarest e Almeida 54

Descarte Certo 59

Diálogo Interamericano 61

Dimension Data 15

EBX 13

Effa Motors 30

Embratel 25

Energy for Industry 79

Essencis 59

Facebook 82

Falabella 13

Fiat 29

Financial Times 82

FLC Plásticos 15

Foley Hoag 65

Fonterra 79

Ford 29

Foursquare 82

Freshfi elds B. Deringer 64

Gartner 18, 47

Gateway 18

Gayosso 46

General Motors 29

Gerdau 39

Globo 24

Goldman Sachs 26

Google 18,82

Grupo Caoa 30

Grupo Impacta 40

Grupo Kalyani 40

GVT 26, 53

Harbin Motor 30

Heineken 50

Hering 36, 34

HP 47

HSBC 73

HTC 18

Huawei 19

Hyundai 29

IBM 18, 69

IDC 20

Itaú Unibanco 59, 73

JAC 30

Kerton Group 18

Kia 30

LAN 13

Lancaster 34

Larcomar 15

Leader 42

Lean Institute Brasil 29

Lenovo 47

LG 18, 41

Lifan 30

LinkedIn 82

Lloyd’s 53

Locaweb 20

Magenta 15

Mangels 15

Marcopolo 39

Marfrig 15

Medoro 15

MEO Australia 15

Microsoft 19

Mitel 13

Mixxer 42

Motorola 18

NET 24

Nike 47

Nokia 18

Occidental Petroleum 64

Oi 26

Panasonic 80

Panda Security 15

PanDigital 80

Pão de Açúcar 42

Parque Arauco 15

Petrobras 15

Philips 15

Pininfarina 30

Portugal Telecom 27

Prada Assessoria 32

PwC 51

Procter & Gamble 50

Protiviti Brasil 42

Pyramid Research 18

Realty Corporation 42

Renault-Nissan 32

Renner 42

Samsung 18

Sancor 79

Santander 73

Schlumberg 53

SHC 30

SKY 26

SLW Corretora 42

Sony Ericsson 18

Sony 80

TAM 13

Tata Motors 39

Tecnoworld 80

Telecom Itália 27

Telefônica 26

Telmex 25

TIM 27

Toshiba 47

Toyota 29

TVS 41

Twitter 82

Vale 15

Vivo 27

Volkswagen 29

WEG 39

ZTE Corp. 19

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Maio, 2010 AméricaEconomia 13

PISTAS

DECLÍNIO MARCADO

PUBLICAMOS Em 2009, as exportações de etanol

caíram, e a expectativa é a de que, até o fi m do ano,

a redução nas vendas internacionais seja de 20%,

sobretudo pela forte queda nas compras dos EUA.

(“Otimismo Verde”, AméricaEconomia No 378, agos-

to, 2009)

O NOVO Segundo a União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica), esse declínio nas exportações de etanol não dará trégua tão cedo. A Unica anunciou uma estimativa de queda na temporada 2010/2011 (abril/março) para o menor nível desde 2003/2004, entre os produtores da região centro-sul, que repre-sentam 90% da produção de cana do Brasil. Para a safra 2010/2011, a Unica prevê exportações de 1,8 bilhão de litros, contra 2,75 bilhões na de 2009/2010. Segundo a organização, os motivos para tal projeção são o câmbio desfavorável e a queda nas vendas para os EUA e a Índia.

MAIS UM X

PUBLICAMOS Foram muitos os que desconfi aram ao ver Eike Batista entrar nos

segmentos de petróleo e geração de energia, para ser mais um em meio a

dezenas de projetos desses setores. Parecia um novo arroubo na carteira do

grupo EBX, que abrange outros empreendimentos tão desconexos como

uma mineradora, turismo náutico e um restaurante chinês. (“O Filho do Sol”,

AméricaEconomia No 385, março, 2010)

O NOVO O grupo EBX inclui mais um setor em seu amplo leque de atu-ação. Assinou um memorando de intenções para a formação de uma jointventure com a canadense Mitel, para atacar no setor de telecomunicações. A ideia é fabricar no Brasil telefones IP e sistemas de vídeo para segurança.

TUDO EM CASA

PUBLICAMOS A TAM posicionou-se como uma das

candidatas à compra da participação na chilena LAN

que o presidente recém-eleito Sebastián Piñera se

comprometeu a vender antes de sua posse. Para is-

so, entretanto, a TAM tinha um páreo duro: a família

Cueto, que já detinha 25% da LAN. (“Voando Alto”,

AméricaEconomia No 385, março, 2010)

O NOVO Com um certo atraso, no fi nal de março, Piñera conseguiu concluir a venda dos 26% que pos-suía na companhia aérea LAN. Entre as compradoras estiveram o grupo empresarial da família Cueto, o grupo Bethia – da família Solari, donos da rede vare-jista chilena Falabella – e a corretora Celfi n Capital, também do Chile. A venda para a Bethia gerou polê-mica, pois, para concretizar a operação, Piñera pri-meiro vendeu a empresa Axxion – por meio da qual administrava as ações da LAN – em bolsa, evitando arrematar diretamente as ações da companhia, eco-nomizando o pagamento de impostos.

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SOMAR FORÇASPUBLICAMOS Os recursos do Fundo da Amazônia serão aplicados exclusivamente sob a forma de fi nancia-mentos não reembolsáveis. “Nossa expectativa é a de que o volume de doações para o fundo cresça muito”, diz Guilherme Accioly, gerente do Departamento de Gestão do Fundo, do Banco Nacional de Desenvolvi-mento Econômico e Social (BNDES). (“Capital Verde”, AméricaEconomia No 383, janeiro, 2010)

O NOVO O Ministério do Meio Ambiente afi rmou que o BNDES está negociando com 12 países futuras doações ao Fundo da Amazônia, que hoje conta apenas com a Noruega como doadora. Não foram divulgados os países inte-ressados. Criado para promover projetos de prevenção e combate ao desmatamento e para a conservação e o uso sustentável das fl orestas no Bioma Amazônico, o Fundo contava, no começo deste ano, com uma carteira de 50 projetos, cinco dos quais já aprovados.

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14 AméricaEconomia Maio, 2010

NEGÓCIO FECHADO

ADVENT INTERNATIONAL Aempresa norte-americana de private equity anunciou, em abril, o término da captação do Latin American Priva-te Equity V (LAPEF V), com um valor total de US$ 1,65 bilhão. Segundo comunicado distribuído à imprensa, as empresas dos segmentos de servi-ços fi nanceiros, serviços em aeropor-tos, varejo, educação e serviços espe-cializados serão os targets do LAPEF V. O valor de cada investimento será de US$ 50 milhões a US$ 200 mi-lhões, em empresas avaliadas entre US$ 50 milhões e US$ 750 milhões. “Do total desse fundo, mais de 50% serão aplicados em empresas brasi-leiras”, adiantou, no comunicado, Pa-trice Etlin, sócio da Advent e respon-sável pelos investimentos no Brasil.VALOR: US$ 1,65 BILHÃO

BRASFANTA O grupo brasileiro que atua em segmentos como nu-trição especial, bebidas inovadoras,

AMBEVA companhia de bebidas investirá até R$ 2 bilhões no Brasil em 2010, com o objetivo de elevar a capaci-dade produtiva de suas fá-bricas entre 10% e 15%. Os recursos serão destinados a unidades localizadas em 13 estados. De acordo com a AmBev, o investimento leva em conta o cenário fa-vorável da economia e está condicionado à manuten-ção das atuais alíquotas de impostos federais para o setor de bebidas.

VALOR: R$ 2 BILHÕES

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Maio, 2010 AméricaEconomia 15

Abumohor – comprou o Larcomar, um dos mais conhecidos centros co-merciais de Lima, do grupo peruano Grana e Montero (G&M). O valor da operação foi de US$ 36 milhões. VALOR: US$ 36 MILHÕES

PETROBRAS O grupo brasileiro ad-quiriu, por meio de sua subsidiária in-tegral Petrobras Internacional Bras-petro, 50% de participação no bloco exploratório WA-360-P, localizado na bacia australiana de North Carnar-von, junto da empresa MEO Australia Ltd. O valor da aquisição é de US$ 39 milhões. O bloco cobre uma área de 1,2 mil quilômetros quadrados e tem profundidade de água máxima de 500 metros, localizado próximo à região de descobertas de gás. VALOR: US$ 39 MILHÕES

PHILIPS A companhia anunciou a aquisição da Tecso Informática, em-presa com sede no Rio de Janeiro focada em sistemas de gestão para a área de saúde. De acordo com a Philips, a compra tem como objetivo complementar e ampliar o portfólio da divisão de Healthcare (cuidados com a saúde) da Philips do Brasil. VALOR: NÃO REVELADO

VALE A área de logística do grupo brasileiro investirá cerca de R$ 60 mi-lhões neste ano no desenvolvimento e na aplicação de tecnologias ino-vadoras em suas ferrovias de carga pesada (heavy haul), nas estradas de ferro Vitória a Minas (EFVM) e Carajás (EFC), e nos portos. Entre os principais aportes estão novos equipamentos para operação de locomotivas por meio de comando remoto e uma tecnologia inédita entre as ferrovias brasileiras, que auxilia nas operações em trechos de aclive.VALOR: R$ 60 MILHÕES

jas de frango e um abatedouro pa-ra produção de produtos in natura(inteiro e cortes), no município de Jaciara, no Mato Grosso. A unidade terá capacidade de abate diária de 200 mil aves, elevando a produção da companhia para 2,6 milhões de aves por dia no Brasil. O prazo pa-ra a conclusão do projeto é de três anos, com investimento previsto de R$ 150 milhões.VALOR: R$ 150 MILHÕES

MEDORO RESOURCES A minera-dora canadense planeja investir en-tre US$ 30 milhões e US$ 40 milhões nos próximos dois anos para explo-rar uma mina de ouro no noroeste da Colômbia, por meio da Frontino Gold Mines. A Medoro recentemente comprou a Frontino, em uma transa-ção avaliada em US$ 200 milhões. VALOR: ATÉ US$ 40 MILHÕES

PANDA SECURITY A desenvol-vedora de soluções de segurança, fundada em 1990, comprou sua ope-ração brasileira que, até o momento, vinha atuando no modelo de distri-buição exclusiva. Com a incorpora-ção, a empresa passa a contar com 13 subsidiárias em diferentes países, incluindo Áustria, Alemanha, Bélgi-ca, China, Espanha, Finlândia, França, Holanda, Japão, Suécia, Inglaterra e EUA. Os sócios da distribuidora pas-sam a integrar o quadro da Panda Security do Brasil, respondendo pe-lo comando estratégico e executivo da operação. A Panda Security conta com 56 escritórios distribuídos por todo o mundo e centrais nos EUA (Califórnia) e Europa (Espanha).VALOR: NÃO REVELADO

PARQUE ARAUCO O grupo chi-leno, que opera centros comerciais – controlado pelas famílias Said e

laminados e software de gestão, comprou a empresa Locomotiva, da São Paulo Alpargatas, por R$ 43 mi-lhões. Segundo comunicado, com a aquisição, o Brasfanta – controlador da empresa FLC Plásticos – passa a ser líder do mercado de lonas e o se-gundo no mercado de laminados.VALOR: R$ 43 MILHÕES

DIMENSION DATA A sul-africana Dimension Data, provedora de servi-ços e soluções na área de tecnologia da informação, comprou participação de 51% na Magenta Computación, um integrador de sistemas com sede em Santiago, por uma quantia não revelada. A transação permite à Di-mension Data aumentar sua presença global no mercado latino-americano. O nome da companhia adquirida mu-dou para Dimension Data Chile. VALOR: NÃO REVELADO

MANGELS A fabricante de rodas de alumínio com sede em São Paulo planeja investir cerca de R$ 382,2 mi-lhões entre 2010 e 2014 nas divisões de rodas e cilindros, entre outras. O aporte está alinhado com as pers-pectivas de crescimento do Brasil para os próximos anos, em espe-cial de setores nos quais a Mangels tem participação. De acordo com a empresa, a cada ano a administra-ção revisará e defi nirá o montante de investimento a ser realizado no exercício seguinte, levando em con-sideração a capacidade fi nanceira da companhia e as condições ma-croeconômicas vigentes.VALOR: R$ 382,2 MILHÕES

MARFRIG Por meio de sua sub-sidiária Seara Alimentos, a empresa alimentícia fi rmou um protocolo de intenções com o governo de Mato Grosso para a construção de gran-Fo

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18 AméricaEconomia Maio, 2010

SINAL CORTADOSony Ericsson aposta em uma nova família de celulares para sair de sua má fase. A estratégia parece trazer mais riscos que acertos

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N o momento em que a fabricante de celulares Sony

Ericsson luta para emergir de um ano marcado por

uma forte queda nas vendas, no lucro e na partici-

pação de mercado, o novo presidente executivo da compa-

nhia, Bert Nordberg, demonstra um otimismo que parece

desproporcional ao cenário que lhe espera.

“Achamos que temos vantagem frente à concorrência”,

diz o executivo sueco, de 53 anos, tirando de uma sacola

os aparelhos celulares recém-lançados para apresentá-los.

“Agora, contamos com o portfólio correto”, completa.

Em 2009, a Sony Ericsson registrou perdas líquidas de

US$ 1,12 bilhão e queda de 40% nas vendas. A empresa ainda

mantém o quarto lugar em participação de mercado mun-

dial, com quase 4,5% das vendas, ainda que muito atrás da

Nokia (39%), da Samsung (21,1%) e da LG Eletronics (10,4%),

segundo dados do Interactive Data Corporation (IDC). Na

América Latina, também está em quarto lugar, com market

share de 10%, segundo a empresa de pesquisas Pyramid Rese-

arch. No Brasil, entretanto, fechou 2009 em quinto lugar, com

apenas 7,4% de mercado – uma queda considerável, frente

aos 11,1% de 2008, segundo dados do Gartner.

Nordberg, que assumiu, em outubro do ano passado, a li-

derança da companhia, aposta que a nova gama de celulares

– cinco no total: Vivaz, Vivaz Pro, X10, X10 mini e X10 mini

pro – será sufi cientemente atraente para garantir a volta do

crescimento e da rentabilidade. Uma jogada arriscada, em

uma indústria em que a concorrência é cada vez mais in-

tensa e na qual os produtos

tendem a se diferenciar

cada vez menos. Para o

sueco, entretanto, ter

os produtos corretos

é garantir que me-

tade da batalha já

esteja ganha. E ci-

ta o exemplo do

iPhone, da Ap-

ple. “Você pode

sair do nada,

ser um total

desconhecido da

ANTONIO MARÍA DELGADO, DE MIAMI

Em problemas

2009Variação

sobre 2008

Unidades vendidas

Preço médio por aparelho

Vendas

57,1 mi

US$ 160

US$ 6,78 bi

-41,0%

2,6%

-39,6%

Números da Sony

Fonte : Sony Ericsson

indústria, mas, se tiver o portfólio que os consumidores que-

rem, pode mudar o jogo rapidamente.”

Chama a atenção o fato de o executivo citar um de seus

rivais mais fortes, já que, diferentemente da Apple, os lan-

çamentos da Sony Ericsson não têm causado tanto frisson.

Segundo a empresa, entretanto, o objetivo desses modelos

– lançados em fevereiro no Congresso Mundial de Celulares,

em Barcelona, e que chegam progressivamente ao mercado

latino-americano no segundo trimestre – é atender a deman-

da dos consumidores por aparelhos de design atraente, oferta

abundante de aplicativos, boa capacidade de gravar vídeo e

fácil acesso a redes sociais.

TODOS IGUAISSegundo Derek Kerton, analista da Kerton Group, consulto-

ria de Telecomunicações com sede em San José, Califórnia,

os telefones da Sony Ericsson efetivamente estão entre os

melhores lançamentos recentes. “O problema é que não há

muita diferença entre esses aparelhos e os melhores lança-

mentos de concorrentes como Motorola e HTC”, diz. Ou seja: a

crescente semelhança entre os celulares quanto a tamanho,

sistema operacional, funcionalidade e aplicações ameaça

derrubar a estratégia da Sony Ericsson.

A maior parte dos fabricantes, por exemplo, está optando

pelo sistema operacional Android, do Google, que vem sendo

apontado como a melhor resposta da indústria frente à expe-

riência do usuário brindada pelo iPhone, da Apple.

Kerton compara o atual cenário dos aparelhos celu-

lares ao dos computadores pessoais no começo dos anos

1990, quando as margens de fabricantes como IBM, Ga-

1

NEGÓCIOS TELECOMUNICAÇÕES

Page 19: Nº 387 Edição Brasil

Maio, 2010 AméricaEconomia 19

BERT NORDBERG, PRESIDENTE

DA SONY ERICSSON:

ESTRATÉGIA ACERTADA

OU EXCESSO DE OTIMISMO?

2

Mercado brasileiro de celularesPrincipais fabricantes

Fonte : Gartner

Nokia LG Eletronics

Motorola Samsung SonyEricsson

2008Vendas consumidor final

(em milhões de unidades)

Percentualde mercado34,3

18,8

32,6

22,5

18,5

13,4

23,9

14,84

16,39

10,216,08 3,34

4,968,98

2009Vendas consumidor final

(em milhões de unidades)

Percentualde mercado

11,43

8,415,31

10,4

11,1

7,4

teway e Dell reduziram-se con-

sideravelmente porque todos

usavam componentes comuns

e o mesmo sistema operacio-

nal, o Windows, da Microsoft.

Norberg discorda dessa

“comoditização” e afi rma que

a companhia aprendeu que

os telefones têm de oferecer

novidades constantemente

para a marca ganhar a lealda-

de dos usuários. Além das con-

vicções do executivo, o certo é

que uma menor diferenciação

no mercado obrigaria os fabri-

cantes a partir para a frente

que mais lhes dói: o preço.

Nesse campo, a Sony Erics-

son parece contar com certa

margem de manobra. Nos úl-

timos anos, a empresa empre-

endeu uma forte redução de

gastos, incluindo o fechamen-

to de instalações nos EUA, na

Suécia e na Índia e a demis-

são de ao menos 3,6 mil em-

pregados. O próprio Nordberg

aponta que a empresa estaria

disposta a comprar essa briga.

“Nossa estratégia é produzir

aparelhos com maior funcio-

nalidade a preços mais baixos”, afi rmou.

O problema é que, nesse campo, falta boa concorrência. A

empresa está focada no segmento de aparelhos voltados ao

público de renda média e média-alta, com preços em torno

de US$ 160, em 2009. Por baixo, está sendo pressionada pelas

companhias chinesas Huawei e ZTE Corp., que, segundo ana-

listas, nos próximos anos, poderão desbancar a Sony Ericsson

e a norte-americana Motorola. E, de cima, a pressão vem da

Apple, com o sucesso de vendas do iPhone. Segundo o Gartner,

a Apple já conta com 17% do mercado global de smartphones.

Segundo Nordberg, ainda restaria uma cartada para sua

empresa: o aporte da japonesa Sony, quando o assunto é en-

tretenimento. “Estamos nos afastando do conceito de ser uma

companhia tecnológica para nos aproximarmos do conceito

de uma de entretenimento”, diz, afi rmando que o objetivo de

seus aparelhos é sempre melhorar a experiência do usuário.

“Queremos que as pessoas sorriam, e aparelhos com alto grau

de funcionalidade as ajudam a fazê-lo”, diz.

Agora, resta esperar para ver se o mercado comprará o

sorriso desse sueco.

Page 20: Nº 387 Edição Brasil

20 AméricaEconomia Maio, 2010

LÁ VAI A NUVEM

Locaweb expande operações na América Latina e quer ganhar o mercado mexicano com serviços de cloudcomputing

SOLANGE MONTEIRO, DE SÃO PAULO

MAUTNER: APOSTA EM PARCERIAS COM

FORNECEDORES PARA GANHAR CLIENTES

A grande vantagem das em-

presas de serviços online é a

de não ter fronteiras físicas

que limitem seu mercado. Para a Loca-

web, que oferece hospedagem de sites

e prestação de serviços de tecnologia,

entretanto, a tentação dessa facilidade

inicial não foi sufi ciente para acelerar

seus planos de internacionalização.

Só depois de 11 anos é que ela decidiu

anunciar formalmente sua entrada no

mercado externo, em setembro de 2009,

com estrutura e metas defi nidas. “Nos-

so foco é a América Latina, e queremos

que a operação na região represente 5%

do nosso faturamento até 2012”, conta

Henrique Macedo, gerente de Produtos

Internacionais da empresa.

Para acompanhar o crescimento

tanto no mercado externo quanto no

interno, a Locaweb fortaleceu sua es-

trutura, num processo que culminou Foto

: Mon

tage

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Am

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Econ

omia

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ivulga

ção

NEGÓCIOS TI

na inauguração, no ano passado, de

um novo data center em São Paulo, cuja

capacidade total é de 25 mil servido-

res. “A ocupação se dará em módulos e

acho que, no ritmo de crescimento que

vimos registrando, poderá nos aten-

der tranquilamente até 2015 ou 2016”,

diz Gilberto Mautner, presidente da

Locaweb. No ano passado, a empresa

também abriu um centro técnico em

Miami (EUA) e outro, de serviços de su-

Page 21: Nº 387 Edição Brasil

Maio, 2010 AméricaEconomia 21

porte, em Montevidéu (Uruguai), com o

objetivo de atender clientes de língua

espanhola em todo o continente ame-

ricano. O investimento foi de cerca de

US$ 1 milhão. “Agora temos uma plata-

forma inicial para poder atender esses

mercados”, afi rma Macedo, destacando

que a empresa espera ver o break even

dessa operação até o fi nal de 2010.

A escolha das duas cidades foi cui-

dadosamente estudada. “Por estar no

Mercosul, Montevidéu apresenta uma

série de facilidades, como no desloca-

mento de pessoas e na forma de admi-

nistrar; além disso, lá existem zonas

francas de serviços, onde podemos nos

estabelecer com um custo bem menor

do que, por exemplo, na Argentina,

inclusive do ponto de vista de salários”,

conta Macedo. Já a eleição de Miami se

deu por ser um “ponto de interconexão

dos países latino-americanos”.

ESTRATÉGIA MARIACHINeste primeiro momento, a Locaweb

dá sinais de ter especial interesse pelo

mercado mexicano, com destaque para

a oferta de serviços de cloud computing

– conceito de computação em nuvem

que permite o acesso a processamento,

armazenamento e softwares através da

internet –, que oferece no Brasil desde

2008, e conta com 3 mil clientes. Neste

ano, o serviço foi oferecido no mercado

internacional. “No México, nenhuma

empresa ainda se estabeleceu como lí-

der ou referência em cloud. O momento

é de conhecer o produto, descobrir para

que serve. E estamos investindo nisso”,

diz Macedo.

E como fazer para ganhar a confi an-

ça de clientes com um serviço pouco

conhecido e uma marca ainda menos fa-

mosa? Segundo Mautner, a empresa pri-

vilegiará a estratégia que a consolidou

no Brasil: parcerias com agências, web-

designers, consultorias e empresas que

desenvolvem soluções digitais, sobretu-

do, para pequenas e médias empresas.

“Temos mais de 14 mil desenvolvedores

parceiros no Brasil; é um sistema que

funciona bem”, afi rma o empresário.

Tal estratégia parece casar muito

bem com o conceito de cloud service, já

que, além de possibilitar agilidade na

expansão de um sistema de armazena-

gem ou de aplicações, este permite um

serviço de custo inicial reduzido, possi-

bilitando a contratação por empresas

menores. “É um conceito que virtualiza

a capacidade de armazenamento, pre-

cifi ca o software como um serviço e per-

mite a cobrança de forma mais granu-

lar, por operação”, diz Reinaldo Roveri,

gerente de Pesquisa da consultoria IDC

Brasil, especializada em TI. Segundo

Roveri, atualmente, o cloud computing

movimenta cerca de US$ 17 bilhões no

mundo, “e a estimativa é de que chegue

a US$ 44 bilhões até 2013, representan-

do entre 25% e 30% da receita total do

setor de TI”, completa Roveri.

Essa elasticidade que permite ofe-

recer um custo inicial baixo e expandir

conforme a demanda é muito bem es-

pelhada na oferta e no perfi l de público

da Locaweb. “Para cloud services, temos

tíquetes que vão de R$ 59 a clientes com

vários servidores e milhares de reais

por mês”, diz Mautner. Dos cerca de 200

mil clientes que a empresa tem, 70%

são pequenos negócios, que colabora-

ram para a Locaweb fechar 2009 com

uma receita bruta de R$ 131 milhões,

crescimento de 28% em relação a 2008

e margem Ebitda de 38,1%. “Quando, no

México, na Argentina, falamos do por-

te da Locaweb, as pessoas fi cam espan-

tadas com uma empresa que tem 200

mil clientes”, diz Mautner, confiante

no potencial de crescimento de seu ne-

gócio na região. Entre outros números

expressivos colecionados pela empresa

estão 2,3 milhões de contas de e-mail,

meio milhão em domínios, 320 mil

sites e 4,67 mil lojas virtuais.

Mautner afi rma que, por enquan-

to, não há planos de aquisições fora

do Brasil. “Não as descartamos, mas

hoje não existe um player mais conso-

lidado nesses países, nem em termos

de market share, nem de qualidade”,

diz. “Talvez o maior seja a Telmex (do

México), mas esta não tem uma oferta

nem próxima do que a gente faz no

Brasil, pois é algo mais arcaico e mais

caro”, defi ne, destacando que a opção

de uma estratégia menos agressiva

tampouco se deve à falta de capital. No

fi nal de 2008, a empresa cancelou uma

oferta pública de ações, por conta do

acirramento da crise fi nanceira mun-

dial. “Pretendemos retomar esse plano

de colocação assim que as condições

de mercado melhorarem”, diz. “Mas a

Locaweb é tranquila quando se trata de

capital, e não o faremos se as condições

não forem boas”, diz.

70%dos clientes da

Locaweb são

pequenas empresas

Page 22: Nº 387 Edição Brasil
Page 23: Nº 387 Edição Brasil
Page 24: Nº 387 Edição Brasil

24 AméricaEconomia Maio, 2010

TODOS LIGADOS

VERÓNICA GOYZUETA, DE SÃO PAULO

A paixão dos brasileiros pelo

futebol está intimamente

ligada à TV e ao seu desen-

volvimento tecnológico. As Copas do

Mundo sempre se converteram em um

grande empurrão para a TV se popu-

larizar no país, já que essa é a oportu-

nidade escolhida por fabricantes de

aparelhos, bem como pelas emissoras,

para lançar novidades. Foi assim com

NEGÓCIOS TV A CABO

Depois de anos de estagnação, a TV paga desponta no Brasil em um jogo de alianças no qual o mexicano Carlos Slim pode levar vantagem

a transmissão ao vivo, a TV em cores, a

TV digital e o LCD. Esse último já alcan-

çou 50 milhões de unidades no Brasil,

mais do que o dobro do registrado em

domicílios do México, por exemplo.

Para a Copa de 2010, sediada na

África do Sul, a novidade esperada é a

transmissão em 3D para clientes de TV

por assinatura. Mas pode ser que ela

não vingue.

A NET Serviços, maior empresa bra-

sileira de TV a cabo, já tem a tecnologia

disponível e a apresentou em even-

tos como o Carnaval e a Fórmula Indy,

em locais restritos. A inviabilidade da

operação se justifi ca por dois fatores:

falta de patrocinadores dispostos a de-

sembolsar um alto valor destinado à

TV Globo – que tem direitos de trans-

missão – e baixa penetração da TV por

Page 25: Nº 387 Edição Brasil

Maio, 2010 AméricaEconomia 25

Foto

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Imag

es

irrisória se comparada a vizinhos como

Colômbia, com 75%, ou Argentina, onde

63% das TVs estão ligadas em canais

pagos. A média sul-americana é de ape-

nas 25% porque é puxada para baixo

pelo resultado do Brasil.

O dado parece estranho em um

país adepto a novidades tecnológicas,

invadido por celulares e redes sociais.

“Foi uma mistura de fatores específi cos

do Brasil com questões regulatórias. A

TV aberta tinha altos índices de audi-

ência e um público satisfeito. Houve

demora no processo de regulamenta-

ção, e só no fi nal dos anos 1990 as nor-

mas fi caram prontas. E houve também

uma série de crises financeiras que

limitaram a adesão de assinantes”, ex-

plica Samuel Possebon, autor do livro

TV por Assinatura, 20 anos de Evolução

e diretor da Converge Comunicações,

grupo editorial especializado no mer-

cado de comunicação e TI.

PACOTE MEXICANOA situação, no entanto, começou a mu-

dar em 2005, quando as operadoras

passaram a focar em produtos desen-

volvidos para a classe C, sobretudo com

a oferta de pacotes de serviços, junta-

mente com telefonia e banda larga. Um

dos responsáveis por essa tendência é

o mexicano Carlos Slim, que, por meio

da Telmex, tem 49% das ações da NET

(os 51% restantes pertencem à Globo-

par) e é dono da empresa de telefonia

Embratel. A presença de Slim nas duas

companhias permitiu uma aliança que

tem sido a grande vantagem da NET no

mercado. Com a Embratel, a NET conse-

guiu colocar TV, telefonia e banda larga

no mesmo cabo. O resultado? Em 2009,

a NET registrou participação de 50% no

mercado de cabo, 25% no de banda lar-

ga e 6% em telefonia fi xa. Para manter

essa aliança vencedora, a NET trocou,

em dezembro, seu contrato de uso de

capacidade de rede da Embratel, que

era de curto prazo, por outro, de longo

prazo e irrevogável.

Com isso, as ações da NET subiram

51% no ano passado, considerado ruim

para o setor de telefonia na Bolsa, graças

a uma melhora considerável em seu

lucro, de R$ 20 milhões em 2008 para R$

736 milhões em 2009. Já o novo contrato

com a Embratel deve elevar a margem

Ebitda (sigla em inglês para lucro antes

de juros, impostos, depreciação e amor-

tização) de 27% para 29%, segundo um

relatório da empresa.

A expectativa agora é a de que a

NET aproveite a Claro, operadora ce-

assinatura no Brasil, considerando que

TV se paga com anunciantes e/ou assi-

nantes. Pois é, apesar de ter o maior nú-

mero de aparelhos da América Latina, o

número de domicílios que pagam para

assistir à TV é de pouco mais de 10%,

o mais baixo da região. Desde 1988,

quando saíram as primeiras licenças,

o Brasil tem vivido uma estagnação na

área, tendo hoje uma penetração ainda

1

Page 26: Nº 387 Edição Brasil

26 AméricaEconomia Maio, 2010

sofrer com essa concorrência em fun-

ção do alto custo da sua infraestrutura.

“A TV paga é um negócio de escala”,

ressalta Pardellas. “O mercado de DTH

tem crescido muito porque o processo

é muito mais simples. Praticamente

todas as empresas têm entrado”, con-

fi rma Possebon, da Converge. Isso faz

também com que o mercado de DTH

seja mais fragmentado, observa Par-

dellas. No cabo, a NET é líder, com mais

de 50%, mas isso representa apenas 93

entre mais de 5,6 mil municípios, dos

quais só 272 têm TV a cabo, enquanto

o satélite não tem limites. Foi por isso

que o Goldman Sachs rebaixou o rating

da empresa no meio de abril e a tirou da

sua carteira de recomendações, provo-

cando uma queda brusca das ações na

Bovespa, de 4,1%, no dia do anúncio.

Para ganhar corpo, a NET tem re-

corrido ao seu caixa e saído às compras.

“Alguns elementos para o nosso cres-

cimento acelerado são a conquista de

clientes e a compra de empresas, que

trazem clientes e licenças”, diz Elek Jr.,

destacando que o plano de aquisições

continua fi rme. A empresa optou por

comprar enquanto a Agência Nacional

de Telecomunicações (Anatel) não libe-

ra novas concessões de TV paga, o que

não deve acontecer tão cedo. “A Anatel

tem arcabouço pronto para fazer licita-

ções de concessão, nada impediria que

o fi zesse, mas a dúvida sobre a partici-

pação das empresas de telecomunica-

ções faz com que adie o assunto”, diz

Possebon. O último leilão aconteceu

em 2000.

ABERTO A ESTRANGEIROSOutra defi nição para a atuação das em-

presas de telefonia na área é o Projeto de

Lei 29, que está emperrado no Congresso

e com poucas chances de ser aprovado

em ano de eleição, acredita Possebon. No

projeto, está previsto que estrangeiros

podem ter o controle de uma empresa de

TV paga, ponto que abriria caminho para

Slim tomar o controle da NET das mãos

do Grupo Globo. Atualmente, a Telmex

tem 49%. Mas, segundo o acordo, caso a

lei seja aprovada, ela passa a ter 51%.

lular de Slim no Brasil, para entrar no

mercado móvel. “É muito interessante

para a oferta da NET dar mobilidade

aos seus clientes e oferecer banda larga

móvel. Temos um assinante muito di-

nâmico, e faz sentido facilitar essa ofer-

ta”, diz João Elek Jr., diretor Financeiro e

de Relações com os Investidores da NET,

afirmando que a parceria é possível,

pode acontecer e não existe restrição

regulatória para isso.

TUDO PARA CRESCERAs apostas da NET e de Slim fazem

sentido em um mercado com gran-

de potencial de crescimento em

TV paga e banda larga. “Hoje, temos

um ritmo de crescimento bastan-

te consistente e constante, com taxas

superiores a 20% todos os anos”, diz Pos-

sebon, que acha que a TV paga não é

mais um produto de alto luxo no Brasil.

Atualmente, o país tem quase 8

milhões de assinantes e espaço para

crescer não apenas em grandes cida-

des – como São Paulo, onde a pene-

tração atualmente é de 19% –, como

também em cidades do Nordeste, onde

a renda vem aumentando, e a TV paga

quase não existe. Recife, por exemplo,

tem uma penetração de apenas 3%, se-

NEGÓCIOS TV A CABO

gundo dados da Associação Brasileira

de TV por Assinatura (ABTA).

Na competição, que promete ser

acirrada, estão, além da NET e da SKY

(da Globo e do Grupo Murdoch), gran-

des empresas de telefonia, como Te-

lefônica, Embratel (também de Slim)

Oi e GVT, que acaba de ser comprada

pela francesa Vivendi. As empresas de

telefonia têm uma vantagem sobre a

NET, que opera na TV a cabo, pois têm

à disposição tecnologias com potencial

de disseminação mais rápida, como o

DTH (via satélite) e o IPTV (TV de proto-

colo Internet).

Para Alex Pardellas, analista do

Banco Banif, a NET, que é a empresa

mais competitiva no momento, pode

Aprovação de

projeto de lei

poderá permitir

a participação

majoritária da

Telmex na NET,

reduzindo o poder

da Globo

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AFP

é a penetração da TV

a cabo na cidade de

São Paulo

19 %

2

Page 27: Nº 387 Edição Brasil

Maio, 2010 AméricaEconomia 27

As especulações fi cam por conta de

quanto pode custar esses 2%, mas Pos-

sebon não vê nenhuma possibilidade

de entraves entre os sócios. “A Globo

já tem uma defi nição muito clara do

que quer na TV paga: uma presença na

área de conteúdo com a Globosat. Seu

foco vai ser na oferta de conteúdo”, diz

o especialista. “E hoje a NET vale mais

do que valia em 2004. Isso, do ponto de

vista fi nanceiro, é bom para ambos”, diz

Possebon. É importante lembrar que es-

se acordo aconteceu quando a Globo en-

frentava sérios problemas fi nanceiros

com a NET. A empresa tinha suspendi-

do o pagamento da sua dívida, em 2002,

e a Telmex entrou na renegociação.

O principal concorrente da NET no

mercado de TV paga e banda larga é

a espanhola Telefônica, que vem de

um ano difícil. A Anatel suspendeu a

venda dos serviços da empresa por três

meses, depois de registrar problemas

na banda larga. Segundo um relatório

da corretora Fator, a empresa pode ter

perdido R$ 12 milhões em vendas e pelo

menos 70 mil clientes por mês para a

concorrência, sem contar os danos à

sua imagem. Segundo um relatório da

Ativa, outra desvantagem da Telefônica

é que ela estaria “amarrada” para con-

correr na oferta móvel porque divide o

controle da operadora celular Vivo com

a Portugal Telecom, que tem planos de

assumir a totalidade da empresa. Já os

espanhóis andam em conversas para

uma fusão com a Telecom Itália, na

qual fi cariam com a TIM no Brasil.

Independentemente de trocas de

ações, fusões e leis, a NET está em van-

tagem no Brasil graças à ousadia de

Carlos Slim. “O Slim já está com as qua-

tro patas no Brasil”, brinca Pardellas,

do Banif. Seja o que acontecer daqui

para a frente, ele já entrou nos setores

de TV paga, internet, telefonia e celular

no Brasil. Com o apetite que o magnata

mexicano demonstra ter, poucos duvi-

dam que ele não consiga.

O MEXICANO CARLOS SLIM: OUSADIA DO

MAGNATA FEZ A NET GANHAR MERCADO

3

Page 28: Nº 387 Edição Brasil

34 AméricaEconomia Maio, 2010

POPULAR DO FUTUROBrasil se torna o quarto maior mercado de automóveis do mundo e impulsiona novo ciclo de investimentos bilionários no país. A demanda anual pode superar os 5 milhões de veículos em 2016

O motor do mercado brasileiro

nunca roncou tão alto como

em 2010. Os resultados das

vendas de automóveis no primeiro tri-

mestre do ano indicam que o país supe-

rou a Alemanha – que registrou 670 mil

licenciamentos de veículos leves no pe-

ríodo, contra 750 mil no Brasil. Com isso,

NEGÓCIOS CAPA

o Brasil já pode ser considerado como o

quarto maior mercado de automóveis

do mundo, atrás apenas de China, EUA e

Japão. Para este ano, a perspectiva é a de

alcançar quase 3,5 milhões de veículos

vendidos, o dobro de 2005 e um avanço

de mais de 8% em relação a 2009. Até

2016, e se a rotação da economia conti-

nuar alta como está, o Brasil deve supe-

rar o Japão e registrar a terceira posição,

com uma demanda que pode chegar a

5 milhões de veículos. E tem tudo para

saltar da atual posição de sexto maior

produtor de veículos do mundo para

quinto, ou mesmo quarto, disputando o

posto com Coreia do Sul e Alemanha.

1

POR GIULIANO AGMONT, DE SÃO PAULO

Page 29: Nº 387 Edição Brasil

Maio, 2010 AméricaEconomia 35

carros compactos e seus derivados, que

respondem por quase 80% do market

share nacional. Hoje, as 20

plantas das 14 montado-

ras do Brasil têm capaci-

dade instalada de cerca de

4 milhões de veículos por

ano. Segundo a Anfavea

(Associação Nacional dos

Fabricantes de Veículos

Automotores), em quatro

anos, o país terá condições

de produzir 6 milhões de

veículos. Nesse período,

de 2010 a 2013, somente o

BNDES (Banco Nacional de

Desenvolvimento Econô-

mico e Social) planeja inje-

tar cerca de US$ 17 bilhões

para empreendimentos

da indústria automobilís-

tica, com destaque para as

novas unidades das asiáti-

cas Toyota e Hyundai, em

Sorocaba e Piracicaba, no

interior de São Paulo, além da expansão

das fábricas das quatro líderes de mer-

cado, que também dispõem de recursos

de suas matrizes: Fiat, Volkswagen, Ge-

neral Motors e Ford.

Esta nova realidade pressiona a pro-

dução das montadoras e impulsiona um

novo ciclo de investimentos bilionários

por parte de fabricantes e fornecedores

de autopeças, com foco, sobretudo, em Foto

: 1 -

Divu

lgaçã

o; 2 -

Fabio

Gon

zalez 2

JAIME ARDILA, DA GM: RENOVAÇÃO

DE PORTFÓLIO NO PAÍS

FORTALECIDOAssim como em outros países emer-

gentes, o setor automotivo brasileiro

saiu da crise melhor do que entrou.

Além da solidez dos alicerces macroe-

conômicos construídos nesta última

década e meia, contribuíram para a

retomada das vendas as medidas anti-

cíclicas adotadas pelo governo, como a

redução do IPI (Imposto sobre Produtos

Industrializados) e a oferta de crédito

por intermédio de bancos públicos. E,

também, o esforço da indústria auto-

mobilística em repassar os benefícios

para o consumidor. Para o consultor

Paulo Cardamone, vice-presidente da

CSM Worldwide, a disponibilidade de

crédito, associada à queda de juros,

ainda que insufi ciente, permitiu o cres-

cimento contínuo desse mercado desde

2002. “A oferta de fi nanciamentos hoje

é dez vezes maior do que era em 2000, o

que refl ete a confi ança do mercado.”

O professor José Roberto Ferro, presi-

dente do Lean Institute Brasil, acrescen-

ta a essa conta a distribuição de renda, a

queda da infl ação, o aumento do empre-

go e o crescimento do PIB. “O Brasil tem

mais gente com recursos para comprar

produtos novos e melhores.”

Page 30: Nº 387 Edição Brasil

34 AméricaEconomia Maio, 2010

NEGÓCIOS CAPA

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CLEDORVINO BELINI, DA FIAT: VOCAÇÃO

BRASILEIRA PARA OS COMPACTOS

3

ASIÁTICOS NO RETROVISORAs montadoras asiáticas crescem no retrovisor dos quatro principais fabricantes de veículos do Brasil: Volkswagen, Fiat, GM e Ford. Elas pro-metem abocanhar 20% do mercado da América do Sul nos próximos dez anos. Primeiro, vieram os japoneses, que hoje têm como principais repre-sentantes a Honda e a Toyota. Depois, foi a vez dos coreanos, que ainda devem fazer bastante barulho no país com as marcas Hyundai e Kia. Agora, são os chineses que prometem invadir o mercado. Pelo menos dez marcas podem ter veículos à venda no país nos próximos dois anos.

A estratégia inicial da maioria das empresas é a de importar o veículo no modelo CKD (kits para serem montados no país em que os veículos são vendidos). Com pouco mais de dez anos de existência e quase 2 milhões de veículos produzidos, a Chery lançou, no ano passado, um utilitário esportivo produzido no Uruguai, acaba de colocar mais dois modelos importados no mercado e promete inaugurar uma fábrica no país até 2012. “Fabricaremos um compacto de R$19 mil, com freios ABS e duplo airbag de série, e um sedã completo. Teremos capacidade de pro-duzir de 150 a 200 mil veículos por ano”, diz Luis Curi, presidente da Chery do Brasil. “Nossa meta é a de atingir 7% do mercado em 2018, chegando aos 350 mil carros vendidos.”

Os chineses sabem que o grande desafi o no Brasil, além de entender a lógica fi scal e tributária, é o de vencer o preconceito contra a qualidade de seus produtos. Eles afi rmam que trarão a “Nova China” para o país, que faz computadores, TVs e celulares. Também garantem que estão escorados nos mesmos estúdios de design e fornecedores dos principais players mundiais, como Pininfarina, Bosch e Delphi. “Sabemos que não podemos errar. Nossos carros têm de satisfazer o consumidor”, reconhe-ce Curi, que garante ter conversado com 43 concessionárias para ofere-cer suporte pós-venda e promete um centro de desenvolvimento tecno-lógico no Brasil. “Já temos motores fl ex desenvolvidos pela Chery.”

Outra empresa que promete agitar o mercado é a JAC. Até o fi m deste ano, o Grupo SHC, de Sérgio Habib, ex-presidente da Citroën, importará três modelos e não descarta construir uma fábrica no Brasil. Completam a lista três parceiras do Grupo Effa Motors: a AviChina, a Harbin Hafei (que vai montar uma van e um comercial leve em Manaus) e a Lifan, além da Great Wall, trazida pela CN Auto e a BYD, que negocia com o Grupo Caoa.

Levando em conta que a taxa de

motorização do país é de um carro para

cada 7,9 habitantes, é possível entender

por que o mercado brasileiro se tornou

tão atraente para as grandes compa-

nhias, a exemplo dos demais Bric – Rús-

sia, Índia e China. Na prática, fi ca evi-

dente que esses países vão ditar o ritmo

de crescimento e desenvolvimento do

setor, já que mercados maduros como

Japão e EUA têm quase um carro por

habitante. “Essas economias renovam

sua frota, mas não têm margem para

crescer”, avalia Sérgio Reze, presidente

da Fenabrave (Federação Nacional da

Distribuição de Veículos Automotores).

Estima-se que o percentual de bra-

sileiros em condições de comprar um

carro novo saltou de 10% para 15% nos

últimos anos – o Brasil tem quase 200

milhões de habitantes, e uma frota

inferior a 30 milhões de carros. “Até

2015, teremos de 20 a 30 milhões de

novos consumidores da classe C”, ava-

lia Jackson Schneider, ex-presidente

da Anfavea (Associação Nacional dos

Fabricantes de Veículos Automotores).

Esse impulso, dizem os analistas,

deve fazer com que a América do Sul,

que hoje responde por cerca de 7% do

mercado mundial, aumente essa par-

ticipação em pelo menos 1% ao ano na

próxima década. Reforça essa expec-

tativa o fato de a Argentina também

viver um bom momento de vendas

de veículos, embora isso se deva mais

Page 31: Nº 387 Edição Brasil

Maio, 2010 AméricaEconomia 35

à busca pela segurança patrimonial

diante da alta da infl ação.

EXPANSÃO À VISTAA maior carteira de investimentos no

Brasil é da Volkswagen, que programa

injetar R$ 6,2 bilhões no país até 2014.

Cerca de 40% desse montante será des-

tinado às três unidades de produção de

São Paulo, e o restante, para desenvol-

vimento de novos produtos. Com pouco

mais de 15% do total, o Brasil é

o terceiro mercado da mon-

tadora alemã, que pre-

tende tomar a lide-

rança mundial da

Toyota até 2018. A

italiana Fiat, que

detém a liderança

de veículos leves

no Brasil desde

2001 e acaba de

apresentar o novo

Uno, não havia divul-

gado seus investimentos

para a América Latina até o

fechamento desta edição. Mas a empre-

sa desembolsou R$ 5 bilhões entre 2008

e este ano para ampliar sua capacidade

de produção de 700 mil para 800 mil

veículos por ano no Brasil. Consideran-

do a planta de Córdoba, na Argentina, a

Fiat tem capacidade instalada para fa-

bricar 1 milhão de veículos por ano na

região. “O Brasil detém 33% das vendas

e 20% do faturamento do Grupo Fiat, o

que demonstra a vocação do país para

carros compactos, com valor agregado

mais baixo”, diz Cledorvino Belini, pre-

sidente da Fiat do Brasil e responsável

pelo Grupo Fiat na América Latina, e

recém-empossado presidente da Fena-

brave. O executivo não confi rma, mas

está praticamente certo que a Fiat vai

produzir o Cinquecento na unidade da

Chrysler no México.

A General Motors manteve inal-

terado seu cronograma de in-

vestimentos no país, de R$

5 bilhões para o período

entre 2008 e 2012,

com liberação anu-

al de R$ 1 bilhão. O

mercado brasilei-

ro é o terceiro mais

importante para a

GM, atrás de EUA e

China. Já a marca

Chevrolet tem o se-

gundo maior mercado

global no Brasil, perdendo

apenas para o norte-america-

no. “Esses investimentos nos permi-

tirão ampliar a capacidade produtiva

e renovar o portfólio de veículos para

atender essa demanda”, estima Jaime

Ardila, presidente da General Motors

do Brasil e Mercosul.

A Ford também anunciou um apor-

te bilionário para o Brasil. Em visita ao

país no início do ano, Alan Mulally,

novo presidente mundial e CEO da

companhia, anunciou um

aumento de R$ 4 bilhões

para R$ 4,5 bilhões no pe-

ríodo de 2011 a 2015 em

infraestrutura no país, de

um total de R$ 5,5 bilhões

previsto para a América

do Sul. “Implantaremos

no Brasil plataformas de

veículos globais, e apos-

tamos em um crescimen-

to desse mercado acima

do PIB”, disse Mulally, na

capital paulista.

GLOBAL COMPACTOOs carros globais são uma

tendência irrefreável do setor automobi-

lístico. As montadoras cada vez mais vão

investir em soluções que atendam dife-

rentes mercados. No Brasil, parece ine-

vitável que os fabricantes invistam no

nicho do carro compacto para aproveitar

o lastro de mercado. As quatro grandes já

fazem isso: brigam nessa categoria o Gol,

da Volks; o Fiesta e o Ka, da Ford; o Palio

e o Uno, da Fiat; e o Corsa e o Celta, da

GM. Toyota e Hyundai, que devem estar

produzindo até 2013, prometem lançar

modelos compactos também. “Mas é

preciso incrementar o conteúdo tecno-

lógico nos carros para o Brasil atingir os

patamares internacionais de exigência.

Estamos muito defasados em questões

como segurança e emissão de CO2”, aler-

ta Paulo Cardamone, da CSM.

Maior montadora do mundo, a

Toyota ainda tem participação rela-

tivamente tímida no Brasil. Isso de-

monstra a cautela e a cadência com que

os japoneses exploram seus mercados,

bem como a prioridade global dada pe-

la matriz. Nos últimos anos, os gastos

da Toyota se concentraram em outros

países, e só agora a equipe de enge-

nharia da empresa está livre para se

dedicar mais ao Brasil. “Paralelamente,

os dirigentes da montadora esperavam

o Corolla ser líder de sua categoria no

país e bater a Honda, assim como já

acontecia com a Hilux, para justifi-

car o investimento. Em 2009, o Corolla

superou pela primeira vez o Honda

6,2bilhões de reais é a

previsão de investimento

da Volks

Page 32: Nº 387 Edição Brasil

34 AméricaEconomia Maio, 2010

da Assessoria mostra que o excesso

de capacidade de produção global,

associado à rápida apreciação cam-

bial do Real, impõe desafios sig-

nifi cativos à competitividade das

empresas. O chamado Custo Brasil,

que envolve principalmente buro-

cracia, infraestrutura, juros e carga

tributária, precisa cair para dar

condições de igualdade aos fabri-

cantes instalados no país. O capital

também é muito caro, difi cultando

empréstimos. Assim como os cus-

tos de matéria-prima.

“O fato de o mercado estar bem

não signifi ca que a indústria tam-

bém esteja”, pondera Letícia Costa,

responsável pelo estudo. O setor de

autopeças, por exemplo, terá um

déficit entre importação e ex-

portação de R$ 3,5 bilhões,

podendo chegar a R$ 4

bilhões em 2011. “O

faturamento do

setor é o mesmo

há décadas”, diz

Arnaldo Frederico

Meschnark, presi-

dente da Sindiforja

(Sindicato Nacio-

nal das Indústrias

de Forjaria). A falta de

mão de obra especializada

é outro drama vivido por esse

setor, que responde por mais de 25% do

PIB industrial do país e cerca de 5 a 10%

do PIB geral.

Tal cenário, além de criar gargalos

pontuais diante de picos de deman-

da, pode enfraquecer o setor manu-

fatureiro e estimular a montagem de

carros com peças produzidas fora do

país, limitando a capacidade da ca-

deia produtiva, responsável por levar

a matéria-prima aos chamados “sis-

temistas” e às montadoras. Por isso, o

mercado aposta, e espera, que entrem

na agenda do próximo governo bra-

sileiro, além das reformas política e

tributária, investimentos em infraes-

trutura e mais medidas de estímulo ao

crédito, sem que a euforia em torno do

pré-sal inviabilize esse processo.

NEGÓCIOS CAPA

Civic e criou condições para a vinda

dos investimentos”, explica o consultor

José Roberto Ferro, apesar do problema

relacionado com o recall do modelo (ver

box na página ao lado).

O motor é outro quesito importan-

te. Mais da metade dos automóveis

emplacados hoje no país é 1.0 litro. Os

outros 50% são versões principalmente

1.4 e 1.6, e a minoria, 2.0 ou mais. Os

modelos fl ex, que permitem abasteci-

mento com gasolina ou álcool, repre-

sentam mais uma tendência. Cerca de

90% dos veículos vendidos no país têm

motor fl ex, e já respondem por mais de

30% da frota. Ou seja, todos os fabrican-

tes que exploram o mercado brasileiro

precisam oferecer carros com motor bi-

combustível, inclusive pelo apelo eco-

lógico. Justamente por isso, os motores

elétricos ainda são no Brasil, bem como

na maior parte do mundo, muito mais

tendência do que realidade.

Uma das primeiras propostas que

parecem mais consistentes quanto aos

carros movidos a eletricidade partiu da

aliança Renault-Nissan. O grupo franco-

nipônico anunciou uma parceria com

a Prefeitura de São Paulo para estudar

a viabilidade de utilização de veículos

elétricos na capital paulista. A ideia é

avaliar, entre outros itens, a infraes-

trutura para implanta-

ção da rede de recarga

dos veículos, além

do modelo mais

indicado para o

projeto. A Renault-

Nissan deve lan-

çar seu primeiro

veículo elétrico, o

Leaf, ainda neste ano

nos mercados dos EUA e

do Japão. Caso o projeto em

São Paulo vingue, o prefeito

Gilberto Kassab prometeu encomendar

um lote de carros elétricos à CET (Com-

panhia de Engenharia de Tráfego). “A

viabilidade do carro elétrico no Brasil de-

pende de incentivos públicos”, defendeu

o CEO da aliança Renault-Nissan, Carlos

Ghosn, em evento da comunidade liba-

nesa, realizado na capital paulista, em

abril. “Já temos acordos com cerca de 50

governos no mundo todo”, afi rmou.

TERRENO ACIDENTADOO otimismo em torno do Brasil é notó-

rio. Mas o motor desse mercado pode

começar a falhar se alguns reparos não

forem feitos. As barreiras à competi-

tividade fora dos portões das fábricas

podem jogar água no reservatório de

óleo do setor. Um estudo feito pela Pra-

90%dos carros

vendidos no Brasil são fl ex

Page 33: Nº 387 Edição Brasil

Maio, 2010 AméricaEconomia 35

A ONDA DE RECALL A Toyota protagonizou o maior recall da história da indústria automobilística e defl a-grou uma onda de convocações para repa-ros de defeitos de fábrica também por parte de outras montadoras. A empresa japonesa já teve de retirar das ruas para consertos mais de 8 milhões de veículos, quantidade superior à que vendeu no ano passado em todo o mundo.

Tudo começou com um alerta emitido pelo órgão de controle de segurança veicular nos EUA sobre um problema nos tapetes de alguns modelos, que virou uma bola de neve até se constatar que a falha era no pedal. No Brasil, as consequências para a empresa, que sempre foi reconhecida pela qualidade de seus carros, foram ainda mais graves. O Ministério Público de Minas Gerais proibiu a venda do Corolla no estado até que a fabricante trocasse os tapetes dos carros em circula-ção. Como resposta, a fabricante tomou a iniciativa de realizar uma campanha de “chamamento preventivo”. “A medida pode ter sido considerada drástica, mas é um alerta para que as empresas comecem a se mexer quando for preciso anunciar um recall”, avalia Eduardo Tomiya, diretor da consultoria de gestão de marcas BrandAnalytics. Ele lembra o caso do Fox, que gerou repercussão em 2008, quando alguns proprietários tiveram os dedos das mãos arrancados ao abaixar o banco traseiro do veículo. “Na época, a Volkswagen disse que os clientes deveriam ter lido o manual, e se eximiu da culpa, o que não deveria ter acontecido”, diz Tomiya. Neste caso, o analista afi rma que o melhor a fazer é ser transparente com o consumidor, expli-cando as causas do problema e o que a empresa está fazendo para resolvê-lo.

Mas o movimento de recalls foi além de Toyota e Volks. A Honda promoveu um deles no início deste ano, em quase meio milhão de veículos em todo o mundo, para reparos nos sistemas de airbags. Na se-quência, GM e Nissan também anunciaram seus recalls.A primeira convocou donos de mais de 1 milhão de ve-

ículos Chevrolet e Pontiac, nos EUA, Canadá e México, para consertar problemas no sistema de direção. E a se-gunda fez um chamamento envolvendo cerca de meio milhão de carros para reparar problemas no pedal de freio e no medidor de tanque de combustível.

No Brasil, o Ministério da Justiça determinou, no iní-cio deste ano, que a Fiat fi zesse o recall do modelo Stilo, que estaria causando acidentes por desprendimento da roda traseira. A montadora convocou pelo menos 50 mil veículos fabricados entre 2004 e 2008.

Segundo Tomiya, é difícil mensurar com exatidão de que forma essa onda impactou no orçamento das montadoras, já que ela ocorreu justamente em um mo-mento aquecido para o setor no Brasil, mas ele garante que “um erro como esse pode colocar em risco todo o investimento em marketing de uma empresa”.

Os analistas reconhecem que as imposições do mer-cado obrigam as montadoras a trabalhar no limite. Isso leva a altas taxas de lançamento de veículos, redução do tempo de desenvolvimento de produtos e emprego de tecnologias cada vez mais novas. Do outro lado, a pressão dos consumidores e a rapidez com que as in-formações circulam na internet tornam a cobrança em torno das normas de segurança cada vez maior. “Está mais difícil omitir problemas”, diz o consultor José Ro-berto Ferro, do Lean Institute. “Mas é um procedimento normal feito pelo setor, que é aceito pelo mercado e continuará acontecendo.” Segundo ele, o segredo para não criar problemas mais graves de imagem é dar res-postas rápidas e proporcionais ao impacto causado por eventuais defeitos de fábrica, algo que passou a ser feito por muitas montadoras depois que a Toyota não o fez.

(Colaborou Graziele Dal-Bó)

4

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Page 34: Nº 387 Edição Brasil

34 AméricaEconomia Maio, 2010

FÁBRICA DA

MODA

VIRADA DA HERING: INVESTIMENTO

EM MODA E AJUSTE NOS PREÇOS Foto

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NEGÓCIOS TÊXTIL

Veja como três empresas da cadeia têxtil brasileira conseguiram reinventar seu negócio

para combater o declínio das vendas

MÁRCIA VAISMAN, DE FLORIANÓPOLIS

H ering, Dalila e Lancaster são

companhias que têm mais

em comum do que a locali-

zação em Santa Catarina. Em meados

desta década, as três – respectivamen-

te, uma confecção, uma fabricante de

malhas em rolo e uma estamparia –

passavam por uma fase ruim, com dí-

vidas e estagnação nas vendas. Graças

a um processo de reinvenção de seus

negócios, as semelhanças entre elas

não param por aí: todas se recupera-

ram e crescem mais de 20% ao ano.

Dos três casos, a intervenção mais

forte parece ter acontecido na centená-

ria Hering. Até 2005, ela era uma em-

presa endividada. Um estudo realizado

com 1,8 mil pessoas, em vários estados

brasileiros, tampouco apontou um bom

diagnóstico para a marca: era pouco

conhecida fora de São Paulo e Santa

Catarina, e seu produto era considerado

caro e sem apelo de moda. Ou seja: pa-

recia o fi m dos dias da camiseta branca

da etiqueta com dois peixinhos.

Depois de registrar prejuízo de

R$ 17,7 milhões em 2004, a empresa

passou a renegociar suas dívidas, in-

cluindo US$ 76 milhões dos títulos

negociados no exterior e um passivo

junto ao BNDES, abriu mão do controle

acionário para capitalizar a companhia

e mergulhou em um agressivo plano de

negócios, com ajuda da Bain Company

Consulting. “Digo que 2007 foi o ano da

transpiração, pois partimos para uma

estratégia de tirar o fôlego”, lembra o

presidente da companhia, Fábio Hering

(veja entrevista na pág. 36).

Com o valor arrecadado, a empresa

foi para o ataque: aumentou o núme-

ro de lojas de 151 para 276, a maioria

franqueada, investiu em peças de mo-

da e muita publicidade e estudou um

reajuste de preço em seus produtos

que, em alguns casos, chegou a uma

redução de 30%.“Tornamos os produ-

tos mais acessíveis, agregando valor

sem reduzir a margem de lucro”, conta

Hering.

Page 35: Nº 387 Edição Brasil

Maio, 2010 AméricaEconomia 35

ANDRÉ KLEIN, DA DALILA: SOLUÇÃO ESTAVA

EM APRIMORAR CRIAÇÃO E MARKETING

A margem de lucro, positiva há cin-

co anos consecutivos, tem como base a

maior escala de produção. Mas se enga-

na quem pensa que a camiseta Hering

foi deixada de lado. A diferença está na

valorização de todas as outras peças

e na preocupação em reduzir o tempo

entre cada lançamento. “Há seis cole-

ções por ano, e, a cada duas semanas,

produtos novos estão nas vitrines”, diz

Gracila Camargo, analista de Relações

com Investidores da Hering.

A mudança não parou por aí. A

empresa, que tinha 12 marcas em seu

portfólio e concentrava parte de sua

produção para atender marcas inter-

nacionais, como Zara, Armani e GAP,

abandonou o private label e enxugou

sua carteira. Hoje, a Hering mantém

apenas quatro marcas: Hering, Dzarm

– para jovens –, PUC e Hering Kids, am-

bas focadas no público infantil.

Para fechar seu plano de negócios, a

companhia também retraiu sua atuação

no exterior: abandonou operações como

a que tinha no Oriente Médio e hoje se

concentra exclusivamente na América

Latina – nas lojas que possui no Uruguai

(5), Venezuela (4), Paraguai (3), Bolívia (2),

além de uma nas Antilhas Holandesas –,

onde quer concentrar seu foco ao menos

pelos próximos três anos.

NOVAS ESTRATÉGIASA busca de valor agregado não foi a so-

lução encontrada apenas quando o foco

direto estava no consumidor fi nal. Isso é

o que mostraram a Lancaster Benefi cia-

mentos Têxteis e a Dalila Têxtil, que, por

meio do programa Santa Catarina Moda

Contemporânea, que atualmente reúne

16 empresas, puderam trocar experi-

ências com outras parceiras do setor e

elaborar sua estratégia de recuperação.

No caso da estamparia e tinturaria

Lancaster, o pulo do gato foi substituir o

puro sistema de venda de hora/máqui-

na para as empresas de confecção, que

chegavam com seus próprios desenhos,

por outro que implicou a contratação de

designers próprios, que também passa-

ram a se envolver no desenvolvimento

de estampas. “Agora, nosso grupo pensa

os conceitos e as tendências de estampas

e cores ao lado da equipe de desenvol-

vimento dos nossos clientes”, comenta

André Luiz Lobe, um dos diretores da

empresa. Hoje, a Lancaster é a única

de seu segmento a patrocinar desfi les

da São Paulo Fashion Week, como os

de Alexandre Herchcovitch e Ronaldo

Fraga. O resultado dessa mudança? Uma

companhia que, apesar de não revelar

faturamento, cresce por volta de 20% ao

ano. “Há apenas cinco anos, não apre-

sentávamos crescimento, e hoje arrisco

dizer que somos a maior estamparia do

Brasil voltada a terceiros. Hoje eu ganho

vendendo moda”, enfatiza o diretor.

Na Dalila, que fabrica tecidos em

rolo para as confecções, a falta de rumo

na busca de um diferencial também

era evidente quatro anos atrás, refl e-

tindo diretamente nos resultados da

empresa. “Sempre pensamos em tra-

balhar com produtos diferenciados,

mas não sabíamos como. Fugíamos

das commodities, mas nosso produto

não tinha uma identidade”, afi rma o

presidente da empresa, André Klein da

Silva. Na inquietude de seus 26 anos, o

empresário afi rma que só encontrou

solução quando passou a investir em

melhorias na área de criação e marke-

ting, além de mudanças na gestão in-

dustrial para atender ao nível de servi-

ço desejado por esse mercado. Hoje em

dia, a Dalila desenvolve coleções, fala

de tendências e mostra o resultado em

desfi les itinerantes pelo país. Isso é raro

no segmento de atuação de malharia

em rolo. “Quando passamos a vender

informação de moda, tivemos um salto

nas nossas receitas”, diz. A empresa,

que faturou R$ 106 milhões em 2009,

espera crescer 40% ao ano e planeja,

até 2013, estar entre as cinco maiores

malharias do Brasil.

2

Mudança de hábitoantes depoisempresa

Hering Foco commodity e private label para o exterior

fortalecimento de marca própriae conceito de valor agregado com redução de preço

Funcionários 5.000

produto sem diferenciação

400

melhoria em criação e marketing e equipe de vendas

produçãohora/máquina

diferenciaçãode produto

540

250 315

6.000

acima de 30%–

acima de 40%–

20%–

Projeção de crescimento

Foco

Funcionários

Projeção de crescimento

Foco

Funcionários

Projeção de crescimento

Dalila

Lancaster

Page 36: Nº 387 Edição Brasil

36 AméricaEconomia Maio, 2010

POTENCIAL RENOVADO

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lgaçã

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NEGÓCIOS ENTREVISTA

AméricaEconomia Quais foram os principais desafi os no processo de reestruturação da empresa? Fabio Hering Nas últimas duas déca-

das, tivemos de sair do modelo de in-

dústria para o de uma gestão focada em

negócios, no varejo e na construção das

nossas marcas próprias. Isso criou as ba-

ses para um modelo de crescimento que

vem tendo sucesso há alguns anos.

AE Há alguns anos, o senhor admitiu que a transição demorou mais do que o esperado. O que motivou isso? Hering Do fi m da década de 1990 até

2005, vivíamos um ambiente macroeco-

nômico no Brasil que não permitia que a

empresa crescesse. O custo do capital era

elevado, e tínhamos dívidas. Passado o

pior momento, o país fi cou mais estável

e foi apresentando boa perspectiva de

crescimento. Desde 2007, conseguimos

pensar em um plano de negócios para

voltar a crescer agressivamente.

Prestes a completar 130 anos, a Cia. Hering passou por diversas fases e muitos

desafi os. Ficou endividada, perdeu mercado e demorou a encontrar seu foco de

atuação. Com o passar dos anos, seu produto de prateleira, a camiseta básica,

foi perdendo atratividade. Atrelada a problemas macroeconômicos, a empresa

afundou-se em dívidas e teve seu faturamento encolhido em cerca de 50%. Em

2005, entretanto, uma nova estratégia colocou a Hering em outro patamar. Basta

ver os números. Seu faturamento atingiu a marca de R$ 877 milhões em 2009, com

crescimento de 39,4% em vendas e ebitda de R$ 154 milhões. “Ainda há oportuni-

dades interessantes no mercado”, diz o presidente da empresa, Fabio Hering, em

entrevista à AmericaEconomia.

MARCIA VAISMAN, DE FLORIANÓPOLIS

FOTO: PATRICK RODRIGUES

AE Qual o resultado registrado? Hering Há dez trimestres crescemos

mais de 20%, e ainda há muito potencial

para atuarmos nesse mercado.

AE Quais são as novas estratégias de mercado da Hering para vencer o prazo das metas estabelecidas pela consultoria que vocês contrataram? Hering Até 2012, pretendemos estar

com 405 lojas Hering no país (hoje são

276), fora as multimarcas e as outras

que trabalhamos, como Dzarm, PUC

e Hering Kids. A partir daí, queremos

desenvolver um plano de negócios para

cada marca, já que nos concentramos

inicialmente na Hering, que era a mais

conhecida do consumidor. Paralela-

mente, podem surgir oportunidades

interessantes. Não estou falando que

pretendemos adquirir novas empresas,

mas estamos atentos ao movimento do

mercado. Tudo vai depender da oportu-

nidade e do momento.

Page 37: Nº 387 Edição Brasil

Maio, 2010 AméricaEconomia 37

Foto

: Divu

lgaçã

o

AE Vocês decidiram encerrar a pro-dução para as marcas estrangeiras e investir nas próprias. Foi uma deci-são acertada? Hering Ninguém constrói uma prote-

ção de suas mercadorias com marcas de

terceiros. Nos últimos 15 anos, atuamos

fortemente em private labels porque a

economia interna era difícil, os juros,

altos, e havia forte oscilação na moeda

estrangeira. Por isso, essa era uma al-

ternativa de sobrevivência. A partir de

2005, o cenário mudou, e resolvemos

concentrar nosso esforço nas marcas

próprias, construindo uma base sólida

no mercado doméstico e no exterior.

AE Por que vocês fecharam lojas no Hemisfério Norte e resolveram investir, inicialmente, apenas na América Latina? Hering Por causa da crise fi nanceira,

e até porque não era nosso target. Em

contrapartida, a Hering já é conhecida

na maior parte da América Latina. Já

temos uma boa operação no Paraguai,

no Uruguai e na Venezuela. Estamos

expandindo para Argentina, Chile e

Peru, onde já estivemos no passado.

Concentraremos nossa atuação, pelos

próximos três anos, na América Latina.

Pode haver outra expansão, mas esse

agora não é o nosso foco.

Page 38: Nº 387 Edição Brasil

38 AméricaEconomia Maio, 2010

TRILHA AO LESTE

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NEGÓCIOS BRICS

Page 39: Nº 387 Edição Brasil

Maio, 2010 AméricaEconomia 39

Empresas brasileiras que se instalaram na Índia colhem os frutos da aposta em custos competitivos e acesso a mercados asiáticos

ROBERTA PREGNACA, DE SÃO PAULO

TERRITÓRIO INDIANO OFERECE

DIFERENCIAIS COMPETITIVOS

PARA COMPANHIAS DO BRASIL

A distância de milhares de qui-

lômetros, as diferenças cul-

turais e o fuso horário não

foram empecilhos para algumas em-

presas brasileiras que, nesta década,

fi ncaram o pé na Índia para expandir

seus negócios, de olho no potencial

de crescimento do mercado asiático.

Hoje, o resultado de companhias como

Gerdau, WEG e Marcopolo, algumas

das principais brasileiras presentes no

país, justifi cam inclusive novos planos

e anúncios de investimentos.

Ruben Bisi, diretor de Operações

Internacionais da fabricante de ônibus

Marcopolo, com sede no Rio Grande

do Sul, aponta que os fatores de atra-

tividade da Índia não repousam ape-

nas naquele país. “O que está aconte-

cendo é que o Brasil está perdendo a

competitividade, não só para a Índia,

em função do custo Brasil”, afi rma. A

empresa atua naquele mercado por

meio de uma joint venture com a Tata

Motors, em duas unidades já em ope-

ração e com expectativa de produzir

aproximadamente 14 mil ônibus em

2010. “Em termos de produção, as duas

fábricas representarão, neste ano, em

torno de 30% do nosso volume”, afi rma

o executivo. O investimento total nas

duas fábricas foi de US$ 66 milhões,

sendo que o aporte da Marcopolo foi

equivalente à metade do valor, incluin-

do recursos próprios e fi nanciamento.

Além da valorização do Real, que

prejudica as exportações a partir do

Brasil, as empresas ainda apontam a

mão de obra qualifi cada, custos reduzi-

dos de frete e de logística e uma proxi-

midade com clientes situados na Ásia

como outras vantagens importantes.

“Com as fábricas da Índia, queremos

avançar no Oriente Médio, para o sul

da Ásia e para os vizinhos da Índia, co-

mo Paquistão e Sri Lanka”, afi rma Bisi.

PLANO DE VOOPara chegar a esse mercado, entretan-

to, não bastou arrumar as malas e par-

tir: as companhias dedicaram anos de

estudo para obter sucesso. Foi o caso da

WEG, fabricante de equipamentos elé-

Page 40: Nº 387 Edição Brasil

40 AméricaEconomia Maio, 2010

tricos e geradores, com sede em Santa

Catarina. “Avaliou-se comprar uma

empresa, para termos uma operação

industrial na Índia”, destaca Sergio

Luis Marsiglia Sobreira, diretor de Ope-

rações da WEG na Índia. “Depois de

avaliar várias opções, optamos desen-

volver um projeto novo, começando

do zero.”

A WEG planeja investir entre US$

65 milhões e US$ 70 milhões em uma

unidade fabril que produzirá motores

e geradores de média e alta tensão na

Índia, com previsão de iniciar operação

no segundo semestre de 2010. A uni-

dade terá capacidade de produzir mais

de 300 motores ou geradores por ano.

“Existe uma vantagem imediata, que

é a de estar próximo ao mercado. Você

encurta o prazo de entrega e simplifi ca

o processo de logística”, diz Sobreira.

Há também o caso de empresas

que escolhem a rota traçada pela Mar-

copolo, trabalhando em conjunto com

empresas locais. A Faculdade Impacta

de Tecnologia (FIT), instituição de en-

sino especializada na área de tecno-

logia da informação e pertencente ao

Grupo Impacta, sediada em São Paulo,

firmou, em 2007, uma parceria com

a faculdade indiana PSG College of

Technology para a utilização da ferra-

menta Virtual Classroom Impacta (ou

classe virtual Impacta). De acordo com

o presidente do grupo, Célio Antunes,

a Impacta, atualmente, trabalha na

adaptação dessa tecnologia na PSG,

que permitirá aos seus alunos acessar

em um ambiente virtual o conteúdo

de aulas presenciais.

“Se somarmos investimentos em

carga horária, no trabalho com os pro-

fessores e na adaptação da tecnologia,

esse valor deve alcançar aproximada-

A Índia atraiu

empresas brasileiras

sobretudo nas áreas

de siderurgia,

transporte, educação

e infraestrutura

mente R$ 500 mil”, afi rma o presidente

do grupo, que faturou R$ 40 milhões no

ano passado e está de olho em novos

mercados para crescer. “Essa tecnologia

poderá ser implementada em qualquer

lugar do mundo, não só na Índia.”

Outro exemplo, de peso, é o do gru-

po Gerdau, que possui operações em

mais de dez países e capacidade insta-

lada superior a 20 milhões de toneladas

de aço. A empresa fechou uma joint

venture, em 2007, com o Grupo Kalyani,

para operar uma planta siderúrgica

naquele país. “A Índia foi eleita pela

Gerdau para ser a porta de entrada no

continente asiático por se tratar de um

mercado extremamente promissor,

principalmente pelo enorme potencial

de crescimento no consumo de aço”,

afirmou André Gerdau Johannpeter,

CEO da companhia.

ACIMA, RUBEN BISI, DA MARCOPOLO. À DIREITA,

O PRESIDENTE DA TVS, HARDIP SINGH GOINDI, E

O PRESIDENTE DA DAFRA, CRESO FRANCO

NEGÓCIOS BRICS

2

3

Page 41: Nº 387 Edição Brasil

Maio, 2010 AméricaEconomia 41

A Gerdau planeja desembolsar,

no total de suas operações, R$ 9,5 bi-

lhões, entre 2010 e 2014. “Na Índia,

estão sendo realizados R$ 88 milhões

em investimentos neste ano”, diz o

CEO. O aporte será para um laminador

com capacidade instalada de 300 mil

toneladas, voltado à produção de aços

especiais e vergalhões. A previsão é de

que o equipamento entre em operação

em 2011.

Bisi, da Marcopolo, destaca a impor-

tância de chegar a um novo território

com o apoio de um parceiro local. “Eu

diria que uma joint venture facilita mui-

to, pois deixamos de ser vistos como um

estrangeiro chegando, mas como sócio

de uma empresa local. Portanto, somos

muito mais bem recebidos. A velocidade

como as coisas acontecem é completa-

mente diferente do que se estivéssemos

sozinho. Diria que é uma questão de

dividir um pouco o lucro, mas também

dividir um pouco o risco”, diz.

PRÓXIMOS PASSOSO território indiano deve continuar na

rota de empresas brasileiras que bus-

cam diferenciais competitivos e custos

atraentes. “A Índia é um país que tem,

assim como o Brasil, necessidade de de-

senvolver sua infraestrutura para con-

tinuar crescendo, como estradas, portos,

aeroportos, energia elétrica, indústria

de aço, cimento, óleo e gás, todas as áre-

as que têm potencial de crescimento”,

diz Sobreira, da WEG.

“Os investimentos programados já

demonstram nossa intenção de expan-

são no país”, afi rma Johannpeter, CEO

da Gerdau. “A dinâmica de crescimento

dos mercados indiano e asiático como

um todo determinará os investimentos

adicionais a serem realizados na Índia.

Entretanto, não estamos planejando

realizar novas aquisições no país.”

Apesar do avanço das empresas

brasileiras, alguns executivos acham

que o apetite das empresas indianas

para investir no Brasil é maior do que

o das empresas brasileiras de se ins-

talar na Índia. “O interesse é muito

forte, principalmente em setores como

açúcar e minério”, afi rma Roberto Pa-

ranhos do Rio Branco, presidente da

Câmara de Comércio Brasil-Índia.

ANDRÉ GERDAU JOHANNPETER: A GERDAU

TEM OPERAÇÃO NA ÍNDIA DESDE 2007

CAMINHO INVERSO

Empresas indianas enxergam o potencial do mercado brasileiro. A fabri-

cante de motocicletas TVS Motor Company fechou uma parceria com

a brasileira Dafra Motos para a fabricação do modelo Apache RTR 150.

“Houve um investimento de cerca de US$ 1 milhão, tendo em vista que

o investimento mais pesado já foi feito durante o processo de implanta-

ção das linhas de montagem da Dafra em Manaus”, afi rma Creso Franco,

presidente da Dafra. “A fabricação de produtos TVS em nossa fábrica vai

nos proporcionar contato com novas tecnologias, tanto em processos

quanto em produtos, e nos levará a um excelente patamar em pesquisa

e desenvolvimento.”

Já o Instituto de Pesquisa & Desenvolvimento Brisa, com sede em Brasília,

é outro exemplo de sinergia entre os dois países do Bric (grupo de países

emergentes formado por Brasil, Rússia, Índia e China). Realizou um inter-

câmbio com engenheiros indianos para trabalhar em projetos de adap-

tação de produtos para o mercado local para a fabricante de eletrônicos

LG. Os engenheiros fi caram no Brasil entre janeiro e julho de 2007 e, de

acordo com Katia Argolo de Castro, diretora de Operações do instituto,

a experiência foi positiva e pode se repetida. “Os indianos são pessoas

extremamente interessadas e dedicadas. São também muito técnicos e

sistemáticos, têm um método de trabalho que visa à melhor qualidade

do que se está fazendo,” diz.

O certo é que, independentemente

do destino, o fl uxo de investimento di-

reto que sai da Índia para outros países

tem registrado um crescimento signifi -

cativo nos últimos anos, indicando um

forte impulso de internacionalização

das empresas do país. Segundo estudo

do Ipea (Instituto de Pesquisa Econô-

mica Aplicada), divulgado em abril,

o investimento estrangeiro direto da

Índia saiu de um fl uxo médio de US$

1,7 bilhão ao ano, entre 2000 e 2005,

para mais de US$ 16 bilhões anuais

entre 2006 e 2008.

“Os brasileiros sempre foram mais

tímidos para serem internacionais”, diz

Rio Branco, afi rmando que a Índia deve

receber investimentos pesados na área

de infraestrutura, o que amplia o inte-

resse de empresas estrangeiras.

De qualquer forma, enquanto os

indianos estudam nosso mercado,

as empresas brasileiras já estão co-

lhendo os frutos de ter chegado antes

à Índia, acumulando experiência na

bagagem que levam em seu processo

de internacionalização.

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Page 42: Nº 387 Edição Brasil

42 AméricaEconomia Maio, 2010

CLIMA DE INCERTEZADecisão da Casas Bahia de rever acordo com o Pão de Açúcar gera impacto negativo no mercado

ROBERTA PREGNACA, DE SÃO PAULO

MICHEL KLEIN, DA CASAS BAHIA (À

ESQUERDA), E ABILIO DINIZ, DO PÃO DE

AÇÚCAR: EM BUSCA DO FINAL FELIZ Foto

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NEGÓCIOS VAREJO

A nalistas de mercado foram

pegos de surpresa em mea-

dos de abril, quando a Casas

Bahia solicitou ao Grupo Pão de Açúcar

a revisão do acordo de fusão entre as

duas companhias, divulgado no fi nal de

2009. Um assunto que parecia encerrado

e não demandaria outro esforço de Abi-

lio Diniz, do Pão de Açúcar, Michel Klein,

da Casas Bahia, advogados e assessores

para encontrar um novo ponto fi nal.

Até o fechamento desta edição, Pão

de Açúcar e Casas Bahia não tinham

manifestado uma decisão. “Do ponto de

vista econômico, isso não faz sentido”,

afi rma Eugenio Foganholo, diretor da

Mixxer, consultoria especializada em

varejo e bens de consumo. “Parece mais

uma jogada de negociação (da Casas

Bahia) do que qualquer outra coisa.”

Apesar das incertezas sobre o rumo das

conversas, o diretor da Mixxer achava,

em meados de abril, que a fusão seguiria

em frente. “Tenho a impressão de que a

chance de haver continuidade dessa

compra é muito grande, pois os custos

envolvidos em uma rescisão, para todas

as partes, e a repercussão no mercado,

seriam extremamente negativas”.

Acordos de fusões e aquisições, se-

gundo analistas, podem ser desfeitos

quando uma das partes se sente em

desvantagem ou quando ocorre uma

mudança das condições de mercado

vigentes, como a crise fi nanceira mun-

dial, que abalou os mercados e mexeu

com o capital de diversas companhias.

“Às vezes, acontece de empresas desfa-

zerem um acordo. Não é normal, mas

acontece”, afi rma Cauê Pinheiro, ana-

lista de varejo da SLW Corretora.

Pinheiro cita o caso da Lojas Renner,

que, em 2008, anunciou a aquisição da

rede varejista Leader, com atuação no

Nordeste e Sudeste do Brasil. Meses

depois, a Renner alegou alteração no

cenário econômico-fi nanceiro brasilei-

ro e mundial para desistir da compra.

No caso da fusão entre Pão de Açú-

car e Casas Bahia, o analista é otimista,

mas, cauteloso. “Acho que há chances

de ser desfeito, mas aposto numa mu-

dança das condições do acordo, que

fi que melhor para a Casas Bahia.”

CAPITAL HUMANOAlguns especialistas alertam que, em

casos de grandes fusões e aquisições,

as empresas devem ter cuidado es-

pecial não somente com ganhos ope-

racionais, melhor competitividade e

acesso a novos mercados. “Os proces-

sos de due dilligence, de forma geral,

têm um foco muito grande na área

financeira e nos aspectos mercado-

lógicos. E muitas vezes não dão uma

atenção especial a aspectos culturais,

que estão associados a essas empresas.

Porque, no fi nal, quem vai fazer a di-

ferença são as pessoas”, diz Waldemir

Bulla, sócio-diretor da Protiviti Brasil,

consultoria especializada em geren-

ciamento de riscos, auditoria interna e

governança corporativa.

Uma rescisão do contrato teria im-

pacto negativo para os dois lados, di-

zem analistas. O mercado espera ansio-

so que o resultado dessas negociações

devolva o sorriso que os presidentes

de Pão de Açúcar e Casas Bahia estam-

pavam no rosto no dia do anúncio da

fusão de seus ativos.

Page 43: Nº 387 Edição Brasil
Page 44: Nº 387 Edição Brasil

44 AméricaEconomia Maio, 2010

MOVIMENTOS

O otimismo está estampado nos olhos de Lakshmi

Mittal (foto), CEO da ArcelorMittal, siderúrgica com

sede em Luxemburgo que produziu 73,2 milhões

de toneladas de aço bruto no ano passado. Ou seja,

aproximadamente 8% da produção mundial. “Ve-

mos recuperação em mercados como Argentina

e México. Mas não estamos vendo isso no México

como vemos no Brasil,” disse à AméricaEconomia o

principal executivo da empresa, durante visita a São

Paulo, em meados de abril.

Somente no Brasil, a ArcelorMittal tem planos de

desembolsar cerca de US$ 5 bilhões em até quatro

anos, com foco no incremento da produção de aço

e de minério de ferro. A siderúrgica planeja aumen-

tar a produção de suas minas brasileiras, que foi de

4 milhões de toneladas em 2009, para 5 milhões

de toneladas neste ano. A meta é a de alcan-

çar 15 milhões de toneladas de minério de

ferro até 2015. A ArcelorMittal tem como

objetivo global aumentar a sua autossu-

fi ciência nessa matéria-prima de 64%

em 2009 para 75% em 2015. ROBERTA PREGNACA, DE SÃO PAULO

FÉ DE AÇO

1

Page 45: Nº 387 Edição Brasil

Maio, 2010 AméricaEconomia 45

COM GELO, POR FAVORA crise econômica não foi sufi ciente para matar o

hábito de degustar um bom uísque. As exportações

dessa bebida representaram uma injeção de US$ 5

bilhões na economia do Reino Unido em 2009, recor-

de histórico quando se trata desse destilado. O Brasil

foi um dos mercados emergentes que registraram

maior aumento de consumo, 44%, totalizando US$

93 milhões em vendas. O México, apesar da crise,

incrementou seu consumo em 25%, com vendas de

US$ 65 milhões. Entretanto, nenhum país latino-ame-

ricano superou a Venezuela, onde, apesar das voláteis

condições da economia, o consumo de uísque cres-

ceu 73%, totalizan-

do um mercado de

US$ 173,7 milhões.

Com esse resulta-

do, o país tornou-se

o único da região a

fi gurar nos destinos

“top 10” das destila-

rias escocesas. Talvez

a revolução bolivaria-

na seja mais fácil de

engolir com um bom

scotch. FELIPE ALDUNATE M., DE SANTIAGO

Consumo sem ressaca

Consumo 2009(US$ milhões)

Variação (% anual)

EUA 627,0 13

França 610,1 13

10 principais destinos de uísque escocês por valor de exportações

Fonte: Scotch Whisky Association e AméricaEconomia

1

2

Espanha 473,7 -53

Cingapura 251,3 -94

Grécia 195,5 155

Venezuela 173,7 736

Coreia do Sul 168,8 -247

África do Sul 162,3 78

Alemanha 154,8 -79

Taiwan 127,5 1410

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REDE SÍSMICAQuando a terra começa a tremer por todo o pla-

neta, a computação em rede pode se transfor-

mar em uma grande arma. É o que defendem

Elizabeth Cochran, da Universidade da Califór-

nia, e Jesse Lawrence, da Universidade de Stan-

ford. Eles dirigem a Quake Catcher Network

(QCN, rede de captação de terremotos), iniciati-

va que busca desenvolver a maior rede sísmica

do mundo. A ideia é simples. A maior parte dos

computadores portáteis modernos tem um

sensor interno, desenhado originalmente para

proteger o disco rígido em caso de queda ou

sacudida violenta. Os sismólogos podem usar

esse sensor para detectar e medir terremotos.

No site da QCN pode-se fazer o download gra-

tuito de um software que mede as vibrações

da Terra e transmitir esses dados via internet à

central da QCN. Os desktops não têm esses sen-

sores, mas a QCN distribuiu sensores sísmicos,

os chamados acelerômetros, que se conectam

a esses computadores por meio de USB. Atual-

mente, essa rede conta com 1.660 voluntários

em todo o mundo. Os esforços da QCN se con-

centram, agora, no Chile, onde cem acelerôme-

tros foram distribuídos entre voluntários para

analisar as réplicas do terremoto de 8,8 graus

do dia 27 de fevereiro, que ainda sacodem o

país. “Não só poderemos ter estatísticas para

entender como se produzem os sismos, como

também dar alertas com mais antecedência”,

diz Cochran, de Aguas Saladas, na fronteira do

México com os Estados Unidos, epicentro de

um terremoto de 7,2 graus no começo de abril.

JUAN PABLO DALMASSO, DE CÓRDOBA

Page 46: Nº 387 Edição Brasil

46 AméricaEconomia Maio, 2010

MOVIMENTOS

FUI AO CONGRESSO E LEMBREI-ME DE VOCÊ A Câmara dos Deputados quer acabar

com a máxima de que política no país só

traz más lembranças. Por isso, inaugurou,

no fi nal de março, uma lojinha de suveni-

res que comercializa, entre os mimos tu-

rísticos de Brasília, produtos com a marca

da Casa. Responsável pelo espaço, Mônica

Rebello diz que o movimento tem surpre-

endido. “Recebo uma média de 200 pes-

soas por dia, e as vendas vão de vento em

popa.” Mônica foi a vencedora de um pre-

gão para escolher quem comandaria o es-

tabelecimento e paga R$ 600 por mês de

aluguel à Câmara. Ela conta que os itens

preferidos da clientela – formada por tu-

ristas, servidores e até manifestantes que

chegam de outras cidades para protestar

em frente ao Congresso – são cartões-pos-

tais, canetas, camisetas e a coleção que co-

memora os 50 anos de Brasília, composta

por canecas, ímãs e caixas ilustrados com

fotos antigas da cidade. Ao contrário do

expediente dos parlamentares, a lojinha

abre de segunda a segunda, inclusive nos

feriados. GRAZIELE DAL-BÓ, DE SÃO PAULO

LÁGRIMAS E CAFEZINHO No México, um velório sem café não é velório. Segundo a

Gayosso, uma das principais agências funerárias do país, pa-

rentes são apenas 10% da frequência em um evento assim,

enquanto 90% passam apenas para socializar. Com base nes-

sa estatística, a Gayosso associou-se à rede de cafeterias que

leva o sugestivo nome de Café Punta del Cielo (Ponta do Céu)

para realizar velórios em cafés adaptados. “Os velórios têm

um componente social e, para isso, é necessário um lugar

próprio”, diz o mexicano Pablo González Cid (foto), funda-

dor da rede. Das sete cafeterias-velório que pretende instalar,

três já estão prontas, oferecendo o serviço 24 horas. Mas nem

tudo é luto nos planos do empresário. Para 2010, ele ainda

planeja expandir sua rede tradicional para a Ásia, onde abriu

recentemente uma cafeteria, em Hong Kong. “Assim como

Juan Valdez é o máximo representante do café colombiano,

nós aspiramos ser embaixadores do bom café mexicano”, diz

González, que já conta com uma loja franqueada em Madri e

planeja, em breve, chegar aos Estados Unidos. DAVID SANTA CRUZ, DA CIDADE DO MÉXICO

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Page 47: Nº 387 Edição Brasil

Maio, 2010 AméricaEconomia 47

NO ATAQUE A Adidas domina o time do Real Madri; a Nike, o do Barcelona. A Adidas

ataca com a Argentina; a Nike, com o Brasil. Cada jogo é também

uma disputa comercial entre as duas maiores companhias de arti-

gos esportivos do mundo. A norte-americana Nike é a líder

de mercado, com US$ 19,17 bilhões em vendas em

2009, seguida pela alemã, com cerca de US$ 15

bilhões. A Adidas reconhece que não vem de

uma boa campanha. “O ano passado foi di-

fícil”, diz o alemão Herbert Hainer, CEO da

empresa, sobre a queda de

10% nas vendas e de 60% no

lucro operacional em 2009.

A única região que salvou a

companhia foi a América La-

tina. “Aí, crescemos 19%, com

vendas de 1 bilhão de euros”, diz

Karl-Heinz Maurath, vice-presiden-

te da Adidas para a América Latina.

Em ano de Copa do Mundo, a empresa

está otimista. “Como patrocinadores

ofi ciais, fornecedores e licenciado-

res, seremos a marca mais visível

durante a Copa”, afi rma Maurath. A

Adidas vestirá 12 seleções, entre

as quais também

estão a do Mé-

xico e a do Pa-

raguai. FELIPE ALDUNATE M., DE SANTIAGO

PC NA MODA A indústria de PCs tem 30 anos, mas segue vendendo 1 milhão de unidades diárias em todo o mundo. As

vendas em nível mundial cresceram 27,4% durante o primeiro trimestre de 2010, chegando a 84,3 milhões

de unidades, de acordo com a consultoria Gartner. A América Latina recebeu 7,2 milhões dessas máquinas,

um aumento de 35,4%, superado somente pelos 36,9% alcançados pela Ásia. “Foi um resultado um pouco

abaixo do esperado”, diz Mikako Kitagawa, analista da Gartner. Em nível global, a HP segue como a empresa

que mais vende no planeta, com 18,2% do mercado, seguida por Acer, Dell e Lenovo. A grande surpresa é a

Asus, companhia taiwanesa que superou a Toshiba, ocupando o quinto lugar. FELIPE ALDUNATE M., DE SANTIAGO

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44 AméricaEconomia Maio, 2010

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MOVIMENTOS

HORAS A FIO Os complexos regimes tributários dos países

latino-americanos são uma dor de cabeça

para as empresas. Segundo dados do BID

(Banco Interamericano de Desenvolvimento),

a América Latina é a segunda região do mun-

do em tempo gasto para preparar os paga-

mentos de impostos, superada apenas pela

Ásia Central. As empresas latino-americanas

dedicam, em média, 320 horas por ano para

preparar suas declarações tributárias, contra

177 horas em mecados de renda alta, como

os Estados Unidos e a Europa Ocidental. O

mais lento é o Brasil: em média, uma empresa

gasta 2,6 mil horas para administrar questões

relativas a impostos. VÍCTOR HERRERO, DE SANTIAGOBOM, MAS AINDA É POUCO Brasil e China assinaram, em abril, acordos para per-

mitir as exportações brasileiras de folhas de tabaco

e carne bovina ao país. Bom sinal? “Considerando

que os BRICs (Brasil, Rússia, Índia e China) têm hoje as

economias mais dinâmicas do mundo pós-crise, isso

pode trazer ganhos a médio e longo prazos”, diz Rafa-

el de Sá Marques, presidente da Associação dos Ana-

listas de Comércio Exterior, sem demonstrar otimis-

mo. “Passou da hora de termos escritórios avançados

de comércio exterior, como fazem os grandes países

exportadores”, afi rma, dando como exemplo os EUA,

“que separaram a condução de sua política comercial

do Departamento de Estado (equivalente ao nosso Itamaraty) em 1962, quando criaram o United States

Trade Representative – USTR”, aumentando, dessa

forma, a efi ciência dos programas de promoção de

exportações. ROBERTA PREGNACA, DE SÃO PAULO

Contabilidade infernalTempo requerido para efetuar os pagamentos de impostos em 2007

0 500 1000 1500 2000 2500

horas anuaisu

Brasil

Venezuela

Equador

México

Argentina

Peru

Chile

Colômbia

Costa Rica

PRESIDENTE LULA E HU JINTAO, PRESIDENTE DA CHINA

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Page 49: Nº 387 Edição Brasil
Page 50: Nº 387 Edição Brasil

50 AméricaEconomia Maio, 2010

O VALOR DAS PEQUENASRanking das Melhores Cidades para Fazer Negócios da América Latina destaca as capitais e os municípios cujo poder de atração se encontra nas vantagens de não ser grande

AMÉRICAECONOMIA INTELLIGENCE

N ão foi fácil para a gigante

norte-americana Procter &

Gamble (P&G) escolher para

onde levar a matriz de suas operações

na América Latina quando decidiu tirá-

la de Caracas, na Venezuela, em busca

de um ambiente de negócios mais aco-

lhedor. A companhia pesquisou as 12

cidades latino-americanas onde tem

operações – entre elas, São Paulo, Cida-

de do México e Buenos Aires, capitais de

seus maiores mercados na região. A es-

colha fi nal, entretanto, recaiu na relati-

vamente pequena Cidade do Panamá.

“A Cidade do Panamá tem uma lo-

calização estratégica e facilidades em

infraestrutura que permitem um rápi-

do acesso a vários pontos da América

Latina de forma direta”, diz Alejandra

Cobb, gerente de relações externas da

P&G. Alejandra ainda aponta os incen-

tivos fiscais e uma política migrató-

ria favorável como outras vantagens,

confirmando a eficácia das políticas

públicas panamenhas na atração de

investimento estrangeiro direto (IED),

que, em 2009, representou 10% do PIB

do país. E a P&G não está só: Caterpillar,

Adidas, Heineken, Dell e 3M estão en-

tre as multinacionais que decidiram

fi ncar os pés por lá.

Esse interesse de empresas inter-

nacionais em buscar cidades menores

ESPECIAL CIDADES

CIDADE DO PANAMÁ E CURITIBA (À DIREITA):

ESFORÇOS PARA ATRAIR INVESTIMENTOS e os esforços destas

em atraí-las levaram

a AméricaEconomia

Intelligence a desen-

volver o ranking deste

ano sob outro ponto

de vista: modifi cou-se

a metodologia que de-

fi ne o Índice de Com-

petitividade Urbana

(Icur), para reduzir a

distância entre gran-

des e pequenas na

hora de avaliar sua

competitividade.

Tal exercício foi

um dos fatores que

provocaram alguns

movimentos de des-

taque na lista, e não

apenas para a Cidade

do Panamá, que saiu

do 11º lugar no ano

passado para o sétimo

neste ano. São Paulo,

reiteradas vezes líder

do ranking, caiu para

a terceira posição. E

o Rio de Janeiro, em

12º em 2009, passou

para o quinto lugar, à

frente de Buenos Ai-

res (em sexto).

Page 51: Nº 387 Edição Brasil

Maio, 2010 AméricaEconomia 51

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OFERTA URBANASegundo a urbanista da Universidade

de Columbia, Saskia Sassen, essa ten-

dência mundial de busca por cidades

menores se dá por um fator que ela

chama de “diferenciação especializa-

da”, em que “as cidades melhoram em

competitividade ao defi nir seu lugar

no mercado global”. Isso implica que,

para melhorar sua oferta urbana, essas

cidades médias não necessitam chegar

a um tamanho pantagruélico. Trata-se

de uma estratégia similar, diz Saskia, à

adotada por cidades como Copenhague

(Dinamarca), Zurique (Suíça) e Chon-

gqing (China).

No caso da Cidade do Panamá, Jai-

me Bocanegra, executivo da Pricewa-

terhouseCoopers, destaca que a equação

competitiva se dá “pela oferta de infra-

estrutura típica de uma urbe, com a van-

tagem de ser um município pequeno e

fácil de administrar”. Algo que depende

de dedicação para um bom planejamen-

to urbano, como é o caso de Curitiba. Seu

ex-prefeito, Beto Richa, destaca o esforço

realizado pelo urbanista e também ex-

prefeito Jaime Lerner, para desenvol-

ver um “conceito de sustentabilidade

integral, que contempla as dimensões

social, econômica e ambiental”.

Outro exemplo de destaque é a

mexicana Monterrey, que não

se inibiu diante do tamanho

da Cidade do México e, com

uma estratégia sustentável,

conseguiu transformar sua

proximidade com os Estados

Unidos em vantagem compe-

titiva para atrair negócios e

empresas multinacionais. Ho-

je, entretanto, a cidade sofre

com os efeitos da violência e

do narcotráfi co, o que a fez per-

der posições no ranking (de 10º

para 12º).

PERDAS E GANHOSMas não é apenas o tamanho

que justifica algumas mudan-

ças no ranking. A mais notória é a volta

de Miami – que, apesar de não ser lati-

no-americana, sempre foi considerada

neste estudo por concentrar muitos he-

adquarters de multinacionais para suas

operações na região – ao primeiro lugar

da lista. Suas vantagens em termos de

qualidade de vida e entretenimento

continuam presentes, além de sua loca-

lização privilegiada e conectividade –

por exemplo, com a melhor oferta aérea

entre as cidades do ranking. A novidade

neste ano é a valorização desses atribu-

tos, já que o custo relativo de operar a

partir dessa cidade foi reduzido forte-

mente em decorrência da queda do pre-

ço dos imóveis e da desvalorização do

dólar em relação à maioria das moedas

latino-americanas. Entretanto, a cidade

ainda tem como ponto negativo as res-

trições à entrada de estrangeiros, não

apenas em relação à obtenção de vistos

de trabalho como também para viagens

de negócios rotineiras. Exemplo notório

dessa difi culdade é o caso da empresa

norte-americana Boston Scientifi c, de

produtos médicos, que decidiu instalar-

se na Costa Rica (nona do ranking).

Santiago está em segundo lugar.

As vantagens da cidade estão na quali-

dade de vida, em seu marco econômico

e político, em sua infraestrutura e em

seu sistema tributário simples e previ-

sível, além do baixo custo em relação a

Page 52: Nº 387 Edição Brasil

52 AméricaEconomia Maio, 2010

ESPECIAL CIDADES

outras metrópoles, sobretudo quando

se trata de mão de obra e bens imobi-

liários. Mesmo depois do terremoto de

fevereiro, ainda ainda são mantidos

projetos para a construção de edifícios

corporativos entre os mais altos da

América Latina. Entretanto, Santiago

ainda é percebida como uma cidade

chata, provinciana, estressada e poluí-

da, fatores que devem ser trabalhados

pelo país. Em pesquisa feita com lei-

tores de AméricaEconomia para este

especial, a pior classifi cação da cidade

é quando se trata de recomendá-la pa-

ra ser visitada.

São Paulo fica em terceiro lugar,

mas continua superando todas as ou-

tras do continente quando se trata de

seu potencial de negócios e serviços

corporativos. E tudo indica que não de-

morará a retomar a liderança geral. Os

investimentos projetados para melho-

rar a infraestrutura logística da cidade

para a Copa do Mundo de 2014 (veja

pág. 55), se concretizados, serão um

grande aporte em um dos segmentos

que mais prejudicam a capital pau-

lista: a capacidade de deslocamento

das pessoas, por conta dos grandes e

constantes congestionamentos.

A infraestrutura para eventos

olímpicos internacionais é outro fator

positivo e que ajudou a cidade do Rio

de Janeiro a ganhar muitas posições

em relação ao ranking de 2009, fi cando

Page 53: Nº 387 Edição Brasil

Maio, 2010 AméricaEconomia 53

pela primeira vez à frente de Buenos

Aires. Enquanto a Argentina se conso-

me em um contexto político que preju-

dica a atração de investimentos, com

constantes ameaças de expropriação e

mudanças nas regras do jogo – como a

intervenção do governo argentino no

Banco Central – o Rio de Janeiro tem

profi ssionalizado sua equipe e sua for-

ma de desenvolver projetos, fator que

foi fundamental para ganhar o posto

de sede dos Jogos Olímpicos de 2016.

Veja metodologia em brasil.americaeconomia.com

Copa e Olimpíada, além da explo-

ração do pré-sal, são sopa no mel para

as empresas que estão em busca de

bons projetos de investimento. Alguns

exemplos são a chegada ao Rio de Ja-

neiro da empresa inglesa de seguros

Lloyd’s, em 2009, e neste ano, o anúncio

da aterrissagem da francesa Schlum-

berg, de tecnologia. Sem contar a força

da própria Petrobras.

Felipe Góes, secretário de Desen-

volvimento do Rio de Janeiro, admite

que o principal problema da cidade

ainda é a violência. Entretanto, afi rma

que “essa tendência está se reverten-

do”, citando a política de ocupação pa-

cífi ca das favelas. Nessa disputa, o que

não falta é torcida a favor do principal

cartão-postal do país.

Page 54: Nº 387 Edição Brasil

54 AméricaEconomia Maio, 2010

ESPECIAL CIDADES

O FATOR FUTEBOL

A corrida, agora, é contra o re-

lógio. Mas o resultado pode-

rá valer a pena. Todas as oito

cidades brasileiras que participam do

ranking de cidades de AméricaEcono-

mia estão entre as 12 escolhidas para

sediar a Copa do Mundo de 2014. Ape-

sar do atraso na tomada de decisões,

elas esperam ganhar, como herança,

um impulso em sua infraestrutura.

“Até poderemos tapar os últimos bu-

racos 15 minutos antes do apito inicial,

mas ainda dá tempo”, diz a advogada

Tatiana Campello Lopes, do Demarest

e Almeida, no Rio de Janeiro. De acordo

com um estudo realizado pelo escritório,

se conseguirem concretizar os projetos

atualmente listados para receber os jo-

gos da Copa, essas cidades terão atraído

mais de R$ 70 bilhões em investimentos.

Uma cifra invejável para um período de

apenas quatro anos. E isso sem contar o

aporte que deverá chegar das redes de

hotéis, numa estimativa de criação de

mais de 30 mil leitos adicionais.

Antes de considerar a partida ga-

nha, entretanto, todas essas cidades

terão de suar a camisa. Os projetos se

concentram, sobretudo, em três áreas:

aeroportuária, transporte terrestre e

estádios. E em todas há problemas por

resolver. No caso dos estádios, a Fifa

(Federação Internacional de Futebol) já

adiou o prazo de início dos trabalhos

de reforma e construção, e até o dia 3

de maio os projetos deverão começar.

Ainda que o caso mais midiático te-

nham sido os problemas encontrados

no projeto do estádio do Morumbi, em

São Paulo, até meados de abril o estádio

do Maracanã, no Rio – cuja reforma

deverá ser realizada através de uma PPP

(Parceria Público-Privada), com prazo

de 30 anos – , ainda não tinha edital de

licitação. No caso do Arena, no Recife,

tampouco se havia chegado a um acor-

do para sua construção, faltando até li-

cenças ambientais, o que poderá fazer a

cidade optar por um plano B, de reforma

de estádios antigos.

“Preocupa-nos que aconteça o mes-

mo que nos Jogos Pan-americanos,

quando, em decorrência do atraso no

calendário, muitas obras foram contra-

tadas com dispensa dos processos lici-

tatórios, para serem completadas em

tempo”, diz Bruno Drago, que também

integra o grupo do Demarest e Almeida

que estuda os eventos esportivos rela-

cionados à Copa e à Olimpíada.

No caso dos aeroportos, a história

se repete: todos demandam reformas,

mas a maioria ainda carece até do edi-

tal de licitação. Bem como o tão acla-

mado projeto do trem-bala. “Diversas

audiências públicas foram realizadas

para ajustes no edital a fi m de evitar

que nenhuma proposta seja apresen-

tada, o que representaria um fracasso

completo para o governo”, diz Drago.

O momento político de eleições pre-

sidenciais também contribui para o

atraso. E, antes mesmo da Copa, os Jo-

gos Militares, no próximo ano e a Copa

das Confederações, em 2013, serão bons

termômetros da reação. “É importante

que os projetos sejam sustentáveis em

todos os sentidos, evitando-se a criação

de grandes elefante brancos”, diz Tatia-

na, apostando numa virada no que já

parece ser os 45 minutos do segundo

tempo. Mas, para as cidades, tanto co-

mo para o futebol, o que importa, no

fi m, é o resultado.

ESTÁDIO DO MARACANÃ, NO RIO:

A REFORMA DEVERÁ SER VIA

PARCERIA PÚBLICO-PRIVADA

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Page 55: Nº 387 Edição Brasil

Maio, 2010 AméricaEconomia 55

Pricipais oportunidadesde investimentos nas cidades-sede dos jogos da Copa

Reformas, expansões e modernizações em aeroportos; valores estimados

Belo HorizonteAeroportuário• Pampulha - R$ 7 mi.Transporte terrestre• Metrô - R$ 3,4 bi.• Terminal de passageiros Aeroporto e Confins -R$ 342,3 mi.

• BRTs (Bus Rapid Transit) - valor não estimado Estádios• Gov. Magalhães Pinto - R$ 300 mi.Hotelaria• 600 leitos adicionais

Construções, expansões, reformas e modernizações em vias e meios de

transporte terrestres; valores estimados

Construções, expansões, reformas e modernizações em estádios e arredores; valores estimados

Obras relacionadas à infraestrutura de saneamento básico

Construções, expansão do setor hoteleiro, feita em número de leitos adicionais; não

inclui previsão de investimentosFonte: Demarest & Almeida

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Legenda

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1

2

7

8

RecifeAeroportuário• Guararapes - R$ 8,7 mi.Transporte terrestre• Projeto VLT (veículo leve sobre trilhos) ou VLP (veículo leve sobre pneus) - Valor não estimado• Rua Gomes Taborda e construção do viaduto BR 101 - R$ 85,3 mi.

• Av. Beira Rio - R$ 52 mi.Estádios• Arena São Lourenço - R$ 500 mi.Hotelaria• 2,5 mil leitos adicionaisSaneamento• Drenagem e saneamento - R$ 346 mi.• Etapas 2 e 3 da Vila Mangue Z. Sul - R$ 331 mi.

8

SalvadorAeroportuário• Luis Eduardo Magalhães – valor não estimadoTransporte terrestre• Linha 2 do Metrô - R$ 200 mi.• Acessibilidade nas estações do Metrô - R$ 200 mi.

• Trem suburbano - R$ 300 mi.• Via expressa Bahia de Todos os Santos - R$ 550 mi. Estádios• Olavo Mangabeira – Fonte Nova – R$ 550 mi.Hotelaria• 5 mil leitos adicionais

7

3

4

5

6

Porto Alegre Aeroportuário• Salgado Filho - R$ 250 mi.Transporte terrestre• Linha 2 do Metrô - R$ 2,5 bi.• Projeto de transporte público Portais da Cidade - US$ 210 mi.

• Projeto cais Mauá - R$ 500 mi.• Rodovia RS 010 - R$ 350 mi.Estádios• José Pinheiro Borda - Beira Rio - R$ 130 mi.Hotelaria• 3 mil leitos adicionais

6

CuritibaAeroportuário• Afonso Pena - R$ 222 mi.Transporte terrestre• Metrô - R$ 2 bi.• Mobilidade urbana -R$ 205,6 mi.Estádios• Conclusão do Joaquim

Américo Guimarães (Arena da Baixada) - R$ 138,3 mi.• Infraestrutura do entorno • Arena da Baixada - R$ 204 mi.Hotelaria• 2 mil leitos adicionais

5

BrasíliaAeroportuário• Juscelino Kubitschek - R$ 300 mi.Transporte terrestre• VLT (veículo leve sobre trilhos) - R$ 1,3 bi.

• Metrô - R$ 600 mi.• Rede viária - R$ 2 bi.Estádios• Mané Garrincha - R$ 600 mi.Hotelaria• 10 mil leitos adicionais

4

São PauloAeroportuário• Gov. André Fco. Montoro - Guarulhos - R$ 1,65 bi. • Congonhas - valor não estimadoTransporte terrestre• Mobilidade urbana - R$ 33,4 bi.

• Linha 4 do Metrô - R$ 4,7 bi.• 61,4 km de rodovias, ligando o Rodoanel à Av. Papa João 23 - R$ 4,4 bi.Estádios• Cícero Pompeu de Toledo (Morumbi) - R$ 250 mi.

3

2

Rio de JaneiroAeroportuário• Tom Jobim - R$ 818,9 mi.• Santos Dumont - R$ 152,2 mi.Transporte terrestre• Trem de Alta Velocidade (TAV) até Campinas (SP) - Valor não estimado• Corredor expresso de ônibus - R$ 750 mi.

• Linha 3 do Metrô - R$ 1,3 bi.• Linha 4 do Metrô - R$ 2,7 bi.• Arco Metropolitano –R$ 965 mi. Estádios• Jornalista Mário Filho (Maracanã) - R$ 430 mi.Hotelaria• 8 mil leitos adicionais

1

Page 56: Nº 387 Edição Brasil

56 AméricaEconomia Maio, 2010

GRAZIELE DAL-BÓ, DE SÃO PAULO

DEBATES RECICLAGEM

Foto

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lgaçã

o

Q uando, no fi nal do ano passado, a geladeira de Rena-

ta Melillo parou de funcionar, e ela decidiu comprar

uma nova, a empresária paulistana deparou-se com

um grande dilema: o que fazer com a geladeira quebrada?

Passá-la adiante parecia impossível, pois o eletrodoméstico

já tinha mais de 20 anos. Jogar em lixo comum, para Renata,

estava fora de cogitação. Contatar a fabricante tampouco

poderia ajudar, afi nal, não há lei que a obrigue a comprome-

ter-se com a logística do produto depois de vendido. O jeito,

então, foi recorrer a uma empresa especializada nesse tipo

de serviço, ao custo de R$ 150. “Quando me disseram o preço,

cheguei a titubear, achei meio ilógico pagar para descartar

algo, mas a consciência falou mais alto”, conta Renata.

Com a economia em crescimento, o nível de renda fami-

liar dos brasileiros seguindo o mesmo caminho ascendente e

alguns incentivos fi scais, casos como o de Renata se repetem

cada vez mais no país. Segundo estudo do Programa das Na-

ções Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) realizado com 11

países emergentes, o Brasil já lidera, por exemplo, o descarte

Aumento do consumo de bens duráveis torna ainda mais urgente a aprovação da Política Nacional dos Resíduos Sólidos

O VELHONÃO ESPERA

DEBATES RECICLAGEM

Page 57: Nº 387 Edição Brasil

Maio, 2010 AméricaEconomia 57

Foto

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o

RENATA MELILLO: R$ 150 PARA SE DESFAZER

DA GELADEIRA VELHA

de computadores, com 0,5 kg de lixo eletrônico per capita ao

ano. Quando se trata de aparelhos de TV, o Brasil só perde

para o México, que registra 0,9 kg, empatando em segundo

lugar com a China, com 0,7 kg per capita ao ano.

Esse aumento de produção de resíduos conta com um agra-

vante: nem todos estão dispostos a pensar duas vezes ao botar

a mão no bolso, como Renata, para pensar em uma destinação

correta, deixando claro o problema trazido pela falta de uma

política pública que determine de quem é a responsabilidade

pelos produtos descartados. Sobretudo quando se trata daque-

les que contêm materiais nocivos ao meio ambiente.

RESPOSTA LENTAO único projeto de lei que pretende reverter essa situação,

a Política Nacional dos Resíduos Sólidos (PNRS), tramita há

exatos 19 anos no Congresso. Neste ano, entretanto, ganhou

um sinal positivo. O texto, que responsabiliza fabricantes,

importadores, distribuidores e comerciantes pelo ciclo de

vida dos produtos, foi aprovado em março pela Câmara dos

Deputados e, agora, espera o voto dos senadores.

“Antes de entrarmos no período eleitoral, em junho, essa

questão deve estar resolvida, com a lei aprovada”, aposta o

deputado federal Arnaldo Jardim, coordenador do grupo de

trabalho suprapartidário responsável pela apresentação da

proposta da PNRS na Câmara.

Somado aos consecutivos recordes de vendas registra-

dos pelo varejo brasileiro, o ciclo cada vez mais curto dos

produtos – nem tanto o de utilidade real, mas o mercadoló-

gico – gera um agravante adicional. Enquanto, em 2005, um

celular era usado por um ano, em média, hoje, ele tem uma

vida útil de menos de seis meses. “A cada novidade lançada

no mercado, outras cinco estão na fi la de espera”, diz o pre-

sidente do Conselho de Logística Reversa do Brasil (CLRB),

Paulo Roberto Leite.

A NOVA REGRASe a PNRS for aprovada, porém, objetos como lâmpadas, ge-

ladeiras, pilhas, baterias e eletrônicos deverão ser retirados

do mercado, quando não forem mais ser utilizados, por meio

da logística reversa pós-consumo, sistema em que o setor

produtivo é responsável pelo processo de coleta e reaprovei-

tamento ou destinação fi nal dos materiais.

Na avaliação de especialistas, esse modelo, similar ao

usado em alguns países europeus, é o ideal também para o

Brasil, mesmo que as fabricantes tenham que embutir esse

custo no preço fi nal dos produtos. “A quantia será proporcio-

nal à difi culdade de se equacionar o descarte, mas, ainda sim,

é a melhor solução dentre todas”, acredita Leite, do CLRB.

Foto

: Éric

o Hille

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Page 58: Nº 387 Edição Brasil

58 AméricaEconomia Maio, 2010

privado e uma consultoria de conceito

urbanístico. O plano é coordenar, em

uma área de 8 milhões de metros qua-

drados, situada ao lado do aeroporto

de Viracopos, em Campinas, a insta-

lação de empresas que se complemen-

tem em sua cadeia de suprimentos.

Mas o país ainda tem um lon-

go caminho pela frente para alcan-

çar o nível da Europa, considerada

benchmarking em logística reversa.

“Enquanto no Brasil apenas 15% dos

itens plásticos retornam, na Europa,

esse índice é de 50%”, afi rma Leite, do CLRB. De tudo o que é

levado ao mercado, apenas 10% faz o caminho inverso depois

de utilizado.

INICIATIVAS ISOLADASEnquanto a legislação segue em compasso de espera, algu-

mas iniciativas isoladas começam a aparecer.

Uma das empresas que já estão aplicando esse concei-

to é a fabricante de computadores norte-americana Dell.

SIMBIOSE AMBIENTALSegundo Orlando Fontes Lima Jú-

nior, coordenador do Laboratório de

Aprendizagem em Logística e Trans-

portes (Lalt) da Unicamp, uma forma

de equalizar o custo desse caminho

inverso – que muitas vezes pode ser

mais alto do que a própria operação

direta – é promover uma simbiose

ambiental, por meio das chamadas

plataformas logísticas, transforman-

do a despesa em receita.

Mas como fazer isso? Para expli-

car, o professor da Unicamp cita o exemplo de Kalundborg,

uma comunidade com cerca de 20 mil habitantes, a 135 km

de Copenhague, na Dinamarca. “Naquele local, nos anos

1980, os empresários se mobilizaram para implantar noções

de complementaridade nas cadeias de suprimento. O que era

resíduo de uma empresa, acabou se tornando insumo para

outra, e isso tem funcionado muito bem lá.”

No Brasil, um projeto semelhante começa a tomar forma,

graças a uma parceria entre a Unicamp, um empreendedor

15%dos produtos de

plástico são reciclados, no Brasil. Na Europa, esse

percentual é de 50%

PROGRAMA DE RECICLAGEM GRATUITA DA DELL: BRASIL FOI O PIONEIRO NA AMÉRICA LATINA

DEBATES RECICLAGEMDEBATES RECICLAGEM

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1

Page 59: Nº 387 Edição Brasil

Maio, 2010 AméricaEconomia 59

O que prevê a Política Nacional dos Resíduos Sólidos

Responsabiliza fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes pelo ciclo de vida dos produtos e sua destinação correta.

Incentiva a adoção, o desenvolvimento e o aprimoramento de tecnologias ambientalmente saudáveis como forma de minimizar impactos ambientais.

Dá preferência, nas aquisições governamentais, a produtos recicláveis e reciclados.

Incentiva a integração dos catadores de materiais recicláveis nas ações que envolvam o fluxo de resíduos sólidos.

Proíbe o lançamento de rejeitos no mar, nos rios ou no solo.

Proíbe a importação de resíduos sólidos e rejeitos cujas características causem danos ao meio ambiente, ainda que para tratamento, reforma, reúso, reutilização ou recuperação.

Prevê que o poder público deverá estabelecer a coleta seletiva, implantar sistema de compostagem (transformação de resíduos sólidos orgânicos em adubo) e dar destino final ambientalmente adequado aos resíduos da limpeza urbana (varredura das ruas).

Os municípios que implantarem a coleta com a participação de associações e cooperativas de catadores terão prioridade no acesso a recursos da União em linhas de crédito.

No programa de reciclagem de equipamentos da marca, o

cliente entra no site da empresa e agenda uma data para o

recolhimento do produto pela unidade logística da compa-

nhia, que o encaminha para uma empresa de reciclagem

gratuitamente. O Brasil, onde o projeto começou em 2006, foi

pioneiro nessa iniciativa na América Latina. Hoje, Colômbia

e México também participam do programa na região. Mes-

mo sem indicar o quanto é investido no projeto, a gerente

de Conformidade Ambiental da Dell para a América Latina,

Cíntia Gates, garante que o processo não interfere no preço

dos eletrônicos.

“Os custos para nós são elevados, sim, mas estamos mais

preocupados com a parte social”, afi rma Cíntia, reconhecen-

do que a América Latina ainda carece de uma cultura mais

forte em reciclagem.

A Garantech, empresa do grupo Itaú Unibanco com

67% do mercado de garantia estendida no país, começou a

implantar a iniciativa no fi nal de 2009. “Temos 50 ecopon-

tos, distribuídos nas cerca de 3 mil assistências técnicas

parceiras. Nesses locais, espalhados em São Paulo, região do

ABC e Guarulhos, o cliente pode descartar celulares, pilhas e

baterias sem custo”, explica o superintendente da empresa,

Eduardo Marchiori Eckersdorff. De dezembro a março, foram

recolhidos 200 quilos de materiais eletrônicos, e a meta é que

esse volume cresça, no médio prazo, para 1 tonelada/mês.

Do outro lado do balcão, algumas empresas já começam

a ver a aprovação da Política Nacional dos

Resíduos Sólidos como oportunidade de

negócio. É o caso da Descarte Certo, cria-

da no ano passado pelos sócios Ernesto

Watanabe e Lucio Di Domenico. Se o foco,

até agora, tem sido a pessoa física – que

paga de R$ 9 a R$ 139 para contratar os

serviços da empresa –, com a entrada em

vigor da PNRS, a rota incluirá também o

setor produtivo.

“Já estamos buscando parcerias com

algumas fabricantes de eletroeletrônicos

e operadoras de celular”, afi rma Watana-

be, sem revelar o nome das companhias.

O objetivo dos sócios é fechar esse pri-

meiro ano com um faturamento de R$ 5

milhões, e parte disso deve vir do novo

modelo de negócio.

Hoje, a Descarte Certo recolhe 82

produtos, de 23 categorias, que contem-

plam desde pilhas e baterias até geladei-

ras e televisores.

Foi pensando no potencial de cresci-

mento do setor que a Essencis Soluções

Ambientais instituiu, há um ano, uma

unidade voltada à Manufatura Rever-

sa. Segundo o superintendente da área,

Roberto Lopes, a empresa trabalha fazendo a

reciclagem de produtos como pilhas, bate-

rias, lâmpadas fl uorescentes e eletro-

eletrônicos para 15 fabricantes e já

pensa em estender o serviço para

o consumidor fi nal.

“O brasileiro co-

meça a ter um grau

de conscientiza-

ção satisfatório, e

isso indica um mer-

cado interessante

para o futuro”, acre-

dita Lopes.

Os exemplos de

empresas e consu-

midores que têm

se atentado pa-

ra a necessidade

de reciclagem se

multiplicam pe-

lo país. O que fal-

ta, agora, é fechar

esse elo com uma

legislação que deixe

as regras bem claras.

2

Page 60: Nº 387 Edição Brasil

60 AméricaEconomia Maio, 2010

PODER EM XEQUE

Infl uência internacional do Brasil se intensifi ca, mas há quem questione as bases que a sustentam

RODRIGO LARA SERRANO, DE BUENOS AIRES

PRESIDENTE DO LÍBANO, MICHEL

SLEIMAN (À ESQUERDA), COM O

MINISTRO DO DESENVOLVIMENTO,

MIGUEL JORGE: DIPLOMACIA “SOFT”

DEBATES RELAÇÕES EXTERIORES

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N os últimos anos, mais do que

nunca, o Brasil tem projeta-

do ao mundo a imagem de

uma sociedade produtiva, feliz e po-

tencialmente sustentável. Graças a

fatores como bem-sucedidas reformas

econômicas e financeiras, empresas

que se internacionalizam, uma bolsa

de valores cuja capitalização só é su-

perada no continente americano pela

Bolsa de Nova York, pela Nasdaq e pela

Bolsa de Toronto, políticas sociais e um

crescimento constante que favoreceu

o fortalecimento de uma classe média

massiva em um país de 190 milhões de

habitantes, o Brasil tornou-se uma das

mais importantes potências emergen-

tes do mundo, com voz ativa em muitos

fóruns internacionais.

Mas alguns podem se perguntar:

por que a Indonésia, por exemplo, que

tem um crescimento semelhante e é

mais populosa, não recebe o mesmo

tratamento? A diferença, apontam os

analistas, é que o Brasil, hoje, é o país

onde muitos gostariam de estar: reúne

as características de um líder confi á-

vel em políticas de meio ambiente, ao

mesmo tempo que se apresenta como

potência petrolífera, com belezas na-

turais, pessoas alegres, além de ser um

grande defensor de um mundo multi-

polar equilibrado.

Essas características, que marcam

a infl uência internacional do país, são

alguns dos ingredientes aspiracionais

que formam o recheio do soft power

(poder brando), expressão cunhada pe-

lo norte-americano Joseph Nye, no fi nal

dos anos 1980, para descrever o poder

de persuasão de um país em nível in-

ternacional a partir de seus atrativos

culturais, em detrimento do uso de in-

centivos econômicos ou do poderio mi-

litar, ou hard power (poder duro).

Em visita a São Paulo, em abril, o

próprio professor da Kennedy School

of Government, da Universidade de

Harvard, reconheceu o “soft power bra-

sileiro”, afi rmando que “hoje, se leva

o Brasil muito mais a sério do que há

20 anos, sobretudo pelo fato de o país

focar-se em um desenvolvimento es-

1

Page 61: Nº 387 Edição Brasil

Maio, 2010 AméricaEconomia 61

JOSEPH NYE, CRIADOR DO CONCEITO

DO “PODER BRANDO”: HOJE O

BRASIL É LEVADO MAIS A SÉRIO

truturado”. E chegou a declarar que a

China não estaria preparada para ser

potência exatamente pela ausência do

poder de coerção da cultura desse país.

“Não sei o que é soft ou hard, mas a

estatura do Brasil cresce à medida que

sua infl uência aumenta, e sua infl uên-

cia cresce com sua estatura”, diz Peter

Hakim, presidente emérito do Diálogo

Interamericano, centro de estudos com

sede em Washington. Entretanto, o que

inquieta parte dos observadores, em

um momento em que o Brasil começa

a dar novos passos – como o acordo

de cooperação militar com os Estados

Unidos –, e à beira de eleições presi-

denciais que poderão mudar a linha

adotada pelo presidente Lula para a po-

lítica internacional do país, é se o uso

desse soft power será sufi ciente para

consolidar e fortalecer o papel do país

no tabuleiro de decisões internacionais

daqui para a frente.

PODER DE PERSUASÃOO conceito de soft e hard

power gera debates desde

que foi criado por Nye. Para

muitos, a parte “soft”, por

não poder ser medida com

exatidão – como o PIB de

uma país ou a quantidade

de aviões de combate que

este possui –, o torna impre-

ciso, quase inútil. Mas tam-

pouco o hard power pode se

traduzir automaticamente

em maior infl uência nos as-

suntos globais. O Paquistão,

por exemplo, possui armas

nucleares e uma grande po-

pulação, mas seu poder de

pressão é quase zero.

Para o brasileiro Paulo

Sotero, diretor do Instituto

Brasil da Escola de Assun-

tos Públicos e Internacio-

nais Woodrow Wilson, da

Universidade de Princeton,

o Brasil é – e precisa ser –

intensivo em seu soft po-

wer. “O potencial do Brasil

para infl uir nos resultados

internacionais provavelmente será de-

terminado mais pela capacidade das

elites do país de identifi car e aprovei-

tar os ativos de valor associados à sua

estabilidade e à governabilidade de-

mocrática do que por qualquer outro

ativo de poder duro”, escreveu em um

paper acadêmico intitulado “Brasil: ser

ou não ser um Bric?”. Sotero aponta que,

ao ritmo em que está, o Brasil a duras

penas chegaria a ter o peso militar da

França ou da Itália até 2040 ou 2050 e

que, por isso, tem de apostar em outro

tipo de persuasão.

O FATOR EUAPara analistas internacionais, a ausên-

cia de confl itos bélicos, seu tradicional

pragmatismo diplomático e o apoio a

um multilateralismo conformam valo-

res dos quais hoje o Brasil se aproveita.

“É uma herança que capitaliza o Brasil,

diferentemente da Argentina, que, no

âmbito internacional, tem sofrido uma

descapitalização permanente, bem co-

mo do México, que era reconhecido co-

mo promessa, devido a sua condição de

ponte para os EUA, mas isso acabou”, diz

Juan Toklatián, professor da Universida-

de Torquato di Tella, na Argentina.

Os observadores questionam a

capacidade do Brasil em manter sua

política externa focada em ser “ami-

go de todos”. “O Brasil precisa decidir

qual é a sua posição estratégica”, diz

Rodrigo Álvarez, analista de Brasil da

Flacso (Faculdade Latino-Americana de

Ciências Sociais), no Chile. Ele lembra

que a posição de Lula frente à questão

nuclear do Irã demonstra a intenção

do país em participar dos

temas mais confl itantes em

escala global, contrariando

potências como os EUA. Para

Toklatián, a tentativa do Bra-

sil de participar de assuntos

do Oriente Médio sem ter o

poder “hard” das armas e do

dinheiro poderá trazer con-

sequências negativas. “Pode

acontecer o mesmo que com

o ex-presidente argentino

Carlos Menen, que, nos anos

1990, tentou mediar um

confl ito na América Latina,

e o resultado foi descrédito

e dois atentados em Buenos

Aires”, diz.

Em sua apresentação na

Faap (Fundação Armando

Alvares Penteado), em São

Paulo, Nye afi rmou que es-

perava que, no caso do Irã, o

Brasil “usasse seu soft power

Alguns observadores

questionam

se o Brasil pode

manter-se

eternamente como

amigo de todos

2

Page 62: Nº 387 Edição Brasil

62 AméricaEconomia Maio, 2010

DEBATES RELAÇÕES EXTERIORES

para convencer as gerações mais jovens

de iranianos de que a posse de armas

nucleares não atrairá os vizinhos”.

Para Khatchik DerGhougassian,

professor de Relações Internacionais

da Universidade de San Andrés, na Ar-

gentina, esse episódio indica que o país

ainda não determinou algo fundamen-

tal para seu posicionamento interna-

cional: como será a relação com os EUA.

“O Brasil ainda não defi niu se quer ter

uma relação com Washington à la Ín-

dia, com uma aliança mais ampla e

forte, ou algo diferente”, diz. Sotero, da

Universidade de Princeton, entretanto,

aposta que o destino do Brasil será ao

lado dos EUA como potência ocidental.

Um sinal disso poderia, inclusive, ser

a recente aproximação, em abril, com

um acordo de cooperação militar fi r-

mado entre os dois países.

PROBLEMAS NO BAIRROApesar desse impasse, os analistas es-

trangeiros apontam que o Brasil ainda

tem uma tarefa básica, não necessaria-

mente mais simples, para resolver: a

de exercer essa mesma infl uência que

prega em âmbito global na vizinhança.

“Na maioria dos países latino-america-

nos, o Brasil ainda precisa de muita di-

plomacia e boa vontade – apesar de sua

habilidade para reduzir tensões, como

a gerada entre Bolívia e Paraguai no

ano passado, ter demonstrado o talen-

to diplomático real do país”, diz Peter

Hakim, do Diálogo Interamericano.

O contraponto, nesse caso, foi a

ação brasileira no golpe de Estado em

Honduras. O governo apostou todas as

suas fi chas na restituição do presidente

Manuel Zelaya, que, por sua vez, acredi-

tou no poder de infl uência do Brasil ao

refugiar-se em sua embaixada. Apesar

de conseguir alinhar o apoio dos países

sul-americanos no repúdio ao golpe, o

país não foi capaz de infl uir de forma

signifi cativa nos acontecimentos.

“O Brasil precisa primeiro conso-

lidar-se na América do Sul, criar con-

senso regional”, opina o professor

DerGhougassian. “Nessa esfera, o país

está cada vez mais retraído, e suas con-

quistas são magras”, diz Toklatián, da

Universidade Torquato di Tella. “Não

conseguiu eleger seus candidatos ao

BID (Banco Interamericano de Desen-

volvimento) nem à OMC (Organização

Mundial do Comércio), tampouco in-

fl uir na Venezuela.”

Para os analistas, o Brasil pode cul-

par esse avanço tímido aos vizinhos

“mal-agradecidos”, mas eles destacam

que esse resultado está muito mais re-

lacionado à personalidade política do

país. “Para convencer os países, é preci-

so tirar dinheiro do bolso, pois toda in-

tegração implica ceder soberania, e isso

tem seu custo”, afirma DerGhougas-

sian. Ou seja, investir em hard power.

A correção ou não desse rumo, en-

tretanto, agora dependerá da estraté-

gia de política internacional escolhida

pelo sucessor do presidente Lula. Seja

ela dura ou branda.

MINISTRO DA DEFESA,

NELSON JOBIM (À

ESQUERDA), E ROBERT

GATES, SECRETÁRIO DE

DEFESA DOS EUA,

APÓS A ASSINATURA

DE ACORDO DE

COOPERAÇÃO MILITAR

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3

Page 63: Nº 387 Edição Brasil

o destino dos dinâmicos

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Page 64: Nº 387 Edição Brasil

64 AméricaEconomia Maio, 2010

BUSCAM-SE ADVOGADOS

Nesta década, a América Latina converteu-se na Meca das arbitragens

ANTONIO MARÍA DELGADO, DE MIAMI

D urante o auge das privati-

zações na década de 1990,

as incursões de empresas

estrangeiras à América Latina eram

comparadas a uma versão moderna

da legendária busca do Eldorado. Na

época, a região mostrava que tinha

muito a oferecer às transnacionais. Os

governos da região esticavam tapetes

vermelhos para atrair investimentos

estrangeiros, e seus mercados subex-

plorados prometiam gerar fortunas.

Entretanto, agora que o Consenso

de Washington parece ter perdido o

crédito, tais companhias estrangei-

ras se destinam a desempenhar outro

papel histórico em alguns países: o de

agentes indesejados do colonialismo,

em uma contenda de emancipação

cujas escaramuças são defendidas por

advogados em renhidas negociações.

As expropriações e as súbitas mu-

danças de regras nas concessões con-

verteram a América Latina em Meca da

arbitragem internacional. Hoje em dia,

a região domina os casos de quebra de

acordos de investimentos estrangeiros,

abarcando mais de 50% do total que

se encontrava registrado em 2009 no

Centro Internacional para Arbitragem

de Disputas sobre Investimentos (Ciadi),

órgão do Banco Mundial para a resolu-

ção de confl itos comerciais. Um percen-

tual alto demais para uma região que re-

presenta apenas

10% da economia

mundial. “Dei-

xou de ser o regis-

tro de dois ou três

casos anuais pa-

ra chegar a 30 no-

vos por ano”, diz

Ignacio Suárez

Anzorena, sócio

do escritório de

advogados Chadbourne & Parke LLP. O

recrudescimento dessa tendência tam-

bém é claramente visível nos montantes

que estão em jogo. “Durante os anos

1990, esses casos envolviam milhões

de dólares. Hoje, são comuns os casos de

centenas de milhões e até bilhões”, diz.

DEBATES ARBITRAGEM

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O fenômeno é liderado por países

vinculados à Alternativa Bolivariana

para as Américas (Alba), que contratam

sofi sticados escritórios de Washington,

Londres, Paris e Nova York para garantir

sua defesa em gigantescas demandas,

como a que a ConocoPhillips acionou

contra a Venezuela por causa da expro-

priação de seus

ativos petrolí-

feros, ou a que a

Occidental Petro-

leum moveu con-

tra o Equador.

Nigel Blacka-

by, sócio do escri-

tório de advoga-

dos Freshfields

Bruckhaus De-

ringer, em Washington, alerta, entre-

tanto, que o aluvião de casos começou

na primeira metade desta década, com

a Argentina, depois que as medidas

adotadas pelo governo no marco da

crise econômica de 2001 levaram de-

zenas de empresas estrangeiras a apre-

14acordos de proteção de

investimento esperam

por aprovação no Brasil

Page 65: Nº 387 Edição Brasil

Maio, 2010 AméricaEconomia 65

sentar reclamações ante o Ciadi. Tais

empresas foram atingidas sobretudo

pela pesificação forçada das tarifas

dos serviços públicos, que antes eram

fi xadas em dólares. Isso levou muitas

empresas a mover processos contra

o país. O ruído foi tamanho que, para

alguns analistas, infl uenciou – além

de outros fatores, como conflitos de

cláusulas com a legislação brasileira

– o Brasil a prorrogar a ratifi cação de

acordos de promoção e proteção ao

investimento (APPIs), o que legitima-

ria o uso de fóruns como o Ciadi para

a resolução de problemas do gênero.

Atualmente, apesar de ser considerado

um país atraente para a entrada de in-

vestimentos estrangeiros, o Brasil não

conta com a aprovação pelo Congresso

Nacional de nenhum dos 14 APPIs que

tem assinados.

PROFISSIONALIZAÇÃOPara Paolo Di Rosa, sócio do

escritório Arnold & Porter, a

busca pelos tratados de proteção

dos investimentos estrangeiros

se intensifi ca porque, “historica-

mente, uma empresa tinha que

acudir aos tribunais nacionais do

país pertinente, onde geralmente o

juízo se prolongava indefi nidamente,

e onde a empresa sentia que não podia

receber um tratamento justo, já que os

tribunais pertenciam ao país cujo Esta-

do era a parte contrária no caso”, diz.

Blackaby concorda que a arbitra-

gem é um dos poucos mecanismos que

os estrangeiros têm para se defender

das nacionalizações. “A triste realida-

de é que é impossível conseguir in-

dependência judicial na Venezuela, e

tampouco na Bolívia”, diz o advogado.

“A ideia de que um juiz de primeira

instância decida contra o governo,

nesses países, é uma ilusão.”

Isso não quer dizer, po-

rém, que estejam desarma-

dos nessa luta. Um advogado

especializado, que pediu ano-

nimato, afi rma que países como

a Venezuela se tornaram muito

hábeis no manejo desses processos. As-

sessorada por escritórios como Arnold

& Porter, Curtis Mallet e Foley Hoag, a

Venezuela conseguiu desativar muitas

demandas antes que chegassem for-

malmente à etapa da arbitragem. “Não

são muitos os casos que chegam a uma

arbitragem propriamente dita”, diz o

advogado. “Seja porque são resolvidos

antes, seja por causa de uma conduta

estratégica do Estado que, devido à as-

sessoria de bons advogados internacio-

nais, consegue que investidores acei-

tem um acordo não muito conveniente

para eles.” Esses acordos, geralmente,

têm sabor de ultimato, sob um formato

de “pegar ou largar”, jogando com a

intenção dessas empresas de operar no

país para lhes obrigar a renunciar aos

seus direitos.

O impacto que essas ações estão

tomando sobre a confi ança dos inves-

tidores é palpável. As empresas que

optam por investir nos países da re-

gião, sobretudo os da Alba, o fazem

somente quando as promessas de lucro

potencial superam os riscos que impli-

cam estar lá. “Estão mais conscientes

da importância de administrar o risco

político e incluí-lo nos custos de desen-

volvimento de um projeto”, diz Suárez,

da Chadbourne & Parke LLP.

0

30

60

90

120

Fonte: Ciadi; dados referentes a outubro de 2009

no de casos

Triste domínioProcessos de arbitragem abertos no Ciad

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Page 66: Nº 387 Edição Brasil

66 AméricaEconomia Maio, 2010

Principal desafi o da nova presidente da Costa Rica será descolar-se da imagem autoritária do homem que a levou ao poder

YENIFER MÁRQUEZ GONZÁLEZ, DA COSTA RICA

O costa-riquenho Oscar Arias,

Prêmio Nobel da Paz em 1987,

é grande amigo das palavras.

Desde o dia 7 de fevereiro, quando Lau-

ra Chinchilla foi eleita presidente da

Costa Rica, Arias não poupou elogios

para apresentar sua sucessora. “Nela se

funde a melhor relação de prudência,

paciência, humildade, responsabilida-

de e valentia”, disse, certa vez, sobre a

sua companheira do Partido Liberação

Nacional (PLN), o mais antigo do país.

Se, por um lado, essa parece ser

uma forte credencial para Laura, cuja

posse será no dia 8 de maio, por outro,

a nova presidente sabe que um de seus

maiores desafi os será o de desgarrar-se

da infl uência de seu antecessor, sobre-

tudo quando se trata de dar uma vira-

da na situação econômica do país.

Os números indicam tal necessida-

de. O desemprego em alta refl ete-se no

aumento da informalidade no mercado

de trabalho, que chega a 35,7%, segundo

a Organização Internacional do Traba-

lho (OIT). Em 2009, o défi cit comercial

do país foi de US$ 2,7 bilhões, ou 10% do

PIB costa-riquenho. O défi cit fi scal do

governo chegou a 3,5%, devido à queda

na arrecadação e à ampliação do gasto

público para frear os efeitos da crise.

Tal cenário faz urgir o projeto de

DEBATES COSTA RICA

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reforma fi scal que fi cou parado no go-

verno de Arias, entre outros motivos,

por sua difi culdade em negociar com

a oposição. Apesar de ter ganhado com

47% dos votos, Laura não conseguiu re-

plicar essa maioria no Congresso, onde

seu partido conseguiu apenas 24 das

57 cadeiras. Para analistas, esse é um

sinal de que Laura não poderá repetir a

característica autoritária cunhada por

Arias. “Ela terá que passar da política

da imposição para a da construção de

consensos democráticos”, diz o cientis-

ta social Alberto Cortés, da Universida-

de da Costa Rica.

ALÉM DAS PROMESSASPor enquanto, os únicos sinais dados

por Laura em seus discursos indicam

a continuidade da linha escolhida por

Arias, ao menos nos assuntos relativos

à promoção do livre-comércio – o país

negocia tratados comerciais com a Chi-

na e Cingapura – e quanto à atração de

investimento estrangeiro direto, funda-

mental para acelerar a recuperação do

país frente à pior recessão registrada em

27 anos. A nova presidente também deu

sinais de apoio à privatização dos seto-

res de eletricidade e telecomunicações

do país, temas que, na administração

Arias, geraram polêmica e divisão entre

os costa-riquenhos. “Mas o maior desa-

fi o que temos é o de combater a crimi-

nalidade, a violência e o narcotráfi co”,

afi rmou Laura depois de eleita, desta-

cando que “a América Central pode ser o

último campo de batalha da guerra que

vivem Colômbia e México”.

Entre as eleições e a posse, a nova

presidente demonstrou buscar o di-

álogo entre diferentes blocos sociais

e políticos. Mas só agora, a partir de

maio, é que ela poderá provar se conse-

guirá desnublar o horizonte dos costa-

riquenhos, seja ou não sob a sombra

de Arias.

COM A BÊNÇÃO DE ARIAS

A NOVA PRESIDENTE,

LAURA CHINCHILLA,

E OSCAR ARIAS:

NECESSIDADE DE

CONSENSO

Page 67: Nº 387 Edição Brasil
Page 68: Nº 387 Edição Brasil

68 AméricaEconomia Maio, 2010

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DEMOCRACIA VERTICAL

DEBATES VISÕES

Page 69: Nº 387 Edição Brasil

Maio, 2010 AméricaEconomia 69

Autores de China – Megatendênciasafi rmam que o ocidente ignora a diversifi cação e a experiência de um sistema político e econômico alternativo vividas pelo gigante asiático

À ESQUERDA, PARLAMENTO CHINÊS: ESPAÇO PARA UMA

“ZONA LIVRE DE POLÍTICA”. ACIMA, DORIS E JOHN NAISBITT

“N os últimos 30 anos, a

China se transformou

no laboratório em gran-

de escala mais incrível que alguém já

viu. É uma sequência de tentativa e erro,

tentativa e erro. Se algo não funciona, é

jogado longe. Se funciona, é multiplica-

do.” A afi rmação de John Naisbitt soa ta-

xativa, destoando dos matizes e meios-

tons da manhã de outono em Buenos

Aires, onde conversou com AméricaE-

conomia. Por trás da convicção desse

norte-americano, ex-executivo da IBM,

estão 43 anos de viagens frequentes ao

país asiático, onde atualmente vive par-

te do ano, encabeçando o Naisbitt China

Institute, instalado na Universidade de

Tianjin, no noroeste da China.

Sentada ao seu lado, Doris Naisbitt,

mulher de John, vai além. “A China está

desenvolvendo um sistema econômico

e social totalmente novo, que será uma

alternativa à democracia ocidental”,

diz. Essa ideia provocadora faz parte do

livro China – Megatendências, que John

e Doris acabam de publicar e que, por

enquanto, está disponível apenas em

chinês, inglês e alemão.

John faz parte da honorável e sem-

pre polêmica tradição dos futuristas

high profi le, que inclui personagens tão

fascinantes e criticados como Herman

Kahn, conhecido por suas análises

sobre as prováveis consequências de

uma guerra nuclear, e Ray Kurzweil,

inventor e futurista envolvido com

inteligência artifi cial. Trata-se de uma

profi ssão de risco, já que o futuro é um

animal tão indócil. Entretanto, mais do

que buscar uma fotografi a detalhada

dele, John Naisbitt busca identifi car as

tendências que lhe darão forma.

NOVO MODELOAssim, quando fala de Pequim, uma das

mensagens deixadas por John é a de que

os chineses não estão a caminho de se

converter em uma democracia liberal

bipartidária. Segundo ele, a China busca

uma “democracia vertical”. E qual é a

diferença? “No ocidente, todo o sistema

depende do movimento das eleições, en-

quanto na China a interação se dá entre

conselhos, uma democracia consultiva

orientada por resultados”, diz.

Nos Estados Unidos, não faltam crí-

ticos ferrenhos ao casal Naisbitt por es-

te considerar o sistema chinês estável

e positivo, alegando que John e Doris

simplesmente adornam o que é uma

ditadura sem divisão real de poderes.

Já cientistas políticos como Robert John

Barros e Adam Przeworski defendem

que “um governo (autocrático) pode

seguir regras, mesmo se os poderes re-

partidos que se vigiam uns aos outros

não forem institucionais: é sufi ciente

que cada um deles tenha poder real”.

A existência desses grupos é regis-

trada pelos Naisbitt como uma “Zona

Livre de Política”. Trata-se de tirar, mo-

mentaneamente, um tema importan-

te do debate diário e imediato para

buscar sua solução a partir de outras

perspectivas, por meio da discussão

nesses conselhos. No ocidente, para

além da questão dos partidos políticos,

lembram os Naisbitt, os lobbies empre-

sariais difi cultam ainda mais a exis-

tência de ações como essa. “Se, aqui no

ocidente, continuarmos dizendo que

isso não é possível de fazer, seguiremos

bloqueando reformas e fi caremos cada

vez mais para trás. Mas poderíamos

consegui-lo”, defende Doris.

Caso essa instância apartidária

consiga manter-se estável e resolver

confl itos, Doris e John salientam que

tal fato pode atrair o interesse e ser imi-

tado por pequenos países em desen-

volvimento. “Esses países interessados

têm como perfi l o fato de trabalhar sob

RODRIGO LARA SERRANO,

DE BUENOS AIRES

2

Page 70: Nº 387 Edição Brasil

70 AméricaEconomia Maio, 2010

DEBATES VISÕES

o modelo ocidental por várias décadas,

com programas de ajuda, e seus PIBs

não melhoram; ao passo que a China

de 30 anos atrás era uma nação pau-

pérrima, diferentemente do potencial

que tem hoje”, afi rma Doris.

IDADE DOURADADe qualquer forma, os Naisbitt identi-

fi cam mudanças progressivas no pa-

ís, segundo eles, rumo a uma maior

flexibilidade e sofisticação. “Por um

lado, os profi ssionais mais jovens que-

rem fazer as coisas para satisfazer a

população e manter a economia em

crescimento”, diz John. “Por outro lado,

hoje os chineses não querem apenas

a continuidade do crescimento, mas

também a sofi sticação da comunica-

ção, e as lideranças governamentais

estão de acordo em mudar as formas

de comunicação entre as diferentes

camadas da estrutura sociopolítica.”

Parte dessa mudança, segundo

Doris, vem de um boom do jornalis-

mo. “Monitoramos os jornais locais em

todas as províncias chinesas, e pos-

so dizer que hoje se vive uma idade

dourada na mídia local”, afi rma. “Ao

observar esses jornais, percebe-se coi-

sas interessantíssimas. Por exemplo,

nos editoriais e nas matérias, os temas

mais importantes hoje são corrupção

e meio ambiente.” A pesquisadora diz

que esses jornalistas, em geral, são

“jovens de vinte e poucos anos e, na

maioria, mulheres, a maioria bilíngues

e acadêmicas. Mas, o mais importante,

com desejo de escrever sobre o que está

passando no país”.

LIÇÃO PARA O BRASILE o que o Brasil poderia aprender com

a China? “Todos podem aprender algo

com a China. Basta observar o que eles

estão fazendo”, diz John. Doris dá um

exemplo: “Eles sabem que, para susten-

tar o crescimento econômico, têm de

passar a um nível mais alto de produ-

ção, no caminho de uma nação inova-

dora, criando um entorno que propicie e

sustente essa meta”. Segundo Doris, não

é o governo quem consegue consolidar

tal projeto, “mas é ele quem cria o am-

biente para que isso se desenvolva”.

Para Doris, seria como “se no Brasil

os diferentes setores políticos se unis-

sem para chegar a um acordo sobre

assuntos importantes”. Uma forma de

consegui-lo, para ela, seria com a cria-

ção de algo parecido com a “Zona Livre

de Política”. John, nesse ponto, chega a

ser crítico ao país: “O Brasil não é capaz

de realizar as reformas que poderiam

alavancar seu potencial; o governo Lu-

la chegou a mexer em poucas coisas

por aqui ou ali, mas nada foi defi nidor.

E o mesmo acontece na Índia”.

Não satisfeito com a observação,

o futurólogo chega a apontar a des-

coberta de petróleo no pré-sal como

uma desgraça. “Para mim, isso é o pior

que poderia ter acontecido ao Brasil.

Disse isso certa vez em um seminário

e houve um grande silêncio. Mas o

que acontecerá? Agora os governantes

poderão pensar: por que se preocu-

par com reformas se o petróleo nos

garante o dinheiro? E dessa forma o

Brasil irá prorrogar ainda mais essas

mudanças essenciais.”

CHAVES DO COMÉRCIOQuanto às possibilidades de negócio

entre Brasil e China, John acha que “os

chineses pensam mais no Brasil do que

os brasileiros na China”. Para ele, “essa

é uma grande oportunidade para a

América do Sul, pois eles precisam de

muitos recursos naturais, e a região os

tem para oferecer”.

Para quem tem planos de rumar

ao oriente para vender seus produtos,

Doris dá três conselhos, segundo ela, es-

senciais: “Primeiro, é importante enten-

der a diversidade da China; seu projeto

e seu tempo podem ser equivocados em

uma região, mas perfeitos para outra”,

diz. “O segundo, é que você precisará – e

terá – um sócio chinês. E, em terceiro

lugar, saber diferenciar que, enquanto a

mente ocidental se foca nos detalhes de

um contrato, os chineses privilegiam a

moldura. Eles costumam dizer que um

contrato emoldura o bosque, mas deixa

crescer as árvores”, conclui. Foto

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CHINA’S MEGATRENDS –

THE 8 PILLARS OF A NEW SOCIETY

JOHN E DORIS NAISBITT

EDITORA HARPER BUSINESS

2010 – R$ 68

MÍDIA CHINESA: CORRUPÇÃO E MEIO AMBIENTE SÃO TEMAS DE DESTAQUE

3

Page 71: Nº 387 Edição Brasil
Page 72: Nº 387 Edição Brasil

72 AméricaEconomia Maio, 2010

ELO REGIONAL

Iniciativa busca transformar o Brasil em plataforma de negócios da América Latina

ANA BORGES, DE SÃO PAULO

A tualmente, a América Latina tem se transformado

em fonte de interesse para investidores europeus,

asiáticos e norte-americanos, certo? Sim. Apesar

disso, tanto o mercado de capitais brasileiro quanto outros

da região sofrem de um problema: muitos têm relações dire-

tas com centros internacionais, mas não mantêm o mesmo

vínculo entre si. Ou seja, um investidor chileno que deseja

aplicar em ações brasileiras, por exemplo, poderá escolher

outras praças globais, como a de Nova York, para concluir

sua operação. O resultado é o aumento dos custos e dos riscos

nesses processos, além de uma redução da expressividade e

da dinâmica dos negócios latino-americanos.

Uma iniciativa, entretanto, está tomando forma para

unir os países da região em um polo de negócios por meio

do Brasil. Ela se chama Brain (Brasil Investimentos & Negó- Foto

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FINANÇAS MERCADO DE CAPITAIS

cios) e é encabeçada pelas entidades do mercado fi nanceiro

brasileiro: BM&FBovespa, Febraban (Federação Brasileira de

Bancos) e Anbima (Associação Brasileira das Entidades dos

Mercados Financeiros e de Capitais). “Muitos negócios com

ativos brasileiros ou latino-americanos que hoje são reali-

zados em Londres e Nova York poderão ser realizados aqui”,

afi rma o presidente da BM&FBovespa, Edemir Pinto.

A organização institucionaliza o Projeto Ômega, criado

há cerca de dois anos para, entre outros objetivos, tornar São

Paulo uma praça fi nanceira de porte semelhante às de cen-

tros como Hong Kong e Cingapura.

Tudo começou em 2008, quando o Brasil obteve o invest-

ment grade, e as três entidades fundadoras viram a oportuni-

dade de lançar um esforço mais ambicioso. A Brain é multis-

setorial, pois trata de projetos em todas as áreas que possam

Page 73: Nº 387 Edição Brasil

Maio, 2010 AméricaEconomia 73

das commodities. A canalização de recursos

para uma praça regional permitiria viabi-

lizar um sonho antigo da BM&FBovespa:

tornar-se a referência mundial para a

formação desses preços. “Somos um dos

maiores exportadores de commodities

do mundo, mas os preços hoje são de-

fi nidos em Chicago”, diz o presidente

da Bolsa.

PROJETOSA Brain estreia com cerca de 80 projetos,

que serão discutidos entre entidades

setoriais, empresas e órgãos do governo

brasileiro. As ações estão agregadas em

três grandes frentes. A primeira consiste

em consolidar o Brasil como centro de ne-

gócios da América Latina, apoiar a expansão

de empresas “multilatinas” e criar um marco

regulatório regional.

A segunda frente é desenvolver o relaciona-

mento desse centro de negócios globalmente. Para

isso, será necessário melhorar a infraestrutura do país,

reforçar o comércio exterior e simplifi car a legislação

cambial. “Queremos preparar o Brasil para ser um polo, e

isso é complexo. Estamos construindo o longo prazo”, defi ne

Pedro Guerra, vice-presidente da Anbima. O terceiro passo é

reforçar a competitividade brasileira.

Entre as propostas listadas, destacam-se a redução da

burocracia para trânsito internacional de capitais e o en-

quadramento mais fl exível das aplicações dos fundos de

pensão. “A questão não é a redução da carga tributária, mas a

simplifi cação dos processos. A desburocratização das regras,

maior clareza e a estabilidade já implicam redução de cus-

tos”, explica Oliveira Júnior, diretor da Brain.

Guerra lembra que não há nada que impeça o capi-

tal latino-americano de ingressar no Brasil, mas que esse

processo poderia

ser mais fáci l .

“Existem certas

assimetrias que

podem ser solu-

cionadas”, diz .

Entre elas, está a

forma pela qual

é tributada a in-

dústria de fundos

de renda variável

e a compra direta de ações. Enquanto os investidores de fun-

dos pagam impostos sobre os ganhos, o mesmo não ocorre

quando aplicam diretamente no mercado acionário.

As ideias vêm sendo discutidas com o governo desde o

início. O raciocínio é o de que, tendo a participação estatal, as

80projetos já estão

listados na Brain para

serem discutidos

promover um ambiente de negócios atraente. “A ideia é ser a

plataforma de negócios da América Latina”, disse o presiden-

te da Anbima, Marcelo Giufrida, durante o lançamento da

organização, em abril, na capital paulista.

VANTAGENS MÚLTIPLASOs criadores da iniciativa não poupam palavras na hora de

enumerar os benefícios que ela pode gerar. “Com a criação de

um polo regional, há o aumento do volume de negócios e mais

transparência”, explica o executivo responsável por levar a

ideia da Brain adiante, Paulo Oliveira Júnior. Antes de assu-

mir o posto de diretor-geral da organização, Oliveira Júnior

ocupava a diretoria de Novos Negócios da BM&FBovespa.

Outro exemplo de como a falta de união prejudica os

negócios dos países latino-americanos é a formação do preço

Page 74: Nº 387 Edição Brasil

74 AméricaEconomia Maio, 2010

propostas ganham musculatura para serem implementadas

com mais celeridade, inclusive as que dependerem de apro-

vação legislativa. De acordo com o presidente da Febraban,

Fabio Barbosa, a execução do projeto é de longo prazo (entre

cinco e dez anos) e, por isso, o objetivo não é tratar de ques-

tões pontuais ou fazer com que o governo federal dê maior

agilidade às modifi cações regulatórias.

Os criadores da Brain também estabeleceram algumas

diretrizes iniciais. Uma delas é o comprometimento fi nan-

ceiro dos candidatos a sócios. Quem quiser participar deve

contribuir com R$ 1 milhão anualmente por pelo menos três

anos. Por isso, o orçamento da Brain para 2010 conta com R$

12 milhões. Além das três entidades iniciais que encabeça-

ram a iniciativa, a Brain conta com outros dez associados

(Bradesco, BTG Pactual, Cetip, Citibank, Itaú Unibanco, HSBC,

Fecomercio, Santander, Banco Votorantim e Banco do Brasil).

Entidades de outros setores da economia, como da indústria,

representada pela Fiesp (Federação das Indústrias do Esta-

do de São Pau-

lo) e pela Firjan

(Federação das

Indústrias do

Estado do Rio de

Janeiro), mos-

traram simpa-

tia pela iniciati-

va. Além de 12

associados que

contribuem com

R$ 1 m i l hão,

haverá outras

duas categorias

de sócios, que

aportarão valo-

res menores.

FINANCAS MERCADO DE CAPITAIS

POLO FINANCEIROA transformação do Brasil em um polo de negócios interna-

cionais terá como duas de suas principais consequências o

aumento da liquidez no mercado fi nanceiro e a redução do

custo de captação de recursos por parte das empresas. “Cerca

de 70% das operações com ações e 90% dos negócios com de-

rivativos na América Latina são feitos no Brasil. Com a Brain,

teremos um grande crescimento”, afi rma Oliveira. Segundo

o executivo, a América Latina está sub-representada quando

o assunto é in-

vestimentos no

Brasil. Do total do

volume de ações

ne go c i a do n a

BM&FBovespa,

um terço é reali-

zado por estran-

geiros. Essa parte

está dividida da

seguinte forma:

50% são investidores norte-americanos, 30% vêm de paraísos

fi scais e da Europa, e o restante são asiáticos (maior parte) e

latino-americanos.

Para concretizar esse projeto, segundo o diretor da Brain,

já estão em andamento negociações com os reguladores dos

mercados fi nanceiros do Chile, Argentina, México e Peru,

além das bolsas locais e dos bancos. A iniciativa não é sim-

ples, pois requer investimentos em tecnologia e mudanças

regulatórias nos diversos países. A BM&FBovespa tem bus-

cado acordos para formar uma rede que ligará São Paulo aos

mercados desses quatro países. As conversas com o Chile são

as mais adiantadas, e um acordo com o país deve sair ainda

neste semestre.

Uma das primeiras ações da Brain será a de criar condi-

ções especiais para que as empresas brasileiras consigam fa-

zer a dupla listagem de papel, ou seja,

negociar na bolsa brasileira e tam-

bém em uma estrangeira. O caminho

inverso será estimulado. Para isso, o

presidente da BM&FBovespa, Edemir

Pinto, afi rmou que os reguladores dos

diversos países, em especial os asiáti-

cos, serão procurados. A ideia é evitar

que as companhias tenham os custos

de listagem duplicados. “Vamos faci-

litar o acesso a capital com um custo

menor, viabilizando o crescimento

das empresas”, diz.

EDEMIR PINTO (FOTO MENOR), QUER

FACILITAR O ACESSO AO CAPITAL. PAULO

OLIVEIRA JÚNIOR (À ESQUERDA) DIZ QUE

DESBUROCRATIZAR REDUZ CUSTOS

12milhões de reais

é o orçamento da Brain para 2010

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Page 76: Nº 387 Edição Brasil

76 AméricaEconomia Maio, 2010

OPINIÃO

VANTAGEMILUSÓRIA

Ilust

raçã

o: Sa

mue

l Cas

al

N os últimos nove anos, a economia peruana re-

gistrou um rápido crescimento. Mesmo em 2009,

quando o mundo inteiro lutou para sobreviver à

crise fi nanceira, o país cresceu 1,1%. Os peruanos estão feli-

zes com tal sucesso, mas ainda não sabem explicá-lo muito

bem, dando motivos ingênuos e superfi ciais.

Alguns justifi cam esse resultado apenas como um perí-

odo de preços altos das commodities que exportam. Eles têm

um profundo ceticismo sobre as instituições econômicas do

país. Não conseguem esquecer a época da grande fi la do pão,

quando seu dinheiro muitas vezes não era sufi ciente para

comprar carne.

Quando lhes perguntam qual governo tem mais res-

ponsabilidade na transformação, alguns citam o de Alberto

Fujimori. Com alguma insistência, pode-se tirar deles algum

crédito a Alejandro Toledo, e quase raivosamente sai um re-

conhecimento de que o segundo governo de Alan García foi

muito melhor que o primeiro.

Para um visitante estrangeiro, é especialmente notório

o fato de os peruanos nunca mencionarem a melhoria de

seu sistema financeiro. Quando são questionados, cau-

telosamente, reconhecem que parece

funcionar melhor do que antes. Os mais

jovens, às vezes, admitem a possibilida-

de de o dinheiro de seu fundo de pensão

ser sufi ciente para lhes sustentar quan-

do se aposentarem.

Tais jovens inclusive se surpreendem ao saber que o valor

total dos fundos de pensão peruanos aumentou de US$ 3,62

bilhões, no fi nal de 2001, para US$ 22,9 bilhões, em setembro

de 2009. Nesse mesmo período, o número de afi liados ao sis-

tema passou de 2,4 milhões para 4,4 milhões, e o montante

médio por afi liado subiu de US$ 1.509 para US$ 5.226.

Essas cifras ainda são tímidas se comparadas às do Chile.

Com uma população pouco maior que a metade da do Peru,

o sistema chileno registrava, em setembro de 2009, quase o

dobro de afi liados que o seu vizinho, e o montante médio de

ativos fi nanceiros por afi liado era de US$ 12.529.

Nos últimos tempos, houve uma interessante modifi ca-

ção da forma como os chilenos passaram a avaliar a econo-

mia de seu país e a do Peru. Os chilenos sempre criticaram

a estratégia adotada por seu próprio governo, os defeitos

dos fundos de pensão e desprezavam a economia peruana.

Enquanto isso, não perceberam o rápido crescimento do

vizinho. Entretanto, a partir de 2007, o nível de autocrítica

passou a ser maior, e o de desprezo ao Peru, menor. Como um

atleta que lidera uma corrida e nota que seu concorrente está

se aproximando, os chilenos começaram a se preocupar com

o risco de a economia peruana um dia ultrapassar a sua. Suas

apreensões aumentaram ainda mais quando o valor de seus

fundos de pensão minguou e a economia estancou.

Já os peruanos continuaram temendo e admirando o

sucesso chileno, e não pareciam tão conscientes de que sua

própria economia crescia mais rapidamente do que a chilena.

Ao contrário, se preocupavam com que os chilenos, tirando

vantagem de sua superioridade fi nanceira, pudessem conti-

nuar comprando grandes companhias

no Peru. Ainda não se viam como um

rival econômico do vizinho.

Agora, o Chile precisa se recupe-

rar do que, provavelmente, foi o maior

desastre natural de sua história, o pior

terremoto desde 1960. Desastres naturais dessa magnitude

são tão severos que levam para longe a fachada de unidade,

harmonia e civilidade que as sociedades constroem tão

cuidadosa e diligentemente durante os períodos de prosperi-

dade. Os desastres sempre revelam o grau de coesão de uma

sociedade, divisões escondidas, preconceitos arraigados.

Agora, enquanto o Chile se foca em sua recuperação, as

pessoas de fora da região podem pensar que o Peru aproveita-

rá a vantagem que o destino lhe deu e irá superar e economia

chilena. Mas isso seria uma conclusão superfi cial, pois vejo

que o Chile logo poderá se fortalecer novamente, com uma

onda de crescimento e inovação.

JOHN C. EDMUNDS é doutor em Administração pela Universidade de Harvard, professor do Babson College e coautor de Wealth by Association.

Os peruanos

continuam temendo

o sucesso chileno

Page 77: Nº 387 Edição Brasil
Page 78: Nº 387 Edição Brasil

78 AméricaEconomia Maio, 2010

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NOVO ETANOL

Page 79: Nº 387 Edição Brasil

Maio, 2010 AméricaEconomia 79

A indústria láctea da Argentina descobriu que seus resíduos servem como matéria-prima para produzir álcool combustível. O desafi o é conseguir escala e rentabilidade

U m desperdício. Isso era o que pensava um grupo

de produtores argentinos ao ver que cada quilo

de queijo fabricado por eles representava 9 litros

de soro lácteo que eram jogados fora. Só uma pequena parte

desse resíduo se destinava à alimentação de suínos; o res-

tante era simplesmente descartado, podendo contaminar

a água. Em 2009, entretanto, uma equipe de cientistas de

Córdoba, liderada pelo pesquisador Pablo Rodríguez, resolveu

mudar o fi nal dessa história. Converteu cada 37 litros do resí-

duo em 1 litro de etanol. E, como uma espécie de bônus track,

também conseguiu gerar 1 quilo de dióxido de carbono e 35

litros de água limpa.

Caso consiga gerar escala a preço competitivo, essa

estratégia poderá transformar o setor de laticínios em um

importante fornecedor de bio-

combustível. A notícia dos pes-

quisadores soou como música

aos ouvidos de Tulio Del Bono,

secretário de Ciência e Tecno-

logia da província de Córdoba.

A média de produção anual de

litros de soro lácteo desse setor

no território argentino é de 3,8

bilhões, o que significaria um

potencial de fabricação de 102 milhões de litros de etanol.

“Poderíamos atender mais de 50% da demanda interna de

etanol sem destruir um hectare de bosque nativo ou de

cultivo alimentar, nem aumentar um centavo do preço do

açúcar”, diz Del Bono.

Tendo como base os preços do etanol fi xados pelo gover-

no argentino, a tecnologia poderia gerar um negócio de US$

70 milhões ao ano onde antes só havia o mau cheiro exalado

do soro. Com esses números em mãos, Del Bono convidou o

governo federal da Argentina a investir, junto com Córdoba,

US$ 215 mil em uma planta piloto para testar sua viabilidade

econômica e, só então, abrir o projeto ao setor privado.

OUTROS TESTES Iniciativas como essas estão se multiplicando na América do

Sul. A Universidade do Norte do Paraná, em Londrina, mon-

tou uma destilaria semelhante à de Córdoba. O coordenador

do projeto, Hélio Suguimoto, está tão otimista que afi rma

JUAN PABLO DALMASSO, DE CÓRDOBA

que o processamento industrial de resíduos lácteos poderá

ser mais econômico que o processamento da cana-de-açúcar.

Nada mal para um país que gera 5 bilhões de litros de soro de

leite ao ano.

No Chile, a Universidade Tecnológica Metropolitana

acaba de lançar um projeto de US$ 270 mil para fazer sua

própria planta piloto de transformação de resíduo de leite. A

iniciativa, que conta com fi nanciamento da agência alemã

de desenvolvimento sustentável GTZ e da ONG britânica

GVEP International, está de olho no 1,3 milhão de toneladas

de soro de leite que este país gera anualmente. Contudo, nem

todos estão otimistas. “Até agora, o único etanol competiti-

vo é o feito a partir da cana-de-açúcar”, assegura Juan José

Gonzalez, que trabalha no escritório argentino da empresa

belga De Smet Ballestra, líder mundial em tecnologias para

a indústria de biocombustíveis. “Fizemos contas e os núme-

ros não batem porque o rendimento é baixo e os custos de

logística, altos.” Segundo González, isso motivou a De Smet

Ballestra a descartar um projeto semelhante na Áustria, on-

de está seu centro de pesquisa e desenvolvimento.

Richard Ling, economista do Departamento de Agricul-

tura dos Estados Unidos, calcula que a viabilidade econômica

do etanol do leite depende de um ajuste na integração dos

processos. As escalas, segundo ele, não deveriam ser meno-

res do que uma produção diária de 60 mil litros de etanol.

Como exemplo, ele conta a ex-

periência da Nova Zelândia. A

empresa neozelandesa Fonter-

ra, maior fornecedora mundial

de produtos lácteos, criou, em

2007, a Anchor Ethanol Ltda.,

companhia que conta com duas

plantas capazes de produzir 19

milhões de litros de etanol obti-

do do soro lácteo por ano.

O caso da Fonterra não é bem-sucedido somente por

causa de sua escala. O segredo também está na integração

de processos, como colocar plantas processadoras em fontes

de energia geotérmica. Isso lhes permite “enfrentar um pro-

cesso energético intensivo, como é o destilado, a um baixo

custo”, diz David Reid, analista da Energy for Industry, con-

sultoria neozelandesa especializada em energia, com sede

em Oakland.

Em abril, a empresa láctea argentina Sancor, em socieda-

de com a sueco-dinamarquesa Arla Foods, começou a proces-

sar 2,7 toneladas de soro diárias para extração de proteínas,

cujo valor pode superar os US$ 8 mil por tonelada. Somar

a fabricação de etanol seria um passo natural, ainda que a

companhia, por enquanto, negue o interesse.

Mas Del Bono não desanima. “É muito provável que hoje

não sejamos competitivos. Mas a regra de ouro é não des-

cartar uma tecnologia por conta dos preços atuais, já que as

variáveis podem mudar”, afi rma.

O soro obtido com a

fabricação de lácteos da

Argentina possibilitaria

produzir cerca de 102 milhões

de litros de etanol por ano

Page 80: Nº 387 Edição Brasil

80 AméricaEconomia Maio, 2010

CLICS & CHIPS

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NETBOOK RECICLADOA Sony lançou no Brasil o Vaio W Eco, que

se diferencia por causar menos impacto

ambiental. O novo mininotebook tem

80% das peças plásticas feitas com

material reciclado, a partir de CDs e DVDs

descartados. Já o manual de instruções

é eletrônico, reduzindo o consumo de

papel. O produto está disponível na

cor branca, tem tela de 10,1 polegadas,

memória de 2 GB e disco rígido de 320

GB, com bluetooth e wi-fi integrados, e

bateria de até 3,5 horas de duração. O

preço sugerido é de R$ 2.099.

www.sony.com.br/vaioeco

NOVA NA FAMÍLIA

A Panasonic do Brasil traz ao mercado a primeira

câmera da linha Lumix 2010, a FP1. Entre os

diferenciais estão o design ultrafi no, tampa frontal

deslizante e conectividade com o YouTube.

O modelo conta com 12.1 megapixels e visor LCD

de 2,7 polegadas, com a função Intelligent LCD,

que detecta as condições de iluminação e controla

o nível de brilho. O valor sugerido é de R$ 699.

www.panasonic.com.br

SCANNER MINIATURAO One-Touch Scanner é um scanner de

fotos fabricado pela PanDigital, com

apenas 16 cm de largura, 300 gramas e

portátil, que é capaz de reproduzir fotos

em alta resolução sem a necessidade de

conexão a um computador. O One-Touch

vem acompanhado de adaptador de

energia, cabo USB e cartão de memória.

O preço sugerido é de R$ 399.

www.tecnoworld.com.br

Page 81: Nº 387 Edição Brasil

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REVISTA

Page 82: Nº 387 Edição Brasil

82 AméricaEconomia Maio, 2010

LINHA DIRETA

REDES GEOSSOCIAIS?RODRIGO GUAYQUIL, DE SANTIAGO

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oto

Q uando achava que já tinha dominado as redes

sociais, com uma bonita página da empresa no

Facebook e no LinkedIn e fi nalmente consegui con-

fi gurar o Twitter para atualizar notícias minuto a minuto

em consonância com nosso site, aparece um geek, com seu

iPhone, e pergunta:

- Você ainda não conhece o Foursquare?

Um frio me percorre a espinha. Há algumas semanas não

leio o TechCrunch e meu Google Reader tem mais de 6 mil

feeds em negrito, sem ler. Forço a memória para resgatar algo

relacionado a esse nome, e solto uma frase de efeito, para não

fi car mal na fi ta:

- Ah, essa rede social que se atualiza por telefone? Claro

que conheço, mas ainda não se pode usá-la no Chile.

Bola fora. O garoto ri. Placar: Nativo digital 1 x Imigrante 0.

Dez minutos de pesquisa depois, fi quei sabendo que: 1) des-

de janeiro o Foursquare está disponível no mundo inteiro e;

2) esse serviço não é apenas mais uma redezinha em que

se preenche um perfi l: trata-se de uma mistura de jogo, rede

social e guia de cidades.

Entro no Wikipédia, que tinha sido atualizado no dia an-

terior, e aprendo que o Foursquare é uma rede “geossocial” e

que, dentro dela, fazer check-in é ter passe livre para localizar

amigos, ganhar pontos e condecorações e até se transformar

no mayor de um bar ou qualquer outro antro: algo como o

primeiro a chegar e o último a sair.

Viajo a Buenos Aires e descarrego no Blackberry da em-

presa o aplicativo do Foursquare para provar a novidade do

ano. Tal como senti em relação ao Twitter, há três anos, o re-

sultado foi imediato: uma epifania. Percebo que estou diante

de uma dessas tecnologias disruptivas que podem mudar

completamente a forma de fazer marketing e negócios, ou

simplesmente a forma de interagir com os amigos.

Como o aplicativo utiliza o GPS do telefone, ou triangula

as antenas de telefonia, consegue identifi car o

ponto exato da cidade em que uma pessoa está

e indica restaurantes, bares, cinemas, teatros e

outros serviços disponíveis nas redondezas.

Penso que não terei mais de andar com o

jornal da cidade ou o pesado guia turístico, pois

outros usuários já deixaram pistas sobre o que

fazer e em que lugar, e recomendam o que comer

e o que evitar.

Assim, fi ca óbvio prognosticar que o marke-

ting urbano não será mais o mesmo. De volta

a Santiago, leio que, nos Estados Unidos e na

Europa, cafés e restaurantes dão descontos e

presentes aos que fazem check-in no Foursquare.

Já o jornal Financial Times trabalha conjunta-

mente com o Foursquare para oferecer assina-

turas gratuitas àqueles que façam check-in em

lugares selecionados, como cafés universitários

e escolas de negócios.

Quem se interessa em explorar essa nova rede

precisa de um aparelho iPhone, Android, webOS,

BlackBerry ou Windows Mobile, independente-

mente de este ter GPS. Depois, deve baixar a apli-

cação no site (www.foursquare.com), criar uma

conta e começar a dizer ao mundo onde está. A

graça é que quem acessa depois do horário comer-

cial ganha mais pontos, o que pode se converter

em uma boa desculpa para um happy hour:

- É que estou provando uma nova tecnologia

para a empresa, meu amor…

Page 83: Nº 387 Edição Brasil
Page 84: Nº 387 Edição Brasil

Atingir a entrega de duas mil unidades do Falcon é mais do que apenas uma celebração de êxito. É uma confi rmação de que todas as qualidades que temos desenvolvido desde 1963 são essenciais para um voo excelente. A força das tecnologias dos aviões de caça. A capacidade intelectual da liderança informática. A disciplina

da engenharia apaixonada. Tudo isto faz com que as máquinas de negócios de elevado desempenho dos Falcons atuais sejam mais econômicas e ecológicas do que qualquer outra na sua classe. Para conhecer a história completa, visite a nossa “Visita histórica interativa da Falcon” em falconjet.com/tour.

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