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15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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15 ANOS DO PROGRAMA DE EDUCACcedilAtildeO FISCAL DO ESTADO DO CEARAacutememoacuterias e perspectivasISBN ndash 978-85-66674-01-9Copyright copy 2014 Ediccedilotildees Fundaccedilatildeo Sintaf

Direitos desta ediccedilatildeo reservados para

Fundaccedilatildeo Sintaf de Ensino Pesquisa Desenvolvimento Tecnoloacutegico e CulturalRua Padre Mororoacute 952 CentroCEP 60015-220 ndashndash Fortaleza CE ndashndash BrasilE-mail fundacaofundacaosintaforgbrwwwfundacaosintaforgbr

Secretaria da Fazenda do Estado do Cearaacute Avenida Alberto Nepomuceno 2 CentroCEP 60055-000 ndash Fortaleza CE ndash BrasilE-mail educacaofiscalsefazcegovbrwwwsefazcegovbr

Os conceitos e opiniotildees emitidos neste livro satildeo de inteira responsabilidade dos autores natildeo repre-sentando a opiniatildeo dos coordenadores organizadores e editores

Este E-book foi editado segundo as normas do Acordo Ortograacutefico da Liacutengua Portuguesa aprovado pelo Decreto Legislativo nordm 54 de 18 de abril de 1995 e promulgado pelo Decreto nordm 6583 de 29 de setembro de 2008

1ordf Ediccedilatildeo ndashndash 2014

Programaccedilatildeo Visual e Capa Rachel Mota Lima

Ficha de Catalogaccedilatildeo na Fonte Mordf da Conceiccedilatildeo G Lemos ndash CRB-3853

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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SumaacuterioPREFAacuteCIO 7

APRESENTACcedilAtildeO 9

PARTE I ndash EacuteTICA E CIDADANIA NO SERVICcedilO PUacuteBLICO 11

1 EDUCACcedilAtildeO FISCAL ITINERANTE UM RELATO DE EXPERIEcircNCIA NA SECRETARIA DA FAZENDA DO ESTADO DO CEARAacute 12 Argemiro Torres NetoGermana Parente Neiva Belchior

2 PROGRAMA DE EDUCACcedilAtildeO FISCAL NO BRASIL ENFATIZAR O GASTO PUacuteBLICO 20Denise Lucena Cavalcante

3 EacuteTICA NAS RELACcedilOtildeES TRIBUTAacuteRIAS 31 Hugo de Brito Machado Segundo

4 REFLEXOtildeES CONCEITUAIS E PRAacuteTICAS DO PROGRAMA ESTADUAL DE EDUCACcedilAtildeO FISCAL NO CEARAacute 47 Imaculada Maria Vidal da Silva

PARTE II ndash TRIBUTACcedilAtildeO E CIDADANIA FISCAL 63

5 A RIQUEZA AO ALCANCE DE TODOS OS TRIBUTOS 64 Alberto Amadei Neto

6 EFICIEcircNCIA DA ADMINISTRACcedilAtildeO TRIBUTAacuteRIA E REDUCcedilAtildeO DA POBREZA 105 Flaacutevio Ataliba Flexa Daltro BarretoCarlos Eduardo dos Santos Marino

7 INCONGRUEcircNCIAS DA POLIacuteTICA TRIBUTAacuteRIA NO BRASIL E O SEU CONTRIBUTO PARA A CRISE DA RELACcedilAtildeO DE TRIBUTACcedilAtildeO 132Francisco Ferreira Chagas Juacutenior

8 INFLUEcircNCIA DOS FATORES ECONOcircMICOS NA ARRECADACcedilAtildeO DA CONTRIBUICcedilAtildeO DE MELHORIA NOS MUNICIacutePIOS BRASILEIROS 151 Joseacute Flaacutevio da Silva

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9 CIDADANIA FISCAL O DEVER FUNDAMENTAL DE PAGAR TRIBUTOS E OS DIREITOS FUNDAMENTAIS 166Marciano Buffon

10 O PROCESSO DE CODIFICACcedilAtildeO DO DIREITO TRIBUTAacuteRIO BRASILEIRO 188 Osvaldo Joseacute Rebouccedilas

11 O ORDENAMENTO JURIacuteDICO E AS ANTINOMIAS TRIBUTAacuteRIAS O LITIacuteGIO IDEOLOacuteGICO-INTERPRETATIVO ENTRE O FISCO OS TRIBUNAIS SUPERIORES E A DOUTRINA 204Tonny Iacutetalo Lima Pinheiro

12 PARA ALEacuteM DA ARREDACACcedilAtildeO A TRIBUTACcedilAtildeO COMO INSTRUMENTO DE REDUCcedilAtildeO DAS DESIGUALDADES SOCIAIS 220 Victor Hugo Cabral de Morais JuniorGermana Parente Neiva Belchior

PARTE III ndash CARGA TRIBUTAacuteRIA REFORMA TRIBUTAacuteRIA E JUSTICcedilA FISCAL 233

13 REFORMA TRIBUTAacuteRIA COM JUSTICcedilA FISCAL E SOCIAL 234 Antocircnio Gilson Aragatildeo de CarvalhoLucas Mouratildeo Aragatildeo

14 TRANSPAREcircNCIA EFICIEcircNCIA E SIMPLICIDADE A SERVICcedilO DA JUSTICcedilA FISCAL PROPOSTAS SUTIS DE REFORMAS TRIBUTAacuteRIAS 250 Fernanda Mara de Oliveira Macedo Carneiro Pacobahyba

15 CARGA TRIBUTAacuteRIA BRASILEIRA Eacute ELEVADA MITO OU VERDADE 264 Jurandir Gurgel Gondim Filho

16 REFORMA TRIBUTAacuteRIA DESENVOLVIMENTO ECONOcircMICO E JUSTICcedilA FISCAL NO BRASIL DIAGNOacuteSTICO E PERSPECTIVAS 286 Marcelo Lettieri Siqueira

PARTE IV ndash CONTROLE SOCIAL E NOVAS MIacuteDIAS 300

17 CIDADANIA FISCAL E NOVAS MIacuteDIAS 301 Debora Bezerra de Menezes Serpa MaiaAna Ceciacutelia Bezerra de Aguiar

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PARTE V ndash EDUCACcedilAtildeO FISCAL NO ENSINO DESAFIOS E PERSPECTIVAS 346

20 A EDUCACcedilAtildeO FISCAL SOB A OacuteTICA DO ALUNO DA ESCOLA PUacuteBLICA ESTADUAL DO CEARAacute QUE PARTICIPA DO PROJETO BOLSA EDUCACcedilAtildeO FISCAL E CIDADANIA 347 Amilca Alves do NascimentoMirizana Alves de Almeida

21 AVALIACcedilAtildeO DO PROGRAMA DE EDUCACcedilAtildeO FISCAL DESAFIOS LIMITES E VIVEcircNCIAS DA PRAacuteTICA DOCENTE 362 Ana Cleiane Carneiro de OliveiraFernando Joseacute Pires de Sousa

22 A EXPERIEcircNCIA DA EDUCACcedilAtildeO A DISTAcircNCIA NO CENTRO DE EDUCACcedilAtildeO FISCAL PARA A CIDADANIA DA ESCOLA FAZENDAacuteRIA DE SAtildeO PAULO E O CURSO DE DISSEMINADORES DE EDUCACcedilAtildeO FISCAL 379Augusto Jeronimo Martini

23 IMPLEMENTACcedilAtildeO DO PROGRAMA NACIONAL DE EDUCACcedilAtildeO FISCAL NAS ESCOLAS ESTADUAIS SOB COMPETEcircNCIA DA CREDE 3 397 Erlane Muniz de Arauacutejo Martins

24 PROGRAMA DE EDUCACcedilAtildeO FISCAL DE FORTALEZA UM LEGADO DE CIDADANIA 408 Leonardo Costa de Almeida

25 EDUCACcedilAtildeO FISCAL ldquoSEFAZrdquo NA CIDADE CONSTITUCIONAL 421 Marcelo Arno Nerling

26 A PERCEPCcedilAtildeO DOS PROFESSORES SOBRE O CURSO DE DISSEMINADORES DA EDUCACcedilAtildeO FISCAL NO MUNICIacutePIO DE ICOacute-CE 445 Maria Nahir Batista Ferreira

POSFAacuteCIO 459

18 A EVOLUCcedilAtildeO DOS ESFORCcedilOS DE TRANSPAREcircNCIA NA GESTAtildeO PUacuteBLICA NO CEARAacute 314 Joseacute Joaquim Neto Cisne

19 A EVOLUCcedilAtildeO DA TRANSPAREcircNCIA DAS CONTAS PUacuteBLICAS E DO CONTROLE SOCIAL NO BRASIL A EXPERIEcircNCIA DO IBEF NO CEARAacute 337 Osvaldo Euclides de ArauacutejoSandra Maria Olimpio Machado

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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Prefaacutecio O Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal objetiva a conscientizaccedilatildeo dos cidadatildeos sobre a fun-

ccedilatildeo social dos tributos e de sua responsabilidade no controle da aplicaccedilatildeo desses recursos por meio

do exerciacutecio da cidadania buscando assim a construccedilatildeo de uma sociedade mais livre justa e solidaacuteria

preconizada na Constituiccedilatildeo Federal

No acircmbito do Estado do Cearaacute o Programa Estadual de Educaccedilatildeo Tributaacuteria (PET) foi instituiacutedo

por meio do Decreto nordm 253261998 Em seguida tendo em vista a importacircncia que o tema adquiriu

neste Estado o Decreto nordm 289002007 criou a Ceacutelula de Educaccedilatildeo Fiscal (Ceduf) na estrutura organi-

zacional da Secretaria da Fazenda (Sefaz) passando o Programa a ser chamado de Programa Estadual

de Educaccedilatildeo Fiscal (PEF) nos moldes estabelecidos pelo Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal (PNEF)

Dessa forma a criaccedilatildeo da Ceacutelula de Educaccedilatildeo Fiscal no organograma desta Secretaria da Fazen-

da ocorreu antes mesmo do Protocolo 052007 firmado durante o Encontro Nacional de Administra-

dores Tributaacuterios (Enat) que incentiva e sensibiliza os Estados a incluir uma unidade especiacutefica em suas

organizaccedilotildees fazendaacuterias destinada a desenvolver as atividades da Educaccedilatildeo Fiscal

Participar do processo de inserccedilatildeo de valores eacuteticos e da mudanccedila de perspectiva do papel da

sociedade na gestatildeo puacuteblica eacute o grande desafio do PEF aliando-se por conseguinte agrave missatildeo desta

Secretaria da Fazenda de ldquocaptar e gerir os recursos financeiros para o desenvolvimento sustentaacutevel do

Estado e promover a cidadania fiscalrdquo

Ao longo de duzentos anos de histoacuteria a Administraccedilatildeo Tributaacuteria cearense tem buscado pro-

mover o processo de crescimento e modernizaccedilatildeo do Estado incrementar as condiccedilotildees de vida da

populaccedilatildeo mediante a captaccedilatildeo dos recursos a serem aplicados nos diversos setores da sociedade

bem como melhorar a relaccedilatildeo entre Fisco contribuinte e sociedade o que gera impacto na qualidade

da receita e do gasto conscientizando a coletividade acerca do dever fundamental de pagar tributo

Verifica-se portanto que o Programa de Educaccedilatildeo Fiscal ocupa posiccedilatildeo relevante natildeo apenas

no acircmbito da Administraccedilatildeo Tributaacuteria mas se revela como uma importante poliacutetica de governo ao

priorizar o ator e o sujeito social que eacute foco desta gestatildeo o cidadatildeo

Em 2013 a Educaccedilatildeo Fiscal do Cearaacute completou 15 anos sendo o momento oportuno de re-

forccedilar os acertos e refletir sobre novas estrateacutegias para permitir a sustentabilidade do Programa Satildeo

vivenciados novos paradigmas e novos conceitos o que impotildee um novo perfil de servidor e de gestatildeo

puacuteblica bem como novos mecanismos de sensibilizaccedilatildeo e empoderamento do tema pela sociedade

Este livro reuacutene artigos acadecircmicos sobre temas abordados pela Educaccedilatildeo Fiscal e experiecircn-

cias bem sucedidas que marcaram a histoacuteria do PEF Cearaacute sendo uma das accedilotildees comemorativas do

seu aniversaacuterio de 15 anos Os estudos trazem interessantes abordagens tendo em vista a aacuterea de

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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formaccedilatildeo e de atuaccedilatildeo dos autores natildeo seguindo necessariamente o entendimento que vem sendo

adotado por esta Administraccedilatildeo Tributaacuteria O conhecimento eacute um processo nunca esgotado estando

em constante construccedilatildeo por isso a importacircncia de o Fisco estar aberto e reflexivo ao olhar da socie-

dade A Educaccedilatildeo Fiscal eacute um instrumento de diaacutelogo com a coletividade em suas diversas instacircncias

fortalecendo a legitimaccedilatildeo do tributo o acesso agrave informaccedilatildeo e ainda o controle social

Natildeo podemos deixar de expressar nossa alegria diante do interesse dos servidores e pesqui-

sadores em relaccedilatildeo ao tema e ainda nossa gratidatildeo aos teacutecnicos e professores que gentilmente

aceitaram o nosso convite em participar da obra contribuindo ainda mais com um enfoque cientiacutefi-

co do livro Agradecemos ainda a parceria da Fundaccedilatildeo Sintaf pelo seu compromisso com a cultura

e a pesquisa natildeo apenas no acircmbito da classe fazendaacuteria mas pelas accedilotildees voltadas a toda sociedade

bem como a AAFEC que possibilitou a diagramaccedilatildeo deste e-book que foi feita pela artista graacutefica

Rachel Lima

Aproveitamos a oportunidade para destacar o valoroso trabalho desenvolvido pela equipe da

Ceacutelula de Educaccedilatildeo Fiscal na disseminaccedilatildeo do PEF e em especial na conduccedilatildeo deste E-book desde a

sua iniciativa divulgaccedilatildeo do edital seleccedilatildeo e formataccedilatildeo dos artigos

Esperamos que a obra possa contribuir com o debate dos temas abordados pelo PEF e com a

disseminaccedilatildeo da cidadania fiscal

Fortaleza 20 de marccedilo de 2014

Joatildeo Marcos Maia

Secretaacuterio da Fazenda do Estado do Cearaacute

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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Apresentaccedilatildeo No Estado do Cearaacute o Programa de Educaccedilatildeo Fiscal eacute desenvolvido na Sefaz por intermeacutedio da Ceacutelula de Educaccedilatildeo Fiscal (Ceduf) tendo completado em 2013 15 anos de existecircncia O trabalho eacute realizado em parceria com a Secretaria da Receita Federal do Brasil da 3ordf Regiatildeo da Prefeitura Mu-nicipal de Fortaleza por meio das Secretarias de Financcedilas e Educaccedilatildeo do Municiacutepio da Secretaria de Educaccedilatildeo do Estado e do Centro Regional da Esaf (Centresaf) que constituem o Grupo de Educaccedilatildeo Fiscal Estadual (Gefe) Apesar de o termo ldquocidadania fiscalrdquo ser ainda pouco difundido na literatura e na Administraccedilatildeo Puacuteblica eacute indiscutiacutevel que seu conteuacutedo ultrapassa uma visatildeo meramente fiscalista Eacute preciso romper o dogma de que o conhecimento do tributo eacute algo distante e complexo limitado aos teacutecnicos e es-pecialistas em Tributaccedilatildeo e Financcedilas Puacuteblicas De nada adianta o conhecimento adquirido se ele natildeo eacute compartilhado principalmente com a sociedade que eacute a detentora legiacutetima do dever fundamental de pagar tributo e de fiscalizar a utilizaccedilatildeo dos recursos puacuteblicos Antes de servir ao puacuteblico o servidor eacute cidadatildeo O servidor puacuteblico fazendaacuterio eacute importante para que o Estado possa efetivamente realizar a justiccedila social principalmente no acircmbito do Estado do Cearaacute jaacute conhecido por seus inuacutemeros problemas sociais Dessa forma ao fazer parte do corpo fun-cional da Administraccedilatildeo Tributaacuteria deve-se ter em mente a dupla funccedilatildeo que exerce cidadatildeo e agente do Fisco Foi exatamente dentro dessa perspectiva que surgiu a ideia do E-book da vontade de poder compartilhar entendimentos visotildees e percepccedilotildees diferentes (e muitas vezes ateacute contraditoacuterias) acerca dos temas abordados pelo Programa de Educaccedilatildeo Fiscal Acreditamos que o conhecimento eacute liberta-dor e que estar aberto ao ldquonovordquo eacute um desafio de todo ser humano e principalmente da Administra-ccedilatildeo Puacuteblica A Administraccedilatildeo Tributaacuteria por ser uma instituiccedilatildeo puacuteblica quase bicentenaacuteria que cuida dos recursos financeiros da sociedade tem assim sua missatildeo fortalecida ao publicar uma obra que conteacutem estudos e relatos de experiecircncia sobre a Educaccedilatildeo Fiscal O livro possui 25 (vinte e cinco) artigos divididos em cinco eixos temaacuteticos (i) Eacutetica e cidadania no serviccedilo puacuteblico (ii) Tributaccedilatildeo e cidadania fiscal (iii) Carga tributaacuteria reforma tributaacuteria e justiccedila fis-cal (iv) Controle social e novas miacutedias e por fim (v) Educaccedilatildeo fiscal no ensino desafios e perspectivasAgradecemos a participaccedilatildeo dos autores que tiveram seus trabalhos selecionados pela Comissatildeo Ava-liadora Amilca Alves do Nascimento Ana Ceciacutelia Bezerra de Aguiar Ana Cleiane Carneiro de Oliveira Antocircnio Gilson Aragatildeo de Carvalho Carlos Eduardo dos Santos Marino Debora Bezerra de Menezes Serpa Maia Erlane Muniz de Arauacutejo Martins Fernanda Mara de Oliveira Macedo Carneiro Pacobahyba Fernando Joseacute Pires de Sousa Francisco Ferreira Chagas Juacutenior Germana Parente Neiva Belchior Joseacute Flaacutevio da Silva Joseacute Joaquim Neto Cisne Leonardo Costa de Almeida Lucas Mouratildeo Aragatildeo Maria Nahir Batista Ferreira Mirizana Alves de Almeida Osvaldo Euclides de Arauacutejo Osvaldo Joseacute Rebouccedilas Sandra Maria Olimpio Machado Tonny Iacutetalo Lima Pinheiro e Victor Hugo Cabral de Morais Junior

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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Destacamos que o livro conta tambeacutem com relatos de experiecircncia de accedilotildees desenvolvidas pela Ceacutelula de Educaccedilatildeo Fiscal da Sefaz apresentados por Argemiro Torres Neto Germana Parente Neiva Belchior e Imaculada Maria Vidal da Silva Agradecemos ainda os teacutecnicos e pesquisadores que aceitaram o nosso convite em participar do livro Alberto Amadei Neto (Receita Federal do Brasil) Augusto Jeronimo Martini (Escola Fazendaacuteria de Satildeo Paulo) Denise Lucena Cavalcante (Universidade Federal do Cearaacute e Procuradoria da Fazenda Nacional) Flaacutevio Ataliba Flexa Daltro Barreto (Universidade Federal do Cearaacute e Instituto de Pesquisa e Estrateacutegia Econocircmica do Cearaacute) Hugo de Brito Machado Segundo (Universidade Federal do Cearaacute) Jurandir Gurgel Gondim Filho (Secretaria de Financcedilas do Municiacutepio de Fortaleza) Marcelo Arno Ner-ling (Universidade de Satildeo Paulo) Marcelo Lettieri Siqueira (Receita Federal do Brasil) e Marciano Buffon (Universidade do Vale do Rio dos Sinos) Por fim nossa gratidatildeo agrave Fundaccedilatildeo Sintaf e agrave AAFEC pela parceria e a toda a equipe que com-potildee a Ceacutelula de Educaccedilatildeo de Fiscal pelo compromisso com o e-book mas ainda por acreditar que sua produccedilatildeo seria possiacutevel Noacutes que fazemos a Educaccedilatildeo Fiscal vivemos a pedagogia do ideal do afeto do conhecimento e da cidadania Afinal toda grande conquista nasce de um sonho E eacute com muita emoccedilatildeo que com-partilhamos nosso sonho com todos nossos autores e leitores na esperanccedila de que a obra estimule o diaacutelogo entre Fisco e Universidade e contribua para a realizaccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas voltadas agrave cida-dania fiscal Boa leitura a todos e a todas

Fortaleza 10 de marccedilo de 2014

Argemiro Torres NetoCoordenador do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

Orientador da Ceacutelula de Educaccedilatildeo Fiscal da Secretaria da Fazenda do Estado do Cearaacute

Sandra Maria Olimpio MachadoSecretaacuteria Executiva da Fazenda do Estado do Cearaacute

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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PARTE I

EacuteTICA E CIDADANIA NO SERVICcedilO PUacuteBLICO

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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EDUCACcedilAtildeO FISCAL ITINERANTE UM RELATO DE EXPERIEcircNCIA NA SECRETARIA

DA FAZENDA DO ESTADO DO CEARAacute

SUMAacuteRIO Introduccedilatildeo 1 A Educaccedilatildeo Fiscal na Secretaria da Fa-zenda do Estado do Cearaacute 2 O Projeto Educaccedilatildeo Fiscal Itinerante 3 Resultados obtidos Consideraccedilotildees finais Referecircncias

INTRODUCcedilAtildeO

O Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute (PEF) objetiva a conscientizaccedilatildeo dos cida-

datildeos sobre a funccedilatildeo social dos tributos e de sua responsabilidade no controle da aplicaccedilatildeo desses

recursos por meio do exerciacutecio da cidadania buscando assim a construccedilatildeo de uma sociedade mais

livre justa e solidaacuteria

Em 2013 a Educaccedilatildeo Fiscal do Cearaacute completou 15 anos sendo o momento oportuno de re-

forccedilar os acertos e refletir sobre novas estrateacutegias para permitir a sustentabilidade do Programa Ateacute

porque satildeo vivenciados novos paradigmas e novos conceitos o que impotildee um novo perfil de servidor

e de gestatildeo puacuteblica

Apesar dos expressivos resultados que o PEF tem conseguido no Estado de onde se destacam

escolas ONGs comunidades e instituiccedilotildees de ensino superior3 o Programa tem tido dificuldade de

alcanccedilar o puacuteblico interno em especial os servidores e colaboradores da Sefaz que essencialmente

devem ser educadores fiscais o que releva um aparente paradoxo O senso comum incluiacutedo o corpo

funcional do Fisco estadual eacute de que a praacutetica da Educaccedilatildeo Fiscal estaacute limitada agrave exigecircncia do docu-

mento fiscal e que uma Administraccedilatildeo Tributaacuteria deve exclusivamente se preocupar com a arrecada-

ccedilatildeo Eacute difiacutecil perceber e internalizar o que significa a funccedilatildeo social do tributo bem como a essecircncia de

ser um servidor cidadatildeo

1 Auditor Fiscal da Receita Estadual Orientador da Ceacutelula de Educaccedilatildeo Fiscal da SefazCe e Coordenador do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute E-mail argemirotorressefazcegovbr2 Auditora Fiscal Juriacutedica da Receita Estadual Doutoranda em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina Mestre em Direito pela Universidade Federal do Cearaacute Professora universitaacuteria E-mail germana_belchioryahoocombr germanabelchiorsefazcegovbr 3 Os relatoacuterios com todas as atividades realizadas e os resultados obtidos pelo Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute podem ser visualizados no siacutetio da SefazCe wwwsefazcegovbreducacaofiscal

Argemiro Torres Neto1

Germana Parente Neiva Belchior2

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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Diante disso surgiu o Projeto Educaccedilatildeo Fiscal Itinerante cujo objetivo eacute despertar criticamente

o corpo funcional da Secretaria da Fazenda acerca dos temas abordados pela Educaccedilatildeo Fiscal e refletir

como e em que medida o PEF pode ser inserido no exerciacutecio das funccedilotildees e no cotidiano da Adminis-

traccedilatildeo Tributaacuteria

A metodologia utilizada para elaboraccedilatildeo deste trabalho eacute descritiva exploratoacuteria e puramente

indutiva com abordagem qualitativa na medida em que busca explicar o Projeto Educaccedilatildeo Fiscal Itine-

rante apontar sua justificativa metodologia desenvolvimento e principais resultados obtidos Nessa

linha como se trata de um relato de experiecircncia eacute importante ressaltar que o foco natildeo seraacute teoacuterico

mas essencialmente praacutetico

Em um primeiro momento seraacute feito um breve escorccedilo histoacuterico acerca do Programa de Educa-

ccedilatildeo Fiscal no acircmbito da Secretaria da Fazenda do Estado do Cearaacute para em seguida analisar o desen-

volvimento do Projeto Educaccedilatildeo Fiscal Itinerante Por fim seratildeo expostos os resultados obtidos com

as visitas realizadas a fim de que se possa refletir como o Projeto pode influenciar uma mudanccedila de

comportamento funcional bem como a dinacircmica da gestatildeo fazendaacuteria

1 A EDUCACcedilAtildeO FISCAL NA SECRETARIA DA FAZENDA DO ESTADO DO CEARAacute

Por ocasiatildeo da 82ordf Reuniatildeo do Conselho Nacional de Poliacutetica Fazendaacuteria (Confaz) sobre Ad-

ministraccedilatildeo Tributaacuteria em Fortaleza foi celebrado em 1996 o Convecircnio de Cooperaccedilatildeo Teacutecnica que

inseriu o tema ldquoEducaccedilatildeo Tributaacuteriardquo como uma diretriz a ser desenvolvida pelos Fiscos

Em 1997 ocorreu a criaccedilatildeo do Grupo Nacional de Educaccedilatildeo Tributaacuteria (GET) com a participaccedilatildeo da

Secretaria da Fazenda do Estado do Cearaacute que vinha de uma experiecircncia anterior com o Projeto ldquoCi-

dadatildeo desde pequenordquo conhecido como ldquoABC da Cidadaniardquo realizado nas escolas do municiacutepio de

HorizonteCe (RIVILLAS VILARDEBOacute MOTA 2010)

No acircmbito do Estado do Cearaacute o Programa Estadual de Educaccedilatildeo Tributaacuteria (PET) foi instituiacutedo

por meio do Decreto nordm 253261998 Em seguida tendo em vista a importacircncia que o tema adquiriu

neste Estado o Decreto nordm 289002007 (CEARAacute 2007) criou a Ceacutelula de Educaccedilatildeo Fiscal (Ceduf) na

estrutura organizacional da Secretaria da Fazenda passando o Programa a ser chamado de Programa

Estadual de Educaccedilatildeo Fiscal (PEF) nos moldes estabelecidos pelo Programa Nacional de Educaccedilatildeo

Fiscal

Participar do processo de inserccedilatildeo de valores eacuteticos e da mudanccedila de perspectiva do papel

da sociedade na gestatildeo puacuteblica eacute o grande desafio do PEF aliando-se por conseguinte agrave missatildeo da

Secretaria da Fazenda para o quadriecircnio 2011-2014 de ldquocaptar e gerir os recursos financeiros para o

desenvolvimento sustentaacutevel do Estado e promover a cidadania fiscalrdquo

Verifica-se portanto que o Programa de Educaccedilatildeo Fiscal ocupa posiccedilatildeo relevante natildeo apenas

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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no acircmbito da Administraccedilatildeo Tributaacuteria cearense mas se revela como uma importante poliacutetica de Esta-

do ao priorizar o ator e o sujeito social o cidadatildeo

Apesar de o termo ldquocidadania fiscalrdquo ser polissecircmico e complexo ainda pouco difundido na lite-

ratura seu conteuacutedo ultrapassa uma visatildeo meramente fiscalista focando-se em uma moral tributaacuteria

(TIPKE 2012) Cidadania fiscal eacute portanto um conceito bem mais amplo do que cidadania tributaacuteria

Inicia na essecircncia da cidadania perpassando a legitimaccedilatildeo do tributo e a moral tributaacuteria o que re-

forccedila sua qualificaccedilatildeo enquanto dever fundamental (BUFFON 2009) Passa ainda pelo controle social

dos recursos puacuteblicos sendo a questatildeo do gasto uma importante vertente da cidadania fiscal

Natildeo basta pois arrecadar Eacute importante reforccedilar a tributaccedilatildeo como instrumento de desenvolvi-

mento e natildeo apenas uma simples fonte de receita sendo a educaccedilatildeo fiscal um mecanismo para discu-

tir alguns dos principais problemas apontados no atual sistema tributaacuterio brasileiro tais como evasatildeo

fiscal estruturas impositivas regressivas bem como a funccedilatildeo extrafiscal tributo que gira em torno do

bem estar social e de melhoria da qualidade ambiental (CORBACHO CIBILS LORA 2013)

No Estado do Cearaacute o Programa de Educaccedilatildeo Fiscal eacute desenvolvido na Sefaz por intermeacutedio

da Ceacutelula de Educaccedilatildeo Fiscal (Ceduf) tendo completado 15 anos de existecircncia O trabalho eacute realizado

em parceria com a Secretaria da Receita Federal do Brasil da 3ordf Regiatildeo da Prefeitura Municipal de For-

taleza por meio das Secretarias de Financcedilas e Educaccedilatildeo do Municiacutepio da Secretaria de Educaccedilatildeo do

Estado e do Centro Regional da Esaf (Centresaf) que constituem o Grupo de Educaccedilatildeo Fiscal Estadual

(Gefe)4

Elaborar a poliacutetica econocircmico tributaacuteria do Estado administrar a Fazenda Puacuteblica (tributaccedilatildeo

arrecadaccedilatildeo e fiscalizaccedilatildeo) e gerenciar o sistema de execuccedilatildeo orccedilamentaacuteria financeira contaacutebil e

patrimonial da Administraccedilatildeo Puacuteblica satildeo as atribuiccedilotildees institucionais da Receita Estadual do Cearaacute

conforme consta do art 2ordm do Decreto nordm 29201 de 28 de fevereiro 2008 que aprova o regulamento

interno da Sefaz (CEARAacute 2008)

A legislaccedilatildeo tributaacuteria deve ser clara e transparente cuja interpretaccedilatildeo deve ser acessiacutevel agrave so-

ciedade e natildeo apenas aos teacutecnicos A elaboraccedilatildeo de um parecer juriacutedico e de uma informaccedilatildeo fiscal

deve ter como foco o interesse puacuteblico primaacuterio qual seja da sociedade e natildeo de grupos especiacuteficos

atendidos os princiacutepios da legalidade impessoalidade moralidade publicidade e eficiecircncia Deve-se

aplicar diuturnamente a Constituiccedilatildeo Federal Lei Maior de um Estado que estaacute acima de decretos

regulamentos e regimes especiais de tributaccedilatildeo tendo em vista o princiacutepio da supremacia da Consti-

tuiccedilatildeo tatildeo difundido na literatura e no Judiciaacuterio brasileiro

Eacute preciso portanto refletir acerca da funccedilatildeo do servidor puacuteblico e do papel que exerce no Esta-

do bem como ele pode (e deve) desempenhar as suas atividades de forma eacutetica e eficiente A celeri-

4 O Acordo de Cooperaccedilatildeo Teacutecnica nordm 0012013 (SefazSeducSefinSRBCentresaf) assinado em 20 de dezembro de 2013 institucionalizou o Grupo de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute com o objetivo de implantar executar e monitorar o PEF

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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dade e a eficiecircncia do processo administrativo tributaacuterio a maacutecula ao ldquojogo de influecircncia e de favoresrdquo

a transparecircncia das informaccedilotildees o combate agrave corrupccedilatildeo a fiscalizaccedilatildeo adequada a racionalidade e o

controle social do gasto puacuteblico e a excelecircncia no atendimento e no tratamento dispensados aos con-

tribuintes satildeo alguns valores que devem ser incorporados e seguidos natildeo apenas por uma imposiccedilatildeo

legal mas principalmente por ser uma obrigaccedilatildeo moral

Por outro lado a previsatildeo da Educaccedilatildeo Fiscal no Planejamento Estrateacutegico da Sefaz (2011-

2014) como um projeto prioritaacuterio natildeo eacute por si soacute suficiente para a transformaccedilatildeo de uma nova

cultura tributaacuteria por isso que o empoderamento do tema pelos servidores eacute emergencial O PEF natildeo

eacute impositivo devendo ser internalizado aos poucos a partir de um processo de legitimaccedilatildeo que eacute di-

nacircmico e contiacutenuo o que justifica a necessidade de accedilotildees endoacutegenas

2 O PROJETO EDUCACcedilAtildeO FISCAL ITINERANTE

Diante da necessidade de difundir os temas abordados pelo PEF para o puacuteblico interno o Se-

cretaacuterio da Fazenda Joatildeo Marcos Maia aprovou por intermeacutedio da Comunicaccedilatildeo Interna nordm 017 de

13 de maio de 2013 enviada pela Ceacutelula de Educaccedilatildeo Fiscal o Projeto Educaccedilatildeo Fiscal Itinerante como

uma accedilatildeo comemorativa dos 15 anos do PEF Cearaacute Em seguida o Projeto foi ratificado pelo Comitecirc

Executivo da Sefaz em Reuniatildeo Ordinaacuteria ocorrida no dia 6 de agosto de 2013

O objetivo do Projeto eacute disseminar de forma criacutetica e reflexiva os conteuacutedos da Educaccedilatildeo Fiscal

no local de trabalho do servidor e do colaborador fazendaacuterio No momento em que o agente do Fisco

incorporar a essecircncia da Educaccedilatildeo Fiscal eacute possiacutevel a praacutexis do PEF e por conseguinte uma nova cul-

tura tributaacuteria

Ao considerar a dificuldade que os servidores e colaboradores tecircm de se ausentar do seu local

de trabalho bem como o deslocamento para os que trabalham nas unidades do interior do Estado o

Projeto Educaccedilatildeo Fiscal Itinerante eacute desenvolvido por meio de visitas in loco Dessa forma a equipe da

Ceacutelula de Educaccedilatildeo Fiscal se dirige agraves unidades fazendaacuterias para dialogar sobre os temas abordados

pela Educaccedilatildeo Fiscal com os colegas

As visitas duram cerca de 1 hora e ocorrem durante o horaacuterio de expediente normal tendo sido

agendadas previamente com a gerecircncia de cada setor Nas unidades de atendimento como ocorre com

as Ceacutelulas de Execuccedilatildeo Tributaacuteria as visitas ocorrem durante o horaacuterio interno de 730h agraves 830h a fim

de que natildeo prejudique o atendimento ao puacuteblico que inicia agraves 830h Jaacute nas demais unidades o horaacuterio

eacute combinado com o gestor de modo que seja compatiacutevel com o exerciacutecio das atividades funcionais

Cada servidor recebe um kit do PEF contendo folder laacutepis bloco de anotaccedilotildees e marcador de

paacutegina Satildeo apresentados tambeacutem outros materiais pedagoacutegicos que satildeo utilizados nas escolas uni-

versidades ONGs e cursos a distacircncia

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

16

A metodologia se daacute por meio de slides com problematizaccedilotildees a fim de que os servidores re-

flitam sobre o conteuacutedo e exponham de maneira informal suas percepccedilotildees individuais e coletivas O

conhecimento natildeo eacute imposto mas construiacutedo a partir da participaccedilatildeo dos colegas numa abordagem

construtivista (FREIRE 1987) Os servidores da Ceduf estimulam o diaacutelogo de modo que se cria um

ambiente favoraacutevel a discussotildees e interaccedilatildeo entre os participantes

Satildeo feitas as seguintes indagaccedilotildees (i) Qual eacute a relaccedilatildeo da tributaccedilatildeo com a cidadania (ii) Qual

eacute a percepccedilatildeo do indiviacuteduo em relaccedilatildeo ao Estado (iii) O que vocecirc entende por Educaccedilatildeo Fiscal (iv) O

que significa ser servidor cidadatildeo (v) O que a cidadania tem a ver com as suas atividades na Sefaz (v)

Como ser um colaborador da Educaccedilatildeo Fiscal

A ideia eacute que com o desenvolvimento das respostas a partir da discussatildeo no grupo o partici-

pante possa elaborar um juiacutezo loacutegico dedutivo e reflexivo da Educaccedilatildeo Fiscal partindo do geral para

o especiacutefico Ao final espera-se que o servidor saia motivado a desenvolver a Educaccedilatildeo Fiscal nas suas

atividades funcionais motivo pelo qual satildeo distribuiacutedas fichas de colaboradores para diagnosticar

quem tem interesse em contribuir com o PEF

3 RESULTADOS OBTIDOS

No ano de 2013 o Projeto foi desenvolvido em 11 (onze) unidades na seguinte ordem Ceacutelula

de Execuccedilatildeo Tributaacuteria de Sobral Ceacutelula de Execuccedilatildeo Tributaacuteria da Aacutegua Fria Ceacutelula de Execuccedilatildeo Tri-

butaacuteria da Barra do Cearaacute Ceacutelula de Execuccedilatildeo Tributaacuteria do Centro Ceacutelula de Execuccedilatildeo Tributaacuteria da

Parangaba Ceacutelula de Execuccedilatildeo Tributaacuteria de Messejana Ceacutelula de Substituiccedilatildeo Tributaacuteria e Comeacutercio

Exterior Ceacutelula de Execuccedilatildeo Tributaacuteria de Caucaia Ceacutelula de Execuccedilatildeo Tributaacuteria de Maracanauacute Ceacutelula

de Gestatildeo Fiscal dos Macrossegmentos Econocircmicos e Ceacutelula de Gestatildeo Fiscal dos Setores Econocircmicos

Ao total foram 251 (duzentos e cinquenta um) servidores e colaboradores que participaram do Proje-

to demonstrando estarem abertos e disponiacuteveis para conhecer os temas abordados5

Apoacutes a realizaccedilatildeo das visitas foram encaminhadas por e-mail as seguintes perguntas aos par-

ticipantes (i) ldquoComo vocecirc avalia o Projeto Educaccedilatildeo Fiscal Itineranterdquo e (ii) ldquoEm que medida o Projeto

Educaccedilatildeo Fiscal Itinerante influenciou a sua percepccedilatildeo em relaccedilatildeo ao Programa de Educaccedilatildeo Fiscalrdquo

Dentre as manifestaccedilotildees recebidas destaca-se a opiniatildeo dos servidores da Ceacutelula de Execuccedilatildeo Tri-

butaacuteria (Cexat) da Parangaba6 ldquoO Projeto Educaccedilatildeo Fiscal Itinerante eacute um instrumento importante

agrave sociedade criando condiccedilotildees para uma relaccedilatildeo harmoniosa entre o Estado (fisco) e os cidadatildeos

sensibilizando-os para a funccedilatildeo socioeconocircmica de arrecadaccedilatildeo de tributosrdquo Destacaram ainda que

ldquoas parcerias com outros oacutergatildeos como CRC Secretaria de Educaccedilatildeo TCM e Escolas foram de muita im-

5 Segundo a Ceacutelula de Informaccedilatildeo e Normas (Cenor) em consulta realizada no dia 20 de janeiro de 2014 no Sistema PDF a Sefaz possui 1541 servidores em atividade e 1356 servidores aposentados6 A compilaccedilatildeo das respostas dos servidores da Cexat Parangaba foi encaminhada pela colega Dulcicleacuteia Gomes Palheta

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

17

portacircncia para que os jovens e adultos tenham uma consciecircncia eacutetica e justa com o trato da aplicaccedilatildeo

dos recursosrdquo

O servidor Manoel Ferreira Lima Neto lotado na Ceacutelula de Execuccedilatildeo Tributaacuteria (Cexat) de Mes-

sejana expocircs o seguinte ldquoAvalio de forma positiva este trabalho de esclarecimento da importacircncia da

Educaccedilatildeo Fiscal e desejo que este projeto se estenda agraves escolas O Projeto ampliou meu conhecimento

sobre o assunto pois tinha uma visatildeo muito fiscalrdquo

Os servidores Carlos Eduardo Marino e Joselias Lopes lotados na Ceacutelula de Gestatildeo Fiscal dos

Macrossegmentos Econocircmicos (Cemas) destacaram a importacircncia do envolvimento da sociedade nas

accedilotildees da Educaccedilatildeo Fiscal

A iniciativa da Ceacutelula de Educaccedilatildeo Fiscal eacute fundamental para que os servidores da Se-cretaria da Fazenda compreendam a necessidade das accedilotildees desenvolvidas no acircmbito da Educaccedilatildeo Fiscal principalmente as externas A atividade de arrecadar e fiscalizar eacute estigmatizada por alguns setores sociais Desta forma buscar o apoio da sociedade eacute de grande importacircncia para a Administraccedilatildeo Tributaacuteria Para tanto eacute preciso levar aos agentes sociais informaccedilotildees quanto aos benefiacutecios gerados pelo uso dos valores arrecadados bem como esclarecer que a evasatildeo fiscal aleacutem de privar o Estado dos seus recursos resulta no enriquecimento indevido do sonegador

Na Ceacutelula de Gestatildeo Fiscal dos Setores Econocircmicos (Cesec) a servidora Ana Paula Bezerra Pi-nheiro lotada na Setorial Alimentos afirmou que o Projeto ldquotem tudo a ver com a nossa missatildeo de servidor puacuteblicordquo Acrescentou ainda que

O Projeto Educaccedilatildeo Fiscal Itinerante foi muito elucidativo Durante a apresentaccedilatildeo pu-demos refletir melhor sobre a relaccedilatildeo da cidadania com a tributaccedilatildeo os fundamentos da educaccedilatildeo fiscal a minha relaccedilatildeo como servidor puacuteblico com a educaccedilatildeo fiscal o que a sociedade espera de noacutes servidores e o que podemos oferecer para que esta sociedade cresccedila e se fortaleccedila atraveacutes da cidadania

Questionado sobre a influecircncia do Projeto para a percepccedilatildeo interna do Programa de Educaccedilatildeo

Fiscal o gestor da Cesec Raimundo Frutuoso de Oliveira Junior apontou a necessidade de desmistifi-

car o PEFHaacute na Sefaz principalmente nas atividades fiscalizatoacuterias um desconhecimento das atividades-meio desenvolvidas na nossa casa sendo que a Educaccedilatildeo Fiscal natildeo foge a este paradigma O que o Projeto Educaccedilatildeo Fiscal Itinerante faz eacute desmistificar tal Pro-grama demonstrando a sua importacircncia institucional e social funcionando tambeacutem como um meio de incentivo para o engajamento dos servidores fazendaacuterios nestas atividades Por isso entendo que o Projeto eacute de importacircncia extrema para a Sefaz por albergar a funccedilatildeo social da nossa instituiccedilatildeo

Em 2014 pretende-se concluir as visitas nas outras unidades da Capital e fomentar o processo

de interiorizaccedilatildeo do PEF Aleacutem disso a equipe da Ceduf retornaraacute aos locais inicialmente visitados a

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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fim de discutir temas especiacuteficos sugeridos pelos servidores e captar o niacutevel de internalizaccedilatildeo da Edu-

caccedilatildeo Fiscal

Diante da boa aceitaccedilatildeo do Programa pelo puacuteblico interno seraacute oferecido em 2014 um Curso

de Formaccedilatildeo de Facilitadores em Educaccedilatildeo Fiscal com o propoacutesito de aprofundar o conhecimento do

PEF e capacitar servidores para disseminar a Educaccedilatildeo Fiscal em sua unidade e para a sociedade civil

fortalecendo assim o grupo de colaboradores do PEF

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Antes de servir ao puacuteblico o servidor eacute cidadatildeo O servidor puacuteblico fazendaacuterio eacute essencial

para que o Estado possa efetivamente realizar a justiccedila social principalmente no acircmbito do Estado

do Cearaacute jaacute conhecido por seus inuacutemeros problemas sociais Dessa forma ao fazer parte do corpo

funcional da Administraccedilatildeo Tributaacuteria deve-se ter em mente a dupla funccedilatildeo que exerce cidadatildeo e

agente do Fisco

A Educaccedilatildeo Fiscal necessariamente perpassa por todas as dimensotildees de uma Administraccedilatildeo

Tributaacuteria devendo assim ser disseminada para (e pelo) os atores que fazem o Fisco cearense

Os depoimentos relataram a importacircncia do Projeto Educaccedilatildeo Fiscal Itinerante e ressaltaram a

mudanccedila de percepccedilatildeo em relaccedilatildeo ao PEF A cultura institucional ainda eacute fiscalista mas novos cami-

nhos se abrem a partir do momento em que o servidor se mostra disponiacutevel para conhecer aprender e

vivenciar a cidadania fiscal Ateacute porque a legitimidade e a sustentabilidade do Programa de Educaccedilatildeo

Fiscal dependem de sua incorporaccedilatildeo pelo servidor fazendaacuterio Por ser uma mudanccedila de cultura eacute um

processo gradual e contiacutenuo

Dentro dessa perspectiva as entidades representativas dos servidores do Fisco cearense Sindica-

to dos Fazendaacuterios do Cearaacute (Sintaf) Associaccedilatildeo dos Auditores e Fiscais do Tesouro do Estado do Cearaacute

(Auditece) Associaccedilatildeo dos Aposentados Fazendaacuterios do Cearaacute (Aafec) e Uniatildeo dos Funcionaacuterios Fazen-

daacuterios do Estado do Cearaacute (UFFEC) exercem um importante papel para desenvolver a Educaccedilatildeo Fiscal

Sob a perspectiva de um sindicalismo social e cidadatildeo e natildeo simplesmente corporativo elas podem

disseminar a Educaccedilatildeo Fiscal como uma accedilatildeo institucional fomentando a essecircncia do servidor cidadatildeo

Eacute preciso romper o dogma de que o conhecimento do tributo eacute algo distante e complexo limi-

tado aos especialistas em Tributaccedilatildeo e Financcedilas Puacuteblicas De nada adianta o conhecimento adquirido

se ele natildeo eacute compartilhado principalmente com a sociedade que eacute a detentora legiacutetima do dever

fundamental de pagar tributo e de fiscalizar a utilizaccedilatildeo dos recursos puacuteblicos

Por fim eacute importante que o servidor no exerciacutecio de sua cidadania controle e fiscalize os atos

da Administraccedilatildeo Puacuteblica zelando pela coisa puacuteblica e fortalecendo a eacutetica institucional

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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REFEREcircNCIAS

BRASIL Ministeacuterio da Fazenda Escola Superior de Administraccedilatildeo Fazendaacuteria Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal (PNEF) Disponiacutevel em wwwesaffazendagovbr Acesso em 10 jan 2014

BUFFON Marciano Tributaccedilatildeo e dignidade humana entre os direitos e deveres fundamentais Porto Alegre Livraria do Advogado 2009

CEARAacute Decreto nordm 25326 de 23 de dezembro de 1998 Aprova a estrutura organizacional da Secre-taria da Fazenda e daacute outras providecircncias DOE 26 dez 1998

______ Decreto nordm 28900 de 27 de dezembro de 2007 Aprova a estrutura organizacional da Secre-taria da Fazenda e daacute outras providecircncias DOE 28 dez 2007

______ Decreto nordm 29201 de 28 de fevereiro de 2008 Aprova o regulamento da Secretaria da Fazen-da e daacute outras providecircncias DOE 29 fev 2008

______ Secretaria da Fazenda Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute (PEF Cearaacute) Dispo-niacutevel em wwwsefazcegovbr Acesso em 10 jan 2014

CORBACHO Ana CIBILS Vicente Fretes LORA Eduardo Recaudar no basta los impuestos como ins-trumento de desarrollo Washington Banco Interamericano de Desarrollo 2013

FREIRE Paulo Pedagogia do oprimido 17 ed Rio de Janeiro Paz e Terra 1987

RIVILLAS Borja Diacuteas VILARDEBOacute Andreacute MOTA Luiza Ondina Santos Educaccedilatildeo Fiscal no Brasil e no mundo In VIDAL Eloiacutesa Maia (org) Educaccedilatildeo Fiscal e Cidadania Fortaleza Ediccedilotildees Demoacutecrito Ro-cha 2010

TIPKE Klaus Moral Tributaacuteria do Estado e dos Contribuintes Porto Alegre Sergio Antocircnio Fabris

2012

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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PROGRAMA DE EDUCACcedilAtildeO FISCAL NO BRASIL ENFATIZAR O GASTO PUacuteBLICO

Denise Lucena Cavalcante1

SUMAacuteRIO Introduccedilatildeo 1 Aleacutem da arrecadaccedilatildeo 2 O enfoque dos PEFacutes no necessaacuterio cumprimento das finalidades estatais 3 A caricatura do Estado Fiscal na imagem do leatildeo fazendaacuterio 4 A educaccedilatildeo fiscal em prol do servidor fazendaacuterio o novo perfil do servidor puacuteblico Consideraccedilotildees finais Referecircncias

INTRODUCcedilAtildeO

Analisando os programas de educaccedilatildeo fiscal no Brasil percebemos que eles evoluiacuteram bas-

tante nos uacuteltimos anos e bem agiram quando ampliaram seus objetivos transpondo a arrecadaccedilatildeo

e passaram a enfocar tambeacutem como meta a atuaccedilatildeo no cuidado da sociedade em relaccedilatildeo ao papel

econocircmico e social dos tributos englobando esclarecimentos formais sobre a aplicaccedilatildeo dos recursos2

Cumprir essa tarefa poreacutem natildeo eacute faacutecil principalmente quando haacute outros oacutergatildeos estatais praticando

atos diaacuterios de desperdiacutecio corrupccedilatildeo e maacute gestatildeo dos recursos auferidos do suor de cada brasileiro

A sociedade natildeo se satisfaz com as informaccedilotildees dos valores arrecadados pelo Fisco uma

vez que o crescimento do Paiacutes ocorre abaixo do esperado Frequentemente os cidadatildeos brasileiros

expotildeem sua insatisfaccedilatildeo no momento do pagamento de seus tributos O mecircs de janeiro represen-

ta bem esta afirmaccedilatildeo pois eacute a ocasiatildeo em que se cobram os impostos anuais como IPTU e IPVA

Em abril temos novas manifestaccedilotildees de rejeiccedilatildeo social com a declaraccedilatildeo do Imposto de Renda Satildeo

momentos bem contingentes em que a populaccedilatildeo brasileira se manifesta em relaccedilatildeo agrave tributaccedilatildeo

do Paiacutes Logo em seguida parece que se esquecem de tudo e voltam a sua rotina diaacuteria Como bem

acentua Ricardo Lobo Torres (1991 p 151) no Brasil sempre foi muito tecircnue a resistecircncia agrave opressatildeo

tributaacuteria tanto na via do pensamento como das soluccedilotildees institucionais Daiacute a importacircncia de os fis-

cos persistirem em seus programas para atuarem como parceiros da sociedade brasileira no combate

1 Poacutes-Doutora pela Universidade de Lisboa Doutora pela PUCSP Professora de Direito Tributaacuterio e Financeiro da gradua-ccedilatildeo e poacutes-graduaccedilatildeo (UFC) Procuradora da Fazenda Nacional E-mail denilucfortalnetcombr2 Na apresentaccedilatildeo do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal da SefazCE tem-se ldquoO Programa de Educaccedilatildeo Fiscal - PEF se fun-damenta na conscientizaccedilatildeo dos cidadatildeos sobre o papel econocircmico e social dos tributos Econocircmico quando se volta agrave funccedilatildeo de otimizaccedilatildeo da receita puacuteblica social quando se volta para aplicaccedilatildeo desses recursos objetivando benefiacuteciar a populaccedilatildeordquo Disponiacutevel em httpwwwsefazcegovbrcontentaplicacaointernetprogramas_campanhasgeradosproje-to_apresentacaoasp Acesso em 12 jan 2014

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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agrave corrupccedilatildeo e maacute utilizaccedilatildeo dos recursos puacuteblicos

Merece aplausos a Secretaria da Fazenda do Estado do Cearaacute que ampliou sua missatildeo ante-

riormente focada na arrecadaccedilatildeo tributaacuteria passando a considerar como meta a captaccedilatildeo e geraccedilatildeo

de recursos financeiros para o desenvolvimento sustentaacutevel do Estado e promover a cidadania fiscal

Da mesma forma enaltecemos o trabalho da Ceacutelula de Educaccedilatildeo Fiscal da SefazCE na ediccedilatildeo

de obra comemorativa aos 15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal no Cearaacute de que temos a honra

de participar e exprimir algumas reflexotildees e sugestotildees para os passos seguintes desse Programa de

sucesso

1 ALEacuteM DA ARRECADACcedilAtildeO

Insistimos na ideia que o orccedilamento puacuteblico tem que ser assunto esclarecido e debatido social-

mente3 A sociedade brasileira natildeo pode mais permanecer silente e afastada das decisotildees financeiras

do Paiacutes A ideia do orccedilamento como um direito de participaccedilatildeo cidadatilde remonta agrave Idade Meacutedia e sem-

pre satildeo alvos de criacuteticas o forccedilado distanciamento popular e os constantes conflitos entre o Direito e

o Poder como jaacute denunciava Paul Laband em sua claacutessica obra sobre o Direito Orccedilamentaacuterio4

O orccedilamento eacute uma previsatildeo de receitas e despesas puacuteblicas Quanto agraves receitas a maior parte

eacute oriunda dos tributos e soacute cabe ao cidadatildeo pagaacute-los e caso natildeo o faccedilam o Estado jaacute tem todos os

meios devidos para efetivar a devida cobranccedila inclusive pela via judicial mediante a Execuccedilatildeo Fiscal

(Lei n 683080) Isto jaacute estaacute devidamente organizado pelo Poder Puacuteblico

Jaacute em relaccedilatildeo agraves despesas natildeo obstante tenha expressamente previsto na Lei de Responsabi-

lidade Fiscal5 que a previsatildeo dos gastos deveraacute sempre constar nos planos orccedilamentaacuterios na praacutetica

sabemos que tais orccedilamentos natildeo satildeo cumpridos

O orccedilamento tem como uma das suas principais finalidades a regulaccedilatildeo do gasto puacuteblico e

essa regulaccedilatildeo deve tambeacutem ser feita por intermeacutedio do controle social6 Dado que a receita e a

despesa natildeo podem estar em desacordo eacute preciso que o controle da sociedade atue com lentes de

aumento para checar as contas puacuteblicas e o estiacutemulo dos oacutergatildeos vinculados agrave arrecadaccedilatildeo tais como

3 Sobre o tema ver CAVALCANTE 2006 4 ldquoEsta exaltacioacuten eminentemente poliacutetica del Derecho presupuestario hacieacutendolo sobresalir de las restantes teoriacuteas juriacutedi-co-puacuteblicas no ha sido en modo alguno beneficiosa para el conocimiento desapasionado y objetivo del mismo Los deseos y afanes poliacuteticos consiguieron imponerse y llevar a la confusioacuten a la concepcioacuten juriacutedica pese a los esfuerzos hechos para mantenerse en el plano del Derecho positivo La vinculacioacuten de los ideales poliacuteticos a las deducciones del Derecho positivo es causa de los mayores perjuicios tanto para la poliacutetica como para el conocimiento del Derecho Para la consecucioacuten de los objetivos poliacuteticos es francamente peligroso entregarse a la ilusioacuten de poseer ya positivamente como derecho lo que se cree estar obligado a formular como imperativo en favor de una provechosa organizacioacuten del Estadordquo (LABAND 1979 p 3) 5 ldquoArt 15 Seratildeo consideradas natildeo autorizadas irregulares e lesivas ao patrimocircnio puacuteblico a geraccedilatildeo de despesa ou assun-ccedilatildeo de obrigaccedilatildeo que natildeo atendam o disposto nos arts 16 e 17 Art 16 A criaccedilatildeo expansatildeo ou aperfeiccediloamento de accedilatildeo governamental que acarrete aumento da despesa seraacute acompanhado de I - estimativa do impacto orccedilamentaacuterio-financeiro no exerciacutecio em que deva entrar em vigor e nos dois subsequumlentes II - declaraccedilatildeo do ordenador da despesa de que o au-

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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os programas de educaccedilatildeo fiscal torna-se muito importante

Entendemos que os programas de educaccedilatildeo fiscal devem insistir tambeacutem no esclarecimento

da programaccedilatildeo da despesa puacuteblica antecipando-se assim ao proacuteprio controle das despesas jaacute efe-

tuadas e permitindo a participaccedilatildeo social na programaccedilatildeo preacutevia de tais despesas

A informaccedilatildeo eacute essencial para o controle social E a era da transparecircncia fiscal exige a utiliza-

ccedilatildeo de condutores eficientes para a compreensatildeo das informaccedilotildees estatais Simplesmente disponi-

bilizar dados contaacutebeis incompreensiacuteveis de informaccedilotildees puacuteblicas natildeo alcanccedila o objetivo da lei da

transparecircncia fiscal7

2 O ENFOQUE DOS PEFrsquoS NO NECESSAacuteRIO CUMPRIMENTO DAS FINALIDADES ESTATAIS

Os programas de educaccedilatildeo fiscal devem primar cada vez mais para a questatildeo do cumpri-

mento das obrigaccedilotildees estatais Os avanccedilos devem ser notados pela sociedade caso contraacuterio ela

continuaraacute desacreditada no que concerne agraves poliacuteticas fiscais E essa tarefa natildeo eacute nada faacutecil quando

a sociedade natildeo estaacute satisfeita e os direitos sociais natildeo estatildeo sendo cumpridos pelo Estado Satildeo

constantes as piadas nos meios de comunicaccedilatildeo e o Estado fica sem argumentos quando a realidade

comprova sua ineficiecircncia como nos exemplos a seguir

mento tem adequaccedilatildeo orccedilamentaacuteria e financeira com a lei orccedilamentaacuteria anual e compatibilidade com o plano plurianual e com a lei de diretrizes orccedilamentaacuterias sect 1o Para os fins desta Lei Complementar considera-se I - adequada com a lei orccedilamentaacuteria anual a despesa objeto de dotaccedilatildeo especiacutefica e suficiente ou que esteja abrangida por creacutedito geneacuterico de forma que somadas todas as despesas da mesma espeacutecie realizadas e a realizar previstas no programa de trabalho natildeo sejam ultrapassados os limites estabelecidos para o exerciacutecio II - compatiacutevel com o plano plurianual e a lei de diretrizes orccedilamentaacuterias a despesa que se conforme com as diretrizes objetivos prioridades e metas previstos nesses instrumentos e natildeo infrinja qualquer de suas disposiccedilotildees sect 2o A estimativa de que trata o inciso I do caput seraacute acompanhada das pre-missas e metodologia de caacutelculo utilizadas sect 3o Ressalva-se do disposto neste artigo a despesa considerada irrelevante nos termos em que dispuser a lei de diretrizes orccedilamentaacuterias sect 4o As normas do caput constituem condiccedilatildeo preacutevia para I - empenho e licitaccedilatildeo de serviccedilos fornecimento de bens ou execuccedilatildeo de obras II - desapropriaccedilatildeo de imoacuteveis urbanos a que se refere o sect 3o do art 182 da Constituiccedilatildeordquo6 Assim expotildee Ricardo Lobo Torres (2000 p 9) ldquoUma das caracteriacutesticas principais do constitucionalismo atual eacute a sua abertura para a participaccedilatildeo social e para o pluralismo de interesses Sob a influecircncia do princiacutepio da subsidiariedade que sinaliza no sentido do primado da sociedade sobre o Estado o orccedilamento se abre para a participaccedilatildeo social durante a sua elaboraccedilatildeo execuccedilatildeo e controle aleacutem de se deixar tocar pelas demandas em torno dos direitos difusos promovidas por oacuterccedilatildeos societais em movimento que comeccedila a ganhar corpo nos uacuteltimos anosrdquo7 Sobre o tema ver CAVALCANTE 2013 p 119-137

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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A desordem das poliacuteticas fiscais estaacute frequentemente demonstrada nas charges contemporacirc-

neas E essas tambeacutem satildeo expressotildees de manifestaccedilatildeo social e natildeo devem ser ignoradas As charges

com sua plasticidade anaacuterquica tambeacutem representam os desabafos cotidianos e como bem assinala

Slavoc Zizek (2008)8 a verdade tem a estrutura de ficccedilatildeo Se os desenhos acima tivessem a foto real

de cidadatildeos e governantes atuais certamente a nossa reaccedilatildeo seria bem diferente e bem mais revol-

tante poreacutem em forma de piada rimos ingenuamente da nossa proacutepria desgraccedila

A sociedade deve ficar alerta para a importantiacutessima questatildeo da adequada aplicaccedilatildeo dos recur-

sos puacuteblicos e este eacute um espaccedilo que os programas de educaccedilatildeo fiscal devem enfatizar cada dia mais

Quando o alerta para a tributaccedilatildeo e o gasto puacuteblico vem dos proacuteprios oacutergatildeos estatais eles ficam com

maior credibilidade Exemplo que merece ser aqui citado eacute a campanha do Sindicato dos Procuradores

da Fazenda Nacional intitulada ldquoQuanto custa o Brasilrdquo9 que informa o peso da carga tributaacuteria nos

produtos e serviccedilos consumidos pela sociedade brasileira muito bem representado pela formiguinha

trabalhadora carregando o peso dos tributos

8 ldquo lsquoA verdade tem a estrutura da ficccedilatildeorsquo ndash haacute exemplo melhor dessa tese que os desenhos animados em que a verdade sobre a ordem social existente eacute mostrada diretamente de uma maneira jamais permitida no cinema narrativo com atores lsquode verdadersquo Pensemos na imagem de lutas agressivas entre animais nos desenhos animados a luta impiedosa pela so-brevivecircncia armadilhas e ataques violentos a exploraccedilatildeo dos outros como parasitas Se a mesma histoacuteria fosse contada num longa metragem com atores lsquode verdadersquo sem duacutevida seria censurada ou descartada por ser ridiacutecula e excessivamente pessimistardquo (ZIZEK 2008 p 456)9 Disponiacutevel em lthttpwwwquantocustaobrasilcombrgt Acesso em 14 jan 2014

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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O principal meacuterito da campanha eacute esclarecer a sociedade a respeito do custo dos tributos inde-

vidamente oculto nas relaccedilotildees de consumo sendo muito uacutetil na implementaccedilatildeo da Lei n 127412012

ao determinar que por ocasiatildeo da venda ao consumidor de mercadorias e serviccedilos deveraacute constar

dos documentos fiscais ou equivalentes a informaccedilatildeo do valor aproximado correspondente agrave totali-

dade dos tributos federais estaduais e municipais cuja incidecircncia influi na formaccedilatildeo dos respectivos

preccedilos de venda Infelizmente ateacute o momento referida lei natildeo estaacute tendo o cumprimento devido

3 A CARICATURA DO ESTADO FISCAL NA IMAGEM DO LEAtildeO FAZENDAacuteRIO

O Estado contemporacircneo atravessa uma grande crise de moralidade decorrente de vaacuterios mo-

tivos dentre os quais destacamos a atuaccedilatildeo ineficiente das instituiccedilotildees agravada pelos inuacutemeros atos

de corrupccedilatildeo que hoje satildeo divulgados diariamente pela imprensa brasileira

O Estado Democraacutetico de Direito tem que ser levado a seacuterio e qualquer imagem que o destorccedila

deve ser esquecida como o siacutembolo do leatildeo fazendaacuterio Se for necessaacuterio um desenho figurativo do

fisco contemporacircneo devemos pensar em outro e nos livramos definitivamente da desgastada ima-

gem do leatildeo fazendaacuterio E sobre isto jaacute haviacuteamos nos manifestado

O Direito Tributaacuterio tambeacutem tem que se adaptar aos novos paradigmas da poacutes-mo-dernidade minimizando seu aspecto coercivo e burocraacutetico e muitas vezes ameaccedila-dor conforme exposto pelo proacuteprio siacutembolo da Receita Federal do Brasil que ainda hoje eacute a figura do ldquoleatildeordquo como animal representativo deste oacutergatildeo A simbologia leo-nina eacute completamente incompatiacutevel com o atual Estado Democraacutetico de Direito aleacutem de prejudicar a imagem do Fisco que insiste em uma figura propagandista da deacutecada de setenta onde ainda reinava a ditadura militar no Brasil As grandes mudanccedilas no sistema tributaacuterio brasileiro devem comeccedilar nos pequenos detalhes (sugere-se desde logo a extinccedilatildeo do inapropriado siacutembolo do leatildeo) partindo da mudanccedila burocraacutetica dos balcotildees de atendimento dos oacutergatildeos fazendaacuterios ateacute a reafirmaccedilatildeo dos princiacutepios constitucionais tributaacuterios (CAVALCANTE 2011 p 251)

De uma vez por todas o leatildeo natildeo eacute uma imagem adequada ao Estado fiscal O leatildeo eacute feroz e

considerado o rei da selva O Estado natildeo eacute uma selva e o fisco natildeo eacute a realeza Natildeo estamos mais na

Idade Meacutedia Aliaacutes nem na Antiguidade o leatildeo tinha uma imagem positiva Dante Alighieri em sua

memoraacutevel obra Divina Comeacutedia ao discorrer sobre as principais transgressotildees humanas utilizou

alegoricamente o leatildeo como siacutembolo da violecircncia10

Infelizmente essa figura do leatildeo fazendaacuterio eacute tambeacutem destaque do programa Cidadania Fiscal

10 E assim comenta o tradutor da obra Iacutetalo Mauro ldquoDante se encontra perdido numa acuteselva selvagemacute que representa o resultado do extravio da certa via da virtude Apoacutes uma noite inteira de anguacutestia ele consegue escapar da selva mas eacute impedido seguidamente por trecircs feras Alegoricamente ele natildeo estaacute livre da investida das trecircs transgressotildees principais

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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onde o ldquoleatildeozinhordquo eacute o iacutecone do Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal11 voltado para o puacuteblico de

7 a 14 anos O Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal ndash PNEF eacute de oacutetima qualidade e visa a alcanccedilar

os educandos do Ensino Fundamental por meio da linguagem virtual A mensagem ali repassada eacute

adequada e oportuna contudo consideramos a insistecircncia na figura leonina totalmente indevida

(Canto XI versos 22-66) que satildeo incontinecircncia violecircncia e fraude exemplificada pelas trecircs feras respectivamente a onccedila o leatildeo e a loba que o impediam de seguir o caminho do monte que ele avista iluminado jaacute pelo Sol da Graccedila divinardquo (ALI-GHIERI 1998 p 25)11 Disponiacutevel em lthttpleaozinhoreceitafazendagovbrgt Acesso em 13 jan 2014

(Iacutecone utilizado na paacutegina eletrocircnica da Receita Federal do Brasil)

O ldquoleatildeozinhordquo realmente natildeo convence e soacute aumenta o desgaste da imagem do Fisco prevale-

cendo nas ilustraccedilotildees abundantemente encontradas nos perioacutedicos nacionais

A educaccedilatildeo fiscal deve focar seus esforccedilos cada vez mais na recuperaccedilatildeo da imagem do Fisco e

evitar siacutembolos que possam gerar polecircmicas Os servidores fazendaacuterios contemporacircneos que atuam

com zelo e dedicaccedilatildeo natildeo merecem isto Natildeo podemos mais deixar que imagens antigas de servido-

res ineficientes e de um Estado arbitraacuterio ainda sejam exaltadas Eacute preciso enfatizar que os atuais ser-

vidores fazendaacuterios assumiram seus cargos em decorrecircncia de rigorosos concursos puacuteblicos Sabem o

que devem fazer e seu trabalho deve ser reconhecido por seus meacuteritos

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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4 A EDUCACcedilAtildeO FISCAL EM PROL DO SERVIDOR FAZENDAacuteRIO O NOVO PERFIL DO SERVIDOR PUacuteBLICO

Constatamos que muitas das criacuteticas feitas ao servidor puacuteblico decorrem de atos que eles rea-

lizaram no estrito cumprimento do dever legal uma vez que o ato administrativo eacute vinculado As leis

fiscais confusas e duacutebias transformam os funcionaacuterios em verdadeiros ldquobodes expiatoacuteriosrdquo de uma

poliacutetica fiscal mal elaborada conforme bem denuncia Klaus Tipke (2002 p 97)

Ahora bien si las leyes tributarias son injustas la Administracioacuten tributaria vinculada por dichas leyes no puede producir justicia alguna Por el contrario cuanto maacutes se apliquen tales leyes injustas maacutes sufriraacute la justicia tributaria Puesto que ndash injustamente ndash muchos contribuyentes no atribuyen los defectos de las leyes tributarias al lejano y anoacutenimo legislador sino al funcionario de Hacienda es eacuteste quien recibe los golpes y se convierte en ldquochivo expiatorio de una poliacutetica fiscal maltrechardquo Los responsables en el poder legislativo y en el ejecutivo esperan que los funcionarios actuacuteen como si no existiera defecto alguno

Outro ponto questionaacutevel satildeo as metas contemporacircneas da gestatildeo de governo exigidas por

vezes de agentes poliacuteticos que desconhecem a estrutura operacional dos proacuteprios oacutergatildeos de arreca-

daccedilatildeo distorcendo a funccedilatildeo dos agentes fiscais As metas com base na produtividade por exemplo

podem ser extremamente infrutiacuteferas O que eacute ser produtivo num oacutergatildeo de arrecadaccedilatildeo controle e

fiscalizaccedilatildeo Emitir autos de infraccedilatildeo Arrecadar a qualquer custo Julgar volumes de processos com-

plexos de qualquer jeito Se a produtividade representar nuacutemeros assim ocorreraacute

Quem atua diretamente na administraccedilatildeo fazendaacuteria sabe muito bem do que aqui falamos

A complexidade de cada caso eacute o que determina o tempo de execuccedilatildeo do trabalho A eficiecircncia do

serviccedilo puacuteblico deve ser medida em cada caso e natildeo por mera produtividade Em cada situaccedilatildeo o

servidor tem que observar os direitos fundamentais do cidadatildeo-contribuinte as limitaccedilotildees ao poder

de tributar previstas na Constituiccedilatildeo a lei para o caso concreto enfim um trabalho minucioso e

complexo que exige teacutecnica e conhecimento profundo do sistema juriacutedico Natildeo fosse a necessidade

de observar todo o sistema partindo das premissas constitucionais faacutecil seria o trabalho e prova-

velmente jaacute estaria delegado para um veloz programa de informaacutetica afinal o computador eacute mais

raacutepido do que a mente humana Os dados numeacutericos natildeo representam a realidade do bom serviccedilo

A mentalidade que predomina hoje com base na produccedilatildeo natildeo eacute compatiacutevel agrave complexidade do

serviccedilo da administraccedilatildeo fazendaacuteria

Outro grande equiacutevoco que temos visto se alastrar na administraccedilatildeo fazendaacuteria eacute a comparaccedilatildeo

do Estado com uma grande ldquoempresardquo e consequentemente o cidadatildeo-contribuinte como um mero

ldquoconsumidorrdquo A relaccedilatildeo entre Estado e cidadatildeo natildeo se encerra no Coacutedigo do Consumidor vai muito

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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mais aleacutem Os agentes poliacuteticos de passagem deveriam entender mais da Constituiccedilatildeo Estado natildeo eacute

empresa privada e o governante natildeo eacute seu dono O Estado existe em funccedilatildeo da sociedade e seu poder

eacute limitado pelos direitos individuais servindo estes de barreiras riacutegidas ao poder estatal Assim prevecirc

a saacutebia liccedilatildeo de Geraldo Ataliba (1985 p 139)

A cidadania corresponde portanto um feixe de privileacutegios decorrentes da condiccedilatildeo da titularidade da coisa puacuteblica Desses os mais conspiacutecuos estatildeo na imunidade juriacute-dica aos excessos estatais no direito agrave resistecircncia aos abusos na prerrogativa de res-ponsabilizar os agentes excessivos e no direito agrave tutela jurisdicional contra os mesmos A cidadania criando o poder ao mesmo tempo estabelece quais os seus limites ou o periacutemetro dentro do qual tal poder haacute de circunscrever-se Assim a plenitude do prin-ciacutepio em mateacuteria de direito puacuteblico assume radical universalidade quando se trata de mateacuteria constitucional (definiccedilatildeo das liberdades puacuteblicas e organizaccedilatildeo do poder agrave vista de sua promoccedilatildeo e proteccedilatildeo mediante organizaccedilatildeo estatal) As liberdades puacuteblicas inscritas na Constituiccedilatildeo satildeo as mais expressivas balizas ao poder do Estado Configura usurpaccedilatildeo constitui-se na mais grave violaccedilatildeo constitucional o exerciacutecio ndash seja pelo Legislativo seja pelo Executivo seja pelo Judiciaacuterio ndash de ato de poder de todo tipo ou de qualquer ato de forccedila voltado contra os cidadatildeos ultrapassando essas mesmas barreiras

A prevalecircncia exagerada do Estado gestor enseja seacuterias distorccedilotildees inclusive do Direito que tem

sido reduzido a um simples saber tecnoloacutegico como bem ressalta Teacutercio Sampaio Ferraz Junior (2007

p 429)12 ldquomesmo o direito na loacutegica do Estado gestor eacute mero instrumento de atuaccedilatildeo de controle

de planejamento tornando-se a ciecircncia juriacutedica um verdadeiro saber tecnoloacutegicordquo

O servidor puacuteblico hoje tem que ir aleacutem da teacutecnica Haacute de ter uma visatildeo global conhecer o

sistema ser cortecircs ser eficiente aacutegil enfim satildeo tantas as exigecircncias que ele se encontra pressionado

por todos os lados De uma parte o cidadatildeo-contribuinte exigindo o devido tratamento e velocidade

das atuaccedilotildees e de outra o gestor exigindo resultados a qualquer custo E qual eacute o investimento que

estaacute sendo feito para estes ldquosuperfuncionaacuteriosrdquo que satildeo pressionados para cumprir horaacuterio executar

eficientemente suas tarefas suprir as deficiecircncias materiais de suas reparticcedilotildees resolver casos com-

plexos em instituiccedilotildees que sequer tecircm bibliotecas especializadas atuar em processos digitais com

12 E assim conclui com propriedade o autor ldquoEm conclusatildeo aplicando analogicamente Arendt podemos dizer por uacuteltimo que o Estado gestor burocraacutetico e tecnocraacutetico tem por imagem adequada agrave estrutura da cebola em cujo centro em uma espeacutecie de espaccedilo vazio acha-se o liacuteder ou melhor a lideranccedila E o que quer que a lideranccedila faccedila quer se integre no organismo poliacutetico como uma hierarquia de competecircncia ou oprima seus suacuteditos como um tirano ela o faz de dentro e natildeo de fora para cima Todas as partes extraordinaacuterias muacuteltiplas do movimento desse todo as organizaccedilotildees de frente poliacutetica as sociedades profissionais os efetivos dos partidos e a organizaccedilatildeo partidaacuteria as formaccedilotildees de elite e os grupos de policiamento relacionam-se de tal maneira que cada uma delas constitue camadas da cebola isto eacute mundo exterior para a cada interna e mundo interior para externa A cebola ou o poder tecnocraacutetico proporciona a cada uma de suas camadas a ficccedilatildeo de mundo normal ao lado de uma consciecircncia de ser diferente dele A estrutura de uma cebola torna enfim o Estado um sistema organizacional do poder agrave prova de choque contra a fatualidade do mundo real o que quer que aconteccedila ele eacute necessaacuteriordquo (FERRAZ JUacuteNIOR 2007 p 429)13 No capiacutetulo A BABA DA LESMA o personagem Dom Rigoberto desabafa ao seu chefe ldquoEmbora eu saiba de sobra que o

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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equipamentos ultrapassados e ainda levar trabalhos extras para concluir em casa

Temos de admitir que muitos de noacutes conhecemos alguns servidores que seguem agrave risca a ima-

gem cocircmica descrita pelo gecircnio de um precircmio Nobel de literatura Mario Vargas Llosa do servidor

embrutecido pela rotina burocraacutetica de sua reparticcedilatildeo que se arrasta em seus dias compridos com

uma uacutenica motivaccedilatildeo a aposentadoria Este perfil asfixiante do personagem Dom Rigoberto13 deve

ser evitado a qualquer custo

Felizmente entretanto o modelo ldquoDom Rigobertordquo estaacute a cada dia sendo exceccedilatildeo na ad-

ministraccedilatildeo fazendaacuteria Ao contraacuterio desse estereoacutetipo enfraquecido encontramos hoje uma seacuterie

de jovens servidores entusiasmados com suas funccedilotildees e que lutam constantemente por melhores

condiccedilotildees de trabalho Quem conhece bem o serviccedilo puacuteblico sabe que natildeo haacute mais espaccedilo para

acomodaccedilatildeo Hoje predomina a proatividade Precisamos adequar o Estado para esta nova geraccedilatildeo

Esses satildeo os jovens que atuam na administraccedilatildeo puacuteblica com domiacutenio da informaacutetica velocidade do

pensamento e novos meacutetodos

Natildeo podemos tambeacutem limitaacute-los a uma estrutura arcaica e gerida pela Era da escrita Os jovens

servidores comumente satildeo exiacutemios operadores dos sistemas virtuais Quando mencionamos aqui esta

questatildeo da tecnologia eacute para alertar aos programas de educaccedilatildeo fiscal a abrir um campo de debate

sobre uma nova eacutetica no governo eletrocircnico Boas condutas devem ser preservadas e estimuladas po-

reacutem natildeo se pode limitar o acesso agrave informaacutetica com base em suposiccedilotildees de abusos casuais Exemplo

do que aqui discutimos satildeo as redes sociais As limitaccedilotildees no serviccedilo puacuteblico a estas redes tecircm que ser

mais bem repensadas afinal a informaacutetica estaacute totalmente inserida na dinacircmica do proacuteprio serviccedilo

No acircmbito da fiscalizaccedilatildeo inclusive eacute imprescindiacutevel pois jaacute haacute alguns anos que atuamos na auditoria

computadorizada no governo eletrocircnico no e-processo enfim na Era do mundo virtual Limitaccedilotildees

generalizadas e sem paracircmetros a determinados sites nos parecem ineficazes Controlar os abusos

sim eacute o que devemos fazer Eacute preciso fazer um uso inteligente da potecircncia digital adicionando uma

dimensatildeo nova e eficiente ao serviccedilo puacuteblico contemporacircneo14 O fato eacute que natildeo podemos mais atuar

e ser geridos por padrotildees anteriores agrave revoluccedilatildeo tecnoloacutegica Os conceitos de tempo e o espaccedilo tecircm

senhor eacute um mal necessaacuterio sem o qual a vida em comunidade natildeo seria viviacutevel devo dizer-lhe que sua pessoa representa tudo o que detesto na sociedade e em mim mesmo Pois haacute pelo menos um quarto de seacuteculo de segunda a sexta-feira e das oito da manhatilde agraves seis da tarde com algumas atividades ancilares (coqueteacuteis seminaacuterios inauguraccedilotildees congressos) agraves quais me eacute impossiacutevel subtrair-me sem ameaccedilar minha sobrevivecircncia tenho sido tambeacutem uma espeacutecie de burocrata ainda que natildeo trabalhe no setor puacuteblico e sim no privado Mas assim como o senhor e por sua culpa minha energia meu tempo e meu talento (tive algum) foram em grande parte engolidos nesses vinte e cinco anos pelos tracircmites gestotildees requerimentos instacircncias e procedimentos inventados pelo senhor para justificar o salaacuterio que recebe e a escrivaninha diante da qual engorda suas naacutedegas deixando-me apenas umas migalhas de liberdade para tomar iniciativas e levar a cabo um trabalho que mereccedila chamar-se criativo Sei que os seguros (meu ramo profissional) e a criatividade encontram-se tatildeo afastados quanto os planetas Saturno e Plutatildeo no universo sideral mas essa distacircncia natildeo seria tatildeo vertiginosa se o se-nhor hidra regulamentarista lagarta tramitadora rei do papel timbrado natildeo a tivesse tornado abissal Porque mesmo no aacuterido deserto das seguradoras e resseguradoras a imaginaccedilatildeo do ser humano poderia expandir-se e dali extrair estiacutemulo intelectual e ateacute prazer se o senhor encarcerado nessa densa malha de regulaccedilotildees asfixiantes ndash destinadas a dar caraacuteter de necessidade agrave obesa burocracia que inchou ateacute estourar as reparticcedilotildees puacuteblicas []rdquo (LLOSA 2011 p 234)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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quer ser reconstituiacutedos Daiacute a importacircncia da inclusatildeo desse debate acerca do funcionalismo puacuteblico

contemporacircneo

Eacute preciso lutar contra esta realidade Os programas de educaccedilatildeo fiscal devem cada vez mais

zelar por estes servidores valorizando suas vocaccedilotildees promovendo cursos de capacitaccedilatildeo incentivan-

do-os agrave mudanccedila e agrave melhoria de suas tarefas E eacute isto o que vemos na iniciativa privada e que falta no

serviccedilo puacuteblico motivaccedilatildeo e capacitaccedilatildeo

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Neste breve ensaio pretendemos enfatizar as importantes questotildees do resgate da cidadania

fiscal e da respeitabilidade do Estado por intermeacutedio do seu servidor Essa eacute uma tarefa natildeo soacute dos

programas de educaccedilatildeo fiscal mas tambeacutem de toda a sociedade brasileira Natildeo haacute partidos nessa luta

Consideramos de enorme importacircncia que os programas de educaccedilatildeo fiscal ampliem seu enfo-

que no gasto puacuteblico pois assim engrandeceremos ainda mais a tarefa da arrecadaccedilatildeo tributaacuteria

Natildeo podemos mais enfatizar os esforccedilos somente na justificativa da arrecadaccedilatildeo quando natildeo

haacute uma contrapartida na prestaccedilatildeo dos serviccedilos puacuteblicos A maioria das criacuteticas na nossa atual situa-

ccedilatildeo comeccedila pela inobservacircncia dos direitos sociais pelo Estado e pela peacutessima aplicaccedilatildeo dos recursos

puacuteblicos

O papel do fisco contemporacircneo transcende a atividade arrecadatoacuteria e assim deve ser enfati-

zado Os tributos natildeo podem mais ser considerados uma perda natildeo compensada mas sim um inves-

timento nos bens coletivos

Reaver a confianccedila nas instituiccedilotildees fazendaacuterias eacute um grande desafio mas seguramente uma

meta possiacutevel Os programas de educaccedilatildeo fiscal satildeo muito importantes nessa luta pela moralidade e

eficiecircncia estatais e principalmente em demonstrar para a sociedade brasileira o fato de que isto eacute

uma missatildeo de todos pois como bem anota Tony Judt (2010 p 188) temos de reaprender a pensar o Estado sempre vivemos com ele afinal

14 Para entender a era digital recomendamos a importante leitura SCHMIDT COHEN 2013

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REFEREcircNCIAS

ALIGHIERI Dante A divina comeacutedia inferno Traduccedilatildeo e notas de Iacutetalo Eugenio Mauro ndash original em torno de 1307 Satildeo Paulo Ed 34 1998

ATALIBA Geraldo Repuacuteblica e Constituiccedilatildeo Satildeo Paulo Revista dos Tribunais 1985

CAVALCANTE Denise Lucena Anotaccedilotildees sobre o sistema tributaacuterio brasileiro In ELALI Andreacute MA-CHADO SEGUNDO Hugo de Brito TRENNEPOHL Terence (org) Direito tributaacuterio homenagem a Hugo de Brito Machado Satildeo Paulo Quartier Latin 2011 p 239-255

______ Dos tributos para as financcedilas puacuteblicas ampliaccedilatildeo do foco Nomos Revista do Curso de Mestra-do em Direito da Universidade Federal do Cearaacute Fortaleza v 25 jandez 2006

FERRAZ JUacuteNIOR Teacutercio Sampaio Direito constitucional liberdade de fumar privacidade estado di-reitos humanos e outros temas Satildeo Paulo Manole 2007

JUDT Tony Um tratado sobre os nossos actuais descontentamentos Lisboa Ediccedilotildees 70 2010

LABAND Paul El derecho presupuestario Traduccedilatildeo de Joseacute Zamit (Original de 1871) Madrid Insti-tuto de estudios fiscales 1979

LLOSA Maacuterio Vargas Os cadernos de Dom Rigoberto Rio de Janeiro Objetiva 2011

SCHMIDT Eric COHEN Jared A nova era digital como seraacute o futuro das pessoas das naccedilotildees e dos negoacutecios Traduccedilatildeo de Ana Beatriz Rodrigues e Rogeacuterio Durst Rio de Janeiro Intriacutenseca 2013

TIPKE Klaus Moral tributaria del Estado y de los contribuyentes Traduccioacuten de Pedro M Herrera Molina Madrid Marcial Pons 2002

TORRES Ricardo Lobo A ideia de liberdade no Estado patrimonial e no Estado fiscal Rio de Janei-ro Renovar 1991

______ Tratado de direito constitucional financeiro e tributaacuterio Vol V o orccedilamento na Constituiccedilatildeo 2 ed Rio de Janeiro Renovar 2000

ZIZEK Slavoj A visatildeo em paralaxe Traduccedilatildeo de Maria Beatriz de Medina Satildeo Paulo Boitempo 2008

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EacuteTICA NAS RELACcedilOtildeES TRIBUTAacuteRIAS

Hugo de Brito Machado Segundo 1

SUMAacuteRIO Introduccedilatildeo 1 Notas preliminares e esclarecimentos ter-minoloacutegicos 2 Eacutetica e concepccedilatildeo de ser humano 3 Eacute possiacutevel dis-cutir objetivamente em torno de questotildees eacuteticas 4 Eacutetica e as rela-ccedilotildees tributaacuterias 41 Tributaccedilatildeo ideal e princiacutepios de legitimaccedilatildeo 42 Dois criteacuterios para a correccedilatildeo de diacutevidas atrasadas 43 Tributaccedilatildeo indireta e suas contradiccedilotildees 44 Unificaccedilatildeo de oacutergatildeos arrecadado-res e direito agrave compensaccedilatildeo Consideraccedilotildees finais Referecircncias

INTRODUCcedilAtildeO

Foi com satisfaccedilatildeo e alegria que recebi o convite para participar da coletacircnea em comemoraccedilatildeo

aos 15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal no Cearaacute organizada pela Secretaria da Fazenda do Esta-

do do Cearaacute em parceria com a Fundaccedilatildeo Sintaf A educaccedilatildeo eacute seguramente o principal e mais nobre

instrumento para conscientizaccedilatildeo do ser humano a respeito da necessidade de se cumprirem deveres

tarefas e obrigaccedilotildees os quais assim se efetivam muito mais eficazmente do que quando fundados

essencialmente na forccedila e na coaccedilatildeo

Parece pertinente a propoacutesito quando se cogita da razatildeo pela qual se cumprem as normas que

natildeo deve ser predominantemente o medo do castigo ou da sanccedilatildeo mas a convicccedilatildeo de que se trata

do melhor caminho perquirir-se um pouco a respeito da eacutetica em geral e no que tange especifica-

mente aos propoacutesitos desta coletacircnea da eacutetica nas relaccedilotildees tributaacuterias Afinal cuidar de fundamentos

substanciais para o cumprimento de deveres eacute algo diretamente relacionado a questionamentos so-

bre o que eacute certo e o que eacute errado bem como sobre as razotildees pelas quais se deve fazer o que eacute certo

assunto central agrave Eacutetica Eacute do que cuidaraacute este artigo

Vale notar de iniacutecio que a eacutetica nas relaccedilotildees tributaacuterias eacute tema de rara abordagem pelos que se

ocupam da tributaccedilatildeo sobretudo no Seacuteculo XX Talvez isso decorra do fato de situar-se o assunto em

zona de fronteira entre o Direito e a Filosofia levando tributaristas a tangenciaacute-lo por ser demasiada-

mente filosoacutefico e filoacutesofos a se distanciarem dele por considerarem a tributaccedilatildeo assunto demasiada-

mente aacuterido e teacutecnico (GUTMANN 2002 p 7) e ainda de influecircncia de um positivismo que indevida-

mente levou a que se evitassem as tatildeo ricas incursotildees inter ou transdisciplinares Questionamentos em

1 Mestre e Doutor em Direito Membro do Instituto Cearense de Estudos Tributaacuterios (ICET) Professor da Faculdade de Direi-to da Universidade Federal do Cearaacute de cujo Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo (MestradoDoutorado) eacute Coordenador Visiting Scholar da Wirtschaftsuniversitaumlt Viena Aacuteustria E-mail hugosegundogmailcom

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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torno da causa ou da razatildeo de ser da tributaccedilatildeo conduziam no maacuteximo a um estudo do fato gerador

e da norma que sobre ele incidia jamais se discutindo as razotildees pelas quais referida norma teria sido elaborada e deveria ser cumpridasup2 Assiste-se poreacutem mais recentemente a um crescente interesse na academia e tambeacutem entre os aplicadores do Direito por esses temas mais substanciais o que talvez leve a um gradual preenchi-mento dessa lacuna De fato ao lado de pesquisas a respeito de questotildees formais em torno de assun-tos como anterioridade estrutura da norma tributaacuteria irretroatividade etc assiste-se a um crescente interesse por temas materiais ou substanciais como capacidade contributiva legitimidade da tributa-ccedilatildeo e justiccedila fiscal Aleacutem de diversas teses e dissertaccedilotildees que tecircm sido defendidas nos Programas de Poacutes-Graduaccedilatildeo no Paiacutes nos uacuteltimos anos pode-se apontar como excelente exemplo do que se estaacute aqui a dizer o proacuteprio Programa de Educaccedilatildeo Fiscal desenvolvido pela Secretaria da Fazenda do Esta-do do Cearaacute Nos itens que se seguem procurar-se-aacute examinar em linhas gerais o papel da eacutetica nas rela-ccedilotildees tributaacuterias e como eventual desprezo a ela pode levar agrave perda de juridicidade dessas relaccedilotildees

1 NOTAS PRELIMINARES E ESCLARECIMENTOS TERMINOLOacuteGICOS

Natildeo existem sentidos uacutenicos e imutaacuteveis para as palavras os quais possam ser objeto de inves-

tigaccedilatildeo anaacuteloga agrave de um bioacutelogo que procura um novo microrganismo na natureza Aliaacutes as palavras

tampouco tecircm um uacutenico sentido literal correto (SEARLE 2002 p 184) sendo ele em verdade aquele

que os partiacutecipes do processo de comunicaccedilatildeo a elas atribuem o qual por certo depende de usos

preacutevios dessas mesmas palavras mas que por igual podem ser gradualmente modificados agrave luz do

contexto e das circunstacircncias no acircmbito dos chamados jogos de linguagem (WITTGENSTEIN 2000)

Eacute um tanto contraproducente portanto investigar a respeito de qual seria o significado correto

da palavra eacutetica Ela pode ser utilizada como sinocircnimo de moral derivando essas duas palavras res-

pectivamente de termos em grego (ethos) e em latim (mores) entatildeo usados para designar a mesma

coisa a saber o conjunto de costumes ou comportamentos adotados em determinada sociedade

Existem poreacutem algumas realidades diferentes conquanto relacionadas que talvez justifiquem o uso

de palavras distintas em sua designaccedilatildeo Haacute um conjunto de costumes ou comportamentos adotados

em certa sociedade mas haacute tambeacutem valores ou paracircmetros de correccedilatildeo em face dos quais esses cos-

tumes ou comportamentos podem ser julgados Pode-se dizer por exemplo que na moralidade islacirc-

mica eacute considerado errado a mulher decidir os destinos de sua proacutepria vida mas que essa natildeo parece

a forma mais adequada de tratar as pessoas do sexo feminino A primeira seria uma ldquomoral positivardquo e

a segunda uma ldquomoral criacuteticardquo Poder-se-ia cogitar ainda do ramo da Filosofia (Filosofia Moral) que se

2 Como observa Ricardo Lobo Torres (2009 p 4) ldquoboa parte dos problemas das financcedilas puacuteblicas atuais no Brasil e no es-trangeiro veio do corte observado entre poder de tributar e poder de gastar ou entre direito tributaacuterio e direito financeiro que conduziu agrave irresponsabilidade fiscal e agrave proacutepria crise fiscal que desestruturou o Estado do Bem-estar Socialrdquo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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ocupa dessas questotildees sendo essa uacuteltima parcela da realidade ndash esse ramo da Filosofia ndash mais adequa-

damente designado pela palavra Eacutetica com ldquoErdquo maiuacutesculo Essa seraacute a opccedilatildeo terminoloacutegica seguida no

presente trabalho

2 EacuteTICA E CONCEPCcedilAtildeO DE SER HUMANO

Exame das ideias dos filoacutesofos que ao longo da Histoacuteria se ocuparam da Eacutetica ou da Filosofia

Moral revela que todos eles partem como premissa de uma concepccedilatildeo de ser humano Uma antro-

pologia filosoacutefica portanto estaacute na base de qualquer estudo a respeito do que seja certo e errado e

das razotildees que as pessoas tecircm para agir da forma correta

Jeremy Bentham (1996) por exemplo um dos principais expoentes do utilitarismo defende

que o criteacuterio para identificar uma conduta como justa ou correta eacute a maximizaccedilatildeo da felicidade O

que traz a maior felicidade para o maior nuacutemero de pessoas eacute o certo a ser feito Isso porque parte da

premissa de que o ser humano eacute um animal que naturalmente vive em busca do prazer e da felicidade

e tem aversatildeo agrave dor e ao sofrimento

Kant (2003) por sua vez um dos principais criacuteticos do utilitarismo e autor de um dos mais im-

portantes sistemas de Filosofia Moral do ocidente constroacutei toda a sua teoria sobre a premissa de que o

ser humano diferentemente dos outros animais e entes existentes na natureza eacute dotado de liberdade

assim entendida natildeo propriamente a possibilidade de escolher por quais meios atingir os fins que a

natureza lhe impotildee (vg comer arroz em vez de macarratildeo para matar a fome) que outros animais tam-

beacutem tecircm mas a aptidatildeo de escolher os proacuteprios fins a serem perseguidos agraves vezes ateacute em oposiccedilatildeo

aos que seus impulsos naturais indicam (pex natildeo comer mesmo estando com fome para no longo

prazo otimizar a sauacutede ou a aparecircncia fiacutesica) Isso confere ao ser humano o caraacuteter de sujeito dotado

de livre-arbiacutetrio e natildeo de mero objeto donde se deduzem maacuteximas como a de que as pessoas devem

ser sempre tratadas como fins em si mesmas (sujeitos) e nunca como meros meios (objetos) aleacutem do

conhecido imperativo categoacuterico segundo o qual o correto a fazer natildeo eacute necessariamente o que traz

felicidade ao maior nuacutemero de pessoas mas aquilo que pode ser transformado em maacutexima universal

ou seja todos poderiam agir da mesma forma Em palavras mais simples para algueacutem saber se uma

conduta eacute correta basta imaginar se seria conveniente que ela fosse adotada por todos Essa eacute uma

forma de avaliar se estamos sendo impelidos por nossos impulsos a agir de determinada forma ou se

ela eacute a maneira correta por estar de acordo com a razatildeo Furar uma fila por exemplo eacute uma conduta

que pode parecer conveniente a quem a adota circunstancialmente mas se todos a adotassem a proacute-

pria figura da fila desapareceria estabelecendo-se o caos nas situaccedilotildees nas quais se fizesse necessaacuterio

ordenar o atendimento de pessoas com igualdade o que eacute suficiente para que se conclua que a con-

duta eacute errada

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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Natildeo se pretende poreacutem alongar o presente texto com incursotildees nos vaacuterios sistemas de Filo-

sofia Moral Os dois exemplos citados servem apenas para mostrar que toda concepccedilatildeo do que seja

certo ou errado envolve necessariamente uma concepccedilatildeo a respeito da natureza do ser humano

Diante disso na contemporaneidade natildeo causa surpresa que as principais contribuiccedilotildees para o estudo

desse tema sejam oriundas da biologia da neurologia da psicologia e das ciecircncias cognificas quando

se interseccionam no estudo da mente humana e datildeo origem ao roacutetulo unificador de neurociecircncia

A biologia tem mostrado de forma contundente que os sentimentos morais de empatia

cooperaccedilatildeo solidariedade e equidade foram naturalmente selecionados natildeo apenas no ser humano

mas em alguns outros mamiacuteferos superiores que vivem em grupos como lobos golfinhos e principal-

mente primatas como chimpanzeacutes e bonobos (WAAL 1996) Entre muitos outros animais eacute comum o

sentimento de proteccedilatildeo agrave prole (kin selection) pela oacutebvia razatildeo de que essa eacute a forma mais imediata

de perpetuaccedilatildeo dos genes mas entre tais mamiacuteferos a vantagem propiciada pela formaccedilatildeo de grupos

selecionou naturalmente aqueles indiviacuteduos dotados de caracteriacutesticas que favorecem a vida em gru-

po dentre as quais se destacam os sentimentos morais (GREENE 2013)

Haacute experimento que se tornou ceacutelebre exibido em palestra ministrada por Frans de Waal no

TEDsup3 que eacute bem ilustrativo dessa ideia Nele duas macaco-prego fecircmeas satildeo solicitadas a realizar a

mesma tarefa mas satildeo remuneradas de forma desigual Uma recebe pequenos pedaccedilos de pepino

e a outra uvas A que recebe pepinos fica satisfeita e poderia passar o dia inteiro realizando a mesma

tarefa e sendo recompensada com os pepinos O problema surge quando ela vecirc a colega ser remune-

rada pela mesma tarefa com uvas bem mais saborosas A injusticcedilada chega a testar a pedra para

ver se a tarefa que desempenha eacute mesmo igual agrave desempenhada pela colega ou seja para aferir se haacute

alguma justificativa para o tratamento desigual

No ser humano que tambeacutem nutre tais sentimentos a seleccedilatildeo de caracteriacutesticas que favorecem

a vida em grupo criou mecanismos ainda mais sofisticados como um sistema neuroloacutegico mais com-

plexo e com ele a linguagem propiciando que se teorize em torno dos referidos sentimentos morais

e mais importante que se construam instituiccedilotildees sociais destinadas a dar-lhes efetividade Surge

assim o Direito que natildeo tem poreacutem como se desligar inteiramente dessa sua origem Disposiccedilotildees

juriacutedicas que contrariem frontalmente sentimentos morais seratildeo com maior probabilidade desres-

peitadas Caso se fundamentem no medo na forccedila e na coaccedilatildeo e natildeo na convicccedilatildeo de que satildeo boas

para a manutenccedilatildeo da harmonia social ndash razatildeo de resto para o proacuteprio surgimento dos sentimentos

morais ndash elas aleacutem de brutalizarem o homem seratildeo no dizer de Pontes de Miranda (2000) apenas

uma revoluccedilatildeo que se retarda4

3 TED (wwwtedcom) eacute uma instituiccedilatildeo sem fins lucrativos que tem por finalidade divulgar ideias consideradas importantes A sigla deriva das palavras Technology Entertainment Design O trecho do viacutedeo com o experimento citado no texto pode ser assistido em httpyoutubelKhAd0Tyny0

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35

3 Eacute POSSIacuteVEL DISCUTIR OBJETIVAMENTE EM TORNO DE QUESTOtildeES EacuteTICAS

Poder-se-ia objetar diante da pretensatildeo de se estudar e considerar a Eacutetica no trato de questotildees

juriacutedicas que questotildees eacuteticas ou morais satildeo sempre muito subjetivas e emocionais natildeo podendo ser

estudadas cientificamente agrave miacutengua da possibilidade de se fazerem afirmaccedilotildees objetivas em torno

delas

Algo do que se disse no item anterior jaacute deveria afastar essa objeccedilatildeo mas em acreacutescimo po-

de-se ressaltar que mesmo quando haacute divergecircncia entre questotildees morais as pessoas apresentam (ou

pelo menos podem ser capazes de apresentar) razotildees para justificar seus pontos de vista discrepantes

Natildeo se apresentam razotildees para convencer algueacutem que sorvete de baunilha eacute mais gostoso que sorve-

te de morango ou que o azul eacute mais bonito que o amarelo mas se apresentam razotildees para convencer

algueacutem que o casamento entre pessoas do mesmo sexo deve ser (ou natildeo) permitido o que mesmo

sem entrar nessa discussatildeo aqui revela que natildeo satildeo temas assim inteirametne subjetivos como ocorre

no caso do gosto por sorvetes ou cores (BENN 1998 p 5)

Aleacutem disso tambeacutem no acircmbito das ciecircncias naturais e ateacute da Fiacutesica haacute divergecircncia Natildeo soacute

motivada por pessoas intransigentes e dogmaacuteticas desprovidas de qualquer base cientiacutefica como eacute o

caso dos que negam a evoluccedilatildeo das espeacutecies e dizem que os foacutesseis de dinossauros satildeo a prova de

que alguns animais natildeo conseguiram subir na Arca de Noeacute mas entre os proacuteprios especialistas como

fiacutesicos que divergem sobre a extensatildeo e a forma do universo por exemplo (ZIMMERMAN 2010 p 26

TERSMAN 2006 p XI) Isso natildeo significa que inexista um miacutenimo de intersubjetividade a permitir um

debate racional em torno de tais ideias Tampouco significa que se deva em tais terrenos abandonar

a ideia de verdade e o propoacutesito honesto de alcanccedilaacute-la (MARCONI 2007 p 50 e ss RESCHER 2003 p

83 HAACK 2011 p 228)5

Finalmente eacute preciso lembrar que a existecircncia de controveacutersia em relaccedilatildeo a certos assuntos natildeo

quer dizer que natildeo existam temas em torno dos quais o consenso seja possiacutevel Muitas vezez natildeo eacute ne-

cessaacuterio por exemplo saber qual eacute a justiccedila ideal se a kantiana ou a utilitarista ou a aristoteacutelica ou

qualquer outra para se concluir que determinada situaccedilatildeo vivida eacute injusta Amartya Sen (2009 p 109 e

ss) economista indiano laureado com o precircmio Nobel e que desde entatildeo parece ter se dedicado mais

agrave filosofia moral que agrave economia propriamente dita utiliza para demonstraacute-lo a chamada ldquometaacutefora da

saunardquo Para ele discutir ldquoideais de justiccedilardquo diante de certas injusticcedilas flagrantes de nossa sociedade ou

recusar o enfrentamento dessas injusticcedilas sob a consideraccedilatildeo de que a justiccedila ideal eacute de impossiacutevel de-

5 Como aponta Haack (2011 p 231) a criacutetica relativista em uacuteltima anaacutelise eacute autodestrutiva e ainda falaciosa pois natildeo se pode ldquopela investigaccedilatildeo honesta descobrir que natildeo haacute investigaccedilatildeo honestardquo Como lembra no mesmo sentido Fazzalari (2006 p 61) natildeo eacute porque a racionalidade eacute faliacutevel que devemos optar pela irracionalidade

4 ldquoToda pressatildeo que dura eacute indiacutecio certo de revoluccedilatildeo que se retardardquo (PONTES DE MIRANDA 2000 p 116)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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terminaccedilatildeo consensual eacute algo semelhante a termos algumas pessoas trancadas dentro de uma sauna

cujo termostato estaacute localizado do lado de fora Desesperadas com um calor insuportaacutevel dentro da

sauna essas pessoas comeccedilam a gritar para que algueacutem as ajude Um sujeito que por acaso passava

pelo lado de fora ouve os gritos e se dirige agrave sauna mas com a matildeo sobre o termostato afirma que soacute

poderaacute ajustar a temperatura dentro da sauna que jaacute passa dos 50 graus quando os que estatildeo dentro

dela trancados decidirem qual seria a temperatura ideal

Nessa ordem de ideias da mesma forma como natildeo se precisa decidir se a temperatura ldquoidealrdquo

eacute 18 21 ou 22 graus positivos para se saber que eacute necessaacuterio reduzir o calor de 50 graus dentro da

sauna em muitos casos natildeo eacute preciso saber qual eacute a concepccedilatildeo ldquoidealrdquo de justiccedila para se concluir que

determinada situaccedilatildeo eacute flagrantemente desigual iniacutequa e injusta e precisa ser remediada Nas linhas

seguintes algumas dessas situaccedilotildees nas quais a sauna talvez esteja passando dos 50 graus seratildeo

examinadas

4 EacuteTICA NAS RELACcedilOtildeES TRIBUTAacuteRIAS

O leitor pode estar a esta altura imaginando o que tais ponderaccedilotildees de ordem predominan-

temente filosoacutefica fazem em texto dedicado em princiacutepio ao Direito Tributaacuterio Eacute preciso lembrar po-

reacutem o que serve de fundamento ao Direito Afinal por que se cumprem as suas disposiccedilotildees Por que

no caso do Direito Tributaacuterio se cumprem as leis tributaacuterias pagando-se os tributos por elas impostos

Em verdade de fato no plano ocircntico ou do ser vaacuterios satildeo os motivos que levam as pessoas

a cumprirem as imposiccedilotildees veiculadas em normas juriacutedicas Tanto no tempo como no espaccedilo a di-

versidade eacute inegaacutevel haacutebito medo da sanccedilatildeo desejo de ser aceito pelo grupo convicccedilatildeo de que eacute

o melhor caminho etc Natildeo se pode negar poreacutem que o Direito eacute uma realidade institucional para

usar uma expressatildeo de John Searle (2005 p 104 e ss) assim entendida aquela realidade que somente

existe enquanto convencionada por seres racionais fazendo parte do que Karl Popper (2006 p 38)

convencionou chamar de mundo 3 Ele natildeo existe como os minerais como um coelho felpudo ou

como uma concha na praia por exemplo mas sim quando haacute um pacto intersubjetivo que o constitui

enquanto realidade Tal como o dinheiro ou as regras de um jogo

E para que as pessoas enxerguem uma ordem uma obrigaccedilatildeo ou um comando como algo fruto

de uma realidade institucional eacute preciso que a aceitem enquanto tal Direito que soacute ndash frise-se o ldquosoacuterdquo ndash

se impotildee pela forccedila eacute algo que equipara o homem a algo pior que muitos animais natildeo humanos ou

para usar uma metaacutefora de Arnaldo Vasconcelos (2001 p 93) como o jumento do verdureiro que

ldquoque para andar ou parar ou retroceder no caminho tem de ver o movimento do chicote ou ouvir

o silvar dele em sua proximidaderdquo Para que as pessoas vejam no conjunto de normas que integra o

Direito Tributaacuterio essa realidade institucional que elas cumprem porque reconhecem como Direito

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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e natildeo apenas por conta da forccedila de quem impotildee sua obediecircncia eacute preciso que o Direito tenha um

fundamento eacutetico Eacute preciso que as normas que existam correspondam na maacutexima medida possiacutevel

agraves normas que as pessoas que a elas se submetem gostariam que existissem (MACHADO SEGUNDO

2010) Daiacute dizer-se que uma legislaccedilatildeo que estabelecesse tributaccedilatildeo mais justa seria independente-

mente de aparatos repressivos dotada de maior eficaacutecia

41 Tributaccedilatildeo ideal e princiacutepios de legitimaccedilatildeo

Tem pouco significado dizer-se que a legislaccedilatildeo que estabelecesse uma tributaccedilatildeo ideal seria

independentemente da atuaccedilatildeo de um aparato coercitivo dotada de maior grau de eficaacutecia De fato

pode-se objetar ideal para quem

Uma teoria segundo a qual o tributo ideal seria aquele com aliacutequota ldquoxrdquo incidente sobre base

ldquoyrdquo certamente seria contestada com a ponderaccedilatildeo de que tal forma de tributaccedilatildeo seria ideal para

quem a imaginou mas natildeo necessariamente para quem se submeteria a ela Aleacutem disso a idealidade

de uma tributaccedilatildeo natildeo pode ser examinada de forma divorciada de uma anaacutelise do gasto ou da des-

tinaccedilatildeo dada ao recursos com ela obtidos Daiacute falar-se atualmente em princiacutepios de legitimaccedilatildeo os

quais conduzem a uma tributaccedilatildeo considerada ideal pela sociedade que a ela se submete Em vez de

defender-se predominantemente uma tributaccedilatildeo sobre esta ou aquela base ou por esta ou aquela

aliacutequota tem-se defendido mais recentemente que a tributaccedilatildeo seja estabelecida por meios demo-

craacuteticos havendo efetiva representaccedilatildeo da sociedade natildeo apenas na elaboraccedilatildeo das leis disciplinado-

ras da relaccedilatildeo tributaacuteria mas tambeacutem nas decisotildees referentes agrave aplicaccedilatildeo dos gastos correspondentes

Mas natildeo soacute Para que a tributaccedilatildeo seja legiacutetima ou assim seja considerada por quem a ela se

submete eacute preciso que ela seja calcada em uma legislaccedilatildeo clara transparente e cobrada em relaccedilotildees

fundadas na lealdade na boa-feacute e na transparecircncia Satildeo na visatildeo de Ricardo Lobo Torres (2006 p 223-

244) os princiacutepios de legitimaccedilatildeo que fazem com que o ocircnus tributaacuterio seja aceito por quem a ele se

deve submeter incrementando consideravelmente a eficaacutecia das normas correspondentes que natildeo se

podem apoiar ndash nem devem ndash apenas ou predominantemente na repressatildeo

Eacute preciso por outras palavras natildeo apenas que o contribuinte ouccedila mas que ele se convenccedila

pela observaccedilatildeo do exemplo que a autoridade fiscal natildeo eacute sua inimiga e que a lei natildeo eacute respeitada

apenas quando isso beneficia a Administraccedilatildeo Tributaacuteria Quando isso acontecer por meio do pres-

tiacutegio aos princiacutepios de legitimaccedilatildeo antes apontados a eficaacutecia da norma tributaacuteria seraacute consideravel-

mente incrementada

Esse convencimento poreacutem natildeo eacute de faacutecil obtenccedilatildeo por conta inclusive de posturas e condu-

tas adotadas pelo proacuteprio Poder Puacuteblico Natildeo se estaacute cumpre insistir fazendo aqui referecircncia a desvios

eacuteticos (e legal) no comportamento de algum agente fiscal especiacutefico algo que tambeacutem pode ocorrer

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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em relaccedilatildeo aos contribuintes Embora isso possa existir e seja induvidosamente prejudicial agrave higidez

da relaccedilatildeo natildeo eacute de tais aspectos que se estaacute aqui a tratar ateacute porque todos sabem que eles existem

e conhecem os mecanismos para combatecirc-los vez que eles acontecem em violaccedilatildeo agraves instituiccedilotildees

existentes Na verdade faz-se referecircncia neste artigo a alguns exemplos de possiacutevel falta de eacutetica ou

de lealdade institucional que eventualmente ateacute pode levar agentes a contragosto mas em obser-

vacircncia aos seus deveres funcionais a praticarem atos antieacuteticos com contribuintes os quais corroem a

relaccedilatildeo tributaacuteria

42 Dois criteacuterios para a correccedilatildeo de diacutevidas atrasadas

Opera contra o objetivo de construir uma tributaccedilatildeo ideal a instituiccedilatildeo de tratamentos ar-

bitrariamente desiguais e discriminatoacuterios entre Fisco e contribuintes quando envolvidos em situ-

accedilotildees iguais ou equivalentes Eacute o caso por exemplo da legislaccedilatildeo do Estado do Cearaacute que prevecirc

criteacuterios de atualizaccedilatildeo diferentes para diacutevidas pagas em atraso conforme o credor seja o Estado ou

o sujeito passivo

Realmente conforme os art 1ordm da ldquoNota Explicativa SEFrdquo nordm 5 de 13 de setembro de 2004 (Pro-

dinfo 2004 online) o Estado quando tem de devolver ao contribuinte valores por este pagos a maior

corrige-os por meio da Ufirce unidade fiscal de referecircncia adotada pelo Estado do Cearaacute Quando

poreacutem se trata de cobrar do sujeito passivo quantias em atraso o criteacuterio de correccedilatildeo eacute a taxa referen-

cial do Sistema Especial de Liquidaccedilatildeo e Custoacutedia (Selic) o que gera uma diferenccedila bastante expressiva

(CEARAacute 1997a RICMS art 77) De fato aleacutem de a Selic ter variaccedilatildeo superior agrave Ufirce a atualizaccedilatildeo da

primeira eacute mensal enquanto a segunda eacute atualizada apenas anualmente o que faz com que deacutebitos

pagos indevidamente e restituiacutedos ou compensados no mesmo exerciacutecio natildeo sofram correccedilatildeo alguma

A disparidade parece bastante clara assim como a falta de justificativa para ela Aleacutem da viola-

ccedilatildeo aos princiacutepios da legalidade6 e da igualdade a proacutepria noccedilatildeo eacutetica de equidade que eacute ateacute mesmo

preacute humana como se vecirc dos experimentos de Frans de Waal (1996) referidos anteriormente parece

ser malferida Com isso insista-se corroacutei-se o sentimento saudaacutevel que deveria estar subjacente agrave

relaccedilatildeo tributaacuteria segundo o qual suas disposiccedilotildees devem ser cumpridas por ser esta a soluccedilatildeo mais

correta do ponto de vista eacutetico e natildeo porque impostas pela forccedila Diante de tratamento assim incre-

menta-se no sujeito passivo de forma indevida a ideia de que o direito soacute deve ser cumprido pelo

receio da puniccedilatildeo o que obviamente faz com que ele seja violado sempre que o contribuinte imagina

que natildeo seraacute descoberto

6 Realmente o art 66 paraacutegrafo uacutenico da Lei 1267097 dispotildee que a ldquoimportacircncia de ser restituiacuteda seraacute atualizada obser-vados os mesmos criteacuterios aplicaacuteveis agrave cobranccedila de creacutedito tributaacuteriordquo o que eacute flagrantemente desrespeitado pelas normas infralegais que compotildeem a adoccedilatildeo da Ufirce na correccedilatildeo dos valores a serem pagos ou restituiacutedos ao sujeito passivo da relaccedilatildeo tributaacuteria (CEARAacute 1997b)

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43 Tributaccedilatildeo indireta e suas contradiccedilotildees

Outro claro exemplo de inadequaccedilatildeo da forma como as instituiccedilotildees juriacutedicas tratam o sujeito

passivo da relaccedilatildeo tributaacuteria no Brasil reside na chamada ldquotributaccedilatildeo indiretardquo e na forma como se

admite o exerciacutecio de direitos por parte de quem a ela se sujeita ou submete

Por razotildees de espaccedilo e de pertinecircncia temaacutetica natildeo seraacute alongada aqui a discussatildeo relativa

agrave identificaccedilatildeo dos tributos indiretos (MACHADO SEGUNDO 2011) admitindo-se a conclusatildeo a que

chegou o Superior Tribunal de Justiccedila (STJ) de que eles satildeo o ICMS7 o IPI e o ISS este uacuteltimo quando

cobrado de forma natildeo fixa8 Sabe-se que essa classificaccedilatildeo e a proacutepria conclusatildeo a que chegou o STJ

satildeo bastante fraacutegeis e tecircm uma seacuterie de inconsistecircncias mas o problema maior eacute na verdade o que

se extrai como consequecircncia da constataccedilatildeo de que um tributo eacute ldquoindiretordquo

Na repeticcedilatildeo do indeacutebito tributaacuterio se quem a pleiteia eacute o contribuinte assim entendido aquele

que legalmente eacute obrigado ao seu pagamento diz-se que a devoluccedilatildeo por mais indevido que tenha

sido o pagamento depende da prova de que natildeo houve a transferecircncia do encargo financeiro a qual

na maioria das vezes torna impossiacutevel a restituiccedilatildeo Afinal quem pagou o tributo ldquona verdaderdquo foi o

consumidor final

Se poreacutem a restituiccedilatildeo eacute postulada pelo consumidor final admitindo-se a conclusatildeo ndash de resto

altamente questionaacutevel ndash indicada no paraacutegrafo anterior diz-se que lhe falece legitimidade por natildeo

ser ele parte na relaccedilatildeo juriacutedica com o Fisco Dessa vez parece admitir-se que quem paga o tributo ldquona

verdaderdquo eacute o comerciante vendedor das mercadorias

Algo semelhante se daacute em relaccedilatildeo a vaacuterios outros assuntos sempre no plano da tributaccedilatildeo

indireta No que tange agrave inadimplecircncia por exemplo se o contribuinte natildeo recebe o preccedilo da mer-

cadoria ainda assim se diz que o tributo eacute devido pois quem o paga ldquona verdaderdquo eacute o comerciante

pouco importando se este recebeu o preccedilo ou natildeo Mas se o comerciante recebe o pagamento da

mercadoria e em seguida natildeo paga o imposto haacute quem defenda que ele estaria praticando ldquocrimerdquo

pois seria uma apropriaccedilatildeo do valor devido ao Fisco pelo consumidor final cabendo ao comerciante

apenas ldquorepassaacute-lordquo (EISELE 2001 p 91)

A incoerecircncia eacute enorme e em vaacuterios cenaacuterios Diante dela mesmo sem discutir qual dessas teses

seria a correta brota no sujeito passivo o sentimento de que o Direito eacute um mecanismo repressor que

soacute opera contra ele Algo inteiramente contraacuterio ao propoacutesito de educar o cidadatildeo quanto ao cumpri-

mento de seus deveres tributaacuterios em face do substrato eacutetico que tecircm

7 STJ 1ordf T AGA 452588SP DJ de 5 abr 2004 p 205 8 STJ 1ordf T AgRg no Ag 692583RJ j em 11 out 2005 DJ de 14 nov 2005 p 205 rep DJ de 28 nov 2005 p 208

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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44 Lanccedilamento por homologaccedilatildeo e consequecircncias do erro do sujeito passivo

Outro problema que talvez seja prejudicial agrave higidez da relaccedilatildeo entre Fisco e contribuintes resi-

de nas consequecircncias do erro do sujeito passivo no acircmbito do lanccedilamento por homologaccedilatildeo

Como se sabe o lanccedilamento por homologaccedilatildeo eacute aquele no qual o sujeito passivo desenvolve

toda a atividade de determinaccedilatildeo ou acertamento do creacutedito tributaacuterio submetendo o resultado dessa

atividade ao crivo da autoridade administrativa e pagando antecipadamente a qualquer manifestaccedilatildeo

da autoridade o montante por si apurado (CTN art 150) Esse pagamento antecipado eacute a principal

caracteriacutestica do lanccedilamento por homologaccedilatildeo diferenciando-o por exemplo do lanccedilamento por

declaraccedilatildeo no qual o sujeito passivo leva certas informaccedilotildees ao conhecimento da autoridade mas soacute

depois de notificado por ela eacute que procede ao pagamento da quantia apurada (CTN art 147)

No mundo atual no acircmbito do lanccedilamento por homologaccedilatildeo eacute cada vez mais intensa a trans-

ferecircncia de atribuiccedilotildees que em tese seriam da Fazenda Puacuteblica ao sujeito passivo ligadas agrave apuraccedilatildeo

do montante devido e ao cumprimento de inuacutemeras obrigaccedilotildees acessoacuterias que visam a permitir a

fiscalizaccedilatildeo de quem as cumpre e de todos que com ele se relacionam Uma contabilidade que apure

o resultado da empresa por exemplo que surgiu em contexto inteiramente natildeo tributaacuterio eacute hoje vista

por muitos empresaacuterios sobretudo os de menor porte como uma necessidade em razatildeo do Fisco

sendo considerado um ldquobenefiacuteciordquo o regime que a dispensa a exemplo do Simples

Essa caracteriacutestica poreacutem natildeo eacute em si um mal O problema sentido por muitos contribuintes

reside nas consequecircncias de erros cometidos no cumprimento de tantas obrigaccedilotildees sobretudo no

que tange agravequelas ligadas agrave determinaccedilatildeo do creacutedito tributaacuterio quando o contribuinte comete um

erro e dele decorre pagamento de tributo inferior ao devido haacute a aplicaccedilatildeo de penalidades as quais

no caso do Fisco Federal por exemplo satildeo ordinariamente de 75 do valor do creacutedito tributaacuterio

percentual correspondente agrave multa aplicada sempre que haacute lanccedilamento de ofiacutecio e natildeo se verifica

a ocorrecircncia de fraude ou maacute feacute (que podem fazer esse percentual ultrapassar 150) conforme a

previsatildeo da Lei 943096) (BRASIL 1996 art 44 inciso I e paraacutegrafos)

Quando poreacutem do erro decorre pagamento superior ao que seria devido suprime-se do su-

jeito passivo em regra a possibilidade de questionamento administrativo Diz-se que ele natildeo poderia

defender-se de suas proacuteprias apuraccedilotildees E pior quando em juiacutezo natildeo sem algum custo o contribuinte

finalmente consegue a extinccedilatildeo do creacutedito tributaacuterio haacute decisotildees que ainda o condenam ao pagamen-

to de honoraacuterios de sucumbecircncia pois a demanda em uacuteltima anaacutelise teria decorrido de erro dele9

Veja-se que natildeo se estaacute cogitando aqui da hipoacutetese em que o sujeito passivo age de maacute feacute o

que corretamente deve ensejar a aplicaccedilatildeo de penalidades mais elevadas Trata-se de caso no qual

9 Ac un da 1ordf T do STJ ndash Resp 299621SC ndash Rel Min Joseacute Delgado ndash (20010003592-2) j em 3 mai 2001 ndash DJ de 13 ago 2001 p 73 Sobre esses entendimentos veja-se MACHADO 2003 p 73

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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de boa feacute se comete um equiacutevoco sendo evidente a inequidade no tratamento quando a Fazenda

comete erro na elaboraccedilatildeo de lanccedilamento e daiacute decorre cobranccedila menor ela pode desde que natildeo

consumada a decadecircncia revisaacute-lo de ofiacutecio para cobrar as diferenccedilas (CTN art 149) E se do erro

origina-se cobranccedila maior que a devida nenhuma puniccedilatildeo se lhe aplica

Natildeo se estaacute por oacutebvio defendendo a necessidade de puniccedilatildeo indiscriminada a todo agente

fiscal que cometa erros no desempenho de sua funccedilatildeo mas apenas chamando a atenccedilatildeo do leitor para

uma evidente iniquidade no tratamento dado pelo Direito Tributaacuterio Brasileiro em regra ao erro que

tem dimensotildees muito diferentes a partir apenas de quem o comete Se diante de uma legislaccedilatildeo tatildeo

complexa e mutante ndash que natildeo eacute o contribuinte quem edita - torna-se difiacutecil aplicar a legislaccedilatildeo que

o equiacutevoco nessa aplicaccedilatildeo tenha tratamento semelhante seja ele praticado por quem exerce uma ati-

vidade econocircmica e de modo colateral tem de interpretar a lei tributaacuteria seja por quem tem por ofiacutecio

exclusivo a sua interpretaccedilatildeo e aplicaccedilatildeo como eacute o caso dos agentes do fisco

45 Unificaccedilatildeo de oacutergatildeos arrecadadores e direito agrave compensaccedilatildeo

Boa feacute lealdade e confianccedila satildeo importantes princiacutepios de legitimaccedilatildeo do tributo O efetivo

respeito a eles notadamente por parte do Poder Puacuteblico gera no sujeito passivo sentimentos que

incrementam a tendecircncia ao cumprimento dos deveres tributaacuterios Mas esses princiacutepios satildeo desrespei-

tados quando se usam no convencimento agrave populaccedilatildeo acerca da necessidade de se aprovarem certas

medidas legislativas discursos que se sabem natildeo serem verdadeiros e que logo em seguida seratildeo

descumpridos e esquecidos

Parece ter ocorrido isso na criaccedilatildeo da chamada Receita Federal do Brasil fruto da unificaccedilatildeo da

Receita Federal com a Receita Previdenciaacuteria esta uacuteltima encarregada da arrecadaccedilatildeo de contribuiccedilotildees

previdenciaacuterias

Sem entrar no meacuterito a respeito da conveniecircncia da utilidade ou mesmo da validade dessa

unificaccedilatildeo10 releva notar aqui apenas que um dos argumentos usados na defesa da necessidade

de unificaccedilatildeo para convencer setores da sociedade que contra ela se insurgiam foi o de que muitos

contribuintes possuiriam diacutevidas perante a Receita Previdenciaacuteria especialmente de contribuiccedilotildees in-

cidentes sobre a folha de pagamentos as quais poderiam ser compensadas com creacuteditos oriundos

de pagamentos indevidos feitos agrave Receita Federal e vice-versa Essa aliaacutes seria uma consequecircncia

automaacutetica da unificaccedilatildeo que faria com que contribuiccedilotildees previdenciaacuterias passassem como de fato

passaram a ser tributos administrados pela Receita Federal nos termos do art 74 da Lei 943096

Tatildeo logo aprovada a unificaccedilatildeo poreacutem inseriu-se na proacutepria lei que a levou a efeito disposiccedilatildeo

proibindo a prometida compensaccedilatildeo (art 26 paraacutegrafo uacutenico da Lei 114572007)

10 Para exame especiacutefico do assunto veja-se MACHADO MACHADO SEGUNDO 2005 p 107-120

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Caso natildeo haja duacutevida a respeito da existecircncia e do montante de creacuteditos e deacutebitos reciacuteprocos

natildeo parece haver fundamento moral para se rejeitar a compensaccedilatildeo pois a uacutenica consequecircncia dessa

negativa eacute permitir que um dos polos da relaccedilatildeo cobre e receba o seu creacutedito e resista ao pagamento

do seu creacutedito (MACHADO 2009 p 450 e ss MACHADO SEGUNDO 2006 p 347) Mas aleacutem disso a

inadequaccedilatildeo moral no caso eacute ateacute maior pois se natildeo se pretendia permitir a compensaccedilatildeo de deacutebitos

referentes a tributos administrados pela Receita Federal com aqueles ateacute entatildeo submetidos agrave Receita

Previdenciaacuteria isso jamais poderia ter sido utilizado como argumento em defesa da unificaccedilatildeo

46 Natildeo cumulatividade de contribuiccedilotildees e direito ao creditamento

Finalmente pode-se apontar como exemplo de desrespeito aos princiacutepios de legitimaccedilatildeo do

tributo por parte da ordem juriacutedica brasileira a forma como tem sido conduzida no acircmbito federal a

sistemaacutetica de natildeo cumulatividade relativamente agraves contribuiccedilotildees PIS e COFINS

Realmente tais contribuiccedilotildees passaram por expressivos aumentos de aliacutequotas as quais salta-

ram de 065 e 3 respectivamente para 165 e 76 majoraccedilatildeo esta justificada pela introduccedilatildeo

da sistemaacutetica natildeo cumulativa e com ela do direito ao creditamento das contribuiccedilotildees que tenham

onerado operaccedilotildees anteriores

Com a introduccedilatildeo da sistemaacutetica poreacutem o montante arrecadado com tais contribuiccedilotildees cres-

ceu consideravelmente a demonstrar que o aumento das aliacutequotas foi maior que o necessaacuterio para

fazer face ao aproveitamento de creacuteditos Natildeo houve poreacutem posterior reduccedilatildeo dessas aliacutequotas ten-

do havido ao contraacuterio o surgimento de grande litigiosidade na relaccedilatildeo tributaacuteria em decorrecircncia de

normas infralegais editadas pela Receita Federal11 que restringem consideravelmente o direito aos

creacuteditos interpretando de maneira bastante restritiva expressotildees utilizadas na lei como eacute o caso da

palavra ldquoinsumordquo

Mesmo sem entrar no meacuterito relativo agrave possiacutevel incompatibilidade de tais restriccedilotildees com o prin-

ciacutepio da legalidade12 essa postura institucional parece subtrair uma vez mais o fundamento eacutetico da

relaccedilatildeo tributaacuteria notadamente quando em sua defesa se usa o argumento de que diversamente do

que ocorre com IPI e ICMS no PIS e na Cofins a natildeo cumulatividade natildeo eacute uma ldquoimposiccedilatildeordquo constitu-

cional podendo a legislaccedilatildeo de hierarquia inferior restringir o uso de creacuteditos sem incorrer em invali-

dade Na verdade se o aumento de aliacutequotas foi justificado porque os creacuteditos seriam aproveitados

11 Instruccedilotildees Normativas 2472002 (PIS) e 4042004 (Cofins) que procuram ldquodefinirrdquo insumo para fins de aplicaccedilatildeo do art 3ordm inciso II da Lei 108332003 (BRASIL Ministeacuterio da Fazenda Receita Federal 2002 2004)12 Eacute preciso notar que a Cofins e o PIS diversamente do IPI por exemplo natildeo incidem sobre operaccedilatildeo de saiacuteda de pro-duto mas sobre receita (WILD 2013 p 106) Assim o regime de creditamento em relaccedilatildeo agraves contribuiccedilotildees deve ser mais amplo jaacute que mais ampla eacute a base sobre a qual incidem Do contraacuterio haveria acumulaccedilatildeo A natildeo cumulatividade do IPI ateacute pode ser compatiacutevel com uma sistemaacutetica de creacutedito fiacutesico jaacute que esse imposto soacute incide sobre o que fisicamente sai do estabelecimento industrial Jaacute o PIS e a Cofins natildeo Assim a palavra ldquoinsumordquo no acircmbito dessas contribuiccedilotildeesm deve ter sua significaccedilatildeo colhida natildeo no acircmbito da legislaccedilatildeo do IPI mas na do imposto de renda tributo cuja materialidade conteacutem

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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e se mesmo assim a arrecadaccedilatildeo subiu consideravelmente natildeo haacute fundamento moral (AacuteVILA 2007 p

175 e ss) para tais restriccedilotildees que natildeo deveriam ser levadas a efeito ainda que tivessem fundamento

juriacutedico do qual diga-se de passagem satildeo igualmente carentes

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

A fim de que o cidadatildeo contribuinte se convenccedila e se eduque no sentido de que eacute necessaacuterio

cumprir seus deveres para com o Fisco os quais satildeo indispensaacuteveis a que se crie uma sociedade livre

justa e solidaacuteria nos termos indicados na Constituiccedilatildeo Federal de 1988 eacute necessaacuterio que esses deveres sejam por ele vistos como justos e equacircnimes Isso eacute essencial para que a eficaacutecia da norma tributaacuteria seja incrementada fazendo com que dependa menos da repressatildeo estatal institucionalizada Para que essa consciecircncia se concretize poreacutem eacute imperioso que as instituiccedilotildees confiram ao cidadatildeo contribuinte tratamento equacircnime sendo inadequado que elas no plano geral e abstrato se-jam eticamente problemaacuteticas Instituiccedilotildees construiacutedas em bases natildeo eacuteticas levam agentes fiscais que tecircm atividade vinculada a agirem de forma igualmente natildeo eacutetica mesmo que com isso natildeo estejam de acordo no plano moral ou pessoal criando assim uma deslealdade institucionalizada Com isso se retira ou compromete a apontada consciecircncia no sujeito passivo de que haacute um fundamento eacutetico para o cumprimento de seus deveres fiscais corroendo a legitimidade da relaccedilatildeo tributaacuteria Natildeo se estaacute com isso incorrendo-se na ingenuidade de imaginar que o contribuinte com-porta-se sempre com honestidade e lealdade perante o Fisco e que este seria o lado maligno da relaccedilatildeo Longe disso Como dito o presente trabalho natildeo trata de possiacuteveis desvios de comportamen-to pessoais deste ou daquele contribuinte ou mesmo deste ou daquele agente fiscal os quais por certo podem existir mas contam com mecanismos institucionais para combate e controle A principal preocupaccedilatildeo aqui como se procurou mostrar satildeo as deslealdades institucionais pois elas estimulam ou incrementam as primeiras impondo a praacutetica de abusos a autoridades que natildeo gostariam de pra-ticaacute-los e despertando em contribuintes a indesejaacutevel sensaccedilatildeo de que a relaccedilatildeo tributaacuteria ainda eacute de fato e predominantemente de poder natildeo sendo errado fazer uso de meios igualmente escusos para se evadir dela

a da Cofins e a do PIS (SILVA 2009 p 28) Assim devem ser entendidos como insumos natildeo apenas as mateacuterias primas ou os materiais que fisicamente se incorporarem ao bem produzido ou ao resultado do serviccedilo prestado mas todos os custos diretos ou indiretos relacionados agrave produccedilatildeo ou agrave geraccedilatildeo da receita a ser tributada Nesse sentido confira-se OLIVEIRA 2005 p 45 e ss

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REFEREcircNCIAS

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GREENE Joshua Moral Tribes New York Penguin 2013

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______ Processo Tributaacuterio 2ed Satildeo Paulo Atlas 2006

MACHADO Hugo de Brito Comentaacuterios ao Coacutedigo Tributaacuterio Nacional 2ed Satildeo Paulo Atlas 2009 v 3

MACHADO Hugo de Brito MACHADO SEGUNDO Hugo de Brito Medida Provisoacuteria nordm 258 Receita Federal do Brasil Inconstitucionalidades formal e substancial Seguridade social na CF88 Autarquia constitucional Revista Dialeacutetica de Direito Tributaacuterio v 122 p 107-120 2005

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PEIXOTO Marcelo Magalhatildees FISCHER Octaacutevio Campos (Coord) PIS-COFINS questotildees atuais e po-lecircmicas Satildeo Paulo Quartier Latin 2005

POPPER Karl Em busca de um mundo melhor Traduccedilatildeo de Milton Camargo Mota Satildeo Paulo Mar-tins Fontes 2006

RESCHER Nicholas Epistemology An Introduction to the Theory of Knowledge Albany State Univer-sity of New York Press 2003

SEARLE John Expressatildeo e significado estudos da teoria dos atos da fala Traduccedilatildeo de Ana Ceciacutelia G A de Camargo e Ana Luiza Marcondes Garcia Satildeo Paulo Martins Fontes 2002

______ Libertad y neurobiologia Traduccioacuten de Miguel Candel Barcelona Paidoacutes 2005

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VASCONCELOS Arnaldo Direito e forccedila uma visatildeo pluridimensional da coaccedilatildeo juriacutedica Satildeo Paulo Dialeacutetica 2001

WAAL Frans de Good Natured The Origins of Right and Wrong in Humans and Other Animals Cam-bridge Harvard University Press 1996

WILD Rafaela Sabino Caliman Do conceito de ldquoinsumosrdquo para fins de creacutedito das contribuiccedilotildees para o PIS e a Cofins natildeo cumulativas Revista Dialeacutetica de Direito Tributaacuterio n 208 Satildeo Paulo Dialeacutetica jan 2013

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WITTGENSTEIN Ludwig Investigaccedilotildees filosoacuteficas Traduccedilatildeo de Joseacute Carlos Bruni Satildeo Paulo Nova Cultural 2000

ZIMMERMAN Aaron Moral epistemology New York Routledge 2010

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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INTRODUCcedilAtildeO

Educaccedilatildeo e cidadania satildeo temas que se enredam e satildeo constantemente postos no centro do

debate na sociedade brasileira O desafio em contribuir com a formaccedilatildeo de agentes sociais que alte-

rem substancialmente sua histoacuteria mediante uma reflexatildeo participativa potildee-se como uma das metas

da educaccedilatildeo no Brasil Para tanto diversos projetos e programas foram desenvolvidos ao longo da

histoacuteria

A base para essas accedilotildees se encontra nos documentos que norteiam a poliacutetica educacional no

Paiacutes a Constituiccedilatildeo Brasileira a Lei de Diretrizes e Bases da Educaccedilatildeo Nacional (LDB) e os Paracircmetros

Curriculares Nacionais (PCNs) Neles estaacute claramente explicitada a importacircncia da formaccedilatildeo para a

conquista da cidadania no processo educacional Uma educaccedilatildeo libertadora passa pelo processo de

empoderamento criacutetico e que leve a uma accedilatildeo efetiva dos atores sociais

Nesse sentido a educaccedilatildeo fiscal contribui para a reflexatildeo da cidadania e seu inter-relaciona-

mento com a tributaccedilatildeo sempre tendo por base o conhecimento para a accedilatildeo Busca-se a criacutetica em-

basada e consciente para a anaacutelise de um orccedilamento puacuteblico ou das planilhas exigidas pela Lei de

Responsabilidade Fiscal por exemplo A educaccedilatildeo fiscal aproxima do cidadatildeo conceitos antes restritos

ao Executivo ou Legislativo ou mesmo aos profissionais da aacuterea tributaacuteria contaacutebil etc

Eacute nessa perspectiva que o Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Cearaacute (PEF) se insere nas discussotildees

sobre cidadania no acircmbito da sociedade cearense em consonacircncia com o Programa Nacional de Edu-

caccedilatildeo Fiscal (PNEF) O objetivo eacute juntar educaccedilatildeo e tributaccedilatildeo o que representa grande desafio em

REFLEXOtildeES CONCEITUAIS E PRAacuteTICAS DO PROGRAMA ESTADUAL DE EDUCACcedilAtildeO FISCAL DO CEARAacute

Imaculada Maria Vidal da Silva1

SUMAacuteRIO Introduccedilatildeo 1 Cidadania participaccedilatildeo e controle social para compreender a Educaccedilatildeo Fiscal 2 Educaccedilatildeo Fiscal para a cida-dania 3 A Educaccedilatildeo Fiscal no Cearaacute 31 Projetos em destaque 311 Educaccedilatildeo a distacircncia 312 Seminaacuterios e palestras 313 Monitores de Educaccedilatildeo Fiscal 314 Educaccedilatildeo Fiscal Itinerante 315 Cidada-nia Fiscal para Universitaacuterios 316 Noccedilotildees de Cidadania Fiscal para Moradores de Comunidades Consideraccedilotildees finais Referecircncias

1 Auditora Fiscal Adjunta da Receita Estadual Mestre em Planejamento e Poliacuteticas Puacuteblicas pela Universidade Estadual do Cearaacute Especialista em Teorias da Comunicaccedilatildeo e da Imagem pela Universidade Federal do Cearaacute E-mail imaculadavidalsefazcegovbr

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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uma naccedilatildeo que secularmente alijou o cidadatildeo do seu processo de construccedilatildeo histoacuterica fomentado

pelos gestores e a elite econocircmica e poliacutetica

O Estado do Cearaacute mediante parceria entre Secretarias da Fazenda e de Educaccedilatildeo implemen-

tou o Programa de Educaccedilatildeo Fiscal (PEF) em 1998 com o intuito de levar agraves escolas puacuteblicas e privadas

a discussatildeo em torno do tema cidadania conforme estabelece o PNEF Nesses dezesseis anos diversas

accedilotildees foram realizadas com a filosofia de deixar disponiacutevel ao cidadatildeo conhecimentos de ordem tri-

butaacuteria para permitir a apropriaccedilatildeo de instrumentos para a participaccedilatildeo e o controle social

Dentro desse contexto o objetivo deste trabalho eacute refletir sobre aspectos conceituais desta-

cando algumas categorias fundantes da temaacutetica e apresentar como a teoria da educaccedilatildeo fiscal se

efetiva de forma praacutetica por meio das accedilotildees desenvolvidas pela Ceacutelula de Educaccedilatildeo Fiscal (Ceduf) da

Secretaria da Fazenda do Estado do Cearaacute (Sefaz)

Como metodologia esse ensaio se conduz por base na investigaccedilatildeo documental bem como

a partir de um levantamento bibliograacutefico do tema com enfoque nos conceitos de cidadania parti-

cipaccedilatildeo e controle social As atividades desenvolvidas pela Ceduf satildeo apresentadas como praacuteticas e

possibilidades de reflexatildeo dos caminhos que a temaacutetica envereda no seu cotidiano

O trabalho estaacute dividido em trecircs toacutepicos Para a compreensatildeo de como se conceitua a educaccedilatildeo

fiscal o primeiro momento aborda trecircs categorias fundamentais para esse entendimento cidadania

participaccedilatildeo e controle social Em seguida a educaccedilatildeo fiscal eacute apresentada como instrumento a ser-

viccedilo da cidadania no terceiro toacutepico eacute relatada a experiecircncia da Ceduf na conduccedilatildeo do Programa de

Educaccedilatildeo Fiscal da Secretaria da Fazenda do Estado do Cearaacute

1 CIDADANIA PARTICIPACcedilAtildeO E CONTROLE SOCIAL PARA COMPREENDER A EDUCACcedilAtildeO FISCAL

Para entender como se estruturam as discussotildees em torno da educaccedilatildeo fiscal necessaacuterio se faz

refletir sobre alguns conceitos baacutesicos da temaacutetica cidadania participaccedilatildeo e controle social Funda-

mentais para entender o papel do cidadatildeo como ator social

A tarefa de apreender cidadania natildeo eacute faacutecil numa naccedilatildeo cujas raiacutezes histoacutericas satildeo permeadas

pelo colonialismo e um passado escravocrata que a engendrou em pouco contato com a participaccedilatildeo

A colonizaccedilatildeo brasileira foi marcada pela usura e apropriaccedilatildeo Para avanccedilar poreacutem na conceituaccedilatildeo

e discutir cidadania no Brasil eacute primordial compreender a gecircnese histoacuterica desse termo tatildeo usado no

discurso cotidiano

Natildeo se pode comparar o conceito de cidadania vivenciado na Antiguidade claacutessica com o de

hoje As referecircncias satildeo claramente diferentes tempo espaccedilo e sociedades distintamente constituiacutedas

o que influencia as percepccedilotildees do que sejam direitos e participaccedilatildeo Hoje parece surreal imaginar uma

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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decisatildeo sendo tomada em praccedila puacuteblica sem o intermeacutedio dos representantes poliacuteticos para legislar

em nome dos eleitores

Atenas um exemplo claacutessico de Cidade-Estado eacute conhecida pela participaccedilatildeo e democracia

Ressalta-se que essa participaccedilatildeo se focava no sexo masculino excluindo totalmente as mulheres

escravos e estrangeiros ou seja a democracia ateniense natildeo era tatildeo democraacutetica assim Um aspecto

positivo diz respeito a natildeo exclusatildeo dos homens menos favorecidos economicamente Nesse sentido

a participaccedilatildeo era ampla independente de poder ou status social Ressalte-se que tambeacutem natildeo existia

a noccedilatildeo de representatividade pois a democracia era direta por voto individual

Com base nesse recorte percebe-se que a cidadania era menos inclusatildeo e infinitamente mais

exclusatildeo Poucos participavam das decisotildees O conceito de cidadania era riacutegido norteado na busca

de garantir a centralizaccedilatildeo do poder como esclarece Karnal (2003 In PINSKY J PINSKY CB 2003

p 144)[] o termo cidadania foi criado em meio a um processo de exclusatildeo Dizer quem era cidadatildeo ndash ao contraacuterio de hoje em que supomos se tratar da maioria ndash era a maneira de eliminar a possibilidade de a maioria participar e garantir privileacutegios de uma mino-ria Admitir o conceito de cidadania como um processo de inclusatildeo total eacute uma leitura contemporacircnea

Importante contribuiccedilatildeo para a formaccedilatildeo do conceito de cidadania vem tambeacutem dos romanos

Diferentemente da Greacutecia onde primeiro havia as cidades e depois os cidadatildeos para os romanos era

o cidadatildeo que formava a cidadecoletividade Vale lembrar que para os romanos cidadania cidade e

Estado tinham o mesmo significado

O caminho da cidadania continua junto aos passos da humanidade As liccedilotildees aprendidas com

Greacutecia e Roma repercutem ao longo do processo histoacuterico e novos ideais surgem Um grande marco

das contribuiccedilotildees para a compreensatildeo do conceito de cidadania eacute trazido pelas chamadas revoluccedilotildees

liberais Revoluccedilatildeo Inglesa Americana e Francesa Delas emergiram conceitos accedilotildees e saberes motivo

pelo qual conhecer sobre elas eacute se apropriar de elementos decisivos no mosaico que compotildee a histoacuteria

da cidadania

As revoluccedilotildees liberais foram capitaneadas pelos burgueses e trabalhadores do campo jaacute no

processo de rompimento com o regime feudal As revoluccedilotildees liberais satildeo tambeacutem chamadas revolu-

ccedilotildees burguesas A partir das reivindicaccedilotildees dos direitos para os cidadatildeos por oportunidades eacute estabe-

lecido o surgimento do liberalismo poliacutetico e econocircmico (COELHO 2005)

Daiacute faz-se necessaacuterio destacar o conceito de cidadania liberal que natildeo busca o coletivo mas a

garantia do acesso do indiviacuteduo agrave posse e ao poder ldquoA cidadania liberal foi pois uma cidadania exclu-

dente diferenciadora de lsquocidadatildeos ativosrsquo e lsquocidadatildeos passivosrsquo lsquocidadatildeo com possesrsquo e lsquocidadatildeo sem

possesrsquo (MONDAINI apud COELHO 2005 p 15)

A primeira revoluccedilatildeo liberal foi a inglesa que teve como caracteriacutestica principal o absolutismo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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da monarquia que se revelava avassalador nas questotildees financeiras A exigecircncia do pagamento de

tributos cada vez mais pesados revoltava e causava reaccedilotildees Esse processo revolucionaacuterio inglecircs foi

longo e passou pela destituiccedilatildeo da Coroa e depois sua restauraccedilatildeo culminando com o estabelecimen-

to da maacutexima de que o parlamento governa e o rei reina

A segunda revoluccedilatildeo iniciou-se no processo de expansatildeo da Coroa Inglesa com a chegada agrave

terra batizada de Nova Inglaterra em 1620 marcando o evento no calendaacuterio mundial Era o iniacutecio

pelo menos na histoacuteria oficial dos EEUU da colonizaccedilatildeo dessa Federaccedilatildeo Com o passar do tempo e jaacute

com as financcedilas combalidas pelas guerras a Inglaterra resolveu pressionar as colocircnias localizadas no

Novo Mundo Mais uma vez as restriccedilotildees e o aumento da carga tributaacuteria promoveram ou potencia-

lizaram insatisfaccedilotildees e deflagraram revoltas

A uacuteltima e grande revoluccedilatildeo liberal do periacuteodo foi a Francesa a mais citada quando se fala em

revoluccedilatildeo por cidadania e participaccedilatildeo Especialmente pelo aspecto universal que pregava a liberdade

A Revoluccedilatildeo Francesa tem como antecedente histoacuterico um paiacutes dominado pelo poder absolutista de

seus reis A expropriaccedilatildeo mediante pesados tributos eacute um dos fatores motivadores da Revoluccedilatildeo Mais

uma vez a tributaccedilatildeo se apresenta como fator fundamental para uma revolta

A Revoluccedilatildeo Francesa eacute tema obrigatoacuterio dentro da educaccedilatildeo fiscal por dois aspectos baacutesicos

a tributaccedilatildeo exigida pelo rei com o baixo niacutevel de retorno social dos tributos e a participaccedilatildeo popular

decisiva para romper com o status quo Aqui se originam profundas discussotildees sobre a cidadania jaacute

que eacute nitidamente uma organizaccedilatildeo dos excluiacutedos e que se torna fato importante na Revoluccedilatildeo

Um instrumento histoacuterico importantiacutessimo para a cidadania eacute produzido no seio da Revoluccedilatildeo

Francesa - a Declaraccedilatildeo dos Direitos do Homem proclamada em 26 de agosto de 1789 tendo como

caracteriacutestica fundamental seu papel universal natildeo se restringindo aos franceses mas a toda uma luta

por igualdade fraternidade e liberdade humana

Feita essa recuperaccedilatildeo histoacuterica da cidadania cabe abordaacute-la com assento na concepccedilatildeo apre-

sentada por Marshall considerada um claacutessico no tema ao abordar o conceito com o foco voltado

para a conquista de direitos em trecircs dimensotildees civis poliacuteticos e sociais (COELHO 2005 p 19-20)

Marshall interpretou o desenvolvimento da cidadania por um vieacutes histoacuterico relacio-nando-a com as instituiccedilotildees e com os valores poliacuteticos O autor estudou a ampliaccedilatildeo dos direitos fundamentais e do nuacutemero de pessoas que poderiam gozar de tais direi-tos para entender como se deu o processo de ldquoextensatildeo da cidadaniardquo apoacutes as revolu-ccedilotildees burguesas [] Marshall interessava-se especialmente pelo impacto da cidadania sobre a desigualdade social e com esse objetivo em vista pensou a cidadania dividida em trecircs elementos ou dimensotildees direitos civis poliacuteticos e sociais Segundo ele cada um desses elementos surgiu em tempos (momentos histoacutericos) diferentes embora alguns processos tenham acontecido simultaneamente jaacute que o tempo natildeo pode ser pensado de forma estaacutetica

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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Assim para se ter cidadania eacute na visatildeo de Marshall imprescindiacutevel a junccedilatildeo dessas trecircs verten-

tes do direito Para se ter plenitude na cidadania haacute de alcanccedilar a completude de acesso revelando-

-se uma accedilatildeo ampla para a formaccedilatildeo do cidadatildeo pleno Aquele que natildeo atinge as trecircs dimensotildees eacute

chamado de cidadatildeo incompleto e o que natildeo eacute contemplado com nenhum direito eacute o natildeo cidadatildeo

(CARVALHO 2003)

Para que essa cidadania ativa se efetive eacute necessaacuteria a accedilatildeo de agentes sociais em processos de

participaccedilatildeo de atuaccedilatildeo na busca de atendimento agraves demandas sociais uma participaccedilatildeo em cons-

tante processo de descoberta como anota Demo (2001 p 44) ldquoParticipaccedilatildeo eacute conquista eacute processo

infindaacutevel em constante vir-agrave-ser sempre se fazendo eacute uma conquista processual Natildeo pode ser en-

tendida como daacutediva nem como concessatildeo nem como algo preexistenterdquo

Destaque-se que essa participaccedilatildeo soacute se reveste de sentido quando eacute efetiva e atuante Natildeo

quando se percebe como uma ldquopossibilidaderdquo manipulada pelo poder estabelecido para dar falsa

ideia de participaccedilatildeo (DEMO 2001)

A participaccedilatildeo se efetiva na gestatildeo puacuteblica pelo exerciacutecio do controle social ou seja no acom-

panhamento pela sociedade das accedilotildees realizadas pelo Poder Puacuteblico Expressatildeo muito usada na atu-

alidade o controle social se baseia numa cidadania ativa e na participaccedilatildeo da sociedade (CORBARI

2004)

Eacute pelo controle social que se consubstancia o papel do agente social na consecuccedilatildeo das deman-

das da sociedade exigindo dos gestores puacuteblicos aquilo que lhe eacute direito e para o qual existe a figura

do Estado Destaque-se que o controle social eacute figura emblemaacutetica de processos democraacuteticos natildeo se

imaginando em regimes de exceccedilatildeo que a sociedade tenha poder de intervir (SILVA 2002)

A praacutetica do controle social vem no escopo da Constituiccedilatildeo de 1988 natildeo por acaso chamada de

Constituiccedilatildeo cidadatilde que estabelece forma de participaccedilatildeo e transparecircncia das accedilotildees de Estado (VALLE

2002 p 82)Por certo a figura do controle social da Administraccedilatildeo veio mesmo a ganhar grande impulso foi com a ediccedilatildeo da Carta de 1988 que a par de referecircncias expressas a ins-titutos proacuteprios ao atingimento dessa finalidade forneceu os mecanismos de publici-dade impostos ao Estado Com esse binocircmio acesso agraves informaccedilatildeo-meios de controle torna-se possiacutevel uma efetiva fiscalizaccedilatildeo sobre as atividades antes acobertadas por afirmaccedilotildees vagas de proteccedilatildeo ao sigilo preservaccedilatildeo da discricionariedade da admi-nistraccedilatildeo e outras

Uma das formas basilares dessa participaccedilatildeo para a cidadania passa pelo processo educacional

Uma educaccedilatildeo voltada para a formaccedilatildeo de pensadores de agentes sociais efetivos no curso da histoacute-

ria A importacircncia do processo educacional eacute assinalada por Carvalho (2003 p 11)

[] a educaccedilatildeo popular Ela eacute definida como direito social mas tem sido historica-mente um preacute-requisito para a expansatildeo dos outros direitos Nos paiacuteses em que a

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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cidadania se desenvolveu com mais rapidez inclusive na Inglaterra por uma razatildeo ou outra a educaccedilatildeo popular foi introduzida Foi ela que permitiu agraves pessoas tomarem conhecimento de seus direitos e se organizarem para lutar por eles A ausecircncia de uma populaccedilatildeo educada tem sido sempre um dos principais obstaacuteculos agrave construccedilatildeo da cidadania civil e poliacutetica

A percepccedilatildeo do cidadatildeo brasileiro sobre o que satildeo seus direitos eacute turvada pela compreensatildeo

de que o Estado eacute o fornecedor desses direitos a tiacutetulo de benesse Isso se justifica pela inversatildeo da

conquista dos direitos em que os direitos sociais foram mais exaltados criando uma visatildeo paternalista

do Estado e natildeo como distribuidor de bens e serviccedilos que pertencem de fato agrave coletividade

Assim a educaccedilatildeo fiscal como fomentadora do debate em torno dos recursos puacuteblicos e da

importacircncia do controle social mediante a participaccedilatildeo cidadatilde colabora diretamente com essa educa-

ccedilatildeo libertadora e de formaccedilatildeo conducente agrave apropriaccedilatildeo de conhecimento para a praacutetica da cidadania

que deve ser marcada pela mediaccedilatildeo histoacuterico-social natildeo um arremedo de cidadania pela metade ou

outorgada pelo Estado mas sim conquistada e estabelecida pela participaccedilatildeo

Como proposta de combater esse Estado corporativo e clientelista e em busca da transposiccedilatildeo

da ldquocidadania de papelrdquo - como conceitua Dimenstein (2001 p17) acerca de garantias somente como

letra impressa em papel e que natildeo se reflete na vida cotidiana - para uma realidade presente eacute que a

educaccedilatildeo fiscal se apresenta com sua concepccedilatildeo filosoacutefica de educaccedilatildeo para a participaccedilatildeo

2 EDUCACcedilAtildeO FISCAL PARA A CIDADANIA

A educaccedilatildeo eacute sem duacutevida uma praacutetica de mediaccedilatildeo entre o ser e sua atuaccedilatildeo no meio social

O processo educacional deve transcender a mera reproduccedilatildeo de conceitos formais e a ecircnfase em con-

teuacutedos e disciplinas objetivando o debate em torno da localizaccedilatildeo do homem em sua histoacuteria como

um ser integral e natildeo limitado a datas e significados pontuais

Nesse sentido a educaccedilatildeo deve estar a serviccedilo da contestaccedilatildeo do que estaacute erroneamente es-

tabelecido propondo a alteraccedilatildeo do que natildeo eacute vaacutelido para o bem-comum da sociedade o que requer

accedilatildeo e compromisso vontade e disposiccedilatildeo dos sujeitos sociais ativos

A educaccedilatildeo fiscal eacute expressa como proposta de accedilatildeo para a cidadania voltada para a percepccedilatildeo

social na qual o cidadatildeo estaacute inserido e principalmente para o fornecimento de subsiacutedios para uma

atuaccedilatildeo consistente e de contribuiccedilatildeo para a melhoria das condiccedilotildees sociais daqueles natildeo contempla-

dos pela justiccedila social ou seja os excluiacutedos

Essa eacute a proposta da educaccedilatildeo fiscal de forma ampliada instrumentalizar o cidadatildeo para a me-

lhoria de toda a sociedade num ato de conhecer para transformar fazendo a intercessatildeo do conheci-

mento com a accedilatildeo criacutetica Conforme estabelece o documento da Escola de Administraccedilatildeo Fazendaacuteria

(Esaf) coordenadora do Programa Nacional (PNEF)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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Nesse contexto surge a discussatildeo do tema Educaccedilatildeo Fiscal visando agrave conscientizaccedilatildeo da sociedade quanto agrave funccedilatildeo do Estado de arrecadar impostos e ao dever do cida-datildeo contribuinte de pagar tributo Entretanto a Educaccedilatildeo Fiscal natildeo eacute apenas isso eacute principalmente um desafio pois se trata de um processo de inserccedilatildeo de valores na sociedade como o de percepccedilatildeo do tributo que assegura o desenvolvimento econocirc-mico e social e com o devido conhecimento de seu conceito sua funccedilatildeo e sua aplica-ccedilatildeo [] Para que haja mudanccedila de comportamento na sociedade com o despertar da consciecircncia de cidadania eacute necessaacuteria uma accedilatildeo educativa permanente e sistemaacutetica voltada para o desenvolvimento de haacutebitos atitudes e valores A Educaccedilatildeo Fiscal eacute um trabalho de sensibilizaccedilatildeo da sociedade para a funccedilatildeo socioeconocircmica do tributo Nesta funccedilatildeo o aspecto econocircmico refere-se agrave otimizaccedilatildeo da receita puacuteblica e o as-pecto social diz respeito agrave aplicaccedilatildeo dos recursos em benefiacutecio da populaccedilatildeo (BRASIL 2002 p 8)

De forma objetiva foi possiacutevel inventariar como caracteriacutesticas da educaccedilatildeo fiscal a accedilatildeo educa-

tiva sob a perspectiva participativa e inclusiva Nela eacute propicio o fato de que as mais diversas temaacuteticas

relacionadas ao tecido social sejam contempladas tais como focar a realidade atual caracteriacutesticas

dos temas transversais de um modo geral questionar e propor melhorias sociais com suporte na

participaccedilatildeo efetiva em associaccedilotildees sindicatos orccedilamento participativo senso criacutetico para interagir

e exercer o controle social e por fim ndash e com respaldo nas caracteriacutesticas anteriores ndash uma visatildeo de

cidadania ativa e plena com direitos e deveres respeitados

A seguir estatildeo listados na visatildeo da autora deste trabalho os principais obstaacuteculos para levar a

efeitos a educaccedilatildeo fiscal como tema a ser inserido no cotidiano social bem como na accedilatildeo dos atores

sociais de forma geral

Descreacutedito das instituiccedilotildees nos governantes e gestores puacuteblicos esse eacute sem duacutevida o maior

desafio a ser vencido para a praacutetica da educaccedilatildeo fiscal Por todo o ranccedilo histoacuterico de desmando inefi-

ciecircncia e ineficaacutecia a populaccedilatildeo tem seacuterias restriccedilotildees em acreditar que eacute possiacutevel mudar esse quadro

e que a sua participaccedilatildeo pode alterar essa realidade cristalizada em suas mentes passo fundamental

para uma atuaccedilatildeo mais cidadatilde Como esclarece Maria das Graccedilas Rua (apud GONCcedilALVES 2002 p 7)

ldquoA grande mudanccedila atual e que coincide com uma ampliaccedilatildeo do conceito de cidadania eacute a descoberta

de que o cidadatildeo pode influir tambeacutem na Administraccedilatildeo Puacuteblicardquo

Corrupccedilatildeo um dos maiores cacircnceres da Administraccedilatildeo Puacuteblica tornando por demais difiacutecil a missatildeo

daqueles que acreditam e praticam uma conduta eacutetica no serviccedilo puacuteblico Em geral eacute a primeira inda-

gaccedilatildeo dos increacutedulos ndash Pagar tributos e lutar para sua aplicaccedilatildeo se em verdade o dinheiro em grande

escala vai para o bolso de algueacutem Os escacircndalos sucessivos alimentam essa percepccedilatildeo

A cultura da ldquoLei de Gersonrdquo Desde a deacutecada de 1970 a expressatildeo ldquoLei de Gersonrdquo passou a ser

lugar-comum na sociedade brasileira Criada como motivo publicitaacuterio (cigarros) em que Gerson jo-

gador da seleccedilatildeo tricampeatilde mundial de futebol afirmava que gostava de levar vantagem em tudo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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(ldquocertordquo) passou a ser considerada accedilatildeo inteligente Afinal ser esperto eacute levar vantagem sobre os ou-

tros Isso se aplica agraves praacuteticas tributaacuterias com base na sonegaccedilatildeo aos comportamentos anticidadatildeos

de furar fila ou passar em sinal vermelho

Reduzida praacutetica de participaccedilatildeo ainda estaacute em decurso no Brasil a praacutetica da participaccedilatildeo prova-

velmente em funccedilatildeo de deacutecadas de regime de exceccedilatildeo eacute preciso superar essa zona de conforto Parti-

cipar exige comprometimento e nem sempre eacute confortaacutevel Afinal apesar de todos os compromissos

pessoais e profissionais de uma jornada de trabalho e em casa eacute preciso encontrar tempo para ler

para estar ciente do que acontece no Legislativo no Executivo como estatildeo sendo aplicados os recur-

sos puacuteblicos como corrobora Joseacute Oliacutempio Bastos (apud GONCcedilALVES 2002 p 3)

Temos tendecircncia a repudiar aquilo que nos incomoda e entatildeo nos limitamos a recla-mar sem nada fazer para que a situaccedilatildeo mude Mas eacute normal ao ser humano essa acomodaccedilatildeo Resta uma atitude a quem consegue enxergar tudo isso Atitude essa que natildeo deve restringir-se agrave indignaccedilatildeo mas agrave vontade de transformar essa realidade

Falta de transparecircncia ou cultura de sombras especialmente porque os legisladores e governantes

natildeo estatildeo habituados a esse controle social proposto pela educaccedilatildeo fiscal e como tal natildeo facilitam

o acesso por meio de uma informaccedilatildeo transparente apesar da Lei de Responsabilidade Fiscal que

estabelece a prestaccedilatildeo de contas ou a Lei de Acesso agrave Informaccedilatildeo A transparecircncia eacute qualidade fun-

damental e obrigatoacuteria quando se trata de gestatildeo puacuteblica (TORRES 2005 p 243)

A transparecircncia fiscal eacute um princiacutepio constitucional impliacutecito Sinaliza no sentido que a atividade financeira deve se desenvolver segundo os ditames da clareza abertura e simplicidade Dirige-se assim ao Estado como agrave sociedade tanto aos organismos financeiros supranacionais quanto agraves entidades natildeo governamentais Baliza e modula a problemaacutetica da elaboraccedilatildeo do orccedilamento e da sua gestatildeo responsaacutevel da criaccedilatildeo de norma antielisivas da abertura de sigilo bancaacuterio e do combate agrave corrupccedilatildeo

Concepccedilatildeo de um tema voltado para mera arrecadaccedilatildeo de tributos eacute muito comum quando da abor-

dagem do tema em sala de aula para professores profissionais liberais e outros existir no contato inicial

a sensaccedilatildeo de que se trata de mais um artifiacutecio do governo para aumentar a arrecadaccedilatildeo a exemplo do

que satildeo as campanhas de troca de notas fiscais por bocircnus financeiros sorteios de casas automoacuteveis etc

Tal percepccedilatildeo acontece ateacute que se verifique natildeo se tratar simplesmente de um programa de governo ou

poliacutetico-partidaacuterio mas sim de um programa de Estado ou seja natildeo se resume a uma visatildeo imediatista

mas sim de longo prazo de mudanccedila de cultura do cidadatildeo e do gestor que deveraacute aplicar aquele tributo

no bem-estar da sociedade assim volta para a sociedade o que de fato a ela pertence

Especificidade do tema quando se aborda a educaccedilatildeo fiscal e se ressalta a importacircncia da temaacutetica

eacute comum encontrar uma resistecircncia o receio de abordar um tema aparentemente aacuterido e complexo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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Como expresso anteriormente poreacutem natildeo se trata de formar tributaristas ou expertos em orccedilamento

e sim formar pensamento criacutetico sobre os tributos o papel do governo na gestatildeo dos recursos puacutebli-

cos e como se efetiva a participaccedilatildeo popular na Administraccedilatildeo Puacuteblica Feito isso a educaccedilatildeo fiscal

teraacute realizado com sucesso sua missatildeo

Como visto superar as dificuldades eacute um grande desafio para que a educaccedilatildeo fiscal tome as-

sento nas discussotildees nacionais e locais Exige esforccedilo de todos os lados do cidadatildeo comprometido

do estudante que sonha com um paiacutes melhor do professor que tencionava alterar uma realidade

perversa dos governantes eacuteticos dos servidores puacuteblicos que acreditam que eacute possiacutevel um futuro

mais digno Assim todos seratildeo vencedores e participantes de uma sociedade com mais equidade e

justiccedila social

3 A EDUCACcedilAtildeO FISCAL NO CEARAacute

O PEF - Cearaacute nasceu em 1998 datando de 14 de agosto daquele ano a aula inaugural do Pro-

grama veiculada pela TV Cearaacute por meio do sistema de telensino que se constituiacutea numa sistemaacutetica

de aula emitida pelo sistema puacuteblico de televisatildeo na sala de aula o orientador de aprendizagem (pro-

fessor) aprofundava os conceitos apresentados em viacutedeo-aula com suporte em material de didaacutetico

(SILVA 2007 p 84-85)

Desenvolve-se formalmente a Educaccedilatildeo Fiscal no Estado do Cearaacute mediante a parceria entre

Secretaria da Fazenda do Estado Secretaria da Receita Federal do Brasil ndash 3a Regiatildeo Fiscal (SRFB)

Prefeitura Municipal de Fortaleza (PMF) por intermeacutedio das Secretarias de Financcedilas (Sefin) e Educaccedilatildeo

do Municiacutepio (SME) Secretaria de Educaccedilatildeo do Estado (Seduc) e Centro Regional da Esaf (Centresaf)

constituindo desta forma o Grupo de Educaccedilatildeo Fiscal Estadual (Gefe Cearaacute)

O Gefe estabelece as accedilotildees de desenvolvimento do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal com base na

filosofia e premissas do programa nacional As accedilotildees satildeo implementadas a partir do grupo e da adesatildeo

de aliados criando-se uma rede de educaccedilatildeo fiscal Ressalte-se ainda que embora se tenha um grupo

agindo em parceria cada instituiccedilatildeo tem sua autonomia de desenvolver accedilotildees especiacuteficas em sua linha

de interesse

Dessa forma seratildeo apresentadas as praacuteticas desenvolvidas pela Ceacutelula de Educaccedilatildeo Fiscal da

Sefaz do Cearaacute sendo que algumas experiecircncias se datildeo em parceria com outras instituiccedilotildees e outras

satildeo de responsabilidade da Ceduf

O decreto de criaccedilatildeo do entatildeo Programa de Educaccedilatildeo Tributaacuteria (PET) de dezembro de 1998

anota a funccedilatildeo conscientizadora do Programa (CEARAacute 1998 p 1)

Art 1ordm - Fica criado o Programa Educaccedilatildeo Tributaacuteria junto agraves instituiccedilotildees de Ensino objetivando conscientizar as pessoas sobre a importacircncia do pagamento de tributos

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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um dos principais deveres do cidadatildeo bem como o de esclarecer sobre o papel do Estado de arrecadar tributos e aplicaacute-los eficientemente para o desenvolvimento da sociedade

Os objetivos do entatildeo chamado PET foram elaborados nessa perspectiva da disseminaccedilatildeo de

informaccedilotildees e conhecimentos para a praacutetica da cidadania conforme estabelece seu projeto (CEARAacute

1998 p 3)Geral evidenciar que a educaccedilatildeo tributaacuteria contribui para a construccedilatildeo da cidadaniaEspeciacuteficos Esclarecer a populaccedilatildeo que o pagamento de tributos eacute um dos principais deveres do cidadatildeo e eacute dever do Estado arrecadar tributos e aplicaacute-los eficientemente para o desenvolvimento da sociedadeEstimular o exerciacutecio da cidadania sensibilizando a populaccedilatildeo para a importacircncia de acompanhar a correta aplicaccedilatildeo dos recursos arrecadados atraveacutes dos canais legais de participaccedilatildeoDespertar no estudante a consciecircncia quanto agrave exigecircncia do documento fiscal como mecanismo gerador de recursos puacuteblicos

Para fortalecer o PEF a Sefaz criou em 2007 a Ceacutelula de Educaccedilatildeo Fiscal (Ceduf) Assim a

educaccedilatildeo fiscal deixou de ser um programa desenvolvido por um setor de planejamento e passou a

fazer parte da estrutura organizacional Atualmente a Ceduf conta com 07 servidores fazendaacuterios e 03

terceirizados que tecircm como missatildeo disseminar a educaccedilatildeo fiscal no Estado do Cearaacute aleacutem do apoio

de diversos colaboradores que mesmo natildeo sendo lotados na Ceacutelula participam de accedilotildees como ca-

pacitaccedilatildeo palestras oficinas O conceito que se busca eacute o envolvimento de servidores fazendaacuterios de

setores diversos com a educaccedilatildeo fiscal

O PEF tem produzido sistematicamente materiais que instrumentalizem as accedilotildees e facilitem a

compreensatildeo da relaccedilatildeo entre tributos e cidadania observando o preceito de adequaccedilatildeo dos conte-

uacutedos ao puacuteblico e a especificidade regional garantindo a identificaccedilatildeo do participante do programa e

o conteuacutedo disponibilizado Atualmente satildeo os seguintes os materiais pedagoacutegicos utilizados

- livros de aluno e professor de ensino fundamental II

- apostila de capacitaccedilatildeo para a formaccedilatildeo de professores e servidores puacuteblicos

- viacutedeo-aulas

- desenho animado ndash ldquoA turma da Cidadaniardquo ndash em DVD com trecircs histoacuterias sobre cidadania

tributos e ICMS produzidos pela Casa Amarela ndash Universidade Federal do Cearaacute - UFC e destinados a

crianccedilas do ensino fundamental I

- revista em quadrinhos com as mesmas personagens do desenho animado

- peccedila de teatro ldquoA comeacutedia da Cidadaniardquo escrita pelo dramaturgo cearense Joseacute Mapurunga

- Jogo da Cidadania jogo de tabuleiro no qual o participante segue uma trilha com informaccedilotildees

sobre tributos e cidadania

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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- Bloco de atividade caderno para realizaccedilatildeo de atividades luacutedicas envolvendo os conceitos de

educaccedilatildeo fiscal

- Cadernos impressos pela ESAF para o curso disseminadores de educaccedilatildeo fiscal

- CD com o conteuacutedo do curso Disseminadores de Educaccedilatildeo Fiscal

- Fasciacuteculos do curso Educaccedilatildeo Fiscal e Cidadania

Neste momento estatildeo em fase de produccedilatildeo novos livros didaacuteticos para alunos e professores

do ensino fundamental II ensino meacutedio e universidades fortalecendo o conteuacutedo e sedimentando o

conhecimento produzido no PEF Cearaacute

Utilizando-se desse material o PEF realiza as capacitaccedilotildees de professores promove semi-

naacuterios estaduais participa de feiras e eventos acadecircmicos recebe visita de estudantes de escolas

puacuteblicas e privadas na Sefaz forma servidores puacuteblicos no tema realiza palestras em universidades

escolas puacuteblicas e privadas associaccedilotildees empresariais e sindicais ONGS comunidades enfim nas

mais variadas situaccedilotildees nas quais existam pessoas dispostas a discutir cidadania e aprender a prati-

car o controle social

31 Projetos em destaque

Entre as atividades realizadas pela Ceduf2 algumas satildeo destacadas pelos resultados obtidos e

tambeacutem pelo pioneirismo na sua realizaccedilatildeo Os dados apresentados a seguir estatildeo contemplados nos

relatoacuterios anuais disponibilizados pela Sefaz no seu siacutetio de internet wwwsefazcegovbr

311 Educaccedilatildeo a distacircncia

O Cearaacute tem trabalhado com a formaccedilatildeo a distacircncia via internet de disseminadores de edu-

caccedilatildeo fiscal especialmente destinado a professores e servidores puacuteblicos das trecircs esferas de governo

promovida pela Esaf Trata-se de um instrumento que possibilita a participaccedilatildeo de cidadatildeos de forma

ampliada vencendo a barreira geograacutefica e de tempo Satildeo cerca de 6600 disseminadores jaacute formados

desde 2003 O Cearaacute tem 70 tutores servidores das instituiccedilotildees gestoras do PEF Cearaacute capacitados

para atuarem no acompanhamento das turmas anuais do curso Disseminadores de Educaccedilatildeo Fiscal

(DEF) Aleacutem da tutoria os servidores que atuam nessa funccedilatildeo satildeo importantes parceiros em diversas

atividades de divulgaccedilatildeo sensibilizaccedilatildeo e formaccedilatildeo em educaccedilatildeo fiscal

O curso tem atualmente 120 horasaulas dividido em cinco moacutedulos Educaccedilatildeo fiscal no con-

texto social Relaccedilatildeo Estado-sociedade Funccedilatildeo social dos tributos Gestatildeo democraacutetica dos recursos

puacuteblicos e Projetos em educaccedilatildeo fiscal

2 Informaccedilotildees sobre as atividades e os resultados obtidos pelo PEF Cearaacute e Ceduf podem ser visualizados no siacutetio da Sefaz Cearaacute wwwsefazcegovbr

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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Um resultado do curso DEF eacute a implementaccedilatildeo de projetos pedagoacutegicos e planos de accedilatildeo ela-

borados pelos participantes nos quais satildeo realizadas accedilotildees de educaccedilatildeo fiscal destinadas aos mais

diversos puacuteblicos garantindo capilaridade e amplificaccedilatildeo da educaccedilatildeo fiscal corroborando a caracte-

riacutestica universal da temaacutetica A implementaccedilatildeo de projetos possibilidade aliar teoria agrave praacutetica perce-

bendo o exerciacutecio da educaccedilatildeo no seu cotidiano

312 Seminaacuterios e palestras

Os seminaacuterios e palestras constituem-se em uma das principais atividades de educaccedilatildeo fiscal

pois marcam o contato direto do PEF com o seu puacuteblico Oportunidade de dialogar e apresentar a

proposta da educaccedilatildeo fiscal para a cidadania Jaacute foram promovidos eventos em universidades esco-

las de ensino baacutesico e meacutedio sindicatos associaccedilotildees profissionais etc Desde a institucionalizaccedilatildeo da

educaccedilatildeo fiscal na Secretaria da Fazenda com a criaccedilatildeo da Ceduf as accedilotildees tecircm sido intensificadas pela

dedicaccedilatildeo exclusiva da equipe de servidores entre 2008 e 2013 foram sensibilizadas cerca de 11600

pessoas entre capital e interior do Estado

313 Monitores de Educaccedilatildeo Fiscal

A Secretaria da Fazenda assinou convecircnio com a Secretaria da Educaccedilatildeo (Seduc) em 2007

para disponibilizar estaacutegios remunerados a jovens da rede puacuteblica estadual de ensino O objetivo eacute

formar grupos para disseminaccedilatildeo junto agrave escola comunidade e famiacutelia sobre aspectos ligados agrave eacutetica

cidadania e da funccedilatildeo social do tributo A parte praacutetica do curso acontece no Programa Sua Nota Vale

Dinheiro que desenvolve um projeto voltado para a conscientizaccedilatildeo do cidadatildeo sobre a importacircncia

da exigecircncia da nota fiscal na aquisiccedilatildeo de bens e serviccedilos Ateacute o final de 2013 a Sefaz contou com a

participaccedilatildeo de 1377 estagiaacuterios

314 Educaccedilatildeo Fiscal Itinerante

Ao considerar a necessidade de sensibilizar o puacuteblico interno o Projeto objetiva disseminar de

forma criacutetica e reflexiva os conteuacutedos da Educaccedilatildeo Fiscal no local de trabalho do servidor e do colabo-

rador fazendaacuterio A ideia eacute que o puacuteblico interno possa refletir como e em que medida o Programa de

Educaccedilatildeo Fiscal pode ser inserido no exerciacutecio das suas atividades funcionais e no cotidiano No mo-

mento em que o agente do Fisco incorporar a essecircncia da Educaccedilatildeo Fiscal eacute possiacutevel a praacutexis do PEF

e por conseguinte uma nova cultura tributaacuteria O Projeto jaacute alcanccedilou 229 servidores e colaboradores

tendo sido iniciado em 2013

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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315 Cidadania Fiscal para Universitaacuterios

O projeto compreende a realizaccedilatildeo de capacitaccedilatildeo de estudantes universitaacuterios e tem por ob-

jetivo disseminar a funccedilatildeo social do tributo e seu papel para a consecuccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas de

melhoria da qualidade de vida dos cidadatildeos possibilitando a instrumentalizaccedilatildeo dos estudantes para

o exerciacutecio profissional a participaccedilatildeo e o controle social Em 2013 foi realizado em parceria com o

Conselho Regional de Contabilidade (CRC) no Cearaacute e teve 104 alunos capacitados A atividade contou

com a participaccedilatildeo do SRFB Centresaf Sefin e Tribunal de Contas do Municiacutepio (TCM) abordando os

temas referentes agraves suas responsabilidade na tributaccedilatildeo e no controle social A primeira experiecircncia

do curso foi voltada para alunos do curso de Ciecircncias Contaacutebeis ofertando uma formaccedilatildeo sintonizada

com papel social e cidadatildeo do profissional de contabilidade um dos mediadores das relaccedilotildees entre o

fisco e a sociedade

A Ceduf tambeacutem desenvolveu uma outra versatildeo do curso para alunos universitaacuterios de cursos

superiores diversos possibilitando uma visatildeo sistecircmica da tributaccedilatildeo e da cidadania O curso foi rea-

lizado em parceria com a Faculdade Ateneu e Universidade Vale do Acarauacute que formaram conjunta-

mente 109 alunos na temaacutetica

316 Noccedilotildees de Cidadania Fiscal para Moradores de Comunidades

O objetivo eacute proporcionar uma reflexatildeo inicial acerca da cidadania fiscal para moradores de co-

munidades proacuteximas agraves unidades da Sefaz no intuito de contribuir para sua emancipaccedilatildeo social e hu-

mana A partir de atividades luacutedicas os participantes vivenciam a realidade da cidadania e dos tributos

aproximando-se assim do Fisco Em 2013 foram formadas trecircs turmas sendo os alunos moradores

das Comunidades Poccedilo da Draga Moura Brasil e Graviolas todas proacuteximas agraves sedes I II e II da Sefaz

em Fortaleza somando um total de 41 participantes

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

A educaccedilatildeo fiscal mostra-se como contribuiccedilatildeo para a formaccedilatildeo cidadatilde da populaccedilatildeo brasileira

Nas mais variadas accedilotildees executadas pelo Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Cearaacute entre as quais pales-

tras seminaacuterios e cursos observa-se a reaccedilatildeo positiva aos aspectos abordados relativos aos direitos e

deveres a atividade arrecadadora do Estado e a consequente necessidade do cidadatildeo exercer o acom-

panhamento da aplicaccedilatildeo do dinheiro puacuteblico

A educaccedilatildeo fiscal se propotildee a ser um canal de acesso a esse conhecimento A sua praacutetica nos

diversos segmentos sociais a partir da disseminaccedilatildeo dos valores relativos ao exerciacutecio da gestatildeo puacute-

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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blica com eacutetica e respeito ao cidadatildeo constitui contribuiccedilatildeo relevante ao exerciacutecio do controle social

A educaccedilatildeo eacute uma ferramenta primordial em qualquer esforccedilo de transformaccedilatildeo que se queira imple-

mentar em uma naccedilatildeo

O debate sobre a educaccedilatildeo fiscal eacute assunto obrigatoacuterio natildeo soacute no sentido curricular mas tam-

beacutem como praacutetica social De fato eacute necessaacuterio discutir a educaccedilatildeo brasileira seu curriacuteculo e suas praacute-

ticas na busca de uma accedilatildeo mais libertadora e natildeo pela simples formaccedilatildeo em conteuacutedos de leitura e

operaccedilotildees matemaacuteticas A formaccedilatildeo humana somente com esses conteuacutedos eacute pobre e pouco revolu-

ciona o status quo A escola eacute espaccedilo de construccedilatildeo de uma nova realidade sem o que se estaacute fadado

ao continuiacutesmo e agrave falta de perspectivas

Tal fato por si eacute respaldo para que cada vez mais se busque a compreensatildeo de como se processa

a histoacuteria do cidadatildeo e de sua Naccedilatildeo Para cada passo dado em direccedilatildeo a uma sociedade mais justa

estaraacute em sua base o conhecimento sobre como acontece a arrecadaccedilatildeo e como se deve acompanhar

e controlar o gasto puacuteblico Este fato natildeo ocorre soacute nos gabinetes das Assembleias e cacircmaras alta e

baixa tambeacutem mas no cotidiano Para que o futuro reserve uma sociedade cada vez mais participativa

e um cidadatildeo atuante e engajado satildeo necessaacuterios conhecimento e informaccedilatildeo que vecircm nos debates

sobre cidadania Nesse aspecto a educaccedilatildeo fiscal deve colaborar de forma efetiva com esse novo Paiacutes

que se busca na equidade social e na participaccedilatildeo

O que a experiecircncia da Ceduf no Cearaacute tem registrado eacute o crescente interesse das pessoas

em acessarem o saber das questotildees tributaacuterias compreendendo como se processa a administraccedilatildeo

puacuteblica dos recursos disponibilizados pelo cidadatildeo para o fornecimento dos serviccedilos puacuteblicos a eles

destinados

Cada vez mais pulsa o desejo de participar e isso requer conhecimento do processo A educa-

ccedilatildeo fiscal se torna a cada dia mais importante A resistecircncia oriunda do descreacutedito tende a ser substi-

tuiacuteda pela vontade de aprender para transformar Sair agraves ruas como se tem visto desde 2012 tem se

tornado um haacutebito e para que se torne uma praacutetica cidadatilde eacute necessaacuterio se apropriar do conhecimento

para encontrar os equiacutevocos da gestatildeo puacuteblica e apontar novas perspectivas

Natildeo se pode falar em direitos de cidadania sem uma base financeira que os sustentem Vida em

sociedade deve pressupor solidariedade e essa eacute a funccedilatildeo do tributo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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REFEREcircNCIAS

BRASIL Ministeacuterio da Fazenda Escola de Administraccedilatildeo Fazendaacuteria (Esaf) Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal Brasiacutelia 2002

BASTOS Joseacute Oliacutempio Senhor cidadatildeo vocecirc eacute o patratildeo Beleacutem Independente 2000

CARVALHO Joseacute Murilo de Cidadania no Brasil o longo caminho 4 ed Rio de Janeiro Civilizaccedilatildeo Brasileira 2003

CEARAacute Decreto n 25326 de 23 de dezembro de 1998 Institui o Programa de Educaccedilatildeo Tributaacuteria do Cearaacute

______ Secretaria da Fazenda do Cearaacute Programa de Educaccedilatildeo Tributaacuteria Fortaleza 1998

______ Secretaria da Fazenda do Cearaacute Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute (PEF Cea-raacute) Disponiacutevel em wwwsefazcegovbr Acesso em 05 fev 2014

COELHO Carolina Marra S Cidadania em poliacuteticas puacuteblicas voltadas para mulheres em situaccedilatildeo de violecircncia de gecircnero 2005 168f Dissertaccedilatildeo (Mestrado em Psicologia Social) Universidade Catoacutelica de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 2005

CORBARI Ely Ceacutelia Accountability e controle social desafio agrave construccedilatildeo da cidadania Cadernos da Escola de Negoacutecios da Unibrasil Satildeo Paulo janjun 2004

DEMO Pedro Participaccedilatildeo eacute conquista noccedilotildees de poliacutetica social participativa 5 ed Satildeo Paulo Cor-tez 2001

DIMENSTEIN G O cidadatildeo de papel 19 ed Satildeo Paulo Aacutetica 2001

KARNAL Leandro Estados Unidos liberdade e cidadania In PINSKY Jaime PINSKY Carla Bassanezi (org) Histoacuteria da cidadania Satildeo Paulo Contexto 2003

GONCcedilALVES Joatildeo Gomes Eacutetica na gestatildeo fiscal-cidadania experiecircncia do Programa Nacional de Edu-caccedilatildeo Fiscal Brasil In VII Congresso Internacional del Clad Sobre laacute Reforma del Estado y de la Administracion Puacuteblica Lisboa 2002

MONDAINI Marco O respeito aos direitos dos indiviacuteduos In PINSKY Jaime PINSKY Carla Bassanezi (org) Histoacuteria da Cidadania 2 ed Satildeo Paulo Contexto 2003

MARSHALL TH Cidadania classe social e status Rio de Janeiro Jorge Zahar 1967

PINSKY Jaime PINSKY Carla Bassanezi (org) Histoacuteria da cidadania Satildeo Paulo Contexto 2003

RUA Maria das Graccedilas O contexto contemporacircneo de atuaccedilatildeo do Estado as novas relaccedilotildees esta-dosociedade Brasiacutelia Esaf 2002

SILVA Imaculada Programa de Educaccedilatildeo Fiscal e Escola caminhos e descaminhos na construccedilatildeo da cidadania Revista Poliacuteticas Puacuteblicas amp Sociedade v 1 n 1 juldez 2010

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

62

SILVA Francisco Carlos da Cruz Controle social reformando a administraccedilatildeo para a sociedade Brasiacute-lia Publicaccedilotildees do Tribunal de Contas da Uniatildeo 2002

SILVA Imaculada MOTA Luiza O S MACHADO Sandra O La Educacioacuten Fiscal en el Estado brasilentildeo de Cearaacute In RIVILLAS D Borja PEacuteREZ Angeles TORRE Tereza (org) Educacioacuten Fiscal y Cohesioacuten Social Experiencias de Ameacuterica Latina Madrid Instituto de Estudios Fiscales 2010

TORRES Ricardo Lobo Tratado do Direito Constitucional Financeiro e Tributaacuterio Satildeo Paulo Reno-var 2005

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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PARTE II

TRIBUTACcedilAtildeO E CIDADANIA FISCAL

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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A RIQUEZA AO ALCANCE DE TODOS OS TRIBUTOS

Alberto Amadei Neto1

SUMAacuteRIO 1 Os ldquosem-impostordquo 2 O fim da meada poliacutetica tributaacuteria 3 Os super-ricos e as desigualdades 4 A Constituinte e o Parlamento 5 Os sem--fortunas nenhumas 6 O diagnoacutestico do Ipea 7 Os condenados agrave ldquorepressatildeo fiscalrdquo 8 Os sem-imposto no paiacutes dos contrastes 9 Os weberianos estariam chegando 10 Os moedeiros grandes e seus pretextos falsos Referecircncias

ldquoPergunto-lhes quais satildeo as outras soluccedilotildees O livre mercado e governos autoritaacuterios natildeo resolveram o problema Natildeo sou dogmaacutetico soacute estou tentando provocar discus-satildeordquo

Rauacutel Prebisch

Para Lina Maria Vieira em testemunho da sua notaacutevel competecircncia inquebraacutevel es-piacuterito puacuteblico e extraordinaacuteria dedicaccedilatildeo enquanto Secretaacuteria da Receita Federal do Brasil onde fez subirem de relevo a educaccedilatildeo fiscal a meritocracia eacutetica a coopera-ccedilatildeo federativa o fortalecimento aduaneiro e a fiscalizaccedilatildeo dos grandes contribuintes como poliacuteticas estrateacutegicas da administraccedilatildeo tributaacuteria federal

Um imposto sobre fortunas grandes ldquoQuando a verdade natildeo puder ser mostrada nua e crua vista-a com humor e ironia Pode fazer isso Vou tentarrdquo

A Noite da Borboleta Dourada

ldquoO aumento da canalhice no Brasil eacute resultado da maacute distribuiccedilatildeo de rendardquoMillocircr Fernandes

1 OS ldquoSEM-IMPOSTOrdquo

O jornalista Janio de Freitas natildeo poderia ter sido mais feliz ao traduzir o universo dos super-ri-

cos quando repisou o fato social do Brasil ser ldquoum paiacutes tatildeo cheio de riquezas prepotentes e avarasrdquo

(FREITAS 2013)

A acumulaccedilatildeo no Brasil de grandes fortunas faz eco a um termo cunhado em 1903 (MILL 1974)

Fruto de um padratildeo cultural enraizado na arrogacircncia e luxo da Casa Grande por meio de relaccedilotildees

privilegiadas junto aos donos do poder caldeado e inserido em ldquoum ciacuterculo impermeaacutevel de poder e

mandordquo que as tornaram infensas ao manancial tributaacuterio existente exceto quanto a benesses originaacute-

1 Graduado em Administraccedilatildeo Puacuteblica pela Escola de Administraccedilatildeo de Empresas de Satildeo Paulo da Fundaccedilatildeo Getulio Var-gas com especializaccedilatildeo em Poliacutetica Fiscal e Financcedilas Puacuteblicas pela Escola Interamericana de Administraccedilatildeo Puacuteblica da Fun-daccedilatildeo Getulio Vargas do Rio de Janeiro Auditor da Secretaria da Receita Federal do Brasil E-mail albertoamadei-netoreceitafazendagovbr

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rias de estiacutemulos fiscais cambiais e creditiacutecios de toda ordem agrave custa do Eraacuterio do qual sempre foram

clientes preferenciais (FAORO 2012)

Ulysses Guimaratildees deixou-nos uma liccedilatildeo inolvidaacutevel quando desvelou ao cabo do processo

constituinte da redemocratizaccedilatildeo brasileira a razatildeo de termos marchado duas deacutecadas assombradas

pelo mandonismo autoritaacuterio e o arbiacutetrio

Dizendo-se ldquovelho nunca velhacordquo carimbou o frontispiacutecio da Carta de 88 com um sapientiacutessi-

mo vaticiacutenio ldquotraidor da Constituiccedilatildeo eacute traidor da paacutetria conhecemos o caminho maldito rasgar

a Constituiccedilatildeordquo

Infelizmente a afirmaccedilatildeo imperativa do lendaacuterio deputado federal do MDB cujo valor poliacutetico

e literaacuterio eacute memoraacutevel natildeo constou da Carta Magna

Seu pronunciamento antoloacutegico faz parte apenas das notas taquigraacuteficas daquele momento

histoacuterico encravado no dia 5 de outubro de 1988 que marca a promulgaccedilatildeo da ldquoConstituiccedilatildeo Cidadatilderdquo

data do reencontro preliminar e parcial do Povo brasileiro com o Estado e a Naccedilatildeo

A fortuna grande aleacutem de ser uma base tributaacuteria inexplorada sistematicamente negligencia-

da tambeacutem remete ao indispensaacutevel incremento do financiamento da coesatildeo social dentro do marco

da legitimidade constitucional de um Estado Democraacutetico de Direito

Natildeo mais sendo toleraacutevel nem sua dilaccedilatildeo e menos ainda revisitaccedilotildees como tantas outras

vezes agrave repisada polecircmica quanto agrave inconveniecircncia econocircmica da sua regulamentaccedilatildeo a pretexto

de sua presumida insignificacircncia no domiacutenio fiscal e supostos malefiacutecios agrave produccedilatildeo e circulaccedilatildeo de

mercadorias e serviccedilos

As sucessivas crises financeiras desde a quebra do Meacutexico em 1994 agrave crise global de 2008 que

motivaram inuacutemeros planos de ajustes recessivo-estruturais natildeo deixam duacutevida a respeito do cabi-

mento loacutegico e da procedecircncia macroeconocircmica do tributo sobre a grande fortuna (SMITH 2013)

Ademais o ordenamento constitucional recepcionou a legiacutetima motivaccedilatildeo da justiccedila fiscal no

capiacutetulo das financcedilas puacuteblicas apoacutes um prolongado debate na Assembleia Nacional Constituinte du-

rante o periacuteodo que medeia entre 1ordm de fevereiro de 1987 ateacute 05 de outubro de 1988 (GIFFONI 1987)

A previsatildeo constitucional do Imposto sobre Grandes Fortunas (IGF) portanto emerge desse

processo partejado pela Emenda Constitucional nordm 26 de 27 de novembro de 1985 O tributo incrus-

tado no artigo 153 engastado no seu inciso VII ainda consta da Constituiccedilatildeo Federal vigente Mais

de um quarto de seacuteculo jaacute decorreu e a disposiccedilatildeo constitucional ainda natildeo logrou ser regulamen-

tada para integrar o nosso sistema tributaacuterio A heranccedila constitucional eacute de ser recuperada Natildeo de-

veria prevalecer a tese de alguns criacuteticos acendrados de que a naccedilatildeo brasileira seja desmemoriada

Tal afirmativa retrata o descaso com que se contorna o passado para manejar necessidades atuais

indesejaacuteveis

A transiccedilatildeo do Estado Novo para o sistema constitucional de 1946 ainda recendendo ao fim da

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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II Guerra Mundial foi impulsionada de maneira exclusiva pelas demandas do Tesouro A partir daiacute as

circunstacircncias restritivas foram sendo vencidas por modelos e organizaccedilotildees que plasmaram o hori-

zonte tributaacuterio brasileiro (SILVA 1986)

Sobrepocircs-se nesse periacuteodo a presenccedila de Gerson Augusto da Silva na Comissatildeo Especial que

formatou o Coacutedigo Tributaacuterio Nacional em 1954

A principal das reformas a tributaacuteria da Emenda Constitucional nordm 18 de 01 de dezembro de

1965 natildeo atacou a concentraccedilatildeo da renda e da riqueza nacional ainda que haja pretendido alguma

progressividade e seletividade no redesenho da matriz tributaacuteria brasileira ensaiada gradualmente

desde 1946

Como se vecirc o processo de acumulaccedilatildeo das riquezas prepotentes e avaras simultaneamente

ao aprofundamento da distribuiccedilatildeo social desigual da renda perdura faz muito tempo e alonga-se por

um interregno bem mais largo do que as duas deacutecadas consumidas na concretizaccedilatildeo da concepccedilatildeo

gersoniana da tributaccedilatildeo nacional

O que salta aos olhos apoacutes uma mirada dos uacuteltimos 70 (setenta) anos eacute o extraordinaacuterio ecircxito

poliacutetico e magniacutefica engenhosidade econocircmica nos procedimentos de blindagem patrimonial invul-

neraacuteveis agrave fixaccedilatildeo de um tributo ou contribuiccedilatildeo social no domiacutenio das grandes fortunas

Impossiacutevel deixar de reconhecer no IGF a compatibilidade com o sentido da poliacutetica tributaacuteria

do genial Gerson Augusto da Silva ambos concatenados enquanto mecanismos de promoccedilatildeo do de-

senvolvimento na perspectiva de que quando se modificam as estruturas de rendas disponiacuteveis e dos

preccedilos relativos o instrumental tributaacuterio deve ser utilizado para auxiliar a induccedilatildeo e correccedilatildeo

dos seus resultados

Nem soacute deixamos de admitir a existecircncia de um passado constituinte como desrespeitamos

o presente ao nos deparamos com ele mesmo se a sua legitimidade seja expliacutecita no texto consti-

tucional

A inexistecircncia do IGF representa o maior exemplo da iniquidade do sistema tributaacuterio nacional

caso levadas ao peacute da letra tanto as anotaccedilotildees ortograacuteficas sobre o radical do termo do latim iniqui-tate quanto agrave formidaacutevel desigualdade da carga tributaacuteria suportada pelos brasileiros inversamente

proporcional agrave renda pessoal e agrave capacidade contributiva

Uma realidade fiscal cuja origem abissal natildeo escapou do olhar penetrante do maior constitucio-

nalista brasileiro vivo ldquoEacute a mais desumana concentraccedilatildeo de renda do mundordquo

O insigne jurista aprofunda o seu diagnoacutestico a respeito da escandalosa assimetria do processo

de acumulaccedilatildeo da riqueza no nosso Paiacutes ldquoNatildeo transgride tal inconstitucionalidade a essecircncia dos di-

reitos fundamentais de todos os graus e dimensotildeesrdquo (BONAVIDES 1999)

A indagaccedilatildeo do nonagenaacuterio jurisconsulto arranca de uma visatildeo social que abrange um espec-

tro de pelo menos seis deacutecadas e natildeo esconde sua perplexidade ldquoComo foi possiacutevel a Naccedilatildeo retroce-

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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der tanto Socialmente o Brasil eacute o paiacutes mais injusto do mundo por um paradoxo sua riqueza fez seu

povo mais pobre e suas elites mais ricas numa proporccedilatildeo de desigualdade que assombra cientistas

sociais e juristas de todos os paiacutesesrdquo (BONAVIDES 1999)

O professor emeacuterito natildeo paacutera aiacute ao falar do ldquoinfortuacutenio desse povordquo cuja natureza deriva de

ldquoa classe dominante empenhar-se em aprofundar a injusticcedila social em governar unicamente para as

elites e em perpetuar o status quo de iniquumlidade e violecircncia que eacute a desonra de uma Naccedilatildeordquo

O Grande Dicionaacuterio Porto Editora trata a iniquidade como injusticcedila perversidade corrupccedilatildeo

nos costumes crime O Dicionaacuterio Houaiss diz que a iniquidade eacute ainda accedilatildeo ou coisa contraacuteria agrave

moral e agrave religiatildeo ato contraacuterio agrave justiccedila ato perverso maldade

O lapso tributaacuterio calcado na perda da memoacuteria constituinte no caso do IGF eacute claramente se-

letivo e coincide totalmente com a niacutetida percepccedilatildeo identificada ldquoparticularmente nas classes de

altas rendas do desejo de natildeo pagar impostosrdquo (FURTADO 1963)

2 O FIO DA MEADA DA POLIacuteTICA TRIBUTAacuteRIA

ldquoArbitraram-se nas passadas vaacuterios modos de tributos para remeacutedio da conservaccedilatildeo do Reino mas como esses tributos natildeo foram efetivos como estes remeacutedios saiacuteram ineficazes importa agora remediar os remeacutediosrdquo

Padre Antocircnio Vieira

ldquoO objetivo dos detentores de riqueza eacute maximizar o ganho monetaacuterio Natildeo querem maximizar o produtordquo

Gonzaga Belluzzo

Se o Tesouro Nacional natildeo pode prescindir de financiamento custeio e investimento o imposto

natildeo pode deixar de ser uma das suas fontes de abastecimento sem o que natildeo haacute Estado e muito me-

nos a prestaccedilatildeo incontornaacutevel dos serviccedilos puacuteblicos A exceccedilatildeo a tal concepccedilatildeo geneacuterica encontra-se

reduzida a alguns autores anarquistas

A tributaccedilatildeo moderna estrutura-se com fulcro em trecircs eixos articulaacuteveis Primeiramente o raso

estritamente fiscal de arrecadar recursos para cobrir as despesas puacuteblicas

Segundo o estrateacutegico essencialmente social de melhorar a distribuiccedilatildeo da renda e da riqueza

Terceiro o taacutetico basicamente funcional de orientar a poupanccedila o investimento e a produccedilatildeo

para corrigir as imperfeiccedilotildees e assimetrias congecircnitas aos mercados

O objetivo fiscal historicamente precedeu aos demais e ainda hoje muitos tributos soacute se jus-

tificam como instrumentos de arrecadaccedilatildeo como o Imposto sobre Operaccedilotildees Financeiras que foi o

sucessor pela Emenda Constitucional nordm 18 do extinto Imposto do Selo

O objetivo social estaacute contido na ideia de usar os impostos como meio de melhorar a distribui-

ccedilatildeo de renda e da riqueza de um Paiacutes e data do iniacutecio do seacuteculo passado

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O princiacutepio que desde entatildeo se firmou foi o de tributar progressivamente a renda as heranccedilas e

os ganhos de capital Qual o iacutendice ideal de progressividade do sistema tributaacuterio nacional eacute questatildeo

em tese aberta aos juiacutezos de valor

Em paiacuteses marcadamente desiguais com sinais de riqueza opulenta conspiacutecua natildeo mais deve-

ria secirc-lo face ao caso concreto do Brasil descrito como ldquoo candidato a campeatildeo mundial da desigual-

dade econocircmicardquo (HOBSBAWN 1996) Impostos fortemente progressivos inequivocamente melhoram

a distribuiccedilatildeo social da renda natildeo tanto pelo aumento da base mas pelo corte no topo pela dimi-

nuiccedilatildeo da renda disponiacutevel dos muito ricos Haacute elementos de evidecircncia empiacuterica a sublinhar Sueacutecia

e Inglaterra costumavam apresentar muitos bons iacutendices de equidade social embora suas taxas de

crescimento econocircmico correspondentes natildeo fossem altas O objetivo funcional remete ao exemplo

tradicional claacutessico atualmente subjugado aos ditames da Organizaccedilatildeo Mundial de Comeacutercio (OMC)

das tarifas aduaneiras protecionistas destinando-se a alguma finalidade econocircmica que natildeo a mera

arrecadaccedilatildeo de tributos com vistas a neutralizar as imperfeiccedilotildees do mercado no que tange agrave forma-

ccedilatildeo de poupanccedilas e agrave orientaccedilatildeo dos investimentos e da produccedilatildeo No Brasil os gravames e isenccedilotildees

tributaacuterias satildeo de cunho nitidamente funcional e alguns exemplos expliacutecitos merecem ser trazidos agrave

tona os incentivos do IRPJ aos investimentos no Norte e Nordeste bem como em turismo e reflores-

tamento agrave subscriccedilatildeo de accedilotildees de sociedades anocircnimas de capital aberto o extinto creacutedito-precircmio

do IPI agraves exportaccedilotildees a permissatildeo de deduccedilatildeo em dobro ateacute 5 do lucro das despesas feitas pelas

pessoas juriacutedicas em educaccedilatildeo e treinamento de pessoal

Oportuno trazer agrave baila um elemento filosoacutefico teoricamente todo incentivo deveria represen-

tar a contrapartida de alguma imperfeiccedilatildeo de mercado o que implica dizer que natildeo seria dado incen-

tivo a um setor soacute porque possui rentabilidade baixa Os incentivos deveriam caber apenas dentro de

uma hipoacutetese a dos custos sociais serem inferiores aos privados neutralizando as diferenccedilas (FINAN-

CcedilAS 1982) Natildeo eacute o caso por exemplo do incentivo dos ldquojuros sobre capitais proacutepriosrdquo e isenccedilatildeo aos

lucros e dividendos distribuiacutedos aos soacutecios criados em 1995

O fato social representado pelo elenco de milionaacuterios e bilionaacuterios brasileiros natildeo existentes

por exemplo haacute trinta anos eacute que centenas de bilhotildees de reais foram canalizadas para o senhorio da

Casa Grande sem que se levasse em conta a noccedilatildeo da capacidade contributiva como lastro dos bene-

fiacutecios e incentivos fiscais

Vale dizer os beneficiaacuterios das renuacutencias fiscais e precircmios tributaacuterios foram os habitantes do

ldquoBrasil de cimardquo E como soacutei secirc-lo sempre em nome do ldquoBrasil de baixordquo

Se cada um que dispotildee de capacidade de contribuiccedilatildeo para fazer frente agraves despesas puacuteblicas

natildeo o fez na justa medida em que deveria tecirc-lo feito por certo natildeo houve a reparticcedilatildeo equacircnime dos

sacrifiacutecios entre todos de sorte que com vistas agrave reforma social tambeacutem via tributaccedilatildeo cada dia que

passa tarda demasiado no ajustamento da conta fiscal dos muito ricos que sempre foram os maiores

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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beneficiaacuterios do sistema tributaacuterio nacional especialmente nas uacuteltimas trecircs deacutecadas (HUGON 1967)

O princiacutepio da capacidade contributiva estaacute apoiado tanto no pensamento conservador quan-

to no revolucionaacuterio

O jovem Marx nos seus Manuscritos econocircmicos e filosoacuteficos genericamente assim o re-

sumira enquanto princiacutepio basilar ldquode cada um segundo sua capacidade a cada um segundo sua

necessidaderdquo

Jaacute Stuart Mill seu antiacutepoda percebia que ldquotampouco uma reduccedilatildeo repentina do capital teria

qualquer efeito no empobrecimento do paiacutes a menos que se tratasse de uma reduccedilatildeo muito granderdquo

isto porque ldquodepois de alguns meses existiria no paiacutes exatamente tanto capital como se nenhuma

parcela tivesse saiacutedordquo

Nos seus ldquoPrinciacutepios de Economia Poliacuteticardquo o pensador contemporacircneo de Marx que supunha

ldquocaber agraves classes mais altas o dever de pensar pelos pobres e de assumir a responsabilidade por sua

sorterdquo concluiacutea que o ldquouacutenico efeitordquo da ldquoreduccedilatildeo repentina do capitalrdquo que se poderia dar quer por

uma crise ou pela tributaccedilatildeo seria a exportaccedilatildeo de menos capital e literalmente sustenta ldquose jogaria

fora menos capital na forma de especulaccedilatildeo perigosardquo

Interessante que tal afirmativa de um conservador convicto tenha sido feita em 1893 quando

os milionaacuterios e bilionaacuterios nem de longe se comparavam ao neo-senhorio da Casa Grande mais de

um seacuteculo depois

Um sistema tributaacuterio para ser equitativo tem de ser neutro em relaccedilatildeo agrave inflaccedilatildeo Algo que natildeo

se viu mais a partir do Plano Real

Se haacute inflaccedilatildeo e haacute desde 01011995 e se natildeo haacute mais correccedilatildeo monetaacuteria e natildeo haacute desde a

mesma data surgem fortes distorccedilotildees

Os indiviacuteduos seratildeo jogados para faixas de tributaccedilatildeo cada vez mais altas do imposto progres-

sivo Como essas faixas natildeo se ajustaram no periacuteodo de 1995 a 2002 e a partir de 2003 o ajuste reco-

nhecido ficou muito abaixo da inflaccedilatildeo as rendas nominais aumentadas de acordo com a inflaccedilatildeo vatildeo

sendo empurradas para as faixas cada vez mais avanccediladas dos progressivos

Isso afeta aliaacutes muito mais a classe meacutedia natildeo os milionaacuterios e bilionaacuterios porque estes jaacute se

encontram no limite superior da progressividade

O Brasil inovou quanto agrave neutralidade relacionada agrave inflaccedilatildeo de sorte a sacrificar as rendas

mais baixas e privilegiar as altas rendas Se a inflaccedilatildeo jamais deveria ser um meio de fazer as pessoas

pagarem menos impostos ndash e isso ocorreu durante muito tempo no paiacutes em favor das classes de

altas rendas que atrasavam seus impostos para ganharem com a arbitragem financeira engordando

as suas fortunas agrave custa do Tesouro ndash no Brasil a inflaccedilatildeo tornou-se um meio de confisco generalizado

sobre as classes assalariadas de renda mais baixa porque as incluiu sistematicamente em faixas de

aliacutequotas progressivas disformes agrave sua real capacidade contributiva Isso jamais aconteceu em relaccedilatildeo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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agraves classes de altas rendas que mereceram uma plecirciade de favores e benefiacutecios voltados agrave acumulaccedilatildeo

patrimonial e agrave riqueza financeira descomunais

O inadimplemento fiscal no caso das grandes fortunas estaacute em desacordo com a histoacuteria da

evoluccedilatildeo fiscal porque contraditoriamente abraccedila a gecircnese da ldquoteoria do lucrordquo cuja concepccedilatildeo tri-

butaacuteria eacute o ldquointeresse particular ldquoe despreza a ldquoteoria da capacidade contributivardquo aonde o tributo vai

lastreado pelo ldquopropoacutesito socialrdquo (VILLELA 1987)

A arrecadaccedilatildeo tributaacuteria nacional desde meados dos anos 40 vem sendo realizada de forma

demasiado desproporcional recorrendo fortemente aos tributos regressivos indiretos responsaacuteveis

por cerca de dois terccedilos da carga fiscal Os diretos progressivos somam natildeo mais do que tatildeo-somen-

te um terccedilo As grandes transformaccedilotildees tributaacuterias ocorridas nos anos 60 a partir do golpe militar e

nos 80 apoacutes a Assembleia Nacional Constituinte configuraram um sistema tributaacuterio nacional apto a

produzir maior carga tributaacuteria com farta ampliaccedilatildeo das bases de incidecircncia contemplando potentes

instrumentos de extraccedilatildeo fiscal tanto seletivos e progressivos quanto regressivos

Ningueacutem esquece as crises cambiais do Meacutexico em 1994 na Tailacircndia em 1977 da Ruacutessia em

1998 e na Coreacuteia do Sul em 2000

Os seus impactos produziram um ldquoefeito dominoacuterdquo que atingiu duramente a economia brasilei-

ra jaacute sob forte pressatildeo fiscal desde o iniacutecio do Plano Real cuja concepccedilatildeo grosso modo poderia ser

traduzida em um uacutenico e isolado objetivo o fim do ldquoimposto inflacionaacuteriordquo

O que natildeo se esclarecia agrave populaccedilatildeo brasileira entretanto satisfeita com a mudanccedila da moeda

era ldquoo quantordquo custaria acabar com o ldquoimposto inflacionaacuteriordquo mais diacutevida puacuteblica e mais impostos

Tudo isso para fazer frente agrave vulnerabilidade externa decorrente dos fundamentos do Plano Real

(paridade fixa com o doacutelar americano juros altiacutessimos para garantir a entrada de capitais e deacuteficit co-

mercial crescente para estimular a concorrecircncia das importaccedilotildees baratas com os produtos nacionais

mantendo os preccedilos das mercadorias sempre no mesmo niacutevel ou em queda)

O enfrentamento das crises cambiais mexicana coreana tailandesa e russa somado ao ataque

especulativo agrave moeda brasileira em 1999 implicou o maior aumento de impostos praticado de uma

uacutenica vez jamais visto antes na histoacuteria republicana de 50 nas aliacutequotas da CSSL e da Cofins de

90 na CPMF e outros

O resultado foi um salto da carga tributaacuteria de 24 para 32 do PIB em apenas oito anos

(19952002) A brutalidade do ldquoajuste fiscalrdquo natildeo teve outra finalidade senatildeo absorver os efeitos da

crise cambial que praticamente espatifaria o Plano Real e elevaria o endividamento puacuteblico continua-

damente de 3 ateacute 10 do PIB em apenas oito anos (AMADEI NETO 2002) O altiacutessimo preccedilo a pagar

pelo cacircmbio sobrevalorizado e elevadas taxas de juro para manter a inflaccedilatildeo sob controle repercutiria

fortemente sobre a arrecadaccedilatildeo tributaacuteria com exigecircncias de recolhimentos cada vez maiores que im-

plicaram aumento expressivo da carga tributaacuteria De fato as consequecircncias da poliacutetica econocircmica pra-

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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ticada com base no Plano Real acentuaram a perversatildeo distributiva da carga tributaacuteria intensificando

sua caracteriacutestica indireta regressiva Quaisquer avaliaccedilotildees objetivas seja de instituiccedilotildees oficiais ou natildeo

governamentais concluiriam que a tributaccedilatildeo de natureza indireta no Brasil tem sido incrementada

continuadamente nos uacuteltimos cinquenta anos e mais ainda nas uacuteltimas duas deacutecadas sem uma con-

trapartida agrave altura correspondente agrave tributaccedilatildeo direta Grosso modo enquanto a tributaccedilatildeo indireta

quase dobrou dos anos 50 ateacute hoje a direta diminuiu proacutexima agrave metade mesmo apoacutes o advento do

imposto de renda sobre as pessoas fiacutesicas

O pano de fundo teoacuterico que orienta tal situaccedilatildeo estaacute inserido na ideologia que defende a

racionalidade do mercado e acredita na importacircncia autocircnoma da moeda que deriva de teorias apa-

rentemente teacutecnicas o ldquomonetarismordquo ldquola nouvelle eacuteconomierdquo e ldquoexpectativas racionaisrdquo

Todas apresentadas como razotildees cientiacuteficas para explicar por que todos teratildeo mais vantagem

se o Estado retirar-se da economia e os capitalistas puderem tratar da acumulaccedilatildeo sem consideraccedilotildees

de ordem distributiva (PRZERWORSKI 1984)

O programa mais conhecido flagrantemente voltado para a concentraccedilatildeo de renda ndash a poliacutetica

econocircmica do governo Ronald Reagan mascarada como uma ldquoteoria de ofertardquo tendo como esteio

uma ldquocurva de Laferrdquo - foi apresentado como referecircncia universal quando natildeo passava de uma estru-

tura ancorada por interesses econocircmicos dominantes

A ldquoteoria da ofertardquo eacute o domiacutenio dos super-ricos dos ricos dos endinheirados A ldquoEra Reaganrdquo

nesse aspecto parece tecirc-la tornado hegemocircnica com apoio da ldquoEra Thatcherrdquo A satisfaccedilatildeo portanto

dos interesses materiais da ldquoburguesiardquo nos lucros seria uma condiccedilatildeo necessaacuteria para a melhora das

condiccedilotildees materiais de todos (SAMPSON 1989) O aumento da produccedilatildeo requer investimento o qual

eacute financiado pela poupanccedila que por sua vez eacute financiado pelo lucro

Portanto o lucro eacute a condiccedilatildeo do crescimento Isso explicaria por que ldquoaumentos de salaacuteriosrdquo e

gastos em ldquobem-estarrdquo seriam ldquoempecilhosrdquo ao crescimento

O mesmo raciociacutenio justificaria a natildeo tributaccedilatildeo dos super-ricos ricos e a natildeo intervenccedilatildeo go-

vernamental que restringiriam a lucratividade mesmo que tais restriccedilotildees refletissem custos sociais e

externalidades negativas

O que isso significa do ponto de vista fiscal A justificaccedilatildeo da eterna existecircncia sem imposto

algum de grandes fortunas O grosso da carga fiscal seria assim transferido sobre quem consome

toda ou quase toda a renda vale dizer os ldquocom ndash nenhumas fortunasrdquo as chamadas classes meacutedias

e de baixa renda A maioria dos administradores tributaacuterios na Ameacuterica Latina passou a receber a

partir dos anos 90 uma grande influecircncia e treinamentos voltados agrave banalizaccedilatildeo da progressivida-

de e da equidade na realizaccedilatildeo do ldquotax mixrdquo com recurso a impostos que quanto mais regressivos

tanto melhores sob o jargatildeo (aparentemente justo) do ldquotax appealrdquo de que ldquoquando todos pagam

todos pagam menosrdquo (GONZAacuteLES 2009)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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A equidade possiacutevel seria obtida com maior ecircnfase na focalizaccedilatildeo dos gastos mediante poliacuteti-

cas puacuteblicas compensatoacuterias vinculadas agraves classes de renda diminuta

Desta forma a ldquoteoria da ofertardquo reforccedilava sua accedilatildeo ideoloacutegica para providenciar a paacute de cal nas

tentativas de tributaccedilatildeo das grandes fortunas A disseminaccedilatildeo de tal ideologia eacute reconheciacutevel e cons-

tatada quando compulsados os manuais distribuiacutedos pelo FMI e BID aos gestores fiscais domiciliados

abaixo da linha do Equador responsaacuteveis pelos aparelhos estatais de arrecadaccedilatildeo (GNAZZO 1993)

Tratava-se de uma operaccedilatildeo de grande envergadura em franca ofensiva para autorizar a falta

de escruacutepulo na manipulaccedilatildeo de foacutermulas de tributaccedilatildeo que de um lado aliviariam totalmente os

super-ricos ricos e endinheirados aleacutem dos lucros das empresas e a remuneraccedilatildeo da propriedade do

capital De outro lado forccedilariam a ldquorepressatildeo fiscalrdquo agraves classes subalternas

No caso brasileiro entre 1996 e 2001 a ldquorepressatildeo fiscalrdquo chegou agraves raias do confisco pela re-

vogaccedilatildeo expliacutecita do princiacutepio da neutralidade aplicaacutevel agrave tributaccedilatildeo em relaccedilatildeo agrave inflaccedilatildeo incorrida

naquele periacuteodo Um total e flagrante desrespeito ao impedimento da incidecircncia tributaacuteria sobre ldquoper-

das inflacionaacuteriasrdquo uma indececircncia fiscal escandalosa

Como se vecirc a tributaccedilatildeo dos super-ricos ricos e endinheirados acostumou-se a andar na con-

tramatildeo da Carta Constituinte que fixara a capacidade contributiva como sendo a base principal de

suporte da pressatildeo fiscal (CATTANI OLIVEIRA 2012)

O IGF acabou tornando-se um totem fiscal amaldiccediloado por uma espeacutecie de tabu tributaacuterio

que atingiria a todos aqueles que lhe exigem o ordenamento juriacutedico correspondente sem submissatildeo

agrave interpretaccedilatildeo fiscal calcada na ldquoteoria da ofertardquo

Inadmissiacutevel desviar o olhar da siacutendrome de Burnout que se aplica ao vivenciado diuturna-

mente por milhotildees de homens e mulheres condenados a uma espeacutecie de escravizaccedilatildeo fiscal a partir

do Plano Real especialmente apoacutes o malsinado Pacote 51 baixado pelo economista ex-ministro da

Fazenda Pedro Malan no ano de 1997 quando aumentos extraordinaacuterios dos impostos indiretos fo-

ram despejados sobre os brasileiros indistintamente O entatildeo ldquoczarrdquo da Fazenda Nacional convidado a

ocupar altos cargos nas principais corporaccedilotildees financeiras privadas a exemplo de outros membros da

equipe econocircmica da Era Cardoso curiosamente prescrevera 14 anos atraacutes literalmente a aplicaccedilatildeo

de uma ldquorepressatildeo fiscal para o resto da vidardquo

Sem incluir por certo as benesses e privileacutegios da Casa Grande no receituaacuterio repressivo

Padre Vieira possivelmente faria menccedilatildeo a essa ldquorepressatildeo fiscalrdquo natildeo esquecendo por lembrar

aos fieacuteis do puacutelpito da Capela Real de Lisboa que a profecia sobre o ldquodoce inferno pela vida eternardquo

realizar-se-ia e estaria reservada aos contribuintes de baixa renda naquela que foi considerada nas

palavras do ex-deputado federal Seacutergio Miranda de saudosa memoacuteria - especialista da Comissatildeo de

Tributaccedilatildeo Orccedilamento e Financcedilas da Cacircmara dos Deputados ndash a ldquoEra Malditardquo representada pela oc-

taeteacuteride do governo do ex-presidente F H Cardoso

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A efetividade do capiacutetulo da financcedila puacuteblica sobre a tributaccedilatildeo das grandes fortunas tem como

ser assegurada sem ferir a liberdade do capital o efeito de confisco e a bitributaccedilatildeo de modo a rea-

linhar a carga tributaacuteria sobre a renda e o patrimocircnio tornando-a melhor equilibrada em relaccedilatildeo ao

consumo (CORSATTO 2002)

O IGF depois de regulamentado subiria os degraus da Suprema Corte Por que natildeo A lide per-

mitiria com absoluta independecircncia e harmonia entre os Poderes decidir cabalmente sobre o tribu-

to de obrigaccedilatildeo principal dos afortunados grandemente subsumidos aos comandos constitucionais

doutrinaacuterios administrativos e legais do ordenamento tributaacuterio nacional entatildeo completo finalmente

Certamente os Ministros do Pretoacuterio Excelso como o fizeram nos casos emblemaacuteticos da Ficha

Limpa e da Cota Racial natildeo deixariam de brindar o paiacutes com a votaccedilatildeo do Pleno afirmativa de uma

justiccedila fiscal histoacuterica mediante exegese antoloacutegica dos direitos de primeira e segunda geraccedilatildeo ba-

lanceados diante dos inesqueciacuteveis desafios do seacuteculo XXI

Oportuno a esta altura revisitar o Sermatildeo de Santo Antocircnio sobre os impostos a serem pagos

pelos Trecircs Estados nobreza clero e povo

Ouccedilamos pois o Sermatildeo de Vieira reverberando da Igreja das Chagas em Lisboa em 14 de

setembro de 1642 ldquoQuando os remeacutedios natildeo tecircm bastante eficaacutecia para curar a enfermidade eacute

necessaacuterio curar os remeacutedios para que os remeacutedios curem aos enfermos Que remeacutedio haacute para

remediar os remeacutedios Muito faacutecil diz Santo Antocircnio Vos estis sal terraerdquo O ldquoimperador da liacutengua portuguesardquo segundo Fernando Pessoa prosseguiria na sua peroraccedilatildeo

ldquoPara se curar uma enfermidade vecirc-se em que peca a enfermidade para se curarem os remeacute-

dios veja-se em que pecaram os remeacutedios Duas propriedades tecircm o sal diz Santo Hilaacuterio

conserva e mais tempera eacute o antiacutedoto da corrupccedilatildeordquo

E assim sentenciaria o maior retoacuterico do barroco portuguecircs a regra a ser trilhada ldquoTais como

isto devem ser os remeacutedios com que se hatildeo de conservar a Repuacuteblicardquo (PEacuteCORA 2001)

A retoacuterica dogmaacutetica dos opositores do IGF fugirem de um imposto fixado em Assembleia Na-

cional Constituinte eacute parecida na ecircnfase com as escaramuccedilas de Dom Marcelo Costa Bispo do Paraacute

relativamente agrave separaccedilatildeo entre Igreja e Estado em 1889 O liacuteder religioso proclamara enfaticamente

ldquoNatildeo desejo a separaccedilatildeo natildeo dou um passo natildeo faccedilo um aceno para que se decrete no Brasil o

divoacutercio entre o Estado e a Igrejardquo A alusatildeo irocircnica ao Clero eacute cabiacutevel porque evidentemente natildeo

se sustenta a ldquoimunidade fiscalrdquo sob o pretexto da liberdade de culto ao ldquoTemplo do Capitalrdquo ou da

pregaccedilatildeo liberal da Sociedade do Mont ndash Pellerin (TEITELBAUM 2012)

Nem mesmo o ldquomilagre da multiplicaccedilatildeordquo decorrente das facilidades concedidas ao processo

de acumulaccedilatildeo da riqueza e de rendas no Brasil - vale dizer sob o pretexto da intocaacutevel ldquoliberdade de

culto ao capitalrdquo - justificaria aceitar estoicamente por um lado o esquecimento de uma das compe-

tecircncias tributaacuterias da Uniatildeo equivalente agrave remissatildeo taacutecita das fortunas grandes E ao mesmo tempo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

74

por outro lado contemplar indiferentemente um povo absorver o grosso da carga tributaacuteria repeti-

damente e ser esbulhado relativa e proporcionalmente pelo desbordo do princiacutepio da equidade no

sacrifiacutecio agrave sua capacidade contributiva enquanto o novo patriciado simplesmente inutiliza a justa e

constitucional medida

3 OS SUPER-RICOS E AS DESIGUALDADES

ldquoUm povo deve ser julgado natildeo pela Constituiccedilatildeo que tem mas pelo modo como potildee em praacutetica a sua Constituiccedilatildeordquo

Ruy Barbosa

ldquoA tentativa para basear um justo sistema fiscal sobre um injusto sistema de pro-priedade eacute uma tentativa para tirar uma parcela boa de um todo maurdquo

Gunnar Myrdal

Ateacute quando a desigualdade de renda sem precedentes deixaraacute de ser dissociada da ldquoincapa-

cidade dos governosrdquo poliacutetica e operacionalmente ldquopara cobrar impostos dos ricosrdquo perguntava

Jeffrey Sachs em 2011 um dos notaacuteveis economistas perfilados ao conservadorismo em mateacuteria

fiscal e monetaacuteria

Ateacute colocar em risco de morte a legitimidade da nova ordem econocircmica sacudida em seus fun-

damentos financeiros neoliberais pela crise mundial de 15 de setembro de 2008 (KRUGMAN 2012)

Ateacute onde iraacute a banalizaccedilatildeo sobre o fato econocircmico-tributaacuterio que criou no Brasil a situaccedilatildeo fis-

cal das super-riquezas sem o imposto da fortuna

O moacutevel do IGF eacute ajustar a progressividade agrave concentraccedilatildeo de riqueza no topo bem como

balancear melhor a reparticcedilatildeo social da renda entre capital e trabalho no processo de reproduccedilatildeo ca-

pitalista

Quase um quarto de seacuteculo depois ainda tergiversa-se sobre fazer cumprir o comando cons-

titucional do Imposto sobre as Grandes Fortunas Milton Santos que foi presidente da Comissatildeo de

Planejamento Econocircmico da Bahia jaacute propusera a criaccedilatildeo do Imposto de fortunas ao presidente Jacircnio

Quadros cujo mandato presidencial foi interrompido bruscamente pela renuacutencia em 1961

Uma espeacutecie de ldquoapartheid fiscalrdquo segrega o IGF do molde juriacutedico paacutetrio As suas natildeo inclusotildees

na legislaccedilatildeo brasileira regulamentaccedilatildeo impositiva e cobranccedila sistemaacutetica denotam nitidamente mais

do que supostas dificuldades teacutecnicas insuficiecircncias administrativas ou insignificacircncia arrecadadora

Hoje induvidosamente em melhores condiccedilotildees do que ontem tornou-se indispensaacutevel explo-

rar todas as formas de desconcentraccedilatildeo da renda e da riqueza da distribuiccedilatildeo do excedente econocirc-

mico de equiliacutebrio da pressatildeo fiscal sobre capital e trabalho nos paiacuteses centrais e emergentes (SZKLA-

ROWSKY 1933)

ldquoCe qursquoil y a de scandaleux dans le scandale crsquoest qursquoon srsquoy habituerdquo alertava Simone de Beau-

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

75

voir para a deleteacuteria consequumlecircncia do escacircndalo promovido agrave situaccedilatildeo de normalidade E a desigual-

dade de renda e riqueza no Brasil eacute mesmo escandalosa sob quaisquer paracircmetros de mensuraccedilatildeo de

apropriaccedilatildeo do excedente econocircmico

A burocracia eleita que natildeo se dedica a viabilizar a tributaccedilatildeo das grandes fortunas tambeacutem eacute

a mesma que identifica as teses capazes de reduzir as pensotildees de ex-soldados com mais de 80 anos

que combateram na II Grande Guerra como pracinhas natildeo deixando de explorar com accedilotildees rescisoacute-

rias o artigo 53 das disposiccedilotildees constitucionais transitoacuterias inscritas na Carta de Outubro

Natildeo se preocuparam em avaliar a ldquobaixa produtividade fiscalrdquo da economia de gastos puacuteblicos

de menos de mil ex-combatentes com pensotildees inferiores a R$ 300000

Nesse caso a burocracia eleita foi diligente fazendo cumprir a eliminaccedilatildeo minuciosa dos bene-

fiacutecios dos ex-pracinhas com economia aos cofres puacuteblicos proporcionalmente irrelevantes de R$ 30

milhotildees anuais Naquele outro das fortunas grandes a desiacutedia fiscal prevalece em valores bastante

maiores (MARTIN SCHUMANN 1996)

Estima-se em R$ 10 bilhotildees a mais baixa arrecadaccedilatildeo possiacutevel do IGF isto eacute o piso da previsatildeo

conservadora em face da subavaliaccedilatildeo patrimonial amplamente praticada com base nos impostos

de transmissatildeo de bens imoacuteveis e de propriedade sem a necessidade de absolutamente nenhuma

fiscalizaccedilatildeo a partir dos registros declarados existentes Neste ponto baacutesico a burocracia eleita natildeo foi

capaz de obter o mesmo padratildeo de desempenho e diligecircncia constitucional quando comparado ao

resultado sobejamente alcanccedilado no corte aos estipecircndios dos octogenaacuterios da Forccedila Expedicionaacuteria

Brasileira que lutaram na II Guerra Mundial

Ningueacutem utilizou a mesma argumentaccedilatildeo contumaz brandida em defesa da natildeo tributaccedilatildeo das

fortunas grandes o efeito fiscal de valor orccedilamentaacuterio despreziacutevel Embora o montante dos valores rei-

vindicados fosse trezentas vezes menor do que a quantia envolvida com o imposto sobre as fortunas

grandes os ex-pracinhas da FEB ainda tecircm de recorrer a liminares ordenando que a Uniatildeo lhes pague

a pensatildeo especial concedida a ex-combatentes da II Guerra Mundial O benefiacutecio pode ser acumulado

com os benefiacutecios que eles jaacute recebem por sua aposentadoria como militar mas tem sido negado

sob o argumento de que natildeo poderiam ser enquadrados legalmente como ex-combatentes porque

continuaram na ativa apoacutes participar do conflito de 1939-1945

Registram-se tais ldquodetalhesrdquo aparentemente desconexos para descortinar de um lado a minu-

decircncia com que se regulamentou o tratamento previdenciaacuterio a octogenaacuterios ex-combatentes com

pagamentos de valores ldquodespreziacuteveisrdquo comparativamente agrave justificaccedilatildeo que a arrecadaccedilatildeo do IGF eacute

complexa e de arrecadaccedilatildeo ldquoinsignificanterdquo (LASCH 1995) Natildeo se vecirc o mesmo ldquoespecialistardquo em de-

fender nenhuma tributaccedilatildeo sobre as grandes fortunas tambeacutem justificar as pensotildees especiais ao ex-

-combatentes que defenderam o solo paacutetrio ldquotatildeo cheio de riquezas prepotentes e avarasrdquo sob igual

argumento de que satildeo valores irrisoacuterios do ponto de vista fiscal (FORRESTER 2001) A propoacutesito

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

76

John Kenneth Galbraith referiu-se no ensaio Un viaje por la economiacutea de nuestro tiempo agrave existecircncia

da ldquotendencia de la economiacutea y de otras ciencias sociales a adaptarse a las necesidades y a la menta-lidad de los miembros ricos de la comunidadrdquo Por que natildeo formular os cenaacuterios produzir os estudos e providenciar os meios aptos e haacutebeis a

fazer cumprir o dispositivo constitucional do IGF

Ateacute a Agecircncia de Notiacutecias Reuters reconhece a expertise brasileira em arrecadar impostos entre

as ldquomelhores do mundordquo O fato eacute que pouquiacutessimos impostos satildeo arrecadados do capital as mais

valias imobiliaacuterias sucessotildees etc Nada praticamente dos ricos e super-ricos A teoria da produtivi-

dade de origem alematilde com razatildeo acha que o imposto em funccedilatildeo do emprego que lhe daacute o Estado

volta agrave coletividade como meio que se resolve em maior produccedilatildeo transformando bens materiais que

satildeo os impostos em bem imateriais que satildeo os serviccedilos puacuteblicos

A teoria produtivista conclui que o imposto eacute o melhor emprego de capital Morselli diria que

se eacute certo que uma parte da receita encontra proveitoso emprego no desenvolvimento da economia

nacional a teoria haveria exagerado no otimismo (DEODATO 1967)

Keynes contudo natildeo teria duacutevida de concordar com os alematildees sobretudo em tempos de

crise econocircmica sistecircmica Wagner faz poreacutem uma didaacutetica distinccedilatildeo entre capital nacional ou social

e o capital individual O primeiro eacute toda riqueza destinada agrave produccedilatildeo O segundo eacute a riqueza posta agrave

parte do indiviacuteduo que deva servir ou natildeo agrave produccedilatildeo

Quanto ao capital individual quando descontado pelo imposto em vez de um mal eacute um bem

agrave produccedilatildeo sempre que empregado Diminui-se a riqueza de alguns acresce a riqueza nacional

Da mesma forma que nas ldquoloteriasrdquo nos ldquolucros extraordinaacuteriosrdquo nas ldquomais valias imobiliaacuteriasrdquo em

todos esses casos justifica-se ndash e assim se desmistifica sua negatividade - o imposto sobre qualquer

forma de capital

A Organizaccedilatildeo para a Cooperaccedilatildeo Econocircmica e Desenvolvimento (OCDE) jaacute indicava que o tri-

buto sobre a fortuna contribuiacutea na deacutecada de 1980 com 05 da receita tributaacuteria da Aacuteustria 041

da Dinamarca 031 da Noruega e 039 da Sueacutecia

Na deacutecada de 1980 o mundo sofria os efeitos do primeiro choque do petroacuteleo uma recessatildeo

mundial e sequer existiam telefones celulares computadores portaacuteteis Internet e transaccedilotildees financei-

ras eletrocircnicas (CEPAL 1985) Vale dizer com a economia mundial em crise continuada sem tecnolo-

gia e controles virtuais e de alcance imediato aleacutem de inuacutemeros elementos de controle cruzado para

tiacutetulos patrimocircnio e operaccedilotildees bancaacuterias inclusive controles das bolsas de valores e fundos os paiacuteses

escandinavos lograram implantar e administrar impostos calibrados em um contexto de persistente

controle efetivo da equidade fiscal

No caso brasileiro 04 da receita tributaacuteria representariam 40 bilhotildees de reais no ano calen-

daacuterio de 2013 equivalente ao montante da extinta CPMF

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

77

4 A CONSTITUINTE E O PARLAMENTO

ldquoA sagrada alianccedila entre os donos de terra do dinheiro e do Estado natildeo permite que nossas transiccedilotildees democraacuteticas se completemrdquo

Maria da Conceiccedilatildeo Tavares

Recentemente mais do que o corpo a memoacuteria do ex-presidente Joatildeo Goulart foi exumada

Algo simbolicamente veio agrave tona as ldquoreformas de baserdquo que o golpe de 64 abortou

Em vez de as fazerem a ditadura fortaleceu a conciliaccedilatildeo patrimonialista e o pacto das elites

endinheiradas resultando em 20 anos de arrocho salarial (CARNEIRO 2006)

Quaisquer iniciativas atuais de tributaccedilatildeo das grandes fortunas satildeo relidas como ldquoilusotildees bol-

cheviquesrdquo

Os neoliberais triunfalistas em verdade pensam apenas no passado que legitima seus privi-

leacutegios fiscais em nome de uma repressatildeo tributaacuteria direcionada exclusivamente aos detentores de

ldquonenhumas fortunasrdquo

Os donos do capital e da riqueza querem a eternidade de uma equaccedilatildeo fiscal repressiva sem

incluiacute-los Os nossos endinheirados continuam com as mesmas ideias dos golpistas de 50 anos atraacutes

Desde 1964 as benesses e privileacutegios dos super-ricos aumentaram (CHOSSUDOWSKI 1999)

Talleyrand diria dos nossos super-ricos de fortunas acumuladas pela Casa Grande ldquonatildeo apren-

deram nada natildeo esqueceram nadardquo

Eacute horrorosa a repeticcedilatildeo dos argumentos jaacute desfalecidos sob a falaacutecia do grande lsquoteoacutelogorsquo da

Economia Liberal Hayek de que os impostos sobre os ricos satildeo sempre lsquonegativosrsquo

Esse pensamento justifica e realimenta os fracassos da ordem financeira em nome do ideal da

racionalidade plutocraacutetica Um espectro ronda o IGF parafraseando Marx a irresponsabilidade fiscal

dos super-ricos (COMPARATO 2004)

Existe um conflito fundamental entre o muito que se pede e espera do poder puacuteblico jaacute o

dissera Celso Furtado na apresentaccedilatildeo do seu Plano Trienal

Natildeo por acaso o sistema tributaacuterio nacional foi modificado pela Carta de Ulysses em muitos

aspectos

Os constituintes forjaram-no encorpado conferindo-lhe a competecircncia delegada para que o

IGF quando instituiacutedo o fosse com a moldagem de lei complementar

Previamente contudo modularam-no circunscrevendo-lhe a incidecircncia inspirados na sapiecircn-

cia da deusa romana da Fortuna simbolizada com uma cornucoacutepia e um timatildeo nas matildeos cuja mito-

logia reservara-lhe o poder da distribuiccedilatildeo dos bens e da sorte

Diferentemente dos romanos no entanto natildeo deixaram a riqueza agrave mercecirc das divindades por-

que a desejaram ao alcance de todos

O criteacuterio poacutes-constituinte de modo caricato ateacute parece baseado no romance policial mais

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

78

famoso do seacuteculo XX - O Falcatildeo Maltecircs - em torno de uma reliacutequia medieval valiosiacutessima levada em

sigilo do Oriente a Califoacuternia Sam Spade o detetive idealizado por Dashiell Hammet seria capaz de ndash

ao investigar a urdidura intrincada do IGF ndash repetir sua frase mais famosa ldquoUm grande misteacuterio deve

tirar a tampa da vida e deixar vocecirc ver como funcionardquo

O comando constitucional originaacuterio era categoacuterico quando delimitara o olhar fiscal tendo

como foco natildeo quaisquer fortunas mas aquelas grandes

De um lado estreme de duacutevida a motivaccedilatildeo constitucional a essecircncia do IGF do outro lado

sua dimensatildeo estrutural natildeo se lhe submetendo todas as fortunas Mais claro impossiacutevel

O processo de elaboraccedilatildeo constituinte cujo sumaacuterio e detalhamento podem ser identificados

nas Fontes de Informaccedilatildeo sobre a ANC de 1987 ndash Senado Federal ndash na Subsecretaria de Ediccedilotildees Teacutecni-

cas procedeu agrave inclusatildeo do IGF no Anteprojeto da Subcomissatildeo de Tributos

A siacutentese do relator constituinte da Subcomissatildeo de Tributos foi liacutempida porque a ldquotributaccedilatildeo

normal dos rendimentos ou mesmo das heranccedilas e doaccedilotildees nem sempre eacute suficiente para pro-

duzir as correccedilotildees desejaacuteveisrdquo donde defluiria a necessidade loacutegica de ldquoum novo impostordquo incidindo

sobre ldquoas situaccedilotildees anormais de riqueza acumulada e natildeo produtivardquo

Natildeo se desconsideram ocorridas algumas tentativas de movimentar o IGF pelo menos 30 pro-

jetos em tramitaccedilatildeo no Parlamento

Haacute vinte e cinco anos a despeito dos inuacutemeros de projetos de Lei apresentados em busca de

fazer cumprir a Carta de Ulysses o IGF dormita esplendidamente como um espeacutecime invertebrado

da nossa vida juriacutedica no panteatildeo sem gloacuteria e mal conservado das normas constitucionais exiladas

embora ensaiado em isoladas proposituras do sistema impositivo nacional

A aparentemente desidiosa contemporizaccedilatildeo do Executivo natildeo passou despercebida dos orga-

nismos mais judiciosos a exemplo do Instituto dos Advogados do Brasil ao constatar que o IGF ldquojaz ali

ocioso por falta de iniciativa do governordquo (CORREIO BRAZILIENSE 1996)

Indubitavelmente vaacuterias das propostas consagram certa motivaccedilatildeo de cunho proseacutelito e eleito-

ral como a utilizada para levaacute-lo agrave conta do Fundo de Combate agrave Pobreza criado pela Emenda Cons-

titucional nordm 312000 de iniciativa do Senador Antonio Carlos Magalhatildees Falta-lhes miacutenimo teoacuterico

fundamentado com embasamento teacutecnico suficiente e suporte administrativo necessaacuterio do que se

aproveitam os opositores do IGF para desqualificaacute-las sistematicamente

O exemplo de que se procura revestir a tributaccedilatildeo do IGF com traccedilos da insensatez vulgar eacute o

da sua proposiccedilatildeo enquanto soluccedilatildeo dogmaacutetica como providecircncia redentora haacutebil a erradicar final-

mente a miserabilidade endecircmica do nosso paiacutes

A questatildeo central todavia natildeo eacute essa mas outra completamente distinta Natildeo se trata de acei-

tar ou natildeo o IGF mas fixaacute-lo teacutecnica e juridicamente

Nem se o cogite como sendo uma proposiccedilatildeo ldquofora de lugarrdquo ou do ldquoseu tempordquo ao contraacuterio

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

79

A desarmonia do IGF com os modismos neoliberais que se espraiaram pelas concepccedilotildees fiscais

dominantes na deacutecada dos 90 natildeo tem como ser esterilizada Afinal o caldeamento dos postulados

mercantis foi processado pelos que se investiram no direito de ditar um ldquocacircnone tributaacuteriordquo baseado

no suposto gozo de um ldquostatus eclesiaacutesticordquo

A desregulamentaccedilatildeo do processo de acumulaccedilatildeo capitalista nas ondas propagadas pelo Wa-shington Consensus (WC) cujo eco se faz sentir nos paiacuteses sujeitos ao decaacutelogo sistematizado por

John Williamson dos quais a reduzida tributaccedilatildeo da renda e nenhuma da riqueza era parte dele natildeo

foi capaz de extirpar as raiacutezes do IGF em escala global embora tenha logrado ecircxito em conter sua di-

fusatildeo momentaneamente

Induvidosamente o IGF natildeo compotildee o figurino fiscal do WC daiacute natildeo faltarem escaramuccedilas para

eliminaacute-lo em vaacuterias emendas de natureza tributaacuteria

No entanto ateacute mesmo o Foacuterum de Davos natildeo tem como ignorar que a desigualdade social na

Terra aumentou e que 1 da populaccedilatildeo mundial deteacutem metade da riqueza global (CINTRA 2014)

O cumprimento do mandamento constitucional de criaccedilatildeo de um imposto concebido para

ajustar o nosso sistema tributaacuterio ao princiacutepio da isonomia e progressividade tributaacuterias de modo

a tornaacute-lo na expressatildeo popular relativamente ldquomais justordquo natildeo estaacute apenas amparado na tese que

o fundamentou vale dizer do sistema fiscal poder subtrair uma fraccedilatildeo parcelada ou uacutenica agraves ldquogran-

desrdquo fortunas do segmento plutocraacutetico brasileiro mas do Estado vir a ter mais um mecanismo agrave sua

disposiccedilatildeo para dar continuidade ao processo de desconcentraccedilatildeo social da renda apoiado na maior

equidade

Haacute tambeacutem o imperativo de maior efetividade fiscal sem concessotildees agrave visatildeo panglossiana

equivocada em havecirc-lo dimensionado como panaceacuteia porque a reduccedilatildeo das abissais desigualdades

entre os possuidores e despossuiacutedos de renda e riqueza no Brasil soacutei serem desbastadas no processo

dinacircmico do desenvolvimento sustentaacutevel e inclusivo

Isso contudo nada tem a ver com a pajelanccedila liberal de deixar imune e isento o capital desre-

gulamentado nem com a apresentaccedilatildeo vulgar do IGF sua proposiccedilatildeo dogmaacutetica enquanto providecircn-

cia redentora haacutebil a erradicar finalmente a miserabilidade endecircmica do nosso paiacutes

Ao mesmo tempo no entanto que o constituinte natildeo remeteu o IGF agrave legislaccedilatildeo ordinaacuteria de

menor quorum necessaacuterio agrave sua aprovaccedilatildeo por conta do embate vitorioso das classes dominantes na

economia e seus representantes poliacuteticos no Parlamento - em defesa de seus interesses de classe e

materiais - ainda assim reservou-lhe a criaccedilatildeo mediante o quorum qualificado da lei complementar

A retomada de iniciativas recentemente tendentes a resgatar a liturgia da legislaccedilatildeo ordinaacuteria

natildeo alcanccedilou ecircxito porquanto os detentores das maiores rendas e riqueza demonstraram mais uma

vez a sua forccedila poliacutetica hegemocircnica ao rechaccedilarem a tentativa de alteraccedilatildeo processual por a consi-

derarem um ameaccedilador atalho pelo qual o IGF pudesse ser instituiacutedo concretizando-se com sucesso

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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Nesse sentido tanto o ex-presidente Lula quanto a presidenta Dilma ambos repetiram o ceri-

monial do beija-matildeo da plutocracia doirada

Suas governanccedilas jamais tentaram movimentar suas bancadas para regulamentarem o IGF A

primeira tentativa de regulamentar o IGF foi do ex-senador Fernando Henrique Cardoso com o PLS nordm

16289 aprovado no Senado dentro do figurino claacutessico da social-democracia que inspirava a linha

programaacutetica do seu partido o PSDB agravequela eacutepoca

Ao chegar agrave Cacircmara dos Deputados recepcionou emendas de tributaccedilatildeo da fortuna familiar

acima de R$ 4 milhotildees isentando-se o imoacutevel residencial instrumentos de trabalho e ativos definidos

de alta relevacircncia social ou importacircncia tecnoloacutegica estrateacutegica travejada por aliacutequotas progressivas

separadas em quatro faixas de incidecircncia 01 02 04 e 07 Mais de uma deacutecada depois no ano

2000 a Comissatildeo de Tributaccedilatildeo e Orccedilamento da Cacircmara o rejeitou

A reboque das tentativas de reforma tributaacuteria surgiu emenda constitucional transfigurando o

tributo em Contribuiccedilatildeo sobre Grandes Fortunas (CGF) vinculada agrave sauacutede puacuteblica sob o argumento

de viabilizar sua instituiccedilatildeo segundo o entendimento de que a destinaccedilatildeo mitigaria a resistecircncia dos

interesses contraacuterios

A CGF fixava trecircs aliacutequotas 05 075 e 1 O limite isentaria ateacute os R$ 11 milhotildees excetuan-

do-se o imoacutevel residencial do contribuinte

O panorama global do imposto sobre a riqueza segundo seus opositores natildeo seria viaacutevel pela

baixa participaccedilatildeo na arrecadaccedilatildeo e alto custo administrativo a cantilena de sempre Estados Unidos

Reino Unido Austraacutelia Japatildeo e Itaacutelia decidiram natildeo adotaacute-lo pelo menos por ora

O argumento do senso comum eacute que o Imposto de Renda (IR) - havido como a grande base

da arrecadaccedilatildeo tributaacuteria da maioria dos paiacuteses desenvolvidos ndash tornaria o imposto sobre a riqueza

tatildeo-somente subsidiaacuterio ao IR ndash como salvaguarda de controle a evitar a evasatildeo comparando-se o

patrimocircnio com renda declarada

Detalhe-se que esses paiacuteses aplicam aliacutequotas efetivas de IRPF em torno de 50 e ateacute maiores

sem isenccedilatildeo na distribuiccedilatildeo de lucros e dividendos que integram a renda bruta sujeita agrave tributaccedilatildeo

pela aliacutequota progressiva

A Alemanha natildeo se cercou de muitos pruridos para experimentaacute-lo Eliminou o imposto sobre

a riqueza em 1996 mas o resgatou em 2007 com aliacutequota uacutenica de 3 A Suiacuteccedila tem aliacutequotas entre

01 e 09 jaacute a Noruega parte de 09 ateacute 11 A Sueacutecia adota aliacutequota uacutenica de 15 e a Iacutendia de

1 soacute alcanccedilando bens improdutivos como joacuteias imoacuteveis automoacuteveis e obras de arte

Islacircndia e Finlacircndia aboliram o imposto em 2006 e Luxemburgo isentou as pessoas fiacutesicas em

2005 poreacutem tatildeo-somente o fizeram depois de taxarem as grandes fortunas durante quase uma deacute-

cada e coincidentemente quando os conservadores chegaram ao poder na esteira da ldquoprimavera

liberalrdquo que visitou os paiacuteses gelados em meados da deacutecada passada

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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Jaacute no Brasil as anaacutelises emanadas dos simpoacutesios seminaacuterios e ensaios antecedentes aos traba-

lhos constituintes explicitavam a evidecircncia de que se impunha a incontornaacutevel necessidade do sistema

tributaacuterio ser reciclado contemplando inovaccedilotildees de diferente natureza

Ao compulsar as anotaccedilotildees dos estudos preacutevios agrave Constituiccedilatildeo vislumbra-se um elenco de pro-

videcircncias portadoras da inspiraccedilatildeo de redesenhar o mapa das incidecircncias no tocante agrave progressivida-

de da tributaccedilatildeo de sorte a dissociaacute-la do suporte tradicional exclusivamente escorado na extraccedilatildeo

fiscal da renda dos trabalhadores do setor puacuteblico e privado assalariados ou autocircnomos

A ofensiva de soprar vida agrave criaccedilatildeo do IGF com os ares da nova fase democraacutetica sensibilizou

agrave lendaacuteria Comissatildeo Afonso Arinos oficialmente denominada Comissatildeo Provisoacuteria de Estudos Cons-

titucionais da qual resultou a apresentaccedilatildeo do anteprojeto cujo conteuacutedo incorporou o IGF Origina-

riamente deve-se a iniciativa da inovaccedilatildeo do IGF ao operoso Instituto dos Advogados de Satildeo Paulo

em conjunto agrave Associaccedilatildeo Brasileira de Direito Financeiro O IGF foi submetido a intenso e abrangente

debate com a participaccedilatildeo de especialistas ao som do clamor convocatoacuterio da Assembleia Nacional

Constituinte Os teacutecnicos descortinaram a existecircncia do vasto espectro das nuances operacionais e

administrativas em relaccedilatildeo ao seu rendimento e eficaacutecia fiscal com espelho na praacutetica internacional

notadamente o sistema francecircs

Sobe de relevo a marcante influecircncia dos sistemas fiscais estrangeiros que impulsionaram a

opccedilatildeo brasileira agrave inovaccedilatildeo com sua incorporaccedilatildeo ao leacutexico tributaacuterio nacional

O equacionamento do IGF considerou as variaacuteveis claacutessicas que precedem quaisquer inovaccedilotildees

no campo das incidecircncias tributaacuterias vale dizer identificou suas possibilidades e limitaccedilotildees a partir -

como natildeo poderia deixar de secirc-lo ndash da recorrecircncia a estrangeirices enquanto referencial de modelos

paralelos Os especialistas desafiaram naquela fase preliminar a tese de Myrdal que prelecionava natildeo

ser possiacutevel fazer assentar um justo sistema fiscal sobre uma ordem socioeconocircmica onde a riqueza e

a renda fossem concentradas

Agravequela eacutepoca debruccedilaram-se em suas preocupaccedilotildees igualmente sobre a singularidade das

experiecircncias internacionais compulsando-as tanto as que natildeo se distinguiriam demasiado da nossa

realidade quanto agravequelas que deveriam obrigatoriamente ser reavaliadas na atualidade em face das

profundas diferenccedilas de configuraccedilatildeo econocircmica e social

Hoje mais do que ontem os pontos de interrogaccedilatildeo permanecem fincados em torno de qual

a melhor forma de precisar o conceito dimensional do patrimocircnio da riqueza da fortuna do piso

de isenccedilatildeo

A partir da qualificaccedilatildeo de ldquogranderdquo tornar-se-ia admissiacutevel mensurar o topo de corte onde a

contribuiccedilatildeo devesse estacionar sua imputaccedilatildeo as camadas moduladoras da progressividade o cali-

bre das suas aliacutequotas os modelos de parametrizaccedilatildeo dos valores pecuniaacuterios os meios e modos de

controle dos contribuintes e de sua administraccedilatildeo tributaacuteria especialmente fiscalizaccedilatildeo e cobranccedila

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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estaqueada por seus compliances and enforcements

Uma anaacutelise prospectiva do IGF natildeo poderia ignorar a anaacutelise do primeiro dos projetos de lei

que visou agrave sua instituiccedilatildeo o PLC nordm 202-A de 1989 substitutivo ao PLS nordm 16289 aprovado com o

crivo analiacutetico das Comissotildees de Constituiccedilatildeo e Justiccedila Redaccedilatildeo e de Financcedilas do Senado Federal

A Receita Federal do Brasil modificou em 2009 o perfil dos contribuintes obrigados a declarar

o Imposto de Renda da Pessoa Fiacutesica (IRPF) ao fixar entre outros denominadores miacutenimos comuns a

propriedade a posse ou titularidade de bens superiores a R$ 30000000 (trezentos mil reais) Gros-

so modo tatildeo somente para efeitos de contextualizaccedilatildeo da ordem de grandeza dos valores patrimo-

niais por que natildeo admitir o patamar isentaacutevel das fortunas merecedoras da atenccedilatildeo do fisco federal

para demarcaccedilatildeo do piso referencial da ldquogrande fortunardquo segundo as regras de obrigatoriedade da

declaraccedilatildeo do IRPF A partir daiacute considerar-se-ia como valor liacutequido patrimonial o valor de mercado

dos bens e direitos da pessoa fiacutesica diminuiacutedo do valor das diacutevidas e empreacutestimos a ele vinculados

desde que natildeo superassem o valor do bem ou direito correspondente Os contribuintes do IGF no

substitutivo do projeto do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso passariam a ser as pessoas fiacutesi-

cas residentes ou domiciliadas no Paiacutes os espoacutelios e aquelas pessoas fiacutesicas ou juriacutedicas domiciliadas

no exterior no que respeitasse ao patrimocircnio possuiacutedo no Brasil

Jaacute quanto agrave base de caacutelculo do imposto seria considerado o valor atualizado do patrimocircnio

alcanccedilado pelo IGF em 31 de dezembro do ano-base relativo ao exerciacutecio financeiro do ano em que

a declaraccedilatildeo do IRPF fosse apresentada conforme constasse da declaraccedilatildeo anual de bens e direitos

do contribuinte

A primeira declaraccedilatildeo anual de bens e direitos posterior agrave publicaccedilatildeo da Lei do IGF implicaria

ao contribuinte a obrigatoriedade de declarar os seus valores de mercado corrigido nos exerciacutecios

financeiros seguintes em conformidade agrave variaccedilatildeo acumulada do IGP-DI

A cultura inflacionaacuteria que permeava a conjuntura econocircmica certamente influenciou o entatildeo

senador Fernando Henrique a exigir atualizaccedilatildeo patrimonial adequando-a aos valores de mercado

A incidecircncia do IGF levaria em conta as participaccedilotildees no capital social da empresa as quais

seriam consideradas parcelas integrantes do conjunto patrimonial dos contribuintes em valores equi-

valentes agraves fraccedilotildees do patrimocircnio liacutequido da empresa de suas propriedades correspondentes

No caso de sociedades por accedilotildees o valor do patrimocircnio liacutequido da empresa para fins do

IGF corresponderia ao maior valor dentre os valores do patrimocircnio liacutequido conforme apurado em

balanccedilo e de mercado das accedilotildees representativas do capital social da empresa As aliacutequotas seriam

progressivas em funccedilatildeo do valor total do patrimocircnio tributado de sorte a incidirem diferencialmente

sobre os ativos considerados improdutivos e os produtivos A previsatildeo de responsabilidade solidaacuteria

da pessoa juriacutedica pelo pagamento do imposto constou do IGF sob a presunccedilatildeo de neutralizar aquelas

operaccedilotildees de incorporaccedilatildeo de bens ou direitos aos ativos que visassem agrave dissimulaccedilatildeo dos verdadei-

ros proprietaacuterios ou pretendessem apresentaacute-los subavaliados

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

83

O referido projeto caminhou no entanto com outras pernas O Senador Gomes de Carvalho foi

o autor do Substitutivo ao projeto de Lei anteriormente analisado aprovando-o de maneira a garantir

maior amplitude agraves exclusotildees da base de caacutelculo do IGF subtraindo-lhe os investimentos voltados agrave

infraestrutura de eletricidade transportes e comunicaccedilotildees com a expressa determinaccedilatildeo que fosse

remetida agrave lei ordinaacuteria a definiccedilatildeo das exigecircncias para a sua comprovaccedilatildeo

O Substitutivo ao projeto originaacuterio foi enviado agrave Comissatildeo de Financcedilas e Tributaccedilatildeo da Cacircmara

dos Deputados cuja relatoria foi delegada agrave ex-Deputada Federal pelo Partido dos Trabalhadores do

Estado do Rio de Janeiro economista Maria da Conceiccedilatildeo Tavares vencida junto aos seus pares

Mais tarde especialistas em financcedilas puacuteblicas simularam algumas projeccedilotildees para avaliaccedilatildeo da

produtividade fiscal do IGF extraiacutedas da arrecadaccedilatildeo reconhecida com base em publicaccedilotildees da Re-

ceita Federal retificando a subavaliaccedilatildeo dos imoacuteveis e rendas com base em estudos mundialmente

aferidos

O Quadro 1 apresenta essa distribuiccedilatildeo para o ano de 1999 extraiacutedo das declaraccedilotildees de im-

posto de renda Apenas 09 dos declarantes possuiacuteam renda mensal superior a R$ 10 mil e detinham

15 do patrimocircnio O mesmo percentual de 15 do patrimocircnio pertencia aos que tinham renda men-

sal entre R$ 1000 e R$ 1500 e representavam 240 do nuacutemero de declarantes Quem tinha renda

mensal acima de R$ 10 mil possuiacutea em meacutedia um patrimocircnio de R$ 1450 mil Quem ganhava ateacute mil

reais dispunha de um patrimocircnio de R$ 47 mil Uma diferenccedila de 3100 (KHAIR 2008)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

84

5 O SEM-FORTUNAS NENHUMAS

ldquoA eficaacutecia do sistema tributaacuterio natildeo eacute apenas uma questatildeo de legislaccedilatildeo tributaacuteria apropriada mas de eficiecircncia e integridade da administraccedilatildeo tributaacuteria e uma ad-ministraccedilatildeo eficiente formada por pessoas de grande integridade eacute o principal requisito para que se possa explorar o potencial tributaacuterio de um paiacutesrdquo

Nicholas Kaldor

A expressatildeo ldquograndes fortunasrdquo no contexto fiscal brasileiro eacute o oacutepio dos neoliberais Admite-se

que seja uma ldquosubstacircnciardquo que organiza o ldquodiscurso do lucrordquo

A sua proteccedilatildeo encobre erros crassos e mesmo justificam virar de pernas para o ar as incipien-

tes garantias sociais O pensamento da ldquovelha nova direitardquo tem de ceder espaccedilo a uma compreensatildeo

experimentada pelo mundo real Max Weber em vez de Von Mises Alexis de Tocqueville por Raimond

Aron Paul Krugmann a Milton Friedman

Nenhum propoacutesito haacute em ler Hayek durante 40 anos e aplicaacute-lo como um emplastro salvador

sobre nossas riquezas prepotentes e avaras De saiacuteda devemos aceitar o desastre do ldquoneoliberalismo

realrdquo que apresentou um caminho em linha reta agrave terra prometida da prosperidade e da eficiecircncia

econocircmica mas entregou a ldquogrande recessatildeordquo de 2009 cujo uacutenico precedente de igual magnitude eacute a

ldquogrande depressatildeordquo de 1929 que acendeu o pavio da II Guerra Mundial (GOWAN 2003)

A ser verdadeiro natildeo existir alternativa ao capitalismo a ldquonova velha direitardquo tem de dar cabo agrave

crenccedila de que os privileacutegios dos super-ricos eacute a roda que potildee o mundo a girar acende o farol dos ca-

minhos e ensina para onde se deva ir Isso faz algum sentido Somente se a aposta no futuro depender

de um privileacutegio fiscal sem a menor razatildeo exceto na concepccedilatildeo neoliberal paranoacuteica inspirada pela

onipotecircncia das grandes fortunas

Se formos agrave cata da falta de sentido das grandes fortunas privilegiadas com renuacutencias fiscais

vamos encontraacute-la em Sumer a primeira civilizaccedilatildeo conhecida haacute seis mil anos atraacutes onde hoje eacute o

Iraque

A relevacircncia dos impostos para aquela sociedade pode ser comprovada por hieroacuteglifos identi-

ficados por arqueoacutelogos em Lagash Curiosidade notaacutevel eacute a constataccedilatildeo da imposiccedilatildeo fiscal genera-

lizada e onerosa Ateacute a morte era taxada

A ldquoliberdade fiscalrdquo que foi proclamada em Sumer no reinado de Urikagina implicou o fim da

rede dos coletores de impostos resultando em uma cataacutestrofe a destruiccedilatildeo da cidade (ADAMS 2001)

A raiz do IGF remonta agrave Antiguidade Claacutessica A histoacuteria e soci-ologia tributaacuteria a identificam

no gecircnero dos impostos diretos Quanto ao imposto direto Marcus Cicero 44 AC lecionava ldquoWhen constant wars made the Roman treasury run short our forefathers often used to levy a property taxrdquo A experiecircncia na Alemanha mereceria alguma atenccedilatildeo com o Vermoegensteur o imposto sobre

a fortuna que impacta os donos de poder econocircmico e poliacutetico

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

85

Caldeada pelo sofrimento de duas grandes guerras mundiais tem uma poliacutetica tributaacuteria que

natildeo subtrai a contribuiccedilatildeo fiscal das riquezas acumuladas do bolo orccedilamentaacuterio em funccedilatildeo de uma feacute

farisaica professada no altar da renuacutencia fiscal sobre as grandes fortunas como se estas fossem mere-

cedoras de favorecimento

Natildeo custa lembrar que a Revoluccedilatildeo Francesa combateu o imposto sobre o consumo afirmando

que ldquosatildeo as classes pobres as mais carregadasrdquo na dicccedilatildeo de Alberto Deodato

A Franccedila fez retornar o tributo sobre as fortunas em 2013

Algo que natildeo se deveria estranhar porque ateacute mesmo Adam Smith jaacute constatara em sua mag-num opus o recolhimento do imposto de capitaccedilatildeo na Franccedila ldquosem nenhuma interrupccedilatildeordquo onde as

ldquoclasses mais altas satildeo taxadas de acordo com a sua posiccedilatildeo com base em uma tarifa invariaacutevelrdquo

A Suiacuteccedila promoveu a incidecircncia sobre o patrimocircnio das pessoas fiacutesicas e juriacutedicas com as aliacute-

quotas de 1 e 2 progressivamente a partir de uma isenccedilatildeo miacutenima atualmente equivalente a R$

50000000 adicional agrave tributaccedilatildeo em bases correntes da renda e dos impostos sobre o patrimocircnio

cobrados pelos condados que descartam a conhecida tese da bitributaccedilatildeo a renda em 42 e a gran-

de fortuna a 1 cumulativamente Como se vecirc a bitributaccedilatildeo eacute uma criacutetica que natildeo saiu de moda

tatildeo-somente no Brasil e costuma ser sempre invocada para descartar o IGF sob o pretexto de que a

aquisiccedilatildeo patrimonial decorreu de rendimento anteriormente tributado Misturam-se os conceitos de

fluxo das rendas ao de estoque das propriedades para justificar a ausecircncia de competecircncia federal agrave

instituiccedilatildeo do tributo porque a incidecircncia patrimonial estaria reservada a estado e municiacutepios com

exceccedilatildeo do imposto territorial rural

Os EUA possuem o general property tax considerado seu imposto sobre a fortuna e o inhe-ritance tax desde a era colonial no entanto influenciados pelo Relatoacuterio Meade que examinou as

origens da riqueza e pela eacutetica protestante hegeliana presumiram a avaliaccedilatildeo das grandes fortunas

como sendo um problema e descartaram o IGF - mercecirc do aperfeiccediloamento do imposto sobre cessotildees

patrimoniais graciosas

O fato eacute que a desigualdade aumentou tanto nos EUA ao ponto do governo Obama pretender

reequilibrar o ldquocoacutedigo fiscalrdquo mediante aliacutequotas de impostos maiores que nas Eras Reagan e Bush

A Gratilde-Bretanha incentivou o debate parlamentar nos anos 60 Os estudos recomendaram a

instituiccedilatildeo do IGF A base parlamentar da primeira-ministra Thatcher que abraccedilara o manancial teoacuterico

neoliberal incompatiacutevel com a incidecircncia fiscal sobre os ricos sepultou o tributo (MOORE JR 1999)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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6 O DIAGNOacuteSTICO DO IPEA

ldquoA justiccedila fiscal pressupotildee tacitamente uma justa distribuiccedilatildeo da renda e da proprieda-de de qualquer ponto de vista que seja julgado o problemardquo

Wicksell

A Reforma Tributaacuteria ensaiada em 2005 deu ecircnfase mais na facilitaccedilatildeo da dinacircmica econocircmica e

foi criticada por silenciar quanto agrave acentuada regressatildeo do sistema tributaacuterio reforccedilada pela proposta

governamental Os tributos impactam bem mais as camadas sociais de rendas consideradas baixas

incidindo risivelmente sobre os ricos e super-ricos

O IRPF passaria das atuais trecircs faixas de aliacutequotas para 12 A primeira seria de 5 para quem

tem renda de R$ 126 mil a R$ 21 mil

A faixa intermediaacuteria seria de 275 para aqueles com rendimentos entre R$ 65 mil e R$ 8 mil

A uacuteltima aliacutequota de 60 atingiria quem tem renda acima de R$ 50 mil Na visatildeo do presidente do

Ipea a uacuteltima proposta de reforma tributaacuteria enviada pelo governo ao Congresso Nacional natildeo pro-

potildee mudanccedilas que promovam a justiccedila fiscal porque enfatiza tatildeo-somente a promoccedilatildeo da eficiecircncia

econocircmica a reduccedilatildeo da burocracia e a eliminaccedilatildeo de desperdiacutecios sem alterar o perfil regressivo

da arrecadaccedilatildeo

Infelizmente outra vez o Executivo natildeo procurou ldquoa justa tributaccedilatildeo antes da arrecadaccedilatildeordquo na

dicccedilatildeo do advogado e ex-auditor da Receita Federal Fernando Marsillac descartando o IGF outra vez

(REFORMA FISCAL 1992)

A novidade do estudo do Ipea diferentemente do que se verificou nos anos 90 foi considerar

que parte da justiccedila tributaacuteria poderia ser alcanccedilada sem tocar a Carta Maior A reforma tributaacuteria

poderia segundo Maacutercio Pochmann oferecer uma perspectiva melhor de avanccedilo social do ponto de

vista da justiccedila tributaacuteria ateacute mesmo com leis infraconstitucionais constituindo-se de fato o imposto

sobre grandes fortunas conforme sua sustentaccedilatildeo oral em audiecircncia puacuteblica realizada na Comissatildeo

de Diretos Humanos do Senado Federal

O enfoque evidentemente equivocado de deixar de buscar a justiccedila fiscal por intermeacutedio tam-

beacutem do sistema tributaacuterio com aplicaccedilatildeo do sect 1ordm do artigo 145 da Carta de 88 natildeo tem recebido

apoio da miacutedia em geral que desdenha do IGF e assemelhados revestindo-os de uma roupagem

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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deacutemodeacute supostamente colocando-os como maleacuteficos aos jaacute pagantes do imposto sem discriminar

as diferenccedilas gritantes entre os contribuintes proporcionalmente altiacutessimas juntando-as agrave rejeiccedilatildeo

irrefletida da classe meacutedia esta sim a grande base do Imposto de Renda no Brasil A linha argumenta

tiva do Ipea trouxe o debate do IGF para o contexto de redistribuir a riqueza acumulada tornando a

tributaccedilatildeo melhor ajustada de modo agraves rendas mais baixas recolherem menos impostos sobre o con-

sumo com as rendas mais altas especialmente os mais ricos contribuindo mais mediante tributos in-

cidentes diretamente Sem sucumbir aos tradicionais argumentos agrave moda liberal as grandes fortunas

seriam submetidas ao imposto adicional em apoio e suporte agrave reduccedilatildeo das desigualdades sociais Isso

faz todo sentido em relaccedilatildeo agrave percepccedilatildeo de Wicksell completando-a porque ldquode outro modo natildeo

faria sentido falar de igualdade de prestaccedilatildeo de serviccedilo ou de contraprestaccedilatildeo de serviccedilo ou

de igualdade de sacrifiacuteciordquo

7 OS CONDENADOS Agrave ldquoREPRESSAtildeO FISCALrdquo

ldquoSatildeo atores econocircmicos que terminam por produzir suas proacuteprias regras evidente-mente adaptadas aos seus interessesrdquo

Delmas-Marty

A inclusatildeo do IGF em nossa Constituiccedilatildeo se deu em momento poliacutetico brasileiro onde podiacutea-

mos definir as correntes adversaacuterias no Congresso o que nos dias atuais eacute impossiacutevel pois temos uma

confusatildeo total entre o que antes chamaacutevamos de esquerda e direita

Esse antagonismo refletia as aspiraccedilotildees de uma maior gama de anseios sociais os quais se re-

fletiram fortemente em nosso ordenamento juriacutedico

No momento atual se haacute conhecida dificuldade de inclusatildeo do IGF pelo arranjo legislativo que

responde aos interesses das classes mais abastadas tambeacutem haacute a conjuntura econocircmica mundial que

favorece a determinaccedilatildeo constitucional de que se faccedila tal inovaccedilatildeo juriacutedica

Intrigante mas perfeitamente compatiacutevel agrave loacutegica interna do modelo de tributaccedilatildeo conformado

nos anos 90 o IGF foi discriminado negativamente abortado prematuramente marginalizado pela

sua suposta ldquobaixardquo arrecadaccedilatildeo sua ldquodificuldaderdquo de operacionalizaccedilatildeo sem que jamais tenha sido

mesmo experimentado durante um periacuteodo em que a CPMF teria sido mecanismo extremamente uacutetil

agrave sua adoccedilatildeo e controle

Curiosamente repise-se natildeo aceitam sequer a alegaccedilatildeo de ser baixa a tributaccedilatildeo dos projetos

do IGF quando os reformistas que o condenam sempre exigiram aliacutequotas moderadas nos seus libelos

acusatoacuterios da tributaccedilatildeo nacional

Ao bem da verdade o IGF tem sido afastado do caminho do livre movimento do processo de

acumulaccedilatildeo do capital e da concentraccedilatildeo social da riqueza por outro motivo subjacente e oculto

impedir o surgimento de soluccedilotildees capazes realmente de alavancar sua potencialidade dadas as ex-

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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pectativas dos formuladores do nouveaux laissez faire de que as riquezas seriam multiplicadas os

capitais seriam mais centralizados e os milionaacuterios e bilionaacuterios aumentariam sua fraccedilatildeo apropriada do

excedente econocircmico Um fato social que salta agrave vista (ELIAS 2011)

Dito de outra maneira a deacutecada de 90 eacute o periacuteodo onde o planejamento tributaacuterio agressivo foi

intensamente exercitado em escala global e assim preparatoriamente antecipando-se ao ldquotax appealrdquo que a referida concentraccedilatildeo social da riqueza e da renda acabaria acarretando (LE MONDE 2012)

Se atentarmos para a questatildeo fiscal a opiniatildeo puacuteblica foi levada a ignorar o meacuterito do IGF e

com base no tratamento superficial do tributo acabou por fazer pateticamente o jogo da neoliber-

tagem fiscal conformando-se a pagar o pato do arrocho tributaacuterio

O modo como tal processo desenrolou-se pode ser compreendido se for observado atenta-

mente de uma perspectiva especial pela janela de Overton que registra como pensa a maioria da

sociedade num dado momento sobre determinado assunto Da sacada da janela miremos o caso

concreto do IGF A maioria dos brasileiros certamente eacute contra cobrar impostos sobre quem natildeo dis-

ponha de capacidade contributiva As posiccedilotildees entretanto quanto a cobrar mais impostos dos que

possuam substancial capacidade contributiva obviamente variam do absolutamente contra ao abso-

lutamente a favor O pensamento modal visto da janela eacute o maacuteximo que um poliacutetico a depender de

sua ambiccedilatildeo poderia sustentar publicamente

Evidente que um militante da tributaccedilatildeo sobre grandes fortunas poderia ser eleito deputa-

do por eleitores simpatizantes da causa mdash mas sem duacutevida alguma teria problemas para se eleger

presidente da Repuacuteblica ou senador porque dependeria inapelavelmente de generosos recursos de

financiamento privado de campanha eleitoral

Eacute possiacutevel deslocar a perspectiva de quem estaacute na janela para um lado ou para outro Isto eacute

mover a opiniatildeo puacuteblica esmagadoramente a favor da cobranccedila de imposto sobre grandes fortunas

agrave situaccedilatildeo de indiferenccedila Absolutamente sim Isso demanda trabalho de pessoas especializadas em

manipulaccedilatildeo da opiniatildeo puacuteblica Empresas de consultoria organizadas passam a atuar na sociedade

para lhe oferecer valores que levem ao pretendido deslocamento

Mesmo quando eram favoraacuteveis os presidentes Fernando Henrique e Lula da Silva diziam que

nenhum cidadatildeo poderia gostar da coisa em si o pagar mais impostos seria um ldquoocircnusrdquo

O mesmo afirma agora a equipe econocircmica da presidenta Dilma Roussef

Repare-se que nesta intervenccedilatildeo afasta-se o IGF para debater outro tema Que outro Uma

proposta da ldquoreforma tributaacuteriardquo com vistas a suavizar as ldquocondiccedilotildees da regressividaderdquo Isso para

tentar deslocar a janela de opiniatildeo do ldquocontrardquo para o ldquomenos contrardquo ateacute chegar agrave ldquoneutralidaderdquo e

quem sabe um dia ao ldquoa favorrdquo da natildeo tributaccedilatildeo das grandes fortunas Assim sendo faz-se imperati-

vo trabalhar algum outro valor relacionado ao mesmo tema A fazer esse trabalho entra em campo um

verdadeiro exeacutercito de ldquoespecialistas em opiniatildeo puacuteblicardquo assessores de imprensa relaccedilotildees puacuteblicas

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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institutos de pesquisa think tanks agecircncias de lobby e ex-ldquoservidores de Estadordquo reciclados em ldquoservi-

dores do Mercadordquo (TER-MINASSIAN 2012)

Ad argumentadum tantum vejamos a questatildeo dos alimentos natildeo-transgecircnicos Eacute evidente que

a maioria da populaccedilatildeo se oporia a que famiacutelias ficassem sem alimento algum ou sujeita a aumentos

de preccedilos pela queda na produccedilatildeo de alimentos

Se a maioria eacute contra dificilmente um poliacutetico com ambiccedilotildees nacionais abraccedilaria essa causa

Mas por que natildeo outra Por exemplo a da ldquoseguranccedila alimentar transgecircnica garantidardquo certamente

seria mais simpaacutetica e em condiccedilotildees de operar o deslocamento da perspectiva de quem estaacute na janela

de Overton

Mutatis mutandis eacute o que tem conseguido o mainstream a favor do esquecimento do IGF

As consultorias associadas financiadas pelo mercado financeiro dentro e fora do paiacutes desmora-

lizam os que procuram fazer cumprir a Constituiccedilatildeo transformando-os em sinocircnimo de desmatado-

res fiscais como se as grandes fortunas fossem uma espeacutecie de Amazocircnia Ocidental cuja natureza

devesse permanecer conservada intocaacutevel espeacutecie de reserva natural indiacutegena protegida como se os

ricos do mundo fossem uma ldquoetnia do Alto Xingurdquo ameaccedilada de extinccedilatildeo

O caso mais bem-sucedido de que se tem notiacutecia nessa aacuterea eacute o terrorismo fiscal feito contra

a tentativa de transformaccedilatildeo do IGF em Contribuiccedilatildeo Social vinculada agrave sauacutede O que se pretende

eacute ldquoditar a agendardquo O trabalho bem-sucedido eacute de amplo espectro detectado um determinado sen-

timento da sociedade que potencialmente seja ameaccedilador das fortunas grandes trabalha-se para

mudaacute-lo ou neutralizaacute-lo

O truque de manipulaccedilatildeo da opiniatildeo puacuteblica consiste numa ponta em transformar o ldquofim do

IGFrdquo numa decorrecircncia natural dos ldquodireitos da propriedaderdquo nivelando assim a plutocracia aos pro-

prietaacuterios do Programa Habitacional das Massas apoiado pela Caixa Econocircmica Federal denominado

como Minha Casa Minha Vida

As forccedilas contraacuterias ao IGF natildeo satildeo secretas nem se movem nas sombras ou satildeo administradas

por algueacutem em especial

A ldquojanela de Overtonrdquo nada tem a ver com ldquoteorias da Conspiraccedilatildeordquo As classes dominantes na

economia sempre influenciaram o debate puacuteblico as opiniotildees alheias a propaganda o trabalho dos

assessores de imprensa de imagem e administradores (DREIFUSS 1989)

Como entatildeo distinguir o ldquomelhor pensamentordquo dessa algaravia de lobbies organizados Se o

meacuterito estaacute sendo efetivamente tratado se a temaacutetica tatildeo-somente guarda algum parentesco com o

assunto principal ou se haacute um oacutebvio desvio da questatildeo central

Se o meacuterito da questatildeo natildeo estiver sendo atacado estamos desbordando para os desvios os

temas paralelos

Neste caso a rede profissional dos operadores de opiniatildeo puacuteblica entra em accedilatildeo para substituir

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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a ldquoquestatildeo de meacuteritordquo no caso o privileacutegio fiscal das grandes fortunas para que a janela da opiniatildeo

puacuteblica se abra focalizada na censura geneacuterica do ldquoaumento dos impostosrdquo em louvor ao ldquocultordquo a natildeo

tributaccedilatildeo das grandes fortunas para ldquoo bem de todos e a felicidade geral da naccedilatildeordquo

As grandes empresas que financiaram o processo eleitoral dos 90 sejam no centro ou na pe-

riferia do sistema capitalista mundial rastreiam o perfil dos ex-servidores puacuteblicos e satildeo atentas aos

que podem ser usados por suas relaccedilotildees estatais de influecircncia corporativa Essa situaccedilatildeo encarna

o conceito de ldquomercado puacuteblicordquo onde os donos da riqueza e do poder recrutam seus executivos

(BENJAMIN 2002)

Franccedila Argentina e Uruguai onde o imposto sobre fortuna foi mantido a receita representada

pela arrecadaccedilatildeo do imposto em 2009 - de 16 15 63 respectivamente - tende ao crescimento

Esses paiacuteses com o passar dos anos desenvolveram uma legislaccedilatildeo e administraccedilatildeo bem detalhada

O nuacutemero de contribuintes aumentou Revertendo a tendecircncia da deacutecada de 1990 paiacuteses como Islacircn-

dia e Espanha reinstituiacuteram o imposto recentemente como resposta a crise financeira e fiscal que tem

assolado a Europa desde 2009

A tendecircncia internacional para uma maior eficiecircncia e arrecadaccedilatildeo do Wealth Tax seria o menor

nuacutemero de aliacutequotas um limite de isenccedilatildeo mais baixo a abrangecircncia de pessoas juriacutedicas a tributaccedilatildeo

especial para natildeo residentes e a presenccedila de normas contra-evasivas severas Empiricamente estudos

mostram que a concentraccedilatildeo da riqueza eacute superior agrave da renda e que numa amostra significativa de

paiacuteses para o ano 2000 25 das famiacutelias mais ricas do mundo isto eacute inseridas no grupo de 1 com

as maiores fortunas do mundo eram brasileiras Isso mostra a dimensatildeo arrecadadora e distributiva

que a instituiccedilatildeo do imposto bem aplicado desde logo poderia gerar

A anaacutelise de oito Projetos de Lei Complementar incluindo-se os dois que foram rejeitados nas

Comissotildees de Tributaccedilatildeo e Financcedilas da Cacircmara em 2000 e de Assuntos Econocircmicos do Senado em

2010 mostra que a estrutura dos projetos se caracterizava por ser pouco detalhada nas normas evasi-

vas divergindo entre si apenas com relaccedilatildeo ao limite de isenccedilatildeo e a estrutura de aliacutequotas

Esses dois uacuteltimos aspectos satildeo fundamentais na tributaccedilatildeo efetiva da fortuna e seu potencial

arrecadador e distributivo Os argumentos utilizados pelos parlamentares para rejeitarem os projetos

em 2000 e 2010 foram os mesmos baixa arrecadaccedilatildeo alto custo administrativo e a sua extinccedilatildeo em

diversos paiacuteses europeus A simples pesquisa das experiecircncias argentina e francesa com o grau de

tecnologia atual fazem da alta concentraccedilatildeo da riqueza no Brasil o objeto par excellence de que a

regulamentaccedilatildeo do imposto teraacute o resultado efetivo desejado A presunccedilatildeo a priori de que natildeo possa

vir a ser bem aplicado natildeo pode ceder agrave tentaccedilatildeo injetada pela razatildeo ciacutenica na loacutegica fiscal da maacute

alocaccedilatildeo de recursos porque cabe agraves instituiccedilotildees republicanas e ao controle social a verificaccedilatildeo das

boas praacuteticas de governanccedila e destinaccedilatildeo dos gastos puacuteblicos

As afirmaccedilotildees de Celso Furtado nos anos 60 ao apresentar seu Plano Trienal de Conceiccedilatildeo Ta-

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

91

vares ao analisar o modelo brasileiro nos 2000 de Kautsky ao discorrer sobre a poliacutetica fiscal nos 20 e

de um Baratildeo de Cotegipe desconsolado sobre a resistecircncia patrimonial natildeo deixam duacutevidas a respeito

de quem satildeo eles de onde vem e de como se comportam quando se trata de estabelecer quem deve

pagar a conta da vida em sociedade (MARIANI 2007)

A definiccedilatildeo de Lester Thurow de que a reforma tributaacuteria eacute a arte de fazer uns pagarem pelos

outros deslocando o peso dos tributos dos ombros dos que podem mais ao costado de quem tem de

menos e apresentar essa decisatildeo poliacutetica como a mais fantaacutestica descoberta da ciecircncia das financcedilas

ainda se torna mais verdadeira quando aplicada aos que defendem abertamente o reacutequiem do IGF

A maacutexima de Lester para o sistema tributaacuterio eacute facilmente perceptiacutevel no setor financeiro Em

eacutepocas passadas o setor puacuteblico contribuiacutea para a formaccedilatildeo do capital com pelo menos 5 do PIB

parte desses recursos sendo de origem puramente inflacionaacuteria Hoje haacute consenso de que natildeo deveriacute-

amos depender da inflaccedilatildeo para financiar o investimento Ora soacute a mudanccedila na base tributaacuteria poderia

substituir o papel da inflaccedilatildeo O Plano Real fez exatamente isso A estabilizaccedilatildeo da moeda implicou

ateacute os dias de hoje e ainda por muito tempo o carregamento de elevadiacutessimas diacutevidas interna e exter-

na cujo serviccedilo deve ser pago com altas taxas reais de juros e muito mais impostos (VASCONCELOS

1995) Nenhum ministro da fazenda diz que a intensidade da ldquorepressatildeo fiscalrdquo resulta inteiramente

concentrada sobre a base da piracircmide social sem nenhum incocircmodo fiscal no topo

O ex-jurista e ex-secretaacuterio da Receita Federal Osiacuteris de Azevedo Lopes Filho resumiu a realida-

de brasileira com a qual convivera bem de perto durante 40 anos em Brasiacutelia ldquoEsse Congresso natildeo

quer tributar os ricosrdquo

8 OS SEM-IMPOSTO NO PAIacuteS DOS CONTRASTES

ldquoReconheccedilo que muito tempo decorreraacute antes que possamos incluir no orccedilamento uma taxa que assente com a devida proporcionalidade sobre todas as proprie-dades territoriais mas eacute preciso ir ensaiando a praticabilidade dessa tatildeo vulgarizada imposiccedilatildeordquo

Baratildeo de Cotegipe

Continuamos a bater recordes de desigualdade moderna e natildeo agrave antiga que como eacute de bom-tom atribuiacuteamos agraves nossas heranccedilas histoacutericas

Chico de Oliveira

Natildeo seria demasiado debitar tambeacutem agrave era republicana a profecia anunciada em 1877 contida

na exposiccedilatildeo de motivos do Ministeacuterio da Fazenda assinada pelo Baratildeo de Cotegipe

Quanto tempo ainda a decorrer para tornaacute-la absolutamente insoacutelita

Os arautos do paacutelio-liberalismo responderiam agrave primeira indagaccedilatildeo com um natildeo dogmaacutetico

Jaacute quanto agrave segunda sob a aureacuteola da modernizaccedilatildeo neoconservadora ateacute concordariam em

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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renovar quiccedilaacute por mais um seacuteculo e meio a impressatildeo estranhada do ministro da Fazenda o Baratildeo de

Cotegipe Com os 20 mais pobres da populaccedilatildeo brasileira dividindo entre si menos de 3 da renda

nacional e os 20 mais ricos cerca de dois terccedilos a onda neoliberal leva mais aacutegua ao moinho dos

sem-equidade porquanto ldquoas poliacuteticas econocircmicas e sociais neoliberais natildeo foram determinantes

para a expansatildeo econocircmica mas ampliaram a desigualdaderdquo (POCHMANN 2008)

Os super-ricos portanto que mais se beneficiaram da crise financeira mundial de 2008 nem

foram chamados ao miacutenimo sacrifiacutecio fiscal adicional no gradual processo de reduccedilatildeo progressiva

e continuada dos contrastes que crispam de violecircncia e inseguranccedila a sociedade brasileira (CARTA

CAPITAL 2012)

Vinte anos atraacutes o economista Garcia Munhoz fez uma afirmaccedilatildeo no Auditoacuterio Petrocircnio Porte-

la em novembro de 1992 que confirma a sina nacional marcante da trajetoacuteria de todos os governos

ateacute agora ldquoQuem vai pagar Eacute a questatildeo da dificuldade do sistema alocar nas pessoas de mais

alta renda uma carga tributaacuteria adicional mesmo quando se trata de impostos diretosrdquo

Stuart Mill nos seus Principles of Political Economy no seacuteculo XIX jaacute dissera e isto se aplica ao

imposto sobre as ldquograndes fortunasrdquo que ldquoa dificuldade de se fazer justiccedila plena natildeo constitui razatildeo

alguma contra o se fazer o que pudermos nesse sentidordquo como tambeacutem que a situaccedilatildeo de rendimen-

tos que tendessem ldquoconstantemente a aumentar sem qualquer atividade ou sacrifiacuteciordquo formaria um

conjunto de beneficiaacuterios ldquoque se enriquece progressivamente pelo curso natural das coisas sem que

eles mesmos faccedilam esforccedilo algum para issordquo

Lugares comuns bem verdade mas que precisam ser repetidos porque como diria Gide ldquonin-

gueacutem escutardquo

A reforma do sistema tributaacuterio brasileiro natildeo deveria mais ignorar o espectro altamente dife-

renciado da capacidade de pagamento entre as classes dominantes e subalternas

A bizarrice mais difundida pela ofensiva neoliberal defende o resumo do tributo ao seu objetivo

puramente fiscal sendo que correccedilotildees e ajustes das imperfeiccedilotildees ou assimetrias fiquem por conta e

responsabilidade do gasto puacuteblico cuja suposta qualidade do foco compensaria as distorccedilotildees inevitaacute-

veis e deliberadas na coleta Tal platitude prevaleceu a partir dos 90 sempre escorada no amplo bureau

dos interesses regrados conforme lembrado por Delmas-Marti (MOTTA 2001)

Aleacutem disso eacute igualmente contestaacutevel na ldquoteoria da ofertardquo o efeito de reduccedilatildeo das taxas de

poupanccedila e investimento quanto aos lucros em virtude da incidecircncia possiacutevel do IGF como um novo

imposto direto uma vez que natildeo haacute indicaccedilotildees que esses niacuteveis ndash de poupanccedila investimento e lucro

- tenham aumentado em virtude da baixiacutessima tributaccedilatildeo da renda e do patrimocircnio que caracteriza o

sistema tributaacuterio brasileiro

Assim sendo a recorrida tese dos impostos indiretos serem melhores propulsores do desenvol-

vimento natildeo seria sustentaacutevel porque as ldquotaxas de poupanccedila e investimentordquo natildeo aumentaram devi-

do agraves insuficientes tributaccedilotildees das rendas e dos patrimocircnios as quais ensejariam ldquoa propensatildeo para

poupar e investirrdquo (NAVARRO 2009) Um grupo de alematildees ricos lanccedilou em 2009 uma campanha para

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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reclamar a volta de um imposto sobre o patrimocircnio com objetivo do paiacutes ter mais recursos para sair

da crise A liccedilatildeo de Navarro natildeo poderia obter melhor confirmaccedilatildeo

Uma deacutecada atraacutes no ano de 2004 o sacrifiacutecio fiscal consoante a distribuiccedilatildeo social da renda

familiar estava assim discriminado consoante a tabela abaixo

Natildeo haacute a menor duacutevida de que melhor do que aguardar um eventual interes-se particular dos

detentores de grandes fortunas em levar adiante um impos-to no paiacutes ldquotatildeo cheio de riquezas prepo-

tentes e avarasrdquo eacute conscientizar a populaccedilatildeo (VIDAL 2010)

A defesa da regulamentaccedilatildeo do IGF mdash haja vista que natildeo lhe fal-ta nem a legitimidade

constitucional consistente para entendecirc-lo como fer-ramenta eficaz de cumprimento dos objetivos

socioeconocircmicos nem condiccedilotildees operacionais tecnoloacutegicas e burocraacuteticas ao implemento pela ad-

ministraccedilatildeo tributaacuteria federal ndash deveria estar na pauta dos manifestantes e redes sociais como timi-

damente ateacute se notou em algumas faixas empunhadas por jovens nos protestos de junho de 2013

no sul do Brasil

O crescimento da participaccedilatildeo dos impostos indiretos cuja fatia passou de 65 nos anos 40

do seacuteculo passado a 75 no seacuteculo presente nitidamente contribuiu agrave ocorrecircncia do fato social de

nos termos transformado no paiacutes onde a desigualdade foi deliberadamente intensificada pelo mo-

delo econocircmico

Uma deacutecada depois o aumento da carga tributaacuteria tendo por base o quadro de 2004 natildeo se

deu sobre o decil superior da piracircmide social ao contraacuterio Os 1 mais ricos beneficiaram-se da poliacute-

tica fiscal e mais ainda da poliacutetica monetaacuteria

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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9 OS WEBERIANOS ESTARIAM CHEGANDO

ldquoAfinal quem manda neste paiacutesrdquoCelso de Alencar Furtado

ldquoNatildeo haacute no mundo elites mais alienadas do que as nossasrdquo

Nelson Rodrigues

As crises financeiras que ameaccedilam a comunidade do Euro mostram a gravidade da situaccedilatildeo

social e poliacutetica de paiacuteses como Espanha Greacutecia Portugal Itaacutelia e Irlanda

As experiecircncias de duas grandes guerras e as sequumlelas de horrores ensinaram o valor essencial

de uma sociedade estaacutevel segura e ordenada ainda que os uacuteltimos 30 anos tenham sido responsaacuteveis

pela derrubada dos pilares do Estado que um dia jaacute foi denominado do Bem-Estar (GALBRAITH 1970)

Natildeo eacute de estranhar que a vertente dos direitos que o professor Paulo Bonavides definiu como

de ldquosegunda geraccedilatildeordquo passe a recrutar novos personagens a compor a cena fiscal

E natildeo como meros coadjuvantes mas reivindicando outro protagonismo - completamente dis-

tinto da mesmice e da repeticcedilatildeo dos discursos verbosos contraacuterios agrave recuperaccedilatildeo do objetivo social

do imposto - representativo de uma nova espeacutecie de ldquodireito tributaacuteriordquo vinculado agrave afirmaccedilatildeo funda-

mental da ldquodignidade humanardquo em contraponto agrave ldquosagrada alianccedilardquo noticiada por Conceiccedilatildeo Tavares

Celso Furtado afirmou certa vez que nunca pudera ldquocompreender a existecircncia de um problema

estritamente econocircmicordquo jamais se esquecendo de interrogar a matriz de poder instalada por traacutes das

diretrizes econocircmicas (DOSMAN 2011) A poliacutetica tributaacuteria estaacute entranhada em igual contexto Pode-

riacuteamos parafrasear sua incompreensatildeo quanto aos tributos desconsiderando a compreensatildeo da exis-

tecircncia de um problema ldquoestritamente tributaacuteriordquo ou seja trata-se de dar percepccedilatildeo agrave importacircncia de

fatores natildeo tributaacuterios subjacente agrave estrutura dos sistemas fiscais Os jovens ainda estariam dispostos

a natildeo banalizar a injusticcedila fiscal Nem fazer pouco caso da indecente concentraccedilatildeo da renda social e

da riqueza no Brasil Ocorre-me entatildeo lembrar-lhe as liccedilotildees daquele que melhor pensou as condiccedilotildees

do subdesenvolvimento com suas desigualdades sociais e regionais

Caberia ao intelectual aprofundar a percepccedilatildeo da realidade social onde se ocultam os cri-

mes cometidos pelos que abusam do poder e reconhecer que o ponto de partida para as alterna-

tivas teraacute que ser inevitavelmente o aumento da participaccedilatildeo do povo nos centros de decisatildeo

(TAVARES 2000)

Os grandes grupos econocircmico-financeiros nacionais e transnacionais seus prepostos consul-

tores e especialistas constituem um soacute bloco de poder o qual natildeo faz o papel de contribuir agrave remo-

ccedilatildeo dos rolos de nuvens que embaccedilam a trilha da justiccedila fiscal Isto porque o seu papel eacute produzir a

espiral fumaceira com justificativas de que ricos natildeo devem pagar (mais) impostos Os mesmos que

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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promovem ldquolas razones que siguen haciendo atractiva a la banca para los lavadores la inexistencia de un impuesto sobre la renta ni de impuestos de sucesiones ni sobre el beneficio empresarial elimi-naacutendose asiacute los controles legales de cambio bajo el supuesta confraternidad profesional del secretordquo (AGUILERA 2012)

A essecircncia da nuvem conservadora eacute constituiacuteda de presumida externalidade extraordinaacuteria

incomparaacutevel agraves atividades dos ricos como se poliacutetica industrial natildeo existisse mas por mera quimera

a criaccedilatildeo de empregos fosse a proacutepria induacutestria das fortunas grandes

Nesta hipoacutetese fantasiosa a tese seria adequada para fundamentar os resultados esperados

Nas demais mais realistas natildeo passaria daquela situaccedilatildeo ldquoem que argumentos imprecisos sobre as

enormes repercussotildees satildeo excelentesrdquo na dicccedilatildeo de Paul Krugman O mesmo bloco de poder muito

menos faraacute o papel de resgatar o IGF do limbo constitucional onde se encontra relegado nem iraacute im-

pedi-lo de ser embaralhado ao senso comum das expectativas de reduccedilatildeo da carga tributaacuteria

Ao contraacuterio porque busca misturaacute-lo aos ventos que sopram a favor da diminuiccedilatildeo do ocircnus

fiscal inflamando o clamor difuso contra ldquoquaisquer aumentosrdquo de impostos Se capazes de formular

e de imporem em escala internacional suas poliacuteticas tributaacuterias longe do alcance da progressividade

fiscal que diraacute no acircmbito nacional restrito agraves burocracias eleitas onde os opositores do IGF contam

com seus aliados naturais de classe social e de poder poliacutetico

Sem falar das administraccedilotildees tributaacuterias vale dizer das burocracias concursadas que reforccedila-

ram as simplificaccedilotildees da realidade para fins fiscais pelas linhas de forccedila fixadas pelas classes dominan-

tes na economia e seus representantes poliacuteticos no Parlamento

Garcia Munhoz natildeo foi capaz de imaginar que sua indagaccedilatildeo acabaria sendo respondida mais

tarde por uma ldquolei de responsabilidade fiscalrdquo que institucionalizou o que ele sempre temera ldquoO que

existe eacute um jogo de poder Para quecirc a Reforma Fiscal Afetou-me muito saber que haacute uma im-

posiccedilatildeo externa pelo superaacutevit fiscal para o problema da diacutevidardquo (LIMA SOBRINHO 1995)

Cerca de 30 anos depois do mal-estar acusado por Munhoz indicar um sentimento que talvez

parecesse vago o mesmo pano de fundo reapresenta-se em maior escala e intensidade quando ob-

servamos ndash pelo menos aqueles que sabem olhar e ver como lembrava Saramago no Ensaio sobre a

Cegueira - nas telas de LCD as imagens da Praccedila Sintagma em Atenas com dezenas de milhares de

manifestantes gregos rebelados em torno de um Parlamento completamente cercado em indignadas

manifestaccedilotildees de protesto contra as ldquonovas leis de austeridaderdquo

As mesmas que satildeo apresentadas em pacotes fiscais imunizantes das grandes fortunas e rendas

conspiacutecuas de quaisquer sacrifiacutecios

Uma faixa enorme pintava os sentimentos emblemaacuteticos da mobilizaccedilatildeo ateniense Aganaktis-meni Igual agrave carregada cerca de 2400 km dali pelos madrilenhos na Porta do Sol com dizeres seme-

lhantes Los indignados

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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O Imposto sobre as Grandes Fortunas confirma agrave brasileira uma profecia de Ruy Barbosa ldquoAin-

da que a Constituiccedilatildeo que nos fosse dada baixasse do Olimpo feita por matildeo divina se noacutes natildeo

a cumpriacutessemos natildeo valeria nada Natildeo adiantaria nada ter vindo do ceacuteurdquo

Ruy natildeo haveria de saber que o IGF seria corpo de prova da sua profecia realizada noutra eacutepo-

ca em que a melhor resposta aos problemas adviria da reduccedilatildeo dos impostos dos ricos da liberdade

total de capitais desregulados sem tributaccedilatildeo das grandes fortunas em escala global

Um Ruy Barbosa liberal indignado perguntaria ao socioacutelogo Francisco de Oliveira Para quecirc

entatildeo Constituiccedilatildeo Meio perplexo ouviria a irocircnica resposta do socialista para preparar brioches

cuja falta levou os jacobinos a subirem as escadarias do Palaacutecio de Versalhes e mais tarde os bol-

cheviques a ocuparem os salotildees do Palaacutecio de Inverno (DEJOURS 1999) Quais os modos e em que

o passado pode ajudar-nos a construir um modelo tributaacuterio melhor Quando ateacute o mega-investidor

americano Warren Buffet engrossa o coro da maior equidade fiscal considerando que paga muito pou-

co em relaccedilatildeo agrave sua capacidade contributiva (NY TIMES 2012)

Ateacute o Herald Tribune ndash voz da conservadora elite londrina ndash reconhece que o primeiro

ministro conservador David Cameron ao renovar o expediente do rebaixamento dos impostos dos

ricos para enfrentar a crise que estremece as bases da Eurolacircndia a partir de agora teraacute pela frente o

desafio de natildeo ignorar a percepccedilatildeo entre os eleitores de que ldquohaacute austeridade para os mais pobres mas natildeo para os ricosrdquo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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10 OS MOEDEIROS GRANDES E SEUS PRETEXTOS FALSOS

ldquoAliacutequotas muito altas para os mais ricos de 50 70 ou 90 em vez da atual maacutexima de 35rdquo

Piketty-Saez

ldquoA simples loacutegica diz que devemos tributar os ricos e com vigorrdquo

Paul Krugmann

A imunizaccedilatildeo fiscal das grandes fortunas natildeo passa de um vetor eversivo A resultante eacute esse

monstro cruel a desigualdade que no paiacutes dos contrastes foi banalizada sob pretextos falsificados

Poder-se-ia dizer que a couraccedila das grandes fortunas soacute tem valor de pretexto para ainda maior

concentraccedilatildeo da riqueza e de poder obviamente como se tal pretexto pertencesse agrave ordem das

fatalidades

A desigualdade negligenciada eacute obra de seacuteculos na sociedade brasileira Ateacute quando indagaria

o socioacutelogo Chico de Oliveira (SAMPAIO 2010)

Imprevidente portanto que escape da clivagem do pensamento criacutetico no Brasil - por onde

orbitam coberturas midiaacuteticas das rebeliotildees aacuterabes e do desastre ecoloacutegico da economia do carbo-

no do surto terrorista pelo choque das civilizaccedilotildees da monumental crise social da proacutepria sauacutede do

capitalismo e do passivo de um exeacutercito de mais de 75 milhotildees de jovens desempregados ndash somente

o caudilhamento de opiniatildeo financiado e ditado pelo mercado (FIORI 1997) A corrente de opiniotildees

refrataacuterias ao IGF eacute inteiramente ofensiva agraves ideacuteias comungadas em torno da justiccedila tributaacuteria - en-

quanto centro de gravidade iniludiacutevel da piracircmide social brasileira ndash a partir da qual se impulsionaria a

configuraccedilatildeo de um futuro modelo fiscal legiacutetimo que fosse capaz de imputar os princiacutepios constitu-

cionais e eacuteticos ao sistema impositivo nacional

A sua existecircncia constitucional e sua inexistecircncia no ordenamento fiscal brasileiro eacute digna de

figurar entre nossas tiacutepicas curiosidades como o araccedilaacute-amarelo e a jabuticaba

Se Millocircr Fernandes soubesse que o governo anunciou a transferecircncia de R$ 26 bilhotildees para o

insuficiente socorro emergencial do semi-aacuterido nordestino - que viveu em 2012 a pior seca dos uacuteltimos

30 anos afetando 26 milhotildees de pessoas - enquanto o IGF arrecadaria o triplo anualmente do miacutenimo

valor alocado para mitigar o sofrimento sertanejo e aleacutem disso de que os impostos sobre a proprie-

dade se reduziram de 33 do total da carga tributaacuteria para 27 acelerando a regressatildeo que marca

o perfil de tributaccedilatildeo existente no Brasil de que maneira a verve iconoclasta dele reagiria correlacio-

nando agrave siacutendrome foacutebica do novo patriciado afortunado perante o tributo a plebe rude despossuiacuteda

e ressecada do agreste

O breviaacuterio das boas e prosaicas intenccedilotildees referentes aos milagres que as grandes fortunas

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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podem obrar na expansatildeo do mercado de trabalho natildeo se prospecta na alta riqueza sem tributaccedilatildeo

compatiacutevel Natildeo reside nas fortunas grandes mas nos micros e pequenos empresaacuterios o grosso da

geraccedilatildeo dos postos de trabalho (GHANI KERR OrsquoCONNEL 2012) O fundamentalismo tributaacuterio que

sustenta a proficiente imunidade fiscal do IGF supostamente produtiva e industriosa natildeo mais deveria

amparar a incauta credibilidade na sua capacidade panegiacuterica de multiplicar a populaccedilatildeo economica-

mente ativa Ora ainda que os mais ricos fossem extraordinariamente aptos agrave geraccedilatildeo da riqueza e

habiliacutessimos ao apresentar suas performances em magia criacionista de empregos perante o mundo

do trabalho natildeo deveriam deixar de recolher muito mais tributos do que o (natildeo) fizeram pelo menos

nos uacuteltimos 30 anos

Os defensores do 1 muito ricos professam a crenccedila primitiva de que o crescimento econocircmico

eacute uma questatildeo de fervor dogmaacutetico na sua imunidade fiscal

Se repetirem a palavra vaacuterias vezes acompanhada da feacute na blindagem fiscal a economia brasi-

leira sairia do buraco senatildeo amanhatilde jaacute a partir da semana vindoura

Isso depois de mais de duas deacutecadas de hegemonia da ldquoteoria da ofertardquo (supply-side econo-mics) com a diminuiccedilatildeo das cargas fiscais sobre os super-ricos e grandes capitais natildeo se mostrarem

capazes de reverter dramaacuteticas tendecircncias recessivas reincentivando os investimentos ditos produti-

vos exatamente porque simplesmente sempre buscam maximizar o ldquoganho monetaacuteriordquo em lugar do

produto (KEYNES 1974)

O aspecto emblemaacutetico de como se tem dado o processo atual de ldquocriaccedilatildeo de riquezardquo na era

do capitalismo financeiro global pode ser observado com o empresaacuterio e investidor americano Warren

Buffett apelidado de ldquooraacuteculo de Omahardquo que mais enriqueceu em 2013 na ldquomeacutedia de 15 milhotildees de

doacutelares por horardquo segundo a pesquisa Wealth-X feita pelo banco UBS Buffett dispotildee do patrimocircnio

de 60 bilhotildees de doacutelares equivalente agrave soma do PIB da Boliacutevia e Uruguai

A sua ldquogrande fortunardquo aumentou doze bilhotildees de doacutelares apenas em 2013 O proacuteprio oraacuteculo

declarou que os super-ricos ldquowouldnrsquot mind being told to pay more in taxes as well particularly when so many of their fellow citizens are truly sufferingrdquo (CCNEWS 2011) Segundo o estudo ldquoo nuacutemero

de bilionaacuterios em 2013 eacute de 2170 pessoas cujas fortunas cresceram em meacutedia 53 no ano Desde

o iniacutecio da crise econocircmica a fortuna da parcela da populaccedilatildeo considerada bilionaacuteria simplesmente

dobrou e saltou ldquode 31 trilhotildees de doacutelares para 65 trilhotildees doacutelaresrdquo (VEJA 2013) Como se vecirc a

fatura da maior crise global desde o crash de 1929 natildeo foi paga pelas grandes fortunas e mais uma

vez o populacho ldquopagou o patordquo da totalidade do deacutebito Esta operaccedilatildeo de transferecircncia do ocircnus

tributaacuterio costumeiramente vem apresentada sob complexos caacutelculos econocircmicos capitaneados

por agecircncias de classificaccedilatildeo de riscos e departamentos dos principais bancos Estes satildeo os mesmos

personagens com as mesmas proposiccedilotildees e argumentos expendidos pelo menos nos uacuteltimos 40

anos desde o primeiro choque do petroacuteleo em 1973 e a crise da diacutevida externa da periferia capita-

lista em 1982 (THUROW 1970)

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A riqueza no Brasil goza do status da invulnerabilidade fiscal Imagine-se mais um seacuteculo adian-

te sem a regulamentaccedilatildeo do imposto correspondente agraves grandes fortunas que a Carta de 1988 aguar-

da faz 25 anos

Isso significa necessariamente preferir o nada fazer quando tudo estaacute por refazer e a ter de

aceitar a grande fortuna como heranccedila imutaacutevel quando tal situaccedilatildeo natildeo passa de um falso pretexto

a repeticcedilatildeo de mais um privileacutegio aversivo idealizado e concebido desde a Casa Grande

O sistema tributaacuterio eacute um meio de concentraccedilatildeo ou desconcentraccedilatildeo de renda e riqueza o que

depende das caracteriacutesticas de cada paiacutes

A histoacuteria da tributaccedilatildeo brasileira indica uma iacutenfima probabilidade de que a desconcentraccedilatildeo

social da riqueza e renda deflua dos impostos vigentes sobre a propriedade ITR IPTU IPVA e ITCM

O IPTU repousa na debilidade municipal para lograr uma progressividade patrimonial eficiente (Ipea

2009) O ITCM estadual tambeacutem natildeo obteria ecircxito nesse propoacutesito em face do limite superior fixado

dos 8 impeditivo agrave progressividade sem falar nas subavaliaccedilotildees

A ecircnfase quanto agrave propriedade ser decorrente de renda tributada anteriormente com a argu-

mentaccedilatildeo de se envidar esforccedilos na reduccedilatildeo das desigualdades por intermeacutedio do Imposto de Renda

natildeo tem como ser demonstrado no Brasil pela simples falta de base histoacuterica e nenhuma compro-

vaccedilatildeo econocircmica Prova disso eacute que a concentraccedilatildeo fundiaacuteria ainda eacute maior que a da renda social

o que reforccedila a tendecircncia a um processo permanente de enriquecimento geracional da Casa Gran-

de por meio de heranccedilas e rendas reduzidamente tributaacuteveis em relaccedilatildeo aos fabulosos rendimentos

natildeo-tributaacuteveis A histoacuteria brasileira ensina que o Imposto de Renda natildeo funcionou com efetividade

eficiecircncia e eficaacutecia no objetivo de melhorar a equidade Hoje e ontem haacute vaacuterios segmentos sociais

que liacutecita e ilicitamente mantecircm-se distantes da arrecadaccedilatildeo de impostos (OSIacuteRIS 2006) No Brasil

reside uma parcela significativa das famiacutelias com as maiores fortunas no mundo Para dados de 2000

que aumentaram nos uacuteltimos 15 anos cerca dos 25 das famiacutelias mais ricas do mundo satildeo brasileiras

similarmente a Espanha e Canadaacute Os paiacuteses europeus que aboliram o Imposto sobre a Riqueza na

uacuteltima deacutecada como a Aacuteustria Sueacutecia Finlacircndia e Dinamarca - e que satildeo utilizados como referecircncia

oportunista na argumentaccedilatildeo da sua obsolescecircncia fiscal para os super-ricos - somente os revogaram

apoacutes muito perseguirem e estabelecerem uma estrutura social com alto teor de equidade

Apenas aboliram o Imposto sobre a Riqueza recentemente porque em suas respectivas experi-

ecircncias fiscais longevas houvera uma tributaccedilatildeo expressiva sobre a riqueza e as transferecircncias median-

te heranccedilas e doaccedilotildees que tambeacutem foi utilizada intensamente para reduzir as desigualdades

Na Franccedila apesar do bom niacutevel de equidade devido ao tamanho de sua economia o paiacutes con-

segue ter uma arrecadaccedilatildeo eficiente do Imposto sobre a Riqueza (Wealth Tax) O Brasil com elevada desigualdade e PIB relevante tambeacutem teria condiccedilotildees de apresentar um

bom indicador arrecadador para tal imposto O padratildeo de tributaccedilatildeo do Imposto sobre a Riqueza

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pode ser modulado pela adoccedilatildeo de aliacutequota uacutenica e reduccedilatildeo dos limites de isenccedilatildeo e seria leviano

disseminar a ideia que a aboliccedilatildeo desse imposto tornou-se paciacutefica na teoria fiscal e no mundo real A

Holanda por exemplo em 2001 aumentou a arrecadaccedilatildeo do Imposto sobre a Riqueza e o nuacutemero de

seus contribuintes (GLOBO 2003)

Devido agrave crise fiscal e financeira que disseminou a atual Grande Recessatildeo Mundial cuja ori-

gem remonta a 15 de setembro de 2008 com a quebra do Banco de Investimentos norte-americano

Lehman Brothers Islacircndia e Espanha reintroduziram o imposto

O IGF francecircs (Impocirct sur les Grandes Fortunes) foi instituiacutedo na Franccedila em 1981 com efeitos a

partir do exerciacutecio fiscal de 1982 Inicialmente abrangia a propriedade de pessoas fiacutesicas e juriacutedicas

mas em 1984 foi restrito somente ao patrimocircnio das pessoas fiacutesicas

Em 1986 o imposto era pago por apenas 05 das famiacutelias francesas (84700 famiacutelias) e foi en-

tatildeo abolido pelo novo Parlamento conservador

Em 1988 no Brasil ano da promulgaccedilatildeo da Constituiccedilatildeo Cidadatilde o Impocirct Solidariteacute sur la Fortu-ne (ISF) foi reinstituiacutedo pelo novo governo socialista francecircs nos moldes existentes atualmente isen-

tando os ativos previdenciaacuterios e incidindo sobre a riqueza liacutequida excedente a 800 (oitocentos) mil

euros Houve crescimento do nuacutemero de contribuintes e da arrecadaccedilatildeo do ISF entre 1992 e 2010 O

presidente francecircs enfrenta a ira por exemplo de personalidades como o ator Gerard Depardieu que

se mudou para Luxemburgo sob protesto poreacutem Franccedilois Hollande eleito em 2012 enfrenta o contra-

-ataque agrave tributaccedilatildeo dos super-ricos para somar esforccedilos em arrostar os fortes impactos da crise do

capital financeiro global Os contribuintes cresceram de 168 mil para 562 mil famiacutelias e a arrecadaccedilatildeo

foi de um bilhatildeo de euros a 45 bilhotildees (CARVALHO 2011)

A notiacutecia mais recente a propoacutesito dos ldquoMega ndash Richrdquo serem incluiacutedos no rol daqueles que de-

vem pagar mais impostos vem dos proacuteprios teacutecnicos do FMI mediante uma nota obviamente natildeo

reconhecida pela instituiccedilatildeo (KRUGMAN 2014)

No entanto eacute um sinal inconfundiacutevel de que ateacute no proacuteprio FMI haacute questionamentos so-

bre a ficccedilatildeo cientiacutefica de que tributar os mega-ricos faz mal agrave sauacutede das economias (CANADIAN

PRESS 2014)

Longe de atribuir algum pecado original agraves grandes fortunas natildeo eacute demasiado recordar da

literatura francesa dois contos claacutessicos sobre a origem da riqueza O Lrsquoauberge rouge insinua a

existecircncia de uma raiz delinquumlente O Le Pegravere Goriot conclui que ldquoo segredo das grandes fortunas

sem causa aparente consiste num crime esquecido porque perpetrado com limpezardquo O primeiro

encontra-se nos Estudos Filosoacuteficos o segundo nas Cenas da Vida Privada ambos em A Comeacutedia

Humana (BALZAC 1979)

Ao fim desta breve notiacutecia sobre a evoluccedilatildeo da natildeo tributaccedilatildeo das grandes fortunas no Brasil

creio que Platatildeo - natildeo o ateniense mas o principal personagem do romance ldquoA noite da borboleta

douradardquo - admitiria haver aleacutem da provocaccedilatildeo sem dogmatismos algum humor e ironia na tentativa

de colocar a riqueza ao alcance de todos os tributos (ALI 2011)

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REFEREcircNCIAS

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AGUILERA Alejandro P Paraiacutesos fiscales y drogas en El ldquonuevo mundordquo americano America Latina en movimento Quito 18 abr 2012 Disponiacutevel em httpalainetorgactive54168amplang=es Acesso em 22 out 2012

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EFICIEcircNCIA DA ADMINISTRACcedilAtildeO TRIBUTAacuteRIA E REDUCcedilAtildeO DA POBREZA1

SUMAacuteRIO Introduccedilatildeo 1 Administraccedilatildeo Tributaacuteria 2 Anaacutelise envoltoacuteria de da-dos e o Iacutendice de Malmquist 3 Receita tributaacuteria dos municiacutepios do Cearaacute 4 Anaacutelise da base de dados 5 Anaacutelise dos resultados 6 Eficiecircncia da Administra-ccedilatildeo Tributaacuteria e reduccedilatildeo da pobreza Consideraccedilotildees finais Referecircncias

Flaacutevio Ataliba Flexa Daltro Barreto2

Carlos Eduardo dos Santos Marino3

INTRODUCcedilAtildeO

No Brasil a Constituiccedilatildeo Federal de 1988 promoveu uma reforma tributaacuteria que elevou con-

sideravelmente a importacircncia das receitas proacuteprias para os entes subnacionais A carga tributaacuteria de

estados e municiacutepios entre 1988 e 2010 passou de 66 para 104 do PIB nacional Nos municiacutepios

a receita tributaacuteria de 2010 medida em percentual do PIB eacute quase trecircs vezes superior a registrada em

19884 Eacute provaacutevel que uma parte deste incremento esteja associada a uma maior eficiecircncia das admi-

nistraccedilotildees tributaacuterias municipais

Desde a estabilizaccedilatildeo econocircmica em 1994 discute-se a exaustatildeo no Brasil a necessidade de

reformas tributaacuterias tendo em algumas oportunidades o Governo Central conseguido aprovar pe-

quenas modificaccedilotildees Pouca importacircncia eacute dada a questatildeo da eficiecircncia da administraccedilatildeo tributaacuteria

Ateacute mesmo a Lei de Responsabilidade Fiscal editada em 2000 que produziu inegaacuteveis avanccedilos na

organizaccedilatildeo das financcedilas puacuteblicas nacionais conteve-se a impor limites agrave concessatildeo de incentivos e

benefiacutecios tributaacuterios Na mesma linha o sistema de reparticcedilatildeo de receitas entre os niacuteveis de governo

utilizado no paiacutes natildeo considera a eficiecircncia na arrecadaccedilatildeo como criteacuterio de rateio Assim um estado

ou municiacutepio com baixa arrecadaccedilatildeo tributaacuteria devido agrave ineficiecircncia na exploraccedilatildeo de suas bases tri-

butaacuterias natildeo sofre qualquer sanccedilatildeo no federalismo fiscal brasileiro

A pobreza eacute um fenocircmeno econocircmico persistente ao longo do tempo e para sua superaccedilatildeo eacute

necessaacuteria a adoccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas adequadas Em uacuteltima anaacutelise o niacutevel de pobreza pode ser

reduzido por um aumento da renda ou por uma mudanccedila na sua distribuiccedilatildeo que conduza a reduccedilatildeo

da desigualdade No caso brasileiro existem fortes evidecircncias de que o niacutevel de pobreza eacute bastante

1 Este artigo eacute uma siacutentese de Marino et alii (2013)2 Poacutes-Doutor em Economia (Harvard University) Professor da Universidade Federal do Cearaacute Diretor Geral do Instituto de Pesquisa e Estrateacutegia Econocircmica do Cearaacute (Ipece) E-mail flavioatalibaipececegovbr3 Doutor em Economia (CaenUFC) Professor e Pesquisador do Laboratoacuterio de Estudos da Pobreza (LEPCaenUFC) Au-ditor Fiscal Adjunto da Receita Estadual do Cearaacute E-mail eduardomarinocaenufcbr4 Caacutelculos proacuteprios com dados disponiacuteveis em SRF (2012) e Afonso et alii (1998)

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influenciado pelo grau de desigualdade Nesse contexto o sistema tributaacuterio brasileiro contribui para

agravar a situaccedilatildeo devido agrave alta participaccedilatildeo de impostos indiretos e regressivos Com exceccedilatildeo do

imposto de renda e do imposto sobre a propriedade rural ambos de responsabilidade da Uniatildeo os

demais impostos diretos notadamente os tributos sobre o patrimocircnio estatildeo sob a competecircncia tri-

butaacuteria de estados e municiacutepios Com a possibilidade de cobranccedila progressiva desses impostos em

tese os efeitos nocivos na economia resultantes de incrementos da arrecadaccedilatildeo municipal podem ser

suavizados ou ateacute mesmo eliminados no tocante a equidade Sendo os recursos adicionais utilizados

na produccedilatildeo de bens puacuteblicos que afetem positivamente a renda dos mais pobres pelo menos a longo

prazo existe a possibilidade de que os incrementos de eficiecircncia das administraccedilotildees tributaacuterias muni-

cipais estejam associados agrave reduccedilatildeo da pobreza

Este artigo intenciona verificar se o incremento da eficiecircncia na arrecadaccedilatildeo de impostos mu-

nicipais no Cearaacute estaacute associado agrave reduccedilatildeo da pobreza Para atingir este objetivo utiliza-se uma estra-

teacutegia empiacuterica desenvolvida em dois estaacutegios Na primeira fase avalia-se a evoluccedilatildeo do niacutevel da efi-

ciecircncia das administraccedilotildees tributaacuterias municipais no Cearaacute na uacuteltima deacutecada estimando-se fronteiras

de arrecadaccedilatildeo natildeo parameacutetricas por meio da teacutecnica de programaccedilatildeo linear de Anaacutelise Envoltoacuteria de

Dados (DEA) (Charnes et alii 1978 Banker et alli 1984) Computa-se a seguir a variaccedilatildeo da eficiecircncia

teacutecnica pura de cada municiacutepio entre os anos de 2000 e 2010 utilizando-se a decomposiccedilatildeo do Iacutendice

de Malmquist proposta em Faumlre et alii (1994) No segundo estaacutegio utilizando-se miacutenimos quadrados

ordinaacuterios verifica-se qual o efeito do incremento da eficiecircncia teacutecnica pura na proporccedilatildeo de pobres

de cada municiacutepio em 2010 usando caracteriacutesticas do municiacutepio no ano 2000 como variaacuteveis de

controle Ao final conclui-se que o incremento da eficiecircncia teacutecnica eacute significativamente negativo na

proporccedilatildeo de pobres em 2010 encontrando-se evidecircncias que a eficiecircncia teacutecnica da administraccedilatildeo

tributaacuteria estaacute associada agrave reduccedilatildeo da pobreza

Este ensaio estaacute dividido em sete seccedilotildees aleacutem desta introduccedilatildeo Na segunda seccedilatildeo apresen-

ta-se uma revisatildeo da literatura sobre administraccedilatildeo tributaacuteria A terceira seccedilatildeo discute a metodolo-

gia DEA e o Iacutendice de Malmquist Na quarta eacute feita uma anaacutelise exploratoacuteria das receitas tributaacuterias

municipais no Cearaacute identificando-se as rubricas mais relevantes Na quinta eacute feita uma discussatildeo

sobre a base de dados utilizada para estimar as fronteiras de arrecadaccedilatildeo justificando-se as escolhas

realizadas Nessa seccedilatildeo tambeacutem eacute apresentada a metodologia utilizada para a exclusatildeo de municiacutepios

atiacutepicos (outliers) A sexta seccedilatildeo apresenta os escores de eficiecircncia teacutecnica na arrecadaccedilatildeo municipal

obtidos no primeiro estaacutegio de estimaccedilatildeo Na seacutetima parte verifica-se se o incremento na eficiecircncia

arrecadatoacuteria estaacute relacionado com a proporccedilatildeo de pobres no final do periacuteodo analisado discutindo-

-se os resultados obtidos Por fim satildeo tecidas as consideraccedilotildees finais

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1 ADMINISTRACcedilAtildeO TRIBUTAacuteRIA

Mesmo considerando certo grau de altruiacutesmo no comportamento individual natildeo eacute possiacutevel ob-

ter recursos da sociedade de forma espontacircnea para o financiamento da produccedilatildeo de bens puacuteblicos

Como por definiccedilatildeo bens puacuteblicos satildeo natildeo excludentes aqueles que optarem por natildeo contribuiacuterem

com o financiamento natildeo poderatildeo ser excluiacutedos do consumo do bem Dessa forma a obtenccedilatildeo de

recursos financeiros pelo Estado por meio da tributaccedilatildeo eacute em todas as sociedades feita de forma

compulsoacuteria e impositiva sempre existindo algum tipo de sanccedilatildeo aplicada agravequeles indiviacuteduos que natildeo

efetuem o pagamento devido Logo se todo sistema tributaacuterio necessita de elementos coercitivos

surge agrave necessidade de administrar essa sistemaacutetica de coerccedilatildeo Assim se existe o tributo existe uma

entidade para administraacute-lo no sentido de verificar os valores pagos e impor penalidades para os

agentes que natildeo efetuaram o pagamento Em uacuteltima anaacutelise a administraccedilatildeo tributaacuteria eacute a entidade

governamental que tem por missatildeo adotar as poliacuteticas que reduzam a evasatildeo fiscal

Apesar de a evasatildeo fiscal ser um problema que ameaccedila a equidade a eficiecircncia e a sustenta-

bilidade de muitas poliacuteticas puacuteblicas (COWEL 1985) o tema soacute foi analisado na literatura econocircmica

a partir da deacutecada de 1970 O efeito negativo inicial da evasatildeo fiscal eacute reduzir as receitas do governo

correccedilotildees do problema que impliquem aumento da aliacutequota tributaacuteria para aqueles agentes que pa-

gam o tributo geram distorccedilotildees adicionais aleacutem de um incremento da inequidade horizontal Aleacutem

disso a maior diversidade na base tributaacuteria dos agentes em melhor situaccedilatildeo permite maiores possi-

bilidades de evasatildeo prejudicando a equidade vertical Outra ineficiecircncia derivada da evasatildeo fiscal eacute o

desperdiacutecio de recursos aplicados em atividades natildeo produtivas Se existe a evasatildeo5 uma parte dos

agentes aplicaraacute recursos em atividades que visem agrave reduccedilatildeo do tributo surgindo uma tecnologia da

sonegaccedilatildeo Por outro lado os governos aplicam recursos nos mecanismos que possibilitam a arreca-

daccedilatildeo e fiscalizaccedilatildeo do tributo surgindo uma tecnologia da administraccedilatildeo tributaacuteria Uma distorccedilatildeo

adicional menos oacutebvia eacute a geraccedilatildeo de incentivos para que os agentes atuem nas atividades nas quais

a sonegaccedilatildeo eacute mais faacutecil de ser praticada e mais difiacutecil de ser detectada Por uacuteltimo por seu caraacuteter

ilegal a evasatildeo fiscal incentiva e facilita a incidecircncia de outros crimes na sociedade

Inspirando-se em Becker (1968) que discutiu o comportamento criminoso sob a oacutetica econocirc-

mica Allingham e Sandmo (1972) desenvolveram um modelo econocircmico que considera a tributaccedilatildeo

sobre a renda um jogo com informaccedilatildeo assimeacutetrica no qual o contribuinte sabe qual eacute sua renda

5 Os termos evasatildeo fiscal e sonegaccedilatildeo fiscal satildeo sinocircnimos e estatildeo associados a uma atividade iliacutecita do contribuinte do tributo Em outra vertente elisatildeo fiscal (planejamento tributaacuterio) utiliza teacutecnicas legais agraves vezes duvidosas para reduzir a carga tributaacuteria Independentemente de se tratar de evasatildeo ou elisatildeo existe uma tecnologia Note-se que a existecircncia de elevado grau de elisatildeo tambeacutem eacute um indicativo de ineficiecircncia da administraccedilatildeo tributaacuteria que possivelmente opera com uma legislaccedilatildeo duacutebia e com lacunas

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enquanto a administraccedilatildeo tributaacuteria natildeo deteacutem essa informaccedilatildeo Nesse ambiente modelaram a de-

cisatildeo de sonegar de um indiviacuteduo racional avesso ao risco maximizador de sua utilidade esperada

que toma como dados a aliacutequota tributaacuteria a probabilidade de ser auditado e a penalidade aplicaacutevel

no caso de detecccedilatildeo Esse modelo tambeacutem tratava a renda como exoacutegena Note-se que por essa uacutel-

tima hipoacutetese que em termos mais gerais pode ser expressa como exogeneidade da base tributaacuteria

o modelo de Allingham e Sandmo eacute aplicaacutevel a qualquer tributo desde que os demais paracircmetros do

modelo natildeo afetem o valor que deveria servir como base de caacutelculo do tributo

Apesar de restritivo e tratar todas as variaacuteveis sob controle da administraccedilatildeo tributaacuteria como

exoacutegenas o modelo apresenta conclusotildees bastante interessantes algumas esperadas como o fato de

aumentos na probabilidade de ser auditado e na penalidade reduzirem a sonegaccedilatildeo Outros surpre-

endentes como o efeito inconclusivo de variaccedilotildees da aliacutequota tributaacuteria sobre a sonegaccedilatildeo Posterior-

mente uma pequena correccedilatildeo do modelo realizada por Yitzhaki (1974) modificou a forma como a

penalidade eacute definida e concluiu contra intuitivamente que quando se aumenta a aliacutequota reduz-se a

sonegaccedilatildeo

A racionalizaccedilatildeo da decisatildeo de sonegar pelo agente foi estendida em diversas direccedilotildees6 Kolm

(1973) em uma pequena nota referente ao modelo AS foi o primeiro a adaptar o modelo introduzin-

do elementos importantes para a discussatildeo posterior sobre administraccedilatildeo tributaacuteria No seu modelo

simples aproveitando o agente racional maximizador da utilidade esperada Kolm introduziu custos de

auditoria e bens puacuteblicos custeados com a receita tributaacuteria Os primeiros trabalhos que trataram da

tecnologia da tributaccedilatildeo de forma parcial endogeneizavam a probabilidade de auditoria (Reinganum

e Wilde 1985 Border e Sobel 1987 Mookherjee e Png 1989)

Mesmo sem considerar explicitamente qualquer tecnologia utilizada pela administraccedilatildeo tribu-

taacuteria Sandmo (1981) Slemrod e Yitzhaki (1987) demonstraram que o tamanho oacutetimo de uma adminis-

traccedilatildeo tributaacuteria deve ser superior ao definido por um modelo simples de custo-benefiacutecio Determinar

o tamanho da administraccedilatildeo tributaacuteria oacutetima de forma ingecircnua igualando a receita marginal gerada

pela adoccedilatildeo de uma fiscalizaccedilatildeo mais severa e com maior custo ao custo marginal dessa poliacutetica eacute

equivocado Eacute necessaacuterio considerar que a receita marginal eacute apenas uma transferecircncia entre os seto-

res privado e puacuteblico Para determinar o volume de recursos que devem ser aplicados na administra-

ccedilatildeo tributaacuteria o procedimento adequado seria utilizar o benefiacutecio social marginal possivelmente natildeo

mensuraacutevel mas com certeza superior a receita marginal do tributo jaacute que uma parte consideraacutevel da

receita gerada retornaraacute a sociedade na forma de bens puacuteblicos

Kaplow (1990) analisou o relacionamento entre a tributaccedilatildeo oacutetima e a poliacutetica tributaacuteria oacutetima

investigando duas poliacuteticas distintas que buscam o incremento da receita tributaacuteria A primeira seria

6 (Benjamini e Maital 1985 Yitzhaki 1987 Erard e Feinstein 1994 Myles e Naylor 1996 Kim 2003 Cowell e Gordon 1988 Cremer e Gahvari 1994)

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aumentar a aliacutequota aplicaacutevel sem qualquer custo adicional enquanto a segunda seria aumentar a efi-

ciecircncia da administraccedilatildeo tributaacuteria incorrendo em custos adicionais Nos modelos analisados pelo au-

tor utilizar recurso para incrementar a eficiecircncia da administraccedilatildeo tributaacuteria poderia ser uma estrateacutegia

oacutetima Mayshar (1991) foi o primeiro a introduzir o termo ldquotecnologia tributaacuteriardquo utilizando em seu

modelo uma funccedilatildeo de produccedilatildeo da administraccedilatildeo tributaacuteria Sanchez e Sobel (1993) caracterizaram a

soluccedilatildeo oacutetima do problema de maximizaccedilatildeo de receita enfrentado pela administraccedilatildeo tributaacuteria Mos-

traram ainda que o orccedilamento da administraccedilatildeo tributaacuteria norte-americana era subdimensionado

Besfamile e Siritto (2009) analisaram os efeitos do investimento na administraccedilatildeo tributaacuteria

concluindo que a possibilidade de investimento permite uma menor frequecircncia das auditorias um

sistema tributaacuterio mais progressivo e um setor puacuteblico mais eficiente

Uma grande literatura empiacuterica sobre evasatildeo fiscal desenvolveu-se desde o modelo inicial de

Allingham e Sandmo (1972) Uma das vertentes tenta mensurar a sonegaccedilatildeo por meacutetodos diretos

ou indiretos em diversas regiotildees e paiacuteses (Tanzi 1983 Nam et alii 2001 Jimeacutenez et alii 2010) Aleacutem

da simples mensuraccedilatildeo da evasatildeo diversos artigos buscaram verificar empiricamente as conclusotildees

relativas ao comportamento individual prescritas nos modelos teoacutericos (Clotfelter 1983 Slemrod

1985 Feinstein 1991 Alm el alii 1993 Erard e Feinstein 2010 Andreoni et alii 1998 Torgler e Sch-

neider 2009)

Um dos problemas metodoloacutegicos com as avaliaccedilotildees empiacutericas citadas anteriormente eacute o fato

do processo de seleccedilatildeo dos agentes auditados natildeo ser puramente estocaacutestico Por mais rudimentar

que seja a tecnologia adotada pela administraccedilatildeo tributaacuteria eacute provaacutevel que exista algum mecanismo

de seleccedilatildeo dos agentes mesmo que esse mecanismo natildeo seja sistematizado Essa caracteriacutestica pode

produzir um vieacutes de seleccedilatildeo comprometendo os resultados obtidos Alguns poucos trabalhos utiliza-

ram experimentos controlados nos quais os agentes foram escolhidos aleatoriamente (Slemrod et alii 2001 Kleven et alii 2011) Por outro lado diversos trabalhos utilizaram a economia comportamental

tentando simular em laboratoacuterios situaccedilotildees que envolvessem a decisatildeo de sonegar um tributo (Frie-

dland et alii 1978 Alm et alii 1992) Uma justificativa para a utilizaccedilatildeo dessa abordagem eacute o grande

nuacutemero de fatores que influenciam a decisatildeo de evadir o tributo tornando o controle economeacutetrico

bastante difiacutecil Alm (2012) elencou uma seacuterie de conclusotildees sobre a decisatildeo de sonegar extraiacutedas da

economia comportamental i) a frequecircncia de auditorias eacute associada negativamente com a sonegaccedilatildeo

ii) os indiviacuteduos em geral superestimam a probabilidade de auditoria iii) auditorias mais produtivas

ou seja com maior possibilidade de detecccedilatildeo impactam negativamente a evasatildeo iv) estrateacutegias de

seleccedilatildeo para a auditoria endoacutegenas satildeo mais eficientes do que regras simplesmente aleatoacuterias v) au-

mento das penalidades provocam pequena reduccedilatildeo na evasatildeo vi) publicidade da sonegaccedilatildeo reduz

a sonegaccedilatildeo vii) a presenccedila de bens puacuteblicos financiados pela tributaccedilatildeo reduz a sonegaccedilatildeo viii) o

processo decisoacuterio para aplicaccedilatildeo dos recursos arrecadados influencia a decisatildeo de sonegar Processos

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mais participativos tendem a reduzir a evasatildeo e ix) arrecadar impostos na fonte impactam negativa-

mente a evasatildeo

Uma questatildeo central foi inicialmente discutida por Slemrod (1990) que criticou a teoria da

tributaccedilatildeo oacutetima (optimal taxation) por ser incompleta e oferecer sugestotildees de poliacuteticas puacuteblicas

inadequadas e em algumas situaccedilotildees inaplicaacuteveis Alicerccedilado no fato de um sistema tributaacuterio ser um

mecanismo coercitivo de arrecadaccedilatildeo de recursos tendo esse sistema tecnologia e custos sugeriu

a inserccedilatildeo desses elementos na anaacutelise denominando essa nova visatildeo de ldquosistema tributaacuterio oacutetimordquo

(optimal tax system) O custo da administraccedilatildeo tributaacuteria natildeo eacute despreziacutevel e existem impostos cujos custos de ad-

ministraccedilatildeo satildeo mais onerosos Aleacutem disso existem diferenccedilas significativas nas tecnologias adota-

das pelas administraccedilotildees tributaacuterias Tecnologias diferentes aplicadas em um uacutenico sistema tributaacuterio

podem conduzir a situaccedilotildees distintas de eficiecircncia e equidade Diante desses fatos Slemrod (1990)

sugere que a teoria da tributaccedilatildeo oacutetima mude seu foco da estrutura de preferecircncias dos indiviacuteduos

para a tecnologia da administraccedilatildeo tributaacuteria Argumenta em favor dessa ideia que as preferecircncias

satildeo razoavelmente estaacuteveis ao longo do tempo mas a tecnologia eacute por natureza dinacircmica Logo um

sistema tributaacuterio oacutetimo haacute dez anos possivelmente natildeo o seraacute no presente

Reforccedilando essa tese os avanccedilos em tecnologia da informaccedilatildeo tornaram em algumas situa-

ccedilotildees a probabilidade de detecccedilatildeo de uma informaccedilatildeo fornecida errada pelo agente agrave administraccedilatildeo

tributaacuteria bastante proacutexima de 100 Outro exemplo eacute a comparaccedilatildeo entre um imposto sobre o valor

adicionado com aliacutequota uniforme e um imposto sobre o consumo Sem a inclusatildeo da evasatildeo fiscal os

dois tributos satildeo instrumentos idecircnticos inclusive contabilmente Ao introduzir a evasatildeo fiscal os cus-

tos e tecnologia da administraccedilatildeo tributaacuteria os dois impostos distanciam-se fortemente (SLEMROD

2007) Ressalte-se ainda que o resultado claacutessico de irrelevacircncia do agente ao qual seraacute atribuiacuteda a

responsabilidade pelo pagamento do imposto natildeo eacute vaacutelido em um ambiente com evasatildeo fiscal

Aleacutem dessa argumentaccedilatildeo eacute possiacutevel arguir a dificuldade do processo poliacutetico principalmente

em paiacuteses federalistas No Brasil a experiecircncia de amplas reformas tributaacuterias inexiste em periacuteodos de-

mocraacuteticos As reformas tributaacuterias de 1934 1965 e 1988 foram realizadas em momentos de transiccedilatildeo

quando se entrava ou saia de um regime autoritaacuterio Por outro lado ganhos de eficiecircncia nas adminis-

traccedilotildees tributaacuterias em geral natildeo encontram oposiccedilatildeo social ou poliacutetica pelo menos claramente

Uma questatildeo crucial para as administraccedilotildees tributaacuterias eacute seu grau de independecircncia Por sua

natureza coercitiva estatildeo sujeitas a grandes pressotildees poliacuteticas e econocircmicas Logo a profissionaliza-

ccedilatildeo de seus agentes e a total independecircncia na aplicaccedilatildeo das normas originadas do poder poliacutetico eacute

essencial para se obter administraccedilotildees tributaacuterias eficientes Mann (2004) descreve e analisa as expe-

riecircncias de vaacuterios paiacuteses em desenvolvimento que adotaram administraccedilotildees tributaacuterias semi-autocircno-

mas com alto grau de autonomia para gerenciamento de seus sistemas internos Concluiu que uma

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

111

administraccedilatildeo tributaacuteria autocircnoma eacute uma plataforma a partir da qual a eficiecircncia pode ser gerada

entretanto seu simples estabelecimento natildeo eacute garantia de sucesso Taliercio (2004) argumentou que a

poliacutetica de estabelecimento de administraccedilotildees tributaacuterias semi-autocircnomas iniciada nos anos oitenta

do seacuteculo passado jaacute atingia mais de quinze paiacuteses Aleacutem da simples separaccedilatildeo e autonomia do Minis-

teacuterio das Financcedilas ou equivalente a criaccedilatildeo de uma administraccedilatildeo tributaacuteria semi-autocircnoma apresenta

as seguintes caracteriacutesticas i) mecanismo de auto-financiamento ii) direccedilatildeo profissional e qualificada

com representaccedilatildeo do setor privado e iii) poliacutetica de recursos humanos proacutepria Apesar de reco-

mendada pelos organismos internacionais a administraccedilatildeo tributaacuteria semi-autocircnoma foi inicialmente

testada nos paiacuteses em desenvolvimento Na amostra pesquisada o autor encontrou evidecircncias que a

autonomia da administraccedilatildeo tributaacuteria gera eficiecircncia e quanto mais autonomia maior a eficiecircncia

2 ANAacuteLISE ENVOLTOacuteRIA DE DADOS E O IacuteNDICE DE MALMQUIST

A literatura empiacuterica de avaliaccedilatildeo de eficiecircncia teacutecnica utiliza em geral duas metodologias dis-

tintas A primeira eacute a estimaccedilatildeo por meacutetodos economeacutetricos da fronteira de possibilidade de produ-

ccedilatildeo Essa teacutecnica eacute denominada de Fronteira Estocaacutestica Outra possibilidade eacute utilizar a teacutecnica de pro-

gramaccedilatildeo linear de Anaacutelise Envoltoacuteria de Dados (DEA)7 Uma das vantagens do uso da metodologia

DEA eacute natildeo ser necessaacuterio definir qualquer forma para a funccedilatildeo de produccedilatildeo Em essecircncia DEA eacute uma

metodologia comparativa que exige apenas um pequeno nuacutemero de condiccedilotildees para obter resultados

robustos Teacutecnicas parameacutetricas exigem o conhecimento da funccedilatildeo de produccedilatildeo que necessariamente

deve ser a mesma para todas as unidades de decisatildeo A teacutecnica DEA requer apenas o conhecimento

dos insumos e produtos do processo sendo a fronteira resultante apenas uma aproximaccedilatildeo linear que

envolve da forma mais ajustada possiacutevel os dados

Em um ambiente de produccedilatildeo com apenas um insumo e um produto uma medida evidente de

eficiecircncia eacute a razatildeo entre a quantidade produzida e quantidade de insumos utilizados Numa situaccedilatildeo

com muacuteltiplos insumos e produtos pode-se continuar a mensurar a eficiecircncia pela razatildeo produto-in-

sumo desde que se utilizem pesos especiacuteficos para cada insumo e produto ou seja a eficiecircncia teacutecnica

de uma DMU pode ser expressa como

xvyu

xvxvyuyu

kk

mm

11

11 =++++

=θ (1)

onde mm Ruuu +isin= )( 1 e k

k Rvvv +isin= )( 1 satildeo vetores de pesos natildeo negativos

A metodologia DEA utiliza programaccedilatildeo linear de forma a definir o vetor de pesos u e v que

maximize a eficiecircncia θ da DMU impondo a restriccedilatildeo que a aplicaccedilatildeo dos pesos oacutetimos em todas

7 Bowlin (1998) apresenta uma comparaccedilatildeo entre as metodologias DEA e de anaacutelise de regressatildeo mostrando as vantagens e desvantagens de cada meacutetodo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

112

as unidades produtivas deve ser menor ou igual a um O primeiro modelo DEA foi desenvolvido por

Charnes et alii (1978) que utilizou o conceito de eficiecircncia do trabalho pioneiro de Farrel (1957) O

modelo proposto eacute conhecido na literatura por CCR e tem por hipoacutetese uma tecnologia com retornos

constantes de escala

O modelo CCR original era orientado aos insumos No sentido que a eficiecircncia teacutecnica com-

putada indicava a reduccedilatildeo proporcional dos insumos para que a DMU seja eficiente produzindo a

mesma quantidade de produtos A eficiecircncia teacutecnica no modelo orientado ao produto mensura o

aumento proporcional dos produtos para que a DMU seja eficiente utilizando a mesma quantidade de

insumos As fronteiras de produccedilatildeo e a eficiecircncia teacutecnica satildeo idecircnticas independentemente da orien-

taccedilatildeo adotada

Banker et alii (1984) fizeram uma extensatildeo do modelo CCR admitindo retornos variaacuteveis de es-

cala Esse modelo eacute denominado na literatura de BCC Em situaccedilotildees nas quais existe grande variaccedilatildeo

no tamanho de cada unidade produtiva eacute possiacutevel que algumas natildeo estejam operando em situaccedilotildees

oacutetimas de escala No caso especiacutefico deste artigo o componente poliacutetico presente na organizaccedilatildeo

espacial dos municiacutepios no Brasil deve causar em algumas situaccedilotildees ineficiecircncias de escala

Intuitivamente a metodologia DEA estima a fronteira de produccedilatildeo mais proacutexima possiacutevel dos

dados envelopando ou envolvendo os dados diante das suposiccedilotildees do modelo adotado O modelo

BCC envelopa os dados de uma maneira mais ldquoapertadardquo Para isso tem que considerar mais unidades

produtivas eficientes ou seja operando na fronteira de produccedilatildeo Por uacuteltimo merece registro que a

eficiecircncia teacutecnica no modelo CCR pode ser decomposta no produto da eficiecircncia teacutecnica no modelo

BCC e da eficiecircncia de escala

O iacutendice de variaccedilatildeo da produtividade de Malmquist foi proposto por Caves et alii (1982) que

definiram o iacutendice como razatildeo de funccedilotildees distacircncias noccedilatildeo introduzida por Malmquist (1953) As

funccedilotildees distacircncia representam uma tecnologia com muacuteltiplos insumos e produtos necessitando para

tanto apenas das quantidades utilizadas e produzidas O iacutendice pode ser decomposto em variaccedilotildees de

eficiecircncia (catching up) e variaccedilotildees na tecnologia Uma observaccedilatildeo relevante eacute que a funccedilatildeo distacircncia

eacute idecircntica a medida de eficiecircncia utilizada na literatura de estimaccedilatildeo natildeo parameacutetrica de fronteiras de

produccedilatildeo por anaacutelise envoltoacuteria de dados (DEA)

O Iacutendice de Malmquist pode ser decomposto em duas partes sendo a primeira a mudanccedila

na eficiecircncia teacutecnica (MET) da unidade produtiva e a segunda o avanccedilo (ou retrocesso) tecnoloacutegico

(MTEC) que deslocou a fronteira de possibilidades de produccedilatildeo

MTECMETM 0 = O iacutendice de Malmquist pode ser computado para qualquer tipo de tecnologia Neste artigo

optou-se por calcular o iacutendice considerando-se inicialmente retornos constantes de escala Em

seguida calcula-se a mudanccedila na eficiecircncia das unidades produtivas assumindo retornos variaacuteveis

(2)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

113

de escala gerando um componente denominado na literatura de variaccedilatildeo de eficiecircncia teacutecnica ldquopurardquo (METp) Considerando que a razatildeo entre as eficiecircncias teacutecnicas computadas por retornos constantes e retornos variaacuteveis de escala resulta numa medida denominada de eficiecircncia de escala pode-se gerar uma a variaccedilatildeo na eficiecircncia de escala (MESC) Assim eacute possiacutevel decompor (2) da seguinte forma

MTECMESCMETpM 0 =

3 RECEITA TRIBUTAacuteRIA DOS MUNICIacutePIOS DO CEARAacute

A Tabela 1 mostra as participaccedilotildees dos itens de receita nas receitas correntes dos municiacutepios

do Cearaacute8 Exibe tambeacutem o valor por habitante de cada rubrica Uma anaacutelise da tabela permite veri-

ficar que o grau de dependecircncia dos municiacutepios com respeito agraves transferecircncias da Uniatildeo e do Estado

do Cearaacute eacute bastante elevado tanto no iniacutecio do periacuteodo (78) como no final (79) As taxas foram o

uacutenico item de receita que apresentou decrescimento real no periacuteodo justificado pela declaraccedilatildeo de

inconstitucionalidade da taxa de iluminaccedilatildeo puacuteblica Percebe-se tambeacutem que o IPTU apresentou a

menor taxa de crescimento inferior inclusive ao crescimento do PIB no periacuteodo

O resultado da arrecadaccedilatildeo do IPTU surpreende devido ao crescimento do niacutevel de urbanizaccedilatildeo

no periacuteodo bem como aos investimentos do Governo Federal em habitaccedilatildeo no final da deacutecada Esse

resultado para os municiacutepios cearenses vai de encontro agraves experiecircncias internacionais nas quais o

processo de descentralizaccedilatildeo fiscal eacute acompanhado do aumento de importacircncia dos impostos sobre

a propriedade (Bird e Zolt 2008 Bahl e Martinez-Vazquez 2007)

8 A base de dados de financcedilas municipais utilizada neste trabalho eacute a disponibilizada pela Secretaria do Tesouro Nacional (STN) por meio do Sistema Financcedilas do Brasil (Finbra) relativa ao periacuteodo de 2000 a 2010 A cobertura da base dados eacute quase integral Nos dois extremos que satildeo usados para a avaliaccedilatildeo empiacuterica faltam apenas os dados contaacutebeis de Varjota municiacutepio com 17593 habitantes menos de 022 da populaccedilatildeo do Cearaacute

Tabela 1 - Municiacutepios do Cearaacute Receita Corrente por itens selecionados (2000 e 2010)

(3)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

114

O baixo crescimento do IPTU indica possivelmente uma opccedilatildeo poliacutetica dos governantes locais

de natildeo intensificarem a cobranccedila desse imposto Essa opccedilatildeo contribui para a manutenccedilatildeo dos altos

iacutendices de desigualdade no Brasil jaacute que natildeo existe impedimento constitucional ou legal para o IPTU

ser utilizado de forma progressiva Desde a CF88 o imposto pode ter suas aliacutequotas progressivas ao

longo do tempo se a propriedade eacute subutilizada ou natildeo utilizada Em 2000 a Emenda Constitucional

29 permitiu a progressividade do IPTU com respeito ao valor do imoacutevel e ainda possibilitou a diferen-

ciaccedilatildeo de aliacutequotas considerando o uso e a localizaccedilatildeo9

Uma das razotildees para o pequeno crescimento do IPTU pode ser a rejeiccedilatildeo social presente nos

impostos diretos que acabam sendo completamente visiacuteveis para a populaccedilatildeo Aleacutem disso os deten-

tores de maior patrimocircnio e sujeitos a maior incidecircncia dos impostos sobre o patrimocircnio em geral

deteacutem tambeacutem o poder poliacutetico local principalmente em unidades geograacuteficas de meacutedia e pequena

populaccedilatildeo (Bahl e Martinez-Vazquez 2007)

Em 2000 trinta municiacutepios natildeo efetuaram a arrecadaccedilatildeo do IPTU enquanto em 2010 apenas

um municiacutepio deixou de cobrar o imposto Com relaccedilatildeo ao outro imposto sobre o patrimocircnio ITBI

dezoito municiacutepios natildeo o cobraram em 2000 e apenas quatro natildeo efetuaram a cobranccedila em 2010 Essa

falta de cobranccedila do imposto natildeo eacute observada no ISSQN que eacute arrecadado por todos os municiacutepios

nos dois anos

O Graacutefico 1 mostra a evoluccedilatildeo dos trecircs principais impostos municipais durante a deacutecada Ob-

serva-se que o crescimento do ITBI e do ISSQN natildeo foi constante em todo periacuteodo havendo um niacutetido

incremento desses impostos a partir 2004 Como jaacute constatado o IPTU avanccedila bem mais lentamente

que os demais tributos No caso do ISSQN o incremento pode ser derivado da ediccedilatildeo da Lei Comple-

mentar Federal 1162003 que entre outros toacutepicos redefiniu a lista de serviccedilos sujeitas ao imposto

9 A Suacutemula do STF nordm 668 de 24092003 declarou inconstitucional as leis municipais anteriores agrave EC 292000 que pre-viam aliacutequotas progressivas do IPTU

Graacutefico 1 ndash Municiacutepios do Cearaacute IPTU ISSQN e ITBI ndash (2000 ndash 2010) (Base 2000 =100)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

115

O Graacutefico 2 exibe a receita tributaacuteria por habitante estratificando os dados por mesorregiatildeo

para os anos de 2000 e 2010 Percebe-se a grande diferenccedila entre Fortaleza e as demais regiotildees For-

taleza em 2010 possui receita tributaacuteria per capita de R$ 280 contra uma meacutedia de R$ 56 no interior

do EstadoGraacutefico 2 ndash Municiacutepios do Cearaacute Receita Tributaacuteria

por Habitante (2000 e 2010)

4 ANAacuteLISE DA BASE DE DADOS

Esta seccedilatildeo apresenta justificativas para a definiccedilatildeo dos insumos e produtos da funccedilatildeo de pro-

duccedilatildeo das administraccedilotildees tributaacuterias Note-se que a avaliaccedilatildeo das administraccedilotildees tributaacuterias efetuada

neste artigo confunde-se com a noccedilatildeo de esforccedilo tributaacuterio De fato a atividade tributaacuteria eacute segmen-

tada em duas fases Na primeira define-se uma poliacutetica tributaacuteria na qual satildeo definidas bases tributaacute-

rias aliacutequotas multas e isenccedilotildees Em geral essa fase eacute de responsabilidade do poder poliacutetico executivo

e legislativo que editam as normas legais necessaacuterias Apoacutes essa definiccedilatildeo a administraccedilatildeo tributaacuteria

por meio de atividades de arrecadaccedilatildeo e fiscalizaccedilatildeo transforma os elementos definidores do tributo

base tributaacuteria aliacutequota isenccedilotildees e penalidades em receita efetiva

O passo inicial para a estimaccedilatildeo de uma fronteira de produccedilatildeo pela metodologia DEA eacute definir

quais os insumos e produtos utilizados no processo produtivo No caso das administraccedilotildees tributaacuterias

o produto eacute o montante de recursos arrecadados Este artigo utilizaraacute as receitas provenientes dos

impostos IPTU ISSQN e ITBI A arrecadaccedilatildeo relativa agrave contribuiccedilatildeo de melhoria natildeo eacute avaliada haja

vista praticamente natildeo ser utilizada no Cearaacute A contribuiccedilatildeo econocircmica de iluminaccedilatildeo puacuteblica (an-

teriormente taxa) natildeo eacute utilizada por dois motivos O primeiro eacute a incompatibilidade de classificaccedilatildeo

da receita entre os dados contaacutebeis de 2000 e 2010 Segundo a contribuiccedilatildeo se instituiacuteda pelo poder

municipal eacute cobrada pela concessionaacuteria distribuidora de energia eleacutetrica na proacutepria conta Logo o

papel da administraccedilatildeo tributaacuteria resume-se a instituir por lei a contribuiccedilatildeo As contribuiccedilotildees sociais

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

116

e o imposto de renda retido na fonte tambeacutem natildeo satildeo avaliados considerando que essas fontes de

receita estatildeo quase integralmente associadas a despesas com pessoal em tese natildeo existindo esforccedilo

algum da administraccedilatildeo tributaacuteria na cobranccedila Aleacutem disso a possibilidade de evasatildeo ou natildeo cobranccedila

pelo municiacutepio eacute miacutenima Receitas patrimoniais embora relevantes financeiramente natildeo satildeo geridas

pelas administraccedilotildees tributaacuterias

A funccedilatildeo de produccedilatildeo da administraccedilatildeo tributaacuteria tem como insumos as bases tributaacuterias de

cada imposto10 Caso as bases fossem plenamente conhecidas natildeo seria necessaacuteria a utilizaccedilatildeo de

qualquer teacutecnica especial para mensuraccedilatildeo da eficiecircncia que poderia ser apurada contabilmente en-

tretanto natildeo existem estatiacutesticas que reflitam plenamente as bases tributaacuterias Dessa forma os traba-

lhos empiacutericos buscam aproximaccedilotildees das bases entre as diversas estatiacutesticas disponiacuteveis

No caso do IPTU11 a base tributaacuteria natural eacute o valor real total dos imoacuteveis localizados em aacuterea

urbana Evidentemente a renda corrente dos proprietaacuterios eacute relevante para a arrecadaccedilatildeo embora

natildeo componha propriamente a base tributaacuteria Quanto ao ITBI a base tributaacuteria eacute o valor da operaccedilatildeo

onerosa de transmissatildeo de bens imoacuteveis ldquointer vivosrdquo Por uacuteltimo tem-se que a base tributaacuteria do ISSQN eacute o valor das prestaccedilotildees de serviccedilos compre-

endidos em listas estabelecidas na legislaccedilatildeo12 Em regra geral o imposto eacute devido ao municiacutepio no

qual se localiza o prestador de serviccedilo entretanto a legislaccedilatildeo atual elenca vinte e duas exceccedilotildees nas

quais o ISSQN eacute devido ao municiacutepio no qual o serviccedilo eacute prestado

Pelas bases tributaacuterias indicadas anteriormente e pela inexistecircncia de estatiacutesticas dessas bases a

renda dos residentes ou o produto interno satildeo potenciais candidatos a servirem de variaacutevel proxy IPTU

e ITBI estatildeo plenamente associados geograficamente ao municiacutepio independentemente do domiciacutelio

do contribuinte Assim julga-se que a adoccedilatildeo do produto interno como proxy da base tributaacuteria eacute

preferiacutevel Para o ISSQN pode-se justificar a opccedilatildeo pelo produto devido agrave disponibilidade de dados

relativos ao valor agregado setorial de serviccedilos13

Diversos trabalhos buscaram medir o esforccedilo tributaacuterio das entidades subnacionais brasileiras

Uma abordagem bastante utilizada eacute medir a eficiecircncia como a razatildeo entre a arrecadaccedilatildeo efetiva e

10 O ideal seria incluir tambeacutem aliacutequotas multas e isenccedilotildees mas para um nuacutemero significativo de municiacutepios isso natildeo eacute possiacutevel Desta forma ao mensurar a eficiecircncia da administraccedilatildeo tributaacuteria utilizando apenas a base tributaacuteria a avaliaccedilatildeo recai tambeacutem sobre a atuaccedilatildeo do poder poliacutetico responsaacutevel pela definiccedilatildeo dos demais elementos definidores do tributo Outra ressalva importante eacute que natildeo se trabalha nesta anaacutelise com os elementos caracteriacutesticos de tributaccedilatildeo oacutetima ou seja o governo natildeo busca maximizar uma funccedilatildeo de bem-estar social ou a utilidade de um agente representativo Logo poliacuteticas de reduccedilatildeo voluntaacuteria da carga tributaacuteria satildeo consideradas como ineficiecircncia11 Carvalho Jr (2012) apresentando proposta de mudanccedila do IPTU do municiacutepio do Rio de Janeiro efetuou uma revisatildeo da literatura econocircmica de impostos sobre imoacuteveis e verificou que mesmo em grandes municiacutepios do Nordeste o IPTU eacute arrecadado em menor intensidade do que na Regiatildeo Sudeste12 Atualmente a lista serviccedilos sujeitos ao ISSQN estaacute estabelecida na Lei Complementar nordm 1162003 Anteriormente o Decreto-lei nordm 4061968 previa os serviccedilos nos quais o imposto incidia13 No Produto Interno Bruto (PIB) Municipal disponibilizado pelo IBGE uma das desagregaccedilotildees apresentadas eacute o valor adicionado pelas atividades de serviccedilos Ressaltando-se que nessas atividades estatildeo incluiacutedos o produto do setor puacuteblico e a atividade comercial sujeita ao ICMS e natildeo ao ISSQN Quanto ao setor puacuteblico eacute possiacutevel a separaccedilatildeo utilizando dados do proacuteprio IBGE Quanto agrave atividade comercial apesar de natildeo ser viaacutevel a separaccedilatildeo atividades comerciais devem estar associadas tambeacutem a diversos serviccedilos sujeitos ao ISSQN como representaccedilatildeo comercial e hotelaria

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

117

a arrecadaccedilatildeo estimada por anaacutelise de regressatildeo14 na qual se consideram algumas variaacuteveis como

determinantes da arrecadaccedilatildeo Nesse caso a estimativa de eficiecircncia eacute uma meacutedia condicionada agraves

variaacuteveis independentes do modelo adotado Outra metodologia eacute a estimaccedilatildeo de fronteiras estocaacutes-

ticas de arrecadaccedilatildeo inicialmente aplicada por Reis e Blanco (1996) Estimada a fronteira eacute possiacutevel

construir os escores de eficiecircncia Em trabalhos mais recentes15 iniciou-se a utilizaccedilatildeo da teacutecnica DEA

para a estimaccedilatildeo da fronteira de arrecadaccedilatildeo

Ante o exposto anteriormente optou-se por utilizar apenas o valor adicionado setorial do PIB

como proxy da base tributaacuteria do IPTU ITBI e ISQN Em tese todos os setores econocircmicos poderiam

ser utilizados Os imoacuteveis rurais por exemplo estatildeo sujeitos ao ITBI assim o valor adicionado do setor

primaacuterio poderia ser um insumo Por outro lado o valor adicionado do setor puacuteblico tambeacutem poderia

capturar informaccedilotildees relevantes Como a metodologia DEA eacute eminentemente comparativa a inclusatildeo

de insumos e produtos pode gerar problemas de dimensionalidade aumentando o quantitativo de

unidades eficientes Desta forma utiliza-se apenas o valor adicionado do setor industrial e de serviccedilos

excluindo-se do uacuteltimo o valor relativo ao setor puacuteblico Espera-se que o niacutevel de urbanizaccedilatildeo do mu-

niciacutepio seja capturado pela dimensatildeo do valor adicionado desses dois setores16 A Tabela 2 sintetiza

insumos e produtos utilizados

14 Vasconcelos e Piancastelli (2005) e Carvalho Jr (2006) utilizaram metodologias similares para arrecadaccedilatildeo estadual e municipal respectivamente15 Gasparini e Melo (2004) Souza Juacutenior e Gasparini (2006) Arauacutejo (2007) Gasparini e Miranda (2011) e Sousa et alii (2012)16 A incidecircncia da informalidade eacute mais presente no setor agriacutecola logo entes tributaacuterios com grande participaccedilatildeo do setor agriacutecola devem ter mais dificuldade para arrecadar impostos Alm et alii (2004) apresentam uma breve revisatildeo da literatura que identifica os tipos de indiviacuteduos mais difiacuteceis de tributar na nomenclatura dos autores hard-to-tax17 Wilson (1993) Simar (2003) e Cazals et alii (2002)

Tabela 2 Insumos e Produtos da Arrecadaccedilatildeo Municipal

Ainda sobre a base de dados eacute importante ressaltar que a metodologia DEA eacute bastante sen-

siacutevel a observaccedilotildees atiacutepicas17 Desta forma eacute necessaacuterio identificar eventuais outliers e excluiacute-los da

amostra

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

118

Como a teacutecnica DEA eacute efetivamente comparativa mesmo sem erros de medida unidades com

valores de insumos e produtos muito distantes do restante das observaccedilotildees acabam sendo conside-

radas eficientes tornando a distribuiccedilatildeo dos escores de eficiecircncia extremamente assimeacutetrica atribuin-

do-se iacutendices muito baixos a uma grande quantidade de unidades

Os tratamentos para este problema satildeo diversos na literatura passando da simples omissatildeo ateacute

teacutecnicas robustas mais sofisticadas que envolvem bootstrap e jackknife (Sousa e Stošić 2005) Neste

ensaio inicialmente satildeo excluiacutedos os municiacutepios que em pelo menos um dos dois exerciacutecios (2000 e

2010) natildeo efetuaram a arrecadaccedilatildeo de todos os tributos analisados A justificativa para esse procedi-

mento eacute baseada no fato de que administraccedilotildees tributaacuterias que natildeo instituiacuteram e cobraram um dos

impostos utilizam tecnologia tatildeo rudimentar que natildeo satildeo passiacuteveis de avaliaccedilatildeo Em seguida excluem-

-se as observaccedilotildees com valores discrepantes em todo o conjunto de insumos e produtos Aleacutem disso

foram excluiacutedas as observaccedilotildees com valores atiacutepicos na razatildeo do somatoacuterio dos tributos analisados

(ISSQN ITBI e IPTU) e o valor do PIB municipal O objetivo deste passo eacute identificar erros nos dados de

financcedilas puacuteblicas em 2000 e 2010

Os pontos extremos contaminam a meacutedia e variacircncia da distribuiccedilatildeo Desta forma eacute convenien-

te adotar um criteacuterio de seleccedilatildeo de outliers robusto com respeito a pontos discrepantes Neste artigo

utiliza-se teacutecnica de boxplot18 O Quadro I a seguir mostra o quantitativo de municiacutepios excluiacutedos da

anaacutelise segundo os criteacuterios adotados Apoacutes as exclusotildees dos 184 municiacutepios cearenses satildeo avaliados

86 municiacutepios19

18 Consideraram-se outliers e foram excluiacutedas da amostra as observaccedilotildees cujos valores de uma ou mais variaacuteveis encon-travam-se a mais de uma vez a distacircncia interquartil (L = Q3ndashQ1) Nesta fase objetivando tornar a distribuiccedilatildeo das seacuteries mais simeacutetricas tomaram-se as variaacuteveis em logaritmos naturais Para uma descriccedilatildeo detalhada do meacutetodo ver Fonseca (2011) 19 Apesar da taxa aparentemente elevada de exclusatildeo a insipiecircncia das administraccedilotildees tributaacuterias municipais no iniacutecio dos anos 2000 justifica a abordagem adotada

Quadro I - Observaccedilotildees Atiacutepicas

5 ANAacuteLISE DOS RESULTADOS

As figuras 1 e 2 mostram a distribuiccedilatildeo de frequumlecircncia dos escores de eficiecircncia teacutecnica com

retornos variaacuteveis de escala em 2000 e 2010 Em 2000 a teacutecnica DEA considerou eficiente na arreca-

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

119

Figura 1 - Distribuiccedilatildeo dos Escores de Eficiecircncia - 2000

Figura 2 - Distribuiccedilatildeo dos Escores de Eficiecircncia - 2010

daccedilatildeo de impostos quatorze municiacutepios 16 da amostra resultado similar ocorreu em 2010 quando

treze municiacutepios 15 da amostra foi eficiente Em 2010 uma concentraccedilatildeo relevante de municiacutepios

tem escore de eficiecircncia nas proximidades de 050

A Tabela 3 mostra as estatiacutesticas descritivas dos escores de eficiecircncia nos dois exerciacutecios Ressal-

te-se que natildeo se devem fazer inferecircncias sobre as variaccedilotildees da eficiecircncia teacutecnica entre os dois exerciacute-

cios Os iacutendices computados satildeo eminentemente comparativos logo dependem do desempenho das

outras unidades ou seja menor meacutedia na eficiecircncia teacutecnica em 2010 em relaccedilatildeo a 2000 natildeo significa

que em meacutedia as unidades tenham piorado mas sim que aumentou a distacircncia meacutedia entre a arre-

cadaccedilatildeo efetiva e a arrecadaccedilatildeo potencial determinada pelas unidades eficientes que natildeo necessaria-

mente satildeo as mesmas nos dois exerciacutecios

Para avaliar a evoluccedilatildeo da tecnologia tributaacuteria e do desempenho dos municiacutepios no periacuteodo

analisado eacute utilizado o Iacutendice de Malmquist Esse iacutendice mede a variaccedilatildeo da produtividade total dos

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

120

Tabela 3 - Estatiacutesticas Descritivas dos Escores de Eficiecircncia

Tabela 4 - Meacutedia dos Iacutendices de Malmquist e seus Componentes

Apesar do acentuado aumento na produtividade total percebe-se que esse incremento eacute deri-

vado em maior parte do deslocamento da fronteira de arrecadaccedilatildeo e de ganhos de escala Em meacutedia a

eficiecircncia teacutecnica pura eacute inferior a unidade contribuindo assim para a reduccedilatildeo da produtividade total

A teacutecnica DEA permite ainda estimar o deacuteficit de arrecadaccedilatildeo de cada unidade avaliada Pela

definiccedilatildeo municiacutepios eficientes com escore de eficiecircncia igual agrave unidade encontram-se sobre a fron-

teira de arrecadaccedilatildeo natildeo registrando portanto deacuteficit A Tabela 5 mostra o incremento percentual

possiacutevel na arrecadaccedilatildeo dos trecircs impostos dos municiacutepios avaliados Percebe-se que em 2010 as

possibilidades de incremento satildeo mais acentuadas nos trecircs tributos De qualquer forma fica evidente

a possibilidade de obtenccedilatildeo de receitas adicionais significativas

fatores e eacute computado para cada municiacutepio Como visto anteriormente em (3) o Iacutendice de Malm-

quist pode ser decomposto em mudanccedilas derivadas do progresso tecnoloacutegico (deslocamento da

fronteira de arrecadaccedilatildeo) da eficiecircncia de escala e da eficiecircncia teacutecnica pura Em meacutedia o Iacutendice de

Malmquist registrou um incremento de produtividade no periacuteodo de 78 taxa equivalente a qua-

se 6 ao ano As meacutedias simples e ponderadas pela populaccedilatildeo do Iacutendice e seus componentes satildeo

apresentadas na Tabela 4

Tabela 5 - Cearaacute - Incrementos Potenciais na Arrecadaccedilatildeo Municipal - 2000 e 2010

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

121

6 EFICIEcircNCIA DA ADMINISTRACcedilAtildeO TRIBUTAacuteRIA E REDUCcedilAtildeO DA POBREZA

A literatura econocircmica indica que dois mecanismos natildeo excludentes satildeo responsaacuteveis pela re-

duccedilatildeo da pobreza o crescimento econocircmico e a reduccedilatildeo da desigualdade (Kakwani 2000) Note-se

que o impacto do primeiro mecanismo sobre a pobreza eacute maior agrave medida que a desigualdade eacute menor

(Barreto 2005 Soares et alii 2006 Barros et alii 2007)

Ainda sobre o niacutevel de pobreza um forte consenso na literatura admite que a acumulaccedilatildeo de

capital humano medido pelo niacutevel educacional eacute um dos responsaacuteveis pelas diferenccedilas pessoais e

regionais da renda Importante frisar que a educaccedilatildeo baacutesica no paiacutes estaacute quase integralmente sob a

responsabilidade das unidades subnacionais sendo a educaccedilatildeo fundamental preponderantemente

municipal

A mensuraccedilatildeo de eficiecircncia da administraccedilatildeo tributaacuteria municipal efetivada na seccedilatildeo anterior

natildeo considerou a possibilidade das unidades de decisatildeo reduzirem propositalmente a arrecadaccedilatildeo

de impostos buscando atingir um determinado objetivo como maximizar uma funccedilatildeo de bem-es-

tar social Logo a priori explorar a base tributaacuteria dos impostos de forma mais eficiente natildeo eacute uma

poliacutetica puacuteblica recomendaacutevel automaticamente jaacute que os incrementos de bem-estar derivados da

oferta de bens puacuteblicos proporcionados pelas receitas tributaacuterias adicionais podem ser compensa-

dos pela reduccedilatildeo da renda disponiacutevel da populaccedilatildeo Note-se ainda que o aumento de eficiecircncia

na administraccedilatildeo tributaacuteria como definido neste artigo estaacute associado ao aumento do volume de

tributos Se a caracteriacutestica desses impostos for regressiva eacute provaacutevel que o aumento da eficiecircncia

conduza ao incremento da pobreza

Por outro lado eacute possiacutevel que uma administraccedilatildeo tributaacuteria mais eficiente possa garantir re-

cursos necessaacuterios para a melhoria de serviccedilos puacuteblicos de responsabilidade municipal como sauacutede e

educaccedilatildeo Essa melhoria conduziria a uma maior acumulaccedilatildeo de capital humano e desenvolvimento

econocircmico com potenciais efeitos sobre a populaccedilatildeo em situaccedilatildeo de pobreza

No caso especiacutefico em que a fonte da ineficiecircncia eacute a evasatildeo fiscal Alm e Finlay (2012) utilizan-

do resultados da literatura teoacuterica empiacuterica experimental e de equiliacutebrio geral apontam evidecircncias

que os principais beneficiaacuterios da evasatildeo fiscal satildeo os proacuteprios sonegadores com efeitos distributi-

vos que beneficiam os mais ricos No tocante aos tributos de competecircncia municipal no Brasil essa

tendecircncia deve ser acentuada considerando que IPTU e ITBI satildeo impostos diretos com caracteriacutesticas

inerentemente progressivas que podem ser acentuadas pelas legislaccedilotildees municipais utilizando-se de

aliacutequotas diferenciadas e isenccedilotildees

Esta seccedilatildeo utilizando os escores de eficiecircncia computados na seccedilatildeo anterior verifica quais os

efeitos do incremento da eficiecircncia teacutecnica pura das administraccedilotildees tributaacuterias no niacutevel de pobreza de

cada municiacutepio Como medida de pobreza este artigo utiliza o iacutendice de proporccedilatildeo de pobres (P0)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

122

com linha de pobreza de frac12 salaacuterio miacutenimo O modelo proposto eacute alicerccedilado na fartamente documen-

tada persistecircncia da pobreza Mais especificamente admite-se que uma parte substancial do iacutendice

de proporccedilatildeo de pobres detectado no presente eacute derivada da mesma situaccedilatildeo observada no passado

Formalmente

onde e satildeo respectivamente o iacutendice de proporccedilatildeo de pobres do municiacutepio i em 2010 e 2000 eacute renda per capita do municiacutepio i em 2000 eacute o nuacutemero de habitantes em milhares do municiacutepio i em 2000 eacute o iacutendice de Gini do municiacutepio i em 2000 eacute a mudanccedila na efici-ecircncia teacutecnica pura da arrecadaccedilatildeo de impostos do municiacutepio i Bj com j = 15 e satildeo paracircmetros a serem estimados eacute um ruiacutedo estocaacutestico As estatiacutesticas descritivas das variaacuteveis presentes na Equaccedilatildeo (4) satildeo expostas na Tabela 6 A Equaccedilatildeo (4) eacute estimada por miacutenimos quadrados ordinaacuterios (MQO)20 apresentando os resultados na Tabela 7 O paracircmetro de maior interesse neste artigo eacute As demais variaacuteveis independentes tecircm por objetivo caracterizar o municiacutepio no periacuteodo inicial Espera-se que essa caracterizaccedilatildeo absorva as informaccedilotildees relevantes que expliquem a proporccedilatildeo de pobres no ano final21 O elevado coeficiente de

determinaccedilatildeo obtido sinaliza um bom ajustamento da regressatildeo

Tabela 6 - Estatiacutesticas Descritivas

Com respeito agraves variaacuteveis de controle do periacuteodo inicial apenas a populaccedilatildeo e a proporccedilatildeo

de pessoas em situaccedilatildeo de pobreza foram significativas O coeficiente da populaccedilatildeo significativo e

positivo indica que em meacutedia os municiacutepios mais populosos em 2000 apresentaram uma maior

proporccedilatildeo de pobres em 2010 Esse resultado apresenta uma evidecircncia favoraacutevel aos municiacutepios de

menor porte pelo menos no tocante a reduccedilatildeo da pobreza contrariando a tese de precariedade e

20 A variaacutevel dependente eacute limitada entre 0 e 100 possibilitando a adoccedilatildeo de um modelo economeacutetrico de amostra cen-surada como por exemplo o Tobit entretanto Mcdonald (2009) indica que MQO eacute superior ao Tobit quando a limitaccedilatildeo dos dados for derivada de processo de geraccedilatildeo de dados fracionaacuterio e natildeo censurado Utilizando-se as mesmas variaacuteveis estimou-se um modelo natildeo linear Probit com resultados extremamente similares preservando-se todos os sinais e signi-ficacircncias dos paracircmetros21 No decorrer dos anos 2000 intensificou-se significativamente a adoccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas voltadas para a reduccedilatildeo da pobreza Uma parte dos efeitos dessas poliacuteticas deve ser capturada pelas variaacuteveis de controle do periacuteodo inicial Para uma discussatildeo dos efeitos das poliacuteticas de transferecircncia de renda sobre os iacutendices de pobreza ver Marinho et alii (2011)

(4)

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insustentabilidade de pequenos municiacutepios O coeficiente da proporccedilatildeo de pobres no periacuteodo inicial

foi estatisticamente positivo confirmando a persistecircncia da pobreza mesmo num horizonte de tempo

mais longo de dez anos Renda per capita e o Iacutendice de Gini do periacuteodo inicial natildeo foram estatistica-

mente significativosTabela 7- Resultados da Regressatildeo

Quanto ao paracircmetro de interesse o valor estimado eacute significantemente negativo demons-

trando que o incremento da eficiecircncia na arrecadaccedilatildeo dos impostos municipais influenciou negativa-

mente a proporccedilatildeo de pobres no periacuteodo final Evidentemente a transmissatildeo dos efeitos derivados da

eficiecircncia da administraccedilatildeo tributaacuteria municipal para o niacutevel de pobreza natildeo eacute elementar nem direta

Duas possibilidades natildeo excludentes podem conduzir a esse resultado

Na primeira hipoacutetese municiacutepios que aumentaram sua eficiecircncia na arrecadaccedilatildeo de impostos

tiveram mais recursos agrave disposiccedilatildeo para a oferta de bens puacuteblicos possibilitando uma maior acumu-

laccedilatildeo de capital humano ou uma melhor infraestrutura para a produccedilatildeo propiciando oportunidades

adicionais as pessoas em situaccedilatildeo de pobreza para a superaccedilatildeo dessa condiccedilatildeo Por outro lado IPTU

e ITBI satildeo impostos diretos que por incidirem sobre a propriedade imoacutevel natildeo atingem ou atingem

moderadamente a populaccedilatildeo mais pobre Regras de progressividade dos impostos geralmente

existentes nas unidades mais desenvolvidas ampliam esse efeito Logo a tributaccedilatildeo municipal im-

pacta em alguma magnitude a distribuiccedilatildeo da renda disponiacutevel da populaccedilatildeo local tendo efeito

redutor da desigualdade

Nota os nuacutemeros entre parecircnteses satildeo os desvios pa-dratildeo () significacircncia a 5 () natildeo-significante As de-mais estimativas satildeo significantes a 1 Erros-padratildeo robustos agrave heteroscedasticidadeFonte elaboraccedilatildeo proacutepria

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Quanto agrave segunda hipoacutetese o efeito detectado do incremento da eficiecircncia da administraccedilatildeo

tributaacuteria municipal sobre o niacutevel pobreza pode estar associado agrave qualidade das instituiccedilotildees municipais

North e Thomas (1973) foram os pioneiros na associaccedilatildeo de desenvolvimento econocircmico e qualidade

das instituiccedilotildees conceito que pode ser sintetizado como a capacidade de uma sociedade definir regras

sociais e econocircmicas claras e estaacuteveis Acemoglu et alii (2001) testaram a hipoacutetese das instituiccedilotildees

definidas no periacuteodo colonial determinarem o crescimento econocircmico concluindo pela relevacircncia

das instituiccedilotildees Uma volumosa literatura buscou investigar a associaccedilatildeo do crescimento econocircmico

a variaacuteveis institucionais como liberdade comercial corrupccedilatildeo agilidade do poder judiciaacuterio respeito

ao direito de propriedade niacutevel de democracia eficiecircncia do sistema financeiro assassinatos poliacuteticos

revoluccedilotildees reformas constitucionais entre outras22

No Brasil e especificamente no Cearaacute considerando as intensas desigualdades regionais eacute pos-

siacutevel que as instituiccedilotildees de cada municiacutepio sejam acentuadamente divergentes Verdadeira essa hipoacute-

tese uma excelente proxy da qualidade das instituiccedilotildees municipais seria a eficiecircncia da administraccedilatildeo

tributaacuteria Se o ente subnacional natildeo consegue organizar de forma eficiente a funccedilatildeo de arrecadar os

recursos necessaacuterios para as demais atividades eacute pouco provaacutevel que outras instituiccedilotildees sob controle

ou interferecircncia municipal sejam organizadas e possam gerar externalidades positivas

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Este artigo aborda a evoluccedilatildeo da eficiecircncia das administraccedilotildees tributaacuterias tema pouco explora-

do pela literatura econocircmica Um amplo debate social e acadecircmico desenvolve-se em torno da neces-

sidade de uma reforma tributaacuteria Pouco ou nada se discute sobre a tecnologia adotada na exploraccedilatildeo

pelos trecircs niacuteveis de governo do sistema tributaacuterio atual No caso especiacutefico do Cearaacute o incremento

da arrecadaccedilatildeo municipal natildeo ocorreu da mesma forma em todos os tributos A arrecadaccedilatildeo do IPTU

apresenta desempenho bastante inferior a dos demais impostos municipais Essa constataccedilatildeo asso-

ciada ao forte processo de urbanizaccedilatildeo indica que os gestores puacuteblicos negligenciam esse imposto

fato possivelmente derivado de pressotildees sociais poliacuteticas e eleitorais Apesar dos avanccedilos observados

existe uma grande possibilidade de incremento das receitas municipais desde que as bases tributaacuterias

atuais sejam exploradas com maior eficiecircncia

O trade-off entre eficiecircncia e equidade estaacute presente nas escolhas dos administradores muni-

cipais Natildeo existe como a priori determinar os resultados econocircmicos de poliacutetica municipal que pos-

sibilite o aumento da arrecadaccedilatildeo de impostos Este artigo utilizando a metodologia DEA computou escores de eficiecircncia da administraccedilatildeo tributaacuteria de 86 municiacutepios cearenses nos anos de 2000 e 2010 Em seguida foram calculadas as mudanccedilas na eficiecircncia teacutecnica pura de cada governo local O resul-

22 Glaeser et alii (2004) revisa e critica as variaacuteveis utilizadas como proxy de instituiccedilotildees

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tado obtido foi utilizado como determinante do niacutevel de pobreza em 2010 Obtiveram-se evidecircncias que os incrementos da eficiecircncia na arrecadaccedilatildeo municipal entre os extremos da deacutecada de 2000 impactam negativamente o niacutevel de pobreza no final do periacuteodo Entre as variaacuteveis de controle utilizadas apenas a proporccedilatildeo de pobres e a populaccedilatildeo ambas do ano inicial tiveram efeitos significantes e positivos sobre a proporccedilatildeo de pobres no periacuteodo final indicando que a pobreza eacute um fenocircmeno persistente e que os municiacutepios mais populosos em 2000 em meacutedia possuem uma desvantagem no processo de reduccedilatildeo da pobreza As conclusotildees do teste empiacuterico realizado indicam que os investimentos nas administraccedilotildees tributaacuterias que visem o aumento de sua eficiecircncia foram poliacuteticas puacuteblicas exitosas que contribuiacuteram para a reduccedilatildeo de um dos maiores problemas brasileiros O aumento da eficiecircncia na arrecadaccedilatildeo proporciona aos governos locais melhores condiccedilotildees financeiras para executar suas atividades Ressal-tando-se que os municiacutepios satildeo responsaacuteveis pela prestaccedilatildeo de serviccedilos que impactam diretamente na qualidade de vida e no estoque de capital humano da populaccedilatildeo principalmente a mais pobre que eacute mais dependente dos serviccedilos puacuteblicos Por outro lado a preponderacircncia de impostos diretos e progressivos entre os tributos municipais pode reduzir a desigualdade de renda quando a eficiecircncia na arrecadaccedilatildeo aumenta Natildeo se descarta a possibilidade dos iacutendices de eficiecircncia da administraccedilatildeo tributaacuteria capturarem informaccedilotildees mais amplas sobre a qualidade das instituiccedilotildees locais Neste contexto a recomendaccedilatildeo surgida dos resultados empiacutericos de busca de uma maior eficiecircncia na arrecadaccedilatildeo permanece vaacutelida A organizaccedilatildeo da administraccedilatildeo tributaacuteria responsaacutevel pela obtenccedilatildeo de recursos deve anteceder as demais accedilotildees de fomento a qualidade das instituiccedilotildees que em geral necessitam de algum dispecircndio financeiro para serem viabilizadas Os resultados obtidos neste exerciacutecio empiacuterico indicam que o incremento da eficiecircncia tributaacute-ria dos municiacutepios cearenses eacute uma poliacutetica puacuteblica complementar para a reduccedilatildeo do niacutevel de pobreza Na estrutura tributaacuteria brasileira os municiacutepios tecircm dois importantes impostos sobre a propriedade No Brasil e nos demais paiacuteses em desenvolvimento impostos sobre a propriedade tecircm pequena rele-vacircncia atingindo em meacutedia 06 do PIB enquanto nos Estados Unidos e Canadaacute esse tipo de imposto eacute superior a 3 do PIB (Bahl e Martinez-Vazquez 2007) Reforccedilar a competecircncia dos governos locais na arrecadaccedilatildeo tributaacuteria parece convergir com os objetivos de poliacuteticas de desenvolvimento social Diversas extensotildees podem ser feitas a partir deste trabalho inicial A ampliaccedilatildeo da amostra pode verificar se os resultados satildeo localizados ou mais gerais Uma amostra maior garantiria ainda a possibilidade de utilizar mais variaacuteveis como insumos da arrecadaccedilatildeo bem como adicionar variaacute-veis explicativas da variaacutevel dependente no segundo estaacutegio Eacute possiacutevel ainda verificar os efeitos da mudanccedila na eficiecircncia tributaacuteria em outras variaacuteveis econocircmicas e sociais Por uacuteltimo teacutecnicas mais robustas de estimaccedilatildeo podem ser utilizadas no segundo estaacutegio

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INCONGRUEcircNCIAS DA POLIacuteTICA TRIBUTAacuteRIA NO BRASIL E O SEU CON-TRIBUTO PARA A CRISE DA RELACcedilAtildeO DE TRIBUTACcedilAtildeO

SUMAacuteRIO Introduccedilatildeo 1 Consideraccedilotildees sobre a poliacutetica tributaacuteria 2 Atores envolvidos na formulaccedilatildeo e na implementaccedilatildeo da poliacutetica tributaacuteria a contur-bada relaccedilatildeo entre o Fisco e o contribuinte 3 O tributo como norma de rejei-ccedilatildeo social 4 Outras caracteriacutesticas do sistema tributaacuterio brasileiro e seus viacuten-culos com a crise da relaccedilatildeo de tributaccedilatildeo Consideraccedilotildees finais Referecircncias

Francisco Ferreira Chagas Juacutenior1

INTRODUCcedilAtildeO

As poliacuteticas tributaacuterias repercutem diretamente na sociedade a que satildeo direcionadas afetando

desde o cidadatildeo mais pobre ateacute o grande empresaacuterio Tal ilaccedilatildeo pode ser facilmente compreendida

quando por exemplo satildeo lanccediladas luzes sobre a regularidade com que tributos satildeo recolhidos Estes

constituem a principal fonte de recursos para o Estado-naccedilatildeo e o seu pagamento representa uma

constante na vida dos cidadatildeos os quais direta ou indiretamente arcam com o ocircnus financeiro decor-

rente desse ato

A dimensatildeo dessa realidade toma corpo em paiacuteses com elevada carga tributaacuteria natildeo raro dan-

do margem a insurgentes manifestaccedilotildees de insatisfaccedilatildeo por parte da populaccedilatildeo sobretudo quando eacute

precaacuteria e ineficiente a prestaccedilatildeo dos serviccedilos puacuteblicos atividade esta que em geral eacute financiada pelos

recursos repassados compulsoriamente ao eraacuterio

Cumpre exaltar a necessidade de ter-se em mente que as poliacuteticas tributaacuterias natildeo se circuns-

crevem agrave elaboraccedilatildeo de planos e estrateacutegias relacionados com a atividade de arrecadaccedilatildeo e de fis-

calizaccedilatildeo

Estatildeo atreladas ainda ao conjunto de accedilotildees voltadas agrave coordenaccedilatildeo agrave orientaccedilatildeo e ao plane-

jamento de projetos governamentais de tributaccedilatildeo a serem executados pela Administraccedilatildeo Tributaacuteria

e que estatildeo situadas dentro de um contexto bem mais amplo de sua atuaccedilatildeo

Tanto a proposiccedilatildeo como a avaliaccedilatildeo das poliacuteticas tributaacuterias encontram amparo na coleta

permanente de dados a elas relativos imprescindiacuteveis que satildeo para nortear a atuaccedilatildeo da Adminis-

traccedilatildeo Tributaacuteria

A anaacutelise desses elementos inclusive possibilita ao gestor puacuteblico a adoccedilatildeo eventual de medidas

pontuais a fim de estimular ou desestimular comportamentos de determinados setores da economia

1 Especialista em Direito Processual pela Faculdade Ateneu Mestre em Planejamento e Poliacuteticas Puacuteblicas pela Universida-de Estadual do Cearaacute Auditor Fiscal Juriacutedico da Receita Estadual do Cearaacute E-mail ffc_juniorhotmailcom

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bem como dos cidadatildeos (extrafiscalidade) visando sempre o resguardo dos interesses da coletividade

que se sobrepotildeem ao do contribuinte enquanto ser individual respeitados por oacutebvio os direitos que

lhe satildeo reconhecidos pelo ordenamento juriacutedico

As diretrizes tributaacuterias seratildeo definidas pelo governo tomando por base as regras constitu-

cionais definidoras das competecircncias que satildeo atribuiacutedas a cada ente poliacutetico para a instituiccedilatildeo de

tributos

Respeitadas as normas positivadas e de observacircncia obrigatoacuteria para o gestor tributaacuterio tem-

-se ser possiacutevel uma ampla margem de liberdade para o planejamento discricionaacuterio de poliacuteticas

voltadas agrave consecuccedilatildeo de objetivos governamentais especiacuteficos diretamente relacionados com a

atuaccedilatildeo da Administraccedilatildeo Tributaacuteria e que envolvem inexoravelmente a tomada de inuacutemeras deci-

sotildees vinculativas

Ocorre que no Brasil o processo que gira em torno do planejamento e da implementaccedilatildeo da

poliacutetica tributaacuteria natildeo raro eacute eivado de viacutecios perniciosos que maculam o seu desenvolvimento regular

desde a origem Aleacutem disso eacute cada vez mais influenciado de forma direta por uma voracidade arre-

cadatoacuterio que parece natildeo ter fim circunstacircncias estas que vecircm contribuindo sobremodo para tornar

ainda mais caoacutetico o sistema tributaacuterio do paiacutes

Indubitavelmente o referido estado de coisas acaba por desencadear um sentimento de revolta

nos contribuintes o qual contrasta com os primados mais elementares da cidadania fiscal Agravando

essa situaccedilatildeo tem-se o fato de que os cidadatildeos satildeo compelidos a contribuir com o custeio de um Es-

tado que aleacutem de perdulaacuterio eacute ineficiente ao gastar porque natildeo procura empregar os recursos arreca-

dados em accedilotildees que efetivamente possam trazer benefiacutecios concretos e duradouros para a populaccedilatildeo

Considerando que o ponto de partida para a busca de soluccedilotildees adequadas para qualquer pro-

blema eacute a identificaccedilatildeo dos fatores que lhe datildeo origem vecirc-se que eacute de todo relevante lanccedilar luzes

sobre algumas das principais falhas de planejamento da poliacutetica tributaacuteria de modo tambeacutem a eviden-

ciar os seus reflexos sobre as relaccedilotildees travadas entre o Fisco e o contribuinte os quais contribuem para

a desconstruccedilatildeo da cidadania fiscal no paiacutes

Antes poreacutem eacute conveniente trazer a lume alguns dos pressupostos baacutesicos da poliacutetica tributaacute-

ria considerando que a natureza do objeto deste breve estudo demanda a apresentaccedilatildeo de determi-

nados elementos fundamentais que servem de substrato teoacuterico para uma adequada compreensatildeo

da crise nas relaccedilotildees de tributaccedilatildeo

1 CONSIDERACcedilOtildeES SOBRE A POLIacuteTICA TRIBUTAacuteRIA

De um modo geral pode-se afirmar que as accedilotildees relacionadas com o planejamento a imple-

mentaccedilatildeo e a avaliaccedilatildeo das poliacuteticas tributaacuterias giram em torno da tomada de decisotildees que dizem

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respeito agraves atividades de tributaccedilatildeo de arrecadaccedilatildeo e de fiscalizaccedilatildeo todas elas voltadas agrave consecuccedilatildeo

de objetivos que podem variar de acordo com os interesses da Administraccedilatildeo Tributaacuteria

Cursi (2011 p 62-63) explica que enquanto a tributaccedilatildeo corresponde a um meio pelo qual a

esfera puacuteblica obteacutem recursos a partir da exploraccedilatildeo econocircmica e financeira de determinada base tri-

butaacuteria a arrecadaccedilatildeo eacute o produto resultante daquela atividade

A execuccedilatildeo de accedilotildees relacionadas com a tributaccedilatildeo e a arrecadaccedilatildeo envolve o manejo estra-

teacutegico adequado e eficiente dos tributos com vistas a que o montante dos recursos arrecadados aos

cofres puacuteblicos possa ser suficiente para fazer face agraves despesas que derivam do atendimento pelo

Poder Puacuteblico das necessidades coletivas

Passam pelo planejamento e pela implementaccedilatildeo das poliacuteticas de tributaccedilatildeo e arrecadaccedilatildeo o

estudo coordenado e orientado de projetos governamentais estrateacutegicos voltados ao constante aper-

feiccediloamento da legislaccedilatildeo tributaacuteria e ao exame da viabilidade da adoccedilatildeo de medidas que possibilitem

tanto a maximizaccedilatildeo das receitas como as desoneraccedilotildees tributaacuterias que impactam negativamente so-

bre o eraacuterio puacuteblico mas que constituem objeto de transcendentes objetivos governamentais Desses

projetos estrateacutegicos derivam consequecircncias (externalidades) que carecem de ser avaliadas previa-

mente pelo gestor tributaacuterio para que se evitem ou pelo menos sejam minorados alguns efeitos in-

desejaacuteveis advindos da busca pelo atingimento de determinadas metas e da execuccedilatildeo de certas accedilotildees

ligadas agraves poliacuteticas de tributaccedilatildeo e de arrecadaccedilatildeo efeitos estes que inclusive podem contribuir para

tornar o sistema tributaacuterio injusto e menos eficiente do ponto de vista econocircmico-fiscal

Essas externalidades estatildeo indissociavelmente atreladas aos processos de poliacutetica fiscal que

permeiam a atividade de administraccedilatildeo tributaacuteria os quais se preocupam com os reflexos da accedilatildeo

puacuteblica sobre a renda nacional disponiacutevel e sobre o comportamento da esfera privada o que significa

cuidar do paradoxo da exploraccedilatildeo da base tributaacuteria afetando a proacutepria base em si considerada (CUR-

SI 2011 p 103-104)A renda disponiacutevel agrave esfera privada eacute um importante fator de influecircncia do ritmo e tipo de atividade executada pela esfera privada no acircmbito da base tributaacuteria explorada economicamente pela esfera puacuteblica Quer dizer que a disponibilidade econocircmica e financeira a geraccedilatildeo de emprego e renda e os comportamentos podem ser afetados pela administraccedilatildeo tributaacuteria conforme o tipo de calibraccedilatildeo da carga tributaacuteria ou segundo o tipo de seletividade essencialidade e equidade utilizada pelos regimes tributaacuterios O modo e a forma como a esfera puacuteblica obteacutem dinheiro junto agrave esfera privada eacute relevante para a administraccedilatildeo tributaacuteria por afetar a sustentabilidade de exploraccedilatildeo da proacutepria base e por produzir efeito sobre as geraccedilotildees futuras Em outras palavras explorar a base tributaacuteria ignorando os efeitos da exploraccedilatildeo verificados na esfera privada eacute ignorar a necessidade de apreciar no longo prazo a hipoacutetese de cuidar para natildeo exaurir a base e natildeo afetar negativamente as decisotildees de desenvolvimento econocircmico e social (CURSI 2011 p 104)

Conclui-se com efeito que o fluxo de dinheiro obtido por meio da tributaccedilatildeo natildeo pode ser

apreciado em termos de mera aplicaccedilatildeo da carga sobre a mateacuteria tributaacutevel Haacute portanto a neces-

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sidade de uma cuidadosa calibraccedilatildeo da incidecircncia que seja capaz de assegurar tanto um volume

adequado de recursos aos cofres puacuteblicos como a maior neutralidade possiacutevel da tributaccedilatildeo com a

preservaccedilatildeo do niacutevel de atividade privada (CURSI 2011 p 104-105)

O planejamento da poliacutetica tributaacuteria tambeacutem envolve o estabelecimento de accedilotildees estrateacutegicas

voltadas agrave implementaccedilatildeo de obrigaccedilotildees instrumentais e agrave realizaccedilatildeo de atividades fiscalizatoacuterias que

tecircm como principal objetivo em uacuteltima anaacutelise combater e prevenir os atos de sonegaccedilatildeo fiscal ten-

dentes a provocar lesatildeo aos cofres puacuteblicos ante o natildeo pagamento dos tributos devidos regularmente

aos cofres puacuteblicos pelo contribuinte

Segundo Eckstein (1971 p 86) para que funcione bem um sistema em que as pessoas respei-

tem as leis tributaacuterias e paguem os seus tributos de forma voluntaacuteria faz-se necessaacuteria agrave transmissatildeo

de confianccedila ao povo de que os impostos satildeo justos e que todos contribuem para ele

Quando se generaliza o sentimento de que o sistema tributaacuterio eacute simplesmente uma sucessatildeo de brechas e evasotildees e as pessoas veem seus vizinhos igualmente proacutespe-ros pagando substancialmente menos ou vivendo agrave base de contas de despesas livres de impostos o moral do contribuinte baixa A apresentaccedilatildeo de uma declaraccedilatildeo de impostos honesta deixa entatildeo de ser um ato moral Em muitos paiacuteses do mundo tanto ricos como pobres a eacutetica relativa aos impostos se distingue da eacutetica em outras esferas (ECKSTEIN 1971 p 86-87)

Nabais (2005 p 135) ao discorrer sobre os aspectos da cidadania fiscal expotildee que se por

um lado aos indiviacuteduos de uma sociedade natildeo eacute dado o distanciamento do dever de contribuir para

o suporte financeiro do Estado-naccedilatildeo observada a capacidade contributiva de cada um por outro

a eles eacute conferido o direito de exigir daquele ente tributante que obrigue a todos a cumprirem com

o referido dever

A fiscalizaccedilatildeo que diga-se constitui atividade que integra especificamente a aacuterea de gestatildeo da

poliacutetica tributaacuteria (POHLMANN IUDIacuteCIBUS 2006 p 55) representa justamente a principal forma de

que dispotildee o Estado para averiguar a regularidade fiscal das pessoas fiacutesicas ou juriacutedicas ainda que natildeo

venham a se enquadrar na figura de contribuintes mas que satildeo obrigadas a cooperar com a atividade

fiscalizatoacuteria por forccedila da legislaccedilatildeo tributaacuteria

Colocadas essas premissas baacutesicas acerca das accedilotildees relacionadas com as atividades de tributa-

ccedilatildeo de arrecadaccedilatildeo e de fiscalizaccedilatildeo cabe agora destacar que conforme Krugman e Wells (2007 p

428) A poliacutetica tributaacuteria sempre tem dois objetivos Por um lado os governos procuram alcanccedilar a eficiecircncia tributaacuteria procuram minimizar os custos diretos e indiretos da cobranccedila de impostos para a economia Por outro lado os governos buscam a justiccedila tributaacuteria ou equidade tributaacuteria procuram garantir que as pessoas certas de fato tenham que arcar com a carga dos impostos O dilema central em poliacutetica tributaacuteria [] eacute que um imposto eficiente pode natildeo parecer justo e um imposto justo pode natildeo ser eficiente Assim haacute um trade-off fundamental entre equidade e eficiecircncia (desta-que no original)

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Poreacutem afirmam os autores (KRUGMANWELLS 2007 p 430) que ldquoa anaacutelise econocircmica natildeo

pode dizer quanto peso um sistema tributaacuterio deve atribuir agrave equidade ou agrave eficiecircncia A escolha eacute um

julgamento de valor que fazemos atraveacutes do processo poliacuteticordquo

Pohlmann e Iudiacutecibus (2006 p 32) elencam dentre os objetivos da poliacutetica tributaacuteria a elevaccedilatildeo

da arrecadaccedilatildeo a redistribuiccedilatildeo da riqueza e o estiacutemulo agrave atividade econocircmica estando constante-

mente preocupada com a avaliaccedilatildeo dos efeitos e da eficaacutecia da mudanccedila nas regras tributaacuterias

Ao discorrer sobre a importacircncia de se manter uma permanente avaliaccedilatildeo de qualquer poliacutetica

puacuteblica Matias-Pereira (2012 p 235) expotildee que

A avaliaccedilatildeo se apresenta como uma ferramenta relevante de gestatildeo visto que pode ser utilizada ao longo de todo o ciclo de gestatildeo A partir da avaliaccedilatildeo torna-se possiacutevel subsidiar o processo de planejamento e formulaccedilatildeo de uma intervenccedilatildeo o acompa-nhamento de sua implementaccedilatildeo os ajustes que se fizerem necessaacuterios as decisotildees sobre sua manutenccedilatildeo aperfeiccediloamento mudanccedila de rumo ou interrupccedilatildeo entre outros procedimentos A avaliaccedilatildeo pode ajudar ainda a viabilizar todas as atividades de controle interno externo por instituiccedilotildees puacuteblicas e pela sociedade permitindo assim uma maior transparecircncia e accountability das accedilotildees realizadas pelos governos

No momento em que o processo de formulaccedilatildeo das poliacuteticas puacuteblicas chega ao estaacutegio da to-

mada de decisotildees vinculativas o grau de liberdade de que gozam os responsaacuteveis pela tomada dessas

decisotildees estaacute circunscrito por um conjunto de ideias e de paradigmas bem como pelas circunstacircncias

sociais econocircmicas e poliacuteticas estabelecidas no acircmbito territorial de suas competecircncias (HOWLETT

RAMESH PERL 2013 p 158) Por tal motivo haacute que se reconhecer que a tomada de decisatildeo natildeo eacute um

exerciacutecio meramente teacutecnico mas um processo inerentemente poliacutetico que implica fazer escolhas de

um nuacutemero relativamente pequeno de opccedilotildees poliacuteticas alternativas identificadas durante o processo

de sua formulaccedilatildeo resultando em diferentes tipos de decisotildees as quais produzem ldquoganhadoresrdquo e

ldquoperdedoresrdquo (HOWLETT RAMESH PERL 2013 p 157)

Natildeo raro quando a formulaccedilatildeo da poliacutetica tributaacuteria chega ao seu estaacutegio decisoacuterio as so-

luccedilotildees para determinadas questotildees satildeo vistas com maus olhos pelos atores natildeo estatais envolvidos

naquele processo os quais satildeo desprovidos de autoridade que lhes legitimem a adotar concreta-

mente as decisotildees vinculativas na aacuterea muito embora estivessem engajados nos estaacutegios antece-

dentes agravequela etapa decisoacuteria

Ao tratarem da possibilidade de engajamento e da influecircncia dos atores no processo de formu-

laccedilatildeo das poliacuteticas puacuteblicas Dias e Matos (2012 p 39-40) assinalam que

Na cena poliacutetica configurada pelo Estado e pelos oacutergatildeos de governo em todas as esferas de atuaccedilatildeo existem inuacutemeros indiviacuteduos grupos organizaccedilotildees movimentos partidos que influenciam as poliacuteticas puacuteblicas quer seja no seu processo de constru-ccedilatildeo quer na sua implantaccedilatildeo e nos seus desdobramentos Os denominados atores e seu papel fundamental eacute influenciar de algum modo as poliacuteticas governamentais de-fendendo seus interesses proacuteprios ou dos grupos que representam Suas praacuteticas satildeo

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diversas podendo empregar diversos meios para defender seus interesses a pressatildeo pura e simples atraveacutes do lobby a greve mobilizaccedilotildees participaccedilatildeo nas reuniotildees etc de tal modo que as poliacuteticas puacuteblicas constituem o resultado das accedilotildees tomadas por esses vaacuterios atores que influenciam o processo de formulaccedilatildeo das poliacuteticas puacuteblicas

Dias e Matos (2012 p 40) reconhecem que os diferentes atores envolvidos no processo de for-

mulaccedilatildeo das poliacuteticas puacuteblicas possuem interesses distintos embora coincidam em muitos pontos

Esse fato possui especial significacircncia para as decisotildees diretamente relacionadas com o manejo

da poliacutetica tributaacuteria porque os interesses distintos do Estado enquanto ente tributante e dos contri-

buintes enquanto financiadores das despesas estatais natildeo raro datildeo origem a uma consequente insa-

tisfaccedilatildeo por parte destes uacuteltimos abrindo caminho para o estabelecimento de uma relaccedilatildeo conflituosa

entre ambos a qual merece ser examinada de perto

Como bem observa Cursi (2011 p 136-137)

[] a esfera puacuteblica delibera em administraccedilatildeo tributaacuteria com percepccedilatildeo diferente daquela empregada pela esfera privada Esta diferenccedila de percepccedilatildeo decorre da di-ferenccedila existente entre a decisatildeo puacuteblica e o juiacutezo privado Essa diferenccedila de juiacutezos tambeacutem ocasiona diferenccedilas de percepccedilatildeo quanto aos seguintes aspectos do regime de tributaccedilatildeo carga seletividade progressividade e essencialidade Em outras pala-vras haacute entre a esfera puacuteblica e a esfera privada uma diferenccedila de percepccedilatildeo quanto agrave extrafiscalidade porque as referidas esferas possuem processos decisoacuterios com carac-teriacutesticas diferentes Deste acircngulo haacute diferenccedilas entre o juiacutezo puacuteblico e o julgamento privado diferenccedilas que conduzem a percepccedilotildees distintas em relaccedilatildeo agraves calibraccedilotildees para exploraccedilatildeo da base tributaacuteria pois os julgamentos da esfera puacuteblica satildeo influen-ciados pelos propoacutesitos e definiccedilotildees poliacutetico-estrateacutegicos e visam maximizar o bem comum enquanto o juiacutezo da esfera privada eacute influenciado pela loacutegica microeconocircmi-ca e pelo interesse particular

O toacutepico seguinte tem por foco justamente as interaccedilotildees entre os atores na arena organiza-

cional das poliacuteticas tributaacuterias que indubitavelmente satildeo influenciadas de forma direta pela complexa

relaccedilatildeo travada entre o Fisco e o contribuinte

2 ATORES ENVOLVIDOS NA FORMULACcedilAtildeO E NA IMPLEMENTACcedilAtildeO DA POLIacuteTICA TRIBUTAacute-RIA A CONTURBADA RELACcedilAtildeO ENTRE O FISCO E O CONTRIBUINTE

As poliacuteticas tributaacuterias se baseiam no exerciacutecio do denominado poder fiscal ou poder de tri-

butar definido por Martins (1988 p 81) como a faculdade de que goza o Estado soberano de exigir

prestaccedilotildees pecuniaacuterias das pessoas que vivem sob sua jurisdiccedilatildeo com a finalidade de viabilizar o aten-

dimento dos encargos que satildeo proacuteprios daquele ente representando uma das manifestaccedilotildees mais

expressivas da vontade soberana das sociedades politicamente organizadas

Segundo a liccedilatildeo de Machado (2009 p 28-29)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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Como se sabe o Estado eacute entidade soberana No plano internacional representa a na-ccedilatildeo em suas relaccedilotildees com as outras naccedilotildees No plano interno tem o poder de gover-nar todos os indiviacuteduos que se encontrem no seu territoacuterio Caracteriza-se a soberania como a vontade superior agraves vontades individuais como um poder que natildeo reconhece superior No exerciacutecio de sua soberania o Estado exige que os indiviacuteduos lhe forneccedilam os recursos de que necessita Institui o tributo O poder de tributar nada mais eacute que um aspecto da soberania estatal ou uma parcela desta

Para Baleeiro (2000 p 189) ldquoo exerciacutecio do poder de tributar eacute fenocircmeno de caraacuteter iniludivel-

mente poliacutetico como todos que se acham vinculados agrave natureza e agraves atribuiccedilotildees do Estadordquo

Conforme Falcatildeo (1981 p 18) a tributaccedilatildeo que aliada a outras fontes de receitas torna pos-

siacutevel a obtenccedilatildeo dos recursos destinados ao custeio de determinadas atividades estatais especiacuteficas eacute

viabilizada em termos praacuteticos pelo fato de o Estado ter se voltado para um aspecto que lhe eacute ineren-

te o impeacuterio das suas decisotildees a cogecircncia do seu mando a imposiccedilatildeo da sua forccedila

Silva (1941 p 21) expotildee que

Organizado o Estado necessariamente que para manter sua existecircncia e cumprir suas finalidades teraacute que se suprir de meios indispensaacuteveis a esse objetivo Isto quer dizer que para manter-se assegurar sua existecircncia cumprir suas finalidades para fazer fun-cionar as instituiccedilotildees que exteriorizam sua organizaccedilatildeo poliacutetica deve o Estado procu-rar os recursos pecuniaacuterios de que necessita para satisfazer as proacuteprias necessidades E daiacute o dever de organizar suas financcedilas e de buscar os elementos para constituiacute-las

Machado (2009 p 29) afirma que o poder de tributar se justifica conforme a concepccedilatildeo que se

adote do proacuteprio Estado sendo que ldquoa ideia mais generalizada parece ser a de que os indiviacuteduos por

seus representantes consentem na instituiccedilatildeo do tributo como de resto na elaboraccedilatildeo de todas as

regras juriacutedicas que regem a naccedilatildeordquo

Carvalho (2010 p 10) seguindo essa linha de pensamento assevera que a tributaccedilatildeo estaacute di-

retamente relacionada com um acordo em que os membros integrantes da sociedade transferem ao

Fisco ldquoo poder de retirar parcelas de suas riquezas que se relacionam com os fatos geradores e suas

repercussotildees econocircmico-financeiras com a incumbecircncia de angariar os recursos de que necessitardquo

Oliveira (1988 p 11) aduz que

Enquanto sociedade politicamente organizada instituiccedilatildeo necessaacuteria ao conviacutevio e desenvolvimento humano o Estado recebe atribuiccedilotildees de que deve se desincumbir sempre visando ao bem-estar social em uacuteltima anaacutelise aos indiviacuteduos que o criaram Estes por conseguinte devem contribuir para os encargos da coletividade por forccedila da solidariedade social que preside o relacionamento interpessoal

No entender de Machado (2009 p 26) a tributaccedilatildeo indubitavelmente constitui o instrumento

que viabiliza a sobrevivecircncia da economia capitalista uma vez que sem ela o Estado teria de mono-

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polizar toda a atividade econocircmica de modo a angariar recursos suficientes para a realizaccedilatildeo de seus

fins sociais Com a tendecircncia revelada pelas naccedilotildees comunistas do leste europeu no sentido da deno-

minada economia de mercado o tributo passou a ganhar ainda mais relevacircncia ante a ineficiecircncia da

economia estatizada

Ao tratar da concepccedilatildeo que se deve ter acerca do tributo Amaro (2008 p 16) registra que o seu

conceito abrangeu desde os pagamentos em dinheiro ou bens exigidos pelos vencedores aos povos

vencidos ldquoateacute a cobranccedila perante os proacuteprios suacuteditos ora sob o disfarce de donativos ajudas contri-

buiccedilotildees para o soberano ora como um dever ou obrigaccedilatildeordquo Contudo o mesmo autor (AMARO 2008

p 16) adverte que uma noccedilatildeo de tributo baseada nessa representaccedilatildeo se perde no tempo

Para Oliveira (1988 p 11)

O tributo eacute o instituto engendrado pelo Homem que permite num clima de liberdade racionalizar juridicamente o esforccedilo de cooperaccedilatildeo individual em prol da comunidade ao mesmo tempo em que representa uma contribuiccedilatildeo constitui uma obrigaccedilatildeo per-mitindo ao seu destinataacuterio exigi-lo daqueles que por uma razatildeo ou por outra deixem de prestaacute-lo ou o faccedilam em desconformidade com a norma vigente

Bastos (1999 p 47) esclarece que eacute inegaacutevel a importacircncia do tributo sobretudo na modalida-

de de imposto considerando a indivisibilidade dos serviccedilos prestados pelo poder puacuteblico que repre-

sentam utilidades natildeo suscetiacuteveis de exclusiva imputaccedilatildeo individual Nada mais justo entatildeo do que

chamar a coletividade para cobrir essas despesas mediante o pagamento daquela exaccedilatildeo

A propoacutesito a ideia de ldquocontribuirrdquo volta-se justamente para a accedilatildeo do indiviacuteduo que presta

uma contribuiccedilatildeo a qual designa a cota que cada um daacute para atender a uma despesa comum (AMARO

2008 p 16) Ocorre que esse espiacuterito de coletividade nem sempre repousa tranquilo na consciecircncia

dos cidadatildeos chamados para contribuir com o custeio dos gastos que envolvem a promoccedilatildeo do bem-

-estar social

Diante dessa circunstacircncia o contribuinte eacute obrigado por forccedila de lei a cumprir com o dever

de dispor de parte de sua riqueza para o financiamento das atividades que o Estado soberano se

compromete em assumir Dessa afirmaccedilatildeo se constata que o tributo se reveste de uma caracteriacutestica

fundamental qual seja a coatividade (BASTOS 1999 p 47)

Conforme Neto Cisne (2002 p 130)

O Estado exige o tributo dos cidadatildeos para em troca prestar-lhes serviccedilos puacuteblicos e promover o bem-comum Nessa relaccedilatildeo deve ficar evidente que natildeo prevalece a von-tade do cidadatildeo de eximir-se da obrigaccedilatildeo de pagar os seus tributos Eacute uma relaccedilatildeo em que prevalece a vontade do Estado em receber as receitas tributaacuterias e a obrigaccedilatildeo do contribuinte em pagar seus tributos

Daiacute porque o traccedilo caracteriacutestico da relaccedilatildeo entre o contribuinte e o ente tributante repousa

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no caraacuteter obrigacional do tributo e no direito que tem o Estado de criaacute-lo e impocirc-lo visando aos

interesses coletivos (NETO CISNE 2002 p 147)

Vanoni (1932 p 119) observa que

Existe um interesse individual em obter da atividade do Estado a maacutexima utilidade possiacutevel e tal interesse apresenta-se particularmente intenso naqueles que sejam cha-mados a entregar uma parte do seu patrimocircnio para constituir os meios necessaacuterios agrave atividade puacuteblica e portanto esperem receber desta benefiacutecios em relaccedilatildeo com o sacrifiacutecio suportado

Na medida em que as expectativas dos cidadatildeos quanto ao retorno de suas contribuiccedilotildees na

forma de benefiacutecios vatildeo sendo frustradas amplia-se a rejeiccedilatildeo social ao pagamento de tributos que eacute

potencializada pela compulsoriedade desses recolhimentos Diante desse cenaacuterio perde-se o espiacuterito

de solidariedade que deve permear o esforccedilo de cooperaccedilatildeo individual para o custeamento dos en-

cargos da coletividade

3 O TRIBUTO COMO NORMA DE REJEICcedilAtildeO SOCIAL

Eacute interessante notar que conforme Eckstein (1971 p 91) nas sociedades organizadas faz-se

premente a aceitabilidade do sistema tributaacuterio que traduz a necessidade da sua aceitaccedilatildeo pelo cida-

datildeo ldquomantendo a coerecircncia com as noccedilotildees que este tem de justiccedila e natildeo sendo oneroso em compa-

raccedilatildeo com o que proporciona em troca aos contribuintesrdquo

No mesmo sentido satildeo as consideraccedilotildees de Cursi (2011 p 63) para quem uma

Boa tributaccedilatildeo eacute aquela proveniente de relaccedilotildees instrumentais imperativas onde a coerccedilatildeo poliacutetico-legal fixada aos particulares conduz a rendas monetaacuterias entregues pela aceitaccedilatildeo da legitimidade pertinecircncia e adequaccedilatildeo da exigecircncia estatal e con-cordacircncia com os propoacutesitos do gasto

Sem embargo observa-se que a cada dia o peso dos tributos e a incapacidade do governo em

promover de forma plena o bem-estar social vecircm dando margem a uma verdadeira repulsa ao sistema

tributaacuterio ocasionando protestos advindos de todas as camadas da sociedade sobretudo daquelas

que sofrem de forma mais intensa as consequecircncias decorrentes da ineficiecircncia estatal em gerenciar

os recursos carreados aos cofres puacuteblicos

Leciona Schoueri (2011 p 27) que

Se no Estado Social a sociedade pagava um preccedilo para o Estado atingir o desidera-to coletivo no Estado do Seacuteculo XXI a sociedade passa a compreender que o preccedilo tornou-se muito alto e o resultado piacutefio A tributaccedilatildeo excessiva torna-se inconciliaacutevel com o modelo do Estado do Seacuteculo XXI pois implica retirar recursos que a proacutepria coletividade necessita para seus fins A transferecircncia excessiva de recursos ao Estado

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

141

pela sociedade tolhe a iniciativa desta reduzindo ou impossibilitando o desenvolvi-mento econocircmico O resultado evidente eacute o surgimento de novas necessidades so-ciais exigindo mais recursos para a construccedilatildeo da liberdade Daiacute a reivindicaccedilatildeo da sociedade de tomar para si as tarefas antes delegadas ao Estado recusando-se daiacute a pagar um preccedilo exorbitante por uma liberdade que aquele jaacute natildeo mais se revela apto a promover O tributo surge nesta perspectiva como o preccedilo dessa liberdade Ele natildeo se justifica enquanto tal mas somente na medida em que seja indispensaacutevel e na extensatildeo em que se espera uma atuaccedilatildeo estatal na construccedilatildeo de uma liberdade coletiva de inclusatildeo social Revelando-se o Estado incapaz de (ou inaacutebil para) suprir certas demandas sociais natildeo se legitima o aumento desmedido de tributos em ciclo crescente e interminaacutevel onde se vecirc que por mais que se aumentem os tributos em maior grau se ampliam as demandas sociais exigindo novos aumentos

Neto Cisne (2002 p 146) assevera que apesar de o tributo ter uma funccedilatildeo socioeconocircmica o

cidadatildeo reage agrave sua imposiccedilatildeo por meio de alegaccedilotildees comuns como a injusticcedila dos tributos o peso

da carga tributaacuteria a desproporcionalidade entre o pagamento dos tributos e as contraprestaccedilotildees es-

tatais a maacute gestatildeo das financcedilas puacuteblicas dentre outras

Pontes (2004 p 138) entende que

[] as discussotildees sobre o aumento de carga tributaacuteria passam inelutavelmente em um primeiro momento pelo debate relativo ao modelo de financiamento do Estado da qualidade e da quantidade das despesas puacuteblicas e em um segundo momento pelo proacuteprio papel que o Estado deve desempenhar na sociedade brasileira

Alguns autores a fim de verificarem o peso real dos tributos para a sociedade chegam a esta-

belecer uma comparaccedilatildeo entre o volume da carga tributaacuteria dos paiacuteses e o efetivo retorno dos valores

a ela correspondentes por meio da prestaccedilatildeo de serviccedilos puacuteblicos

Sobre o tema Pellizzari (1990 p 38) discorre que a carga tributaacuteria de um determinado paiacutes so-

mente seraacute considerada alta ou baixa mediante o estabelecimento de um comparativo entre os custos

e os benefiacutecios que decorrem dos serviccedilos prestados pelo poder puacuteblico Demais disso caso ocorra

uma comparaccedilatildeo entre as cargas tributaacuterias de paiacuteses distintos e que venha a se basear nesse paracircme-

tro deveratildeo ser consideradas tanto a quantidade como a qualidade dos serviccedilos puacuteblicos prestados

pelos paiacuteses envolvidos no comparativo

Ocorre que conforme Heidemann (2010 p 33) o volume e a qualidade dos serviccedilos puacuteblicos

natildeo justificam os custos que envolvem a sua prestaccedilatildeo Aleacutem disso os proacuteprios governos estatildeo mui-

to caros o que contraria o mandamento de que para serem razoaacuteveis e viaacuteveis devem funcionar de

acordo com a disposiccedilatildeo e a capacidade de financiamento dos contribuintes

Machado (2009 p 26) exorta a importacircncia de que

[] a carga tributaacuteria natildeo se torne pesada ao ponto de desestimular a iniciativa privada No Brasil infelizmente isto vem acontecendo Nossos tributos aleacutem de serem muitos satildeo calculados mediante aliacutequotas elevadas Por outro lado o Estado eacute perdulaacuterio

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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Gasta muito e ao fazecirc-lo privilegia uns poucos em detrimento da maioria pois natildeo investe nos serviccedilos puacuteblicos essenciais dos quais esta carece tais como educaccedilatildeo seguranccedila e sauacutede Assim mesmo sem qualquer comparaccedilatildeo com a carga tributaacuteria de outros paiacuteses eacute possiacutevel afirmar-se que a nossa eacute exageradamente elevada posto que o Estado praticamente nada nos oferece em termos de serviccedilos puacuteblicos

Martins (2004 p 266 - 227) chega a defender a tese de que o tributo eacute uma norma de rejeiccedilatildeo

social diante do fato de os contribuintes pagarem mais do que deveriam para receber serviccedilos puacutebli-

cos porquanto uma parte substancial dos recursos arrecadados serve apenas para viabilizar a manu-

tenccedilatildeo dos poliacuteticos no poder quando natildeo eacute canalizada diretamente para os ralos da corrupccedilatildeo

A esse respeito assevera Vanoni (1932 p 118) que ldquoum encargo imposto aos cidadatildeos por

qualquer abuso de poder puacuteblico e que natildeo sirva a fins de utilidade coletiva mas seja dispecircndio em

vantagens particulares seraacute uma espoliaccedilatildeo mas nunca um tributordquo

Machado (2009 p 27) expotildee que a carga tributaacuteria brasileira muito embora jaacute seja bastante

elevada natildeo impede que a arrecadaccedilatildeo venha batendo sucessivos recordes haja vista a regularidade

com que se criam ou satildeo aumentados os tributos

Estudo realizado pelo Instituto Brasileiro de Planejamento Tributaacuterio (2012 online) concluiacutedo

em marccedilo de 2013 e amplamente divulgado pela miacutedia nacional aponta que a carga tributaacuteria brasi-

leira em 2012 chegou a 3627 do Produto Interno Bruto com crescimento de 025 ponto percentual

em relaccedilatildeo a 2011 periacuteodo no qual a carga tributaacuteria jaacute havia batido recorde histoacuterico O mesmo es-

tudo destaca o fato de que nos uacuteltimos dez anos a carga tributaacuteria cresceu 363 pontos percentuais

com meacutedia de 036 ponto percentual ao ano

Queiroz (2003 p 191) lembra que ldquouma carga tributaacuteria excessiva atrasa o desenvolvimento e

num ciacuterculo vicioso provoca a queda da arrecadaccedilatildeo e assim dificulta a realizaccedilatildeo dos investimentos

para a geraccedilatildeo de emprego e rendardquo

Sobre o assunto Tipke (2012 p 53) discorre que

Se as Constituiccedilotildees liberais garantem fomentam ou favorecem a iniciativa privada sobretudo a econocircmica se reconhecem a liberdade empresarial e garantem a pro-priedade privada segue-se que tambeacutem a imposiccedilatildeo precisa respeitar esses valores da liberdade natildeo deve usurpar por meio de uma carga tributaacuteria global excessiva Esse eacute o caso quando por meio da elevaccedilatildeo da carga tributaacuteria global prejudica essencial-mente a iniciativa privada solapa a vontade de produzir de quem desenvolve uma ati-vidade econocircmica autocircnoma ou dependente ou a debilita essencialmente Tambeacutem a experiecircncia demonstra que a vontade de produzir do trabalhador eacute debilitada mesmo quando a carga tributaacuteria natildeo alcanccedila o miacutenimo existencial

Pontes (2004 p 145) salienta que no Brasil os sucessivos aumentos da carga tributaacuteria com-

prometem o crescimento econocircmico Bem assim desestimulam o investimento na produccedilatildeo con-

siderando que ldquoa maior parte da incidecircncia de tributos recai sobre bens e serviccedilos e muito pouco

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

143

sobre a renda e propriedade o que natildeo deixa de ser curioso em um paiacutes marcado pela desigualda-

de como o Brasilrdquo

Luchiezi Jr e Maria (2010 p 168-169) observam que dentre as principais tendecircncias que mar-

caram as modificaccedilotildees no sistema tributaacuterio brasileiro desde a ediccedilatildeo do Plano Real destacam-se i)

o aumento da regressividade da carga tributaacuteria com a maior incidecircncia de tributos sobre o consumo

de bens e serviccedilos ii) a limitaccedilatildeo da tributaccedilatildeo direta no Brasil e iii) o tratamento diferenciado da tri-

butaccedilatildeo das rendas violando o princiacutepio da isonomia tributaacuteria ao tratar com criteacuterios diferenciados

a renda do capital (lucros dividendos e juros) e do trabalho considerando que haacute uma concentraccedilatildeo

cada vez maior de impostos comprometedores da renda dos trabalhadores assalariados

No entender de Pellizzari (1990 p 73-74) o sistema tributaacuterio brasileiro

[] ao inveacutes de ser uma forma de distribuiccedilatildeo de renda eacute uma forma de concentraccedilatildeo uma vez que quem paga os impostos satildeo os assalariados e na distribuiccedilatildeo destes re-cursos uma grande parte eacute transferida para as empresas ndash atraveacutes de infra-estrutura incentivos e ajudas oficiais sobrando uma pequena parte para retornar em serviccedilos puacuteblicos aos contribuintes de fato [] Na realidade o nosso sistema tributaacuterio em-basado em impostos indiretos e sobre a renda consumida foi justamente planejado para concentrar a renda nacional

Sem prejuiacutezo dessas consideraccedilotildees indaga-se aleacutem dessas quais seriam as demais caracteriacutesti-

cas marcantes do sistema tributaacuterio brasileiro que contribuem para a relaccedilatildeo conflituosa entre o Fisco

e o contribuinte Eacute o que se veraacute no toacutepico seguinte

4 OUTRAS CARACTERIacuteSTICAS DO SISTEMA TRIBUTAacuteRIO BRASILEIRO E SEUS VIacuteNCULOS COM A CRISE DA RELACcedilAtildeO DE TRIBUTACcedilAtildeO

Pontes (2004 p 139) elenca a instabilidade como sendo uma das caracteriacutesticas marcantes

do sistema tributaacuterio brasileiro que contribuem para o estabelecimento de uma relaccedilatildeo conflituo-

sa entre o Fisco e o contribuinte chegando inclusive a afirmar a inexistecircncia de oacutergatildeos especiacuteficos

responsaacuteveis pelo planejamento da poliacutetica tributaacuteria no Brasil entendida pelo autor como ldquo[] a

definiccedilatildeo de diretrizes claras de curto meacutedio e longo prazo bem como das respectivas medidas

necessaacuterias ao seu atingimentordquo

Salienta Pontes (2004 p 139) que no acircmbito federal

A Secretaria da Receita Federal eacute o oacutergatildeo encarregado de definir a poliacutetica tributaacuteria e ao mesmo tempo promover a arrecadaccedilatildeo das incidecircncias por ela preestabelecidas (e via de regra ratificadas pelo Congresso Nacional e pelo Chefe do Poder Executivo) A consequecircncia eacute a adoccedilatildeo de um amontoado desarticulado de medidas motivadas pela urgecircncia da conjuntura que natildeo guardam sintonia entre si quando observadas no longo prazo e que tecircm quase sempre apenas um objetivo promover o aumento de arrecadaccedilatildeo exigido pela poliacutetica macroeconocircmica

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Demais disso Pontes (2004 p 141) explicita que a instabilidade reflete-se ainda

[] na contemplaccedilatildeo legal cada vez maior de pleitos de setores econocircmicos indivi-dualizados Como natildeo haacute uma diretriz tributaacuteria clara (dada a inexistecircncia de plane-jamento para a poliacutetica tributaacuteria) a legislaccedilatildeo eacute o repertoacuterio de comandos discipli-nando interesses setorizados fruto das pressotildees institucionais [hellip] Assim a falta de planejamento aumenta a desarticulaccedilatildeo das regras tributaacuterias acirra as desigualdades infundadas e constitui campo propiacutecio para a contemplaccedilatildeo de normas que represen-tam o fruto da pressatildeo de alguns setores organizados

Segundo Pontes (2004 p 142) tambeacutem eacute da natureza do sistema tributaacuterio brasileiro a sua

complexidade que seria uma unanimidade entre os expertos dos setores puacuteblico e privado a classe

empresarial e os profissionais dedicados ao tema da tributaccedilatildeo Para o autor (PONTES 2004 142-143)

o Governo Federal natildeo empreende esforccedilos no sentido de solucionar o problema que vem se agigan-

tando cada vez mais sobretudo na esfera estadual onde a complexidade eacute traduzida pela amplitude

de normas que versam acerca do ICMS ldquo[] tornando praticamente impossiacutevel o regular cumprimento

da legislaccedilatildeo tributaacuteria por contribuintes que natildeo dispotildeem de um arsenal de competentes assessores

fiscais e contaacutebeisrdquo (PONTES 2004 143)

A propoacutesito Krugman e Wells (2007 p 429) lembram que ldquoo custo administrativo mais co-

nhecido do sistema tributaacuterio eacute o tempo que os indiviacuteduos gastam preenchendo seus formulaacuterios de

imposto ou o dinheiro gasto com contadores para que preparem os impostos para elesrdquo

Daiacute porque Zottmann (2008 p 42) ao discorrer sobre os agentes econocircmicos que integram a

informalidade afirma que estes muitas das vezes tecircm a pretensatildeo de se enquadrarem na categoria de

agentes formais cumpridores das responsabilidades tributaacuterias a eles atribuiacutedas mas que assim natildeo

o fazem ante o custo extremamente alto que envolve a responsabilidade pela administraccedilatildeo e pelo

pagamento de tributos

Conforme Tanzi (2009 p 45)

A economia subterracircnea traz implicaccedilotildees para o sistema tributaacuterio Quando uma por-ccedilatildeo consideraacutevel da economia de um paiacutes passa para a economia subterracircnea e por-tanto natildeo cumpre com suas obrigaccedilotildees fiscais mas ainda assim usa os serviccedilos do governo isso forccedila o governo a aumentar as aliacutequotas dos impostos para aqueles que as pagam tornando sua vida ainda mais difiacutecil O governo tambeacutem pode arrecadar menos receitas fiscais do que o necessaacuterio para evitar dificuldades macroeconocircmicas Por se tornar menos neutro o sistema fiscal tambeacutem impotildee distorccedilotildees agrave economia

No que tange especificamente ao planejamento da poliacutetica tributaacuteria que envolve o cumpri-

mento de obrigaccedilotildees acessoacuterias tem-se que a idealizaccedilatildeo desses mecanismos de controle utilizados

pela Administraccedilatildeo Tributaacuteria deve estar baseada em paracircmetros razoaacuteveis que permitam ao contri-

buinte cumprir adequadamente com as suas obrigaccedilotildees tributaacuterias sem que essa conduta venha a

representar um ocircnus insuportaacutevel prejudicando o exerciacutecio da atividade econocircmica

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

145

Machado Segundo e Machado (2004 p 192) ao discorrerem sobre o razoaacutevel e o proporcional

em mateacuteria tributaacuteria aduzem que as obrigaccedilotildees acessoacuterias devem consubstanciar deveres racio-

nais coerentes com o senso comum devendo ainda serem adequadas necessaacuterias e proporcionais

tornando possiacutevel desta forma que a Administraccedilatildeo Tributaacuteria possa ldquo[] aferir o cumprimento das

obrigaccedilotildees tributaacuterias principais otimizando assim o atendimento aos princiacutepios da isonomia e da

capacidade contributivardquo

Vecirc-se portanto que para o estabelecimento de uma adequada poliacutetica tributaacuteria nesse sentido

eacute salutar que os seus gestores empreendam esforccedilos no sentido de racionalizar o cumprimento das

obrigaccedilotildees acessoacuterias por parte do contribuinte viabilizando por um lado a realizaccedilatildeo da atividade

fiscalizatoacuteria mas evitando por outro que elas venham a representar um ocircnus excessivo implicando

em custos elevados e pouco razoaacuteveis para os contribuintes

Apesar disso segundo Pontes (2004 p 142) no Brasil o custo de conformidade (compliance

cost) com as regras que impotildeem as obrigaccedilotildees acessoacuterias tornou-se um relevante item na planilha de

custos das empresas

Enquanto no mundo inteiro a simplicidade dos deveres acessoacuterios constitui meta de uma adequada poliacutetica tributaacuteria do ponto de vista da economicidade e da eficiecircncia no Brasil a legislaccedilatildeo caminha no sentido oposto elevando o custo de conformidade a patamares talvez nunca vividos neste paiacutes (PONTES 2004 p 142)

Pontes (2004 p 143) entende que o objetivo arrecadatoacuterio tambeacutem eacute marcante do sistema

tributaacuterio brasileiro o qual por razotildees macroeconocircmicas tem objetivado exclusivamente a geraccedilatildeo

de receita e a implementaccedilatildeo de meios para facilitar a arrecadaccedilatildeo sem se preocupar com a qua-

lidade da receita seja do ponto de vista da eficiecircncia econocircmica seja do ponto de vista da justiccedila

fiscal e da articulaccedilatildeo com os demais objetivos da ordem constitucional como por exemplo o de-

senvolvimento regional

Todas essas circunstacircncias contribuem sobremodo para o agravamento da crise que afeta as

relaccedilotildees entre o Fisco e o contribuinte Poreacutem existem outros fatores que funcionam como um cata-

lisador do processo de animosidade que se desenvolve no acircmbito do relacionamento travado entre

ambos os atores envolvidos com as poliacuteticas tributaacuterias

Para Neto Cisne (2002 p 147) no Brasil uma das causas que fomentam essa relaccedilatildeo conflituosa

reside na circunstacircncia de que haacute uma desconfianccedila muacutetua entre o Fisco e o contribuinte que poderia

ser mitigada por meio de uma maior participaccedilatildeo dos cidadatildeos nas poliacuteticas puacuteblicas e mediante o

estabelecimento de mecanismos que tenham o condatildeo de conferir transparecircncia agraves accedilotildees estatais

Schoueri (2011 p 43) argumenta que a ideia de responsabilidade poliacutetica dentro do contexto de um

sistema tributaacuterio ideal envolve justamente a necessidade de se exigir por parte dos governos uma

transparecircncia em mateacuteria tributaacuteria que implica saber quem estaacute arcando com o pagamento dos tri-

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

146

butos e quem estaacute se beneficiando com a aplicaccedilatildeo dos recursos A relevacircncia da responsabilidade

poliacutetica toma vulto por exemplo quando se percebe que o sistema tributaacuterio eacute dotado de tributos

indiretos os quais levam a crer que satildeo as empresas natildeo os indiviacuteduos que arcam com o ocircnus deles

decorrentes Do mesmo modo esse tipo de tributaccedilatildeo permite esconder do indiviacuteduo o valor que estaacute

sendo pago por ele (SCHOUERI 2011 p 43)

Ocorre que conforme Pellizzari (1990 p 108) o sistema tributaacuterio brasileiro eacute pouco divulga-

do A populaccedilatildeo tem dificuldade em receber esclarecimentos concernentes a quem paga os tributos

de que forma paga quanto paga onde satildeo aplicados quem os recebe de que forma satildeo distribu-

iacutedos enfim eacute pouco esclarecida quanto ao processo de arrecadaccedilatildeo e de aplicaccedilatildeo dos tributos

como um todo

Acresccedila-se a tudo isso o fato de que corriqueiramente as administraccedilotildees tributaacuterias tecircm o

haacutebito de instituiacuterem mecanismos de cobranccedila de seus tributos que acabam por constranger ilegal-

mente os contribuintes a promoverem a quitaccedilatildeo de seus deacutebitos gerando ainda mais conflitos Satildeo

as denominadas sanccedilotildees poliacuteticas

Sobre o assunto Bim (2004 p 67-68) esclarece que

Para cobrar seus tributos o Estado institui natildeo somente sanccedilotildees pecuniaacuterias para es-timular o cumprimento das obrigaccedilotildees principais ou acessoacuterias mas tambeacutem ldquosan-ccedilotildeesrdquo natildeo pecuniaacuterias para constranger o contribuinte a pagaacute-los Tais sanccedilotildees satildeo conhecidas como indiretas tributaacuterias ou poliacuteticas [] As sanccedilotildees indiretas satildeo meios obliacutequos de cobranccedila tributaacuteria cerceadoras dos direitos fundamentais do cidadatildeo--contribuinte [] Satildeo sanccedilotildees indiretas a saber a interdiccedilatildeo de estabelecimento a apreensatildeo de mercadorias a negativa para a impressatildeo de bloco de notas fiscais o regime especial de fiscalizaccedilatildeo a proibiccedilatildeo de inscriccedilatildeo ou cassaccedilatildeo do cadastro de contribuintes (vg CNPJ) a exigecircncia de pagamento de certos tributos para a expe-diccedilatildeo de licenccedilas alvaraacutes ou para participar de licitaccedilotildees etc A constante nas san-ccedilotildees indiretas eacute a utilizaccedilatildeo de meios diversos sempre restritivos ou impeditivos de aquisiccedilatildeo de algum direito que impeccedilam ou dificultem a atividade do contribuinte para obrigaacute-lo a pagar o tributo O meio eacute variaacutevel mas o fim eacute constante garantir o adimplemento fiscal

Tipke (2012 p 112) ao discorrer sobre a possiacutevel existecircncia de uma conexatildeo entre a inapropria-

da moral impositiva do Estado e uma fraacutegil moral tributaacuteria do contribuinte afirma que muitos fatores

levam a crer que uma tributaccedilatildeo que despreza um coacutedigo de eacutetica modelar dificilmente pode construir

nos contribuintes inibiccedilotildees de ordem moral-tributaacuterias Em verdade ela teria o condatildeo de suprimir sua

consciecircncia tributaacuteria Eacute por isso que o autor (TIPKE 2012 p 114) acredita que ldquouma verdadeira reno-

vaccedilatildeo moral do contribuinte soacute teria ecircxito se em primeiro lugar as leis tributaacuterias fossem remoralizadas

a Justiccedila Tributaacuteria natildeo mais permanecendo marginalizadardquo

Ao discorrer sobre a temaacutetica Cursi (2011 p 158-159) emite a seguinte opiniatildeo

[] eacute preciso se esforccedilar para construir convergecircncias por isso eacute recomendaacutevel de-

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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senvolver um ambiente de exploraccedilatildeo da base tributaacuteria onde os bons valores morais e comportamentais satildeo prestigiados em nome da sustentabilidade e do equiliacutebrio presente e futuro da moralidade nas relaccedilotildees e do comprometimento reciacuteproco O desenvolvimento de valores morais e eacuteticos eacute fundamental para favorecer a efetivida-de e eficaacutecia das relaccedilotildees mantidas no bojo da exploraccedilatildeo da base tributaacuteria

Todavia esperar o desenvolvimento de valores morais e eacuteticos que possam permear o relacio-

namento travado entre o Fisco e o contribuinte eacute uma medida irracional quando o planejamento da

tributaccedilatildeo eacute pautado pela absoluta falta de compromisso dos atores envolvidos nesse processo em

observar os primados baacutesicos e as diretrizes elementares para o estabelecimento de uma adequada

poliacutetica tributaacuteria que possa manter sintonia com os primados da justiccedila fiscal

Destaque-se a esse respeito que Pontes (2004 p 138) numa postura mais radical quanto ao as-

sunto chega inclusive a afirmar que o sistema tributaacuterio brasileiro atual eacute marcado pela completa falta

de planejamento das poliacuteticas tributaacuterias o que constitui um desmedido absurdo que merece todo

tipo de repreensatildeo e censura por parte da populaccedilatildeo sobretudo daquela sua parcela que eacute chamada

a contribuir com o custeio da maacutequina puacuteblica estatal

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Tudo o que fora esboccedilado neste breve estudo leva a crer que em uacuteltima anaacutelise o fator deter-

minante da existecircncia de uma animosidade entre o Fisco e o contribuinte eacute a deficiecircncia das poliacuteticas

tributaacuterias brasileiras como um todo que em geral natildeo buscam efetivar a justiccedila fiscal promovendo

uma redistribuiccedilatildeo de renda e onerando a populaccedilatildeo dentro de limites razoaacuteveis ou seja somente

na medida do que for estritamente necessaacuterio para a consecuccedilatildeo dos objetivos de bem-estar da

coletividade

Esse nefasto estado de coisas vem perdurando e se agravando ao longo dos anos que suce-

deram a promulgaccedilatildeo da Constituiccedilatildeo Federal de 1988 Nesse contexto tem-se que as propostas de

reforma tributaacuteria se apresentam como um novo norte de direccedilatildeo voltado a orientar uma adequada

postura da Administraccedilatildeo Tributaacuteria frente agraves questotildees fiscais mais condizente com os anseios da so-

ciedade brasileira que eacute tatildeo castigada pela deficiecircncia das poliacuteticas tributaacuterias

Sem embargo o que se observa eacute que as dificuldades inerentes agrave implementaccedilatildeo de uma re-

forma tributaacuteria seacuteria no paiacutes que indubitavelmente passa por interminaacuteveis debates poliacuteticos acerca

das suas especificidades fazem minguar qualquer esperanccedila de que mudanccedilas positivas estatildeo por vir

Essa circunstacircncia tem o condatildeo de evidenciar a existecircncia de um cenaacuterio desolador para os

cidadatildeos brasileiros que se veem obrigados a contribuir ferozmente para a manutenccedilatildeo da maacutequina

estatal de conformidade com regras definidas por um sistema tributaacuterio extremamente injusto e de-

sigual que parece ser revestido de uma imutabilidade que diga-se eacute relativa uma vez que as meta-

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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morfoses do arcabouccedilo juriacutedico que lhe daacute forma soacute se prestam a acarretar cada vez mais transtornos

na vida dos contribuintes Diante desse estado de coisas indaga-se como esperar uma relaccedilatildeo har-

mocircnica entre estes e o Fisco

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15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

151

INFLUEcircNCIA DOS FATORES ECONOcircMICOS NA ARRECADACcedilAtildeO DA CON-TRIBUICcedilAtildeO DE MELHORIA NOS MUNICIacutePIOS BRASILEIROS

SUMAacuteRIO Introduccedilatildeo 1 Consideraccedilotildees sobre a Contribuiccedilatildeo de Melhoria e as dificuldades de sua implementaccedilatildeo 2 Anaacutelise prospectiva 3 Anaacutelise eco-nomeacutetrica 31 Interpretando os Resultados 311 Fundo Nacional de Desen-volvimento da Educaccedilatildeo 312 Fundo de Participaccedilatildeo dos Municiacutepios 313 Populaccedilatildeo 314 Contribuiccedilatildeo de Intervenccedilatildeo no Domiacutenio Econocircmico 315 Iacutendice Firjan de Desenvolvimento Municipal 316 Imposto de Propriedade de Veiacuteculos Automotores 317 Imposto Sobre a Propriedade Territorial Rural Consideraccedilotildees finais Referecircncias

Joseacute Flaacutevio da Silva1

INTRODUCcedilAtildeO

A contribuiccedilatildeo de melhoria no Brasil possui previsatildeo constitucional desde a Constituiccedilatildeo Fe-

deral de 1934 por meio do seu artigo 124 A Constituiccedilatildeo Federal de 1937 natildeo previu essa espeacutecie

tributaacuteria as Constituiccedilotildees Federais posteriores previram e atualmente a previsatildeo consta do artigo

145 III da Constituiccedilatildeo Federal de 1988 Eacute importante destacar que o Coacutedigo Tributaacuterio Nacional (CTN)

natildeo definiu a contribuiccedilatildeo de melhoria poreacutem trouxe seus elementos norteadores em seu artigo 81

A literatura sobre federalismo fiscal no Brasil ensina que em uma federaccedilatildeo onde se estrutura

o poder poliacutetico de forma descentralizada (Uniatildeo Estados Municiacutepios e DF) como a forma de Estado

brasileira os municiacutepios possuem competecircncias tributaacuterias limitadas com arrecadaccedilatildeo insuficiente

para suprir suas despesas fazendo-se necessaacuterias as transferecircncias de recursos das esferas superiores

de governo para garantir o equiliacutebrio das contas publicas municipais Aleacutem disso tais repasses federais

e estaduais podem causar nos governantes municipais um desincentivo da exploraccedilatildeo de suas bases

tributaacuterias dado que eles receberatildeo um volume de verbas sem praticar qualquer tipo de esforccedilo arre-

cadatoacuterio desonerando-se do ocircnus poliacutetico que tal esforccedilo possa causar

Nesse sentido ao considerar os constantes deacuteficits observados pelos governos locais eacute impor-

tante destacar o princiacutepio do natildeo deacuteficit na Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) Lei Complementar

1012000 associado ao baixo niacutevel da arrecadaccedilatildeo municipal motivo pelo qual eacute interessante conhe-

cer os fatores que contribuem para a situaccedilatildeo de descaso na cobranccedila de algumas receitas puacuteblicas

Frente agrave determinaccedilatildeo legal da LRF que restringe as renuacutencias de receitas resta a pergunta como os

municiacutepios atendem a essa imposiccedilatildeo jaacute que cobram de forma ineficiente seus tributos O IPTU por

1 Auditor Fiscal Adjunto da Receita Estadual do Cearaacute Mestre em Economia (CAENUFC) E-mail flaviojose2003igcombr

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

152

exemplo em muitos municiacutepios natildeo eacute cobrado e quando cobrado os imoacuteveis possuem os valores ve-

nais desatualizados enquanto a contribuiccedilatildeo de melhoria raramente eacute cobrada

Conjuntamente ao descaso dos governantes a populaccedilatildeo natildeo demonstra consciecircncia tributaacute-

ria falta educaccedilatildeo fiscal em cada um dos contribuintes brasileiros e tal situaccedilatildeo compromete a res-

ponsabilidade de arrecadar os tributos Aleacutem disso as administraccedilotildees puacuteblicas municipais possuem

dificuldades de estruturar Secretarias de Financcedilas muitas vezes o que seria arrecadado da populaccedilatildeo

natildeo justificaria os gastos materiais e o desgaste poliacutetico

O objetivo deste artigo entatildeo eacute investigar a influecircncia dos fatores econocircmicos (variaacuteveis ex-

plicativas) no incremento da arrecadaccedilatildeo da contribuiccedilatildeo de melhoria pelos municiacutepios brasileiros no

ano de 2009

A metodologia de pesquisa utilizada eacute em um primeiro momento bibliograacutefica e em seguida

satildeo utilizados os recursos da Econometria Apoacutes os resultados obtidos do modelo o coeficiente de

determinaccedilatildeo R2 mostra o quanto da variaccedilatildeo total da arrecadaccedilatildeo eacute explicado pela reta de regressatildeo

dos miacutenimos quadrados ordinaacuterios (MQO) Em siacutentese o poder explicativo do modelo economeacutetrico

foi 2425 indicando uma significativa influecircncia dos fatores econocircmicos Tambeacutem eacute essencial conhe-

cer quais as causas do desprezo pela contribuiccedilatildeo de melhoria no Brasil Esse conhecimento torna-se

fundamental para a construccedilatildeo de poliacuteticas voltadas para a elevaccedilatildeo da arrecadaccedilatildeo com o objetivo

de assegurar os recursos que compatibilizem as receitas obtidas com as despesas praticadas

Aleacutem desta seccedilatildeo introdutoacuteria o trabalho eacute dividido em trecircs toacutepicos Inicialmente satildeo apresen-

tadas as consideraccedilotildees gerais sobre a contribuiccedilatildeo de melhoria no Brasil sob o enfoque legislativo

Em seguida trata-se da anaacutelise prospectiva do referido tributo O terceiro toacutepico apresenta a anaacutelise

economeacutetrica e o modelo utilizado para estimaccedilatildeo dos paracircmetros das variaacuteveis explicativas Por fim

as consideraccedilotildees finais limitaccedilotildees e recomendaccedilotildees para trabalhos futuros

1 CONSIDERACcedilOtildeES SOBRE A CONTRIBUICcedilAtildeO DE MELHORIA E AS DIFICULDADES NA SUA IMPLEMENTACcedilAtildeO

A contribuiccedilatildeo de melhoria eacute uma espeacutecie tributaacuteria que possui como base imponiacutevel a valori-

zaccedilatildeo imobiliaacuteria decorrente de obra puacuteblica estando contemplada no artigo 145 inciso III da Consti-

tuiccedilatildeo Federal de 1988 Destaque-se ainda que o referido tributo foi disciplinado nos artigos 81 e 82

do Coacutedigo Tributaacuterio Nacional (CTN) e regulamentado pelo Decreto-Lei 195 de 1967

Deve-se observar que o CTN respalda a cobranccedila da contribuiccedilatildeo pela necessidade da indeni-

zaccedilatildeo do contribuinte ao ente poliacutetico em consequecircncia dos custos da obra dos valores gastos con-

forme prevecirc seu artigo 81

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

153

Art 81 A contribuiccedilatildeo de melhoria cobrada pela Uniatildeo pelos Estados pelo Distrito Federal ou pelos municiacutepios no acircmbito de suas respectivas atribuiccedilotildees eacute instituiacuteda para fazer face ao custo de obras puacuteblicas de que decorra valorizaccedilatildeo imobiliaacuteria ten-do como limite total a despesa realizada e como limite individual o acreacutescimo de valor que da obra resultar para cada imoacutevel beneficiado

O Decreto-Lei 19567 por sua vez respalda a cobranccedila da contribuiccedilatildeo pela valorizaccedilatildeo imo-

biliaacuteria consoante se verifica em seu artigo 1ordm ldquoA Contribuiccedilatildeo de Melhoria prevista na Constituiccedilatildeo

Federal tem como fato gerador o acreacutescimo do valor do imoacutevel localizado nas aacutereas beneficiadas di-

reta ou indiretamente por obras puacuteblicasrdquo

A legitimidade da contribuiccedilatildeo de melhoria em decorrecircncia do Decreto-Lei 1951967 foi ques-

tionada poreacutem segundo o Supremo Tribunal Federal (STF) a Suacutemula 496 editada ainda sobre a eacutegide

de ordem constitucional anterior o tributo eacute legiacutetimo no ordenamento juriacutedico brasileiro

STF Suacutemula nordm 496 - 03121969 Satildeo vaacutelidos porque salvaguardados pelas disposiccedilotildees constitucionais transitoacuterias da Constituiccedilatildeo Federal de 1967 os decretos-leis expedidos entre 24 de janeiro e 15 de marccedilo de 1967

Pela definiccedilatildeo a contribuiccedilatildeo de melhoria eacute um tributo cobrado quando uma obra puacuteblica valo-

riza um imoacutevel particular Sua utilizaccedilatildeo no ordenamento juriacutedico brasileiro eacute antiga segundo registros

de Gomide (2009) tendo os primeiros indiacutecios da contribuiccedilatildeo de melhoria ocorridos no Brasil Impeacute-

rio em 1812 com a imposiccedilatildeo das fintas2 para a edificaccedilatildeo de obras puacuteblicas na Bahia e em 1818

com a determinaccedilatildeo das fintas para o reparo de vaacuterias pontes no Municiacutepio de Mariana ndash MG

Esse tributo eacute bastante justo e sua aparente complexidade natildeo pode inibir a busca de soluccedilotildees

para o caso de sua subutilizaccedilatildeo no meio fazendaacuterio A atividade de arrecadaccedilatildeo da contribuiccedilatildeo de

melhoria natildeo eacute simples cabendo destacar que tal processo arrecadatoacuterio passa por um conjunto de

dificuldades que impregnam o referido tributo no contexto da legislaccedilatildeo fiscal tornando seu entendi-

mento e operacionalizaccedilatildeo uma tarefa complexa

A questatildeo da valorizaccedilatildeo imobiliaacuteria decorrente dos investimentos puacuteblicos como fato gerador

interage com os aparelhamentos teacutecnicos de outros profissionais alheios ao fisco3 A cobranccedila da con-

tribuiccedilatildeo de melhoria eacute uma questatildeo complexa tendo em vista os vaacuterios requisitos previstos na norma

O Decreto-Lei 19567 por exemplo exige para a cobranccedila do tributo que a Administraccedilatildeo compe-

tente publique o edital contendo entre outros os seguintes elementos delimitaccedilatildeo das aacutereas direta

e indiretamente beneficiadas e a relaccedilatildeo dos imoacuteveis nelas compreendidos memorial descritivo do

projeto orccedilamento total ou parcial do custo das obras determinaccedilatildeo da parcela do custo das obras a

2 Fintas eacute o mesmo que imposto tributo contribuiccedilatildeo puacuteblica poreacutem sem frequecircncia de uso SENIOR (1882 p 101) 3 O art 9ordm da Lei que dispotildee sobre a contribuiccedilatildeo de melhoria no Cearaacute Lei nordm 154842013 indica ldquoOs valores referidos no caput deste artigo seratildeo estabelecidos em avaliaccedilatildeo efetuada por comissatildeo composta por representantes de oacutergatildeos puacuteblicos nos termos definidos em decreto regulamentarrdquo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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ser ressarcida pela contribuiccedilatildeo com o correspondente plano de rateio entre os imoacuteveis beneficiados

Haacute ainda outras exigecircncias o que torna sua operacionalizaccedilatildeo trabalhosa

Chiara (2006) mostra que a contribuiccedilatildeo de melhoria eacute um tributo ainda pouco explorado no

Brasil Essa constataccedilatildeo eacute reforccedilada especialmente no Cearaacute pois a Secretaria da Fazenda Estadual (Se-

faz) nada arrecada com essa competecircncia tributaacuteria O artigo 3ordm da Lei Estadual 154842013 diz que a

contribuiccedilatildeo de melhoria seraacute exigida para fazer face a seus custos

Parece que a influecircncia legal eacute muito pequena e conforme Machado (2007) a realidade tem de-

monstrado que de forma geral a contribuiccedilatildeo de melhoria pouco ou nada vem rendendo ao eraacuterio

raras e esparsas satildeo as notiacutecias da sua utilizaccedilatildeo o que contribui para o agravamento de uma situaccedilatildeo

comum no ordenamento juriacutedico paacutetrio a transformaccedilatildeo dos diplomas legais em simples repertoacuterios

de dispositivos ineficazes e de pouca efetividade

As obras puacuteblicas satildeo iniciadas e concretizadas em decorrecircncia de interesse puacuteblico e natildeo de

interesse particular assim toda a sociedade em tese eacute beneficiada com a concretizaccedilatildeo do gasto

puacuteblico Apressadamente poder-se-ia concluir que toda a populaccedilatildeo estaria beneficiada de forma

isonocircmica e que todos contribuiacuteram indiretamente via impostos com os gastos decorrentes poreacutem

natildeo eacute isso que ocorre Algumas obras puacuteblicas beneficiam diretamente algumas pessoas valorizando

diretamente seus imoacuteveis Nesse sentido Paulsen (2004) justifica o seu pagamento pelo princiacutepio do

enriquecimento sem causa Daiacute a razatildeo da existecircncia do tributo competecircncia concedida aos entes

poliacuteticos para tributar os particulares diretamente beneficiados pela concretizaccedilatildeo da obra puacuteblica

Essa espeacutecie tributaacuteria objetiva um senso de justiccedila no sentido de distribuir os ocircnus de algu-

mas obras puacuteblicas tipificadas na norma para pessoas adjacentes diretamente beneficiadas Machado

(2007 p 139) comenta a respeito

Por isso ao falar-se da funccedilatildeo da contribuiccedilatildeo de melhoria eacute importante esclarecer que ao lado da funccedilatildeo arrecadatoacuteria tem ela uma importantiacutessima funccedilatildeo redistribu-tiva funccedilatildeo que aliaacutes lhe confere especificidade Natildeo fora sua especial funccedilatildeo como instrumento destinado a retirar dos proprietaacuterios de imoacuteveis o incremento de valor destes decorrente da obra puacuteblica natildeo teria ela razatildeo de ser no sistema tributaacuterio

Bastos (1990) entende que a contribuiccedilatildeo de melhoria eacute possivelmente a espeacutecie tributaacuteria mais

justa Paga aquele que dela se beneficiar nos limites dos custos que a obra puacuteblica utilizou Aqui deve

ser lembrado o instituto da imputaccedilatildeo do pagamento4 que ocorre quando o contribuinte possui mais

de um deacutebito perante o fisco em que a contribuiccedilatildeo de melhoria prevaleceraacute sobre as taxas e impos-

4 CTN - ldquoArt 163 Existindo simultaneamente dois ou mais deacutebitos vencidos do mesmo sujeito passivo para com a mesma pessoa juriacutedica de direito puacuteblico relativos ao mesmo ou a diferentes tributos ou provenientes de penalidade pecuniaacuteria ou juros de mora a autoridade administrativa competente para receber o pagamento determinaraacute a respectiva imputaccedilatildeo obedecidas as seguintes regras na ordem em que enumeradas I - em primeiro lugar aos deacutebitos por obrigaccedilatildeo proacutepria e em segundo lugar aos decorrentes de responsabilidade tributaacuteria II - primeiramente agraves contribuiccedilotildees de melhoria depois agraves taxas e por fim aos impostos []rdquo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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tos (deveraacute ser paga antes desses) pelo fato de possuir um alto grau de retributividade Desta forma

deveraacute ser paga com prioridade a fim de evitar o enriquecimento sem causa

Biava (1994 p 2) encontra reforccedilo para a cobranccedila da contribuiccedilatildeo de melhoria

Entre as alternativas factiacuteveis para a Uniatildeo os Estados e os municiacutepios existe uma potencialidade efetiva tradicionalmente inaproveitada mas que poderaacute ser impor-tante instrumento para cobrir os crescentes custos de implantaccedilatildeo de serviccedilos que demandem a execuccedilatildeo de obras Trata-se da contribuiccedilatildeo de melhoria instrumento tributaacuterio jaacute disponiacutevel constitucionalmente haacute mais de meio seacuteculo persistentemen-te desprezado

Tem-se farta literatura juriacutedica sobre o assunto contudo do ponto de vista econocircmico os tra-

balhos satildeo escassos e isso natildeo passou despercebido por Biava (1986 p 18)

Observa-se assim que o conjunto de trabalhos acadecircmicos teoacutericos e tambeacutem os que visavam sua aplicaccedilatildeo no Brasil caracteriza-se pela ecircnfase nos aspectos juriacutedicos e pragmaacuteticos com poucas referecircncias a elementos vinculados agrave aacuterea econocircmica Estes aspectos encontrados muito esparsamente na literatura mundial satildeo apresentados de forma sinteacutetica em pesquisa publicada pelo Banco Interamericano de Desenvolvi-mento

O pouco ou nenhum uso do tributo contribuiccedilatildeo de melhoria gera um grande desperdiacutecio da

base tributaacuteria o que seria de enorme importacircncia nos projetos das gestotildees puacuteblicas municipais De-

veria ser cobrada mas verdadeiramente natildeo eacute essa postura das autoridades fazendaacuterias jaacute eacute esperada

porque muitos contribuintes que estariam no acircmbito da incidecircncia possuem influecircncia no meio poliacute-

tico afastando a cobranccedila que recairia sobre eles mesmos

Conforme ensina Machado (2011) essa espeacutecie tributaacuteria a contribuiccedilatildeo de melhoria natildeo tem

sido exigida no Brasil por causa da exigecircncia legal de publicaccedilatildeo do orccedilamento da obra tendo o

contribuinte o direito de impugnar o respectivo valor Enfatiza o autor que as obras puacuteblicas satildeo geral-

mente contratadas por valores superfaturados praticados acima dos indicados no mercado de sorte

que a transparecircncia natildeo eacute conveniente para a Administraccedilatildeo e muito menos para as empresas que

contratam com o Estado para finalizar as obras puacuteblicas A verdadeira razatildeo para a natildeo instituiccedilatildeo da

contribuiccedilatildeo de melhoria consoante Machado (2011) eacute a necessidade da transparecircncia aparentemen-

te rejeitada pelos administradores puacuteblicos

Observando como exemplo o Estado do Cearaacute e levando em consideraccedilatildeo os demais tributos

de competecircncia estadual essa espeacutecie tributaacuteria natildeo repercute significativamente na arrecadaccedilatildeo A

omissatildeo na cobranccedila da contribuiccedilatildeo de melhoria torna a lei estadual que dispotildee sobre o tributo5 uma

letra morta desconsiderando abertamente o trabalho da Casa Legislativa Eacute omissatildeo sem justificativa

existe a lei deve ser cumprida A ausecircncia da taxaccedilatildeo eacute puramente de ordem poliacutetica a despeito da sua

5 Lei Estadual nordm 15484 de 20 de dezembro de 2013 que dispotildee sobre a contribuiccedilatildeo de melhoria em obras estaduais

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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importacircncia para as receitas de um Estado pobre como o Cearaacute Tanto eacute assim que Nascimento (2001)

registra que o artigo 11 da LRF incorpora regra da doutrina administrativa e como tal obriga o agente

puacuteblico a cumprir em toda a sua plenitude o mandato que lhe eacute conferido pela sociedade Tenta evitar

as atitudes fisioloacutegicas tatildeo comuns na poliacutetica brasileira assentadas na maacutexima religiosa que ganhou

certa notoriedade consistente no ldquoeacute dando que se receberdquo numa utilizaccedilatildeo deturpada e caricaturada

do princiacutepio consagrado pela crenccedila popular Nesse sentido eacute o entendimento de Mota (2005 p 787)

ldquoO texto busca coibir as indevidas e demagoacutegicas isenccedilotildees de tributos que se verificam nas instacircncias

federativas a exemplo inexigecircncia de IPTU Municipalrdquo

A redaccedilatildeo enfatiza um princiacutepio assente na doutrina do Direito Administrativo que eacute a indispo-

nibilidade do bem puacuteblico o Estado natildeo pode abrir matildeo de suas prerrogativas devendo exercer toda

a extensatildeo de sua competecircncia tributaacuteria incluindo a eficiecircncia na arrecadaccedilatildeo

Como ensina Pinheiro (2003) a injusticcedila do sistema de benefiacutecios fiscais eacute evidente ateacute para

o governo mas nada se faz para mudar a situaccedilatildeo A renuacutencia fiscal favorece na maioria das vezes a

quem menos dela necessita a injusticcedila eacute evidente e demonstrada pelo governo Natildeo eacute realizada uma

distribuiccedilatildeo dos benefiacutecios favorecendo as regiotildees mais necessitadas do Estado O governo para isso

teria de enfrentar lobbies com bom apoio no Legislativo e provavelmente no proacuteprio Executivo Como

resultado perpetuam-se as regiotildees inseridas nos bolsotildees de pobreza enquanto regiotildees desenvolvidas

tecircm acesso a benefiacutecios de que natildeo precisam6

Como percebido por Locircbo (2012) quando a atuaccedilatildeo do Estado consiste na execuccedilatildeo de uma

obra puacuteblica duas consequecircncias podem acontecer o incremento do valor dos imoacuteveis circunvi-

zinhos ou a desvalorizaccedilatildeo daqueles preacutedios Esta uacuteltima hipoacutetese menos comum rende ensejo

agrave reparaccedilatildeo econocircmica a primeira mais frequente reclama a absorccedilatildeo da mais-valia pelo Poder

Puacuteblico Se o Estado por meio do instrumento adequado natildeo chamar para si a ldquomais valiardquo estaraacute

desatendendo o princiacutepio da igualdade Nesse sentido vale destacar uma decisatildeo judicial que res-

palda esse entendimento7

A LRF introduz uma exigecircncia legal na gestatildeo das financcedilas puacuteblicas apoiada pela respon-

sabilidade dos gestores puacuteblicos de todos os poderes demonstrando um avanccedilo no cuidado que a

Administraccedilatildeo Puacuteblica deve reservar aos recursos que os contribuintes entregam ao eraacuterio Afinal a

LRF instituiu condiccedilotildees fixou limites e estabeleceu demonstrativos com o objetivo de ter um maior

controle no acompanhamento e transparecircncia dos recursos puacuteblicos

6 Eacute uma omissatildeo inaceitaacutevel porque o artigo 3ordm da Lei que dispotildee sobre a contribuiccedilatildeo de melhoria no Cearaacute Lei 154842013 eacute claro ao determinar a tributaccedilatildeo natildeo deixando margem para a sua discricionariedade fato presente tam-beacutem na legislaccedilatildeo anterior7 (18486) EXECUCcedilAtildeO FISCAL CONTRIBUICcedilAtildeO DE MELHORIA Sendo o fato gerador do tributo a valorizaccedilatildeo produzida no imoacutevel pela obra puacuteblica (calccedilamento) o ressarcimento pelo beneficiaacuterio eacute devido sob pena de enriquecimento iliacutecito (Apelaccedilatildeo Ciacutevel e Reexame Necessaacuterio nordm 196054761 2ordf Cacircmara Ciacutevel do TARS Campo Bom Rel Marco Aureacutelio dos Santos Caminha Apelante Municiacutepio de Campo Bom Apelado Jorge Jair Schuch j 220896)

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De acordo com a Secretaria do Tesouro Nacional em 1997 apenas 18 dos municiacutepios brasi-

leiros cobravam essa espeacutecie de receita proacutepria Comentando o artigo 11 da Lei de Responsabilidade

Fiscal os autores afirmamO artigo obriga os entes a instituir e arrecadar os tributos de sua competecircncia Trata--se para muitos de uma norma inconstitucional posto que a Carta Magna ao dispor sobre competecircncias tributaacuterias o faz no sentido de outorgaacute-las Portanto estaria ao alvedrio do ente instituir ou natildeo o tributo No entanto a regra eacute taxativa instituir e cobrar todos os tributos de sua competecircncia Caso essa norma seja levada a termo a Uniatildeo seria obrigada a instituir e cobrar o imposto sobre grandes fortunas que eacute de previsatildeo constitucional (FIGUEIREDO et al 2001 p 92)

Dessa forma referindo-se ao mesmo artigo 11 da LRF Toledo Jr e Rossi (2005) afirmam que a

contribuiccedilatildeo de melhoria eacute tributo muito pouco explorado pela unidade local de governo

2 ANAacuteLISE PROSPECTIVA

Este trabalho utiliza dados transversais do ano de 2009 objetivando realizar uma anaacutelise pros-

pectiva que permite investigar a influecircncia das variaacuteveis econocircmicas na arrecadaccedilatildeo da contribuiccedilatildeo

de melhoria

O modelo utiliza uma amostra de municiacutepios que tecircm em comum valores arrecadados da con-

tribuiccedilatildeo de melhoria em 2009 Dessa forma pode-se observar a maneira como a presenccedila dos fatores

econocircmicos (cota IPVA cota FPM populaccedilatildeo entre outros) influencia a arrecadaccedilatildeo desse tributo As

conclusotildees obtidas a partir dos dados dos municiacutepios que arrecadam a contribuiccedilatildeo de melhoria po-

dem influenciar os gestores dos 791 dos municiacutepios que natildeo cobram o tributo

Foram testados no modelo como variaacutevel explicativa o PIB de 2008 e o PIB de 2009 todavia

se mostraram estatisticamente insignificantes e foram retirados Eacute consenso que o PIB contribui para o

aumento da arrecadaccedilatildeo tal variaacutevel eacute uma das responsaacuteveis por captar o efeito da base tributaacuteria so-

bre a arrecadaccedilatildeo Consequentemente uma maior base propicia uma maior arrecadaccedilatildeo Poreacutem isso

natildeo eacute realidade com a contribuiccedilatildeo de melhoria na praacutetica haacute casos que derrubam tal entendimento

Por exemplo em 2009 o municiacutepio de Satildeo Paulo com um PIB de R$ 188 milhotildees arrecadou apenas R$

500614 enquanto municiacutepios com PIB moderado arrecadaram valores expressivos

Todos os municiacutepios estatildeo expostos aos fatores econocircmicos todavia somente alguns arreca-

dam o tributo O problema natildeo estaacute nesses fatores econocircmicos porque duacutevidas natildeo existem que sem

eles natildeo haacute base tributaacuteria para a cobranccedila da contribuiccedilatildeo de melhoria

A razatildeo da maioria dos municiacutepios natildeo cobrarem o tributo eacute a mesma da Uniatildeo natildeo cobrar o

Imposto sobre Grandes Fortunas bem como da Uniatildeo natildeo ter interesse no Imposto Territorial Rural

tanto eacute assim que delega a capacidade tributaacuteria ativa desse imposto aos municiacutepios caso queiram

Razotildees satildeo muitas e de cunho poliacutetico Por exemplo poderaacute ser questionado que esse tributo traz mais

prejuiacutezo que benefiacutecio ao Sistema Tributaacuterio Nacional eacute um retrocesso falar na instituiccedilatildeo e cobranccedila

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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de mais um tributo quando se espera a qualquer momento uma reforma tributaacuteria os recordes de ar-

recadaccedilatildeo satildeo constantes aumento de superaacutevit primaacuterio ano a ano tudo isso sem uma poliacutetica firme

de redistribuiccedilatildeo de riqueza entatildeo para que mais um tributo para aumentar a carga tributaacuteria dos

contribuintes

De todo modo acredita-se que o foco deveraacute ser no futuro o crescimento da arrecadaccedilatildeo

desse tributo prevendo-o de forma diferente da situaccedilatildeo atual de omissatildeo da maioria dos municiacutepios

Segue quadro com as participaccedilotildees das contribuiccedilotildees de melhoria municipais em suas respectivas

regiotildees bem como os percentuais dos municiacutepios que arrecadaram esse tributo em 2009

Quadro - Arrecadaccedilatildeo da Contribuiccedilatildeo de Melhoria por Regiatildeo Estados e municiacutepios em 2009

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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Por isso pode-se observar que os municiacutepios brasileiros participam muito pouco em todas as

regiotildees da configuraccedilatildeo da arrecadaccedilatildeo da contribuiccedilatildeo de melhoria Essa constataccedilatildeo eacute mais eviden-

te nas regiotildees Norte e Nordeste especialmente nessa uacuteltima meacutedia de 717 bem inferior a nacional

que foi 2124 Os municiacutepios da regiatildeo Sul satildeo os mais ativos na arrecadaccedilatildeo tributaacuteria com desem-

penho acima da meacutedia nacional apresentando o percentual de 4431 por outro lado os percentuais

da regiatildeo Centro-Oeste e Sudeste giraram em torno de 209 e 2142 respectivamente Resta claro

que satildeo percentuais longe do ideal contudo indicam para os municiacutepios omissos na cobranccedila a pos-

sibilidade da arrecadaccedilatildeo da contribuiccedilatildeo de melhoria

Percebe-se que ainda precisa ser feito muito mais para o ajustamento da gestatildeo puacuteblica mu-

nicipal principalmente as gestotildees municipais do Norte e Nordeste brasileiro as quais mostram ar-

recadaccedilotildees longe da meacutedia nacional As administraccedilotildees municipais precisam expandir os potenciais

de arrecadaccedilatildeo especialmente o da contribuiccedilatildeo de melhoria Um bom comeccedilo seria seguir a praacutetica

dos governos locais da regiatildeo Sul do Brasil importando essas boas praacuteticas Igualmente os gestores

municipais devem implantar um preciso controle das bases tributaacuterias como eacute o caso da perioacutedica

atualizaccedilatildeo cadastral dos imoacuteveis em seus territoacuterios

3 ANAacuteLISE ECONOMEacuteTRICA

Uma maneira bastante conveniente para expressar o comportamento de um conjunto de va-

riaacuteveis sobre uma variaacutevel qualquer eacute o Modelo Claacutessico de Regressatildeo Linear (MCRL) Esse meacutetodo

oferece um conjunto de propriedades que garante de forma eficiente e consistente a estimaccedilatildeo da

contribuiccedilatildeo de cada variaacutevel explicativa sobre uma variaacutevel dependente Dessa forma partindo dos

objetivos apresentados neste trabalho esta pesquisa manuseia uma estrutura de dados em cortes

transversais8 para 1149 municiacutepios brasileiros no ano de 2009 e estima-se o seguinte modelo em sua

8 Variaacuteveis explicativas estaacuteticas no tempo retiradas de um uacutenico periacuteodo de tempo no caso 2009

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

160

forma geral Yi = szligo + szlig1X1i + szlig2X2i + + szligkXki + εi (1)

onde Yi eacute a variaacutevel dependente Xki satildeo as variaacuteveis explicativas szligk satildeo os paracircmetros a serem

estimados εi eacute o erro do modelo

Especificamente o modelo eacute descrito da seguinte forma

RTi = szlig0 + szlig1fndei + szlig2fpmi + szlig3popui + szlig4cidei + szlig5ifdmi + szlig6ipvai + szlig7itrui + εi (2)

onde RTi eacute a receita da contribuiccedilatildeo de melhoria do municiacutepio i fndei eacute o valor repassado pelo

Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educaccedilatildeo ao municiacutepio i fpmi eacute o valor repassado pelo Fundo

de Participaccedilatildeo dos Municiacutepios ao municiacutepio i popui eacute a populaccedilatildeo total do municiacutepio i cidei eacute o valor

da Contribuiccedilatildeo de Intervenccedilatildeo do Domiacutenio Econocircmico transferido ao municiacutepio i ifdmi eacute o iacutendice

Firjan de desenvolvimento municipal do municiacutepio i ipvai eacute a cota do IPVA transferida ao municiacutepio i

itrui eacute o valor do imposto sobre a propriedade territorial rural do municiacutepio i εi eacute o termo de erro

Os paracircmetros correspondentes de cada uma das variaacuteveis explicativas apresentam seus acreacutes-

cimos ou decreacutescimos na mensuraccedilatildeo da variaacutevel dependente estudada A Tabela 1 em seguida apre-

senta os resultados da regressatildeo proposta A Tabela 2 mostra as estatiacutesticas descritivas das variaacuteveis

Tabela 1 - resultados da regressatildeo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

161

Tabela 2 - Estatiacutesticas descritivas

31 Interpretando os resultados

Diante dos resultados a hipoacutetese nula foi rejeitada para todos os coeficientes do modelo ao niacute-

vel de significacircncia de 10 Desta forma as estimativas destacam que as variaacuteveis incluiacutedas no modelo

afetaram de forma individual a arrecadaccedilatildeo da contribuiccedilatildeo de melhoria

Ademais atraveacutes da estatiacutestica F pode-se afirmar que conjuntamente as variaacuteveis explicativas

utilizadas provocaram mudanccedilas nos valores arrecadados a tiacutetulo de contribuiccedilatildeo de melhoria Ao

niacutevel de significacircncia de 1 as variaacuteveis explicativas afetaram conjuntamente o comportamento das

receitas provenientes desse tributo

O coeficiente de determinaccedilatildeo R2 mostra o quanto da variaccedilatildeo total da arrecadaccedilatildeo eacute explica-

do pela reta de regressatildeo de MQO Assim pode-se dizer que 2425 da variaccedilatildeo da contribuiccedilatildeo de

melhoria em torno da sua meacutedia satildeo explicadas pelo modelo considerado

311 Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educaccedilatildeo

A influecircncia do FNDE na arrecadaccedilatildeo da contribuiccedilatildeo de melhoria eacute significativa A cada R$

600 mil de receita recebida para aplicaccedilatildeo na educaccedilatildeo estima-se um decreacutescimo na arrecadaccedilatildeo do

tributo em R$ 306 mil Quanto mais recursos advindos de outro ente poliacutetico menor o interesse do

Municiacutepio na tributaccedilatildeo consequentemente menor o desgaste poliacutetico diante do eleitorado

312 Fundo de Participaccedilatildeo dos Municiacutepios

Constatou-se que esse tipo de transferecircncia governamental aos municiacutepios brasileiros exerce

influecircncia negativa sobre a arrecadaccedilatildeo tributaacuteria Verifica-se que quanto maior o volume de recursos

repassados aos municiacutepios via FPM menor a necessidade de auferir receita proacutepria para realizaccedilatildeo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

162

de suas atividades Quando as receitas de uma municipalidade possuem grande dependecircncia dessa

transferecircncia os governos locais acabam por natildeo explorar suas bases e assim exercem um baixo niacutevel

de esforccedilo fiscal Diante disso da mesma forma que o FNDE a influecircncia do FPM na arrecadaccedilatildeo da

contribuiccedilatildeo de melhoria foi negativa A cada milhatildeo de receita recebida desse fundo estima-se um

decreacutescimo na arrecadaccedilatildeo do tributo em R$ 320

313 Populaccedilatildeo

Note-se que a variaacutevel populaccedilatildeo eacute uma proxy que capta o tamanho da base tributaacuteria Quan-

to maior a base tributaacuteria maior seraacute o potencial de arrecadaccedilatildeo assim era esperado que tal variaacutevel

explicativa influenciasse positivamente a arrecadaccedilatildeo De fato um maior contingente populacional

condiz com uma base tributaacuteria mais elevada e assim possui um efeito marginal positivo sobre a ar-

recadaccedilatildeo da contribuiccedilatildeo de melhoria Tal fato pode ser observado pelo sinal positivo do paracircmetro

estimado para variaacutevel populaccedilatildeo

314 Contribuiccedilatildeo de Intervenccedilatildeo no Domiacutenio Econocircmico

O efeito positivo da variaacutevel Cide jaacute era previsto no modelo Estaacute se tratando de uma trans-

ferecircncia governamental obrigatoacuteria contudo de uso condicional em investimento de infra-estrutura

de transporte e sem contrapartida Deduz-se entatildeo que como os recursos satildeo condicionados para

investimentos de infra-estrutura de transporte resta pouca manipulaccedilatildeo poliacutetica de tais recursos O

fato eacute que a construccedilatildeo de estradas e obras semelhantes eacute fato gerador da contribuiccedilatildeo de melhoria

portanto quanto mais recursos da Cide - Combustiacutevel no Municiacutepio mais obras no setor de transporte

e daiacute o reflexo no paracircmetro positivo em 0098 A cada R$ 50 mil recebido pelo municiacutepio estima-se

que a arrecadaccedilatildeo da contribuiccedilatildeo de melhoria cresccedila R$ 49 mil

315 Iacutendice Firjan de Desenvolvimento Municipal

Esperava-se que o iacutendice Firjan contribuiacutesse positivamente porque quanto mais investimentos

municipais mais recursos satildeo necessaacuterios para o custeio desses serviccedilos puacuteblicos Assim o gestor puacute-

blico natildeo pode desprezar a arrecadaccedilatildeo da contribuiccedilatildeo de melhoria O resultado da contribuiccedilatildeo do

iacutendice Firjan para a arrecadaccedilatildeo foi positiva O paracircmetro positivo mostra que existe uma relaccedilatildeo entre

arrecadaccedilatildeo da contribuiccedilatildeo e o IFDM

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

163

316 Imposto de Propriedade de Veiacuteculos Automotores

A influecircncia da cota do IPVA na arrecadaccedilatildeo da contribuiccedilatildeo de melhoria foi negativa confor-

me o presente modelo economeacutetrico O paracircmetro apresenta o coeficiente -0000937 ou seja a cada

recebimento de R$ 1 milhatildeo da cota IPVA a arrecadaccedilatildeo do tributo diminui em R$ 930 Essa receita

puacuteblica possui a caracteriacutestica da sazonalidade entra nos cofres puacuteblicos municipais no comeccedilo do

ano Tal como o FPM eacute uma transferecircncia governamental no caso do Estado que desestimula a arre-

cadaccedilatildeo de receita proacutepria daiacute a influecircncia negativa

317 Imposto Sobre a Propriedade Territorial Rural

A influecircncia do ITR na arrecadaccedilatildeo da contribuiccedilatildeo de melhoria foi positiva conforme o presen-

te modelo economeacutetrico O paracircmetro apresenta o coeficiente 0106912 ou seja a cada recebimento

de R$ 50 mil da cota ITR a arrecadaccedilatildeo do tributo aumenta em R$ 53 mil O ITR eacute um tributo de com-

petecircncia federal e a Uniatildeo demonstra natildeo se interessar pela arrecadaccedilatildeo tanto eacute assim que delega a

capacidade tributaacuteria ativa aos municiacutepios casos esses fiscalizem e arrecadem Eacute um tributo trabalhoso

e dispendioso sendo a arrecadaccedilatildeo prejudicada por questotildees poliacuteticas e tambeacutem teacutecnicas De iniacutecio

eacute preciso um cadastro nacional das propriedades rurais e na zona rural a disputa poliacutetica eacute muito acir-

rada de forma que quase natildeo se arrecada esse imposto Daiacute a influecircncia positiva da variaacutevel ou seja

para compensar a baixa arrecadaccedilatildeo do ITR resta lanccedilar matildeo da contribuiccedilatildeo de melhoria

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Foram analisadas as participaccedilotildees dos municiacutepios brasileiros na arrecadaccedilatildeo da contribuiccedilatildeo

de melhoria no ano de 2009 a partir de uma amostra de todos os municiacutepios que arrecadaram esse

tributo Apesar da previsatildeo na Constituiccedilatildeo Federal de 1988 artigo 145 III e exigecircncia da Lei de Res-

ponsabilidade Fiscal em poucos municiacutepios esse tributo eacute cobrado conforme constataccedilatildeo diante da

anaacutelise dos demonstrativos financeiros publicados pela Secretaria do Tesouro Nacional

A contribuiccedilatildeo de melhoria natildeo eacute nova no ordenamento juriacutedico brasileiro foi prevista jaacute na

Constituiccedilatildeo Federal de 1934 poreacutem ateacute hoje eacute mal aproveitada pelos fiscos municipais estaduais

distrital e federal Os artigos 12 e 13 do Decreto-Lei 1951967 jaacute possuem a previsatildeo de a Uniatildeo dele-

gar a capacidade tributaacuteria ativa aos municiacutepios estados e Distrito Federal demonstraccedilatildeo desde logo

do desinteresse pela arrecadaccedilatildeo desse tributo

Esse tributo existe para impedir o enriquecimento sem causa dos beneficiados diretamente

por uma obra puacuteblica possui entatildeo um elevado grau de justiccedila diante dos demais contribuintes que

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

164

financiaram as referidas obras Apoacutes a ediccedilatildeo da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) a boa gestatildeo

fiscal municipal possui como fundamento a efetiva arrecadaccedilatildeo de todos os tributos da competecircncia

do ente poliacutetico A LRF exige demonstraccedilotildees perioacutedicas das contas puacuteblicas receitas e despesas bem

como transparecircncia da gestatildeo puacuteblica dos entes poliacuteticos O artigo 14 da LRF inibe a renuacutencia de re-

ceita enquanto a Lei de Improbidade Lei 842992 alerta para a improbidade administrativa quando

o gestor puacuteblico age negligentemente na arrecadaccedilatildeo de tributo ou renda

Desse arrazoado induz-se o raciociacutenio de que a arrecadaccedilatildeo da contribuiccedilatildeo de melhoria eacute

explicada tambeacutem por razotildees teacutecnicas e poliacuteticas natildeo alcanccediladas pelo modelo economeacutetrico contri-

buindo consequentemente na diminuiccedilatildeo do poder explicativo do modelo utilizado neste trabalho

Assim a falta de cultura tributaacuteria desse tributo atrelada a razotildees teacutecnicas e poliacuteticas justifica o com-

portamento omissivo na cobranccedila por parte da maioria dos municiacutepios ou seja existe um trade-off entre a responsabilidade fiscal e o benefiacutecio poliacutetico advindo da omissatildeo na cobranccedila do tributo

Acredita-se que o foco deveraacute ser no futuro o crescimento da arrecadaccedilatildeo desse tributo diver-

gindo da situaccedilatildeo atual de omissatildeo da maioria dos municiacutepios Por fim entende-se que este trabalho

poderaacute ser utilizado para futuros planos de metas que pretendam inibir as mais diversas formas de

evasatildeo fiscal da contribuiccedilatildeo de melhoria a eficaacutecia tributaacuteria municipal poderaacute ser comparada com a

de outros municiacutepios que arrecadam o mesmo tributo Dessa forma poderaacute auxiliar os servidores fa-

zendaacuterios na programaccedilatildeo das accedilotildees fiscais de combate agrave evasatildeo fiscal tatildeo perniciosa para as poliacuteticas

puacuteblicas contribuindo assim com a promoccedilatildeo da cidadania fiscal

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

165

REFEREcircNCIAS

BASTOS Celso Ribeiro MARTINS Ives Gandra da Silva Comentaacuterios agrave Constituiccedilatildeo do Brasil (Pro-mulgada em 5 de outubro de 1988) V 6 Tomo I Art 145 a 156 Satildeo Paulo Saraiva 1990

BIAVA Adriano HR Contribuiccedilatildeo de Melhoria Necessidade de Inovaccedilatildeo Fiscal Tese de Doutorado Satildeo Paulo USP 1986

______ Contribuiccedilatildeo de Melhoria Capacidade Inaproveitada Artigo Satildeo Paulo USP 1994

CHIARA Rafael Gomes de A Contribuiccedilatildeo de Melhoria Razotildees de sua Pouca Utilizaccedilatildeo pelos Entes Federativos Monografia do Curso de Direito Florianoacutepolis UFSC 2006

FIGUEIREDO Carlos Mauriacutecio et al Comentaacuterios agrave Lei de Responsabilidade Fiscal 2 ed Satildeo Paulo Revista dos Tribunais 2001

GOMIDE Tainaacute Rodrigues A Aplicabilidade da Contribuiccedilatildeo de Melhoria Pela Administraccedilatildeo Puacute-blica Municipal Dissertaccedilatildeo de mestrado em AdministraccedilatildeoUniversidade Federal de Viccedilosa 2009

LOcircBO Marcelo Jatobaacute Uma Reflexatildeo sobre o exerciacutecio da Competecircncia para Instituir a Contribui-ccedilatildeo de Melhoria Disponiacutevel em wwwviajuridicacombr Acesso em 7 mai 2012

MACHADO Hugo de Brito Curso de Direito Tributaacuterio 32 ed Satildeo Paulo Malheiros 2011

______ Comentaacuterios ao Coacutedigo Tributaacuterio Nacional (Art 1ordm a 95) v I 2 Ed Satildeo Paulo Atlas 2007

MOTA Carlos Pinto Coelho Eficaacutecia nas Licitaccedilotildees e Contratos Doutrina Jurisprudecircncia e Legisla-ccedilatildeo 10 ed Belo Horizonte Del Rey 2005

NASCIMENTO Carlos Vaacutelder do MARTINS Ives Gandra da Silva (orgs) Comentaacuterios agrave Lei de Respon-sabilidade Fiscal Satildeo Paulo Saraiva 2001

PAULSEN Leandro Direito Tributaacuterio Constituiccedilatildeo e Coacutedigo Tribuutaacuterio agrave Luz da Doutrina e da Juris-prudecircncia Porto Alegre Livraria do Advogado 2004

PINHEIRO Fernando Antocircnio Franccedila Sette Renuacutencias Fiscais e Lei de Responsabilidade Fiscal o caso de Minas Gerais Monografia de Especializaccedilatildeo em Administraccedilatildeo Puacuteblica Belo Horizonte Fun-daccedilatildeo Joatildeo Pinheiro 2003

ROSSI Seacutergio Ciquera TOLEDO JUNIOR Flaacutevio C de Lei de Responsabilidade Fiscal 3 ed Satildeo Paulo NDJ 2005

SENIOR Augusto Teixeira de Freitas Vocabulaacuterio Juriacutedico Rio de Janeiro B L Garnier ndash Livreiro Editor 1882

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166

CIDADANIA FISCAL O DEVER FUNDAMENTAL DE PAGAR TRIBUTOS E OS DIREITOS FUNDAMENTAIS

SUMAacuteRIO Introduccedilatildeo 1 O dever fundamental de pagar tributos 11 O es-quecimento dos deveres e a hipertrofia dos direitos 12 Conceito e eficaacute-cia juriacutedica dos deveres fundamentais 13 O princiacutepio da solidariedade social como alicerce do dever fundamental de pagar tributos 2 A cidadania fiscal no Estado Democraacutetico de Direito 3 O combate agrave evasatildeo fiscal como condiccedilatildeo de exigibilidade dos deveres de cidadania Consideraccedilotildees finais Referecircncias

Marciano Buffon1

INTRODUCcedilAtildeO

O presente trabalho tem como objetivo principal traccedilar os contornos de uma concepccedilatildeo con-

temporaneamente adequada de cidadania fiscal a partir da compreensatildeo e aceitabilidade social do

dever fundamental de pagar tributos e do reconhecimento da sua importacircncia para realizaccedilatildeo dos di-

reitos fundamentais de cunho prestacional Tudo isso permeado pelo princiacutepio da solidariedade social

que fundamenta a Constituiccedilatildeo Brasileira

Em verdade natildeo haacute como exigir-se a concretizaccedilatildeo dos direitos fundamentais sem que haja em

contrapartida a contribuiccedilatildeo dos cidadatildeos para que tal intento seja alcanccedilado Ou seja natildeo haacute como

concretizar direitos fundamentais sem que haja o cumprimento por parte dos cidadatildeos de um dos

principais deveres de cidadania pagar tributos

Isso verifica-se por oacutebvio porque a realizaccedilatildeo dos direitos fundamentais especialmente aque-

les de cunho prestacional implica a assunccedilatildeo de um significativo ocircnus financeiro Ocorre que tal en-

cargo social vem sendo ldquoesquecidordquo pois uma parcela expressiva da sociedade restringe a concepccedilatildeo

de cidadania apenas agrave esfera dos direitos descurando da faceta obrigacional daquela

Assim o pilar da solidariedade ndash fundamento do modelo estatal vigente ndash sofre profundas

avarias e a sociedade perde-se em suas concepccedilotildees individualistas e egocecircntricas Por conseguinte o

ldquocidadatildeordquo sucumbe ao seu inimigo o ldquoindiviacuteduordquo como alertara Tocqueville

Passa-se entatildeo a analisar o dever fundamental de pagar tributos e o princiacutepio da solidariedade

social que o sustenta tendo em vista que uma compreensatildeo adequada dessa questatildeo precede a dis-

cussatildeo acerca da concretizaccedilatildeo dos direitos fundamentais

Enfim natildeo eacute por acaso que este trabalho tem como ponto de partida a anaacutelise do dever fun-

1 Doutor em Direito Puacuteblico pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos) Professor dos cursos de graduaccedilatildeo e Poacutes-Graduaccedilatildeo (Mestrado) em Direito da Unisinos Autor do Livro Tributaccedilatildeo e Dignidade Humana entre direitos e deveres fundamentais Advogado E-mail marcianolucinicombr

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

167

damental de pagar tributos e natildeo os tradicionais direitos fundamentais dos contribuintes Tal ocorre

porque antes de falar em direitos haacute de ter-se em mente os deveres pois em suma natildeo haacute como

sustentar a exigecircncia daqueles sem o cumprimento destes

1 O DEVER FUNDAMENTAL DE PAGAR TRIBUTOS

Na parte inicial deste trabalho aborda-se a questatildeo dos deveres fundamentais especificamen-

te o dever fundamental de pagar tributos no sentido de examinar as razotildees pelas quais os deveres

fundamentais caiacuteram em esquecimento paradoxalmente no mesmo periacuteodo histoacuterico de reafirmaccedilatildeo

consensual dos direitos fundamentais

11 O esquecimento dos deveres e a hipertrofia dos direitos

No periacuteodo poacutes-guerra houve uma crescente constitucionalizaccedilatildeo de direitos que passaram a

usufruir o status de direitos fundamentais Isso ocorreu especialmente em relaccedilatildeo aos direitos sociais

econocircmicos e culturais isto eacute os direitos fundamentais entendidos como de cunho prestacional os

quais passaram a ocupar um importante espaccedilo dentro de vaacuterias constituiccedilotildees democraacuteticas que sur-

giram naquele periacuteodo

Verificou-se entatildeo um fenocircmeno que pode ser denominado de ldquohipertrofia de direitos fun-

damentaisrdquo na medida em que as constituiccedilotildees passaram a consagrar formalmente uma expressiva

gama desses direitos sem que houvesse a devida preocupaccedilatildeo com a perspectiva de esses novos

direitos tornarem-se realidade

Isso ocorreu de uma forma tatildeo expressiva que autores como Casalta Nabais2 provocativa-

mente defendem ldquomenos direitos fundamentais em nome dos direitos fundamentaisrdquo ou seja de-

fendem que haja uma menor quantidade de direitos fundamentais e que estes tenham condiccedilotildees de

tornar-se algo real

A partir dessa maciccedila consagraccedilatildeo houve uma significativa preocupaccedilatildeo da doutrina e da

jurisprudecircncia no sentido de desenvolver estudos acerca desses denominados novos direitos De-

senvolveu-se assim uma soacutelida teoria acerca dos direitos sem que houvesse o correspondente

aprofundamento teoacuterico sobre a questatildeo dos deveres sociais Com isso daacute-se uma validaccedilatildeo ldquohistoacute-

rica da ideacuteia dos direitos humanos desvinculada da ideacuteia de dever e de valor na mentalidade social

2 Como menciona Casalta Nabais haacute constituiccedilotildees de 1ordf 2ordf e 3ordf linha As constituiccedilotildees de primeira linha consagram quatro ou cinco direitos fundamentais sendo que tais direitos satildeo efetivos e respeitados por todos as constituiccedilotildees de segunda linha consagram quinze a vinte direitos fundamentais e desses apenas quatro ou cinco satildeo respeitados e concretizados e haacute por fim as constituiccedilotildees de terceira linha aquelas que consagram uma gama enorme de direitos fundamentais os quais natildeo passam de promessas que iludem toda sociedade (Observaccedilatildeo feita em arguiccedilatildeo de defesa de tese de doutoramento ocorrida em 13 de janeiro de 2006 na Universidade de Coimbra)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

168

dos povos ocidentaisrdquo instalando-se paradoxalmente ldquoum processo de desmoralizaccedilatildeo da vida

puacuteblicardquo (ROBLES 2005 p 18)

Eacute certo que natildeo se pode afirmar que a construccedilatildeo de uma soacutelida teoria sobre os direitos funda-

mentais tenha sido algo negativo mesmo porque haacute um consenso acerca da importacircncia da concreti-

zaccedilatildeo dos direitos fundamentais para a maacutexima eficaacutecia do princiacutepio da dignidade da pessoa humana

O que se discute poreacutem eacute se a profusatildeo de novos direitos constitucionalmente positivados

natildeo resultou numa forma de banalizaccedilatildeo dos proacuteprios direitos fundamentais e se isso natildeo tem sido

um dos fatores que dificultam a realizaccedilatildeo daqueles direitos efetivamente imprescindiacuteveis de serem

concretizados com vistas a assegurar uma existecircncia digna a todos3

Enfim eacute evidente que se advoga aqui tese contraacuteria agrave concretizaccedilatildeo na plenitude de suas pos-

sibilidades dos direitos fundamentais Todavia natildeo eacute possiacutevel simplesmente esquecer que soacute seraacute

possiacutevel concretizaacute-los se houver o razoaacutevel cumprimento do principal dever de cidadania

Ocorre que inegavelmente a centralidade do debate sobre direitos fundamentais relegou para

um plano secundaacuterio e muitas vezes inexistente o espaccedilo destinado pela doutrina para o debate acer-

ca dos deveres fundamentais Tal verificou-se porque as proacuteprias constituiccedilotildees que foram generosas

quanto aos direitos quase natildeo trataram dos deveres ou ateacute mesmo silenciaram sobre eles

O processo de esquecimento dos deveres fundamentais mostra-se ldquomanifestamente visiacutevel

quando confrontado com o tratamento dispensado aos direitos fundamentais que dispotildeem hoje de

uma desenvolvida disciplina constitucional e de uma soacutelida construccedilatildeo dogmaacuteticardquo Isso explica-se

basicamente pelo ldquoambiente de militantismo antitotalitaacuterio e antiautoritaacuterio que se vivia quando da

aprovaccedilatildeo das atuais constituiccedilotildeesrdquo Trata-se de uma consequecircncia historicamente identificada com

um sentimento vivenciado apoacutes a retomada da democracia sendo que nas constituiccedilatildeo respectiva-

mente adotadas percebe-se uma ldquopreocupaccedilatildeo senatildeo mesmo a quase obsessatildeo de fazer vingar de

uma vez por todas a efetiva afirmaccedilatildeo e vigecircncia dos direitos fundamentaisrdquo (NABAIS 2004a p 673)

Enfim eacute inequiacutevoco que houve um cocircmodo abandono da ideia de dever social estimulada pelo

marcante individualismo do tempo contemporacircneo que empalideceu e fez tornar-se anacrocircnica a im-

prescindiacutevel solidariedade social Nos dias atuais o sentimento de dever apresenta-se de uma forma

tecircnue e tiacutemida enquanto o seu oposto ldquoo sentimento reivindicativo alcanccedila as maiores cotas de in-

tensidade Sob um ponto de vista eacutetico esse fenocircmeno traduz-se em um decreacutescimo da solidariedade

e em uma justificaccedilatildeo do hedonismordquo (ROBLES 2005 p 18) Como afirma Robles (2005 p 23-24) ldquoas

pessoas se sentem sentimo-nos portadores naturais de direitos que todos devem reconhecer e ao

3 Conforme explica Casalta Nabais (1998 p 997) ldquose se pretende evitar o risco da panjusfundamentalizaccedilatildeo e da conse-quente banalizaccedilatildeo dos direitos fundamentais impotildee-se um esforccedilo maior na concretizaccedilatildeo da ideia de fundamentalidade ancorado na dignidade da pessoa humana vinculando-a por exemplo agrave satisfaccedilatildeo de necessidades vitais ndash materiais e espirituais ndash constantes do ser humano e natildeo de meros desejos mais ou menos conjunturais claramente secundaacuterios e particulares que os cidadatildeos podem satisfazer com base exclusivamente no ordenamento ordinaacuteriordquo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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mesmo tempo dificilmente pensamos que pesam sobre noacutes mais deveres que aqueles necessaacuterios a

tornar nossa vida mais cocircmoda e interessanterdquo

Haacute de reconhecer-se todavia que nem sempre foi assim Houve um periacuteodo histoacuterico em que

os deveres fundamentais ocuparam um posto de significativo interesse tal qual se verificava em rela-

ccedilatildeo aos direitos Em Roma a Repuacuteblica era o reino da virtude cujo funcionamento dependia do cum-

primento por parte dos cidadatildeos de um certo nuacutemero de deveres servir a paacutetria votar ser solidaacuterio

aprender ldquoNeste sentido a teoria da cidadania republicana implicaria que um indiviacuteduo teria natildeo ape-

nas direitos mas tambeacutem deveresrdquo (CANOTILHO 2006 p 531)

Cabe observar que a Declaraccedilatildeo dos Direitos do Homem e do Cidadatildeo de 1789 jaacute consagra-

va expressamente trecircs do deveres fundamentais claacutessicos o dever de obediecircncia o dever de pagar

impostos e o dever de suportar a privaccedilatildeo da propriedade em caso de expropriaccedilatildeo por utilidade

puacuteblica Tais deveres foram consagrados na maioria dos documentos constitucionais do modelo de

estado liberal

A importacircncia dos deveres fundamentais reaparece fortemente nos regimes nacional-socialista

e comunista No regime nazista ldquoos deveres fundamentais dos cidadatildeos convertem-se em deveres

fundamentais dos membros do povo (dever de serviccedilo de poderes dever de trabalhar dever de defen-

der o povo)rdquo (CANOTILHO 2006 p 531) No regime sovieacutetico denominado de comunista ldquoos direitos

fundamentais eram tambeacutem relativizados pelos deveres fundamentais os indiviacuteduos tinham direitos

conexos com deveres o que nos quadros poliacuteticos dos ex-paiacuteses comunistas acabou por aniquilar os

direitos e hipertrofiar os deveresrdquo

Essas desastradas experiecircncias histoacutericas explicam a negligecircncia e o esquecimento dos deveres

fundamentais na medida em que deram ensejo a uma justificaacutevel desconfianccedila e receio quanto agrave am-

plitude dos poderes conferidos ao Estado para exigiacute-los Em vista disso as constituiccedilotildees surgidas no

poacutes-guerra chegaram ao extremo de sequer utilizarem o termo dever - como o fez a Lei Fundamental

Alematilde ndash ou quando o utilizaram reservaram um modesto tratamento diferentemente do generoso

espaccedilo com os quais foram contemplados os direitos ditos fundamentais (NABAIS 1998 p 986)

Aleacutem disso haacute de reconhecer-se que as constituiccedilotildees contemporacircneas (especialmente da Itaacutelia

Alemanha Portugal Espanha e Brasil) surgiram num periacuteodo poacutes-autoritarismo motivo pelo qual se

entende a ldquoquase-obsessatildeordquo por consagrar direitos e descurar deveres

No entanto as circunstacircncias contemporacircneas satildeo outras e a categoria dos deveres fundamen-

tais deve ser pensada como parte integrante do Estado Democraacutetico de Direito Se assim natildeo for o

debate rumaraacute para o ingecircnuo descompromissado e irreal cenaacuterio do ldquoparaiacuteso dos direitosrdquo no qual

se reclamam e cada vez mais se reconhecem formalmente novos direitos sem que se tenha a devida

preocupaccedilatildeo com o seu custo social e portanto sem que tais direitos tenham a perspectiva de divor-

ciarem-se da condiccedilatildeo de meras promessas4

4 Uma nota interessante dos movimentos de rua ocorridos no Brasil em julho de 2013 diz respeito justamente a isso De

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

170

A questatildeo dos deveres fundamentais natildeo pode continuar ocupando um espaccedilo tatildeo pouco

significativo na teoria constitucional pois isso implica um pacto de hipocrisia em que se faz de conta

que se tem direitos ndash dado que formalmente consagrados ndash e imagina-se que tais direitos possam ser

assegurados por um ente ldquosobrenaturalrdquo ndash Estado ndash esquecendo-se de que esse ente nada mais eacute do

que a soma de todos e natildeo o contraponto da sociedade

Com essa postura minimamente comprometida com a realidade natildeo restaraacute superado o de-

nominado ldquodilema tiacutepico de nossa eacutepocardquo segundo qual todos querem viver agraves custas do Estado mas

rejeitam a ideia de que este Estado possa financiar-se mediante arrecadaccedilatildeo de tributos Esquecem

pois que eacute o Estado que vive agrave custa de todos5

Por mais paradoxal que possa parecer agravequeles que concebem a cidadania apenas sob a face

dos direitos a proacutepria ideia de dignidade humana estaacute vinculada aos deveres fundamentais pois ela

ldquonatildeo consiste em cada um exigir seus direitos mas sobretudo consiste em cada um assumir seus

deveres como pessoa e como cidadatildeo e exigir de si mesmo seu cumprimento permanenterdquo (ROBLES

2005 p 123)

Agrave medida que as sociedades avanccedilam em direccedilatildeo a um complexo futuro torna-se imprescin-

diacutevel que uma concepccedilatildeo mais clara e precisa dos deveres e obrigaccedilotildees ganhe corpo e aceitabilidade

social Como lembra Haumlberle (2005 p 102) ldquotal componente encontra fundamento especialmente na

dimensatildeo comunitaacuteria da dignidade humana que em princiacutepio jaacute foi esporadicamente atualizada de-

vendo nessa medida tornar-se atual tal como os rsquolimites do crescimentorsquo do Estado social de Direito

tornaram necessaacuteria a proteccedilatildeo do meio ambienterdquo

Enfim essa hipertrofia dos direitos fundamentais paralelamente ao esquecimento dos deveres

fundamentais causa um nocivo efeito nas bases estruturais da sociedade pois a ideia de solidariedade

esvazia-se e paulatinamente frustram-se as expectativas de concretizaccedilatildeo daqueles direitos mais fun-

damentais justamente por parte daqueles que necessitam substancialmente que tais direitos deixem

de ser apenas uma parte de uma ldquobela obra de arte literaacuteriardquo (constituiccedilatildeo)

A partir da criacutetica relativamente ao menosprezo teoacuterico sobre os deveres fundamentais faz-se

necessaacuterio examinar suas bases estruturais dirigindo-se os esforccedilos para uma adequada definiccedilatildeo e

discussatildeo sobre o alcance e a eficaacutecia juriacutedica

um lado os manifestantes defendiam ldquomais sauacutede e educaccedilatildeordquo e por outro lado pediam a reduccedilatildeo dos impostos Ou seja queriam um Estado Social forte e capaz de garantir direitos sociais entendidos como legiacutetimos todavia natildeo assumiam o ocircnus de responder ao questionamento acerca de como financiar ldquomais sauacutede e educaccedilatildeordquo para falar apenas de duas das principais reivindicaccedilotildees unissonamente defendidas 5 Conforme lembra Albano Santos (2003 p 352) a partir da questatildeo da evasatildeo fiscal ldquoDe qualquer modo importa reter que a indulgecircncia para com a fuga ao imposto contrasta acentuadamente com a praacutetica muito divulgada de responsabi-lizar o Estado por parcelas crescentes da existecircncia dos cidadatildeos criando assim uma incongruecircncia a que jaacute se chamou o laquodilema tiacutepico da nossa eacutepocaraquo reclama-se o maacuteximo do Estado mas rejeitam-se as inevitaacuteveis consequumlecircncias financeiras dessa atitude Uma tal contradiccedilatildeo reconduz aliaacutes o fenoacutemeno ao plano eacutetico uma vez que soacute encontra solidez loacutegica na afirmaccedilatildeo de Bastiat de que laquotodos querem viver agrave custa do Estado mas esquecem que o Estado vive agrave custa de todos raquo - o que levou o eminente economista da Escola Liberal ao celebrado corolaacuterio de que o Estado representa laquoa grande ficccedilatildeo atraveacutes da qual toda a gente se esforccedila por viver agrave custa de toda a genteraquordquo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

171

12 Conceito e eficaacutecia juriacutedica dos deveres fundamentais

A ideia de deveres fundamentais estaacute nitidamente vinculada agrave concepccedilatildeo de solidariedade so-

cial ou seja soacute haacute deveres porque se vive em uma sociedade sendo que esta seraacute tanto mais harmocirc-

nica quanto maior for a preocupaccedilatildeo de cada um com o destino de todos

Essa ideia de dever fundamental dentro do modelo do Estado social de Direito eacute incompa-

tiacutevel com a ideia liberal reducionista de cidadania (direito a ter direitos apenas) No entanto os de-

veres fundamentais natildeo podem ser pensados dentro de uma concepccedilatildeo comunitarista que apenas

reconhecia deveres e serviu de fundamentaccedilatildeo a vaacuterios regimes totalitaacuterios que surgiram na Europa

do seacuteculo XX

Isso ocorre porque ldquoo entendimento adequado dos deveres fundamentais rejeita simultane-

amente os extremismos de um liberalismo que soacute reconhece direitos e esquece a responsabilidade

comunitaacuteria dos indiviacuteduos e de um comunitarismo que dissolve a liberdade individual numa teia de

deveres (rectius funccedilotildees)rdquo (NABAIS 2004a p 673) Ou seja nem soacute direitos e tampouco nem soacute de-

veres devem pautar o Estado contemporacircneo Direitos e deveres convivem numa relaccedilatildeo de causa e

efeito na qual um eacute o pressuposto de outro e ao mesmo tempo auto-limitam-se

Para Jorge Miranda (2000 p 76) ldquosimeacutetricos dos direitos fundamentais apresentam-se os de-

veres fundamentaisrdquo e estes seriam ldquoas situaccedilotildees juriacutedicas de necessidade ou de adstriccedilatildeo constitu-

cionalmente estabelecidas impostas agraves pessoas frente ao poder poliacuteticordquo ou ainda exigidas conforme

menciona ldquopor decorrecircncia de direitos ou interesses difusos a certas pessoas perante outrasrdquo

Jaacute Gomes Canotilho (2006 p 536) lembra que ldquoas ideacuteias de solidariedade e de fraternidade

apontam para deveres fundamentais entre cidadatildeosrdquo sendo que tal entendimento eacute corroborado por

Cristina Chulvi (2001 p 296) ao sustentar que em cumprimento ao princiacutepio de solidariedade que

identifica o Estado Social todos os cidadatildeos estatildeo submetidos agrave realizaccedilatildeo de determinadas condutas

(deveres) que satildeo exigidas natildeo em benefiacutecio proacuteprio mas em benefiacutecio da coletividade

Essa vinculaccedilatildeo com a ideia de solidariedade social resta mais evidente agrave medida que se exami-

na o dever fundamental de pagar tributos Certamente em eacutepocas anteriores - absolutista e liberal - o

cumprimento desse dever orientava-se para conservaccedilatildeo do Estado de modo que natildeo se encontrava

um fundamento eacutetico ou moral para a obrigaccedilatildeo tributaacuteria visto que esta era adimplida unicamente

em face ao dever de obediecircncia agrave autoridade soberana que a estabelecia Com o advento do Estado

Social e Democraacutetico de Direito o dever de contribuir com o sustento dos gastos puacuteblicos passou a

ter um conteuacutedo solidaacuterio agrave medida que foi sendo empregado como instrumento a serviccedilo da poliacutetica

social e econocircmica do Estado redistribuidor (CHULVI 2001 p 70)

Pode-se afirmar portanto que os deveres fundamentais correspondem aos meios necessaacuterios

para que o Estado possa atingir a sua histoacuterica finalidade de propiciar o bem comum o que em ar-

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

172

riscada siacutentese pode ser entendido como a concretizaccedilatildeo dos objetivos constitucionalmente postos

mediante especialmente a realizaccedilatildeo dos direitos fundamentais

Assim resta reafirmada a vinculaccedilatildeo dos deveres fundamentais com a concepccedilatildeo de solida-

riedade sendo que isso ficaraacute mais evidente se essa vinculaccedilatildeo for pensada a partir do dever funda-

mental de pagar tributos Desse modo os deveres fundamentais satildeo os comportamentos positivos ou

negativos impostos a um sujeito em consideraccedilatildeo e interesse que natildeo satildeo particularmente seus mas

sim em benefiacutecio de outros sujeitos ou de interesse geral da comunidade (CHULVI 2001)

Gomes Canotilho (2006 p 532-533) afasta em princiacutepio o entendimento de que haveria uma

simetria entre direitos e deveres fundamentais ou seja a ideia de que ldquoum direito fundamental en-

quanto protegido pressuporia um dever correspondenterdquo Tal ocorre porque a categoria dos deveres

fundamentais corresponde a uma categoria constitucional autocircnoma Como exemplo maior dessa

autonomia pode-se citar o dever de pagar tributos e o dever de defesa da Paacutetria Isso natildeo afasta con-

tudo a possibilidade de existirem deveres fundamentais conexos a direitos fundamentais como ocon-

tece com o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e com correlato dever de defesa do

meio ambiente por exemplo

Nessa mesma linha Morato Leite (2007 p 112) lembra que os deveres natildeo se resumem agravequeles

em relaccedilatildeo aos quais haja um direito ldquoisto eacute obrigaccedilotildees deduziacuteveis ou derivadas de direitos outor-

gados previamenterdquo Diferentemente disso ldquoo legislador exprime-se por meio da decretaccedilatildeo de obri-

gaccedilotildees diretas que ocupam por assim dizer o centro do palco e a partir das quais se reconhecem

poderes os implementadores e beneficiaacuterios para fazecirc-las valerrdquo

Haacute de ressaltar-se tambeacutem que os deveres fundamentais soacute excepcionalmente tecircm natureza

de norma diretamente aplicaacutevel pois na maioria das situaccedilotildees reclamam a existecircncia de uma me-

diaccedilatildeo legislativa para que possam ser exigidos Ou seja os deveres estabelecem-se numa direccedilatildeo

geneacuterica e configuram-se como um mandado ao legislador para que os concretize mediante o estabe-

lecimento de obrigaccedilotildees especiacuteficas momento em que se tornam vinculantes para os cidadatildeos e para

o restante dos poderes puacuteblicos (CHULVI 2001 p 295)

Por representarem uma espeacutecie de norma que determina sua proacutepria concretizaccedilatildeo pode-se

afirmar que as normas constitucionais relativas aos deveres fundamentais natildeo correspondem tatildeo-

-somente a uma ldquocarta de boas intenccedilotildeesrdquo desprovida de eficaacutecia juriacutedica Eacute certo que nem todos os

preceitos constitucionais oferecem o mesmo grau de concretizaccedilatildeo mas isso natildeo significa que uma

constituiccedilatildeo possa ser entendida apenas como um conjunto de declaraccedilotildees programaacuteticas ineficazes

Tendo em vista que a Constituiccedilatildeo eacute uma norma juriacutedica ela soacute poderaacute permanecer com tal condiccedilatildeo

se houver uma contiacutenua accedilatildeo para seu cumprimento

Por isso deve-se rechaccedilar a suposta ldquoirrelevacircnciardquo juriacutedica das normas que contecircm deveres

constitucionais em vista da necessidade de incremento legal posterior para sua concretizaccedilatildeo Assim

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

173

como ocorre com as demais normas constitucionais eacute normal que os deveres fundamentais deman-

dem uma atuaccedilatildeo legislativa para concretizar-se especialmente para delimitar a exigecircncia e para san-

cionar seu descumprimento

No caso do Brasil o dever de pagar tributos eacute um exemplo bem claro da necessidade da me-

diaccedilatildeo legislativa pois a Constituiccedilatildeo apenas menciona a competecircncia de cada ente estatal para a

instituiccedilatildeo sempre atraveacutes de lei dos tributos respectivos sendo que enquanto natildeo sobrevier a norma

juriacutedica correspondente o dever num plano pragmaacutetico simplesmente inexiste (exemplo disso eacute o

Imposto sobre as Grandes Fortunas previsto no art 153 VII da Constituiccedilatildeo de 1988 que ainda natildeo foi

instituiacutedo pela Uniatildeo)

Isso contudo natildeo significa que o ente esteja autorizado a natildeo exercer sua competecircncia tribu-

taacuteria mesmo porque isso significaria inviabilizar as condiccedilotildees necessaacuterias ao cumprimento das tarefas

tambeacutem constitucionalmente impostas para cada ente da federaccedilatildeo brasileira

Assim como ocorre com os direitos fundamentais cabe reconhecer que os deveres fundamen-

tais sofrem evidentes limitaccedilotildees porquanto eles existem a partir de dispositivos constitucionais que

impliacutecita ou explicitamente estabelecem-nos Para aleacutem disso as proacuteprias constituiccedilotildees estabelecem

balizamentos a esses deveres e tratam-nos como limites da atuaccedilatildeo estatal isto eacute as constituiccedilotildees

estabelecem os criteacuterios a partir dos quais os deveres fundamentais seratildeo impostos pelo Estado e

cumpridos pelos cidadatildeos

Posto isso passa-se a examinar de uma forma mais especiacutefica o dever fundamental que pode

ser entendido como de maior relevacircncia dentro de um Estado Democraacutetico de Direito o dever de pa-

gar tributos Isso ocorre porque natildeo se pode pensar nesse modelo de Estado sem que o referido dever

seja adequadamente cumprido pelos cidadatildeos

13 O princiacutepio da solidariedade social como alicerce do dever fundamental de pagar tributos

Cumpre primeiramente analisar as razotildees pelas quais o dever fundamental de pagar tributos

estaacute intimamente vinculado agrave ideia de solidariedade social fazendo-se necessaacuterio um resumo histoacuterico

para melhor compreender e colocar a questatildeo

Antes disso cabe reconhecer que em tempos de individualismo exacerbado soa estranho fa-

lar em solidariedade natildeo obstante o consideraacutevel risco de se ldquoperder o conceito de responsabilidade

puacuteblicardquo com a consequente avaria irreparaacutevel na consciecircncia dos cidadatildeos de ldquoque uma parte de

suas vidas deve ser gerida em comum com os outros este eacute o significado real da solidariedade como

ensina a etimologia do termordquo (SACCHETTO 2005 p 11)

Quanto agrave origem etimoloacutegica do termo vale lembrar que o substantivo solidum em latim sig-

nifica a totalidade de uma soma enquanto o termo solidus tem o sentido de inteiro ou completo ra-

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

174

zatildeo pela qual Konder Comparato (2006 p 577) afirma que ldquoa solidariedade natildeo diz respeito portanto

a uma unidade isolada nem a uma proporccedilatildeo entre duas ou mais unidades mas agrave relaccedilatildeo de todas as

partes de um todo entre si e cada um perante o conjunto de todas elasrdquo

A ideia original de solidariedade estava vinculada agrave existecircncia de mais de um responsaacutevel para

a solvecircncia da obrigaccedilatildeo Em vista disso segundo Duvignaud (1986 p 12) tratava-se de ldquouma ques-

tatildeo de nuacutemeros de reembolso de diacutevidas que atraveacutes do velho coacutedigo de Justiniano retomado pelas

universidades medievais sugere a origem rigorosamente individual do direito e da propriedaderdquo

Ao longo da histoacuteria a ideia de solidariedade teve concepccedilotildees diversas A solidariedade dos

antigos correspondia agrave virtude indispensaacutevel na relaccedilatildeo com os outros dentro de grupos primaacuterios

(famiacutelia especialmente) jaacute a denominada ldquosolidariedade dos modernosrdquo corresponde a um princiacutepio

de caraacuteter juriacutedico ou poliacutetico e sua realizaccedilatildeo passa pela comunidade estadual pela sociedade civil

ou comunidade ciacutevica Cabe ainda referir a denominada solidariedade mutualista isto eacute uma solida-

riedade cuja intenccedilatildeo eacute gerar riqueza em comum relativamente agrave infraestrutura bens e serviccedilos con-

siderados indispensaacuteveis ao bom funcionamento da sociedade (NABAIS 2005 p 85-86)

De acordo com a concepccedilatildeo que ora se conhece a ideia de solidariedade social pode ser en-

tendida como um fenocircmeno tiacutepico da modernidade tendo surgido no final do seacuteculo XIX com o de-

nominado Estado Social na Alemanha de Bismarck

Modernamente pode ser entendida como fruto de uma reaccedilatildeo agraves privaccedilotildees suportadas es-

pecialmente por trabalhadores no seacuteculo XIX Os diferentes movimentos socialistas da eacutepoca perce-

beram os flagelos sociais natildeo eram cataclismos da natureza nem efeitos necessaacuterios da organizaccedilatildeo

racional das atividades econocircmicas Tais flagelos nada mais eram do que ldquoprodutos necessaacuterios do

sistema capitalista de produccedilatildeo cuja loacutegica consiste em considerar os trabalhadores e consumido-

res como mercadorias atribuindo-lhes um valor econocircmico muito inferior ao dos bens de capitalrdquo

(COMPARATO 2006 p 579)

Considerando-se que a ideia de solidariedade estaacute intimamente vinculada com a ideia de co-

munidade de pertencer e partilhar obrigaccedilotildees dentro de um grupo ou formaccedilatildeo social pode-se afir-

mar que ldquoa solidariedade pode ser entendida quer em sentido objetivo em que se alude agrave relaccedilatildeo de

pertenccedila e por conseguinte de partilha e de corresponsabilidade que liga cada um dos indiviacuteduos agrave

sorte e vicissitudes dos demais membros da comunidaderdquo Num sentido subjetivo pode ser entendida

como sinocircnimo de ldquoeacutetica social em que a solidariedade exprime o sentimento a consciecircncia dessa

mesma pertenccedila agrave comunidaderdquo (NABAIS 2005 p 84)

Ainda pode-se afirmar na linha de Konder Comparato (2006 p 577) que a solidariedade ldquoeacute o

fecho de aboacutebada do sistema de princiacutepio eacuteticos pois complementa e aperfeiccediloa a liberdade a igual-

dade e a seguranccedilardquo Isso acontece porque ldquoenquanto a liberdade e a igualdade potildeem as pessoas

umas diante das outras a solidariedade as reuacutene todas no seio de uma mesma comunidaderdquo A ideia

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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de solidariedade ldquonatildeo traz conteuacutedos materiais especiacuteficos podendo ser visualizada ao mesmo tempo

como valor eacutetico e juriacutedico absolutamente abstrato e como princiacutepio positivado ou natildeo nas Consti-

tuiccedilotildeesrdquo Eacute sobretudo uma obrigaccedilatildeo moral ou um dever juriacutedico que ldquoinforma e vincula a liberdade

a justiccedila e a igualdaderdquo (TORRES 2005 p 181)

Cabe referir no entanto que autores como Jean Duvignaud (1986 p 196) sustentam que estaacute

havendo uma verdadeira banalizaccedilatildeo da ideia de solidariedade ao dizer que tal termo eacute usado por to-

dos ldquopara confortar a consciecircncia de uns ou para conseguir um esmola da maacute consciecircncia de outrosrdquo

entendendo que ocorre em relaccedilatildeo agrave ideia de solidariedade ldquouma desvalorizaccedilatildeo que atinge todas as

ideacuteias do seacuteculo passado sobre cujos destroccedilos se constroem as interpretaccedilotildeesrdquo as quais ironicamente

denomina de ldquomodernistasrdquo

Para este estudo importa a concepccedilatildeo atual de solidariedade a qual estaacute por um lado vincula-

da agrave solidariedade pelos direitos denominada de paterna ou vertical e por outro lado estaacute vinculada

agrave solidariedade pelos deveres denominada de fraterna ou horizontal na terminologia adotada por

Casalta Nabais anteriormente mencionada

Relativamente agrave solidariedade pelos direitos pode-se afirmar que a ideia passa pela realizaccedilatildeo

ndash em especial ndash dos direitos sociais e dos denominados direitos de solidariedade (meio ambiente equi-

librado por exemplo) Tal tarefa cabe ao Estado de uma forma mais incisiva em relaccedilatildeo aos direitos

sociais pois eacute ele que deve garantir a concretizaccedilatildeo das promessas que estejam aptas a assegurar um

miacutenimo de dignidade aos seus cidadatildeos (NABAIS 2005 p 87-88)

Quanto agrave solidariedade vertical tem-se de um lado que do Estado eacute cobrado o cumprimento

de seus deveres constitucionalmente estabelecidos e de outro lado da comunidade social ou socie-

dade civil eacute exigido o cumprimento do dever de solidariedade perante outros indiviacuteduos ou grupos

sociais

Superada essa questatildeo passa-se a examinar a ideia de solidariedade social dentro do Estado

Fiscal Para tanto cabe lembrar inicialmente que o Estado eacute adjetivado de fiscal pois eacute suportado

fundamentalmente por tributos unilaterais isto eacute tributos cuja exigecircncia natildeo implica a realizaccedilatildeo de

uma atuaccedilatildeo estatal especiacutefica

Eacute certo que qualquer classificaccedilatildeo das espeacutecies tributaacuterias existentes atualmente no Brasil im-

plica abertura de um significativo espaccedilo de contestaccedilatildeo Natildeo obstante os verdadeiros ldquofrankensteinrdquo

tributaacuterios existentes pode-se dizer que os tributos bilaterais corresponderiam agraves taxas e contribui-

ccedilotildees de melhoria os unilaterais por sua vez corresponderiam aos impostos e agraves contribuiccedilotildees sociais

natildeo sinalagmaacuteticas tambeacutem denominadas de impostos finaliacutesticos (PIS COFINS CPP CSLL)

Noutros termos pode-se dizer que como o denominado estado fiscal social eacute financiado ba-

sicamente pelo pagamento de tributos natildeo vinculados a uma atuaccedilatildeo estatal especiacutefica sua proacutepria

concepccedilatildeo encerra a ideia de solidariedade pois acarreta um dever solidaacuterio de contribuir para a ma-

nutenccedilatildeo e desenvolvimento da sociedade

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

176

Essa solidariedade pode ser vislumbrada a partir de dois enfoques a) a solidariedade pela fis-

calidade b) a solidariedade pela extrafiscalidade Em relaccedilatildeo agrave primeira o Estado exige do cidadatildeo o

pagamento de tributos natildeo vinculados (especialmente impostos) tendo por fim preciacutepuo a obtenccedilatildeo

de receitas sendo que nessa atividade dispensa ou concede um tratamento menos gravoso agravequeles

cidadatildeos ou grupos com menor capacidade econocircmica Se por um lado a ideia de solidariedade

social implica tratamento menos gravoso por outro impotildee a assunccedilatildeo de um ocircnus mais significativo

para aqueles cidadatildeos com maior capacidade econocircmica especialmente pela via da progressividade

de aliacutequotas

A solidariedade pela extrafiscalidade por sua vez acontece quando a imposiccedilatildeo fiscal natildeo

tem por objetivo direto a obtenccedilatildeo de receitas mas sim a realizaccedilatildeo de determinado fim no cam-

po social econocircmico ou cultural Em relaccedilatildeo agrave extrafiscalidade a ideia da solidariedade mostra-se

presente - tanto no vieacutes da oneraccedilatildeo como no vieacutes da reduccedilatildeo da carga - mediante a concessatildeo de

benefiacutecios fiscais

Isso ocorre porque seja no caso do agravamento seja no caso da desoneraccedilatildeo fiscal a pre-

senccedila da ideia de solidariedade eacute reconhecida desde que o objetivo visado seja constitucionalmente

justificaacutevel No primeiro caso aqueles que suportam uma tributaccedilatildeo mais expressiva estatildeo cumprindo

o dever de solidariedade com o restante da coletividade no segundo caso toda sociedade divide o

ocircnus decorrente da concessatildeo do benefiacutecio fiscal respectivo de uma forma solidaacuteria

Em decorrecircncia do exposto exige-se um rigoroso criteacuterio na utilizaccedilatildeo da extrafiscalidade

pois esta apenas seraacute constitucionalmente legiacutetima se os objetivos visados forem justificaacuteveis a par-

tir da contemporacircnea ideia de solidariedade social isto eacute quando esse mecanismo fiscal for utiliza-

do por exemplo para alcanccedilar algum objetivo previsto na constituiccedilatildeo ou para concretizar direitos

fundamentais

De qualquer sorte haacute de recuperar-se (ou construir) a concepccedilatildeo de solidariedade social como

fundamento da exigecircncia fiscal pois apenas esta pode justificar a legitimidade de um modelo de Esta-

do socialmente justo Natildeo fossem suficientes as razotildees de ordem eacutetica e moral expostas haacute de ter-se

presente que um Estado imbuiacutedo de tais fins representa uma escolha pragmaticamente mais acertada

ante a crescente inviabilidade de sobrevivecircncia em um ambiente socialmente hostil como se verifica

em tantos locais deste paiacutes6

Enfim a questatildeo da solidariedade social mostra-se especialmente relevante para garantir-se

que o princiacutepio da dignidade da pessoa humana seja o elemento norteador da tributaccedilatildeo Isso apenas

seraacute possiacutevel se a tributaccedilatildeo estiver adequada agrave efetiva capacidade contributiva do cidadatildeo e quando

for utilizada a extrafiscalidade para a concretizaccedilatildeo dos direitos fundamentais

6 Conforme constata Bauman (2006 p 101) ldquoQuando a competiccedilatildeo substitui a solidariedade os indiviacuteduos se vecircem aban-donados agrave proacutepria sorte restando-lhes apenas os seus parcos recursos evidentemente inadequados A dilapidaccedilatildeo e de-composiccedilatildeo dos viacutenculos coletivos os transformaram sem o seu consentimento em indiviacuteduos de jure ndash mas circunstacircncias poderosas e insuperaacuteveis militam contra a sua ascensatildeo ao modelo postulado dos indiviacuteduos de fatordquo

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Ao adequar-se a tributaccedilatildeo agrave efetiva capacidade contributiva deixa-se de tributar o miacutenimo vi-

tal para existecircncia humana pois nada mais diametralmente oposto agrave concepccedilatildeo de dignidade humana

do que dispor do indisponiacutevel agrave proacutepria sobrevivecircncia com vistas a fazer frente agrave exigecircncia fiscal

Por outro lado ao maximizar-se a densificaccedilatildeo ao princiacutepio da dignidade da pessoa humana

daacute-se a maacutexima eficaacutecia social aos direitos fundamentais uma vez que o referido princiacutepio eacute reconheci-

damente o elemento comum de todos os direitos dessa natureza Para que isso aconteccedila efetivamente

satildeo indispensaacuteveis a) a exigecircncia de tributos adequados agrave capacidade de contribuir daqueles que

manifestam tal capacidade de uma forma mais expressiva obtendo-se os recursos necessaacuterios para a

concretizaccedilatildeo dos direitos fundamentais de cunho prestacional b) a utilizaccedilatildeo da extrafiscalidade para

estimular ou desestimular comportamentos mediante poliacuteticas puacuteblicas no campo fiscal que tenham

como norte a realizaccedilatildeo das promessas fundamentais feitas pela ldquoConstituiccedilatildeo Cidadatilderdquo de 1988

Enfim o liame da solidariedade eacute o fundamento que justifica e legitima o dever fundamental de

pagar tributos haja vista que esse dever corresponde a uma decorrecircncia inafastaacutevel de pertencer-se a

uma sociedade Por isso faz-se necessaacuterio examinar a questatildeo da denominada cidadania fiscal pois

em face do dever fundamental de pagar tributos uma concepccedilatildeo adequada de cidadania passa pelo

reconhecimento de que o cidadatildeo tem direitos poreacutem em contrapartida tambeacutem deve cumprir seus

deveres dentro de uma sociedade

2 A CIDADANIA FISCAL NO ESTADO DEMOCRAacuteTICO DE DIREITO

Numa anaacutelise preliminar pareceria um pouco estranho examinar a questatildeo da cidadania sob o

enfoque que ora se pretende porquanto a sua concepccedilatildeo mais visiacutevel corresponde agrave ideia de ldquodireito

a ter direitos numa sociedaderdquo No entanto a concepccedilatildeo contemporacircnea de cidadania natildeo pode im-

plicar a existecircncia de cidadatildeos que de uma forma pouco altruiacutesta reclamem para si o maacuteximo de di-

reitos e em contrapartida neguem-se a contribuir com a sua parcela de esforccedilos para que tais direitos

viabilizem-se num plano faacutetico

Ou seja natildeo haacute foacutermula viaacutevel nem caminhos factiacuteveis se a ideia de cidadania restringir-se agrave

ideia de ldquodireito a ter direitosrdquo pois como jaacute examinado a efetivaccedilatildeo de direitos especialmente os de

cunho social econocircmico e cultural exige uma gama de recursos por parte do Estado e tais recursos

satildeo obtidos quase que exclusivamente mediante a tributaccedilatildeo

Em relaccedilatildeo agrave face correspondente aos deveres de cidadania Casalta Nabais menciona que o de-

ver fundamental de pagar tributos representa um dos principais deveres dentro de um Estado Social

pois ldquono actual estado fiscal para o qual natildeo se vislumbra qualquer alternativa viaacutevel pelo menos nos

tempos mais proacuteximos os impostos constituem um indeclinaacutevel dever de cidadania cujo cumprimen-

to a todos nos deve honrarrdquo (NABAIS 2005 p 44)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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Em vista disso eacute possiacutevel afirmar que o dever de pagar tributos eacute o principal dever de cidada-

nia justamente porque caso tal dever seja sonegado por parte dos componentes de uma sociedade

restaratildeo inviabilizadas as possibilidades de realizaccedilatildeo dos proacuteprios direitos especialmente aqueles de

cunho prestacional

Entretanto se por um lado a concepccedilatildeo contemporacircnea de cidadania fiscal implica o dever

de pagar tributos por outro lado impotildee que esse dever seja exercido nos estritos limites previstos na

constituiccedilatildeo observados os tradicionais direitos de defesa que deram ensejo ao liberalismo claacutessico

Outra dimensatildeo do dever fundamental de pagar tributos - que decorre diretamente da ideia de

cidadania fiscal - consiste no direito de participaccedilatildeo na tomada de decisotildees acerca dos tributos que

se estaacute disposto a pagar Ocorre que isso jaacute natildeo pode ser visto apenas no acircmbito da representaccedilatildeo

parlamentar pois eacute quase ingecircnuo acreditar que o povo autotributa-se atraveacutes de seus representantes

(legislativo) ideia que serviu de justificativa para a estrita observacircncia do princiacutepio da legalidade nos

primoacuterdios do constitucionalismo

Se por um lado o Poder Executivo usurpou a competecircncia no que tange agrave ediccedilatildeo de normas

no campo tributaacuterio por outro o Poder Legislativo sofre uma crise de legitimidade sem precedentes

que se confunde com a proacutepria crise da denominada democracia representativa

A festejada democracia representativa transformou-se num tremendo processo de ldquofaz de con-

tardquo no qual uma parcela diminuta da populaccedilatildeo - que ocupa o topo da piracircmide social - dita os rumos

e decide em nome de toda a sociedade enquanto esta sequer tem ideia dos caminhos escolhidos

Em dissonante contrapartida no entanto a parcela mais fragilizada da sociedade sofre os efeitos da

tomada de decisotildees sem entender as razotildees porque suporta tamanho ocircnus

Haacute dessa forma uma inegaacutevel crise de legitimidade que afeta as democracias representativas

Essa crise eacute visiacutevel especialmente nos paiacuteses de modernidade tardia e decorre de um crescente pro-

cesso de marginalizaccedilatildeo e exclusatildeo social7

Na democracia representativa aos ldquopseudocidadatildeosrdquo poacutes-modernos restou a prerrogativa de

comparecer agraves urnas de tempos em tempos para escolher poliacuteticos descomprometidos com os efeti-

vos interesses republicanos dos quais passado determinado tempo poucos lembram

Em vista dessa inegaacutevel crise da democracia representativa (com a qual Fukuyama ao final do

seacuteculo XX imaginava ter se chegado ao fim da histoacuteria)8 faz-se necessaacuterio construir uma concepccedilatildeo

contemporaneamente adequada de democracia e da proacutepria cidadania a qual implique um direi-

7 Como aduz Casalta Nabais (1998 p 975) ldquoNaturalmente que natildeo encontramos hoje eleitores despojados do direito de voto O que haacute isso sim eacute alguns eleitores com voto duplo ou pluacuterimo que ao natildeo ser atribuiacutedo aos outros exprime um privileacutegio contra o qual eacute suposto ter-se feito a revoluccedilatildeo democraacutetica que impocircs a igualdade poliacutetica E ao falar em voto duplo ou pluacuterimo estou a referir-me por um lado ao voto informal exercido pelos grupos de pressatildeo (integrem estes for-malmente corporaccedilotildees ou natildeo) atraveacutes das mais sofisticadas e subtis formas de lobbying que assim esvaziam a democracia representativa do seu mais significativo papel e por outro lado agrave atribuiccedilatildeo legal de um (verdadeiro) segundo ou terceiro direito de voto apenas aos membros de algumas corporaccedilotildees ou corpos eleitorais privilegiadosrdquo

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to-dever de participaccedilatildeo de toda a sociedade no debate sobre os rumos da tributaccedilatildeo e do proacuteprio

Estado neste novo milecircnio

Para Norberto Bobbio no entanto haacute um importante entrave a isso pois segundo ele ldquotecno-

cracia e democracia satildeo antiteacuteticas se o protagonista da sociedade industrial eacute o especialista impos-

siacutevel que venha a ser o cidadatildeo qualquerrdquo Se de um lado a ideia de democracia ldquosustenta-se sobre

a hipoacutetese de que todos podem decidir a respeito de tudordquo por outro a tecnocracia ldquopretende que

sejam convocados para decidir apenas aqueles poucos que detecircm conhecimentos especiacuteficosrdquo Haacute

problemas pois muito mais complexos a resolver-se nos dias atuais como inflaccedilatildeo crise desemprego

desigualdade social motivo pelo qual Bobbio (2002 p 46) entende que a soluccedilatildeo requer conhecimen-

tos cientiacuteficos e teacutecnicos muito mais profundos para o homem meacutedio de hoje do que para o homem

meacutedio dos primoacuterdios da democracia apesar de o atual ser incomensuravelmente mais instruiacutedo

As objeccedilotildees levantadas por Bobbio (2002) quanto agraves possibilidades do proacuteprio futuro da de-

mocracia verdadeiramente impressionam Eacute inegaacutevel que a questatildeo tributaacuteria alcanccedilou um grau de

complexidade que reduz sobremaneira a proacutepria possibilidade de compreensatildeo por parte de uma

parcela muito significativa da sociedade Para contornar-se isso impotildee-se a criaccedilatildeo de mecanismos de

visibilidade do proacuteprio Estado especialmente em relaccedilatildeo ao ldquocaixa pretardquo da tributaccedilatildeo

De qualquer forma mesmo que isso se verificasse num grau satisfatoacuterio ainda assim haveria seacute-

rias dificuldades de uma efetiva participaccedilatildeo popular na tomada de decisotildees sobre aspectos teacutecnicos

de uma adequada carga tributaacuteria

Entretanto natildeo eacute necessaacuterio tamanho aprofundamento da discussatildeo bastando num primeiro

momento que esse debate perpasse pela questatildeo da justiccedila fiscal cuja concepccedilatildeo eacute facilmente com-

preendida por todos independentemente do conhecimento teacutecnico Enfim isso impotildee-se porque ldquoos

impostos constituem um assunto demasiado importante para poder ser deixado exclusivamente nas

matildeos de poliacuteticos e teacutecnicos (economistas)rdquo Em vista disso ldquotodos os contribuintes devam ter opiniatildeo

acerca dos impostos e da justiccedila ou injusticcedila fiscal que suportam ateacute porque a ideacuteia de justiccedila fiscal

natildeo deixa de ser um conceito que tambeacutem passa pelo bom sensordquo (NABAIS 2005 p 59)

A outra faceta da cidadania fiscal assegura aos membros da sociedade o direito de exigir que

todos contribuam para com a coletividade conforme sua capacidade econocircmica Em vista disso dis-

cute-se se seria possiacutevel postular judicialmente contra o beneficiado ou contra o ente estatal em de-

correcircncia do natildeo justificado descumprimento do dever fundamental de pagar tributos

8 Oviacutedio Baptista da Silva (2004 p 12) em criacutetica contundente ao referido autor explica ldquoAo glorificar a democracia liberal Fukuyama esqueceu-se da crescente suspeita com que os eleitores vecircem que sua convocaccedilatildeo para votar de quatro em quatro anos natildeo tem a relevacircncia que seria de esperar de uma democracia representativa A desconfianccedila eacute explicaacutevel en-quanto os eleitores satildeo convocados a votar de quatro em quatro anos o mercado como algueacutem jaacute observou vota todos os dias Aleacutem disso a miacutedia encarrega-se de promover habilmente seus votos de modo que essas decisotildees tornam-se determinantes e imperativas para os governos Na verdade a teoria poliacutetica esquece-se de incluir em suas construccedilotildees teoacutericas a miacutedia como o Grande Eleitor Natildeo leva em conta que vivemos num mundo ciberneacuteticordquo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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Eacute certo que a concessatildeo de benefiacutecios fiscais ou remissotildees corresponde a um legiacutetimo mecanis-

mo de intervenccedilatildeo do Estado no campo econocircmico e social Todavia essa legitimidade apenas estaraacute

presente se os objetivos visados forem constitucionalmente justificaacuteveis sob pena de tal exoneraccedilatildeo

afrontar inclusive a ideia de justiccedila fiscal

Relativamente a essa questatildeo Cristina Chulvi (2001 p 35) entende que natildeo haveria a possibili-

dade de que um indiviacuteduo viesse no caso de descumprimento por outrem a exigir a realizaccedilatildeo de um

dever constitucional posto que natildeo se encontraria legitimado para tanto

No entanto natildeo eacute possiacutevel concordar com tal raciociacutenio pois se a cidadania fiscal plena impli-

ca de um lado o dever de contribuir por outro assegura o direito de exigir que todos na proporccedilatildeo

da capacidade econocircmica contribuam De que adiantaria reconhecer-se tal direito se natildeo houvesse

a legitimidade para exercecirc-lo mediante uma adequada accedilatildeo judicial Negar a legitimidade significa

amesquinhar a ideia de cidadania ao mesmo tempo em que num plano praacutetico significa suportar

um dever de contribuir mais oneroso para compensar a desoneraccedilatildeo indevidamente concedida No

caso especiacutefico do Brasil haacute inclusive instrumentos adequados para tanto como a Accedilatildeo Popular (Lei

471765) a Accedilatildeo Civil Puacuteblica (Lei 734785) ou a Accedilatildeo Direta de Inconstitucionalidade respeitado em

relaccedilatildeo agraves duas uacuteltimas o rol dos legitimados para propocirc-las

Enfim a construccedilatildeo de uma concepccedilatildeo adequada de cidadania fiscal tem potencialidades para

constituir-se num elemento importante agrave concretizaccedilatildeo das promessas constitucionais natildeo cumpridas

(direitos fundamentais sociais especialmente) Poreacutem seria ingenuidade afirmar que a mera (re) cons-

truccedilatildeo dessa ideia poderia dar-se de uma forma espontacircnea na sociedade principalmente naqueles

paiacuteses como o Brasil onde a percepccedilatildeo da atuaccedilatildeo do Estado eacute miacutenima

Em decorrecircncia da visatildeo negativa do papel que o Estado desempenha a evasatildeo fiscal encon-

tra um terreno feacutertil par a sua legitimaccedilatildeo perante a sociedade razatildeo pela qual eacute preciso encontrar

pragmaticamente caminhos viaacuteveis para eficazmente combatecirc-la pois ela corroacutei significativamente

os alicerces da cidadania

3 O COMBATE Agrave EVASAtildeO FISCAL COMO CONDICcedilAtildeO DE EXIGIBILIDADE DOS DEVERES DE CIDADANIA

Um elemento de crescente importacircncia dentro do Estado eacute a questatildeo da evasatildeo fiscal haja

vista que cada vez mais parece ser incontrolaacutevel O fenocircmeno da evasatildeo fiscal pode ser explicado

principalmente pela inexistecircncia de imperativos de ordem moral que a impeccedilam e pela incontornaacutevel

complexidade das relaccedilotildees econocircmicas e sociais na era da globalizaccedilatildeo

Pode-se dizer inclusive que haacute uma aceitaccedilatildeo social taacutecita agrave evasatildeo fiscal razatildeo pela qual natildeo

existe por parte da sociedade uma reaccedilatildeo que tenha por objetivo punir o infrator Tal verifica-se por-

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que nas palavras de Gregoacuterio Robles (2005 p 42) ldquoa infraccedilatildeo da norma social eacute considerada grave

quando afeta um valor essencial de capital importacircncia para o grupo para tanto a reaccedilatildeo seraacute severa

contundenterdquo De outra baila quando ldquoo valor afetado eacute considerado de escassa importacircncia ou de

hierarquia inferior o sentimento de indignaccedilatildeo seraacute leve e difuso e a reaccedilatildeo caso ocorra seraacute suaverdquo

Esse sentimento daacute-se especialmente em face da inexistecircncia de uma resposta estatal agraves de-

mandas sociais bem como em decorrecircncia da visiacutevel e aparentemente incontrolaacutevel corrupccedilatildeo e de

desvios de recursos na administraccedilatildeo puacuteblica Aleacutem disso o sentimento de injusticcedila na reparticcedilatildeo da

carga tributaacuteria (tributaccedilatildeo sem a observacircncia da capacidade contributiva principalmente) traduz-se

num componente importante dessa equaccedilatildeo Isso porque natildeo basta que a justiccedila esteja sendo feita

eacute fundamental que haja a percepccedilatildeo de que ela esteja sendo feita e isso eacute condiccedilatildeo de aceitabilidade

de qualquer sistema fiscal

Entretanto eacute muito difiacutecil controlar a fraude especialmente em face da globalizaccedilatildeo e da

complexidade das relaccedilotildees econocircmicas bem como da crescente desmaterializaccedilatildeo do patrimocircnio

Ou seja os bens imoacuteveis jaacute natildeo ocupam o espaccedilo de excelecircncia no conjunto do patrimocircnio dos

cidadatildeos uma vez que cederam tal espaccedilo aos bens imateriais (accedilotildees tiacutetulos direitos de marcas e

patentes tecnoloacutegicas)

Eacute certo que a ideia de cidadania fiscal contraria a aceitabilidade social da evasatildeo Conforme

alerta Albano Santos (2003 p 359) ldquoa fuga ao imposto quando praticada impunemente de forma cor-

rente e com uma amplitude significativa constitui uma fonte inesgotaacutevel de consequumlecircncias negativas

que atingem a sociedade por inteirordquo Um fenocircmeno desta natureza ldquoperturba o normal funcionamen-

to da economia compromete a consecuccedilatildeo dos objectivos prosseguidos pelas poliacuteticas econoacutemicas

e sociais estabelecidas pelas autoridades subverte o princiacutepio republicano da igualdade dos cidadatildeos

perante a Leirdquo Isso tudo pois ldquoacaba por contribuir seriamente para a degradaccedilatildeo do sentido ciacutevico e

da moralidade puacuteblicardquo

Os efeitos mencionados satildeo bastante visiacuteveis e estatildeo inter-relacionados haja vista que o

Estado depende da efetivaccedilatildeo da arrecadaccedilatildeo para a manutenccedilatildeo de suas contas e para a consecu-

ccedilatildeo dos objetivos constitucionalmente consagrados especialmente a realizaccedilatildeo dos direitos sociais

econocircmicos e culturais

Aleacutem disso a evasatildeo fiscal causa uma distorccedilatildeo irremediaacutevel na economia porquanto atenta

frontalmente contra a lei da livre concorrecircncia Considerando o peso que a carga tributaacuteria repre-

senta no preccedilo final de mercadorias e serviccedilos natildeo eacute difiacutecil perceber que quem tem possibilidades e

opta pela evasatildeo teraacute condiccedilotildees de competitividade muito diferenciadas comparativamente agravequele

que se submete ao peso da carga tributaacuteria e com isso necessariamente embute no preccedilo o res-

pectivo custo

Cabe ressaltar tambeacutem que no plano da justiccedila fiscal o bom contribuinte acaba sendo exces-

sivamente onerado pois em uacuteltima anaacutelise acaba pagando seu tributo e tambeacutem aquele que deveria

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ser pago por quem o sonegou Eacute muito difiacutecil pois sustentar a legitimidade da tributaccedilatildeo quando uma

parcela da sociedade consegue de uma maneira eficaz encontrar mecanismos de burla e fuga fiscal9

Eacute inadmissiacutevel que especialmente em paiacuteses como o Brasil o Estado opte por solucionar essa

questatildeo reduzindo de um lado a jaacute miacutenima proteccedilatildeo social ou de outro instituindo novos tribu-

tos ou majorando aliacutequotas daqueles jaacute existentes para fazer frente agrave diminuiccedilatildeo da receita fruto da

evasatildeo fiscal Ainda que poderosos grupos de pressatildeo defendam tais soluccedilotildees elas provavelmente

levariam a uma ampliaccedilatildeo das jaacute elaacutesticas desigualdades sociais o que seria inaceitaacutevel num modelo

de Estado cuja tarefa preciacutepua eacute combatecirc-las

Admite-se no entanto que a fraude embora ilegal e imoral faz parte do sistema e que por

mais esforccedilos que sejam empregados ela natildeo seraacute debelada por completo Em vista disso haacute de bus-

car-se de uma forma realista niacuteveis reduzidos e toleraacuteveis da fraude e da evasatildeo da mesma forma

como ocorre relativamente agrave questatildeo da corrupccedilatildeo Isso exigiria uma postura de incessante enfrenta-

mento da evasatildeo fiscal

Segundo Sevilla Segura (2004 p 162) haacute trecircs formas de atuaccedilatildeo capazes de eliminar a evasatildeo

fiscal dependendo da variaacutevel em que se queira fundamentalmente atuar As mais tradicionais procu-

ram reforccedilar a capacidade coativa da administraccedilatildeo tributaacuteria como recurso para melhorar os niacuteveis de

cumprimento das obrigaccedilotildees pelos contribuintes Recentemente vem consolidando-se um segundo

grupo de accedilotildees cujo propoacutesito consiste em favorecer a aceitaccedilatildeo do imposto por parte dos cidadatildeos

incentivando o cumprimento voluntaacuterio das suas obrigaccedilotildees fiscais Finalmente cabe tambeacutem recon-

siderar a proacutepria estrutura normativa que estaacute sendo objeto de aplicaccedilatildeo eliminando suas arestas de

forma que resulte em algo mais compreensiacutevel para os cidadatildeos e mais faacutecil para a administraccedilatildeo

Deve-se pois insistir na busca de mecanismos eficazes para combater a evasatildeo fiscal como

por exemplo a ampliaccedilatildeo de investimentos em pessoal altamente qualificado a informatizaccedilatildeo das

informaccedilotildees objetivando a existecircncia de um rigoroso cruzamento de dados bem como a implemen-

taccedilatildeo de mecanismos de controle agrave corrupccedilatildeo Relativamente a essa uacuteltima Prahalad (2005 p 83) sus-

tenta que ldquoa maioria dos paiacuteses em desenvolvimento natildeo entende na totalidade os verdadeiros custos

da corrupccedilatildeo e seu impacto no desenvolvimento do setor privado e na diminuiccedilatildeo da pobrezardquo

Conquanto a complexidade das relaccedilotildees econocircmicas seja inevitaacutevel eacute fundamental simplificar

a legislaccedilatildeo fiscal Como se pode constatar diariamente multiplica-se uma quantidade inexplicaacutevel

9 Como afirma Albano Santos (2003 p 362) ldquoisso resulta numa clara desigualdade perante a tributaccedilatildeo e por conseguinte implica uma inaceitaacutevel sensaccedilatildeo de injusticcedila Ora no dizer do Prof Maurice Duverger laquoum dos mais graves golpes que se podem infligir na igualdade perante o imposto eacute o de estabelecer uma desigualdade perante a frauderaquo Nestas condiccedilotildees a Justiccedila Tributaacuteria poderaacute ser gravemente subvertida com as inevitaacuteveis consequumlecircncias na aceitaccedilatildeo do sistema fiscal pelos cidadatildeos De facto uma situaccedilatildeo que oferece a certos grupos ou indiviacuteduos a cocircmoda possibilidade de escaparem ao pagamento dos impostos devidos pelo exemplo que daacute acaba por representar forccedilosamente um incitamento a outros contribuintes para se subtraiacuterem ao Fisco com o risco de gerar uma reacccedilatildeo em cadeia susceptiacutevel de provocar seacuterios da-nos natildeo apenas nas tesourarias puacuteblicas mas bem mais importante na proacutepria coesatildeo socialrdquo

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de normas especialmente aquelas voltadas a dar condiccedilotildees de executoriedade agraves leis isto eacute normas

regulamentares provenientes do Poder Executivo Essas normas exageram na criaccedilatildeo de conceitos

indeterminados ficccedilotildees e presunccedilotildees e aleacutem disso como constata Seacutergio Silva (2006 p 151) ldquoo cor-

porativismo e a utilizaccedilatildeo da legislaccedilatildeo tributaacuteria como instrumento da defesa de interesses de grupos

econocircmicos fazem do ordenamento tributaacuterio um emaranhado de normas muitas vezes conflitantes e

sem sentido que soacute podem ser compreendidas (quando o satildeo) por especialistasrdquo

Conforme adverte Prahalad (2005 p 85) ldquoos regulamentos resultam da interpretaccedilatildeo bu-

rocraacutetica das leis e sua proliferaccedilatildeo pode tornar o sistema obscuro para qualquer um exceto para

os muito experientesrdquo Em decorrecircncia disso sustenta o autor que a corrupccedilatildeo em todos os niacuteveis

da burocracia tende a ser endecircmica ademais a proliferaccedilatildeo dos regulamentos pode ter a mesma

consequecircncia da ldquopura inexistecircncia de leisrdquo a emergecircncia da informalidade Com isso os empreen-

dimentos permanecem pequenos e locais pois a corrupccedilatildeo passa a ser um custo inassimilaacutevel para

empreendimentos maiores

Natildeo bastasse isso aumentam-se os deveres instrumentais que devem ser adimplidos pelos

contribuintes Isto eacute os contribuintes assumem obrigaccedilotildees acessoacuterias cada vez mais complexas e one-

rosas com vistas a fornecer informaccedilotildees ao fisco sendo que eventuais erros ou omissotildees satildeo severa-

mente punidos Em vista disso tudo Casalta Nabais (2004b p 219) sustenta que ldquotorna-se imperiosa a

necessidade de simplificaccedilatildeo do sistema fiscalrdquo Eacute fundamental que o ldquolegislador desonere as empresa

da rede labiriacutentica de obrigaccedilotildees acessoacuterias as que crescentemente as tem vindo a manietarrdquo

Conveacutem ressaltar entretanto que a necessaacuteria simplificaccedilatildeo natildeo pode trilhar um caminho que

aponte para a construccedilatildeo de um modelo tributaacuterio que desconsidere o princiacutepio da capacidade con-

tributiva Por isso natildeo satildeo aceitaacuteveis as ideias que sustentam uma reduccedilatildeo das hipoacuteteses de manifes-

taccedilotildees de riquezas passiacuteveis de serem alcanccediladas pela tributaccedilatildeo especialmente a simplista ideia de

instituiccedilatildeo de um imposto uacutenico seja qual for sua materialidade ou hipoacutetese de incidecircncia Isso impli-

caria pois optar por um destino diametralmente oposto ao princiacutepio da dignidade da pessoa humana

Paralelamente a isso eacute necessaacuterio que as penalidades pelo descumprimento do dever funda-

mental sejam de tal modo severas que desestimulem a praacutetica da evasatildeo para que o raciociacutenio do

ldquoriscobenefiacuteciordquo seja levado em consideraccedilatildeo no momento de eventualmente optar-se pela praacutetica

delituosa Para tanto eacute claro que como qualquer outra penalidade haacute de ter-se um fundado receio

expectativa de que ela venha a ser aplicada De qualquer forma tambeacutem nesse ponto deve-se ter uma

devida cautela para que a penalidade imposta natildeo seja desproporcional agrave infraccedilatildeo cometida

Ainda para que a fraude seja desestimulada faz-se necessaacuterio que o Estado distribua equitati-

vamente a carga tributaacuteria e paralelamente a isso o cidadatildeo possa visualizar claramente os benefiacutecios

sociais oriundos do recolhimento de tributos Talvez em paiacuteses como o Brasil seja esse o maior desafio

a ser enfrentando no combate agrave evasatildeo

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Pode-se concluir assim que o combate agrave evasatildeo eacute um dos importantes elementos para a cons-

truccedilatildeo da cidadania fiscal que passa pela aceitabilidade do dever fundamental de pagar tributos e pela

reconstruccedilatildeo dos mecanismos de solidariedade entre os indiviacuteduos que compotildeem uma sociedade

Eacute certo que natildeo se trata de um caminho que possa ser percorrido sem agruras ou dificuldades

No entanto tomar tal rumo eacute inclusive uma condiccedilatildeo para construccedilatildeo de um modelo tributaacuterio mais

equitativo que esteja apto a colaborar decisivamente na densificaccedilatildeo do princiacutepio basilar que norteia

a Constituiccedilatildeo Brasileira o princiacutepio da dignidade da pessoa humana

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Ao concluir este trabalho optou-se por traccedilar algumas consideraccedilotildees que se natildeo estatildeo no

acircmago da questatildeo abordada tecircm uma relaccedilatildeo de indiscutiacutevel pertinecircncia Busca-se pois examinar

a relaccedilatildeo da ideia de liberdade em tempos de culto a uma ideia no miacutenimo distorcida do que seja

a tatildeo almejada felicidade

As sociedades de massa existentes no que se convencionou denominar de poacutes-modernidade

tecircm uma caracteriacutestica comum o apreccedilo pelo indiviacuteduo Como se cada qual pudesse ter uma vida

autocircnoma e desconectada do restante esquece-se o alerta que jaacute fizera Tocqueville ndash conforme

lembra o socioacutelogo polonecircs Zygmunt Bauman ldquoo indiviacuteduo eacute o pior inimigo do cidadatildeordquo Nestes

tempos de culto ao individualismo haacute uma busca irrefreaacutevel por sentir-se uacutenico - social econocircmica

e esteticamente desejaacutevel - como uma espeacutecie de mercadoria posta na prateleira do ldquoSr Mercadordquo

para ser cobiccedilada e admirada pelo restante dos indiviacuteduos que tambeacutem almejam ocupar o mesmo

espaccedilo Na linha de Bauman os seres humanos transformam-se em mercadorias e vivem para satis-

fazer suas necessidades de consumo

Segundo tal loacutegica isso permitiria alcanccedilar aquilo que mais se pode buscar a felicidade Quando

se passa a discutir o que significa isso as respostas satildeo as mais variadas possiacuteveis Poreacutem percebe-se

que felicidade no mais das vezes associa-se agrave possibilidade de ter acesso a tudo que supostamente

permitiria sentir-se uacutenico notadamente o acesso a determinados padrotildees de consumo Acredita-se

que ldquoterrdquo algo possa propiciar um sentimento de satisfaccedilatildeo e alegria sem finitude

Isso torna-se particularmente perverso nas relaccedilotildees que se desenvolvem no acircmbito das de-

nominadas redes sociais Neste universo eacute essencialmente necessaacuterio parecer feliz pois o contraacuterio

eacute revelador de certa incompetecircncia em gerir o destino Constroem-se vidas perfeitas e portanto

fictiacutecias as quais geram um sentimento de frustraccedilatildeo e inseguranccedila por parte daqueles que acredi-

tam nesse verdadeiro ldquoconto de fadasrdquo automidiaacutetico quando constatam que suas proacuteprias vidas satildeo

comuns e pequenas diante de tantos ldquofelizesrdquo que povoam tais redes Incrivelmente esse sentimento

eacute reciacuteproco pois aqueles que vendem tal imagem tambeacutem se sentem dessa forma uma vez que

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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intimamente sabem que seu - eficazmente vendido - marketing pessoal nada mais eacute do que uma

pura obra de ficccedilatildeo

Tudo eacute tatildeo avassalador que mesmo dando-se conta disso eacute difiacutecil natildeo se submeter aos seus

efeitos negativos De qualquer forma este texto natildeo tem a pretensatildeo de convencer algueacutem acerca das

armadilhas deste mito nem pretende vender uma nova foacutermula para alcanccedilar este intento como o

fazem tantos livros de autoajuda cujos autores satildeo os principais ldquoajudadosrdquo O que se pretende aqui

singelamente eacute sugerir uma reflexatildeo eacute possiacutevel ser feliz sem ser livre

Eacute certo que a convivecircncia coletiva impotildee limites no plano individual que frustram a liberdade

no seu estado original Isso acontece porque soacute eacute possiacutevel ser verdadeiramente livre no seio de uma

sociedade O ser humano natildeo se realiza como tal a natildeo ser coexistindo Numa ilha deserta o ser hu-

mano nada mais eacute do que sua versatildeo primordial de evoluccedilatildeo agrave medida que estaacute condenado a satisfa-

zer apenas seus instintos baacutesicos Portanto os limites impostos pela convivecircncia coletiva satildeo meios de

garantia da proacutepria liberdade Desconsiderando o outro o ser humano faz da liberdade sua primeira

viacutetima e de si proacuteprio um verdadeiro escravo de seus instintos

Ocorre que natildeo satildeo esses limites que na atualidade comprometem a liberdade Uma vez que

se assume a tarefa de ser aceito pela sociedade de consumo automaticamente passa-se a agir de

acordo com os padrotildees estabelecidos por ela Satildeo normas natildeo escritas e leis concretamente inexis-

tentes as quais imperceptivelmente balizam o modo de agir Desde a necessidade de adquirir deter-

minados bens ateacute a manifestaccedilatildeo de determinadas opiniotildees age-se de acordo com modo de viver

e pensar que eacute sutilmente imposto como condiccedilatildeo para alcanccedilar aquilo que se diz ser felicidade Por

mais paradoxal que pareccedila quanto mais brilhante for o aluno mais provavelmente restaraacute frustrado e

infeliz ao perceber a euforia esvaindo-se tatildeo rapidamente No dia seguinte novos desejos artificial-

mente produzidos haveratildeo de ser satisfeitos

Por isso nestes bons tempos de iniacutecio de seacuteculo vale pensar o quanto se deve buscar a decan-

tada felicidade que se vende tal qual anuacutencio publicitaacuterio de margarina quanto isso significa compro-

meter algo indissociaacutevel agrave proacutepria condiccedilatildeo humana ser livre Portanto melhor do que desejar algueacutem

ldquoSeja Felizrdquo poder-se-ia dizer ldquoSeja Livrerdquo Pelo menos natildeo seja refeacutens de normas e leis concretamente

inexistentes e faticamente inuacuteteis Seja feliz sem deixar de ser livre Ou seja livre pois soacute assim poderaacute

ser verdadeiramente feliz

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O PROCESSO DE CODIFICACcedilAtildeO DO DIREITO TRIBUTAacuteRIO BRASILEIRO

SUMAacuteRIO Introduccedilatildeo 1 Antecedentes do processo de codificaccedilatildeo do Di-reito Tributaacuterio no Brasil 11 O sistema tributaacuterio na Constituiccedilatildeo Federal de 1946 12 A Emenda Constitucional no 1865 2 O Coacutedigo Tributaacuterio Na-cional (CTN) 21 Precedentes da codificaccedilatildeo 22 O Coacutedigo de Napoleatildeo 23 O processo de codificaccedilatildeo no Brasil 24 O movimento de codificaccedilatildeo do Direito Tributaacuterio no Brasil 25 Movimentos que antecederam o CTN 26 O anteprojeto de lei 27 A Lei no 5172 de 1966 (Coacutedigo Tributaacuterio Nacional ndash CTN) 28 O CTN no ordenamento juriacutedico nacional 281 A funccedilatildeo do CTN 282 Algumas criacuteticas ao CTN Consideraccedilotildees finais Referecircncias

Osvaldo Joseacute Rebouccedilas1

INTRODUCcedilAtildeO

A codificaccedilatildeo do Direito Tributaacuterio no Brasil passou por um processo relativamente longo de

infindaacuteveis discussotildees Vaacuterios fatores deram causa a este retardamento no processo de codificaccedilatildeo

especialmente a ignoracircncia da doutrina paacutetria sobre a importacircncia do Direito Tributaacuterio que era co-

mumente aceito como um apecircndice do Direito Financeiro e a inexistecircncia de obras com repercussatildeo

ampla levando a comunidade juriacutedica a despertar para a necessidade da realizaccedilatildeo de estudos mais

consistentes sobre os institutos e as formas desta relevante aacuterea do Direito para a sociedade moderna

O trabalho que se propotildee desenvolver tem por objetivo efetuar um estudo sobre o processo

da codificaccedilatildeo do Direito Tributaacuterio no Brasil sob uma perspectiva histoacuterica vale dizer identificar em

sua histoacuteria o conjunto de fatos e procedimentos que o precederam e foram adotados para enfim se

chegar agrave elaboraccedilatildeo de um projeto e de Coacutedigo Tributaacuterio Nacional no contexto juriacutedico brasileiro

Eacute certo que para a consecuccedilatildeo dos objetivos almejados eacute necessaacuterio assentar previamente algu-

mas premissas ou hipoacuteteses sobre as quais se vai desenvolver o estudo Primeiro eacute preciso demonstrar

se havia necessidade ou natildeo da elaboraccedilatildeo de um coacutedigo tributaacuterio para o direito brasileiro segundo

que vantagens traria para a ordenaccedilatildeo do sistema tributaacuterio sua ediccedilatildeo terceiro que efeitos juriacutedicos

irradiariam da codificaccedilatildeo das normas tributaacuterias no modelo poliacutetico nacional tendo em vista a forma

como o Brasil eacute organizado politicamente (modelo federativo onde cada esfera de poder tem auto-

nomia poliacutetica e administrativa para se auto-governar e auto-administrar) e quarto como a doutrina

paacutetria enfrentou a questatildeo da codificaccedilatildeo normativa da tributaccedilatildeo em face do sistema tributaacuterio na-

cional vigente agrave eacutepoca

Natildeo se pode perder de vista que para a elaboraccedilatildeo exitosa deste estudo eacute necessaacuterio que se

1 Auditor Fiscal da Receita Estadual do Cearaacute E-mail osvaldorebhotmailcom

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

189

estabeleccedila a metodologia a ser adotada e os caminhos a serem trilhados Seguramente necessaacuterio se

faz orientar a pesquisa para uma anaacutelise do sistema tributaacuterio vigente agrave eacutepoca da elaboraccedilatildeo da pro-

posta especialmente as competecircncias dos entes central e perifeacutericos e como se desenvolvia esta ad-

ministraccedilatildeo tributaacuteria em seguida seratildeo identificados quais os principais problemas enfrentados pela

administraccedilatildeo e pelo contribuinte no que concerne ao exerciacutecio da tributaccedilatildeo posteriormente seratildeo

retratados os procedimentos adotados visando a elaboraccedilatildeo de um anteprojeto de lei passando pela

formaccedilatildeo da comissatildeo de redaccedilatildeo e escolha de seus membros a seguir seraacute detalhado o processo his-

toacuterico da elaboraccedilatildeo do anteprojeto e a participaccedilatildeo efetiva da sociedade na consolidaccedilatildeo da minuta

a ser apresentada ao Congresso Nacional e por derradeiro a transformaccedilatildeo do anteprojeto em lei (Lei

nordm 5172 de 30 de outubro de 1966)

Todo o trabalho de pesquisa deveraacute ser desenvolvido analisando-se a legislaccedilatildeo nacional inclu-

sive a constitucional publicaccedilotildees sobre a histoacuteria da codificaccedilatildeo do direito tributaacuterio projetos de lei

debates e sobretudo o processo histoacuterico no qual se inseriu as accedilotildees desenvolvidas visando a elabo-

raccedilatildeo da minuta de codificaccedilatildeo das normas tributaacuterias

Superadas todas estas etapas para a realizaccedilatildeo do trabalho espera-se ao final retratar com

relativa fidedignidade o processo histoacuterico de codificaccedilatildeo do Direito Tributaacuterio brasileiro que culminou

com a ediccedilatildeo da lei retrocitada transformada a posteriori em Coacutedigo Tributaacuterio Nacional como ele

foi inserido em nosso ordenamento juriacutedico e os efeitos que decorreram agrave eacutepoca de sua publicaccedilatildeo no

modelo poliacutetico juriacutedico e administrativo nacional

Da compreensatildeo deste processo histoacuterico se pode com certeza entender de maneira mais

ampla e segura o modelo tributaacuterio paacutetrio atual e porque o Coacutedigo que jaacute perdura por mais de qua-

renta anos continua sendo o mais importante instrumento de harmonizaccedilatildeo do sistema tributaacuterio

nacional apesar de nosso modelo poliacutetico de federalismo tatildeo complexo e ao mesmo tempo enge-

nhoso em sua concepccedilatildeo

E como afirma o Prof Waldemar Ferreira nenhum jurista pode dispensar o contingente do pas-

sado a fim de bem compreender as instituiccedilotildees juriacutedicas dos dias atuais (FERREIRA 1952 p1) sendo

destarte de fundamental importacircncia o conhecimento da histoacuteria do direito para a compreensatildeo dos

fenocircmenos juriacutedicos do presente

1 ANTECEDENTES DO PROCESSO DE CODIFICACcedilAtildeO DO DIREITO TRIBUTAacuteRIO NO BRASIL

11 O Sistema Tributaacuterio Nacional na Constituiccedilatildeo Federal de 1946

Para exame de qualquer ramo do Direito inclusive o do Direito Tributaacuterio a lembranccedila de sua

gecircnese e de seu desenvolvimento no tempo reveste-se de grande interesse e importacircncia sobretu-

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

190

do sob o aspecto pedagoacutegico A compreensatildeo da histoacuteria permite contextualizar melhor os temas

a serem abordados e assim melhor compreendecirc-los Ela portanto se transforma em elemento de

inegaacutevel valia e auxiliar de relevante destaque no estudo natildeo somente do direito enquanto realidade

soacutecio-cultural mas tambeacutem na anaacutelise de elementos que compotildeem sua estrutura em determinado

periacuteodo de evoluccedilatildeo da sociedade tendo sempre presente que em razatildeo de ser ele um reflexo das

relaccedilotildees humanas estaacute em contiacutenuo desenvolvimento pressupondo sempre a existecircncia de um direito

anterior regulador de tais relaccedilotildees intersubjetivas inerentes agrave condiccedilatildeo humana

E o Brasil (e natildeo poderia ser diferente) desde o iniacutecio de sua descoberta teve seu Direito Tribu-

taacuterio expresso pela legislaccedilatildeo fiscal (conjunto de leis e de praxes portuguesas) que eram aplicadas em

seu territoacuterio Assim o direito tributaacuterio brasileiro tem suas origens com o proacuteprio descobrimento do

Brasil e vem sofrendo todo o processo de evoluccedilatildeo ao qual eacute submetido agrave proacutepria sociedade

De se lembrar que para elaboraccedilatildeo de um panorama histoacuterico do Coacutedigo Tributaacuterio Nacional

eacute necessaacuterio se efetuar um corte epistemoloacutegico no tempo e adotar como ponto de partida um deter-

minado sistema juriacutedico vigente a justificar sua inserccedilatildeo no ordenamento paacutetrio

O Direito Tributaacuterio como afirma Machado (1998) enquanto conjunto de normas constituin-

do-se um ramo do Direito Puacuteblico natildeo tinha no Brasil nessa eacutepoca sido objeto de estudo como

ramo autocircnomo do Direito vale dizer natildeo havia um estudo sistematizado de seus institutos e nor-

mas nem discussotildees mais amplas pela comunidade acadecircmica acerca de sua existecircncia com foros

de autonomia

E o reflexo desse ldquodesconhecimentordquo se materializa em nossos sistemas tributaacuterios Veja-se o

sistema tributaacuterio estruturado na Constituiccedilatildeo Federal de 1946 que mesmo jaacute contendo uma certa

densidade estrutural ainda assim apresentava uma multiplicaccedilatildeo e acumulaccedilatildeo de incidecircncias tributaacute-

rias que dificultavam e oneravam a produccedilatildeo impondo ao contribuinte uma carga de tributos confusa

e elevada Como afirma Martins (1989 p19)

Os conflitos se sucediam as formas tributaacuterias eram utilizadas com imperfeiccedilotildees no-toacuterias as garantias se diluiacuteam em casuiacutesmos surgidos da melancoacutelica vocaccedilatildeo da Fe-deraccedilatildeo brasileira em transformar os governantes em criadores de despesas uacuteteis e inuacuteteis a serem ndash apenas apoacutes sua projeccedilatildeo ndash cobertas pelas receitas fiscais

Isso gerou permanente tensatildeo entre o contribuinte que se sentia penalizado com uma tri-

butaccedilatildeo injusta e o fisco cada vez mais exigindo recursos financeiros do particular E como salienta

Nogueira (1989) tal procedimento encontra fundamento para a exigecircncia no direito de tributar do

Estado decorrente de seu poder de impeacuterio pelo qual faz ldquoderivarrdquo para seus cofres uma parcela do

patrimocircnio das pessoas sujeitas agrave sua jurisdiccedilatildeo para atender as necessidades da sociedade

Atente-se que conforme Moraes (1993) o sistema tributaacuterio definido na Constituiccedilatildeo de 1946

preservando o modelo federativo fundamentava-se em trecircs premissas baacutesicas a) coexistecircncia de trecircs

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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sistemas tributaacuterios autocircnomos um para cada ente poliacutetico da Federaccedilatildeo (Uniatildeo Estados e Municiacute-

pios) separando-se teoricamente os campos de imposiccedilatildeo tributaacuteria de cada ente b) adoccedilatildeo de uma

classificaccedilatildeo dos impostos tendo como fundamento apenas o nome juriacutedico e desprezando-se o con-

teuacutedo econocircmico e c) preservaccedilatildeo da autonomia financeira das trecircs entidades poliacuteticas da Federaccedilatildeo

outorgada atraveacutes de impostos privativos embora houvessem participaccedilotildees financeiras no produto da

arrecadaccedilatildeo de impostos de um poder tributante por parte de outro visando reduzir desequiliacutebrios e

fortalecer a Federaccedilatildeo

Esta Constituiccedilatildeo disciplinou o sistema tributaacuterio estabelecendo uma reparticcedilatildeo de compe-

tecircncia dos tributos entre os fiscos e impocircs limitaccedilotildees ao poder de tributar (art17) fixou a imunidade

reciacuteproca para efeito da instituiccedilatildeo do Imposto de Renda bens e serviccedilos da Uniatildeo dos Estados Dis-

trito Federal e Municiacutepios assegurou a imunidade dos templos de qualquer culto bens e serviccedilos de

partidos poliacuteticos instituiccedilotildees de educaccedilatildeo e de assistecircncia social e o papel destinado agrave impressatildeo de

livros jornais e perioacutedicos (art 31 V) Reintroduziu tambeacutem a contribuiccedilatildeo de melhoria com previsatildeo

constitucional e as taxas de competecircncia concorrente entre Uniatildeo Estados Distrito Federal e Municiacute-

pios dando mais solidez agrave estrutura tributaacuteria dos entes perifeacutericos

Vedou ainda limitaccedilotildees ao traacutefego de qualquer natureza por meio de tributos aleacutem de consa-

grar o princiacutepio da legalidade e o princiacutepio da anualidade ao estabelecer no art 141 sect 34 (dos Direitos

e das Garantias Individuais) que a) nenhum tributo seraacute exigido ou aumentado sem que a lei o esta-

beleccedila e b) nenhum seraacute cobrado em cada exerciacutecio sem preacutevia autorizaccedilatildeo orccedilamentaacuteria ressalvada

a tarifa aduaneira e o imposto lanccedilado por motivo de guerra

A Constituiccedilatildeo conferiu competecircncia agrave Uniatildeo para cobrar impostos sobre importaccedilatildeo de mer-

cadorias consumo de mercadorias produccedilatildeo comeacutercio distribuiccedilatildeo e consumo e bem assim im-

portaccedilatildeo e exportaccedilatildeo de lubrificantes e de combustiacuteveis liacutequidos ou gasosos de qualquer origem ou

natureza minerais do paiacutes e energia eleacutetrica imposto de renda transferecircncia de fundos para o exterior

e negoacutecios de sua economia

Aos Estados foi atribuiacuteda competecircncia para decretar impostos sobre a propriedade territorial

transmissatildeo causa mortis e inter vivos e sua incorporaccedilatildeo ao capital das sociedades aleacutem do imposto

sobre vendas e consignaccedilotildees exportaccedilatildeo de suas mercadorias para o estrangeiro com aliacutequota maacutexi-

ma de 5 ad valorem serviccedilos da justiccedila e negoacutecios de sua economia

Os Municiacutepios ficaram com as transferecircncias previstas constitucionalmente e com o imposto

predial e territorial urbano de licenccedila de induacutestrias e profissotildees sobre diversotildees puacuteblicas sobre atos

de sua economia ou de assuntos de sua competecircncia

Em que pese estrutura a tributaacuteria definida pela Constituiccedilatildeo de 1946 conforme visto contendo

significativos avanccedilos vaacuterios problemas assolavam o paiacutes dentre os quais um processo inflacionaacuterio

galopante que corroiacutea o poder de compra da moeda o iniacutecio de crise e desordens poliacuteticas e adminis-

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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trativas Veja-se o elenco de criacuteticas sintetizadas ainda com Moraes (1993) nos seguintes aspectos

a) tributaccedilatildeo ampla e variada permitindo incidecircncias tributaacuterias em duplicidade sendo que o

acircmbito de incidecircncia dos tributos baseava-se em distinccedilotildees meramente juriacutedicas ignorando os fatos

econocircmicos

b) a discriminaccedilatildeo de rendas tributaacuterias apresentava-se empiacuterica natildeo se originando de anaacutelise

econocircmica pondo em risco o regime federativo em razatildeo do desequilibro causado

c) o imposto sobre vendas e consignaccedilotildees se apresentava com incidecircncia cumulativa em cas-

cata prejudicando a comercializaccedilatildeo e industrializaccedilatildeo de produtos

d) o excesso de leis provocando a proliferaccedilatildeo de obrigaccedilotildees acessoacuterias e a complexidade de

procedimentos a serem adotados pelo contribuinte dificultando suas atividades

Apesar da teoacuterica separaccedilatildeo das competecircncias entre os entes tributantes e da classificaccedilatildeo ( ju-

riacutedica) dos tributos outro problema detectado com frequecircncia era a constante invasatildeo pelas taxas de

aacutereas de competecircncias dos impostos bem como a criaccedilatildeo de contribuiccedilotildees que se confundiam com

taxas ou impostos todos exigidos do particular

De outro lado o progresso econocircmico e o crescimento do paiacutes impunham mudanccedilas que re-

movessem esses empecilhos ao desenvolvimento nacional dotando-se o paiacutes de uma estrutura tri-

butaacuteria moderna e adequada agrave realidade poliacutetica e econocircmica que ora se apresentava Natildeo era mais

possiacutevel se compatibilizar o estaacutegio de desenvolvimento que a naccedilatildeo brasileira experimentava com um

sistema juriacutedico-tributaacuterio arcaico como comentado que inexoravelmente a levava ao engessamento

e impedia seu desenvolvimento em niacuteveis desejados e exigidos pela sociedade em contiacutenua evoluccedilatildeo

Aleacutem de todos os problemas anteriormente apontados um fator de desequilibro financeiro se

fazia presente na economia nacional qual seja a existecircncia de um quadro inflacionaacuterio instaacutevel e re-

cessivo que impunha a urgente necessidade de mudanccedilas lanccedilando a semente para a realizaccedilatildeo de

uma reforma tributaacuteria adequada agraves necessidades do paiacutes e que viesse dotaacute-lo do instrumental neces-

saacuterio agrave plena evoluccedilatildeo econocircmica nos patamares exigidos pela novel realidade econocircmica

12 A Emenda Constitucional no 1865

Como visto era imperioso que se processasse radical transformaccedilatildeo no sistema tributaacuterio na-

cional O Presidente Castelo Branco visando essa reestruturaccedilatildeo segundo as diretrizes sugeridas pelos

professores Otaacutevio Gouveia de Bulhotildees e Roberto Campos Ministros respectivamente da Fazenda

e do Planejamento determinou em caraacuteter de urgecircncia a elaboraccedilatildeo normativa necessaacuteria a con-

secuccedilatildeo de tal fim Foram entatildeo convidados dois ilustres professores de direito tributaacuterio brasileiros

Rubens Gomes de Sousa e Gilberto de Ulhoa Canto para prestaram assessoria ao governo federal na

idealizaccedilatildeo e preparaccedilatildeo de uma proposta de mudanccedila do sistema tributaacuterio

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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Em verdade esta mudanccedila comeccedilou com a Portaria Conjunta GB 30 de 27 de janeiro de 1965

do Ministeacuterio de Estado dos Negoacutecios da Fazenda e do Planejamento que instituiu uma comissatildeo

especial para elaborar um projeto de reforma constitucional Esta comissatildeo era formada por juristas

e renomados teacutecnicos da administraccedilatildeo puacuteblica nas aacutereas financeira e econocircmica Seus componentes

eram Luis Simotildees Lopes como presidente o prof Rubens Gomes de Sousa designado relator como

membros foram indicados Gerson Augusto da Silva Sebastiatildeo SantrsquoAna e Silva Gilberto de Ulhoa

Canto e Maacuterio Henrique Simonsen A comissatildeo preparou dois anteprojetos de emenda constitucional

Depois da divulgaccedilatildeo das propostas para receber sugestotildees da sociedade e em especial dos juristas

ela foi apoacutes sua fusatildeo e consolidaccedilatildeo enviada em outubro de 1965 ao Ministeacuterio da Fazenda que a

encaminhou ao Presidente da Repuacuteblica A posteriori foi por este remetida ao Congresso Nacional que

aprovou o projeto em 1ordm de dezembro de 1965 com o nuacutemero de Emenda Constitucional 18 instituin-

do uma nova discriminaccedilatildeo de rendas e uma estrutura moderna e totalmente diversa do que se tinha

ateacute entatildeo feito no Brasil em mateacuteria fiscal

Eacute o que se colhe do bem lanccedilado comentaacuterio de Moraes (2000 p 153) ao afirmar que

Desde 1891 a discriminaccedilatildeo de rendas tributaacuterias vinha sendo repetida nas Consti-tuiccedilotildees que se seguiram (1934 1937 e 1946) sem a menor imaginaccedilatildeo alterando-se apenas a parte relativa agrave competecircncia tributaacuteria das entidades poliacuteticas ou melhor modificando-se as pessoas de direito puacuteblico titulares de cada imposto A Emenda Constitucional nordm 18 de 1965 natildeo mais copiou comodamente a teacutecnica anterior mas realizando uma reforma de essecircncia pois aleacutem de alterar a discriminaccedilatildeo de competecircncia tributaacuteria a Emenda adotou uma classificaccedilatildeo de imposto baseada em nomenclatura econocircmica procurando solucionar ainda outros problemas inclusive os dos efeitos econocircmicos dos impostos

Feita a primeira grande reforma tributaacuteria em sede de Constituiccedilatildeo Federal os entes tributantes

que compotildeem a Federaccedilatildeo brasileira passaram conviver com uma nova realidade onde estavam de-

finidas as competecircncias e atribuiccedilotildees de cada ente de maneira clara e exclusiva evitando destarte as

superposiccedilotildees tributaacuterias que ateacute entatildeo haviam norteado a tributaccedilatildeo no Brasil Contudo para imple-

mentar o novo modelo tributaacuterio concebido pela Emenda Constitucional 1865 havia a necessidade

da ediccedilatildeo de vaacuterias leis complementares em razatildeo ateacute da competecircncia de cada unidade poliacutetica de

legislar sobre seus proacuteprios sistemas tributaacuterios decorrentes do modelo federativo adotado no paiacutes

2 O COacuteDIGO TRIBUTAacuteRIO NACIONAL (CTN)

21 Precedentes da codificaccedilatildeo

A ideia da codificaccedilatildeo natildeo eacute nova e natildeo foi originada na eacutepoca da Revoluccedilatildeo Francesa O termo

codex eacute de origem romana caudex eacute um conjunto de vaacuterias taacutebuas unidas daiacute tabuinha de escrever

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

194

livro Portanto codex designa a uniatildeo material de vaacuterios elementos antes dispersos formando uma

unidade Os coacutedigos de Teodoacutesio (438) e de Justiniano (529 e 534) satildeo exemplos mais antigos

22 Os Coacutedigos de Napoleatildeo

A codificaccedilatildeo como instrumento de realizaccedilatildeo do Direito eacute uma aspiraccedilatildeo da sociedade que

sempre e continuamente tem acompanhado sua evoluccedilatildeo Como bem demonstra Justo (2000 p 216)

ldquoMovimento codificador eacute um dos frutos do Iluminismo que afirmou a excelecircncia da razatildeo (subjetiva e

criacutetica) e um racionalismo essencialmente humanista e antropocecircntricordquo agrave sociedade na busca de seu

pleno desenvolvimento

E Napoleatildeo compreendeu agrave perfeiccedilatildeo essa relaccedilatildeo entre codificaccedilatildeo e desenvolvimento da

sociedade tanto que conseguiu dar agrave Franccedila um conjunto de coacutedigos que constituem um dos mais

notaacuteveis esforccedilos de sistematizaccedilatildeo de regras juriacutedicas de toda a histoacuteria Assim eacute que de 1804 a 1810

foram sucessivamente promulgados um Coacutedigo Civil um Coacutedigo de Processo Civil um Coacutedigo Comer-

cial um Coacutedigo Penal e um Coacutedigo de Instruccedilatildeo Criminal

A maior parte deles manteve-se em vigor ateacute aos nossos dias tanto na Franccedila como na Beacutel-

gica Aleacutem disso influenciaram a codificaccedilatildeo em numerosos paiacuteses da Europa e da Ameacuterica Latina

durante o seacutec XIX inclusive no Brasil onde tais ordenaccedilotildees foram aplicadas especialmente no que

se refere ao Direito Civil

Sem nenhuma duacutevida o processo histoacuterico de codificaccedilatildeo desenvolvido na Franccedila por Napo-

leatildeo irradiou-se por todo o mundo natildeo somente servindo de base para a criaccedilatildeo de normas juriacutedicas

em vaacuterias naccedilotildees mas sobretudo na disseminaccedilatildeo do conhecimento que provocou sendo uma refe-

recircncia para a moderna histoacuteria do Direito

Eacute certo que natildeo se pode perder de vista a importacircncia do processo de codificaccedilatildeo para o desen-

volvimento das sociedades Contudo a publicaccedilatildeo em si de coacutedigos com seguranccedila natildeo eacute a soluccedilatildeo

para todos os problemas juriacutedicos decorrentes das relaccedilotildees sociais Faz-se necessaacuterio sobretudo uma

mudanccedila de mentalidade para assimilar a nova cultura juriacutedica implantada para reger estas relaccedilotildees

E esta afirmativa colhe-se do lapidar pensamento a seguir transcrito que mesmo apesar de se referir

a uma determinada regiatildeo em uma determinada eacutepoca reflete a realidade agrave qual foram submetidas

todas as naccedilotildees que enfrentaram o processo de codificaccedilatildeo do Direito

Entendo oportuno dedicar um espaccedilo ao outra reflexatildeo Ainda que agrave primeira vis-ta possa parecer simplesmente absurdo parece-me vital ter presente que a simples sanccedilatildeo do coacutedigo natildeo foi condiccedilatildeo suficiente para assegurar a exaltaccedilatildeo da sua nova cultura juriacutedica Isto obviamente natildeo significa que natildeo se admita a existecircncia de uma vinculaccedilatildeo entre a cultura da codificaccedilatildeo e a vigecircncia de novos corpos legais O que quero dizer eacute que seu ecircxito obedeceu antes de tudo a uma questatildeo de mentalidades Ou seja para que a praacutetica dos coacutedigos se transformasse em autecircntica cultura era

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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necessaacuterio que os juristas tivessem um compromisso para o qual nem todos os opera-dores juriacutedicos rioplatenses anteriores a 1880 estavam preparados Em definitivo para alcanccedilar sua consagraccedilatildeo o coacutedigo teve de esperar ser utilizado por uma nova classe de juristas que fez dele o efetivo eixo de seu discurso juriacutedico (ABAacuteSOLO 2008 p243)

23 O processo de codificaccedilatildeo no Brasil

No Brasil a ideia da codificaccedilatildeo remonta aos dias que sucederam agrave independecircncia Ainda em

1823 uma lei previa a elaboraccedilatildeo de um novo coacutedigo (lei de 20 de Outubro) enquanto que o mesmo

era previsto na Constituiccedilatildeo de 1824 (art 179 sect 18) Em 1858 Teixeira de Freitas um dos mais bri-

lhantes juristas da eacutepoca foi encarregado de elaborar um projeto que no entanto acabou por natildeo

ser aceito Novos projetos (Nabuco de Arauacutejo Feliacutecio dos Santos Antocircnio Coelho Rodrigues) tambeacutem

foram elaborados mas natildeo lograram ecircxito E eacute soacute em 1916 que um Coacutedigo Civil com base num proje-

to de Cloacutevis Bevilaacutequa professor da Faculdade de Direito em Recife acaba por ser aprovado apoacutes 17

anos de discussotildees em comissatildeo e no parlamento

24 O movimento de codificaccedilatildeo do Direito Tributaacuterio no Brasil

A codificaccedilatildeo do Direito Tributaacuterio no Brasil em que pese todas as dificuldades que se apre-

sentavam era um processo irreversiacutevel ateacute porque em vaacuterios outros paiacuteses jaacute havia sido com ecircxito

concluiacutedo os processos de codificaccedilatildeo Note-se que a mudanccedila ocorrida no seacuteculo XX em relaccedilatildeo agrave

codificaccedilatildeo estendeu-se a outros ramos do direito sobretudo ao direito fiscal Como bem demonstra

Balleiro (1973) jaacute haviam implantado codificaccedilotildees os franceses com o Coacutedigo Geral dos Impostos

(1950) reunindo os sete coacutedigos franceses os italianos com o coacutedigo fiscal total (1938) a Ordenaccedilatildeo

Tributaacuteria do Reich Alematildeo (RAO) publicada em 1919 e a Beacutelgica a Espanha a Argentina e os Estados

Unidos tambeacutem iniciaram um processo de codificaccedilatildeo ainda que limitados a determinados setores

tributaacuterios Seguiram-se expressivas accedilotildees convergindo todas nesse mesmo sentido tais como a Lei

de Justiccedila Fiscal do Meacutexico a publicaccedilatildeo do anteprojeto Giuliani Fonrouge pelo Centro de Investigaci-

oacuten de Derecho Financeiro da Faculdade de Direito de Buenos Aires e o Coacutedigo Fiscal da Proviacutencia de

Buenos Aires (lei 5246 de dezembro de 1947)

No Brasil um primeiro passo foi dado com as consolidaccedilotildees dos Impostos de Selo Consumo e

Regulamento do Imposto de Renda Contudo representou tal atitude apenas uma pequena tentativa

de por um miacutenimo de ordem no caos em que se encontrava tributaccedilatildeo nacional

Precisamente porque um dos grandes problemas encontrados no sistema tributaacuterio da eacutepoca

era o nuacutemero excessivo de leis tributaacuterias situaccedilatildeo essa que se agravava em funccedilatildeo da estrutura fede-

rativa do Estado brasileiro em que no mesmo territoacuterio havia uma sobreposiccedilatildeo de ordens juriacutedicas

federal estadual e municipal Faltava um instrumento de caraacuteter nacional capaz de gerar certa conver-

gecircncia entre as regulamentaccedilotildees estaduais e municipais

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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Como afirma De Santi (2008 p327) ldquoNo mesmo territoacuterio paacutetrio o contribuinte eacute disputado

por trecircs competecircncias fiscais que nem sempre coordenam as respectivas exigecircncias para bom conviacute-

vio entre si e com os governadosrdquo

Era necessaacuteria para harmonizaccedilatildeo do sistema tributaacuterio nacional a ediccedilatildeo de normas de caraacute-

ter geral qual seja aquelas sobrenormas que dirigidas agrave Uniatildeo Estados Municiacutepios e Distrito Federal

visam agrave realizaccedilatildeo das funccedilotildees certeza e seguranccedila do direito oferecendo estabilidade nas relaccedilotildees

juriacutedicas decorrentes das accedilotildees humanas

Essas normas gerais exercem uma funccedilatildeo estruturante do sistema juriacutedico e garantem um miacuteni-

mo de uniformidade legislativa o que no acircmbito do Direito configura importante garantia para aque-

les a quem eacute dada a incumbecircncia de manter financeiramente o Estado Satildeo de extrema importacircncia

para o equilibro e a eficiecircncia do ordenamento juriacutedico pois

[] o fato de existirem tantas fontes produtoras de normas (Uniatildeo Estados Distrito Federal e Municiacutepios) leva agrave possibilidade de inuacutemeros conflitos divergecircncias e super-posiccedilatildeo de normasCom a finalidade de assegurar um miacutenimo de uniformidade nacional agrave disciplina legal a constituiccedilatildeo brasileira prevecirc a possibilidade de a Uniatildeo editar leis que veiculem nor-mas gerais sobre determinadas mateacuterias cujo regime eacute o seguintebull as normas gerais aplicam-se a todas as entidades poliacuteticas (Uniatildeo Estados-federa-dos e Municiacutepios) Entende-se que as normas gerais satildeo normas ldquonacionaisrdquo (de todo o paiacutes) e natildeo ldquofederaisrdquo (apenas da Uniatildeo) A produccedilatildeo da norma geral eacute feita pelos oacutergatildeos da Uniatildeo (federal) mas a norma tem natureza nacionalbull enquanto a Uniatildeo natildeo editar uma ldquonorma geralldquo cada entidade poliacutetica pode exer-cer plenamente a competecircncia legislativa que lhe foi atribuiacuteda para atender a suas peculiaridades (Art 24 cf)bull sobrevindo a norma geral ela suspende a eficaacutecia da lei federal estadual ou munici-pal no que as contrariar Natildeo haacute revogaccedilatildeo da lei mas apenas suspensatildeo da eficaacutecia ou seja deixa de ser aplicaacutevel mas natildeo eacute retirada do ordenamento juriacutedico positivo isso significa que se a norma geral for revogada a lei federal estadual ou municipal recupera sua eficaacutecia sem necessidade de haver nova produccedilatildeo normativa ( Art 24 sect 4deg) ebull uma lei ordinaacuteria federal estadual ou municipal nova conflitar com uma norma geral existente entende-se que eacute hipoacutetese de inconstitucionalidade da lei nova por invasatildeo de competecircncia (art 102 III ldquodrdquo) (GRECCO 2008 p325)

A Emenda Constitucional 18 de 1965 a par do grande avanccedilo que proporcionou ao paiacutes em

mateacuteria tributaacuteria necessitava para que se concretizassem seus os objetivos do exerciacutecio da compe-

tecircncia legislativa qual seja a ediccedilatildeo de normas infraconstitucionais de caraacuteter nacional responsaacuteveis

pela arquitetura do sistema

25 Movimentos que antecederam a elaboraccedilatildeo do CTN

A multiplicidade dos problemas de natureza especificamente tributaacuteria levantados na Segunda

Conferecircncia de Teacutecnicos em Contabilidade Puacuteblica e Assuntos Fazendaacuterios reunida em 1940 forccedilou o

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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reconhecimento da necessidade da elaboraccedilatildeo para o direito tributaacuterio de um conjunto de normas

gerais Daiacute resultou a convocaccedilatildeo em 1941 da Primeira Conferecircncia Nacional da Legislaccedilatildeo Tributaacute-

ria na qual o tema da codificaccedilatildeo recebeu tratamento orgacircnico aplicaacutevel por igual aos trecircs niacuteveis de

governo que continuariam a legislar sobre os seus proacuteprios tributos poreacutem com estrita observacircncia

daqueles princiacutepios comuns por ela traccedilados que imprimiriam ao sistema a desejada uniformidade

Simultaneamente a isto uma centralizaccedilatildeo administrativa mais acentuada veio contribuir para a

busca da soluccedilatildeo dos problemas Um primeiro exemplo resultante da Conferecircncia dos Secretaacuterios de

Fazenda realizada em 1938 eacute o decreto-lei 915 daquele ano que solucionou normativamente os con-

flitos de competecircncia na tributaccedilatildeo das vendas interestaduais de mercadorias No decreto-lei 1202 de

1939 encontravam-se dispositivos visando a uniformizaccedilatildeo da atividade tributaacuteria dos Estados e Muni-

ciacutepios Por sua vez os decretos-leis 1804 de 1939 e 2416 de 1940 consagrando em lei as recomenda-

ccedilotildees da Primeira e da Segunda Conferecircncia de Contabilidade Puacuteblica e Assuntos Fazendaacuterios vieram

codificar todo o setor da atividade financeira puacuteblica ultrapassando o campo da teacutecnica e elaborando

regras substantivas no que se refere agrave conceituaccedilatildeo de certos institutos tributaacuterios Finalmente o de-

creto-lei 960 de 1938 embora decorra da competecircncia legislativa da Uniatildeo em mateacuteria de processo

pode ser enquadrado na mesma ordem de ideacuteias pois se reflete sobre o direito financeiro em todo

o importante setor da cobranccedila executiva da diacutevida ativa da Fazenda Puacuteblica Contudo os problemas

inerentes ao sistema tributaacuterio conforme apontados continuavam a causar seu efeito nocivo e deleteacute-

rio ao desenvolvimento nacional impondo a necessidade urgente de uma sistematizaccedilatildeo racional da

ordem juriacutedica tributaacuteria

26 O anteprojeto de lei

Diante dessa realidade o governo federal tomou para si a responsabilidade de iniciar o processo

de elaboraccedilatildeo de um Coacutedigo Tributaacuterio Nacional O Ministro da Fazenda Dr Oswaldo Aranha nomeou

uma comissatildeo especial para elaborar minuta de anteprojeto de lei tratando das normas gerais de di-

reito tributaacuterio Referida comissatildeo era formada pelo proacuteprio Ministro que assumiu a presidecircncia e

pelos seguintes componentes Prof Rubens Gomes de Sousa (relator) e os funcionaacuterios do Ministeacuterio

Afonso Almiro Ribeiro da Costa Pedro Teixeira Soares Juacutenior Gerson Augusto da Silva e Romeu Gibson

Tal comissatildeo especial como dito tinha por objetivo elaborar um anteprojeto de lei que tratasse ldquosobre

o sistema tributaacuterio nacional e instituiacutesse normas gerais de direito aplicaacuteveis agrave Uniatildeo Estados e Muni-

ciacutepiosrdquo visando harmonizar as normas juriacutedicas e eliminar os graves problemas decorrentes do modelo

tributaacuterio nacional especialmente a multiplicidade de normas e incidecircncias tributaacuterias

Uma peculiaridade do coacutedigo tributaacuterio brasileiro que o destinguiraacute de todos os demais da

mesma natureza eacute justamente o caraacuteter nacional decorrente de sua aplicabilidade simultacircnea aos trecircs

niacuteveis de governo integrantes da Federaccedilatildeo Essa caracteriacutestica eacute fundamental portanto sua influecircn-

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

198

cia natildeo se restringe aos aspectos imediatamente decorrentes da implantaccedilatildeo constitucional no que se

refere agrave competecircncia legislativa mas se estende a toda a sistemaacutetica do direito tributaacuterio substantivo

regulada no coacutedigo E a orientaccedilatildeo da comissatildeo foi compatiacutevel com a realidade do paiacutes baseado no

triacuteplice plano econocircmico juriacutedico e poliacutetico

Segundo se constata na exposiccedilatildeo de motivos nordm 1250 de 2171954 do Ministro da Fazen-

da encaminhando o anteprojeto de lei ao Presidente da Repuacuteblica a Comissatildeo preocupou-se em

desenvolver seus trabalhos no terreno exclusivamente juriacutedico Teve o cuidado de se conservar em

plano rigorosamente neutro evitando soluccedilotildees juriacutedicas que interferissem na atividade do legislador

ordinaacuterio no tocante agrave orientaccedilatildeo poliacutetica ou econocircmica que se deseje imprimir por intermeacutedio da

legislaccedilatildeo tributaacuteria especiacutefica ou que viessem condicionar a formulaccedilatildeo dessa orientaccedilatildeo agravequeles a

quem competia essa responsabilidade

O Projeto compreendia seis livros precedidos de uma Disposiccedilatildeo Preliminar e seguido de al-

gumas Disposiccedilotildees Finais e Transitoacuterias A Disposiccedilatildeo Preliminar definindo o conteuacutedo do Coacutedigo em

funccedilatildeo da competecircncia legislativa constitucional que invoca foi corretamente colocada em Capiacutetulo

proacuteprio antecedendo os demais Nas Disposiccedilotildees Finais e Transitoacuterias constam algumas regras com-

plementares de aplicaccedilatildeo do proacuteprio Coacutedigo visando principalmente atenuar seus efeitos iniciais

sobre a legislaccedilatildeo existente agrave data de sua entrada em vigor

Os seis livros tratavam respectivamente da competecircncia tributaacuteria dos tributos da legislaccedilatildeo

da obrigaccedilatildeo do creacutedito e da administraccedilatildeo segundo a ordem decrescente da generalidade dos as-

suntos congregando organicamente os poderes do estado em mateacuteria tributaacuteria os instrumentos da

sua atuaccedilatildeo e o proacuteprio funcionamento desta uacuteltima

Concluiacutedo o anteprojeto de lei este foi exposto no Diaacuterio Oficial da Uniatildeo e em avulsos

amplamente divulgados em todo o paiacutes para receber criacuteticas e sugestotildees Primeiro no periacuteodo de

marccedilo a setembro de 1953 prazo fixado para a apresentaccedilatildeo de sugestotildees a comissatildeo examinou o

anteprojeto em todos os seus artigos confrontando-os com a legislaccedilatildeo vigente e analisando-os agrave

luz da jurisprudecircncia predominante da doutrina e do direito comparado especialmente os coacutedigos

receacutem publicados

Paralelamente procurou por meio de palestras e reuniotildees de debates realizadas nas diversas

regiotildees do paiacutes ouvir as autoridades fazendaacuterias as entidades representativas dos contribuintes as

associaccedilotildees culturais e estudiosos da mateacuteria buscando captar as aspiraccedilotildees e receber sugestotildees da-

queles que mais diretamente lidam com a espeacutecie na condiccedilatildeo de seus operadores

Em um segundo momento (segunda fase dos trabalhos) no periacuteodo de janeiro a abril de

1954 foi realizado um novo exame integral do anteprojeto e das 1152 sugestotildees recebidas Apoacutes a

conclusatildeo da nova anaacutelise a comissatildeo especial tendo como relator-geral o Prof Rubens Gomes de

Sousa discutiu e votou no mecircs de maio de 1954 o texto definitivo do projeto e a justificaccedilatildeo indi-

vidual de seus artigos

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

199

Concluiacuteda a proposta foi ela entregue ao Ministro da Fazenda para ser submetido agrave rotina do

processo legislativo de elaboraccedilatildeo das leis Ainda chegou a ser discutido na Comissatildeo de Constituiccedilatildeo

e Justiccedila onde recebeu parecer favoraacutevel Quando foi posto em pauta para deliberaccedilatildeo os sucessores

do Ministro Aranha no Ministeacuterio da Fazenda por divergecircncias poliacuteticas solicitaram ao liacuteder do go-

verno o adiamento da votaccedilatildeo para fazer modificaccedilotildees E estas alteraccedilotildees nunca foram apresentadas

ficando referido projeto paralisado no Congresso Nacional sem ser analisado e sem sofrer tramitaccedilatildeo

Somente em 1965 foi formada uma nova comissatildeo composta pelo jaacute citado pelo Prof Rubens

Gomes de Sousa Gilberto de Ulhoa Canto Gerson Augusto da Silva e Luiz Gonzaga do Nascimento

e Silva que resgatou o antigo projeto paralisado no Congresso Nacional desde 1954 fez uma ampla

revisatildeo para adequaacute-lo agrave Emenda Constitucional 18 de 1965 ndash cognominada de reforma tributaacuteria

ndash resultando este processo em amplas modificaccedilotildees e reduccedilotildees significativas da proposta original

Concluiacuteda a revisatildeo o anteprojeto de lei em sua nova conformaccedilatildeo foi encaminhado ao Congresso

sob o nuacutemero 13 de 1966 para discussatildeo e votaccedilatildeo sendo enfim aprovado como a Lei nordm 5172 de

30 de outubro de 1966 que ldquoDispotildee sobre o Sistema Tributaacuterio Nacional e institui normas gerais de

direito tributaacuterio aplicaacuteveis agrave Uniatildeo Estados e Municiacutepiosrdquo

27 A Lei no 5172 de 1966 (Coacutedigo Tributaacuterio Nacional)

A lei em comento foi enfim aprovada com uma estrutura mais geral e objetiva que as pro-

postas anteriores Constitui-se de uma disposiccedilatildeo preliminar (como proposto no projeto original) e

de apenas dois livros o Livro Primeiro formado pelos artigos 2ordm ao 95 dispotildee sobre as seguintes

mateacuterias regula o sistema tributaacuterio nacional contendo normas sobre disposiccedilotildees gerais limitaccedilotildees

de competecircncia tributaacuteria impostos do sistema taxas e contribuiccedilotildees de melhoria inclusive normas

sobre distribuiccedilotildees de receitas tributaacuterias e o Livro segundo formado pelos artigos 96 ao 218 dispon-

do sobre os seguintes conteuacutedos normas gerais de direito tributaacuterio contendo regras sobre legislaccedilatildeo

tributaacuteria (objeto vigecircncia aplicaccedilatildeo interpretaccedilatildeo e integraccedilatildeo) obrigaccedilatildeo tributaacuteria (fato gerador

sujeito ativo sujeito passivo e responsabilidade) creacutedito tributaacuterio (constituiccedilatildeo suspensatildeo extinccedilatildeo

exclusatildeo garantias e privileacutegios) administraccedilatildeo tributaacuteria (fiscalizaccedilatildeo diacutevida ativa e certidatildeo negativa)

e as disposiccedilotildees finais e transitoacuterias

Apoacutes este longo periacuteodo de maturaccedilatildeo no Parlamento teve-se por fim aprovada a lei de nor-

mas gerais em mateacuteria tributaacuteria com vigecircncia em todo territoacuterio nacional Por forccedila do Ato Comple-

mentar nordm 36 de 13 de marccedilo de 1967 (art 7ordm) esta lei foi denominada de Coacutedigo Tributaacuterio Nacional

(CTN) Enfim vencida uma longa e penosa etapa no direito brasileiro surgiu o instrumento harmoni-

zador desse caoacutetico sistema causando mudanccedilas significativas na cultura juriacutedica nacional pois

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

200

Nenhuma duacutevida existe de que o CTN representou sensiacutevel marco na evoluccedilatildeo do Di-reito Tributaacuterio no Paiacutes devendo-se em grande parte agrave esplecircndida produccedilatildeo doutrinaacute-ria e jurisprudencial dos uacuteltimos vinte anos sua implantaccedilatildeo como sistema veiculador de imposiccedilatildeo fiscal (MARTINS 1989 p 34)

28 O CTN no ordenamento juriacutedico nacional

281 A funccedilatildeo do CTN

Em razatildeo de ser o CTN lei nacional de natureza distinta de lei federal suas disposiccedilotildees consti-

tuem regras informativas endereccediladas ao legislador que cuida de mateacuteria tributaacuteria afetando o contri-

buinte quase sempre apenas de maneira indireta atraveacutes de sua aplicaccedilatildeo na elaboraccedilatildeo normativa

Na conformaccedilatildeo juriacutedica por ele assumida sua funccedilatildeo eacute estruturante no sistema qual seja estabelecer

normais gerais voltadas para a administraccedilatildeo tributaacuteria

Com efeito o Coacutedigo procurou sistematizar a partir de conceitos juriacutedicos o exerciacutecio do poder

tributaacuterio e veio como desdobramento de uma ampla reforma constitucional tributaacuteria (implementa-

da pela jaacute citada Emenda Constitucional 18 de 1965) que revogou um sistema de caraacuteter histoacuterico

para implantar um sistema de caraacuteter racional e moderno tendo como eixo condutor precisamente a

racionalidade e a objetividade tributaacuterias pedras fundamentais da reforma ao lado da busca de uma

ldquopurezardquo juriacutedica levada tatildeo longe a ponto de ignorar determinados princiacutepios em homenagem a po-

sitivaccedilatildeo das condutas que levam agrave estabilidade das relaccedilotildees juriacutedicas e sociais

Pode-se em apertada siacutentese distinguir algumas funccedilotildees baacutesicas do Coacutedigo como

a) constituir diretriz baacutesica a ser observada na accedilatildeo do legislador ordinaacuterio dos trecircs niacuteveis de

governo (Uniatildeo Estados e Municiacutepios)

b) natildeo revogar a legislaccedilatildeo ordinaacuteria existente pois natildeo guarda com esta afinidade de conteuacute-

dos materiais

c) natildeo criar tributo pois a lei ordinaacuteria eacute que pode definir os elementos essecircncias da exaccedilatildeo

fiscal servindo apenas de norte para sua criaccedilatildeo

d) disciplinar as limitaccedilotildees constitucionais ao poder de tributar dos entes poliacuteticos estabelecen-

do os criteacuterios e condiccedilotildees para o exerciacutecio da competecircncia tributaacuteria

Estas novas diretrizes implantadas no ordenamento paacutetrio certamente revolucionaram o pen-

samento juriacutedico nacional e possibilitaram a partir dos comandos nele fixados uma mudanccedila de com-

portamento natildeo somente nas administraccedilotildees tributaacuterias que passaram a ter diretrizes norteadoras de

sua produccedilatildeo legislativa mas para os contribuintes que encontraram no conjunto de normais gerais

as garantias e a seguranccedila juriacutedica necessaacuterias ao desenvolvimento de suas atividades em razatildeo da

estabilidade normativa assentada no Coacutedigo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

201

282 Algumas criacuteticas ao CTN

Como visto induvidosamente o CTN apresenta grandes qualidades que ainda hoje podem

ser observadas como servir de referencial objetivo e com elevado grau de seguranccedila para identifica-

ccedilatildeo de exigecircncias caracterizadas como tributaacuterias a harmonizaccedilatildeo (ainda que em grau miacutenimo) do

sistema e a seguranccedila juriacutedica oferecida nas relaccedilotildees esta racionalidade e objetividade ainda assim

merece criacuteticas

Com efeito conforme sintetiza Santi (2008) a forma como o Coacutedigo foi concebida apresenta

grande preocupaccedilatildeo com a estrutura do tributo sem levar em consideraccedilatildeo um elemento essencial

que eacute sua funccedilatildeo Natildeo estatildeo contempladas na concepccedilatildeo e definiccedilatildeo do CTN preocupaccedilotildees com os

fundamentos do tributo (p ex princiacutepios norteadores da tributaccedilatildeo como o da capacidade contributi-

va) nem com suas finalidades (p ex necessidades objetivas da sociedade quantificadas nos orccedilamen-

tos) uma confusatildeo conceitual entre obrigaccedilatildeo e creacutedito tributaacuterio e umas classificaccedilotildees inadequadas

(p ex decadecircncia como forma de extinccedilatildeo do creacutedito tributaacuterio) contendo ainda algumas definiccedilotildees

aceacutepticas e sem conteuacutedo loacutegico que natildeo retratam a vida e a dinamicidade da tributaccedilatildeo em conso-

nacircncia com a realidade de cada momento na evoluccedilatildeo da sociedade

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Como se constata ao longo do desenvolvimento deste estudo quase sempre se concebe o seacute-

culo XIX como o seacuteculo da codificaccedilatildeo E este movimento a par de se constituir um estilo peculiar de

fixaccedilatildeo do Direito implica todo um conjunto de mudanccedilas na sociedade e em especial nos operado-

res do Direito que para adequarem-se agrave nova realidade tiveram que sofrer um processo de mudanccedila

de mentalidade mormente em relaccedilatildeo compreensatildeo da realidade juriacutedica

Eacute certo que o processo de codificaccedilatildeo iniciado na Franccedila influenciou todo o mundo contempo-

racircneo contaminando os legisladores e incitando-os a direcionar a produccedilatildeo normativa para a produ-

ccedilatildeo de coacutedigos instrumentos de coesatildeo e harmonizaccedilatildeo das relaccedilotildees sociais

Impende salientar que este movimento de codificaccedilatildeo impotildee um processo de evoluccedilatildeo da

maneira de se interpretar o Direito figurando como um importante marco na moderna histoacuteria dos

sistemas juriacutedicos

Este processo de codificaccedilatildeo no Brasil data do seacuteculo passado iniciando-se com o Direito Civil

para ao final chegar ao Direito Tributaacuterio Somente em 1965 o Presidente Castelo Branco buscando

adequar a legislaccedilatildeo tributaacuteria aos seus ideais de governo determinou a formaccedilatildeo de uma nova co-

missatildeo liderada outra vez pelo Professor Rubens Gomes de Sousa objetivando modernizar o sistema

tributaacuterio nacional arcaico e de alto grau de lesividade para a economia e o progresso do paiacutes

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

202

Com a ediccedilatildeo da Emenda Constitucional 1865 o Brasil eacute dotado de um sistema tributaacuterio mo-

derno mas que necessitava de legislaccedilatildeo infraconstitucional para sua completa efetivaccedilatildeo

O citado Prof Rubens Gomes entatildeo juntamente como os demais membros da comissatildeo res-

gata o antigo projeto de coacutedigo apresentado e paralisado no Congresso Nacional desde 1953 e apoacutes

uma revisatildeo geral e sua completa adequaccedilatildeo agrave Emenda Constitucional 1865 enfim a proposta eacute apro-

vada como a lei 5172 de 30 de outubro de 1966

Importante frisar que mesmo sendo tal lei ordinaacuteria tem no ordenamento juriacutedico paacutetrio status de lei complementar em razatildeo da mateacuteria de que cuida qual seja normas gerais e complementares de

direito tributaacuterio entendimento este hoje por todos aceito inclusive na jurisprudecircncia assentada pelo

Supremo Tribunal Federal

Em que pese algumas criacuteticas feitas ao Coacutedigo quanto agrave sua limitaccedilatildeo estrutural ao desprezar

em sua elaboraccedilatildeo fundamentos do tributo como princiacutepios estruturais e um desvirtuamento em

sua finalidade ao tratar de reparticcedilatildeo de receitas eacute certo que tal regramento constituiu-se ao longo

dos anos no mais importante conjunto de normas para a harmonizaccedilatildeo das relaccedilotildees entre o Fisco e

o contribuinte em todos os niacuteveis de governo pois eacute de observacircncia obrigatoacuteria por todos os entes

tributantes servindo de substrato juriacutedico para a construccedilatildeo de toda uma jurisprudecircncia e ordenaccedilatildeo

normativa duradouras base do desenvolvimento e do aperfeiccediloamento contiacutenuo do Direito e por

conseguinte da evoluccedilatildeo do proacuteprio homem enquanto elemento nuclear da sociedade

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

203

REFEREcircNCIAS

ABAacuteSOLO Ezequiel O Adeus agrave antiga jurisprudecircncia as teses de doutorado da Universidade de Bue-nos Aires como reflexo do tracircnsito entre a hegemonia da cultura juriacutedica indiana e a da codificaccedilatildeo In FONSECA Ricardo Marcelo SEELAENDER Airton Cerqueira Leite (coord) Histoacuteria do Direito em perspectiva do antigo regime agrave modernidade Curitiba Juruaacute 2008

BALEEIRO Aliomar Direito Tributaacuterio Brasileiro 5 ed rev Rio de Janeiro Forense 1973

BRASIL Lei nordm 5172 de 30 de outubro de 1966 Coacutedigo Tributaacuterio Nacional Diaacuterio Oficial da Uniatildeo Brasiacutelia 27 de outubro de 1966 Seccedilatildeo I ndash Parte I

______ Ministeacuterio da Fazenda Trabalhos da Comissatildeo Especial do Coacutedigo Tributaacuterio Nacional Rio de Janeiro 1954

FERREIRA Waldemar Martins Histoacuteria do Direito Brasileiro Rio de Janeiro Freitas Bastos 1952

GILISSEN John Introduccedilatildeo Histoacuterica ao Direito 3 ed Traduccedilatildeo de Hespanha A Manoel e Malhei-ros L M Macaiacutesta Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste Gulbenkian 2001

MACHADO Hugo de Brito Curso de Direito Tributaacuterio 14 ed rev atualizada e ampliada Rio de Ja-neiro Malheiros Editores 1998

MARTINS Ives Gandra da Silva Sistema Tributaacuterio na Constituiccedilatildeo de 1988 Satildeo Paulo Saraiva 1989

MORAES Bernardo Ribeiro de Compecircndio de Direito Tributaacuterio 3 ed rev aumentada e atualizada Rio de Janeiro Forense 1993

NOGUEIRA Ruy Barbosa Curso de Direito Tributaacuterio 9 ed atual Satildeo Paulo Saraiva 1989

SANTI Eurico Marcos Diniz de (coord) Curso de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas Satildeo Paulo Saraiva 2008

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204

O ORDENAMENTO JURIacuteDICO E AS ANTINOMIAS TRIBUTAacuteRIAS O LI-TIacuteGIO IDEOLOacuteGICO-INTERPRETATIVO ENTRE O FISCO OS TRIBUNAIS

SUPERIORES E A DOUTRINA

SUMAacuteRIO Introduccedilatildeo 1 As caracteriacutesticas do ordenamento juriacutedico concei-tos linguagem e conhecimento 2 O reconhecimento das malfadadas anti-nomias e os criteacuterios para sua superaccedilatildeo os litiacutegios entre os agentes inter-pretativos 21 Criteacuterio cronoloacutegico 211 Revogaccedilatildeo da isenccedilatildeo da Cofins agraves sociedades civis prestadoras de serviccedilos profissionais legalmente regulamen-tadas 22 Criteacuterio hieraacuterquico 221 Diferencial de aliacutequota de ICMS nas ope-raccedilotildees interestaduais realizadas por natildeo contribuintes 23 Criteacuterio da espe-cialidade 231 Isenccedilatildeo tributaacuteria do Imposto de Renda Consideraccedilotildees finais Referecircncias

Tonny Iacutetalo Lima Pinheiro1

INTRODUCcedilAtildeO

Eacute necessaacuterio para estudarmos o Direito e suas diversas implicaccedilotildees normativas termos o pleno

conhecimento dos conceitos que marcam profundamente sua vetusta e dinacircmica teoria

Por meio dos conceitos que se amoldam agrave dinamicidade da vida entendemos que o Direito

deve ser estudado agrave luz do ordenamento juriacutedico e de suas principais caracteriacutesticas sistematicidade

completude e unicidade

O ordenamento juriacutedico eacute considerado um sistema porque tem na coerecircncia seu pressuposto

epistemoloacutegico Natildeo devem existir assim contradiccedilotildees nas normas juriacutedicas (regras) cabendo ao in-

teacuterprete por meio dos diversos criteacuterios de soluccedilatildeo das denominadas antinomias (criteacuterios cronoloacutegi-

co hieraacuterquico e especial) superaacute-las

A unicidade ainda diz respeito agrave capacidade de a Constituiccedilatildeo conceder ao ordenamento ju-

riacutedico apesar da existecircncia de diversas normas juriacutedicas (regras) que formam o universo do Direito

plena validade

Por sua vez o ordenamento juriacutedico eacute completo (completude garantida pelo jurista) dado agrave ine-

xistecircncia concreta de lacunas Haacute pois tendo em vista os elementos de integraccedilatildeo do Direito sempre

uma norma juriacutedica para disciplinar todas as condutas humanas

1 Bacharel em Direito pela Universidade de Fortaleza (2010) especialista em Direito Tributaacuterio pela Faculdade 7 de Setem-bro (2013) e Mestrando em Direito Constitucional pela Universidade Federal do Cearaacute (Turma 2014) Servidor Puacuteblico do Estado do Cearaacute lotado na SSPDS (Investigador de Poliacutecia Civil de 1ordf Classe) professor de graduaccedilatildeo e poacutes-graduaccedilatildeo aleacutem de articulista principalmente nas searas do Direito Tributaacuterio Direito Constitucional e Hermenecircutica Juriacutedica E-mail tonnyitalohotmailcom

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

205

Em razatildeo dessas caracteriacutesticas do ordenamento juriacutedico temos como foco principal deste ar-

tigo o diaacutelogo hermenecircutico travado entre o Fisco os tribunais e a doutrina acerca das diversas solu-

ccedilotildees de antinomias normativo-tributaacuterias Dando ademais ecircnfase agrave acircnsia de arrecadaccedilatildeo da Fazenda

Puacuteblica mesmo que haja distorccedilatildeo por parte dela dos demasiados conceitos definiccedilotildees noccedilotildees ou

ideais do Direito

Em especial portanto destacamos como exemplos dos metacriteacuterios de soluccedilatildeo de antino-

mias os casos respectivamente da revogaccedilatildeo da isenccedilatildeo da Cofins agraves sociedades civis prestadoras de

serviccedilos profissionais legalmente regulamentadas (criteacuterio cronoloacutegico) do diferencial de aliacutequota de

ICMS nas operaccedilotildees interestaduais realizadas por natildeo contribuintes (criteacuterio hieraacuterquico) e enfim os

casos de isenccedilatildeo tributaacuteria do Imposto de Renda (criteacuterio da especialidade)

Este artigo por oacutebvio natildeo encerra o estudo sobre o tema Todavia refletimos em cima de tais

causos juriacutedicos pois como tematizou Larry E Wood (1986) damos ao ato de pensar natildeo mais a rari-

dade acerca de sua reflexatildeo Em outras palavras abordamos os criteacuterios de soluccedilatildeo de antinomias com

exemplos do Direito Tributaacuterio uma vez que temos a tiacutemida intenccedilatildeo de dar aos juristas (lato sensu) o

poder de reflexatildeo para quem sabe mudarmos determinados paradigmas e enfim ir ao encontro da

dinamicidade do Direito

1 AS CARACTERIacuteSTICAS DO ORDENAMENTO JURIacuteDICO CONCEITOS LINGUAGEM E CONHE-CIMENTO

O estudo do Direito inicialmente tem de partir pela anaacutelise dos conceitos que formam sua ve-

tusta e dinacircmica teoria Esta conforme leciona Hugo de Brito Machado (2012 p 21) ldquonada mais eacute do

que o conjunto sistematizado de conceitosrdquo uma vez que ldquonos permite conhecer um dado domiacutenio da

realidaderdquo (ROCHA 2002 p 17)

Eduardo Luft (2005) com inteira razatildeo assevera que compreendemos o mundo por meio dos

conceitos apesar de alguns doutrinadores no acircmbito do conhecimento do Direito preferirem ao in-

veacutes de conceitos ou definiccedilotildees falar em noccedilotildees ou ideais (MACHADO 2012)

Escreve o professor Hugo de Brito Machado (2012 p 7) ainda que mesmo com certa impreci-

satildeo ou vaguidade sem conhecer os conceitos que compotildeem a Teoria Geral do Direito ldquonatildeo eacute possiacutevel

o conhecimento desse importante setor do saber humanordquo haja vista ser o Direito uma normatividade

entre os homens (RADBRUCH 2011)

O Direito dada agrave importacircncia da linguagem exige muita atenccedilatildeo e dedicaccedilatildeo daqueles que o

estudam (MACHADO 2012) Rafael Bielsa (1987 p 9) natildeo por acaso afirma que ldquosi hay uma disciplina en la cual convieve emplear la palabra adecuada o propria ella es la del Derechordquo Allan Kardec (1996 p 9) haacute muito nos ensinou que ldquopara as coisas novas necessitam-se de pala-

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

206

vras novas assim o quer a clareza da linguagem para evitar a confusatildeo inseparaacutevel do sentido muacuteltiplo

dos mesmos vocaacutebulosrdquo Hugo de Brito Machado Segundo (2005 p 129) acertadamente na mesma

toada assevera que o Direito eacute veiculado por intermeacutedio da linguagem sendo pois ldquoimpossiacutevel com-

preendecirc-lo sem antes interpretaacute-lordquo

Conhecimento numa perspectiva filosoacutefica platocircnica eacute opiniatildeo verdadeira acompanhada de

razatildeo ou seja ldquoo conhecimento exige aleacutem de opiniatildeo verdadeira o domiacutenio sobre o assunto o que

significa capacidade de dar razotildees sobre a opiniatildeo emitidardquo (LUFT 2005 p 23)

As verdades assim por mais contraditoacuterio que possa parecer tecircm como destino habitual con-

forme explanou T H Huxley (Apud SEN 2010 p 150) ldquocomeccedilarem como heresias e terminarem como

supersticcedilatildeordquo Por isso natildeo eacute errocircnea a liccedilatildeo de Paulo Dourado de Gusmatildeo rememorado pelo professor

Hugo de Brito Machado Segundo (2008 p 14) ao afirmar que as teorias cientiacuteficas (nelas se enqua-

drando o Direito) natildeo satildeo ldquonem verdadeiras nem falsas mas unicamente uacuteteisrdquo

Uma das mais maravilhosas facetas do Direito todavia eacute sua relatividade (ZAGREBELSKY 1999)

pois os conceitos satildeo marcados sempre a depender da posiccedilatildeo filosoacutefica do jurista pela ambiguidade

e vaguidatildeo Eacute esse relativismo que marca profundamente o Direito que o torna essencial ao homem

e inalienaacutevel agrave sociedade O Direito assim como os conceitos ou definiccedilotildees eacute e sempre seraacute insuficien-

te (relativismo consequencial) uma vez que ldquodecorre da proacutepria incapacidade do homem para produzir

coisas acabadas e perfeitasrdquo (VASCONCELOS 2006 p 166)

Natildeo eacute despiciendo salientarmos contudo que a existecircncia de muacuteltiplas opiniotildees natildeo deve nos

levar ao ceticismo Muito pelo contraacuterio Por ser natural a diversidade de pensamentos ldquoa unanimida-

de de pontos de vista eacute inalcanccedilaacutevelrdquo (MACHADO 2010 p 10) principalmente porque ldquonunca estamos

contentes onde estamosrdquo (SAINT-EXUPEacuteRY 2009 p 73)

Eduardo Luft (2005) nos ensina que a mais radical de todas as teses eacute a do relativismo sendo

pois inadmissiacutevel ldquoa afirmaccedilatildeo de que o mero consenso da comunidade de argumentaccedilatildeo determine

a verdade originaacuteriardquo (MAGALHAtildeES FILHO 2006 p 68)

O ser humano eacute dinacircmico e por consequecircncia sempre mutaacutevel cognoscitivamente Eduardo

Luft (2005 p 26-27) nesse sentido escreve que ldquocada homem interpreta o lsquomundorsquo agrave sua maneira com

seus proacuteprios condicionamentos bioloacutegicos e culturais dentro de seu proacuteprio aparato mental e de sua

situaccedilatildeo histoacutericardquo Assim conclui o filoacutesofo ldquoatribuir a homens diversos estados cognitivos comuns eacute

um enganordquo (LUFT 2005 p 27)

Hugo de Brito Machado Segundo (2008 p 21-22) entrementes leciona que ldquoeacute essencial a que

se possa falar em lsquoconhecimento cientiacuteficorsquo a provisoriedade de suas verdades e a possibilidade de

serem lsquotestadasrsquo ou terem sua veracidade (ou falsidade) posta agrave prova continuamenterdquo Conclui assim

o professor da Universidade Federal do Cearaacute que ldquocomo natildeo se pode afirmar o estacionamento da

evoluccedilatildeo das espeacutecies tambeacutem natildeo haacute estacionamento de ideiasrdquo (MACHADO SEGUNDO 2008 p 22)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

207

Toda obra intelectual nos lapidares ensinamentos de Arnaldo Vasconcelos (2001) eacute incompleto por

definiccedilatildeo Tudo eacute transitoacuterio pois ldquoo mundo eacute totalidade em contiacutenuo processo de auto-organizaccedilatildeordquo

(LUFT 2005 p 77) Ainda Segundo este filoacutesofo ldquoa existecircncia eacute essa marcha contiacutenua um presente

eternamente marcado por um passado e um futuro potencialmente infinitosrdquo (LUFT 2005 p 72)

Conhecer nas precisas liccedilotildees de Maria Helena Diniz (2001 p 13) tambeacutem ldquoeacute trazer para o sujei-

to algo que se potildee como objetordquo ou conforme nos informa Goffredo Telles Jr (1962 p 7) ldquoeacute a opera-

ccedilatildeo imanente pela qual um sujeito pensante se representa um objetordquo O conhecimento portanto eacute a

apreensatildeo intelectual do objeto eacute pois ldquouma transferecircncia das propriedades do objeto para o sujeito

pensanterdquo (DINIZ 2001 p 13) Natildeo por acaso pois ldquoa tarefa da inteligecircncia humana eacute tirar o valor das

coisas da obscuridade para a luzrdquo (DANTAS 1948 p 16)

Destarte haacute um verdadeiro intercambiamento entre o ldquoconhecerrdquo e o ldquoconceituarrdquo principal-

mente quando falamos de Direito Seja como for ldquoqualquer trabalho juriacutedico de pretensotildees cientiacuteficas

impotildee ao autor uma tomada de posiccedilatildeo no que atina aos conceitos fundamentais da mateacuteria em que

laborardquo (CARVALHO 1981 p 19) Natildeo podemos por tudo negar a importacircncia dos conceitos nos es-

tudos do Direito (MACHADO 2012)

Glauco Barreira Magalhatildees Filho (2006 p 200) nos mostra que ldquoo problema do conceito de Di-

reito eacute o problema de sua essecircnciardquo Se a ciecircncia foi criada para atingir a verdade e a arte para atingir o

belo o Direito por sua vez tem como fim o valor justiccedila razatildeo pela qual ldquotodo ordenamento juriacutedico

deve ser um ensaio de Direito justordquo (MAGALHAtildeES FILHO 2006 p 204)

O Direito escreve Norberto Bobbio (2011 p 37) natildeo se resume a norma mas num conjunto

ordenado de normas ldquosendo evidente que uma norma juriacutedica natildeo se encontra jamais soacute mas estaacute

ligada a outras normas com as quais forma um sistema normativordquo Portanto seguindo a trilha do dou-

trinador italiano soacute eacute possiacutevel de modo satisfatoacuterio definirmos o Direito se nos colocarmos do ponto

de vista do ordenamento juriacutedico

O ordenamento juriacutedico eacute classicamente formado por uma logicidade normativa de regras e

princiacutepios em gradual evoluccedilatildeo caracterizando-se por sua sistematicidade completude e unicidade

tendo ainda como fundamento de validade sua lei maior a Constituiccedilatildeo Todavia a beleza pela qual

transpassa o ordenamento juriacutedico natildeo eacute tatildeo simples de ser analisada

Na realidade o ordenamento juriacutedico eacute formado por mateacuteria juriacutedica caoacutetica com lacunas e

contradiccedilotildees tiacutepicas da atividade legislativa Apoiando-nos nas doutrinas de Giuseppe Zaccaria e Fran-

cesco Viola (2007) podemos afirmar que a ideia de ornamento juriacutedico eacute equivocada tratando-se de

um caos realiacutestico pois a rigor natildeo haacute um sistema mas sim um esforccedilo consciente de sistematizaccedilatildeo

realizado pelo inteacuterprete

Mesmo etimologicamente considerado o termo sistema advindo do grego systema significan-

do ldquopocircrrdquo (histemi) ldquojuntordquo (syn) ldquodar unidaderdquo (LUFT 2005) apresenta variadas concepccedilotildees nas mais

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

208

diversas aacutereas do conhecimento em que eacute usado natildeo sendo pois diferente do que ocorre no Direito

O ordenamento juriacutedico natildeo pode ser considerado prima facie um sistema perfeito pois natildeo

se apresenta sempre de forma concatenada haja vista a possibilidade de existirem antinomias e lacu-

nas

Dessa forma eacute de suma importacircncia a atividade do inteacuterprete com o objetivo de ordenar o con-

junto de regras postas transformando o caos normativo num sistema harmocircnico que preserva ente

outros sua unidade e coerecircncia Portanto dentro de uma postura kantiana a partir do qual o meacutetodo

constroacutei o objeto ldquoeacute o olhar cientiacutefico do jurista que constitui o ordenamento juriacutedico dando-lhe uni-

dade coerecircncia e completuderdquo (MAGALHAtildeES FILHO 2013 p 93)

Temos resumidamente que o ordenamento juriacutedico constitui um sistema porque nele natildeo

devem coexistir normas incompatiacuteveis (BOBBIO 2011) isto eacute tem a coerecircncia como pressuposto epis-

temoloacutegico

A coerecircncia do ordenamento juriacutedico expressatildeo derivada do latim cohaerentia significando

ldquouniatildeordquo ldquoligaccedilatildeordquo (LUFT 2005) ldquoconsiste na compatibilidade de suas partes entre si e das partes com o

todo Disso decorre o fato de natildeo se poder tolerar a permanecircncia de antinomias (conflito de normas)

as quais precisam ser solucionadasrdquo (MAGALHAtildeES FILHO 2013 p 95)

Aleacutem da coerecircncia sistecircmica do ordenamento juriacutedico ele tambeacutem se caracteriza pela unidade

Apesar de conforme suscitou Norberto Bobbio (2011 p 51) os ordenamentos juriacutedicos serem com-

plexos e ldquocompostos por uma miriacuteade de normas que tal como as estrelas do ceacuteu ningueacutem jamais foi

capaz de contarrdquo tecircm na Constituiccedilatildeo norma superior (mais geral e abstrata respectivamente) sua

unidade garantida

Concebe-se assim a Constituiccedilatildeo nos dizeres de Lecircnio Luiz Sreck (2004 p 225) como o ldquotopo

hermenecircutico que conformaraacute a interpretaccedilatildeo juriacutedica do restante do sistema juriacutedicordquo

Eacute a liccedilatildeo de Hans Kelsen (2006 p 247)

A norma que regula a produccedilatildeo eacute a norma superior a norma produzida segundo as determinaccedilotildees daquela eacute a norma inferior A ordem juriacutedica natildeo eacute um sistema de normas juriacutedicas ordenadas no mesmo plano situadas umas ao lado das outras mas eacute uma construccedilatildeo escalonada de diferentes camadas ou niacuteveis de normas juriacutedicas A sua unidade eacute produto da conexatildeo de dependecircncia que resulta do fato de a validade de uma norma que foi produzida de acordo com outra norma se apoiar sobre essa outra norma cuja produccedilatildeo por sua vez eacute determinada por outra

A completude por fim terceira caracteriacutestica do ordenamento juriacutedico se entende a proprie-

dade pela qual um sistema juriacutedico tem uma norma para regular qualquer caso Doutrina Norberto

Bobbio (2011 p 115) que a ausecircncia de uma norma se chama com frequecircncia de lacuna ao passo

que completude significa ausecircncia de lacuna ou seja ldquoum ordenamento eacute completo quando o juiz

pode encontrar nele uma norma para regular qualquer caso que se lhe apresente ou melhor natildeo haacute

caso que natildeo possa ser regulado com uma norma extraiacuteda do sistemardquo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

209

O ordenamento juriacutedico portanto eacute completo ldquopois o preenchimento das lacunas eacute garantido

pela presenccedila e atuaccedilatildeo dos juiacutezesrdquo (MAGALHAtildeES FILHO 2013 p 96) A completude do ordenamento

juriacutedico pode ser assegurada natildeo como ponto de partida mas como ponto de chegada (BETTI 2007)

atraveacutes dos meacutetodos de integraccedilatildeo elencados precipuamente no artigo 4ordm da Lei de Introduccedilatildeo agraves

Normas do Direito Brasileiro (analogia costumes e os princiacutepios gerais do direito)

Dessa forma em suma temos que o ordenamento juriacutedico eacute formado por um sistema de nor-

mas legitimadas formal e materialmente pela Constituiccedilatildeo cujas caracteriacutesticas de coerecircncia harmo-

nia e unidade natildeo se perde apesar de elevada gama de regras e pluralidade de causos faacutetico-juriacutedicos

que delas podem advir

Todavia apesar desse apanaacutegio intriacutenseco e extriacutenseco o ordenamento juriacutedico dado ser idea-

lizado pela atividade faliacutevel humana pode conter aparentemente normas-regras que se contradizem

A isso pois a doutrina denomina de antinomia ou norma antinorma (KELSEN 2006) cuja anaacutelise de

sua incidecircncia e consequente soluccedilatildeo a seguir exporemos principalmente tendo em vista o litiacutegio ide-

oloacutegico travado pelo fisco pelos tribunais superiores e em especial pela doutrina

2 O RECONHECIMENTO DAS MALFADADAS ANTINOMIAS E OS CRITEacuteRIOS PARA SUA SU-PERACcedilAtildeO OS LITIacuteGIOS ENTRE OS AGENTES INTERPRETATIVOS

A antinomia conforme explanamos acima se caracteriza por ser aquela situaccedilatildeo de incompa-

tibilidade que se verifica entre duas ou mais normas (regras) pertencentes ao mesmo ordenamento e

com o mesmo acircmbito de validade

Tiacutepica consequecircncia do princiacutepio da natildeo contradiccedilatildeo haacute muito suscitado por Aristoacuteteles a an-

tinomia vai ao encontro da maacutexima de que ldquoeacute impossiacutevel que o mesmo (predicado) convenha e natildeo

convenha ao mesmo (sujeito) sob o mesmo aspecto e ao mesmo tempordquo (LUFT 2005 p 49) A contra-

diccedilatildeo (antinomia) portanto eacute ldquoa face extrema da incoerecircncia no discursordquo (LUFT 2005 p 49)

Quando Norberto Bobbio (2011 p 87) categoricamente prescreve que ldquoo direito natildeo tolera

antinomiasrdquo estaacute apenas a corroborar que o sistema normativo deve ser pautado pelo maacuteximo de cer-

teza e seguranccedila juriacutedica (postulados tiacutepicos e essenciais de convivecircncia humana Valores igualmente

defensaacuteveis agrave ideia de Direito) conseguindo garantir assim seu ideaacuterio de justiccedila

Eduardo Luft (2005 p 68-69) assim leciona

O princiacutepio da coerecircncia natildeo torna impossiacuteveis incoerecircncias no discurso ou no ser Incoe-recircncias satildeo possiacuteveis embora sempre inseridas no processo de sua superaccedilatildeo em um novo movimento para a coerecircncia [] o princiacutepio da coerecircncia eacute o modo de organizaccedilatildeo de todo e qualquer sistema

Eacute tarefa do inteacuterprete portanto utilizar determinados criteacuterios para soluccedilatildeo das antinomias de

primeiro grau (ou pelo menos para harmonizaacute-las dado que a interpretaccedilatildeo da lei natildeo deve conduzir

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

210

ao absurdo de afrontar a finalidade da norma ou do direito que encerra) quais sejam o cronoloacutegico ou

lex posterior (ldquoa norma posterior revoga a anteriorrdquo) o hieraacuterquico ou lex superior (ldquoa norma superior

prevalece sobre a inferiorrdquo) e o da especialidade ou lex specialis (ldquoa norma especial prevalece sobre a

geral naquilo que dispotildeerdquo)

Entrementes as antinomias de segundo grau (conflitos entre normas e os criteacuterios de soluccedilatildeo)

satildeo solvidas conforme doutrina de Glauco Barreira Magalhatildees Filho (2013) do seguinte modo no

conflito entre o criteacuterio hieraacuterquico e o cronoloacutegico prevalece o primeiro No conflito entre o criteacuterio

da especialidade e o cronoloacutegico prevalece a lex specialis Por fim no conflito entre o criteacuterio hieraacuter-

quico e do da especialidade via de regra2 prevalece aquele

Quando todavia natildeo existirem criteacuterios suficientes para soluccedilotildees de antinomias (conflito entre

duas normas da mesma eacutepoca ambas gerais e da mesma hierarquia) ldquoo julgador entatildeo conforme seu

juiacutezo de valor e seu livre convencimento apelaraacute para uma das trecircs opccedilotildees a interpretaccedilatildeo modifica-

tivo-corretiva a interpretaccedilatildeo ab-rogante ou a interpretaccedilatildeo mutuamente ab-roganterdquo (MAGALHAtildeES

FILHO 2013 p 96)

A fim de compreendermos a incidecircncia desses criteacuterios de soluccedilatildeo de antinomias juriacutedicas seja

do ponto de vista legal seja do ponto de vista praacutetico elencamos alguns casos debatidos pela juris-

prudecircncia e doutrina especialmente em virtude de envolverem determinados postulados tiacutepicos do

Direito Tributaacuterio demonstrando ainda a ldquoforccedila interpretativa fiscalrdquo

Vejamos

21 Criteacuterio cronoloacutegico

211 Revogaccedilatildeo da isenccedilatildeo da Cofins agraves sociedades civis prestadoras de serviccedilos profissionais legalmente regulamentadas

Tema bastante interessante que pode servir de ilustraccedilatildeo do postulado lex posterior derogat priori natildeo soacute pelo seu aspecto econocircmico-financeiro mas principalmente em razatildeo da controveacutersia

doutrinaacuteria e jurisprudencial acerca da existecircncia ou natildeo de hierarquia normativa entre Lei Comple-

mentar e Lei Ordinaacuteria eacute o caso da Lei nordm Lei 94301996 diploma normativo posterior agrave Lei Comple-

2 Haacute casos em que modernamente o criteacuterio da especialidade prevaleceraacute sobre o hieraacuterquico pois ldquoquando uma norma (regra) infraconstitucional ferir uma norma (regra) constitucional mas realizar de modo efetivo os valores baacutesicos da Cons-tituiccedilatildeo prevaleceraacute a norma infraconstitucionalrdquo (MAGALHAtildeES FILHO 2013 p 96) Isso ocorre em virtude do princiacutepio de interpretaccedilatildeo conforme agrave Constituiccedilatildeo segundo o qual ldquouma lei natildeo deve ser declara nula quando possa ser interpretada em consonacircncia com a Constituiccedilatildeordquo (HESSE 2009 p 118) Assim para Konrad Hesse (2009 p 119) ldquoas normas consti-tucionais natildeo satildeo apenas lsquonormas-paracircmetrosrsquo (Pruumlfungsnormen) mas tambeacutem normas de conteuacutedo (Sachnormen) na determinaccedilatildeo do conteuacutedo das leis ordinaacuteriasrdquo Ainda segundo o jurista de Freiburg o princiacutepio da interpretaccedilatildeo conforme agrave Constituiccedilatildeo deita suas raiacutezes no princiacutepio da unidade do ordenamento juriacutedico estreitando por consequecircncia a inter--relaccedilatildeo existente entre Constituiccedilatildeo e lei

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

211

mentar nordm 701991 cuja vigecircncia e aplicaccedilatildeo seguiu os termos do artigo 2ordm sect 1ordm da Lei de Introduccedilatildeo

agraves Normas do Direito Brasileiro3

O artigo 6ordm inciso II da LC nordm 701991 estabeleceu a isenccedilatildeo da Cofins agraves sociedades civis

prestadoras de serviccedilos profissionais legalmente regulamentadas pelo artigo 1ordm do Decreto-Lei nordm

23971897 retirando assim uma parte do suporte faacutetico da norma que definia o fato gerador do

aludido tributo

Essa isenccedilatildeo niacutetida exceccedilatildeo agrave norma de tributaccedilatildeo (MACHADO 2012) nunca agradou o Fisco

que desde entatildeo procurou restringir hermeneuticamente seu campo normativo especialmente sus-

tentando agrave eacutepoca que tatildeo somente as sociedades civis tributadas pelo imposto de renda no regime

previsto no artigo 1ordm do Decreto-Lei nordm 23971987 seriam beneficiaacuterias da regra de isenccedilatildeo tributaacuteria

(argumentaccedilatildeo todavia rechaccedila pelo STJ4)

Finalmente o Fisco utilizando de estratagemas poliacuteticas conseguiu a aprovaccedilatildeo da Lei nordm

94301996 que por meio do seu artigo 56 revogou a isenccedilatildeo concedida pela LC nordm 701991

Hugo de Brito Machado (2012) contraacuterio agrave manobra antijuriacutedica da Fazenda Puacuteblica desta-

cou que o dispositivo da Lei Ordinaacuteria que estabeleceu a tributaccedilatildeo das sociedades civis foi uma

forma sutil e inaceitaacutevel perpetrada pelo sujeito ativo da relaccedilatildeo juriacutedico-tributaacuteria pois aleacutem de

violar regra expliacutecita contida no artigo 150 sect 6ordm da CF88 uma Lei Ordinaacuteria natildeo poderia revogar

dispositivo de Lei Complementar dado os princiacutepios da hierarquia das normas e do paralelismo das

formas ou da homologia

Assim o supramencionado artigo 56 da Lei nordm 94301996 apesar de cronologicamente mais

recente seria totalmente inconstitucional Esse entendimento inclusive era ateacute entatildeo consolidado natildeo

soacute na doutrina mas outrossim junto aos Tribunais

O STF todavia num maniqueiacutesmo jurisprudencial influenciado politicamente pelos interesses

do Fisco se posicionou de modo diverso da doutrina majoritaacuteria e do proacuteprio STJ afirmando em

siacutentese que em virtude da natureza constitucional do instituto inexistia relaccedilatildeo hieraacuterquica entre

Lei Ordinaacuteria e Lei Complementar principalmente porque a LC nordm 701991 seria apenas formalmente

complementar mas materialmente ordinaacuteria com relaccedilatildeo aos dispositivos concernentes agrave contribui-

ccedilatildeo social por ela instituiacuteda Portanto a Lei nordm 94301996 posterior revogou aquela e tecircm aplicaccedilatildeo

agraves relaccedilotildees por ela disciplinadas5

Tendo em vista a posiccedilatildeo adotada pelo STF o STJ6 acatando a supremacia de sua decisatildeo can-

celou a supracitada Suacutemula nordm 276 sob o argumento de que a referida LC nordm 701991 tratou de mateacuteria

3 Artigo 2ordm sect 1ordm da LINDB ldquoA lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare quando seja com ela incom-patiacutevel ou quando regule inteiramente a mateacuteria de que tratava a lei anteriorrdquo4 Suacutemula nordm 276 do STJ ldquoAs sociedades civis de prestaccedilatildeo de serviccedilos profissionais satildeo isentas da Cofins irrelevante o regime tributaacuterio adotadordquo5 STF ldquoO Supremo Tribunal Federal no julgamento dos REs 377457 e 381864 ambos da relatoria do ministro Gilmar Men-des concluiu pela legitimidade do art 56 da Lei 94301996 que revogou a isenccedilatildeo da Cofins concedida agraves sociedades civis

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

212

natildeo submetida agrave reserva constitucional de lei complementar permitindo pois que mudanccedilas no texto

daquele diploma legal pudessem ser introduzidas por meio de simples Lei Ordinaacuteria

Entrementes apesar de toda cizacircnia respectiva o STF natildeo se sensibilizou em modular os efeitos

de sua decisatildeo7 (operou-se como de regra efeitos ex tunc) causando enorme inseguranccedila juriacutedica

pois vigorou por mais de cinco anos a aludida Suacutemula nordm 276 do STJ consolidando-se na mente do

contribuinte a legalidade de sua conduta (LENZA 2011) Os valores justiccedila e seguranccedila pois consa-

grados constitucionalmente foram solapados sem nenhuma compaixatildeo pelo Fisco

O Fisco mais uma vez influenciou o Poder Judiciaacuterio com manobras poliacutetico-arrecadatoacuterias

principalmente porque agora conforme precedentes do STJ8 vem desconstituindo por meio do efei-

to loacutegico-positivo do julgamento procedente de Accedilotildees Rescisoacuterias (contrariando inclusive a Suacutemula

nordm 343 do STF) a coisa julgada material de sentenccedilas que declaravam a ilegalidade da revogaccedilatildeo da

isenccedilatildeo da COFINS agraves sociedades civis prestadoras de serviccedilos profissionais e cobrando os contribuin-

tes que agrave eacutepoca agiam no campo da legalidade

Consideramos a inconstitucionalidade do artigo 56 da Lei nordm 94301996 natildeo soacute em razatildeo da

ausecircncia de especificidade normativa (artigo 150 sect 6ordm da CF88) mas precipuamente de afronta aos

princiacutepios da seguranccedila juriacutedica e da irretroatividade

Conforme doutrina Hugo de Brito Machado (2009 p 59) rememorando Gustav Radbruch ldquoum

sistema normativo que natildeo tente a preservar a justiccedila nem a seguranccedila efetivamente natildeo eacute Direitordquo

Ainda segundo o tributarista (posiccedilatildeo que tambeacutem perfilhamos) ldquosempre que da declaraccedilatildeo de in-

constitucionalidade resultar agravamento da situaccedilatildeo do cidadatildeo frente ao Estado os efeitos da de-

claraccedilatildeo de inconstitucionalidade natildeo podem retroagirrdquo (MACHADO 2009 p 74)

prestadoras de serviccedilos pelo inciso II do art 6ordm da Lei Complementar 701991rdquo (RE nordm 522719 AgRDF Segunda Turma Min rel Ayres Britto DJ 04032011) 6 STJ AR nordm 3761PR Primeira Seccedilatildeo Min rel Eliana Calmon DJ 01122008 ndash Informativo nordm 3767 STF RE nordm 377457PR Plenaacuterio Min rel Gilmar Mendes DJ 19122008 ndash Informativo nordm 5208 STJ ldquoO oacutebice da Suacutemula 343STF segundo a qual eacute incabiacutevel accedilatildeo rescisoacuteria por ofensa a literal disposiccedilatildeo de lei quando fundada a decisatildeo rescindenda em texto legal de interpretaccedilatildeo controvertida nos tribunais eacute afastado quando a mateacuteria eacute de iacutendole constitucional O Supremo Tribunal Federal firmou entendimento de que eacute constitucional a revogaccedilatildeo pelo art 56 da Lei 943096 da isenccedilatildeo da Cofins concedida pelo art 6ordm II da Lei Complementar 7091 agraves sociedades civis de prestaccedilatildeo de serviccedilos profissionais hipoacutetese em que natildeo haacute ofensa ao princiacutepio da hierarquia das leis Julgou que as leis em confronto satildeo materialmente ordinaacuterias e que por ostentarem normatizaccedilatildeo incompatiacutevel prevalece o diploma legal mais moderno O Superior Tribunal de Justiccedila tem iterativamente rescindido acoacuterdatildeos que ao reconhecer a revogaccedilatildeo em tela se mostram contraacuterios agrave compreensatildeo firmada pelo Supremo Tribunal Federal especialmente por reconhecida ofensa literal aos arts 97 102 III e 105 III da Constituiccedilatildeo Federalrdquo (AR nordm 3782RS Primeira Seccedilatildeo Min rel Arnaldo Esteves Lima DJ 30102012)

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213

22 Criteacuterio hieraacuterquico

221 Diferencial de aliacutequota de ICMS nas operaccedilotildees interestaduais realizadas por natildeo contribuintes

Podemos visualizar na praacutetica a utilizaccedilatildeo do metacriteacuterio hieraacuterquico de soluccedilatildeo de antinomia

quando comparamos o disposto no artigo 155 sect 2ordm inciso VII aliacutenea b da CF88 com o artigo 11 da

Lei nordm 142372008 referente ao malfadado diferencial de aliacutequota de ICMS cobrado pelo Estado do

Cearaacute sobre as operaccedilotildees interestaduais efetuadas por consumidores para a aquisiccedilatildeo de produtos

sem objetivo de comercializaccedilatildeo (consumidores finais)

Em siacutentese o artigo 11 da Lei nordm 142372008 prescreve que seria devido ICMS nas entradas

de mercadorias ou bens de outras unidades da Federaccedilatildeo destinadas agrave pessoa fiacutesica ou juriacutedica natildeo

inscrita no Cadastro Geral da Fazenda do Estado do Cearaacute em quantidade valor ou habitualidade que

caracterize ato comercial

Na verdade o que o Estado do Cearaacute pretendia com a regra em comento era evitar a evasatildeo

fiscal por parte de empresas que se utilizavam de pessoas fiacutesicas ou juriacutedicas para a aquisiccedilatildeo de de-

terminados produtos em outros Estados para posterior comercializaccedilatildeo no Estado cearense

Essa medida conforme entendimento da entidade tributante faz parte de poliacutetica adminis-

trativa a fim de neutralizar eventuais benefiacutecios fiscais ilegais concedidos por outros estados que

estariam prejudicando a induacutestria local Todavia quando da regulamentaccedilatildeo do citado artigo ocor-

reu uma distorccedilatildeo em seu objetivo inicial e se passou a exigir o ICMS sobre todas as compras feitas

fora do Estado do Cearaacute

Por exemplo nos termos do artigo 11 da Lei nordm 142372008 a pessoa fiacutesica natildeo contribuinte

habitual do ICMS que adquirisse de fornecedores localizados no Estado de Satildeo Paulo moacuteveis e uten-

siacutelios destinados agrave decoraccedilatildeo de seu apartamento desfigurando assim o intuito comercial dado sua

qualidade de consumidora final (artigo 2ordm caput do CDC) teria de pagar ao Estado do Cearaacute o dife-

rencial de aliacutequota sobre as operaccedilotildees interestaduais efetuadas9

A questatildeo faacutetico-juriacutedica descrita gira em torno da incidecircncia e aplicaccedilatildeo das vaacuterias aliacutequotas

de ICMS sobre operaccedilotildees interestaduais de circulaccedilatildeo de mercadorias e produtos adquiridos para uso

proacuteprio por pessoa fiacutesica natildeo contribuinte criando verdadeira limitaccedilatildeo ao tracircnsito de mercadorias

Sem adentramos no extenso e deformado estudo do ICMS tendo ainda como paradigma o

caso concreto acima a forccedila normativa e hieraacuterquica do comando constitucional nos permite con-

9 Se a aliacutequota cobrada for a legalmente estabelecida pelo RICMSSP (artigo 52 inciso II do Decreto nordm 454902000) ou seja 7 o Estado do Cearaacute por meio de seu RICMSCE (artigo 55 inciso I aliacutenea b do Decreto nordm 245691997) cobra do consumidor final natildeo contribuinte do tributo o diferencial de 10 que seria por simples subtraccedilatildeo matemaacutetica o resulta-do obtido de 17 (RICMSCE) menos 7 (RICMSSP)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

214

cluir que a compra de moacuteveis e utensiacutelios destinados agrave decoraccedilatildeo de apartamento natildeo tem intuito

comercial natildeo ocorrendo assim o fato gerador do tributo estadual razatildeo pela qual o diferencial de

aliacutequota eacute ilegiacutetimo

Claacutessicas e precisas pois satildeo as palavras de Carlos Maximiliano citado por Arnaldo Sampaio

Godoy (2010 p 222)

O poder de tributar externa-se por meio de regras fixas e precisas aplicadas impar-cialmente jamais seraacute exercido de modo arbitraacuterio e sim de acordo com princiacutepios estabelecidos de relativa justiccedila que amparam o contribuinte contra exaccedilotildees odiosas e excepcionais

O artigo 155 sect 2ordm inciso VII aliacutenea b da CF88 talvez por questatildeo pragmaacutetica optou por onerar

a operaccedilatildeo interestadual destinada a consumidor final natildeo contribuinte do ICMS com aliacutequota interna

isto eacute tal operaccedilatildeo conquanto interestadual eacute tratada como se fosse interna e todo imposto sobre

ela incidente eacute devido ao Estado de origem (MACHADO SEGUNDO 2009)

Como no caso em tela se o consumidor final (artigo 2ordm caput do CDC) residente no Estado

do Cearaacute adquire produtos de fornecedores estabelecidos no Estado de Satildeo Paulo a operaccedilatildeo seraacute

tributada integralmente por esta unidade da Federaccedilatildeo sendo destarte invaacutelida (inconstitucional) a

exigecircncia pelo Fisco Cearense do diferencial de aliacutequota

Ademais o ICMS deve ser recolhido pela aliacutequota interna no Estado onde saiu a mercadoria

para o consumidor final apoacutes a sua fatura ainda que tenha sido negociada a venda em outro local por

meio da empresa filial10

O que se veda pois eacute a cobranccedila de diferencial no caso de aquisiccedilatildeo por consumidor final que

natildeo eacute contribuinte do tributo estadual11 O TJCE natildeo eacute despiciendo salientarmos possui paciacutefico po-

sicionamento no sentido de que quando o destinataacuterio das mercadorias natildeo for contribuinte de ICMS

incide tatildeo-somente a aliacutequota interna12

Assim do ponto de vista do Direito abstrato estaria em conflito aparente a norma legal cearen-

se contida no artigo 11 da Lei nordm 142372008 e a regra inserta no artigo 155 sect 2ordm inciso VII aliacutenea

b da CF88 Todavia sem adentrarmos nos dogmas do controle de constitucionalidade e das teacutecnicas

de interpretaccedilatildeo conforme agrave Constituiccedilatildeo com ou sem reduccedilatildeo de texto natildeo restam duacutevidas que a

norma constitucional de superioridade hieraacuterquica prevalece sobre a legislaccedilatildeo infraconstitucional do

Estado do Cearaacute aplicando-se em tela o brocardo lex superior derogat legi inferior

10 STJ AgRg no REsp nordm 703232SC Segunda Turma Min rel Castro Meira DJ 2511200911 STJ RMS nordm 31456MA Segunda Turma Min rel Herman Benjamin DJ 0107201012 TJCE MS nordm 2867-752010 Plenaacuterio Des rel Haroldo Correia De Oliveira Maximo DJ 23022011

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215

23 Criteacuterio da especialidade

231 Isenccedilatildeo tributaacuteria do Imposto de Renda

Tiacutepico exemplo de antinomia normativo-tributaacuteria solviacutevel pelo criteacuterio da especialidade nos eacute

transmitido mutatis mutandis por meio dos estudos do professor Hugo de Brito Machado (2012)

Segundo consta destoando da liccedilatildeo de Roque Antocircnio Carraza (2009) a norma que concede

isenccedilatildeo dada sua peculiaridade constitucional (artigo 150 sect 6ordm da CF88) eacute sempre mais especiacutefica

que a norma de tributaccedilatildeo pois apenas retira uma parte do suporta faacutetico da norma que define o fato

gerador do tributo natildeo o revogando

A norma de isenccedilatildeo tributaacuteria em outras palavras concedida mediante lei especiacutefica (artigo

150 sect 6ordm da CF88 cc artigos 97 inciso VI e 176 do CTN) seja contemporacircnea ou posterior agrave norma

de tributaccedilatildeo ldquoeacute aquela cuja hipoacutetese de incidecircncia consubstancia uma exceccedilatildeo agrave hipoacutetese de inci-

decircncia do tributo respectivordquo (MACHADO 2012 p 291) motivo pelo qual haja vista sua especialidade

prevalece sobre a regra geral de tributaccedilatildeo

Nas precisas liccedilotildees de Luciano Amaro (2011 p 307) ldquoa isenccedilatildeo atua geralmente num sistema

de par de normas em que uma eacute regra a outra eacute exceccedilatildeo uma eacute gecircnero (regra) a outra eacute espeacutecie

(excepcionada)rdquo

Assim dado sua especificidade o proacuteprio Coacutedigo Tributaacuterio Nacional assevera que as normas

de isenccedilatildeo seriam interpretadas de forma literal (artigo 111 incisos I e II) bem como apesar das criacuteti-

cas de Luciano Amaro (2011) em razatildeo do disposto no artigo 175 inciso I do CTN causam a exclusatildeo

do creacutedito tributaacuterio

Eacute o tiacutepico caso do artigo 6ordm da Lei nordm 77131988 que concede isenccedilatildeo do imposto de renda nas

hipoacuteteses ali taxativamente enumeradas Os incisos elencados no supracitado artigo satildeo exceccedilotildees agrave

norma de tributaccedilatildeo do imposto sobre a renda e proventos pois apenas retira parte do suporte faacutetico

que define o fato gerador do tributo de competecircncia da Uniatildeo (artigo 153 inciso III da CF88)

A Lei nordm 77131988 apesar da exceccedilatildeo do artigo 6ordm natildeo foi por ele revogada seguindo no

plano da abstraccedilatildeo juriacutedica plenamente vigente

De fato agrave luz do artigo 2ordm sect 2ordm da Lei de Introduccedilatildeo agraves normas do Direito Brasileiro13 a lei

especial circunscrevendo-se a determinada particularidade natildeo altera o disciplinamento geral da ma-

teacuteria isto eacute temperando o brocardo lex specialis derogat generalis aduz Carrazza (2009 p 344)

A lei especial natildeo revoga a lei geral mas apenas a ela prefere nos pontos que expres-samente regula Aiacute natildeo se verifica uma revogaccedilatildeo mas pelo menos em circunstancias normais a aplicaccedilatildeo simultacircnea das duas leis (a geral e a especial)

13 Artigo 2ordm sect 2ordm da LINDB ldquoA lei nova que estabeleccedila disposiccedilotildees gerais ou especiais a par das jaacute existentes natildeo revoga nem modifica a lei anteriorrdquo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

216

Portanto toda norma de isenccedilatildeo natildeo revoga a norma de tributaccedilatildeo ldquoposto que aparente anti-

nomia entre ambas eacute superada pelo criteacuterio da especialidaderdquo (MACHADO 2012 p 292)

O Fisco todavia tenta maximizar a interpretaccedilatildeo literal dada agraves normas de isenccedilatildeo esquecen-

do-se propositalmente ou natildeo que o artigo 111 inciso I e II do CTN especialmente natildeo afasta as

demais teacutecnicas hermenecircuticas A interpretaccedilatildeo gramatical ou literal embora necessaacuteria natildeo eacute nem

nunca seraacute suficiente para os demasiados causos da vida principalmente das inuacutemeras hipoacuteteses de

incidecircncias tributaacuterias

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Vislumbramos que o Direito eacute marcado por diversos conceitos que peculiariza sua teoria prin-

cipalmente quando o estudamos mais especificamente agrave luz do ordenamento juriacutedico

O ordenamento juriacutedico eacute em real marcado por um verdadeiro caos normativo ou seja as

diversas normas que compotildee o sistema em razatildeo muita das vezes da falibilidade humana natildeo se

agrupam de forma coerente sponte sua Eacute necessaacuterio assim que o jurista por meio dos diversos

mecanismos loacutegico-hermenecircuticos organize o ordenamento juriacutedico a fim de equilibrar e fortificar

as normas

Diante dessa organizaccedilatildeo forccedilada do ordenamento juriacutedico em tese ele marcou-se por ser

uma logicidade normativa de regras e princiacutepios em gradual evoluccedilatildeo ainda tendo como principais

caracteriacutesticas sua natureza sistecircmica completa e una

Eacute sistecircmico o ordenamento juriacutedico porque natildeo podem existir normas-regra que se contradi-

zem teleologicamente Repousa pois essa noccedilatildeo nos princiacutepios da natildeo contradiccedilatildeo e da coerecircncia

epistemoloacutegica As antinomias portanto devem ser repelidas pelos criteacuterios da hierarquia cronologia

e especialidade

Ainda eacute completo tendo em vista a possibilidade de o jurista por intermeacutedio dos meios de in-

tegraccedilatildeo do Direito (analogia princiacutepios gerais do Direito e costumes entre outros) encontrar sempre

uma norma para disciplinar determinado caso concreto Natildeo se admitem destarte lacunas no ordena-

mento juriacutedico

Por fim o ordenamento juriacutedico eacute uno uma vez que tem na Constituiccedilatildeo sua validade norma-

tiva garantida Todas as regras que nascem e amoldam ao sistema precisam assim encontrar sua va-

lidade confirmada pela Lei Fundamental A unicidade assim como a noccedilatildeo sistecircmica do ordenamento

juriacutedico conforme alhures esclarecemos tem no princiacutepio da coerecircncia sua raiz filosoacutefica dado que

ldquocoerecircncia eacute a unidade de uma multiplicidade ou a multiplicidade em unidaderdquo (LUFT 2005 p 78)

O foco deste trabalho como ficou demonstrado nas laudas anteriores eacute desenvolvido na

noccedilatildeo de como os agentes hermeneutas ndash Fisco Tribunais Superiores e Doutrina ndash vislumbram e

solucionam as antinomias tributaacuterias

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

217

Destacamos ademais como exemplos dos metacriteacuterios de soluccedilatildeo de antinomias os casos

respectivamente da revogaccedilatildeo da isenccedilatildeo da Cofins agraves sociedades civis prestadoras de serviccedilos pro-

fissionais legalmente regulamentadas (criteacuterio cronoloacutegico) do diferencial de aliacutequota de ICMS nas

operaccedilotildees interestaduais realizadas por natildeo contribuintes (criteacuterio hieraacuterquico) e ainda os casos de

isenccedilatildeo tributaacuteria do Imposto de Renda (criteacuterio da especialidade)

Apesar de em tese os criteacuterios de soluccedilatildeo de antinomias natildeo poderem desmerecer agraves nor-

mas constitucionais evidenciamos principalmente nos dois primeiros exemplos que o Fisco exerce

grande influecircncia hermenecircutico-poliacutetica junto agraves demais fontes de interpretaccedilatildeo especialmente o

Poder Judiciaacuterio

O diaacutelogo que precipuamente travariam os agentes de interpretaccedilatildeo (Fisco Tribunais Supe-

riores e Doutrina) para o bom desenvolvimento do Direito consequecircncia assim de sua dinamicida-

de quando da anaacutelise dos exemplos de soluccedilatildeo das antinomias juriacutedico-tributaacuterias eacute solapado pelo

desejo de arrecadaccedilatildeo O Direito muitas vezes para o Fisco eacute secundaacuterio quando eacute necessaacuterio suprir

financeiramente a maacutequina estatal

O estudo todavia natildeo foi em vatildeo A existecircncia pelo menos em tese de um verdadeiro debate

entre os agentes hermeneutas demonstra que o Direito mesmo ao reveacutes dos interesses puramente

poliacutetico-arrecadatoacuterios eacute uma ciecircncia dinacircmica aberta a novas ideias e principalmente antidogmaacutetica

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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REFEREcircNCIAS

AMARO Luciano Direito tributaacuterio brasileiro 17 ed Satildeo Paulo Saraiva 2011

BETTI Emilio Interpretaccedilatildeo da lei e dos atos juriacutedicos Traduccedilatildeo de Karina Jannini Satildeo Paulo Mar-tins Fontes 2007

BIELSA Rafael Los conceptos juriacutedicos y su terminologiacutea 3 ed Buenos Aires Depalma 1987

BOBBIO Norberto Teoria do ordenamento juriacutedico Traduccedilatildeo de Ari Marcelo Solon Satildeo Paulo EDI-PRO 2011

CARRAZZA Roque Antocircnio Curso de direito constitucional tributaacuterio 25 ed Satildeo Paulo Malheiros 2009

CARVALHO Paulo de Barros Teoria da norma tributaacuteria 2 ed Satildeo Paulo Revista dos Tribunais 1981

DANTAS San Tiago D Quixote um apoacutelogo da alma ocidental Rio de Janeiro Agir 1948

DINIZ Maria Helena Compecircndio de introduccedilatildeo agrave ciecircncia do direito 13 ed Satildeo Paulo Saraiva 2001

GODOY Arnaldo Sampaio de Moraes Memoacuteria jurisprudencial Ministro Carlos Maximiliano Brasiacutelia Supremo Tribunal Federal 2010

HESSE Konrad Temas Fundamentais do Direito Constitucional Textos selecionados e traduzidos por Carlos dos Santos Almeida Gilmar Ferreira Mendes e Inocecircncio Maacutertires Coelho Satildeo Paulo Sarai-va 2009

KARDEC Allan O livro dos espiacuteritos Traduccedilatildeo de Salvador Gentile 101 ed Araras IDE 1996

KELSEN Hans Teoria pura do direito Traduccedilatildeo de Joatildeo Baptista Machado 7 ed Satildeo Paulo Martins Fontes 2006

LENZA Pedro Direito constitucional esquematizado 15 ed Satildeo Paulo Saraiva 2011

LUFT Eduardo Sobre a coerecircncia do mundo Rio de Janeiro Civilizaccedilatildeo Brasileira 2005

MACHADO Hugo de Brito Direitos fundamentais do contribuinte e a efetividade da jurisdiccedilatildeo Satildeo Paulo Atlas 2009

______ Curso de direito constitucional tributaacuterio Satildeo Paulo Malheiros 2012

______ Introduccedilatildeo ao estudo do direito 3 ed Satildeo Paulo Atlas 2012

MACHADO SEGUNDO Hugo de Brito Contribuiccedilotildees e federalismo Satildeo Paulo Dialeacutetica 2005

______ Por que dogmaacutetica juriacutedica Rio de Janeiro Forense 2008

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219

______ Coacutedigo Tributaacuterio Nacional anotaccedilotildees agrave Constituiccedilatildeo ao Coacutedigo Tributaacuterio Nacional e agraves leis complementares 871996 e 1162003 2 ed Satildeo Paulo Atlas 2009

MAGALHAtildeES FILHO Glauco Barreira Teoria dos valores juriacutedicos uma luta argumentativa pela restauraccedilatildeo dos valores claacutessicos Belo Horizonte Mandamentos 2006

______ Hermenecircutica e unidade axioloacutegica da Constituiccedilatildeo 4 ed Belo Horizonte Del Rey 2011

______ Curso de hermenecircutica juriacutedica 4 ed Satildeo Paulo Atlas 2013

RADBRUCH Gustav Introduccedilatildeo agrave ciecircncia do direito Traduccedilatildeo de Vera Barkow Satildeo Paulo Editora WMF Martins Fontes 2011

RIBEIRO NETO Joseacute Direito tributaacuterio e legislaccedilatildeo tributaacuteria do Estado do Cearaacute 4 ed Fortaleza Fortes 2011

ROCHA Joseacute de Albuquerque Teoria geral do processo 6 ed Satildeo Paulo Malheiros 2002

SAINT-EXUPEacuteRY Antoine de O pequeno priacutencipe Traduccedilatildeo de Dom Marcos Barbosa 48 ed Rio de Janeiro Agir 2009

SEN Amartya Desenvolvimento como liberdade Traduccedilatildeo de Laura Teixeira Motta Satildeo Paulo Com-panhia das Letras 2010

STRECK Lecircnio Luiz Hermenecircutica juriacutedica e(m) crise 5 ed Porto Alegre Livraria do Advogado 2004

TELLES JR Goffredo Tratado da consequecircncia 2 ed Satildeo Paulo Bushatsky 1962

VASCONCELOS Arnaldo Direito e forccedila uma visatildeo pluridimensional da coaccedilatildeo juriacutedica Satildeo Paulo Dialeacutetica 2001

______ Teoria da norma juriacutedica 6 ed Satildeo Paulo Malheiros 2006

VIOLA Francesco ZACCARIA Giuseppe Derecho e Interpretacioacuten elementos de Teoriacutea Hermeneacuteuti-ca del Derecho Madrid Dykinson 2007

WOOD Larry E Estrateacutegias do pensamento Traduccedilatildeo de Claacuteudia G Duarte Satildeo Paulo Ciacuterculo do Livro 1986

ZAGREBELSKY Gustavo El Derecho Duacutectil ley derechos justicia Traduccedilatildeo de Marina Gascoacuten 3 ed Madrid Trotta SA 1999

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220

PARA ALEacuteM DA ARREDACACcedilAtildeO A TRIBUTACcedilAtildeO COMO INSTRUMENTO DE REDUCcedilAtildeO DAS DESIGUALDADES SOCIAIS

SUMAacuteRIO Introduccedilatildeo 1 A evoluccedilatildeo do Estado o princiacutepio da dignidade da pessoa humana e a tributaccedilatildeo 2 A tributaccedilatildeo como instrumento de con-cretizaccedilatildeo dos direitos fundamentais no Estado Democraacutetico de Direito e a consequente reduccedilatildeo de desigualdades sociais 3 Adequaccedilatildeo da tributaccedilatildeo agrave capacidade contributiva e agrave extrafiscalidade na realizaccedilatildeo de direitos fun-damentais um olhar aleacutem da arrecadaccedilatildeo Consideraccedilotildees finais Referecircncias

Victor Hugo Cabral de Morais Junior1 Germana Parente Neiva Belchior2

INTRODUCcedilAtildeO

Natildeo obstante os uacuteltimos esforccedilos desenvolvidos pelo Estado brasileiro por meio de programas

assistencialistas e poliacuteticas afirmativas ainda se percebem os graves problemas sociais no entorno dos

grandes centros urbanos com pessoas vivendo em condiccedilotildees deploraacuteveis sem acesso aos direitos

sociais que o Estado brasileiro se comprometeu a prestar tais como educaccedilatildeo sauacutede moradia segu-

ranccedila e assistecircncia social

Vislumbra-se claramente uma contiacutenua desigualdade com o fosso entre ricos e pobres esque-

cendo-se da solidariedade que deveria existir em uma sociedade democraacutetica Dessa forma na medida

em que satildeo priorizados grupos especiacuteficos satildeo agravados os problemas de marginalizaccedilatildeo violecircncia

dependecircncia de drogas desemprego fome abandono de crianccedilas e adolescentes prostituiccedilatildeo infan-

til entre outros

Ademais pouco se discute que a tributaccedilatildeo vem sendo utilizada como instrumento de con-

centraccedilatildeo de renda agravando o ocircnus dos mais pobres havendo um aumento consideraacutevel da carga

tributaacuteria sem respeito agrave capacidade contributiva do cidadatildeo e ao mesmo tempo sem que seja efeti-

vada a proteccedilatildeo social constitucionalmente consagrada e tatildeo indispensaacutevel para que muitos possam

ter uma vida digna

Constata-se essa situaccedilatildeo por exemplo quando a populaccedilatildeo tem que recolher o imposto de

1 Auditor Fiscal Juriacutedico da Receita Estadual do Cearaacute Mestrando em Direito pela Universidade Federal do Cearaacute Especia-lista em Direito e Processo Tributaacuterios pela Universidade de Fortaleza E-mail victormoraissefazcegovbr victordemo-raisyahoocombr 2 Auditora Fiscal Juriacutedica da Receita Estadual do Cearaacute Doutoranda em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina Mestre em Direito pela Universidade Federal do Cearaacute Professora universitaacuteria E-mail germanabelchiorsefazcegovbr germana_belchioryahoocombr

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

221

renda pessoa fiacutesica sobre valores iacutenfimos em total prejuiacutezo de seu miacutenimo vital Aleacutem disso verifica-se

tambeacutem que os tributos indiretos oneram significativamente os bens e os serviccedilos consumidos pelas

pessoas que muitas vezes sem perceber arcam com o ocircnus tributaacuterio o que atinge especialmente a

parcela da populaccedilatildeo que tem capacidade contributiva praticamente nula

O Estado Democraacutetico de Direito formalmente instituiacutedo pela Constituiccedilatildeo Federal de 1988

natildeo se sustenta sem que haja a consagraccedilatildeo do princiacutepio da dignidade da pessoa humana assim

como o homem necessita desse modelo estatal para ter garantida a sua dignidade

Dentro desse contexto a partir de pesquisa bibliograacutefica teoacuterica e descritiva com abordagem

qualitativa o objetivo deste trabalho eacute investigar como a tributaccedilatildeo pode ser utilizada como instru-

mento de realizaccedilatildeo do objetivo fundamental de reduccedilatildeo das desigualdades sociais insculpido no art

3ordm da Constituiccedilatildeo Federal de 1988

Discutir o conteuacutedo e a eficaacutecia social dos objetivos fundamentais da Repuacuteblica eacute essencial para

que referida norma natildeo seja meramente siacutembolo ou uma romacircntica carta de intenccedilotildees do constituinte

mas que possa ser um devir possiacutevel cuja efetividade eacute constante e progressiva

A temaacutetica se justifica portanto no enfoque da tributaccedilatildeo que se busca oferecer ao pensar um

sistema tributaacuterio agrave luz do princiacutepio da dignidade da pessoa humana que seja capaz de materializar o

Estado Democraacutetico de Direito distanciando-se daquele paradigma em que eacute tida apenas como ins-

trumento de arrecadaccedilatildeo pra fazer frente aos custos do Estado

O trabalho eacute dividido em trecircs toacutepicos Em um primeiro momento discute-se a evoluccedilatildeo do

Estado e da tributaccedilatildeo sob o enfoque do princiacutepio da dignidade da pessoa humana Em seguida a

tributaccedilatildeo eacute analisada no acircmbito do Estado Democraacutetico de Direito como mecanismo de reduccedilatildeo

das desigualdades sociais Por fim pretende-se refletir como eacute possiacutevel a adequaccedilatildeo da tributaccedilatildeo agrave

capacidade contributiva e agrave extrafiscalidade a fim de que sejam efetivados os direitos fundamentais

do cidadatildeo

1 A EVOLUCcedilAtildeO DO ESTADO O PRINCIacutePIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E A TRI-BUTACcedilAtildeO

Diante da necessidade de tornar a tributaccedilatildeo um instrumento eficaz de realizaccedilatildeo dos direitos

sociais econocircmicos e culturais possibilitando ao Estado promover a tatildeo esperada reduccedilatildeo das de-

sigualdades sociais por meio de poliacuteticas fiscais faz-se imperioso analisar a evoluccedilatildeo do modelo de

Estado desde o Estado Liberal ateacute o modelo contemporacircneo de Estado Democraacutetico de Direito que

tem por ldquovalor-guiardquo o princiacutepio da dignidade da pessoa humana

No Estado liberal a Constituiccedilatildeo tinha como finalidade baacutesica limitar o exerciacutecio do poder esta-

tal O poder estava adstrito agraves normas que almejavam a liberdade protegendo assim o indiviacuteduo E

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

222

para se ter liberdade era preciso seguranccedila na ordem juriacutedica A liberdade individual e consequente-

mente a seguranccedila da ordem juriacutedica eram os primados baacutesicos do Estado liberal

Eacute nesse contexto que nascem os direitos civis e poliacuteticos denominados de direitos fundamen-

tais de primeira geraccedilatildeo (ou dimensatildeo) caracterizados ldquopela necessidade de natildeo intervenccedilatildeo do Esta-

do no patrimocircnio juriacutedico dos membros da comunidaderdquo (LIMA 2002 p 34) Esta categoria eacute fundada

no Estado liberal absenteiacutesta onde se deu a manifestaccedilatildeo do status libertatis ou status negativus conforme classificaccedilatildeo de Jellinek

Os direitos fundamentais do cidadatildeo se inserem na moldura do que a doutrina classificou como

geraccedilotildees ou dimensotildees tendo como premissa central a dignidade da pessoa humana

Importante destacar o entendimento de Perez Luntildeo (1987 p 56) no sentido de que ldquoas gera-

ccedilotildees de direitos humanos natildeo representam um processo meramente cronoloacutegico e linear [] De outro

lado as geraccedilotildees de direitos humanos natildeo implicam na substituiccedilatildeo global de um cataacutelogo de direitos

por outro []rdquo No Brasil Dimoulis e Martins (2008) seguem a mesma linha ao expor que o termo ge-

raccedilatildeo natildeo se mostra cronologicamente exato haja vista que as primeiras Constituiccedilotildees e declaraccedilotildees

dos seacuteculos XVIII e XIX jaacute abordavam certos direitos sociais

O Estado social entra em cena tendo como objetivo inicial a igualdade material contraposta agrave

igualdade formal da visatildeo liberal fruto das lutas de classes ocorridas apoacutes a Revoluccedilatildeo Industrial com-

prometendo-se a garantir os direitos econocircmicos sociais e culturais tidos como direitos fundamentais

de segunda dimensatildeo

Referidos direitos sociais requerem prestaccedilotildees positivas (status positivus) por parte do Estado

para suprir as carecircncias da sociedade Satildeo os direitos dos cidadatildeos agraves prestaccedilotildees necessaacuterias ao pleno

desenvolvimento da existecircncia individual tendo o Estado como sujeito passivo devendo ser cumpri-

dos mediante poliacuteticas puacuteblicas que para tanto necessitam de recursos (obtidos por meio de tributos

em sua maior parte) para serem concretizados Diante da ausecircncia de normatividade desses direitos

frente a sua natildeo consecuccedilatildeo esse modelo estatal entra em crise

No Estado contemporacircneo manteacutem-se o essencial da concepccedilatildeo liberal traduzido na afirma-

ccedilatildeo de que o homem pelo simples fato de o ser tem direitos e que o Poder Puacuteblico deve respeitaacute-los

Assegurar o respeito agrave dignidade da pessoa humana eacute o fim da sociedade poliacutetica Dignidade esta no

entanto que natildeo eacute vista apenas no acircmbito do indiviacuteduo isolado mas sim de uma forma coletiva em

virtude da solidariedade

Por conta disso eacute que surgem direitos de titularidade coletiva intitulados pela doutrina de di-

reitos fundamentais de terceira dimensatildeo que consagram o princiacutepio da solidariedade atingindo natildeo

soacute a presente geraccedilatildeo mas tambeacutem as futuras (BELCHIOR 2011)

O constituinte brasileiro inspirado em constituiccedilotildees sociais democratas do seacuteculo anterior no-

tadamente a Constituiccedilatildeo do Meacutexico de 1917 inscreveu em seu artigo 1ordm inciso III o postulado da

dignidade da pessoa humana entre os fundamentos da organizaccedilatildeo nacional

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

223

De fato pode-se afirmar que o Estado Democraacutetico da atualidade eacute um Estado de abertura

constitucional fundado no principio da dignidade do ser humano tendo-o como valor-guia conforme

abordagem de Sarlet (2002 p 62)

Dessa forma considerando que o modelo estatal escolhido foi o Estado Democraacutetico de Direito

em que haacute a necessidade de se consagrar a dignidade humana ldquoeacute de suma importacircncia que se trate

os direitos fundamentais como valores indivisiacuteveis e interdependentesrdquo (MARMELSTEIN 2008 p 60)

abolindo a falsa ideia de existecircncia de hierarquia entre as diversas geraccedilotildees de direitos fundamen-

tais conforme mencionado anteriormente englobando-os todos na luta por efetivaccedilatildeo para assim

conferir maacutexima eficaacutecia ao texto constitucional Nesse sentido Bonavides (2011 p 573) afirma que a

ldquouniversalidade dos direitos fundamentais os coloca assim desde o princiacutepio num grau mais alto de

juridicidade concretude positividade e eficaacuteciardquo

Em relaccedilatildeo aos tributos eacute sabido que essa eacute uma ideia que se perde no tempo possivelmen-

te existente em todas as formas de agrupamentos humanos havendo assim desde as primitivas

sociedades uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria ou em bens arrecadada pelo ldquoEstadordquo ou por seu chefe ob-

jetivando realizar seus fins sociais seus gastos e despesas oriundas da vida em sociedade Assim as

contribuiccedilotildees em sentido lato abrangeram desde os pagamentos em dinheiro ou bens (produtos

ou serviccedilos prestados agrave comunidade) exigidos pelos vencedores das guerras aos povos vencidos ateacute

a cobranccedila entre os proacuteprios integrantes da comunidade ora como donativos e ajudas ora como

um dever (HUGON 1951)

No mundo atual haacute uma defesa da ideia de imposto-troca (pagamento como retribuiccedilatildeo de

um serviccedilo) a partir das concepccedilotildees individualistas e das teses de fiscalidade miacutenima (Estado miacutenimo)

surgidas no decorrer dos anos oitenta e noventa auge da poliacutetica neoliberal

Oportuno o entendimento de Buffon (2009 p 66) ao considerar que o processo surgido nessa

fase levou no Brasil a ldquoum incremento significativo da carga tributaacuteria sem que a capacidade con-

tributiva do cidadatildeo seja levada em consideraccedilatildeo e sem que o Estado concomitantemente decirc efeti-

vidade agrave proteccedilatildeo social constitucionalmente exigiacutevel e faticamente imprescindiacutevelrdquo Isso acarretou a

sofisticaccedilatildeo do sistema tributaacuterio convertendo-o em um meio de redistribuiccedilatildeo de renda agraves avessas

haja vista que a parte da populaccedilatildeo com menor capacidade contributiva arca com parcela significativa

da carga tributaacuteria sem que lhe sejam garantidos minimamente os direitos sociais em demonstraccedilatildeo

clara de que a democracia representativa brasileira corresponde a um grande ldquofaz de contardquo

Diante desse cenaacuterio faz-se imprescindiacutevel um olhar reflexivo a fim de que se encontrem os

fundamentos de um modelo de tributaccedilatildeo que esteja de fato apto a recuperar os seus compromissos

histoacutericos sobretudo no que se refere agrave solidariedade para assim dar maacutexima eficaacutecia ao princiacutepio da

dignidade da pessoa humana por meio da concretizaccedilatildeo dos direitos fundamentais

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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2 A TRIBUTACcedilAtildeO COMO INSTRUMENTO DE CONCRETIZACcedilAtildeO DOS DIREITOS FUNDAMEN-TAIS NO ESTADO DEMOCRAacuteTICO DE DIREITO E A CONSEQUENTE REDUCcedilAtildeO DE DESIGUAL-DADES SOCIAIS

Conforme se percebe com a crise do Estado Social em natildeo conseguir efetivar os direitos sociais

por ausecircncia de recursos o que fez das normas meros programas sem eficaacutecia social natildeo haacute como se

exigir a concretizaccedilatildeo dos direitos fundamentais sem que haja a contribuiccedilatildeo dos cidadatildeos para que

se alcance esse objetivo uma vez que a realizaccedilatildeo desses direitos em especial dos direitos sociais de

cunho prestacional implica a assunccedilatildeo de um significativo ocircnus financeiro por parte do Estado

Apesar de haver um consenso acerca da importacircncia da concretizaccedilatildeo dos direitos fundamen-

tais para a maacutexima efetividade do princiacutepio da dignidade da pessoa humana o que leva indubitavel-

mente agrave reduccedilatildeo das desigualdades sociais natildeo se pode esquecer de que essa concretizaccedilatildeo somente

se revela possiacutevel com o cumprimento do principal dever de cidadania que eacute o dever de pagar tribu-

tos que por sua vez eacute sustentado no princiacutepio da solidariedade social

Paul Hugon nas deacutecadas de 1940 e 1950 jaacute defendia que

[] ningueacutem contesta ser o Estado obrigado na eacutepoca atual a estender sua atividade muito aleacutem da simples proteccedilatildeo ora pela teoria do lucro o ocircnus do imposto recairia neste caso sobre o cidadatildeo que recebe do poder puacuteblico as maiores e mais impor-tantes vantagens Em outros termos seria o mesmo que tributar mais pesadamente o fraco ou o pobre pois eacute este que comumente eacute o grande beneficiaacuterio da accedilatildeo puacuteblica nos domiacutenios da instruccedilatildeo da Previdecircncia Social da Proteccedilatildeo do trabalho da Higiene etc Seria ir assim contra o princiacutepio da solidariedade natural e social que impotildee aos fortes o dever de auxiliar os fracos (HUGON 1951 p 17)

Como se vecirc o princiacutepio da solidariedade social implica que aquele que deteacutem maior capacidade

econocircmica colabore com parcela mais significativa da carga tributaacuteria Ainda acerca do tema Nabais

explica que a solidariedade se refere agrave relaccedilatildeo ou sentimento de pertencer a um grupo ou formaccedilatildeo

social dentre os quais sobressai o Estado Em suas palavras

[] a solidariedade pode ser entendida quer em sentido objetivo em que se alude agrave relaccedilatildeo de pertenccedila e por conseguinte de partilha e de co-responsabilidade que liga cada um dos indiviacuteduos agrave sorte e vicissitudes dos demais membros da comunidades quer em sentido subjetivo e de eacutetica social em que a solidariedade exprime sentimen-to a consciecircncia dessa mesma pertenccedila agrave comunidade (NABAIS 2005 p 112)

Essa concepccedilatildeo de solidariedade social vincula a ideia de deveres fundamentais que apesar de

abandonada pelo individualismo do tempo contemporacircneo deve ser retomada e entendida pois a

sociedade seraacute cada vez mais harmocircnica na medida em que a preocupaccedilatildeo de cada um com o destino

dos outros for cada vez mais intensa

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

225

A ideia de solidariedade social se evidencia exatamente quando se examina o dever funda-

mental de pagar tributos Consoante entende Buffon (2009 p 86) nos periacuteodos dos Estados Abso-

lutista e Liberal o cumprimento do dever de pagar tributo se orientava para conservaccedilatildeo do Estado

natildeo havendo uma fundamentaccedilatildeo eacutetica ou moral para a obrigaccedilatildeo tributaacuteria No entanto com o

advento dos Estados Social e Democraacutetico de Direito o dever de contribuir com os gastos puacuteblicos

passou a ter conteuacutedo solidaacuterio sendo instrumento a serviccedilo das poliacuteticas sociais e econocircmicas do

Estado redistribuidor

Dessa forma eacute faacutecil perceber a relevacircncia do dever fundamental de pagar tributo pois sem ele

o proacuteprio papel do Estado resta inviabilizado uma vez que natildeo eacute possiacutevel imaginar uma sociedade or-

ganizada sem que existam recursos financeiros para fazer frente aos seus custos em especial quando a

sociedade se propotildee a garantir a todos uma existecircncia digna o que passa pela realizaccedilatildeo dos direitos

sociais econocircmicos e culturais fato que demanda uma gama expressiva de recursos

Para Contipelli (2010 p 194) a concepccedilatildeo de Estado Democraacutetico de Direito exige uma postura

ativa perante o contexto social encarregando o Estado do cumprimento de metas que manifestam

o projeto de bem comum pautado na ideia de solidariedade necessitando para o atendimento das

demandas sociais da obtenccedilatildeo de recursos provenientes da arrecadaccedilatildeo de tributos que resumida-

mente consiste em um dever de colaboraccedilatildeo atribuiacutedo aos membros da comunidade de levar parcela

de suas riquezas aos cofres puacuteblicos justificado como forma de participaccedilatildeo no alcance dos objetivos

fundamentais da Repuacuteblica

Ressalte-se que a Constituiccedilatildeo Federal de 1988 instituiu um Estado Democraacutetico de Direito que

tem como marca fundamental a busca de uma igualdade substancial natildeo meramente formal (CARVA-

LHO MORAIS JUNIOR 2014) o que resta evidente da anaacutelise dos artigos 1ordm e 3ordm incisos I e III tornan-

do imperiosa a necessidade de se buscar o equiliacutebrio social mediante a reduccedilatildeo das desigualdades

Essa ideia de igualdade material peculiar ao Estado Democraacutetico de Direito liga-se indubitavelmente

ao princiacutepio da dignidade da pessoa humana conforme expotildee Buffon (2009 p 113)

Essa nova acepccedilatildeo de igualdade estaacute a exigir do Estado natildeo apenas que formalmente trate os iguais como iguais e os desiguais como desiguais mas tambeacutem que aja no sentido de que as desigualdades econocircmicas e sociais que produziram essas diferen-ccedilas sejam combatidas minimizadas e eliminadas Ou seja o tratamento formalmente desigual deve visar agrave reduccedilatildeo das desigualdades faacuteticas ou materiais o que equivale a uma nova concepccedilatildeo de justiccedila a qual sempre esteve vinculada a ideia de igualdade

Dentro dessa concepccedilatildeo portanto a igualdade tributaacuteria deve ser pensada a partir da ideia

de que o Estado brasileiro somente se legitima se visar a substancializar a igualdade faacutetica deven-

do para tanto a tributaccedilatildeo ser adequadamente implementada com o objetivo de servir como ins-

trumento do referido fim maior do Estado com respeito agrave dignidade humana e concretizaccedilatildeo dos

direitos fundamentais

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

226

Nesse sentido Machado Segundo (2010 p 212) sustenta que a tributaccedilatildeo eacute um relevante meio

natildeo apenas de mudanccedila social mas de uma mudanccedila social que se pode prestar agrave implementaccedilatildeo de

uma sociedade mais justa entendida essa como aquela que seria escolhida na ldquoposiccedilatildeo originalrdquo de

John Rawls ou aquela que se aproxima o mais possiacutevel daquilo que seus membros desejam proximi-

dade que seraacute tanto mais quanto maior for a proteccedilatildeo agrave liberdade e a promoccedilatildeo da igualdade em um

ambiente democraacutetico

Vale lembrar que a concretizaccedilatildeo dos direitos fundamentais eacute um processo inter-relacionado

considerando as marcas de interdependecircncia e indivisibilidade que os caracteriza no que se revela

que os direitos ditos de primeira dimensatildeo dependem dos direitos de segunda e terceira dimensatildeo

e vice-versa No campo tributaacuterio eacute facilmente perceptiacutevel a presenccedila dos direitos fundamentais de

primeira dimensatildeo como limitadores do poder de tributar estatal No que diz respeito aos direitos

fundamentais de segunda e terceira dimensatildeo por outro lado visualiza-se que eles dependem de um

sistema tributaacuterio com eles comprometido para sua concretizaccedilatildeo tendo em vista que o Estado eacute o

seu principal devedor

Assim garantir o cumprimento dos direitos fundamentais em especial os direitos sociais eacute

condiccedilatildeo de concretizaccedilatildeo da promessa constitucional de tratar todos com igual dignidade requisito

para que sejam reconhecidos a democracia substancial e o Estado Democraacutetico de Direito instituiacutedos

pela Constituiccedilatildeo cidadatilde

Pode-se sustentar portanto que a tributaccedilatildeo eacute instrumento apto agrave concretizaccedilatildeo dos direitos

fundamentais sendo possiacutevel por meio dela dar maacutexima eficaacutecia ao principio da dignidade da pessoa

humana desde que haja a adequaccedilatildeo da carga tributaacuteria agrave efetiva capacidade econocircmica do cidadatildeo

Para tanto faz-se imprescindiacutevel compreender o denominado princiacutepio da capacidade contributiva

conforme seraacute discutido no toacutepico seguinte

3 ADEQUACcedilAtildeO DA TRIBUTACcedilAtildeO Agrave CAPACIDADE CONTRIBUTIVA E Agrave EXTRAFISCALIDADE NA REALIZACcedilAtildeO DE DIREITOS FUNDAMENTAIS UM OLHAR ALEacuteM DA ARRECADACcedilAtildeO

Para que se realize o objetivo fundamental da Repuacuteblica Federativa do Brasil de reduccedilatildeo das

desigualdades sociais eacute preciso que o Estado por meio da tributaccedilatildeo obtenha daqueles cidadatildeos

dotados de capacidade contributiva os recursos necessaacuterios agraves atividades destinadas ao oferecimento

de iguais oportunidades para todos (MACHADO SEGUNDO 2010 p 211)

Faz-se necessaacuterio assim enfrentar a tortuosa questatildeo acerca da real compreensatildeo do princiacutepio

da capacidade contributiva que para muitos estaria albergado na literalidade do disposto no sect 1ordm do

artigo 145 da Constituiccedilatildeo do Brasil assim transcrito

Art 145 [] sect 1ordm - Sempre que possiacutevel os impostos teratildeo caraacuteter pessoal e seratildeo graduados segundo a capacidade econocircmica do contribuinte facultado agrave adminis-

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

227

traccedilatildeo tributaacuteria especialmente para conferir efetividade a esses objetivos identificar respeitados os direitos individuais e nos termos da lei o patrimocircnio os rendimentos e as atividades econocircmicas do contribuinte

Nos termos defendidos por Buffon (2009 p 175) deve-se primeiramente ter em mente a dife-

renccedila ontoloacutegica entre texto e norma para somente assim perceber que restringir a discussatildeo acerca

da interpretaccedilatildeo do dispositivo mencionado eacute hermeneuticamente inadequado Em suas palavras

O princiacutepio da capacidade contributiva diferentemente do que sustentam muitos natildeo estaacute fundamentado no sect1ordm do art 145 da CF88 Ele decorre do caraacuteter do modelo de Estado constituiacutedo pela Carta brasileira de 1988 (Estado Democraacutetico de Direito) o qual estaacute alicerccedilado nos princiacutepios da dignidade da pessoa humana da igualdade substancial e da solidariedade Isto eacute natildeo haacute de se falar em Estado Democraacutetico de Direito se esse natildeo tiver como objetivo a reduccedilatildeo das desigualdades sociais a cons-truccedilatildeo de uma sociedade solidaacuteria que esteja apta a assegurar igual dignidade a to-dos os seus membros

Desse entendimento natildeo parece discrepar Torres (2005 p 300-301) ao afirmar que a ldquolegitima-

ccedilatildeo do princiacutepio da capacidade contributiva eacute pragmaacutetica e ocorre com a intermediaccedilatildeo dos princiacutepios

da igualdade ponderaccedilatildeo razoabilidade transparecircncia e responsabilidaderdquo defendendo ainda que a

solidariedade entre os cidadatildeos deve fazer com que a carga tributaacuteria recaia sobre ricos aliviando-se

a incidecircncia sobre os mais pobres e dela dispensando os que estatildeo abaixo do niacutevel de sobrevivecircncia

Concretiza-se diante dessa foacutermula o princiacutepio da igualdade uma vez que tributando os cida-

datildeos de acordo com a capacidade contributiva em suas trecircs dimensotildees (miacutenimo existencial progressi-

vidade e seletividade) podem-se viabilizar a reduccedilatildeo das desigualdades sociais e a construccedilatildeo de uma

sociedade livre justa e solidaacuteria fundada na dignidade da pessoa humana (AacuteVILA 2008 p 370)

Como a tributaccedilatildeo somente pode recair sobre as parcelas do rendimento que exceder ao valor

das despesas necessaacuterias agrave proacutepria substacircncia sob pena de se ferir a dignidade humana deve-se ga-

rantir o denominado ldquomiacutenimo existencialrdquo Nesse sentido Torres (2005 p 305) afirma que ldquoa tributaccedilatildeo

tambeacutem natildeo pode incidir sobre o miacutenimo necessaacuterio agrave sobrevivecircncia do cidadatildeo e de sua famiacutelia em

condiccedilotildees compatiacuteveis com a dignidade humanardquo

Por outro lado o miacutenimo existencial estaacute diretamente vinculado agrave claacuteusula de progressividade

dos direitos sociais econocircmicos e culturais oriunda do Pacto Internacional relativo aos Direitos Eco-

nocircmicos Sociais e Culturais de 1966 (PIDESC) ratificado pelo Estado brasileiro que busca o progresso

constante dos direitos ali protegidos Logo se o instrumento visa agrave constante progressatildeo a partir de

uma claacuteusula de progressividade deduz-se que a regressatildeo deve ser proibida

Da mesma forma o art 26 da Convenccedilatildeo Americana sobre Direitos Humanos (1969) comple-

mentado pelo art 1ordm do Protocolo de San Salvador Adicional agrave Convenccedilatildeo Americana sobre Direitos

Humanos em Mateacuteria de Direitos Econocircmicos Sociais e Culturais (1988) assegura o ldquodesenvolvimento

progressivordquo dos direitos econocircmicos sociais e culturais

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

228

Dentro desse contexto a doutrina entende que dessa obrigaccedilatildeo de progressividade na imple-

mentaccedilatildeo dos direitos econocircmicos sociais e culturais emana uma ldquoclaacuteusula de proibiccedilatildeo de retrocesso

socialrdquo sendo portanto vedado ao Estado retroceder na implementaccedilatildeo destes direitos na medida de

sua maacutexima disponibilidade financeira (PIOVESAN 2007 p 178) Referida disponibilidade portanto

reforccedila a necessidade do dever fundamental de pagar tributos e da solidariedade na medida em que

a implementaccedilatildeo desses direitos fundamentais demanda uma prestaccedilatildeo onerosa do Estado

Eacute oportuno ressaltar entretanto que a chamada ldquoclaacuteusula da reserva do possiacutevelrdquo natildeo pode ser

utilizada como oacutebice para a efetivaccedilatildeo do nuacutecleo miacutenimo dos direitos sociais denominado de miacutenimo

existencial conforme liccedilatildeo de Sarlet (2002 p 148)

Vislumbra-se tambeacutem o alcance da capacidade contributiva a partir da utilizaccedilatildeo da progres-

sividade tributaacuteria que eacute justificaacutevel por dispensar tratamento desigual a favor dos economicamente

mais fracos de forma compatiacutevel com o princiacutepio da igualdade haja vista que as aliacutequotas dos impos-

tos seratildeo maiores quanto maior for a renda obtida

Cabe destacar que em relaccedilatildeo ao imposto de renda o estabelecimento de um maior nuacutemero

de aliacutequotas e uma ampliaccedilatildeo do limite de isenccedilatildeo fariam com que esse tributo atingisse de forma

mais significativa pessoas dotadas de efetiva capacidade contributiva realizando a igualdade material

no acircmbito do custeio de gastos puacuteblicos (MACHADO SEGUNDO 2010 p 215)

No que se refere aos tributos indiretos a adequaccedilatildeo ao princiacutepio da capacidade contributiva

pode se dar por meio da seletividade (TIPKE YAMASHITA 2002 p 107) com a aplicaccedilatildeo de aliacutequo-

tas variaacuteveis conforme a essencialidade dos bens ou produtos recaindo de forma mais pesada sobre

produtos considerados suntuosos e luxuosos e por conseguinte de modo mais brando sobre pro-

dutos essenciais

Eacute ainda de se observar que na hipoacutetese de o tributo natildeo se prestar agrave graduaccedilatildeo segundo a

capacidade econocircmica do contribuinte impotildee-se a aplicaccedilatildeo de extrafiscalidade possibilidade em

que o Estado utiliza a tributaccedilatildeo como instrumento de intervenccedilatildeo na sociedade estimulando ou de-

sestimulando comportamentos Isso natildeo significa que o Estado natildeo iraacute arrecadar mas o intuito natildeo eacute

meramente arrecadatoacuterio conforme se extrai da liccedilatildeo de Nabais (2009)

A extrafiscalidade traduz-se no conjunto de normas que embora formalmente in-tegrem o direito fiscal tem por finalidade principal ou dominante a consecuccedilatildeo de determinados resultados econocircmicos ou sociais atraveacutes da utilizaccedilatildeo do instrumento fiscal e natildeo a obtenccedilatildeo de receitas para fazer face agraves despesas puacuteblicas Trata-se assim de normas (fiscais) que ao preverem uma tributaccedilatildeo isto eacute uma ablaccedilatildeo ou amputa-ccedilatildeo pecuniaacuteria (impostos) ou uma natildeo tributaccedilatildeo ou uma tributaccedilatildeo menor agrave requeri-da pelo criteacuterio da capacidade contributiva isto eacute uma renuacutencia total ou parcial a essa ablaccedilatildeo ou amputaccedilatildeo (benefiacutecios fiscais) estatildeo dominadas pelo intuito de actuar directamente sobre os comportamentos econocircmicos e sociais dos seus destinataacuterios desincentivando-os neutralizando-os nos seus efeitos econoacutemicos e sociais ou fo-mentando-os ou seja de normas que conteacutem medidas de poliacutetica econoacutemica e social

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

229

Nesse sentido Humberto Aacutevila afirma que quando os tributos se destinarem a atingir uma

finalidade extrafiscal considerando fins econocircmicos ou sociais a medida de comparaccedilatildeo natildeo seraacute a

capacidade contributiva Segundo o autor ldquocomo a distinccedilatildeo entre os contribuintes eacute feita com base

em elementos a eles exteriores e a tributaccedilatildeo baseia-se numa finalidade estranha agrave proacutepria distribui-

ccedilatildeo igualitaacuteria da carga tributaacuteria criteacuterio e finalidade afastam-se para consubstanciar duas realidades

empiricamente discerniacuteveisrdquo (AacuteVILA 2009 p 161-162) Para ele entatildeo quando houver a instituiccedilatildeo de

tributo com finalidade extrafiscal a tributaccedilatildeo se submete ao controle de proporcionalidade exigindo

que a medida seja adequada necessaacuteria e proporcional em sentido estrito

Desta feita tanto a conjuntura quanto a estrutura econocircmica passam a cobrar medidas correti-

vas por parte do Estado a fim de que a tributaccedilatildeo seja natildeo soacute um instrumento para obtenccedilatildeo de recei-

ta para a respectiva despesa puacuteblica mas tambeacutem um agente que provoque modificaccedilotildees deliberadas

nas estruturas sociais

A tributaccedilatildeo extrafiscal eacute considerada de acordo com Falcatildeo (1981 p 47) como um ldquofenocircmeno

que caminha de matildeos dadas com o intervencionismo do Estado na medida em que eacute accedilatildeo sobre o

mercado e a antes sagrada livre iniciativardquo

A compostura da legislaccedilatildeo de um tributo pode assim vir pontilhada de providecircncias no in-

tuito de prestigiar certas situaccedilotildees tidas como social poliacutetica ou economicamente valiosas agraves quais

o legislador dispensa tratamento mais confortaacutevel ou menos gravoso A extrafiscalidade eacute portanto

um dos valores finaliacutesticos que o legislador imprime na lei tributaacuteria manipulando categorias juriacutedicas

postas agrave sua disposiccedilatildeo na perseguiccedilatildeo de objetivos alheios aos meramente arrecadatoacuterios (CARVA-

LHO 2004 p 230-231)

Eacute importante destacar que apesar de a extrafiscalidade ser uma foacutermula juriacutedico-tributaacuteria para

a obtenccedilatildeo de metas que prevalecem sobre os fins simplesmente arrecadatoacuterios de recursos monetaacute-

rios o regime que dirige referida atividade deve ser o proacuteprio das exaccedilotildees tributaacuterias Deve o legislador

guiar-se pelos paracircmetros previstos na Constituiccedilatildeo Federal respeitando os limites da competecircncia

impositiva e dos princiacutepios que regem a mateacuteria

Com o Estado Democraacutetico de Direito a importacircncia da tributaccedilatildeo foi ampliada em cuja sus-

tentaccedilatildeo estaacute a norma juriacutedica estatal Na estrutura da norma juriacutedica conforme liccedilatildeo de Bobbio (2007

p 44-45) mesmo sem comprometer a disjunccedilatildeo existe lugar para a sanccedilatildeo recompensatoacuteria esta que

eacute um dos principais instrumentos de extrafiscalidade

Dessa forma a partir da anaacutelise do marco teoacuterico desenvolvido percebe-se que a tributaccedilatildeo

desde que adequada agrave capacidade contributiva entendida como aquela adequadamente progressiva

seletiva que natildeo atinja o miacutenimo existencial e que aleacutem disso utilize a extrafiscalidade para estimular

e desestimular comportamentos comportamentos orientados pelos paracircmetros constitucionais pode

viabilizar a reduccedilatildeo das desigualdades sociais e a construccedilatildeo de uma sociedade livre justa e solidaacuteria

fundada na dignidade da pessoa humana

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Ao vislumbrar o contexto socioeconocircmico brasileiro desde a promulgaccedilatildeo da Constituiccedilatildeo

de 1988 ateacute os dias atuais percebe-se que ao inveacutes de caminhar em direccedilatildeo a uma sociedade mais

justa humana e igualitaacuteria vive-se um momento marcado por desigualdades sociais inclusive na

perspectiva tributaacuteria

Verifica-se o aumento de poliacuteticas puacuteblicas de seguranccedila puacuteblica para amenizar os assaltos se-

questros e assassinatos escolas em tempo integral assistencialismo para diminuir a pobreza reduccedilatildeo

da carga tributaacuteria para aumentar o consumo e fomentar a economia quotas para efetivar a igualdade

material no entanto essas medidas satildeo paliativas Faz-se necessaacuterio combater uma das principais cau-

sas dos problemas sociais talvez a mais difiacutecil de ser enfrentada a desigualdade social

No entanto eacute mister pensar o problema por uma oacuteptica inversa acreditando-se na esperanccedila

da construccedilatildeo de uma sociedade livre justa e solidaacuteria na qual se busca constantemente erradicar a

pobreza e a marginalizaccedilatildeo bem como reduzir as desigualdades sociais e regionais dando real efeti-

vidade aos objetivos fundamentais da Repuacuteblica Federativa do Brasil insculpidos no art 3ordm da Consti-

tuiccedilatildeo Federal de 1988

A tributaccedilatildeo nesse contexto ganha destaque haja vista poder constituir um excelente instru-

mento de concretizaccedilatildeo dos direitos sociais sem descuidar da observacircncia aos limites inerentes aos

tradicionais direitos e garantias fundamentais do contribuinte

Eacute preciso entatildeo uma accedilatildeo estatal que de fato labore a favor da reduccedilatildeo das desigualdades

econocircmicas e sociais por meio da concretizaccedilatildeo dos direitos fundamentais utilizando-se para tanto

a exigecircncia de uma carga tributaacuteria de acordo com a capacidade contributiva entendida como aquela

adequadamente progressiva seletiva que natildeo atinja o miacutenimo existencial e que aleacutem disso utilize a

extrafiscalidade para estimular e desestimular comportamentos alinhados aos ditames constitucionais

Novos caminhos devem ser trilhados num processo de reconstruccedilatildeo das relaccedilotildees pessoais e

redefiniccedilatildeo do papel do Estado numa perspectiva que estaacute aleacutem da arrecadaccedilatildeo Trata-se de uma mu-

danccedila de cultura individual coletiva e institucional dos que fazem parte do Estado em especial a Ad-

ministraccedilatildeo Tributaacuteria pensando-se isso a partir do paradigma da solidariedade de modo a construir

uma nova realidade em que o ser humano eacute o elemento central com accedilotildees voltadas a uma existecircncia

digna para todos

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

231

REFEREcircNCIAS

AacuteVILA Humberto Teoria da igualdade tributaacuteria 2 ed Satildeo Paulo Malheiros 2009

BELCHIOR Germana Parente Neiva Hermenecircutica Juriacutedica Ambiental Satildeo Paulo Saraiva 2011

BOBBIO Norberto Da estrutura agrave funccedilatildeo novos estudos de teoria do direito Traduccedilatildeo de Daniela Beccacia Versiani Satildeo Paulo Manole 2007

______ O Positivismo Juriacutedico liccedilotildees de filosofia do Direito Traduccedilatildeo de Maacutercio Pugliese Satildeo Paulo Iacutecone 2006

BONAVIDES Paulo Curso de Direito Constitucional 26 ed Satildeo Paulo Malheiros 2011

BUFFON Marciano Tributaccedilatildeo e dignidade humana entre os direitos e deveres fundamentais Porto Alegre Livraria do Advogado 2009

CARVALHO Antocircnio Gilson Aragatildeo de MORAIS JUNIOR Victor Hugo Cabral de A prova em ques-totildees tributaacuterias In MACHADO Hugo de Brito (coord) A prova em questotildees tributaacuterias Satildeo Paulo Malheiros 2014

CARVALHO Paulo de Barros Curso de Direito Tributaacuterio 16 ed Satildeo Paulo Saraiva 2004

CONTIPELLI Ernani Paula Solidariedade social tributaacuteria Coimbra Almedina 2010

DIMOULIS Dimitri MARTINS Leonardo Teoria Geral dos Direitos Fundamentais Satildeo Paulo Revista dos Tribunais 2008

FALCAtildeO Raimundo Bezerra Tributaccedilatildeo e mudanccedila social Rio de Janeiro Forense 1981

HUGON Paul O Imposto Teoria moderna e principais sistemas 2 ed Rio de Janeiro Financeiras 1951

LIMA Francisco Geacuterson Marques de Fundamentos constitucionais do processo sob a perspectiva de eficaacutecia dos direitos e garantias fundamentais Satildeo Paulo Malheiros 2002

MACHADO SEGUNDO Hugo de Brito Fundamentos do direito Satildeo Paulo Atlas 2010

MARMELSTEIN George Curso de direitos fundamentais Satildeo Paulo Atlas 2008

NABAIS Joseacute Casalta O dever fundamental de pagar impostos contributo para a compreensatildeo do estado fiscal contemporacircneo Coimbra Livraria Almedina 2009

______ Solidariedade Social Cidadania e Direito Fiscal In GRECO Marco Aureacutelio GODOI Marciano Seabra de (coord) Solidariedade Social e Tributaccedilatildeo Satildeo Paulo Dialeacutetica 2005

PEREZ LUNtildeO Antonio E Los derechos fundamentales 8 ed Madrid Tecnos 2005

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

232

______ Concepto y concepcioacuten de loacutes derechos humanos In Revista DOXA Cuadernos de Filosofia Del Derecho Madrid Biblioteca Miguel de Cervantes n 4 1987

PIOVESAN Flaacutevia Direitos humanos e o direito constitucional internacional 8 ed Satildeo Paulo Sa-raiva 2007

RAWS John Uma teoria da justiccedila Traduccedilatildeo de Almiro Pisetta e Lenita M R Esteves Satildeo Paulo Mar-tins Fontes 1997

SARLET Ingo Wolfgang Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na Constituiccedilatildeo Federal de 1988 2 ed Porto Alegre Livraria do Advogado 2002

______ A Eficaacutecia dos Direitos Fundamentais 3 ed Porto Alegre Livraria do Advogado 2003

TIPKE Klaus YAMASHITA Douglas Justiccedila fiscal e princiacutepio da capacidade contributiva Satildeo Paulo Malheiros 2002

TORRES Ricardo Lobo Tratado de Direito Constitucional Financeiro e Tributaacuterio valores e princiacute-pios constitucionais tributaacuterios Rio de Janeiro Renovar 2005 v 2

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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PARTE III

CARGA TRIBUTAacuteRIA REFORMA TRIBUTAacuteRIA E JUSTICcedilA FISCAL

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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REFORMA TRIBUTAacuteRIA COM JUSTICcedilA FISCAL E SOCIAL

SUMAacuteRIO Introduccedilatildeo 1 A importacircncia da tributaccedilatildeo 2 Tipos de tributos 21 Impostos 22 Taxas 23 Contribuiccedilotildees 3 Classificaccedilatildeo dos impostos 31 Imposto direto 32 Imposto indireto 33 Imposto progressivo 34 Imposto regressivo 4 Justiccedila tributaacuteria 41 Princiacutepios relacionados agrave justiccedila tributaacuteria 411 Princiacutepio da capacidade contributiva 412 Princiacutepio da solidariedade 5 Carga tributaacuteria no Brasil 51 A regressividade da carga tributaacuteria no Brasil 6 Algumas sugestotildees que visam a tornar a tributaccedilatildeo mais justa 61 Desonerar a cesta baacutesica 62 Tributar os bens supeacuterfluos considerados de luxo 63 Po-tencializar a cobranccedila do Imposto de Transmissatildeo de Causa Mortis e Doaccedilotildees 64 Aumentar os impostos sobre a propriedade da terra 65 Tributaccedilatildeo sobre a remessa de lucros 66 Cobrar IPVA sobre embarcaccedilotildees e aeronaves 67 Ins-tituir o imposto sobre grandes fortunas 68 A cobranccedila da contribuiccedilatildeo de melhoria Consideraccedilotildees finais Referecircncias

Antocircnio Gilson Aragatildeo de Carvalho1 Lucas Mouratildeo Aragatildeo2

INTRODUCcedilAtildeO

A ideia deste artigo surgiu diante da necessidade de colaborar com o debate da Reforma Tribu-

taacuteria que seraacute objeto de discussatildeo com o processo eleitoral que se avizinha Neste sentido o objetivo

deste artigo eacute analisar o sistema tributaacuterio nacional visando ao final oferecer sugestotildees para uma

Reforma Tributaacuteria que venha acompanhada de uma foacutermula que busque maior justiccedila fiscal e social

Para isso a metodologia aplicada seraacute bibliograacutefica descritiva e exploratoacuteria

Entende-se que a temaacutetica se demonstra relevante posto que haacute muito desde a promulgaccedilatildeo

da Constituiccedilatildeo Federal de 1988 fala-se em reforma tributaacuteria no Brasil partindo geralmente de pro-

postas de setores econocircmicos bem como de governos em iniacutecio de gestatildeo tentando cumprir com as

promessas de campanha eleitoral

Contudo devemos destacar que entre os vaacuterios pontos do debate trecircs parecem merecer espe-

cial registro quais sejam a regressividade da tributaccedilatildeo o tamanho da carga tributaacuteria cobrada num

paiacutes com tatildeo baixo niacutevel de renda por habitante e ainda abordagem sobre a justiccedila fiscal o que nos

leva a uma necessaacuteria reflexatildeo sobre justiccedila social

1 Doutorando em Direito Professor de poacutes-graduaccedilatildeo em Direito Tributaacuterio na FA7 Especialista em Direito Tributaacuterio e Gestatildeo Puacuteblica e Servidor da Secretaria da Fazenda do Estado do Cearaacute E-mail aragogilsongmailcom2 Estudante de Direito da Unifor E-mail lucasmourao10yahoocombr3 Neste ano de 2014 em outubro seratildeo realizadas eleiccedilotildees no acircmbito Federal para Presidente da Repuacuteblica para o Senado e Cacircmara dos Deputados

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

235

Entendemos que essas trecircs questotildees natildeo podem fugir de qualquer discussatildeo a respeito da re-

forma tributaacuteria adequada para o nosso Paiacutes Pergunta que natildeo quer se calar no acircmbito tributaacuterio o

sistema tributaacuterio nacional eacute justo

Percebe-se que durante este periacuteodo as alteraccedilotildees no sistema tributaacuterio foram parciais haja

vista que nenhuma reforma de substancial importacircncia foi realizada apesar de os uacuteltimos governos

Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inaacutecio Lula da Silva bem como o atual terem em algum momento

defendido a reforma tributaacuteria como prioridade

Por outro lado verifica-se que as resistecircncias para mudar o regime tributaacuterio no Brasil satildeo haacute

muito tempo conhecidas tendo em vista que presenciamos a existecircncia de conflitos entre o trabalho

e o capital as instacircncias federativas (Uniatildeo Estados e Municiacutepios) com o comeacutercio internacional e as

financcedilas globalizadas entre outros

De conseguinte cabe esclarecer que enfrentam uma batalha difiacutecil os que lutam pela adequada

regulamentaccedilatildeo dos impostos com maior incidecircncia para os segmentos mais poderosos nas aacutereas

da economia e da poliacutetica As dificuldades satildeo tantas que tecircm paralisado qualquer tentativa de levar

adiante uma reforma tributaacuteria e fiscal abrangente com intenccedilatildeo de promover mais justiccedila social e

reduzir as desigualdades de renda e riqueza no Brasil

1 A IMPORTAcircNCIA DA TRIBUTACcedilAtildeO

Asseverou certa vez o iacutedolo norte americano Oliver Wendell Holmes Junior (1841-1935) juiz da

Suprema Corte norte-americana ldquoGosto de pagar impostordquo ldquoporque com eles compro civilizaccedilatildeordquo In-

felizmente no Brasil natildeo podemos falar a mesma coisa posto que em vez de pagarmos por civilizaccedilatildeo

pagamos pelos juros da diacutevida puacuteblica interna para salvar banqueiros e empresas falidas etc

Pois bem Natildeo existe nenhum cidadatildeo que nunca tenha questionado ainda que a si mes-

mo a necessidade do pagamento de tributo sua destinaccedilatildeo e sua efetiva aplicaccedilatildeo e sobre ele

natildeo tenha apresentado criacuteticas severas e ateacute mesmo extremada de requintes preconceituosos Eacute

evidente que questionamentos e criacuteticas satildeo praacuteticas naturais do ser humano que traduzem sua

forma mais tradicional de adquirir conhecimento e aprimorar aquilo que traz preacute-concebido do

conhecimento ordinaacuterio

Diante de tantos questionamentos e criacuteticas sente-se a importacircncia em aprofundar os estudos

referentes agrave relaccedilatildeo existente entre o Estado de Direito a Administraccedilatildeo Puacuteblica e a efetivaccedilatildeo dos

direitos constitucionais do cidadatildeo presentes na Constituiccedilatildeo em razatildeo das espeacutecies tributaacuterias pagas

pela sociedade

Eacute de sabenccedila geral que o tributo e o Estado satildeo parte de uma mesma moeda Eles andam juntos

haacute seacuteculos Neste sentido para financiar suas atividades o Estado por meio do Fisco intervecircm no do-

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

236

miacutenio econocircmico tributando as manifestaccedilotildees de riquezas produzidas pelas pessoas fiacutesicas e juriacutedicas

Eacute bem verdade que cada paiacutes tem a sua proacutepria histoacuteria poliacutetica econocircmica e social O tama-

nho do Estado e a forma de financiaacute-lo eacute uma construccedilatildeo histoacuterica de cada naccedilatildeo ou seja quem deve

pagar mais impostos quem deve pagar menos quem natildeo deve pagar e qual a extensatildeo da atuaccedilatildeo

estatal em cada paiacutes

Os regimes tributaacuterios e fiscais de cada paiacutes respondem agraves escolhas da sociedade sobre o

que o Estado deve prover para os cidadatildeos em termos de bens e serviccedilos puacuteblicos Mais bens e

serviccedilos puacuteblicos universais e de boa qualidade soacute satildeo viaacuteveis com um Estado e um sistema tribu-

taacuterio e fiscal fortes

Eacute nesse sentido que a justiccedila fiscal se insere nesse contexto em virtude da realizaccedilatildeo pela Ad-

ministraccedilatildeo Puacuteblica da distribuiccedilatildeo de renda e ainda da promoccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas que cumpram

os interesses sociais Sua participaccedilatildeo estaacute presente tanto nas despesas ou seja no atendimento das

necessidades baacutesicas dos cidadatildeos quanto na receita a partir da realizaccedilatildeo de uma tributaccedilatildeo justa

Em busca da justiccedila fiscal especialistas sugerem como veremos mais adiante a reduccedilatildeo da

carga tributaacuteria com o aumento de sua progressividade e da participaccedilatildeo nos tributos diretos bem

como reduccedilatildeo dos indiretos o que promove o fortalecimento da economia com produtos mais

competitivos no mercado e aumento da capacidade de consumo gerando riqueza e crescimento

social e econocircmico

2 TIPOS DE TRIBUTOS

No Brasil o tributo eacute classificado em impostos taxas e contribuiccedilotildees4 conforme o Coacutedigo Tri-

butaacuterio Nacional e o Sistema Tributaacuterio definido na Constituiccedilatildeo Federal

O conceito de tributo encontra-se no Coacutedigo Tributaacuterio Nacional ldquoToda prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

compulsoacuteria (obrigatoacuteria) em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir que natildeo constitua sanccedilatildeo

de ato iliacutecito constituiacuteda em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculadardquo5

Conveacutem destacar que o Professor Paulo de Barros de Carvalho (1999 p 15) salienta que o vocaacute-

bulo tributo experimenta pelo menos seis significados diversos a saber a) ldquotributordquo como quantia em

dinheiro b) ldquotributordquo como prestaccedilatildeo correspondente ao dever juriacutedico do sujeito passivo c) ldquotributordquo

como direito subjetivo de que eacute titular o sujeito ativo d) ldquotributordquo como sinocircnimo de relaccedilatildeo juriacutedica

tributaacuteria e) ldquotributordquo como norma juriacutedica tributaacuteria f) ldquotributordquo como norma fato e relaccedilatildeo juriacutedica

Imperioso destacar aqui que a compulsoriedade prevista no conceito de tributo se deve pelo

4 Existe uma outra espeacutecie tributaacuteria - o empreacutestimo compulsoacuterio - que eacute extremamente controversa que natildeo interessa a nossa pesquisa razatildeo pela qual natildeo a incluiacutemos em nosso objeto de estudo5 Cf Art 3ordm do Coacutedigo Tributaacuterio Nacional Lei nordm 5172 de 25101966

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

237

fato de o ser humano ainda natildeo ser capaz de superar sozinho o individualismo interno A formaccedilatildeo

social do mundo moderno tende ao individualismo e agrave acumulaccedilatildeo de riquezas em face das opres-

sotildees sofridas e do desenvolvimento do pensamento capitalista Eacute necessaacuteria que uma ldquomatildeo forterdquo

mantenha a opccedilatildeo inicial feita nos primoacuterdios do agrupamento humano para que esse sentimento de

proteccedilatildeo natildeo se perca ante os devaneios egoiacutestas

Importante salientar para o estudo em debate que nos paiacuteses desenvolvidos e em desenvol-

vimento os sistemas tributaacuterios se lastreiam nas seguintes bases de arrecadaccedilatildeo renda patrimocircnio

consumo ou circulaccedilatildeo de bens e serviccedilos bem como a folha de pagamentos arrecadaccedilatildeo que finan-

cia os sistemas de previdecircncia social em muitos paiacuteses

Consoante o Professor Hugo de Brito Machado (1998 p 51) os impostos satildeo classificados em

quatro grupos a) sobre o comeacutercio exterior b) sobre o patrimocircnio e a renda c) sobre a produccedilatildeo e a

circulaccedilatildeo e d) impostos especiais

21 Impostos

Impostos satildeo valores pagos por pessoas fiacutesicas e juriacutedicas (empresas) O valor eacute arrecadado

pelo Estado (governos municipal estadual e federal) e servem para custear os gastos puacuteblicos em

sauacutede seguranccedila educaccedilatildeo transporte cultura pagamentos de salaacuterios de servidores puacuteblicos etc O

dinheiro arrecadado com impostos tambeacutem eacute usado para investimentos em obras puacuteblicas (hospitais

rodovias hidreleacutetricas portos universidades etc) A utilizaccedilatildeo do dinheiro proveniente da arrecada-

ccedilatildeo de impostos natildeo eacute vinculada a gastos especiacuteficos O governo com a aprovaccedilatildeo do legislativo eacute

quem define o destino dos valores por meio do orccedilamento

22 Taxas

Taxa eacute a exigecircncia financeira agrave pessoa privada ou juriacutedica para usar certos serviccedilos fundamen-

tais ou pelo exerciacutecio do poder de poliacutecia imposta pelo governo ou alguma organizaccedilatildeo poliacutetica ou

governamental

23 Contribuiccedilotildees

Na Constituiccedilatildeo Federal de 1988 encontramos os seguintes tipos de contribuiccedilotildees contribui-

ccedilotildees sociais de intervenccedilatildeo no domiacutenio econocircmico e as de interesse de categorias profissionais

ou econocircmicas A Uniatildeo tem competecircncia exclusiva de instituiacute-las Aleacutem dessas haacute tambeacutem as con-

tribuiccedilotildees de melhoria de competecircncia comum As contribuiccedilotildees sociais ganham destaque porque

financiam a Seguridade Social

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

238

A contribuiccedilatildeo de melhoria eacute uma espeacutecie do gecircnero tributo vinculada a uma atuaccedilatildeo estatal

melhor dizendo a construccedilatildeo de uma determinada obra puacuteblica que venha ocasionar valorizaccedilatildeo dos

imoacuteveis pertencentes aos particulares Desta forma podemos deduzir que eacute um tributo decorrente de

obra puacuteblica que gera valorizaccedilatildeo em bens imoacuteveis de um determinado sujeito passivo (particular)

Nesse sentido se o poder puacuteblico (Uniatildeo Estados Distrito Federal e Municiacutepios) promove a constru-

ccedilatildeo de um viaduto ponte estrada saneamento baacutesico etc acarretando a esta obra a valorizaccedilatildeo dos

imoacuteveis circunscritos agrave entidade puacuteblica que promoveu a construccedilatildeo eacute permitida a cobranccedila desta

espeacutecie tributaacuteria

Cumpre acentuar que encontramos na doutrina discussotildees acerca da natureza juriacutedica deste

tributo ou seja se a contribuiccedilatildeo de melhoria eacute imposto taxa ou tributo inconfundiacutevel como bem

assevera Alfredo Augusto Becker

A doutrina tradicional entende que a contribuiccedilatildeo de melhoria eacute tributo inconfundiacute-vel mesmo no plano juriacutedico com imposto e taxa Entretanto aqueles estudiosos do Direito Tributaacuterio que preocupam-se em natildeo deixar sua atitude mental juriacutedica conta-minar-se com princiacutepios e conceitos da Ciecircncia das Financcedilas Puacuteblicas ao procederem recentes investigaccedilotildees sobre as diferentes naturezas juriacutedicas dos tributos concluiacuteram que a contribuinte eacute um imposto ou uma taxa (BECKER 1998 p 386)

Contudo para o nosso estudo ressaltamos que consideramos como um tributo inconfundiacutevel

com qualquer outra espeacutecie tributaacuteria

3 CLASSIFICACcedilAtildeO DOS IMPOSTOS

Para a nossa pesquisa eacute importante estudarmos a classificaccedilatildeo dos impostos Na doutrina en-

contramos diversas classificaccedilotildees para os impostos dentre elas destacamos as principais vale dizer

impostos diretos indiretos progressivos e regressivos

31 Imposto direto

Eacute aquele que incide periodicamente sobre a renda e o patrimocircnio de uma uacutenica pessoa ou do

capital O imposto de renda e o IPTU satildeo exemplos de impostos diretos

32 Imposto indireto

Eacute aquele que estaacute embutido no preccedilo final do produto e natildeo aparece explicitado na Nota Fis-

cal Um contribuinte recolhe o imposto e outro efetivamente o paga Eacute o caso do IPI (Imposto sobre

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

239

Produtos Industrializados) e do ICMS (Imposto sobre a circulaccedilatildeo de mercadorias) O consumidor final

de uma geladeira por exemplo eacute quem pagaraacute o imposto embora ele seja recolhido pelo fabricante

Como regra geral considera-se que os tributos sobre renda e patrimocircnio (IRPF IRPJ CSLL IPTU IPVA

ITR ITCD ITBI) satildeo diretos enquanto os tributos sobre produccedilatildeo e consumo de bens e serviccedilos (ICMS

Cofins IPI ISS Cide) satildeo indiretos

33 Imposto progressivo

Progressivo eacute um imposto que incide de modo que a taxa efetiva de um imposto aumenta con-

forme o montante em que a taxa aplicada aumenta Para que um imposto seja progressivo eacute preciso

que ele tenha mais de uma aliacutequota e que elas incidam de forma crescente conforme aumenta a base

de caacutelculo O imposto de renda eacute um bom exemplo Quanto maiores satildeo as faixas de renda (base de

caacutelculo) maiores satildeo as aliacutequotas

Leandro Paulsen foi enfaacutetico sobre tal ponto

Progressividade como instrumento para observacircncia da capacidade contributiva Atra-veacutes das aliacutequotas progressivas eacute possiacutevel fazer com que aqueles que revelam melhor situaccedilatildeo econocircmica e portanto capacidade para contribuir para as despesas puacuteblicas o faccedilam em maior grau que os demais natildeo apenas proporcionalmente a sua maior riqueza mas suportando maior carga em termos percentuais Eacute pois um instrumento para efetivaccedilatildeo do princiacutepio da capacidade contributiva mas deve ser utilizado com moderaccedilatildeo para natildeo desestimular a geraccedilatildeo de riqueza (PAULSEN 2010 p 49)

34 Imposto regressivo

Regressivo eacute o exato oposto de um imposto progressivo onde a taxa efetiva de imposto di-

minui agrave medida que aumenta a quantia a que a taxa eacute aplicada Este efeito eacute geralmente produzido

em testes de meios e eacute usado para retirar subsiacutedios ou benefiacutecios fiscais estaduais criando taxas

marginais de imposto As maiores taxas de imposto marginal seratildeo suportadas por aqueles com

renda mais baixa

4 JUSTICcedilA TRIBUTAacuteRIA

Preliminarmente faz-se necessaacuterio ressaltar que definir justiccedila eacute uma tarefa extremamente

complicada principalmente quando se trata de justiccedila tributaacuteria conforme alerta Hugo de Brito

Machado (2009 p 84) ldquoDefinir eacute uma tarefa difiacutecil e definir justiccedila eacute praticamente impossiacutevel Se-

guramente poreacutem todos temos um sentimento de justiccedila que ateacute certo ponto se confunde com a

ideia de igualdaderdquo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

240

Contudo eacute vaacutelido frisar a importacircncia da questatildeo da justiccedila tributaacuteria6 natildeo soacute nos dias atuais

mas em grande parte da histoacuteria Outrora o Rei todo poderoso era considerado uma lideranccedila natildeo

soacute militar mas tambeacutem espiritual ao seu povo haja vista que ao ocupar o posto maacuteximo em determi-

nada sociedade ele tinha que satisfazer as necessidades dos seus seguidores de acordo com as suas

possibilidades No entanto essas possibilidades surgiam ao passo que aquele liacuteder possuiacutea ou natildeo

condiccedilotildees financeiras para arcar com suas vontades Assim sendo a tributaccedilatildeo surgiu com o objetivo

de apoiar financeiramente o liacuteder de certo povo revertendo o produto daquela em vantagens e servi-

ccedilos individuais ou gerais de acordo com as necessidades do povo

Na linha doutrinaacuteria de Michel Sandel (2012 p 28) para identificar se uma sociedade eacute justa haacute

que se perguntar se ela distribui as coisas que ela valoriza

Para saber se uma sociedade eacute justa basta perguntar como ela distribui as coisas que valoriza ndash renda e riqueza deveres e direitos poderes e oportunidades cargos e honrarias Uma sociedade justa distribui esses bens da maneira correta ela daacute a cada indiviacuteduo o que lhe eacute devido

Justiccedila tributaacuteria pois eacute a possibilidade processual do justo na aacuterea tributaacuteria focando princi-

palmente a cobranccedila dos impostos contribuiccedilotildees taxas e empreacutestimos compulsoacuterios Pode-se sinte-

tizar esse tema como sendo um limite eacutetico entre o Direito Tributaacuterio e o Excesso Tributaacuterio

Dito isto no caso brasileiro o cidadatildeo paga uma alta carga tributaacuteria poreacutem ele natildeo recebe a

contraprestaccedilatildeo das garantias constitucionais ou seja sauacutede educaccedilatildeo seguranccedila o que ocasiona

um sufocamento na sociedade em face da demasiada arrecadaccedilatildeo

Ives Gandra da Silva Martins (1989 p 8-10) na obra ldquoExerciacutecio da Cidadania e Sistema Tributaacuterio

na Constituiccedilatildeo de 1988rdquo critica duramente a corrupccedilatildeo a maacute aplicaccedilatildeo do dinheiro puacuteblico e a situ-

accedilatildeo confiscatoacuteria em que se visualiza a atividade tributaacuteria atualmente causando uma revolta silente

em toda sociedade Pela oacuteptica fiscal os recursos deveriam ter origem e destino identificados para

diminuir as ocorrecircncias de crime contra a ordem tributaacuteria

Na teoria da carga desmedida formulada pelo mesmo autor fica claro que haacute a tendecircncia de

o homem exigir da sociedade sempre mais do que seria desejaacutevel somando aos interesses sociais

o favorecimento dos possuidores do poder Os valores arrecadados com a tributaccedilatildeo natildeo se restrin-

gem a atender aos interesses da coletividade mas sim a interesses privados o que culmina com a

rejeiccedilatildeo social

Em uacuteltima menccedilatildeo Ives Gandra (MARTINS 1989 p 10) arremata da seguinte forma

6 Diz-se justiccedila tributaacuteria substancial aquela que se afasta da mera estrutura formal do texto juriacutedico tributaacuterio para se aproximar daquela que incorpora conceitos mais amplos e que repele a positivaccedilatildeo de meras formas legais e sua interpre-taccedilatildeo isolada

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

241

Alguns aspectos que determinam a carga desmedida ldquoobjetivos e necessidades mal colocados gastos supeacuterfluos contribuintes apenados porque privileacutegios e incentivos satildeo mal distribuiacutedos sonegaccedilatildeo e tratamento praacutetico diferencial fiscalizaccedilatildeo com bai-xa moralidade exatora e sonegaccedilatildeo e aumento de receita que se traduz pelo princiacutepio de que a tributaccedilatildeo seria mais elevada para compensar a receita natildeo arrecadada dos sonegadoresrdquo

Nesta esteira Alberto Nogueira em sua obra ldquoA Reconstruccedilatildeo dos Direitos Humanos da Tri-

butaccedilatildeordquo evidencia trecircs caminhos para a tal reconstruccedilatildeo O primeiro deles eacute a ldquoefetiva direta e ativa

participaccedilatildeo de todos os segmentos da sociedade na elaboraccedilatildeo fiscalizaccedilatildeo e controle das regras

tributaacuteriasrdquo (NOGUEIRA 1997 p 411) o que tende a eliminar os excessos e as injusticcedilas da carga tribu-

taacuteria O segundo se daacute pelas vias judiciais e por uacuteltimo a primazia da Constituiccedilatildeo

41 Princiacutepios relacionados agrave justiccedila tributaacuteria

411 Princiacutepio da capacidade contributiva

O principio da capacidade contributiva seria a graduaccedilatildeo dos impostos segundo a capacidade

econocircmica do contribuinte devendo cada um respeitar e contribuir de acordo com sua aptidatildeo eco-

nocircmica originando assim o ideal de justiccedila distributiva Esse princiacutepio pode ser considerado o pilar

da justiccedila tributaacuteria sendo ainda base para o princiacutepio constitucional da igualdade jaacute que aleacutem de

minimizar as injusticcedilas e diminuir as desigualdades busca a igualdade impondo tributos maiores so-

bre os que tiverem maior riqueza em sua posse Deve aqui o legislador observar a peculiaridade dos

cidadatildeos considerando a capacidade de cada um individualmente harmonizando a capacidade eco-

nocircmica com certas medidas inclusive tratando de forma diversa os desiguais Resumindo de forma

simples e clara quem dispotildee de maior riqueza deve proporcionalmente pagar mais tributos do que

aquele que tem menor poderio econocircmico para ser realizada a conservaccedilatildeo do patrimocircnio puacuteblico

Sobreleva notar o conceito de Klaus Tipke (2012 p 21) acerca do princiacutepio da capacidade con-

tributiva ldquoCada qual deve pagar impostos de conformidade com o montante de sua renda desde que

este ultrapasse o miacutenimo existencial e natildeo deva ser empregado para obrigaccedilotildees privadas inevitaacuteveisrdquo

412 Princiacutepio da solidariedade

O princiacutepio da solidariedade tem fundamentaccedilatildeo na Constituiccedilatildeo Federal no seu artigo 3ordm inci-

so I Tem como objetivo central por meio de accedilotildees puacuteblicas e privadas construir um estado ideal bus-

cando a formaccedilatildeo de uma sociedade livre justa e solidaacuteria Eacute na busca do bem comum interesse

comum da sociedade que se aplica o princiacutepio da solidariedade pois visa agrave accedilatildeo da coletividade

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

242

em prol de um propoacutesito maior que traduz o bem comum em igualdade e dignidade a todos os

membros sociais

No acircmbito juriacutedico mais precisamente em face do Direito Tributaacuterio o embasamento da apli-

caccedilatildeo do princiacutepio da solidariedade encontra-se na Filosofia demonstrando que o ser humano sente

um dever inato em colaborar com o meio em que vive aprimorando-o haja vista a caracteriacutestica e o

instinto gregaacuterio que o direciona de modo que mesmo em seu egoiacutesmo o homem colabora com o

todo para receber algum benefiacutecio

Na questatildeo tributaacuteria deve ser observado o Coacutedigo Tributaacuterio Nacional no seu artigo 145 sect 1ordm

onde trata da capacidade contributiva Neste ponto eacute de faacutecil conclusatildeo que a Repuacuteblica Federativa

do Brasil com o objetivo de uma melhor distribuiccedilatildeo da riqueza tributa mais intensamente os que

auferem mais renda para compensar a falta de receita dos menos favorecidos ou seja dos que pos-

suem menos condiccedilotildees Esse objetivo na busca uma melhor distribuiccedilatildeo de renda e implementaccedilatildeo da

capacidade contributiva une o princiacutepio da solidariedade agrave ideia de justiccedila

5 CARGA TRIBUTAacuteRIA NO BRASIL

Estudos do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributaacuterio (IBPT) (2012) revelam que a carga

tributaacuteria do Brasil eacute uma das mais altas do mundo quando comparada agrave de paiacuteses de renda per capita semelhante Pode-se medir a carga de tributos que a sociedade suporta pelo conceito de carga tribu-

taacuteria bruta que eacute o total de tributos arrecadados (diretos e indiretos) em relaccedilatildeo ao PIB (Produto Inter-

no Bruto) Segundo este instituto a arrecadaccedilatildeo tributaacuteria no Brasil cresce ano a ano batendo novos

recordes em arrecadaccedilatildeo O estudo compara a voracidade tributaacuteria de 30 paiacuteses com o niacutevel de bem

estar dos cidadatildeos medido pelo Iacutendice de Desenvolvimento Humano (IDH) elaborado pelo Programa

das Naccedilotildees Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) E conclui ldquoEntre os 30 paiacuteses com a maior carga

tributaacuteria o Brasil continua sendo o que proporciona o pior retorno dos valores arrecadados em prol

do bem-estar da sociedaderdquo

Neste mesmo estudo o Ipea7 afirma que em 2008 a carga tributaacuteria liacutequida foi de 205

do PIB As transferecircncias de previdecircncia e assistecircncia e os subsiacutedios somaram 153 do PIB naquele

ano Essa distinccedilatildeo eacute importante pois o volume de recursos mobilizado por estas transferecircncias satildeo

resultado da atuaccedilatildeo direta do Estado na redistribuiccedilatildeo de renda Eacute um dinheiro que arrecadado pelo

governo natildeo fica com ele para manutenccedilatildeo da maacutequina puacuteblica mas eacute redirecionado ao bolso das

famiacutelias que gastaratildeo esses recursos no mercado como quiserem

7 Instituto de Pesquisa Econocircmica Aplicada (Ipea) eacute uma fundaccedilatildeo puacuteblica federal vinculada agrave Secretaria de Assuntos Estrateacutegicos da Presidecircncia da Repuacuteblica Suas atividades de pesquisa fornecem suporte teacutecnico e institucional agraves accedilotildees governamentais para a formulaccedilatildeo e reformulaccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas e programas de desenvolvimento brasileiros Dis-poniacutevel em wwwIpeagovbr Acesso em 3 jan 2014

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

243

Outro ponto muito importante no debate sobre o tamanho da carga tributaacuteria eacute o uso dos re-

cursos Boa parte da arrecadaccedilatildeo de impostos e de outros tributos eacute destinada ao pagamento de juros

da diacutevida puacuteblica e natildeo ao financiamento de serviccedilos puacuteblicos como educaccedilatildeo sauacutede saneamento e

seguranccedila puacuteblica Em 2008 o pagamento de juros sobre a diacutevida puacuteblica alcanccedilou 56 do PIB

Contudo o tamanho da carga tributaacuteria pode ser relativizado pelo conjunto de transferecircncias

e subsiacutedios previstos no sistema tributaacuterio e na poliacutetica fiscal que orienta os gastos puacuteblicos Aqui eacute

necessaacuterio introduzir o conceito de carga tributaacuteria liacutequida que corresponde agrave carga bruta deduzida

de transferecircncias e subsiacutedios

Quando o retorno de recursos para a sociedade por meio de transferecircncias (como pensotildees e

aposentadorias e outros benefiacutecios previdenciaacuterios e assistenciais para idosos eou muito pobres eou

portadores de deficiecircncias) eacute socialmente mais justo o efeito de uma carga tributaacuteria alta eacute relativiza-

da e o uso da carga tributaacuteria liacutequida deve ser considerado na discussatildeo

Ao considerar as transferecircncias e o pagamento de juros da diacutevida puacuteblica pode-se concluir que

a carga tributaacuteria liacutequida exclusive juros era bem menor do que aparentava

Assim eacute preciso tambeacutem pensar na qualidade dos bens e serviccedilos que o Estado devolve em tro-

ca dos recursos que arrecada e na forma como faz isso Se o Estado arrecada muito mas oferece bens

e serviccedilos de qualidade dificilmente a populaccedilatildeo questionaraacute o tamanho da carga tributaacuteria Contu-

do quando a carga tributaacuteria eacute alta e os serviccedilos oferecidos pelo Estado natildeo satildeo de boa qualidade o

questionamento eacute inevitaacutevel

No Brasil haacute uma percepccedilatildeo negativa do retorno social e econocircmico da arrecadaccedilatildeo de impos-

tos ou seja de que pagamos muito imposto e recebemos em troca serviccedilos de baixa qualidade

Corroborando com o que foi exposto reportagem do jornal Folha de Satildeo Paulo publicada em

17052013 afirma que o Brasil eacute o campeatildeo da ldquodesigualdade horizontalrdquo isto eacute apresenta a maior

diferenccedila entre o que eacute cobrado a trabalhadores com a mesma renda apenas pelo regime fiscal esco-

lhido A contribuiccedilatildeo de um trabalhador brasileiro que paga o imposto Simples como pessoa juriacutedica eacute

de 38 do rendimento O percentual eacute quase dez vezes inferior ao pago por funcionaacuterio com carteira

assinada (347) Em outros paiacuteses da regiatildeo a diferenccedila chega a ser nula como no Chile ou de menos

de trecircs vezes como no Meacutexico

Esta percepccedilatildeo natildeo passou despercebida por Daacutevio Antonio Prado Zarzana (2010 p 11)

[] Natildeo haacute duacutevida que a carga tributaacuteria eacute muito alta em nosso paiacutes Grita-se contra ela e com razatildeo mas poucos perguntam por que razatildeo ela eacute tatildeo grande A resposta eacute simples essa carga eacute alta porque a despesa eacute alta notando-se que a despesa cor-rente tem crescido continuamente Dessa maneira deve-se voltar as baterias contra a despesa que eacute o alvo certo Enquanto a despesa for alta a carga tributaacuteria natildeo pode ser reduzida Pior ainda agrave despesa alta alia-se a ineficiecircncia da maacutequina admi-nistrativa puacuteblica na qual soacute haacute as exceccedilotildees de praxe E esta alta e improdutiva des-pesa inibe o investimento puacuteblico e tambeacutem o privado este por tabela em resultado da alta carga tributaacuteria

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

244

51 A regressividade da carga tributaacuteria no Brasil

Mais da metade da arrecadaccedilatildeo tributaacuteria no Brasil proveacutem de impostos indiretos e satildeo pagos

por toda a populaccedilatildeo O imposto indireto incide sobre o valor dos bens e mercadorias comercializa-

dos Este tipo de imposto acaba sendo cobrado nos preccedilos desses bens e serviccedilos Assim um cidadatildeo

de baixa renda que compra uma mercadoria paga o mesmo imposto que outro de renda mais alta

O imposto indireto eacute regressivo proporcionalmente agrave renda das famiacutelias Se as famiacutelias de me-

nor renda pagam o mesmo imposto que as de renda mais alta ao consumir um produto entatildeo em

termos do total da renda dessas famiacutelias esse tipo de imposto indireto incide desigualmente sobre a

populaccedilatildeo ndash e por isso eacute chamado de regressivo

6 ALGUMAS SUGESTOtildeES QUE VISAM A TORNAR A TRIBUTACcedilAtildeO MAIS JUSTA

Por tudo o que foi exposto cumpre aqui sugerir alguns pontos que podem resultar na praacutetica

de uma justiccedila fiscal

61 Desonerar a cesta baacutesica

Como vimos a regressividade da tributaccedilatildeo estaacute relacionada ao elevado peso dos tributos in-

diretos no total da carga tributaacuteria Famiacutelias com rendas diferentes acabam pagando igual valor em

tributos embutidos no preccedilo de um mesmo produto Desta forma percebe-se que uma forma de

atenuar este efeito regressivo seria fixar aliacutequotas mais baixas para itens essenciais reduzindo assim

o peso dos tributos para as famiacutelias de menor renda afinal elas gastam a maior parte do orccedilamento

com estes itens entre os quais estatildeo os componentes da cesta baacutesica

Portanto entende-se que a reduccedilatildeo da carga tributaacuteria sobre os preccedilos dos alimentos eacute uma

forma de amenizar a situaccedilatildeo de pobreza em que vivem muitos brasileiros e tornar mais justo o Siste-

ma Tributaacuterio Nacional

62 Tributar os bens supeacuterfluos considerados de luxo

Outra forma de atuar para reduzir a regressividade da tributaccedilatildeo seria aumentar as aliacutequotas

dos tributos que incidem sobre itens supeacuterfluos de luxo ou suntuosos Assim os efeitos de uma deso-

neraccedilatildeo da cesta baacutesica sobre a arrecadaccedilatildeo tributaacuteria seriam compensados ao menos parcialmente

pela maior incidecircncia tributaacuteria sobre bens supeacuterfluos natildeo essenciais

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

245

63 Potencializar a cobranccedila do Imposto de Transmissatildeo de Causa Mortis e Doaccedilotildees

O Imposto de Transmissatildeo de Causa Mortis e Doaccedilotildees (ITCD ou ITCMD) previsto na Consti-

tuiccedilatildeo Federal eacute de competecircncia dos Estados e do Distrito Federal e por esta razatildeo eacute regulamen-

tado pelas diferentes legislaccedilotildees estaduais Ele eacute devido por todas as pessoas fiacutesicas ou juriacutedicas

que receberem bens ou direitos como heranccedila doaccedilatildeo e diferenccedila de partilha e pelo donataacuterio

na transmissatildeo

A aliacutequota do ITCD varia conforme o tipo (doaccedilatildeo ou causa mortis) e o valor transmitido ou

doado atingindo o maacuteximo de 8 de acordo com a Resoluccedilatildeo nordm 9 de 1992 do Senado Federal que

tambeacutem autoriza a progressividade das aliacutequotas conforme o valor da heranccedila

Tornar o ITCD mais progressivo implicaria introduzir mais um elemento de justiccedila em nosso

sistema tributaacuterio Herdeiros com maior capacidade contributiva que recebem heranccedilas significativas

seriam tributados a uma aliacutequota maior do que aqueles que herdam pequenos patrimocircnios Aleacutem

disso possibilitaria tambeacutem elevar a arrecadaccedilatildeo deste imposto e por conseguinte a aplicaccedilatildeo deste

tributo em investimentos puacuteblicos estaduais que poderiam ser igualmente usados em benefiacutecio de

toda a sociedade

64 Aumentar os impostos sobre a propriedade da terra

O Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural (ITR) previsto na Constituiccedilatildeo Federal eacute cobra-

do do proprietaacuterio de imoacutevel rural ou do titular de domiacutenio uacutetil ou possuidor a qualquer tiacutetulo O fato

gerador eacute a propriedade o domiacutenio uacutetil ou a posse de imoacutevel localizado fora da zona urbana Como

no caso anterior o Imposto Territorial Rural gera uma arrecadaccedilatildeo iacutenfima para os cofres puacuteblicos ape-

nas 007 da receita administrada pela Receita Federal do Brasil em 2012 e 004 da Carga Tributaacuteria

Brasileira em 2011

Insta salientar que o ITR eacute essencialmente um imposto direto incidente sobre o patrimocircnio

Uma revisatildeo da tributaccedilatildeo da propriedade rural propondo paracircmetros atualizados para a incidecircncia

do imposto as aliacutequotas e faixas de tributaccedilatildeo o valor da terra os diversos conceitos de aacuterea rural

(aproveitaacutevel utilizaacutevel tributaacutevel etc) contribuiria para elevar a progressividade prevista para este

tributo no paraacutegrafo 4ordm do artigo 153 da Constituiccedilatildeo Federal de forma a promover maior justiccedila tri-

butaacuteria com reduccedilatildeo de desigualdade social

65 Tributaccedilatildeo sobre a remessa de lucros

A remessa de lucros ao exterior das empresas estrangeiras natildeo eacute tributada o que resulta em um

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

246

benefiacutecio questionaacutevel No momento em que o Brasil eacute muito atraente para os capitais internacionais

esta medida estimula a remessa de lucros e natildeo o reinvestimento no proacuteprio paiacutes

Entre as mudanccedilas jaacute realizadas e que favorecem a renda do capital estaacute a isenccedilatildeo de imposto

de renda sobre a remessa de lucros e dividendos ao exterior com impacto econocircmico no balanccedilo de

pagamentos Eacute uma medida de atraccedilatildeo de capital estrangeiro ao paiacutes pois transmite maior seguranccedila

aos investidores quanto agrave remessa dos lucros e dividendos do capital aqui investido Entretanto eacute ne-

cessaacuteria uma reflexatildeo acerca do impacto sobre o saldo de transaccedilotildees correntes do Brasil

Portanto o fim da isenccedilatildeo de IR agrave distribuiccedilatildeo dos lucros e dividendos ao exterior eacute uma alte-

raccedilatildeo necessaacuteria na legislaccedilatildeo tributaacuteria e relevante para fins de justiccedila tributaacuteria no Brasil

66 Cobrar IPVA sobre embarcaccedilotildees e aeronaves

O Imposto sobre a Propriedade de Veiacuteculos Automotores (IPVA) eacute de competecircncia dos Estados

e do Distrito Federal e o fato gerador como o proacuteprio nome diz eacute a propriedade de veiacuteculo auto-

motor As aliacutequotas podem ser diferenciadas de acordo com o tipo de veiacuteculo e a utilizaccedilatildeo Cabe ao

Senado Federal fixar aliacutequotas miacutenimas sobre o valor venal do veiacuteculo

Apesar de tributar a propriedade de veiacuteculos automotores o IPVA natildeo eacute cobrado de quem

possui embarcaccedilotildees e aeronaves (barcos lanchas helicoacutepteros aviotildees etc) Cabe lembrar que o Brasil

eacute o paiacutes com a segunda maior frota de aviotildees executivos e o maior conjunto de helicoacutepteros urbanos

do mundo Os proprietaacuterios geralmente possuem renda ou patrimocircnio elevado e por isso capacidade

maior de contribuir para o financiamento do Estado No entanto isso natildeo acontece por falta de clareza

na legislaccedilatildeo o que levou o Supremo Tribunal Federal a natildeo reconhecer tal cobranccedila

Para que haja justiccedila tributaacuteria e harmonizaccedilatildeo das legislaccedilotildees estaduais eacute necessaacuterio que se

edite e aprove uma lei complementar regulamentando e normatizando nacionalmente o IPVA Esta

lei deve incluir aeronaves e embarcaccedilotildees no conceito de veiacuteculo automotor a fim de eliminar um dos

pontos mais controversos sobre este tributo e ao mesmo tempo contribuir para a promoccedilatildeo de maior

justiccedila fiscal

A ediccedilatildeo de uma resoluccedilatildeo do Senado Federal cumprindo o mandado constitucional de definir

aliacutequotas miacutenimas certamente contribuiria para efeitos da referida harmonizaccedilatildeo

67 Instituir o Imposto sobre Grandes Fortunas

Uma discussatildeo muito atual e com grande apelo na sociedade eacute a instituiccedilatildeo do Imposto sobre

Grandes Fortunas (IGF) no paiacutes de forma que se tenha alguma desconcentraccedilatildeo da riqueza e natildeo

apenas da renda

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247

A tributaccedilatildeo sobre grandes fortunas estaacute prevista na Constituiccedilatildeo Federal (artigo 153 VII) e a

Uniatildeo por intermeacutedio do Congresso Nacional pode instituir este imposto definindo o que eacute grande

fortuna o fato gerador as aliacutequotas e a base de caacutelculo entre outros aspectos

A tributaccedilatildeo incidente sobre o patrimocircnio como o IGF opera como um instrumento de corre-

ccedilatildeo de distorccedilotildees distributivas Ao incidir sobre a renda estocada sob forma de bens e direitos este

imposto de fato recai mais sobre as maiores rendas que foram relativamente menos tributadas quando

destinadas ao consumo

68 A cobranccedila da contribuiccedilatildeo de melhoria

Como vimos neste estudo a contribuiccedilatildeo de melhoria eacute o tributo cuja obrigaccedilatildeo tem por fato

gerador uma situaccedilatildeo que representa um benefiacutecio especial auferido pelo contribuinte Assim de-

terminado oacutergatildeo puacuteblico (Uniatildeo Estados Distrito Federal e Municiacutepios) que constroacutei determinada

obra que acarrete valorizaccedilatildeo imobiliaacuteria ao patrimocircnio do particular deveraacute cobrar a contribuiccedilatildeo

de melhoria aos proprietaacuterios dos imoacuteveis (sujeito passivo) que se beneficiaram com a valorizaccedilatildeo

dos seus imoacuteveis Daiacute a justificaccedilatildeo do tributo pelo princiacutepio do enriquecimento sem causa peculiar

ao Direito Privado

Portanto se o Poder Puacuteblico embora agindo no interesse da coletividade emprega recursos

puacuteblicos em obras de grande envergadura que acarreta valorizaccedilatildeo dos imoacuteveis aiacute situados impotildee-se

que este em observacircncia aos princiacutepios de justiccedila e de moralidade restitua parte do benefiacutecio origi-

nado do dinheiro alheio

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Como vimos o Sistema Tributaacuterio Nacional eacute extremamente regressivo visto que tributa exor-

bitantemente aqueles possuidores de menor renda e isso se justifica em grande parte pela opccedilatildeo do

legislador em tributar primordialmente o consumo Assim agindo o Estado brasileiro natildeo concretiza o

princiacutepio constitucional da capacidade contributiva previsto no art 145 paraacutegrafo 1ordm da Carta Magna

o qual determina que o cidadatildeo deve ser tributado na medida de suas riquezas devendo portanto os

mais abastados contribuiacuterem em uma proporccedilatildeo maior

Desta forma o brasileiro espera uma reforma tributaacuteria que desempenhe quatro funccedilotildees baacute-

sicas o financiamento das atividades estatais a redistribuiccedilatildeo justa da renda a equalizaccedilatildeo das desi-

gualdades regionais e a justa reparticcedilatildeo das receitas entre os entes da federaccedilatildeo Afinal a verdadeira

reforma tributaacuteria seria aquela que implicasse reduccedilatildeo da carga tributaacuteria acompanhada de uma boa

dose de justiccedila fiscal

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248

Neste contexto a busca de um sistema tributaacuterio e fiscal mais justo deve arrecadar recur-

sos progressivamente segundo a capacidade contributiva de pessoas e empresas e gastaacute-los de

modo socialmente mais justo destinando maior parte para a parcela da populaccedilatildeo que mais de-

pende do gasto social

Por outro lado que venha com um sistema tributaacuterio mais progressivo que tribute diferente-

mente e de forma crescente as diferentes faixas de renda viabilizando maior distribuiccedilatildeo da renda

e da riqueza Aleacutem de representar maior justiccedila social estimularia fortemente o desenvolvimento

econocircmico Falar em progressividade da tributaccedilatildeo eacute tambeacutem considerar os aspectos de equidade

do sistema tributaacuterio

Por fim como epiacutetome de tudo o que foi discutido aqui bem como visando a perspectiva de

se concretizar uma melhor distribuiccedilatildeo de renda e objetivando alcanccedilar uma justiccedila fiscal enten-

de-se que a reforma tributaacuteria enseja as seguintes accedilotildees a) a adoccedilatildeo de medidas que simplifiquem

o sistema tributaacuterio b) a reduccedilatildeo da carga tributaacuteria sobre os produtos essenciais (cesta baacutesica) c)

regulamentaccedilatildeo do IGF (Imposto sobre Grandes Fortunas) previsto no artigo 153 inciso VII da CF

d) Tributar os bens supeacuterfluos e de luxo e) potencializar a cobranccedila do Imposto de Transmissatildeo de

Causa Mortis e Doaccedilotildees f) Aumentar os impostos sobre a propriedade da terra g) Tributaccedilatildeo sobre

a remessa de lucros h) Cobrar IPVA sobre embarcaccedilotildees e aeronaves e i) efetivar a cobranccedila da con-

tribuiccedilatildeo de melhoria

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REFEREcircNCIAS

BECKER Alfredo Augusto Becker Teoria Geral do Direito Tributaacuterio 3 ed Satildeo Paulo Lejus 1998

BRASIL oferece o pior retorno em benefiacutecios em comparaccedilatildeo agrave alta carga tributaacuteria Instituto Brasi-leiro de Planejamento Tributaacuterio (IBPT) Disponiacutevel em httpibptcombrhomepublicacaoviewphppublicacao_id=14205amppagina=70gt Acesso em 20 fev 2012

CARRAZZA Roque Antocircnio Curso de Direito Constitucional Tributaacuterio 8 ed Satildeo Paulo Revista dos Tribunais 1996

CARVALHO Paulo de Barros Curso de Direito Tributaacuterio 11 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999

MACHADO Hugo de Brito Curso de Direito Tributaacuterio 14 ed Satildeo Paulo Malheiros 1998

______ Direitos Fundamentais do Contribuinte e a Efetividade da Jurisdiccedilatildeo Satildeo Paulo Atlas 2009

MARTINS Ives Gandra da Silva Sistema Tributaacuterio na Constituiccedilatildeo de 1988 Satildeo Paulo Saraiva 1989

______ Exerciacutecio da Cidadania Satildeo Paulo Lex 2007

NOGUEIRA Alberto A reconstruccedilatildeo dos Direitos Humanos da Tributaccedilatildeo Rio de Janeiro Renovar 1997

PAULSEN Leandro Direito Tributaacuterio Constituiccedilatildeo e Coacutedigo Tributaacuterio agrave luz da doutrina e da jurispru-decircncia 12 ed Porto Alegre Livraria do Advogado 2010

SANDEL Michael J Justiccedila o que eacute fazer a coisa certa 6 ed Rio de Janeiro Civilizaccedilatildeo Brasileira 2012

TIPKE Klaus Moral Tributaacuteria do Estado e dos Contribuintes Porto Alegre Sergio Antocircnio Fabris 2012

ZARZANA Daacutevio Antonio Prado O paiacutes dos impostos Satildeo Paulo Saraiva 2010

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TRANSPAREcircNCIA EFICIEcircNCIA E SIMPLICIDADE A SERVICcedilO DA JUSTICcedilA FISCAL PROPOSTAS SUTIS DE REFORMAS TRIBUTAacuteRIAS1

SUMAacuteRIO Introduccedilatildeo 1 Sistema tributaacuterio em busca da transparecircncia efici-ecircncia e simplicidade 2 Medidas pragmaacuteticas de alcance da transparecircncia da eficiecircncia e da simplicidade no Sistema Tributaacuterio Brasileiro a busca pela jus-ticcedila fiscal a partir de reformas tributaacuterias pontuais 21 Eficiecircncia transparecircncia e simplificaccedilatildeo na tributaccedilatildeo sobre bens imoacuteveis no Brasil a justiccedila fiscal a partir da atuaccedilatildeo coordenada dos entes poliacuteticos 22 Eficiecircncia transparecircncia e simplificaccedilatildeo na tributaccedilatildeo incidente sobre a atividade empresarial brasileira como medida de justiccedila fiscal Consideraccedilotildees finais Referecircncias

Fernanda Mara de Oliveira Macedo Carneiro Pacobahyba2

INTRODUCcedilAtildeO

Ao se intentar analisar o Sistema Tributaacuterio brasileiro algumas medidas se revelam assaz impor-tantes tendo em vista a proacutepria necessidade de delimitar cada um dos termos da pesquisa A primeira providecircncia entatildeo eacute identificar no contexto doutrinaacuterio o proacuteprio conceito de sistema a fim de defi-nir a exata noccedilatildeo aplicaacutevel agrave tributaccedilatildeo Dessa forma a composiccedilatildeo e os delineamentos do sistema tributaacuterio posto partem de um olhar que se estrutura a partir da Constituiccedilatildeo Federal de 1988 enquanto foco irradiante dos mais relevantes vetores que devem conduzir a atividade administrativa tributaacuteria com vistas a legitimar sua atuaccedilatildeo de arrecadaccedilatildeo dos valores imprescindiacuteveis agrave manutenccedilatildeo da maacutequina estatal respeitando-se os direitos fundamentais dos contribuintes Na esteira desse imenso desafio eacute que se faz imperativa a busca de harmonizaccedilatildeo de toda a legislaccedilatildeo tributaacuteria aos conceitos de transparecircncia eficiecircncia e simplicidade os quais atingem plena-mente a efetivaccedilatildeo de uma poliacutetica tributaacuteria e natildeo meramente uma poliacutetica arrecadatoacuteria Contudo por se tratar de medidas que visam a dinamizar o sistema posto deve-se buscar o mais urgentemente possiacutevel a conciliaccedilatildeo da teoria agrave praacutetica a fim de se visualizar medidas praticaacuteveis em que efetivem as tatildeo almejadas eficiecircncia transparecircncia e simplicidade O objetivo desse trabalho eacute portanto investigar os aspectos conceitualmente erigidos acerca do Sistema Tributaacuterio brasileiro nessa busca incessante por justiccedila fiscal efetivaccedilatildeo de verdadeira po-liacutetica tributaacuteria e respeito aos direitos fundamentais dos contribuintes passando pela transparecircncia eficiecircncia e simplificaccedilatildeo

1 Artigo adaptado a partir do conteuacutedo da monografia intitulada ldquoSistema Tributaacuterio em busca da transparecircncia eficiecircncia e simplificaccedilatildeordquo vencedora do Precircmio Hugo de Brito Machado no ano de 20132 Mestre em Direito Constitucional pela Universidade de Fortaleza (Unifor) Especialista em Direito Empresarial pela Uni-versidade Estadual do Cearaacute (Uece) Professora universitaacuteria Auditora Fiscal Juriacutedica da Receita Estadual do Cearaacute E-mail fernandamarasefazcegovbr pacmara9yahoocombr

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Em um primeiro momento seratildeo discutidos os contornos dos institutos mais importantes re-lativos agrave temaacutetica para em um momento posterior apresentar medidas com alto iacutendice de pratica-bilidade e que promovam os valores mais elevados descritos na CF88 a partir da reestruturaccedilatildeo dos procedimentos a serem impostos pelos entes tributantes e que visem a racionalizar o processo de arrecadaccedilatildeo dos tributos e cumprimento de obrigaccedilotildees acessoacuterias

1 SISTEMA TRIBUTAacuteRIO EM BUSCA DE TRANSPAREcircNCIA EFICIEcircNCIA E SIMPLICIDADE

Em uma tentativa de se flagrar o Sistema Tributaacuterio Nacional especialmente na busca que se reveste deveras importante da transparecircncia da eficiecircncia e da simplicidade o termo sistema com que se inicia o estudo haacute de ser delimitado evitando-se assim a ambiguidade ou a vagueza das palavras (ROSS 2007) que tanto podem prejudicar a elaboraccedilatildeo de um trabalho cientiacutefico Dessa forma sistema deve ser compreendido

como o objeto de porccedilotildees que se vinculam debaixo de um princiacutepio unitaacuterio ou como a composiccedilatildeo de partes orientadas por um vetor comum Onde houver um conjunto de elementos relacionados entre si e aglutinados perante uma referecircncia determi-nada teremos a noccedilatildeo fundamental de sistema [] as normas juriacutedicas formam um sistema na medida em que se relacionam de vaacuterias maneiras segundo um princiacutepio unificador (CARVALHO 2012 p 68-69 e 76)

Com isso falar-se em sistema tributaacuterio brasileiro remonta ao elemento mais importante sob o qual se estrutura tal conjunto qual seja na atualidade a Constituiccedilatildeo Federal de 1988 fazendo-se a ressalva de que soacute se pode afirmar a existecircncia de ldquosistemardquo em sentido moderno a partir da Emenda Constitucional nordm 18 de 1965 (MACHADO 2011 p 273) Contudo como o proacuteprio conceito acima deixa transparecer o sistema enquanto entidade complexa possui diversos outros elementos que se relacionam sendo fundamental que todos eles sejam orientados por um ldquovetor comumrdquo Na doutrina brasileira desde 1951 com Aliomar Baleeiro passando por Sampaio Doacuteria Geraldo Ataliba Roque Antocircnio Carrazza Souto Maior Borges e Ameacuterico Lacombe dentre outros tem-se um histoacuterico de desenvolvimento da noccedilatildeo relativa ao sistema tributaacuterio culminando na apropriaccedilatildeo de conceitos abrangentes como o de dignidade humana e de seguranccedila juriacutedica dentre outros os quais comprovam a constante evoluccedilatildeo da mateacuteria (AacuteVILA 2010 p 18-21) Assim ao se falar em busca da transparecircncia da eficiecircncia e da simplicidade no sistema tribu-taacuterio brasileiro natildeo se pode tentar localizar tais caracteres exclusivamente no Texto Fundamental de-vendo tais signos serem a tocircnica de toda a legislaccedilatildeo tributaacuteria vigente no paiacutes seja na esfera federal estadual municipal ou distrital bem como de toda a atuaccedilatildeo estatal desde os Chefes dos Poderes ateacute o servidor mais recentemente admitido ao serviccedilo puacuteblico Partindo-se do fato de que o sistema seraacute tratado em seu conceito abrangente e jaacute que se destacou alguns signos relevantes na estruturaccedilatildeo deste trabalho faz-se fundamental tambeacutem que se admita agrave presente anaacutelise o significado daquilo que se busca encontrar afinal de que se trata ao se falar em transparecircncia eficiecircncia e simplicidade Corresponderia a um conjunto de instrumentos

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utilizados para se atingir a tributaccedilatildeo adequada ou de metas a serem alcanccediladas pela tributaccedilatildeo Comeccedilando-se pelo conceito mais facilmente operaacutevel mas natildeo menos denso em virtude de estar expliacutecito na CF88 a partir da redaccedilatildeo dada pela Emenda Constitucional nordm 19 de 1998 tem-se a eficiecircncia como um dos princiacutepios a serem obedecidos pela administraccedilatildeo puacuteblica direta e indireta de qualquer dos poderes da Uniatildeo dos Estados do Distrito Federal e dos Municiacutepios3 Trata-se de conceito amplamente explorado pelos doutrinadores administrativistas e que ainda pouco reverbera entre os tributaristas4 Deve-se destacar ainda que se encontram superadas discussotildees acerca da autonomia didaacutetica e cientiacutefica do Direito Tributaacuterio tendo em conta este haver brotado do Direito Administrativo proble-maacutetica que poderia ser reenfatizada a partir da redaccedilatildeo do art 37 da CF88 Nesse ponto ao se falar em administraccedilatildeo puacuteblica a qual deve curvar-se agrave eficiecircncia nos termos do art 37 natildeo restam duacutevidas de que a administraccedilatildeo tributaacuteria encontra-se plenamente submetida a esse princiacutepio5 Assim dito a eficiecircncia consistiria ldquono desempenho concreto das atividades necessaacuterias agrave pres-taccedilatildeo das utilidades materiais de molde a satisfazer necessidades dos usuaacuterios com imposiccedilatildeo do menor encargo possiacutevel inclusive do ponto de vista econocircmicordquo (JUSTEN FILHO 1997 p 124) Dessa forma vincula-se tal ideia ao atingimento dos objetivos com o menor custo ou do modo menos one-roso possiacutevel Como manifestaccedilotildees desse princiacutepio agregar-se-iam ainda os princiacutepios da seguranccedila e da atualidade (PORTO NETO 1998 p 89) Pelo princiacutepio da seguranccedila adotar-se-iam as teacutecnicas conhecidas e todas as cautelas e pro-videcircncias possiacuteveis para em face das circunstacircncias reduzir o risco de danos Jaacute pela atualidade os serviccedilos puacuteblicos obrigar-se-iam a uma constante atualizaccedilatildeo tecnoloacutegica inclusive para autorizar o exerciacutecio de poderes de modificaccedilatildeo extinccedilatildeo unilateral da concessatildeo ou aplicaccedilatildeo das sanccedilotildees con-tratuais previstas (GROTTI 2006 p 60) Entretanto Celso Antocircnio Bandeira de Mello (2010 p 122) ressalva que a eficiecircncia na Admi-nistraccedilatildeo Puacuteblica natildeo pode se apartar jamais do princiacutepio da legalidade em virtude de que este se configura no dever administrativo por excelecircncia6 Ao concluir o raciociacutenio o jurista finca as bases histoacutericas de tal princiacutepio

3 Constituiccedilatildeo Federal de 1988 art 37 caput4 Aqui se deve fazer referecircncia ao XXXI Simpoacutesio Nacional de Direito Tributaacuterio realizado no ano de 2006 e cujos trabalhos foram coordenados pelo jurista Ives Gandra da Silva Martins Por ocasiatildeo do evento foi publicada obra intitulada ldquoPrinciacutepio da eficiecircncia em mateacuteria tributaacuteriardquo que de forma ineacutedita tratou especificamente de tal questatildeo aplicaacutevel aos tributos Aleacutem de tal obra as conclusotildees do evento se encontram disponiacuteveis na Revista de Doutrina do Tribunal Regional Federal da 4ordf Regiatildeo Disponiacutevel em lthttpwwwrevistadoutrinatrf4jusbrindexhtmhttpwwwrevistadoutrinatrf4jusbrartigosedicao016Ives_Martinshtmgt Acesso em 5 out 20135 Aqui se pode fazer referecircncia a Alfredo Augusto Becker o qual ressalta a autonomia didaacutetica do Direito tributaacuterio con-trapondo-se a AD Gianinini e G Zanobini por ele citados os quais ressaltariam ldquoa lsquoautonomiarsquo apenas didaacutetica do Direito Tributaacuterio para consideraacute-la um ramo do Direito Administrativo do qual deve ser destacado para fins didaacuteticos e de tra-balho cientiacutefico esquecem-se que tambeacutem o Direito Administrativo goza de uma lsquoautonomiarsquo apenas didaacuteticardquo (BECKER 2010 p 31)6 Identicamente a tal raciociacutenio Hugo de Brito Machado (2011 p 44) adverte que ldquonatildeo se deve admitir que os princiacutepios da legalidade e da anterioridade da lei tributaacuteria que satildeo garantias do contribuinte sejam simplesmente minimizados ou descartadosrdquo

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O fato eacute que o princiacutepio da eficiecircncia natildeo parece ser mais do que uma faceta de um princiacutepio mais amplo jaacute superiormente tratado de haacute muito no Direito italiano o prin-ciacutepio da boa administraccedilatildeo Este uacuteltimo significa como resulta das liccedilotildees de Guido Falzone em desenvolver a atividade administrativa do modo mais congruente mais oportuno e mais adequado aos fins a serem alcanccedilados graccedilas agrave escolha dos meios e da ocasiatildeo de utilizaacute-los concebiacuteveis como os mais idocircneos para tanto Tal dever como assinala Falzone natildeo se potildee simplesmente como um dever eacutetico ou como mera aspiraccedilatildeo deontoloacutegica senatildeo como um dever atual e estritamente juriacutedico (MELLO 2010 p 122)

Aproximando-se da eficiecircncia em mateacuteria tributaacuteria a qual carrega os caracteres ateacute agora expostos pode-se dizer que esta compreende a ldquoadoccedilatildeo de poliacutetica tributaacuteria com mecanismos e instrumentos legais capazes de gerar desenvolvimento e justiccedila fiscalrdquo (MARTINS 2007) Trata-se de conceituaccedilatildeo ampliada e que vem a agregar outros valores tambeacutem insertos no texto constitucional focando em medidas que visem ao estabelecimento de uma poliacutetica tributaacuteria7 e natildeo meramente uma poliacutetica arrecadatoacuteria8 Sob tal oacutetica eacute que se erige o conceito de eficiecircncia do Sistema Tributaacuterio brasileiro presente-mente discutido na qual existe um equiliacutebrio entre as necessidades do Estado e os direitos dos contri-buintes9 Trata-se de corte conceitual que se faraacute deveras importante quando da anaacutelise a seguir de algumas medidas pragmaacuteticas para efetividade de tal princiacutepio em sede de tributaccedilatildeo A seguir instados a discorrer acerca da transparecircncia deve-se destacar que tal vocaacutebulo remon-ta a outra ideia bastante difundida no Direito Consumerista portanto na esfera privada e que pertine ao direito agrave informaccedilatildeo10 Assim estando de posse de todas as informaccedilotildees acerca de determinado produto ou da prestaccedilatildeo de um serviccedilo em tese instaurar-se-ia uma relaccedilatildeo transparente entre usu-aacuterioconsumidor e empresa Aprofundando-se a temaacutetica e buscando suas raiacutezes no Estado Democraacutetico de Direito pode-se identificar duas ordens de valores a que este se submete agrave vontade democraticamente definida e agrave vontade juridicamente positivada Esta como jaacute se viu ao se tratar da eficiecircncia representa submissatildeo ao princiacutepio da legalidade Jaacute no tocante agrave vontade democraticamente expressa positivada ou natildeo

7 ldquoPoliacutetica Tributaacuteria eacute o estabelecimento de paracircmetros para o exerciacutecio do poder impositivo que levem em conta de um lado as necessidades do Estado na prestaccedilatildeo de atividades puacuteblicas e de outro os limites ao poder de tributar e os direi-tos dos contribuintes Segundo a Constituiccedilatildeo tem por finalidades a justiccedila fiscal e o desenvolvimento do paiacutesrdquo (MARTINS 2007)8 ldquoJaacute poliacutetica de arrecadaccedilatildeo tambeacutem sob o prisma da eficiecircncia diz respeito ao manejo dos instrumentos arrecadatoacuterios de forma a natildeo desvirtuar os vetores e as finalidades da poliacutetica tributaacuteria e natildeo mero aumento da carga tributaacuteria muitas vezes em detrimento dos valores fundamentais ao Estado de Direitordquo (MARTINS 2007)9 Aqui vale a transcriccedilatildeo de trecho de obra especialmente dedicada ao estudo dos direitos dos contribuintes na qual Hugo de Brito Machado (2009 p 27) acresce o importante fator de aceitaccedilatildeo do papel de contribuinte o qual soacute pode ser impu-tado quando se tem o que ele denomina de ldquoconsciecircncia fiscalrdquo ldquoPara que todos os cidadatildeos se sintam contribuintes o que falta eacute a denominada consciecircncia fiscal a consciecircncia de que a carga tributaacuteria natildeo pesa apenas nos ombros de quem tem o dever legal de efetuar o pagamento dos tributos mas tambeacutem sobre os ombros de quem como comprador ou tomador de serviccedilos paga um preccedilo no qual estatildeo embutidos os tributosrdquo10 Conforme Cabana (2006 p 255) na Carta de Proteccedilatildeo do Consumidor do Conselho da Europa de 1751973 reconhe-ceu-se a informaccedilatildeo como um dos direitos baacutesicos do consumidor Na Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas a Resoluccedilatildeo da Assembleia-Geral 30248 de 1641985 a qual cuida de Diretrizes para a Proteccedilatildeo do Consumidor determina que eacute neces-saacuterio promover o acesso dos consumidores agrave informaccedilatildeo (art 3ordm)rdquo

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encontra-se esta situada no campo mais vasto da legitimidade princiacutepio substantivo especiacutefico do Direito Puacuteblico que informa particularmente o Direito Constitucional (MOREIRA NETO 2006 p 82) Dessa forma como preacute-requisito de uma relaccedilatildeo legitimamente estruturada a transparecircncia insere-se como o caminho necessaacuterio a ser trilhado pelos debates poliacuteticos

impregando toda a estrutura do Estado democraacutetico passa a ser necessariamente informativa em maior ou menor grau de toda sua accedilatildeo conforme o grau de discri-cionariedade de decisatildeo aberto pela Constituiccedilatildeo e pelas leis do Paiacutes aos legisladores administradores ou mesmo aos juiacutezes Eacute essa vontade geral popular em uacuteltima anaacute-lise a definitoacuteria dos interesses puacuteblicos que deve ser atendida pela accedilatildeo do Estado especialmente em sua atividade administrativa A fidelidade da accedilatildeo dos Poderes Puacute-blicos agrave vontade do povo democraticamente manifestada que Maurice Duverger tem como uma conformidade da accedilatildeo do Estado com a teoria do poder que se tem como verdadeira qualifica essas accedilotildees agentes governos e os proacuteprios regimes segundo atendam ou natildeo aos interesses da sociedade (MOREIRA NETO 2006 p 82)11

Isto posto agora na seara tributaacuteria a transparecircncia haacute de ser meta a ser alcanccedilada bem como vetor a ser empregado diuturnamente pelas administraccedilotildees tributaacuterias ampliando-se as possibilida-des de debates poliacuteticos acerca dos rumos da tributaccedilatildeo e oportunizando o conhecimento por toda a sociedade das medidas fiscais adotadas mormente diante das imensas possibilidades a partir da utilizaccedilatildeo dos meios tecnoloacutegicos Em virtude do atual estaacutegio evolutivo da sociedade brasileira democraticamente estrutura-da a partir de 1988 natildeo haacute como se construir uma relaccedilatildeo legiacutetima sem que haja transparecircncia na atuaccedilatildeo dos agentes puacuteblicos bem como de todos os dados acerca da arrecadaccedilatildeo e da execuccedilatildeo orccedilamentaacuteria os quais demonstrem apego agraves finalidades eleitas pelo texto constitucional e busca-das por toda a comunidade Haacute de se compreender ainda que a transparecircncia haacute de pautar toda a atividade legiferante especialmente ao se tratar das ldquoquase semprerdquo (para natildeo dizer apenas ldquosemprerdquo) complexas confusas e abundantes legislaccedilotildees tributaacuterias12 que muitas vezes encobrem engodos difiacuteceis de serem desven-dados pelos contribuintes Da mesma forma se se busca uma poliacutetica tributaacuteria transparente natildeo se pode admitir a concessatildeo de benefiacutecios e incentivos fiscais agraves escuras os quais rompem com a eacutetica que haacute de haver entre as unidades federadas fissurando o princiacutepio federativo13

11 Aqui se deve fazer um aparte para explicitar o amplo movimento da sociedade brasileira que eclodiu a partir de junho de 2013 em praticamente todas as capitais do paiacutes e que demonstram um alto grau de insatisfaccedilatildeo dos cidadatildeos com as poliacuteticas econocircmicas fiscais e sociais adotadas pelo Governo A partir de um discurso apartidaacuterio as pessoas clamam por maior transparecircncia dos gastos puacuteblicos reduccedilatildeo no niacutevel de corrupccedilatildeo cominaccedilatildeo de penas mais severas aos maus ad-ministradores dentre outros pontos Nesse tocante deve-se buscar essa ampliaccedilatildeo do debate poliacutetico de que trata o autor como forma de legitimar as decisotildees tomadas pelos governantes e atender aos interesses da sociedade12 Tal situaccedilatildeo jaacute foi exposta por Alfredo Augusto Becker (2010 p 3-7) sob a expressatildeo ldquomanicocircmio juriacutedico-tributaacuteriordquo emprestada de Lello Gangemi Professor Catedraacutetico da Universidade de Naacutepoles que expressa a profusatildeo de leis tributaacute-rias bem como uma doutrina desconexa e complicada 13 Conforme jaacute defendi em alguns artigos cientiacuteficos publicados tal ideia aplica-se mais apropriadamente agrave chamada ldquoGuerra Fiscalrdquo do ICMS na qual os Estados e o Distrito Federal em uma atitude de afronta agrave eacutetica que deveria reger as suas relaccedilotildees (o que normalmente acontece agraves espreitas tambeacutem ridicularizando a transparecircncia que haacute de ser buscada nas relaccedilotildees tributaacuterias) editam decretos que contrariam acordos inicialmente firmados ou mesmo concedem benefiacutecios e incentivos fiscais agrave revelia do Conselho Nacional de Poliacutetica Fazendaacuteria (Confaz) o que afronta a proacutepria redaccedilatildeo constitu-cional (art 155 sect 2ordm inc XII aliacutenea g) Dentre todos cite-se PACOBAHYBA 2011

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Conforme apontado por Grupenmacher (2012 p 45) ldquoa adoccedilatildeo de uma postura eacutetica por parte do contribuinte verifica-se sobretudo com o adimplemento das obrigaccedilotildees tributaacuterias O Estado por seu turno atua eticamente quando ao exercer o poder de imposiccedilatildeo tributaacuteria observa fielmente os direitos e garantias do contribuinterdquo Com isso como forma de se agregar em um conceito a transparecircncia que se defenderaacute no sis-tema tributaacuterio brasileiro pode-se dizer que esta representa o conjunto de instrumentos a serem uti-lizados pelos fiscos com vistas a oportunizar agrave sociedade o conhecimento integral e irrestrito de toda a atuaccedilatildeo concernente ao atingimento das metas de poliacutetica tributaacuteria Ademais a transparecircncia seraacute tambeacutem a meta a ser alcanccedilada por tais administraccedilotildees ao se afirmarem como expressatildeo do princiacutepio democraacutetico Por fim mas natildeo menos importante resta agora tratar acerca da simplicidade aqui tomada sob o vieacutes da simplificaccedilatildeo Longe de parecer reducionista a simplificaccedilatildeo parece atrelar-se visceralmente agrave chamada ldquoburocraciardquo revelando-se como um antiacutedoto contra os procedimentos lentos e repetitivos ainda adotados pela Administraccedilatildeo Puacuteblica14 Conforme apontou Philippe Beaugonin (1977 p 13-14)

A simplificaccedilatildeo e o aperfeiccediloamento dos trabalhos administrativos soacute satildeo possiacuteveis se os estudos forem conduzidos de acordo com um meacutetodo Este meacutetodo deve permitir a supressatildeo ou pelo menos a diminuiccedilatildeo do desperdiacutecio de material de mateacuteria de tempo de espaccedilo e de energia provocado pelo consumo destes elementos na execuccedilatildeo de um determinado trabalho O resultado final deve ser o da utilizaccedilatildeo de um meacutetodo de trabalho mais simples mais raacutepido e mais seguro do que o utilizado anteriormente

Dessa forma a simplificaccedilatildeo do sistema tributaacuterio nacional pertine agrave necessaacuteria racionalizaccedilatildeo dos processos agrave revisatildeo dos meacutetodos e procedimentos impostos agrave adoccedilatildeo pelos contribuintes para cumprir suas obrigaccedilotildees tributaacuterias Nesse ponto em consonacircncia com a biparticcedilatildeo de tais obrigaccedilotildees empreendida pelo art 113 do Coacutedigo Tributaacuterio Nacional haacute de se fazer algumas ressalvas A primeira delas consiste em algo que parece inverter toda a loacutegica esperada de uma poliacutetica tributaacuteria afinando-se mais ao conceito de poliacutetica arrecadatoacuteria o cumprimento das obrigaccedilotildees tri-butaacuterias acessoacuterias15 no Brasil parece ter se tornado mais relevante do que o proacuteprio cumprimento das obrigaccedilotildees principais16

14 Aqui se pode citar importante programa que visa a simplificar o procedimento de desembaraccedilo aduaneiro de impor-taccedilatildeo e de exportaccedilatildeo adotado pelo Governo brasileiro a ser implementado gradualmente a partir de dezembro de 2013 Denominado de projeto ldquoPorto sem papelrdquo a medida adotada pela Uniatildeo visa a reduzir o tempo de espera nos portos brasileiros aproximando-se de um padratildeo internacional condizente com uma grande economia do mundo tendo em vista o desperdiacutecio de dinheiro ao se levar a uma repeticcedilatildeo de procedimentos desnecessaacuterios por parte dos importadoresex-portadores bem como pelos proacuteprios fiscais Apenas a tiacutetulo de exemplo uma mercadoria a ser internalizada no mercado brasileiro pode ser inspecionada pela Receita Federal do Brasil pela Vigilacircncia Sanitaacuteria pela Poliacutecia Federal dentre outros Para cada uma dessas fiscalizaccedilotildees exige-se o preenchimento de formulaacuterios despadronizados e que compreendem no mais das vezes as mesmas informaccedilotildees configurando-se uma repeticcedilatildeo absurda e odiosa que gera custos desnecessaacuterios A partir do inovador projeto simplificam-se os procedimentos e padronizam-se as obrigaccedilotildees acessoacuterias o que vem a partir do estudo dos meacutetodos adotados no processo do Comeacutercio Exterior Dentre outras pode-se citar interessante mateacute-ria disponiacutevel no site httpwwwcntorgbrPaginasAgencia_Noticiaaspxn=6402 Acesso em 23 out 2013

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Esse fato torna-se extremamente relevante de ser discutido tendo em vista que conforme es-tudos empreendidos pela proacutepria Consultoria Legislativa da Cacircmara dos Deputados chega-se a resul-tados absurdos de posicionamento do Brasil em relaccedilatildeo a outros paiacuteses do mundo ao se considerar o custo para se atender agraves obrigaccedilotildees acessoacuterias

No quesito ldquoNuacutemero de Horas Gastasrdquo o Brasil ocupa a pior posiccedilatildeo do ranking a 183ordf colocaccedilatildeo Segundo a PwC a empresa brasileira dispende anualmente 2600 horas para cumprir com suas obrigaccedilotildees fiscais mais que o dobro da penuacuteltima colocada ndash a Boliacutevia ndash onde gastam-se 1080 horas () De fato isso pode estar prejudicando o que-sito ldquoPeso da Tributaccedilatildeo em relaccedilatildeo aos Lucrosrdquo no qual a posiccedilatildeo do Brasil tambeacutem eacute bem ruim 168ordf colocaccedilatildeo estimando-se que os tributos nacionais representem 671 do lucro da empresa (SOARES 2012 p 5-6)

A segunda ressalva que atine agrave simplificaccedilatildeo indica que o cumprimento das obrigaccedilotildees tribu-taacuterias torna-se irracional pela falta de compartilhamento de informaccedilotildees entre as proacuteprias entidades tributantes17 o que revela um federalismo construiacutedo agrave base da desconfianccedila entre os entes o que culmina em repeticcedilatildeo indevida de dados a serem disponibilizados pelos contribuintes bem como al-canccedila uma ineficiecircncia cabal no desenvolvimento da poliacutetica tributaacuteria18 Como se veraacute a seguir ao se tratar das medidas praacuteticas especialmente em se tratando dos tributos que incidem sobre bens imoacuteveis haacute um completo descaso e muitas vezes um subjetivismo por parte da Administraccedilatildeo que poderia ser contornado a partir do compartilhamento de informaccedilotildees entre os proacuteprios entes recolhendo os valores que se fazem necessaacuterios ao Estado e respeitando-se os direitos dos contribuintes Com tudo isso finalizando as referecircncias que seratildeo fundamentais para a construccedilatildeo das me-didas pragmaacuteticas pode-se resumir que a simplificaccedilatildeo do sistema tributaacuterio brasileiro passa pela adoccedilatildeo de meacutetodos racionais para o cumprimento das obrigaccedilotildees tributaacuterias sejam principais ou acessoacuterias evitando-se a indesejada burocratizaccedilatildeo de procedimentos e a agregaccedilatildeo de custos ou ocircnus financeiros desnecessaacuterios

15 CTN art113 sect 2ordm A obrigaccedilatildeo acessoacuteria decorre da legislaccedilatildeo tributaacuteria e tem por objeto as prestaccedilotildees positivas ou negativas nela previstas no interesse da arrecadaccedilatildeo ou da fiscalizaccedilatildeo dos tributos16 CTN art113 sect 1ordm A obrigaccedilatildeo principal surge com a ocorrecircncia do fato gerador tem por objeto o pagamento de tributo ou penalidade pecuniaacuteria e extingue-se juntamente com o creacutedito dela decorrente17 Aqui vale transcrever excerto da Constituiccedilatildeo Federal o qual representa um avanccedilo ainda natildeo efetivado plenamente pe-las Administraccedilotildees Tributaacuterias ldquoArt 37 inciso XXII - as administraccedilotildees tributaacuterias da Uniatildeo dos Estados do Distrito Federal e dos Municiacutepios atividades essenciais ao funcionamento do Estado exercidas por servidores de carreiras especiacuteficas teratildeo recursos prioritaacuterios para a realizaccedilatildeo de suas atividades e atuaratildeo de forma integrada inclusive com o compartilhamento de cadastros e de informaccedilotildees fiscais na forma da lei ou convecircniordquo (destacado)18 Deve-se fazer referecircncia aqui ao Programa de Simplificaccedilatildeo do Sistema Tributaacuterio coordenado pela Associaccedilatildeo Comer-cial de Satildeo Paulo e subscrito pelo Instituto Brasileiro de Eacutetica Concorrencial (ETCO) e entregue agrave Presidenta Dilma Roussef com trecircs medidas conectadas e que ldquoservem para simplificar e agilizar processos dar maior seguranccedila juriacutedica alterar alguns dispositivos do Coacutedigo Tributaacuterio Nacional e adequar a legislaccedilatildeo agraves demandas atuais do Brasilrdquo Mateacuteria disponiacutevel em wwwetcoorgbrnoticiasetco-informaetco-subscreve-programa-de-simplificacao-do-sistema-tributario-entregue--a-dilma-rousseff Acesso em 24 out 13

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2 MEDIDAS PRAGMAacuteTICAS DE ALCANCE DA TRANSPAREcircNCIA DA EFICIEcircNCIA E DA SIM-PLICIDADE NO SISTEMA TRIBUTAacuteRIO BRASILEIRO A BUSCA PELA JUSTICcedilA FISCAL A PARTIR DE REFORMAS TRIBUTAacuteRIAS PONTUAIS

Ultrapassadas as questotildees estritamente doutrinaacuterias e de recorte dos significados fundamen-tais a serem desenvolvidos no presente trabalho partir-se-aacute para os delineamentos gerais de duas medidas praacuteticas que caso adotadas podem efetivar a transparecircncia a eficiecircncia e a simplicidade no Sistema Tributaacuterio brasileiro A importacircncia dessa apresentaccedilatildeo se daacute em virtude de que conforme se viu acima o atingi-mento de tais objetivos soacute se opera eficazmente a partir da adoccedilatildeo de padrotildees diferenciados pela administraccedilatildeo puacuteblica evidenciando esforccedilos no sentido de alcanccedilar uma real poliacutetica tributaacuteria e natildeo meramente uma poliacutetica arrecadatoacuteria Para tanto as medidas praacuteticas indicaratildeo dois pontos fundamentais do sistema e que represen-tam verdadeiras incongruecircncias decorrentes da estruturaccedilatildeo da tributaccedilatildeo no Brasil especificamente a partir do desenho constitucional as quais se aprofundam pelo que aqui jaacute foi denominado de ldquofedera-lismo da desconfianccedilardquo19 a primeira dessas medidas envolve a tributaccedilatildeo de bens imoacuteveis e a segunda delas envolve uma parcela da tributaccedilatildeo incidente sobre as empresas

21 Eficiecircncia transparecircncia e simplificaccedilatildeo na tributaccedilatildeo sobre bens imoacuteveis no Brasil a justiccedila fiscal a partir da atuaccedilatildeo coordenada dos entes poliacuteticos

Uma das primeiras incongruecircncias que podem ser apontadas no sistema tributaacuterio brasileiro refere-se agrave tributaccedilatildeo que envolve bens imoacuteveis De acordo com a estruturaccedilatildeo de competecircncias prevista nos arts 153 155 e 156 os seguintes impostos possuem conexatildeo com bens imoacuteveis consi-derando-se a construccedilatildeo do criteacuterio material das respectivas regras-matrizes de incidecircncia20 Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural (ITR) Imposto sobre a Transmissatildeo Causa Mortis e Doaccedilatildeo (ITCD) Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU) e Imposto sobre a Transmissatildeo Inter Vivos a qualquer tiacutetulo por ato oneroso de bens imoacuteveis por natureza ou acessatildeo fiacutesica e de direitos reais sobre imoacuteveis exceto os de garantia bem como cessatildeo de direitos a sua aquisiccedilatildeo (ITBI)

19 Como exemplo de situaccedilatildeo que expressa essa desconfianccedila entre os entes pode-se citar o penoso processo de im-plementaccedilatildeo do Simples Nacional no Brasil em especial pela forma de arrecadaccedilatildeo a partir de documento uacutenico o qual revolucionou os sistemas ateacute entatildeo desenvolvidos pela Receita Federal do Brasil Conforme relata Silas Santiago ldquonatildeo havia paralelo desse modelo no sistema de arrecadaccedilatildeo federal e isso com certeza influenciou positivamente a RFB na busca de melhores soluccedilotildees para sua arrecadaccedilatildeo proacutepria Eacute preciso salientar que Estados e Municiacutepios nutriam grande desconfianccedila com relaccedilatildeo agrave Receita Federal do Brasil e esse sentimento durou um tempo que parecia nunca terminar Houve muitos e desagradaacuteveis conflitos principalmente no primeiro ano Eles imaginavam que a RFB iria dominar as accedilotildees e as decisotildees no Simples Nacional e teriam necessariamente de mostrar forccedila principalmente no iniacutecio do processordquo (SANTIAGO 2011 p 18)20 A regra-matriz de incidecircncia tributaacuteria eacute conceito inovador concebido por Paulo de Barros Carvalho e que pode ser assim identificado ldquoA construccedilatildeo da regra-matriz de incidecircncia como instrumento metoacutedico que organiza o texto bruto do direito positivo propondo a compreensatildeo da mensagem legislada num contexto comunicacional bem concebido e racio-nalmente estruturado eacute um subproduto da teoria da norma juriacutedica o que significa reconhecer tratar-se de contribuiccedilatildeo efetiva da Teoria Geral e da Filosofia do Direito expandindo as fronteiras do territoacuterio cientiacuteficordquo (CARVALHO 2009 p 146)

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Quanto ao primeiro deles o ITR de competecircncia federal a CF88 possibilitou que os Municiacute-pios que assim desejarem celebrem convecircnio com a Uniatildeo com vistas a fiscalizar e cobrar o imposto desde que natildeo implique reduccedilatildeo do valor a pagar ou qualquer outra forma de renuacutencia Trata-se de medida que visa a estimular a cobranccedila de um tributo que possui dificuldades operacionais para sua implementaccedilatildeo em virtude da extensatildeo territorial brasileira imagine-se a imen-sidatildeo de imoacuteveis rurais no paiacutes muitos deles distantes de qualquer formalizaccedilatildeo junto aos oacutergatildeos competentes e que anualmente precisam ser reavaliados para fins de cobranccedila do ITR Ademais outro aspecto visado eacute fornecer agravequeles municiacutepios que se interessam pela medida fonte de arrecadaccedilatildeo originariamente natildeo prevista21

A reparticcedilatildeo da receita tributaacuteria do ITR entre a Uniatildeo e os Municiacutepios (50 para a Uniatildeo e 50 para o Municiacutepio em que situado o imoacutevel) fica alterada na hipoacutetese de opccedilatildeo do Municiacutepio pela fiscalizaccedilatildeo e cobranccedila de que trata este inciso (referindo-se ao incIII sect4ordm art 153 CF88) cabendo entatildeo ao Municiacutepio a totalidade da receita relativa ao ITR por ele lanccedilado (100) [] (MELO PAULSEN 2010 p 185)

O segundo dos impostos citados ITCD de competecircncia estadual diferentemente da regulari-dade anual de cobranccedila do ITR apenas eacute cabiacutevel quando de transmissatildeo por morte ou mesmo por ato de liberalidade (doaccedilatildeo) O que o aproxima do ITR todavia eacute a mesma dificuldade em avaliar bens imoacuteveis sejam rurais ou urbanos que sejam transmitidos no paiacutes Ademais por normalmente repre-sentar parcela pouco significativa da arrecadaccedilatildeo dos Estados e do Distrito Federal22 que se satisfa-zem com os valores arrecadados a tiacutetulo de ICMS acaba-se investindo pouco no tributo pelo seu alto custo de implementaccedilatildeo e pouco retorno arrecadatoacuterio O terceiro e o quatro impostos IPTU e ITBI ambos de competecircncia municipal possuem arre-cadaccedilotildees que satildeo um reflexo da desestrutura administrativa normalmente encontrada nos municiacute-pios brasileiros Ademais a existecircncia de diversos meacutetodos para a avaliaccedilatildeo dos imoacuteveis associada agrave chamada ldquoPlanta Geneacuterica de Valoresrdquo acabam por dificultar sobremaneira a mensuraccedilatildeo da base de caacutelculo Para o IPTU a base de caacutelculo corresponde ao valor venal do imoacutevel sendo identicamente considerada a do ITBI (MELO PAULSEN 2010 p 294-303)23 Quanto a esses impostos municipais a falecircncia do Estado brasileiro no tocante ao compartilha-mento de informaccedilotildees chega agrave situaccedilatildeo mais draacutestica eacute bastante comum em um mesmo municiacutepio

21 Vale destacar que a Uniatildeo tem empreendido parcerias importantes com os municiacutepios que optam pela fiscalizaccedilatildeo e cobranccedila do ITR Assim disponibilizou link especiacutefico em seu site com todas as informaccedilotildees necessaacuterias agrave celebraccedilatildeo do convecircnio a legislaccedilatildeo aplicaacutevel ao imposto bem como a capacitaccedilatildeo dos servidores envolvidos por meio de cursos agrave dis-tacircncia Disponiacutevel em ltwwwreceitafazendagovbrPessoaJuridica ITRConvenios2008defaulthtmgt Acesso em 24 out 1322 Apenas a tiacutetulo de exemplo pode-se citar a arrecadaccedilatildeo do ITCD no Estado do Cearaacute em 2012 a qual foi da ordem de R$ 4386700000 (quarenta e trecircs milhotildees oitocentos e sessenta e sete mil reais) quando no mesmo periacuteodo o ICMS representou R$ 764641000000 (sete bilhotildees seiscentos e quarenta e seis milhotildees quatrocentos e dez mil reais) o que representa pouco mais de 05 deste imposto Dados disponiacuteveis no site do Confaz relativamente a todas as unidades federativas ltww1fazendagovbrconfazboletimgt Acesso em 24 out 1323 Haacute de se considerar doutrina divergente a qual compreende que seriam divergentes as bases de caacutelculo do ITCDITBI daquelas indicadas para o ITRIPTU Para tal corrente haveria bitributaccedilatildeo se tais bases de caacutelculo coincidissem ou seja haveria desrespeito ao princiacutepio da reserva de competecircncia impositiva Dentre todos cite-se FURLAN 2001

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proceder-se agrave cobranccedila do ITBI sobre o valor venal atualizado do imoacutevel e ainda assim o IPTU conti-nuar sendo recolhido com uma base de caacutelculo excessivamente defasada Tal situaccedilatildeo inclusive jaacute foi julgada plenamente aceitaacutevel pelo Superior Tribunal de Justiccedila24 em uma demonstraccedilatildeo da ineficiecircn-cia falta de transparecircncia e complicaccedilatildeo para delimitaccedilatildeo dos tributos brasileiros Com tudo isso vecirc-se que a Uniatildeo os Estados o Distrito Federal e os Municiacutepios carecem de ins-trumentos que tomados em seu conjunto reduziriam sobremaneira a ineficiecircncia e as arbitrariedades nas cobranccedilas dos impostos citados Propotildee-se entatildeo a utilizaccedilatildeo de um sistema informatizado uacutenico mensurador da base de caacutelculo dos imoacuteveis brasileiros a ser alimentado por todos os entes segundo criteacuterios cientiacuteficos previamente determinados como os comumente utilizados pelo georreferencia-mento e que simplificariam sensivelmente a atuaccedilatildeo estatal aleacutem de promover maior transparecircncia e eficiecircncia na cobranccedila dos tributos No tocante ao georreferenciamento jaacute existem iniciativas em plena operacionalizaccedilatildeo pelo Mi-nisteacuterio do Desenvolvimento Agraacuterio25 e pelo Instituto Nacional de Colonizaccedilatildeo e Reforma Agraacuteria (In-cra)26 Aleacutem de tudo isso haacute de se destacar que tal medida poderia envolver ainda a Caixa Econocircmica Federal e os cartoacuterios de registro de imoacuteveis os quais possuem informaccedilotildees valiosas sobre valores venais de imoacuteveis bem como quanto agrave primeira o fato de contar com corpo teacutecnico especiacutefico para a realizaccedilatildeo de avaliaccedilotildees Contudo uma medida dessa magnitude careceria da iniciativa de algum ente o qual lanccedilasse as ideias primordiais da estrutura a se formar e mobilizasse as demais unidades federadas no sentido de adesatildeo e definiccedilatildeo do seu conteuacutedo essencial A partir daiacute a tributaccedilatildeo envolvendo imoacuteveis no Brasil que foi estruturada de forma que tem trazido seacuterias dificuldades a todos os entes passaria a ser racionalizada visando maior eficiecircncia da poliacutetica tributaacuteria maior transparecircncia dos meacutetodos e da apuraccedilatildeo do tributo e simplificaccedilatildeo para os servidores envolvidos na cobranccedila bem como para o proacuteprio contribuinte o qual saberia de antematildeo identificar a base de caacutelculo das exaccedilotildees

22 Eficiecircncia transparecircncia e simplificaccedilatildeo na tributaccedilatildeo incidente sobre a atividade empre-sarial brasileira como medida de justiccedila fiscal

Aqui por fim uma proposta mais ousada mas natildeo menos aplicaacutevel Jaacute foram claramente de-monstradas na primeira parte do trabalho as enormes obrigaccedilotildees impostas agraves empresas no Brasil em

24 Assim dispotildee o voto do Min Benedito Gonccedilalves Relator do AgRg nos EDcl no AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nordm 36076 ndash SP ldquoConforme assentado pela decisatildeo agravada a jurisprudecircncia desta Corte Superior jaacute pacificou o entendimen-to de que o valor venal adotado para fins de tributaccedilatildeo do ITBI natildeo estaacute vinculado ao utilizado para a cobranccedila do IPTU uma vez que a maneira de apuraccedilatildeo dessa base de caacutelculo e a modalidade de lanccedilamento desses impostos satildeo diversas podendo o fisco arbitrar a valor venal do imoacutevel transmitido nos moldes do art 148 do CTNrdquo Semelhante decisatildeo con-forme defende a tese aqui esposada soacute obstaculiza a eficiecircncia a transparecircncia e a simplificaccedilatildeo do Sistema Tributaacuterio Disponiacutevel em lthttpsww2stjjusbrrevistaeletronicaitaaspregistro=201101059457 ampdt_publicacao=04092013gt Acesso em 24 out 1325 Disponiacutevel em lthttpwwwmdagovbrterralegalpagesgeorreferenciamentogt Acesso em 24 out 1326 Disponiacutevel em lthttpwwwincragovbrindexphpnoticias-sala-de-imprensanoticias11283-prorrogado-prazo-de--georreferenciamento-para-imoveis-rurais-com-menos-de-500-hectaresgt Acesso em 24 out 13

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virtude de uma carga tributaacuteria relativamente elevada bem como da imposiccedilatildeo de complicadas obri-gaccedilotildees acessoacuterias as quais muitas vezes parecem ser mais importantes que o proacuteprio pagamento do tributo devido Contudo observando o cenaacuterio nacional verifica-se que algumas iniciativas ainda na deacutecada de 1980 com a ediccedilatildeo da Lei ndeg 7256 de 27 de dezembro de 1984 passaram a construir um modelo diferenciado para um setor produtivo da economia que normalmente ficava turvado pela grandiosida-de das grandes empresas aqui situa-se o histoacuterico de evidenciaccedilatildeo das pequenas empresas brasilei-ras cuja evoluccedilatildeo tem se tornado ainda mais patente Atualmente pode-se apontar uma alteraccedilatildeo substancial no tratamento tributaacuterio conferido a esse grupo de pequenas empresas a partir da promulgaccedilatildeo da Lei Complementar nordm 123 de 14 de dezembro de 2006 a qual instituiu o Estatuto Nacional da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte estabelecendo normas gerais relativas ao tratamento diferenciado e favorecido a ser dispensa-do agraves microempresas (ME) e empresas de pequeno porte (EPP) no acircmbito dos Poderes da Uniatildeo dos Estados do Distrito Federal e dos Municiacutepios Tal lei eacute resultado de um amplo processo de reivindicaccedilatildeo social quanto agrave regulamentaccedilatildeo de disposiccedilatildeo constitucional atinente ao tratamento diferenciado e favorecido a ser conferido agraves micro-empresas e agraves empresas de pequeno porte Capitaneados pela Uniatildeo os Estados e Municiacutepios da federaccedilatildeo juntamente com a sociedade civil organizaram-se para criar um complexo sistema que alcanccedilasse a meta constitucional No contexto dessa lei destaca-se o Regime Especial Unificado de Arrecadaccedilatildeo de Tributos e Contribuiccedilotildees devidos pelas Microempresas e Empresas de Pequeno Porte -Simples Nacional o qual envolve todo o conteuacutedo tributaacuterio do tratamento diferenciado e favorecido concedido agraves ME e agraves EPP Para o que interessa ao intento de proporcionar maior eficiecircncia transparecircncia e simplificaccedilatildeo do sistema tributaacuterio especialmente no tocante ao desenvolvimento das atividades empresariais op-tar-se-ia por estruturar para as demais empresas que natildeo apenas as pequenas toda a tributaccedilatildeo nas mesmas bases jaacute utilizadas pelo Simples Nacional Assim se tal sistema jaacute se encontra em pleno uso pelas pequenas empresas qual seria o oacutebice em expandi-lo visando a uma maior racionalizaccedilatildeo de processos e evitando-se uma repeticcedilatildeo desne-cessaacuteria de informaccedilatildeo de dados Dessa forma por exemplo em um sistema uacutenico mas que abran-gesse as peculiaridades de cada tributo poder-se-ia ao final instrumentalizar-se uma uacutenica declaraccedilatildeo formal bem como poderia ser expedido uma uacutenica guia para pagamento com a devida separaccedilatildeo dos valores correspondentes a cada ente a ser feita pela proacutepria instituiccedilatildeo bancaacuteria a partir da tecnologia disponiacutevel do coacutedigo de barras Dessa maneira a cobranccedila dos tributos poderia ocorrer de forma mais eficiente satisfazendo agraves necessidades do Estado e respeitando os direitos dos contribuintes de natildeo serem ridicularizados pela existecircncia de inuacutemeros padrotildees a serem repetidos para apuraccedilatildeo do tributo A transparecircncia e a simplificaccedilatildeo entatildeo viriam como decorrecircncias absolutamente naturais de um sistema racionalmente estruturado e coordenado pelos fiscos interessados Assim a utilizaccedilatildeo de uma forma inovadora de cumprimento das obrigaccedilotildees tributaacuterias poderia

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ser estendida a diversos outros segmentos empresarias englobando os tributos que mais impactam na atividade dessas empresas tais como o Imposto sobre a Renda ndash Pessoa Juriacutedica (IRPJ) o Imposto sobre a Circulaccedilatildeo de Mercadorias e sobre a Prestaccedilatildeo de Serviccedilos de Transporte Interestadual e Inter-municipal e de Comunicaccedilotildees (ICMS) e o Imposto sobre a Prestaccedilatildeo de Serviccedilos (ISS) aleacutem de algumas contribuiccedilotildees tambeacutem para as grandes empresas

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

No acircmbito do Direito Tributaacuterio um dos temas que mais demanda investigaccedilatildeo eacute a questatildeo em torno da evoluccedilatildeo do Sistema Tributaacuterio Nacional legitimando a atuaccedilatildeo dos fiscos aos interesses pretendidos pela sociedade Nessa busca contrabalanccedila-se o interesse arrecadatoacuterio necessaacuterio agrave manutenccedilatildeo da atividade estatal com o respeito aos direitos fundamentais dos contribuintes O conceito de sistema tributaacuterio haacute de ser o mais alargado possiacutevel possibilitando que toda a legislaccedilatildeo tributaacuteria brasileira seja irradiada pelos valores superiores dispostos na CF88 e que repre-sentam vetores do desenvolvimento social Com isso a busca pela eficiecircncia pela transparecircncia e pela simplicidade do Sistema Tributaacuterio brasileiro rompe a questatildeo doutrinaacuteria e toda a sociedade clama por medidas efetivas que priorizem uma tributaccedilatildeo mais justa e que natildeo se transforme em um verdadeiro calvaacuterio para os contribuintes Neste tocante foram propostas medidas efetivas que passam por uma maior troca de informa-ccedilotildees entre os fiscos aprimorando a relaccedilatildeo juriacutedico-tributaacuteria estabelecida entre o ente tributante e os contribuintes bem como a partir da utilizaccedilatildeo de modelos jaacute vencedores como o Simples Nacional os quais oportunizam que o creacutedito tributaacuterio seja satisfeito com menos obrigaccedilotildees acessoacuterias a serem impostas agraves pessoas fiacutesicas e juriacutedicas Como se vecirc a temaacutetica eacute complexa e totalmente emergencial de forma que o Estado brasileiro deve de forma progressiva e inovadora alinhar poliacuteticas fiscais ao respeito aos direitos dos contri-buintes efetivando na maior medida possiacutevel a eficiecircncia a transparecircncia e a simplificaccedilatildeo em suas atividades de cobranccedila de tributos

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REFEREcircNCIAS

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BEAUGONIN Philippe Simplificaccedilatildeo administrativa Traduccedilatildeo de Sampaio Marinho Lisboa Poacutertico 1977

BECKER Alfredo Augusto Teoria geral do direito tributaacuterio Satildeo Paulo Noeses 2010

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CARVALHO Paulo de Barros Direito tributaacuterio fundamentos juriacutedicos da incidecircncia Satildeo Paulo Sa-raiva 2012

______ Direito tributaacuterio linguagem e meacutetodo Satildeo Paulo Noeses 2009

GROTTI Dinoraacute Adelaide Musetti Teoria dos serviccedilos puacuteblicos e sua transformaccedilatildeo In SUNDFELD Carlos Ari (org) Direito Administrativo Econocircmico Satildeo Paulo Malheiros 2006 p 39-71

GRUPENMACHER Betina Treigher Das exoneraccedilotildees tributaacuterias Incentivos e benefiacutecios fiscais In CA-VALCANTE Denise Lucena et al Novos horizontes da tributaccedilatildeo um diaacutelogo luso-brasileiro Coim-bra Almedina 2012

JUSTEN FILHO Marccedilal Concessatildeo de serviccedilos puacuteblicos Satildeo Paulo Dialeacutetica 1997

MACHADO Hugo de Brito Curso de direito tributaacuterio Satildeo Paulo Malheiros 2011

______ Direitos fundamentais do contribuinte e a efetividade da jurisdiccedilatildeo Satildeo Paulo Atlas 2009

______ Os princiacutepios juriacutedicos da tributaccedilatildeo na Constituiccedilatildeo de 1988 Satildeo Paulo Dialeacutetica 2004

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MELLO Celso Antonio Bandeira de Curso de direito administrativo Satildeo Paulo Malheiros 2010

MELO Joseacute Eduardo Soares de PAULSEN Leandro Impostos federais estaduais e municipais Porto Alegre Livraria do Advogado 2010

MOREIRA NETO Diogo de Figueiredo Curso de Direito Administrativo Parte introdutoacuteria parte ge-ral e parte especial Rio de Janeiro Forense 2006

PORTO NETO Benedito Concessatildeo de serviccedilo puacuteblico no regime da Lei nordm 898795 Satildeo Paulo Malheiros 1998

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SOARES Murilo Rodrigues da Cunha Custo do cumprimento das obrigaccedilotildees acessoacuterias no Brasil Brasiacutelia Biblioteca Digital da Cacircmara dos Deputados 2012 Disponiacutevel em lthttpbdcamaragovbrbdbitstreamhandlebdcamara9849custo_ cumprimento_soarespdfsequence=1gt Acesso em 23 out 13

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CARGA TRIBUTAacuteRIA BRASILEIRA Eacute ELEVADA MITO OU VERDADE

SUMAacuteRIO Introduccedilatildeo 1 A evoluccedilatildeo do papel do Estado 2 Justificativa eco-nocircmica para a existecircncia do Estado 21 Falhas de mercado 3 Atividade finan-ceira do Estado 4 Sistema tributaacuterio 41 Princiacutepio do benefiacutecio 42 Princiacutepio da capacidade de contribuiccedilatildeo 43 Tributos diretos e indiretos 44 Caracteriacutes-ticas do Sistema Tributaacuterio Nacional 5 A carga tributaacuteria brasileira eacute elevada mito ou verdade 51 Carga tributaacuteria e investimento em educaccedilatildeo Conside-raccedilotildees finais Referecircncias

Jurandir Gurgel Gondim Filho1

INTRODUCcedilAtildeO

Qualquer investigaccedilatildeo da cena contemporacircnea revelaraacute uma revoluccedilatildeo no sistema econocircmico

mundial levando as naccedilotildees ao enfrentamento do grande desafio do iniacutecio deste seacuteculo que eacute a refor-

ma ou reconstruccedilatildeo do Estado

Na realidade os princiacutepios e as praacuteticas econocircmicas tecircm ao longo do tempo moldado o coti-

diano dos cidadatildeos e por conseguinte da sociedade Inegavelmente a histoacuteria brasileira natildeo foge agrave

regra e mostra que coube ao Estado o papel de indutor do desenvolvimento econocircmico demonstrado

pela expansatildeo consideraacutevel que o setor puacuteblico apresentou nos uacuteltimos tempos

Tal expansatildeo entretanto trouxe a reboque um crescimento do volume de despesas do governo

e em consequecircncia uma elevaccedilatildeo semelhante no volume total de recursos necessaacuterios ao financia-

mento das atividades que passou a exercer

Atualmente o conhecimento sobre assuntos de financcedilas puacuteblicas se faz necessaacuterio mais do que

nunca uma vez que a maior parte dos complexos problemas das sociedades modernas tais como

globalizaccedilatildeo riqueza desigualdade social e a questatildeo do meio ambiente entre outros estaacute atrelada a

problemas de natureza econocircmica e atuaccedilatildeo do setor puacuteblico nesse contexto

Eacute por meio do conhecimento das financcedilas puacuteblicas que se forma uma visatildeo mais ampla e criacutetica

de todo funcionamento da sociedade econocircmica permitindo que se responda agraves diversas questotildees

que envolvem poliacutetica fiscal orccedilamentaacuteria sistema tributaacuterio e carga tributaacuteria e investimentos puacutebli-

cos e desenvolvimento socioeconocircmico

Essa expansatildeo durante o processo histoacuterico da participaccedilatildeo do Estado na vida dos brasileiros

exigiu destes uma contribuiccedilatildeo maior para o financiamento dos gastos puacuteblicos fazendo com que

1 Mestre em Economia pela Universidade Federal do Cearaacute (UFC) MBA em Financcedilas pelo Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais (IBMEC) Especialista em Financcedilas Puacuteblicas pela Fundaccedilatildeo Getuacutelio Vargas (FGV) Secretaacuterio Municipal de Financcedilas de Fortaleza E-mail jggondimterracombr

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a carga tributaacuteria se elevasse sem a contrapartida dos serviccedilos puacuteblicos de qualidade gerando uma

insatisfaccedilatildeo generalizada de bem estar social nacional Entretanto eacute importante ter em mente alguns

aspectos que tornam o assunto carga tributaacuteria brasileira nada simplista Esse artigo tenciona esclare-

cer alguns desses aspectos de forma a construir um contraponto a uma afirmaccedilatildeo dita reiteradas vezes

sobre a carga tributaacuteria brasileira colocando sempre uma duacutevida que consiste numa indagaccedilatildeo Seraacute

que carga tributaacuteria brasileira eacute realmente elevada

Para responder tal indagaccedilatildeo inicialmente faremos uma abordagem sobre a evoluccedilatildeo do pa-

pel do Estado e a justificativa econocircmica para existecircncia do setor puacuteblico destacando os principais

objetivos da intervenccedilatildeo governamental fazendo uma ponte para a necessidade de financiamento do

setor puacuteblico evidenciando o surgimento da atividade financeira atrelada a do Estado notadamente a

poliacutetica fiscal na sua vertente tributaacuteria Na sequecircncia destacamos algumas caracteriacutesticas do sistema

tributaacuterio como preacircmbulo da anaacutelise da carga tributaacuteria nacional e por fim eacute feita uma abordagem

dos aspectos relevantes que desmistificam ou melhor clarividecircncia a questatildeo sempre recorrente sobre

a elevada carga tributaacuteria nacional

1 A EVOLUCcedilAtildeO DO PAPEL DO ESTADO

Desde tempos imemoriais os seres humanos se juntaram em associaccedilotildees comeccedilando com a

famiacutelia e os grupos de parentesco e se estendendo ateacute o Estado moderno Para que os Estados exis-

tam os indiviacuteduos e grupos tecircm que ceder a um oacutergatildeo puacuteblico autoridade em certas aacutereas impor-

tantes como a defesa nacional Esse oacutergatildeo deve possuir poder coercivo sobre todas as outras formas

organizacionais dentro de determinado territoacuterio

Em 1651 com o seu Livro ldquoO Leviatatilderdquo Thomas Hobbes afirmava que o homem em seu estado

natural era egoiacutesta e egocecircntrico como os recursos satildeo escassos estava armado ambiente perfeito

para as contendas

[] imitando a criatura racionala mais excelente obra da natureza o Homem Porque pela arte eacute criado aquele grande Leviatatilde a que se chama Estado ou Cidade em latim (Civitas) que nada mais eacute senatildeo um homem artificial de maior estatura e forccedila do que o homem natural para cuja proteccedilatildeo e defesa foi projetado (HOBBES 1651 p15)

Thomas Hobbes sob inspiraccedilatildeo absolutista definiu o Estado como Salus Populi ou seja a

seguranccedila do povo O Estado deve cuidar do aparato juriacutedico institucional e das relaccedilotildees contra-

tuais entre os membros da sociedade para que natildeo sejam gerados conflitos e a proacutepria sociedade

seja prejudicada

Desta forma o Estado eacute uma criaccedilatildeo racional do homem cuja decisatildeo foi substituir uma exis-

tecircncia com mais liberdade mas com pouca seguranccedila por uma existecircncia com pouca liberdade mas

com mais seguranccedila

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Recapitulando a histoacuteria do Estado desde os seus primoacuterdios ele mostra como a noccedilatildeo do pa-

pel do Estado evoluiu ateacute produzir tanto nos paiacuteses industriais quanto nos em desenvolvimento uma

tremenda expansatildeo do Estado saindo do enfoque da quantidade para a qualidade das accedilotildees estatais

A partir do seacuteculo XVIII mediante conquistas e colonizaccedilatildeo os Estados nacionais incorporaram

aos seus territoacuterios a maior parte do mundo Com a desintegraccedilatildeo dos impeacuterios e a pretensatildeo agrave condi-

ccedilatildeo de Estado por parte de grupos minoritaacuterios o nuacutemero de naccedilotildees cresceu acentuadamente De 50

paiacuteses independentes em 1945 hoje o nuacutemero de membros das Naccedilotildees Unidas aumentou para 193

Seja no ldquoPriacutenciperdquo de Maquiavel e no ldquoLeviatatilderdquo de Hobbes o debate gira em torno dos direitos

e obrigaccedilotildees reciacuteprocas dos Estados e dos cidadatildeos Quase todas essas tradiccedilotildees reservam ao Estado

um papel na provisatildeo de bens puacuteblicos e meritoacuterios Nada haacute de novo na utilizaccedilatildeo de recursos do Es-

tado para fornecer bens puacuteblicos essenciais e aumentar a produtividade privada favorecer a promoccedilatildeo

do desenvolvimento socioeconocircmico

Entretanto fora dessas funccedilotildees miacutenimas observa-se muito menos acordo quanto ao papel

apropriado do Estado na promoccedilatildeo direta do desenvolvimento Os mercantilistas do seacuteculo XVII viam

um papel importante para o Estado na direccedilatildeo do comeacutercio Somente depois que Adam Smith escre-

veu ldquoA Riqueza das Naccedilotildeesrdquo no final do seacuteculo XVIII foi que se passou a reconhecer o mercado como

o melhor instrumento para promover o crescimento e aumentar o bem-estar da sociedade Segundo

essa opiniatildeo o Estado deveria limitar-se a certas funccedilotildees baacutesicas ndash proporcionar bens puacuteblicos como a

defesa garantir a seguranccedila da pessoa e da propriedade educar os cidadatildeos e impor o cumprimento

dos contratos ndash considerados essenciais para o florescimento do mercado

Adam Smith embora refutasse a estrutura de um estado intervencionista jaacute estabelecia quatro

princiacutepios gerais que deveriam nortear um sistema tributaacuterio oacutetimo a fim de atender o financiamento

das atividades miacutenimas estatais a saber

a) Os indiviacuteduos devem contribuir para receita do Estado na proporccedilatildeo de suas capacida-

des de pagamento ou seja em proporccedilatildeo a seus rendimentos

b) O tributo a ser pago deve ser certo e natildeo arbitraacuterio com o valor a ser pago e a forma do

pagamento devendo ser claros e evidentes para o contribuinte

c) Todo tributo deve ser arrecadado da maneira mais conveniente para o contribuinte

d) Todo tributo deve ser arrecadado de forma que implique o menor custo possiacutevel para o

contribuinte aleacutem do montante arrecadado pelo Estado com o tributo

Na escalada do tempo uma seacuterie de acontecimentos incentivou a uma maior participaccedilatildeo do

Estado O primeiro evento foi a Revoluccedilatildeo Russa de 1917 que levou agrave aboliccedilatildeo da maior parte da

propriedade privada e entregou ao Estado o controle de toda atividade econocircmica Em seguida foi

a Depressatildeo dos anos 30 que provocou no mundo natildeo comunista uma devastaccedilatildeo econocircmica tatildeo

grande que forccedilou os Estados a experimentar poliacuteticas contra ciacuteclicas para restaurar a atividade eco-

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nocircmica O terceiro acontecimento provocado pela Segunda Guerra Mundial foi a raacutepida desintegraccedilatildeo

dos impeacuterios europeus Assim o Estado assumiu novos papeis e ampliou funccedilotildees que jaacute vinha desem-

penhando Em meados do seacuteculo 20 a variedade de tarefas executadas pelos governos incluiu natildeo soacute

uma provisatildeo de infraestrutura e serviccedilos puacuteblicos mas tambeacutem um apoio muito maior aos serviccedilos

de educaccedilatildeo e sauacutede Entre os anos 30 e os 60 do seacuteculo passado o Estado foi promotor do desenvol-

vimento econocircmico e social

A partir dos anos 70 poreacutem face ao seu crescimento distorcido e ao processo de globalizaccedilatildeo

o Estado entrou em crise e se transformou na principal causa da reduccedilatildeo das taxas de crescimento

econocircmico da elevaccedilatildeo das taxas de desemprego e do aumento da taxa de inflaccedilatildeo

A popularidade do ativismo estatal em todo o mundo entrou em decadecircncia Os choques dos

preccedilos do petroacuteleo na deacutecada de 70 foram os fatores finais para a expansatildeo do Estado Baseado no

ativismo estatal os custos dessa estrateacutegia de desenvolvimento se intensificaram quando ocorreu a

crise da diacutevida nos anos 80 e o preccedilo do petroacuteleo caiu Essa crise teve como causa fundamental o de-

sequiliacutebrio fiscal que pocircs em cheque o modo de intervenccedilatildeo do Estado

A ineficiecircncia do Estado inclusive o das empresas estatais parecia gritantemente oacutebvio por

toda parte Os governos comeccedilaram adotar poliacuteticas destinadas a reduzir o alcance da intervenccedilatildeo do

Estado na economia Os Estados diminuiacuteram a sua participaccedilatildeo na produccedilatildeo nos preccedilos e no comeacuter-

cio Estrateacutegias favoraacuteveis ao mercado ganharam firmeza em grande parte do mundo

A figura 1 identifica que o papel do Estado ao longo do tempo eacute pendular desde os tempos de

Maquiavel e Hobbes ateacute os dias atuais essa questatildeo da oscilaccedilatildeo entre uma participaccedilatildeo mais ativista

com atuaccedilotildees miacutenimas do Estado sempre vem agrave tona

Nesse contexto de transiccedilatildeo em direccedilatildeo a um modelo menos estatizante e centralizador surgiu

o neoliberalismo na deacutecada de 90 O pecircndulo oscilou do modelo de desenvolvimento dominado pelos

Estados dos anos 60 e 70 para o Estado minimalista dos anos 80 e 90 com a ideia de reformar o Estado

central a quem deve caber as funccedilotildees de regulaccedilatildeo entendidas como previsatildeo anaacutelise formulaccedilatildeo de

poliacuteticas legislaccedilatildeo e avaliaccedilatildeo

O pecircndulo mais uma vez oscila nesse iniacutecio de seacuteculo tanto isto eacute fato que saiacutemos da deacutecada

de 90 com a ideia capitalista de que a economia natildeo precisa do Estado para acontecer durante anos

se propagou uma evangelizaccedilatildeo neoliberal avassaladora em defesa de um estado miacutenimo entretanto

essa forma de atuaccedilatildeo mais uma vez eacute posta em xeque tendo em vista que entramos na 1ordf deacutecada do

seacuteculo XXI com a defesa de um estado mais intervencionista em face da crise financeira que se instalou

no mundo inteiro

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O fato eacute que a despeito da discussatildeo se o Estado deve ter uma atuaccedilatildeo miacutenima ou mais inter-

vencionista pois sua presenccedila e necessidade natildeo se discute eacute que sua imprescindibilidade deve estar

atrelada a sua eficiecircncia eficaacutecia e efetividade eacute como afirmava Thomas Hobbes em seu livro Leviatatilde

ldquoa vida sem um estado efetivo capaz de manter a ordem eacute solitaacuteria pobre desagradaacutevel incivil

e curtardquo

Para aleacutem da abordagem teoacuterica e filosoacutefica para existecircncia do estado existe a abordagem eco-

nocircmica que traz em seu escopo a necessidade premente do atendimento de condiccedilotildees por meio do

que se convencionou chamar de atividade financeira tendo precipuamente como objeto a questatildeo

fiscal que tem com preocupaccedilatildeo a poliacutetica tributaacuteria (obtenccedilatildeo de receitas) e poliacutetica orccedilamentaacuteria

(gastos puacuteblicos) exigindo assim a construccedilatildeo de um sistema tributaacuterio moderno que aleacutem de ter

como escopo o financiamento das despesas do governo deve tambeacutem procurar atender vaacuterios obje-

tivos no intuito de contribuir efetivamente para o desenvolvimento econocircmico e social do paiacutes

2 JUSTIFICATIVA ECONOcircMICA PARA A EXISTEcircNCIA DO ESTADO

Uma das maiores dificuldades para a redefiniccedilatildeo do papel do Estado eacute que o contexto de atua-

ccedilatildeo eacute dinacircmico Se considerarmos a forma pela qual as forccedilas econocircmicas e sociais globais alteraram

as concepccedilotildees vigentes do Estado vemos claramente que ele manteacutem um papel caracteriacutestico no do-

miacutenio econocircmico que visa o desenvolvimento econocircmico e social O ponto de partida da moderna te-

oria das financcedilas puacuteblicas eacute que o governo natildeo deveria causar danos Se a economia de mercado estaacute

indo bem ndash satisfazendo as demandas do consumidor a custo mais baixo - entatildeo natildeo haacute necessidade

intervenccedilatildeo direta do governo Entretanto as falhas do mercado continuam oferecendo argumen-

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tos econocircmicos poderosos a favor da intervenccedilatildeo do Estado

Eacute quando os mercados falham em trabalhar bem ndash quando as demandas natildeo satildeo atendidas ou

os custos estatildeo altos ndash que deveriacuteamos considerar intervenccedilatildeo governamental Basicamente a atuaccedilatildeo

do governo justifica-se com o objetivo de eliminar as falhas de mercado que consiste num conjunto

de condiccedilotildees sob as quais uma economia de mercado natildeo obteve ecircxito em distribuir os recursos de

maneira eficiente isto eacute as chamadas distorccedilotildees alocativas distributivas e estabilizadoras e promover

a melhoria do padratildeo de vida da coletividade

Musgrave citado por Riani (2002 p 41) estabeleceu trecircs funccedilotildees baacutesicas a serem exercidas

pelo governo Satildeo elas (i) alocativa assegurar o ajustamento na alocaccedilatildeo dos recursos (ii) distribu-

tiva assegurar o ajustamento na distribuiccedilatildeo da renda e da riqueza e (iii) estabilizadora assegurar a

estabilizaccedilatildeo socioeconocircmica

21 Falhas de mercado

Entende-se por falhas de mercado o conjunto de condiccedilotildees sob as quais uma economia de

mercado natildeo logra distribuir os recursos de maneira eficiente Deve-se a muitas razotildees o malogro do

mercado que tem muitos graus As implicaccedilotildees no que tange ao papel do Estado e agrave forma de inter-

venccedilatildeo puacuteblica podem ser bem diferentes em cada caso

O sistema de ldquoEconomia de Mercadordquo tem as seguintes metas

bull Eficiente alocaccedilatildeo dos recursos escassos

bull Distribuiccedilatildeo justa de renda

bull Estabilidade de preccedilos

Na verdade esse tipo de sistema eacute uma grande simplificaccedilatildeo da realidade e apresenta falhas em

seu funcionamento que o impedem de atingir tais metas Essas falhas satildeo

bull Provimento dos bens puacuteblicos

bull Externalidades

bull Incapacidade da perfeita alocaccedilatildeo dos recursos

bull Distribuiccedilatildeo justa de renda

A fronteira entre o setor puacuteblico e privado eacute explicaacutevel em boa medida pela existecircncia de bens

com possiacutevel rivalidade diferentes graus de exclusividade e externalidades associadas a bens que nor-

malmente ficariam nas matildeos do setor privado Nesses casos dizemos que haacute falhas nas instituiccedilotildees de

mercado que mantecircm ou levam agrave produccedilatildeo estatal Bens puacuteblicos puros com rivalidade no consumo

e altos custos de exclusatildeo satildeo aqueles que tecircm a provisatildeo puacuteblica Sendo assim o provimento dos

bens puacuteblicos encontra justificativa na sua oferta por meio do orccedilamento puacuteblico quando os bens satildeo

natildeo rivais (o consumo por um usuaacuterio natildeo reduz o estoque disponiacutevel para outros) ou se para esses

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bens natildeo se aplica o princiacutepio da exclusatildeo (os usuaacuterios natildeo podem ser impedidos de consumi-los)

Devido a essas caracteriacutesticas eacute inviaacutevel cobrar pelo consumo de bens puacuteblicos e por isso mesmo o

setor privado natildeo dispotildee de incentivos para fornececirc-los

No que se refere agraves externalidades a imperfeiccedilatildeo do sistema de preccedilos se configuraria quan-

do as accedilotildees econocircmicas desenvolvidas por produtores e consumidores exercessem efeitos incidentes

sobre outros produtores ou consumidores e que escapam ao mecanismo de preccedilos isto eacute uma pessoa

ou empresa prejudicam ou beneficiam outros sem que a pessoa ou empresa pague ou receba com-

pensaccedilatildeo A poluiccedilatildeo eacute um exemplo de uma externalidade negativa que impotildee agrave sociedade custos

natildeo compensados O benefiacutecio mais amplo que uma populaccedilatildeo alfabetizada representa para a so-

ciedade eacute uma externalidade positiva da educaccedilatildeo A atuaccedilatildeo governamental visaria entatildeo reduzir as

externalidades negativas e promover as positivas mediante regulamentaccedilatildeo tributaccedilatildeo subsiacutedios ou

provisatildeo direta

Ainda no acircmbito das inadequaccedilotildees da economia de mercado o modelo de concorrecircncia pura e

perfeita admite que a economia funcione com a maior eficiecircncia possiacutevel Entretanto existe uma falha

que consiste na incapacidade do mercado de promover uma perfeita alocaccedilatildeo de recursos A ini-

ciativa privada natildeo se interessaria em alocar recursos em projetos que exigissem altos investimentos e

apresentassem retorno lento tais como a construccedilatildeo de usinas hidroeleacutetricas portos etc Desta forma

cabe ao setor puacuteblico promover ajustamentos na alocaccedilatildeo de recursos para o desenvolvimento de ati-

vidades que natildeo satildeo desenvolvidas eficientemente pelo sistema de mercado devido ao alto custo de

seu investimento ou a baixa margem de retorno sobre o investimento Outra situaccedilatildeo que demanda

a atuaccedilatildeo de governos eacute quando haacute imperfeiccedilotildees na concorrecircncia decorrente da presenccedila de poucos

produtores (monopoacutelios e oligopoacutelios) que tecircm o poder de influenciar na formaccedilatildeo de preccedilos no mer-

cado causando distorccedilotildees no equiliacutebrio de mercado

Devido agrave incapacidade de o mercado de sozinho promover uma distribuiccedilatildeo justa de renda

cabe ao governo viabilizar por meio de orccedilamento puacuteblico poliacuteticas de distribuiccedilatildeo de renda con-

sistentes no intuito de tirar de um para melhorar a situaccedilatildeo de outros menos favorecidos na busca

de assegurar o atendimento agraves necessidades baacutesicas da maioria dos cidadatildeos Uma forma de redis-

tribuiccedilatildeo de renda no Brasil eacute a inclusatildeo de pessoas idosas de baixa renda no sistema previdenciaacuterio

mesmo que elas nunca tenham contribuiacutedo para o sistema e outro exemplo amplamente divulgado

eacute o Programa Bolsa Famiacutelia

Por fim exige-se do Estado atuaccedilatildeo sobre a economia por meio de poliacuteticas econocircmicas (fiscal

monetaacuteria) com objetivo de atingir as variaacuteveis macroeconocircmicas na busca da estabilidade de preccedilos

e combate a grandes flutuaccedilotildees do niacutevel de emprego com o fito de permitir a manutenccedilatildeo do equi-

liacutebrio do sistema econocircmico

No exerciacutecio das funccedilotildees descritas por Musgrave a atuaccedilatildeo estatal buscaraacute atingir alguns ob-

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jetivos que estatildeo simplificadamente agrupados em quatro grandes categorias (1) Satisfaccedilatildeo das Ne-

cessidades Coletivas (2) Manutenccedilatildeo da Estabilidade Econocircmica (3) Promoccedilatildeo do Crescimento

Econocircmico e (4) Melhoria na Distribuiccedilatildeo da Renda Por meio da utilizaccedilatildeo dos instrumentos fis-

cais e monetaacuterios o governo desenvolveraacute cada uma dessas funccedilotildees que embora tenham objetivos

especiacuteficos satildeo bastante inter-relacionadas e consubstanciam a atividade financeira do Estado

3 ATIVIDADE FINANCEIRA DO ESTADO

Nos toacutepicos anteriores procurou-se explicar a evoluccedilatildeo do papel do Estado e a justificativa eco-

nocircmica para sua existecircncia e a relaccedilatildeo entre uma economia de mercado pura sem a interferecircncia do

governo com uma economia mista cuja participaccedilatildeo do governo eacute exigida Se faz mister demonstrar

que a proacutepria existecircncia do Estado trouxe a reboque o exerciacutecio de uma atividade que lhe proporcio-

nasse a obtenccedilatildeo de recursos e alocaccedilatildeo destes na economia a fim de obter o maacuteximo de bem-estar

para sociedade

O Estado interveacutem em quase todas as atividades humanas cresce de importacircncia o estudo das

necessidades puacuteblicas Desde o iniacutecio o ente estatal dirigiu suas atividades para suprir as chamadas

necessidades puacuteblicas

Crepaldi (2008) afirma que o conceito de necessidade puacuteblica e de bem comum varia muito

conforme o tempo o estaacutegio de desenvolvimento e especialmente a vontade do governante que estaacute

no poder Eacute aquela necessidade que o Estado vai satisfazer ou seja aquela que prioritariamente vai

atender Um ideal de promover o bem estar o desenvolvimento das potencialidades e a noccedilatildeo do que

seja bem comum constituem finalidade do Estado

Assim o Estado encontra sua legitimidade e razatildeo de ser no atendimento das necessidades

sociais O incremento dessa atividade envolve gastos vultuosos que satildeo custeados pelas socieda-

des como um todo O Estado como o homem exerce vaacuterias atividades vaacuterias funccedilotildees a fim de que

possa concretizar os seus objetivos O Estado assim exerce uma atividade poliacutetica juriacutedica de se-

guranccedila etc da mesma forma o homem manteacutem inuacutemeras atividades sociais de lazer e culturais

Entre estas atividades exercemos funccedilotildees comuns que eacute a Atividade Financeira ndash eacute a procura de

meios notadamente pecuniaacuterios para satisfazer as necessidades puacuteblicas Sendo assim entende-se

por atividade financeira do Estado o conjunto de atos voltados para a obtenccedilatildeo gestatildeo e aplicaccedilatildeo

de recursos pecuniaacuterios nos fins perseguidos pelo Poder Puacuteblico visando agrave satisfaccedilatildeo das necessi-

dades da coletividade

Nesse sentido o Estado participa direta ou indiretamente das relaccedilotildees econocircmicas a partir de

vaacuterios instrumentos de poliacutetica econocircmica tais como poliacutetica fiscal controle cambial movimento do

comeacutercio internacional controle de preccedilos emissatildeo da moeda etc O principal deles que tem maior

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reflexo na atividade financeira do Estado eacute a poliacutetica fiscal ou seja aquela desempenhada pelos po-

deres puacuteblicos com o propoacutesito de obter e aplicar recursos para o custeio e investimento dos serviccedilos

puacuteblicos Assim a poliacutetica fiscal segundo Matias (2009 p 120) orienta-se em duas direccedilotildees

bull Poliacutetica tributaacuteria - que se materializa na captaccedilatildeo de recursos para atendimento das

funccedilotildees da administraccedilatildeo puacuteblica por meio de suas distintas esferas (Uniatildeo Estados Municiacutepios e

Distrito Federal)

bull Poliacutetica orccedilamentaacuteria - que se refere especificamente aos gastos ou seja aos atos e

medidas relacionados com a forma de aplicaccedilatildeo dos recursos levando em consideraccedilatildeo a dimensatildeo e

a natureza das atribuiccedilotildees do poder puacuteblico bem como a capacidade e a disposiccedilatildeo para seu funcio-

namento pela populaccedilatildeo

Ante tudo o que foi exposto anteriormente conclui-se que cabe ao Estado portanto a respon-

sabilidade de viabilizar o funcionamento dos serviccedilos puacuteblicos essenciais demandados pela coletivi-

dade Para atingir esse objetivo ficou claro que o Estado necessita de recursos financeiros que satildeo

obtidos por meio da poliacutetica tributaacuteria a fim de promover os serviccedilos indispensaacuteveis ao perfeito fun-

cionamento das atividades estatais e ao bem comum da populaccedilatildeo Dessa maneira a principal fonte

para o custeio das necessidades puacuteblicas decorre do sistema tributaacuterio que se materializa por meio da

transferecircncia de parcelas dos recursos dos indiviacuteduos e das empresas para o governo completando

assim o ciacuterculo financeiro entre sociedade e Estado

Para efeito deste artigo e ao objetivo a que se propotildee iremos nos deter agrave poliacutetica tributaacuteria

notadamente no que se refere ao nosso sistema tributaacuterio buscando evidenciar os aspectos que escla-

reccedilam e respondam a indagaccedilatildeo sobre a carga tributaacuteria brasileira

4 SISTEMA TRIBUTAacuteRIO

O mecanismo da tributaccedilatildeo associado agraves poliacuteticas orccedilamentaacuterias interveacutem diretamente na

alocaccedilatildeo dos recursos na distribuiccedilatildeo de recursos na sociedade e pode tambeacutem reduzir as desigual-

dades na riqueza na renda e no consumo A tributaccedilatildeo eacute um instrumento pelo qual o governo obtecircm

recursos coletivamente para satisfazer agraves necessidades da sociedade

O sistema de tributaccedilatildeo variaraacute de acordo com as peculiaridades e tambeacutem com determinadas

situaccedilotildees poliacuteticas econocircmicas e sociais de cada pais Mesmo que os sistemas de tributaccedilatildeo sejam di-

ferentes eles se constituiratildeo assim mesmo no principal mecanismo de obtenccedilatildeo dos recursos puacuteblicos

no sistema capitalista

O sistema tributaacuterio pode desenvolver papeis diferentes dependendo dos objetivos a serem

alcanccedilados e de determinadas situaccedilotildees especificas O fato eacute que independentemente das altera-

ccedilotildees que possam ser feitas o sistema tributaacuterio continua sendo o principal instrumento de poliacutetica

fiscal do governo

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Existem vaacuterias anaacutelises que apontam diferentes maneiras de como deveria funcionar o sistema

de tributaccedilatildeo e que objetivos ele deveria tentar alcanccedilar De uma forma ou de outra espera-se que um

sistema de tributaccedilatildeo siga quatro pontos baacutesicos

bull O primeiro obtenccedilatildeo de receitas para financiar os serviccedilos puacuteblicos

bull Cada indiviacuteduo deveria ser taxado de acordo com sua capacidade para pagar

bull Os tributos devem ser universais impostos sem distinccedilatildeo a indiviacuteduos em situaccedilotildees si-

milares

bull Os tributos seriam escolhidos de forma a minimizar sua interferecircncia no sistema de mer-

cado a fim de tornaacute-lo eficiente

Por princiacutepio o sistema de tributaccedilatildeo deveria ser o mais justo possiacutevel Entretanto o conceito

de justiccedila nem sempre eacute de faacutecil determinaccedilatildeo Como uma tentativa de aproximar o sistema dentro

daquilo que possa ser considerado mais justo a anaacutelise da aplicaccedilatildeo da tributaccedilatildeo baseia-se no prin-

ciacutepio dos benefiacutecios e no princiacutepio da capacidade de pagamento

41 Princiacutepio do benefiacutecio

Estabelece que cada indiviacuteduo na sociedade pagaraacute um tributo de acordo com o montante de

benefiacutecios que ele recebe Quanto maior benefiacutecio maior seria a contribuiccedilatildeo e vice-versa Assim o

princiacutepio do benefiacutecio associa a contribuiccedilatildeo do indiviacuteduo com os benefiacutecios que ele recebe dos bens

e serviccedilos oferecidos pelo governo

Uma grande dificuldade encontrada pelo princiacutepio do benefiacutecio eacute se tratar com os bens coleti-

vos ou bens puacuteblicos puros Esse oacutebice estaacute na impossibilidade de se apurar adequadamente seus be-

nefiacutecios para cada indiviacuteduo na sociedade Se isto eacute possiacutevel torna-se realmente difiacutecil de estabelecer

a parcela de tributo que eacute devida a cada indiviacuteduo na sociedade

42 Princiacutepio da capacidade de contribuiccedilatildeo

Dada esta situaccedilatildeo soluccedilatildeo encontrada eacute a de se introduzir no sistema de tributaccedilatildeo o princiacute-

pio da capacidade de contribuiccedilatildeo Esse princiacutepio distribui o ocircnus da tributaccedilatildeo entre os indiviacuteduos na

sociedade de acordo com sua capacidade de contribuiccedilatildeo medida usualmente pelo niacutevel de renda

Esse princiacutepio tem duas vantagens sobre o anterior primeiro permite que determinada pauta de ser-

viccedilos puacuteblicos seja oferecida agrave sociedade sem que haja exclusatildeo ou discriminaccedilatildeo entre os indiviacuteduos

quanto ao seu uso e benefiacutecios segundo ele se torna um princiacutepio mais justo agrave medida que o sacrifiacutecio

individual eacute feito na mesma proporccedilatildeo e de acordo com a capacidade de pagamento de cada um

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43 Tributos diretos e indiretos

A diferenccedila baacutesica entre esses tributos estaacute na maneira pela qual eles afetam os indiviacuteduos na

sociedade Enquanto o tributo direto incide sobre os rendimentos dos indiviacuteduos o indireto eacute cobrado

normalmente com base nos bens e serviccedilos que satisfazem a parte de suas necessidades O imposto

sobre a renda coloca-se como o melhor exemplo dos tributos diretos enquanto o imposto sobre o

consumo caracteriza mais adequadamente os tributos indiretos

44 Caracteriacutesticas do Sistema Tributaacuterio Nacional

A tributaccedilatildeo caracteriza-se como mecanismo de solidariedade social no qual eacute retirado do

patrimocircnio particular do cidadatildeo uma porcentagem da sua renda auferida em prol do financiamento

dos serviccedilos puacuteblicos e da implementaccedilatildeo dos direitos sociais tendo como finalidade a diminuiccedilatildeo

das desigualdades sociais Sendo assim a carga tributaacuteria de um paiacutes eacute composta pela incidecircncia de

tributos diretos incidentes sobre a renda e o patrimocircnio ou seja da demonstraccedilatildeo real de capacidade

contributiva e tributos indiretos que se caracterizam por incidirem nos produtos e serviccedilos a partir

de uma demonstraccedilatildeo indireta de capacidade contributiva No Brasil o que ocorre eacute que o peso da

tributaccedilatildeo indireta eacute muito maior que o da tributaccedilatildeo direta fazendo com que haja uma onerosidade

maior da parcela populacional com menor poder aquisitivo

Os resultados obtidos ateacute agora natildeo satildeo absolutamente conclusivos mas impostos sobre a

propriedade e a renda tendem a penalizar mais fortemente os mais ricos enquanto que os impostos

sobre vendas de bens e serviccedilos penalizam os mais pobres Impostos sobre a propriedade como

o IPTU e o IPVA acabam associados mais fortemente a quem tem propriedades de maior valor Jaacute

impostos como o ICMS estatildeo associados mais a por exemplo gastos baacutesicos de alimentaccedilatildeo e ves-

tuaacuterio que juntamente com outros gastos baacutesicos representam uma fatia maior do orccedilamento das

pessoas de renda mais baixa

Um sistema tributaacuterio deve ser imparcial ou justo no tratamento dos indiviacuteduos Todavia o

conceito de justiccedila social afirmado anteriormente natildeo eacute questatildeo trivial Uma possiacutevel interpretaccedilatildeo eacute

que cada indiviacuteduo deveria pagar seus impostos de acordo com os benefiacutecios recebidos do governo

na provisatildeo de bens e serviccedilos Aliaacutes esse conceito eacute usado por boa parte da sociedade brasileira em

argumentos contra aumentos da carga tributaacuteria alegando-se que natildeo existe contrapartida do gover-

no na prestaccedilatildeo de serviccedilos para o contribuinte como por exemplo educaccedilatildeo e sauacutede de qualidade

aceitaacutevel para a populaccedilatildeo que paga imposto Eacute nesse tocante que reside o ponto central desse ar-

tigo oferecer ao leitor a clarividecircncia de alguns aspectos sobre a carga tributaacuteria brasileira para natildeo

cairmos na tentaccedilatildeo de afirmaccedilotildees incompletas cujo discurso absoluto de ser alta ou baixa a carga

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

275

tributaacuteria brasileira atende a objetivos especiacuteficos de grupos de interesses e a despeito da percepccedilatildeo

que o retorno social da tributaccedilatildeo natildeo satisfaz plenamente agraves necessidades coletivas e individuais o

que eacute fundamental o esclarecimento para compreensatildeo do leitor

5 A CARGA TRIBUTAacuteRIA BRASILEIRA Eacute ELEVADA MITO OU VERDADE

Neste toacutepico iremos tratar da carga tributaacuteria brasileira suas caracteriacutesticas e mudanccedilas apoacutes

a Constituiccedilatildeo de 1988 O objetivo eacute que no final da leitura o leitor tenha uma visatildeo mais clara da

complexidade do tema a ponto de se ter condiccedilotildees de responder com mais lucidez a indagaccedilatildeo

acima mencionada

A reforma tributaacuteria realizada por meio da Constituiccedilatildeo de 1988 teve como principal motiva-

ccedilatildeo a desconcentraccedilatildeo da receita disponiacutevel do setor puacuteblico A Constituiccedilatildeo de 1988 intensificou a

descentralizaccedilatildeo do federalismo fiscal brasileiro entretanto o Brasil na verdade nunca funcionou na

praacutetica como um regime federalista pois a Uniatildeo sempre exerceu um grande poder sobre os estados

e os municiacutepios das principais capitais

A reaccedilatildeo da sociedade brasileira nos uacuteltimos anos indica um desejo de mudar esse arranjo

institucional a partir de um sistema fiscal que permita uma relaccedilatildeo de poder menos assimeacutetrica A

conclusatildeo a que se chega eacute que as trecircs principais bases tributaacuterias foram de modo geral distribuiacutedas

da seguinte forma a renda para o governo federal o consumo para os estados e a propriedade para

os municiacutepios permitindo-se de alguma forma a complementaccedilatildeo de receita tributaacuteria de um niacutevel de

governo com base tributaacuteria de outro

Entretanto a Uniatildeo tambeacutem se valeu da Constituiccedilatildeo de 1988 que permitiu que contribuiccedilotildees

para a seguridade social tivessem como fator gerador o faturamento das empresas daiacute surgiu a Co-

fins-Contribuiccedilatildeo para Financiamento da Seguridade Social O que se verifica desde entatildeo eacute o uso

intenso por parte da Uniatildeo de contribuiccedilotildees sociais e tributos cumulativos como fonte de receita Com

base na tabela abaixo constata-se a maior preponderacircncia das contribuiccedilotildees no total da receita admi-

nistrada pela Receita Federal do Brasil que eacute da ordem de 307

Tabela 1 Arrecadaccedilatildeo Tributaacuteria Federal 2012 em R$ milhotildees

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

276

Por conta das peculiaridades do sistema tributaacuterio brasileiro eacute que a carga tributaacuteria bra-

sileira decorrente se apresenta de forma desequilibrada e revela uma preferecircncia pela tributaccedilatildeo

sobre bens e serviccedilos e em particular pelos tributos cumulativos que tecircm participaccedilatildeo exagerada

na arrecadaccedilatildeo total A tabela abaixo apresenta a distribuiccedilatildeo da carga tributaacuteria entre as principais

bases de incidecircncia

Tabela 2 Carga Tributaacuteria por base de incidecircncia - 2012

A maior proporccedilatildeo da carga tributaacuteria brasileira cabe aos impostos sobre bens e serviccedilos

que em 2012 corresponderam a 4355 da arrecadaccedilatildeo total A opccedilatildeo por esses tributos pode ser

atribuiacuteda a dois fatores importantes sonegaccedilatildeo e custo de cobranccedila do imposto Os tributos sobre

bens e serviccedilos possivelmente satildeo mais faacuteceis de cobrar e tambeacutem mais difiacuteceis de sonegar inclusi-

ve devido ao uso do mecanismos de substituiccedilatildeo tributaacuteria Entretanto cabe salientar o que muitos

analistas e grande parte do puacuteblico natildeo especializado criticam o uso excessivo desses impostos e

argumentam que eles satildeo regressivos uma vez que os tributos que incidem sobre o consumo satildeo os

mesmos para pessoas ricas e pobres Essa preponderacircncia por impostos indiretos conjugado com a

baixa participaccedilatildeo relativa dos impostos diretos sobre a renda e a propriedade agrava ainda mais o

caraacuteter regressivo do sistema tributaacuterio brasileiro Desta forma no intuito de evidenciar esse caraacuteter

regressivo eacute importante destacar a comparabilidade demonstrada pela figura abaixo que enquanto

no Brasil a representatividade do consumo na composiccedilatildeo da arrecadaccedilatildeo eacute da ordem de 44 nos

paiacuteses ricos a meacutedia eacute de 29Figura 2 Composiccedilatildeo de arrecadaccedilatildeo comparativa de paiacuteses

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

277

Ademais existem estudos que estabelecem uma correlaccedilatildeo entre essa preponderacircncia com o

niacutevel de desigualdade social

Figura 3 Correlanccedilatildeo entre desigualdade social e imposto sobre consumo

Outra questatildeo que se coloca aleacutem dessa regressividade do imposto sobre consumo e que

nos revela outra peculiaridade do nosso sistema tributaacuterio e que nos ajuda a compreender melhor o

assunto carga tributaacuteria brasileira eacute o fato que vocecirc que ganha salaacuterio sabe muito bem o quanto eacute

descontado na fonte a tiacutetulo de imposto de renda e como eacute alta a porcentagem de impostos nos pre-

ccedilos dos produtos entretanto eacute importante ressaltar que existe um outro lado da moeda que precisa

ser elucidado para entendermos essa equaccedilatildeo Brasil Sim pagamos muito imposto todavia o governo

(municipal estadual e federal) arrecada pouco No caso US$ 4085 por habitante por ano Eacute isso o que

a estrutura estatal arrecada e o que tem para financiar os serviccedilos puacuteblicos prestados a cada pessoa

tais como hospitais universidades escolas poliacutecia cadeias tribunais ruas estradas portos poliacutecia

investimentos puacuteblicos etc Na verdade todos esses gastos mais os decorrentes do pagamento dos

servidores envolvidos sairaacute desses mesmos U$4085 Para se ter uma ideia se esse valor eacute muito ou

pouco observe o graacutefico abaixo que compara o Brasil com outros paiacuteses Os nuacutemeros estatildeo todos

em doacutelar mas jaacute corrigidos pela paridade do poder de compra (criteacuterio que ajusta o valor conforme o

preccedilo das coisas em cada paiacutes)

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Graacutefico 1 Comparativo de arrecadaccedilatildeo por habitante em US$

Da anaacutelise do graacutefico acima constata-se que paiacuteses desenvolvidos arrecadam pelo menos o tri-

plo de dinheiro por habitante e portanto tecircm pelo menos o triplo para investir em serviccedilos puacuteblicos

Depreende-se entatildeo que o Brasil simplesmente natildeo arrecada o suficiente para prestar serviccedilos de

primeiro mundo uma vez que paiacutes como EUA que arrecada por ano U$ 13429 tem o triplo do Brasil

para investir em cada habitante Ateacute paiacuteses subdesenvolvidos como Argentina e Meacutexico arrecadam

mais que noacutes Entatildeo por que o Brasil arrecada tatildeo pouco se nossa carga tributaacuteria alta Aleacutem do mais

somos a seacutetima economia do planeta conforme demonstra o graacutefico abaixo

Graacutefico 2 Comparativo de Paiacuteses de maior PIB

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Aliado ao fato supramencionado eacute importante destacar que somos um paiacutes com 1974 milhotildees

de habitantes a quinta maior populaccedilatildeo do mundo sendo assim seria necessaacuterio fazermos uma outra

conta que eacute dividir nosso PIB pelo nuacutemero de habitantes e o resultado eacute um PIB per capita de apenas

US$ 118 mil por habitante o que nos coloca no 74ordm lugar no ranking global De fato nosso resultado

eacute de paiacutes pobre conforme demonstra o graacutefico abaixo

Graacutefico 3 PIB per Capita

A equaccedilatildeo eacute complexa Para termos uma gestatildeo fiscal compatiacutevel eacute necessaacuterio termos em

mente os pilares que sustentam a gestatildeo fiscal eficiente aumento de arrecadaccedilatildeo controle dos gastos

correntes elevaccedilatildeo dos investimentos e controle do niacutevel de endividamento Se quiseacutessemos ter mais

investimentos puacuteblico indubitavelmente teriacuteamos que aumentar a carga tributaacuteria sem massacrar a

sociedade buscando maior qualidade dos serviccedilos puacuteblicos prestados

A tendecircncia agrave elevaccedilatildeo da carga tributaacuteria ao longo dos anos 1990 e no seacuteculo XXI decorreu

principalmente do aumento da carga de tributos incidentes sobre bens e serviccedilos explicado boa parte

pelo crescimento da carga tributaacuteria de impostos cumulativos que do ponto de vista econocircmico satildeo

de pior qualidade prejudicando o desempenho do setor produtivo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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Tabela 3 Evoluccedilatildeo da Carga Tributaacuteria

Da anaacutelise do graacutefico abaixo depreendermos que o niacutevel de carga tributaacuteria brasileira eacute expres-

sivamente superior aos de outros paiacuteses da Ameacuterica Latina Por outro lado quando comparado aos

paiacuteses de renda per capita alta o Brasil apresenta-se em patamar inferior Vale ressaltar que o niacutevel de

tributaccedilatildeo no Brasil eacute da mesma ordem do Reino Unido e muito maior do que o Japatildeo Entretanto o

niacutevel de serviccedilo puacuteblico eacute bem aqueacutem quando aferido por meio do IRBES2 Iacutendice de Retorno de Bem

Estar Social definido pelo Instituto Brasileiro de Planejamento Tributaacuterio (IBPT) e comparado com ou-

tros paiacuteses conforme demonstrado abaixo

2 O IRBES eacute decorrente da somatoacuteria do valor numeacuterico relativo agrave carga tributaacuteria do paiacutes com uma ponderaccedilatildeo de 5 com o valor do IDH que recebeu uma ponderaccedilatildeo de 85 por entendermos que o IDH elevado independentemente a carga tributaacuteria do paiacutes eacute muito mais representativo e significante do que uma carga tributaacuteria elevada independente-mente do IDH Assim sendo entendemos que o IDH necessariamente deve ter um peso bem maior para a composiccedilatildeo do iacutendice

Graacutefico 4 Comparaccedilatildeo da Carga Tributaacuteria entre paiacuteses

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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Graacutefico 5 Iacutendice de Desenvolvimento Humano (IDH)

Graacutefico 6 Iacutendice de Retorno do Bem Estar agrave Sociedade (IRBES)

Corolaacuterio

bull O Iacutendice de Desenvolvimento Humano (IDH) eacute uma medida comparativa de riqueza alfa-

betizaccedilatildeo educaccedilatildeo esperanccedila de vida natalidade e outros fatores para os diversos paiacuteses do mundo

Eacute uma maneira padronizada de avaliaccedilatildeo e medida do bem-estar de uma populaccedilatildeo especialmente

bem-estar infantil O iacutendice foi desenvolvido em 1990 pelo economista paquistanecircs Mahbubul Haq e

vem sendo usado desde 1993 pelo Programa das Naccedilotildees Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) em

seu relatoacuterio anual

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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bull O Iacutendice de Retorno De Bem Estar agrave Sociedade (IRBES) eacute resultado da somatoacuteria da carga

tributaacuteria ponderada percentualmente pela importacircncia deste paracircmetro com o IDH ponderado da

mesma forma

51 Carga tributaacuteria e investimento em educaccedilatildeo

Uma relaccedilatildeo importante a ser feita para corroborar com o exposto acima eacute destacar o aspecto

educacional no processo de reduccedilatildeo das desigualdades Haacute algo a ser feito temos produccedilatildeo e riqueza

de paiacutes rico niacutevel de renda incompatiacutevel arrecadaccedilatildeo por habitante aqueacutem dos paiacuteses ricos conse-

quentemente serviccedilos puacuteblicos natildeo condizentes com as reais necessidades sociais dos brasileiros Ine-

quivocamente o sistema educacional brasileiro tem seu protagonismo na construccedilatildeo dessa realidade

bem como de sua reversatildeo

O Brasil aplicou US$ 960 por estudante em 2010 e a Coreacuteia do Sul US$ 5448 Embora tenham

o mesmo niacutevel do PIB aplicado em educaccedilatildeo parece oacutebvio a Coreacuteia do Sul eacute que propicia melhores

condiccedilotildees financeiras para o setor educacional ao aplicar 6 vezes mais recursos por pessoa em idade

educacional que o Brasil Apesar de o investimento brasileiro ser proacuteximo da meacutedia dos paiacuteses da

OCDE o paiacutes se encontra somente em 53ordm lugar - de um total de 65 - no Pisa um programa de ava-

liaccedilatildeo da qualidade da educaccedilatildeo da mesma organizaccedilatildeo em cujo programa a Coreia do Sul ocupou a

2ordf posiccedilatildeo no ranking Ou seja maiores investimentos natildeo necessariamente acompanham na mesma

proporccedilatildeo uma melhora no desempenho dos estudantes Amaral (2011) afirma que para avaliar o

investimento em educaccedilatildeo proporcional ao PIB eacute preciso conjugar trecircs indicadores total de recursos

aplicados em educaccedilatildeo como percentual do PIB riqueza do paiacutes expressa pelo valor de seu PIB e a

quantidade de pessoas em idade educacional

Tabela 4 Recursos Financeiros aplicados em educaccedilatildeo por pessoa

O Brasil eacute o 15ordm que mais investe o PIB na aacuterea na lista da OCDE Segundo o estudo o governo

brasileiro investe 54 do seu PIB em educaccedilatildeo ndash sendo que a meacutedia dos outros paiacuteses da OCDE eacute de

623 Para os alunos do ensino superior sobram apenas 08 do PIB o quarto menor investimento

entre 36 paiacuteses Ter diploma de ensino superior eacute vantajoso em todos os paiacuteses que participaram da

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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pesquisa mas no Brasil eacute ainda mais relevante Por aqui a diferenccedila salarial pode chegar ao triplo da

meacutedia da diferenccedila nos outros 34 paiacuteses

Os recursos puacuteblicos investidos na educaccedilatildeo convertem-se em mais valias incluindo por exem-

plo aumento das receitas fiscais Em meacutedia nos paiacuteses da OCDE um homem habilitado com um niacutevel

superior de ensino iraacute gerar um valor adicional de US$ 119000 no imposto de renda e contribuiccedilatildeo

social durante a sua vida ativa em relaccedilatildeo a algueacutem habilitado apenas com uma educaccedilatildeo de niacutevel

secundaacuterio Mesmo depois de subtrair as receitas puacuteblicas que financiaram o grau remanescem em

meacutedia de US$ 86000 quase trecircs vezes o montante do investimento puacuteblico por aluno no ensino supe-

rior Os retornos para a sociedade satildeo ainda maiores porque haacute muitos outros benefiacutecios resultantes

da educaccedilatildeo que natildeo se refletem diretamente no imposto de rendimentos

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Avaliar o desempenho do setor puacuteblico o envolvimento do governo e a percepccedilatildeo da socie-

dade sob a oacutetica do sistema tributaacuterio eacute uma tarefa extremamente complexa e subjetiva Isso porque

aleacutem dos nuacutemeros na maioria das vezes as avaliaccedilotildees envolvem grande parcela de juiacutezo de valor

Nesse sentido o artigo procurou trazer elementos mais criacuteveis para uma anaacutelise mais percuciente por

parte do leitor

O resgate histoacuterico a justificativa para existecircncia inexoraacutevel do setor puacuteblico e a elucidaccedilatildeo do

Sistema Tributaacuterio Nacional abrem espaccedilo para reflexatildeo e estudo das financcedilas puacuteblicas pois existe

uma seacuterie de problemas a serem enfrentados pela sociedade e pelos administradores puacuteblicos de

forma a tornar o setor puacuteblico mais eficiente e viaacutevel financeiramente

O quadro de dificuldades das financcedilas puacuteblicas associa-se a trecircs fatores fundamentais o pri-

meiro refere-se agrave necessidade da busca de uma forma mais eficiente de obtenccedilatildeo e aplicaccedilatildeo dos re-

cursos puacuteblicos Essa busca implica natildeo somente uma aplicaccedilatildeo mais adequada dos recursos em face

das reais necessidades da sociedade mas tambeacutem em funccedilatildeo de uma escala de prioridades de tarefas

a serem executadas pelo governo Eacute necessaacuterio tambeacutem analisar o fato de que a tributaccedilatildeo no Brasil

carece de uma legitimidade social visto que a incidecircncia de tributos no paiacutes eacute vista como um peso na

populaccedilatildeo e natildeo como um mecanismo essencial ao proacuteprio desenvolvimento do paiacutes

O segundo ponto relaciona-se ao sistema de financiamento do setor puacuteblico e mais precisa-

mente agrave arrecadaccedilatildeo tributaacuteria As estatiacutesticas mostram que a carga de tributos e a complexidade do

sistema tributaacuterio brasileiro e do aparato juriacutedico-legal comprometem a competitividade e alavancam

a economia informal impondo custos administrativos elevados com reflexos negativos sobre o cresci-

mento e a distribuiccedilatildeo de renda Terceiro eacute a excessiva participaccedilatildeo dos tributos sobre bens e serviccedilos

na arrecadaccedilatildeo Esse tipo tributaccedilatildeo indireta traz um alto grau de regressividade agrave carga tributaacuteria agrave

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medida que acaba onerando as pessoas de menor rendimento em vez de se concentrar na pequena

parcela da populaccedilatildeo cuja renda apresenta uma alta participaccedilatildeo no PIB

Os cidadatildeos natildeo se sentem impelidos e entusiasmados em pagar tributos Natildeo haacute consciecircncia

de que estes satildeo necessaacuterios para atender o financiamento das necessidades sociais por meio dos pro-

gramas projetos e accedilotildees articulados e coordenados pelo Estado Os contribuintes muitas vezes natildeo

cumprem com as suas obrigaccedilotildees tributaacuterias e deixam de fiscalizar o atendimento das mesmas pelos

demais cidadatildeos

Talvez tudo isto eacute consequecircncia de uma seacuterie de desacertos dentre os quais se podem citar a

malversaccedilatildeo do dinheiro puacuteblico a falta de visibilidade quanto agraves fontes e aplicaccedilotildees dos recursos o

baixo retorno social traduzido na falta de atendimento agraves necessidades prioritaacuterias da sociedade o

agravamento das desigualdades entre pessoas e regiotildees deficiecircncia nas informaccedilotildees simples e aces-

siacuteveis sobre o STN e por uacuteltimo e de forma conclusiva uma intensificaccedilatildeo na educaccedilatildeo fiscal Embora

haja atualmente arranjo institucional e legal para acesso agraves informaccedilotildees e transparecircncia do gasto puacute-

blico precisamos avanccedilar mais pois a tiacutetulo de exemplo existe um programa oficial de acircmbito nacio-

nal ndash o PNEF ndash Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal - em vigor desde 1996 o mesmo tem resultados

que ainda deixam muito a desejar soacute atingindo em 2008 193 dos municiacutepios 166 das escolas

brasileiras e 108 da populaccedilatildeo

Para aleacutem de oferecer uma resposta pronta e acabada para questotildees levantadas a proposta eacute

levar ao leitor informaccedilotildees e instrumentos analiacuteticos que possam contribuir tanto para compreensatildeo

da complexa relaccedilatildeo Estado e sociedade bem como propiciar o redirecionamento dos pontos relevan-

tes que o problema requer para natildeo ficarmos na simploacuteria conclusatildeo de que a carga tributaacuteria eacute alta e

podermos indagar sobre Estado que temos do Estado que queremos e o Estado que podemos ter

Eacute verdade que o Estado mal administrado e sem vinculaccedilatildeo com as reais demandas dos setores

mais carentes da sociedade tende a tornar mais ineficiente e desigual Isso natildeo invalida portanto a

necessidade de um Estado mais eficiente cuja participaccedilatildeo e intervenccedilatildeo na economia e na sociedade

eacute indispensaacutevel A mensagem eacute que o Estado pode ficar agrave altura dos desafios que enfrenta mas isso

somente se primeiro ajustar o que procura fazer ao que eacute capaz de fazer e depois aumentar o nuacute-

mero de coisas que pode fazer com habilidade mediante o fortalecimento das instituiccedilotildees puacuteblicas

Sendo assim espera-se que as administraccedilotildees puacuteblicas federais estaduais municipais ou seja

todos os niacuteveis da administraccedilatildeo puacuteblica estejam preparados para enfrentar os desafios gerando as-

sim melhores resultados para a sociedade isto eacute em uacuteltima instacircncia se colocarem como instrumento

da sociedade a que serve

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REFEREcircNCIAS

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ZOTTMANN Luiz Vocecirc o Estado e a questatildeo fiscal Rio de Janeiro Documenta Histoacuterica 2008

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286

REFORMA TRIBUTAacuteRIA DESENVOLVIMENTO ECONOcircMICO E JUSTICcedilA FISCAL NO BRASIL DIAGNOacuteSTICO E PERSPECTIVAS

SUMAacuteRIO Introduccedilatildeo 1 Tributaccedilatildeo e justiccedila fiscal no Brasil diagnoacutestico 2 Tributaccedilatildeo e justiccedila fiscal no Brasil perspectivas Consideraccedilotildees finais Refe-recircncias

Marcelo Lettieri Siqueira1

INTRODUCcedilAtildeO

O debate sobre reformas tributaacuterias tem adquirido crescente importacircncia na definiccedilatildeo das poliacute-

ticas puacuteblicas no mundo globalizado principalmente quanto ao efetivo papel do sistema tributaacuterio na

promoccedilatildeo do crescimento econocircmico e na reduccedilatildeo das desigualdades sociais e regionais

Diante do diagnoacutestico de que seus sistemas tributaacuterios natildeo cumprem o papel de facilitador e

fomentador de um desenvolvimento econocircmico inclusivo vaacuterios paiacuteses tecircm questionado seu modelo

tributaacuterio clamando por reformas urgentes independentemente do niacutevel de suas cargas tributaacuterias

do grau de desenvolvimento econocircmico-social de cada um deles e da qualidade dos serviccedilos puacuteblicos

colocados agrave disposiccedilatildeo de seus cidadatildeos

No Brasil embora haja um aparente consenso quanto agrave necessidade de se reformar o sistema

tributaacuterio vigente haacute grandes discordacircncias quanto aos caminhos a serem seguidos

Dada a inexistecircncia de um modelo ideal para qualquer paiacutes o que se procura ao menos en-

quanto se trabalha nos projetos de reforma eacute buscar a formulaccedilatildeo de um modelo que se aproxime de

certas caracteriacutesticas desejaacuteveis de qualquer sistema tributaacuterio justo e eficiente Eacute a partir dessa pre-

missa que pesquisadores tecircm convergido para o estabelecimento de cinco caracteriacutesticas desejaacuteveis

que segundo eles devem ser perseguidas para a obtenccedilatildeo de um sistema tributaacuterio eficiente eficaz

e efetivo na promoccedilatildeo do desenvolvimento econocircmico-social eficiecircncia simplicidade flexibilidade

responsabilidade poliacutetica e justiccedila fiscal

Em relaccedilatildeo agrave eficiecircncia econocircmica estabelecem que um sistema tributaacuterio adequado natildeo deve

interferir na alocaccedilatildeo eficiente de recursos Ou seja defendem que um tributo natildeo deve ser utilizado

de forma a alterar a decisatildeo que o contribuinte tomaria se ele o tributo natildeo existisse Como exemplo

uma isenccedilatildeo tributaacuteria natildeo deveria ser utilizada de forma a influenciar a localizaccedilatildeo de uma empresa

1 Graduado em Engenharia Mecacircnica Aeronaacuteutica pelo Instituto Tecnoloacutegico de Aeronaacuteutica (1994) Mestre e Doutor em Economia pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) Eacute professor colaborador da Universidade Federal do Cearaacute Auditor da Secretaria da Receita Federal do Brasil E-mail marlettierigmailcom

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em um lugar que natildeo seria escolhido caso natildeo houvesse o referido benefiacutecio fiscal

Quanto agrave simplicidade advogam que o projeto de um sistema tributaacuterio justo e eficiente natildeo

pode deixaacute-lo demasiadamente complexo pois tal complexidade pode gerar custos tatildeo altos para a

sociedade que acabariam por prejudicar qualquer noccedilatildeo de eficiecircncia e justiccedila

A flexibilidade de um sistema tributaacuterio se refere ao seu poder de adaptar-se facilmente ao

ambiente econocircmico vigente Essa flexibilidade deve ser entendida como uma sintonia fina um ajuste

permanente do sistema tributaacuterio aos ciclos econocircmicos

Em relaccedilatildeo agrave responsabilidade poliacutetica defendem que o sistema tributaacuterio deve ser desenhado

de modo a permitir que os contribuintes saibam exatamente o quanto estatildeo pagando possibilitando

que o sistema poliacutetico possa refletir as preferecircncias dos indiviacuteduos

Por fim a justiccedila eacute uma das caracteriacutesticas mais desejadas e mais discutidas na elaboraccedilatildeo de

qualquer sistema tributaacuterio Para Sen (2011 p 33) o que eacute fundamental para a ideia de justiccedila ldquoeacute que

podemos ter um forte senso de injusticcedila com base em muitos fundamentos diferentes sem contudo

concordarmos que um fundamento especiacutefico seja a razatildeo dominante para o diagnoacutestico da injusticcedilardquo

Isso dificulta sobremaneira a definiccedilatildeo de quais elementos devem fundamentar um sistema tributaacuterio

que se coadune com a justiccedila fiscal

Dada essa extrema dificuldade praacutetica de sua definiccedilatildeo e alcance a justiccedila fiscal ou tributaacuteria

tem sido entendida como a aceitaccedilatildeo pela maioria do pacto tributaacuterio acordado Conveacutem ressaltar

que a linha de pensamento mais em voga tem sido a que defende a justiccedila ou progressividade em

relaccedilatildeo agraves atividades liacutequidas do Estado isto eacute o equiliacutebrio econocircmico apoacutes a ocorrecircncia das receitas

e despesas puacuteblicas No entanto a pouca progressividade observada em relaccedilatildeo aos gastos sociais

minou o argumento de que os paiacuteses deveriam arrecadar maximizando a eficiecircncia sem qualquer pre-

ocupaccedilatildeo com a justiccedila fiscal deixando para fazer justiccedila pelo lado dos gastos2

Nosso sistema tal como hoje estaacute concebido tem suas raiacutezes na reforma tributaacuteria de 1966

quando se privilegiou uma tributaccedilatildeo mais racional do ponto de vista econocircmico e a criaccedilatildeo de im-

postos modernos para a eacutepoca Data desse periacuteodo a introduccedilatildeo oficial de impostos incidentes sobre o

valor adicionado representados pelo Imposto sobre Circulaccedilatildeo de Mercadorias (ICM) e o Imposto so-

bre Produtos Industrializados (IPI) O objetivo era eliminar a tributaccedilatildeo em cascata reconhecidamente

uma das maiores fontes de distorccedilatildeo da economia

Todavia apesar do substancial avanccedilo que essa reforma representou para o paiacutes o sistema tri-

butaacuterio nacional natildeo continuou a evoluir isto eacute natildeo se adaptou agraves alteraccedilotildees ocorridas na estrutura

econocircmica brasileira desde entatildeo Em muitos aspectos ateacute se pode admitir que o sistema sofreu al-

guns retrocessos como no caso da introduccedilatildeo de contribuiccedilotildees sociais cumulativas

2 Veja por exemplos as conclusotildees do trabalho de Silveira (2008)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

288

Natildeo obstante a partir de 1994 a estabilidade econocircmica tem permitido a obtenccedilatildeo da estabi-

lidade fiscal o que possibilita a busca de um sistema tributaacuterio mais simples racional justo e eficiente

aleacutem de mais legiacutetimo no que concerne agrave responsabilidade poliacutetico-social

No entanto o paiacutes tem equivocadamente concentrado seus esforccedilos na ampliaccedilatildeo da tributa-

ccedilatildeo sobre o consumo seguindo a tendecircncia mundial e as teorias neoliberais que advogam a mudanccedila

para uma base tributaacuteria sobre o consumo porque provavelmente incentivaria a acumulaccedilatildeo de capi-

tal jaacute que removeria a tributaccedilatildeo sobre a renda do capital

Tal estrateacutegia ideoloacutegica tornou o nosso sistema mais injusto altamente regressivo e minou

qualquer possibilidade de se utilizar os instrumentos tributaacuterios para fins de reduccedilatildeo das desigualda-

des de renda e riqueza Isso o afastou da caracteriacutestica mais desejada por seus cidadatildeos a justiccedila fiscal

O que fazer entatildeo para revertermos esse quadro

Tributaristas e economistas argumentam que a equidade fiscal ndash e por decorrecircncia a justiccedila

fiscal ndash pode ser ampliada se diminuirmos a carga tributaacuteria bruta melhorarmos a transparecircncia da

tributaccedilatildeo e reduzirmos os custos de cumprimento das obrigaccedilotildees tributaacuterias Mas isso seria suficiente

no caso do Brasil que deteacutem um dos piores iacutendices de desigualdade do mundo e o quarto pior da

Ameacuterica Latina3 Seria possiacutevel resolver o grave problema da desigualdade brasileira com uma carga

tributaacuteria menor Definitivamente natildeo

De uma forma geral todos se acham injusticcedilados pelo que pagam de impostos e exigem refor-

mas Formou-se um consenso de que nossa carga tributaacuteria eacute elevada principalmente para os padrotildees

de serviccedilos puacuteblicos que satildeo prestados Entretanto as criacuteticas agrave alta carga tributaacuteria brasileira natildeo

enfrentam a discussatildeo sobre quem efetivamente paga a conta Isto eacute natildeo se discute de onde estamos

extraindo os recursos necessaacuterios ao financiamento do Estado quem recebe do governo esses recur-

sos e se a extraccedilatildeo e a distribuiccedilatildeo estatildeo sendo feitas de forma a reduzir as desigualdades

Eacute fundamental portanto ter em mente que o crescimento econocircmico eacute apenas um dos obje-

tivos da poliacutetica tributaacuteria de um paiacutes e que este deve ser conciliado com outros objetivos tatildeo impor-

tantes quanto como a promoccedilatildeo da justiccedila fiscal a garantia da estabilidade econocircmica e a adequaccedilatildeo

da reparticcedilatildeo federativa das receitas Objetivos que certamente seratildeo lembrados quando o sistema

tributaacuterio for reformado

E a boa notiacutecia eacute que jaacute haacute alguns consensos sendo estabelecidos o sistema tributaacuterio precisa

ser menos complexo e mais transparente eacute necessaacuterio um maior equiliacutebrio entre os diversos entes fe-

derativos (Uniatildeo Estados Distrito Federal e Municiacutepios) a tributaccedilatildeo excessiva do consumo altamente

3 Eacute o que aponta um estudo ineacutedito do Programa das Naccedilotildees Unidas para os Assentamentos Humanos (ONU-HABITAT) divulgado no dia 21082012 O Paiacutes aparece em condiccedilotildees melhores apenas que Guatemala Honduras e Colocircmbia todos com coeficiente acima de 056 (quanto mais proacuteximo do 1 maior a desigualdade) O melhor resultado foi o da Venezuela (041) seguida pelo Uruguai Veja reportagem da revista Carta Capital em httpwwwcartacapitalcombrsociedadebra-sil-e-o-quarto-pais-mais-desigual-da-america-latina Acesso em 19 jan 2014

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

289

regressiva deve ser reavaliada e a tributaccedilatildeo da renda mais progressiva principalmente da renda do

capital deve ser reconsiderada

E se desejarmos utilizar efetivamente o sistema tributaacuterio como instrumento de desenvolvi-

mento econocircmico e social eacute importante comeccedilar com objetivos bem estabelecidos e acordados que

devem incluir por exemplo a reduccedilatildeo da pobreza e das desigualdades sociais e regionais a eliminaccedilatildeo

de entraves burocraacuteticos agrave atividade empreendedora e o aumento da renda meacutedia do trabalhador en-

tre outros Estrateacutegias especiacuteficas devem ser concebidas e implementadas E deve haver uma relaccedilatildeo

clara entre a poliacutetica tributaacuteria e as estrateacutegias de desenvolvimento

Nesse sentido o presente artigo pretende contribuir para o debate apresentando um breve

diagnoacutestico da relaccedilatildeo entre tributaccedilatildeo e justiccedila fiscal no Brasil e algumas perspectivas para as proacutexi-

mas propostas de reforma tributaacuteria

Aleacutem da presente introduccedilatildeo o artigo estaacute organizado em mais trecircs seccedilotildees incluindo as con-

sideraccedilotildees finais Na segunda seccedilatildeo apresentamos um breve diagnoacutestico da relaccedilatildeo entre tributaccedilatildeo

e justiccedila fiscal no Brasil para em seguida mostrarmos algumas perspectivas quanto aos caminhos

desejaacuteveis rumo a uma reforma que promova a justiccedila fiscal no Brasil

1 TRIBUTACcedilAtildeO E JUSTICcedilA FISCAL NO BRASIL DIAGNOacuteSTICO

Conforme relatado por Gondim e Siqueira (2012) no final do seacuteculo XIX a tributaccedilatildeo no Brasil

era quase que totalmente concentrada em tributos sobre o comeacutercio exterior caracteriacutestica de siste-

mas tributaacuterios de paiacuteses natildeo industrializados tipicamente exportadores de commodities Agrave medida

que o paiacutes foi-se industrializando o ocircnus tributaacuterio passou o cair sobre o consumo tornando-se base

predominante jaacute no iniacutecio da deacutecada de quarenta

Por um curto periacuteodo histoacuterico nas deacutecadas de 70 e 80 tivemos a predominacircncia da tributaccedilatildeo

sobre a renda mas a partir da deacutecada de 90 com a hegemonia do projeto econocircmico neoliberal a tri-

butaccedilatildeo sobre o consumo voltou a predominar representando hoje cerca de 50 da Carga Tributaacuteria

Bruta conforme podemos observar no graacutefico a seguir

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

290

Analisando a distribuiccedilatildeo recente da carga tributaacuteria por vaacuterias bases de incidecircncia ndash que inclui

a propriedade a folha de salaacuterios e as operaccedilotildees financeiras aleacutem do consumo de bens e serviccedilos e

da renda ndash podemos observar como se distribui o ocircnus tributaacuterio no Brasil

O que se observa na tabela 1 a seguir para o ano 2012 eacute uma tributaccedilatildeo bastante concentrada

no consumo de bens e serviccedilos (1783 do PIB e 4973 da Arrecadaccedilatildeo Total) seguida pela incidecircn-

cia sobre a folha de salaacuterios (951 do PIB e 2653 da Arrecadaccedilatildeo Total) e sobre a renda (640 do

PIB e 1784 da Arrecadaccedilatildeo Total) enquanto a tributaccedilatildeo sobre operaccedilotildees financeiras (07 do PIB

e 195 da Arrecadaccedilatildeo Total) e sobre a propriedade (138 do PIB e 385 da Arrecadaccedilatildeo Total) eacute

quase insignificante

Carga Tributaacuteria e Variaccedilotildees por Base de Incidecircncia - 2012 x 2011

Ou seja as reformas tributaacuterias recentes tecircm acentuado uma anomalia do Brasil aumento da

tributaccedilatildeo sobre o consumo em detrimento da tributaccedilatildeo da renda agravando o quadro de desigual-

dade ou no miacutenimo natildeo permitindo uma maior reduccedilatildeo desta como observou Silveira (2008) em sua

relevante pesquisa

Em termo de anaacutelise comparativa internacional constata-se que paiacuteses com renda per capita

mais elevada tendem a tributar mais a renda do que o consumo a arrecadaccedilatildeo de tributos previden-

ciaacuterios tende a ser mais importante nesses paiacuteses (provavelmente em virtude da maior expectativa de

vida) chegando a ser a principal fonte de receita na Alemanha Franccedila Espanha e Japatildeo e a incidecircncia

sobre o consumo no Brasil eacute muito alta mesmo quando comparado a paiacuteses com renda semelhante

(Argentina Chile e Turquia)4

Em termos de Carga Tributaacuteria Bruta temos a seguinte realidade em comparaccedilatildeo com paiacuteses

da OCDE

Veja mais detalhes em Gondim e Siqueira (2012 Tabela 1 p 39)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

291

Mas como o proacuteprio conceito de Carga Tributaacuteria Bruta5 deixa claro tais nuacutemeros apenas

indicam o percentual dos recursos produzidos no paiacutes que satildeo apropriados pelo Estado para o finan-

ciamento das poliacuteticas puacuteblicas natildeo sendo possiacutevel fazer qualquer inferecircncia direta sobre quem eacute que

efetivamente financia o estado (quem paga a conta) ou sobre a relaccedilatildeo entre a Carga e a qualidade

dos serviccedilos puacuteblicos prestados

Como entatildeo podemos avaliar de forma mais precisa a relaccedilatildeo entre a arrecadaccedilatildeo de impostos

e a prestaccedilatildeo de serviccedilos puacuteblicos

Para isso precisamos trazer agrave baila o conceito de Carga Tributaacuteria Liacutequida (CTL) e de Carga Tri-

butaacuteria Liacutequida exclusive Juros (CTL-Juros)

Estudo recente do Instituto de Pesquisa Econocircmica Aplicada (Ipea) divulgado por meio do

Comunicado da Presidecircncia nordm 23 - Ipea (2009) resgatou o esquecido conceito de Carga Tributaacuteria Liacute-

quida (CTL) assim definindo-a ldquoa partir da Carga Tributaacuteria Bruta quando descontado o conjunto das

transferecircncias puacuteblicas e subsiacutedios imediatamente devolvido agrave sociedade chega-se agrave Carga Tributaacuteria

Liacutequida (CTL)rdquo

Referido estudo mostrou que

[] parcela significativa dos recursos arrecadados pelo governo em cada ano termina sendo prontamente devolvida para a sociedade na forma de transferecircncias puacuteblicas (pensotildees e aposentadorias e outros benefiacutecios previdenciaacuterios e assistenciais para ido-sos eou muito pobres eou portadores de deficiecircncias) e subsiacutedios ao setor privado (TAPS) (Ipea 2009)

5 Carga Tributaacuteria Bruta eacute uma medida do esforccedilo da sociedade para o financiamento das poliacuteticas puacuteblicas Ela eacute definida matematicamente como a relaccedilatildeo entre o total de tributos pagos num determinado ano (Arrecadaccedilatildeo Total) e o Produto Interno Bruto (PIB) a preccedilos de mercado neste mesmo ano A Secretaria da Receita Federal do Brasil (2013) calculou a Carga Tributaacuteria Bruta do Brasil em 2012 em 3585

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

292

Constata-se que em 2007 e 2008 tais transferecircncias representaram mais de 15 do PIB como mostra

o graacutefico a seguir

Transferecircncias de Assistecircncia e Previdecircncia e Subsiacutedios ( do PIB)

Assim a CTL nesses anos alcanccedilou cerca de 20 do PIB conforme se verifica no graacutefico a seguir

Carga Tributaacuteria Liacutequida - Receita Federal

No entanto como ressalta o referido estudo do Ipea

a Carga Tributaacuteria Liacutequida natildeo eacute ainda uma boa aproximaccedilatildeo dos recursos efetiva-mente agrave disposiccedilatildeo dos governos brasileiros para a prestaccedilatildeo de serviccedilos puacuteblicos (sauacutede educaccedilatildeo seguranccedila entre outros) e para os bens puacuteblicos (estradas aero-portos prisotildees entre outros) para toda populaccedilatildeo Haacute que considerar tambeacutem as despesas com o pagamento de juros que decorrem do endividamento puacuteblico que ultrapassam 5 do PIB ao ano (Ipea 2009)

Logo se o nosso objetivo eacute comparar a qualidade dos serviccedilos puacuteblicos entre paiacuteses em funccedilatildeo

dos impostos pagos devemos utilizar o conceito de Carga Tributaacuteria Liacutequida exclusive Juros (CTL-j)

Como lembrou o Ipea

quando se desconta da Carga Tributaacuteria Liacutequida o pagamento com juros obteacutem-se uma aproximaccedilatildeo mais razoaacutevel da quantia de recursos anual efetivamente disponiacutevel para fazer frente aos bens puacuteblicos e agrave prestaccedilatildeo dos serviccedilos do Estado no Brasil Apesar de sua elevaccedilatildeo relativa no periacuteodo recente a Carga Tributaacuteria Liacutequida exclusi-ve juros (CTL-j) representou 1485 do PIB em 2008 (Ipea 2009)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

293

Eacute o que mostra a tabela 2 a seguir

Tabela 2 - CTB TAPS CTL Juros liacutequidos e CTL-j em 2006

Verifica-se que embora a CTB do Brasil seja superior a do Canadaacute devemos observar que este

paiacutes deteacutem 225 (correspondente agrave sua CTL-j) do PIB para investimentos em serviccedilos e obras puacute-

blicas valor muito superior aos 131 do Brasil Entre os paiacuteses da OCDE somente a Greacutecia possuiacutea

em 2006 CTL-j inferior a do Brasil mas praticamente na mesma magnitude A Polocircnia com CTB bem

proacutexima a do Brasil detinha uma CTL-j de 177 cerca de 45 pp acima da brasileira

Portanto natildeo eacute intelectualmente honesto utilizar a CTB como elemento de comparaccedilatildeo entre

paiacuteses dos serviccedilos puacuteblicos prestados aos seus cidadatildeos sendo mais adequado para tal a utilizaccedilatildeo

da CTL-j

E quanto agrave tese de que o sistema tributaacuterio deve buscar a eficiecircncia em detrimento da equidade

deixando para o lado dos gastos o papel de buscar a justiccedila fiscal Seraacute que ela se sustenta no Brasil

Ou seja seraacute que a regressividade do nosso sistema tributaacuterio tem sido compensada pela progressivi-

dade do lado do gasto puacuteblico

As evidecircncias mostram que natildeo

Silveira (2008) demonstrou em seu estudo que

a) natildeo houve alteraccedilatildeo significativa na concentraccedilatildeo da renda pessoal resultado do conjunto de poliacuteticas consideradas ndash aposentadorias e pensotildees programas de trans-ferecircncia de renda auxiacutelios seguro-desemprego bolsa de estudo impostos sobre a renda contribuiccedilotildees previdenciaacuterias impostos sobre imoacuteveis e veiacuteculos e impostos ou contribuiccedilotildees sobre o consumob) baixo impacto distributivo dos benefiacutecios previdenciaacuterios e assistenciais do segu-ro-desemprego e das outras transferecircncias monetaacuterias comparativamente ao que se observa nos paiacuteses desenvolvidos

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

294

Ou seja a opccedilatildeo que o Brasil teria adotado nas deacutecadas de 1990 e 2000 ndash tributaccedilatildeo regressiva

concentrada sobre o consumo (com pretensa maior eficiecircncia) combinada com gastos progressivos

ndash natildeo se efetivou no que se refere agrave poliacutetica de gastos Isso nos deixou no pior dos mundos um qua-

dro onde tanto a tributaccedilatildeo quanto os gastos sociais aumentaram as desigualdades de renda ou no

miacutenimo natildeo permitiram que a reduccedilatildeo observada nos uacuteltimos anos6 fosse mais acentuada

Outra evidecircncia de que esperar a promoccedilatildeo da justiccedila fiscal somente pelo lado dos gastos puacute-

blicos natildeo se mostra suficiente foi apresentada num estudo do Ipea de julho de 2009 divulgado por

meio do ldquoComunicado nordm 22 da Presidecircncia do Ipea (2009)rdquo Aquele renomado Instituto analisou deta-

lhadamente o destino da carga tributaacuteria discriminando quanto se destina de recursos puacuteblicos para

os principais programas e accedilotildees do governo federal tanto em termos de volume de recursos quanto

de nuacutemero de beneficiaacuterios

O estudo comparou o que foi recolhido aos cofres puacuteblicos e o que foi destinado aos progra-

mas de governo nas aacutereas de sauacutede educaccedilatildeo previdecircncia e assistecircncia social dentre outras incluin-

do o montante destinado ao pagamento dos juros da diacutevida puacuteblica

Segundo o Ipea (2009) o montante destinado ao pagamento de juros da diacutevida puacuteblica

recebeu em 2008 somente do governo federal 38 do PIB enquanto o Programa Bolsa Famiacutelia

que complementa a renda de 12 milhotildees de famiacutelias custou ao governo federal 04 do PIB dez

vezes menos

O financiamento do Programa Bolsa Famiacutelia exige arrecadar o equivalente a um dia e meio de

trabalho do contribuinte Mas para financiar a diacutevida puacuteblica a Uniatildeo os Estados o Distrito Federal

e os municiacutepios destinaram em conjunto 56 do PIB (valores de 2008) ou seja 20 dias e meio de

trabalho do cidadatildeo brasileiro quase um sexto de toda a carga tributaacuteria arrecadada em 2008

Para as mais importantes aacutereas de atuaccedilatildeo do governo sauacutede e educaccedilatildeo foram destinados

36 do PIB ou 13 dias de trabalho do contribuinte e 43 do PIB ou 157 dias de trabalho respecti-

vamente Tais dados datildeo uma ideia das prioridades nacionais

Natildeo eacute difiacutecil pois imaginar a razatildeo pela qual natildeo houve uma gritaria do andar de cima pelo au-

mento dos impostos e dos juros no Brasil nas deacutecadas de 1990 Ambos beneficiaram exclusivamente

os detentores da renda e riqueza nacionais que ganharam ldquocomo nunca antes na histoacuteria desse paiacutesrdquo

tanto pelo lado da remuneraccedilatildeo dos tiacutetulos da diacutevida puacuteblica como pelo que deixaram de pagar em

impostos e a receber de incentivos (GONDIM SIQUEIRA 2012)

Mas como podemos mudar esse quadro Eacute o que pretendemos explorar na proacutexima seccedilatildeo

6 Conforme demonstrado em Barros et al (2007)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

295

2 TRIBUTACcedilAtildeO E JUSTICcedilA FISCAL NO BRASIL PERSPECTIVAS

Conforme relatou Mahon Jr (2012) haacute basicamente trecircs alternativas para as eventuais refor-

mas tributaacuterias na Ameacuterica Latina ampliar e aprofundar as reformas do pacote neoliberal ndash o que tem

sido proposto mas se tornou praticamente indefensaacutevel apoacutes a crise de 2008 promover ajustes no

modelo neoliberal mas sem efetivamente promover uma tributaccedilatildeo redistributiva ndash como tem sido

tentado nas uacuteltimas duas deacutecadas sem sucesso ou definitivamente engajarmo-nos nos movimentos

em direccedilatildeo agrave maior progressividade do sistema tributaacuterio como condiccedilatildeo primeira agrave efetiva reduccedilatildeo

das desigualdades ndash o que natildeo foi tentado ateacute entatildeo

Conforme ressaltaram Gondim e Siqueira (2012)

[] depois da crise mundial - iniciada em setembro de 2008 e acentuada em 2009 - cujo efeito propaga-se continuadamente poucos economistas exatamente aque-les que comandam os grandes fundos de investimento como a Goldman Sachs por exemplo apostariam na ampliaccedilatildeo das reformas do pacote liberal agraves quais denomi-nam de ldquoreformas de segunda geraccedilatildeordquo O que temos visto nos debates recentes in-cluindo o eleitoral tem sido uma tentativa mal disfarccedilada de promover meros ajustes no modelo neoliberal sem redistribuiccedilatildeo efetiva do ocircnus tributaacuterio Em outras pala-vras um pouco mais do mesmo

A tocircnica das principais propostas de reforma tributaacuteria no Brasil tem sido a mesma simplifica-

ccedilatildeo pura e simples desoneraccedilotildees da renda do capital e da folha de pagamentos sem qualquer avalia-

ccedilatildeo criacutetica dos efeitos sobre o financiamento da Previdecircncia Social e sobre a regressividade do sistema

entre outras (GONDIM SIQUEIRA 2012)

Mahon Jr (2012) destaca que ningueacutem ousou ateacute o presente momento incluir no debate das

reformas tributaacuterias na Ameacuterica Latina a necessidade de novos movimentos em direccedilatildeo agrave maior pro-

gressividade do sistema No caso do Brasil isso implicaria repensar por exemplo o princiacutepio da sele-

tividade na tributaccedilatildeo sobre o consumo de artigos de luxo (como fez o Equador com a criaccedilatildeo do Im-puesto a los Consumos Especiales em 2008) ampliar os impostos sobre a propriedade especialmente

sobre a terra nua com a sua utilizaccedilatildeo como instrumento tanto de reforma agraacuteria quanto de controle

ambiental instituir o imposto sobre as grandes fortunas e avanccedilar rumo a maior progressividade na

tributaccedilatildeo sobre a renda de modo a alcanccedilar efetivamente a renda do capital

Eacute fundamental ter um norte E este deve ser no sentido de resgatar o sistema tributaacuterio como

instrumento de redistribuiccedilatildeo de renda E eacute importante reconhecer tambeacutem que nas proacuteximas refor-

mas ainda natildeo seraacute possiacutevel abrir matildeo de receitas (natildeo haacute espaccedilo para a ldquopretendidardquo reduccedilatildeo da Car-

ga Tributaacuteria Bruta) seja porque o endividamento estatal continua elevado o que causa uma enorme

pressatildeo sobre o Tesouro seja porque haacute muito ainda que se investir em poliacuteticas sociais principalmen-

te nas aacutereas vitais da sauacutede e educaccedilatildeo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

296

E quanto agraves desigualdades regionais Como uma reforma no sistema tributaacuterio nacional pode-

ria contribuir para a reduccedilatildeo da vergonhosa disparidade de renda

Como eacute de amplo conhecimento a economia brasileira eacute bastante concentrada em duas regi-

otildees geograacuteficas o Sudeste e o Sul do paiacutes que possuiacuteam PIB per capita em 2010 de R$ 1160000 e

R$ 1014000 (a preccedilos constantes de 2000) respectivamente O PIB dessas regiotildees representava na-

quele ano 72 do PIB brasileiro para 55 da populaccedilatildeo do paiacutes No extremo inferior as regiotildees Norte

e Nordeste apresentavam PIB per capita de R$ 567000 e R$ 402700 (a preccedilos constantes de 2000)

respectivamente com participaccedilatildeo conjunta no PIB brasileiro de apenas 19 embora possuam 38

da populaccedilatildeo do paiacutes7

Conforme ressaltaram Paes e Siqueira (2005) a existecircncia de grandes desigualdades regionais

exerce influecircncia negativa sobre os padrotildees de desenvolvimento de um paiacutes e sobre o bem-estar da

sua populaccedilatildeo podendo levar agrave ruptura do pacto federativo E a crenccedila no mercado como elemento

suficiente para induzir um processo de convergecircncia da renda nacional todavia natildeo parece se susten-

tar ateacute porque o desenvolvimento econocircmico tem se mostrado cada vez mais dependente da inserccedilatildeo

competitiva dos paiacuteses e regiotildees no mercado mundial e a abertura necessaacuteria para essa inserccedilatildeo tende

a agravar as desigualdades presentes no interior das sociedades nacionais

Assim a superaccedilatildeo das assimetrias sociais e regionais passa necessariamente pela mediaccedilatildeo

do Estado que continua exercendo um papel importante como indutor do desenvolvimento econocircmi-

co E para mitigar essas disparidades regionais o governo brasileiro adotou programas de desenvol-

vimento baseados em instrumentos creditiacutecios e tributaacuterios como os fundos fiscais de investimentos

regionais e as transferecircncias constitucionais da Uniatildeo para os Estados e Municiacutepios que compotildeem o

Fundo de Participaccedilatildeo dos Estados (FPE) e o Fundo de Participaccedilatildeo dos Municiacutepios (FPM)

Apesar de o FPE e FPM trazerem uma razoaacutevel melhoria na distribuiccedilatildeo de recursos entre os

estados brasileiros ainda permanece inaceitaacutevel que cidadatildeos de locais menos favorecidos tenham agrave

sua disposiccedilatildeo menos da metade dos recursos disponiacuteveis para regiotildees mais desenvolvidas8

Logo uma poliacutetica fiscal que busque combater as desigualdades regionais deve privilegiar a

transferecircncia de recursos para os estados mais pobres com o objetivo principal de promover o desen-

volvimento da infraestrutura e do capital humano desses estados

Tal poliacutetica pode ser desenhada a partir de um modelo de tributaccedilatildeo que promova maior equi-

dade na distribuiccedilatildeo das receitas tributaacuterias entre os estados fator essencial para um maior equiliacutebrio

socioeconocircmico da federaccedilatildeo

Uma alternativa poliacutetica e economicamente viaacutevel seria a adoccedilatildeo do princiacutepio do destino nas

transaccedilotildees interestaduais como se pretendeu por exemplo na PEC 2332008 devendo-se promover

7 Fonte Ipeadata Dados Regionais PIB Per Capita (R$ de 2000)8 Veja em PAES SIQUEIRA(2005)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

297

a alteraccedilatildeo concomitantemente do mecanismo de incentivos regionais ateacute o momento utilizado ex-

tinguindo-se alguns deles e ao inveacutes de reduzir a tributaccedilatildeo ou fornecer creacutedito subsidiado para as

empresas privadas destinar os recursos aos estados com arrecadaccedilatildeo per capita mais baixa

Em estudo recente Paes e Siqueira (2005) demonstraram as vantagens da adoccedilatildeo do princiacutepio

do destino na cobranccedila do ICMS Foram consideradas duas possibilidades uma englobando todos os

Estados e outra excetuando o Amazonas por conta da especificidade envolvendo a Zona Franca de

Manaus Aleacutem disso os estados ganhadores puderam aumentar as suas despesas com o ganho de

arrecadaccedilatildeo ou repassaacute-lo para as famiacutelias via transferecircncias de rendas

Os resultados mostraram que somente seis Estados perderiam com a implantaccedilatildeo dessa nova

sistemaacutetica Goiaacutes Santa Catarina Mato Grosso do Sul Satildeo Paulo Espiacuterito Santo e Amazonas Entre os

maiores ganhadores estariam o Maranhatildeo Distrito Federal Roraima Acre Alagoas e Piauiacute Em termos

macroeconocircmicos haveria um pequeno aumento no consumo e uma reduccedilatildeo progressiva do produto

e do estoque de capital mas nada significativo Do ponto de vista da equidade se os ganhos forem

transferidos agraves famiacutelias haveria uma significativa reduccedilatildeo da pobreza notadamente nos Estados mais

pobres mas com pouca variaccedilatildeo na desigualdade regional com um pequeno ganho para os Estados

do Nordeste

E todos os estados teriam um patamar miacutenimo de arrecadaccedilatildeo equivalente a 80 da arreca-

daccedilatildeo per capita estadual meacutedia brasileira um resultado bastante significativo e com efeitos diretos e

indiretos sobre a pobreza e a desigualdade no Brasil

Embora ciente da dificuldade poliacutetica de se conduzir uma reforma que promova perdas no cur-

to prazo para alguns entes federativos acredito que o quadro atual de desigualdade regional pratica-

mente estagnado haacute deacutecadas deve servir de fonte de pressatildeo da sociedade para que tais modificaccedilotildees

sejam finalmente promovidas E a Uniatildeo teria o papel de equalizar essas perdas no curto prazo por

meio de fundos de compensaccedilatildeo

Em suma o Brasil deve decidir o que pretende do seu sistema tributaacuterio estabelecendo obje-

tivos especiacuteficos que certamente estaratildeo em conflito uns com os outros Natildeo satildeo conflitos insuperaacute-

veis mas que devem ser debatidos e equacionados com um maior teor de equidade vertical e respeito

aos comandos tributaacuterios constitucionais

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

O Brasil vive um momento iacutempar e uma oportunidade uacutenica A transformaccedilatildeo econocircmica

que estamos vivenciando neste novo milecircnio deve continuar o seu curso mas ameaccedila deixar o pa-

pel do Sistema Tributaacuterio sobre a reduccedilatildeo da pobreza e das desigualdades sociais e regionais em

segundo plano As decisotildees relativas agrave tributaccedilatildeo e agraves poliacuteticas de desenvolvimento econocircmico

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

298

precisam ser colocadas no centro do debate se quisermos influenciar positivamente a qualidade

de vida das proacuteximas geraccedilotildees

O Brasil deve decidir o que quer do seu sistema tributaacuterio estabelecendo objetivos especiacuteficos

que certamente estaratildeo em conflito uns com os outros Estes conflitos e dilemas devem ser abordados

debatidos e equilibrados Quanta equidade eacute possiacutevel obter a partir do seu sistema tributaacuterio sabendo

que impostos distorcem a atividade econocircmica Quatildeo rapidamente as receitas tributaacuterias devem cres-

cer durante periacuteodos prolongados de expansatildeo econocircmica e quatildeo estaacutevel devem ser a arrecadaccedilatildeo

em diversas fases do ciclo econocircmico Quatildeo alta pode ser a tributaccedilatildeo sem criar excessivas distorccedilotildees

econocircmicas Como programas de incentivos devem ser estruturados de forma a minimizar as perdas

de arrecadaccedilatildeo e ao mesmo tempo maximizar o desenvolvimento econocircmico Que poliacuteticas podem

ser projetadas para promover o investimento em capital humano e satisfazer as necessidades dos tra-

balhadores brasileiros

Natildeo eacute faacutecil responder a nenhuma dessas perguntas Mas precisamos fazer as escolhas agora

Estas e outras questotildees devem ser resolvidas por meio de uma discussatildeo ampla e democraacutetica cons-

truiacuteda sobre uma base soacutelida de conhecimento dados e informaccedilotildees o que remete aos Programas de

Educaccedilatildeo Fiscal uma imensa responsabilidade

Sabemos natildeo serem insoluacuteveis as muitas questotildees a serem tratadas nem de difiacutecil equacio-

namento a resposta agrave maior parte delas O que precisamos ter em mente eacute que devemos fazer uma

escolha com a clara avaliaccedilatildeo do seu impacto futuro

Natildeo se deve ignorar que um sistema tributaacuterio regressivo e uma baixa equidade vertical no sis-

tema fiscal como um todo eacute deleteacuteria para a sustentabilidade do modelo econocircmico-social brasileiro

com consequecircncias graves para a coesatildeo social e o pacto federativo

O essencial das reformas tributaacuterias vindouras eacute produzir um sistema tributaacuterio voltado para o

desenvolvimento mas com horizonte para aleacutem da mera busca do crescimento econocircmico constituin-

do-se preferencialmente em instrumento imprescindiacutevel ao combate agrave pobreza e agraves desigualdades

sociais principalmente mediante o resgate do princiacutepio da progressividade e a substituiccedilatildeo parcial da

tributaccedilatildeo sobre o consumo pela tributaccedilatildeo sobre a renda

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

299

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15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

300

PARTE IV

CONTROLE SOCIAL E NOVAS MIacuteDIAS

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

301

CIDADANIA FISCAL E NOVAS MIacuteDIAS

SUMAacuteRIO Introduccedilatildeo 1 Os contornos da cidadania fiscal 2 O controle social dos gastos puacuteblicos e a educaccedilatildeo fiscal 3 O exerciacutecio da cidadania fiscal e a utilizaccedilatildeo das novas miacutedias Consideraccedilotildees finais Referecircncias

Debora Bezerra de Menezes Serpa Maia1 Ana Ceciacutelia Bezerra de Aguiar2

INTRODUCcedilAtildeO

A arrecadaccedilatildeo de recursos pelo Estado feita por meio da tributaccedilatildeo sempre se demonstrou

como uma invasatildeo ao patrimocircnio dos cidadatildeos contribuintes motivo pelo qual diversas vezes esta

atividade provocou resistecircncia e indignaccedilatildeo aleacutem de questionamentos acerca da sua necessidade

A noccedilatildeo de cidadania fiscal no entanto ainda eacute incipiente em paiacuteses como o Brasil em que a

maioria dos cidadatildeos por ausecircncia de conscientizaccedilatildeo poliacutetica e da necessidade de controle social dos

recursos arrecadados natildeo procedem agrave averiguaccedilatildeo de como ocorre a aplicaccedilatildeo das receitas prove-

nientes de tributos e a gerecircncia do orccedilamento puacuteblico de forma geral o que daacute margem para que os

recursos sejam mal aplicados ou ainda desviados da finalidade

Contudo as novas miacutedias decorrentes da revoluccedilatildeo da informaacutetica e o crescente acesso agrave in-

formaccedilatildeo acabaram por trazer a oportunidade de modificaccedilatildeo dessa situaccedilatildeo de resignaccedilatildeo por meio

de avanccedilos como por exemplo a possibilidade de criar mecanismos de controle da efetiva destinaccedilatildeo

dos tributos e dos gastos puacuteblicos A fiscalizaccedilatildeo se torna muito mais faacutecil se orccedilamentos e gastos

puacuteblicos satildeo disponibilizados por exemplo em siacutetios da Rede Mundial de Computadores

Eacute imprescindiacutevel que as poliacuteticas puacuteblicas sejam acompanhadas da criaccedilatildeo de normas que facili-

tem o controle social Afinal natildeo basta que os cidadatildeos estejam conscientes de seus direitos e deveres

eacute necessaacuterio ainda que o Estado possibilite o exerciacutecio da fiscalizaccedilatildeo

A metodologia implementada neste trabalho foi primordialmente a pesquisa bibliograacutefica

1 Mestranda pelo Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Direito da Universidade Federal do Cearaacute especialista em Direito e Processo Tributaacuterios pela Universidade de Fortaleza membro pesquisadora do Centro de Estudos de Direito Constitucional da Faculdade de Direito da UFC (Cedic) na linha de pesquisa Educaccedilatildeo e cidadania membro pesquisadora do Grupo de pesquisa Democracia e Financcedilas Puacuteblicas da Faculdade de Direito da UFC advogada E-mail deborabezerragmailcom2 Mestranda pelo Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Direito da Universidade Federal do Cearaacute especialista em Direito Pro-cessual Civil pelo Centro Universitaacuterio Christus bolsista da Coordenaccedilatildeo de Aperfeiccediloamento de Pessoal de Niacutevel Superior (Capes) membro pesquisadora do Centro de Estudos de Direito Constitucional da Faculdade de Direito da UFC (Cedic) na condiccedilatildeo de coordenadora da linha de pesquisa Educaccedilatildeo e cidadania membro pesquisadora do Grupo de pesquisa Democracia e Financcedilas Puacuteblicas da Faculdade de Direito da UFC professora da Universidade de Fortaleza do Curso de graduaccedilatildeo em Direito advogada E-mail ceciliabdeaguiargmailcom

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

302

tendo em vista o caraacuteter eminentemente teoacuterico consistindo principalmente na leitura e no exame

das obras referenciadas documentos tais como legislaccedilotildees nacionais em especial a Constituiccedilatildeo da

Repuacuteblica Federativa do Brasil de 1988 Quanto agrave natureza a pesquisa caracteriza-se como qualitativa

uma vez que se procedeu a uma anaacutelise dos aspectos essenciais da temaacutetica das novas miacutedias e da

cidadania fiscal explicando-as poreacutem sem quantificar valores Quanto aos fins eacute exploratoacuteria por se

dar em caraacuteter preliminar com o escopo de tornar o tema mais familiar a partir da construccedilatildeo de hi-

poacuteteses Jaacute quanto agrave utilizaccedilatildeo dos resultados pura por se caracterizar pela finalidade de estudo sem

concreta mudanccedila na realidade

1 OS CONTORNOS DA CIDADANIA FISCAL

A cidadania desenvolveu-se dentro do fenocircmeno do Estado-naccedilatildeo que data da Revoluccedilatildeo

Francesa de 1789 Logo a construccedilatildeo da cidadania liga-se agrave relaccedilatildeo das pessoas com o Estado e com

a naccedilatildeo (CARVALHO 2005 p 12)

Para Marshall (2002 p 24) ldquocidadania eacute um status concedido agravequeles que satildeo membros inte-

grais de uma comunidade Todos aqueles que possuem o status satildeo iguais com respeito aos direitos e

obrigaccedilotildees pertinentes ao statusrdquo

Considerando a cidadania como uma construccedilatildeo histoacuterica posiccedilatildeo que tambeacutem se adota no

presente trabalho Marshall (2002 p 9) divide seu conceito em trecircs partes civil poliacutetica e social

A primeira relaciona-se com a aquisiccedilatildeo dos direitos de liberdade (de expressatildeo de locomoccedilatildeo

de pensamento etc) O elemento poliacutetico constitui-se na oportunidade de atuar interferindo no

exerciacutecio do poder Por fim a cidadania incorpora o elemento social que ldquo[] se refere a tudo que

vai desde o direito a um miacutenimo de bem-estar econocircmico e seguranccedila ao direito de participar por

completo na heranccedila social e levar a vida de um ser civilizado de acordo com os padrotildees que pre-

valecem na sociedaderdquo

No entanto a partir da deacutecada de 90 do seacuteculo passado passou-se a revisar o conceito de cida-

dania pautado precipuamente na titularidade de direitos Nesse diapasatildeo Lopes chama atenccedilatildeo para

a importacircncia de destacar no conceito de cidadania a noccedilatildeo de dever Segundo a autora ldquoa cidadania

deve ser concebida como um direito sendo que simultaneamente e paralelamente a noccedilatildeo de dever

deve ser inserida no seu conteuacutedo jaacute que natildeo existem direitos sem seus deveres correlatosrdquo (LOPES

2006 p 25)

Sobre o tema traz-se a liccedilatildeo de Nabais (2007 p 149-150) segundo o qual a cidadania passa

atualmente por um terceiro estaacutegio que ele denomina ldquocidadania solidaacuteriardquo ou ldquoresponsavelmente

solidaacuteriardquo Essa nova fase eacute inaugurada apoacutes a superaccedilatildeo das duas anteriores a cidadania do Estado

Liberal em que se buscava a defesa dos direitos individuais e a cidadania do Estado Democraacutetico

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

303

quando se procurou assegurar a participaccedilatildeo na vida poliacutetica do Estado Nessa nova etapa o cidadatildeo

desempenha um papel ativo assumindo responsabilidades que outrora ficavam a cargo exclusiva-

mente do Estado (2007 p 150)

A assunccedilatildeo dessa postura relaciona-se agrave solidariedade3 entre os membros da sociedade fruto

de um sentimento de pertenccedila que orienta suas accedilotildees na busca pelo bem-estar comum Ou seja haacute

a conscientizaccedilatildeo de que a comunidade consiste num todo formado por indiviacuteduos cujas consequecircn-

cias das accedilotildees (sejam positivas ou negativas) ultrapassam a esfera particular e interferem na configu-

raccedilatildeo desse todo4-5

Nesse tocante Torres insere na perspectiva atual do conceito em comento como um possiacutevel

desdobramento seu a cidadania fiscal6 Para o autor essa vertente da cidadania engloba natildeo somente

o estatuto do contribuinte mas tambeacutem

os aspectos mais largos da cidadania financeira que compreendendo a vertente da despesa puacuteblica envolve as prestaccedilotildees positivas de proteccedilatildeo aos direitos fundamen-tais e aos direitos sociais e as escolhas orccedilamentaacuterias questotildees que apresentam o maior deacuteficit de reflexatildeo teoacuterica no campo da cidadania (TORRES 1999 p 460)

Dessarte a ideia de cidadania fiscal deve englobar duas vertentes quais sejam tanto o co-

nhecimento acerca da funccedilatildeo da tributaccedilatildeo quanto a informaccedilatildeo sobre a importacircncia do controle da

aplicaccedilatildeo dos recursos puacuteblicos Eacute o magisteacuterio de Cruz e Amorim (2010 p 17)

O exerciacutecio da cidadania ativa percorre todos os momentos de funcionamento da vida puacuteblica O cidadatildeo deve pagar seus impostos consciente de que estaacute contribuindo para o bem da coletividade mas seu dever natildeo termina aiacute O cidadatildeo consciente participa de forma ativa das decisotildees de natureza puacuteblica e deve lutar para que se amplie seu poder de participaccedilatildeo e de decisatildeo soacute assim teremos uma democracia substantiva

3 Segundo Nabais a solidariedade [] enquanto fenoacutemeno estaacutevel ou duradouro e mais geral se refira agrave relaccedilatildeo ou o sentimento de pertenccedila a um grupo ou formaccedilatildeo social entre os muito grupos ou formaccedilotildees sociais em que o homem manifesta e realiza actualmente a sua affectio societatis dentro dos quais sobressai naturalmente a comunidade paradigma dos tempo modernos - o estado Do que resulta que a solidariedade pode ser entendida quer em seu aspecto objectivo em que se alude agrave relaccedilatildeo de pertenccedila e por conseguinte de partilha e de corresponsabilidade que liga cada um dos indiviacuteduos agrave sorte e vicissitudes dos demais membros da comunidade quer em sentido subjetivo e de eacutetica social dessa mesma pertenccedila agrave comunidade (2007 p 134)4 Nesse vieacutes Eduardo Marccedilal Grilo Presidente do Foacuterum Educaccedilatildeo para a Cidadania ocorrido em Portugal entre 2006 e 2008 assim prefaciou o relatoacuterio do evento ldquoMas a Cidadania natildeo eacute apenas o conjunto de direitos e deveres que os cidadatildeos devem exercer e cumprir O exerciacutecio da Cidadania eacute sobretudo um comportamento uma atitude e uma certa forma de ser de estar e de fazer em que cada um encara os problemas da sociedade em que se insere com a mesma prio-ridade com que aborda as suas questotildees individuais atendendo aos direitos dos outros e em particular no respeito pela diversidade e pelas diferenccedilas que caracterizam as sociedades em que vivemos nesta primeira deacutecada do seacuteculo XXI []rdquo (PORTUGAL 2008 on line) 5 No mesmo sentido ldquo[] na democracia o indiviacuteduo eacute cidadatildeo pessoa juriacutedica e responsaacutevel por um lado exprime sues desejos e interesses por outro eacute responsaacutevel e solidaacuterio com sua cidaderdquo (MORIN 2000 p 105) 6 ldquoO deverdireito de pagar impostos se coloca no veacutertice da multiplicidade de enfoques que a ideia de cidadania exibe Cidadatildeo e contribuinte satildeo conceitos coexistentes desde o inicio do liberalismordquo (TORRES 1999 p 460)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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Tem-se pois que a funccedilatildeo preciacutepua dos tributos eacute a sua aplicaccedilatildeo no financiamento das despe-

sas puacuteblicas Faz-se necessaacuteria a abordagem no entanto do fundamento da exaccedilatildeo tributaacuteria Afinal

o binocircmio ldquodespesas-receitasrdquo estaacute intimamente relacionado agrave ideia da figura estatal como propor-

cionadora do bem comum Nos ensinamentos de Torres (2006 p 3) ldquoOs fins e os objetivos poliacuteticos e

econocircmicos do Estado soacute podem ser financiados pelos ingressos na receita puacuteblica A arrecadaccedilatildeo dos

tributos [] constituem o principal item da receitardquo

O conceito de cidadania fiscal no entanto deve ser visto em uma dupla vertente uma vez que

esta soacute se concretizaraacute quando aleacutem de entenderem os contribuintes a importacircncia da atividade de

tributar como forma de arrecadar recursos para a manutenccedilatildeo da maacutequina estatal e para o fomento

dos direitos fundamentais exercitarem os cidadatildeos o controle social

2 O CONTROLE SOCIAL DOS GASTOS PUacuteBLICOS E A EDUCACcedilAtildeO FISCAL

Inerente agrave qualquer atividade administrativa o exerciacutecio do controle estaacute presente tambeacutem na

Administraccedilatildeo Puacuteblica Busca-se por meio da atividade de controle entendido como o conjunto de

mecanismos de fiscalizaccedilatildeo e de revisatildeo dos atos de natureza administrativa garantir que esses (os

atos administrativos) proporcionaratildeo o alcance dos objetivos coletivos sem desrespeitar os direitos

subjetivos dos indiviacuteduos (CARVALHO FILHO 2009 p 893-894)

Especificamente no que pertine agrave atividade financeira do Estado a Constituiccedilatildeo Federal de

1988 em seu art 70 disciplina a possibilidade de realizaccedilatildeo de controle externo e interno Dessa

forma o art 71 deixa a cargo do Congresso Nacional (na esfera federal) auxiliado pelo Tribunal de

Contas da Uniatildeo o controle externo dessa atividade consistente por exemplo em apreciar as contas

do Executivo os atos de admissatildeo de pessoal e de concessatildeo de aposentadoria reformas e pensatildeo e

na realizaccedilatildeo de auditorias nas unidades administrativas dos trecircs Poderes

O controle interno por seu turno disciplinado no art 74 da CF88 eacute realizado por cada Poder

oacutergatildeo sobre seus proacuteprios atos por meio da manutenccedilatildeo de sistemas de controle para dentre outras

funccedilotildees avaliar o cumprimento das metas previstas no plano plurianual exercer controle das opera-

ccedilotildees de creacutedito avais e garantias comprovar a legalidade e avaliar os resultados da gestatildeo orccedilamen-

taacuteria financeira e patrimonial dos oacutergatildeos e entidades da Administraccedilatildeo

Paralelamente a esse controle institucional ou estatal existe o controle social consistente na-

quele realizado por segmentos oriundos da sociedade Trata-se portanto de um controle exoacutegeno do

Poder Puacuteblico (CARVALHO FILHO 2009 p 902)

Garcia define controle social como ldquo[] uma particularizaccedilatildeo da funccedilatildeo de controle que tem

sido entendida como a atuaccedilatildeo de grupos sociais no controle da execuccedilatildeo das accedilotildees governamentais

e da administraccedilatildeo dos gestores puacuteblicosrdquo (2003 p 139)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

305

Destarte o sect 2ordm do art74 da CF88 determina que ldquoqualquer cidadatildeo partido poliacutetico asso-

ciaccedilatildeo ou sindicato eacute parte legiacutetima para na forma da lei denunciar irregularidades ou ilegalidades

perante o Tribunal de Contas da Uniatildeordquo7

A mencionada disposiccedilatildeo guarda perfeita sintonia com a ordem inaugurada pela Constituiccedilatildeo

Federal de 1988 que recebeu no discurso proferido na cerimocircnia de sua promulgaccedilatildeo pelo entatildeo

deputado Ulysses Guimaratildees a alcunha de ldquoCarta Cidadatilderdquo8

Nesse contexto de redemocratizaccedilatildeo em que o Brasil eacute constituiacutedo como Estado Democraacutetico

de Direito tendo a cidadania como um de seus fundamentos torna-se imprescindiacutevel a forte partici-

paccedilatildeo popular consequecircncia da atuaccedilatildeo dos cidadatildeos verdadeiros titulares do poder poliacutetico legiti-

mando seu exerciacutecio

Refletindo sobre a relaccedilatildeo em comento que congrega controle social democracia e soberania

popular Silva (2012 p 49-51) explica que

[] o controle integra a essecircncia do regime democraacutetico visto que este tem como pressuposto inafastaacutevel o sistema dos freios e contrapesos E mais corolaacuterio da so-berania popular ou seja do reconhecimento da titularidade do poder reservada ao povo evidente se torna a legitimidade dos cidadatildeos para controle do exerciacutecio do poder instituiacutedo Afinal a administraccedilatildeo puacuteblica incumbida de gerir a ldquocoisa puacuteblicardquo acha-se obrigada a uacutenica e exclusivamente direcionar as suas accedilotildees para a ultimaccedilatildeo do interesse coletivo fim uacuteltimo que deve perseguir []Trata-se de fato do reconhe-cimento de que a esfera puacuteblica natildeo diz respeito apenas ao Estado mas sim a todos que dele fazem parte

No entanto esse protagonismo do cidadatildeo necessaacuterio ao Estado Democraacutetico encontra seu

exerciacutecio prejudicado porque o Brasil enfrenta as adversidades decorrentes do processo de desenvol-

vimento da maacutequina gigantesca que engloba ciecircncia teacutecnica e burocracia Segundo Morin (2010 p

108-110) esse avanccedilo tornou a despeito das vantagens da divisatildeo do trabalho o saber hiperespe-

7 Sobre a citada disposiccedilatildeo constitucional Oliveira assevera que ldquoEvidente que este dispositivo conteacutem ao lado da legiti-midade ativa para denuacutencia de ilegalidades um apelo ao exerciacutecio da cidadania Eacute claro que qualquer um mesmo antes da existecircncia do dispositivo poderia denunciar irregularidades perante os oacutergatildeos puacuteblicos Todavia conveacutem que haja expressa previsatildeo para evitar que algum servidor burocrata deixe de tomar qualquer providecircncia sob a leviana ilegalidade ou ma-nifesta irregularidaderdquo (2011 p 458)8 ldquoA Constituiccedilatildeo mudou na sua elaboraccedilatildeo mudou na definiccedilatildeo dos poderes mudou restaurando a Federaccedilatildeo mudou quando quer mudar o homem em cidadatildeo e soacute eacute cidadatildeo quem ganha justo e suficiente salaacuterio lecirc e escreve mora tem hospital e remeacutedio lazer quando descansardquo (Discurso de Ulysses Guimaratildees na cerimocircnia de promulgaccedilatildeo da Constituiccedilatildeo Federal de 1988 em 05 out 1988 Disponiacutevel em lt httpwww2camaralegbratividade-legislativaplenariodiscursoses-crevendohistoriadestaque-de-materiasconstituinte-1987-1988pdfUlysses20Guimaraes20-20DISCURSO2020REVISADOpdfgt Acesso em 12 set 2012) No mesmo sentido transcreve-se o prefaacutecio de Ulysses Guimaratildees na ediccedilatildeo da Constituiccedilatildeo de 1988 lanccedilada pelo Senado Federal e posteriormente retirada de circulaccedilatildeo O homem eacute o problema da sociedade brasileira sem salaacuterio analfabeto sem sauacutede sem casa portanto sem cidadania A Constituiccedilatildeo luta contra os bolsotildees de miseacuteria que envergonham o Paiacutes Diferentemente das sete Constituiccedilotildees anteriores comeccedila com o homem Geograficamente testemunha a primazia do homem que foi escrita para o homem que o homem eacute seu fim e sua esperanccedila eacute a Constituiccedilatildeo cidadatilde Cidadatildeo eacute o que ganha come mora sabe pode se curar (BONAVIDES ANDRADE 2004 p 501)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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cializado e fragmentado dificultando seu acesso pelos cidadatildeos que perdem o direito ao conheci-

mento Instaura-se assim uma divisatildeo na sociedade entre os ldquoexpertosrdquo detentores do conhecimento

necessaacuterio agrave conduccedilatildeo das questotildees poliacuteticas e os cidadatildeos inaptos para posicionar-se em relaccedilatildeo a

situaccedilotildees que ignoram

Como consequecircncia tecircm-se o enfraquecimento do civismo e o exacerbamento do individualis-

mo o que mina a vida democraacutetica apesar de suas instituiccedilotildees continuarem existindo 9-10

Essa conjuntura pode ser configurada com a descriccedilatildeo de sociedade alienada feita por Freire

(1987 p 35) Segundo o autor seus membros natildeo possuem consciecircncia da existecircncia da sociedade

natildeo tendo portanto como se comprometer com a realidade responsabilizando-se apenas por si

Percebe-se dessa forma que para que se tenha de fato o exerciacutecio de um controle social

dos gastos puacuteblicos efetivo e consequentemente a ampliaccedilatildeo do regime democraacutetico no Brasil

eacute necessaacuterio mais que a previsatildeo normativa de direitos e de mecanismos de participaccedilatildeo popular

Imprescindiacutevel eacute a absorccedilatildeo pelos membros da sociedade da noccedilatildeo de solidariedade de compro-

metimento com a coletividade

Nesse sentido a soluccedilatildeo aponta impreterivelmente para a educaccedilatildeo como instrumento apto

a capacitar o cidadatildeo para o exerciacutecio de sua funccedilatildeo11 Como a educaccedilatildeo cidadatilde pode ser tatildeo

abrangente quanto o proacuteprio conceito de cidadania abordando os mais variados temas como

noccedilotildees de sauacutede de higiene de boas maneiras e de preservaccedilatildeo ambiental reserva-se um ramo

especiacutefico para a construccedilatildeo do conhecimento necessaacuterio ao exerciacutecio do controle social dos gas-

tos puacuteblicos a educaccedilatildeo fiscal

A educaccedilatildeo fiscal de acordo com o material utilizado no Brasil no Curso de formaccedilatildeo de disse-

minadores promovido pelo Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal pode ser assim definida

[] como uma abordagem didaacutetico-pedagoacutegica capaz de interpretar as vertentes fi-nanceiras da arrecadaccedilatildeo e dos gastos puacuteblicos estimulando o cidadatildeo a compreen-der o seu dever de contribuir solidariamente em benefiacutecio do conjunto da sociedade e por outro lado estar consciente da importacircncia de sua participaccedilatildeo no acompanha-mento da aplicaccedilatildeo dos recursos arrecadados com justiccedila transparecircncia honestidade e eficiecircncia minimizando o conflito de relaccedilatildeo entre o cidadatildeo contribuinte e o Estado arrecadador (BRASIL 2009 p 27)

9 Nas palavras de Morin ldquoNessas condiccedilotildees a reduccedilatildeo do poliacutetico ao teacutecnico e ao econocircmico a reduccedilatildeo do econocircmico ao crescimento a perda dos referenciais e dos horizontes tudo isso conduz ao enfraquecimento do civismo agrave fuga e ao refuacutegio na vida privada a alternacircncia entre apatia e revolta violenta e assim a despeito da permanecircncia das instituiccedilotildees democraacuteticas a vida democraacutetica enfraquecerdquo (2010 p 110)10 Percebe-se a configuraccedilatildeo do quadro de pobreza poliacutetica descrito por Demo segundo o qual ldquoNatildeo eacute exagero afirmar que o traccedilo mais profundo da pobreza poliacutetica de um povo seja a falta de organizaccedilatildeo da sociedade civil sobretudo frente ao Estado e agraves oligarquias econocircmicas Uma sociedade desorganizada natildeo chega a constituir-se como povo consciente e capaz de conquistas espaccedilo proacuteprio de auto-sustentaccedilatildeo da histoacuteria ao contraacuterio caracteriza-se como massa de manobrardquo (DEMO 2001 p 24-25)11 Nesse sentido ldquoPoreacutem eacute importante lembrar que controle social natildeo eacute algo tatildeo faacutecil de se conseguir O processo demo-craacutetico depende de aprendizado O simples estabelecimento de dispositivos legais e estruturais pode resultar num amon-toado de regras e mecanismos inuacuteteis pois natildeo correspondem agraves habilidade de cidadania desenvolvidas na sociedade civil

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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A importacircncia desse vieacutes da educaccedilatildeo cidadatilde eacute inegaacutevel Sabe-se que os termos envolvidos na

seara fiscal satildeo bastante teacutecnicos o que ocasiona a incompreensatildeo por parte da sociedade como um

todo Esse fator eacute responsaacutevel pelo desinteresse por assuntos relacionados agrave temaacutetica A educaccedilatildeo

fiscal visa entatildeo oferecer ao cidadatildeo o ferramental necessaacuterio para acessar esses conteuacutedos fazendo

com que assuntos outrora obscuros tornem-se familiares e faccedilam parte do dia a dia da comunidade

Ademais por meio dela torna-se possiacutevel a desconstruccedilatildeo da concepccedilatildeo marcante de antago-

nismo entre Estado e cidadatildeo existente no Brasil Pinsky retrata de forma bastante precisa o sentimen-

to que permeia essa relaccedilatildeo o qual ultrapassa o descomprometimento e alcanccedila a rivalidade

Por conta desse divoacutercio entre governo e sociedade ldquoelesrdquo natildeo nos respeitam e ldquonoacutesrdquo natildeo lhes damos legitimidade Noacutes natildeo nos sentimos responsaacuteveis pelos atos do go-verno portanto natildeo nos consideramos com obrigaccedilotildees diante das leis Burlar a lei sonegar impostos atravessar sinais vermelhos [] satildeo atos que creditamos frequen-temente a nossa esperteza e rebeldia nunca considerando-os lesivos agrave sociedade de cidadatildeos da qual noacutes fazemos parte ou deveriacuteamos fazer parte (1998 p 97)

Para substituir essa noccedilatildeo a educaccedilatildeo fiscal propotildee a conscientizaccedilatildeo de que natildeo existem o

Estado e os indiviacuteduos que se encontram subjulgados a ele O que haacute na realidade satildeo cidadatildeos que

se organizam em torno de uma ficccedilatildeo chamada Estado formada e coordenada por eles mesmos A

troca da relaccedilatildeo de competiccedilatildeo entre cidadatildeo e Estado pela de cooperaccedilatildeo ocasiona entatildeo a cons-

cientizaccedilatildeo da importacircncia de contribuir para o bem-estar da coletividade a partir do pagamento de

tributos e do acompanhamento da gestatildeo e da aplicaccedilatildeo dos recursos puacuteblicos garantindo que esses

seratildeo empregados devidamente nas aacutereas eleitas como aquelas que mais urgentemente necessitam

de investimento Como consequecircncia tem-se uma maior e mais democraacutetica fruiccedilatildeo de direitos em

especial dos classificados como sociais que de uma forma geral carecem de um maior investimento

estatal para se verem implementados

Ademais essa mudanccedila associa-se ainda ao sentimento de pertenccedila agrave comunidade e agrave solida-

riedade comentados anteriormente Pois o respeito pela coisa puacuteblica prescinde da noccedilatildeo de que na

sociedade em que se vive existem bens (materiais ou imateriais) que satildeo ao mesmo tempo proprie-

dade de todos E de forma concomitante convivem o direito de usufruiacute-los e o dever de preservaacute-los

lembrando que as consequecircncias das accedilotildees dirigidas a esse bens repercutiratildeo em todos

Aleacutem da educaccedilatildeo outro elemento primordial para a realizaccedilatildeo do controle social dos gastos

puacuteblicos eacute a disponibilizaccedilatildeo por parte do poder puacuteblico das informaccedilotildees necessaacuterias ao desempenho

brasileirardquo (SILVA 2002 p 39) No mesmo vieacutes ldquoNatildeo parece simples trabalhar nessas duas dimensotildees [na dimensatildeo da sociedade e na dimensatildeo da burocracia] para modificar valores seculares que caracterizam uma cultura arraigada que ain-da privilegia em muito o privado em detrimento do coletivo e que cristaliza a separaccedilatildeo Estado e sociedade dificultando o avanccedilo da evoluccedilatildeo do exerciacutecio da cidadania mas eacute possiacutevel confiar no processo se houver um investimento decisivo em educaccedilatildeo em informaccedilatildeo e principalmente na evoluccedilatildeo da consciecircncia democraacuteticardquo (GARCIA 2003 p 178)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

308

dessa atividade Em outras palavras ao realizar a gestatildeo financeira o Estado precisa agir com transpa-

recircncia que nada mais eacute do que uma expressatildeo do princiacutepio da publicidade (art 37 CF88) no acircmbito

das financcedilas puacuteblicas (RAMOS FILHO 2002 p 115) Trata-se de uma consequecircncia loacutegica do regime

republicano e do Estado Democraacutetico de Direito pois ldquose o povo eacute o titular do poder tem o direito

de conhecer tudo o que concerne agrave Administraccedilatildeo bem como controlar passo a passo o exerciacutecio do

poderrdquo (RAMOS FILHO 2002 p 115)rdquo12

As novas tecnologias e o acesso agrave informaccedilatildeo vecircm contribuindo ao facilitar a proliferaccedilatildeo de

dados e conhecimentos de forma essencial para a concretizaccedilatildeo de uma democracia mais participati-

va por meio da aproximaccedilatildeo entre a vontade popular e as decisotildees governamentais Dessa forma seraacute

possiacutevel alcanccedilar o efetivo exerciacutecio da cidadania em especial em sua vertente fiscal

Para tanto provavelmente o meio disponiacutevel na atualidade para a divulgaccedilatildeo e o acesso agraves

informaccedilotildees referentes agrave atividade financeira do Estado eacute a Rede Mundial de computadores Destarte

a seguir explorar-se-aacute a relaccedilatildeo entre cidadania fiscal e novas miacutedias

3 O EXERCIacuteCIO DA CIDADANIA FISCAL E A UTILIZACcedilAtildeO DAS NOVAS MIacuteDIAS

A ldquoRevoluccedilatildeo da Informaacuteticardquo caracterizada pela evoluccedilatildeo da Rede Mundial de computadores

dentre outros inuacutemeros avanccedilos vem proporcionando maior acesso agraves informaccedilotildees Greco (2000 p

16) ressaltou em sua obra a importacircncia da revoluccedilatildeo tecnoloacutegica para os novos rumos da sociedade

por se tratar natildeo somente de revoluccedilatildeo de natureza teacutecnica mas ldquorevoluccedilatildeo ligada ao proacuteprio padratildeo

da civilizaccedilatildeo ocidental que estaacute se alterando em sua concepccedilatildeo baacutesicardquo

Como jaacute mencionado o verdadeiro exerciacutecio da cidadania fiscal e o interesse por parte dos con-

tribuintes acerca dos gastos puacuteblicos apenas se concretiza com o acesso pela populaccedilatildeo a informaccedilotildees

sobre as formas de arrecadaccedilatildeo de receitas e sua destinaccedilatildeo o que permite inibir desvios dos recursos

arrecadados ensejando gestotildees mais responsaacuteveis As novas miacutedias vecircm assim colaborando para a

efetivaccedilatildeo de uma cidadania fiscal a partir do maior conhecimento dos cidadatildeos acerca do orccedilamento

puacuteblico bem como da sua destinaccedilatildeo

Cruz e Amorim (2010) destacam que na complexa sociedade atual as informaccedilotildees e os conheci-

mentos disseminados pelos meios de comunicaccedilatildeo tecircm cada vez maior importacircncia o que demonstra

o papel essencial que desenvolvem as novas tecnologias da informaccedilatildeo atualmente para o exerciacutecio

da cidadania fiscal

12 Sobre a relaccedilatildeo entre transparecircncia da atuaccedilatildeo do agente administrativo e a possibilidade de controle sobre seus atos ldquoJaacute natildeo mais se admite qualquer ato que possa burlar comandos normativos ou servir de impedimento a que qualquer pessoa tenha acesso agrave conduta do agente puacuteblico Este natildeo soacute tem que ser honesto mas tem o dever de mostrar-se como tal A publicidade assegura a possibilidade de controlerdquo (OLIVEIRA 2011 p 543)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

309

O mundo globalizado e digitalizado proporciona assim por meio da Internet e de outras novas

miacutedias que se efetivem meios de controle social antes inimaginaacuteveis como por exemplo os portais

de transparecircncia aleacutem de projetos de destaque nas redes sociais

Destacam-se projetos relacionados a tornar a tributaccedilatildeo indireta mais transparente cujo es-

copo eacute informar os cidadatildeos acerca da real incidecircncia de tributos sobre a circulaccedilatildeo de mercadorias

e as prestaccedilotildees de serviccedilos uma vez que o caraacuteter velado da tributaccedilatildeo sobre o consumo acaba por

provocar uma anestesia fiscal por natildeo sentir a populaccedilatildeo essa incidecircncia de impostos e contribuiccedilotildees

Esses projetos satildeo de suma importacircncia para a efetivaccedilatildeo da cidadania fiscal por tornarem mais

clara e evidente aos cidadatildeos-contribuintes a tributaccedilatildeo indireta o que faz com que percebam a real

carga tributaacuteria nacional

Citemos como exemplos o projeto ldquoQuanto Custa o Brasilrdquo organizado pelo Sindicato Nacional

dos Procuradores da Fazenda Nacional (Sinprofaz) e que por meio de miacutedias como a Internet e em

especial por meio das redes sociais busca divulgar o peso da carga tributaacuteria brasileira combater a

sonegaccedilatildeo bem como conscientizar a populaccedilatildeo sobre a necessidade de reforma tributaacuteria em espe-

cial propagando a importacircncia de se proceder agrave reduccedilatildeo da tributaccedilatildeo indireta O siacutetio eletrocircnico da

campanha possui ainda jogos educativos e histoacuterias em quadrinhos divulgadas na paacutegina todas com

intuito de conscientizar os cidadatildeos sobre a carga tributaacuteria nacional (SINPROFAZ 2014)

Deve-se ainda destacar que instrumentos como o impostocircmetro e o sonegocircmetro divulgados

natildeo apenas em paineacuteis nas ruas como tambeacutem atraveacutes de siacutetios eletrocircnicos tambeacutem constituem meios

de conscientizaccedilatildeo e promoccedilatildeo da cidadania fiscal

Os aplicativos de celular tambeacutem tecircm sido utilizados como forma de promover a cidadania fis-

cal O ldquoNa Realrdquo revela o percentual incidente sobre determinado produto bem como o valor em reais

correspondente a tributos (APLICATIVO 2013) Ao digitar o nome do produto e a quantia paga o

software apresenta o quantum de tributos que compotildeem o preccedilo da mercadoria a partir de uma base

de dados desenvolvida juntamente com o Instituto Brasileiro de Planejamento Tributaacuterio

Outros mecanismos que demonstram a importacircncia das novas miacutedias para a efetivaccedilatildeo da ci-

dadania fiscal satildeo as leis de Responsabilidade Fiscal e de Acesso agrave Informaccedilatildeo

A lei complementar nordm 10100 conhecida como Lei de Responsabilidade Fiscal eacute de destaque

por ter consagrado o princiacutepio da transparecircncia como pressuposto da gestatildeo fiscal responsaacutevel Para

Machado (2010 p 93) a questatildeo da transparecircncia tributaacuteria eacute de extrema relevacircncia no que se refere

aos direitos fundamentais do contribuinte Salienta o autor ainda

Realmente hoje a maioria das pessoas natildeo sabe que suporta o ocircnus dos denomina-dos impostos indiretos que incidem sobre o consumo Isso explica a preferecircncia pelos impostos indiretos em todos os paiacuteses nos quais prevalecem atualmente as ideias do neoliberalismo Seja pelo efetivo propoacutesito dos governantes de favorecer os muito ricos que suportam ocircnus tributaacuterio quase nenhum enquanto os pobres suportam quase inteiramente o peso do Estado

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

310

Posteriormente a lei nordm 1252711 caracterizou-se como mais uma tentativa de implementar

uma gestatildeo fiscal transparente ao regulamentar o acesso agrave informaccedilatildeo e a transparecircncia na atividade

administrativa com a determinaccedilatildeo da criaccedilatildeo dos Portais de Transparecircncia ou seja sites em que de-

vem ser disponibilizadas informaccedilotildees referentes agraves financcedilas dos Estados

Essas inovaccedilotildees normativas a partir da imposiccedilatildeo de divulgaccedilatildeo na Internet de informaccedilatildeo

acerca das receitas e dos gastos puacuteblicos ensejam o exerciacutecio do controle social sobre o orccedilamento

puacuteblico criando assim uma cultura de cidadania fiscal natildeo se limitando a participaccedilatildeo popular no

Estado democraacutetico agraves formas tradicionais

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

A maior facilidade de acesso agraves informaccedilotildees ocasionada pela revoluccedilatildeo tecnoloacutegica eacute ins-

trumento capaz de desenvolver a cidadania fiscal ensejando o controle por parte da populaccedilatildeo da

arrecadaccedilatildeo tributaacuteria Esse maior acesso jaacute tem produzido dentre diversos efeitos uma evoluccedilatildeo no

pensamento da sociedade a qual indaga por exemplo sobre a necessidade de pagar tributos o que

eacute ainda mais aflorado em paiacuteses como o Brasil em que a carga tributaacuteria parece ser demasiadamente

pesada para a precariedade do serviccedilo puacuteblico

Percebe-se que o verdadeiro exerciacutecio da cidadania fiscal apenas se concretiza com o acesso

pela populaccedilatildeo a informaccedilotildees sobre as formas de arrecadaccedilatildeo de receitas sua destinaccedilatildeo e sobre os

gastos puacuteblicos de forma geral

A cidadania fiscal demonstra sua importacircncia como forma de participaccedilatildeo popular na democra-

cia estimulando o controle social Essa ideia de cidadania soacute seraacute consolidada com a reivindicaccedilatildeo ao

Poder Puacuteblico de direitos e garantias presentes na nossa Constituiccedilatildeo com o cumprimento de deveres

e com a participaccedilatildeo ativa da tomada de decisotildees Nota-se que o mundo digitalizado proporciona que

se efetivem novos meios de controle social Destarte o acesso agrave informaccedilatildeo inibe desvios dos recursos

arrecadados por parte de governantes corruptos ensejando gestotildees mais responsaacuteveis

Em suma a efetivaccedilatildeo da cidadania fiscal eacute imprescindiacutevel jaacute que o pagamento de tributos eacute um

dever dos cidadatildeos uma vez que o Estado necessita de recursos para funcionar Logo o que se deve

ter em mente eacute a necessidade de participaccedilatildeo da sociedade no controle das receitas tributaacuterias ana-

lisando o efetivo destino dos tributos pagos bem como fornecendo subsiacutedios para que os cidadatildeos

entendam a importacircncia dos tributos para o custeio dos serviccedilos estatais em prol da sociedade

O exerciacutecio da cidadania fiscal pois em que a tributaccedilatildeo seja acompanhada de um controle

da destinaccedilatildeo dos recursos puacuteblicos pode proporcionar uma sociedade proacutespera com cidadatildeos em

situaccedilatildeo de vida digna

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

311

REFEREcircNCIAS

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15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

314

A EVOLUCcedilAtildeO DOS ESFORCcedilOS DE TRANSPAREcircNCIA NA GESTAtildeO PUacuteBLICA NO CEARAacute

SUMAacuteRIO Introduccedilatildeo 1 A evoluccedilatildeo da transparecircncia puacuteblica no Cearaacute 2 As recentes medidas administrativas e institucionais para a transparecircncia puacuteblica no Cearaacute 3 As boas praacuteticas de transparecircncia fiscal no Cearaacute Consideraccedilotildees finais Referecircncias

Joseacute Joaquim Neto Cisne1

INTRODUCcedilAtildeO

O conceito de transparecircncia natildeo pode ser visto apenas sob a oacutetica do acesso agrave informaccedilatildeo Ela

tem uma dimensatildeo bem maior que o simples acesso agraves informaccedilotildees ou divulgaccedilatildeo dos dados Tem

por finalidade contribuir para o aprimoramento dos atos governamentais e incentivar a participaccedilatildeo

dos cidadatildeos como observam Assoni Filho (2009) e Christopoulos (2011a) A transparecircncia deve ser

entendida como um importante processo que contribui para a construccedilatildeo da cidadania envolvendo

outros elementos que pautam a eficiecircncia da Administraccedilatildeo Puacuteblica como a accountability 2 o com-

bate agrave corrupccedilatildeo confianccedila prestaccedilatildeo de serviccedilos clareza entre outros

Em 2005 no Foacuterum Global sobre a Reinvenccedilatildeo do Governo organizado pela United Nations Public Administration Network (UNIPAN) ficou demonstrada a importacircncia e a necessidade de um

modelo de boa gestatildeo como uma maneira de se construir a paz a prosperidade e as sociedades de-

mocraacuteticas (KIM et al 2005) Para uma boa governanccedila segundo a Organizaccedilatildeo para a Cooperaccedilatildeo e

Desenvolvimento Econocircmico (OCDE) eacute necessaacuterio melhorar a transparecircncia dos governos em relaccedilatildeo

a seus cidadatildeos (MOLINA BLASCO GOMIS 2011 p 139)

Nas uacuteltimas duas deacutecadas tem-se observado uma grande transformaccedilatildeo quanto agrave postura dos

cidadatildeos e da sociedade em relaccedilatildeo aos serviccedilos prestados pelos governos Tais transformaccedilotildees satildeo

consequecircncias das ideias da Nova Gestatildeo Puacuteblica que tem pautado as agendas internas dos governos

bem como os avanccedilos nos niacuteveis de formaccedilatildeo e exigecircncias dos cidadatildeos ajudados pelas novas tecno-

logias da informaccedilatildeo que possibilitaram uma maior transparecircncia das accedilotildees governamentais

1 Professor Adjunto da Universidade Estadual do Cearaacute (Uece) Doutor em Desenvolvimento Econocircmico e Auditor Fiscal da Receita Estadual na Secretaria da Fazenda do Cearaacute 2 O termo accountability segundo Campos (1990) ainda natildeo foi suficientemente traduzido para a liacutengua portuguesa Esse termo de um certo modo procura sintetizar as relaccedilotildees de controle que devem existir entre administraccedilatildeo puacuteblica funcionaacuterios e cidadatildeos Significa a ldquoobrigaccedilatildeo de responder pelos resultados no sentido do controle orccedilamentaacuterio e organizacional sobre os atos administrativos do respeito pela legalidade dos procedimentos e da responsabilizaccedilatildeo pelas consequecircncias da execuccedilatildeo das poliacuteticas puacuteblicasrdquo A adesatildeo ao processo de modernizaccedilatildeo e de racionalizaccedilatildeo da admi-nistraccedilatildeo diz respeito aos proacuteprios interesses dos indiviacuteduos como tambeacutem eacute reforccedilado pela confianccedila na forma como a eacutetica profissional eacute respeitada pela autoridade como observa Mozzicafreddo (2002)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

315

Apoacutes a redemocratizaccedilatildeo do paiacutes as reformas poliacuteticas administrativas e institucionais ini-

ciadas em meados da deacutecada de 1980 atentaram para a participaccedilatildeo social e foram adotadas as

primeiras medidas para dar maior transparecircncia agraves accedilotildees governamentais Este novo desenho na re-

laccedilatildeo entre o cidadatildeo e o Estado tem feito a gestatildeo puacuteblica inovar na busca de tornar mais eficiente

e transparente suas accedilotildees As medidas administrativas e institucionais introduzidas no Cearaacute a partir

da segunda metade dos anos de 1980 colocaram este Estado na vanguarda nacional por haver an-

tecipado um conjunto de reformas que somente aconteceriam quase uma deacutecada depois no acircmbito

do Governo Federal

Aleacutem dos dispositivos constitucionais (Constituiccedilatildeo Federal promulgada em 1988) que pri-

mam pela transparecircncia3 cabe ressaltar a lei de responsabilidade fiscal (Lei Complementar nordm 101

de 4 de maio de 2000) que define normas de financcedilas puacuteblicas voltadas para a responsabilidade na

gestatildeo fiscal Esta lei tem contribuiacutedo para tornar mais transparente as contas puacuteblicas ao trazer um

capiacutetulo especiacutefico intitulado ldquoDa Transparecircncia Controle e Fiscalizaccedilatildeordquo (artigos 48 a 59) sendo a

questatildeo da transparecircncia da gestatildeo fiscal tratada em seus artigos 48 e 49 Esta lei foi alterada pela

Lei Complementar nordm 131 de 27 de maio de 2009 denominada lei da transparecircncia que acrescen-

ta dispositivos agrave lei de responsabilidade fiscal determinando a disponibilidade em tempo real de

informaccedilotildees pormenorizadas sobre a execuccedilatildeo orccedilamentaacuteria e financeira da Uniatildeo dos Estados do

Distrito Federal e dos Municiacutepios Dentre as alteraccedilotildees estabelece no artigo 73-A que ldquoqualquer

cidadatildeo partido poliacutetico associaccedilatildeo ou sindicato eacute parte legiacutetima para denunciar ao respectivo Tri-

bunal de Contas e ao oacutergatildeo competente do Ministeacuterio Puacuteblico o descumprimento das prescriccedilotildees

estabelecidas nesta Lei Complementarrdquo

Mais recentemente em maio de 2012 entrou em vigor a lei de acesso agrave informaccedilatildeo puacuteblica (Lei

nordm 12527 de 18 de novembro de 2011) que regula o acesso a informaccedilotildees previsto no inciso XXXIII

do art 5o no inciso II do sect 3o do art 37 e no sect 2o do art 216 da Constituiccedilatildeo Federal dentre outras

E como preceitua o artigo 216 sect 2ordm dessa Constituiccedilatildeo ldquocabem agrave administraccedilatildeo puacuteblica na forma da

lei a gestatildeo da documentaccedilatildeo governamental e as providecircncias para franquear sua consulta a quantos

dela necessitemrdquo

Diante disso este trabalho tem por objetivo analisar os esforccedilos para promover a participaccedilatildeo

social e para tornar transparente as accedilotildees do governo no Cearaacute Para tanto este artigo adotou o

meacutetodo dedutivo com abordagem de pesquisa bibliograacutefica e documental procedendo uma revisatildeo

3 O artigo 5ordm inciso XXXIII da Constituiccedilatildeo Federal de 1988 estabelece que todos os cidadatildeos ldquotecircm direito a receber dos oacutergatildeos puacuteblicos informaccedilotildees de seu interesse particular ou de interesse coletivo ou geral que seratildeo prestadas no prazo da lei sob pena de responsabilidade ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindiacutevel agrave seguranccedila da sociedade e do Estadordquo Tambeacutem em seu artigo 37 define a publicidade dos atos administrativos dentre os princiacutepios que devem nortear a Administraccedilatildeo Puacuteblica E no sect 3ordm desse artigo estaacute determinado que a lei disciplinaraacute as formas de participaccedilatildeo do usu-aacuterio na administraccedilatildeo puacuteblica direta e indireta E o seu inciso II trata do acesso dos usuaacuterios a registros administrativos e a informaccedilotildees sobre atos de governo observado o disposto no art 5ordm X e XXXIII da referida Constituiccedilatildeo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

316

da literatura e uma anaacutelise dos diferentes planos de governo elaborados no Cearaacute a partir dos anos

de 1960

Este artigo conta com trecircs seccedilotildees de desenvolvimento sendo que na primeira seccedilatildeo se analisa

a evoluccedilatildeo da transparecircncia puacuteblica no Cearaacute na perspectiva dos diferentes planos de governo elabo-

rados nas uacuteltimas quatro deacutecadas Analisam-se as medidas administrativas e institucionais adotadas a

partir dos anos de 1980 e enfatizam-se em um segundo momento os aspectos positivos e os desafios

para implementar uma gestatildeo mais participativa na Administraccedilatildeo Puacuteblica do Cearaacute por meio dos

Conselhos formados por lideranccedilas poliacuteticas empresariais e intelectuais criados com o objetivo de

discutir as accedilotildees governamentais e estreitar as relaccedilotildees entre o Governo e a sociedade

Na terceira seccedilatildeo se analisam os recentes esforccedilos e as boas praacuteticas de transparecircncia fiscal no

Cearaacute destacando as medidas inovadoras no acircmbito da Administraccedilatildeo Tributaacuteria que vieram facilitar a

interaccedilatildeo entre o fisco e os contribuintes e romper com as velhas barreiras institucionais e operacio-

nais existentes nesta relaccedilatildeo

1 A EVOLUCcedilAtildeO DA TRANSPAREcircNCIA PUacuteBLICA NO CEARAacute

Analisando os diferentes planos de governo elaborados no Cearaacute desde o iniacutecio dos anos de

1960 observa-se que a participaccedilatildeo social e a transparecircncia puacuteblica somente fizeram parte da agenda

governamental muito recentemente em especial a partir dos anos de 1980

O primeiro plano elaborado pelo Governo do Estado para o periacuteodo de 1963-1966 considerava

o planejamento ldquoo meio mais adequado para vencer as deficiecircncias da ordem social e econocircmicardquo e

entendia que uma das formas de promover o desenvolvimento passa pela ldquoreformulaccedilatildeo dos meacutetodos

de accedilatildeo do Poder Puacuteblico abolindo-se praacuteticas obsoletas e anacrocircnicas de administraccedilatildeordquo Este plano

reconhecia a preponderacircncia da atuaccedilatildeo do Governo no processo de desenvolvimento do Estado

cabendo-lhe portanto impulsionar e estimular a sua expansatildeo no setor privado e disciplinar-lhe os in-

vestimentos no setor puacuteblico Destacava que no processo de desenvolvimento ldquonatildeo se pode dissociar

o fato social do fato econocircmico porque ambos visam atraveacutes do aumento da disponibilidade de bens

e serviccedilos agrave criaccedilatildeo de condiccedilotildees de bem estar da coletividaderdquo Este plano considera que o desenvol-

vimento deveria visar entre outras questotildees ldquoa manutenccedilatildeo dos serviccedilos de valorizaccedilatildeo humana e do

bem estar socialrdquo (CEARAacute 1963 p I-II) No entanto natildeo se constata uma maior preocupaccedilatildeo por parte

do governo em manter uma interaccedilatildeo efetiva com a sociedade por meio da participaccedilatildeo social ou em

promover a transparecircncia puacuteblica de seus atos

No segundo plano de governo elaborado para o periacuteodo de 1967-1970 foi considerado um

ldquograve problemardquo a ldquodispersatildeo de esforccedilos pela falta de entrosamento entre as atividades dos diversos

departamentos governamentaisrdquo (CEARAacute 1967 p 169) No que se refere ao esforccedilo da transparecircncia

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

317

este plano prevecirc a criaccedilatildeo de ldquoum oacutergatildeo Central de Relaccedilotildees Puacuteblicas e Informaccedilotildees e a institucionali-

zaccedilatildeo do processo de transmissatildeo de informaccedilatildeo em todos os sentidos da hierarquia administrativardquo

Para este governo o desenvolvimento econocircmico natildeo pode ser um problema soacute do governo mas

precisa contar com a entusiaacutestica colaboraccedilatildeo de toda a populaccedilatildeo para que possa ter ecircxito Poreacutem

natildeo definiu de forma clara quais os mecanismos seriam utilizados para intensificar essa interaccedilatildeo do

Governo com as empresas e com a sociedade

A ineficiecircncia do setor puacuteblico ficou mais uma vez caracterizada no plano de governo elaborado

para o periacuteodo de 1971-1974 quando se identificou na administraccedilatildeo estadual ldquoduplicidade funcional

entre vaacuterios oacutergatildeos conflitos de competecircncia e falta de racionalizaccedilatildeo para efeito de implantaccedilatildeo e

acompanhamento da execuccedilatildeordquo do referido plano Constatou-se tambeacutem que o sistema de planeja-

mento do Estado natildeo funcionava ldquosatisfatoriamenterdquo ainda que possuiacutesse o Fundo de Desenvolvimen-

to do Cearaacute (FDC) que era considerado um instrumento importante para a conduccedilatildeo do planejamento

do Estado A inoperacircncia desse sistema foi atribuiacuteda ao pouco dinamismo da proacutepria Secretaria de Pla-

nejamento bem como agrave falta de decisatildeo superior no sentido de implantar integralmente o sistema de

planejamento previsto Por isso considerava importante uma melhor adequaccedilatildeo da estrutura daquela

secretaria para dotaacute-la de condiccedilotildees de acompanhamento efetivo da execuccedilatildeo das metas e objetivos

do referido plano (CEARAacute 1971 p 117) Fica evidente que para esta missatildeo o Governo do Estado natildeo

contava com a colaboraccedilatildeo de outros segmentos da sociedade Este plano destacava como proposta

de modernizaccedilatildeo da Administraccedilatildeo Puacuteblica estadual os princiacutepios fundamentais definidos pelo De-

creto-Lei nordm 200 de 25 de fevereiro de 1967 que era o planejamento coordenaccedilatildeo descentralizaccedilatildeo

delegaccedilatildeo de competecircncia e controle4

No diagnoacutestico que antecedeu a elaboraccedilatildeo do plano de governo para o periacuteodo de 1975-1978

considerava que ldquoa ampliaccedilatildeo de atribuiccedilotildees e a consequente multiplicaccedilatildeo de instituiccedilotildees de forma

desordenada levaram a um gigantismo da maacutequina estadual e a uma estrutura administrativa com

razoaacuteveis deficiecircncias de funcionamentordquo E que essa hipertrofia orgacircnica e o paralelismo das accedilotildees

tornava difiacutecil a coordenaccedilatildeo administrativa comprometendo o seu bom desempenho Ademais ldquoo

paralelismo das accedilotildees nas vaacuterias poliacuteticas setoriais e a execuccedilatildeo de programaccedilatildeo estabelecidas nos

planos de desenvolvimentordquo representava um fator de significativos desperdiacutecios Quanto agrave avalia-

ccedilatildeo das poliacuteticas administrativas adotadas pelo governo este plano constatou falta de informaccedilotildees e

deficiecircncias na forma de disponibilizaacute-las que se dava de forma breve e com o intuito de identificar

possiacuteveis limitaccedilotildees ou inadequados procedimentos (CEARAacute 1975a p 210-211)

Um dos objetivos deste plano para a poliacutetica de accedilatildeo administrativa era ldquoreforccedilar o papel do se-

tor puacuteblico estadual como agente maior do processo de modernizaccedilatildeo e transformaccedilatildeo estrutural da

4 Este Decreto-Lei foi considerado pelo Governo Federal (1995) como uma introduccedilatildeo de administraccedilatildeo gerencial no Brasil uma vez que teve por objetivo o ldquomaior dinamismo e eficiecircncia da administraccedilatildeo puacuteblica brasileirardquo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

318

economia cearenserdquo (CEARAacute 1975b p 184) Natildeo constou deste plano nenhuma parceria com outros

segmentos da sociedade nem se referiu a nenhum esforccedilo para promover a transparecircncia de seus atos

ou participaccedilatildeo social

O plano de governo para o periacuteodo de 1983-1987 considerou importante adotar o meacutetodo

participativo de administraccedilatildeo natildeo somente na elaboraccedilatildeo do referido plano mas que fosse uma

ldquoconstante durante o periacuteodo administrativo quer nas revisotildees e atualizaccedilatildeo dos planos e projetos

setoriais que no processo de avaliaccedilatildeo das accedilotildees do Executivordquo (CEARAacute 1983) Apesar dessa vontade

expressa no diagnoacutestico do plano de Governo ldquoCearaacute Melhorrdquo para o periacuteodo de 1992-1995 fez refe-

recircncia a algumas questotildees que caracterizaram o Estado nos uacuteltimos trinta anos ldquocomo o demiurgordquo e

tambeacutem destaca a ldquocentralizaccedilatildeo federal combinada com o distanciamento da sociedade por forccedila do

autoritarismo poliacutetico que marcou o periacuteodo de 1964-1985rdquo que pouco permitia a participaccedilatildeo social

sem muita transparecircncia dos atos governamentais

Esta realidade comeccedilou a mudar na deacutecada de 1990 quando se deu inicio ao processo de refor-

ma do Estado brasileiro5 passando a adotar medidas a exemplo de outros paiacuteses como a privatizaccedilatildeo

de suas empresas estatais descentralizaccedilatildeo de serviccedilos para outros entes federados redesenho da

estrutura dos oacutergatildeos puacuteblicos adoccedilatildeo de medidas de estiacutemulo agrave participaccedilatildeo cidadatilde e agrave transparecircncia

esforccedilos para reduzir o excesso de burocracia entre outras

2 AS RECENTES MEDIDAS ADMINISTRATIVAS E INSTITUCIONAIS PARA A TRANSPAREcircNCIA PUacuteBLICA NO CEARAacute

A literatura mostra que o processo de desenvolvimento em cada sociedade eacute facilitado ou

dificultado de acordo como estatildeo estruturadas suas organizaccedilotildees e suas instituiccedilotildees jaacute que trazem

impactos diretos nos custos de transaccedilatildeo no niacutevel de confianccedila e na forma como se relacionam os

diferentes agentes Por isso North (1995 p 139) atribui um papel fundamental agraves instituiccedilotildees (regras

do jogo) nas sociedades quando as consideram como ldquoo determinante subjacente do desempenho

das economiasrdquo A funccedilatildeo principal das instituiccedilotildees na sociedade como argumenta North (1995 p 16)

ldquoeacute reduzir a incerteza estabelecendo uma estrutura estaacutevel (poreacutem natildeo necessariamente eficiente) da

interaccedilatildeo humanardquo

Algumas mudanccedilas institucionais importantes foram introduzidas no Brasil por meio da Consti-

5 A partir dos anos de 1980 vaacuterios paiacuteses por razotildees diversas promoveram mudanccedilas administrativas e institucionais como o objetivo de introduzir a ldquoNova Gestatildeo Puacuteblicardquo Estas reformas foram iniciadas pelo Reino Unido no governo de Margaret Thatcher com o chamado ldquomodelo de westminsterrdquo nos Estados Unidos no mandato de Ronald Reagan depois se expandiu para paiacuteses como Nova Zelacircndia Austraacutelia entre outros Os impactos destas medidas nos diferentes paiacuteses dependeram de seus marcos histoacutericos poliacuteticos e legais (FERLIE et al 1999) Maiores detalhes sobre as reformas no Estado brasileiro podem ser analisados em trabalhos como Governo Federal (1995) Bresser Pereira (1996 e 1998) Diniz Azevedo et al (1997) Abruacutecio (1997 e 1999) entre outros

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

319

tuiccedilatildeo Federal promulgada em 1988 e no Cearaacute por meio da Constituiccedilatildeo do Estado promulgada em

1989 Outra importante mudanccedila institucional foi a publicaccedilatildeo da Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei

Complementar nordm 101 de 4 de maio de 2000) com o objetivo de melhorar a gestatildeo fiscal e financeira

do setor puacuteblico no Brasil atribuindo aos governantes compromissos com o orccedilamento e com metas

apresentadas e aprovadas pelos respectivos poderes legislativos dos Estados e municiacutepios brasileiros

impondo assim um maior controle nos gastos puacuteblicos

No primeiro plano de governo elaborado depois da redemocratizaccedilatildeo do paiacutes definindo as po-

liacuteticas para o periacuteodo do 1987-1991 apontou-se dentre outras anomalias um crescimento desordena-

do e uma hipertrofia da administraccedilatildeo puacuteblica estadual ineficiecircncia nas finalidades sociais do Estado

aleacutem de uma obsolescecircncia dos esquemas estruturais e funcionais empreguismo desenfreado (CEA-

RAacute 1987 p 36-37) No acircmbito da modernizaccedilatildeo administrativa este plano define como objetivo ldquotor-

nar a administraccedilatildeo puacuteblica estadual agente propulsor do processo de modernizaccedilatildeo e transformaccedilatildeo

estrutural da economia e da sociedaderdquo Apesar de um governo formado por jovens empresaacuterios

observa-se que a visatildeo sobre o Estado era a do grande indutor do processo de desenvolvimento e das

transformaccedilotildees sociais Aleacutem de destacar a contribuiccedilatildeo dos demais agentes como co-responsaacuteveis na

conduccedilatildeo do processo de desenvolvimento este plano em seus objetivos especiacuteficos natildeo demonstra

nenhuma preocupaccedilatildeo com a transparecircncia puacuteblica natildeo define nenhuma forma de estimular a parti-

cipaccedilatildeo social nem mesmo em qualquer espeacutecie de controle social

Na segunda metade da deacutecada de 1980 houve grandes transformaccedilotildees poliacuteticas administrati-

vas e institucionais no Cearaacute quando ascendeu ao governo do Estado um grupo de jovens empresaacuterios

apoiados por algumas organizaccedilotildees representativas da classe empresarial6 Estes novos governantes

surgiram apoiados pelo Centro Industrial do Cearaacute (CIC) que desde sua origem em 1978 defendeu

novas ideias sobre o papel do Estado e de suas relaccedilotildees com o setor produtivo Estes novos governan-

tes trouxeram novas ideias e um projeto poliacutetico de introduzir medidas para mudar a realidade poliacutetica

social econocircmica e cultural do Cearaacute Por isso tomaram posiccedilotildees poliacuteticas bem diferentes das ideias

das elites tradicionais locais cujas praacuteticas eram baseadas na cultura patrimonialista no paternalismo

clientelismo nepotismos e outros privileacutegios poucos recomendados agrave nova gestatildeo puacuteblica (AMARAL

FILHO 2004 LUGO 2005)

Para definir e fundamentar as propostas destes novos projetos poliacuteticos foram promovidos

debates com diversos economistas e ministros como Celso Furtado e outros pensadores patrocinados

pelo CIC Daiacute surgiu o ldquoMovimento Proacute-Mudanccedilasrdquo que divulgava as novas ideias e as perspectivas de

futuro de um Estado moderno Este movimento resultou na eleiccedilatildeo em 1986 de Tasso Jereissati cujo

lema de governo era denominado de ldquoGoverno das Mudanccedilasrdquo A partir deste novo governo comeccedilou

6 As entidades que apoiaram os jovens empresaacuterios no governo do Cearaacute em 1986 foram o Centro Industrial do Cearaacute (CIC) a Federaccedilatildeo das Induacutestrias do Estado do Cearaacute (Fiec) e a Associaccedilatildeo dos Jovens Empresaacuterios (AJE)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

320

o processo de desenvolvimento de caraacuteter endoacutegeno cujas accedilotildees contribuiacuteram para mudar com o

modelo econocircmico primaacuterio-exportador baseado na cultura do gado-algodatildeo-cultura de subsistecircncia

onde predominava o capital local no setor produtivo (AMARAL FILHO 2004 LUGO 2005)

Como era de se esperar para cumprir com seus projetos poliacuteticos estes novos liacutederes no pri-

meiro periacuteodo de governo (1987-1990) geraram grandes insatisfaccedilotildees agrave classe poliacutetica e a alguns gru-

pos empresariais por natildeo haver atendido mais a seus interesses e por haver mudado o velho modelo

poliacutetico (coronelismo) baseado no patrimonialismo e nepotismo que existia no Cearaacute Esta nova elite

empresarial no governo do Cearaacute rompeu com a velha forma de administrar7 e introduziu um novo

modelo de gestatildeo puacuteblica promovendo primeiramente um ajuste fiscal financeiro e administrativo

para equilibrar as financcedilas puacuteblicas e gerar recursos para investir em infraestruturas sociais e produ-

tivas (BONFIM 2000) e criar as bases para o processo de desenvolvimento nas deacutecadas seguintes

Diversos trabalhos de pesquisa8 fazem referecircncias a esta experiecircncia de gestatildeo no Cearaacute no periacuteodo

de 1987 a 2002 cujas medidas poliacutetico-institucionais resultaram em uma nova dinacircmica econocircmica

Neste periacuteodo baseados nas ideias de cooperaccedilatildeo e associaccedilatildeo entre os setores puacuteblicos e

privados nos dois periacuteodos de governo seguintes (1991-1994 e 1995-1998) houve uma tentativa por

parte do governo de introduzir um sistema de gestatildeo participativa para envolver a sociedade na dis-

cussatildeo dos temas mais estrateacutegicos Por isso criou-se o Pacto de Cooperaccedilatildeo (REBOUCcedilAS et al 1998)

o Plano Estrateacutegico da Regiatildeo Metropolitana de Fortaleza (PLANEFOR 1999)9 e diversos conselhos

regionais e municipais de desenvolvimento sustentaacutevel (CORDEIRO 1998) que agregavam a elite eco-

nocircmica poliacutetica e intelectual e as lideranccedilas regionais e municipais nas discussotildees dos temas de seus

interesses Com o transcurso do tempo estes conselhos natildeo produziram os resultados planejados10

Assim a participaccedilatildeo da sociedade passou a ser solicitada na elaboraccedilatildeo dos diferentes planos de go-

verno com a indicaccedilatildeo das prioridades para cada regiatildeo

As mudanccedilas introduzidas na Administraccedilatildeo Puacuteblica do Cearaacute trouxeram uma seacuterie de inova-

ccedilotildees que contribuiacuteram para o aumento da eficiecircncia na gestatildeo dos recursos puacuteblicos com a reduccedilatildeo de

desperdiacutecios e ao romper com os velhos viacutecios poliacutetico-institucionais de uma cultura patrimonialista

heranccedilas de deacutecadas de nepotismo e clientelismo tambeacutem contribuiacuteram para democratizar a relaccedilatildeo

7 Na Regiatildeo Nordeste e no Cearaacute haacute uma longa histoacuteria de clientelismo e coronelismo sistema puacuteblico inflado e de maacute qualidade que tem gerado uma forte desconfianccedila na institucionalidade poliacutetica (BANCO MUNDIAL 2003) 8 Esta experiecircncia no Cearaacute foi mencionada em trabalhos nacionais e internacionais Entre eles Naisbitt (1994) Diniz e Azevedo (1997 p 369) Tandler (1998) Giddens (1999 p 93) inclusive em um artigo do Financial Times de 26 de marccedilo de 1993 e Lugo (2005)9 O Planefor estabeleceu quatro estrateacutegias Regiatildeo metropolitana integrada Regiatildeo metropolitana empreendedora e competitiva Educaccedilatildeo por desenvolvimento humano Integraccedilatildeo e fortalecimento da gestatildeo puacuteblica (AMARAL FILHO 2004)10 Cordeiro (1998) elabora uma interessante anaacutelise sobre o sistema de gestatildeo participativa do governo do Estado do Ce-araacute em especial quanto aos Conselhos de Desenvolvimento Sustentaacutevel pesquisando suas potencialidades democraacuteticas e suas ambiguidades como resultado de dinacircmicas sociais orientadas pelo governo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

321

Estado e a sociedade11 Estas mudanccedilas estabeleceram ldquonovos paracircmetros para os compromissos po-

liacuteticosrdquo tendo que ldquopassar cada vez mais pelo crivo de uma sociedade civil ampliada e democratizada

capaz de exigir eficiecircncia e eficaacutecia de demandas responsabilizaccedilatildeo e de envolver-se no controle dos

serviccedilos prestado pelo Estadordquo (RUA 1999 p 277) Tudo isso na tentativa de eliminar os resquiacutecios

das velhas praacuteticas por meio de uma maior participaccedilatildeo social nas atividades governamentais Estas

mudanccedilas natildeo aconteceram sem fortes resistecircncias culturais poliacuteticas e comportamentais O novo

modelo de administraccedilatildeo gerencial implantado no Cearaacute significou esforccedilos de se criar um ambiente

de inovaccedilatildeo no contexto da administraccedilatildeo puacuteblica (LUGO 2005)

Em meados dos anos de 1990 foi elaborado o primeiro plano de desenvolvimento sustentaacutevel

do Cearaacute cuja execuccedilatildeo se daria no periacuteodo de 1995-1998 Este plano destaca como heranccedila histoacuterica

e ao mesmo tempo um desafio a enfrentar a poliacutetica de clientela e o Estado patrimonialista Segundo

este plano ldquoa baixa capacitaccedilatildeo da populaccedilatildeo e a vulnerabilidade da economia agraves vicissitudes climaacute-

ticas aliadas ao atraso cultural e tecnoloacutegico provocaram o surgimento no Cearaacute de um sistema de

dominaccedilatildeo social baseado no clientelismo e na gestatildeo patrimonialista do Estado em que os cargos e

as benesses do Governo eram distribuiacutedos em troca da lealdade e de contraprestaccedilotildees diversas tudo

para garantir a permanecircncia da elite dirigente no poderrdquo (CEARAacute 1995 p 9)

Dentre a visatildeo de futuro daquele plano de desenvolvimento sustentaacutevel estaacute a construccedilatildeo de

uma sociedade justa democraacutetica e pluralista onde fatores como o atraso poliacutetico clientelismo pa-

ternalismo corporativismo corrupccedilatildeo possam ser superados pelo amadurecimento poliacutetico e pela

ldquoparceria Governo e sociedade pela ampla participaccedilatildeo no processo poliacutetico e no planejamento pela

transparecircncia e pela impessoalidade nas poliacuteticas puacuteblicasrdquo (CEARAacute 1995 p 7) Este foi o primeiro pla-

no de governo a ressaltar a importacircncia da transparecircncia como elemento de amadurecimento poliacutetico

e para o fortalecimento do controle social das accedilotildees governamentais reconhecendo a participaccedilatildeo

como elemento fundamental para a) ajudar na definiccedilatildeo das prioridades b) acompanhar e fiscalizar a

accedilatildeo de governo c) manter o Governo fiel aos anseios da sociedade d) dar sustentaccedilatildeo poliacutetica agrave accedilatildeo

de governo e assegurar a continuidade das accedilotildees

Este plano de desenvolvimento tinha dentre seus objetivos ldquopotencializar o papel do Estado

mediante a mobilizaccedilatildeo da sociedade e iniciativas do setor privado dos municiacutepios das comunidades

das organizaccedilotildees da sociedade civil e dos cidadatildeosrdquo Para tanto trouxe como inovaccedilatildeo um modelo

de gestatildeo participativa12 novo no acircmbito da administraccedilatildeo estadual organizando a participaccedilatildeo des-

11 Estudos do Banco Mundial (2003) enfatizam os impactos dessa heranccedila juntamente com a falta de cuidado com a educaccedilatildeo com a sauacutede a perpetuaccedilatildeo da pobreza facilmente identificados nos indicadores socioeconocircmicos do Estado12 Este modelo de gestatildeo estava amparado nos princiacutepios de modelo de administraccedilatildeo gerencial que era aliada agrave visatildeo ne-oliberal vigente Dentre estes princiacutepios destacam-se os seguintes a) manter e consolidar o equiliacutebrio financeiro do Estado b) buscar a eficiecircncia dos serviccedilos puacuteblicos estimulando a competiccedilatildeo no serviccedilo puacuteblico c) orientar a accedilatildeo do governo para a obtenccedilatildeo de resultados d) promover a descentralizaccedilatildeo e a participaccedilatildeo social (ABRUacuteCIO 1997 PEREIRA 1998)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

322

tes agentes em vaacuterios Conselhos que contava com a presenccedila de diversos segmentos da sociedade

cearense para atuar nas instacircncias estadual regional e municipal Esta proposta de trabalho apesar

de nobre e motivadora por trazer algo inovador no acircmbito da Administraccedilatildeo Puacuteblica do Cearaacute natildeo

produziu resultados duradouros

No acircmbito desse plano havia uma preocupaccedilatildeo do governo em promover a integraccedilatildeo do

Governo com a sociedade Para estimular a articulaccedilatildeo no acircmbito interno foram criados seis Grupos

de Trabalho Institucional (GTI) para coordenar as prioridades estrateacutegicas identificadas por este plano

de governo Foram criados GTIs nas aacutereas a) proteccedilatildeo do maio ambiente e reordenamento do espaccedilo

b) capacitaccedilatildeo da populaccedilatildeo c) seguranccedila puacuteblica d) desenvolvimento da cultura ciecircncia tecnologia

e inovaccedilatildeo e) promoccedilatildeo do emprego e desenvolvimento econocircmico sustentaacutevel e f) gestatildeo puacuteblica

Estes grupos contavam com a participaccedilatildeo de teacutecnicos representando as diversas Secretarias e outros

oacutergatildeos do Governo sob a coordenaccedilatildeo da Secretaria de Planejamento e Coordenaccedilatildeo

Para a articulaccedilatildeo externa o governo criou diferentes Conselhos sendo que alguns contavam

com a participaccedilatildeo da sociedade formados de pessoas eminentes convidadas pelo Governo para opi-

nar sobre as questotildees governamentais Para tanto foram criados a) O Conselho Estadual de Desenvol-

vimento Sustentaacutevel formado por diversos cidadatildeos que discutiram temas ligados agrave sustentabilidade

incluindo suas vaacuterias dimensotildees social econocircmica poliacutetica e ambiental b) O Conselho de Desenvol-

vimento da Famiacutelia e da Cidadania para a discussatildeo de temas como a famiacutelia sauacutede educaccedilatildeo baacutesica

e profissional crianccedila seguranccedila alimentar seguranccedila puacuteblica entre outros c) O Conselho de Desen-

volvimento Cultural para discutir temas relacionados agrave cultura cearense Tambeacutem foram criados os

Conselhos Regionais de Desenvolvimento Sustentaacutevel formado por lideranccedilas regionais para discutir

temas relacionados agrave realidade de cada uma das 20 (vinte) regiotildees administrativas

Mesmo com esses Conselhos a poliacutetica social do Estado definida como a forma de racionali-

zar a oferta de serviccedilos baacutesicos buscando articular interesses gerais na opiniatildeo de Cordeiro (1998)

na praacutetica em relaccedilatildeo agraves camadas mais pobre da populaccedilatildeo tem sido marcada pelo ldquopersonalismo

e assistencialismordquo o que pode ser um ldquoespaccedilo de conflito sobre essa distribuiccedilatildeo de bens onde os

diversos setores sociais tentam fazer valer seus direitosrdquo

Cabe destacar que a participaccedilatildeo e o controle social se realizam de forma mais efetiva quanto

mais proacutexima agrave populaccedilatildeo esteja dos centros de decisatildeo No Brasil esses desafios se tornam maiores

devido agrave pouca interaccedilatildeo que o Estado sempre manteve com os cidadatildeos e com a sociedade civil e

tambeacutem em consequecircncia do pouco poder econocircmico institucional ou normativo dos municiacutepios

brasileiros Por ser o municiacutepio a esfera de poder do Estado mais proacutexima do cidadatildeo nunca houve

interesse dos que controlam o poder no Brasil em geral que o poder local fosse efetivo Como forma

de corrigir estas questotildees por decisatildeo dos proacuteprios Conselhos Regionais as reuniotildees poderiam ser re-

alizadas alternadamente nos diferentes municiacutepios de cada uma das regiotildees Como forma de estimular

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

323

a descentralizaccedilatildeo administrativa o Governo do Estado estimulou a criaccedilatildeo de conselhos municipais

e conselhos comunitaacuterios para discutir as questotildees no acircmbito local Estes Conselhos indicariam repre-

sentantes para formarem os conselhos regionais levando para estes as demandas de cada municiacutepio

(CORDEIRO 1998)

Vale ressaltar ainda os seguintes efeitos positivos da participaccedilatildeo social em accedilotildees de desenvol-

vimento que foram evidenciadas por Bandeira (1997) e mencionadas por Cordeiro (1998 p 12-15)

a) Como meio de assegurar uma maior eficiecircncia e sustentabilidade aos programas gover-

namentais

b) Para garantir a ldquoboa governanccedilardquo na medida em que assegura a transparecircncia das accedilotildees

do poder puacuteblico e combate a corrupccedilatildeo

c) Como instrumento para acumular o capital social para fazer com que os seus membros

se tornem propensos a colaborar no sentido da soluccedilatildeo de problemas de interesse comum

d) Na formaccedilatildeo e consolidaccedilatildeo de identidades regionais por meio da construccedilatildeo de con-

sensos baacutesicos entre os atores sociais de uma regiatildeo

A praacutetica de gestatildeo participativa jaacute se faz presente na Administraccedilatildeo Puacuteblica no Cearaacute desde

meados dos anos de 1980 com a criaccedilatildeo dos Conselhos de Sauacutede sendo o Cearaacute o primeiro Es-

tado brasileiro a implantar este tipo de Conselho e a criar em 1987 o programa Agente de Sauacutede

Diversos Conselhos foram criados alguns deles por exigecircncia de legislaccedilatildeo federal a exemplo do

Conselho da Crianccedila e do Adolescente Nesta organizaccedilatildeo em Conselhos como observa Cordeiro

(1998 p 40) em tese o governo e a sociedade ldquose associam para planejar discutir e deliberar acerca

de poliacuteticas puacuteblicasrdquo

Para a implantaccedilatildeo de grandes projetos estruturantes o Governo adotou Grupos de Trabalho

Participativo que foi outra forma de incluir as lideranccedilas e os diversos segmentos da sociedade nas

discussotildees na execuccedilatildeo e acompanhamento daqueles projetos Dentre estes GTs destacam-se o da

construccedilatildeo do Complexo Portuaacuterio do Peceacutem o da construccedilatildeo do Accedilude do Castanhatildeo Outra experi-

ecircncia de participaccedilatildeo social foi a gestatildeo dos recursos hiacutedricos do Estado instituiacuteda a partir de outubro

de 1997 Os representantes dos governos federal estadual e municipais os representantes dos usuaacute-

rios e da sociedade civil formavam estes colegiados que opinavam sobre o uso controle e preservaccedilatildeo

da aacutegua nas diferentes bacias hidrograacuteficas do Estado (SILVA 2004)

Analisando os aspectos positivos e negativos do modelo de gestatildeo puacuteblica participativa no Ce-

araacute desde a perspectiva desses Conselhos criados pelo Governo do Estado a partir de 1995 Cordeiro

(1998 p 63-90) destaca dentre outros os seguintes obstaacuteculos para o pleno ecircxito destes instrumentos

de participaccedilatildeo social

a) A falta de uma cultura de planejamento na aacuterea puacuteblica e a quase inexistecircncia da praacutetica

do planejamento de forma participativa

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

324

b) Imediatismo personalista dos governantes pela crocircnica falta de recursos e pela pobreza

extrema das comunidades

c) Falta de experiecircncias democraacuteticas que dificultam as accedilotildees tanto da equipe de Governo

como das comunidades

d) Falta de preparo teacutecnico das equipes e de metodologias adequadas para o exerciacutecio da

participaccedilatildeo social e para integrar os diferentes Conselhos

Baseada na opiniatildeo de diversas autoridades entrevistadas na eacutepoca Cordeiro (1998) identifi-

cou os seguintes fatores que contribuiacuteram para impedir o ecircxito desse modelo de gestatildeo participativa

no Cearaacute

a) Paternalismo clientelismo e cultura do patrimonialismo manifestados na opiniatildeo da Se-

cretaacuteria de Planejamento do Estado daquele periacuteodo de governo ao firmar que ldquoos prefeitos preferem

demonstrar prestiacutegio tratando pessoalmente com o Governo e buscando afirmar seu poder individual

na resolutividade de problemasrdquo Tambeacutem para o Chefe de Gabinete da Secretaria de Governo (Segov)

ldquoa formataccedilatildeo cultural dos atores poliacuteticos natildeo ajuda na efetivaccedilatildeo do modelo de gestatildeo comparti-

lhada [] Em grande parte do Cearaacute ainda eacute vigente o modelo clientelista populista de se credenciar

politicamenterdquo Na opiniatildeo de um ex-presidente da Associaccedilatildeo de Municiacutepios do Cearaacute (Amece) ldquoa

questatildeo do personalismo do autoritarismo etc natildeo eacute soacute cultural mas operacional - eacute assim que fun-

ciona [] Quando haacute necessidade de parceria o Governo sabe como ir atraacutes Mas para fazer o orccedila-

mento participativo por exemplo o Governo natildeo precisa de parceriardquo

b) Resistecircncia do Poder Puacuteblico constatada por um ex-secretaacuterio dos Conselhos de Participa-

ccedilatildeo da Sociedade ao afirmar que ldquoeacute a resistecircncia geral e dentro do proacuteprio Governo [] agrave realizaccedilatildeo

de gestotildees participativa eacute o obstaacuteculo do patrimonialismo da dominaccedilatildeo tradicional em que se acha

o lsquodonorsquo da cidaderdquo

c) Falta de integraccedilatildeo e de conhecimento constatada pela Secretaacuteria de Planejamento do

Estado na eacutepoca ao afirmar que ldquoos Conselhos sempre foram estanques e o sistema nunca funcionou

como sistemardquo Tambeacutem como observou um ex-presidente da Associaccedilatildeo de Municiacutepios do Cearaacute

(Amece) ldquoSe o Estado vai laacute (aos municiacutepios) e natildeo volta mais a Prefeitura tambeacutem natildeo tem maior

interesse na participaccedilatildeo da sociedade fica difiacutecil porque a comunidade natildeo tem experiecircncia de pla-

nejamentordquo Tambeacutem um ex-presidente da Associaccedilatildeo de Municiacutepios do Cearaacute (Amece) afirmou que

ldquopara fazer uma coisa eacute preciso querer e saber o Governo quis fazer se levantou a ideia devia estar

interessado mas natildeo teve competecircncia teacutecnica para fazer Natildeo eacute faacutecil desenvolver participaccedilatildeo eacute pre-

ciso muito conhecimento meacutetodo e capacidade de saber escutar as pessoas [] e isso natildeo eacute uma coisa

que se aprende de uma hora para outra Faltou capacidade dos setores responsaacuteveis em implantar esse

modelo E faltou tambeacutem a universidade se envolver mais nesse processordquo Ademais houve falha na

elaboraccedilatildeo do modelo de gestatildeo participativa quando tais Conselhos passaram a ser visto mais como

ldquobraccedilosrdquo poliacuteticos do Governo do que como espaccedilo puacuteblico para discussatildeo dos interesses coletivos

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

325

Pela falta de qualificaccedilatildeo e de experiecircncia democraacutetica comum aos diversos atores sociais em

todos os niacuteveis de lideranccedila os agentes tiveram que aprender na base do improviso Os proacuteprios

secretaacuterios do Governo natildeo estavam preparados e conscientes do que significava aquilo do que era

planejamento regional esse despreparo ldquoera generalizado porque os conselhos eram apenas uma

ideia que estava no papel e ningueacutem sabia o que era e nem para que serviardquo como afirmou o Diretor

da empresa de Consultoria Personal

d) Descontinuidade dos Conselhos haja vista que a partir de junho de 1997 natildeo houve mais

reuniotildees dos Conselhos Regionais de Desenvolvimento Sustentaacutevel Nunca funcionaram efetivamente

como Conselhos como afirmou um Ex-secretaacuterio dos Conselhos de Participaccedilatildeo da Sociedade ldquoape-

nas no inicio houve uma participaccedilatildeo interessante na elaboraccedilatildeo do Plano Plurianual de Investimentos

em que cada um dos vinte Conselhos foi ouvido e ocorreu muitas discussotildees Depois disso o que ainda

houve foram reuniotildees do Governo com lideranccedilas da regiatildeo convidados para assistir a palestras dos

secretaacuterios estaduais e de outros teacutecnicos []rdquo Aleacutem disso ldquoos poliacuteticos nunca prestigiaram os CRDs

nem os deputados federais nem os estaduais nem da oposiccedilatildeo nem da situaccedilatildeordquo

Como observou uma coordenadora da Secretaria de Planejamento do Estado naquele periacuteodo

ldquoNa praacutetica natildeo se estaacute vendo necessidade dos CRDs as coisas estatildeo acontecendo sem passar por essa

instacircnciardquo Para o Chefe de Gabinete da Secretaria de Governo (Segov) daquele periacuteodo percebia-se

que ldquoa descoincidecircncia dos calendaacuterios eleitorais constitui uma dificuldade para o funcionamento des-

ses Conselhos regionais porque eles se formam no periacuteodo de meio de mandato de Prefeitos e inicio

de mandato de Governo estadual ou seja com pouco tempo de funcionamento vocecirc jaacute tem uma

acentuada modificaccedilatildeo na composiccedilatildeo dos Conselhosrdquo

Estes Conselhos cuja funccedilatildeo era servir de elo entre o Estado e a sociedade cearense agrupa-

vam lideranccedilas poliacuteticas empresariais intelectuais religiosas cuja missatildeo era definir as prioridades no

acircmbito das diferentes regiotildees administrativas a serem atendidas pelo Governo do Estado aleacutem de de-

bater questotildees consideradas relevantes e estrateacutegicas de modo a promover uma gestatildeo de alto niacutevel

e em sintonia com a sociedade

Considerando as experiecircncias de gestatildeo participativa anteriores o plano de governo para o

periacuteodo de 2003 a 2006 cujo objetivo maior era promover o crescimento econocircmico com inclusatildeo

social definiu dentre seus fundamentos a transparecircncia Para tornar um governo transparente consi-

derava ser imprescindiacutevel agrave mobilizaccedilatildeo e sensibilizaccedilatildeo social mecanismos eficientes de participaccedilatildeo

e compromisso puacuteblico Para tanto devia-se ampliar o processo de informaccedilatildeo nos atores sociais na

formulaccedilatildeo e implementaccedilatildeo das poliacuteticas puacuteblicas e no controle social das accedilotildees governamentais

Esse processo de interaccedilatildeo e de criaccedilatildeo de novos espaccedilos puacuteblicos ldquoestimula o aperfeiccediloamento dos

programas e sua melhor focalizaccedilatildeo e eficaacuteciardquo (CEARAacute 2003a p 24)

Como medida concreta este Governo promoveu em todas as microrregiotildees administrativas uma

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

326

ampla discussatildeo para a elaboraccedilatildeo do Plano Plurianual para o periacuteodo de 2004 a 2007 (CEARAacute 2003b)

Tambeacutem implantou uma Sala de Situaccedilatildeo com os indicadores socioeconocircmicos e informaccedilotildees sobre

os programas e accedilotildees de governo inclusive sobre a infraestrutura e o perfil econocircmico e social de cada

municiacutepio cearense Este instrumento de transparecircncia puacuteblica tratou de disponibilizar as informaccedilotildees

de forma detalhada e regionalizada de modo a facilitar as consultas e anaacutelises pelos cidadatildeos sobre a

realidade das diferentes regiotildees do Estado A atualizaccedilatildeo dos dados se dava diariamente o que possi-

bilitava agrave equipe de governo e aos cidadatildeos acessar e opinar sobre as accedilotildees governamentais

Entre as diretrizes para o plano do governo que se inicia em 2007 quando trata da sustentabili-

dade poliacutetica e institucional estatildeo ldquopromover a democracia aprimorar a cidadania garantir os direitos

sociais e conduzir as poliacuteticas puacuteblicas com base na participaccedilatildeo social gestatildeo estrateacutegica criativa

dotada dos mais modernos recursos tecnoloacutegicos e logiacutesticos comunicaccedilatildeo a serviccedilo dos interesses

da sociedade garantindo a melhor aplicaccedilatildeo dos recursos e combatendo a corrupccedilatildeordquo (CEARAacute 2007)

Tomando por base as experiecircncias dos governos anteriores novos mecanismos para sistemati-

zar os programas e projetos definidos como prioritaacuterios foram adotados a partir do governo empossa-

do em 2007 Por meio do Decreto n 29917 de 8 de outubro de 2009 foi redefinido o Sistema Estadual

de Planejamento13 e instituiacuteda a Rede Estadual de Planejamento sob a coordenaccedilatildeo da Secretaria de

Planejamento e Gestatildeo (Seplag) Este sistema estaacute constituiacutedo pelos subsistemas de planejamento

orccedilamento acompanhamento fiacutesico-financeiro e de gestatildeo puacuteblica por resultado Utilizando-se desse

sistema o governo elaborou seu Plano Plurianual 2008-2011 de forma participativa colhendo subsiacute-

dios nas diversas regiotildees administrativas do Estado

Nas uacuteltimas deacutecadas foram introduzidos pelos governos procedimentos administrativos e cria-

dos vaacuterios instrumentos institucionais com o intuito de facilitar o acesso do cidadatildeo agraves informaccedilotildees e

com isso aumentar a transparecircncia puacuteblica nos trecircs acircmbitos de governo (federal estadual e munici-

pal) No caso do Cearaacute algumas boas praacuteticas no acircmbito da transparecircncia fiscal valem ser destacadas

3 AS BOAS PRAacuteTICAS DE TRANSPAREcircNCIA FISCAL NO CEARAacute

A literatura mostra que a transparecircncia fiscal desempenha um grande papel no fortalecimento

da cidadania quando mostra os dados das contas puacuteblicas e estimula a participaccedilatildeo social influen-

ciando assim nas decisotildees governamentais Isto permite um maior controle social e aumenta a res-

ponsabilidades dos governantes para melhor aplicar os recursos puacuteblicos e em prestar contas de suas

accedilotildees agrave sociedade Constitui-se numa ldquoesfera puacuteblica natildeo estatalrdquo de controle (GENRO 1996) que

se materializa na elaboraccedilatildeo execuccedilatildeo e controle das leis orccedilamentaacuterias Dentre outros benefiacutecios

13 Este sistema foi criado pela primeira vez no acircmbito do Governo do Cearaacute em meados dos anos de 1960 com a criaccedilatildeo da Secretaria de Planejamento e Coordenaccedilatildeo (Seplan)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

327

a transparecircncia aumenta a possibilidade de um maior alinhamento de interesses entre o fisco e o

contribuinte14 Assim fica evidente que as novas tecnologias ainda que potencializem as pressotildees de

determinados grupos proporcionam maior participaccedilatildeo do cidadatildeo-cliente e do cidadatildeo-contribuinte

na reivindicaccedilatildeo dos seus direitos ou mesmo na possibilidade de influenciar com suas sugestotildees a

adoccedilatildeo de medidas administrativas de interesse popular Tudo isso de certo modo revoluciona a re-

laccedilatildeo do indiviacuteduo com as organizaccedilotildees

O padratildeo do relacionamento entre o Estado e a sociedade revela o niacutevel de desenvolvimento e

maturidade poliacutetica do paiacutes Nos paiacuteses desenvolvidos economicamente percebe-se uma integraccedilatildeo

maior entre o fisco e o cidadatildeo contribuinte Satildeo diversos os motivos para que essa relaccedilatildeo seja amis-

tosa Do lado do fisco haacute dentre outras providecircncias uma preocupaccedilatildeo em orientar o cidadatildeo-con-

tribuinte quanto ao cumprimento de suas obrigaccedilotildees tributaacuterias haacute tambeacutem o livre acesso do cidadatildeo

agraves informaccedilotildees puacuteblicas de interesse coletivo (open goverment) a percepccedilatildeo clara da aplicaccedilatildeo dos

recursos puacuteblicos em obras de interesse comum um niacutevel de corrupccedilatildeo menor puniccedilatildeo rigorosa a

quem infringe agraves leis etc Por outro lado o cidadatildeo tem a consciecircncia de sua responsabilidade social

e sabe que ao pagar seus tributos estaacute exercendo o seu papel de cidadatildeo que cumpre com suas

obrigaccedilotildees razatildeo por que tem forccedila para exigir seus direitos Nesses paiacuteses haacute uma maior integraccedilatildeo

entre Estado e sociedade

Desde as uacuteltimas deacutecadas nas sociedades onde a democracia jaacute esteja consolidada verifica-

-se uma mudanccedila de comportamento nas relaccedilotildees entre os cidadatildeos e os poderes puacuteblicos onde os

cidadatildeos tecircm assumido cada vez mais uma posiccedilatildeo de sujeitos ativos nas reivindicaccedilotildees individuais

e coletivas posicionando-se de forma mais exigente nas cobranccedilas de melhores resultados da Ad-

ministraccedilatildeo Puacuteblica (GARCEacuteS et al 2007) Consciente desta realidade o Fundo Monetaacuterio Interna-

cional (FMI) com o intuito de estimular a transparecircncia das accedilotildees e das contas puacuteblicas nos paiacuteses

membros criou em marccedilo de 2001 um Coacutedigo de Boas Praacuteticas de Transparecircncia Fiscal Este coacutedigo

avalia o processo de transparecircncia fiscal sob quatro aspectos a) clareza das responsabilidades do

governo b) abertura do processo orccedilamentaacuterio c) disponibilidade puacuteblica de informaccedilotildees e d) ga-

rantia de integridade das informaccedilotildees fiscais15 Para facilitar a implementaccedilatildeo deste Coacutedigo esta

instituiccedilatildeo financeira editou um Manual de Transparecircncia Fiscal que daacute instruccedilotildees detalhadas sobre

como implantar as boas praacuteticas

Segundo Campos (1990 p 34-40) um Poder Executivo forte ldquoarrecada descontroladamente

14 O conflito existente entre o cidadatildeo-contribuinte e o Estado quanto agraves questotildees tributaacuterias parece ter como uma das causas a desconfianccedila muacutetua Se houvesse participaccedilatildeo do cidadatildeo nas poliacuteticas puacuteblicas e maior transparecircncia nas accedilotildees do Estado acredita-se que em parte esse conflito se reduziria Poreacutem como observa Gonccedilalves (1999 p 9) ldquopara os go-vernantes a sociedade natildeo colabora a maioria de seus elementos satildeo sonegadores de impostos e soacute sabem criticar Para o cidadatildeo comum os governantes e os poliacuteticos satildeo desonestos em sua grande maioria e natildeo administram os recursos puacuteblicos na busca do bem-estar da populaccedilatildeordquo15 Baseado nestes criteacuterios foi realizado um estudo sobre a transparecircncia das accedilotildees e das contas puacuteblicas no Estado de Satildeo Paulo (CHEASTY 2008)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

328

recursos desses cidadatildeos considera-se independente para alocar recursos puacuteblicos sem qualquer con-

sideraccedilatildeo a criteacuterios como igualdade representaccedilatildeo participaccedilatildeo transparecircnciardquo Esse fortalecimento

se daacute pela centralizaccedilatildeo poliacutetico-administrativa e pela natildeo participaccedilatildeo do cidadatildeo e das entidades na

formulaccedilatildeo das poliacuteticas puacuteblicas o que gera foco de corrupccedilatildeo burocracia e corporativismo

A participaccedilatildeo no acircmbito da Administraccedilatildeo Tributaacuteria o que se poderia chamar de ldquofiscalidade

participativardquo foi estudada por Sousa Santos (1998 p 64) que acredita ser possiacutevel implementar algu-

ma discussatildeo com a sociedade sobre as poliacuteticas tributaacuterias A participaccedilatildeo do cidadatildeo-contribuinte

no processo de obtenccedilatildeo de recursos puacuteblicos enfocando o aspecto da ldquofiscalidaderdquo foi tambeacutem

defendida por este autor quando propotildee a ldquofiscalidade participativardquo como ldquouma alteraccedilatildeo radical na

loacutegica da fiscalidade adequada agraves novas condiccedilotildees de dominaccedilatildeo poliacuteticardquo Para esse catedraacutetico de

Coimbra e socioacutelogo do Direito ldquoo controle da vinculaccedilatildeo da obtenccedilatildeo de recursos a destinaccedilotildees es-

peciacuteficas por via dos mecanismos da democracia representativa torna-se virtualmente impossiacutevel Daiacute

a necessidade de a complementar com mecanismos de democracia participativardquo Este autor observa

a viabilidade de sua ideia ao afirmar que a fiscalidade participativa eacute uma via possiacutevel para recuperar

a ldquocapacidade extrativardquo do Estado vinculando-a agrave realizaccedilatildeo de objetivos sociais participativamente

definidos Para ele ldquoo orccedilamento participativo e a fiscalidade participativa satildeo peccedilas fundamentais

da nova democracia redistributivardquo quebrando assim o velho paradigma da falta de participaccedilatildeo da

sociedade no ato de definir a carga tributaacuteria cabendo-lhe a esta apenas a obrigaccedilatildeo de pagar os tri-

butos sem a prerrogativa de opinar discutir sonegar ou reclamar

Poreacutem para viabilizar esta participaccedilatildeo em questotildees tatildeo complexas faz-se necessaacuteria uma nova

postura dos governantes e uma conscientizaccedilatildeo do cidadatildeo quanto agrave responsabilidade social do tribu-

to Tal participaccedilatildeo poderia se iniciar com a criaccedilatildeo de um foacuterum de natureza consultiva formado por

representantes do Governo empresas e sociedade civil para aprofundar os mecanismos de participa-

ccedilatildeo (NETO CISNE 2002)

Devemos sempre lembrar que o interesse puacuteblico parece ser o indissociaacutevel fundamento de

toda e qualquer relaccedilatildeo ou atividade desenvolvida pela Administrativa Puacuteblica Toffler (1985) considera

que a aceitaccedilatildeo da participaccedilatildeo puacuteblica aleacutem de ser um ato de boa feacute e de boa cidadania aperfeiccediloa

imensamente os esforccedilos de planejamento e de obter informaccedilotildees antecipadas o que facilita a toma-

da de decisatildeo e a adaptaccedilatildeo agraves mudanccedilas

Atenta a esse movimento internacional pela transparecircncia a Fundaccedilatildeo Getuacutelio Vargas (FGV)

por meio de seu Nuacutecleo de Estudos Fiscais (NEFFGV) em parceria com o Banco Interamericano de

Desenvolvimento (BID) estatildeo elaborando o Iacutendice de Transparecircncia e Cidadania Fiscal (ITCF) Este iacuten-

dice tem por objetivo como observa Christopoulos (2011a) ldquoidentificar e divulgar quais satildeo as boas

praacuteticas adotadas nas administraccedilotildees fiscais estaduais brasileiras e estudar quais delas podem ser

ferramentas no fortalecimento da cidadania fiscalrdquo A construccedilatildeo deste iacutendice poderaacute contribuir tanto

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

329

para uma eficiecircncia das Administraccedilotildees Tributaacuterias dos Estados como tambeacutem para intensificar as in-

teraccedilotildees entre o Estado e a sociedade

Na elaboraccedilatildeo de um diagnoacutestico sobre a transparecircncia fiscal nos Estados brasileiros Christo-

poulos e Bastos (2011) ao analisar seus portais de transparecircncia constataram um conjunto de boas

obras jaacute adotadas pelos Estados e que ldquomuitos avanccedilos jaacute podem ser auferidos na prestaccedilatildeo de servi-

ccedilos fiscais aos cidadatildeosrdquo Em linhas gerais dentre as boas praacuteticas constatadas por estes pesquisado-

res estatildeo a) Interatividade pelas redes sociais b) Relaccedilatildeo dos 100 maiores fornecedores do Estado c)

Controle de programas governamentais por mapas d) Padronizaccedilatildeo e construccedilatildeo de dados e graacuteficos

pelos cidadatildeos e) Serviccedilos de atendimento ao cidadatildeo f) Informaccedilotildees legislativas tributaacuterias e or-

ccedilamentaacuterias Ao identificar criteacuterios que possibilitasse a construccedilatildeo de um Iacutendice de Transparecircncia e

Cidadania Fiscal (ITFC) Christopoulos (2011b) tinha por objetivo com esse iacutendice ldquoinduzir valorizar e

difundir as boas praacuteticasrdquo entre as Administraccedilotildees Tributaacuterias brasileiras

Considerando os efeitos positivos da participaccedilatildeo ativa da sociedade o governo do Cearaacute por

meio de seus diferentes oacutergatildeos tem adotado as seguintes praacuteticas como forma de estimular a eficiecircn-

cia transparecircncia de seus atos bem como estimular a interaccedilatildeo com a sociedade

a) Adequaccedilatildeo do Portal da Transparecircncia para atender agrave legislaccedilatildeo vigente e oferecer mais

informaccedilotildees aos cidadatildeos Neste portal encontram-se as informaccedilotildees dos valores das receitas des-

pesas transferecircncias constitucionais valores repassados pelo Estado aos municiacutepios e agraves entidades

privadas gastos com pessoal compras e contrataccedilatildeo de obras e serviccedilos entre outros O acesso a este

portal se daacute pelo site wwwtransparenciacegovbr

b) Publicaccedilatildeo da Lei Estadual nordm 15175 de 28 de junho de 2012 que define regras especiacute-

ficas para a implementaccedilatildeo do disposto da Lei Federal nordm 12537 de 16 de novembro de 2011 que

regula o acesso agrave informaccedilatildeo Nesta lei o Governo do Cearaacute criou o Sistema Estadual de Acesso agrave

Informaccedilatildeo integrado pelo Conselho Estadual de Acesso agrave Informaccedilatildeo e pelos Comitecircs Gestores de

Acesso agrave Informaccedilatildeo

c) O Tribunal de Contas do Municiacutepio (TCM) redesenhou seu portal da transparecircncia para do-

taacute-lo de mais informaccedilotildees aleacutem de oferecer apoio teacutecnico para os municiacutepios cearenses criarem e

aprimorarem seus portais de transparecircncia (wwwtcmcegovbr)

d) A Assembleia Legislativa do Cearaacute aleacutem de suas funccedilotildees como representante do povo criou

dentre outros instrumentos a Universidade do Parlamento e um oacutergatildeo de defesa dos consumidores

com o objetivo de intensificar sua interaccedilatildeo com a sociedade cearense (wwwalcegovbr)

e) O Tribunal de Contas do Estado do Cearaacute (TCE) com o objetivo de aprimorar suas funccedilotildees

como oacutergatildeo de controle criou a Escola Superior de Contas e o programa Agente de Controle para

promover seminaacuterios e cursos para jovens e estudantes sobre o papel do Estado e o controle das accedilotildees

governamentais (wwwtcecegovbr)

f) A Associaccedilatildeo Cearense de Transparecircncia Puacuteblica (ACTP) eacute uma associaccedilatildeo civil de direito pri-

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

330

vado sem fins lucrativos cuja finalidade eacute cooperar com os oacutergatildeos governamentais no planejamento

na aplicaccedilatildeo dos recursos puacuteblicos na implantaccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas e na realizaccedilatildeo de estudos e

pesquisa sobre o tema (wwwdomceorgbrpageactphtml)

g) Realizaccedilatildeo em maio de 2012 da primeira Conferecircncia Estadual sobre Transparecircncia e Contro-

le Social (1ordm Consocial) para debater a questatildeo da transparecircncia puacuteblica e do papel da sociedade no

controle das accedilotildees governamentais

h) Accedilatildeo Cearense de Combate agrave Corrupccedilatildeo e a Impunidade (Acecci) eacute uma associaccedilatildeo sem fins

econocircmicos ou lucrativos destinada promover a defesa do interesse puacuteblico por meio do combate agrave

corrupccedilatildeo e a impunidade contribuindo para o aperfeiccediloamento das instituiccedilotildees e do processo de-

mocraacutetico (httpwwwacecciorgbr)

i) O Cearaacute assim como outros Estados da federaccedilatildeo brasileira16 possuem Twitter com link na

paacutegina de transparecircncia para divulgar as accedilotildees realizadas pelo governo inclusive com interaccedilatildeo com

o cidadatildeo para responder suas duacutevidas

j) Elaboraccedilatildeo do novo Sistema de Gestatildeo Governamental por Resultados (S2GPR) que permite

dentre outros feitos a atualizaccedilatildeo em tempo real das informaccedilotildees sobre as receitas despesas diacutevida

puacuteblica contratos e convecircnios no portal da transparecircncia do governo cearense Com este sistema o

Cearaacute foi o primeiro Estado brasileiro a cumprir o novo padratildeo de controle contaacutebil das contas puacuteblicas

exigido pelo Governo Federal atraveacutes da Secretaria do Tesouro Nacional

k) Outra boa praacutetica tem sido o Programa de Educaccedilatildeo Fiscal (PEF) que no acircmbito do Estado

do Cearaacute eacute coordenado pela Secretaria da Fazenda Este programa fortalece a cidadania quando cons-

cientiza a populaccedilatildeo sobre a funccedilatildeo socioeconocircmica do tributo e sua responsabilidade pelo pagamen-

to dos tributos bem como enfatiza a importacircncia do controle social para a eficiente e justa aplicaccedilatildeo

dos recursos puacuteblicos17

Estas boas praacuteticas mostram os recentes avanccedilos rumo ao fortalecimento da cidadania pro-

porcionada pela transparecircncia e pelo acesso agraves informaccedilotildees em nosso Estado Poreacutem o caminho

eacute longo para a consolidaccedilatildeo e incorporaccedilatildeo dessas praacuteticas como direito do cidadatildeo usuaacuterio dos

serviccedilos puacuteblicos

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

As forccedilas da oligarquia vigente no Brasil rural e as condiccedilotildees ideoloacutegicas prevalecentes nas

deacutecadas anteriores a de 1980 natildeo permitiam uma maior participaccedilatildeo social e transparecircncia nas accedilotildees

governamentais Observa-se que ateacute aquela deacutecada seguindo a realidade nacional natildeo havia maiores

16 Outros Estados que tambeacutem adotam esta miacutedia satildeo Alagoas Mato Grosso do Sul e Piauiacute17 Para maiores informaccedilotildees sobre as accedilotildees e resultados deste programa acessar a paacutegina web wwwsefazcegovbredu-cacaofiscal

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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preocupaccedilotildees em mostrar ou prestar contas com a sociedade prendendo-se quase sempre apenas ao

que era exigido pelas leis para fazer cumprir os papeis dos tribunais e das casas legislativas Pouca era

a preocupaccedilatildeo em cumprir os ditames da accountability ou seja a justa prestaccedilatildeo de conta agrave socieda-

de e muito menos havia estimulado o exerciacutecio do controle social de suas accedilotildees

Acredita-se que a gestatildeo participativa deveraacute ser pautada por uma corresponsabilidade com

um senso eacutetico e por uma grande consciecircncia social Tendo sempre a preocupaccedilatildeo de jamais compro-

meter o interesse puacuteblico e o equiliacutebrio financeiro do Estado

Nos diferentes planos de governo as accedilotildees governamentais desde o iniacutecio dos anos 60 do

seacuteculo XX o Estado aparece como o principal responsaacutevel em promover o desenvolvimento eco-

nocircmico e social natildeo contando com a participaccedilatildeo da sociedade para opinar e avaliar as poliacuteticas

puacuteblicas implementadas

A persistecircncia da estrutura de poder baseada no clientelismo patrimonialismo e outras praacuteticas

pouco aconselhadas pelo principio de justiccedila social foi garantida pelas alianccedilas entre os poderes esta-

dual e federal durante o periacuteodo militar (1964-1985) Com a redemocratizaccedilatildeo do paiacutes foi implantado

um novo modelo de gestatildeo puacuteblica baseado nos princiacutepios de Administraccedilatildeo Puacuteblica Gerencial surgi-

da apoacutes a reforma do Estado e introduzindo novas praacuteticas focadas nos resultados e na accountability As tentativas anteriores de se introduzir o controle social com uma maior participaccedilatildeo da so-

ciedade nas accedilotildees governamentais e mesmo natildeo tendo sido consolidada e perdurada ao longo dos

governos no Cearaacute pode se ter como uma aprendizagem valiosa

A participaccedilatildeo da sociedade apesar de ser um grande desafio agrave gestatildeo puacuteblica eacute uma for-

ma de assegurar a transparecircncia dos atos governamentais expandir o controle social sobre as accedilotildees

governamentais e uma forma de consolidar o processo democraacutetico assegurar como prioridade os

interesses da populaccedilatildeo e reduzir a exclusatildeo social

O denominado ldquogoverno das mudanccedilasrdquo que esteve agrave frente da administraccedilatildeo estadual no pe-

riacuteodo de 1987 a 1990 tratou de descentralizar algumas poliacuteticas como a sauacutede no esforccedilo de novos

tipos de intervenccedilatildeo com a sociedade e enfraquecer a velha estrutura de poder vigente no Estado

Podemos perceber no entanto que assim como toda a sociedade estaacute elevando seu niacutevel de

conhecimento e de exigecircncia os contribuintes tambeacutem estatildeo desenvolvendo mais sua consciecircncia

tributaacuteria tornando-se mais esclarecidos e questionadores Esta consciecircncia elevada nem sempre con-

duz ao cumprimento espontacircneo de suas obrigaccedilotildees tributaacuterias

Com os esforccedilos de modernizaccedilatildeo da administraccedilatildeo tributaacuteria no Cearaacute identifica-se uma maior

quantidade de serviccedilos disponiacuteveis aos cidadatildeos por meio da internet ou telefone Poreacutem eacute inexis-

tente qualquer forma de participaccedilatildeo direta da sociedade nas questotildees tributaacuterias seja na captaccedilatildeo

ou aplicaccedilatildeo dos recursos puacuteblicos O cidadatildeo cearense ainda natildeo tem um efetivo controle quanto agrave

aplicaccedilatildeo destes recursos ademais satildeo escassas as avaliaccedilotildees dos impactos dos programas e projetos

governamentais na melhoria de vida dos cidadatildeos

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

332

Outra dimensatildeo que necessita de uma maior atenccedilatildeo eacute quanto agrave capacitaccedilatildeo continuada dos

servidores A falta de conhecimento teacutecnico da equipe responsaacutevel pelo processo participativo soma-

-se agraves dificuldades e agrave complexidade proacuteprias desse processo aumentando a chance de fracasso

Numa recente pesquisa promovida por um jornal18 foi indagado se a populaccedilatildeo acessava os

portais da transparecircncia puacuteblica Dos que responderam a tal indagaccedilatildeo 74 disseram que sim e 26

disseram que natildeo Tal percentual demonstra o interesse da populaccedilatildeo cearense em conhecer o desem-

penho das contas puacuteblicas e das accedilotildees governamentais

A participaccedilatildeo social consiste como bem observa Cordeiro (1998 p 81) num processo peda-

goacutegico para mudar toda uma mentalidade tanto dos governantes como da sociedade E isso leva

tempo e demanda um trabalho persistente e continuado

Quanto aos aspectos positivos desse processo participativo na opiniatildeo de Cordeiro ldquoo princi-

pal ganho no processo de implementaccedilatildeo das gestotildees puacuteblicas participativas no Cearaacute diz respeito

ao avanccedilo da sociedade civil agrave mudanccedila de mentalidade do homem comum que comeccedila a perceber

que seu maior espaccedilo de cidadania eacute discutir os problemas coletivos de seu municiacutepio de sua regiatildeo

num foacuterum adequado A ruptura com a tradicional poliacutetica autoritaacuteria e clientelista estaacute se dando mui-

to mais por conta da sociedade e da afirmaccedilatildeo de cidadania do que do proacuteprio Governordquo Quanto a

esse processo de aprendizagem a maioria dos entrevistados concorda como algo positivo para um

ex-secretaacuterio de planejamento ldquoConstatar esse aprendizado nos anima a continuar com esse tipo de

trabalhordquo Na opiniatildeo de Secretaacuteria de Planejamento do Cearaacute a ldquosociedade mudou avanccedilou em ter-

mo de mobilizaccedilatildeo organizaccedilatildeo e controle socialrdquo

O sistema constitui ldquoum passo importante na medida em que os Conselhos enfrentaram pre-

feitos os poderosos da cidaderdquo Dessa forma ldquohaacute uma marca um substrato de cidadania que ficou e

que pode juntando-se a outros elementos - especialmente a melhoria na educaccedilatildeo - a vir a provocar

outras mudanccedilas jaacute num novo patamarrdquo

Cordeiro (1998 p 93) observa que a participaccedilatildeo eacute ldquoconquistardquo e que ldquonunca haacute condiccedilotildees

ideais para se comeccedilar a participar do mesmo modo como tambeacutem natildeo haacute um ldquoquantumrdquo de partici-

paccedilatildeo maacutexima a partir da qual estariacuteamos satisfeitos E cita Pedro Demo ao afirmar que ldquoparticipaccedilatildeo

que daacute certo traz problemas porque este eacute seu sentidordquo Esta autora observa que ldquonuma sociedade

profundamente desigual como a nossa em que o esforccedilo de manter privileacutegios frente a setores mi-

seraacuteveis chega agraves raias do inimaginaacutevel e em que o Estado sempre funcionou como apoio para essa

concentraccedilatildeo de riqueza natildeo eacute faacutecil implementar qualquer estrutura poliacutetica que possa constituir em-

pecilho agraves poliacuteticas clientelistasrdquo Afirma ainda que ldquoo uso privado da poliacutetica eacute costume tatildeo arraigado

que mesmo o miacutenimo esforccedilo no sentido de tornaacute-la mais efetivamente puacuteblica coletiva participada

tem consequecircncia quase revolucionaacuteriardquo

Cordeiro indaga ldquoQuem estaacute insatisfeito com os Conselhos A populaccedilatildeo que gostaria de ver

18 Esta consulta puacuteblica foi realizada pelo jornal cearense Diaacuterio do Nordeste cujo resultado foi publicado em sua ediccedilatildeo de 14 de maio de 2012

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

333

suas atribuiccedilotildees ampliadas ou as famiacutelias coronelistas que sentem seus caprichos poliacuteticos ameaccedila-

dosrdquo Na opiniatildeo de Cordeiro (1998 p 104) ldquocabe aos formadores de opiniatildeo convencer o Governo e a

sociedade de que esse eacute um bom caminho de que a participaccedilatildeo pode ser instrumento de eficiecircncia

de que a democracia eacute uma aposta alta arriscada mas que vale a pena Para isso em primeiro lugar eacute

necessaacuterio conhecer a realidade das experiecircncias em andamento []rdquo

Apesar dos esforccedilos em inovar a administraccedilatildeo puacuteblica no Cearaacute por interesse dos governos e

atendendo aos reclamos da sociedade ainda se observa que muito ainda haacute por ser feito para torna-

rem eficientes os portais da transparecircncia nas diversas instacircncias de governo Analisando a realidade

desses portais nos diferentes Estados brasileiros Platt et al (2007) identificam dentre outras limitaccedilotildees

que os relatoacuterios satildeo elaborados mais para cumprir as exigecircncias da legislaccedilatildeo que atender aos inte-

resses dos usuaacuterios observando-se a ausecircncia de resumos graacuteficos anaacutelises conclusivas e glossaacuterios

que poderiam ajudar na compreensatildeo do conteuacutedo de tais documentos Ademais eacute pouca a preocu-

paccedilatildeo em facilitar o acesso dos cidadatildeos agraves informaccedilotildees

Ainda satildeo tiacutemidas as accedilotildees que estimulem as medidas intersetoriais na formulaccedilatildeo implemen-

taccedilatildeo e avaliaccedilatildeo dos projetos mesmo aqueles considerados estrateacutegicos A experiecircncia mostra que

fenocircmenos sociais complexos que tecircm afligido nossa sociedade natildeo poderatildeo ser solucionados com

poliacuteticas fragmentadas com accedilotildees isoladas ou seja sem a formulaccedilatildeo de poliacuteticas integradas e com a

participaccedilatildeo e comprometimento do Governo e de todos os segmentos da sociedade Os projetos que

tratam destas questotildees sociais ainda satildeo fragmentos com accedilotildees pontuais e descoordenadas onde natildeo

fica evidenciada qual eacute a participaccedilatildeo das Secretarias envolvidas nem as metodologias e criteacuterios de

avaliaccedilatildeo dos impactos destes projetos

Avaliaccedilatildeo de especialistas a respeito dos portais de transparecircncia constata que apesar da

democratizaccedilatildeo da informaccedilatildeo puacuteblica ainda faltam os devidos cuidados na demonstraccedilatildeo atua-

lizaccedilatildeo veracidade e acesso agraves informaccedilotildees aleacutem de faltarem links de acesso a aacutereas consideradas

importantes19 Deve caber agrave sociedade o papel de fiscalizar e denunciar aos oacutergatildeos competentes

essa falta de cuidado e outras dificuldades para acessar aos dados e informaccedilotildees sobre as contas

puacuteblicas e atos governamentais Na opiniatildeo de um dos especialistas consultados esses portais para

serem de fato transparentes faz-se necessaacuterio que as informaccedilotildees sejam atualizadas em tempo

real como determina a lei com informaccedilotildees completas e detalhadas Tambeacutem eacute necessaacuterio criar as

condiccedilotildees que possibilite ao cidadatildeo interpretar os dados Analisando diversos portais chegou-se a

conclusatildeo de que o portal de transparecircncia do Governo do Cearaacute eacute um dos mais completos poreacutem

satildeo ldquocomplexos alguns meacutetodos de buscar informaccedilotildees Natildeo daacute para saber onde e como satildeo em-

pregadas verbas destinadas agraves secretariasrdquo

19 Opiniotildees de professores da Universidade Federal do Cearaacute (UFC) a respeito dos portais de transparecircncia em entrevistas - Portais de Transparecircncia estatildeo longe do modelo ideal - ao Jornal O Povo ediccedilatildeo de 9 de janeiro de 2011

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

334

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15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

335

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15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

337

A EVOLUCcedilAtildeO DA TRANSPAREcircNCIA DAS CONTAS PUacuteBLICAS E DO CONTROLE SOCIAL NO BRASIL A EXPERIEcircNCIA DO IBEF NO CEARAacute

SUMAacuteRIO Introduccedilatildeo 1 A prestaccedilatildeo de contas puacuteblicas no Brasil 2 A expe-riecircncia do Ibef no Cearaacute 21 As circunstacircncias 22 A instituiccedilatildeo 23 O local 24 O fato 25 A campanha 3 Resultados e desdobramentos Consideraccedilotildees finais Referecircncias

Osvaldo Euclides de Arauacutejo1 Sandra Maria Olimpio Machado2

INTRODUCcedilAtildeO

Na medida em que o mundo civilizado parece ter feito uma opccedilatildeo definitiva pelo liberalismo

poliacutetico e econocircmico com a ampla adoccedilatildeo da Democracia e do Capitalismo e os modelos adversaacuterios

(as tiranias e o comunismo) parecem ter sido definitivamente afastados resta o caminho do aperfei-

ccediloamento do sistema econocircmico escolhido e do regime poliacutetico adotado Na Economia parece haver

convicccedilatildeo de que o Capitalismo se aperfeiccediloa na medida em que se torna mais livre e desregulado

com a miacutenima intervenccedilatildeo do Poder Puacuteblico Na Poliacutetica o aperfeiccediloamento democraacutetico pede o en-

gajamento crescente do cidadatildeo na vida puacuteblica sem o que natildeo haacute saiacuteda possiacutevel para o desenvolvi-

mento real da sociedade em que haja igualdade de oportunidades para todos

Nesse sentido o controle social do poder puacuteblico e a gestatildeo transparente do dinheiro arrecada-

do via tributos satildeo propostas que encontram simpatia da populaccedilatildeo e em funccedilatildeo disso avanccedilam ora

apenas no discurso ora na praacutetica Na medida em que o avanccedilo eacute lento e incompleto surge na cena

puacuteblica um novo protagonista a entidade privada e sem fins lucrativos que nasce da sociedade civil

para catalisar o processo buscando dar-lhe consistecircncia e agilidade Este eacute o cenaacuterio baacutesico em que se

desenrolam os fatos que apontam para o futuro na questatildeo da transparecircncia das contas puacuteblicas (para

concentrar em um termo esse movimento de diversas frentes e diversos matizes)

Este artigo relata uma pesquisa sobre o desenvolvimento da legislaccedilatildeo e de iniciativas da so-

ciedade civil que marcaram os uacuteltimos 25 anos de avanccedilo do Brasil nesta questatildeo e concentra sua

atenccedilatildeo numa iniciativa singular ocorrida quando a consciecircncia sobre a dimensatildeo dessa questatildeo era

ainda pequena quase engatinhava Eacute a singularidade dessa iniciativa o foco deste trabalho

1 Economista Professor Universitaacuterio Mestre em Administraccedilatildeo2 Auditora Fiscal da Receita Estadual da Secretaria da Fazenda do Estado do Cearaacute (Sefaz) Secretaacuteria Executiva da Sefaz Mestre em Administraccedilatildeo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

338

1 A PRESTACcedilAtildeO DE CONTAS PUacuteBLICA NO BRASIL

Os pesquisadores da questatildeo fiscal no Brasil situam na Constituiccedilatildeo Federal promulgada em

05 de outubro de 1988 o ponto de partida e de apoio para o movimento em defesa da transparecircncia

das contas puacuteblicas aqui compreendida como a praacutetica regular e sistemaacutetica de uma gestatildeo do eraacute-

rio aberta ao controle social e da prestaccedilatildeo de contas Como regra geral o seu artigo 37 estampa o

princiacutepio da publicidade aplicaacutevel a todos os Poderes em todos os niacuteveis de governo junto com a

legalidade moralidade impessoalidade e eficiecircncia

Por doze anos nenhuma nova legislaccedilatildeo volta ao assunto Soacute no ano de 2000 eacute que o Congres-

so Nacional vota e aprova a Lei de Responsabilidade Fiscal a Lei Complementar 10100 No bojo das

normas riacutegidas de disciplina fiscal para os entes federados um sistema de indicadores de disciplina

fiscal a serem monitorados e obedecidos impotildee a estados e municiacutepios um protocolo de prestaccedilatildeo de

contas de natureza financeira e fiscal regular e sistemaacutetico para tornar possiacutevel este monitoramento

preventivo e eventualmente punitivo

No ano de 2003 um novo dispositivo legal estabelece a criaccedilatildeo da Controladoria Geral da

Uniatildeo uma nova estrutura com autoridade para no processo de fiscalizar a administraccedilatildeo puacuteblica em

seus trecircs niacuteveis estabelecer normas e procedimentos de transparecircncia das contas puacuteblicas

Eacute nesse contexto que nasce logo em seguida o Portal da Transparecircncia criado em 2004 A en-

trega de informaccedilotildees do cotidiano da administraccedilatildeo puacuteblica ao cidadatildeo pela rede mundial de com-

putadores comeccedila a se desenhar e um prazo razoaacutevel eacute oferecido aos gestores puacuteblicos para darem

concretude ao objetivo da nova norma Estados e Municiacutepios satildeo obrigados a criar e a colocar na

internet seu Portal de informaccedilotildees com acesso livre ao cidadatildeo

Mais adiante no ano de 2009 a Lei Complementar 13109 a Lei da Transparecircncia altera a re-

daccedilatildeo da Lei de Responsabilidade Fiscal no que se refere agrave transparecircncia da gestatildeo fiscal inovando

ao determinar a disponibilizaccedilatildeo em tempo real de informaccedilotildees pormenorizadas sobre a execuccedilatildeo

orccedilamentaacuteria e financeira (pagamentos) da Uniatildeo dos Estados do Distrito Federal e dos Municiacutepios

Em 2012 uma nova lei eacute votada e aprovada A Lei 12527 eacute promulgada dando prazo de seis

meses para o poder puacuteblico em todos os niacuteveis preparar-se para atender demandas de informaccedilatildeo do

cidadatildeo O Brasil junta-se a 96 paiacuteses e cria a sua Lei de Acesso agrave Informaccedilatildeo com o espiacuterito de dar

acesso pleno e aacutegil agrave informaccedilatildeo disponiacutevel na administraccedilatildeo puacuteblica admitindo-se como exceccedilatildeo

apenas o que a lei expressamente prevecirc (como a informaccedilatildeo que possa colocar em risco a seguranccedila

nacional) Qualquer cidadatildeo ou entidade pode solicitar qualquer tipo de informaccedilatildeo a qualquer oacutergatildeo

puacuteblico sem ter de justificar as razotildees de seu interesse Os prazos de atendimento satildeo estreitos e a

puniccedilatildeo por natildeo atendimento eacute severa

No esteio da transparecircncia a Lei 125282012 criou a Comissatildeo da Verdade que investigaraacute

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

339

arquivos puacuteblicos instituiccedilotildees e pessoas que possam ter cometido crimes contra a dignidade hu-

mana como a tortura usando ou natildeo recursos puacuteblicos cobrindo periacuteodo de aproximadamente

quatro deacutecadas

Como se pode observar haacute um avanccedilo importante no arcabouccedilo legal do Paiacutes em apoio agrave trans-

parecircncia das contas puacuteblicas induzindo o Poder Puacuteblico a se abrir estimulando e instrumentando pro-

gressivamente o cidadatildeo agrave participaccedilatildeo e ao controle social Ainda que sem a dimensatildeo e a forccedila de

leis inuacutemeros estados e municiacutepios tomaram interessantes iniciativas de educaccedilatildeo fiscal e de estiacutemulo

agrave participaccedilatildeo cidadatilde Vaacuterias secretarias de fazenda estaduais e inuacutemeras secretarias de financcedilas muni-

cipais conduziram por exemplo programas de orccedilamento participativo e programas promocionais de

educaccedilatildeo fiscal nas escolas fundamentais (com ediccedilatildeo e distribuiccedilatildeo de cartilhas grupos de teatro etc)

Todos eles ou quase todos aconteceram ao longo dos uacuteltimos quinze anos vaacuterios deles se tornando

regulares embora natildeo percam a caracteriacutestica de serem apenas exemplares (pela pequena dimensatildeo)

e de ainda natildeo serem poliacutetica de Estado mas iniciativas de governos

Em termos de novas leis em niacutevel de estados e municiacutepios praticamente natildeo haacute inovaccedilatildeo rele-

vante e iniciativa apenas haacute reaccedilatildeo e adaptaccedilatildeo formal ao ativismo da Uniatildeo Ou seja estados e mu-

niciacutepios quase soacute regulamentam o que a Uniatildeo estabelece via Congresso Nacional Sim a lei eacute votada

no Congresso mas os projetos tecircm tido origem no executivo federal

No Estado do Cearaacute a Lei Estadual 138752007 e o Decreto 309392012 regulamentam o Por-

tal da Transparecircncia enquanto a Lei 151752012 regulamenta observando as diretrizes da Uniatildeo a Lei

de Acesso agrave Informaccedilatildeo Isso se repete nos demais Estados

Se deixarmos o espaccedilo puacuteblico encontraremos iniciativas no Terceiro Setor (referimo-nos a

organizaccedilotildees natildeo governamentais que buscam atender o interesse coletivo sem visar lucro) que

reuacutene as organizaccedilotildees criadas especialmente para cumprir de forma complementar (ou substitutiva)

papeacuteis que em tese caberiam ao Primeiro Setor (poder puacuteblico) e ao Segundo Setor (a iniciativa

empresarial privada)

Neste contexto a primeira organizaccedilatildeo natildeo governamental criada em abril de 2000 eacute a Trans-

parecircncia Brasil que alcanccedilou grande visibilidade e reputaccedilatildeo puacuteblica pela divulgaccedilatildeo regular de um

iacutendice de percepccedilatildeo do niacutevel de corrupccedilatildeo no Paiacutes e pela incisiva accedilatildeo de vigilacircncia e cobranccedila do

desempenho dos eleitos pelo povo para representaacute-lo no Parlamento entre outras accedilotildees

Outra instituiccedilatildeo eacute o Observatoacuterio Social de Maringaacute criado em 2004 por meio do movimento

Sociedade Eticamente Responsaacutevel (SER) Esta instituiccedilatildeo constituiacuteda sob a forma de associaccedilatildeo civil

sem fins lucrativos tornou-se modelo de como a sociedade civil pode efetivamente participar e fazer

controle social O Observatoacuterio realiza accedilotildees exemplares de vaacuterios tipos como o acompanhamento do

princiacutepio ao fim de processos licitatoacuterios relevantes levados a efeito pelo poder puacuteblico municipal

Tambeacutem alcanccedilou grande destaque a criaccedilatildeo em 2005 da entidade Contas Abertas que atua no

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

340

acompanhamento direto e criacutetico dos gastos do governo federal e dos parlamentares sendo constan-

temente citada por seu trabalho na imprensa e no proacuteprio Congresso

Na esfera puacuteblica como se pode observar haacute uma concentraccedilatildeo da iniciativa nas matildeos do Po-

der Executivo em niacutevel federal assim como haacute uma concentraccedilatildeo temporal das iniciativas a partir do

ano 2000 Fora da esfera puacuteblica o Terceiro Setor tambeacutem datou suas iniciativas a partir do ano 2000

de forma mais decisiva

Assim qualquer iniciativa que esteja fora desse contexto pelo menos em tese merece

atenccedilatildeo e anaacutelise Este artigo pretende expor uma iniciativa que natildeo partiu do poder puacuteblico natildeo

teve origem numa instituiccedilatildeo tiacutepica de Terceiro Setor e aconteceu antes do ano 2000 Segue relato

dessa experiecircncia

2 A EXPERIEcircNCIA DO IBEF NO CEARAacute

21 As circunstacircncias

O Brasil experimentou em quatro anos de 1988 a 1992 trecircs grandes fatos histoacutericos a promul-

gaccedilatildeo de uma nova Constituiccedilatildeo a primeira eleiccedilatildeo para presidente depois de 29 anos de ditadura

militar e a renuacutencia (ou impeachment haacute controveacutersia pois a carta de renuacutencia chega ao Congresso

no exato momento em que se iniciava a votaccedilatildeo do impedimento) do presidente eleito Eacute sem duacutevida

uma ambiecircncia institucional e poliacutetica propiacutecia ao avanccedilo de praacuteticas de cidadania

22 A instituiccedilatildeo

O Instituto Brasileiro de Executivos de Financcedilas (Ibef) eacute uma associaccedilatildeo civil sem fins lucrativos

criada em 1980 e que reuacutene executivos financeiros das empresas privadas brasileiras de um modo ge-

ral visando valorizar e contribuir para o desenvolvimento desses profissionais O Ibef natildeo tem e nunca

teve accedilatildeo poliacutetica nem atividade partidaacuteria e tradicionalmente sempre focou quase exclusivamente o

crescimento profissional atraveacutes da troca de experiecircncias e do treinamento de seus associados O Ibef

eacute uma entidade de atuaccedilatildeo nacional (por meio da instituiccedilatildeo master) e regional (por meio de seccedilotildees

estaduais) e contava entatildeo com aproximadamente dois mil membros associados

23 O local

O Cearaacute eacute um estado brasileiro dos mais pobres localizado na regiatildeo Nordeste Tem uma popu-

laccedilatildeo de cerca de oito milhotildees de habitantes (cerca de quatro por cento do Brasil) e um PIB de apro-

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

341

ximadamente quarenta bilhotildees de doacutelares (menos de dois por cento do PIB do Brasil de cerca de US$

26 tri) O Cearaacute experimentou grande e forte mudanccedila poliacutetica entre 1987 e 1992 Um jovem e moder-

no empresaacuterio disputou uma eleiccedilatildeo para o Governo do Estado em 1986 e derrotou uma coligaccedilatildeo de

trecircs antigos ldquocoroneacuteisrdquo da poliacutetica cearense Esse jovem empresaacuterio foi sucedido por um poliacutetico ainda

mais jovem e ainda mais ousado e aberto em termos poliacuteticos Ambos foram eleitos e governavam o

Estado sob o signo das ldquoMudanccedilasrdquo acenando para a populaccedilatildeo com a promessa de novas praacuteticas

poliacuteticas e administraccedilatildeo moderna

24 O fato

Num artigo publicado na paacutegina de opiniatildeo do mais tradicional jornal local o presidente do

Ibef (capiacutetulo do Cearaacute) surpreendendo a comunidade lanccedila uma campanha pela Transparecircncia das

Contas Puacuteblicas e convida a sociedade civil a ser parceira desta empreitada No texto o articulista defi-

ne bem a campanha a proposta eacute obrigar os gestores puacuteblicos a prestar contas dos atos fatos nuacuteme-

ros e dinheiros puacuteblicos E faz um convite aberto agrave participaccedilatildeo geral como o tiacutetulo do artigo sugere

em busca de apoio e parceiros Sempre que teve oportunidade de apresentar e explicar a campanha o

presidente do IBEF explicava que natildeo defendia um conceito abstrato como eacutetica modernidade espiacuteri-

to puacuteblico etc Defendia sim uma ideia de ordem objetiva a praacutetica da prestaccedilatildeo de contas O artigo

na imprensa deflagrou vaacuterias accedilotildees

25 A campanha

A campanha consistiu de accedilotildees em vaacuterias frentes

a) cerca de vinte palestras foram realizadas em escolas puacuteblicas e privadas em universidades

em clubes de serviccedilo (como Rotary e Lyons) em associaccedilotildees empresariais e de profissionais liberais

em sindicatos

b) entrevistas foram concedidas para diversos canais de televisatildeo e de raacutedio Eacute interessante

notar que a campanha atraiu expressiva atenccedilatildeo dos meios de comunicaccedilatildeo de massa principal-

mente no seu iniacutecio

c) uma campanha publicitaacuteria com seis anuacutencios de um quarto de paacutegina cada um foi pro-

duzida por uma agecircncia de propaganda e veiculada no maior jornal regional (e chegou a ser consi-

derada uma das cinco melhores do ano em concurso organizado pelas entidades de comunicaccedilatildeo

empresarial da regiatildeo)

d) um adesivo plaacutestico da campanha foi distribuiacutedo para ser colado em paacutera-brisas de auto-

moacuteveis (foram impressos e distribuiacutedos aproximadamente duzentos exemplares)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

342

e) contatos e trocas de informaccedilatildeo foram feitos com membros do parlamento municipal e

estadual

f) contatos e trocas de informaccedilatildeo foram feitos com membros do poder executivo municipal

e estadual

g) convites foram feitos a membros destacados dos trecircs poderes locais (executivo legislativo

e judiciaacuterio) para debate e inuacutemeros debates aconteceram

3 RESULTADOS E DESDOBRAMENTOS

1 O Prefeito Municipal da capital do Estado forneceu ao presidente regional do Ibef os balan-

cetes mensais relativos aos uacuteltimos 12 (doze) meses de sua gestatildeo e prometeu continuar a fazer a en-

trega regularmente De posse dos nuacutemeros da prestaccedilatildeo de contas de natureza contaacutebil o Ibef fez por

intermeacutedio de um de seus diretores uma anaacutelise criacutetica da evoluccedilatildeo das financcedilas municipais Quando

o Ibef publicou na imprensa local a anaacutelise da situaccedilatildeo financeira da Prefeitura o Prefeito manifestou

todo o seu aborrecimento e cancelou sua ordem anterior suspendendo definitivamente a entrega dos

balancetes mensais

2 O Governador do Estado assegurou em contatos informais a sua simpatia e o seu apoio agrave

campanha Tal posiccedilatildeo entretanto foi rapidamente modificada Quando um deputado apresentou na

Assembleia Legislativa do Estado projeto de lei propondo que o Governo do Estado publicasse ba-

lancetes financeiros mensais obteve dos seus pares do Parlamento a aprovaccedilatildeo por unanimidade do

voto dos demais deputados Para surpresa geral ao inveacutes de simplesmente sancionaacute-lo o Governador

o vetou integralmente com alegaccedilotildees pouco convincentes

3 Um vereador de Fortaleza capital do Estado do Cearaacute apresentou na Cacircmara Municipal pro-

jeto de lei similar Ou seja a prefeitura seria levada pela lei a divulgar balancetes financeiros mensais

dando transparecircncia agrave sua arrecadaccedilatildeo gastos investimentos e situaccedilatildeo financeira de caixa e de en-

dividamento Advertido pela anterior votaccedilatildeo unacircnime no acircmbito da Assembleia do Estado o prefeito

antecipou-se e interferiu na votaccedilatildeo usou toda a sua forccedila poliacutetica para derrotar o projeto de lei que

terminou sendo rejeitado por larguiacutessima margem

4 Pelo menos quatro prefeituras municipais de pequenas cidades do interior passaram a di-

vulgar regularmente seus balancetes financeiros na imprensa local A praacutetica foi interrompida quando

mudaram os prefeitos

5 A campanha do Ibef durou oito meses Foi interrompida com a eleiccedilatildeo de nova diretoria Ja-

mais foi retomada

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

343

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Como foi dito o foco deste trabalho eacute a singularidade que caracteriza a iniciativa do Ibef no

Estado do Cearaacute no ano de 1992 entrando pelos primeiros meses de 1993 que lanccedilou uma campanha

pela Transparecircncia das Contas Puacuteblicas Satildeo vaacuterios os motivos que tornam a campanha singular

Em primeiro lugar o momento de seu lanccedilamento Naquela ocasiatildeo a palavra Transparecircncia

natildeo havia ainda adquirido o significado imediato que hoje sua simples pronuacutencia sugere Era uma

palavra de pouco uso e pouco curso Para se ter uma ideia mais exata de quanto a palavra era pouco

comum vale lembrar que a instituiccedilatildeo pioneira nesse movimento em niacutevel internacional a Transpa-

recircncia Internacional soacute foi criada em maio de 1993 em Berlim Alemanha Em nosso Paiacutes soacute em 2001

eacute que nasce a pioneira Transparecircncia Brasil

Em segundo lugar cabe ressaltar o fato de que o Ibef eacute uma associaccedilatildeo de profissionais cem por

cento ligada ao mercado empresarial sem nenhuma experiecircncia ou accedilatildeo anterior de natureza poliacutetica

Esse tipo de entidade costuma concentrar todo seu esforccedilo para promover seus proacuteprios associados

no mercado e oferecer-lhes o maacuteximo em oportunidades de T amp D (treinamento e desenvolvimento)

e convivecircncia com os pares para troca de experiecircncia A campanha pela Transparecircncia das Contas Puacute-

blicas natildeo tinha na histoacuteria do Ibef nenhum precedente

Terceiro o Ibef do Cearaacute natildeo eacute o maior natildeo eacute o principal e natildeo tem nenhuma particularidade

que o distinga dos demais Ibefs estaduais O Cearaacute entretanto viveu nos anos que precederam a

campanha uma grande mudanccedila poliacutetica com poliacuteticos jovens portadores de um discurso de mo-

dernizaccedilatildeo da administraccedilatildeo puacuteblica promovendo a derrota de lideranccedilas antigas ultrapassadas Era

o discurso da ldquomudanccedilardquo contra o discurso dos ldquocoroneisrdquo Evidentemente natildeo aconteceu nenhuma

revoluccedilatildeo no Estado do Cearaacute mas a poliacutetica teve uma efervescecircncia especial com a mobilizaccedilatildeo da

cidadania em alguns momentos

Quarto a pesquisa sobre a campanha da Transparecircncia das Contas Puacuteblicas mostra que ela teve

excepcional impacto porque teve muita cobertura da imprensa local Checando a miacutedia impressa local

observa-se todavia que soacute um dos dois grandes jornais diaacuterios locais cobriu toda a campanha noti-

ciando cada fato cada desdobramento cada evento tudo repercutindo (trata-se do jornal O POVO de

maior tradiccedilatildeo e credibilidade) Haacute dois fatos a destacar O primeiro eacute que houve uma cobertura com-

pleta e profunda da campanha O segundo eacute que a cobertura foi feita pelo veiacuteculo de comunicaccedilatildeo de

massa reconhecido por todos como o mais forte formador de opiniatildeo do Cearaacute

Quinto ainda com relaccedilatildeo ao momento da campanha cabe registrar que ela foi avanccedilada para

o momento Nenhuma instacircncia do Parlamento (seja municipal estadual ou federal) havia ateacute entatildeo

tomado qualquer iniciativa de propor leis sobre prestaccedilatildeo de contas por parte do poder puacuteblico Des-

se ponto de vista a campanha do Ibef aproximou-se de realizar algo quase impensaacutevel municiacutepio e

estado legislarem sobre a questatildeo antes da Uniatildeo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

344

Sexto apesar de toda a publicidade e de toda a repercussatildeo da campanha ela natildeo foi jamais

retomada ou imitada mesmo ateacute hoje mais de vinte anos depois nem pelo Ibef nem por nenhuma

outra entidade de profissionais ou de empresaacuterios O movimento pela transparecircncia soacute volta pelas

atividades institucionais das organizaccedilotildees especializadas de Terceiro Setor (Contas Abertas Transpa-

recircncia Brasil e Observatoacuterio de Maringaacute para citar as pioneiras)

Seacutetimo a campanha e suas caracteriacutesticas a colocam tambeacutem como uma avanccedilada accedilatildeo em

busca de controle social a outra face da transparecircncia

Natildeo se deve esperar que este trabalho apresente alguma tese para explicar as leituras que estes

fatos sugerem Sequer apresentamos as inuacutemeras leituras que os fatos sugerem fica a oportunidade

aberta a outros pesquisadores O objetivo era apenas expor uma iniciativa especial e demonstrar sua

singularidade sob os mais diversos aspectos Esperamos ter atingido esse objetivo assim como espe-

ramos que outros pesquisadores se debrucem sobre o passado para nos ajudar a compreendecirc-lo e a

melhor construir o futuro

REFEREcircNCIAS

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15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

346

PARTE V

EDUCACcedilAtildeO FISCAL NO ENSINO DESAFIOS E PERSPECTIVAS

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

347

A EDUCACcedilAtildeO FISCAL SOB A OacuteTICA DO ALUNO DA ESCOLA PUacuteBLICA ESTADUAL DO CEARAacute QUE PARTICIPA DO PROJETO BOLSA EDUCACcedilAtildeO

FISCAL E CIDADANIA

SUMAacuteRIO Introduccedilatildeo 1 A tributaccedilatildeo e a educaccedilatildeo fiscal 2 A educaccedilatildeo fis-cal no Cearaacute 3 Metodologia 4 Resultados e discussotildees Consideraccedilotildees finais Referecircncias

Amilca Alves do Nascimento1 Mirizana Alves de Almeida2

INTRODUCcedilAtildeO

Os termos Cidadania e Tributaccedilatildeo tecircm sido assunto mais que recorrente na agenda poliacutetica e

econocircmica nos uacuteltimos anos no Brasil Um resgate da evoluccedilatildeo histoacuterica da cidadania e da tributaccedilatildeo

no Brasil eacute essencial para compreender o tema dessa pesquisa Para Carvalho (2003) a cidadania eacute

fruto de luta e conquista de direitos e participaccedilatildeo do povo Poreacutem no Brasil essa dita cidadania surge

como doaccedilatildeo de governos autoritaacuterios invertendo a piracircmide de T A Marshall representada pelo tri-

peacute direitos civis poliacuteticos e sociais Faz-se necessaacuterio uma leitura do Estado e da relaccedilatildeo estabelecida

com o cidadatildeo no decorrer da histoacuteria A sociedade civil e o Governo natildeo conseguem chegar a uma

relaccedilatildeo harmoniosa tendo em vista que os objetivos a serem alcanccedilados satildeo conflitantes ou incompa-

tiacuteveis pois cada lado dessa relaccedilatildeo tem concepccedilotildees distintas acerca do modelo de tributaccedilatildeo exigindo

do sistema tributaacuterio modificaccedilotildees substanciais

Dessa forma a relaccedilatildeo fisco-sociedade surgiu com a proacutepria evoluccedilatildeo da humanidade A ne-

cessidade de viver em grupo de ser gregaacuterio levou o homem a se organizar e viver em sociedade O

Estado representa a sociedade responsaacutevel por satisfazer agraves necessidades baacutesicas de sauacutede educaccedilatildeo

transporte saneamento e moradia de seus indiviacuteduos Portanto pensar numa sociedade organizada

exige recursos financeiros para mantecirc-la onde o tributo eacute a principal fonte de recurso para financiar o

ocircnus desta organizaccedilatildeo social (BUFFON 2009)

O Estado Democraacutetico de Direito exige de seus cidadatildeos o cumprimento da obrigaccedilatildeo de maior

relevacircncia para o desenvolvimento social o dever de pagar os tributos Nesta concepccedilatildeo o dever

1 Administradora Mestrado em Planejamento de Poliacutetica Puacuteblicas pela Universidade Estadual do Cearaacute (2012) Especialista em Gerecircncia de Recursos Humanos pela Universidade Estadual do Cearaacute (1999) E-mail amilcaalvessefazcegovbr 2 Fisioterapeuta (UNIFOR) Aprimoramento em Fisioterapia Hospitalar (UFC-HUWC) Especialista e Mestre em Ciecircncias Fi-sioloacutegicas (UECE) Doutora em Ciecircncias Meacutedicas (UFC) docente da UNICHRISTUS e pesquisadora do RespLab - UFC E-mail professoramirizanyahoocombr

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

348

tributaacuterio eacute de interesse geral pois ele proporciona as condiccedilotildees de sobrevivecircncia da sociedade Por

isso segundo Buffon (2009) para o Estado exercer o papel de regulador da economia e de promotor

da justiccedila social deve captar recursos financeiros para cumprir essa funccedilatildeo

Dessa forma os Estados em 1996 reunidos no Conselho Nacional de Poliacutetica Fazendaacuteria (Con-

faz) criaram o Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal (PNEF) em seu discurso oficial objetiva desper-

tar a sociedade para o pleno exerciacutecio da cidadania e controle social

O Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Cearaacute eacute uma ferramenta que procura formar a consciecircncia

fiscal e tributaacuteria da populaccedilatildeo Em meio a diversas accedilotildees do PNEF a Sefaz e Seduc realizaram o ter-

mo de cooperaccedilatildeo teacutecnica e criaram o Projeto ldquoBolsa Educaccedilatildeo Fiscal e Cidadaniardquo com o objetivo de

contribuir para formaccedilatildeo da cidadania do estudante matriculado no ensino meacutedio da escola puacuteblica

estadual com ecircnfase na educaccedilatildeo fiscal

Portanto a Cidadania Fiscal tem se configurado um assunto complexo e por isso foi realizada

essa pesquisa para responder a seguinte pergunta o Projeto ldquoBolsa Escola e Cidadaniardquo contribui na

formaccedilatildeo da cidadania do aluno da escola puacuteblica do estado do Cearaacute Deste modo os objetivos

especiacuteficos desta pesquisa buscam mensurar a eficiecircncia do curso ldquoMonitor de Educaccedilatildeo Fiscalrdquo reali-

zado pela Sefaz verificar as atividades de disseminaccedilatildeo da educaccedilatildeo fiscal praticadas pelos alunos na

comunidade escolar e identificar o perfil socioeconocircmico e cultural do aluno que participa do projeto

O referencial teoacuterico traz uma apresentaccedilatildeo dos conceitos de cidadania e tributaccedilatildeo abordan-

do alguns aspectos histoacutericos que estatildeo na base dos problemas atuais na sociedade Pretende-se mos-

trar que a relaccedilatildeo Fisco e Sociedade assunto de caraacuteter conflituoso apresenta-se de forma recorrente

em qualquer paiacutes do mundo

Certamente que cada ponto mencionado nessa pesquisa visa mostrar sob a oacutetica do aluno a

contribuiccedilatildeo do Projeto Educaccedilatildeo Fiscal e Cidadania na formaccedilatildeo do estudante da escola puacuteblica do

Estado do Cearaacute

1 A TRIBUTACcedilAtildeO E A EDUCACcedilAtildeO FISCAL

A Constituiccedilatildeo Federal do Brasil traccedila as principais diretrizes para organizaccedilatildeo social do paiacutes os

princiacutepios fundamentais os direitos e garantias fundamentais a organizaccedilatildeo do Estado e dos Poderes

a questatildeo da defesa do Estado e das instituiccedilotildees democraacuteticas a tributaccedilatildeo o orccedilamento as ordens

econocircmicas financeiras e sociais do paiacutes (BRASIL 2007)

O Sistema Tributaacuterio Nacional (STN) eacute o conjunto de normas que regulam o poder de tributar de

determinadas instituiccedilotildees em que a justiccedila fiscal deve ser o fundamento desse sistema ou seja quem

ganha mais paga mais O STN deve em sua composiccedilatildeo atender os direitos humanos fundamentais

da sociedade e por meio do Estado deve cumprir o seu papel promover a justiccedila social e ser instru-

mento de distribuiccedilatildeo de renda visando o alcance do bem comum (BRASIL 2009)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

349

Para dar suporte a esse Estado tributaacuterio e fiscal surge o Sistema Tributaacuterio Brasileiro que pas-

sou a vigorar apoacutes a promulgaccedilatildeo da Constituiccedilatildeo de 1988 fundamentado nos artigos 145 a 162 da

Constituiccedilatildeo Federal (CF) A estrutura piramidal do STN demostra a hierarquia juriacutedica do sistema em

que a Constituiccedilatildeo eacute a lei maacutexima no paiacutes (BRASIL 2002a)

A Constituiccedilatildeo Federal define os Princiacutepios Tributaacuterios Constitucionais que regulamentam e sis-

tematizam o poder de tributar do Estado brasileiro para uma efetiva justiccedila social do paiacutes Tais princiacute-

pios existem para proteger os contribuintes contra os abusos do poder de tributar que estatildeo definidos

conforme os artigos 145 150 e 151 da CF88 (BRASIL 2007)

Desse modo observa-se que esses princiacutepios limitam a accedilatildeo estatal garantindo que esses en-

tes natildeo criem tributos que natildeo estejam previstos na Constituiccedilatildeo Federal respeitando e protegendo

os direitos fundamentais dos cidadatildeos Assim o conceito de tributo eacute entendido como toda presta-

ccedilatildeo pecuniaacuteria e compulsoacuteria devida a um ente puacuteblico federal estadual ou municipal previsto em

lei com finalidade de prover recursos financeiros para o Estado no cumprimento das necessidades

sociais de sauacutede educaccedilatildeo habitaccedilatildeo saneamento transporte seguranccedila urbanismo e justiccedila so-

cial (BRASIL 2002b)

Para o tributarista Buffon (2009 p79) pagar tributos eacute o principal dever de cidadania que pos-

sibilita o Estado realizar de forma efetiva o combate agrave desigualdade social e agrave concentraccedilatildeo de renda

na sociedade

Nesta direccedilatildeo os impostos taxas e contribuiccedilotildees de melhoria satildeo a principal fonte de recursos

financeiros do Estado para promover o crescimento econocircmico e o desenvolvimento social do Paiacutes

Esses recursos financeiros devem cumprir os fundamentos da Repuacuteblica Federativa do Brasil e seus

objetivos nunca se limitar agrave simples arrecadaccedilatildeo de valores e sim cumprir a funccedilatildeo econocircmica e social

estabelecida na Constituiccedilatildeo Federal (BRASIL 2007)

Os tributos satildeo classificados em vinculados e natildeo vinculados Os tributos vinculados se referem

a uma atividade prestada pelo Estado em que o CTN em seu artigo 77 classifica taxas e contribuiccedilatildeo

de melhoria como tributos vinculados a uma prestaccedilatildeo de serviccedilo concreta e de competecircncia comum

isto eacute pode ser cobrada por qualquer ente federativo (Uniatildeo Estados Distrito Federal e Municiacutepios)

As taxas satildeo tributos vinculados e estatildeo divididas em duas espeacutecies taxa de fiscalizaccedilatildeo e taxa

de serviccedilos A taxa de licenccedila para construccedilatildeo de um imoacutevel a taxa de publicidade a taxa de localiza-

ccedilatildeo de estabelecimento satildeo exemplos de taxas de fiscalizaccedilatildeo visto que acompanham e regulam as

accedilotildees dos cidadatildeos garantindo a vida em comunidade A taxa de emissatildeo de passaporte a taxa de

coleta de lixo a taxa para emissatildeo de certidatildeo de bons antecedentes satildeo exemplos de taxas de servi-

ccedilos puacuteblicos especificos (BRASIL 2002a)

A contribuiccedilatildeo de melhoria eacute um tributo instituiacutedo decorrente do custo de obras puacuteblicas que

valorizam imoacuteveis tendo como limite total a despesa realizada e como limite individual a valorizaccedilatildeo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

350

do imoacutevel beneficiado O Estado entende que quando ocorre uma obra puacuteblica haacute a valorizaccedilatildeo do

imoacutevel particular sendo o pagamento da contribuiccedilatildeo de melhoria devido ao Estado Este tributo eacute

vinculado agrave realizaccedilatildeo de uma obra puacuteblica O CTN em seu artigo 81 esclarece o que eacute a contribuiccedilatildeo

de melhoria (BRASIL 2002a)

Art 81 A contribuiccedilatildeo de melhoria cobrada pela Uniatildeo pelos Estados pelo Distrito Federal ou pelos Municiacutepios no acircmbito de suas respectivas atribuiccedilotildees eacute instituiacuteda para fazer face ao custo de obras puacuteblicas de que decorra valorizaccedilatildeo imobiliaacuteria ten-do como limite total a despesa realizada e como limite individual o acreacutescimo de valor que da obra resultar para cada imoacutevel beneficiado

E os tributos natildeo vinculados satildeo aqueles que tecircm por fato gerador uma situaccedilatildeo independente

de qualquer atividade estatal especiacutefica relativa ao contribuinte Os tributos natildeo vinculados satildeo os

impostos especificados nos artigos 153 155 e 156 da CF88 cobrados pelo Estado sem qualquer

prestaccedilatildeo de serviccedilo ou obra a um determinado contribuinte que retornam agrave sociedade por meio de

benefiacutecios e vantagens coletivas em prol do bem comum (BRASIL 2007)

Dessa forma o imposto ldquoeacute o tributo cuja obrigaccedilatildeo tem por fato gerador uma situaccedilatildeo in-

dependente de qualquer atividade especifica do Estado relativa ao contribuinterdquo Os impostos satildeo

tributos natildeo vinculados a uma prestaccedilatildeo de serviccedilo especifica e pode ser de competecircncia da Uniatildeo

Estados Distrito Federal e Municiacutepios (BRASIL 2002a)

Os impostos satildeo classificados em direto ou indireto e progressivo ou regressivo O imposto

direto eacute aquele pago e recolhido pela proacutepria pessoa fiacutesica ou juriacutedica O imposto indireto eacute aquele

pago por uma pessoa e recolhido por outra isto eacute quem paga o imposto natildeo eacute o mesmo que re-

colhe ou seja eacute aquele que incide sobre o consumo independente da capacidade contributiva do

cidadatildeo O imposto progressivo eacute aquele que quando a renda aumenta o valor cobrado aumenta

isto eacute de acordo com a capacidade econocircmica (contributiva) da pessoa O imposto regressivo eacute

aquele que natildeo considera o poder aquisitivo ou a capacidade contibutiva do cidadatildeo (REBOUCcedilAS

2000 In VIDAL 2010)

A tributaccedilatildeo brasileira tem como base os impostos regressivos e indiretos desprezando a capa-

cidade contributiva da populaccedilatildeo desrespeitando os princiacutepios tributaacuterios estabelecidos na Constitui-

cao Federal acarretando uma pesada e injusta carga tributaacuteria para a sociedade e acirrando o conflito

na relaccedilatildeo Estado-Cidadatildeo (BUFFON 2009)

Aleacutem disso a populaccedilatildeo paga os impostos mas natildeo se reconhece como contribuinte criando

uma visatildeo distorcida na relaccedilatildeo Fisco-Sociedade Por outro lado o STN possui uma linguagem teacutecnica

e complexa que dificulta a sociedade de se apropriar dessas informaccedilotildees importantes para a constru-

ccedilatildeo de confianccedila nessa relaccedilatildeo Do ponto de vista humano eacute essencial que STN atenda as necessida-

des de grande parcela da populaccedilatildeo combatendo as desigualdades e a concentraccedilatildeo de renda por

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

351

meio da efetiva justiccedila fiscal da transparecircncia e da eficiecircncia na aplicaccedilatildeo dos recursos puacuteblicos Desse

modo conhecer o papel do Estado suas origens seus propoacutesitos e o controle do gasto puacuteblico cria

um ambiente democraacutetico de participaccedilatildeo tornando a relaccedilatildeo FiscoSociedade mais transparente e

harmocircnica (BUFFON 2009)

2 A EDUCACcedilAtildeO FISCAL NO CEARAacute

A Portaria nordm 35 do Ministeacuterio da Fazenda criou o grupo de Educaccedilatildeo Tributaacuteria dos Estados

(GET) responsaacutevel por promover e coordenar as accedilotildees do PNEF nos Estados Jaacute a Portaria nordm 413 defi-

niu as instituiccedilotildees responsaacuteveis por implantar o Programa nos trecircs niacuteveis de governo Federal Estadual

e Municipal O GET tem autonomia de elaborar e implementar o programa estadual de acordo com a

filosofia e as diretrizes do PNEF (BRASIL 2009)

No Cearaacute a Sefaz em 1959 no governo de Joseacute Parsival Barroso sob o discurso de melhorar a

relaccedilatildeo conflituosa Fisco-Sociedade lanccedilou a Campanha ldquoSeu talatildeo vale um milhatildeordquo O objetivo des-

sa campanha era estimular a populaccedilatildeo a exigir o documento fiscal no momento da compra de um

produto Essa campanha foi um sucesso em arrecadaccedilatildeo e levou o governo estadual a lanccedilar diver-

sas campanhas visando incentivar cada vez mais a participaccedilatildeo do cidadatildeo na tarefa de fiscalizaccedilatildeo

e recolhimento dos tributos Dessa forma a partir da deacutecada de 1990 foram elaborados programas

e projetos locais que visavam disseminar a educaccedilatildeo tributaacuteria na sociedade cearense (AMORIM

WEYNE 2006)

A Lei Estadual nordm 11916 de janeiro de 1992 instituiu o ldquoPrograma Estadual de Fiscalizaccedilatildeo Co-

munitaacuterialdquo Esse programa incentivava o cidadatildeo a exigir a nota fiscal e em contrapartida premiava as

Associaccedilotildees Comunitaacuterias Creches Comunitaacuterias Postos de Sauacutede Galpotildees Industriais Casa de Fari-

nha Engenhos Comunitaacuterios que recolhessem o maior valor em notas fiscais emitidas pelo comeacutercio

varejista do Estado (AMORIM WEYNE 2006)

No Cearaacute o Confaz em 1996 no seminaacuterio sobre Administraccedilatildeo Tributaacuteria percebeu a impor-

tacircncia de inserir no curriacuteculo das escolas puacuteblicas um programa que despertasse nos jovens estudan-

tes a praacutetica da cidadania o respeito ao bem comum e a certeza de que o bem-estar social somente

se consegue com a conscientizaccedilatildeo de todos (RIVILLAS VILLADERBOacute MOTA 2010)

Por sua vez em 1997 no municiacutepio de HorizonteCE a Sefaz lanccedilou o Projeto ldquoCidadatildeo desde

Pequeno o ABC da cidadaniardquo apresentando noccedilotildees gerais sobre tributaccedilatildeo e cidadania por meio de

palestras nas escolas puacuteblicas e particulares dos municiacutepios Esse projeto visava despertar a cidadania

nos jovens cearenses passo importante para a implantaccedilatildeo do Programa de Educaccedilatildeo Tributaacuteria no

Estado (RIVILLAS VILLADERBOacute MOTA 2010)

Deste modo o Estado do Cearaacute por meio do Decreto Estadual nordm 25326 de 23 de Dezem-

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

352

bro de 1998 lanccedilou em parceria com as Secretarias estaduais de Fazenda de Educaccedilatildeo e a Secre-

taria Municipal de Desenvolvimento Social o Programa de Educaccedilatildeo Tributaacuteria do Cearaacute ndash PET CE

(CEARAacute 1998)

Art 1ordm - Fica criado o Programa Educaccedilatildeo Tributaacuteria junto agraves instituiccedilotildees de Ensino objetivando conscientizar as pessoas sobre a importacircncia do pagamento de tributos um dos principais deveres do cidadatildeo bem como o de esclarecer sobre o papel do Estado de arrecadar tributos e aplicaacute-los eficientemente para o desenvolvimento da sociedade (CEARAacute 1998)

Os recursos financeiros para implementaccedilatildeo do programa vieram de contratos de financiamen-

to com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e a Unidade de Cooperaccedilatildeo do Programa

(UCP) vinculada agrave Secretaria Executiva do Ministeacuterio da Fazenda com contrapartida da Uniatildeo e dos

Estados (CEARAacute 1998) O Grupo de Educaccedilatildeo Tributaria dos Estados (GETE) criado em 1997 eacute o res-

ponsaacutevel por coordenar e implementar as accedilotildees educativas do Programa de Educaccedilatildeo Tributaacuteria dos

Estados (MOTA 2001)

Executar atividades necessaacuterias agrave implementaccedilatildeo do Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal em seu EstadoDivulgar as experiecircncias e resultados para facilitar a troca de conhecimentos e vivecircn-cias em apoio aos demais Estados com vistas ao aperfeiccediloamento do programaColaborar com apoio teacutecnico aos Estados onde a implantaccedilatildeo do programa estaacute em fase inicial

A Secretaria da Fazenda e a Secretaria de Educaccedilatildeo implantaram nas escolas estaduais e muni-

cipais do ensino fundamental a primeira versatildeo do Programa de Educaccedilatildeo Tributaacuteria O PET cearense

implantado inicialmente nas escolas do Sistema de Telensino tem o objetivo de conscientizar o cida-

datildeo sobre o dever de pagar os tributos para concretizaccedilatildeo dos direitos fundamentais de cidadania O

tema educaccedilatildeo fiscal abordado por meio de teleaulas dinacircmicas de grupo e leitura de textos apresen-

ta a histoacuteria dos tributos os direitos e deveres dos cidadatildeos a importacircncia do documento fiscal como

instrumento de arrecadar recursos para realizaccedilatildeo das poliacuteticas puacuteblicas Desta forma professores e

alunos discutiram sobre os primeiros passos para o efetivo exerciacutecio de cidadania (CEARAacute 1998)

Em 2000 o PET alterou o nome do programa para Programa de Educaccedilatildeo Fiscal (PEF) com

ampliaccedilatildeo das accedilotildees e abrangecircncia do processo educacional envolvendo o conceito de Estado suas

funccedilotildees uso do recurso puacuteblico orccedilamento e participaccedilatildeo Objetiva disseminar informaccedilotildees e valores

fundamentais para o processo de construccedilatildeo de uma sociedade mais justa e igualitaacuteria Tem como

objetivos promover o exerciacutecio de cidadania por meio da conscientizaccedilatildeo sobre o retorno social do

tributo harmonizar a relaccedilatildeo estado-cidadatildeo disseminar os conhecimentos a respeito das atividades

administrativas e financeiras do estado fomentando o controle social (CEARAacute 2005)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

353

A meta do PEF eacute ajudar o cidadatildeo a compreender as atividades financeiras do Estado desde

sua arrecadaccedilatildeo ateacute o gasto puacuteblico bem como o exerciacutecio do controle social construindo a cida-

dania fiscal Desta forma para alcanccedilar os objetivos do PEF foram traccediladas estrateacutegias durante mais

de uma deacutecada disseminando conceitos e definiccedilotildees sobre tributos eacutetica cidadania e de gestatildeo

puacuteblica instruindo a sociedade para o exerciacutecio da cidadania buscando melhorar a relaccedilatildeo Estado

Sociedade (CEARAacute 2005)

No Cearaacute a Sefaz eacute a instituiccedilatildeo responsaacutevel por implementar o PEF do Estado Ateacute 2007 as

accedilotildees do Programa eram coordenadas pela Assessoria de Desenvolvimento Institucional (Adins) que

monitorou e distribuiu material didaacutetico agraves escolas promoveu a capacitaccedilatildeo de professores e alunos

por meio de cursos seminaacuterios e palestras visando formar um quadro de disseminadores da educaccedilatildeo

fiscal em todo o Estado (CEARAacute 2005)

O Decreto nordm 28900 de 2792007 instituiu a Ceacutelula de Educaccedilatildeo Fiscal (Ceduf) responsaacutevel

por coordenar a partir de 2007 as accedilotildees do PEF no Estado com as seguintes competecircncias dispostas

no Decreto nordm 29201 de 2822008 em seu artigo 45

I Promover a conscientizaccedilatildeo na sociedade da funccedilatildeo socioeconocircmica do tributoII Coordenar e executar as accedilotildees do Programa Educaccedilatildeo Fiscal - PEF- CearaacuteIII Promover a educaccedilatildeo fiscal junto ao puacuteblico escolar em seus diferentes niacuteveis bem como desenvolver parcerias com instituiccedilotildees puacuteblicas e privadas para inserccedilatildeo do Programa nos diversos segmentos da sociedadeIV Promover o marketing interno e externo do programaV Representar o Estado no Grupo Nacional de educaccedilatildeo fiscalVI Promover em parceria com a aacuterea de treinamento a formaccedilatildeo de agentes capaci-tados e multiplicadoresVII Monitorar a produccedilatildeo do material a ser utilizado pelo programa tais como livro material didaacutetico viacutedeo educativo e outros (CEARAacute 2008)

A Ceduf tem ampliado as accedilotildees educativas do PEF por meio de cursos a distacircncia e presenciais

aumentando o nuacutemero de disseminadores da educaccedilatildeo fiscal nas escolas puacuteblicas estaduais e na so-

ciedade cearense

A accedilatildeo de maior impacto do Programa cearense eacute o curso na modalidade a distacircncia ldquoDisse-

minador da Educaccedilatildeo Fiscalldquo com carga horaacuteria de 160 horas direcionado aos servidores puacuteblicos

(federais estaduais e municipais) agraves escolas puacuteblicas nas trecircs esferas agraves ONGs e instituiccedilotildees privadas

(CEARAacute 2011)

Segundo Mota (2001) servidora puacuteblica da Sefaz a populaccedilatildeo precisa de informaccedilatildeo instru-

ccedilatildeo e conhecimento para avanccedilar no processo de participaccedilatildeo e construccedilatildeo da cidadania fiscal Para

Mota (2001) o Programa cearense eacute um instrumento de informaccedilatildeo acerca da histoacuteria dos tributos do

sistema tributaacuterio nacional da funccedilatildeo social do tributo bem como sobre o papel do Estado com seus

deveres de prestar contas agrave sociedade de suas atividades administrativas e financeiras

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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Neste sentido conhecer o conceito de tributo sua funccedilatildeo e aplicaccedilatildeo satildeo requisitos essenciais

ao desenvolvimento econocircmico e social do Estado mostra que a Educaccedilatildeo Fiscal ao alcance de todos

eacute um instrumento fundamental na mudanccedila da visatildeo do povo sobre a relaccedilatildeo fiscosociedade Dessa

forma a Educaccedilatildeo Fiscal eacute a ponte que liga o cidadatildeo agraves questotildees sociais despertando a consciecircncia

cidadatilde acerca do retorno social dos tributos e da gestatildeo fiscal dos recursos puacuteblicos (VIDAL 2010)

Portanto a Ceduf vem realizando diversas accedilotildees previstas no PEF ao longo dos anos buscando

preparar o cidadatildeo para lutar por seus direitos e ensinando a importacircncia no cumprimento de seus

deveres para exercer de forma democraacutetica a plena cidadania (BRASIL 2007)

3 METODOLOGIA

Pesquisa de natureza eminentemente qualitativa populaccedilatildeo composta por duzentos e cinquen-

ta alunos da rede puacuteblica estadual que participam do projeto Bolsa Educaccedilatildeo Fiscal e Cidadania no

municiacutepio de Fortaleza-Ce A amostra de natureza representativa seguiu um ponto de saturaccedilatildeo defi-

nida pela quantidade de repeticcedilotildees de respostas e a escassez de diferenccedilas das mesmas abrangendo

trinta alunos que participam do referido projeto Pesquisa empiacuterica realizou-se na Sede da Secretaria

da Fazenda do Estado do Cearaacute com os estudantes da rede puacuteblica estagiaacuterios bolsistas lotados no

setor responsaacutevel pela Campanha ldquoSua Nota Vale Dinheirordquo no periacuteodo de Janeiro a Marccedilo de 2012

Quanto aos instrumentos de coleta de dados consistiu de uma entrevista semiestruturada

elaborada mediante roteiro com dez perguntas abertas buscando identificar a efetividade das accedilotildees

do Projeto ldquoBolsa Educaccedilatildeo Fiscal e Cidadaniardquo na formaccedilatildeo da cidadania dos estudantes da escola

puacuteblica do Cearaacute Os dados coletados foram sistematizados e analisados na perspectiva de compre-

ensatildeo da relaccedilatildeo teoria-empiria As categorias teoacutericas priorizadas foram cidadania e tributaccedilatildeo sobre

as quais se buscou compreender velhos e novos caminhos assim como o tributo e sua funccedilatildeo socioe-

conocircmica Com base nas respostas dos entrevistados buscou-se identificar categorias de anaacutelise sem

entretanto perder de vista os propoacutesitos da pesquisa

4 RESULTADOS E DISCUSSAtildeO

Esta pesquisa teve como objetivo de conhecer a contribuiccedilatildeo da educaccedilatildeo fiscal na formaccedilatildeo

da cidadania do aluno que participa do Projeto Bolsa Educaccedilatildeo Fiscal e Cidadania da SefazCE

Buscou-se traccedilar uma aproximaccedilatildeo do perfil do aluno atraveacutes de dados pessoais tais como

gecircnero idade escolaridade descriccedilatildeo do nuacutecleo familiar (dinacircmica composiccedilatildeo e posiccedilatildeo do aluno)

seguido da autopercepccedilatildeo acerca da participaccedilatildeo na vida comunitaacuteria e por fim a utilizaccedilatildeo da bolsa

salaacuterio

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O estudo demonstrou que o perfil socioeconocircmico e cultural dos sujeitos desta pesquisa satildeo

alunos matriculados no ensino meacutedio da rede puacuteblica estadual com a idade entre 16 e 18 anos A

maioria deles eacute do sexo feminino e participam do projeto haacute mais de seis meses Indagou-se acerca

do significado do bairro na sua vida visto que se trata de uma relaccedilatildeo pessoal especiacutefica que interes-

sa agrave nossa pesquisa Eles residem nos bairros carentes da periferia da cidade de Fortaleza Vila Uniatildeo

Edson Queiroz Henrique Jorge Pirambu Planalto Mundubim Praia do Futuro Montese Parque Santa

Rosa Paupina Manuel Satiro Parque Genibau Jangurussu Joseacute Walter Varjota Bom Jardim Aldeota

Cidades dos Funcionaacuterios e Alto Alegre II

Durante a pesquisa emergiram sentimentos carregados de diferentes significados que pro-

duzem explicaccedilotildees e generalizaccedilotildees em relaccedilatildeo ao bairro Observou-se uma saturaccedilatildeo das palavras

bom alegre legal oacutetimo harmonioso nas diferentes entrevistas que indicam com mais clareza e

precisatildeo os sentimentos dos sujeitos em relaccedilatildeo ao lugar de moradia Nas falas percebe-se o sen-

timento de apego de gozo de seguranccedila ao lugar paacutetrio Nas frases o sentimento de orgulho sa-

tisfaccedilatildeo alegria e contentamento revelam a posse o apego integraccedilatildeo ao lugar de nascimento As

qualidades positivas expressas revelam o viacutenculo com o bairro Desse modo percebe-se nas falas de

alguns sujeitos entrevistados o sentimento de pertencimento

Nesta etapa da pesquisa buscou-se tambeacutem conhecer as formas de lazer de entretenimento

de acesso agrave cultura e participaccedilatildeo na comunidade Constatou-se que o acesso a cultura lazer e en-

tretenimento em sua maioria satildeo informaccedilotildees advindas da televisatildeo e internet sendo que a escola

alcanccedilou uma iacutendice menor entre os demais No Brasil o poder mediaacutetico eacute responsaacutevel por formar a

opiniatildeo popular que se concentra na miacutedia visual a televisatildeo A TV eacute o meio de comunicaccedilatildeo popu-

lar mais raacutepido e eficaz na formaccedilatildeo (forjaccedilatildeo) de costumes e valores sociais da contemporaneidade

Desse modo o poder institucional passa a exercer forte influecircncia e manipulaccedilatildeo de classes que tecircm

a TV como fonte verdadeira de informaccedilatildeo (MEKSENAS 2002)

Buscou-se tambeacutem conhecer o lugar que ocupa no nuacutecleo familiar composiccedilatildeo dinacircmica e

posiccedilatildeo expressou-se de forma constrangida valores sentimentos e relacionamentos da vida pessoal

Constatou-se que o chefe da famiacutelia estaacute representado na figura materna onde na maioria das vezes

os pais estatildeo separados e ou satildeo filhos de matildee solteira O desejo de diaacutelogo expressa a dificuldade

de comunicaccedilatildeo existente no nuacutecleo familiar Alguns revelavam o grau de importacircncia no seio familiar

expressando com orgulho o lugar em que ocupa no nuacutecleo familiar

No tocante agrave bolsa salaacuterio ela representa um acreacutescimo na renda da famiacutelia ajudando a pagar

as despesas de casa O sentimento de independecircncia financeira do aluno tambeacutem foi percebido quan-

do diz ldquopago minhas despesas e cursos de capacitaccedilatildeordquo Percebeu-se nas falas dos alunos a importacircn-

cia financeira e sentimental da bolsa salaacuterio paga aos sujeitos desta pesquisa As entrevistas indicaram

com clareza e precisatildeo o valor financeiro desse beneficio que corrobora para o Estado exercer forte-

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mente seu poder sobre o cidadatildeo o qual expressa o sentimento de gratidatildeo

No quesito conteuacutedo do curso ldquoMonitor de Educaccedilatildeo Fiscalrdquo ministrado no formato presencial

pela equipe da Ceduf percebeu-se que proporcionou aos alunos os conhecimentos sobre a histoacuteria

do tributo e a importacircncia social e econocircmica para o desenvolvimento da sociedade contribuindo na

formaccedilatildeo da consciecircncia criacutetica do aluno da escola puacuteblica Entendeu-se que o objetivo do curso foi

alcanccedilando os alunos reconhecem a importacircncia dos tributos para o desenvolvimento da vida em

sociedade apesar de natildeo verem o retorno desses recursos aplicados para o bem da coletividade

Os relatos demonstraram que depois do curso os alunos passaram a olhar o tributo de forma

diferente ou seja reconhecem a relevacircncia do imposto para o desenvolvimento social

Dessa forma os conceitos sobre eacutetica tributaccedilatildeo deveres e direitos administraccedilatildeo puacuteblica

repassados no Curso Monitor de Educaccedilatildeo Fiscal satildeo fundamentais para vida em sociedade que con-

tribuem para o pleno exerciacutecio de cidadania Percebe-se ao longo das falas dos sujeitos o impacto

desses conceitos na formaccedilatildeo da vida cidadatilde do aluno que demonstraram motivados a repassar os

conhecimentos adquiridos no curso

Expressam o desejo de compartilhar com mais pessoas os conhecimentos adquiridos impor-

tantes para formaccedilatildeo da consciecircncia cidadatilde de todos Apesar de questionarem se o poder puacuteblico

representado pelo Estado tem de fato o interesse de contribuir na formaccedilatildeo desse cidadatildeo que luta

participa reclama fiscaliza os atos praticados com os recursos puacuteblicos O curso tambeacutem despertou

no aluno o sentimento de participaccedilatildeo para fiscalizar e acompanhar a aplicaccedilatildeo dos recursos puacuteblicos

do seu Estado O desejo de exercer o seu direito de cidadatildeo de participar das decisotildees da vida em

grupo pode ser percebido em diferentes falas dos entrevistados

A disseminaccedilatildeo da Educaccedilatildeo Fiscal configura-se mais uma oportunidade de reverter os aspec-

tos negativos na relaccedilatildeo Fisco e Sociedade heranccedila deixada pela colonizaccedilatildeo Novas formas de ensino

e aprendizagem satildeo necessaacuterias para atender os anseios de uma sociedade complexa que exige infor-

maccedilotildees e transparecircncia por parte dos governantes contemporacircneos (VIDAL 2010)

O discurso oficial da educaccedilatildeo fiscal adveacutem do Poder Puacuteblico visa informar a populaccedilatildeo dos

seus direitos e deveres Busca realmente preparar o cidadatildeo Ou ldquono frigir dos ovosrdquo quer alavancar

a arrecadaccedilatildeo dos entes tributantes Seria um manejo dos detentores do poder para manter o povo

cativo e mais uma vez alienaacute-los do verdadeiro direito de cidadania

Apesar de motivados em repassar e compartilhar os conhecimentos sobre o tema na comunida-

de ou na escola os alunos natildeo colocaram em praacutetica os projetos elaborados durante o estaacutegio tendo

em vista que os oacutergatildeos competentes natildeo demonstraram interesse nessa disseminaccedilatildeo Por que seraacute

que os alunos natildeo colocaram em praacutetica os conhecimentos adquiridos A escola natildeo estaacute preparada

para construir esse conhecimento O modelo escolar brasileiro preso a uma grade curricular natildeo estaacute

usufruindo do espaccedilo democraacutetico que eacute peculiar agrave escola Professores diretores mestres satildeo fruto

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de uma ditadura opressatildeo e consequente ausecircncia de participaccedilatildeo dificultando a construccedilatildeo de uma

massa criacutetica para disseminar conhecimentos e formar a consciecircncia cidadatilde

No tocante ao curso ldquoMonitor de Educaccedilatildeo Fiscalrdquo os alunos o consideraram bom oacutetimo di-

nacircmico poreacutem a carga horaacuteria eacute pequena para um conteuacutedo complexo e relevante tema para forma-

ccedilatildeo da cidadania do aluno Provavelmente um curso com carga horaacuteria de 16 horas natildeo iraacute formar a

consciecircncia cidadatilde no maacuteximo despertar e aguccedilar o interesse em conhecer algo sobre o tema Seraacute

que esse tempo tatildeo reduzido seria apenas para legitimar uma das accedilotildees estabelecida no PNEF Por

que entatildeo natildeo aprofundar o curso com accedilotildees sobre a educaccedilatildeo fiscal nas escolas Seraacute o verdadeiro

interesse do governo do estado construir a cidadania fiscal e tributaacuteria da populaccedilatildeo

Os alunos expressaram o desejo de conhecer e aprofundar mais sobre os conteuacutedos abordados

no curso ou seja demonstraram o sentimento de apreender sobre o Estado e a poliacutetica fiscal do seu

paiacutes Eles entendem que o tema eacute importante que desperta o aluno para o mundo fiscal e tributaacuterio

desconhecido ateacute entatildeo Para eles os tributos influenciam dominam e determinam a vida em socie-

dade Consideram relevante para construccedilatildeo da justiccedila social a disseminaccedilatildeo da Educaccedilatildeo Fiscal na

escola que pode contribuir para formaccedilatildeo da cidadania do aluno A disseminaccedilatildeo da educaccedilatildeo fiscal

por meio de temas que perfazem o cotidiano da populaccedilatildeo pode ser uma ferramenta eficaz no apren-

dizado da populaccedilatildeo sobre a importacircncia de exigir seus direitos e cumprir seus deveres de cidadatildeos

Os entrevistados afirmaram que os conhecimentos apreendidos durante o estaacutegio influencia-

ram na mudanccedila de comportamento e de atitude da maioria dos alunos desta pesquisa Eles passaram

a solicitar a nota fiscal perceberam que os tributos estatildeo incluiacutedos em todos os produtos consumidos

e o Estado natildeo administra com eficiecircncia os recursos arrecadados que deveria retornar em serviccedilos

para populaccedilatildeo Mudar o comportamento traz consequecircncias seraacute que o poder dominante quer essa

mudanccedila Transparecircncia no uso do dinheiro puacuteblico

Na Constituiccedilatildeo Federal de 1988 a cidadania eacute um dos princiacutepios fundamentais que busca a

universalizaccedilatildeo da dignidade humana como pressuposto e a emancipaccedilatildeo da humanidade para uma

vida livre e aberta na diversidade cultural Mas o significado de cidadania encontra-se em construccedilatildeo

nas diversas etapas da vida em sociedade em sua essecircncia eacute o direito de viver decentemente (BRASIL

2007) Seraacute que a cidadania do povo brasileiro estaacute apenas na Constituiccedilatildeo

A cidadania pode ter diferentes concepccedilotildees e ateacute antagocircnicas poreacutem ela estaacute em constante

transformaccedilatildeo na sociedade Os sujeitos em estudo apreenderam que cidadania eacute ter direitos e tam-

beacutem ter deveres Para Covre (2006) a cidadania varia muito depende da classe social que o individuo

faz parte

Apesar de todas as informaccedilotildees repassadas via oacutergatildeos puacuteblicos sobre a relaccedilatildeo Fisco-Socieda-

de os sujeitos entrevistados apontam algumas atitudes que o Estado deve tomar para melhorar essa

relaccedilatildeo Ser transparente nas atitudes fazer a parte do Estado ser honesto reduzir as desigualdades

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e injusticcedilas Para os alunos a relaccedilatildeo poderaacute ser harmoniosa desde que o Estado ou seja o governo

faccedila a sua parte oferecendo escolas de qualidade sauacutede puacuteblica eficiente seguranccedila puacuteblica eficaz

administrando com efetividade os recursos arrecadados pois o cidadatildeo jaacute faz a sua parte contribuin-

do com uma pesada e onerosa carga tributaacuteria

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Avaliar a contribuiccedilatildeo da educaccedilatildeo fiscal na formaccedilatildeo da cidadania do aluno da escola puacuteblica

que participou do Projeto Bolsa Educaccedilatildeo fiscal e Cidadania em Fortaleza sob a oacutetica do aluno foi

um desafio e ao mesmo tempo uma experiecircncia enriquecedora especialmente porque nos propiciou

vaacuterios olhares acerca do objeto estudado Os bairros citados da capital cearense tecircm seu cotidiano

permeado de grandes dificuldades e problemas econocircmicos e sociais que influenciam diretamente o

comportamento dos seus habitantes As drogas a violecircncia a falta de oportunidade de emprego e de

serviccedilos puacuteblicos alargam cada vez mais esse quadro de desigualdades sociais

Os alunos que participam do projeto cumprem uma rotina diaacuteria de quatro horas de trabalho

no setor da Campanha ldquoSua Nota Vale Dinheirordquo Eles exercem as atividades de separaccedilatildeo contagem

e digitaccedilatildeo dos cupons fiscais enviados pelos participantes da Campanha Com relaccedilatildeo a essa rotina

de trabalho merece uma reflexatildeo para os responsaacuteveis pela implementaccedilatildeo do projeto na Sefaz Seraacute

que essas atividades estatildeo contribuindo para formaccedilatildeo da cidadania do aluno ou seraacute a utilizaccedilatildeo de

matildeo de obra desqualificada Eles recebem uma bolsa salaacuterio que custeia as despesas pessoais e ajuda

a compor a renda da famiacutelia Nas falas dos alunos percebeu-se que a bolsa salaacuterio paga no estaacutegio eacute

um incentivo que motiva os alunos a participar ativamente das atividades da educaccedilatildeo fiscal na Sefaz

Com relaccedilatildeo agrave participaccedilatildeo nas atividades da comunidade os alunos expressam um posicio-

namento ainda muito individual sem nenhuma indicaccedilatildeo de organizaccedilatildeo coletiva e muito menos de

uma compreensatildeo mais ampla de participaccedilatildeo comunitaacuteria apesar da indignaccedilatildeo demonstrada sobre

a ausecircncia do retorno dos tributos arrecadados em serviccedilos puacuteblicos agrave comunidade

Desse modo diante de uma aproximaccedilatildeo aos perfis socioeconocircmico e cultural dos alunos en-

trevistados identificou-se que os alunos que participam do Projeto Bolsa Educaccedilatildeo Fiscal e Cidadania

satildeo jovens da classe pobre da periferia de Fortaleza que tecircm a Internet como principal meio de lazer

entretenimento cultura e informaccedilatildeo O nuacutecleo familiar desse sujeito eacute formado por matildee e avoacutes Os jo-

vens tecircm grandes desejos e sonhos de superar a barreira da pobreza por meio da educaccedilatildeo Acreditam

que a escola ainda eacute o espaccedilo democraacutetico que possibilita a formaccedilatildeo da massa criacutetica para superar as

barreiras sociais encontradas ao longo da vida Apesar disso natildeo costumam participam das atividades

da comunidade ou escola ainda tecircm uma visatildeo muito individual

Um segundo olhar foi direcionado para verificar a eficiecircncia do Curso Monitor de Educaccedilatildeo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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Fiscal ministrado pela CedufSefaz aos alunos da escola puacuteblica que participam do Projeto Bolsa Edu-

caccedilatildeo fiscal e Cidadania O curso aborda diferentes temas sobre eacutetica controle social gestatildeo puacuteblica

funccedilatildeo social do tributo conteuacutedos importantes e essenciais na construccedilatildeo da cidadania fiscal do alu-

no cearense

Constatou-se de modo geral uma compreensatildeo de que a educaccedilatildeo fiscal deveria existir em

todas as escolas dando oportunidades a todos de conhecer os seus direitos e deveres Embora natildeo

haja uniformidade quanto agraves dificuldades encontrada na disseminaccedilatildeo da educaccedilatildeo fiscal nas escolas

alguns destacam as principais dificuldades a falta de capacitaccedilatildeo do professor sobre o tema falta o

interesse de diretores e profissionais da educaccedilatildeo e falta de infraestrutura das escolas puacuteblicas

A compreensatildeo do aluno em relaccedilatildeo agrave cidadania eacute inserida num contexto maior Sua efetivaccedilatildeo

diante da complexidade dos processos que a envolve natildeo dependeraacute somente das accedilotildees do PNEF

mas de compreensatildeo quanto agrave proacutepria concepccedilatildeo do conceito de cidadania seja pela aquisiccedilatildeo de

direitos pelo cumprimento de deveres que satildeo realizados e pela forma como os serviccedilos puacuteblicos satildeo

estruturados e oferecidos agrave populaccedilatildeo Assim para os alunos desta pesquisa a cidadania compreende

uma vida digna com sauacutede de qualidade educaccedilatildeo seguranccedila diversidade cultural religiosa como

um todo garantindo o exerciacutecio da plena cidadania

Por sua vez para a maioria dos alunos existem muitas dificuldades de relacionamento quando

se trata da relaccedilatildeo fiscocidadatildeo Vaacuterios relatos revelam uma necessidade muito forte de transparecircncia

nas accedilotildees do Estado Os alunos querem que o Estado faccedila a parte dele nesta relaccedilatildeo ou seja atender

as necessidades baacutesicas de vida em sociedade Os relatos apontam a dificuldade de acesso agrave informa-

ccedilatildeo e transparecircncia das accedilotildees do poder puacuteblico como um dos principais obstaacuteculos a harmonizaccedilatildeo

dessa relaccedilatildeo Apesar disso a efetivaccedilatildeo de um PNEF que atenda de fato agraves necessidades de educaccedilatildeo

fiscal da populaccedilatildeo requer intensas transformaccedilotildees sociais poliacuteticas econocircmicas e culturais Dessa

forma eacute possiacutevel afirmar que apesar das accedilotildees do PNEF suas praacuteticas ainda concentram um distancia-

mento entre o cidadatildeo e o fisco

Desse modo com base neste estudo realizado propotildeem-se algumas accedilotildees como forma de

contribuir para formaccedilatildeo da cidadania fiscal por meio do programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Cearaacute quais

sejam envolver o centro estudantil no processo de disseminaccedilatildeo da educaccedilatildeo fiscal na escola pro-

movendo parceria da organizaccedilatildeo estudantil com os educadores da Sefaz fortalecendo o processo

de construccedilatildeo da cidadania fiscal revisar o curriacuteculo dos cursos de formaccedilatildeo de professores incluindo

os conteuacutedos sobre educaccedilatildeo fiscal para subsidiar na melhoria da praacutetica educativa ampliar vagas no

projeto Bolsa Educaccedilatildeo Fiscal e Cidadania promover seminaacuterios palestras debates jornadas sobre

temas transversais a fim de contribuir para que professores e alunos possam conhecer mais profunda-

mente sobre direitos deveres funccedilatildeo do tributo administraccedilatildeo do estado aumentar a carga horaacuteria

do Curso ldquoMonitor de Educaccedilatildeo Fiscalrdquo oferecer lanche aos alunos nos intervalos durante o curso mi-

nistrado pela Ceduf promover a inserccedilatildeo da educaccedilatildeo fiscal como disciplina do curriacuteculo escolar

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De modo geral essa avaliaccedilatildeo deve ser vista como instrumento importante para gerar ideias de

aprimoramento mas nunca como uma verdade absoluta devido agraves limitaccedilotildees das metodologias exis-

tentes entretanto se bem interpretadas tornam-se de grande importacircncia para o autoconhecimento

aprimorando e auxiliando a gestatildeo das accedilotildees da educaccedilatildeo fiscal no Estado do Cearaacute

E por fim com referecircncia nas avaliaccedilotildees efetuadas pelos alunos podem ser apontadas as se-

guintes consideraccedilotildees o curso monitor de educaccedilatildeo fiscal foi eficaz em fomentar a reflexatildeo sobre

alguns temas que perfazem o cotidiano do aluno enquanto cidadatildeo e influenciou a mudanccedila de com-

portamento dos mesmos em relaccedilatildeo agrave funccedilatildeo socioeconocircmica dos tributos e sua gestatildeo Contudo

enfatiza-se que em termos de conscientizaccedilatildeo tributaacuteria e fiscal ainda existe muito a percorrer sendo

que a disseminaccedilatildeo da educaccedilatildeo fiscal por meio da escola poderaacute ajudar minimizar o distanciamento

existente na relaccedilatildeo Fisco-Sociedade Desse modo o Estado precisa considerar a importacircncia do papel

da escola na disseminaccedilatildeo da educaccedilatildeo fiscal e ater-se agrave valorizaccedilatildeo de sua funccedilatildeo social na sociedade

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REFEREcircNCIAS

AMORIM Maacutercio Wiliam F WEYNE Walda Maria M (Orgs) SEFAZ tributo a historia Fortaleza Secre-taria da Fazenda do Cearaacute 2006

BRASIL Ministeacuterio da Fazenda Escola de Administraccedilatildeo Fazendaacuteria Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal Funccedilatildeo social do tributo 4 ed Brasiacutelia 2009 58 p (Serie Educaccedilatildeo Fiscal caderno 3)

______ Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Federativa do Brasil promulgada em 5 de outubro de 1988 40 p Satildeo Paulo Saraiva 2007

______ Coacutedigo Tributaacuterio Nacional Lei ndeg 5172 de 25 de Outubro de 1966 8 ed Satildeo Paulo Saraiva 2002a

______ Ministeacuterio da Fazenda Escola Superior de Administraccedilatildeo Fazendaacuteria Programa Nacional de Educaccedilatildeo Tributaacuteria Curso de disseminadores de educaccedilatildeo fiscal Brasiacutelia 2002b

BUFFON Marciano Tributaccedilatildeo e dignidade humana Livraria do Advogado 2009

CARVALHO Joseacute Murilo de Cidadania no Brasil o longo caminho 4 ed Rio de Janeiro Civilizaccedilatildeo Brasileira 2003

CEARAacute Decreto nordm 26600 de 09 de maio de 2002 Fortaleza 2005

______ Decreto nordm 25326 de 23 de dezembro de 1998 Programa de Educaccedilatildeo Tributaacuteria Fortaleza 1998

COVRE Maria de Lourdes Manzini O que eacute cidadania Satildeo Paulo Brasiliense 2006 (Coleccedilatildeo Primeiros Passos)

FREIRE Paulo Educaccedilatildeo como praacutetica da liberdade 11 ed Rio de Janeiro Paz e Terra 1980

MEKSENAS Paulo Cidadania poder e comunicaccedilatildeo 2 ed Satildeo Paulo Cortez 2002

MOTA Luiza Ondina Santos Educaccedilatildeo fiscal caderno do participante Fortaleza Sefaz 2001

REBOUCcedilAS Osvaldo Joseacute Educaccedilatildeo fiscal no Brasil e no mundo In VIDAL Eloiacutesa Maia (org) Educaccedilatildeo Fiscal e Cidadania Fortaleza Ediccedilotildees Demoacutecrito Rocha 2010

RIVILLAS Borja Diacuteaz VILLADERBOacute Andreacutea MOTA Luiza Ondina Santos Educaccedilatildeo fiscal no Brasil e no mundo In VIDAL Eloiacutesa Maia (org) Educaccedilatildeo Fiscal e Cidadania Fortaleza Ediccedilotildees Demoacutecrito Rocha 2010

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AVALIACcedilAtildeO DO PROGRAMA DE EDUCACcedilAtildeO FISCAL DESAFIOS LIMITES E VIVEcircNCIAS DA PRAacuteTICA DOCENTE

SUMAacuteRIO Introduccedilatildeo 1 As marcas estruturais do Estado brasileiro 2 Cidada-nia no Brasil 3 Aspectos histoacutericos da tributaccedilatildeo no Brasil 4 O atual Sistema Tributaacuterio Nacional 5 Educaccedilatildeo Fiscal e o PNEF 51 O Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal 52 A Educaccedilatildeo Fiscal no Cearaacute 6 Metodologia 7 Resultados Consideraccedilotildees finais Referecircncias

Ana Cleiane Carneiro de Oliveira1 Fernando Joseacute Pires de Sousa2

INTRODUCcedilAtildeO

A sociedade brasileira evidencia que o Estado Democraacutetico de Direito formalmente vigente

estaacute longe de assegurar os direitos sociais e econocircmicos fundamentais para uma grande parcela da

populaccedilatildeo apesar dos avanccedilos jaacute conquistados

Para fazer frente a suas obrigaccedilotildees o Estado dispotildee de recursos por meio da arrecadaccedilatildeo de

tributos dentre outros financiamentos O universo tributaacuterio perpassa os direitos humanos fundamen-

tais pois a promoccedilatildeo da justiccedila social papel do Estado depende em grande parte de recursos origi-

nados da arrecadaccedilatildeo dos tributos

Conforme avalia Buffon (2009) o dever de pagar tributos eacute fundamental para a realizaccedilatildeo dos

direitos Mas por outro lado eacute preciso que o Estado cumpra seu papel decisivo de assegurar a concre-

tizaccedilatildeo dos direitos fundamentais e exerccedila tal prerrogativa tal dever com base no mesmo pressuposto

que arrecada tributos o imperativo do Estado Social

Eacute essencial portanto compreender o universo tributaacuterio acionar o seu mecanismo de com-

bate agrave desigualdade social lutar por um modelo tributaacuterio que atenda a urgecircncia de corrigir a gran-

de concentraccedilatildeo de renda deste paiacutes Eacute imperativo no tempo presente pensar a tributaccedilatildeo do ponto

de vista do interesse da sociedade natildeo eacute justo pagar tributo sem ter efetivamente assegurados os

direitos fundamentais afinal a tributaccedilatildeo deve estar em consonacircncia aos princiacutepios do Estado De-

mocraacutetico de Direito

A questatildeo tributaacuteria no Brasil ao longo da histoacuteria foi pautada pelo conflito e hoje natildeo eacute dife-

1 Servidora Puacuteblica Estadual Mestre em Avaliaccedilatildeo de Poliacuteticas Puacuteblicas pela Universidade Federal do Cearaacute (2013) Especia-lista em Direito e Processo Tributaacuterio pela Faculdade Integrada do Cearaacute (2008) E-mail acleianehotmailcom2 Doutor e Poacutes-Doutor em Economia pelas Universiteacutes Paris XIII Franccedila e Montreal Canadaacute respectivamente Professor do Mestrado em Avaliaccedilatildeo de Poliacuteticas Puacuteblicas da Universidade Federal do Cearaacute e do Departamento de Teoria Econocircmica Coordenador do Observatoacuterio de Poliacuteticas Puacuteblicas ndash OPP

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363

rente O modelo tributaacuterio que foi construiacutedo tem a marca da nossa sociedade injusta desigual e ex-

cludente Segundo Buffon (2009) a tributaccedilatildeo passou a ser instrumento de ampliaccedilatildeo de desigualda-

des econocircmicas e sociais que colaboram para a construccedilatildeo de uma das sociedades mais desiguais do

mundo Eis aqui a ideia central defendida por Buffon (2009) a dignidade humana deve ser o elemento

norteador em todas as relaccedilotildees dentre estas a tributaccedilatildeo

Faltam poliacuteticas puacuteblicas no campo tributaacuterio que priorizem a concretizaccedilatildeo do que estaacute for-

malmente instituiacutedo pela Constituiccedilatildeo ldquoCidadatilderdquo no tocante aos direitos sociais que ofereccedilam respos-

tas imediatas agraves questotildees sociais urgentes que considerem a funccedilatildeo socioeconocircmica do tributo uma

diretriz a ser perseguida Enfim falta vontade poliacutetica para articular uma reforma tributaacuteria que torne

o Sistema Tributaacuterio Nacional instrumento de distribuiccedilatildeo de renda e riqueza

Nesse contexto a pesquisa teve como proposta investigativa a anaacutelise criacutetica de uma das accedilotildees

do Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal (PNEF) Tal programa eacute uma estrateacutegia do Estado brasileiro

de promover a cidadania fiscal Segundo o discurso oficial o mesmo se propotildee a ldquocontribuir perma-

nentemente para a formaccedilatildeo do indiviacuteduo visando ao desenvolvimento da conscientizaccedilatildeo sobre seus

direitos e deveres no tocante ao valor social do tributo e ao controle socialrdquo (BRASIL 2009 p 29)

O foco da pesquisa estaacute em uma das accedilotildees do Programa a accedilatildeo de disseminaccedilatildeo da Educaccedilatildeo

Fiscal por meio do Curso de Formaccedilatildeo de Disseminadores de Educaccedilatildeo Fiscal coordenado pela Escola

de Administraccedilatildeo Fazendaacuteria (Esaf) de acordo com a Portaria Interministerial (Fazenda e Educaccedilatildeo) nordm

413 de 31122002 Referido curso eacute promovido haacute quase uma deacutecada e tem por objetivo multiplicar

os conceitos e valores da Educaccedilatildeo Fiscal no espaccedilo escolar Ocorre em parceria com as Secretarias da

Fazenda e da Educaccedilatildeo dos estados e municiacutepios e Secretaria da Receita Federal (SRF)

O objetivo geral da pesquisa foi avaliar em que medida o Curso de Formaccedilatildeo de Disseminado-

res de Educaccedilatildeo Fiscal possibilita aos professores participantes da escola puacuteblica municipal de Forta-

leza promover a disseminaccedilatildeo da cidadania fiscal na sua praacutetica docente

Os objetivos especiacuteficos satildeo identificar o grau de comprometimento dos professores cursistas

em efetivar a disseminaccedilatildeo da Educaccedilatildeo Fiscal analisar os limites e desafios da proposta do Curso de

Formaccedilatildeo na praacutetica docente verificar o desenvolvimento de projetos pedagoacutegicos da Educaccedilatildeo Fiscal

pelos professores cursistas e examinar o aproveitamento acerca do conteuacutedo ministrado no referido

Curso para os participantes

Ressalta-se que a pesquisa de campo tem uma abordagem metodoloacutegica de natureza qualitati-

va que buscou investigar a praacutetica em torno da Educaccedilatildeo Fiscal a partir do Curso de Formaccedilatildeo de Dis-

seminadores de Educaccedilatildeo Fiscal para compreender as accedilotildees as atitudes dos professores participantes

na sua praacutetica docente

Legalmente a praacutetica educativa tem na cidadania o eixo principal Sabe-se que na atual conjun-

tura esse eacute um grande objetivo a ser alcanccedilado ou seja a distacircncia entre o discurso legal e a aplicaccedilatildeo

praacutetica do que estaacute proposto eacute um longo caminho a ser percorrido

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

364

Eacute importante para a intervenccedilatildeo nos aspectos da vida social o suporte da educaccedilatildeo educaccedilatildeo

como ponte travessia instrumento de transformaccedilatildeo de resgate da responsabilidade pessoal coletiva

e com o meio ambiente Nos termos de Paulo Freire (2001) a educaccedilatildeo natildeo faraacute a mudanccedila sozinha

mas sem ela pouco seraacute construiacutedo

Assim eacute pertinente avaliar referido Programa em virtude da importacircncia da questatildeo tributaacuteria

no atual contexto do Estado contemporacircneo A sociedade brasileira necessita de mecanismos estrateacute-

gias para interferir na poliacutetica fiscal-tributaacuteria do paiacutes para influenciar na criaccedilatildeo e modificaccedilatildeo de leis

para exigir uma postura eacutetica do Estado quanto agrave esfera tributaacuteria enfim para legitimar a cidadania

formalmente instituiacuteda

Frente ao exposto a escolha do tema se justifica pela vivecircncia da autora do estudo como agen-

te do fisco onde se percebe que o tributo estaacute presente no nosso cotidiano e interfere diretamente

na vida de cada cidadatildeo e que a apatia ou a rejeiccedilatildeo pelas questotildees tributaacuterias natildeo eacute a via de soluccedilatildeo

para enfrentarmos o modelo tributaacuterio injusto que foi sendo gestado no Brasil A indignaccedilatildeo de pagar

tributos deve ser transformada em mecanismos de participaccedilatildeo e mobilizaccedilatildeo da sociedade brasileira

por justiccedila social Referida luta social estaacute muito aleacutem da indignaccedilatildeo sonegaccedilatildeo aversatildeo ou apatia

pelos tributos A via de transformaccedilatildeo perpassa outros mecanismos mais eficazes

1 AS MARCAS ESTRUTURAIS DO ESTADO BRASILEIRO

Nesta pesquisa foi essencial fazer o resgate da histoacuteria da tributaccedilatildeo do Brasil para compreen-

satildeo de suas marcas estruturais onde foram analisadas as bases da construccedilatildeo da estrutura tributaacuteria

com destaque para as implicaccedilotildees do tributo na relaccedilatildeo EstadoSociedade

No campo das interpretaccedilotildees da realidade brasileira vale destacar o valioso trabalho de

Raymundo Faoro (2000) Sua busca foi no sentido de resgatar as estruturas e configuraccedilotildees arraiga-

das na realidade brasileira oriundos de Portugal tanto que se debruccedilou sobre a histoacuteria poliacutetica de

Portugal desde o seacuteculo XII Sua conclusatildeo eacute que naquele paiacutes iniciou a consolidaccedilatildeo de um ldquoesta-

mento burocraacuteticordquo que deteve o poder em um sistema patrimonialista e essa tradiccedilatildeo foi implan-

tada aqui no Brasil

Segundo o autor o Estado brasileiro estava exposto em seu excesso aos interesses privados do-

minantes na sociedade fazendo com que toda accedilatildeo estatal fosse no sentido de satisfazer os interesses

dos detentores do poder econocircmico As relaccedilotildees de poder ou como bem determinou Faoro (2000)

ldquoos donos do poderrdquo cometeram os autoritarismos poliacuteticos mantendo relaccedilotildees pessoais de favor

clientela e tutela a fim de priorizar interesses privados egoiacutestas

Pode-se afirmar que a sociedade brasileira conserva as marcas da sociedade colonial escravis-

ta e estas estatildeo expressas nas suas relaccedilotildees sociais relaccedilotildees que de um lado estatildeo os que mandam

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

365

e no outro os que obedecem Esta relaccedilatildeo perpassa as instituiccedilotildees inclusive o Estado daiacute vaacuterias

manifestaccedilotildees de autoritarismo poliacutetico cujo exemplo maior foi o periacuteodo de quase duas deacutecadas de

Ditadura Militar

No Brasil foi construiacutedo um modelo de Estado que estaria a serviccedilo dos segmentos sociais do-

nos da propriedade e dos meios de produccedilatildeo Seus efeitos podem ser expressos pela grande diacutevida

social que perdura haacute seacuteculos

Aqui natildeo houve luta pela independecircncia por meio de lutas populares tudo ocorreu de cima

para baixo diferente dos movimentos ocorridos em vaacuterias regiotildees da Ameacuterica espanhola Para Couti-

nho (2008) o Brasil foi um Estado antes de ser naccedilatildeo e esta supremacia do Estado sobre a sociedade

civil foi uma caracteriacutestica marcante da sociedade brasileira A nossa modernizaccedilatildeo via Estado forte

autoritaacuterio corporativista construtor da naccedilatildeo brasileira favoreceu uma sociedade fragmentada onde

as classes sociais natildeo haviam se constituiacutedo ainda

Para Caio Prado Juacutenior (1994) em sua anaacutelise do Brasil referiu-se a essa forma de modernizaccedilatildeo

conservadora um fato histoacuterico com efeitos perversos para a realidade brasileira como a dependecircncia

externa formas de coerccedilatildeo na relaccedilatildeo entre capital e trabalho e deacuteficit de cidadania

De forma corporativa tambeacutem os interesses da classe dominante eram feitos no proacuteprio apa-

relho de Estado como por exemplo os Institutos de Accediluacutecar e do Aacutelcool do Cafeacute do Cacau Referidos

grupos foram defendidos por toda a Ditadura Militar e os seus efeitos ainda persistem Hoje os atores

econocircmicos detentores do capital continuam barganhando vantagens benefiacutecios nas mais variadas

instituiccedilotildees moldados de acordo com casuiacutesmos e interesses de corporaccedilotildees econocircmicas e politica-

mente influentes

Um exemplo de proteccedilatildeo a esses atores econocircmicos influentes eacute a constataccedilatildeo da estrutura

tributaacuteria injusta que segundo Buffon (2009) amplia as desigualdades sociais e econocircmicas Dessa

forma vale interrogar-se por que a Uniatildeo natildeo regulamentou ainda o Imposto sobre Grandes Fortunas

criado desde 1988 Por que existem as renuacutencias fiscais indiscriminadas aos detentores de capital me-

diante isenccedilatildeo remissatildeo ou anistia Eacute justa a excessiva tributaccedilatildeo indireta sobre os produtos da cesta

baacutesica e serviccedilos essenciais como a energia eleacutetrica telecomunicaccedilotildees A quem interessa a negociaccedilatildeo

das aliacutequotas do IPI

Nesse sentido vale ressaltar uma estrateacutegia utilizada por atores econocircmicos influentes que

colocam na maior cidade do paiacutes Satildeo Paulo o ldquoimpostocircmetrorsquorsquo informando sobre o montante arreca-

dado de tributos Qual eacute a intenccedilatildeo Qual o interesse Por que natildeo colocar tambeacutem o montante do

lucro que estaacute presente no valor de cada produto Seria justo e completo informar ao contribuinte e

ao consumidor o montante dos itens que compotildeem o valor da mercadoria dentre estes os impostos

os custos e o lucro

A veiculaccedilatildeo deveria recair sobre a aplicaccedilatildeo correta e transparente dos recursos puacuteblicos

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

366

Seria interessante ter os dados dos valores arrecadados dos tributos que natildeo foram aplicados em

benefiacutecio das demandas sociais Ou seja jaacute feita a deduccedilatildeo com o que foi aplicado e o que deixou

de ser aplicado Esse nuacutemero eacute o que nos interessa natildeo somente aos detentores do capital mas a

sociedade como um todo A partir do conhecimento dessa diferenccedila amplamente divulgada pode-

riacuteamos participar exigir uma gestatildeo correta dos recursos arrecadados a partir de uma nova perspec-

tiva de cidadania fiscal

A veiculaccedilatildeo do ldquoimpostocircmetrordquo leva a crer que seja uma estrateacutegia de desqualificar o puacuteblico

o estatal nos termos de Emir Sader (2009) com a colaboraccedilatildeo do neoliberalismo em sua operaccedilatildeo

ideoloacutegica de instaurar a oposiccedilatildeo entre estatal e privado e de caracterizar o Estado brasileiro como

ineficiente corrupto e burocraacutetico Dessa forma o autor defende que a polarizaccedilatildeo deve ser entre o

puacuteblico e o mercantil e natildeo entre o estatal e o privado O conflito estaacute relacionado entre os que defen-

dem os interesses coletivos puacuteblicos e os que defendem interesses mercantis Referida luta ocorre no

campo de disputa dentro do proacuteprio Estado

Pode-se afirmar assim que o Estado brasileiro natildeo foi constituiacutedo em favor de todos os seus

habitantes O Estado com sua forma poliacutetica autoritaacuteria e centralizadora sempre esteve a serviccedilo de

interesses particulares As suas caracteriacutesticas patrimonialistas o puacuteblico sendo tratado como pessoal

levou a privatizaccedilatildeo do puacuteblico a favor dos interesses do capital

Como bem adverte Sousa (2010) o Estado brasileiro tradicionalmente tem colocado em se-

gundo plano a qualidade de vida da populaccedilatildeo beneficiando assim interesses particulares em

nome do capital contribuindo dessa forma para o processo de precarizaccedilatildeo do mercado de trabalho

e consequentemente para a crise do emprego

As demandas das classes trabalhadoras fruto dos movimentos sociais no periacuteodo da transiccedilatildeo

democraacutetica natildeo foram implementadas efetivamente devido ao novo contexto de ajuste neoliberal

como tambeacutem nos termos de Coutinho (2008) agrave falta de vontade poliacutetica de implementar a conquista

dos direitos sociais da Carta de 1988 porque natildeo haacute verdadeiro interesse puacuteblico embasando a accedilatildeo

dos nossos governantes

Os movimentos sociais e as lutas emancipatoacuterias que foram gestadas nos periacuteodos de autori-

tarismo poliacutetico promoveram as conquistas sociais e hoje favorecidas pela democracia apontam para

um novo caminho Assim na Ameacuterica Latina em um contexto de agravamento da questatildeo social haacute

inuacutemeros movimentos emancipatoacuterios na construccedilatildeo de uma contra-hegemonia e que faz surgir uma

nova invenccedilatildeo do Estado com nova direccedilatildeo novo modelo viabilizando uma ampliaccedilatildeo do Estado nos

termos de Carvalho (2010)

Eacute importante que a sociedade civil brasileira que jaacute conseguiu articular a luta social expressa

nos direitos sociais instituiacutedos retome novas articulaccedilotildees no sentido de defender um modelo de

Estado que coloque o interesse puacuteblico no centro de suas decisotildees Eacute urgente que novos mecanis-

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

367

mos de participaccedilatildeo social defendam a ampliaccedilatildeo da dimensatildeo do puacuteblico na esfera da vida social

e poliacutetica Enfim que surjam propostas de redefiniccedilatildeo do papel do Estado a serviccedilo da democracia

e da justiccedila social

2 CIDADANIA NO BRASIL

Murilo de Carvalho (2003) confronta a cidadania inglesa baseada na classificaccedilatildeo de Marshall

e a cidadania brasileira Na Inglaterra a cidadania foi fruto da conquista ao longo de trecircs seacuteculos con-

quista atrelada A direitos ou seja cada direito garantia a conquista de outros No Brasil a cidadania

foi fruto da estrateacutegia poliacutetica de governantes autoritaacuterios que fizeram de ordem inversa a doaccedilatildeo com

supressatildeo de alguns direitos sem nenhuma vinculaccedilatildeo E esta eacute a tese de Carvalho (2003) demonstrar

que ao longo do tempo neste paiacutes foi desenvolvida uma cidadania inconclusa por natildeo ter havido

vinculaccedilatildeo dessas trecircs dimensotildees poliacuteticas da cidadania

A considerar a chegada dos portugueses em 1500 ateacute o iniacutecio do seacuteculo XX o Brasil em quatro

seacuteculos pouco avanccedilou em termos de cidadania e de participaccedilatildeo da sociedade civil Os direitos civis

eram estendidos a poucos os direitos poliacuteticos a uma parcela ainda menor e os direitos sociais ainda

nem eram cogitados pois a assistecircncia social estava a cargo da Igreja e de particulares

Falar de cidadania no Brasil eacute analisar a matriz cultural de uma sociedade em que direitos natildeo

fazem parte das regras que organizam a vida social ou seja natildeo foram concebidos como direitos e sim

como favores benefiacutecios Eacute constatar o modo como as relaccedilotildees sociais se estruturaram na medida do

poder dos interesses privados dos ldquodonos do poderrdquo

A sociedade brasileira apesar dos avanccedilos carrega o peso da tradiccedilatildeo de um paiacutes escravocrata

concentrador de riquezas E ao analisar o esquema apresentado por Marshall e confrontar com a reali-

dade brasileira como fez Carvalho (2003) percebe-se que a cidadania estaacute desconectada da formaccedilatildeo

da sociedade brasileira E mais pode-se constatar que a existecircncia formal desses direitos natildeo significa

a sua efetivaccedilatildeo ou seja existe um grande fosso entre o paiacutes legal e o paiacutes real

3 ASPECTOS HISTOacuteRICOS DA TRIBUTACcedilAtildeO NO BRASIL

O primeiro tributo instituiacutedo no Brasil foi o pagamento do Quinto que correspondia ao paga-

mento da quinta parte do produto da venda de madeira ao soberano portuguecircs conforme Weyne e

Amorim (2006) Estava instituiacutedo o primeiro ocircnus fiscal agrave Coroa Portuguesa Os tributos eram pagos

em produtos accediluacutecar tabaco cravo pano de algodatildeo couro pau-brasil dentre outros

O Fisco portuguecircs segundo Weyne e Amorim (2006) cometia abusos e desmandos aleacutem da

criaccedilatildeo da estrutura tributaacuteria com modernas teacutecnicas de escrituraccedilatildeo elaboraccedilatildeo de balanccedilos regula-

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

368

res e prestaccedilatildeo de contas agrave Real Fazenda Segundo os autores de 1808 a 1822 o nuacutemero de tributos

era quase cem e ainda existiam os diacutezimos laudecircmio emolumentos foros dentre outros E como natildeo

havia separaccedilatildeo de competecircncias em mateacuteria tributaacuteria os impostos eram cobrados em duplicidade

pela Corte proviacutencia e municiacutepios Em um relatoacuterio de 1831 o accediluacutecar era tributado cinco vezes a

aguardente oito o tabaco seis e o algodatildeo trecircs vezes ressaltam Weyne e Amorim (2006)

A revolta mais importante contra a cobranccedila extorsiva dos tributos por Portugal foi a Inconfi-

decircncia Mineira segundo Savegnani (2006) A revolta popular era contra a Derrama um dos tributos

mais perversos aplicados na Regiatildeo das Minas que era a apropriaccedilatildeo pela Coroa dos bens particulares

de todos os habitantes mineradores ou natildeo caso natildeo fosse computado a cota estipulada do ouro

Essa rebeliatildeo dos inconfidentes foi a que teve mais viacutenculo com a questatildeo fiscal Seu resultado a Der-

rama foi suspensa e referido movimento inspirou mais tarde a Independecircncia do Brasil

A primeira lei de orccedilamento que traccedilava normas sobre receita e despesas das proviacutencias data

de 14 de novembro de 1827 conforme Weyne e Amorim (2006) Com a aboliccedilatildeo da escravatura em

1888 houve a liberaccedilatildeo do capital antes empregado na compra de escravos para uma nova economia

o cafeacute Surgem os grupos cafeeiros do oeste paulista que recebiam incentivos fiscais ou a garantia de

compra dos estoques excedentes que foram os interlocutores poliacuteticos das questotildees nacionais na ldquoRe-

puacuteblica Velhardquo de acordo com Weyne e Amorim (2006)

Nesse sentido eacute oportuno destacar a criacutetica feita por Buffon (2009) a respeito da estrutura tri-

butaacuteria atual moldada com casuiacutesmos e interesses que mediante mecanismos de proteccedilatildeo a grupos

econocircmicos influentes satildeo feitas negociaccedilotildees por representantes do Poder Executivo com relaccedilatildeo a

renuacutencias fiscais indiscriminadas Satildeo isenccedilotildees remissatildeo ou anistia que beneficiam atores econocircmicos

tais quais os cafeicultores do oeste paulista que receberam na ldquoRepuacuteblica Velhardquo os benefiacutecios fiscais

Atualmente aos detentores do capital concedem-se benefiacutecios fiscais e aos trabalhadores tem-se

pesada carga tributaacuteria incidente sobre o trabalho assevera o autor

A Era Vargas trouxe medidas tributaacuterias mais ampliadas proposta de reforma fiscal onde fosse

contemplada a organizaccedilatildeo orccedilamentaacuteria soluccedilatildeo de problemas fiscais e uniformizaccedilatildeo da contabili-

dade puacuteblica O estabelecimento do Sistema Tributaacuterio Nacional conforme Weyne e Amorim (2006)

surge na Ditadura Militar onde a poliacutetica tributaacuteria assim como os demais aspectos da vida brasileira

passaram por profundas modificaccedilotildees

Conforme os historiadores houve a centralizaccedilatildeo do poder fiscal da Uniatildeo e esta foi a princi-

pal criacutetica feita agrave reforma tributaacuteria de 1965 que limitou drasticamente a autonomia financeira dos

estados

O sistema tributaacuterio que passou a vigorar com a promulgaccedilatildeo da Constituiccedilatildeo de 1988 repre-

sentou um novo pacto federativo onde estados e municiacutepios passaram a dispor de mais autonomia

encerrando assim o centralismo de outrora conforme Weyne e Amorim (2006) O grande avanccedilo foi

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

369

representado pelas limitaccedilotildees ao poder de tributar do Estado revelando-se um instrumento de prote-

ccedilatildeo contra o arbiacutetrio de poder estatal O fato relevante nos termos de Hugo de Brito Machado (2006)

consiste na compreensatildeo da tributaccedilatildeo como relaccedilatildeo juriacutedica e natildeo apenas como relaccedilatildeo de poder

4 O ATUAL SISTEMA TRIBUTAacuteRIO NACIONAL

Por meio da Constituiccedilatildeo Federal de 1988 fonte primaacuteria de toda ordem juriacutedica o Sistema Tri-

butaacuterio Nacional eacute instituiacutedo em seus artigos 145 a 162 A Constituiccedilatildeo natildeo cria tributo cumpre papel

essencial na construccedilatildeo do sistema ao definir competecircncias tributaacuterias dos entes poliacuteticos da federa-

ccedilatildeo (Uniatildeo Estados Distrito Federal e Municiacutepios) consagrar os princiacutepios e normais gerais do Direito

Tributaacuterio instituir limitaccedilotildees ao poder de tributar estabelecer a reparticcedilatildeo das receitas e vinculaccedilotildees

compulsoacuterias conforme Brasil (2007)

O conceito de tributo estaacute relacionado ao que por dever eacute repassado ao Estado cuja finalidade

eacute servir de meio para o atendimento agraves necessidades financeiras do Estado para que este cumpra sua

funccedilatildeo social nos termos de Amaro (2005)

Conforme dispotildee o artigo 145 da CF88 as espeacutecies tributaacuterias satildeo os impostos as taxas e as

contribuiccedilotildees de melhorias Vale ressaltar que satildeo previstas ainda na Constituiccedilatildeo duas outras formas

tributaacuterias tratadas como se fossem tributos os empreacutestimos compulsoacuterios (art 148) e as contribui-

ccedilotildees especiais ou parafiscais (art 149)

Haacute um senso comum de atribuir como imposto toda e qualquer exigecircncia do poder puacuteblico

poreacutem cada espeacutecie tem sua especificidade O imposto de acordo com o art 16 do Coacutedigo Tributaacuterio

Nacional ldquoeacute o tributo cuja obrigaccedilatildeo tem por fato gerador uma situaccedilatildeo independente de qualquer

atividade estatal especiacutefica relativa ao contribuinterdquo

Outra classificaccedilatildeo importante dos impostos eles podem ser diretos ou indiretos progressivos

ou regressivos Assim de acordo com Brasil (2009) o imposto direto eacute aquele em que o contribuinte de

fato eacute o mesmo contribuinte de direito Exemplos de impostos diretos IRPJ IRPF IPVA e IPTU Jaacute com

o imposto indireto a situaccedilatildeo eacute inversa ou seja o contribuinte de fato natildeo eacute o mesmo de direito por

exemplo o ICMS IPI e ISS

Quanto aos princiacutepios conforme Brasil (2009) podem ser assim enumerados princiacutepios da

legalidade da anterioridade da lei da isonomia da irretroatividade da lei da uniformidade da tributa-

ccedilatildeo da capacidade contributiva da proibiccedilatildeo de confisco

Eacute oportuno grifar as consideraccedilotildees de Buffon (2009) que defende a tese da tributaccedilatildeo poten-

cializar a materializaccedilatildeo dos direitos fundamentais sociais econocircmicos e culturais por meio de dois

mecanismos extrafiscalidade e adequaccedilatildeo da carga fiscal ao princiacutepio da capacidade contributiva Se-

gundo o autor eacute necessaacuteria uma accedilatildeo estatal efetiva bem diferente da accedilatildeo recomendada pelo mode-

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

370

lo liberal E um dos poderosos instrumentos que o Estado dispotildee eacute a imposiccedilatildeo de uma carga tributaacuteria

de acordo com a efetiva capacidade contributiva que representa o principal vetor de desigualdade no

campo da tributaccedilatildeo

O autor relata que a parcela da populaccedilatildeo com a menor capacidade contributiva que natildeo tem

garantido minimamente os direitos sociais arca com parcela exorbitante da carga tributaacuteria eacute uma

ldquoredistribuiccedilatildeo de renda agraves avessasrdquo em favor das minorias organizadas que se encontram no topo

da piracircmide social que dispotildee de poder para fazer valer seus interesses Em outras palavras o Estado

retira parte importante dos recursos daqueles que natildeo tecircm proteccedilatildeo social

Sabe-se que mecanismos existem vaacuterios dentre estes a adequaccedilatildeo da carga tributaacuteria ao prin-

ciacutepio da capacidade contributiva a extrafiscalidade e tantos outros que jaacute satildeo formalmente instituiacutedos

Este paiacutes dispotildee de teacutecnicos para pensar nas melhores estrateacutegias de reconduzir o Sistema Tributaacuterio

faltam entretanto a vontade e o interesse poliacutetico da sociedade civil e dos governantes em transfor-

mar o modelo de tributaccedilatildeo injusto que amplia desigualdades sociais e econocircmicas nos termos de

Buffon (2009) em um modelo condizente ao Estado Democraacutetico de Direito que preserva a dignidade

humana

5 EDUCACcedilAtildeO FISCAL E O PNEF

A Educaccedilatildeo Fiscal estaacute inserida em um amplo projeto educativo com o objetivo de proporcio-

nar o bem estar social por meio da construccedilatildeo de conhecimentos especiacuteficos sobre direitos e deveres

do cidadatildeo e promoccedilatildeo da consciecircncia cidadatilde Os pressupostos principais satildeo direitos e deveres con-

trole democraacutetico e funccedilatildeo socioeconocircmica do tributo Os valores estatildeo expressos na superioridade

do homem sobre o Estado liberdade justiccedila social conforme Brasil (2009)

Eacute relevante destacar que a Constituiccedilatildeo Federal de 1988 a Lei de Diretrizes Baacutesicas (LDB) e os

Paracircmetros Curriculares Nacionais (PCNs) expressam claramente a importacircncia da conquista da cida-

dania no processo educacional

As temaacuteticas sociais em relaccedilatildeo agrave eacutetica meio ambiente pluralidade cultural orientaccedilatildeo sexual

trabalho e consumo satildeo integradss na proposta educacional dos Paracircmetros Curriculares Nacionais

como temas transversais Referidos temas satildeo questotildees atuais urgentes da vida cotidiana que exigem

novos saberes para sua intervenccedilatildeo conforme Brasil (1998)

Eacute nesse contexto que se insere a Educaccedilatildeo Fiscal dentro do tema transversal Trabalho e Con-

sumo e tem como pressuposto contribuir para o exerciacutecio da cidadania por meio da sensibilizaccedilatildeo

da funccedilatildeo social do tributo em prol do controle social da aplicaccedilatildeo dos recursos oriundos conforme

Brasil (2009)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

371

51 O Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal (PNEF)

A Educaccedilatildeo Fiscal foi institucionalizada por intermeacutedio do Programa Nacional de Educaccedilatildeo

Fiscal em acircmbito nacional nas escolas de ensino fundamental escolas de ensino meacutedio institui-

ccedilotildees puacuteblicas universidades e sociedade em geral Os objetivos do Programa foram assim definidos

(BRASIL 2009)

Objetivo Geral promover e institucionalizar a Educaccedilatildeo Fiscal para o pleno exerciacutecio da cidadania

Os objetivos especiacuteficos do Programa satildeo

a) Sensibilizar o cidadatildeo para a funccedilatildeo socioeconocircmica do tributo

b) Levar o conhecimento ao cidadatildeo sobre administraccedilatildeo puacuteblica

c) Incentivar o acompanhamento pela sociedade da aplicaccedilatildeo dos recursos puacuteblicos

d) Criar condiccedilotildees para uma relaccedilatildeo harmoniosa entre o Estado e o cidadatildeo

A Educaccedilatildeo Fiscal natildeo eacute uma disciplina especiacutefica do curriacuteculo escolar segundo decisatildeo do Mi-

nisteacuterio da Educaccedilatildeo Ela eacute ministrada de maneira transversal em todas as demais mateacuterias das escolas

Seu conteuacutedo trata sobre a constituiccedilatildeo do Estado funccedilotildees receitas despesas funccedilatildeo social do tribu-

to orccedilamento gasto e investimento puacuteblico noccedilatildeo de bem puacuteblico dentre outros Referido conteuacutedo

eacute incorporado nas mateacuterias de geografia matemaacutetica portuguecircs eacutetica etc

As principais accedilotildees do Programa de acircmbito nacional correspondem a accedilotildees de sensibilizaccedilatildeo

formaccedilatildeo educaccedilatildeo e arte As accedilotildees de sensibilizaccedilotildees referem-se a palestras seminaacuterios mesas re-

dondas debates etc As accedilotildees de formaccedilatildeo abrangem cursos de formaccedilatildeo de disseminadores de

forma presencial e a distacircncia e cursos de poacutes-graduaccedilatildeo em Educaccedilatildeo Fiscal Com relaccedilatildeo agraves accedilotildees

de educaccedilatildeo estatildeo relacionadas agrave capacitaccedilatildeo de monitores professores atividades acadecircmicas como

projetos pedagoacutegicos elaboraccedilatildeo de monografias e dissertaccedilotildees As accedilotildees dirigidas ao setor artiacutestico

correspondem agrave elaboraccedilatildeo e encenaccedilatildeo de peccedilas de teatro elaboraccedilatildeo de muacutesicas paroacutedias poesias

cordeacuteis cartazes realizaccedilatildeo de concursos culturais todos abrangendo o tema Educaccedilatildeo Fiscal

52 A Educaccedilatildeo Fiscal no Cearaacute

A instituiccedilatildeo oficial do Programa de Educaccedilatildeo Tributaacuteria do Cearaacute foi por meio do Decreto

Estadual nordm 25326 de 23121998 fundamentado no artigo 1ordm paraacutegrafo uacutenico da Lei Estadual nordm

12436 de 11 de maio de 1995 revogada posteriormente pela Lei Estadual nordm 133142003 Houve

aqui um trabalho pioneiro com o projeto ldquoCidadatildeo Desde Pequenordquo em 07 de outubro de 1997 na

unidade fazendaacuteria localizada no municiacutepio de Horizonte no Nuacutecleo de Execuccedilatildeo Fiscal que abrangia

os seguintes municiacutepios Horizonte Pacajus Itaitinga Barreira Ocara e Chorozinho conforme Weyne

e Amorim (2006)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

372

Segundo os autores referido trabalho educativo procurava conscientizar as crianccedilas de 9 a 14

anos da circunscriccedilatildeo fiscal citada de escolas puacuteblicas e particulares acerca da importacircncia dos tributos

estaduais e seus benefiacutecios com a intenccedilatildeo de sensibilizar sobre o valor da participaccedilatildeo de cada um

ou seja dos futuros cidadatildeos Houve no dia 28 de novembro de 1997 a entrega da premiaccedilatildeo na ci-

dade de Pacajus ndash CE do concurso de redaccedilatildeo do Projeto Cidadatildeo desde Pequeno Concorreram nove

mil redaccedilotildees com o tema ICMS - sua importacircncia e seus benefiacutecios

Apoacutes o cronograma de implantaccedilatildeo dos Programas estaduais o Programa do Cearaacute pela ex-

periecircncia do ldquoProjeto Cidadatildeo Desde Pequenordquo na regiatildeo de Horizonte ndash CE foi selecionado como

um dos estados-pilotos para o ano de 1998 A aula inaugural foi veiculada pela TV Cearaacute canal 5 e

mensagens de Educaccedilatildeo Tributaacuteria foram levadas para adolescentes do 6ordm ano ao 9ordm ano do Ensino

Fundamental da rede estadual e municipal de ensino conforme Weyne e Amorim (2006)

O Programa de Educaccedilatildeo Fiscal no Estado do Cearaacute tem hoje a seguinte constituiccedilatildeo Secretaria

da Fazenda do Estado do Cearaacute (Sefaz) Secretaria da Receita Federal do Brasil ndash 3ordf Regiatildeo Fiscal Pre-

feitura Municipal de Fortaleza por meio da Secretarias de Financcedilas e Educaccedilatildeo do Municiacutepio Secreta-

ria de Educaccedilatildeo do Estado e Centro Regional da Escola de Administraccedilatildeo Fazendaacuteria - Centresaf ndash CE

Referidos oacutergatildeos parceiros compotildeem o Grupo de Educaccedilatildeo Fiscal Estadual (Gefe) no Cearaacute conforme

Rivillas Vilardeboacute Mota (2010)

O Decreto nordm 28900 de 27092007 incumbuiu agrave Ceacutelula de Educaccedilatildeo Fiscal (Ceduf) a respon-

sabilidade de coordenar as accedilotildees do PEF com as seguintes atribuiccedilotildees dispostas no Decreto nordm 29201

de 28022008 em seu artigo 45

I ndash promover a conscientizaccedilatildeo na sociedade da funccedilatildeo socioeconocircmica do tributoII ndash coordenar e executar as accedilotildees do Programa Educaccedilatildeo Fiscal ndash PEF ndash CearaacuteIII ndash Promover a educaccedilatildeo fiscal junto ao puacuteblico escolar em seus diferentes niacuteveis bem como desenvolver parcerias com instituiccedilotildees puacuteblicas e privadas para inserccedilatildeo do Programa nos diversos segmentos da sociedadeIV- promover o marketing interno e externo do ProgramaV ndash representar o Estado no Grupo Nacional de Educaccedilatildeo FiscalVI ndash promover em parceria com a aacuterea de treinamento a formaccedilatildeo de agentes capa-citados e multiplicadoresVII ndash monitorar a produccedilatildeo do material a ser utilizado pelo Programa tais como livro material didaacutetico viacutedeo educativo e outros (CEARAacute 2008)

6 METODOLOGIA

A fase inicial do trabalho abrangeu a pesquisa bibliograacutefica que contou como suporte de pes-

quisa as referecircncias teoacutericas constantes nos livros artigos dissertaccedilotildees e teses E sobretudo foi feita

a anaacutelise documental acerca da Educaccedilatildeo Fiscal e um levantamento bibliograacutefico sobre o tema Vale

ressaltar que ainda como suporte de pesquisa houve a participaccedilatildeo em cursos seminaacuterios e congres-

sos a fim de uma maior aproximaccedilatildeo com o assunto

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

373

A segunda etapa ou pesquisa de campo foi realizada com professores da rede puacuteblica municipal

de Fortaleza participantes do Curso de Formaccedilatildeo de Disseminadores de Educaccedilatildeo Fiscal promovido

pela Eesaf nos anos de 2008 a 2012 na modalidade a distacircncia

O instrumento utilizado para a coleta de dados foi um questionaacuterio enviado aos referidos par-

ticipantes por meio do endereccedilo eletrocircnico fornecido pela Ceduf Foram enviados durante o mecircs de

setembro de 2012 aos participantes embora tenha sido necessaacuterio o reenvio dos questionaacuterios o

reforccedilo sobre a importacircncia da colaboraccedilatildeo dos pesquisados enfim um apelo agrave participaccedilatildeo na ava-

liaccedilatildeo do referido Curso

O questionaacuterio apresentava questotildees fechadas e abertas e fundadas nos objetivos especiacuteficos

e em conformidade aos objetivos previstos pelo PNEF A pesquisa de campo teve uma abordagem

metodoloacutegica de natureza qualitativa que trabalha nos termos de Minayo (2007) com o universo dos

significados das atitudes dos valores

7 RESULTADOS

Na pesquisa de campo foram enviados um total de novecentos questionaacuterios aos professores

participantes mas o nuacutemero de respondentes foi bem reduzido apenas setenta e cinco responderam

ao questionaacuterio Tal fato pode ser um indicador importante a ser considerado Excluindo o alto retorno

por correio eletrocircnico invaacutelido houve uma participaccedilatildeo bem inferior ao esperado e natildeo foi possiacutevel

atingir o valor da amostra apesar da insistecircncia no reenvio dos questionaacuterios e sensibilizaccedilatildeo para a

importacircncia da participaccedilatildeo na avaliaccedilatildeo do referido Curso

Indaga-se por que a maioria dos cursistas natildeo se sentiu motivada a responder o questionaacuterio

eletrocircnico da pesquisa acadecircmica que avalia o Curso de Disseminadores de Educaccedilatildeo Fiscal e sua in-

fluecircncia na praacutetica docente Tal abstenccedilatildeo evidencia uma praacutetica natildeo condizente com o que legitima

o referido Programa ou seja a praacutetica cidadatilde Seraacute que expressar as criacuteticas as sugestotildees os desafios

a vivecircncia natildeo representa uma tentativa de buscar o aperfeiccediloamento do referido Curso Como seratildeo

feitas as avaliaccedilotildees das poliacuteticas puacuteblicas financiadas por recursos puacuteblicos sem a participaccedilatildeo dos

usuaacuterios de tais poliacuteticas sociais

Houve maior participaccedilatildeo na pesquisa de campo dos cursistas referentes aos uacuteltimos anos ou

seja de 2010 a 2012 quase oitenta por cento Praticamente todos ensinam no ensino fundamental

atribuiacuteram uma avaliaccedilatildeo positiva ao referido Curso sentem-se motivados a participar como dissemi-

nadores na praacutetica docente Tal resultado reforccedila a ideia de satisfaccedilatildeo de aprovaccedilatildeo de reflexatildeo sobre

os conceitos e valores da Educaccedilatildeo Fiscal

Todos os participantes apresentaram ao final do Curso o projeto pedagoacutegico mas 41 natildeo o

fazem ou seja mais da metade (59) desenvolvem na praacutetica docente atividades em Educaccedilatildeo Fiscal

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

374

Segundo os respondentes falta acompanhamento da accedilatildeo dos novos disseminadores pela escola e

este fato eacute apontado como principal desafio pelos participantes

Dentre os principais exemplos de atividades citados pelos respondentes que desenvolvem ati-

vidades sobre a forma de abordar em sala de aula a Educaccedilatildeo Fiscal destacam-se debates palestras

foacuteruns seminaacuterios e peccedilas teatrais sobre os conceitos e valores da Educaccedilatildeo Fiscal

Como foi exposto mais da metade dos participantes (59) abordam em sua praacutetica docente o

tema Educaccedilatildeo Fiscal mas em uma frequecircncia ainda baixa segundo os participantes

O apoio pedagoacutegico por parte do nuacutecleo gestor foi apontado como sendo o mais necessaacuterio

para motivar a disseminaccedilatildeo da Educaccedilatildeo Fiscal apoacutes a conclusatildeo do Curso aleacutem da oferta de mais

cursos sobre o tema

Percebeu-se com clareza a necessidade de mais cursos acerca do tema ou seja eacute necessaacuterio

que o novo disseminador familiarize-se com o assunto e possa disseminar bem ter argumentos sobre

mateacuteria complexa em um contexto nada favoraacutevel como bem adverte Pegoraro

De que forma nosso disseminador armado de oacutetimas intenccedilotildees que acaba de se apo-derar de determinados assuntos ainda natildeo muito familiares pode falar e ser ouvido em uma sociedade como esta dominada pelas elites carente da presenccedila estatal contraacuteria ao pagamento de tributos e sem o acompanhamento presente daqueles que o incentivaram a tomar essa atitude (PEGORARO 2011 p 151)

Com relaccedilatildeo aos principais desafios em abordar o tema Educaccedilatildeo Fiscal em sala de aula se-

gundo os professores participantes foram apontados falta de interesse dos alunos falta de apoio

estrutural da escola domiacutenio do assunto necessidade de mais cursos acerca do tema adequar o tema

complexo de forma simples Tal resultado evidencia lacunas a serem supridas de forma satisfatoacuteria

pelo PNEF para melhor atender seu puacuteblico alvo

Para quase 80 dos pesquisados o Curso de Formaccedilatildeo sensibilizou para a compreensatildeo socio-

econocircmica do tributo e controle social ou seja atingiu os objetivos especiacuteficos do PNEF

Vale destacar que a maioria dos pesquisados apontou a necessidade de inclusatildeo do tema como

disciplina obrigatoacuteria no curriacuteculo escolar Tal resultado confere ao tema um significado relevante

Os cursistas apontaram como principais condiccedilotildees para a construccedilatildeo de uma relaccedilatildeo harmo-

niosa entre Estado e cidadatildeo gestatildeo eficiente dos recursos puacuteblicos com transparecircncia e combate agrave

corrupccedilatildeo amplo conhecimento dos direitos e deveres dos cidadatildeos e retorno social dos tributos po-

liacuteticas puacuteblicas voltadas ao interesse social participaccedilatildeo e controle social Tal resultado reflete a cons-

ciecircncia do grupo de participantes sobre as razotildees do conflito entre Estado e sociedade Em siacutentese as

condiccedilotildees elencadas satildeo essenciais para a vivecircncia da cidadania para o resgate da eacutetica nas relaccedilotildees

para a instituiccedilatildeo real do Estado Democraacutetico de Direito

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

375

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

O universo tributaacuterio perpassa a cidadania fiscal pois os tributos representam o suporte fi-

nanceiro do Estado Social que por sua vez deve gerir tais recursos puacuteblicos de forma transparente e

eficiente atendendo assim as demandas sociais o bem comum razatildeo de sua instituiccedilatildeo Parece bem

simples esta relaccedilatildeo de parceria Estadosociedade mas aqui no Brasil foi e tem sido uma relaccedilatildeo de-

sarmocircnica

A sociedade brasileira tem uma carga tributaacuteria que aleacutem de ser alta penaliza com mais rigor

quem menos possui recursos isto eacute o Estado aleacutem de natildeo garantir a proteccedilatildeo social devida ainda exi-

ge tributos sobre os parcos recursos destinados a sobrevivecircncia Como superar a loacutegica deste modelo

tributaacuterio que atenta contra a dignidade humana

O enfrentamento ao sistema tributaacuterio injusto e complexo requer uma accedilatildeo eficaz da socieda-

de civil e do proacuteprio Estado no sentido de redefinir o papel do Estado redefinir valores os princiacutepios

enfim eacute urgente romper a loacutegica deste modelo atual que desconsidera o interesse humano que esva-

zia de seu sentido os direitos fundamentais que afronta a proacutepria sobrevivecircncia

As questotildees fiscais e tributaacuterias deveriam estar ao alcance do conhecimento criacutetico de todos

natildeo poderia existir para grande parcela da populaccedilatildeo esse ldquoalheamentordquo o imperativo de pagar tri-

butos deveria empoderar a sociedade na cobranccedila e na fiscalizaccedilatildeo dos recursos puacuteblicos e mais

deveria provocar um acirrado controle social A liccedilatildeo primordial a ser refletida encerra o conceito

baacutesico de cidadania vivecircncia de direitos e deveres um depende do outro eacute uma relaccedilatildeo juriacutedica

entre Estado e sociedade

Nesse sentido eacute fundamental considerar o papel da educaccedilatildeo Educaccedilatildeo voltada para a trans-

formaccedilatildeo para a mudanccedila de valores para a formaccedilatildeo cidadatilde isto eacute servindo como ponte travessia

da vida social que estaacute posta para aquela que se quer conquistar com base na eacutetica no respeito na

responsabilidade individual coletiva e social

Os temas transversais que versam sobre a realidade social como eacute o caso da Educaccedilatildeo Fiscal

devem contemplar o incentivo para a atuaccedilatildeo em seu entorno social Eacute necessaacuterio no tempo presente

interpretar dados fatos e situaccedilotildees a fim de que se tenha uma compreensatildeo para agir sobre a reali-

dade social principalmente a sociedade brasileira que historicamente eacute desigual

Conforme dados obtidos na pesquisa os professores avaliaram de forma positiva o Curso de

Formaccedilatildeo de Disseminadores de Educaccedilatildeo Fiscal entretanto foram enfaacuteticos ao apontar os seus li-

mites quanto ao apoio logiacutestico do nuacutecleo gestor do Programa Percebe-se que haacute necessidade de

avaliaccedilatildeo de monitoramento de acompanhamento da accedilatildeo de disseminaccedilatildeo Ou seja o que ocorre

apoacutes a capacitaccedilatildeo do professor da educaccedilatildeo baacutesica corresponde a uma etapa que exige a soma de

esforccedilos dos oacutergatildeos envolvidos no sentido de efetivar no espaccedilo escolar a disseminaccedilatildeo dos conteuacute-

dos do Programa

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

376

Pela dinacircmica do curso as informaccedilotildees foram veiculadas por meio das accedilotildees de divulgaccedilatildeo de

disseminaccedilatildeo do curso a distacircncia o material didaacutetico foi distribuiacutedo enfim os conteuacutedos e valores da

Educaccedilatildeo Fiscal foram disseminados E a accedilatildeo dos novos disseminadores Sem o envolvimento efetivo

dos oacutergatildeos responsaacuteveis natildeo haveraacute uma accedilatildeo ampliada A parceria entre os oacutergatildeos gestores deve ser

articulada com base nos novos conceitos e valores da Educaccedilatildeo Fiscal que o Programa legitima ou

seja de cidadania fiscal

Os setores responsaacuteveis pelo PNEF os Ministeacuterios da Fazenda da Educaccedilatildeo a Esaf a Receita

Federal Secretarias da Fazenda e Educaccedilatildeo dos estados e municiacutepios dentre outros devem articular

medidas necessaacuterias ao amplo desenvolvimento deste Programa isto eacute superar os desafios e limites

existentes para que o objetivo do mesmo seja atingido de forma satisfatoacuteria

A sugestatildeo como contribuiccedilatildeo ao Programa eacute que aqueles que jaacute estatildeo envolvidos servido-

res puacuteblicos professores alunos enfim todos que foram sensibilizados pelos conceitos e valores da

Educaccedilatildeo Fiscal assumam o compromisso de disseminar estes conteuacutedos e colaborem no sentido de

exigir dos oacutergatildeos responsaacuteveis o apoio necessaacuterio para o cumprimento dos objetivos para expansatildeo

do Programa exercitando assim o que foi assimilado isto eacute a praacutexis promotora de mudanccedilas

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377

REFEREcircNCIAS

AMARO Luciano Direito Tributaacuterio Brasileiro Satildeo Paulo Saraiva 2005

AMORIM Maacutercio Wiliam F WEYNE Walda Maria M (orgs) SEFAZ tributo agrave histoacuteria Fortaleza Secre-taria da Fazenda do Cearaacute 2006

BRASIL Ministeacuterio da Educaccedilatildeo Paracircmetros Curriculares Nacionais Documento introdutoacuterio Secre-taacuteria de Educaccedilatildeo Fundamental Brasiacutelia 1998

______ Ministeacuterio da Fazenda Escola de Administraccedilatildeo Fazendaacuteria Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal (PNEF) Educaccedilatildeo fiscal no contexto social Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal Moacutedulo 3 Brasiacutelia Esaf 2009

______ Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Federativa do Brasil promulgada em 5 de outubro de 1988 40 p Satildeo Paulo Saraiva 2007

CARVALHO Alba Maria Pinho de Poliacuteticas Puacuteblicas e o dilema de enfrentamento das desigualdades um olhar criacutetico sobre a Ameacuterica Latina no seacuteculo XXI In SOUSA Fernando J Pires de (org) Poder e Poliacuteticas Puacuteblicas na Ameacuterica Latina Fortaleza Ediccedilotildees UFC 2010

CARVALHO Joseacute Murilo de Cidadania no Brasil o longo caminho Rio de Janeiro Civilizaccedilatildeo Brasi-leira 2003

CEARAacute Decreto nordm 29201 de 28 de fevereiro de 2008 Fortaleza 2008

FAORO Raymundo Os donos do poder formaccedilatildeo do patronato poliacutetico brasileiro Satildeo Paulo Globo 2000

FREIRE Paulo Educaccedilatildeo e mudanccedila 12 ed Rio de Janeiro Paz e Terra 2001

MACHADO Hugo de Brito Curso de Direito Tributaacuterio Satildeo Paulo Malheiros Editores 2006

MINAYO Maria Ceciacutelia de Souza (org) Pesquisa Social teoria meacutetodo e criatividade 25ed Petroacutepolis Vozes 2007

PEGORARO Celso Gomes O Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal no Estado de Satildeo Paulo estaacute sendo eficaz 2011 199 f Monografia Curso de Especializaccedilatildeo em Educaccedilatildeo Fiscal e Cidadania Bra-siacutelia Esaf 2011

PRADO Jr Caio Formaccedilatildeo do Brasil Contemporacircneo 23 ed Satildeo Paulo Brasiliense 1994

SADER Emir Puacuteblico versus mercantil 2009 Disponiacutevel em lthttpalainetorgactive3804amplan-g=esgt Acesso em 01 jan 2013

SAVEGNANI Joacir A resistecircncia aos tributos no Brasil o Estado e a Sociedade em conflito Disser-taccedilatildeo de Mestrado Santa Catarina Florianoacutepolis UNIVALI 2006

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378

SOUSA Fernando J Pires de Percalccedilos da Ameacuterica Latina de Bretton Woods agrave atual crise financeira global In SOUSA Fernando J Pires de (org) Poder e Poliacuteticas Puacuteblicas na Ameacuterica Latina Fortaleza Ediccedilotildees UFC 2010 ______ Proteccedilatildeo Social e a crise do emprego In BRAGA Elza Maria Fanco (org) Ameacuterica Latina trans-formaccedilotildees econocircmicas e poliacuteticas Fortaleza Ediccedilotildees UFC 2003

RIVILLAS Borja Diacuteaz VILARDEBOacute Andreacutea MOTA Luiza Ondina Santos Educaccedilatildeo Fiscal no Brasil e no mundo In VIDAL Eloiacutesa Maia (org) Educaccedilatildeo Fiscal e cidadania Fortaleza Ediccedilotildees Demoacutecrito Ro-cha 2010

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A EXPERIEcircNCIA DA EDUCACcedilAtildeO A DISTAcircNCIA NO CENTRO DE EDU-CACcedilAtildeO FISCAL PARA A CIDADANIA DA ESCOLA FAZENDAacuteRIA DE SAtildeO

PAULO E O CURSO DE DISSEMINADORES DE EDUCACcedilAtildeO FISCAL

SUMAacuteRIO Introduccedilatildeo 1 O Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal (PNEF) 2 A Educaccedilatildeo Fiscal no Estado de Satildeo Paulo 21 Histoacuterico do PNEF no Estado de Satildeo Paulo 3 A inserccedilatildeo da EAD nesse processo 4 EAD como metodologia utilizada pelo PNEF 5 Resultados do Curso de DEF no Estado de Satildeo Paulo 51 Novas alteraccedilotildees no formato do Curso de DEF 52 Resultados do Curso de DEF no Estado de Satildeo Paulo no ano de 2013 6 Alguns apontamentos so-bre pesquisa realizada com tutores e alunos 61 Sobre o Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVAMOODLE) 62 Apontamentos sobre o material didaacutetico 63 Apontamentos sobre o tempo de duraccedilatildeo do curso 64 Apontamentos sobre os foacuteruns 65 Apontamentos sobre as atividades avaliativas 66 Apon-tamentos sobre o Projeto Pedagoacutegico Plano de Accedilatildeo 67 Principais reclama-ccedilotildees dos tutores 68 Apontamentos do gestor regional Consideraccedilotildees finais Referecircncias

Augusto Jeronimo Martini1

INTRODUCcedilAtildeO

O Estado no desejo de se manter participe das accedilotildees que beneficiem a populaccedilatildeo por vezes

tributa excessivamente e natildeo fornece dados que deixem claro ou justifiquem suas accedilotildees fazendo com

que a sociedade se submeta agraves suas imposiccedilotildees e mantenha-se distanciada gerando assim uma re-

laccedilatildeo de conflito (FERNANDES 2008)

Nesta perspectiva o Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal (PNEF) surge como um programa

que busca diminuir esta relaccedilatildeo existente entre o Estado e a Sociedade por meio dos conhecimentos

referentes ao retorno social do pagamento dos tributos a gestatildeo democraacutetica dos recursos puacuteblicos

e o exerciacutecio pleno da cidadania O tributo eacute essencial agrave construccedilatildeo da vida em sociedade e por isso

ele guarda relaccedilatildeo direta com o cotidiano das pessoas

A Educaccedilatildeo Fiscal tem como principal proposta despertar na sociedade uma reflexatildeo sobre o

contexto em que o cidadatildeo estaacute inserido oferecendo a ele informaccedilotildees para uma atuaccedilatildeo consistente

e de contribuiccedilatildeo para a melhoria das condiccedilotildees sociais vigentes Quanto mais educada fiscalmente

1 Possui graduaccedilatildeo em Geografia (Licenciatura e Bacharelado) pelo IGCE - Unesp - Rio ClaroSP (1993) mestrado em Histoacuteria Social pela USP (2004) e Especializaccedilatildeo em Organizaccedilatildeo de Arquivos pelo IEBUSP Funcionaacuterio Puacuteblico Estadual trabalhando na Secretaria da Fazenda de Satildeo Paulo na Fazesp - Escola Fazendaacuteria atuando na aacuterea de treinamento em EAD Eacute Gestor Estadual do curso a distacircncia de Disseminadores de Educaccedilatildeo Fiscal para o estado de Satildeo Paulo oferecido pela Escola de Administraccedilatildeo Fazendaacuteria (Esaf) de BrasiacuteliaDF E-mail augustomartinigmailcom

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

380

estiver nossa populaccedilatildeo mais seraacute possiacutevel exercer plenamente a cidadania e em consequecircncia maior

seraacute o desenvolvimento econocircmico e social Quanto maior a consciecircncia de contribuinte maior seraacute a

possibilidade de conseguirmos a justiccedila social e uma distribuiccedilatildeo de riqueza mais justa

1 O PROGRAMA NACIONAL DE EDUCACcedilAtildeO FISCAL (PNEF)

Em maio de 1996 o Conselho Nacional de Poliacutetica Fazendaacuteria (Confaz) reunido em Fortaleza

(CE) registra a importacircncia de um programa de consciecircncia tributaacuteria para despertar a praacutetica da cida-

dania Em setembro de 1996 a implantaccedilatildeo de um programa nacional permanente de conscientizaccedilatildeo

tributaacuteria faz parte do Convecircnio de Cooperaccedilatildeo Teacutecnica entre Uniatildeo Estados e Distrito Federal e em

julho de 1999 tendo em vista a abrangecircncia do programa que natildeo se restringe apenas aos tributos

mas que aborda tambeacutem as questotildees da alocaccedilatildeo dos recursos puacuteblicos arrecadados e da sua gestatildeo

o Confaz reunido na Paraiacuteba (PB) aprova a alteraccedilatildeo de sua denominaccedilatildeo que passa a ser Programa

Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal (PNEF)

Em julho de 1997 foi aprovada pelo Confaz a criaccedilatildeo de um grupo de trabalho constituiacutedo por

representantes das Secretarias Estaduais de Fazenda da Secretaria da Receita Federal e do Gabinete

do Ministro da Fazenda - o GEF (Grupo de Educaccedilatildeo Fiscal) que tem como missatildeo promover coor-

denar e acompanhar as accedilotildees necessaacuterias agrave elaboraccedilatildeo e agrave implantaccedilatildeo de um programa permanente

de educaccedilatildeo fiscal e acompanhar as atividades dos Grupos de Educaccedilatildeo Fiscal nos Estados (Gefes)

O objetivo geral do PNEF eacute promover e institucionalizar a educaccedilatildeo fiscal para o pleno exerciacutecio

da cidadania tendo como objetivos especiacuteficos sensibilizar o cidadatildeo para a funccedilatildeo socioeconocircmica

do tributo levar conhecimentos aos cidadatildeos sobre administraccedilatildeo puacuteblica incentivar o acompanha-

mento pela sociedade da aplicaccedilatildeo dos recursos puacuteblicos e criar condiccedilotildees para uma relaccedilatildeo harmo-

niosa entre o Estado e o cidadatildeo

2 A EDUCACcedilAtildeO FISCAL NO ESTADO DE SAtildeO PAULO

As accedilotildees do PNEF no Estado de Satildeo Paulo satildeo desenvolvidas pelo Gefe (Grupo de Educaccedilatildeo

Fiscal Estadual) composto em parceria pela Secretaria de Estado de Fazenda Receita Federal da 8ordf

Regiatildeo Secretaria de Estado de Educaccedilatildeo Centro de Treinamento Regional da Esaf-CentresafSP

e PGFN (Procuradoria Geral da Fazenda Nacional) da 3ordf Regiatildeo Tem por responsabilidade difundir

conhecimentos que propiciem o exerciacutecio da cidadania conforme as propostas da Constituiccedilatildeo Federal

de 1988 e da Lei de Diretrizes e Bases da Educaccedilatildeo Nacional

O Gefe pretende contribuir para que a sociedade se instrumentalize visando a melhoria do grau

de consciecircncia puacuteblica levando o cidadatildeo a conscientizar-se das mudanccedilas ocorridas no setor social

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

381

e econocircmico ligados ao tributo e agrave gestatildeo dos recursos puacuteblicos arrecadados como forma de auxiliar

na realizaccedilatildeo dos anseios da sociedade em que vive

A Educaccedilatildeo Fiscal busca estimular e criar condiccedilotildees que permitam aos formadores de opiniotildees

o acesso ao conjunto de conhecimentos elaborados construiacutedos e reconhecidos necessaacuterios para o

pleno exerciacutecio da cidadania Assim se apresenta como um veiacuteculo que induz o cidadatildeo a contribuir

para que o processo das mudanccedilas sociais pretendidas torne-se realidade e possa interferir no mo-

mento histoacuterico pelo qual passa a Naccedilatildeo brasileira Os maiores esforccedilos encontram-se voltados agrave ca-

pacitaccedilatildeo de professores do ensino fundamental e ensino meacutedio principalmente das escolas da Rede

Puacuteblica de Ensino na temaacutetica da Educaccedilatildeo Fiscal onde se objetivam a mudanccedila de comportamento

do cidadatildeo e a praacutetica efetiva da sua cidadania

No seu campo de atuaccedilatildeo o Gefe desenvolve inuacutemeras accedilotildees metodoloacutegicas visando dissemi-

nar os conhecimentos que permeiam a temaacutetica Educaccedilatildeo Fiscal Inicialmente tinha como carro chefe

a capacitaccedilatildeo presencial como um dos procedimentos metodoloacutegicos mais utilizados o que permitia

levar diretamente aos formadores de opiniotildees conceitos e estrateacutegias que esclarecem ao cidadatildeo

como funciona a maacutequina puacuteblica e como agir de maneira coerente para que juntos Estado e socie-

dade pudessem trabalhar para proporcionar o bem estar comum a todos

A inserccedilatildeo da Educaccedilatildeo a Distacircncia (EaD) como uma nova opccedilatildeo metodoloacutegica contribuiu

para atingir um puacuteblico bem mais amplo para disseminar os temas abordados pela Educaccedilatildeo Fiscal

sem que haja necessidade do aluno se deslocar de seu local de origem permitindo elaborar seus

horaacuterios de estudo e propiciando condiccedilotildees favoraacuteveis para que se desenvolva o processo de ensino

e da aprendizagem

Nessa premissa o presente trabalho buscou reunir dados significativos que permitam analisar

a eficiecircncia da Educaccedilatildeo a Distacircncia como procedimento metodoloacutegico utilizado pelo PNEF e refletir

sobre sua implementaccedilatildeo

21 Histoacuterico do PNEF no Estado de Satildeo Paulo

No Estado de Satildeo Paulo foram desenvolvidas diversas iniciativas e programas relacionados agrave

temaacutetica tratada pela Educaccedilatildeo Fiscal nas deacutecadas de 1950 1960 1970 e 1980 destacando-se a ques-

tatildeo da relevacircncia do papel dos tributos Nesse sentido ocorreram campanhas de educaccedilatildeo para fins

pontuais concursos de premiaccedilatildeo voltados a estudantes e jovens campanhas de esclarecimento no

tocante agrave nota e cupom fiscal dentre outras

No entanto somente na deacutecada de 1990 - mais precisamente em 1993 - eacute que foi organizado

o Programa de Educaccedilatildeo Fiscal para a Cidadania com o intuito de conscientizar a sociedade quanto agrave

relevacircncia dos tributos e do controle dos gastos puacuteblicos

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

382

A partir de 1993 comeccedilou portanto a serem desenvolvidas no Estado atividades de palestras

em escolas puacuteblicas e particulares eventos juntos agraves delegacias regionais de ensino da Secretaria Es-

tadual de Educaccedilatildeo dentre outras

Cabe destacar que as atividades no Estado Satildeo Paulo antecederam agrave criaccedilatildeo do Programa Na-

cional de Educaccedilatildeo Fiscal (PNEF) do qual fazemos parte que como jaacute foi citado ocorreu em 1999

A partir do ano 2000 o programa - sendo coordenador no acircmbito da Escola Fazendaacuteria do Es-

tado ndash Escola Fazendaacuteria de Satildeo Paulo (Fazesp) continua a desenvolver diversas atividades muitas

delas tambeacutem em parceria com a Receita Federal do Brasil em Satildeo Paulo no acircmbito do PNEF desta-

cando-se os Programas Fazenda Aberta2 Fazenda Vai agrave Escola3 e Fazenda Vai agrave Praia4 aleacutem dos

Seminaacuterios Estaduais de Educaccedilatildeo Fiscal

Vale ressaltar ainda o forte envolvimento no programa da parte das delegacias regionais da

Secretaria da Fazenda tambeacutem nesse periacuteodo quando foram desenvolvidas diversas atividades junto

a vaacuterios municiacutepios do Estado sempre sob a coordenaccedilatildeo da Fazesp

Tambeacutem o curso de Disseminadores de Educaccedilatildeo Fiscal (DEF) que visa capacitar cidadatildeos

estudantes e professores sobre questotildees relacionadas aos tributos e ao controle dos Gastos puacuteblicos

por meio da Educaccedilatildeo a Distacircncia tanto passa a ser coordenado pela Fazesp em Satildeo Paulo como pas-

sa a ter diversos servidores da Secretaria em sua grade de tutores

Cabe destacar hoje a criaccedilatildeo de um Centro especiacutefico na Escola ndash Centro de Educaccedilatildeo Fiscal

para a Cidadania - para coordenar o programa no Estado bem como a formalizaccedilatildeo do Grupo Es-

tadual de Educaccedilatildeo Fiscal (GefeSP) por meio do Decreto Estadual nordm 57362 de 23 de setembro

de 2011

3 A INSERCcedilAtildeO DA EaD NESSE PROCESSO

Cada vez mais percebemos que a sociedade estaacute caminhando para uma nova realidade a Era

Digital As tecnologias de informaccedilatildeo e comunicaccedilatildeo estatildeo cada vez mais presentes os ambientes

2 O Programa Fazenda Aberta tem por objetivo apresentar a Secretaria da Fazenda aos alunos do ensino fundamental meacutedio e superior da rede puacuteblica estadual municipal e particular por meio de visitas monitoradas agraves instalaccedilotildees da Secre-taria precedida por palestras que abordam os conteuacutedos da Educaccedilatildeo Fiscal3 No Programa Fazenda Vai agrave Escola um membro da equipe do Grupo da Educaccedilatildeo Fiscal Estadual de Satildeo Paulo (GefeSP) se desloca para a Escola e ministra palestras objetivando sensibilizar os estudantes e professores sobre a funccedilatildeo social do tributo estimulando-os para o cumprimento voluntaacuterio das obrigaccedilotildees tributaacuterias criando assim condiccedilotildees para o desenvolvimento do espiacuterito criacutetico no acompanhamento da aplicaccedilatildeo dos recursos puacuteblicos4 Esse Programa nasceu de uma parceria com a Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental (Cetesb) que realiza o Programa Veratildeo Limpo O trabalho consiste no desenvolvimento de atividades luacutedicas que permitem agraves crianccedilas fixa-rem alguns conceitos sobre tributos gasto puacuteblico e cidadania de forma simples e agradaacutevel Em paralelo temos uma feira de produtos apresentando alguns trabalhos realizados pelos alunos das escolas que participaram do projeto em ediccedilotildees passadas uma amostra de materiais didaacuteticos desenvolvidos por outros Estados e os materiais didaacuteticos desenvolvidos pela Fazesp e outras entidades que satildeo utilizados por nossos disseminadores

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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informatizados ampliam as nossas capacidades intelectuais as redes de comunicaccedilatildeo disponibilizam

informaccedilatildeo diversificada em acesso direto e os trabalhos cooperativos siacutencronos e assiacutencronos entre

pessoas fisicamente distantes jaacute eacute uma realidade

Segundo Eliasquevici e Prado Jr (2008)

EaD eacute em primeira instacircncia educaccedilatildeo A decisatildeo de projetar e implementar qualquer sistema passa a ser uma decisatildeo poliacutetica Mesmo que a vontade a instalaccedilatildeo fiacutesica a contrataccedilatildeo de recursos humanos entre outros sejam elementos importantes natildeo satildeo suficientes Eacute preciso tambeacutem coerecircncia entre o que se requer e o que se tem por meio do conhecimento da realidade na qual o processo estaacute inserido e de suas limitaccedilotildees e poliacuteticas claras traduzidas em planos e programas viaacuteveis O sucesso de projetos de EaD eacute dependente da concepccedilatildeo de planejamento e administraccedilatildeo envol-vidas no processo

As tecnologias de informaccedilatildeo e comunicaccedilatildeo oferecem potencialidades imprescindiacuteveis agrave edu-

caccedilatildeo e agrave formaccedilatildeo permitindo que o sistema educativo e a formaccedilatildeo contiacutenua usufruam do desen-

volvimento destas tecnologias Como diz Sander (1997)

A tecnologia eacute hoje tatildeo ou mais importante para o conhecimento como era a palavra impressa quando surgiu o livro A funccedilatildeo que o livro vem desempenhando tradicional-mente hoje se amplia exponencialmente com as novas tecnologias da comunicaccedilatildeo Ambos satildeo poderosos instrumentos de informaccedilatildeo e aprendizagem Ambos devem ser instrumentos de democratizaccedilatildeo da informaccedilatildeo e de desenvolvimento social equumli-tativo No entanto nem o livro nem as maacutequinas constroem o conhecimento e o desenvolvimento social Ambos satildeo obra do ser humano que hoje encontra na nova tecnologia da informaccedilatildeo um novo instrumento de extenso efeito multiplicador

A utilizaccedilatildeo de metodologias de aprendizagem a distacircncia pode levantar algumas duacutevidas no-

meadamente quanto agrave sua eficaacutecia Seraacute que os formandos que frequentam accedilotildees a distacircncia conse-

guem obter niacuteveis de aprendizagem aceitaacuteveis Seraacute que a produtividade obtida em accedilotildees presenciais

eacute superior a que se consegue em accedilotildees sobre a mesma temaacutetica mas induzidas a distacircncia

A experiecircncia leva-nos a afirmar que os resultados da formaccedilatildeo a distacircncia satildeo extremamente

positivos e por vezes ultrapassam situaccedilotildees de aprendizagem presencial

[] as administraccedilotildees puacuteblicas entenderam que soacute poderatildeo se desenvolver e cumprir sua missatildeo promovendo a implantaccedilatildeo das novas tecnologias e capacitando de forma contiacutenua seu pessoal A formaccedilatildeo de seus trabalhadores eacute agora mais importante do que nunca para fazer frente aos novos desafios que planeja um mundo em perma-nente mutaccedilatildeo Para adaptar-se e na medida do possiacutevel antecipar-se agraves mudanccedilas do ambiente o pessoal das administraccedilotildees deveraacute se capacitar de forma permanente natildeo soacute para cumprir com os requisitos do seu posto como tambeacutem para aproveitar ao maacuteximo seu potencial de desenvolvimento (FUNDACcedilAtildeO CEDDET 2011)

Infelizmente ainda existem algumas dificuldades de enquadramento administrativo das accedilotildees

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

384

realizadas neste modelo pois a legislaccedilatildeo sobre este tipo de formaccedilatildeo ainda eacute incipiente e as accedilotildees de

formaccedilatildeo a distacircncia satildeo creditadas financiadas e geridas basicamente da mesma forma que as accedilotildees

presenciais Toda a organizaccedilatildeo dos processos pedagoacutegicos e financeiros eacute mais complicada do que

na formaccedilatildeo presencial no entanto as dificuldades podem ser sempre superadas com persistecircncia

(MARTINI 2006)

Eacute uacutetil ter presente duas das principais vantagens da formaccedilatildeo agrave distacircncia a possibilidade de

realizar accedilotildees para grupos especiacuteficos e o acesso a uma gama de pessoas muito mais vasta ou seja

acesso a pessoas que estatildeo geograficamente distantes A experiecircncia que temos adquirido com o tra-

tamento da formaccedilatildeo a distacircncia tem sido uma mais valia para a formaccedilatildeo no modelo tradicional

Aqui natildeo pretendo fazer uma anaacutelise profunda e exaustiva dos resultados obtidos com a for-

maccedilatildeo a distacircncia nem comparar este tipo de formaccedilatildeo com a formaccedilatildeo presencial Existem muitos

trabalhos na internet com esse propoacutesito que podem ser consultados De toda a minha experiecircncia

de formaccedilatildeo a distacircncia e presencial percebo que a EaD obtecircm oacutetimos resultados pedagoacutegicos e que

permite o estabelecimento de uma colaboraccedilatildeo muacutetua entre os intervenientes O trabalho feito em

grupos virtuais funciona muito bem Os seus resultados comprovam a qualidade dos mesmos crian-

do-se assim o conceito colaborativo de comunidade em rede

Falando especificamente do curso de Disseminadores de Educaccedilatildeo Fiscal que eacute gratuito e ofe-

rece um certificado de 120 ha aos aprovados posso dizer que eacute um modelo inovador Inovador na

forma nas praacuteticas e nos princiacutepios Estaacute trazendo alteraccedilotildees significativamente positivas agraves pessoas

envolvidas sendo essencial para a mudanccedila de meacutetodos haacutebitos atitudes e comportamentos da po-

pulaccedilatildeo que fica ciente de por que pagar impostos a importacircncia de pedir notas fiscais e para onde

vai o dinheiro arrecadado entre tantos outros temas ali tratados

O sucesso desse curso se assenta fundamentalmente na rede humana ndash uma rede solidaacuteria

e autoconfiante Uma rede em constante funcionamento que associa entre outros coordenadores

gestores tutores teacutecnicos dirigentes da educaccedilatildeo liacutederes de escola professores diretores e socie-

dade em geral Esta rede constitui o segredo do ecircxito do curso e eacute a chave do sucesso do PNEF e

natildeo apenas a tecnologia

4 EaD COMO METODOLOGIA UTILIZADA PELO PNEF

A Educaccedilatildeo a Distacircncia tem sido atualmente a metodologia mais utilizada pelo PNEF jaacute que

a maioria dos estados da Federaccedilatildeo natildeo disponibiliza de recursos financeiros e orccedilamentaacuterios para

atender agrave demanda de cursos presenciais solicitados pelas escolas puacuteblicas privadas Organizaccedilotildees

Natildeo Governamentais (ONGs) entidades de classe etc

O histoacuterico da Educaccedilatildeo a Distacircncia no Programa teve iniacutecio com o Curso a Distacircncia de Disse-

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

385

minadores de Educaccedilatildeo Fiscal elaborado pela Escola de Administraccedilatildeo Fazendaacuteria (Esaf) como um

projeto piloto no ano de 2002 Caso fosse positiva a resposta de todos os Estados seria implantada a

EaD com maior nuacutemero de participantes

O Estado de Satildeo Paulo iniciou com o nuacutemero modesto de 28 alunos O curso era diferente do

formato atual o ambiente virtual era ainda muito simples natildeo existiam os materiais didaacuteticos e peda-

goacutegicos que hoje subsidiam o curso ndash cartilhas CDs textos especiacuteficos etc e os alunos precisavam

ficar um nuacutemero determinado de horas on-line pois isso contava para a pontuaccedilatildeo As dificuldades

eram muitas e os alunos natildeo estavam familiarizados com um curso a distacircncia

A partir de 2004 o curso sofre adaptaccedilotildees Pouco tempo depois passam a fazer parte dele ani-

maccedilotildees em flash player os personagens ganham maior personalidade com a inserccedilatildeo de voz e som

Desde entatildeo o PNEF utilizou diversas metodologias que permitiram disseminar os conheci-

mentos referentes agrave temaacutetica Educaccedilatildeo Fiscal Atualmente o curso estaacute no ar com uma versatildeo atuali-

zada eacute formado por quatro moacutedulos de conteuacutedo (e um quinto que natildeo estaacute no formato de Caderno

mas objetiva a elaboraccedilatildeo de um projeto pedagoacutegico ou plano de accedilatildeo) e com um excelente material

didaacutetico pedagoacutegico elaborado especialmente para ele Assim a EaD passou a ter um papel funda-

mental nas accedilotildees do Programa e a servir de referencial para desenvolver outros projetos

Em pesquisa realizada no iniacutecio de 2013 com os tutores do curso no estado de Satildeo Paulo

formados pela Esaf foram apontados alguns fatores negativos que natildeo permitem ainda que haja

100 de aproveitamento dos alunos no curso de DEF Grande parte dos alunos satildeo professores das

escolas puacuteblicas e as maiores dificuldades detectadas foram o acesso ao computador e internet jaacute

que grande parte dos cursistas utiliza os computadores das Escolas onde trabalham tempo escasso

pois a maioria dos professores ministra aulas em ateacute trecircs turnos e o despreparo destes em relaccedilatildeo ao

ambiente virtual Algumas dessas dificuldades tambeacutem satildeo apontadas pelos alunos ligados a outros

ramos de atividades

Entretanto os tutores foram unacircnimes em afirmar que os pontos positivos da utilizaccedilatildeo da EaD

como metodologia superam as expectativas do grupo Para os tutores pesquisados os pontos positi-

vos que mais chamaram a atenccedilatildeo foram

1- Romper distacircncias e levar conhecimentos agraves pessoas que estatildeo em lugares de difiacutecil

acesso

2- Possibilitar ao aluno planejar o seu proacuteprio horaacuterio de estudos e ter seu proacuteprio espaccedilo

para realizar atividades

3- A utilizaccedilatildeo da EaD democratiza e generaliza o processo de aprendizagem sem ocircnus

elevados para o aluno e permite que o conhecimento seja disseminado em tempo real a um maior

nuacutemero de pessoas

4- Como os estudos realizados no Curso de DEF extrapolam os temas especiacuteficos dos textos

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

386

base levando o aluno a acessar links externos indicando leituras etc abre um leque de novos saberes

fazendo com que o aluno expanda seus conhecimentos na proacutepria web tanto em relaccedilatildeo ao conteuacutedo

do curso como as ferramentas que o mesmo disponibiliza

5- Se os conteuacutedos do DEF forem aplicados como se propotildeem a populaccedilatildeo munida dos

conhecimentos sobre seus direitos e deveres com formaccedilatildeo criacutetica mais atuante passa a cobrar da

administraccedilatildeo maior transparecircncia a exigir dos seus governantes o retorno social dos tributos a acom-

panhar a gestatildeo dos recursos puacuteblicos contribuindo com a construccedilatildeo de uma sociedade mais justa

5 RESULTADOS DO CURSO DE DEF NO ESTADO DE SAtildeO PAULO

O GefeSP desde o ano de 2002 e ateacute o segundo semestre do ano de 2013 realizou 20 (vinte)

ediccedilotildees do Curso de DEF utilizando a metodologia de EaD Com cerca de 17636 (dezessete mil seis-

centos e trinta e seis) alunos inscritos no curso 14109 (quatorze mil cento e nove) foram aprovados

Tais nuacutemeros chegam ao resultado expressivo de 80 de aprovaccedilatildeo abrangendo cerca de 30 dos

municiacutepios do Estado (de um total de 645 municiacutepios)

Se fizermos uma anaacutelise a niacutevel Brasil ateacute o momento chegamos a 0066 da populaccedilatildeo to-

mando como base os nuacutemeros do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatiacutestica (IBGE)

Histoacuterico do curso de DEF no Brasil

Graacutefico 1 - Histoacuterico do curso de DEF no Brasil

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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Nos 26 estados da Federaccedilatildeo mais o Distrito Federal e conforme nuacutemeros levantados pela

ESAF ateacute dezembro de 2010 tiacutenhamos 1709 (mil setecentos e nove) tutores formados pela ESAF O

nuacutemero de capacitados no estado de Satildeo Paulo atualmente eacute de 213 (duzentos e treze) tutores sendo

que cerca de 30 desse total natildeo atua regularmente

No estado de Satildeo Paulo nos uacuteltimos trecircs anos foram capacitados 86 novos tutores assim dis-

tribuiacutedos

bull Curso iniciado em 01 de fevereiro de 2011 20 novos tutores

bull Curso iniciado em 10 de junho de 2011 20 novos tutores

bull Curso iniciado em 27 de fevereiro de 2012 23 novos tutores

bull Curso iniciado em 21 de fevereiro de 2013 23 novos tutores ndash sendo que 70 dos capa-

citados nessa turma satildeo professores da rede estadual de ensino

Para manter essa rede de profissionais alinhados ao PNEF haacute constantes capacitaccedilotildees de novos

tutores formaccedilatildeo continuada eacute oferecido o curso de metodologia de projetos em Educaccedilatildeo Fiscal e

haacute pouco foi criada uma Comunidade Virtual de Tutores No primeiro semestre de 2014 houve a

capacitaccedilatilde de uma nova turma de 24 novos tutores no iniacutecio de fevereiro

Buscamos tambeacutem elaborar o perfil profissional dos tutores para o curso de DEF e este foi

definido em um processo progressivo de estudos levando-se em conta diversos contextos Iniciamos

com a definiccedilatildeo de competecircncias e delimitamos os pontos baacutesicos e estruturais de atuaccedilatildeo desses

profissionais baseados em estudos realizados pela Profa Vani Moreira Kenski5 que aponta o que eacute

necessaacuterio para tal profissional realizar suas funccedilotildees

a) Competecircncias dos tutores em cursos online

bull Condiccedilotildees pessoais

ndash Caracteriacutesticas pessoais que facilitam a atuaccedilatildeo como tutor na internet

bull Envolvimento com a organizaccedilatildeo

ndash Atitudes pessoais de comprometimento com a proposta de EaD em desenvolvimento e com

a organizaccedilatildeo

bull Domiacutenio do conteuacutedo

ndash Conhecimentos relacionados aos conteuacutedos dos cursos

5 Doutora em Educaccedilatildeo pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp 1990) Professora do Programa de Poacutes-Gra-duaccedilatildeo em Educaccedilatildeo da Universidade de Satildeo Paulo (USP) Diretora do ldquoSite Educacional Ltdardquo Consultora do Sebrae Pesquisadora do CNPq

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

388

bull Conhecimentos pedagoacutegicos em EaD

ndash Conhecimentos vinculados agraves abordagens estrateacutegias e propostas pedagoacutegicas dos cursos

bull Conhecimentos teacutecnicos

ndash Fluecircncia no ambiente virtual e condiccedilotildees para orientar os alunos sobre o melhor uso dos re-

cursos disponiacuteveis

bull Capacidade de Interaccedilatildeo e Comunicaccedilatildeo

ndash Comunicabilidade com os demais participantes

b) Competecircncias pessoais

1 Estar atento aos detalhes do curso e aos movimentos da turma

2 Ser paciente Natildeo se irritar com facilidade

3 Ser persistente Natildeo desistir diante das dificuldades

4 Ter empatia Conseguir se colocar no lugar dos participantes

5 Comunicar-se com participantes sem usar palavras ofensivas

6 Ter bom domiacutenio da linguagem escrita

7 Ter capacidade para conduzir os debates

8 Compartilhar os seus conhecimentos sobre os temas do curso

9 Ter eacutetica profissional

10 Cumprir os prazos das tarefas de tutoria do curso

11 Realizar o aperfeiccediloamento teacutecnico e educacional como tutor

12 Ter consciecircncia da importacircncia do seu papel como agente de mudanccedilas

c) Envolvimento com a organizaccedilatildeo

1 Conhecer a proposta pedagoacutegica de EaD da organizaccedilatildeo

2 Identificar-se com a filosofia de educaccedilatildeo a distacircncia da organizaccedilatildeo

3 Conhecer a realidade do puacuteblico-alvo atendido pela organizaccedilatildeocurso

4 Elaborar o planejamento de tutoria para a turma que se inicia

5 Identificar-se como educador da organizaccedilatildeo

6 Conhecer o sistema de avaliaccedilatildeo para EaD do curso e da organizaccedilatildeo

7 Participar dos cursos e eventos de educaccedilatildeo continuada da organizaccedilatildeo

8 Estabelecer meios de interaccedilatildeo e comunicaccedilatildeo com os demais tutores professores teacutecnicos

diretores etc

9 Colaborar com o processo educacional oferecendo sugestotildees de melhoria

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

389

d) Domiacutenio do conteuacutedo

1 Possuir domiacutenio do conteuacutedo do curso em que exerce tutoria

2 Demonstrar capacidade loacutegica de anaacutelise e siacutentese do conteuacutedo do curso

3 Ser capaz de interpretar os textos escritos do curso

4 Conhecer formas diferenciadas de estudo dos conteuacutedos do curso em que exerce tutoria

5 Conhecer a proposta educacional do curso (objetivos conteuacutedos meacutetodo atividades)

6 Conhecer alternativas (bibliografias cursos etc) que possam auxiliar os participantes no

aprofundamento dos conteuacutedos do curso

e) Conhecimentos pedagoacutegicos

1 Analisar previamente a proposta do curso para planejar as accedilotildees de tutoria

2 Planejar estrateacutegias diferenciadas ligadas aos conteuacutedos

3 Esclarecer aos participantes sobre as aprendizagens a serem desenvolvidas nos temas pro-

postos

4 Conduzir debates nos foacuteruns colocando questotildees que faccedilam sentido e orientem os alunos

para o alcance dos objetivos de aprendizagem

5 Apresentar alternativas para os participantes visando aprofundar os conteuacutedos do curso

6 Avaliar os alunos de acordo com os objetivos previstos

7 Dar feedback sobre o desempenho de cada aluno apoacutes cada avaliaccedilatildeo

f) Conhecimentos teacutecnicos

1 Conhecer facilidades na Internet (mecanismos de busca e pesquisa acesso a textos e revistas

especializadas etc) que possam auxiliar os participantes na compreensatildeo dos conteuacutedos

2 Ser haacutebil no uso do teclado (velocidade e correccedilatildeo na escrita)

3 Saber usar acessoacuterios e perifeacutericos baacutesicos do computador bem como os mecanismos de

comunicaccedilatildeo pela internet (Skype e compatiacuteveis)

4 Conseguir oferecer suporte teacutecnico baacutesico aos participantes quando solicitam

5 Saber para quem encaminhar os problemas teacutecnicos apresentados pelos participantes quan-

do natildeo consegue resolver

6 Conhecer as ferramentas e possibilidades do ambiente educacional virtual do curso

g) Interaccedilatildeo e Comunicaccedilatildeo

1 Utilizar linguagem escrita correta

2 Ser cortecircs e respeitaacutevel Manter uma postura simpaacutetica e de respeito na comunicaccedilatildeo escrita

3 Escrever mensagens de forma concisa e personalizada

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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4 Usar linguagem profissional e adequada ao niacutevel do curso

5 Ser capaz de responder duacutevidas de forma pertinente clara e objetiva

6 Ter facilidade para se relacionar comunicar e conversar pela Internet

7 Saber explorar ideias desenvolver argumentos promover boas discussotildees encerrar discus-

sotildees improdutivas

8 Saber controlar os grupos quando deixar a comunicaccedilatildeo mais livre e quando ser mais diretivo

9 Saber como trazer os natildeo participantes de volta ao ambiente do curso

10 Conseguir criar ldquopresenccedilardquo e ldquovisibilidaderdquo no ambiente virtual

11 Incentivar os participantes a apresentarem suas contribuiccedilotildees

12 Evitar tomar atitudes autoritaacuterias ou excessivamente permissivas

13 Desenvolver formas de comunicaccedilatildeo com os participantes para evitar que eles se sintam soacutes

14 Conseguir criar e manter com os participantes uma comunidade on-line uacutetil e relevante

15 Conseguir administrar os conflitos que ocorrem nos cursos

51 Novas alteraccedilotildees no formato do Curso de DEF Em 2007 o curso de DEF novamente sofreu alteraccedilotildees em seu formato e a partir de entatildeo os

alunos tecircm a possibilidade de desenvolver Projetos Pedagoacutegicos Planos de Accedilatildeo ou Planos Docentes

versando sobre as temaacuteticas tratadas no curso De 2007 ateacute 2010 segundo a Esaf foram postados

13668 projetos (treze mil seiscentos e sessenta e oito) levando-se em conta todos os estados da Fe-

deraccedilatildeo assim distribuiacutedos

bull 2007 2670

bull 2008 3866

bull 2009 2712

bull 2010 7420

A partir do segundo semestre de 2014 comeccedilaraacute a ser distribuiacuteda a 5ordf ediccedilatildeo dos cadernos

pedagoacutegicos do PNEF e quando seraacute oferecida a nova versatildeo do curso a distacircncia Disseminadores em

Educaccedilatildeo Fiscal Os cadernos jaacute foram concluiacutedos e enviados a todos os integrantes do GEF e Coor-

denadores Estaduais do curso de DEF para apreciaccedilatildeo e validaccedilatildeo Nos dias 16 a 18 de setembro de

2013 realizou-se em Brasiacutelia a oficina de produccedilatildeo do novo curso de DEF na qual os conteuacutedos chaves

constantes da 5ordf ediccedilatildeo dos cadernos de Educaccedilatildeo Fiscal foram selecionados para serem convertidos

em linguagem HTML 56 O material produzido compotildee o Planejamento Educacional do novo DEF que

foi enviado para a empresa licitada pela Esaf para produccedilatildeo de cursos a distacircncia Portanto a partir do

segundo semestre de 2014 o DEF teraacute um novo formato mais moderno e interativo com a utilizaccedilatildeo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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de novos objetos de aprendizagem

52 Resultados do Curso de DEF no Estado de Satildeo Paulo no ano de 2013

Foram 68 turmas no primeiro semestre e 65 turmas no segundo semestre com total de 4895

alunos matriculados dos quais 2818 alunos aprovados (5757) 1224 alunos desistentes (25) e 837

alunos reprovados (1709)

6 O HTML5 eacute a versatildeo mais recente da linguagem de programaccedilatildeo conhecida como HTML (Hyper Text Markup Language) sigla em Inglecircs para Linguagem de Marcaccedilatildeo de Hipertexto Essa linguagem usa um texto codificado para criar e organizar conteuacutedo online e torna a navegaccedilatildeo mais raacutepida e simples melhorando a performance de uma paacutegina web Os desen-volvedores utilizam o HTML5 para reduzir o tamanho dos arquivos online e com isso melhorar a experiecircncia do usuaacuterio O HTML5 possui uma ferramenta graacutefica poderosa chamada de Canvas (tela em Inglecircs) Com o Canvas eacute muito mais faacutecil criar animaccedilotildees desenhos e outros visuais complexos sem a necessidade de usar um aplicativo externo

Graacutefico 2 - Curso on-line de disseminadores de Educaccedilatildeo Fiscal - ano de 2013

Devido ao sucesso do curso e levando-se em conta o alto iacutendice de desistentes e reprovados

e as dificuldades apresentadas nos relatoacuterios dos gestores estaduais a partir desse ano deveratildeo ser

desenvolvidos trecircs cursos a partir do atual destinados para puacuteblicos alvo distintos um curso para pro-

fessores outro para fazendaacuterios e universitaacuterios e um terceiro no formato auto instrucional destinado

a servidores puacuteblicos e sociedade civil Nesse sentido houve iniciativa do GefeSP de fazer um curso

voltado para o estudante de ensino meacutedio com metodologia e linguagem adequada a esse puacuteblico

O Centro de Integraccedilatildeo Empresa Escola (CIEESP) achou interessante abraccedilou a ideia e estaacute traba-

lhando com o GefeSP na adaptaccedilatildeo desse conteuacutedo

Tambeacutem sob a responsabilidade da Gerecircncia de Educaccedilatildeo Fiscal (Geref) da Esaf haacute mais al-

guns projetos em andamento

1- Accedilotildees no acircmbito do Programa Mais Educaccedilatildeo em parceria com o Ministeacuterio de Edu-

caccedilatildeo (MEC) e as Secretarias Estaduais de Educaccedilatildeo No curso de DEF do segundo semestre do ano

passado os Coordenadores Municipais do Programa Mais Educaccedilatildeo foram inscritos com o objetivo

de serem preparados para orientarem as escolas participantes na realizaccedilatildeo das atividades do macro

campo ldquoEducaccedilatildeo Econocircmicardquo onde se insere a Educaccedilatildeo Fiscal A Geref estaacute colaborando com o

MEC na reformulaccedilatildeo desse macro campo que passaraacute a se chamar ldquoEducaccedilatildeo Fiscal e Financeirardquo

em 2014

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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2- Curso a distacircncia para universitaacuterios em parceria com o EUROsociAL O Termo de Refe-

recircncia para a contrataccedilatildeo dos serviccedilos estaacute sendo ultimado pelos teacutecnicos do Programa EUROsociAL

Em breve seratildeo contratados os profissionais que iratildeo produzir o material didaacutetico a ser posteriormente

submetido agrave aprovaccedilatildeo da Comissatildeo do Referencial Teoacuterico e Metodoloacutegico do PNEF

3- Proposta inicial de um curso de Educaccedilatildeo Fiscal para a comunidade fazendaacuteria em par-

ceria com a Federaccedilatildeo Brasileira de Associaccedilotildees de Fiscais de Tributos Estaduais (Febrafite)

6 ALGUNS APONTAMENTOS SOBRE PESQUISA REALIZADA COM TUTORES E ALUNOS

A partir de questionaacuterio enviado para tutores e alunos no iniacutecio de 2013 e perguntados sobre

o curso oferecido em 2012 em duas ediccedilotildees seguem alguns aspectos que foram levantados sem a

intenccedilatildeo de quantificar essas informaccedilotildees

61 Sobre o Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVAMOODLE)

bull Natildeo houve registro de dificuldades de acesso por problemas teacutecnicos

bull A mensagem automaacutetica gerada apoacutes a matriacutecula deixa o aluno confuso

bull Tutores que conseguiram fazer um encontro presencial no iniacutecio do curso tiveram alunos

com menor dificuldade de navegaccedilatildeo

bull Muitos alunos reclamam que o curso no formato anterior era mais simples para navegar

e muito mais dinacircmico As aulas eram mais interativas

bull O acesso total do conteuacutedo logo no iniacutecio do curso eacute um ponto positivo apontado pelos

alunos pois a familiarizaccedilatildeo com o visual vai sendo absorvida aos poucos

bull Alunos acenaram positivamente para a quantidade e diversidade de links

62 Apontamentos sobre o material didaacutetico

bull A disponibilizaccedilatildeo dos kits com cartilhas impressas logo no iniacutecio do curso foi um ponto

muito positivo

bull Alunos pediram linguagem menos teacutecnica tanto no material on-line como no material

impresso e disseram que a falta de ilustraccedilotildees fez com que o curso se tornasse pouco atrativo

bull Conteuacutedo muito denso considerando o tempo de duraccedilatildeo do curso (90 dias)

bull Elogios ao conteuacutedo diversificado e ao material didaacutetico parte histoacuterica bem elaborada

bull Implementaccedilatildeo de uma biblioteca melhor fundamentada pois ela daacute embasamento para

a elaboraccedilatildeo do Projeto PedagoacutegicoPlano de Accedilatildeo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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63 Apontamentos sobre o tempo de duraccedilatildeo do curso

bull Foi adequado e suficiente para a maioria Fez com que o aluno elaborasse uma rotina

de estudos Mas alguns alunos apontaram que eacute tambeacutem muito pouco tempo para tantas leituras

tornando-se impossiacutevel fazecirc-las com profundidade bem como elaborar o Projeto Pedagoacutegico com

qualidade

bull Sugestotildees de que seja possiacutevel a postagem de atividades ateacute 24 horas depois do encer-

ramento

bull Dificuldades de conciliar o curso de DEF com outras atividadesresponsabilidades diaacuterias

64 Apontamentos sobre os foacuteruns

bull Enunciados extensos causa desinteresse e desmotivaccedilatildeo Mas elogiaram os textos di-

zendo serem bem elaborados e proporcionando discussotildees relevantes

bull Muitos alunos cumprem somente com a atividade proposta e depois natildeo voltam para

a discussatildeo Outros deixam para a uacuteltima hora e natildeo desenvolvem o tema como deveria Aqui eacute que

entra o papel fundamental do tutor de instigaccedilatildeo fazer o aluno voltar ao foco

bull Um dos melhores recursos do curso Eacute nesse momento que eacute possiacutevel verificar a opiniatildeo

do aluno

bull Apresentaram novos conhecimentos e informaccedilotildees complementares aos conteuacutedos dos

cadernos - aspecto que foi bastante positivo e propiciou enriquecimento nas discussotildees

65 Apontamentos sobre as atividades avaliativas bull Persistem as questotildees confusas com dupla interpretaccedilatildeo (como as do tipo ldquoidentifique

a resposta erradardquo) e falta de clareza nos enunciados Alguns alunos foram prejudicados por isso

bull Exige aprofundamento nos estudos e pesquisa

66 Apontamentos sobre o Projeto Pedagoacutegico Plano de Accedilatildeo

bull Deixar mais ou menos 10 dias apoacutes o encerramento para revisatildeo e ajustes no Plano Pe-

dagoacutegico (PP) ou Plano de Accedilatildeo (PA) de modo que natildeo comprometa a qualidade dos trabalhos

bull Com o PP ou PA eacute possiacutevel verificar se o aluno se apropriou dos conteuacutedos abordados

durante o curso

bull Ponto chave para a efetivaccedilatildeo de um trabalho consistente em relaccedilatildeo agrave Educaccedilatildeo Fiscal

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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67 Principais reclamaccedilotildees dos tutores

bull A primeira reclamaccedilatildeo foi em relaccedilatildeo aos dados cadastrais dos alunos Muitos ao preen-

cherem a ficha de inscriccedilatildeo informam telefones errados e e-mails desativados ou com erro

bull Alguns reclamaram da ausecircncia do gestor regional nos encontros presenciais Mas en-

tenderam que nem sempre eacute possiacutevel conciliar a agenda devido ao nuacutemero de turmas no estado - meacute-

dia de 50 (cinquumlenta) e a distacircncia geograacutefica

bull Falta de conhecimento tecnoloacutegico por parte de alguns alunos

68 Apontamentos do gestor regional

bull Alguns tutores formaram grupos de estudos entre seus alunos e outros conseguiram

realizar encontros semanais com esses grupos E estas foram as turmas de melhor desempenho no

estado no geral com 100 de aprovaccedilotildees

bull Falta de feedback por parte de alguns tutores ndash principalmente no envio dos dados se-

manais para a elaboraccedilatildeo do Mapa de Acessos

bull Falta de comprometimento de alguns tutores

bull Falta de relatoacuterios estatiacutesticos semanais a niacutevel de Brasil Eacute uma forma de situar a atuaccedilatildeo

do estado no panorama nacional e buscar parcerias

bull Falta de dados estatiacutesticos mais precisos no AVAMOODLE Um exemplo eacute que ao final

do curso a meacutedia geral apresentada no quadro de notas natildeo reflete a meacutedia de aprovaccedilatildeo (que real-

mente interessa) Os alunos precisam ser contados um a um quando eacute preciso formular planilhas de

acompanhamento em relaccedilatildeo agrave realizaccedilatildeo das atividades projeto aprovaccedilatildeo reprovaccedilatildeo etc

bull Adoccedilatildeo mais criteriosa na seleccedilatildeo de alunos

bull Muitos alunos sensibilizados em eventos puacuteblicos (feiras etc) e que se inscrevem no

curso desistem

bull Adoccedilatildeo de criteacuterios mais rigorosos para a seleccedilatildeo de tutores

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Toda metodologia requer procedimentos eficazes e a EaD vai ao encontro dos objetivos

propostos pelo PNEF pois possibilita democratizar conhecimentos em tempo real a um maior

nuacutemero de pessoas contribuindo para o processo de ensino e da aprendizagem e quando bem

utilizada promove a inclusatildeo de todos aqueles que anseiam por transformar a sociedade atraveacutes

dos novos conhecimentos

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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O PNEF que comeccedilou timidamente com a EaD no ano de 2002 jaacute possui em seus registros a

formaccedilatildeo de 1709 Tutores de EaD (dados de 2010) e 118963 alunos aprovados no curso de Disse-

minadores de Educaccedilatildeo Fiscal a Distacircncia Nessa premissa conclui-se que a EaD eacute um procedimento

metodoloacutegico eficiente e que muito contribui para que continue sendo utilizada para disseminar os

conhecimentos da Educaccedilatildeo Fiscal e coopere para que mais pessoas se emancipem

Ainda haacute muito que se fazer em relaccedilatildeo agrave EaD Primeiro temos que lutar contra o analfabetismo

digital inserir a sociedade no mundo ciberneacutetico propiciar situaccedilotildees reais para aquisiccedilatildeo de equipa-

mentos necessaacuterios agrave realizaccedilatildeo de cursos a distacircncia mas acima de tudo o Estado precisa proporcio-

nar condiccedilotildees financeiras para que a sociedade tenha a estrutura necessaacuteria para manter o acesso

permanente ao mundo digital

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

396

REFEREcircNCIAS

BRASIL Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Federativa do Brasil de 1988 Brasiacutelia Senado Federal Subsecre-taria de Ediccedilotildees Teacutecnicas 2000

______ Ministeacuterio da Fazenda Escola Superior de Administraccedilatildeo Fazendaacuteria Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal Situando a Educaccedilatildeo Fiscal Moacutedulo I Brasiacutelia Esaf 2000

______ Ministeacuterio da Fazenda Escola Superior de Administraccedilatildeo Fazendaacuteria Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal Atas Relatoacuterio da 46ordf Reuniatildeo GEF-BSB Mar 2011 Disponiacutevel em lthttpwwwesaffazendagovbresafsiteeducacaofiscalEdu_Fiscal2008arquivos_2011atasRelatorio_da_46a_Reuniao_GEF-BSB_mar2011docgt Acesso em 30 nov 2013

______ Ministeacuterio da Fazenda Escola Superior de Administraccedilatildeo Fazendaacuteria Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal Educaccedilatildeo Fiscal no contexto social Brasiacutelia Esaf 2009 (seacuterie Educaccedilatildeo Fiscal Cader-nos 1234)

ELIASQUEVIC Marianne Kogut PRADO JR Arnaldo Correcirca O papel da incerteza no planejamento de sistemas de educaccedilatildeo a distacircncia Educ Pesqui [online] 2008 vol34 n2 pp 311 Disponiacutevel em lthttpwwwscielobrpdfepv34n207pdfgt Acesso em 03 jan 2014

FERNANDES Eliane Leatildeo A Educaccedilatildeo agrave Distacircncia no Programa de Educaccedilatildeo Fiscal de Mato Grosso do Sul Disponiacutevel em lthttpwwwesaffazendagovbresafsiteeducacaofiscalEdu_Fiscal2008PDFArtigo_cientifico_Elianepdf gt Acesso em 21 dez 2013

FUNDACcedilAtildeO CEDDET Material do curso Formaccedilatildeo On-line na Administraccedilatildeo Puacuteblica Moacutedulo I mai2011

KENSKI Vani Moreira Perfil de tutor de cursos pela internet o caso do Sebrae Linhas Criacuteticas v 13 n 24 jun2007

MARTINI Augusto Jeronimo Apontamentos sobre o curso a distacircncia de Disseminadores de Edu-caccedilatildeo Fiscal do PNEF - Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal Disponiacutevel em lt httpwwwfazen-daspgovbreducacao_fiscalcontentsApontamentosSobreCursoDistanciaPNEFpdf gt Acesso em 03 jan 2014

______ Minha Experiecircncia com a EAD ndash Educaccedilatildeo agrave Distacircncia Disponiacutevel em lthttpasimplicidade-dascoisaswordpresscom20060824minha-experiencia-com-a-ead-E28093-educacao-a-dis-tanciagt Acesso em 22 dez 2013

MORAN Joseacute Manuel Tendecircncias da Educaccedilatildeo on line no Brasil Disponiacutevel em lt httpwwwecauspbrprofmorantendenciashtm gt Acesso em 30 jul 2013

NUNES Ivocircnio Barros Modalidades Educativas e Novas Demandas por Educaccedilatildeo Disponiacutevel em lthttpwwwintelectoneteadmodalidadeshtmgt Acesso em 21 nov 2013

SANDER Benno Perspectivas da Educaccedilatildeo a Distacircncia na Ameacuterica Latina Perspectivas da educa-ccedilatildeo a distacircncia Ameacuterica Latina Seminaacuterio de Brasiacutelia 1997 Secretaria de Educaccedilatildeo a Distacircncia Brasiacute-lia Ministeacuterio da Educaccedilatildeo e do Desporto SEED 1998

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

397

IMPLEMENTACcedilAtildeO DO PROGRAMA NACIONAL DE EDUCACcedilAtildeO FISCAL NAS ESCOLAS ESTADUAIS SOB COMPETEcircNCIA DA CREDE 3

SUMAacuteRIO Introduccedilatildeo 1 A importacircncia da implementaccedilatildeo do Programa Na-cional de Educaccedilatildeo Fiscal para as escolas estaduais 2 Objetivos do trabalho com a Educaccedilatildeo Fiscal e Cidadania nas escolas estaduais da Crede 3 3 Abran-gecircncia e inovaccedilatildeo 4 Eficiecircncia no uso dos recursos puacuteblicos resultados dos trabalhos desenvolvidos nas escolas estaduais da Crede 3 5 Mais evidecircncias do trabalho da Crede 3 2011 e 2012 6 Aprendizado organizacional e respon-sabilidade social 7 Relevacircncia do projeto e possibilidade de multiplicaccedilatildeo 8 Satisfaccedilatildeo dos cidadatildeos Consideraccedilotildees finais Referecircncias

Erlane Muniz de Arauacutejo Martins1

INTRODUCcedilAtildeO

A Educaccedilatildeo Fiscal para a cidadania eacute uma nova praacutetica na aacuterea da educaccedilatildeo a qual debate a

relaccedilatildeo do cidadatildeo com o Estado no campo financeiro integrando suas duas vertentes a arreca-

daccedilatildeo e o gasto puacuteblico vigiando para que ambos sejam realizados com eficiecircncia transparecircncia

e honestidade

Na tentativa de disseminaccedilatildeo e efetivaccedilatildeo do Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal a Coor-

denadoria Regional de Desenvolvimento da Educaccedilatildeo 3 (Crede 3) sistematizou desde o 1ordm semestre

de 2012 um trabalho de monitoramento pedagoacutegico agraves accedilotildees empreendidas nas escolas estaduais

contemplando os conteuacutedos de Educaccedilatildeo Fiscal e Cidadania nas diversas disciplinas do Ensino Meacutedio

Esse trabalho eacute realizado pela Superintendente Escolar Erlane Muniz de Arauacutejo Martins tambeacutem Coor-

denadora Regional do Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal As accedilotildees do PNEF vatildeo desde a formaccedilatildeo

dos educadores no curso de Disseminadores da Educaccedilatildeo Fiscal ateacute a implementaccedilatildeo das accedilotildees dos

planos dos professores em sala de aula

Por meio desta iniciativa poderemos alcanccedilar um caminho para a divisatildeo mais justa do produto

do trabalho de toda a sociedade em que a populaccedilatildeo poderaacute analisar criticamente e criteriosamente

os recursos puacuteblicos e sua arrecadaccedilatildeo Esta accedilatildeo jaacute se encontra consolidada nas estrateacutegias pedagoacute-

gicas da Crede 3 obtendo resultados satisfatoacuterios na praacutetica cidadatilde dos alunos nas escolas favore-

1 Formada em Pedagogia e Ciecircncias Sociais com Especializaccedilatildeo em Psicopedagogia Liacutengua Portuguesa e Literatura e Gestatildeo e Avaliaccedilatildeo da Educaccedilatildeo Puacuteblica Professora concursada do Estado do Cearaacute atualmente exerce o cargo de Superin-tendente Escolar do NRDEA da 3ordf CredeAcarauacute tendo como uma das funccedilotildees acompanhar e apoiar a gestatildeo das unidades escolares Coordena ainda na 3ordf Crede Ensino Afrodescendente e Indiacutegena (1063911645) e o Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal E-mail erlanecrede03seduccegovbr

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

398

cendo uma maior valorizaccedilatildeo dos espaccedilos puacuteblicos (as escolas dessa regiatildeo encontram-se melhores

conservadas) como tambeacutem uma maior conscientizaccedilatildeo de alunos e professores sobre a responsabi-

lidade social que os mesmos tecircm em relaccedilatildeo ao controle social dos gastos puacuteblicos

Como forma de acompanhamento deste trabalho as escolas enviam suas experiecircncias exitosas

para a Ceacutelula Regional de Desenvolvimento da Escola e da Aprendizagem (Cedea) da Crede 3 sendo

analisados e condensados em relatoacuterio anual enviado para Seduc e Sefaz

Sendo assim vimos que a consolidaccedilatildeo do PNEF nas escolas estaduais dessa regiatildeo vem sendo

sistematizada de forma constante visto que anualmente haacute uma revisatildeo dos planos de cursos dos

professores logo no iniacutecio do ano letivo e jaacute eacute uma praacutetica a inserccedilatildeo dos conteuacutedos relacionados a

essa temaacutetica nas disciplinas do ensino meacutedio Percebe-se ainda uma tendecircncia maior do trabalho

dos professores na aacuterea de Ciecircncias Humanas Nosso ensejo enquanto coordenadoria eacute que o estudo

se propague e cada vez mais tenhamos educandos conscientes do seu papel de fiscalizador dos gastos

com o dinheiro puacuteblico

1 A IMPORTAcircNCIA DA IMPLEMENTACcedilAtildeO DO PROGRAMA NACIONAL DE EDUCACcedilAtildeO FISCAL PARA AS ESCOLAS ESTADUAIS

O Brasil possui uma carga tributaacuteria muito elevada para a qualidade dos serviccedilos prestados isso

gera uma insatisfaccedilatildeo popular Por outro lado a maior parte dos brasileiros natildeo tem conhecimento dos

diversos impostos que incidem direto ou indiretamente sobre os produtos bens e serviccedilos adquiridos

muito menos o destino que deve ser dado aos mesmos

Tal situaccedilatildeo de desconhecimento inibe a efetivaccedilatildeo da cidadania principalmente entre o puacutebli-

co jovem que necessita de uma formaccedilatildeo baacutesica na escola sobre seus direitos e deveres enquanto ci-

dadatildeo Partindo deste foco faz-se necessaacuterio o desenvolvimento de um Projeto de Educaccedilatildeo Fiscal na

escola que venha a trabalhar efetivamente com a temaacutetica e que um dos objetivos seja o de disseminar

a educaccedilatildeo fiscal na escola conscientizando alunos pais e funcionaacuterios para que estes levem a seus

vizinhos eou comunidade conhecimentos baacutesicos sobre a origem os tipos e o destino dos tributos

bem como a necessidade de serem pagos a contento e a importacircncia destes para a sociedade

Acreditamos que ter pessoas informadas e cientes de seus direitos e deveres eacute fundamental

para o exerciacutecio da democracia E que reconhecer a necessidade de cumprir as obrigaccedilotildees tribu-

taacuterias compreendendo o real significado o porquecirc de pagar impostos e qual a importacircncia dessa

accedilatildeo para o paiacutes se faz tatildeo urgente para o povo brasileiro quanto acompanhar e fiscalizar a aplica-

ccedilatildeo dos mesmos

Partindo dessa realidade e como uma accedilatildeo proveniente dos conhecimentos adquiridos no

curso de Disseminadores da Educaccedilatildeo Fiscal encontra-se em desenvolvimento na Crede 3 o Projeto

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

399

intitulado ldquoImplementaccedilatildeo do Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal nas escolas estaduais sob com-

petecircncia da Crede 3rdquo Estaacute sendo implementado em 18 escolas estaduais da regiatildeo tendo como puacute-

blico alvo os alunos do ensino meacutedio Uma das accedilotildees para produzir este projeto foi uma reuniatildeo com

alguns dos professores das escolas estaduais que participaram do uacuteltimo Curso de Disseminadores

da Educaccedilatildeo Fiscal (2012) tendo como foco a socializaccedilatildeo de ideias e conteuacutedos a serem incluiacutedos na

elaboraccedilatildeo do projeto em pauta e nos planos de curso anuais

Trabalha-se o PNEF nesta regiatildeo com a parceria da Secretaria de Educaccedilatildeo (Seduc) a Secretaria

da Fazenda (Sefaz) e da Escola de Administraccedilatildeo Fazendaacuteria (Esaf) sediada em Brasiacutelia Este projeto eacute

uma tentativa de promover a Educaccedilatildeo Fiscal e sua importacircncia social e econocircmica para os cidadatildeos

Assim o investimento em Educaccedilatildeo Fiscal para a Cidadania eacute o investimento em Educaccedilatildeo e Formaccedilatildeo

para a Cidadania pois desperta na sociedade uma reflexatildeo e uma accedilatildeo participativa ou seja mostra a

todos como funciona a maacutequina puacuteblica e ajuda na compreensatildeo da finalidade do Estado

Diante do exposto fez-se necessaacuterio que na apresentaccedilatildeo dessa proposta agraves escolas fosse re-

passada a orientaccedilatildeo de que a Educaccedilatildeo Fiscal eacute aplicada como tema transversal a ser desenvolvido

de forma inter e multidisciplinar em todas as aacutereas do conhecimento Sua proposta educativa consiste

em garantir o processo de formaccedilatildeo do cidadatildeo a sensibilizaccedilatildeo gradativa de todos os setores e ca-

madas da sociedade estimulando a mudanccedila de valores crenccedilas e culturas como meio de possibilitar

o desenvolvimento de uma consciecircncia de cidadania e propiciar a transformaccedilatildeo social

Pactuando com essa ideia do trabalho de Educaccedilatildeo Fiscal como tema transversal a professora

da Universidade Federal de Goiaacutes (UFG) Sonia Lamounier enfatiza

A concepccedilatildeo do Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal nos encaminha para a forma-ccedilatildeo de um homem que compreenda o mundo no qual vive os interesses em jogo as relaccedilotildees de poder um homem que se reconheccedila ndash e aos demais ndash como sujeito de direitos e deveres livre para organizar expressar suas ideias e opiniotildees para decidir intervir participar capaz de colocar-se como sujeito na construccedilatildeo da histoacuteria

Assim a escola como formadora de cidadatildeos criacuteticos tem um papel preponderante no proces-

so de formaccedilatildeo dos jovens contribuindo portanto com o desenvolvimento social de pessoas respon-

saacuteveis por questotildees relacionadas agrave educaccedilatildeo fiscal

2 OBJETIVOS DO TRABALHO COM EDUCACcedilAtildeO FISCAL E CIDADANIA NAS ESCOLAS ES-TADUAIS DA CREDE 3

Para o desenvolvimento desse trabalho o foco principal foi e eacute (este eacute um projeto de continuida-

de) acompanhar e orientar as accedilotildees desenvolvidas nas escolas estaduais sob competecircncia da Crede 3

por meio da Superintendecircncia Escolar referentes ao Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal realizando

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

400

um trabalho de monitoramento pedagoacutegico e analisando os impactos beneacuteficos das accedilotildees imple-

mentadas em sala de aula relacionadas agrave Educaccedilatildeo Fiscal e Cidadania Como objetivos especiacuteficos o

projeto busca

(i) estimular o interesse pela Educaccedilatildeo Fiscal visando oferecer agrave comunidade escolar conheci-

mentos que conduzam a uma praacutetica cidadatilde de transformaccedilatildeo social por meio de debates e reflexotildees

fundamentais para a compreensatildeo da funccedilatildeo socioeconocircmica do tributo

(ii) promover e institucionalizar a Educaccedilatildeo Fiscal para o efetivo exerciacutecio da cidadania

(iii) disseminar informaccedilotildees accedilotildees e conceitos sobre a Educaccedilatildeo Fiscal e o trabalho desenvolvi-

do pela Crede 3 e Escolas Estaduais sobre a temaacutetica e

(iv) incentivar o acompanhamento da aplicaccedilatildeo dos recursos puacuteblicos pela sociedade e nas

escolas os alunos acompanharem os investimentos aplicados pelos gestores

3 ABRANGEcircNCIA E INOVACcedilAtildeO

Dezoito (18) Escolas Estaduais satildeo contempladas com a implementaccedilatildeo das accedilotildees do Progra-

ma Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal coordenado pela Servidora Erlane Muniz de Arauacutejo Martins Segue a

relaccedilatildeo das escolas 1- EEM Liceu de Acarauacute Maria Alice Ramos Gomes 2- Ceja Padre Antocircnio Tomaacutes

3- EEEP Marta Maria Giffoni de Sousa 4- EEM Tomaz Pompeu de Sousa Brasil 5- EEM Vicente de Paulo

da Costa 6- EEFM Maria Conceiccedilatildeo de Arauacutejo 7- EEEP Juacutelio Franccedila 8- EEFM Professora Marieta Santos

9- EEM Theolina de Muryllo Zacas 10- EEM Satildeo Francisco da Cruz 11- EEM Liceu de Itarema Valdo de

Vasconcelos Rios 12- EEM Luzia Arauacutejo Barros 13- EEM Prefeito Joseacute Maria Monteiro 14- EEM Fran-

cisco Arauacutejo Barros 15- EEM Joseacute Teixeira de Albuquerque 16- EEM Ricardo de Sousa Neves 17- EEM

Francisco Porciano Ferreira 18- EEFM Carminha Vasconcelos

Como inovaccedilatildeo do trabalho realizado destacam-se as seguintes accedilotildees

(i) Formaccedilatildeo sistematizada dos professores da rede estadual com o Curso de Disseminadores

da Educaccedilatildeo Fiscal e desenvolvimento das accedilotildees durante o ano letivo nas escolas

(ii) Socializaccedilatildeo para os Coordenadores Escolares e PCA (Professor Coordenador de Aacuterea) sobre

uma proposta Curricular com inserccedilatildeo dos Temas TransversaisEducaccedilatildeo Fiscal

(iii) Realizaccedilatildeo de seminaacuteriospalestras in loco (nas escolas estaduais) com o tema Educaccedilatildeo

Fiscal e Cidadania

(iv) Realizaccedilatildeo do Foacuterum Regional de Educaccedilatildeo Fiscal na Crede 3

(v) Realizaccedilatildeo do concurso regional de redaccedilatildeo com o tema Educaccedilatildeo Fiscal e Cidadania

(vi) criaccedilatildeo do Blog da 3ordf Crede a fim de disseminar as accedilotildees textos comentaacuterios palestras

fotos e outros dos trabalhos realizados (3credeeducacaofiscalecidadaniablogspotcom)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

401

4 EFICIEcircNCIA NO USO DE RECURSOS PUacuteBLICOS RESULTADOS DOS TRABALHOS DESEN-VOLVIDOS NAS ESCOLAS ESTADUAIS DA CREDE 3

Depois da implementaccedilatildeo do Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal alunos professores e

comunidade escolar passaram a valorizar mais o patrimocircnio puacuteblico a desenvolver o haacutebito de um

consumo sustentaacutevel dentro das escolas evitando o desperdiacutecio de aacutegua a valorizaccedilatildeo do material

didaacutetico recebido a natildeo degradaccedilatildeo dos preacutedios escolares e a uma maior conscientizaccedilatildeo relacionada

a praacutetica da cidadania e ao controle dos gastos puacuteblicos vejamos as evidecircncias

Exemplo 1 Desenvolvimento de um Projeto Pedagoacutegico no Centro de Educaccedilatildeo de Jovens e

Adultos CEJA Padre Antocircnio Tomaacutes Tema ndash Conscientizaccedilatildeo Tributaacuteria um caminho para o exerciacutecio

da cidadania

Cronograma

Exemplo 2 Realizaccedilatildeo de uma Blitz Educativa com aplicaccedilatildeo de pesquisa a comunidade Esco-

lar Encenaccedilatildeo de peccedila teatral sobre ldquoPatrimocircnio Puacuteblicordquo com a finalidade de desenvolver uma maior

conscientizaccedilatildeo aos alunos sobre a preservaccedilatildeo e o uso eficiente dos recursos puacuteblicos ofertados a

populaccedilatildeo Accedilotildees realizadas pela EEEP Juacutelio Franccedila municiacutepio de Bela Cruz-CE (2012)

Trecho do relatoacuterio enviado pela Coordenaccedilatildeo Escolar

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

402

Na II BLITZ DA EDUCACcedilAtildeO FISCAL foram realizados coleta de dados criaccedilatildeo de graacutefi-cos e exposiccedilatildeo destes No mecircs de outubro de 2012 a equipe preparou e ensaiou uma peccedila teatral acerca do subtema ldquoPatrimocircnio Puacuteblicordquo Ainda no mesmo mecircs cartazes foram pelo grupo criados e expostos nas galerias da escola

Exemplo 3 Atividades realizadas na EEM Theolina de Muryllo Zacas apoacutes a formaccedilatildeo dos pro-

fessores no Curso de Disseminadores da Educaccedilatildeo Fiscal

- Inserccedilatildeo da temaacutetica Educaccedilatildeo Fiscal nas aulas de Matemaacutetica

- Divulgaccedilatildeo de materiais informativos no painel da escola despertando a curiosidade de gran-

de parte dos educandos por apresentar de formas diversas

- Desenvolvimento de um projeto cientiacutefico com o tema Educaccedilatildeo Fiscal

As accedilotildees estenderam-se com os alunos do ensino fundamental da rede municipal de Bela Cruz

sendo estas muito proveitosas porque ao mesmo tempo em que se divulgou tambeacutem chamou agrave

atenccedilatildeo dos adolescentes e das crianccedilas para a questatildeo da educaccedilatildeo tributaacuteria e a praacutetica da cidada-

nia Embora tenham sido momentos com curto intervalo de tempo trouxeram um tema nunca antes

trabalhado com os mesmos

Outra relevante accedilatildeo nesta escola foi agrave distribuiccedilatildeo de panfletos e botons permitindo assim

que as informaccedilotildees sobre Educaccedilatildeo Fiscal chegassem a lugares mais distantes e consequentemente

disseminassem essa ideia Praacuteticas como essas sempre mostram resultados satisfatoacuterios

Exemplo 4 Trabalho da Crede 3 em implementar o Programa Nacional de Educaccedilatildeo nas esco-

las estaduais da regiatildeo (2012-2013)

- Sensibilizaccedilatildeo e Apresentaccedilatildeo do Curso de Disseminadores da Educaccedilatildeo Fiscal para professo-

res durante a semana pedagoacutegica

- Processo de inscriccedilatildeo dos cursistas nos prazos estabelecidos Realizaccedilatildeo de dois momentos

presenciais durante o periacuteodo do curso

- Acompanhamento sistemaacutetico ao desempenho dos cursistas e-mail fax telefone msn aten-

dimento individual e visitas in loco

- Acompanhamento aos Planos de Accedilotildees e Projetos a serem implementados pelos cursistas

Exemplo 5 Acompanhamento aos Planos de curso dos professores e aos Projetos desenvolvi-

dos por conta do Curso de Disseminadores da Educaccedilatildeo Fiscal 20112012

Exemplo 6 Aprovaccedilatildeo no Curso de Disseminadores da Educaccedilatildeo Fiscal em 2011

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

403

Exemplo 7 Accedilotildees da Crede 3 em 2012

- Apresentaccedilatildeo do PNEF durante a semana pedagoacutegica e das sugestotildees de conteuacutedos sobre a

Educaccedilatildeo Fiscal para serem estudados nas diversas disciplinas

-Socializaccedilatildeo para os Coordenadores Escolares e PCAs da proposta curricular com inserccedilatildeo dos

temas transversais Educaccedilatildeo Fiscal

- Realizaccedilatildeo de palestras eou seminaacuterios nas escolas estaduais com o tema Educaccedilatildeo Fiscal e

Cidadania

- Acompanhamento a implementaccedilatildeo dos Planos de Accedilotildees dos cursistas (2011 e 2012)

- Alimentaccedilatildeo do blog Educaccedilatildeo Fiscal3ordfCrede (www3credeeducacaofiscalecidadaniablogs-

potcom)

5 MAIS EVIDEcircNCIAS DO TRABALHO DA CREDE 3 2011 E 2012

- Avaliaccedilotildees das escolas estaduais contemplando o tema Educaccedilatildeo Fiscal

- Palestras Itinerantes Educaccedilatildeo Fiscal e Cidadania ndash 2011 2012 realizadas pela Coordenadora

Regional Erlane Muniz de Arauacutejo Martins nas escolas EEM Joseacute Teixeira de Albuquerque EEEP Juacutelio

Franccedila

- Experiecircncia Exitosa 2012 PROJETO DE EDUCACcedilAtildeO FISCAL DA EEM THEOLINA DE MURYLLO

ZACAS CREDE 3 Eacute SELECIONADO PARA FEBRACE

A EEM Theolina de Muryllo Zacas de Bela Cruz-CE representou a Crede 3Acarauacute na FEBRACE

2012 com trecircs projetos escolares entre esses o projeto Educaccedilatildeo Fiscal como pressuposto para ci-

dadania os resultados de uma praacutetica na escola O referido trabalho objetiva oferecer agrave comunidade

escolar conhecimentos que conduzam a uma praacutetica cidadatilde de transformaccedilatildeo social por meio de

debates e reflexotildees fundamentais para a compreensatildeo da funccedilatildeo socioeconocircmica do tributo incenti-

vando o acompanhamento da aplicaccedilatildeo dos recursos puacuteblicos pela sociedade

6 APRENDIZADO ORGANIZACIONAL E RESPONSABILIDADE SOCIAL

A Educaccedilatildeo Fiscal eacute pressuposto para a cidadania Assim realizar atividades que desenvolvam

uma consciecircncia cidadatilde com base na Educaccedilatildeo Fiscal promove a evoluccedilatildeo da sociedade uma vez que

um cidadatildeo bem informado eacute participativo e estaacute sempre apto a promover mudanccedilas enfim a lutar

pela boa aplicaccedilatildeo dos nossos recursos fiscalizando o Executivo

Para que o conhecimento adquirido no decorrer da implementaccedilatildeo das accedilotildees do PNEF nas

escolas estaduais da Crede 3 natildeo seja esquecido eacute necessaacuterio que se tenha permanecircncia na vida da

comunidade escolar temaacuteticas e atitudes voltadas para Cidadania E isso estamos conseguindo nas

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

404

unidades em que o programa estaacute sendo bem desenvolvido Eacute necessaacuterio ainda que essa ideia

ultrapasse fronteiras atingindo outros grupos sociais tornando-se veiacuteculo de sensibilizaccedilatildeo e trans-

formaccedilatildeo para o livre exerciacutecio da cidadania tendo na escola o agente principal dessa nova maneira

de ver ser e conviver incentivando a todos a agirem como seres transformadores de si mesmo e do

meio em que vivem

A escola eacute um espaccedilo de construccedilatildeo de conhecimento e reflexatildeo criacutetica para situaccedilatildeo vigente da

comunidade em que estaacute inserida Despertar a consciecircncia fiscal com o objetivo de incitar a populaccedilatildeo

a acompanhar a aplicaccedilatildeo dos recursos arrecadados pela Administraccedilatildeo Puacuteblica favorece a populaccedilatildeo

em geral A desigualdade social presente em nosso paiacutes estaacute estampada por todos os locais em que

transitamos Logo o cidadatildeo deve conscientizar-se da importacircncia do tributo pois eacute por meio deste

instrumento que as desigualdades sociais podem ser reduzidas promovendo assim uma justa redis-

tribuiccedilatildeo de renda nacional

7 RELEVAcircNCIA DO PROJETO E POSSIBILIDADE DE MULTIPLICACcedilAtildeO

Quando se passa a ter consciecircncia do poder de influenciar e decidir um novo mundo pode ser

vislumbrado A Educaccedilatildeo Fiscal poderaacute ser este caminho de estimulaccedilatildeo para o exerciacutecio de uma pos-

tura ativa na decisatildeo sobre gestatildeo dos recursos puacuteblicos E eacute soacute neste sentido que se pode entender a

cidadania oportunizando agrave pessoa a compreensatildeo do valor social dos tributos logo possibilitando a

ela participar da vida do governo e de seu povo Dessa forma de acordo com o exposto percebemos

que a Educaccedilatildeo Fiscal eacute um importante meio de conscientizaccedilatildeo para a cidadania desde as experiecircn-

cias escolares a situaccedilotildees cotidianas

O Programa Nacional de Educaccedilatildeo tem possibilidade de ser implementado em todas as escolas

estaduais do Cearaacute favorecendo uma maior conscientizaccedilatildeo de alunos e professores sobre os gastos

com recursos puacuteblicos Para ser aplicado com sucesso o PNEF deve acontecer nas Credes com um

maior envolvimento de quem coordena esse processo

8 SATISFACcedilAtildeO DOS CIDADAtildeOS

Os resultados observados mostram-se positivos em virtude da demonstraccedilatildeo de interesse pelas

atividades e accedilotildees desenvolvidas nas escolas em relaccedilatildeo ao desenvolvimento do Programa Nacional

de Educaccedilatildeo Fiscal Por parte do puacuteblico alvo atendido observa-se demonstraccedilatildeo de atitudes que

revelam a compreensatildeo de que a participaccedilatildeo social soacute eacute possiacutevel em um ambiente democraacutetico e

de que esses primeiros passos na escola satildeo importantes para a fiscalizaccedilatildeo de seu proacuteprio dinheiro

sendo assim requisito fundamental para a construccedilatildeo de uma sociedade melhor

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

405

Observemos como um exemplo os resultados alcanccedilados por uma escola estadual da Crede

3 onde o programa foi implementado A aplicaccedilatildeo de questionaacuterios foi realizada com os alunos da

EEM Professora Theolina de Muryllo Zacas ocorrendo da seguinte forma dos 451 alunos matriculados

fizemos uma amostragem de 7 alunos por turma totalizando 77 alunos no geral Esses alunos respon-

deram a algumas perguntas que foram analisadas antes e apoacutes a realizaccedilatildeo de accedilotildees com a temaacutetica

Educaccedilatildeo Fiscal na Escola

Perguntamos se os alunos costumam fiscalizar as contas da escola onde estudam e do municiacute-

pio no iniacutecio apenas 10 tinham interesse em fiscalizar essas contas Apoacutes a realizaccedilatildeo das atividades

com o Programa de Educaccedilatildeo Fiscal 70 passaram a fiscalizar essas contas

Graacutefico 1 Resultado inicial com estudantes

Graacutefico 2 Resultado inicial com estudantes

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

406

Outro questionamento realizado foi se os alunos consideravam a Educaccedilatildeo Fiscal importante

para o exerciacutecio da cidadania O questionaacuterio inicial apresentou boas respostas 90 dos alunos disse-

ram que sim e apoacutes a aplicaccedilatildeo das accedilotildees esse percentual melhorou chegando a 100 dos alunos

Graacutefico 3 Importacircncia da Educaccedilatildeo Fiscal para o exerciacutecio da cidadania

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Aqueles e aquelas que participaram e participaratildeo (enfatiza-se eacute um projeto de continuidade)

de alguma accedilatildeo desenvolvida com o Programa de Educaccedilatildeo Fiscal nas escolas estaduais certamente

teratildeo subsiacutedios natildeo soacute para esclarecer a outros mas tambeacutem para realizar e incentivar praacuteticas cida-

datildes Como nos diz (XEREZ 2008 p 450) ldquoA escola eacute o espaccedilo que tem como funccedilatildeo social ensejar

essa estimulaccedilatildeo a autonomia da autoconstruccedilatildeo consciecircncia poliacutetica e social porque cidadania eacute

algo construiacutedo e conquistado atraveacutes da plena consciecircncia dos direitos e deveres e da criticidade do

mundordquo

A cidadania cresce e se afirma na sociedade na medida em que os indiviacuteduos adquirem direitos

e ampliam sua participaccedilatildeo e para que essa seja eficaz eacute imprescindiacutevel o conhecimento No que se

refere aos tributos eacute de suma importacircncia que a populaccedilatildeo conheccedila com mais detalhes esse assunto

Assim acredita-se que os esclarecimentos aos participantes de accedilotildees envolvendo o tema edu-

caccedilatildeo fiscal iratildeo repercutir na comunidade e consequentemente no municiacutepio estado e paiacutes cum-

prindo assim o papel de disseminadores Aleacutem do mais teremos uma parcela maior da populaccedilatildeo

consciente do direcionamento dos recursos e capaz de fiscalizaacute-los

Dado o exposto a escola eacute um espaccedilo de construccedilatildeo de conhecimento e reflexatildeo criacutetica para

situaccedilatildeo vigente da comunidade em que estaacute inserida Portanto quando se passa a ter consciecircncia

do poder de influenciar e decidir um novo mundo pode ser vislumbrado A Educaccedilatildeo Fiscal poderaacute

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

407

ser este caminho de estimulaccedilatildeo para o exerciacutecio de uma postura ativa na decisatildeo sobre gestatildeo dos

recursos puacuteblicos E eacute soacute neste sentido que se pode entender a cidadania oportunizando agrave pessoa a

compreensatildeo do valor social dos tributos logo possibilitando a ela participar da vida do governo e de

seu povo Dessa forma de acordo com o que jaacute foi mencionado percebemos que a Educaccedilatildeo Fiscal eacute

um importante meio de conscientizaccedilatildeo para a cidadania desde as experiecircncias escolares a situaccedilotildees

cotidianas

REFEREcircNCIAS

AMARO Luciano Direito tributaacuterio brasileiro 18 ed Satildeo Paulo Saraiva 2011

BOBBIO Noberto A era dos Direitos Satildeo Paulo Campus 1992

BRASIL Constituiccedilatildeo (1988) Constituiccedilatildeo Repuacuteblica Federativa do Brasil 12 ed Satildeo Paulo Rideel 2011

______ Ministeacuterio da Fazenda Escola Superior de Administraccedilatildeo Fazendaacuteria Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal (PNEF) Cadernos temaacuteticos I II III e IV 4ed Brasiacutelia Esaf 2009

CARTA DA TERRA Disponiacutevel em wwwcartadaterraorgbr Acesso em 10 set 2011

CONTROLADORIA GERAL DA UNIAtildeO Olho vivo no dinheiro Puacuteblico Disponiacutevel em wwwcgugovbr Acesso em 10 set 2011

______ Portal da Transparecircncia Disponiacutevel em wwwportaldatransparenciagovbrgt Acesso em 10 set 2011

FERREIRA A B de H Miacuteni Aureacutelio O Dicionaacuterio da Liacutengua Portuguesa 6 ed Curitiba Positivo 2004

OECD Organisation for Economic Co-operation and Development Disponiacutevel em httpstatsoecdorgindexaspxqueryid= Acesso em 10 set 2011

PINSK J Cidadania e Educaccedilatildeo Satildeo Paulo Contexto 2003

SABBAG Eduardo Manual de Direito Tributaacuterio 3 ed Satildeo Paulo Saraiva 2011

XEREZ Antonia Solange Pinheiro Educaccedilao e cidadania ampliando os espaccedilos de inclusatildeo Fortaleza Graacutefica e Editora LCR 2008

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

408

PROGRAMA DE EDUCACcedilAtildeO FISCAL DE FORTALEZA UM LEGADO DE CIDADANIA

SUMAacuteRIO Introduccedilatildeo 1 Um olhar sobre educaccedilatildeo fiscal 2 Em Fortaleza eacute assim quem leva as financcedilas agrave serio leva precircmio 21 Comunicaccedilatildeo alternativa e popular 22 Palestras e seminaacuterios 23 Resultados do Precircmio Sefin 3 Outros instrumentos para disseminaccedilatildeo da educaccedilatildeo fiscal 31 Enquetes teatrais 32 Publicaccedilotildees 33 Reformulaccedilatildeo do portal 4 PEF Fortaleza um legado de cida-dania 5 Cief Consideraccedilotildees finais Referecircncias

Leonardo Costa de Almeida1

INTRODUCcedilAtildeO

O desafio de estruturar implantar e promover accedilotildees de educaccedilatildeo fiscal natildeo eacute tarefa das mais

faacuteceis ainda mais quando se trata de uma cidade como Fortaleza capital do Estado do Cearaacute onde os

iacutendices de desigualdade social ainda satildeo bastante alarmantes Para se ter uma ideia no final do ano de

2012 relatoacuterio produzido pelas Naccedilotildees Unidas denominado State of the World Cities colocou Forta-

leza no mapa das dez cidades mais desiguais do mundo

O relatoacuterio mostrou que apenas 7 da populaccedilatildeo de Fortaleza deteacutem 26 de toda a riqueza

Os serviccedilos puacuteblicos ainda escassos diante da demanda natildeo conseguem atingir os cidadatildeos que es-

tatildeo agrave margem e que muitas vezes natildeo sabem a importacircncia da sua proacutepria voz no processo decisoacuterio

das poliacuteticas puacuteblicas

O cenaacuterio que parece desanimador surge como um desafio ao Poder Puacuteblico que entre tantas

outras obrigaccedilotildees tambeacutem precisa garantir justiccedila social e plenas condiccedilotildees de participaccedilatildeo e cida-

dania a todos Diante disso inquietaccedilotildees de toda ordem vecircm agrave tona quais as alternativas para mudar

essa realidade Que instrumentos podem ser utilizados para aproximar o cidadatildeo do Poder Puacuteblico

Que espaccedilos podem ser ocupados Como chegar a eles

Em 2005 ao assumir a Secretaria de Financcedilas da Prefeitura de Fortaleza o economista Alexan-

dre Sobreira Cialdini escolheu o caminho da educaccedilatildeo fiscal No ano seguinte deu iniacutecio a primeira

iniciativa na busca por uma consciecircncia criacutetica onde o cidadatildeo pudesse reconhecer a importacircncia do

Fisco na manutenccedilatildeo e promoccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas

Sempre guiado pelas diretrizes que norteiam esta temaacutetica foi na gestatildeo do economista que

1 Jornalista com especializaccedilatildeo em Comunicaccedilatildeo e Jornalismo Poliacutetico pela Universidade de Fortaleza coordenou o Programa de Educaccedilatildeo Fiscal de Fortaleza eacute tutor de educaccedilatildeo a distacircncia (educaccedilatildeo fiscal) pela Escola de Administraccedilatildeo Fazendaacuteria Atualmente eacute assessor de comunicaccedilatildeo na Prefeitura de Fortaleza E-mail leonardocosta2gmailcom

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

409

Fortaleza foi elevada ao patamar de primeira capital a institucionalizar como poliacutetica de Estado por

meio de lei um Programa de Educaccedilatildeo Fiscal De 2006 a 2012 diversos instrumentos e accedilotildees foram

criados no intuito de estimular agrave discussatildeo acerca da participaccedilatildeo cidadatilde aleacutem de conscientizar para

a funccedilatildeo socioeconocircmica dos tributos

O trabalho desenvolvido por Fortaleza neste periacuteodo ganhou consistecircncia e destacou-se de

forma insusgente entre os municiacutepios brasileiros Neste artigo pretendemos apresentar e discutir esta

experiecircncia agrave luz dos trecircs principais eixos que norteiam a educaccedilatildeo fiscal (valores cidadania e cultura)

e na busca por uma relaccedilatildeo harmoniosa e participativa entre o Poder Puacuteblico e o cidadatildeo por meio do

estiacutemulo ao exerciacutecio pleno da cidadania

1 UM OLHAR SOBRE EDUCACcedilAtildeO FISCAL

As transformaccedilotildees da sociedade o avanccedilo das novas tecnologias da informaccedilatildeo os novos

meios de comunicaccedilatildeo os instrumentos ofertados pelo Poder Puacuteblico as diversas formas de se rela-

cionar com a cidade com o bairro em que vivemos e ateacute mesmo com os grupos que frequentamos se

configuram em importantes ferramentas agrave disposiccedilatildeo dos cidadatildeos

Na aacuterea de financcedilas puacuteblicas por exemplo eacute a partir de meios como a internet que os governos

federal estadual e municipal tentam manter um canal direto com o cidadatildeo na prestaccedilatildeo de contas do

dinheiro puacuteblico e de tudo que eacute aplicado e investido

Desta forma os governos seja por iniciativa proacutepria ou mesmo por cobranccedila da sociedade tecircm

buscado implementar accedilotildees para gerar transparecircncia e clareza nas informaccedilotildees e decisotildees de maneira

a garantir os direitos de cidadania e o exerciacutecio do controle social

Marshall (1967 p 82) ao discutir a noccedilatildeo de direitos de cidadania destaca que ldquopara que a

igualdade nos exerciacutecio dos direitos seja alcanccedilada coloca-se a necessidade de instrumentos que pro-

movam a garantia de sua efetivaccedilatildeordquo

Seguindo esta linha de raciociacutenio podemos considerar que o Poder Puacuteblico compreendido

aqui como o Estado Democraacutetico Brasileiro assume uma responsabilidade primordial na garantia dos

direitos de cidadania uma vez que eacute ele o responsaacutevel pela validaccedilatildeo de normas e implementaccedilatildeo de

medidas que promovam efetivamente tais direitos

Natildeo eacute difiacutecil perceber que a relaccedilatildeo entre poder puacuteblico e sociedade ainda acontece de forma

aacuterida Muitas vezes o cidadatildeo natildeo se sente parte daquilo que lhe ofertado ou natildeo percebe a presenccedila

do Estado quando utiliza um serviccedilo puacuteblico Por mais simples que pareccedila a participaccedilatildeo do Estado

estaacute presente nas menores accedilotildees corriqueiras como garantir giz para que o professor possa ensinar

Diante disso a ideia de educaccedilatildeo fiscal se configura como um forte instrumento pedagoacutegico de

ensino e sensibilizaccedilatildeo para fomentar a cidadania e promover uma relaccedilatildeo harmoniosa e participativa

entre o Poder Puacuteblico e o cidadatildeo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

410

De acordo com Rivillas em artigo publicado no livro Educaccedilatildeo Fiscal e Cidadania ldquoa educaccedilatildeo

fiscal eacute um processo de ensino e aprendizagem baseado em trecircs eixos ndash valores cidadania e cultura

fiscal ndash e que tem como objetivo fomentar uma cidadania participativa e consciente de seus direitos e

obrigaccedilotildeesrdquo (In VIDAL 2010 p24)

Ainda segundo o autor entende-se por valores a possibilidade de uma construccedilatildeo criacutetica so-

bre a importacircncia do tema desde a escola que pode ser considerada o primeiro espaccedilo de discussatildeo

com o qual as crianccedilas tecircm contato propiacutecio para o desenvolvimento livre de cada indiviacuteduo Eacute na

escola que se promovem as primeiras discussotildees acerca dos interesses individuais e coletivos Jaacute

os conceitos de cidadania e cultura fiscal podem ser entendidos como elementos complementares

para a garantia dos direitos e deveres de cada cidadatildeo O primeiro estaacute ligado agrave participaccedilatildeo demo-

craacutetica e o segundo se trata de uma formaccedilatildeo eacutetico-cidadatilde onde se constroacutei uma consciecircncia criacutetica

reconhecendo a importacircncia dos tributos na garantia do bem comum e da correta aplicaccedilatildeo deles

de forma transparente

No Brasil o Estado do Cearaacute foi um dos pioneiros em 1998 na implantaccedilatildeo de um Programa

Estadual de Educaccedilatildeo Fiscal (PEF) O Programa estabeleceu-se a partir de orientaccedilatildeo do Confaz de

1996 que deliberava acerca da constituiccedilatildeo de um Grupo Estadual de Educaccedilatildeo Tributaacuteria (Gete) hoje

denominado Grupo Estadual de Educaccedilatildeo Fiscal (Gefe) para implantar e viabilizar as diretrizes do Pro-

grama Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal (PNEF)

Mobilizado pela causa da educaccedilatildeo fiscal em Fortaleza o economista Alexandre Sobreira

Cialdini ao assumir a Secretaria Municipal de Financcedilas da Prefeitura em 2005 decidiu investir no

tema e empreendeu diversas accedilotildees no intuito estimular fortalecer e disseminar a educaccedilatildeo fiscal

no municiacutepio

Desde entatildeo inuacutemeras accedilotildees e iniciativas foram implementadas para gerar informaccedilatildeo trans-

parecircncia e clareza com as financcedilas puacuteblicas da cidade A partir de 2006 foram veiculados os primeiros

instrumentos apresentados de maneira simples e didaacutetica que facilitavam o controle social e estimu-

lavam o exerciacutecio pleno da cidadania na capital cearense

As medidas adotas pela Secretaria Municipal de Financcedilas buscavam impactar na produccedilatildeo de

conteuacutedos acadecircmicos e pedagoacutegicos no intuito de promover a discussatildeo democraacutetica acerca de

temas relacionados agraves financcedilas puacuteblicas Entre principais accedilotildees adotadas destaca-se o Precircmio Sefin

de Financcedilas Municipais primeira iniciativa de educaccedilatildeo fiscal da Prefeitura de Fortaleza criada para

envolver trecircs das principais esferas da sociedade a academia a imprensa e a escola

A partir daiacute outras accedilotildees foram desencadeadas como apresentaremos a seguir ateacute a formali-

zaccedilatildeo da Lei Municipal n 98252011 que instituiu o Programa de Educaccedilatildeo Fiscal de Fortaleza (PEF

Fortaleza) responsaacutevel por colocar a cidade como a primeira capital do paiacutes a instituir um Programa

de Educaccedilatildeo Fiscal com recursos garantidos em orccedilamento orientando para a inclusatildeo do tema de

forma transversal nas escolas puacuteblicas do municiacutepio

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

411

Para isso diversos atores externos foram sensibilizados mobilizados e incluiacutedos no processo

de disseminaccedilatildeo da educaccedilatildeo fiscal Crianccedilas professores estudantes universitaacuterios artistas muacutesi-

cos jornalistas comunicadores populares cineastas profissionais de tecnologia da informaccedilatildeo ser-

vidores puacuteblicos executivos pais matildees todos engajados pela mesma causa fazer valer seus direitos

de cidadania

2 EM FORTALEZA Eacute ASSIM QUEM LEVA AS FINANCcedilAS Agrave SERIO LEVA PREcircMIO

Em 2006 a Prefeitura de Fortaleza por intemeacutedio da Secretaria Municipal de Financcedilas instituiu

o Precircmio Sefin de Financcedilas Municipais desd da aprovaccedilatildeo do Decreto nordm 12096 que tem por objetivo

estimular as pesquisas nas aacutereas Financcedilas Tributaccedilatildeo Auditoria Contabilidade Direito Economia e

Tecnologia da Informaccedilatildeo aleacutem da produccedilatildeo de conteuacutedos jornaliacutestico por parte da imprensa acerca

da administraccedilatildeo puacuteblica municipal

O Precircmio Sefin pode ser considerado o projeto piloto entre as accedilotildees de educaccedilatildeo fiscal que

seriam promovidas posteriormente pelo Municiacutepio de Fortaleza Em sua primeira ediccedilatildeo no ano de

2007 o Precircmio buscava estimular a discussatildeo democraacutetica das financcedilas municipais em apenas duas

grandes aacutereas universidade e imprensa

A experiecircncia proveitosa e os resultados obtidos com esta ediccedilatildeo do precircmio levaram a Secre-

taria Municipal de Financcedilas a reformular a proposta e incorporar a escola como nova aacuterea de atuaccedilatildeo

para as accedilotildees de educaccedilatildeo fiscal

Em 2008 a segunda ediccedilatildeo do Precircmio foi lanccedilada jaacute com a nova proposta apoiada em trecircs

linhas de atuaccedilatildeo a primeira o estiacutemulo agrave pesquisa nas aacutereas de Financcedilas Tributaccedilatildeo Auditoria

Contabilidade Direito Economia e Tecnologia da Informaccedilatildeo aplicada agrave administraccedilatildeo puacuteblica mu-

nicipal a segunda o reconhecimento do trabalho dos jornalistas locais na abordagem das financcedilas

puacuteblicas em acircmbito municipal e a terceira o incentivo ao ensino da educaccedilatildeo fiscal nas escolas da

rede puacuteblica e privada

Pelos termos do Regulamento do Precircmio Sefin os participantes poderiam concorrer em diver-

sas categorias listadas a seguir

Na aacuterea de pesquisa estudantes de graduaccedilatildeo e profissionais graduados ou com poacutes gradu-

accedilatildeo poderiam concorrer com artigos cientiacuteficos monografias dissertaccedilatildeo de mestrado ou tese de

doutorado Na aacuterea de imprensa profissionais de comunicaccedilatildeo poderiam concorrer nas categorias de

jornalismo impresso radiojornalismo e telejornalismo Os vencedores recebiam precircmios em dinheiro

e publicaccedilatildeo dos trabalhos nos Anais do Precircmio Sefin Em contrapartida os trabalhos apresentados

eram utilizados para a otimizaccedilatildeo da atividade fazendaacuteria no municiacutepio

Jaacute na aacuterea escola alunos da rede puacuteblica e privada de ensino com faixa etaacuteria entre 6 e 17

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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anos podiam concorrer com desenho e frase redaccedilatildeo poesia ou paroacutedia relacionados com temas

de educaccedilatildeo fiscal e cidadania Jaacute os professores de ensino fundamental e meacutedio poderiam participar

desenvolvendo projetos pedagoacutegicos de educaccedilatildeo fiscal aplicaacuteveis agrave sala de aula

A premiaccedilatildeo para esta aacuterea era composta por produtos para os alunos vencedores e gratifica-

ccedilatildeo em dinheiro para os professores por estimularem a educaccedilatildeo fiscal em sala de aula

Todos os trabalhos inscritos eram avaliados por uma comissatildeo formada por representantes

de entidades de classe ligadas agraves aacutereas envolvidas no Precircmio bem como professores universitaacuterios

e outros profissionais de imprensa e educaccedilatildeo A comissatildeo avaliadora natildeo tinha acesso a nenhuma

informaccedilatildeo que pudesse identificar o candidato

21 Comunicaccedilatildeo alternativa e popular

Em 2011 compreendendo a importacircncia de disseminar a educaccedilatildeo fiscal em locais onde mui-

tas vezes a grande miacutedia ou os instrumentos de formaccedilatildeo promovidos pelo poder puacuteblico natildeo che-

gam o Precircmio abriu espaccedilo para a participaccedilatildeo de comunicadores populares e alternativos

Desta forma profissionais de raacutedios comunitaacuterias e raacutedios-escola poderiam participar com a

produccedilatildeo de conteuacutedos radiofocircnicos em veiacuteculos de comunicaccedilatildeo popular e alternativa De acordo

com Girardi e Jacobus entende-se como raacutedios comunitaacuterias aquelas que ldquotecircm a intenccedilatildeo de funcio-

namento democraacutetico abrindo suas portas e estimulando a participaccedilatildeo da comunidade onde estatildeo

inseridasrdquo (GIRARDI JACOBUS 2009)

Ou seja ao incluir a comunicaccedilatildeo popular e alternativa entre as categorias do Precircmio Sefin a

Secretaria Municipal de Financcedilas buscava inserir a educaccedilatildeo fiscal neste espaccedilo voltado para as temaacute-

ticas locais da comunidade em que estes veiacuteculos estavam inseridos distante de interesses comerciais

que muitas vezes inibem uma produccedilatildeo criacutetica e formadora

No intuito de dar mais subsiacutedios agraves produccedilotildees radiofocircnicas de comunicaccedilatildeo popular o Precircmio

Sefin elaborou uma capacitaccedilatildeo para cerca de 30 comunicadores no intuito de preparaacute-los para co-

nhecer mais sobre a importacircncia das financcedilas e da educaccedilatildeo fiscal para o exerciacutecio da cidadania A

capacitaccedilatildeo teve carga horaacuteria de 8 horasaula e contou com participaccedilatildeo de representantes de raacutedios

comunitaacuterias portais de bairro e raacutedios-escola A iniciativa teve o apoio pedagoacutegico do Grupo de

Educaccedilatildeo Fiscal da Secretaria da Fazenda do Estado do Cearaacute e do Nuacutecleo de Comunicaccedilatildeo Popular

e Alternativa da Prefeitura de Fortaleza Para concorrer os programas deveriam obrigatoriamente

serem produzidos em um dos seguintes formatos debate entrevista raacutedio-novela ou raacutediodrama

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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22 Palestras e Seminaacuterios

O Precircmio Sefin tambeacutem promoveu diversos seminaacuterios e palestras no intuito de instigar e en-

riquecer o debate acerca da educaccedilatildeo fiscal Com esta linha de atuaccedilatildeo o Precircmio trouxe agrave Fortaleza

diversos intelectuais e pessoas de renome nacional e internacional como o Senador Eduardo Suplicy a

especialista em Gestatildeo Fiscal e Municipal do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) Faacutetima

Cartaxo o coordenador da Aacuterea Internacional do Instituto de Estudios Fiscales (IEFES) Bienvenido

Pascual Encuentra o jornalista Luis Nassif entre outros

23 Resultados do Precircmio Sefin

Nas seis ediccedilotildees realizadas entre os anos de 2007 e 2012 o Precircmio Sefin de Financcedilas Municipais

contabilizou aproximadamente 5500 inscriccedilotildees considerando todas as categorias disponiacuteveis Veja

abaixo a evoluccedilatildeo dos nuacutemeros

Ou seja o crescimento no nuacutemero de inscriccedilotildees foi notoacuterio Percebe-se que a cada o ano o

Precircmio Sefin se consolidava ainda mais atingindo uma maior parcela de cidadatildeos No total das seis

ediccedilotildees o Precircmio Sefin entregou 156 precircmios nas diversas categorias Somente na aacuterea de pesquisa

53 trabalhos acadecircmicos foram contemplados Na aacuterea de imprensa 31 mateacuterias jornaliacutesticas de veiacute-

culos impressos radiofocircnicos televisivos e de comunicadores populares foram premiadas

Na aacuterea escola 63 alunos receberam precircmios pelos trabalhos produzidos sobre educaccedilatildeo fiscal

e cidadania Aleacutem disso 09 professores tambeacutem foram contemplados por desenvolverem projetos

pedagoacutegicos de educaccedilatildeo fiscal aplicaacuteveis agrave sala de aula

2 Nesta ediccedilatildeo o Precircmio Sefin contava apenas com as aacutereas de pesquisa e imprensa ainda natildeo contemplando artigos cientiacuteficos

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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3 OUTROS INSTRUMENTOS PARA DISSEMINACcedilAtildeO DA EDUCACcedilAtildeO FISCAL

No periacuteodo que compreende os anos de 2006 a 2012 a Secretaria Municipal de Financcedilas tam-

beacutem elaborou diversos instrumentos didaacuteticos para auxiliar na formaccedilatildeo cidadatilde e estimular a aplicaccedilatildeo

da educaccedilatildeo fiscal de forma transversal nas mais diversas aacutereas

31 Esquetes teatrais

Aleacutem do Precircmio Sefin de Financcedilas Municipais a Secretaria elaborou duas esquetes teatrais que

trabalhavam de forma luacutedica a importacircncia dos tributos e da cidadania para garantia de serviccedilos e

manutenccedilatildeo da cidade

A primeira esquete intitulada ldquoOs Primosrdquo apresenta os principais tributos brasileiros e a im-

portacircncia do pagamento deles para a cidade o Estado e o paiacutes O enredo se daacute por meio do diaacutelogo

entre trecircs personagens que possuem relaccedilatildeo de parentesco e vivem em situaccedilotildees de financeiras dife-

rentes O primeiro eacute rico o segundo eacute um artista pobre e a terceira uma estudiosa e ativa cidadatilde que

vai buscar na educaccedilatildeo fiscal maneiras para esclarecer as duacutevidas do primo artista na tentativa de

tornaacute-lo mais consciente de seu papel na sociedade

Desde 2006 quando foi lanccedilada a esquete foi apresentada em associaccedilotildees igrejas comuni-

dades e outras entidades representativas da sociedade civil Em 2007 a esquete foi utilizada durante

as Assembleias do Orccedilamento Participativo de Fortaleza como mais um instrumento para facilitar a

compreensatildeo por parte dos cidadatildeos que deliberavam suas demandas para a cidade

Devido ao sucesso de ldquoOs Primosrdquo em 2008 a Secretaria Municipal de Financcedilas resolveu produ-

zir mais uma esquete teatral Desta vez para tratar especificamente da importacircncia do Imposto sobre

a Propriedade Predial e Territorial (IPTU) no reordenamento da cidade

Assim surgiu ldquoO Casoacuteriordquo mais uma ferramenta utilizada pela Secretaria Municipal de Financcedilas

na disseminaccedilatildeo da educaccedilatildeo fiscal Com linguagem simples e regional o enredo apresentava a his-

toacuteria do conturbado matrimocircnio entre Cazandra e Cazeacute que para se casarem precisavam estar em dia

com o IPTU da cidade

O texto trabalhava questotildees importantes ligadas agrave participaccedilatildeo cidadatilde e o retorno que o cida-

datildeo espera do Poder Puacuteblico Aleacutem disso a esquete ainda desenvolvia ideias como a importacircncia de

realizar justiccedila fiscal com justiccedila social

No intuito de atingir o maior puacuteblico possiacutevel aleacutem de outros espaccedilos em que o teatro natildeo

alcanccedila a Secretaria Municipal de Financcedilas converteu as duas esquetes em viacutedeos formato DVD que

foram distribuiacutedos em escolas instituiccedilotildees e entidades representativas de classe

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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32 Publicaccedilotildees

Diversos conteuacutedos didaacuteticos como manuais cartilhas e guias que facilitavam o entendimen-

to das financcedilas puacuteblicas por parte dos cidadatildeos tambeacutem foram criados Entre os primeiros estatildeo

ldquoLei de Responsabilidade Fiscal ndash Guia Praacutetico do Cidadatildeordquo e ldquoPor dentro do Orccedilamento Puacuteblicordquo

Ambos foram distribuiacutedos para imprensa oacutergatildeos governamentais empresas privadas associaccedilotildees

sindicatos etc

A partir daiacute a Secretaria Municipal de Financcedilas desencadeou a publicaccedilatildeo de outros materiais

com as mais diversas temaacuteticas Vejamos a seguir

bull ldquoManual de Orientaccedilatildeo da Programaccedilatildeo Orccedilamentaacuteria e Financeirardquo que explica

o papel do gestor e dos diretores administrativos e financeiros dos oacutergatildeos da administraccedilatildeo direta e

indireta e apresenta o fluxo da despesa orccedilamentaacuteria da Prefeitura O documento foi entregue a todos

os gestores e Diretores Administrativos Financeiros

bull ldquoManual do Investidorrdquo publicaccedilatildeo que tem por objetivo apoiar as decisotildees dos inves-

tidores na cidade de Fortaleza O manual apresenta elementos essenciais que caracterizam o Programa

Municipal de Incentivos Fiscais para Fortaleza natildeo soacute em termos normativos mas tambeacutem no que diz

respeito agraves nuances necessaacuterias ao amadurecimento das decisotildees empresariais

bull ldquoA cartilha IPTUrdquo trata-se de um documento que tem o objetivo de informar a popu-

laccedilatildeo sobre a importacircncia do IPTU para arrecadaccedilatildeo do Municiacutepio e para o reordenamento urbano da

Cidade A cartilha tambeacutem esclarece duacutevidas sobre a cobranccedila do imposto e orienta sobre procedi-

mentos

bull ldquoCartilha da Transparecircnciardquo publicaccedilatildeo que tem o objetivo de orientar o cidadatildeo so-

bre as ferramentas disponibilizadas pela Prefeitura para garantir agrave populaccedilatildeo acesso faacutecil e didaacutetico

agraves financcedilas puacuteblicas municipais O material ainda apresenta como o cidadatildeo pode acompanhar a

aplicaccedilatildeo dos recursos puacuteblicos e as principais puniccedilotildees aplicadas aos gestores que natildeo obedecerem

agraves condiccedilotildees e limites estabelecidos pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) Por meio da Cartilha

da Transparecircncia a Secretaria Municipal de Financcedilas ofereceu mais um instrumento democraacutetico de

participaccedilatildeo onde a sociedade pocircde compreender de forma simples e transparente a relaccedilatildeo entre a

receita e despesa aleacutem de conhecer outras ferramentas que auxiliam o cidadatildeo no papel de agente

fiscalizador de tudo que eacute aplicado com o dinheiro puacuteblico

Todo o material produzido foi disponibilizado na internet no site da secretaria por intermeacutedio

do endereccedilo eletrocircnico wwwsefinfortalezacegovbr

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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33 Reformulaccedilatildeo do portal

No iniacutecio de 2005 o portal da Secretaria Municipal de Financcedilas foi reformulado e ganhou nova

versatildeo que contava com mais serviccedilos e informaccedilotildees fiscais e financeiras mantendo um canal direto

com o cidadatildeo e facilitando a fiscalizaccedilatildeo por parte dos oacutergatildeos de controle externo

O portal passou a permitir consultas sobre situaccedilatildeo financeira e cadastral e ateacute acompanhar o

andamento das pautas de julgamento do Contecioso Administrativo Tributaacuterio (CAT) Aleacutem disso pe-

riodicamente a Secretaria Municipal de Financcedilas publicava todos os relatoacuterios estabelecidos pela Lei

de Responsabilidade Fiscal (LRF) ndash Relatoacuterio de Gestatildeo Fiscal (RGF) e Relatoacuterio Resumido da Execuccedilatildeo

Orccedilamentaacuteria (RREO) ndash aleacutem de todos os repasses do governo federal para o municiacutepio balanccedilos ge-

rais e balancetes mensais da Prefeitura

34 Foco na escola

Em 2011 no intuito de consolidar ainda mais o trabalho desenvolvido especialmente por meio

do Precircmio Sefin a Secretaria Municipal de Financcedilas ampliou as accedilotildees e focou ainda mais na escola Em

parceria com a Fundaccedilatildeo Demoacutecrito Rocha a secretaria desenvolveu diversas accedilotildees que visam valori-

zar e estimular a discussatildeo da educaccedilatildeo fiscal em sala de aula desde a infacircncia

A parceria entre as duas instituiccedilotildees resultou na criaccedilatildeo de um Kit de Educaccedilatildeo Fiscal voltado

para as escolas do ensino fundamental de Fortaleza composto por jogos e dois livros paradidaacuteticos A

funccedilatildeo do kit era auxiliar pedagogicamente na aplicaccedilatildeo do tema educaccedilatildeo fiscal de forma transversal

em sala de aula O Kit foi distribuiacutedo em todas as escolas puacuteblicas do municiacutepio

Veja abaixo as ferramentas que compunham o kit

bull Jogo de tabuleiro e dados com a representaccedilatildeo social da cidade (prefeitura empresas

cidadatildeos escolas hospitais) Uma dinacircmica de jogo com ceacutedulas pagamentos de impostos e seu re-

torno social

bull Jogo da memoacuteria contendo cartelas com associaccedilatildeo positiva agrave cultura fiscal

bull Grupo de fantoches com os personagens de representaccedilatildeo social pai matildee filhos pro-

fessores meacutedicos poliacuteticos Tratava-se de uma atividade voltada para o desenvolvimento criacutetico dos

jovens

bull Dois livros paradidaacuteticos elaborados por escritores da literatura infantil cearense abor-

dando a importacircncia dos tributos na manutenccedilatildeo dos serviccedilos e poliacuteticas puacuteblicas do municiacutepio e o

exerciacutecio da cidadania

Em 2012 a Secretaria Municipal de Financcedilas utilizou-se das ferramentas de tecnologia da infor-

maccedilatildeo para inovar e transformou o jogo de tabuleiro em um game virtual A accedilatildeo teve como objetivo

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garantir a inclusatildeo digital e inserir uma nova linguagem aos instrumentos desenvolvidos no acircmbito da

educaccedilatildeo fiscal

O game denominado ldquoEducaccedilatildeo Fiscal e Cidadaniardquo foi distribuiacutedo nas escolas da rede puacutebli-

ca de Fortaleza e disponibilizado para download na internet no portal da secretaria Assim como na

versatildeo em tabuleiro basicamente o jogo buscava estimular a cidadania e garantir um maior conheci-

mento sobre financcedilas de uma forma divertida para as crianccedilas

Dos pontos de vista visual e funcional o game foi todo desenvolvido em graacuteficos 3D e trazia

como cenaacuterio a cidade de Fortaleza por meio de representaccedilotildees como a estaacutetua de Iracema o Estaacutedio

Presidente Vargas etc O game pode ser jogado individualmente ou em dupla e natildeo precisa ser insta-

lado no computador

4 PEF FORTALEZA UM LEGADO DE CIDADANIA

Em 31 de janeiro de 2012 a Secretaria Municipal de Financcedilas lanccedilou formalmente o Progra-

ma de Educaccedilatildeo Fiscal de Fortaleza (PEF Fortaleza) Por intermeacutedio da Lei n 98252011 o Programa

institucionalizou as accedilotildees jaacute desenvolvidas pela secretaria desde 2005 como poliacuteticas puacuteblicas do

municiacutepio de Fortaleza

Pelos termos da referida Lei o programa tem objetivo de estimular o pleno exerciacutecio da cida-

dania promover campanhas de premiaccedilatildeo aos contribuintes adimplentes com o fisco municipal esti-

mular a educaccedilatildeo fiscal e a discussatildeo das financcedilas puacuteblicas nas principais esferas da sociedade civil e

ainda propiciar relaccedilatildeo harmoniosa e participativa entre o cidadatildeo e o Governo Municipal conscien-

tizando para a funccedilatildeo socioeconocircmica dos tributos

Para isso a Lei orienta a criaccedilatildeo de um Grupo de Educaccedilatildeo Fiscal de Fortaleza (GEF Fortaleza)

que ficaraacute com entre outras incubecircncias a responsabilidade de planejar executar e acompanhar accedilotildees

de educaccedilatildeo fiscal no municiacutepio e ainda desenvolver novos projetos e instrumentos voltados para a

disseminaccedilatildeo da educaccedilatildeo fiscal nas diversas esferas da sociedade De acordo com a Lei cabe ao GEF

Fortaleza a captaccedilatildeo de recursos para a sustentabilidade do programa

Sendo assim Fortaleza tornou-se a primeira capital brasileira a implantar um Programa de

Educaccedilatildeo Fiscal com tamanha abrangecircncia envolvendo o cidadatildeo desde a infacircncia Vale destacar

que a aprovaccedilatildeo da Lei n 98252011 tambeacutem cumpre a diretriz indicada pelo Ministeacuterio da Fazenda

e Ministeacuterio da Educaccedilatildeo (por meio da Portaria Interministerial nordm 413 de 31 de dezembro de 2002)

onde orientam os municiacutepios a baixar os atos necessaacuterios para garantir a implementaccedilatildeo do Programa

Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal (PNEF)

Outro destaque que cabe ressaltar eacute que o Programa de Educaccedilatildeo Fiscal de Fortaleza possui

recurso garantido (por Lei) de 004 da Receita Corrente Liacutequida do Municiacutepio para assegurar as

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

418

accedilotildees que seratildeo desenvolvidas pela secretaria Aleacutem disso permite ainda que o municiacutepio possa

buscar parcerias puacuteblico-privadas e com organismos multilaterais para a ampliaccedilatildeo e desenvolvi-

mento de novas atividades

Outra inovaccedilatildeo trazida por esta Lei no acircmbito de Fortaleza eacute a inclusatildeo da educaccedilatildeo fiscal de

forma transversal nas escolas puacuteblicas do municiacutepio Com o apoio do ldquoPEF Fortalezardquo as escolas mu-

nicipais poderatildeo incluir a educaccedilatildeo fiscal em sala de aula nos conteuacutedos programaacuteticos do ano letivo

utilizando os recursos didaacuteticos disponibilizados pela Secretaria Municipal de Financcedilas

5 CIEF

No final de 2012 momento em que encerra-se o periacuteodo temporal destinado a este artigo a

Secretaria Municipal de Financcedilas em parceria com a Associaccedilatildeo Brasileira das Secretarias de Financcedilas

das Capitais (Abrasf) realizou o Congresso Internacional de Educaccedilatildeo Fiscal (Cief 2012) O evento

configurou-se como um espaccedilo democraacutetico de participaccedilatildeo para o fortalecimento dos programas de

educaccedilatildeo fiscal nas trecircs esferas de poder

O Congresso teve como objetivo buscar estrateacutegias de intensificaccedilatildeo dos programas de edu-

caccedilatildeo fiscal bem como descobrir desenvolver e estimular praacuteticas coletivas que auxiliem o processo

de conscientizaccedilatildeo dos cidadatildeos sobre a importacircncia da educaccedilatildeo fiscal em niacutevel internacional Aleacutem

disso tambeacutem abriu oportunidade para troca de experiecircncias e praacuteticas exitosas de educaccedilatildeo fiscal

desenvolvidas em todo o paiacutes

Durante dois dias (27 e 28 de novembro) o Cief reuniu em Fortaleza diversos intelectuais que

juntos ofereceram excelente contribuiccedilatildeo para o aperfeiccediloamento da poliacutetica fiscal na perspectiva da

cidadania e dignidade humana Entre os conferencistas que participaram dos debates destacam-se

John Christensen (Tax Justice Network) Martin Soares (Universiteacute Lumiegravere Lyon 2) Ladislau Dowbor

(PUC-SP) Marciano Buffon (Unisinos) Carlos Alberto Barreto (Receita Federal) entre outros

Ao todo 500 vagas foram disponibilizadas para os mais diversos puacuteblicos profissionais ligados

a entidades de classe universidades imprensa oacutergatildeos puacuteblicos professores e cidadatildeos interessados

em participar da discussatildeo acerca da cidadania fiscal Para garantir maior acesso inclusive para aqueles

que natildeo puderam estar presentes o evento foi veiculado ao vivo pela internet

Ao final do Congresso o auditor da Receita Federal do Brasil Alberto Amadei veiculou docu-

mento intitulado ldquoCarta de Fortalezardquo traccedilando resultados essenciais que a experiecircncia do Cief trouxe

para o debate das poliacuteticas tributaacuterias e sociais

Na carta ele destaca ldquoO CIEF-2012 realccedilou a perspectiva de um novo rumo agrave atuaccedilatildeo estatal

e consolidou importantes conclusotildees sobre as poliacuteticas tributaacuterias e sociais contingentes bem como

seus impactos distributivos diretos e indiretosrdquo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

419

Sem duacutevida o debate realizado neste Congresso teve papel essencial para a valorizaccedilatildeo da

educaccedilatildeo fiscal e ampliaccedilatildeo da discussatildeo em torno das ideias de justiccedila fiscal e cidadania

Por outro lado a Secretaria Municipal de Financcedilas tambeacutem teve a oportunidade de apresentar

em niacutevel internacional as accedilotildees realizadas por Fortaleza na construccedilatildeo de uma sociedade mais justa e

participativa

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Entre os anos de 2006 a 2012 a Prefeitura de Fortaleza por intermeacutedio da Secretaria Municipal

de Financcedilas desempenhou relevante papel na disseminaccedilatildeo da educaccedilatildeo fiscal e no estiacutemulo ao exer-

ciacutecio pleno da cidadania em diversas instacircncias da sociedade

Neste periacuteodo vaacuterias accedilotildees e instrumentos didaacuteticos que facilitam a compreensatildeo acerca da

importacircncia das financcedilas puacuteblicas e estimulam a relaccedilatildeo harmoniosa entre o Poder Puacuteblico e os cida-

datildeos foram desenvolvidos pelo governo municipal Entre eles o Precircmio Sefin de Financcedilas Municipais

que incentiva a produccedilatildeo de pesquisas acadecircmicas nas aacutereas de Tributaccedilatildeo Auditoria Economia Con-

tabilidade Direito e Tecnologia da Informaccedilatildeo voltadas para a administraccedilatildeo puacuteblica municipal reco-

nhece o trabalho da imprensa na abordagem das financcedilas puacuteblicas do Municiacutepio e ainda o estimula

a educaccedilatildeo fiscal na escola entre alunos das redes puacuteblica e privada de ensino

Sem duacutevida o trabalho desenvolvido em Fortaleza ganhou consistecircncia e insurgiu ao longo dos

anos entre os municiacutepios brasileiros Especialmente apoacutes a aprovaccedilatildeo da Lei n 98252011 que insti-

tucionalizou o Programa de Educaccedilatildeo Fiscal de Fortaleza a cidade conseguiu transformar educaccedilatildeo

fiscal em uma poliacutetica puacuteblica com recursos garantidos no orccedilamento municipal

Desta forma compreendemos que por meio da educaccedilatildeo fiscal a Secretaria Municipal de Fi-

nanccedilas cumpriu o compromisso que aliaacutes eacute funccedilatildeo do Poder Puacuteblico de garantir os direitos de ci-

dadania e estimular a relaccedilatildeo participativa entre o cidadatildeo e o governo municipal Assim a secretaria

compreendeu a importacircncia da conscientizaccedilatildeo acerca da funccedilatildeo socioeconocircmica dos tributos inclu-

sive na manutenccedilatildeo e desenvolvimento de poliacuteticas puacuteblicas ofertadas diretamente aos cidadatildeos

O exemplo deixado pela Secretaria Municipal de Financcedilas de Fortaleza no periacuteodo destacado

neste artigo mostrou o quanto eacute importante a busca pela inovaccedilatildeo e criatividade nos processos de

formaccedilatildeo que compreendem um tema tatildeo aacuterido

Sendo assim acreditamos que tais accedilotildees ficam registradas como um verdadeiro legado de cida-

dania que precisa ser compreendido como uma poliacutetica puacuteblica de Estado Portanto deve ser exigida

pela sociedade como direito adquirido que (de fato) eacute

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

420

REFEREcircNCIAS

BRASIL Portaria Interministerial nordm 413 de 31 de dezembro de 2002 DF Diaacuterio Oficial da Uniatildeo 2003 11p

CEARAacute Secretaria da Fazenda Portal do Programa Estadual de Educaccedilatildeo Fiscal Disponiacutevel em wwwsefazcegovbr Acesso em 10 jan 2014

CIALDINI Alexandre Sobreira O caminho estaacute na educaccedilatildeo a educaccedilatildeo fiscal O POVO Caderno Opi-niatildeo p 6 29 dez 2010

______ Foco no cidadatildeo Diaacuterio do Nordeste Caderno de Opiniatildeo 19 out 2008

FORTALEZA Lei ndeg 9825 de 11 de novembro de 2011 Fortaleza Diaacuterio Oficial do Municiacutepio de Fortaleza 2011 04p

______ Decreto nordm 12096 de 21 de setembro de 2006 Fortaleza Diaacuterio Oficial do Municiacutepio de Fortaleza 2006 02p

_______ Lei nordm 8947 de 05 de agosto de 2005 Fortaleza Diaacuterio Oficial do Municiacutepio de Fortaleza 2005 01p

______ Secretaria de Financcedilas Portal do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal de Fortaleza Disponiacutevel em wwwsefinfortalezacegovbr Acesso em 10 jan 2014

GIRARDI Ilza JACOBUS Rodrigo (orgs) Para fazer raacutedio comunitaacuteria com ldquoCrdquo maiuacutesculo Porto Alegre Revoluccedilatildeo de Ideias 2009

GOMES Wilson MAIA Rousiley C M Comunicaccedilatildeo e Democracia Satildeo Paulo Paulus 2008

MARSHALL TH Cidadania classe social e status Rio de Janeiro Zahar 1967

VIDAL Eloiacutesa Maia (org) Educaccedilatildeo Fiscal e Cidadania Fortaleza Ediccedilotildees Demoacutecrito Rocha 2010

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

421

EDUCACcedilAtildeO FISCAL ldquoSEFAZrdquo NA CIDADE CONSTITUCIONAL

SUMAacuteRIO Introduccedilatildeo 1 A educaccedilatildeo fiscal no contexto da Ameacuterica Latina 2 Educaccedilatildeo fiscal no Cearaacute 3 A educaccedilatildeo fiscal como Programa e o proje-to de ensinagem 4 A educaccedilatildeo para a autonomia e o espaccedilo escolar 5 Um Programa que prepara para a cidadania 6 Fundamentos para uma educaccedilatildeo fiscal 7 Valores e missatildeo da educaccedilatildeo fiscal e do PNEF 8 Diretrizes do PNEF 9 Objetivos e abrangecircncia do PNEF 10 O espaccedilo pedagoacutegico e a vinculaccedilatildeo ao programa ldquoA Cidade Constitucionalrdquo como estudo de caso Consideraccedilotildees finais Referecircncias

Marcelo Arno Nerling1

RESUMO Educaccedilatildeo fiscal e ensino superior desafios e perspectivas Educaccedilatildeo formal fiscal desenvol-

vimento da personalidade e preparo para a cidadania na lsquocidade constitucionalrsquo Educaccedilatildeo fiscal do

global ao local O Estado do Cearaacute-CE referecircncia nacional de educaccedilatildeo fiscal Diretrizes curriculares

ensino pesquisa e extensatildeo promotoras da cultura de participaccedilatildeo Autonomia do sujeito adulto pela

educaccedilatildeo continuada e superior Perspectivas positivas na aproximaccedilatildeo da administraccedilatildeo tributaacuteria

com o ensino superior e de adultos

PALAVRAS-CHAVE Preparo da cidadania Educaccedilatildeo fiscal Educaccedilatildeo formal e continuada para adultos Orccedilamento

receita e despesa puacuteblica Programas e metas Inovaccedilatildeo na ensinagem superior

INTRODUCcedilAtildeO Escrevemos este Artigo para comemorar os 15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal da Secre-

taria da Fazenda do Estado do Cearaacute (Sefaz) A histoacuteria da educaccedilatildeo fiscal desenvolvida ao longo desse

periacuteodo pela Sefaz se funde e se confunde positivamente com os fundamentos princiacutepios e diretrizes

da educaccedilatildeo fiscal no Brasil contidos no Programa que sustenta essas iniciativas PNEF

Do geral ao particular nossa ecircnfase destaca os estudos eurocecircntricos e latinoamericanos sobre

1 Bacharel em Ciecircncias Juriacutedicas e Sociais (Unijuiacute) especialista em Pedagogia Universitaacuteria (USP) mestre em Instituiccedilotildees Juriacutedico Poliacuteticas (UFSC) e doutor em Direito do Estado (PUC-SP) Tendo a ciecircncia por vocaccedilatildeo emprega metodologias ativas e flexibilidade na ensinagem formal e continuada Atua na graduaccedilatildeo no Curso de Gestatildeo de Poliacuteticas Puacuteblicas e na poacutes-graduaccedilatildeo no Programa Interdisciplinar em Humanidades Direitos e Outras Legitimidades na Universidade de Satildeo Paulo (USP) Operador do direito na gestatildeo de poliacuteticas puacuteblicas busca resultados quantitativos e qualitativos em progra-mas projetos atividades e accedilotildees puacuteblicas Inovador e ativista defende meacutetodos de planejamento participativo no setor puacuteblico estatal e natildeo estatal - terceiro setor Pesquisa orienta implementa e avalia temas relativos agrave reforma do Estado E-mail mnerlinguspbr

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

422

o tema Aprofundamos os fundamentos e princiacutepios da educaccedilatildeo fiscal e mostraremos as possibilida-

des de inovaccedilatildeo nos resultados das experiecircncias empiacutericas aliadas pelo conhecimento e compreensatildeo

agraves diretrizes objetivos missatildeo visatildeo e valores da educaccedilatildeo fiscal

Pendem duacutevidas sobre a compatibilidade das diretrizes da educaccedilatildeo fiscal com as diretrizes do

ensino superior brasileiro Com isto a inovaccedilatildeo fica freada e a universidade natildeo responde aos desafios

do ensino superior formal Superamos o problema pela apresentaccedilatildeo de uma hipoacutetese que eacute a priori

negativa ou seja haacute plena compatibilidade entre as diretrizes e princiacutepios do ensino superior com a

educaccedilatildeo fiscal bastando encontrar pessoas na administraccedilatildeo tributaacuteria e educacional dispostas e em-

preender em nome da coesatildeo social por meio da educaccedilatildeo fiscal Vamos apresentar aquiacute o conteuacutedo

programaacutetico de uma disciplina de graduaccedilatildeo e projeto de extensatildeo da Universidade de Satildeo Paulo

ministrada em Brasiacutelia - DF que convencionamos chamar ldquoA cidade constitucional Capital da Repuacutebli-

cardquo Eacute uma disciplina de graduaccedilatildeo muito concorrida na Universidade e que tem na educaccedilatildeo fiscal um

tema transversal e tambeacutem especiacutefico e compotildee a estrutura curricular do Projeto Poliacutetico Pedagoacutegico

do Curso de Gestatildeo de Poliacuteticas Puacuteblicas da Escola de Artes Ciecircncias e Humanidades da USP

A motivaccedilatildeo deste Capiacutetulo eacute ajudar a conhecer e compreender este problema A edu-

caccedilatildeo fiscal se ajusta a metodologias inovadoras de ensinagem no ensino superior brasileiro

Nossa hipoacutetese eacute positiva ou seja acreditamos a priori que eacute possiacutevel aproximar as ideias pre-

cursoras lanccediladas pela Sefaz-CE unindo histoacuteria e tempo presente para fortalecer as amarras

do futuro com as ideias da cidade constitucional

Este Capiacutetulo aprende e na medida que aprende ensina sobre o estado da arte da educaccedilatildeo

fiscal na Ameacuterica Latina no Brasil com destaque para o Cearaacute ndash CE estado federado brasileiro que no

exerciacutecio da autonomia administrativo financeira implementa com resultados positivos e visibilidade a

sua poliacutetica puacuteblica de educaccedilatildeo fiscal

Eacute regra geral que o preparo e o exerciacutecio da cidadania eacute base para a construccedilatildeo de uma socie-

dade democraacutetica com igualdade e justiccedila A sociedade civil e o Estado devem trabalhar para a cons-

truccedilatildeo dessa sociedade com base nos princiacutepios constitucionais

O exerciacutecio da cidadania pressupotildee uma educaccedilatildeo para a cidadania Eacute o conhecimento e a

compreensatildeo dos fatos pelas lentes dos valores e do direito que permitem reconhecer novas e ino-

vadoras legitimidades que precisam ser conhecidas e compreendidas para que a sociedade avance

no compasso do tempo

O preparo para a cidadania eacute um dever da universidade brasileira do ensino superior brasileiro

sem eximir o ensino fundamental e meacutedio O artigo 205 da CF estabelece que a educaccedilatildeo direito de

todos e dever do Estado e da famiacutelia seraacute promovida e incentivada com a colaboraccedilatildeo da sociedade

visando ao pleno desenvolvimento da pessoa seu preparo para o exerciacutecio da cidadania e sua qualifi-

caccedilatildeo para o trabalho O pleno desenvolvimento da pessoa e o preparo para o exerciacutecio da cidadania

devem ser promovidos incentivados ldquocom a colaboraccedilatildeo da sociedaderdquo e com controle social

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

423

O que significa preparar para o exerciacutecio da cidadania Como e com que conteuacutedo preparamos

este exerciacutecio Tributos e financcedilas pessoais e puacuteblicas satildeo levadas em consideraccedilatildeo nos projetos poliacute-

tico-pedagoacutegicos e planos de atividades das disciplinas de graduaccedilatildeo Como preparar contribuintes e

servidores por meio da educaccedilatildeo fiscal nos conteuacutedos nos projetos poliacutetico-pedagoacutegicos nos proje-

tos de desenvolvimento institucional do ensino superior

Natildeo temos pretensatildeo de resolver todos estes problemas mas natildeo os desprezamos porque nos

servem de guia como meacutetodo Vejamos como a educaccedilatildeo fiscal serve ao preparo da cidadania Alinhar

a educaccedilatildeo fiscal a um projeto educacional para a autonomia dentro ou aleacutem do espaccedilo escolar com

a transmissatildeo criacutetica de valores missatildeo diretrizes objetivos e abrangecircncias satildeo capazes de avivar o

espaccedilo pedagoacutegico e a cidade constitucional em cada um de noacutes Se eacute verdade vejamos

1 A EDUCACcedilAtildeO FISCAL NO CONTEXTO DA AMEacuteRICA LATINA

A educaccedilatildeo fiscal eacute um tema que compotildee a agenda governamental do nosso tempo Eacute tema

atual ainda que o trabalho sistematizado e material dedicado ao tema tenha se iniciado no Peru

(1993) no Brasil (1996) no Meacutexico (1997) e na Argentina (1998) eacute depois de 2005 que o tema se am-

plia de forma significativa esperando alcanccedilar continuidade para aleacutem de programas fundamentais

fruto da cooperaccedilatildeo (RIVILLAS VELARDEBOacute 2010)

No geral a educaccedilatildeo fiscal eacute um tema bastante movediccedilo ldquocon el que los docentes por lo ge-neral no estaacuten familiarizados y que puede resultarles muy aacuteridordquo (RIVILLAS VELARDEBOacute 2010)

Uma formaccedilatildeo especiacutefica e a colaboraccedilatildeo de material didaacutetico complementar que serve de

orientaccedilatildeo didaacutetica para articulaccedilatildeo com os planos de trabalho e projetos poliacutetico-pedagoacutegicos dos

cursos de graduaccedilatildeo satildeo indispensaacuteveis

O desenvolvimento de moacutedulos especiacuteficos para docentes e caderno de atividade para alunos eacute

estimulado devendo ser articulado para integraccedilatildeo de conteuacutedos formais das mateacuterias que integram

a estrutura curricular dos cursos de graduaccedilatildeo no Brasil

A composiccedilatildeo de unidades de textos formais satildeo elaborados pelo Ministeacuterio da Educaccedilatildeo e as

secretarias estaduais e municipais da mesma forma Esses materiais se avaliados pelo oacutergatildeo ministe-

rial competente podem ser financiados pelas proacuteprias administraccedilotildees fiscais Eacute necessaacuterio ficar atento

para o fato de que vertiginosas mudanccedilas na tecnologia da informaccedilatildeo comunicaccedilatildeo e avaliaccedilatildeo da

preferecircncia dos jovens tecircm obrigado a repensar as estrateacutegias didaacuteticas ldquopara reduzir la brecha entre el mundo fuera de la escuela y la ensentildeanza tradicionalrdquo (RIVILLAS VELARDEBOacute 2010)

Portanto haacute uma estrateacutegia educativa da administraccedilatildeo tributaacuteria que atinge a organizaccedilatildeo da

estrutura social da sociedade buscando dialogar com ela sobre a tomada de decisatildeo relativos aos re-

cursos ndash escassos ou abundantes ndash sobre a fonte para obter esses recursos ou sobre a aplicaccedilatildeo desses

recursos transformados em poliacuteticas puacuteblicas

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

424

Eacute preciso tocar nos valores culturais que regem as sociedades latino-americanas

Todas las leyes tributarias y las planificaciones financieras concebidas en la mesa de despacho son esteacuteriles si no se presta la debida atencioacuten a las ideas actitudes moti-vaciones y formas de comportamiento de los poderes puacuteblicos y de los ciudadanos a su moral personal y colectiva a su grado de cohesioacuten o de antagonismo y a sus ideas maacutes o menos compartidas sobre el modo de organizar la convivencia ciacutevica (GARCIacuteA LOBO 2010 p 3)

Eacute preciso prestar atenccedilatildeo agraves ideias diretrizes atitudes motivaccedilotildees e formas de comportamento

do poder puacuteblico e do cidadatildeo recarregando de sentidos e permeando o senso comum com valores

que sirvam ao desenvolvimento da personalidade e ao preparo para a cidadania e elevado grau de

coesatildeo social sobre a forma e modos de organizar a convivecircncia ciacutevica

Na medida em que as teacutecnicas juriacutedicas e econocircmicas se potildeem a serviccedilo das ideias sociopoliacuteticas

[] as decisotildees fiscais como expressas nas partidas das receitas e despesas do Orccedila-mento puacuteblico constituem um dos melhores indicadores de quais satildeo as metas e as prioridades de um Estado Portanto o espelho fiscal eacute um espelho social em sentido amplo natildeo soacute reflete estruturas poliacuteticas e econocircmicas Tambeacutem reflete metas fins valores atitudes e condutas que satildeo por sua vez causa e consequencia daquelas es-truturas Eacute possiacutevel que no plano das ideacuteias se assumam valores morais que datildeo lugar a formulaccedilatildeo de metas desejadas pela maioria do corpo social de um paiacutes (GARCIacuteA LOBO 2010 p 3)

A assunccedilatildeo de valores morais por servidores e cidadatildeos dependem portanto de uma certa

consciencia ciacutevica que natildeo eacute algo natural mas sim um produto social resultante da educaccedilatildeo portanto

requer processos educativos ldquocuja maior ou menor aceleraccedilatildeo depende da vontade de quem deseja

impulsiona-losrdquo (GARCIacuteA LOBO 2010 p 4)

Como destacamos a universidade brasileira pelo que formalmente estabelece a Constituiccedilatildeo

tem a obrigaccedilatildeo de impulsionar esta consciencia ciacutevica Na medida em que o individuo tenha sido

preparado para seu papel de cidadatildeo natildeo necessita de excessiva pressatildeo coativa externa para cumprir

obrigaccedilotildees sociais porque ldquoao haver interiorizado eacute capaz de compreender que os direitos e as obri-

gaccedilotildees que este papel comporta e ajustar sua conduta de maneira espontanea agraves expectativas que se

tem delerdquo como individuo e cidadatildeo (GARCIacuteA LOBO 2010 p 5)

A modificaccedilatildeo de atitudes fiscais de cidadatildeos adultos bem como de crianccedilas e jovens deve

ter em conta que as intervenccedilotildees pela via do sistema educacional satildeo lentas devem ser meditadas e

constantes se pretendem efetividade e continuidade nesta aproximaccedilatildeo entre o ensino superior e a

administraccedilatildeo tributaacuteria Entatildeo natildeo custa recordar

Por esta razatildeo definidos os objetivos do projeto educativo a administraccedilatildeo tributaacuteria natildeo pode ser nem arrogante nem apressada Sem perder o controle deve ceder parte do protagonismo aos profissionais da administraccedilatildeo educacional Eles conhecem seu

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

425

oficio como noacutes o nosso portanto eacute preciso delegar aspectos teacutecnicos mantendo para os profissionais da administraccedilatildeo tributaacuteria o papel de impulso seguimento e controle do processo em todas as fases (GARCIacuteA LOBO 2010 p 9)

Portanto a educaccedilatildeo fiscal eacute uma estrateacutegia global para a formaccedilatildeo de uma cultura fiscal ldquoba-

seada em um conjunto de valores que inspirem e orientem a conduta fiscal de cidadatildeos livres ativos

e responsaacuteveis que desejam viver em uma sociedade cohesionada onde se compartilham tanto as

metas coletivas como os meios necessaacuterios para lograr tais metasrdquo (GARCIacuteA LOBO 2010 p 10)

O princiacutepio da solidariedade institucional eacute apontado como sendo a base da alianccedila entre o

sistema fiscal e o sistema educacional A educaccedilatildeo ciacutevico tributaacuteria eacute uma poliacutetica puacuteblica de duraccedilatildeo

continuada e serve para o Estado fomentar a cidadania participativa e consciente de direitos e deveres

por meio de processos de ensino e aprendizagem de ensinagem baseada na formaccedilatildeo de valores na

construccedilatildeo da cidadania e da cultura fiscal eacute tarefa do presente (ANASTASIOU ALVES 2009)

A alianccedila entre o sistema tributaacuterio com o sistema educacional pressupotildee que a administraccedilatildeo

tributaacuteria eacute peccedila chave e natildeo conveacutem que perca o controle sobre uma atividade que tambeacutem tem uma

funccedilatildeo de comunicaccedilatildeo institucional interna e externa

Porque se a educaccedilatildeo fiscal proporciona ao sistema educativo muacuteltiplas oportunida-des formativas e informativas muito uacuteteis para seus fins e objetivos tambeacutem a ativi-dade educativa proporciona ao sistema fiscal muacuteltiplas oportunidades de reflexatildeo Eacute eacute sabido que natildeo haacute nada como a reflexatildeo para encontrar vias de melhorar e renovar as proacuteprias atuaccedilotildees agraves vezes insuspeitas ainda que claras e evidentes para os alheios agrave dita instituiccedilatildeordquo (GARCIacuteA LOBO 2010 p 13)

A comunicaccedilatildeo pela administraccedilatildeo tributaacuteria sobre objetivos ideacuteias e iniciativas que precisam

ser interpretadas e devolvidas de forma operativa eacute fundamental nesta alianccedila entre o sistema tributaacute-

rio e o sistema educacional e deve ter em conta a definiccedilatildeo clara dos objetivos do projeto educativo e

a gestatildeo dos ritmos tradicionalmente distintos da academia e da administraccedilatildeo tributaacuteria

A administraccedilatildeo tributaacuteria deve ter em mente que a assunccedilatildeo de responsabilidade educativa

nova por parte do docente supotildee ganhos e natildeo perdas ao docente que deve contar com um orccedilamen-

to uma estrutura administrativa dentro da administraccedilatildeo tributaacuteria que enlace apoie e colabore com

a estrutura administrativa educacional

A alianccedila entre a administraccedilatildeo educacional e tributaacuteria deve proporcionar oportunidades di-

daacuteticas certas e variadas dentro do curriacuteculo escolar contando com material didaacutetico e com recursos

humanos suficientes e consensualizados com um sistema de recompensas que podem ser materiais

ou pelo menos simboacutelica para os docentes Nesta alianccedila a previsatildeo de um sistema de avaliaccedilatildeo con-

tinuada da accedilatildeo e dos recursos que proporcione seguranccedila e credibilidade a todos atores implicados

no processo ante si ante aos destinataacuterios do programa e ante a hierarquia administrativa

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

426

Eacute importante enfatizar a lentidatildeo mediaccedilatildeo e constancia para que a intervenccedilatildeo seja efetiva

porque a interrupccedilatildeo significa retrocesso porque se perde a rede os equipamentos e oportunidades

Aleacutem disso definidos os objetivos do projeto educacional cabe a administraccedilatildeo tributaacuteria sem perder

o controle ceder parte do protagonismo aos profissionais da administraccedilatildeo educacional delegando

aspectos teacutecnicos e se reservando o papel de impulso acompanhamento da implementaccedilatildeo e apoio

ao processo em todas as suas fases A soberania e as caracteriacutesticas do sistema educacional de cada

paiacutes e de cada circunstacircncia devem ser respeitadas

A tiacutetulo indicativo a recomendaccedilatildeo eacute pela formalizaccedilatildeo de um termo de colaboraccedilatildeo como

marco juriacutedico e orccedilamentaacuterio para implementar o projeto com a constituiccedilatildeo de um grupo misto

de trabalho educacional-tributaacuterio com representaccedilatildeo partidaacuteria de expertos A revisatildeo do projeto

poliacutetico0pedagoacutegico e das estruturas curriculares para encontrar o lugar ideal da educaccedilatildeo fiscal

dentro dele e do desenvolvimento do desenho didaacutetico com grupos de professores de diferentes

instituiccedilotildees e definiccedilatildeo das necessidades de formaccedilatildeo do professorado e do material didaacutetico neces-

saacuterio e pertinente para a educaccedilatildeo fiscal e o seu sistema de avaliaccedilatildeo Os professores precisam as-

sim como os servidores educaccedilatildeo continuada e redes de capacitaccedilatildeo permanente (GARCIacuteA LOBO

2010 p 13)

Desde o claacutessico ldquoUnderstanding Taxesrdquo norteamericano de 1954 passando pela Europa a edu-

caccedilatildeo fiscal na Ameacuterica Latina tambeacutem eacute um tema da agenda puacuteblica Apesar da complexidade do

fenomeno fiscal no contexto latinoamericano ldquomelhorou a comunicaccedilatildeo com o cidadatildeo para tentar

conhecer as suas necessidades e brindar-lhe um serviccedilo melhor e atenccedilatildeo para facilitar que cumpra

suas obrigaccedilotildees fiscais o que requer ferramentas pedagoacutegicas especiacuteficas proacuteprias das praacuteticas e

estrateacutegias da administraccedilatildeo educacional para que tenhamos tambeacutem um conteuacutedo atitudinal de

responsabilidade e compromisso com o bem comum por meio da formaccedilatildeo sobre valores princiacutepios

normas e atitudes que esperamos na vida democraacutetica

ldquoO ensino da cidadania eacute chave na hora de compreender a cultura fiscal de um paiacutes eacute impor-

tante que se relacionem direitos e deveres dos cidadatildeos na construccedilatildeo da democraciardquo A cultura fiscal

2 ldquoNo seminaacuterio do Conselho Nacional de Politica Fazendaria (Confaz) a respeito da ldquoAdministraccedilatildeo Tributariardquo realizado na cidade de Fortaleza ndash CE em maio de 1996 foi inserido o tema Educaccedilatildeo Tributaacuteria Nas conclusotildees constou como item de destaque a introduccedilatildeo do ensino nas escolas do programa de consciecircncia tributaacuteria Em setembro desse ano celebrou-se o Convecircnio de Cooperaccedilatildeo Teacutecnica entre a Uniatildeo os Estados e o Distrito Federal No anexo ao texto do acordo entre as inuacutemeras atividades de cooperaccedilatildeo constou a elaboraccedilatildeo e a implementaccedilatildeo de um programa nacional permanente de conscientizaccedilatildeo tributaacuteria para ser desenvolvido nas unidades da Federaccedilatildeo Em reuniatildeo de julho de 1997 o Confaz apro-vou a criaccedilatildeo do Grupo de Trabalho de Educaccedilatildeo Tributaacuteria (GET) constituido por representantes do Ministeacuterio da Fazenda (Gabinete do Ministro Secretaria da Receita Federal Escola de Administraccedilatildeo Fazendaacuteria ndash Esaf) das Secretarias de Fazen-da Financcedilas ou Tributaccedilatildeo dos Estados e do Distrito Federal A Portaria n 35 de 27 de fevereiro de 1998 do Ministeacuterio da Fazenda que oficializou o grupo de trabalho formulou como seus objetivos promover e coordenar as accedilotildees necessaacuterias agrave elaboraccedilatildeo e a implementaccedilatildeo de um programa nacional permanente de educaccedilatildeo tributaacuteria e acompanhar as atividades do Grupo de Educaccedilatildeo Tributaacuteria nos Estados ndash GETE Em marccedilo de 1999 passaram a integrar o grupo representantes da Secretaria do Tesouro Nacional e do Ministeacuterio da Educaccedilatildeo Em julho do mesmo ano tendo em vista a abrangencia do

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

427

se soma agrave formaccedilatildeo eacutetica e cidadatilde consciente da funccedilatildeo social dos tributos da importancia da trans-

parencia e da gestatildeo adequada do gasto puacuteblico

Na Ameacuterica Latina os grupos que receberam maior atenccedilatildeo foram os estudantes do ensino

fundamental e meacutedio No Brasil destacam-se o Observatoacuterio Social de Maringaacute o Programa Nacional

de Educaccedilatildeo Fiscal e o Curso de ldquoEducaccedilatildeo Fiscal e Cidadaniardquo realizado no marco do Programa de

Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

Desloquemos a nossa atenccedilatildeo para o Estado do Cearaacute para ver como estes princiacutepios ateacute agora

vistos vatildeo se materializando

2 EDUCACcedilAtildeO FISCAL NO CEARAacute

O Estado do Cearaacute liacuteder brasileiro na arte da educaccedilatildeo fiscal2 - este E-book comemora os 15

anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal (PEF) - conscientiza os cidadatildeos sobre o papel econocircmico e

social dos tributos ldquoEconocircmico quando se volta agrave funccedilatildeo de otimizaccedilatildeo da receita puacuteblica social

quando se volta para aplicaccedilatildeo desses recursos objetivando beneficiar a populaccedilatildeordquo (MOTA 2007)

Respeitar esses princiacutepios significa tambeacutem aplicar corretamente os recursos arrecadados

Ao descrevermos exemplos da poliacutetica de educaccedilatildeo fiscal como no Estado do Cearaacute percebe-

mos que ela se fundamenta no Tiacutetulo I da Constituiccedilatildeo Federal do Brasil nos princiacutepios fundamentais

da Repuacuteblica a soberania a cidadania a dignidade da pessoa humana os valores sociais do trabalho

e da livre iniciativa e o pluralismo poliacutetico

A Sefaz trabalha com a ideia de ldquoinformaccedilatildeo e conhecimento para a cidadaniardquo e assim ajuda

positivamente a concretizar a nossa Constituiccedilatildeo preparando para o exerciacutecio da cidadania Esta cul-

tura pode colaborar de forma positiva para a superaccedilatildeo da resistecircncia do brasileiro ao fisco ao dever

de pagar tributos

Segundo Luiza Mota (2007) o tema da educaccedilatildeo fiscal tem circulado nas escolas e nas cam-

panhas educativas junto agrave sociedade chamando atenccedilatildeo para o cumprimento das obrigaccedilotildees fiscais

pelos cidadatildeos contribuintes com resultados positivos poreacutem ldquoa inserccedilatildeo do tema tributaacuterio na vida

profissional dos funcionaacuterios puacuteblicos em especial dos servidores dos fiscos nos curriacuteculos escolares

de algumas disciplinas e no dia a dia das empresas das entidades de classe e associaccedilotildeesrdquo natildeo tem

conseguido formar a maioria da opiniatildeo social ldquopara romper com a premissa defesa dos sonegadores

de impostos e criacutetica ao papel arrecadador do Estadordquo

programa que natildeo se restringe apenas aos tributos mas que aborda tambeacutem as questotildees da alocaccedilatildeo dos recursos puacutebli-cos e da sua gestatildeo o Confaz aprovou a alteraccedilatildeo de sua denominaccedilatildeo que passou a ser Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal ndash PNEF Assim o Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal surgiu dessa relaccedilatildeo histoacuterica buscando a harmonia entre Estado e sociedade a partir do entendimento da necessidade do financiamento da coisa publica pois sem dinheiro natildeo haacute como se prestar serviccedilos puacuteblicos Por outro lado o Programa instrumentaliza a sociedade acerca dos meiosmecanismos disponiacuteveis para acompanhar a aplicaccedilatildeo dos recursos arrecadados favorecendo o exerciacutecio efetivo da cidadaniardquo BRASIL 2009 p 27 SILVA MOTA MACHADO 2010 p 170-182

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

428

A ausecircncia do tema tributaacuterio ndash receita e despesa ndash na vida profissional de servidores e nos cur-

riacuteculos escolares eacute fato O ensino formal presencial semi presencial virtual continuado deve assumir

a sua parcela republicana e difundir conhecimento sobre o papel do fisco e sobre o papel dos toma-

dores de decisatildeo da despesa puacuteblica O ensino superior pode ter um papel proeminente na difusatildeo

dessas teses e na habilitaccedilatildeo para esta praacutetica profissionalizante

A inserccedilatildeo do tema tributaacuterio e financeiro nos curriacuteculos e disciplinas eacute fundamental para o de-

senvolvimento da livre iniciativa e para a inserccedilatildeo soberana do Brasil no mundo globalizado

A inserccedilatildeo do tema tributaacuterio e financeiro nos projeto poliacutetico pedagoacutegico e nos curriacuteculos e

disciplinas da graduaccedilatildeo e poacutes graduaccedilatildeo eacute fundamental para o preparo da cidadania Se entendemos

a educaccedilatildeo fiscal como um processo de inserccedilatildeo de valores na sociedade com o retorno de longo

prazo teremos colaborado para a formaccedilatildeo de cidadatildeos ldquoconscientes do seu dever de cumprimento

das obrigaccedilotildees fiscais e do seu direito ao exerciacutecio da cidadania mediante a cobranccedila da coerente

destinaccedilatildeo dos recursos provenientes dos tributos arrecadados pelo Estadordquo

Portanto eacute voz no Cearaacute e eacute voz no Brasil demanda para ldquoformaccedilatildeordquo e preparo para a cidada-

nia O ensino formal natildeo deve se furtar ao debate e praacutexis ldquoAs pessoas necessitam de informaccedilotildees

para conhecer melhor o trabalho dos que arrecadam e aplicam recursos no fornecimento dos serviccedilos

puacuteblicosrdquo Como bem dito ldquoa educaccedilatildeo fiscal deve caminhar nesse sentido informar para que todos

conheccedilam educar para que todos pratiquemrdquo O Estado aleacutem de fornecer condiccedilotildees sociais baacutesicas

deve ser provedor de informaccedilotildees e valores promotor do preparo para o exerciacutecio da cidadania por

cada membro da sociedade um a um e natildeo na potecircncia do Estado

3 A EDUCACcedilAtildeO FISCAL COMO PROGRAMA E PROJETO DE ENSINAGEM

A educaccedilatildeo fiscal se insere em um amplo projeto educativo que objetiva o bem-estar social re-

sultante da consciencia cidadatilde e da construccedilatildeo criacutetica de conhecimentos especiacuteficos sobre os direitos

e deveres do cidadatildeo para efetivaccedilatildeo do princiacutepio constitucional da dignidade humana (BRASIL 2009)

Esses conceitos alicerccedilam uma educaccedilatildeo capaz de contribuir para a construccedilatildeo da cidadania pautada

pela solidariedade eacutetica transparencia e responsabilidade fiscal e social onde o ser humano eacute ldquoante-

riorrdquo ao Estado contemplando reflexotildees sobre o crescimento economico a distribuiccedilatildeo de renda e a

relaccedilatildeo homem-natureza no desenvolvimento dos paiacuteses (BRASIL 2009 p 1)

A educaccedilatildeo eacute um fenocircmeno social e repercute no espaccedilo social e cultural Educar para a auto-

nomia para a participaccedilatildeo e para o controle social significa preparar para a cidadania

Este conhecimento requer a compreensatildeo dos valores diretrizes e missatildeo do Programa de Edu-

caccedilatildeo Fiscal No presente estudo interessa aprofundar o tema das possibilidades de inserccedilatildeo na edu-

caccedilatildeo particularmente na educaccedilatildeo superior O preparo da cidadania no contexto do ensino formal

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

429

superior assim chamado requer uma escola uma faculdade um centro uma universidade em sintonia

com o seu tempo de projetos pedagoacutegicos e institucionais Alternativas de gestatildeo democraacutetica e de

inserccedilatildeo curricular das temaacuteticas da educaccedilatildeo fiscal nas disciplinas da graduaccedilatildeo e poacutes-graduaccedilatildeo no

Brasil que trabalhe na perspectiva da ampliaccedilatildeo do bem estar social fortalecimento da cidadania e

construccedilatildeo criacutetica de conhecimentos sobre direitos e deveres proacuteprios do conceito de cidadatildeo huma-

namente digno satildeo temas da modernidade latino-americana

4 A EDUCACcedilAtildeO PARA A AUTONOMIA E O ESPACcedilO ESCOLAR

A escola eacute um espaccedilo social para aprender ldquoa conviver a ser a fazer a conhecer e a propiciar

a troca a imaginaccedilatildeo a interaccedilatildeo a investigaccedilatildeo e a partilhardquo O processo de aprendizagem tambeacutem

envolve a construccedilatildeo de conteuacutedos dividindo e reconhecendo o conhecimento em diversas aacutereas do

conhecimento

O estudante aprende a aprender exercitando suas compreensotildees e habilidades Aprender a

fazer requer competencias que propiciem ao individuo enfrentar situaccedilotildees e problemas sociais e

de trabalho

A educaccedilatildeo fiscal no contexto social seja no trabalho na famiacutelia eou na comunidade implicam

a descoberta do outro e o exerciacutecio do respeito ldquoToda essa relaccedilatildeo interpessoal conduz o sujeito a

sua descoberta interior como um ser total sensiacutevel inteligente autonomo e capaz de formular seus

proacuteprios juiacutezos de valor de forma criacutetica Isso eacute aprender a serrdquo

O real valor da imaginaccedilatildeo das praacuteticas luacutedicas do multiculturalismo e das muacuteltiplas lingua-

gens requer saber pensar de forma autonoma ldquoeacute saber pensar e eacute sobretudo saber intervirrdquo As

formas de organizaccedilatildeo do conhecimento escolar estaacute diante de um desafio teacutecnico e requer pro-

cedimento metodoloacutegico que incorpore o ser humano o individuo o cidadatildeo Resolver a questatildeo

fundamental da educaccedilatildeo de hoje pode significar orientaccedilatildeo ldquopara as transformaccedilotildees e promoccedilatildeo

da inclusatildeo socialrdquo (BRASIL 2009)

Uma educaccedilatildeo que prepara para a cidadania deve refletir diretamente na vida das pessoas e das

instituiccedilotildees da sociedade pois leva ao conhecimento dos princiacutepios que fundamentam as praticas so-

ciais estas dependentes da educaccedilatildeo fiscal no contexto social da democracia ldquoreafirmando os valores

culturais e artiacutesticos sejam eles locais regionais ou nacionais e possibilitando o resgate da dignidade

humana por meio de novos saberesrdquo

As Diretrizes Curriculares Nacionais (BRASIL 1996) para a educaccedilatildeo baacutesica e superior vigentes

apontam para variedades curriculares condicionadas apenas as accedilotildees pedagoacutegicas pelo princiacutepio eacuteti-

co ndash da autonomia da responsabilidade da solidariedade e do respeito ao bem comum pelo princiacutepio

esteacutetico ndash da sensibilidade da criatividade e da diversidade de manifestaccedilotildees artiacutesticas e culturais e

pelo princiacutepio poliacutetico ndash dos direitos e deveres de cidadania do exerciacutecio da criticidade e do respeito a

ordem democraacutetica

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

430

Eacute interessante observar que no momento em que o professor se conscientizar de que tambeacutem

eacute um sujeito critico e participativo do processo educativo iraacute buscar capacitaccedilatildeo e em contrapartida

ldquoseraacute um sujeito mais exigente no que se refere ao apoio da instituiccedilatildeo e do Estadordquo Eacute no espaccedilo da

educaccedilatildeo que natildeo se resume ao espaccedilo escolar que se deve viver a democracia seguindo princiacutepios

eacutetico esteacutetico e poliacutetico na educaccedilatildeo formamos haacutebitos e atitudes individuais e coletivas ldquoestimulan-

do crianccedilas jovens e adultos a participarem de movimentos sociais que buscam uma vida mais justa e

solidaacuteria para o resgate da dignidade humanardquo

Convivendo com essa praacutetica educativa e privilegiando os referidos princiacutepios a educaccedilatildeo fiscal

ajuda no preparo para a cidadania e para o seu exerciacutecio ldquosensibilizando para funccedilatildeo socioeconocircmica

do tributo com vistas ao controle social na aplicaccedilatildeo dos recursos puacuteblicosrdquo (BRASIL 2009)

5 UM PROGRAMA QUE PREPARA PARA A CIDADANIA

O Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal (PNEF) objetiva sensibilizar o cidadatildeo para a funccedilatildeo

socioeconocircmica do tributo levando conhecimentos aos cidadatildeos sobre gestatildeo de puacuteblicas puacutebli-

cas incentivando o acompanhamento pela sociedade e pelos estudantes universitaacuterios da aplica-

ccedilatildeo dos recursos puacuteblicos criando entatildeo as condiccedilotildees para uma relaccedilatildeo harmoniosa entre o Estado

e o cidadatildeo

O PNEF ldquoeacute um programa de acircmbito nacional integrado pelos Ministeacuterios da Educaccedilatildeo Receita

Federal do Brasil Secretaria do Tesouro Nacional Escola Superior de Administraccedilatildeo Fazendaacuteria (Esaf)

e Secretarias de Fazenda e de Educaccedilatildeo estaduaisrdquo (BRASIL 2000)

Um Estado democraacutetico de direito espera de fato que o cidadatildeo seja preparado para conhecer

o ciclo da formulaccedilatildeo implementaccedilatildeo e avaliaccedilatildeo da gestatildeo de poliacuteticas puacuteblicas preparado para

conhecer os seus direitos e deveres e sensibilizado sobre a funccedilatildeo socieconocircmica do tributo harmo-

nizando assim a relaccedilatildeo entre ele a sociedade e o Estado

O ensino formal superior deve difundir valores e princiacutepios que preparem para a cidadania para

conhecer a administraccedilatildeo puacuteblica e a funccedilatildeo socieconocircmica do tributo visando a harmonizaccedilatildeo na

relaccedilatildeo entre o Estado e o cidadatildeo

O objetivo do PNEF eacute ldquopromover e institucionalizar a Educaccedilatildeo Fiscal para o efetivo exerciacutecio da

cidadania visando ao constante aprimoramento da relaccedilatildeo participativa e consciente entre o Estado e

o cidadatildeo e da defesa permanente das garantias constitucionaisrdquo A justificativa do Programa aponta

a necessidade de compreensatildeo da funccedilatildeo socioeconomica do tributo e da alocaccedilatildeo dos recursos puacute-

blicos da estrutura e funcionamento da administraccedilatildeo publica pautada por princiacutepios e normas e da

busca de estrateacutegias e meios para o exerciacutecio do controle democraacutetico

A implantaccedilatildeo do Programa estaacute a cargo do Grupo de Trabalho de Educaccedilatildeo Fiscal (GEF) com-

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

431

posto por representantes de oacutergatildeos federais estaduais e municipais a quem compete definir a politica

e discutir analisar propor monitorar e avaliar as accedilotildees do Programa

Existe um material pedagoacutegico composto por quatro Cadernos elaborados com o objetivo de

contribuir para a formaccedilatildeo permanente do individuo na perspectiva da maior participaccedilatildeo social nos

processos de geraccedilatildeo aplicaccedilatildeo e fiscalizaccedilatildeo dos recursos puacuteblicos Adequar conteuacutedos aos fatos

sociais poliacuteticos e economicos que constroem o dinamismo da histoacuteria bem como incorporar temas

relacionados agraves novas bases de financiamento da educaccedilatildeo baacutesica e aos avanccedilos promovidos pelo po-

der publico e pela sociedade na transparencia e no controle das financcedilas do Estado deve ser levados

em consideraccedilatildeo na formaccedilatildeo de multiplicadores

O Caderno 01 aborda a educaccedilatildeo fiscal no contexto social apontando as diretrizes objetivos

e abrangecircncia do contexto da educaccedilatildeo fiscal e da educaccedilatildeo puacuteblica O Caderno 02 cuida da relaccedilatildeo

Estado-Sociedade suscitando temas relativos a organizaccedilatildeo da vida em sociedade e suas implicaccedilotildees

na garantia do Estado Democraacutetico de Direito e da cidadania O Caderno 03 cuida da funccedilatildeo social

dos tributos destacando a sua importancia na atividade financeira do Estado para a manutenccedilatildeo e

continuidade das politicas puacuteblicas para a melhoria das condiccedilotildees de vida do cidadatildeo O Caderno 04

trata da gestatildeo democraacutetica dos recursos puacuteblicos evidenciando temas relativos ao orccedilamento ao

compromisso social e fiscal do gestor publico e ao exerciacutecio do controle social (BRASIL 2009)

6 FUNDAMENTOS PARA UMA EDUCACcedilAtildeO FISCAL

A educaccedilatildeo para a cidadania e o preparo da personalidade pressupotildee respeito agrave muacuteltiplas cul-

turas etnias e induz agrave reflexatildeo sobre as possibilidades de formaccedilatildeo integral do ser humano do desen-

volvimento da personalidade devendo se inserir de forma consciente no contexto histoacuterico

Uma das matrizes do PNEF como vimos destaca o papel economico e social do sistema tribu-

taacuterio e dos orccedilamentos puacuteblicos Educando para a cidadania chamamos atenccedilatildeo para o fato de que

todos noacutes pagamos tributo e em contrapartida temos o direito de participar do processo decisoacuterio de

alocaccedilatildeo dessa receita pela formaccedilatildeo da despesa puacuteblica

A formaccedilatildeo da receita e da despesa puacuteblica devem ser conjugadas com a participaccedilatildeo conscien-

te do cidadatildeo adquirida no processo educativo do ensino formal com destaque para o ensino superior

O ensino superior eacute um contexto privilegiado para a tomada de consciencia sobre receita e

despesa puacuteblica A educaccedilatildeo fiscal prepara para o exerciacutecio da cidadania ligada aos fundamentos e

princiacutepios da Constituiccedilatildeo Federal de 1988 pedindo ldquovontade de Constituiccedilatildeordquo (HESSE 1991) para

que juntos possamos construir uma sociedade livre justa e solidaria combatendo a pobreza e a ex-

clusatildeo social

Esses objetivos fundamentais e principioloacutegicos da Repuacuteblica brasileira demandam uma edu-

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

432

caccedilatildeo de qualidade acessiacutevel e permanente a todos segundo a capacidade de cada um um sistema

tributaacuterio capaz de tributar segundo a capacidade economica de cada cidadatildeo exige que aquele que

tem mais renda maior patrimonio ou consome produtos de luxosupeacuterfluos deve pagar mais tributos

e um processo orccedilamentaacuterio que garanta a efetiva participaccedilatildeo popular

A democratizaccedilatildeo das informaccedilotildees sobre financcedilas puacuteblicas permitiratildeo o acompanhamento e

o controle do gasto publico A partir desta matriz se pode auferir se as despesas puacuteblicas necessa-

riamente orccedilamentaacuterias e contabilizadas foram aplicadas conforme as prioridades do povo (MULLER

2000) A educaccedilatildeo fiscal permite educando para a cidadania a compreensatildeo da dinacircmica e da impor-

tancia desses processos para a vida com possibilidade de mudarmos paradigmas

Eacute mais honesto explicar que o tributo por meio da contribuiccedilatildeo equitativa de todos e todas eacute o

meio para construirmos uma sociedade mais justa o que soacute sera possiacutevel com o conhecimento com-

preensatildeo e consciecircncia adquiridos pela educaccedilatildeo para a cidadania sobre a necessidade do controle

popular do gasto publico

Essa consciecircncia estimula a mudanccedila de comportamento em relaccedilatildeo a sonegar e mal-versar recursos puacuteblicos atos que passam a ser repudiados como crimes sociais uma vez que retiram dos cidadatildeos que mais dependem do Estado as condiccedilotildees miacutenimas para que tenham dignidade e esperanccedila de construir seu futuro com autonomia e liberdade [hellip] A construccedilatildeo de uma naccedilatildeo livre justa e solidaacuteria depende de nossa participaccedilatildeo conscienterdquo (BRASIL 2009 p 25)

7 VALORES E MISSAtildeO DA EDUCACcedilAtildeO FISCAL E DO PNEF

Satildeo valores da educaccedilatildeo fiscal os seguintes ldquosuperioridade do homem sobre o Estado Liberda-de Igualdade Justiccedila socialrdquo (BRASIL 2009)

Os mesmos valores entram no PNEF comprometidos com a construccedilatildeo da cidadania com a

solidariedade a eacutetica a transparencia a responsabilidade fiscal e o controle social expressando as

seguintes ldquoideias-forccedilardquo

bull Na educaccedilatildeo o exerciacutecio de uma praacutetica educativa formadora de um ser humano socialmente

consciente

bull Na cidadania possibilitar e estimular o crescente poder do cidadatildeo quanto ao controle demo-

craacutetico do Estado incentivando a participaccedilatildeo individual e coletiva na definiccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas e

na elaboraccedilatildeo das leis para sua execuccedilatildeo

bull Na eacutetica uma conduta responsaacutevel individual e coletiva que valorize o bem comum e

bull Na poliacutetica uma gestatildeo puacuteblica eficiente transparente e honesta quanto agrave captaccedilatildeo alocaccedilatildeo

e aplicaccedilatildeo dos recursos puacuteblicos

Estes mesmos valores da educaccedilatildeo fiscal e do Programa Nacional devem permear as institui-

ccedilotildees gestoras do PNEF e isto ocorre na medida em que a praacutexis mostra a ldquorealizaccedilatildeo de praticas de-

mocraacuteticas em permanente integraccedilatildeo com todos os segmentos sociaisrdquo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

433

A missatildeo da educaccedilatildeo fiscal eacute estimular a mudanccedila de valores crenccedilas e culturas dos indiviacutedu-

os na perspectiva da formaccedilatildeo de um ser humano integral apto ao efetivo exerciacutecio de cidadania e

preparado para transformaccedilotildees sociais contribuindo permanentemente para o desenvolvimento pes-

soal do individuo com educaccedilatildeo para a cidadania e a tomada de consciecircncia sobre direitos e deveres

sobre o valor social do tributo e o controle social do Estado democraacutetico

8 DIRETRIZES DO PNEF

Citaremos novamente que ldquoa Educaccedilatildeo Fiscal deve caminhar nesse sentido informar para que

todos conheccedilam educar para que todos pratiquemrdquo

O exerciacutecio da cidadania devera voltar-se para a organizaccedilatildeo mobilizaccedilatildeo e o estiacutemulo agrave parti-

cipaccedilatildeo social envolvendo questotildees tributaacuterias e financeiras em todos os poderes e esferas de poder

do Estado brasileiro

A elaboraccedilatildeo e execuccedilatildeo de planos estrateacutegicos programas e projetos cujos resultados espe-

rados e impactos desejados devem ser monitorados e avaliados quantitativa e qualitativamente por

sistema nacional e local eacute o que se espera da politica institucional de cada instituiccedilatildeo gestora de

poliacuteticas puacuteblicas

O elemento pedagoacutegico ganha um contorno peculiar nas diretrizes quando aponta para o fato

de que a educaccedilatildeo formal como mecanismo de transformaccedilatildeo social deveraacute se nortear pelos princiacute-

pios politico esteacutetico e eacutetico das Diretrizes Curriculares Nacionais pela legislaccedilatildeo educacional vigente

respeitando as diretrizes nacionais estaduais e municipais e pela autonomia das instituiccedilotildees de ensino

A alianccedila entre a administraccedilatildeo educacional e o Fisco deve observar as diretrizes do Programa

e seguir as linhas de referenciais nacionais definidas em documentos orientadores especiacuteficos de-

vendo haver permanente socializaccedilatildeo nacional do material produzido e das experiencias realizadas

(NERLING 2014)

Educar para a praacutetica da liberdade significa educar para o desenvolvimento da pessoa humana

para a cidadania e preparar para o mundo do trabalho

No Brasil o tema da educaccedilatildeo fiscal encontra na Ordem Interministerial 413 de 31 de dezem-

bro de 2002 o instrumento de preparo para a cidadania que envolve todos os Estados e o DF da Fe-

deraccedilatildeo sob a coordenaccedilatildeo da Esaf (BALTAZAR AQUINO 2010)

9 OBJETIVOS E ABRANGEcircNCIA DO PNEF

O objetivo geral do PNEF eacute promover e institucionalizar a educaccedilatildeo fiscal para o efetivo exerciacute-

cio da cidadania Entre os objetivos especiacuteficos estatildeo a disseminaccedilatildeo de informaccedilotildees e conceitos sobre

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

434

a gestatildeo fiscal favorecendo a compreensatildeo sobre a necessaacuteria intensificaccedilatildeo da participaccedilatildeo social

nos processos de geraccedilatildeo aplicaccedilatildeo e fiscalizaccedilatildeo dos recursos puacuteblicos e accedilotildees permanentes de sen-

sibilizaccedilatildeo em todos os entes puacuteblicos estatais e natildeo estatais estimulando a praacutetica interdisciplinar nas

accedilotildees de educaccedilatildeo fiscal e na capacitaccedilatildeo continuada de multiplicadores

O Programa deve ter uma abrangencia nacional focando prioritariamente em estudantes e

profissionais da educaccedilatildeo baacutesica A formaccedilatildeo dos servidores desenvolvendo conteuacutedos e praacuteticas

sobre direitos e deveres reciacuteprocos na relaccedilatildeo Estadondashcidadatildeo tambeacutem eacute uma prioridade abrangen-

te do Programa

O Programa eacute amplo e possui cinco aacutereas de abrangecircncia (BALTAZAR AQUINO 2010 p 73)

para que sejam atendidos todos os brasileiros e todas as brasileiras em qualquer estagio de sua vida

Destaquemos entatildeo as aacutereas de abrangecircncia prioritaacuterias do Programa

1 Os estudantes do ensino fundamental garantindo-lhes acesso aos conceitos da Educaccedilatildeo

Fiscal

2 Os estudantes do ensino meacutedio com aprofundamento maior dos assuntos

3 Os servidores puacuteblicos num processo de sensibilizaccedilatildeo e envolvimento no Programa

4 Os universitaacuterios oportunizando o acompanhamento do cidadatildeo em toda sua vida es-

tudantil

5 A sociedade em geral para abranger aqueles que natildeo teriam a chance de voltar mais aos

bancos escolares utilizando de preferencia as organizaccedilotildees a que pertencem como clubes associa-

ccedilotildees sindicatos clubes de serviccedilo e ONGs entre outras

Considerando as aacutereas de abrangecircncia o Programa pode ser desenvolvido em todos os niacuteveis

de ensino e faixas etaacuterias para que a sociedade em geral - o senso comum - (SANTOS 2002) possa ter

um melhor entendimento da organizaccedilatildeo da estrutura e do funcionamento da administraccedilatildeo puacutebli-

ca da funccedilatildeo socioeconomica dos tributos da aplicaccedilatildeo dos recursos puacuteblicos das estrateacutegias e dos

meios para o exerciacutecio do controle democraacutetico

A difusatildeo desses conceitos contribui para que professores lideranccedilas comunitaacuterias estudantes

universitaacuterios entre outros possam realizar seu papel de modo cada vez mais consciente e responsaacutevel

Recordemos por fim que o Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal se propotildee a

bull Ser um instrumento de fortalecimento permanente do Estado democraacutetico

bull Contribuir para fortalecer os mecanismos de transformaccedilatildeo social por meio da educaccedilatildeo

bull Difundir informaccedilotildees que possibilitem o desenvolvimento da personalidade e o preparo para

a cidadania

bull Ampliar a participaccedilatildeo popular na gestatildeo democraacutetica do Estado

bull Contribuir para aperfeiccediloar a eacutetica dos valores e missotildees na administraccedilatildeo puacuteblica e na

sociedade

bull Harmonizar a relaccedilatildeo Estado-cidadatildeo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

435

bull Desenvolver a consciecircncia criacutetica da sociedade para o exerciacutecio do controle social

bull Aumentar a eficiecircncia a eficaacutecia e a transparecircncia do Estado

bull Aumentar a responsabilidade fiscal

bull Obter o equiliacutebrio fiscal

bull Combater e prevenir a corrupccedilatildeo

bull Promover a reflexatildeo sobre nossas praacuteticas sociais

bull Melhorar o perfil do servidor empregado agente ou funcionaacuterio puacuteblico

bull Erradicar a pobreza e as desigualdades sociais

10 O ESPACcedilO PEDAGOacuteGICO E A VINCULACcedilAtildeO AO PROGRAMA A CIDADE CONSTITUCIONAL COMO ESTUDO DE CASO

Entre as estrateacutegias da educaccedilatildeo fiscal como vimos estaacute o ensino superior Os estudos apon-

tam que as principais accedilotildees conhecidas vecircm do campo do ensino fundamental e meacutedio

Existem experiecircncias relevantes como aquela da Universidade Estadual de Maringaacute onde na

lavra Magnacircnima do Dr Marciacutelio Hubner de Miranda Neto nasceu a primeira obra teatral brasileira

que retrata com humor e ironia realidades e verdades sobre a importacircncia dos tributos e costumes

dos cidadatildeos e gestores do dinheiro puacuteblico no Brasil (PIALARISSI 2010 p 185)

Outras iniciativas vem ganhando visibilidade e alinhamento estrateacutegico com o PNEF A expe-

riecircncia convencionada chamar ldquoA cidade constitucionalrdquo tambeacutem incorpora como disciplina de gra-

duaccedilatildeo que eacute a temaacutetica da educaccedilatildeo fiscal em cooperaccedilatildeo teacutecnica com a Escola de Administraccedilatildeo

Fazendaacuteria (Esaf) A cidade constitucional eacute um Projeto de duraccedilatildeo continuada da Universidade de

Satildeo Paulo em Cooperaccedilatildeo Teacutecnica com a Escola Superior de Administraccedilatildeo Fazendaacuteria A disciplina

fomenta metodologias ativas de ensinagem no ensino superior e flexibilizaccedilatildeo curricular

Ofertada na Capital da Repuacuteblica como disciplina de graduaccedilatildeo ensina com pesquisa e exten-

satildeo valorizando conteuacutedos cognitivos e atitudinais dos participantes estudantes universitaacuterios de todo

o Brasil A ideia eacute antiga ldquoAquele que lecirc muito e anda muito vecirc muito e sabe muitordquo (CERVANTES)

O roteiro envolve vaacuterias estrateacutegias de trabalho docente como aula expositiva dialogada mapa

conceitual estudo dirigido soluccedilatildeo de problemas dramatizaccedilatildeo seminaacuterio estudo de caso painel

estudo de meio Durante as visitas os professores e monitores atendem e envolvem os alunos para

que procurem participar ativamente colaborando na conduccedilatildeo dos grupos O momento da visitaccedilatildeo

eacute uacutenico Nesse processo todos estatildeo interagindo e aprendendo Por isso eacute indispensaacutevel registrar as

observaccedilotildees dos colegas solicitar explicaccedilotildees enfim interagir no processo educacional e isso de-

pende de todos os envolvidos (professores alunos e servidores) Recomendamos preencher fichas de

avaliaccedilatildeo para apreciaccedilatildeo das visitas e seminaacuterios oferecendo sugestotildees se for o caso

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

436

De volta agrave Universidade eacute fundamental avaliar a experiecircncia verificando o que foi assimilado

e o que poderia ter sido melhor esclarecido Eacute importante natildeo findar as atividades apoacutes a visitaccedilatildeo

Os acadecircmicos tecircm oportunidade de manifestar a assimilaccedilatildeo das atividades pela produccedilatildeo de tex-

tos artigos jornaliacutesticos e cientiacuteficos fotografias poesias frases e desenhos sobre Brasiacutelia e sobre o

que entendem ser uma ldquocidade constitucionalrdquo podendo atingir com criatividade diversos campos

de conhecimento

O Projeto permite aos acadecircmicos obter documentaccedilatildeo direta (documentos informaccedilotildees leis)

e tambeacutem fontes bibliograacuteficas Eacute momento de experimentar as teacutecnicas de observaccedilatildeo direta intensi-

va a exemplo da observaccedilatildeo ndash assistemaacutetica e sistemaacutetica natildeo participante e participante individual

e em equipe na vida real As entrevistas e seu preparo as medidas de opiniatildeo e as atitudes a histoacuteria

de vida e a anaacutelise de conteuacutedo cognitivo e atitudinal satildeo teacutecnicas caras para o nosso Projeto

A experiencia do cidade constitucional contribui para formar um perfil profissiograacutefico no

egresso e desperta a vocaccedilatildeo para as carreiras do Estado das instituiccedilotildees dos entes e das entidades

puacuteblicas que formam a organizaccedilatildeo do Estado e dos Poderes da Repuacuteblica brasileira

A educaccedilatildeo fiscal entra com os temas do preparo para a cidadania apregoado no artigo 205

da Constituiccedilatildeo Federal o desenvolvimento da personalidade e o preparo para o trabalho Valoriza-

mos a cultura ciacutevica os siacutembolos e as datas comemorativas da Repuacuteblica e o calendaacuterio ciacutevico-cul-

tural Buscamos a ldquoSemana da Paacutetriardquo Queremos refletir e conversar sobre os siacutembolos nacionais os

heroacuteis da paacutetria o civismo e a cidadania dos modernos Sobre a importacircncia geopoliacutetica da Capital

da Repuacuteblica e a modernidade - esteacutetica modernista - dos palaacutecios e museus Valorizamos a diver-

sidade da riqueza cultural e social da populaccedilatildeo local com suas identidades Ocupar os ambientes

de formulaccedilatildeo implementaccedilatildeo e avaliaccedilatildeo das poliacuteticas puacuteblicas permite compreender melhor os

conceitos de pressatildeo lobby demandas prioridades tomada de decisatildeo implementaccedilatildeo e controle

do Governo Federal e do DF

A disciplina (NERLING ANDRADE 2013) estaacute estruturada e cada participante eacute induzido a tra-

balhar com a loacutegica do sistema operacional orccedilamentaacuterio financeiro patrimonial e contaacutebil da ad-

ministraccedilatildeo puacuteblica dos poderes segundo um planejamento - plano de governo plano diretor plano

plurianual - conjugado com o orccedilamento funcional programaacutetico por meio dos programas projetos

atividades e accedilotildees de interesse da gestatildeo conhecidos como poliacuteticas puacuteblicas

A iniciativa pode atender agraves necessidades de capacitaccedilatildeo da proacutepria administraccedilatildeo para a me-

lhoria da gestatildeo dos programas e projetos que envolvendo a juventude com atenccedilatildeo para os aca-

decircmicos do ensino superior brasileiro reforccedila o controle institucional e social do ciclo de formulaccedilatildeo

implementaccedilatildeo e avaliaccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas e sua duraccedilatildeo continuada

O controle social e o comprometimento acadecircmico com a melhoria continuada da gestatildeo

das poliacuteticas puacuteblicas nos permitem operaccedilotildees de pensamento privilegiadas comparaccedilatildeo resumo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

437

observaccedilatildeo obtenccedilatildeo organizaccedilatildeo classificaccedilatildeo e arquivo dos dados (fotos gravaccedilotildees viacutedeos)

interpretaccedilatildeo criacutetica suposiccedilotildees imaginaccedilatildeo levantamento de hipoacuteteses decisatildeo planejamento e

projetos de pesquisa

Realizaccedilatildeo com certificaccedilatildeo conjunta o Projeto conta com a atenccedilatildeo da Diretoria de Coo-

peraccedilatildeo Teacutecnica e Pesquisa (Dirco) Prof Paulo Mauger com fundamento nos Arts 13 15 e 29 da

Portaria MF nordm 106 de 03062008 utilizando as dependecircncias do Centro Estrateacutegico de Formaccedilatildeo

e Educaccedilatildeo Permanente

A cidade constitucional serve para fortalecer o desenvolvimento da personalidade ciacutevica e da

cidadania ativa por meio do ensino da pesquisa e da extensatildeo universitaacuterias na Semana da Paacutetria na

cidade constitucional no caso Brasiacutelia ndash DF

Eacute uma disciplina de graduaccedilatildeo da Universidade de Satildeo Paulo ofertada na Capital da Repuacuteblica

Por meio da cooperaccedilatildeo teacutecnica experimentamos avaliamos e descobrimos uma metodologia inova-

dora de ensinagem no ensino superior Noacutes aproximamos o ensino e a extensatildeo e com isto colhemos

mais e melhor pesquisa porque o meacutetodo impotildee accedilatildeo

A partir de um procedimento sistematizado com exploraccedilatildeo teacutecnica intensiva e de imersatildeo no

mundo real na vida como ela eacute fora do ambiente tradicional da sala de aula ensinamos aprendendo

com quem faz O projeto foi implementado e vem sendo avaliado ininterruptamente ao longo de 07

anos estando pois mensurada a filosofia da praacutexis3

3 Sobre metodologias ativas e teacutecnicas de ensinagem no ensino superior NERLING 2010 2011 4 Da lavra da Presidenta da Repuacuteblica no Discurso de Posse ldquoEacute portanto tarefa indispensaacutevel uma accedilatildeo renovada efetiva e integrada dos governos federal estaduais e municipais em particular nas aacutereas da sauacutede da educaccedilatildeo e da seguranccedila vontade expressa das famiacutelias brasileiras [hellip] Natildeo vou descansar enquanto houver brasileiros sem alimentos na mesa en-quanto houver famiacutelias no desalento das ruas enquanto houver crianccedilas pobres abandonadas agrave proacutepria sorte O congra-ccedilamento das famiacutelias se daacute no alimento na paz e na alegria E este eacute o sonho que vou perseguir Esta natildeo eacute tarefa isolada de um governo mas um compromisso a ser abraccedilado por toda sociedade Para isso peccedilo com humildade o apoio das instituiccedilotildees puacuteblicas e privadas de todos os partidos das entidades empresariais e dos trabalhadores das universidades da juventude de toda a imprensa e de das pessoas de bem [hellip] Queridas brasileiras e queridos brasileiros junto com a erradicaccedilatildeo da miseacuteria seraacute prioridade do meu governo a luta pela qualidade da educaccedilatildeo da sauacutede e da seguranccedila [] Mas soacute existiraacute ensino de qualidade se o professor e a professora forem tratados como as verdadeiras autoridades da educaccedilatildeo com formaccedilatildeo continuada remuneraccedilatildeo adequada e soacutelido compromisso com a educaccedilatildeo das crianccedilas e jovens Somente com avanccedilo na qualidade de ensino poderemos formar jovens preparados de fato para nos conduzir agrave sociedade da tecnologia e do conhecimento [hellip] Em suma temos que combater a miseacuteria que eacute a forma mais traacutegica de atraso e ao mesmo tempo avanccedilar investindo fortemente nas aacutereas mais sofisticadas da invenccedilatildeo tecnoloacutegica da criaccedilatildeo intelectual e da produccedilatildeo artiacutestica e cultural Justiccedila social moralidade conhecimento invenccedilatildeo e criatividade devem ser mais que nunca conceitos vivos no dia-a-dia da naccedilatildeo [hellip] Mas eacute importante lembrar que o destino de um paiacutes natildeo se resume agrave accedilatildeo de seu governo Ele eacute o resultado do trabalho e da accedilatildeo transformadora de todos os brasileiros e brasileiras O Brasil do futuro seraacute exatamente do tamanho daquilo que juntos fizermos por ele hoje Do tamanho da participaccedilatildeo de todos e de cada um Dos movimentos sociais dos que labutam no campo dos profissionais liberais dos trabalhadores e dos pequenos empreendedores dos intelectuais dos servidores puacuteblicos dos empresaacuterios das mulheres dos negros dos iacutendios e dos jovens de todos aqueles que lutam para superar distintas formas de discriminaccedilatildeo [hellip] Quero estar ao lado dos que trabalham pelo bem do Brasil na solidatildeo amazocircnica na seca nordestina na imensidatildeo do cerrado na vastidatildeo dos pampas Quero estar ao lado dos que vivem nos aglomerados metropolitanos na vastidatildeo das florestas no interior ou no litoral nas capitais e nas fronteiras do Brasil Quero convocar todos a participar do esforccedilo de transformaccedilatildeo do nosso paiacutes Respeitada a autonomia dos poderes e o princiacutepio federativo quero contar com o Legislativo e o Judiciaacuterio e com a parceria de governadores e prefeitos para continuarmos desenvolvendo nosso Paiacutes aperfeiccediloando nossas instituiccedilotildees e fortalecendo nossa democraciardquo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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O alinhamento estrateacutegico acreditamos eacute uma contribuiccedilatildeo da Universidade Puacuteblica para o

Projeto de Desenvolvimento Nacional4 Nosso puacuteblico alvo satildeo universitaacuterios em vias de conclusatildeo

dos cursos de graduaccedilatildeo que tenham vocaccedilatildeo para a relaccedilatildeo do Estado com a sociedade civil

Chamamos atenccedilatildeo para os problemas da gestatildeo de poliacuteticas puacuteblicas estabelecidas como

prioritaacuterias pelo Governo da Uniatildeo em todos os Poderes

Orientamos em um contexto interdisciplinar voltados para a resoluccedilatildeo de problemas segundo

um sistema de programas atividades e accedilotildees quantitativas e qualitativas Orientamos para a gestatildeo

com quem estuda e faz a gestatildeo das poliacuteticas puacuteblicas na Capital da Repuacuteblica

Entre os resultados pretendidos o Projeto serve para alinhar o ensino superior formal e os estu-

dantes universitaacuterios no planejamento estrateacutegico como estrateacutegia de articulaccedilatildeo social que fortalece

a participaccedilatildeo como meacutetodo e poliacutetica de Estado Queremos difundir a educaccedilatildeo fiscal sua missatildeo

valores objetivos diretrizes na Semana da Paacutetria divulgando e vivendo o ambiente institucional na

Capital da Repuacuteblica segundo orccedilamentos programas e sistema de convenios agrave Projetos de ensino

e de extensatildeo visando colher mais eficiencia na operacionalizaccedilatildeo da gestatildeo de poliacuteticas puacuteblicas na

Federaccedilatildeo brasileira

Os conceitos centrais servem a difusatildeo cultural dos programas prioritaacuterios (PPA LDO e LOA)

segundo a loacutegica dos programas projetos atividades e accedilotildees do Governo do Brasil Utilizaccedilatildeo da infra-

-estrutura e pedagogia da praacutexis O alinhamento estrateacutegico operacional da gestatildeo com a articulaccedilatildeo

social no ensino superior brasileiro atrai academicos interessados no tema da formulaccedilatildeo implemen-

taccedilatildeo e avaliaccedilatildeo da gestatildeo de poliacuteticas puacuteblicas do Governo Federal e sua articulaccedilatildeo com o poder

estadual e local com a realidade faacutetica para aleacutem dos muros da escola

Veja a estrutura da uacuteltima ediccedilatildeo do Projeto

USP Leste

Homenagem

ESAF ndash 40 Anos

A CIDADE CONSTITUCIONAL CAPITAL DA REPUacuteBLICA - VII

CONTEUacuteDO PROGRAMAacuteTICO

EDICcedilAtildeO 2013

31092012 - Saacutebado

2100 ndash Saiacuteda do Ocircnibus da USP

01092012 ndash Domingo

1230 ndash Praccedila dos Trecircs Poderes

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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1300 - Palaacutecio do Planalto

1400 - Sede do Ministeacuterio das Relaccedilotildees Exteriores do Brasil

1400 ndash Escola Superior de Administraccedilatildeo Fazendaacuteria

1730 ndash Reuniatildeo geral ndash Definiccedilatildeo das estrateacutegias limites e possibilidades do Projeto

1830 - Jantar

0209 Segunda-feira

0700 ndash Cafeacute

0800 ndash III Seminaacuterio USP-ESAF ndash Os 40 Anos da Escola de Administraccedilatildeo Fazendaacute-

ria ndash ESAF

1230 ndashAlmoccedilo

1400 ndash VII Seminaacuterio USP-ENAP ndash A Comunicaccedilatildeo e a Pesquisa na Escola Nacional

de Administraccedilatildeo Puacuteblica

1700 ndash II Seminaacuterio USP-Ipea

1800 ndash III Seminaacuterio USP-ESAF ndash O Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal Educa-

ccedilatildeo fiscal e preparo da cidadania

2000 - Jantar

0309 Terccedila-feira

0700 ndash Cafeacute

0900 ndash Controladoria Geral da Uniatildeo - Unidades finaliacutesticas Ouvidoria Geral da

Uniatildeo Secretaria Federal de Controle Interno Corregedoria Geral da Uniatildeo Secre-

taria de Prevenccedilatildeo da Corrupccedilatildeo e Informaccedilotildees Estrateacutegicas

1200 - Almoccedilo

1230 ndash Catedral Metropolitana de Brasiacutelia

1230 - Museu Nacional

1400 ndash O Senado da Repuacuteblica na cidade constitucional - III Seminaacuterio USP ndash Even-

tos Legislativos Serviccedilo de Eventos Legislativos Senado Federal Diretoria Geral ndash O

planejamento estrateacutegico do Senado Escritoacuterio Corporativo Gestatildeo de Informaccedilatildeo

e Documentaccedilatildeo ndash Guardar eacute um haacutebito arquivar eacute uma arte Instituto do Legisla-

tivo Brasileiro - Programa Interlegis Consultoria de Orccedilamento do Senado

1830 ndash Jantar

1930 ndash III Seminaacuterio USP-UNB - Universidade de Brasiacutelia ndash O direito achado na rua

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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0409 Quarta-feira

0500 ndash Palaacutecio da Alvorada

0700 - Cafeacute

0830 ndash Cacircmara dos Deputados ndash Comissatildeo Direitos Humanos e Legislaccedilatildeo Partici-

pativa

1000 ndash Comissotildees Gabinetes Lideranccedilas

1130 ndash Panteatildeo da Paacutetria

1200 ndash 1300 Almoccedilo ndash Restaurante Cacircmara dos Deputados

1300 ndash VI Seminaacuterio Cacircmara dos Deputados - USP ndash Reforma poliacutetica

1500 ndash III Seminaacuterio USP - Eventos Legislativos do Senado ndash Comissatildeo de Direitos

Humanos e Legislaccedilatildeo Participativa - Presidenta da Comissatildeo de Direitos Humanos

e Legislaccedilatildeo Participativa do Senado Federal

1600 ndash 1730 ndash Visita Guiada Congresso Nacional

1830 ndash III Seminaacuterio USP-ESAF Educaccedilatildeo fiscal ndash Funccedilatildeo social dos tributos

2100 ndash Jantar

0509 Quinta-feira

0930 ndash Caixa Econocircmica Federal

1030 ndash Banco Central ndash Educaccedilatildeo financeira

1300 ndash Almoccedilo

1430 - Secretaria Nacional de Articulaccedilatildeo Social da Secretaria-Geral da Presidecircncia

da Repuacuteblica

Diaacutelogo do governo com a sociedade ndash segmentos da sociedade civil demandas

sociais monitoramento e avaliaccedilatildeo compromisso nacional pela participaccedilatildeo social

ndash formas de consulta e participaccedilatildeo social estudos e pesquisas intersetorialidade

e integraccedilatildeo entre conselhos ouvidorias e conferencias Educaccedilatildeo popular e mo-

bilizaccedilatildeo cidadatilde ndash processos de educaccedilatildeo popular acesso a poliacuteticas puacuteblicas para

populaccedilotildees vulneraacuteveis metodologia para formar lideranccedilas e educadores popu-

lares praacuteticas de educaccedilatildeo popular e de metodologias participativas no governo e

na educaccedilatildeo popular

1800 ndash Ministeacuterio da Justiccedila

2000 ndash Jantar de confraternizaccedilatildeo

0609 ndash Sexta-feira

0900 ndash Ministeacuterio dos Esportes

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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1300 - Almoccedilo

1400 ndash Ministeacuterio da Sauacutede

1630 ndash Ministeacuterio das Cidades

2000 ndash Jantar

0709 ndash Saacutebado

0600 ndash Cafeacute

0630 ndash Check Out Alojamento ESAF

0700 ndash Saiacuteda Ocircnibus

0900 - Desfile Ciacutevico Militar

1230 - Torre de TV e Feira de Artesanato

1400 ndash Viagem de Retorno para Satildeo Paulo

0809 ndash Domingo

0500 ndash Chegada estimada do ocircnibus em Satildeo Paulo

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Para facilitar a vida do leitor o tema geral deste Capiacutetulo trata da educaccedilatildeo fiscal e mostra uma

experiecircncia O estudo permitiu conhecer e compreender um pouco melhor as diretrizes objetivos

missatildeo visatildeo e valores da educaccedilatildeo fiscal uma aliada potencial no ensino superior brasileiro

Como vimos natildeo haacute incompatibilidade nas diretrizes da educaccedilatildeo fiscal com as diretrizes do

ensino superior O tema compotildee a agenda governamental e vem sendo levado cada dia mais a seacuterio

no ocidente e em suas universidades haacute espaccedilo para crescimento

Na praacutetica novas experiencias vatildeo surgindo e consolidam o estado da arte da educaccedilatildeo fiscal

tambeacutem como tema transversal de disciplinas de graduaccedilatildeo como vimos na iniciativa da USP mais um

exemplo de como a educaccedilatildeo fiscal pode compor como tema transversal e tambeacutem especiacutefico uma

disciplina de graduaccedilatildeo e ainda como esta disciplina ministrada de forma paradoxal deve compor

uma estrutura curricular e um Projeto Poliacutetico-Pedagoacutegico de Curso na graduaccedilatildeo e poacutes

Nossa motivaccedilatildeo geral partindo do pressuposto da duacutevida imanente ao exerciacutecio cientiacutefico

se perguntou se a educaccedilatildeo fiscal serve a metodologias inovadoras de ensinagem no ensino supe-

rior brasileiro

Nossa hipoacutetese era positiva porque acreditaacutevamos e confirmando nossa hipoacuteteses seguimos

acreditando que eacute possiacutevel aproximar as ideias precursoras unindo histoacuteria e tempo presente com

projetos atividades e accedilotildees conjuntas no futuro quiccedilaacute uma disciplina ldquoCidade Constitucional Capital

do Cearaacute ndash CErdquo ou recebendo estudantes de Universidades do Cearaacute em Brasiacutelia durante a realizaccedilatildeo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

442

da disciplina fortalecendo assim o intercacircmbio e a disseminaccedilatildeo de experiecircncias fortalecedoras da

coesatildeo social no ensino superior

O preparo e o exerciacutecio da cidadania satildeo a base para a construccedilatildeo de uma sociedade demo-

craacutetica com igualdade e justiccedila A sociedade civil e o Estado devem trabalhar para a construccedilatildeo dessa

sociedade com base nos princiacutepios constitucionais

O exerciacutecio da cidadania pressupotildee uma educaccedilatildeo para a cidadania uma educaccedilatildeo para esse

exerciacutecio do desenvolvimento da personalidade do individuo Eacute o conhecimento e a compreensatildeo dos

fatos pelas lentes dos valores e do direito que ajudam a reconhecer novas e inovadoras legitimidades

conhecidas e compreendidas para que a sociedade avance no compasso do tempo

O preparo para a cidadania eacute um dever da universidade brasileira do ensino superior brasileiro

sem eximir o ensino fundamental e meacutedio O artigo 205 da CF estabelece que a educaccedilatildeo direito de

todos e dever do Estado e da famiacutelia seraacute promovida e incentivada com a colaboraccedilatildeo da sociedade

visando ao pleno desenvolvimento da pessoa seu preparo para o exerciacutecio da cidadania e sua qualifi-

caccedilatildeo para o trabalho O pleno desenvolvimento da pessoa e o preparo para o exerciacutecio da cidadania

devem ser promovidos incentivados ldquocom a colaboraccedilatildeo da sociedaderdquo para o controle social

Preparar para o exerciacutecio da cidadania requer definiccedilatildeo de conteuacutedo e estrateacutegias Tributos e

financcedilas pessoais e puacuteblicas devem ser levados em consideraccedilatildeo nos projetos poliacutetico-pedagoacutegicos e

planos de atividades das disciplinas de graduaccedilatildeo e poacutes-graduaccedilatildeo Preparar contribuintes e servido-

res por meio da educaccedilatildeo fiscal eacute possiacutevel e existem boas referecircncias metodologias e produtos didaacute-

ticos prontos para conhecimento compreensatildeo e multiplicaccedilatildeo de accedilotildees A administraccedilatildeo educacional

pode ajudar a educaccedilatildeo tributaacuteria de forma ciacutevica

A educaccedilatildeo fiscal serve de forma objetiva para o preparo da cidadania Alinhar a educaccedilatildeo fiscal

a um projeto educacional para a autonomia dentro ou aleacutem do espaccedilo escolar com a transmissatildeo

criacutetica de valores missatildeo diretrizes objetivos e abrangecircncias ajuda a fazer mais felizes as pessoas e o

espaccedilo pedagoacutegico na cidade constitucional Desta forma consideramos que a educaccedilatildeo fiscal soacute se

faz em uma democracia soacute se faz em uma cidade constitucional

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

443

REFEREcircNCIAS

ANASTASIOU Leacutea das Graccedilas Camargos ALVES Leonir Pessate (Orgs) Processos de ensinagem na universidade pressupostos para as estrateacutegias de trabalho em aula 8 ed Joinville Univille 2009

BALTAZAR Antonio Henrique Lindemberg AQUINO Monica de El Programa Nacional de Educacioacuten Fiscal de Brasil In RIVILLAS Borja Diacuteaz PEacuteREZ Aacutengeles Fernaacutendez (org) Educacioacuten fiscal y cohesioacuten social experiecircncias de Ameacuterica Latina Madrid Instituto de Estudios Fiscales 2010

BRASIL Ministeacuterio da Fazenda Escola de Administraccedilatildeo Fazendaacuteria Programa Nacional de Educa-cao Fiscal (PNEF) Educaccedilatildeo fiscal no contexto social 4 ed Brasilia ESAF 2009 Serie Educaccedilatildeo Fiscal Caderno 1

______ Estabelece as diretrizes e bases da educaccedilatildeo nacional Lei 9394 de 20 de Dezembro de 1996 Adin 3324-7 de 2005 Decreto 3860 de 2001 Lei 10870 de 2004 Lei 12601 de 2009 Brasiacutelia Dispo-niacutevel em httpwwwplanaltogovbrccivil_03leisl9394htm Acesso em 10 jan 2014

GARCIacuteA Maria Luisa Valdenebro LOBO Luisa Delgado La educacioacuten fiscal por queacute y para queacute In RI-VILLAS Borja Diacuteaz PEacuteREZ Aacutengeles Fernaacutendez (org) Educacioacuten fiscal y cohesioacuten social experiecircncias de Ameacuterica Latina Madrid Instituto de Estudios Fiscales 2010

HESSE Konrad A forccedila normativa da Constituiccedilatildeo Porto Alegre Sergio Fabris 1991

MOTA Luiza Ondina Santos Apresentaccedilatildeo do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute Secretaria da Fazenda Disponiacutevel em httpwwwsefazcegovbrcontentaplicacaointernetprogra-mas_campanhasgeradosprojeto_apresentacaoasp Acesso em 15 jan 2014

MUumlLLER Friedrich Quem eacute o povo A questatildeo fundamental da democracia Satildeo Paulo Max Limonad 2000

NERLING Marcelo Arno ANDRADE Douglas de A cidade constitucional Capital da Repuacuteblica VII Brasiacutelia Disciplina de graduaccedilatildeo da Universidade de Satildeo Paulo ACH 3666 2013 Mimeo

NERLING Marcelo Arno A cidade constitucional e a Capital da Repuacuteblica Metodologia ativa no en-sino superior In Congresso Internacional PBL-2010 Programa final p 30 2010 Disponiacutevel em httpeachuspnetuspbrpbl2010index_pthtm Acesso em jul 2013

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______ In 1ordm Simpoacutesio de Pedagogia Universitaacuteria Escola de Artes Ciecircncias e Humanidades (EACH) da USP As Metodologias Ativas de Aprendizagem no ensino superior 25-26022013 GAP-EACH--USP 2013 Disponiacutevel em httpwwwuspbrimprensap=27363 Acesso em jul 2013

PIALARISSI Decio Rui El Observatoacuterio Social de Maringaacute haciendo viable la cohesioacuten social In RI-

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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VILLAS Borja Diacuteaz PEacuteREZ Aacutengeles Fernaacutendez (org) Educacioacuten fiscal y cohesioacuten social experiecircncias de Ameacuterica Latina Madrid Instituto de Estudios Fiscales 2010

RIVILLAS Borja Diacuteaz VELARDEBOacute Andrea Oriacutegenes y situacioacuten de los programas de Educacioacuten Fiscal em Ameacuterica Latina In RIVILLAS Borja Diacuteaz PEacuteREZ Aacutengeles Fernaacutendez (org) Educacioacuten fiscal y cohe-sioacuten social experiecircncias de Ameacuterica Latina Madrid Instituto de Estudios Fiscales 2010

SANTOS Boaventura de Souza Um discurso sobre as ciecircncias 13 ed Porto Afrontamento 2002

SILVA Imaculada Maria Vidal da MOTA Luiza Ondina Santos MACHADO Sandra Maria Olimpio La educacioacutens fiscal em el Estado brasilentildeo de Cearaacute In RIVILLAS Borja Diacuteaz PEacuteREZ Aacutengeles Fernaacutendez (org) Educacioacuten fiscal y cohesioacuten social experiecircncias de Ameacuterica Latina Madrid Instituto de Estu-dios Fiscales 2010

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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A PERCEPCcedilAtildeO DOS PROFESSORES SOBRE O CURSO DE DISSEMINADORES DA EDUCACcedilAtildeO FISCAL NO MUNICIPIO DE ICOacute-CE

SUMAacuteRIO Introduccedilatildeo 1 A formaccedilatildeo continuada caminhos e perspectivas 2 A educaccedilatildeo a distacircncia na formaccedilatildeo docente 3 O campolocus da pesquisa 4 O curso de disseminadores da educaccedilatildeo fiscal 5 A formaccedilatildeo em dissemina-dores da educaccedilatildeo fiscal na Crede 17 ndash Icoacute Consideraccedilotildees finais Referecircncias

Maria Nahir Batista Ferreira1

INTRODUCcedilAtildeO

Este artigo apresenta uma discussatildeo acerca da temaacutetica que envolve a percepccedilatildeo dos profes-

sores sobre o Curso de Disseminadores da Educaccedilatildeo Fiscal promovido pela Escola de Administraccedilatildeo

Fazendaacuteria (Esaf)

Refletir sobre o curso nos remete agrave formaccedilatildeo docente considerando que a docecircncia exige dos

professores permanente atualizaccedilatildeo Essa discussatildeo no entanto envolve ainda os processos de capa-

citaccedilatildeo e as diferentes nomenclaturas para designar a formaccedilatildeo continuada dos professores que natildeo

traz apenas a escolha de um termo mas tambeacutem as concepccedilotildees teoacuterico-metodoloacutegicas que envolvem

os processos implicando assim uma multiplicidade de significados que como praacutetica social sinaliza

variadas formas de realizar determinadas accedilotildees

Para a realizaccedilatildeo da formaccedilatildeo dos professores tem-se utilizado a modalidade de educaccedilatildeo a

distacircncia tendo em vista a viabilidade dessa modalidade de ensino por meio da internet e o uso dos

ambientes virtuais de aprendizagem modalidade na qual eacute praticada o Curso de Disseminadores da

Educaccedilatildeo Fiscal

A metodologia utilizada concentra-se na pesquisa bibliograacutefica fomentada nos escritos de Noacute-

voa (1995) Tardif (2012) Imbernoacuten (1998) bem como em outras referecircncias bibliograacuteficas acerca do

tema A demarcaccedilatildeo espacial focou no municiacutepio de Icoacute Cearaacute ndash Brasil Para a constituiccedilatildeo do campo

documental foram aplicados questionaacuterios com os professores da rede oficial do Estado do Cearaacute

especificamente da Coordenadoria Regional de Desenvolvimento da Educaccedilatildeo (Crede) 17 ndash Icoacute vincu-

lada agrave Secretaria Estadual de Educaccedilatildeo A demarcaccedilatildeo temporal estabelecida para o desenvolvimento

da investigaccedilatildeo foi o segundo semestre do ano de 2008

1 Professora da Rede Oficial de Ensino do Cearaacute ProfessoraTeacutecnica na Secretaria da Educaccedilatildeo do Cearaacute Mestranda em Educaccedilatildeo pela Universidade Estadual do Cearaacute E-mail nahir701hotmailcom

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

446

Assim na primeira parte do trabalho destacamos a formaccedilatildeo docente sobretudo a formaccedilatildeo

continuada apontando os caminhos trilhados e as perspectivas que transitam por esse campo de

discussatildeo haja vista os debates em torno da formaccedilatildeo dos professores e da especificidade da accedilatildeo

docente Em seguida discutimos acerca do uso da educaccedilatildeo a distacircncia na formaccedilatildeo docente depois

apresentamos a descriccedilatildeo do curso de Disseminadores da Educaccedilatildeo Fiscal apontando objetivos me-

todologia e estrutura bem como para a uacuteltima parte do trabalho objetivamos descrever a formaccedilatildeo

em disseminaccedilatildeo fiscal na Crede 17

Por fim informaremos o resultado da pesquisa em que os professores mostram suas percep-

ccedilotildees sobre o Curso de Disseminadores da Educaccedilatildeo Fiscal dos conteuacutedos trabalhados da metodo-

logia empregada das atividades desenvolvidas da mediaccedilatildeo do tutor das ferramentas utilizadas e

aplicaccedilatildeo dos conhecimentos adquiridos com os estudantes

1 A FORMACcedilAtildeO CONTINUADA CAMINHOS E PERSPECTIVAS

A discussatildeo sobre a formaccedilatildeo de professores no Brasil e no mundo iniciou na deacutecada de 1980

levando agrave intensificaccedilatildeo das discussotildees em torno do papel da instituiccedilatildeo escola No Brasil a referida

discussatildeo intensificou-se nos anos de 1990 suscitando reflexotildees contradiccedilotildees e embates Nesse cam-

po destacam-se as contribuiccedilotildees de estudos e pesquisas desenvolvidos que abordam a temaacutetica em

torno da formaccedilatildeo dos professores e da especificidade da accedilatildeo docente Desde a deacutecada de 1980 satildeo

apresentadas propostas para a formaccedilatildeo de professores e muitos de seus conceitos satildeo incorporados

aos textos oficiais e adentram nas escolas e instituiccedilotildees formadoras que se encontram diante dos pro-

blemas apelos e interesses de diferentes ordens

Acerca da formaccedilatildeo Antonio Noacutevoa afirma que

A formaccedilatildeo deve estimular uma perspectiva criacutetico- reflexiva que forneccedila aos profes-sores os meios de um pensamento autocircnomo e que facilite as dinacircmicas de autofor-maccedilatildeo participada Estar em formaccedilatildeo implica um investimento pessoal um trabalho livre e criativo sobre os percursos e os projetos proacuteprios com vista agrave construccedilatildeo de uma identidade que eacute tambeacutem uma identidade profissional (NOacuteVOA 1995 p 25)

Para Isabel Alarcatildeo o paradigma do professor reflexivo pode ser mais bem compreendido

se o transportar do niacutevel da formaccedilatildeo dos professores individualmente para o niacutevel de formaccedilatildeo

situado no coletivo dos professores no contexto da escola na qual ele estaacute inserido e no exerciacutecio da

sua atividade evidenciando sua praacutetica pedagoacutegica a partir do processo educativo que acontece no

interior da escola bem como pela praacutetica social relacionada agrave formaccedilatildeo do homem em suas rela-

ccedilotildees poliacuteticos-culturais Na perspectiva de ldquouma formaccedilatildeo que transforme a experiecircncia profissional

adquirida e valorize a reflexatildeo formativa e a investigaccedilatildeo conjunta em contexto de trabalhordquo (ALAR-

CAtildeO 1998 p118)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

447

Na acepccedilatildeo de Rosa Maria Torres

[] a experiecircncia mostra que o professor com iniciativa e boas ideias sem uma ins-tituiccedilatildeo e equipe escolar que o respaldem termine em geral absorvido pela loacutegica escolar dominante A experiecircncia mostra tambeacutem que o professor capacitado de for-ma individual e isolado quando regressa a sua escola fica segregado e termina por retomaras suas praacuteticas em pouco tempo Hoje eacute urgente superar esse esquema tra-dicional altamente individualizado de capacitaccedilatildeo Apontasse a equipe escolar como sujeito privilegiado da capacitaccedilatildeo E isso se complementa com a proposta de que tal capacitaccedilatildeo seja feita na proacutepria escola (TORRES 1998 p 185)

No tocante agrave formaccedilatildeo inicial de professores evidencia-se a criacutetica acerca da oferta de um

ensino desarticulado das reais necessidades teoacuterico-metodoloacutegicas dos professores bem como pelo

distanciamento e estranhamento docente em funccedilatildeo da realidade vivenciada pelas escolas configu-

rando-se uma dicotomia teoria-praacutetica na constituiccedilatildeo do conhecimento consequentemente provo-

cando nos professores uma accedilatildeo pedagoacutegica limitada e inconsistente em razatildeo da formaccedilatildeo recebida

ldquoNa formaccedilatildeo de professores ensinam-se teorias [] histoacutericas pedagoacutegicas etc que foram concebi-

das a maioria das vezes sem nenhum tipo de relaccedilatildeo com o ensino nem com as realidades cotidianas

do oficio de professorrdquo (TARDIF 2012 p 241) Nessa perspectiva na medida em que os cursos natildeo

se apresentam eficazes amplia-se a discussatildeo em torno das abordagens teoacuterico-metodoloacutegicas dos

processos de formaccedilatildeo continuada como possibilidade de qualificaccedilatildeo da praacutetica docente

Nesse contexto a formaccedilatildeo continuada possui um caraacuteter permanente e extrapola os limites

formais de ensino Vale ressaltar que a literatura educacional registra que o discurso dos oacutergatildeos que

gerenciam a educaccedilatildeo ao longo do tempo trata as accedilotildees relativas agrave formaccedilatildeo contiacutenua de professo-

res como reciclagem treinamento aperfeiccediloamento capacitaccedilatildeo entre outros Atualmente surge

uma nova nomenclatura que demonstra mudanccedilas que ampliam o campo conceitual expressas nos

termos formaccedilatildeo em serviccedilo formaccedilatildeo continuada educaccedilatildeo permanente formaccedilatildeo contiacutenua fruto

de cada momento histoacuterico designando concepccedilotildees e demonstrando ideologias objetivos e linhas

de accedilotildees nesse campo

Haacute de se considerar tambeacutem que a temaacutetica da formaccedilatildeo continuada natildeo eacute algo novo no Brasil

mas se intensificou a partir da deacutecada de 1990 com as reformas educacionais apresentando novas

concepccedilotildees e abordagens para se adaptar agraves novas exigecircncias do mundo produtivo

Nessa perspectiva Imbernoacuten (2010 p 55) evidencia que

Na atualidade temos certeza de que a educaccedilatildeo soacute mudaraacute se os professores mu-darem mas os contextos em que esses interagem tambeacutem deveratildeo fazecirc-lo Se o contexto natildeo muda podemos ter professores mais cultos e com mais conhecimento pedagoacutegico mas natildeo necessariamente mais inovadores jaacute que o contexto pode im-possibilitar-lhes o desenvolvimento da inovaccedilatildeo ou pode levaacute-los a se recolherem em seus microcontextos sem repercutirem com sua praacutetica uma inovaccedilatildeo mais institu-cional

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

448

Atualmente o cenaacuterio da educaccedilatildeo brasileira convive com uma diversidade de opccedilotildees de ensi-

nar aprender e formar professores que iratildeo mediar o processo ensino-aprendizagem na Escola Baacutesica

o que nos remete aos estudos de Maurice Tardif focalizados em saber docente e suas interferecircncias

na praacutetica pedagoacutegica Esse autor identifica e caracteriza diferentes tipos de saberes e aborda a rela-

ccedilatildeo que o professor estabelece com esses saberes pois ldquosaber docente eacute um saber plural formado

pelo amaacutelgama mais ou menos coerente de saberes oriundos da formaccedilatildeo profissional e de saberes

disciplinares curriculares e experienciaisrdquo (TARDIF 2012 p 36) O autor reconhece a pluralidade e a

heterogeneidade do saber docente no entanto destaca a importacircncia dos saberes da experiecircncia

abordando que

Surgem como nuacutecleo vital do saber docente a partir do qual o (a)s professor (a)s tentam transformar suas relaccedilotildees de exterioridade com os saberes em relaccedilotildees de in-terioridade com sua proacutepria praacutetica Nesse sentido os saberes da experiecircncia natildeo satildeo saberes como os demais eles satildeo ao contraacuterio formados de todos os demais poreacutem retraduzidos ldquopolidosrdquo e submetidos agraves certezas construiacutedas na praacutetica e no vivido (TARDIF 2012 p 234)

Para Tardif (2012 p 39) o professor eacute ldquoalgueacutem que deve conhecer sua mateacuteria sua disciplina e

seu programa aleacutem de possuir certos conhecimentos relativos agraves ciecircncias da educaccedilatildeo e agrave pedagogia

e desenvolver um saber praacutetico baseado em sua experiecircncia cotidiana com os alunosrdquo

Sendo assim existe um ldquolugarrdquo onde se aprende a teoria a praacutetica e ambas se entrelaccedilam

cujo encontro ocorre de forma dinacircmica Nessa direccedilatildeo Tardif (2012) em seu ldquoSaberes docentes e

formaccedilatildeo profissionalrdquo sugere que a formaccedilatildeo profissional e a formaccedilatildeo docente ocorram de forma

separada mencionando que a formaccedilatildeo profissional eacute aquela que se processa por meio da formaccedilatildeo

inicial do aluno no acircmbito da universidade e a formaccedilatildeo docente eacute concretizada no exerciacutecio da

profissatildeo propriamente dita isto eacute durante o exerciacutecio da praacutetica docente Os saberes dos professo-

res satildeo constituiacutedos e mobilizados cotidianamente para desenvolver as tarefas subjacentes agrave accedilatildeo

no espaccedilo escolar

Pelo exposto percebe-se que a formaccedilatildeo continuada dos professores natildeo deve ser entendida

como um processo cumulativo de informaccedilotildees bem como de conhecimentos mas deve buscar o de-

senvolvimento profissional e pessoal com foco no processo de desenvolvimento das competecircncias

poliacuteticas teacutecnicas e humanas do professor tendo em vista a melhoria da praacutetica profissional Antonio

Noacutevoa ensina que a formaccedilatildeo assume uma dimensatildeo maior que a realizaccedilatildeo de cursos quando afirma

que

A formaccedilatildeo natildeo se constroacutei por acumulaccedilatildeo (de cursos de conhecimentos ou de teacutecnicas) mas sim atraveacutes de um trabalho de reflexividade criacutetica sobre as praacuteticas e de (re)construccedilatildeo permanente de uma identidade pessoal Por isso eacute tatildeo importante investir a pessoa e dar um estatuto ao saber da experiecircncia (NOacuteVOA 2005 p25)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

449

Assim umas das criacuteticas feitas agrave formaccedilatildeo continuada concerne aos cursos pontuais geralmen-

te de curta duraccedilatildeo distantes das reais necessidades formativas do professor das demandas da sala de

aula dos desafios da praacutetica docente e desarticulados da formaccedilatildeo inicial do professor Essa questatildeo

estaacute expressa conforme a seguir

As praacuteticas de formaccedilatildeo continuada tecircm se configurado predominante em eventos pontuais ndash cursos oficinas seminaacuterios e palestras que de modo geral natildeo respon-dem agraves necessidades pedagoacutegicas mais imediatas dos professores e nem sempre se constituem num programada articulado e planejado como tal (MEC 1999 p 41)

Na perspectiva da formaccedilatildeo docente Yeda da Silva Porto realizou um estudo sobre as dife-

rentes concepccedilotildees sobre a formaccedilatildeo em geral e a formaccedilatildeo continuada e suas relaccedilotildees com a praacute-

tica pedagoacutegica Para essa autora a educaccedilatildeo eacute uma praacutetica social estruturada sob um novo tempo

repleto de mudanccedilas epistemoloacutegicas sociais e tecnoloacutegicas que impotildeem novas exigecircncias Diante

dos dilemas que o professor vivencia na sociedade contemporacircnea faz-se necessaacuterio que ele esteja

em constante formaccedilatildeo

Segundo a pesquisadora

[] a formaccedilatildeo continuada eacute importante condiccedilatildeo de mudanccedila das praacuteticas pedagoacutegi-cas entendida a primeira fundamentalmente como processo crescente de autonomia do professor e da unidade escolar e a segunda como processo de pensar-fazer dos agentes educativos e em particular dos professores com o propoacutesito de concretizar o objetivo educativo da escola (PORTO 2000 p 15)

Nesse sentido os dilemas presentes na sociedade e vivenciados pelo professor na escola tecircm

demandado a participaccedilatildeo dos docentes em alguns cursos para responder a sua situaccedilatildeo concreta de

ensino e uma das formas de realizaccedilatildeo da formaccedilatildeo continuada tem sido por meio da modalidade de

educaccedilatildeo a distacircncia

2 A EDUCACcedilAtildeO A DISTAcircNCIA NA FORMACcedilAtildeO DOCENTE

A introduccedilatildeo da EAD no Brasil remete ao uso do raacutedio que corresponde ao marco histoacuterico da

implantaccedilatildeo das primeiras raacutedios no paiacutes No entanto a primeira e mais longa geraccedilatildeo de EAD no

Brasil assim como no mundo se deu por meio do uso de material textual impresso e foi sucedida

por geraccedilotildees que ao longo do tempo acrescentaram o uso de elementos audiovisuais (televisatildeo e

viacutedeo) raacutedio e telefone Posteriormente veio a geraccedilatildeo das telecomunicaccedilotildees e o uso da informaacuteti-

ca inicialmente sem ligaccedilatildeo agrave rede ateacute chegar a geraccedilatildeo na qual haacute a criaccedilatildeo de ambientes virtuais

de aprendizagem com processos de ensino - aprendizagem multimidiaacuteticos e multilaterais (GARCIA

ARETIO 2001)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

450

Nesse sentido Garcia Aretio (2001) menciona a existecircncia de etapas ou fases distintas da EAD

sendo elas o ensino por correspondecircncia que surge com o desenvolvimento da impressatildeo e dos ser-

viccedilos postais o ensino multimiacutedia o ensino telemaacutetico e por uacuteltimo uma quarta geraccedilatildeo a do ensino

mediado por computador e com uso da internet

Observa-se que essa classificaccedilatildeo se fundamenta na abordagem didaacutetica bem como na tipifi-

caccedilatildeo do material e da comunicaccedilatildeo utilizado em cada periacuteodo A literatura registra que na deacutecada de

1990 surgiram as primeiras ferramentas de apoio a aprendizagem virtual no Brasil oferecendo assim o

suporte da tecnologia digital possibilitando maior interaccedilatildeo entre os sujeitos de forma natildeo presencial

desenvolvendo a EAD on-line

A legitimidade e regulamentaccedilatildeo da EAD no Brasil estatildeo expressas no Decreto nordm 249498 Art

1ordm levando a Educaccedilatildeo a Distacircncia ter uma definiccedilatildeo oficial

A Educaccedilatildeo a Distacircncia eacute uma forma de ensino que possibilita a autoaprendizagem com a mediaccedilatildeo de recursos didaacuteticos sistematicamente organizados apresentados em diferentes suportes de informaccedilatildeo utilizados isoladamente ou combinados e vei-culados pelos diversos meios de comunicaccedilatildeo

Assim o Governo procurou criar condiccedilotildees para a viabilizaccedilatildeo de cursos utilizando a modalida-

de EAD o que proporcionou o crescimento e o interesse em adotar essa modalidade de ensino tendo

em vista alguns fatores que a EAD apresenta como a possibilidade de fazer chegar o conhecimento

de modo simultacircneo a um grande nuacutemero de pessoas independente do espaccedilo geograacutefico a accedilatildeo

pedagoacutegica permitida pela sofisticaccedilatildeo dos instrumentos didaacuteticos utilizados para o desenvolvimento

do processo ensino-aprendizagem mediante o uso das tecnologias digitais a flexibilidade de tempo e

espaccedilo permitida possibilitando a formaccedilatildeo para aqueles que estavam agrave margem das accedilotildees formati-

vas existentes proveniente da falta de tempo ou pela distacircncia dos espaccedilos educacionais

O crescimento da Educaccedilatildeo a Distacircncia nos dias atuais tem provocado muitas mudanccedilas nos

processos formativos do professor como a criaccedilatildeo da Universidade Aberta do Brasil (UAB) em 2005

em decorrecircncia do Foacuterum de Educaccedilatildeo das Secretarias de Estado que busca uma integraccedilatildeo articu-

laccedilatildeo e experimentaccedilatildeo de um Sistema Nacional de Educaccedilatildeo Superior Nesse contexto o modelo de

implementaccedilatildeo da UAB tambeacutem conta com a utilizaccedilatildeo de recursos televisivos e radiofocircnicos aulas

complementares transmitidas por meio de viacutedeo conferecircncia encontros presenciais contato telefocircni-

co e a utilizaccedilatildeo da internet bem como o apoio da tutoria presencial que auxilia os alunos nos seus

estudos nos momentos presenciais e a distacircncia mediada pelos recursos tecnoloacutegicos de acordo com

o Decreto nordm 5800 de 8 junho de 2006

Mediante a implementaccedilatildeo da UAB o Ministeacuterio da Educaccedilatildeo (MEC) lanccedilou o Plano Nacional

de Formaccedilatildeo de Professores da Educaccedilatildeo Baacutesica utilizando uma plataforma especiacutefica para esse fim

a Plataforma Freire envolvendo a Coordenaccedilatildeo de Aperfeiccediloamento de Pessoal de Niacutevel Superior

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

451

(Capes) e as Diretorias de Educaccedilatildeo Baacutesica Presencial e de Educaccedilatildeo a Distacircncia Os cursos destina-

dos aos professores satildeo ofertados pelas instituiccedilotildees formadoras respaldadas pelos Foacuteruns Estaduais

Permanentes de Apoio agrave Formaccedilatildeo Docente com base legal apoiada no Decreto ndeg 6755 de 29 de

janeiro de 2009

Sendo assim a EAD adquire cada vez mais espaccedilo como modalidade de ensino capaz de pro-

porcionar a oferta de cursos a um maior nuacutemero de pessoas democratizando o conhecimento tendo

em vista a necessidade de desenvolver novas praacuteticas formativas

3 O CAMPOLOCUS DA PESQUISA

O locus dessa investigaccedilatildeo foi o municiacutepio de Icoacute localizado na regiatildeo centro-sul do estado do

Cearaacute que foi a terceira vila instalada no Cearaacute e possui um siacutetio arquitetocircnico datado do seacuteculo XVIII

A povoaccedilatildeo foi elevada agrave terceira vila do Cearaacute em 1738 logo apoacutes Aquiraz e Fortaleza Em 1842 ob-

teve a categoria de cidade ldquodevido agrave sua importacircncia econocircmica Icoacute foi uma das cidades que tiveram

projetos urbaniacutesticos planejados na corte de Lisboardquo (OCEANOS 2000 p105)

Os estudos desenvolvidos por Studart sobre a vila do Icoacute evidenciam que esta ldquoteve precoce de-

senvolvimento e alcanccedilou raacutepida hegemonia sobre os demais povos do interior cearense em razatildeo de

sua posiccedilatildeo privilegiadardquo (2002 p 44) Desse modo os avanccedilos no desenvolvimento da Vila em pleno

ciclo do gado e do algodatildeo ganharam expressatildeo no cenaacuterio da proviacutencia do Cearaacute transformando-se

em entreposto comercial decorrente da localizaccedilatildeo de grandes fazendas no seu acircmbito territorial

Dessa forma surgiu a Vila de Icoacute que no final do seacuteculo XVIII e iniacutecio do seacuteculo XIX atingiu seu

auge como Vila colonial cearense Embora decorridos seacuteculos ainda hoje satildeo visiacuteveis as marcas desse

periacuteodo de esplendor e riquezas sobretudo na arquitetura sobrados igrejas teatro e outras edifi-

caccedilotildees que pela importacircncia histoacuterica e cultural receberam tombamento do Instituto do Patrimocircnio

Histoacuterico e Artiacutestico Nacional (Iphan)

O Largo do Themberg patrimocircnio nacional abriga algumas das principais manifestaccedilotildees reli-

giosas em torno da Igreja do Senhor do Bonfim haacute seacuteculos ruas largas igrejas sobrados e casarotildees

bem como as manifestaccedilotildees culturais e artiacutesticas em torno do Teatro da Ribeira dos Icoacutes construiacutedo

no seacuteculo XIX

Caracterizado o campolocus da investigaccedilatildeo apresentamos os sujeitos da pesquisa que foram

formados por 14 professores das escolas dos sete municiacutepios de abrangecircncia da 17ordf Coordenadoria

Regional de Desenvolvimento da Educaccedilatildeo (Crede Icoacute) que integra as 20 regionais da Secretaria de

Educaccedilatildeo do Estado do Cearaacute As Credes abrangem um conjunto de municiacutepio por regiatildeo geograacutefica

e suas escolas sendo responsaacutevel pela gestatildeo e desenvolvimento das poliacuteticas educacionais estaduais

Os sujeitos natildeo seratildeo identificados pelo nome mas por nuacutemeros de 01 a 14

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

452

Os questionaacuterios aplicados continham questotildees fechadas e abertas que abordavam sobre o

Curso de Disseminadores da Educaccedilatildeo Fiscal

4 O CURSO DE DISSEMINADORES DE EDUCACcedilAtildeO FISCAL

Como parte integrante do Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal (PNEF) o Curso Dissemina-

dores da Educaccedilatildeo Fiscal ofertado pela Escola de Administraccedilatildeo Fazendaacuteria (Esaf) foi pensado com

o objetivo de contribuir com a formaccedilatildeo dos sujeitos com foco na participaccedilatildeo nos processos de

geraccedilatildeo aplicaccedilatildeo e fiscalizaccedilatildeo dos recursos puacuteblicos cujo objetivo principal eacute a realizaccedilatildeo de leitu-

ras e estudos sobre a temaacutetica O referido curso oferecido na modalidade de EAD inicialmente tinha

uma carga horaacuteria de 80 horas posteriormente ofereceu aos participantes a opccedilatildeo de ampliaccedilatildeo da

carga horaacuteria para 120 horas mediante a elaboraccedilatildeo de um projeto na temaacutetica da Educaccedilatildeo Fiscal Eacute

importante ressaltar que a execuccedilatildeo do projeto pedagoacutegico natildeo era obrigatoacuteria bastava apenas a sua

elaboraccedilatildeo para a certificaccedilatildeo de 120ha A carga horaacuteria atual do curso eacute de 160h

A realizaccedilatildeo do curso conta com a parceria da Secretaria da Fazenda do Estado do Cearaacute (Se-

faz) e Secretaria da Educaccedilatildeo (Seduc) e destina-se aos servidores de ambas as secretarias bem como

para a Secretaria Municipal de Educaccedilatildeo de Fortaleza (SME) Na Seduc o curso eacute destinado preferen-

cialmente aos professores em funccedilatildeo docente podendo tambeacutem contemplar gestores e professores

lotados nos Centros de Multimeios das escolas laboratoacuterio escolar de informaacutetica e servidores da

Crede e Seduc Atualmente o curso eacute aberto ao puacuteblico em geral tendo sido bastante procurado por

universitaacuterios Outro aspecto a considerar eacute a tutoria do curso a Esaf realiza uma consistente formaccedilatildeo

dos seus tutores bem como acompanhamento e cursos de aperfeiccediloamento

Nesse contexto a experiecircncia do curso de Disseminadores da Educaccedilatildeo Fiscal traz em sua pro-

posta uma formaccedilatildeo para os professores com o intuito de que os conhecimentos adquiridos sejam

disseminados com os estudantes na escola e com a comunidade

O nuacutemero de estudantes por turma depende do nuacutemero de vagas destinadas para cada Estado

que de acordo com as vagas recebidas distribui para as instituiccedilotildees parceiras Nas Credes apoacutes a for-

maccedilatildeo da turma o tutor que a acompanha efetua a matriacutecula no ambiente virtual e informa os nomes

dos inscritos para a coordenaccedilatildeo para que as inscriccedilotildees sejam validadas

Durante o curso satildeo trabalhados cinco moacutedulos especiacuteficos sendo quatro de conteuacutedo e um

sobre elaboraccedilatildeo de projetos pedagoacutegicos e planos de accedilatildeo Sendo que o primeiro traz como tema

a Educaccedilatildeo Fiscal no Contexto Social cujo conteuacutedo versa sobre o processo de criaccedilatildeo do programa

missatildeo valores princiacutepios norteadores diretrizes objetivos valores Faz ainda uma retrospectiva his-

toacuterica da educaccedilatildeo no Brasil (BRASIL 2008)

O moacutedulo dois trata da relaccedilatildeo Estado-Sociedade apresentando conteuacutedos que buscam com-

preendecirc-la assim como a evoluccedilatildeo histoacuterica do conceito de Estado e Sociedade (BRASIL 2008)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

453

O moacutedulo trecircs traz uma discussatildeo sobre o Sistema Tributaacuterio Nacional fazendo um aprofunda-

mento sobre o conceito de Estado trata dos serviccedilos puacuteblicos apresenta a histoacuteria do tributo no Brasil

conceituando tributo e mostrando as obrigaccedilotildees tributaacuterias (BRASIL 2008)

O quarto moacutedulo aborda conteuacutedos tocantes agrave gestatildeo democraacutetica dos recursos puacuteblicos

dessa forma eacute estudado nesse moacutedulo orccedilamento puacuteblico gestatildeo financeira contabilidade das

despesas puacuteblicas oacutergatildeos fiscalizadores das contas puacuteblicas Lei de Responsabilidade Fiscal Lei de

Responsabilidade Social e situa o programa de educaccedilatildeo fiscal dentro no contexto do controle social

(BRASIL 2008)

E por fim haacute um quinto moacutedulo referente a Projeto Pedagoacutegico tendo em vista que o aluno

deveraacute apresentar um projeto pedagoacutegico relacionado aos temas estudados ou um Plano de Accedilatildeo em

Educaccedilatildeo Fiscal a ser desenvolvido

A formaccedilatildeo conta com momentos de estudos presenciais e a distacircncia Para os estudos a dis-

tacircncia utiliza-se o ambiente virtual de aprendizagem que conta com a sala de aula destinado ao es-

tudo do conteuacutedo realizaccedilatildeo das postagens dos foacuteruns de discussatildeo sendo um foacuterum relativo a cada

moacutedulo realizaccedilatildeo de exerciacutecios troca de experiecircncias bem como para acesso a biblioteca virtual

com a disponibilidade de artigos textos leis e informaccedilotildees para aprofundamento das discussotildees Na

mediaccedilatildeo a tutoria conta com utilizaccedilatildeo de ferramentas siacutencronas utilizadas em tempo real ou seja

ao mesmo tempo como chat mensagens instantacircneas telefone e assiacutencronas utilizadas em tempo

diferente como foacuterum de discussatildeo e e-mail

Com base nos conhecimentos adquiridos na formaccedilatildeo os professores participantes trabalha-

ram os conteuacutedos do curso com os alunos como tema transversal e interdisciplinar Assim foram de-

senvolvidas atividades com os estudantes do Ensino Meacutedio inserindo a temaacutetica da Educaccedilatildeo Fiscal

mediante a realizaccedilatildeo de atividades como Leitura e interpretaccedilatildeo de textos sobre a importacircncia dos

tributos Visitaccedilatildeo agrave Cacircmara de Vereadores em audiecircncias puacuteblicas (planejamento orccedilamentaacuterio pres-

taccedilatildeo de contas) Acesso ao siacutetio Leatildeozinho (wwwleaozinhoreceitafazendagovbr) interpretaccedilatildeo do

coacutedigo do consumidor realizaccedilatildeo de pesquisas sobre o haacutebito de exigir a nota fiscal

As atividades enfatizaram ainda o acompanhamentomonitoramento dos recursos financeiros

recebidos pela escola destinados para o consumo serviccedilo e capital aplicaccedilatildeo planejamento operacio-

nal participaccedilatildeo da comunidade escolar na definiccedilatildeo de prioridades e supervisatildeo dos cronogramas de

desembolso avaliaccedilatildeo dos projetos baacutesicos e prestaccedilatildeo de contas

Os professores utilizaram tambeacutem as contas de aacutegua luz e telefone levadas pelos alunos para

a sala de aula como subsiacutedios para anaacutelises e estudos de aspectos especiacuteficos fraccedilotildees e operaccedilotildees

de nuacutemeros decimais ndash contribuiccedilotildees impostos e taxas que incidem sobre esses serviccedilos informaccedilotildees

teacutecnicas sobre monitoramento e controle do consumo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

454

5 A FORMACcedilAtildeO EM DISSEMINADORES DE EDUCACcedilAtildeO FISCAL NA CREDE 17

Para analisar a formaccedilatildeo na Crede 17 foi aplicado um questionaacuterio com os professores envol-

vidos na formaccedilatildeo com o intuito de investigar a percepccedilatildeo dos professores sobre o Curso de Dissemi-

nadores da Educaccedilatildeo Fiscal

Os sujeitos envolvidos nessa pesquisa foram 14 professores em funccedilatildeo docente nas 14 escolas

puacuteblicas estaduais que compotildeem os 07 municiacutepios da 17ordf Crede - Icoacute (Coordenadoria Regional de

Desenvolvimento da Educaccedilatildeo) sendo um professor de cada unidade escolar cursistas da turma 269

ndash DEF2ordm semestre ndash 2008 ndash CE 33 do curso de Disseminadores da Educaccedilatildeo Fiscal Todos os partici-

pantes da pesquisa estatildeo em funccedilatildeo docente possuem licenciatura plena e possuem carga horaacuteria na

escola de 40 horas semanais

No decorrer do estudo verificou-se o interesse dos professores participantes do curso ao de-

senvolverem atividades na escola como confecccedilatildeo de cartazes encenaccedilatildeo de peccedilas paroacutedias ativida-

des executadas no laboratoacuterio de informaacutetica no centro de multimeios e na comunidade

Sendo assim o Curso de Disseminadores da Educaccedilatildeo Fiscal realizado na Crede 17 provocou

mudanccedilas na atuaccedilatildeo do professor que passou a trabalhar a temaacutetica com os alunos em sala de aula

bem como a desenvolver atividades envolvendo a comunidade escolar e a local no tocante agrave sensibi-

lizaccedilatildeo conscientizaccedilatildeo e participaccedilatildeo do cidadatildeo mediante os recursos puacuteblicos

De acordo com a pesquisa 100 dos entrevistados disseram ter tomado conhecimento do

curso por meio da Crede e consideraram baacutesicos o seu conhecimento de Informaacutetica ao ingressar

no curso

Quando perguntados se jaacute tinham realizado curso na modalidade de EAD antes 60 dos pro-

fessores disseram que sim Isso revela que a maioria dos professores participantes do curso em epiacute-

grafe e envolvidos na pesquisa jaacute participa de cursos de formaccedilatildeo continuada na modalidade de EAD

mediante a utilizaccedilatildeo das ferramentas tecnoloacutegicas No tocante ao conteuacutedo do curso 100 avaliaram

como excelente o que revela que os professores sentem a necessidade da formaccedilatildeo continuada prin-

cipalmente na temaacutetica da Educaccedilatildeo Fiscal com o intuito de atender as novas demandas e viabilidade

de dialogar com as mudanccedilas do tempo presente

O Curso Disseminadores da Educaccedilatildeo Fiscal se desenvolveu com o uso de ferramentas variadas

o que motivou a participaccedilatildeo e a realizaccedilatildeo das atividades de todos os envolvidos na formaccedilatildeo O

curso contou com a utilizaccedilatildeo de ambiente virtual de aprendizagem bem como o uso de ferramentas

siacutencronas e assiacutencronas Sobre essa questatildeo 100 dos professores responderam que acharam exce-

lente o AVA bem como os materiais impressos O que revela que o uso das miacutedias integradas favorece

o sucesso dos cursos ofertados na modalidade de EAD

No tocante ao conteuacutedo do curso os professores apontam que eacute muito significativo e de fun-

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

455

damental importacircncia para a compreensatildeo da Educaccedilatildeo Fiscal bem como para o exerciacutecio da cida-

dania Dos 14 professores envolvidos na pesquisa quando perguntados sobre o conteuacutedo do curso

apontaram como positivos os conteuacutedos estudados bem como seu aprendizado em relaccedilatildeo agrave temaacute-

tica Transcrevemos alguns argumentos por eles apresentados da seguinte maneira

O conteuacutedo do curso me trouxe grandes aprendizados ajudou a enxergar coisas que antes eu natildeo enxergava jaacute no estudo do Moacutedulo 1 (Educaccedilatildeo Fiscal no Contexto So-cial) percebi que precisamos exercer a cidadania frente os serviccedilos puacuteblicos ofereci-dos agrave populaccedilatildeo (Professor 01)O conteuacutedo do curso eacute uma leitura obrigatoacuteria para o professor porque provoca uma reflexatildeo sobre a relaccedilatildeo estado-sociedade frente agrave carga tributaacuteria cobrada pelo es-tado e de outro lado a qualidade dos serviccedilos puacuteblicos oferecidos agrave sociedade E a tutoria eacute fundamental para nos acompanhar (Professor 02)O conteuacutedo do curso foi excelente principalmente porque a metodologia do curso eacute muito boa natildeo sobrecarrega o cursista com atividades o tutor acompanha bem as discussotildees nos foacuteruns provoca a leitura e noacutes natildeo temos desculpas de falta de com-putador Internet pois aleacutem do conteuacutedo no ambiente virtual recebemos tambeacutem os moacutedulos impressos o que facilita bastante o estudo (Professor 03)

Dessa forma 100 dos professores envolvidos na pesquisa apresentaram satisfaccedilatildeo com

os conteuacutedos trabalhados no curso em depoimento de igual teor dos depoimentos transcritos

dos professores 01 e 03 que revelam em suas falas a importacircncia da formaccedilatildeo realizada como o

significado dos conteuacutedos trabalhados no processo formativo e o atendimento agraves necessidades do

exerciacutecio da docecircncia

No caso especifico que estamos estudando o uso das miacutedias integradas favoreceu a aprendiza-

gem e consequentemente o sucesso do curso como revelam os professores em suas falas Vale des-

tacar tambeacutem o papel fundamental da tutoria nos cursos de EAD como mediaccedilatildeo e interaccedilatildeo entre os

cursistas e apoio no desenvolvimento das atividades A importacircncia do tutor foi destacada por todos

os pesquisados e estaacute expressa na fala dos docentes Vejamos alguns dos depoimentos

O tutor ajudou muito a nos situar no curso tirar duacutevidas e a participar das discussotildees nos foacuteruns (Professor 06)A resposta do tutor aos e-mails era quase imediata sem duacutevida foi de suma impor-tacircncia o acompanhamento do tutor [] Aprendi sobre usuaacuterios de EAD no encontro presencial e o perfil do aluno de EAD (Professor 11)Destaco o tutor no acompanhamento incentivo e contribuiccedilatildeo nas discussotildees do foacute-rum e durante todo o curso e o encontro presencial onde o tutor mostrou a proposta do curso o ambiente a sala de aula o perfil do aluno de EAD (Professor 13)

Vale salientar que o Curso de Disseminadores da Educaccedilatildeo Fiscal contou com chats foacuteruns

contato por telefone material impresso e o acompanhamento do tutor A turma investigada teve

100 de acesso e conclusatildeo do curso (BRASIL Relatoacuterio ESAF 2008) o que mostra que a EAD eacute uma

modalidade de ensino que pode se adaptar com facilidade ao universo do aluno adulto cujos fatores

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

456

motivacionais satildeo autogerenciados podendo ser aplicada em larga escala considerando o desenvol-

vimento de uma estrutura que flexibilize o diaacutelogo e a interaccedilatildeo

Os foacuteruns foram avaliados pelos professores como positivos por propiciar uma ampla discus-

satildeo em torno da temaacutetica Sobre essa questatildeo os professores assim se pronunciam

Eu demorei muito a acessar o primeiro foacuterum soacute depois de ler o moacutedulo 01 todo reler e refletir eacute que fui participar das discussotildees e aprendi muito sobre o assunto na inte-raccedilatildeo com os colegas Participei de um chat pela primeira vez foi muito bom A ajuda do tutor foi fundamental para superar as dificuldades que surgiram (Professor 07)Eu me viciei no curso vivia acessando o conteuacutedo dos moacutedulos para participar das discussotildees dos foacuteruns que foram muito boas Como soacute eacute um foacuterum para cada moacutedulo a gente natildeo fica carregada de atividade fazendo de qualquer jeito apenas para cum-prir a tarefa o que ajuda bastante (Professor 08)O ambiente virtual eacute muito praacutetico com boa distribuiccedilatildeo das ferramentas os foacuteruns nos ajudaram a refletir sobre os conteuacutedos trabalhados nos 4 moacutedulos Os telefone-mas do tutor tambeacutem ajudava a gente a cumprir o cronograma e a comunicaccedilatildeo via e-mail foi muito eficiente (Professor 09)O que eu achei mais significativo no curso foi o material impresso pois eu natildeo tenho Internet em casa entatildeo estudava o material no moacutedulo impresso e acessava na es-cola para responder os foacuteruns e fazer as avaliaccedilotildees Destaco nos foacuteruns agrave mediaccedilatildeo do tutor motivando a participaccedilatildeo de todos incentivando a leitura comentando as respostas e incentivando a disseminaccedilatildeo dos conteuacutedos na escola (Professor 10)

A narrativa dos professores revela que os foacuteruns contribuiacuteram para a constituiccedilatildeo do conheci-

mento sobre a temaacutetica estudada Na concepccedilatildeo dos professores a formaccedilatildeo continuada eacute importan-

te e necessaacuteria pois quando indagamos sobre esse aspecto podemos extrair das falas dos professores

que o exerciacutecio da docecircncia exige um constante aperfeiccediloamento fazendo dos professores ldquoeternos

aprendizesrdquo Essa percepccedilatildeo eacute evidenciada no discurso dos professores aqui transcrevemos alguns

Quando eu fiz o Normal (Curso Pedagoacutegico ndash Profissionalizante) a gente era profes-sora diplomada e isso era suficiente Mas hoje a gente precisa da Licenciatura da poacutes-graduaccedilatildeo e de aperfeiccediloamento constante (Professora 05)A gente precisa de uma formaccedilatildeo como essa que nos ajude a lidar com certos temas que estatildeo presentes na sociedade e portanto na escola Trabalhando com os alunos ateacute peccedila eles criaram e apresentaram na escola (Professora 04)[] Natildeo temos como fugir da formaccedilatildeo continuada o nosso ofiacutecio exige As atividades realizadas com os alunos envolvendo a temaacutetica da Educaccedilatildeo Fiscal foram significa-tivas para os alunos por juntar teoria e praacutetica entre outras mudanccedilas no compor-tamento dos alunos destaco o zelo pelo patrimocircnio da escola e a exigecircncia da nota fiscal no comeacutercio local (Professora 14)

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Por meio da realizaccedilatildeo deste trabalho esperamos oferecer subsiacutedios teoacutericos e praacuteticos que

contribuam para o significado da formaccedilatildeo continuada sobretudo na modalidade de Educaccedilatildeo a

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

457

Distacircncia uma vez que o movimento de introduccedilatildeo da EAD com a utilizaccedilatildeo das tecnologias digitais

tem atingido vaacuterios segmentos educacionais em diferentes niacuteveis e complexidades O resultado da

pesquisa revelou que os professores compreendem a necessidade da formaccedilatildeo continuada conforme

expresso em seus depoimentos Mostra que a maioria dos professores jaacute havia realizado algum curso

na modalidade de EAD e que os professores que fizeram o curso pela primeira vez utilizando a moda-

lidade de EAD ficaram entusiasmados com o ambiente virtual de aprendizagem com as ferramentas

de interaccedilatildeo utilizadas e com a mediaccedilatildeo do tutor superaram suas dificuldades iniciais A pesquisa

evidenciou que o uso das miacutedias integradas favoreceu o aprendizado e propiciou o sucesso no curso

Na anaacutelise da pesquisa verificou-se que a tutoria foi fundamental para o incentivo ao acesso

do curso a participaccedilatildeo nas atividades a motivaccedilatildeo para superar as dificuldades bem como para o

processo de constituiccedilatildeo da aprendizagem Considerando a proposta do Curso de Disseminadores

da Educaccedilatildeo Fiscal que visa agrave contribuiccedilatildeo com a formaccedilatildeo permanente dos sujeitos com foco na

participaccedilatildeo nos processos de geraccedilatildeo aplicaccedilatildeo e fiscalizaccedilatildeo dos recursos puacuteblicos os professo-

res ao participar do curso realizam atividades com os alunos abordando a temaacutetica Ressaltamos

a importacircncia do trabalho de investigaccedilatildeo para o contexto educacional envolvendo a formaccedilatildeo

continuada de professores na modalidade de EAD sobretudo na temaacutetica da Educaccedilatildeo Fiscal por

propiciar a participaccedilatildeo dos sujeitos da sociedade na fiscalizaccedilatildeo dos recursos puacuteblicos o que vem

ao encontro de recentes movimentos em prol da democratizaccedilatildeo da informaccedilatildeo da transparecircncia e

do combate agrave corrupccedilatildeo

Os achados da pesquisa revelam que a sensibilizaccedilatildeo e a mobilizaccedilatildeo dos cursistas contribuem

de forma significante para o sucesso da formaccedilatildeo ou seja a maneira como a turma eacute formada incide

sobre os resultados de conclusatildeo do curso Eacute portanto relevante o papel da tutoria para ajudar na

superaccedilatildeo das dificuldades dos cursistas bem como na aprendizagem dos conteuacutedos estudados

Observamos a relaccedilatildeo de identificaccedilatildeo e cumplicidade estabelecida entre os professores e o

curso Os professores perceberam no curso uma possibilidade de formaccedilatildeo continuada para atualiza-

ccedilatildeo e ressignificaccedilatildeo dos seus conhecimentos A identificaccedilatildeo com o curso proporcionou a motivaccedilatildeo

para aplicar as temaacuteticas estudadas por meio de atividades realizadas com a comunidade escolar e

local Portanto no desenvolvimento desta pesquisa nos deparamos com a execuccedilatildeo dos projetos

pedagoacutegicos quando a obrigatoriedade era apenas para a elaboraccedilatildeo no entanto a percepccedilatildeo dos

professores de pertinecircncia do curso e dos temas estudados levou-os a serem disseminadores dos co-

nhecimentos adquiridos

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

458

REFEREcircNCIAS

ALARCAtildeO Isabel Formaccedilatildeo continuada como instrumento de profissionalizaccedilatildeo docente In VEIGA I P (Org) Caminhos da profissionalizaccedilatildeo do magisteacuterio Campinas SP Papirus 1998 p 99-122

BRASIL Ministeacuterio da Fazenda Escola de Administraccedilatildeo Fazendaacuteria Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal (PNEF) Educaccedilatildeo Fiscal no contexto Social Caderno I 3 ed Brasiacutelia Esaf 2008

______ Ministeacuterio da Fazenda Escola de Administraccedilatildeo Fazendaacuteria Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal (PNEF) Relatoacuterio de Conclusatildeo do Curso Disseminadores da Educaccedilatildeo Fiscal Brasiacutelia Esaf 2008

______ Decreto 2494 de 10 de fevereiro de 1998 Regulamenta o Art 80 da LDB (Lei nordm 939496) Revogado pelo Decreto nordm 5622 de 2005 Publicado no Diaacuterio Oficial da Uniatildeo de 1121998

CEARAacute Secretaria da Fazenda Programa Estadual de Educaccedilatildeo Fiscal Material Didaacutetico do Curso de Capacitaccedilatildeo para Disseminadores em Educaccedilatildeo Fiscal Fortaleza 2009

COMISSAtildeO NACIONAL PARA AS COMEMORACcedilOtildeES DOS DESCOBRIMENTOS PORTUGUESES Cearaacute no seacuteculo XVII Icoacute Aracati e Sobral Revista Oceanos n 41 Lisboa 2000 p 105-108

GARCIA ARETIO Lourenzo Educacioacuten a la Distancia la teoria y la pratica Espantildea UNED 2001

IMBERNON Francisco Formaccedilatildeo Continuada de Professores Traduccedilatildeo Juliana dos Santos Padilha Porto Alegre Artmed 2010

NOacuteVOA Antoacutenio (Coord) Os professores e sua formaccedilatildeo Lisboa Dom Quixote 1995

PORTO Yeda da Silva Formaccedilatildeo continuada a praacutetica pedagoacutegica recorrente In MARIN Alda J(Org) Educaccedilatildeo continuada Campinas Papirus 2000

STUDART FILHO Carlos Paacuteginas de histoacuteria preacute-histoacuteria do Cearaacute Fortaleza Instituto do Cearaacute 1966

TARDIF Maurice Saberes docentes e formaccedilatildeo profissional Petroacutepolis Vozes 2012

TORRES Rosa Maria Tendecircncias da formaccedilatildeo docente nos anos 90 In WARDE Mirian J (Org) Novas poliacuteticas educacionais criacuteticas e perspectivas Satildeo Paulo Programa de Estudos Poacutes-graduados em Educaccedilatildeo Histoacuteria e Filosofia da Educaccedilatildeo da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica de Satildeo Paulo p 173-191 1998

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

459

Posfaacutecio Em 1998 o Governo do Estado do Cearaacute reconhecendo a relevacircncia de disseminar informaccedilotildees

relativas agrave importacircncia social do tributo instituiu o Programa Estadual de Educaccedilatildeo Tributaacuteria Decorri-

dos quinze anos e observando o passado verifica-se que muito foi realizado mas muitos passos ainda

precisam ser concretizados A sociedade cearense como as das demais unidades regionais ainda natildeo

reconhece em sua plenitude os malefiacutecios causados pela sonegaccedilatildeo fiscal Apesar dos esforccedilos das

administraccedilotildees tributaacuterias a praacutetica de evadir tributos ainda eacute socialmente tolerada natildeo gerando o

estigma social provocado por outros atos criminosos

Natildeo podemos classificar nosso paiacutes como uma naccedilatildeo pobre De fato comparaccedilotildees interna-

cionais indicam que o Brasil eacute um paiacutes de renda per capita meacutedia Natildeo obstante somos um paiacutes com

milhotildees de pessoas em situaccedilatildeo de fragilidade social principalmente na Regiatildeo Nordeste Nosso paiacutes

de renda meacutedia soacute possui muitos pobres porque eacute o paiacutes das desigualdades apresentando uma das

maiores taxas de concentraccedilatildeo de renda do mundo Os resultados negativos da desigualdade satildeo bem

conhecidos violecircncia conflitos sociais baixo crescimento econocircmico elevados gastos com atividades

de poliacutecia e carceragem

A reduccedilatildeo da desigualdade de renda em ambiente democraacutetico soacute eacute possiacutevel por dois meios

Primeiro por um sistema de transferecircncias diretas de recursos aos estratos inferiores da piracircmide de

renda Segundo por meio de uma tributaccedilatildeo justa que arrecade os tributos de forma progressiva

cobrando impostos mais elevados das pessoas com maior renda e patrimocircnio

O Sistema Tributaacuterio Brasileiro eacute fortemente regressivo porque utiliza prioritariamente a tribu-

taccedilatildeo indireta Por tradiccedilatildeo e por opccedilatildeo dos Poderes Legislativo e Executivo impostos sobre a renda e

sobre o patrimocircnio nos quais a progressividade pode ser utilizada com facilidade satildeo pouco explo-

rados no paiacutes Um elemento necessaacuterio para o desenvolvimento econocircmico brasileiro eacute sem duacutevida

a correccedilatildeo do nosso Sistema Tributaacuterio direcionando-o para um modelo progressivo Desta forma a

Educaccedilatildeo Fiscal deve ir aleacutem da simples conscientizaccedilatildeo da sociedade quanto agrave importacircncia do tributo

e aos malefiacutecios da sonegaccedilatildeo fiscal devendo tambeacutem agir de modo a conscientizar o cidadatildeo-eleitor

a exigir dos seus representantes as mudanccedilas legislativas que conduzam agrave justiccedila fiscal

A sonegaccedilatildeo fiscal intensifica o problema da desigualdade Os agentes econocircmicos que se

beneficiam do crime tributaacuterio em sua maior parte satildeo aqueles que possuem maior renda Assim as

poliacuteticas de desincentivo agrave evasatildeo fiscal indiretamente atuam no sentido de obtermos uma sociedade

com mais equidade

Evidentemente a oposiccedilatildeo inicial agrave sonegaccedilatildeo eacute feita pelos aparelhos coercitivos das admi-

nistraccedilotildees tributaacuterias Entretanto natildeo satildeo apenas a detecccedilatildeo da infraccedilatildeo a aplicaccedilatildeo da multa e a

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

460

execuccedilatildeo do creacutedito tributaacuterio as accedilotildees governamentais que devem ser adotadas para inibir a evasatildeo

Apesar da importacircncia talvez primazia da possibilidade de puniccedilatildeo como elemento incentivador do

cumprimento das obrigaccedilotildees tributaacuterias a sonegaccedilatildeo eacute impactada por aspectos culturais bem como

pela forma como os recursos arrecadados satildeo gastos

Existe um alto grau de toleracircncia cultural em relaccedilatildeo agrave sonegaccedilatildeo fiscal em nosso paiacutes Apesar

dessa constataccedilatildeo isso natildeo deve ser entendido como um elemento determiniacutestico e imutaacutevel A cul-

tura eacute dinacircmica a exemplo das grandes transformaccedilotildees culturais em relaccedilatildeo ao papel da mulher na

sociedade e a uma melhor aceitaccedilatildeo da orientaccedilatildeo sexual do indiviacuteduo a caracterizaccedilatildeo cultural da

sonegaccedilatildeo como crime social importante pode ser efetivada Neste contexto as accedilotildees de Educaccedilatildeo

Fiscal satildeo elementos catalisadores dessa bem vinda transformaccedilatildeo cultural futura

A transparecircncia na utilizaccedilatildeo dos recursos arrecadados e a participaccedilatildeo ampla da sociedade

no estabelecimento de gastos prioritaacuterios tambeacutem satildeo determinantes do grau de evasatildeo fiscal Nessa

linha as poliacuteticas de Educaccedilatildeo Fiscal devem fomentar a participaccedilatildeo popular tanto no controle social

dos governos como na elaboraccedilatildeo de orccedilamentos participativos

Os problemas existentes satildeo muitos como falta de equidade do Sistema Tributaacuterio baixa puni-

ccedilatildeo aos indiviacuteduos que praticam a evasatildeo fiscal pouca transparecircncia nos gastos e orccedilamentos imposi-

tivos Entretanto esses entraves ao desenvolvimento satildeo um grande desafio sendo a Educaccedilatildeo Fiscal

certamente indispensaacutevel para a superaccedilatildeo desses problemas

Este livro intenciona contribuir com o debate sobre Educaccedilatildeo Fiscal apresentando a visatildeo e

experiecircncia de diversos pesquisadores de vaacuterias aacutereas do conhecimento Apesar do caraacuteter multidis-

ciplinar da Educaccedilatildeo Fiscal os artigos que compotildeem este livro foram apresentados em cinco eixos

temaacuteticos que buscaram agrupar os trabalhos correlatos O livro eacute editado pela Fundaccedilatildeo Sintaf em

parceria com a Secretaria da Fazenda do Estado do Cearaacute como uma das accedilotildees comemorativas dos

quinze anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal no Cearaacute

Fortaleza 17 de marccedilo de 2014

Carlos Eduardo dos Santos Marino

Diretor Teacutecnico-Cientiacutefico da Fundaccedilatildeo Sintaf

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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Page 2: New 15 anos do Programa de Educação Fiscal do Estado do Ceará · 2019. 6. 25. · 15 anos do Programa de Educação Fiscal do Estado do Ceará 8 formação e de atuação dos autores,

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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15 ANOS DO PROGRAMA DE EDUCACcedilAtildeO FISCAL DO ESTADO DO CEARAacutememoacuterias e perspectivasISBN ndash 978-85-66674-01-9Copyright copy 2014 Ediccedilotildees Fundaccedilatildeo Sintaf

Direitos desta ediccedilatildeo reservados para

Fundaccedilatildeo Sintaf de Ensino Pesquisa Desenvolvimento Tecnoloacutegico e CulturalRua Padre Mororoacute 952 CentroCEP 60015-220 ndashndash Fortaleza CE ndashndash BrasilE-mail fundacaofundacaosintaforgbrwwwfundacaosintaforgbr

Secretaria da Fazenda do Estado do Cearaacute Avenida Alberto Nepomuceno 2 CentroCEP 60055-000 ndash Fortaleza CE ndash BrasilE-mail educacaofiscalsefazcegovbrwwwsefazcegovbr

Os conceitos e opiniotildees emitidos neste livro satildeo de inteira responsabilidade dos autores natildeo repre-sentando a opiniatildeo dos coordenadores organizadores e editores

Este E-book foi editado segundo as normas do Acordo Ortograacutefico da Liacutengua Portuguesa aprovado pelo Decreto Legislativo nordm 54 de 18 de abril de 1995 e promulgado pelo Decreto nordm 6583 de 29 de setembro de 2008

1ordf Ediccedilatildeo ndashndash 2014

Programaccedilatildeo Visual e Capa Rachel Mota Lima

Ficha de Catalogaccedilatildeo na Fonte Mordf da Conceiccedilatildeo G Lemos ndash CRB-3853

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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SumaacuterioPREFAacuteCIO 7

APRESENTACcedilAtildeO 9

PARTE I ndash EacuteTICA E CIDADANIA NO SERVICcedilO PUacuteBLICO 11

1 EDUCACcedilAtildeO FISCAL ITINERANTE UM RELATO DE EXPERIEcircNCIA NA SECRETARIA DA FAZENDA DO ESTADO DO CEARAacute 12 Argemiro Torres NetoGermana Parente Neiva Belchior

2 PROGRAMA DE EDUCACcedilAtildeO FISCAL NO BRASIL ENFATIZAR O GASTO PUacuteBLICO 20Denise Lucena Cavalcante

3 EacuteTICA NAS RELACcedilOtildeES TRIBUTAacuteRIAS 31 Hugo de Brito Machado Segundo

4 REFLEXOtildeES CONCEITUAIS E PRAacuteTICAS DO PROGRAMA ESTADUAL DE EDUCACcedilAtildeO FISCAL NO CEARAacute 47 Imaculada Maria Vidal da Silva

PARTE II ndash TRIBUTACcedilAtildeO E CIDADANIA FISCAL 63

5 A RIQUEZA AO ALCANCE DE TODOS OS TRIBUTOS 64 Alberto Amadei Neto

6 EFICIEcircNCIA DA ADMINISTRACcedilAtildeO TRIBUTAacuteRIA E REDUCcedilAtildeO DA POBREZA 105 Flaacutevio Ataliba Flexa Daltro BarretoCarlos Eduardo dos Santos Marino

7 INCONGRUEcircNCIAS DA POLIacuteTICA TRIBUTAacuteRIA NO BRASIL E O SEU CONTRIBUTO PARA A CRISE DA RELACcedilAtildeO DE TRIBUTACcedilAtildeO 132Francisco Ferreira Chagas Juacutenior

8 INFLUEcircNCIA DOS FATORES ECONOcircMICOS NA ARRECADACcedilAtildeO DA CONTRIBUICcedilAtildeO DE MELHORIA NOS MUNICIacutePIOS BRASILEIROS 151 Joseacute Flaacutevio da Silva

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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9 CIDADANIA FISCAL O DEVER FUNDAMENTAL DE PAGAR TRIBUTOS E OS DIREITOS FUNDAMENTAIS 166Marciano Buffon

10 O PROCESSO DE CODIFICACcedilAtildeO DO DIREITO TRIBUTAacuteRIO BRASILEIRO 188 Osvaldo Joseacute Rebouccedilas

11 O ORDENAMENTO JURIacuteDICO E AS ANTINOMIAS TRIBUTAacuteRIAS O LITIacuteGIO IDEOLOacuteGICO-INTERPRETATIVO ENTRE O FISCO OS TRIBUNAIS SUPERIORES E A DOUTRINA 204Tonny Iacutetalo Lima Pinheiro

12 PARA ALEacuteM DA ARREDACACcedilAtildeO A TRIBUTACcedilAtildeO COMO INSTRUMENTO DE REDUCcedilAtildeO DAS DESIGUALDADES SOCIAIS 220 Victor Hugo Cabral de Morais JuniorGermana Parente Neiva Belchior

PARTE III ndash CARGA TRIBUTAacuteRIA REFORMA TRIBUTAacuteRIA E JUSTICcedilA FISCAL 233

13 REFORMA TRIBUTAacuteRIA COM JUSTICcedilA FISCAL E SOCIAL 234 Antocircnio Gilson Aragatildeo de CarvalhoLucas Mouratildeo Aragatildeo

14 TRANSPAREcircNCIA EFICIEcircNCIA E SIMPLICIDADE A SERVICcedilO DA JUSTICcedilA FISCAL PROPOSTAS SUTIS DE REFORMAS TRIBUTAacuteRIAS 250 Fernanda Mara de Oliveira Macedo Carneiro Pacobahyba

15 CARGA TRIBUTAacuteRIA BRASILEIRA Eacute ELEVADA MITO OU VERDADE 264 Jurandir Gurgel Gondim Filho

16 REFORMA TRIBUTAacuteRIA DESENVOLVIMENTO ECONOcircMICO E JUSTICcedilA FISCAL NO BRASIL DIAGNOacuteSTICO E PERSPECTIVAS 286 Marcelo Lettieri Siqueira

PARTE IV ndash CONTROLE SOCIAL E NOVAS MIacuteDIAS 300

17 CIDADANIA FISCAL E NOVAS MIacuteDIAS 301 Debora Bezerra de Menezes Serpa MaiaAna Ceciacutelia Bezerra de Aguiar

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

6

PARTE V ndash EDUCACcedilAtildeO FISCAL NO ENSINO DESAFIOS E PERSPECTIVAS 346

20 A EDUCACcedilAtildeO FISCAL SOB A OacuteTICA DO ALUNO DA ESCOLA PUacuteBLICA ESTADUAL DO CEARAacute QUE PARTICIPA DO PROJETO BOLSA EDUCACcedilAtildeO FISCAL E CIDADANIA 347 Amilca Alves do NascimentoMirizana Alves de Almeida

21 AVALIACcedilAtildeO DO PROGRAMA DE EDUCACcedilAtildeO FISCAL DESAFIOS LIMITES E VIVEcircNCIAS DA PRAacuteTICA DOCENTE 362 Ana Cleiane Carneiro de OliveiraFernando Joseacute Pires de Sousa

22 A EXPERIEcircNCIA DA EDUCACcedilAtildeO A DISTAcircNCIA NO CENTRO DE EDUCACcedilAtildeO FISCAL PARA A CIDADANIA DA ESCOLA FAZENDAacuteRIA DE SAtildeO PAULO E O CURSO DE DISSEMINADORES DE EDUCACcedilAtildeO FISCAL 379Augusto Jeronimo Martini

23 IMPLEMENTACcedilAtildeO DO PROGRAMA NACIONAL DE EDUCACcedilAtildeO FISCAL NAS ESCOLAS ESTADUAIS SOB COMPETEcircNCIA DA CREDE 3 397 Erlane Muniz de Arauacutejo Martins

24 PROGRAMA DE EDUCACcedilAtildeO FISCAL DE FORTALEZA UM LEGADO DE CIDADANIA 408 Leonardo Costa de Almeida

25 EDUCACcedilAtildeO FISCAL ldquoSEFAZrdquo NA CIDADE CONSTITUCIONAL 421 Marcelo Arno Nerling

26 A PERCEPCcedilAtildeO DOS PROFESSORES SOBRE O CURSO DE DISSEMINADORES DA EDUCACcedilAtildeO FISCAL NO MUNICIacutePIO DE ICOacute-CE 445 Maria Nahir Batista Ferreira

POSFAacuteCIO 459

18 A EVOLUCcedilAtildeO DOS ESFORCcedilOS DE TRANSPAREcircNCIA NA GESTAtildeO PUacuteBLICA NO CEARAacute 314 Joseacute Joaquim Neto Cisne

19 A EVOLUCcedilAtildeO DA TRANSPAREcircNCIA DAS CONTAS PUacuteBLICAS E DO CONTROLE SOCIAL NO BRASIL A EXPERIEcircNCIA DO IBEF NO CEARAacute 337 Osvaldo Euclides de ArauacutejoSandra Maria Olimpio Machado

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

7

Prefaacutecio O Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal objetiva a conscientizaccedilatildeo dos cidadatildeos sobre a fun-

ccedilatildeo social dos tributos e de sua responsabilidade no controle da aplicaccedilatildeo desses recursos por meio

do exerciacutecio da cidadania buscando assim a construccedilatildeo de uma sociedade mais livre justa e solidaacuteria

preconizada na Constituiccedilatildeo Federal

No acircmbito do Estado do Cearaacute o Programa Estadual de Educaccedilatildeo Tributaacuteria (PET) foi instituiacutedo

por meio do Decreto nordm 253261998 Em seguida tendo em vista a importacircncia que o tema adquiriu

neste Estado o Decreto nordm 289002007 criou a Ceacutelula de Educaccedilatildeo Fiscal (Ceduf) na estrutura organi-

zacional da Secretaria da Fazenda (Sefaz) passando o Programa a ser chamado de Programa Estadual

de Educaccedilatildeo Fiscal (PEF) nos moldes estabelecidos pelo Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal (PNEF)

Dessa forma a criaccedilatildeo da Ceacutelula de Educaccedilatildeo Fiscal no organograma desta Secretaria da Fazen-

da ocorreu antes mesmo do Protocolo 052007 firmado durante o Encontro Nacional de Administra-

dores Tributaacuterios (Enat) que incentiva e sensibiliza os Estados a incluir uma unidade especiacutefica em suas

organizaccedilotildees fazendaacuterias destinada a desenvolver as atividades da Educaccedilatildeo Fiscal

Participar do processo de inserccedilatildeo de valores eacuteticos e da mudanccedila de perspectiva do papel da

sociedade na gestatildeo puacuteblica eacute o grande desafio do PEF aliando-se por conseguinte agrave missatildeo desta

Secretaria da Fazenda de ldquocaptar e gerir os recursos financeiros para o desenvolvimento sustentaacutevel do

Estado e promover a cidadania fiscalrdquo

Ao longo de duzentos anos de histoacuteria a Administraccedilatildeo Tributaacuteria cearense tem buscado pro-

mover o processo de crescimento e modernizaccedilatildeo do Estado incrementar as condiccedilotildees de vida da

populaccedilatildeo mediante a captaccedilatildeo dos recursos a serem aplicados nos diversos setores da sociedade

bem como melhorar a relaccedilatildeo entre Fisco contribuinte e sociedade o que gera impacto na qualidade

da receita e do gasto conscientizando a coletividade acerca do dever fundamental de pagar tributo

Verifica-se portanto que o Programa de Educaccedilatildeo Fiscal ocupa posiccedilatildeo relevante natildeo apenas

no acircmbito da Administraccedilatildeo Tributaacuteria mas se revela como uma importante poliacutetica de governo ao

priorizar o ator e o sujeito social que eacute foco desta gestatildeo o cidadatildeo

Em 2013 a Educaccedilatildeo Fiscal do Cearaacute completou 15 anos sendo o momento oportuno de re-

forccedilar os acertos e refletir sobre novas estrateacutegias para permitir a sustentabilidade do Programa Satildeo

vivenciados novos paradigmas e novos conceitos o que impotildee um novo perfil de servidor e de gestatildeo

puacuteblica bem como novos mecanismos de sensibilizaccedilatildeo e empoderamento do tema pela sociedade

Este livro reuacutene artigos acadecircmicos sobre temas abordados pela Educaccedilatildeo Fiscal e experiecircn-

cias bem sucedidas que marcaram a histoacuteria do PEF Cearaacute sendo uma das accedilotildees comemorativas do

seu aniversaacuterio de 15 anos Os estudos trazem interessantes abordagens tendo em vista a aacuterea de

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

8

formaccedilatildeo e de atuaccedilatildeo dos autores natildeo seguindo necessariamente o entendimento que vem sendo

adotado por esta Administraccedilatildeo Tributaacuteria O conhecimento eacute um processo nunca esgotado estando

em constante construccedilatildeo por isso a importacircncia de o Fisco estar aberto e reflexivo ao olhar da socie-

dade A Educaccedilatildeo Fiscal eacute um instrumento de diaacutelogo com a coletividade em suas diversas instacircncias

fortalecendo a legitimaccedilatildeo do tributo o acesso agrave informaccedilatildeo e ainda o controle social

Natildeo podemos deixar de expressar nossa alegria diante do interesse dos servidores e pesqui-

sadores em relaccedilatildeo ao tema e ainda nossa gratidatildeo aos teacutecnicos e professores que gentilmente

aceitaram o nosso convite em participar da obra contribuindo ainda mais com um enfoque cientiacutefi-

co do livro Agradecemos ainda a parceria da Fundaccedilatildeo Sintaf pelo seu compromisso com a cultura

e a pesquisa natildeo apenas no acircmbito da classe fazendaacuteria mas pelas accedilotildees voltadas a toda sociedade

bem como a AAFEC que possibilitou a diagramaccedilatildeo deste e-book que foi feita pela artista graacutefica

Rachel Lima

Aproveitamos a oportunidade para destacar o valoroso trabalho desenvolvido pela equipe da

Ceacutelula de Educaccedilatildeo Fiscal na disseminaccedilatildeo do PEF e em especial na conduccedilatildeo deste E-book desde a

sua iniciativa divulgaccedilatildeo do edital seleccedilatildeo e formataccedilatildeo dos artigos

Esperamos que a obra possa contribuir com o debate dos temas abordados pelo PEF e com a

disseminaccedilatildeo da cidadania fiscal

Fortaleza 20 de marccedilo de 2014

Joatildeo Marcos Maia

Secretaacuterio da Fazenda do Estado do Cearaacute

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

9

Apresentaccedilatildeo No Estado do Cearaacute o Programa de Educaccedilatildeo Fiscal eacute desenvolvido na Sefaz por intermeacutedio da Ceacutelula de Educaccedilatildeo Fiscal (Ceduf) tendo completado em 2013 15 anos de existecircncia O trabalho eacute realizado em parceria com a Secretaria da Receita Federal do Brasil da 3ordf Regiatildeo da Prefeitura Mu-nicipal de Fortaleza por meio das Secretarias de Financcedilas e Educaccedilatildeo do Municiacutepio da Secretaria de Educaccedilatildeo do Estado e do Centro Regional da Esaf (Centresaf) que constituem o Grupo de Educaccedilatildeo Fiscal Estadual (Gefe) Apesar de o termo ldquocidadania fiscalrdquo ser ainda pouco difundido na literatura e na Administraccedilatildeo Puacuteblica eacute indiscutiacutevel que seu conteuacutedo ultrapassa uma visatildeo meramente fiscalista Eacute preciso romper o dogma de que o conhecimento do tributo eacute algo distante e complexo limitado aos teacutecnicos e es-pecialistas em Tributaccedilatildeo e Financcedilas Puacuteblicas De nada adianta o conhecimento adquirido se ele natildeo eacute compartilhado principalmente com a sociedade que eacute a detentora legiacutetima do dever fundamental de pagar tributo e de fiscalizar a utilizaccedilatildeo dos recursos puacuteblicos Antes de servir ao puacuteblico o servidor eacute cidadatildeo O servidor puacuteblico fazendaacuterio eacute importante para que o Estado possa efetivamente realizar a justiccedila social principalmente no acircmbito do Estado do Cearaacute jaacute conhecido por seus inuacutemeros problemas sociais Dessa forma ao fazer parte do corpo fun-cional da Administraccedilatildeo Tributaacuteria deve-se ter em mente a dupla funccedilatildeo que exerce cidadatildeo e agente do Fisco Foi exatamente dentro dessa perspectiva que surgiu a ideia do E-book da vontade de poder compartilhar entendimentos visotildees e percepccedilotildees diferentes (e muitas vezes ateacute contraditoacuterias) acerca dos temas abordados pelo Programa de Educaccedilatildeo Fiscal Acreditamos que o conhecimento eacute liberta-dor e que estar aberto ao ldquonovordquo eacute um desafio de todo ser humano e principalmente da Administra-ccedilatildeo Puacuteblica A Administraccedilatildeo Tributaacuteria por ser uma instituiccedilatildeo puacuteblica quase bicentenaacuteria que cuida dos recursos financeiros da sociedade tem assim sua missatildeo fortalecida ao publicar uma obra que conteacutem estudos e relatos de experiecircncia sobre a Educaccedilatildeo Fiscal O livro possui 25 (vinte e cinco) artigos divididos em cinco eixos temaacuteticos (i) Eacutetica e cidadania no serviccedilo puacuteblico (ii) Tributaccedilatildeo e cidadania fiscal (iii) Carga tributaacuteria reforma tributaacuteria e justiccedila fis-cal (iv) Controle social e novas miacutedias e por fim (v) Educaccedilatildeo fiscal no ensino desafios e perspectivasAgradecemos a participaccedilatildeo dos autores que tiveram seus trabalhos selecionados pela Comissatildeo Ava-liadora Amilca Alves do Nascimento Ana Ceciacutelia Bezerra de Aguiar Ana Cleiane Carneiro de Oliveira Antocircnio Gilson Aragatildeo de Carvalho Carlos Eduardo dos Santos Marino Debora Bezerra de Menezes Serpa Maia Erlane Muniz de Arauacutejo Martins Fernanda Mara de Oliveira Macedo Carneiro Pacobahyba Fernando Joseacute Pires de Sousa Francisco Ferreira Chagas Juacutenior Germana Parente Neiva Belchior Joseacute Flaacutevio da Silva Joseacute Joaquim Neto Cisne Leonardo Costa de Almeida Lucas Mouratildeo Aragatildeo Maria Nahir Batista Ferreira Mirizana Alves de Almeida Osvaldo Euclides de Arauacutejo Osvaldo Joseacute Rebouccedilas Sandra Maria Olimpio Machado Tonny Iacutetalo Lima Pinheiro e Victor Hugo Cabral de Morais Junior

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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Destacamos que o livro conta tambeacutem com relatos de experiecircncia de accedilotildees desenvolvidas pela Ceacutelula de Educaccedilatildeo Fiscal da Sefaz apresentados por Argemiro Torres Neto Germana Parente Neiva Belchior e Imaculada Maria Vidal da Silva Agradecemos ainda os teacutecnicos e pesquisadores que aceitaram o nosso convite em participar do livro Alberto Amadei Neto (Receita Federal do Brasil) Augusto Jeronimo Martini (Escola Fazendaacuteria de Satildeo Paulo) Denise Lucena Cavalcante (Universidade Federal do Cearaacute e Procuradoria da Fazenda Nacional) Flaacutevio Ataliba Flexa Daltro Barreto (Universidade Federal do Cearaacute e Instituto de Pesquisa e Estrateacutegia Econocircmica do Cearaacute) Hugo de Brito Machado Segundo (Universidade Federal do Cearaacute) Jurandir Gurgel Gondim Filho (Secretaria de Financcedilas do Municiacutepio de Fortaleza) Marcelo Arno Ner-ling (Universidade de Satildeo Paulo) Marcelo Lettieri Siqueira (Receita Federal do Brasil) e Marciano Buffon (Universidade do Vale do Rio dos Sinos) Por fim nossa gratidatildeo agrave Fundaccedilatildeo Sintaf e agrave AAFEC pela parceria e a toda a equipe que com-potildee a Ceacutelula de Educaccedilatildeo de Fiscal pelo compromisso com o e-book mas ainda por acreditar que sua produccedilatildeo seria possiacutevel Noacutes que fazemos a Educaccedilatildeo Fiscal vivemos a pedagogia do ideal do afeto do conhecimento e da cidadania Afinal toda grande conquista nasce de um sonho E eacute com muita emoccedilatildeo que com-partilhamos nosso sonho com todos nossos autores e leitores na esperanccedila de que a obra estimule o diaacutelogo entre Fisco e Universidade e contribua para a realizaccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas voltadas agrave cida-dania fiscal Boa leitura a todos e a todas

Fortaleza 10 de marccedilo de 2014

Argemiro Torres NetoCoordenador do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

Orientador da Ceacutelula de Educaccedilatildeo Fiscal da Secretaria da Fazenda do Estado do Cearaacute

Sandra Maria Olimpio MachadoSecretaacuteria Executiva da Fazenda do Estado do Cearaacute

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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PARTE I

EacuteTICA E CIDADANIA NO SERVICcedilO PUacuteBLICO

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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EDUCACcedilAtildeO FISCAL ITINERANTE UM RELATO DE EXPERIEcircNCIA NA SECRETARIA

DA FAZENDA DO ESTADO DO CEARAacute

SUMAacuteRIO Introduccedilatildeo 1 A Educaccedilatildeo Fiscal na Secretaria da Fa-zenda do Estado do Cearaacute 2 O Projeto Educaccedilatildeo Fiscal Itinerante 3 Resultados obtidos Consideraccedilotildees finais Referecircncias

INTRODUCcedilAtildeO

O Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute (PEF) objetiva a conscientizaccedilatildeo dos cida-

datildeos sobre a funccedilatildeo social dos tributos e de sua responsabilidade no controle da aplicaccedilatildeo desses

recursos por meio do exerciacutecio da cidadania buscando assim a construccedilatildeo de uma sociedade mais

livre justa e solidaacuteria

Em 2013 a Educaccedilatildeo Fiscal do Cearaacute completou 15 anos sendo o momento oportuno de re-

forccedilar os acertos e refletir sobre novas estrateacutegias para permitir a sustentabilidade do Programa Ateacute

porque satildeo vivenciados novos paradigmas e novos conceitos o que impotildee um novo perfil de servidor

e de gestatildeo puacuteblica

Apesar dos expressivos resultados que o PEF tem conseguido no Estado de onde se destacam

escolas ONGs comunidades e instituiccedilotildees de ensino superior3 o Programa tem tido dificuldade de

alcanccedilar o puacuteblico interno em especial os servidores e colaboradores da Sefaz que essencialmente

devem ser educadores fiscais o que releva um aparente paradoxo O senso comum incluiacutedo o corpo

funcional do Fisco estadual eacute de que a praacutetica da Educaccedilatildeo Fiscal estaacute limitada agrave exigecircncia do docu-

mento fiscal e que uma Administraccedilatildeo Tributaacuteria deve exclusivamente se preocupar com a arrecada-

ccedilatildeo Eacute difiacutecil perceber e internalizar o que significa a funccedilatildeo social do tributo bem como a essecircncia de

ser um servidor cidadatildeo

1 Auditor Fiscal da Receita Estadual Orientador da Ceacutelula de Educaccedilatildeo Fiscal da SefazCe e Coordenador do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute E-mail argemirotorressefazcegovbr2 Auditora Fiscal Juriacutedica da Receita Estadual Doutoranda em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina Mestre em Direito pela Universidade Federal do Cearaacute Professora universitaacuteria E-mail germana_belchioryahoocombr germanabelchiorsefazcegovbr 3 Os relatoacuterios com todas as atividades realizadas e os resultados obtidos pelo Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute podem ser visualizados no siacutetio da SefazCe wwwsefazcegovbreducacaofiscal

Argemiro Torres Neto1

Germana Parente Neiva Belchior2

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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Diante disso surgiu o Projeto Educaccedilatildeo Fiscal Itinerante cujo objetivo eacute despertar criticamente

o corpo funcional da Secretaria da Fazenda acerca dos temas abordados pela Educaccedilatildeo Fiscal e refletir

como e em que medida o PEF pode ser inserido no exerciacutecio das funccedilotildees e no cotidiano da Adminis-

traccedilatildeo Tributaacuteria

A metodologia utilizada para elaboraccedilatildeo deste trabalho eacute descritiva exploratoacuteria e puramente

indutiva com abordagem qualitativa na medida em que busca explicar o Projeto Educaccedilatildeo Fiscal Itine-

rante apontar sua justificativa metodologia desenvolvimento e principais resultados obtidos Nessa

linha como se trata de um relato de experiecircncia eacute importante ressaltar que o foco natildeo seraacute teoacuterico

mas essencialmente praacutetico

Em um primeiro momento seraacute feito um breve escorccedilo histoacuterico acerca do Programa de Educa-

ccedilatildeo Fiscal no acircmbito da Secretaria da Fazenda do Estado do Cearaacute para em seguida analisar o desen-

volvimento do Projeto Educaccedilatildeo Fiscal Itinerante Por fim seratildeo expostos os resultados obtidos com

as visitas realizadas a fim de que se possa refletir como o Projeto pode influenciar uma mudanccedila de

comportamento funcional bem como a dinacircmica da gestatildeo fazendaacuteria

1 A EDUCACcedilAtildeO FISCAL NA SECRETARIA DA FAZENDA DO ESTADO DO CEARAacute

Por ocasiatildeo da 82ordf Reuniatildeo do Conselho Nacional de Poliacutetica Fazendaacuteria (Confaz) sobre Ad-

ministraccedilatildeo Tributaacuteria em Fortaleza foi celebrado em 1996 o Convecircnio de Cooperaccedilatildeo Teacutecnica que

inseriu o tema ldquoEducaccedilatildeo Tributaacuteriardquo como uma diretriz a ser desenvolvida pelos Fiscos

Em 1997 ocorreu a criaccedilatildeo do Grupo Nacional de Educaccedilatildeo Tributaacuteria (GET) com a participaccedilatildeo da

Secretaria da Fazenda do Estado do Cearaacute que vinha de uma experiecircncia anterior com o Projeto ldquoCi-

dadatildeo desde pequenordquo conhecido como ldquoABC da Cidadaniardquo realizado nas escolas do municiacutepio de

HorizonteCe (RIVILLAS VILARDEBOacute MOTA 2010)

No acircmbito do Estado do Cearaacute o Programa Estadual de Educaccedilatildeo Tributaacuteria (PET) foi instituiacutedo

por meio do Decreto nordm 253261998 Em seguida tendo em vista a importacircncia que o tema adquiriu

neste Estado o Decreto nordm 289002007 (CEARAacute 2007) criou a Ceacutelula de Educaccedilatildeo Fiscal (Ceduf) na

estrutura organizacional da Secretaria da Fazenda passando o Programa a ser chamado de Programa

Estadual de Educaccedilatildeo Fiscal (PEF) nos moldes estabelecidos pelo Programa Nacional de Educaccedilatildeo

Fiscal

Participar do processo de inserccedilatildeo de valores eacuteticos e da mudanccedila de perspectiva do papel

da sociedade na gestatildeo puacuteblica eacute o grande desafio do PEF aliando-se por conseguinte agrave missatildeo da

Secretaria da Fazenda para o quadriecircnio 2011-2014 de ldquocaptar e gerir os recursos financeiros para o

desenvolvimento sustentaacutevel do Estado e promover a cidadania fiscalrdquo

Verifica-se portanto que o Programa de Educaccedilatildeo Fiscal ocupa posiccedilatildeo relevante natildeo apenas

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

14

no acircmbito da Administraccedilatildeo Tributaacuteria cearense mas se revela como uma importante poliacutetica de Esta-

do ao priorizar o ator e o sujeito social o cidadatildeo

Apesar de o termo ldquocidadania fiscalrdquo ser polissecircmico e complexo ainda pouco difundido na lite-

ratura seu conteuacutedo ultrapassa uma visatildeo meramente fiscalista focando-se em uma moral tributaacuteria

(TIPKE 2012) Cidadania fiscal eacute portanto um conceito bem mais amplo do que cidadania tributaacuteria

Inicia na essecircncia da cidadania perpassando a legitimaccedilatildeo do tributo e a moral tributaacuteria o que re-

forccedila sua qualificaccedilatildeo enquanto dever fundamental (BUFFON 2009) Passa ainda pelo controle social

dos recursos puacuteblicos sendo a questatildeo do gasto uma importante vertente da cidadania fiscal

Natildeo basta pois arrecadar Eacute importante reforccedilar a tributaccedilatildeo como instrumento de desenvolvi-

mento e natildeo apenas uma simples fonte de receita sendo a educaccedilatildeo fiscal um mecanismo para discu-

tir alguns dos principais problemas apontados no atual sistema tributaacuterio brasileiro tais como evasatildeo

fiscal estruturas impositivas regressivas bem como a funccedilatildeo extrafiscal tributo que gira em torno do

bem estar social e de melhoria da qualidade ambiental (CORBACHO CIBILS LORA 2013)

No Estado do Cearaacute o Programa de Educaccedilatildeo Fiscal eacute desenvolvido na Sefaz por intermeacutedio

da Ceacutelula de Educaccedilatildeo Fiscal (Ceduf) tendo completado 15 anos de existecircncia O trabalho eacute realizado

em parceria com a Secretaria da Receita Federal do Brasil da 3ordf Regiatildeo da Prefeitura Municipal de For-

taleza por meio das Secretarias de Financcedilas e Educaccedilatildeo do Municiacutepio da Secretaria de Educaccedilatildeo do

Estado e do Centro Regional da Esaf (Centresaf) que constituem o Grupo de Educaccedilatildeo Fiscal Estadual

(Gefe)4

Elaborar a poliacutetica econocircmico tributaacuteria do Estado administrar a Fazenda Puacuteblica (tributaccedilatildeo

arrecadaccedilatildeo e fiscalizaccedilatildeo) e gerenciar o sistema de execuccedilatildeo orccedilamentaacuteria financeira contaacutebil e

patrimonial da Administraccedilatildeo Puacuteblica satildeo as atribuiccedilotildees institucionais da Receita Estadual do Cearaacute

conforme consta do art 2ordm do Decreto nordm 29201 de 28 de fevereiro 2008 que aprova o regulamento

interno da Sefaz (CEARAacute 2008)

A legislaccedilatildeo tributaacuteria deve ser clara e transparente cuja interpretaccedilatildeo deve ser acessiacutevel agrave so-

ciedade e natildeo apenas aos teacutecnicos A elaboraccedilatildeo de um parecer juriacutedico e de uma informaccedilatildeo fiscal

deve ter como foco o interesse puacuteblico primaacuterio qual seja da sociedade e natildeo de grupos especiacuteficos

atendidos os princiacutepios da legalidade impessoalidade moralidade publicidade e eficiecircncia Deve-se

aplicar diuturnamente a Constituiccedilatildeo Federal Lei Maior de um Estado que estaacute acima de decretos

regulamentos e regimes especiais de tributaccedilatildeo tendo em vista o princiacutepio da supremacia da Consti-

tuiccedilatildeo tatildeo difundido na literatura e no Judiciaacuterio brasileiro

Eacute preciso portanto refletir acerca da funccedilatildeo do servidor puacuteblico e do papel que exerce no Esta-

do bem como ele pode (e deve) desempenhar as suas atividades de forma eacutetica e eficiente A celeri-

4 O Acordo de Cooperaccedilatildeo Teacutecnica nordm 0012013 (SefazSeducSefinSRBCentresaf) assinado em 20 de dezembro de 2013 institucionalizou o Grupo de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute com o objetivo de implantar executar e monitorar o PEF

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

15

dade e a eficiecircncia do processo administrativo tributaacuterio a maacutecula ao ldquojogo de influecircncia e de favoresrdquo

a transparecircncia das informaccedilotildees o combate agrave corrupccedilatildeo a fiscalizaccedilatildeo adequada a racionalidade e o

controle social do gasto puacuteblico e a excelecircncia no atendimento e no tratamento dispensados aos con-

tribuintes satildeo alguns valores que devem ser incorporados e seguidos natildeo apenas por uma imposiccedilatildeo

legal mas principalmente por ser uma obrigaccedilatildeo moral

Por outro lado a previsatildeo da Educaccedilatildeo Fiscal no Planejamento Estrateacutegico da Sefaz (2011-

2014) como um projeto prioritaacuterio natildeo eacute por si soacute suficiente para a transformaccedilatildeo de uma nova

cultura tributaacuteria por isso que o empoderamento do tema pelos servidores eacute emergencial O PEF natildeo

eacute impositivo devendo ser internalizado aos poucos a partir de um processo de legitimaccedilatildeo que eacute di-

nacircmico e contiacutenuo o que justifica a necessidade de accedilotildees endoacutegenas

2 O PROJETO EDUCACcedilAtildeO FISCAL ITINERANTE

Diante da necessidade de difundir os temas abordados pelo PEF para o puacuteblico interno o Se-

cretaacuterio da Fazenda Joatildeo Marcos Maia aprovou por intermeacutedio da Comunicaccedilatildeo Interna nordm 017 de

13 de maio de 2013 enviada pela Ceacutelula de Educaccedilatildeo Fiscal o Projeto Educaccedilatildeo Fiscal Itinerante como

uma accedilatildeo comemorativa dos 15 anos do PEF Cearaacute Em seguida o Projeto foi ratificado pelo Comitecirc

Executivo da Sefaz em Reuniatildeo Ordinaacuteria ocorrida no dia 6 de agosto de 2013

O objetivo do Projeto eacute disseminar de forma criacutetica e reflexiva os conteuacutedos da Educaccedilatildeo Fiscal

no local de trabalho do servidor e do colaborador fazendaacuterio No momento em que o agente do Fisco

incorporar a essecircncia da Educaccedilatildeo Fiscal eacute possiacutevel a praacutexis do PEF e por conseguinte uma nova cul-

tura tributaacuteria

Ao considerar a dificuldade que os servidores e colaboradores tecircm de se ausentar do seu local

de trabalho bem como o deslocamento para os que trabalham nas unidades do interior do Estado o

Projeto Educaccedilatildeo Fiscal Itinerante eacute desenvolvido por meio de visitas in loco Dessa forma a equipe da

Ceacutelula de Educaccedilatildeo Fiscal se dirige agraves unidades fazendaacuterias para dialogar sobre os temas abordados

pela Educaccedilatildeo Fiscal com os colegas

As visitas duram cerca de 1 hora e ocorrem durante o horaacuterio de expediente normal tendo sido

agendadas previamente com a gerecircncia de cada setor Nas unidades de atendimento como ocorre com

as Ceacutelulas de Execuccedilatildeo Tributaacuteria as visitas ocorrem durante o horaacuterio interno de 730h agraves 830h a fim

de que natildeo prejudique o atendimento ao puacuteblico que inicia agraves 830h Jaacute nas demais unidades o horaacuterio

eacute combinado com o gestor de modo que seja compatiacutevel com o exerciacutecio das atividades funcionais

Cada servidor recebe um kit do PEF contendo folder laacutepis bloco de anotaccedilotildees e marcador de

paacutegina Satildeo apresentados tambeacutem outros materiais pedagoacutegicos que satildeo utilizados nas escolas uni-

versidades ONGs e cursos a distacircncia

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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A metodologia se daacute por meio de slides com problematizaccedilotildees a fim de que os servidores re-

flitam sobre o conteuacutedo e exponham de maneira informal suas percepccedilotildees individuais e coletivas O

conhecimento natildeo eacute imposto mas construiacutedo a partir da participaccedilatildeo dos colegas numa abordagem

construtivista (FREIRE 1987) Os servidores da Ceduf estimulam o diaacutelogo de modo que se cria um

ambiente favoraacutevel a discussotildees e interaccedilatildeo entre os participantes

Satildeo feitas as seguintes indagaccedilotildees (i) Qual eacute a relaccedilatildeo da tributaccedilatildeo com a cidadania (ii) Qual

eacute a percepccedilatildeo do indiviacuteduo em relaccedilatildeo ao Estado (iii) O que vocecirc entende por Educaccedilatildeo Fiscal (iv) O

que significa ser servidor cidadatildeo (v) O que a cidadania tem a ver com as suas atividades na Sefaz (v)

Como ser um colaborador da Educaccedilatildeo Fiscal

A ideia eacute que com o desenvolvimento das respostas a partir da discussatildeo no grupo o partici-

pante possa elaborar um juiacutezo loacutegico dedutivo e reflexivo da Educaccedilatildeo Fiscal partindo do geral para

o especiacutefico Ao final espera-se que o servidor saia motivado a desenvolver a Educaccedilatildeo Fiscal nas suas

atividades funcionais motivo pelo qual satildeo distribuiacutedas fichas de colaboradores para diagnosticar

quem tem interesse em contribuir com o PEF

3 RESULTADOS OBTIDOS

No ano de 2013 o Projeto foi desenvolvido em 11 (onze) unidades na seguinte ordem Ceacutelula

de Execuccedilatildeo Tributaacuteria de Sobral Ceacutelula de Execuccedilatildeo Tributaacuteria da Aacutegua Fria Ceacutelula de Execuccedilatildeo Tri-

butaacuteria da Barra do Cearaacute Ceacutelula de Execuccedilatildeo Tributaacuteria do Centro Ceacutelula de Execuccedilatildeo Tributaacuteria da

Parangaba Ceacutelula de Execuccedilatildeo Tributaacuteria de Messejana Ceacutelula de Substituiccedilatildeo Tributaacuteria e Comeacutercio

Exterior Ceacutelula de Execuccedilatildeo Tributaacuteria de Caucaia Ceacutelula de Execuccedilatildeo Tributaacuteria de Maracanauacute Ceacutelula

de Gestatildeo Fiscal dos Macrossegmentos Econocircmicos e Ceacutelula de Gestatildeo Fiscal dos Setores Econocircmicos

Ao total foram 251 (duzentos e cinquenta um) servidores e colaboradores que participaram do Proje-

to demonstrando estarem abertos e disponiacuteveis para conhecer os temas abordados5

Apoacutes a realizaccedilatildeo das visitas foram encaminhadas por e-mail as seguintes perguntas aos par-

ticipantes (i) ldquoComo vocecirc avalia o Projeto Educaccedilatildeo Fiscal Itineranterdquo e (ii) ldquoEm que medida o Projeto

Educaccedilatildeo Fiscal Itinerante influenciou a sua percepccedilatildeo em relaccedilatildeo ao Programa de Educaccedilatildeo Fiscalrdquo

Dentre as manifestaccedilotildees recebidas destaca-se a opiniatildeo dos servidores da Ceacutelula de Execuccedilatildeo Tri-

butaacuteria (Cexat) da Parangaba6 ldquoO Projeto Educaccedilatildeo Fiscal Itinerante eacute um instrumento importante

agrave sociedade criando condiccedilotildees para uma relaccedilatildeo harmoniosa entre o Estado (fisco) e os cidadatildeos

sensibilizando-os para a funccedilatildeo socioeconocircmica de arrecadaccedilatildeo de tributosrdquo Destacaram ainda que

ldquoas parcerias com outros oacutergatildeos como CRC Secretaria de Educaccedilatildeo TCM e Escolas foram de muita im-

5 Segundo a Ceacutelula de Informaccedilatildeo e Normas (Cenor) em consulta realizada no dia 20 de janeiro de 2014 no Sistema PDF a Sefaz possui 1541 servidores em atividade e 1356 servidores aposentados6 A compilaccedilatildeo das respostas dos servidores da Cexat Parangaba foi encaminhada pela colega Dulcicleacuteia Gomes Palheta

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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portacircncia para que os jovens e adultos tenham uma consciecircncia eacutetica e justa com o trato da aplicaccedilatildeo

dos recursosrdquo

O servidor Manoel Ferreira Lima Neto lotado na Ceacutelula de Execuccedilatildeo Tributaacuteria (Cexat) de Mes-

sejana expocircs o seguinte ldquoAvalio de forma positiva este trabalho de esclarecimento da importacircncia da

Educaccedilatildeo Fiscal e desejo que este projeto se estenda agraves escolas O Projeto ampliou meu conhecimento

sobre o assunto pois tinha uma visatildeo muito fiscalrdquo

Os servidores Carlos Eduardo Marino e Joselias Lopes lotados na Ceacutelula de Gestatildeo Fiscal dos

Macrossegmentos Econocircmicos (Cemas) destacaram a importacircncia do envolvimento da sociedade nas

accedilotildees da Educaccedilatildeo Fiscal

A iniciativa da Ceacutelula de Educaccedilatildeo Fiscal eacute fundamental para que os servidores da Se-cretaria da Fazenda compreendam a necessidade das accedilotildees desenvolvidas no acircmbito da Educaccedilatildeo Fiscal principalmente as externas A atividade de arrecadar e fiscalizar eacute estigmatizada por alguns setores sociais Desta forma buscar o apoio da sociedade eacute de grande importacircncia para a Administraccedilatildeo Tributaacuteria Para tanto eacute preciso levar aos agentes sociais informaccedilotildees quanto aos benefiacutecios gerados pelo uso dos valores arrecadados bem como esclarecer que a evasatildeo fiscal aleacutem de privar o Estado dos seus recursos resulta no enriquecimento indevido do sonegador

Na Ceacutelula de Gestatildeo Fiscal dos Setores Econocircmicos (Cesec) a servidora Ana Paula Bezerra Pi-nheiro lotada na Setorial Alimentos afirmou que o Projeto ldquotem tudo a ver com a nossa missatildeo de servidor puacuteblicordquo Acrescentou ainda que

O Projeto Educaccedilatildeo Fiscal Itinerante foi muito elucidativo Durante a apresentaccedilatildeo pu-demos refletir melhor sobre a relaccedilatildeo da cidadania com a tributaccedilatildeo os fundamentos da educaccedilatildeo fiscal a minha relaccedilatildeo como servidor puacuteblico com a educaccedilatildeo fiscal o que a sociedade espera de noacutes servidores e o que podemos oferecer para que esta sociedade cresccedila e se fortaleccedila atraveacutes da cidadania

Questionado sobre a influecircncia do Projeto para a percepccedilatildeo interna do Programa de Educaccedilatildeo

Fiscal o gestor da Cesec Raimundo Frutuoso de Oliveira Junior apontou a necessidade de desmistifi-

car o PEFHaacute na Sefaz principalmente nas atividades fiscalizatoacuterias um desconhecimento das atividades-meio desenvolvidas na nossa casa sendo que a Educaccedilatildeo Fiscal natildeo foge a este paradigma O que o Projeto Educaccedilatildeo Fiscal Itinerante faz eacute desmistificar tal Pro-grama demonstrando a sua importacircncia institucional e social funcionando tambeacutem como um meio de incentivo para o engajamento dos servidores fazendaacuterios nestas atividades Por isso entendo que o Projeto eacute de importacircncia extrema para a Sefaz por albergar a funccedilatildeo social da nossa instituiccedilatildeo

Em 2014 pretende-se concluir as visitas nas outras unidades da Capital e fomentar o processo

de interiorizaccedilatildeo do PEF Aleacutem disso a equipe da Ceduf retornaraacute aos locais inicialmente visitados a

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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fim de discutir temas especiacuteficos sugeridos pelos servidores e captar o niacutevel de internalizaccedilatildeo da Edu-

caccedilatildeo Fiscal

Diante da boa aceitaccedilatildeo do Programa pelo puacuteblico interno seraacute oferecido em 2014 um Curso

de Formaccedilatildeo de Facilitadores em Educaccedilatildeo Fiscal com o propoacutesito de aprofundar o conhecimento do

PEF e capacitar servidores para disseminar a Educaccedilatildeo Fiscal em sua unidade e para a sociedade civil

fortalecendo assim o grupo de colaboradores do PEF

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Antes de servir ao puacuteblico o servidor eacute cidadatildeo O servidor puacuteblico fazendaacuterio eacute essencial

para que o Estado possa efetivamente realizar a justiccedila social principalmente no acircmbito do Estado

do Cearaacute jaacute conhecido por seus inuacutemeros problemas sociais Dessa forma ao fazer parte do corpo

funcional da Administraccedilatildeo Tributaacuteria deve-se ter em mente a dupla funccedilatildeo que exerce cidadatildeo e

agente do Fisco

A Educaccedilatildeo Fiscal necessariamente perpassa por todas as dimensotildees de uma Administraccedilatildeo

Tributaacuteria devendo assim ser disseminada para (e pelo) os atores que fazem o Fisco cearense

Os depoimentos relataram a importacircncia do Projeto Educaccedilatildeo Fiscal Itinerante e ressaltaram a

mudanccedila de percepccedilatildeo em relaccedilatildeo ao PEF A cultura institucional ainda eacute fiscalista mas novos cami-

nhos se abrem a partir do momento em que o servidor se mostra disponiacutevel para conhecer aprender e

vivenciar a cidadania fiscal Ateacute porque a legitimidade e a sustentabilidade do Programa de Educaccedilatildeo

Fiscal dependem de sua incorporaccedilatildeo pelo servidor fazendaacuterio Por ser uma mudanccedila de cultura eacute um

processo gradual e contiacutenuo

Dentro dessa perspectiva as entidades representativas dos servidores do Fisco cearense Sindica-

to dos Fazendaacuterios do Cearaacute (Sintaf) Associaccedilatildeo dos Auditores e Fiscais do Tesouro do Estado do Cearaacute

(Auditece) Associaccedilatildeo dos Aposentados Fazendaacuterios do Cearaacute (Aafec) e Uniatildeo dos Funcionaacuterios Fazen-

daacuterios do Estado do Cearaacute (UFFEC) exercem um importante papel para desenvolver a Educaccedilatildeo Fiscal

Sob a perspectiva de um sindicalismo social e cidadatildeo e natildeo simplesmente corporativo elas podem

disseminar a Educaccedilatildeo Fiscal como uma accedilatildeo institucional fomentando a essecircncia do servidor cidadatildeo

Eacute preciso romper o dogma de que o conhecimento do tributo eacute algo distante e complexo limi-

tado aos especialistas em Tributaccedilatildeo e Financcedilas Puacuteblicas De nada adianta o conhecimento adquirido

se ele natildeo eacute compartilhado principalmente com a sociedade que eacute a detentora legiacutetima do dever

fundamental de pagar tributo e de fiscalizar a utilizaccedilatildeo dos recursos puacuteblicos

Por fim eacute importante que o servidor no exerciacutecio de sua cidadania controle e fiscalize os atos

da Administraccedilatildeo Puacuteblica zelando pela coisa puacuteblica e fortalecendo a eacutetica institucional

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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REFEREcircNCIAS

BRASIL Ministeacuterio da Fazenda Escola Superior de Administraccedilatildeo Fazendaacuteria Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal (PNEF) Disponiacutevel em wwwesaffazendagovbr Acesso em 10 jan 2014

BUFFON Marciano Tributaccedilatildeo e dignidade humana entre os direitos e deveres fundamentais Porto Alegre Livraria do Advogado 2009

CEARAacute Decreto nordm 25326 de 23 de dezembro de 1998 Aprova a estrutura organizacional da Secre-taria da Fazenda e daacute outras providecircncias DOE 26 dez 1998

______ Decreto nordm 28900 de 27 de dezembro de 2007 Aprova a estrutura organizacional da Secre-taria da Fazenda e daacute outras providecircncias DOE 28 dez 2007

______ Decreto nordm 29201 de 28 de fevereiro de 2008 Aprova o regulamento da Secretaria da Fazen-da e daacute outras providecircncias DOE 29 fev 2008

______ Secretaria da Fazenda Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute (PEF Cearaacute) Dispo-niacutevel em wwwsefazcegovbr Acesso em 10 jan 2014

CORBACHO Ana CIBILS Vicente Fretes LORA Eduardo Recaudar no basta los impuestos como ins-trumento de desarrollo Washington Banco Interamericano de Desarrollo 2013

FREIRE Paulo Pedagogia do oprimido 17 ed Rio de Janeiro Paz e Terra 1987

RIVILLAS Borja Diacuteas VILARDEBOacute Andreacute MOTA Luiza Ondina Santos Educaccedilatildeo Fiscal no Brasil e no mundo In VIDAL Eloiacutesa Maia (org) Educaccedilatildeo Fiscal e Cidadania Fortaleza Ediccedilotildees Demoacutecrito Ro-cha 2010

TIPKE Klaus Moral Tributaacuteria do Estado e dos Contribuintes Porto Alegre Sergio Antocircnio Fabris

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PROGRAMA DE EDUCACcedilAtildeO FISCAL NO BRASIL ENFATIZAR O GASTO PUacuteBLICO

Denise Lucena Cavalcante1

SUMAacuteRIO Introduccedilatildeo 1 Aleacutem da arrecadaccedilatildeo 2 O enfoque dos PEFacutes no necessaacuterio cumprimento das finalidades estatais 3 A caricatura do Estado Fiscal na imagem do leatildeo fazendaacuterio 4 A educaccedilatildeo fiscal em prol do servidor fazendaacuterio o novo perfil do servidor puacuteblico Consideraccedilotildees finais Referecircncias

INTRODUCcedilAtildeO

Analisando os programas de educaccedilatildeo fiscal no Brasil percebemos que eles evoluiacuteram bas-

tante nos uacuteltimos anos e bem agiram quando ampliaram seus objetivos transpondo a arrecadaccedilatildeo

e passaram a enfocar tambeacutem como meta a atuaccedilatildeo no cuidado da sociedade em relaccedilatildeo ao papel

econocircmico e social dos tributos englobando esclarecimentos formais sobre a aplicaccedilatildeo dos recursos2

Cumprir essa tarefa poreacutem natildeo eacute faacutecil principalmente quando haacute outros oacutergatildeos estatais praticando

atos diaacuterios de desperdiacutecio corrupccedilatildeo e maacute gestatildeo dos recursos auferidos do suor de cada brasileiro

A sociedade natildeo se satisfaz com as informaccedilotildees dos valores arrecadados pelo Fisco uma

vez que o crescimento do Paiacutes ocorre abaixo do esperado Frequentemente os cidadatildeos brasileiros

expotildeem sua insatisfaccedilatildeo no momento do pagamento de seus tributos O mecircs de janeiro represen-

ta bem esta afirmaccedilatildeo pois eacute a ocasiatildeo em que se cobram os impostos anuais como IPTU e IPVA

Em abril temos novas manifestaccedilotildees de rejeiccedilatildeo social com a declaraccedilatildeo do Imposto de Renda Satildeo

momentos bem contingentes em que a populaccedilatildeo brasileira se manifesta em relaccedilatildeo agrave tributaccedilatildeo

do Paiacutes Logo em seguida parece que se esquecem de tudo e voltam a sua rotina diaacuteria Como bem

acentua Ricardo Lobo Torres (1991 p 151) no Brasil sempre foi muito tecircnue a resistecircncia agrave opressatildeo

tributaacuteria tanto na via do pensamento como das soluccedilotildees institucionais Daiacute a importacircncia de os fis-

cos persistirem em seus programas para atuarem como parceiros da sociedade brasileira no combate

1 Poacutes-Doutora pela Universidade de Lisboa Doutora pela PUCSP Professora de Direito Tributaacuterio e Financeiro da gradua-ccedilatildeo e poacutes-graduaccedilatildeo (UFC) Procuradora da Fazenda Nacional E-mail denilucfortalnetcombr2 Na apresentaccedilatildeo do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal da SefazCE tem-se ldquoO Programa de Educaccedilatildeo Fiscal - PEF se fun-damenta na conscientizaccedilatildeo dos cidadatildeos sobre o papel econocircmico e social dos tributos Econocircmico quando se volta agrave funccedilatildeo de otimizaccedilatildeo da receita puacuteblica social quando se volta para aplicaccedilatildeo desses recursos objetivando benefiacuteciar a populaccedilatildeordquo Disponiacutevel em httpwwwsefazcegovbrcontentaplicacaointernetprogramas_campanhasgeradosproje-to_apresentacaoasp Acesso em 12 jan 2014

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agrave corrupccedilatildeo e maacute utilizaccedilatildeo dos recursos puacuteblicos

Merece aplausos a Secretaria da Fazenda do Estado do Cearaacute que ampliou sua missatildeo ante-

riormente focada na arrecadaccedilatildeo tributaacuteria passando a considerar como meta a captaccedilatildeo e geraccedilatildeo

de recursos financeiros para o desenvolvimento sustentaacutevel do Estado e promover a cidadania fiscal

Da mesma forma enaltecemos o trabalho da Ceacutelula de Educaccedilatildeo Fiscal da SefazCE na ediccedilatildeo

de obra comemorativa aos 15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal no Cearaacute de que temos a honra

de participar e exprimir algumas reflexotildees e sugestotildees para os passos seguintes desse Programa de

sucesso

1 ALEacuteM DA ARRECADACcedilAtildeO

Insistimos na ideia que o orccedilamento puacuteblico tem que ser assunto esclarecido e debatido social-

mente3 A sociedade brasileira natildeo pode mais permanecer silente e afastada das decisotildees financeiras

do Paiacutes A ideia do orccedilamento como um direito de participaccedilatildeo cidadatilde remonta agrave Idade Meacutedia e sem-

pre satildeo alvos de criacuteticas o forccedilado distanciamento popular e os constantes conflitos entre o Direito e

o Poder como jaacute denunciava Paul Laband em sua claacutessica obra sobre o Direito Orccedilamentaacuterio4

O orccedilamento eacute uma previsatildeo de receitas e despesas puacuteblicas Quanto agraves receitas a maior parte

eacute oriunda dos tributos e soacute cabe ao cidadatildeo pagaacute-los e caso natildeo o faccedilam o Estado jaacute tem todos os

meios devidos para efetivar a devida cobranccedila inclusive pela via judicial mediante a Execuccedilatildeo Fiscal

(Lei n 683080) Isto jaacute estaacute devidamente organizado pelo Poder Puacuteblico

Jaacute em relaccedilatildeo agraves despesas natildeo obstante tenha expressamente previsto na Lei de Responsabi-

lidade Fiscal5 que a previsatildeo dos gastos deveraacute sempre constar nos planos orccedilamentaacuterios na praacutetica

sabemos que tais orccedilamentos natildeo satildeo cumpridos

O orccedilamento tem como uma das suas principais finalidades a regulaccedilatildeo do gasto puacuteblico e

essa regulaccedilatildeo deve tambeacutem ser feita por intermeacutedio do controle social6 Dado que a receita e a

despesa natildeo podem estar em desacordo eacute preciso que o controle da sociedade atue com lentes de

aumento para checar as contas puacuteblicas e o estiacutemulo dos oacutergatildeos vinculados agrave arrecadaccedilatildeo tais como

3 Sobre o tema ver CAVALCANTE 2006 4 ldquoEsta exaltacioacuten eminentemente poliacutetica del Derecho presupuestario hacieacutendolo sobresalir de las restantes teoriacuteas juriacutedi-co-puacuteblicas no ha sido en modo alguno beneficiosa para el conocimiento desapasionado y objetivo del mismo Los deseos y afanes poliacuteticos consiguieron imponerse y llevar a la confusioacuten a la concepcioacuten juriacutedica pese a los esfuerzos hechos para mantenerse en el plano del Derecho positivo La vinculacioacuten de los ideales poliacuteticos a las deducciones del Derecho positivo es causa de los mayores perjuicios tanto para la poliacutetica como para el conocimiento del Derecho Para la consecucioacuten de los objetivos poliacuteticos es francamente peligroso entregarse a la ilusioacuten de poseer ya positivamente como derecho lo que se cree estar obligado a formular como imperativo en favor de una provechosa organizacioacuten del Estadordquo (LABAND 1979 p 3) 5 ldquoArt 15 Seratildeo consideradas natildeo autorizadas irregulares e lesivas ao patrimocircnio puacuteblico a geraccedilatildeo de despesa ou assun-ccedilatildeo de obrigaccedilatildeo que natildeo atendam o disposto nos arts 16 e 17 Art 16 A criaccedilatildeo expansatildeo ou aperfeiccediloamento de accedilatildeo governamental que acarrete aumento da despesa seraacute acompanhado de I - estimativa do impacto orccedilamentaacuterio-financeiro no exerciacutecio em que deva entrar em vigor e nos dois subsequumlentes II - declaraccedilatildeo do ordenador da despesa de que o au-

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os programas de educaccedilatildeo fiscal torna-se muito importante

Entendemos que os programas de educaccedilatildeo fiscal devem insistir tambeacutem no esclarecimento

da programaccedilatildeo da despesa puacuteblica antecipando-se assim ao proacuteprio controle das despesas jaacute efe-

tuadas e permitindo a participaccedilatildeo social na programaccedilatildeo preacutevia de tais despesas

A informaccedilatildeo eacute essencial para o controle social E a era da transparecircncia fiscal exige a utiliza-

ccedilatildeo de condutores eficientes para a compreensatildeo das informaccedilotildees estatais Simplesmente disponi-

bilizar dados contaacutebeis incompreensiacuteveis de informaccedilotildees puacuteblicas natildeo alcanccedila o objetivo da lei da

transparecircncia fiscal7

2 O ENFOQUE DOS PEFrsquoS NO NECESSAacuteRIO CUMPRIMENTO DAS FINALIDADES ESTATAIS

Os programas de educaccedilatildeo fiscal devem primar cada vez mais para a questatildeo do cumpri-

mento das obrigaccedilotildees estatais Os avanccedilos devem ser notados pela sociedade caso contraacuterio ela

continuaraacute desacreditada no que concerne agraves poliacuteticas fiscais E essa tarefa natildeo eacute nada faacutecil quando

a sociedade natildeo estaacute satisfeita e os direitos sociais natildeo estatildeo sendo cumpridos pelo Estado Satildeo

constantes as piadas nos meios de comunicaccedilatildeo e o Estado fica sem argumentos quando a realidade

comprova sua ineficiecircncia como nos exemplos a seguir

mento tem adequaccedilatildeo orccedilamentaacuteria e financeira com a lei orccedilamentaacuteria anual e compatibilidade com o plano plurianual e com a lei de diretrizes orccedilamentaacuterias sect 1o Para os fins desta Lei Complementar considera-se I - adequada com a lei orccedilamentaacuteria anual a despesa objeto de dotaccedilatildeo especiacutefica e suficiente ou que esteja abrangida por creacutedito geneacuterico de forma que somadas todas as despesas da mesma espeacutecie realizadas e a realizar previstas no programa de trabalho natildeo sejam ultrapassados os limites estabelecidos para o exerciacutecio II - compatiacutevel com o plano plurianual e a lei de diretrizes orccedilamentaacuterias a despesa que se conforme com as diretrizes objetivos prioridades e metas previstos nesses instrumentos e natildeo infrinja qualquer de suas disposiccedilotildees sect 2o A estimativa de que trata o inciso I do caput seraacute acompanhada das pre-missas e metodologia de caacutelculo utilizadas sect 3o Ressalva-se do disposto neste artigo a despesa considerada irrelevante nos termos em que dispuser a lei de diretrizes orccedilamentaacuterias sect 4o As normas do caput constituem condiccedilatildeo preacutevia para I - empenho e licitaccedilatildeo de serviccedilos fornecimento de bens ou execuccedilatildeo de obras II - desapropriaccedilatildeo de imoacuteveis urbanos a que se refere o sect 3o do art 182 da Constituiccedilatildeordquo6 Assim expotildee Ricardo Lobo Torres (2000 p 9) ldquoUma das caracteriacutesticas principais do constitucionalismo atual eacute a sua abertura para a participaccedilatildeo social e para o pluralismo de interesses Sob a influecircncia do princiacutepio da subsidiariedade que sinaliza no sentido do primado da sociedade sobre o Estado o orccedilamento se abre para a participaccedilatildeo social durante a sua elaboraccedilatildeo execuccedilatildeo e controle aleacutem de se deixar tocar pelas demandas em torno dos direitos difusos promovidas por oacuterccedilatildeos societais em movimento que comeccedila a ganhar corpo nos uacuteltimos anosrdquo7 Sobre o tema ver CAVALCANTE 2013 p 119-137

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A desordem das poliacuteticas fiscais estaacute frequentemente demonstrada nas charges contemporacirc-

neas E essas tambeacutem satildeo expressotildees de manifestaccedilatildeo social e natildeo devem ser ignoradas As charges

com sua plasticidade anaacuterquica tambeacutem representam os desabafos cotidianos e como bem assinala

Slavoc Zizek (2008)8 a verdade tem a estrutura de ficccedilatildeo Se os desenhos acima tivessem a foto real

de cidadatildeos e governantes atuais certamente a nossa reaccedilatildeo seria bem diferente e bem mais revol-

tante poreacutem em forma de piada rimos ingenuamente da nossa proacutepria desgraccedila

A sociedade deve ficar alerta para a importantiacutessima questatildeo da adequada aplicaccedilatildeo dos recur-

sos puacuteblicos e este eacute um espaccedilo que os programas de educaccedilatildeo fiscal devem enfatizar cada dia mais

Quando o alerta para a tributaccedilatildeo e o gasto puacuteblico vem dos proacuteprios oacutergatildeos estatais eles ficam com

maior credibilidade Exemplo que merece ser aqui citado eacute a campanha do Sindicato dos Procuradores

da Fazenda Nacional intitulada ldquoQuanto custa o Brasilrdquo9 que informa o peso da carga tributaacuteria nos

produtos e serviccedilos consumidos pela sociedade brasileira muito bem representado pela formiguinha

trabalhadora carregando o peso dos tributos

8 ldquo lsquoA verdade tem a estrutura da ficccedilatildeorsquo ndash haacute exemplo melhor dessa tese que os desenhos animados em que a verdade sobre a ordem social existente eacute mostrada diretamente de uma maneira jamais permitida no cinema narrativo com atores lsquode verdadersquo Pensemos na imagem de lutas agressivas entre animais nos desenhos animados a luta impiedosa pela so-brevivecircncia armadilhas e ataques violentos a exploraccedilatildeo dos outros como parasitas Se a mesma histoacuteria fosse contada num longa metragem com atores lsquode verdadersquo sem duacutevida seria censurada ou descartada por ser ridiacutecula e excessivamente pessimistardquo (ZIZEK 2008 p 456)9 Disponiacutevel em lthttpwwwquantocustaobrasilcombrgt Acesso em 14 jan 2014

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O principal meacuterito da campanha eacute esclarecer a sociedade a respeito do custo dos tributos inde-

vidamente oculto nas relaccedilotildees de consumo sendo muito uacutetil na implementaccedilatildeo da Lei n 127412012

ao determinar que por ocasiatildeo da venda ao consumidor de mercadorias e serviccedilos deveraacute constar

dos documentos fiscais ou equivalentes a informaccedilatildeo do valor aproximado correspondente agrave totali-

dade dos tributos federais estaduais e municipais cuja incidecircncia influi na formaccedilatildeo dos respectivos

preccedilos de venda Infelizmente ateacute o momento referida lei natildeo estaacute tendo o cumprimento devido

3 A CARICATURA DO ESTADO FISCAL NA IMAGEM DO LEAtildeO FAZENDAacuteRIO

O Estado contemporacircneo atravessa uma grande crise de moralidade decorrente de vaacuterios mo-

tivos dentre os quais destacamos a atuaccedilatildeo ineficiente das instituiccedilotildees agravada pelos inuacutemeros atos

de corrupccedilatildeo que hoje satildeo divulgados diariamente pela imprensa brasileira

O Estado Democraacutetico de Direito tem que ser levado a seacuterio e qualquer imagem que o destorccedila

deve ser esquecida como o siacutembolo do leatildeo fazendaacuterio Se for necessaacuterio um desenho figurativo do

fisco contemporacircneo devemos pensar em outro e nos livramos definitivamente da desgastada ima-

gem do leatildeo fazendaacuterio E sobre isto jaacute haviacuteamos nos manifestado

O Direito Tributaacuterio tambeacutem tem que se adaptar aos novos paradigmas da poacutes-mo-dernidade minimizando seu aspecto coercivo e burocraacutetico e muitas vezes ameaccedila-dor conforme exposto pelo proacuteprio siacutembolo da Receita Federal do Brasil que ainda hoje eacute a figura do ldquoleatildeordquo como animal representativo deste oacutergatildeo A simbologia leo-nina eacute completamente incompatiacutevel com o atual Estado Democraacutetico de Direito aleacutem de prejudicar a imagem do Fisco que insiste em uma figura propagandista da deacutecada de setenta onde ainda reinava a ditadura militar no Brasil As grandes mudanccedilas no sistema tributaacuterio brasileiro devem comeccedilar nos pequenos detalhes (sugere-se desde logo a extinccedilatildeo do inapropriado siacutembolo do leatildeo) partindo da mudanccedila burocraacutetica dos balcotildees de atendimento dos oacutergatildeos fazendaacuterios ateacute a reafirmaccedilatildeo dos princiacutepios constitucionais tributaacuterios (CAVALCANTE 2011 p 251)

De uma vez por todas o leatildeo natildeo eacute uma imagem adequada ao Estado fiscal O leatildeo eacute feroz e

considerado o rei da selva O Estado natildeo eacute uma selva e o fisco natildeo eacute a realeza Natildeo estamos mais na

Idade Meacutedia Aliaacutes nem na Antiguidade o leatildeo tinha uma imagem positiva Dante Alighieri em sua

memoraacutevel obra Divina Comeacutedia ao discorrer sobre as principais transgressotildees humanas utilizou

alegoricamente o leatildeo como siacutembolo da violecircncia10

Infelizmente essa figura do leatildeo fazendaacuterio eacute tambeacutem destaque do programa Cidadania Fiscal

10 E assim comenta o tradutor da obra Iacutetalo Mauro ldquoDante se encontra perdido numa acuteselva selvagemacute que representa o resultado do extravio da certa via da virtude Apoacutes uma noite inteira de anguacutestia ele consegue escapar da selva mas eacute impedido seguidamente por trecircs feras Alegoricamente ele natildeo estaacute livre da investida das trecircs transgressotildees principais

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onde o ldquoleatildeozinhordquo eacute o iacutecone do Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal11 voltado para o puacuteblico de

7 a 14 anos O Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal ndash PNEF eacute de oacutetima qualidade e visa a alcanccedilar

os educandos do Ensino Fundamental por meio da linguagem virtual A mensagem ali repassada eacute

adequada e oportuna contudo consideramos a insistecircncia na figura leonina totalmente indevida

(Canto XI versos 22-66) que satildeo incontinecircncia violecircncia e fraude exemplificada pelas trecircs feras respectivamente a onccedila o leatildeo e a loba que o impediam de seguir o caminho do monte que ele avista iluminado jaacute pelo Sol da Graccedila divinardquo (ALI-GHIERI 1998 p 25)11 Disponiacutevel em lthttpleaozinhoreceitafazendagovbrgt Acesso em 13 jan 2014

(Iacutecone utilizado na paacutegina eletrocircnica da Receita Federal do Brasil)

O ldquoleatildeozinhordquo realmente natildeo convence e soacute aumenta o desgaste da imagem do Fisco prevale-

cendo nas ilustraccedilotildees abundantemente encontradas nos perioacutedicos nacionais

A educaccedilatildeo fiscal deve focar seus esforccedilos cada vez mais na recuperaccedilatildeo da imagem do Fisco e

evitar siacutembolos que possam gerar polecircmicas Os servidores fazendaacuterios contemporacircneos que atuam

com zelo e dedicaccedilatildeo natildeo merecem isto Natildeo podemos mais deixar que imagens antigas de servido-

res ineficientes e de um Estado arbitraacuterio ainda sejam exaltadas Eacute preciso enfatizar que os atuais ser-

vidores fazendaacuterios assumiram seus cargos em decorrecircncia de rigorosos concursos puacuteblicos Sabem o

que devem fazer e seu trabalho deve ser reconhecido por seus meacuteritos

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4 A EDUCACcedilAtildeO FISCAL EM PROL DO SERVIDOR FAZENDAacuteRIO O NOVO PERFIL DO SERVIDOR PUacuteBLICO

Constatamos que muitas das criacuteticas feitas ao servidor puacuteblico decorrem de atos que eles rea-

lizaram no estrito cumprimento do dever legal uma vez que o ato administrativo eacute vinculado As leis

fiscais confusas e duacutebias transformam os funcionaacuterios em verdadeiros ldquobodes expiatoacuteriosrdquo de uma

poliacutetica fiscal mal elaborada conforme bem denuncia Klaus Tipke (2002 p 97)

Ahora bien si las leyes tributarias son injustas la Administracioacuten tributaria vinculada por dichas leyes no puede producir justicia alguna Por el contrario cuanto maacutes se apliquen tales leyes injustas maacutes sufriraacute la justicia tributaria Puesto que ndash injustamente ndash muchos contribuyentes no atribuyen los defectos de las leyes tributarias al lejano y anoacutenimo legislador sino al funcionario de Hacienda es eacuteste quien recibe los golpes y se convierte en ldquochivo expiatorio de una poliacutetica fiscal maltrechardquo Los responsables en el poder legislativo y en el ejecutivo esperan que los funcionarios actuacuteen como si no existiera defecto alguno

Outro ponto questionaacutevel satildeo as metas contemporacircneas da gestatildeo de governo exigidas por

vezes de agentes poliacuteticos que desconhecem a estrutura operacional dos proacuteprios oacutergatildeos de arreca-

daccedilatildeo distorcendo a funccedilatildeo dos agentes fiscais As metas com base na produtividade por exemplo

podem ser extremamente infrutiacuteferas O que eacute ser produtivo num oacutergatildeo de arrecadaccedilatildeo controle e

fiscalizaccedilatildeo Emitir autos de infraccedilatildeo Arrecadar a qualquer custo Julgar volumes de processos com-

plexos de qualquer jeito Se a produtividade representar nuacutemeros assim ocorreraacute

Quem atua diretamente na administraccedilatildeo fazendaacuteria sabe muito bem do que aqui falamos

A complexidade de cada caso eacute o que determina o tempo de execuccedilatildeo do trabalho A eficiecircncia do

serviccedilo puacuteblico deve ser medida em cada caso e natildeo por mera produtividade Em cada situaccedilatildeo o

servidor tem que observar os direitos fundamentais do cidadatildeo-contribuinte as limitaccedilotildees ao poder

de tributar previstas na Constituiccedilatildeo a lei para o caso concreto enfim um trabalho minucioso e

complexo que exige teacutecnica e conhecimento profundo do sistema juriacutedico Natildeo fosse a necessidade

de observar todo o sistema partindo das premissas constitucionais faacutecil seria o trabalho e prova-

velmente jaacute estaria delegado para um veloz programa de informaacutetica afinal o computador eacute mais

raacutepido do que a mente humana Os dados numeacutericos natildeo representam a realidade do bom serviccedilo

A mentalidade que predomina hoje com base na produccedilatildeo natildeo eacute compatiacutevel agrave complexidade do

serviccedilo da administraccedilatildeo fazendaacuteria

Outro grande equiacutevoco que temos visto se alastrar na administraccedilatildeo fazendaacuteria eacute a comparaccedilatildeo

do Estado com uma grande ldquoempresardquo e consequentemente o cidadatildeo-contribuinte como um mero

ldquoconsumidorrdquo A relaccedilatildeo entre Estado e cidadatildeo natildeo se encerra no Coacutedigo do Consumidor vai muito

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mais aleacutem Os agentes poliacuteticos de passagem deveriam entender mais da Constituiccedilatildeo Estado natildeo eacute

empresa privada e o governante natildeo eacute seu dono O Estado existe em funccedilatildeo da sociedade e seu poder

eacute limitado pelos direitos individuais servindo estes de barreiras riacutegidas ao poder estatal Assim prevecirc

a saacutebia liccedilatildeo de Geraldo Ataliba (1985 p 139)

A cidadania corresponde portanto um feixe de privileacutegios decorrentes da condiccedilatildeo da titularidade da coisa puacuteblica Desses os mais conspiacutecuos estatildeo na imunidade juriacute-dica aos excessos estatais no direito agrave resistecircncia aos abusos na prerrogativa de res-ponsabilizar os agentes excessivos e no direito agrave tutela jurisdicional contra os mesmos A cidadania criando o poder ao mesmo tempo estabelece quais os seus limites ou o periacutemetro dentro do qual tal poder haacute de circunscrever-se Assim a plenitude do prin-ciacutepio em mateacuteria de direito puacuteblico assume radical universalidade quando se trata de mateacuteria constitucional (definiccedilatildeo das liberdades puacuteblicas e organizaccedilatildeo do poder agrave vista de sua promoccedilatildeo e proteccedilatildeo mediante organizaccedilatildeo estatal) As liberdades puacuteblicas inscritas na Constituiccedilatildeo satildeo as mais expressivas balizas ao poder do Estado Configura usurpaccedilatildeo constitui-se na mais grave violaccedilatildeo constitucional o exerciacutecio ndash seja pelo Legislativo seja pelo Executivo seja pelo Judiciaacuterio ndash de ato de poder de todo tipo ou de qualquer ato de forccedila voltado contra os cidadatildeos ultrapassando essas mesmas barreiras

A prevalecircncia exagerada do Estado gestor enseja seacuterias distorccedilotildees inclusive do Direito que tem

sido reduzido a um simples saber tecnoloacutegico como bem ressalta Teacutercio Sampaio Ferraz Junior (2007

p 429)12 ldquomesmo o direito na loacutegica do Estado gestor eacute mero instrumento de atuaccedilatildeo de controle

de planejamento tornando-se a ciecircncia juriacutedica um verdadeiro saber tecnoloacutegicordquo

O servidor puacuteblico hoje tem que ir aleacutem da teacutecnica Haacute de ter uma visatildeo global conhecer o

sistema ser cortecircs ser eficiente aacutegil enfim satildeo tantas as exigecircncias que ele se encontra pressionado

por todos os lados De uma parte o cidadatildeo-contribuinte exigindo o devido tratamento e velocidade

das atuaccedilotildees e de outra o gestor exigindo resultados a qualquer custo E qual eacute o investimento que

estaacute sendo feito para estes ldquosuperfuncionaacuteriosrdquo que satildeo pressionados para cumprir horaacuterio executar

eficientemente suas tarefas suprir as deficiecircncias materiais de suas reparticcedilotildees resolver casos com-

plexos em instituiccedilotildees que sequer tecircm bibliotecas especializadas atuar em processos digitais com

12 E assim conclui com propriedade o autor ldquoEm conclusatildeo aplicando analogicamente Arendt podemos dizer por uacuteltimo que o Estado gestor burocraacutetico e tecnocraacutetico tem por imagem adequada agrave estrutura da cebola em cujo centro em uma espeacutecie de espaccedilo vazio acha-se o liacuteder ou melhor a lideranccedila E o que quer que a lideranccedila faccedila quer se integre no organismo poliacutetico como uma hierarquia de competecircncia ou oprima seus suacuteditos como um tirano ela o faz de dentro e natildeo de fora para cima Todas as partes extraordinaacuterias muacuteltiplas do movimento desse todo as organizaccedilotildees de frente poliacutetica as sociedades profissionais os efetivos dos partidos e a organizaccedilatildeo partidaacuteria as formaccedilotildees de elite e os grupos de policiamento relacionam-se de tal maneira que cada uma delas constitue camadas da cebola isto eacute mundo exterior para a cada interna e mundo interior para externa A cebola ou o poder tecnocraacutetico proporciona a cada uma de suas camadas a ficccedilatildeo de mundo normal ao lado de uma consciecircncia de ser diferente dele A estrutura de uma cebola torna enfim o Estado um sistema organizacional do poder agrave prova de choque contra a fatualidade do mundo real o que quer que aconteccedila ele eacute necessaacuteriordquo (FERRAZ JUacuteNIOR 2007 p 429)13 No capiacutetulo A BABA DA LESMA o personagem Dom Rigoberto desabafa ao seu chefe ldquoEmbora eu saiba de sobra que o

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equipamentos ultrapassados e ainda levar trabalhos extras para concluir em casa

Temos de admitir que muitos de noacutes conhecemos alguns servidores que seguem agrave risca a ima-

gem cocircmica descrita pelo gecircnio de um precircmio Nobel de literatura Mario Vargas Llosa do servidor

embrutecido pela rotina burocraacutetica de sua reparticcedilatildeo que se arrasta em seus dias compridos com

uma uacutenica motivaccedilatildeo a aposentadoria Este perfil asfixiante do personagem Dom Rigoberto13 deve

ser evitado a qualquer custo

Felizmente entretanto o modelo ldquoDom Rigobertordquo estaacute a cada dia sendo exceccedilatildeo na ad-

ministraccedilatildeo fazendaacuteria Ao contraacuterio desse estereoacutetipo enfraquecido encontramos hoje uma seacuterie

de jovens servidores entusiasmados com suas funccedilotildees e que lutam constantemente por melhores

condiccedilotildees de trabalho Quem conhece bem o serviccedilo puacuteblico sabe que natildeo haacute mais espaccedilo para

acomodaccedilatildeo Hoje predomina a proatividade Precisamos adequar o Estado para esta nova geraccedilatildeo

Esses satildeo os jovens que atuam na administraccedilatildeo puacuteblica com domiacutenio da informaacutetica velocidade do

pensamento e novos meacutetodos

Natildeo podemos tambeacutem limitaacute-los a uma estrutura arcaica e gerida pela Era da escrita Os jovens

servidores comumente satildeo exiacutemios operadores dos sistemas virtuais Quando mencionamos aqui esta

questatildeo da tecnologia eacute para alertar aos programas de educaccedilatildeo fiscal a abrir um campo de debate

sobre uma nova eacutetica no governo eletrocircnico Boas condutas devem ser preservadas e estimuladas po-

reacutem natildeo se pode limitar o acesso agrave informaacutetica com base em suposiccedilotildees de abusos casuais Exemplo

do que aqui discutimos satildeo as redes sociais As limitaccedilotildees no serviccedilo puacuteblico a estas redes tecircm que ser

mais bem repensadas afinal a informaacutetica estaacute totalmente inserida na dinacircmica do proacuteprio serviccedilo

No acircmbito da fiscalizaccedilatildeo inclusive eacute imprescindiacutevel pois jaacute haacute alguns anos que atuamos na auditoria

computadorizada no governo eletrocircnico no e-processo enfim na Era do mundo virtual Limitaccedilotildees

generalizadas e sem paracircmetros a determinados sites nos parecem ineficazes Controlar os abusos

sim eacute o que devemos fazer Eacute preciso fazer um uso inteligente da potecircncia digital adicionando uma

dimensatildeo nova e eficiente ao serviccedilo puacuteblico contemporacircneo14 O fato eacute que natildeo podemos mais atuar

e ser geridos por padrotildees anteriores agrave revoluccedilatildeo tecnoloacutegica Os conceitos de tempo e o espaccedilo tecircm

senhor eacute um mal necessaacuterio sem o qual a vida em comunidade natildeo seria viviacutevel devo dizer-lhe que sua pessoa representa tudo o que detesto na sociedade e em mim mesmo Pois haacute pelo menos um quarto de seacuteculo de segunda a sexta-feira e das oito da manhatilde agraves seis da tarde com algumas atividades ancilares (coqueteacuteis seminaacuterios inauguraccedilotildees congressos) agraves quais me eacute impossiacutevel subtrair-me sem ameaccedilar minha sobrevivecircncia tenho sido tambeacutem uma espeacutecie de burocrata ainda que natildeo trabalhe no setor puacuteblico e sim no privado Mas assim como o senhor e por sua culpa minha energia meu tempo e meu talento (tive algum) foram em grande parte engolidos nesses vinte e cinco anos pelos tracircmites gestotildees requerimentos instacircncias e procedimentos inventados pelo senhor para justificar o salaacuterio que recebe e a escrivaninha diante da qual engorda suas naacutedegas deixando-me apenas umas migalhas de liberdade para tomar iniciativas e levar a cabo um trabalho que mereccedila chamar-se criativo Sei que os seguros (meu ramo profissional) e a criatividade encontram-se tatildeo afastados quanto os planetas Saturno e Plutatildeo no universo sideral mas essa distacircncia natildeo seria tatildeo vertiginosa se o se-nhor hidra regulamentarista lagarta tramitadora rei do papel timbrado natildeo a tivesse tornado abissal Porque mesmo no aacuterido deserto das seguradoras e resseguradoras a imaginaccedilatildeo do ser humano poderia expandir-se e dali extrair estiacutemulo intelectual e ateacute prazer se o senhor encarcerado nessa densa malha de regulaccedilotildees asfixiantes ndash destinadas a dar caraacuteter de necessidade agrave obesa burocracia que inchou ateacute estourar as reparticcedilotildees puacuteblicas []rdquo (LLOSA 2011 p 234)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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quer ser reconstituiacutedos Daiacute a importacircncia da inclusatildeo desse debate acerca do funcionalismo puacuteblico

contemporacircneo

Eacute preciso lutar contra esta realidade Os programas de educaccedilatildeo fiscal devem cada vez mais

zelar por estes servidores valorizando suas vocaccedilotildees promovendo cursos de capacitaccedilatildeo incentivan-

do-os agrave mudanccedila e agrave melhoria de suas tarefas E eacute isto o que vemos na iniciativa privada e que falta no

serviccedilo puacuteblico motivaccedilatildeo e capacitaccedilatildeo

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Neste breve ensaio pretendemos enfatizar as importantes questotildees do resgate da cidadania

fiscal e da respeitabilidade do Estado por intermeacutedio do seu servidor Essa eacute uma tarefa natildeo soacute dos

programas de educaccedilatildeo fiscal mas tambeacutem de toda a sociedade brasileira Natildeo haacute partidos nessa luta

Consideramos de enorme importacircncia que os programas de educaccedilatildeo fiscal ampliem seu enfo-

que no gasto puacuteblico pois assim engrandeceremos ainda mais a tarefa da arrecadaccedilatildeo tributaacuteria

Natildeo podemos mais enfatizar os esforccedilos somente na justificativa da arrecadaccedilatildeo quando natildeo

haacute uma contrapartida na prestaccedilatildeo dos serviccedilos puacuteblicos A maioria das criacuteticas na nossa atual situa-

ccedilatildeo comeccedila pela inobservacircncia dos direitos sociais pelo Estado e pela peacutessima aplicaccedilatildeo dos recursos

puacuteblicos

O papel do fisco contemporacircneo transcende a atividade arrecadatoacuteria e assim deve ser enfati-

zado Os tributos natildeo podem mais ser considerados uma perda natildeo compensada mas sim um inves-

timento nos bens coletivos

Reaver a confianccedila nas instituiccedilotildees fazendaacuterias eacute um grande desafio mas seguramente uma

meta possiacutevel Os programas de educaccedilatildeo fiscal satildeo muito importantes nessa luta pela moralidade e

eficiecircncia estatais e principalmente em demonstrar para a sociedade brasileira o fato de que isto eacute

uma missatildeo de todos pois como bem anota Tony Judt (2010 p 188) temos de reaprender a pensar o Estado sempre vivemos com ele afinal

14 Para entender a era digital recomendamos a importante leitura SCHMIDT COHEN 2013

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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REFEREcircNCIAS

ALIGHIERI Dante A divina comeacutedia inferno Traduccedilatildeo e notas de Iacutetalo Eugenio Mauro ndash original em torno de 1307 Satildeo Paulo Ed 34 1998

ATALIBA Geraldo Repuacuteblica e Constituiccedilatildeo Satildeo Paulo Revista dos Tribunais 1985

CAVALCANTE Denise Lucena Anotaccedilotildees sobre o sistema tributaacuterio brasileiro In ELALI Andreacute MA-CHADO SEGUNDO Hugo de Brito TRENNEPOHL Terence (org) Direito tributaacuterio homenagem a Hugo de Brito Machado Satildeo Paulo Quartier Latin 2011 p 239-255

______ Dos tributos para as financcedilas puacuteblicas ampliaccedilatildeo do foco Nomos Revista do Curso de Mestra-do em Direito da Universidade Federal do Cearaacute Fortaleza v 25 jandez 2006

FERRAZ JUacuteNIOR Teacutercio Sampaio Direito constitucional liberdade de fumar privacidade estado di-reitos humanos e outros temas Satildeo Paulo Manole 2007

JUDT Tony Um tratado sobre os nossos actuais descontentamentos Lisboa Ediccedilotildees 70 2010

LABAND Paul El derecho presupuestario Traduccedilatildeo de Joseacute Zamit (Original de 1871) Madrid Insti-tuto de estudios fiscales 1979

LLOSA Maacuterio Vargas Os cadernos de Dom Rigoberto Rio de Janeiro Objetiva 2011

SCHMIDT Eric COHEN Jared A nova era digital como seraacute o futuro das pessoas das naccedilotildees e dos negoacutecios Traduccedilatildeo de Ana Beatriz Rodrigues e Rogeacuterio Durst Rio de Janeiro Intriacutenseca 2013

TIPKE Klaus Moral tributaria del Estado y de los contribuyentes Traduccioacuten de Pedro M Herrera Molina Madrid Marcial Pons 2002

TORRES Ricardo Lobo A ideia de liberdade no Estado patrimonial e no Estado fiscal Rio de Janei-ro Renovar 1991

______ Tratado de direito constitucional financeiro e tributaacuterio Vol V o orccedilamento na Constituiccedilatildeo 2 ed Rio de Janeiro Renovar 2000

ZIZEK Slavoj A visatildeo em paralaxe Traduccedilatildeo de Maria Beatriz de Medina Satildeo Paulo Boitempo 2008

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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EacuteTICA NAS RELACcedilOtildeES TRIBUTAacuteRIAS

Hugo de Brito Machado Segundo 1

SUMAacuteRIO Introduccedilatildeo 1 Notas preliminares e esclarecimentos ter-minoloacutegicos 2 Eacutetica e concepccedilatildeo de ser humano 3 Eacute possiacutevel dis-cutir objetivamente em torno de questotildees eacuteticas 4 Eacutetica e as rela-ccedilotildees tributaacuterias 41 Tributaccedilatildeo ideal e princiacutepios de legitimaccedilatildeo 42 Dois criteacuterios para a correccedilatildeo de diacutevidas atrasadas 43 Tributaccedilatildeo indireta e suas contradiccedilotildees 44 Unificaccedilatildeo de oacutergatildeos arrecadado-res e direito agrave compensaccedilatildeo Consideraccedilotildees finais Referecircncias

INTRODUCcedilAtildeO

Foi com satisfaccedilatildeo e alegria que recebi o convite para participar da coletacircnea em comemoraccedilatildeo

aos 15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal no Cearaacute organizada pela Secretaria da Fazenda do Esta-

do do Cearaacute em parceria com a Fundaccedilatildeo Sintaf A educaccedilatildeo eacute seguramente o principal e mais nobre

instrumento para conscientizaccedilatildeo do ser humano a respeito da necessidade de se cumprirem deveres

tarefas e obrigaccedilotildees os quais assim se efetivam muito mais eficazmente do que quando fundados

essencialmente na forccedila e na coaccedilatildeo

Parece pertinente a propoacutesito quando se cogita da razatildeo pela qual se cumprem as normas que

natildeo deve ser predominantemente o medo do castigo ou da sanccedilatildeo mas a convicccedilatildeo de que se trata

do melhor caminho perquirir-se um pouco a respeito da eacutetica em geral e no que tange especifica-

mente aos propoacutesitos desta coletacircnea da eacutetica nas relaccedilotildees tributaacuterias Afinal cuidar de fundamentos

substanciais para o cumprimento de deveres eacute algo diretamente relacionado a questionamentos so-

bre o que eacute certo e o que eacute errado bem como sobre as razotildees pelas quais se deve fazer o que eacute certo

assunto central agrave Eacutetica Eacute do que cuidaraacute este artigo

Vale notar de iniacutecio que a eacutetica nas relaccedilotildees tributaacuterias eacute tema de rara abordagem pelos que se

ocupam da tributaccedilatildeo sobretudo no Seacuteculo XX Talvez isso decorra do fato de situar-se o assunto em

zona de fronteira entre o Direito e a Filosofia levando tributaristas a tangenciaacute-lo por ser demasiada-

mente filosoacutefico e filoacutesofos a se distanciarem dele por considerarem a tributaccedilatildeo assunto demasiada-

mente aacuterido e teacutecnico (GUTMANN 2002 p 7) e ainda de influecircncia de um positivismo que indevida-

mente levou a que se evitassem as tatildeo ricas incursotildees inter ou transdisciplinares Questionamentos em

1 Mestre e Doutor em Direito Membro do Instituto Cearense de Estudos Tributaacuterios (ICET) Professor da Faculdade de Direi-to da Universidade Federal do Cearaacute de cujo Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo (MestradoDoutorado) eacute Coordenador Visiting Scholar da Wirtschaftsuniversitaumlt Viena Aacuteustria E-mail hugosegundogmailcom

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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torno da causa ou da razatildeo de ser da tributaccedilatildeo conduziam no maacuteximo a um estudo do fato gerador

e da norma que sobre ele incidia jamais se discutindo as razotildees pelas quais referida norma teria sido elaborada e deveria ser cumpridasup2 Assiste-se poreacutem mais recentemente a um crescente interesse na academia e tambeacutem entre os aplicadores do Direito por esses temas mais substanciais o que talvez leve a um gradual preenchi-mento dessa lacuna De fato ao lado de pesquisas a respeito de questotildees formais em torno de assun-tos como anterioridade estrutura da norma tributaacuteria irretroatividade etc assiste-se a um crescente interesse por temas materiais ou substanciais como capacidade contributiva legitimidade da tributa-ccedilatildeo e justiccedila fiscal Aleacutem de diversas teses e dissertaccedilotildees que tecircm sido defendidas nos Programas de Poacutes-Graduaccedilatildeo no Paiacutes nos uacuteltimos anos pode-se apontar como excelente exemplo do que se estaacute aqui a dizer o proacuteprio Programa de Educaccedilatildeo Fiscal desenvolvido pela Secretaria da Fazenda do Esta-do do Cearaacute Nos itens que se seguem procurar-se-aacute examinar em linhas gerais o papel da eacutetica nas rela-ccedilotildees tributaacuterias e como eventual desprezo a ela pode levar agrave perda de juridicidade dessas relaccedilotildees

1 NOTAS PRELIMINARES E ESCLARECIMENTOS TERMINOLOacuteGICOS

Natildeo existem sentidos uacutenicos e imutaacuteveis para as palavras os quais possam ser objeto de inves-

tigaccedilatildeo anaacuteloga agrave de um bioacutelogo que procura um novo microrganismo na natureza Aliaacutes as palavras

tampouco tecircm um uacutenico sentido literal correto (SEARLE 2002 p 184) sendo ele em verdade aquele

que os partiacutecipes do processo de comunicaccedilatildeo a elas atribuem o qual por certo depende de usos

preacutevios dessas mesmas palavras mas que por igual podem ser gradualmente modificados agrave luz do

contexto e das circunstacircncias no acircmbito dos chamados jogos de linguagem (WITTGENSTEIN 2000)

Eacute um tanto contraproducente portanto investigar a respeito de qual seria o significado correto

da palavra eacutetica Ela pode ser utilizada como sinocircnimo de moral derivando essas duas palavras res-

pectivamente de termos em grego (ethos) e em latim (mores) entatildeo usados para designar a mesma

coisa a saber o conjunto de costumes ou comportamentos adotados em determinada sociedade

Existem poreacutem algumas realidades diferentes conquanto relacionadas que talvez justifiquem o uso

de palavras distintas em sua designaccedilatildeo Haacute um conjunto de costumes ou comportamentos adotados

em certa sociedade mas haacute tambeacutem valores ou paracircmetros de correccedilatildeo em face dos quais esses cos-

tumes ou comportamentos podem ser julgados Pode-se dizer por exemplo que na moralidade islacirc-

mica eacute considerado errado a mulher decidir os destinos de sua proacutepria vida mas que essa natildeo parece

a forma mais adequada de tratar as pessoas do sexo feminino A primeira seria uma ldquomoral positivardquo e

a segunda uma ldquomoral criacuteticardquo Poder-se-ia cogitar ainda do ramo da Filosofia (Filosofia Moral) que se

2 Como observa Ricardo Lobo Torres (2009 p 4) ldquoboa parte dos problemas das financcedilas puacuteblicas atuais no Brasil e no es-trangeiro veio do corte observado entre poder de tributar e poder de gastar ou entre direito tributaacuterio e direito financeiro que conduziu agrave irresponsabilidade fiscal e agrave proacutepria crise fiscal que desestruturou o Estado do Bem-estar Socialrdquo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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ocupa dessas questotildees sendo essa uacuteltima parcela da realidade ndash esse ramo da Filosofia ndash mais adequa-

damente designado pela palavra Eacutetica com ldquoErdquo maiuacutesculo Essa seraacute a opccedilatildeo terminoloacutegica seguida no

presente trabalho

2 EacuteTICA E CONCEPCcedilAtildeO DE SER HUMANO

Exame das ideias dos filoacutesofos que ao longo da Histoacuteria se ocuparam da Eacutetica ou da Filosofia

Moral revela que todos eles partem como premissa de uma concepccedilatildeo de ser humano Uma antro-

pologia filosoacutefica portanto estaacute na base de qualquer estudo a respeito do que seja certo e errado e

das razotildees que as pessoas tecircm para agir da forma correta

Jeremy Bentham (1996) por exemplo um dos principais expoentes do utilitarismo defende

que o criteacuterio para identificar uma conduta como justa ou correta eacute a maximizaccedilatildeo da felicidade O

que traz a maior felicidade para o maior nuacutemero de pessoas eacute o certo a ser feito Isso porque parte da

premissa de que o ser humano eacute um animal que naturalmente vive em busca do prazer e da felicidade

e tem aversatildeo agrave dor e ao sofrimento

Kant (2003) por sua vez um dos principais criacuteticos do utilitarismo e autor de um dos mais im-

portantes sistemas de Filosofia Moral do ocidente constroacutei toda a sua teoria sobre a premissa de que o

ser humano diferentemente dos outros animais e entes existentes na natureza eacute dotado de liberdade

assim entendida natildeo propriamente a possibilidade de escolher por quais meios atingir os fins que a

natureza lhe impotildee (vg comer arroz em vez de macarratildeo para matar a fome) que outros animais tam-

beacutem tecircm mas a aptidatildeo de escolher os proacuteprios fins a serem perseguidos agraves vezes ateacute em oposiccedilatildeo

aos que seus impulsos naturais indicam (pex natildeo comer mesmo estando com fome para no longo

prazo otimizar a sauacutede ou a aparecircncia fiacutesica) Isso confere ao ser humano o caraacuteter de sujeito dotado

de livre-arbiacutetrio e natildeo de mero objeto donde se deduzem maacuteximas como a de que as pessoas devem

ser sempre tratadas como fins em si mesmas (sujeitos) e nunca como meros meios (objetos) aleacutem do

conhecido imperativo categoacuterico segundo o qual o correto a fazer natildeo eacute necessariamente o que traz

felicidade ao maior nuacutemero de pessoas mas aquilo que pode ser transformado em maacutexima universal

ou seja todos poderiam agir da mesma forma Em palavras mais simples para algueacutem saber se uma

conduta eacute correta basta imaginar se seria conveniente que ela fosse adotada por todos Essa eacute uma

forma de avaliar se estamos sendo impelidos por nossos impulsos a agir de determinada forma ou se

ela eacute a maneira correta por estar de acordo com a razatildeo Furar uma fila por exemplo eacute uma conduta

que pode parecer conveniente a quem a adota circunstancialmente mas se todos a adotassem a proacute-

pria figura da fila desapareceria estabelecendo-se o caos nas situaccedilotildees nas quais se fizesse necessaacuterio

ordenar o atendimento de pessoas com igualdade o que eacute suficiente para que se conclua que a con-

duta eacute errada

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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Natildeo se pretende poreacutem alongar o presente texto com incursotildees nos vaacuterios sistemas de Filo-

sofia Moral Os dois exemplos citados servem apenas para mostrar que toda concepccedilatildeo do que seja

certo ou errado envolve necessariamente uma concepccedilatildeo a respeito da natureza do ser humano

Diante disso na contemporaneidade natildeo causa surpresa que as principais contribuiccedilotildees para o estudo

desse tema sejam oriundas da biologia da neurologia da psicologia e das ciecircncias cognificas quando

se interseccionam no estudo da mente humana e datildeo origem ao roacutetulo unificador de neurociecircncia

A biologia tem mostrado de forma contundente que os sentimentos morais de empatia

cooperaccedilatildeo solidariedade e equidade foram naturalmente selecionados natildeo apenas no ser humano

mas em alguns outros mamiacuteferos superiores que vivem em grupos como lobos golfinhos e principal-

mente primatas como chimpanzeacutes e bonobos (WAAL 1996) Entre muitos outros animais eacute comum o

sentimento de proteccedilatildeo agrave prole (kin selection) pela oacutebvia razatildeo de que essa eacute a forma mais imediata

de perpetuaccedilatildeo dos genes mas entre tais mamiacuteferos a vantagem propiciada pela formaccedilatildeo de grupos

selecionou naturalmente aqueles indiviacuteduos dotados de caracteriacutesticas que favorecem a vida em gru-

po dentre as quais se destacam os sentimentos morais (GREENE 2013)

Haacute experimento que se tornou ceacutelebre exibido em palestra ministrada por Frans de Waal no

TEDsup3 que eacute bem ilustrativo dessa ideia Nele duas macaco-prego fecircmeas satildeo solicitadas a realizar a

mesma tarefa mas satildeo remuneradas de forma desigual Uma recebe pequenos pedaccedilos de pepino

e a outra uvas A que recebe pepinos fica satisfeita e poderia passar o dia inteiro realizando a mesma

tarefa e sendo recompensada com os pepinos O problema surge quando ela vecirc a colega ser remune-

rada pela mesma tarefa com uvas bem mais saborosas A injusticcedilada chega a testar a pedra para

ver se a tarefa que desempenha eacute mesmo igual agrave desempenhada pela colega ou seja para aferir se haacute

alguma justificativa para o tratamento desigual

No ser humano que tambeacutem nutre tais sentimentos a seleccedilatildeo de caracteriacutesticas que favorecem

a vida em grupo criou mecanismos ainda mais sofisticados como um sistema neuroloacutegico mais com-

plexo e com ele a linguagem propiciando que se teorize em torno dos referidos sentimentos morais

e mais importante que se construam instituiccedilotildees sociais destinadas a dar-lhes efetividade Surge

assim o Direito que natildeo tem poreacutem como se desligar inteiramente dessa sua origem Disposiccedilotildees

juriacutedicas que contrariem frontalmente sentimentos morais seratildeo com maior probabilidade desres-

peitadas Caso se fundamentem no medo na forccedila e na coaccedilatildeo e natildeo na convicccedilatildeo de que satildeo boas

para a manutenccedilatildeo da harmonia social ndash razatildeo de resto para o proacuteprio surgimento dos sentimentos

morais ndash elas aleacutem de brutalizarem o homem seratildeo no dizer de Pontes de Miranda (2000) apenas

uma revoluccedilatildeo que se retarda4

3 TED (wwwtedcom) eacute uma instituiccedilatildeo sem fins lucrativos que tem por finalidade divulgar ideias consideradas importantes A sigla deriva das palavras Technology Entertainment Design O trecho do viacutedeo com o experimento citado no texto pode ser assistido em httpyoutubelKhAd0Tyny0

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3 Eacute POSSIacuteVEL DISCUTIR OBJETIVAMENTE EM TORNO DE QUESTOtildeES EacuteTICAS

Poder-se-ia objetar diante da pretensatildeo de se estudar e considerar a Eacutetica no trato de questotildees

juriacutedicas que questotildees eacuteticas ou morais satildeo sempre muito subjetivas e emocionais natildeo podendo ser

estudadas cientificamente agrave miacutengua da possibilidade de se fazerem afirmaccedilotildees objetivas em torno

delas

Algo do que se disse no item anterior jaacute deveria afastar essa objeccedilatildeo mas em acreacutescimo po-

de-se ressaltar que mesmo quando haacute divergecircncia entre questotildees morais as pessoas apresentam (ou

pelo menos podem ser capazes de apresentar) razotildees para justificar seus pontos de vista discrepantes

Natildeo se apresentam razotildees para convencer algueacutem que sorvete de baunilha eacute mais gostoso que sorve-

te de morango ou que o azul eacute mais bonito que o amarelo mas se apresentam razotildees para convencer

algueacutem que o casamento entre pessoas do mesmo sexo deve ser (ou natildeo) permitido o que mesmo

sem entrar nessa discussatildeo aqui revela que natildeo satildeo temas assim inteirametne subjetivos como ocorre

no caso do gosto por sorvetes ou cores (BENN 1998 p 5)

Aleacutem disso tambeacutem no acircmbito das ciecircncias naturais e ateacute da Fiacutesica haacute divergecircncia Natildeo soacute

motivada por pessoas intransigentes e dogmaacuteticas desprovidas de qualquer base cientiacutefica como eacute o

caso dos que negam a evoluccedilatildeo das espeacutecies e dizem que os foacutesseis de dinossauros satildeo a prova de

que alguns animais natildeo conseguiram subir na Arca de Noeacute mas entre os proacuteprios especialistas como

fiacutesicos que divergem sobre a extensatildeo e a forma do universo por exemplo (ZIMMERMAN 2010 p 26

TERSMAN 2006 p XI) Isso natildeo significa que inexista um miacutenimo de intersubjetividade a permitir um

debate racional em torno de tais ideias Tampouco significa que se deva em tais terrenos abandonar

a ideia de verdade e o propoacutesito honesto de alcanccedilaacute-la (MARCONI 2007 p 50 e ss RESCHER 2003 p

83 HAACK 2011 p 228)5

Finalmente eacute preciso lembrar que a existecircncia de controveacutersia em relaccedilatildeo a certos assuntos natildeo

quer dizer que natildeo existam temas em torno dos quais o consenso seja possiacutevel Muitas vezez natildeo eacute ne-

cessaacuterio por exemplo saber qual eacute a justiccedila ideal se a kantiana ou a utilitarista ou a aristoteacutelica ou

qualquer outra para se concluir que determinada situaccedilatildeo vivida eacute injusta Amartya Sen (2009 p 109 e

ss) economista indiano laureado com o precircmio Nobel e que desde entatildeo parece ter se dedicado mais

agrave filosofia moral que agrave economia propriamente dita utiliza para demonstraacute-lo a chamada ldquometaacutefora da

saunardquo Para ele discutir ldquoideais de justiccedilardquo diante de certas injusticcedilas flagrantes de nossa sociedade ou

recusar o enfrentamento dessas injusticcedilas sob a consideraccedilatildeo de que a justiccedila ideal eacute de impossiacutevel de-

5 Como aponta Haack (2011 p 231) a criacutetica relativista em uacuteltima anaacutelise eacute autodestrutiva e ainda falaciosa pois natildeo se pode ldquopela investigaccedilatildeo honesta descobrir que natildeo haacute investigaccedilatildeo honestardquo Como lembra no mesmo sentido Fazzalari (2006 p 61) natildeo eacute porque a racionalidade eacute faliacutevel que devemos optar pela irracionalidade

4 ldquoToda pressatildeo que dura eacute indiacutecio certo de revoluccedilatildeo que se retardardquo (PONTES DE MIRANDA 2000 p 116)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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terminaccedilatildeo consensual eacute algo semelhante a termos algumas pessoas trancadas dentro de uma sauna

cujo termostato estaacute localizado do lado de fora Desesperadas com um calor insuportaacutevel dentro da

sauna essas pessoas comeccedilam a gritar para que algueacutem as ajude Um sujeito que por acaso passava

pelo lado de fora ouve os gritos e se dirige agrave sauna mas com a matildeo sobre o termostato afirma que soacute

poderaacute ajustar a temperatura dentro da sauna que jaacute passa dos 50 graus quando os que estatildeo dentro

dela trancados decidirem qual seria a temperatura ideal

Nessa ordem de ideias da mesma forma como natildeo se precisa decidir se a temperatura ldquoidealrdquo

eacute 18 21 ou 22 graus positivos para se saber que eacute necessaacuterio reduzir o calor de 50 graus dentro da

sauna em muitos casos natildeo eacute preciso saber qual eacute a concepccedilatildeo ldquoidealrdquo de justiccedila para se concluir que

determinada situaccedilatildeo eacute flagrantemente desigual iniacutequa e injusta e precisa ser remediada Nas linhas

seguintes algumas dessas situaccedilotildees nas quais a sauna talvez esteja passando dos 50 graus seratildeo

examinadas

4 EacuteTICA NAS RELACcedilOtildeES TRIBUTAacuteRIAS

O leitor pode estar a esta altura imaginando o que tais ponderaccedilotildees de ordem predominan-

temente filosoacutefica fazem em texto dedicado em princiacutepio ao Direito Tributaacuterio Eacute preciso lembrar po-

reacutem o que serve de fundamento ao Direito Afinal por que se cumprem as suas disposiccedilotildees Por que

no caso do Direito Tributaacuterio se cumprem as leis tributaacuterias pagando-se os tributos por elas impostos

Em verdade de fato no plano ocircntico ou do ser vaacuterios satildeo os motivos que levam as pessoas

a cumprirem as imposiccedilotildees veiculadas em normas juriacutedicas Tanto no tempo como no espaccedilo a di-

versidade eacute inegaacutevel haacutebito medo da sanccedilatildeo desejo de ser aceito pelo grupo convicccedilatildeo de que eacute

o melhor caminho etc Natildeo se pode negar poreacutem que o Direito eacute uma realidade institucional para

usar uma expressatildeo de John Searle (2005 p 104 e ss) assim entendida aquela realidade que somente

existe enquanto convencionada por seres racionais fazendo parte do que Karl Popper (2006 p 38)

convencionou chamar de mundo 3 Ele natildeo existe como os minerais como um coelho felpudo ou

como uma concha na praia por exemplo mas sim quando haacute um pacto intersubjetivo que o constitui

enquanto realidade Tal como o dinheiro ou as regras de um jogo

E para que as pessoas enxerguem uma ordem uma obrigaccedilatildeo ou um comando como algo fruto

de uma realidade institucional eacute preciso que a aceitem enquanto tal Direito que soacute ndash frise-se o ldquosoacuterdquo ndash

se impotildee pela forccedila eacute algo que equipara o homem a algo pior que muitos animais natildeo humanos ou

para usar uma metaacutefora de Arnaldo Vasconcelos (2001 p 93) como o jumento do verdureiro que

ldquoque para andar ou parar ou retroceder no caminho tem de ver o movimento do chicote ou ouvir

o silvar dele em sua proximidaderdquo Para que as pessoas vejam no conjunto de normas que integra o

Direito Tributaacuterio essa realidade institucional que elas cumprem porque reconhecem como Direito

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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e natildeo apenas por conta da forccedila de quem impotildee sua obediecircncia eacute preciso que o Direito tenha um

fundamento eacutetico Eacute preciso que as normas que existam correspondam na maacutexima medida possiacutevel

agraves normas que as pessoas que a elas se submetem gostariam que existissem (MACHADO SEGUNDO

2010) Daiacute dizer-se que uma legislaccedilatildeo que estabelecesse tributaccedilatildeo mais justa seria independente-

mente de aparatos repressivos dotada de maior eficaacutecia

41 Tributaccedilatildeo ideal e princiacutepios de legitimaccedilatildeo

Tem pouco significado dizer-se que a legislaccedilatildeo que estabelecesse uma tributaccedilatildeo ideal seria

independentemente da atuaccedilatildeo de um aparato coercitivo dotada de maior grau de eficaacutecia De fato

pode-se objetar ideal para quem

Uma teoria segundo a qual o tributo ideal seria aquele com aliacutequota ldquoxrdquo incidente sobre base

ldquoyrdquo certamente seria contestada com a ponderaccedilatildeo de que tal forma de tributaccedilatildeo seria ideal para

quem a imaginou mas natildeo necessariamente para quem se submeteria a ela Aleacutem disso a idealidade

de uma tributaccedilatildeo natildeo pode ser examinada de forma divorciada de uma anaacutelise do gasto ou da des-

tinaccedilatildeo dada ao recursos com ela obtidos Daiacute falar-se atualmente em princiacutepios de legitimaccedilatildeo os

quais conduzem a uma tributaccedilatildeo considerada ideal pela sociedade que a ela se submete Em vez de

defender-se predominantemente uma tributaccedilatildeo sobre esta ou aquela base ou por esta ou aquela

aliacutequota tem-se defendido mais recentemente que a tributaccedilatildeo seja estabelecida por meios demo-

craacuteticos havendo efetiva representaccedilatildeo da sociedade natildeo apenas na elaboraccedilatildeo das leis disciplinado-

ras da relaccedilatildeo tributaacuteria mas tambeacutem nas decisotildees referentes agrave aplicaccedilatildeo dos gastos correspondentes

Mas natildeo soacute Para que a tributaccedilatildeo seja legiacutetima ou assim seja considerada por quem a ela se

submete eacute preciso que ela seja calcada em uma legislaccedilatildeo clara transparente e cobrada em relaccedilotildees

fundadas na lealdade na boa-feacute e na transparecircncia Satildeo na visatildeo de Ricardo Lobo Torres (2006 p 223-

244) os princiacutepios de legitimaccedilatildeo que fazem com que o ocircnus tributaacuterio seja aceito por quem a ele se

deve submeter incrementando consideravelmente a eficaacutecia das normas correspondentes que natildeo se

podem apoiar ndash nem devem ndash apenas ou predominantemente na repressatildeo

Eacute preciso por outras palavras natildeo apenas que o contribuinte ouccedila mas que ele se convenccedila

pela observaccedilatildeo do exemplo que a autoridade fiscal natildeo eacute sua inimiga e que a lei natildeo eacute respeitada

apenas quando isso beneficia a Administraccedilatildeo Tributaacuteria Quando isso acontecer por meio do pres-

tiacutegio aos princiacutepios de legitimaccedilatildeo antes apontados a eficaacutecia da norma tributaacuteria seraacute consideravel-

mente incrementada

Esse convencimento poreacutem natildeo eacute de faacutecil obtenccedilatildeo por conta inclusive de posturas e condu-

tas adotadas pelo proacuteprio Poder Puacuteblico Natildeo se estaacute cumpre insistir fazendo aqui referecircncia a desvios

eacuteticos (e legal) no comportamento de algum agente fiscal especiacutefico algo que tambeacutem pode ocorrer

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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em relaccedilatildeo aos contribuintes Embora isso possa existir e seja induvidosamente prejudicial agrave higidez

da relaccedilatildeo natildeo eacute de tais aspectos que se estaacute aqui a tratar ateacute porque todos sabem que eles existem

e conhecem os mecanismos para combatecirc-los vez que eles acontecem em violaccedilatildeo agraves instituiccedilotildees

existentes Na verdade faz-se referecircncia neste artigo a alguns exemplos de possiacutevel falta de eacutetica ou

de lealdade institucional que eventualmente ateacute pode levar agentes a contragosto mas em obser-

vacircncia aos seus deveres funcionais a praticarem atos antieacuteticos com contribuintes os quais corroem a

relaccedilatildeo tributaacuteria

42 Dois criteacuterios para a correccedilatildeo de diacutevidas atrasadas

Opera contra o objetivo de construir uma tributaccedilatildeo ideal a instituiccedilatildeo de tratamentos ar-

bitrariamente desiguais e discriminatoacuterios entre Fisco e contribuintes quando envolvidos em situ-

accedilotildees iguais ou equivalentes Eacute o caso por exemplo da legislaccedilatildeo do Estado do Cearaacute que prevecirc

criteacuterios de atualizaccedilatildeo diferentes para diacutevidas pagas em atraso conforme o credor seja o Estado ou

o sujeito passivo

Realmente conforme os art 1ordm da ldquoNota Explicativa SEFrdquo nordm 5 de 13 de setembro de 2004 (Pro-

dinfo 2004 online) o Estado quando tem de devolver ao contribuinte valores por este pagos a maior

corrige-os por meio da Ufirce unidade fiscal de referecircncia adotada pelo Estado do Cearaacute Quando

poreacutem se trata de cobrar do sujeito passivo quantias em atraso o criteacuterio de correccedilatildeo eacute a taxa referen-

cial do Sistema Especial de Liquidaccedilatildeo e Custoacutedia (Selic) o que gera uma diferenccedila bastante expressiva

(CEARAacute 1997a RICMS art 77) De fato aleacutem de a Selic ter variaccedilatildeo superior agrave Ufirce a atualizaccedilatildeo da

primeira eacute mensal enquanto a segunda eacute atualizada apenas anualmente o que faz com que deacutebitos

pagos indevidamente e restituiacutedos ou compensados no mesmo exerciacutecio natildeo sofram correccedilatildeo alguma

A disparidade parece bastante clara assim como a falta de justificativa para ela Aleacutem da viola-

ccedilatildeo aos princiacutepios da legalidade6 e da igualdade a proacutepria noccedilatildeo eacutetica de equidade que eacute ateacute mesmo

preacute humana como se vecirc dos experimentos de Frans de Waal (1996) referidos anteriormente parece

ser malferida Com isso insista-se corroacutei-se o sentimento saudaacutevel que deveria estar subjacente agrave

relaccedilatildeo tributaacuteria segundo o qual suas disposiccedilotildees devem ser cumpridas por ser esta a soluccedilatildeo mais

correta do ponto de vista eacutetico e natildeo porque impostas pela forccedila Diante de tratamento assim incre-

menta-se no sujeito passivo de forma indevida a ideia de que o direito soacute deve ser cumprido pelo

receio da puniccedilatildeo o que obviamente faz com que ele seja violado sempre que o contribuinte imagina

que natildeo seraacute descoberto

6 Realmente o art 66 paraacutegrafo uacutenico da Lei 1267097 dispotildee que a ldquoimportacircncia de ser restituiacuteda seraacute atualizada obser-vados os mesmos criteacuterios aplicaacuteveis agrave cobranccedila de creacutedito tributaacuteriordquo o que eacute flagrantemente desrespeitado pelas normas infralegais que compotildeem a adoccedilatildeo da Ufirce na correccedilatildeo dos valores a serem pagos ou restituiacutedos ao sujeito passivo da relaccedilatildeo tributaacuteria (CEARAacute 1997b)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

39

43 Tributaccedilatildeo indireta e suas contradiccedilotildees

Outro claro exemplo de inadequaccedilatildeo da forma como as instituiccedilotildees juriacutedicas tratam o sujeito

passivo da relaccedilatildeo tributaacuteria no Brasil reside na chamada ldquotributaccedilatildeo indiretardquo e na forma como se

admite o exerciacutecio de direitos por parte de quem a ela se sujeita ou submete

Por razotildees de espaccedilo e de pertinecircncia temaacutetica natildeo seraacute alongada aqui a discussatildeo relativa

agrave identificaccedilatildeo dos tributos indiretos (MACHADO SEGUNDO 2011) admitindo-se a conclusatildeo a que

chegou o Superior Tribunal de Justiccedila (STJ) de que eles satildeo o ICMS7 o IPI e o ISS este uacuteltimo quando

cobrado de forma natildeo fixa8 Sabe-se que essa classificaccedilatildeo e a proacutepria conclusatildeo a que chegou o STJ

satildeo bastante fraacutegeis e tecircm uma seacuterie de inconsistecircncias mas o problema maior eacute na verdade o que

se extrai como consequecircncia da constataccedilatildeo de que um tributo eacute ldquoindiretordquo

Na repeticcedilatildeo do indeacutebito tributaacuterio se quem a pleiteia eacute o contribuinte assim entendido aquele

que legalmente eacute obrigado ao seu pagamento diz-se que a devoluccedilatildeo por mais indevido que tenha

sido o pagamento depende da prova de que natildeo houve a transferecircncia do encargo financeiro a qual

na maioria das vezes torna impossiacutevel a restituiccedilatildeo Afinal quem pagou o tributo ldquona verdaderdquo foi o

consumidor final

Se poreacutem a restituiccedilatildeo eacute postulada pelo consumidor final admitindo-se a conclusatildeo ndash de resto

altamente questionaacutevel ndash indicada no paraacutegrafo anterior diz-se que lhe falece legitimidade por natildeo

ser ele parte na relaccedilatildeo juriacutedica com o Fisco Dessa vez parece admitir-se que quem paga o tributo ldquona

verdaderdquo eacute o comerciante vendedor das mercadorias

Algo semelhante se daacute em relaccedilatildeo a vaacuterios outros assuntos sempre no plano da tributaccedilatildeo

indireta No que tange agrave inadimplecircncia por exemplo se o contribuinte natildeo recebe o preccedilo da mer-

cadoria ainda assim se diz que o tributo eacute devido pois quem o paga ldquona verdaderdquo eacute o comerciante

pouco importando se este recebeu o preccedilo ou natildeo Mas se o comerciante recebe o pagamento da

mercadoria e em seguida natildeo paga o imposto haacute quem defenda que ele estaria praticando ldquocrimerdquo

pois seria uma apropriaccedilatildeo do valor devido ao Fisco pelo consumidor final cabendo ao comerciante

apenas ldquorepassaacute-lordquo (EISELE 2001 p 91)

A incoerecircncia eacute enorme e em vaacuterios cenaacuterios Diante dela mesmo sem discutir qual dessas teses

seria a correta brota no sujeito passivo o sentimento de que o Direito eacute um mecanismo repressor que

soacute opera contra ele Algo inteiramente contraacuterio ao propoacutesito de educar o cidadatildeo quanto ao cumpri-

mento de seus deveres tributaacuterios em face do substrato eacutetico que tecircm

7 STJ 1ordf T AGA 452588SP DJ de 5 abr 2004 p 205 8 STJ 1ordf T AgRg no Ag 692583RJ j em 11 out 2005 DJ de 14 nov 2005 p 205 rep DJ de 28 nov 2005 p 208

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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44 Lanccedilamento por homologaccedilatildeo e consequecircncias do erro do sujeito passivo

Outro problema que talvez seja prejudicial agrave higidez da relaccedilatildeo entre Fisco e contribuintes resi-

de nas consequecircncias do erro do sujeito passivo no acircmbito do lanccedilamento por homologaccedilatildeo

Como se sabe o lanccedilamento por homologaccedilatildeo eacute aquele no qual o sujeito passivo desenvolve

toda a atividade de determinaccedilatildeo ou acertamento do creacutedito tributaacuterio submetendo o resultado dessa

atividade ao crivo da autoridade administrativa e pagando antecipadamente a qualquer manifestaccedilatildeo

da autoridade o montante por si apurado (CTN art 150) Esse pagamento antecipado eacute a principal

caracteriacutestica do lanccedilamento por homologaccedilatildeo diferenciando-o por exemplo do lanccedilamento por

declaraccedilatildeo no qual o sujeito passivo leva certas informaccedilotildees ao conhecimento da autoridade mas soacute

depois de notificado por ela eacute que procede ao pagamento da quantia apurada (CTN art 147)

No mundo atual no acircmbito do lanccedilamento por homologaccedilatildeo eacute cada vez mais intensa a trans-

ferecircncia de atribuiccedilotildees que em tese seriam da Fazenda Puacuteblica ao sujeito passivo ligadas agrave apuraccedilatildeo

do montante devido e ao cumprimento de inuacutemeras obrigaccedilotildees acessoacuterias que visam a permitir a

fiscalizaccedilatildeo de quem as cumpre e de todos que com ele se relacionam Uma contabilidade que apure

o resultado da empresa por exemplo que surgiu em contexto inteiramente natildeo tributaacuterio eacute hoje vista

por muitos empresaacuterios sobretudo os de menor porte como uma necessidade em razatildeo do Fisco

sendo considerado um ldquobenefiacuteciordquo o regime que a dispensa a exemplo do Simples

Essa caracteriacutestica poreacutem natildeo eacute em si um mal O problema sentido por muitos contribuintes

reside nas consequecircncias de erros cometidos no cumprimento de tantas obrigaccedilotildees sobretudo no

que tange agravequelas ligadas agrave determinaccedilatildeo do creacutedito tributaacuterio quando o contribuinte comete um

erro e dele decorre pagamento de tributo inferior ao devido haacute a aplicaccedilatildeo de penalidades as quais

no caso do Fisco Federal por exemplo satildeo ordinariamente de 75 do valor do creacutedito tributaacuterio

percentual correspondente agrave multa aplicada sempre que haacute lanccedilamento de ofiacutecio e natildeo se verifica

a ocorrecircncia de fraude ou maacute feacute (que podem fazer esse percentual ultrapassar 150) conforme a

previsatildeo da Lei 943096) (BRASIL 1996 art 44 inciso I e paraacutegrafos)

Quando poreacutem do erro decorre pagamento superior ao que seria devido suprime-se do su-

jeito passivo em regra a possibilidade de questionamento administrativo Diz-se que ele natildeo poderia

defender-se de suas proacuteprias apuraccedilotildees E pior quando em juiacutezo natildeo sem algum custo o contribuinte

finalmente consegue a extinccedilatildeo do creacutedito tributaacuterio haacute decisotildees que ainda o condenam ao pagamen-

to de honoraacuterios de sucumbecircncia pois a demanda em uacuteltima anaacutelise teria decorrido de erro dele9

Veja-se que natildeo se estaacute cogitando aqui da hipoacutetese em que o sujeito passivo age de maacute feacute o

que corretamente deve ensejar a aplicaccedilatildeo de penalidades mais elevadas Trata-se de caso no qual

9 Ac un da 1ordf T do STJ ndash Resp 299621SC ndash Rel Min Joseacute Delgado ndash (20010003592-2) j em 3 mai 2001 ndash DJ de 13 ago 2001 p 73 Sobre esses entendimentos veja-se MACHADO 2003 p 73

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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de boa feacute se comete um equiacutevoco sendo evidente a inequidade no tratamento quando a Fazenda

comete erro na elaboraccedilatildeo de lanccedilamento e daiacute decorre cobranccedila menor ela pode desde que natildeo

consumada a decadecircncia revisaacute-lo de ofiacutecio para cobrar as diferenccedilas (CTN art 149) E se do erro

origina-se cobranccedila maior que a devida nenhuma puniccedilatildeo se lhe aplica

Natildeo se estaacute por oacutebvio defendendo a necessidade de puniccedilatildeo indiscriminada a todo agente

fiscal que cometa erros no desempenho de sua funccedilatildeo mas apenas chamando a atenccedilatildeo do leitor para

uma evidente iniquidade no tratamento dado pelo Direito Tributaacuterio Brasileiro em regra ao erro que

tem dimensotildees muito diferentes a partir apenas de quem o comete Se diante de uma legislaccedilatildeo tatildeo

complexa e mutante ndash que natildeo eacute o contribuinte quem edita - torna-se difiacutecil aplicar a legislaccedilatildeo que

o equiacutevoco nessa aplicaccedilatildeo tenha tratamento semelhante seja ele praticado por quem exerce uma ati-

vidade econocircmica e de modo colateral tem de interpretar a lei tributaacuteria seja por quem tem por ofiacutecio

exclusivo a sua interpretaccedilatildeo e aplicaccedilatildeo como eacute o caso dos agentes do fisco

45 Unificaccedilatildeo de oacutergatildeos arrecadadores e direito agrave compensaccedilatildeo

Boa feacute lealdade e confianccedila satildeo importantes princiacutepios de legitimaccedilatildeo do tributo O efetivo

respeito a eles notadamente por parte do Poder Puacuteblico gera no sujeito passivo sentimentos que

incrementam a tendecircncia ao cumprimento dos deveres tributaacuterios Mas esses princiacutepios satildeo desrespei-

tados quando se usam no convencimento agrave populaccedilatildeo acerca da necessidade de se aprovarem certas

medidas legislativas discursos que se sabem natildeo serem verdadeiros e que logo em seguida seratildeo

descumpridos e esquecidos

Parece ter ocorrido isso na criaccedilatildeo da chamada Receita Federal do Brasil fruto da unificaccedilatildeo da

Receita Federal com a Receita Previdenciaacuteria esta uacuteltima encarregada da arrecadaccedilatildeo de contribuiccedilotildees

previdenciaacuterias

Sem entrar no meacuterito a respeito da conveniecircncia da utilidade ou mesmo da validade dessa

unificaccedilatildeo10 releva notar aqui apenas que um dos argumentos usados na defesa da necessidade

de unificaccedilatildeo para convencer setores da sociedade que contra ela se insurgiam foi o de que muitos

contribuintes possuiriam diacutevidas perante a Receita Previdenciaacuteria especialmente de contribuiccedilotildees in-

cidentes sobre a folha de pagamentos as quais poderiam ser compensadas com creacuteditos oriundos

de pagamentos indevidos feitos agrave Receita Federal e vice-versa Essa aliaacutes seria uma consequecircncia

automaacutetica da unificaccedilatildeo que faria com que contribuiccedilotildees previdenciaacuterias passassem como de fato

passaram a ser tributos administrados pela Receita Federal nos termos do art 74 da Lei 943096

Tatildeo logo aprovada a unificaccedilatildeo poreacutem inseriu-se na proacutepria lei que a levou a efeito disposiccedilatildeo

proibindo a prometida compensaccedilatildeo (art 26 paraacutegrafo uacutenico da Lei 114572007)

10 Para exame especiacutefico do assunto veja-se MACHADO MACHADO SEGUNDO 2005 p 107-120

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Caso natildeo haja duacutevida a respeito da existecircncia e do montante de creacuteditos e deacutebitos reciacuteprocos

natildeo parece haver fundamento moral para se rejeitar a compensaccedilatildeo pois a uacutenica consequecircncia dessa

negativa eacute permitir que um dos polos da relaccedilatildeo cobre e receba o seu creacutedito e resista ao pagamento

do seu creacutedito (MACHADO 2009 p 450 e ss MACHADO SEGUNDO 2006 p 347) Mas aleacutem disso a

inadequaccedilatildeo moral no caso eacute ateacute maior pois se natildeo se pretendia permitir a compensaccedilatildeo de deacutebitos

referentes a tributos administrados pela Receita Federal com aqueles ateacute entatildeo submetidos agrave Receita

Previdenciaacuteria isso jamais poderia ter sido utilizado como argumento em defesa da unificaccedilatildeo

46 Natildeo cumulatividade de contribuiccedilotildees e direito ao creditamento

Finalmente pode-se apontar como exemplo de desrespeito aos princiacutepios de legitimaccedilatildeo do

tributo por parte da ordem juriacutedica brasileira a forma como tem sido conduzida no acircmbito federal a

sistemaacutetica de natildeo cumulatividade relativamente agraves contribuiccedilotildees PIS e COFINS

Realmente tais contribuiccedilotildees passaram por expressivos aumentos de aliacutequotas as quais salta-

ram de 065 e 3 respectivamente para 165 e 76 majoraccedilatildeo esta justificada pela introduccedilatildeo

da sistemaacutetica natildeo cumulativa e com ela do direito ao creditamento das contribuiccedilotildees que tenham

onerado operaccedilotildees anteriores

Com a introduccedilatildeo da sistemaacutetica poreacutem o montante arrecadado com tais contribuiccedilotildees cres-

ceu consideravelmente a demonstrar que o aumento das aliacutequotas foi maior que o necessaacuterio para

fazer face ao aproveitamento de creacuteditos Natildeo houve poreacutem posterior reduccedilatildeo dessas aliacutequotas ten-

do havido ao contraacuterio o surgimento de grande litigiosidade na relaccedilatildeo tributaacuteria em decorrecircncia de

normas infralegais editadas pela Receita Federal11 que restringem consideravelmente o direito aos

creacuteditos interpretando de maneira bastante restritiva expressotildees utilizadas na lei como eacute o caso da

palavra ldquoinsumordquo

Mesmo sem entrar no meacuterito relativo agrave possiacutevel incompatibilidade de tais restriccedilotildees com o prin-

ciacutepio da legalidade12 essa postura institucional parece subtrair uma vez mais o fundamento eacutetico da

relaccedilatildeo tributaacuteria notadamente quando em sua defesa se usa o argumento de que diversamente do

que ocorre com IPI e ICMS no PIS e na Cofins a natildeo cumulatividade natildeo eacute uma ldquoimposiccedilatildeordquo constitu-

cional podendo a legislaccedilatildeo de hierarquia inferior restringir o uso de creacuteditos sem incorrer em invali-

dade Na verdade se o aumento de aliacutequotas foi justificado porque os creacuteditos seriam aproveitados

11 Instruccedilotildees Normativas 2472002 (PIS) e 4042004 (Cofins) que procuram ldquodefinirrdquo insumo para fins de aplicaccedilatildeo do art 3ordm inciso II da Lei 108332003 (BRASIL Ministeacuterio da Fazenda Receita Federal 2002 2004)12 Eacute preciso notar que a Cofins e o PIS diversamente do IPI por exemplo natildeo incidem sobre operaccedilatildeo de saiacuteda de pro-duto mas sobre receita (WILD 2013 p 106) Assim o regime de creditamento em relaccedilatildeo agraves contribuiccedilotildees deve ser mais amplo jaacute que mais ampla eacute a base sobre a qual incidem Do contraacuterio haveria acumulaccedilatildeo A natildeo cumulatividade do IPI ateacute pode ser compatiacutevel com uma sistemaacutetica de creacutedito fiacutesico jaacute que esse imposto soacute incide sobre o que fisicamente sai do estabelecimento industrial Jaacute o PIS e a Cofins natildeo Assim a palavra ldquoinsumordquo no acircmbito dessas contribuiccedilotildeesm deve ter sua significaccedilatildeo colhida natildeo no acircmbito da legislaccedilatildeo do IPI mas na do imposto de renda tributo cuja materialidade conteacutem

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e se mesmo assim a arrecadaccedilatildeo subiu consideravelmente natildeo haacute fundamento moral (AacuteVILA 2007 p

175 e ss) para tais restriccedilotildees que natildeo deveriam ser levadas a efeito ainda que tivessem fundamento

juriacutedico do qual diga-se de passagem satildeo igualmente carentes

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

A fim de que o cidadatildeo contribuinte se convenccedila e se eduque no sentido de que eacute necessaacuterio

cumprir seus deveres para com o Fisco os quais satildeo indispensaacuteveis a que se crie uma sociedade livre

justa e solidaacuteria nos termos indicados na Constituiccedilatildeo Federal de 1988 eacute necessaacuterio que esses deveres sejam por ele vistos como justos e equacircnimes Isso eacute essencial para que a eficaacutecia da norma tributaacuteria seja incrementada fazendo com que dependa menos da repressatildeo estatal institucionalizada Para que essa consciecircncia se concretize poreacutem eacute imperioso que as instituiccedilotildees confiram ao cidadatildeo contribuinte tratamento equacircnime sendo inadequado que elas no plano geral e abstrato se-jam eticamente problemaacuteticas Instituiccedilotildees construiacutedas em bases natildeo eacuteticas levam agentes fiscais que tecircm atividade vinculada a agirem de forma igualmente natildeo eacutetica mesmo que com isso natildeo estejam de acordo no plano moral ou pessoal criando assim uma deslealdade institucionalizada Com isso se retira ou compromete a apontada consciecircncia no sujeito passivo de que haacute um fundamento eacutetico para o cumprimento de seus deveres fiscais corroendo a legitimidade da relaccedilatildeo tributaacuteria Natildeo se estaacute com isso incorrendo-se na ingenuidade de imaginar que o contribuinte com-porta-se sempre com honestidade e lealdade perante o Fisco e que este seria o lado maligno da relaccedilatildeo Longe disso Como dito o presente trabalho natildeo trata de possiacuteveis desvios de comportamen-to pessoais deste ou daquele contribuinte ou mesmo deste ou daquele agente fiscal os quais por certo podem existir mas contam com mecanismos institucionais para combate e controle A principal preocupaccedilatildeo aqui como se procurou mostrar satildeo as deslealdades institucionais pois elas estimulam ou incrementam as primeiras impondo a praacutetica de abusos a autoridades que natildeo gostariam de pra-ticaacute-los e despertando em contribuintes a indesejaacutevel sensaccedilatildeo de que a relaccedilatildeo tributaacuteria ainda eacute de fato e predominantemente de poder natildeo sendo errado fazer uso de meios igualmente escusos para se evadir dela

a da Cofins e a do PIS (SILVA 2009 p 28) Assim devem ser entendidos como insumos natildeo apenas as mateacuterias primas ou os materiais que fisicamente se incorporarem ao bem produzido ou ao resultado do serviccedilo prestado mas todos os custos diretos ou indiretos relacionados agrave produccedilatildeo ou agrave geraccedilatildeo da receita a ser tributada Nesse sentido confira-se OLIVEIRA 2005 p 45 e ss

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15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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INTRODUCcedilAtildeO

Educaccedilatildeo e cidadania satildeo temas que se enredam e satildeo constantemente postos no centro do

debate na sociedade brasileira O desafio em contribuir com a formaccedilatildeo de agentes sociais que alte-

rem substancialmente sua histoacuteria mediante uma reflexatildeo participativa potildee-se como uma das metas

da educaccedilatildeo no Brasil Para tanto diversos projetos e programas foram desenvolvidos ao longo da

histoacuteria

A base para essas accedilotildees se encontra nos documentos que norteiam a poliacutetica educacional no

Paiacutes a Constituiccedilatildeo Brasileira a Lei de Diretrizes e Bases da Educaccedilatildeo Nacional (LDB) e os Paracircmetros

Curriculares Nacionais (PCNs) Neles estaacute claramente explicitada a importacircncia da formaccedilatildeo para a

conquista da cidadania no processo educacional Uma educaccedilatildeo libertadora passa pelo processo de

empoderamento criacutetico e que leve a uma accedilatildeo efetiva dos atores sociais

Nesse sentido a educaccedilatildeo fiscal contribui para a reflexatildeo da cidadania e seu inter-relaciona-

mento com a tributaccedilatildeo sempre tendo por base o conhecimento para a accedilatildeo Busca-se a criacutetica em-

basada e consciente para a anaacutelise de um orccedilamento puacuteblico ou das planilhas exigidas pela Lei de

Responsabilidade Fiscal por exemplo A educaccedilatildeo fiscal aproxima do cidadatildeo conceitos antes restritos

ao Executivo ou Legislativo ou mesmo aos profissionais da aacuterea tributaacuteria contaacutebil etc

Eacute nessa perspectiva que o Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Cearaacute (PEF) se insere nas discussotildees

sobre cidadania no acircmbito da sociedade cearense em consonacircncia com o Programa Nacional de Edu-

caccedilatildeo Fiscal (PNEF) O objetivo eacute juntar educaccedilatildeo e tributaccedilatildeo o que representa grande desafio em

REFLEXOtildeES CONCEITUAIS E PRAacuteTICAS DO PROGRAMA ESTADUAL DE EDUCACcedilAtildeO FISCAL DO CEARAacute

Imaculada Maria Vidal da Silva1

SUMAacuteRIO Introduccedilatildeo 1 Cidadania participaccedilatildeo e controle social para compreender a Educaccedilatildeo Fiscal 2 Educaccedilatildeo Fiscal para a cida-dania 3 A Educaccedilatildeo Fiscal no Cearaacute 31 Projetos em destaque 311 Educaccedilatildeo a distacircncia 312 Seminaacuterios e palestras 313 Monitores de Educaccedilatildeo Fiscal 314 Educaccedilatildeo Fiscal Itinerante 315 Cidada-nia Fiscal para Universitaacuterios 316 Noccedilotildees de Cidadania Fiscal para Moradores de Comunidades Consideraccedilotildees finais Referecircncias

1 Auditora Fiscal Adjunta da Receita Estadual Mestre em Planejamento e Poliacuteticas Puacuteblicas pela Universidade Estadual do Cearaacute Especialista em Teorias da Comunicaccedilatildeo e da Imagem pela Universidade Federal do Cearaacute E-mail imaculadavidalsefazcegovbr

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uma naccedilatildeo que secularmente alijou o cidadatildeo do seu processo de construccedilatildeo histoacuterica fomentado

pelos gestores e a elite econocircmica e poliacutetica

O Estado do Cearaacute mediante parceria entre Secretarias da Fazenda e de Educaccedilatildeo implemen-

tou o Programa de Educaccedilatildeo Fiscal (PEF) em 1998 com o intuito de levar agraves escolas puacuteblicas e privadas

a discussatildeo em torno do tema cidadania conforme estabelece o PNEF Nesses dezesseis anos diversas

accedilotildees foram realizadas com a filosofia de deixar disponiacutevel ao cidadatildeo conhecimentos de ordem tri-

butaacuteria para permitir a apropriaccedilatildeo de instrumentos para a participaccedilatildeo e o controle social

Dentro desse contexto o objetivo deste trabalho eacute refletir sobre aspectos conceituais desta-

cando algumas categorias fundantes da temaacutetica e apresentar como a teoria da educaccedilatildeo fiscal se

efetiva de forma praacutetica por meio das accedilotildees desenvolvidas pela Ceacutelula de Educaccedilatildeo Fiscal (Ceduf) da

Secretaria da Fazenda do Estado do Cearaacute (Sefaz)

Como metodologia esse ensaio se conduz por base na investigaccedilatildeo documental bem como

a partir de um levantamento bibliograacutefico do tema com enfoque nos conceitos de cidadania parti-

cipaccedilatildeo e controle social As atividades desenvolvidas pela Ceduf satildeo apresentadas como praacuteticas e

possibilidades de reflexatildeo dos caminhos que a temaacutetica envereda no seu cotidiano

O trabalho estaacute dividido em trecircs toacutepicos Para a compreensatildeo de como se conceitua a educaccedilatildeo

fiscal o primeiro momento aborda trecircs categorias fundamentais para esse entendimento cidadania

participaccedilatildeo e controle social Em seguida a educaccedilatildeo fiscal eacute apresentada como instrumento a ser-

viccedilo da cidadania no terceiro toacutepico eacute relatada a experiecircncia da Ceduf na conduccedilatildeo do Programa de

Educaccedilatildeo Fiscal da Secretaria da Fazenda do Estado do Cearaacute

1 CIDADANIA PARTICIPACcedilAtildeO E CONTROLE SOCIAL PARA COMPREENDER A EDUCACcedilAtildeO FISCAL

Para entender como se estruturam as discussotildees em torno da educaccedilatildeo fiscal necessaacuterio se faz

refletir sobre alguns conceitos baacutesicos da temaacutetica cidadania participaccedilatildeo e controle social Funda-

mentais para entender o papel do cidadatildeo como ator social

A tarefa de apreender cidadania natildeo eacute faacutecil numa naccedilatildeo cujas raiacutezes histoacutericas satildeo permeadas

pelo colonialismo e um passado escravocrata que a engendrou em pouco contato com a participaccedilatildeo

A colonizaccedilatildeo brasileira foi marcada pela usura e apropriaccedilatildeo Para avanccedilar poreacutem na conceituaccedilatildeo

e discutir cidadania no Brasil eacute primordial compreender a gecircnese histoacuterica desse termo tatildeo usado no

discurso cotidiano

Natildeo se pode comparar o conceito de cidadania vivenciado na Antiguidade claacutessica com o de

hoje As referecircncias satildeo claramente diferentes tempo espaccedilo e sociedades distintamente constituiacutedas

o que influencia as percepccedilotildees do que sejam direitos e participaccedilatildeo Hoje parece surreal imaginar uma

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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decisatildeo sendo tomada em praccedila puacuteblica sem o intermeacutedio dos representantes poliacuteticos para legislar

em nome dos eleitores

Atenas um exemplo claacutessico de Cidade-Estado eacute conhecida pela participaccedilatildeo e democracia

Ressalta-se que essa participaccedilatildeo se focava no sexo masculino excluindo totalmente as mulheres

escravos e estrangeiros ou seja a democracia ateniense natildeo era tatildeo democraacutetica assim Um aspecto

positivo diz respeito a natildeo exclusatildeo dos homens menos favorecidos economicamente Nesse sentido

a participaccedilatildeo era ampla independente de poder ou status social Ressalte-se que tambeacutem natildeo existia

a noccedilatildeo de representatividade pois a democracia era direta por voto individual

Com base nesse recorte percebe-se que a cidadania era menos inclusatildeo e infinitamente mais

exclusatildeo Poucos participavam das decisotildees O conceito de cidadania era riacutegido norteado na busca

de garantir a centralizaccedilatildeo do poder como esclarece Karnal (2003 In PINSKY J PINSKY CB 2003

p 144)[] o termo cidadania foi criado em meio a um processo de exclusatildeo Dizer quem era cidadatildeo ndash ao contraacuterio de hoje em que supomos se tratar da maioria ndash era a maneira de eliminar a possibilidade de a maioria participar e garantir privileacutegios de uma mino-ria Admitir o conceito de cidadania como um processo de inclusatildeo total eacute uma leitura contemporacircnea

Importante contribuiccedilatildeo para a formaccedilatildeo do conceito de cidadania vem tambeacutem dos romanos

Diferentemente da Greacutecia onde primeiro havia as cidades e depois os cidadatildeos para os romanos era

o cidadatildeo que formava a cidadecoletividade Vale lembrar que para os romanos cidadania cidade e

Estado tinham o mesmo significado

O caminho da cidadania continua junto aos passos da humanidade As liccedilotildees aprendidas com

Greacutecia e Roma repercutem ao longo do processo histoacuterico e novos ideais surgem Um grande marco

das contribuiccedilotildees para a compreensatildeo do conceito de cidadania eacute trazido pelas chamadas revoluccedilotildees

liberais Revoluccedilatildeo Inglesa Americana e Francesa Delas emergiram conceitos accedilotildees e saberes motivo

pelo qual conhecer sobre elas eacute se apropriar de elementos decisivos no mosaico que compotildee a histoacuteria

da cidadania

As revoluccedilotildees liberais foram capitaneadas pelos burgueses e trabalhadores do campo jaacute no

processo de rompimento com o regime feudal As revoluccedilotildees liberais satildeo tambeacutem chamadas revolu-

ccedilotildees burguesas A partir das reivindicaccedilotildees dos direitos para os cidadatildeos por oportunidades eacute estabe-

lecido o surgimento do liberalismo poliacutetico e econocircmico (COELHO 2005)

Daiacute faz-se necessaacuterio destacar o conceito de cidadania liberal que natildeo busca o coletivo mas a

garantia do acesso do indiviacuteduo agrave posse e ao poder ldquoA cidadania liberal foi pois uma cidadania exclu-

dente diferenciadora de lsquocidadatildeos ativosrsquo e lsquocidadatildeos passivosrsquo lsquocidadatildeo com possesrsquo e lsquocidadatildeo sem

possesrsquo (MONDAINI apud COELHO 2005 p 15)

A primeira revoluccedilatildeo liberal foi a inglesa que teve como caracteriacutestica principal o absolutismo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

50

da monarquia que se revelava avassalador nas questotildees financeiras A exigecircncia do pagamento de

tributos cada vez mais pesados revoltava e causava reaccedilotildees Esse processo revolucionaacuterio inglecircs foi

longo e passou pela destituiccedilatildeo da Coroa e depois sua restauraccedilatildeo culminando com o estabelecimen-

to da maacutexima de que o parlamento governa e o rei reina

A segunda revoluccedilatildeo iniciou-se no processo de expansatildeo da Coroa Inglesa com a chegada agrave

terra batizada de Nova Inglaterra em 1620 marcando o evento no calendaacuterio mundial Era o iniacutecio

pelo menos na histoacuteria oficial dos EEUU da colonizaccedilatildeo dessa Federaccedilatildeo Com o passar do tempo e jaacute

com as financcedilas combalidas pelas guerras a Inglaterra resolveu pressionar as colocircnias localizadas no

Novo Mundo Mais uma vez as restriccedilotildees e o aumento da carga tributaacuteria promoveram ou potencia-

lizaram insatisfaccedilotildees e deflagraram revoltas

A uacuteltima e grande revoluccedilatildeo liberal do periacuteodo foi a Francesa a mais citada quando se fala em

revoluccedilatildeo por cidadania e participaccedilatildeo Especialmente pelo aspecto universal que pregava a liberdade

A Revoluccedilatildeo Francesa tem como antecedente histoacuterico um paiacutes dominado pelo poder absolutista de

seus reis A expropriaccedilatildeo mediante pesados tributos eacute um dos fatores motivadores da Revoluccedilatildeo Mais

uma vez a tributaccedilatildeo se apresenta como fator fundamental para uma revolta

A Revoluccedilatildeo Francesa eacute tema obrigatoacuterio dentro da educaccedilatildeo fiscal por dois aspectos baacutesicos

a tributaccedilatildeo exigida pelo rei com o baixo niacutevel de retorno social dos tributos e a participaccedilatildeo popular

decisiva para romper com o status quo Aqui se originam profundas discussotildees sobre a cidadania jaacute

que eacute nitidamente uma organizaccedilatildeo dos excluiacutedos e que se torna fato importante na Revoluccedilatildeo

Um instrumento histoacuterico importantiacutessimo para a cidadania eacute produzido no seio da Revoluccedilatildeo

Francesa - a Declaraccedilatildeo dos Direitos do Homem proclamada em 26 de agosto de 1789 tendo como

caracteriacutestica fundamental seu papel universal natildeo se restringindo aos franceses mas a toda uma luta

por igualdade fraternidade e liberdade humana

Feita essa recuperaccedilatildeo histoacuterica da cidadania cabe abordaacute-la com assento na concepccedilatildeo apre-

sentada por Marshall considerada um claacutessico no tema ao abordar o conceito com o foco voltado

para a conquista de direitos em trecircs dimensotildees civis poliacuteticos e sociais (COELHO 2005 p 19-20)

Marshall interpretou o desenvolvimento da cidadania por um vieacutes histoacuterico relacio-nando-a com as instituiccedilotildees e com os valores poliacuteticos O autor estudou a ampliaccedilatildeo dos direitos fundamentais e do nuacutemero de pessoas que poderiam gozar de tais direi-tos para entender como se deu o processo de ldquoextensatildeo da cidadaniardquo apoacutes as revolu-ccedilotildees burguesas [] Marshall interessava-se especialmente pelo impacto da cidadania sobre a desigualdade social e com esse objetivo em vista pensou a cidadania dividida em trecircs elementos ou dimensotildees direitos civis poliacuteticos e sociais Segundo ele cada um desses elementos surgiu em tempos (momentos histoacutericos) diferentes embora alguns processos tenham acontecido simultaneamente jaacute que o tempo natildeo pode ser pensado de forma estaacutetica

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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Assim para se ter cidadania eacute na visatildeo de Marshall imprescindiacutevel a junccedilatildeo dessas trecircs verten-

tes do direito Para se ter plenitude na cidadania haacute de alcanccedilar a completude de acesso revelando-

-se uma accedilatildeo ampla para a formaccedilatildeo do cidadatildeo pleno Aquele que natildeo atinge as trecircs dimensotildees eacute

chamado de cidadatildeo incompleto e o que natildeo eacute contemplado com nenhum direito eacute o natildeo cidadatildeo

(CARVALHO 2003)

Para que essa cidadania ativa se efetive eacute necessaacuteria a accedilatildeo de agentes sociais em processos de

participaccedilatildeo de atuaccedilatildeo na busca de atendimento agraves demandas sociais uma participaccedilatildeo em cons-

tante processo de descoberta como anota Demo (2001 p 44) ldquoParticipaccedilatildeo eacute conquista eacute processo

infindaacutevel em constante vir-agrave-ser sempre se fazendo eacute uma conquista processual Natildeo pode ser en-

tendida como daacutediva nem como concessatildeo nem como algo preexistenterdquo

Destaque-se que essa participaccedilatildeo soacute se reveste de sentido quando eacute efetiva e atuante Natildeo

quando se percebe como uma ldquopossibilidaderdquo manipulada pelo poder estabelecido para dar falsa

ideia de participaccedilatildeo (DEMO 2001)

A participaccedilatildeo se efetiva na gestatildeo puacuteblica pelo exerciacutecio do controle social ou seja no acom-

panhamento pela sociedade das accedilotildees realizadas pelo Poder Puacuteblico Expressatildeo muito usada na atu-

alidade o controle social se baseia numa cidadania ativa e na participaccedilatildeo da sociedade (CORBARI

2004)

Eacute pelo controle social que se consubstancia o papel do agente social na consecuccedilatildeo das deman-

das da sociedade exigindo dos gestores puacuteblicos aquilo que lhe eacute direito e para o qual existe a figura

do Estado Destaque-se que o controle social eacute figura emblemaacutetica de processos democraacuteticos natildeo se

imaginando em regimes de exceccedilatildeo que a sociedade tenha poder de intervir (SILVA 2002)

A praacutetica do controle social vem no escopo da Constituiccedilatildeo de 1988 natildeo por acaso chamada de

Constituiccedilatildeo cidadatilde que estabelece forma de participaccedilatildeo e transparecircncia das accedilotildees de Estado (VALLE

2002 p 82)Por certo a figura do controle social da Administraccedilatildeo veio mesmo a ganhar grande impulso foi com a ediccedilatildeo da Carta de 1988 que a par de referecircncias expressas a ins-titutos proacuteprios ao atingimento dessa finalidade forneceu os mecanismos de publici-dade impostos ao Estado Com esse binocircmio acesso agraves informaccedilatildeo-meios de controle torna-se possiacutevel uma efetiva fiscalizaccedilatildeo sobre as atividades antes acobertadas por afirmaccedilotildees vagas de proteccedilatildeo ao sigilo preservaccedilatildeo da discricionariedade da admi-nistraccedilatildeo e outras

Uma das formas basilares dessa participaccedilatildeo para a cidadania passa pelo processo educacional

Uma educaccedilatildeo voltada para a formaccedilatildeo de pensadores de agentes sociais efetivos no curso da histoacute-

ria A importacircncia do processo educacional eacute assinalada por Carvalho (2003 p 11)

[] a educaccedilatildeo popular Ela eacute definida como direito social mas tem sido historica-mente um preacute-requisito para a expansatildeo dos outros direitos Nos paiacuteses em que a

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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cidadania se desenvolveu com mais rapidez inclusive na Inglaterra por uma razatildeo ou outra a educaccedilatildeo popular foi introduzida Foi ela que permitiu agraves pessoas tomarem conhecimento de seus direitos e se organizarem para lutar por eles A ausecircncia de uma populaccedilatildeo educada tem sido sempre um dos principais obstaacuteculos agrave construccedilatildeo da cidadania civil e poliacutetica

A percepccedilatildeo do cidadatildeo brasileiro sobre o que satildeo seus direitos eacute turvada pela compreensatildeo

de que o Estado eacute o fornecedor desses direitos a tiacutetulo de benesse Isso se justifica pela inversatildeo da

conquista dos direitos em que os direitos sociais foram mais exaltados criando uma visatildeo paternalista

do Estado e natildeo como distribuidor de bens e serviccedilos que pertencem de fato agrave coletividade

Assim a educaccedilatildeo fiscal como fomentadora do debate em torno dos recursos puacuteblicos e da

importacircncia do controle social mediante a participaccedilatildeo cidadatilde colabora diretamente com essa educa-

ccedilatildeo libertadora e de formaccedilatildeo conducente agrave apropriaccedilatildeo de conhecimento para a praacutetica da cidadania

que deve ser marcada pela mediaccedilatildeo histoacuterico-social natildeo um arremedo de cidadania pela metade ou

outorgada pelo Estado mas sim conquistada e estabelecida pela participaccedilatildeo

Como proposta de combater esse Estado corporativo e clientelista e em busca da transposiccedilatildeo

da ldquocidadania de papelrdquo - como conceitua Dimenstein (2001 p17) acerca de garantias somente como

letra impressa em papel e que natildeo se reflete na vida cotidiana - para uma realidade presente eacute que a

educaccedilatildeo fiscal se apresenta com sua concepccedilatildeo filosoacutefica de educaccedilatildeo para a participaccedilatildeo

2 EDUCACcedilAtildeO FISCAL PARA A CIDADANIA

A educaccedilatildeo eacute sem duacutevida uma praacutetica de mediaccedilatildeo entre o ser e sua atuaccedilatildeo no meio social

O processo educacional deve transcender a mera reproduccedilatildeo de conceitos formais e a ecircnfase em con-

teuacutedos e disciplinas objetivando o debate em torno da localizaccedilatildeo do homem em sua histoacuteria como

um ser integral e natildeo limitado a datas e significados pontuais

Nesse sentido a educaccedilatildeo deve estar a serviccedilo da contestaccedilatildeo do que estaacute erroneamente es-

tabelecido propondo a alteraccedilatildeo do que natildeo eacute vaacutelido para o bem-comum da sociedade o que requer

accedilatildeo e compromisso vontade e disposiccedilatildeo dos sujeitos sociais ativos

A educaccedilatildeo fiscal eacute expressa como proposta de accedilatildeo para a cidadania voltada para a percepccedilatildeo

social na qual o cidadatildeo estaacute inserido e principalmente para o fornecimento de subsiacutedios para uma

atuaccedilatildeo consistente e de contribuiccedilatildeo para a melhoria das condiccedilotildees sociais daqueles natildeo contempla-

dos pela justiccedila social ou seja os excluiacutedos

Essa eacute a proposta da educaccedilatildeo fiscal de forma ampliada instrumentalizar o cidadatildeo para a me-

lhoria de toda a sociedade num ato de conhecer para transformar fazendo a intercessatildeo do conheci-

mento com a accedilatildeo criacutetica Conforme estabelece o documento da Escola de Administraccedilatildeo Fazendaacuteria

(Esaf) coordenadora do Programa Nacional (PNEF)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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Nesse contexto surge a discussatildeo do tema Educaccedilatildeo Fiscal visando agrave conscientizaccedilatildeo da sociedade quanto agrave funccedilatildeo do Estado de arrecadar impostos e ao dever do cida-datildeo contribuinte de pagar tributo Entretanto a Educaccedilatildeo Fiscal natildeo eacute apenas isso eacute principalmente um desafio pois se trata de um processo de inserccedilatildeo de valores na sociedade como o de percepccedilatildeo do tributo que assegura o desenvolvimento econocirc-mico e social e com o devido conhecimento de seu conceito sua funccedilatildeo e sua aplica-ccedilatildeo [] Para que haja mudanccedila de comportamento na sociedade com o despertar da consciecircncia de cidadania eacute necessaacuteria uma accedilatildeo educativa permanente e sistemaacutetica voltada para o desenvolvimento de haacutebitos atitudes e valores A Educaccedilatildeo Fiscal eacute um trabalho de sensibilizaccedilatildeo da sociedade para a funccedilatildeo socioeconocircmica do tributo Nesta funccedilatildeo o aspecto econocircmico refere-se agrave otimizaccedilatildeo da receita puacuteblica e o as-pecto social diz respeito agrave aplicaccedilatildeo dos recursos em benefiacutecio da populaccedilatildeo (BRASIL 2002 p 8)

De forma objetiva foi possiacutevel inventariar como caracteriacutesticas da educaccedilatildeo fiscal a accedilatildeo educa-

tiva sob a perspectiva participativa e inclusiva Nela eacute propicio o fato de que as mais diversas temaacuteticas

relacionadas ao tecido social sejam contempladas tais como focar a realidade atual caracteriacutesticas

dos temas transversais de um modo geral questionar e propor melhorias sociais com suporte na

participaccedilatildeo efetiva em associaccedilotildees sindicatos orccedilamento participativo senso criacutetico para interagir

e exercer o controle social e por fim ndash e com respaldo nas caracteriacutesticas anteriores ndash uma visatildeo de

cidadania ativa e plena com direitos e deveres respeitados

A seguir estatildeo listados na visatildeo da autora deste trabalho os principais obstaacuteculos para levar a

efeitos a educaccedilatildeo fiscal como tema a ser inserido no cotidiano social bem como na accedilatildeo dos atores

sociais de forma geral

Descreacutedito das instituiccedilotildees nos governantes e gestores puacuteblicos esse eacute sem duacutevida o maior

desafio a ser vencido para a praacutetica da educaccedilatildeo fiscal Por todo o ranccedilo histoacuterico de desmando inefi-

ciecircncia e ineficaacutecia a populaccedilatildeo tem seacuterias restriccedilotildees em acreditar que eacute possiacutevel mudar esse quadro

e que a sua participaccedilatildeo pode alterar essa realidade cristalizada em suas mentes passo fundamental

para uma atuaccedilatildeo mais cidadatilde Como esclarece Maria das Graccedilas Rua (apud GONCcedilALVES 2002 p 7)

ldquoA grande mudanccedila atual e que coincide com uma ampliaccedilatildeo do conceito de cidadania eacute a descoberta

de que o cidadatildeo pode influir tambeacutem na Administraccedilatildeo Puacuteblicardquo

Corrupccedilatildeo um dos maiores cacircnceres da Administraccedilatildeo Puacuteblica tornando por demais difiacutecil a missatildeo

daqueles que acreditam e praticam uma conduta eacutetica no serviccedilo puacuteblico Em geral eacute a primeira inda-

gaccedilatildeo dos increacutedulos ndash Pagar tributos e lutar para sua aplicaccedilatildeo se em verdade o dinheiro em grande

escala vai para o bolso de algueacutem Os escacircndalos sucessivos alimentam essa percepccedilatildeo

A cultura da ldquoLei de Gersonrdquo Desde a deacutecada de 1970 a expressatildeo ldquoLei de Gersonrdquo passou a ser

lugar-comum na sociedade brasileira Criada como motivo publicitaacuterio (cigarros) em que Gerson jo-

gador da seleccedilatildeo tricampeatilde mundial de futebol afirmava que gostava de levar vantagem em tudo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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(ldquocertordquo) passou a ser considerada accedilatildeo inteligente Afinal ser esperto eacute levar vantagem sobre os ou-

tros Isso se aplica agraves praacuteticas tributaacuterias com base na sonegaccedilatildeo aos comportamentos anticidadatildeos

de furar fila ou passar em sinal vermelho

Reduzida praacutetica de participaccedilatildeo ainda estaacute em decurso no Brasil a praacutetica da participaccedilatildeo prova-

velmente em funccedilatildeo de deacutecadas de regime de exceccedilatildeo eacute preciso superar essa zona de conforto Parti-

cipar exige comprometimento e nem sempre eacute confortaacutevel Afinal apesar de todos os compromissos

pessoais e profissionais de uma jornada de trabalho e em casa eacute preciso encontrar tempo para ler

para estar ciente do que acontece no Legislativo no Executivo como estatildeo sendo aplicados os recur-

sos puacuteblicos como corrobora Joseacute Oliacutempio Bastos (apud GONCcedilALVES 2002 p 3)

Temos tendecircncia a repudiar aquilo que nos incomoda e entatildeo nos limitamos a recla-mar sem nada fazer para que a situaccedilatildeo mude Mas eacute normal ao ser humano essa acomodaccedilatildeo Resta uma atitude a quem consegue enxergar tudo isso Atitude essa que natildeo deve restringir-se agrave indignaccedilatildeo mas agrave vontade de transformar essa realidade

Falta de transparecircncia ou cultura de sombras especialmente porque os legisladores e governantes

natildeo estatildeo habituados a esse controle social proposto pela educaccedilatildeo fiscal e como tal natildeo facilitam

o acesso por meio de uma informaccedilatildeo transparente apesar da Lei de Responsabilidade Fiscal que

estabelece a prestaccedilatildeo de contas ou a Lei de Acesso agrave Informaccedilatildeo A transparecircncia eacute qualidade fun-

damental e obrigatoacuteria quando se trata de gestatildeo puacuteblica (TORRES 2005 p 243)

A transparecircncia fiscal eacute um princiacutepio constitucional impliacutecito Sinaliza no sentido que a atividade financeira deve se desenvolver segundo os ditames da clareza abertura e simplicidade Dirige-se assim ao Estado como agrave sociedade tanto aos organismos financeiros supranacionais quanto agraves entidades natildeo governamentais Baliza e modula a problemaacutetica da elaboraccedilatildeo do orccedilamento e da sua gestatildeo responsaacutevel da criaccedilatildeo de norma antielisivas da abertura de sigilo bancaacuterio e do combate agrave corrupccedilatildeo

Concepccedilatildeo de um tema voltado para mera arrecadaccedilatildeo de tributos eacute muito comum quando da abor-

dagem do tema em sala de aula para professores profissionais liberais e outros existir no contato inicial

a sensaccedilatildeo de que se trata de mais um artifiacutecio do governo para aumentar a arrecadaccedilatildeo a exemplo do

que satildeo as campanhas de troca de notas fiscais por bocircnus financeiros sorteios de casas automoacuteveis etc

Tal percepccedilatildeo acontece ateacute que se verifique natildeo se tratar simplesmente de um programa de governo ou

poliacutetico-partidaacuterio mas sim de um programa de Estado ou seja natildeo se resume a uma visatildeo imediatista

mas sim de longo prazo de mudanccedila de cultura do cidadatildeo e do gestor que deveraacute aplicar aquele tributo

no bem-estar da sociedade assim volta para a sociedade o que de fato a ela pertence

Especificidade do tema quando se aborda a educaccedilatildeo fiscal e se ressalta a importacircncia da temaacutetica

eacute comum encontrar uma resistecircncia o receio de abordar um tema aparentemente aacuterido e complexo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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Como expresso anteriormente poreacutem natildeo se trata de formar tributaristas ou expertos em orccedilamento

e sim formar pensamento criacutetico sobre os tributos o papel do governo na gestatildeo dos recursos puacutebli-

cos e como se efetiva a participaccedilatildeo popular na Administraccedilatildeo Puacuteblica Feito isso a educaccedilatildeo fiscal

teraacute realizado com sucesso sua missatildeo

Como visto superar as dificuldades eacute um grande desafio para que a educaccedilatildeo fiscal tome as-

sento nas discussotildees nacionais e locais Exige esforccedilo de todos os lados do cidadatildeo comprometido

do estudante que sonha com um paiacutes melhor do professor que tencionava alterar uma realidade

perversa dos governantes eacuteticos dos servidores puacuteblicos que acreditam que eacute possiacutevel um futuro

mais digno Assim todos seratildeo vencedores e participantes de uma sociedade com mais equidade e

justiccedila social

3 A EDUCACcedilAtildeO FISCAL NO CEARAacute

O PEF - Cearaacute nasceu em 1998 datando de 14 de agosto daquele ano a aula inaugural do Pro-

grama veiculada pela TV Cearaacute por meio do sistema de telensino que se constituiacutea numa sistemaacutetica

de aula emitida pelo sistema puacuteblico de televisatildeo na sala de aula o orientador de aprendizagem (pro-

fessor) aprofundava os conceitos apresentados em viacutedeo-aula com suporte em material de didaacutetico

(SILVA 2007 p 84-85)

Desenvolve-se formalmente a Educaccedilatildeo Fiscal no Estado do Cearaacute mediante a parceria entre

Secretaria da Fazenda do Estado Secretaria da Receita Federal do Brasil ndash 3a Regiatildeo Fiscal (SRFB)

Prefeitura Municipal de Fortaleza (PMF) por intermeacutedio das Secretarias de Financcedilas (Sefin) e Educaccedilatildeo

do Municiacutepio (SME) Secretaria de Educaccedilatildeo do Estado (Seduc) e Centro Regional da Esaf (Centresaf)

constituindo desta forma o Grupo de Educaccedilatildeo Fiscal Estadual (Gefe Cearaacute)

O Gefe estabelece as accedilotildees de desenvolvimento do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal com base na

filosofia e premissas do programa nacional As accedilotildees satildeo implementadas a partir do grupo e da adesatildeo

de aliados criando-se uma rede de educaccedilatildeo fiscal Ressalte-se ainda que embora se tenha um grupo

agindo em parceria cada instituiccedilatildeo tem sua autonomia de desenvolver accedilotildees especiacuteficas em sua linha

de interesse

Dessa forma seratildeo apresentadas as praacuteticas desenvolvidas pela Ceacutelula de Educaccedilatildeo Fiscal da

Sefaz do Cearaacute sendo que algumas experiecircncias se datildeo em parceria com outras instituiccedilotildees e outras

satildeo de responsabilidade da Ceduf

O decreto de criaccedilatildeo do entatildeo Programa de Educaccedilatildeo Tributaacuteria (PET) de dezembro de 1998

anota a funccedilatildeo conscientizadora do Programa (CEARAacute 1998 p 1)

Art 1ordm - Fica criado o Programa Educaccedilatildeo Tributaacuteria junto agraves instituiccedilotildees de Ensino objetivando conscientizar as pessoas sobre a importacircncia do pagamento de tributos

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

56

um dos principais deveres do cidadatildeo bem como o de esclarecer sobre o papel do Estado de arrecadar tributos e aplicaacute-los eficientemente para o desenvolvimento da sociedade

Os objetivos do entatildeo chamado PET foram elaborados nessa perspectiva da disseminaccedilatildeo de

informaccedilotildees e conhecimentos para a praacutetica da cidadania conforme estabelece seu projeto (CEARAacute

1998 p 3)Geral evidenciar que a educaccedilatildeo tributaacuteria contribui para a construccedilatildeo da cidadaniaEspeciacuteficos Esclarecer a populaccedilatildeo que o pagamento de tributos eacute um dos principais deveres do cidadatildeo e eacute dever do Estado arrecadar tributos e aplicaacute-los eficientemente para o desenvolvimento da sociedadeEstimular o exerciacutecio da cidadania sensibilizando a populaccedilatildeo para a importacircncia de acompanhar a correta aplicaccedilatildeo dos recursos arrecadados atraveacutes dos canais legais de participaccedilatildeoDespertar no estudante a consciecircncia quanto agrave exigecircncia do documento fiscal como mecanismo gerador de recursos puacuteblicos

Para fortalecer o PEF a Sefaz criou em 2007 a Ceacutelula de Educaccedilatildeo Fiscal (Ceduf) Assim a

educaccedilatildeo fiscal deixou de ser um programa desenvolvido por um setor de planejamento e passou a

fazer parte da estrutura organizacional Atualmente a Ceduf conta com 07 servidores fazendaacuterios e 03

terceirizados que tecircm como missatildeo disseminar a educaccedilatildeo fiscal no Estado do Cearaacute aleacutem do apoio

de diversos colaboradores que mesmo natildeo sendo lotados na Ceacutelula participam de accedilotildees como ca-

pacitaccedilatildeo palestras oficinas O conceito que se busca eacute o envolvimento de servidores fazendaacuterios de

setores diversos com a educaccedilatildeo fiscal

O PEF tem produzido sistematicamente materiais que instrumentalizem as accedilotildees e facilitem a

compreensatildeo da relaccedilatildeo entre tributos e cidadania observando o preceito de adequaccedilatildeo dos conte-

uacutedos ao puacuteblico e a especificidade regional garantindo a identificaccedilatildeo do participante do programa e

o conteuacutedo disponibilizado Atualmente satildeo os seguintes os materiais pedagoacutegicos utilizados

- livros de aluno e professor de ensino fundamental II

- apostila de capacitaccedilatildeo para a formaccedilatildeo de professores e servidores puacuteblicos

- viacutedeo-aulas

- desenho animado ndash ldquoA turma da Cidadaniardquo ndash em DVD com trecircs histoacuterias sobre cidadania

tributos e ICMS produzidos pela Casa Amarela ndash Universidade Federal do Cearaacute - UFC e destinados a

crianccedilas do ensino fundamental I

- revista em quadrinhos com as mesmas personagens do desenho animado

- peccedila de teatro ldquoA comeacutedia da Cidadaniardquo escrita pelo dramaturgo cearense Joseacute Mapurunga

- Jogo da Cidadania jogo de tabuleiro no qual o participante segue uma trilha com informaccedilotildees

sobre tributos e cidadania

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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- Bloco de atividade caderno para realizaccedilatildeo de atividades luacutedicas envolvendo os conceitos de

educaccedilatildeo fiscal

- Cadernos impressos pela ESAF para o curso disseminadores de educaccedilatildeo fiscal

- CD com o conteuacutedo do curso Disseminadores de Educaccedilatildeo Fiscal

- Fasciacuteculos do curso Educaccedilatildeo Fiscal e Cidadania

Neste momento estatildeo em fase de produccedilatildeo novos livros didaacuteticos para alunos e professores

do ensino fundamental II ensino meacutedio e universidades fortalecendo o conteuacutedo e sedimentando o

conhecimento produzido no PEF Cearaacute

Utilizando-se desse material o PEF realiza as capacitaccedilotildees de professores promove semi-

naacuterios estaduais participa de feiras e eventos acadecircmicos recebe visita de estudantes de escolas

puacuteblicas e privadas na Sefaz forma servidores puacuteblicos no tema realiza palestras em universidades

escolas puacuteblicas e privadas associaccedilotildees empresariais e sindicais ONGS comunidades enfim nas

mais variadas situaccedilotildees nas quais existam pessoas dispostas a discutir cidadania e aprender a prati-

car o controle social

31 Projetos em destaque

Entre as atividades realizadas pela Ceduf2 algumas satildeo destacadas pelos resultados obtidos e

tambeacutem pelo pioneirismo na sua realizaccedilatildeo Os dados apresentados a seguir estatildeo contemplados nos

relatoacuterios anuais disponibilizados pela Sefaz no seu siacutetio de internet wwwsefazcegovbr

311 Educaccedilatildeo a distacircncia

O Cearaacute tem trabalhado com a formaccedilatildeo a distacircncia via internet de disseminadores de edu-

caccedilatildeo fiscal especialmente destinado a professores e servidores puacuteblicos das trecircs esferas de governo

promovida pela Esaf Trata-se de um instrumento que possibilita a participaccedilatildeo de cidadatildeos de forma

ampliada vencendo a barreira geograacutefica e de tempo Satildeo cerca de 6600 disseminadores jaacute formados

desde 2003 O Cearaacute tem 70 tutores servidores das instituiccedilotildees gestoras do PEF Cearaacute capacitados

para atuarem no acompanhamento das turmas anuais do curso Disseminadores de Educaccedilatildeo Fiscal

(DEF) Aleacutem da tutoria os servidores que atuam nessa funccedilatildeo satildeo importantes parceiros em diversas

atividades de divulgaccedilatildeo sensibilizaccedilatildeo e formaccedilatildeo em educaccedilatildeo fiscal

O curso tem atualmente 120 horasaulas dividido em cinco moacutedulos Educaccedilatildeo fiscal no con-

texto social Relaccedilatildeo Estado-sociedade Funccedilatildeo social dos tributos Gestatildeo democraacutetica dos recursos

puacuteblicos e Projetos em educaccedilatildeo fiscal

2 Informaccedilotildees sobre as atividades e os resultados obtidos pelo PEF Cearaacute e Ceduf podem ser visualizados no siacutetio da Sefaz Cearaacute wwwsefazcegovbr

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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Um resultado do curso DEF eacute a implementaccedilatildeo de projetos pedagoacutegicos e planos de accedilatildeo ela-

borados pelos participantes nos quais satildeo realizadas accedilotildees de educaccedilatildeo fiscal destinadas aos mais

diversos puacuteblicos garantindo capilaridade e amplificaccedilatildeo da educaccedilatildeo fiscal corroborando a caracte-

riacutestica universal da temaacutetica A implementaccedilatildeo de projetos possibilidade aliar teoria agrave praacutetica perce-

bendo o exerciacutecio da educaccedilatildeo no seu cotidiano

312 Seminaacuterios e palestras

Os seminaacuterios e palestras constituem-se em uma das principais atividades de educaccedilatildeo fiscal

pois marcam o contato direto do PEF com o seu puacuteblico Oportunidade de dialogar e apresentar a

proposta da educaccedilatildeo fiscal para a cidadania Jaacute foram promovidos eventos em universidades esco-

las de ensino baacutesico e meacutedio sindicatos associaccedilotildees profissionais etc Desde a institucionalizaccedilatildeo da

educaccedilatildeo fiscal na Secretaria da Fazenda com a criaccedilatildeo da Ceduf as accedilotildees tecircm sido intensificadas pela

dedicaccedilatildeo exclusiva da equipe de servidores entre 2008 e 2013 foram sensibilizadas cerca de 11600

pessoas entre capital e interior do Estado

313 Monitores de Educaccedilatildeo Fiscal

A Secretaria da Fazenda assinou convecircnio com a Secretaria da Educaccedilatildeo (Seduc) em 2007

para disponibilizar estaacutegios remunerados a jovens da rede puacuteblica estadual de ensino O objetivo eacute

formar grupos para disseminaccedilatildeo junto agrave escola comunidade e famiacutelia sobre aspectos ligados agrave eacutetica

cidadania e da funccedilatildeo social do tributo A parte praacutetica do curso acontece no Programa Sua Nota Vale

Dinheiro que desenvolve um projeto voltado para a conscientizaccedilatildeo do cidadatildeo sobre a importacircncia

da exigecircncia da nota fiscal na aquisiccedilatildeo de bens e serviccedilos Ateacute o final de 2013 a Sefaz contou com a

participaccedilatildeo de 1377 estagiaacuterios

314 Educaccedilatildeo Fiscal Itinerante

Ao considerar a necessidade de sensibilizar o puacuteblico interno o Projeto objetiva disseminar de

forma criacutetica e reflexiva os conteuacutedos da Educaccedilatildeo Fiscal no local de trabalho do servidor e do colabo-

rador fazendaacuterio A ideia eacute que o puacuteblico interno possa refletir como e em que medida o Programa de

Educaccedilatildeo Fiscal pode ser inserido no exerciacutecio das suas atividades funcionais e no cotidiano No mo-

mento em que o agente do Fisco incorporar a essecircncia da Educaccedilatildeo Fiscal eacute possiacutevel a praacutexis do PEF

e por conseguinte uma nova cultura tributaacuteria O Projeto jaacute alcanccedilou 229 servidores e colaboradores

tendo sido iniciado em 2013

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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315 Cidadania Fiscal para Universitaacuterios

O projeto compreende a realizaccedilatildeo de capacitaccedilatildeo de estudantes universitaacuterios e tem por ob-

jetivo disseminar a funccedilatildeo social do tributo e seu papel para a consecuccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas de

melhoria da qualidade de vida dos cidadatildeos possibilitando a instrumentalizaccedilatildeo dos estudantes para

o exerciacutecio profissional a participaccedilatildeo e o controle social Em 2013 foi realizado em parceria com o

Conselho Regional de Contabilidade (CRC) no Cearaacute e teve 104 alunos capacitados A atividade contou

com a participaccedilatildeo do SRFB Centresaf Sefin e Tribunal de Contas do Municiacutepio (TCM) abordando os

temas referentes agraves suas responsabilidade na tributaccedilatildeo e no controle social A primeira experiecircncia

do curso foi voltada para alunos do curso de Ciecircncias Contaacutebeis ofertando uma formaccedilatildeo sintonizada

com papel social e cidadatildeo do profissional de contabilidade um dos mediadores das relaccedilotildees entre o

fisco e a sociedade

A Ceduf tambeacutem desenvolveu uma outra versatildeo do curso para alunos universitaacuterios de cursos

superiores diversos possibilitando uma visatildeo sistecircmica da tributaccedilatildeo e da cidadania O curso foi rea-

lizado em parceria com a Faculdade Ateneu e Universidade Vale do Acarauacute que formaram conjunta-

mente 109 alunos na temaacutetica

316 Noccedilotildees de Cidadania Fiscal para Moradores de Comunidades

O objetivo eacute proporcionar uma reflexatildeo inicial acerca da cidadania fiscal para moradores de co-

munidades proacuteximas agraves unidades da Sefaz no intuito de contribuir para sua emancipaccedilatildeo social e hu-

mana A partir de atividades luacutedicas os participantes vivenciam a realidade da cidadania e dos tributos

aproximando-se assim do Fisco Em 2013 foram formadas trecircs turmas sendo os alunos moradores

das Comunidades Poccedilo da Draga Moura Brasil e Graviolas todas proacuteximas agraves sedes I II e II da Sefaz

em Fortaleza somando um total de 41 participantes

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

A educaccedilatildeo fiscal mostra-se como contribuiccedilatildeo para a formaccedilatildeo cidadatilde da populaccedilatildeo brasileira

Nas mais variadas accedilotildees executadas pelo Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Cearaacute entre as quais pales-

tras seminaacuterios e cursos observa-se a reaccedilatildeo positiva aos aspectos abordados relativos aos direitos e

deveres a atividade arrecadadora do Estado e a consequente necessidade do cidadatildeo exercer o acom-

panhamento da aplicaccedilatildeo do dinheiro puacuteblico

A educaccedilatildeo fiscal se propotildee a ser um canal de acesso a esse conhecimento A sua praacutetica nos

diversos segmentos sociais a partir da disseminaccedilatildeo dos valores relativos ao exerciacutecio da gestatildeo puacute-

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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blica com eacutetica e respeito ao cidadatildeo constitui contribuiccedilatildeo relevante ao exerciacutecio do controle social

A educaccedilatildeo eacute uma ferramenta primordial em qualquer esforccedilo de transformaccedilatildeo que se queira imple-

mentar em uma naccedilatildeo

O debate sobre a educaccedilatildeo fiscal eacute assunto obrigatoacuterio natildeo soacute no sentido curricular mas tam-

beacutem como praacutetica social De fato eacute necessaacuterio discutir a educaccedilatildeo brasileira seu curriacuteculo e suas praacute-

ticas na busca de uma accedilatildeo mais libertadora e natildeo pela simples formaccedilatildeo em conteuacutedos de leitura e

operaccedilotildees matemaacuteticas A formaccedilatildeo humana somente com esses conteuacutedos eacute pobre e pouco revolu-

ciona o status quo A escola eacute espaccedilo de construccedilatildeo de uma nova realidade sem o que se estaacute fadado

ao continuiacutesmo e agrave falta de perspectivas

Tal fato por si eacute respaldo para que cada vez mais se busque a compreensatildeo de como se processa

a histoacuteria do cidadatildeo e de sua Naccedilatildeo Para cada passo dado em direccedilatildeo a uma sociedade mais justa

estaraacute em sua base o conhecimento sobre como acontece a arrecadaccedilatildeo e como se deve acompanhar

e controlar o gasto puacuteblico Este fato natildeo ocorre soacute nos gabinetes das Assembleias e cacircmaras alta e

baixa tambeacutem mas no cotidiano Para que o futuro reserve uma sociedade cada vez mais participativa

e um cidadatildeo atuante e engajado satildeo necessaacuterios conhecimento e informaccedilatildeo que vecircm nos debates

sobre cidadania Nesse aspecto a educaccedilatildeo fiscal deve colaborar de forma efetiva com esse novo Paiacutes

que se busca na equidade social e na participaccedilatildeo

O que a experiecircncia da Ceduf no Cearaacute tem registrado eacute o crescente interesse das pessoas

em acessarem o saber das questotildees tributaacuterias compreendendo como se processa a administraccedilatildeo

puacuteblica dos recursos disponibilizados pelo cidadatildeo para o fornecimento dos serviccedilos puacuteblicos a eles

destinados

Cada vez mais pulsa o desejo de participar e isso requer conhecimento do processo A educa-

ccedilatildeo fiscal se torna a cada dia mais importante A resistecircncia oriunda do descreacutedito tende a ser substi-

tuiacuteda pela vontade de aprender para transformar Sair agraves ruas como se tem visto desde 2012 tem se

tornado um haacutebito e para que se torne uma praacutetica cidadatilde eacute necessaacuterio se apropriar do conhecimento

para encontrar os equiacutevocos da gestatildeo puacuteblica e apontar novas perspectivas

Natildeo se pode falar em direitos de cidadania sem uma base financeira que os sustentem Vida em

sociedade deve pressupor solidariedade e essa eacute a funccedilatildeo do tributo

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REFEREcircNCIAS

BRASIL Ministeacuterio da Fazenda Escola de Administraccedilatildeo Fazendaacuteria (Esaf) Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal Brasiacutelia 2002

BASTOS Joseacute Oliacutempio Senhor cidadatildeo vocecirc eacute o patratildeo Beleacutem Independente 2000

CARVALHO Joseacute Murilo de Cidadania no Brasil o longo caminho 4 ed Rio de Janeiro Civilizaccedilatildeo Brasileira 2003

CEARAacute Decreto n 25326 de 23 de dezembro de 1998 Institui o Programa de Educaccedilatildeo Tributaacuteria do Cearaacute

______ Secretaria da Fazenda do Cearaacute Programa de Educaccedilatildeo Tributaacuteria Fortaleza 1998

______ Secretaria da Fazenda do Cearaacute Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute (PEF Cea-raacute) Disponiacutevel em wwwsefazcegovbr Acesso em 05 fev 2014

COELHO Carolina Marra S Cidadania em poliacuteticas puacuteblicas voltadas para mulheres em situaccedilatildeo de violecircncia de gecircnero 2005 168f Dissertaccedilatildeo (Mestrado em Psicologia Social) Universidade Catoacutelica de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 2005

CORBARI Ely Ceacutelia Accountability e controle social desafio agrave construccedilatildeo da cidadania Cadernos da Escola de Negoacutecios da Unibrasil Satildeo Paulo janjun 2004

DEMO Pedro Participaccedilatildeo eacute conquista noccedilotildees de poliacutetica social participativa 5 ed Satildeo Paulo Cor-tez 2001

DIMENSTEIN G O cidadatildeo de papel 19 ed Satildeo Paulo Aacutetica 2001

KARNAL Leandro Estados Unidos liberdade e cidadania In PINSKY Jaime PINSKY Carla Bassanezi (org) Histoacuteria da cidadania Satildeo Paulo Contexto 2003

GONCcedilALVES Joatildeo Gomes Eacutetica na gestatildeo fiscal-cidadania experiecircncia do Programa Nacional de Edu-caccedilatildeo Fiscal Brasil In VII Congresso Internacional del Clad Sobre laacute Reforma del Estado y de la Administracion Puacuteblica Lisboa 2002

MONDAINI Marco O respeito aos direitos dos indiviacuteduos In PINSKY Jaime PINSKY Carla Bassanezi (org) Histoacuteria da Cidadania 2 ed Satildeo Paulo Contexto 2003

MARSHALL TH Cidadania classe social e status Rio de Janeiro Jorge Zahar 1967

PINSKY Jaime PINSKY Carla Bassanezi (org) Histoacuteria da cidadania Satildeo Paulo Contexto 2003

RUA Maria das Graccedilas O contexto contemporacircneo de atuaccedilatildeo do Estado as novas relaccedilotildees esta-dosociedade Brasiacutelia Esaf 2002

SILVA Imaculada Programa de Educaccedilatildeo Fiscal e Escola caminhos e descaminhos na construccedilatildeo da cidadania Revista Poliacuteticas Puacuteblicas amp Sociedade v 1 n 1 juldez 2010

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SILVA Francisco Carlos da Cruz Controle social reformando a administraccedilatildeo para a sociedade Brasiacute-lia Publicaccedilotildees do Tribunal de Contas da Uniatildeo 2002

SILVA Imaculada MOTA Luiza O S MACHADO Sandra O La Educacioacuten Fiscal en el Estado brasilentildeo de Cearaacute In RIVILLAS D Borja PEacuteREZ Angeles TORRE Tereza (org) Educacioacuten Fiscal y Cohesioacuten Social Experiencias de Ameacuterica Latina Madrid Instituto de Estudios Fiscales 2010

TORRES Ricardo Lobo Tratado do Direito Constitucional Financeiro e Tributaacuterio Satildeo Paulo Reno-var 2005

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PARTE II

TRIBUTACcedilAtildeO E CIDADANIA FISCAL

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A RIQUEZA AO ALCANCE DE TODOS OS TRIBUTOS

Alberto Amadei Neto1

SUMAacuteRIO 1 Os ldquosem-impostordquo 2 O fim da meada poliacutetica tributaacuteria 3 Os super-ricos e as desigualdades 4 A Constituinte e o Parlamento 5 Os sem--fortunas nenhumas 6 O diagnoacutestico do Ipea 7 Os condenados agrave ldquorepressatildeo fiscalrdquo 8 Os sem-imposto no paiacutes dos contrastes 9 Os weberianos estariam chegando 10 Os moedeiros grandes e seus pretextos falsos Referecircncias

ldquoPergunto-lhes quais satildeo as outras soluccedilotildees O livre mercado e governos autoritaacuterios natildeo resolveram o problema Natildeo sou dogmaacutetico soacute estou tentando provocar discus-satildeordquo

Rauacutel Prebisch

Para Lina Maria Vieira em testemunho da sua notaacutevel competecircncia inquebraacutevel es-piacuterito puacuteblico e extraordinaacuteria dedicaccedilatildeo enquanto Secretaacuteria da Receita Federal do Brasil onde fez subirem de relevo a educaccedilatildeo fiscal a meritocracia eacutetica a coopera-ccedilatildeo federativa o fortalecimento aduaneiro e a fiscalizaccedilatildeo dos grandes contribuintes como poliacuteticas estrateacutegicas da administraccedilatildeo tributaacuteria federal

Um imposto sobre fortunas grandes ldquoQuando a verdade natildeo puder ser mostrada nua e crua vista-a com humor e ironia Pode fazer isso Vou tentarrdquo

A Noite da Borboleta Dourada

ldquoO aumento da canalhice no Brasil eacute resultado da maacute distribuiccedilatildeo de rendardquoMillocircr Fernandes

1 OS ldquoSEM-IMPOSTOrdquo

O jornalista Janio de Freitas natildeo poderia ter sido mais feliz ao traduzir o universo dos super-ri-

cos quando repisou o fato social do Brasil ser ldquoum paiacutes tatildeo cheio de riquezas prepotentes e avarasrdquo

(FREITAS 2013)

A acumulaccedilatildeo no Brasil de grandes fortunas faz eco a um termo cunhado em 1903 (MILL 1974)

Fruto de um padratildeo cultural enraizado na arrogacircncia e luxo da Casa Grande por meio de relaccedilotildees

privilegiadas junto aos donos do poder caldeado e inserido em ldquoum ciacuterculo impermeaacutevel de poder e

mandordquo que as tornaram infensas ao manancial tributaacuterio existente exceto quanto a benesses originaacute-

1 Graduado em Administraccedilatildeo Puacuteblica pela Escola de Administraccedilatildeo de Empresas de Satildeo Paulo da Fundaccedilatildeo Getulio Var-gas com especializaccedilatildeo em Poliacutetica Fiscal e Financcedilas Puacuteblicas pela Escola Interamericana de Administraccedilatildeo Puacuteblica da Fun-daccedilatildeo Getulio Vargas do Rio de Janeiro Auditor da Secretaria da Receita Federal do Brasil E-mail albertoamadei-netoreceitafazendagovbr

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rias de estiacutemulos fiscais cambiais e creditiacutecios de toda ordem agrave custa do Eraacuterio do qual sempre foram

clientes preferenciais (FAORO 2012)

Ulysses Guimaratildees deixou-nos uma liccedilatildeo inolvidaacutevel quando desvelou ao cabo do processo

constituinte da redemocratizaccedilatildeo brasileira a razatildeo de termos marchado duas deacutecadas assombradas

pelo mandonismo autoritaacuterio e o arbiacutetrio

Dizendo-se ldquovelho nunca velhacordquo carimbou o frontispiacutecio da Carta de 88 com um sapientiacutessi-

mo vaticiacutenio ldquotraidor da Constituiccedilatildeo eacute traidor da paacutetria conhecemos o caminho maldito rasgar

a Constituiccedilatildeordquo

Infelizmente a afirmaccedilatildeo imperativa do lendaacuterio deputado federal do MDB cujo valor poliacutetico

e literaacuterio eacute memoraacutevel natildeo constou da Carta Magna

Seu pronunciamento antoloacutegico faz parte apenas das notas taquigraacuteficas daquele momento

histoacuterico encravado no dia 5 de outubro de 1988 que marca a promulgaccedilatildeo da ldquoConstituiccedilatildeo Cidadatilderdquo

data do reencontro preliminar e parcial do Povo brasileiro com o Estado e a Naccedilatildeo

A fortuna grande aleacutem de ser uma base tributaacuteria inexplorada sistematicamente negligencia-

da tambeacutem remete ao indispensaacutevel incremento do financiamento da coesatildeo social dentro do marco

da legitimidade constitucional de um Estado Democraacutetico de Direito

Natildeo mais sendo toleraacutevel nem sua dilaccedilatildeo e menos ainda revisitaccedilotildees como tantas outras

vezes agrave repisada polecircmica quanto agrave inconveniecircncia econocircmica da sua regulamentaccedilatildeo a pretexto

de sua presumida insignificacircncia no domiacutenio fiscal e supostos malefiacutecios agrave produccedilatildeo e circulaccedilatildeo de

mercadorias e serviccedilos

As sucessivas crises financeiras desde a quebra do Meacutexico em 1994 agrave crise global de 2008 que

motivaram inuacutemeros planos de ajustes recessivo-estruturais natildeo deixam duacutevida a respeito do cabi-

mento loacutegico e da procedecircncia macroeconocircmica do tributo sobre a grande fortuna (SMITH 2013)

Ademais o ordenamento constitucional recepcionou a legiacutetima motivaccedilatildeo da justiccedila fiscal no

capiacutetulo das financcedilas puacuteblicas apoacutes um prolongado debate na Assembleia Nacional Constituinte du-

rante o periacuteodo que medeia entre 1ordm de fevereiro de 1987 ateacute 05 de outubro de 1988 (GIFFONI 1987)

A previsatildeo constitucional do Imposto sobre Grandes Fortunas (IGF) portanto emerge desse

processo partejado pela Emenda Constitucional nordm 26 de 27 de novembro de 1985 O tributo incrus-

tado no artigo 153 engastado no seu inciso VII ainda consta da Constituiccedilatildeo Federal vigente Mais

de um quarto de seacuteculo jaacute decorreu e a disposiccedilatildeo constitucional ainda natildeo logrou ser regulamen-

tada para integrar o nosso sistema tributaacuterio A heranccedila constitucional eacute de ser recuperada Natildeo de-

veria prevalecer a tese de alguns criacuteticos acendrados de que a naccedilatildeo brasileira seja desmemoriada

Tal afirmativa retrata o descaso com que se contorna o passado para manejar necessidades atuais

indesejaacuteveis

A transiccedilatildeo do Estado Novo para o sistema constitucional de 1946 ainda recendendo ao fim da

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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II Guerra Mundial foi impulsionada de maneira exclusiva pelas demandas do Tesouro A partir daiacute as

circunstacircncias restritivas foram sendo vencidas por modelos e organizaccedilotildees que plasmaram o hori-

zonte tributaacuterio brasileiro (SILVA 1986)

Sobrepocircs-se nesse periacuteodo a presenccedila de Gerson Augusto da Silva na Comissatildeo Especial que

formatou o Coacutedigo Tributaacuterio Nacional em 1954

A principal das reformas a tributaacuteria da Emenda Constitucional nordm 18 de 01 de dezembro de

1965 natildeo atacou a concentraccedilatildeo da renda e da riqueza nacional ainda que haja pretendido alguma

progressividade e seletividade no redesenho da matriz tributaacuteria brasileira ensaiada gradualmente

desde 1946

Como se vecirc o processo de acumulaccedilatildeo das riquezas prepotentes e avaras simultaneamente

ao aprofundamento da distribuiccedilatildeo social desigual da renda perdura faz muito tempo e alonga-se por

um interregno bem mais largo do que as duas deacutecadas consumidas na concretizaccedilatildeo da concepccedilatildeo

gersoniana da tributaccedilatildeo nacional

O que salta aos olhos apoacutes uma mirada dos uacuteltimos 70 (setenta) anos eacute o extraordinaacuterio ecircxito

poliacutetico e magniacutefica engenhosidade econocircmica nos procedimentos de blindagem patrimonial invul-

neraacuteveis agrave fixaccedilatildeo de um tributo ou contribuiccedilatildeo social no domiacutenio das grandes fortunas

Impossiacutevel deixar de reconhecer no IGF a compatibilidade com o sentido da poliacutetica tributaacuteria

do genial Gerson Augusto da Silva ambos concatenados enquanto mecanismos de promoccedilatildeo do de-

senvolvimento na perspectiva de que quando se modificam as estruturas de rendas disponiacuteveis e dos

preccedilos relativos o instrumental tributaacuterio deve ser utilizado para auxiliar a induccedilatildeo e correccedilatildeo

dos seus resultados

Nem soacute deixamos de admitir a existecircncia de um passado constituinte como desrespeitamos

o presente ao nos deparamos com ele mesmo se a sua legitimidade seja expliacutecita no texto consti-

tucional

A inexistecircncia do IGF representa o maior exemplo da iniquidade do sistema tributaacuterio nacional

caso levadas ao peacute da letra tanto as anotaccedilotildees ortograacuteficas sobre o radical do termo do latim iniqui-tate quanto agrave formidaacutevel desigualdade da carga tributaacuteria suportada pelos brasileiros inversamente

proporcional agrave renda pessoal e agrave capacidade contributiva

Uma realidade fiscal cuja origem abissal natildeo escapou do olhar penetrante do maior constitucio-

nalista brasileiro vivo ldquoEacute a mais desumana concentraccedilatildeo de renda do mundordquo

O insigne jurista aprofunda o seu diagnoacutestico a respeito da escandalosa assimetria do processo

de acumulaccedilatildeo da riqueza no nosso Paiacutes ldquoNatildeo transgride tal inconstitucionalidade a essecircncia dos di-

reitos fundamentais de todos os graus e dimensotildeesrdquo (BONAVIDES 1999)

A indagaccedilatildeo do nonagenaacuterio jurisconsulto arranca de uma visatildeo social que abrange um espec-

tro de pelo menos seis deacutecadas e natildeo esconde sua perplexidade ldquoComo foi possiacutevel a Naccedilatildeo retroce-

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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der tanto Socialmente o Brasil eacute o paiacutes mais injusto do mundo por um paradoxo sua riqueza fez seu

povo mais pobre e suas elites mais ricas numa proporccedilatildeo de desigualdade que assombra cientistas

sociais e juristas de todos os paiacutesesrdquo (BONAVIDES 1999)

O professor emeacuterito natildeo paacutera aiacute ao falar do ldquoinfortuacutenio desse povordquo cuja natureza deriva de

ldquoa classe dominante empenhar-se em aprofundar a injusticcedila social em governar unicamente para as

elites e em perpetuar o status quo de iniquumlidade e violecircncia que eacute a desonra de uma Naccedilatildeordquo

O Grande Dicionaacuterio Porto Editora trata a iniquidade como injusticcedila perversidade corrupccedilatildeo

nos costumes crime O Dicionaacuterio Houaiss diz que a iniquidade eacute ainda accedilatildeo ou coisa contraacuteria agrave

moral e agrave religiatildeo ato contraacuterio agrave justiccedila ato perverso maldade

O lapso tributaacuterio calcado na perda da memoacuteria constituinte no caso do IGF eacute claramente se-

letivo e coincide totalmente com a niacutetida percepccedilatildeo identificada ldquoparticularmente nas classes de

altas rendas do desejo de natildeo pagar impostosrdquo (FURTADO 1963)

2 O FIO DA MEADA DA POLIacuteTICA TRIBUTAacuteRIA

ldquoArbitraram-se nas passadas vaacuterios modos de tributos para remeacutedio da conservaccedilatildeo do Reino mas como esses tributos natildeo foram efetivos como estes remeacutedios saiacuteram ineficazes importa agora remediar os remeacutediosrdquo

Padre Antocircnio Vieira

ldquoO objetivo dos detentores de riqueza eacute maximizar o ganho monetaacuterio Natildeo querem maximizar o produtordquo

Gonzaga Belluzzo

Se o Tesouro Nacional natildeo pode prescindir de financiamento custeio e investimento o imposto

natildeo pode deixar de ser uma das suas fontes de abastecimento sem o que natildeo haacute Estado e muito me-

nos a prestaccedilatildeo incontornaacutevel dos serviccedilos puacuteblicos A exceccedilatildeo a tal concepccedilatildeo geneacuterica encontra-se

reduzida a alguns autores anarquistas

A tributaccedilatildeo moderna estrutura-se com fulcro em trecircs eixos articulaacuteveis Primeiramente o raso

estritamente fiscal de arrecadar recursos para cobrir as despesas puacuteblicas

Segundo o estrateacutegico essencialmente social de melhorar a distribuiccedilatildeo da renda e da riqueza

Terceiro o taacutetico basicamente funcional de orientar a poupanccedila o investimento e a produccedilatildeo

para corrigir as imperfeiccedilotildees e assimetrias congecircnitas aos mercados

O objetivo fiscal historicamente precedeu aos demais e ainda hoje muitos tributos soacute se jus-

tificam como instrumentos de arrecadaccedilatildeo como o Imposto sobre Operaccedilotildees Financeiras que foi o

sucessor pela Emenda Constitucional nordm 18 do extinto Imposto do Selo

O objetivo social estaacute contido na ideia de usar os impostos como meio de melhorar a distribui-

ccedilatildeo de renda e da riqueza de um Paiacutes e data do iniacutecio do seacuteculo passado

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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O princiacutepio que desde entatildeo se firmou foi o de tributar progressivamente a renda as heranccedilas e

os ganhos de capital Qual o iacutendice ideal de progressividade do sistema tributaacuterio nacional eacute questatildeo

em tese aberta aos juiacutezos de valor

Em paiacuteses marcadamente desiguais com sinais de riqueza opulenta conspiacutecua natildeo mais deve-

ria secirc-lo face ao caso concreto do Brasil descrito como ldquoo candidato a campeatildeo mundial da desigual-

dade econocircmicardquo (HOBSBAWN 1996) Impostos fortemente progressivos inequivocamente melhoram

a distribuiccedilatildeo social da renda natildeo tanto pelo aumento da base mas pelo corte no topo pela dimi-

nuiccedilatildeo da renda disponiacutevel dos muito ricos Haacute elementos de evidecircncia empiacuterica a sublinhar Sueacutecia

e Inglaterra costumavam apresentar muitos bons iacutendices de equidade social embora suas taxas de

crescimento econocircmico correspondentes natildeo fossem altas O objetivo funcional remete ao exemplo

tradicional claacutessico atualmente subjugado aos ditames da Organizaccedilatildeo Mundial de Comeacutercio (OMC)

das tarifas aduaneiras protecionistas destinando-se a alguma finalidade econocircmica que natildeo a mera

arrecadaccedilatildeo de tributos com vistas a neutralizar as imperfeiccedilotildees do mercado no que tange agrave forma-

ccedilatildeo de poupanccedilas e agrave orientaccedilatildeo dos investimentos e da produccedilatildeo No Brasil os gravames e isenccedilotildees

tributaacuterias satildeo de cunho nitidamente funcional e alguns exemplos expliacutecitos merecem ser trazidos agrave

tona os incentivos do IRPJ aos investimentos no Norte e Nordeste bem como em turismo e reflores-

tamento agrave subscriccedilatildeo de accedilotildees de sociedades anocircnimas de capital aberto o extinto creacutedito-precircmio

do IPI agraves exportaccedilotildees a permissatildeo de deduccedilatildeo em dobro ateacute 5 do lucro das despesas feitas pelas

pessoas juriacutedicas em educaccedilatildeo e treinamento de pessoal

Oportuno trazer agrave baila um elemento filosoacutefico teoricamente todo incentivo deveria represen-

tar a contrapartida de alguma imperfeiccedilatildeo de mercado o que implica dizer que natildeo seria dado incen-

tivo a um setor soacute porque possui rentabilidade baixa Os incentivos deveriam caber apenas dentro de

uma hipoacutetese a dos custos sociais serem inferiores aos privados neutralizando as diferenccedilas (FINAN-

CcedilAS 1982) Natildeo eacute o caso por exemplo do incentivo dos ldquojuros sobre capitais proacutepriosrdquo e isenccedilatildeo aos

lucros e dividendos distribuiacutedos aos soacutecios criados em 1995

O fato social representado pelo elenco de milionaacuterios e bilionaacuterios brasileiros natildeo existentes

por exemplo haacute trinta anos eacute que centenas de bilhotildees de reais foram canalizadas para o senhorio da

Casa Grande sem que se levasse em conta a noccedilatildeo da capacidade contributiva como lastro dos bene-

fiacutecios e incentivos fiscais

Vale dizer os beneficiaacuterios das renuacutencias fiscais e precircmios tributaacuterios foram os habitantes do

ldquoBrasil de cimardquo E como soacutei secirc-lo sempre em nome do ldquoBrasil de baixordquo

Se cada um que dispotildee de capacidade de contribuiccedilatildeo para fazer frente agraves despesas puacuteblicas

natildeo o fez na justa medida em que deveria tecirc-lo feito por certo natildeo houve a reparticcedilatildeo equacircnime dos

sacrifiacutecios entre todos de sorte que com vistas agrave reforma social tambeacutem via tributaccedilatildeo cada dia que

passa tarda demasiado no ajustamento da conta fiscal dos muito ricos que sempre foram os maiores

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

69

beneficiaacuterios do sistema tributaacuterio nacional especialmente nas uacuteltimas trecircs deacutecadas (HUGON 1967)

O princiacutepio da capacidade contributiva estaacute apoiado tanto no pensamento conservador quan-

to no revolucionaacuterio

O jovem Marx nos seus Manuscritos econocircmicos e filosoacuteficos genericamente assim o re-

sumira enquanto princiacutepio basilar ldquode cada um segundo sua capacidade a cada um segundo sua

necessidaderdquo

Jaacute Stuart Mill seu antiacutepoda percebia que ldquotampouco uma reduccedilatildeo repentina do capital teria

qualquer efeito no empobrecimento do paiacutes a menos que se tratasse de uma reduccedilatildeo muito granderdquo

isto porque ldquodepois de alguns meses existiria no paiacutes exatamente tanto capital como se nenhuma

parcela tivesse saiacutedordquo

Nos seus ldquoPrinciacutepios de Economia Poliacuteticardquo o pensador contemporacircneo de Marx que supunha

ldquocaber agraves classes mais altas o dever de pensar pelos pobres e de assumir a responsabilidade por sua

sorterdquo concluiacutea que o ldquouacutenico efeitordquo da ldquoreduccedilatildeo repentina do capitalrdquo que se poderia dar quer por

uma crise ou pela tributaccedilatildeo seria a exportaccedilatildeo de menos capital e literalmente sustenta ldquose jogaria

fora menos capital na forma de especulaccedilatildeo perigosardquo

Interessante que tal afirmativa de um conservador convicto tenha sido feita em 1893 quando

os milionaacuterios e bilionaacuterios nem de longe se comparavam ao neo-senhorio da Casa Grande mais de

um seacuteculo depois

Um sistema tributaacuterio para ser equitativo tem de ser neutro em relaccedilatildeo agrave inflaccedilatildeo Algo que natildeo

se viu mais a partir do Plano Real

Se haacute inflaccedilatildeo e haacute desde 01011995 e se natildeo haacute mais correccedilatildeo monetaacuteria e natildeo haacute desde a

mesma data surgem fortes distorccedilotildees

Os indiviacuteduos seratildeo jogados para faixas de tributaccedilatildeo cada vez mais altas do imposto progres-

sivo Como essas faixas natildeo se ajustaram no periacuteodo de 1995 a 2002 e a partir de 2003 o ajuste reco-

nhecido ficou muito abaixo da inflaccedilatildeo as rendas nominais aumentadas de acordo com a inflaccedilatildeo vatildeo

sendo empurradas para as faixas cada vez mais avanccediladas dos progressivos

Isso afeta aliaacutes muito mais a classe meacutedia natildeo os milionaacuterios e bilionaacuterios porque estes jaacute se

encontram no limite superior da progressividade

O Brasil inovou quanto agrave neutralidade relacionada agrave inflaccedilatildeo de sorte a sacrificar as rendas

mais baixas e privilegiar as altas rendas Se a inflaccedilatildeo jamais deveria ser um meio de fazer as pessoas

pagarem menos impostos ndash e isso ocorreu durante muito tempo no paiacutes em favor das classes de

altas rendas que atrasavam seus impostos para ganharem com a arbitragem financeira engordando

as suas fortunas agrave custa do Tesouro ndash no Brasil a inflaccedilatildeo tornou-se um meio de confisco generalizado

sobre as classes assalariadas de renda mais baixa porque as incluiu sistematicamente em faixas de

aliacutequotas progressivas disformes agrave sua real capacidade contributiva Isso jamais aconteceu em relaccedilatildeo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

70

agraves classes de altas rendas que mereceram uma plecirciade de favores e benefiacutecios voltados agrave acumulaccedilatildeo

patrimonial e agrave riqueza financeira descomunais

O inadimplemento fiscal no caso das grandes fortunas estaacute em desacordo com a histoacuteria da

evoluccedilatildeo fiscal porque contraditoriamente abraccedila a gecircnese da ldquoteoria do lucrordquo cuja concepccedilatildeo tri-

butaacuteria eacute o ldquointeresse particular ldquoe despreza a ldquoteoria da capacidade contributivardquo aonde o tributo vai

lastreado pelo ldquopropoacutesito socialrdquo (VILLELA 1987)

A arrecadaccedilatildeo tributaacuteria nacional desde meados dos anos 40 vem sendo realizada de forma

demasiado desproporcional recorrendo fortemente aos tributos regressivos indiretos responsaacuteveis

por cerca de dois terccedilos da carga fiscal Os diretos progressivos somam natildeo mais do que tatildeo-somen-

te um terccedilo As grandes transformaccedilotildees tributaacuterias ocorridas nos anos 60 a partir do golpe militar e

nos 80 apoacutes a Assembleia Nacional Constituinte configuraram um sistema tributaacuterio nacional apto a

produzir maior carga tributaacuteria com farta ampliaccedilatildeo das bases de incidecircncia contemplando potentes

instrumentos de extraccedilatildeo fiscal tanto seletivos e progressivos quanto regressivos

Ningueacutem esquece as crises cambiais do Meacutexico em 1994 na Tailacircndia em 1977 da Ruacutessia em

1998 e na Coreacuteia do Sul em 2000

Os seus impactos produziram um ldquoefeito dominoacuterdquo que atingiu duramente a economia brasilei-

ra jaacute sob forte pressatildeo fiscal desde o iniacutecio do Plano Real cuja concepccedilatildeo grosso modo poderia ser

traduzida em um uacutenico e isolado objetivo o fim do ldquoimposto inflacionaacuteriordquo

O que natildeo se esclarecia agrave populaccedilatildeo brasileira entretanto satisfeita com a mudanccedila da moeda

era ldquoo quantordquo custaria acabar com o ldquoimposto inflacionaacuteriordquo mais diacutevida puacuteblica e mais impostos

Tudo isso para fazer frente agrave vulnerabilidade externa decorrente dos fundamentos do Plano Real

(paridade fixa com o doacutelar americano juros altiacutessimos para garantir a entrada de capitais e deacuteficit co-

mercial crescente para estimular a concorrecircncia das importaccedilotildees baratas com os produtos nacionais

mantendo os preccedilos das mercadorias sempre no mesmo niacutevel ou em queda)

O enfrentamento das crises cambiais mexicana coreana tailandesa e russa somado ao ataque

especulativo agrave moeda brasileira em 1999 implicou o maior aumento de impostos praticado de uma

uacutenica vez jamais visto antes na histoacuteria republicana de 50 nas aliacutequotas da CSSL e da Cofins de

90 na CPMF e outros

O resultado foi um salto da carga tributaacuteria de 24 para 32 do PIB em apenas oito anos

(19952002) A brutalidade do ldquoajuste fiscalrdquo natildeo teve outra finalidade senatildeo absorver os efeitos da

crise cambial que praticamente espatifaria o Plano Real e elevaria o endividamento puacuteblico continua-

damente de 3 ateacute 10 do PIB em apenas oito anos (AMADEI NETO 2002) O altiacutessimo preccedilo a pagar

pelo cacircmbio sobrevalorizado e elevadas taxas de juro para manter a inflaccedilatildeo sob controle repercutiria

fortemente sobre a arrecadaccedilatildeo tributaacuteria com exigecircncias de recolhimentos cada vez maiores que im-

plicaram aumento expressivo da carga tributaacuteria De fato as consequecircncias da poliacutetica econocircmica pra-

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

71

ticada com base no Plano Real acentuaram a perversatildeo distributiva da carga tributaacuteria intensificando

sua caracteriacutestica indireta regressiva Quaisquer avaliaccedilotildees objetivas seja de instituiccedilotildees oficiais ou natildeo

governamentais concluiriam que a tributaccedilatildeo de natureza indireta no Brasil tem sido incrementada

continuadamente nos uacuteltimos cinquenta anos e mais ainda nas uacuteltimas duas deacutecadas sem uma con-

trapartida agrave altura correspondente agrave tributaccedilatildeo direta Grosso modo enquanto a tributaccedilatildeo indireta

quase dobrou dos anos 50 ateacute hoje a direta diminuiu proacutexima agrave metade mesmo apoacutes o advento do

imposto de renda sobre as pessoas fiacutesicas

O pano de fundo teoacuterico que orienta tal situaccedilatildeo estaacute inserido na ideologia que defende a

racionalidade do mercado e acredita na importacircncia autocircnoma da moeda que deriva de teorias apa-

rentemente teacutecnicas o ldquomonetarismordquo ldquola nouvelle eacuteconomierdquo e ldquoexpectativas racionaisrdquo

Todas apresentadas como razotildees cientiacuteficas para explicar por que todos teratildeo mais vantagem

se o Estado retirar-se da economia e os capitalistas puderem tratar da acumulaccedilatildeo sem consideraccedilotildees

de ordem distributiva (PRZERWORSKI 1984)

O programa mais conhecido flagrantemente voltado para a concentraccedilatildeo de renda ndash a poliacutetica

econocircmica do governo Ronald Reagan mascarada como uma ldquoteoria de ofertardquo tendo como esteio

uma ldquocurva de Laferrdquo - foi apresentado como referecircncia universal quando natildeo passava de uma estru-

tura ancorada por interesses econocircmicos dominantes

A ldquoteoria da ofertardquo eacute o domiacutenio dos super-ricos dos ricos dos endinheirados A ldquoEra Reaganrdquo

nesse aspecto parece tecirc-la tornado hegemocircnica com apoio da ldquoEra Thatcherrdquo A satisfaccedilatildeo portanto

dos interesses materiais da ldquoburguesiardquo nos lucros seria uma condiccedilatildeo necessaacuteria para a melhora das

condiccedilotildees materiais de todos (SAMPSON 1989) O aumento da produccedilatildeo requer investimento o qual

eacute financiado pela poupanccedila que por sua vez eacute financiado pelo lucro

Portanto o lucro eacute a condiccedilatildeo do crescimento Isso explicaria por que ldquoaumentos de salaacuteriosrdquo e

gastos em ldquobem-estarrdquo seriam ldquoempecilhosrdquo ao crescimento

O mesmo raciociacutenio justificaria a natildeo tributaccedilatildeo dos super-ricos ricos e a natildeo intervenccedilatildeo go-

vernamental que restringiriam a lucratividade mesmo que tais restriccedilotildees refletissem custos sociais e

externalidades negativas

O que isso significa do ponto de vista fiscal A justificaccedilatildeo da eterna existecircncia sem imposto

algum de grandes fortunas O grosso da carga fiscal seria assim transferido sobre quem consome

toda ou quase toda a renda vale dizer os ldquocom ndash nenhumas fortunasrdquo as chamadas classes meacutedias

e de baixa renda A maioria dos administradores tributaacuterios na Ameacuterica Latina passou a receber a

partir dos anos 90 uma grande influecircncia e treinamentos voltados agrave banalizaccedilatildeo da progressivida-

de e da equidade na realizaccedilatildeo do ldquotax mixrdquo com recurso a impostos que quanto mais regressivos

tanto melhores sob o jargatildeo (aparentemente justo) do ldquotax appealrdquo de que ldquoquando todos pagam

todos pagam menosrdquo (GONZAacuteLES 2009)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

72

A equidade possiacutevel seria obtida com maior ecircnfase na focalizaccedilatildeo dos gastos mediante poliacuteti-

cas puacuteblicas compensatoacuterias vinculadas agraves classes de renda diminuta

Desta forma a ldquoteoria da ofertardquo reforccedilava sua accedilatildeo ideoloacutegica para providenciar a paacute de cal nas

tentativas de tributaccedilatildeo das grandes fortunas A disseminaccedilatildeo de tal ideologia eacute reconheciacutevel e cons-

tatada quando compulsados os manuais distribuiacutedos pelo FMI e BID aos gestores fiscais domiciliados

abaixo da linha do Equador responsaacuteveis pelos aparelhos estatais de arrecadaccedilatildeo (GNAZZO 1993)

Tratava-se de uma operaccedilatildeo de grande envergadura em franca ofensiva para autorizar a falta

de escruacutepulo na manipulaccedilatildeo de foacutermulas de tributaccedilatildeo que de um lado aliviariam totalmente os

super-ricos ricos e endinheirados aleacutem dos lucros das empresas e a remuneraccedilatildeo da propriedade do

capital De outro lado forccedilariam a ldquorepressatildeo fiscalrdquo agraves classes subalternas

No caso brasileiro entre 1996 e 2001 a ldquorepressatildeo fiscalrdquo chegou agraves raias do confisco pela re-

vogaccedilatildeo expliacutecita do princiacutepio da neutralidade aplicaacutevel agrave tributaccedilatildeo em relaccedilatildeo agrave inflaccedilatildeo incorrida

naquele periacuteodo Um total e flagrante desrespeito ao impedimento da incidecircncia tributaacuteria sobre ldquoper-

das inflacionaacuteriasrdquo uma indececircncia fiscal escandalosa

Como se vecirc a tributaccedilatildeo dos super-ricos ricos e endinheirados acostumou-se a andar na con-

tramatildeo da Carta Constituinte que fixara a capacidade contributiva como sendo a base principal de

suporte da pressatildeo fiscal (CATTANI OLIVEIRA 2012)

O IGF acabou tornando-se um totem fiscal amaldiccediloado por uma espeacutecie de tabu tributaacuterio

que atingiria a todos aqueles que lhe exigem o ordenamento juriacutedico correspondente sem submissatildeo

agrave interpretaccedilatildeo fiscal calcada na ldquoteoria da ofertardquo

Inadmissiacutevel desviar o olhar da siacutendrome de Burnout que se aplica ao vivenciado diuturna-

mente por milhotildees de homens e mulheres condenados a uma espeacutecie de escravizaccedilatildeo fiscal a partir

do Plano Real especialmente apoacutes o malsinado Pacote 51 baixado pelo economista ex-ministro da

Fazenda Pedro Malan no ano de 1997 quando aumentos extraordinaacuterios dos impostos indiretos fo-

ram despejados sobre os brasileiros indistintamente O entatildeo ldquoczarrdquo da Fazenda Nacional convidado a

ocupar altos cargos nas principais corporaccedilotildees financeiras privadas a exemplo de outros membros da

equipe econocircmica da Era Cardoso curiosamente prescrevera 14 anos atraacutes literalmente a aplicaccedilatildeo

de uma ldquorepressatildeo fiscal para o resto da vidardquo

Sem incluir por certo as benesses e privileacutegios da Casa Grande no receituaacuterio repressivo

Padre Vieira possivelmente faria menccedilatildeo a essa ldquorepressatildeo fiscalrdquo natildeo esquecendo por lembrar

aos fieacuteis do puacutelpito da Capela Real de Lisboa que a profecia sobre o ldquodoce inferno pela vida eternardquo

realizar-se-ia e estaria reservada aos contribuintes de baixa renda naquela que foi considerada nas

palavras do ex-deputado federal Seacutergio Miranda de saudosa memoacuteria - especialista da Comissatildeo de

Tributaccedilatildeo Orccedilamento e Financcedilas da Cacircmara dos Deputados ndash a ldquoEra Malditardquo representada pela oc-

taeteacuteride do governo do ex-presidente F H Cardoso

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

73

A efetividade do capiacutetulo da financcedila puacuteblica sobre a tributaccedilatildeo das grandes fortunas tem como

ser assegurada sem ferir a liberdade do capital o efeito de confisco e a bitributaccedilatildeo de modo a rea-

linhar a carga tributaacuteria sobre a renda e o patrimocircnio tornando-a melhor equilibrada em relaccedilatildeo ao

consumo (CORSATTO 2002)

O IGF depois de regulamentado subiria os degraus da Suprema Corte Por que natildeo A lide per-

mitiria com absoluta independecircncia e harmonia entre os Poderes decidir cabalmente sobre o tribu-

to de obrigaccedilatildeo principal dos afortunados grandemente subsumidos aos comandos constitucionais

doutrinaacuterios administrativos e legais do ordenamento tributaacuterio nacional entatildeo completo finalmente

Certamente os Ministros do Pretoacuterio Excelso como o fizeram nos casos emblemaacuteticos da Ficha

Limpa e da Cota Racial natildeo deixariam de brindar o paiacutes com a votaccedilatildeo do Pleno afirmativa de uma

justiccedila fiscal histoacuterica mediante exegese antoloacutegica dos direitos de primeira e segunda geraccedilatildeo ba-

lanceados diante dos inesqueciacuteveis desafios do seacuteculo XXI

Oportuno a esta altura revisitar o Sermatildeo de Santo Antocircnio sobre os impostos a serem pagos

pelos Trecircs Estados nobreza clero e povo

Ouccedilamos pois o Sermatildeo de Vieira reverberando da Igreja das Chagas em Lisboa em 14 de

setembro de 1642 ldquoQuando os remeacutedios natildeo tecircm bastante eficaacutecia para curar a enfermidade eacute

necessaacuterio curar os remeacutedios para que os remeacutedios curem aos enfermos Que remeacutedio haacute para

remediar os remeacutedios Muito faacutecil diz Santo Antocircnio Vos estis sal terraerdquo O ldquoimperador da liacutengua portuguesardquo segundo Fernando Pessoa prosseguiria na sua peroraccedilatildeo

ldquoPara se curar uma enfermidade vecirc-se em que peca a enfermidade para se curarem os remeacute-

dios veja-se em que pecaram os remeacutedios Duas propriedades tecircm o sal diz Santo Hilaacuterio

conserva e mais tempera eacute o antiacutedoto da corrupccedilatildeordquo

E assim sentenciaria o maior retoacuterico do barroco portuguecircs a regra a ser trilhada ldquoTais como

isto devem ser os remeacutedios com que se hatildeo de conservar a Repuacuteblicardquo (PEacuteCORA 2001)

A retoacuterica dogmaacutetica dos opositores do IGF fugirem de um imposto fixado em Assembleia Na-

cional Constituinte eacute parecida na ecircnfase com as escaramuccedilas de Dom Marcelo Costa Bispo do Paraacute

relativamente agrave separaccedilatildeo entre Igreja e Estado em 1889 O liacuteder religioso proclamara enfaticamente

ldquoNatildeo desejo a separaccedilatildeo natildeo dou um passo natildeo faccedilo um aceno para que se decrete no Brasil o

divoacutercio entre o Estado e a Igrejardquo A alusatildeo irocircnica ao Clero eacute cabiacutevel porque evidentemente natildeo

se sustenta a ldquoimunidade fiscalrdquo sob o pretexto da liberdade de culto ao ldquoTemplo do Capitalrdquo ou da

pregaccedilatildeo liberal da Sociedade do Mont ndash Pellerin (TEITELBAUM 2012)

Nem mesmo o ldquomilagre da multiplicaccedilatildeordquo decorrente das facilidades concedidas ao processo

de acumulaccedilatildeo da riqueza e de rendas no Brasil - vale dizer sob o pretexto da intocaacutevel ldquoliberdade de

culto ao capitalrdquo - justificaria aceitar estoicamente por um lado o esquecimento de uma das compe-

tecircncias tributaacuterias da Uniatildeo equivalente agrave remissatildeo taacutecita das fortunas grandes E ao mesmo tempo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

74

por outro lado contemplar indiferentemente um povo absorver o grosso da carga tributaacuteria repeti-

damente e ser esbulhado relativa e proporcionalmente pelo desbordo do princiacutepio da equidade no

sacrifiacutecio agrave sua capacidade contributiva enquanto o novo patriciado simplesmente inutiliza a justa e

constitucional medida

3 OS SUPER-RICOS E AS DESIGUALDADES

ldquoUm povo deve ser julgado natildeo pela Constituiccedilatildeo que tem mas pelo modo como potildee em praacutetica a sua Constituiccedilatildeordquo

Ruy Barbosa

ldquoA tentativa para basear um justo sistema fiscal sobre um injusto sistema de pro-priedade eacute uma tentativa para tirar uma parcela boa de um todo maurdquo

Gunnar Myrdal

Ateacute quando a desigualdade de renda sem precedentes deixaraacute de ser dissociada da ldquoincapa-

cidade dos governosrdquo poliacutetica e operacionalmente ldquopara cobrar impostos dos ricosrdquo perguntava

Jeffrey Sachs em 2011 um dos notaacuteveis economistas perfilados ao conservadorismo em mateacuteria

fiscal e monetaacuteria

Ateacute colocar em risco de morte a legitimidade da nova ordem econocircmica sacudida em seus fun-

damentos financeiros neoliberais pela crise mundial de 15 de setembro de 2008 (KRUGMAN 2012)

Ateacute onde iraacute a banalizaccedilatildeo sobre o fato econocircmico-tributaacuterio que criou no Brasil a situaccedilatildeo fis-

cal das super-riquezas sem o imposto da fortuna

O moacutevel do IGF eacute ajustar a progressividade agrave concentraccedilatildeo de riqueza no topo bem como

balancear melhor a reparticcedilatildeo social da renda entre capital e trabalho no processo de reproduccedilatildeo ca-

pitalista

Quase um quarto de seacuteculo depois ainda tergiversa-se sobre fazer cumprir o comando cons-

titucional do Imposto sobre as Grandes Fortunas Milton Santos que foi presidente da Comissatildeo de

Planejamento Econocircmico da Bahia jaacute propusera a criaccedilatildeo do Imposto de fortunas ao presidente Jacircnio

Quadros cujo mandato presidencial foi interrompido bruscamente pela renuacutencia em 1961

Uma espeacutecie de ldquoapartheid fiscalrdquo segrega o IGF do molde juriacutedico paacutetrio As suas natildeo inclusotildees

na legislaccedilatildeo brasileira regulamentaccedilatildeo impositiva e cobranccedila sistemaacutetica denotam nitidamente mais

do que supostas dificuldades teacutecnicas insuficiecircncias administrativas ou insignificacircncia arrecadadora

Hoje induvidosamente em melhores condiccedilotildees do que ontem tornou-se indispensaacutevel explo-

rar todas as formas de desconcentraccedilatildeo da renda e da riqueza da distribuiccedilatildeo do excedente econocirc-

mico de equiliacutebrio da pressatildeo fiscal sobre capital e trabalho nos paiacuteses centrais e emergentes (SZKLA-

ROWSKY 1933)

ldquoCe qursquoil y a de scandaleux dans le scandale crsquoest qursquoon srsquoy habituerdquo alertava Simone de Beau-

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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voir para a deleteacuteria consequumlecircncia do escacircndalo promovido agrave situaccedilatildeo de normalidade E a desigual-

dade de renda e riqueza no Brasil eacute mesmo escandalosa sob quaisquer paracircmetros de mensuraccedilatildeo de

apropriaccedilatildeo do excedente econocircmico

A burocracia eleita que natildeo se dedica a viabilizar a tributaccedilatildeo das grandes fortunas tambeacutem eacute

a mesma que identifica as teses capazes de reduzir as pensotildees de ex-soldados com mais de 80 anos

que combateram na II Grande Guerra como pracinhas natildeo deixando de explorar com accedilotildees rescisoacute-

rias o artigo 53 das disposiccedilotildees constitucionais transitoacuterias inscritas na Carta de Outubro

Natildeo se preocuparam em avaliar a ldquobaixa produtividade fiscalrdquo da economia de gastos puacuteblicos

de menos de mil ex-combatentes com pensotildees inferiores a R$ 300000

Nesse caso a burocracia eleita foi diligente fazendo cumprir a eliminaccedilatildeo minuciosa dos bene-

fiacutecios dos ex-pracinhas com economia aos cofres puacuteblicos proporcionalmente irrelevantes de R$ 30

milhotildees anuais Naquele outro das fortunas grandes a desiacutedia fiscal prevalece em valores bastante

maiores (MARTIN SCHUMANN 1996)

Estima-se em R$ 10 bilhotildees a mais baixa arrecadaccedilatildeo possiacutevel do IGF isto eacute o piso da previsatildeo

conservadora em face da subavaliaccedilatildeo patrimonial amplamente praticada com base nos impostos

de transmissatildeo de bens imoacuteveis e de propriedade sem a necessidade de absolutamente nenhuma

fiscalizaccedilatildeo a partir dos registros declarados existentes Neste ponto baacutesico a burocracia eleita natildeo foi

capaz de obter o mesmo padratildeo de desempenho e diligecircncia constitucional quando comparado ao

resultado sobejamente alcanccedilado no corte aos estipecircndios dos octogenaacuterios da Forccedila Expedicionaacuteria

Brasileira que lutaram na II Guerra Mundial

Ningueacutem utilizou a mesma argumentaccedilatildeo contumaz brandida em defesa da natildeo tributaccedilatildeo das

fortunas grandes o efeito fiscal de valor orccedilamentaacuterio despreziacutevel Embora o montante dos valores rei-

vindicados fosse trezentas vezes menor do que a quantia envolvida com o imposto sobre as fortunas

grandes os ex-pracinhas da FEB ainda tecircm de recorrer a liminares ordenando que a Uniatildeo lhes pague

a pensatildeo especial concedida a ex-combatentes da II Guerra Mundial O benefiacutecio pode ser acumulado

com os benefiacutecios que eles jaacute recebem por sua aposentadoria como militar mas tem sido negado

sob o argumento de que natildeo poderiam ser enquadrados legalmente como ex-combatentes porque

continuaram na ativa apoacutes participar do conflito de 1939-1945

Registram-se tais ldquodetalhesrdquo aparentemente desconexos para descortinar de um lado a minu-

decircncia com que se regulamentou o tratamento previdenciaacuterio a octogenaacuterios ex-combatentes com

pagamentos de valores ldquodespreziacuteveisrdquo comparativamente agrave justificaccedilatildeo que a arrecadaccedilatildeo do IGF eacute

complexa e de arrecadaccedilatildeo ldquoinsignificanterdquo (LASCH 1995) Natildeo se vecirc o mesmo ldquoespecialistardquo em de-

fender nenhuma tributaccedilatildeo sobre as grandes fortunas tambeacutem justificar as pensotildees especiais ao ex-

-combatentes que defenderam o solo paacutetrio ldquotatildeo cheio de riquezas prepotentes e avarasrdquo sob igual

argumento de que satildeo valores irrisoacuterios do ponto de vista fiscal (FORRESTER 2001) A propoacutesito

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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John Kenneth Galbraith referiu-se no ensaio Un viaje por la economiacutea de nuestro tiempo agrave existecircncia

da ldquotendencia de la economiacutea y de otras ciencias sociales a adaptarse a las necesidades y a la menta-lidad de los miembros ricos de la comunidadrdquo Por que natildeo formular os cenaacuterios produzir os estudos e providenciar os meios aptos e haacutebeis a

fazer cumprir o dispositivo constitucional do IGF

Ateacute a Agecircncia de Notiacutecias Reuters reconhece a expertise brasileira em arrecadar impostos entre

as ldquomelhores do mundordquo O fato eacute que pouquiacutessimos impostos satildeo arrecadados do capital as mais

valias imobiliaacuterias sucessotildees etc Nada praticamente dos ricos e super-ricos A teoria da produtivi-

dade de origem alematilde com razatildeo acha que o imposto em funccedilatildeo do emprego que lhe daacute o Estado

volta agrave coletividade como meio que se resolve em maior produccedilatildeo transformando bens materiais que

satildeo os impostos em bem imateriais que satildeo os serviccedilos puacuteblicos

A teoria produtivista conclui que o imposto eacute o melhor emprego de capital Morselli diria que

se eacute certo que uma parte da receita encontra proveitoso emprego no desenvolvimento da economia

nacional a teoria haveria exagerado no otimismo (DEODATO 1967)

Keynes contudo natildeo teria duacutevida de concordar com os alematildees sobretudo em tempos de

crise econocircmica sistecircmica Wagner faz poreacutem uma didaacutetica distinccedilatildeo entre capital nacional ou social

e o capital individual O primeiro eacute toda riqueza destinada agrave produccedilatildeo O segundo eacute a riqueza posta agrave

parte do indiviacuteduo que deva servir ou natildeo agrave produccedilatildeo

Quanto ao capital individual quando descontado pelo imposto em vez de um mal eacute um bem

agrave produccedilatildeo sempre que empregado Diminui-se a riqueza de alguns acresce a riqueza nacional

Da mesma forma que nas ldquoloteriasrdquo nos ldquolucros extraordinaacuteriosrdquo nas ldquomais valias imobiliaacuteriasrdquo em

todos esses casos justifica-se ndash e assim se desmistifica sua negatividade - o imposto sobre qualquer

forma de capital

A Organizaccedilatildeo para a Cooperaccedilatildeo Econocircmica e Desenvolvimento (OCDE) jaacute indicava que o tri-

buto sobre a fortuna contribuiacutea na deacutecada de 1980 com 05 da receita tributaacuteria da Aacuteustria 041

da Dinamarca 031 da Noruega e 039 da Sueacutecia

Na deacutecada de 1980 o mundo sofria os efeitos do primeiro choque do petroacuteleo uma recessatildeo

mundial e sequer existiam telefones celulares computadores portaacuteteis Internet e transaccedilotildees financei-

ras eletrocircnicas (CEPAL 1985) Vale dizer com a economia mundial em crise continuada sem tecnolo-

gia e controles virtuais e de alcance imediato aleacutem de inuacutemeros elementos de controle cruzado para

tiacutetulos patrimocircnio e operaccedilotildees bancaacuterias inclusive controles das bolsas de valores e fundos os paiacuteses

escandinavos lograram implantar e administrar impostos calibrados em um contexto de persistente

controle efetivo da equidade fiscal

No caso brasileiro 04 da receita tributaacuteria representariam 40 bilhotildees de reais no ano calen-

daacuterio de 2013 equivalente ao montante da extinta CPMF

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

77

4 A CONSTITUINTE E O PARLAMENTO

ldquoA sagrada alianccedila entre os donos de terra do dinheiro e do Estado natildeo permite que nossas transiccedilotildees democraacuteticas se completemrdquo

Maria da Conceiccedilatildeo Tavares

Recentemente mais do que o corpo a memoacuteria do ex-presidente Joatildeo Goulart foi exumada

Algo simbolicamente veio agrave tona as ldquoreformas de baserdquo que o golpe de 64 abortou

Em vez de as fazerem a ditadura fortaleceu a conciliaccedilatildeo patrimonialista e o pacto das elites

endinheiradas resultando em 20 anos de arrocho salarial (CARNEIRO 2006)

Quaisquer iniciativas atuais de tributaccedilatildeo das grandes fortunas satildeo relidas como ldquoilusotildees bol-

cheviquesrdquo

Os neoliberais triunfalistas em verdade pensam apenas no passado que legitima seus privi-

leacutegios fiscais em nome de uma repressatildeo tributaacuteria direcionada exclusivamente aos detentores de

ldquonenhumas fortunasrdquo

Os donos do capital e da riqueza querem a eternidade de uma equaccedilatildeo fiscal repressiva sem

incluiacute-los Os nossos endinheirados continuam com as mesmas ideias dos golpistas de 50 anos atraacutes

Desde 1964 as benesses e privileacutegios dos super-ricos aumentaram (CHOSSUDOWSKI 1999)

Talleyrand diria dos nossos super-ricos de fortunas acumuladas pela Casa Grande ldquonatildeo apren-

deram nada natildeo esqueceram nadardquo

Eacute horrorosa a repeticcedilatildeo dos argumentos jaacute desfalecidos sob a falaacutecia do grande lsquoteoacutelogorsquo da

Economia Liberal Hayek de que os impostos sobre os ricos satildeo sempre lsquonegativosrsquo

Esse pensamento justifica e realimenta os fracassos da ordem financeira em nome do ideal da

racionalidade plutocraacutetica Um espectro ronda o IGF parafraseando Marx a irresponsabilidade fiscal

dos super-ricos (COMPARATO 2004)

Existe um conflito fundamental entre o muito que se pede e espera do poder puacuteblico jaacute o

dissera Celso Furtado na apresentaccedilatildeo do seu Plano Trienal

Natildeo por acaso o sistema tributaacuterio nacional foi modificado pela Carta de Ulysses em muitos

aspectos

Os constituintes forjaram-no encorpado conferindo-lhe a competecircncia delegada para que o

IGF quando instituiacutedo o fosse com a moldagem de lei complementar

Previamente contudo modularam-no circunscrevendo-lhe a incidecircncia inspirados na sapiecircn-

cia da deusa romana da Fortuna simbolizada com uma cornucoacutepia e um timatildeo nas matildeos cuja mito-

logia reservara-lhe o poder da distribuiccedilatildeo dos bens e da sorte

Diferentemente dos romanos no entanto natildeo deixaram a riqueza agrave mercecirc das divindades por-

que a desejaram ao alcance de todos

O criteacuterio poacutes-constituinte de modo caricato ateacute parece baseado no romance policial mais

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

78

famoso do seacuteculo XX - O Falcatildeo Maltecircs - em torno de uma reliacutequia medieval valiosiacutessima levada em

sigilo do Oriente a Califoacuternia Sam Spade o detetive idealizado por Dashiell Hammet seria capaz de ndash

ao investigar a urdidura intrincada do IGF ndash repetir sua frase mais famosa ldquoUm grande misteacuterio deve

tirar a tampa da vida e deixar vocecirc ver como funcionardquo

O comando constitucional originaacuterio era categoacuterico quando delimitara o olhar fiscal tendo

como foco natildeo quaisquer fortunas mas aquelas grandes

De um lado estreme de duacutevida a motivaccedilatildeo constitucional a essecircncia do IGF do outro lado

sua dimensatildeo estrutural natildeo se lhe submetendo todas as fortunas Mais claro impossiacutevel

O processo de elaboraccedilatildeo constituinte cujo sumaacuterio e detalhamento podem ser identificados

nas Fontes de Informaccedilatildeo sobre a ANC de 1987 ndash Senado Federal ndash na Subsecretaria de Ediccedilotildees Teacutecni-

cas procedeu agrave inclusatildeo do IGF no Anteprojeto da Subcomissatildeo de Tributos

A siacutentese do relator constituinte da Subcomissatildeo de Tributos foi liacutempida porque a ldquotributaccedilatildeo

normal dos rendimentos ou mesmo das heranccedilas e doaccedilotildees nem sempre eacute suficiente para pro-

duzir as correccedilotildees desejaacuteveisrdquo donde defluiria a necessidade loacutegica de ldquoum novo impostordquo incidindo

sobre ldquoas situaccedilotildees anormais de riqueza acumulada e natildeo produtivardquo

Natildeo se desconsideram ocorridas algumas tentativas de movimentar o IGF pelo menos 30 pro-

jetos em tramitaccedilatildeo no Parlamento

Haacute vinte e cinco anos a despeito dos inuacutemeros de projetos de Lei apresentados em busca de

fazer cumprir a Carta de Ulysses o IGF dormita esplendidamente como um espeacutecime invertebrado

da nossa vida juriacutedica no panteatildeo sem gloacuteria e mal conservado das normas constitucionais exiladas

embora ensaiado em isoladas proposituras do sistema impositivo nacional

A aparentemente desidiosa contemporizaccedilatildeo do Executivo natildeo passou despercebida dos orga-

nismos mais judiciosos a exemplo do Instituto dos Advogados do Brasil ao constatar que o IGF ldquojaz ali

ocioso por falta de iniciativa do governordquo (CORREIO BRAZILIENSE 1996)

Indubitavelmente vaacuterias das propostas consagram certa motivaccedilatildeo de cunho proseacutelito e eleito-

ral como a utilizada para levaacute-lo agrave conta do Fundo de Combate agrave Pobreza criado pela Emenda Cons-

titucional nordm 312000 de iniciativa do Senador Antonio Carlos Magalhatildees Falta-lhes miacutenimo teoacuterico

fundamentado com embasamento teacutecnico suficiente e suporte administrativo necessaacuterio do que se

aproveitam os opositores do IGF para desqualificaacute-las sistematicamente

O exemplo de que se procura revestir a tributaccedilatildeo do IGF com traccedilos da insensatez vulgar eacute o

da sua proposiccedilatildeo enquanto soluccedilatildeo dogmaacutetica como providecircncia redentora haacutebil a erradicar final-

mente a miserabilidade endecircmica do nosso paiacutes

A questatildeo central todavia natildeo eacute essa mas outra completamente distinta Natildeo se trata de acei-

tar ou natildeo o IGF mas fixaacute-lo teacutecnica e juridicamente

Nem se o cogite como sendo uma proposiccedilatildeo ldquofora de lugarrdquo ou do ldquoseu tempordquo ao contraacuterio

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

79

A desarmonia do IGF com os modismos neoliberais que se espraiaram pelas concepccedilotildees fiscais

dominantes na deacutecada dos 90 natildeo tem como ser esterilizada Afinal o caldeamento dos postulados

mercantis foi processado pelos que se investiram no direito de ditar um ldquocacircnone tributaacuteriordquo baseado

no suposto gozo de um ldquostatus eclesiaacutesticordquo

A desregulamentaccedilatildeo do processo de acumulaccedilatildeo capitalista nas ondas propagadas pelo Wa-shington Consensus (WC) cujo eco se faz sentir nos paiacuteses sujeitos ao decaacutelogo sistematizado por

John Williamson dos quais a reduzida tributaccedilatildeo da renda e nenhuma da riqueza era parte dele natildeo

foi capaz de extirpar as raiacutezes do IGF em escala global embora tenha logrado ecircxito em conter sua di-

fusatildeo momentaneamente

Induvidosamente o IGF natildeo compotildee o figurino fiscal do WC daiacute natildeo faltarem escaramuccedilas para

eliminaacute-lo em vaacuterias emendas de natureza tributaacuteria

No entanto ateacute mesmo o Foacuterum de Davos natildeo tem como ignorar que a desigualdade social na

Terra aumentou e que 1 da populaccedilatildeo mundial deteacutem metade da riqueza global (CINTRA 2014)

O cumprimento do mandamento constitucional de criaccedilatildeo de um imposto concebido para

ajustar o nosso sistema tributaacuterio ao princiacutepio da isonomia e progressividade tributaacuterias de modo

a tornaacute-lo na expressatildeo popular relativamente ldquomais justordquo natildeo estaacute apenas amparado na tese que

o fundamentou vale dizer do sistema fiscal poder subtrair uma fraccedilatildeo parcelada ou uacutenica agraves ldquogran-

desrdquo fortunas do segmento plutocraacutetico brasileiro mas do Estado vir a ter mais um mecanismo agrave sua

disposiccedilatildeo para dar continuidade ao processo de desconcentraccedilatildeo social da renda apoiado na maior

equidade

Haacute tambeacutem o imperativo de maior efetividade fiscal sem concessotildees agrave visatildeo panglossiana

equivocada em havecirc-lo dimensionado como panaceacuteia porque a reduccedilatildeo das abissais desigualdades

entre os possuidores e despossuiacutedos de renda e riqueza no Brasil soacutei serem desbastadas no processo

dinacircmico do desenvolvimento sustentaacutevel e inclusivo

Isso contudo nada tem a ver com a pajelanccedila liberal de deixar imune e isento o capital desre-

gulamentado nem com a apresentaccedilatildeo vulgar do IGF sua proposiccedilatildeo dogmaacutetica enquanto providecircn-

cia redentora haacutebil a erradicar finalmente a miserabilidade endecircmica do nosso paiacutes

Ao mesmo tempo no entanto que o constituinte natildeo remeteu o IGF agrave legislaccedilatildeo ordinaacuteria de

menor quorum necessaacuterio agrave sua aprovaccedilatildeo por conta do embate vitorioso das classes dominantes na

economia e seus representantes poliacuteticos no Parlamento - em defesa de seus interesses de classe e

materiais - ainda assim reservou-lhe a criaccedilatildeo mediante o quorum qualificado da lei complementar

A retomada de iniciativas recentemente tendentes a resgatar a liturgia da legislaccedilatildeo ordinaacuteria

natildeo alcanccedilou ecircxito porquanto os detentores das maiores rendas e riqueza demonstraram mais uma

vez a sua forccedila poliacutetica hegemocircnica ao rechaccedilarem a tentativa de alteraccedilatildeo processual por a consi-

derarem um ameaccedilador atalho pelo qual o IGF pudesse ser instituiacutedo concretizando-se com sucesso

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

80

Nesse sentido tanto o ex-presidente Lula quanto a presidenta Dilma ambos repetiram o ceri-

monial do beija-matildeo da plutocracia doirada

Suas governanccedilas jamais tentaram movimentar suas bancadas para regulamentarem o IGF A

primeira tentativa de regulamentar o IGF foi do ex-senador Fernando Henrique Cardoso com o PLS nordm

16289 aprovado no Senado dentro do figurino claacutessico da social-democracia que inspirava a linha

programaacutetica do seu partido o PSDB agravequela eacutepoca

Ao chegar agrave Cacircmara dos Deputados recepcionou emendas de tributaccedilatildeo da fortuna familiar

acima de R$ 4 milhotildees isentando-se o imoacutevel residencial instrumentos de trabalho e ativos definidos

de alta relevacircncia social ou importacircncia tecnoloacutegica estrateacutegica travejada por aliacutequotas progressivas

separadas em quatro faixas de incidecircncia 01 02 04 e 07 Mais de uma deacutecada depois no ano

2000 a Comissatildeo de Tributaccedilatildeo e Orccedilamento da Cacircmara o rejeitou

A reboque das tentativas de reforma tributaacuteria surgiu emenda constitucional transfigurando o

tributo em Contribuiccedilatildeo sobre Grandes Fortunas (CGF) vinculada agrave sauacutede puacuteblica sob o argumento

de viabilizar sua instituiccedilatildeo segundo o entendimento de que a destinaccedilatildeo mitigaria a resistecircncia dos

interesses contraacuterios

A CGF fixava trecircs aliacutequotas 05 075 e 1 O limite isentaria ateacute os R$ 11 milhotildees excetuan-

do-se o imoacutevel residencial do contribuinte

O panorama global do imposto sobre a riqueza segundo seus opositores natildeo seria viaacutevel pela

baixa participaccedilatildeo na arrecadaccedilatildeo e alto custo administrativo a cantilena de sempre Estados Unidos

Reino Unido Austraacutelia Japatildeo e Itaacutelia decidiram natildeo adotaacute-lo pelo menos por ora

O argumento do senso comum eacute que o Imposto de Renda (IR) - havido como a grande base

da arrecadaccedilatildeo tributaacuteria da maioria dos paiacuteses desenvolvidos ndash tornaria o imposto sobre a riqueza

tatildeo-somente subsidiaacuterio ao IR ndash como salvaguarda de controle a evitar a evasatildeo comparando-se o

patrimocircnio com renda declarada

Detalhe-se que esses paiacuteses aplicam aliacutequotas efetivas de IRPF em torno de 50 e ateacute maiores

sem isenccedilatildeo na distribuiccedilatildeo de lucros e dividendos que integram a renda bruta sujeita agrave tributaccedilatildeo

pela aliacutequota progressiva

A Alemanha natildeo se cercou de muitos pruridos para experimentaacute-lo Eliminou o imposto sobre

a riqueza em 1996 mas o resgatou em 2007 com aliacutequota uacutenica de 3 A Suiacuteccedila tem aliacutequotas entre

01 e 09 jaacute a Noruega parte de 09 ateacute 11 A Sueacutecia adota aliacutequota uacutenica de 15 e a Iacutendia de

1 soacute alcanccedilando bens improdutivos como joacuteias imoacuteveis automoacuteveis e obras de arte

Islacircndia e Finlacircndia aboliram o imposto em 2006 e Luxemburgo isentou as pessoas fiacutesicas em

2005 poreacutem tatildeo-somente o fizeram depois de taxarem as grandes fortunas durante quase uma deacute-

cada e coincidentemente quando os conservadores chegaram ao poder na esteira da ldquoprimavera

liberalrdquo que visitou os paiacuteses gelados em meados da deacutecada passada

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

81

Jaacute no Brasil as anaacutelises emanadas dos simpoacutesios seminaacuterios e ensaios antecedentes aos traba-

lhos constituintes explicitavam a evidecircncia de que se impunha a incontornaacutevel necessidade do sistema

tributaacuterio ser reciclado contemplando inovaccedilotildees de diferente natureza

Ao compulsar as anotaccedilotildees dos estudos preacutevios agrave Constituiccedilatildeo vislumbra-se um elenco de pro-

videcircncias portadoras da inspiraccedilatildeo de redesenhar o mapa das incidecircncias no tocante agrave progressivida-

de da tributaccedilatildeo de sorte a dissociaacute-la do suporte tradicional exclusivamente escorado na extraccedilatildeo

fiscal da renda dos trabalhadores do setor puacuteblico e privado assalariados ou autocircnomos

A ofensiva de soprar vida agrave criaccedilatildeo do IGF com os ares da nova fase democraacutetica sensibilizou

agrave lendaacuteria Comissatildeo Afonso Arinos oficialmente denominada Comissatildeo Provisoacuteria de Estudos Cons-

titucionais da qual resultou a apresentaccedilatildeo do anteprojeto cujo conteuacutedo incorporou o IGF Origina-

riamente deve-se a iniciativa da inovaccedilatildeo do IGF ao operoso Instituto dos Advogados de Satildeo Paulo

em conjunto agrave Associaccedilatildeo Brasileira de Direito Financeiro O IGF foi submetido a intenso e abrangente

debate com a participaccedilatildeo de especialistas ao som do clamor convocatoacuterio da Assembleia Nacional

Constituinte Os teacutecnicos descortinaram a existecircncia do vasto espectro das nuances operacionais e

administrativas em relaccedilatildeo ao seu rendimento e eficaacutecia fiscal com espelho na praacutetica internacional

notadamente o sistema francecircs

Sobe de relevo a marcante influecircncia dos sistemas fiscais estrangeiros que impulsionaram a

opccedilatildeo brasileira agrave inovaccedilatildeo com sua incorporaccedilatildeo ao leacutexico tributaacuterio nacional

O equacionamento do IGF considerou as variaacuteveis claacutessicas que precedem quaisquer inovaccedilotildees

no campo das incidecircncias tributaacuterias vale dizer identificou suas possibilidades e limitaccedilotildees a partir -

como natildeo poderia deixar de secirc-lo ndash da recorrecircncia a estrangeirices enquanto referencial de modelos

paralelos Os especialistas desafiaram naquela fase preliminar a tese de Myrdal que prelecionava natildeo

ser possiacutevel fazer assentar um justo sistema fiscal sobre uma ordem socioeconocircmica onde a riqueza e

a renda fossem concentradas

Agravequela eacutepoca debruccedilaram-se em suas preocupaccedilotildees igualmente sobre a singularidade das

experiecircncias internacionais compulsando-as tanto as que natildeo se distinguiriam demasiado da nossa

realidade quanto agravequelas que deveriam obrigatoriamente ser reavaliadas na atualidade em face das

profundas diferenccedilas de configuraccedilatildeo econocircmica e social

Hoje mais do que ontem os pontos de interrogaccedilatildeo permanecem fincados em torno de qual

a melhor forma de precisar o conceito dimensional do patrimocircnio da riqueza da fortuna do piso

de isenccedilatildeo

A partir da qualificaccedilatildeo de ldquogranderdquo tornar-se-ia admissiacutevel mensurar o topo de corte onde a

contribuiccedilatildeo devesse estacionar sua imputaccedilatildeo as camadas moduladoras da progressividade o cali-

bre das suas aliacutequotas os modelos de parametrizaccedilatildeo dos valores pecuniaacuterios os meios e modos de

controle dos contribuintes e de sua administraccedilatildeo tributaacuteria especialmente fiscalizaccedilatildeo e cobranccedila

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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estaqueada por seus compliances and enforcements

Uma anaacutelise prospectiva do IGF natildeo poderia ignorar a anaacutelise do primeiro dos projetos de lei

que visou agrave sua instituiccedilatildeo o PLC nordm 202-A de 1989 substitutivo ao PLS nordm 16289 aprovado com o

crivo analiacutetico das Comissotildees de Constituiccedilatildeo e Justiccedila Redaccedilatildeo e de Financcedilas do Senado Federal

A Receita Federal do Brasil modificou em 2009 o perfil dos contribuintes obrigados a declarar

o Imposto de Renda da Pessoa Fiacutesica (IRPF) ao fixar entre outros denominadores miacutenimos comuns a

propriedade a posse ou titularidade de bens superiores a R$ 30000000 (trezentos mil reais) Gros-

so modo tatildeo somente para efeitos de contextualizaccedilatildeo da ordem de grandeza dos valores patrimo-

niais por que natildeo admitir o patamar isentaacutevel das fortunas merecedoras da atenccedilatildeo do fisco federal

para demarcaccedilatildeo do piso referencial da ldquogrande fortunardquo segundo as regras de obrigatoriedade da

declaraccedilatildeo do IRPF A partir daiacute considerar-se-ia como valor liacutequido patrimonial o valor de mercado

dos bens e direitos da pessoa fiacutesica diminuiacutedo do valor das diacutevidas e empreacutestimos a ele vinculados

desde que natildeo superassem o valor do bem ou direito correspondente Os contribuintes do IGF no

substitutivo do projeto do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso passariam a ser as pessoas fiacutesi-

cas residentes ou domiciliadas no Paiacutes os espoacutelios e aquelas pessoas fiacutesicas ou juriacutedicas domiciliadas

no exterior no que respeitasse ao patrimocircnio possuiacutedo no Brasil

Jaacute quanto agrave base de caacutelculo do imposto seria considerado o valor atualizado do patrimocircnio

alcanccedilado pelo IGF em 31 de dezembro do ano-base relativo ao exerciacutecio financeiro do ano em que

a declaraccedilatildeo do IRPF fosse apresentada conforme constasse da declaraccedilatildeo anual de bens e direitos

do contribuinte

A primeira declaraccedilatildeo anual de bens e direitos posterior agrave publicaccedilatildeo da Lei do IGF implicaria

ao contribuinte a obrigatoriedade de declarar os seus valores de mercado corrigido nos exerciacutecios

financeiros seguintes em conformidade agrave variaccedilatildeo acumulada do IGP-DI

A cultura inflacionaacuteria que permeava a conjuntura econocircmica certamente influenciou o entatildeo

senador Fernando Henrique a exigir atualizaccedilatildeo patrimonial adequando-a aos valores de mercado

A incidecircncia do IGF levaria em conta as participaccedilotildees no capital social da empresa as quais

seriam consideradas parcelas integrantes do conjunto patrimonial dos contribuintes em valores equi-

valentes agraves fraccedilotildees do patrimocircnio liacutequido da empresa de suas propriedades correspondentes

No caso de sociedades por accedilotildees o valor do patrimocircnio liacutequido da empresa para fins do

IGF corresponderia ao maior valor dentre os valores do patrimocircnio liacutequido conforme apurado em

balanccedilo e de mercado das accedilotildees representativas do capital social da empresa As aliacutequotas seriam

progressivas em funccedilatildeo do valor total do patrimocircnio tributado de sorte a incidirem diferencialmente

sobre os ativos considerados improdutivos e os produtivos A previsatildeo de responsabilidade solidaacuteria

da pessoa juriacutedica pelo pagamento do imposto constou do IGF sob a presunccedilatildeo de neutralizar aquelas

operaccedilotildees de incorporaccedilatildeo de bens ou direitos aos ativos que visassem agrave dissimulaccedilatildeo dos verdadei-

ros proprietaacuterios ou pretendessem apresentaacute-los subavaliados

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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O referido projeto caminhou no entanto com outras pernas O Senador Gomes de Carvalho foi

o autor do Substitutivo ao projeto de Lei anteriormente analisado aprovando-o de maneira a garantir

maior amplitude agraves exclusotildees da base de caacutelculo do IGF subtraindo-lhe os investimentos voltados agrave

infraestrutura de eletricidade transportes e comunicaccedilotildees com a expressa determinaccedilatildeo que fosse

remetida agrave lei ordinaacuteria a definiccedilatildeo das exigecircncias para a sua comprovaccedilatildeo

O Substitutivo ao projeto originaacuterio foi enviado agrave Comissatildeo de Financcedilas e Tributaccedilatildeo da Cacircmara

dos Deputados cuja relatoria foi delegada agrave ex-Deputada Federal pelo Partido dos Trabalhadores do

Estado do Rio de Janeiro economista Maria da Conceiccedilatildeo Tavares vencida junto aos seus pares

Mais tarde especialistas em financcedilas puacuteblicas simularam algumas projeccedilotildees para avaliaccedilatildeo da

produtividade fiscal do IGF extraiacutedas da arrecadaccedilatildeo reconhecida com base em publicaccedilotildees da Re-

ceita Federal retificando a subavaliaccedilatildeo dos imoacuteveis e rendas com base em estudos mundialmente

aferidos

O Quadro 1 apresenta essa distribuiccedilatildeo para o ano de 1999 extraiacutedo das declaraccedilotildees de im-

posto de renda Apenas 09 dos declarantes possuiacuteam renda mensal superior a R$ 10 mil e detinham

15 do patrimocircnio O mesmo percentual de 15 do patrimocircnio pertencia aos que tinham renda men-

sal entre R$ 1000 e R$ 1500 e representavam 240 do nuacutemero de declarantes Quem tinha renda

mensal acima de R$ 10 mil possuiacutea em meacutedia um patrimocircnio de R$ 1450 mil Quem ganhava ateacute mil

reais dispunha de um patrimocircnio de R$ 47 mil Uma diferenccedila de 3100 (KHAIR 2008)

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5 O SEM-FORTUNAS NENHUMAS

ldquoA eficaacutecia do sistema tributaacuterio natildeo eacute apenas uma questatildeo de legislaccedilatildeo tributaacuteria apropriada mas de eficiecircncia e integridade da administraccedilatildeo tributaacuteria e uma ad-ministraccedilatildeo eficiente formada por pessoas de grande integridade eacute o principal requisito para que se possa explorar o potencial tributaacuterio de um paiacutesrdquo

Nicholas Kaldor

A expressatildeo ldquograndes fortunasrdquo no contexto fiscal brasileiro eacute o oacutepio dos neoliberais Admite-se

que seja uma ldquosubstacircnciardquo que organiza o ldquodiscurso do lucrordquo

A sua proteccedilatildeo encobre erros crassos e mesmo justificam virar de pernas para o ar as incipien-

tes garantias sociais O pensamento da ldquovelha nova direitardquo tem de ceder espaccedilo a uma compreensatildeo

experimentada pelo mundo real Max Weber em vez de Von Mises Alexis de Tocqueville por Raimond

Aron Paul Krugmann a Milton Friedman

Nenhum propoacutesito haacute em ler Hayek durante 40 anos e aplicaacute-lo como um emplastro salvador

sobre nossas riquezas prepotentes e avaras De saiacuteda devemos aceitar o desastre do ldquoneoliberalismo

realrdquo que apresentou um caminho em linha reta agrave terra prometida da prosperidade e da eficiecircncia

econocircmica mas entregou a ldquogrande recessatildeordquo de 2009 cujo uacutenico precedente de igual magnitude eacute a

ldquogrande depressatildeordquo de 1929 que acendeu o pavio da II Guerra Mundial (GOWAN 2003)

A ser verdadeiro natildeo existir alternativa ao capitalismo a ldquonova velha direitardquo tem de dar cabo agrave

crenccedila de que os privileacutegios dos super-ricos eacute a roda que potildee o mundo a girar acende o farol dos ca-

minhos e ensina para onde se deva ir Isso faz algum sentido Somente se a aposta no futuro depender

de um privileacutegio fiscal sem a menor razatildeo exceto na concepccedilatildeo neoliberal paranoacuteica inspirada pela

onipotecircncia das grandes fortunas

Se formos agrave cata da falta de sentido das grandes fortunas privilegiadas com renuacutencias fiscais

vamos encontraacute-la em Sumer a primeira civilizaccedilatildeo conhecida haacute seis mil anos atraacutes onde hoje eacute o

Iraque

A relevacircncia dos impostos para aquela sociedade pode ser comprovada por hieroacuteglifos identi-

ficados por arqueoacutelogos em Lagash Curiosidade notaacutevel eacute a constataccedilatildeo da imposiccedilatildeo fiscal genera-

lizada e onerosa Ateacute a morte era taxada

A ldquoliberdade fiscalrdquo que foi proclamada em Sumer no reinado de Urikagina implicou o fim da

rede dos coletores de impostos resultando em uma cataacutestrofe a destruiccedilatildeo da cidade (ADAMS 2001)

A raiz do IGF remonta agrave Antiguidade Claacutessica A histoacuteria e soci-ologia tributaacuteria a identificam

no gecircnero dos impostos diretos Quanto ao imposto direto Marcus Cicero 44 AC lecionava ldquoWhen constant wars made the Roman treasury run short our forefathers often used to levy a property taxrdquo A experiecircncia na Alemanha mereceria alguma atenccedilatildeo com o Vermoegensteur o imposto sobre

a fortuna que impacta os donos de poder econocircmico e poliacutetico

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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Caldeada pelo sofrimento de duas grandes guerras mundiais tem uma poliacutetica tributaacuteria que

natildeo subtrai a contribuiccedilatildeo fiscal das riquezas acumuladas do bolo orccedilamentaacuterio em funccedilatildeo de uma feacute

farisaica professada no altar da renuacutencia fiscal sobre as grandes fortunas como se estas fossem mere-

cedoras de favorecimento

Natildeo custa lembrar que a Revoluccedilatildeo Francesa combateu o imposto sobre o consumo afirmando

que ldquosatildeo as classes pobres as mais carregadasrdquo na dicccedilatildeo de Alberto Deodato

A Franccedila fez retornar o tributo sobre as fortunas em 2013

Algo que natildeo se deveria estranhar porque ateacute mesmo Adam Smith jaacute constatara em sua mag-num opus o recolhimento do imposto de capitaccedilatildeo na Franccedila ldquosem nenhuma interrupccedilatildeordquo onde as

ldquoclasses mais altas satildeo taxadas de acordo com a sua posiccedilatildeo com base em uma tarifa invariaacutevelrdquo

A Suiacuteccedila promoveu a incidecircncia sobre o patrimocircnio das pessoas fiacutesicas e juriacutedicas com as aliacute-

quotas de 1 e 2 progressivamente a partir de uma isenccedilatildeo miacutenima atualmente equivalente a R$

50000000 adicional agrave tributaccedilatildeo em bases correntes da renda e dos impostos sobre o patrimocircnio

cobrados pelos condados que descartam a conhecida tese da bitributaccedilatildeo a renda em 42 e a gran-

de fortuna a 1 cumulativamente Como se vecirc a bitributaccedilatildeo eacute uma criacutetica que natildeo saiu de moda

tatildeo-somente no Brasil e costuma ser sempre invocada para descartar o IGF sob o pretexto de que a

aquisiccedilatildeo patrimonial decorreu de rendimento anteriormente tributado Misturam-se os conceitos de

fluxo das rendas ao de estoque das propriedades para justificar a ausecircncia de competecircncia federal agrave

instituiccedilatildeo do tributo porque a incidecircncia patrimonial estaria reservada a estado e municiacutepios com

exceccedilatildeo do imposto territorial rural

Os EUA possuem o general property tax considerado seu imposto sobre a fortuna e o inhe-ritance tax desde a era colonial no entanto influenciados pelo Relatoacuterio Meade que examinou as

origens da riqueza e pela eacutetica protestante hegeliana presumiram a avaliaccedilatildeo das grandes fortunas

como sendo um problema e descartaram o IGF - mercecirc do aperfeiccediloamento do imposto sobre cessotildees

patrimoniais graciosas

O fato eacute que a desigualdade aumentou tanto nos EUA ao ponto do governo Obama pretender

reequilibrar o ldquocoacutedigo fiscalrdquo mediante aliacutequotas de impostos maiores que nas Eras Reagan e Bush

A Gratilde-Bretanha incentivou o debate parlamentar nos anos 60 Os estudos recomendaram a

instituiccedilatildeo do IGF A base parlamentar da primeira-ministra Thatcher que abraccedilara o manancial teoacuterico

neoliberal incompatiacutevel com a incidecircncia fiscal sobre os ricos sepultou o tributo (MOORE JR 1999)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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6 O DIAGNOacuteSTICO DO IPEA

ldquoA justiccedila fiscal pressupotildee tacitamente uma justa distribuiccedilatildeo da renda e da proprieda-de de qualquer ponto de vista que seja julgado o problemardquo

Wicksell

A Reforma Tributaacuteria ensaiada em 2005 deu ecircnfase mais na facilitaccedilatildeo da dinacircmica econocircmica e

foi criticada por silenciar quanto agrave acentuada regressatildeo do sistema tributaacuterio reforccedilada pela proposta

governamental Os tributos impactam bem mais as camadas sociais de rendas consideradas baixas

incidindo risivelmente sobre os ricos e super-ricos

O IRPF passaria das atuais trecircs faixas de aliacutequotas para 12 A primeira seria de 5 para quem

tem renda de R$ 126 mil a R$ 21 mil

A faixa intermediaacuteria seria de 275 para aqueles com rendimentos entre R$ 65 mil e R$ 8 mil

A uacuteltima aliacutequota de 60 atingiria quem tem renda acima de R$ 50 mil Na visatildeo do presidente do

Ipea a uacuteltima proposta de reforma tributaacuteria enviada pelo governo ao Congresso Nacional natildeo pro-

potildee mudanccedilas que promovam a justiccedila fiscal porque enfatiza tatildeo-somente a promoccedilatildeo da eficiecircncia

econocircmica a reduccedilatildeo da burocracia e a eliminaccedilatildeo de desperdiacutecios sem alterar o perfil regressivo

da arrecadaccedilatildeo

Infelizmente outra vez o Executivo natildeo procurou ldquoa justa tributaccedilatildeo antes da arrecadaccedilatildeordquo na

dicccedilatildeo do advogado e ex-auditor da Receita Federal Fernando Marsillac descartando o IGF outra vez

(REFORMA FISCAL 1992)

A novidade do estudo do Ipea diferentemente do que se verificou nos anos 90 foi considerar

que parte da justiccedila tributaacuteria poderia ser alcanccedilada sem tocar a Carta Maior A reforma tributaacuteria

poderia segundo Maacutercio Pochmann oferecer uma perspectiva melhor de avanccedilo social do ponto de

vista da justiccedila tributaacuteria ateacute mesmo com leis infraconstitucionais constituindo-se de fato o imposto

sobre grandes fortunas conforme sua sustentaccedilatildeo oral em audiecircncia puacuteblica realizada na Comissatildeo

de Diretos Humanos do Senado Federal

O enfoque evidentemente equivocado de deixar de buscar a justiccedila fiscal por intermeacutedio tam-

beacutem do sistema tributaacuterio com aplicaccedilatildeo do sect 1ordm do artigo 145 da Carta de 88 natildeo tem recebido

apoio da miacutedia em geral que desdenha do IGF e assemelhados revestindo-os de uma roupagem

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

87

deacutemodeacute supostamente colocando-os como maleacuteficos aos jaacute pagantes do imposto sem discriminar

as diferenccedilas gritantes entre os contribuintes proporcionalmente altiacutessimas juntando-as agrave rejeiccedilatildeo

irrefletida da classe meacutedia esta sim a grande base do Imposto de Renda no Brasil A linha argumenta

tiva do Ipea trouxe o debate do IGF para o contexto de redistribuir a riqueza acumulada tornando a

tributaccedilatildeo melhor ajustada de modo agraves rendas mais baixas recolherem menos impostos sobre o con-

sumo com as rendas mais altas especialmente os mais ricos contribuindo mais mediante tributos in-

cidentes diretamente Sem sucumbir aos tradicionais argumentos agrave moda liberal as grandes fortunas

seriam submetidas ao imposto adicional em apoio e suporte agrave reduccedilatildeo das desigualdades sociais Isso

faz todo sentido em relaccedilatildeo agrave percepccedilatildeo de Wicksell completando-a porque ldquode outro modo natildeo

faria sentido falar de igualdade de prestaccedilatildeo de serviccedilo ou de contraprestaccedilatildeo de serviccedilo ou

de igualdade de sacrifiacuteciordquo

7 OS CONDENADOS Agrave ldquoREPRESSAtildeO FISCALrdquo

ldquoSatildeo atores econocircmicos que terminam por produzir suas proacuteprias regras evidente-mente adaptadas aos seus interessesrdquo

Delmas-Marty

A inclusatildeo do IGF em nossa Constituiccedilatildeo se deu em momento poliacutetico brasileiro onde podiacutea-

mos definir as correntes adversaacuterias no Congresso o que nos dias atuais eacute impossiacutevel pois temos uma

confusatildeo total entre o que antes chamaacutevamos de esquerda e direita

Esse antagonismo refletia as aspiraccedilotildees de uma maior gama de anseios sociais os quais se re-

fletiram fortemente em nosso ordenamento juriacutedico

No momento atual se haacute conhecida dificuldade de inclusatildeo do IGF pelo arranjo legislativo que

responde aos interesses das classes mais abastadas tambeacutem haacute a conjuntura econocircmica mundial que

favorece a determinaccedilatildeo constitucional de que se faccedila tal inovaccedilatildeo juriacutedica

Intrigante mas perfeitamente compatiacutevel agrave loacutegica interna do modelo de tributaccedilatildeo conformado

nos anos 90 o IGF foi discriminado negativamente abortado prematuramente marginalizado pela

sua suposta ldquobaixardquo arrecadaccedilatildeo sua ldquodificuldaderdquo de operacionalizaccedilatildeo sem que jamais tenha sido

mesmo experimentado durante um periacuteodo em que a CPMF teria sido mecanismo extremamente uacutetil

agrave sua adoccedilatildeo e controle

Curiosamente repise-se natildeo aceitam sequer a alegaccedilatildeo de ser baixa a tributaccedilatildeo dos projetos

do IGF quando os reformistas que o condenam sempre exigiram aliacutequotas moderadas nos seus libelos

acusatoacuterios da tributaccedilatildeo nacional

Ao bem da verdade o IGF tem sido afastado do caminho do livre movimento do processo de

acumulaccedilatildeo do capital e da concentraccedilatildeo social da riqueza por outro motivo subjacente e oculto

impedir o surgimento de soluccedilotildees capazes realmente de alavancar sua potencialidade dadas as ex-

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

88

pectativas dos formuladores do nouveaux laissez faire de que as riquezas seriam multiplicadas os

capitais seriam mais centralizados e os milionaacuterios e bilionaacuterios aumentariam sua fraccedilatildeo apropriada do

excedente econocircmico Um fato social que salta agrave vista (ELIAS 2011)

Dito de outra maneira a deacutecada de 90 eacute o periacuteodo onde o planejamento tributaacuterio agressivo foi

intensamente exercitado em escala global e assim preparatoriamente antecipando-se ao ldquotax appealrdquo que a referida concentraccedilatildeo social da riqueza e da renda acabaria acarretando (LE MONDE 2012)

Se atentarmos para a questatildeo fiscal a opiniatildeo puacuteblica foi levada a ignorar o meacuterito do IGF e

com base no tratamento superficial do tributo acabou por fazer pateticamente o jogo da neoliber-

tagem fiscal conformando-se a pagar o pato do arrocho tributaacuterio

O modo como tal processo desenrolou-se pode ser compreendido se for observado atenta-

mente de uma perspectiva especial pela janela de Overton que registra como pensa a maioria da

sociedade num dado momento sobre determinado assunto Da sacada da janela miremos o caso

concreto do IGF A maioria dos brasileiros certamente eacute contra cobrar impostos sobre quem natildeo dis-

ponha de capacidade contributiva As posiccedilotildees entretanto quanto a cobrar mais impostos dos que

possuam substancial capacidade contributiva obviamente variam do absolutamente contra ao abso-

lutamente a favor O pensamento modal visto da janela eacute o maacuteximo que um poliacutetico a depender de

sua ambiccedilatildeo poderia sustentar publicamente

Evidente que um militante da tributaccedilatildeo sobre grandes fortunas poderia ser eleito deputa-

do por eleitores simpatizantes da causa mdash mas sem duacutevida alguma teria problemas para se eleger

presidente da Repuacuteblica ou senador porque dependeria inapelavelmente de generosos recursos de

financiamento privado de campanha eleitoral

Eacute possiacutevel deslocar a perspectiva de quem estaacute na janela para um lado ou para outro Isto eacute

mover a opiniatildeo puacuteblica esmagadoramente a favor da cobranccedila de imposto sobre grandes fortunas

agrave situaccedilatildeo de indiferenccedila Absolutamente sim Isso demanda trabalho de pessoas especializadas em

manipulaccedilatildeo da opiniatildeo puacuteblica Empresas de consultoria organizadas passam a atuar na sociedade

para lhe oferecer valores que levem ao pretendido deslocamento

Mesmo quando eram favoraacuteveis os presidentes Fernando Henrique e Lula da Silva diziam que

nenhum cidadatildeo poderia gostar da coisa em si o pagar mais impostos seria um ldquoocircnusrdquo

O mesmo afirma agora a equipe econocircmica da presidenta Dilma Roussef

Repare-se que nesta intervenccedilatildeo afasta-se o IGF para debater outro tema Que outro Uma

proposta da ldquoreforma tributaacuteriardquo com vistas a suavizar as ldquocondiccedilotildees da regressividaderdquo Isso para

tentar deslocar a janela de opiniatildeo do ldquocontrardquo para o ldquomenos contrardquo ateacute chegar agrave ldquoneutralidaderdquo e

quem sabe um dia ao ldquoa favorrdquo da natildeo tributaccedilatildeo das grandes fortunas Assim sendo faz-se imperati-

vo trabalhar algum outro valor relacionado ao mesmo tema A fazer esse trabalho entra em campo um

verdadeiro exeacutercito de ldquoespecialistas em opiniatildeo puacuteblicardquo assessores de imprensa relaccedilotildees puacuteblicas

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

89

institutos de pesquisa think tanks agecircncias de lobby e ex-ldquoservidores de Estadordquo reciclados em ldquoservi-

dores do Mercadordquo (TER-MINASSIAN 2012)

Ad argumentadum tantum vejamos a questatildeo dos alimentos natildeo-transgecircnicos Eacute evidente que

a maioria da populaccedilatildeo se oporia a que famiacutelias ficassem sem alimento algum ou sujeita a aumentos

de preccedilos pela queda na produccedilatildeo de alimentos

Se a maioria eacute contra dificilmente um poliacutetico com ambiccedilotildees nacionais abraccedilaria essa causa

Mas por que natildeo outra Por exemplo a da ldquoseguranccedila alimentar transgecircnica garantidardquo certamente

seria mais simpaacutetica e em condiccedilotildees de operar o deslocamento da perspectiva de quem estaacute na janela

de Overton

Mutatis mutandis eacute o que tem conseguido o mainstream a favor do esquecimento do IGF

As consultorias associadas financiadas pelo mercado financeiro dentro e fora do paiacutes desmora-

lizam os que procuram fazer cumprir a Constituiccedilatildeo transformando-os em sinocircnimo de desmatado-

res fiscais como se as grandes fortunas fossem uma espeacutecie de Amazocircnia Ocidental cuja natureza

devesse permanecer conservada intocaacutevel espeacutecie de reserva natural indiacutegena protegida como se os

ricos do mundo fossem uma ldquoetnia do Alto Xingurdquo ameaccedilada de extinccedilatildeo

O caso mais bem-sucedido de que se tem notiacutecia nessa aacuterea eacute o terrorismo fiscal feito contra

a tentativa de transformaccedilatildeo do IGF em Contribuiccedilatildeo Social vinculada agrave sauacutede O que se pretende

eacute ldquoditar a agendardquo O trabalho bem-sucedido eacute de amplo espectro detectado um determinado sen-

timento da sociedade que potencialmente seja ameaccedilador das fortunas grandes trabalha-se para

mudaacute-lo ou neutralizaacute-lo

O truque de manipulaccedilatildeo da opiniatildeo puacuteblica consiste numa ponta em transformar o ldquofim do

IGFrdquo numa decorrecircncia natural dos ldquodireitos da propriedaderdquo nivelando assim a plutocracia aos pro-

prietaacuterios do Programa Habitacional das Massas apoiado pela Caixa Econocircmica Federal denominado

como Minha Casa Minha Vida

As forccedilas contraacuterias ao IGF natildeo satildeo secretas nem se movem nas sombras ou satildeo administradas

por algueacutem em especial

A ldquojanela de Overtonrdquo nada tem a ver com ldquoteorias da Conspiraccedilatildeordquo As classes dominantes na

economia sempre influenciaram o debate puacuteblico as opiniotildees alheias a propaganda o trabalho dos

assessores de imprensa de imagem e administradores (DREIFUSS 1989)

Como entatildeo distinguir o ldquomelhor pensamentordquo dessa algaravia de lobbies organizados Se o

meacuterito estaacute sendo efetivamente tratado se a temaacutetica tatildeo-somente guarda algum parentesco com o

assunto principal ou se haacute um oacutebvio desvio da questatildeo central

Se o meacuterito da questatildeo natildeo estiver sendo atacado estamos desbordando para os desvios os

temas paralelos

Neste caso a rede profissional dos operadores de opiniatildeo puacuteblica entra em accedilatildeo para substituir

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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a ldquoquestatildeo de meacuteritordquo no caso o privileacutegio fiscal das grandes fortunas para que a janela da opiniatildeo

puacuteblica se abra focalizada na censura geneacuterica do ldquoaumento dos impostosrdquo em louvor ao ldquocultordquo a natildeo

tributaccedilatildeo das grandes fortunas para ldquoo bem de todos e a felicidade geral da naccedilatildeordquo

As grandes empresas que financiaram o processo eleitoral dos 90 sejam no centro ou na pe-

riferia do sistema capitalista mundial rastreiam o perfil dos ex-servidores puacuteblicos e satildeo atentas aos

que podem ser usados por suas relaccedilotildees estatais de influecircncia corporativa Essa situaccedilatildeo encarna

o conceito de ldquomercado puacuteblicordquo onde os donos da riqueza e do poder recrutam seus executivos

(BENJAMIN 2002)

Franccedila Argentina e Uruguai onde o imposto sobre fortuna foi mantido a receita representada

pela arrecadaccedilatildeo do imposto em 2009 - de 16 15 63 respectivamente - tende ao crescimento

Esses paiacuteses com o passar dos anos desenvolveram uma legislaccedilatildeo e administraccedilatildeo bem detalhada

O nuacutemero de contribuintes aumentou Revertendo a tendecircncia da deacutecada de 1990 paiacuteses como Islacircn-

dia e Espanha reinstituiacuteram o imposto recentemente como resposta a crise financeira e fiscal que tem

assolado a Europa desde 2009

A tendecircncia internacional para uma maior eficiecircncia e arrecadaccedilatildeo do Wealth Tax seria o menor

nuacutemero de aliacutequotas um limite de isenccedilatildeo mais baixo a abrangecircncia de pessoas juriacutedicas a tributaccedilatildeo

especial para natildeo residentes e a presenccedila de normas contra-evasivas severas Empiricamente estudos

mostram que a concentraccedilatildeo da riqueza eacute superior agrave da renda e que numa amostra significativa de

paiacuteses para o ano 2000 25 das famiacutelias mais ricas do mundo isto eacute inseridas no grupo de 1 com

as maiores fortunas do mundo eram brasileiras Isso mostra a dimensatildeo arrecadadora e distributiva

que a instituiccedilatildeo do imposto bem aplicado desde logo poderia gerar

A anaacutelise de oito Projetos de Lei Complementar incluindo-se os dois que foram rejeitados nas

Comissotildees de Tributaccedilatildeo e Financcedilas da Cacircmara em 2000 e de Assuntos Econocircmicos do Senado em

2010 mostra que a estrutura dos projetos se caracterizava por ser pouco detalhada nas normas evasi-

vas divergindo entre si apenas com relaccedilatildeo ao limite de isenccedilatildeo e a estrutura de aliacutequotas

Esses dois uacuteltimos aspectos satildeo fundamentais na tributaccedilatildeo efetiva da fortuna e seu potencial

arrecadador e distributivo Os argumentos utilizados pelos parlamentares para rejeitarem os projetos

em 2000 e 2010 foram os mesmos baixa arrecadaccedilatildeo alto custo administrativo e a sua extinccedilatildeo em

diversos paiacuteses europeus A simples pesquisa das experiecircncias argentina e francesa com o grau de

tecnologia atual fazem da alta concentraccedilatildeo da riqueza no Brasil o objeto par excellence de que a

regulamentaccedilatildeo do imposto teraacute o resultado efetivo desejado A presunccedilatildeo a priori de que natildeo possa

vir a ser bem aplicado natildeo pode ceder agrave tentaccedilatildeo injetada pela razatildeo ciacutenica na loacutegica fiscal da maacute

alocaccedilatildeo de recursos porque cabe agraves instituiccedilotildees republicanas e ao controle social a verificaccedilatildeo das

boas praacuteticas de governanccedila e destinaccedilatildeo dos gastos puacuteblicos

As afirmaccedilotildees de Celso Furtado nos anos 60 ao apresentar seu Plano Trienal de Conceiccedilatildeo Ta-

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

91

vares ao analisar o modelo brasileiro nos 2000 de Kautsky ao discorrer sobre a poliacutetica fiscal nos 20 e

de um Baratildeo de Cotegipe desconsolado sobre a resistecircncia patrimonial natildeo deixam duacutevidas a respeito

de quem satildeo eles de onde vem e de como se comportam quando se trata de estabelecer quem deve

pagar a conta da vida em sociedade (MARIANI 2007)

A definiccedilatildeo de Lester Thurow de que a reforma tributaacuteria eacute a arte de fazer uns pagarem pelos

outros deslocando o peso dos tributos dos ombros dos que podem mais ao costado de quem tem de

menos e apresentar essa decisatildeo poliacutetica como a mais fantaacutestica descoberta da ciecircncia das financcedilas

ainda se torna mais verdadeira quando aplicada aos que defendem abertamente o reacutequiem do IGF

A maacutexima de Lester para o sistema tributaacuterio eacute facilmente perceptiacutevel no setor financeiro Em

eacutepocas passadas o setor puacuteblico contribuiacutea para a formaccedilatildeo do capital com pelo menos 5 do PIB

parte desses recursos sendo de origem puramente inflacionaacuteria Hoje haacute consenso de que natildeo deveriacute-

amos depender da inflaccedilatildeo para financiar o investimento Ora soacute a mudanccedila na base tributaacuteria poderia

substituir o papel da inflaccedilatildeo O Plano Real fez exatamente isso A estabilizaccedilatildeo da moeda implicou

ateacute os dias de hoje e ainda por muito tempo o carregamento de elevadiacutessimas diacutevidas interna e exter-

na cujo serviccedilo deve ser pago com altas taxas reais de juros e muito mais impostos (VASCONCELOS

1995) Nenhum ministro da fazenda diz que a intensidade da ldquorepressatildeo fiscalrdquo resulta inteiramente

concentrada sobre a base da piracircmide social sem nenhum incocircmodo fiscal no topo

O ex-jurista e ex-secretaacuterio da Receita Federal Osiacuteris de Azevedo Lopes Filho resumiu a realida-

de brasileira com a qual convivera bem de perto durante 40 anos em Brasiacutelia ldquoEsse Congresso natildeo

quer tributar os ricosrdquo

8 OS SEM-IMPOSTO NO PAIacuteS DOS CONTRASTES

ldquoReconheccedilo que muito tempo decorreraacute antes que possamos incluir no orccedilamento uma taxa que assente com a devida proporcionalidade sobre todas as proprie-dades territoriais mas eacute preciso ir ensaiando a praticabilidade dessa tatildeo vulgarizada imposiccedilatildeordquo

Baratildeo de Cotegipe

Continuamos a bater recordes de desigualdade moderna e natildeo agrave antiga que como eacute de bom-tom atribuiacuteamos agraves nossas heranccedilas histoacutericas

Chico de Oliveira

Natildeo seria demasiado debitar tambeacutem agrave era republicana a profecia anunciada em 1877 contida

na exposiccedilatildeo de motivos do Ministeacuterio da Fazenda assinada pelo Baratildeo de Cotegipe

Quanto tempo ainda a decorrer para tornaacute-la absolutamente insoacutelita

Os arautos do paacutelio-liberalismo responderiam agrave primeira indagaccedilatildeo com um natildeo dogmaacutetico

Jaacute quanto agrave segunda sob a aureacuteola da modernizaccedilatildeo neoconservadora ateacute concordariam em

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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renovar quiccedilaacute por mais um seacuteculo e meio a impressatildeo estranhada do ministro da Fazenda o Baratildeo de

Cotegipe Com os 20 mais pobres da populaccedilatildeo brasileira dividindo entre si menos de 3 da renda

nacional e os 20 mais ricos cerca de dois terccedilos a onda neoliberal leva mais aacutegua ao moinho dos

sem-equidade porquanto ldquoas poliacuteticas econocircmicas e sociais neoliberais natildeo foram determinantes

para a expansatildeo econocircmica mas ampliaram a desigualdaderdquo (POCHMANN 2008)

Os super-ricos portanto que mais se beneficiaram da crise financeira mundial de 2008 nem

foram chamados ao miacutenimo sacrifiacutecio fiscal adicional no gradual processo de reduccedilatildeo progressiva

e continuada dos contrastes que crispam de violecircncia e inseguranccedila a sociedade brasileira (CARTA

CAPITAL 2012)

Vinte anos atraacutes o economista Garcia Munhoz fez uma afirmaccedilatildeo no Auditoacuterio Petrocircnio Porte-

la em novembro de 1992 que confirma a sina nacional marcante da trajetoacuteria de todos os governos

ateacute agora ldquoQuem vai pagar Eacute a questatildeo da dificuldade do sistema alocar nas pessoas de mais

alta renda uma carga tributaacuteria adicional mesmo quando se trata de impostos diretosrdquo

Stuart Mill nos seus Principles of Political Economy no seacuteculo XIX jaacute dissera e isto se aplica ao

imposto sobre as ldquograndes fortunasrdquo que ldquoa dificuldade de se fazer justiccedila plena natildeo constitui razatildeo

alguma contra o se fazer o que pudermos nesse sentidordquo como tambeacutem que a situaccedilatildeo de rendimen-

tos que tendessem ldquoconstantemente a aumentar sem qualquer atividade ou sacrifiacuteciordquo formaria um

conjunto de beneficiaacuterios ldquoque se enriquece progressivamente pelo curso natural das coisas sem que

eles mesmos faccedilam esforccedilo algum para issordquo

Lugares comuns bem verdade mas que precisam ser repetidos porque como diria Gide ldquonin-

gueacutem escutardquo

A reforma do sistema tributaacuterio brasileiro natildeo deveria mais ignorar o espectro altamente dife-

renciado da capacidade de pagamento entre as classes dominantes e subalternas

A bizarrice mais difundida pela ofensiva neoliberal defende o resumo do tributo ao seu objetivo

puramente fiscal sendo que correccedilotildees e ajustes das imperfeiccedilotildees ou assimetrias fiquem por conta e

responsabilidade do gasto puacuteblico cuja suposta qualidade do foco compensaria as distorccedilotildees inevitaacute-

veis e deliberadas na coleta Tal platitude prevaleceu a partir dos 90 sempre escorada no amplo bureau

dos interesses regrados conforme lembrado por Delmas-Marti (MOTTA 2001)

Aleacutem disso eacute igualmente contestaacutevel na ldquoteoria da ofertardquo o efeito de reduccedilatildeo das taxas de

poupanccedila e investimento quanto aos lucros em virtude da incidecircncia possiacutevel do IGF como um novo

imposto direto uma vez que natildeo haacute indicaccedilotildees que esses niacuteveis ndash de poupanccedila investimento e lucro

- tenham aumentado em virtude da baixiacutessima tributaccedilatildeo da renda e do patrimocircnio que caracteriza o

sistema tributaacuterio brasileiro

Assim sendo a recorrida tese dos impostos indiretos serem melhores propulsores do desenvol-

vimento natildeo seria sustentaacutevel porque as ldquotaxas de poupanccedila e investimentordquo natildeo aumentaram devi-

do agraves insuficientes tributaccedilotildees das rendas e dos patrimocircnios as quais ensejariam ldquoa propensatildeo para

poupar e investirrdquo (NAVARRO 2009) Um grupo de alematildees ricos lanccedilou em 2009 uma campanha para

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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reclamar a volta de um imposto sobre o patrimocircnio com objetivo do paiacutes ter mais recursos para sair

da crise A liccedilatildeo de Navarro natildeo poderia obter melhor confirmaccedilatildeo

Uma deacutecada atraacutes no ano de 2004 o sacrifiacutecio fiscal consoante a distribuiccedilatildeo social da renda

familiar estava assim discriminado consoante a tabela abaixo

Natildeo haacute a menor duacutevida de que melhor do que aguardar um eventual interes-se particular dos

detentores de grandes fortunas em levar adiante um impos-to no paiacutes ldquotatildeo cheio de riquezas prepo-

tentes e avarasrdquo eacute conscientizar a populaccedilatildeo (VIDAL 2010)

A defesa da regulamentaccedilatildeo do IGF mdash haja vista que natildeo lhe fal-ta nem a legitimidade

constitucional consistente para entendecirc-lo como fer-ramenta eficaz de cumprimento dos objetivos

socioeconocircmicos nem condiccedilotildees operacionais tecnoloacutegicas e burocraacuteticas ao implemento pela ad-

ministraccedilatildeo tributaacuteria federal ndash deveria estar na pauta dos manifestantes e redes sociais como timi-

damente ateacute se notou em algumas faixas empunhadas por jovens nos protestos de junho de 2013

no sul do Brasil

O crescimento da participaccedilatildeo dos impostos indiretos cuja fatia passou de 65 nos anos 40

do seacuteculo passado a 75 no seacuteculo presente nitidamente contribuiu agrave ocorrecircncia do fato social de

nos termos transformado no paiacutes onde a desigualdade foi deliberadamente intensificada pelo mo-

delo econocircmico

Uma deacutecada depois o aumento da carga tributaacuteria tendo por base o quadro de 2004 natildeo se

deu sobre o decil superior da piracircmide social ao contraacuterio Os 1 mais ricos beneficiaram-se da poliacute-

tica fiscal e mais ainda da poliacutetica monetaacuteria

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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9 OS WEBERIANOS ESTARIAM CHEGANDO

ldquoAfinal quem manda neste paiacutesrdquoCelso de Alencar Furtado

ldquoNatildeo haacute no mundo elites mais alienadas do que as nossasrdquo

Nelson Rodrigues

As crises financeiras que ameaccedilam a comunidade do Euro mostram a gravidade da situaccedilatildeo

social e poliacutetica de paiacuteses como Espanha Greacutecia Portugal Itaacutelia e Irlanda

As experiecircncias de duas grandes guerras e as sequumlelas de horrores ensinaram o valor essencial

de uma sociedade estaacutevel segura e ordenada ainda que os uacuteltimos 30 anos tenham sido responsaacuteveis

pela derrubada dos pilares do Estado que um dia jaacute foi denominado do Bem-Estar (GALBRAITH 1970)

Natildeo eacute de estranhar que a vertente dos direitos que o professor Paulo Bonavides definiu como

de ldquosegunda geraccedilatildeordquo passe a recrutar novos personagens a compor a cena fiscal

E natildeo como meros coadjuvantes mas reivindicando outro protagonismo - completamente dis-

tinto da mesmice e da repeticcedilatildeo dos discursos verbosos contraacuterios agrave recuperaccedilatildeo do objetivo social

do imposto - representativo de uma nova espeacutecie de ldquodireito tributaacuteriordquo vinculado agrave afirmaccedilatildeo funda-

mental da ldquodignidade humanardquo em contraponto agrave ldquosagrada alianccedilardquo noticiada por Conceiccedilatildeo Tavares

Celso Furtado afirmou certa vez que nunca pudera ldquocompreender a existecircncia de um problema

estritamente econocircmicordquo jamais se esquecendo de interrogar a matriz de poder instalada por traacutes das

diretrizes econocircmicas (DOSMAN 2011) A poliacutetica tributaacuteria estaacute entranhada em igual contexto Pode-

riacuteamos parafrasear sua incompreensatildeo quanto aos tributos desconsiderando a compreensatildeo da exis-

tecircncia de um problema ldquoestritamente tributaacuteriordquo ou seja trata-se de dar percepccedilatildeo agrave importacircncia de

fatores natildeo tributaacuterios subjacente agrave estrutura dos sistemas fiscais Os jovens ainda estariam dispostos

a natildeo banalizar a injusticcedila fiscal Nem fazer pouco caso da indecente concentraccedilatildeo da renda social e

da riqueza no Brasil Ocorre-me entatildeo lembrar-lhe as liccedilotildees daquele que melhor pensou as condiccedilotildees

do subdesenvolvimento com suas desigualdades sociais e regionais

Caberia ao intelectual aprofundar a percepccedilatildeo da realidade social onde se ocultam os cri-

mes cometidos pelos que abusam do poder e reconhecer que o ponto de partida para as alterna-

tivas teraacute que ser inevitavelmente o aumento da participaccedilatildeo do povo nos centros de decisatildeo

(TAVARES 2000)

Os grandes grupos econocircmico-financeiros nacionais e transnacionais seus prepostos consul-

tores e especialistas constituem um soacute bloco de poder o qual natildeo faz o papel de contribuir agrave remo-

ccedilatildeo dos rolos de nuvens que embaccedilam a trilha da justiccedila fiscal Isto porque o seu papel eacute produzir a

espiral fumaceira com justificativas de que ricos natildeo devem pagar (mais) impostos Os mesmos que

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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promovem ldquolas razones que siguen haciendo atractiva a la banca para los lavadores la inexistencia de un impuesto sobre la renta ni de impuestos de sucesiones ni sobre el beneficio empresarial elimi-naacutendose asiacute los controles legales de cambio bajo el supuesta confraternidad profesional del secretordquo (AGUILERA 2012)

A essecircncia da nuvem conservadora eacute constituiacuteda de presumida externalidade extraordinaacuteria

incomparaacutevel agraves atividades dos ricos como se poliacutetica industrial natildeo existisse mas por mera quimera

a criaccedilatildeo de empregos fosse a proacutepria induacutestria das fortunas grandes

Nesta hipoacutetese fantasiosa a tese seria adequada para fundamentar os resultados esperados

Nas demais mais realistas natildeo passaria daquela situaccedilatildeo ldquoem que argumentos imprecisos sobre as

enormes repercussotildees satildeo excelentesrdquo na dicccedilatildeo de Paul Krugman O mesmo bloco de poder muito

menos faraacute o papel de resgatar o IGF do limbo constitucional onde se encontra relegado nem iraacute im-

pedi-lo de ser embaralhado ao senso comum das expectativas de reduccedilatildeo da carga tributaacuteria

Ao contraacuterio porque busca misturaacute-lo aos ventos que sopram a favor da diminuiccedilatildeo do ocircnus

fiscal inflamando o clamor difuso contra ldquoquaisquer aumentosrdquo de impostos Se capazes de formular

e de imporem em escala internacional suas poliacuteticas tributaacuterias longe do alcance da progressividade

fiscal que diraacute no acircmbito nacional restrito agraves burocracias eleitas onde os opositores do IGF contam

com seus aliados naturais de classe social e de poder poliacutetico

Sem falar das administraccedilotildees tributaacuterias vale dizer das burocracias concursadas que reforccedila-

ram as simplificaccedilotildees da realidade para fins fiscais pelas linhas de forccedila fixadas pelas classes dominan-

tes na economia e seus representantes poliacuteticos no Parlamento

Garcia Munhoz natildeo foi capaz de imaginar que sua indagaccedilatildeo acabaria sendo respondida mais

tarde por uma ldquolei de responsabilidade fiscalrdquo que institucionalizou o que ele sempre temera ldquoO que

existe eacute um jogo de poder Para quecirc a Reforma Fiscal Afetou-me muito saber que haacute uma im-

posiccedilatildeo externa pelo superaacutevit fiscal para o problema da diacutevidardquo (LIMA SOBRINHO 1995)

Cerca de 30 anos depois do mal-estar acusado por Munhoz indicar um sentimento que talvez

parecesse vago o mesmo pano de fundo reapresenta-se em maior escala e intensidade quando ob-

servamos ndash pelo menos aqueles que sabem olhar e ver como lembrava Saramago no Ensaio sobre a

Cegueira - nas telas de LCD as imagens da Praccedila Sintagma em Atenas com dezenas de milhares de

manifestantes gregos rebelados em torno de um Parlamento completamente cercado em indignadas

manifestaccedilotildees de protesto contra as ldquonovas leis de austeridaderdquo

As mesmas que satildeo apresentadas em pacotes fiscais imunizantes das grandes fortunas e rendas

conspiacutecuas de quaisquer sacrifiacutecios

Uma faixa enorme pintava os sentimentos emblemaacuteticos da mobilizaccedilatildeo ateniense Aganaktis-meni Igual agrave carregada cerca de 2400 km dali pelos madrilenhos na Porta do Sol com dizeres seme-

lhantes Los indignados

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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O Imposto sobre as Grandes Fortunas confirma agrave brasileira uma profecia de Ruy Barbosa ldquoAin-

da que a Constituiccedilatildeo que nos fosse dada baixasse do Olimpo feita por matildeo divina se noacutes natildeo

a cumpriacutessemos natildeo valeria nada Natildeo adiantaria nada ter vindo do ceacuteurdquo

Ruy natildeo haveria de saber que o IGF seria corpo de prova da sua profecia realizada noutra eacutepo-

ca em que a melhor resposta aos problemas adviria da reduccedilatildeo dos impostos dos ricos da liberdade

total de capitais desregulados sem tributaccedilatildeo das grandes fortunas em escala global

Um Ruy Barbosa liberal indignado perguntaria ao socioacutelogo Francisco de Oliveira Para quecirc

entatildeo Constituiccedilatildeo Meio perplexo ouviria a irocircnica resposta do socialista para preparar brioches

cuja falta levou os jacobinos a subirem as escadarias do Palaacutecio de Versalhes e mais tarde os bol-

cheviques a ocuparem os salotildees do Palaacutecio de Inverno (DEJOURS 1999) Quais os modos e em que

o passado pode ajudar-nos a construir um modelo tributaacuterio melhor Quando ateacute o mega-investidor

americano Warren Buffet engrossa o coro da maior equidade fiscal considerando que paga muito pou-

co em relaccedilatildeo agrave sua capacidade contributiva (NY TIMES 2012)

Ateacute o Herald Tribune ndash voz da conservadora elite londrina ndash reconhece que o primeiro

ministro conservador David Cameron ao renovar o expediente do rebaixamento dos impostos dos

ricos para enfrentar a crise que estremece as bases da Eurolacircndia a partir de agora teraacute pela frente o

desafio de natildeo ignorar a percepccedilatildeo entre os eleitores de que ldquohaacute austeridade para os mais pobres mas natildeo para os ricosrdquo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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10 OS MOEDEIROS GRANDES E SEUS PRETEXTOS FALSOS

ldquoAliacutequotas muito altas para os mais ricos de 50 70 ou 90 em vez da atual maacutexima de 35rdquo

Piketty-Saez

ldquoA simples loacutegica diz que devemos tributar os ricos e com vigorrdquo

Paul Krugmann

A imunizaccedilatildeo fiscal das grandes fortunas natildeo passa de um vetor eversivo A resultante eacute esse

monstro cruel a desigualdade que no paiacutes dos contrastes foi banalizada sob pretextos falsificados

Poder-se-ia dizer que a couraccedila das grandes fortunas soacute tem valor de pretexto para ainda maior

concentraccedilatildeo da riqueza e de poder obviamente como se tal pretexto pertencesse agrave ordem das

fatalidades

A desigualdade negligenciada eacute obra de seacuteculos na sociedade brasileira Ateacute quando indagaria

o socioacutelogo Chico de Oliveira (SAMPAIO 2010)

Imprevidente portanto que escape da clivagem do pensamento criacutetico no Brasil - por onde

orbitam coberturas midiaacuteticas das rebeliotildees aacuterabes e do desastre ecoloacutegico da economia do carbo-

no do surto terrorista pelo choque das civilizaccedilotildees da monumental crise social da proacutepria sauacutede do

capitalismo e do passivo de um exeacutercito de mais de 75 milhotildees de jovens desempregados ndash somente

o caudilhamento de opiniatildeo financiado e ditado pelo mercado (FIORI 1997) A corrente de opiniotildees

refrataacuterias ao IGF eacute inteiramente ofensiva agraves ideacuteias comungadas em torno da justiccedila tributaacuteria - en-

quanto centro de gravidade iniludiacutevel da piracircmide social brasileira ndash a partir da qual se impulsionaria a

configuraccedilatildeo de um futuro modelo fiscal legiacutetimo que fosse capaz de imputar os princiacutepios constitu-

cionais e eacuteticos ao sistema impositivo nacional

A sua existecircncia constitucional e sua inexistecircncia no ordenamento fiscal brasileiro eacute digna de

figurar entre nossas tiacutepicas curiosidades como o araccedilaacute-amarelo e a jabuticaba

Se Millocircr Fernandes soubesse que o governo anunciou a transferecircncia de R$ 26 bilhotildees para o

insuficiente socorro emergencial do semi-aacuterido nordestino - que viveu em 2012 a pior seca dos uacuteltimos

30 anos afetando 26 milhotildees de pessoas - enquanto o IGF arrecadaria o triplo anualmente do miacutenimo

valor alocado para mitigar o sofrimento sertanejo e aleacutem disso de que os impostos sobre a proprie-

dade se reduziram de 33 do total da carga tributaacuteria para 27 acelerando a regressatildeo que marca

o perfil de tributaccedilatildeo existente no Brasil de que maneira a verve iconoclasta dele reagiria correlacio-

nando agrave siacutendrome foacutebica do novo patriciado afortunado perante o tributo a plebe rude despossuiacuteda

e ressecada do agreste

O breviaacuterio das boas e prosaicas intenccedilotildees referentes aos milagres que as grandes fortunas

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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podem obrar na expansatildeo do mercado de trabalho natildeo se prospecta na alta riqueza sem tributaccedilatildeo

compatiacutevel Natildeo reside nas fortunas grandes mas nos micros e pequenos empresaacuterios o grosso da

geraccedilatildeo dos postos de trabalho (GHANI KERR OrsquoCONNEL 2012) O fundamentalismo tributaacuterio que

sustenta a proficiente imunidade fiscal do IGF supostamente produtiva e industriosa natildeo mais deveria

amparar a incauta credibilidade na sua capacidade panegiacuterica de multiplicar a populaccedilatildeo economica-

mente ativa Ora ainda que os mais ricos fossem extraordinariamente aptos agrave geraccedilatildeo da riqueza e

habiliacutessimos ao apresentar suas performances em magia criacionista de empregos perante o mundo

do trabalho natildeo deveriam deixar de recolher muito mais tributos do que o (natildeo) fizeram pelo menos

nos uacuteltimos 30 anos

Os defensores do 1 muito ricos professam a crenccedila primitiva de que o crescimento econocircmico

eacute uma questatildeo de fervor dogmaacutetico na sua imunidade fiscal

Se repetirem a palavra vaacuterias vezes acompanhada da feacute na blindagem fiscal a economia brasi-

leira sairia do buraco senatildeo amanhatilde jaacute a partir da semana vindoura

Isso depois de mais de duas deacutecadas de hegemonia da ldquoteoria da ofertardquo (supply-side econo-mics) com a diminuiccedilatildeo das cargas fiscais sobre os super-ricos e grandes capitais natildeo se mostrarem

capazes de reverter dramaacuteticas tendecircncias recessivas reincentivando os investimentos ditos produti-

vos exatamente porque simplesmente sempre buscam maximizar o ldquoganho monetaacuteriordquo em lugar do

produto (KEYNES 1974)

O aspecto emblemaacutetico de como se tem dado o processo atual de ldquocriaccedilatildeo de riquezardquo na era

do capitalismo financeiro global pode ser observado com o empresaacuterio e investidor americano Warren

Buffett apelidado de ldquooraacuteculo de Omahardquo que mais enriqueceu em 2013 na ldquomeacutedia de 15 milhotildees de

doacutelares por horardquo segundo a pesquisa Wealth-X feita pelo banco UBS Buffett dispotildee do patrimocircnio

de 60 bilhotildees de doacutelares equivalente agrave soma do PIB da Boliacutevia e Uruguai

A sua ldquogrande fortunardquo aumentou doze bilhotildees de doacutelares apenas em 2013 O proacuteprio oraacuteculo

declarou que os super-ricos ldquowouldnrsquot mind being told to pay more in taxes as well particularly when so many of their fellow citizens are truly sufferingrdquo (CCNEWS 2011) Segundo o estudo ldquoo nuacutemero

de bilionaacuterios em 2013 eacute de 2170 pessoas cujas fortunas cresceram em meacutedia 53 no ano Desde

o iniacutecio da crise econocircmica a fortuna da parcela da populaccedilatildeo considerada bilionaacuteria simplesmente

dobrou e saltou ldquode 31 trilhotildees de doacutelares para 65 trilhotildees doacutelaresrdquo (VEJA 2013) Como se vecirc a

fatura da maior crise global desde o crash de 1929 natildeo foi paga pelas grandes fortunas e mais uma

vez o populacho ldquopagou o patordquo da totalidade do deacutebito Esta operaccedilatildeo de transferecircncia do ocircnus

tributaacuterio costumeiramente vem apresentada sob complexos caacutelculos econocircmicos capitaneados

por agecircncias de classificaccedilatildeo de riscos e departamentos dos principais bancos Estes satildeo os mesmos

personagens com as mesmas proposiccedilotildees e argumentos expendidos pelo menos nos uacuteltimos 40

anos desde o primeiro choque do petroacuteleo em 1973 e a crise da diacutevida externa da periferia capita-

lista em 1982 (THUROW 1970)

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A riqueza no Brasil goza do status da invulnerabilidade fiscal Imagine-se mais um seacuteculo adian-

te sem a regulamentaccedilatildeo do imposto correspondente agraves grandes fortunas que a Carta de 1988 aguar-

da faz 25 anos

Isso significa necessariamente preferir o nada fazer quando tudo estaacute por refazer e a ter de

aceitar a grande fortuna como heranccedila imutaacutevel quando tal situaccedilatildeo natildeo passa de um falso pretexto

a repeticcedilatildeo de mais um privileacutegio aversivo idealizado e concebido desde a Casa Grande

O sistema tributaacuterio eacute um meio de concentraccedilatildeo ou desconcentraccedilatildeo de renda e riqueza o que

depende das caracteriacutesticas de cada paiacutes

A histoacuteria da tributaccedilatildeo brasileira indica uma iacutenfima probabilidade de que a desconcentraccedilatildeo

social da riqueza e renda deflua dos impostos vigentes sobre a propriedade ITR IPTU IPVA e ITCM

O IPTU repousa na debilidade municipal para lograr uma progressividade patrimonial eficiente (Ipea

2009) O ITCM estadual tambeacutem natildeo obteria ecircxito nesse propoacutesito em face do limite superior fixado

dos 8 impeditivo agrave progressividade sem falar nas subavaliaccedilotildees

A ecircnfase quanto agrave propriedade ser decorrente de renda tributada anteriormente com a argu-

mentaccedilatildeo de se envidar esforccedilos na reduccedilatildeo das desigualdades por intermeacutedio do Imposto de Renda

natildeo tem como ser demonstrado no Brasil pela simples falta de base histoacuterica e nenhuma compro-

vaccedilatildeo econocircmica Prova disso eacute que a concentraccedilatildeo fundiaacuteria ainda eacute maior que a da renda social

o que reforccedila a tendecircncia a um processo permanente de enriquecimento geracional da Casa Gran-

de por meio de heranccedilas e rendas reduzidamente tributaacuteveis em relaccedilatildeo aos fabulosos rendimentos

natildeo-tributaacuteveis A histoacuteria brasileira ensina que o Imposto de Renda natildeo funcionou com efetividade

eficiecircncia e eficaacutecia no objetivo de melhorar a equidade Hoje e ontem haacute vaacuterios segmentos sociais

que liacutecita e ilicitamente mantecircm-se distantes da arrecadaccedilatildeo de impostos (OSIacuteRIS 2006) No Brasil

reside uma parcela significativa das famiacutelias com as maiores fortunas no mundo Para dados de 2000

que aumentaram nos uacuteltimos 15 anos cerca dos 25 das famiacutelias mais ricas do mundo satildeo brasileiras

similarmente a Espanha e Canadaacute Os paiacuteses europeus que aboliram o Imposto sobre a Riqueza na

uacuteltima deacutecada como a Aacuteustria Sueacutecia Finlacircndia e Dinamarca - e que satildeo utilizados como referecircncia

oportunista na argumentaccedilatildeo da sua obsolescecircncia fiscal para os super-ricos - somente os revogaram

apoacutes muito perseguirem e estabelecerem uma estrutura social com alto teor de equidade

Apenas aboliram o Imposto sobre a Riqueza recentemente porque em suas respectivas experi-

ecircncias fiscais longevas houvera uma tributaccedilatildeo expressiva sobre a riqueza e as transferecircncias median-

te heranccedilas e doaccedilotildees que tambeacutem foi utilizada intensamente para reduzir as desigualdades

Na Franccedila apesar do bom niacutevel de equidade devido ao tamanho de sua economia o paiacutes con-

segue ter uma arrecadaccedilatildeo eficiente do Imposto sobre a Riqueza (Wealth Tax) O Brasil com elevada desigualdade e PIB relevante tambeacutem teria condiccedilotildees de apresentar um

bom indicador arrecadador para tal imposto O padratildeo de tributaccedilatildeo do Imposto sobre a Riqueza

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pode ser modulado pela adoccedilatildeo de aliacutequota uacutenica e reduccedilatildeo dos limites de isenccedilatildeo e seria leviano

disseminar a ideia que a aboliccedilatildeo desse imposto tornou-se paciacutefica na teoria fiscal e no mundo real A

Holanda por exemplo em 2001 aumentou a arrecadaccedilatildeo do Imposto sobre a Riqueza e o nuacutemero de

seus contribuintes (GLOBO 2003)

Devido agrave crise fiscal e financeira que disseminou a atual Grande Recessatildeo Mundial cuja ori-

gem remonta a 15 de setembro de 2008 com a quebra do Banco de Investimentos norte-americano

Lehman Brothers Islacircndia e Espanha reintroduziram o imposto

O IGF francecircs (Impocirct sur les Grandes Fortunes) foi instituiacutedo na Franccedila em 1981 com efeitos a

partir do exerciacutecio fiscal de 1982 Inicialmente abrangia a propriedade de pessoas fiacutesicas e juriacutedicas

mas em 1984 foi restrito somente ao patrimocircnio das pessoas fiacutesicas

Em 1986 o imposto era pago por apenas 05 das famiacutelias francesas (84700 famiacutelias) e foi en-

tatildeo abolido pelo novo Parlamento conservador

Em 1988 no Brasil ano da promulgaccedilatildeo da Constituiccedilatildeo Cidadatilde o Impocirct Solidariteacute sur la Fortu-ne (ISF) foi reinstituiacutedo pelo novo governo socialista francecircs nos moldes existentes atualmente isen-

tando os ativos previdenciaacuterios e incidindo sobre a riqueza liacutequida excedente a 800 (oitocentos) mil

euros Houve crescimento do nuacutemero de contribuintes e da arrecadaccedilatildeo do ISF entre 1992 e 2010 O

presidente francecircs enfrenta a ira por exemplo de personalidades como o ator Gerard Depardieu que

se mudou para Luxemburgo sob protesto poreacutem Franccedilois Hollande eleito em 2012 enfrenta o contra-

-ataque agrave tributaccedilatildeo dos super-ricos para somar esforccedilos em arrostar os fortes impactos da crise do

capital financeiro global Os contribuintes cresceram de 168 mil para 562 mil famiacutelias e a arrecadaccedilatildeo

foi de um bilhatildeo de euros a 45 bilhotildees (CARVALHO 2011)

A notiacutecia mais recente a propoacutesito dos ldquoMega ndash Richrdquo serem incluiacutedos no rol daqueles que de-

vem pagar mais impostos vem dos proacuteprios teacutecnicos do FMI mediante uma nota obviamente natildeo

reconhecida pela instituiccedilatildeo (KRUGMAN 2014)

No entanto eacute um sinal inconfundiacutevel de que ateacute no proacuteprio FMI haacute questionamentos so-

bre a ficccedilatildeo cientiacutefica de que tributar os mega-ricos faz mal agrave sauacutede das economias (CANADIAN

PRESS 2014)

Longe de atribuir algum pecado original agraves grandes fortunas natildeo eacute demasiado recordar da

literatura francesa dois contos claacutessicos sobre a origem da riqueza O Lrsquoauberge rouge insinua a

existecircncia de uma raiz delinquumlente O Le Pegravere Goriot conclui que ldquoo segredo das grandes fortunas

sem causa aparente consiste num crime esquecido porque perpetrado com limpezardquo O primeiro

encontra-se nos Estudos Filosoacuteficos o segundo nas Cenas da Vida Privada ambos em A Comeacutedia

Humana (BALZAC 1979)

Ao fim desta breve notiacutecia sobre a evoluccedilatildeo da natildeo tributaccedilatildeo das grandes fortunas no Brasil

creio que Platatildeo - natildeo o ateniense mas o principal personagem do romance ldquoA noite da borboleta

douradardquo - admitiria haver aleacutem da provocaccedilatildeo sem dogmatismos algum humor e ironia na tentativa

de colocar a riqueza ao alcance de todos os tributos (ALI 2011)

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EFICIEcircNCIA DA ADMINISTRACcedilAtildeO TRIBUTAacuteRIA E REDUCcedilAtildeO DA POBREZA1

SUMAacuteRIO Introduccedilatildeo 1 Administraccedilatildeo Tributaacuteria 2 Anaacutelise envoltoacuteria de da-dos e o Iacutendice de Malmquist 3 Receita tributaacuteria dos municiacutepios do Cearaacute 4 Anaacutelise da base de dados 5 Anaacutelise dos resultados 6 Eficiecircncia da Administra-ccedilatildeo Tributaacuteria e reduccedilatildeo da pobreza Consideraccedilotildees finais Referecircncias

Flaacutevio Ataliba Flexa Daltro Barreto2

Carlos Eduardo dos Santos Marino3

INTRODUCcedilAtildeO

No Brasil a Constituiccedilatildeo Federal de 1988 promoveu uma reforma tributaacuteria que elevou con-

sideravelmente a importacircncia das receitas proacuteprias para os entes subnacionais A carga tributaacuteria de

estados e municiacutepios entre 1988 e 2010 passou de 66 para 104 do PIB nacional Nos municiacutepios

a receita tributaacuteria de 2010 medida em percentual do PIB eacute quase trecircs vezes superior a registrada em

19884 Eacute provaacutevel que uma parte deste incremento esteja associada a uma maior eficiecircncia das admi-

nistraccedilotildees tributaacuterias municipais

Desde a estabilizaccedilatildeo econocircmica em 1994 discute-se a exaustatildeo no Brasil a necessidade de

reformas tributaacuterias tendo em algumas oportunidades o Governo Central conseguido aprovar pe-

quenas modificaccedilotildees Pouca importacircncia eacute dada a questatildeo da eficiecircncia da administraccedilatildeo tributaacuteria

Ateacute mesmo a Lei de Responsabilidade Fiscal editada em 2000 que produziu inegaacuteveis avanccedilos na

organizaccedilatildeo das financcedilas puacuteblicas nacionais conteve-se a impor limites agrave concessatildeo de incentivos e

benefiacutecios tributaacuterios Na mesma linha o sistema de reparticcedilatildeo de receitas entre os niacuteveis de governo

utilizado no paiacutes natildeo considera a eficiecircncia na arrecadaccedilatildeo como criteacuterio de rateio Assim um estado

ou municiacutepio com baixa arrecadaccedilatildeo tributaacuteria devido agrave ineficiecircncia na exploraccedilatildeo de suas bases tri-

butaacuterias natildeo sofre qualquer sanccedilatildeo no federalismo fiscal brasileiro

A pobreza eacute um fenocircmeno econocircmico persistente ao longo do tempo e para sua superaccedilatildeo eacute

necessaacuteria a adoccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas adequadas Em uacuteltima anaacutelise o niacutevel de pobreza pode ser

reduzido por um aumento da renda ou por uma mudanccedila na sua distribuiccedilatildeo que conduza a reduccedilatildeo

da desigualdade No caso brasileiro existem fortes evidecircncias de que o niacutevel de pobreza eacute bastante

1 Este artigo eacute uma siacutentese de Marino et alii (2013)2 Poacutes-Doutor em Economia (Harvard University) Professor da Universidade Federal do Cearaacute Diretor Geral do Instituto de Pesquisa e Estrateacutegia Econocircmica do Cearaacute (Ipece) E-mail flavioatalibaipececegovbr3 Doutor em Economia (CaenUFC) Professor e Pesquisador do Laboratoacuterio de Estudos da Pobreza (LEPCaenUFC) Au-ditor Fiscal Adjunto da Receita Estadual do Cearaacute E-mail eduardomarinocaenufcbr4 Caacutelculos proacuteprios com dados disponiacuteveis em SRF (2012) e Afonso et alii (1998)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

106

influenciado pelo grau de desigualdade Nesse contexto o sistema tributaacuterio brasileiro contribui para

agravar a situaccedilatildeo devido agrave alta participaccedilatildeo de impostos indiretos e regressivos Com exceccedilatildeo do

imposto de renda e do imposto sobre a propriedade rural ambos de responsabilidade da Uniatildeo os

demais impostos diretos notadamente os tributos sobre o patrimocircnio estatildeo sob a competecircncia tri-

butaacuteria de estados e municiacutepios Com a possibilidade de cobranccedila progressiva desses impostos em

tese os efeitos nocivos na economia resultantes de incrementos da arrecadaccedilatildeo municipal podem ser

suavizados ou ateacute mesmo eliminados no tocante a equidade Sendo os recursos adicionais utilizados

na produccedilatildeo de bens puacuteblicos que afetem positivamente a renda dos mais pobres pelo menos a longo

prazo existe a possibilidade de que os incrementos de eficiecircncia das administraccedilotildees tributaacuterias muni-

cipais estejam associados agrave reduccedilatildeo da pobreza

Este artigo intenciona verificar se o incremento da eficiecircncia na arrecadaccedilatildeo de impostos mu-

nicipais no Cearaacute estaacute associado agrave reduccedilatildeo da pobreza Para atingir este objetivo utiliza-se uma estra-

teacutegia empiacuterica desenvolvida em dois estaacutegios Na primeira fase avalia-se a evoluccedilatildeo do niacutevel da efi-

ciecircncia das administraccedilotildees tributaacuterias municipais no Cearaacute na uacuteltima deacutecada estimando-se fronteiras

de arrecadaccedilatildeo natildeo parameacutetricas por meio da teacutecnica de programaccedilatildeo linear de Anaacutelise Envoltoacuteria de

Dados (DEA) (Charnes et alii 1978 Banker et alli 1984) Computa-se a seguir a variaccedilatildeo da eficiecircncia

teacutecnica pura de cada municiacutepio entre os anos de 2000 e 2010 utilizando-se a decomposiccedilatildeo do Iacutendice

de Malmquist proposta em Faumlre et alii (1994) No segundo estaacutegio utilizando-se miacutenimos quadrados

ordinaacuterios verifica-se qual o efeito do incremento da eficiecircncia teacutecnica pura na proporccedilatildeo de pobres

de cada municiacutepio em 2010 usando caracteriacutesticas do municiacutepio no ano 2000 como variaacuteveis de

controle Ao final conclui-se que o incremento da eficiecircncia teacutecnica eacute significativamente negativo na

proporccedilatildeo de pobres em 2010 encontrando-se evidecircncias que a eficiecircncia teacutecnica da administraccedilatildeo

tributaacuteria estaacute associada agrave reduccedilatildeo da pobreza

Este ensaio estaacute dividido em sete seccedilotildees aleacutem desta introduccedilatildeo Na segunda seccedilatildeo apresen-

ta-se uma revisatildeo da literatura sobre administraccedilatildeo tributaacuteria A terceira seccedilatildeo discute a metodolo-

gia DEA e o Iacutendice de Malmquist Na quarta eacute feita uma anaacutelise exploratoacuteria das receitas tributaacuterias

municipais no Cearaacute identificando-se as rubricas mais relevantes Na quinta eacute feita uma discussatildeo

sobre a base de dados utilizada para estimar as fronteiras de arrecadaccedilatildeo justificando-se as escolhas

realizadas Nessa seccedilatildeo tambeacutem eacute apresentada a metodologia utilizada para a exclusatildeo de municiacutepios

atiacutepicos (outliers) A sexta seccedilatildeo apresenta os escores de eficiecircncia teacutecnica na arrecadaccedilatildeo municipal

obtidos no primeiro estaacutegio de estimaccedilatildeo Na seacutetima parte verifica-se se o incremento na eficiecircncia

arrecadatoacuteria estaacute relacionado com a proporccedilatildeo de pobres no final do periacuteodo analisado discutindo-

-se os resultados obtidos Por fim satildeo tecidas as consideraccedilotildees finais

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

107

1 ADMINISTRACcedilAtildeO TRIBUTAacuteRIA

Mesmo considerando certo grau de altruiacutesmo no comportamento individual natildeo eacute possiacutevel ob-

ter recursos da sociedade de forma espontacircnea para o financiamento da produccedilatildeo de bens puacuteblicos

Como por definiccedilatildeo bens puacuteblicos satildeo natildeo excludentes aqueles que optarem por natildeo contribuiacuterem

com o financiamento natildeo poderatildeo ser excluiacutedos do consumo do bem Dessa forma a obtenccedilatildeo de

recursos financeiros pelo Estado por meio da tributaccedilatildeo eacute em todas as sociedades feita de forma

compulsoacuteria e impositiva sempre existindo algum tipo de sanccedilatildeo aplicada agravequeles indiviacuteduos que natildeo

efetuem o pagamento devido Logo se todo sistema tributaacuterio necessita de elementos coercitivos

surge agrave necessidade de administrar essa sistemaacutetica de coerccedilatildeo Assim se existe o tributo existe uma

entidade para administraacute-lo no sentido de verificar os valores pagos e impor penalidades para os

agentes que natildeo efetuaram o pagamento Em uacuteltima anaacutelise a administraccedilatildeo tributaacuteria eacute a entidade

governamental que tem por missatildeo adotar as poliacuteticas que reduzam a evasatildeo fiscal

Apesar de a evasatildeo fiscal ser um problema que ameaccedila a equidade a eficiecircncia e a sustenta-

bilidade de muitas poliacuteticas puacuteblicas (COWEL 1985) o tema soacute foi analisado na literatura econocircmica

a partir da deacutecada de 1970 O efeito negativo inicial da evasatildeo fiscal eacute reduzir as receitas do governo

correccedilotildees do problema que impliquem aumento da aliacutequota tributaacuteria para aqueles agentes que pa-

gam o tributo geram distorccedilotildees adicionais aleacutem de um incremento da inequidade horizontal Aleacutem

disso a maior diversidade na base tributaacuteria dos agentes em melhor situaccedilatildeo permite maiores possi-

bilidades de evasatildeo prejudicando a equidade vertical Outra ineficiecircncia derivada da evasatildeo fiscal eacute o

desperdiacutecio de recursos aplicados em atividades natildeo produtivas Se existe a evasatildeo5 uma parte dos

agentes aplicaraacute recursos em atividades que visem agrave reduccedilatildeo do tributo surgindo uma tecnologia da

sonegaccedilatildeo Por outro lado os governos aplicam recursos nos mecanismos que possibilitam a arreca-

daccedilatildeo e fiscalizaccedilatildeo do tributo surgindo uma tecnologia da administraccedilatildeo tributaacuteria Uma distorccedilatildeo

adicional menos oacutebvia eacute a geraccedilatildeo de incentivos para que os agentes atuem nas atividades nas quais

a sonegaccedilatildeo eacute mais faacutecil de ser praticada e mais difiacutecil de ser detectada Por uacuteltimo por seu caraacuteter

ilegal a evasatildeo fiscal incentiva e facilita a incidecircncia de outros crimes na sociedade

Inspirando-se em Becker (1968) que discutiu o comportamento criminoso sob a oacutetica econocirc-

mica Allingham e Sandmo (1972) desenvolveram um modelo econocircmico que considera a tributaccedilatildeo

sobre a renda um jogo com informaccedilatildeo assimeacutetrica no qual o contribuinte sabe qual eacute sua renda

5 Os termos evasatildeo fiscal e sonegaccedilatildeo fiscal satildeo sinocircnimos e estatildeo associados a uma atividade iliacutecita do contribuinte do tributo Em outra vertente elisatildeo fiscal (planejamento tributaacuterio) utiliza teacutecnicas legais agraves vezes duvidosas para reduzir a carga tributaacuteria Independentemente de se tratar de evasatildeo ou elisatildeo existe uma tecnologia Note-se que a existecircncia de elevado grau de elisatildeo tambeacutem eacute um indicativo de ineficiecircncia da administraccedilatildeo tributaacuteria que possivelmente opera com uma legislaccedilatildeo duacutebia e com lacunas

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

108

enquanto a administraccedilatildeo tributaacuteria natildeo deteacutem essa informaccedilatildeo Nesse ambiente modelaram a de-

cisatildeo de sonegar de um indiviacuteduo racional avesso ao risco maximizador de sua utilidade esperada

que toma como dados a aliacutequota tributaacuteria a probabilidade de ser auditado e a penalidade aplicaacutevel

no caso de detecccedilatildeo Esse modelo tambeacutem tratava a renda como exoacutegena Note-se que por essa uacutel-

tima hipoacutetese que em termos mais gerais pode ser expressa como exogeneidade da base tributaacuteria

o modelo de Allingham e Sandmo eacute aplicaacutevel a qualquer tributo desde que os demais paracircmetros do

modelo natildeo afetem o valor que deveria servir como base de caacutelculo do tributo

Apesar de restritivo e tratar todas as variaacuteveis sob controle da administraccedilatildeo tributaacuteria como

exoacutegenas o modelo apresenta conclusotildees bastante interessantes algumas esperadas como o fato de

aumentos na probabilidade de ser auditado e na penalidade reduzirem a sonegaccedilatildeo Outros surpre-

endentes como o efeito inconclusivo de variaccedilotildees da aliacutequota tributaacuteria sobre a sonegaccedilatildeo Posterior-

mente uma pequena correccedilatildeo do modelo realizada por Yitzhaki (1974) modificou a forma como a

penalidade eacute definida e concluiu contra intuitivamente que quando se aumenta a aliacutequota reduz-se a

sonegaccedilatildeo

A racionalizaccedilatildeo da decisatildeo de sonegar pelo agente foi estendida em diversas direccedilotildees6 Kolm

(1973) em uma pequena nota referente ao modelo AS foi o primeiro a adaptar o modelo introduzin-

do elementos importantes para a discussatildeo posterior sobre administraccedilatildeo tributaacuteria No seu modelo

simples aproveitando o agente racional maximizador da utilidade esperada Kolm introduziu custos de

auditoria e bens puacuteblicos custeados com a receita tributaacuteria Os primeiros trabalhos que trataram da

tecnologia da tributaccedilatildeo de forma parcial endogeneizavam a probabilidade de auditoria (Reinganum

e Wilde 1985 Border e Sobel 1987 Mookherjee e Png 1989)

Mesmo sem considerar explicitamente qualquer tecnologia utilizada pela administraccedilatildeo tribu-

taacuteria Sandmo (1981) Slemrod e Yitzhaki (1987) demonstraram que o tamanho oacutetimo de uma adminis-

traccedilatildeo tributaacuteria deve ser superior ao definido por um modelo simples de custo-benefiacutecio Determinar

o tamanho da administraccedilatildeo tributaacuteria oacutetima de forma ingecircnua igualando a receita marginal gerada

pela adoccedilatildeo de uma fiscalizaccedilatildeo mais severa e com maior custo ao custo marginal dessa poliacutetica eacute

equivocado Eacute necessaacuterio considerar que a receita marginal eacute apenas uma transferecircncia entre os seto-

res privado e puacuteblico Para determinar o volume de recursos que devem ser aplicados na administra-

ccedilatildeo tributaacuteria o procedimento adequado seria utilizar o benefiacutecio social marginal possivelmente natildeo

mensuraacutevel mas com certeza superior a receita marginal do tributo jaacute que uma parte consideraacutevel da

receita gerada retornaraacute a sociedade na forma de bens puacuteblicos

Kaplow (1990) analisou o relacionamento entre a tributaccedilatildeo oacutetima e a poliacutetica tributaacuteria oacutetima

investigando duas poliacuteticas distintas que buscam o incremento da receita tributaacuteria A primeira seria

6 (Benjamini e Maital 1985 Yitzhaki 1987 Erard e Feinstein 1994 Myles e Naylor 1996 Kim 2003 Cowell e Gordon 1988 Cremer e Gahvari 1994)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

109

aumentar a aliacutequota aplicaacutevel sem qualquer custo adicional enquanto a segunda seria aumentar a efi-

ciecircncia da administraccedilatildeo tributaacuteria incorrendo em custos adicionais Nos modelos analisados pelo au-

tor utilizar recurso para incrementar a eficiecircncia da administraccedilatildeo tributaacuteria poderia ser uma estrateacutegia

oacutetima Mayshar (1991) foi o primeiro a introduzir o termo ldquotecnologia tributaacuteriardquo utilizando em seu

modelo uma funccedilatildeo de produccedilatildeo da administraccedilatildeo tributaacuteria Sanchez e Sobel (1993) caracterizaram a

soluccedilatildeo oacutetima do problema de maximizaccedilatildeo de receita enfrentado pela administraccedilatildeo tributaacuteria Mos-

traram ainda que o orccedilamento da administraccedilatildeo tributaacuteria norte-americana era subdimensionado

Besfamile e Siritto (2009) analisaram os efeitos do investimento na administraccedilatildeo tributaacuteria

concluindo que a possibilidade de investimento permite uma menor frequecircncia das auditorias um

sistema tributaacuterio mais progressivo e um setor puacuteblico mais eficiente

Uma grande literatura empiacuterica sobre evasatildeo fiscal desenvolveu-se desde o modelo inicial de

Allingham e Sandmo (1972) Uma das vertentes tenta mensurar a sonegaccedilatildeo por meacutetodos diretos

ou indiretos em diversas regiotildees e paiacuteses (Tanzi 1983 Nam et alii 2001 Jimeacutenez et alii 2010) Aleacutem

da simples mensuraccedilatildeo da evasatildeo diversos artigos buscaram verificar empiricamente as conclusotildees

relativas ao comportamento individual prescritas nos modelos teoacutericos (Clotfelter 1983 Slemrod

1985 Feinstein 1991 Alm el alii 1993 Erard e Feinstein 2010 Andreoni et alii 1998 Torgler e Sch-

neider 2009)

Um dos problemas metodoloacutegicos com as avaliaccedilotildees empiacutericas citadas anteriormente eacute o fato

do processo de seleccedilatildeo dos agentes auditados natildeo ser puramente estocaacutestico Por mais rudimentar

que seja a tecnologia adotada pela administraccedilatildeo tributaacuteria eacute provaacutevel que exista algum mecanismo

de seleccedilatildeo dos agentes mesmo que esse mecanismo natildeo seja sistematizado Essa caracteriacutestica pode

produzir um vieacutes de seleccedilatildeo comprometendo os resultados obtidos Alguns poucos trabalhos utiliza-

ram experimentos controlados nos quais os agentes foram escolhidos aleatoriamente (Slemrod et alii 2001 Kleven et alii 2011) Por outro lado diversos trabalhos utilizaram a economia comportamental

tentando simular em laboratoacuterios situaccedilotildees que envolvessem a decisatildeo de sonegar um tributo (Frie-

dland et alii 1978 Alm et alii 1992) Uma justificativa para a utilizaccedilatildeo dessa abordagem eacute o grande

nuacutemero de fatores que influenciam a decisatildeo de evadir o tributo tornando o controle economeacutetrico

bastante difiacutecil Alm (2012) elencou uma seacuterie de conclusotildees sobre a decisatildeo de sonegar extraiacutedas da

economia comportamental i) a frequecircncia de auditorias eacute associada negativamente com a sonegaccedilatildeo

ii) os indiviacuteduos em geral superestimam a probabilidade de auditoria iii) auditorias mais produtivas

ou seja com maior possibilidade de detecccedilatildeo impactam negativamente a evasatildeo iv) estrateacutegias de

seleccedilatildeo para a auditoria endoacutegenas satildeo mais eficientes do que regras simplesmente aleatoacuterias v) au-

mento das penalidades provocam pequena reduccedilatildeo na evasatildeo vi) publicidade da sonegaccedilatildeo reduz

a sonegaccedilatildeo vii) a presenccedila de bens puacuteblicos financiados pela tributaccedilatildeo reduz a sonegaccedilatildeo viii) o

processo decisoacuterio para aplicaccedilatildeo dos recursos arrecadados influencia a decisatildeo de sonegar Processos

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

110

mais participativos tendem a reduzir a evasatildeo e ix) arrecadar impostos na fonte impactam negativa-

mente a evasatildeo

Uma questatildeo central foi inicialmente discutida por Slemrod (1990) que criticou a teoria da

tributaccedilatildeo oacutetima (optimal taxation) por ser incompleta e oferecer sugestotildees de poliacuteticas puacuteblicas

inadequadas e em algumas situaccedilotildees inaplicaacuteveis Alicerccedilado no fato de um sistema tributaacuterio ser um

mecanismo coercitivo de arrecadaccedilatildeo de recursos tendo esse sistema tecnologia e custos sugeriu

a inserccedilatildeo desses elementos na anaacutelise denominando essa nova visatildeo de ldquosistema tributaacuterio oacutetimordquo

(optimal tax system) O custo da administraccedilatildeo tributaacuteria natildeo eacute despreziacutevel e existem impostos cujos custos de ad-

ministraccedilatildeo satildeo mais onerosos Aleacutem disso existem diferenccedilas significativas nas tecnologias adota-

das pelas administraccedilotildees tributaacuterias Tecnologias diferentes aplicadas em um uacutenico sistema tributaacuterio

podem conduzir a situaccedilotildees distintas de eficiecircncia e equidade Diante desses fatos Slemrod (1990)

sugere que a teoria da tributaccedilatildeo oacutetima mude seu foco da estrutura de preferecircncias dos indiviacuteduos

para a tecnologia da administraccedilatildeo tributaacuteria Argumenta em favor dessa ideia que as preferecircncias

satildeo razoavelmente estaacuteveis ao longo do tempo mas a tecnologia eacute por natureza dinacircmica Logo um

sistema tributaacuterio oacutetimo haacute dez anos possivelmente natildeo o seraacute no presente

Reforccedilando essa tese os avanccedilos em tecnologia da informaccedilatildeo tornaram em algumas situa-

ccedilotildees a probabilidade de detecccedilatildeo de uma informaccedilatildeo fornecida errada pelo agente agrave administraccedilatildeo

tributaacuteria bastante proacutexima de 100 Outro exemplo eacute a comparaccedilatildeo entre um imposto sobre o valor

adicionado com aliacutequota uniforme e um imposto sobre o consumo Sem a inclusatildeo da evasatildeo fiscal os

dois tributos satildeo instrumentos idecircnticos inclusive contabilmente Ao introduzir a evasatildeo fiscal os cus-

tos e tecnologia da administraccedilatildeo tributaacuteria os dois impostos distanciam-se fortemente (SLEMROD

2007) Ressalte-se ainda que o resultado claacutessico de irrelevacircncia do agente ao qual seraacute atribuiacuteda a

responsabilidade pelo pagamento do imposto natildeo eacute vaacutelido em um ambiente com evasatildeo fiscal

Aleacutem dessa argumentaccedilatildeo eacute possiacutevel arguir a dificuldade do processo poliacutetico principalmente

em paiacuteses federalistas No Brasil a experiecircncia de amplas reformas tributaacuterias inexiste em periacuteodos de-

mocraacuteticos As reformas tributaacuterias de 1934 1965 e 1988 foram realizadas em momentos de transiccedilatildeo

quando se entrava ou saia de um regime autoritaacuterio Por outro lado ganhos de eficiecircncia nas adminis-

traccedilotildees tributaacuterias em geral natildeo encontram oposiccedilatildeo social ou poliacutetica pelo menos claramente

Uma questatildeo crucial para as administraccedilotildees tributaacuterias eacute seu grau de independecircncia Por sua

natureza coercitiva estatildeo sujeitas a grandes pressotildees poliacuteticas e econocircmicas Logo a profissionaliza-

ccedilatildeo de seus agentes e a total independecircncia na aplicaccedilatildeo das normas originadas do poder poliacutetico eacute

essencial para se obter administraccedilotildees tributaacuterias eficientes Mann (2004) descreve e analisa as expe-

riecircncias de vaacuterios paiacuteses em desenvolvimento que adotaram administraccedilotildees tributaacuterias semi-autocircno-

mas com alto grau de autonomia para gerenciamento de seus sistemas internos Concluiu que uma

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

111

administraccedilatildeo tributaacuteria autocircnoma eacute uma plataforma a partir da qual a eficiecircncia pode ser gerada

entretanto seu simples estabelecimento natildeo eacute garantia de sucesso Taliercio (2004) argumentou que a

poliacutetica de estabelecimento de administraccedilotildees tributaacuterias semi-autocircnomas iniciada nos anos oitenta

do seacuteculo passado jaacute atingia mais de quinze paiacuteses Aleacutem da simples separaccedilatildeo e autonomia do Minis-

teacuterio das Financcedilas ou equivalente a criaccedilatildeo de uma administraccedilatildeo tributaacuteria semi-autocircnoma apresenta

as seguintes caracteriacutesticas i) mecanismo de auto-financiamento ii) direccedilatildeo profissional e qualificada

com representaccedilatildeo do setor privado e iii) poliacutetica de recursos humanos proacutepria Apesar de reco-

mendada pelos organismos internacionais a administraccedilatildeo tributaacuteria semi-autocircnoma foi inicialmente

testada nos paiacuteses em desenvolvimento Na amostra pesquisada o autor encontrou evidecircncias que a

autonomia da administraccedilatildeo tributaacuteria gera eficiecircncia e quanto mais autonomia maior a eficiecircncia

2 ANAacuteLISE ENVOLTOacuteRIA DE DADOS E O IacuteNDICE DE MALMQUIST

A literatura empiacuterica de avaliaccedilatildeo de eficiecircncia teacutecnica utiliza em geral duas metodologias dis-

tintas A primeira eacute a estimaccedilatildeo por meacutetodos economeacutetricos da fronteira de possibilidade de produ-

ccedilatildeo Essa teacutecnica eacute denominada de Fronteira Estocaacutestica Outra possibilidade eacute utilizar a teacutecnica de pro-

gramaccedilatildeo linear de Anaacutelise Envoltoacuteria de Dados (DEA)7 Uma das vantagens do uso da metodologia

DEA eacute natildeo ser necessaacuterio definir qualquer forma para a funccedilatildeo de produccedilatildeo Em essecircncia DEA eacute uma

metodologia comparativa que exige apenas um pequeno nuacutemero de condiccedilotildees para obter resultados

robustos Teacutecnicas parameacutetricas exigem o conhecimento da funccedilatildeo de produccedilatildeo que necessariamente

deve ser a mesma para todas as unidades de decisatildeo A teacutecnica DEA requer apenas o conhecimento

dos insumos e produtos do processo sendo a fronteira resultante apenas uma aproximaccedilatildeo linear que

envolve da forma mais ajustada possiacutevel os dados

Em um ambiente de produccedilatildeo com apenas um insumo e um produto uma medida evidente de

eficiecircncia eacute a razatildeo entre a quantidade produzida e quantidade de insumos utilizados Numa situaccedilatildeo

com muacuteltiplos insumos e produtos pode-se continuar a mensurar a eficiecircncia pela razatildeo produto-in-

sumo desde que se utilizem pesos especiacuteficos para cada insumo e produto ou seja a eficiecircncia teacutecnica

de uma DMU pode ser expressa como

xvyu

xvxvyuyu

kk

mm

11

11 =++++

=θ (1)

onde mm Ruuu +isin= )( 1 e k

k Rvvv +isin= )( 1 satildeo vetores de pesos natildeo negativos

A metodologia DEA utiliza programaccedilatildeo linear de forma a definir o vetor de pesos u e v que

maximize a eficiecircncia θ da DMU impondo a restriccedilatildeo que a aplicaccedilatildeo dos pesos oacutetimos em todas

7 Bowlin (1998) apresenta uma comparaccedilatildeo entre as metodologias DEA e de anaacutelise de regressatildeo mostrando as vantagens e desvantagens de cada meacutetodo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

112

as unidades produtivas deve ser menor ou igual a um O primeiro modelo DEA foi desenvolvido por

Charnes et alii (1978) que utilizou o conceito de eficiecircncia do trabalho pioneiro de Farrel (1957) O

modelo proposto eacute conhecido na literatura por CCR e tem por hipoacutetese uma tecnologia com retornos

constantes de escala

O modelo CCR original era orientado aos insumos No sentido que a eficiecircncia teacutecnica com-

putada indicava a reduccedilatildeo proporcional dos insumos para que a DMU seja eficiente produzindo a

mesma quantidade de produtos A eficiecircncia teacutecnica no modelo orientado ao produto mensura o

aumento proporcional dos produtos para que a DMU seja eficiente utilizando a mesma quantidade de

insumos As fronteiras de produccedilatildeo e a eficiecircncia teacutecnica satildeo idecircnticas independentemente da orien-

taccedilatildeo adotada

Banker et alii (1984) fizeram uma extensatildeo do modelo CCR admitindo retornos variaacuteveis de es-

cala Esse modelo eacute denominado na literatura de BCC Em situaccedilotildees nas quais existe grande variaccedilatildeo

no tamanho de cada unidade produtiva eacute possiacutevel que algumas natildeo estejam operando em situaccedilotildees

oacutetimas de escala No caso especiacutefico deste artigo o componente poliacutetico presente na organizaccedilatildeo

espacial dos municiacutepios no Brasil deve causar em algumas situaccedilotildees ineficiecircncias de escala

Intuitivamente a metodologia DEA estima a fronteira de produccedilatildeo mais proacutexima possiacutevel dos

dados envelopando ou envolvendo os dados diante das suposiccedilotildees do modelo adotado O modelo

BCC envelopa os dados de uma maneira mais ldquoapertadardquo Para isso tem que considerar mais unidades

produtivas eficientes ou seja operando na fronteira de produccedilatildeo Por uacuteltimo merece registro que a

eficiecircncia teacutecnica no modelo CCR pode ser decomposta no produto da eficiecircncia teacutecnica no modelo

BCC e da eficiecircncia de escala

O iacutendice de variaccedilatildeo da produtividade de Malmquist foi proposto por Caves et alii (1982) que

definiram o iacutendice como razatildeo de funccedilotildees distacircncias noccedilatildeo introduzida por Malmquist (1953) As

funccedilotildees distacircncia representam uma tecnologia com muacuteltiplos insumos e produtos necessitando para

tanto apenas das quantidades utilizadas e produzidas O iacutendice pode ser decomposto em variaccedilotildees de

eficiecircncia (catching up) e variaccedilotildees na tecnologia Uma observaccedilatildeo relevante eacute que a funccedilatildeo distacircncia

eacute idecircntica a medida de eficiecircncia utilizada na literatura de estimaccedilatildeo natildeo parameacutetrica de fronteiras de

produccedilatildeo por anaacutelise envoltoacuteria de dados (DEA)

O Iacutendice de Malmquist pode ser decomposto em duas partes sendo a primeira a mudanccedila

na eficiecircncia teacutecnica (MET) da unidade produtiva e a segunda o avanccedilo (ou retrocesso) tecnoloacutegico

(MTEC) que deslocou a fronteira de possibilidades de produccedilatildeo

MTECMETM 0 = O iacutendice de Malmquist pode ser computado para qualquer tipo de tecnologia Neste artigo

optou-se por calcular o iacutendice considerando-se inicialmente retornos constantes de escala Em

seguida calcula-se a mudanccedila na eficiecircncia das unidades produtivas assumindo retornos variaacuteveis

(2)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

113

de escala gerando um componente denominado na literatura de variaccedilatildeo de eficiecircncia teacutecnica ldquopurardquo (METp) Considerando que a razatildeo entre as eficiecircncias teacutecnicas computadas por retornos constantes e retornos variaacuteveis de escala resulta numa medida denominada de eficiecircncia de escala pode-se gerar uma a variaccedilatildeo na eficiecircncia de escala (MESC) Assim eacute possiacutevel decompor (2) da seguinte forma

MTECMESCMETpM 0 =

3 RECEITA TRIBUTAacuteRIA DOS MUNICIacutePIOS DO CEARAacute

A Tabela 1 mostra as participaccedilotildees dos itens de receita nas receitas correntes dos municiacutepios

do Cearaacute8 Exibe tambeacutem o valor por habitante de cada rubrica Uma anaacutelise da tabela permite veri-

ficar que o grau de dependecircncia dos municiacutepios com respeito agraves transferecircncias da Uniatildeo e do Estado

do Cearaacute eacute bastante elevado tanto no iniacutecio do periacuteodo (78) como no final (79) As taxas foram o

uacutenico item de receita que apresentou decrescimento real no periacuteodo justificado pela declaraccedilatildeo de

inconstitucionalidade da taxa de iluminaccedilatildeo puacuteblica Percebe-se tambeacutem que o IPTU apresentou a

menor taxa de crescimento inferior inclusive ao crescimento do PIB no periacuteodo

O resultado da arrecadaccedilatildeo do IPTU surpreende devido ao crescimento do niacutevel de urbanizaccedilatildeo

no periacuteodo bem como aos investimentos do Governo Federal em habitaccedilatildeo no final da deacutecada Esse

resultado para os municiacutepios cearenses vai de encontro agraves experiecircncias internacionais nas quais o

processo de descentralizaccedilatildeo fiscal eacute acompanhado do aumento de importacircncia dos impostos sobre

a propriedade (Bird e Zolt 2008 Bahl e Martinez-Vazquez 2007)

8 A base de dados de financcedilas municipais utilizada neste trabalho eacute a disponibilizada pela Secretaria do Tesouro Nacional (STN) por meio do Sistema Financcedilas do Brasil (Finbra) relativa ao periacuteodo de 2000 a 2010 A cobertura da base dados eacute quase integral Nos dois extremos que satildeo usados para a avaliaccedilatildeo empiacuterica faltam apenas os dados contaacutebeis de Varjota municiacutepio com 17593 habitantes menos de 022 da populaccedilatildeo do Cearaacute

Tabela 1 - Municiacutepios do Cearaacute Receita Corrente por itens selecionados (2000 e 2010)

(3)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

114

O baixo crescimento do IPTU indica possivelmente uma opccedilatildeo poliacutetica dos governantes locais

de natildeo intensificarem a cobranccedila desse imposto Essa opccedilatildeo contribui para a manutenccedilatildeo dos altos

iacutendices de desigualdade no Brasil jaacute que natildeo existe impedimento constitucional ou legal para o IPTU

ser utilizado de forma progressiva Desde a CF88 o imposto pode ter suas aliacutequotas progressivas ao

longo do tempo se a propriedade eacute subutilizada ou natildeo utilizada Em 2000 a Emenda Constitucional

29 permitiu a progressividade do IPTU com respeito ao valor do imoacutevel e ainda possibilitou a diferen-

ciaccedilatildeo de aliacutequotas considerando o uso e a localizaccedilatildeo9

Uma das razotildees para o pequeno crescimento do IPTU pode ser a rejeiccedilatildeo social presente nos

impostos diretos que acabam sendo completamente visiacuteveis para a populaccedilatildeo Aleacutem disso os deten-

tores de maior patrimocircnio e sujeitos a maior incidecircncia dos impostos sobre o patrimocircnio em geral

deteacutem tambeacutem o poder poliacutetico local principalmente em unidades geograacuteficas de meacutedia e pequena

populaccedilatildeo (Bahl e Martinez-Vazquez 2007)

Em 2000 trinta municiacutepios natildeo efetuaram a arrecadaccedilatildeo do IPTU enquanto em 2010 apenas

um municiacutepio deixou de cobrar o imposto Com relaccedilatildeo ao outro imposto sobre o patrimocircnio ITBI

dezoito municiacutepios natildeo o cobraram em 2000 e apenas quatro natildeo efetuaram a cobranccedila em 2010 Essa

falta de cobranccedila do imposto natildeo eacute observada no ISSQN que eacute arrecadado por todos os municiacutepios

nos dois anos

O Graacutefico 1 mostra a evoluccedilatildeo dos trecircs principais impostos municipais durante a deacutecada Ob-

serva-se que o crescimento do ITBI e do ISSQN natildeo foi constante em todo periacuteodo havendo um niacutetido

incremento desses impostos a partir 2004 Como jaacute constatado o IPTU avanccedila bem mais lentamente

que os demais tributos No caso do ISSQN o incremento pode ser derivado da ediccedilatildeo da Lei Comple-

mentar Federal 1162003 que entre outros toacutepicos redefiniu a lista de serviccedilos sujeitas ao imposto

9 A Suacutemula do STF nordm 668 de 24092003 declarou inconstitucional as leis municipais anteriores agrave EC 292000 que pre-viam aliacutequotas progressivas do IPTU

Graacutefico 1 ndash Municiacutepios do Cearaacute IPTU ISSQN e ITBI ndash (2000 ndash 2010) (Base 2000 =100)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

115

O Graacutefico 2 exibe a receita tributaacuteria por habitante estratificando os dados por mesorregiatildeo

para os anos de 2000 e 2010 Percebe-se a grande diferenccedila entre Fortaleza e as demais regiotildees For-

taleza em 2010 possui receita tributaacuteria per capita de R$ 280 contra uma meacutedia de R$ 56 no interior

do EstadoGraacutefico 2 ndash Municiacutepios do Cearaacute Receita Tributaacuteria

por Habitante (2000 e 2010)

4 ANAacuteLISE DA BASE DE DADOS

Esta seccedilatildeo apresenta justificativas para a definiccedilatildeo dos insumos e produtos da funccedilatildeo de pro-

duccedilatildeo das administraccedilotildees tributaacuterias Note-se que a avaliaccedilatildeo das administraccedilotildees tributaacuterias efetuada

neste artigo confunde-se com a noccedilatildeo de esforccedilo tributaacuterio De fato a atividade tributaacuteria eacute segmen-

tada em duas fases Na primeira define-se uma poliacutetica tributaacuteria na qual satildeo definidas bases tributaacute-

rias aliacutequotas multas e isenccedilotildees Em geral essa fase eacute de responsabilidade do poder poliacutetico executivo

e legislativo que editam as normas legais necessaacuterias Apoacutes essa definiccedilatildeo a administraccedilatildeo tributaacuteria

por meio de atividades de arrecadaccedilatildeo e fiscalizaccedilatildeo transforma os elementos definidores do tributo

base tributaacuteria aliacutequota isenccedilotildees e penalidades em receita efetiva

O passo inicial para a estimaccedilatildeo de uma fronteira de produccedilatildeo pela metodologia DEA eacute definir

quais os insumos e produtos utilizados no processo produtivo No caso das administraccedilotildees tributaacuterias

o produto eacute o montante de recursos arrecadados Este artigo utilizaraacute as receitas provenientes dos

impostos IPTU ISSQN e ITBI A arrecadaccedilatildeo relativa agrave contribuiccedilatildeo de melhoria natildeo eacute avaliada haja

vista praticamente natildeo ser utilizada no Cearaacute A contribuiccedilatildeo econocircmica de iluminaccedilatildeo puacuteblica (an-

teriormente taxa) natildeo eacute utilizada por dois motivos O primeiro eacute a incompatibilidade de classificaccedilatildeo

da receita entre os dados contaacutebeis de 2000 e 2010 Segundo a contribuiccedilatildeo se instituiacuteda pelo poder

municipal eacute cobrada pela concessionaacuteria distribuidora de energia eleacutetrica na proacutepria conta Logo o

papel da administraccedilatildeo tributaacuteria resume-se a instituir por lei a contribuiccedilatildeo As contribuiccedilotildees sociais

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

116

e o imposto de renda retido na fonte tambeacutem natildeo satildeo avaliados considerando que essas fontes de

receita estatildeo quase integralmente associadas a despesas com pessoal em tese natildeo existindo esforccedilo

algum da administraccedilatildeo tributaacuteria na cobranccedila Aleacutem disso a possibilidade de evasatildeo ou natildeo cobranccedila

pelo municiacutepio eacute miacutenima Receitas patrimoniais embora relevantes financeiramente natildeo satildeo geridas

pelas administraccedilotildees tributaacuterias

A funccedilatildeo de produccedilatildeo da administraccedilatildeo tributaacuteria tem como insumos as bases tributaacuterias de

cada imposto10 Caso as bases fossem plenamente conhecidas natildeo seria necessaacuteria a utilizaccedilatildeo de

qualquer teacutecnica especial para mensuraccedilatildeo da eficiecircncia que poderia ser apurada contabilmente en-

tretanto natildeo existem estatiacutesticas que reflitam plenamente as bases tributaacuterias Dessa forma os traba-

lhos empiacutericos buscam aproximaccedilotildees das bases entre as diversas estatiacutesticas disponiacuteveis

No caso do IPTU11 a base tributaacuteria natural eacute o valor real total dos imoacuteveis localizados em aacuterea

urbana Evidentemente a renda corrente dos proprietaacuterios eacute relevante para a arrecadaccedilatildeo embora

natildeo componha propriamente a base tributaacuteria Quanto ao ITBI a base tributaacuteria eacute o valor da operaccedilatildeo

onerosa de transmissatildeo de bens imoacuteveis ldquointer vivosrdquo Por uacuteltimo tem-se que a base tributaacuteria do ISSQN eacute o valor das prestaccedilotildees de serviccedilos compre-

endidos em listas estabelecidas na legislaccedilatildeo12 Em regra geral o imposto eacute devido ao municiacutepio no

qual se localiza o prestador de serviccedilo entretanto a legislaccedilatildeo atual elenca vinte e duas exceccedilotildees nas

quais o ISSQN eacute devido ao municiacutepio no qual o serviccedilo eacute prestado

Pelas bases tributaacuterias indicadas anteriormente e pela inexistecircncia de estatiacutesticas dessas bases a

renda dos residentes ou o produto interno satildeo potenciais candidatos a servirem de variaacutevel proxy IPTU

e ITBI estatildeo plenamente associados geograficamente ao municiacutepio independentemente do domiciacutelio

do contribuinte Assim julga-se que a adoccedilatildeo do produto interno como proxy da base tributaacuteria eacute

preferiacutevel Para o ISSQN pode-se justificar a opccedilatildeo pelo produto devido agrave disponibilidade de dados

relativos ao valor agregado setorial de serviccedilos13

Diversos trabalhos buscaram medir o esforccedilo tributaacuterio das entidades subnacionais brasileiras

Uma abordagem bastante utilizada eacute medir a eficiecircncia como a razatildeo entre a arrecadaccedilatildeo efetiva e

10 O ideal seria incluir tambeacutem aliacutequotas multas e isenccedilotildees mas para um nuacutemero significativo de municiacutepios isso natildeo eacute possiacutevel Desta forma ao mensurar a eficiecircncia da administraccedilatildeo tributaacuteria utilizando apenas a base tributaacuteria a avaliaccedilatildeo recai tambeacutem sobre a atuaccedilatildeo do poder poliacutetico responsaacutevel pela definiccedilatildeo dos demais elementos definidores do tributo Outra ressalva importante eacute que natildeo se trabalha nesta anaacutelise com os elementos caracteriacutesticos de tributaccedilatildeo oacutetima ou seja o governo natildeo busca maximizar uma funccedilatildeo de bem-estar social ou a utilidade de um agente representativo Logo poliacuteticas de reduccedilatildeo voluntaacuteria da carga tributaacuteria satildeo consideradas como ineficiecircncia11 Carvalho Jr (2012) apresentando proposta de mudanccedila do IPTU do municiacutepio do Rio de Janeiro efetuou uma revisatildeo da literatura econocircmica de impostos sobre imoacuteveis e verificou que mesmo em grandes municiacutepios do Nordeste o IPTU eacute arrecadado em menor intensidade do que na Regiatildeo Sudeste12 Atualmente a lista serviccedilos sujeitos ao ISSQN estaacute estabelecida na Lei Complementar nordm 1162003 Anteriormente o Decreto-lei nordm 4061968 previa os serviccedilos nos quais o imposto incidia13 No Produto Interno Bruto (PIB) Municipal disponibilizado pelo IBGE uma das desagregaccedilotildees apresentadas eacute o valor adicionado pelas atividades de serviccedilos Ressaltando-se que nessas atividades estatildeo incluiacutedos o produto do setor puacuteblico e a atividade comercial sujeita ao ICMS e natildeo ao ISSQN Quanto ao setor puacuteblico eacute possiacutevel a separaccedilatildeo utilizando dados do proacuteprio IBGE Quanto agrave atividade comercial apesar de natildeo ser viaacutevel a separaccedilatildeo atividades comerciais devem estar associadas tambeacutem a diversos serviccedilos sujeitos ao ISSQN como representaccedilatildeo comercial e hotelaria

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

117

a arrecadaccedilatildeo estimada por anaacutelise de regressatildeo14 na qual se consideram algumas variaacuteveis como

determinantes da arrecadaccedilatildeo Nesse caso a estimativa de eficiecircncia eacute uma meacutedia condicionada agraves

variaacuteveis independentes do modelo adotado Outra metodologia eacute a estimaccedilatildeo de fronteiras estocaacutes-

ticas de arrecadaccedilatildeo inicialmente aplicada por Reis e Blanco (1996) Estimada a fronteira eacute possiacutevel

construir os escores de eficiecircncia Em trabalhos mais recentes15 iniciou-se a utilizaccedilatildeo da teacutecnica DEA

para a estimaccedilatildeo da fronteira de arrecadaccedilatildeo

Ante o exposto anteriormente optou-se por utilizar apenas o valor adicionado setorial do PIB

como proxy da base tributaacuteria do IPTU ITBI e ISQN Em tese todos os setores econocircmicos poderiam

ser utilizados Os imoacuteveis rurais por exemplo estatildeo sujeitos ao ITBI assim o valor adicionado do setor

primaacuterio poderia ser um insumo Por outro lado o valor adicionado do setor puacuteblico tambeacutem poderia

capturar informaccedilotildees relevantes Como a metodologia DEA eacute eminentemente comparativa a inclusatildeo

de insumos e produtos pode gerar problemas de dimensionalidade aumentando o quantitativo de

unidades eficientes Desta forma utiliza-se apenas o valor adicionado do setor industrial e de serviccedilos

excluindo-se do uacuteltimo o valor relativo ao setor puacuteblico Espera-se que o niacutevel de urbanizaccedilatildeo do mu-

niciacutepio seja capturado pela dimensatildeo do valor adicionado desses dois setores16 A Tabela 2 sintetiza

insumos e produtos utilizados

14 Vasconcelos e Piancastelli (2005) e Carvalho Jr (2006) utilizaram metodologias similares para arrecadaccedilatildeo estadual e municipal respectivamente15 Gasparini e Melo (2004) Souza Juacutenior e Gasparini (2006) Arauacutejo (2007) Gasparini e Miranda (2011) e Sousa et alii (2012)16 A incidecircncia da informalidade eacute mais presente no setor agriacutecola logo entes tributaacuterios com grande participaccedilatildeo do setor agriacutecola devem ter mais dificuldade para arrecadar impostos Alm et alii (2004) apresentam uma breve revisatildeo da literatura que identifica os tipos de indiviacuteduos mais difiacuteceis de tributar na nomenclatura dos autores hard-to-tax17 Wilson (1993) Simar (2003) e Cazals et alii (2002)

Tabela 2 Insumos e Produtos da Arrecadaccedilatildeo Municipal

Ainda sobre a base de dados eacute importante ressaltar que a metodologia DEA eacute bastante sen-

siacutevel a observaccedilotildees atiacutepicas17 Desta forma eacute necessaacuterio identificar eventuais outliers e excluiacute-los da

amostra

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

118

Como a teacutecnica DEA eacute efetivamente comparativa mesmo sem erros de medida unidades com

valores de insumos e produtos muito distantes do restante das observaccedilotildees acabam sendo conside-

radas eficientes tornando a distribuiccedilatildeo dos escores de eficiecircncia extremamente assimeacutetrica atribuin-

do-se iacutendices muito baixos a uma grande quantidade de unidades

Os tratamentos para este problema satildeo diversos na literatura passando da simples omissatildeo ateacute

teacutecnicas robustas mais sofisticadas que envolvem bootstrap e jackknife (Sousa e Stošić 2005) Neste

ensaio inicialmente satildeo excluiacutedos os municiacutepios que em pelo menos um dos dois exerciacutecios (2000 e

2010) natildeo efetuaram a arrecadaccedilatildeo de todos os tributos analisados A justificativa para esse procedi-

mento eacute baseada no fato de que administraccedilotildees tributaacuterias que natildeo instituiacuteram e cobraram um dos

impostos utilizam tecnologia tatildeo rudimentar que natildeo satildeo passiacuteveis de avaliaccedilatildeo Em seguida excluem-

-se as observaccedilotildees com valores discrepantes em todo o conjunto de insumos e produtos Aleacutem disso

foram excluiacutedas as observaccedilotildees com valores atiacutepicos na razatildeo do somatoacuterio dos tributos analisados

(ISSQN ITBI e IPTU) e o valor do PIB municipal O objetivo deste passo eacute identificar erros nos dados de

financcedilas puacuteblicas em 2000 e 2010

Os pontos extremos contaminam a meacutedia e variacircncia da distribuiccedilatildeo Desta forma eacute convenien-

te adotar um criteacuterio de seleccedilatildeo de outliers robusto com respeito a pontos discrepantes Neste artigo

utiliza-se teacutecnica de boxplot18 O Quadro I a seguir mostra o quantitativo de municiacutepios excluiacutedos da

anaacutelise segundo os criteacuterios adotados Apoacutes as exclusotildees dos 184 municiacutepios cearenses satildeo avaliados

86 municiacutepios19

18 Consideraram-se outliers e foram excluiacutedas da amostra as observaccedilotildees cujos valores de uma ou mais variaacuteveis encon-travam-se a mais de uma vez a distacircncia interquartil (L = Q3ndashQ1) Nesta fase objetivando tornar a distribuiccedilatildeo das seacuteries mais simeacutetricas tomaram-se as variaacuteveis em logaritmos naturais Para uma descriccedilatildeo detalhada do meacutetodo ver Fonseca (2011) 19 Apesar da taxa aparentemente elevada de exclusatildeo a insipiecircncia das administraccedilotildees tributaacuterias municipais no iniacutecio dos anos 2000 justifica a abordagem adotada

Quadro I - Observaccedilotildees Atiacutepicas

5 ANAacuteLISE DOS RESULTADOS

As figuras 1 e 2 mostram a distribuiccedilatildeo de frequumlecircncia dos escores de eficiecircncia teacutecnica com

retornos variaacuteveis de escala em 2000 e 2010 Em 2000 a teacutecnica DEA considerou eficiente na arreca-

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

119

Figura 1 - Distribuiccedilatildeo dos Escores de Eficiecircncia - 2000

Figura 2 - Distribuiccedilatildeo dos Escores de Eficiecircncia - 2010

daccedilatildeo de impostos quatorze municiacutepios 16 da amostra resultado similar ocorreu em 2010 quando

treze municiacutepios 15 da amostra foi eficiente Em 2010 uma concentraccedilatildeo relevante de municiacutepios

tem escore de eficiecircncia nas proximidades de 050

A Tabela 3 mostra as estatiacutesticas descritivas dos escores de eficiecircncia nos dois exerciacutecios Ressal-

te-se que natildeo se devem fazer inferecircncias sobre as variaccedilotildees da eficiecircncia teacutecnica entre os dois exerciacute-

cios Os iacutendices computados satildeo eminentemente comparativos logo dependem do desempenho das

outras unidades ou seja menor meacutedia na eficiecircncia teacutecnica em 2010 em relaccedilatildeo a 2000 natildeo significa

que em meacutedia as unidades tenham piorado mas sim que aumentou a distacircncia meacutedia entre a arre-

cadaccedilatildeo efetiva e a arrecadaccedilatildeo potencial determinada pelas unidades eficientes que natildeo necessaria-

mente satildeo as mesmas nos dois exerciacutecios

Para avaliar a evoluccedilatildeo da tecnologia tributaacuteria e do desempenho dos municiacutepios no periacuteodo

analisado eacute utilizado o Iacutendice de Malmquist Esse iacutendice mede a variaccedilatildeo da produtividade total dos

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

120

Tabela 3 - Estatiacutesticas Descritivas dos Escores de Eficiecircncia

Tabela 4 - Meacutedia dos Iacutendices de Malmquist e seus Componentes

Apesar do acentuado aumento na produtividade total percebe-se que esse incremento eacute deri-

vado em maior parte do deslocamento da fronteira de arrecadaccedilatildeo e de ganhos de escala Em meacutedia a

eficiecircncia teacutecnica pura eacute inferior a unidade contribuindo assim para a reduccedilatildeo da produtividade total

A teacutecnica DEA permite ainda estimar o deacuteficit de arrecadaccedilatildeo de cada unidade avaliada Pela

definiccedilatildeo municiacutepios eficientes com escore de eficiecircncia igual agrave unidade encontram-se sobre a fron-

teira de arrecadaccedilatildeo natildeo registrando portanto deacuteficit A Tabela 5 mostra o incremento percentual

possiacutevel na arrecadaccedilatildeo dos trecircs impostos dos municiacutepios avaliados Percebe-se que em 2010 as

possibilidades de incremento satildeo mais acentuadas nos trecircs tributos De qualquer forma fica evidente

a possibilidade de obtenccedilatildeo de receitas adicionais significativas

fatores e eacute computado para cada municiacutepio Como visto anteriormente em (3) o Iacutendice de Malm-

quist pode ser decomposto em mudanccedilas derivadas do progresso tecnoloacutegico (deslocamento da

fronteira de arrecadaccedilatildeo) da eficiecircncia de escala e da eficiecircncia teacutecnica pura Em meacutedia o Iacutendice de

Malmquist registrou um incremento de produtividade no periacuteodo de 78 taxa equivalente a qua-

se 6 ao ano As meacutedias simples e ponderadas pela populaccedilatildeo do Iacutendice e seus componentes satildeo

apresentadas na Tabela 4

Tabela 5 - Cearaacute - Incrementos Potenciais na Arrecadaccedilatildeo Municipal - 2000 e 2010

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

121

6 EFICIEcircNCIA DA ADMINISTRACcedilAtildeO TRIBUTAacuteRIA E REDUCcedilAtildeO DA POBREZA

A literatura econocircmica indica que dois mecanismos natildeo excludentes satildeo responsaacuteveis pela re-

duccedilatildeo da pobreza o crescimento econocircmico e a reduccedilatildeo da desigualdade (Kakwani 2000) Note-se

que o impacto do primeiro mecanismo sobre a pobreza eacute maior agrave medida que a desigualdade eacute menor

(Barreto 2005 Soares et alii 2006 Barros et alii 2007)

Ainda sobre o niacutevel de pobreza um forte consenso na literatura admite que a acumulaccedilatildeo de

capital humano medido pelo niacutevel educacional eacute um dos responsaacuteveis pelas diferenccedilas pessoais e

regionais da renda Importante frisar que a educaccedilatildeo baacutesica no paiacutes estaacute quase integralmente sob a

responsabilidade das unidades subnacionais sendo a educaccedilatildeo fundamental preponderantemente

municipal

A mensuraccedilatildeo de eficiecircncia da administraccedilatildeo tributaacuteria municipal efetivada na seccedilatildeo anterior

natildeo considerou a possibilidade das unidades de decisatildeo reduzirem propositalmente a arrecadaccedilatildeo

de impostos buscando atingir um determinado objetivo como maximizar uma funccedilatildeo de bem-es-

tar social Logo a priori explorar a base tributaacuteria dos impostos de forma mais eficiente natildeo eacute uma

poliacutetica puacuteblica recomendaacutevel automaticamente jaacute que os incrementos de bem-estar derivados da

oferta de bens puacuteblicos proporcionados pelas receitas tributaacuterias adicionais podem ser compensa-

dos pela reduccedilatildeo da renda disponiacutevel da populaccedilatildeo Note-se ainda que o aumento de eficiecircncia

na administraccedilatildeo tributaacuteria como definido neste artigo estaacute associado ao aumento do volume de

tributos Se a caracteriacutestica desses impostos for regressiva eacute provaacutevel que o aumento da eficiecircncia

conduza ao incremento da pobreza

Por outro lado eacute possiacutevel que uma administraccedilatildeo tributaacuteria mais eficiente possa garantir re-

cursos necessaacuterios para a melhoria de serviccedilos puacuteblicos de responsabilidade municipal como sauacutede e

educaccedilatildeo Essa melhoria conduziria a uma maior acumulaccedilatildeo de capital humano e desenvolvimento

econocircmico com potenciais efeitos sobre a populaccedilatildeo em situaccedilatildeo de pobreza

No caso especiacutefico em que a fonte da ineficiecircncia eacute a evasatildeo fiscal Alm e Finlay (2012) utilizan-

do resultados da literatura teoacuterica empiacuterica experimental e de equiliacutebrio geral apontam evidecircncias

que os principais beneficiaacuterios da evasatildeo fiscal satildeo os proacuteprios sonegadores com efeitos distributi-

vos que beneficiam os mais ricos No tocante aos tributos de competecircncia municipal no Brasil essa

tendecircncia deve ser acentuada considerando que IPTU e ITBI satildeo impostos diretos com caracteriacutesticas

inerentemente progressivas que podem ser acentuadas pelas legislaccedilotildees municipais utilizando-se de

aliacutequotas diferenciadas e isenccedilotildees

Esta seccedilatildeo utilizando os escores de eficiecircncia computados na seccedilatildeo anterior verifica quais os

efeitos do incremento da eficiecircncia teacutecnica pura das administraccedilotildees tributaacuterias no niacutevel de pobreza de

cada municiacutepio Como medida de pobreza este artigo utiliza o iacutendice de proporccedilatildeo de pobres (P0)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

122

com linha de pobreza de frac12 salaacuterio miacutenimo O modelo proposto eacute alicerccedilado na fartamente documen-

tada persistecircncia da pobreza Mais especificamente admite-se que uma parte substancial do iacutendice

de proporccedilatildeo de pobres detectado no presente eacute derivada da mesma situaccedilatildeo observada no passado

Formalmente

onde e satildeo respectivamente o iacutendice de proporccedilatildeo de pobres do municiacutepio i em 2010 e 2000 eacute renda per capita do municiacutepio i em 2000 eacute o nuacutemero de habitantes em milhares do municiacutepio i em 2000 eacute o iacutendice de Gini do municiacutepio i em 2000 eacute a mudanccedila na efici-ecircncia teacutecnica pura da arrecadaccedilatildeo de impostos do municiacutepio i Bj com j = 15 e satildeo paracircmetros a serem estimados eacute um ruiacutedo estocaacutestico As estatiacutesticas descritivas das variaacuteveis presentes na Equaccedilatildeo (4) satildeo expostas na Tabela 6 A Equaccedilatildeo (4) eacute estimada por miacutenimos quadrados ordinaacuterios (MQO)20 apresentando os resultados na Tabela 7 O paracircmetro de maior interesse neste artigo eacute As demais variaacuteveis independentes tecircm por objetivo caracterizar o municiacutepio no periacuteodo inicial Espera-se que essa caracterizaccedilatildeo absorva as informaccedilotildees relevantes que expliquem a proporccedilatildeo de pobres no ano final21 O elevado coeficiente de

determinaccedilatildeo obtido sinaliza um bom ajustamento da regressatildeo

Tabela 6 - Estatiacutesticas Descritivas

Com respeito agraves variaacuteveis de controle do periacuteodo inicial apenas a populaccedilatildeo e a proporccedilatildeo

de pessoas em situaccedilatildeo de pobreza foram significativas O coeficiente da populaccedilatildeo significativo e

positivo indica que em meacutedia os municiacutepios mais populosos em 2000 apresentaram uma maior

proporccedilatildeo de pobres em 2010 Esse resultado apresenta uma evidecircncia favoraacutevel aos municiacutepios de

menor porte pelo menos no tocante a reduccedilatildeo da pobreza contrariando a tese de precariedade e

20 A variaacutevel dependente eacute limitada entre 0 e 100 possibilitando a adoccedilatildeo de um modelo economeacutetrico de amostra cen-surada como por exemplo o Tobit entretanto Mcdonald (2009) indica que MQO eacute superior ao Tobit quando a limitaccedilatildeo dos dados for derivada de processo de geraccedilatildeo de dados fracionaacuterio e natildeo censurado Utilizando-se as mesmas variaacuteveis estimou-se um modelo natildeo linear Probit com resultados extremamente similares preservando-se todos os sinais e signi-ficacircncias dos paracircmetros21 No decorrer dos anos 2000 intensificou-se significativamente a adoccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas voltadas para a reduccedilatildeo da pobreza Uma parte dos efeitos dessas poliacuteticas deve ser capturada pelas variaacuteveis de controle do periacuteodo inicial Para uma discussatildeo dos efeitos das poliacuteticas de transferecircncia de renda sobre os iacutendices de pobreza ver Marinho et alii (2011)

(4)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

123

insustentabilidade de pequenos municiacutepios O coeficiente da proporccedilatildeo de pobres no periacuteodo inicial

foi estatisticamente positivo confirmando a persistecircncia da pobreza mesmo num horizonte de tempo

mais longo de dez anos Renda per capita e o Iacutendice de Gini do periacuteodo inicial natildeo foram estatistica-

mente significativosTabela 7- Resultados da Regressatildeo

Quanto ao paracircmetro de interesse o valor estimado eacute significantemente negativo demons-

trando que o incremento da eficiecircncia na arrecadaccedilatildeo dos impostos municipais influenciou negativa-

mente a proporccedilatildeo de pobres no periacuteodo final Evidentemente a transmissatildeo dos efeitos derivados da

eficiecircncia da administraccedilatildeo tributaacuteria municipal para o niacutevel de pobreza natildeo eacute elementar nem direta

Duas possibilidades natildeo excludentes podem conduzir a esse resultado

Na primeira hipoacutetese municiacutepios que aumentaram sua eficiecircncia na arrecadaccedilatildeo de impostos

tiveram mais recursos agrave disposiccedilatildeo para a oferta de bens puacuteblicos possibilitando uma maior acumu-

laccedilatildeo de capital humano ou uma melhor infraestrutura para a produccedilatildeo propiciando oportunidades

adicionais as pessoas em situaccedilatildeo de pobreza para a superaccedilatildeo dessa condiccedilatildeo Por outro lado IPTU

e ITBI satildeo impostos diretos que por incidirem sobre a propriedade imoacutevel natildeo atingem ou atingem

moderadamente a populaccedilatildeo mais pobre Regras de progressividade dos impostos geralmente

existentes nas unidades mais desenvolvidas ampliam esse efeito Logo a tributaccedilatildeo municipal im-

pacta em alguma magnitude a distribuiccedilatildeo da renda disponiacutevel da populaccedilatildeo local tendo efeito

redutor da desigualdade

Nota os nuacutemeros entre parecircnteses satildeo os desvios pa-dratildeo () significacircncia a 5 () natildeo-significante As de-mais estimativas satildeo significantes a 1 Erros-padratildeo robustos agrave heteroscedasticidadeFonte elaboraccedilatildeo proacutepria

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

124

Quanto agrave segunda hipoacutetese o efeito detectado do incremento da eficiecircncia da administraccedilatildeo

tributaacuteria municipal sobre o niacutevel pobreza pode estar associado agrave qualidade das instituiccedilotildees municipais

North e Thomas (1973) foram os pioneiros na associaccedilatildeo de desenvolvimento econocircmico e qualidade

das instituiccedilotildees conceito que pode ser sintetizado como a capacidade de uma sociedade definir regras

sociais e econocircmicas claras e estaacuteveis Acemoglu et alii (2001) testaram a hipoacutetese das instituiccedilotildees

definidas no periacuteodo colonial determinarem o crescimento econocircmico concluindo pela relevacircncia

das instituiccedilotildees Uma volumosa literatura buscou investigar a associaccedilatildeo do crescimento econocircmico

a variaacuteveis institucionais como liberdade comercial corrupccedilatildeo agilidade do poder judiciaacuterio respeito

ao direito de propriedade niacutevel de democracia eficiecircncia do sistema financeiro assassinatos poliacuteticos

revoluccedilotildees reformas constitucionais entre outras22

No Brasil e especificamente no Cearaacute considerando as intensas desigualdades regionais eacute pos-

siacutevel que as instituiccedilotildees de cada municiacutepio sejam acentuadamente divergentes Verdadeira essa hipoacute-

tese uma excelente proxy da qualidade das instituiccedilotildees municipais seria a eficiecircncia da administraccedilatildeo

tributaacuteria Se o ente subnacional natildeo consegue organizar de forma eficiente a funccedilatildeo de arrecadar os

recursos necessaacuterios para as demais atividades eacute pouco provaacutevel que outras instituiccedilotildees sob controle

ou interferecircncia municipal sejam organizadas e possam gerar externalidades positivas

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Este artigo aborda a evoluccedilatildeo da eficiecircncia das administraccedilotildees tributaacuterias tema pouco explora-

do pela literatura econocircmica Um amplo debate social e acadecircmico desenvolve-se em torno da neces-

sidade de uma reforma tributaacuteria Pouco ou nada se discute sobre a tecnologia adotada na exploraccedilatildeo

pelos trecircs niacuteveis de governo do sistema tributaacuterio atual No caso especiacutefico do Cearaacute o incremento

da arrecadaccedilatildeo municipal natildeo ocorreu da mesma forma em todos os tributos A arrecadaccedilatildeo do IPTU

apresenta desempenho bastante inferior a dos demais impostos municipais Essa constataccedilatildeo asso-

ciada ao forte processo de urbanizaccedilatildeo indica que os gestores puacuteblicos negligenciam esse imposto

fato possivelmente derivado de pressotildees sociais poliacuteticas e eleitorais Apesar dos avanccedilos observados

existe uma grande possibilidade de incremento das receitas municipais desde que as bases tributaacuterias

atuais sejam exploradas com maior eficiecircncia

O trade-off entre eficiecircncia e equidade estaacute presente nas escolhas dos administradores muni-

cipais Natildeo existe como a priori determinar os resultados econocircmicos de poliacutetica municipal que pos-

sibilite o aumento da arrecadaccedilatildeo de impostos Este artigo utilizando a metodologia DEA computou escores de eficiecircncia da administraccedilatildeo tributaacuteria de 86 municiacutepios cearenses nos anos de 2000 e 2010 Em seguida foram calculadas as mudanccedilas na eficiecircncia teacutecnica pura de cada governo local O resul-

22 Glaeser et alii (2004) revisa e critica as variaacuteveis utilizadas como proxy de instituiccedilotildees

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

125

tado obtido foi utilizado como determinante do niacutevel de pobreza em 2010 Obtiveram-se evidecircncias que os incrementos da eficiecircncia na arrecadaccedilatildeo municipal entre os extremos da deacutecada de 2000 impactam negativamente o niacutevel de pobreza no final do periacuteodo Entre as variaacuteveis de controle utilizadas apenas a proporccedilatildeo de pobres e a populaccedilatildeo ambas do ano inicial tiveram efeitos significantes e positivos sobre a proporccedilatildeo de pobres no periacuteodo final indicando que a pobreza eacute um fenocircmeno persistente e que os municiacutepios mais populosos em 2000 em meacutedia possuem uma desvantagem no processo de reduccedilatildeo da pobreza As conclusotildees do teste empiacuterico realizado indicam que os investimentos nas administraccedilotildees tributaacuterias que visem o aumento de sua eficiecircncia foram poliacuteticas puacuteblicas exitosas que contribuiacuteram para a reduccedilatildeo de um dos maiores problemas brasileiros O aumento da eficiecircncia na arrecadaccedilatildeo proporciona aos governos locais melhores condiccedilotildees financeiras para executar suas atividades Ressal-tando-se que os municiacutepios satildeo responsaacuteveis pela prestaccedilatildeo de serviccedilos que impactam diretamente na qualidade de vida e no estoque de capital humano da populaccedilatildeo principalmente a mais pobre que eacute mais dependente dos serviccedilos puacuteblicos Por outro lado a preponderacircncia de impostos diretos e progressivos entre os tributos municipais pode reduzir a desigualdade de renda quando a eficiecircncia na arrecadaccedilatildeo aumenta Natildeo se descarta a possibilidade dos iacutendices de eficiecircncia da administraccedilatildeo tributaacuteria capturarem informaccedilotildees mais amplas sobre a qualidade das instituiccedilotildees locais Neste contexto a recomendaccedilatildeo surgida dos resultados empiacutericos de busca de uma maior eficiecircncia na arrecadaccedilatildeo permanece vaacutelida A organizaccedilatildeo da administraccedilatildeo tributaacuteria responsaacutevel pela obtenccedilatildeo de recursos deve anteceder as demais accedilotildees de fomento a qualidade das instituiccedilotildees que em geral necessitam de algum dispecircndio financeiro para serem viabilizadas Os resultados obtidos neste exerciacutecio empiacuterico indicam que o incremento da eficiecircncia tributaacute-ria dos municiacutepios cearenses eacute uma poliacutetica puacuteblica complementar para a reduccedilatildeo do niacutevel de pobreza Na estrutura tributaacuteria brasileira os municiacutepios tecircm dois importantes impostos sobre a propriedade No Brasil e nos demais paiacuteses em desenvolvimento impostos sobre a propriedade tecircm pequena rele-vacircncia atingindo em meacutedia 06 do PIB enquanto nos Estados Unidos e Canadaacute esse tipo de imposto eacute superior a 3 do PIB (Bahl e Martinez-Vazquez 2007) Reforccedilar a competecircncia dos governos locais na arrecadaccedilatildeo tributaacuteria parece convergir com os objetivos de poliacuteticas de desenvolvimento social Diversas extensotildees podem ser feitas a partir deste trabalho inicial A ampliaccedilatildeo da amostra pode verificar se os resultados satildeo localizados ou mais gerais Uma amostra maior garantiria ainda a possibilidade de utilizar mais variaacuteveis como insumos da arrecadaccedilatildeo bem como adicionar variaacute-veis explicativas da variaacutevel dependente no segundo estaacutegio Eacute possiacutevel ainda verificar os efeitos da mudanccedila na eficiecircncia tributaacuteria em outras variaacuteveis econocircmicas e sociais Por uacuteltimo teacutecnicas mais robustas de estimaccedilatildeo podem ser utilizadas no segundo estaacutegio

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INCONGRUEcircNCIAS DA POLIacuteTICA TRIBUTAacuteRIA NO BRASIL E O SEU CON-TRIBUTO PARA A CRISE DA RELACcedilAtildeO DE TRIBUTACcedilAtildeO

SUMAacuteRIO Introduccedilatildeo 1 Consideraccedilotildees sobre a poliacutetica tributaacuteria 2 Atores envolvidos na formulaccedilatildeo e na implementaccedilatildeo da poliacutetica tributaacuteria a contur-bada relaccedilatildeo entre o Fisco e o contribuinte 3 O tributo como norma de rejei-ccedilatildeo social 4 Outras caracteriacutesticas do sistema tributaacuterio brasileiro e seus viacuten-culos com a crise da relaccedilatildeo de tributaccedilatildeo Consideraccedilotildees finais Referecircncias

Francisco Ferreira Chagas Juacutenior1

INTRODUCcedilAtildeO

As poliacuteticas tributaacuterias repercutem diretamente na sociedade a que satildeo direcionadas afetando

desde o cidadatildeo mais pobre ateacute o grande empresaacuterio Tal ilaccedilatildeo pode ser facilmente compreendida

quando por exemplo satildeo lanccediladas luzes sobre a regularidade com que tributos satildeo recolhidos Estes

constituem a principal fonte de recursos para o Estado-naccedilatildeo e o seu pagamento representa uma

constante na vida dos cidadatildeos os quais direta ou indiretamente arcam com o ocircnus financeiro decor-

rente desse ato

A dimensatildeo dessa realidade toma corpo em paiacuteses com elevada carga tributaacuteria natildeo raro dan-

do margem a insurgentes manifestaccedilotildees de insatisfaccedilatildeo por parte da populaccedilatildeo sobretudo quando eacute

precaacuteria e ineficiente a prestaccedilatildeo dos serviccedilos puacuteblicos atividade esta que em geral eacute financiada pelos

recursos repassados compulsoriamente ao eraacuterio

Cumpre exaltar a necessidade de ter-se em mente que as poliacuteticas tributaacuterias natildeo se circuns-

crevem agrave elaboraccedilatildeo de planos e estrateacutegias relacionados com a atividade de arrecadaccedilatildeo e de fis-

calizaccedilatildeo

Estatildeo atreladas ainda ao conjunto de accedilotildees voltadas agrave coordenaccedilatildeo agrave orientaccedilatildeo e ao plane-

jamento de projetos governamentais de tributaccedilatildeo a serem executados pela Administraccedilatildeo Tributaacuteria

e que estatildeo situadas dentro de um contexto bem mais amplo de sua atuaccedilatildeo

Tanto a proposiccedilatildeo como a avaliaccedilatildeo das poliacuteticas tributaacuterias encontram amparo na coleta

permanente de dados a elas relativos imprescindiacuteveis que satildeo para nortear a atuaccedilatildeo da Adminis-

traccedilatildeo Tributaacuteria

A anaacutelise desses elementos inclusive possibilita ao gestor puacuteblico a adoccedilatildeo eventual de medidas

pontuais a fim de estimular ou desestimular comportamentos de determinados setores da economia

1 Especialista em Direito Processual pela Faculdade Ateneu Mestre em Planejamento e Poliacuteticas Puacuteblicas pela Universida-de Estadual do Cearaacute Auditor Fiscal Juriacutedico da Receita Estadual do Cearaacute E-mail ffc_juniorhotmailcom

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bem como dos cidadatildeos (extrafiscalidade) visando sempre o resguardo dos interesses da coletividade

que se sobrepotildeem ao do contribuinte enquanto ser individual respeitados por oacutebvio os direitos que

lhe satildeo reconhecidos pelo ordenamento juriacutedico

As diretrizes tributaacuterias seratildeo definidas pelo governo tomando por base as regras constitu-

cionais definidoras das competecircncias que satildeo atribuiacutedas a cada ente poliacutetico para a instituiccedilatildeo de

tributos

Respeitadas as normas positivadas e de observacircncia obrigatoacuteria para o gestor tributaacuterio tem-

-se ser possiacutevel uma ampla margem de liberdade para o planejamento discricionaacuterio de poliacuteticas

voltadas agrave consecuccedilatildeo de objetivos governamentais especiacuteficos diretamente relacionados com a

atuaccedilatildeo da Administraccedilatildeo Tributaacuteria e que envolvem inexoravelmente a tomada de inuacutemeras deci-

sotildees vinculativas

Ocorre que no Brasil o processo que gira em torno do planejamento e da implementaccedilatildeo da

poliacutetica tributaacuteria natildeo raro eacute eivado de viacutecios perniciosos que maculam o seu desenvolvimento regular

desde a origem Aleacutem disso eacute cada vez mais influenciado de forma direta por uma voracidade arre-

cadatoacuterio que parece natildeo ter fim circunstacircncias estas que vecircm contribuindo sobremodo para tornar

ainda mais caoacutetico o sistema tributaacuterio do paiacutes

Indubitavelmente o referido estado de coisas acaba por desencadear um sentimento de revolta

nos contribuintes o qual contrasta com os primados mais elementares da cidadania fiscal Agravando

essa situaccedilatildeo tem-se o fato de que os cidadatildeos satildeo compelidos a contribuir com o custeio de um Es-

tado que aleacutem de perdulaacuterio eacute ineficiente ao gastar porque natildeo procura empregar os recursos arreca-

dados em accedilotildees que efetivamente possam trazer benefiacutecios concretos e duradouros para a populaccedilatildeo

Considerando que o ponto de partida para a busca de soluccedilotildees adequadas para qualquer pro-

blema eacute a identificaccedilatildeo dos fatores que lhe datildeo origem vecirc-se que eacute de todo relevante lanccedilar luzes

sobre algumas das principais falhas de planejamento da poliacutetica tributaacuteria de modo tambeacutem a eviden-

ciar os seus reflexos sobre as relaccedilotildees travadas entre o Fisco e o contribuinte os quais contribuem para

a desconstruccedilatildeo da cidadania fiscal no paiacutes

Antes poreacutem eacute conveniente trazer a lume alguns dos pressupostos baacutesicos da poliacutetica tributaacute-

ria considerando que a natureza do objeto deste breve estudo demanda a apresentaccedilatildeo de determi-

nados elementos fundamentais que servem de substrato teoacuterico para uma adequada compreensatildeo

da crise nas relaccedilotildees de tributaccedilatildeo

1 CONSIDERACcedilOtildeES SOBRE A POLIacuteTICA TRIBUTAacuteRIA

De um modo geral pode-se afirmar que as accedilotildees relacionadas com o planejamento a imple-

mentaccedilatildeo e a avaliaccedilatildeo das poliacuteticas tributaacuterias giram em torno da tomada de decisotildees que dizem

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respeito agraves atividades de tributaccedilatildeo de arrecadaccedilatildeo e de fiscalizaccedilatildeo todas elas voltadas agrave consecuccedilatildeo

de objetivos que podem variar de acordo com os interesses da Administraccedilatildeo Tributaacuteria

Cursi (2011 p 62-63) explica que enquanto a tributaccedilatildeo corresponde a um meio pelo qual a

esfera puacuteblica obteacutem recursos a partir da exploraccedilatildeo econocircmica e financeira de determinada base tri-

butaacuteria a arrecadaccedilatildeo eacute o produto resultante daquela atividade

A execuccedilatildeo de accedilotildees relacionadas com a tributaccedilatildeo e a arrecadaccedilatildeo envolve o manejo estra-

teacutegico adequado e eficiente dos tributos com vistas a que o montante dos recursos arrecadados aos

cofres puacuteblicos possa ser suficiente para fazer face agraves despesas que derivam do atendimento pelo

Poder Puacuteblico das necessidades coletivas

Passam pelo planejamento e pela implementaccedilatildeo das poliacuteticas de tributaccedilatildeo e arrecadaccedilatildeo o

estudo coordenado e orientado de projetos governamentais estrateacutegicos voltados ao constante aper-

feiccediloamento da legislaccedilatildeo tributaacuteria e ao exame da viabilidade da adoccedilatildeo de medidas que possibilitem

tanto a maximizaccedilatildeo das receitas como as desoneraccedilotildees tributaacuterias que impactam negativamente so-

bre o eraacuterio puacuteblico mas que constituem objeto de transcendentes objetivos governamentais Desses

projetos estrateacutegicos derivam consequecircncias (externalidades) que carecem de ser avaliadas previa-

mente pelo gestor tributaacuterio para que se evitem ou pelo menos sejam minorados alguns efeitos in-

desejaacuteveis advindos da busca pelo atingimento de determinadas metas e da execuccedilatildeo de certas accedilotildees

ligadas agraves poliacuteticas de tributaccedilatildeo e de arrecadaccedilatildeo efeitos estes que inclusive podem contribuir para

tornar o sistema tributaacuterio injusto e menos eficiente do ponto de vista econocircmico-fiscal

Essas externalidades estatildeo indissociavelmente atreladas aos processos de poliacutetica fiscal que

permeiam a atividade de administraccedilatildeo tributaacuteria os quais se preocupam com os reflexos da accedilatildeo

puacuteblica sobre a renda nacional disponiacutevel e sobre o comportamento da esfera privada o que significa

cuidar do paradoxo da exploraccedilatildeo da base tributaacuteria afetando a proacutepria base em si considerada (CUR-

SI 2011 p 103-104)A renda disponiacutevel agrave esfera privada eacute um importante fator de influecircncia do ritmo e tipo de atividade executada pela esfera privada no acircmbito da base tributaacuteria explorada economicamente pela esfera puacuteblica Quer dizer que a disponibilidade econocircmica e financeira a geraccedilatildeo de emprego e renda e os comportamentos podem ser afetados pela administraccedilatildeo tributaacuteria conforme o tipo de calibraccedilatildeo da carga tributaacuteria ou segundo o tipo de seletividade essencialidade e equidade utilizada pelos regimes tributaacuterios O modo e a forma como a esfera puacuteblica obteacutem dinheiro junto agrave esfera privada eacute relevante para a administraccedilatildeo tributaacuteria por afetar a sustentabilidade de exploraccedilatildeo da proacutepria base e por produzir efeito sobre as geraccedilotildees futuras Em outras palavras explorar a base tributaacuteria ignorando os efeitos da exploraccedilatildeo verificados na esfera privada eacute ignorar a necessidade de apreciar no longo prazo a hipoacutetese de cuidar para natildeo exaurir a base e natildeo afetar negativamente as decisotildees de desenvolvimento econocircmico e social (CURSI 2011 p 104)

Conclui-se com efeito que o fluxo de dinheiro obtido por meio da tributaccedilatildeo natildeo pode ser

apreciado em termos de mera aplicaccedilatildeo da carga sobre a mateacuteria tributaacutevel Haacute portanto a neces-

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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sidade de uma cuidadosa calibraccedilatildeo da incidecircncia que seja capaz de assegurar tanto um volume

adequado de recursos aos cofres puacuteblicos como a maior neutralidade possiacutevel da tributaccedilatildeo com a

preservaccedilatildeo do niacutevel de atividade privada (CURSI 2011 p 104-105)

O planejamento da poliacutetica tributaacuteria tambeacutem envolve o estabelecimento de accedilotildees estrateacutegicas

voltadas agrave implementaccedilatildeo de obrigaccedilotildees instrumentais e agrave realizaccedilatildeo de atividades fiscalizatoacuterias que

tecircm como principal objetivo em uacuteltima anaacutelise combater e prevenir os atos de sonegaccedilatildeo fiscal ten-

dentes a provocar lesatildeo aos cofres puacuteblicos ante o natildeo pagamento dos tributos devidos regularmente

aos cofres puacuteblicos pelo contribuinte

Segundo Eckstein (1971 p 86) para que funcione bem um sistema em que as pessoas respei-

tem as leis tributaacuterias e paguem os seus tributos de forma voluntaacuteria faz-se necessaacuteria agrave transmissatildeo

de confianccedila ao povo de que os impostos satildeo justos e que todos contribuem para ele

Quando se generaliza o sentimento de que o sistema tributaacuterio eacute simplesmente uma sucessatildeo de brechas e evasotildees e as pessoas veem seus vizinhos igualmente proacutespe-ros pagando substancialmente menos ou vivendo agrave base de contas de despesas livres de impostos o moral do contribuinte baixa A apresentaccedilatildeo de uma declaraccedilatildeo de impostos honesta deixa entatildeo de ser um ato moral Em muitos paiacuteses do mundo tanto ricos como pobres a eacutetica relativa aos impostos se distingue da eacutetica em outras esferas (ECKSTEIN 1971 p 86-87)

Nabais (2005 p 135) ao discorrer sobre os aspectos da cidadania fiscal expotildee que se por

um lado aos indiviacuteduos de uma sociedade natildeo eacute dado o distanciamento do dever de contribuir para

o suporte financeiro do Estado-naccedilatildeo observada a capacidade contributiva de cada um por outro

a eles eacute conferido o direito de exigir daquele ente tributante que obrigue a todos a cumprirem com

o referido dever

A fiscalizaccedilatildeo que diga-se constitui atividade que integra especificamente a aacuterea de gestatildeo da

poliacutetica tributaacuteria (POHLMANN IUDIacuteCIBUS 2006 p 55) representa justamente a principal forma de

que dispotildee o Estado para averiguar a regularidade fiscal das pessoas fiacutesicas ou juriacutedicas ainda que natildeo

venham a se enquadrar na figura de contribuintes mas que satildeo obrigadas a cooperar com a atividade

fiscalizatoacuteria por forccedila da legislaccedilatildeo tributaacuteria

Colocadas essas premissas baacutesicas acerca das accedilotildees relacionadas com as atividades de tributa-

ccedilatildeo de arrecadaccedilatildeo e de fiscalizaccedilatildeo cabe agora destacar que conforme Krugman e Wells (2007 p

428) A poliacutetica tributaacuteria sempre tem dois objetivos Por um lado os governos procuram alcanccedilar a eficiecircncia tributaacuteria procuram minimizar os custos diretos e indiretos da cobranccedila de impostos para a economia Por outro lado os governos buscam a justiccedila tributaacuteria ou equidade tributaacuteria procuram garantir que as pessoas certas de fato tenham que arcar com a carga dos impostos O dilema central em poliacutetica tributaacuteria [] eacute que um imposto eficiente pode natildeo parecer justo e um imposto justo pode natildeo ser eficiente Assim haacute um trade-off fundamental entre equidade e eficiecircncia (desta-que no original)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

136

Poreacutem afirmam os autores (KRUGMANWELLS 2007 p 430) que ldquoa anaacutelise econocircmica natildeo

pode dizer quanto peso um sistema tributaacuterio deve atribuir agrave equidade ou agrave eficiecircncia A escolha eacute um

julgamento de valor que fazemos atraveacutes do processo poliacuteticordquo

Pohlmann e Iudiacutecibus (2006 p 32) elencam dentre os objetivos da poliacutetica tributaacuteria a elevaccedilatildeo

da arrecadaccedilatildeo a redistribuiccedilatildeo da riqueza e o estiacutemulo agrave atividade econocircmica estando constante-

mente preocupada com a avaliaccedilatildeo dos efeitos e da eficaacutecia da mudanccedila nas regras tributaacuterias

Ao discorrer sobre a importacircncia de se manter uma permanente avaliaccedilatildeo de qualquer poliacutetica

puacuteblica Matias-Pereira (2012 p 235) expotildee que

A avaliaccedilatildeo se apresenta como uma ferramenta relevante de gestatildeo visto que pode ser utilizada ao longo de todo o ciclo de gestatildeo A partir da avaliaccedilatildeo torna-se possiacutevel subsidiar o processo de planejamento e formulaccedilatildeo de uma intervenccedilatildeo o acompa-nhamento de sua implementaccedilatildeo os ajustes que se fizerem necessaacuterios as decisotildees sobre sua manutenccedilatildeo aperfeiccediloamento mudanccedila de rumo ou interrupccedilatildeo entre outros procedimentos A avaliaccedilatildeo pode ajudar ainda a viabilizar todas as atividades de controle interno externo por instituiccedilotildees puacuteblicas e pela sociedade permitindo assim uma maior transparecircncia e accountability das accedilotildees realizadas pelos governos

No momento em que o processo de formulaccedilatildeo das poliacuteticas puacuteblicas chega ao estaacutegio da to-

mada de decisotildees vinculativas o grau de liberdade de que gozam os responsaacuteveis pela tomada dessas

decisotildees estaacute circunscrito por um conjunto de ideias e de paradigmas bem como pelas circunstacircncias

sociais econocircmicas e poliacuteticas estabelecidas no acircmbito territorial de suas competecircncias (HOWLETT

RAMESH PERL 2013 p 158) Por tal motivo haacute que se reconhecer que a tomada de decisatildeo natildeo eacute um

exerciacutecio meramente teacutecnico mas um processo inerentemente poliacutetico que implica fazer escolhas de

um nuacutemero relativamente pequeno de opccedilotildees poliacuteticas alternativas identificadas durante o processo

de sua formulaccedilatildeo resultando em diferentes tipos de decisotildees as quais produzem ldquoganhadoresrdquo e

ldquoperdedoresrdquo (HOWLETT RAMESH PERL 2013 p 157)

Natildeo raro quando a formulaccedilatildeo da poliacutetica tributaacuteria chega ao seu estaacutegio decisoacuterio as so-

luccedilotildees para determinadas questotildees satildeo vistas com maus olhos pelos atores natildeo estatais envolvidos

naquele processo os quais satildeo desprovidos de autoridade que lhes legitimem a adotar concreta-

mente as decisotildees vinculativas na aacuterea muito embora estivessem engajados nos estaacutegios antece-

dentes agravequela etapa decisoacuteria

Ao tratarem da possibilidade de engajamento e da influecircncia dos atores no processo de formu-

laccedilatildeo das poliacuteticas puacuteblicas Dias e Matos (2012 p 39-40) assinalam que

Na cena poliacutetica configurada pelo Estado e pelos oacutergatildeos de governo em todas as esferas de atuaccedilatildeo existem inuacutemeros indiviacuteduos grupos organizaccedilotildees movimentos partidos que influenciam as poliacuteticas puacuteblicas quer seja no seu processo de constru-ccedilatildeo quer na sua implantaccedilatildeo e nos seus desdobramentos Os denominados atores e seu papel fundamental eacute influenciar de algum modo as poliacuteticas governamentais de-fendendo seus interesses proacuteprios ou dos grupos que representam Suas praacuteticas satildeo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

137

diversas podendo empregar diversos meios para defender seus interesses a pressatildeo pura e simples atraveacutes do lobby a greve mobilizaccedilotildees participaccedilatildeo nas reuniotildees etc de tal modo que as poliacuteticas puacuteblicas constituem o resultado das accedilotildees tomadas por esses vaacuterios atores que influenciam o processo de formulaccedilatildeo das poliacuteticas puacuteblicas

Dias e Matos (2012 p 40) reconhecem que os diferentes atores envolvidos no processo de for-

mulaccedilatildeo das poliacuteticas puacuteblicas possuem interesses distintos embora coincidam em muitos pontos

Esse fato possui especial significacircncia para as decisotildees diretamente relacionadas com o manejo

da poliacutetica tributaacuteria porque os interesses distintos do Estado enquanto ente tributante e dos contri-

buintes enquanto financiadores das despesas estatais natildeo raro datildeo origem a uma consequente insa-

tisfaccedilatildeo por parte destes uacuteltimos abrindo caminho para o estabelecimento de uma relaccedilatildeo conflituosa

entre ambos a qual merece ser examinada de perto

Como bem observa Cursi (2011 p 136-137)

[] a esfera puacuteblica delibera em administraccedilatildeo tributaacuteria com percepccedilatildeo diferente daquela empregada pela esfera privada Esta diferenccedila de percepccedilatildeo decorre da di-ferenccedila existente entre a decisatildeo puacuteblica e o juiacutezo privado Essa diferenccedila de juiacutezos tambeacutem ocasiona diferenccedilas de percepccedilatildeo quanto aos seguintes aspectos do regime de tributaccedilatildeo carga seletividade progressividade e essencialidade Em outras pala-vras haacute entre a esfera puacuteblica e a esfera privada uma diferenccedila de percepccedilatildeo quanto agrave extrafiscalidade porque as referidas esferas possuem processos decisoacuterios com carac-teriacutesticas diferentes Deste acircngulo haacute diferenccedilas entre o juiacutezo puacuteblico e o julgamento privado diferenccedilas que conduzem a percepccedilotildees distintas em relaccedilatildeo agraves calibraccedilotildees para exploraccedilatildeo da base tributaacuteria pois os julgamentos da esfera puacuteblica satildeo influen-ciados pelos propoacutesitos e definiccedilotildees poliacutetico-estrateacutegicos e visam maximizar o bem comum enquanto o juiacutezo da esfera privada eacute influenciado pela loacutegica microeconocircmi-ca e pelo interesse particular

O toacutepico seguinte tem por foco justamente as interaccedilotildees entre os atores na arena organiza-

cional das poliacuteticas tributaacuterias que indubitavelmente satildeo influenciadas de forma direta pela complexa

relaccedilatildeo travada entre o Fisco e o contribuinte

2 ATORES ENVOLVIDOS NA FORMULACcedilAtildeO E NA IMPLEMENTACcedilAtildeO DA POLIacuteTICA TRIBUTAacute-RIA A CONTURBADA RELACcedilAtildeO ENTRE O FISCO E O CONTRIBUINTE

As poliacuteticas tributaacuterias se baseiam no exerciacutecio do denominado poder fiscal ou poder de tri-

butar definido por Martins (1988 p 81) como a faculdade de que goza o Estado soberano de exigir

prestaccedilotildees pecuniaacuterias das pessoas que vivem sob sua jurisdiccedilatildeo com a finalidade de viabilizar o aten-

dimento dos encargos que satildeo proacuteprios daquele ente representando uma das manifestaccedilotildees mais

expressivas da vontade soberana das sociedades politicamente organizadas

Segundo a liccedilatildeo de Machado (2009 p 28-29)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

138

Como se sabe o Estado eacute entidade soberana No plano internacional representa a na-ccedilatildeo em suas relaccedilotildees com as outras naccedilotildees No plano interno tem o poder de gover-nar todos os indiviacuteduos que se encontrem no seu territoacuterio Caracteriza-se a soberania como a vontade superior agraves vontades individuais como um poder que natildeo reconhece superior No exerciacutecio de sua soberania o Estado exige que os indiviacuteduos lhe forneccedilam os recursos de que necessita Institui o tributo O poder de tributar nada mais eacute que um aspecto da soberania estatal ou uma parcela desta

Para Baleeiro (2000 p 189) ldquoo exerciacutecio do poder de tributar eacute fenocircmeno de caraacuteter iniludivel-

mente poliacutetico como todos que se acham vinculados agrave natureza e agraves atribuiccedilotildees do Estadordquo

Conforme Falcatildeo (1981 p 18) a tributaccedilatildeo que aliada a outras fontes de receitas torna pos-

siacutevel a obtenccedilatildeo dos recursos destinados ao custeio de determinadas atividades estatais especiacuteficas eacute

viabilizada em termos praacuteticos pelo fato de o Estado ter se voltado para um aspecto que lhe eacute ineren-

te o impeacuterio das suas decisotildees a cogecircncia do seu mando a imposiccedilatildeo da sua forccedila

Silva (1941 p 21) expotildee que

Organizado o Estado necessariamente que para manter sua existecircncia e cumprir suas finalidades teraacute que se suprir de meios indispensaacuteveis a esse objetivo Isto quer dizer que para manter-se assegurar sua existecircncia cumprir suas finalidades para fazer fun-cionar as instituiccedilotildees que exteriorizam sua organizaccedilatildeo poliacutetica deve o Estado procu-rar os recursos pecuniaacuterios de que necessita para satisfazer as proacuteprias necessidades E daiacute o dever de organizar suas financcedilas e de buscar os elementos para constituiacute-las

Machado (2009 p 29) afirma que o poder de tributar se justifica conforme a concepccedilatildeo que se

adote do proacuteprio Estado sendo que ldquoa ideia mais generalizada parece ser a de que os indiviacuteduos por

seus representantes consentem na instituiccedilatildeo do tributo como de resto na elaboraccedilatildeo de todas as

regras juriacutedicas que regem a naccedilatildeordquo

Carvalho (2010 p 10) seguindo essa linha de pensamento assevera que a tributaccedilatildeo estaacute di-

retamente relacionada com um acordo em que os membros integrantes da sociedade transferem ao

Fisco ldquoo poder de retirar parcelas de suas riquezas que se relacionam com os fatos geradores e suas

repercussotildees econocircmico-financeiras com a incumbecircncia de angariar os recursos de que necessitardquo

Oliveira (1988 p 11) aduz que

Enquanto sociedade politicamente organizada instituiccedilatildeo necessaacuteria ao conviacutevio e desenvolvimento humano o Estado recebe atribuiccedilotildees de que deve se desincumbir sempre visando ao bem-estar social em uacuteltima anaacutelise aos indiviacuteduos que o criaram Estes por conseguinte devem contribuir para os encargos da coletividade por forccedila da solidariedade social que preside o relacionamento interpessoal

No entender de Machado (2009 p 26) a tributaccedilatildeo indubitavelmente constitui o instrumento

que viabiliza a sobrevivecircncia da economia capitalista uma vez que sem ela o Estado teria de mono-

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

139

polizar toda a atividade econocircmica de modo a angariar recursos suficientes para a realizaccedilatildeo de seus

fins sociais Com a tendecircncia revelada pelas naccedilotildees comunistas do leste europeu no sentido da deno-

minada economia de mercado o tributo passou a ganhar ainda mais relevacircncia ante a ineficiecircncia da

economia estatizada

Ao tratar da concepccedilatildeo que se deve ter acerca do tributo Amaro (2008 p 16) registra que o seu

conceito abrangeu desde os pagamentos em dinheiro ou bens exigidos pelos vencedores aos povos

vencidos ldquoateacute a cobranccedila perante os proacuteprios suacuteditos ora sob o disfarce de donativos ajudas contri-

buiccedilotildees para o soberano ora como um dever ou obrigaccedilatildeordquo Contudo o mesmo autor (AMARO 2008

p 16) adverte que uma noccedilatildeo de tributo baseada nessa representaccedilatildeo se perde no tempo

Para Oliveira (1988 p 11)

O tributo eacute o instituto engendrado pelo Homem que permite num clima de liberdade racionalizar juridicamente o esforccedilo de cooperaccedilatildeo individual em prol da comunidade ao mesmo tempo em que representa uma contribuiccedilatildeo constitui uma obrigaccedilatildeo per-mitindo ao seu destinataacuterio exigi-lo daqueles que por uma razatildeo ou por outra deixem de prestaacute-lo ou o faccedilam em desconformidade com a norma vigente

Bastos (1999 p 47) esclarece que eacute inegaacutevel a importacircncia do tributo sobretudo na modalida-

de de imposto considerando a indivisibilidade dos serviccedilos prestados pelo poder puacuteblico que repre-

sentam utilidades natildeo suscetiacuteveis de exclusiva imputaccedilatildeo individual Nada mais justo entatildeo do que

chamar a coletividade para cobrir essas despesas mediante o pagamento daquela exaccedilatildeo

A propoacutesito a ideia de ldquocontribuirrdquo volta-se justamente para a accedilatildeo do indiviacuteduo que presta

uma contribuiccedilatildeo a qual designa a cota que cada um daacute para atender a uma despesa comum (AMARO

2008 p 16) Ocorre que esse espiacuterito de coletividade nem sempre repousa tranquilo na consciecircncia

dos cidadatildeos chamados para contribuir com o custeio dos gastos que envolvem a promoccedilatildeo do bem-

-estar social

Diante dessa circunstacircncia o contribuinte eacute obrigado por forccedila de lei a cumprir com o dever

de dispor de parte de sua riqueza para o financiamento das atividades que o Estado soberano se

compromete em assumir Dessa afirmaccedilatildeo se constata que o tributo se reveste de uma caracteriacutestica

fundamental qual seja a coatividade (BASTOS 1999 p 47)

Conforme Neto Cisne (2002 p 130)

O Estado exige o tributo dos cidadatildeos para em troca prestar-lhes serviccedilos puacuteblicos e promover o bem-comum Nessa relaccedilatildeo deve ficar evidente que natildeo prevalece a von-tade do cidadatildeo de eximir-se da obrigaccedilatildeo de pagar os seus tributos Eacute uma relaccedilatildeo em que prevalece a vontade do Estado em receber as receitas tributaacuterias e a obrigaccedilatildeo do contribuinte em pagar seus tributos

Daiacute porque o traccedilo caracteriacutestico da relaccedilatildeo entre o contribuinte e o ente tributante repousa

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

140

no caraacuteter obrigacional do tributo e no direito que tem o Estado de criaacute-lo e impocirc-lo visando aos

interesses coletivos (NETO CISNE 2002 p 147)

Vanoni (1932 p 119) observa que

Existe um interesse individual em obter da atividade do Estado a maacutexima utilidade possiacutevel e tal interesse apresenta-se particularmente intenso naqueles que sejam cha-mados a entregar uma parte do seu patrimocircnio para constituir os meios necessaacuterios agrave atividade puacuteblica e portanto esperem receber desta benefiacutecios em relaccedilatildeo com o sacrifiacutecio suportado

Na medida em que as expectativas dos cidadatildeos quanto ao retorno de suas contribuiccedilotildees na

forma de benefiacutecios vatildeo sendo frustradas amplia-se a rejeiccedilatildeo social ao pagamento de tributos que eacute

potencializada pela compulsoriedade desses recolhimentos Diante desse cenaacuterio perde-se o espiacuterito

de solidariedade que deve permear o esforccedilo de cooperaccedilatildeo individual para o custeamento dos en-

cargos da coletividade

3 O TRIBUTO COMO NORMA DE REJEICcedilAtildeO SOCIAL

Eacute interessante notar que conforme Eckstein (1971 p 91) nas sociedades organizadas faz-se

premente a aceitabilidade do sistema tributaacuterio que traduz a necessidade da sua aceitaccedilatildeo pelo cida-

datildeo ldquomantendo a coerecircncia com as noccedilotildees que este tem de justiccedila e natildeo sendo oneroso em compa-

raccedilatildeo com o que proporciona em troca aos contribuintesrdquo

No mesmo sentido satildeo as consideraccedilotildees de Cursi (2011 p 63) para quem uma

Boa tributaccedilatildeo eacute aquela proveniente de relaccedilotildees instrumentais imperativas onde a coerccedilatildeo poliacutetico-legal fixada aos particulares conduz a rendas monetaacuterias entregues pela aceitaccedilatildeo da legitimidade pertinecircncia e adequaccedilatildeo da exigecircncia estatal e con-cordacircncia com os propoacutesitos do gasto

Sem embargo observa-se que a cada dia o peso dos tributos e a incapacidade do governo em

promover de forma plena o bem-estar social vecircm dando margem a uma verdadeira repulsa ao sistema

tributaacuterio ocasionando protestos advindos de todas as camadas da sociedade sobretudo daquelas

que sofrem de forma mais intensa as consequecircncias decorrentes da ineficiecircncia estatal em gerenciar

os recursos carreados aos cofres puacuteblicos

Leciona Schoueri (2011 p 27) que

Se no Estado Social a sociedade pagava um preccedilo para o Estado atingir o desidera-to coletivo no Estado do Seacuteculo XXI a sociedade passa a compreender que o preccedilo tornou-se muito alto e o resultado piacutefio A tributaccedilatildeo excessiva torna-se inconciliaacutevel com o modelo do Estado do Seacuteculo XXI pois implica retirar recursos que a proacutepria coletividade necessita para seus fins A transferecircncia excessiva de recursos ao Estado

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

141

pela sociedade tolhe a iniciativa desta reduzindo ou impossibilitando o desenvolvi-mento econocircmico O resultado evidente eacute o surgimento de novas necessidades so-ciais exigindo mais recursos para a construccedilatildeo da liberdade Daiacute a reivindicaccedilatildeo da sociedade de tomar para si as tarefas antes delegadas ao Estado recusando-se daiacute a pagar um preccedilo exorbitante por uma liberdade que aquele jaacute natildeo mais se revela apto a promover O tributo surge nesta perspectiva como o preccedilo dessa liberdade Ele natildeo se justifica enquanto tal mas somente na medida em que seja indispensaacutevel e na extensatildeo em que se espera uma atuaccedilatildeo estatal na construccedilatildeo de uma liberdade coletiva de inclusatildeo social Revelando-se o Estado incapaz de (ou inaacutebil para) suprir certas demandas sociais natildeo se legitima o aumento desmedido de tributos em ciclo crescente e interminaacutevel onde se vecirc que por mais que se aumentem os tributos em maior grau se ampliam as demandas sociais exigindo novos aumentos

Neto Cisne (2002 p 146) assevera que apesar de o tributo ter uma funccedilatildeo socioeconocircmica o

cidadatildeo reage agrave sua imposiccedilatildeo por meio de alegaccedilotildees comuns como a injusticcedila dos tributos o peso

da carga tributaacuteria a desproporcionalidade entre o pagamento dos tributos e as contraprestaccedilotildees es-

tatais a maacute gestatildeo das financcedilas puacuteblicas dentre outras

Pontes (2004 p 138) entende que

[] as discussotildees sobre o aumento de carga tributaacuteria passam inelutavelmente em um primeiro momento pelo debate relativo ao modelo de financiamento do Estado da qualidade e da quantidade das despesas puacuteblicas e em um segundo momento pelo proacuteprio papel que o Estado deve desempenhar na sociedade brasileira

Alguns autores a fim de verificarem o peso real dos tributos para a sociedade chegam a esta-

belecer uma comparaccedilatildeo entre o volume da carga tributaacuteria dos paiacuteses e o efetivo retorno dos valores

a ela correspondentes por meio da prestaccedilatildeo de serviccedilos puacuteblicos

Sobre o tema Pellizzari (1990 p 38) discorre que a carga tributaacuteria de um determinado paiacutes so-

mente seraacute considerada alta ou baixa mediante o estabelecimento de um comparativo entre os custos

e os benefiacutecios que decorrem dos serviccedilos prestados pelo poder puacuteblico Demais disso caso ocorra

uma comparaccedilatildeo entre as cargas tributaacuterias de paiacuteses distintos e que venha a se basear nesse paracircme-

tro deveratildeo ser consideradas tanto a quantidade como a qualidade dos serviccedilos puacuteblicos prestados

pelos paiacuteses envolvidos no comparativo

Ocorre que conforme Heidemann (2010 p 33) o volume e a qualidade dos serviccedilos puacuteblicos

natildeo justificam os custos que envolvem a sua prestaccedilatildeo Aleacutem disso os proacuteprios governos estatildeo mui-

to caros o que contraria o mandamento de que para serem razoaacuteveis e viaacuteveis devem funcionar de

acordo com a disposiccedilatildeo e a capacidade de financiamento dos contribuintes

Machado (2009 p 26) exorta a importacircncia de que

[] a carga tributaacuteria natildeo se torne pesada ao ponto de desestimular a iniciativa privada No Brasil infelizmente isto vem acontecendo Nossos tributos aleacutem de serem muitos satildeo calculados mediante aliacutequotas elevadas Por outro lado o Estado eacute perdulaacuterio

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

142

Gasta muito e ao fazecirc-lo privilegia uns poucos em detrimento da maioria pois natildeo investe nos serviccedilos puacuteblicos essenciais dos quais esta carece tais como educaccedilatildeo seguranccedila e sauacutede Assim mesmo sem qualquer comparaccedilatildeo com a carga tributaacuteria de outros paiacuteses eacute possiacutevel afirmar-se que a nossa eacute exageradamente elevada posto que o Estado praticamente nada nos oferece em termos de serviccedilos puacuteblicos

Martins (2004 p 266 - 227) chega a defender a tese de que o tributo eacute uma norma de rejeiccedilatildeo

social diante do fato de os contribuintes pagarem mais do que deveriam para receber serviccedilos puacutebli-

cos porquanto uma parte substancial dos recursos arrecadados serve apenas para viabilizar a manu-

tenccedilatildeo dos poliacuteticos no poder quando natildeo eacute canalizada diretamente para os ralos da corrupccedilatildeo

A esse respeito assevera Vanoni (1932 p 118) que ldquoum encargo imposto aos cidadatildeos por

qualquer abuso de poder puacuteblico e que natildeo sirva a fins de utilidade coletiva mas seja dispecircndio em

vantagens particulares seraacute uma espoliaccedilatildeo mas nunca um tributordquo

Machado (2009 p 27) expotildee que a carga tributaacuteria brasileira muito embora jaacute seja bastante

elevada natildeo impede que a arrecadaccedilatildeo venha batendo sucessivos recordes haja vista a regularidade

com que se criam ou satildeo aumentados os tributos

Estudo realizado pelo Instituto Brasileiro de Planejamento Tributaacuterio (2012 online) concluiacutedo

em marccedilo de 2013 e amplamente divulgado pela miacutedia nacional aponta que a carga tributaacuteria brasi-

leira em 2012 chegou a 3627 do Produto Interno Bruto com crescimento de 025 ponto percentual

em relaccedilatildeo a 2011 periacuteodo no qual a carga tributaacuteria jaacute havia batido recorde histoacuterico O mesmo es-

tudo destaca o fato de que nos uacuteltimos dez anos a carga tributaacuteria cresceu 363 pontos percentuais

com meacutedia de 036 ponto percentual ao ano

Queiroz (2003 p 191) lembra que ldquouma carga tributaacuteria excessiva atrasa o desenvolvimento e

num ciacuterculo vicioso provoca a queda da arrecadaccedilatildeo e assim dificulta a realizaccedilatildeo dos investimentos

para a geraccedilatildeo de emprego e rendardquo

Sobre o assunto Tipke (2012 p 53) discorre que

Se as Constituiccedilotildees liberais garantem fomentam ou favorecem a iniciativa privada sobretudo a econocircmica se reconhecem a liberdade empresarial e garantem a pro-priedade privada segue-se que tambeacutem a imposiccedilatildeo precisa respeitar esses valores da liberdade natildeo deve usurpar por meio de uma carga tributaacuteria global excessiva Esse eacute o caso quando por meio da elevaccedilatildeo da carga tributaacuteria global prejudica essencial-mente a iniciativa privada solapa a vontade de produzir de quem desenvolve uma ati-vidade econocircmica autocircnoma ou dependente ou a debilita essencialmente Tambeacutem a experiecircncia demonstra que a vontade de produzir do trabalhador eacute debilitada mesmo quando a carga tributaacuteria natildeo alcanccedila o miacutenimo existencial

Pontes (2004 p 145) salienta que no Brasil os sucessivos aumentos da carga tributaacuteria com-

prometem o crescimento econocircmico Bem assim desestimulam o investimento na produccedilatildeo con-

siderando que ldquoa maior parte da incidecircncia de tributos recai sobre bens e serviccedilos e muito pouco

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

143

sobre a renda e propriedade o que natildeo deixa de ser curioso em um paiacutes marcado pela desigualda-

de como o Brasilrdquo

Luchiezi Jr e Maria (2010 p 168-169) observam que dentre as principais tendecircncias que mar-

caram as modificaccedilotildees no sistema tributaacuterio brasileiro desde a ediccedilatildeo do Plano Real destacam-se i)

o aumento da regressividade da carga tributaacuteria com a maior incidecircncia de tributos sobre o consumo

de bens e serviccedilos ii) a limitaccedilatildeo da tributaccedilatildeo direta no Brasil e iii) o tratamento diferenciado da tri-

butaccedilatildeo das rendas violando o princiacutepio da isonomia tributaacuteria ao tratar com criteacuterios diferenciados

a renda do capital (lucros dividendos e juros) e do trabalho considerando que haacute uma concentraccedilatildeo

cada vez maior de impostos comprometedores da renda dos trabalhadores assalariados

No entender de Pellizzari (1990 p 73-74) o sistema tributaacuterio brasileiro

[] ao inveacutes de ser uma forma de distribuiccedilatildeo de renda eacute uma forma de concentraccedilatildeo uma vez que quem paga os impostos satildeo os assalariados e na distribuiccedilatildeo destes re-cursos uma grande parte eacute transferida para as empresas ndash atraveacutes de infra-estrutura incentivos e ajudas oficiais sobrando uma pequena parte para retornar em serviccedilos puacuteblicos aos contribuintes de fato [] Na realidade o nosso sistema tributaacuterio em-basado em impostos indiretos e sobre a renda consumida foi justamente planejado para concentrar a renda nacional

Sem prejuiacutezo dessas consideraccedilotildees indaga-se aleacutem dessas quais seriam as demais caracteriacutesti-

cas marcantes do sistema tributaacuterio brasileiro que contribuem para a relaccedilatildeo conflituosa entre o Fisco

e o contribuinte Eacute o que se veraacute no toacutepico seguinte

4 OUTRAS CARACTERIacuteSTICAS DO SISTEMA TRIBUTAacuteRIO BRASILEIRO E SEUS VIacuteNCULOS COM A CRISE DA RELACcedilAtildeO DE TRIBUTACcedilAtildeO

Pontes (2004 p 139) elenca a instabilidade como sendo uma das caracteriacutesticas marcantes

do sistema tributaacuterio brasileiro que contribuem para o estabelecimento de uma relaccedilatildeo conflituo-

sa entre o Fisco e o contribuinte chegando inclusive a afirmar a inexistecircncia de oacutergatildeos especiacuteficos

responsaacuteveis pelo planejamento da poliacutetica tributaacuteria no Brasil entendida pelo autor como ldquo[] a

definiccedilatildeo de diretrizes claras de curto meacutedio e longo prazo bem como das respectivas medidas

necessaacuterias ao seu atingimentordquo

Salienta Pontes (2004 p 139) que no acircmbito federal

A Secretaria da Receita Federal eacute o oacutergatildeo encarregado de definir a poliacutetica tributaacuteria e ao mesmo tempo promover a arrecadaccedilatildeo das incidecircncias por ela preestabelecidas (e via de regra ratificadas pelo Congresso Nacional e pelo Chefe do Poder Executivo) A consequecircncia eacute a adoccedilatildeo de um amontoado desarticulado de medidas motivadas pela urgecircncia da conjuntura que natildeo guardam sintonia entre si quando observadas no longo prazo e que tecircm quase sempre apenas um objetivo promover o aumento de arrecadaccedilatildeo exigido pela poliacutetica macroeconocircmica

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

144

Demais disso Pontes (2004 p 141) explicita que a instabilidade reflete-se ainda

[] na contemplaccedilatildeo legal cada vez maior de pleitos de setores econocircmicos indivi-dualizados Como natildeo haacute uma diretriz tributaacuteria clara (dada a inexistecircncia de plane-jamento para a poliacutetica tributaacuteria) a legislaccedilatildeo eacute o repertoacuterio de comandos discipli-nando interesses setorizados fruto das pressotildees institucionais [hellip] Assim a falta de planejamento aumenta a desarticulaccedilatildeo das regras tributaacuterias acirra as desigualdades infundadas e constitui campo propiacutecio para a contemplaccedilatildeo de normas que represen-tam o fruto da pressatildeo de alguns setores organizados

Segundo Pontes (2004 p 142) tambeacutem eacute da natureza do sistema tributaacuterio brasileiro a sua

complexidade que seria uma unanimidade entre os expertos dos setores puacuteblico e privado a classe

empresarial e os profissionais dedicados ao tema da tributaccedilatildeo Para o autor (PONTES 2004 142-143)

o Governo Federal natildeo empreende esforccedilos no sentido de solucionar o problema que vem se agigan-

tando cada vez mais sobretudo na esfera estadual onde a complexidade eacute traduzida pela amplitude

de normas que versam acerca do ICMS ldquo[] tornando praticamente impossiacutevel o regular cumprimento

da legislaccedilatildeo tributaacuteria por contribuintes que natildeo dispotildeem de um arsenal de competentes assessores

fiscais e contaacutebeisrdquo (PONTES 2004 143)

A propoacutesito Krugman e Wells (2007 p 429) lembram que ldquoo custo administrativo mais co-

nhecido do sistema tributaacuterio eacute o tempo que os indiviacuteduos gastam preenchendo seus formulaacuterios de

imposto ou o dinheiro gasto com contadores para que preparem os impostos para elesrdquo

Daiacute porque Zottmann (2008 p 42) ao discorrer sobre os agentes econocircmicos que integram a

informalidade afirma que estes muitas das vezes tecircm a pretensatildeo de se enquadrarem na categoria de

agentes formais cumpridores das responsabilidades tributaacuterias a eles atribuiacutedas mas que assim natildeo

o fazem ante o custo extremamente alto que envolve a responsabilidade pela administraccedilatildeo e pelo

pagamento de tributos

Conforme Tanzi (2009 p 45)

A economia subterracircnea traz implicaccedilotildees para o sistema tributaacuterio Quando uma por-ccedilatildeo consideraacutevel da economia de um paiacutes passa para a economia subterracircnea e por-tanto natildeo cumpre com suas obrigaccedilotildees fiscais mas ainda assim usa os serviccedilos do governo isso forccedila o governo a aumentar as aliacutequotas dos impostos para aqueles que as pagam tornando sua vida ainda mais difiacutecil O governo tambeacutem pode arrecadar menos receitas fiscais do que o necessaacuterio para evitar dificuldades macroeconocircmicas Por se tornar menos neutro o sistema fiscal tambeacutem impotildee distorccedilotildees agrave economia

No que tange especificamente ao planejamento da poliacutetica tributaacuteria que envolve o cumpri-

mento de obrigaccedilotildees acessoacuterias tem-se que a idealizaccedilatildeo desses mecanismos de controle utilizados

pela Administraccedilatildeo Tributaacuteria deve estar baseada em paracircmetros razoaacuteveis que permitam ao contri-

buinte cumprir adequadamente com as suas obrigaccedilotildees tributaacuterias sem que essa conduta venha a

representar um ocircnus insuportaacutevel prejudicando o exerciacutecio da atividade econocircmica

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

145

Machado Segundo e Machado (2004 p 192) ao discorrerem sobre o razoaacutevel e o proporcional

em mateacuteria tributaacuteria aduzem que as obrigaccedilotildees acessoacuterias devem consubstanciar deveres racio-

nais coerentes com o senso comum devendo ainda serem adequadas necessaacuterias e proporcionais

tornando possiacutevel desta forma que a Administraccedilatildeo Tributaacuteria possa ldquo[] aferir o cumprimento das

obrigaccedilotildees tributaacuterias principais otimizando assim o atendimento aos princiacutepios da isonomia e da

capacidade contributivardquo

Vecirc-se portanto que para o estabelecimento de uma adequada poliacutetica tributaacuteria nesse sentido

eacute salutar que os seus gestores empreendam esforccedilos no sentido de racionalizar o cumprimento das

obrigaccedilotildees acessoacuterias por parte do contribuinte viabilizando por um lado a realizaccedilatildeo da atividade

fiscalizatoacuteria mas evitando por outro que elas venham a representar um ocircnus excessivo implicando

em custos elevados e pouco razoaacuteveis para os contribuintes

Apesar disso segundo Pontes (2004 p 142) no Brasil o custo de conformidade (compliance

cost) com as regras que impotildeem as obrigaccedilotildees acessoacuterias tornou-se um relevante item na planilha de

custos das empresas

Enquanto no mundo inteiro a simplicidade dos deveres acessoacuterios constitui meta de uma adequada poliacutetica tributaacuteria do ponto de vista da economicidade e da eficiecircncia no Brasil a legislaccedilatildeo caminha no sentido oposto elevando o custo de conformidade a patamares talvez nunca vividos neste paiacutes (PONTES 2004 p 142)

Pontes (2004 p 143) entende que o objetivo arrecadatoacuterio tambeacutem eacute marcante do sistema

tributaacuterio brasileiro o qual por razotildees macroeconocircmicas tem objetivado exclusivamente a geraccedilatildeo

de receita e a implementaccedilatildeo de meios para facilitar a arrecadaccedilatildeo sem se preocupar com a qua-

lidade da receita seja do ponto de vista da eficiecircncia econocircmica seja do ponto de vista da justiccedila

fiscal e da articulaccedilatildeo com os demais objetivos da ordem constitucional como por exemplo o de-

senvolvimento regional

Todas essas circunstacircncias contribuem sobremodo para o agravamento da crise que afeta as

relaccedilotildees entre o Fisco e o contribuinte Poreacutem existem outros fatores que funcionam como um cata-

lisador do processo de animosidade que se desenvolve no acircmbito do relacionamento travado entre

ambos os atores envolvidos com as poliacuteticas tributaacuterias

Para Neto Cisne (2002 p 147) no Brasil uma das causas que fomentam essa relaccedilatildeo conflituosa

reside na circunstacircncia de que haacute uma desconfianccedila muacutetua entre o Fisco e o contribuinte que poderia

ser mitigada por meio de uma maior participaccedilatildeo dos cidadatildeos nas poliacuteticas puacuteblicas e mediante o

estabelecimento de mecanismos que tenham o condatildeo de conferir transparecircncia agraves accedilotildees estatais

Schoueri (2011 p 43) argumenta que a ideia de responsabilidade poliacutetica dentro do contexto de um

sistema tributaacuterio ideal envolve justamente a necessidade de se exigir por parte dos governos uma

transparecircncia em mateacuteria tributaacuteria que implica saber quem estaacute arcando com o pagamento dos tri-

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

146

butos e quem estaacute se beneficiando com a aplicaccedilatildeo dos recursos A relevacircncia da responsabilidade

poliacutetica toma vulto por exemplo quando se percebe que o sistema tributaacuterio eacute dotado de tributos

indiretos os quais levam a crer que satildeo as empresas natildeo os indiviacuteduos que arcam com o ocircnus deles

decorrentes Do mesmo modo esse tipo de tributaccedilatildeo permite esconder do indiviacuteduo o valor que estaacute

sendo pago por ele (SCHOUERI 2011 p 43)

Ocorre que conforme Pellizzari (1990 p 108) o sistema tributaacuterio brasileiro eacute pouco divulga-

do A populaccedilatildeo tem dificuldade em receber esclarecimentos concernentes a quem paga os tributos

de que forma paga quanto paga onde satildeo aplicados quem os recebe de que forma satildeo distribu-

iacutedos enfim eacute pouco esclarecida quanto ao processo de arrecadaccedilatildeo e de aplicaccedilatildeo dos tributos

como um todo

Acresccedila-se a tudo isso o fato de que corriqueiramente as administraccedilotildees tributaacuterias tecircm o

haacutebito de instituiacuterem mecanismos de cobranccedila de seus tributos que acabam por constranger ilegal-

mente os contribuintes a promoverem a quitaccedilatildeo de seus deacutebitos gerando ainda mais conflitos Satildeo

as denominadas sanccedilotildees poliacuteticas

Sobre o assunto Bim (2004 p 67-68) esclarece que

Para cobrar seus tributos o Estado institui natildeo somente sanccedilotildees pecuniaacuterias para es-timular o cumprimento das obrigaccedilotildees principais ou acessoacuterias mas tambeacutem ldquosan-ccedilotildeesrdquo natildeo pecuniaacuterias para constranger o contribuinte a pagaacute-los Tais sanccedilotildees satildeo conhecidas como indiretas tributaacuterias ou poliacuteticas [] As sanccedilotildees indiretas satildeo meios obliacutequos de cobranccedila tributaacuteria cerceadoras dos direitos fundamentais do cidadatildeo--contribuinte [] Satildeo sanccedilotildees indiretas a saber a interdiccedilatildeo de estabelecimento a apreensatildeo de mercadorias a negativa para a impressatildeo de bloco de notas fiscais o regime especial de fiscalizaccedilatildeo a proibiccedilatildeo de inscriccedilatildeo ou cassaccedilatildeo do cadastro de contribuintes (vg CNPJ) a exigecircncia de pagamento de certos tributos para a expe-diccedilatildeo de licenccedilas alvaraacutes ou para participar de licitaccedilotildees etc A constante nas san-ccedilotildees indiretas eacute a utilizaccedilatildeo de meios diversos sempre restritivos ou impeditivos de aquisiccedilatildeo de algum direito que impeccedilam ou dificultem a atividade do contribuinte para obrigaacute-lo a pagar o tributo O meio eacute variaacutevel mas o fim eacute constante garantir o adimplemento fiscal

Tipke (2012 p 112) ao discorrer sobre a possiacutevel existecircncia de uma conexatildeo entre a inapropria-

da moral impositiva do Estado e uma fraacutegil moral tributaacuteria do contribuinte afirma que muitos fatores

levam a crer que uma tributaccedilatildeo que despreza um coacutedigo de eacutetica modelar dificilmente pode construir

nos contribuintes inibiccedilotildees de ordem moral-tributaacuterias Em verdade ela teria o condatildeo de suprimir sua

consciecircncia tributaacuteria Eacute por isso que o autor (TIPKE 2012 p 114) acredita que ldquouma verdadeira reno-

vaccedilatildeo moral do contribuinte soacute teria ecircxito se em primeiro lugar as leis tributaacuterias fossem remoralizadas

a Justiccedila Tributaacuteria natildeo mais permanecendo marginalizadardquo

Ao discorrer sobre a temaacutetica Cursi (2011 p 158-159) emite a seguinte opiniatildeo

[] eacute preciso se esforccedilar para construir convergecircncias por isso eacute recomendaacutevel de-

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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senvolver um ambiente de exploraccedilatildeo da base tributaacuteria onde os bons valores morais e comportamentais satildeo prestigiados em nome da sustentabilidade e do equiliacutebrio presente e futuro da moralidade nas relaccedilotildees e do comprometimento reciacuteproco O desenvolvimento de valores morais e eacuteticos eacute fundamental para favorecer a efetivida-de e eficaacutecia das relaccedilotildees mantidas no bojo da exploraccedilatildeo da base tributaacuteria

Todavia esperar o desenvolvimento de valores morais e eacuteticos que possam permear o relacio-

namento travado entre o Fisco e o contribuinte eacute uma medida irracional quando o planejamento da

tributaccedilatildeo eacute pautado pela absoluta falta de compromisso dos atores envolvidos nesse processo em

observar os primados baacutesicos e as diretrizes elementares para o estabelecimento de uma adequada

poliacutetica tributaacuteria que possa manter sintonia com os primados da justiccedila fiscal

Destaque-se a esse respeito que Pontes (2004 p 138) numa postura mais radical quanto ao as-

sunto chega inclusive a afirmar que o sistema tributaacuterio brasileiro atual eacute marcado pela completa falta

de planejamento das poliacuteticas tributaacuterias o que constitui um desmedido absurdo que merece todo

tipo de repreensatildeo e censura por parte da populaccedilatildeo sobretudo daquela sua parcela que eacute chamada

a contribuir com o custeio da maacutequina puacuteblica estatal

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Tudo o que fora esboccedilado neste breve estudo leva a crer que em uacuteltima anaacutelise o fator deter-

minante da existecircncia de uma animosidade entre o Fisco e o contribuinte eacute a deficiecircncia das poliacuteticas

tributaacuterias brasileiras como um todo que em geral natildeo buscam efetivar a justiccedila fiscal promovendo

uma redistribuiccedilatildeo de renda e onerando a populaccedilatildeo dentro de limites razoaacuteveis ou seja somente

na medida do que for estritamente necessaacuterio para a consecuccedilatildeo dos objetivos de bem-estar da

coletividade

Esse nefasto estado de coisas vem perdurando e se agravando ao longo dos anos que suce-

deram a promulgaccedilatildeo da Constituiccedilatildeo Federal de 1988 Nesse contexto tem-se que as propostas de

reforma tributaacuteria se apresentam como um novo norte de direccedilatildeo voltado a orientar uma adequada

postura da Administraccedilatildeo Tributaacuteria frente agraves questotildees fiscais mais condizente com os anseios da so-

ciedade brasileira que eacute tatildeo castigada pela deficiecircncia das poliacuteticas tributaacuterias

Sem embargo o que se observa eacute que as dificuldades inerentes agrave implementaccedilatildeo de uma re-

forma tributaacuteria seacuteria no paiacutes que indubitavelmente passa por interminaacuteveis debates poliacuteticos acerca

das suas especificidades fazem minguar qualquer esperanccedila de que mudanccedilas positivas estatildeo por vir

Essa circunstacircncia tem o condatildeo de evidenciar a existecircncia de um cenaacuterio desolador para os

cidadatildeos brasileiros que se veem obrigados a contribuir ferozmente para a manutenccedilatildeo da maacutequina

estatal de conformidade com regras definidas por um sistema tributaacuterio extremamente injusto e de-

sigual que parece ser revestido de uma imutabilidade que diga-se eacute relativa uma vez que as meta-

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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morfoses do arcabouccedilo juriacutedico que lhe daacute forma soacute se prestam a acarretar cada vez mais transtornos

na vida dos contribuintes Diante desse estado de coisas indaga-se como esperar uma relaccedilatildeo har-

mocircnica entre estes e o Fisco

REFEREcircNCIAS

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ZOTTMANN Luiz Vocecirc o Estado e a questatildeo fiscal Rio de Janeiro Documenta Histoacuterica 2008

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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INFLUEcircNCIA DOS FATORES ECONOcircMICOS NA ARRECADACcedilAtildeO DA CON-TRIBUICcedilAtildeO DE MELHORIA NOS MUNICIacutePIOS BRASILEIROS

SUMAacuteRIO Introduccedilatildeo 1 Consideraccedilotildees sobre a Contribuiccedilatildeo de Melhoria e as dificuldades de sua implementaccedilatildeo 2 Anaacutelise prospectiva 3 Anaacutelise eco-nomeacutetrica 31 Interpretando os Resultados 311 Fundo Nacional de Desen-volvimento da Educaccedilatildeo 312 Fundo de Participaccedilatildeo dos Municiacutepios 313 Populaccedilatildeo 314 Contribuiccedilatildeo de Intervenccedilatildeo no Domiacutenio Econocircmico 315 Iacutendice Firjan de Desenvolvimento Municipal 316 Imposto de Propriedade de Veiacuteculos Automotores 317 Imposto Sobre a Propriedade Territorial Rural Consideraccedilotildees finais Referecircncias

Joseacute Flaacutevio da Silva1

INTRODUCcedilAtildeO

A contribuiccedilatildeo de melhoria no Brasil possui previsatildeo constitucional desde a Constituiccedilatildeo Fe-

deral de 1934 por meio do seu artigo 124 A Constituiccedilatildeo Federal de 1937 natildeo previu essa espeacutecie

tributaacuteria as Constituiccedilotildees Federais posteriores previram e atualmente a previsatildeo consta do artigo

145 III da Constituiccedilatildeo Federal de 1988 Eacute importante destacar que o Coacutedigo Tributaacuterio Nacional (CTN)

natildeo definiu a contribuiccedilatildeo de melhoria poreacutem trouxe seus elementos norteadores em seu artigo 81

A literatura sobre federalismo fiscal no Brasil ensina que em uma federaccedilatildeo onde se estrutura

o poder poliacutetico de forma descentralizada (Uniatildeo Estados Municiacutepios e DF) como a forma de Estado

brasileira os municiacutepios possuem competecircncias tributaacuterias limitadas com arrecadaccedilatildeo insuficiente

para suprir suas despesas fazendo-se necessaacuterias as transferecircncias de recursos das esferas superiores

de governo para garantir o equiliacutebrio das contas publicas municipais Aleacutem disso tais repasses federais

e estaduais podem causar nos governantes municipais um desincentivo da exploraccedilatildeo de suas bases

tributaacuterias dado que eles receberatildeo um volume de verbas sem praticar qualquer tipo de esforccedilo arre-

cadatoacuterio desonerando-se do ocircnus poliacutetico que tal esforccedilo possa causar

Nesse sentido ao considerar os constantes deacuteficits observados pelos governos locais eacute impor-

tante destacar o princiacutepio do natildeo deacuteficit na Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) Lei Complementar

1012000 associado ao baixo niacutevel da arrecadaccedilatildeo municipal motivo pelo qual eacute interessante conhe-

cer os fatores que contribuem para a situaccedilatildeo de descaso na cobranccedila de algumas receitas puacuteblicas

Frente agrave determinaccedilatildeo legal da LRF que restringe as renuacutencias de receitas resta a pergunta como os

municiacutepios atendem a essa imposiccedilatildeo jaacute que cobram de forma ineficiente seus tributos O IPTU por

1 Auditor Fiscal Adjunto da Receita Estadual do Cearaacute Mestre em Economia (CAENUFC) E-mail flaviojose2003igcombr

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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exemplo em muitos municiacutepios natildeo eacute cobrado e quando cobrado os imoacuteveis possuem os valores ve-

nais desatualizados enquanto a contribuiccedilatildeo de melhoria raramente eacute cobrada

Conjuntamente ao descaso dos governantes a populaccedilatildeo natildeo demonstra consciecircncia tributaacute-

ria falta educaccedilatildeo fiscal em cada um dos contribuintes brasileiros e tal situaccedilatildeo compromete a res-

ponsabilidade de arrecadar os tributos Aleacutem disso as administraccedilotildees puacuteblicas municipais possuem

dificuldades de estruturar Secretarias de Financcedilas muitas vezes o que seria arrecadado da populaccedilatildeo

natildeo justificaria os gastos materiais e o desgaste poliacutetico

O objetivo deste artigo entatildeo eacute investigar a influecircncia dos fatores econocircmicos (variaacuteveis ex-

plicativas) no incremento da arrecadaccedilatildeo da contribuiccedilatildeo de melhoria pelos municiacutepios brasileiros no

ano de 2009

A metodologia de pesquisa utilizada eacute em um primeiro momento bibliograacutefica e em seguida

satildeo utilizados os recursos da Econometria Apoacutes os resultados obtidos do modelo o coeficiente de

determinaccedilatildeo R2 mostra o quanto da variaccedilatildeo total da arrecadaccedilatildeo eacute explicado pela reta de regressatildeo

dos miacutenimos quadrados ordinaacuterios (MQO) Em siacutentese o poder explicativo do modelo economeacutetrico

foi 2425 indicando uma significativa influecircncia dos fatores econocircmicos Tambeacutem eacute essencial conhe-

cer quais as causas do desprezo pela contribuiccedilatildeo de melhoria no Brasil Esse conhecimento torna-se

fundamental para a construccedilatildeo de poliacuteticas voltadas para a elevaccedilatildeo da arrecadaccedilatildeo com o objetivo

de assegurar os recursos que compatibilizem as receitas obtidas com as despesas praticadas

Aleacutem desta seccedilatildeo introdutoacuteria o trabalho eacute dividido em trecircs toacutepicos Inicialmente satildeo apresen-

tadas as consideraccedilotildees gerais sobre a contribuiccedilatildeo de melhoria no Brasil sob o enfoque legislativo

Em seguida trata-se da anaacutelise prospectiva do referido tributo O terceiro toacutepico apresenta a anaacutelise

economeacutetrica e o modelo utilizado para estimaccedilatildeo dos paracircmetros das variaacuteveis explicativas Por fim

as consideraccedilotildees finais limitaccedilotildees e recomendaccedilotildees para trabalhos futuros

1 CONSIDERACcedilOtildeES SOBRE A CONTRIBUICcedilAtildeO DE MELHORIA E AS DIFICULDADES NA SUA IMPLEMENTACcedilAtildeO

A contribuiccedilatildeo de melhoria eacute uma espeacutecie tributaacuteria que possui como base imponiacutevel a valori-

zaccedilatildeo imobiliaacuteria decorrente de obra puacuteblica estando contemplada no artigo 145 inciso III da Consti-

tuiccedilatildeo Federal de 1988 Destaque-se ainda que o referido tributo foi disciplinado nos artigos 81 e 82

do Coacutedigo Tributaacuterio Nacional (CTN) e regulamentado pelo Decreto-Lei 195 de 1967

Deve-se observar que o CTN respalda a cobranccedila da contribuiccedilatildeo pela necessidade da indeni-

zaccedilatildeo do contribuinte ao ente poliacutetico em consequecircncia dos custos da obra dos valores gastos con-

forme prevecirc seu artigo 81

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

153

Art 81 A contribuiccedilatildeo de melhoria cobrada pela Uniatildeo pelos Estados pelo Distrito Federal ou pelos municiacutepios no acircmbito de suas respectivas atribuiccedilotildees eacute instituiacuteda para fazer face ao custo de obras puacuteblicas de que decorra valorizaccedilatildeo imobiliaacuteria ten-do como limite total a despesa realizada e como limite individual o acreacutescimo de valor que da obra resultar para cada imoacutevel beneficiado

O Decreto-Lei 19567 por sua vez respalda a cobranccedila da contribuiccedilatildeo pela valorizaccedilatildeo imo-

biliaacuteria consoante se verifica em seu artigo 1ordm ldquoA Contribuiccedilatildeo de Melhoria prevista na Constituiccedilatildeo

Federal tem como fato gerador o acreacutescimo do valor do imoacutevel localizado nas aacutereas beneficiadas di-

reta ou indiretamente por obras puacuteblicasrdquo

A legitimidade da contribuiccedilatildeo de melhoria em decorrecircncia do Decreto-Lei 1951967 foi ques-

tionada poreacutem segundo o Supremo Tribunal Federal (STF) a Suacutemula 496 editada ainda sobre a eacutegide

de ordem constitucional anterior o tributo eacute legiacutetimo no ordenamento juriacutedico brasileiro

STF Suacutemula nordm 496 - 03121969 Satildeo vaacutelidos porque salvaguardados pelas disposiccedilotildees constitucionais transitoacuterias da Constituiccedilatildeo Federal de 1967 os decretos-leis expedidos entre 24 de janeiro e 15 de marccedilo de 1967

Pela definiccedilatildeo a contribuiccedilatildeo de melhoria eacute um tributo cobrado quando uma obra puacuteblica valo-

riza um imoacutevel particular Sua utilizaccedilatildeo no ordenamento juriacutedico brasileiro eacute antiga segundo registros

de Gomide (2009) tendo os primeiros indiacutecios da contribuiccedilatildeo de melhoria ocorridos no Brasil Impeacute-

rio em 1812 com a imposiccedilatildeo das fintas2 para a edificaccedilatildeo de obras puacuteblicas na Bahia e em 1818

com a determinaccedilatildeo das fintas para o reparo de vaacuterias pontes no Municiacutepio de Mariana ndash MG

Esse tributo eacute bastante justo e sua aparente complexidade natildeo pode inibir a busca de soluccedilotildees

para o caso de sua subutilizaccedilatildeo no meio fazendaacuterio A atividade de arrecadaccedilatildeo da contribuiccedilatildeo de

melhoria natildeo eacute simples cabendo destacar que tal processo arrecadatoacuterio passa por um conjunto de

dificuldades que impregnam o referido tributo no contexto da legislaccedilatildeo fiscal tornando seu entendi-

mento e operacionalizaccedilatildeo uma tarefa complexa

A questatildeo da valorizaccedilatildeo imobiliaacuteria decorrente dos investimentos puacuteblicos como fato gerador

interage com os aparelhamentos teacutecnicos de outros profissionais alheios ao fisco3 A cobranccedila da con-

tribuiccedilatildeo de melhoria eacute uma questatildeo complexa tendo em vista os vaacuterios requisitos previstos na norma

O Decreto-Lei 19567 por exemplo exige para a cobranccedila do tributo que a Administraccedilatildeo compe-

tente publique o edital contendo entre outros os seguintes elementos delimitaccedilatildeo das aacutereas direta

e indiretamente beneficiadas e a relaccedilatildeo dos imoacuteveis nelas compreendidos memorial descritivo do

projeto orccedilamento total ou parcial do custo das obras determinaccedilatildeo da parcela do custo das obras a

2 Fintas eacute o mesmo que imposto tributo contribuiccedilatildeo puacuteblica poreacutem sem frequecircncia de uso SENIOR (1882 p 101) 3 O art 9ordm da Lei que dispotildee sobre a contribuiccedilatildeo de melhoria no Cearaacute Lei nordm 154842013 indica ldquoOs valores referidos no caput deste artigo seratildeo estabelecidos em avaliaccedilatildeo efetuada por comissatildeo composta por representantes de oacutergatildeos puacuteblicos nos termos definidos em decreto regulamentarrdquo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

154

ser ressarcida pela contribuiccedilatildeo com o correspondente plano de rateio entre os imoacuteveis beneficiados

Haacute ainda outras exigecircncias o que torna sua operacionalizaccedilatildeo trabalhosa

Chiara (2006) mostra que a contribuiccedilatildeo de melhoria eacute um tributo ainda pouco explorado no

Brasil Essa constataccedilatildeo eacute reforccedilada especialmente no Cearaacute pois a Secretaria da Fazenda Estadual (Se-

faz) nada arrecada com essa competecircncia tributaacuteria O artigo 3ordm da Lei Estadual 154842013 diz que a

contribuiccedilatildeo de melhoria seraacute exigida para fazer face a seus custos

Parece que a influecircncia legal eacute muito pequena e conforme Machado (2007) a realidade tem de-

monstrado que de forma geral a contribuiccedilatildeo de melhoria pouco ou nada vem rendendo ao eraacuterio

raras e esparsas satildeo as notiacutecias da sua utilizaccedilatildeo o que contribui para o agravamento de uma situaccedilatildeo

comum no ordenamento juriacutedico paacutetrio a transformaccedilatildeo dos diplomas legais em simples repertoacuterios

de dispositivos ineficazes e de pouca efetividade

As obras puacuteblicas satildeo iniciadas e concretizadas em decorrecircncia de interesse puacuteblico e natildeo de

interesse particular assim toda a sociedade em tese eacute beneficiada com a concretizaccedilatildeo do gasto

puacuteblico Apressadamente poder-se-ia concluir que toda a populaccedilatildeo estaria beneficiada de forma

isonocircmica e que todos contribuiacuteram indiretamente via impostos com os gastos decorrentes poreacutem

natildeo eacute isso que ocorre Algumas obras puacuteblicas beneficiam diretamente algumas pessoas valorizando

diretamente seus imoacuteveis Nesse sentido Paulsen (2004) justifica o seu pagamento pelo princiacutepio do

enriquecimento sem causa Daiacute a razatildeo da existecircncia do tributo competecircncia concedida aos entes

poliacuteticos para tributar os particulares diretamente beneficiados pela concretizaccedilatildeo da obra puacuteblica

Essa espeacutecie tributaacuteria objetiva um senso de justiccedila no sentido de distribuir os ocircnus de algu-

mas obras puacuteblicas tipificadas na norma para pessoas adjacentes diretamente beneficiadas Machado

(2007 p 139) comenta a respeito

Por isso ao falar-se da funccedilatildeo da contribuiccedilatildeo de melhoria eacute importante esclarecer que ao lado da funccedilatildeo arrecadatoacuteria tem ela uma importantiacutessima funccedilatildeo redistribu-tiva funccedilatildeo que aliaacutes lhe confere especificidade Natildeo fora sua especial funccedilatildeo como instrumento destinado a retirar dos proprietaacuterios de imoacuteveis o incremento de valor destes decorrente da obra puacuteblica natildeo teria ela razatildeo de ser no sistema tributaacuterio

Bastos (1990) entende que a contribuiccedilatildeo de melhoria eacute possivelmente a espeacutecie tributaacuteria mais

justa Paga aquele que dela se beneficiar nos limites dos custos que a obra puacuteblica utilizou Aqui deve

ser lembrado o instituto da imputaccedilatildeo do pagamento4 que ocorre quando o contribuinte possui mais

de um deacutebito perante o fisco em que a contribuiccedilatildeo de melhoria prevaleceraacute sobre as taxas e impos-

4 CTN - ldquoArt 163 Existindo simultaneamente dois ou mais deacutebitos vencidos do mesmo sujeito passivo para com a mesma pessoa juriacutedica de direito puacuteblico relativos ao mesmo ou a diferentes tributos ou provenientes de penalidade pecuniaacuteria ou juros de mora a autoridade administrativa competente para receber o pagamento determinaraacute a respectiva imputaccedilatildeo obedecidas as seguintes regras na ordem em que enumeradas I - em primeiro lugar aos deacutebitos por obrigaccedilatildeo proacutepria e em segundo lugar aos decorrentes de responsabilidade tributaacuteria II - primeiramente agraves contribuiccedilotildees de melhoria depois agraves taxas e por fim aos impostos []rdquo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

155

tos (deveraacute ser paga antes desses) pelo fato de possuir um alto grau de retributividade Desta forma

deveraacute ser paga com prioridade a fim de evitar o enriquecimento sem causa

Biava (1994 p 2) encontra reforccedilo para a cobranccedila da contribuiccedilatildeo de melhoria

Entre as alternativas factiacuteveis para a Uniatildeo os Estados e os municiacutepios existe uma potencialidade efetiva tradicionalmente inaproveitada mas que poderaacute ser impor-tante instrumento para cobrir os crescentes custos de implantaccedilatildeo de serviccedilos que demandem a execuccedilatildeo de obras Trata-se da contribuiccedilatildeo de melhoria instrumento tributaacuterio jaacute disponiacutevel constitucionalmente haacute mais de meio seacuteculo persistentemen-te desprezado

Tem-se farta literatura juriacutedica sobre o assunto contudo do ponto de vista econocircmico os tra-

balhos satildeo escassos e isso natildeo passou despercebido por Biava (1986 p 18)

Observa-se assim que o conjunto de trabalhos acadecircmicos teoacutericos e tambeacutem os que visavam sua aplicaccedilatildeo no Brasil caracteriza-se pela ecircnfase nos aspectos juriacutedicos e pragmaacuteticos com poucas referecircncias a elementos vinculados agrave aacuterea econocircmica Estes aspectos encontrados muito esparsamente na literatura mundial satildeo apresentados de forma sinteacutetica em pesquisa publicada pelo Banco Interamericano de Desenvolvi-mento

O pouco ou nenhum uso do tributo contribuiccedilatildeo de melhoria gera um grande desperdiacutecio da

base tributaacuteria o que seria de enorme importacircncia nos projetos das gestotildees puacuteblicas municipais De-

veria ser cobrada mas verdadeiramente natildeo eacute essa postura das autoridades fazendaacuterias jaacute eacute esperada

porque muitos contribuintes que estariam no acircmbito da incidecircncia possuem influecircncia no meio poliacute-

tico afastando a cobranccedila que recairia sobre eles mesmos

Conforme ensina Machado (2011) essa espeacutecie tributaacuteria a contribuiccedilatildeo de melhoria natildeo tem

sido exigida no Brasil por causa da exigecircncia legal de publicaccedilatildeo do orccedilamento da obra tendo o

contribuinte o direito de impugnar o respectivo valor Enfatiza o autor que as obras puacuteblicas satildeo geral-

mente contratadas por valores superfaturados praticados acima dos indicados no mercado de sorte

que a transparecircncia natildeo eacute conveniente para a Administraccedilatildeo e muito menos para as empresas que

contratam com o Estado para finalizar as obras puacuteblicas A verdadeira razatildeo para a natildeo instituiccedilatildeo da

contribuiccedilatildeo de melhoria consoante Machado (2011) eacute a necessidade da transparecircncia aparentemen-

te rejeitada pelos administradores puacuteblicos

Observando como exemplo o Estado do Cearaacute e levando em consideraccedilatildeo os demais tributos

de competecircncia estadual essa espeacutecie tributaacuteria natildeo repercute significativamente na arrecadaccedilatildeo A

omissatildeo na cobranccedila da contribuiccedilatildeo de melhoria torna a lei estadual que dispotildee sobre o tributo5 uma

letra morta desconsiderando abertamente o trabalho da Casa Legislativa Eacute omissatildeo sem justificativa

existe a lei deve ser cumprida A ausecircncia da taxaccedilatildeo eacute puramente de ordem poliacutetica a despeito da sua

5 Lei Estadual nordm 15484 de 20 de dezembro de 2013 que dispotildee sobre a contribuiccedilatildeo de melhoria em obras estaduais

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

156

importacircncia para as receitas de um Estado pobre como o Cearaacute Tanto eacute assim que Nascimento (2001)

registra que o artigo 11 da LRF incorpora regra da doutrina administrativa e como tal obriga o agente

puacuteblico a cumprir em toda a sua plenitude o mandato que lhe eacute conferido pela sociedade Tenta evitar

as atitudes fisioloacutegicas tatildeo comuns na poliacutetica brasileira assentadas na maacutexima religiosa que ganhou

certa notoriedade consistente no ldquoeacute dando que se receberdquo numa utilizaccedilatildeo deturpada e caricaturada

do princiacutepio consagrado pela crenccedila popular Nesse sentido eacute o entendimento de Mota (2005 p 787)

ldquoO texto busca coibir as indevidas e demagoacutegicas isenccedilotildees de tributos que se verificam nas instacircncias

federativas a exemplo inexigecircncia de IPTU Municipalrdquo

A redaccedilatildeo enfatiza um princiacutepio assente na doutrina do Direito Administrativo que eacute a indispo-

nibilidade do bem puacuteblico o Estado natildeo pode abrir matildeo de suas prerrogativas devendo exercer toda

a extensatildeo de sua competecircncia tributaacuteria incluindo a eficiecircncia na arrecadaccedilatildeo

Como ensina Pinheiro (2003) a injusticcedila do sistema de benefiacutecios fiscais eacute evidente ateacute para

o governo mas nada se faz para mudar a situaccedilatildeo A renuacutencia fiscal favorece na maioria das vezes a

quem menos dela necessita a injusticcedila eacute evidente e demonstrada pelo governo Natildeo eacute realizada uma

distribuiccedilatildeo dos benefiacutecios favorecendo as regiotildees mais necessitadas do Estado O governo para isso

teria de enfrentar lobbies com bom apoio no Legislativo e provavelmente no proacuteprio Executivo Como

resultado perpetuam-se as regiotildees inseridas nos bolsotildees de pobreza enquanto regiotildees desenvolvidas

tecircm acesso a benefiacutecios de que natildeo precisam6

Como percebido por Locircbo (2012) quando a atuaccedilatildeo do Estado consiste na execuccedilatildeo de uma

obra puacuteblica duas consequecircncias podem acontecer o incremento do valor dos imoacuteveis circunvi-

zinhos ou a desvalorizaccedilatildeo daqueles preacutedios Esta uacuteltima hipoacutetese menos comum rende ensejo

agrave reparaccedilatildeo econocircmica a primeira mais frequente reclama a absorccedilatildeo da mais-valia pelo Poder

Puacuteblico Se o Estado por meio do instrumento adequado natildeo chamar para si a ldquomais valiardquo estaraacute

desatendendo o princiacutepio da igualdade Nesse sentido vale destacar uma decisatildeo judicial que res-

palda esse entendimento7

A LRF introduz uma exigecircncia legal na gestatildeo das financcedilas puacuteblicas apoiada pela respon-

sabilidade dos gestores puacuteblicos de todos os poderes demonstrando um avanccedilo no cuidado que a

Administraccedilatildeo Puacuteblica deve reservar aos recursos que os contribuintes entregam ao eraacuterio Afinal a

LRF instituiu condiccedilotildees fixou limites e estabeleceu demonstrativos com o objetivo de ter um maior

controle no acompanhamento e transparecircncia dos recursos puacuteblicos

6 Eacute uma omissatildeo inaceitaacutevel porque o artigo 3ordm da Lei que dispotildee sobre a contribuiccedilatildeo de melhoria no Cearaacute Lei 154842013 eacute claro ao determinar a tributaccedilatildeo natildeo deixando margem para a sua discricionariedade fato presente tam-beacutem na legislaccedilatildeo anterior7 (18486) EXECUCcedilAtildeO FISCAL CONTRIBUICcedilAtildeO DE MELHORIA Sendo o fato gerador do tributo a valorizaccedilatildeo produzida no imoacutevel pela obra puacuteblica (calccedilamento) o ressarcimento pelo beneficiaacuterio eacute devido sob pena de enriquecimento iliacutecito (Apelaccedilatildeo Ciacutevel e Reexame Necessaacuterio nordm 196054761 2ordf Cacircmara Ciacutevel do TARS Campo Bom Rel Marco Aureacutelio dos Santos Caminha Apelante Municiacutepio de Campo Bom Apelado Jorge Jair Schuch j 220896)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

157

De acordo com a Secretaria do Tesouro Nacional em 1997 apenas 18 dos municiacutepios brasi-

leiros cobravam essa espeacutecie de receita proacutepria Comentando o artigo 11 da Lei de Responsabilidade

Fiscal os autores afirmamO artigo obriga os entes a instituir e arrecadar os tributos de sua competecircncia Trata--se para muitos de uma norma inconstitucional posto que a Carta Magna ao dispor sobre competecircncias tributaacuterias o faz no sentido de outorgaacute-las Portanto estaria ao alvedrio do ente instituir ou natildeo o tributo No entanto a regra eacute taxativa instituir e cobrar todos os tributos de sua competecircncia Caso essa norma seja levada a termo a Uniatildeo seria obrigada a instituir e cobrar o imposto sobre grandes fortunas que eacute de previsatildeo constitucional (FIGUEIREDO et al 2001 p 92)

Dessa forma referindo-se ao mesmo artigo 11 da LRF Toledo Jr e Rossi (2005) afirmam que a

contribuiccedilatildeo de melhoria eacute tributo muito pouco explorado pela unidade local de governo

2 ANAacuteLISE PROSPECTIVA

Este trabalho utiliza dados transversais do ano de 2009 objetivando realizar uma anaacutelise pros-

pectiva que permite investigar a influecircncia das variaacuteveis econocircmicas na arrecadaccedilatildeo da contribuiccedilatildeo

de melhoria

O modelo utiliza uma amostra de municiacutepios que tecircm em comum valores arrecadados da con-

tribuiccedilatildeo de melhoria em 2009 Dessa forma pode-se observar a maneira como a presenccedila dos fatores

econocircmicos (cota IPVA cota FPM populaccedilatildeo entre outros) influencia a arrecadaccedilatildeo desse tributo As

conclusotildees obtidas a partir dos dados dos municiacutepios que arrecadam a contribuiccedilatildeo de melhoria po-

dem influenciar os gestores dos 791 dos municiacutepios que natildeo cobram o tributo

Foram testados no modelo como variaacutevel explicativa o PIB de 2008 e o PIB de 2009 todavia

se mostraram estatisticamente insignificantes e foram retirados Eacute consenso que o PIB contribui para o

aumento da arrecadaccedilatildeo tal variaacutevel eacute uma das responsaacuteveis por captar o efeito da base tributaacuteria so-

bre a arrecadaccedilatildeo Consequentemente uma maior base propicia uma maior arrecadaccedilatildeo Poreacutem isso

natildeo eacute realidade com a contribuiccedilatildeo de melhoria na praacutetica haacute casos que derrubam tal entendimento

Por exemplo em 2009 o municiacutepio de Satildeo Paulo com um PIB de R$ 188 milhotildees arrecadou apenas R$

500614 enquanto municiacutepios com PIB moderado arrecadaram valores expressivos

Todos os municiacutepios estatildeo expostos aos fatores econocircmicos todavia somente alguns arreca-

dam o tributo O problema natildeo estaacute nesses fatores econocircmicos porque duacutevidas natildeo existem que sem

eles natildeo haacute base tributaacuteria para a cobranccedila da contribuiccedilatildeo de melhoria

A razatildeo da maioria dos municiacutepios natildeo cobrarem o tributo eacute a mesma da Uniatildeo natildeo cobrar o

Imposto sobre Grandes Fortunas bem como da Uniatildeo natildeo ter interesse no Imposto Territorial Rural

tanto eacute assim que delega a capacidade tributaacuteria ativa desse imposto aos municiacutepios caso queiram

Razotildees satildeo muitas e de cunho poliacutetico Por exemplo poderaacute ser questionado que esse tributo traz mais

prejuiacutezo que benefiacutecio ao Sistema Tributaacuterio Nacional eacute um retrocesso falar na instituiccedilatildeo e cobranccedila

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

158

de mais um tributo quando se espera a qualquer momento uma reforma tributaacuteria os recordes de ar-

recadaccedilatildeo satildeo constantes aumento de superaacutevit primaacuterio ano a ano tudo isso sem uma poliacutetica firme

de redistribuiccedilatildeo de riqueza entatildeo para que mais um tributo para aumentar a carga tributaacuteria dos

contribuintes

De todo modo acredita-se que o foco deveraacute ser no futuro o crescimento da arrecadaccedilatildeo

desse tributo prevendo-o de forma diferente da situaccedilatildeo atual de omissatildeo da maioria dos municiacutepios

Segue quadro com as participaccedilotildees das contribuiccedilotildees de melhoria municipais em suas respectivas

regiotildees bem como os percentuais dos municiacutepios que arrecadaram esse tributo em 2009

Quadro - Arrecadaccedilatildeo da Contribuiccedilatildeo de Melhoria por Regiatildeo Estados e municiacutepios em 2009

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

159

Por isso pode-se observar que os municiacutepios brasileiros participam muito pouco em todas as

regiotildees da configuraccedilatildeo da arrecadaccedilatildeo da contribuiccedilatildeo de melhoria Essa constataccedilatildeo eacute mais eviden-

te nas regiotildees Norte e Nordeste especialmente nessa uacuteltima meacutedia de 717 bem inferior a nacional

que foi 2124 Os municiacutepios da regiatildeo Sul satildeo os mais ativos na arrecadaccedilatildeo tributaacuteria com desem-

penho acima da meacutedia nacional apresentando o percentual de 4431 por outro lado os percentuais

da regiatildeo Centro-Oeste e Sudeste giraram em torno de 209 e 2142 respectivamente Resta claro

que satildeo percentuais longe do ideal contudo indicam para os municiacutepios omissos na cobranccedila a pos-

sibilidade da arrecadaccedilatildeo da contribuiccedilatildeo de melhoria

Percebe-se que ainda precisa ser feito muito mais para o ajustamento da gestatildeo puacuteblica mu-

nicipal principalmente as gestotildees municipais do Norte e Nordeste brasileiro as quais mostram ar-

recadaccedilotildees longe da meacutedia nacional As administraccedilotildees municipais precisam expandir os potenciais

de arrecadaccedilatildeo especialmente o da contribuiccedilatildeo de melhoria Um bom comeccedilo seria seguir a praacutetica

dos governos locais da regiatildeo Sul do Brasil importando essas boas praacuteticas Igualmente os gestores

municipais devem implantar um preciso controle das bases tributaacuterias como eacute o caso da perioacutedica

atualizaccedilatildeo cadastral dos imoacuteveis em seus territoacuterios

3 ANAacuteLISE ECONOMEacuteTRICA

Uma maneira bastante conveniente para expressar o comportamento de um conjunto de va-

riaacuteveis sobre uma variaacutevel qualquer eacute o Modelo Claacutessico de Regressatildeo Linear (MCRL) Esse meacutetodo

oferece um conjunto de propriedades que garante de forma eficiente e consistente a estimaccedilatildeo da

contribuiccedilatildeo de cada variaacutevel explicativa sobre uma variaacutevel dependente Dessa forma partindo dos

objetivos apresentados neste trabalho esta pesquisa manuseia uma estrutura de dados em cortes

transversais8 para 1149 municiacutepios brasileiros no ano de 2009 e estima-se o seguinte modelo em sua

8 Variaacuteveis explicativas estaacuteticas no tempo retiradas de um uacutenico periacuteodo de tempo no caso 2009

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

160

forma geral Yi = szligo + szlig1X1i + szlig2X2i + + szligkXki + εi (1)

onde Yi eacute a variaacutevel dependente Xki satildeo as variaacuteveis explicativas szligk satildeo os paracircmetros a serem

estimados εi eacute o erro do modelo

Especificamente o modelo eacute descrito da seguinte forma

RTi = szlig0 + szlig1fndei + szlig2fpmi + szlig3popui + szlig4cidei + szlig5ifdmi + szlig6ipvai + szlig7itrui + εi (2)

onde RTi eacute a receita da contribuiccedilatildeo de melhoria do municiacutepio i fndei eacute o valor repassado pelo

Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educaccedilatildeo ao municiacutepio i fpmi eacute o valor repassado pelo Fundo

de Participaccedilatildeo dos Municiacutepios ao municiacutepio i popui eacute a populaccedilatildeo total do municiacutepio i cidei eacute o valor

da Contribuiccedilatildeo de Intervenccedilatildeo do Domiacutenio Econocircmico transferido ao municiacutepio i ifdmi eacute o iacutendice

Firjan de desenvolvimento municipal do municiacutepio i ipvai eacute a cota do IPVA transferida ao municiacutepio i

itrui eacute o valor do imposto sobre a propriedade territorial rural do municiacutepio i εi eacute o termo de erro

Os paracircmetros correspondentes de cada uma das variaacuteveis explicativas apresentam seus acreacutes-

cimos ou decreacutescimos na mensuraccedilatildeo da variaacutevel dependente estudada A Tabela 1 em seguida apre-

senta os resultados da regressatildeo proposta A Tabela 2 mostra as estatiacutesticas descritivas das variaacuteveis

Tabela 1 - resultados da regressatildeo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

161

Tabela 2 - Estatiacutesticas descritivas

31 Interpretando os resultados

Diante dos resultados a hipoacutetese nula foi rejeitada para todos os coeficientes do modelo ao niacute-

vel de significacircncia de 10 Desta forma as estimativas destacam que as variaacuteveis incluiacutedas no modelo

afetaram de forma individual a arrecadaccedilatildeo da contribuiccedilatildeo de melhoria

Ademais atraveacutes da estatiacutestica F pode-se afirmar que conjuntamente as variaacuteveis explicativas

utilizadas provocaram mudanccedilas nos valores arrecadados a tiacutetulo de contribuiccedilatildeo de melhoria Ao

niacutevel de significacircncia de 1 as variaacuteveis explicativas afetaram conjuntamente o comportamento das

receitas provenientes desse tributo

O coeficiente de determinaccedilatildeo R2 mostra o quanto da variaccedilatildeo total da arrecadaccedilatildeo eacute explica-

do pela reta de regressatildeo de MQO Assim pode-se dizer que 2425 da variaccedilatildeo da contribuiccedilatildeo de

melhoria em torno da sua meacutedia satildeo explicadas pelo modelo considerado

311 Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educaccedilatildeo

A influecircncia do FNDE na arrecadaccedilatildeo da contribuiccedilatildeo de melhoria eacute significativa A cada R$

600 mil de receita recebida para aplicaccedilatildeo na educaccedilatildeo estima-se um decreacutescimo na arrecadaccedilatildeo do

tributo em R$ 306 mil Quanto mais recursos advindos de outro ente poliacutetico menor o interesse do

Municiacutepio na tributaccedilatildeo consequentemente menor o desgaste poliacutetico diante do eleitorado

312 Fundo de Participaccedilatildeo dos Municiacutepios

Constatou-se que esse tipo de transferecircncia governamental aos municiacutepios brasileiros exerce

influecircncia negativa sobre a arrecadaccedilatildeo tributaacuteria Verifica-se que quanto maior o volume de recursos

repassados aos municiacutepios via FPM menor a necessidade de auferir receita proacutepria para realizaccedilatildeo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

162

de suas atividades Quando as receitas de uma municipalidade possuem grande dependecircncia dessa

transferecircncia os governos locais acabam por natildeo explorar suas bases e assim exercem um baixo niacutevel

de esforccedilo fiscal Diante disso da mesma forma que o FNDE a influecircncia do FPM na arrecadaccedilatildeo da

contribuiccedilatildeo de melhoria foi negativa A cada milhatildeo de receita recebida desse fundo estima-se um

decreacutescimo na arrecadaccedilatildeo do tributo em R$ 320

313 Populaccedilatildeo

Note-se que a variaacutevel populaccedilatildeo eacute uma proxy que capta o tamanho da base tributaacuteria Quan-

to maior a base tributaacuteria maior seraacute o potencial de arrecadaccedilatildeo assim era esperado que tal variaacutevel

explicativa influenciasse positivamente a arrecadaccedilatildeo De fato um maior contingente populacional

condiz com uma base tributaacuteria mais elevada e assim possui um efeito marginal positivo sobre a ar-

recadaccedilatildeo da contribuiccedilatildeo de melhoria Tal fato pode ser observado pelo sinal positivo do paracircmetro

estimado para variaacutevel populaccedilatildeo

314 Contribuiccedilatildeo de Intervenccedilatildeo no Domiacutenio Econocircmico

O efeito positivo da variaacutevel Cide jaacute era previsto no modelo Estaacute se tratando de uma trans-

ferecircncia governamental obrigatoacuteria contudo de uso condicional em investimento de infra-estrutura

de transporte e sem contrapartida Deduz-se entatildeo que como os recursos satildeo condicionados para

investimentos de infra-estrutura de transporte resta pouca manipulaccedilatildeo poliacutetica de tais recursos O

fato eacute que a construccedilatildeo de estradas e obras semelhantes eacute fato gerador da contribuiccedilatildeo de melhoria

portanto quanto mais recursos da Cide - Combustiacutevel no Municiacutepio mais obras no setor de transporte

e daiacute o reflexo no paracircmetro positivo em 0098 A cada R$ 50 mil recebido pelo municiacutepio estima-se

que a arrecadaccedilatildeo da contribuiccedilatildeo de melhoria cresccedila R$ 49 mil

315 Iacutendice Firjan de Desenvolvimento Municipal

Esperava-se que o iacutendice Firjan contribuiacutesse positivamente porque quanto mais investimentos

municipais mais recursos satildeo necessaacuterios para o custeio desses serviccedilos puacuteblicos Assim o gestor puacute-

blico natildeo pode desprezar a arrecadaccedilatildeo da contribuiccedilatildeo de melhoria O resultado da contribuiccedilatildeo do

iacutendice Firjan para a arrecadaccedilatildeo foi positiva O paracircmetro positivo mostra que existe uma relaccedilatildeo entre

arrecadaccedilatildeo da contribuiccedilatildeo e o IFDM

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

163

316 Imposto de Propriedade de Veiacuteculos Automotores

A influecircncia da cota do IPVA na arrecadaccedilatildeo da contribuiccedilatildeo de melhoria foi negativa confor-

me o presente modelo economeacutetrico O paracircmetro apresenta o coeficiente -0000937 ou seja a cada

recebimento de R$ 1 milhatildeo da cota IPVA a arrecadaccedilatildeo do tributo diminui em R$ 930 Essa receita

puacuteblica possui a caracteriacutestica da sazonalidade entra nos cofres puacuteblicos municipais no comeccedilo do

ano Tal como o FPM eacute uma transferecircncia governamental no caso do Estado que desestimula a arre-

cadaccedilatildeo de receita proacutepria daiacute a influecircncia negativa

317 Imposto Sobre a Propriedade Territorial Rural

A influecircncia do ITR na arrecadaccedilatildeo da contribuiccedilatildeo de melhoria foi positiva conforme o presen-

te modelo economeacutetrico O paracircmetro apresenta o coeficiente 0106912 ou seja a cada recebimento

de R$ 50 mil da cota ITR a arrecadaccedilatildeo do tributo aumenta em R$ 53 mil O ITR eacute um tributo de com-

petecircncia federal e a Uniatildeo demonstra natildeo se interessar pela arrecadaccedilatildeo tanto eacute assim que delega a

capacidade tributaacuteria ativa aos municiacutepios casos esses fiscalizem e arrecadem Eacute um tributo trabalhoso

e dispendioso sendo a arrecadaccedilatildeo prejudicada por questotildees poliacuteticas e tambeacutem teacutecnicas De iniacutecio

eacute preciso um cadastro nacional das propriedades rurais e na zona rural a disputa poliacutetica eacute muito acir-

rada de forma que quase natildeo se arrecada esse imposto Daiacute a influecircncia positiva da variaacutevel ou seja

para compensar a baixa arrecadaccedilatildeo do ITR resta lanccedilar matildeo da contribuiccedilatildeo de melhoria

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Foram analisadas as participaccedilotildees dos municiacutepios brasileiros na arrecadaccedilatildeo da contribuiccedilatildeo

de melhoria no ano de 2009 a partir de uma amostra de todos os municiacutepios que arrecadaram esse

tributo Apesar da previsatildeo na Constituiccedilatildeo Federal de 1988 artigo 145 III e exigecircncia da Lei de Res-

ponsabilidade Fiscal em poucos municiacutepios esse tributo eacute cobrado conforme constataccedilatildeo diante da

anaacutelise dos demonstrativos financeiros publicados pela Secretaria do Tesouro Nacional

A contribuiccedilatildeo de melhoria natildeo eacute nova no ordenamento juriacutedico brasileiro foi prevista jaacute na

Constituiccedilatildeo Federal de 1934 poreacutem ateacute hoje eacute mal aproveitada pelos fiscos municipais estaduais

distrital e federal Os artigos 12 e 13 do Decreto-Lei 1951967 jaacute possuem a previsatildeo de a Uniatildeo dele-

gar a capacidade tributaacuteria ativa aos municiacutepios estados e Distrito Federal demonstraccedilatildeo desde logo

do desinteresse pela arrecadaccedilatildeo desse tributo

Esse tributo existe para impedir o enriquecimento sem causa dos beneficiados diretamente

por uma obra puacuteblica possui entatildeo um elevado grau de justiccedila diante dos demais contribuintes que

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

164

financiaram as referidas obras Apoacutes a ediccedilatildeo da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) a boa gestatildeo

fiscal municipal possui como fundamento a efetiva arrecadaccedilatildeo de todos os tributos da competecircncia

do ente poliacutetico A LRF exige demonstraccedilotildees perioacutedicas das contas puacuteblicas receitas e despesas bem

como transparecircncia da gestatildeo puacuteblica dos entes poliacuteticos O artigo 14 da LRF inibe a renuacutencia de re-

ceita enquanto a Lei de Improbidade Lei 842992 alerta para a improbidade administrativa quando

o gestor puacuteblico age negligentemente na arrecadaccedilatildeo de tributo ou renda

Desse arrazoado induz-se o raciociacutenio de que a arrecadaccedilatildeo da contribuiccedilatildeo de melhoria eacute

explicada tambeacutem por razotildees teacutecnicas e poliacuteticas natildeo alcanccediladas pelo modelo economeacutetrico contri-

buindo consequentemente na diminuiccedilatildeo do poder explicativo do modelo utilizado neste trabalho

Assim a falta de cultura tributaacuteria desse tributo atrelada a razotildees teacutecnicas e poliacuteticas justifica o com-

portamento omissivo na cobranccedila por parte da maioria dos municiacutepios ou seja existe um trade-off entre a responsabilidade fiscal e o benefiacutecio poliacutetico advindo da omissatildeo na cobranccedila do tributo

Acredita-se que o foco deveraacute ser no futuro o crescimento da arrecadaccedilatildeo desse tributo diver-

gindo da situaccedilatildeo atual de omissatildeo da maioria dos municiacutepios Por fim entende-se que este trabalho

poderaacute ser utilizado para futuros planos de metas que pretendam inibir as mais diversas formas de

evasatildeo fiscal da contribuiccedilatildeo de melhoria a eficaacutecia tributaacuteria municipal poderaacute ser comparada com a

de outros municiacutepios que arrecadam o mesmo tributo Dessa forma poderaacute auxiliar os servidores fa-

zendaacuterios na programaccedilatildeo das accedilotildees fiscais de combate agrave evasatildeo fiscal tatildeo perniciosa para as poliacuteticas

puacuteblicas contribuindo assim com a promoccedilatildeo da cidadania fiscal

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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REFEREcircNCIAS

BASTOS Celso Ribeiro MARTINS Ives Gandra da Silva Comentaacuterios agrave Constituiccedilatildeo do Brasil (Pro-mulgada em 5 de outubro de 1988) V 6 Tomo I Art 145 a 156 Satildeo Paulo Saraiva 1990

BIAVA Adriano HR Contribuiccedilatildeo de Melhoria Necessidade de Inovaccedilatildeo Fiscal Tese de Doutorado Satildeo Paulo USP 1986

______ Contribuiccedilatildeo de Melhoria Capacidade Inaproveitada Artigo Satildeo Paulo USP 1994

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CIDADANIA FISCAL O DEVER FUNDAMENTAL DE PAGAR TRIBUTOS E OS DIREITOS FUNDAMENTAIS

SUMAacuteRIO Introduccedilatildeo 1 O dever fundamental de pagar tributos 11 O es-quecimento dos deveres e a hipertrofia dos direitos 12 Conceito e eficaacute-cia juriacutedica dos deveres fundamentais 13 O princiacutepio da solidariedade social como alicerce do dever fundamental de pagar tributos 2 A cidadania fiscal no Estado Democraacutetico de Direito 3 O combate agrave evasatildeo fiscal como condiccedilatildeo de exigibilidade dos deveres de cidadania Consideraccedilotildees finais Referecircncias

Marciano Buffon1

INTRODUCcedilAtildeO

O presente trabalho tem como objetivo principal traccedilar os contornos de uma concepccedilatildeo con-

temporaneamente adequada de cidadania fiscal a partir da compreensatildeo e aceitabilidade social do

dever fundamental de pagar tributos e do reconhecimento da sua importacircncia para realizaccedilatildeo dos di-

reitos fundamentais de cunho prestacional Tudo isso permeado pelo princiacutepio da solidariedade social

que fundamenta a Constituiccedilatildeo Brasileira

Em verdade natildeo haacute como exigir-se a concretizaccedilatildeo dos direitos fundamentais sem que haja em

contrapartida a contribuiccedilatildeo dos cidadatildeos para que tal intento seja alcanccedilado Ou seja natildeo haacute como

concretizar direitos fundamentais sem que haja o cumprimento por parte dos cidadatildeos de um dos

principais deveres de cidadania pagar tributos

Isso verifica-se por oacutebvio porque a realizaccedilatildeo dos direitos fundamentais especialmente aque-

les de cunho prestacional implica a assunccedilatildeo de um significativo ocircnus financeiro Ocorre que tal en-

cargo social vem sendo ldquoesquecidordquo pois uma parcela expressiva da sociedade restringe a concepccedilatildeo

de cidadania apenas agrave esfera dos direitos descurando da faceta obrigacional daquela

Assim o pilar da solidariedade ndash fundamento do modelo estatal vigente ndash sofre profundas

avarias e a sociedade perde-se em suas concepccedilotildees individualistas e egocecircntricas Por conseguinte o

ldquocidadatildeordquo sucumbe ao seu inimigo o ldquoindiviacuteduordquo como alertara Tocqueville

Passa-se entatildeo a analisar o dever fundamental de pagar tributos e o princiacutepio da solidariedade

social que o sustenta tendo em vista que uma compreensatildeo adequada dessa questatildeo precede a dis-

cussatildeo acerca da concretizaccedilatildeo dos direitos fundamentais

Enfim natildeo eacute por acaso que este trabalho tem como ponto de partida a anaacutelise do dever fun-

1 Doutor em Direito Puacuteblico pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos) Professor dos cursos de graduaccedilatildeo e Poacutes-Graduaccedilatildeo (Mestrado) em Direito da Unisinos Autor do Livro Tributaccedilatildeo e Dignidade Humana entre direitos e deveres fundamentais Advogado E-mail marcianolucinicombr

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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damental de pagar tributos e natildeo os tradicionais direitos fundamentais dos contribuintes Tal ocorre

porque antes de falar em direitos haacute de ter-se em mente os deveres pois em suma natildeo haacute como

sustentar a exigecircncia daqueles sem o cumprimento destes

1 O DEVER FUNDAMENTAL DE PAGAR TRIBUTOS

Na parte inicial deste trabalho aborda-se a questatildeo dos deveres fundamentais especificamen-

te o dever fundamental de pagar tributos no sentido de examinar as razotildees pelas quais os deveres

fundamentais caiacuteram em esquecimento paradoxalmente no mesmo periacuteodo histoacuterico de reafirmaccedilatildeo

consensual dos direitos fundamentais

11 O esquecimento dos deveres e a hipertrofia dos direitos

No periacuteodo poacutes-guerra houve uma crescente constitucionalizaccedilatildeo de direitos que passaram a

usufruir o status de direitos fundamentais Isso ocorreu especialmente em relaccedilatildeo aos direitos sociais

econocircmicos e culturais isto eacute os direitos fundamentais entendidos como de cunho prestacional os

quais passaram a ocupar um importante espaccedilo dentro de vaacuterias constituiccedilotildees democraacuteticas que sur-

giram naquele periacuteodo

Verificou-se entatildeo um fenocircmeno que pode ser denominado de ldquohipertrofia de direitos fun-

damentaisrdquo na medida em que as constituiccedilotildees passaram a consagrar formalmente uma expressiva

gama desses direitos sem que houvesse a devida preocupaccedilatildeo com a perspectiva de esses novos

direitos tornarem-se realidade

Isso ocorreu de uma forma tatildeo expressiva que autores como Casalta Nabais2 provocativa-

mente defendem ldquomenos direitos fundamentais em nome dos direitos fundamentaisrdquo ou seja de-

fendem que haja uma menor quantidade de direitos fundamentais e que estes tenham condiccedilotildees de

tornar-se algo real

A partir dessa maciccedila consagraccedilatildeo houve uma significativa preocupaccedilatildeo da doutrina e da

jurisprudecircncia no sentido de desenvolver estudos acerca desses denominados novos direitos De-

senvolveu-se assim uma soacutelida teoria acerca dos direitos sem que houvesse o correspondente

aprofundamento teoacuterico sobre a questatildeo dos deveres sociais Com isso daacute-se uma validaccedilatildeo ldquohistoacute-

rica da ideacuteia dos direitos humanos desvinculada da ideacuteia de dever e de valor na mentalidade social

2 Como menciona Casalta Nabais haacute constituiccedilotildees de 1ordf 2ordf e 3ordf linha As constituiccedilotildees de primeira linha consagram quatro ou cinco direitos fundamentais sendo que tais direitos satildeo efetivos e respeitados por todos as constituiccedilotildees de segunda linha consagram quinze a vinte direitos fundamentais e desses apenas quatro ou cinco satildeo respeitados e concretizados e haacute por fim as constituiccedilotildees de terceira linha aquelas que consagram uma gama enorme de direitos fundamentais os quais natildeo passam de promessas que iludem toda sociedade (Observaccedilatildeo feita em arguiccedilatildeo de defesa de tese de doutoramento ocorrida em 13 de janeiro de 2006 na Universidade de Coimbra)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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dos povos ocidentaisrdquo instalando-se paradoxalmente ldquoum processo de desmoralizaccedilatildeo da vida

puacuteblicardquo (ROBLES 2005 p 18)

Eacute certo que natildeo se pode afirmar que a construccedilatildeo de uma soacutelida teoria sobre os direitos funda-

mentais tenha sido algo negativo mesmo porque haacute um consenso acerca da importacircncia da concreti-

zaccedilatildeo dos direitos fundamentais para a maacutexima eficaacutecia do princiacutepio da dignidade da pessoa humana

O que se discute poreacutem eacute se a profusatildeo de novos direitos constitucionalmente positivados

natildeo resultou numa forma de banalizaccedilatildeo dos proacuteprios direitos fundamentais e se isso natildeo tem sido

um dos fatores que dificultam a realizaccedilatildeo daqueles direitos efetivamente imprescindiacuteveis de serem

concretizados com vistas a assegurar uma existecircncia digna a todos3

Enfim eacute evidente que se advoga aqui tese contraacuteria agrave concretizaccedilatildeo na plenitude de suas pos-

sibilidades dos direitos fundamentais Todavia natildeo eacute possiacutevel simplesmente esquecer que soacute seraacute

possiacutevel concretizaacute-los se houver o razoaacutevel cumprimento do principal dever de cidadania

Ocorre que inegavelmente a centralidade do debate sobre direitos fundamentais relegou para

um plano secundaacuterio e muitas vezes inexistente o espaccedilo destinado pela doutrina para o debate acer-

ca dos deveres fundamentais Tal verificou-se porque as proacuteprias constituiccedilotildees que foram generosas

quanto aos direitos quase natildeo trataram dos deveres ou ateacute mesmo silenciaram sobre eles

O processo de esquecimento dos deveres fundamentais mostra-se ldquomanifestamente visiacutevel

quando confrontado com o tratamento dispensado aos direitos fundamentais que dispotildeem hoje de

uma desenvolvida disciplina constitucional e de uma soacutelida construccedilatildeo dogmaacuteticardquo Isso explica-se

basicamente pelo ldquoambiente de militantismo antitotalitaacuterio e antiautoritaacuterio que se vivia quando da

aprovaccedilatildeo das atuais constituiccedilotildeesrdquo Trata-se de uma consequecircncia historicamente identificada com

um sentimento vivenciado apoacutes a retomada da democracia sendo que nas constituiccedilatildeo respectiva-

mente adotadas percebe-se uma ldquopreocupaccedilatildeo senatildeo mesmo a quase obsessatildeo de fazer vingar de

uma vez por todas a efetiva afirmaccedilatildeo e vigecircncia dos direitos fundamentaisrdquo (NABAIS 2004a p 673)

Enfim eacute inequiacutevoco que houve um cocircmodo abandono da ideia de dever social estimulada pelo

marcante individualismo do tempo contemporacircneo que empalideceu e fez tornar-se anacrocircnica a im-

prescindiacutevel solidariedade social Nos dias atuais o sentimento de dever apresenta-se de uma forma

tecircnue e tiacutemida enquanto o seu oposto ldquoo sentimento reivindicativo alcanccedila as maiores cotas de in-

tensidade Sob um ponto de vista eacutetico esse fenocircmeno traduz-se em um decreacutescimo da solidariedade

e em uma justificaccedilatildeo do hedonismordquo (ROBLES 2005 p 18) Como afirma Robles (2005 p 23-24) ldquoas

pessoas se sentem sentimo-nos portadores naturais de direitos que todos devem reconhecer e ao

3 Conforme explica Casalta Nabais (1998 p 997) ldquose se pretende evitar o risco da panjusfundamentalizaccedilatildeo e da conse-quente banalizaccedilatildeo dos direitos fundamentais impotildee-se um esforccedilo maior na concretizaccedilatildeo da ideia de fundamentalidade ancorado na dignidade da pessoa humana vinculando-a por exemplo agrave satisfaccedilatildeo de necessidades vitais ndash materiais e espirituais ndash constantes do ser humano e natildeo de meros desejos mais ou menos conjunturais claramente secundaacuterios e particulares que os cidadatildeos podem satisfazer com base exclusivamente no ordenamento ordinaacuteriordquo

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mesmo tempo dificilmente pensamos que pesam sobre noacutes mais deveres que aqueles necessaacuterios a

tornar nossa vida mais cocircmoda e interessanterdquo

Haacute de reconhecer-se todavia que nem sempre foi assim Houve um periacuteodo histoacuterico em que

os deveres fundamentais ocuparam um posto de significativo interesse tal qual se verificava em rela-

ccedilatildeo aos direitos Em Roma a Repuacuteblica era o reino da virtude cujo funcionamento dependia do cum-

primento por parte dos cidadatildeos de um certo nuacutemero de deveres servir a paacutetria votar ser solidaacuterio

aprender ldquoNeste sentido a teoria da cidadania republicana implicaria que um indiviacuteduo teria natildeo ape-

nas direitos mas tambeacutem deveresrdquo (CANOTILHO 2006 p 531)

Cabe observar que a Declaraccedilatildeo dos Direitos do Homem e do Cidadatildeo de 1789 jaacute consagra-

va expressamente trecircs do deveres fundamentais claacutessicos o dever de obediecircncia o dever de pagar

impostos e o dever de suportar a privaccedilatildeo da propriedade em caso de expropriaccedilatildeo por utilidade

puacuteblica Tais deveres foram consagrados na maioria dos documentos constitucionais do modelo de

estado liberal

A importacircncia dos deveres fundamentais reaparece fortemente nos regimes nacional-socialista

e comunista No regime nazista ldquoos deveres fundamentais dos cidadatildeos convertem-se em deveres

fundamentais dos membros do povo (dever de serviccedilo de poderes dever de trabalhar dever de defen-

der o povo)rdquo (CANOTILHO 2006 p 531) No regime sovieacutetico denominado de comunista ldquoos direitos

fundamentais eram tambeacutem relativizados pelos deveres fundamentais os indiviacuteduos tinham direitos

conexos com deveres o que nos quadros poliacuteticos dos ex-paiacuteses comunistas acabou por aniquilar os

direitos e hipertrofiar os deveresrdquo

Essas desastradas experiecircncias histoacutericas explicam a negligecircncia e o esquecimento dos deveres

fundamentais na medida em que deram ensejo a uma justificaacutevel desconfianccedila e receio quanto agrave am-

plitude dos poderes conferidos ao Estado para exigiacute-los Em vista disso as constituiccedilotildees surgidas no

poacutes-guerra chegaram ao extremo de sequer utilizarem o termo dever - como o fez a Lei Fundamental

Alematilde ndash ou quando o utilizaram reservaram um modesto tratamento diferentemente do generoso

espaccedilo com os quais foram contemplados os direitos ditos fundamentais (NABAIS 1998 p 986)

Aleacutem disso haacute de reconhecer-se que as constituiccedilotildees contemporacircneas (especialmente da Itaacutelia

Alemanha Portugal Espanha e Brasil) surgiram num periacuteodo poacutes-autoritarismo motivo pelo qual se

entende a ldquoquase-obsessatildeordquo por consagrar direitos e descurar deveres

No entanto as circunstacircncias contemporacircneas satildeo outras e a categoria dos deveres fundamen-

tais deve ser pensada como parte integrante do Estado Democraacutetico de Direito Se assim natildeo for o

debate rumaraacute para o ingecircnuo descompromissado e irreal cenaacuterio do ldquoparaiacuteso dos direitosrdquo no qual

se reclamam e cada vez mais se reconhecem formalmente novos direitos sem que se tenha a devida

preocupaccedilatildeo com o seu custo social e portanto sem que tais direitos tenham a perspectiva de divor-

ciarem-se da condiccedilatildeo de meras promessas4

4 Uma nota interessante dos movimentos de rua ocorridos no Brasil em julho de 2013 diz respeito justamente a isso De

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A questatildeo dos deveres fundamentais natildeo pode continuar ocupando um espaccedilo tatildeo pouco

significativo na teoria constitucional pois isso implica um pacto de hipocrisia em que se faz de conta

que se tem direitos ndash dado que formalmente consagrados ndash e imagina-se que tais direitos possam ser

assegurados por um ente ldquosobrenaturalrdquo ndash Estado ndash esquecendo-se de que esse ente nada mais eacute do

que a soma de todos e natildeo o contraponto da sociedade

Com essa postura minimamente comprometida com a realidade natildeo restaraacute superado o de-

nominado ldquodilema tiacutepico de nossa eacutepocardquo segundo qual todos querem viver agraves custas do Estado mas

rejeitam a ideia de que este Estado possa financiar-se mediante arrecadaccedilatildeo de tributos Esquecem

pois que eacute o Estado que vive agrave custa de todos5

Por mais paradoxal que possa parecer agravequeles que concebem a cidadania apenas sob a face

dos direitos a proacutepria ideia de dignidade humana estaacute vinculada aos deveres fundamentais pois ela

ldquonatildeo consiste em cada um exigir seus direitos mas sobretudo consiste em cada um assumir seus

deveres como pessoa e como cidadatildeo e exigir de si mesmo seu cumprimento permanenterdquo (ROBLES

2005 p 123)

Agrave medida que as sociedades avanccedilam em direccedilatildeo a um complexo futuro torna-se imprescin-

diacutevel que uma concepccedilatildeo mais clara e precisa dos deveres e obrigaccedilotildees ganhe corpo e aceitabilidade

social Como lembra Haumlberle (2005 p 102) ldquotal componente encontra fundamento especialmente na

dimensatildeo comunitaacuteria da dignidade humana que em princiacutepio jaacute foi esporadicamente atualizada de-

vendo nessa medida tornar-se atual tal como os rsquolimites do crescimentorsquo do Estado social de Direito

tornaram necessaacuteria a proteccedilatildeo do meio ambienterdquo

Enfim essa hipertrofia dos direitos fundamentais paralelamente ao esquecimento dos deveres

fundamentais causa um nocivo efeito nas bases estruturais da sociedade pois a ideia de solidariedade

esvazia-se e paulatinamente frustram-se as expectativas de concretizaccedilatildeo daqueles direitos mais fun-

damentais justamente por parte daqueles que necessitam substancialmente que tais direitos deixem

de ser apenas uma parte de uma ldquobela obra de arte literaacuteriardquo (constituiccedilatildeo)

A partir da criacutetica relativamente ao menosprezo teoacuterico sobre os deveres fundamentais faz-se

necessaacuterio examinar suas bases estruturais dirigindo-se os esforccedilos para uma adequada definiccedilatildeo e

discussatildeo sobre o alcance e a eficaacutecia juriacutedica

um lado os manifestantes defendiam ldquomais sauacutede e educaccedilatildeordquo e por outro lado pediam a reduccedilatildeo dos impostos Ou seja queriam um Estado Social forte e capaz de garantir direitos sociais entendidos como legiacutetimos todavia natildeo assumiam o ocircnus de responder ao questionamento acerca de como financiar ldquomais sauacutede e educaccedilatildeordquo para falar apenas de duas das principais reivindicaccedilotildees unissonamente defendidas 5 Conforme lembra Albano Santos (2003 p 352) a partir da questatildeo da evasatildeo fiscal ldquoDe qualquer modo importa reter que a indulgecircncia para com a fuga ao imposto contrasta acentuadamente com a praacutetica muito divulgada de responsabi-lizar o Estado por parcelas crescentes da existecircncia dos cidadatildeos criando assim uma incongruecircncia a que jaacute se chamou o laquodilema tiacutepico da nossa eacutepocaraquo reclama-se o maacuteximo do Estado mas rejeitam-se as inevitaacuteveis consequumlecircncias financeiras dessa atitude Uma tal contradiccedilatildeo reconduz aliaacutes o fenoacutemeno ao plano eacutetico uma vez que soacute encontra solidez loacutegica na afirmaccedilatildeo de Bastiat de que laquotodos querem viver agrave custa do Estado mas esquecem que o Estado vive agrave custa de todos raquo - o que levou o eminente economista da Escola Liberal ao celebrado corolaacuterio de que o Estado representa laquoa grande ficccedilatildeo atraveacutes da qual toda a gente se esforccedila por viver agrave custa de toda a genteraquordquo

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12 Conceito e eficaacutecia juriacutedica dos deveres fundamentais

A ideia de deveres fundamentais estaacute nitidamente vinculada agrave concepccedilatildeo de solidariedade so-

cial ou seja soacute haacute deveres porque se vive em uma sociedade sendo que esta seraacute tanto mais harmocirc-

nica quanto maior for a preocupaccedilatildeo de cada um com o destino de todos

Essa ideia de dever fundamental dentro do modelo do Estado social de Direito eacute incompa-

tiacutevel com a ideia liberal reducionista de cidadania (direito a ter direitos apenas) No entanto os de-

veres fundamentais natildeo podem ser pensados dentro de uma concepccedilatildeo comunitarista que apenas

reconhecia deveres e serviu de fundamentaccedilatildeo a vaacuterios regimes totalitaacuterios que surgiram na Europa

do seacuteculo XX

Isso ocorre porque ldquoo entendimento adequado dos deveres fundamentais rejeita simultane-

amente os extremismos de um liberalismo que soacute reconhece direitos e esquece a responsabilidade

comunitaacuteria dos indiviacuteduos e de um comunitarismo que dissolve a liberdade individual numa teia de

deveres (rectius funccedilotildees)rdquo (NABAIS 2004a p 673) Ou seja nem soacute direitos e tampouco nem soacute de-

veres devem pautar o Estado contemporacircneo Direitos e deveres convivem numa relaccedilatildeo de causa e

efeito na qual um eacute o pressuposto de outro e ao mesmo tempo auto-limitam-se

Para Jorge Miranda (2000 p 76) ldquosimeacutetricos dos direitos fundamentais apresentam-se os de-

veres fundamentaisrdquo e estes seriam ldquoas situaccedilotildees juriacutedicas de necessidade ou de adstriccedilatildeo constitu-

cionalmente estabelecidas impostas agraves pessoas frente ao poder poliacuteticordquo ou ainda exigidas conforme

menciona ldquopor decorrecircncia de direitos ou interesses difusos a certas pessoas perante outrasrdquo

Jaacute Gomes Canotilho (2006 p 536) lembra que ldquoas ideacuteias de solidariedade e de fraternidade

apontam para deveres fundamentais entre cidadatildeosrdquo sendo que tal entendimento eacute corroborado por

Cristina Chulvi (2001 p 296) ao sustentar que em cumprimento ao princiacutepio de solidariedade que

identifica o Estado Social todos os cidadatildeos estatildeo submetidos agrave realizaccedilatildeo de determinadas condutas

(deveres) que satildeo exigidas natildeo em benefiacutecio proacuteprio mas em benefiacutecio da coletividade

Essa vinculaccedilatildeo com a ideia de solidariedade social resta mais evidente agrave medida que se exami-

na o dever fundamental de pagar tributos Certamente em eacutepocas anteriores - absolutista e liberal - o

cumprimento desse dever orientava-se para conservaccedilatildeo do Estado de modo que natildeo se encontrava

um fundamento eacutetico ou moral para a obrigaccedilatildeo tributaacuteria visto que esta era adimplida unicamente

em face ao dever de obediecircncia agrave autoridade soberana que a estabelecia Com o advento do Estado

Social e Democraacutetico de Direito o dever de contribuir com o sustento dos gastos puacuteblicos passou a

ter um conteuacutedo solidaacuterio agrave medida que foi sendo empregado como instrumento a serviccedilo da poliacutetica

social e econocircmica do Estado redistribuidor (CHULVI 2001 p 70)

Pode-se afirmar portanto que os deveres fundamentais correspondem aos meios necessaacuterios

para que o Estado possa atingir a sua histoacuterica finalidade de propiciar o bem comum o que em ar-

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riscada siacutentese pode ser entendido como a concretizaccedilatildeo dos objetivos constitucionalmente postos

mediante especialmente a realizaccedilatildeo dos direitos fundamentais

Assim resta reafirmada a vinculaccedilatildeo dos deveres fundamentais com a concepccedilatildeo de solida-

riedade sendo que isso ficaraacute mais evidente se essa vinculaccedilatildeo for pensada a partir do dever funda-

mental de pagar tributos Desse modo os deveres fundamentais satildeo os comportamentos positivos ou

negativos impostos a um sujeito em consideraccedilatildeo e interesse que natildeo satildeo particularmente seus mas

sim em benefiacutecio de outros sujeitos ou de interesse geral da comunidade (CHULVI 2001)

Gomes Canotilho (2006 p 532-533) afasta em princiacutepio o entendimento de que haveria uma

simetria entre direitos e deveres fundamentais ou seja a ideia de que ldquoum direito fundamental en-

quanto protegido pressuporia um dever correspondenterdquo Tal ocorre porque a categoria dos deveres

fundamentais corresponde a uma categoria constitucional autocircnoma Como exemplo maior dessa

autonomia pode-se citar o dever de pagar tributos e o dever de defesa da Paacutetria Isso natildeo afasta con-

tudo a possibilidade de existirem deveres fundamentais conexos a direitos fundamentais como ocon-

tece com o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e com correlato dever de defesa do

meio ambiente por exemplo

Nessa mesma linha Morato Leite (2007 p 112) lembra que os deveres natildeo se resumem agravequeles

em relaccedilatildeo aos quais haja um direito ldquoisto eacute obrigaccedilotildees deduziacuteveis ou derivadas de direitos outor-

gados previamenterdquo Diferentemente disso ldquoo legislador exprime-se por meio da decretaccedilatildeo de obri-

gaccedilotildees diretas que ocupam por assim dizer o centro do palco e a partir das quais se reconhecem

poderes os implementadores e beneficiaacuterios para fazecirc-las valerrdquo

Haacute de ressaltar-se tambeacutem que os deveres fundamentais soacute excepcionalmente tecircm natureza

de norma diretamente aplicaacutevel pois na maioria das situaccedilotildees reclamam a existecircncia de uma me-

diaccedilatildeo legislativa para que possam ser exigidos Ou seja os deveres estabelecem-se numa direccedilatildeo

geneacuterica e configuram-se como um mandado ao legislador para que os concretize mediante o estabe-

lecimento de obrigaccedilotildees especiacuteficas momento em que se tornam vinculantes para os cidadatildeos e para

o restante dos poderes puacuteblicos (CHULVI 2001 p 295)

Por representarem uma espeacutecie de norma que determina sua proacutepria concretizaccedilatildeo pode-se

afirmar que as normas constitucionais relativas aos deveres fundamentais natildeo correspondem tatildeo-

-somente a uma ldquocarta de boas intenccedilotildeesrdquo desprovida de eficaacutecia juriacutedica Eacute certo que nem todos os

preceitos constitucionais oferecem o mesmo grau de concretizaccedilatildeo mas isso natildeo significa que uma

constituiccedilatildeo possa ser entendida apenas como um conjunto de declaraccedilotildees programaacuteticas ineficazes

Tendo em vista que a Constituiccedilatildeo eacute uma norma juriacutedica ela soacute poderaacute permanecer com tal condiccedilatildeo

se houver uma contiacutenua accedilatildeo para seu cumprimento

Por isso deve-se rechaccedilar a suposta ldquoirrelevacircnciardquo juriacutedica das normas que contecircm deveres

constitucionais em vista da necessidade de incremento legal posterior para sua concretizaccedilatildeo Assim

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como ocorre com as demais normas constitucionais eacute normal que os deveres fundamentais deman-

dem uma atuaccedilatildeo legislativa para concretizar-se especialmente para delimitar a exigecircncia e para san-

cionar seu descumprimento

No caso do Brasil o dever de pagar tributos eacute um exemplo bem claro da necessidade da me-

diaccedilatildeo legislativa pois a Constituiccedilatildeo apenas menciona a competecircncia de cada ente estatal para a

instituiccedilatildeo sempre atraveacutes de lei dos tributos respectivos sendo que enquanto natildeo sobrevier a norma

juriacutedica correspondente o dever num plano pragmaacutetico simplesmente inexiste (exemplo disso eacute o

Imposto sobre as Grandes Fortunas previsto no art 153 VII da Constituiccedilatildeo de 1988 que ainda natildeo foi

instituiacutedo pela Uniatildeo)

Isso contudo natildeo significa que o ente esteja autorizado a natildeo exercer sua competecircncia tribu-

taacuteria mesmo porque isso significaria inviabilizar as condiccedilotildees necessaacuterias ao cumprimento das tarefas

tambeacutem constitucionalmente impostas para cada ente da federaccedilatildeo brasileira

Assim como ocorre com os direitos fundamentais cabe reconhecer que os deveres fundamen-

tais sofrem evidentes limitaccedilotildees porquanto eles existem a partir de dispositivos constitucionais que

impliacutecita ou explicitamente estabelecem-nos Para aleacutem disso as proacuteprias constituiccedilotildees estabelecem

balizamentos a esses deveres e tratam-nos como limites da atuaccedilatildeo estatal isto eacute as constituiccedilotildees

estabelecem os criteacuterios a partir dos quais os deveres fundamentais seratildeo impostos pelo Estado e

cumpridos pelos cidadatildeos

Posto isso passa-se a examinar de uma forma mais especiacutefica o dever fundamental que pode

ser entendido como de maior relevacircncia dentro de um Estado Democraacutetico de Direito o dever de pa-

gar tributos Isso ocorre porque natildeo se pode pensar nesse modelo de Estado sem que o referido dever

seja adequadamente cumprido pelos cidadatildeos

13 O princiacutepio da solidariedade social como alicerce do dever fundamental de pagar tributos

Cumpre primeiramente analisar as razotildees pelas quais o dever fundamental de pagar tributos

estaacute intimamente vinculado agrave ideia de solidariedade social fazendo-se necessaacuterio um resumo histoacuterico

para melhor compreender e colocar a questatildeo

Antes disso cabe reconhecer que em tempos de individualismo exacerbado soa estranho fa-

lar em solidariedade natildeo obstante o consideraacutevel risco de se ldquoperder o conceito de responsabilidade

puacuteblicardquo com a consequente avaria irreparaacutevel na consciecircncia dos cidadatildeos de ldquoque uma parte de

suas vidas deve ser gerida em comum com os outros este eacute o significado real da solidariedade como

ensina a etimologia do termordquo (SACCHETTO 2005 p 11)

Quanto agrave origem etimoloacutegica do termo vale lembrar que o substantivo solidum em latim sig-

nifica a totalidade de uma soma enquanto o termo solidus tem o sentido de inteiro ou completo ra-

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zatildeo pela qual Konder Comparato (2006 p 577) afirma que ldquoa solidariedade natildeo diz respeito portanto

a uma unidade isolada nem a uma proporccedilatildeo entre duas ou mais unidades mas agrave relaccedilatildeo de todas as

partes de um todo entre si e cada um perante o conjunto de todas elasrdquo

A ideia original de solidariedade estava vinculada agrave existecircncia de mais de um responsaacutevel para

a solvecircncia da obrigaccedilatildeo Em vista disso segundo Duvignaud (1986 p 12) tratava-se de ldquouma ques-

tatildeo de nuacutemeros de reembolso de diacutevidas que atraveacutes do velho coacutedigo de Justiniano retomado pelas

universidades medievais sugere a origem rigorosamente individual do direito e da propriedaderdquo

Ao longo da histoacuteria a ideia de solidariedade teve concepccedilotildees diversas A solidariedade dos

antigos correspondia agrave virtude indispensaacutevel na relaccedilatildeo com os outros dentro de grupos primaacuterios

(famiacutelia especialmente) jaacute a denominada ldquosolidariedade dos modernosrdquo corresponde a um princiacutepio

de caraacuteter juriacutedico ou poliacutetico e sua realizaccedilatildeo passa pela comunidade estadual pela sociedade civil

ou comunidade ciacutevica Cabe ainda referir a denominada solidariedade mutualista isto eacute uma solida-

riedade cuja intenccedilatildeo eacute gerar riqueza em comum relativamente agrave infraestrutura bens e serviccedilos con-

siderados indispensaacuteveis ao bom funcionamento da sociedade (NABAIS 2005 p 85-86)

De acordo com a concepccedilatildeo que ora se conhece a ideia de solidariedade social pode ser en-

tendida como um fenocircmeno tiacutepico da modernidade tendo surgido no final do seacuteculo XIX com o de-

nominado Estado Social na Alemanha de Bismarck

Modernamente pode ser entendida como fruto de uma reaccedilatildeo agraves privaccedilotildees suportadas es-

pecialmente por trabalhadores no seacuteculo XIX Os diferentes movimentos socialistas da eacutepoca perce-

beram os flagelos sociais natildeo eram cataclismos da natureza nem efeitos necessaacuterios da organizaccedilatildeo

racional das atividades econocircmicas Tais flagelos nada mais eram do que ldquoprodutos necessaacuterios do

sistema capitalista de produccedilatildeo cuja loacutegica consiste em considerar os trabalhadores e consumido-

res como mercadorias atribuindo-lhes um valor econocircmico muito inferior ao dos bens de capitalrdquo

(COMPARATO 2006 p 579)

Considerando-se que a ideia de solidariedade estaacute intimamente vinculada com a ideia de co-

munidade de pertencer e partilhar obrigaccedilotildees dentro de um grupo ou formaccedilatildeo social pode-se afir-

mar que ldquoa solidariedade pode ser entendida quer em sentido objetivo em que se alude agrave relaccedilatildeo de

pertenccedila e por conseguinte de partilha e de corresponsabilidade que liga cada um dos indiviacuteduos agrave

sorte e vicissitudes dos demais membros da comunidaderdquo Num sentido subjetivo pode ser entendida

como sinocircnimo de ldquoeacutetica social em que a solidariedade exprime o sentimento a consciecircncia dessa

mesma pertenccedila agrave comunidaderdquo (NABAIS 2005 p 84)

Ainda pode-se afirmar na linha de Konder Comparato (2006 p 577) que a solidariedade ldquoeacute o

fecho de aboacutebada do sistema de princiacutepio eacuteticos pois complementa e aperfeiccediloa a liberdade a igual-

dade e a seguranccedilardquo Isso acontece porque ldquoenquanto a liberdade e a igualdade potildeem as pessoas

umas diante das outras a solidariedade as reuacutene todas no seio de uma mesma comunidaderdquo A ideia

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

175

de solidariedade ldquonatildeo traz conteuacutedos materiais especiacuteficos podendo ser visualizada ao mesmo tempo

como valor eacutetico e juriacutedico absolutamente abstrato e como princiacutepio positivado ou natildeo nas Consti-

tuiccedilotildeesrdquo Eacute sobretudo uma obrigaccedilatildeo moral ou um dever juriacutedico que ldquoinforma e vincula a liberdade

a justiccedila e a igualdaderdquo (TORRES 2005 p 181)

Cabe referir no entanto que autores como Jean Duvignaud (1986 p 196) sustentam que estaacute

havendo uma verdadeira banalizaccedilatildeo da ideia de solidariedade ao dizer que tal termo eacute usado por to-

dos ldquopara confortar a consciecircncia de uns ou para conseguir um esmola da maacute consciecircncia de outrosrdquo

entendendo que ocorre em relaccedilatildeo agrave ideia de solidariedade ldquouma desvalorizaccedilatildeo que atinge todas as

ideacuteias do seacuteculo passado sobre cujos destroccedilos se constroem as interpretaccedilotildeesrdquo as quais ironicamente

denomina de ldquomodernistasrdquo

Para este estudo importa a concepccedilatildeo atual de solidariedade a qual estaacute por um lado vincula-

da agrave solidariedade pelos direitos denominada de paterna ou vertical e por outro lado estaacute vinculada

agrave solidariedade pelos deveres denominada de fraterna ou horizontal na terminologia adotada por

Casalta Nabais anteriormente mencionada

Relativamente agrave solidariedade pelos direitos pode-se afirmar que a ideia passa pela realizaccedilatildeo

ndash em especial ndash dos direitos sociais e dos denominados direitos de solidariedade (meio ambiente equi-

librado por exemplo) Tal tarefa cabe ao Estado de uma forma mais incisiva em relaccedilatildeo aos direitos

sociais pois eacute ele que deve garantir a concretizaccedilatildeo das promessas que estejam aptas a assegurar um

miacutenimo de dignidade aos seus cidadatildeos (NABAIS 2005 p 87-88)

Quanto agrave solidariedade vertical tem-se de um lado que do Estado eacute cobrado o cumprimento

de seus deveres constitucionalmente estabelecidos e de outro lado da comunidade social ou socie-

dade civil eacute exigido o cumprimento do dever de solidariedade perante outros indiviacuteduos ou grupos

sociais

Superada essa questatildeo passa-se a examinar a ideia de solidariedade social dentro do Estado

Fiscal Para tanto cabe lembrar inicialmente que o Estado eacute adjetivado de fiscal pois eacute suportado

fundamentalmente por tributos unilaterais isto eacute tributos cuja exigecircncia natildeo implica a realizaccedilatildeo de

uma atuaccedilatildeo estatal especiacutefica

Eacute certo que qualquer classificaccedilatildeo das espeacutecies tributaacuterias existentes atualmente no Brasil im-

plica abertura de um significativo espaccedilo de contestaccedilatildeo Natildeo obstante os verdadeiros ldquofrankensteinrdquo

tributaacuterios existentes pode-se dizer que os tributos bilaterais corresponderiam agraves taxas e contribui-

ccedilotildees de melhoria os unilaterais por sua vez corresponderiam aos impostos e agraves contribuiccedilotildees sociais

natildeo sinalagmaacuteticas tambeacutem denominadas de impostos finaliacutesticos (PIS COFINS CPP CSLL)

Noutros termos pode-se dizer que como o denominado estado fiscal social eacute financiado ba-

sicamente pelo pagamento de tributos natildeo vinculados a uma atuaccedilatildeo estatal especiacutefica sua proacutepria

concepccedilatildeo encerra a ideia de solidariedade pois acarreta um dever solidaacuterio de contribuir para a ma-

nutenccedilatildeo e desenvolvimento da sociedade

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

176

Essa solidariedade pode ser vislumbrada a partir de dois enfoques a) a solidariedade pela fis-

calidade b) a solidariedade pela extrafiscalidade Em relaccedilatildeo agrave primeira o Estado exige do cidadatildeo o

pagamento de tributos natildeo vinculados (especialmente impostos) tendo por fim preciacutepuo a obtenccedilatildeo

de receitas sendo que nessa atividade dispensa ou concede um tratamento menos gravoso agravequeles

cidadatildeos ou grupos com menor capacidade econocircmica Se por um lado a ideia de solidariedade

social implica tratamento menos gravoso por outro impotildee a assunccedilatildeo de um ocircnus mais significativo

para aqueles cidadatildeos com maior capacidade econocircmica especialmente pela via da progressividade

de aliacutequotas

A solidariedade pela extrafiscalidade por sua vez acontece quando a imposiccedilatildeo fiscal natildeo

tem por objetivo direto a obtenccedilatildeo de receitas mas sim a realizaccedilatildeo de determinado fim no cam-

po social econocircmico ou cultural Em relaccedilatildeo agrave extrafiscalidade a ideia da solidariedade mostra-se

presente - tanto no vieacutes da oneraccedilatildeo como no vieacutes da reduccedilatildeo da carga - mediante a concessatildeo de

benefiacutecios fiscais

Isso ocorre porque seja no caso do agravamento seja no caso da desoneraccedilatildeo fiscal a pre-

senccedila da ideia de solidariedade eacute reconhecida desde que o objetivo visado seja constitucionalmente

justificaacutevel No primeiro caso aqueles que suportam uma tributaccedilatildeo mais expressiva estatildeo cumprindo

o dever de solidariedade com o restante da coletividade no segundo caso toda sociedade divide o

ocircnus decorrente da concessatildeo do benefiacutecio fiscal respectivo de uma forma solidaacuteria

Em decorrecircncia do exposto exige-se um rigoroso criteacuterio na utilizaccedilatildeo da extrafiscalidade

pois esta apenas seraacute constitucionalmente legiacutetima se os objetivos visados forem justificaacuteveis a par-

tir da contemporacircnea ideia de solidariedade social isto eacute quando esse mecanismo fiscal for utiliza-

do por exemplo para alcanccedilar algum objetivo previsto na constituiccedilatildeo ou para concretizar direitos

fundamentais

De qualquer sorte haacute de recuperar-se (ou construir) a concepccedilatildeo de solidariedade social como

fundamento da exigecircncia fiscal pois apenas esta pode justificar a legitimidade de um modelo de Esta-

do socialmente justo Natildeo fossem suficientes as razotildees de ordem eacutetica e moral expostas haacute de ter-se

presente que um Estado imbuiacutedo de tais fins representa uma escolha pragmaticamente mais acertada

ante a crescente inviabilidade de sobrevivecircncia em um ambiente socialmente hostil como se verifica

em tantos locais deste paiacutes6

Enfim a questatildeo da solidariedade social mostra-se especialmente relevante para garantir-se

que o princiacutepio da dignidade da pessoa humana seja o elemento norteador da tributaccedilatildeo Isso apenas

seraacute possiacutevel se a tributaccedilatildeo estiver adequada agrave efetiva capacidade contributiva do cidadatildeo e quando

for utilizada a extrafiscalidade para a concretizaccedilatildeo dos direitos fundamentais

6 Conforme constata Bauman (2006 p 101) ldquoQuando a competiccedilatildeo substitui a solidariedade os indiviacuteduos se vecircem aban-donados agrave proacutepria sorte restando-lhes apenas os seus parcos recursos evidentemente inadequados A dilapidaccedilatildeo e de-composiccedilatildeo dos viacutenculos coletivos os transformaram sem o seu consentimento em indiviacuteduos de jure ndash mas circunstacircncias poderosas e insuperaacuteveis militam contra a sua ascensatildeo ao modelo postulado dos indiviacuteduos de fatordquo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

177

Ao adequar-se a tributaccedilatildeo agrave efetiva capacidade contributiva deixa-se de tributar o miacutenimo vi-

tal para existecircncia humana pois nada mais diametralmente oposto agrave concepccedilatildeo de dignidade humana

do que dispor do indisponiacutevel agrave proacutepria sobrevivecircncia com vistas a fazer frente agrave exigecircncia fiscal

Por outro lado ao maximizar-se a densificaccedilatildeo ao princiacutepio da dignidade da pessoa humana

daacute-se a maacutexima eficaacutecia social aos direitos fundamentais uma vez que o referido princiacutepio eacute reconheci-

damente o elemento comum de todos os direitos dessa natureza Para que isso aconteccedila efetivamente

satildeo indispensaacuteveis a) a exigecircncia de tributos adequados agrave capacidade de contribuir daqueles que

manifestam tal capacidade de uma forma mais expressiva obtendo-se os recursos necessaacuterios para a

concretizaccedilatildeo dos direitos fundamentais de cunho prestacional b) a utilizaccedilatildeo da extrafiscalidade para

estimular ou desestimular comportamentos mediante poliacuteticas puacuteblicas no campo fiscal que tenham

como norte a realizaccedilatildeo das promessas fundamentais feitas pela ldquoConstituiccedilatildeo Cidadatilderdquo de 1988

Enfim o liame da solidariedade eacute o fundamento que justifica e legitima o dever fundamental de

pagar tributos haja vista que esse dever corresponde a uma decorrecircncia inafastaacutevel de pertencer-se a

uma sociedade Por isso faz-se necessaacuterio examinar a questatildeo da denominada cidadania fiscal pois

em face do dever fundamental de pagar tributos uma concepccedilatildeo adequada de cidadania passa pelo

reconhecimento de que o cidadatildeo tem direitos poreacutem em contrapartida tambeacutem deve cumprir seus

deveres dentro de uma sociedade

2 A CIDADANIA FISCAL NO ESTADO DEMOCRAacuteTICO DE DIREITO

Numa anaacutelise preliminar pareceria um pouco estranho examinar a questatildeo da cidadania sob o

enfoque que ora se pretende porquanto a sua concepccedilatildeo mais visiacutevel corresponde agrave ideia de ldquodireito

a ter direitos numa sociedaderdquo No entanto a concepccedilatildeo contemporacircnea de cidadania natildeo pode im-

plicar a existecircncia de cidadatildeos que de uma forma pouco altruiacutesta reclamem para si o maacuteximo de di-

reitos e em contrapartida neguem-se a contribuir com a sua parcela de esforccedilos para que tais direitos

viabilizem-se num plano faacutetico

Ou seja natildeo haacute foacutermula viaacutevel nem caminhos factiacuteveis se a ideia de cidadania restringir-se agrave

ideia de ldquodireito a ter direitosrdquo pois como jaacute examinado a efetivaccedilatildeo de direitos especialmente os de

cunho social econocircmico e cultural exige uma gama de recursos por parte do Estado e tais recursos

satildeo obtidos quase que exclusivamente mediante a tributaccedilatildeo

Em relaccedilatildeo agrave face correspondente aos deveres de cidadania Casalta Nabais menciona que o de-

ver fundamental de pagar tributos representa um dos principais deveres dentro de um Estado Social

pois ldquono actual estado fiscal para o qual natildeo se vislumbra qualquer alternativa viaacutevel pelo menos nos

tempos mais proacuteximos os impostos constituem um indeclinaacutevel dever de cidadania cujo cumprimen-

to a todos nos deve honrarrdquo (NABAIS 2005 p 44)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

178

Em vista disso eacute possiacutevel afirmar que o dever de pagar tributos eacute o principal dever de cidada-

nia justamente porque caso tal dever seja sonegado por parte dos componentes de uma sociedade

restaratildeo inviabilizadas as possibilidades de realizaccedilatildeo dos proacuteprios direitos especialmente aqueles de

cunho prestacional

Entretanto se por um lado a concepccedilatildeo contemporacircnea de cidadania fiscal implica o dever

de pagar tributos por outro lado impotildee que esse dever seja exercido nos estritos limites previstos na

constituiccedilatildeo observados os tradicionais direitos de defesa que deram ensejo ao liberalismo claacutessico

Outra dimensatildeo do dever fundamental de pagar tributos - que decorre diretamente da ideia de

cidadania fiscal - consiste no direito de participaccedilatildeo na tomada de decisotildees acerca dos tributos que

se estaacute disposto a pagar Ocorre que isso jaacute natildeo pode ser visto apenas no acircmbito da representaccedilatildeo

parlamentar pois eacute quase ingecircnuo acreditar que o povo autotributa-se atraveacutes de seus representantes

(legislativo) ideia que serviu de justificativa para a estrita observacircncia do princiacutepio da legalidade nos

primoacuterdios do constitucionalismo

Se por um lado o Poder Executivo usurpou a competecircncia no que tange agrave ediccedilatildeo de normas

no campo tributaacuterio por outro o Poder Legislativo sofre uma crise de legitimidade sem precedentes

que se confunde com a proacutepria crise da denominada democracia representativa

A festejada democracia representativa transformou-se num tremendo processo de ldquofaz de con-

tardquo no qual uma parcela diminuta da populaccedilatildeo - que ocupa o topo da piracircmide social - dita os rumos

e decide em nome de toda a sociedade enquanto esta sequer tem ideia dos caminhos escolhidos

Em dissonante contrapartida no entanto a parcela mais fragilizada da sociedade sofre os efeitos da

tomada de decisotildees sem entender as razotildees porque suporta tamanho ocircnus

Haacute dessa forma uma inegaacutevel crise de legitimidade que afeta as democracias representativas

Essa crise eacute visiacutevel especialmente nos paiacuteses de modernidade tardia e decorre de um crescente pro-

cesso de marginalizaccedilatildeo e exclusatildeo social7

Na democracia representativa aos ldquopseudocidadatildeosrdquo poacutes-modernos restou a prerrogativa de

comparecer agraves urnas de tempos em tempos para escolher poliacuteticos descomprometidos com os efeti-

vos interesses republicanos dos quais passado determinado tempo poucos lembram

Em vista dessa inegaacutevel crise da democracia representativa (com a qual Fukuyama ao final do

seacuteculo XX imaginava ter se chegado ao fim da histoacuteria)8 faz-se necessaacuterio construir uma concepccedilatildeo

contemporaneamente adequada de democracia e da proacutepria cidadania a qual implique um direi-

7 Como aduz Casalta Nabais (1998 p 975) ldquoNaturalmente que natildeo encontramos hoje eleitores despojados do direito de voto O que haacute isso sim eacute alguns eleitores com voto duplo ou pluacuterimo que ao natildeo ser atribuiacutedo aos outros exprime um privileacutegio contra o qual eacute suposto ter-se feito a revoluccedilatildeo democraacutetica que impocircs a igualdade poliacutetica E ao falar em voto duplo ou pluacuterimo estou a referir-me por um lado ao voto informal exercido pelos grupos de pressatildeo (integrem estes for-malmente corporaccedilotildees ou natildeo) atraveacutes das mais sofisticadas e subtis formas de lobbying que assim esvaziam a democracia representativa do seu mais significativo papel e por outro lado agrave atribuiccedilatildeo legal de um (verdadeiro) segundo ou terceiro direito de voto apenas aos membros de algumas corporaccedilotildees ou corpos eleitorais privilegiadosrdquo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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to-dever de participaccedilatildeo de toda a sociedade no debate sobre os rumos da tributaccedilatildeo e do proacuteprio

Estado neste novo milecircnio

Para Norberto Bobbio no entanto haacute um importante entrave a isso pois segundo ele ldquotecno-

cracia e democracia satildeo antiteacuteticas se o protagonista da sociedade industrial eacute o especialista impos-

siacutevel que venha a ser o cidadatildeo qualquerrdquo Se de um lado a ideia de democracia ldquosustenta-se sobre

a hipoacutetese de que todos podem decidir a respeito de tudordquo por outro a tecnocracia ldquopretende que

sejam convocados para decidir apenas aqueles poucos que detecircm conhecimentos especiacuteficosrdquo Haacute

problemas pois muito mais complexos a resolver-se nos dias atuais como inflaccedilatildeo crise desemprego

desigualdade social motivo pelo qual Bobbio (2002 p 46) entende que a soluccedilatildeo requer conhecimen-

tos cientiacuteficos e teacutecnicos muito mais profundos para o homem meacutedio de hoje do que para o homem

meacutedio dos primoacuterdios da democracia apesar de o atual ser incomensuravelmente mais instruiacutedo

As objeccedilotildees levantadas por Bobbio (2002) quanto agraves possibilidades do proacuteprio futuro da de-

mocracia verdadeiramente impressionam Eacute inegaacutevel que a questatildeo tributaacuteria alcanccedilou um grau de

complexidade que reduz sobremaneira a proacutepria possibilidade de compreensatildeo por parte de uma

parcela muito significativa da sociedade Para contornar-se isso impotildee-se a criaccedilatildeo de mecanismos de

visibilidade do proacuteprio Estado especialmente em relaccedilatildeo ao ldquocaixa pretardquo da tributaccedilatildeo

De qualquer forma mesmo que isso se verificasse num grau satisfatoacuterio ainda assim haveria seacute-

rias dificuldades de uma efetiva participaccedilatildeo popular na tomada de decisotildees sobre aspectos teacutecnicos

de uma adequada carga tributaacuteria

Entretanto natildeo eacute necessaacuterio tamanho aprofundamento da discussatildeo bastando num primeiro

momento que esse debate perpasse pela questatildeo da justiccedila fiscal cuja concepccedilatildeo eacute facilmente com-

preendida por todos independentemente do conhecimento teacutecnico Enfim isso impotildee-se porque ldquoos

impostos constituem um assunto demasiado importante para poder ser deixado exclusivamente nas

matildeos de poliacuteticos e teacutecnicos (economistas)rdquo Em vista disso ldquotodos os contribuintes devam ter opiniatildeo

acerca dos impostos e da justiccedila ou injusticcedila fiscal que suportam ateacute porque a ideacuteia de justiccedila fiscal

natildeo deixa de ser um conceito que tambeacutem passa pelo bom sensordquo (NABAIS 2005 p 59)

A outra faceta da cidadania fiscal assegura aos membros da sociedade o direito de exigir que

todos contribuam para com a coletividade conforme sua capacidade econocircmica Em vista disso dis-

cute-se se seria possiacutevel postular judicialmente contra o beneficiado ou contra o ente estatal em de-

correcircncia do natildeo justificado descumprimento do dever fundamental de pagar tributos

8 Oviacutedio Baptista da Silva (2004 p 12) em criacutetica contundente ao referido autor explica ldquoAo glorificar a democracia liberal Fukuyama esqueceu-se da crescente suspeita com que os eleitores vecircem que sua convocaccedilatildeo para votar de quatro em quatro anos natildeo tem a relevacircncia que seria de esperar de uma democracia representativa A desconfianccedila eacute explicaacutevel en-quanto os eleitores satildeo convocados a votar de quatro em quatro anos o mercado como algueacutem jaacute observou vota todos os dias Aleacutem disso a miacutedia encarrega-se de promover habilmente seus votos de modo que essas decisotildees tornam-se determinantes e imperativas para os governos Na verdade a teoria poliacutetica esquece-se de incluir em suas construccedilotildees teoacutericas a miacutedia como o Grande Eleitor Natildeo leva em conta que vivemos num mundo ciberneacuteticordquo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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Eacute certo que a concessatildeo de benefiacutecios fiscais ou remissotildees corresponde a um legiacutetimo mecanis-

mo de intervenccedilatildeo do Estado no campo econocircmico e social Todavia essa legitimidade apenas estaraacute

presente se os objetivos visados forem constitucionalmente justificaacuteveis sob pena de tal exoneraccedilatildeo

afrontar inclusive a ideia de justiccedila fiscal

Relativamente a essa questatildeo Cristina Chulvi (2001 p 35) entende que natildeo haveria a possibili-

dade de que um indiviacuteduo viesse no caso de descumprimento por outrem a exigir a realizaccedilatildeo de um

dever constitucional posto que natildeo se encontraria legitimado para tanto

No entanto natildeo eacute possiacutevel concordar com tal raciociacutenio pois se a cidadania fiscal plena impli-

ca de um lado o dever de contribuir por outro assegura o direito de exigir que todos na proporccedilatildeo

da capacidade econocircmica contribuam De que adiantaria reconhecer-se tal direito se natildeo houvesse

a legitimidade para exercecirc-lo mediante uma adequada accedilatildeo judicial Negar a legitimidade significa

amesquinhar a ideia de cidadania ao mesmo tempo em que num plano praacutetico significa suportar

um dever de contribuir mais oneroso para compensar a desoneraccedilatildeo indevidamente concedida No

caso especiacutefico do Brasil haacute inclusive instrumentos adequados para tanto como a Accedilatildeo Popular (Lei

471765) a Accedilatildeo Civil Puacuteblica (Lei 734785) ou a Accedilatildeo Direta de Inconstitucionalidade respeitado em

relaccedilatildeo agraves duas uacuteltimas o rol dos legitimados para propocirc-las

Enfim a construccedilatildeo de uma concepccedilatildeo adequada de cidadania fiscal tem potencialidades para

constituir-se num elemento importante agrave concretizaccedilatildeo das promessas constitucionais natildeo cumpridas

(direitos fundamentais sociais especialmente) Poreacutem seria ingenuidade afirmar que a mera (re) cons-

truccedilatildeo dessa ideia poderia dar-se de uma forma espontacircnea na sociedade principalmente naqueles

paiacuteses como o Brasil onde a percepccedilatildeo da atuaccedilatildeo do Estado eacute miacutenima

Em decorrecircncia da visatildeo negativa do papel que o Estado desempenha a evasatildeo fiscal encon-

tra um terreno feacutertil par a sua legitimaccedilatildeo perante a sociedade razatildeo pela qual eacute preciso encontrar

pragmaticamente caminhos viaacuteveis para eficazmente combatecirc-la pois ela corroacutei significativamente

os alicerces da cidadania

3 O COMBATE Agrave EVASAtildeO FISCAL COMO CONDICcedilAtildeO DE EXIGIBILIDADE DOS DEVERES DE CIDADANIA

Um elemento de crescente importacircncia dentro do Estado eacute a questatildeo da evasatildeo fiscal haja

vista que cada vez mais parece ser incontrolaacutevel O fenocircmeno da evasatildeo fiscal pode ser explicado

principalmente pela inexistecircncia de imperativos de ordem moral que a impeccedilam e pela incontornaacutevel

complexidade das relaccedilotildees econocircmicas e sociais na era da globalizaccedilatildeo

Pode-se dizer inclusive que haacute uma aceitaccedilatildeo social taacutecita agrave evasatildeo fiscal razatildeo pela qual natildeo

existe por parte da sociedade uma reaccedilatildeo que tenha por objetivo punir o infrator Tal verifica-se por-

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

181

que nas palavras de Gregoacuterio Robles (2005 p 42) ldquoa infraccedilatildeo da norma social eacute considerada grave

quando afeta um valor essencial de capital importacircncia para o grupo para tanto a reaccedilatildeo seraacute severa

contundenterdquo De outra baila quando ldquoo valor afetado eacute considerado de escassa importacircncia ou de

hierarquia inferior o sentimento de indignaccedilatildeo seraacute leve e difuso e a reaccedilatildeo caso ocorra seraacute suaverdquo

Esse sentimento daacute-se especialmente em face da inexistecircncia de uma resposta estatal agraves de-

mandas sociais bem como em decorrecircncia da visiacutevel e aparentemente incontrolaacutevel corrupccedilatildeo e de

desvios de recursos na administraccedilatildeo puacuteblica Aleacutem disso o sentimento de injusticcedila na reparticcedilatildeo da

carga tributaacuteria (tributaccedilatildeo sem a observacircncia da capacidade contributiva principalmente) traduz-se

num componente importante dessa equaccedilatildeo Isso porque natildeo basta que a justiccedila esteja sendo feita

eacute fundamental que haja a percepccedilatildeo de que ela esteja sendo feita e isso eacute condiccedilatildeo de aceitabilidade

de qualquer sistema fiscal

Entretanto eacute muito difiacutecil controlar a fraude especialmente em face da globalizaccedilatildeo e da

complexidade das relaccedilotildees econocircmicas bem como da crescente desmaterializaccedilatildeo do patrimocircnio

Ou seja os bens imoacuteveis jaacute natildeo ocupam o espaccedilo de excelecircncia no conjunto do patrimocircnio dos

cidadatildeos uma vez que cederam tal espaccedilo aos bens imateriais (accedilotildees tiacutetulos direitos de marcas e

patentes tecnoloacutegicas)

Eacute certo que a ideia de cidadania fiscal contraria a aceitabilidade social da evasatildeo Conforme

alerta Albano Santos (2003 p 359) ldquoa fuga ao imposto quando praticada impunemente de forma cor-

rente e com uma amplitude significativa constitui uma fonte inesgotaacutevel de consequumlecircncias negativas

que atingem a sociedade por inteirordquo Um fenocircmeno desta natureza ldquoperturba o normal funcionamen-

to da economia compromete a consecuccedilatildeo dos objectivos prosseguidos pelas poliacuteticas econoacutemicas

e sociais estabelecidas pelas autoridades subverte o princiacutepio republicano da igualdade dos cidadatildeos

perante a Leirdquo Isso tudo pois ldquoacaba por contribuir seriamente para a degradaccedilatildeo do sentido ciacutevico e

da moralidade puacuteblicardquo

Os efeitos mencionados satildeo bastante visiacuteveis e estatildeo inter-relacionados haja vista que o

Estado depende da efetivaccedilatildeo da arrecadaccedilatildeo para a manutenccedilatildeo de suas contas e para a consecu-

ccedilatildeo dos objetivos constitucionalmente consagrados especialmente a realizaccedilatildeo dos direitos sociais

econocircmicos e culturais

Aleacutem disso a evasatildeo fiscal causa uma distorccedilatildeo irremediaacutevel na economia porquanto atenta

frontalmente contra a lei da livre concorrecircncia Considerando o peso que a carga tributaacuteria repre-

senta no preccedilo final de mercadorias e serviccedilos natildeo eacute difiacutecil perceber que quem tem possibilidades e

opta pela evasatildeo teraacute condiccedilotildees de competitividade muito diferenciadas comparativamente agravequele

que se submete ao peso da carga tributaacuteria e com isso necessariamente embute no preccedilo o res-

pectivo custo

Cabe ressaltar tambeacutem que no plano da justiccedila fiscal o bom contribuinte acaba sendo exces-

sivamente onerado pois em uacuteltima anaacutelise acaba pagando seu tributo e tambeacutem aquele que deveria

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

182

ser pago por quem o sonegou Eacute muito difiacutecil pois sustentar a legitimidade da tributaccedilatildeo quando uma

parcela da sociedade consegue de uma maneira eficaz encontrar mecanismos de burla e fuga fiscal9

Eacute inadmissiacutevel que especialmente em paiacuteses como o Brasil o Estado opte por solucionar essa

questatildeo reduzindo de um lado a jaacute miacutenima proteccedilatildeo social ou de outro instituindo novos tribu-

tos ou majorando aliacutequotas daqueles jaacute existentes para fazer frente agrave diminuiccedilatildeo da receita fruto da

evasatildeo fiscal Ainda que poderosos grupos de pressatildeo defendam tais soluccedilotildees elas provavelmente

levariam a uma ampliaccedilatildeo das jaacute elaacutesticas desigualdades sociais o que seria inaceitaacutevel num modelo

de Estado cuja tarefa preciacutepua eacute combatecirc-las

Admite-se no entanto que a fraude embora ilegal e imoral faz parte do sistema e que por

mais esforccedilos que sejam empregados ela natildeo seraacute debelada por completo Em vista disso haacute de bus-

car-se de uma forma realista niacuteveis reduzidos e toleraacuteveis da fraude e da evasatildeo da mesma forma

como ocorre relativamente agrave questatildeo da corrupccedilatildeo Isso exigiria uma postura de incessante enfrenta-

mento da evasatildeo fiscal

Segundo Sevilla Segura (2004 p 162) haacute trecircs formas de atuaccedilatildeo capazes de eliminar a evasatildeo

fiscal dependendo da variaacutevel em que se queira fundamentalmente atuar As mais tradicionais procu-

ram reforccedilar a capacidade coativa da administraccedilatildeo tributaacuteria como recurso para melhorar os niacuteveis de

cumprimento das obrigaccedilotildees pelos contribuintes Recentemente vem consolidando-se um segundo

grupo de accedilotildees cujo propoacutesito consiste em favorecer a aceitaccedilatildeo do imposto por parte dos cidadatildeos

incentivando o cumprimento voluntaacuterio das suas obrigaccedilotildees fiscais Finalmente cabe tambeacutem recon-

siderar a proacutepria estrutura normativa que estaacute sendo objeto de aplicaccedilatildeo eliminando suas arestas de

forma que resulte em algo mais compreensiacutevel para os cidadatildeos e mais faacutecil para a administraccedilatildeo

Deve-se pois insistir na busca de mecanismos eficazes para combater a evasatildeo fiscal como

por exemplo a ampliaccedilatildeo de investimentos em pessoal altamente qualificado a informatizaccedilatildeo das

informaccedilotildees objetivando a existecircncia de um rigoroso cruzamento de dados bem como a implemen-

taccedilatildeo de mecanismos de controle agrave corrupccedilatildeo Relativamente a essa uacuteltima Prahalad (2005 p 83) sus-

tenta que ldquoa maioria dos paiacuteses em desenvolvimento natildeo entende na totalidade os verdadeiros custos

da corrupccedilatildeo e seu impacto no desenvolvimento do setor privado e na diminuiccedilatildeo da pobrezardquo

Conquanto a complexidade das relaccedilotildees econocircmicas seja inevitaacutevel eacute fundamental simplificar

a legislaccedilatildeo fiscal Como se pode constatar diariamente multiplica-se uma quantidade inexplicaacutevel

9 Como afirma Albano Santos (2003 p 362) ldquoisso resulta numa clara desigualdade perante a tributaccedilatildeo e por conseguinte implica uma inaceitaacutevel sensaccedilatildeo de injusticcedila Ora no dizer do Prof Maurice Duverger laquoum dos mais graves golpes que se podem infligir na igualdade perante o imposto eacute o de estabelecer uma desigualdade perante a frauderaquo Nestas condiccedilotildees a Justiccedila Tributaacuteria poderaacute ser gravemente subvertida com as inevitaacuteveis consequumlecircncias na aceitaccedilatildeo do sistema fiscal pelos cidadatildeos De facto uma situaccedilatildeo que oferece a certos grupos ou indiviacuteduos a cocircmoda possibilidade de escaparem ao pagamento dos impostos devidos pelo exemplo que daacute acaba por representar forccedilosamente um incitamento a outros contribuintes para se subtraiacuterem ao Fisco com o risco de gerar uma reacccedilatildeo em cadeia susceptiacutevel de provocar seacuterios da-nos natildeo apenas nas tesourarias puacuteblicas mas bem mais importante na proacutepria coesatildeo socialrdquo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

183

de normas especialmente aquelas voltadas a dar condiccedilotildees de executoriedade agraves leis isto eacute normas

regulamentares provenientes do Poder Executivo Essas normas exageram na criaccedilatildeo de conceitos

indeterminados ficccedilotildees e presunccedilotildees e aleacutem disso como constata Seacutergio Silva (2006 p 151) ldquoo cor-

porativismo e a utilizaccedilatildeo da legislaccedilatildeo tributaacuteria como instrumento da defesa de interesses de grupos

econocircmicos fazem do ordenamento tributaacuterio um emaranhado de normas muitas vezes conflitantes e

sem sentido que soacute podem ser compreendidas (quando o satildeo) por especialistasrdquo

Conforme adverte Prahalad (2005 p 85) ldquoos regulamentos resultam da interpretaccedilatildeo bu-

rocraacutetica das leis e sua proliferaccedilatildeo pode tornar o sistema obscuro para qualquer um exceto para

os muito experientesrdquo Em decorrecircncia disso sustenta o autor que a corrupccedilatildeo em todos os niacuteveis

da burocracia tende a ser endecircmica ademais a proliferaccedilatildeo dos regulamentos pode ter a mesma

consequecircncia da ldquopura inexistecircncia de leisrdquo a emergecircncia da informalidade Com isso os empreen-

dimentos permanecem pequenos e locais pois a corrupccedilatildeo passa a ser um custo inassimilaacutevel para

empreendimentos maiores

Natildeo bastasse isso aumentam-se os deveres instrumentais que devem ser adimplidos pelos

contribuintes Isto eacute os contribuintes assumem obrigaccedilotildees acessoacuterias cada vez mais complexas e one-

rosas com vistas a fornecer informaccedilotildees ao fisco sendo que eventuais erros ou omissotildees satildeo severa-

mente punidos Em vista disso tudo Casalta Nabais (2004b p 219) sustenta que ldquotorna-se imperiosa a

necessidade de simplificaccedilatildeo do sistema fiscalrdquo Eacute fundamental que o ldquolegislador desonere as empresa

da rede labiriacutentica de obrigaccedilotildees acessoacuterias as que crescentemente as tem vindo a manietarrdquo

Conveacutem ressaltar entretanto que a necessaacuteria simplificaccedilatildeo natildeo pode trilhar um caminho que

aponte para a construccedilatildeo de um modelo tributaacuterio que desconsidere o princiacutepio da capacidade con-

tributiva Por isso natildeo satildeo aceitaacuteveis as ideias que sustentam uma reduccedilatildeo das hipoacuteteses de manifes-

taccedilotildees de riquezas passiacuteveis de serem alcanccediladas pela tributaccedilatildeo especialmente a simplista ideia de

instituiccedilatildeo de um imposto uacutenico seja qual for sua materialidade ou hipoacutetese de incidecircncia Isso impli-

caria pois optar por um destino diametralmente oposto ao princiacutepio da dignidade da pessoa humana

Paralelamente a isso eacute necessaacuterio que as penalidades pelo descumprimento do dever funda-

mental sejam de tal modo severas que desestimulem a praacutetica da evasatildeo para que o raciociacutenio do

ldquoriscobenefiacuteciordquo seja levado em consideraccedilatildeo no momento de eventualmente optar-se pela praacutetica

delituosa Para tanto eacute claro que como qualquer outra penalidade haacute de ter-se um fundado receio

expectativa de que ela venha a ser aplicada De qualquer forma tambeacutem nesse ponto deve-se ter uma

devida cautela para que a penalidade imposta natildeo seja desproporcional agrave infraccedilatildeo cometida

Ainda para que a fraude seja desestimulada faz-se necessaacuterio que o Estado distribua equitati-

vamente a carga tributaacuteria e paralelamente a isso o cidadatildeo possa visualizar claramente os benefiacutecios

sociais oriundos do recolhimento de tributos Talvez em paiacuteses como o Brasil seja esse o maior desafio

a ser enfrentando no combate agrave evasatildeo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

184

Pode-se concluir assim que o combate agrave evasatildeo eacute um dos importantes elementos para a cons-

truccedilatildeo da cidadania fiscal que passa pela aceitabilidade do dever fundamental de pagar tributos e pela

reconstruccedilatildeo dos mecanismos de solidariedade entre os indiviacuteduos que compotildeem uma sociedade

Eacute certo que natildeo se trata de um caminho que possa ser percorrido sem agruras ou dificuldades

No entanto tomar tal rumo eacute inclusive uma condiccedilatildeo para construccedilatildeo de um modelo tributaacuterio mais

equitativo que esteja apto a colaborar decisivamente na densificaccedilatildeo do princiacutepio basilar que norteia

a Constituiccedilatildeo Brasileira o princiacutepio da dignidade da pessoa humana

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Ao concluir este trabalho optou-se por traccedilar algumas consideraccedilotildees que se natildeo estatildeo no

acircmago da questatildeo abordada tecircm uma relaccedilatildeo de indiscutiacutevel pertinecircncia Busca-se pois examinar

a relaccedilatildeo da ideia de liberdade em tempos de culto a uma ideia no miacutenimo distorcida do que seja

a tatildeo almejada felicidade

As sociedades de massa existentes no que se convencionou denominar de poacutes-modernidade

tecircm uma caracteriacutestica comum o apreccedilo pelo indiviacuteduo Como se cada qual pudesse ter uma vida

autocircnoma e desconectada do restante esquece-se o alerta que jaacute fizera Tocqueville ndash conforme

lembra o socioacutelogo polonecircs Zygmunt Bauman ldquoo indiviacuteduo eacute o pior inimigo do cidadatildeordquo Nestes

tempos de culto ao individualismo haacute uma busca irrefreaacutevel por sentir-se uacutenico - social econocircmica

e esteticamente desejaacutevel - como uma espeacutecie de mercadoria posta na prateleira do ldquoSr Mercadordquo

para ser cobiccedilada e admirada pelo restante dos indiviacuteduos que tambeacutem almejam ocupar o mesmo

espaccedilo Na linha de Bauman os seres humanos transformam-se em mercadorias e vivem para satis-

fazer suas necessidades de consumo

Segundo tal loacutegica isso permitiria alcanccedilar aquilo que mais se pode buscar a felicidade Quando

se passa a discutir o que significa isso as respostas satildeo as mais variadas possiacuteveis Poreacutem percebe-se

que felicidade no mais das vezes associa-se agrave possibilidade de ter acesso a tudo que supostamente

permitiria sentir-se uacutenico notadamente o acesso a determinados padrotildees de consumo Acredita-se

que ldquoterrdquo algo possa propiciar um sentimento de satisfaccedilatildeo e alegria sem finitude

Isso torna-se particularmente perverso nas relaccedilotildees que se desenvolvem no acircmbito das de-

nominadas redes sociais Neste universo eacute essencialmente necessaacuterio parecer feliz pois o contraacuterio

eacute revelador de certa incompetecircncia em gerir o destino Constroem-se vidas perfeitas e portanto

fictiacutecias as quais geram um sentimento de frustraccedilatildeo e inseguranccedila por parte daqueles que acredi-

tam nesse verdadeiro ldquoconto de fadasrdquo automidiaacutetico quando constatam que suas proacuteprias vidas satildeo

comuns e pequenas diante de tantos ldquofelizesrdquo que povoam tais redes Incrivelmente esse sentimento

eacute reciacuteproco pois aqueles que vendem tal imagem tambeacutem se sentem dessa forma uma vez que

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

185

intimamente sabem que seu - eficazmente vendido - marketing pessoal nada mais eacute do que uma

pura obra de ficccedilatildeo

Tudo eacute tatildeo avassalador que mesmo dando-se conta disso eacute difiacutecil natildeo se submeter aos seus

efeitos negativos De qualquer forma este texto natildeo tem a pretensatildeo de convencer algueacutem acerca das

armadilhas deste mito nem pretende vender uma nova foacutermula para alcanccedilar este intento como o

fazem tantos livros de autoajuda cujos autores satildeo os principais ldquoajudadosrdquo O que se pretende aqui

singelamente eacute sugerir uma reflexatildeo eacute possiacutevel ser feliz sem ser livre

Eacute certo que a convivecircncia coletiva impotildee limites no plano individual que frustram a liberdade

no seu estado original Isso acontece porque soacute eacute possiacutevel ser verdadeiramente livre no seio de uma

sociedade O ser humano natildeo se realiza como tal a natildeo ser coexistindo Numa ilha deserta o ser hu-

mano nada mais eacute do que sua versatildeo primordial de evoluccedilatildeo agrave medida que estaacute condenado a satisfa-

zer apenas seus instintos baacutesicos Portanto os limites impostos pela convivecircncia coletiva satildeo meios de

garantia da proacutepria liberdade Desconsiderando o outro o ser humano faz da liberdade sua primeira

viacutetima e de si proacuteprio um verdadeiro escravo de seus instintos

Ocorre que natildeo satildeo esses limites que na atualidade comprometem a liberdade Uma vez que

se assume a tarefa de ser aceito pela sociedade de consumo automaticamente passa-se a agir de

acordo com os padrotildees estabelecidos por ela Satildeo normas natildeo escritas e leis concretamente inexis-

tentes as quais imperceptivelmente balizam o modo de agir Desde a necessidade de adquirir deter-

minados bens ateacute a manifestaccedilatildeo de determinadas opiniotildees age-se de acordo com modo de viver

e pensar que eacute sutilmente imposto como condiccedilatildeo para alcanccedilar aquilo que se diz ser felicidade Por

mais paradoxal que pareccedila quanto mais brilhante for o aluno mais provavelmente restaraacute frustrado e

infeliz ao perceber a euforia esvaindo-se tatildeo rapidamente No dia seguinte novos desejos artificial-

mente produzidos haveratildeo de ser satisfeitos

Por isso nestes bons tempos de iniacutecio de seacuteculo vale pensar o quanto se deve buscar a decan-

tada felicidade que se vende tal qual anuacutencio publicitaacuterio de margarina quanto isso significa compro-

meter algo indissociaacutevel agrave proacutepria condiccedilatildeo humana ser livre Portanto melhor do que desejar algueacutem

ldquoSeja Felizrdquo poder-se-ia dizer ldquoSeja Livrerdquo Pelo menos natildeo seja refeacutens de normas e leis concretamente

inexistentes e faticamente inuacuteteis Seja feliz sem deixar de ser livre Ou seja livre pois soacute assim poderaacute

ser verdadeiramente feliz

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REFEREcircNCIAS

BAUMAN Zygmunt Europa Traduccedilatildeo de Carlos Alberto Medeiros Rio de Janeiro Jorge Zahar 2006

BOBBIO Norberto O Futuro da Democracia 7 ed Satildeo Paulo Paz e Terra 2002

CANOTILHO Joseacute Joaquim Gomes Direito Constitucional e Teoria da Constituiccedilatildeo 7 ed 2 reimpr Coimbra Almedina 2006

CANOTILHO Joseacute Joaquim Gomes LEITE Joseacute Rubens Morato Direito Constitucional Ambiental Brasileiro Satildeo Paulo Saraiva 2007

CHULVI Cristina Pauner El Deber Constitucional de Contribuir al Sostenimiento de los Gastos Puacute-blicos Madrid Centro de Estudios Poliacuteticos e Constituionales 2001

COMPARATO Faacutebio Konder Eacutetica direito moral e religiatildeo no mundo moderno Satildeo Paulo Companhia das Letras 2006

DUVIGNAUD Jean A Solidariedade laccedilos de sangue laccedilos de razatildeo Trad Vasco Casimiro Lisboa Instituto Piaget 1986

HAumlBERLE Peter A Dignidade Humana como Fundamento da Comunidade Estatal In SARLET Ingo Wolfgang (org) Dimensotildees da Dignidade ensaios de filosofia do direito e direito constitucional Trad Ingo Wolfgang Sarlet Pedro Scherer de Mello Aleixo e Rita Dostal Zanini Porto Alegre Livraria do Advogado 2005

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NABAIS Joseacute Casalta O Dever Fundamental de Pagar Impostos Coimbra Almedina 2004a

______ Algumas Reflexotildees Criticas sobre os Direitos Fundamentais ab uno ad omnes 75 anos da Coimbra Editora Coimbra Coimbra 1998

______ Avaliaccedilatildeo Indireta e Manifestaccedilotildees de Fortuna na Luta Contra a Evasatildeo Fiscal Separata Direito e Cidadania Praia ndash Cabo Verde ano VI n 20-21 mai dez 2004b

______ Estudos de Direito Fiscal por um estado fiscal suportaacutevel Coimbra Almedina 2005

PRAHALAD CK A Riqueza na Base da Piracircmide como erradicar a pobreza com o lucro Trad Baacutezan Tecnologia e Linguumliacutestica Porto Alegre Bookman 2005

ROBLES Gregorio Os Direitos Fundamentais e a Eacutetica na Sociedade Atual Satildeo Paulo Manole 2005 SANTOS J Albano Teoria Fiscal Lisboa Universidade Teacutecnica de Lisboa ndash Instituto Superior de Ciecircn-cias Sociais e Poliacuteticas 2003

SACCHETTO Claacuteudio O Dever de Solidariedade no Direito Tributaacuterio o ordenamento italiano Trad Milene Eugecircnio Cavalcante Greco e Marco Aureacutelio Greco In GRECCO Marco Aureacutelio GODOI Marciano

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TORRES Ricardo Lobo Tratado de Direito Constitucional Financeiro e Tributaacuterio Valores e Princiacute-pios Constitucionais Tributaacuterios VII Rio de Janeiro Renovar 2005

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O PROCESSO DE CODIFICACcedilAtildeO DO DIREITO TRIBUTAacuteRIO BRASILEIRO

SUMAacuteRIO Introduccedilatildeo 1 Antecedentes do processo de codificaccedilatildeo do Di-reito Tributaacuterio no Brasil 11 O sistema tributaacuterio na Constituiccedilatildeo Federal de 1946 12 A Emenda Constitucional no 1865 2 O Coacutedigo Tributaacuterio Na-cional (CTN) 21 Precedentes da codificaccedilatildeo 22 O Coacutedigo de Napoleatildeo 23 O processo de codificaccedilatildeo no Brasil 24 O movimento de codificaccedilatildeo do Direito Tributaacuterio no Brasil 25 Movimentos que antecederam o CTN 26 O anteprojeto de lei 27 A Lei no 5172 de 1966 (Coacutedigo Tributaacuterio Nacional ndash CTN) 28 O CTN no ordenamento juriacutedico nacional 281 A funccedilatildeo do CTN 282 Algumas criacuteticas ao CTN Consideraccedilotildees finais Referecircncias

Osvaldo Joseacute Rebouccedilas1

INTRODUCcedilAtildeO

A codificaccedilatildeo do Direito Tributaacuterio no Brasil passou por um processo relativamente longo de

infindaacuteveis discussotildees Vaacuterios fatores deram causa a este retardamento no processo de codificaccedilatildeo

especialmente a ignoracircncia da doutrina paacutetria sobre a importacircncia do Direito Tributaacuterio que era co-

mumente aceito como um apecircndice do Direito Financeiro e a inexistecircncia de obras com repercussatildeo

ampla levando a comunidade juriacutedica a despertar para a necessidade da realizaccedilatildeo de estudos mais

consistentes sobre os institutos e as formas desta relevante aacuterea do Direito para a sociedade moderna

O trabalho que se propotildee desenvolver tem por objetivo efetuar um estudo sobre o processo

da codificaccedilatildeo do Direito Tributaacuterio no Brasil sob uma perspectiva histoacuterica vale dizer identificar em

sua histoacuteria o conjunto de fatos e procedimentos que o precederam e foram adotados para enfim se

chegar agrave elaboraccedilatildeo de um projeto e de Coacutedigo Tributaacuterio Nacional no contexto juriacutedico brasileiro

Eacute certo que para a consecuccedilatildeo dos objetivos almejados eacute necessaacuterio assentar previamente algu-

mas premissas ou hipoacuteteses sobre as quais se vai desenvolver o estudo Primeiro eacute preciso demonstrar

se havia necessidade ou natildeo da elaboraccedilatildeo de um coacutedigo tributaacuterio para o direito brasileiro segundo

que vantagens traria para a ordenaccedilatildeo do sistema tributaacuterio sua ediccedilatildeo terceiro que efeitos juriacutedicos

irradiariam da codificaccedilatildeo das normas tributaacuterias no modelo poliacutetico nacional tendo em vista a forma

como o Brasil eacute organizado politicamente (modelo federativo onde cada esfera de poder tem auto-

nomia poliacutetica e administrativa para se auto-governar e auto-administrar) e quarto como a doutrina

paacutetria enfrentou a questatildeo da codificaccedilatildeo normativa da tributaccedilatildeo em face do sistema tributaacuterio na-

cional vigente agrave eacutepoca

Natildeo se pode perder de vista que para a elaboraccedilatildeo exitosa deste estudo eacute necessaacuterio que se

1 Auditor Fiscal da Receita Estadual do Cearaacute E-mail osvaldorebhotmailcom

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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estabeleccedila a metodologia a ser adotada e os caminhos a serem trilhados Seguramente necessaacuterio se

faz orientar a pesquisa para uma anaacutelise do sistema tributaacuterio vigente agrave eacutepoca da elaboraccedilatildeo da pro-

posta especialmente as competecircncias dos entes central e perifeacutericos e como se desenvolvia esta ad-

ministraccedilatildeo tributaacuteria em seguida seratildeo identificados quais os principais problemas enfrentados pela

administraccedilatildeo e pelo contribuinte no que concerne ao exerciacutecio da tributaccedilatildeo posteriormente seratildeo

retratados os procedimentos adotados visando a elaboraccedilatildeo de um anteprojeto de lei passando pela

formaccedilatildeo da comissatildeo de redaccedilatildeo e escolha de seus membros a seguir seraacute detalhado o processo his-

toacuterico da elaboraccedilatildeo do anteprojeto e a participaccedilatildeo efetiva da sociedade na consolidaccedilatildeo da minuta

a ser apresentada ao Congresso Nacional e por derradeiro a transformaccedilatildeo do anteprojeto em lei (Lei

nordm 5172 de 30 de outubro de 1966)

Todo o trabalho de pesquisa deveraacute ser desenvolvido analisando-se a legislaccedilatildeo nacional inclu-

sive a constitucional publicaccedilotildees sobre a histoacuteria da codificaccedilatildeo do direito tributaacuterio projetos de lei

debates e sobretudo o processo histoacuterico no qual se inseriu as accedilotildees desenvolvidas visando a elabo-

raccedilatildeo da minuta de codificaccedilatildeo das normas tributaacuterias

Superadas todas estas etapas para a realizaccedilatildeo do trabalho espera-se ao final retratar com

relativa fidedignidade o processo histoacuterico de codificaccedilatildeo do Direito Tributaacuterio brasileiro que culminou

com a ediccedilatildeo da lei retrocitada transformada a posteriori em Coacutedigo Tributaacuterio Nacional como ele

foi inserido em nosso ordenamento juriacutedico e os efeitos que decorreram agrave eacutepoca de sua publicaccedilatildeo no

modelo poliacutetico juriacutedico e administrativo nacional

Da compreensatildeo deste processo histoacuterico se pode com certeza entender de maneira mais

ampla e segura o modelo tributaacuterio paacutetrio atual e porque o Coacutedigo que jaacute perdura por mais de qua-

renta anos continua sendo o mais importante instrumento de harmonizaccedilatildeo do sistema tributaacuterio

nacional apesar de nosso modelo poliacutetico de federalismo tatildeo complexo e ao mesmo tempo enge-

nhoso em sua concepccedilatildeo

E como afirma o Prof Waldemar Ferreira nenhum jurista pode dispensar o contingente do pas-

sado a fim de bem compreender as instituiccedilotildees juriacutedicas dos dias atuais (FERREIRA 1952 p1) sendo

destarte de fundamental importacircncia o conhecimento da histoacuteria do direito para a compreensatildeo dos

fenocircmenos juriacutedicos do presente

1 ANTECEDENTES DO PROCESSO DE CODIFICACcedilAtildeO DO DIREITO TRIBUTAacuteRIO NO BRASIL

11 O Sistema Tributaacuterio Nacional na Constituiccedilatildeo Federal de 1946

Para exame de qualquer ramo do Direito inclusive o do Direito Tributaacuterio a lembranccedila de sua

gecircnese e de seu desenvolvimento no tempo reveste-se de grande interesse e importacircncia sobretu-

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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do sob o aspecto pedagoacutegico A compreensatildeo da histoacuteria permite contextualizar melhor os temas

a serem abordados e assim melhor compreendecirc-los Ela portanto se transforma em elemento de

inegaacutevel valia e auxiliar de relevante destaque no estudo natildeo somente do direito enquanto realidade

soacutecio-cultural mas tambeacutem na anaacutelise de elementos que compotildeem sua estrutura em determinado

periacuteodo de evoluccedilatildeo da sociedade tendo sempre presente que em razatildeo de ser ele um reflexo das

relaccedilotildees humanas estaacute em contiacutenuo desenvolvimento pressupondo sempre a existecircncia de um direito

anterior regulador de tais relaccedilotildees intersubjetivas inerentes agrave condiccedilatildeo humana

E o Brasil (e natildeo poderia ser diferente) desde o iniacutecio de sua descoberta teve seu Direito Tribu-

taacuterio expresso pela legislaccedilatildeo fiscal (conjunto de leis e de praxes portuguesas) que eram aplicadas em

seu territoacuterio Assim o direito tributaacuterio brasileiro tem suas origens com o proacuteprio descobrimento do

Brasil e vem sofrendo todo o processo de evoluccedilatildeo ao qual eacute submetido agrave proacutepria sociedade

De se lembrar que para elaboraccedilatildeo de um panorama histoacuterico do Coacutedigo Tributaacuterio Nacional

eacute necessaacuterio se efetuar um corte epistemoloacutegico no tempo e adotar como ponto de partida um deter-

minado sistema juriacutedico vigente a justificar sua inserccedilatildeo no ordenamento paacutetrio

O Direito Tributaacuterio como afirma Machado (1998) enquanto conjunto de normas constituin-

do-se um ramo do Direito Puacuteblico natildeo tinha no Brasil nessa eacutepoca sido objeto de estudo como

ramo autocircnomo do Direito vale dizer natildeo havia um estudo sistematizado de seus institutos e nor-

mas nem discussotildees mais amplas pela comunidade acadecircmica acerca de sua existecircncia com foros

de autonomia

E o reflexo desse ldquodesconhecimentordquo se materializa em nossos sistemas tributaacuterios Veja-se o

sistema tributaacuterio estruturado na Constituiccedilatildeo Federal de 1946 que mesmo jaacute contendo uma certa

densidade estrutural ainda assim apresentava uma multiplicaccedilatildeo e acumulaccedilatildeo de incidecircncias tributaacute-

rias que dificultavam e oneravam a produccedilatildeo impondo ao contribuinte uma carga de tributos confusa

e elevada Como afirma Martins (1989 p19)

Os conflitos se sucediam as formas tributaacuterias eram utilizadas com imperfeiccedilotildees no-toacuterias as garantias se diluiacuteam em casuiacutesmos surgidos da melancoacutelica vocaccedilatildeo da Fe-deraccedilatildeo brasileira em transformar os governantes em criadores de despesas uacuteteis e inuacuteteis a serem ndash apenas apoacutes sua projeccedilatildeo ndash cobertas pelas receitas fiscais

Isso gerou permanente tensatildeo entre o contribuinte que se sentia penalizado com uma tri-

butaccedilatildeo injusta e o fisco cada vez mais exigindo recursos financeiros do particular E como salienta

Nogueira (1989) tal procedimento encontra fundamento para a exigecircncia no direito de tributar do

Estado decorrente de seu poder de impeacuterio pelo qual faz ldquoderivarrdquo para seus cofres uma parcela do

patrimocircnio das pessoas sujeitas agrave sua jurisdiccedilatildeo para atender as necessidades da sociedade

Atente-se que conforme Moraes (1993) o sistema tributaacuterio definido na Constituiccedilatildeo de 1946

preservando o modelo federativo fundamentava-se em trecircs premissas baacutesicas a) coexistecircncia de trecircs

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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sistemas tributaacuterios autocircnomos um para cada ente poliacutetico da Federaccedilatildeo (Uniatildeo Estados e Municiacute-

pios) separando-se teoricamente os campos de imposiccedilatildeo tributaacuteria de cada ente b) adoccedilatildeo de uma

classificaccedilatildeo dos impostos tendo como fundamento apenas o nome juriacutedico e desprezando-se o con-

teuacutedo econocircmico e c) preservaccedilatildeo da autonomia financeira das trecircs entidades poliacuteticas da Federaccedilatildeo

outorgada atraveacutes de impostos privativos embora houvessem participaccedilotildees financeiras no produto da

arrecadaccedilatildeo de impostos de um poder tributante por parte de outro visando reduzir desequiliacutebrios e

fortalecer a Federaccedilatildeo

Esta Constituiccedilatildeo disciplinou o sistema tributaacuterio estabelecendo uma reparticcedilatildeo de compe-

tecircncia dos tributos entre os fiscos e impocircs limitaccedilotildees ao poder de tributar (art17) fixou a imunidade

reciacuteproca para efeito da instituiccedilatildeo do Imposto de Renda bens e serviccedilos da Uniatildeo dos Estados Dis-

trito Federal e Municiacutepios assegurou a imunidade dos templos de qualquer culto bens e serviccedilos de

partidos poliacuteticos instituiccedilotildees de educaccedilatildeo e de assistecircncia social e o papel destinado agrave impressatildeo de

livros jornais e perioacutedicos (art 31 V) Reintroduziu tambeacutem a contribuiccedilatildeo de melhoria com previsatildeo

constitucional e as taxas de competecircncia concorrente entre Uniatildeo Estados Distrito Federal e Municiacute-

pios dando mais solidez agrave estrutura tributaacuteria dos entes perifeacutericos

Vedou ainda limitaccedilotildees ao traacutefego de qualquer natureza por meio de tributos aleacutem de consa-

grar o princiacutepio da legalidade e o princiacutepio da anualidade ao estabelecer no art 141 sect 34 (dos Direitos

e das Garantias Individuais) que a) nenhum tributo seraacute exigido ou aumentado sem que a lei o esta-

beleccedila e b) nenhum seraacute cobrado em cada exerciacutecio sem preacutevia autorizaccedilatildeo orccedilamentaacuteria ressalvada

a tarifa aduaneira e o imposto lanccedilado por motivo de guerra

A Constituiccedilatildeo conferiu competecircncia agrave Uniatildeo para cobrar impostos sobre importaccedilatildeo de mer-

cadorias consumo de mercadorias produccedilatildeo comeacutercio distribuiccedilatildeo e consumo e bem assim im-

portaccedilatildeo e exportaccedilatildeo de lubrificantes e de combustiacuteveis liacutequidos ou gasosos de qualquer origem ou

natureza minerais do paiacutes e energia eleacutetrica imposto de renda transferecircncia de fundos para o exterior

e negoacutecios de sua economia

Aos Estados foi atribuiacuteda competecircncia para decretar impostos sobre a propriedade territorial

transmissatildeo causa mortis e inter vivos e sua incorporaccedilatildeo ao capital das sociedades aleacutem do imposto

sobre vendas e consignaccedilotildees exportaccedilatildeo de suas mercadorias para o estrangeiro com aliacutequota maacutexi-

ma de 5 ad valorem serviccedilos da justiccedila e negoacutecios de sua economia

Os Municiacutepios ficaram com as transferecircncias previstas constitucionalmente e com o imposto

predial e territorial urbano de licenccedila de induacutestrias e profissotildees sobre diversotildees puacuteblicas sobre atos

de sua economia ou de assuntos de sua competecircncia

Em que pese estrutura a tributaacuteria definida pela Constituiccedilatildeo de 1946 conforme visto contendo

significativos avanccedilos vaacuterios problemas assolavam o paiacutes dentre os quais um processo inflacionaacuterio

galopante que corroiacutea o poder de compra da moeda o iniacutecio de crise e desordens poliacuteticas e adminis-

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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trativas Veja-se o elenco de criacuteticas sintetizadas ainda com Moraes (1993) nos seguintes aspectos

a) tributaccedilatildeo ampla e variada permitindo incidecircncias tributaacuterias em duplicidade sendo que o

acircmbito de incidecircncia dos tributos baseava-se em distinccedilotildees meramente juriacutedicas ignorando os fatos

econocircmicos

b) a discriminaccedilatildeo de rendas tributaacuterias apresentava-se empiacuterica natildeo se originando de anaacutelise

econocircmica pondo em risco o regime federativo em razatildeo do desequilibro causado

c) o imposto sobre vendas e consignaccedilotildees se apresentava com incidecircncia cumulativa em cas-

cata prejudicando a comercializaccedilatildeo e industrializaccedilatildeo de produtos

d) o excesso de leis provocando a proliferaccedilatildeo de obrigaccedilotildees acessoacuterias e a complexidade de

procedimentos a serem adotados pelo contribuinte dificultando suas atividades

Apesar da teoacuterica separaccedilatildeo das competecircncias entre os entes tributantes e da classificaccedilatildeo ( ju-

riacutedica) dos tributos outro problema detectado com frequecircncia era a constante invasatildeo pelas taxas de

aacutereas de competecircncias dos impostos bem como a criaccedilatildeo de contribuiccedilotildees que se confundiam com

taxas ou impostos todos exigidos do particular

De outro lado o progresso econocircmico e o crescimento do paiacutes impunham mudanccedilas que re-

movessem esses empecilhos ao desenvolvimento nacional dotando-se o paiacutes de uma estrutura tri-

butaacuteria moderna e adequada agrave realidade poliacutetica e econocircmica que ora se apresentava Natildeo era mais

possiacutevel se compatibilizar o estaacutegio de desenvolvimento que a naccedilatildeo brasileira experimentava com um

sistema juriacutedico-tributaacuterio arcaico como comentado que inexoravelmente a levava ao engessamento

e impedia seu desenvolvimento em niacuteveis desejados e exigidos pela sociedade em contiacutenua evoluccedilatildeo

Aleacutem de todos os problemas anteriormente apontados um fator de desequilibro financeiro se

fazia presente na economia nacional qual seja a existecircncia de um quadro inflacionaacuterio instaacutevel e re-

cessivo que impunha a urgente necessidade de mudanccedilas lanccedilando a semente para a realizaccedilatildeo de

uma reforma tributaacuteria adequada agraves necessidades do paiacutes e que viesse dotaacute-lo do instrumental neces-

saacuterio agrave plena evoluccedilatildeo econocircmica nos patamares exigidos pela novel realidade econocircmica

12 A Emenda Constitucional no 1865

Como visto era imperioso que se processasse radical transformaccedilatildeo no sistema tributaacuterio na-

cional O Presidente Castelo Branco visando essa reestruturaccedilatildeo segundo as diretrizes sugeridas pelos

professores Otaacutevio Gouveia de Bulhotildees e Roberto Campos Ministros respectivamente da Fazenda

e do Planejamento determinou em caraacuteter de urgecircncia a elaboraccedilatildeo normativa necessaacuteria a con-

secuccedilatildeo de tal fim Foram entatildeo convidados dois ilustres professores de direito tributaacuterio brasileiros

Rubens Gomes de Sousa e Gilberto de Ulhoa Canto para prestaram assessoria ao governo federal na

idealizaccedilatildeo e preparaccedilatildeo de uma proposta de mudanccedila do sistema tributaacuterio

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

193

Em verdade esta mudanccedila comeccedilou com a Portaria Conjunta GB 30 de 27 de janeiro de 1965

do Ministeacuterio de Estado dos Negoacutecios da Fazenda e do Planejamento que instituiu uma comissatildeo

especial para elaborar um projeto de reforma constitucional Esta comissatildeo era formada por juristas

e renomados teacutecnicos da administraccedilatildeo puacuteblica nas aacutereas financeira e econocircmica Seus componentes

eram Luis Simotildees Lopes como presidente o prof Rubens Gomes de Sousa designado relator como

membros foram indicados Gerson Augusto da Silva Sebastiatildeo SantrsquoAna e Silva Gilberto de Ulhoa

Canto e Maacuterio Henrique Simonsen A comissatildeo preparou dois anteprojetos de emenda constitucional

Depois da divulgaccedilatildeo das propostas para receber sugestotildees da sociedade e em especial dos juristas

ela foi apoacutes sua fusatildeo e consolidaccedilatildeo enviada em outubro de 1965 ao Ministeacuterio da Fazenda que a

encaminhou ao Presidente da Repuacuteblica A posteriori foi por este remetida ao Congresso Nacional que

aprovou o projeto em 1ordm de dezembro de 1965 com o nuacutemero de Emenda Constitucional 18 instituin-

do uma nova discriminaccedilatildeo de rendas e uma estrutura moderna e totalmente diversa do que se tinha

ateacute entatildeo feito no Brasil em mateacuteria fiscal

Eacute o que se colhe do bem lanccedilado comentaacuterio de Moraes (2000 p 153) ao afirmar que

Desde 1891 a discriminaccedilatildeo de rendas tributaacuterias vinha sendo repetida nas Consti-tuiccedilotildees que se seguiram (1934 1937 e 1946) sem a menor imaginaccedilatildeo alterando-se apenas a parte relativa agrave competecircncia tributaacuteria das entidades poliacuteticas ou melhor modificando-se as pessoas de direito puacuteblico titulares de cada imposto A Emenda Constitucional nordm 18 de 1965 natildeo mais copiou comodamente a teacutecnica anterior mas realizando uma reforma de essecircncia pois aleacutem de alterar a discriminaccedilatildeo de competecircncia tributaacuteria a Emenda adotou uma classificaccedilatildeo de imposto baseada em nomenclatura econocircmica procurando solucionar ainda outros problemas inclusive os dos efeitos econocircmicos dos impostos

Feita a primeira grande reforma tributaacuteria em sede de Constituiccedilatildeo Federal os entes tributantes

que compotildeem a Federaccedilatildeo brasileira passaram conviver com uma nova realidade onde estavam de-

finidas as competecircncias e atribuiccedilotildees de cada ente de maneira clara e exclusiva evitando destarte as

superposiccedilotildees tributaacuterias que ateacute entatildeo haviam norteado a tributaccedilatildeo no Brasil Contudo para imple-

mentar o novo modelo tributaacuterio concebido pela Emenda Constitucional 1865 havia a necessidade

da ediccedilatildeo de vaacuterias leis complementares em razatildeo ateacute da competecircncia de cada unidade poliacutetica de

legislar sobre seus proacuteprios sistemas tributaacuterios decorrentes do modelo federativo adotado no paiacutes

2 O COacuteDIGO TRIBUTAacuteRIO NACIONAL (CTN)

21 Precedentes da codificaccedilatildeo

A ideia da codificaccedilatildeo natildeo eacute nova e natildeo foi originada na eacutepoca da Revoluccedilatildeo Francesa O termo

codex eacute de origem romana caudex eacute um conjunto de vaacuterias taacutebuas unidas daiacute tabuinha de escrever

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

194

livro Portanto codex designa a uniatildeo material de vaacuterios elementos antes dispersos formando uma

unidade Os coacutedigos de Teodoacutesio (438) e de Justiniano (529 e 534) satildeo exemplos mais antigos

22 Os Coacutedigos de Napoleatildeo

A codificaccedilatildeo como instrumento de realizaccedilatildeo do Direito eacute uma aspiraccedilatildeo da sociedade que

sempre e continuamente tem acompanhado sua evoluccedilatildeo Como bem demonstra Justo (2000 p 216)

ldquoMovimento codificador eacute um dos frutos do Iluminismo que afirmou a excelecircncia da razatildeo (subjetiva e

criacutetica) e um racionalismo essencialmente humanista e antropocecircntricordquo agrave sociedade na busca de seu

pleno desenvolvimento

E Napoleatildeo compreendeu agrave perfeiccedilatildeo essa relaccedilatildeo entre codificaccedilatildeo e desenvolvimento da

sociedade tanto que conseguiu dar agrave Franccedila um conjunto de coacutedigos que constituem um dos mais

notaacuteveis esforccedilos de sistematizaccedilatildeo de regras juriacutedicas de toda a histoacuteria Assim eacute que de 1804 a 1810

foram sucessivamente promulgados um Coacutedigo Civil um Coacutedigo de Processo Civil um Coacutedigo Comer-

cial um Coacutedigo Penal e um Coacutedigo de Instruccedilatildeo Criminal

A maior parte deles manteve-se em vigor ateacute aos nossos dias tanto na Franccedila como na Beacutel-

gica Aleacutem disso influenciaram a codificaccedilatildeo em numerosos paiacuteses da Europa e da Ameacuterica Latina

durante o seacutec XIX inclusive no Brasil onde tais ordenaccedilotildees foram aplicadas especialmente no que

se refere ao Direito Civil

Sem nenhuma duacutevida o processo histoacuterico de codificaccedilatildeo desenvolvido na Franccedila por Napo-

leatildeo irradiou-se por todo o mundo natildeo somente servindo de base para a criaccedilatildeo de normas juriacutedicas

em vaacuterias naccedilotildees mas sobretudo na disseminaccedilatildeo do conhecimento que provocou sendo uma refe-

recircncia para a moderna histoacuteria do Direito

Eacute certo que natildeo se pode perder de vista a importacircncia do processo de codificaccedilatildeo para o desen-

volvimento das sociedades Contudo a publicaccedilatildeo em si de coacutedigos com seguranccedila natildeo eacute a soluccedilatildeo

para todos os problemas juriacutedicos decorrentes das relaccedilotildees sociais Faz-se necessaacuterio sobretudo uma

mudanccedila de mentalidade para assimilar a nova cultura juriacutedica implantada para reger estas relaccedilotildees

E esta afirmativa colhe-se do lapidar pensamento a seguir transcrito que mesmo apesar de se referir

a uma determinada regiatildeo em uma determinada eacutepoca reflete a realidade agrave qual foram submetidas

todas as naccedilotildees que enfrentaram o processo de codificaccedilatildeo do Direito

Entendo oportuno dedicar um espaccedilo ao outra reflexatildeo Ainda que agrave primeira vis-ta possa parecer simplesmente absurdo parece-me vital ter presente que a simples sanccedilatildeo do coacutedigo natildeo foi condiccedilatildeo suficiente para assegurar a exaltaccedilatildeo da sua nova cultura juriacutedica Isto obviamente natildeo significa que natildeo se admita a existecircncia de uma vinculaccedilatildeo entre a cultura da codificaccedilatildeo e a vigecircncia de novos corpos legais O que quero dizer eacute que seu ecircxito obedeceu antes de tudo a uma questatildeo de mentalidades Ou seja para que a praacutetica dos coacutedigos se transformasse em autecircntica cultura era

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

195

necessaacuterio que os juristas tivessem um compromisso para o qual nem todos os opera-dores juriacutedicos rioplatenses anteriores a 1880 estavam preparados Em definitivo para alcanccedilar sua consagraccedilatildeo o coacutedigo teve de esperar ser utilizado por uma nova classe de juristas que fez dele o efetivo eixo de seu discurso juriacutedico (ABAacuteSOLO 2008 p243)

23 O processo de codificaccedilatildeo no Brasil

No Brasil a ideia da codificaccedilatildeo remonta aos dias que sucederam agrave independecircncia Ainda em

1823 uma lei previa a elaboraccedilatildeo de um novo coacutedigo (lei de 20 de Outubro) enquanto que o mesmo

era previsto na Constituiccedilatildeo de 1824 (art 179 sect 18) Em 1858 Teixeira de Freitas um dos mais bri-

lhantes juristas da eacutepoca foi encarregado de elaborar um projeto que no entanto acabou por natildeo

ser aceito Novos projetos (Nabuco de Arauacutejo Feliacutecio dos Santos Antocircnio Coelho Rodrigues) tambeacutem

foram elaborados mas natildeo lograram ecircxito E eacute soacute em 1916 que um Coacutedigo Civil com base num proje-

to de Cloacutevis Bevilaacutequa professor da Faculdade de Direito em Recife acaba por ser aprovado apoacutes 17

anos de discussotildees em comissatildeo e no parlamento

24 O movimento de codificaccedilatildeo do Direito Tributaacuterio no Brasil

A codificaccedilatildeo do Direito Tributaacuterio no Brasil em que pese todas as dificuldades que se apre-

sentavam era um processo irreversiacutevel ateacute porque em vaacuterios outros paiacuteses jaacute havia sido com ecircxito

concluiacutedo os processos de codificaccedilatildeo Note-se que a mudanccedila ocorrida no seacuteculo XX em relaccedilatildeo agrave

codificaccedilatildeo estendeu-se a outros ramos do direito sobretudo ao direito fiscal Como bem demonstra

Balleiro (1973) jaacute haviam implantado codificaccedilotildees os franceses com o Coacutedigo Geral dos Impostos

(1950) reunindo os sete coacutedigos franceses os italianos com o coacutedigo fiscal total (1938) a Ordenaccedilatildeo

Tributaacuteria do Reich Alematildeo (RAO) publicada em 1919 e a Beacutelgica a Espanha a Argentina e os Estados

Unidos tambeacutem iniciaram um processo de codificaccedilatildeo ainda que limitados a determinados setores

tributaacuterios Seguiram-se expressivas accedilotildees convergindo todas nesse mesmo sentido tais como a Lei

de Justiccedila Fiscal do Meacutexico a publicaccedilatildeo do anteprojeto Giuliani Fonrouge pelo Centro de Investigaci-

oacuten de Derecho Financeiro da Faculdade de Direito de Buenos Aires e o Coacutedigo Fiscal da Proviacutencia de

Buenos Aires (lei 5246 de dezembro de 1947)

No Brasil um primeiro passo foi dado com as consolidaccedilotildees dos Impostos de Selo Consumo e

Regulamento do Imposto de Renda Contudo representou tal atitude apenas uma pequena tentativa

de por um miacutenimo de ordem no caos em que se encontrava tributaccedilatildeo nacional

Precisamente porque um dos grandes problemas encontrados no sistema tributaacuterio da eacutepoca

era o nuacutemero excessivo de leis tributaacuterias situaccedilatildeo essa que se agravava em funccedilatildeo da estrutura fede-

rativa do Estado brasileiro em que no mesmo territoacuterio havia uma sobreposiccedilatildeo de ordens juriacutedicas

federal estadual e municipal Faltava um instrumento de caraacuteter nacional capaz de gerar certa conver-

gecircncia entre as regulamentaccedilotildees estaduais e municipais

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

196

Como afirma De Santi (2008 p327) ldquoNo mesmo territoacuterio paacutetrio o contribuinte eacute disputado

por trecircs competecircncias fiscais que nem sempre coordenam as respectivas exigecircncias para bom conviacute-

vio entre si e com os governadosrdquo

Era necessaacuteria para harmonizaccedilatildeo do sistema tributaacuterio nacional a ediccedilatildeo de normas de caraacute-

ter geral qual seja aquelas sobrenormas que dirigidas agrave Uniatildeo Estados Municiacutepios e Distrito Federal

visam agrave realizaccedilatildeo das funccedilotildees certeza e seguranccedila do direito oferecendo estabilidade nas relaccedilotildees

juriacutedicas decorrentes das accedilotildees humanas

Essas normas gerais exercem uma funccedilatildeo estruturante do sistema juriacutedico e garantem um miacuteni-

mo de uniformidade legislativa o que no acircmbito do Direito configura importante garantia para aque-

les a quem eacute dada a incumbecircncia de manter financeiramente o Estado Satildeo de extrema importacircncia

para o equilibro e a eficiecircncia do ordenamento juriacutedico pois

[] o fato de existirem tantas fontes produtoras de normas (Uniatildeo Estados Distrito Federal e Municiacutepios) leva agrave possibilidade de inuacutemeros conflitos divergecircncias e super-posiccedilatildeo de normasCom a finalidade de assegurar um miacutenimo de uniformidade nacional agrave disciplina legal a constituiccedilatildeo brasileira prevecirc a possibilidade de a Uniatildeo editar leis que veiculem nor-mas gerais sobre determinadas mateacuterias cujo regime eacute o seguintebull as normas gerais aplicam-se a todas as entidades poliacuteticas (Uniatildeo Estados-federa-dos e Municiacutepios) Entende-se que as normas gerais satildeo normas ldquonacionaisrdquo (de todo o paiacutes) e natildeo ldquofederaisrdquo (apenas da Uniatildeo) A produccedilatildeo da norma geral eacute feita pelos oacutergatildeos da Uniatildeo (federal) mas a norma tem natureza nacionalbull enquanto a Uniatildeo natildeo editar uma ldquonorma geralldquo cada entidade poliacutetica pode exer-cer plenamente a competecircncia legislativa que lhe foi atribuiacuteda para atender a suas peculiaridades (Art 24 cf)bull sobrevindo a norma geral ela suspende a eficaacutecia da lei federal estadual ou munici-pal no que as contrariar Natildeo haacute revogaccedilatildeo da lei mas apenas suspensatildeo da eficaacutecia ou seja deixa de ser aplicaacutevel mas natildeo eacute retirada do ordenamento juriacutedico positivo isso significa que se a norma geral for revogada a lei federal estadual ou municipal recupera sua eficaacutecia sem necessidade de haver nova produccedilatildeo normativa ( Art 24 sect 4deg) ebull uma lei ordinaacuteria federal estadual ou municipal nova conflitar com uma norma geral existente entende-se que eacute hipoacutetese de inconstitucionalidade da lei nova por invasatildeo de competecircncia (art 102 III ldquodrdquo) (GRECCO 2008 p325)

A Emenda Constitucional 18 de 1965 a par do grande avanccedilo que proporcionou ao paiacutes em

mateacuteria tributaacuteria necessitava para que se concretizassem seus os objetivos do exerciacutecio da compe-

tecircncia legislativa qual seja a ediccedilatildeo de normas infraconstitucionais de caraacuteter nacional responsaacuteveis

pela arquitetura do sistema

25 Movimentos que antecederam a elaboraccedilatildeo do CTN

A multiplicidade dos problemas de natureza especificamente tributaacuteria levantados na Segunda

Conferecircncia de Teacutecnicos em Contabilidade Puacuteblica e Assuntos Fazendaacuterios reunida em 1940 forccedilou o

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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reconhecimento da necessidade da elaboraccedilatildeo para o direito tributaacuterio de um conjunto de normas

gerais Daiacute resultou a convocaccedilatildeo em 1941 da Primeira Conferecircncia Nacional da Legislaccedilatildeo Tributaacute-

ria na qual o tema da codificaccedilatildeo recebeu tratamento orgacircnico aplicaacutevel por igual aos trecircs niacuteveis de

governo que continuariam a legislar sobre os seus proacuteprios tributos poreacutem com estrita observacircncia

daqueles princiacutepios comuns por ela traccedilados que imprimiriam ao sistema a desejada uniformidade

Simultaneamente a isto uma centralizaccedilatildeo administrativa mais acentuada veio contribuir para a

busca da soluccedilatildeo dos problemas Um primeiro exemplo resultante da Conferecircncia dos Secretaacuterios de

Fazenda realizada em 1938 eacute o decreto-lei 915 daquele ano que solucionou normativamente os con-

flitos de competecircncia na tributaccedilatildeo das vendas interestaduais de mercadorias No decreto-lei 1202 de

1939 encontravam-se dispositivos visando a uniformizaccedilatildeo da atividade tributaacuteria dos Estados e Muni-

ciacutepios Por sua vez os decretos-leis 1804 de 1939 e 2416 de 1940 consagrando em lei as recomenda-

ccedilotildees da Primeira e da Segunda Conferecircncia de Contabilidade Puacuteblica e Assuntos Fazendaacuterios vieram

codificar todo o setor da atividade financeira puacuteblica ultrapassando o campo da teacutecnica e elaborando

regras substantivas no que se refere agrave conceituaccedilatildeo de certos institutos tributaacuterios Finalmente o de-

creto-lei 960 de 1938 embora decorra da competecircncia legislativa da Uniatildeo em mateacuteria de processo

pode ser enquadrado na mesma ordem de ideacuteias pois se reflete sobre o direito financeiro em todo

o importante setor da cobranccedila executiva da diacutevida ativa da Fazenda Puacuteblica Contudo os problemas

inerentes ao sistema tributaacuterio conforme apontados continuavam a causar seu efeito nocivo e deleteacute-

rio ao desenvolvimento nacional impondo a necessidade urgente de uma sistematizaccedilatildeo racional da

ordem juriacutedica tributaacuteria

26 O anteprojeto de lei

Diante dessa realidade o governo federal tomou para si a responsabilidade de iniciar o processo

de elaboraccedilatildeo de um Coacutedigo Tributaacuterio Nacional O Ministro da Fazenda Dr Oswaldo Aranha nomeou

uma comissatildeo especial para elaborar minuta de anteprojeto de lei tratando das normas gerais de di-

reito tributaacuterio Referida comissatildeo era formada pelo proacuteprio Ministro que assumiu a presidecircncia e

pelos seguintes componentes Prof Rubens Gomes de Sousa (relator) e os funcionaacuterios do Ministeacuterio

Afonso Almiro Ribeiro da Costa Pedro Teixeira Soares Juacutenior Gerson Augusto da Silva e Romeu Gibson

Tal comissatildeo especial como dito tinha por objetivo elaborar um anteprojeto de lei que tratasse ldquosobre

o sistema tributaacuterio nacional e instituiacutesse normas gerais de direito aplicaacuteveis agrave Uniatildeo Estados e Muni-

ciacutepiosrdquo visando harmonizar as normas juriacutedicas e eliminar os graves problemas decorrentes do modelo

tributaacuterio nacional especialmente a multiplicidade de normas e incidecircncias tributaacuterias

Uma peculiaridade do coacutedigo tributaacuterio brasileiro que o destinguiraacute de todos os demais da

mesma natureza eacute justamente o caraacuteter nacional decorrente de sua aplicabilidade simultacircnea aos trecircs

niacuteveis de governo integrantes da Federaccedilatildeo Essa caracteriacutestica eacute fundamental portanto sua influecircn-

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

198

cia natildeo se restringe aos aspectos imediatamente decorrentes da implantaccedilatildeo constitucional no que se

refere agrave competecircncia legislativa mas se estende a toda a sistemaacutetica do direito tributaacuterio substantivo

regulada no coacutedigo E a orientaccedilatildeo da comissatildeo foi compatiacutevel com a realidade do paiacutes baseado no

triacuteplice plano econocircmico juriacutedico e poliacutetico

Segundo se constata na exposiccedilatildeo de motivos nordm 1250 de 2171954 do Ministro da Fazen-

da encaminhando o anteprojeto de lei ao Presidente da Repuacuteblica a Comissatildeo preocupou-se em

desenvolver seus trabalhos no terreno exclusivamente juriacutedico Teve o cuidado de se conservar em

plano rigorosamente neutro evitando soluccedilotildees juriacutedicas que interferissem na atividade do legislador

ordinaacuterio no tocante agrave orientaccedilatildeo poliacutetica ou econocircmica que se deseje imprimir por intermeacutedio da

legislaccedilatildeo tributaacuteria especiacutefica ou que viessem condicionar a formulaccedilatildeo dessa orientaccedilatildeo agravequeles a

quem competia essa responsabilidade

O Projeto compreendia seis livros precedidos de uma Disposiccedilatildeo Preliminar e seguido de al-

gumas Disposiccedilotildees Finais e Transitoacuterias A Disposiccedilatildeo Preliminar definindo o conteuacutedo do Coacutedigo em

funccedilatildeo da competecircncia legislativa constitucional que invoca foi corretamente colocada em Capiacutetulo

proacuteprio antecedendo os demais Nas Disposiccedilotildees Finais e Transitoacuterias constam algumas regras com-

plementares de aplicaccedilatildeo do proacuteprio Coacutedigo visando principalmente atenuar seus efeitos iniciais

sobre a legislaccedilatildeo existente agrave data de sua entrada em vigor

Os seis livros tratavam respectivamente da competecircncia tributaacuteria dos tributos da legislaccedilatildeo

da obrigaccedilatildeo do creacutedito e da administraccedilatildeo segundo a ordem decrescente da generalidade dos as-

suntos congregando organicamente os poderes do estado em mateacuteria tributaacuteria os instrumentos da

sua atuaccedilatildeo e o proacuteprio funcionamento desta uacuteltima

Concluiacutedo o anteprojeto de lei este foi exposto no Diaacuterio Oficial da Uniatildeo e em avulsos

amplamente divulgados em todo o paiacutes para receber criacuteticas e sugestotildees Primeiro no periacuteodo de

marccedilo a setembro de 1953 prazo fixado para a apresentaccedilatildeo de sugestotildees a comissatildeo examinou o

anteprojeto em todos os seus artigos confrontando-os com a legislaccedilatildeo vigente e analisando-os agrave

luz da jurisprudecircncia predominante da doutrina e do direito comparado especialmente os coacutedigos

receacutem publicados

Paralelamente procurou por meio de palestras e reuniotildees de debates realizadas nas diversas

regiotildees do paiacutes ouvir as autoridades fazendaacuterias as entidades representativas dos contribuintes as

associaccedilotildees culturais e estudiosos da mateacuteria buscando captar as aspiraccedilotildees e receber sugestotildees da-

queles que mais diretamente lidam com a espeacutecie na condiccedilatildeo de seus operadores

Em um segundo momento (segunda fase dos trabalhos) no periacuteodo de janeiro a abril de

1954 foi realizado um novo exame integral do anteprojeto e das 1152 sugestotildees recebidas Apoacutes a

conclusatildeo da nova anaacutelise a comissatildeo especial tendo como relator-geral o Prof Rubens Gomes de

Sousa discutiu e votou no mecircs de maio de 1954 o texto definitivo do projeto e a justificaccedilatildeo indi-

vidual de seus artigos

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

199

Concluiacuteda a proposta foi ela entregue ao Ministro da Fazenda para ser submetido agrave rotina do

processo legislativo de elaboraccedilatildeo das leis Ainda chegou a ser discutido na Comissatildeo de Constituiccedilatildeo

e Justiccedila onde recebeu parecer favoraacutevel Quando foi posto em pauta para deliberaccedilatildeo os sucessores

do Ministro Aranha no Ministeacuterio da Fazenda por divergecircncias poliacuteticas solicitaram ao liacuteder do go-

verno o adiamento da votaccedilatildeo para fazer modificaccedilotildees E estas alteraccedilotildees nunca foram apresentadas

ficando referido projeto paralisado no Congresso Nacional sem ser analisado e sem sofrer tramitaccedilatildeo

Somente em 1965 foi formada uma nova comissatildeo composta pelo jaacute citado pelo Prof Rubens

Gomes de Sousa Gilberto de Ulhoa Canto Gerson Augusto da Silva e Luiz Gonzaga do Nascimento

e Silva que resgatou o antigo projeto paralisado no Congresso Nacional desde 1954 fez uma ampla

revisatildeo para adequaacute-lo agrave Emenda Constitucional 18 de 1965 ndash cognominada de reforma tributaacuteria

ndash resultando este processo em amplas modificaccedilotildees e reduccedilotildees significativas da proposta original

Concluiacuteda a revisatildeo o anteprojeto de lei em sua nova conformaccedilatildeo foi encaminhado ao Congresso

sob o nuacutemero 13 de 1966 para discussatildeo e votaccedilatildeo sendo enfim aprovado como a Lei nordm 5172 de

30 de outubro de 1966 que ldquoDispotildee sobre o Sistema Tributaacuterio Nacional e institui normas gerais de

direito tributaacuterio aplicaacuteveis agrave Uniatildeo Estados e Municiacutepiosrdquo

27 A Lei no 5172 de 1966 (Coacutedigo Tributaacuterio Nacional)

A lei em comento foi enfim aprovada com uma estrutura mais geral e objetiva que as pro-

postas anteriores Constitui-se de uma disposiccedilatildeo preliminar (como proposto no projeto original) e

de apenas dois livros o Livro Primeiro formado pelos artigos 2ordm ao 95 dispotildee sobre as seguintes

mateacuterias regula o sistema tributaacuterio nacional contendo normas sobre disposiccedilotildees gerais limitaccedilotildees

de competecircncia tributaacuteria impostos do sistema taxas e contribuiccedilotildees de melhoria inclusive normas

sobre distribuiccedilotildees de receitas tributaacuterias e o Livro segundo formado pelos artigos 96 ao 218 dispon-

do sobre os seguintes conteuacutedos normas gerais de direito tributaacuterio contendo regras sobre legislaccedilatildeo

tributaacuteria (objeto vigecircncia aplicaccedilatildeo interpretaccedilatildeo e integraccedilatildeo) obrigaccedilatildeo tributaacuteria (fato gerador

sujeito ativo sujeito passivo e responsabilidade) creacutedito tributaacuterio (constituiccedilatildeo suspensatildeo extinccedilatildeo

exclusatildeo garantias e privileacutegios) administraccedilatildeo tributaacuteria (fiscalizaccedilatildeo diacutevida ativa e certidatildeo negativa)

e as disposiccedilotildees finais e transitoacuterias

Apoacutes este longo periacuteodo de maturaccedilatildeo no Parlamento teve-se por fim aprovada a lei de nor-

mas gerais em mateacuteria tributaacuteria com vigecircncia em todo territoacuterio nacional Por forccedila do Ato Comple-

mentar nordm 36 de 13 de marccedilo de 1967 (art 7ordm) esta lei foi denominada de Coacutedigo Tributaacuterio Nacional

(CTN) Enfim vencida uma longa e penosa etapa no direito brasileiro surgiu o instrumento harmoni-

zador desse caoacutetico sistema causando mudanccedilas significativas na cultura juriacutedica nacional pois

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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Nenhuma duacutevida existe de que o CTN representou sensiacutevel marco na evoluccedilatildeo do Di-reito Tributaacuterio no Paiacutes devendo-se em grande parte agrave esplecircndida produccedilatildeo doutrinaacute-ria e jurisprudencial dos uacuteltimos vinte anos sua implantaccedilatildeo como sistema veiculador de imposiccedilatildeo fiscal (MARTINS 1989 p 34)

28 O CTN no ordenamento juriacutedico nacional

281 A funccedilatildeo do CTN

Em razatildeo de ser o CTN lei nacional de natureza distinta de lei federal suas disposiccedilotildees consti-

tuem regras informativas endereccediladas ao legislador que cuida de mateacuteria tributaacuteria afetando o contri-

buinte quase sempre apenas de maneira indireta atraveacutes de sua aplicaccedilatildeo na elaboraccedilatildeo normativa

Na conformaccedilatildeo juriacutedica por ele assumida sua funccedilatildeo eacute estruturante no sistema qual seja estabelecer

normais gerais voltadas para a administraccedilatildeo tributaacuteria

Com efeito o Coacutedigo procurou sistematizar a partir de conceitos juriacutedicos o exerciacutecio do poder

tributaacuterio e veio como desdobramento de uma ampla reforma constitucional tributaacuteria (implementa-

da pela jaacute citada Emenda Constitucional 18 de 1965) que revogou um sistema de caraacuteter histoacuterico

para implantar um sistema de caraacuteter racional e moderno tendo como eixo condutor precisamente a

racionalidade e a objetividade tributaacuterias pedras fundamentais da reforma ao lado da busca de uma

ldquopurezardquo juriacutedica levada tatildeo longe a ponto de ignorar determinados princiacutepios em homenagem a po-

sitivaccedilatildeo das condutas que levam agrave estabilidade das relaccedilotildees juriacutedicas e sociais

Pode-se em apertada siacutentese distinguir algumas funccedilotildees baacutesicas do Coacutedigo como

a) constituir diretriz baacutesica a ser observada na accedilatildeo do legislador ordinaacuterio dos trecircs niacuteveis de

governo (Uniatildeo Estados e Municiacutepios)

b) natildeo revogar a legislaccedilatildeo ordinaacuteria existente pois natildeo guarda com esta afinidade de conteuacute-

dos materiais

c) natildeo criar tributo pois a lei ordinaacuteria eacute que pode definir os elementos essecircncias da exaccedilatildeo

fiscal servindo apenas de norte para sua criaccedilatildeo

d) disciplinar as limitaccedilotildees constitucionais ao poder de tributar dos entes poliacuteticos estabelecen-

do os criteacuterios e condiccedilotildees para o exerciacutecio da competecircncia tributaacuteria

Estas novas diretrizes implantadas no ordenamento paacutetrio certamente revolucionaram o pen-

samento juriacutedico nacional e possibilitaram a partir dos comandos nele fixados uma mudanccedila de com-

portamento natildeo somente nas administraccedilotildees tributaacuterias que passaram a ter diretrizes norteadoras de

sua produccedilatildeo legislativa mas para os contribuintes que encontraram no conjunto de normais gerais

as garantias e a seguranccedila juriacutedica necessaacuterias ao desenvolvimento de suas atividades em razatildeo da

estabilidade normativa assentada no Coacutedigo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

201

282 Algumas criacuteticas ao CTN

Como visto induvidosamente o CTN apresenta grandes qualidades que ainda hoje podem

ser observadas como servir de referencial objetivo e com elevado grau de seguranccedila para identifica-

ccedilatildeo de exigecircncias caracterizadas como tributaacuterias a harmonizaccedilatildeo (ainda que em grau miacutenimo) do

sistema e a seguranccedila juriacutedica oferecida nas relaccedilotildees esta racionalidade e objetividade ainda assim

merece criacuteticas

Com efeito conforme sintetiza Santi (2008) a forma como o Coacutedigo foi concebida apresenta

grande preocupaccedilatildeo com a estrutura do tributo sem levar em consideraccedilatildeo um elemento essencial

que eacute sua funccedilatildeo Natildeo estatildeo contempladas na concepccedilatildeo e definiccedilatildeo do CTN preocupaccedilotildees com os

fundamentos do tributo (p ex princiacutepios norteadores da tributaccedilatildeo como o da capacidade contributi-

va) nem com suas finalidades (p ex necessidades objetivas da sociedade quantificadas nos orccedilamen-

tos) uma confusatildeo conceitual entre obrigaccedilatildeo e creacutedito tributaacuterio e umas classificaccedilotildees inadequadas

(p ex decadecircncia como forma de extinccedilatildeo do creacutedito tributaacuterio) contendo ainda algumas definiccedilotildees

aceacutepticas e sem conteuacutedo loacutegico que natildeo retratam a vida e a dinamicidade da tributaccedilatildeo em conso-

nacircncia com a realidade de cada momento na evoluccedilatildeo da sociedade

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Como se constata ao longo do desenvolvimento deste estudo quase sempre se concebe o seacute-

culo XIX como o seacuteculo da codificaccedilatildeo E este movimento a par de se constituir um estilo peculiar de

fixaccedilatildeo do Direito implica todo um conjunto de mudanccedilas na sociedade e em especial nos operado-

res do Direito que para adequarem-se agrave nova realidade tiveram que sofrer um processo de mudanccedila

de mentalidade mormente em relaccedilatildeo compreensatildeo da realidade juriacutedica

Eacute certo que o processo de codificaccedilatildeo iniciado na Franccedila influenciou todo o mundo contempo-

racircneo contaminando os legisladores e incitando-os a direcionar a produccedilatildeo normativa para a produ-

ccedilatildeo de coacutedigos instrumentos de coesatildeo e harmonizaccedilatildeo das relaccedilotildees sociais

Impende salientar que este movimento de codificaccedilatildeo impotildee um processo de evoluccedilatildeo da

maneira de se interpretar o Direito figurando como um importante marco na moderna histoacuteria dos

sistemas juriacutedicos

Este processo de codificaccedilatildeo no Brasil data do seacuteculo passado iniciando-se com o Direito Civil

para ao final chegar ao Direito Tributaacuterio Somente em 1965 o Presidente Castelo Branco buscando

adequar a legislaccedilatildeo tributaacuteria aos seus ideais de governo determinou a formaccedilatildeo de uma nova co-

missatildeo liderada outra vez pelo Professor Rubens Gomes de Sousa objetivando modernizar o sistema

tributaacuterio nacional arcaico e de alto grau de lesividade para a economia e o progresso do paiacutes

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

202

Com a ediccedilatildeo da Emenda Constitucional 1865 o Brasil eacute dotado de um sistema tributaacuterio mo-

derno mas que necessitava de legislaccedilatildeo infraconstitucional para sua completa efetivaccedilatildeo

O citado Prof Rubens Gomes entatildeo juntamente como os demais membros da comissatildeo res-

gata o antigo projeto de coacutedigo apresentado e paralisado no Congresso Nacional desde 1953 e apoacutes

uma revisatildeo geral e sua completa adequaccedilatildeo agrave Emenda Constitucional 1865 enfim a proposta eacute apro-

vada como a lei 5172 de 30 de outubro de 1966

Importante frisar que mesmo sendo tal lei ordinaacuteria tem no ordenamento juriacutedico paacutetrio status de lei complementar em razatildeo da mateacuteria de que cuida qual seja normas gerais e complementares de

direito tributaacuterio entendimento este hoje por todos aceito inclusive na jurisprudecircncia assentada pelo

Supremo Tribunal Federal

Em que pese algumas criacuteticas feitas ao Coacutedigo quanto agrave sua limitaccedilatildeo estrutural ao desprezar

em sua elaboraccedilatildeo fundamentos do tributo como princiacutepios estruturais e um desvirtuamento em

sua finalidade ao tratar de reparticcedilatildeo de receitas eacute certo que tal regramento constituiu-se ao longo

dos anos no mais importante conjunto de normas para a harmonizaccedilatildeo das relaccedilotildees entre o Fisco e

o contribuinte em todos os niacuteveis de governo pois eacute de observacircncia obrigatoacuteria por todos os entes

tributantes servindo de substrato juriacutedico para a construccedilatildeo de toda uma jurisprudecircncia e ordenaccedilatildeo

normativa duradouras base do desenvolvimento e do aperfeiccediloamento contiacutenuo do Direito e por

conseguinte da evoluccedilatildeo do proacuteprio homem enquanto elemento nuclear da sociedade

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

203

REFEREcircNCIAS

ABAacuteSOLO Ezequiel O Adeus agrave antiga jurisprudecircncia as teses de doutorado da Universidade de Bue-nos Aires como reflexo do tracircnsito entre a hegemonia da cultura juriacutedica indiana e a da codificaccedilatildeo In FONSECA Ricardo Marcelo SEELAENDER Airton Cerqueira Leite (coord) Histoacuteria do Direito em perspectiva do antigo regime agrave modernidade Curitiba Juruaacute 2008

BALEEIRO Aliomar Direito Tributaacuterio Brasileiro 5 ed rev Rio de Janeiro Forense 1973

BRASIL Lei nordm 5172 de 30 de outubro de 1966 Coacutedigo Tributaacuterio Nacional Diaacuterio Oficial da Uniatildeo Brasiacutelia 27 de outubro de 1966 Seccedilatildeo I ndash Parte I

______ Ministeacuterio da Fazenda Trabalhos da Comissatildeo Especial do Coacutedigo Tributaacuterio Nacional Rio de Janeiro 1954

FERREIRA Waldemar Martins Histoacuteria do Direito Brasileiro Rio de Janeiro Freitas Bastos 1952

GILISSEN John Introduccedilatildeo Histoacuterica ao Direito 3 ed Traduccedilatildeo de Hespanha A Manoel e Malhei-ros L M Macaiacutesta Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste Gulbenkian 2001

MACHADO Hugo de Brito Curso de Direito Tributaacuterio 14 ed rev atualizada e ampliada Rio de Ja-neiro Malheiros Editores 1998

MARTINS Ives Gandra da Silva Sistema Tributaacuterio na Constituiccedilatildeo de 1988 Satildeo Paulo Saraiva 1989

MORAES Bernardo Ribeiro de Compecircndio de Direito Tributaacuterio 3 ed rev aumentada e atualizada Rio de Janeiro Forense 1993

NOGUEIRA Ruy Barbosa Curso de Direito Tributaacuterio 9 ed atual Satildeo Paulo Saraiva 1989

SANTI Eurico Marcos Diniz de (coord) Curso de Direito Tributaacuterio e Financcedilas Puacuteblicas Satildeo Paulo Saraiva 2008

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

204

O ORDENAMENTO JURIacuteDICO E AS ANTINOMIAS TRIBUTAacuteRIAS O LI-TIacuteGIO IDEOLOacuteGICO-INTERPRETATIVO ENTRE O FISCO OS TRIBUNAIS

SUPERIORES E A DOUTRINA

SUMAacuteRIO Introduccedilatildeo 1 As caracteriacutesticas do ordenamento juriacutedico concei-tos linguagem e conhecimento 2 O reconhecimento das malfadadas anti-nomias e os criteacuterios para sua superaccedilatildeo os litiacutegios entre os agentes inter-pretativos 21 Criteacuterio cronoloacutegico 211 Revogaccedilatildeo da isenccedilatildeo da Cofins agraves sociedades civis prestadoras de serviccedilos profissionais legalmente regulamen-tadas 22 Criteacuterio hieraacuterquico 221 Diferencial de aliacutequota de ICMS nas ope-raccedilotildees interestaduais realizadas por natildeo contribuintes 23 Criteacuterio da espe-cialidade 231 Isenccedilatildeo tributaacuteria do Imposto de Renda Consideraccedilotildees finais Referecircncias

Tonny Iacutetalo Lima Pinheiro1

INTRODUCcedilAtildeO

Eacute necessaacuterio para estudarmos o Direito e suas diversas implicaccedilotildees normativas termos o pleno

conhecimento dos conceitos que marcam profundamente sua vetusta e dinacircmica teoria

Por meio dos conceitos que se amoldam agrave dinamicidade da vida entendemos que o Direito

deve ser estudado agrave luz do ordenamento juriacutedico e de suas principais caracteriacutesticas sistematicidade

completude e unicidade

O ordenamento juriacutedico eacute considerado um sistema porque tem na coerecircncia seu pressuposto

epistemoloacutegico Natildeo devem existir assim contradiccedilotildees nas normas juriacutedicas (regras) cabendo ao in-

teacuterprete por meio dos diversos criteacuterios de soluccedilatildeo das denominadas antinomias (criteacuterios cronoloacutegi-

co hieraacuterquico e especial) superaacute-las

A unicidade ainda diz respeito agrave capacidade de a Constituiccedilatildeo conceder ao ordenamento ju-

riacutedico apesar da existecircncia de diversas normas juriacutedicas (regras) que formam o universo do Direito

plena validade

Por sua vez o ordenamento juriacutedico eacute completo (completude garantida pelo jurista) dado agrave ine-

xistecircncia concreta de lacunas Haacute pois tendo em vista os elementos de integraccedilatildeo do Direito sempre

uma norma juriacutedica para disciplinar todas as condutas humanas

1 Bacharel em Direito pela Universidade de Fortaleza (2010) especialista em Direito Tributaacuterio pela Faculdade 7 de Setem-bro (2013) e Mestrando em Direito Constitucional pela Universidade Federal do Cearaacute (Turma 2014) Servidor Puacuteblico do Estado do Cearaacute lotado na SSPDS (Investigador de Poliacutecia Civil de 1ordf Classe) professor de graduaccedilatildeo e poacutes-graduaccedilatildeo aleacutem de articulista principalmente nas searas do Direito Tributaacuterio Direito Constitucional e Hermenecircutica Juriacutedica E-mail tonnyitalohotmailcom

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

205

Em razatildeo dessas caracteriacutesticas do ordenamento juriacutedico temos como foco principal deste ar-

tigo o diaacutelogo hermenecircutico travado entre o Fisco os tribunais e a doutrina acerca das diversas solu-

ccedilotildees de antinomias normativo-tributaacuterias Dando ademais ecircnfase agrave acircnsia de arrecadaccedilatildeo da Fazenda

Puacuteblica mesmo que haja distorccedilatildeo por parte dela dos demasiados conceitos definiccedilotildees noccedilotildees ou

ideais do Direito

Em especial portanto destacamos como exemplos dos metacriteacuterios de soluccedilatildeo de antino-

mias os casos respectivamente da revogaccedilatildeo da isenccedilatildeo da Cofins agraves sociedades civis prestadoras de

serviccedilos profissionais legalmente regulamentadas (criteacuterio cronoloacutegico) do diferencial de aliacutequota de

ICMS nas operaccedilotildees interestaduais realizadas por natildeo contribuintes (criteacuterio hieraacuterquico) e enfim os

casos de isenccedilatildeo tributaacuteria do Imposto de Renda (criteacuterio da especialidade)

Este artigo por oacutebvio natildeo encerra o estudo sobre o tema Todavia refletimos em cima de tais

causos juriacutedicos pois como tematizou Larry E Wood (1986) damos ao ato de pensar natildeo mais a rari-

dade acerca de sua reflexatildeo Em outras palavras abordamos os criteacuterios de soluccedilatildeo de antinomias com

exemplos do Direito Tributaacuterio uma vez que temos a tiacutemida intenccedilatildeo de dar aos juristas (lato sensu) o

poder de reflexatildeo para quem sabe mudarmos determinados paradigmas e enfim ir ao encontro da

dinamicidade do Direito

1 AS CARACTERIacuteSTICAS DO ORDENAMENTO JURIacuteDICO CONCEITOS LINGUAGEM E CONHE-CIMENTO

O estudo do Direito inicialmente tem de partir pela anaacutelise dos conceitos que formam sua ve-

tusta e dinacircmica teoria Esta conforme leciona Hugo de Brito Machado (2012 p 21) ldquonada mais eacute do

que o conjunto sistematizado de conceitosrdquo uma vez que ldquonos permite conhecer um dado domiacutenio da

realidaderdquo (ROCHA 2002 p 17)

Eduardo Luft (2005) com inteira razatildeo assevera que compreendemos o mundo por meio dos

conceitos apesar de alguns doutrinadores no acircmbito do conhecimento do Direito preferirem ao in-

veacutes de conceitos ou definiccedilotildees falar em noccedilotildees ou ideais (MACHADO 2012)

Escreve o professor Hugo de Brito Machado (2012 p 7) ainda que mesmo com certa impreci-

satildeo ou vaguidade sem conhecer os conceitos que compotildeem a Teoria Geral do Direito ldquonatildeo eacute possiacutevel

o conhecimento desse importante setor do saber humanordquo haja vista ser o Direito uma normatividade

entre os homens (RADBRUCH 2011)

O Direito dada agrave importacircncia da linguagem exige muita atenccedilatildeo e dedicaccedilatildeo daqueles que o

estudam (MACHADO 2012) Rafael Bielsa (1987 p 9) natildeo por acaso afirma que ldquosi hay uma disciplina en la cual convieve emplear la palabra adecuada o propria ella es la del Derechordquo Allan Kardec (1996 p 9) haacute muito nos ensinou que ldquopara as coisas novas necessitam-se de pala-

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

206

vras novas assim o quer a clareza da linguagem para evitar a confusatildeo inseparaacutevel do sentido muacuteltiplo

dos mesmos vocaacutebulosrdquo Hugo de Brito Machado Segundo (2005 p 129) acertadamente na mesma

toada assevera que o Direito eacute veiculado por intermeacutedio da linguagem sendo pois ldquoimpossiacutevel com-

preendecirc-lo sem antes interpretaacute-lordquo

Conhecimento numa perspectiva filosoacutefica platocircnica eacute opiniatildeo verdadeira acompanhada de

razatildeo ou seja ldquoo conhecimento exige aleacutem de opiniatildeo verdadeira o domiacutenio sobre o assunto o que

significa capacidade de dar razotildees sobre a opiniatildeo emitidardquo (LUFT 2005 p 23)

As verdades assim por mais contraditoacuterio que possa parecer tecircm como destino habitual con-

forme explanou T H Huxley (Apud SEN 2010 p 150) ldquocomeccedilarem como heresias e terminarem como

supersticcedilatildeordquo Por isso natildeo eacute errocircnea a liccedilatildeo de Paulo Dourado de Gusmatildeo rememorado pelo professor

Hugo de Brito Machado Segundo (2008 p 14) ao afirmar que as teorias cientiacuteficas (nelas se enqua-

drando o Direito) natildeo satildeo ldquonem verdadeiras nem falsas mas unicamente uacuteteisrdquo

Uma das mais maravilhosas facetas do Direito todavia eacute sua relatividade (ZAGREBELSKY 1999)

pois os conceitos satildeo marcados sempre a depender da posiccedilatildeo filosoacutefica do jurista pela ambiguidade

e vaguidatildeo Eacute esse relativismo que marca profundamente o Direito que o torna essencial ao homem

e inalienaacutevel agrave sociedade O Direito assim como os conceitos ou definiccedilotildees eacute e sempre seraacute insuficien-

te (relativismo consequencial) uma vez que ldquodecorre da proacutepria incapacidade do homem para produzir

coisas acabadas e perfeitasrdquo (VASCONCELOS 2006 p 166)

Natildeo eacute despiciendo salientarmos contudo que a existecircncia de muacuteltiplas opiniotildees natildeo deve nos

levar ao ceticismo Muito pelo contraacuterio Por ser natural a diversidade de pensamentos ldquoa unanimida-

de de pontos de vista eacute inalcanccedilaacutevelrdquo (MACHADO 2010 p 10) principalmente porque ldquonunca estamos

contentes onde estamosrdquo (SAINT-EXUPEacuteRY 2009 p 73)

Eduardo Luft (2005) nos ensina que a mais radical de todas as teses eacute a do relativismo sendo

pois inadmissiacutevel ldquoa afirmaccedilatildeo de que o mero consenso da comunidade de argumentaccedilatildeo determine

a verdade originaacuteriardquo (MAGALHAtildeES FILHO 2006 p 68)

O ser humano eacute dinacircmico e por consequecircncia sempre mutaacutevel cognoscitivamente Eduardo

Luft (2005 p 26-27) nesse sentido escreve que ldquocada homem interpreta o lsquomundorsquo agrave sua maneira com

seus proacuteprios condicionamentos bioloacutegicos e culturais dentro de seu proacuteprio aparato mental e de sua

situaccedilatildeo histoacutericardquo Assim conclui o filoacutesofo ldquoatribuir a homens diversos estados cognitivos comuns eacute

um enganordquo (LUFT 2005 p 27)

Hugo de Brito Machado Segundo (2008 p 21-22) entrementes leciona que ldquoeacute essencial a que

se possa falar em lsquoconhecimento cientiacuteficorsquo a provisoriedade de suas verdades e a possibilidade de

serem lsquotestadasrsquo ou terem sua veracidade (ou falsidade) posta agrave prova continuamenterdquo Conclui assim

o professor da Universidade Federal do Cearaacute que ldquocomo natildeo se pode afirmar o estacionamento da

evoluccedilatildeo das espeacutecies tambeacutem natildeo haacute estacionamento de ideiasrdquo (MACHADO SEGUNDO 2008 p 22)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

207

Toda obra intelectual nos lapidares ensinamentos de Arnaldo Vasconcelos (2001) eacute incompleto por

definiccedilatildeo Tudo eacute transitoacuterio pois ldquoo mundo eacute totalidade em contiacutenuo processo de auto-organizaccedilatildeordquo

(LUFT 2005 p 77) Ainda Segundo este filoacutesofo ldquoa existecircncia eacute essa marcha contiacutenua um presente

eternamente marcado por um passado e um futuro potencialmente infinitosrdquo (LUFT 2005 p 72)

Conhecer nas precisas liccedilotildees de Maria Helena Diniz (2001 p 13) tambeacutem ldquoeacute trazer para o sujei-

to algo que se potildee como objetordquo ou conforme nos informa Goffredo Telles Jr (1962 p 7) ldquoeacute a opera-

ccedilatildeo imanente pela qual um sujeito pensante se representa um objetordquo O conhecimento portanto eacute a

apreensatildeo intelectual do objeto eacute pois ldquouma transferecircncia das propriedades do objeto para o sujeito

pensanterdquo (DINIZ 2001 p 13) Natildeo por acaso pois ldquoa tarefa da inteligecircncia humana eacute tirar o valor das

coisas da obscuridade para a luzrdquo (DANTAS 1948 p 16)

Destarte haacute um verdadeiro intercambiamento entre o ldquoconhecerrdquo e o ldquoconceituarrdquo principal-

mente quando falamos de Direito Seja como for ldquoqualquer trabalho juriacutedico de pretensotildees cientiacuteficas

impotildee ao autor uma tomada de posiccedilatildeo no que atina aos conceitos fundamentais da mateacuteria em que

laborardquo (CARVALHO 1981 p 19) Natildeo podemos por tudo negar a importacircncia dos conceitos nos es-

tudos do Direito (MACHADO 2012)

Glauco Barreira Magalhatildees Filho (2006 p 200) nos mostra que ldquoo problema do conceito de Di-

reito eacute o problema de sua essecircnciardquo Se a ciecircncia foi criada para atingir a verdade e a arte para atingir o

belo o Direito por sua vez tem como fim o valor justiccedila razatildeo pela qual ldquotodo ordenamento juriacutedico

deve ser um ensaio de Direito justordquo (MAGALHAtildeES FILHO 2006 p 204)

O Direito escreve Norberto Bobbio (2011 p 37) natildeo se resume a norma mas num conjunto

ordenado de normas ldquosendo evidente que uma norma juriacutedica natildeo se encontra jamais soacute mas estaacute

ligada a outras normas com as quais forma um sistema normativordquo Portanto seguindo a trilha do dou-

trinador italiano soacute eacute possiacutevel de modo satisfatoacuterio definirmos o Direito se nos colocarmos do ponto

de vista do ordenamento juriacutedico

O ordenamento juriacutedico eacute classicamente formado por uma logicidade normativa de regras e

princiacutepios em gradual evoluccedilatildeo caracterizando-se por sua sistematicidade completude e unicidade

tendo ainda como fundamento de validade sua lei maior a Constituiccedilatildeo Todavia a beleza pela qual

transpassa o ordenamento juriacutedico natildeo eacute tatildeo simples de ser analisada

Na realidade o ordenamento juriacutedico eacute formado por mateacuteria juriacutedica caoacutetica com lacunas e

contradiccedilotildees tiacutepicas da atividade legislativa Apoiando-nos nas doutrinas de Giuseppe Zaccaria e Fran-

cesco Viola (2007) podemos afirmar que a ideia de ornamento juriacutedico eacute equivocada tratando-se de

um caos realiacutestico pois a rigor natildeo haacute um sistema mas sim um esforccedilo consciente de sistematizaccedilatildeo

realizado pelo inteacuterprete

Mesmo etimologicamente considerado o termo sistema advindo do grego systema significan-

do ldquopocircrrdquo (histemi) ldquojuntordquo (syn) ldquodar unidaderdquo (LUFT 2005) apresenta variadas concepccedilotildees nas mais

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

208

diversas aacutereas do conhecimento em que eacute usado natildeo sendo pois diferente do que ocorre no Direito

O ordenamento juriacutedico natildeo pode ser considerado prima facie um sistema perfeito pois natildeo

se apresenta sempre de forma concatenada haja vista a possibilidade de existirem antinomias e lacu-

nas

Dessa forma eacute de suma importacircncia a atividade do inteacuterprete com o objetivo de ordenar o con-

junto de regras postas transformando o caos normativo num sistema harmocircnico que preserva ente

outros sua unidade e coerecircncia Portanto dentro de uma postura kantiana a partir do qual o meacutetodo

constroacutei o objeto ldquoeacute o olhar cientiacutefico do jurista que constitui o ordenamento juriacutedico dando-lhe uni-

dade coerecircncia e completuderdquo (MAGALHAtildeES FILHO 2013 p 93)

Temos resumidamente que o ordenamento juriacutedico constitui um sistema porque nele natildeo

devem coexistir normas incompatiacuteveis (BOBBIO 2011) isto eacute tem a coerecircncia como pressuposto epis-

temoloacutegico

A coerecircncia do ordenamento juriacutedico expressatildeo derivada do latim cohaerentia significando

ldquouniatildeordquo ldquoligaccedilatildeordquo (LUFT 2005) ldquoconsiste na compatibilidade de suas partes entre si e das partes com o

todo Disso decorre o fato de natildeo se poder tolerar a permanecircncia de antinomias (conflito de normas)

as quais precisam ser solucionadasrdquo (MAGALHAtildeES FILHO 2013 p 95)

Aleacutem da coerecircncia sistecircmica do ordenamento juriacutedico ele tambeacutem se caracteriza pela unidade

Apesar de conforme suscitou Norberto Bobbio (2011 p 51) os ordenamentos juriacutedicos serem com-

plexos e ldquocompostos por uma miriacuteade de normas que tal como as estrelas do ceacuteu ningueacutem jamais foi

capaz de contarrdquo tecircm na Constituiccedilatildeo norma superior (mais geral e abstrata respectivamente) sua

unidade garantida

Concebe-se assim a Constituiccedilatildeo nos dizeres de Lecircnio Luiz Sreck (2004 p 225) como o ldquotopo

hermenecircutico que conformaraacute a interpretaccedilatildeo juriacutedica do restante do sistema juriacutedicordquo

Eacute a liccedilatildeo de Hans Kelsen (2006 p 247)

A norma que regula a produccedilatildeo eacute a norma superior a norma produzida segundo as determinaccedilotildees daquela eacute a norma inferior A ordem juriacutedica natildeo eacute um sistema de normas juriacutedicas ordenadas no mesmo plano situadas umas ao lado das outras mas eacute uma construccedilatildeo escalonada de diferentes camadas ou niacuteveis de normas juriacutedicas A sua unidade eacute produto da conexatildeo de dependecircncia que resulta do fato de a validade de uma norma que foi produzida de acordo com outra norma se apoiar sobre essa outra norma cuja produccedilatildeo por sua vez eacute determinada por outra

A completude por fim terceira caracteriacutestica do ordenamento juriacutedico se entende a proprie-

dade pela qual um sistema juriacutedico tem uma norma para regular qualquer caso Doutrina Norberto

Bobbio (2011 p 115) que a ausecircncia de uma norma se chama com frequecircncia de lacuna ao passo

que completude significa ausecircncia de lacuna ou seja ldquoum ordenamento eacute completo quando o juiz

pode encontrar nele uma norma para regular qualquer caso que se lhe apresente ou melhor natildeo haacute

caso que natildeo possa ser regulado com uma norma extraiacuteda do sistemardquo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

209

O ordenamento juriacutedico portanto eacute completo ldquopois o preenchimento das lacunas eacute garantido

pela presenccedila e atuaccedilatildeo dos juiacutezesrdquo (MAGALHAtildeES FILHO 2013 p 96) A completude do ordenamento

juriacutedico pode ser assegurada natildeo como ponto de partida mas como ponto de chegada (BETTI 2007)

atraveacutes dos meacutetodos de integraccedilatildeo elencados precipuamente no artigo 4ordm da Lei de Introduccedilatildeo agraves

Normas do Direito Brasileiro (analogia costumes e os princiacutepios gerais do direito)

Dessa forma em suma temos que o ordenamento juriacutedico eacute formado por um sistema de nor-

mas legitimadas formal e materialmente pela Constituiccedilatildeo cujas caracteriacutesticas de coerecircncia harmo-

nia e unidade natildeo se perde apesar de elevada gama de regras e pluralidade de causos faacutetico-juriacutedicos

que delas podem advir

Todavia apesar desse apanaacutegio intriacutenseco e extriacutenseco o ordenamento juriacutedico dado ser idea-

lizado pela atividade faliacutevel humana pode conter aparentemente normas-regras que se contradizem

A isso pois a doutrina denomina de antinomia ou norma antinorma (KELSEN 2006) cuja anaacutelise de

sua incidecircncia e consequente soluccedilatildeo a seguir exporemos principalmente tendo em vista o litiacutegio ide-

oloacutegico travado pelo fisco pelos tribunais superiores e em especial pela doutrina

2 O RECONHECIMENTO DAS MALFADADAS ANTINOMIAS E OS CRITEacuteRIOS PARA SUA SU-PERACcedilAtildeO OS LITIacuteGIOS ENTRE OS AGENTES INTERPRETATIVOS

A antinomia conforme explanamos acima se caracteriza por ser aquela situaccedilatildeo de incompa-

tibilidade que se verifica entre duas ou mais normas (regras) pertencentes ao mesmo ordenamento e

com o mesmo acircmbito de validade

Tiacutepica consequecircncia do princiacutepio da natildeo contradiccedilatildeo haacute muito suscitado por Aristoacuteteles a an-

tinomia vai ao encontro da maacutexima de que ldquoeacute impossiacutevel que o mesmo (predicado) convenha e natildeo

convenha ao mesmo (sujeito) sob o mesmo aspecto e ao mesmo tempordquo (LUFT 2005 p 49) A contra-

diccedilatildeo (antinomia) portanto eacute ldquoa face extrema da incoerecircncia no discursordquo (LUFT 2005 p 49)

Quando Norberto Bobbio (2011 p 87) categoricamente prescreve que ldquoo direito natildeo tolera

antinomiasrdquo estaacute apenas a corroborar que o sistema normativo deve ser pautado pelo maacuteximo de cer-

teza e seguranccedila juriacutedica (postulados tiacutepicos e essenciais de convivecircncia humana Valores igualmente

defensaacuteveis agrave ideia de Direito) conseguindo garantir assim seu ideaacuterio de justiccedila

Eduardo Luft (2005 p 68-69) assim leciona

O princiacutepio da coerecircncia natildeo torna impossiacuteveis incoerecircncias no discurso ou no ser Incoe-recircncias satildeo possiacuteveis embora sempre inseridas no processo de sua superaccedilatildeo em um novo movimento para a coerecircncia [] o princiacutepio da coerecircncia eacute o modo de organizaccedilatildeo de todo e qualquer sistema

Eacute tarefa do inteacuterprete portanto utilizar determinados criteacuterios para soluccedilatildeo das antinomias de

primeiro grau (ou pelo menos para harmonizaacute-las dado que a interpretaccedilatildeo da lei natildeo deve conduzir

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

210

ao absurdo de afrontar a finalidade da norma ou do direito que encerra) quais sejam o cronoloacutegico ou

lex posterior (ldquoa norma posterior revoga a anteriorrdquo) o hieraacuterquico ou lex superior (ldquoa norma superior

prevalece sobre a inferiorrdquo) e o da especialidade ou lex specialis (ldquoa norma especial prevalece sobre a

geral naquilo que dispotildeerdquo)

Entrementes as antinomias de segundo grau (conflitos entre normas e os criteacuterios de soluccedilatildeo)

satildeo solvidas conforme doutrina de Glauco Barreira Magalhatildees Filho (2013) do seguinte modo no

conflito entre o criteacuterio hieraacuterquico e o cronoloacutegico prevalece o primeiro No conflito entre o criteacuterio

da especialidade e o cronoloacutegico prevalece a lex specialis Por fim no conflito entre o criteacuterio hieraacuter-

quico e do da especialidade via de regra2 prevalece aquele

Quando todavia natildeo existirem criteacuterios suficientes para soluccedilotildees de antinomias (conflito entre

duas normas da mesma eacutepoca ambas gerais e da mesma hierarquia) ldquoo julgador entatildeo conforme seu

juiacutezo de valor e seu livre convencimento apelaraacute para uma das trecircs opccedilotildees a interpretaccedilatildeo modifica-

tivo-corretiva a interpretaccedilatildeo ab-rogante ou a interpretaccedilatildeo mutuamente ab-roganterdquo (MAGALHAtildeES

FILHO 2013 p 96)

A fim de compreendermos a incidecircncia desses criteacuterios de soluccedilatildeo de antinomias juriacutedicas seja

do ponto de vista legal seja do ponto de vista praacutetico elencamos alguns casos debatidos pela juris-

prudecircncia e doutrina especialmente em virtude de envolverem determinados postulados tiacutepicos do

Direito Tributaacuterio demonstrando ainda a ldquoforccedila interpretativa fiscalrdquo

Vejamos

21 Criteacuterio cronoloacutegico

211 Revogaccedilatildeo da isenccedilatildeo da Cofins agraves sociedades civis prestadoras de serviccedilos profissionais legalmente regulamentadas

Tema bastante interessante que pode servir de ilustraccedilatildeo do postulado lex posterior derogat priori natildeo soacute pelo seu aspecto econocircmico-financeiro mas principalmente em razatildeo da controveacutersia

doutrinaacuteria e jurisprudencial acerca da existecircncia ou natildeo de hierarquia normativa entre Lei Comple-

mentar e Lei Ordinaacuteria eacute o caso da Lei nordm Lei 94301996 diploma normativo posterior agrave Lei Comple-

2 Haacute casos em que modernamente o criteacuterio da especialidade prevaleceraacute sobre o hieraacuterquico pois ldquoquando uma norma (regra) infraconstitucional ferir uma norma (regra) constitucional mas realizar de modo efetivo os valores baacutesicos da Cons-tituiccedilatildeo prevaleceraacute a norma infraconstitucionalrdquo (MAGALHAtildeES FILHO 2013 p 96) Isso ocorre em virtude do princiacutepio de interpretaccedilatildeo conforme agrave Constituiccedilatildeo segundo o qual ldquouma lei natildeo deve ser declara nula quando possa ser interpretada em consonacircncia com a Constituiccedilatildeordquo (HESSE 2009 p 118) Assim para Konrad Hesse (2009 p 119) ldquoas normas consti-tucionais natildeo satildeo apenas lsquonormas-paracircmetrosrsquo (Pruumlfungsnormen) mas tambeacutem normas de conteuacutedo (Sachnormen) na determinaccedilatildeo do conteuacutedo das leis ordinaacuteriasrdquo Ainda segundo o jurista de Freiburg o princiacutepio da interpretaccedilatildeo conforme agrave Constituiccedilatildeo deita suas raiacutezes no princiacutepio da unidade do ordenamento juriacutedico estreitando por consequecircncia a inter--relaccedilatildeo existente entre Constituiccedilatildeo e lei

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mentar nordm 701991 cuja vigecircncia e aplicaccedilatildeo seguiu os termos do artigo 2ordm sect 1ordm da Lei de Introduccedilatildeo

agraves Normas do Direito Brasileiro3

O artigo 6ordm inciso II da LC nordm 701991 estabeleceu a isenccedilatildeo da Cofins agraves sociedades civis

prestadoras de serviccedilos profissionais legalmente regulamentadas pelo artigo 1ordm do Decreto-Lei nordm

23971897 retirando assim uma parte do suporte faacutetico da norma que definia o fato gerador do

aludido tributo

Essa isenccedilatildeo niacutetida exceccedilatildeo agrave norma de tributaccedilatildeo (MACHADO 2012) nunca agradou o Fisco

que desde entatildeo procurou restringir hermeneuticamente seu campo normativo especialmente sus-

tentando agrave eacutepoca que tatildeo somente as sociedades civis tributadas pelo imposto de renda no regime

previsto no artigo 1ordm do Decreto-Lei nordm 23971987 seriam beneficiaacuterias da regra de isenccedilatildeo tributaacuteria

(argumentaccedilatildeo todavia rechaccedila pelo STJ4)

Finalmente o Fisco utilizando de estratagemas poliacuteticas conseguiu a aprovaccedilatildeo da Lei nordm

94301996 que por meio do seu artigo 56 revogou a isenccedilatildeo concedida pela LC nordm 701991

Hugo de Brito Machado (2012) contraacuterio agrave manobra antijuriacutedica da Fazenda Puacuteblica desta-

cou que o dispositivo da Lei Ordinaacuteria que estabeleceu a tributaccedilatildeo das sociedades civis foi uma

forma sutil e inaceitaacutevel perpetrada pelo sujeito ativo da relaccedilatildeo juriacutedico-tributaacuteria pois aleacutem de

violar regra expliacutecita contida no artigo 150 sect 6ordm da CF88 uma Lei Ordinaacuteria natildeo poderia revogar

dispositivo de Lei Complementar dado os princiacutepios da hierarquia das normas e do paralelismo das

formas ou da homologia

Assim o supramencionado artigo 56 da Lei nordm 94301996 apesar de cronologicamente mais

recente seria totalmente inconstitucional Esse entendimento inclusive era ateacute entatildeo consolidado natildeo

soacute na doutrina mas outrossim junto aos Tribunais

O STF todavia num maniqueiacutesmo jurisprudencial influenciado politicamente pelos interesses

do Fisco se posicionou de modo diverso da doutrina majoritaacuteria e do proacuteprio STJ afirmando em

siacutentese que em virtude da natureza constitucional do instituto inexistia relaccedilatildeo hieraacuterquica entre

Lei Ordinaacuteria e Lei Complementar principalmente porque a LC nordm 701991 seria apenas formalmente

complementar mas materialmente ordinaacuteria com relaccedilatildeo aos dispositivos concernentes agrave contribui-

ccedilatildeo social por ela instituiacuteda Portanto a Lei nordm 94301996 posterior revogou aquela e tecircm aplicaccedilatildeo

agraves relaccedilotildees por ela disciplinadas5

Tendo em vista a posiccedilatildeo adotada pelo STF o STJ6 acatando a supremacia de sua decisatildeo can-

celou a supracitada Suacutemula nordm 276 sob o argumento de que a referida LC nordm 701991 tratou de mateacuteria

3 Artigo 2ordm sect 1ordm da LINDB ldquoA lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare quando seja com ela incom-patiacutevel ou quando regule inteiramente a mateacuteria de que tratava a lei anteriorrdquo4 Suacutemula nordm 276 do STJ ldquoAs sociedades civis de prestaccedilatildeo de serviccedilos profissionais satildeo isentas da Cofins irrelevante o regime tributaacuterio adotadordquo5 STF ldquoO Supremo Tribunal Federal no julgamento dos REs 377457 e 381864 ambos da relatoria do ministro Gilmar Men-des concluiu pela legitimidade do art 56 da Lei 94301996 que revogou a isenccedilatildeo da Cofins concedida agraves sociedades civis

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natildeo submetida agrave reserva constitucional de lei complementar permitindo pois que mudanccedilas no texto

daquele diploma legal pudessem ser introduzidas por meio de simples Lei Ordinaacuteria

Entrementes apesar de toda cizacircnia respectiva o STF natildeo se sensibilizou em modular os efeitos

de sua decisatildeo7 (operou-se como de regra efeitos ex tunc) causando enorme inseguranccedila juriacutedica

pois vigorou por mais de cinco anos a aludida Suacutemula nordm 276 do STJ consolidando-se na mente do

contribuinte a legalidade de sua conduta (LENZA 2011) Os valores justiccedila e seguranccedila pois consa-

grados constitucionalmente foram solapados sem nenhuma compaixatildeo pelo Fisco

O Fisco mais uma vez influenciou o Poder Judiciaacuterio com manobras poliacutetico-arrecadatoacuterias

principalmente porque agora conforme precedentes do STJ8 vem desconstituindo por meio do efei-

to loacutegico-positivo do julgamento procedente de Accedilotildees Rescisoacuterias (contrariando inclusive a Suacutemula

nordm 343 do STF) a coisa julgada material de sentenccedilas que declaravam a ilegalidade da revogaccedilatildeo da

isenccedilatildeo da COFINS agraves sociedades civis prestadoras de serviccedilos profissionais e cobrando os contribuin-

tes que agrave eacutepoca agiam no campo da legalidade

Consideramos a inconstitucionalidade do artigo 56 da Lei nordm 94301996 natildeo soacute em razatildeo da

ausecircncia de especificidade normativa (artigo 150 sect 6ordm da CF88) mas precipuamente de afronta aos

princiacutepios da seguranccedila juriacutedica e da irretroatividade

Conforme doutrina Hugo de Brito Machado (2009 p 59) rememorando Gustav Radbruch ldquoum

sistema normativo que natildeo tente a preservar a justiccedila nem a seguranccedila efetivamente natildeo eacute Direitordquo

Ainda segundo o tributarista (posiccedilatildeo que tambeacutem perfilhamos) ldquosempre que da declaraccedilatildeo de in-

constitucionalidade resultar agravamento da situaccedilatildeo do cidadatildeo frente ao Estado os efeitos da de-

claraccedilatildeo de inconstitucionalidade natildeo podem retroagirrdquo (MACHADO 2009 p 74)

prestadoras de serviccedilos pelo inciso II do art 6ordm da Lei Complementar 701991rdquo (RE nordm 522719 AgRDF Segunda Turma Min rel Ayres Britto DJ 04032011) 6 STJ AR nordm 3761PR Primeira Seccedilatildeo Min rel Eliana Calmon DJ 01122008 ndash Informativo nordm 3767 STF RE nordm 377457PR Plenaacuterio Min rel Gilmar Mendes DJ 19122008 ndash Informativo nordm 5208 STJ ldquoO oacutebice da Suacutemula 343STF segundo a qual eacute incabiacutevel accedilatildeo rescisoacuteria por ofensa a literal disposiccedilatildeo de lei quando fundada a decisatildeo rescindenda em texto legal de interpretaccedilatildeo controvertida nos tribunais eacute afastado quando a mateacuteria eacute de iacutendole constitucional O Supremo Tribunal Federal firmou entendimento de que eacute constitucional a revogaccedilatildeo pelo art 56 da Lei 943096 da isenccedilatildeo da Cofins concedida pelo art 6ordm II da Lei Complementar 7091 agraves sociedades civis de prestaccedilatildeo de serviccedilos profissionais hipoacutetese em que natildeo haacute ofensa ao princiacutepio da hierarquia das leis Julgou que as leis em confronto satildeo materialmente ordinaacuterias e que por ostentarem normatizaccedilatildeo incompatiacutevel prevalece o diploma legal mais moderno O Superior Tribunal de Justiccedila tem iterativamente rescindido acoacuterdatildeos que ao reconhecer a revogaccedilatildeo em tela se mostram contraacuterios agrave compreensatildeo firmada pelo Supremo Tribunal Federal especialmente por reconhecida ofensa literal aos arts 97 102 III e 105 III da Constituiccedilatildeo Federalrdquo (AR nordm 3782RS Primeira Seccedilatildeo Min rel Arnaldo Esteves Lima DJ 30102012)

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22 Criteacuterio hieraacuterquico

221 Diferencial de aliacutequota de ICMS nas operaccedilotildees interestaduais realizadas por natildeo contribuintes

Podemos visualizar na praacutetica a utilizaccedilatildeo do metacriteacuterio hieraacuterquico de soluccedilatildeo de antinomia

quando comparamos o disposto no artigo 155 sect 2ordm inciso VII aliacutenea b da CF88 com o artigo 11 da

Lei nordm 142372008 referente ao malfadado diferencial de aliacutequota de ICMS cobrado pelo Estado do

Cearaacute sobre as operaccedilotildees interestaduais efetuadas por consumidores para a aquisiccedilatildeo de produtos

sem objetivo de comercializaccedilatildeo (consumidores finais)

Em siacutentese o artigo 11 da Lei nordm 142372008 prescreve que seria devido ICMS nas entradas

de mercadorias ou bens de outras unidades da Federaccedilatildeo destinadas agrave pessoa fiacutesica ou juriacutedica natildeo

inscrita no Cadastro Geral da Fazenda do Estado do Cearaacute em quantidade valor ou habitualidade que

caracterize ato comercial

Na verdade o que o Estado do Cearaacute pretendia com a regra em comento era evitar a evasatildeo

fiscal por parte de empresas que se utilizavam de pessoas fiacutesicas ou juriacutedicas para a aquisiccedilatildeo de de-

terminados produtos em outros Estados para posterior comercializaccedilatildeo no Estado cearense

Essa medida conforme entendimento da entidade tributante faz parte de poliacutetica adminis-

trativa a fim de neutralizar eventuais benefiacutecios fiscais ilegais concedidos por outros estados que

estariam prejudicando a induacutestria local Todavia quando da regulamentaccedilatildeo do citado artigo ocor-

reu uma distorccedilatildeo em seu objetivo inicial e se passou a exigir o ICMS sobre todas as compras feitas

fora do Estado do Cearaacute

Por exemplo nos termos do artigo 11 da Lei nordm 142372008 a pessoa fiacutesica natildeo contribuinte

habitual do ICMS que adquirisse de fornecedores localizados no Estado de Satildeo Paulo moacuteveis e uten-

siacutelios destinados agrave decoraccedilatildeo de seu apartamento desfigurando assim o intuito comercial dado sua

qualidade de consumidora final (artigo 2ordm caput do CDC) teria de pagar ao Estado do Cearaacute o dife-

rencial de aliacutequota sobre as operaccedilotildees interestaduais efetuadas9

A questatildeo faacutetico-juriacutedica descrita gira em torno da incidecircncia e aplicaccedilatildeo das vaacuterias aliacutequotas

de ICMS sobre operaccedilotildees interestaduais de circulaccedilatildeo de mercadorias e produtos adquiridos para uso

proacuteprio por pessoa fiacutesica natildeo contribuinte criando verdadeira limitaccedilatildeo ao tracircnsito de mercadorias

Sem adentramos no extenso e deformado estudo do ICMS tendo ainda como paradigma o

caso concreto acima a forccedila normativa e hieraacuterquica do comando constitucional nos permite con-

9 Se a aliacutequota cobrada for a legalmente estabelecida pelo RICMSSP (artigo 52 inciso II do Decreto nordm 454902000) ou seja 7 o Estado do Cearaacute por meio de seu RICMSCE (artigo 55 inciso I aliacutenea b do Decreto nordm 245691997) cobra do consumidor final natildeo contribuinte do tributo o diferencial de 10 que seria por simples subtraccedilatildeo matemaacutetica o resulta-do obtido de 17 (RICMSCE) menos 7 (RICMSSP)

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cluir que a compra de moacuteveis e utensiacutelios destinados agrave decoraccedilatildeo de apartamento natildeo tem intuito

comercial natildeo ocorrendo assim o fato gerador do tributo estadual razatildeo pela qual o diferencial de

aliacutequota eacute ilegiacutetimo

Claacutessicas e precisas pois satildeo as palavras de Carlos Maximiliano citado por Arnaldo Sampaio

Godoy (2010 p 222)

O poder de tributar externa-se por meio de regras fixas e precisas aplicadas impar-cialmente jamais seraacute exercido de modo arbitraacuterio e sim de acordo com princiacutepios estabelecidos de relativa justiccedila que amparam o contribuinte contra exaccedilotildees odiosas e excepcionais

O artigo 155 sect 2ordm inciso VII aliacutenea b da CF88 talvez por questatildeo pragmaacutetica optou por onerar

a operaccedilatildeo interestadual destinada a consumidor final natildeo contribuinte do ICMS com aliacutequota interna

isto eacute tal operaccedilatildeo conquanto interestadual eacute tratada como se fosse interna e todo imposto sobre

ela incidente eacute devido ao Estado de origem (MACHADO SEGUNDO 2009)

Como no caso em tela se o consumidor final (artigo 2ordm caput do CDC) residente no Estado

do Cearaacute adquire produtos de fornecedores estabelecidos no Estado de Satildeo Paulo a operaccedilatildeo seraacute

tributada integralmente por esta unidade da Federaccedilatildeo sendo destarte invaacutelida (inconstitucional) a

exigecircncia pelo Fisco Cearense do diferencial de aliacutequota

Ademais o ICMS deve ser recolhido pela aliacutequota interna no Estado onde saiu a mercadoria

para o consumidor final apoacutes a sua fatura ainda que tenha sido negociada a venda em outro local por

meio da empresa filial10

O que se veda pois eacute a cobranccedila de diferencial no caso de aquisiccedilatildeo por consumidor final que

natildeo eacute contribuinte do tributo estadual11 O TJCE natildeo eacute despiciendo salientarmos possui paciacutefico po-

sicionamento no sentido de que quando o destinataacuterio das mercadorias natildeo for contribuinte de ICMS

incide tatildeo-somente a aliacutequota interna12

Assim do ponto de vista do Direito abstrato estaria em conflito aparente a norma legal cearen-

se contida no artigo 11 da Lei nordm 142372008 e a regra inserta no artigo 155 sect 2ordm inciso VII aliacutenea

b da CF88 Todavia sem adentrarmos nos dogmas do controle de constitucionalidade e das teacutecnicas

de interpretaccedilatildeo conforme agrave Constituiccedilatildeo com ou sem reduccedilatildeo de texto natildeo restam duacutevidas que a

norma constitucional de superioridade hieraacuterquica prevalece sobre a legislaccedilatildeo infraconstitucional do

Estado do Cearaacute aplicando-se em tela o brocardo lex superior derogat legi inferior

10 STJ AgRg no REsp nordm 703232SC Segunda Turma Min rel Castro Meira DJ 2511200911 STJ RMS nordm 31456MA Segunda Turma Min rel Herman Benjamin DJ 0107201012 TJCE MS nordm 2867-752010 Plenaacuterio Des rel Haroldo Correia De Oliveira Maximo DJ 23022011

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23 Criteacuterio da especialidade

231 Isenccedilatildeo tributaacuteria do Imposto de Renda

Tiacutepico exemplo de antinomia normativo-tributaacuteria solviacutevel pelo criteacuterio da especialidade nos eacute

transmitido mutatis mutandis por meio dos estudos do professor Hugo de Brito Machado (2012)

Segundo consta destoando da liccedilatildeo de Roque Antocircnio Carraza (2009) a norma que concede

isenccedilatildeo dada sua peculiaridade constitucional (artigo 150 sect 6ordm da CF88) eacute sempre mais especiacutefica

que a norma de tributaccedilatildeo pois apenas retira uma parte do suporta faacutetico da norma que define o fato

gerador do tributo natildeo o revogando

A norma de isenccedilatildeo tributaacuteria em outras palavras concedida mediante lei especiacutefica (artigo

150 sect 6ordm da CF88 cc artigos 97 inciso VI e 176 do CTN) seja contemporacircnea ou posterior agrave norma

de tributaccedilatildeo ldquoeacute aquela cuja hipoacutetese de incidecircncia consubstancia uma exceccedilatildeo agrave hipoacutetese de inci-

decircncia do tributo respectivordquo (MACHADO 2012 p 291) motivo pelo qual haja vista sua especialidade

prevalece sobre a regra geral de tributaccedilatildeo

Nas precisas liccedilotildees de Luciano Amaro (2011 p 307) ldquoa isenccedilatildeo atua geralmente num sistema

de par de normas em que uma eacute regra a outra eacute exceccedilatildeo uma eacute gecircnero (regra) a outra eacute espeacutecie

(excepcionada)rdquo

Assim dado sua especificidade o proacuteprio Coacutedigo Tributaacuterio Nacional assevera que as normas

de isenccedilatildeo seriam interpretadas de forma literal (artigo 111 incisos I e II) bem como apesar das criacuteti-

cas de Luciano Amaro (2011) em razatildeo do disposto no artigo 175 inciso I do CTN causam a exclusatildeo

do creacutedito tributaacuterio

Eacute o tiacutepico caso do artigo 6ordm da Lei nordm 77131988 que concede isenccedilatildeo do imposto de renda nas

hipoacuteteses ali taxativamente enumeradas Os incisos elencados no supracitado artigo satildeo exceccedilotildees agrave

norma de tributaccedilatildeo do imposto sobre a renda e proventos pois apenas retira parte do suporte faacutetico

que define o fato gerador do tributo de competecircncia da Uniatildeo (artigo 153 inciso III da CF88)

A Lei nordm 77131988 apesar da exceccedilatildeo do artigo 6ordm natildeo foi por ele revogada seguindo no

plano da abstraccedilatildeo juriacutedica plenamente vigente

De fato agrave luz do artigo 2ordm sect 2ordm da Lei de Introduccedilatildeo agraves normas do Direito Brasileiro13 a lei

especial circunscrevendo-se a determinada particularidade natildeo altera o disciplinamento geral da ma-

teacuteria isto eacute temperando o brocardo lex specialis derogat generalis aduz Carrazza (2009 p 344)

A lei especial natildeo revoga a lei geral mas apenas a ela prefere nos pontos que expres-samente regula Aiacute natildeo se verifica uma revogaccedilatildeo mas pelo menos em circunstancias normais a aplicaccedilatildeo simultacircnea das duas leis (a geral e a especial)

13 Artigo 2ordm sect 2ordm da LINDB ldquoA lei nova que estabeleccedila disposiccedilotildees gerais ou especiais a par das jaacute existentes natildeo revoga nem modifica a lei anteriorrdquo

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Portanto toda norma de isenccedilatildeo natildeo revoga a norma de tributaccedilatildeo ldquoposto que aparente anti-

nomia entre ambas eacute superada pelo criteacuterio da especialidaderdquo (MACHADO 2012 p 292)

O Fisco todavia tenta maximizar a interpretaccedilatildeo literal dada agraves normas de isenccedilatildeo esquecen-

do-se propositalmente ou natildeo que o artigo 111 inciso I e II do CTN especialmente natildeo afasta as

demais teacutecnicas hermenecircuticas A interpretaccedilatildeo gramatical ou literal embora necessaacuteria natildeo eacute nem

nunca seraacute suficiente para os demasiados causos da vida principalmente das inuacutemeras hipoacuteteses de

incidecircncias tributaacuterias

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Vislumbramos que o Direito eacute marcado por diversos conceitos que peculiariza sua teoria prin-

cipalmente quando o estudamos mais especificamente agrave luz do ordenamento juriacutedico

O ordenamento juriacutedico eacute em real marcado por um verdadeiro caos normativo ou seja as

diversas normas que compotildee o sistema em razatildeo muita das vezes da falibilidade humana natildeo se

agrupam de forma coerente sponte sua Eacute necessaacuterio assim que o jurista por meio dos diversos

mecanismos loacutegico-hermenecircuticos organize o ordenamento juriacutedico a fim de equilibrar e fortificar

as normas

Diante dessa organizaccedilatildeo forccedilada do ordenamento juriacutedico em tese ele marcou-se por ser

uma logicidade normativa de regras e princiacutepios em gradual evoluccedilatildeo ainda tendo como principais

caracteriacutesticas sua natureza sistecircmica completa e una

Eacute sistecircmico o ordenamento juriacutedico porque natildeo podem existir normas-regra que se contradi-

zem teleologicamente Repousa pois essa noccedilatildeo nos princiacutepios da natildeo contradiccedilatildeo e da coerecircncia

epistemoloacutegica As antinomias portanto devem ser repelidas pelos criteacuterios da hierarquia cronologia

e especialidade

Ainda eacute completo tendo em vista a possibilidade de o jurista por intermeacutedio dos meios de in-

tegraccedilatildeo do Direito (analogia princiacutepios gerais do Direito e costumes entre outros) encontrar sempre

uma norma para disciplinar determinado caso concreto Natildeo se admitem destarte lacunas no ordena-

mento juriacutedico

Por fim o ordenamento juriacutedico eacute uno uma vez que tem na Constituiccedilatildeo sua validade norma-

tiva garantida Todas as regras que nascem e amoldam ao sistema precisam assim encontrar sua va-

lidade confirmada pela Lei Fundamental A unicidade assim como a noccedilatildeo sistecircmica do ordenamento

juriacutedico conforme alhures esclarecemos tem no princiacutepio da coerecircncia sua raiz filosoacutefica dado que

ldquocoerecircncia eacute a unidade de uma multiplicidade ou a multiplicidade em unidaderdquo (LUFT 2005 p 78)

O foco deste trabalho como ficou demonstrado nas laudas anteriores eacute desenvolvido na

noccedilatildeo de como os agentes hermeneutas ndash Fisco Tribunais Superiores e Doutrina ndash vislumbram e

solucionam as antinomias tributaacuterias

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Destacamos ademais como exemplos dos metacriteacuterios de soluccedilatildeo de antinomias os casos

respectivamente da revogaccedilatildeo da isenccedilatildeo da Cofins agraves sociedades civis prestadoras de serviccedilos pro-

fissionais legalmente regulamentadas (criteacuterio cronoloacutegico) do diferencial de aliacutequota de ICMS nas

operaccedilotildees interestaduais realizadas por natildeo contribuintes (criteacuterio hieraacuterquico) e ainda os casos de

isenccedilatildeo tributaacuteria do Imposto de Renda (criteacuterio da especialidade)

Apesar de em tese os criteacuterios de soluccedilatildeo de antinomias natildeo poderem desmerecer agraves nor-

mas constitucionais evidenciamos principalmente nos dois primeiros exemplos que o Fisco exerce

grande influecircncia hermenecircutico-poliacutetica junto agraves demais fontes de interpretaccedilatildeo especialmente o

Poder Judiciaacuterio

O diaacutelogo que precipuamente travariam os agentes de interpretaccedilatildeo (Fisco Tribunais Supe-

riores e Doutrina) para o bom desenvolvimento do Direito consequecircncia assim de sua dinamicida-

de quando da anaacutelise dos exemplos de soluccedilatildeo das antinomias juriacutedico-tributaacuterias eacute solapado pelo

desejo de arrecadaccedilatildeo O Direito muitas vezes para o Fisco eacute secundaacuterio quando eacute necessaacuterio suprir

financeiramente a maacutequina estatal

O estudo todavia natildeo foi em vatildeo A existecircncia pelo menos em tese de um verdadeiro debate

entre os agentes hermeneutas demonstra que o Direito mesmo ao reveacutes dos interesses puramente

poliacutetico-arrecadatoacuterios eacute uma ciecircncia dinacircmica aberta a novas ideias e principalmente antidogmaacutetica

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PARA ALEacuteM DA ARREDACACcedilAtildeO A TRIBUTACcedilAtildeO COMO INSTRUMENTO DE REDUCcedilAtildeO DAS DESIGUALDADES SOCIAIS

SUMAacuteRIO Introduccedilatildeo 1 A evoluccedilatildeo do Estado o princiacutepio da dignidade da pessoa humana e a tributaccedilatildeo 2 A tributaccedilatildeo como instrumento de con-cretizaccedilatildeo dos direitos fundamentais no Estado Democraacutetico de Direito e a consequente reduccedilatildeo de desigualdades sociais 3 Adequaccedilatildeo da tributaccedilatildeo agrave capacidade contributiva e agrave extrafiscalidade na realizaccedilatildeo de direitos fun-damentais um olhar aleacutem da arrecadaccedilatildeo Consideraccedilotildees finais Referecircncias

Victor Hugo Cabral de Morais Junior1 Germana Parente Neiva Belchior2

INTRODUCcedilAtildeO

Natildeo obstante os uacuteltimos esforccedilos desenvolvidos pelo Estado brasileiro por meio de programas

assistencialistas e poliacuteticas afirmativas ainda se percebem os graves problemas sociais no entorno dos

grandes centros urbanos com pessoas vivendo em condiccedilotildees deploraacuteveis sem acesso aos direitos

sociais que o Estado brasileiro se comprometeu a prestar tais como educaccedilatildeo sauacutede moradia segu-

ranccedila e assistecircncia social

Vislumbra-se claramente uma contiacutenua desigualdade com o fosso entre ricos e pobres esque-

cendo-se da solidariedade que deveria existir em uma sociedade democraacutetica Dessa forma na medida

em que satildeo priorizados grupos especiacuteficos satildeo agravados os problemas de marginalizaccedilatildeo violecircncia

dependecircncia de drogas desemprego fome abandono de crianccedilas e adolescentes prostituiccedilatildeo infan-

til entre outros

Ademais pouco se discute que a tributaccedilatildeo vem sendo utilizada como instrumento de con-

centraccedilatildeo de renda agravando o ocircnus dos mais pobres havendo um aumento consideraacutevel da carga

tributaacuteria sem respeito agrave capacidade contributiva do cidadatildeo e ao mesmo tempo sem que seja efeti-

vada a proteccedilatildeo social constitucionalmente consagrada e tatildeo indispensaacutevel para que muitos possam

ter uma vida digna

Constata-se essa situaccedilatildeo por exemplo quando a populaccedilatildeo tem que recolher o imposto de

1 Auditor Fiscal Juriacutedico da Receita Estadual do Cearaacute Mestrando em Direito pela Universidade Federal do Cearaacute Especia-lista em Direito e Processo Tributaacuterios pela Universidade de Fortaleza E-mail victormoraissefazcegovbr victordemo-raisyahoocombr 2 Auditora Fiscal Juriacutedica da Receita Estadual do Cearaacute Doutoranda em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina Mestre em Direito pela Universidade Federal do Cearaacute Professora universitaacuteria E-mail germanabelchiorsefazcegovbr germana_belchioryahoocombr

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renda pessoa fiacutesica sobre valores iacutenfimos em total prejuiacutezo de seu miacutenimo vital Aleacutem disso verifica-se

tambeacutem que os tributos indiretos oneram significativamente os bens e os serviccedilos consumidos pelas

pessoas que muitas vezes sem perceber arcam com o ocircnus tributaacuterio o que atinge especialmente a

parcela da populaccedilatildeo que tem capacidade contributiva praticamente nula

O Estado Democraacutetico de Direito formalmente instituiacutedo pela Constituiccedilatildeo Federal de 1988

natildeo se sustenta sem que haja a consagraccedilatildeo do princiacutepio da dignidade da pessoa humana assim

como o homem necessita desse modelo estatal para ter garantida a sua dignidade

Dentro desse contexto a partir de pesquisa bibliograacutefica teoacuterica e descritiva com abordagem

qualitativa o objetivo deste trabalho eacute investigar como a tributaccedilatildeo pode ser utilizada como instru-

mento de realizaccedilatildeo do objetivo fundamental de reduccedilatildeo das desigualdades sociais insculpido no art

3ordm da Constituiccedilatildeo Federal de 1988

Discutir o conteuacutedo e a eficaacutecia social dos objetivos fundamentais da Repuacuteblica eacute essencial para

que referida norma natildeo seja meramente siacutembolo ou uma romacircntica carta de intenccedilotildees do constituinte

mas que possa ser um devir possiacutevel cuja efetividade eacute constante e progressiva

A temaacutetica se justifica portanto no enfoque da tributaccedilatildeo que se busca oferecer ao pensar um

sistema tributaacuterio agrave luz do princiacutepio da dignidade da pessoa humana que seja capaz de materializar o

Estado Democraacutetico de Direito distanciando-se daquele paradigma em que eacute tida apenas como ins-

trumento de arrecadaccedilatildeo pra fazer frente aos custos do Estado

O trabalho eacute dividido em trecircs toacutepicos Em um primeiro momento discute-se a evoluccedilatildeo do

Estado e da tributaccedilatildeo sob o enfoque do princiacutepio da dignidade da pessoa humana Em seguida a

tributaccedilatildeo eacute analisada no acircmbito do Estado Democraacutetico de Direito como mecanismo de reduccedilatildeo

das desigualdades sociais Por fim pretende-se refletir como eacute possiacutevel a adequaccedilatildeo da tributaccedilatildeo agrave

capacidade contributiva e agrave extrafiscalidade a fim de que sejam efetivados os direitos fundamentais

do cidadatildeo

1 A EVOLUCcedilAtildeO DO ESTADO O PRINCIacutePIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E A TRI-BUTACcedilAtildeO

Diante da necessidade de tornar a tributaccedilatildeo um instrumento eficaz de realizaccedilatildeo dos direitos

sociais econocircmicos e culturais possibilitando ao Estado promover a tatildeo esperada reduccedilatildeo das de-

sigualdades sociais por meio de poliacuteticas fiscais faz-se imperioso analisar a evoluccedilatildeo do modelo de

Estado desde o Estado Liberal ateacute o modelo contemporacircneo de Estado Democraacutetico de Direito que

tem por ldquovalor-guiardquo o princiacutepio da dignidade da pessoa humana

No Estado liberal a Constituiccedilatildeo tinha como finalidade baacutesica limitar o exerciacutecio do poder esta-

tal O poder estava adstrito agraves normas que almejavam a liberdade protegendo assim o indiviacuteduo E

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para se ter liberdade era preciso seguranccedila na ordem juriacutedica A liberdade individual e consequente-

mente a seguranccedila da ordem juriacutedica eram os primados baacutesicos do Estado liberal

Eacute nesse contexto que nascem os direitos civis e poliacuteticos denominados de direitos fundamen-

tais de primeira geraccedilatildeo (ou dimensatildeo) caracterizados ldquopela necessidade de natildeo intervenccedilatildeo do Esta-

do no patrimocircnio juriacutedico dos membros da comunidaderdquo (LIMA 2002 p 34) Esta categoria eacute fundada

no Estado liberal absenteiacutesta onde se deu a manifestaccedilatildeo do status libertatis ou status negativus conforme classificaccedilatildeo de Jellinek

Os direitos fundamentais do cidadatildeo se inserem na moldura do que a doutrina classificou como

geraccedilotildees ou dimensotildees tendo como premissa central a dignidade da pessoa humana

Importante destacar o entendimento de Perez Luntildeo (1987 p 56) no sentido de que ldquoas gera-

ccedilotildees de direitos humanos natildeo representam um processo meramente cronoloacutegico e linear [] De outro

lado as geraccedilotildees de direitos humanos natildeo implicam na substituiccedilatildeo global de um cataacutelogo de direitos

por outro []rdquo No Brasil Dimoulis e Martins (2008) seguem a mesma linha ao expor que o termo ge-

raccedilatildeo natildeo se mostra cronologicamente exato haja vista que as primeiras Constituiccedilotildees e declaraccedilotildees

dos seacuteculos XVIII e XIX jaacute abordavam certos direitos sociais

O Estado social entra em cena tendo como objetivo inicial a igualdade material contraposta agrave

igualdade formal da visatildeo liberal fruto das lutas de classes ocorridas apoacutes a Revoluccedilatildeo Industrial com-

prometendo-se a garantir os direitos econocircmicos sociais e culturais tidos como direitos fundamentais

de segunda dimensatildeo

Referidos direitos sociais requerem prestaccedilotildees positivas (status positivus) por parte do Estado

para suprir as carecircncias da sociedade Satildeo os direitos dos cidadatildeos agraves prestaccedilotildees necessaacuterias ao pleno

desenvolvimento da existecircncia individual tendo o Estado como sujeito passivo devendo ser cumpri-

dos mediante poliacuteticas puacuteblicas que para tanto necessitam de recursos (obtidos por meio de tributos

em sua maior parte) para serem concretizados Diante da ausecircncia de normatividade desses direitos

frente a sua natildeo consecuccedilatildeo esse modelo estatal entra em crise

No Estado contemporacircneo manteacutem-se o essencial da concepccedilatildeo liberal traduzido na afirma-

ccedilatildeo de que o homem pelo simples fato de o ser tem direitos e que o Poder Puacuteblico deve respeitaacute-los

Assegurar o respeito agrave dignidade da pessoa humana eacute o fim da sociedade poliacutetica Dignidade esta no

entanto que natildeo eacute vista apenas no acircmbito do indiviacuteduo isolado mas sim de uma forma coletiva em

virtude da solidariedade

Por conta disso eacute que surgem direitos de titularidade coletiva intitulados pela doutrina de di-

reitos fundamentais de terceira dimensatildeo que consagram o princiacutepio da solidariedade atingindo natildeo

soacute a presente geraccedilatildeo mas tambeacutem as futuras (BELCHIOR 2011)

O constituinte brasileiro inspirado em constituiccedilotildees sociais democratas do seacuteculo anterior no-

tadamente a Constituiccedilatildeo do Meacutexico de 1917 inscreveu em seu artigo 1ordm inciso III o postulado da

dignidade da pessoa humana entre os fundamentos da organizaccedilatildeo nacional

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De fato pode-se afirmar que o Estado Democraacutetico da atualidade eacute um Estado de abertura

constitucional fundado no principio da dignidade do ser humano tendo-o como valor-guia conforme

abordagem de Sarlet (2002 p 62)

Dessa forma considerando que o modelo estatal escolhido foi o Estado Democraacutetico de Direito

em que haacute a necessidade de se consagrar a dignidade humana ldquoeacute de suma importacircncia que se trate

os direitos fundamentais como valores indivisiacuteveis e interdependentesrdquo (MARMELSTEIN 2008 p 60)

abolindo a falsa ideia de existecircncia de hierarquia entre as diversas geraccedilotildees de direitos fundamen-

tais conforme mencionado anteriormente englobando-os todos na luta por efetivaccedilatildeo para assim

conferir maacutexima eficaacutecia ao texto constitucional Nesse sentido Bonavides (2011 p 573) afirma que a

ldquouniversalidade dos direitos fundamentais os coloca assim desde o princiacutepio num grau mais alto de

juridicidade concretude positividade e eficaacuteciardquo

Em relaccedilatildeo aos tributos eacute sabido que essa eacute uma ideia que se perde no tempo possivelmen-

te existente em todas as formas de agrupamentos humanos havendo assim desde as primitivas

sociedades uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria ou em bens arrecadada pelo ldquoEstadordquo ou por seu chefe ob-

jetivando realizar seus fins sociais seus gastos e despesas oriundas da vida em sociedade Assim as

contribuiccedilotildees em sentido lato abrangeram desde os pagamentos em dinheiro ou bens (produtos

ou serviccedilos prestados agrave comunidade) exigidos pelos vencedores das guerras aos povos vencidos ateacute

a cobranccedila entre os proacuteprios integrantes da comunidade ora como donativos e ajudas ora como

um dever (HUGON 1951)

No mundo atual haacute uma defesa da ideia de imposto-troca (pagamento como retribuiccedilatildeo de

um serviccedilo) a partir das concepccedilotildees individualistas e das teses de fiscalidade miacutenima (Estado miacutenimo)

surgidas no decorrer dos anos oitenta e noventa auge da poliacutetica neoliberal

Oportuno o entendimento de Buffon (2009 p 66) ao considerar que o processo surgido nessa

fase levou no Brasil a ldquoum incremento significativo da carga tributaacuteria sem que a capacidade con-

tributiva do cidadatildeo seja levada em consideraccedilatildeo e sem que o Estado concomitantemente decirc efeti-

vidade agrave proteccedilatildeo social constitucionalmente exigiacutevel e faticamente imprescindiacutevelrdquo Isso acarretou a

sofisticaccedilatildeo do sistema tributaacuterio convertendo-o em um meio de redistribuiccedilatildeo de renda agraves avessas

haja vista que a parte da populaccedilatildeo com menor capacidade contributiva arca com parcela significativa

da carga tributaacuteria sem que lhe sejam garantidos minimamente os direitos sociais em demonstraccedilatildeo

clara de que a democracia representativa brasileira corresponde a um grande ldquofaz de contardquo

Diante desse cenaacuterio faz-se imprescindiacutevel um olhar reflexivo a fim de que se encontrem os

fundamentos de um modelo de tributaccedilatildeo que esteja de fato apto a recuperar os seus compromissos

histoacutericos sobretudo no que se refere agrave solidariedade para assim dar maacutexima eficaacutecia ao princiacutepio da

dignidade da pessoa humana por meio da concretizaccedilatildeo dos direitos fundamentais

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2 A TRIBUTACcedilAtildeO COMO INSTRUMENTO DE CONCRETIZACcedilAtildeO DOS DIREITOS FUNDAMEN-TAIS NO ESTADO DEMOCRAacuteTICO DE DIREITO E A CONSEQUENTE REDUCcedilAtildeO DE DESIGUAL-DADES SOCIAIS

Conforme se percebe com a crise do Estado Social em natildeo conseguir efetivar os direitos sociais

por ausecircncia de recursos o que fez das normas meros programas sem eficaacutecia social natildeo haacute como se

exigir a concretizaccedilatildeo dos direitos fundamentais sem que haja a contribuiccedilatildeo dos cidadatildeos para que

se alcance esse objetivo uma vez que a realizaccedilatildeo desses direitos em especial dos direitos sociais de

cunho prestacional implica a assunccedilatildeo de um significativo ocircnus financeiro por parte do Estado

Apesar de haver um consenso acerca da importacircncia da concretizaccedilatildeo dos direitos fundamen-

tais para a maacutexima efetividade do princiacutepio da dignidade da pessoa humana o que leva indubitavel-

mente agrave reduccedilatildeo das desigualdades sociais natildeo se pode esquecer de que essa concretizaccedilatildeo somente

se revela possiacutevel com o cumprimento do principal dever de cidadania que eacute o dever de pagar tribu-

tos que por sua vez eacute sustentado no princiacutepio da solidariedade social

Paul Hugon nas deacutecadas de 1940 e 1950 jaacute defendia que

[] ningueacutem contesta ser o Estado obrigado na eacutepoca atual a estender sua atividade muito aleacutem da simples proteccedilatildeo ora pela teoria do lucro o ocircnus do imposto recairia neste caso sobre o cidadatildeo que recebe do poder puacuteblico as maiores e mais impor-tantes vantagens Em outros termos seria o mesmo que tributar mais pesadamente o fraco ou o pobre pois eacute este que comumente eacute o grande beneficiaacuterio da accedilatildeo puacuteblica nos domiacutenios da instruccedilatildeo da Previdecircncia Social da Proteccedilatildeo do trabalho da Higiene etc Seria ir assim contra o princiacutepio da solidariedade natural e social que impotildee aos fortes o dever de auxiliar os fracos (HUGON 1951 p 17)

Como se vecirc o princiacutepio da solidariedade social implica que aquele que deteacutem maior capacidade

econocircmica colabore com parcela mais significativa da carga tributaacuteria Ainda acerca do tema Nabais

explica que a solidariedade se refere agrave relaccedilatildeo ou sentimento de pertencer a um grupo ou formaccedilatildeo

social dentre os quais sobressai o Estado Em suas palavras

[] a solidariedade pode ser entendida quer em sentido objetivo em que se alude agrave relaccedilatildeo de pertenccedila e por conseguinte de partilha e de co-responsabilidade que liga cada um dos indiviacuteduos agrave sorte e vicissitudes dos demais membros da comunidades quer em sentido subjetivo e de eacutetica social em que a solidariedade exprime sentimen-to a consciecircncia dessa mesma pertenccedila agrave comunidade (NABAIS 2005 p 112)

Essa concepccedilatildeo de solidariedade social vincula a ideia de deveres fundamentais que apesar de

abandonada pelo individualismo do tempo contemporacircneo deve ser retomada e entendida pois a

sociedade seraacute cada vez mais harmocircnica na medida em que a preocupaccedilatildeo de cada um com o destino

dos outros for cada vez mais intensa

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A ideia de solidariedade social se evidencia exatamente quando se examina o dever funda-

mental de pagar tributos Consoante entende Buffon (2009 p 86) nos periacuteodos dos Estados Abso-

lutista e Liberal o cumprimento do dever de pagar tributo se orientava para conservaccedilatildeo do Estado

natildeo havendo uma fundamentaccedilatildeo eacutetica ou moral para a obrigaccedilatildeo tributaacuteria No entanto com o

advento dos Estados Social e Democraacutetico de Direito o dever de contribuir com os gastos puacuteblicos

passou a ter conteuacutedo solidaacuterio sendo instrumento a serviccedilo das poliacuteticas sociais e econocircmicas do

Estado redistribuidor

Dessa forma eacute faacutecil perceber a relevacircncia do dever fundamental de pagar tributo pois sem ele

o proacuteprio papel do Estado resta inviabilizado uma vez que natildeo eacute possiacutevel imaginar uma sociedade or-

ganizada sem que existam recursos financeiros para fazer frente aos seus custos em especial quando a

sociedade se propotildee a garantir a todos uma existecircncia digna o que passa pela realizaccedilatildeo dos direitos

sociais econocircmicos e culturais fato que demanda uma gama expressiva de recursos

Para Contipelli (2010 p 194) a concepccedilatildeo de Estado Democraacutetico de Direito exige uma postura

ativa perante o contexto social encarregando o Estado do cumprimento de metas que manifestam

o projeto de bem comum pautado na ideia de solidariedade necessitando para o atendimento das

demandas sociais da obtenccedilatildeo de recursos provenientes da arrecadaccedilatildeo de tributos que resumida-

mente consiste em um dever de colaboraccedilatildeo atribuiacutedo aos membros da comunidade de levar parcela

de suas riquezas aos cofres puacuteblicos justificado como forma de participaccedilatildeo no alcance dos objetivos

fundamentais da Repuacuteblica

Ressalte-se que a Constituiccedilatildeo Federal de 1988 instituiu um Estado Democraacutetico de Direito que

tem como marca fundamental a busca de uma igualdade substancial natildeo meramente formal (CARVA-

LHO MORAIS JUNIOR 2014) o que resta evidente da anaacutelise dos artigos 1ordm e 3ordm incisos I e III tornan-

do imperiosa a necessidade de se buscar o equiliacutebrio social mediante a reduccedilatildeo das desigualdades

Essa ideia de igualdade material peculiar ao Estado Democraacutetico de Direito liga-se indubitavelmente

ao princiacutepio da dignidade da pessoa humana conforme expotildee Buffon (2009 p 113)

Essa nova acepccedilatildeo de igualdade estaacute a exigir do Estado natildeo apenas que formalmente trate os iguais como iguais e os desiguais como desiguais mas tambeacutem que aja no sentido de que as desigualdades econocircmicas e sociais que produziram essas diferen-ccedilas sejam combatidas minimizadas e eliminadas Ou seja o tratamento formalmente desigual deve visar agrave reduccedilatildeo das desigualdades faacuteticas ou materiais o que equivale a uma nova concepccedilatildeo de justiccedila a qual sempre esteve vinculada a ideia de igualdade

Dentro dessa concepccedilatildeo portanto a igualdade tributaacuteria deve ser pensada a partir da ideia

de que o Estado brasileiro somente se legitima se visar a substancializar a igualdade faacutetica deven-

do para tanto a tributaccedilatildeo ser adequadamente implementada com o objetivo de servir como ins-

trumento do referido fim maior do Estado com respeito agrave dignidade humana e concretizaccedilatildeo dos

direitos fundamentais

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Nesse sentido Machado Segundo (2010 p 212) sustenta que a tributaccedilatildeo eacute um relevante meio

natildeo apenas de mudanccedila social mas de uma mudanccedila social que se pode prestar agrave implementaccedilatildeo de

uma sociedade mais justa entendida essa como aquela que seria escolhida na ldquoposiccedilatildeo originalrdquo de

John Rawls ou aquela que se aproxima o mais possiacutevel daquilo que seus membros desejam proximi-

dade que seraacute tanto mais quanto maior for a proteccedilatildeo agrave liberdade e a promoccedilatildeo da igualdade em um

ambiente democraacutetico

Vale lembrar que a concretizaccedilatildeo dos direitos fundamentais eacute um processo inter-relacionado

considerando as marcas de interdependecircncia e indivisibilidade que os caracteriza no que se revela

que os direitos ditos de primeira dimensatildeo dependem dos direitos de segunda e terceira dimensatildeo

e vice-versa No campo tributaacuterio eacute facilmente perceptiacutevel a presenccedila dos direitos fundamentais de

primeira dimensatildeo como limitadores do poder de tributar estatal No que diz respeito aos direitos

fundamentais de segunda e terceira dimensatildeo por outro lado visualiza-se que eles dependem de um

sistema tributaacuterio com eles comprometido para sua concretizaccedilatildeo tendo em vista que o Estado eacute o

seu principal devedor

Assim garantir o cumprimento dos direitos fundamentais em especial os direitos sociais eacute

condiccedilatildeo de concretizaccedilatildeo da promessa constitucional de tratar todos com igual dignidade requisito

para que sejam reconhecidos a democracia substancial e o Estado Democraacutetico de Direito instituiacutedos

pela Constituiccedilatildeo cidadatilde

Pode-se sustentar portanto que a tributaccedilatildeo eacute instrumento apto agrave concretizaccedilatildeo dos direitos

fundamentais sendo possiacutevel por meio dela dar maacutexima eficaacutecia ao principio da dignidade da pessoa

humana desde que haja a adequaccedilatildeo da carga tributaacuteria agrave efetiva capacidade econocircmica do cidadatildeo

Para tanto faz-se imprescindiacutevel compreender o denominado princiacutepio da capacidade contributiva

conforme seraacute discutido no toacutepico seguinte

3 ADEQUACcedilAtildeO DA TRIBUTACcedilAtildeO Agrave CAPACIDADE CONTRIBUTIVA E Agrave EXTRAFISCALIDADE NA REALIZACcedilAtildeO DE DIREITOS FUNDAMENTAIS UM OLHAR ALEacuteM DA ARRECADACcedilAtildeO

Para que se realize o objetivo fundamental da Repuacuteblica Federativa do Brasil de reduccedilatildeo das

desigualdades sociais eacute preciso que o Estado por meio da tributaccedilatildeo obtenha daqueles cidadatildeos

dotados de capacidade contributiva os recursos necessaacuterios agraves atividades destinadas ao oferecimento

de iguais oportunidades para todos (MACHADO SEGUNDO 2010 p 211)

Faz-se necessaacuterio assim enfrentar a tortuosa questatildeo acerca da real compreensatildeo do princiacutepio

da capacidade contributiva que para muitos estaria albergado na literalidade do disposto no sect 1ordm do

artigo 145 da Constituiccedilatildeo do Brasil assim transcrito

Art 145 [] sect 1ordm - Sempre que possiacutevel os impostos teratildeo caraacuteter pessoal e seratildeo graduados segundo a capacidade econocircmica do contribuinte facultado agrave adminis-

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traccedilatildeo tributaacuteria especialmente para conferir efetividade a esses objetivos identificar respeitados os direitos individuais e nos termos da lei o patrimocircnio os rendimentos e as atividades econocircmicas do contribuinte

Nos termos defendidos por Buffon (2009 p 175) deve-se primeiramente ter em mente a dife-

renccedila ontoloacutegica entre texto e norma para somente assim perceber que restringir a discussatildeo acerca

da interpretaccedilatildeo do dispositivo mencionado eacute hermeneuticamente inadequado Em suas palavras

O princiacutepio da capacidade contributiva diferentemente do que sustentam muitos natildeo estaacute fundamentado no sect1ordm do art 145 da CF88 Ele decorre do caraacuteter do modelo de Estado constituiacutedo pela Carta brasileira de 1988 (Estado Democraacutetico de Direito) o qual estaacute alicerccedilado nos princiacutepios da dignidade da pessoa humana da igualdade substancial e da solidariedade Isto eacute natildeo haacute de se falar em Estado Democraacutetico de Direito se esse natildeo tiver como objetivo a reduccedilatildeo das desigualdades sociais a cons-truccedilatildeo de uma sociedade solidaacuteria que esteja apta a assegurar igual dignidade a to-dos os seus membros

Desse entendimento natildeo parece discrepar Torres (2005 p 300-301) ao afirmar que a ldquolegitima-

ccedilatildeo do princiacutepio da capacidade contributiva eacute pragmaacutetica e ocorre com a intermediaccedilatildeo dos princiacutepios

da igualdade ponderaccedilatildeo razoabilidade transparecircncia e responsabilidaderdquo defendendo ainda que a

solidariedade entre os cidadatildeos deve fazer com que a carga tributaacuteria recaia sobre ricos aliviando-se

a incidecircncia sobre os mais pobres e dela dispensando os que estatildeo abaixo do niacutevel de sobrevivecircncia

Concretiza-se diante dessa foacutermula o princiacutepio da igualdade uma vez que tributando os cida-

datildeos de acordo com a capacidade contributiva em suas trecircs dimensotildees (miacutenimo existencial progressi-

vidade e seletividade) podem-se viabilizar a reduccedilatildeo das desigualdades sociais e a construccedilatildeo de uma

sociedade livre justa e solidaacuteria fundada na dignidade da pessoa humana (AacuteVILA 2008 p 370)

Como a tributaccedilatildeo somente pode recair sobre as parcelas do rendimento que exceder ao valor

das despesas necessaacuterias agrave proacutepria substacircncia sob pena de se ferir a dignidade humana deve-se ga-

rantir o denominado ldquomiacutenimo existencialrdquo Nesse sentido Torres (2005 p 305) afirma que ldquoa tributaccedilatildeo

tambeacutem natildeo pode incidir sobre o miacutenimo necessaacuterio agrave sobrevivecircncia do cidadatildeo e de sua famiacutelia em

condiccedilotildees compatiacuteveis com a dignidade humanardquo

Por outro lado o miacutenimo existencial estaacute diretamente vinculado agrave claacuteusula de progressividade

dos direitos sociais econocircmicos e culturais oriunda do Pacto Internacional relativo aos Direitos Eco-

nocircmicos Sociais e Culturais de 1966 (PIDESC) ratificado pelo Estado brasileiro que busca o progresso

constante dos direitos ali protegidos Logo se o instrumento visa agrave constante progressatildeo a partir de

uma claacuteusula de progressividade deduz-se que a regressatildeo deve ser proibida

Da mesma forma o art 26 da Convenccedilatildeo Americana sobre Direitos Humanos (1969) comple-

mentado pelo art 1ordm do Protocolo de San Salvador Adicional agrave Convenccedilatildeo Americana sobre Direitos

Humanos em Mateacuteria de Direitos Econocircmicos Sociais e Culturais (1988) assegura o ldquodesenvolvimento

progressivordquo dos direitos econocircmicos sociais e culturais

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Dentro desse contexto a doutrina entende que dessa obrigaccedilatildeo de progressividade na imple-

mentaccedilatildeo dos direitos econocircmicos sociais e culturais emana uma ldquoclaacuteusula de proibiccedilatildeo de retrocesso

socialrdquo sendo portanto vedado ao Estado retroceder na implementaccedilatildeo destes direitos na medida de

sua maacutexima disponibilidade financeira (PIOVESAN 2007 p 178) Referida disponibilidade portanto

reforccedila a necessidade do dever fundamental de pagar tributos e da solidariedade na medida em que

a implementaccedilatildeo desses direitos fundamentais demanda uma prestaccedilatildeo onerosa do Estado

Eacute oportuno ressaltar entretanto que a chamada ldquoclaacuteusula da reserva do possiacutevelrdquo natildeo pode ser

utilizada como oacutebice para a efetivaccedilatildeo do nuacutecleo miacutenimo dos direitos sociais denominado de miacutenimo

existencial conforme liccedilatildeo de Sarlet (2002 p 148)

Vislumbra-se tambeacutem o alcance da capacidade contributiva a partir da utilizaccedilatildeo da progres-

sividade tributaacuteria que eacute justificaacutevel por dispensar tratamento desigual a favor dos economicamente

mais fracos de forma compatiacutevel com o princiacutepio da igualdade haja vista que as aliacutequotas dos impos-

tos seratildeo maiores quanto maior for a renda obtida

Cabe destacar que em relaccedilatildeo ao imposto de renda o estabelecimento de um maior nuacutemero

de aliacutequotas e uma ampliaccedilatildeo do limite de isenccedilatildeo fariam com que esse tributo atingisse de forma

mais significativa pessoas dotadas de efetiva capacidade contributiva realizando a igualdade material

no acircmbito do custeio de gastos puacuteblicos (MACHADO SEGUNDO 2010 p 215)

No que se refere aos tributos indiretos a adequaccedilatildeo ao princiacutepio da capacidade contributiva

pode se dar por meio da seletividade (TIPKE YAMASHITA 2002 p 107) com a aplicaccedilatildeo de aliacutequo-

tas variaacuteveis conforme a essencialidade dos bens ou produtos recaindo de forma mais pesada sobre

produtos considerados suntuosos e luxuosos e por conseguinte de modo mais brando sobre pro-

dutos essenciais

Eacute ainda de se observar que na hipoacutetese de o tributo natildeo se prestar agrave graduaccedilatildeo segundo a

capacidade econocircmica do contribuinte impotildee-se a aplicaccedilatildeo de extrafiscalidade possibilidade em

que o Estado utiliza a tributaccedilatildeo como instrumento de intervenccedilatildeo na sociedade estimulando ou de-

sestimulando comportamentos Isso natildeo significa que o Estado natildeo iraacute arrecadar mas o intuito natildeo eacute

meramente arrecadatoacuterio conforme se extrai da liccedilatildeo de Nabais (2009)

A extrafiscalidade traduz-se no conjunto de normas que embora formalmente in-tegrem o direito fiscal tem por finalidade principal ou dominante a consecuccedilatildeo de determinados resultados econocircmicos ou sociais atraveacutes da utilizaccedilatildeo do instrumento fiscal e natildeo a obtenccedilatildeo de receitas para fazer face agraves despesas puacuteblicas Trata-se assim de normas (fiscais) que ao preverem uma tributaccedilatildeo isto eacute uma ablaccedilatildeo ou amputa-ccedilatildeo pecuniaacuteria (impostos) ou uma natildeo tributaccedilatildeo ou uma tributaccedilatildeo menor agrave requeri-da pelo criteacuterio da capacidade contributiva isto eacute uma renuacutencia total ou parcial a essa ablaccedilatildeo ou amputaccedilatildeo (benefiacutecios fiscais) estatildeo dominadas pelo intuito de actuar directamente sobre os comportamentos econocircmicos e sociais dos seus destinataacuterios desincentivando-os neutralizando-os nos seus efeitos econoacutemicos e sociais ou fo-mentando-os ou seja de normas que conteacutem medidas de poliacutetica econoacutemica e social

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Nesse sentido Humberto Aacutevila afirma que quando os tributos se destinarem a atingir uma

finalidade extrafiscal considerando fins econocircmicos ou sociais a medida de comparaccedilatildeo natildeo seraacute a

capacidade contributiva Segundo o autor ldquocomo a distinccedilatildeo entre os contribuintes eacute feita com base

em elementos a eles exteriores e a tributaccedilatildeo baseia-se numa finalidade estranha agrave proacutepria distribui-

ccedilatildeo igualitaacuteria da carga tributaacuteria criteacuterio e finalidade afastam-se para consubstanciar duas realidades

empiricamente discerniacuteveisrdquo (AacuteVILA 2009 p 161-162) Para ele entatildeo quando houver a instituiccedilatildeo de

tributo com finalidade extrafiscal a tributaccedilatildeo se submete ao controle de proporcionalidade exigindo

que a medida seja adequada necessaacuteria e proporcional em sentido estrito

Desta feita tanto a conjuntura quanto a estrutura econocircmica passam a cobrar medidas correti-

vas por parte do Estado a fim de que a tributaccedilatildeo seja natildeo soacute um instrumento para obtenccedilatildeo de recei-

ta para a respectiva despesa puacuteblica mas tambeacutem um agente que provoque modificaccedilotildees deliberadas

nas estruturas sociais

A tributaccedilatildeo extrafiscal eacute considerada de acordo com Falcatildeo (1981 p 47) como um ldquofenocircmeno

que caminha de matildeos dadas com o intervencionismo do Estado na medida em que eacute accedilatildeo sobre o

mercado e a antes sagrada livre iniciativardquo

A compostura da legislaccedilatildeo de um tributo pode assim vir pontilhada de providecircncias no in-

tuito de prestigiar certas situaccedilotildees tidas como social poliacutetica ou economicamente valiosas agraves quais

o legislador dispensa tratamento mais confortaacutevel ou menos gravoso A extrafiscalidade eacute portanto

um dos valores finaliacutesticos que o legislador imprime na lei tributaacuteria manipulando categorias juriacutedicas

postas agrave sua disposiccedilatildeo na perseguiccedilatildeo de objetivos alheios aos meramente arrecadatoacuterios (CARVA-

LHO 2004 p 230-231)

Eacute importante destacar que apesar de a extrafiscalidade ser uma foacutermula juriacutedico-tributaacuteria para

a obtenccedilatildeo de metas que prevalecem sobre os fins simplesmente arrecadatoacuterios de recursos monetaacute-

rios o regime que dirige referida atividade deve ser o proacuteprio das exaccedilotildees tributaacuterias Deve o legislador

guiar-se pelos paracircmetros previstos na Constituiccedilatildeo Federal respeitando os limites da competecircncia

impositiva e dos princiacutepios que regem a mateacuteria

Com o Estado Democraacutetico de Direito a importacircncia da tributaccedilatildeo foi ampliada em cuja sus-

tentaccedilatildeo estaacute a norma juriacutedica estatal Na estrutura da norma juriacutedica conforme liccedilatildeo de Bobbio (2007

p 44-45) mesmo sem comprometer a disjunccedilatildeo existe lugar para a sanccedilatildeo recompensatoacuteria esta que

eacute um dos principais instrumentos de extrafiscalidade

Dessa forma a partir da anaacutelise do marco teoacuterico desenvolvido percebe-se que a tributaccedilatildeo

desde que adequada agrave capacidade contributiva entendida como aquela adequadamente progressiva

seletiva que natildeo atinja o miacutenimo existencial e que aleacutem disso utilize a extrafiscalidade para estimular

e desestimular comportamentos comportamentos orientados pelos paracircmetros constitucionais pode

viabilizar a reduccedilatildeo das desigualdades sociais e a construccedilatildeo de uma sociedade livre justa e solidaacuteria

fundada na dignidade da pessoa humana

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

230

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Ao vislumbrar o contexto socioeconocircmico brasileiro desde a promulgaccedilatildeo da Constituiccedilatildeo

de 1988 ateacute os dias atuais percebe-se que ao inveacutes de caminhar em direccedilatildeo a uma sociedade mais

justa humana e igualitaacuteria vive-se um momento marcado por desigualdades sociais inclusive na

perspectiva tributaacuteria

Verifica-se o aumento de poliacuteticas puacuteblicas de seguranccedila puacuteblica para amenizar os assaltos se-

questros e assassinatos escolas em tempo integral assistencialismo para diminuir a pobreza reduccedilatildeo

da carga tributaacuteria para aumentar o consumo e fomentar a economia quotas para efetivar a igualdade

material no entanto essas medidas satildeo paliativas Faz-se necessaacuterio combater uma das principais cau-

sas dos problemas sociais talvez a mais difiacutecil de ser enfrentada a desigualdade social

No entanto eacute mister pensar o problema por uma oacuteptica inversa acreditando-se na esperanccedila

da construccedilatildeo de uma sociedade livre justa e solidaacuteria na qual se busca constantemente erradicar a

pobreza e a marginalizaccedilatildeo bem como reduzir as desigualdades sociais e regionais dando real efeti-

vidade aos objetivos fundamentais da Repuacuteblica Federativa do Brasil insculpidos no art 3ordm da Consti-

tuiccedilatildeo Federal de 1988

A tributaccedilatildeo nesse contexto ganha destaque haja vista poder constituir um excelente instru-

mento de concretizaccedilatildeo dos direitos sociais sem descuidar da observacircncia aos limites inerentes aos

tradicionais direitos e garantias fundamentais do contribuinte

Eacute preciso entatildeo uma accedilatildeo estatal que de fato labore a favor da reduccedilatildeo das desigualdades

econocircmicas e sociais por meio da concretizaccedilatildeo dos direitos fundamentais utilizando-se para tanto

a exigecircncia de uma carga tributaacuteria de acordo com a capacidade contributiva entendida como aquela

adequadamente progressiva seletiva que natildeo atinja o miacutenimo existencial e que aleacutem disso utilize a

extrafiscalidade para estimular e desestimular comportamentos alinhados aos ditames constitucionais

Novos caminhos devem ser trilhados num processo de reconstruccedilatildeo das relaccedilotildees pessoais e

redefiniccedilatildeo do papel do Estado numa perspectiva que estaacute aleacutem da arrecadaccedilatildeo Trata-se de uma mu-

danccedila de cultura individual coletiva e institucional dos que fazem parte do Estado em especial a Ad-

ministraccedilatildeo Tributaacuteria pensando-se isso a partir do paradigma da solidariedade de modo a construir

uma nova realidade em que o ser humano eacute o elemento central com accedilotildees voltadas a uma existecircncia

digna para todos

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

231

REFEREcircNCIAS

AacuteVILA Humberto Teoria da igualdade tributaacuteria 2 ed Satildeo Paulo Malheiros 2009

BELCHIOR Germana Parente Neiva Hermenecircutica Juriacutedica Ambiental Satildeo Paulo Saraiva 2011

BOBBIO Norberto Da estrutura agrave funccedilatildeo novos estudos de teoria do direito Traduccedilatildeo de Daniela Beccacia Versiani Satildeo Paulo Manole 2007

______ O Positivismo Juriacutedico liccedilotildees de filosofia do Direito Traduccedilatildeo de Maacutercio Pugliese Satildeo Paulo Iacutecone 2006

BONAVIDES Paulo Curso de Direito Constitucional 26 ed Satildeo Paulo Malheiros 2011

BUFFON Marciano Tributaccedilatildeo e dignidade humana entre os direitos e deveres fundamentais Porto Alegre Livraria do Advogado 2009

CARVALHO Antocircnio Gilson Aragatildeo de MORAIS JUNIOR Victor Hugo Cabral de A prova em ques-totildees tributaacuterias In MACHADO Hugo de Brito (coord) A prova em questotildees tributaacuterias Satildeo Paulo Malheiros 2014

CARVALHO Paulo de Barros Curso de Direito Tributaacuterio 16 ed Satildeo Paulo Saraiva 2004

CONTIPELLI Ernani Paula Solidariedade social tributaacuteria Coimbra Almedina 2010

DIMOULIS Dimitri MARTINS Leonardo Teoria Geral dos Direitos Fundamentais Satildeo Paulo Revista dos Tribunais 2008

FALCAtildeO Raimundo Bezerra Tributaccedilatildeo e mudanccedila social Rio de Janeiro Forense 1981

HUGON Paul O Imposto Teoria moderna e principais sistemas 2 ed Rio de Janeiro Financeiras 1951

LIMA Francisco Geacuterson Marques de Fundamentos constitucionais do processo sob a perspectiva de eficaacutecia dos direitos e garantias fundamentais Satildeo Paulo Malheiros 2002

MACHADO SEGUNDO Hugo de Brito Fundamentos do direito Satildeo Paulo Atlas 2010

MARMELSTEIN George Curso de direitos fundamentais Satildeo Paulo Atlas 2008

NABAIS Joseacute Casalta O dever fundamental de pagar impostos contributo para a compreensatildeo do estado fiscal contemporacircneo Coimbra Livraria Almedina 2009

______ Solidariedade Social Cidadania e Direito Fiscal In GRECO Marco Aureacutelio GODOI Marciano Seabra de (coord) Solidariedade Social e Tributaccedilatildeo Satildeo Paulo Dialeacutetica 2005

PEREZ LUNtildeO Antonio E Los derechos fundamentales 8 ed Madrid Tecnos 2005

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

232

______ Concepto y concepcioacuten de loacutes derechos humanos In Revista DOXA Cuadernos de Filosofia Del Derecho Madrid Biblioteca Miguel de Cervantes n 4 1987

PIOVESAN Flaacutevia Direitos humanos e o direito constitucional internacional 8 ed Satildeo Paulo Sa-raiva 2007

RAWS John Uma teoria da justiccedila Traduccedilatildeo de Almiro Pisetta e Lenita M R Esteves Satildeo Paulo Mar-tins Fontes 1997

SARLET Ingo Wolfgang Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na Constituiccedilatildeo Federal de 1988 2 ed Porto Alegre Livraria do Advogado 2002

______ A Eficaacutecia dos Direitos Fundamentais 3 ed Porto Alegre Livraria do Advogado 2003

TIPKE Klaus YAMASHITA Douglas Justiccedila fiscal e princiacutepio da capacidade contributiva Satildeo Paulo Malheiros 2002

TORRES Ricardo Lobo Tratado de Direito Constitucional Financeiro e Tributaacuterio valores e princiacute-pios constitucionais tributaacuterios Rio de Janeiro Renovar 2005 v 2

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

233

PARTE III

CARGA TRIBUTAacuteRIA REFORMA TRIBUTAacuteRIA E JUSTICcedilA FISCAL

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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REFORMA TRIBUTAacuteRIA COM JUSTICcedilA FISCAL E SOCIAL

SUMAacuteRIO Introduccedilatildeo 1 A importacircncia da tributaccedilatildeo 2 Tipos de tributos 21 Impostos 22 Taxas 23 Contribuiccedilotildees 3 Classificaccedilatildeo dos impostos 31 Imposto direto 32 Imposto indireto 33 Imposto progressivo 34 Imposto regressivo 4 Justiccedila tributaacuteria 41 Princiacutepios relacionados agrave justiccedila tributaacuteria 411 Princiacutepio da capacidade contributiva 412 Princiacutepio da solidariedade 5 Carga tributaacuteria no Brasil 51 A regressividade da carga tributaacuteria no Brasil 6 Algumas sugestotildees que visam a tornar a tributaccedilatildeo mais justa 61 Desonerar a cesta baacutesica 62 Tributar os bens supeacuterfluos considerados de luxo 63 Po-tencializar a cobranccedila do Imposto de Transmissatildeo de Causa Mortis e Doaccedilotildees 64 Aumentar os impostos sobre a propriedade da terra 65 Tributaccedilatildeo sobre a remessa de lucros 66 Cobrar IPVA sobre embarcaccedilotildees e aeronaves 67 Ins-tituir o imposto sobre grandes fortunas 68 A cobranccedila da contribuiccedilatildeo de melhoria Consideraccedilotildees finais Referecircncias

Antocircnio Gilson Aragatildeo de Carvalho1 Lucas Mouratildeo Aragatildeo2

INTRODUCcedilAtildeO

A ideia deste artigo surgiu diante da necessidade de colaborar com o debate da Reforma Tribu-

taacuteria que seraacute objeto de discussatildeo com o processo eleitoral que se avizinha Neste sentido o objetivo

deste artigo eacute analisar o sistema tributaacuterio nacional visando ao final oferecer sugestotildees para uma

Reforma Tributaacuteria que venha acompanhada de uma foacutermula que busque maior justiccedila fiscal e social

Para isso a metodologia aplicada seraacute bibliograacutefica descritiva e exploratoacuteria

Entende-se que a temaacutetica se demonstra relevante posto que haacute muito desde a promulgaccedilatildeo

da Constituiccedilatildeo Federal de 1988 fala-se em reforma tributaacuteria no Brasil partindo geralmente de pro-

postas de setores econocircmicos bem como de governos em iniacutecio de gestatildeo tentando cumprir com as

promessas de campanha eleitoral

Contudo devemos destacar que entre os vaacuterios pontos do debate trecircs parecem merecer espe-

cial registro quais sejam a regressividade da tributaccedilatildeo o tamanho da carga tributaacuteria cobrada num

paiacutes com tatildeo baixo niacutevel de renda por habitante e ainda abordagem sobre a justiccedila fiscal o que nos

leva a uma necessaacuteria reflexatildeo sobre justiccedila social

1 Doutorando em Direito Professor de poacutes-graduaccedilatildeo em Direito Tributaacuterio na FA7 Especialista em Direito Tributaacuterio e Gestatildeo Puacuteblica e Servidor da Secretaria da Fazenda do Estado do Cearaacute E-mail aragogilsongmailcom2 Estudante de Direito da Unifor E-mail lucasmourao10yahoocombr3 Neste ano de 2014 em outubro seratildeo realizadas eleiccedilotildees no acircmbito Federal para Presidente da Repuacuteblica para o Senado e Cacircmara dos Deputados

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

235

Entendemos que essas trecircs questotildees natildeo podem fugir de qualquer discussatildeo a respeito da re-

forma tributaacuteria adequada para o nosso Paiacutes Pergunta que natildeo quer se calar no acircmbito tributaacuterio o

sistema tributaacuterio nacional eacute justo

Percebe-se que durante este periacuteodo as alteraccedilotildees no sistema tributaacuterio foram parciais haja

vista que nenhuma reforma de substancial importacircncia foi realizada apesar de os uacuteltimos governos

Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inaacutecio Lula da Silva bem como o atual terem em algum momento

defendido a reforma tributaacuteria como prioridade

Por outro lado verifica-se que as resistecircncias para mudar o regime tributaacuterio no Brasil satildeo haacute

muito tempo conhecidas tendo em vista que presenciamos a existecircncia de conflitos entre o trabalho

e o capital as instacircncias federativas (Uniatildeo Estados e Municiacutepios) com o comeacutercio internacional e as

financcedilas globalizadas entre outros

De conseguinte cabe esclarecer que enfrentam uma batalha difiacutecil os que lutam pela adequada

regulamentaccedilatildeo dos impostos com maior incidecircncia para os segmentos mais poderosos nas aacutereas

da economia e da poliacutetica As dificuldades satildeo tantas que tecircm paralisado qualquer tentativa de levar

adiante uma reforma tributaacuteria e fiscal abrangente com intenccedilatildeo de promover mais justiccedila social e

reduzir as desigualdades de renda e riqueza no Brasil

1 A IMPORTAcircNCIA DA TRIBUTACcedilAtildeO

Asseverou certa vez o iacutedolo norte americano Oliver Wendell Holmes Junior (1841-1935) juiz da

Suprema Corte norte-americana ldquoGosto de pagar impostordquo ldquoporque com eles compro civilizaccedilatildeordquo In-

felizmente no Brasil natildeo podemos falar a mesma coisa posto que em vez de pagarmos por civilizaccedilatildeo

pagamos pelos juros da diacutevida puacuteblica interna para salvar banqueiros e empresas falidas etc

Pois bem Natildeo existe nenhum cidadatildeo que nunca tenha questionado ainda que a si mes-

mo a necessidade do pagamento de tributo sua destinaccedilatildeo e sua efetiva aplicaccedilatildeo e sobre ele

natildeo tenha apresentado criacuteticas severas e ateacute mesmo extremada de requintes preconceituosos Eacute

evidente que questionamentos e criacuteticas satildeo praacuteticas naturais do ser humano que traduzem sua

forma mais tradicional de adquirir conhecimento e aprimorar aquilo que traz preacute-concebido do

conhecimento ordinaacuterio

Diante de tantos questionamentos e criacuteticas sente-se a importacircncia em aprofundar os estudos

referentes agrave relaccedilatildeo existente entre o Estado de Direito a Administraccedilatildeo Puacuteblica e a efetivaccedilatildeo dos

direitos constitucionais do cidadatildeo presentes na Constituiccedilatildeo em razatildeo das espeacutecies tributaacuterias pagas

pela sociedade

Eacute de sabenccedila geral que o tributo e o Estado satildeo parte de uma mesma moeda Eles andam juntos

haacute seacuteculos Neste sentido para financiar suas atividades o Estado por meio do Fisco intervecircm no do-

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

236

miacutenio econocircmico tributando as manifestaccedilotildees de riquezas produzidas pelas pessoas fiacutesicas e juriacutedicas

Eacute bem verdade que cada paiacutes tem a sua proacutepria histoacuteria poliacutetica econocircmica e social O tama-

nho do Estado e a forma de financiaacute-lo eacute uma construccedilatildeo histoacuterica de cada naccedilatildeo ou seja quem deve

pagar mais impostos quem deve pagar menos quem natildeo deve pagar e qual a extensatildeo da atuaccedilatildeo

estatal em cada paiacutes

Os regimes tributaacuterios e fiscais de cada paiacutes respondem agraves escolhas da sociedade sobre o

que o Estado deve prover para os cidadatildeos em termos de bens e serviccedilos puacuteblicos Mais bens e

serviccedilos puacuteblicos universais e de boa qualidade soacute satildeo viaacuteveis com um Estado e um sistema tribu-

taacuterio e fiscal fortes

Eacute nesse sentido que a justiccedila fiscal se insere nesse contexto em virtude da realizaccedilatildeo pela Ad-

ministraccedilatildeo Puacuteblica da distribuiccedilatildeo de renda e ainda da promoccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas que cumpram

os interesses sociais Sua participaccedilatildeo estaacute presente tanto nas despesas ou seja no atendimento das

necessidades baacutesicas dos cidadatildeos quanto na receita a partir da realizaccedilatildeo de uma tributaccedilatildeo justa

Em busca da justiccedila fiscal especialistas sugerem como veremos mais adiante a reduccedilatildeo da

carga tributaacuteria com o aumento de sua progressividade e da participaccedilatildeo nos tributos diretos bem

como reduccedilatildeo dos indiretos o que promove o fortalecimento da economia com produtos mais

competitivos no mercado e aumento da capacidade de consumo gerando riqueza e crescimento

social e econocircmico

2 TIPOS DE TRIBUTOS

No Brasil o tributo eacute classificado em impostos taxas e contribuiccedilotildees4 conforme o Coacutedigo Tri-

butaacuterio Nacional e o Sistema Tributaacuterio definido na Constituiccedilatildeo Federal

O conceito de tributo encontra-se no Coacutedigo Tributaacuterio Nacional ldquoToda prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

compulsoacuteria (obrigatoacuteria) em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir que natildeo constitua sanccedilatildeo

de ato iliacutecito constituiacuteda em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculadardquo5

Conveacutem destacar que o Professor Paulo de Barros de Carvalho (1999 p 15) salienta que o vocaacute-

bulo tributo experimenta pelo menos seis significados diversos a saber a) ldquotributordquo como quantia em

dinheiro b) ldquotributordquo como prestaccedilatildeo correspondente ao dever juriacutedico do sujeito passivo c) ldquotributordquo

como direito subjetivo de que eacute titular o sujeito ativo d) ldquotributordquo como sinocircnimo de relaccedilatildeo juriacutedica

tributaacuteria e) ldquotributordquo como norma juriacutedica tributaacuteria f) ldquotributordquo como norma fato e relaccedilatildeo juriacutedica

Imperioso destacar aqui que a compulsoriedade prevista no conceito de tributo se deve pelo

4 Existe uma outra espeacutecie tributaacuteria - o empreacutestimo compulsoacuterio - que eacute extremamente controversa que natildeo interessa a nossa pesquisa razatildeo pela qual natildeo a incluiacutemos em nosso objeto de estudo5 Cf Art 3ordm do Coacutedigo Tributaacuterio Nacional Lei nordm 5172 de 25101966

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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fato de o ser humano ainda natildeo ser capaz de superar sozinho o individualismo interno A formaccedilatildeo

social do mundo moderno tende ao individualismo e agrave acumulaccedilatildeo de riquezas em face das opres-

sotildees sofridas e do desenvolvimento do pensamento capitalista Eacute necessaacuteria que uma ldquomatildeo forterdquo

mantenha a opccedilatildeo inicial feita nos primoacuterdios do agrupamento humano para que esse sentimento de

proteccedilatildeo natildeo se perca ante os devaneios egoiacutestas

Importante salientar para o estudo em debate que nos paiacuteses desenvolvidos e em desenvol-

vimento os sistemas tributaacuterios se lastreiam nas seguintes bases de arrecadaccedilatildeo renda patrimocircnio

consumo ou circulaccedilatildeo de bens e serviccedilos bem como a folha de pagamentos arrecadaccedilatildeo que finan-

cia os sistemas de previdecircncia social em muitos paiacuteses

Consoante o Professor Hugo de Brito Machado (1998 p 51) os impostos satildeo classificados em

quatro grupos a) sobre o comeacutercio exterior b) sobre o patrimocircnio e a renda c) sobre a produccedilatildeo e a

circulaccedilatildeo e d) impostos especiais

21 Impostos

Impostos satildeo valores pagos por pessoas fiacutesicas e juriacutedicas (empresas) O valor eacute arrecadado

pelo Estado (governos municipal estadual e federal) e servem para custear os gastos puacuteblicos em

sauacutede seguranccedila educaccedilatildeo transporte cultura pagamentos de salaacuterios de servidores puacuteblicos etc O

dinheiro arrecadado com impostos tambeacutem eacute usado para investimentos em obras puacuteblicas (hospitais

rodovias hidreleacutetricas portos universidades etc) A utilizaccedilatildeo do dinheiro proveniente da arrecada-

ccedilatildeo de impostos natildeo eacute vinculada a gastos especiacuteficos O governo com a aprovaccedilatildeo do legislativo eacute

quem define o destino dos valores por meio do orccedilamento

22 Taxas

Taxa eacute a exigecircncia financeira agrave pessoa privada ou juriacutedica para usar certos serviccedilos fundamen-

tais ou pelo exerciacutecio do poder de poliacutecia imposta pelo governo ou alguma organizaccedilatildeo poliacutetica ou

governamental

23 Contribuiccedilotildees

Na Constituiccedilatildeo Federal de 1988 encontramos os seguintes tipos de contribuiccedilotildees contribui-

ccedilotildees sociais de intervenccedilatildeo no domiacutenio econocircmico e as de interesse de categorias profissionais

ou econocircmicas A Uniatildeo tem competecircncia exclusiva de instituiacute-las Aleacutem dessas haacute tambeacutem as con-

tribuiccedilotildees de melhoria de competecircncia comum As contribuiccedilotildees sociais ganham destaque porque

financiam a Seguridade Social

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

238

A contribuiccedilatildeo de melhoria eacute uma espeacutecie do gecircnero tributo vinculada a uma atuaccedilatildeo estatal

melhor dizendo a construccedilatildeo de uma determinada obra puacuteblica que venha ocasionar valorizaccedilatildeo dos

imoacuteveis pertencentes aos particulares Desta forma podemos deduzir que eacute um tributo decorrente de

obra puacuteblica que gera valorizaccedilatildeo em bens imoacuteveis de um determinado sujeito passivo (particular)

Nesse sentido se o poder puacuteblico (Uniatildeo Estados Distrito Federal e Municiacutepios) promove a constru-

ccedilatildeo de um viaduto ponte estrada saneamento baacutesico etc acarretando a esta obra a valorizaccedilatildeo dos

imoacuteveis circunscritos agrave entidade puacuteblica que promoveu a construccedilatildeo eacute permitida a cobranccedila desta

espeacutecie tributaacuteria

Cumpre acentuar que encontramos na doutrina discussotildees acerca da natureza juriacutedica deste

tributo ou seja se a contribuiccedilatildeo de melhoria eacute imposto taxa ou tributo inconfundiacutevel como bem

assevera Alfredo Augusto Becker

A doutrina tradicional entende que a contribuiccedilatildeo de melhoria eacute tributo inconfundiacute-vel mesmo no plano juriacutedico com imposto e taxa Entretanto aqueles estudiosos do Direito Tributaacuterio que preocupam-se em natildeo deixar sua atitude mental juriacutedica conta-minar-se com princiacutepios e conceitos da Ciecircncia das Financcedilas Puacuteblicas ao procederem recentes investigaccedilotildees sobre as diferentes naturezas juriacutedicas dos tributos concluiacuteram que a contribuinte eacute um imposto ou uma taxa (BECKER 1998 p 386)

Contudo para o nosso estudo ressaltamos que consideramos como um tributo inconfundiacutevel

com qualquer outra espeacutecie tributaacuteria

3 CLASSIFICACcedilAtildeO DOS IMPOSTOS

Para a nossa pesquisa eacute importante estudarmos a classificaccedilatildeo dos impostos Na doutrina en-

contramos diversas classificaccedilotildees para os impostos dentre elas destacamos as principais vale dizer

impostos diretos indiretos progressivos e regressivos

31 Imposto direto

Eacute aquele que incide periodicamente sobre a renda e o patrimocircnio de uma uacutenica pessoa ou do

capital O imposto de renda e o IPTU satildeo exemplos de impostos diretos

32 Imposto indireto

Eacute aquele que estaacute embutido no preccedilo final do produto e natildeo aparece explicitado na Nota Fis-

cal Um contribuinte recolhe o imposto e outro efetivamente o paga Eacute o caso do IPI (Imposto sobre

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

239

Produtos Industrializados) e do ICMS (Imposto sobre a circulaccedilatildeo de mercadorias) O consumidor final

de uma geladeira por exemplo eacute quem pagaraacute o imposto embora ele seja recolhido pelo fabricante

Como regra geral considera-se que os tributos sobre renda e patrimocircnio (IRPF IRPJ CSLL IPTU IPVA

ITR ITCD ITBI) satildeo diretos enquanto os tributos sobre produccedilatildeo e consumo de bens e serviccedilos (ICMS

Cofins IPI ISS Cide) satildeo indiretos

33 Imposto progressivo

Progressivo eacute um imposto que incide de modo que a taxa efetiva de um imposto aumenta con-

forme o montante em que a taxa aplicada aumenta Para que um imposto seja progressivo eacute preciso

que ele tenha mais de uma aliacutequota e que elas incidam de forma crescente conforme aumenta a base

de caacutelculo O imposto de renda eacute um bom exemplo Quanto maiores satildeo as faixas de renda (base de

caacutelculo) maiores satildeo as aliacutequotas

Leandro Paulsen foi enfaacutetico sobre tal ponto

Progressividade como instrumento para observacircncia da capacidade contributiva Atra-veacutes das aliacutequotas progressivas eacute possiacutevel fazer com que aqueles que revelam melhor situaccedilatildeo econocircmica e portanto capacidade para contribuir para as despesas puacuteblicas o faccedilam em maior grau que os demais natildeo apenas proporcionalmente a sua maior riqueza mas suportando maior carga em termos percentuais Eacute pois um instrumento para efetivaccedilatildeo do princiacutepio da capacidade contributiva mas deve ser utilizado com moderaccedilatildeo para natildeo desestimular a geraccedilatildeo de riqueza (PAULSEN 2010 p 49)

34 Imposto regressivo

Regressivo eacute o exato oposto de um imposto progressivo onde a taxa efetiva de imposto di-

minui agrave medida que aumenta a quantia a que a taxa eacute aplicada Este efeito eacute geralmente produzido

em testes de meios e eacute usado para retirar subsiacutedios ou benefiacutecios fiscais estaduais criando taxas

marginais de imposto As maiores taxas de imposto marginal seratildeo suportadas por aqueles com

renda mais baixa

4 JUSTICcedilA TRIBUTAacuteRIA

Preliminarmente faz-se necessaacuterio ressaltar que definir justiccedila eacute uma tarefa extremamente

complicada principalmente quando se trata de justiccedila tributaacuteria conforme alerta Hugo de Brito

Machado (2009 p 84) ldquoDefinir eacute uma tarefa difiacutecil e definir justiccedila eacute praticamente impossiacutevel Se-

guramente poreacutem todos temos um sentimento de justiccedila que ateacute certo ponto se confunde com a

ideia de igualdaderdquo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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Contudo eacute vaacutelido frisar a importacircncia da questatildeo da justiccedila tributaacuteria6 natildeo soacute nos dias atuais

mas em grande parte da histoacuteria Outrora o Rei todo poderoso era considerado uma lideranccedila natildeo

soacute militar mas tambeacutem espiritual ao seu povo haja vista que ao ocupar o posto maacuteximo em determi-

nada sociedade ele tinha que satisfazer as necessidades dos seus seguidores de acordo com as suas

possibilidades No entanto essas possibilidades surgiam ao passo que aquele liacuteder possuiacutea ou natildeo

condiccedilotildees financeiras para arcar com suas vontades Assim sendo a tributaccedilatildeo surgiu com o objetivo

de apoiar financeiramente o liacuteder de certo povo revertendo o produto daquela em vantagens e servi-

ccedilos individuais ou gerais de acordo com as necessidades do povo

Na linha doutrinaacuteria de Michel Sandel (2012 p 28) para identificar se uma sociedade eacute justa haacute

que se perguntar se ela distribui as coisas que ela valoriza

Para saber se uma sociedade eacute justa basta perguntar como ela distribui as coisas que valoriza ndash renda e riqueza deveres e direitos poderes e oportunidades cargos e honrarias Uma sociedade justa distribui esses bens da maneira correta ela daacute a cada indiviacuteduo o que lhe eacute devido

Justiccedila tributaacuteria pois eacute a possibilidade processual do justo na aacuterea tributaacuteria focando princi-

palmente a cobranccedila dos impostos contribuiccedilotildees taxas e empreacutestimos compulsoacuterios Pode-se sinte-

tizar esse tema como sendo um limite eacutetico entre o Direito Tributaacuterio e o Excesso Tributaacuterio

Dito isto no caso brasileiro o cidadatildeo paga uma alta carga tributaacuteria poreacutem ele natildeo recebe a

contraprestaccedilatildeo das garantias constitucionais ou seja sauacutede educaccedilatildeo seguranccedila o que ocasiona

um sufocamento na sociedade em face da demasiada arrecadaccedilatildeo

Ives Gandra da Silva Martins (1989 p 8-10) na obra ldquoExerciacutecio da Cidadania e Sistema Tributaacuterio

na Constituiccedilatildeo de 1988rdquo critica duramente a corrupccedilatildeo a maacute aplicaccedilatildeo do dinheiro puacuteblico e a situ-

accedilatildeo confiscatoacuteria em que se visualiza a atividade tributaacuteria atualmente causando uma revolta silente

em toda sociedade Pela oacuteptica fiscal os recursos deveriam ter origem e destino identificados para

diminuir as ocorrecircncias de crime contra a ordem tributaacuteria

Na teoria da carga desmedida formulada pelo mesmo autor fica claro que haacute a tendecircncia de

o homem exigir da sociedade sempre mais do que seria desejaacutevel somando aos interesses sociais

o favorecimento dos possuidores do poder Os valores arrecadados com a tributaccedilatildeo natildeo se restrin-

gem a atender aos interesses da coletividade mas sim a interesses privados o que culmina com a

rejeiccedilatildeo social

Em uacuteltima menccedilatildeo Ives Gandra (MARTINS 1989 p 10) arremata da seguinte forma

6 Diz-se justiccedila tributaacuteria substancial aquela que se afasta da mera estrutura formal do texto juriacutedico tributaacuterio para se aproximar daquela que incorpora conceitos mais amplos e que repele a positivaccedilatildeo de meras formas legais e sua interpre-taccedilatildeo isolada

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Alguns aspectos que determinam a carga desmedida ldquoobjetivos e necessidades mal colocados gastos supeacuterfluos contribuintes apenados porque privileacutegios e incentivos satildeo mal distribuiacutedos sonegaccedilatildeo e tratamento praacutetico diferencial fiscalizaccedilatildeo com bai-xa moralidade exatora e sonegaccedilatildeo e aumento de receita que se traduz pelo princiacutepio de que a tributaccedilatildeo seria mais elevada para compensar a receita natildeo arrecadada dos sonegadoresrdquo

Nesta esteira Alberto Nogueira em sua obra ldquoA Reconstruccedilatildeo dos Direitos Humanos da Tri-

butaccedilatildeordquo evidencia trecircs caminhos para a tal reconstruccedilatildeo O primeiro deles eacute a ldquoefetiva direta e ativa

participaccedilatildeo de todos os segmentos da sociedade na elaboraccedilatildeo fiscalizaccedilatildeo e controle das regras

tributaacuteriasrdquo (NOGUEIRA 1997 p 411) o que tende a eliminar os excessos e as injusticcedilas da carga tribu-

taacuteria O segundo se daacute pelas vias judiciais e por uacuteltimo a primazia da Constituiccedilatildeo

41 Princiacutepios relacionados agrave justiccedila tributaacuteria

411 Princiacutepio da capacidade contributiva

O principio da capacidade contributiva seria a graduaccedilatildeo dos impostos segundo a capacidade

econocircmica do contribuinte devendo cada um respeitar e contribuir de acordo com sua aptidatildeo eco-

nocircmica originando assim o ideal de justiccedila distributiva Esse princiacutepio pode ser considerado o pilar

da justiccedila tributaacuteria sendo ainda base para o princiacutepio constitucional da igualdade jaacute que aleacutem de

minimizar as injusticcedilas e diminuir as desigualdades busca a igualdade impondo tributos maiores so-

bre os que tiverem maior riqueza em sua posse Deve aqui o legislador observar a peculiaridade dos

cidadatildeos considerando a capacidade de cada um individualmente harmonizando a capacidade eco-

nocircmica com certas medidas inclusive tratando de forma diversa os desiguais Resumindo de forma

simples e clara quem dispotildee de maior riqueza deve proporcionalmente pagar mais tributos do que

aquele que tem menor poderio econocircmico para ser realizada a conservaccedilatildeo do patrimocircnio puacuteblico

Sobreleva notar o conceito de Klaus Tipke (2012 p 21) acerca do princiacutepio da capacidade con-

tributiva ldquoCada qual deve pagar impostos de conformidade com o montante de sua renda desde que

este ultrapasse o miacutenimo existencial e natildeo deva ser empregado para obrigaccedilotildees privadas inevitaacuteveisrdquo

412 Princiacutepio da solidariedade

O princiacutepio da solidariedade tem fundamentaccedilatildeo na Constituiccedilatildeo Federal no seu artigo 3ordm inci-

so I Tem como objetivo central por meio de accedilotildees puacuteblicas e privadas construir um estado ideal bus-

cando a formaccedilatildeo de uma sociedade livre justa e solidaacuteria Eacute na busca do bem comum interesse

comum da sociedade que se aplica o princiacutepio da solidariedade pois visa agrave accedilatildeo da coletividade

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

242

em prol de um propoacutesito maior que traduz o bem comum em igualdade e dignidade a todos os

membros sociais

No acircmbito juriacutedico mais precisamente em face do Direito Tributaacuterio o embasamento da apli-

caccedilatildeo do princiacutepio da solidariedade encontra-se na Filosofia demonstrando que o ser humano sente

um dever inato em colaborar com o meio em que vive aprimorando-o haja vista a caracteriacutestica e o

instinto gregaacuterio que o direciona de modo que mesmo em seu egoiacutesmo o homem colabora com o

todo para receber algum benefiacutecio

Na questatildeo tributaacuteria deve ser observado o Coacutedigo Tributaacuterio Nacional no seu artigo 145 sect 1ordm

onde trata da capacidade contributiva Neste ponto eacute de faacutecil conclusatildeo que a Repuacuteblica Federativa

do Brasil com o objetivo de uma melhor distribuiccedilatildeo da riqueza tributa mais intensamente os que

auferem mais renda para compensar a falta de receita dos menos favorecidos ou seja dos que pos-

suem menos condiccedilotildees Esse objetivo na busca uma melhor distribuiccedilatildeo de renda e implementaccedilatildeo da

capacidade contributiva une o princiacutepio da solidariedade agrave ideia de justiccedila

5 CARGA TRIBUTAacuteRIA NO BRASIL

Estudos do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributaacuterio (IBPT) (2012) revelam que a carga

tributaacuteria do Brasil eacute uma das mais altas do mundo quando comparada agrave de paiacuteses de renda per capita semelhante Pode-se medir a carga de tributos que a sociedade suporta pelo conceito de carga tribu-

taacuteria bruta que eacute o total de tributos arrecadados (diretos e indiretos) em relaccedilatildeo ao PIB (Produto Inter-

no Bruto) Segundo este instituto a arrecadaccedilatildeo tributaacuteria no Brasil cresce ano a ano batendo novos

recordes em arrecadaccedilatildeo O estudo compara a voracidade tributaacuteria de 30 paiacuteses com o niacutevel de bem

estar dos cidadatildeos medido pelo Iacutendice de Desenvolvimento Humano (IDH) elaborado pelo Programa

das Naccedilotildees Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) E conclui ldquoEntre os 30 paiacuteses com a maior carga

tributaacuteria o Brasil continua sendo o que proporciona o pior retorno dos valores arrecadados em prol

do bem-estar da sociedaderdquo

Neste mesmo estudo o Ipea7 afirma que em 2008 a carga tributaacuteria liacutequida foi de 205

do PIB As transferecircncias de previdecircncia e assistecircncia e os subsiacutedios somaram 153 do PIB naquele

ano Essa distinccedilatildeo eacute importante pois o volume de recursos mobilizado por estas transferecircncias satildeo

resultado da atuaccedilatildeo direta do Estado na redistribuiccedilatildeo de renda Eacute um dinheiro que arrecadado pelo

governo natildeo fica com ele para manutenccedilatildeo da maacutequina puacuteblica mas eacute redirecionado ao bolso das

famiacutelias que gastaratildeo esses recursos no mercado como quiserem

7 Instituto de Pesquisa Econocircmica Aplicada (Ipea) eacute uma fundaccedilatildeo puacuteblica federal vinculada agrave Secretaria de Assuntos Estrateacutegicos da Presidecircncia da Repuacuteblica Suas atividades de pesquisa fornecem suporte teacutecnico e institucional agraves accedilotildees governamentais para a formulaccedilatildeo e reformulaccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas e programas de desenvolvimento brasileiros Dis-poniacutevel em wwwIpeagovbr Acesso em 3 jan 2014

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243

Outro ponto muito importante no debate sobre o tamanho da carga tributaacuteria eacute o uso dos re-

cursos Boa parte da arrecadaccedilatildeo de impostos e de outros tributos eacute destinada ao pagamento de juros

da diacutevida puacuteblica e natildeo ao financiamento de serviccedilos puacuteblicos como educaccedilatildeo sauacutede saneamento e

seguranccedila puacuteblica Em 2008 o pagamento de juros sobre a diacutevida puacuteblica alcanccedilou 56 do PIB

Contudo o tamanho da carga tributaacuteria pode ser relativizado pelo conjunto de transferecircncias

e subsiacutedios previstos no sistema tributaacuterio e na poliacutetica fiscal que orienta os gastos puacuteblicos Aqui eacute

necessaacuterio introduzir o conceito de carga tributaacuteria liacutequida que corresponde agrave carga bruta deduzida

de transferecircncias e subsiacutedios

Quando o retorno de recursos para a sociedade por meio de transferecircncias (como pensotildees e

aposentadorias e outros benefiacutecios previdenciaacuterios e assistenciais para idosos eou muito pobres eou

portadores de deficiecircncias) eacute socialmente mais justo o efeito de uma carga tributaacuteria alta eacute relativiza-

da e o uso da carga tributaacuteria liacutequida deve ser considerado na discussatildeo

Ao considerar as transferecircncias e o pagamento de juros da diacutevida puacuteblica pode-se concluir que

a carga tributaacuteria liacutequida exclusive juros era bem menor do que aparentava

Assim eacute preciso tambeacutem pensar na qualidade dos bens e serviccedilos que o Estado devolve em tro-

ca dos recursos que arrecada e na forma como faz isso Se o Estado arrecada muito mas oferece bens

e serviccedilos de qualidade dificilmente a populaccedilatildeo questionaraacute o tamanho da carga tributaacuteria Contu-

do quando a carga tributaacuteria eacute alta e os serviccedilos oferecidos pelo Estado natildeo satildeo de boa qualidade o

questionamento eacute inevitaacutevel

No Brasil haacute uma percepccedilatildeo negativa do retorno social e econocircmico da arrecadaccedilatildeo de impos-

tos ou seja de que pagamos muito imposto e recebemos em troca serviccedilos de baixa qualidade

Corroborando com o que foi exposto reportagem do jornal Folha de Satildeo Paulo publicada em

17052013 afirma que o Brasil eacute o campeatildeo da ldquodesigualdade horizontalrdquo isto eacute apresenta a maior

diferenccedila entre o que eacute cobrado a trabalhadores com a mesma renda apenas pelo regime fiscal esco-

lhido A contribuiccedilatildeo de um trabalhador brasileiro que paga o imposto Simples como pessoa juriacutedica eacute

de 38 do rendimento O percentual eacute quase dez vezes inferior ao pago por funcionaacuterio com carteira

assinada (347) Em outros paiacuteses da regiatildeo a diferenccedila chega a ser nula como no Chile ou de menos

de trecircs vezes como no Meacutexico

Esta percepccedilatildeo natildeo passou despercebida por Daacutevio Antonio Prado Zarzana (2010 p 11)

[] Natildeo haacute duacutevida que a carga tributaacuteria eacute muito alta em nosso paiacutes Grita-se contra ela e com razatildeo mas poucos perguntam por que razatildeo ela eacute tatildeo grande A resposta eacute simples essa carga eacute alta porque a despesa eacute alta notando-se que a despesa cor-rente tem crescido continuamente Dessa maneira deve-se voltar as baterias contra a despesa que eacute o alvo certo Enquanto a despesa for alta a carga tributaacuteria natildeo pode ser reduzida Pior ainda agrave despesa alta alia-se a ineficiecircncia da maacutequina admi-nistrativa puacuteblica na qual soacute haacute as exceccedilotildees de praxe E esta alta e improdutiva des-pesa inibe o investimento puacuteblico e tambeacutem o privado este por tabela em resultado da alta carga tributaacuteria

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51 A regressividade da carga tributaacuteria no Brasil

Mais da metade da arrecadaccedilatildeo tributaacuteria no Brasil proveacutem de impostos indiretos e satildeo pagos

por toda a populaccedilatildeo O imposto indireto incide sobre o valor dos bens e mercadorias comercializa-

dos Este tipo de imposto acaba sendo cobrado nos preccedilos desses bens e serviccedilos Assim um cidadatildeo

de baixa renda que compra uma mercadoria paga o mesmo imposto que outro de renda mais alta

O imposto indireto eacute regressivo proporcionalmente agrave renda das famiacutelias Se as famiacutelias de me-

nor renda pagam o mesmo imposto que as de renda mais alta ao consumir um produto entatildeo em

termos do total da renda dessas famiacutelias esse tipo de imposto indireto incide desigualmente sobre a

populaccedilatildeo ndash e por isso eacute chamado de regressivo

6 ALGUMAS SUGESTOtildeES QUE VISAM A TORNAR A TRIBUTACcedilAtildeO MAIS JUSTA

Por tudo o que foi exposto cumpre aqui sugerir alguns pontos que podem resultar na praacutetica

de uma justiccedila fiscal

61 Desonerar a cesta baacutesica

Como vimos a regressividade da tributaccedilatildeo estaacute relacionada ao elevado peso dos tributos in-

diretos no total da carga tributaacuteria Famiacutelias com rendas diferentes acabam pagando igual valor em

tributos embutidos no preccedilo de um mesmo produto Desta forma percebe-se que uma forma de

atenuar este efeito regressivo seria fixar aliacutequotas mais baixas para itens essenciais reduzindo assim

o peso dos tributos para as famiacutelias de menor renda afinal elas gastam a maior parte do orccedilamento

com estes itens entre os quais estatildeo os componentes da cesta baacutesica

Portanto entende-se que a reduccedilatildeo da carga tributaacuteria sobre os preccedilos dos alimentos eacute uma

forma de amenizar a situaccedilatildeo de pobreza em que vivem muitos brasileiros e tornar mais justo o Siste-

ma Tributaacuterio Nacional

62 Tributar os bens supeacuterfluos considerados de luxo

Outra forma de atuar para reduzir a regressividade da tributaccedilatildeo seria aumentar as aliacutequotas

dos tributos que incidem sobre itens supeacuterfluos de luxo ou suntuosos Assim os efeitos de uma deso-

neraccedilatildeo da cesta baacutesica sobre a arrecadaccedilatildeo tributaacuteria seriam compensados ao menos parcialmente

pela maior incidecircncia tributaacuteria sobre bens supeacuterfluos natildeo essenciais

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63 Potencializar a cobranccedila do Imposto de Transmissatildeo de Causa Mortis e Doaccedilotildees

O Imposto de Transmissatildeo de Causa Mortis e Doaccedilotildees (ITCD ou ITCMD) previsto na Consti-

tuiccedilatildeo Federal eacute de competecircncia dos Estados e do Distrito Federal e por esta razatildeo eacute regulamen-

tado pelas diferentes legislaccedilotildees estaduais Ele eacute devido por todas as pessoas fiacutesicas ou juriacutedicas

que receberem bens ou direitos como heranccedila doaccedilatildeo e diferenccedila de partilha e pelo donataacuterio

na transmissatildeo

A aliacutequota do ITCD varia conforme o tipo (doaccedilatildeo ou causa mortis) e o valor transmitido ou

doado atingindo o maacuteximo de 8 de acordo com a Resoluccedilatildeo nordm 9 de 1992 do Senado Federal que

tambeacutem autoriza a progressividade das aliacutequotas conforme o valor da heranccedila

Tornar o ITCD mais progressivo implicaria introduzir mais um elemento de justiccedila em nosso

sistema tributaacuterio Herdeiros com maior capacidade contributiva que recebem heranccedilas significativas

seriam tributados a uma aliacutequota maior do que aqueles que herdam pequenos patrimocircnios Aleacutem

disso possibilitaria tambeacutem elevar a arrecadaccedilatildeo deste imposto e por conseguinte a aplicaccedilatildeo deste

tributo em investimentos puacuteblicos estaduais que poderiam ser igualmente usados em benefiacutecio de

toda a sociedade

64 Aumentar os impostos sobre a propriedade da terra

O Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural (ITR) previsto na Constituiccedilatildeo Federal eacute cobra-

do do proprietaacuterio de imoacutevel rural ou do titular de domiacutenio uacutetil ou possuidor a qualquer tiacutetulo O fato

gerador eacute a propriedade o domiacutenio uacutetil ou a posse de imoacutevel localizado fora da zona urbana Como

no caso anterior o Imposto Territorial Rural gera uma arrecadaccedilatildeo iacutenfima para os cofres puacuteblicos ape-

nas 007 da receita administrada pela Receita Federal do Brasil em 2012 e 004 da Carga Tributaacuteria

Brasileira em 2011

Insta salientar que o ITR eacute essencialmente um imposto direto incidente sobre o patrimocircnio

Uma revisatildeo da tributaccedilatildeo da propriedade rural propondo paracircmetros atualizados para a incidecircncia

do imposto as aliacutequotas e faixas de tributaccedilatildeo o valor da terra os diversos conceitos de aacuterea rural

(aproveitaacutevel utilizaacutevel tributaacutevel etc) contribuiria para elevar a progressividade prevista para este

tributo no paraacutegrafo 4ordm do artigo 153 da Constituiccedilatildeo Federal de forma a promover maior justiccedila tri-

butaacuteria com reduccedilatildeo de desigualdade social

65 Tributaccedilatildeo sobre a remessa de lucros

A remessa de lucros ao exterior das empresas estrangeiras natildeo eacute tributada o que resulta em um

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benefiacutecio questionaacutevel No momento em que o Brasil eacute muito atraente para os capitais internacionais

esta medida estimula a remessa de lucros e natildeo o reinvestimento no proacuteprio paiacutes

Entre as mudanccedilas jaacute realizadas e que favorecem a renda do capital estaacute a isenccedilatildeo de imposto

de renda sobre a remessa de lucros e dividendos ao exterior com impacto econocircmico no balanccedilo de

pagamentos Eacute uma medida de atraccedilatildeo de capital estrangeiro ao paiacutes pois transmite maior seguranccedila

aos investidores quanto agrave remessa dos lucros e dividendos do capital aqui investido Entretanto eacute ne-

cessaacuteria uma reflexatildeo acerca do impacto sobre o saldo de transaccedilotildees correntes do Brasil

Portanto o fim da isenccedilatildeo de IR agrave distribuiccedilatildeo dos lucros e dividendos ao exterior eacute uma alte-

raccedilatildeo necessaacuteria na legislaccedilatildeo tributaacuteria e relevante para fins de justiccedila tributaacuteria no Brasil

66 Cobrar IPVA sobre embarcaccedilotildees e aeronaves

O Imposto sobre a Propriedade de Veiacuteculos Automotores (IPVA) eacute de competecircncia dos Estados

e do Distrito Federal e o fato gerador como o proacuteprio nome diz eacute a propriedade de veiacuteculo auto-

motor As aliacutequotas podem ser diferenciadas de acordo com o tipo de veiacuteculo e a utilizaccedilatildeo Cabe ao

Senado Federal fixar aliacutequotas miacutenimas sobre o valor venal do veiacuteculo

Apesar de tributar a propriedade de veiacuteculos automotores o IPVA natildeo eacute cobrado de quem

possui embarcaccedilotildees e aeronaves (barcos lanchas helicoacutepteros aviotildees etc) Cabe lembrar que o Brasil

eacute o paiacutes com a segunda maior frota de aviotildees executivos e o maior conjunto de helicoacutepteros urbanos

do mundo Os proprietaacuterios geralmente possuem renda ou patrimocircnio elevado e por isso capacidade

maior de contribuir para o financiamento do Estado No entanto isso natildeo acontece por falta de clareza

na legislaccedilatildeo o que levou o Supremo Tribunal Federal a natildeo reconhecer tal cobranccedila

Para que haja justiccedila tributaacuteria e harmonizaccedilatildeo das legislaccedilotildees estaduais eacute necessaacuterio que se

edite e aprove uma lei complementar regulamentando e normatizando nacionalmente o IPVA Esta

lei deve incluir aeronaves e embarcaccedilotildees no conceito de veiacuteculo automotor a fim de eliminar um dos

pontos mais controversos sobre este tributo e ao mesmo tempo contribuir para a promoccedilatildeo de maior

justiccedila fiscal

A ediccedilatildeo de uma resoluccedilatildeo do Senado Federal cumprindo o mandado constitucional de definir

aliacutequotas miacutenimas certamente contribuiria para efeitos da referida harmonizaccedilatildeo

67 Instituir o Imposto sobre Grandes Fortunas

Uma discussatildeo muito atual e com grande apelo na sociedade eacute a instituiccedilatildeo do Imposto sobre

Grandes Fortunas (IGF) no paiacutes de forma que se tenha alguma desconcentraccedilatildeo da riqueza e natildeo

apenas da renda

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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A tributaccedilatildeo sobre grandes fortunas estaacute prevista na Constituiccedilatildeo Federal (artigo 153 VII) e a

Uniatildeo por intermeacutedio do Congresso Nacional pode instituir este imposto definindo o que eacute grande

fortuna o fato gerador as aliacutequotas e a base de caacutelculo entre outros aspectos

A tributaccedilatildeo incidente sobre o patrimocircnio como o IGF opera como um instrumento de corre-

ccedilatildeo de distorccedilotildees distributivas Ao incidir sobre a renda estocada sob forma de bens e direitos este

imposto de fato recai mais sobre as maiores rendas que foram relativamente menos tributadas quando

destinadas ao consumo

68 A cobranccedila da contribuiccedilatildeo de melhoria

Como vimos neste estudo a contribuiccedilatildeo de melhoria eacute o tributo cuja obrigaccedilatildeo tem por fato

gerador uma situaccedilatildeo que representa um benefiacutecio especial auferido pelo contribuinte Assim de-

terminado oacutergatildeo puacuteblico (Uniatildeo Estados Distrito Federal e Municiacutepios) que constroacutei determinada

obra que acarrete valorizaccedilatildeo imobiliaacuteria ao patrimocircnio do particular deveraacute cobrar a contribuiccedilatildeo

de melhoria aos proprietaacuterios dos imoacuteveis (sujeito passivo) que se beneficiaram com a valorizaccedilatildeo

dos seus imoacuteveis Daiacute a justificaccedilatildeo do tributo pelo princiacutepio do enriquecimento sem causa peculiar

ao Direito Privado

Portanto se o Poder Puacuteblico embora agindo no interesse da coletividade emprega recursos

puacuteblicos em obras de grande envergadura que acarreta valorizaccedilatildeo dos imoacuteveis aiacute situados impotildee-se

que este em observacircncia aos princiacutepios de justiccedila e de moralidade restitua parte do benefiacutecio origi-

nado do dinheiro alheio

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Como vimos o Sistema Tributaacuterio Nacional eacute extremamente regressivo visto que tributa exor-

bitantemente aqueles possuidores de menor renda e isso se justifica em grande parte pela opccedilatildeo do

legislador em tributar primordialmente o consumo Assim agindo o Estado brasileiro natildeo concretiza o

princiacutepio constitucional da capacidade contributiva previsto no art 145 paraacutegrafo 1ordm da Carta Magna

o qual determina que o cidadatildeo deve ser tributado na medida de suas riquezas devendo portanto os

mais abastados contribuiacuterem em uma proporccedilatildeo maior

Desta forma o brasileiro espera uma reforma tributaacuteria que desempenhe quatro funccedilotildees baacute-

sicas o financiamento das atividades estatais a redistribuiccedilatildeo justa da renda a equalizaccedilatildeo das desi-

gualdades regionais e a justa reparticcedilatildeo das receitas entre os entes da federaccedilatildeo Afinal a verdadeira

reforma tributaacuteria seria aquela que implicasse reduccedilatildeo da carga tributaacuteria acompanhada de uma boa

dose de justiccedila fiscal

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Neste contexto a busca de um sistema tributaacuterio e fiscal mais justo deve arrecadar recur-

sos progressivamente segundo a capacidade contributiva de pessoas e empresas e gastaacute-los de

modo socialmente mais justo destinando maior parte para a parcela da populaccedilatildeo que mais de-

pende do gasto social

Por outro lado que venha com um sistema tributaacuterio mais progressivo que tribute diferente-

mente e de forma crescente as diferentes faixas de renda viabilizando maior distribuiccedilatildeo da renda

e da riqueza Aleacutem de representar maior justiccedila social estimularia fortemente o desenvolvimento

econocircmico Falar em progressividade da tributaccedilatildeo eacute tambeacutem considerar os aspectos de equidade

do sistema tributaacuterio

Por fim como epiacutetome de tudo o que foi discutido aqui bem como visando a perspectiva de

se concretizar uma melhor distribuiccedilatildeo de renda e objetivando alcanccedilar uma justiccedila fiscal enten-

de-se que a reforma tributaacuteria enseja as seguintes accedilotildees a) a adoccedilatildeo de medidas que simplifiquem

o sistema tributaacuterio b) a reduccedilatildeo da carga tributaacuteria sobre os produtos essenciais (cesta baacutesica) c)

regulamentaccedilatildeo do IGF (Imposto sobre Grandes Fortunas) previsto no artigo 153 inciso VII da CF

d) Tributar os bens supeacuterfluos e de luxo e) potencializar a cobranccedila do Imposto de Transmissatildeo de

Causa Mortis e Doaccedilotildees f) Aumentar os impostos sobre a propriedade da terra g) Tributaccedilatildeo sobre

a remessa de lucros h) Cobrar IPVA sobre embarcaccedilotildees e aeronaves e i) efetivar a cobranccedila da con-

tribuiccedilatildeo de melhoria

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REFEREcircNCIAS

BECKER Alfredo Augusto Becker Teoria Geral do Direito Tributaacuterio 3 ed Satildeo Paulo Lejus 1998

BRASIL oferece o pior retorno em benefiacutecios em comparaccedilatildeo agrave alta carga tributaacuteria Instituto Brasi-leiro de Planejamento Tributaacuterio (IBPT) Disponiacutevel em httpibptcombrhomepublicacaoviewphppublicacao_id=14205amppagina=70gt Acesso em 20 fev 2012

CARRAZZA Roque Antocircnio Curso de Direito Constitucional Tributaacuterio 8 ed Satildeo Paulo Revista dos Tribunais 1996

CARVALHO Paulo de Barros Curso de Direito Tributaacuterio 11 ed Satildeo Paulo Saraiva 1999

MACHADO Hugo de Brito Curso de Direito Tributaacuterio 14 ed Satildeo Paulo Malheiros 1998

______ Direitos Fundamentais do Contribuinte e a Efetividade da Jurisdiccedilatildeo Satildeo Paulo Atlas 2009

MARTINS Ives Gandra da Silva Sistema Tributaacuterio na Constituiccedilatildeo de 1988 Satildeo Paulo Saraiva 1989

______ Exerciacutecio da Cidadania Satildeo Paulo Lex 2007

NOGUEIRA Alberto A reconstruccedilatildeo dos Direitos Humanos da Tributaccedilatildeo Rio de Janeiro Renovar 1997

PAULSEN Leandro Direito Tributaacuterio Constituiccedilatildeo e Coacutedigo Tributaacuterio agrave luz da doutrina e da jurispru-decircncia 12 ed Porto Alegre Livraria do Advogado 2010

SANDEL Michael J Justiccedila o que eacute fazer a coisa certa 6 ed Rio de Janeiro Civilizaccedilatildeo Brasileira 2012

TIPKE Klaus Moral Tributaacuteria do Estado e dos Contribuintes Porto Alegre Sergio Antocircnio Fabris 2012

ZARZANA Daacutevio Antonio Prado O paiacutes dos impostos Satildeo Paulo Saraiva 2010

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TRANSPAREcircNCIA EFICIEcircNCIA E SIMPLICIDADE A SERVICcedilO DA JUSTICcedilA FISCAL PROPOSTAS SUTIS DE REFORMAS TRIBUTAacuteRIAS1

SUMAacuteRIO Introduccedilatildeo 1 Sistema tributaacuterio em busca da transparecircncia efici-ecircncia e simplicidade 2 Medidas pragmaacuteticas de alcance da transparecircncia da eficiecircncia e da simplicidade no Sistema Tributaacuterio Brasileiro a busca pela jus-ticcedila fiscal a partir de reformas tributaacuterias pontuais 21 Eficiecircncia transparecircncia e simplificaccedilatildeo na tributaccedilatildeo sobre bens imoacuteveis no Brasil a justiccedila fiscal a partir da atuaccedilatildeo coordenada dos entes poliacuteticos 22 Eficiecircncia transparecircncia e simplificaccedilatildeo na tributaccedilatildeo incidente sobre a atividade empresarial brasileira como medida de justiccedila fiscal Consideraccedilotildees finais Referecircncias

Fernanda Mara de Oliveira Macedo Carneiro Pacobahyba2

INTRODUCcedilAtildeO

Ao se intentar analisar o Sistema Tributaacuterio brasileiro algumas medidas se revelam assaz impor-tantes tendo em vista a proacutepria necessidade de delimitar cada um dos termos da pesquisa A primeira providecircncia entatildeo eacute identificar no contexto doutrinaacuterio o proacuteprio conceito de sistema a fim de defi-nir a exata noccedilatildeo aplicaacutevel agrave tributaccedilatildeo Dessa forma a composiccedilatildeo e os delineamentos do sistema tributaacuterio posto partem de um olhar que se estrutura a partir da Constituiccedilatildeo Federal de 1988 enquanto foco irradiante dos mais relevantes vetores que devem conduzir a atividade administrativa tributaacuteria com vistas a legitimar sua atuaccedilatildeo de arrecadaccedilatildeo dos valores imprescindiacuteveis agrave manutenccedilatildeo da maacutequina estatal respeitando-se os direitos fundamentais dos contribuintes Na esteira desse imenso desafio eacute que se faz imperativa a busca de harmonizaccedilatildeo de toda a legislaccedilatildeo tributaacuteria aos conceitos de transparecircncia eficiecircncia e simplicidade os quais atingem plena-mente a efetivaccedilatildeo de uma poliacutetica tributaacuteria e natildeo meramente uma poliacutetica arrecadatoacuteria Contudo por se tratar de medidas que visam a dinamizar o sistema posto deve-se buscar o mais urgentemente possiacutevel a conciliaccedilatildeo da teoria agrave praacutetica a fim de se visualizar medidas praticaacuteveis em que efetivem as tatildeo almejadas eficiecircncia transparecircncia e simplicidade O objetivo desse trabalho eacute portanto investigar os aspectos conceitualmente erigidos acerca do Sistema Tributaacuterio brasileiro nessa busca incessante por justiccedila fiscal efetivaccedilatildeo de verdadeira po-liacutetica tributaacuteria e respeito aos direitos fundamentais dos contribuintes passando pela transparecircncia eficiecircncia e simplificaccedilatildeo

1 Artigo adaptado a partir do conteuacutedo da monografia intitulada ldquoSistema Tributaacuterio em busca da transparecircncia eficiecircncia e simplificaccedilatildeordquo vencedora do Precircmio Hugo de Brito Machado no ano de 20132 Mestre em Direito Constitucional pela Universidade de Fortaleza (Unifor) Especialista em Direito Empresarial pela Uni-versidade Estadual do Cearaacute (Uece) Professora universitaacuteria Auditora Fiscal Juriacutedica da Receita Estadual do Cearaacute E-mail fernandamarasefazcegovbr pacmara9yahoocombr

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Em um primeiro momento seratildeo discutidos os contornos dos institutos mais importantes re-lativos agrave temaacutetica para em um momento posterior apresentar medidas com alto iacutendice de pratica-bilidade e que promovam os valores mais elevados descritos na CF88 a partir da reestruturaccedilatildeo dos procedimentos a serem impostos pelos entes tributantes e que visem a racionalizar o processo de arrecadaccedilatildeo dos tributos e cumprimento de obrigaccedilotildees acessoacuterias

1 SISTEMA TRIBUTAacuteRIO EM BUSCA DE TRANSPAREcircNCIA EFICIEcircNCIA E SIMPLICIDADE

Em uma tentativa de se flagrar o Sistema Tributaacuterio Nacional especialmente na busca que se reveste deveras importante da transparecircncia da eficiecircncia e da simplicidade o termo sistema com que se inicia o estudo haacute de ser delimitado evitando-se assim a ambiguidade ou a vagueza das palavras (ROSS 2007) que tanto podem prejudicar a elaboraccedilatildeo de um trabalho cientiacutefico Dessa forma sistema deve ser compreendido

como o objeto de porccedilotildees que se vinculam debaixo de um princiacutepio unitaacuterio ou como a composiccedilatildeo de partes orientadas por um vetor comum Onde houver um conjunto de elementos relacionados entre si e aglutinados perante uma referecircncia determi-nada teremos a noccedilatildeo fundamental de sistema [] as normas juriacutedicas formam um sistema na medida em que se relacionam de vaacuterias maneiras segundo um princiacutepio unificador (CARVALHO 2012 p 68-69 e 76)

Com isso falar-se em sistema tributaacuterio brasileiro remonta ao elemento mais importante sob o qual se estrutura tal conjunto qual seja na atualidade a Constituiccedilatildeo Federal de 1988 fazendo-se a ressalva de que soacute se pode afirmar a existecircncia de ldquosistemardquo em sentido moderno a partir da Emenda Constitucional nordm 18 de 1965 (MACHADO 2011 p 273) Contudo como o proacuteprio conceito acima deixa transparecer o sistema enquanto entidade complexa possui diversos outros elementos que se relacionam sendo fundamental que todos eles sejam orientados por um ldquovetor comumrdquo Na doutrina brasileira desde 1951 com Aliomar Baleeiro passando por Sampaio Doacuteria Geraldo Ataliba Roque Antocircnio Carrazza Souto Maior Borges e Ameacuterico Lacombe dentre outros tem-se um histoacuterico de desenvolvimento da noccedilatildeo relativa ao sistema tributaacuterio culminando na apropriaccedilatildeo de conceitos abrangentes como o de dignidade humana e de seguranccedila juriacutedica dentre outros os quais comprovam a constante evoluccedilatildeo da mateacuteria (AacuteVILA 2010 p 18-21) Assim ao se falar em busca da transparecircncia da eficiecircncia e da simplicidade no sistema tribu-taacuterio brasileiro natildeo se pode tentar localizar tais caracteres exclusivamente no Texto Fundamental de-vendo tais signos serem a tocircnica de toda a legislaccedilatildeo tributaacuteria vigente no paiacutes seja na esfera federal estadual municipal ou distrital bem como de toda a atuaccedilatildeo estatal desde os Chefes dos Poderes ateacute o servidor mais recentemente admitido ao serviccedilo puacuteblico Partindo-se do fato de que o sistema seraacute tratado em seu conceito abrangente e jaacute que se destacou alguns signos relevantes na estruturaccedilatildeo deste trabalho faz-se fundamental tambeacutem que se admita agrave presente anaacutelise o significado daquilo que se busca encontrar afinal de que se trata ao se falar em transparecircncia eficiecircncia e simplicidade Corresponderia a um conjunto de instrumentos

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utilizados para se atingir a tributaccedilatildeo adequada ou de metas a serem alcanccediladas pela tributaccedilatildeo Comeccedilando-se pelo conceito mais facilmente operaacutevel mas natildeo menos denso em virtude de estar expliacutecito na CF88 a partir da redaccedilatildeo dada pela Emenda Constitucional nordm 19 de 1998 tem-se a eficiecircncia como um dos princiacutepios a serem obedecidos pela administraccedilatildeo puacuteblica direta e indireta de qualquer dos poderes da Uniatildeo dos Estados do Distrito Federal e dos Municiacutepios3 Trata-se de conceito amplamente explorado pelos doutrinadores administrativistas e que ainda pouco reverbera entre os tributaristas4 Deve-se destacar ainda que se encontram superadas discussotildees acerca da autonomia didaacutetica e cientiacutefica do Direito Tributaacuterio tendo em conta este haver brotado do Direito Administrativo proble-maacutetica que poderia ser reenfatizada a partir da redaccedilatildeo do art 37 da CF88 Nesse ponto ao se falar em administraccedilatildeo puacuteblica a qual deve curvar-se agrave eficiecircncia nos termos do art 37 natildeo restam duacutevidas de que a administraccedilatildeo tributaacuteria encontra-se plenamente submetida a esse princiacutepio5 Assim dito a eficiecircncia consistiria ldquono desempenho concreto das atividades necessaacuterias agrave pres-taccedilatildeo das utilidades materiais de molde a satisfazer necessidades dos usuaacuterios com imposiccedilatildeo do menor encargo possiacutevel inclusive do ponto de vista econocircmicordquo (JUSTEN FILHO 1997 p 124) Dessa forma vincula-se tal ideia ao atingimento dos objetivos com o menor custo ou do modo menos one-roso possiacutevel Como manifestaccedilotildees desse princiacutepio agregar-se-iam ainda os princiacutepios da seguranccedila e da atualidade (PORTO NETO 1998 p 89) Pelo princiacutepio da seguranccedila adotar-se-iam as teacutecnicas conhecidas e todas as cautelas e pro-videcircncias possiacuteveis para em face das circunstacircncias reduzir o risco de danos Jaacute pela atualidade os serviccedilos puacuteblicos obrigar-se-iam a uma constante atualizaccedilatildeo tecnoloacutegica inclusive para autorizar o exerciacutecio de poderes de modificaccedilatildeo extinccedilatildeo unilateral da concessatildeo ou aplicaccedilatildeo das sanccedilotildees con-tratuais previstas (GROTTI 2006 p 60) Entretanto Celso Antocircnio Bandeira de Mello (2010 p 122) ressalva que a eficiecircncia na Admi-nistraccedilatildeo Puacuteblica natildeo pode se apartar jamais do princiacutepio da legalidade em virtude de que este se configura no dever administrativo por excelecircncia6 Ao concluir o raciociacutenio o jurista finca as bases histoacutericas de tal princiacutepio

3 Constituiccedilatildeo Federal de 1988 art 37 caput4 Aqui se deve fazer referecircncia ao XXXI Simpoacutesio Nacional de Direito Tributaacuterio realizado no ano de 2006 e cujos trabalhos foram coordenados pelo jurista Ives Gandra da Silva Martins Por ocasiatildeo do evento foi publicada obra intitulada ldquoPrinciacutepio da eficiecircncia em mateacuteria tributaacuteriardquo que de forma ineacutedita tratou especificamente de tal questatildeo aplicaacutevel aos tributos Aleacutem de tal obra as conclusotildees do evento se encontram disponiacuteveis na Revista de Doutrina do Tribunal Regional Federal da 4ordf Regiatildeo Disponiacutevel em lthttpwwwrevistadoutrinatrf4jusbrindexhtmhttpwwwrevistadoutrinatrf4jusbrartigosedicao016Ives_Martinshtmgt Acesso em 5 out 20135 Aqui se pode fazer referecircncia a Alfredo Augusto Becker o qual ressalta a autonomia didaacutetica do Direito tributaacuterio con-trapondo-se a AD Gianinini e G Zanobini por ele citados os quais ressaltariam ldquoa lsquoautonomiarsquo apenas didaacutetica do Direito Tributaacuterio para consideraacute-la um ramo do Direito Administrativo do qual deve ser destacado para fins didaacuteticos e de tra-balho cientiacutefico esquecem-se que tambeacutem o Direito Administrativo goza de uma lsquoautonomiarsquo apenas didaacuteticardquo (BECKER 2010 p 31)6 Identicamente a tal raciociacutenio Hugo de Brito Machado (2011 p 44) adverte que ldquonatildeo se deve admitir que os princiacutepios da legalidade e da anterioridade da lei tributaacuteria que satildeo garantias do contribuinte sejam simplesmente minimizados ou descartadosrdquo

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O fato eacute que o princiacutepio da eficiecircncia natildeo parece ser mais do que uma faceta de um princiacutepio mais amplo jaacute superiormente tratado de haacute muito no Direito italiano o prin-ciacutepio da boa administraccedilatildeo Este uacuteltimo significa como resulta das liccedilotildees de Guido Falzone em desenvolver a atividade administrativa do modo mais congruente mais oportuno e mais adequado aos fins a serem alcanccedilados graccedilas agrave escolha dos meios e da ocasiatildeo de utilizaacute-los concebiacuteveis como os mais idocircneos para tanto Tal dever como assinala Falzone natildeo se potildee simplesmente como um dever eacutetico ou como mera aspiraccedilatildeo deontoloacutegica senatildeo como um dever atual e estritamente juriacutedico (MELLO 2010 p 122)

Aproximando-se da eficiecircncia em mateacuteria tributaacuteria a qual carrega os caracteres ateacute agora expostos pode-se dizer que esta compreende a ldquoadoccedilatildeo de poliacutetica tributaacuteria com mecanismos e instrumentos legais capazes de gerar desenvolvimento e justiccedila fiscalrdquo (MARTINS 2007) Trata-se de conceituaccedilatildeo ampliada e que vem a agregar outros valores tambeacutem insertos no texto constitucional focando em medidas que visem ao estabelecimento de uma poliacutetica tributaacuteria7 e natildeo meramente uma poliacutetica arrecadatoacuteria8 Sob tal oacutetica eacute que se erige o conceito de eficiecircncia do Sistema Tributaacuterio brasileiro presente-mente discutido na qual existe um equiliacutebrio entre as necessidades do Estado e os direitos dos contri-buintes9 Trata-se de corte conceitual que se faraacute deveras importante quando da anaacutelise a seguir de algumas medidas pragmaacuteticas para efetividade de tal princiacutepio em sede de tributaccedilatildeo A seguir instados a discorrer acerca da transparecircncia deve-se destacar que tal vocaacutebulo remon-ta a outra ideia bastante difundida no Direito Consumerista portanto na esfera privada e que pertine ao direito agrave informaccedilatildeo10 Assim estando de posse de todas as informaccedilotildees acerca de determinado produto ou da prestaccedilatildeo de um serviccedilo em tese instaurar-se-ia uma relaccedilatildeo transparente entre usu-aacuterioconsumidor e empresa Aprofundando-se a temaacutetica e buscando suas raiacutezes no Estado Democraacutetico de Direito pode-se identificar duas ordens de valores a que este se submete agrave vontade democraticamente definida e agrave vontade juridicamente positivada Esta como jaacute se viu ao se tratar da eficiecircncia representa submissatildeo ao princiacutepio da legalidade Jaacute no tocante agrave vontade democraticamente expressa positivada ou natildeo

7 ldquoPoliacutetica Tributaacuteria eacute o estabelecimento de paracircmetros para o exerciacutecio do poder impositivo que levem em conta de um lado as necessidades do Estado na prestaccedilatildeo de atividades puacuteblicas e de outro os limites ao poder de tributar e os direi-tos dos contribuintes Segundo a Constituiccedilatildeo tem por finalidades a justiccedila fiscal e o desenvolvimento do paiacutesrdquo (MARTINS 2007)8 ldquoJaacute poliacutetica de arrecadaccedilatildeo tambeacutem sob o prisma da eficiecircncia diz respeito ao manejo dos instrumentos arrecadatoacuterios de forma a natildeo desvirtuar os vetores e as finalidades da poliacutetica tributaacuteria e natildeo mero aumento da carga tributaacuteria muitas vezes em detrimento dos valores fundamentais ao Estado de Direitordquo (MARTINS 2007)9 Aqui vale a transcriccedilatildeo de trecho de obra especialmente dedicada ao estudo dos direitos dos contribuintes na qual Hugo de Brito Machado (2009 p 27) acresce o importante fator de aceitaccedilatildeo do papel de contribuinte o qual soacute pode ser impu-tado quando se tem o que ele denomina de ldquoconsciecircncia fiscalrdquo ldquoPara que todos os cidadatildeos se sintam contribuintes o que falta eacute a denominada consciecircncia fiscal a consciecircncia de que a carga tributaacuteria natildeo pesa apenas nos ombros de quem tem o dever legal de efetuar o pagamento dos tributos mas tambeacutem sobre os ombros de quem como comprador ou tomador de serviccedilos paga um preccedilo no qual estatildeo embutidos os tributosrdquo10 Conforme Cabana (2006 p 255) na Carta de Proteccedilatildeo do Consumidor do Conselho da Europa de 1751973 reconhe-ceu-se a informaccedilatildeo como um dos direitos baacutesicos do consumidor Na Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas a Resoluccedilatildeo da Assembleia-Geral 30248 de 1641985 a qual cuida de Diretrizes para a Proteccedilatildeo do Consumidor determina que eacute neces-saacuterio promover o acesso dos consumidores agrave informaccedilatildeo (art 3ordm)rdquo

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encontra-se esta situada no campo mais vasto da legitimidade princiacutepio substantivo especiacutefico do Direito Puacuteblico que informa particularmente o Direito Constitucional (MOREIRA NETO 2006 p 82) Dessa forma como preacute-requisito de uma relaccedilatildeo legitimamente estruturada a transparecircncia insere-se como o caminho necessaacuterio a ser trilhado pelos debates poliacuteticos

impregando toda a estrutura do Estado democraacutetico passa a ser necessariamente informativa em maior ou menor grau de toda sua accedilatildeo conforme o grau de discri-cionariedade de decisatildeo aberto pela Constituiccedilatildeo e pelas leis do Paiacutes aos legisladores administradores ou mesmo aos juiacutezes Eacute essa vontade geral popular em uacuteltima anaacute-lise a definitoacuteria dos interesses puacuteblicos que deve ser atendida pela accedilatildeo do Estado especialmente em sua atividade administrativa A fidelidade da accedilatildeo dos Poderes Puacute-blicos agrave vontade do povo democraticamente manifestada que Maurice Duverger tem como uma conformidade da accedilatildeo do Estado com a teoria do poder que se tem como verdadeira qualifica essas accedilotildees agentes governos e os proacuteprios regimes segundo atendam ou natildeo aos interesses da sociedade (MOREIRA NETO 2006 p 82)11

Isto posto agora na seara tributaacuteria a transparecircncia haacute de ser meta a ser alcanccedilada bem como vetor a ser empregado diuturnamente pelas administraccedilotildees tributaacuterias ampliando-se as possibilida-des de debates poliacuteticos acerca dos rumos da tributaccedilatildeo e oportunizando o conhecimento por toda a sociedade das medidas fiscais adotadas mormente diante das imensas possibilidades a partir da utilizaccedilatildeo dos meios tecnoloacutegicos Em virtude do atual estaacutegio evolutivo da sociedade brasileira democraticamente estrutura-da a partir de 1988 natildeo haacute como se construir uma relaccedilatildeo legiacutetima sem que haja transparecircncia na atuaccedilatildeo dos agentes puacuteblicos bem como de todos os dados acerca da arrecadaccedilatildeo e da execuccedilatildeo orccedilamentaacuteria os quais demonstrem apego agraves finalidades eleitas pelo texto constitucional e busca-das por toda a comunidade Haacute de se compreender ainda que a transparecircncia haacute de pautar toda a atividade legiferante especialmente ao se tratar das ldquoquase semprerdquo (para natildeo dizer apenas ldquosemprerdquo) complexas confusas e abundantes legislaccedilotildees tributaacuterias12 que muitas vezes encobrem engodos difiacuteceis de serem desven-dados pelos contribuintes Da mesma forma se se busca uma poliacutetica tributaacuteria transparente natildeo se pode admitir a concessatildeo de benefiacutecios e incentivos fiscais agraves escuras os quais rompem com a eacutetica que haacute de haver entre as unidades federadas fissurando o princiacutepio federativo13

11 Aqui se deve fazer um aparte para explicitar o amplo movimento da sociedade brasileira que eclodiu a partir de junho de 2013 em praticamente todas as capitais do paiacutes e que demonstram um alto grau de insatisfaccedilatildeo dos cidadatildeos com as poliacuteticas econocircmicas fiscais e sociais adotadas pelo Governo A partir de um discurso apartidaacuterio as pessoas clamam por maior transparecircncia dos gastos puacuteblicos reduccedilatildeo no niacutevel de corrupccedilatildeo cominaccedilatildeo de penas mais severas aos maus ad-ministradores dentre outros pontos Nesse tocante deve-se buscar essa ampliaccedilatildeo do debate poliacutetico de que trata o autor como forma de legitimar as decisotildees tomadas pelos governantes e atender aos interesses da sociedade12 Tal situaccedilatildeo jaacute foi exposta por Alfredo Augusto Becker (2010 p 3-7) sob a expressatildeo ldquomanicocircmio juriacutedico-tributaacuteriordquo emprestada de Lello Gangemi Professor Catedraacutetico da Universidade de Naacutepoles que expressa a profusatildeo de leis tributaacute-rias bem como uma doutrina desconexa e complicada 13 Conforme jaacute defendi em alguns artigos cientiacuteficos publicados tal ideia aplica-se mais apropriadamente agrave chamada ldquoGuerra Fiscalrdquo do ICMS na qual os Estados e o Distrito Federal em uma atitude de afronta agrave eacutetica que deveria reger as suas relaccedilotildees (o que normalmente acontece agraves espreitas tambeacutem ridicularizando a transparecircncia que haacute de ser buscada nas relaccedilotildees tributaacuterias) editam decretos que contrariam acordos inicialmente firmados ou mesmo concedem benefiacutecios e incentivos fiscais agrave revelia do Conselho Nacional de Poliacutetica Fazendaacuteria (Confaz) o que afronta a proacutepria redaccedilatildeo constitu-cional (art 155 sect 2ordm inc XII aliacutenea g) Dentre todos cite-se PACOBAHYBA 2011

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Conforme apontado por Grupenmacher (2012 p 45) ldquoa adoccedilatildeo de uma postura eacutetica por parte do contribuinte verifica-se sobretudo com o adimplemento das obrigaccedilotildees tributaacuterias O Estado por seu turno atua eticamente quando ao exercer o poder de imposiccedilatildeo tributaacuteria observa fielmente os direitos e garantias do contribuinterdquo Com isso como forma de se agregar em um conceito a transparecircncia que se defenderaacute no sis-tema tributaacuterio brasileiro pode-se dizer que esta representa o conjunto de instrumentos a serem uti-lizados pelos fiscos com vistas a oportunizar agrave sociedade o conhecimento integral e irrestrito de toda a atuaccedilatildeo concernente ao atingimento das metas de poliacutetica tributaacuteria Ademais a transparecircncia seraacute tambeacutem a meta a ser alcanccedilada por tais administraccedilotildees ao se afirmarem como expressatildeo do princiacutepio democraacutetico Por fim mas natildeo menos importante resta agora tratar acerca da simplicidade aqui tomada sob o vieacutes da simplificaccedilatildeo Longe de parecer reducionista a simplificaccedilatildeo parece atrelar-se visceralmente agrave chamada ldquoburocraciardquo revelando-se como um antiacutedoto contra os procedimentos lentos e repetitivos ainda adotados pela Administraccedilatildeo Puacuteblica14 Conforme apontou Philippe Beaugonin (1977 p 13-14)

A simplificaccedilatildeo e o aperfeiccediloamento dos trabalhos administrativos soacute satildeo possiacuteveis se os estudos forem conduzidos de acordo com um meacutetodo Este meacutetodo deve permitir a supressatildeo ou pelo menos a diminuiccedilatildeo do desperdiacutecio de material de mateacuteria de tempo de espaccedilo e de energia provocado pelo consumo destes elementos na execuccedilatildeo de um determinado trabalho O resultado final deve ser o da utilizaccedilatildeo de um meacutetodo de trabalho mais simples mais raacutepido e mais seguro do que o utilizado anteriormente

Dessa forma a simplificaccedilatildeo do sistema tributaacuterio nacional pertine agrave necessaacuteria racionalizaccedilatildeo dos processos agrave revisatildeo dos meacutetodos e procedimentos impostos agrave adoccedilatildeo pelos contribuintes para cumprir suas obrigaccedilotildees tributaacuterias Nesse ponto em consonacircncia com a biparticcedilatildeo de tais obrigaccedilotildees empreendida pelo art 113 do Coacutedigo Tributaacuterio Nacional haacute de se fazer algumas ressalvas A primeira delas consiste em algo que parece inverter toda a loacutegica esperada de uma poliacutetica tributaacuteria afinando-se mais ao conceito de poliacutetica arrecadatoacuteria o cumprimento das obrigaccedilotildees tri-butaacuterias acessoacuterias15 no Brasil parece ter se tornado mais relevante do que o proacuteprio cumprimento das obrigaccedilotildees principais16

14 Aqui se pode citar importante programa que visa a simplificar o procedimento de desembaraccedilo aduaneiro de impor-taccedilatildeo e de exportaccedilatildeo adotado pelo Governo brasileiro a ser implementado gradualmente a partir de dezembro de 2013 Denominado de projeto ldquoPorto sem papelrdquo a medida adotada pela Uniatildeo visa a reduzir o tempo de espera nos portos brasileiros aproximando-se de um padratildeo internacional condizente com uma grande economia do mundo tendo em vista o desperdiacutecio de dinheiro ao se levar a uma repeticcedilatildeo de procedimentos desnecessaacuterios por parte dos importadoresex-portadores bem como pelos proacuteprios fiscais Apenas a tiacutetulo de exemplo uma mercadoria a ser internalizada no mercado brasileiro pode ser inspecionada pela Receita Federal do Brasil pela Vigilacircncia Sanitaacuteria pela Poliacutecia Federal dentre outros Para cada uma dessas fiscalizaccedilotildees exige-se o preenchimento de formulaacuterios despadronizados e que compreendem no mais das vezes as mesmas informaccedilotildees configurando-se uma repeticcedilatildeo absurda e odiosa que gera custos desnecessaacuterios A partir do inovador projeto simplificam-se os procedimentos e padronizam-se as obrigaccedilotildees acessoacuterias o que vem a partir do estudo dos meacutetodos adotados no processo do Comeacutercio Exterior Dentre outras pode-se citar interessante mateacute-ria disponiacutevel no site httpwwwcntorgbrPaginasAgencia_Noticiaaspxn=6402 Acesso em 23 out 2013

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Esse fato torna-se extremamente relevante de ser discutido tendo em vista que conforme es-tudos empreendidos pela proacutepria Consultoria Legislativa da Cacircmara dos Deputados chega-se a resul-tados absurdos de posicionamento do Brasil em relaccedilatildeo a outros paiacuteses do mundo ao se considerar o custo para se atender agraves obrigaccedilotildees acessoacuterias

No quesito ldquoNuacutemero de Horas Gastasrdquo o Brasil ocupa a pior posiccedilatildeo do ranking a 183ordf colocaccedilatildeo Segundo a PwC a empresa brasileira dispende anualmente 2600 horas para cumprir com suas obrigaccedilotildees fiscais mais que o dobro da penuacuteltima colocada ndash a Boliacutevia ndash onde gastam-se 1080 horas () De fato isso pode estar prejudicando o que-sito ldquoPeso da Tributaccedilatildeo em relaccedilatildeo aos Lucrosrdquo no qual a posiccedilatildeo do Brasil tambeacutem eacute bem ruim 168ordf colocaccedilatildeo estimando-se que os tributos nacionais representem 671 do lucro da empresa (SOARES 2012 p 5-6)

A segunda ressalva que atine agrave simplificaccedilatildeo indica que o cumprimento das obrigaccedilotildees tribu-taacuterias torna-se irracional pela falta de compartilhamento de informaccedilotildees entre as proacuteprias entidades tributantes17 o que revela um federalismo construiacutedo agrave base da desconfianccedila entre os entes o que culmina em repeticcedilatildeo indevida de dados a serem disponibilizados pelos contribuintes bem como al-canccedila uma ineficiecircncia cabal no desenvolvimento da poliacutetica tributaacuteria18 Como se veraacute a seguir ao se tratar das medidas praacuteticas especialmente em se tratando dos tributos que incidem sobre bens imoacuteveis haacute um completo descaso e muitas vezes um subjetivismo por parte da Administraccedilatildeo que poderia ser contornado a partir do compartilhamento de informaccedilotildees entre os proacuteprios entes recolhendo os valores que se fazem necessaacuterios ao Estado e respeitando-se os direitos dos contribuintes Com tudo isso finalizando as referecircncias que seratildeo fundamentais para a construccedilatildeo das me-didas pragmaacuteticas pode-se resumir que a simplificaccedilatildeo do sistema tributaacuterio brasileiro passa pela adoccedilatildeo de meacutetodos racionais para o cumprimento das obrigaccedilotildees tributaacuterias sejam principais ou acessoacuterias evitando-se a indesejada burocratizaccedilatildeo de procedimentos e a agregaccedilatildeo de custos ou ocircnus financeiros desnecessaacuterios

15 CTN art113 sect 2ordm A obrigaccedilatildeo acessoacuteria decorre da legislaccedilatildeo tributaacuteria e tem por objeto as prestaccedilotildees positivas ou negativas nela previstas no interesse da arrecadaccedilatildeo ou da fiscalizaccedilatildeo dos tributos16 CTN art113 sect 1ordm A obrigaccedilatildeo principal surge com a ocorrecircncia do fato gerador tem por objeto o pagamento de tributo ou penalidade pecuniaacuteria e extingue-se juntamente com o creacutedito dela decorrente17 Aqui vale transcrever excerto da Constituiccedilatildeo Federal o qual representa um avanccedilo ainda natildeo efetivado plenamente pe-las Administraccedilotildees Tributaacuterias ldquoArt 37 inciso XXII - as administraccedilotildees tributaacuterias da Uniatildeo dos Estados do Distrito Federal e dos Municiacutepios atividades essenciais ao funcionamento do Estado exercidas por servidores de carreiras especiacuteficas teratildeo recursos prioritaacuterios para a realizaccedilatildeo de suas atividades e atuaratildeo de forma integrada inclusive com o compartilhamento de cadastros e de informaccedilotildees fiscais na forma da lei ou convecircniordquo (destacado)18 Deve-se fazer referecircncia aqui ao Programa de Simplificaccedilatildeo do Sistema Tributaacuterio coordenado pela Associaccedilatildeo Comer-cial de Satildeo Paulo e subscrito pelo Instituto Brasileiro de Eacutetica Concorrencial (ETCO) e entregue agrave Presidenta Dilma Roussef com trecircs medidas conectadas e que ldquoservem para simplificar e agilizar processos dar maior seguranccedila juriacutedica alterar alguns dispositivos do Coacutedigo Tributaacuterio Nacional e adequar a legislaccedilatildeo agraves demandas atuais do Brasilrdquo Mateacuteria disponiacutevel em wwwetcoorgbrnoticiasetco-informaetco-subscreve-programa-de-simplificacao-do-sistema-tributario-entregue--a-dilma-rousseff Acesso em 24 out 13

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2 MEDIDAS PRAGMAacuteTICAS DE ALCANCE DA TRANSPAREcircNCIA DA EFICIEcircNCIA E DA SIM-PLICIDADE NO SISTEMA TRIBUTAacuteRIO BRASILEIRO A BUSCA PELA JUSTICcedilA FISCAL A PARTIR DE REFORMAS TRIBUTAacuteRIAS PONTUAIS

Ultrapassadas as questotildees estritamente doutrinaacuterias e de recorte dos significados fundamen-tais a serem desenvolvidos no presente trabalho partir-se-aacute para os delineamentos gerais de duas medidas praacuteticas que caso adotadas podem efetivar a transparecircncia a eficiecircncia e a simplicidade no Sistema Tributaacuterio brasileiro A importacircncia dessa apresentaccedilatildeo se daacute em virtude de que conforme se viu acima o atingi-mento de tais objetivos soacute se opera eficazmente a partir da adoccedilatildeo de padrotildees diferenciados pela administraccedilatildeo puacuteblica evidenciando esforccedilos no sentido de alcanccedilar uma real poliacutetica tributaacuteria e natildeo meramente uma poliacutetica arrecadatoacuteria Para tanto as medidas praacuteticas indicaratildeo dois pontos fundamentais do sistema e que represen-tam verdadeiras incongruecircncias decorrentes da estruturaccedilatildeo da tributaccedilatildeo no Brasil especificamente a partir do desenho constitucional as quais se aprofundam pelo que aqui jaacute foi denominado de ldquofedera-lismo da desconfianccedilardquo19 a primeira dessas medidas envolve a tributaccedilatildeo de bens imoacuteveis e a segunda delas envolve uma parcela da tributaccedilatildeo incidente sobre as empresas

21 Eficiecircncia transparecircncia e simplificaccedilatildeo na tributaccedilatildeo sobre bens imoacuteveis no Brasil a justiccedila fiscal a partir da atuaccedilatildeo coordenada dos entes poliacuteticos

Uma das primeiras incongruecircncias que podem ser apontadas no sistema tributaacuterio brasileiro refere-se agrave tributaccedilatildeo que envolve bens imoacuteveis De acordo com a estruturaccedilatildeo de competecircncias prevista nos arts 153 155 e 156 os seguintes impostos possuem conexatildeo com bens imoacuteveis consi-derando-se a construccedilatildeo do criteacuterio material das respectivas regras-matrizes de incidecircncia20 Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural (ITR) Imposto sobre a Transmissatildeo Causa Mortis e Doaccedilatildeo (ITCD) Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU) e Imposto sobre a Transmissatildeo Inter Vivos a qualquer tiacutetulo por ato oneroso de bens imoacuteveis por natureza ou acessatildeo fiacutesica e de direitos reais sobre imoacuteveis exceto os de garantia bem como cessatildeo de direitos a sua aquisiccedilatildeo (ITBI)

19 Como exemplo de situaccedilatildeo que expressa essa desconfianccedila entre os entes pode-se citar o penoso processo de im-plementaccedilatildeo do Simples Nacional no Brasil em especial pela forma de arrecadaccedilatildeo a partir de documento uacutenico o qual revolucionou os sistemas ateacute entatildeo desenvolvidos pela Receita Federal do Brasil Conforme relata Silas Santiago ldquonatildeo havia paralelo desse modelo no sistema de arrecadaccedilatildeo federal e isso com certeza influenciou positivamente a RFB na busca de melhores soluccedilotildees para sua arrecadaccedilatildeo proacutepria Eacute preciso salientar que Estados e Municiacutepios nutriam grande desconfianccedila com relaccedilatildeo agrave Receita Federal do Brasil e esse sentimento durou um tempo que parecia nunca terminar Houve muitos e desagradaacuteveis conflitos principalmente no primeiro ano Eles imaginavam que a RFB iria dominar as accedilotildees e as decisotildees no Simples Nacional e teriam necessariamente de mostrar forccedila principalmente no iniacutecio do processordquo (SANTIAGO 2011 p 18)20 A regra-matriz de incidecircncia tributaacuteria eacute conceito inovador concebido por Paulo de Barros Carvalho e que pode ser assim identificado ldquoA construccedilatildeo da regra-matriz de incidecircncia como instrumento metoacutedico que organiza o texto bruto do direito positivo propondo a compreensatildeo da mensagem legislada num contexto comunicacional bem concebido e racio-nalmente estruturado eacute um subproduto da teoria da norma juriacutedica o que significa reconhecer tratar-se de contribuiccedilatildeo efetiva da Teoria Geral e da Filosofia do Direito expandindo as fronteiras do territoacuterio cientiacuteficordquo (CARVALHO 2009 p 146)

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Quanto ao primeiro deles o ITR de competecircncia federal a CF88 possibilitou que os Municiacute-pios que assim desejarem celebrem convecircnio com a Uniatildeo com vistas a fiscalizar e cobrar o imposto desde que natildeo implique reduccedilatildeo do valor a pagar ou qualquer outra forma de renuacutencia Trata-se de medida que visa a estimular a cobranccedila de um tributo que possui dificuldades operacionais para sua implementaccedilatildeo em virtude da extensatildeo territorial brasileira imagine-se a imen-sidatildeo de imoacuteveis rurais no paiacutes muitos deles distantes de qualquer formalizaccedilatildeo junto aos oacutergatildeos competentes e que anualmente precisam ser reavaliados para fins de cobranccedila do ITR Ademais outro aspecto visado eacute fornecer agravequeles municiacutepios que se interessam pela medida fonte de arrecadaccedilatildeo originariamente natildeo prevista21

A reparticcedilatildeo da receita tributaacuteria do ITR entre a Uniatildeo e os Municiacutepios (50 para a Uniatildeo e 50 para o Municiacutepio em que situado o imoacutevel) fica alterada na hipoacutetese de opccedilatildeo do Municiacutepio pela fiscalizaccedilatildeo e cobranccedila de que trata este inciso (referindo-se ao incIII sect4ordm art 153 CF88) cabendo entatildeo ao Municiacutepio a totalidade da receita relativa ao ITR por ele lanccedilado (100) [] (MELO PAULSEN 2010 p 185)

O segundo dos impostos citados ITCD de competecircncia estadual diferentemente da regulari-dade anual de cobranccedila do ITR apenas eacute cabiacutevel quando de transmissatildeo por morte ou mesmo por ato de liberalidade (doaccedilatildeo) O que o aproxima do ITR todavia eacute a mesma dificuldade em avaliar bens imoacuteveis sejam rurais ou urbanos que sejam transmitidos no paiacutes Ademais por normalmente repre-sentar parcela pouco significativa da arrecadaccedilatildeo dos Estados e do Distrito Federal22 que se satisfa-zem com os valores arrecadados a tiacutetulo de ICMS acaba-se investindo pouco no tributo pelo seu alto custo de implementaccedilatildeo e pouco retorno arrecadatoacuterio O terceiro e o quatro impostos IPTU e ITBI ambos de competecircncia municipal possuem arre-cadaccedilotildees que satildeo um reflexo da desestrutura administrativa normalmente encontrada nos municiacute-pios brasileiros Ademais a existecircncia de diversos meacutetodos para a avaliaccedilatildeo dos imoacuteveis associada agrave chamada ldquoPlanta Geneacuterica de Valoresrdquo acabam por dificultar sobremaneira a mensuraccedilatildeo da base de caacutelculo Para o IPTU a base de caacutelculo corresponde ao valor venal do imoacutevel sendo identicamente considerada a do ITBI (MELO PAULSEN 2010 p 294-303)23 Quanto a esses impostos municipais a falecircncia do Estado brasileiro no tocante ao compartilha-mento de informaccedilotildees chega agrave situaccedilatildeo mais draacutestica eacute bastante comum em um mesmo municiacutepio

21 Vale destacar que a Uniatildeo tem empreendido parcerias importantes com os municiacutepios que optam pela fiscalizaccedilatildeo e cobranccedila do ITR Assim disponibilizou link especiacutefico em seu site com todas as informaccedilotildees necessaacuterias agrave celebraccedilatildeo do convecircnio a legislaccedilatildeo aplicaacutevel ao imposto bem como a capacitaccedilatildeo dos servidores envolvidos por meio de cursos agrave dis-tacircncia Disponiacutevel em ltwwwreceitafazendagovbrPessoaJuridica ITRConvenios2008defaulthtmgt Acesso em 24 out 1322 Apenas a tiacutetulo de exemplo pode-se citar a arrecadaccedilatildeo do ITCD no Estado do Cearaacute em 2012 a qual foi da ordem de R$ 4386700000 (quarenta e trecircs milhotildees oitocentos e sessenta e sete mil reais) quando no mesmo periacuteodo o ICMS representou R$ 764641000000 (sete bilhotildees seiscentos e quarenta e seis milhotildees quatrocentos e dez mil reais) o que representa pouco mais de 05 deste imposto Dados disponiacuteveis no site do Confaz relativamente a todas as unidades federativas ltww1fazendagovbrconfazboletimgt Acesso em 24 out 1323 Haacute de se considerar doutrina divergente a qual compreende que seriam divergentes as bases de caacutelculo do ITCDITBI daquelas indicadas para o ITRIPTU Para tal corrente haveria bitributaccedilatildeo se tais bases de caacutelculo coincidissem ou seja haveria desrespeito ao princiacutepio da reserva de competecircncia impositiva Dentre todos cite-se FURLAN 2001

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proceder-se agrave cobranccedila do ITBI sobre o valor venal atualizado do imoacutevel e ainda assim o IPTU conti-nuar sendo recolhido com uma base de caacutelculo excessivamente defasada Tal situaccedilatildeo inclusive jaacute foi julgada plenamente aceitaacutevel pelo Superior Tribunal de Justiccedila24 em uma demonstraccedilatildeo da ineficiecircn-cia falta de transparecircncia e complicaccedilatildeo para delimitaccedilatildeo dos tributos brasileiros Com tudo isso vecirc-se que a Uniatildeo os Estados o Distrito Federal e os Municiacutepios carecem de ins-trumentos que tomados em seu conjunto reduziriam sobremaneira a ineficiecircncia e as arbitrariedades nas cobranccedilas dos impostos citados Propotildee-se entatildeo a utilizaccedilatildeo de um sistema informatizado uacutenico mensurador da base de caacutelculo dos imoacuteveis brasileiros a ser alimentado por todos os entes segundo criteacuterios cientiacuteficos previamente determinados como os comumente utilizados pelo georreferencia-mento e que simplificariam sensivelmente a atuaccedilatildeo estatal aleacutem de promover maior transparecircncia e eficiecircncia na cobranccedila dos tributos No tocante ao georreferenciamento jaacute existem iniciativas em plena operacionalizaccedilatildeo pelo Mi-nisteacuterio do Desenvolvimento Agraacuterio25 e pelo Instituto Nacional de Colonizaccedilatildeo e Reforma Agraacuteria (In-cra)26 Aleacutem de tudo isso haacute de se destacar que tal medida poderia envolver ainda a Caixa Econocircmica Federal e os cartoacuterios de registro de imoacuteveis os quais possuem informaccedilotildees valiosas sobre valores venais de imoacuteveis bem como quanto agrave primeira o fato de contar com corpo teacutecnico especiacutefico para a realizaccedilatildeo de avaliaccedilotildees Contudo uma medida dessa magnitude careceria da iniciativa de algum ente o qual lanccedilasse as ideias primordiais da estrutura a se formar e mobilizasse as demais unidades federadas no sentido de adesatildeo e definiccedilatildeo do seu conteuacutedo essencial A partir daiacute a tributaccedilatildeo envolvendo imoacuteveis no Brasil que foi estruturada de forma que tem trazido seacuterias dificuldades a todos os entes passaria a ser racionalizada visando maior eficiecircncia da poliacutetica tributaacuteria maior transparecircncia dos meacutetodos e da apuraccedilatildeo do tributo e simplificaccedilatildeo para os servidores envolvidos na cobranccedila bem como para o proacuteprio contribuinte o qual saberia de antematildeo identificar a base de caacutelculo das exaccedilotildees

22 Eficiecircncia transparecircncia e simplificaccedilatildeo na tributaccedilatildeo incidente sobre a atividade empre-sarial brasileira como medida de justiccedila fiscal

Aqui por fim uma proposta mais ousada mas natildeo menos aplicaacutevel Jaacute foram claramente de-monstradas na primeira parte do trabalho as enormes obrigaccedilotildees impostas agraves empresas no Brasil em

24 Assim dispotildee o voto do Min Benedito Gonccedilalves Relator do AgRg nos EDcl no AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nordm 36076 ndash SP ldquoConforme assentado pela decisatildeo agravada a jurisprudecircncia desta Corte Superior jaacute pacificou o entendimen-to de que o valor venal adotado para fins de tributaccedilatildeo do ITBI natildeo estaacute vinculado ao utilizado para a cobranccedila do IPTU uma vez que a maneira de apuraccedilatildeo dessa base de caacutelculo e a modalidade de lanccedilamento desses impostos satildeo diversas podendo o fisco arbitrar a valor venal do imoacutevel transmitido nos moldes do art 148 do CTNrdquo Semelhante decisatildeo con-forme defende a tese aqui esposada soacute obstaculiza a eficiecircncia a transparecircncia e a simplificaccedilatildeo do Sistema Tributaacuterio Disponiacutevel em lthttpsww2stjjusbrrevistaeletronicaitaaspregistro=201101059457 ampdt_publicacao=04092013gt Acesso em 24 out 1325 Disponiacutevel em lthttpwwwmdagovbrterralegalpagesgeorreferenciamentogt Acesso em 24 out 1326 Disponiacutevel em lthttpwwwincragovbrindexphpnoticias-sala-de-imprensanoticias11283-prorrogado-prazo-de--georreferenciamento-para-imoveis-rurais-com-menos-de-500-hectaresgt Acesso em 24 out 13

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virtude de uma carga tributaacuteria relativamente elevada bem como da imposiccedilatildeo de complicadas obri-gaccedilotildees acessoacuterias as quais muitas vezes parecem ser mais importantes que o proacuteprio pagamento do tributo devido Contudo observando o cenaacuterio nacional verifica-se que algumas iniciativas ainda na deacutecada de 1980 com a ediccedilatildeo da Lei ndeg 7256 de 27 de dezembro de 1984 passaram a construir um modelo diferenciado para um setor produtivo da economia que normalmente ficava turvado pela grandiosida-de das grandes empresas aqui situa-se o histoacuterico de evidenciaccedilatildeo das pequenas empresas brasilei-ras cuja evoluccedilatildeo tem se tornado ainda mais patente Atualmente pode-se apontar uma alteraccedilatildeo substancial no tratamento tributaacuterio conferido a esse grupo de pequenas empresas a partir da promulgaccedilatildeo da Lei Complementar nordm 123 de 14 de dezembro de 2006 a qual instituiu o Estatuto Nacional da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte estabelecendo normas gerais relativas ao tratamento diferenciado e favorecido a ser dispensa-do agraves microempresas (ME) e empresas de pequeno porte (EPP) no acircmbito dos Poderes da Uniatildeo dos Estados do Distrito Federal e dos Municiacutepios Tal lei eacute resultado de um amplo processo de reivindicaccedilatildeo social quanto agrave regulamentaccedilatildeo de disposiccedilatildeo constitucional atinente ao tratamento diferenciado e favorecido a ser conferido agraves micro-empresas e agraves empresas de pequeno porte Capitaneados pela Uniatildeo os Estados e Municiacutepios da federaccedilatildeo juntamente com a sociedade civil organizaram-se para criar um complexo sistema que alcanccedilasse a meta constitucional No contexto dessa lei destaca-se o Regime Especial Unificado de Arrecadaccedilatildeo de Tributos e Contribuiccedilotildees devidos pelas Microempresas e Empresas de Pequeno Porte -Simples Nacional o qual envolve todo o conteuacutedo tributaacuterio do tratamento diferenciado e favorecido concedido agraves ME e agraves EPP Para o que interessa ao intento de proporcionar maior eficiecircncia transparecircncia e simplificaccedilatildeo do sistema tributaacuterio especialmente no tocante ao desenvolvimento das atividades empresariais op-tar-se-ia por estruturar para as demais empresas que natildeo apenas as pequenas toda a tributaccedilatildeo nas mesmas bases jaacute utilizadas pelo Simples Nacional Assim se tal sistema jaacute se encontra em pleno uso pelas pequenas empresas qual seria o oacutebice em expandi-lo visando a uma maior racionalizaccedilatildeo de processos e evitando-se uma repeticcedilatildeo desne-cessaacuteria de informaccedilatildeo de dados Dessa forma por exemplo em um sistema uacutenico mas que abran-gesse as peculiaridades de cada tributo poder-se-ia ao final instrumentalizar-se uma uacutenica declaraccedilatildeo formal bem como poderia ser expedido uma uacutenica guia para pagamento com a devida separaccedilatildeo dos valores correspondentes a cada ente a ser feita pela proacutepria instituiccedilatildeo bancaacuteria a partir da tecnologia disponiacutevel do coacutedigo de barras Dessa maneira a cobranccedila dos tributos poderia ocorrer de forma mais eficiente satisfazendo agraves necessidades do Estado e respeitando os direitos dos contribuintes de natildeo serem ridicularizados pela existecircncia de inuacutemeros padrotildees a serem repetidos para apuraccedilatildeo do tributo A transparecircncia e a simplificaccedilatildeo entatildeo viriam como decorrecircncias absolutamente naturais de um sistema racionalmente estruturado e coordenado pelos fiscos interessados Assim a utilizaccedilatildeo de uma forma inovadora de cumprimento das obrigaccedilotildees tributaacuterias poderia

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ser estendida a diversos outros segmentos empresarias englobando os tributos que mais impactam na atividade dessas empresas tais como o Imposto sobre a Renda ndash Pessoa Juriacutedica (IRPJ) o Imposto sobre a Circulaccedilatildeo de Mercadorias e sobre a Prestaccedilatildeo de Serviccedilos de Transporte Interestadual e Inter-municipal e de Comunicaccedilotildees (ICMS) e o Imposto sobre a Prestaccedilatildeo de Serviccedilos (ISS) aleacutem de algumas contribuiccedilotildees tambeacutem para as grandes empresas

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

No acircmbito do Direito Tributaacuterio um dos temas que mais demanda investigaccedilatildeo eacute a questatildeo em torno da evoluccedilatildeo do Sistema Tributaacuterio Nacional legitimando a atuaccedilatildeo dos fiscos aos interesses pretendidos pela sociedade Nessa busca contrabalanccedila-se o interesse arrecadatoacuterio necessaacuterio agrave manutenccedilatildeo da atividade estatal com o respeito aos direitos fundamentais dos contribuintes O conceito de sistema tributaacuterio haacute de ser o mais alargado possiacutevel possibilitando que toda a legislaccedilatildeo tributaacuteria brasileira seja irradiada pelos valores superiores dispostos na CF88 e que repre-sentam vetores do desenvolvimento social Com isso a busca pela eficiecircncia pela transparecircncia e pela simplicidade do Sistema Tributaacuterio brasileiro rompe a questatildeo doutrinaacuteria e toda a sociedade clama por medidas efetivas que priorizem uma tributaccedilatildeo mais justa e que natildeo se transforme em um verdadeiro calvaacuterio para os contribuintes Neste tocante foram propostas medidas efetivas que passam por uma maior troca de informa-ccedilotildees entre os fiscos aprimorando a relaccedilatildeo juriacutedico-tributaacuteria estabelecida entre o ente tributante e os contribuintes bem como a partir da utilizaccedilatildeo de modelos jaacute vencedores como o Simples Nacional os quais oportunizam que o creacutedito tributaacuterio seja satisfeito com menos obrigaccedilotildees acessoacuterias a serem impostas agraves pessoas fiacutesicas e juriacutedicas Como se vecirc a temaacutetica eacute complexa e totalmente emergencial de forma que o Estado brasileiro deve de forma progressiva e inovadora alinhar poliacuteticas fiscais ao respeito aos direitos dos contri-buintes efetivando na maior medida possiacutevel a eficiecircncia a transparecircncia e a simplificaccedilatildeo em suas atividades de cobranccedila de tributos

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REFEREcircNCIAS

AacuteVILA Humberto Sistema constitucional tributaacuterio Satildeo Paulo Saraiva 2010

BEAUGONIN Philippe Simplificaccedilatildeo administrativa Traduccedilatildeo de Sampaio Marinho Lisboa Poacutertico 1977

BECKER Alfredo Augusto Teoria geral do direito tributaacuterio Satildeo Paulo Noeses 2010

CABANA Roberto M Lopez Dever de informaccedilatildeo ao usuaacuterio na Argentina In SUNDFELD Carlos Ari (org) Direito Administrativo Econocircmico Satildeo Paulo Malheiros 2006 p 255 - 263

CARVALHO Paulo de Barros Direito tributaacuterio fundamentos juriacutedicos da incidecircncia Satildeo Paulo Sa-raiva 2012

______ Direito tributaacuterio linguagem e meacutetodo Satildeo Paulo Noeses 2009

GROTTI Dinoraacute Adelaide Musetti Teoria dos serviccedilos puacuteblicos e sua transformaccedilatildeo In SUNDFELD Carlos Ari (org) Direito Administrativo Econocircmico Satildeo Paulo Malheiros 2006 p 39-71

GRUPENMACHER Betina Treigher Das exoneraccedilotildees tributaacuterias Incentivos e benefiacutecios fiscais In CA-VALCANTE Denise Lucena et al Novos horizontes da tributaccedilatildeo um diaacutelogo luso-brasileiro Coim-bra Almedina 2012

JUSTEN FILHO Marccedilal Concessatildeo de serviccedilos puacuteblicos Satildeo Paulo Dialeacutetica 1997

MACHADO Hugo de Brito Curso de direito tributaacuterio Satildeo Paulo Malheiros 2011

______ Direitos fundamentais do contribuinte e a efetividade da jurisdiccedilatildeo Satildeo Paulo Atlas 2009

______ Os princiacutepios juriacutedicos da tributaccedilatildeo na Constituiccedilatildeo de 1988 Satildeo Paulo Dialeacutetica 2004

MARTINS Ives Gandra da Silva (coord) Conclusotildees do XXXI Simpoacutesio Nacional de Direito Tributaacuterio Revista de Doutrina TRF-4 ano 2007 Disponiacutevel em lt httpwww revistadoutrinatrf4jusbrindexhtmhttpwwwrevistadoutrinatrf4jusbr artigosedicao016Ives_Martinshtmgt Acesso em 23 out 13

MELLO Celso Antonio Bandeira de Curso de direito administrativo Satildeo Paulo Malheiros 2010

MELO Joseacute Eduardo Soares de PAULSEN Leandro Impostos federais estaduais e municipais Porto Alegre Livraria do Advogado 2010

MOREIRA NETO Diogo de Figueiredo Curso de Direito Administrativo Parte introdutoacuteria parte ge-ral e parte especial Rio de Janeiro Forense 2006

PORTO NETO Benedito Concessatildeo de serviccedilo puacuteblico no regime da Lei nordm 898795 Satildeo Paulo Malheiros 1998

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ROSS Alf Direito e justiccedila Traduccedilatildeo de Edson Bini Bauru SP EDIPRO 2007

SANTIAGO Silas Simples Nacional o exemplo do federalismo fiscal brasileiro Satildeo Paulo Saraiva 2011

SOARES Murilo Rodrigues da Cunha Custo do cumprimento das obrigaccedilotildees acessoacuterias no Brasil Brasiacutelia Biblioteca Digital da Cacircmara dos Deputados 2012 Disponiacutevel em lthttpbdcamaragovbrbdbitstreamhandlebdcamara9849custo_ cumprimento_soarespdfsequence=1gt Acesso em 23 out 13

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CARGA TRIBUTAacuteRIA BRASILEIRA Eacute ELEVADA MITO OU VERDADE

SUMAacuteRIO Introduccedilatildeo 1 A evoluccedilatildeo do papel do Estado 2 Justificativa eco-nocircmica para a existecircncia do Estado 21 Falhas de mercado 3 Atividade finan-ceira do Estado 4 Sistema tributaacuterio 41 Princiacutepio do benefiacutecio 42 Princiacutepio da capacidade de contribuiccedilatildeo 43 Tributos diretos e indiretos 44 Caracteriacutes-ticas do Sistema Tributaacuterio Nacional 5 A carga tributaacuteria brasileira eacute elevada mito ou verdade 51 Carga tributaacuteria e investimento em educaccedilatildeo Conside-raccedilotildees finais Referecircncias

Jurandir Gurgel Gondim Filho1

INTRODUCcedilAtildeO

Qualquer investigaccedilatildeo da cena contemporacircnea revelaraacute uma revoluccedilatildeo no sistema econocircmico

mundial levando as naccedilotildees ao enfrentamento do grande desafio do iniacutecio deste seacuteculo que eacute a refor-

ma ou reconstruccedilatildeo do Estado

Na realidade os princiacutepios e as praacuteticas econocircmicas tecircm ao longo do tempo moldado o coti-

diano dos cidadatildeos e por conseguinte da sociedade Inegavelmente a histoacuteria brasileira natildeo foge agrave

regra e mostra que coube ao Estado o papel de indutor do desenvolvimento econocircmico demonstrado

pela expansatildeo consideraacutevel que o setor puacuteblico apresentou nos uacuteltimos tempos

Tal expansatildeo entretanto trouxe a reboque um crescimento do volume de despesas do governo

e em consequecircncia uma elevaccedilatildeo semelhante no volume total de recursos necessaacuterios ao financia-

mento das atividades que passou a exercer

Atualmente o conhecimento sobre assuntos de financcedilas puacuteblicas se faz necessaacuterio mais do que

nunca uma vez que a maior parte dos complexos problemas das sociedades modernas tais como

globalizaccedilatildeo riqueza desigualdade social e a questatildeo do meio ambiente entre outros estaacute atrelada a

problemas de natureza econocircmica e atuaccedilatildeo do setor puacuteblico nesse contexto

Eacute por meio do conhecimento das financcedilas puacuteblicas que se forma uma visatildeo mais ampla e criacutetica

de todo funcionamento da sociedade econocircmica permitindo que se responda agraves diversas questotildees

que envolvem poliacutetica fiscal orccedilamentaacuteria sistema tributaacuterio e carga tributaacuteria e investimentos puacutebli-

cos e desenvolvimento socioeconocircmico

Essa expansatildeo durante o processo histoacuterico da participaccedilatildeo do Estado na vida dos brasileiros

exigiu destes uma contribuiccedilatildeo maior para o financiamento dos gastos puacuteblicos fazendo com que

1 Mestre em Economia pela Universidade Federal do Cearaacute (UFC) MBA em Financcedilas pelo Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais (IBMEC) Especialista em Financcedilas Puacuteblicas pela Fundaccedilatildeo Getuacutelio Vargas (FGV) Secretaacuterio Municipal de Financcedilas de Fortaleza E-mail jggondimterracombr

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a carga tributaacuteria se elevasse sem a contrapartida dos serviccedilos puacuteblicos de qualidade gerando uma

insatisfaccedilatildeo generalizada de bem estar social nacional Entretanto eacute importante ter em mente alguns

aspectos que tornam o assunto carga tributaacuteria brasileira nada simplista Esse artigo tenciona esclare-

cer alguns desses aspectos de forma a construir um contraponto a uma afirmaccedilatildeo dita reiteradas vezes

sobre a carga tributaacuteria brasileira colocando sempre uma duacutevida que consiste numa indagaccedilatildeo Seraacute

que carga tributaacuteria brasileira eacute realmente elevada

Para responder tal indagaccedilatildeo inicialmente faremos uma abordagem sobre a evoluccedilatildeo do pa-

pel do Estado e a justificativa econocircmica para existecircncia do setor puacuteblico destacando os principais

objetivos da intervenccedilatildeo governamental fazendo uma ponte para a necessidade de financiamento do

setor puacuteblico evidenciando o surgimento da atividade financeira atrelada a do Estado notadamente a

poliacutetica fiscal na sua vertente tributaacuteria Na sequecircncia destacamos algumas caracteriacutesticas do sistema

tributaacuterio como preacircmbulo da anaacutelise da carga tributaacuteria nacional e por fim eacute feita uma abordagem

dos aspectos relevantes que desmistificam ou melhor clarividecircncia a questatildeo sempre recorrente sobre

a elevada carga tributaacuteria nacional

1 A EVOLUCcedilAtildeO DO PAPEL DO ESTADO

Desde tempos imemoriais os seres humanos se juntaram em associaccedilotildees comeccedilando com a

famiacutelia e os grupos de parentesco e se estendendo ateacute o Estado moderno Para que os Estados exis-

tam os indiviacuteduos e grupos tecircm que ceder a um oacutergatildeo puacuteblico autoridade em certas aacutereas impor-

tantes como a defesa nacional Esse oacutergatildeo deve possuir poder coercivo sobre todas as outras formas

organizacionais dentro de determinado territoacuterio

Em 1651 com o seu Livro ldquoO Leviatatilderdquo Thomas Hobbes afirmava que o homem em seu estado

natural era egoiacutesta e egocecircntrico como os recursos satildeo escassos estava armado ambiente perfeito

para as contendas

[] imitando a criatura racionala mais excelente obra da natureza o Homem Porque pela arte eacute criado aquele grande Leviatatilde a que se chama Estado ou Cidade em latim (Civitas) que nada mais eacute senatildeo um homem artificial de maior estatura e forccedila do que o homem natural para cuja proteccedilatildeo e defesa foi projetado (HOBBES 1651 p15)

Thomas Hobbes sob inspiraccedilatildeo absolutista definiu o Estado como Salus Populi ou seja a

seguranccedila do povo O Estado deve cuidar do aparato juriacutedico institucional e das relaccedilotildees contra-

tuais entre os membros da sociedade para que natildeo sejam gerados conflitos e a proacutepria sociedade

seja prejudicada

Desta forma o Estado eacute uma criaccedilatildeo racional do homem cuja decisatildeo foi substituir uma exis-

tecircncia com mais liberdade mas com pouca seguranccedila por uma existecircncia com pouca liberdade mas

com mais seguranccedila

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Recapitulando a histoacuteria do Estado desde os seus primoacuterdios ele mostra como a noccedilatildeo do pa-

pel do Estado evoluiu ateacute produzir tanto nos paiacuteses industriais quanto nos em desenvolvimento uma

tremenda expansatildeo do Estado saindo do enfoque da quantidade para a qualidade das accedilotildees estatais

A partir do seacuteculo XVIII mediante conquistas e colonizaccedilatildeo os Estados nacionais incorporaram

aos seus territoacuterios a maior parte do mundo Com a desintegraccedilatildeo dos impeacuterios e a pretensatildeo agrave condi-

ccedilatildeo de Estado por parte de grupos minoritaacuterios o nuacutemero de naccedilotildees cresceu acentuadamente De 50

paiacuteses independentes em 1945 hoje o nuacutemero de membros das Naccedilotildees Unidas aumentou para 193

Seja no ldquoPriacutenciperdquo de Maquiavel e no ldquoLeviatatilderdquo de Hobbes o debate gira em torno dos direitos

e obrigaccedilotildees reciacuteprocas dos Estados e dos cidadatildeos Quase todas essas tradiccedilotildees reservam ao Estado

um papel na provisatildeo de bens puacuteblicos e meritoacuterios Nada haacute de novo na utilizaccedilatildeo de recursos do Es-

tado para fornecer bens puacuteblicos essenciais e aumentar a produtividade privada favorecer a promoccedilatildeo

do desenvolvimento socioeconocircmico

Entretanto fora dessas funccedilotildees miacutenimas observa-se muito menos acordo quanto ao papel

apropriado do Estado na promoccedilatildeo direta do desenvolvimento Os mercantilistas do seacuteculo XVII viam

um papel importante para o Estado na direccedilatildeo do comeacutercio Somente depois que Adam Smith escre-

veu ldquoA Riqueza das Naccedilotildeesrdquo no final do seacuteculo XVIII foi que se passou a reconhecer o mercado como

o melhor instrumento para promover o crescimento e aumentar o bem-estar da sociedade Segundo

essa opiniatildeo o Estado deveria limitar-se a certas funccedilotildees baacutesicas ndash proporcionar bens puacuteblicos como a

defesa garantir a seguranccedila da pessoa e da propriedade educar os cidadatildeos e impor o cumprimento

dos contratos ndash considerados essenciais para o florescimento do mercado

Adam Smith embora refutasse a estrutura de um estado intervencionista jaacute estabelecia quatro

princiacutepios gerais que deveriam nortear um sistema tributaacuterio oacutetimo a fim de atender o financiamento

das atividades miacutenimas estatais a saber

a) Os indiviacuteduos devem contribuir para receita do Estado na proporccedilatildeo de suas capacida-

des de pagamento ou seja em proporccedilatildeo a seus rendimentos

b) O tributo a ser pago deve ser certo e natildeo arbitraacuterio com o valor a ser pago e a forma do

pagamento devendo ser claros e evidentes para o contribuinte

c) Todo tributo deve ser arrecadado da maneira mais conveniente para o contribuinte

d) Todo tributo deve ser arrecadado de forma que implique o menor custo possiacutevel para o

contribuinte aleacutem do montante arrecadado pelo Estado com o tributo

Na escalada do tempo uma seacuterie de acontecimentos incentivou a uma maior participaccedilatildeo do

Estado O primeiro evento foi a Revoluccedilatildeo Russa de 1917 que levou agrave aboliccedilatildeo da maior parte da

propriedade privada e entregou ao Estado o controle de toda atividade econocircmica Em seguida foi

a Depressatildeo dos anos 30 que provocou no mundo natildeo comunista uma devastaccedilatildeo econocircmica tatildeo

grande que forccedilou os Estados a experimentar poliacuteticas contra ciacuteclicas para restaurar a atividade eco-

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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nocircmica O terceiro acontecimento provocado pela Segunda Guerra Mundial foi a raacutepida desintegraccedilatildeo

dos impeacuterios europeus Assim o Estado assumiu novos papeis e ampliou funccedilotildees que jaacute vinha desem-

penhando Em meados do seacuteculo 20 a variedade de tarefas executadas pelos governos incluiu natildeo soacute

uma provisatildeo de infraestrutura e serviccedilos puacuteblicos mas tambeacutem um apoio muito maior aos serviccedilos

de educaccedilatildeo e sauacutede Entre os anos 30 e os 60 do seacuteculo passado o Estado foi promotor do desenvol-

vimento econocircmico e social

A partir dos anos 70 poreacutem face ao seu crescimento distorcido e ao processo de globalizaccedilatildeo

o Estado entrou em crise e se transformou na principal causa da reduccedilatildeo das taxas de crescimento

econocircmico da elevaccedilatildeo das taxas de desemprego e do aumento da taxa de inflaccedilatildeo

A popularidade do ativismo estatal em todo o mundo entrou em decadecircncia Os choques dos

preccedilos do petroacuteleo na deacutecada de 70 foram os fatores finais para a expansatildeo do Estado Baseado no

ativismo estatal os custos dessa estrateacutegia de desenvolvimento se intensificaram quando ocorreu a

crise da diacutevida nos anos 80 e o preccedilo do petroacuteleo caiu Essa crise teve como causa fundamental o de-

sequiliacutebrio fiscal que pocircs em cheque o modo de intervenccedilatildeo do Estado

A ineficiecircncia do Estado inclusive o das empresas estatais parecia gritantemente oacutebvio por

toda parte Os governos comeccedilaram adotar poliacuteticas destinadas a reduzir o alcance da intervenccedilatildeo do

Estado na economia Os Estados diminuiacuteram a sua participaccedilatildeo na produccedilatildeo nos preccedilos e no comeacuter-

cio Estrateacutegias favoraacuteveis ao mercado ganharam firmeza em grande parte do mundo

A figura 1 identifica que o papel do Estado ao longo do tempo eacute pendular desde os tempos de

Maquiavel e Hobbes ateacute os dias atuais essa questatildeo da oscilaccedilatildeo entre uma participaccedilatildeo mais ativista

com atuaccedilotildees miacutenimas do Estado sempre vem agrave tona

Nesse contexto de transiccedilatildeo em direccedilatildeo a um modelo menos estatizante e centralizador surgiu

o neoliberalismo na deacutecada de 90 O pecircndulo oscilou do modelo de desenvolvimento dominado pelos

Estados dos anos 60 e 70 para o Estado minimalista dos anos 80 e 90 com a ideia de reformar o Estado

central a quem deve caber as funccedilotildees de regulaccedilatildeo entendidas como previsatildeo anaacutelise formulaccedilatildeo de

poliacuteticas legislaccedilatildeo e avaliaccedilatildeo

O pecircndulo mais uma vez oscila nesse iniacutecio de seacuteculo tanto isto eacute fato que saiacutemos da deacutecada

de 90 com a ideia capitalista de que a economia natildeo precisa do Estado para acontecer durante anos

se propagou uma evangelizaccedilatildeo neoliberal avassaladora em defesa de um estado miacutenimo entretanto

essa forma de atuaccedilatildeo mais uma vez eacute posta em xeque tendo em vista que entramos na 1ordf deacutecada do

seacuteculo XXI com a defesa de um estado mais intervencionista em face da crise financeira que se instalou

no mundo inteiro

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O fato eacute que a despeito da discussatildeo se o Estado deve ter uma atuaccedilatildeo miacutenima ou mais inter-

vencionista pois sua presenccedila e necessidade natildeo se discute eacute que sua imprescindibilidade deve estar

atrelada a sua eficiecircncia eficaacutecia e efetividade eacute como afirmava Thomas Hobbes em seu livro Leviatatilde

ldquoa vida sem um estado efetivo capaz de manter a ordem eacute solitaacuteria pobre desagradaacutevel incivil

e curtardquo

Para aleacutem da abordagem teoacuterica e filosoacutefica para existecircncia do estado existe a abordagem eco-

nocircmica que traz em seu escopo a necessidade premente do atendimento de condiccedilotildees por meio do

que se convencionou chamar de atividade financeira tendo precipuamente como objeto a questatildeo

fiscal que tem com preocupaccedilatildeo a poliacutetica tributaacuteria (obtenccedilatildeo de receitas) e poliacutetica orccedilamentaacuteria

(gastos puacuteblicos) exigindo assim a construccedilatildeo de um sistema tributaacuterio moderno que aleacutem de ter

como escopo o financiamento das despesas do governo deve tambeacutem procurar atender vaacuterios obje-

tivos no intuito de contribuir efetivamente para o desenvolvimento econocircmico e social do paiacutes

2 JUSTIFICATIVA ECONOcircMICA PARA A EXISTEcircNCIA DO ESTADO

Uma das maiores dificuldades para a redefiniccedilatildeo do papel do Estado eacute que o contexto de atua-

ccedilatildeo eacute dinacircmico Se considerarmos a forma pela qual as forccedilas econocircmicas e sociais globais alteraram

as concepccedilotildees vigentes do Estado vemos claramente que ele manteacutem um papel caracteriacutestico no do-

miacutenio econocircmico que visa o desenvolvimento econocircmico e social O ponto de partida da moderna te-

oria das financcedilas puacuteblicas eacute que o governo natildeo deveria causar danos Se a economia de mercado estaacute

indo bem ndash satisfazendo as demandas do consumidor a custo mais baixo - entatildeo natildeo haacute necessidade

intervenccedilatildeo direta do governo Entretanto as falhas do mercado continuam oferecendo argumen-

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269

tos econocircmicos poderosos a favor da intervenccedilatildeo do Estado

Eacute quando os mercados falham em trabalhar bem ndash quando as demandas natildeo satildeo atendidas ou

os custos estatildeo altos ndash que deveriacuteamos considerar intervenccedilatildeo governamental Basicamente a atuaccedilatildeo

do governo justifica-se com o objetivo de eliminar as falhas de mercado que consiste num conjunto

de condiccedilotildees sob as quais uma economia de mercado natildeo obteve ecircxito em distribuir os recursos de

maneira eficiente isto eacute as chamadas distorccedilotildees alocativas distributivas e estabilizadoras e promover

a melhoria do padratildeo de vida da coletividade

Musgrave citado por Riani (2002 p 41) estabeleceu trecircs funccedilotildees baacutesicas a serem exercidas

pelo governo Satildeo elas (i) alocativa assegurar o ajustamento na alocaccedilatildeo dos recursos (ii) distribu-

tiva assegurar o ajustamento na distribuiccedilatildeo da renda e da riqueza e (iii) estabilizadora assegurar a

estabilizaccedilatildeo socioeconocircmica

21 Falhas de mercado

Entende-se por falhas de mercado o conjunto de condiccedilotildees sob as quais uma economia de

mercado natildeo logra distribuir os recursos de maneira eficiente Deve-se a muitas razotildees o malogro do

mercado que tem muitos graus As implicaccedilotildees no que tange ao papel do Estado e agrave forma de inter-

venccedilatildeo puacuteblica podem ser bem diferentes em cada caso

O sistema de ldquoEconomia de Mercadordquo tem as seguintes metas

bull Eficiente alocaccedilatildeo dos recursos escassos

bull Distribuiccedilatildeo justa de renda

bull Estabilidade de preccedilos

Na verdade esse tipo de sistema eacute uma grande simplificaccedilatildeo da realidade e apresenta falhas em

seu funcionamento que o impedem de atingir tais metas Essas falhas satildeo

bull Provimento dos bens puacuteblicos

bull Externalidades

bull Incapacidade da perfeita alocaccedilatildeo dos recursos

bull Distribuiccedilatildeo justa de renda

A fronteira entre o setor puacuteblico e privado eacute explicaacutevel em boa medida pela existecircncia de bens

com possiacutevel rivalidade diferentes graus de exclusividade e externalidades associadas a bens que nor-

malmente ficariam nas matildeos do setor privado Nesses casos dizemos que haacute falhas nas instituiccedilotildees de

mercado que mantecircm ou levam agrave produccedilatildeo estatal Bens puacuteblicos puros com rivalidade no consumo

e altos custos de exclusatildeo satildeo aqueles que tecircm a provisatildeo puacuteblica Sendo assim o provimento dos

bens puacuteblicos encontra justificativa na sua oferta por meio do orccedilamento puacuteblico quando os bens satildeo

natildeo rivais (o consumo por um usuaacuterio natildeo reduz o estoque disponiacutevel para outros) ou se para esses

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

270

bens natildeo se aplica o princiacutepio da exclusatildeo (os usuaacuterios natildeo podem ser impedidos de consumi-los)

Devido a essas caracteriacutesticas eacute inviaacutevel cobrar pelo consumo de bens puacuteblicos e por isso mesmo o

setor privado natildeo dispotildee de incentivos para fornececirc-los

No que se refere agraves externalidades a imperfeiccedilatildeo do sistema de preccedilos se configuraria quan-

do as accedilotildees econocircmicas desenvolvidas por produtores e consumidores exercessem efeitos incidentes

sobre outros produtores ou consumidores e que escapam ao mecanismo de preccedilos isto eacute uma pessoa

ou empresa prejudicam ou beneficiam outros sem que a pessoa ou empresa pague ou receba com-

pensaccedilatildeo A poluiccedilatildeo eacute um exemplo de uma externalidade negativa que impotildee agrave sociedade custos

natildeo compensados O benefiacutecio mais amplo que uma populaccedilatildeo alfabetizada representa para a so-

ciedade eacute uma externalidade positiva da educaccedilatildeo A atuaccedilatildeo governamental visaria entatildeo reduzir as

externalidades negativas e promover as positivas mediante regulamentaccedilatildeo tributaccedilatildeo subsiacutedios ou

provisatildeo direta

Ainda no acircmbito das inadequaccedilotildees da economia de mercado o modelo de concorrecircncia pura e

perfeita admite que a economia funcione com a maior eficiecircncia possiacutevel Entretanto existe uma falha

que consiste na incapacidade do mercado de promover uma perfeita alocaccedilatildeo de recursos A ini-

ciativa privada natildeo se interessaria em alocar recursos em projetos que exigissem altos investimentos e

apresentassem retorno lento tais como a construccedilatildeo de usinas hidroeleacutetricas portos etc Desta forma

cabe ao setor puacuteblico promover ajustamentos na alocaccedilatildeo de recursos para o desenvolvimento de ati-

vidades que natildeo satildeo desenvolvidas eficientemente pelo sistema de mercado devido ao alto custo de

seu investimento ou a baixa margem de retorno sobre o investimento Outra situaccedilatildeo que demanda

a atuaccedilatildeo de governos eacute quando haacute imperfeiccedilotildees na concorrecircncia decorrente da presenccedila de poucos

produtores (monopoacutelios e oligopoacutelios) que tecircm o poder de influenciar na formaccedilatildeo de preccedilos no mer-

cado causando distorccedilotildees no equiliacutebrio de mercado

Devido agrave incapacidade de o mercado de sozinho promover uma distribuiccedilatildeo justa de renda

cabe ao governo viabilizar por meio de orccedilamento puacuteblico poliacuteticas de distribuiccedilatildeo de renda con-

sistentes no intuito de tirar de um para melhorar a situaccedilatildeo de outros menos favorecidos na busca

de assegurar o atendimento agraves necessidades baacutesicas da maioria dos cidadatildeos Uma forma de redis-

tribuiccedilatildeo de renda no Brasil eacute a inclusatildeo de pessoas idosas de baixa renda no sistema previdenciaacuterio

mesmo que elas nunca tenham contribuiacutedo para o sistema e outro exemplo amplamente divulgado

eacute o Programa Bolsa Famiacutelia

Por fim exige-se do Estado atuaccedilatildeo sobre a economia por meio de poliacuteticas econocircmicas (fiscal

monetaacuteria) com objetivo de atingir as variaacuteveis macroeconocircmicas na busca da estabilidade de preccedilos

e combate a grandes flutuaccedilotildees do niacutevel de emprego com o fito de permitir a manutenccedilatildeo do equi-

liacutebrio do sistema econocircmico

No exerciacutecio das funccedilotildees descritas por Musgrave a atuaccedilatildeo estatal buscaraacute atingir alguns ob-

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jetivos que estatildeo simplificadamente agrupados em quatro grandes categorias (1) Satisfaccedilatildeo das Ne-

cessidades Coletivas (2) Manutenccedilatildeo da Estabilidade Econocircmica (3) Promoccedilatildeo do Crescimento

Econocircmico e (4) Melhoria na Distribuiccedilatildeo da Renda Por meio da utilizaccedilatildeo dos instrumentos fis-

cais e monetaacuterios o governo desenvolveraacute cada uma dessas funccedilotildees que embora tenham objetivos

especiacuteficos satildeo bastante inter-relacionadas e consubstanciam a atividade financeira do Estado

3 ATIVIDADE FINANCEIRA DO ESTADO

Nos toacutepicos anteriores procurou-se explicar a evoluccedilatildeo do papel do Estado e a justificativa eco-

nocircmica para sua existecircncia e a relaccedilatildeo entre uma economia de mercado pura sem a interferecircncia do

governo com uma economia mista cuja participaccedilatildeo do governo eacute exigida Se faz mister demonstrar

que a proacutepria existecircncia do Estado trouxe a reboque o exerciacutecio de uma atividade que lhe proporcio-

nasse a obtenccedilatildeo de recursos e alocaccedilatildeo destes na economia a fim de obter o maacuteximo de bem-estar

para sociedade

O Estado interveacutem em quase todas as atividades humanas cresce de importacircncia o estudo das

necessidades puacuteblicas Desde o iniacutecio o ente estatal dirigiu suas atividades para suprir as chamadas

necessidades puacuteblicas

Crepaldi (2008) afirma que o conceito de necessidade puacuteblica e de bem comum varia muito

conforme o tempo o estaacutegio de desenvolvimento e especialmente a vontade do governante que estaacute

no poder Eacute aquela necessidade que o Estado vai satisfazer ou seja aquela que prioritariamente vai

atender Um ideal de promover o bem estar o desenvolvimento das potencialidades e a noccedilatildeo do que

seja bem comum constituem finalidade do Estado

Assim o Estado encontra sua legitimidade e razatildeo de ser no atendimento das necessidades

sociais O incremento dessa atividade envolve gastos vultuosos que satildeo custeados pelas socieda-

des como um todo O Estado como o homem exerce vaacuterias atividades vaacuterias funccedilotildees a fim de que

possa concretizar os seus objetivos O Estado assim exerce uma atividade poliacutetica juriacutedica de se-

guranccedila etc da mesma forma o homem manteacutem inuacutemeras atividades sociais de lazer e culturais

Entre estas atividades exercemos funccedilotildees comuns que eacute a Atividade Financeira ndash eacute a procura de

meios notadamente pecuniaacuterios para satisfazer as necessidades puacuteblicas Sendo assim entende-se

por atividade financeira do Estado o conjunto de atos voltados para a obtenccedilatildeo gestatildeo e aplicaccedilatildeo

de recursos pecuniaacuterios nos fins perseguidos pelo Poder Puacuteblico visando agrave satisfaccedilatildeo das necessi-

dades da coletividade

Nesse sentido o Estado participa direta ou indiretamente das relaccedilotildees econocircmicas a partir de

vaacuterios instrumentos de poliacutetica econocircmica tais como poliacutetica fiscal controle cambial movimento do

comeacutercio internacional controle de preccedilos emissatildeo da moeda etc O principal deles que tem maior

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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reflexo na atividade financeira do Estado eacute a poliacutetica fiscal ou seja aquela desempenhada pelos po-

deres puacuteblicos com o propoacutesito de obter e aplicar recursos para o custeio e investimento dos serviccedilos

puacuteblicos Assim a poliacutetica fiscal segundo Matias (2009 p 120) orienta-se em duas direccedilotildees

bull Poliacutetica tributaacuteria - que se materializa na captaccedilatildeo de recursos para atendimento das

funccedilotildees da administraccedilatildeo puacuteblica por meio de suas distintas esferas (Uniatildeo Estados Municiacutepios e

Distrito Federal)

bull Poliacutetica orccedilamentaacuteria - que se refere especificamente aos gastos ou seja aos atos e

medidas relacionados com a forma de aplicaccedilatildeo dos recursos levando em consideraccedilatildeo a dimensatildeo e

a natureza das atribuiccedilotildees do poder puacuteblico bem como a capacidade e a disposiccedilatildeo para seu funcio-

namento pela populaccedilatildeo

Ante tudo o que foi exposto anteriormente conclui-se que cabe ao Estado portanto a respon-

sabilidade de viabilizar o funcionamento dos serviccedilos puacuteblicos essenciais demandados pela coletivi-

dade Para atingir esse objetivo ficou claro que o Estado necessita de recursos financeiros que satildeo

obtidos por meio da poliacutetica tributaacuteria a fim de promover os serviccedilos indispensaacuteveis ao perfeito fun-

cionamento das atividades estatais e ao bem comum da populaccedilatildeo Dessa maneira a principal fonte

para o custeio das necessidades puacuteblicas decorre do sistema tributaacuterio que se materializa por meio da

transferecircncia de parcelas dos recursos dos indiviacuteduos e das empresas para o governo completando

assim o ciacuterculo financeiro entre sociedade e Estado

Para efeito deste artigo e ao objetivo a que se propotildee iremos nos deter agrave poliacutetica tributaacuteria

notadamente no que se refere ao nosso sistema tributaacuterio buscando evidenciar os aspectos que escla-

reccedilam e respondam a indagaccedilatildeo sobre a carga tributaacuteria brasileira

4 SISTEMA TRIBUTAacuteRIO

O mecanismo da tributaccedilatildeo associado agraves poliacuteticas orccedilamentaacuterias interveacutem diretamente na

alocaccedilatildeo dos recursos na distribuiccedilatildeo de recursos na sociedade e pode tambeacutem reduzir as desigual-

dades na riqueza na renda e no consumo A tributaccedilatildeo eacute um instrumento pelo qual o governo obtecircm

recursos coletivamente para satisfazer agraves necessidades da sociedade

O sistema de tributaccedilatildeo variaraacute de acordo com as peculiaridades e tambeacutem com determinadas

situaccedilotildees poliacuteticas econocircmicas e sociais de cada pais Mesmo que os sistemas de tributaccedilatildeo sejam di-

ferentes eles se constituiratildeo assim mesmo no principal mecanismo de obtenccedilatildeo dos recursos puacuteblicos

no sistema capitalista

O sistema tributaacuterio pode desenvolver papeis diferentes dependendo dos objetivos a serem

alcanccedilados e de determinadas situaccedilotildees especificas O fato eacute que independentemente das altera-

ccedilotildees que possam ser feitas o sistema tributaacuterio continua sendo o principal instrumento de poliacutetica

fiscal do governo

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273

Existem vaacuterias anaacutelises que apontam diferentes maneiras de como deveria funcionar o sistema

de tributaccedilatildeo e que objetivos ele deveria tentar alcanccedilar De uma forma ou de outra espera-se que um

sistema de tributaccedilatildeo siga quatro pontos baacutesicos

bull O primeiro obtenccedilatildeo de receitas para financiar os serviccedilos puacuteblicos

bull Cada indiviacuteduo deveria ser taxado de acordo com sua capacidade para pagar

bull Os tributos devem ser universais impostos sem distinccedilatildeo a indiviacuteduos em situaccedilotildees si-

milares

bull Os tributos seriam escolhidos de forma a minimizar sua interferecircncia no sistema de mer-

cado a fim de tornaacute-lo eficiente

Por princiacutepio o sistema de tributaccedilatildeo deveria ser o mais justo possiacutevel Entretanto o conceito

de justiccedila nem sempre eacute de faacutecil determinaccedilatildeo Como uma tentativa de aproximar o sistema dentro

daquilo que possa ser considerado mais justo a anaacutelise da aplicaccedilatildeo da tributaccedilatildeo baseia-se no prin-

ciacutepio dos benefiacutecios e no princiacutepio da capacidade de pagamento

41 Princiacutepio do benefiacutecio

Estabelece que cada indiviacuteduo na sociedade pagaraacute um tributo de acordo com o montante de

benefiacutecios que ele recebe Quanto maior benefiacutecio maior seria a contribuiccedilatildeo e vice-versa Assim o

princiacutepio do benefiacutecio associa a contribuiccedilatildeo do indiviacuteduo com os benefiacutecios que ele recebe dos bens

e serviccedilos oferecidos pelo governo

Uma grande dificuldade encontrada pelo princiacutepio do benefiacutecio eacute se tratar com os bens coleti-

vos ou bens puacuteblicos puros Esse oacutebice estaacute na impossibilidade de se apurar adequadamente seus be-

nefiacutecios para cada indiviacuteduo na sociedade Se isto eacute possiacutevel torna-se realmente difiacutecil de estabelecer

a parcela de tributo que eacute devida a cada indiviacuteduo na sociedade

42 Princiacutepio da capacidade de contribuiccedilatildeo

Dada esta situaccedilatildeo soluccedilatildeo encontrada eacute a de se introduzir no sistema de tributaccedilatildeo o princiacute-

pio da capacidade de contribuiccedilatildeo Esse princiacutepio distribui o ocircnus da tributaccedilatildeo entre os indiviacuteduos na

sociedade de acordo com sua capacidade de contribuiccedilatildeo medida usualmente pelo niacutevel de renda

Esse princiacutepio tem duas vantagens sobre o anterior primeiro permite que determinada pauta de ser-

viccedilos puacuteblicos seja oferecida agrave sociedade sem que haja exclusatildeo ou discriminaccedilatildeo entre os indiviacuteduos

quanto ao seu uso e benefiacutecios segundo ele se torna um princiacutepio mais justo agrave medida que o sacrifiacutecio

individual eacute feito na mesma proporccedilatildeo e de acordo com a capacidade de pagamento de cada um

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43 Tributos diretos e indiretos

A diferenccedila baacutesica entre esses tributos estaacute na maneira pela qual eles afetam os indiviacuteduos na

sociedade Enquanto o tributo direto incide sobre os rendimentos dos indiviacuteduos o indireto eacute cobrado

normalmente com base nos bens e serviccedilos que satisfazem a parte de suas necessidades O imposto

sobre a renda coloca-se como o melhor exemplo dos tributos diretos enquanto o imposto sobre o

consumo caracteriza mais adequadamente os tributos indiretos

44 Caracteriacutesticas do Sistema Tributaacuterio Nacional

A tributaccedilatildeo caracteriza-se como mecanismo de solidariedade social no qual eacute retirado do

patrimocircnio particular do cidadatildeo uma porcentagem da sua renda auferida em prol do financiamento

dos serviccedilos puacuteblicos e da implementaccedilatildeo dos direitos sociais tendo como finalidade a diminuiccedilatildeo

das desigualdades sociais Sendo assim a carga tributaacuteria de um paiacutes eacute composta pela incidecircncia de

tributos diretos incidentes sobre a renda e o patrimocircnio ou seja da demonstraccedilatildeo real de capacidade

contributiva e tributos indiretos que se caracterizam por incidirem nos produtos e serviccedilos a partir

de uma demonstraccedilatildeo indireta de capacidade contributiva No Brasil o que ocorre eacute que o peso da

tributaccedilatildeo indireta eacute muito maior que o da tributaccedilatildeo direta fazendo com que haja uma onerosidade

maior da parcela populacional com menor poder aquisitivo

Os resultados obtidos ateacute agora natildeo satildeo absolutamente conclusivos mas impostos sobre a

propriedade e a renda tendem a penalizar mais fortemente os mais ricos enquanto que os impostos

sobre vendas de bens e serviccedilos penalizam os mais pobres Impostos sobre a propriedade como

o IPTU e o IPVA acabam associados mais fortemente a quem tem propriedades de maior valor Jaacute

impostos como o ICMS estatildeo associados mais a por exemplo gastos baacutesicos de alimentaccedilatildeo e ves-

tuaacuterio que juntamente com outros gastos baacutesicos representam uma fatia maior do orccedilamento das

pessoas de renda mais baixa

Um sistema tributaacuterio deve ser imparcial ou justo no tratamento dos indiviacuteduos Todavia o

conceito de justiccedila social afirmado anteriormente natildeo eacute questatildeo trivial Uma possiacutevel interpretaccedilatildeo eacute

que cada indiviacuteduo deveria pagar seus impostos de acordo com os benefiacutecios recebidos do governo

na provisatildeo de bens e serviccedilos Aliaacutes esse conceito eacute usado por boa parte da sociedade brasileira em

argumentos contra aumentos da carga tributaacuteria alegando-se que natildeo existe contrapartida do gover-

no na prestaccedilatildeo de serviccedilos para o contribuinte como por exemplo educaccedilatildeo e sauacutede de qualidade

aceitaacutevel para a populaccedilatildeo que paga imposto Eacute nesse tocante que reside o ponto central desse ar-

tigo oferecer ao leitor a clarividecircncia de alguns aspectos sobre a carga tributaacuteria brasileira para natildeo

cairmos na tentaccedilatildeo de afirmaccedilotildees incompletas cujo discurso absoluto de ser alta ou baixa a carga

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tributaacuteria brasileira atende a objetivos especiacuteficos de grupos de interesses e a despeito da percepccedilatildeo

que o retorno social da tributaccedilatildeo natildeo satisfaz plenamente agraves necessidades coletivas e individuais o

que eacute fundamental o esclarecimento para compreensatildeo do leitor

5 A CARGA TRIBUTAacuteRIA BRASILEIRA Eacute ELEVADA MITO OU VERDADE

Neste toacutepico iremos tratar da carga tributaacuteria brasileira suas caracteriacutesticas e mudanccedilas apoacutes

a Constituiccedilatildeo de 1988 O objetivo eacute que no final da leitura o leitor tenha uma visatildeo mais clara da

complexidade do tema a ponto de se ter condiccedilotildees de responder com mais lucidez a indagaccedilatildeo

acima mencionada

A reforma tributaacuteria realizada por meio da Constituiccedilatildeo de 1988 teve como principal motiva-

ccedilatildeo a desconcentraccedilatildeo da receita disponiacutevel do setor puacuteblico A Constituiccedilatildeo de 1988 intensificou a

descentralizaccedilatildeo do federalismo fiscal brasileiro entretanto o Brasil na verdade nunca funcionou na

praacutetica como um regime federalista pois a Uniatildeo sempre exerceu um grande poder sobre os estados

e os municiacutepios das principais capitais

A reaccedilatildeo da sociedade brasileira nos uacuteltimos anos indica um desejo de mudar esse arranjo

institucional a partir de um sistema fiscal que permita uma relaccedilatildeo de poder menos assimeacutetrica A

conclusatildeo a que se chega eacute que as trecircs principais bases tributaacuterias foram de modo geral distribuiacutedas

da seguinte forma a renda para o governo federal o consumo para os estados e a propriedade para

os municiacutepios permitindo-se de alguma forma a complementaccedilatildeo de receita tributaacuteria de um niacutevel de

governo com base tributaacuteria de outro

Entretanto a Uniatildeo tambeacutem se valeu da Constituiccedilatildeo de 1988 que permitiu que contribuiccedilotildees

para a seguridade social tivessem como fator gerador o faturamento das empresas daiacute surgiu a Co-

fins-Contribuiccedilatildeo para Financiamento da Seguridade Social O que se verifica desde entatildeo eacute o uso

intenso por parte da Uniatildeo de contribuiccedilotildees sociais e tributos cumulativos como fonte de receita Com

base na tabela abaixo constata-se a maior preponderacircncia das contribuiccedilotildees no total da receita admi-

nistrada pela Receita Federal do Brasil que eacute da ordem de 307

Tabela 1 Arrecadaccedilatildeo Tributaacuteria Federal 2012 em R$ milhotildees

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Por conta das peculiaridades do sistema tributaacuterio brasileiro eacute que a carga tributaacuteria bra-

sileira decorrente se apresenta de forma desequilibrada e revela uma preferecircncia pela tributaccedilatildeo

sobre bens e serviccedilos e em particular pelos tributos cumulativos que tecircm participaccedilatildeo exagerada

na arrecadaccedilatildeo total A tabela abaixo apresenta a distribuiccedilatildeo da carga tributaacuteria entre as principais

bases de incidecircncia

Tabela 2 Carga Tributaacuteria por base de incidecircncia - 2012

A maior proporccedilatildeo da carga tributaacuteria brasileira cabe aos impostos sobre bens e serviccedilos

que em 2012 corresponderam a 4355 da arrecadaccedilatildeo total A opccedilatildeo por esses tributos pode ser

atribuiacuteda a dois fatores importantes sonegaccedilatildeo e custo de cobranccedila do imposto Os tributos sobre

bens e serviccedilos possivelmente satildeo mais faacuteceis de cobrar e tambeacutem mais difiacuteceis de sonegar inclusi-

ve devido ao uso do mecanismos de substituiccedilatildeo tributaacuteria Entretanto cabe salientar o que muitos

analistas e grande parte do puacuteblico natildeo especializado criticam o uso excessivo desses impostos e

argumentam que eles satildeo regressivos uma vez que os tributos que incidem sobre o consumo satildeo os

mesmos para pessoas ricas e pobres Essa preponderacircncia por impostos indiretos conjugado com a

baixa participaccedilatildeo relativa dos impostos diretos sobre a renda e a propriedade agrava ainda mais o

caraacuteter regressivo do sistema tributaacuterio brasileiro Desta forma no intuito de evidenciar esse caraacuteter

regressivo eacute importante destacar a comparabilidade demonstrada pela figura abaixo que enquanto

no Brasil a representatividade do consumo na composiccedilatildeo da arrecadaccedilatildeo eacute da ordem de 44 nos

paiacuteses ricos a meacutedia eacute de 29Figura 2 Composiccedilatildeo de arrecadaccedilatildeo comparativa de paiacuteses

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Ademais existem estudos que estabelecem uma correlaccedilatildeo entre essa preponderacircncia com o

niacutevel de desigualdade social

Figura 3 Correlanccedilatildeo entre desigualdade social e imposto sobre consumo

Outra questatildeo que se coloca aleacutem dessa regressividade do imposto sobre consumo e que

nos revela outra peculiaridade do nosso sistema tributaacuterio e que nos ajuda a compreender melhor o

assunto carga tributaacuteria brasileira eacute o fato que vocecirc que ganha salaacuterio sabe muito bem o quanto eacute

descontado na fonte a tiacutetulo de imposto de renda e como eacute alta a porcentagem de impostos nos pre-

ccedilos dos produtos entretanto eacute importante ressaltar que existe um outro lado da moeda que precisa

ser elucidado para entendermos essa equaccedilatildeo Brasil Sim pagamos muito imposto todavia o governo

(municipal estadual e federal) arrecada pouco No caso US$ 4085 por habitante por ano Eacute isso o que

a estrutura estatal arrecada e o que tem para financiar os serviccedilos puacuteblicos prestados a cada pessoa

tais como hospitais universidades escolas poliacutecia cadeias tribunais ruas estradas portos poliacutecia

investimentos puacuteblicos etc Na verdade todos esses gastos mais os decorrentes do pagamento dos

servidores envolvidos sairaacute desses mesmos U$4085 Para se ter uma ideia se esse valor eacute muito ou

pouco observe o graacutefico abaixo que compara o Brasil com outros paiacuteses Os nuacutemeros estatildeo todos

em doacutelar mas jaacute corrigidos pela paridade do poder de compra (criteacuterio que ajusta o valor conforme o

preccedilo das coisas em cada paiacutes)

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Graacutefico 1 Comparativo de arrecadaccedilatildeo por habitante em US$

Da anaacutelise do graacutefico acima constata-se que paiacuteses desenvolvidos arrecadam pelo menos o tri-

plo de dinheiro por habitante e portanto tecircm pelo menos o triplo para investir em serviccedilos puacuteblicos

Depreende-se entatildeo que o Brasil simplesmente natildeo arrecada o suficiente para prestar serviccedilos de

primeiro mundo uma vez que paiacutes como EUA que arrecada por ano U$ 13429 tem o triplo do Brasil

para investir em cada habitante Ateacute paiacuteses subdesenvolvidos como Argentina e Meacutexico arrecadam

mais que noacutes Entatildeo por que o Brasil arrecada tatildeo pouco se nossa carga tributaacuteria alta Aleacutem do mais

somos a seacutetima economia do planeta conforme demonstra o graacutefico abaixo

Graacutefico 2 Comparativo de Paiacuteses de maior PIB

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Aliado ao fato supramencionado eacute importante destacar que somos um paiacutes com 1974 milhotildees

de habitantes a quinta maior populaccedilatildeo do mundo sendo assim seria necessaacuterio fazermos uma outra

conta que eacute dividir nosso PIB pelo nuacutemero de habitantes e o resultado eacute um PIB per capita de apenas

US$ 118 mil por habitante o que nos coloca no 74ordm lugar no ranking global De fato nosso resultado

eacute de paiacutes pobre conforme demonstra o graacutefico abaixo

Graacutefico 3 PIB per Capita

A equaccedilatildeo eacute complexa Para termos uma gestatildeo fiscal compatiacutevel eacute necessaacuterio termos em

mente os pilares que sustentam a gestatildeo fiscal eficiente aumento de arrecadaccedilatildeo controle dos gastos

correntes elevaccedilatildeo dos investimentos e controle do niacutevel de endividamento Se quiseacutessemos ter mais

investimentos puacuteblico indubitavelmente teriacuteamos que aumentar a carga tributaacuteria sem massacrar a

sociedade buscando maior qualidade dos serviccedilos puacuteblicos prestados

A tendecircncia agrave elevaccedilatildeo da carga tributaacuteria ao longo dos anos 1990 e no seacuteculo XXI decorreu

principalmente do aumento da carga de tributos incidentes sobre bens e serviccedilos explicado boa parte

pelo crescimento da carga tributaacuteria de impostos cumulativos que do ponto de vista econocircmico satildeo

de pior qualidade prejudicando o desempenho do setor produtivo

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Tabela 3 Evoluccedilatildeo da Carga Tributaacuteria

Da anaacutelise do graacutefico abaixo depreendermos que o niacutevel de carga tributaacuteria brasileira eacute expres-

sivamente superior aos de outros paiacuteses da Ameacuterica Latina Por outro lado quando comparado aos

paiacuteses de renda per capita alta o Brasil apresenta-se em patamar inferior Vale ressaltar que o niacutevel de

tributaccedilatildeo no Brasil eacute da mesma ordem do Reino Unido e muito maior do que o Japatildeo Entretanto o

niacutevel de serviccedilo puacuteblico eacute bem aqueacutem quando aferido por meio do IRBES2 Iacutendice de Retorno de Bem

Estar Social definido pelo Instituto Brasileiro de Planejamento Tributaacuterio (IBPT) e comparado com ou-

tros paiacuteses conforme demonstrado abaixo

2 O IRBES eacute decorrente da somatoacuteria do valor numeacuterico relativo agrave carga tributaacuteria do paiacutes com uma ponderaccedilatildeo de 5 com o valor do IDH que recebeu uma ponderaccedilatildeo de 85 por entendermos que o IDH elevado independentemente a carga tributaacuteria do paiacutes eacute muito mais representativo e significante do que uma carga tributaacuteria elevada independente-mente do IDH Assim sendo entendemos que o IDH necessariamente deve ter um peso bem maior para a composiccedilatildeo do iacutendice

Graacutefico 4 Comparaccedilatildeo da Carga Tributaacuteria entre paiacuteses

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

281

Graacutefico 5 Iacutendice de Desenvolvimento Humano (IDH)

Graacutefico 6 Iacutendice de Retorno do Bem Estar agrave Sociedade (IRBES)

Corolaacuterio

bull O Iacutendice de Desenvolvimento Humano (IDH) eacute uma medida comparativa de riqueza alfa-

betizaccedilatildeo educaccedilatildeo esperanccedila de vida natalidade e outros fatores para os diversos paiacuteses do mundo

Eacute uma maneira padronizada de avaliaccedilatildeo e medida do bem-estar de uma populaccedilatildeo especialmente

bem-estar infantil O iacutendice foi desenvolvido em 1990 pelo economista paquistanecircs Mahbubul Haq e

vem sendo usado desde 1993 pelo Programa das Naccedilotildees Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) em

seu relatoacuterio anual

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

282

bull O Iacutendice de Retorno De Bem Estar agrave Sociedade (IRBES) eacute resultado da somatoacuteria da carga

tributaacuteria ponderada percentualmente pela importacircncia deste paracircmetro com o IDH ponderado da

mesma forma

51 Carga tributaacuteria e investimento em educaccedilatildeo

Uma relaccedilatildeo importante a ser feita para corroborar com o exposto acima eacute destacar o aspecto

educacional no processo de reduccedilatildeo das desigualdades Haacute algo a ser feito temos produccedilatildeo e riqueza

de paiacutes rico niacutevel de renda incompatiacutevel arrecadaccedilatildeo por habitante aqueacutem dos paiacuteses ricos conse-

quentemente serviccedilos puacuteblicos natildeo condizentes com as reais necessidades sociais dos brasileiros Ine-

quivocamente o sistema educacional brasileiro tem seu protagonismo na construccedilatildeo dessa realidade

bem como de sua reversatildeo

O Brasil aplicou US$ 960 por estudante em 2010 e a Coreacuteia do Sul US$ 5448 Embora tenham

o mesmo niacutevel do PIB aplicado em educaccedilatildeo parece oacutebvio a Coreacuteia do Sul eacute que propicia melhores

condiccedilotildees financeiras para o setor educacional ao aplicar 6 vezes mais recursos por pessoa em idade

educacional que o Brasil Apesar de o investimento brasileiro ser proacuteximo da meacutedia dos paiacuteses da

OCDE o paiacutes se encontra somente em 53ordm lugar - de um total de 65 - no Pisa um programa de ava-

liaccedilatildeo da qualidade da educaccedilatildeo da mesma organizaccedilatildeo em cujo programa a Coreia do Sul ocupou a

2ordf posiccedilatildeo no ranking Ou seja maiores investimentos natildeo necessariamente acompanham na mesma

proporccedilatildeo uma melhora no desempenho dos estudantes Amaral (2011) afirma que para avaliar o

investimento em educaccedilatildeo proporcional ao PIB eacute preciso conjugar trecircs indicadores total de recursos

aplicados em educaccedilatildeo como percentual do PIB riqueza do paiacutes expressa pelo valor de seu PIB e a

quantidade de pessoas em idade educacional

Tabela 4 Recursos Financeiros aplicados em educaccedilatildeo por pessoa

O Brasil eacute o 15ordm que mais investe o PIB na aacuterea na lista da OCDE Segundo o estudo o governo

brasileiro investe 54 do seu PIB em educaccedilatildeo ndash sendo que a meacutedia dos outros paiacuteses da OCDE eacute de

623 Para os alunos do ensino superior sobram apenas 08 do PIB o quarto menor investimento

entre 36 paiacuteses Ter diploma de ensino superior eacute vantajoso em todos os paiacuteses que participaram da

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

283

pesquisa mas no Brasil eacute ainda mais relevante Por aqui a diferenccedila salarial pode chegar ao triplo da

meacutedia da diferenccedila nos outros 34 paiacuteses

Os recursos puacuteblicos investidos na educaccedilatildeo convertem-se em mais valias incluindo por exem-

plo aumento das receitas fiscais Em meacutedia nos paiacuteses da OCDE um homem habilitado com um niacutevel

superior de ensino iraacute gerar um valor adicional de US$ 119000 no imposto de renda e contribuiccedilatildeo

social durante a sua vida ativa em relaccedilatildeo a algueacutem habilitado apenas com uma educaccedilatildeo de niacutevel

secundaacuterio Mesmo depois de subtrair as receitas puacuteblicas que financiaram o grau remanescem em

meacutedia de US$ 86000 quase trecircs vezes o montante do investimento puacuteblico por aluno no ensino supe-

rior Os retornos para a sociedade satildeo ainda maiores porque haacute muitos outros benefiacutecios resultantes

da educaccedilatildeo que natildeo se refletem diretamente no imposto de rendimentos

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Avaliar o desempenho do setor puacuteblico o envolvimento do governo e a percepccedilatildeo da socie-

dade sob a oacutetica do sistema tributaacuterio eacute uma tarefa extremamente complexa e subjetiva Isso porque

aleacutem dos nuacutemeros na maioria das vezes as avaliaccedilotildees envolvem grande parcela de juiacutezo de valor

Nesse sentido o artigo procurou trazer elementos mais criacuteveis para uma anaacutelise mais percuciente por

parte do leitor

O resgate histoacuterico a justificativa para existecircncia inexoraacutevel do setor puacuteblico e a elucidaccedilatildeo do

Sistema Tributaacuterio Nacional abrem espaccedilo para reflexatildeo e estudo das financcedilas puacuteblicas pois existe

uma seacuterie de problemas a serem enfrentados pela sociedade e pelos administradores puacuteblicos de

forma a tornar o setor puacuteblico mais eficiente e viaacutevel financeiramente

O quadro de dificuldades das financcedilas puacuteblicas associa-se a trecircs fatores fundamentais o pri-

meiro refere-se agrave necessidade da busca de uma forma mais eficiente de obtenccedilatildeo e aplicaccedilatildeo dos re-

cursos puacuteblicos Essa busca implica natildeo somente uma aplicaccedilatildeo mais adequada dos recursos em face

das reais necessidades da sociedade mas tambeacutem em funccedilatildeo de uma escala de prioridades de tarefas

a serem executadas pelo governo Eacute necessaacuterio tambeacutem analisar o fato de que a tributaccedilatildeo no Brasil

carece de uma legitimidade social visto que a incidecircncia de tributos no paiacutes eacute vista como um peso na

populaccedilatildeo e natildeo como um mecanismo essencial ao proacuteprio desenvolvimento do paiacutes

O segundo ponto relaciona-se ao sistema de financiamento do setor puacuteblico e mais precisa-

mente agrave arrecadaccedilatildeo tributaacuteria As estatiacutesticas mostram que a carga de tributos e a complexidade do

sistema tributaacuterio brasileiro e do aparato juriacutedico-legal comprometem a competitividade e alavancam

a economia informal impondo custos administrativos elevados com reflexos negativos sobre o cresci-

mento e a distribuiccedilatildeo de renda Terceiro eacute a excessiva participaccedilatildeo dos tributos sobre bens e serviccedilos

na arrecadaccedilatildeo Esse tipo tributaccedilatildeo indireta traz um alto grau de regressividade agrave carga tributaacuteria agrave

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

284

medida que acaba onerando as pessoas de menor rendimento em vez de se concentrar na pequena

parcela da populaccedilatildeo cuja renda apresenta uma alta participaccedilatildeo no PIB

Os cidadatildeos natildeo se sentem impelidos e entusiasmados em pagar tributos Natildeo haacute consciecircncia

de que estes satildeo necessaacuterios para atender o financiamento das necessidades sociais por meio dos pro-

gramas projetos e accedilotildees articulados e coordenados pelo Estado Os contribuintes muitas vezes natildeo

cumprem com as suas obrigaccedilotildees tributaacuterias e deixam de fiscalizar o atendimento das mesmas pelos

demais cidadatildeos

Talvez tudo isto eacute consequecircncia de uma seacuterie de desacertos dentre os quais se podem citar a

malversaccedilatildeo do dinheiro puacuteblico a falta de visibilidade quanto agraves fontes e aplicaccedilotildees dos recursos o

baixo retorno social traduzido na falta de atendimento agraves necessidades prioritaacuterias da sociedade o

agravamento das desigualdades entre pessoas e regiotildees deficiecircncia nas informaccedilotildees simples e aces-

siacuteveis sobre o STN e por uacuteltimo e de forma conclusiva uma intensificaccedilatildeo na educaccedilatildeo fiscal Embora

haja atualmente arranjo institucional e legal para acesso agraves informaccedilotildees e transparecircncia do gasto puacute-

blico precisamos avanccedilar mais pois a tiacutetulo de exemplo existe um programa oficial de acircmbito nacio-

nal ndash o PNEF ndash Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal - em vigor desde 1996 o mesmo tem resultados

que ainda deixam muito a desejar soacute atingindo em 2008 193 dos municiacutepios 166 das escolas

brasileiras e 108 da populaccedilatildeo

Para aleacutem de oferecer uma resposta pronta e acabada para questotildees levantadas a proposta eacute

levar ao leitor informaccedilotildees e instrumentos analiacuteticos que possam contribuir tanto para compreensatildeo

da complexa relaccedilatildeo Estado e sociedade bem como propiciar o redirecionamento dos pontos relevan-

tes que o problema requer para natildeo ficarmos na simploacuteria conclusatildeo de que a carga tributaacuteria eacute alta e

podermos indagar sobre Estado que temos do Estado que queremos e o Estado que podemos ter

Eacute verdade que o Estado mal administrado e sem vinculaccedilatildeo com as reais demandas dos setores

mais carentes da sociedade tende a tornar mais ineficiente e desigual Isso natildeo invalida portanto a

necessidade de um Estado mais eficiente cuja participaccedilatildeo e intervenccedilatildeo na economia e na sociedade

eacute indispensaacutevel A mensagem eacute que o Estado pode ficar agrave altura dos desafios que enfrenta mas isso

somente se primeiro ajustar o que procura fazer ao que eacute capaz de fazer e depois aumentar o nuacute-

mero de coisas que pode fazer com habilidade mediante o fortalecimento das instituiccedilotildees puacuteblicas

Sendo assim espera-se que as administraccedilotildees puacuteblicas federais estaduais municipais ou seja

todos os niacuteveis da administraccedilatildeo puacuteblica estejam preparados para enfrentar os desafios gerando as-

sim melhores resultados para a sociedade isto eacute em uacuteltima instacircncia se colocarem como instrumento

da sociedade a que serve

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

285

REFEREcircNCIAS

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CREPALDI Silvio Aparecido Orccedilamento Puacuteblico teoria e praacutetica Minas Gerais INPA 2008

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PASSOS Carlos Roberto M NOGAMI Otto Princiacutepios de Economia 5 ed revisada Satildeo Paulo Thom-son Learning 2006

REZENDE Fernando Antocircnio Financcedilas Puacuteblicas 2 ed Satildeo Paulo Atlas 2001

RIANI Flaacutevio Economia do Setor Puacuteblico 4 ed Satildeo Paulo Atlas 2002

ZOTTMANN Luiz Vocecirc o Estado e a questatildeo fiscal Rio de Janeiro Documenta Histoacuterica 2008

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

286

REFORMA TRIBUTAacuteRIA DESENVOLVIMENTO ECONOcircMICO E JUSTICcedilA FISCAL NO BRASIL DIAGNOacuteSTICO E PERSPECTIVAS

SUMAacuteRIO Introduccedilatildeo 1 Tributaccedilatildeo e justiccedila fiscal no Brasil diagnoacutestico 2 Tributaccedilatildeo e justiccedila fiscal no Brasil perspectivas Consideraccedilotildees finais Refe-recircncias

Marcelo Lettieri Siqueira1

INTRODUCcedilAtildeO

O debate sobre reformas tributaacuterias tem adquirido crescente importacircncia na definiccedilatildeo das poliacute-

ticas puacuteblicas no mundo globalizado principalmente quanto ao efetivo papel do sistema tributaacuterio na

promoccedilatildeo do crescimento econocircmico e na reduccedilatildeo das desigualdades sociais e regionais

Diante do diagnoacutestico de que seus sistemas tributaacuterios natildeo cumprem o papel de facilitador e

fomentador de um desenvolvimento econocircmico inclusivo vaacuterios paiacuteses tecircm questionado seu modelo

tributaacuterio clamando por reformas urgentes independentemente do niacutevel de suas cargas tributaacuterias

do grau de desenvolvimento econocircmico-social de cada um deles e da qualidade dos serviccedilos puacuteblicos

colocados agrave disposiccedilatildeo de seus cidadatildeos

No Brasil embora haja um aparente consenso quanto agrave necessidade de se reformar o sistema

tributaacuterio vigente haacute grandes discordacircncias quanto aos caminhos a serem seguidos

Dada a inexistecircncia de um modelo ideal para qualquer paiacutes o que se procura ao menos en-

quanto se trabalha nos projetos de reforma eacute buscar a formulaccedilatildeo de um modelo que se aproxime de

certas caracteriacutesticas desejaacuteveis de qualquer sistema tributaacuterio justo e eficiente Eacute a partir dessa pre-

missa que pesquisadores tecircm convergido para o estabelecimento de cinco caracteriacutesticas desejaacuteveis

que segundo eles devem ser perseguidas para a obtenccedilatildeo de um sistema tributaacuterio eficiente eficaz

e efetivo na promoccedilatildeo do desenvolvimento econocircmico-social eficiecircncia simplicidade flexibilidade

responsabilidade poliacutetica e justiccedila fiscal

Em relaccedilatildeo agrave eficiecircncia econocircmica estabelecem que um sistema tributaacuterio adequado natildeo deve

interferir na alocaccedilatildeo eficiente de recursos Ou seja defendem que um tributo natildeo deve ser utilizado

de forma a alterar a decisatildeo que o contribuinte tomaria se ele o tributo natildeo existisse Como exemplo

uma isenccedilatildeo tributaacuteria natildeo deveria ser utilizada de forma a influenciar a localizaccedilatildeo de uma empresa

1 Graduado em Engenharia Mecacircnica Aeronaacuteutica pelo Instituto Tecnoloacutegico de Aeronaacuteutica (1994) Mestre e Doutor em Economia pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) Eacute professor colaborador da Universidade Federal do Cearaacute Auditor da Secretaria da Receita Federal do Brasil E-mail marlettierigmailcom

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

287

em um lugar que natildeo seria escolhido caso natildeo houvesse o referido benefiacutecio fiscal

Quanto agrave simplicidade advogam que o projeto de um sistema tributaacuterio justo e eficiente natildeo

pode deixaacute-lo demasiadamente complexo pois tal complexidade pode gerar custos tatildeo altos para a

sociedade que acabariam por prejudicar qualquer noccedilatildeo de eficiecircncia e justiccedila

A flexibilidade de um sistema tributaacuterio se refere ao seu poder de adaptar-se facilmente ao

ambiente econocircmico vigente Essa flexibilidade deve ser entendida como uma sintonia fina um ajuste

permanente do sistema tributaacuterio aos ciclos econocircmicos

Em relaccedilatildeo agrave responsabilidade poliacutetica defendem que o sistema tributaacuterio deve ser desenhado

de modo a permitir que os contribuintes saibam exatamente o quanto estatildeo pagando possibilitando

que o sistema poliacutetico possa refletir as preferecircncias dos indiviacuteduos

Por fim a justiccedila eacute uma das caracteriacutesticas mais desejadas e mais discutidas na elaboraccedilatildeo de

qualquer sistema tributaacuterio Para Sen (2011 p 33) o que eacute fundamental para a ideia de justiccedila ldquoeacute que

podemos ter um forte senso de injusticcedila com base em muitos fundamentos diferentes sem contudo

concordarmos que um fundamento especiacutefico seja a razatildeo dominante para o diagnoacutestico da injusticcedilardquo

Isso dificulta sobremaneira a definiccedilatildeo de quais elementos devem fundamentar um sistema tributaacuterio

que se coadune com a justiccedila fiscal

Dada essa extrema dificuldade praacutetica de sua definiccedilatildeo e alcance a justiccedila fiscal ou tributaacuteria

tem sido entendida como a aceitaccedilatildeo pela maioria do pacto tributaacuterio acordado Conveacutem ressaltar

que a linha de pensamento mais em voga tem sido a que defende a justiccedila ou progressividade em

relaccedilatildeo agraves atividades liacutequidas do Estado isto eacute o equiliacutebrio econocircmico apoacutes a ocorrecircncia das receitas

e despesas puacuteblicas No entanto a pouca progressividade observada em relaccedilatildeo aos gastos sociais

minou o argumento de que os paiacuteses deveriam arrecadar maximizando a eficiecircncia sem qualquer pre-

ocupaccedilatildeo com a justiccedila fiscal deixando para fazer justiccedila pelo lado dos gastos2

Nosso sistema tal como hoje estaacute concebido tem suas raiacutezes na reforma tributaacuteria de 1966

quando se privilegiou uma tributaccedilatildeo mais racional do ponto de vista econocircmico e a criaccedilatildeo de im-

postos modernos para a eacutepoca Data desse periacuteodo a introduccedilatildeo oficial de impostos incidentes sobre o

valor adicionado representados pelo Imposto sobre Circulaccedilatildeo de Mercadorias (ICM) e o Imposto so-

bre Produtos Industrializados (IPI) O objetivo era eliminar a tributaccedilatildeo em cascata reconhecidamente

uma das maiores fontes de distorccedilatildeo da economia

Todavia apesar do substancial avanccedilo que essa reforma representou para o paiacutes o sistema tri-

butaacuterio nacional natildeo continuou a evoluir isto eacute natildeo se adaptou agraves alteraccedilotildees ocorridas na estrutura

econocircmica brasileira desde entatildeo Em muitos aspectos ateacute se pode admitir que o sistema sofreu al-

guns retrocessos como no caso da introduccedilatildeo de contribuiccedilotildees sociais cumulativas

2 Veja por exemplos as conclusotildees do trabalho de Silveira (2008)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

288

Natildeo obstante a partir de 1994 a estabilidade econocircmica tem permitido a obtenccedilatildeo da estabi-

lidade fiscal o que possibilita a busca de um sistema tributaacuterio mais simples racional justo e eficiente

aleacutem de mais legiacutetimo no que concerne agrave responsabilidade poliacutetico-social

No entanto o paiacutes tem equivocadamente concentrado seus esforccedilos na ampliaccedilatildeo da tributa-

ccedilatildeo sobre o consumo seguindo a tendecircncia mundial e as teorias neoliberais que advogam a mudanccedila

para uma base tributaacuteria sobre o consumo porque provavelmente incentivaria a acumulaccedilatildeo de capi-

tal jaacute que removeria a tributaccedilatildeo sobre a renda do capital

Tal estrateacutegia ideoloacutegica tornou o nosso sistema mais injusto altamente regressivo e minou

qualquer possibilidade de se utilizar os instrumentos tributaacuterios para fins de reduccedilatildeo das desigualda-

des de renda e riqueza Isso o afastou da caracteriacutestica mais desejada por seus cidadatildeos a justiccedila fiscal

O que fazer entatildeo para revertermos esse quadro

Tributaristas e economistas argumentam que a equidade fiscal ndash e por decorrecircncia a justiccedila

fiscal ndash pode ser ampliada se diminuirmos a carga tributaacuteria bruta melhorarmos a transparecircncia da

tributaccedilatildeo e reduzirmos os custos de cumprimento das obrigaccedilotildees tributaacuterias Mas isso seria suficiente

no caso do Brasil que deteacutem um dos piores iacutendices de desigualdade do mundo e o quarto pior da

Ameacuterica Latina3 Seria possiacutevel resolver o grave problema da desigualdade brasileira com uma carga

tributaacuteria menor Definitivamente natildeo

De uma forma geral todos se acham injusticcedilados pelo que pagam de impostos e exigem refor-

mas Formou-se um consenso de que nossa carga tributaacuteria eacute elevada principalmente para os padrotildees

de serviccedilos puacuteblicos que satildeo prestados Entretanto as criacuteticas agrave alta carga tributaacuteria brasileira natildeo

enfrentam a discussatildeo sobre quem efetivamente paga a conta Isto eacute natildeo se discute de onde estamos

extraindo os recursos necessaacuterios ao financiamento do Estado quem recebe do governo esses recur-

sos e se a extraccedilatildeo e a distribuiccedilatildeo estatildeo sendo feitas de forma a reduzir as desigualdades

Eacute fundamental portanto ter em mente que o crescimento econocircmico eacute apenas um dos obje-

tivos da poliacutetica tributaacuteria de um paiacutes e que este deve ser conciliado com outros objetivos tatildeo impor-

tantes quanto como a promoccedilatildeo da justiccedila fiscal a garantia da estabilidade econocircmica e a adequaccedilatildeo

da reparticcedilatildeo federativa das receitas Objetivos que certamente seratildeo lembrados quando o sistema

tributaacuterio for reformado

E a boa notiacutecia eacute que jaacute haacute alguns consensos sendo estabelecidos o sistema tributaacuterio precisa

ser menos complexo e mais transparente eacute necessaacuterio um maior equiliacutebrio entre os diversos entes fe-

derativos (Uniatildeo Estados Distrito Federal e Municiacutepios) a tributaccedilatildeo excessiva do consumo altamente

3 Eacute o que aponta um estudo ineacutedito do Programa das Naccedilotildees Unidas para os Assentamentos Humanos (ONU-HABITAT) divulgado no dia 21082012 O Paiacutes aparece em condiccedilotildees melhores apenas que Guatemala Honduras e Colocircmbia todos com coeficiente acima de 056 (quanto mais proacuteximo do 1 maior a desigualdade) O melhor resultado foi o da Venezuela (041) seguida pelo Uruguai Veja reportagem da revista Carta Capital em httpwwwcartacapitalcombrsociedadebra-sil-e-o-quarto-pais-mais-desigual-da-america-latina Acesso em 19 jan 2014

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

289

regressiva deve ser reavaliada e a tributaccedilatildeo da renda mais progressiva principalmente da renda do

capital deve ser reconsiderada

E se desejarmos utilizar efetivamente o sistema tributaacuterio como instrumento de desenvolvi-

mento econocircmico e social eacute importante comeccedilar com objetivos bem estabelecidos e acordados que

devem incluir por exemplo a reduccedilatildeo da pobreza e das desigualdades sociais e regionais a eliminaccedilatildeo

de entraves burocraacuteticos agrave atividade empreendedora e o aumento da renda meacutedia do trabalhador en-

tre outros Estrateacutegias especiacuteficas devem ser concebidas e implementadas E deve haver uma relaccedilatildeo

clara entre a poliacutetica tributaacuteria e as estrateacutegias de desenvolvimento

Nesse sentido o presente artigo pretende contribuir para o debate apresentando um breve

diagnoacutestico da relaccedilatildeo entre tributaccedilatildeo e justiccedila fiscal no Brasil e algumas perspectivas para as proacutexi-

mas propostas de reforma tributaacuteria

Aleacutem da presente introduccedilatildeo o artigo estaacute organizado em mais trecircs seccedilotildees incluindo as con-

sideraccedilotildees finais Na segunda seccedilatildeo apresentamos um breve diagnoacutestico da relaccedilatildeo entre tributaccedilatildeo

e justiccedila fiscal no Brasil para em seguida mostrarmos algumas perspectivas quanto aos caminhos

desejaacuteveis rumo a uma reforma que promova a justiccedila fiscal no Brasil

1 TRIBUTACcedilAtildeO E JUSTICcedilA FISCAL NO BRASIL DIAGNOacuteSTICO

Conforme relatado por Gondim e Siqueira (2012) no final do seacuteculo XIX a tributaccedilatildeo no Brasil

era quase que totalmente concentrada em tributos sobre o comeacutercio exterior caracteriacutestica de siste-

mas tributaacuterios de paiacuteses natildeo industrializados tipicamente exportadores de commodities Agrave medida

que o paiacutes foi-se industrializando o ocircnus tributaacuterio passou o cair sobre o consumo tornando-se base

predominante jaacute no iniacutecio da deacutecada de quarenta

Por um curto periacuteodo histoacuterico nas deacutecadas de 70 e 80 tivemos a predominacircncia da tributaccedilatildeo

sobre a renda mas a partir da deacutecada de 90 com a hegemonia do projeto econocircmico neoliberal a tri-

butaccedilatildeo sobre o consumo voltou a predominar representando hoje cerca de 50 da Carga Tributaacuteria

Bruta conforme podemos observar no graacutefico a seguir

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

290

Analisando a distribuiccedilatildeo recente da carga tributaacuteria por vaacuterias bases de incidecircncia ndash que inclui

a propriedade a folha de salaacuterios e as operaccedilotildees financeiras aleacutem do consumo de bens e serviccedilos e

da renda ndash podemos observar como se distribui o ocircnus tributaacuterio no Brasil

O que se observa na tabela 1 a seguir para o ano 2012 eacute uma tributaccedilatildeo bastante concentrada

no consumo de bens e serviccedilos (1783 do PIB e 4973 da Arrecadaccedilatildeo Total) seguida pela incidecircn-

cia sobre a folha de salaacuterios (951 do PIB e 2653 da Arrecadaccedilatildeo Total) e sobre a renda (640 do

PIB e 1784 da Arrecadaccedilatildeo Total) enquanto a tributaccedilatildeo sobre operaccedilotildees financeiras (07 do PIB

e 195 da Arrecadaccedilatildeo Total) e sobre a propriedade (138 do PIB e 385 da Arrecadaccedilatildeo Total) eacute

quase insignificante

Carga Tributaacuteria e Variaccedilotildees por Base de Incidecircncia - 2012 x 2011

Ou seja as reformas tributaacuterias recentes tecircm acentuado uma anomalia do Brasil aumento da

tributaccedilatildeo sobre o consumo em detrimento da tributaccedilatildeo da renda agravando o quadro de desigual-

dade ou no miacutenimo natildeo permitindo uma maior reduccedilatildeo desta como observou Silveira (2008) em sua

relevante pesquisa

Em termo de anaacutelise comparativa internacional constata-se que paiacuteses com renda per capita

mais elevada tendem a tributar mais a renda do que o consumo a arrecadaccedilatildeo de tributos previden-

ciaacuterios tende a ser mais importante nesses paiacuteses (provavelmente em virtude da maior expectativa de

vida) chegando a ser a principal fonte de receita na Alemanha Franccedila Espanha e Japatildeo e a incidecircncia

sobre o consumo no Brasil eacute muito alta mesmo quando comparado a paiacuteses com renda semelhante

(Argentina Chile e Turquia)4

Em termos de Carga Tributaacuteria Bruta temos a seguinte realidade em comparaccedilatildeo com paiacuteses

da OCDE

Veja mais detalhes em Gondim e Siqueira (2012 Tabela 1 p 39)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

291

Mas como o proacuteprio conceito de Carga Tributaacuteria Bruta5 deixa claro tais nuacutemeros apenas

indicam o percentual dos recursos produzidos no paiacutes que satildeo apropriados pelo Estado para o finan-

ciamento das poliacuteticas puacuteblicas natildeo sendo possiacutevel fazer qualquer inferecircncia direta sobre quem eacute que

efetivamente financia o estado (quem paga a conta) ou sobre a relaccedilatildeo entre a Carga e a qualidade

dos serviccedilos puacuteblicos prestados

Como entatildeo podemos avaliar de forma mais precisa a relaccedilatildeo entre a arrecadaccedilatildeo de impostos

e a prestaccedilatildeo de serviccedilos puacuteblicos

Para isso precisamos trazer agrave baila o conceito de Carga Tributaacuteria Liacutequida (CTL) e de Carga Tri-

butaacuteria Liacutequida exclusive Juros (CTL-Juros)

Estudo recente do Instituto de Pesquisa Econocircmica Aplicada (Ipea) divulgado por meio do

Comunicado da Presidecircncia nordm 23 - Ipea (2009) resgatou o esquecido conceito de Carga Tributaacuteria Liacute-

quida (CTL) assim definindo-a ldquoa partir da Carga Tributaacuteria Bruta quando descontado o conjunto das

transferecircncias puacuteblicas e subsiacutedios imediatamente devolvido agrave sociedade chega-se agrave Carga Tributaacuteria

Liacutequida (CTL)rdquo

Referido estudo mostrou que

[] parcela significativa dos recursos arrecadados pelo governo em cada ano termina sendo prontamente devolvida para a sociedade na forma de transferecircncias puacuteblicas (pensotildees e aposentadorias e outros benefiacutecios previdenciaacuterios e assistenciais para ido-sos eou muito pobres eou portadores de deficiecircncias) e subsiacutedios ao setor privado (TAPS) (Ipea 2009)

5 Carga Tributaacuteria Bruta eacute uma medida do esforccedilo da sociedade para o financiamento das poliacuteticas puacuteblicas Ela eacute definida matematicamente como a relaccedilatildeo entre o total de tributos pagos num determinado ano (Arrecadaccedilatildeo Total) e o Produto Interno Bruto (PIB) a preccedilos de mercado neste mesmo ano A Secretaria da Receita Federal do Brasil (2013) calculou a Carga Tributaacuteria Bruta do Brasil em 2012 em 3585

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

292

Constata-se que em 2007 e 2008 tais transferecircncias representaram mais de 15 do PIB como mostra

o graacutefico a seguir

Transferecircncias de Assistecircncia e Previdecircncia e Subsiacutedios ( do PIB)

Assim a CTL nesses anos alcanccedilou cerca de 20 do PIB conforme se verifica no graacutefico a seguir

Carga Tributaacuteria Liacutequida - Receita Federal

No entanto como ressalta o referido estudo do Ipea

a Carga Tributaacuteria Liacutequida natildeo eacute ainda uma boa aproximaccedilatildeo dos recursos efetiva-mente agrave disposiccedilatildeo dos governos brasileiros para a prestaccedilatildeo de serviccedilos puacuteblicos (sauacutede educaccedilatildeo seguranccedila entre outros) e para os bens puacuteblicos (estradas aero-portos prisotildees entre outros) para toda populaccedilatildeo Haacute que considerar tambeacutem as despesas com o pagamento de juros que decorrem do endividamento puacuteblico que ultrapassam 5 do PIB ao ano (Ipea 2009)

Logo se o nosso objetivo eacute comparar a qualidade dos serviccedilos puacuteblicos entre paiacuteses em funccedilatildeo

dos impostos pagos devemos utilizar o conceito de Carga Tributaacuteria Liacutequida exclusive Juros (CTL-j)

Como lembrou o Ipea

quando se desconta da Carga Tributaacuteria Liacutequida o pagamento com juros obteacutem-se uma aproximaccedilatildeo mais razoaacutevel da quantia de recursos anual efetivamente disponiacutevel para fazer frente aos bens puacuteblicos e agrave prestaccedilatildeo dos serviccedilos do Estado no Brasil Apesar de sua elevaccedilatildeo relativa no periacuteodo recente a Carga Tributaacuteria Liacutequida exclusi-ve juros (CTL-j) representou 1485 do PIB em 2008 (Ipea 2009)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

293

Eacute o que mostra a tabela 2 a seguir

Tabela 2 - CTB TAPS CTL Juros liacutequidos e CTL-j em 2006

Verifica-se que embora a CTB do Brasil seja superior a do Canadaacute devemos observar que este

paiacutes deteacutem 225 (correspondente agrave sua CTL-j) do PIB para investimentos em serviccedilos e obras puacute-

blicas valor muito superior aos 131 do Brasil Entre os paiacuteses da OCDE somente a Greacutecia possuiacutea

em 2006 CTL-j inferior a do Brasil mas praticamente na mesma magnitude A Polocircnia com CTB bem

proacutexima a do Brasil detinha uma CTL-j de 177 cerca de 45 pp acima da brasileira

Portanto natildeo eacute intelectualmente honesto utilizar a CTB como elemento de comparaccedilatildeo entre

paiacuteses dos serviccedilos puacuteblicos prestados aos seus cidadatildeos sendo mais adequado para tal a utilizaccedilatildeo

da CTL-j

E quanto agrave tese de que o sistema tributaacuterio deve buscar a eficiecircncia em detrimento da equidade

deixando para o lado dos gastos o papel de buscar a justiccedila fiscal Seraacute que ela se sustenta no Brasil

Ou seja seraacute que a regressividade do nosso sistema tributaacuterio tem sido compensada pela progressivi-

dade do lado do gasto puacuteblico

As evidecircncias mostram que natildeo

Silveira (2008) demonstrou em seu estudo que

a) natildeo houve alteraccedilatildeo significativa na concentraccedilatildeo da renda pessoal resultado do conjunto de poliacuteticas consideradas ndash aposentadorias e pensotildees programas de trans-ferecircncia de renda auxiacutelios seguro-desemprego bolsa de estudo impostos sobre a renda contribuiccedilotildees previdenciaacuterias impostos sobre imoacuteveis e veiacuteculos e impostos ou contribuiccedilotildees sobre o consumob) baixo impacto distributivo dos benefiacutecios previdenciaacuterios e assistenciais do segu-ro-desemprego e das outras transferecircncias monetaacuterias comparativamente ao que se observa nos paiacuteses desenvolvidos

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

294

Ou seja a opccedilatildeo que o Brasil teria adotado nas deacutecadas de 1990 e 2000 ndash tributaccedilatildeo regressiva

concentrada sobre o consumo (com pretensa maior eficiecircncia) combinada com gastos progressivos

ndash natildeo se efetivou no que se refere agrave poliacutetica de gastos Isso nos deixou no pior dos mundos um qua-

dro onde tanto a tributaccedilatildeo quanto os gastos sociais aumentaram as desigualdades de renda ou no

miacutenimo natildeo permitiram que a reduccedilatildeo observada nos uacuteltimos anos6 fosse mais acentuada

Outra evidecircncia de que esperar a promoccedilatildeo da justiccedila fiscal somente pelo lado dos gastos puacute-

blicos natildeo se mostra suficiente foi apresentada num estudo do Ipea de julho de 2009 divulgado por

meio do ldquoComunicado nordm 22 da Presidecircncia do Ipea (2009)rdquo Aquele renomado Instituto analisou deta-

lhadamente o destino da carga tributaacuteria discriminando quanto se destina de recursos puacuteblicos para

os principais programas e accedilotildees do governo federal tanto em termos de volume de recursos quanto

de nuacutemero de beneficiaacuterios

O estudo comparou o que foi recolhido aos cofres puacuteblicos e o que foi destinado aos progra-

mas de governo nas aacutereas de sauacutede educaccedilatildeo previdecircncia e assistecircncia social dentre outras incluin-

do o montante destinado ao pagamento dos juros da diacutevida puacuteblica

Segundo o Ipea (2009) o montante destinado ao pagamento de juros da diacutevida puacuteblica

recebeu em 2008 somente do governo federal 38 do PIB enquanto o Programa Bolsa Famiacutelia

que complementa a renda de 12 milhotildees de famiacutelias custou ao governo federal 04 do PIB dez

vezes menos

O financiamento do Programa Bolsa Famiacutelia exige arrecadar o equivalente a um dia e meio de

trabalho do contribuinte Mas para financiar a diacutevida puacuteblica a Uniatildeo os Estados o Distrito Federal

e os municiacutepios destinaram em conjunto 56 do PIB (valores de 2008) ou seja 20 dias e meio de

trabalho do cidadatildeo brasileiro quase um sexto de toda a carga tributaacuteria arrecadada em 2008

Para as mais importantes aacutereas de atuaccedilatildeo do governo sauacutede e educaccedilatildeo foram destinados

36 do PIB ou 13 dias de trabalho do contribuinte e 43 do PIB ou 157 dias de trabalho respecti-

vamente Tais dados datildeo uma ideia das prioridades nacionais

Natildeo eacute difiacutecil pois imaginar a razatildeo pela qual natildeo houve uma gritaria do andar de cima pelo au-

mento dos impostos e dos juros no Brasil nas deacutecadas de 1990 Ambos beneficiaram exclusivamente

os detentores da renda e riqueza nacionais que ganharam ldquocomo nunca antes na histoacuteria desse paiacutesrdquo

tanto pelo lado da remuneraccedilatildeo dos tiacutetulos da diacutevida puacuteblica como pelo que deixaram de pagar em

impostos e a receber de incentivos (GONDIM SIQUEIRA 2012)

Mas como podemos mudar esse quadro Eacute o que pretendemos explorar na proacutexima seccedilatildeo

6 Conforme demonstrado em Barros et al (2007)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

295

2 TRIBUTACcedilAtildeO E JUSTICcedilA FISCAL NO BRASIL PERSPECTIVAS

Conforme relatou Mahon Jr (2012) haacute basicamente trecircs alternativas para as eventuais refor-

mas tributaacuterias na Ameacuterica Latina ampliar e aprofundar as reformas do pacote neoliberal ndash o que tem

sido proposto mas se tornou praticamente indefensaacutevel apoacutes a crise de 2008 promover ajustes no

modelo neoliberal mas sem efetivamente promover uma tributaccedilatildeo redistributiva ndash como tem sido

tentado nas uacuteltimas duas deacutecadas sem sucesso ou definitivamente engajarmo-nos nos movimentos

em direccedilatildeo agrave maior progressividade do sistema tributaacuterio como condiccedilatildeo primeira agrave efetiva reduccedilatildeo

das desigualdades ndash o que natildeo foi tentado ateacute entatildeo

Conforme ressaltaram Gondim e Siqueira (2012)

[] depois da crise mundial - iniciada em setembro de 2008 e acentuada em 2009 - cujo efeito propaga-se continuadamente poucos economistas exatamente aque-les que comandam os grandes fundos de investimento como a Goldman Sachs por exemplo apostariam na ampliaccedilatildeo das reformas do pacote liberal agraves quais denomi-nam de ldquoreformas de segunda geraccedilatildeordquo O que temos visto nos debates recentes in-cluindo o eleitoral tem sido uma tentativa mal disfarccedilada de promover meros ajustes no modelo neoliberal sem redistribuiccedilatildeo efetiva do ocircnus tributaacuterio Em outras pala-vras um pouco mais do mesmo

A tocircnica das principais propostas de reforma tributaacuteria no Brasil tem sido a mesma simplifica-

ccedilatildeo pura e simples desoneraccedilotildees da renda do capital e da folha de pagamentos sem qualquer avalia-

ccedilatildeo criacutetica dos efeitos sobre o financiamento da Previdecircncia Social e sobre a regressividade do sistema

entre outras (GONDIM SIQUEIRA 2012)

Mahon Jr (2012) destaca que ningueacutem ousou ateacute o presente momento incluir no debate das

reformas tributaacuterias na Ameacuterica Latina a necessidade de novos movimentos em direccedilatildeo agrave maior pro-

gressividade do sistema No caso do Brasil isso implicaria repensar por exemplo o princiacutepio da sele-

tividade na tributaccedilatildeo sobre o consumo de artigos de luxo (como fez o Equador com a criaccedilatildeo do Im-puesto a los Consumos Especiales em 2008) ampliar os impostos sobre a propriedade especialmente

sobre a terra nua com a sua utilizaccedilatildeo como instrumento tanto de reforma agraacuteria quanto de controle

ambiental instituir o imposto sobre as grandes fortunas e avanccedilar rumo a maior progressividade na

tributaccedilatildeo sobre a renda de modo a alcanccedilar efetivamente a renda do capital

Eacute fundamental ter um norte E este deve ser no sentido de resgatar o sistema tributaacuterio como

instrumento de redistribuiccedilatildeo de renda E eacute importante reconhecer tambeacutem que nas proacuteximas refor-

mas ainda natildeo seraacute possiacutevel abrir matildeo de receitas (natildeo haacute espaccedilo para a ldquopretendidardquo reduccedilatildeo da Car-

ga Tributaacuteria Bruta) seja porque o endividamento estatal continua elevado o que causa uma enorme

pressatildeo sobre o Tesouro seja porque haacute muito ainda que se investir em poliacuteticas sociais principalmen-

te nas aacutereas vitais da sauacutede e educaccedilatildeo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

296

E quanto agraves desigualdades regionais Como uma reforma no sistema tributaacuterio nacional pode-

ria contribuir para a reduccedilatildeo da vergonhosa disparidade de renda

Como eacute de amplo conhecimento a economia brasileira eacute bastante concentrada em duas regi-

otildees geograacuteficas o Sudeste e o Sul do paiacutes que possuiacuteam PIB per capita em 2010 de R$ 1160000 e

R$ 1014000 (a preccedilos constantes de 2000) respectivamente O PIB dessas regiotildees representava na-

quele ano 72 do PIB brasileiro para 55 da populaccedilatildeo do paiacutes No extremo inferior as regiotildees Norte

e Nordeste apresentavam PIB per capita de R$ 567000 e R$ 402700 (a preccedilos constantes de 2000)

respectivamente com participaccedilatildeo conjunta no PIB brasileiro de apenas 19 embora possuam 38

da populaccedilatildeo do paiacutes7

Conforme ressaltaram Paes e Siqueira (2005) a existecircncia de grandes desigualdades regionais

exerce influecircncia negativa sobre os padrotildees de desenvolvimento de um paiacutes e sobre o bem-estar da

sua populaccedilatildeo podendo levar agrave ruptura do pacto federativo E a crenccedila no mercado como elemento

suficiente para induzir um processo de convergecircncia da renda nacional todavia natildeo parece se susten-

tar ateacute porque o desenvolvimento econocircmico tem se mostrado cada vez mais dependente da inserccedilatildeo

competitiva dos paiacuteses e regiotildees no mercado mundial e a abertura necessaacuteria para essa inserccedilatildeo tende

a agravar as desigualdades presentes no interior das sociedades nacionais

Assim a superaccedilatildeo das assimetrias sociais e regionais passa necessariamente pela mediaccedilatildeo

do Estado que continua exercendo um papel importante como indutor do desenvolvimento econocircmi-

co E para mitigar essas disparidades regionais o governo brasileiro adotou programas de desenvol-

vimento baseados em instrumentos creditiacutecios e tributaacuterios como os fundos fiscais de investimentos

regionais e as transferecircncias constitucionais da Uniatildeo para os Estados e Municiacutepios que compotildeem o

Fundo de Participaccedilatildeo dos Estados (FPE) e o Fundo de Participaccedilatildeo dos Municiacutepios (FPM)

Apesar de o FPE e FPM trazerem uma razoaacutevel melhoria na distribuiccedilatildeo de recursos entre os

estados brasileiros ainda permanece inaceitaacutevel que cidadatildeos de locais menos favorecidos tenham agrave

sua disposiccedilatildeo menos da metade dos recursos disponiacuteveis para regiotildees mais desenvolvidas8

Logo uma poliacutetica fiscal que busque combater as desigualdades regionais deve privilegiar a

transferecircncia de recursos para os estados mais pobres com o objetivo principal de promover o desen-

volvimento da infraestrutura e do capital humano desses estados

Tal poliacutetica pode ser desenhada a partir de um modelo de tributaccedilatildeo que promova maior equi-

dade na distribuiccedilatildeo das receitas tributaacuterias entre os estados fator essencial para um maior equiliacutebrio

socioeconocircmico da federaccedilatildeo

Uma alternativa poliacutetica e economicamente viaacutevel seria a adoccedilatildeo do princiacutepio do destino nas

transaccedilotildees interestaduais como se pretendeu por exemplo na PEC 2332008 devendo-se promover

7 Fonte Ipeadata Dados Regionais PIB Per Capita (R$ de 2000)8 Veja em PAES SIQUEIRA(2005)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

297

a alteraccedilatildeo concomitantemente do mecanismo de incentivos regionais ateacute o momento utilizado ex-

tinguindo-se alguns deles e ao inveacutes de reduzir a tributaccedilatildeo ou fornecer creacutedito subsidiado para as

empresas privadas destinar os recursos aos estados com arrecadaccedilatildeo per capita mais baixa

Em estudo recente Paes e Siqueira (2005) demonstraram as vantagens da adoccedilatildeo do princiacutepio

do destino na cobranccedila do ICMS Foram consideradas duas possibilidades uma englobando todos os

Estados e outra excetuando o Amazonas por conta da especificidade envolvendo a Zona Franca de

Manaus Aleacutem disso os estados ganhadores puderam aumentar as suas despesas com o ganho de

arrecadaccedilatildeo ou repassaacute-lo para as famiacutelias via transferecircncias de rendas

Os resultados mostraram que somente seis Estados perderiam com a implantaccedilatildeo dessa nova

sistemaacutetica Goiaacutes Santa Catarina Mato Grosso do Sul Satildeo Paulo Espiacuterito Santo e Amazonas Entre os

maiores ganhadores estariam o Maranhatildeo Distrito Federal Roraima Acre Alagoas e Piauiacute Em termos

macroeconocircmicos haveria um pequeno aumento no consumo e uma reduccedilatildeo progressiva do produto

e do estoque de capital mas nada significativo Do ponto de vista da equidade se os ganhos forem

transferidos agraves famiacutelias haveria uma significativa reduccedilatildeo da pobreza notadamente nos Estados mais

pobres mas com pouca variaccedilatildeo na desigualdade regional com um pequeno ganho para os Estados

do Nordeste

E todos os estados teriam um patamar miacutenimo de arrecadaccedilatildeo equivalente a 80 da arreca-

daccedilatildeo per capita estadual meacutedia brasileira um resultado bastante significativo e com efeitos diretos e

indiretos sobre a pobreza e a desigualdade no Brasil

Embora ciente da dificuldade poliacutetica de se conduzir uma reforma que promova perdas no cur-

to prazo para alguns entes federativos acredito que o quadro atual de desigualdade regional pratica-

mente estagnado haacute deacutecadas deve servir de fonte de pressatildeo da sociedade para que tais modificaccedilotildees

sejam finalmente promovidas E a Uniatildeo teria o papel de equalizar essas perdas no curto prazo por

meio de fundos de compensaccedilatildeo

Em suma o Brasil deve decidir o que pretende do seu sistema tributaacuterio estabelecendo obje-

tivos especiacuteficos que certamente estaratildeo em conflito uns com os outros Natildeo satildeo conflitos insuperaacute-

veis mas que devem ser debatidos e equacionados com um maior teor de equidade vertical e respeito

aos comandos tributaacuterios constitucionais

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

O Brasil vive um momento iacutempar e uma oportunidade uacutenica A transformaccedilatildeo econocircmica

que estamos vivenciando neste novo milecircnio deve continuar o seu curso mas ameaccedila deixar o pa-

pel do Sistema Tributaacuterio sobre a reduccedilatildeo da pobreza e das desigualdades sociais e regionais em

segundo plano As decisotildees relativas agrave tributaccedilatildeo e agraves poliacuteticas de desenvolvimento econocircmico

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

298

precisam ser colocadas no centro do debate se quisermos influenciar positivamente a qualidade

de vida das proacuteximas geraccedilotildees

O Brasil deve decidir o que quer do seu sistema tributaacuterio estabelecendo objetivos especiacuteficos

que certamente estaratildeo em conflito uns com os outros Estes conflitos e dilemas devem ser abordados

debatidos e equilibrados Quanta equidade eacute possiacutevel obter a partir do seu sistema tributaacuterio sabendo

que impostos distorcem a atividade econocircmica Quatildeo rapidamente as receitas tributaacuterias devem cres-

cer durante periacuteodos prolongados de expansatildeo econocircmica e quatildeo estaacutevel devem ser a arrecadaccedilatildeo

em diversas fases do ciclo econocircmico Quatildeo alta pode ser a tributaccedilatildeo sem criar excessivas distorccedilotildees

econocircmicas Como programas de incentivos devem ser estruturados de forma a minimizar as perdas

de arrecadaccedilatildeo e ao mesmo tempo maximizar o desenvolvimento econocircmico Que poliacuteticas podem

ser projetadas para promover o investimento em capital humano e satisfazer as necessidades dos tra-

balhadores brasileiros

Natildeo eacute faacutecil responder a nenhuma dessas perguntas Mas precisamos fazer as escolhas agora

Estas e outras questotildees devem ser resolvidas por meio de uma discussatildeo ampla e democraacutetica cons-

truiacuteda sobre uma base soacutelida de conhecimento dados e informaccedilotildees o que remete aos Programas de

Educaccedilatildeo Fiscal uma imensa responsabilidade

Sabemos natildeo serem insoluacuteveis as muitas questotildees a serem tratadas nem de difiacutecil equacio-

namento a resposta agrave maior parte delas O que precisamos ter em mente eacute que devemos fazer uma

escolha com a clara avaliaccedilatildeo do seu impacto futuro

Natildeo se deve ignorar que um sistema tributaacuterio regressivo e uma baixa equidade vertical no sis-

tema fiscal como um todo eacute deleteacuteria para a sustentabilidade do modelo econocircmico-social brasileiro

com consequecircncias graves para a coesatildeo social e o pacto federativo

O essencial das reformas tributaacuterias vindouras eacute produzir um sistema tributaacuterio voltado para o

desenvolvimento mas com horizonte para aleacutem da mera busca do crescimento econocircmico constituin-

do-se preferencialmente em instrumento imprescindiacutevel ao combate agrave pobreza e agraves desigualdades

sociais principalmente mediante o resgate do princiacutepio da progressividade e a substituiccedilatildeo parcial da

tributaccedilatildeo sobre o consumo pela tributaccedilatildeo sobre a renda

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

299

REFEREcircNCIAS

BARROS R P FOGUEL M N ULYSSEA G (Org) Desigualdade de Renda no Brasil uma anaacutelise da queda recente Brasiacutelia Ipea 2007 v II

BRASIL Ministeacuterio da Fazenda Secretaria da Receita Federal do Brasil Carga Tributaacuteria no Brasil ndash 2012 Anaacutelise por Tributo e Bases de Incidecircncia SANTANA I C (org) Brasiacutelia Centro de Estudos Tri-butaacuterios e Aduaneiros (Cetad) dez 2013

GONDIM F SIQUEIRA M L Bases Tributaacuterias Brasileiras penalizando os pobres e beneficiando os rentistas In CATTANI A D OLIVEIRA M R (Org) A Sociedade Justa e seus Inimigos Porto Alegre Tomo Editorial 2012

GONDIM F SIQUEIRA M L Tributaccedilatildeo e Desigualdade no Brasil de onde viemos onde estamos e para onde vamos Le Monde Diplomatique Brasil n 39 out 2010

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MAHON JR J E Tax Incidence and Tax Reforms in Latin America Woodrow Wilson Center Update on the Americas Washington Nov 2012 Disponiacutevel em httpwwwwilsoncenterorgsitesdefaultfilesWWC_LAP_MahonReport_0pdf Acesso em 10 jan 2014

PAES N L SIQUEIRA M L Anaacutelise dos efeitos econocircmicos da implantaccedilatildeo do princiacutepio do destino na cobranccedila do ICMS e suas implicaccedilotildees sobre a pobreza e a desigualdade de renda EconomiA Se-lecta Brasiacutelia(DF) v6 n3 p91ndash126 dez 2005 Disponiacutevel em httpwwwanpecorgbrrevistavol6vol6n3p91_123pdf Acesso em 10 jan 2014

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SEN Amartya A ideia de justiccedila Companhia das Letras Satildeo Paulo 2011

SILVEIRA F G Tributaccedilatildeo previdecircncia e assistecircncia sociais impactos distributivos Universidade Es-tadual de Campinas Instituto de Economia Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Economia Aplicada Tese de Doutorado 2008

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

300

PARTE IV

CONTROLE SOCIAL E NOVAS MIacuteDIAS

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

301

CIDADANIA FISCAL E NOVAS MIacuteDIAS

SUMAacuteRIO Introduccedilatildeo 1 Os contornos da cidadania fiscal 2 O controle social dos gastos puacuteblicos e a educaccedilatildeo fiscal 3 O exerciacutecio da cidadania fiscal e a utilizaccedilatildeo das novas miacutedias Consideraccedilotildees finais Referecircncias

Debora Bezerra de Menezes Serpa Maia1 Ana Ceciacutelia Bezerra de Aguiar2

INTRODUCcedilAtildeO

A arrecadaccedilatildeo de recursos pelo Estado feita por meio da tributaccedilatildeo sempre se demonstrou

como uma invasatildeo ao patrimocircnio dos cidadatildeos contribuintes motivo pelo qual diversas vezes esta

atividade provocou resistecircncia e indignaccedilatildeo aleacutem de questionamentos acerca da sua necessidade

A noccedilatildeo de cidadania fiscal no entanto ainda eacute incipiente em paiacuteses como o Brasil em que a

maioria dos cidadatildeos por ausecircncia de conscientizaccedilatildeo poliacutetica e da necessidade de controle social dos

recursos arrecadados natildeo procedem agrave averiguaccedilatildeo de como ocorre a aplicaccedilatildeo das receitas prove-

nientes de tributos e a gerecircncia do orccedilamento puacuteblico de forma geral o que daacute margem para que os

recursos sejam mal aplicados ou ainda desviados da finalidade

Contudo as novas miacutedias decorrentes da revoluccedilatildeo da informaacutetica e o crescente acesso agrave in-

formaccedilatildeo acabaram por trazer a oportunidade de modificaccedilatildeo dessa situaccedilatildeo de resignaccedilatildeo por meio

de avanccedilos como por exemplo a possibilidade de criar mecanismos de controle da efetiva destinaccedilatildeo

dos tributos e dos gastos puacuteblicos A fiscalizaccedilatildeo se torna muito mais faacutecil se orccedilamentos e gastos

puacuteblicos satildeo disponibilizados por exemplo em siacutetios da Rede Mundial de Computadores

Eacute imprescindiacutevel que as poliacuteticas puacuteblicas sejam acompanhadas da criaccedilatildeo de normas que facili-

tem o controle social Afinal natildeo basta que os cidadatildeos estejam conscientes de seus direitos e deveres

eacute necessaacuterio ainda que o Estado possibilite o exerciacutecio da fiscalizaccedilatildeo

A metodologia implementada neste trabalho foi primordialmente a pesquisa bibliograacutefica

1 Mestranda pelo Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Direito da Universidade Federal do Cearaacute especialista em Direito e Processo Tributaacuterios pela Universidade de Fortaleza membro pesquisadora do Centro de Estudos de Direito Constitucional da Faculdade de Direito da UFC (Cedic) na linha de pesquisa Educaccedilatildeo e cidadania membro pesquisadora do Grupo de pesquisa Democracia e Financcedilas Puacuteblicas da Faculdade de Direito da UFC advogada E-mail deborabezerragmailcom2 Mestranda pelo Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Direito da Universidade Federal do Cearaacute especialista em Direito Pro-cessual Civil pelo Centro Universitaacuterio Christus bolsista da Coordenaccedilatildeo de Aperfeiccediloamento de Pessoal de Niacutevel Superior (Capes) membro pesquisadora do Centro de Estudos de Direito Constitucional da Faculdade de Direito da UFC (Cedic) na condiccedilatildeo de coordenadora da linha de pesquisa Educaccedilatildeo e cidadania membro pesquisadora do Grupo de pesquisa Democracia e Financcedilas Puacuteblicas da Faculdade de Direito da UFC professora da Universidade de Fortaleza do Curso de graduaccedilatildeo em Direito advogada E-mail ceciliabdeaguiargmailcom

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

302

tendo em vista o caraacuteter eminentemente teoacuterico consistindo principalmente na leitura e no exame

das obras referenciadas documentos tais como legislaccedilotildees nacionais em especial a Constituiccedilatildeo da

Repuacuteblica Federativa do Brasil de 1988 Quanto agrave natureza a pesquisa caracteriza-se como qualitativa

uma vez que se procedeu a uma anaacutelise dos aspectos essenciais da temaacutetica das novas miacutedias e da

cidadania fiscal explicando-as poreacutem sem quantificar valores Quanto aos fins eacute exploratoacuteria por se

dar em caraacuteter preliminar com o escopo de tornar o tema mais familiar a partir da construccedilatildeo de hi-

poacuteteses Jaacute quanto agrave utilizaccedilatildeo dos resultados pura por se caracterizar pela finalidade de estudo sem

concreta mudanccedila na realidade

1 OS CONTORNOS DA CIDADANIA FISCAL

A cidadania desenvolveu-se dentro do fenocircmeno do Estado-naccedilatildeo que data da Revoluccedilatildeo

Francesa de 1789 Logo a construccedilatildeo da cidadania liga-se agrave relaccedilatildeo das pessoas com o Estado e com

a naccedilatildeo (CARVALHO 2005 p 12)

Para Marshall (2002 p 24) ldquocidadania eacute um status concedido agravequeles que satildeo membros inte-

grais de uma comunidade Todos aqueles que possuem o status satildeo iguais com respeito aos direitos e

obrigaccedilotildees pertinentes ao statusrdquo

Considerando a cidadania como uma construccedilatildeo histoacuterica posiccedilatildeo que tambeacutem se adota no

presente trabalho Marshall (2002 p 9) divide seu conceito em trecircs partes civil poliacutetica e social

A primeira relaciona-se com a aquisiccedilatildeo dos direitos de liberdade (de expressatildeo de locomoccedilatildeo

de pensamento etc) O elemento poliacutetico constitui-se na oportunidade de atuar interferindo no

exerciacutecio do poder Por fim a cidadania incorpora o elemento social que ldquo[] se refere a tudo que

vai desde o direito a um miacutenimo de bem-estar econocircmico e seguranccedila ao direito de participar por

completo na heranccedila social e levar a vida de um ser civilizado de acordo com os padrotildees que pre-

valecem na sociedaderdquo

No entanto a partir da deacutecada de 90 do seacuteculo passado passou-se a revisar o conceito de cida-

dania pautado precipuamente na titularidade de direitos Nesse diapasatildeo Lopes chama atenccedilatildeo para

a importacircncia de destacar no conceito de cidadania a noccedilatildeo de dever Segundo a autora ldquoa cidadania

deve ser concebida como um direito sendo que simultaneamente e paralelamente a noccedilatildeo de dever

deve ser inserida no seu conteuacutedo jaacute que natildeo existem direitos sem seus deveres correlatosrdquo (LOPES

2006 p 25)

Sobre o tema traz-se a liccedilatildeo de Nabais (2007 p 149-150) segundo o qual a cidadania passa

atualmente por um terceiro estaacutegio que ele denomina ldquocidadania solidaacuteriardquo ou ldquoresponsavelmente

solidaacuteriardquo Essa nova fase eacute inaugurada apoacutes a superaccedilatildeo das duas anteriores a cidadania do Estado

Liberal em que se buscava a defesa dos direitos individuais e a cidadania do Estado Democraacutetico

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

303

quando se procurou assegurar a participaccedilatildeo na vida poliacutetica do Estado Nessa nova etapa o cidadatildeo

desempenha um papel ativo assumindo responsabilidades que outrora ficavam a cargo exclusiva-

mente do Estado (2007 p 150)

A assunccedilatildeo dessa postura relaciona-se agrave solidariedade3 entre os membros da sociedade fruto

de um sentimento de pertenccedila que orienta suas accedilotildees na busca pelo bem-estar comum Ou seja haacute

a conscientizaccedilatildeo de que a comunidade consiste num todo formado por indiviacuteduos cujas consequecircn-

cias das accedilotildees (sejam positivas ou negativas) ultrapassam a esfera particular e interferem na configu-

raccedilatildeo desse todo4-5

Nesse tocante Torres insere na perspectiva atual do conceito em comento como um possiacutevel

desdobramento seu a cidadania fiscal6 Para o autor essa vertente da cidadania engloba natildeo somente

o estatuto do contribuinte mas tambeacutem

os aspectos mais largos da cidadania financeira que compreendendo a vertente da despesa puacuteblica envolve as prestaccedilotildees positivas de proteccedilatildeo aos direitos fundamen-tais e aos direitos sociais e as escolhas orccedilamentaacuterias questotildees que apresentam o maior deacuteficit de reflexatildeo teoacuterica no campo da cidadania (TORRES 1999 p 460)

Dessarte a ideia de cidadania fiscal deve englobar duas vertentes quais sejam tanto o co-

nhecimento acerca da funccedilatildeo da tributaccedilatildeo quanto a informaccedilatildeo sobre a importacircncia do controle da

aplicaccedilatildeo dos recursos puacuteblicos Eacute o magisteacuterio de Cruz e Amorim (2010 p 17)

O exerciacutecio da cidadania ativa percorre todos os momentos de funcionamento da vida puacuteblica O cidadatildeo deve pagar seus impostos consciente de que estaacute contribuindo para o bem da coletividade mas seu dever natildeo termina aiacute O cidadatildeo consciente participa de forma ativa das decisotildees de natureza puacuteblica e deve lutar para que se amplie seu poder de participaccedilatildeo e de decisatildeo soacute assim teremos uma democracia substantiva

3 Segundo Nabais a solidariedade [] enquanto fenoacutemeno estaacutevel ou duradouro e mais geral se refira agrave relaccedilatildeo ou o sentimento de pertenccedila a um grupo ou formaccedilatildeo social entre os muito grupos ou formaccedilotildees sociais em que o homem manifesta e realiza actualmente a sua affectio societatis dentro dos quais sobressai naturalmente a comunidade paradigma dos tempo modernos - o estado Do que resulta que a solidariedade pode ser entendida quer em seu aspecto objectivo em que se alude agrave relaccedilatildeo de pertenccedila e por conseguinte de partilha e de corresponsabilidade que liga cada um dos indiviacuteduos agrave sorte e vicissitudes dos demais membros da comunidade quer em sentido subjetivo e de eacutetica social dessa mesma pertenccedila agrave comunidade (2007 p 134)4 Nesse vieacutes Eduardo Marccedilal Grilo Presidente do Foacuterum Educaccedilatildeo para a Cidadania ocorrido em Portugal entre 2006 e 2008 assim prefaciou o relatoacuterio do evento ldquoMas a Cidadania natildeo eacute apenas o conjunto de direitos e deveres que os cidadatildeos devem exercer e cumprir O exerciacutecio da Cidadania eacute sobretudo um comportamento uma atitude e uma certa forma de ser de estar e de fazer em que cada um encara os problemas da sociedade em que se insere com a mesma prio-ridade com que aborda as suas questotildees individuais atendendo aos direitos dos outros e em particular no respeito pela diversidade e pelas diferenccedilas que caracterizam as sociedades em que vivemos nesta primeira deacutecada do seacuteculo XXI []rdquo (PORTUGAL 2008 on line) 5 No mesmo sentido ldquo[] na democracia o indiviacuteduo eacute cidadatildeo pessoa juriacutedica e responsaacutevel por um lado exprime sues desejos e interesses por outro eacute responsaacutevel e solidaacuterio com sua cidaderdquo (MORIN 2000 p 105) 6 ldquoO deverdireito de pagar impostos se coloca no veacutertice da multiplicidade de enfoques que a ideia de cidadania exibe Cidadatildeo e contribuinte satildeo conceitos coexistentes desde o inicio do liberalismordquo (TORRES 1999 p 460)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

304

Tem-se pois que a funccedilatildeo preciacutepua dos tributos eacute a sua aplicaccedilatildeo no financiamento das despe-

sas puacuteblicas Faz-se necessaacuteria a abordagem no entanto do fundamento da exaccedilatildeo tributaacuteria Afinal

o binocircmio ldquodespesas-receitasrdquo estaacute intimamente relacionado agrave ideia da figura estatal como propor-

cionadora do bem comum Nos ensinamentos de Torres (2006 p 3) ldquoOs fins e os objetivos poliacuteticos e

econocircmicos do Estado soacute podem ser financiados pelos ingressos na receita puacuteblica A arrecadaccedilatildeo dos

tributos [] constituem o principal item da receitardquo

O conceito de cidadania fiscal no entanto deve ser visto em uma dupla vertente uma vez que

esta soacute se concretizaraacute quando aleacutem de entenderem os contribuintes a importacircncia da atividade de

tributar como forma de arrecadar recursos para a manutenccedilatildeo da maacutequina estatal e para o fomento

dos direitos fundamentais exercitarem os cidadatildeos o controle social

2 O CONTROLE SOCIAL DOS GASTOS PUacuteBLICOS E A EDUCACcedilAtildeO FISCAL

Inerente agrave qualquer atividade administrativa o exerciacutecio do controle estaacute presente tambeacutem na

Administraccedilatildeo Puacuteblica Busca-se por meio da atividade de controle entendido como o conjunto de

mecanismos de fiscalizaccedilatildeo e de revisatildeo dos atos de natureza administrativa garantir que esses (os

atos administrativos) proporcionaratildeo o alcance dos objetivos coletivos sem desrespeitar os direitos

subjetivos dos indiviacuteduos (CARVALHO FILHO 2009 p 893-894)

Especificamente no que pertine agrave atividade financeira do Estado a Constituiccedilatildeo Federal de

1988 em seu art 70 disciplina a possibilidade de realizaccedilatildeo de controle externo e interno Dessa

forma o art 71 deixa a cargo do Congresso Nacional (na esfera federal) auxiliado pelo Tribunal de

Contas da Uniatildeo o controle externo dessa atividade consistente por exemplo em apreciar as contas

do Executivo os atos de admissatildeo de pessoal e de concessatildeo de aposentadoria reformas e pensatildeo e

na realizaccedilatildeo de auditorias nas unidades administrativas dos trecircs Poderes

O controle interno por seu turno disciplinado no art 74 da CF88 eacute realizado por cada Poder

oacutergatildeo sobre seus proacuteprios atos por meio da manutenccedilatildeo de sistemas de controle para dentre outras

funccedilotildees avaliar o cumprimento das metas previstas no plano plurianual exercer controle das opera-

ccedilotildees de creacutedito avais e garantias comprovar a legalidade e avaliar os resultados da gestatildeo orccedilamen-

taacuteria financeira e patrimonial dos oacutergatildeos e entidades da Administraccedilatildeo

Paralelamente a esse controle institucional ou estatal existe o controle social consistente na-

quele realizado por segmentos oriundos da sociedade Trata-se portanto de um controle exoacutegeno do

Poder Puacuteblico (CARVALHO FILHO 2009 p 902)

Garcia define controle social como ldquo[] uma particularizaccedilatildeo da funccedilatildeo de controle que tem

sido entendida como a atuaccedilatildeo de grupos sociais no controle da execuccedilatildeo das accedilotildees governamentais

e da administraccedilatildeo dos gestores puacuteblicosrdquo (2003 p 139)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

305

Destarte o sect 2ordm do art74 da CF88 determina que ldquoqualquer cidadatildeo partido poliacutetico asso-

ciaccedilatildeo ou sindicato eacute parte legiacutetima para na forma da lei denunciar irregularidades ou ilegalidades

perante o Tribunal de Contas da Uniatildeordquo7

A mencionada disposiccedilatildeo guarda perfeita sintonia com a ordem inaugurada pela Constituiccedilatildeo

Federal de 1988 que recebeu no discurso proferido na cerimocircnia de sua promulgaccedilatildeo pelo entatildeo

deputado Ulysses Guimaratildees a alcunha de ldquoCarta Cidadatilderdquo8

Nesse contexto de redemocratizaccedilatildeo em que o Brasil eacute constituiacutedo como Estado Democraacutetico

de Direito tendo a cidadania como um de seus fundamentos torna-se imprescindiacutevel a forte partici-

paccedilatildeo popular consequecircncia da atuaccedilatildeo dos cidadatildeos verdadeiros titulares do poder poliacutetico legiti-

mando seu exerciacutecio

Refletindo sobre a relaccedilatildeo em comento que congrega controle social democracia e soberania

popular Silva (2012 p 49-51) explica que

[] o controle integra a essecircncia do regime democraacutetico visto que este tem como pressuposto inafastaacutevel o sistema dos freios e contrapesos E mais corolaacuterio da so-berania popular ou seja do reconhecimento da titularidade do poder reservada ao povo evidente se torna a legitimidade dos cidadatildeos para controle do exerciacutecio do poder instituiacutedo Afinal a administraccedilatildeo puacuteblica incumbida de gerir a ldquocoisa puacuteblicardquo acha-se obrigada a uacutenica e exclusivamente direcionar as suas accedilotildees para a ultimaccedilatildeo do interesse coletivo fim uacuteltimo que deve perseguir []Trata-se de fato do reconhe-cimento de que a esfera puacuteblica natildeo diz respeito apenas ao Estado mas sim a todos que dele fazem parte

No entanto esse protagonismo do cidadatildeo necessaacuterio ao Estado Democraacutetico encontra seu

exerciacutecio prejudicado porque o Brasil enfrenta as adversidades decorrentes do processo de desenvol-

vimento da maacutequina gigantesca que engloba ciecircncia teacutecnica e burocracia Segundo Morin (2010 p

108-110) esse avanccedilo tornou a despeito das vantagens da divisatildeo do trabalho o saber hiperespe-

7 Sobre a citada disposiccedilatildeo constitucional Oliveira assevera que ldquoEvidente que este dispositivo conteacutem ao lado da legiti-midade ativa para denuacutencia de ilegalidades um apelo ao exerciacutecio da cidadania Eacute claro que qualquer um mesmo antes da existecircncia do dispositivo poderia denunciar irregularidades perante os oacutergatildeos puacuteblicos Todavia conveacutem que haja expressa previsatildeo para evitar que algum servidor burocrata deixe de tomar qualquer providecircncia sob a leviana ilegalidade ou ma-nifesta irregularidaderdquo (2011 p 458)8 ldquoA Constituiccedilatildeo mudou na sua elaboraccedilatildeo mudou na definiccedilatildeo dos poderes mudou restaurando a Federaccedilatildeo mudou quando quer mudar o homem em cidadatildeo e soacute eacute cidadatildeo quem ganha justo e suficiente salaacuterio lecirc e escreve mora tem hospital e remeacutedio lazer quando descansardquo (Discurso de Ulysses Guimaratildees na cerimocircnia de promulgaccedilatildeo da Constituiccedilatildeo Federal de 1988 em 05 out 1988 Disponiacutevel em lt httpwww2camaralegbratividade-legislativaplenariodiscursoses-crevendohistoriadestaque-de-materiasconstituinte-1987-1988pdfUlysses20Guimaraes20-20DISCURSO2020REVISADOpdfgt Acesso em 12 set 2012) No mesmo sentido transcreve-se o prefaacutecio de Ulysses Guimaratildees na ediccedilatildeo da Constituiccedilatildeo de 1988 lanccedilada pelo Senado Federal e posteriormente retirada de circulaccedilatildeo O homem eacute o problema da sociedade brasileira sem salaacuterio analfabeto sem sauacutede sem casa portanto sem cidadania A Constituiccedilatildeo luta contra os bolsotildees de miseacuteria que envergonham o Paiacutes Diferentemente das sete Constituiccedilotildees anteriores comeccedila com o homem Geograficamente testemunha a primazia do homem que foi escrita para o homem que o homem eacute seu fim e sua esperanccedila eacute a Constituiccedilatildeo cidadatilde Cidadatildeo eacute o que ganha come mora sabe pode se curar (BONAVIDES ANDRADE 2004 p 501)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

306

cializado e fragmentado dificultando seu acesso pelos cidadatildeos que perdem o direito ao conheci-

mento Instaura-se assim uma divisatildeo na sociedade entre os ldquoexpertosrdquo detentores do conhecimento

necessaacuterio agrave conduccedilatildeo das questotildees poliacuteticas e os cidadatildeos inaptos para posicionar-se em relaccedilatildeo a

situaccedilotildees que ignoram

Como consequecircncia tecircm-se o enfraquecimento do civismo e o exacerbamento do individualis-

mo o que mina a vida democraacutetica apesar de suas instituiccedilotildees continuarem existindo 9-10

Essa conjuntura pode ser configurada com a descriccedilatildeo de sociedade alienada feita por Freire

(1987 p 35) Segundo o autor seus membros natildeo possuem consciecircncia da existecircncia da sociedade

natildeo tendo portanto como se comprometer com a realidade responsabilizando-se apenas por si

Percebe-se dessa forma que para que se tenha de fato o exerciacutecio de um controle social

dos gastos puacuteblicos efetivo e consequentemente a ampliaccedilatildeo do regime democraacutetico no Brasil

eacute necessaacuterio mais que a previsatildeo normativa de direitos e de mecanismos de participaccedilatildeo popular

Imprescindiacutevel eacute a absorccedilatildeo pelos membros da sociedade da noccedilatildeo de solidariedade de compro-

metimento com a coletividade

Nesse sentido a soluccedilatildeo aponta impreterivelmente para a educaccedilatildeo como instrumento apto

a capacitar o cidadatildeo para o exerciacutecio de sua funccedilatildeo11 Como a educaccedilatildeo cidadatilde pode ser tatildeo

abrangente quanto o proacuteprio conceito de cidadania abordando os mais variados temas como

noccedilotildees de sauacutede de higiene de boas maneiras e de preservaccedilatildeo ambiental reserva-se um ramo

especiacutefico para a construccedilatildeo do conhecimento necessaacuterio ao exerciacutecio do controle social dos gas-

tos puacuteblicos a educaccedilatildeo fiscal

A educaccedilatildeo fiscal de acordo com o material utilizado no Brasil no Curso de formaccedilatildeo de disse-

minadores promovido pelo Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal pode ser assim definida

[] como uma abordagem didaacutetico-pedagoacutegica capaz de interpretar as vertentes fi-nanceiras da arrecadaccedilatildeo e dos gastos puacuteblicos estimulando o cidadatildeo a compreen-der o seu dever de contribuir solidariamente em benefiacutecio do conjunto da sociedade e por outro lado estar consciente da importacircncia de sua participaccedilatildeo no acompanha-mento da aplicaccedilatildeo dos recursos arrecadados com justiccedila transparecircncia honestidade e eficiecircncia minimizando o conflito de relaccedilatildeo entre o cidadatildeo contribuinte e o Estado arrecadador (BRASIL 2009 p 27)

9 Nas palavras de Morin ldquoNessas condiccedilotildees a reduccedilatildeo do poliacutetico ao teacutecnico e ao econocircmico a reduccedilatildeo do econocircmico ao crescimento a perda dos referenciais e dos horizontes tudo isso conduz ao enfraquecimento do civismo agrave fuga e ao refuacutegio na vida privada a alternacircncia entre apatia e revolta violenta e assim a despeito da permanecircncia das instituiccedilotildees democraacuteticas a vida democraacutetica enfraquecerdquo (2010 p 110)10 Percebe-se a configuraccedilatildeo do quadro de pobreza poliacutetica descrito por Demo segundo o qual ldquoNatildeo eacute exagero afirmar que o traccedilo mais profundo da pobreza poliacutetica de um povo seja a falta de organizaccedilatildeo da sociedade civil sobretudo frente ao Estado e agraves oligarquias econocircmicas Uma sociedade desorganizada natildeo chega a constituir-se como povo consciente e capaz de conquistas espaccedilo proacuteprio de auto-sustentaccedilatildeo da histoacuteria ao contraacuterio caracteriza-se como massa de manobrardquo (DEMO 2001 p 24-25)11 Nesse sentido ldquoPoreacutem eacute importante lembrar que controle social natildeo eacute algo tatildeo faacutecil de se conseguir O processo demo-craacutetico depende de aprendizado O simples estabelecimento de dispositivos legais e estruturais pode resultar num amon-toado de regras e mecanismos inuacuteteis pois natildeo correspondem agraves habilidade de cidadania desenvolvidas na sociedade civil

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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A importacircncia desse vieacutes da educaccedilatildeo cidadatilde eacute inegaacutevel Sabe-se que os termos envolvidos na

seara fiscal satildeo bastante teacutecnicos o que ocasiona a incompreensatildeo por parte da sociedade como um

todo Esse fator eacute responsaacutevel pelo desinteresse por assuntos relacionados agrave temaacutetica A educaccedilatildeo

fiscal visa entatildeo oferecer ao cidadatildeo o ferramental necessaacuterio para acessar esses conteuacutedos fazendo

com que assuntos outrora obscuros tornem-se familiares e faccedilam parte do dia a dia da comunidade

Ademais por meio dela torna-se possiacutevel a desconstruccedilatildeo da concepccedilatildeo marcante de antago-

nismo entre Estado e cidadatildeo existente no Brasil Pinsky retrata de forma bastante precisa o sentimen-

to que permeia essa relaccedilatildeo o qual ultrapassa o descomprometimento e alcanccedila a rivalidade

Por conta desse divoacutercio entre governo e sociedade ldquoelesrdquo natildeo nos respeitam e ldquonoacutesrdquo natildeo lhes damos legitimidade Noacutes natildeo nos sentimos responsaacuteveis pelos atos do go-verno portanto natildeo nos consideramos com obrigaccedilotildees diante das leis Burlar a lei sonegar impostos atravessar sinais vermelhos [] satildeo atos que creditamos frequen-temente a nossa esperteza e rebeldia nunca considerando-os lesivos agrave sociedade de cidadatildeos da qual noacutes fazemos parte ou deveriacuteamos fazer parte (1998 p 97)

Para substituir essa noccedilatildeo a educaccedilatildeo fiscal propotildee a conscientizaccedilatildeo de que natildeo existem o

Estado e os indiviacuteduos que se encontram subjulgados a ele O que haacute na realidade satildeo cidadatildeos que

se organizam em torno de uma ficccedilatildeo chamada Estado formada e coordenada por eles mesmos A

troca da relaccedilatildeo de competiccedilatildeo entre cidadatildeo e Estado pela de cooperaccedilatildeo ocasiona entatildeo a cons-

cientizaccedilatildeo da importacircncia de contribuir para o bem-estar da coletividade a partir do pagamento de

tributos e do acompanhamento da gestatildeo e da aplicaccedilatildeo dos recursos puacuteblicos garantindo que esses

seratildeo empregados devidamente nas aacutereas eleitas como aquelas que mais urgentemente necessitam

de investimento Como consequecircncia tem-se uma maior e mais democraacutetica fruiccedilatildeo de direitos em

especial dos classificados como sociais que de uma forma geral carecem de um maior investimento

estatal para se verem implementados

Ademais essa mudanccedila associa-se ainda ao sentimento de pertenccedila agrave comunidade e agrave solida-

riedade comentados anteriormente Pois o respeito pela coisa puacuteblica prescinde da noccedilatildeo de que na

sociedade em que se vive existem bens (materiais ou imateriais) que satildeo ao mesmo tempo proprie-

dade de todos E de forma concomitante convivem o direito de usufruiacute-los e o dever de preservaacute-los

lembrando que as consequecircncias das accedilotildees dirigidas a esse bens repercutiratildeo em todos

Aleacutem da educaccedilatildeo outro elemento primordial para a realizaccedilatildeo do controle social dos gastos

puacuteblicos eacute a disponibilizaccedilatildeo por parte do poder puacuteblico das informaccedilotildees necessaacuterias ao desempenho

brasileirardquo (SILVA 2002 p 39) No mesmo vieacutes ldquoNatildeo parece simples trabalhar nessas duas dimensotildees [na dimensatildeo da sociedade e na dimensatildeo da burocracia] para modificar valores seculares que caracterizam uma cultura arraigada que ain-da privilegia em muito o privado em detrimento do coletivo e que cristaliza a separaccedilatildeo Estado e sociedade dificultando o avanccedilo da evoluccedilatildeo do exerciacutecio da cidadania mas eacute possiacutevel confiar no processo se houver um investimento decisivo em educaccedilatildeo em informaccedilatildeo e principalmente na evoluccedilatildeo da consciecircncia democraacuteticardquo (GARCIA 2003 p 178)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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dessa atividade Em outras palavras ao realizar a gestatildeo financeira o Estado precisa agir com transpa-

recircncia que nada mais eacute do que uma expressatildeo do princiacutepio da publicidade (art 37 CF88) no acircmbito

das financcedilas puacuteblicas (RAMOS FILHO 2002 p 115) Trata-se de uma consequecircncia loacutegica do regime

republicano e do Estado Democraacutetico de Direito pois ldquose o povo eacute o titular do poder tem o direito

de conhecer tudo o que concerne agrave Administraccedilatildeo bem como controlar passo a passo o exerciacutecio do

poderrdquo (RAMOS FILHO 2002 p 115)rdquo12

As novas tecnologias e o acesso agrave informaccedilatildeo vecircm contribuindo ao facilitar a proliferaccedilatildeo de

dados e conhecimentos de forma essencial para a concretizaccedilatildeo de uma democracia mais participati-

va por meio da aproximaccedilatildeo entre a vontade popular e as decisotildees governamentais Dessa forma seraacute

possiacutevel alcanccedilar o efetivo exerciacutecio da cidadania em especial em sua vertente fiscal

Para tanto provavelmente o meio disponiacutevel na atualidade para a divulgaccedilatildeo e o acesso agraves

informaccedilotildees referentes agrave atividade financeira do Estado eacute a Rede Mundial de computadores Destarte

a seguir explorar-se-aacute a relaccedilatildeo entre cidadania fiscal e novas miacutedias

3 O EXERCIacuteCIO DA CIDADANIA FISCAL E A UTILIZACcedilAtildeO DAS NOVAS MIacuteDIAS

A ldquoRevoluccedilatildeo da Informaacuteticardquo caracterizada pela evoluccedilatildeo da Rede Mundial de computadores

dentre outros inuacutemeros avanccedilos vem proporcionando maior acesso agraves informaccedilotildees Greco (2000 p

16) ressaltou em sua obra a importacircncia da revoluccedilatildeo tecnoloacutegica para os novos rumos da sociedade

por se tratar natildeo somente de revoluccedilatildeo de natureza teacutecnica mas ldquorevoluccedilatildeo ligada ao proacuteprio padratildeo

da civilizaccedilatildeo ocidental que estaacute se alterando em sua concepccedilatildeo baacutesicardquo

Como jaacute mencionado o verdadeiro exerciacutecio da cidadania fiscal e o interesse por parte dos con-

tribuintes acerca dos gastos puacuteblicos apenas se concretiza com o acesso pela populaccedilatildeo a informaccedilotildees

sobre as formas de arrecadaccedilatildeo de receitas e sua destinaccedilatildeo o que permite inibir desvios dos recursos

arrecadados ensejando gestotildees mais responsaacuteveis As novas miacutedias vecircm assim colaborando para a

efetivaccedilatildeo de uma cidadania fiscal a partir do maior conhecimento dos cidadatildeos acerca do orccedilamento

puacuteblico bem como da sua destinaccedilatildeo

Cruz e Amorim (2010) destacam que na complexa sociedade atual as informaccedilotildees e os conheci-

mentos disseminados pelos meios de comunicaccedilatildeo tecircm cada vez maior importacircncia o que demonstra

o papel essencial que desenvolvem as novas tecnologias da informaccedilatildeo atualmente para o exerciacutecio

da cidadania fiscal

12 Sobre a relaccedilatildeo entre transparecircncia da atuaccedilatildeo do agente administrativo e a possibilidade de controle sobre seus atos ldquoJaacute natildeo mais se admite qualquer ato que possa burlar comandos normativos ou servir de impedimento a que qualquer pessoa tenha acesso agrave conduta do agente puacuteblico Este natildeo soacute tem que ser honesto mas tem o dever de mostrar-se como tal A publicidade assegura a possibilidade de controlerdquo (OLIVEIRA 2011 p 543)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

309

O mundo globalizado e digitalizado proporciona assim por meio da Internet e de outras novas

miacutedias que se efetivem meios de controle social antes inimaginaacuteveis como por exemplo os portais

de transparecircncia aleacutem de projetos de destaque nas redes sociais

Destacam-se projetos relacionados a tornar a tributaccedilatildeo indireta mais transparente cujo es-

copo eacute informar os cidadatildeos acerca da real incidecircncia de tributos sobre a circulaccedilatildeo de mercadorias

e as prestaccedilotildees de serviccedilos uma vez que o caraacuteter velado da tributaccedilatildeo sobre o consumo acaba por

provocar uma anestesia fiscal por natildeo sentir a populaccedilatildeo essa incidecircncia de impostos e contribuiccedilotildees

Esses projetos satildeo de suma importacircncia para a efetivaccedilatildeo da cidadania fiscal por tornarem mais

clara e evidente aos cidadatildeos-contribuintes a tributaccedilatildeo indireta o que faz com que percebam a real

carga tributaacuteria nacional

Citemos como exemplos o projeto ldquoQuanto Custa o Brasilrdquo organizado pelo Sindicato Nacional

dos Procuradores da Fazenda Nacional (Sinprofaz) e que por meio de miacutedias como a Internet e em

especial por meio das redes sociais busca divulgar o peso da carga tributaacuteria brasileira combater a

sonegaccedilatildeo bem como conscientizar a populaccedilatildeo sobre a necessidade de reforma tributaacuteria em espe-

cial propagando a importacircncia de se proceder agrave reduccedilatildeo da tributaccedilatildeo indireta O siacutetio eletrocircnico da

campanha possui ainda jogos educativos e histoacuterias em quadrinhos divulgadas na paacutegina todas com

intuito de conscientizar os cidadatildeos sobre a carga tributaacuteria nacional (SINPROFAZ 2014)

Deve-se ainda destacar que instrumentos como o impostocircmetro e o sonegocircmetro divulgados

natildeo apenas em paineacuteis nas ruas como tambeacutem atraveacutes de siacutetios eletrocircnicos tambeacutem constituem meios

de conscientizaccedilatildeo e promoccedilatildeo da cidadania fiscal

Os aplicativos de celular tambeacutem tecircm sido utilizados como forma de promover a cidadania fis-

cal O ldquoNa Realrdquo revela o percentual incidente sobre determinado produto bem como o valor em reais

correspondente a tributos (APLICATIVO 2013) Ao digitar o nome do produto e a quantia paga o

software apresenta o quantum de tributos que compotildeem o preccedilo da mercadoria a partir de uma base

de dados desenvolvida juntamente com o Instituto Brasileiro de Planejamento Tributaacuterio

Outros mecanismos que demonstram a importacircncia das novas miacutedias para a efetivaccedilatildeo da ci-

dadania fiscal satildeo as leis de Responsabilidade Fiscal e de Acesso agrave Informaccedilatildeo

A lei complementar nordm 10100 conhecida como Lei de Responsabilidade Fiscal eacute de destaque

por ter consagrado o princiacutepio da transparecircncia como pressuposto da gestatildeo fiscal responsaacutevel Para

Machado (2010 p 93) a questatildeo da transparecircncia tributaacuteria eacute de extrema relevacircncia no que se refere

aos direitos fundamentais do contribuinte Salienta o autor ainda

Realmente hoje a maioria das pessoas natildeo sabe que suporta o ocircnus dos denomina-dos impostos indiretos que incidem sobre o consumo Isso explica a preferecircncia pelos impostos indiretos em todos os paiacuteses nos quais prevalecem atualmente as ideias do neoliberalismo Seja pelo efetivo propoacutesito dos governantes de favorecer os muito ricos que suportam ocircnus tributaacuterio quase nenhum enquanto os pobres suportam quase inteiramente o peso do Estado

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

310

Posteriormente a lei nordm 1252711 caracterizou-se como mais uma tentativa de implementar

uma gestatildeo fiscal transparente ao regulamentar o acesso agrave informaccedilatildeo e a transparecircncia na atividade

administrativa com a determinaccedilatildeo da criaccedilatildeo dos Portais de Transparecircncia ou seja sites em que de-

vem ser disponibilizadas informaccedilotildees referentes agraves financcedilas dos Estados

Essas inovaccedilotildees normativas a partir da imposiccedilatildeo de divulgaccedilatildeo na Internet de informaccedilatildeo

acerca das receitas e dos gastos puacuteblicos ensejam o exerciacutecio do controle social sobre o orccedilamento

puacuteblico criando assim uma cultura de cidadania fiscal natildeo se limitando a participaccedilatildeo popular no

Estado democraacutetico agraves formas tradicionais

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

A maior facilidade de acesso agraves informaccedilotildees ocasionada pela revoluccedilatildeo tecnoloacutegica eacute ins-

trumento capaz de desenvolver a cidadania fiscal ensejando o controle por parte da populaccedilatildeo da

arrecadaccedilatildeo tributaacuteria Esse maior acesso jaacute tem produzido dentre diversos efeitos uma evoluccedilatildeo no

pensamento da sociedade a qual indaga por exemplo sobre a necessidade de pagar tributos o que

eacute ainda mais aflorado em paiacuteses como o Brasil em que a carga tributaacuteria parece ser demasiadamente

pesada para a precariedade do serviccedilo puacuteblico

Percebe-se que o verdadeiro exerciacutecio da cidadania fiscal apenas se concretiza com o acesso

pela populaccedilatildeo a informaccedilotildees sobre as formas de arrecadaccedilatildeo de receitas sua destinaccedilatildeo e sobre os

gastos puacuteblicos de forma geral

A cidadania fiscal demonstra sua importacircncia como forma de participaccedilatildeo popular na democra-

cia estimulando o controle social Essa ideia de cidadania soacute seraacute consolidada com a reivindicaccedilatildeo ao

Poder Puacuteblico de direitos e garantias presentes na nossa Constituiccedilatildeo com o cumprimento de deveres

e com a participaccedilatildeo ativa da tomada de decisotildees Nota-se que o mundo digitalizado proporciona que

se efetivem novos meios de controle social Destarte o acesso agrave informaccedilatildeo inibe desvios dos recursos

arrecadados por parte de governantes corruptos ensejando gestotildees mais responsaacuteveis

Em suma a efetivaccedilatildeo da cidadania fiscal eacute imprescindiacutevel jaacute que o pagamento de tributos eacute um

dever dos cidadatildeos uma vez que o Estado necessita de recursos para funcionar Logo o que se deve

ter em mente eacute a necessidade de participaccedilatildeo da sociedade no controle das receitas tributaacuterias ana-

lisando o efetivo destino dos tributos pagos bem como fornecendo subsiacutedios para que os cidadatildeos

entendam a importacircncia dos tributos para o custeio dos serviccedilos estatais em prol da sociedade

O exerciacutecio da cidadania fiscal pois em que a tributaccedilatildeo seja acompanhada de um controle

da destinaccedilatildeo dos recursos puacuteblicos pode proporcionar uma sociedade proacutespera com cidadatildeos em

situaccedilatildeo de vida digna

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

311

REFEREcircNCIAS

APLICATIVO mostra imposto embutido nos produtos Diaacuterio do Nordeste Disponiacutevel em lthttpdiariodonordesteglobocommateriaaspcodigo=1251560gt Acesso em 10 jan 2014

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A EVOLUCcedilAtildeO DOS ESFORCcedilOS DE TRANSPAREcircNCIA NA GESTAtildeO PUacuteBLICA NO CEARAacute

SUMAacuteRIO Introduccedilatildeo 1 A evoluccedilatildeo da transparecircncia puacuteblica no Cearaacute 2 As recentes medidas administrativas e institucionais para a transparecircncia puacuteblica no Cearaacute 3 As boas praacuteticas de transparecircncia fiscal no Cearaacute Consideraccedilotildees finais Referecircncias

Joseacute Joaquim Neto Cisne1

INTRODUCcedilAtildeO

O conceito de transparecircncia natildeo pode ser visto apenas sob a oacutetica do acesso agrave informaccedilatildeo Ela

tem uma dimensatildeo bem maior que o simples acesso agraves informaccedilotildees ou divulgaccedilatildeo dos dados Tem

por finalidade contribuir para o aprimoramento dos atos governamentais e incentivar a participaccedilatildeo

dos cidadatildeos como observam Assoni Filho (2009) e Christopoulos (2011a) A transparecircncia deve ser

entendida como um importante processo que contribui para a construccedilatildeo da cidadania envolvendo

outros elementos que pautam a eficiecircncia da Administraccedilatildeo Puacuteblica como a accountability 2 o com-

bate agrave corrupccedilatildeo confianccedila prestaccedilatildeo de serviccedilos clareza entre outros

Em 2005 no Foacuterum Global sobre a Reinvenccedilatildeo do Governo organizado pela United Nations Public Administration Network (UNIPAN) ficou demonstrada a importacircncia e a necessidade de um

modelo de boa gestatildeo como uma maneira de se construir a paz a prosperidade e as sociedades de-

mocraacuteticas (KIM et al 2005) Para uma boa governanccedila segundo a Organizaccedilatildeo para a Cooperaccedilatildeo e

Desenvolvimento Econocircmico (OCDE) eacute necessaacuterio melhorar a transparecircncia dos governos em relaccedilatildeo

a seus cidadatildeos (MOLINA BLASCO GOMIS 2011 p 139)

Nas uacuteltimas duas deacutecadas tem-se observado uma grande transformaccedilatildeo quanto agrave postura dos

cidadatildeos e da sociedade em relaccedilatildeo aos serviccedilos prestados pelos governos Tais transformaccedilotildees satildeo

consequecircncias das ideias da Nova Gestatildeo Puacuteblica que tem pautado as agendas internas dos governos

bem como os avanccedilos nos niacuteveis de formaccedilatildeo e exigecircncias dos cidadatildeos ajudados pelas novas tecno-

logias da informaccedilatildeo que possibilitaram uma maior transparecircncia das accedilotildees governamentais

1 Professor Adjunto da Universidade Estadual do Cearaacute (Uece) Doutor em Desenvolvimento Econocircmico e Auditor Fiscal da Receita Estadual na Secretaria da Fazenda do Cearaacute 2 O termo accountability segundo Campos (1990) ainda natildeo foi suficientemente traduzido para a liacutengua portuguesa Esse termo de um certo modo procura sintetizar as relaccedilotildees de controle que devem existir entre administraccedilatildeo puacuteblica funcionaacuterios e cidadatildeos Significa a ldquoobrigaccedilatildeo de responder pelos resultados no sentido do controle orccedilamentaacuterio e organizacional sobre os atos administrativos do respeito pela legalidade dos procedimentos e da responsabilizaccedilatildeo pelas consequecircncias da execuccedilatildeo das poliacuteticas puacuteblicasrdquo A adesatildeo ao processo de modernizaccedilatildeo e de racionalizaccedilatildeo da admi-nistraccedilatildeo diz respeito aos proacuteprios interesses dos indiviacuteduos como tambeacutem eacute reforccedilado pela confianccedila na forma como a eacutetica profissional eacute respeitada pela autoridade como observa Mozzicafreddo (2002)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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Apoacutes a redemocratizaccedilatildeo do paiacutes as reformas poliacuteticas administrativas e institucionais ini-

ciadas em meados da deacutecada de 1980 atentaram para a participaccedilatildeo social e foram adotadas as

primeiras medidas para dar maior transparecircncia agraves accedilotildees governamentais Este novo desenho na re-

laccedilatildeo entre o cidadatildeo e o Estado tem feito a gestatildeo puacuteblica inovar na busca de tornar mais eficiente

e transparente suas accedilotildees As medidas administrativas e institucionais introduzidas no Cearaacute a partir

da segunda metade dos anos de 1980 colocaram este Estado na vanguarda nacional por haver an-

tecipado um conjunto de reformas que somente aconteceriam quase uma deacutecada depois no acircmbito

do Governo Federal

Aleacutem dos dispositivos constitucionais (Constituiccedilatildeo Federal promulgada em 1988) que pri-

mam pela transparecircncia3 cabe ressaltar a lei de responsabilidade fiscal (Lei Complementar nordm 101

de 4 de maio de 2000) que define normas de financcedilas puacuteblicas voltadas para a responsabilidade na

gestatildeo fiscal Esta lei tem contribuiacutedo para tornar mais transparente as contas puacuteblicas ao trazer um

capiacutetulo especiacutefico intitulado ldquoDa Transparecircncia Controle e Fiscalizaccedilatildeordquo (artigos 48 a 59) sendo a

questatildeo da transparecircncia da gestatildeo fiscal tratada em seus artigos 48 e 49 Esta lei foi alterada pela

Lei Complementar nordm 131 de 27 de maio de 2009 denominada lei da transparecircncia que acrescen-

ta dispositivos agrave lei de responsabilidade fiscal determinando a disponibilidade em tempo real de

informaccedilotildees pormenorizadas sobre a execuccedilatildeo orccedilamentaacuteria e financeira da Uniatildeo dos Estados do

Distrito Federal e dos Municiacutepios Dentre as alteraccedilotildees estabelece no artigo 73-A que ldquoqualquer

cidadatildeo partido poliacutetico associaccedilatildeo ou sindicato eacute parte legiacutetima para denunciar ao respectivo Tri-

bunal de Contas e ao oacutergatildeo competente do Ministeacuterio Puacuteblico o descumprimento das prescriccedilotildees

estabelecidas nesta Lei Complementarrdquo

Mais recentemente em maio de 2012 entrou em vigor a lei de acesso agrave informaccedilatildeo puacuteblica (Lei

nordm 12527 de 18 de novembro de 2011) que regula o acesso a informaccedilotildees previsto no inciso XXXIII

do art 5o no inciso II do sect 3o do art 37 e no sect 2o do art 216 da Constituiccedilatildeo Federal dentre outras

E como preceitua o artigo 216 sect 2ordm dessa Constituiccedilatildeo ldquocabem agrave administraccedilatildeo puacuteblica na forma da

lei a gestatildeo da documentaccedilatildeo governamental e as providecircncias para franquear sua consulta a quantos

dela necessitemrdquo

Diante disso este trabalho tem por objetivo analisar os esforccedilos para promover a participaccedilatildeo

social e para tornar transparente as accedilotildees do governo no Cearaacute Para tanto este artigo adotou o

meacutetodo dedutivo com abordagem de pesquisa bibliograacutefica e documental procedendo uma revisatildeo

3 O artigo 5ordm inciso XXXIII da Constituiccedilatildeo Federal de 1988 estabelece que todos os cidadatildeos ldquotecircm direito a receber dos oacutergatildeos puacuteblicos informaccedilotildees de seu interesse particular ou de interesse coletivo ou geral que seratildeo prestadas no prazo da lei sob pena de responsabilidade ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindiacutevel agrave seguranccedila da sociedade e do Estadordquo Tambeacutem em seu artigo 37 define a publicidade dos atos administrativos dentre os princiacutepios que devem nortear a Administraccedilatildeo Puacuteblica E no sect 3ordm desse artigo estaacute determinado que a lei disciplinaraacute as formas de participaccedilatildeo do usu-aacuterio na administraccedilatildeo puacuteblica direta e indireta E o seu inciso II trata do acesso dos usuaacuterios a registros administrativos e a informaccedilotildees sobre atos de governo observado o disposto no art 5ordm X e XXXIII da referida Constituiccedilatildeo

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da literatura e uma anaacutelise dos diferentes planos de governo elaborados no Cearaacute a partir dos anos

de 1960

Este artigo conta com trecircs seccedilotildees de desenvolvimento sendo que na primeira seccedilatildeo se analisa

a evoluccedilatildeo da transparecircncia puacuteblica no Cearaacute na perspectiva dos diferentes planos de governo elabo-

rados nas uacuteltimas quatro deacutecadas Analisam-se as medidas administrativas e institucionais adotadas a

partir dos anos de 1980 e enfatizam-se em um segundo momento os aspectos positivos e os desafios

para implementar uma gestatildeo mais participativa na Administraccedilatildeo Puacuteblica do Cearaacute por meio dos

Conselhos formados por lideranccedilas poliacuteticas empresariais e intelectuais criados com o objetivo de

discutir as accedilotildees governamentais e estreitar as relaccedilotildees entre o Governo e a sociedade

Na terceira seccedilatildeo se analisam os recentes esforccedilos e as boas praacuteticas de transparecircncia fiscal no

Cearaacute destacando as medidas inovadoras no acircmbito da Administraccedilatildeo Tributaacuteria que vieram facilitar a

interaccedilatildeo entre o fisco e os contribuintes e romper com as velhas barreiras institucionais e operacio-

nais existentes nesta relaccedilatildeo

1 A EVOLUCcedilAtildeO DA TRANSPAREcircNCIA PUacuteBLICA NO CEARAacute

Analisando os diferentes planos de governo elaborados no Cearaacute desde o iniacutecio dos anos de

1960 observa-se que a participaccedilatildeo social e a transparecircncia puacuteblica somente fizeram parte da agenda

governamental muito recentemente em especial a partir dos anos de 1980

O primeiro plano elaborado pelo Governo do Estado para o periacuteodo de 1963-1966 considerava

o planejamento ldquoo meio mais adequado para vencer as deficiecircncias da ordem social e econocircmicardquo e

entendia que uma das formas de promover o desenvolvimento passa pela ldquoreformulaccedilatildeo dos meacutetodos

de accedilatildeo do Poder Puacuteblico abolindo-se praacuteticas obsoletas e anacrocircnicas de administraccedilatildeordquo Este plano

reconhecia a preponderacircncia da atuaccedilatildeo do Governo no processo de desenvolvimento do Estado

cabendo-lhe portanto impulsionar e estimular a sua expansatildeo no setor privado e disciplinar-lhe os in-

vestimentos no setor puacuteblico Destacava que no processo de desenvolvimento ldquonatildeo se pode dissociar

o fato social do fato econocircmico porque ambos visam atraveacutes do aumento da disponibilidade de bens

e serviccedilos agrave criaccedilatildeo de condiccedilotildees de bem estar da coletividaderdquo Este plano considera que o desenvol-

vimento deveria visar entre outras questotildees ldquoa manutenccedilatildeo dos serviccedilos de valorizaccedilatildeo humana e do

bem estar socialrdquo (CEARAacute 1963 p I-II) No entanto natildeo se constata uma maior preocupaccedilatildeo por parte

do governo em manter uma interaccedilatildeo efetiva com a sociedade por meio da participaccedilatildeo social ou em

promover a transparecircncia puacuteblica de seus atos

No segundo plano de governo elaborado para o periacuteodo de 1967-1970 foi considerado um

ldquograve problemardquo a ldquodispersatildeo de esforccedilos pela falta de entrosamento entre as atividades dos diversos

departamentos governamentaisrdquo (CEARAacute 1967 p 169) No que se refere ao esforccedilo da transparecircncia

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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este plano prevecirc a criaccedilatildeo de ldquoum oacutergatildeo Central de Relaccedilotildees Puacuteblicas e Informaccedilotildees e a institucionali-

zaccedilatildeo do processo de transmissatildeo de informaccedilatildeo em todos os sentidos da hierarquia administrativardquo

Para este governo o desenvolvimento econocircmico natildeo pode ser um problema soacute do governo mas

precisa contar com a entusiaacutestica colaboraccedilatildeo de toda a populaccedilatildeo para que possa ter ecircxito Poreacutem

natildeo definiu de forma clara quais os mecanismos seriam utilizados para intensificar essa interaccedilatildeo do

Governo com as empresas e com a sociedade

A ineficiecircncia do setor puacuteblico ficou mais uma vez caracterizada no plano de governo elaborado

para o periacuteodo de 1971-1974 quando se identificou na administraccedilatildeo estadual ldquoduplicidade funcional

entre vaacuterios oacutergatildeos conflitos de competecircncia e falta de racionalizaccedilatildeo para efeito de implantaccedilatildeo e

acompanhamento da execuccedilatildeordquo do referido plano Constatou-se tambeacutem que o sistema de planeja-

mento do Estado natildeo funcionava ldquosatisfatoriamenterdquo ainda que possuiacutesse o Fundo de Desenvolvimen-

to do Cearaacute (FDC) que era considerado um instrumento importante para a conduccedilatildeo do planejamento

do Estado A inoperacircncia desse sistema foi atribuiacuteda ao pouco dinamismo da proacutepria Secretaria de Pla-

nejamento bem como agrave falta de decisatildeo superior no sentido de implantar integralmente o sistema de

planejamento previsto Por isso considerava importante uma melhor adequaccedilatildeo da estrutura daquela

secretaria para dotaacute-la de condiccedilotildees de acompanhamento efetivo da execuccedilatildeo das metas e objetivos

do referido plano (CEARAacute 1971 p 117) Fica evidente que para esta missatildeo o Governo do Estado natildeo

contava com a colaboraccedilatildeo de outros segmentos da sociedade Este plano destacava como proposta

de modernizaccedilatildeo da Administraccedilatildeo Puacuteblica estadual os princiacutepios fundamentais definidos pelo De-

creto-Lei nordm 200 de 25 de fevereiro de 1967 que era o planejamento coordenaccedilatildeo descentralizaccedilatildeo

delegaccedilatildeo de competecircncia e controle4

No diagnoacutestico que antecedeu a elaboraccedilatildeo do plano de governo para o periacuteodo de 1975-1978

considerava que ldquoa ampliaccedilatildeo de atribuiccedilotildees e a consequente multiplicaccedilatildeo de instituiccedilotildees de forma

desordenada levaram a um gigantismo da maacutequina estadual e a uma estrutura administrativa com

razoaacuteveis deficiecircncias de funcionamentordquo E que essa hipertrofia orgacircnica e o paralelismo das accedilotildees

tornava difiacutecil a coordenaccedilatildeo administrativa comprometendo o seu bom desempenho Ademais ldquoo

paralelismo das accedilotildees nas vaacuterias poliacuteticas setoriais e a execuccedilatildeo de programaccedilatildeo estabelecidas nos

planos de desenvolvimentordquo representava um fator de significativos desperdiacutecios Quanto agrave avalia-

ccedilatildeo das poliacuteticas administrativas adotadas pelo governo este plano constatou falta de informaccedilotildees e

deficiecircncias na forma de disponibilizaacute-las que se dava de forma breve e com o intuito de identificar

possiacuteveis limitaccedilotildees ou inadequados procedimentos (CEARAacute 1975a p 210-211)

Um dos objetivos deste plano para a poliacutetica de accedilatildeo administrativa era ldquoreforccedilar o papel do se-

tor puacuteblico estadual como agente maior do processo de modernizaccedilatildeo e transformaccedilatildeo estrutural da

4 Este Decreto-Lei foi considerado pelo Governo Federal (1995) como uma introduccedilatildeo de administraccedilatildeo gerencial no Brasil uma vez que teve por objetivo o ldquomaior dinamismo e eficiecircncia da administraccedilatildeo puacuteblica brasileirardquo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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economia cearenserdquo (CEARAacute 1975b p 184) Natildeo constou deste plano nenhuma parceria com outros

segmentos da sociedade nem se referiu a nenhum esforccedilo para promover a transparecircncia de seus atos

ou participaccedilatildeo social

O plano de governo para o periacuteodo de 1983-1987 considerou importante adotar o meacutetodo

participativo de administraccedilatildeo natildeo somente na elaboraccedilatildeo do referido plano mas que fosse uma

ldquoconstante durante o periacuteodo administrativo quer nas revisotildees e atualizaccedilatildeo dos planos e projetos

setoriais que no processo de avaliaccedilatildeo das accedilotildees do Executivordquo (CEARAacute 1983) Apesar dessa vontade

expressa no diagnoacutestico do plano de Governo ldquoCearaacute Melhorrdquo para o periacuteodo de 1992-1995 fez refe-

recircncia a algumas questotildees que caracterizaram o Estado nos uacuteltimos trinta anos ldquocomo o demiurgordquo e

tambeacutem destaca a ldquocentralizaccedilatildeo federal combinada com o distanciamento da sociedade por forccedila do

autoritarismo poliacutetico que marcou o periacuteodo de 1964-1985rdquo que pouco permitia a participaccedilatildeo social

sem muita transparecircncia dos atos governamentais

Esta realidade comeccedilou a mudar na deacutecada de 1990 quando se deu inicio ao processo de refor-

ma do Estado brasileiro5 passando a adotar medidas a exemplo de outros paiacuteses como a privatizaccedilatildeo

de suas empresas estatais descentralizaccedilatildeo de serviccedilos para outros entes federados redesenho da

estrutura dos oacutergatildeos puacuteblicos adoccedilatildeo de medidas de estiacutemulo agrave participaccedilatildeo cidadatilde e agrave transparecircncia

esforccedilos para reduzir o excesso de burocracia entre outras

2 AS RECENTES MEDIDAS ADMINISTRATIVAS E INSTITUCIONAIS PARA A TRANSPAREcircNCIA PUacuteBLICA NO CEARAacute

A literatura mostra que o processo de desenvolvimento em cada sociedade eacute facilitado ou

dificultado de acordo como estatildeo estruturadas suas organizaccedilotildees e suas instituiccedilotildees jaacute que trazem

impactos diretos nos custos de transaccedilatildeo no niacutevel de confianccedila e na forma como se relacionam os

diferentes agentes Por isso North (1995 p 139) atribui um papel fundamental agraves instituiccedilotildees (regras

do jogo) nas sociedades quando as consideram como ldquoo determinante subjacente do desempenho

das economiasrdquo A funccedilatildeo principal das instituiccedilotildees na sociedade como argumenta North (1995 p 16)

ldquoeacute reduzir a incerteza estabelecendo uma estrutura estaacutevel (poreacutem natildeo necessariamente eficiente) da

interaccedilatildeo humanardquo

Algumas mudanccedilas institucionais importantes foram introduzidas no Brasil por meio da Consti-

5 A partir dos anos de 1980 vaacuterios paiacuteses por razotildees diversas promoveram mudanccedilas administrativas e institucionais como o objetivo de introduzir a ldquoNova Gestatildeo Puacuteblicardquo Estas reformas foram iniciadas pelo Reino Unido no governo de Margaret Thatcher com o chamado ldquomodelo de westminsterrdquo nos Estados Unidos no mandato de Ronald Reagan depois se expandiu para paiacuteses como Nova Zelacircndia Austraacutelia entre outros Os impactos destas medidas nos diferentes paiacuteses dependeram de seus marcos histoacutericos poliacuteticos e legais (FERLIE et al 1999) Maiores detalhes sobre as reformas no Estado brasileiro podem ser analisados em trabalhos como Governo Federal (1995) Bresser Pereira (1996 e 1998) Diniz Azevedo et al (1997) Abruacutecio (1997 e 1999) entre outros

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tuiccedilatildeo Federal promulgada em 1988 e no Cearaacute por meio da Constituiccedilatildeo do Estado promulgada em

1989 Outra importante mudanccedila institucional foi a publicaccedilatildeo da Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei

Complementar nordm 101 de 4 de maio de 2000) com o objetivo de melhorar a gestatildeo fiscal e financeira

do setor puacuteblico no Brasil atribuindo aos governantes compromissos com o orccedilamento e com metas

apresentadas e aprovadas pelos respectivos poderes legislativos dos Estados e municiacutepios brasileiros

impondo assim um maior controle nos gastos puacuteblicos

No primeiro plano de governo elaborado depois da redemocratizaccedilatildeo do paiacutes definindo as po-

liacuteticas para o periacuteodo do 1987-1991 apontou-se dentre outras anomalias um crescimento desordena-

do e uma hipertrofia da administraccedilatildeo puacuteblica estadual ineficiecircncia nas finalidades sociais do Estado

aleacutem de uma obsolescecircncia dos esquemas estruturais e funcionais empreguismo desenfreado (CEA-

RAacute 1987 p 36-37) No acircmbito da modernizaccedilatildeo administrativa este plano define como objetivo ldquotor-

nar a administraccedilatildeo puacuteblica estadual agente propulsor do processo de modernizaccedilatildeo e transformaccedilatildeo

estrutural da economia e da sociedaderdquo Apesar de um governo formado por jovens empresaacuterios

observa-se que a visatildeo sobre o Estado era a do grande indutor do processo de desenvolvimento e das

transformaccedilotildees sociais Aleacutem de destacar a contribuiccedilatildeo dos demais agentes como co-responsaacuteveis na

conduccedilatildeo do processo de desenvolvimento este plano em seus objetivos especiacuteficos natildeo demonstra

nenhuma preocupaccedilatildeo com a transparecircncia puacuteblica natildeo define nenhuma forma de estimular a parti-

cipaccedilatildeo social nem mesmo em qualquer espeacutecie de controle social

Na segunda metade da deacutecada de 1980 houve grandes transformaccedilotildees poliacuteticas administrati-

vas e institucionais no Cearaacute quando ascendeu ao governo do Estado um grupo de jovens empresaacuterios

apoiados por algumas organizaccedilotildees representativas da classe empresarial6 Estes novos governantes

surgiram apoiados pelo Centro Industrial do Cearaacute (CIC) que desde sua origem em 1978 defendeu

novas ideias sobre o papel do Estado e de suas relaccedilotildees com o setor produtivo Estes novos governan-

tes trouxeram novas ideias e um projeto poliacutetico de introduzir medidas para mudar a realidade poliacutetica

social econocircmica e cultural do Cearaacute Por isso tomaram posiccedilotildees poliacuteticas bem diferentes das ideias

das elites tradicionais locais cujas praacuteticas eram baseadas na cultura patrimonialista no paternalismo

clientelismo nepotismos e outros privileacutegios poucos recomendados agrave nova gestatildeo puacuteblica (AMARAL

FILHO 2004 LUGO 2005)

Para definir e fundamentar as propostas destes novos projetos poliacuteticos foram promovidos

debates com diversos economistas e ministros como Celso Furtado e outros pensadores patrocinados

pelo CIC Daiacute surgiu o ldquoMovimento Proacute-Mudanccedilasrdquo que divulgava as novas ideias e as perspectivas de

futuro de um Estado moderno Este movimento resultou na eleiccedilatildeo em 1986 de Tasso Jereissati cujo

lema de governo era denominado de ldquoGoverno das Mudanccedilasrdquo A partir deste novo governo comeccedilou

6 As entidades que apoiaram os jovens empresaacuterios no governo do Cearaacute em 1986 foram o Centro Industrial do Cearaacute (CIC) a Federaccedilatildeo das Induacutestrias do Estado do Cearaacute (Fiec) e a Associaccedilatildeo dos Jovens Empresaacuterios (AJE)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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o processo de desenvolvimento de caraacuteter endoacutegeno cujas accedilotildees contribuiacuteram para mudar com o

modelo econocircmico primaacuterio-exportador baseado na cultura do gado-algodatildeo-cultura de subsistecircncia

onde predominava o capital local no setor produtivo (AMARAL FILHO 2004 LUGO 2005)

Como era de se esperar para cumprir com seus projetos poliacuteticos estes novos liacutederes no pri-

meiro periacuteodo de governo (1987-1990) geraram grandes insatisfaccedilotildees agrave classe poliacutetica e a alguns gru-

pos empresariais por natildeo haver atendido mais a seus interesses e por haver mudado o velho modelo

poliacutetico (coronelismo) baseado no patrimonialismo e nepotismo que existia no Cearaacute Esta nova elite

empresarial no governo do Cearaacute rompeu com a velha forma de administrar7 e introduziu um novo

modelo de gestatildeo puacuteblica promovendo primeiramente um ajuste fiscal financeiro e administrativo

para equilibrar as financcedilas puacuteblicas e gerar recursos para investir em infraestruturas sociais e produ-

tivas (BONFIM 2000) e criar as bases para o processo de desenvolvimento nas deacutecadas seguintes

Diversos trabalhos de pesquisa8 fazem referecircncias a esta experiecircncia de gestatildeo no Cearaacute no periacuteodo

de 1987 a 2002 cujas medidas poliacutetico-institucionais resultaram em uma nova dinacircmica econocircmica

Neste periacuteodo baseados nas ideias de cooperaccedilatildeo e associaccedilatildeo entre os setores puacuteblicos e

privados nos dois periacuteodos de governo seguintes (1991-1994 e 1995-1998) houve uma tentativa por

parte do governo de introduzir um sistema de gestatildeo participativa para envolver a sociedade na dis-

cussatildeo dos temas mais estrateacutegicos Por isso criou-se o Pacto de Cooperaccedilatildeo (REBOUCcedilAS et al 1998)

o Plano Estrateacutegico da Regiatildeo Metropolitana de Fortaleza (PLANEFOR 1999)9 e diversos conselhos

regionais e municipais de desenvolvimento sustentaacutevel (CORDEIRO 1998) que agregavam a elite eco-

nocircmica poliacutetica e intelectual e as lideranccedilas regionais e municipais nas discussotildees dos temas de seus

interesses Com o transcurso do tempo estes conselhos natildeo produziram os resultados planejados10

Assim a participaccedilatildeo da sociedade passou a ser solicitada na elaboraccedilatildeo dos diferentes planos de go-

verno com a indicaccedilatildeo das prioridades para cada regiatildeo

As mudanccedilas introduzidas na Administraccedilatildeo Puacuteblica do Cearaacute trouxeram uma seacuterie de inova-

ccedilotildees que contribuiacuteram para o aumento da eficiecircncia na gestatildeo dos recursos puacuteblicos com a reduccedilatildeo de

desperdiacutecios e ao romper com os velhos viacutecios poliacutetico-institucionais de uma cultura patrimonialista

heranccedilas de deacutecadas de nepotismo e clientelismo tambeacutem contribuiacuteram para democratizar a relaccedilatildeo

7 Na Regiatildeo Nordeste e no Cearaacute haacute uma longa histoacuteria de clientelismo e coronelismo sistema puacuteblico inflado e de maacute qualidade que tem gerado uma forte desconfianccedila na institucionalidade poliacutetica (BANCO MUNDIAL 2003) 8 Esta experiecircncia no Cearaacute foi mencionada em trabalhos nacionais e internacionais Entre eles Naisbitt (1994) Diniz e Azevedo (1997 p 369) Tandler (1998) Giddens (1999 p 93) inclusive em um artigo do Financial Times de 26 de marccedilo de 1993 e Lugo (2005)9 O Planefor estabeleceu quatro estrateacutegias Regiatildeo metropolitana integrada Regiatildeo metropolitana empreendedora e competitiva Educaccedilatildeo por desenvolvimento humano Integraccedilatildeo e fortalecimento da gestatildeo puacuteblica (AMARAL FILHO 2004)10 Cordeiro (1998) elabora uma interessante anaacutelise sobre o sistema de gestatildeo participativa do governo do Estado do Ce-araacute em especial quanto aos Conselhos de Desenvolvimento Sustentaacutevel pesquisando suas potencialidades democraacuteticas e suas ambiguidades como resultado de dinacircmicas sociais orientadas pelo governo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

321

Estado e a sociedade11 Estas mudanccedilas estabeleceram ldquonovos paracircmetros para os compromissos po-

liacuteticosrdquo tendo que ldquopassar cada vez mais pelo crivo de uma sociedade civil ampliada e democratizada

capaz de exigir eficiecircncia e eficaacutecia de demandas responsabilizaccedilatildeo e de envolver-se no controle dos

serviccedilos prestado pelo Estadordquo (RUA 1999 p 277) Tudo isso na tentativa de eliminar os resquiacutecios

das velhas praacuteticas por meio de uma maior participaccedilatildeo social nas atividades governamentais Estas

mudanccedilas natildeo aconteceram sem fortes resistecircncias culturais poliacuteticas e comportamentais O novo

modelo de administraccedilatildeo gerencial implantado no Cearaacute significou esforccedilos de se criar um ambiente

de inovaccedilatildeo no contexto da administraccedilatildeo puacuteblica (LUGO 2005)

Em meados dos anos de 1990 foi elaborado o primeiro plano de desenvolvimento sustentaacutevel

do Cearaacute cuja execuccedilatildeo se daria no periacuteodo de 1995-1998 Este plano destaca como heranccedila histoacuterica

e ao mesmo tempo um desafio a enfrentar a poliacutetica de clientela e o Estado patrimonialista Segundo

este plano ldquoa baixa capacitaccedilatildeo da populaccedilatildeo e a vulnerabilidade da economia agraves vicissitudes climaacute-

ticas aliadas ao atraso cultural e tecnoloacutegico provocaram o surgimento no Cearaacute de um sistema de

dominaccedilatildeo social baseado no clientelismo e na gestatildeo patrimonialista do Estado em que os cargos e

as benesses do Governo eram distribuiacutedos em troca da lealdade e de contraprestaccedilotildees diversas tudo

para garantir a permanecircncia da elite dirigente no poderrdquo (CEARAacute 1995 p 9)

Dentre a visatildeo de futuro daquele plano de desenvolvimento sustentaacutevel estaacute a construccedilatildeo de

uma sociedade justa democraacutetica e pluralista onde fatores como o atraso poliacutetico clientelismo pa-

ternalismo corporativismo corrupccedilatildeo possam ser superados pelo amadurecimento poliacutetico e pela

ldquoparceria Governo e sociedade pela ampla participaccedilatildeo no processo poliacutetico e no planejamento pela

transparecircncia e pela impessoalidade nas poliacuteticas puacuteblicasrdquo (CEARAacute 1995 p 7) Este foi o primeiro pla-

no de governo a ressaltar a importacircncia da transparecircncia como elemento de amadurecimento poliacutetico

e para o fortalecimento do controle social das accedilotildees governamentais reconhecendo a participaccedilatildeo

como elemento fundamental para a) ajudar na definiccedilatildeo das prioridades b) acompanhar e fiscalizar a

accedilatildeo de governo c) manter o Governo fiel aos anseios da sociedade d) dar sustentaccedilatildeo poliacutetica agrave accedilatildeo

de governo e assegurar a continuidade das accedilotildees

Este plano de desenvolvimento tinha dentre seus objetivos ldquopotencializar o papel do Estado

mediante a mobilizaccedilatildeo da sociedade e iniciativas do setor privado dos municiacutepios das comunidades

das organizaccedilotildees da sociedade civil e dos cidadatildeosrdquo Para tanto trouxe como inovaccedilatildeo um modelo

de gestatildeo participativa12 novo no acircmbito da administraccedilatildeo estadual organizando a participaccedilatildeo des-

11 Estudos do Banco Mundial (2003) enfatizam os impactos dessa heranccedila juntamente com a falta de cuidado com a educaccedilatildeo com a sauacutede a perpetuaccedilatildeo da pobreza facilmente identificados nos indicadores socioeconocircmicos do Estado12 Este modelo de gestatildeo estava amparado nos princiacutepios de modelo de administraccedilatildeo gerencial que era aliada agrave visatildeo ne-oliberal vigente Dentre estes princiacutepios destacam-se os seguintes a) manter e consolidar o equiliacutebrio financeiro do Estado b) buscar a eficiecircncia dos serviccedilos puacuteblicos estimulando a competiccedilatildeo no serviccedilo puacuteblico c) orientar a accedilatildeo do governo para a obtenccedilatildeo de resultados d) promover a descentralizaccedilatildeo e a participaccedilatildeo social (ABRUacuteCIO 1997 PEREIRA 1998)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

322

tes agentes em vaacuterios Conselhos que contava com a presenccedila de diversos segmentos da sociedade

cearense para atuar nas instacircncias estadual regional e municipal Esta proposta de trabalho apesar

de nobre e motivadora por trazer algo inovador no acircmbito da Administraccedilatildeo Puacuteblica do Cearaacute natildeo

produziu resultados duradouros

No acircmbito desse plano havia uma preocupaccedilatildeo do governo em promover a integraccedilatildeo do

Governo com a sociedade Para estimular a articulaccedilatildeo no acircmbito interno foram criados seis Grupos

de Trabalho Institucional (GTI) para coordenar as prioridades estrateacutegicas identificadas por este plano

de governo Foram criados GTIs nas aacutereas a) proteccedilatildeo do maio ambiente e reordenamento do espaccedilo

b) capacitaccedilatildeo da populaccedilatildeo c) seguranccedila puacuteblica d) desenvolvimento da cultura ciecircncia tecnologia

e inovaccedilatildeo e) promoccedilatildeo do emprego e desenvolvimento econocircmico sustentaacutevel e f) gestatildeo puacuteblica

Estes grupos contavam com a participaccedilatildeo de teacutecnicos representando as diversas Secretarias e outros

oacutergatildeos do Governo sob a coordenaccedilatildeo da Secretaria de Planejamento e Coordenaccedilatildeo

Para a articulaccedilatildeo externa o governo criou diferentes Conselhos sendo que alguns contavam

com a participaccedilatildeo da sociedade formados de pessoas eminentes convidadas pelo Governo para opi-

nar sobre as questotildees governamentais Para tanto foram criados a) O Conselho Estadual de Desenvol-

vimento Sustentaacutevel formado por diversos cidadatildeos que discutiram temas ligados agrave sustentabilidade

incluindo suas vaacuterias dimensotildees social econocircmica poliacutetica e ambiental b) O Conselho de Desenvol-

vimento da Famiacutelia e da Cidadania para a discussatildeo de temas como a famiacutelia sauacutede educaccedilatildeo baacutesica

e profissional crianccedila seguranccedila alimentar seguranccedila puacuteblica entre outros c) O Conselho de Desen-

volvimento Cultural para discutir temas relacionados agrave cultura cearense Tambeacutem foram criados os

Conselhos Regionais de Desenvolvimento Sustentaacutevel formado por lideranccedilas regionais para discutir

temas relacionados agrave realidade de cada uma das 20 (vinte) regiotildees administrativas

Mesmo com esses Conselhos a poliacutetica social do Estado definida como a forma de racionali-

zar a oferta de serviccedilos baacutesicos buscando articular interesses gerais na opiniatildeo de Cordeiro (1998)

na praacutetica em relaccedilatildeo agraves camadas mais pobre da populaccedilatildeo tem sido marcada pelo ldquopersonalismo

e assistencialismordquo o que pode ser um ldquoespaccedilo de conflito sobre essa distribuiccedilatildeo de bens onde os

diversos setores sociais tentam fazer valer seus direitosrdquo

Cabe destacar que a participaccedilatildeo e o controle social se realizam de forma mais efetiva quanto

mais proacutexima agrave populaccedilatildeo esteja dos centros de decisatildeo No Brasil esses desafios se tornam maiores

devido agrave pouca interaccedilatildeo que o Estado sempre manteve com os cidadatildeos e com a sociedade civil e

tambeacutem em consequecircncia do pouco poder econocircmico institucional ou normativo dos municiacutepios

brasileiros Por ser o municiacutepio a esfera de poder do Estado mais proacutexima do cidadatildeo nunca houve

interesse dos que controlam o poder no Brasil em geral que o poder local fosse efetivo Como forma

de corrigir estas questotildees por decisatildeo dos proacuteprios Conselhos Regionais as reuniotildees poderiam ser re-

alizadas alternadamente nos diferentes municiacutepios de cada uma das regiotildees Como forma de estimular

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

323

a descentralizaccedilatildeo administrativa o Governo do Estado estimulou a criaccedilatildeo de conselhos municipais

e conselhos comunitaacuterios para discutir as questotildees no acircmbito local Estes Conselhos indicariam repre-

sentantes para formarem os conselhos regionais levando para estes as demandas de cada municiacutepio

(CORDEIRO 1998)

Vale ressaltar ainda os seguintes efeitos positivos da participaccedilatildeo social em accedilotildees de desenvol-

vimento que foram evidenciadas por Bandeira (1997) e mencionadas por Cordeiro (1998 p 12-15)

a) Como meio de assegurar uma maior eficiecircncia e sustentabilidade aos programas gover-

namentais

b) Para garantir a ldquoboa governanccedilardquo na medida em que assegura a transparecircncia das accedilotildees

do poder puacuteblico e combate a corrupccedilatildeo

c) Como instrumento para acumular o capital social para fazer com que os seus membros

se tornem propensos a colaborar no sentido da soluccedilatildeo de problemas de interesse comum

d) Na formaccedilatildeo e consolidaccedilatildeo de identidades regionais por meio da construccedilatildeo de con-

sensos baacutesicos entre os atores sociais de uma regiatildeo

A praacutetica de gestatildeo participativa jaacute se faz presente na Administraccedilatildeo Puacuteblica no Cearaacute desde

meados dos anos de 1980 com a criaccedilatildeo dos Conselhos de Sauacutede sendo o Cearaacute o primeiro Es-

tado brasileiro a implantar este tipo de Conselho e a criar em 1987 o programa Agente de Sauacutede

Diversos Conselhos foram criados alguns deles por exigecircncia de legislaccedilatildeo federal a exemplo do

Conselho da Crianccedila e do Adolescente Nesta organizaccedilatildeo em Conselhos como observa Cordeiro

(1998 p 40) em tese o governo e a sociedade ldquose associam para planejar discutir e deliberar acerca

de poliacuteticas puacuteblicasrdquo

Para a implantaccedilatildeo de grandes projetos estruturantes o Governo adotou Grupos de Trabalho

Participativo que foi outra forma de incluir as lideranccedilas e os diversos segmentos da sociedade nas

discussotildees na execuccedilatildeo e acompanhamento daqueles projetos Dentre estes GTs destacam-se o da

construccedilatildeo do Complexo Portuaacuterio do Peceacutem o da construccedilatildeo do Accedilude do Castanhatildeo Outra experi-

ecircncia de participaccedilatildeo social foi a gestatildeo dos recursos hiacutedricos do Estado instituiacuteda a partir de outubro

de 1997 Os representantes dos governos federal estadual e municipais os representantes dos usuaacute-

rios e da sociedade civil formavam estes colegiados que opinavam sobre o uso controle e preservaccedilatildeo

da aacutegua nas diferentes bacias hidrograacuteficas do Estado (SILVA 2004)

Analisando os aspectos positivos e negativos do modelo de gestatildeo puacuteblica participativa no Ce-

araacute desde a perspectiva desses Conselhos criados pelo Governo do Estado a partir de 1995 Cordeiro

(1998 p 63-90) destaca dentre outros os seguintes obstaacuteculos para o pleno ecircxito destes instrumentos

de participaccedilatildeo social

a) A falta de uma cultura de planejamento na aacuterea puacuteblica e a quase inexistecircncia da praacutetica

do planejamento de forma participativa

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

324

b) Imediatismo personalista dos governantes pela crocircnica falta de recursos e pela pobreza

extrema das comunidades

c) Falta de experiecircncias democraacuteticas que dificultam as accedilotildees tanto da equipe de Governo

como das comunidades

d) Falta de preparo teacutecnico das equipes e de metodologias adequadas para o exerciacutecio da

participaccedilatildeo social e para integrar os diferentes Conselhos

Baseada na opiniatildeo de diversas autoridades entrevistadas na eacutepoca Cordeiro (1998) identifi-

cou os seguintes fatores que contribuiacuteram para impedir o ecircxito desse modelo de gestatildeo participativa

no Cearaacute

a) Paternalismo clientelismo e cultura do patrimonialismo manifestados na opiniatildeo da Se-

cretaacuteria de Planejamento do Estado daquele periacuteodo de governo ao firmar que ldquoos prefeitos preferem

demonstrar prestiacutegio tratando pessoalmente com o Governo e buscando afirmar seu poder individual

na resolutividade de problemasrdquo Tambeacutem para o Chefe de Gabinete da Secretaria de Governo (Segov)

ldquoa formataccedilatildeo cultural dos atores poliacuteticos natildeo ajuda na efetivaccedilatildeo do modelo de gestatildeo comparti-

lhada [] Em grande parte do Cearaacute ainda eacute vigente o modelo clientelista populista de se credenciar

politicamenterdquo Na opiniatildeo de um ex-presidente da Associaccedilatildeo de Municiacutepios do Cearaacute (Amece) ldquoa

questatildeo do personalismo do autoritarismo etc natildeo eacute soacute cultural mas operacional - eacute assim que fun-

ciona [] Quando haacute necessidade de parceria o Governo sabe como ir atraacutes Mas para fazer o orccedila-

mento participativo por exemplo o Governo natildeo precisa de parceriardquo

b) Resistecircncia do Poder Puacuteblico constatada por um ex-secretaacuterio dos Conselhos de Participa-

ccedilatildeo da Sociedade ao afirmar que ldquoeacute a resistecircncia geral e dentro do proacuteprio Governo [] agrave realizaccedilatildeo

de gestotildees participativa eacute o obstaacuteculo do patrimonialismo da dominaccedilatildeo tradicional em que se acha

o lsquodonorsquo da cidaderdquo

c) Falta de integraccedilatildeo e de conhecimento constatada pela Secretaacuteria de Planejamento do

Estado na eacutepoca ao afirmar que ldquoos Conselhos sempre foram estanques e o sistema nunca funcionou

como sistemardquo Tambeacutem como observou um ex-presidente da Associaccedilatildeo de Municiacutepios do Cearaacute

(Amece) ldquoSe o Estado vai laacute (aos municiacutepios) e natildeo volta mais a Prefeitura tambeacutem natildeo tem maior

interesse na participaccedilatildeo da sociedade fica difiacutecil porque a comunidade natildeo tem experiecircncia de pla-

nejamentordquo Tambeacutem um ex-presidente da Associaccedilatildeo de Municiacutepios do Cearaacute (Amece) afirmou que

ldquopara fazer uma coisa eacute preciso querer e saber o Governo quis fazer se levantou a ideia devia estar

interessado mas natildeo teve competecircncia teacutecnica para fazer Natildeo eacute faacutecil desenvolver participaccedilatildeo eacute pre-

ciso muito conhecimento meacutetodo e capacidade de saber escutar as pessoas [] e isso natildeo eacute uma coisa

que se aprende de uma hora para outra Faltou capacidade dos setores responsaacuteveis em implantar esse

modelo E faltou tambeacutem a universidade se envolver mais nesse processordquo Ademais houve falha na

elaboraccedilatildeo do modelo de gestatildeo participativa quando tais Conselhos passaram a ser visto mais como

ldquobraccedilosrdquo poliacuteticos do Governo do que como espaccedilo puacuteblico para discussatildeo dos interesses coletivos

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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Pela falta de qualificaccedilatildeo e de experiecircncia democraacutetica comum aos diversos atores sociais em

todos os niacuteveis de lideranccedila os agentes tiveram que aprender na base do improviso Os proacuteprios

secretaacuterios do Governo natildeo estavam preparados e conscientes do que significava aquilo do que era

planejamento regional esse despreparo ldquoera generalizado porque os conselhos eram apenas uma

ideia que estava no papel e ningueacutem sabia o que era e nem para que serviardquo como afirmou o Diretor

da empresa de Consultoria Personal

d) Descontinuidade dos Conselhos haja vista que a partir de junho de 1997 natildeo houve mais

reuniotildees dos Conselhos Regionais de Desenvolvimento Sustentaacutevel Nunca funcionaram efetivamente

como Conselhos como afirmou um Ex-secretaacuterio dos Conselhos de Participaccedilatildeo da Sociedade ldquoape-

nas no inicio houve uma participaccedilatildeo interessante na elaboraccedilatildeo do Plano Plurianual de Investimentos

em que cada um dos vinte Conselhos foi ouvido e ocorreu muitas discussotildees Depois disso o que ainda

houve foram reuniotildees do Governo com lideranccedilas da regiatildeo convidados para assistir a palestras dos

secretaacuterios estaduais e de outros teacutecnicos []rdquo Aleacutem disso ldquoos poliacuteticos nunca prestigiaram os CRDs

nem os deputados federais nem os estaduais nem da oposiccedilatildeo nem da situaccedilatildeordquo

Como observou uma coordenadora da Secretaria de Planejamento do Estado naquele periacuteodo

ldquoNa praacutetica natildeo se estaacute vendo necessidade dos CRDs as coisas estatildeo acontecendo sem passar por essa

instacircnciardquo Para o Chefe de Gabinete da Secretaria de Governo (Segov) daquele periacuteodo percebia-se

que ldquoa descoincidecircncia dos calendaacuterios eleitorais constitui uma dificuldade para o funcionamento des-

ses Conselhos regionais porque eles se formam no periacuteodo de meio de mandato de Prefeitos e inicio

de mandato de Governo estadual ou seja com pouco tempo de funcionamento vocecirc jaacute tem uma

acentuada modificaccedilatildeo na composiccedilatildeo dos Conselhosrdquo

Estes Conselhos cuja funccedilatildeo era servir de elo entre o Estado e a sociedade cearense agrupa-

vam lideranccedilas poliacuteticas empresariais intelectuais religiosas cuja missatildeo era definir as prioridades no

acircmbito das diferentes regiotildees administrativas a serem atendidas pelo Governo do Estado aleacutem de de-

bater questotildees consideradas relevantes e estrateacutegicas de modo a promover uma gestatildeo de alto niacutevel

e em sintonia com a sociedade

Considerando as experiecircncias de gestatildeo participativa anteriores o plano de governo para o

periacuteodo de 2003 a 2006 cujo objetivo maior era promover o crescimento econocircmico com inclusatildeo

social definiu dentre seus fundamentos a transparecircncia Para tornar um governo transparente consi-

derava ser imprescindiacutevel agrave mobilizaccedilatildeo e sensibilizaccedilatildeo social mecanismos eficientes de participaccedilatildeo

e compromisso puacuteblico Para tanto devia-se ampliar o processo de informaccedilatildeo nos atores sociais na

formulaccedilatildeo e implementaccedilatildeo das poliacuteticas puacuteblicas e no controle social das accedilotildees governamentais

Esse processo de interaccedilatildeo e de criaccedilatildeo de novos espaccedilos puacuteblicos ldquoestimula o aperfeiccediloamento dos

programas e sua melhor focalizaccedilatildeo e eficaacuteciardquo (CEARAacute 2003a p 24)

Como medida concreta este Governo promoveu em todas as microrregiotildees administrativas uma

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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ampla discussatildeo para a elaboraccedilatildeo do Plano Plurianual para o periacuteodo de 2004 a 2007 (CEARAacute 2003b)

Tambeacutem implantou uma Sala de Situaccedilatildeo com os indicadores socioeconocircmicos e informaccedilotildees sobre

os programas e accedilotildees de governo inclusive sobre a infraestrutura e o perfil econocircmico e social de cada

municiacutepio cearense Este instrumento de transparecircncia puacuteblica tratou de disponibilizar as informaccedilotildees

de forma detalhada e regionalizada de modo a facilitar as consultas e anaacutelises pelos cidadatildeos sobre a

realidade das diferentes regiotildees do Estado A atualizaccedilatildeo dos dados se dava diariamente o que possi-

bilitava agrave equipe de governo e aos cidadatildeos acessar e opinar sobre as accedilotildees governamentais

Entre as diretrizes para o plano do governo que se inicia em 2007 quando trata da sustentabili-

dade poliacutetica e institucional estatildeo ldquopromover a democracia aprimorar a cidadania garantir os direitos

sociais e conduzir as poliacuteticas puacuteblicas com base na participaccedilatildeo social gestatildeo estrateacutegica criativa

dotada dos mais modernos recursos tecnoloacutegicos e logiacutesticos comunicaccedilatildeo a serviccedilo dos interesses

da sociedade garantindo a melhor aplicaccedilatildeo dos recursos e combatendo a corrupccedilatildeordquo (CEARAacute 2007)

Tomando por base as experiecircncias dos governos anteriores novos mecanismos para sistemati-

zar os programas e projetos definidos como prioritaacuterios foram adotados a partir do governo empossa-

do em 2007 Por meio do Decreto n 29917 de 8 de outubro de 2009 foi redefinido o Sistema Estadual

de Planejamento13 e instituiacuteda a Rede Estadual de Planejamento sob a coordenaccedilatildeo da Secretaria de

Planejamento e Gestatildeo (Seplag) Este sistema estaacute constituiacutedo pelos subsistemas de planejamento

orccedilamento acompanhamento fiacutesico-financeiro e de gestatildeo puacuteblica por resultado Utilizando-se desse

sistema o governo elaborou seu Plano Plurianual 2008-2011 de forma participativa colhendo subsiacute-

dios nas diversas regiotildees administrativas do Estado

Nas uacuteltimas deacutecadas foram introduzidos pelos governos procedimentos administrativos e cria-

dos vaacuterios instrumentos institucionais com o intuito de facilitar o acesso do cidadatildeo agraves informaccedilotildees e

com isso aumentar a transparecircncia puacuteblica nos trecircs acircmbitos de governo (federal estadual e munici-

pal) No caso do Cearaacute algumas boas praacuteticas no acircmbito da transparecircncia fiscal valem ser destacadas

3 AS BOAS PRAacuteTICAS DE TRANSPAREcircNCIA FISCAL NO CEARAacute

A literatura mostra que a transparecircncia fiscal desempenha um grande papel no fortalecimento

da cidadania quando mostra os dados das contas puacuteblicas e estimula a participaccedilatildeo social influen-

ciando assim nas decisotildees governamentais Isto permite um maior controle social e aumenta a res-

ponsabilidades dos governantes para melhor aplicar os recursos puacuteblicos e em prestar contas de suas

accedilotildees agrave sociedade Constitui-se numa ldquoesfera puacuteblica natildeo estatalrdquo de controle (GENRO 1996) que

se materializa na elaboraccedilatildeo execuccedilatildeo e controle das leis orccedilamentaacuterias Dentre outros benefiacutecios

13 Este sistema foi criado pela primeira vez no acircmbito do Governo do Cearaacute em meados dos anos de 1960 com a criaccedilatildeo da Secretaria de Planejamento e Coordenaccedilatildeo (Seplan)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

327

a transparecircncia aumenta a possibilidade de um maior alinhamento de interesses entre o fisco e o

contribuinte14 Assim fica evidente que as novas tecnologias ainda que potencializem as pressotildees de

determinados grupos proporcionam maior participaccedilatildeo do cidadatildeo-cliente e do cidadatildeo-contribuinte

na reivindicaccedilatildeo dos seus direitos ou mesmo na possibilidade de influenciar com suas sugestotildees a

adoccedilatildeo de medidas administrativas de interesse popular Tudo isso de certo modo revoluciona a re-

laccedilatildeo do indiviacuteduo com as organizaccedilotildees

O padratildeo do relacionamento entre o Estado e a sociedade revela o niacutevel de desenvolvimento e

maturidade poliacutetica do paiacutes Nos paiacuteses desenvolvidos economicamente percebe-se uma integraccedilatildeo

maior entre o fisco e o cidadatildeo contribuinte Satildeo diversos os motivos para que essa relaccedilatildeo seja amis-

tosa Do lado do fisco haacute dentre outras providecircncias uma preocupaccedilatildeo em orientar o cidadatildeo-con-

tribuinte quanto ao cumprimento de suas obrigaccedilotildees tributaacuterias haacute tambeacutem o livre acesso do cidadatildeo

agraves informaccedilotildees puacuteblicas de interesse coletivo (open goverment) a percepccedilatildeo clara da aplicaccedilatildeo dos

recursos puacuteblicos em obras de interesse comum um niacutevel de corrupccedilatildeo menor puniccedilatildeo rigorosa a

quem infringe agraves leis etc Por outro lado o cidadatildeo tem a consciecircncia de sua responsabilidade social

e sabe que ao pagar seus tributos estaacute exercendo o seu papel de cidadatildeo que cumpre com suas

obrigaccedilotildees razatildeo por que tem forccedila para exigir seus direitos Nesses paiacuteses haacute uma maior integraccedilatildeo

entre Estado e sociedade

Desde as uacuteltimas deacutecadas nas sociedades onde a democracia jaacute esteja consolidada verifica-

-se uma mudanccedila de comportamento nas relaccedilotildees entre os cidadatildeos e os poderes puacuteblicos onde os

cidadatildeos tecircm assumido cada vez mais uma posiccedilatildeo de sujeitos ativos nas reivindicaccedilotildees individuais

e coletivas posicionando-se de forma mais exigente nas cobranccedilas de melhores resultados da Ad-

ministraccedilatildeo Puacuteblica (GARCEacuteS et al 2007) Consciente desta realidade o Fundo Monetaacuterio Interna-

cional (FMI) com o intuito de estimular a transparecircncia das accedilotildees e das contas puacuteblicas nos paiacuteses

membros criou em marccedilo de 2001 um Coacutedigo de Boas Praacuteticas de Transparecircncia Fiscal Este coacutedigo

avalia o processo de transparecircncia fiscal sob quatro aspectos a) clareza das responsabilidades do

governo b) abertura do processo orccedilamentaacuterio c) disponibilidade puacuteblica de informaccedilotildees e d) ga-

rantia de integridade das informaccedilotildees fiscais15 Para facilitar a implementaccedilatildeo deste Coacutedigo esta

instituiccedilatildeo financeira editou um Manual de Transparecircncia Fiscal que daacute instruccedilotildees detalhadas sobre

como implantar as boas praacuteticas

Segundo Campos (1990 p 34-40) um Poder Executivo forte ldquoarrecada descontroladamente

14 O conflito existente entre o cidadatildeo-contribuinte e o Estado quanto agraves questotildees tributaacuterias parece ter como uma das causas a desconfianccedila muacutetua Se houvesse participaccedilatildeo do cidadatildeo nas poliacuteticas puacuteblicas e maior transparecircncia nas accedilotildees do Estado acredita-se que em parte esse conflito se reduziria Poreacutem como observa Gonccedilalves (1999 p 9) ldquopara os go-vernantes a sociedade natildeo colabora a maioria de seus elementos satildeo sonegadores de impostos e soacute sabem criticar Para o cidadatildeo comum os governantes e os poliacuteticos satildeo desonestos em sua grande maioria e natildeo administram os recursos puacuteblicos na busca do bem-estar da populaccedilatildeordquo15 Baseado nestes criteacuterios foi realizado um estudo sobre a transparecircncia das accedilotildees e das contas puacuteblicas no Estado de Satildeo Paulo (CHEASTY 2008)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

328

recursos desses cidadatildeos considera-se independente para alocar recursos puacuteblicos sem qualquer con-

sideraccedilatildeo a criteacuterios como igualdade representaccedilatildeo participaccedilatildeo transparecircnciardquo Esse fortalecimento

se daacute pela centralizaccedilatildeo poliacutetico-administrativa e pela natildeo participaccedilatildeo do cidadatildeo e das entidades na

formulaccedilatildeo das poliacuteticas puacuteblicas o que gera foco de corrupccedilatildeo burocracia e corporativismo

A participaccedilatildeo no acircmbito da Administraccedilatildeo Tributaacuteria o que se poderia chamar de ldquofiscalidade

participativardquo foi estudada por Sousa Santos (1998 p 64) que acredita ser possiacutevel implementar algu-

ma discussatildeo com a sociedade sobre as poliacuteticas tributaacuterias A participaccedilatildeo do cidadatildeo-contribuinte

no processo de obtenccedilatildeo de recursos puacuteblicos enfocando o aspecto da ldquofiscalidaderdquo foi tambeacutem

defendida por este autor quando propotildee a ldquofiscalidade participativardquo como ldquouma alteraccedilatildeo radical na

loacutegica da fiscalidade adequada agraves novas condiccedilotildees de dominaccedilatildeo poliacuteticardquo Para esse catedraacutetico de

Coimbra e socioacutelogo do Direito ldquoo controle da vinculaccedilatildeo da obtenccedilatildeo de recursos a destinaccedilotildees es-

peciacuteficas por via dos mecanismos da democracia representativa torna-se virtualmente impossiacutevel Daiacute

a necessidade de a complementar com mecanismos de democracia participativardquo Este autor observa

a viabilidade de sua ideia ao afirmar que a fiscalidade participativa eacute uma via possiacutevel para recuperar

a ldquocapacidade extrativardquo do Estado vinculando-a agrave realizaccedilatildeo de objetivos sociais participativamente

definidos Para ele ldquoo orccedilamento participativo e a fiscalidade participativa satildeo peccedilas fundamentais

da nova democracia redistributivardquo quebrando assim o velho paradigma da falta de participaccedilatildeo da

sociedade no ato de definir a carga tributaacuteria cabendo-lhe a esta apenas a obrigaccedilatildeo de pagar os tri-

butos sem a prerrogativa de opinar discutir sonegar ou reclamar

Poreacutem para viabilizar esta participaccedilatildeo em questotildees tatildeo complexas faz-se necessaacuteria uma nova

postura dos governantes e uma conscientizaccedilatildeo do cidadatildeo quanto agrave responsabilidade social do tribu-

to Tal participaccedilatildeo poderia se iniciar com a criaccedilatildeo de um foacuterum de natureza consultiva formado por

representantes do Governo empresas e sociedade civil para aprofundar os mecanismos de participa-

ccedilatildeo (NETO CISNE 2002)

Devemos sempre lembrar que o interesse puacuteblico parece ser o indissociaacutevel fundamento de

toda e qualquer relaccedilatildeo ou atividade desenvolvida pela Administrativa Puacuteblica Toffler (1985) considera

que a aceitaccedilatildeo da participaccedilatildeo puacuteblica aleacutem de ser um ato de boa feacute e de boa cidadania aperfeiccediloa

imensamente os esforccedilos de planejamento e de obter informaccedilotildees antecipadas o que facilita a toma-

da de decisatildeo e a adaptaccedilatildeo agraves mudanccedilas

Atenta a esse movimento internacional pela transparecircncia a Fundaccedilatildeo Getuacutelio Vargas (FGV)

por meio de seu Nuacutecleo de Estudos Fiscais (NEFFGV) em parceria com o Banco Interamericano de

Desenvolvimento (BID) estatildeo elaborando o Iacutendice de Transparecircncia e Cidadania Fiscal (ITCF) Este iacuten-

dice tem por objetivo como observa Christopoulos (2011a) ldquoidentificar e divulgar quais satildeo as boas

praacuteticas adotadas nas administraccedilotildees fiscais estaduais brasileiras e estudar quais delas podem ser

ferramentas no fortalecimento da cidadania fiscalrdquo A construccedilatildeo deste iacutendice poderaacute contribuir tanto

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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para uma eficiecircncia das Administraccedilotildees Tributaacuterias dos Estados como tambeacutem para intensificar as in-

teraccedilotildees entre o Estado e a sociedade

Na elaboraccedilatildeo de um diagnoacutestico sobre a transparecircncia fiscal nos Estados brasileiros Christo-

poulos e Bastos (2011) ao analisar seus portais de transparecircncia constataram um conjunto de boas

obras jaacute adotadas pelos Estados e que ldquomuitos avanccedilos jaacute podem ser auferidos na prestaccedilatildeo de servi-

ccedilos fiscais aos cidadatildeosrdquo Em linhas gerais dentre as boas praacuteticas constatadas por estes pesquisado-

res estatildeo a) Interatividade pelas redes sociais b) Relaccedilatildeo dos 100 maiores fornecedores do Estado c)

Controle de programas governamentais por mapas d) Padronizaccedilatildeo e construccedilatildeo de dados e graacuteficos

pelos cidadatildeos e) Serviccedilos de atendimento ao cidadatildeo f) Informaccedilotildees legislativas tributaacuterias e or-

ccedilamentaacuterias Ao identificar criteacuterios que possibilitasse a construccedilatildeo de um Iacutendice de Transparecircncia e

Cidadania Fiscal (ITFC) Christopoulos (2011b) tinha por objetivo com esse iacutendice ldquoinduzir valorizar e

difundir as boas praacuteticasrdquo entre as Administraccedilotildees Tributaacuterias brasileiras

Considerando os efeitos positivos da participaccedilatildeo ativa da sociedade o governo do Cearaacute por

meio de seus diferentes oacutergatildeos tem adotado as seguintes praacuteticas como forma de estimular a eficiecircn-

cia transparecircncia de seus atos bem como estimular a interaccedilatildeo com a sociedade

a) Adequaccedilatildeo do Portal da Transparecircncia para atender agrave legislaccedilatildeo vigente e oferecer mais

informaccedilotildees aos cidadatildeos Neste portal encontram-se as informaccedilotildees dos valores das receitas des-

pesas transferecircncias constitucionais valores repassados pelo Estado aos municiacutepios e agraves entidades

privadas gastos com pessoal compras e contrataccedilatildeo de obras e serviccedilos entre outros O acesso a este

portal se daacute pelo site wwwtransparenciacegovbr

b) Publicaccedilatildeo da Lei Estadual nordm 15175 de 28 de junho de 2012 que define regras especiacute-

ficas para a implementaccedilatildeo do disposto da Lei Federal nordm 12537 de 16 de novembro de 2011 que

regula o acesso agrave informaccedilatildeo Nesta lei o Governo do Cearaacute criou o Sistema Estadual de Acesso agrave

Informaccedilatildeo integrado pelo Conselho Estadual de Acesso agrave Informaccedilatildeo e pelos Comitecircs Gestores de

Acesso agrave Informaccedilatildeo

c) O Tribunal de Contas do Municiacutepio (TCM) redesenhou seu portal da transparecircncia para do-

taacute-lo de mais informaccedilotildees aleacutem de oferecer apoio teacutecnico para os municiacutepios cearenses criarem e

aprimorarem seus portais de transparecircncia (wwwtcmcegovbr)

d) A Assembleia Legislativa do Cearaacute aleacutem de suas funccedilotildees como representante do povo criou

dentre outros instrumentos a Universidade do Parlamento e um oacutergatildeo de defesa dos consumidores

com o objetivo de intensificar sua interaccedilatildeo com a sociedade cearense (wwwalcegovbr)

e) O Tribunal de Contas do Estado do Cearaacute (TCE) com o objetivo de aprimorar suas funccedilotildees

como oacutergatildeo de controle criou a Escola Superior de Contas e o programa Agente de Controle para

promover seminaacuterios e cursos para jovens e estudantes sobre o papel do Estado e o controle das accedilotildees

governamentais (wwwtcecegovbr)

f) A Associaccedilatildeo Cearense de Transparecircncia Puacuteblica (ACTP) eacute uma associaccedilatildeo civil de direito pri-

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vado sem fins lucrativos cuja finalidade eacute cooperar com os oacutergatildeos governamentais no planejamento

na aplicaccedilatildeo dos recursos puacuteblicos na implantaccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas e na realizaccedilatildeo de estudos e

pesquisa sobre o tema (wwwdomceorgbrpageactphtml)

g) Realizaccedilatildeo em maio de 2012 da primeira Conferecircncia Estadual sobre Transparecircncia e Contro-

le Social (1ordm Consocial) para debater a questatildeo da transparecircncia puacuteblica e do papel da sociedade no

controle das accedilotildees governamentais

h) Accedilatildeo Cearense de Combate agrave Corrupccedilatildeo e a Impunidade (Acecci) eacute uma associaccedilatildeo sem fins

econocircmicos ou lucrativos destinada promover a defesa do interesse puacuteblico por meio do combate agrave

corrupccedilatildeo e a impunidade contribuindo para o aperfeiccediloamento das instituiccedilotildees e do processo de-

mocraacutetico (httpwwwacecciorgbr)

i) O Cearaacute assim como outros Estados da federaccedilatildeo brasileira16 possuem Twitter com link na

paacutegina de transparecircncia para divulgar as accedilotildees realizadas pelo governo inclusive com interaccedilatildeo com

o cidadatildeo para responder suas duacutevidas

j) Elaboraccedilatildeo do novo Sistema de Gestatildeo Governamental por Resultados (S2GPR) que permite

dentre outros feitos a atualizaccedilatildeo em tempo real das informaccedilotildees sobre as receitas despesas diacutevida

puacuteblica contratos e convecircnios no portal da transparecircncia do governo cearense Com este sistema o

Cearaacute foi o primeiro Estado brasileiro a cumprir o novo padratildeo de controle contaacutebil das contas puacuteblicas

exigido pelo Governo Federal atraveacutes da Secretaria do Tesouro Nacional

k) Outra boa praacutetica tem sido o Programa de Educaccedilatildeo Fiscal (PEF) que no acircmbito do Estado

do Cearaacute eacute coordenado pela Secretaria da Fazenda Este programa fortalece a cidadania quando cons-

cientiza a populaccedilatildeo sobre a funccedilatildeo socioeconocircmica do tributo e sua responsabilidade pelo pagamen-

to dos tributos bem como enfatiza a importacircncia do controle social para a eficiente e justa aplicaccedilatildeo

dos recursos puacuteblicos17

Estas boas praacuteticas mostram os recentes avanccedilos rumo ao fortalecimento da cidadania pro-

porcionada pela transparecircncia e pelo acesso agraves informaccedilotildees em nosso Estado Poreacutem o caminho

eacute longo para a consolidaccedilatildeo e incorporaccedilatildeo dessas praacuteticas como direito do cidadatildeo usuaacuterio dos

serviccedilos puacuteblicos

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

As forccedilas da oligarquia vigente no Brasil rural e as condiccedilotildees ideoloacutegicas prevalecentes nas

deacutecadas anteriores a de 1980 natildeo permitiam uma maior participaccedilatildeo social e transparecircncia nas accedilotildees

governamentais Observa-se que ateacute aquela deacutecada seguindo a realidade nacional natildeo havia maiores

16 Outros Estados que tambeacutem adotam esta miacutedia satildeo Alagoas Mato Grosso do Sul e Piauiacute17 Para maiores informaccedilotildees sobre as accedilotildees e resultados deste programa acessar a paacutegina web wwwsefazcegovbredu-cacaofiscal

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preocupaccedilotildees em mostrar ou prestar contas com a sociedade prendendo-se quase sempre apenas ao

que era exigido pelas leis para fazer cumprir os papeis dos tribunais e das casas legislativas Pouca era

a preocupaccedilatildeo em cumprir os ditames da accountability ou seja a justa prestaccedilatildeo de conta agrave socieda-

de e muito menos havia estimulado o exerciacutecio do controle social de suas accedilotildees

Acredita-se que a gestatildeo participativa deveraacute ser pautada por uma corresponsabilidade com

um senso eacutetico e por uma grande consciecircncia social Tendo sempre a preocupaccedilatildeo de jamais compro-

meter o interesse puacuteblico e o equiliacutebrio financeiro do Estado

Nos diferentes planos de governo as accedilotildees governamentais desde o iniacutecio dos anos 60 do

seacuteculo XX o Estado aparece como o principal responsaacutevel em promover o desenvolvimento eco-

nocircmico e social natildeo contando com a participaccedilatildeo da sociedade para opinar e avaliar as poliacuteticas

puacuteblicas implementadas

A persistecircncia da estrutura de poder baseada no clientelismo patrimonialismo e outras praacuteticas

pouco aconselhadas pelo principio de justiccedila social foi garantida pelas alianccedilas entre os poderes esta-

dual e federal durante o periacuteodo militar (1964-1985) Com a redemocratizaccedilatildeo do paiacutes foi implantado

um novo modelo de gestatildeo puacuteblica baseado nos princiacutepios de Administraccedilatildeo Puacuteblica Gerencial surgi-

da apoacutes a reforma do Estado e introduzindo novas praacuteticas focadas nos resultados e na accountability As tentativas anteriores de se introduzir o controle social com uma maior participaccedilatildeo da so-

ciedade nas accedilotildees governamentais e mesmo natildeo tendo sido consolidada e perdurada ao longo dos

governos no Cearaacute pode se ter como uma aprendizagem valiosa

A participaccedilatildeo da sociedade apesar de ser um grande desafio agrave gestatildeo puacuteblica eacute uma for-

ma de assegurar a transparecircncia dos atos governamentais expandir o controle social sobre as accedilotildees

governamentais e uma forma de consolidar o processo democraacutetico assegurar como prioridade os

interesses da populaccedilatildeo e reduzir a exclusatildeo social

O denominado ldquogoverno das mudanccedilasrdquo que esteve agrave frente da administraccedilatildeo estadual no pe-

riacuteodo de 1987 a 1990 tratou de descentralizar algumas poliacuteticas como a sauacutede no esforccedilo de novos

tipos de intervenccedilatildeo com a sociedade e enfraquecer a velha estrutura de poder vigente no Estado

Podemos perceber no entanto que assim como toda a sociedade estaacute elevando seu niacutevel de

conhecimento e de exigecircncia os contribuintes tambeacutem estatildeo desenvolvendo mais sua consciecircncia

tributaacuteria tornando-se mais esclarecidos e questionadores Esta consciecircncia elevada nem sempre con-

duz ao cumprimento espontacircneo de suas obrigaccedilotildees tributaacuterias

Com os esforccedilos de modernizaccedilatildeo da administraccedilatildeo tributaacuteria no Cearaacute identifica-se uma maior

quantidade de serviccedilos disponiacuteveis aos cidadatildeos por meio da internet ou telefone Poreacutem eacute inexis-

tente qualquer forma de participaccedilatildeo direta da sociedade nas questotildees tributaacuterias seja na captaccedilatildeo

ou aplicaccedilatildeo dos recursos puacuteblicos O cidadatildeo cearense ainda natildeo tem um efetivo controle quanto agrave

aplicaccedilatildeo destes recursos ademais satildeo escassas as avaliaccedilotildees dos impactos dos programas e projetos

governamentais na melhoria de vida dos cidadatildeos

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Outra dimensatildeo que necessita de uma maior atenccedilatildeo eacute quanto agrave capacitaccedilatildeo continuada dos

servidores A falta de conhecimento teacutecnico da equipe responsaacutevel pelo processo participativo soma-

-se agraves dificuldades e agrave complexidade proacuteprias desse processo aumentando a chance de fracasso

Numa recente pesquisa promovida por um jornal18 foi indagado se a populaccedilatildeo acessava os

portais da transparecircncia puacuteblica Dos que responderam a tal indagaccedilatildeo 74 disseram que sim e 26

disseram que natildeo Tal percentual demonstra o interesse da populaccedilatildeo cearense em conhecer o desem-

penho das contas puacuteblicas e das accedilotildees governamentais

A participaccedilatildeo social consiste como bem observa Cordeiro (1998 p 81) num processo peda-

goacutegico para mudar toda uma mentalidade tanto dos governantes como da sociedade E isso leva

tempo e demanda um trabalho persistente e continuado

Quanto aos aspectos positivos desse processo participativo na opiniatildeo de Cordeiro ldquoo princi-

pal ganho no processo de implementaccedilatildeo das gestotildees puacuteblicas participativas no Cearaacute diz respeito

ao avanccedilo da sociedade civil agrave mudanccedila de mentalidade do homem comum que comeccedila a perceber

que seu maior espaccedilo de cidadania eacute discutir os problemas coletivos de seu municiacutepio de sua regiatildeo

num foacuterum adequado A ruptura com a tradicional poliacutetica autoritaacuteria e clientelista estaacute se dando mui-

to mais por conta da sociedade e da afirmaccedilatildeo de cidadania do que do proacuteprio Governordquo Quanto a

esse processo de aprendizagem a maioria dos entrevistados concorda como algo positivo para um

ex-secretaacuterio de planejamento ldquoConstatar esse aprendizado nos anima a continuar com esse tipo de

trabalhordquo Na opiniatildeo de Secretaacuteria de Planejamento do Cearaacute a ldquosociedade mudou avanccedilou em ter-

mo de mobilizaccedilatildeo organizaccedilatildeo e controle socialrdquo

O sistema constitui ldquoum passo importante na medida em que os Conselhos enfrentaram pre-

feitos os poderosos da cidaderdquo Dessa forma ldquohaacute uma marca um substrato de cidadania que ficou e

que pode juntando-se a outros elementos - especialmente a melhoria na educaccedilatildeo - a vir a provocar

outras mudanccedilas jaacute num novo patamarrdquo

Cordeiro (1998 p 93) observa que a participaccedilatildeo eacute ldquoconquistardquo e que ldquonunca haacute condiccedilotildees

ideais para se comeccedilar a participar do mesmo modo como tambeacutem natildeo haacute um ldquoquantumrdquo de partici-

paccedilatildeo maacutexima a partir da qual estariacuteamos satisfeitos E cita Pedro Demo ao afirmar que ldquoparticipaccedilatildeo

que daacute certo traz problemas porque este eacute seu sentidordquo Esta autora observa que ldquonuma sociedade

profundamente desigual como a nossa em que o esforccedilo de manter privileacutegios frente a setores mi-

seraacuteveis chega agraves raias do inimaginaacutevel e em que o Estado sempre funcionou como apoio para essa

concentraccedilatildeo de riqueza natildeo eacute faacutecil implementar qualquer estrutura poliacutetica que possa constituir em-

pecilho agraves poliacuteticas clientelistasrdquo Afirma ainda que ldquoo uso privado da poliacutetica eacute costume tatildeo arraigado

que mesmo o miacutenimo esforccedilo no sentido de tornaacute-la mais efetivamente puacuteblica coletiva participada

tem consequecircncia quase revolucionaacuteriardquo

Cordeiro indaga ldquoQuem estaacute insatisfeito com os Conselhos A populaccedilatildeo que gostaria de ver

18 Esta consulta puacuteblica foi realizada pelo jornal cearense Diaacuterio do Nordeste cujo resultado foi publicado em sua ediccedilatildeo de 14 de maio de 2012

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suas atribuiccedilotildees ampliadas ou as famiacutelias coronelistas que sentem seus caprichos poliacuteticos ameaccedila-

dosrdquo Na opiniatildeo de Cordeiro (1998 p 104) ldquocabe aos formadores de opiniatildeo convencer o Governo e a

sociedade de que esse eacute um bom caminho de que a participaccedilatildeo pode ser instrumento de eficiecircncia

de que a democracia eacute uma aposta alta arriscada mas que vale a pena Para isso em primeiro lugar eacute

necessaacuterio conhecer a realidade das experiecircncias em andamento []rdquo

Apesar dos esforccedilos em inovar a administraccedilatildeo puacuteblica no Cearaacute por interesse dos governos e

atendendo aos reclamos da sociedade ainda se observa que muito ainda haacute por ser feito para torna-

rem eficientes os portais da transparecircncia nas diversas instacircncias de governo Analisando a realidade

desses portais nos diferentes Estados brasileiros Platt et al (2007) identificam dentre outras limitaccedilotildees

que os relatoacuterios satildeo elaborados mais para cumprir as exigecircncias da legislaccedilatildeo que atender aos inte-

resses dos usuaacuterios observando-se a ausecircncia de resumos graacuteficos anaacutelises conclusivas e glossaacuterios

que poderiam ajudar na compreensatildeo do conteuacutedo de tais documentos Ademais eacute pouca a preocu-

paccedilatildeo em facilitar o acesso dos cidadatildeos agraves informaccedilotildees

Ainda satildeo tiacutemidas as accedilotildees que estimulem as medidas intersetoriais na formulaccedilatildeo implemen-

taccedilatildeo e avaliaccedilatildeo dos projetos mesmo aqueles considerados estrateacutegicos A experiecircncia mostra que

fenocircmenos sociais complexos que tecircm afligido nossa sociedade natildeo poderatildeo ser solucionados com

poliacuteticas fragmentadas com accedilotildees isoladas ou seja sem a formulaccedilatildeo de poliacuteticas integradas e com a

participaccedilatildeo e comprometimento do Governo e de todos os segmentos da sociedade Os projetos que

tratam destas questotildees sociais ainda satildeo fragmentos com accedilotildees pontuais e descoordenadas onde natildeo

fica evidenciada qual eacute a participaccedilatildeo das Secretarias envolvidas nem as metodologias e criteacuterios de

avaliaccedilatildeo dos impactos destes projetos

Avaliaccedilatildeo de especialistas a respeito dos portais de transparecircncia constata que apesar da

democratizaccedilatildeo da informaccedilatildeo puacuteblica ainda faltam os devidos cuidados na demonstraccedilatildeo atua-

lizaccedilatildeo veracidade e acesso agraves informaccedilotildees aleacutem de faltarem links de acesso a aacutereas consideradas

importantes19 Deve caber agrave sociedade o papel de fiscalizar e denunciar aos oacutergatildeos competentes

essa falta de cuidado e outras dificuldades para acessar aos dados e informaccedilotildees sobre as contas

puacuteblicas e atos governamentais Na opiniatildeo de um dos especialistas consultados esses portais para

serem de fato transparentes faz-se necessaacuterio que as informaccedilotildees sejam atualizadas em tempo

real como determina a lei com informaccedilotildees completas e detalhadas Tambeacutem eacute necessaacuterio criar as

condiccedilotildees que possibilite ao cidadatildeo interpretar os dados Analisando diversos portais chegou-se a

conclusatildeo de que o portal de transparecircncia do Governo do Cearaacute eacute um dos mais completos poreacutem

satildeo ldquocomplexos alguns meacutetodos de buscar informaccedilotildees Natildeo daacute para saber onde e como satildeo em-

pregadas verbas destinadas agraves secretariasrdquo

19 Opiniotildees de professores da Universidade Federal do Cearaacute (UFC) a respeito dos portais de transparecircncia em entrevistas - Portais de Transparecircncia estatildeo longe do modelo ideal - ao Jornal O Povo ediccedilatildeo de 9 de janeiro de 2011

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A EVOLUCcedilAtildeO DA TRANSPAREcircNCIA DAS CONTAS PUacuteBLICAS E DO CONTROLE SOCIAL NO BRASIL A EXPERIEcircNCIA DO IBEF NO CEARAacute

SUMAacuteRIO Introduccedilatildeo 1 A prestaccedilatildeo de contas puacuteblicas no Brasil 2 A expe-riecircncia do Ibef no Cearaacute 21 As circunstacircncias 22 A instituiccedilatildeo 23 O local 24 O fato 25 A campanha 3 Resultados e desdobramentos Consideraccedilotildees finais Referecircncias

Osvaldo Euclides de Arauacutejo1 Sandra Maria Olimpio Machado2

INTRODUCcedilAtildeO

Na medida em que o mundo civilizado parece ter feito uma opccedilatildeo definitiva pelo liberalismo

poliacutetico e econocircmico com a ampla adoccedilatildeo da Democracia e do Capitalismo e os modelos adversaacuterios

(as tiranias e o comunismo) parecem ter sido definitivamente afastados resta o caminho do aperfei-

ccediloamento do sistema econocircmico escolhido e do regime poliacutetico adotado Na Economia parece haver

convicccedilatildeo de que o Capitalismo se aperfeiccediloa na medida em que se torna mais livre e desregulado

com a miacutenima intervenccedilatildeo do Poder Puacuteblico Na Poliacutetica o aperfeiccediloamento democraacutetico pede o en-

gajamento crescente do cidadatildeo na vida puacuteblica sem o que natildeo haacute saiacuteda possiacutevel para o desenvolvi-

mento real da sociedade em que haja igualdade de oportunidades para todos

Nesse sentido o controle social do poder puacuteblico e a gestatildeo transparente do dinheiro arrecada-

do via tributos satildeo propostas que encontram simpatia da populaccedilatildeo e em funccedilatildeo disso avanccedilam ora

apenas no discurso ora na praacutetica Na medida em que o avanccedilo eacute lento e incompleto surge na cena

puacuteblica um novo protagonista a entidade privada e sem fins lucrativos que nasce da sociedade civil

para catalisar o processo buscando dar-lhe consistecircncia e agilidade Este eacute o cenaacuterio baacutesico em que se

desenrolam os fatos que apontam para o futuro na questatildeo da transparecircncia das contas puacuteblicas (para

concentrar em um termo esse movimento de diversas frentes e diversos matizes)

Este artigo relata uma pesquisa sobre o desenvolvimento da legislaccedilatildeo e de iniciativas da so-

ciedade civil que marcaram os uacuteltimos 25 anos de avanccedilo do Brasil nesta questatildeo e concentra sua

atenccedilatildeo numa iniciativa singular ocorrida quando a consciecircncia sobre a dimensatildeo dessa questatildeo era

ainda pequena quase engatinhava Eacute a singularidade dessa iniciativa o foco deste trabalho

1 Economista Professor Universitaacuterio Mestre em Administraccedilatildeo2 Auditora Fiscal da Receita Estadual da Secretaria da Fazenda do Estado do Cearaacute (Sefaz) Secretaacuteria Executiva da Sefaz Mestre em Administraccedilatildeo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

338

1 A PRESTACcedilAtildeO DE CONTAS PUacuteBLICA NO BRASIL

Os pesquisadores da questatildeo fiscal no Brasil situam na Constituiccedilatildeo Federal promulgada em

05 de outubro de 1988 o ponto de partida e de apoio para o movimento em defesa da transparecircncia

das contas puacuteblicas aqui compreendida como a praacutetica regular e sistemaacutetica de uma gestatildeo do eraacute-

rio aberta ao controle social e da prestaccedilatildeo de contas Como regra geral o seu artigo 37 estampa o

princiacutepio da publicidade aplicaacutevel a todos os Poderes em todos os niacuteveis de governo junto com a

legalidade moralidade impessoalidade e eficiecircncia

Por doze anos nenhuma nova legislaccedilatildeo volta ao assunto Soacute no ano de 2000 eacute que o Congres-

so Nacional vota e aprova a Lei de Responsabilidade Fiscal a Lei Complementar 10100 No bojo das

normas riacutegidas de disciplina fiscal para os entes federados um sistema de indicadores de disciplina

fiscal a serem monitorados e obedecidos impotildee a estados e municiacutepios um protocolo de prestaccedilatildeo de

contas de natureza financeira e fiscal regular e sistemaacutetico para tornar possiacutevel este monitoramento

preventivo e eventualmente punitivo

No ano de 2003 um novo dispositivo legal estabelece a criaccedilatildeo da Controladoria Geral da

Uniatildeo uma nova estrutura com autoridade para no processo de fiscalizar a administraccedilatildeo puacuteblica em

seus trecircs niacuteveis estabelecer normas e procedimentos de transparecircncia das contas puacuteblicas

Eacute nesse contexto que nasce logo em seguida o Portal da Transparecircncia criado em 2004 A en-

trega de informaccedilotildees do cotidiano da administraccedilatildeo puacuteblica ao cidadatildeo pela rede mundial de com-

putadores comeccedila a se desenhar e um prazo razoaacutevel eacute oferecido aos gestores puacuteblicos para darem

concretude ao objetivo da nova norma Estados e Municiacutepios satildeo obrigados a criar e a colocar na

internet seu Portal de informaccedilotildees com acesso livre ao cidadatildeo

Mais adiante no ano de 2009 a Lei Complementar 13109 a Lei da Transparecircncia altera a re-

daccedilatildeo da Lei de Responsabilidade Fiscal no que se refere agrave transparecircncia da gestatildeo fiscal inovando

ao determinar a disponibilizaccedilatildeo em tempo real de informaccedilotildees pormenorizadas sobre a execuccedilatildeo

orccedilamentaacuteria e financeira (pagamentos) da Uniatildeo dos Estados do Distrito Federal e dos Municiacutepios

Em 2012 uma nova lei eacute votada e aprovada A Lei 12527 eacute promulgada dando prazo de seis

meses para o poder puacuteblico em todos os niacuteveis preparar-se para atender demandas de informaccedilatildeo do

cidadatildeo O Brasil junta-se a 96 paiacuteses e cria a sua Lei de Acesso agrave Informaccedilatildeo com o espiacuterito de dar

acesso pleno e aacutegil agrave informaccedilatildeo disponiacutevel na administraccedilatildeo puacuteblica admitindo-se como exceccedilatildeo

apenas o que a lei expressamente prevecirc (como a informaccedilatildeo que possa colocar em risco a seguranccedila

nacional) Qualquer cidadatildeo ou entidade pode solicitar qualquer tipo de informaccedilatildeo a qualquer oacutergatildeo

puacuteblico sem ter de justificar as razotildees de seu interesse Os prazos de atendimento satildeo estreitos e a

puniccedilatildeo por natildeo atendimento eacute severa

No esteio da transparecircncia a Lei 125282012 criou a Comissatildeo da Verdade que investigaraacute

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

339

arquivos puacuteblicos instituiccedilotildees e pessoas que possam ter cometido crimes contra a dignidade hu-

mana como a tortura usando ou natildeo recursos puacuteblicos cobrindo periacuteodo de aproximadamente

quatro deacutecadas

Como se pode observar haacute um avanccedilo importante no arcabouccedilo legal do Paiacutes em apoio agrave trans-

parecircncia das contas puacuteblicas induzindo o Poder Puacuteblico a se abrir estimulando e instrumentando pro-

gressivamente o cidadatildeo agrave participaccedilatildeo e ao controle social Ainda que sem a dimensatildeo e a forccedila de

leis inuacutemeros estados e municiacutepios tomaram interessantes iniciativas de educaccedilatildeo fiscal e de estiacutemulo

agrave participaccedilatildeo cidadatilde Vaacuterias secretarias de fazenda estaduais e inuacutemeras secretarias de financcedilas muni-

cipais conduziram por exemplo programas de orccedilamento participativo e programas promocionais de

educaccedilatildeo fiscal nas escolas fundamentais (com ediccedilatildeo e distribuiccedilatildeo de cartilhas grupos de teatro etc)

Todos eles ou quase todos aconteceram ao longo dos uacuteltimos quinze anos vaacuterios deles se tornando

regulares embora natildeo percam a caracteriacutestica de serem apenas exemplares (pela pequena dimensatildeo)

e de ainda natildeo serem poliacutetica de Estado mas iniciativas de governos

Em termos de novas leis em niacutevel de estados e municiacutepios praticamente natildeo haacute inovaccedilatildeo rele-

vante e iniciativa apenas haacute reaccedilatildeo e adaptaccedilatildeo formal ao ativismo da Uniatildeo Ou seja estados e mu-

niciacutepios quase soacute regulamentam o que a Uniatildeo estabelece via Congresso Nacional Sim a lei eacute votada

no Congresso mas os projetos tecircm tido origem no executivo federal

No Estado do Cearaacute a Lei Estadual 138752007 e o Decreto 309392012 regulamentam o Por-

tal da Transparecircncia enquanto a Lei 151752012 regulamenta observando as diretrizes da Uniatildeo a Lei

de Acesso agrave Informaccedilatildeo Isso se repete nos demais Estados

Se deixarmos o espaccedilo puacuteblico encontraremos iniciativas no Terceiro Setor (referimo-nos a

organizaccedilotildees natildeo governamentais que buscam atender o interesse coletivo sem visar lucro) que

reuacutene as organizaccedilotildees criadas especialmente para cumprir de forma complementar (ou substitutiva)

papeacuteis que em tese caberiam ao Primeiro Setor (poder puacuteblico) e ao Segundo Setor (a iniciativa

empresarial privada)

Neste contexto a primeira organizaccedilatildeo natildeo governamental criada em abril de 2000 eacute a Trans-

parecircncia Brasil que alcanccedilou grande visibilidade e reputaccedilatildeo puacuteblica pela divulgaccedilatildeo regular de um

iacutendice de percepccedilatildeo do niacutevel de corrupccedilatildeo no Paiacutes e pela incisiva accedilatildeo de vigilacircncia e cobranccedila do

desempenho dos eleitos pelo povo para representaacute-lo no Parlamento entre outras accedilotildees

Outra instituiccedilatildeo eacute o Observatoacuterio Social de Maringaacute criado em 2004 por meio do movimento

Sociedade Eticamente Responsaacutevel (SER) Esta instituiccedilatildeo constituiacuteda sob a forma de associaccedilatildeo civil

sem fins lucrativos tornou-se modelo de como a sociedade civil pode efetivamente participar e fazer

controle social O Observatoacuterio realiza accedilotildees exemplares de vaacuterios tipos como o acompanhamento do

princiacutepio ao fim de processos licitatoacuterios relevantes levados a efeito pelo poder puacuteblico municipal

Tambeacutem alcanccedilou grande destaque a criaccedilatildeo em 2005 da entidade Contas Abertas que atua no

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

340

acompanhamento direto e criacutetico dos gastos do governo federal e dos parlamentares sendo constan-

temente citada por seu trabalho na imprensa e no proacuteprio Congresso

Na esfera puacuteblica como se pode observar haacute uma concentraccedilatildeo da iniciativa nas matildeos do Po-

der Executivo em niacutevel federal assim como haacute uma concentraccedilatildeo temporal das iniciativas a partir do

ano 2000 Fora da esfera puacuteblica o Terceiro Setor tambeacutem datou suas iniciativas a partir do ano 2000

de forma mais decisiva

Assim qualquer iniciativa que esteja fora desse contexto pelo menos em tese merece

atenccedilatildeo e anaacutelise Este artigo pretende expor uma iniciativa que natildeo partiu do poder puacuteblico natildeo

teve origem numa instituiccedilatildeo tiacutepica de Terceiro Setor e aconteceu antes do ano 2000 Segue relato

dessa experiecircncia

2 A EXPERIEcircNCIA DO IBEF NO CEARAacute

21 As circunstacircncias

O Brasil experimentou em quatro anos de 1988 a 1992 trecircs grandes fatos histoacutericos a promul-

gaccedilatildeo de uma nova Constituiccedilatildeo a primeira eleiccedilatildeo para presidente depois de 29 anos de ditadura

militar e a renuacutencia (ou impeachment haacute controveacutersia pois a carta de renuacutencia chega ao Congresso

no exato momento em que se iniciava a votaccedilatildeo do impedimento) do presidente eleito Eacute sem duacutevida

uma ambiecircncia institucional e poliacutetica propiacutecia ao avanccedilo de praacuteticas de cidadania

22 A instituiccedilatildeo

O Instituto Brasileiro de Executivos de Financcedilas (Ibef) eacute uma associaccedilatildeo civil sem fins lucrativos

criada em 1980 e que reuacutene executivos financeiros das empresas privadas brasileiras de um modo ge-

ral visando valorizar e contribuir para o desenvolvimento desses profissionais O Ibef natildeo tem e nunca

teve accedilatildeo poliacutetica nem atividade partidaacuteria e tradicionalmente sempre focou quase exclusivamente o

crescimento profissional atraveacutes da troca de experiecircncias e do treinamento de seus associados O Ibef

eacute uma entidade de atuaccedilatildeo nacional (por meio da instituiccedilatildeo master) e regional (por meio de seccedilotildees

estaduais) e contava entatildeo com aproximadamente dois mil membros associados

23 O local

O Cearaacute eacute um estado brasileiro dos mais pobres localizado na regiatildeo Nordeste Tem uma popu-

laccedilatildeo de cerca de oito milhotildees de habitantes (cerca de quatro por cento do Brasil) e um PIB de apro-

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

341

ximadamente quarenta bilhotildees de doacutelares (menos de dois por cento do PIB do Brasil de cerca de US$

26 tri) O Cearaacute experimentou grande e forte mudanccedila poliacutetica entre 1987 e 1992 Um jovem e moder-

no empresaacuterio disputou uma eleiccedilatildeo para o Governo do Estado em 1986 e derrotou uma coligaccedilatildeo de

trecircs antigos ldquocoroneacuteisrdquo da poliacutetica cearense Esse jovem empresaacuterio foi sucedido por um poliacutetico ainda

mais jovem e ainda mais ousado e aberto em termos poliacuteticos Ambos foram eleitos e governavam o

Estado sob o signo das ldquoMudanccedilasrdquo acenando para a populaccedilatildeo com a promessa de novas praacuteticas

poliacuteticas e administraccedilatildeo moderna

24 O fato

Num artigo publicado na paacutegina de opiniatildeo do mais tradicional jornal local o presidente do

Ibef (capiacutetulo do Cearaacute) surpreendendo a comunidade lanccedila uma campanha pela Transparecircncia das

Contas Puacuteblicas e convida a sociedade civil a ser parceira desta empreitada No texto o articulista defi-

ne bem a campanha a proposta eacute obrigar os gestores puacuteblicos a prestar contas dos atos fatos nuacuteme-

ros e dinheiros puacuteblicos E faz um convite aberto agrave participaccedilatildeo geral como o tiacutetulo do artigo sugere

em busca de apoio e parceiros Sempre que teve oportunidade de apresentar e explicar a campanha o

presidente do IBEF explicava que natildeo defendia um conceito abstrato como eacutetica modernidade espiacuteri-

to puacuteblico etc Defendia sim uma ideia de ordem objetiva a praacutetica da prestaccedilatildeo de contas O artigo

na imprensa deflagrou vaacuterias accedilotildees

25 A campanha

A campanha consistiu de accedilotildees em vaacuterias frentes

a) cerca de vinte palestras foram realizadas em escolas puacuteblicas e privadas em universidades

em clubes de serviccedilo (como Rotary e Lyons) em associaccedilotildees empresariais e de profissionais liberais

em sindicatos

b) entrevistas foram concedidas para diversos canais de televisatildeo e de raacutedio Eacute interessante

notar que a campanha atraiu expressiva atenccedilatildeo dos meios de comunicaccedilatildeo de massa principal-

mente no seu iniacutecio

c) uma campanha publicitaacuteria com seis anuacutencios de um quarto de paacutegina cada um foi pro-

duzida por uma agecircncia de propaganda e veiculada no maior jornal regional (e chegou a ser consi-

derada uma das cinco melhores do ano em concurso organizado pelas entidades de comunicaccedilatildeo

empresarial da regiatildeo)

d) um adesivo plaacutestico da campanha foi distribuiacutedo para ser colado em paacutera-brisas de auto-

moacuteveis (foram impressos e distribuiacutedos aproximadamente duzentos exemplares)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

342

e) contatos e trocas de informaccedilatildeo foram feitos com membros do parlamento municipal e

estadual

f) contatos e trocas de informaccedilatildeo foram feitos com membros do poder executivo municipal

e estadual

g) convites foram feitos a membros destacados dos trecircs poderes locais (executivo legislativo

e judiciaacuterio) para debate e inuacutemeros debates aconteceram

3 RESULTADOS E DESDOBRAMENTOS

1 O Prefeito Municipal da capital do Estado forneceu ao presidente regional do Ibef os balan-

cetes mensais relativos aos uacuteltimos 12 (doze) meses de sua gestatildeo e prometeu continuar a fazer a en-

trega regularmente De posse dos nuacutemeros da prestaccedilatildeo de contas de natureza contaacutebil o Ibef fez por

intermeacutedio de um de seus diretores uma anaacutelise criacutetica da evoluccedilatildeo das financcedilas municipais Quando

o Ibef publicou na imprensa local a anaacutelise da situaccedilatildeo financeira da Prefeitura o Prefeito manifestou

todo o seu aborrecimento e cancelou sua ordem anterior suspendendo definitivamente a entrega dos

balancetes mensais

2 O Governador do Estado assegurou em contatos informais a sua simpatia e o seu apoio agrave

campanha Tal posiccedilatildeo entretanto foi rapidamente modificada Quando um deputado apresentou na

Assembleia Legislativa do Estado projeto de lei propondo que o Governo do Estado publicasse ba-

lancetes financeiros mensais obteve dos seus pares do Parlamento a aprovaccedilatildeo por unanimidade do

voto dos demais deputados Para surpresa geral ao inveacutes de simplesmente sancionaacute-lo o Governador

o vetou integralmente com alegaccedilotildees pouco convincentes

3 Um vereador de Fortaleza capital do Estado do Cearaacute apresentou na Cacircmara Municipal pro-

jeto de lei similar Ou seja a prefeitura seria levada pela lei a divulgar balancetes financeiros mensais

dando transparecircncia agrave sua arrecadaccedilatildeo gastos investimentos e situaccedilatildeo financeira de caixa e de en-

dividamento Advertido pela anterior votaccedilatildeo unacircnime no acircmbito da Assembleia do Estado o prefeito

antecipou-se e interferiu na votaccedilatildeo usou toda a sua forccedila poliacutetica para derrotar o projeto de lei que

terminou sendo rejeitado por larguiacutessima margem

4 Pelo menos quatro prefeituras municipais de pequenas cidades do interior passaram a di-

vulgar regularmente seus balancetes financeiros na imprensa local A praacutetica foi interrompida quando

mudaram os prefeitos

5 A campanha do Ibef durou oito meses Foi interrompida com a eleiccedilatildeo de nova diretoria Ja-

mais foi retomada

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

343

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Como foi dito o foco deste trabalho eacute a singularidade que caracteriza a iniciativa do Ibef no

Estado do Cearaacute no ano de 1992 entrando pelos primeiros meses de 1993 que lanccedilou uma campanha

pela Transparecircncia das Contas Puacuteblicas Satildeo vaacuterios os motivos que tornam a campanha singular

Em primeiro lugar o momento de seu lanccedilamento Naquela ocasiatildeo a palavra Transparecircncia

natildeo havia ainda adquirido o significado imediato que hoje sua simples pronuacutencia sugere Era uma

palavra de pouco uso e pouco curso Para se ter uma ideia mais exata de quanto a palavra era pouco

comum vale lembrar que a instituiccedilatildeo pioneira nesse movimento em niacutevel internacional a Transpa-

recircncia Internacional soacute foi criada em maio de 1993 em Berlim Alemanha Em nosso Paiacutes soacute em 2001

eacute que nasce a pioneira Transparecircncia Brasil

Em segundo lugar cabe ressaltar o fato de que o Ibef eacute uma associaccedilatildeo de profissionais cem por

cento ligada ao mercado empresarial sem nenhuma experiecircncia ou accedilatildeo anterior de natureza poliacutetica

Esse tipo de entidade costuma concentrar todo seu esforccedilo para promover seus proacuteprios associados

no mercado e oferecer-lhes o maacuteximo em oportunidades de T amp D (treinamento e desenvolvimento)

e convivecircncia com os pares para troca de experiecircncia A campanha pela Transparecircncia das Contas Puacute-

blicas natildeo tinha na histoacuteria do Ibef nenhum precedente

Terceiro o Ibef do Cearaacute natildeo eacute o maior natildeo eacute o principal e natildeo tem nenhuma particularidade

que o distinga dos demais Ibefs estaduais O Cearaacute entretanto viveu nos anos que precederam a

campanha uma grande mudanccedila poliacutetica com poliacuteticos jovens portadores de um discurso de mo-

dernizaccedilatildeo da administraccedilatildeo puacuteblica promovendo a derrota de lideranccedilas antigas ultrapassadas Era

o discurso da ldquomudanccedilardquo contra o discurso dos ldquocoroneisrdquo Evidentemente natildeo aconteceu nenhuma

revoluccedilatildeo no Estado do Cearaacute mas a poliacutetica teve uma efervescecircncia especial com a mobilizaccedilatildeo da

cidadania em alguns momentos

Quarto a pesquisa sobre a campanha da Transparecircncia das Contas Puacuteblicas mostra que ela teve

excepcional impacto porque teve muita cobertura da imprensa local Checando a miacutedia impressa local

observa-se todavia que soacute um dos dois grandes jornais diaacuterios locais cobriu toda a campanha noti-

ciando cada fato cada desdobramento cada evento tudo repercutindo (trata-se do jornal O POVO de

maior tradiccedilatildeo e credibilidade) Haacute dois fatos a destacar O primeiro eacute que houve uma cobertura com-

pleta e profunda da campanha O segundo eacute que a cobertura foi feita pelo veiacuteculo de comunicaccedilatildeo de

massa reconhecido por todos como o mais forte formador de opiniatildeo do Cearaacute

Quinto ainda com relaccedilatildeo ao momento da campanha cabe registrar que ela foi avanccedilada para

o momento Nenhuma instacircncia do Parlamento (seja municipal estadual ou federal) havia ateacute entatildeo

tomado qualquer iniciativa de propor leis sobre prestaccedilatildeo de contas por parte do poder puacuteblico Des-

se ponto de vista a campanha do Ibef aproximou-se de realizar algo quase impensaacutevel municiacutepio e

estado legislarem sobre a questatildeo antes da Uniatildeo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

344

Sexto apesar de toda a publicidade e de toda a repercussatildeo da campanha ela natildeo foi jamais

retomada ou imitada mesmo ateacute hoje mais de vinte anos depois nem pelo Ibef nem por nenhuma

outra entidade de profissionais ou de empresaacuterios O movimento pela transparecircncia soacute volta pelas

atividades institucionais das organizaccedilotildees especializadas de Terceiro Setor (Contas Abertas Transpa-

recircncia Brasil e Observatoacuterio de Maringaacute para citar as pioneiras)

Seacutetimo a campanha e suas caracteriacutesticas a colocam tambeacutem como uma avanccedilada accedilatildeo em

busca de controle social a outra face da transparecircncia

Natildeo se deve esperar que este trabalho apresente alguma tese para explicar as leituras que estes

fatos sugerem Sequer apresentamos as inuacutemeras leituras que os fatos sugerem fica a oportunidade

aberta a outros pesquisadores O objetivo era apenas expor uma iniciativa especial e demonstrar sua

singularidade sob os mais diversos aspectos Esperamos ter atingido esse objetivo assim como espe-

ramos que outros pesquisadores se debrucem sobre o passado para nos ajudar a compreendecirc-lo e a

melhor construir o futuro

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15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

346

PARTE V

EDUCACcedilAtildeO FISCAL NO ENSINO DESAFIOS E PERSPECTIVAS

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

347

A EDUCACcedilAtildeO FISCAL SOB A OacuteTICA DO ALUNO DA ESCOLA PUacuteBLICA ESTADUAL DO CEARAacute QUE PARTICIPA DO PROJETO BOLSA EDUCACcedilAtildeO

FISCAL E CIDADANIA

SUMAacuteRIO Introduccedilatildeo 1 A tributaccedilatildeo e a educaccedilatildeo fiscal 2 A educaccedilatildeo fis-cal no Cearaacute 3 Metodologia 4 Resultados e discussotildees Consideraccedilotildees finais Referecircncias

Amilca Alves do Nascimento1 Mirizana Alves de Almeida2

INTRODUCcedilAtildeO

Os termos Cidadania e Tributaccedilatildeo tecircm sido assunto mais que recorrente na agenda poliacutetica e

econocircmica nos uacuteltimos anos no Brasil Um resgate da evoluccedilatildeo histoacuterica da cidadania e da tributaccedilatildeo

no Brasil eacute essencial para compreender o tema dessa pesquisa Para Carvalho (2003) a cidadania eacute

fruto de luta e conquista de direitos e participaccedilatildeo do povo Poreacutem no Brasil essa dita cidadania surge

como doaccedilatildeo de governos autoritaacuterios invertendo a piracircmide de T A Marshall representada pelo tri-

peacute direitos civis poliacuteticos e sociais Faz-se necessaacuterio uma leitura do Estado e da relaccedilatildeo estabelecida

com o cidadatildeo no decorrer da histoacuteria A sociedade civil e o Governo natildeo conseguem chegar a uma

relaccedilatildeo harmoniosa tendo em vista que os objetivos a serem alcanccedilados satildeo conflitantes ou incompa-

tiacuteveis pois cada lado dessa relaccedilatildeo tem concepccedilotildees distintas acerca do modelo de tributaccedilatildeo exigindo

do sistema tributaacuterio modificaccedilotildees substanciais

Dessa forma a relaccedilatildeo fisco-sociedade surgiu com a proacutepria evoluccedilatildeo da humanidade A ne-

cessidade de viver em grupo de ser gregaacuterio levou o homem a se organizar e viver em sociedade O

Estado representa a sociedade responsaacutevel por satisfazer agraves necessidades baacutesicas de sauacutede educaccedilatildeo

transporte saneamento e moradia de seus indiviacuteduos Portanto pensar numa sociedade organizada

exige recursos financeiros para mantecirc-la onde o tributo eacute a principal fonte de recurso para financiar o

ocircnus desta organizaccedilatildeo social (BUFFON 2009)

O Estado Democraacutetico de Direito exige de seus cidadatildeos o cumprimento da obrigaccedilatildeo de maior

relevacircncia para o desenvolvimento social o dever de pagar os tributos Nesta concepccedilatildeo o dever

1 Administradora Mestrado em Planejamento de Poliacutetica Puacuteblicas pela Universidade Estadual do Cearaacute (2012) Especialista em Gerecircncia de Recursos Humanos pela Universidade Estadual do Cearaacute (1999) E-mail amilcaalvessefazcegovbr 2 Fisioterapeuta (UNIFOR) Aprimoramento em Fisioterapia Hospitalar (UFC-HUWC) Especialista e Mestre em Ciecircncias Fi-sioloacutegicas (UECE) Doutora em Ciecircncias Meacutedicas (UFC) docente da UNICHRISTUS e pesquisadora do RespLab - UFC E-mail professoramirizanyahoocombr

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

348

tributaacuterio eacute de interesse geral pois ele proporciona as condiccedilotildees de sobrevivecircncia da sociedade Por

isso segundo Buffon (2009) para o Estado exercer o papel de regulador da economia e de promotor

da justiccedila social deve captar recursos financeiros para cumprir essa funccedilatildeo

Dessa forma os Estados em 1996 reunidos no Conselho Nacional de Poliacutetica Fazendaacuteria (Con-

faz) criaram o Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal (PNEF) em seu discurso oficial objetiva desper-

tar a sociedade para o pleno exerciacutecio da cidadania e controle social

O Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Cearaacute eacute uma ferramenta que procura formar a consciecircncia

fiscal e tributaacuteria da populaccedilatildeo Em meio a diversas accedilotildees do PNEF a Sefaz e Seduc realizaram o ter-

mo de cooperaccedilatildeo teacutecnica e criaram o Projeto ldquoBolsa Educaccedilatildeo Fiscal e Cidadaniardquo com o objetivo de

contribuir para formaccedilatildeo da cidadania do estudante matriculado no ensino meacutedio da escola puacuteblica

estadual com ecircnfase na educaccedilatildeo fiscal

Portanto a Cidadania Fiscal tem se configurado um assunto complexo e por isso foi realizada

essa pesquisa para responder a seguinte pergunta o Projeto ldquoBolsa Escola e Cidadaniardquo contribui na

formaccedilatildeo da cidadania do aluno da escola puacuteblica do estado do Cearaacute Deste modo os objetivos

especiacuteficos desta pesquisa buscam mensurar a eficiecircncia do curso ldquoMonitor de Educaccedilatildeo Fiscalrdquo reali-

zado pela Sefaz verificar as atividades de disseminaccedilatildeo da educaccedilatildeo fiscal praticadas pelos alunos na

comunidade escolar e identificar o perfil socioeconocircmico e cultural do aluno que participa do projeto

O referencial teoacuterico traz uma apresentaccedilatildeo dos conceitos de cidadania e tributaccedilatildeo abordan-

do alguns aspectos histoacutericos que estatildeo na base dos problemas atuais na sociedade Pretende-se mos-

trar que a relaccedilatildeo Fisco e Sociedade assunto de caraacuteter conflituoso apresenta-se de forma recorrente

em qualquer paiacutes do mundo

Certamente que cada ponto mencionado nessa pesquisa visa mostrar sob a oacutetica do aluno a

contribuiccedilatildeo do Projeto Educaccedilatildeo Fiscal e Cidadania na formaccedilatildeo do estudante da escola puacuteblica do

Estado do Cearaacute

1 A TRIBUTACcedilAtildeO E A EDUCACcedilAtildeO FISCAL

A Constituiccedilatildeo Federal do Brasil traccedila as principais diretrizes para organizaccedilatildeo social do paiacutes os

princiacutepios fundamentais os direitos e garantias fundamentais a organizaccedilatildeo do Estado e dos Poderes

a questatildeo da defesa do Estado e das instituiccedilotildees democraacuteticas a tributaccedilatildeo o orccedilamento as ordens

econocircmicas financeiras e sociais do paiacutes (BRASIL 2007)

O Sistema Tributaacuterio Nacional (STN) eacute o conjunto de normas que regulam o poder de tributar de

determinadas instituiccedilotildees em que a justiccedila fiscal deve ser o fundamento desse sistema ou seja quem

ganha mais paga mais O STN deve em sua composiccedilatildeo atender os direitos humanos fundamentais

da sociedade e por meio do Estado deve cumprir o seu papel promover a justiccedila social e ser instru-

mento de distribuiccedilatildeo de renda visando o alcance do bem comum (BRASIL 2009)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

349

Para dar suporte a esse Estado tributaacuterio e fiscal surge o Sistema Tributaacuterio Brasileiro que pas-

sou a vigorar apoacutes a promulgaccedilatildeo da Constituiccedilatildeo de 1988 fundamentado nos artigos 145 a 162 da

Constituiccedilatildeo Federal (CF) A estrutura piramidal do STN demostra a hierarquia juriacutedica do sistema em

que a Constituiccedilatildeo eacute a lei maacutexima no paiacutes (BRASIL 2002a)

A Constituiccedilatildeo Federal define os Princiacutepios Tributaacuterios Constitucionais que regulamentam e sis-

tematizam o poder de tributar do Estado brasileiro para uma efetiva justiccedila social do paiacutes Tais princiacute-

pios existem para proteger os contribuintes contra os abusos do poder de tributar que estatildeo definidos

conforme os artigos 145 150 e 151 da CF88 (BRASIL 2007)

Desse modo observa-se que esses princiacutepios limitam a accedilatildeo estatal garantindo que esses en-

tes natildeo criem tributos que natildeo estejam previstos na Constituiccedilatildeo Federal respeitando e protegendo

os direitos fundamentais dos cidadatildeos Assim o conceito de tributo eacute entendido como toda presta-

ccedilatildeo pecuniaacuteria e compulsoacuteria devida a um ente puacuteblico federal estadual ou municipal previsto em

lei com finalidade de prover recursos financeiros para o Estado no cumprimento das necessidades

sociais de sauacutede educaccedilatildeo habitaccedilatildeo saneamento transporte seguranccedila urbanismo e justiccedila so-

cial (BRASIL 2002b)

Para o tributarista Buffon (2009 p79) pagar tributos eacute o principal dever de cidadania que pos-

sibilita o Estado realizar de forma efetiva o combate agrave desigualdade social e agrave concentraccedilatildeo de renda

na sociedade

Nesta direccedilatildeo os impostos taxas e contribuiccedilotildees de melhoria satildeo a principal fonte de recursos

financeiros do Estado para promover o crescimento econocircmico e o desenvolvimento social do Paiacutes

Esses recursos financeiros devem cumprir os fundamentos da Repuacuteblica Federativa do Brasil e seus

objetivos nunca se limitar agrave simples arrecadaccedilatildeo de valores e sim cumprir a funccedilatildeo econocircmica e social

estabelecida na Constituiccedilatildeo Federal (BRASIL 2007)

Os tributos satildeo classificados em vinculados e natildeo vinculados Os tributos vinculados se referem

a uma atividade prestada pelo Estado em que o CTN em seu artigo 77 classifica taxas e contribuiccedilatildeo

de melhoria como tributos vinculados a uma prestaccedilatildeo de serviccedilo concreta e de competecircncia comum

isto eacute pode ser cobrada por qualquer ente federativo (Uniatildeo Estados Distrito Federal e Municiacutepios)

As taxas satildeo tributos vinculados e estatildeo divididas em duas espeacutecies taxa de fiscalizaccedilatildeo e taxa

de serviccedilos A taxa de licenccedila para construccedilatildeo de um imoacutevel a taxa de publicidade a taxa de localiza-

ccedilatildeo de estabelecimento satildeo exemplos de taxas de fiscalizaccedilatildeo visto que acompanham e regulam as

accedilotildees dos cidadatildeos garantindo a vida em comunidade A taxa de emissatildeo de passaporte a taxa de

coleta de lixo a taxa para emissatildeo de certidatildeo de bons antecedentes satildeo exemplos de taxas de servi-

ccedilos puacuteblicos especificos (BRASIL 2002a)

A contribuiccedilatildeo de melhoria eacute um tributo instituiacutedo decorrente do custo de obras puacuteblicas que

valorizam imoacuteveis tendo como limite total a despesa realizada e como limite individual a valorizaccedilatildeo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

350

do imoacutevel beneficiado O Estado entende que quando ocorre uma obra puacuteblica haacute a valorizaccedilatildeo do

imoacutevel particular sendo o pagamento da contribuiccedilatildeo de melhoria devido ao Estado Este tributo eacute

vinculado agrave realizaccedilatildeo de uma obra puacuteblica O CTN em seu artigo 81 esclarece o que eacute a contribuiccedilatildeo

de melhoria (BRASIL 2002a)

Art 81 A contribuiccedilatildeo de melhoria cobrada pela Uniatildeo pelos Estados pelo Distrito Federal ou pelos Municiacutepios no acircmbito de suas respectivas atribuiccedilotildees eacute instituiacuteda para fazer face ao custo de obras puacuteblicas de que decorra valorizaccedilatildeo imobiliaacuteria ten-do como limite total a despesa realizada e como limite individual o acreacutescimo de valor que da obra resultar para cada imoacutevel beneficiado

E os tributos natildeo vinculados satildeo aqueles que tecircm por fato gerador uma situaccedilatildeo independente

de qualquer atividade estatal especiacutefica relativa ao contribuinte Os tributos natildeo vinculados satildeo os

impostos especificados nos artigos 153 155 e 156 da CF88 cobrados pelo Estado sem qualquer

prestaccedilatildeo de serviccedilo ou obra a um determinado contribuinte que retornam agrave sociedade por meio de

benefiacutecios e vantagens coletivas em prol do bem comum (BRASIL 2007)

Dessa forma o imposto ldquoeacute o tributo cuja obrigaccedilatildeo tem por fato gerador uma situaccedilatildeo in-

dependente de qualquer atividade especifica do Estado relativa ao contribuinterdquo Os impostos satildeo

tributos natildeo vinculados a uma prestaccedilatildeo de serviccedilo especifica e pode ser de competecircncia da Uniatildeo

Estados Distrito Federal e Municiacutepios (BRASIL 2002a)

Os impostos satildeo classificados em direto ou indireto e progressivo ou regressivo O imposto

direto eacute aquele pago e recolhido pela proacutepria pessoa fiacutesica ou juriacutedica O imposto indireto eacute aquele

pago por uma pessoa e recolhido por outra isto eacute quem paga o imposto natildeo eacute o mesmo que re-

colhe ou seja eacute aquele que incide sobre o consumo independente da capacidade contributiva do

cidadatildeo O imposto progressivo eacute aquele que quando a renda aumenta o valor cobrado aumenta

isto eacute de acordo com a capacidade econocircmica (contributiva) da pessoa O imposto regressivo eacute

aquele que natildeo considera o poder aquisitivo ou a capacidade contibutiva do cidadatildeo (REBOUCcedilAS

2000 In VIDAL 2010)

A tributaccedilatildeo brasileira tem como base os impostos regressivos e indiretos desprezando a capa-

cidade contributiva da populaccedilatildeo desrespeitando os princiacutepios tributaacuterios estabelecidos na Constitui-

cao Federal acarretando uma pesada e injusta carga tributaacuteria para a sociedade e acirrando o conflito

na relaccedilatildeo Estado-Cidadatildeo (BUFFON 2009)

Aleacutem disso a populaccedilatildeo paga os impostos mas natildeo se reconhece como contribuinte criando

uma visatildeo distorcida na relaccedilatildeo Fisco-Sociedade Por outro lado o STN possui uma linguagem teacutecnica

e complexa que dificulta a sociedade de se apropriar dessas informaccedilotildees importantes para a constru-

ccedilatildeo de confianccedila nessa relaccedilatildeo Do ponto de vista humano eacute essencial que STN atenda as necessida-

des de grande parcela da populaccedilatildeo combatendo as desigualdades e a concentraccedilatildeo de renda por

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

351

meio da efetiva justiccedila fiscal da transparecircncia e da eficiecircncia na aplicaccedilatildeo dos recursos puacuteblicos Desse

modo conhecer o papel do Estado suas origens seus propoacutesitos e o controle do gasto puacuteblico cria

um ambiente democraacutetico de participaccedilatildeo tornando a relaccedilatildeo FiscoSociedade mais transparente e

harmocircnica (BUFFON 2009)

2 A EDUCACcedilAtildeO FISCAL NO CEARAacute

A Portaria nordm 35 do Ministeacuterio da Fazenda criou o grupo de Educaccedilatildeo Tributaacuteria dos Estados

(GET) responsaacutevel por promover e coordenar as accedilotildees do PNEF nos Estados Jaacute a Portaria nordm 413 defi-

niu as instituiccedilotildees responsaacuteveis por implantar o Programa nos trecircs niacuteveis de governo Federal Estadual

e Municipal O GET tem autonomia de elaborar e implementar o programa estadual de acordo com a

filosofia e as diretrizes do PNEF (BRASIL 2009)

No Cearaacute a Sefaz em 1959 no governo de Joseacute Parsival Barroso sob o discurso de melhorar a

relaccedilatildeo conflituosa Fisco-Sociedade lanccedilou a Campanha ldquoSeu talatildeo vale um milhatildeordquo O objetivo des-

sa campanha era estimular a populaccedilatildeo a exigir o documento fiscal no momento da compra de um

produto Essa campanha foi um sucesso em arrecadaccedilatildeo e levou o governo estadual a lanccedilar diver-

sas campanhas visando incentivar cada vez mais a participaccedilatildeo do cidadatildeo na tarefa de fiscalizaccedilatildeo

e recolhimento dos tributos Dessa forma a partir da deacutecada de 1990 foram elaborados programas

e projetos locais que visavam disseminar a educaccedilatildeo tributaacuteria na sociedade cearense (AMORIM

WEYNE 2006)

A Lei Estadual nordm 11916 de janeiro de 1992 instituiu o ldquoPrograma Estadual de Fiscalizaccedilatildeo Co-

munitaacuterialdquo Esse programa incentivava o cidadatildeo a exigir a nota fiscal e em contrapartida premiava as

Associaccedilotildees Comunitaacuterias Creches Comunitaacuterias Postos de Sauacutede Galpotildees Industriais Casa de Fari-

nha Engenhos Comunitaacuterios que recolhessem o maior valor em notas fiscais emitidas pelo comeacutercio

varejista do Estado (AMORIM WEYNE 2006)

No Cearaacute o Confaz em 1996 no seminaacuterio sobre Administraccedilatildeo Tributaacuteria percebeu a impor-

tacircncia de inserir no curriacuteculo das escolas puacuteblicas um programa que despertasse nos jovens estudan-

tes a praacutetica da cidadania o respeito ao bem comum e a certeza de que o bem-estar social somente

se consegue com a conscientizaccedilatildeo de todos (RIVILLAS VILLADERBOacute MOTA 2010)

Por sua vez em 1997 no municiacutepio de HorizonteCE a Sefaz lanccedilou o Projeto ldquoCidadatildeo desde

Pequeno o ABC da cidadaniardquo apresentando noccedilotildees gerais sobre tributaccedilatildeo e cidadania por meio de

palestras nas escolas puacuteblicas e particulares dos municiacutepios Esse projeto visava despertar a cidadania

nos jovens cearenses passo importante para a implantaccedilatildeo do Programa de Educaccedilatildeo Tributaacuteria no

Estado (RIVILLAS VILLADERBOacute MOTA 2010)

Deste modo o Estado do Cearaacute por meio do Decreto Estadual nordm 25326 de 23 de Dezem-

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

352

bro de 1998 lanccedilou em parceria com as Secretarias estaduais de Fazenda de Educaccedilatildeo e a Secre-

taria Municipal de Desenvolvimento Social o Programa de Educaccedilatildeo Tributaacuteria do Cearaacute ndash PET CE

(CEARAacute 1998)

Art 1ordm - Fica criado o Programa Educaccedilatildeo Tributaacuteria junto agraves instituiccedilotildees de Ensino objetivando conscientizar as pessoas sobre a importacircncia do pagamento de tributos um dos principais deveres do cidadatildeo bem como o de esclarecer sobre o papel do Estado de arrecadar tributos e aplicaacute-los eficientemente para o desenvolvimento da sociedade (CEARAacute 1998)

Os recursos financeiros para implementaccedilatildeo do programa vieram de contratos de financiamen-

to com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e a Unidade de Cooperaccedilatildeo do Programa

(UCP) vinculada agrave Secretaria Executiva do Ministeacuterio da Fazenda com contrapartida da Uniatildeo e dos

Estados (CEARAacute 1998) O Grupo de Educaccedilatildeo Tributaria dos Estados (GETE) criado em 1997 eacute o res-

ponsaacutevel por coordenar e implementar as accedilotildees educativas do Programa de Educaccedilatildeo Tributaacuteria dos

Estados (MOTA 2001)

Executar atividades necessaacuterias agrave implementaccedilatildeo do Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal em seu EstadoDivulgar as experiecircncias e resultados para facilitar a troca de conhecimentos e vivecircn-cias em apoio aos demais Estados com vistas ao aperfeiccediloamento do programaColaborar com apoio teacutecnico aos Estados onde a implantaccedilatildeo do programa estaacute em fase inicial

A Secretaria da Fazenda e a Secretaria de Educaccedilatildeo implantaram nas escolas estaduais e muni-

cipais do ensino fundamental a primeira versatildeo do Programa de Educaccedilatildeo Tributaacuteria O PET cearense

implantado inicialmente nas escolas do Sistema de Telensino tem o objetivo de conscientizar o cida-

datildeo sobre o dever de pagar os tributos para concretizaccedilatildeo dos direitos fundamentais de cidadania O

tema educaccedilatildeo fiscal abordado por meio de teleaulas dinacircmicas de grupo e leitura de textos apresen-

ta a histoacuteria dos tributos os direitos e deveres dos cidadatildeos a importacircncia do documento fiscal como

instrumento de arrecadar recursos para realizaccedilatildeo das poliacuteticas puacuteblicas Desta forma professores e

alunos discutiram sobre os primeiros passos para o efetivo exerciacutecio de cidadania (CEARAacute 1998)

Em 2000 o PET alterou o nome do programa para Programa de Educaccedilatildeo Fiscal (PEF) com

ampliaccedilatildeo das accedilotildees e abrangecircncia do processo educacional envolvendo o conceito de Estado suas

funccedilotildees uso do recurso puacuteblico orccedilamento e participaccedilatildeo Objetiva disseminar informaccedilotildees e valores

fundamentais para o processo de construccedilatildeo de uma sociedade mais justa e igualitaacuteria Tem como

objetivos promover o exerciacutecio de cidadania por meio da conscientizaccedilatildeo sobre o retorno social do

tributo harmonizar a relaccedilatildeo estado-cidadatildeo disseminar os conhecimentos a respeito das atividades

administrativas e financeiras do estado fomentando o controle social (CEARAacute 2005)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

353

A meta do PEF eacute ajudar o cidadatildeo a compreender as atividades financeiras do Estado desde

sua arrecadaccedilatildeo ateacute o gasto puacuteblico bem como o exerciacutecio do controle social construindo a cida-

dania fiscal Desta forma para alcanccedilar os objetivos do PEF foram traccediladas estrateacutegias durante mais

de uma deacutecada disseminando conceitos e definiccedilotildees sobre tributos eacutetica cidadania e de gestatildeo

puacuteblica instruindo a sociedade para o exerciacutecio da cidadania buscando melhorar a relaccedilatildeo Estado

Sociedade (CEARAacute 2005)

No Cearaacute a Sefaz eacute a instituiccedilatildeo responsaacutevel por implementar o PEF do Estado Ateacute 2007 as

accedilotildees do Programa eram coordenadas pela Assessoria de Desenvolvimento Institucional (Adins) que

monitorou e distribuiu material didaacutetico agraves escolas promoveu a capacitaccedilatildeo de professores e alunos

por meio de cursos seminaacuterios e palestras visando formar um quadro de disseminadores da educaccedilatildeo

fiscal em todo o Estado (CEARAacute 2005)

O Decreto nordm 28900 de 2792007 instituiu a Ceacutelula de Educaccedilatildeo Fiscal (Ceduf) responsaacutevel

por coordenar a partir de 2007 as accedilotildees do PEF no Estado com as seguintes competecircncias dispostas

no Decreto nordm 29201 de 2822008 em seu artigo 45

I Promover a conscientizaccedilatildeo na sociedade da funccedilatildeo socioeconocircmica do tributoII Coordenar e executar as accedilotildees do Programa Educaccedilatildeo Fiscal - PEF- CearaacuteIII Promover a educaccedilatildeo fiscal junto ao puacuteblico escolar em seus diferentes niacuteveis bem como desenvolver parcerias com instituiccedilotildees puacuteblicas e privadas para inserccedilatildeo do Programa nos diversos segmentos da sociedadeIV Promover o marketing interno e externo do programaV Representar o Estado no Grupo Nacional de educaccedilatildeo fiscalVI Promover em parceria com a aacuterea de treinamento a formaccedilatildeo de agentes capaci-tados e multiplicadoresVII Monitorar a produccedilatildeo do material a ser utilizado pelo programa tais como livro material didaacutetico viacutedeo educativo e outros (CEARAacute 2008)

A Ceduf tem ampliado as accedilotildees educativas do PEF por meio de cursos a distacircncia e presenciais

aumentando o nuacutemero de disseminadores da educaccedilatildeo fiscal nas escolas puacuteblicas estaduais e na so-

ciedade cearense

A accedilatildeo de maior impacto do Programa cearense eacute o curso na modalidade a distacircncia ldquoDisse-

minador da Educaccedilatildeo Fiscalldquo com carga horaacuteria de 160 horas direcionado aos servidores puacuteblicos

(federais estaduais e municipais) agraves escolas puacuteblicas nas trecircs esferas agraves ONGs e instituiccedilotildees privadas

(CEARAacute 2011)

Segundo Mota (2001) servidora puacuteblica da Sefaz a populaccedilatildeo precisa de informaccedilatildeo instru-

ccedilatildeo e conhecimento para avanccedilar no processo de participaccedilatildeo e construccedilatildeo da cidadania fiscal Para

Mota (2001) o Programa cearense eacute um instrumento de informaccedilatildeo acerca da histoacuteria dos tributos do

sistema tributaacuterio nacional da funccedilatildeo social do tributo bem como sobre o papel do Estado com seus

deveres de prestar contas agrave sociedade de suas atividades administrativas e financeiras

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

354

Neste sentido conhecer o conceito de tributo sua funccedilatildeo e aplicaccedilatildeo satildeo requisitos essenciais

ao desenvolvimento econocircmico e social do Estado mostra que a Educaccedilatildeo Fiscal ao alcance de todos

eacute um instrumento fundamental na mudanccedila da visatildeo do povo sobre a relaccedilatildeo fiscosociedade Dessa

forma a Educaccedilatildeo Fiscal eacute a ponte que liga o cidadatildeo agraves questotildees sociais despertando a consciecircncia

cidadatilde acerca do retorno social dos tributos e da gestatildeo fiscal dos recursos puacuteblicos (VIDAL 2010)

Portanto a Ceduf vem realizando diversas accedilotildees previstas no PEF ao longo dos anos buscando

preparar o cidadatildeo para lutar por seus direitos e ensinando a importacircncia no cumprimento de seus

deveres para exercer de forma democraacutetica a plena cidadania (BRASIL 2007)

3 METODOLOGIA

Pesquisa de natureza eminentemente qualitativa populaccedilatildeo composta por duzentos e cinquen-

ta alunos da rede puacuteblica estadual que participam do projeto Bolsa Educaccedilatildeo Fiscal e Cidadania no

municiacutepio de Fortaleza-Ce A amostra de natureza representativa seguiu um ponto de saturaccedilatildeo defi-

nida pela quantidade de repeticcedilotildees de respostas e a escassez de diferenccedilas das mesmas abrangendo

trinta alunos que participam do referido projeto Pesquisa empiacuterica realizou-se na Sede da Secretaria

da Fazenda do Estado do Cearaacute com os estudantes da rede puacuteblica estagiaacuterios bolsistas lotados no

setor responsaacutevel pela Campanha ldquoSua Nota Vale Dinheirordquo no periacuteodo de Janeiro a Marccedilo de 2012

Quanto aos instrumentos de coleta de dados consistiu de uma entrevista semiestruturada

elaborada mediante roteiro com dez perguntas abertas buscando identificar a efetividade das accedilotildees

do Projeto ldquoBolsa Educaccedilatildeo Fiscal e Cidadaniardquo na formaccedilatildeo da cidadania dos estudantes da escola

puacuteblica do Cearaacute Os dados coletados foram sistematizados e analisados na perspectiva de compre-

ensatildeo da relaccedilatildeo teoria-empiria As categorias teoacutericas priorizadas foram cidadania e tributaccedilatildeo sobre

as quais se buscou compreender velhos e novos caminhos assim como o tributo e sua funccedilatildeo socioe-

conocircmica Com base nas respostas dos entrevistados buscou-se identificar categorias de anaacutelise sem

entretanto perder de vista os propoacutesitos da pesquisa

4 RESULTADOS E DISCUSSAtildeO

Esta pesquisa teve como objetivo de conhecer a contribuiccedilatildeo da educaccedilatildeo fiscal na formaccedilatildeo

da cidadania do aluno que participa do Projeto Bolsa Educaccedilatildeo Fiscal e Cidadania da SefazCE

Buscou-se traccedilar uma aproximaccedilatildeo do perfil do aluno atraveacutes de dados pessoais tais como

gecircnero idade escolaridade descriccedilatildeo do nuacutecleo familiar (dinacircmica composiccedilatildeo e posiccedilatildeo do aluno)

seguido da autopercepccedilatildeo acerca da participaccedilatildeo na vida comunitaacuteria e por fim a utilizaccedilatildeo da bolsa

salaacuterio

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

355

O estudo demonstrou que o perfil socioeconocircmico e cultural dos sujeitos desta pesquisa satildeo

alunos matriculados no ensino meacutedio da rede puacuteblica estadual com a idade entre 16 e 18 anos A

maioria deles eacute do sexo feminino e participam do projeto haacute mais de seis meses Indagou-se acerca

do significado do bairro na sua vida visto que se trata de uma relaccedilatildeo pessoal especiacutefica que interes-

sa agrave nossa pesquisa Eles residem nos bairros carentes da periferia da cidade de Fortaleza Vila Uniatildeo

Edson Queiroz Henrique Jorge Pirambu Planalto Mundubim Praia do Futuro Montese Parque Santa

Rosa Paupina Manuel Satiro Parque Genibau Jangurussu Joseacute Walter Varjota Bom Jardim Aldeota

Cidades dos Funcionaacuterios e Alto Alegre II

Durante a pesquisa emergiram sentimentos carregados de diferentes significados que pro-

duzem explicaccedilotildees e generalizaccedilotildees em relaccedilatildeo ao bairro Observou-se uma saturaccedilatildeo das palavras

bom alegre legal oacutetimo harmonioso nas diferentes entrevistas que indicam com mais clareza e

precisatildeo os sentimentos dos sujeitos em relaccedilatildeo ao lugar de moradia Nas falas percebe-se o sen-

timento de apego de gozo de seguranccedila ao lugar paacutetrio Nas frases o sentimento de orgulho sa-

tisfaccedilatildeo alegria e contentamento revelam a posse o apego integraccedilatildeo ao lugar de nascimento As

qualidades positivas expressas revelam o viacutenculo com o bairro Desse modo percebe-se nas falas de

alguns sujeitos entrevistados o sentimento de pertencimento

Nesta etapa da pesquisa buscou-se tambeacutem conhecer as formas de lazer de entretenimento

de acesso agrave cultura e participaccedilatildeo na comunidade Constatou-se que o acesso a cultura lazer e en-

tretenimento em sua maioria satildeo informaccedilotildees advindas da televisatildeo e internet sendo que a escola

alcanccedilou uma iacutendice menor entre os demais No Brasil o poder mediaacutetico eacute responsaacutevel por formar a

opiniatildeo popular que se concentra na miacutedia visual a televisatildeo A TV eacute o meio de comunicaccedilatildeo popu-

lar mais raacutepido e eficaz na formaccedilatildeo (forjaccedilatildeo) de costumes e valores sociais da contemporaneidade

Desse modo o poder institucional passa a exercer forte influecircncia e manipulaccedilatildeo de classes que tecircm

a TV como fonte verdadeira de informaccedilatildeo (MEKSENAS 2002)

Buscou-se tambeacutem conhecer o lugar que ocupa no nuacutecleo familiar composiccedilatildeo dinacircmica e

posiccedilatildeo expressou-se de forma constrangida valores sentimentos e relacionamentos da vida pessoal

Constatou-se que o chefe da famiacutelia estaacute representado na figura materna onde na maioria das vezes

os pais estatildeo separados e ou satildeo filhos de matildee solteira O desejo de diaacutelogo expressa a dificuldade

de comunicaccedilatildeo existente no nuacutecleo familiar Alguns revelavam o grau de importacircncia no seio familiar

expressando com orgulho o lugar em que ocupa no nuacutecleo familiar

No tocante agrave bolsa salaacuterio ela representa um acreacutescimo na renda da famiacutelia ajudando a pagar

as despesas de casa O sentimento de independecircncia financeira do aluno tambeacutem foi percebido quan-

do diz ldquopago minhas despesas e cursos de capacitaccedilatildeordquo Percebeu-se nas falas dos alunos a importacircn-

cia financeira e sentimental da bolsa salaacuterio paga aos sujeitos desta pesquisa As entrevistas indicaram

com clareza e precisatildeo o valor financeiro desse beneficio que corrobora para o Estado exercer forte-

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

356

mente seu poder sobre o cidadatildeo o qual expressa o sentimento de gratidatildeo

No quesito conteuacutedo do curso ldquoMonitor de Educaccedilatildeo Fiscalrdquo ministrado no formato presencial

pela equipe da Ceduf percebeu-se que proporcionou aos alunos os conhecimentos sobre a histoacuteria

do tributo e a importacircncia social e econocircmica para o desenvolvimento da sociedade contribuindo na

formaccedilatildeo da consciecircncia criacutetica do aluno da escola puacuteblica Entendeu-se que o objetivo do curso foi

alcanccedilando os alunos reconhecem a importacircncia dos tributos para o desenvolvimento da vida em

sociedade apesar de natildeo verem o retorno desses recursos aplicados para o bem da coletividade

Os relatos demonstraram que depois do curso os alunos passaram a olhar o tributo de forma

diferente ou seja reconhecem a relevacircncia do imposto para o desenvolvimento social

Dessa forma os conceitos sobre eacutetica tributaccedilatildeo deveres e direitos administraccedilatildeo puacuteblica

repassados no Curso Monitor de Educaccedilatildeo Fiscal satildeo fundamentais para vida em sociedade que con-

tribuem para o pleno exerciacutecio de cidadania Percebe-se ao longo das falas dos sujeitos o impacto

desses conceitos na formaccedilatildeo da vida cidadatilde do aluno que demonstraram motivados a repassar os

conhecimentos adquiridos no curso

Expressam o desejo de compartilhar com mais pessoas os conhecimentos adquiridos impor-

tantes para formaccedilatildeo da consciecircncia cidadatilde de todos Apesar de questionarem se o poder puacuteblico

representado pelo Estado tem de fato o interesse de contribuir na formaccedilatildeo desse cidadatildeo que luta

participa reclama fiscaliza os atos praticados com os recursos puacuteblicos O curso tambeacutem despertou

no aluno o sentimento de participaccedilatildeo para fiscalizar e acompanhar a aplicaccedilatildeo dos recursos puacuteblicos

do seu Estado O desejo de exercer o seu direito de cidadatildeo de participar das decisotildees da vida em

grupo pode ser percebido em diferentes falas dos entrevistados

A disseminaccedilatildeo da Educaccedilatildeo Fiscal configura-se mais uma oportunidade de reverter os aspec-

tos negativos na relaccedilatildeo Fisco e Sociedade heranccedila deixada pela colonizaccedilatildeo Novas formas de ensino

e aprendizagem satildeo necessaacuterias para atender os anseios de uma sociedade complexa que exige infor-

maccedilotildees e transparecircncia por parte dos governantes contemporacircneos (VIDAL 2010)

O discurso oficial da educaccedilatildeo fiscal adveacutem do Poder Puacuteblico visa informar a populaccedilatildeo dos

seus direitos e deveres Busca realmente preparar o cidadatildeo Ou ldquono frigir dos ovosrdquo quer alavancar

a arrecadaccedilatildeo dos entes tributantes Seria um manejo dos detentores do poder para manter o povo

cativo e mais uma vez alienaacute-los do verdadeiro direito de cidadania

Apesar de motivados em repassar e compartilhar os conhecimentos sobre o tema na comunida-

de ou na escola os alunos natildeo colocaram em praacutetica os projetos elaborados durante o estaacutegio tendo

em vista que os oacutergatildeos competentes natildeo demonstraram interesse nessa disseminaccedilatildeo Por que seraacute

que os alunos natildeo colocaram em praacutetica os conhecimentos adquiridos A escola natildeo estaacute preparada

para construir esse conhecimento O modelo escolar brasileiro preso a uma grade curricular natildeo estaacute

usufruindo do espaccedilo democraacutetico que eacute peculiar agrave escola Professores diretores mestres satildeo fruto

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

357

de uma ditadura opressatildeo e consequente ausecircncia de participaccedilatildeo dificultando a construccedilatildeo de uma

massa criacutetica para disseminar conhecimentos e formar a consciecircncia cidadatilde

No tocante ao curso ldquoMonitor de Educaccedilatildeo Fiscalrdquo os alunos o consideraram bom oacutetimo di-

nacircmico poreacutem a carga horaacuteria eacute pequena para um conteuacutedo complexo e relevante tema para forma-

ccedilatildeo da cidadania do aluno Provavelmente um curso com carga horaacuteria de 16 horas natildeo iraacute formar a

consciecircncia cidadatilde no maacuteximo despertar e aguccedilar o interesse em conhecer algo sobre o tema Seraacute

que esse tempo tatildeo reduzido seria apenas para legitimar uma das accedilotildees estabelecida no PNEF Por

que entatildeo natildeo aprofundar o curso com accedilotildees sobre a educaccedilatildeo fiscal nas escolas Seraacute o verdadeiro

interesse do governo do estado construir a cidadania fiscal e tributaacuteria da populaccedilatildeo

Os alunos expressaram o desejo de conhecer e aprofundar mais sobre os conteuacutedos abordados

no curso ou seja demonstraram o sentimento de apreender sobre o Estado e a poliacutetica fiscal do seu

paiacutes Eles entendem que o tema eacute importante que desperta o aluno para o mundo fiscal e tributaacuterio

desconhecido ateacute entatildeo Para eles os tributos influenciam dominam e determinam a vida em socie-

dade Consideram relevante para construccedilatildeo da justiccedila social a disseminaccedilatildeo da Educaccedilatildeo Fiscal na

escola que pode contribuir para formaccedilatildeo da cidadania do aluno A disseminaccedilatildeo da educaccedilatildeo fiscal

por meio de temas que perfazem o cotidiano da populaccedilatildeo pode ser uma ferramenta eficaz no apren-

dizado da populaccedilatildeo sobre a importacircncia de exigir seus direitos e cumprir seus deveres de cidadatildeos

Os entrevistados afirmaram que os conhecimentos apreendidos durante o estaacutegio influencia-

ram na mudanccedila de comportamento e de atitude da maioria dos alunos desta pesquisa Eles passaram

a solicitar a nota fiscal perceberam que os tributos estatildeo incluiacutedos em todos os produtos consumidos

e o Estado natildeo administra com eficiecircncia os recursos arrecadados que deveria retornar em serviccedilos

para populaccedilatildeo Mudar o comportamento traz consequecircncias seraacute que o poder dominante quer essa

mudanccedila Transparecircncia no uso do dinheiro puacuteblico

Na Constituiccedilatildeo Federal de 1988 a cidadania eacute um dos princiacutepios fundamentais que busca a

universalizaccedilatildeo da dignidade humana como pressuposto e a emancipaccedilatildeo da humanidade para uma

vida livre e aberta na diversidade cultural Mas o significado de cidadania encontra-se em construccedilatildeo

nas diversas etapas da vida em sociedade em sua essecircncia eacute o direito de viver decentemente (BRASIL

2007) Seraacute que a cidadania do povo brasileiro estaacute apenas na Constituiccedilatildeo

A cidadania pode ter diferentes concepccedilotildees e ateacute antagocircnicas poreacutem ela estaacute em constante

transformaccedilatildeo na sociedade Os sujeitos em estudo apreenderam que cidadania eacute ter direitos e tam-

beacutem ter deveres Para Covre (2006) a cidadania varia muito depende da classe social que o individuo

faz parte

Apesar de todas as informaccedilotildees repassadas via oacutergatildeos puacuteblicos sobre a relaccedilatildeo Fisco-Socieda-

de os sujeitos entrevistados apontam algumas atitudes que o Estado deve tomar para melhorar essa

relaccedilatildeo Ser transparente nas atitudes fazer a parte do Estado ser honesto reduzir as desigualdades

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

358

e injusticcedilas Para os alunos a relaccedilatildeo poderaacute ser harmoniosa desde que o Estado ou seja o governo

faccedila a sua parte oferecendo escolas de qualidade sauacutede puacuteblica eficiente seguranccedila puacuteblica eficaz

administrando com efetividade os recursos arrecadados pois o cidadatildeo jaacute faz a sua parte contribuin-

do com uma pesada e onerosa carga tributaacuteria

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Avaliar a contribuiccedilatildeo da educaccedilatildeo fiscal na formaccedilatildeo da cidadania do aluno da escola puacuteblica

que participou do Projeto Bolsa Educaccedilatildeo fiscal e Cidadania em Fortaleza sob a oacutetica do aluno foi

um desafio e ao mesmo tempo uma experiecircncia enriquecedora especialmente porque nos propiciou

vaacuterios olhares acerca do objeto estudado Os bairros citados da capital cearense tecircm seu cotidiano

permeado de grandes dificuldades e problemas econocircmicos e sociais que influenciam diretamente o

comportamento dos seus habitantes As drogas a violecircncia a falta de oportunidade de emprego e de

serviccedilos puacuteblicos alargam cada vez mais esse quadro de desigualdades sociais

Os alunos que participam do projeto cumprem uma rotina diaacuteria de quatro horas de trabalho

no setor da Campanha ldquoSua Nota Vale Dinheirordquo Eles exercem as atividades de separaccedilatildeo contagem

e digitaccedilatildeo dos cupons fiscais enviados pelos participantes da Campanha Com relaccedilatildeo a essa rotina

de trabalho merece uma reflexatildeo para os responsaacuteveis pela implementaccedilatildeo do projeto na Sefaz Seraacute

que essas atividades estatildeo contribuindo para formaccedilatildeo da cidadania do aluno ou seraacute a utilizaccedilatildeo de

matildeo de obra desqualificada Eles recebem uma bolsa salaacuterio que custeia as despesas pessoais e ajuda

a compor a renda da famiacutelia Nas falas dos alunos percebeu-se que a bolsa salaacuterio paga no estaacutegio eacute

um incentivo que motiva os alunos a participar ativamente das atividades da educaccedilatildeo fiscal na Sefaz

Com relaccedilatildeo agrave participaccedilatildeo nas atividades da comunidade os alunos expressam um posicio-

namento ainda muito individual sem nenhuma indicaccedilatildeo de organizaccedilatildeo coletiva e muito menos de

uma compreensatildeo mais ampla de participaccedilatildeo comunitaacuteria apesar da indignaccedilatildeo demonstrada sobre

a ausecircncia do retorno dos tributos arrecadados em serviccedilos puacuteblicos agrave comunidade

Desse modo diante de uma aproximaccedilatildeo aos perfis socioeconocircmico e cultural dos alunos en-

trevistados identificou-se que os alunos que participam do Projeto Bolsa Educaccedilatildeo Fiscal e Cidadania

satildeo jovens da classe pobre da periferia de Fortaleza que tecircm a Internet como principal meio de lazer

entretenimento cultura e informaccedilatildeo O nuacutecleo familiar desse sujeito eacute formado por matildee e avoacutes Os jo-

vens tecircm grandes desejos e sonhos de superar a barreira da pobreza por meio da educaccedilatildeo Acreditam

que a escola ainda eacute o espaccedilo democraacutetico que possibilita a formaccedilatildeo da massa criacutetica para superar as

barreiras sociais encontradas ao longo da vida Apesar disso natildeo costumam participam das atividades

da comunidade ou escola ainda tecircm uma visatildeo muito individual

Um segundo olhar foi direcionado para verificar a eficiecircncia do Curso Monitor de Educaccedilatildeo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

359

Fiscal ministrado pela CedufSefaz aos alunos da escola puacuteblica que participam do Projeto Bolsa Edu-

caccedilatildeo fiscal e Cidadania O curso aborda diferentes temas sobre eacutetica controle social gestatildeo puacuteblica

funccedilatildeo social do tributo conteuacutedos importantes e essenciais na construccedilatildeo da cidadania fiscal do alu-

no cearense

Constatou-se de modo geral uma compreensatildeo de que a educaccedilatildeo fiscal deveria existir em

todas as escolas dando oportunidades a todos de conhecer os seus direitos e deveres Embora natildeo

haja uniformidade quanto agraves dificuldades encontrada na disseminaccedilatildeo da educaccedilatildeo fiscal nas escolas

alguns destacam as principais dificuldades a falta de capacitaccedilatildeo do professor sobre o tema falta o

interesse de diretores e profissionais da educaccedilatildeo e falta de infraestrutura das escolas puacuteblicas

A compreensatildeo do aluno em relaccedilatildeo agrave cidadania eacute inserida num contexto maior Sua efetivaccedilatildeo

diante da complexidade dos processos que a envolve natildeo dependeraacute somente das accedilotildees do PNEF

mas de compreensatildeo quanto agrave proacutepria concepccedilatildeo do conceito de cidadania seja pela aquisiccedilatildeo de

direitos pelo cumprimento de deveres que satildeo realizados e pela forma como os serviccedilos puacuteblicos satildeo

estruturados e oferecidos agrave populaccedilatildeo Assim para os alunos desta pesquisa a cidadania compreende

uma vida digna com sauacutede de qualidade educaccedilatildeo seguranccedila diversidade cultural religiosa como

um todo garantindo o exerciacutecio da plena cidadania

Por sua vez para a maioria dos alunos existem muitas dificuldades de relacionamento quando

se trata da relaccedilatildeo fiscocidadatildeo Vaacuterios relatos revelam uma necessidade muito forte de transparecircncia

nas accedilotildees do Estado Os alunos querem que o Estado faccedila a parte dele nesta relaccedilatildeo ou seja atender

as necessidades baacutesicas de vida em sociedade Os relatos apontam a dificuldade de acesso agrave informa-

ccedilatildeo e transparecircncia das accedilotildees do poder puacuteblico como um dos principais obstaacuteculos a harmonizaccedilatildeo

dessa relaccedilatildeo Apesar disso a efetivaccedilatildeo de um PNEF que atenda de fato agraves necessidades de educaccedilatildeo

fiscal da populaccedilatildeo requer intensas transformaccedilotildees sociais poliacuteticas econocircmicas e culturais Dessa

forma eacute possiacutevel afirmar que apesar das accedilotildees do PNEF suas praacuteticas ainda concentram um distancia-

mento entre o cidadatildeo e o fisco

Desse modo com base neste estudo realizado propotildeem-se algumas accedilotildees como forma de

contribuir para formaccedilatildeo da cidadania fiscal por meio do programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Cearaacute quais

sejam envolver o centro estudantil no processo de disseminaccedilatildeo da educaccedilatildeo fiscal na escola pro-

movendo parceria da organizaccedilatildeo estudantil com os educadores da Sefaz fortalecendo o processo

de construccedilatildeo da cidadania fiscal revisar o curriacuteculo dos cursos de formaccedilatildeo de professores incluindo

os conteuacutedos sobre educaccedilatildeo fiscal para subsidiar na melhoria da praacutetica educativa ampliar vagas no

projeto Bolsa Educaccedilatildeo Fiscal e Cidadania promover seminaacuterios palestras debates jornadas sobre

temas transversais a fim de contribuir para que professores e alunos possam conhecer mais profunda-

mente sobre direitos deveres funccedilatildeo do tributo administraccedilatildeo do estado aumentar a carga horaacuteria

do Curso ldquoMonitor de Educaccedilatildeo Fiscalrdquo oferecer lanche aos alunos nos intervalos durante o curso mi-

nistrado pela Ceduf promover a inserccedilatildeo da educaccedilatildeo fiscal como disciplina do curriacuteculo escolar

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

360

De modo geral essa avaliaccedilatildeo deve ser vista como instrumento importante para gerar ideias de

aprimoramento mas nunca como uma verdade absoluta devido agraves limitaccedilotildees das metodologias exis-

tentes entretanto se bem interpretadas tornam-se de grande importacircncia para o autoconhecimento

aprimorando e auxiliando a gestatildeo das accedilotildees da educaccedilatildeo fiscal no Estado do Cearaacute

E por fim com referecircncia nas avaliaccedilotildees efetuadas pelos alunos podem ser apontadas as se-

guintes consideraccedilotildees o curso monitor de educaccedilatildeo fiscal foi eficaz em fomentar a reflexatildeo sobre

alguns temas que perfazem o cotidiano do aluno enquanto cidadatildeo e influenciou a mudanccedila de com-

portamento dos mesmos em relaccedilatildeo agrave funccedilatildeo socioeconocircmica dos tributos e sua gestatildeo Contudo

enfatiza-se que em termos de conscientizaccedilatildeo tributaacuteria e fiscal ainda existe muito a percorrer sendo

que a disseminaccedilatildeo da educaccedilatildeo fiscal por meio da escola poderaacute ajudar minimizar o distanciamento

existente na relaccedilatildeo Fisco-Sociedade Desse modo o Estado precisa considerar a importacircncia do papel

da escola na disseminaccedilatildeo da educaccedilatildeo fiscal e ater-se agrave valorizaccedilatildeo de sua funccedilatildeo social na sociedade

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

361

REFEREcircNCIAS

AMORIM Maacutercio Wiliam F WEYNE Walda Maria M (Orgs) SEFAZ tributo a historia Fortaleza Secre-taria da Fazenda do Cearaacute 2006

BRASIL Ministeacuterio da Fazenda Escola de Administraccedilatildeo Fazendaacuteria Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal Funccedilatildeo social do tributo 4 ed Brasiacutelia 2009 58 p (Serie Educaccedilatildeo Fiscal caderno 3)

______ Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Federativa do Brasil promulgada em 5 de outubro de 1988 40 p Satildeo Paulo Saraiva 2007

______ Coacutedigo Tributaacuterio Nacional Lei ndeg 5172 de 25 de Outubro de 1966 8 ed Satildeo Paulo Saraiva 2002a

______ Ministeacuterio da Fazenda Escola Superior de Administraccedilatildeo Fazendaacuteria Programa Nacional de Educaccedilatildeo Tributaacuteria Curso de disseminadores de educaccedilatildeo fiscal Brasiacutelia 2002b

BUFFON Marciano Tributaccedilatildeo e dignidade humana Livraria do Advogado 2009

CARVALHO Joseacute Murilo de Cidadania no Brasil o longo caminho 4 ed Rio de Janeiro Civilizaccedilatildeo Brasileira 2003

CEARAacute Decreto nordm 26600 de 09 de maio de 2002 Fortaleza 2005

______ Decreto nordm 25326 de 23 de dezembro de 1998 Programa de Educaccedilatildeo Tributaacuteria Fortaleza 1998

COVRE Maria de Lourdes Manzini O que eacute cidadania Satildeo Paulo Brasiliense 2006 (Coleccedilatildeo Primeiros Passos)

FREIRE Paulo Educaccedilatildeo como praacutetica da liberdade 11 ed Rio de Janeiro Paz e Terra 1980

MEKSENAS Paulo Cidadania poder e comunicaccedilatildeo 2 ed Satildeo Paulo Cortez 2002

MOTA Luiza Ondina Santos Educaccedilatildeo fiscal caderno do participante Fortaleza Sefaz 2001

REBOUCcedilAS Osvaldo Joseacute Educaccedilatildeo fiscal no Brasil e no mundo In VIDAL Eloiacutesa Maia (org) Educaccedilatildeo Fiscal e Cidadania Fortaleza Ediccedilotildees Demoacutecrito Rocha 2010

RIVILLAS Borja Diacuteaz VILLADERBOacute Andreacutea MOTA Luiza Ondina Santos Educaccedilatildeo fiscal no Brasil e no mundo In VIDAL Eloiacutesa Maia (org) Educaccedilatildeo Fiscal e Cidadania Fortaleza Ediccedilotildees Demoacutecrito Rocha 2010

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

362

AVALIACcedilAtildeO DO PROGRAMA DE EDUCACcedilAtildeO FISCAL DESAFIOS LIMITES E VIVEcircNCIAS DA PRAacuteTICA DOCENTE

SUMAacuteRIO Introduccedilatildeo 1 As marcas estruturais do Estado brasileiro 2 Cidada-nia no Brasil 3 Aspectos histoacutericos da tributaccedilatildeo no Brasil 4 O atual Sistema Tributaacuterio Nacional 5 Educaccedilatildeo Fiscal e o PNEF 51 O Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal 52 A Educaccedilatildeo Fiscal no Cearaacute 6 Metodologia 7 Resultados Consideraccedilotildees finais Referecircncias

Ana Cleiane Carneiro de Oliveira1 Fernando Joseacute Pires de Sousa2

INTRODUCcedilAtildeO

A sociedade brasileira evidencia que o Estado Democraacutetico de Direito formalmente vigente

estaacute longe de assegurar os direitos sociais e econocircmicos fundamentais para uma grande parcela da

populaccedilatildeo apesar dos avanccedilos jaacute conquistados

Para fazer frente a suas obrigaccedilotildees o Estado dispotildee de recursos por meio da arrecadaccedilatildeo de

tributos dentre outros financiamentos O universo tributaacuterio perpassa os direitos humanos fundamen-

tais pois a promoccedilatildeo da justiccedila social papel do Estado depende em grande parte de recursos origi-

nados da arrecadaccedilatildeo dos tributos

Conforme avalia Buffon (2009) o dever de pagar tributos eacute fundamental para a realizaccedilatildeo dos

direitos Mas por outro lado eacute preciso que o Estado cumpra seu papel decisivo de assegurar a concre-

tizaccedilatildeo dos direitos fundamentais e exerccedila tal prerrogativa tal dever com base no mesmo pressuposto

que arrecada tributos o imperativo do Estado Social

Eacute essencial portanto compreender o universo tributaacuterio acionar o seu mecanismo de com-

bate agrave desigualdade social lutar por um modelo tributaacuterio que atenda a urgecircncia de corrigir a gran-

de concentraccedilatildeo de renda deste paiacutes Eacute imperativo no tempo presente pensar a tributaccedilatildeo do ponto

de vista do interesse da sociedade natildeo eacute justo pagar tributo sem ter efetivamente assegurados os

direitos fundamentais afinal a tributaccedilatildeo deve estar em consonacircncia aos princiacutepios do Estado De-

mocraacutetico de Direito

A questatildeo tributaacuteria no Brasil ao longo da histoacuteria foi pautada pelo conflito e hoje natildeo eacute dife-

1 Servidora Puacuteblica Estadual Mestre em Avaliaccedilatildeo de Poliacuteticas Puacuteblicas pela Universidade Federal do Cearaacute (2013) Especia-lista em Direito e Processo Tributaacuterio pela Faculdade Integrada do Cearaacute (2008) E-mail acleianehotmailcom2 Doutor e Poacutes-Doutor em Economia pelas Universiteacutes Paris XIII Franccedila e Montreal Canadaacute respectivamente Professor do Mestrado em Avaliaccedilatildeo de Poliacuteticas Puacuteblicas da Universidade Federal do Cearaacute e do Departamento de Teoria Econocircmica Coordenador do Observatoacuterio de Poliacuteticas Puacuteblicas ndash OPP

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

363

rente O modelo tributaacuterio que foi construiacutedo tem a marca da nossa sociedade injusta desigual e ex-

cludente Segundo Buffon (2009) a tributaccedilatildeo passou a ser instrumento de ampliaccedilatildeo de desigualda-

des econocircmicas e sociais que colaboram para a construccedilatildeo de uma das sociedades mais desiguais do

mundo Eis aqui a ideia central defendida por Buffon (2009) a dignidade humana deve ser o elemento

norteador em todas as relaccedilotildees dentre estas a tributaccedilatildeo

Faltam poliacuteticas puacuteblicas no campo tributaacuterio que priorizem a concretizaccedilatildeo do que estaacute for-

malmente instituiacutedo pela Constituiccedilatildeo ldquoCidadatilderdquo no tocante aos direitos sociais que ofereccedilam respos-

tas imediatas agraves questotildees sociais urgentes que considerem a funccedilatildeo socioeconocircmica do tributo uma

diretriz a ser perseguida Enfim falta vontade poliacutetica para articular uma reforma tributaacuteria que torne

o Sistema Tributaacuterio Nacional instrumento de distribuiccedilatildeo de renda e riqueza

Nesse contexto a pesquisa teve como proposta investigativa a anaacutelise criacutetica de uma das accedilotildees

do Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal (PNEF) Tal programa eacute uma estrateacutegia do Estado brasileiro

de promover a cidadania fiscal Segundo o discurso oficial o mesmo se propotildee a ldquocontribuir perma-

nentemente para a formaccedilatildeo do indiviacuteduo visando ao desenvolvimento da conscientizaccedilatildeo sobre seus

direitos e deveres no tocante ao valor social do tributo e ao controle socialrdquo (BRASIL 2009 p 29)

O foco da pesquisa estaacute em uma das accedilotildees do Programa a accedilatildeo de disseminaccedilatildeo da Educaccedilatildeo

Fiscal por meio do Curso de Formaccedilatildeo de Disseminadores de Educaccedilatildeo Fiscal coordenado pela Escola

de Administraccedilatildeo Fazendaacuteria (Esaf) de acordo com a Portaria Interministerial (Fazenda e Educaccedilatildeo) nordm

413 de 31122002 Referido curso eacute promovido haacute quase uma deacutecada e tem por objetivo multiplicar

os conceitos e valores da Educaccedilatildeo Fiscal no espaccedilo escolar Ocorre em parceria com as Secretarias da

Fazenda e da Educaccedilatildeo dos estados e municiacutepios e Secretaria da Receita Federal (SRF)

O objetivo geral da pesquisa foi avaliar em que medida o Curso de Formaccedilatildeo de Disseminado-

res de Educaccedilatildeo Fiscal possibilita aos professores participantes da escola puacuteblica municipal de Forta-

leza promover a disseminaccedilatildeo da cidadania fiscal na sua praacutetica docente

Os objetivos especiacuteficos satildeo identificar o grau de comprometimento dos professores cursistas

em efetivar a disseminaccedilatildeo da Educaccedilatildeo Fiscal analisar os limites e desafios da proposta do Curso de

Formaccedilatildeo na praacutetica docente verificar o desenvolvimento de projetos pedagoacutegicos da Educaccedilatildeo Fiscal

pelos professores cursistas e examinar o aproveitamento acerca do conteuacutedo ministrado no referido

Curso para os participantes

Ressalta-se que a pesquisa de campo tem uma abordagem metodoloacutegica de natureza qualitati-

va que buscou investigar a praacutetica em torno da Educaccedilatildeo Fiscal a partir do Curso de Formaccedilatildeo de Dis-

seminadores de Educaccedilatildeo Fiscal para compreender as accedilotildees as atitudes dos professores participantes

na sua praacutetica docente

Legalmente a praacutetica educativa tem na cidadania o eixo principal Sabe-se que na atual conjun-

tura esse eacute um grande objetivo a ser alcanccedilado ou seja a distacircncia entre o discurso legal e a aplicaccedilatildeo

praacutetica do que estaacute proposto eacute um longo caminho a ser percorrido

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

364

Eacute importante para a intervenccedilatildeo nos aspectos da vida social o suporte da educaccedilatildeo educaccedilatildeo

como ponte travessia instrumento de transformaccedilatildeo de resgate da responsabilidade pessoal coletiva

e com o meio ambiente Nos termos de Paulo Freire (2001) a educaccedilatildeo natildeo faraacute a mudanccedila sozinha

mas sem ela pouco seraacute construiacutedo

Assim eacute pertinente avaliar referido Programa em virtude da importacircncia da questatildeo tributaacuteria

no atual contexto do Estado contemporacircneo A sociedade brasileira necessita de mecanismos estrateacute-

gias para interferir na poliacutetica fiscal-tributaacuteria do paiacutes para influenciar na criaccedilatildeo e modificaccedilatildeo de leis

para exigir uma postura eacutetica do Estado quanto agrave esfera tributaacuteria enfim para legitimar a cidadania

formalmente instituiacuteda

Frente ao exposto a escolha do tema se justifica pela vivecircncia da autora do estudo como agen-

te do fisco onde se percebe que o tributo estaacute presente no nosso cotidiano e interfere diretamente

na vida de cada cidadatildeo e que a apatia ou a rejeiccedilatildeo pelas questotildees tributaacuterias natildeo eacute a via de soluccedilatildeo

para enfrentarmos o modelo tributaacuterio injusto que foi sendo gestado no Brasil A indignaccedilatildeo de pagar

tributos deve ser transformada em mecanismos de participaccedilatildeo e mobilizaccedilatildeo da sociedade brasileira

por justiccedila social Referida luta social estaacute muito aleacutem da indignaccedilatildeo sonegaccedilatildeo aversatildeo ou apatia

pelos tributos A via de transformaccedilatildeo perpassa outros mecanismos mais eficazes

1 AS MARCAS ESTRUTURAIS DO ESTADO BRASILEIRO

Nesta pesquisa foi essencial fazer o resgate da histoacuteria da tributaccedilatildeo do Brasil para compreen-

satildeo de suas marcas estruturais onde foram analisadas as bases da construccedilatildeo da estrutura tributaacuteria

com destaque para as implicaccedilotildees do tributo na relaccedilatildeo EstadoSociedade

No campo das interpretaccedilotildees da realidade brasileira vale destacar o valioso trabalho de

Raymundo Faoro (2000) Sua busca foi no sentido de resgatar as estruturas e configuraccedilotildees arraiga-

das na realidade brasileira oriundos de Portugal tanto que se debruccedilou sobre a histoacuteria poliacutetica de

Portugal desde o seacuteculo XII Sua conclusatildeo eacute que naquele paiacutes iniciou a consolidaccedilatildeo de um ldquoesta-

mento burocraacuteticordquo que deteve o poder em um sistema patrimonialista e essa tradiccedilatildeo foi implan-

tada aqui no Brasil

Segundo o autor o Estado brasileiro estava exposto em seu excesso aos interesses privados do-

minantes na sociedade fazendo com que toda accedilatildeo estatal fosse no sentido de satisfazer os interesses

dos detentores do poder econocircmico As relaccedilotildees de poder ou como bem determinou Faoro (2000)

ldquoos donos do poderrdquo cometeram os autoritarismos poliacuteticos mantendo relaccedilotildees pessoais de favor

clientela e tutela a fim de priorizar interesses privados egoiacutestas

Pode-se afirmar que a sociedade brasileira conserva as marcas da sociedade colonial escravis-

ta e estas estatildeo expressas nas suas relaccedilotildees sociais relaccedilotildees que de um lado estatildeo os que mandam

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

365

e no outro os que obedecem Esta relaccedilatildeo perpassa as instituiccedilotildees inclusive o Estado daiacute vaacuterias

manifestaccedilotildees de autoritarismo poliacutetico cujo exemplo maior foi o periacuteodo de quase duas deacutecadas de

Ditadura Militar

No Brasil foi construiacutedo um modelo de Estado que estaria a serviccedilo dos segmentos sociais do-

nos da propriedade e dos meios de produccedilatildeo Seus efeitos podem ser expressos pela grande diacutevida

social que perdura haacute seacuteculos

Aqui natildeo houve luta pela independecircncia por meio de lutas populares tudo ocorreu de cima

para baixo diferente dos movimentos ocorridos em vaacuterias regiotildees da Ameacuterica espanhola Para Couti-

nho (2008) o Brasil foi um Estado antes de ser naccedilatildeo e esta supremacia do Estado sobre a sociedade

civil foi uma caracteriacutestica marcante da sociedade brasileira A nossa modernizaccedilatildeo via Estado forte

autoritaacuterio corporativista construtor da naccedilatildeo brasileira favoreceu uma sociedade fragmentada onde

as classes sociais natildeo haviam se constituiacutedo ainda

Para Caio Prado Juacutenior (1994) em sua anaacutelise do Brasil referiu-se a essa forma de modernizaccedilatildeo

conservadora um fato histoacuterico com efeitos perversos para a realidade brasileira como a dependecircncia

externa formas de coerccedilatildeo na relaccedilatildeo entre capital e trabalho e deacuteficit de cidadania

De forma corporativa tambeacutem os interesses da classe dominante eram feitos no proacuteprio apa-

relho de Estado como por exemplo os Institutos de Accediluacutecar e do Aacutelcool do Cafeacute do Cacau Referidos

grupos foram defendidos por toda a Ditadura Militar e os seus efeitos ainda persistem Hoje os atores

econocircmicos detentores do capital continuam barganhando vantagens benefiacutecios nas mais variadas

instituiccedilotildees moldados de acordo com casuiacutesmos e interesses de corporaccedilotildees econocircmicas e politica-

mente influentes

Um exemplo de proteccedilatildeo a esses atores econocircmicos influentes eacute a constataccedilatildeo da estrutura

tributaacuteria injusta que segundo Buffon (2009) amplia as desigualdades sociais e econocircmicas Dessa

forma vale interrogar-se por que a Uniatildeo natildeo regulamentou ainda o Imposto sobre Grandes Fortunas

criado desde 1988 Por que existem as renuacutencias fiscais indiscriminadas aos detentores de capital me-

diante isenccedilatildeo remissatildeo ou anistia Eacute justa a excessiva tributaccedilatildeo indireta sobre os produtos da cesta

baacutesica e serviccedilos essenciais como a energia eleacutetrica telecomunicaccedilotildees A quem interessa a negociaccedilatildeo

das aliacutequotas do IPI

Nesse sentido vale ressaltar uma estrateacutegia utilizada por atores econocircmicos influentes que

colocam na maior cidade do paiacutes Satildeo Paulo o ldquoimpostocircmetrorsquorsquo informando sobre o montante arreca-

dado de tributos Qual eacute a intenccedilatildeo Qual o interesse Por que natildeo colocar tambeacutem o montante do

lucro que estaacute presente no valor de cada produto Seria justo e completo informar ao contribuinte e

ao consumidor o montante dos itens que compotildeem o valor da mercadoria dentre estes os impostos

os custos e o lucro

A veiculaccedilatildeo deveria recair sobre a aplicaccedilatildeo correta e transparente dos recursos puacuteblicos

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

366

Seria interessante ter os dados dos valores arrecadados dos tributos que natildeo foram aplicados em

benefiacutecio das demandas sociais Ou seja jaacute feita a deduccedilatildeo com o que foi aplicado e o que deixou

de ser aplicado Esse nuacutemero eacute o que nos interessa natildeo somente aos detentores do capital mas a

sociedade como um todo A partir do conhecimento dessa diferenccedila amplamente divulgada pode-

riacuteamos participar exigir uma gestatildeo correta dos recursos arrecadados a partir de uma nova perspec-

tiva de cidadania fiscal

A veiculaccedilatildeo do ldquoimpostocircmetrordquo leva a crer que seja uma estrateacutegia de desqualificar o puacuteblico

o estatal nos termos de Emir Sader (2009) com a colaboraccedilatildeo do neoliberalismo em sua operaccedilatildeo

ideoloacutegica de instaurar a oposiccedilatildeo entre estatal e privado e de caracterizar o Estado brasileiro como

ineficiente corrupto e burocraacutetico Dessa forma o autor defende que a polarizaccedilatildeo deve ser entre o

puacuteblico e o mercantil e natildeo entre o estatal e o privado O conflito estaacute relacionado entre os que defen-

dem os interesses coletivos puacuteblicos e os que defendem interesses mercantis Referida luta ocorre no

campo de disputa dentro do proacuteprio Estado

Pode-se afirmar assim que o Estado brasileiro natildeo foi constituiacutedo em favor de todos os seus

habitantes O Estado com sua forma poliacutetica autoritaacuteria e centralizadora sempre esteve a serviccedilo de

interesses particulares As suas caracteriacutesticas patrimonialistas o puacuteblico sendo tratado como pessoal

levou a privatizaccedilatildeo do puacuteblico a favor dos interesses do capital

Como bem adverte Sousa (2010) o Estado brasileiro tradicionalmente tem colocado em se-

gundo plano a qualidade de vida da populaccedilatildeo beneficiando assim interesses particulares em

nome do capital contribuindo dessa forma para o processo de precarizaccedilatildeo do mercado de trabalho

e consequentemente para a crise do emprego

As demandas das classes trabalhadoras fruto dos movimentos sociais no periacuteodo da transiccedilatildeo

democraacutetica natildeo foram implementadas efetivamente devido ao novo contexto de ajuste neoliberal

como tambeacutem nos termos de Coutinho (2008) agrave falta de vontade poliacutetica de implementar a conquista

dos direitos sociais da Carta de 1988 porque natildeo haacute verdadeiro interesse puacuteblico embasando a accedilatildeo

dos nossos governantes

Os movimentos sociais e as lutas emancipatoacuterias que foram gestadas nos periacuteodos de autori-

tarismo poliacutetico promoveram as conquistas sociais e hoje favorecidas pela democracia apontam para

um novo caminho Assim na Ameacuterica Latina em um contexto de agravamento da questatildeo social haacute

inuacutemeros movimentos emancipatoacuterios na construccedilatildeo de uma contra-hegemonia e que faz surgir uma

nova invenccedilatildeo do Estado com nova direccedilatildeo novo modelo viabilizando uma ampliaccedilatildeo do Estado nos

termos de Carvalho (2010)

Eacute importante que a sociedade civil brasileira que jaacute conseguiu articular a luta social expressa

nos direitos sociais instituiacutedos retome novas articulaccedilotildees no sentido de defender um modelo de

Estado que coloque o interesse puacuteblico no centro de suas decisotildees Eacute urgente que novos mecanis-

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

367

mos de participaccedilatildeo social defendam a ampliaccedilatildeo da dimensatildeo do puacuteblico na esfera da vida social

e poliacutetica Enfim que surjam propostas de redefiniccedilatildeo do papel do Estado a serviccedilo da democracia

e da justiccedila social

2 CIDADANIA NO BRASIL

Murilo de Carvalho (2003) confronta a cidadania inglesa baseada na classificaccedilatildeo de Marshall

e a cidadania brasileira Na Inglaterra a cidadania foi fruto da conquista ao longo de trecircs seacuteculos con-

quista atrelada A direitos ou seja cada direito garantia a conquista de outros No Brasil a cidadania

foi fruto da estrateacutegia poliacutetica de governantes autoritaacuterios que fizeram de ordem inversa a doaccedilatildeo com

supressatildeo de alguns direitos sem nenhuma vinculaccedilatildeo E esta eacute a tese de Carvalho (2003) demonstrar

que ao longo do tempo neste paiacutes foi desenvolvida uma cidadania inconclusa por natildeo ter havido

vinculaccedilatildeo dessas trecircs dimensotildees poliacuteticas da cidadania

A considerar a chegada dos portugueses em 1500 ateacute o iniacutecio do seacuteculo XX o Brasil em quatro

seacuteculos pouco avanccedilou em termos de cidadania e de participaccedilatildeo da sociedade civil Os direitos civis

eram estendidos a poucos os direitos poliacuteticos a uma parcela ainda menor e os direitos sociais ainda

nem eram cogitados pois a assistecircncia social estava a cargo da Igreja e de particulares

Falar de cidadania no Brasil eacute analisar a matriz cultural de uma sociedade em que direitos natildeo

fazem parte das regras que organizam a vida social ou seja natildeo foram concebidos como direitos e sim

como favores benefiacutecios Eacute constatar o modo como as relaccedilotildees sociais se estruturaram na medida do

poder dos interesses privados dos ldquodonos do poderrdquo

A sociedade brasileira apesar dos avanccedilos carrega o peso da tradiccedilatildeo de um paiacutes escravocrata

concentrador de riquezas E ao analisar o esquema apresentado por Marshall e confrontar com a reali-

dade brasileira como fez Carvalho (2003) percebe-se que a cidadania estaacute desconectada da formaccedilatildeo

da sociedade brasileira E mais pode-se constatar que a existecircncia formal desses direitos natildeo significa

a sua efetivaccedilatildeo ou seja existe um grande fosso entre o paiacutes legal e o paiacutes real

3 ASPECTOS HISTOacuteRICOS DA TRIBUTACcedilAtildeO NO BRASIL

O primeiro tributo instituiacutedo no Brasil foi o pagamento do Quinto que correspondia ao paga-

mento da quinta parte do produto da venda de madeira ao soberano portuguecircs conforme Weyne e

Amorim (2006) Estava instituiacutedo o primeiro ocircnus fiscal agrave Coroa Portuguesa Os tributos eram pagos

em produtos accediluacutecar tabaco cravo pano de algodatildeo couro pau-brasil dentre outros

O Fisco portuguecircs segundo Weyne e Amorim (2006) cometia abusos e desmandos aleacutem da

criaccedilatildeo da estrutura tributaacuteria com modernas teacutecnicas de escrituraccedilatildeo elaboraccedilatildeo de balanccedilos regula-

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

368

res e prestaccedilatildeo de contas agrave Real Fazenda Segundo os autores de 1808 a 1822 o nuacutemero de tributos

era quase cem e ainda existiam os diacutezimos laudecircmio emolumentos foros dentre outros E como natildeo

havia separaccedilatildeo de competecircncias em mateacuteria tributaacuteria os impostos eram cobrados em duplicidade

pela Corte proviacutencia e municiacutepios Em um relatoacuterio de 1831 o accediluacutecar era tributado cinco vezes a

aguardente oito o tabaco seis e o algodatildeo trecircs vezes ressaltam Weyne e Amorim (2006)

A revolta mais importante contra a cobranccedila extorsiva dos tributos por Portugal foi a Inconfi-

decircncia Mineira segundo Savegnani (2006) A revolta popular era contra a Derrama um dos tributos

mais perversos aplicados na Regiatildeo das Minas que era a apropriaccedilatildeo pela Coroa dos bens particulares

de todos os habitantes mineradores ou natildeo caso natildeo fosse computado a cota estipulada do ouro

Essa rebeliatildeo dos inconfidentes foi a que teve mais viacutenculo com a questatildeo fiscal Seu resultado a Der-

rama foi suspensa e referido movimento inspirou mais tarde a Independecircncia do Brasil

A primeira lei de orccedilamento que traccedilava normas sobre receita e despesas das proviacutencias data

de 14 de novembro de 1827 conforme Weyne e Amorim (2006) Com a aboliccedilatildeo da escravatura em

1888 houve a liberaccedilatildeo do capital antes empregado na compra de escravos para uma nova economia

o cafeacute Surgem os grupos cafeeiros do oeste paulista que recebiam incentivos fiscais ou a garantia de

compra dos estoques excedentes que foram os interlocutores poliacuteticos das questotildees nacionais na ldquoRe-

puacuteblica Velhardquo de acordo com Weyne e Amorim (2006)

Nesse sentido eacute oportuno destacar a criacutetica feita por Buffon (2009) a respeito da estrutura tri-

butaacuteria atual moldada com casuiacutesmos e interesses que mediante mecanismos de proteccedilatildeo a grupos

econocircmicos influentes satildeo feitas negociaccedilotildees por representantes do Poder Executivo com relaccedilatildeo a

renuacutencias fiscais indiscriminadas Satildeo isenccedilotildees remissatildeo ou anistia que beneficiam atores econocircmicos

tais quais os cafeicultores do oeste paulista que receberam na ldquoRepuacuteblica Velhardquo os benefiacutecios fiscais

Atualmente aos detentores do capital concedem-se benefiacutecios fiscais e aos trabalhadores tem-se

pesada carga tributaacuteria incidente sobre o trabalho assevera o autor

A Era Vargas trouxe medidas tributaacuterias mais ampliadas proposta de reforma fiscal onde fosse

contemplada a organizaccedilatildeo orccedilamentaacuteria soluccedilatildeo de problemas fiscais e uniformizaccedilatildeo da contabili-

dade puacuteblica O estabelecimento do Sistema Tributaacuterio Nacional conforme Weyne e Amorim (2006)

surge na Ditadura Militar onde a poliacutetica tributaacuteria assim como os demais aspectos da vida brasileira

passaram por profundas modificaccedilotildees

Conforme os historiadores houve a centralizaccedilatildeo do poder fiscal da Uniatildeo e esta foi a princi-

pal criacutetica feita agrave reforma tributaacuteria de 1965 que limitou drasticamente a autonomia financeira dos

estados

O sistema tributaacuterio que passou a vigorar com a promulgaccedilatildeo da Constituiccedilatildeo de 1988 repre-

sentou um novo pacto federativo onde estados e municiacutepios passaram a dispor de mais autonomia

encerrando assim o centralismo de outrora conforme Weyne e Amorim (2006) O grande avanccedilo foi

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

369

representado pelas limitaccedilotildees ao poder de tributar do Estado revelando-se um instrumento de prote-

ccedilatildeo contra o arbiacutetrio de poder estatal O fato relevante nos termos de Hugo de Brito Machado (2006)

consiste na compreensatildeo da tributaccedilatildeo como relaccedilatildeo juriacutedica e natildeo apenas como relaccedilatildeo de poder

4 O ATUAL SISTEMA TRIBUTAacuteRIO NACIONAL

Por meio da Constituiccedilatildeo Federal de 1988 fonte primaacuteria de toda ordem juriacutedica o Sistema Tri-

butaacuterio Nacional eacute instituiacutedo em seus artigos 145 a 162 A Constituiccedilatildeo natildeo cria tributo cumpre papel

essencial na construccedilatildeo do sistema ao definir competecircncias tributaacuterias dos entes poliacuteticos da federa-

ccedilatildeo (Uniatildeo Estados Distrito Federal e Municiacutepios) consagrar os princiacutepios e normais gerais do Direito

Tributaacuterio instituir limitaccedilotildees ao poder de tributar estabelecer a reparticcedilatildeo das receitas e vinculaccedilotildees

compulsoacuterias conforme Brasil (2007)

O conceito de tributo estaacute relacionado ao que por dever eacute repassado ao Estado cuja finalidade

eacute servir de meio para o atendimento agraves necessidades financeiras do Estado para que este cumpra sua

funccedilatildeo social nos termos de Amaro (2005)

Conforme dispotildee o artigo 145 da CF88 as espeacutecies tributaacuterias satildeo os impostos as taxas e as

contribuiccedilotildees de melhorias Vale ressaltar que satildeo previstas ainda na Constituiccedilatildeo duas outras formas

tributaacuterias tratadas como se fossem tributos os empreacutestimos compulsoacuterios (art 148) e as contribui-

ccedilotildees especiais ou parafiscais (art 149)

Haacute um senso comum de atribuir como imposto toda e qualquer exigecircncia do poder puacuteblico

poreacutem cada espeacutecie tem sua especificidade O imposto de acordo com o art 16 do Coacutedigo Tributaacuterio

Nacional ldquoeacute o tributo cuja obrigaccedilatildeo tem por fato gerador uma situaccedilatildeo independente de qualquer

atividade estatal especiacutefica relativa ao contribuinterdquo

Outra classificaccedilatildeo importante dos impostos eles podem ser diretos ou indiretos progressivos

ou regressivos Assim de acordo com Brasil (2009) o imposto direto eacute aquele em que o contribuinte de

fato eacute o mesmo contribuinte de direito Exemplos de impostos diretos IRPJ IRPF IPVA e IPTU Jaacute com

o imposto indireto a situaccedilatildeo eacute inversa ou seja o contribuinte de fato natildeo eacute o mesmo de direito por

exemplo o ICMS IPI e ISS

Quanto aos princiacutepios conforme Brasil (2009) podem ser assim enumerados princiacutepios da

legalidade da anterioridade da lei da isonomia da irretroatividade da lei da uniformidade da tributa-

ccedilatildeo da capacidade contributiva da proibiccedilatildeo de confisco

Eacute oportuno grifar as consideraccedilotildees de Buffon (2009) que defende a tese da tributaccedilatildeo poten-

cializar a materializaccedilatildeo dos direitos fundamentais sociais econocircmicos e culturais por meio de dois

mecanismos extrafiscalidade e adequaccedilatildeo da carga fiscal ao princiacutepio da capacidade contributiva Se-

gundo o autor eacute necessaacuteria uma accedilatildeo estatal efetiva bem diferente da accedilatildeo recomendada pelo mode-

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

370

lo liberal E um dos poderosos instrumentos que o Estado dispotildee eacute a imposiccedilatildeo de uma carga tributaacuteria

de acordo com a efetiva capacidade contributiva que representa o principal vetor de desigualdade no

campo da tributaccedilatildeo

O autor relata que a parcela da populaccedilatildeo com a menor capacidade contributiva que natildeo tem

garantido minimamente os direitos sociais arca com parcela exorbitante da carga tributaacuteria eacute uma

ldquoredistribuiccedilatildeo de renda agraves avessasrdquo em favor das minorias organizadas que se encontram no topo

da piracircmide social que dispotildee de poder para fazer valer seus interesses Em outras palavras o Estado

retira parte importante dos recursos daqueles que natildeo tecircm proteccedilatildeo social

Sabe-se que mecanismos existem vaacuterios dentre estes a adequaccedilatildeo da carga tributaacuteria ao prin-

ciacutepio da capacidade contributiva a extrafiscalidade e tantos outros que jaacute satildeo formalmente instituiacutedos

Este paiacutes dispotildee de teacutecnicos para pensar nas melhores estrateacutegias de reconduzir o Sistema Tributaacuterio

faltam entretanto a vontade e o interesse poliacutetico da sociedade civil e dos governantes em transfor-

mar o modelo de tributaccedilatildeo injusto que amplia desigualdades sociais e econocircmicas nos termos de

Buffon (2009) em um modelo condizente ao Estado Democraacutetico de Direito que preserva a dignidade

humana

5 EDUCACcedilAtildeO FISCAL E O PNEF

A Educaccedilatildeo Fiscal estaacute inserida em um amplo projeto educativo com o objetivo de proporcio-

nar o bem estar social por meio da construccedilatildeo de conhecimentos especiacuteficos sobre direitos e deveres

do cidadatildeo e promoccedilatildeo da consciecircncia cidadatilde Os pressupostos principais satildeo direitos e deveres con-

trole democraacutetico e funccedilatildeo socioeconocircmica do tributo Os valores estatildeo expressos na superioridade

do homem sobre o Estado liberdade justiccedila social conforme Brasil (2009)

Eacute relevante destacar que a Constituiccedilatildeo Federal de 1988 a Lei de Diretrizes Baacutesicas (LDB) e os

Paracircmetros Curriculares Nacionais (PCNs) expressam claramente a importacircncia da conquista da cida-

dania no processo educacional

As temaacuteticas sociais em relaccedilatildeo agrave eacutetica meio ambiente pluralidade cultural orientaccedilatildeo sexual

trabalho e consumo satildeo integradss na proposta educacional dos Paracircmetros Curriculares Nacionais

como temas transversais Referidos temas satildeo questotildees atuais urgentes da vida cotidiana que exigem

novos saberes para sua intervenccedilatildeo conforme Brasil (1998)

Eacute nesse contexto que se insere a Educaccedilatildeo Fiscal dentro do tema transversal Trabalho e Con-

sumo e tem como pressuposto contribuir para o exerciacutecio da cidadania por meio da sensibilizaccedilatildeo

da funccedilatildeo social do tributo em prol do controle social da aplicaccedilatildeo dos recursos oriundos conforme

Brasil (2009)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

371

51 O Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal (PNEF)

A Educaccedilatildeo Fiscal foi institucionalizada por intermeacutedio do Programa Nacional de Educaccedilatildeo

Fiscal em acircmbito nacional nas escolas de ensino fundamental escolas de ensino meacutedio institui-

ccedilotildees puacuteblicas universidades e sociedade em geral Os objetivos do Programa foram assim definidos

(BRASIL 2009)

Objetivo Geral promover e institucionalizar a Educaccedilatildeo Fiscal para o pleno exerciacutecio da cidadania

Os objetivos especiacuteficos do Programa satildeo

a) Sensibilizar o cidadatildeo para a funccedilatildeo socioeconocircmica do tributo

b) Levar o conhecimento ao cidadatildeo sobre administraccedilatildeo puacuteblica

c) Incentivar o acompanhamento pela sociedade da aplicaccedilatildeo dos recursos puacuteblicos

d) Criar condiccedilotildees para uma relaccedilatildeo harmoniosa entre o Estado e o cidadatildeo

A Educaccedilatildeo Fiscal natildeo eacute uma disciplina especiacutefica do curriacuteculo escolar segundo decisatildeo do Mi-

nisteacuterio da Educaccedilatildeo Ela eacute ministrada de maneira transversal em todas as demais mateacuterias das escolas

Seu conteuacutedo trata sobre a constituiccedilatildeo do Estado funccedilotildees receitas despesas funccedilatildeo social do tribu-

to orccedilamento gasto e investimento puacuteblico noccedilatildeo de bem puacuteblico dentre outros Referido conteuacutedo

eacute incorporado nas mateacuterias de geografia matemaacutetica portuguecircs eacutetica etc

As principais accedilotildees do Programa de acircmbito nacional correspondem a accedilotildees de sensibilizaccedilatildeo

formaccedilatildeo educaccedilatildeo e arte As accedilotildees de sensibilizaccedilotildees referem-se a palestras seminaacuterios mesas re-

dondas debates etc As accedilotildees de formaccedilatildeo abrangem cursos de formaccedilatildeo de disseminadores de

forma presencial e a distacircncia e cursos de poacutes-graduaccedilatildeo em Educaccedilatildeo Fiscal Com relaccedilatildeo agraves accedilotildees

de educaccedilatildeo estatildeo relacionadas agrave capacitaccedilatildeo de monitores professores atividades acadecircmicas como

projetos pedagoacutegicos elaboraccedilatildeo de monografias e dissertaccedilotildees As accedilotildees dirigidas ao setor artiacutestico

correspondem agrave elaboraccedilatildeo e encenaccedilatildeo de peccedilas de teatro elaboraccedilatildeo de muacutesicas paroacutedias poesias

cordeacuteis cartazes realizaccedilatildeo de concursos culturais todos abrangendo o tema Educaccedilatildeo Fiscal

52 A Educaccedilatildeo Fiscal no Cearaacute

A instituiccedilatildeo oficial do Programa de Educaccedilatildeo Tributaacuteria do Cearaacute foi por meio do Decreto

Estadual nordm 25326 de 23121998 fundamentado no artigo 1ordm paraacutegrafo uacutenico da Lei Estadual nordm

12436 de 11 de maio de 1995 revogada posteriormente pela Lei Estadual nordm 133142003 Houve

aqui um trabalho pioneiro com o projeto ldquoCidadatildeo Desde Pequenordquo em 07 de outubro de 1997 na

unidade fazendaacuteria localizada no municiacutepio de Horizonte no Nuacutecleo de Execuccedilatildeo Fiscal que abrangia

os seguintes municiacutepios Horizonte Pacajus Itaitinga Barreira Ocara e Chorozinho conforme Weyne

e Amorim (2006)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

372

Segundo os autores referido trabalho educativo procurava conscientizar as crianccedilas de 9 a 14

anos da circunscriccedilatildeo fiscal citada de escolas puacuteblicas e particulares acerca da importacircncia dos tributos

estaduais e seus benefiacutecios com a intenccedilatildeo de sensibilizar sobre o valor da participaccedilatildeo de cada um

ou seja dos futuros cidadatildeos Houve no dia 28 de novembro de 1997 a entrega da premiaccedilatildeo na ci-

dade de Pacajus ndash CE do concurso de redaccedilatildeo do Projeto Cidadatildeo desde Pequeno Concorreram nove

mil redaccedilotildees com o tema ICMS - sua importacircncia e seus benefiacutecios

Apoacutes o cronograma de implantaccedilatildeo dos Programas estaduais o Programa do Cearaacute pela ex-

periecircncia do ldquoProjeto Cidadatildeo Desde Pequenordquo na regiatildeo de Horizonte ndash CE foi selecionado como

um dos estados-pilotos para o ano de 1998 A aula inaugural foi veiculada pela TV Cearaacute canal 5 e

mensagens de Educaccedilatildeo Tributaacuteria foram levadas para adolescentes do 6ordm ano ao 9ordm ano do Ensino

Fundamental da rede estadual e municipal de ensino conforme Weyne e Amorim (2006)

O Programa de Educaccedilatildeo Fiscal no Estado do Cearaacute tem hoje a seguinte constituiccedilatildeo Secretaria

da Fazenda do Estado do Cearaacute (Sefaz) Secretaria da Receita Federal do Brasil ndash 3ordf Regiatildeo Fiscal Pre-

feitura Municipal de Fortaleza por meio da Secretarias de Financcedilas e Educaccedilatildeo do Municiacutepio Secreta-

ria de Educaccedilatildeo do Estado e Centro Regional da Escola de Administraccedilatildeo Fazendaacuteria - Centresaf ndash CE

Referidos oacutergatildeos parceiros compotildeem o Grupo de Educaccedilatildeo Fiscal Estadual (Gefe) no Cearaacute conforme

Rivillas Vilardeboacute Mota (2010)

O Decreto nordm 28900 de 27092007 incumbuiu agrave Ceacutelula de Educaccedilatildeo Fiscal (Ceduf) a respon-

sabilidade de coordenar as accedilotildees do PEF com as seguintes atribuiccedilotildees dispostas no Decreto nordm 29201

de 28022008 em seu artigo 45

I ndash promover a conscientizaccedilatildeo na sociedade da funccedilatildeo socioeconocircmica do tributoII ndash coordenar e executar as accedilotildees do Programa Educaccedilatildeo Fiscal ndash PEF ndash CearaacuteIII ndash Promover a educaccedilatildeo fiscal junto ao puacuteblico escolar em seus diferentes niacuteveis bem como desenvolver parcerias com instituiccedilotildees puacuteblicas e privadas para inserccedilatildeo do Programa nos diversos segmentos da sociedadeIV- promover o marketing interno e externo do ProgramaV ndash representar o Estado no Grupo Nacional de Educaccedilatildeo FiscalVI ndash promover em parceria com a aacuterea de treinamento a formaccedilatildeo de agentes capa-citados e multiplicadoresVII ndash monitorar a produccedilatildeo do material a ser utilizado pelo Programa tais como livro material didaacutetico viacutedeo educativo e outros (CEARAacute 2008)

6 METODOLOGIA

A fase inicial do trabalho abrangeu a pesquisa bibliograacutefica que contou como suporte de pes-

quisa as referecircncias teoacutericas constantes nos livros artigos dissertaccedilotildees e teses E sobretudo foi feita

a anaacutelise documental acerca da Educaccedilatildeo Fiscal e um levantamento bibliograacutefico sobre o tema Vale

ressaltar que ainda como suporte de pesquisa houve a participaccedilatildeo em cursos seminaacuterios e congres-

sos a fim de uma maior aproximaccedilatildeo com o assunto

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

373

A segunda etapa ou pesquisa de campo foi realizada com professores da rede puacuteblica municipal

de Fortaleza participantes do Curso de Formaccedilatildeo de Disseminadores de Educaccedilatildeo Fiscal promovido

pela Eesaf nos anos de 2008 a 2012 na modalidade a distacircncia

O instrumento utilizado para a coleta de dados foi um questionaacuterio enviado aos referidos par-

ticipantes por meio do endereccedilo eletrocircnico fornecido pela Ceduf Foram enviados durante o mecircs de

setembro de 2012 aos participantes embora tenha sido necessaacuterio o reenvio dos questionaacuterios o

reforccedilo sobre a importacircncia da colaboraccedilatildeo dos pesquisados enfim um apelo agrave participaccedilatildeo na ava-

liaccedilatildeo do referido Curso

O questionaacuterio apresentava questotildees fechadas e abertas e fundadas nos objetivos especiacuteficos

e em conformidade aos objetivos previstos pelo PNEF A pesquisa de campo teve uma abordagem

metodoloacutegica de natureza qualitativa que trabalha nos termos de Minayo (2007) com o universo dos

significados das atitudes dos valores

7 RESULTADOS

Na pesquisa de campo foram enviados um total de novecentos questionaacuterios aos professores

participantes mas o nuacutemero de respondentes foi bem reduzido apenas setenta e cinco responderam

ao questionaacuterio Tal fato pode ser um indicador importante a ser considerado Excluindo o alto retorno

por correio eletrocircnico invaacutelido houve uma participaccedilatildeo bem inferior ao esperado e natildeo foi possiacutevel

atingir o valor da amostra apesar da insistecircncia no reenvio dos questionaacuterios e sensibilizaccedilatildeo para a

importacircncia da participaccedilatildeo na avaliaccedilatildeo do referido Curso

Indaga-se por que a maioria dos cursistas natildeo se sentiu motivada a responder o questionaacuterio

eletrocircnico da pesquisa acadecircmica que avalia o Curso de Disseminadores de Educaccedilatildeo Fiscal e sua in-

fluecircncia na praacutetica docente Tal abstenccedilatildeo evidencia uma praacutetica natildeo condizente com o que legitima

o referido Programa ou seja a praacutetica cidadatilde Seraacute que expressar as criacuteticas as sugestotildees os desafios

a vivecircncia natildeo representa uma tentativa de buscar o aperfeiccediloamento do referido Curso Como seratildeo

feitas as avaliaccedilotildees das poliacuteticas puacuteblicas financiadas por recursos puacuteblicos sem a participaccedilatildeo dos

usuaacuterios de tais poliacuteticas sociais

Houve maior participaccedilatildeo na pesquisa de campo dos cursistas referentes aos uacuteltimos anos ou

seja de 2010 a 2012 quase oitenta por cento Praticamente todos ensinam no ensino fundamental

atribuiacuteram uma avaliaccedilatildeo positiva ao referido Curso sentem-se motivados a participar como dissemi-

nadores na praacutetica docente Tal resultado reforccedila a ideia de satisfaccedilatildeo de aprovaccedilatildeo de reflexatildeo sobre

os conceitos e valores da Educaccedilatildeo Fiscal

Todos os participantes apresentaram ao final do Curso o projeto pedagoacutegico mas 41 natildeo o

fazem ou seja mais da metade (59) desenvolvem na praacutetica docente atividades em Educaccedilatildeo Fiscal

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

374

Segundo os respondentes falta acompanhamento da accedilatildeo dos novos disseminadores pela escola e

este fato eacute apontado como principal desafio pelos participantes

Dentre os principais exemplos de atividades citados pelos respondentes que desenvolvem ati-

vidades sobre a forma de abordar em sala de aula a Educaccedilatildeo Fiscal destacam-se debates palestras

foacuteruns seminaacuterios e peccedilas teatrais sobre os conceitos e valores da Educaccedilatildeo Fiscal

Como foi exposto mais da metade dos participantes (59) abordam em sua praacutetica docente o

tema Educaccedilatildeo Fiscal mas em uma frequecircncia ainda baixa segundo os participantes

O apoio pedagoacutegico por parte do nuacutecleo gestor foi apontado como sendo o mais necessaacuterio

para motivar a disseminaccedilatildeo da Educaccedilatildeo Fiscal apoacutes a conclusatildeo do Curso aleacutem da oferta de mais

cursos sobre o tema

Percebeu-se com clareza a necessidade de mais cursos acerca do tema ou seja eacute necessaacuterio

que o novo disseminador familiarize-se com o assunto e possa disseminar bem ter argumentos sobre

mateacuteria complexa em um contexto nada favoraacutevel como bem adverte Pegoraro

De que forma nosso disseminador armado de oacutetimas intenccedilotildees que acaba de se apo-derar de determinados assuntos ainda natildeo muito familiares pode falar e ser ouvido em uma sociedade como esta dominada pelas elites carente da presenccedila estatal contraacuteria ao pagamento de tributos e sem o acompanhamento presente daqueles que o incentivaram a tomar essa atitude (PEGORARO 2011 p 151)

Com relaccedilatildeo aos principais desafios em abordar o tema Educaccedilatildeo Fiscal em sala de aula se-

gundo os professores participantes foram apontados falta de interesse dos alunos falta de apoio

estrutural da escola domiacutenio do assunto necessidade de mais cursos acerca do tema adequar o tema

complexo de forma simples Tal resultado evidencia lacunas a serem supridas de forma satisfatoacuteria

pelo PNEF para melhor atender seu puacuteblico alvo

Para quase 80 dos pesquisados o Curso de Formaccedilatildeo sensibilizou para a compreensatildeo socio-

econocircmica do tributo e controle social ou seja atingiu os objetivos especiacuteficos do PNEF

Vale destacar que a maioria dos pesquisados apontou a necessidade de inclusatildeo do tema como

disciplina obrigatoacuteria no curriacuteculo escolar Tal resultado confere ao tema um significado relevante

Os cursistas apontaram como principais condiccedilotildees para a construccedilatildeo de uma relaccedilatildeo harmo-

niosa entre Estado e cidadatildeo gestatildeo eficiente dos recursos puacuteblicos com transparecircncia e combate agrave

corrupccedilatildeo amplo conhecimento dos direitos e deveres dos cidadatildeos e retorno social dos tributos po-

liacuteticas puacuteblicas voltadas ao interesse social participaccedilatildeo e controle social Tal resultado reflete a cons-

ciecircncia do grupo de participantes sobre as razotildees do conflito entre Estado e sociedade Em siacutentese as

condiccedilotildees elencadas satildeo essenciais para a vivecircncia da cidadania para o resgate da eacutetica nas relaccedilotildees

para a instituiccedilatildeo real do Estado Democraacutetico de Direito

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

375

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

O universo tributaacuterio perpassa a cidadania fiscal pois os tributos representam o suporte fi-

nanceiro do Estado Social que por sua vez deve gerir tais recursos puacuteblicos de forma transparente e

eficiente atendendo assim as demandas sociais o bem comum razatildeo de sua instituiccedilatildeo Parece bem

simples esta relaccedilatildeo de parceria Estadosociedade mas aqui no Brasil foi e tem sido uma relaccedilatildeo de-

sarmocircnica

A sociedade brasileira tem uma carga tributaacuteria que aleacutem de ser alta penaliza com mais rigor

quem menos possui recursos isto eacute o Estado aleacutem de natildeo garantir a proteccedilatildeo social devida ainda exi-

ge tributos sobre os parcos recursos destinados a sobrevivecircncia Como superar a loacutegica deste modelo

tributaacuterio que atenta contra a dignidade humana

O enfrentamento ao sistema tributaacuterio injusto e complexo requer uma accedilatildeo eficaz da socieda-

de civil e do proacuteprio Estado no sentido de redefinir o papel do Estado redefinir valores os princiacutepios

enfim eacute urgente romper a loacutegica deste modelo atual que desconsidera o interesse humano que esva-

zia de seu sentido os direitos fundamentais que afronta a proacutepria sobrevivecircncia

As questotildees fiscais e tributaacuterias deveriam estar ao alcance do conhecimento criacutetico de todos

natildeo poderia existir para grande parcela da populaccedilatildeo esse ldquoalheamentordquo o imperativo de pagar tri-

butos deveria empoderar a sociedade na cobranccedila e na fiscalizaccedilatildeo dos recursos puacuteblicos e mais

deveria provocar um acirrado controle social A liccedilatildeo primordial a ser refletida encerra o conceito

baacutesico de cidadania vivecircncia de direitos e deveres um depende do outro eacute uma relaccedilatildeo juriacutedica

entre Estado e sociedade

Nesse sentido eacute fundamental considerar o papel da educaccedilatildeo Educaccedilatildeo voltada para a trans-

formaccedilatildeo para a mudanccedila de valores para a formaccedilatildeo cidadatilde isto eacute servindo como ponte travessia

da vida social que estaacute posta para aquela que se quer conquistar com base na eacutetica no respeito na

responsabilidade individual coletiva e social

Os temas transversais que versam sobre a realidade social como eacute o caso da Educaccedilatildeo Fiscal

devem contemplar o incentivo para a atuaccedilatildeo em seu entorno social Eacute necessaacuterio no tempo presente

interpretar dados fatos e situaccedilotildees a fim de que se tenha uma compreensatildeo para agir sobre a reali-

dade social principalmente a sociedade brasileira que historicamente eacute desigual

Conforme dados obtidos na pesquisa os professores avaliaram de forma positiva o Curso de

Formaccedilatildeo de Disseminadores de Educaccedilatildeo Fiscal entretanto foram enfaacuteticos ao apontar os seus li-

mites quanto ao apoio logiacutestico do nuacutecleo gestor do Programa Percebe-se que haacute necessidade de

avaliaccedilatildeo de monitoramento de acompanhamento da accedilatildeo de disseminaccedilatildeo Ou seja o que ocorre

apoacutes a capacitaccedilatildeo do professor da educaccedilatildeo baacutesica corresponde a uma etapa que exige a soma de

esforccedilos dos oacutergatildeos envolvidos no sentido de efetivar no espaccedilo escolar a disseminaccedilatildeo dos conteuacute-

dos do Programa

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

376

Pela dinacircmica do curso as informaccedilotildees foram veiculadas por meio das accedilotildees de divulgaccedilatildeo de

disseminaccedilatildeo do curso a distacircncia o material didaacutetico foi distribuiacutedo enfim os conteuacutedos e valores da

Educaccedilatildeo Fiscal foram disseminados E a accedilatildeo dos novos disseminadores Sem o envolvimento efetivo

dos oacutergatildeos responsaacuteveis natildeo haveraacute uma accedilatildeo ampliada A parceria entre os oacutergatildeos gestores deve ser

articulada com base nos novos conceitos e valores da Educaccedilatildeo Fiscal que o Programa legitima ou

seja de cidadania fiscal

Os setores responsaacuteveis pelo PNEF os Ministeacuterios da Fazenda da Educaccedilatildeo a Esaf a Receita

Federal Secretarias da Fazenda e Educaccedilatildeo dos estados e municiacutepios dentre outros devem articular

medidas necessaacuterias ao amplo desenvolvimento deste Programa isto eacute superar os desafios e limites

existentes para que o objetivo do mesmo seja atingido de forma satisfatoacuteria

A sugestatildeo como contribuiccedilatildeo ao Programa eacute que aqueles que jaacute estatildeo envolvidos servido-

res puacuteblicos professores alunos enfim todos que foram sensibilizados pelos conceitos e valores da

Educaccedilatildeo Fiscal assumam o compromisso de disseminar estes conteuacutedos e colaborem no sentido de

exigir dos oacutergatildeos responsaacuteveis o apoio necessaacuterio para o cumprimento dos objetivos para expansatildeo

do Programa exercitando assim o que foi assimilado isto eacute a praacutexis promotora de mudanccedilas

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

377

REFEREcircNCIAS

AMARO Luciano Direito Tributaacuterio Brasileiro Satildeo Paulo Saraiva 2005

AMORIM Maacutercio Wiliam F WEYNE Walda Maria M (orgs) SEFAZ tributo agrave histoacuteria Fortaleza Secre-taria da Fazenda do Cearaacute 2006

BRASIL Ministeacuterio da Educaccedilatildeo Paracircmetros Curriculares Nacionais Documento introdutoacuterio Secre-taacuteria de Educaccedilatildeo Fundamental Brasiacutelia 1998

______ Ministeacuterio da Fazenda Escola de Administraccedilatildeo Fazendaacuteria Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal (PNEF) Educaccedilatildeo fiscal no contexto social Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal Moacutedulo 3 Brasiacutelia Esaf 2009

______ Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Federativa do Brasil promulgada em 5 de outubro de 1988 40 p Satildeo Paulo Saraiva 2007

CARVALHO Alba Maria Pinho de Poliacuteticas Puacuteblicas e o dilema de enfrentamento das desigualdades um olhar criacutetico sobre a Ameacuterica Latina no seacuteculo XXI In SOUSA Fernando J Pires de (org) Poder e Poliacuteticas Puacuteblicas na Ameacuterica Latina Fortaleza Ediccedilotildees UFC 2010

CARVALHO Joseacute Murilo de Cidadania no Brasil o longo caminho Rio de Janeiro Civilizaccedilatildeo Brasi-leira 2003

CEARAacute Decreto nordm 29201 de 28 de fevereiro de 2008 Fortaleza 2008

FAORO Raymundo Os donos do poder formaccedilatildeo do patronato poliacutetico brasileiro Satildeo Paulo Globo 2000

FREIRE Paulo Educaccedilatildeo e mudanccedila 12 ed Rio de Janeiro Paz e Terra 2001

MACHADO Hugo de Brito Curso de Direito Tributaacuterio Satildeo Paulo Malheiros Editores 2006

MINAYO Maria Ceciacutelia de Souza (org) Pesquisa Social teoria meacutetodo e criatividade 25ed Petroacutepolis Vozes 2007

PEGORARO Celso Gomes O Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal no Estado de Satildeo Paulo estaacute sendo eficaz 2011 199 f Monografia Curso de Especializaccedilatildeo em Educaccedilatildeo Fiscal e Cidadania Bra-siacutelia Esaf 2011

PRADO Jr Caio Formaccedilatildeo do Brasil Contemporacircneo 23 ed Satildeo Paulo Brasiliense 1994

SADER Emir Puacuteblico versus mercantil 2009 Disponiacutevel em lthttpalainetorgactive3804amplan-g=esgt Acesso em 01 jan 2013

SAVEGNANI Joacir A resistecircncia aos tributos no Brasil o Estado e a Sociedade em conflito Disser-taccedilatildeo de Mestrado Santa Catarina Florianoacutepolis UNIVALI 2006

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

378

SOUSA Fernando J Pires de Percalccedilos da Ameacuterica Latina de Bretton Woods agrave atual crise financeira global In SOUSA Fernando J Pires de (org) Poder e Poliacuteticas Puacuteblicas na Ameacuterica Latina Fortaleza Ediccedilotildees UFC 2010 ______ Proteccedilatildeo Social e a crise do emprego In BRAGA Elza Maria Fanco (org) Ameacuterica Latina trans-formaccedilotildees econocircmicas e poliacuteticas Fortaleza Ediccedilotildees UFC 2003

RIVILLAS Borja Diacuteaz VILARDEBOacute Andreacutea MOTA Luiza Ondina Santos Educaccedilatildeo Fiscal no Brasil e no mundo In VIDAL Eloiacutesa Maia (org) Educaccedilatildeo Fiscal e cidadania Fortaleza Ediccedilotildees Demoacutecrito Ro-cha 2010

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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A EXPERIEcircNCIA DA EDUCACcedilAtildeO A DISTAcircNCIA NO CENTRO DE EDU-CACcedilAtildeO FISCAL PARA A CIDADANIA DA ESCOLA FAZENDAacuteRIA DE SAtildeO

PAULO E O CURSO DE DISSEMINADORES DE EDUCACcedilAtildeO FISCAL

SUMAacuteRIO Introduccedilatildeo 1 O Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal (PNEF) 2 A Educaccedilatildeo Fiscal no Estado de Satildeo Paulo 21 Histoacuterico do PNEF no Estado de Satildeo Paulo 3 A inserccedilatildeo da EAD nesse processo 4 EAD como metodologia utilizada pelo PNEF 5 Resultados do Curso de DEF no Estado de Satildeo Paulo 51 Novas alteraccedilotildees no formato do Curso de DEF 52 Resultados do Curso de DEF no Estado de Satildeo Paulo no ano de 2013 6 Alguns apontamentos so-bre pesquisa realizada com tutores e alunos 61 Sobre o Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVAMOODLE) 62 Apontamentos sobre o material didaacutetico 63 Apontamentos sobre o tempo de duraccedilatildeo do curso 64 Apontamentos sobre os foacuteruns 65 Apontamentos sobre as atividades avaliativas 66 Apon-tamentos sobre o Projeto Pedagoacutegico Plano de Accedilatildeo 67 Principais reclama-ccedilotildees dos tutores 68 Apontamentos do gestor regional Consideraccedilotildees finais Referecircncias

Augusto Jeronimo Martini1

INTRODUCcedilAtildeO

O Estado no desejo de se manter participe das accedilotildees que beneficiem a populaccedilatildeo por vezes

tributa excessivamente e natildeo fornece dados que deixem claro ou justifiquem suas accedilotildees fazendo com

que a sociedade se submeta agraves suas imposiccedilotildees e mantenha-se distanciada gerando assim uma re-

laccedilatildeo de conflito (FERNANDES 2008)

Nesta perspectiva o Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal (PNEF) surge como um programa

que busca diminuir esta relaccedilatildeo existente entre o Estado e a Sociedade por meio dos conhecimentos

referentes ao retorno social do pagamento dos tributos a gestatildeo democraacutetica dos recursos puacuteblicos

e o exerciacutecio pleno da cidadania O tributo eacute essencial agrave construccedilatildeo da vida em sociedade e por isso

ele guarda relaccedilatildeo direta com o cotidiano das pessoas

A Educaccedilatildeo Fiscal tem como principal proposta despertar na sociedade uma reflexatildeo sobre o

contexto em que o cidadatildeo estaacute inserido oferecendo a ele informaccedilotildees para uma atuaccedilatildeo consistente

e de contribuiccedilatildeo para a melhoria das condiccedilotildees sociais vigentes Quanto mais educada fiscalmente

1 Possui graduaccedilatildeo em Geografia (Licenciatura e Bacharelado) pelo IGCE - Unesp - Rio ClaroSP (1993) mestrado em Histoacuteria Social pela USP (2004) e Especializaccedilatildeo em Organizaccedilatildeo de Arquivos pelo IEBUSP Funcionaacuterio Puacuteblico Estadual trabalhando na Secretaria da Fazenda de Satildeo Paulo na Fazesp - Escola Fazendaacuteria atuando na aacuterea de treinamento em EAD Eacute Gestor Estadual do curso a distacircncia de Disseminadores de Educaccedilatildeo Fiscal para o estado de Satildeo Paulo oferecido pela Escola de Administraccedilatildeo Fazendaacuteria (Esaf) de BrasiacuteliaDF E-mail augustomartinigmailcom

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

380

estiver nossa populaccedilatildeo mais seraacute possiacutevel exercer plenamente a cidadania e em consequecircncia maior

seraacute o desenvolvimento econocircmico e social Quanto maior a consciecircncia de contribuinte maior seraacute a

possibilidade de conseguirmos a justiccedila social e uma distribuiccedilatildeo de riqueza mais justa

1 O PROGRAMA NACIONAL DE EDUCACcedilAtildeO FISCAL (PNEF)

Em maio de 1996 o Conselho Nacional de Poliacutetica Fazendaacuteria (Confaz) reunido em Fortaleza

(CE) registra a importacircncia de um programa de consciecircncia tributaacuteria para despertar a praacutetica da cida-

dania Em setembro de 1996 a implantaccedilatildeo de um programa nacional permanente de conscientizaccedilatildeo

tributaacuteria faz parte do Convecircnio de Cooperaccedilatildeo Teacutecnica entre Uniatildeo Estados e Distrito Federal e em

julho de 1999 tendo em vista a abrangecircncia do programa que natildeo se restringe apenas aos tributos

mas que aborda tambeacutem as questotildees da alocaccedilatildeo dos recursos puacuteblicos arrecadados e da sua gestatildeo

o Confaz reunido na Paraiacuteba (PB) aprova a alteraccedilatildeo de sua denominaccedilatildeo que passa a ser Programa

Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal (PNEF)

Em julho de 1997 foi aprovada pelo Confaz a criaccedilatildeo de um grupo de trabalho constituiacutedo por

representantes das Secretarias Estaduais de Fazenda da Secretaria da Receita Federal e do Gabinete

do Ministro da Fazenda - o GEF (Grupo de Educaccedilatildeo Fiscal) que tem como missatildeo promover coor-

denar e acompanhar as accedilotildees necessaacuterias agrave elaboraccedilatildeo e agrave implantaccedilatildeo de um programa permanente

de educaccedilatildeo fiscal e acompanhar as atividades dos Grupos de Educaccedilatildeo Fiscal nos Estados (Gefes)

O objetivo geral do PNEF eacute promover e institucionalizar a educaccedilatildeo fiscal para o pleno exerciacutecio

da cidadania tendo como objetivos especiacuteficos sensibilizar o cidadatildeo para a funccedilatildeo socioeconocircmica

do tributo levar conhecimentos aos cidadatildeos sobre administraccedilatildeo puacuteblica incentivar o acompanha-

mento pela sociedade da aplicaccedilatildeo dos recursos puacuteblicos e criar condiccedilotildees para uma relaccedilatildeo harmo-

niosa entre o Estado e o cidadatildeo

2 A EDUCACcedilAtildeO FISCAL NO ESTADO DE SAtildeO PAULO

As accedilotildees do PNEF no Estado de Satildeo Paulo satildeo desenvolvidas pelo Gefe (Grupo de Educaccedilatildeo

Fiscal Estadual) composto em parceria pela Secretaria de Estado de Fazenda Receita Federal da 8ordf

Regiatildeo Secretaria de Estado de Educaccedilatildeo Centro de Treinamento Regional da Esaf-CentresafSP

e PGFN (Procuradoria Geral da Fazenda Nacional) da 3ordf Regiatildeo Tem por responsabilidade difundir

conhecimentos que propiciem o exerciacutecio da cidadania conforme as propostas da Constituiccedilatildeo Federal

de 1988 e da Lei de Diretrizes e Bases da Educaccedilatildeo Nacional

O Gefe pretende contribuir para que a sociedade se instrumentalize visando a melhoria do grau

de consciecircncia puacuteblica levando o cidadatildeo a conscientizar-se das mudanccedilas ocorridas no setor social

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

381

e econocircmico ligados ao tributo e agrave gestatildeo dos recursos puacuteblicos arrecadados como forma de auxiliar

na realizaccedilatildeo dos anseios da sociedade em que vive

A Educaccedilatildeo Fiscal busca estimular e criar condiccedilotildees que permitam aos formadores de opiniotildees

o acesso ao conjunto de conhecimentos elaborados construiacutedos e reconhecidos necessaacuterios para o

pleno exerciacutecio da cidadania Assim se apresenta como um veiacuteculo que induz o cidadatildeo a contribuir

para que o processo das mudanccedilas sociais pretendidas torne-se realidade e possa interferir no mo-

mento histoacuterico pelo qual passa a Naccedilatildeo brasileira Os maiores esforccedilos encontram-se voltados agrave ca-

pacitaccedilatildeo de professores do ensino fundamental e ensino meacutedio principalmente das escolas da Rede

Puacuteblica de Ensino na temaacutetica da Educaccedilatildeo Fiscal onde se objetivam a mudanccedila de comportamento

do cidadatildeo e a praacutetica efetiva da sua cidadania

No seu campo de atuaccedilatildeo o Gefe desenvolve inuacutemeras accedilotildees metodoloacutegicas visando dissemi-

nar os conhecimentos que permeiam a temaacutetica Educaccedilatildeo Fiscal Inicialmente tinha como carro chefe

a capacitaccedilatildeo presencial como um dos procedimentos metodoloacutegicos mais utilizados o que permitia

levar diretamente aos formadores de opiniotildees conceitos e estrateacutegias que esclarecem ao cidadatildeo

como funciona a maacutequina puacuteblica e como agir de maneira coerente para que juntos Estado e socie-

dade pudessem trabalhar para proporcionar o bem estar comum a todos

A inserccedilatildeo da Educaccedilatildeo a Distacircncia (EaD) como uma nova opccedilatildeo metodoloacutegica contribuiu

para atingir um puacuteblico bem mais amplo para disseminar os temas abordados pela Educaccedilatildeo Fiscal

sem que haja necessidade do aluno se deslocar de seu local de origem permitindo elaborar seus

horaacuterios de estudo e propiciando condiccedilotildees favoraacuteveis para que se desenvolva o processo de ensino

e da aprendizagem

Nessa premissa o presente trabalho buscou reunir dados significativos que permitam analisar

a eficiecircncia da Educaccedilatildeo a Distacircncia como procedimento metodoloacutegico utilizado pelo PNEF e refletir

sobre sua implementaccedilatildeo

21 Histoacuterico do PNEF no Estado de Satildeo Paulo

No Estado de Satildeo Paulo foram desenvolvidas diversas iniciativas e programas relacionados agrave

temaacutetica tratada pela Educaccedilatildeo Fiscal nas deacutecadas de 1950 1960 1970 e 1980 destacando-se a ques-

tatildeo da relevacircncia do papel dos tributos Nesse sentido ocorreram campanhas de educaccedilatildeo para fins

pontuais concursos de premiaccedilatildeo voltados a estudantes e jovens campanhas de esclarecimento no

tocante agrave nota e cupom fiscal dentre outras

No entanto somente na deacutecada de 1990 - mais precisamente em 1993 - eacute que foi organizado

o Programa de Educaccedilatildeo Fiscal para a Cidadania com o intuito de conscientizar a sociedade quanto agrave

relevacircncia dos tributos e do controle dos gastos puacuteblicos

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

382

A partir de 1993 comeccedilou portanto a serem desenvolvidas no Estado atividades de palestras

em escolas puacuteblicas e particulares eventos juntos agraves delegacias regionais de ensino da Secretaria Es-

tadual de Educaccedilatildeo dentre outras

Cabe destacar que as atividades no Estado Satildeo Paulo antecederam agrave criaccedilatildeo do Programa Na-

cional de Educaccedilatildeo Fiscal (PNEF) do qual fazemos parte que como jaacute foi citado ocorreu em 1999

A partir do ano 2000 o programa - sendo coordenador no acircmbito da Escola Fazendaacuteria do Es-

tado ndash Escola Fazendaacuteria de Satildeo Paulo (Fazesp) continua a desenvolver diversas atividades muitas

delas tambeacutem em parceria com a Receita Federal do Brasil em Satildeo Paulo no acircmbito do PNEF desta-

cando-se os Programas Fazenda Aberta2 Fazenda Vai agrave Escola3 e Fazenda Vai agrave Praia4 aleacutem dos

Seminaacuterios Estaduais de Educaccedilatildeo Fiscal

Vale ressaltar ainda o forte envolvimento no programa da parte das delegacias regionais da

Secretaria da Fazenda tambeacutem nesse periacuteodo quando foram desenvolvidas diversas atividades junto

a vaacuterios municiacutepios do Estado sempre sob a coordenaccedilatildeo da Fazesp

Tambeacutem o curso de Disseminadores de Educaccedilatildeo Fiscal (DEF) que visa capacitar cidadatildeos

estudantes e professores sobre questotildees relacionadas aos tributos e ao controle dos Gastos puacuteblicos

por meio da Educaccedilatildeo a Distacircncia tanto passa a ser coordenado pela Fazesp em Satildeo Paulo como pas-

sa a ter diversos servidores da Secretaria em sua grade de tutores

Cabe destacar hoje a criaccedilatildeo de um Centro especiacutefico na Escola ndash Centro de Educaccedilatildeo Fiscal

para a Cidadania - para coordenar o programa no Estado bem como a formalizaccedilatildeo do Grupo Es-

tadual de Educaccedilatildeo Fiscal (GefeSP) por meio do Decreto Estadual nordm 57362 de 23 de setembro

de 2011

3 A INSERCcedilAtildeO DA EaD NESSE PROCESSO

Cada vez mais percebemos que a sociedade estaacute caminhando para uma nova realidade a Era

Digital As tecnologias de informaccedilatildeo e comunicaccedilatildeo estatildeo cada vez mais presentes os ambientes

2 O Programa Fazenda Aberta tem por objetivo apresentar a Secretaria da Fazenda aos alunos do ensino fundamental meacutedio e superior da rede puacuteblica estadual municipal e particular por meio de visitas monitoradas agraves instalaccedilotildees da Secre-taria precedida por palestras que abordam os conteuacutedos da Educaccedilatildeo Fiscal3 No Programa Fazenda Vai agrave Escola um membro da equipe do Grupo da Educaccedilatildeo Fiscal Estadual de Satildeo Paulo (GefeSP) se desloca para a Escola e ministra palestras objetivando sensibilizar os estudantes e professores sobre a funccedilatildeo social do tributo estimulando-os para o cumprimento voluntaacuterio das obrigaccedilotildees tributaacuterias criando assim condiccedilotildees para o desenvolvimento do espiacuterito criacutetico no acompanhamento da aplicaccedilatildeo dos recursos puacuteblicos4 Esse Programa nasceu de uma parceria com a Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental (Cetesb) que realiza o Programa Veratildeo Limpo O trabalho consiste no desenvolvimento de atividades luacutedicas que permitem agraves crianccedilas fixa-rem alguns conceitos sobre tributos gasto puacuteblico e cidadania de forma simples e agradaacutevel Em paralelo temos uma feira de produtos apresentando alguns trabalhos realizados pelos alunos das escolas que participaram do projeto em ediccedilotildees passadas uma amostra de materiais didaacuteticos desenvolvidos por outros Estados e os materiais didaacuteticos desenvolvidos pela Fazesp e outras entidades que satildeo utilizados por nossos disseminadores

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

383

informatizados ampliam as nossas capacidades intelectuais as redes de comunicaccedilatildeo disponibilizam

informaccedilatildeo diversificada em acesso direto e os trabalhos cooperativos siacutencronos e assiacutencronos entre

pessoas fisicamente distantes jaacute eacute uma realidade

Segundo Eliasquevici e Prado Jr (2008)

EaD eacute em primeira instacircncia educaccedilatildeo A decisatildeo de projetar e implementar qualquer sistema passa a ser uma decisatildeo poliacutetica Mesmo que a vontade a instalaccedilatildeo fiacutesica a contrataccedilatildeo de recursos humanos entre outros sejam elementos importantes natildeo satildeo suficientes Eacute preciso tambeacutem coerecircncia entre o que se requer e o que se tem por meio do conhecimento da realidade na qual o processo estaacute inserido e de suas limitaccedilotildees e poliacuteticas claras traduzidas em planos e programas viaacuteveis O sucesso de projetos de EaD eacute dependente da concepccedilatildeo de planejamento e administraccedilatildeo envol-vidas no processo

As tecnologias de informaccedilatildeo e comunicaccedilatildeo oferecem potencialidades imprescindiacuteveis agrave edu-

caccedilatildeo e agrave formaccedilatildeo permitindo que o sistema educativo e a formaccedilatildeo contiacutenua usufruam do desen-

volvimento destas tecnologias Como diz Sander (1997)

A tecnologia eacute hoje tatildeo ou mais importante para o conhecimento como era a palavra impressa quando surgiu o livro A funccedilatildeo que o livro vem desempenhando tradicional-mente hoje se amplia exponencialmente com as novas tecnologias da comunicaccedilatildeo Ambos satildeo poderosos instrumentos de informaccedilatildeo e aprendizagem Ambos devem ser instrumentos de democratizaccedilatildeo da informaccedilatildeo e de desenvolvimento social equumli-tativo No entanto nem o livro nem as maacutequinas constroem o conhecimento e o desenvolvimento social Ambos satildeo obra do ser humano que hoje encontra na nova tecnologia da informaccedilatildeo um novo instrumento de extenso efeito multiplicador

A utilizaccedilatildeo de metodologias de aprendizagem a distacircncia pode levantar algumas duacutevidas no-

meadamente quanto agrave sua eficaacutecia Seraacute que os formandos que frequentam accedilotildees a distacircncia conse-

guem obter niacuteveis de aprendizagem aceitaacuteveis Seraacute que a produtividade obtida em accedilotildees presenciais

eacute superior a que se consegue em accedilotildees sobre a mesma temaacutetica mas induzidas a distacircncia

A experiecircncia leva-nos a afirmar que os resultados da formaccedilatildeo a distacircncia satildeo extremamente

positivos e por vezes ultrapassam situaccedilotildees de aprendizagem presencial

[] as administraccedilotildees puacuteblicas entenderam que soacute poderatildeo se desenvolver e cumprir sua missatildeo promovendo a implantaccedilatildeo das novas tecnologias e capacitando de forma contiacutenua seu pessoal A formaccedilatildeo de seus trabalhadores eacute agora mais importante do que nunca para fazer frente aos novos desafios que planeja um mundo em perma-nente mutaccedilatildeo Para adaptar-se e na medida do possiacutevel antecipar-se agraves mudanccedilas do ambiente o pessoal das administraccedilotildees deveraacute se capacitar de forma permanente natildeo soacute para cumprir com os requisitos do seu posto como tambeacutem para aproveitar ao maacuteximo seu potencial de desenvolvimento (FUNDACcedilAtildeO CEDDET 2011)

Infelizmente ainda existem algumas dificuldades de enquadramento administrativo das accedilotildees

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

384

realizadas neste modelo pois a legislaccedilatildeo sobre este tipo de formaccedilatildeo ainda eacute incipiente e as accedilotildees de

formaccedilatildeo a distacircncia satildeo creditadas financiadas e geridas basicamente da mesma forma que as accedilotildees

presenciais Toda a organizaccedilatildeo dos processos pedagoacutegicos e financeiros eacute mais complicada do que

na formaccedilatildeo presencial no entanto as dificuldades podem ser sempre superadas com persistecircncia

(MARTINI 2006)

Eacute uacutetil ter presente duas das principais vantagens da formaccedilatildeo agrave distacircncia a possibilidade de

realizar accedilotildees para grupos especiacuteficos e o acesso a uma gama de pessoas muito mais vasta ou seja

acesso a pessoas que estatildeo geograficamente distantes A experiecircncia que temos adquirido com o tra-

tamento da formaccedilatildeo a distacircncia tem sido uma mais valia para a formaccedilatildeo no modelo tradicional

Aqui natildeo pretendo fazer uma anaacutelise profunda e exaustiva dos resultados obtidos com a for-

maccedilatildeo a distacircncia nem comparar este tipo de formaccedilatildeo com a formaccedilatildeo presencial Existem muitos

trabalhos na internet com esse propoacutesito que podem ser consultados De toda a minha experiecircncia

de formaccedilatildeo a distacircncia e presencial percebo que a EaD obtecircm oacutetimos resultados pedagoacutegicos e que

permite o estabelecimento de uma colaboraccedilatildeo muacutetua entre os intervenientes O trabalho feito em

grupos virtuais funciona muito bem Os seus resultados comprovam a qualidade dos mesmos crian-

do-se assim o conceito colaborativo de comunidade em rede

Falando especificamente do curso de Disseminadores de Educaccedilatildeo Fiscal que eacute gratuito e ofe-

rece um certificado de 120 ha aos aprovados posso dizer que eacute um modelo inovador Inovador na

forma nas praacuteticas e nos princiacutepios Estaacute trazendo alteraccedilotildees significativamente positivas agraves pessoas

envolvidas sendo essencial para a mudanccedila de meacutetodos haacutebitos atitudes e comportamentos da po-

pulaccedilatildeo que fica ciente de por que pagar impostos a importacircncia de pedir notas fiscais e para onde

vai o dinheiro arrecadado entre tantos outros temas ali tratados

O sucesso desse curso se assenta fundamentalmente na rede humana ndash uma rede solidaacuteria

e autoconfiante Uma rede em constante funcionamento que associa entre outros coordenadores

gestores tutores teacutecnicos dirigentes da educaccedilatildeo liacutederes de escola professores diretores e socie-

dade em geral Esta rede constitui o segredo do ecircxito do curso e eacute a chave do sucesso do PNEF e

natildeo apenas a tecnologia

4 EaD COMO METODOLOGIA UTILIZADA PELO PNEF

A Educaccedilatildeo a Distacircncia tem sido atualmente a metodologia mais utilizada pelo PNEF jaacute que

a maioria dos estados da Federaccedilatildeo natildeo disponibiliza de recursos financeiros e orccedilamentaacuterios para

atender agrave demanda de cursos presenciais solicitados pelas escolas puacuteblicas privadas Organizaccedilotildees

Natildeo Governamentais (ONGs) entidades de classe etc

O histoacuterico da Educaccedilatildeo a Distacircncia no Programa teve iniacutecio com o Curso a Distacircncia de Disse-

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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minadores de Educaccedilatildeo Fiscal elaborado pela Escola de Administraccedilatildeo Fazendaacuteria (Esaf) como um

projeto piloto no ano de 2002 Caso fosse positiva a resposta de todos os Estados seria implantada a

EaD com maior nuacutemero de participantes

O Estado de Satildeo Paulo iniciou com o nuacutemero modesto de 28 alunos O curso era diferente do

formato atual o ambiente virtual era ainda muito simples natildeo existiam os materiais didaacuteticos e peda-

goacutegicos que hoje subsidiam o curso ndash cartilhas CDs textos especiacuteficos etc e os alunos precisavam

ficar um nuacutemero determinado de horas on-line pois isso contava para a pontuaccedilatildeo As dificuldades

eram muitas e os alunos natildeo estavam familiarizados com um curso a distacircncia

A partir de 2004 o curso sofre adaptaccedilotildees Pouco tempo depois passam a fazer parte dele ani-

maccedilotildees em flash player os personagens ganham maior personalidade com a inserccedilatildeo de voz e som

Desde entatildeo o PNEF utilizou diversas metodologias que permitiram disseminar os conheci-

mentos referentes agrave temaacutetica Educaccedilatildeo Fiscal Atualmente o curso estaacute no ar com uma versatildeo atuali-

zada eacute formado por quatro moacutedulos de conteuacutedo (e um quinto que natildeo estaacute no formato de Caderno

mas objetiva a elaboraccedilatildeo de um projeto pedagoacutegico ou plano de accedilatildeo) e com um excelente material

didaacutetico pedagoacutegico elaborado especialmente para ele Assim a EaD passou a ter um papel funda-

mental nas accedilotildees do Programa e a servir de referencial para desenvolver outros projetos

Em pesquisa realizada no iniacutecio de 2013 com os tutores do curso no estado de Satildeo Paulo

formados pela Esaf foram apontados alguns fatores negativos que natildeo permitem ainda que haja

100 de aproveitamento dos alunos no curso de DEF Grande parte dos alunos satildeo professores das

escolas puacuteblicas e as maiores dificuldades detectadas foram o acesso ao computador e internet jaacute

que grande parte dos cursistas utiliza os computadores das Escolas onde trabalham tempo escasso

pois a maioria dos professores ministra aulas em ateacute trecircs turnos e o despreparo destes em relaccedilatildeo ao

ambiente virtual Algumas dessas dificuldades tambeacutem satildeo apontadas pelos alunos ligados a outros

ramos de atividades

Entretanto os tutores foram unacircnimes em afirmar que os pontos positivos da utilizaccedilatildeo da EaD

como metodologia superam as expectativas do grupo Para os tutores pesquisados os pontos positi-

vos que mais chamaram a atenccedilatildeo foram

1- Romper distacircncias e levar conhecimentos agraves pessoas que estatildeo em lugares de difiacutecil

acesso

2- Possibilitar ao aluno planejar o seu proacuteprio horaacuterio de estudos e ter seu proacuteprio espaccedilo

para realizar atividades

3- A utilizaccedilatildeo da EaD democratiza e generaliza o processo de aprendizagem sem ocircnus

elevados para o aluno e permite que o conhecimento seja disseminado em tempo real a um maior

nuacutemero de pessoas

4- Como os estudos realizados no Curso de DEF extrapolam os temas especiacuteficos dos textos

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

386

base levando o aluno a acessar links externos indicando leituras etc abre um leque de novos saberes

fazendo com que o aluno expanda seus conhecimentos na proacutepria web tanto em relaccedilatildeo ao conteuacutedo

do curso como as ferramentas que o mesmo disponibiliza

5- Se os conteuacutedos do DEF forem aplicados como se propotildeem a populaccedilatildeo munida dos

conhecimentos sobre seus direitos e deveres com formaccedilatildeo criacutetica mais atuante passa a cobrar da

administraccedilatildeo maior transparecircncia a exigir dos seus governantes o retorno social dos tributos a acom-

panhar a gestatildeo dos recursos puacuteblicos contribuindo com a construccedilatildeo de uma sociedade mais justa

5 RESULTADOS DO CURSO DE DEF NO ESTADO DE SAtildeO PAULO

O GefeSP desde o ano de 2002 e ateacute o segundo semestre do ano de 2013 realizou 20 (vinte)

ediccedilotildees do Curso de DEF utilizando a metodologia de EaD Com cerca de 17636 (dezessete mil seis-

centos e trinta e seis) alunos inscritos no curso 14109 (quatorze mil cento e nove) foram aprovados

Tais nuacutemeros chegam ao resultado expressivo de 80 de aprovaccedilatildeo abrangendo cerca de 30 dos

municiacutepios do Estado (de um total de 645 municiacutepios)

Se fizermos uma anaacutelise a niacutevel Brasil ateacute o momento chegamos a 0066 da populaccedilatildeo to-

mando como base os nuacutemeros do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatiacutestica (IBGE)

Histoacuterico do curso de DEF no Brasil

Graacutefico 1 - Histoacuterico do curso de DEF no Brasil

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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Nos 26 estados da Federaccedilatildeo mais o Distrito Federal e conforme nuacutemeros levantados pela

ESAF ateacute dezembro de 2010 tiacutenhamos 1709 (mil setecentos e nove) tutores formados pela ESAF O

nuacutemero de capacitados no estado de Satildeo Paulo atualmente eacute de 213 (duzentos e treze) tutores sendo

que cerca de 30 desse total natildeo atua regularmente

No estado de Satildeo Paulo nos uacuteltimos trecircs anos foram capacitados 86 novos tutores assim dis-

tribuiacutedos

bull Curso iniciado em 01 de fevereiro de 2011 20 novos tutores

bull Curso iniciado em 10 de junho de 2011 20 novos tutores

bull Curso iniciado em 27 de fevereiro de 2012 23 novos tutores

bull Curso iniciado em 21 de fevereiro de 2013 23 novos tutores ndash sendo que 70 dos capa-

citados nessa turma satildeo professores da rede estadual de ensino

Para manter essa rede de profissionais alinhados ao PNEF haacute constantes capacitaccedilotildees de novos

tutores formaccedilatildeo continuada eacute oferecido o curso de metodologia de projetos em Educaccedilatildeo Fiscal e

haacute pouco foi criada uma Comunidade Virtual de Tutores No primeiro semestre de 2014 houve a

capacitaccedilatilde de uma nova turma de 24 novos tutores no iniacutecio de fevereiro

Buscamos tambeacutem elaborar o perfil profissional dos tutores para o curso de DEF e este foi

definido em um processo progressivo de estudos levando-se em conta diversos contextos Iniciamos

com a definiccedilatildeo de competecircncias e delimitamos os pontos baacutesicos e estruturais de atuaccedilatildeo desses

profissionais baseados em estudos realizados pela Profa Vani Moreira Kenski5 que aponta o que eacute

necessaacuterio para tal profissional realizar suas funccedilotildees

a) Competecircncias dos tutores em cursos online

bull Condiccedilotildees pessoais

ndash Caracteriacutesticas pessoais que facilitam a atuaccedilatildeo como tutor na internet

bull Envolvimento com a organizaccedilatildeo

ndash Atitudes pessoais de comprometimento com a proposta de EaD em desenvolvimento e com

a organizaccedilatildeo

bull Domiacutenio do conteuacutedo

ndash Conhecimentos relacionados aos conteuacutedos dos cursos

5 Doutora em Educaccedilatildeo pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp 1990) Professora do Programa de Poacutes-Gra-duaccedilatildeo em Educaccedilatildeo da Universidade de Satildeo Paulo (USP) Diretora do ldquoSite Educacional Ltdardquo Consultora do Sebrae Pesquisadora do CNPq

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bull Conhecimentos pedagoacutegicos em EaD

ndash Conhecimentos vinculados agraves abordagens estrateacutegias e propostas pedagoacutegicas dos cursos

bull Conhecimentos teacutecnicos

ndash Fluecircncia no ambiente virtual e condiccedilotildees para orientar os alunos sobre o melhor uso dos re-

cursos disponiacuteveis

bull Capacidade de Interaccedilatildeo e Comunicaccedilatildeo

ndash Comunicabilidade com os demais participantes

b) Competecircncias pessoais

1 Estar atento aos detalhes do curso e aos movimentos da turma

2 Ser paciente Natildeo se irritar com facilidade

3 Ser persistente Natildeo desistir diante das dificuldades

4 Ter empatia Conseguir se colocar no lugar dos participantes

5 Comunicar-se com participantes sem usar palavras ofensivas

6 Ter bom domiacutenio da linguagem escrita

7 Ter capacidade para conduzir os debates

8 Compartilhar os seus conhecimentos sobre os temas do curso

9 Ter eacutetica profissional

10 Cumprir os prazos das tarefas de tutoria do curso

11 Realizar o aperfeiccediloamento teacutecnico e educacional como tutor

12 Ter consciecircncia da importacircncia do seu papel como agente de mudanccedilas

c) Envolvimento com a organizaccedilatildeo

1 Conhecer a proposta pedagoacutegica de EaD da organizaccedilatildeo

2 Identificar-se com a filosofia de educaccedilatildeo a distacircncia da organizaccedilatildeo

3 Conhecer a realidade do puacuteblico-alvo atendido pela organizaccedilatildeocurso

4 Elaborar o planejamento de tutoria para a turma que se inicia

5 Identificar-se como educador da organizaccedilatildeo

6 Conhecer o sistema de avaliaccedilatildeo para EaD do curso e da organizaccedilatildeo

7 Participar dos cursos e eventos de educaccedilatildeo continuada da organizaccedilatildeo

8 Estabelecer meios de interaccedilatildeo e comunicaccedilatildeo com os demais tutores professores teacutecnicos

diretores etc

9 Colaborar com o processo educacional oferecendo sugestotildees de melhoria

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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d) Domiacutenio do conteuacutedo

1 Possuir domiacutenio do conteuacutedo do curso em que exerce tutoria

2 Demonstrar capacidade loacutegica de anaacutelise e siacutentese do conteuacutedo do curso

3 Ser capaz de interpretar os textos escritos do curso

4 Conhecer formas diferenciadas de estudo dos conteuacutedos do curso em que exerce tutoria

5 Conhecer a proposta educacional do curso (objetivos conteuacutedos meacutetodo atividades)

6 Conhecer alternativas (bibliografias cursos etc) que possam auxiliar os participantes no

aprofundamento dos conteuacutedos do curso

e) Conhecimentos pedagoacutegicos

1 Analisar previamente a proposta do curso para planejar as accedilotildees de tutoria

2 Planejar estrateacutegias diferenciadas ligadas aos conteuacutedos

3 Esclarecer aos participantes sobre as aprendizagens a serem desenvolvidas nos temas pro-

postos

4 Conduzir debates nos foacuteruns colocando questotildees que faccedilam sentido e orientem os alunos

para o alcance dos objetivos de aprendizagem

5 Apresentar alternativas para os participantes visando aprofundar os conteuacutedos do curso

6 Avaliar os alunos de acordo com os objetivos previstos

7 Dar feedback sobre o desempenho de cada aluno apoacutes cada avaliaccedilatildeo

f) Conhecimentos teacutecnicos

1 Conhecer facilidades na Internet (mecanismos de busca e pesquisa acesso a textos e revistas

especializadas etc) que possam auxiliar os participantes na compreensatildeo dos conteuacutedos

2 Ser haacutebil no uso do teclado (velocidade e correccedilatildeo na escrita)

3 Saber usar acessoacuterios e perifeacutericos baacutesicos do computador bem como os mecanismos de

comunicaccedilatildeo pela internet (Skype e compatiacuteveis)

4 Conseguir oferecer suporte teacutecnico baacutesico aos participantes quando solicitam

5 Saber para quem encaminhar os problemas teacutecnicos apresentados pelos participantes quan-

do natildeo consegue resolver

6 Conhecer as ferramentas e possibilidades do ambiente educacional virtual do curso

g) Interaccedilatildeo e Comunicaccedilatildeo

1 Utilizar linguagem escrita correta

2 Ser cortecircs e respeitaacutevel Manter uma postura simpaacutetica e de respeito na comunicaccedilatildeo escrita

3 Escrever mensagens de forma concisa e personalizada

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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4 Usar linguagem profissional e adequada ao niacutevel do curso

5 Ser capaz de responder duacutevidas de forma pertinente clara e objetiva

6 Ter facilidade para se relacionar comunicar e conversar pela Internet

7 Saber explorar ideias desenvolver argumentos promover boas discussotildees encerrar discus-

sotildees improdutivas

8 Saber controlar os grupos quando deixar a comunicaccedilatildeo mais livre e quando ser mais diretivo

9 Saber como trazer os natildeo participantes de volta ao ambiente do curso

10 Conseguir criar ldquopresenccedilardquo e ldquovisibilidaderdquo no ambiente virtual

11 Incentivar os participantes a apresentarem suas contribuiccedilotildees

12 Evitar tomar atitudes autoritaacuterias ou excessivamente permissivas

13 Desenvolver formas de comunicaccedilatildeo com os participantes para evitar que eles se sintam soacutes

14 Conseguir criar e manter com os participantes uma comunidade on-line uacutetil e relevante

15 Conseguir administrar os conflitos que ocorrem nos cursos

51 Novas alteraccedilotildees no formato do Curso de DEF Em 2007 o curso de DEF novamente sofreu alteraccedilotildees em seu formato e a partir de entatildeo os

alunos tecircm a possibilidade de desenvolver Projetos Pedagoacutegicos Planos de Accedilatildeo ou Planos Docentes

versando sobre as temaacuteticas tratadas no curso De 2007 ateacute 2010 segundo a Esaf foram postados

13668 projetos (treze mil seiscentos e sessenta e oito) levando-se em conta todos os estados da Fe-

deraccedilatildeo assim distribuiacutedos

bull 2007 2670

bull 2008 3866

bull 2009 2712

bull 2010 7420

A partir do segundo semestre de 2014 comeccedilaraacute a ser distribuiacuteda a 5ordf ediccedilatildeo dos cadernos

pedagoacutegicos do PNEF e quando seraacute oferecida a nova versatildeo do curso a distacircncia Disseminadores em

Educaccedilatildeo Fiscal Os cadernos jaacute foram concluiacutedos e enviados a todos os integrantes do GEF e Coor-

denadores Estaduais do curso de DEF para apreciaccedilatildeo e validaccedilatildeo Nos dias 16 a 18 de setembro de

2013 realizou-se em Brasiacutelia a oficina de produccedilatildeo do novo curso de DEF na qual os conteuacutedos chaves

constantes da 5ordf ediccedilatildeo dos cadernos de Educaccedilatildeo Fiscal foram selecionados para serem convertidos

em linguagem HTML 56 O material produzido compotildee o Planejamento Educacional do novo DEF que

foi enviado para a empresa licitada pela Esaf para produccedilatildeo de cursos a distacircncia Portanto a partir do

segundo semestre de 2014 o DEF teraacute um novo formato mais moderno e interativo com a utilizaccedilatildeo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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de novos objetos de aprendizagem

52 Resultados do Curso de DEF no Estado de Satildeo Paulo no ano de 2013

Foram 68 turmas no primeiro semestre e 65 turmas no segundo semestre com total de 4895

alunos matriculados dos quais 2818 alunos aprovados (5757) 1224 alunos desistentes (25) e 837

alunos reprovados (1709)

6 O HTML5 eacute a versatildeo mais recente da linguagem de programaccedilatildeo conhecida como HTML (Hyper Text Markup Language) sigla em Inglecircs para Linguagem de Marcaccedilatildeo de Hipertexto Essa linguagem usa um texto codificado para criar e organizar conteuacutedo online e torna a navegaccedilatildeo mais raacutepida e simples melhorando a performance de uma paacutegina web Os desen-volvedores utilizam o HTML5 para reduzir o tamanho dos arquivos online e com isso melhorar a experiecircncia do usuaacuterio O HTML5 possui uma ferramenta graacutefica poderosa chamada de Canvas (tela em Inglecircs) Com o Canvas eacute muito mais faacutecil criar animaccedilotildees desenhos e outros visuais complexos sem a necessidade de usar um aplicativo externo

Graacutefico 2 - Curso on-line de disseminadores de Educaccedilatildeo Fiscal - ano de 2013

Devido ao sucesso do curso e levando-se em conta o alto iacutendice de desistentes e reprovados

e as dificuldades apresentadas nos relatoacuterios dos gestores estaduais a partir desse ano deveratildeo ser

desenvolvidos trecircs cursos a partir do atual destinados para puacuteblicos alvo distintos um curso para pro-

fessores outro para fazendaacuterios e universitaacuterios e um terceiro no formato auto instrucional destinado

a servidores puacuteblicos e sociedade civil Nesse sentido houve iniciativa do GefeSP de fazer um curso

voltado para o estudante de ensino meacutedio com metodologia e linguagem adequada a esse puacuteblico

O Centro de Integraccedilatildeo Empresa Escola (CIEESP) achou interessante abraccedilou a ideia e estaacute traba-

lhando com o GefeSP na adaptaccedilatildeo desse conteuacutedo

Tambeacutem sob a responsabilidade da Gerecircncia de Educaccedilatildeo Fiscal (Geref) da Esaf haacute mais al-

guns projetos em andamento

1- Accedilotildees no acircmbito do Programa Mais Educaccedilatildeo em parceria com o Ministeacuterio de Edu-

caccedilatildeo (MEC) e as Secretarias Estaduais de Educaccedilatildeo No curso de DEF do segundo semestre do ano

passado os Coordenadores Municipais do Programa Mais Educaccedilatildeo foram inscritos com o objetivo

de serem preparados para orientarem as escolas participantes na realizaccedilatildeo das atividades do macro

campo ldquoEducaccedilatildeo Econocircmicardquo onde se insere a Educaccedilatildeo Fiscal A Geref estaacute colaborando com o

MEC na reformulaccedilatildeo desse macro campo que passaraacute a se chamar ldquoEducaccedilatildeo Fiscal e Financeirardquo

em 2014

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2- Curso a distacircncia para universitaacuterios em parceria com o EUROsociAL O Termo de Refe-

recircncia para a contrataccedilatildeo dos serviccedilos estaacute sendo ultimado pelos teacutecnicos do Programa EUROsociAL

Em breve seratildeo contratados os profissionais que iratildeo produzir o material didaacutetico a ser posteriormente

submetido agrave aprovaccedilatildeo da Comissatildeo do Referencial Teoacuterico e Metodoloacutegico do PNEF

3- Proposta inicial de um curso de Educaccedilatildeo Fiscal para a comunidade fazendaacuteria em par-

ceria com a Federaccedilatildeo Brasileira de Associaccedilotildees de Fiscais de Tributos Estaduais (Febrafite)

6 ALGUNS APONTAMENTOS SOBRE PESQUISA REALIZADA COM TUTORES E ALUNOS

A partir de questionaacuterio enviado para tutores e alunos no iniacutecio de 2013 e perguntados sobre

o curso oferecido em 2012 em duas ediccedilotildees seguem alguns aspectos que foram levantados sem a

intenccedilatildeo de quantificar essas informaccedilotildees

61 Sobre o Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVAMOODLE)

bull Natildeo houve registro de dificuldades de acesso por problemas teacutecnicos

bull A mensagem automaacutetica gerada apoacutes a matriacutecula deixa o aluno confuso

bull Tutores que conseguiram fazer um encontro presencial no iniacutecio do curso tiveram alunos

com menor dificuldade de navegaccedilatildeo

bull Muitos alunos reclamam que o curso no formato anterior era mais simples para navegar

e muito mais dinacircmico As aulas eram mais interativas

bull O acesso total do conteuacutedo logo no iniacutecio do curso eacute um ponto positivo apontado pelos

alunos pois a familiarizaccedilatildeo com o visual vai sendo absorvida aos poucos

bull Alunos acenaram positivamente para a quantidade e diversidade de links

62 Apontamentos sobre o material didaacutetico

bull A disponibilizaccedilatildeo dos kits com cartilhas impressas logo no iniacutecio do curso foi um ponto

muito positivo

bull Alunos pediram linguagem menos teacutecnica tanto no material on-line como no material

impresso e disseram que a falta de ilustraccedilotildees fez com que o curso se tornasse pouco atrativo

bull Conteuacutedo muito denso considerando o tempo de duraccedilatildeo do curso (90 dias)

bull Elogios ao conteuacutedo diversificado e ao material didaacutetico parte histoacuterica bem elaborada

bull Implementaccedilatildeo de uma biblioteca melhor fundamentada pois ela daacute embasamento para

a elaboraccedilatildeo do Projeto PedagoacutegicoPlano de Accedilatildeo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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63 Apontamentos sobre o tempo de duraccedilatildeo do curso

bull Foi adequado e suficiente para a maioria Fez com que o aluno elaborasse uma rotina

de estudos Mas alguns alunos apontaram que eacute tambeacutem muito pouco tempo para tantas leituras

tornando-se impossiacutevel fazecirc-las com profundidade bem como elaborar o Projeto Pedagoacutegico com

qualidade

bull Sugestotildees de que seja possiacutevel a postagem de atividades ateacute 24 horas depois do encer-

ramento

bull Dificuldades de conciliar o curso de DEF com outras atividadesresponsabilidades diaacuterias

64 Apontamentos sobre os foacuteruns

bull Enunciados extensos causa desinteresse e desmotivaccedilatildeo Mas elogiaram os textos di-

zendo serem bem elaborados e proporcionando discussotildees relevantes

bull Muitos alunos cumprem somente com a atividade proposta e depois natildeo voltam para

a discussatildeo Outros deixam para a uacuteltima hora e natildeo desenvolvem o tema como deveria Aqui eacute que

entra o papel fundamental do tutor de instigaccedilatildeo fazer o aluno voltar ao foco

bull Um dos melhores recursos do curso Eacute nesse momento que eacute possiacutevel verificar a opiniatildeo

do aluno

bull Apresentaram novos conhecimentos e informaccedilotildees complementares aos conteuacutedos dos

cadernos - aspecto que foi bastante positivo e propiciou enriquecimento nas discussotildees

65 Apontamentos sobre as atividades avaliativas bull Persistem as questotildees confusas com dupla interpretaccedilatildeo (como as do tipo ldquoidentifique

a resposta erradardquo) e falta de clareza nos enunciados Alguns alunos foram prejudicados por isso

bull Exige aprofundamento nos estudos e pesquisa

66 Apontamentos sobre o Projeto Pedagoacutegico Plano de Accedilatildeo

bull Deixar mais ou menos 10 dias apoacutes o encerramento para revisatildeo e ajustes no Plano Pe-

dagoacutegico (PP) ou Plano de Accedilatildeo (PA) de modo que natildeo comprometa a qualidade dos trabalhos

bull Com o PP ou PA eacute possiacutevel verificar se o aluno se apropriou dos conteuacutedos abordados

durante o curso

bull Ponto chave para a efetivaccedilatildeo de um trabalho consistente em relaccedilatildeo agrave Educaccedilatildeo Fiscal

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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67 Principais reclamaccedilotildees dos tutores

bull A primeira reclamaccedilatildeo foi em relaccedilatildeo aos dados cadastrais dos alunos Muitos ao preen-

cherem a ficha de inscriccedilatildeo informam telefones errados e e-mails desativados ou com erro

bull Alguns reclamaram da ausecircncia do gestor regional nos encontros presenciais Mas en-

tenderam que nem sempre eacute possiacutevel conciliar a agenda devido ao nuacutemero de turmas no estado - meacute-

dia de 50 (cinquumlenta) e a distacircncia geograacutefica

bull Falta de conhecimento tecnoloacutegico por parte de alguns alunos

68 Apontamentos do gestor regional

bull Alguns tutores formaram grupos de estudos entre seus alunos e outros conseguiram

realizar encontros semanais com esses grupos E estas foram as turmas de melhor desempenho no

estado no geral com 100 de aprovaccedilotildees

bull Falta de feedback por parte de alguns tutores ndash principalmente no envio dos dados se-

manais para a elaboraccedilatildeo do Mapa de Acessos

bull Falta de comprometimento de alguns tutores

bull Falta de relatoacuterios estatiacutesticos semanais a niacutevel de Brasil Eacute uma forma de situar a atuaccedilatildeo

do estado no panorama nacional e buscar parcerias

bull Falta de dados estatiacutesticos mais precisos no AVAMOODLE Um exemplo eacute que ao final

do curso a meacutedia geral apresentada no quadro de notas natildeo reflete a meacutedia de aprovaccedilatildeo (que real-

mente interessa) Os alunos precisam ser contados um a um quando eacute preciso formular planilhas de

acompanhamento em relaccedilatildeo agrave realizaccedilatildeo das atividades projeto aprovaccedilatildeo reprovaccedilatildeo etc

bull Adoccedilatildeo mais criteriosa na seleccedilatildeo de alunos

bull Muitos alunos sensibilizados em eventos puacuteblicos (feiras etc) e que se inscrevem no

curso desistem

bull Adoccedilatildeo de criteacuterios mais rigorosos para a seleccedilatildeo de tutores

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Toda metodologia requer procedimentos eficazes e a EaD vai ao encontro dos objetivos

propostos pelo PNEF pois possibilita democratizar conhecimentos em tempo real a um maior

nuacutemero de pessoas contribuindo para o processo de ensino e da aprendizagem e quando bem

utilizada promove a inclusatildeo de todos aqueles que anseiam por transformar a sociedade atraveacutes

dos novos conhecimentos

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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O PNEF que comeccedilou timidamente com a EaD no ano de 2002 jaacute possui em seus registros a

formaccedilatildeo de 1709 Tutores de EaD (dados de 2010) e 118963 alunos aprovados no curso de Disse-

minadores de Educaccedilatildeo Fiscal a Distacircncia Nessa premissa conclui-se que a EaD eacute um procedimento

metodoloacutegico eficiente e que muito contribui para que continue sendo utilizada para disseminar os

conhecimentos da Educaccedilatildeo Fiscal e coopere para que mais pessoas se emancipem

Ainda haacute muito que se fazer em relaccedilatildeo agrave EaD Primeiro temos que lutar contra o analfabetismo

digital inserir a sociedade no mundo ciberneacutetico propiciar situaccedilotildees reais para aquisiccedilatildeo de equipa-

mentos necessaacuterios agrave realizaccedilatildeo de cursos a distacircncia mas acima de tudo o Estado precisa proporcio-

nar condiccedilotildees financeiras para que a sociedade tenha a estrutura necessaacuteria para manter o acesso

permanente ao mundo digital

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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REFEREcircNCIAS

BRASIL Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Federativa do Brasil de 1988 Brasiacutelia Senado Federal Subsecre-taria de Ediccedilotildees Teacutecnicas 2000

______ Ministeacuterio da Fazenda Escola Superior de Administraccedilatildeo Fazendaacuteria Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal Situando a Educaccedilatildeo Fiscal Moacutedulo I Brasiacutelia Esaf 2000

______ Ministeacuterio da Fazenda Escola Superior de Administraccedilatildeo Fazendaacuteria Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal Atas Relatoacuterio da 46ordf Reuniatildeo GEF-BSB Mar 2011 Disponiacutevel em lthttpwwwesaffazendagovbresafsiteeducacaofiscalEdu_Fiscal2008arquivos_2011atasRelatorio_da_46a_Reuniao_GEF-BSB_mar2011docgt Acesso em 30 nov 2013

______ Ministeacuterio da Fazenda Escola Superior de Administraccedilatildeo Fazendaacuteria Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal Educaccedilatildeo Fiscal no contexto social Brasiacutelia Esaf 2009 (seacuterie Educaccedilatildeo Fiscal Cader-nos 1234)

ELIASQUEVIC Marianne Kogut PRADO JR Arnaldo Correcirca O papel da incerteza no planejamento de sistemas de educaccedilatildeo a distacircncia Educ Pesqui [online] 2008 vol34 n2 pp 311 Disponiacutevel em lthttpwwwscielobrpdfepv34n207pdfgt Acesso em 03 jan 2014

FERNANDES Eliane Leatildeo A Educaccedilatildeo agrave Distacircncia no Programa de Educaccedilatildeo Fiscal de Mato Grosso do Sul Disponiacutevel em lthttpwwwesaffazendagovbresafsiteeducacaofiscalEdu_Fiscal2008PDFArtigo_cientifico_Elianepdf gt Acesso em 21 dez 2013

FUNDACcedilAtildeO CEDDET Material do curso Formaccedilatildeo On-line na Administraccedilatildeo Puacuteblica Moacutedulo I mai2011

KENSKI Vani Moreira Perfil de tutor de cursos pela internet o caso do Sebrae Linhas Criacuteticas v 13 n 24 jun2007

MARTINI Augusto Jeronimo Apontamentos sobre o curso a distacircncia de Disseminadores de Edu-caccedilatildeo Fiscal do PNEF - Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal Disponiacutevel em lt httpwwwfazen-daspgovbreducacao_fiscalcontentsApontamentosSobreCursoDistanciaPNEFpdf gt Acesso em 03 jan 2014

______ Minha Experiecircncia com a EAD ndash Educaccedilatildeo agrave Distacircncia Disponiacutevel em lthttpasimplicidade-dascoisaswordpresscom20060824minha-experiencia-com-a-ead-E28093-educacao-a-dis-tanciagt Acesso em 22 dez 2013

MORAN Joseacute Manuel Tendecircncias da Educaccedilatildeo on line no Brasil Disponiacutevel em lt httpwwwecauspbrprofmorantendenciashtm gt Acesso em 30 jul 2013

NUNES Ivocircnio Barros Modalidades Educativas e Novas Demandas por Educaccedilatildeo Disponiacutevel em lthttpwwwintelectoneteadmodalidadeshtmgt Acesso em 21 nov 2013

SANDER Benno Perspectivas da Educaccedilatildeo a Distacircncia na Ameacuterica Latina Perspectivas da educa-ccedilatildeo a distacircncia Ameacuterica Latina Seminaacuterio de Brasiacutelia 1997 Secretaria de Educaccedilatildeo a Distacircncia Brasiacute-lia Ministeacuterio da Educaccedilatildeo e do Desporto SEED 1998

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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IMPLEMENTACcedilAtildeO DO PROGRAMA NACIONAL DE EDUCACcedilAtildeO FISCAL NAS ESCOLAS ESTADUAIS SOB COMPETEcircNCIA DA CREDE 3

SUMAacuteRIO Introduccedilatildeo 1 A importacircncia da implementaccedilatildeo do Programa Na-cional de Educaccedilatildeo Fiscal para as escolas estaduais 2 Objetivos do trabalho com a Educaccedilatildeo Fiscal e Cidadania nas escolas estaduais da Crede 3 3 Abran-gecircncia e inovaccedilatildeo 4 Eficiecircncia no uso dos recursos puacuteblicos resultados dos trabalhos desenvolvidos nas escolas estaduais da Crede 3 5 Mais evidecircncias do trabalho da Crede 3 2011 e 2012 6 Aprendizado organizacional e respon-sabilidade social 7 Relevacircncia do projeto e possibilidade de multiplicaccedilatildeo 8 Satisfaccedilatildeo dos cidadatildeos Consideraccedilotildees finais Referecircncias

Erlane Muniz de Arauacutejo Martins1

INTRODUCcedilAtildeO

A Educaccedilatildeo Fiscal para a cidadania eacute uma nova praacutetica na aacuterea da educaccedilatildeo a qual debate a

relaccedilatildeo do cidadatildeo com o Estado no campo financeiro integrando suas duas vertentes a arreca-

daccedilatildeo e o gasto puacuteblico vigiando para que ambos sejam realizados com eficiecircncia transparecircncia

e honestidade

Na tentativa de disseminaccedilatildeo e efetivaccedilatildeo do Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal a Coor-

denadoria Regional de Desenvolvimento da Educaccedilatildeo 3 (Crede 3) sistematizou desde o 1ordm semestre

de 2012 um trabalho de monitoramento pedagoacutegico agraves accedilotildees empreendidas nas escolas estaduais

contemplando os conteuacutedos de Educaccedilatildeo Fiscal e Cidadania nas diversas disciplinas do Ensino Meacutedio

Esse trabalho eacute realizado pela Superintendente Escolar Erlane Muniz de Arauacutejo Martins tambeacutem Coor-

denadora Regional do Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal As accedilotildees do PNEF vatildeo desde a formaccedilatildeo

dos educadores no curso de Disseminadores da Educaccedilatildeo Fiscal ateacute a implementaccedilatildeo das accedilotildees dos

planos dos professores em sala de aula

Por meio desta iniciativa poderemos alcanccedilar um caminho para a divisatildeo mais justa do produto

do trabalho de toda a sociedade em que a populaccedilatildeo poderaacute analisar criticamente e criteriosamente

os recursos puacuteblicos e sua arrecadaccedilatildeo Esta accedilatildeo jaacute se encontra consolidada nas estrateacutegias pedagoacute-

gicas da Crede 3 obtendo resultados satisfatoacuterios na praacutetica cidadatilde dos alunos nas escolas favore-

1 Formada em Pedagogia e Ciecircncias Sociais com Especializaccedilatildeo em Psicopedagogia Liacutengua Portuguesa e Literatura e Gestatildeo e Avaliaccedilatildeo da Educaccedilatildeo Puacuteblica Professora concursada do Estado do Cearaacute atualmente exerce o cargo de Superin-tendente Escolar do NRDEA da 3ordf CredeAcarauacute tendo como uma das funccedilotildees acompanhar e apoiar a gestatildeo das unidades escolares Coordena ainda na 3ordf Crede Ensino Afrodescendente e Indiacutegena (1063911645) e o Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal E-mail erlanecrede03seduccegovbr

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

398

cendo uma maior valorizaccedilatildeo dos espaccedilos puacuteblicos (as escolas dessa regiatildeo encontram-se melhores

conservadas) como tambeacutem uma maior conscientizaccedilatildeo de alunos e professores sobre a responsabi-

lidade social que os mesmos tecircm em relaccedilatildeo ao controle social dos gastos puacuteblicos

Como forma de acompanhamento deste trabalho as escolas enviam suas experiecircncias exitosas

para a Ceacutelula Regional de Desenvolvimento da Escola e da Aprendizagem (Cedea) da Crede 3 sendo

analisados e condensados em relatoacuterio anual enviado para Seduc e Sefaz

Sendo assim vimos que a consolidaccedilatildeo do PNEF nas escolas estaduais dessa regiatildeo vem sendo

sistematizada de forma constante visto que anualmente haacute uma revisatildeo dos planos de cursos dos

professores logo no iniacutecio do ano letivo e jaacute eacute uma praacutetica a inserccedilatildeo dos conteuacutedos relacionados a

essa temaacutetica nas disciplinas do ensino meacutedio Percebe-se ainda uma tendecircncia maior do trabalho

dos professores na aacuterea de Ciecircncias Humanas Nosso ensejo enquanto coordenadoria eacute que o estudo

se propague e cada vez mais tenhamos educandos conscientes do seu papel de fiscalizador dos gastos

com o dinheiro puacuteblico

1 A IMPORTAcircNCIA DA IMPLEMENTACcedilAtildeO DO PROGRAMA NACIONAL DE EDUCACcedilAtildeO FISCAL PARA AS ESCOLAS ESTADUAIS

O Brasil possui uma carga tributaacuteria muito elevada para a qualidade dos serviccedilos prestados isso

gera uma insatisfaccedilatildeo popular Por outro lado a maior parte dos brasileiros natildeo tem conhecimento dos

diversos impostos que incidem direto ou indiretamente sobre os produtos bens e serviccedilos adquiridos

muito menos o destino que deve ser dado aos mesmos

Tal situaccedilatildeo de desconhecimento inibe a efetivaccedilatildeo da cidadania principalmente entre o puacutebli-

co jovem que necessita de uma formaccedilatildeo baacutesica na escola sobre seus direitos e deveres enquanto ci-

dadatildeo Partindo deste foco faz-se necessaacuterio o desenvolvimento de um Projeto de Educaccedilatildeo Fiscal na

escola que venha a trabalhar efetivamente com a temaacutetica e que um dos objetivos seja o de disseminar

a educaccedilatildeo fiscal na escola conscientizando alunos pais e funcionaacuterios para que estes levem a seus

vizinhos eou comunidade conhecimentos baacutesicos sobre a origem os tipos e o destino dos tributos

bem como a necessidade de serem pagos a contento e a importacircncia destes para a sociedade

Acreditamos que ter pessoas informadas e cientes de seus direitos e deveres eacute fundamental

para o exerciacutecio da democracia E que reconhecer a necessidade de cumprir as obrigaccedilotildees tribu-

taacuterias compreendendo o real significado o porquecirc de pagar impostos e qual a importacircncia dessa

accedilatildeo para o paiacutes se faz tatildeo urgente para o povo brasileiro quanto acompanhar e fiscalizar a aplica-

ccedilatildeo dos mesmos

Partindo dessa realidade e como uma accedilatildeo proveniente dos conhecimentos adquiridos no

curso de Disseminadores da Educaccedilatildeo Fiscal encontra-se em desenvolvimento na Crede 3 o Projeto

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

399

intitulado ldquoImplementaccedilatildeo do Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal nas escolas estaduais sob com-

petecircncia da Crede 3rdquo Estaacute sendo implementado em 18 escolas estaduais da regiatildeo tendo como puacute-

blico alvo os alunos do ensino meacutedio Uma das accedilotildees para produzir este projeto foi uma reuniatildeo com

alguns dos professores das escolas estaduais que participaram do uacuteltimo Curso de Disseminadores

da Educaccedilatildeo Fiscal (2012) tendo como foco a socializaccedilatildeo de ideias e conteuacutedos a serem incluiacutedos na

elaboraccedilatildeo do projeto em pauta e nos planos de curso anuais

Trabalha-se o PNEF nesta regiatildeo com a parceria da Secretaria de Educaccedilatildeo (Seduc) a Secretaria

da Fazenda (Sefaz) e da Escola de Administraccedilatildeo Fazendaacuteria (Esaf) sediada em Brasiacutelia Este projeto eacute

uma tentativa de promover a Educaccedilatildeo Fiscal e sua importacircncia social e econocircmica para os cidadatildeos

Assim o investimento em Educaccedilatildeo Fiscal para a Cidadania eacute o investimento em Educaccedilatildeo e Formaccedilatildeo

para a Cidadania pois desperta na sociedade uma reflexatildeo e uma accedilatildeo participativa ou seja mostra a

todos como funciona a maacutequina puacuteblica e ajuda na compreensatildeo da finalidade do Estado

Diante do exposto fez-se necessaacuterio que na apresentaccedilatildeo dessa proposta agraves escolas fosse re-

passada a orientaccedilatildeo de que a Educaccedilatildeo Fiscal eacute aplicada como tema transversal a ser desenvolvido

de forma inter e multidisciplinar em todas as aacutereas do conhecimento Sua proposta educativa consiste

em garantir o processo de formaccedilatildeo do cidadatildeo a sensibilizaccedilatildeo gradativa de todos os setores e ca-

madas da sociedade estimulando a mudanccedila de valores crenccedilas e culturas como meio de possibilitar

o desenvolvimento de uma consciecircncia de cidadania e propiciar a transformaccedilatildeo social

Pactuando com essa ideia do trabalho de Educaccedilatildeo Fiscal como tema transversal a professora

da Universidade Federal de Goiaacutes (UFG) Sonia Lamounier enfatiza

A concepccedilatildeo do Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal nos encaminha para a forma-ccedilatildeo de um homem que compreenda o mundo no qual vive os interesses em jogo as relaccedilotildees de poder um homem que se reconheccedila ndash e aos demais ndash como sujeito de direitos e deveres livre para organizar expressar suas ideias e opiniotildees para decidir intervir participar capaz de colocar-se como sujeito na construccedilatildeo da histoacuteria

Assim a escola como formadora de cidadatildeos criacuteticos tem um papel preponderante no proces-

so de formaccedilatildeo dos jovens contribuindo portanto com o desenvolvimento social de pessoas respon-

saacuteveis por questotildees relacionadas agrave educaccedilatildeo fiscal

2 OBJETIVOS DO TRABALHO COM EDUCACcedilAtildeO FISCAL E CIDADANIA NAS ESCOLAS ES-TADUAIS DA CREDE 3

Para o desenvolvimento desse trabalho o foco principal foi e eacute (este eacute um projeto de continuida-

de) acompanhar e orientar as accedilotildees desenvolvidas nas escolas estaduais sob competecircncia da Crede 3

por meio da Superintendecircncia Escolar referentes ao Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal realizando

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

400

um trabalho de monitoramento pedagoacutegico e analisando os impactos beneacuteficos das accedilotildees imple-

mentadas em sala de aula relacionadas agrave Educaccedilatildeo Fiscal e Cidadania Como objetivos especiacuteficos o

projeto busca

(i) estimular o interesse pela Educaccedilatildeo Fiscal visando oferecer agrave comunidade escolar conheci-

mentos que conduzam a uma praacutetica cidadatilde de transformaccedilatildeo social por meio de debates e reflexotildees

fundamentais para a compreensatildeo da funccedilatildeo socioeconocircmica do tributo

(ii) promover e institucionalizar a Educaccedilatildeo Fiscal para o efetivo exerciacutecio da cidadania

(iii) disseminar informaccedilotildees accedilotildees e conceitos sobre a Educaccedilatildeo Fiscal e o trabalho desenvolvi-

do pela Crede 3 e Escolas Estaduais sobre a temaacutetica e

(iv) incentivar o acompanhamento da aplicaccedilatildeo dos recursos puacuteblicos pela sociedade e nas

escolas os alunos acompanharem os investimentos aplicados pelos gestores

3 ABRANGEcircNCIA E INOVACcedilAtildeO

Dezoito (18) Escolas Estaduais satildeo contempladas com a implementaccedilatildeo das accedilotildees do Progra-

ma Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal coordenado pela Servidora Erlane Muniz de Arauacutejo Martins Segue a

relaccedilatildeo das escolas 1- EEM Liceu de Acarauacute Maria Alice Ramos Gomes 2- Ceja Padre Antocircnio Tomaacutes

3- EEEP Marta Maria Giffoni de Sousa 4- EEM Tomaz Pompeu de Sousa Brasil 5- EEM Vicente de Paulo

da Costa 6- EEFM Maria Conceiccedilatildeo de Arauacutejo 7- EEEP Juacutelio Franccedila 8- EEFM Professora Marieta Santos

9- EEM Theolina de Muryllo Zacas 10- EEM Satildeo Francisco da Cruz 11- EEM Liceu de Itarema Valdo de

Vasconcelos Rios 12- EEM Luzia Arauacutejo Barros 13- EEM Prefeito Joseacute Maria Monteiro 14- EEM Fran-

cisco Arauacutejo Barros 15- EEM Joseacute Teixeira de Albuquerque 16- EEM Ricardo de Sousa Neves 17- EEM

Francisco Porciano Ferreira 18- EEFM Carminha Vasconcelos

Como inovaccedilatildeo do trabalho realizado destacam-se as seguintes accedilotildees

(i) Formaccedilatildeo sistematizada dos professores da rede estadual com o Curso de Disseminadores

da Educaccedilatildeo Fiscal e desenvolvimento das accedilotildees durante o ano letivo nas escolas

(ii) Socializaccedilatildeo para os Coordenadores Escolares e PCA (Professor Coordenador de Aacuterea) sobre

uma proposta Curricular com inserccedilatildeo dos Temas TransversaisEducaccedilatildeo Fiscal

(iii) Realizaccedilatildeo de seminaacuteriospalestras in loco (nas escolas estaduais) com o tema Educaccedilatildeo

Fiscal e Cidadania

(iv) Realizaccedilatildeo do Foacuterum Regional de Educaccedilatildeo Fiscal na Crede 3

(v) Realizaccedilatildeo do concurso regional de redaccedilatildeo com o tema Educaccedilatildeo Fiscal e Cidadania

(vi) criaccedilatildeo do Blog da 3ordf Crede a fim de disseminar as accedilotildees textos comentaacuterios palestras

fotos e outros dos trabalhos realizados (3credeeducacaofiscalecidadaniablogspotcom)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

401

4 EFICIEcircNCIA NO USO DE RECURSOS PUacuteBLICOS RESULTADOS DOS TRABALHOS DESEN-VOLVIDOS NAS ESCOLAS ESTADUAIS DA CREDE 3

Depois da implementaccedilatildeo do Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal alunos professores e

comunidade escolar passaram a valorizar mais o patrimocircnio puacuteblico a desenvolver o haacutebito de um

consumo sustentaacutevel dentro das escolas evitando o desperdiacutecio de aacutegua a valorizaccedilatildeo do material

didaacutetico recebido a natildeo degradaccedilatildeo dos preacutedios escolares e a uma maior conscientizaccedilatildeo relacionada

a praacutetica da cidadania e ao controle dos gastos puacuteblicos vejamos as evidecircncias

Exemplo 1 Desenvolvimento de um Projeto Pedagoacutegico no Centro de Educaccedilatildeo de Jovens e

Adultos CEJA Padre Antocircnio Tomaacutes Tema ndash Conscientizaccedilatildeo Tributaacuteria um caminho para o exerciacutecio

da cidadania

Cronograma

Exemplo 2 Realizaccedilatildeo de uma Blitz Educativa com aplicaccedilatildeo de pesquisa a comunidade Esco-

lar Encenaccedilatildeo de peccedila teatral sobre ldquoPatrimocircnio Puacuteblicordquo com a finalidade de desenvolver uma maior

conscientizaccedilatildeo aos alunos sobre a preservaccedilatildeo e o uso eficiente dos recursos puacuteblicos ofertados a

populaccedilatildeo Accedilotildees realizadas pela EEEP Juacutelio Franccedila municiacutepio de Bela Cruz-CE (2012)

Trecho do relatoacuterio enviado pela Coordenaccedilatildeo Escolar

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

402

Na II BLITZ DA EDUCACcedilAtildeO FISCAL foram realizados coleta de dados criaccedilatildeo de graacutefi-cos e exposiccedilatildeo destes No mecircs de outubro de 2012 a equipe preparou e ensaiou uma peccedila teatral acerca do subtema ldquoPatrimocircnio Puacuteblicordquo Ainda no mesmo mecircs cartazes foram pelo grupo criados e expostos nas galerias da escola

Exemplo 3 Atividades realizadas na EEM Theolina de Muryllo Zacas apoacutes a formaccedilatildeo dos pro-

fessores no Curso de Disseminadores da Educaccedilatildeo Fiscal

- Inserccedilatildeo da temaacutetica Educaccedilatildeo Fiscal nas aulas de Matemaacutetica

- Divulgaccedilatildeo de materiais informativos no painel da escola despertando a curiosidade de gran-

de parte dos educandos por apresentar de formas diversas

- Desenvolvimento de um projeto cientiacutefico com o tema Educaccedilatildeo Fiscal

As accedilotildees estenderam-se com os alunos do ensino fundamental da rede municipal de Bela Cruz

sendo estas muito proveitosas porque ao mesmo tempo em que se divulgou tambeacutem chamou agrave

atenccedilatildeo dos adolescentes e das crianccedilas para a questatildeo da educaccedilatildeo tributaacuteria e a praacutetica da cidada-

nia Embora tenham sido momentos com curto intervalo de tempo trouxeram um tema nunca antes

trabalhado com os mesmos

Outra relevante accedilatildeo nesta escola foi agrave distribuiccedilatildeo de panfletos e botons permitindo assim

que as informaccedilotildees sobre Educaccedilatildeo Fiscal chegassem a lugares mais distantes e consequentemente

disseminassem essa ideia Praacuteticas como essas sempre mostram resultados satisfatoacuterios

Exemplo 4 Trabalho da Crede 3 em implementar o Programa Nacional de Educaccedilatildeo nas esco-

las estaduais da regiatildeo (2012-2013)

- Sensibilizaccedilatildeo e Apresentaccedilatildeo do Curso de Disseminadores da Educaccedilatildeo Fiscal para professo-

res durante a semana pedagoacutegica

- Processo de inscriccedilatildeo dos cursistas nos prazos estabelecidos Realizaccedilatildeo de dois momentos

presenciais durante o periacuteodo do curso

- Acompanhamento sistemaacutetico ao desempenho dos cursistas e-mail fax telefone msn aten-

dimento individual e visitas in loco

- Acompanhamento aos Planos de Accedilotildees e Projetos a serem implementados pelos cursistas

Exemplo 5 Acompanhamento aos Planos de curso dos professores e aos Projetos desenvolvi-

dos por conta do Curso de Disseminadores da Educaccedilatildeo Fiscal 20112012

Exemplo 6 Aprovaccedilatildeo no Curso de Disseminadores da Educaccedilatildeo Fiscal em 2011

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

403

Exemplo 7 Accedilotildees da Crede 3 em 2012

- Apresentaccedilatildeo do PNEF durante a semana pedagoacutegica e das sugestotildees de conteuacutedos sobre a

Educaccedilatildeo Fiscal para serem estudados nas diversas disciplinas

-Socializaccedilatildeo para os Coordenadores Escolares e PCAs da proposta curricular com inserccedilatildeo dos

temas transversais Educaccedilatildeo Fiscal

- Realizaccedilatildeo de palestras eou seminaacuterios nas escolas estaduais com o tema Educaccedilatildeo Fiscal e

Cidadania

- Acompanhamento a implementaccedilatildeo dos Planos de Accedilotildees dos cursistas (2011 e 2012)

- Alimentaccedilatildeo do blog Educaccedilatildeo Fiscal3ordfCrede (www3credeeducacaofiscalecidadaniablogs-

potcom)

5 MAIS EVIDEcircNCIAS DO TRABALHO DA CREDE 3 2011 E 2012

- Avaliaccedilotildees das escolas estaduais contemplando o tema Educaccedilatildeo Fiscal

- Palestras Itinerantes Educaccedilatildeo Fiscal e Cidadania ndash 2011 2012 realizadas pela Coordenadora

Regional Erlane Muniz de Arauacutejo Martins nas escolas EEM Joseacute Teixeira de Albuquerque EEEP Juacutelio

Franccedila

- Experiecircncia Exitosa 2012 PROJETO DE EDUCACcedilAtildeO FISCAL DA EEM THEOLINA DE MURYLLO

ZACAS CREDE 3 Eacute SELECIONADO PARA FEBRACE

A EEM Theolina de Muryllo Zacas de Bela Cruz-CE representou a Crede 3Acarauacute na FEBRACE

2012 com trecircs projetos escolares entre esses o projeto Educaccedilatildeo Fiscal como pressuposto para ci-

dadania os resultados de uma praacutetica na escola O referido trabalho objetiva oferecer agrave comunidade

escolar conhecimentos que conduzam a uma praacutetica cidadatilde de transformaccedilatildeo social por meio de

debates e reflexotildees fundamentais para a compreensatildeo da funccedilatildeo socioeconocircmica do tributo incenti-

vando o acompanhamento da aplicaccedilatildeo dos recursos puacuteblicos pela sociedade

6 APRENDIZADO ORGANIZACIONAL E RESPONSABILIDADE SOCIAL

A Educaccedilatildeo Fiscal eacute pressuposto para a cidadania Assim realizar atividades que desenvolvam

uma consciecircncia cidadatilde com base na Educaccedilatildeo Fiscal promove a evoluccedilatildeo da sociedade uma vez que

um cidadatildeo bem informado eacute participativo e estaacute sempre apto a promover mudanccedilas enfim a lutar

pela boa aplicaccedilatildeo dos nossos recursos fiscalizando o Executivo

Para que o conhecimento adquirido no decorrer da implementaccedilatildeo das accedilotildees do PNEF nas

escolas estaduais da Crede 3 natildeo seja esquecido eacute necessaacuterio que se tenha permanecircncia na vida da

comunidade escolar temaacuteticas e atitudes voltadas para Cidadania E isso estamos conseguindo nas

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

404

unidades em que o programa estaacute sendo bem desenvolvido Eacute necessaacuterio ainda que essa ideia

ultrapasse fronteiras atingindo outros grupos sociais tornando-se veiacuteculo de sensibilizaccedilatildeo e trans-

formaccedilatildeo para o livre exerciacutecio da cidadania tendo na escola o agente principal dessa nova maneira

de ver ser e conviver incentivando a todos a agirem como seres transformadores de si mesmo e do

meio em que vivem

A escola eacute um espaccedilo de construccedilatildeo de conhecimento e reflexatildeo criacutetica para situaccedilatildeo vigente da

comunidade em que estaacute inserida Despertar a consciecircncia fiscal com o objetivo de incitar a populaccedilatildeo

a acompanhar a aplicaccedilatildeo dos recursos arrecadados pela Administraccedilatildeo Puacuteblica favorece a populaccedilatildeo

em geral A desigualdade social presente em nosso paiacutes estaacute estampada por todos os locais em que

transitamos Logo o cidadatildeo deve conscientizar-se da importacircncia do tributo pois eacute por meio deste

instrumento que as desigualdades sociais podem ser reduzidas promovendo assim uma justa redis-

tribuiccedilatildeo de renda nacional

7 RELEVAcircNCIA DO PROJETO E POSSIBILIDADE DE MULTIPLICACcedilAtildeO

Quando se passa a ter consciecircncia do poder de influenciar e decidir um novo mundo pode ser

vislumbrado A Educaccedilatildeo Fiscal poderaacute ser este caminho de estimulaccedilatildeo para o exerciacutecio de uma pos-

tura ativa na decisatildeo sobre gestatildeo dos recursos puacuteblicos E eacute soacute neste sentido que se pode entender a

cidadania oportunizando agrave pessoa a compreensatildeo do valor social dos tributos logo possibilitando a

ela participar da vida do governo e de seu povo Dessa forma de acordo com o exposto percebemos

que a Educaccedilatildeo Fiscal eacute um importante meio de conscientizaccedilatildeo para a cidadania desde as experiecircn-

cias escolares a situaccedilotildees cotidianas

O Programa Nacional de Educaccedilatildeo tem possibilidade de ser implementado em todas as escolas

estaduais do Cearaacute favorecendo uma maior conscientizaccedilatildeo de alunos e professores sobre os gastos

com recursos puacuteblicos Para ser aplicado com sucesso o PNEF deve acontecer nas Credes com um

maior envolvimento de quem coordena esse processo

8 SATISFACcedilAtildeO DOS CIDADAtildeOS

Os resultados observados mostram-se positivos em virtude da demonstraccedilatildeo de interesse pelas

atividades e accedilotildees desenvolvidas nas escolas em relaccedilatildeo ao desenvolvimento do Programa Nacional

de Educaccedilatildeo Fiscal Por parte do puacuteblico alvo atendido observa-se demonstraccedilatildeo de atitudes que

revelam a compreensatildeo de que a participaccedilatildeo social soacute eacute possiacutevel em um ambiente democraacutetico e

de que esses primeiros passos na escola satildeo importantes para a fiscalizaccedilatildeo de seu proacuteprio dinheiro

sendo assim requisito fundamental para a construccedilatildeo de uma sociedade melhor

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

405

Observemos como um exemplo os resultados alcanccedilados por uma escola estadual da Crede

3 onde o programa foi implementado A aplicaccedilatildeo de questionaacuterios foi realizada com os alunos da

EEM Professora Theolina de Muryllo Zacas ocorrendo da seguinte forma dos 451 alunos matriculados

fizemos uma amostragem de 7 alunos por turma totalizando 77 alunos no geral Esses alunos respon-

deram a algumas perguntas que foram analisadas antes e apoacutes a realizaccedilatildeo de accedilotildees com a temaacutetica

Educaccedilatildeo Fiscal na Escola

Perguntamos se os alunos costumam fiscalizar as contas da escola onde estudam e do municiacute-

pio no iniacutecio apenas 10 tinham interesse em fiscalizar essas contas Apoacutes a realizaccedilatildeo das atividades

com o Programa de Educaccedilatildeo Fiscal 70 passaram a fiscalizar essas contas

Graacutefico 1 Resultado inicial com estudantes

Graacutefico 2 Resultado inicial com estudantes

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

406

Outro questionamento realizado foi se os alunos consideravam a Educaccedilatildeo Fiscal importante

para o exerciacutecio da cidadania O questionaacuterio inicial apresentou boas respostas 90 dos alunos disse-

ram que sim e apoacutes a aplicaccedilatildeo das accedilotildees esse percentual melhorou chegando a 100 dos alunos

Graacutefico 3 Importacircncia da Educaccedilatildeo Fiscal para o exerciacutecio da cidadania

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Aqueles e aquelas que participaram e participaratildeo (enfatiza-se eacute um projeto de continuidade)

de alguma accedilatildeo desenvolvida com o Programa de Educaccedilatildeo Fiscal nas escolas estaduais certamente

teratildeo subsiacutedios natildeo soacute para esclarecer a outros mas tambeacutem para realizar e incentivar praacuteticas cida-

datildes Como nos diz (XEREZ 2008 p 450) ldquoA escola eacute o espaccedilo que tem como funccedilatildeo social ensejar

essa estimulaccedilatildeo a autonomia da autoconstruccedilatildeo consciecircncia poliacutetica e social porque cidadania eacute

algo construiacutedo e conquistado atraveacutes da plena consciecircncia dos direitos e deveres e da criticidade do

mundordquo

A cidadania cresce e se afirma na sociedade na medida em que os indiviacuteduos adquirem direitos

e ampliam sua participaccedilatildeo e para que essa seja eficaz eacute imprescindiacutevel o conhecimento No que se

refere aos tributos eacute de suma importacircncia que a populaccedilatildeo conheccedila com mais detalhes esse assunto

Assim acredita-se que os esclarecimentos aos participantes de accedilotildees envolvendo o tema edu-

caccedilatildeo fiscal iratildeo repercutir na comunidade e consequentemente no municiacutepio estado e paiacutes cum-

prindo assim o papel de disseminadores Aleacutem do mais teremos uma parcela maior da populaccedilatildeo

consciente do direcionamento dos recursos e capaz de fiscalizaacute-los

Dado o exposto a escola eacute um espaccedilo de construccedilatildeo de conhecimento e reflexatildeo criacutetica para

situaccedilatildeo vigente da comunidade em que estaacute inserida Portanto quando se passa a ter consciecircncia

do poder de influenciar e decidir um novo mundo pode ser vislumbrado A Educaccedilatildeo Fiscal poderaacute

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

407

ser este caminho de estimulaccedilatildeo para o exerciacutecio de uma postura ativa na decisatildeo sobre gestatildeo dos

recursos puacuteblicos E eacute soacute neste sentido que se pode entender a cidadania oportunizando agrave pessoa a

compreensatildeo do valor social dos tributos logo possibilitando a ela participar da vida do governo e de

seu povo Dessa forma de acordo com o que jaacute foi mencionado percebemos que a Educaccedilatildeo Fiscal eacute

um importante meio de conscientizaccedilatildeo para a cidadania desde as experiecircncias escolares a situaccedilotildees

cotidianas

REFEREcircNCIAS

AMARO Luciano Direito tributaacuterio brasileiro 18 ed Satildeo Paulo Saraiva 2011

BOBBIO Noberto A era dos Direitos Satildeo Paulo Campus 1992

BRASIL Constituiccedilatildeo (1988) Constituiccedilatildeo Repuacuteblica Federativa do Brasil 12 ed Satildeo Paulo Rideel 2011

______ Ministeacuterio da Fazenda Escola Superior de Administraccedilatildeo Fazendaacuteria Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal (PNEF) Cadernos temaacuteticos I II III e IV 4ed Brasiacutelia Esaf 2009

CARTA DA TERRA Disponiacutevel em wwwcartadaterraorgbr Acesso em 10 set 2011

CONTROLADORIA GERAL DA UNIAtildeO Olho vivo no dinheiro Puacuteblico Disponiacutevel em wwwcgugovbr Acesso em 10 set 2011

______ Portal da Transparecircncia Disponiacutevel em wwwportaldatransparenciagovbrgt Acesso em 10 set 2011

FERREIRA A B de H Miacuteni Aureacutelio O Dicionaacuterio da Liacutengua Portuguesa 6 ed Curitiba Positivo 2004

OECD Organisation for Economic Co-operation and Development Disponiacutevel em httpstatsoecdorgindexaspxqueryid= Acesso em 10 set 2011

PINSK J Cidadania e Educaccedilatildeo Satildeo Paulo Contexto 2003

SABBAG Eduardo Manual de Direito Tributaacuterio 3 ed Satildeo Paulo Saraiva 2011

XEREZ Antonia Solange Pinheiro Educaccedilao e cidadania ampliando os espaccedilos de inclusatildeo Fortaleza Graacutefica e Editora LCR 2008

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

408

PROGRAMA DE EDUCACcedilAtildeO FISCAL DE FORTALEZA UM LEGADO DE CIDADANIA

SUMAacuteRIO Introduccedilatildeo 1 Um olhar sobre educaccedilatildeo fiscal 2 Em Fortaleza eacute assim quem leva as financcedilas agrave serio leva precircmio 21 Comunicaccedilatildeo alternativa e popular 22 Palestras e seminaacuterios 23 Resultados do Precircmio Sefin 3 Outros instrumentos para disseminaccedilatildeo da educaccedilatildeo fiscal 31 Enquetes teatrais 32 Publicaccedilotildees 33 Reformulaccedilatildeo do portal 4 PEF Fortaleza um legado de cida-dania 5 Cief Consideraccedilotildees finais Referecircncias

Leonardo Costa de Almeida1

INTRODUCcedilAtildeO

O desafio de estruturar implantar e promover accedilotildees de educaccedilatildeo fiscal natildeo eacute tarefa das mais

faacuteceis ainda mais quando se trata de uma cidade como Fortaleza capital do Estado do Cearaacute onde os

iacutendices de desigualdade social ainda satildeo bastante alarmantes Para se ter uma ideia no final do ano de

2012 relatoacuterio produzido pelas Naccedilotildees Unidas denominado State of the World Cities colocou Forta-

leza no mapa das dez cidades mais desiguais do mundo

O relatoacuterio mostrou que apenas 7 da populaccedilatildeo de Fortaleza deteacutem 26 de toda a riqueza

Os serviccedilos puacuteblicos ainda escassos diante da demanda natildeo conseguem atingir os cidadatildeos que es-

tatildeo agrave margem e que muitas vezes natildeo sabem a importacircncia da sua proacutepria voz no processo decisoacuterio

das poliacuteticas puacuteblicas

O cenaacuterio que parece desanimador surge como um desafio ao Poder Puacuteblico que entre tantas

outras obrigaccedilotildees tambeacutem precisa garantir justiccedila social e plenas condiccedilotildees de participaccedilatildeo e cida-

dania a todos Diante disso inquietaccedilotildees de toda ordem vecircm agrave tona quais as alternativas para mudar

essa realidade Que instrumentos podem ser utilizados para aproximar o cidadatildeo do Poder Puacuteblico

Que espaccedilos podem ser ocupados Como chegar a eles

Em 2005 ao assumir a Secretaria de Financcedilas da Prefeitura de Fortaleza o economista Alexan-

dre Sobreira Cialdini escolheu o caminho da educaccedilatildeo fiscal No ano seguinte deu iniacutecio a primeira

iniciativa na busca por uma consciecircncia criacutetica onde o cidadatildeo pudesse reconhecer a importacircncia do

Fisco na manutenccedilatildeo e promoccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas

Sempre guiado pelas diretrizes que norteiam esta temaacutetica foi na gestatildeo do economista que

1 Jornalista com especializaccedilatildeo em Comunicaccedilatildeo e Jornalismo Poliacutetico pela Universidade de Fortaleza coordenou o Programa de Educaccedilatildeo Fiscal de Fortaleza eacute tutor de educaccedilatildeo a distacircncia (educaccedilatildeo fiscal) pela Escola de Administraccedilatildeo Fazendaacuteria Atualmente eacute assessor de comunicaccedilatildeo na Prefeitura de Fortaleza E-mail leonardocosta2gmailcom

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

409

Fortaleza foi elevada ao patamar de primeira capital a institucionalizar como poliacutetica de Estado por

meio de lei um Programa de Educaccedilatildeo Fiscal De 2006 a 2012 diversos instrumentos e accedilotildees foram

criados no intuito de estimular agrave discussatildeo acerca da participaccedilatildeo cidadatilde aleacutem de conscientizar para

a funccedilatildeo socioeconocircmica dos tributos

O trabalho desenvolvido por Fortaleza neste periacuteodo ganhou consistecircncia e destacou-se de

forma insusgente entre os municiacutepios brasileiros Neste artigo pretendemos apresentar e discutir esta

experiecircncia agrave luz dos trecircs principais eixos que norteiam a educaccedilatildeo fiscal (valores cidadania e cultura)

e na busca por uma relaccedilatildeo harmoniosa e participativa entre o Poder Puacuteblico e o cidadatildeo por meio do

estiacutemulo ao exerciacutecio pleno da cidadania

1 UM OLHAR SOBRE EDUCACcedilAtildeO FISCAL

As transformaccedilotildees da sociedade o avanccedilo das novas tecnologias da informaccedilatildeo os novos

meios de comunicaccedilatildeo os instrumentos ofertados pelo Poder Puacuteblico as diversas formas de se rela-

cionar com a cidade com o bairro em que vivemos e ateacute mesmo com os grupos que frequentamos se

configuram em importantes ferramentas agrave disposiccedilatildeo dos cidadatildeos

Na aacuterea de financcedilas puacuteblicas por exemplo eacute a partir de meios como a internet que os governos

federal estadual e municipal tentam manter um canal direto com o cidadatildeo na prestaccedilatildeo de contas do

dinheiro puacuteblico e de tudo que eacute aplicado e investido

Desta forma os governos seja por iniciativa proacutepria ou mesmo por cobranccedila da sociedade tecircm

buscado implementar accedilotildees para gerar transparecircncia e clareza nas informaccedilotildees e decisotildees de maneira

a garantir os direitos de cidadania e o exerciacutecio do controle social

Marshall (1967 p 82) ao discutir a noccedilatildeo de direitos de cidadania destaca que ldquopara que a

igualdade nos exerciacutecio dos direitos seja alcanccedilada coloca-se a necessidade de instrumentos que pro-

movam a garantia de sua efetivaccedilatildeordquo

Seguindo esta linha de raciociacutenio podemos considerar que o Poder Puacuteblico compreendido

aqui como o Estado Democraacutetico Brasileiro assume uma responsabilidade primordial na garantia dos

direitos de cidadania uma vez que eacute ele o responsaacutevel pela validaccedilatildeo de normas e implementaccedilatildeo de

medidas que promovam efetivamente tais direitos

Natildeo eacute difiacutecil perceber que a relaccedilatildeo entre poder puacuteblico e sociedade ainda acontece de forma

aacuterida Muitas vezes o cidadatildeo natildeo se sente parte daquilo que lhe ofertado ou natildeo percebe a presenccedila

do Estado quando utiliza um serviccedilo puacuteblico Por mais simples que pareccedila a participaccedilatildeo do Estado

estaacute presente nas menores accedilotildees corriqueiras como garantir giz para que o professor possa ensinar

Diante disso a ideia de educaccedilatildeo fiscal se configura como um forte instrumento pedagoacutegico de

ensino e sensibilizaccedilatildeo para fomentar a cidadania e promover uma relaccedilatildeo harmoniosa e participativa

entre o Poder Puacuteblico e o cidadatildeo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

410

De acordo com Rivillas em artigo publicado no livro Educaccedilatildeo Fiscal e Cidadania ldquoa educaccedilatildeo

fiscal eacute um processo de ensino e aprendizagem baseado em trecircs eixos ndash valores cidadania e cultura

fiscal ndash e que tem como objetivo fomentar uma cidadania participativa e consciente de seus direitos e

obrigaccedilotildeesrdquo (In VIDAL 2010 p24)

Ainda segundo o autor entende-se por valores a possibilidade de uma construccedilatildeo criacutetica so-

bre a importacircncia do tema desde a escola que pode ser considerada o primeiro espaccedilo de discussatildeo

com o qual as crianccedilas tecircm contato propiacutecio para o desenvolvimento livre de cada indiviacuteduo Eacute na

escola que se promovem as primeiras discussotildees acerca dos interesses individuais e coletivos Jaacute

os conceitos de cidadania e cultura fiscal podem ser entendidos como elementos complementares

para a garantia dos direitos e deveres de cada cidadatildeo O primeiro estaacute ligado agrave participaccedilatildeo demo-

craacutetica e o segundo se trata de uma formaccedilatildeo eacutetico-cidadatilde onde se constroacutei uma consciecircncia criacutetica

reconhecendo a importacircncia dos tributos na garantia do bem comum e da correta aplicaccedilatildeo deles

de forma transparente

No Brasil o Estado do Cearaacute foi um dos pioneiros em 1998 na implantaccedilatildeo de um Programa

Estadual de Educaccedilatildeo Fiscal (PEF) O Programa estabeleceu-se a partir de orientaccedilatildeo do Confaz de

1996 que deliberava acerca da constituiccedilatildeo de um Grupo Estadual de Educaccedilatildeo Tributaacuteria (Gete) hoje

denominado Grupo Estadual de Educaccedilatildeo Fiscal (Gefe) para implantar e viabilizar as diretrizes do Pro-

grama Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal (PNEF)

Mobilizado pela causa da educaccedilatildeo fiscal em Fortaleza o economista Alexandre Sobreira

Cialdini ao assumir a Secretaria Municipal de Financcedilas da Prefeitura em 2005 decidiu investir no

tema e empreendeu diversas accedilotildees no intuito estimular fortalecer e disseminar a educaccedilatildeo fiscal

no municiacutepio

Desde entatildeo inuacutemeras accedilotildees e iniciativas foram implementadas para gerar informaccedilatildeo trans-

parecircncia e clareza com as financcedilas puacuteblicas da cidade A partir de 2006 foram veiculados os primeiros

instrumentos apresentados de maneira simples e didaacutetica que facilitavam o controle social e estimu-

lavam o exerciacutecio pleno da cidadania na capital cearense

As medidas adotas pela Secretaria Municipal de Financcedilas buscavam impactar na produccedilatildeo de

conteuacutedos acadecircmicos e pedagoacutegicos no intuito de promover a discussatildeo democraacutetica acerca de

temas relacionados agraves financcedilas puacuteblicas Entre principais accedilotildees adotadas destaca-se o Precircmio Sefin

de Financcedilas Municipais primeira iniciativa de educaccedilatildeo fiscal da Prefeitura de Fortaleza criada para

envolver trecircs das principais esferas da sociedade a academia a imprensa e a escola

A partir daiacute outras accedilotildees foram desencadeadas como apresentaremos a seguir ateacute a formali-

zaccedilatildeo da Lei Municipal n 98252011 que instituiu o Programa de Educaccedilatildeo Fiscal de Fortaleza (PEF

Fortaleza) responsaacutevel por colocar a cidade como a primeira capital do paiacutes a instituir um Programa

de Educaccedilatildeo Fiscal com recursos garantidos em orccedilamento orientando para a inclusatildeo do tema de

forma transversal nas escolas puacuteblicas do municiacutepio

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

411

Para isso diversos atores externos foram sensibilizados mobilizados e incluiacutedos no processo

de disseminaccedilatildeo da educaccedilatildeo fiscal Crianccedilas professores estudantes universitaacuterios artistas muacutesi-

cos jornalistas comunicadores populares cineastas profissionais de tecnologia da informaccedilatildeo ser-

vidores puacuteblicos executivos pais matildees todos engajados pela mesma causa fazer valer seus direitos

de cidadania

2 EM FORTALEZA Eacute ASSIM QUEM LEVA AS FINANCcedilAS Agrave SERIO LEVA PREcircMIO

Em 2006 a Prefeitura de Fortaleza por intemeacutedio da Secretaria Municipal de Financcedilas instituiu

o Precircmio Sefin de Financcedilas Municipais desd da aprovaccedilatildeo do Decreto nordm 12096 que tem por objetivo

estimular as pesquisas nas aacutereas Financcedilas Tributaccedilatildeo Auditoria Contabilidade Direito Economia e

Tecnologia da Informaccedilatildeo aleacutem da produccedilatildeo de conteuacutedos jornaliacutestico por parte da imprensa acerca

da administraccedilatildeo puacuteblica municipal

O Precircmio Sefin pode ser considerado o projeto piloto entre as accedilotildees de educaccedilatildeo fiscal que

seriam promovidas posteriormente pelo Municiacutepio de Fortaleza Em sua primeira ediccedilatildeo no ano de

2007 o Precircmio buscava estimular a discussatildeo democraacutetica das financcedilas municipais em apenas duas

grandes aacutereas universidade e imprensa

A experiecircncia proveitosa e os resultados obtidos com esta ediccedilatildeo do precircmio levaram a Secre-

taria Municipal de Financcedilas a reformular a proposta e incorporar a escola como nova aacuterea de atuaccedilatildeo

para as accedilotildees de educaccedilatildeo fiscal

Em 2008 a segunda ediccedilatildeo do Precircmio foi lanccedilada jaacute com a nova proposta apoiada em trecircs

linhas de atuaccedilatildeo a primeira o estiacutemulo agrave pesquisa nas aacutereas de Financcedilas Tributaccedilatildeo Auditoria

Contabilidade Direito Economia e Tecnologia da Informaccedilatildeo aplicada agrave administraccedilatildeo puacuteblica mu-

nicipal a segunda o reconhecimento do trabalho dos jornalistas locais na abordagem das financcedilas

puacuteblicas em acircmbito municipal e a terceira o incentivo ao ensino da educaccedilatildeo fiscal nas escolas da

rede puacuteblica e privada

Pelos termos do Regulamento do Precircmio Sefin os participantes poderiam concorrer em diver-

sas categorias listadas a seguir

Na aacuterea de pesquisa estudantes de graduaccedilatildeo e profissionais graduados ou com poacutes gradu-

accedilatildeo poderiam concorrer com artigos cientiacuteficos monografias dissertaccedilatildeo de mestrado ou tese de

doutorado Na aacuterea de imprensa profissionais de comunicaccedilatildeo poderiam concorrer nas categorias de

jornalismo impresso radiojornalismo e telejornalismo Os vencedores recebiam precircmios em dinheiro

e publicaccedilatildeo dos trabalhos nos Anais do Precircmio Sefin Em contrapartida os trabalhos apresentados

eram utilizados para a otimizaccedilatildeo da atividade fazendaacuteria no municiacutepio

Jaacute na aacuterea escola alunos da rede puacuteblica e privada de ensino com faixa etaacuteria entre 6 e 17

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

412

anos podiam concorrer com desenho e frase redaccedilatildeo poesia ou paroacutedia relacionados com temas

de educaccedilatildeo fiscal e cidadania Jaacute os professores de ensino fundamental e meacutedio poderiam participar

desenvolvendo projetos pedagoacutegicos de educaccedilatildeo fiscal aplicaacuteveis agrave sala de aula

A premiaccedilatildeo para esta aacuterea era composta por produtos para os alunos vencedores e gratifica-

ccedilatildeo em dinheiro para os professores por estimularem a educaccedilatildeo fiscal em sala de aula

Todos os trabalhos inscritos eram avaliados por uma comissatildeo formada por representantes

de entidades de classe ligadas agraves aacutereas envolvidas no Precircmio bem como professores universitaacuterios

e outros profissionais de imprensa e educaccedilatildeo A comissatildeo avaliadora natildeo tinha acesso a nenhuma

informaccedilatildeo que pudesse identificar o candidato

21 Comunicaccedilatildeo alternativa e popular

Em 2011 compreendendo a importacircncia de disseminar a educaccedilatildeo fiscal em locais onde mui-

tas vezes a grande miacutedia ou os instrumentos de formaccedilatildeo promovidos pelo poder puacuteblico natildeo che-

gam o Precircmio abriu espaccedilo para a participaccedilatildeo de comunicadores populares e alternativos

Desta forma profissionais de raacutedios comunitaacuterias e raacutedios-escola poderiam participar com a

produccedilatildeo de conteuacutedos radiofocircnicos em veiacuteculos de comunicaccedilatildeo popular e alternativa De acordo

com Girardi e Jacobus entende-se como raacutedios comunitaacuterias aquelas que ldquotecircm a intenccedilatildeo de funcio-

namento democraacutetico abrindo suas portas e estimulando a participaccedilatildeo da comunidade onde estatildeo

inseridasrdquo (GIRARDI JACOBUS 2009)

Ou seja ao incluir a comunicaccedilatildeo popular e alternativa entre as categorias do Precircmio Sefin a

Secretaria Municipal de Financcedilas buscava inserir a educaccedilatildeo fiscal neste espaccedilo voltado para as temaacute-

ticas locais da comunidade em que estes veiacuteculos estavam inseridos distante de interesses comerciais

que muitas vezes inibem uma produccedilatildeo criacutetica e formadora

No intuito de dar mais subsiacutedios agraves produccedilotildees radiofocircnicas de comunicaccedilatildeo popular o Precircmio

Sefin elaborou uma capacitaccedilatildeo para cerca de 30 comunicadores no intuito de preparaacute-los para co-

nhecer mais sobre a importacircncia das financcedilas e da educaccedilatildeo fiscal para o exerciacutecio da cidadania A

capacitaccedilatildeo teve carga horaacuteria de 8 horasaula e contou com participaccedilatildeo de representantes de raacutedios

comunitaacuterias portais de bairro e raacutedios-escola A iniciativa teve o apoio pedagoacutegico do Grupo de

Educaccedilatildeo Fiscal da Secretaria da Fazenda do Estado do Cearaacute e do Nuacutecleo de Comunicaccedilatildeo Popular

e Alternativa da Prefeitura de Fortaleza Para concorrer os programas deveriam obrigatoriamente

serem produzidos em um dos seguintes formatos debate entrevista raacutedio-novela ou raacutediodrama

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

413

22 Palestras e Seminaacuterios

O Precircmio Sefin tambeacutem promoveu diversos seminaacuterios e palestras no intuito de instigar e en-

riquecer o debate acerca da educaccedilatildeo fiscal Com esta linha de atuaccedilatildeo o Precircmio trouxe agrave Fortaleza

diversos intelectuais e pessoas de renome nacional e internacional como o Senador Eduardo Suplicy a

especialista em Gestatildeo Fiscal e Municipal do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) Faacutetima

Cartaxo o coordenador da Aacuterea Internacional do Instituto de Estudios Fiscales (IEFES) Bienvenido

Pascual Encuentra o jornalista Luis Nassif entre outros

23 Resultados do Precircmio Sefin

Nas seis ediccedilotildees realizadas entre os anos de 2007 e 2012 o Precircmio Sefin de Financcedilas Municipais

contabilizou aproximadamente 5500 inscriccedilotildees considerando todas as categorias disponiacuteveis Veja

abaixo a evoluccedilatildeo dos nuacutemeros

Ou seja o crescimento no nuacutemero de inscriccedilotildees foi notoacuterio Percebe-se que a cada o ano o

Precircmio Sefin se consolidava ainda mais atingindo uma maior parcela de cidadatildeos No total das seis

ediccedilotildees o Precircmio Sefin entregou 156 precircmios nas diversas categorias Somente na aacuterea de pesquisa

53 trabalhos acadecircmicos foram contemplados Na aacuterea de imprensa 31 mateacuterias jornaliacutesticas de veiacute-

culos impressos radiofocircnicos televisivos e de comunicadores populares foram premiadas

Na aacuterea escola 63 alunos receberam precircmios pelos trabalhos produzidos sobre educaccedilatildeo fiscal

e cidadania Aleacutem disso 09 professores tambeacutem foram contemplados por desenvolverem projetos

pedagoacutegicos de educaccedilatildeo fiscal aplicaacuteveis agrave sala de aula

2 Nesta ediccedilatildeo o Precircmio Sefin contava apenas com as aacutereas de pesquisa e imprensa ainda natildeo contemplando artigos cientiacuteficos

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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3 OUTROS INSTRUMENTOS PARA DISSEMINACcedilAtildeO DA EDUCACcedilAtildeO FISCAL

No periacuteodo que compreende os anos de 2006 a 2012 a Secretaria Municipal de Financcedilas tam-

beacutem elaborou diversos instrumentos didaacuteticos para auxiliar na formaccedilatildeo cidadatilde e estimular a aplicaccedilatildeo

da educaccedilatildeo fiscal de forma transversal nas mais diversas aacutereas

31 Esquetes teatrais

Aleacutem do Precircmio Sefin de Financcedilas Municipais a Secretaria elaborou duas esquetes teatrais que

trabalhavam de forma luacutedica a importacircncia dos tributos e da cidadania para garantia de serviccedilos e

manutenccedilatildeo da cidade

A primeira esquete intitulada ldquoOs Primosrdquo apresenta os principais tributos brasileiros e a im-

portacircncia do pagamento deles para a cidade o Estado e o paiacutes O enredo se daacute por meio do diaacutelogo

entre trecircs personagens que possuem relaccedilatildeo de parentesco e vivem em situaccedilotildees de financeiras dife-

rentes O primeiro eacute rico o segundo eacute um artista pobre e a terceira uma estudiosa e ativa cidadatilde que

vai buscar na educaccedilatildeo fiscal maneiras para esclarecer as duacutevidas do primo artista na tentativa de

tornaacute-lo mais consciente de seu papel na sociedade

Desde 2006 quando foi lanccedilada a esquete foi apresentada em associaccedilotildees igrejas comuni-

dades e outras entidades representativas da sociedade civil Em 2007 a esquete foi utilizada durante

as Assembleias do Orccedilamento Participativo de Fortaleza como mais um instrumento para facilitar a

compreensatildeo por parte dos cidadatildeos que deliberavam suas demandas para a cidade

Devido ao sucesso de ldquoOs Primosrdquo em 2008 a Secretaria Municipal de Financcedilas resolveu produ-

zir mais uma esquete teatral Desta vez para tratar especificamente da importacircncia do Imposto sobre

a Propriedade Predial e Territorial (IPTU) no reordenamento da cidade

Assim surgiu ldquoO Casoacuteriordquo mais uma ferramenta utilizada pela Secretaria Municipal de Financcedilas

na disseminaccedilatildeo da educaccedilatildeo fiscal Com linguagem simples e regional o enredo apresentava a his-

toacuteria do conturbado matrimocircnio entre Cazandra e Cazeacute que para se casarem precisavam estar em dia

com o IPTU da cidade

O texto trabalhava questotildees importantes ligadas agrave participaccedilatildeo cidadatilde e o retorno que o cida-

datildeo espera do Poder Puacuteblico Aleacutem disso a esquete ainda desenvolvia ideias como a importacircncia de

realizar justiccedila fiscal com justiccedila social

No intuito de atingir o maior puacuteblico possiacutevel aleacutem de outros espaccedilos em que o teatro natildeo

alcanccedila a Secretaria Municipal de Financcedilas converteu as duas esquetes em viacutedeos formato DVD que

foram distribuiacutedos em escolas instituiccedilotildees e entidades representativas de classe

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

415

32 Publicaccedilotildees

Diversos conteuacutedos didaacuteticos como manuais cartilhas e guias que facilitavam o entendimen-

to das financcedilas puacuteblicas por parte dos cidadatildeos tambeacutem foram criados Entre os primeiros estatildeo

ldquoLei de Responsabilidade Fiscal ndash Guia Praacutetico do Cidadatildeordquo e ldquoPor dentro do Orccedilamento Puacuteblicordquo

Ambos foram distribuiacutedos para imprensa oacutergatildeos governamentais empresas privadas associaccedilotildees

sindicatos etc

A partir daiacute a Secretaria Municipal de Financcedilas desencadeou a publicaccedilatildeo de outros materiais

com as mais diversas temaacuteticas Vejamos a seguir

bull ldquoManual de Orientaccedilatildeo da Programaccedilatildeo Orccedilamentaacuteria e Financeirardquo que explica

o papel do gestor e dos diretores administrativos e financeiros dos oacutergatildeos da administraccedilatildeo direta e

indireta e apresenta o fluxo da despesa orccedilamentaacuteria da Prefeitura O documento foi entregue a todos

os gestores e Diretores Administrativos Financeiros

bull ldquoManual do Investidorrdquo publicaccedilatildeo que tem por objetivo apoiar as decisotildees dos inves-

tidores na cidade de Fortaleza O manual apresenta elementos essenciais que caracterizam o Programa

Municipal de Incentivos Fiscais para Fortaleza natildeo soacute em termos normativos mas tambeacutem no que diz

respeito agraves nuances necessaacuterias ao amadurecimento das decisotildees empresariais

bull ldquoA cartilha IPTUrdquo trata-se de um documento que tem o objetivo de informar a popu-

laccedilatildeo sobre a importacircncia do IPTU para arrecadaccedilatildeo do Municiacutepio e para o reordenamento urbano da

Cidade A cartilha tambeacutem esclarece duacutevidas sobre a cobranccedila do imposto e orienta sobre procedi-

mentos

bull ldquoCartilha da Transparecircnciardquo publicaccedilatildeo que tem o objetivo de orientar o cidadatildeo so-

bre as ferramentas disponibilizadas pela Prefeitura para garantir agrave populaccedilatildeo acesso faacutecil e didaacutetico

agraves financcedilas puacuteblicas municipais O material ainda apresenta como o cidadatildeo pode acompanhar a

aplicaccedilatildeo dos recursos puacuteblicos e as principais puniccedilotildees aplicadas aos gestores que natildeo obedecerem

agraves condiccedilotildees e limites estabelecidos pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) Por meio da Cartilha

da Transparecircncia a Secretaria Municipal de Financcedilas ofereceu mais um instrumento democraacutetico de

participaccedilatildeo onde a sociedade pocircde compreender de forma simples e transparente a relaccedilatildeo entre a

receita e despesa aleacutem de conhecer outras ferramentas que auxiliam o cidadatildeo no papel de agente

fiscalizador de tudo que eacute aplicado com o dinheiro puacuteblico

Todo o material produzido foi disponibilizado na internet no site da secretaria por intermeacutedio

do endereccedilo eletrocircnico wwwsefinfortalezacegovbr

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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33 Reformulaccedilatildeo do portal

No iniacutecio de 2005 o portal da Secretaria Municipal de Financcedilas foi reformulado e ganhou nova

versatildeo que contava com mais serviccedilos e informaccedilotildees fiscais e financeiras mantendo um canal direto

com o cidadatildeo e facilitando a fiscalizaccedilatildeo por parte dos oacutergatildeos de controle externo

O portal passou a permitir consultas sobre situaccedilatildeo financeira e cadastral e ateacute acompanhar o

andamento das pautas de julgamento do Contecioso Administrativo Tributaacuterio (CAT) Aleacutem disso pe-

riodicamente a Secretaria Municipal de Financcedilas publicava todos os relatoacuterios estabelecidos pela Lei

de Responsabilidade Fiscal (LRF) ndash Relatoacuterio de Gestatildeo Fiscal (RGF) e Relatoacuterio Resumido da Execuccedilatildeo

Orccedilamentaacuteria (RREO) ndash aleacutem de todos os repasses do governo federal para o municiacutepio balanccedilos ge-

rais e balancetes mensais da Prefeitura

34 Foco na escola

Em 2011 no intuito de consolidar ainda mais o trabalho desenvolvido especialmente por meio

do Precircmio Sefin a Secretaria Municipal de Financcedilas ampliou as accedilotildees e focou ainda mais na escola Em

parceria com a Fundaccedilatildeo Demoacutecrito Rocha a secretaria desenvolveu diversas accedilotildees que visam valori-

zar e estimular a discussatildeo da educaccedilatildeo fiscal em sala de aula desde a infacircncia

A parceria entre as duas instituiccedilotildees resultou na criaccedilatildeo de um Kit de Educaccedilatildeo Fiscal voltado

para as escolas do ensino fundamental de Fortaleza composto por jogos e dois livros paradidaacuteticos A

funccedilatildeo do kit era auxiliar pedagogicamente na aplicaccedilatildeo do tema educaccedilatildeo fiscal de forma transversal

em sala de aula O Kit foi distribuiacutedo em todas as escolas puacuteblicas do municiacutepio

Veja abaixo as ferramentas que compunham o kit

bull Jogo de tabuleiro e dados com a representaccedilatildeo social da cidade (prefeitura empresas

cidadatildeos escolas hospitais) Uma dinacircmica de jogo com ceacutedulas pagamentos de impostos e seu re-

torno social

bull Jogo da memoacuteria contendo cartelas com associaccedilatildeo positiva agrave cultura fiscal

bull Grupo de fantoches com os personagens de representaccedilatildeo social pai matildee filhos pro-

fessores meacutedicos poliacuteticos Tratava-se de uma atividade voltada para o desenvolvimento criacutetico dos

jovens

bull Dois livros paradidaacuteticos elaborados por escritores da literatura infantil cearense abor-

dando a importacircncia dos tributos na manutenccedilatildeo dos serviccedilos e poliacuteticas puacuteblicas do municiacutepio e o

exerciacutecio da cidadania

Em 2012 a Secretaria Municipal de Financcedilas utilizou-se das ferramentas de tecnologia da infor-

maccedilatildeo para inovar e transformou o jogo de tabuleiro em um game virtual A accedilatildeo teve como objetivo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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garantir a inclusatildeo digital e inserir uma nova linguagem aos instrumentos desenvolvidos no acircmbito da

educaccedilatildeo fiscal

O game denominado ldquoEducaccedilatildeo Fiscal e Cidadaniardquo foi distribuiacutedo nas escolas da rede puacutebli-

ca de Fortaleza e disponibilizado para download na internet no portal da secretaria Assim como na

versatildeo em tabuleiro basicamente o jogo buscava estimular a cidadania e garantir um maior conheci-

mento sobre financcedilas de uma forma divertida para as crianccedilas

Dos pontos de vista visual e funcional o game foi todo desenvolvido em graacuteficos 3D e trazia

como cenaacuterio a cidade de Fortaleza por meio de representaccedilotildees como a estaacutetua de Iracema o Estaacutedio

Presidente Vargas etc O game pode ser jogado individualmente ou em dupla e natildeo precisa ser insta-

lado no computador

4 PEF FORTALEZA UM LEGADO DE CIDADANIA

Em 31 de janeiro de 2012 a Secretaria Municipal de Financcedilas lanccedilou formalmente o Progra-

ma de Educaccedilatildeo Fiscal de Fortaleza (PEF Fortaleza) Por intermeacutedio da Lei n 98252011 o Programa

institucionalizou as accedilotildees jaacute desenvolvidas pela secretaria desde 2005 como poliacuteticas puacuteblicas do

municiacutepio de Fortaleza

Pelos termos da referida Lei o programa tem objetivo de estimular o pleno exerciacutecio da cida-

dania promover campanhas de premiaccedilatildeo aos contribuintes adimplentes com o fisco municipal esti-

mular a educaccedilatildeo fiscal e a discussatildeo das financcedilas puacuteblicas nas principais esferas da sociedade civil e

ainda propiciar relaccedilatildeo harmoniosa e participativa entre o cidadatildeo e o Governo Municipal conscien-

tizando para a funccedilatildeo socioeconocircmica dos tributos

Para isso a Lei orienta a criaccedilatildeo de um Grupo de Educaccedilatildeo Fiscal de Fortaleza (GEF Fortaleza)

que ficaraacute com entre outras incubecircncias a responsabilidade de planejar executar e acompanhar accedilotildees

de educaccedilatildeo fiscal no municiacutepio e ainda desenvolver novos projetos e instrumentos voltados para a

disseminaccedilatildeo da educaccedilatildeo fiscal nas diversas esferas da sociedade De acordo com a Lei cabe ao GEF

Fortaleza a captaccedilatildeo de recursos para a sustentabilidade do programa

Sendo assim Fortaleza tornou-se a primeira capital brasileira a implantar um Programa de

Educaccedilatildeo Fiscal com tamanha abrangecircncia envolvendo o cidadatildeo desde a infacircncia Vale destacar

que a aprovaccedilatildeo da Lei n 98252011 tambeacutem cumpre a diretriz indicada pelo Ministeacuterio da Fazenda

e Ministeacuterio da Educaccedilatildeo (por meio da Portaria Interministerial nordm 413 de 31 de dezembro de 2002)

onde orientam os municiacutepios a baixar os atos necessaacuterios para garantir a implementaccedilatildeo do Programa

Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal (PNEF)

Outro destaque que cabe ressaltar eacute que o Programa de Educaccedilatildeo Fiscal de Fortaleza possui

recurso garantido (por Lei) de 004 da Receita Corrente Liacutequida do Municiacutepio para assegurar as

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

418

accedilotildees que seratildeo desenvolvidas pela secretaria Aleacutem disso permite ainda que o municiacutepio possa

buscar parcerias puacuteblico-privadas e com organismos multilaterais para a ampliaccedilatildeo e desenvolvi-

mento de novas atividades

Outra inovaccedilatildeo trazida por esta Lei no acircmbito de Fortaleza eacute a inclusatildeo da educaccedilatildeo fiscal de

forma transversal nas escolas puacuteblicas do municiacutepio Com o apoio do ldquoPEF Fortalezardquo as escolas mu-

nicipais poderatildeo incluir a educaccedilatildeo fiscal em sala de aula nos conteuacutedos programaacuteticos do ano letivo

utilizando os recursos didaacuteticos disponibilizados pela Secretaria Municipal de Financcedilas

5 CIEF

No final de 2012 momento em que encerra-se o periacuteodo temporal destinado a este artigo a

Secretaria Municipal de Financcedilas em parceria com a Associaccedilatildeo Brasileira das Secretarias de Financcedilas

das Capitais (Abrasf) realizou o Congresso Internacional de Educaccedilatildeo Fiscal (Cief 2012) O evento

configurou-se como um espaccedilo democraacutetico de participaccedilatildeo para o fortalecimento dos programas de

educaccedilatildeo fiscal nas trecircs esferas de poder

O Congresso teve como objetivo buscar estrateacutegias de intensificaccedilatildeo dos programas de edu-

caccedilatildeo fiscal bem como descobrir desenvolver e estimular praacuteticas coletivas que auxiliem o processo

de conscientizaccedilatildeo dos cidadatildeos sobre a importacircncia da educaccedilatildeo fiscal em niacutevel internacional Aleacutem

disso tambeacutem abriu oportunidade para troca de experiecircncias e praacuteticas exitosas de educaccedilatildeo fiscal

desenvolvidas em todo o paiacutes

Durante dois dias (27 e 28 de novembro) o Cief reuniu em Fortaleza diversos intelectuais que

juntos ofereceram excelente contribuiccedilatildeo para o aperfeiccediloamento da poliacutetica fiscal na perspectiva da

cidadania e dignidade humana Entre os conferencistas que participaram dos debates destacam-se

John Christensen (Tax Justice Network) Martin Soares (Universiteacute Lumiegravere Lyon 2) Ladislau Dowbor

(PUC-SP) Marciano Buffon (Unisinos) Carlos Alberto Barreto (Receita Federal) entre outros

Ao todo 500 vagas foram disponibilizadas para os mais diversos puacuteblicos profissionais ligados

a entidades de classe universidades imprensa oacutergatildeos puacuteblicos professores e cidadatildeos interessados

em participar da discussatildeo acerca da cidadania fiscal Para garantir maior acesso inclusive para aqueles

que natildeo puderam estar presentes o evento foi veiculado ao vivo pela internet

Ao final do Congresso o auditor da Receita Federal do Brasil Alberto Amadei veiculou docu-

mento intitulado ldquoCarta de Fortalezardquo traccedilando resultados essenciais que a experiecircncia do Cief trouxe

para o debate das poliacuteticas tributaacuterias e sociais

Na carta ele destaca ldquoO CIEF-2012 realccedilou a perspectiva de um novo rumo agrave atuaccedilatildeo estatal

e consolidou importantes conclusotildees sobre as poliacuteticas tributaacuterias e sociais contingentes bem como

seus impactos distributivos diretos e indiretosrdquo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

419

Sem duacutevida o debate realizado neste Congresso teve papel essencial para a valorizaccedilatildeo da

educaccedilatildeo fiscal e ampliaccedilatildeo da discussatildeo em torno das ideias de justiccedila fiscal e cidadania

Por outro lado a Secretaria Municipal de Financcedilas tambeacutem teve a oportunidade de apresentar

em niacutevel internacional as accedilotildees realizadas por Fortaleza na construccedilatildeo de uma sociedade mais justa e

participativa

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Entre os anos de 2006 a 2012 a Prefeitura de Fortaleza por intermeacutedio da Secretaria Municipal

de Financcedilas desempenhou relevante papel na disseminaccedilatildeo da educaccedilatildeo fiscal e no estiacutemulo ao exer-

ciacutecio pleno da cidadania em diversas instacircncias da sociedade

Neste periacuteodo vaacuterias accedilotildees e instrumentos didaacuteticos que facilitam a compreensatildeo acerca da

importacircncia das financcedilas puacuteblicas e estimulam a relaccedilatildeo harmoniosa entre o Poder Puacuteblico e os cida-

datildeos foram desenvolvidos pelo governo municipal Entre eles o Precircmio Sefin de Financcedilas Municipais

que incentiva a produccedilatildeo de pesquisas acadecircmicas nas aacutereas de Tributaccedilatildeo Auditoria Economia Con-

tabilidade Direito e Tecnologia da Informaccedilatildeo voltadas para a administraccedilatildeo puacuteblica municipal reco-

nhece o trabalho da imprensa na abordagem das financcedilas puacuteblicas do Municiacutepio e ainda o estimula

a educaccedilatildeo fiscal na escola entre alunos das redes puacuteblica e privada de ensino

Sem duacutevida o trabalho desenvolvido em Fortaleza ganhou consistecircncia e insurgiu ao longo dos

anos entre os municiacutepios brasileiros Especialmente apoacutes a aprovaccedilatildeo da Lei n 98252011 que insti-

tucionalizou o Programa de Educaccedilatildeo Fiscal de Fortaleza a cidade conseguiu transformar educaccedilatildeo

fiscal em uma poliacutetica puacuteblica com recursos garantidos no orccedilamento municipal

Desta forma compreendemos que por meio da educaccedilatildeo fiscal a Secretaria Municipal de Fi-

nanccedilas cumpriu o compromisso que aliaacutes eacute funccedilatildeo do Poder Puacuteblico de garantir os direitos de ci-

dadania e estimular a relaccedilatildeo participativa entre o cidadatildeo e o governo municipal Assim a secretaria

compreendeu a importacircncia da conscientizaccedilatildeo acerca da funccedilatildeo socioeconocircmica dos tributos inclu-

sive na manutenccedilatildeo e desenvolvimento de poliacuteticas puacuteblicas ofertadas diretamente aos cidadatildeos

O exemplo deixado pela Secretaria Municipal de Financcedilas de Fortaleza no periacuteodo destacado

neste artigo mostrou o quanto eacute importante a busca pela inovaccedilatildeo e criatividade nos processos de

formaccedilatildeo que compreendem um tema tatildeo aacuterido

Sendo assim acreditamos que tais accedilotildees ficam registradas como um verdadeiro legado de cida-

dania que precisa ser compreendido como uma poliacutetica puacuteblica de Estado Portanto deve ser exigida

pela sociedade como direito adquirido que (de fato) eacute

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

420

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EDUCACcedilAtildeO FISCAL ldquoSEFAZrdquo NA CIDADE CONSTITUCIONAL

SUMAacuteRIO Introduccedilatildeo 1 A educaccedilatildeo fiscal no contexto da Ameacuterica Latina 2 Educaccedilatildeo fiscal no Cearaacute 3 A educaccedilatildeo fiscal como Programa e o proje-to de ensinagem 4 A educaccedilatildeo para a autonomia e o espaccedilo escolar 5 Um Programa que prepara para a cidadania 6 Fundamentos para uma educaccedilatildeo fiscal 7 Valores e missatildeo da educaccedilatildeo fiscal e do PNEF 8 Diretrizes do PNEF 9 Objetivos e abrangecircncia do PNEF 10 O espaccedilo pedagoacutegico e a vinculaccedilatildeo ao programa ldquoA Cidade Constitucionalrdquo como estudo de caso Consideraccedilotildees finais Referecircncias

Marcelo Arno Nerling1

RESUMO Educaccedilatildeo fiscal e ensino superior desafios e perspectivas Educaccedilatildeo formal fiscal desenvol-

vimento da personalidade e preparo para a cidadania na lsquocidade constitucionalrsquo Educaccedilatildeo fiscal do

global ao local O Estado do Cearaacute-CE referecircncia nacional de educaccedilatildeo fiscal Diretrizes curriculares

ensino pesquisa e extensatildeo promotoras da cultura de participaccedilatildeo Autonomia do sujeito adulto pela

educaccedilatildeo continuada e superior Perspectivas positivas na aproximaccedilatildeo da administraccedilatildeo tributaacuteria

com o ensino superior e de adultos

PALAVRAS-CHAVE Preparo da cidadania Educaccedilatildeo fiscal Educaccedilatildeo formal e continuada para adultos Orccedilamento

receita e despesa puacuteblica Programas e metas Inovaccedilatildeo na ensinagem superior

INTRODUCcedilAtildeO Escrevemos este Artigo para comemorar os 15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal da Secre-

taria da Fazenda do Estado do Cearaacute (Sefaz) A histoacuteria da educaccedilatildeo fiscal desenvolvida ao longo desse

periacuteodo pela Sefaz se funde e se confunde positivamente com os fundamentos princiacutepios e diretrizes

da educaccedilatildeo fiscal no Brasil contidos no Programa que sustenta essas iniciativas PNEF

Do geral ao particular nossa ecircnfase destaca os estudos eurocecircntricos e latinoamericanos sobre

1 Bacharel em Ciecircncias Juriacutedicas e Sociais (Unijuiacute) especialista em Pedagogia Universitaacuteria (USP) mestre em Instituiccedilotildees Juriacutedico Poliacuteticas (UFSC) e doutor em Direito do Estado (PUC-SP) Tendo a ciecircncia por vocaccedilatildeo emprega metodologias ativas e flexibilidade na ensinagem formal e continuada Atua na graduaccedilatildeo no Curso de Gestatildeo de Poliacuteticas Puacuteblicas e na poacutes-graduaccedilatildeo no Programa Interdisciplinar em Humanidades Direitos e Outras Legitimidades na Universidade de Satildeo Paulo (USP) Operador do direito na gestatildeo de poliacuteticas puacuteblicas busca resultados quantitativos e qualitativos em progra-mas projetos atividades e accedilotildees puacuteblicas Inovador e ativista defende meacutetodos de planejamento participativo no setor puacuteblico estatal e natildeo estatal - terceiro setor Pesquisa orienta implementa e avalia temas relativos agrave reforma do Estado E-mail mnerlinguspbr

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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o tema Aprofundamos os fundamentos e princiacutepios da educaccedilatildeo fiscal e mostraremos as possibilida-

des de inovaccedilatildeo nos resultados das experiecircncias empiacutericas aliadas pelo conhecimento e compreensatildeo

agraves diretrizes objetivos missatildeo visatildeo e valores da educaccedilatildeo fiscal

Pendem duacutevidas sobre a compatibilidade das diretrizes da educaccedilatildeo fiscal com as diretrizes do

ensino superior brasileiro Com isto a inovaccedilatildeo fica freada e a universidade natildeo responde aos desafios

do ensino superior formal Superamos o problema pela apresentaccedilatildeo de uma hipoacutetese que eacute a priori

negativa ou seja haacute plena compatibilidade entre as diretrizes e princiacutepios do ensino superior com a

educaccedilatildeo fiscal bastando encontrar pessoas na administraccedilatildeo tributaacuteria e educacional dispostas e em-

preender em nome da coesatildeo social por meio da educaccedilatildeo fiscal Vamos apresentar aquiacute o conteuacutedo

programaacutetico de uma disciplina de graduaccedilatildeo e projeto de extensatildeo da Universidade de Satildeo Paulo

ministrada em Brasiacutelia - DF que convencionamos chamar ldquoA cidade constitucional Capital da Repuacutebli-

cardquo Eacute uma disciplina de graduaccedilatildeo muito concorrida na Universidade e que tem na educaccedilatildeo fiscal um

tema transversal e tambeacutem especiacutefico e compotildee a estrutura curricular do Projeto Poliacutetico Pedagoacutegico

do Curso de Gestatildeo de Poliacuteticas Puacuteblicas da Escola de Artes Ciecircncias e Humanidades da USP

A motivaccedilatildeo deste Capiacutetulo eacute ajudar a conhecer e compreender este problema A edu-

caccedilatildeo fiscal se ajusta a metodologias inovadoras de ensinagem no ensino superior brasileiro

Nossa hipoacutetese eacute positiva ou seja acreditamos a priori que eacute possiacutevel aproximar as ideias pre-

cursoras lanccediladas pela Sefaz-CE unindo histoacuteria e tempo presente para fortalecer as amarras

do futuro com as ideias da cidade constitucional

Este Capiacutetulo aprende e na medida que aprende ensina sobre o estado da arte da educaccedilatildeo

fiscal na Ameacuterica Latina no Brasil com destaque para o Cearaacute ndash CE estado federado brasileiro que no

exerciacutecio da autonomia administrativo financeira implementa com resultados positivos e visibilidade a

sua poliacutetica puacuteblica de educaccedilatildeo fiscal

Eacute regra geral que o preparo e o exerciacutecio da cidadania eacute base para a construccedilatildeo de uma socie-

dade democraacutetica com igualdade e justiccedila A sociedade civil e o Estado devem trabalhar para a cons-

truccedilatildeo dessa sociedade com base nos princiacutepios constitucionais

O exerciacutecio da cidadania pressupotildee uma educaccedilatildeo para a cidadania Eacute o conhecimento e a

compreensatildeo dos fatos pelas lentes dos valores e do direito que permitem reconhecer novas e ino-

vadoras legitimidades que precisam ser conhecidas e compreendidas para que a sociedade avance

no compasso do tempo

O preparo para a cidadania eacute um dever da universidade brasileira do ensino superior brasileiro

sem eximir o ensino fundamental e meacutedio O artigo 205 da CF estabelece que a educaccedilatildeo direito de

todos e dever do Estado e da famiacutelia seraacute promovida e incentivada com a colaboraccedilatildeo da sociedade

visando ao pleno desenvolvimento da pessoa seu preparo para o exerciacutecio da cidadania e sua qualifi-

caccedilatildeo para o trabalho O pleno desenvolvimento da pessoa e o preparo para o exerciacutecio da cidadania

devem ser promovidos incentivados ldquocom a colaboraccedilatildeo da sociedaderdquo e com controle social

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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O que significa preparar para o exerciacutecio da cidadania Como e com que conteuacutedo preparamos

este exerciacutecio Tributos e financcedilas pessoais e puacuteblicas satildeo levadas em consideraccedilatildeo nos projetos poliacute-

tico-pedagoacutegicos e planos de atividades das disciplinas de graduaccedilatildeo Como preparar contribuintes e

servidores por meio da educaccedilatildeo fiscal nos conteuacutedos nos projetos poliacutetico-pedagoacutegicos nos proje-

tos de desenvolvimento institucional do ensino superior

Natildeo temos pretensatildeo de resolver todos estes problemas mas natildeo os desprezamos porque nos

servem de guia como meacutetodo Vejamos como a educaccedilatildeo fiscal serve ao preparo da cidadania Alinhar

a educaccedilatildeo fiscal a um projeto educacional para a autonomia dentro ou aleacutem do espaccedilo escolar com

a transmissatildeo criacutetica de valores missatildeo diretrizes objetivos e abrangecircncias satildeo capazes de avivar o

espaccedilo pedagoacutegico e a cidade constitucional em cada um de noacutes Se eacute verdade vejamos

1 A EDUCACcedilAtildeO FISCAL NO CONTEXTO DA AMEacuteRICA LATINA

A educaccedilatildeo fiscal eacute um tema que compotildee a agenda governamental do nosso tempo Eacute tema

atual ainda que o trabalho sistematizado e material dedicado ao tema tenha se iniciado no Peru

(1993) no Brasil (1996) no Meacutexico (1997) e na Argentina (1998) eacute depois de 2005 que o tema se am-

plia de forma significativa esperando alcanccedilar continuidade para aleacutem de programas fundamentais

fruto da cooperaccedilatildeo (RIVILLAS VELARDEBOacute 2010)

No geral a educaccedilatildeo fiscal eacute um tema bastante movediccedilo ldquocon el que los docentes por lo ge-neral no estaacuten familiarizados y que puede resultarles muy aacuteridordquo (RIVILLAS VELARDEBOacute 2010)

Uma formaccedilatildeo especiacutefica e a colaboraccedilatildeo de material didaacutetico complementar que serve de

orientaccedilatildeo didaacutetica para articulaccedilatildeo com os planos de trabalho e projetos poliacutetico-pedagoacutegicos dos

cursos de graduaccedilatildeo satildeo indispensaacuteveis

O desenvolvimento de moacutedulos especiacuteficos para docentes e caderno de atividade para alunos eacute

estimulado devendo ser articulado para integraccedilatildeo de conteuacutedos formais das mateacuterias que integram

a estrutura curricular dos cursos de graduaccedilatildeo no Brasil

A composiccedilatildeo de unidades de textos formais satildeo elaborados pelo Ministeacuterio da Educaccedilatildeo e as

secretarias estaduais e municipais da mesma forma Esses materiais se avaliados pelo oacutergatildeo ministe-

rial competente podem ser financiados pelas proacuteprias administraccedilotildees fiscais Eacute necessaacuterio ficar atento

para o fato de que vertiginosas mudanccedilas na tecnologia da informaccedilatildeo comunicaccedilatildeo e avaliaccedilatildeo da

preferecircncia dos jovens tecircm obrigado a repensar as estrateacutegias didaacuteticas ldquopara reduzir la brecha entre el mundo fuera de la escuela y la ensentildeanza tradicionalrdquo (RIVILLAS VELARDEBOacute 2010)

Portanto haacute uma estrateacutegia educativa da administraccedilatildeo tributaacuteria que atinge a organizaccedilatildeo da

estrutura social da sociedade buscando dialogar com ela sobre a tomada de decisatildeo relativos aos re-

cursos ndash escassos ou abundantes ndash sobre a fonte para obter esses recursos ou sobre a aplicaccedilatildeo desses

recursos transformados em poliacuteticas puacuteblicas

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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Eacute preciso tocar nos valores culturais que regem as sociedades latino-americanas

Todas las leyes tributarias y las planificaciones financieras concebidas en la mesa de despacho son esteacuteriles si no se presta la debida atencioacuten a las ideas actitudes moti-vaciones y formas de comportamiento de los poderes puacuteblicos y de los ciudadanos a su moral personal y colectiva a su grado de cohesioacuten o de antagonismo y a sus ideas maacutes o menos compartidas sobre el modo de organizar la convivencia ciacutevica (GARCIacuteA LOBO 2010 p 3)

Eacute preciso prestar atenccedilatildeo agraves ideias diretrizes atitudes motivaccedilotildees e formas de comportamento

do poder puacuteblico e do cidadatildeo recarregando de sentidos e permeando o senso comum com valores

que sirvam ao desenvolvimento da personalidade e ao preparo para a cidadania e elevado grau de

coesatildeo social sobre a forma e modos de organizar a convivecircncia ciacutevica

Na medida em que as teacutecnicas juriacutedicas e econocircmicas se potildeem a serviccedilo das ideias sociopoliacuteticas

[] as decisotildees fiscais como expressas nas partidas das receitas e despesas do Orccedila-mento puacuteblico constituem um dos melhores indicadores de quais satildeo as metas e as prioridades de um Estado Portanto o espelho fiscal eacute um espelho social em sentido amplo natildeo soacute reflete estruturas poliacuteticas e econocircmicas Tambeacutem reflete metas fins valores atitudes e condutas que satildeo por sua vez causa e consequencia daquelas es-truturas Eacute possiacutevel que no plano das ideacuteias se assumam valores morais que datildeo lugar a formulaccedilatildeo de metas desejadas pela maioria do corpo social de um paiacutes (GARCIacuteA LOBO 2010 p 3)

A assunccedilatildeo de valores morais por servidores e cidadatildeos dependem portanto de uma certa

consciencia ciacutevica que natildeo eacute algo natural mas sim um produto social resultante da educaccedilatildeo portanto

requer processos educativos ldquocuja maior ou menor aceleraccedilatildeo depende da vontade de quem deseja

impulsiona-losrdquo (GARCIacuteA LOBO 2010 p 4)

Como destacamos a universidade brasileira pelo que formalmente estabelece a Constituiccedilatildeo

tem a obrigaccedilatildeo de impulsionar esta consciencia ciacutevica Na medida em que o individuo tenha sido

preparado para seu papel de cidadatildeo natildeo necessita de excessiva pressatildeo coativa externa para cumprir

obrigaccedilotildees sociais porque ldquoao haver interiorizado eacute capaz de compreender que os direitos e as obri-

gaccedilotildees que este papel comporta e ajustar sua conduta de maneira espontanea agraves expectativas que se

tem delerdquo como individuo e cidadatildeo (GARCIacuteA LOBO 2010 p 5)

A modificaccedilatildeo de atitudes fiscais de cidadatildeos adultos bem como de crianccedilas e jovens deve

ter em conta que as intervenccedilotildees pela via do sistema educacional satildeo lentas devem ser meditadas e

constantes se pretendem efetividade e continuidade nesta aproximaccedilatildeo entre o ensino superior e a

administraccedilatildeo tributaacuteria Entatildeo natildeo custa recordar

Por esta razatildeo definidos os objetivos do projeto educativo a administraccedilatildeo tributaacuteria natildeo pode ser nem arrogante nem apressada Sem perder o controle deve ceder parte do protagonismo aos profissionais da administraccedilatildeo educacional Eles conhecem seu

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oficio como noacutes o nosso portanto eacute preciso delegar aspectos teacutecnicos mantendo para os profissionais da administraccedilatildeo tributaacuteria o papel de impulso seguimento e controle do processo em todas as fases (GARCIacuteA LOBO 2010 p 9)

Portanto a educaccedilatildeo fiscal eacute uma estrateacutegia global para a formaccedilatildeo de uma cultura fiscal ldquoba-

seada em um conjunto de valores que inspirem e orientem a conduta fiscal de cidadatildeos livres ativos

e responsaacuteveis que desejam viver em uma sociedade cohesionada onde se compartilham tanto as

metas coletivas como os meios necessaacuterios para lograr tais metasrdquo (GARCIacuteA LOBO 2010 p 10)

O princiacutepio da solidariedade institucional eacute apontado como sendo a base da alianccedila entre o

sistema fiscal e o sistema educacional A educaccedilatildeo ciacutevico tributaacuteria eacute uma poliacutetica puacuteblica de duraccedilatildeo

continuada e serve para o Estado fomentar a cidadania participativa e consciente de direitos e deveres

por meio de processos de ensino e aprendizagem de ensinagem baseada na formaccedilatildeo de valores na

construccedilatildeo da cidadania e da cultura fiscal eacute tarefa do presente (ANASTASIOU ALVES 2009)

A alianccedila entre o sistema tributaacuterio com o sistema educacional pressupotildee que a administraccedilatildeo

tributaacuteria eacute peccedila chave e natildeo conveacutem que perca o controle sobre uma atividade que tambeacutem tem uma

funccedilatildeo de comunicaccedilatildeo institucional interna e externa

Porque se a educaccedilatildeo fiscal proporciona ao sistema educativo muacuteltiplas oportunida-des formativas e informativas muito uacuteteis para seus fins e objetivos tambeacutem a ativi-dade educativa proporciona ao sistema fiscal muacuteltiplas oportunidades de reflexatildeo Eacute eacute sabido que natildeo haacute nada como a reflexatildeo para encontrar vias de melhorar e renovar as proacuteprias atuaccedilotildees agraves vezes insuspeitas ainda que claras e evidentes para os alheios agrave dita instituiccedilatildeordquo (GARCIacuteA LOBO 2010 p 13)

A comunicaccedilatildeo pela administraccedilatildeo tributaacuteria sobre objetivos ideacuteias e iniciativas que precisam

ser interpretadas e devolvidas de forma operativa eacute fundamental nesta alianccedila entre o sistema tributaacute-

rio e o sistema educacional e deve ter em conta a definiccedilatildeo clara dos objetivos do projeto educativo e

a gestatildeo dos ritmos tradicionalmente distintos da academia e da administraccedilatildeo tributaacuteria

A administraccedilatildeo tributaacuteria deve ter em mente que a assunccedilatildeo de responsabilidade educativa

nova por parte do docente supotildee ganhos e natildeo perdas ao docente que deve contar com um orccedilamen-

to uma estrutura administrativa dentro da administraccedilatildeo tributaacuteria que enlace apoie e colabore com

a estrutura administrativa educacional

A alianccedila entre a administraccedilatildeo educacional e tributaacuteria deve proporcionar oportunidades di-

daacuteticas certas e variadas dentro do curriacuteculo escolar contando com material didaacutetico e com recursos

humanos suficientes e consensualizados com um sistema de recompensas que podem ser materiais

ou pelo menos simboacutelica para os docentes Nesta alianccedila a previsatildeo de um sistema de avaliaccedilatildeo con-

tinuada da accedilatildeo e dos recursos que proporcione seguranccedila e credibilidade a todos atores implicados

no processo ante si ante aos destinataacuterios do programa e ante a hierarquia administrativa

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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Eacute importante enfatizar a lentidatildeo mediaccedilatildeo e constancia para que a intervenccedilatildeo seja efetiva

porque a interrupccedilatildeo significa retrocesso porque se perde a rede os equipamentos e oportunidades

Aleacutem disso definidos os objetivos do projeto educacional cabe a administraccedilatildeo tributaacuteria sem perder

o controle ceder parte do protagonismo aos profissionais da administraccedilatildeo educacional delegando

aspectos teacutecnicos e se reservando o papel de impulso acompanhamento da implementaccedilatildeo e apoio

ao processo em todas as suas fases A soberania e as caracteriacutesticas do sistema educacional de cada

paiacutes e de cada circunstacircncia devem ser respeitadas

A tiacutetulo indicativo a recomendaccedilatildeo eacute pela formalizaccedilatildeo de um termo de colaboraccedilatildeo como

marco juriacutedico e orccedilamentaacuterio para implementar o projeto com a constituiccedilatildeo de um grupo misto

de trabalho educacional-tributaacuterio com representaccedilatildeo partidaacuteria de expertos A revisatildeo do projeto

poliacutetico0pedagoacutegico e das estruturas curriculares para encontrar o lugar ideal da educaccedilatildeo fiscal

dentro dele e do desenvolvimento do desenho didaacutetico com grupos de professores de diferentes

instituiccedilotildees e definiccedilatildeo das necessidades de formaccedilatildeo do professorado e do material didaacutetico neces-

saacuterio e pertinente para a educaccedilatildeo fiscal e o seu sistema de avaliaccedilatildeo Os professores precisam as-

sim como os servidores educaccedilatildeo continuada e redes de capacitaccedilatildeo permanente (GARCIacuteA LOBO

2010 p 13)

Desde o claacutessico ldquoUnderstanding Taxesrdquo norteamericano de 1954 passando pela Europa a edu-

caccedilatildeo fiscal na Ameacuterica Latina tambeacutem eacute um tema da agenda puacuteblica Apesar da complexidade do

fenomeno fiscal no contexto latinoamericano ldquomelhorou a comunicaccedilatildeo com o cidadatildeo para tentar

conhecer as suas necessidades e brindar-lhe um serviccedilo melhor e atenccedilatildeo para facilitar que cumpra

suas obrigaccedilotildees fiscais o que requer ferramentas pedagoacutegicas especiacuteficas proacuteprias das praacuteticas e

estrateacutegias da administraccedilatildeo educacional para que tenhamos tambeacutem um conteuacutedo atitudinal de

responsabilidade e compromisso com o bem comum por meio da formaccedilatildeo sobre valores princiacutepios

normas e atitudes que esperamos na vida democraacutetica

ldquoO ensino da cidadania eacute chave na hora de compreender a cultura fiscal de um paiacutes eacute impor-

tante que se relacionem direitos e deveres dos cidadatildeos na construccedilatildeo da democraciardquo A cultura fiscal

2 ldquoNo seminaacuterio do Conselho Nacional de Politica Fazendaria (Confaz) a respeito da ldquoAdministraccedilatildeo Tributariardquo realizado na cidade de Fortaleza ndash CE em maio de 1996 foi inserido o tema Educaccedilatildeo Tributaacuteria Nas conclusotildees constou como item de destaque a introduccedilatildeo do ensino nas escolas do programa de consciecircncia tributaacuteria Em setembro desse ano celebrou-se o Convecircnio de Cooperaccedilatildeo Teacutecnica entre a Uniatildeo os Estados e o Distrito Federal No anexo ao texto do acordo entre as inuacutemeras atividades de cooperaccedilatildeo constou a elaboraccedilatildeo e a implementaccedilatildeo de um programa nacional permanente de conscientizaccedilatildeo tributaacuteria para ser desenvolvido nas unidades da Federaccedilatildeo Em reuniatildeo de julho de 1997 o Confaz apro-vou a criaccedilatildeo do Grupo de Trabalho de Educaccedilatildeo Tributaacuteria (GET) constituido por representantes do Ministeacuterio da Fazenda (Gabinete do Ministro Secretaria da Receita Federal Escola de Administraccedilatildeo Fazendaacuteria ndash Esaf) das Secretarias de Fazen-da Financcedilas ou Tributaccedilatildeo dos Estados e do Distrito Federal A Portaria n 35 de 27 de fevereiro de 1998 do Ministeacuterio da Fazenda que oficializou o grupo de trabalho formulou como seus objetivos promover e coordenar as accedilotildees necessaacuterias agrave elaboraccedilatildeo e a implementaccedilatildeo de um programa nacional permanente de educaccedilatildeo tributaacuteria e acompanhar as atividades do Grupo de Educaccedilatildeo Tributaacuteria nos Estados ndash GETE Em marccedilo de 1999 passaram a integrar o grupo representantes da Secretaria do Tesouro Nacional e do Ministeacuterio da Educaccedilatildeo Em julho do mesmo ano tendo em vista a abrangencia do

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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se soma agrave formaccedilatildeo eacutetica e cidadatilde consciente da funccedilatildeo social dos tributos da importancia da trans-

parencia e da gestatildeo adequada do gasto puacuteblico

Na Ameacuterica Latina os grupos que receberam maior atenccedilatildeo foram os estudantes do ensino

fundamental e meacutedio No Brasil destacam-se o Observatoacuterio Social de Maringaacute o Programa Nacional

de Educaccedilatildeo Fiscal e o Curso de ldquoEducaccedilatildeo Fiscal e Cidadaniardquo realizado no marco do Programa de

Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

Desloquemos a nossa atenccedilatildeo para o Estado do Cearaacute para ver como estes princiacutepios ateacute agora

vistos vatildeo se materializando

2 EDUCACcedilAtildeO FISCAL NO CEARAacute

O Estado do Cearaacute liacuteder brasileiro na arte da educaccedilatildeo fiscal2 - este E-book comemora os 15

anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal (PEF) - conscientiza os cidadatildeos sobre o papel econocircmico e

social dos tributos ldquoEconocircmico quando se volta agrave funccedilatildeo de otimizaccedilatildeo da receita puacuteblica social

quando se volta para aplicaccedilatildeo desses recursos objetivando beneficiar a populaccedilatildeordquo (MOTA 2007)

Respeitar esses princiacutepios significa tambeacutem aplicar corretamente os recursos arrecadados

Ao descrevermos exemplos da poliacutetica de educaccedilatildeo fiscal como no Estado do Cearaacute percebe-

mos que ela se fundamenta no Tiacutetulo I da Constituiccedilatildeo Federal do Brasil nos princiacutepios fundamentais

da Repuacuteblica a soberania a cidadania a dignidade da pessoa humana os valores sociais do trabalho

e da livre iniciativa e o pluralismo poliacutetico

A Sefaz trabalha com a ideia de ldquoinformaccedilatildeo e conhecimento para a cidadaniardquo e assim ajuda

positivamente a concretizar a nossa Constituiccedilatildeo preparando para o exerciacutecio da cidadania Esta cul-

tura pode colaborar de forma positiva para a superaccedilatildeo da resistecircncia do brasileiro ao fisco ao dever

de pagar tributos

Segundo Luiza Mota (2007) o tema da educaccedilatildeo fiscal tem circulado nas escolas e nas cam-

panhas educativas junto agrave sociedade chamando atenccedilatildeo para o cumprimento das obrigaccedilotildees fiscais

pelos cidadatildeos contribuintes com resultados positivos poreacutem ldquoa inserccedilatildeo do tema tributaacuterio na vida

profissional dos funcionaacuterios puacuteblicos em especial dos servidores dos fiscos nos curriacuteculos escolares

de algumas disciplinas e no dia a dia das empresas das entidades de classe e associaccedilotildeesrdquo natildeo tem

conseguido formar a maioria da opiniatildeo social ldquopara romper com a premissa defesa dos sonegadores

de impostos e criacutetica ao papel arrecadador do Estadordquo

programa que natildeo se restringe apenas aos tributos mas que aborda tambeacutem as questotildees da alocaccedilatildeo dos recursos puacutebli-cos e da sua gestatildeo o Confaz aprovou a alteraccedilatildeo de sua denominaccedilatildeo que passou a ser Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal ndash PNEF Assim o Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal surgiu dessa relaccedilatildeo histoacuterica buscando a harmonia entre Estado e sociedade a partir do entendimento da necessidade do financiamento da coisa publica pois sem dinheiro natildeo haacute como se prestar serviccedilos puacuteblicos Por outro lado o Programa instrumentaliza a sociedade acerca dos meiosmecanismos disponiacuteveis para acompanhar a aplicaccedilatildeo dos recursos arrecadados favorecendo o exerciacutecio efetivo da cidadaniardquo BRASIL 2009 p 27 SILVA MOTA MACHADO 2010 p 170-182

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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A ausecircncia do tema tributaacuterio ndash receita e despesa ndash na vida profissional de servidores e nos cur-

riacuteculos escolares eacute fato O ensino formal presencial semi presencial virtual continuado deve assumir

a sua parcela republicana e difundir conhecimento sobre o papel do fisco e sobre o papel dos toma-

dores de decisatildeo da despesa puacuteblica O ensino superior pode ter um papel proeminente na difusatildeo

dessas teses e na habilitaccedilatildeo para esta praacutetica profissionalizante

A inserccedilatildeo do tema tributaacuterio e financeiro nos curriacuteculos e disciplinas eacute fundamental para o de-

senvolvimento da livre iniciativa e para a inserccedilatildeo soberana do Brasil no mundo globalizado

A inserccedilatildeo do tema tributaacuterio e financeiro nos projeto poliacutetico pedagoacutegico e nos curriacuteculos e

disciplinas da graduaccedilatildeo e poacutes graduaccedilatildeo eacute fundamental para o preparo da cidadania Se entendemos

a educaccedilatildeo fiscal como um processo de inserccedilatildeo de valores na sociedade com o retorno de longo

prazo teremos colaborado para a formaccedilatildeo de cidadatildeos ldquoconscientes do seu dever de cumprimento

das obrigaccedilotildees fiscais e do seu direito ao exerciacutecio da cidadania mediante a cobranccedila da coerente

destinaccedilatildeo dos recursos provenientes dos tributos arrecadados pelo Estadordquo

Portanto eacute voz no Cearaacute e eacute voz no Brasil demanda para ldquoformaccedilatildeordquo e preparo para a cidada-

nia O ensino formal natildeo deve se furtar ao debate e praacutexis ldquoAs pessoas necessitam de informaccedilotildees

para conhecer melhor o trabalho dos que arrecadam e aplicam recursos no fornecimento dos serviccedilos

puacuteblicosrdquo Como bem dito ldquoa educaccedilatildeo fiscal deve caminhar nesse sentido informar para que todos

conheccedilam educar para que todos pratiquemrdquo O Estado aleacutem de fornecer condiccedilotildees sociais baacutesicas

deve ser provedor de informaccedilotildees e valores promotor do preparo para o exerciacutecio da cidadania por

cada membro da sociedade um a um e natildeo na potecircncia do Estado

3 A EDUCACcedilAtildeO FISCAL COMO PROGRAMA E PROJETO DE ENSINAGEM

A educaccedilatildeo fiscal se insere em um amplo projeto educativo que objetiva o bem-estar social re-

sultante da consciencia cidadatilde e da construccedilatildeo criacutetica de conhecimentos especiacuteficos sobre os direitos

e deveres do cidadatildeo para efetivaccedilatildeo do princiacutepio constitucional da dignidade humana (BRASIL 2009)

Esses conceitos alicerccedilam uma educaccedilatildeo capaz de contribuir para a construccedilatildeo da cidadania pautada

pela solidariedade eacutetica transparencia e responsabilidade fiscal e social onde o ser humano eacute ldquoante-

riorrdquo ao Estado contemplando reflexotildees sobre o crescimento economico a distribuiccedilatildeo de renda e a

relaccedilatildeo homem-natureza no desenvolvimento dos paiacuteses (BRASIL 2009 p 1)

A educaccedilatildeo eacute um fenocircmeno social e repercute no espaccedilo social e cultural Educar para a auto-

nomia para a participaccedilatildeo e para o controle social significa preparar para a cidadania

Este conhecimento requer a compreensatildeo dos valores diretrizes e missatildeo do Programa de Edu-

caccedilatildeo Fiscal No presente estudo interessa aprofundar o tema das possibilidades de inserccedilatildeo na edu-

caccedilatildeo particularmente na educaccedilatildeo superior O preparo da cidadania no contexto do ensino formal

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

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superior assim chamado requer uma escola uma faculdade um centro uma universidade em sintonia

com o seu tempo de projetos pedagoacutegicos e institucionais Alternativas de gestatildeo democraacutetica e de

inserccedilatildeo curricular das temaacuteticas da educaccedilatildeo fiscal nas disciplinas da graduaccedilatildeo e poacutes-graduaccedilatildeo no

Brasil que trabalhe na perspectiva da ampliaccedilatildeo do bem estar social fortalecimento da cidadania e

construccedilatildeo criacutetica de conhecimentos sobre direitos e deveres proacuteprios do conceito de cidadatildeo huma-

namente digno satildeo temas da modernidade latino-americana

4 A EDUCACcedilAtildeO PARA A AUTONOMIA E O ESPACcedilO ESCOLAR

A escola eacute um espaccedilo social para aprender ldquoa conviver a ser a fazer a conhecer e a propiciar

a troca a imaginaccedilatildeo a interaccedilatildeo a investigaccedilatildeo e a partilhardquo O processo de aprendizagem tambeacutem

envolve a construccedilatildeo de conteuacutedos dividindo e reconhecendo o conhecimento em diversas aacutereas do

conhecimento

O estudante aprende a aprender exercitando suas compreensotildees e habilidades Aprender a

fazer requer competencias que propiciem ao individuo enfrentar situaccedilotildees e problemas sociais e

de trabalho

A educaccedilatildeo fiscal no contexto social seja no trabalho na famiacutelia eou na comunidade implicam

a descoberta do outro e o exerciacutecio do respeito ldquoToda essa relaccedilatildeo interpessoal conduz o sujeito a

sua descoberta interior como um ser total sensiacutevel inteligente autonomo e capaz de formular seus

proacuteprios juiacutezos de valor de forma criacutetica Isso eacute aprender a serrdquo

O real valor da imaginaccedilatildeo das praacuteticas luacutedicas do multiculturalismo e das muacuteltiplas lingua-

gens requer saber pensar de forma autonoma ldquoeacute saber pensar e eacute sobretudo saber intervirrdquo As

formas de organizaccedilatildeo do conhecimento escolar estaacute diante de um desafio teacutecnico e requer pro-

cedimento metodoloacutegico que incorpore o ser humano o individuo o cidadatildeo Resolver a questatildeo

fundamental da educaccedilatildeo de hoje pode significar orientaccedilatildeo ldquopara as transformaccedilotildees e promoccedilatildeo

da inclusatildeo socialrdquo (BRASIL 2009)

Uma educaccedilatildeo que prepara para a cidadania deve refletir diretamente na vida das pessoas e das

instituiccedilotildees da sociedade pois leva ao conhecimento dos princiacutepios que fundamentam as praticas so-

ciais estas dependentes da educaccedilatildeo fiscal no contexto social da democracia ldquoreafirmando os valores

culturais e artiacutesticos sejam eles locais regionais ou nacionais e possibilitando o resgate da dignidade

humana por meio de novos saberesrdquo

As Diretrizes Curriculares Nacionais (BRASIL 1996) para a educaccedilatildeo baacutesica e superior vigentes

apontam para variedades curriculares condicionadas apenas as accedilotildees pedagoacutegicas pelo princiacutepio eacuteti-

co ndash da autonomia da responsabilidade da solidariedade e do respeito ao bem comum pelo princiacutepio

esteacutetico ndash da sensibilidade da criatividade e da diversidade de manifestaccedilotildees artiacutesticas e culturais e

pelo princiacutepio poliacutetico ndash dos direitos e deveres de cidadania do exerciacutecio da criticidade e do respeito a

ordem democraacutetica

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

430

Eacute interessante observar que no momento em que o professor se conscientizar de que tambeacutem

eacute um sujeito critico e participativo do processo educativo iraacute buscar capacitaccedilatildeo e em contrapartida

ldquoseraacute um sujeito mais exigente no que se refere ao apoio da instituiccedilatildeo e do Estadordquo Eacute no espaccedilo da

educaccedilatildeo que natildeo se resume ao espaccedilo escolar que se deve viver a democracia seguindo princiacutepios

eacutetico esteacutetico e poliacutetico na educaccedilatildeo formamos haacutebitos e atitudes individuais e coletivas ldquoestimulan-

do crianccedilas jovens e adultos a participarem de movimentos sociais que buscam uma vida mais justa e

solidaacuteria para o resgate da dignidade humanardquo

Convivendo com essa praacutetica educativa e privilegiando os referidos princiacutepios a educaccedilatildeo fiscal

ajuda no preparo para a cidadania e para o seu exerciacutecio ldquosensibilizando para funccedilatildeo socioeconocircmica

do tributo com vistas ao controle social na aplicaccedilatildeo dos recursos puacuteblicosrdquo (BRASIL 2009)

5 UM PROGRAMA QUE PREPARA PARA A CIDADANIA

O Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal (PNEF) objetiva sensibilizar o cidadatildeo para a funccedilatildeo

socioeconocircmica do tributo levando conhecimentos aos cidadatildeos sobre gestatildeo de puacuteblicas puacutebli-

cas incentivando o acompanhamento pela sociedade e pelos estudantes universitaacuterios da aplica-

ccedilatildeo dos recursos puacuteblicos criando entatildeo as condiccedilotildees para uma relaccedilatildeo harmoniosa entre o Estado

e o cidadatildeo

O PNEF ldquoeacute um programa de acircmbito nacional integrado pelos Ministeacuterios da Educaccedilatildeo Receita

Federal do Brasil Secretaria do Tesouro Nacional Escola Superior de Administraccedilatildeo Fazendaacuteria (Esaf)

e Secretarias de Fazenda e de Educaccedilatildeo estaduaisrdquo (BRASIL 2000)

Um Estado democraacutetico de direito espera de fato que o cidadatildeo seja preparado para conhecer

o ciclo da formulaccedilatildeo implementaccedilatildeo e avaliaccedilatildeo da gestatildeo de poliacuteticas puacuteblicas preparado para

conhecer os seus direitos e deveres e sensibilizado sobre a funccedilatildeo socieconocircmica do tributo harmo-

nizando assim a relaccedilatildeo entre ele a sociedade e o Estado

O ensino formal superior deve difundir valores e princiacutepios que preparem para a cidadania para

conhecer a administraccedilatildeo puacuteblica e a funccedilatildeo socieconocircmica do tributo visando a harmonizaccedilatildeo na

relaccedilatildeo entre o Estado e o cidadatildeo

O objetivo do PNEF eacute ldquopromover e institucionalizar a Educaccedilatildeo Fiscal para o efetivo exerciacutecio da

cidadania visando ao constante aprimoramento da relaccedilatildeo participativa e consciente entre o Estado e

o cidadatildeo e da defesa permanente das garantias constitucionaisrdquo A justificativa do Programa aponta

a necessidade de compreensatildeo da funccedilatildeo socioeconomica do tributo e da alocaccedilatildeo dos recursos puacute-

blicos da estrutura e funcionamento da administraccedilatildeo publica pautada por princiacutepios e normas e da

busca de estrateacutegias e meios para o exerciacutecio do controle democraacutetico

A implantaccedilatildeo do Programa estaacute a cargo do Grupo de Trabalho de Educaccedilatildeo Fiscal (GEF) com-

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

431

posto por representantes de oacutergatildeos federais estaduais e municipais a quem compete definir a politica

e discutir analisar propor monitorar e avaliar as accedilotildees do Programa

Existe um material pedagoacutegico composto por quatro Cadernos elaborados com o objetivo de

contribuir para a formaccedilatildeo permanente do individuo na perspectiva da maior participaccedilatildeo social nos

processos de geraccedilatildeo aplicaccedilatildeo e fiscalizaccedilatildeo dos recursos puacuteblicos Adequar conteuacutedos aos fatos

sociais poliacuteticos e economicos que constroem o dinamismo da histoacuteria bem como incorporar temas

relacionados agraves novas bases de financiamento da educaccedilatildeo baacutesica e aos avanccedilos promovidos pelo po-

der publico e pela sociedade na transparencia e no controle das financcedilas do Estado deve ser levados

em consideraccedilatildeo na formaccedilatildeo de multiplicadores

O Caderno 01 aborda a educaccedilatildeo fiscal no contexto social apontando as diretrizes objetivos

e abrangecircncia do contexto da educaccedilatildeo fiscal e da educaccedilatildeo puacuteblica O Caderno 02 cuida da relaccedilatildeo

Estado-Sociedade suscitando temas relativos a organizaccedilatildeo da vida em sociedade e suas implicaccedilotildees

na garantia do Estado Democraacutetico de Direito e da cidadania O Caderno 03 cuida da funccedilatildeo social

dos tributos destacando a sua importancia na atividade financeira do Estado para a manutenccedilatildeo e

continuidade das politicas puacuteblicas para a melhoria das condiccedilotildees de vida do cidadatildeo O Caderno 04

trata da gestatildeo democraacutetica dos recursos puacuteblicos evidenciando temas relativos ao orccedilamento ao

compromisso social e fiscal do gestor publico e ao exerciacutecio do controle social (BRASIL 2009)

6 FUNDAMENTOS PARA UMA EDUCACcedilAtildeO FISCAL

A educaccedilatildeo para a cidadania e o preparo da personalidade pressupotildee respeito agrave muacuteltiplas cul-

turas etnias e induz agrave reflexatildeo sobre as possibilidades de formaccedilatildeo integral do ser humano do desen-

volvimento da personalidade devendo se inserir de forma consciente no contexto histoacuterico

Uma das matrizes do PNEF como vimos destaca o papel economico e social do sistema tribu-

taacuterio e dos orccedilamentos puacuteblicos Educando para a cidadania chamamos atenccedilatildeo para o fato de que

todos noacutes pagamos tributo e em contrapartida temos o direito de participar do processo decisoacuterio de

alocaccedilatildeo dessa receita pela formaccedilatildeo da despesa puacuteblica

A formaccedilatildeo da receita e da despesa puacuteblica devem ser conjugadas com a participaccedilatildeo conscien-

te do cidadatildeo adquirida no processo educativo do ensino formal com destaque para o ensino superior

O ensino superior eacute um contexto privilegiado para a tomada de consciencia sobre receita e

despesa puacuteblica A educaccedilatildeo fiscal prepara para o exerciacutecio da cidadania ligada aos fundamentos e

princiacutepios da Constituiccedilatildeo Federal de 1988 pedindo ldquovontade de Constituiccedilatildeordquo (HESSE 1991) para

que juntos possamos construir uma sociedade livre justa e solidaria combatendo a pobreza e a ex-

clusatildeo social

Esses objetivos fundamentais e principioloacutegicos da Repuacuteblica brasileira demandam uma edu-

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

432

caccedilatildeo de qualidade acessiacutevel e permanente a todos segundo a capacidade de cada um um sistema

tributaacuterio capaz de tributar segundo a capacidade economica de cada cidadatildeo exige que aquele que

tem mais renda maior patrimonio ou consome produtos de luxosupeacuterfluos deve pagar mais tributos

e um processo orccedilamentaacuterio que garanta a efetiva participaccedilatildeo popular

A democratizaccedilatildeo das informaccedilotildees sobre financcedilas puacuteblicas permitiratildeo o acompanhamento e

o controle do gasto publico A partir desta matriz se pode auferir se as despesas puacuteblicas necessa-

riamente orccedilamentaacuterias e contabilizadas foram aplicadas conforme as prioridades do povo (MULLER

2000) A educaccedilatildeo fiscal permite educando para a cidadania a compreensatildeo da dinacircmica e da impor-

tancia desses processos para a vida com possibilidade de mudarmos paradigmas

Eacute mais honesto explicar que o tributo por meio da contribuiccedilatildeo equitativa de todos e todas eacute o

meio para construirmos uma sociedade mais justa o que soacute sera possiacutevel com o conhecimento com-

preensatildeo e consciecircncia adquiridos pela educaccedilatildeo para a cidadania sobre a necessidade do controle

popular do gasto publico

Essa consciecircncia estimula a mudanccedila de comportamento em relaccedilatildeo a sonegar e mal-versar recursos puacuteblicos atos que passam a ser repudiados como crimes sociais uma vez que retiram dos cidadatildeos que mais dependem do Estado as condiccedilotildees miacutenimas para que tenham dignidade e esperanccedila de construir seu futuro com autonomia e liberdade [hellip] A construccedilatildeo de uma naccedilatildeo livre justa e solidaacuteria depende de nossa participaccedilatildeo conscienterdquo (BRASIL 2009 p 25)

7 VALORES E MISSAtildeO DA EDUCACcedilAtildeO FISCAL E DO PNEF

Satildeo valores da educaccedilatildeo fiscal os seguintes ldquosuperioridade do homem sobre o Estado Liberda-de Igualdade Justiccedila socialrdquo (BRASIL 2009)

Os mesmos valores entram no PNEF comprometidos com a construccedilatildeo da cidadania com a

solidariedade a eacutetica a transparencia a responsabilidade fiscal e o controle social expressando as

seguintes ldquoideias-forccedilardquo

bull Na educaccedilatildeo o exerciacutecio de uma praacutetica educativa formadora de um ser humano socialmente

consciente

bull Na cidadania possibilitar e estimular o crescente poder do cidadatildeo quanto ao controle demo-

craacutetico do Estado incentivando a participaccedilatildeo individual e coletiva na definiccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas e

na elaboraccedilatildeo das leis para sua execuccedilatildeo

bull Na eacutetica uma conduta responsaacutevel individual e coletiva que valorize o bem comum e

bull Na poliacutetica uma gestatildeo puacuteblica eficiente transparente e honesta quanto agrave captaccedilatildeo alocaccedilatildeo

e aplicaccedilatildeo dos recursos puacuteblicos

Estes mesmos valores da educaccedilatildeo fiscal e do Programa Nacional devem permear as institui-

ccedilotildees gestoras do PNEF e isto ocorre na medida em que a praacutexis mostra a ldquorealizaccedilatildeo de praticas de-

mocraacuteticas em permanente integraccedilatildeo com todos os segmentos sociaisrdquo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

433

A missatildeo da educaccedilatildeo fiscal eacute estimular a mudanccedila de valores crenccedilas e culturas dos indiviacutedu-

os na perspectiva da formaccedilatildeo de um ser humano integral apto ao efetivo exerciacutecio de cidadania e

preparado para transformaccedilotildees sociais contribuindo permanentemente para o desenvolvimento pes-

soal do individuo com educaccedilatildeo para a cidadania e a tomada de consciecircncia sobre direitos e deveres

sobre o valor social do tributo e o controle social do Estado democraacutetico

8 DIRETRIZES DO PNEF

Citaremos novamente que ldquoa Educaccedilatildeo Fiscal deve caminhar nesse sentido informar para que

todos conheccedilam educar para que todos pratiquemrdquo

O exerciacutecio da cidadania devera voltar-se para a organizaccedilatildeo mobilizaccedilatildeo e o estiacutemulo agrave parti-

cipaccedilatildeo social envolvendo questotildees tributaacuterias e financeiras em todos os poderes e esferas de poder

do Estado brasileiro

A elaboraccedilatildeo e execuccedilatildeo de planos estrateacutegicos programas e projetos cujos resultados espe-

rados e impactos desejados devem ser monitorados e avaliados quantitativa e qualitativamente por

sistema nacional e local eacute o que se espera da politica institucional de cada instituiccedilatildeo gestora de

poliacuteticas puacuteblicas

O elemento pedagoacutegico ganha um contorno peculiar nas diretrizes quando aponta para o fato

de que a educaccedilatildeo formal como mecanismo de transformaccedilatildeo social deveraacute se nortear pelos princiacute-

pios politico esteacutetico e eacutetico das Diretrizes Curriculares Nacionais pela legislaccedilatildeo educacional vigente

respeitando as diretrizes nacionais estaduais e municipais e pela autonomia das instituiccedilotildees de ensino

A alianccedila entre a administraccedilatildeo educacional e o Fisco deve observar as diretrizes do Programa

e seguir as linhas de referenciais nacionais definidas em documentos orientadores especiacuteficos de-

vendo haver permanente socializaccedilatildeo nacional do material produzido e das experiencias realizadas

(NERLING 2014)

Educar para a praacutetica da liberdade significa educar para o desenvolvimento da pessoa humana

para a cidadania e preparar para o mundo do trabalho

No Brasil o tema da educaccedilatildeo fiscal encontra na Ordem Interministerial 413 de 31 de dezem-

bro de 2002 o instrumento de preparo para a cidadania que envolve todos os Estados e o DF da Fe-

deraccedilatildeo sob a coordenaccedilatildeo da Esaf (BALTAZAR AQUINO 2010)

9 OBJETIVOS E ABRANGEcircNCIA DO PNEF

O objetivo geral do PNEF eacute promover e institucionalizar a educaccedilatildeo fiscal para o efetivo exerciacute-

cio da cidadania Entre os objetivos especiacuteficos estatildeo a disseminaccedilatildeo de informaccedilotildees e conceitos sobre

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

434

a gestatildeo fiscal favorecendo a compreensatildeo sobre a necessaacuteria intensificaccedilatildeo da participaccedilatildeo social

nos processos de geraccedilatildeo aplicaccedilatildeo e fiscalizaccedilatildeo dos recursos puacuteblicos e accedilotildees permanentes de sen-

sibilizaccedilatildeo em todos os entes puacuteblicos estatais e natildeo estatais estimulando a praacutetica interdisciplinar nas

accedilotildees de educaccedilatildeo fiscal e na capacitaccedilatildeo continuada de multiplicadores

O Programa deve ter uma abrangencia nacional focando prioritariamente em estudantes e

profissionais da educaccedilatildeo baacutesica A formaccedilatildeo dos servidores desenvolvendo conteuacutedos e praacuteticas

sobre direitos e deveres reciacuteprocos na relaccedilatildeo Estadondashcidadatildeo tambeacutem eacute uma prioridade abrangen-

te do Programa

O Programa eacute amplo e possui cinco aacutereas de abrangecircncia (BALTAZAR AQUINO 2010 p 73)

para que sejam atendidos todos os brasileiros e todas as brasileiras em qualquer estagio de sua vida

Destaquemos entatildeo as aacutereas de abrangecircncia prioritaacuterias do Programa

1 Os estudantes do ensino fundamental garantindo-lhes acesso aos conceitos da Educaccedilatildeo

Fiscal

2 Os estudantes do ensino meacutedio com aprofundamento maior dos assuntos

3 Os servidores puacuteblicos num processo de sensibilizaccedilatildeo e envolvimento no Programa

4 Os universitaacuterios oportunizando o acompanhamento do cidadatildeo em toda sua vida es-

tudantil

5 A sociedade em geral para abranger aqueles que natildeo teriam a chance de voltar mais aos

bancos escolares utilizando de preferencia as organizaccedilotildees a que pertencem como clubes associa-

ccedilotildees sindicatos clubes de serviccedilo e ONGs entre outras

Considerando as aacutereas de abrangecircncia o Programa pode ser desenvolvido em todos os niacuteveis

de ensino e faixas etaacuterias para que a sociedade em geral - o senso comum - (SANTOS 2002) possa ter

um melhor entendimento da organizaccedilatildeo da estrutura e do funcionamento da administraccedilatildeo puacutebli-

ca da funccedilatildeo socioeconomica dos tributos da aplicaccedilatildeo dos recursos puacuteblicos das estrateacutegias e dos

meios para o exerciacutecio do controle democraacutetico

A difusatildeo desses conceitos contribui para que professores lideranccedilas comunitaacuterias estudantes

universitaacuterios entre outros possam realizar seu papel de modo cada vez mais consciente e responsaacutevel

Recordemos por fim que o Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal se propotildee a

bull Ser um instrumento de fortalecimento permanente do Estado democraacutetico

bull Contribuir para fortalecer os mecanismos de transformaccedilatildeo social por meio da educaccedilatildeo

bull Difundir informaccedilotildees que possibilitem o desenvolvimento da personalidade e o preparo para

a cidadania

bull Ampliar a participaccedilatildeo popular na gestatildeo democraacutetica do Estado

bull Contribuir para aperfeiccediloar a eacutetica dos valores e missotildees na administraccedilatildeo puacuteblica e na

sociedade

bull Harmonizar a relaccedilatildeo Estado-cidadatildeo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

435

bull Desenvolver a consciecircncia criacutetica da sociedade para o exerciacutecio do controle social

bull Aumentar a eficiecircncia a eficaacutecia e a transparecircncia do Estado

bull Aumentar a responsabilidade fiscal

bull Obter o equiliacutebrio fiscal

bull Combater e prevenir a corrupccedilatildeo

bull Promover a reflexatildeo sobre nossas praacuteticas sociais

bull Melhorar o perfil do servidor empregado agente ou funcionaacuterio puacuteblico

bull Erradicar a pobreza e as desigualdades sociais

10 O ESPACcedilO PEDAGOacuteGICO E A VINCULACcedilAtildeO AO PROGRAMA A CIDADE CONSTITUCIONAL COMO ESTUDO DE CASO

Entre as estrateacutegias da educaccedilatildeo fiscal como vimos estaacute o ensino superior Os estudos apon-

tam que as principais accedilotildees conhecidas vecircm do campo do ensino fundamental e meacutedio

Existem experiecircncias relevantes como aquela da Universidade Estadual de Maringaacute onde na

lavra Magnacircnima do Dr Marciacutelio Hubner de Miranda Neto nasceu a primeira obra teatral brasileira

que retrata com humor e ironia realidades e verdades sobre a importacircncia dos tributos e costumes

dos cidadatildeos e gestores do dinheiro puacuteblico no Brasil (PIALARISSI 2010 p 185)

Outras iniciativas vem ganhando visibilidade e alinhamento estrateacutegico com o PNEF A expe-

riecircncia convencionada chamar ldquoA cidade constitucionalrdquo tambeacutem incorpora como disciplina de gra-

duaccedilatildeo que eacute a temaacutetica da educaccedilatildeo fiscal em cooperaccedilatildeo teacutecnica com a Escola de Administraccedilatildeo

Fazendaacuteria (Esaf) A cidade constitucional eacute um Projeto de duraccedilatildeo continuada da Universidade de

Satildeo Paulo em Cooperaccedilatildeo Teacutecnica com a Escola Superior de Administraccedilatildeo Fazendaacuteria A disciplina

fomenta metodologias ativas de ensinagem no ensino superior e flexibilizaccedilatildeo curricular

Ofertada na Capital da Repuacuteblica como disciplina de graduaccedilatildeo ensina com pesquisa e exten-

satildeo valorizando conteuacutedos cognitivos e atitudinais dos participantes estudantes universitaacuterios de todo

o Brasil A ideia eacute antiga ldquoAquele que lecirc muito e anda muito vecirc muito e sabe muitordquo (CERVANTES)

O roteiro envolve vaacuterias estrateacutegias de trabalho docente como aula expositiva dialogada mapa

conceitual estudo dirigido soluccedilatildeo de problemas dramatizaccedilatildeo seminaacuterio estudo de caso painel

estudo de meio Durante as visitas os professores e monitores atendem e envolvem os alunos para

que procurem participar ativamente colaborando na conduccedilatildeo dos grupos O momento da visitaccedilatildeo

eacute uacutenico Nesse processo todos estatildeo interagindo e aprendendo Por isso eacute indispensaacutevel registrar as

observaccedilotildees dos colegas solicitar explicaccedilotildees enfim interagir no processo educacional e isso de-

pende de todos os envolvidos (professores alunos e servidores) Recomendamos preencher fichas de

avaliaccedilatildeo para apreciaccedilatildeo das visitas e seminaacuterios oferecendo sugestotildees se for o caso

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

436

De volta agrave Universidade eacute fundamental avaliar a experiecircncia verificando o que foi assimilado

e o que poderia ter sido melhor esclarecido Eacute importante natildeo findar as atividades apoacutes a visitaccedilatildeo

Os acadecircmicos tecircm oportunidade de manifestar a assimilaccedilatildeo das atividades pela produccedilatildeo de tex-

tos artigos jornaliacutesticos e cientiacuteficos fotografias poesias frases e desenhos sobre Brasiacutelia e sobre o

que entendem ser uma ldquocidade constitucionalrdquo podendo atingir com criatividade diversos campos

de conhecimento

O Projeto permite aos acadecircmicos obter documentaccedilatildeo direta (documentos informaccedilotildees leis)

e tambeacutem fontes bibliograacuteficas Eacute momento de experimentar as teacutecnicas de observaccedilatildeo direta intensi-

va a exemplo da observaccedilatildeo ndash assistemaacutetica e sistemaacutetica natildeo participante e participante individual

e em equipe na vida real As entrevistas e seu preparo as medidas de opiniatildeo e as atitudes a histoacuteria

de vida e a anaacutelise de conteuacutedo cognitivo e atitudinal satildeo teacutecnicas caras para o nosso Projeto

A experiencia do cidade constitucional contribui para formar um perfil profissiograacutefico no

egresso e desperta a vocaccedilatildeo para as carreiras do Estado das instituiccedilotildees dos entes e das entidades

puacuteblicas que formam a organizaccedilatildeo do Estado e dos Poderes da Repuacuteblica brasileira

A educaccedilatildeo fiscal entra com os temas do preparo para a cidadania apregoado no artigo 205

da Constituiccedilatildeo Federal o desenvolvimento da personalidade e o preparo para o trabalho Valoriza-

mos a cultura ciacutevica os siacutembolos e as datas comemorativas da Repuacuteblica e o calendaacuterio ciacutevico-cul-

tural Buscamos a ldquoSemana da Paacutetriardquo Queremos refletir e conversar sobre os siacutembolos nacionais os

heroacuteis da paacutetria o civismo e a cidadania dos modernos Sobre a importacircncia geopoliacutetica da Capital

da Repuacuteblica e a modernidade - esteacutetica modernista - dos palaacutecios e museus Valorizamos a diver-

sidade da riqueza cultural e social da populaccedilatildeo local com suas identidades Ocupar os ambientes

de formulaccedilatildeo implementaccedilatildeo e avaliaccedilatildeo das poliacuteticas puacuteblicas permite compreender melhor os

conceitos de pressatildeo lobby demandas prioridades tomada de decisatildeo implementaccedilatildeo e controle

do Governo Federal e do DF

A disciplina (NERLING ANDRADE 2013) estaacute estruturada e cada participante eacute induzido a tra-

balhar com a loacutegica do sistema operacional orccedilamentaacuterio financeiro patrimonial e contaacutebil da ad-

ministraccedilatildeo puacuteblica dos poderes segundo um planejamento - plano de governo plano diretor plano

plurianual - conjugado com o orccedilamento funcional programaacutetico por meio dos programas projetos

atividades e accedilotildees de interesse da gestatildeo conhecidos como poliacuteticas puacuteblicas

A iniciativa pode atender agraves necessidades de capacitaccedilatildeo da proacutepria administraccedilatildeo para a me-

lhoria da gestatildeo dos programas e projetos que envolvendo a juventude com atenccedilatildeo para os aca-

decircmicos do ensino superior brasileiro reforccedila o controle institucional e social do ciclo de formulaccedilatildeo

implementaccedilatildeo e avaliaccedilatildeo de poliacuteticas puacuteblicas e sua duraccedilatildeo continuada

O controle social e o comprometimento acadecircmico com a melhoria continuada da gestatildeo

das poliacuteticas puacuteblicas nos permitem operaccedilotildees de pensamento privilegiadas comparaccedilatildeo resumo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

437

observaccedilatildeo obtenccedilatildeo organizaccedilatildeo classificaccedilatildeo e arquivo dos dados (fotos gravaccedilotildees viacutedeos)

interpretaccedilatildeo criacutetica suposiccedilotildees imaginaccedilatildeo levantamento de hipoacuteteses decisatildeo planejamento e

projetos de pesquisa

Realizaccedilatildeo com certificaccedilatildeo conjunta o Projeto conta com a atenccedilatildeo da Diretoria de Coo-

peraccedilatildeo Teacutecnica e Pesquisa (Dirco) Prof Paulo Mauger com fundamento nos Arts 13 15 e 29 da

Portaria MF nordm 106 de 03062008 utilizando as dependecircncias do Centro Estrateacutegico de Formaccedilatildeo

e Educaccedilatildeo Permanente

A cidade constitucional serve para fortalecer o desenvolvimento da personalidade ciacutevica e da

cidadania ativa por meio do ensino da pesquisa e da extensatildeo universitaacuterias na Semana da Paacutetria na

cidade constitucional no caso Brasiacutelia ndash DF

Eacute uma disciplina de graduaccedilatildeo da Universidade de Satildeo Paulo ofertada na Capital da Repuacuteblica

Por meio da cooperaccedilatildeo teacutecnica experimentamos avaliamos e descobrimos uma metodologia inova-

dora de ensinagem no ensino superior Noacutes aproximamos o ensino e a extensatildeo e com isto colhemos

mais e melhor pesquisa porque o meacutetodo impotildee accedilatildeo

A partir de um procedimento sistematizado com exploraccedilatildeo teacutecnica intensiva e de imersatildeo no

mundo real na vida como ela eacute fora do ambiente tradicional da sala de aula ensinamos aprendendo

com quem faz O projeto foi implementado e vem sendo avaliado ininterruptamente ao longo de 07

anos estando pois mensurada a filosofia da praacutexis3

3 Sobre metodologias ativas e teacutecnicas de ensinagem no ensino superior NERLING 2010 2011 4 Da lavra da Presidenta da Repuacuteblica no Discurso de Posse ldquoEacute portanto tarefa indispensaacutevel uma accedilatildeo renovada efetiva e integrada dos governos federal estaduais e municipais em particular nas aacutereas da sauacutede da educaccedilatildeo e da seguranccedila vontade expressa das famiacutelias brasileiras [hellip] Natildeo vou descansar enquanto houver brasileiros sem alimentos na mesa en-quanto houver famiacutelias no desalento das ruas enquanto houver crianccedilas pobres abandonadas agrave proacutepria sorte O congra-ccedilamento das famiacutelias se daacute no alimento na paz e na alegria E este eacute o sonho que vou perseguir Esta natildeo eacute tarefa isolada de um governo mas um compromisso a ser abraccedilado por toda sociedade Para isso peccedilo com humildade o apoio das instituiccedilotildees puacuteblicas e privadas de todos os partidos das entidades empresariais e dos trabalhadores das universidades da juventude de toda a imprensa e de das pessoas de bem [hellip] Queridas brasileiras e queridos brasileiros junto com a erradicaccedilatildeo da miseacuteria seraacute prioridade do meu governo a luta pela qualidade da educaccedilatildeo da sauacutede e da seguranccedila [] Mas soacute existiraacute ensino de qualidade se o professor e a professora forem tratados como as verdadeiras autoridades da educaccedilatildeo com formaccedilatildeo continuada remuneraccedilatildeo adequada e soacutelido compromisso com a educaccedilatildeo das crianccedilas e jovens Somente com avanccedilo na qualidade de ensino poderemos formar jovens preparados de fato para nos conduzir agrave sociedade da tecnologia e do conhecimento [hellip] Em suma temos que combater a miseacuteria que eacute a forma mais traacutegica de atraso e ao mesmo tempo avanccedilar investindo fortemente nas aacutereas mais sofisticadas da invenccedilatildeo tecnoloacutegica da criaccedilatildeo intelectual e da produccedilatildeo artiacutestica e cultural Justiccedila social moralidade conhecimento invenccedilatildeo e criatividade devem ser mais que nunca conceitos vivos no dia-a-dia da naccedilatildeo [hellip] Mas eacute importante lembrar que o destino de um paiacutes natildeo se resume agrave accedilatildeo de seu governo Ele eacute o resultado do trabalho e da accedilatildeo transformadora de todos os brasileiros e brasileiras O Brasil do futuro seraacute exatamente do tamanho daquilo que juntos fizermos por ele hoje Do tamanho da participaccedilatildeo de todos e de cada um Dos movimentos sociais dos que labutam no campo dos profissionais liberais dos trabalhadores e dos pequenos empreendedores dos intelectuais dos servidores puacuteblicos dos empresaacuterios das mulheres dos negros dos iacutendios e dos jovens de todos aqueles que lutam para superar distintas formas de discriminaccedilatildeo [hellip] Quero estar ao lado dos que trabalham pelo bem do Brasil na solidatildeo amazocircnica na seca nordestina na imensidatildeo do cerrado na vastidatildeo dos pampas Quero estar ao lado dos que vivem nos aglomerados metropolitanos na vastidatildeo das florestas no interior ou no litoral nas capitais e nas fronteiras do Brasil Quero convocar todos a participar do esforccedilo de transformaccedilatildeo do nosso paiacutes Respeitada a autonomia dos poderes e o princiacutepio federativo quero contar com o Legislativo e o Judiciaacuterio e com a parceria de governadores e prefeitos para continuarmos desenvolvendo nosso Paiacutes aperfeiccediloando nossas instituiccedilotildees e fortalecendo nossa democraciardquo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

438

O alinhamento estrateacutegico acreditamos eacute uma contribuiccedilatildeo da Universidade Puacuteblica para o

Projeto de Desenvolvimento Nacional4 Nosso puacuteblico alvo satildeo universitaacuterios em vias de conclusatildeo

dos cursos de graduaccedilatildeo que tenham vocaccedilatildeo para a relaccedilatildeo do Estado com a sociedade civil

Chamamos atenccedilatildeo para os problemas da gestatildeo de poliacuteticas puacuteblicas estabelecidas como

prioritaacuterias pelo Governo da Uniatildeo em todos os Poderes

Orientamos em um contexto interdisciplinar voltados para a resoluccedilatildeo de problemas segundo

um sistema de programas atividades e accedilotildees quantitativas e qualitativas Orientamos para a gestatildeo

com quem estuda e faz a gestatildeo das poliacuteticas puacuteblicas na Capital da Repuacuteblica

Entre os resultados pretendidos o Projeto serve para alinhar o ensino superior formal e os estu-

dantes universitaacuterios no planejamento estrateacutegico como estrateacutegia de articulaccedilatildeo social que fortalece

a participaccedilatildeo como meacutetodo e poliacutetica de Estado Queremos difundir a educaccedilatildeo fiscal sua missatildeo

valores objetivos diretrizes na Semana da Paacutetria divulgando e vivendo o ambiente institucional na

Capital da Repuacuteblica segundo orccedilamentos programas e sistema de convenios agrave Projetos de ensino

e de extensatildeo visando colher mais eficiencia na operacionalizaccedilatildeo da gestatildeo de poliacuteticas puacuteblicas na

Federaccedilatildeo brasileira

Os conceitos centrais servem a difusatildeo cultural dos programas prioritaacuterios (PPA LDO e LOA)

segundo a loacutegica dos programas projetos atividades e accedilotildees do Governo do Brasil Utilizaccedilatildeo da infra-

-estrutura e pedagogia da praacutexis O alinhamento estrateacutegico operacional da gestatildeo com a articulaccedilatildeo

social no ensino superior brasileiro atrai academicos interessados no tema da formulaccedilatildeo implemen-

taccedilatildeo e avaliaccedilatildeo da gestatildeo de poliacuteticas puacuteblicas do Governo Federal e sua articulaccedilatildeo com o poder

estadual e local com a realidade faacutetica para aleacutem dos muros da escola

Veja a estrutura da uacuteltima ediccedilatildeo do Projeto

USP Leste

Homenagem

ESAF ndash 40 Anos

A CIDADE CONSTITUCIONAL CAPITAL DA REPUacuteBLICA - VII

CONTEUacuteDO PROGRAMAacuteTICO

EDICcedilAtildeO 2013

31092012 - Saacutebado

2100 ndash Saiacuteda do Ocircnibus da USP

01092012 ndash Domingo

1230 ndash Praccedila dos Trecircs Poderes

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

439

1300 - Palaacutecio do Planalto

1400 - Sede do Ministeacuterio das Relaccedilotildees Exteriores do Brasil

1400 ndash Escola Superior de Administraccedilatildeo Fazendaacuteria

1730 ndash Reuniatildeo geral ndash Definiccedilatildeo das estrateacutegias limites e possibilidades do Projeto

1830 - Jantar

0209 Segunda-feira

0700 ndash Cafeacute

0800 ndash III Seminaacuterio USP-ESAF ndash Os 40 Anos da Escola de Administraccedilatildeo Fazendaacute-

ria ndash ESAF

1230 ndashAlmoccedilo

1400 ndash VII Seminaacuterio USP-ENAP ndash A Comunicaccedilatildeo e a Pesquisa na Escola Nacional

de Administraccedilatildeo Puacuteblica

1700 ndash II Seminaacuterio USP-Ipea

1800 ndash III Seminaacuterio USP-ESAF ndash O Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal Educa-

ccedilatildeo fiscal e preparo da cidadania

2000 - Jantar

0309 Terccedila-feira

0700 ndash Cafeacute

0900 ndash Controladoria Geral da Uniatildeo - Unidades finaliacutesticas Ouvidoria Geral da

Uniatildeo Secretaria Federal de Controle Interno Corregedoria Geral da Uniatildeo Secre-

taria de Prevenccedilatildeo da Corrupccedilatildeo e Informaccedilotildees Estrateacutegicas

1200 - Almoccedilo

1230 ndash Catedral Metropolitana de Brasiacutelia

1230 - Museu Nacional

1400 ndash O Senado da Repuacuteblica na cidade constitucional - III Seminaacuterio USP ndash Even-

tos Legislativos Serviccedilo de Eventos Legislativos Senado Federal Diretoria Geral ndash O

planejamento estrateacutegico do Senado Escritoacuterio Corporativo Gestatildeo de Informaccedilatildeo

e Documentaccedilatildeo ndash Guardar eacute um haacutebito arquivar eacute uma arte Instituto do Legisla-

tivo Brasileiro - Programa Interlegis Consultoria de Orccedilamento do Senado

1830 ndash Jantar

1930 ndash III Seminaacuterio USP-UNB - Universidade de Brasiacutelia ndash O direito achado na rua

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

440

0409 Quarta-feira

0500 ndash Palaacutecio da Alvorada

0700 - Cafeacute

0830 ndash Cacircmara dos Deputados ndash Comissatildeo Direitos Humanos e Legislaccedilatildeo Partici-

pativa

1000 ndash Comissotildees Gabinetes Lideranccedilas

1130 ndash Panteatildeo da Paacutetria

1200 ndash 1300 Almoccedilo ndash Restaurante Cacircmara dos Deputados

1300 ndash VI Seminaacuterio Cacircmara dos Deputados - USP ndash Reforma poliacutetica

1500 ndash III Seminaacuterio USP - Eventos Legislativos do Senado ndash Comissatildeo de Direitos

Humanos e Legislaccedilatildeo Participativa - Presidenta da Comissatildeo de Direitos Humanos

e Legislaccedilatildeo Participativa do Senado Federal

1600 ndash 1730 ndash Visita Guiada Congresso Nacional

1830 ndash III Seminaacuterio USP-ESAF Educaccedilatildeo fiscal ndash Funccedilatildeo social dos tributos

2100 ndash Jantar

0509 Quinta-feira

0930 ndash Caixa Econocircmica Federal

1030 ndash Banco Central ndash Educaccedilatildeo financeira

1300 ndash Almoccedilo

1430 - Secretaria Nacional de Articulaccedilatildeo Social da Secretaria-Geral da Presidecircncia

da Repuacuteblica

Diaacutelogo do governo com a sociedade ndash segmentos da sociedade civil demandas

sociais monitoramento e avaliaccedilatildeo compromisso nacional pela participaccedilatildeo social

ndash formas de consulta e participaccedilatildeo social estudos e pesquisas intersetorialidade

e integraccedilatildeo entre conselhos ouvidorias e conferencias Educaccedilatildeo popular e mo-

bilizaccedilatildeo cidadatilde ndash processos de educaccedilatildeo popular acesso a poliacuteticas puacuteblicas para

populaccedilotildees vulneraacuteveis metodologia para formar lideranccedilas e educadores popu-

lares praacuteticas de educaccedilatildeo popular e de metodologias participativas no governo e

na educaccedilatildeo popular

1800 ndash Ministeacuterio da Justiccedila

2000 ndash Jantar de confraternizaccedilatildeo

0609 ndash Sexta-feira

0900 ndash Ministeacuterio dos Esportes

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

441

1300 - Almoccedilo

1400 ndash Ministeacuterio da Sauacutede

1630 ndash Ministeacuterio das Cidades

2000 ndash Jantar

0709 ndash Saacutebado

0600 ndash Cafeacute

0630 ndash Check Out Alojamento ESAF

0700 ndash Saiacuteda Ocircnibus

0900 - Desfile Ciacutevico Militar

1230 - Torre de TV e Feira de Artesanato

1400 ndash Viagem de Retorno para Satildeo Paulo

0809 ndash Domingo

0500 ndash Chegada estimada do ocircnibus em Satildeo Paulo

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Para facilitar a vida do leitor o tema geral deste Capiacutetulo trata da educaccedilatildeo fiscal e mostra uma

experiecircncia O estudo permitiu conhecer e compreender um pouco melhor as diretrizes objetivos

missatildeo visatildeo e valores da educaccedilatildeo fiscal uma aliada potencial no ensino superior brasileiro

Como vimos natildeo haacute incompatibilidade nas diretrizes da educaccedilatildeo fiscal com as diretrizes do

ensino superior O tema compotildee a agenda governamental e vem sendo levado cada dia mais a seacuterio

no ocidente e em suas universidades haacute espaccedilo para crescimento

Na praacutetica novas experiencias vatildeo surgindo e consolidam o estado da arte da educaccedilatildeo fiscal

tambeacutem como tema transversal de disciplinas de graduaccedilatildeo como vimos na iniciativa da USP mais um

exemplo de como a educaccedilatildeo fiscal pode compor como tema transversal e tambeacutem especiacutefico uma

disciplina de graduaccedilatildeo e ainda como esta disciplina ministrada de forma paradoxal deve compor

uma estrutura curricular e um Projeto Poliacutetico-Pedagoacutegico de Curso na graduaccedilatildeo e poacutes

Nossa motivaccedilatildeo geral partindo do pressuposto da duacutevida imanente ao exerciacutecio cientiacutefico

se perguntou se a educaccedilatildeo fiscal serve a metodologias inovadoras de ensinagem no ensino supe-

rior brasileiro

Nossa hipoacutetese era positiva porque acreditaacutevamos e confirmando nossa hipoacuteteses seguimos

acreditando que eacute possiacutevel aproximar as ideias precursoras unindo histoacuteria e tempo presente com

projetos atividades e accedilotildees conjuntas no futuro quiccedilaacute uma disciplina ldquoCidade Constitucional Capital

do Cearaacute ndash CErdquo ou recebendo estudantes de Universidades do Cearaacute em Brasiacutelia durante a realizaccedilatildeo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

442

da disciplina fortalecendo assim o intercacircmbio e a disseminaccedilatildeo de experiecircncias fortalecedoras da

coesatildeo social no ensino superior

O preparo e o exerciacutecio da cidadania satildeo a base para a construccedilatildeo de uma sociedade demo-

craacutetica com igualdade e justiccedila A sociedade civil e o Estado devem trabalhar para a construccedilatildeo dessa

sociedade com base nos princiacutepios constitucionais

O exerciacutecio da cidadania pressupotildee uma educaccedilatildeo para a cidadania uma educaccedilatildeo para esse

exerciacutecio do desenvolvimento da personalidade do individuo Eacute o conhecimento e a compreensatildeo dos

fatos pelas lentes dos valores e do direito que ajudam a reconhecer novas e inovadoras legitimidades

conhecidas e compreendidas para que a sociedade avance no compasso do tempo

O preparo para a cidadania eacute um dever da universidade brasileira do ensino superior brasileiro

sem eximir o ensino fundamental e meacutedio O artigo 205 da CF estabelece que a educaccedilatildeo direito de

todos e dever do Estado e da famiacutelia seraacute promovida e incentivada com a colaboraccedilatildeo da sociedade

visando ao pleno desenvolvimento da pessoa seu preparo para o exerciacutecio da cidadania e sua qualifi-

caccedilatildeo para o trabalho O pleno desenvolvimento da pessoa e o preparo para o exerciacutecio da cidadania

devem ser promovidos incentivados ldquocom a colaboraccedilatildeo da sociedaderdquo para o controle social

Preparar para o exerciacutecio da cidadania requer definiccedilatildeo de conteuacutedo e estrateacutegias Tributos e

financcedilas pessoais e puacuteblicas devem ser levados em consideraccedilatildeo nos projetos poliacutetico-pedagoacutegicos e

planos de atividades das disciplinas de graduaccedilatildeo e poacutes-graduaccedilatildeo Preparar contribuintes e servido-

res por meio da educaccedilatildeo fiscal eacute possiacutevel e existem boas referecircncias metodologias e produtos didaacute-

ticos prontos para conhecimento compreensatildeo e multiplicaccedilatildeo de accedilotildees A administraccedilatildeo educacional

pode ajudar a educaccedilatildeo tributaacuteria de forma ciacutevica

A educaccedilatildeo fiscal serve de forma objetiva para o preparo da cidadania Alinhar a educaccedilatildeo fiscal

a um projeto educacional para a autonomia dentro ou aleacutem do espaccedilo escolar com a transmissatildeo

criacutetica de valores missatildeo diretrizes objetivos e abrangecircncias ajuda a fazer mais felizes as pessoas e o

espaccedilo pedagoacutegico na cidade constitucional Desta forma consideramos que a educaccedilatildeo fiscal soacute se

faz em uma democracia soacute se faz em uma cidade constitucional

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

443

REFEREcircNCIAS

ANASTASIOU Leacutea das Graccedilas Camargos ALVES Leonir Pessate (Orgs) Processos de ensinagem na universidade pressupostos para as estrateacutegias de trabalho em aula 8 ed Joinville Univille 2009

BALTAZAR Antonio Henrique Lindemberg AQUINO Monica de El Programa Nacional de Educacioacuten Fiscal de Brasil In RIVILLAS Borja Diacuteaz PEacuteREZ Aacutengeles Fernaacutendez (org) Educacioacuten fiscal y cohesioacuten social experiecircncias de Ameacuterica Latina Madrid Instituto de Estudios Fiscales 2010

BRASIL Ministeacuterio da Fazenda Escola de Administraccedilatildeo Fazendaacuteria Programa Nacional de Educa-cao Fiscal (PNEF) Educaccedilatildeo fiscal no contexto social 4 ed Brasilia ESAF 2009 Serie Educaccedilatildeo Fiscal Caderno 1

______ Estabelece as diretrizes e bases da educaccedilatildeo nacional Lei 9394 de 20 de Dezembro de 1996 Adin 3324-7 de 2005 Decreto 3860 de 2001 Lei 10870 de 2004 Lei 12601 de 2009 Brasiacutelia Dispo-niacutevel em httpwwwplanaltogovbrccivil_03leisl9394htm Acesso em 10 jan 2014

GARCIacuteA Maria Luisa Valdenebro LOBO Luisa Delgado La educacioacuten fiscal por queacute y para queacute In RI-VILLAS Borja Diacuteaz PEacuteREZ Aacutengeles Fernaacutendez (org) Educacioacuten fiscal y cohesioacuten social experiecircncias de Ameacuterica Latina Madrid Instituto de Estudios Fiscales 2010

HESSE Konrad A forccedila normativa da Constituiccedilatildeo Porto Alegre Sergio Fabris 1991

MOTA Luiza Ondina Santos Apresentaccedilatildeo do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute Secretaria da Fazenda Disponiacutevel em httpwwwsefazcegovbrcontentaplicacaointernetprogra-mas_campanhasgeradosprojeto_apresentacaoasp Acesso em 15 jan 2014

MUumlLLER Friedrich Quem eacute o povo A questatildeo fundamental da democracia Satildeo Paulo Max Limonad 2000

NERLING Marcelo Arno ANDRADE Douglas de A cidade constitucional Capital da Repuacuteblica VII Brasiacutelia Disciplina de graduaccedilatildeo da Universidade de Satildeo Paulo ACH 3666 2013 Mimeo

NERLING Marcelo Arno A cidade constitucional e a Capital da Repuacuteblica Metodologia ativa no en-sino superior In Congresso Internacional PBL-2010 Programa final p 30 2010 Disponiacutevel em httpeachuspnetuspbrpbl2010index_pthtm Acesso em jul 2013

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______ In 1ordm Simpoacutesio de Pedagogia Universitaacuteria Escola de Artes Ciecircncias e Humanidades (EACH) da USP As Metodologias Ativas de Aprendizagem no ensino superior 25-26022013 GAP-EACH--USP 2013 Disponiacutevel em httpwwwuspbrimprensap=27363 Acesso em jul 2013

PIALARISSI Decio Rui El Observatoacuterio Social de Maringaacute haciendo viable la cohesioacuten social In RI-

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

444

VILLAS Borja Diacuteaz PEacuteREZ Aacutengeles Fernaacutendez (org) Educacioacuten fiscal y cohesioacuten social experiecircncias de Ameacuterica Latina Madrid Instituto de Estudios Fiscales 2010

RIVILLAS Borja Diacuteaz VELARDEBOacute Andrea Oriacutegenes y situacioacuten de los programas de Educacioacuten Fiscal em Ameacuterica Latina In RIVILLAS Borja Diacuteaz PEacuteREZ Aacutengeles Fernaacutendez (org) Educacioacuten fiscal y cohe-sioacuten social experiecircncias de Ameacuterica Latina Madrid Instituto de Estudios Fiscales 2010

SANTOS Boaventura de Souza Um discurso sobre as ciecircncias 13 ed Porto Afrontamento 2002

SILVA Imaculada Maria Vidal da MOTA Luiza Ondina Santos MACHADO Sandra Maria Olimpio La educacioacutens fiscal em el Estado brasilentildeo de Cearaacute In RIVILLAS Borja Diacuteaz PEacuteREZ Aacutengeles Fernaacutendez (org) Educacioacuten fiscal y cohesioacuten social experiecircncias de Ameacuterica Latina Madrid Instituto de Estu-dios Fiscales 2010

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

445

A PERCEPCcedilAtildeO DOS PROFESSORES SOBRE O CURSO DE DISSEMINADORES DA EDUCACcedilAtildeO FISCAL NO MUNICIPIO DE ICOacute-CE

SUMAacuteRIO Introduccedilatildeo 1 A formaccedilatildeo continuada caminhos e perspectivas 2 A educaccedilatildeo a distacircncia na formaccedilatildeo docente 3 O campolocus da pesquisa 4 O curso de disseminadores da educaccedilatildeo fiscal 5 A formaccedilatildeo em dissemina-dores da educaccedilatildeo fiscal na Crede 17 ndash Icoacute Consideraccedilotildees finais Referecircncias

Maria Nahir Batista Ferreira1

INTRODUCcedilAtildeO

Este artigo apresenta uma discussatildeo acerca da temaacutetica que envolve a percepccedilatildeo dos profes-

sores sobre o Curso de Disseminadores da Educaccedilatildeo Fiscal promovido pela Escola de Administraccedilatildeo

Fazendaacuteria (Esaf)

Refletir sobre o curso nos remete agrave formaccedilatildeo docente considerando que a docecircncia exige dos

professores permanente atualizaccedilatildeo Essa discussatildeo no entanto envolve ainda os processos de capa-

citaccedilatildeo e as diferentes nomenclaturas para designar a formaccedilatildeo continuada dos professores que natildeo

traz apenas a escolha de um termo mas tambeacutem as concepccedilotildees teoacuterico-metodoloacutegicas que envolvem

os processos implicando assim uma multiplicidade de significados que como praacutetica social sinaliza

variadas formas de realizar determinadas accedilotildees

Para a realizaccedilatildeo da formaccedilatildeo dos professores tem-se utilizado a modalidade de educaccedilatildeo a

distacircncia tendo em vista a viabilidade dessa modalidade de ensino por meio da internet e o uso dos

ambientes virtuais de aprendizagem modalidade na qual eacute praticada o Curso de Disseminadores da

Educaccedilatildeo Fiscal

A metodologia utilizada concentra-se na pesquisa bibliograacutefica fomentada nos escritos de Noacute-

voa (1995) Tardif (2012) Imbernoacuten (1998) bem como em outras referecircncias bibliograacuteficas acerca do

tema A demarcaccedilatildeo espacial focou no municiacutepio de Icoacute Cearaacute ndash Brasil Para a constituiccedilatildeo do campo

documental foram aplicados questionaacuterios com os professores da rede oficial do Estado do Cearaacute

especificamente da Coordenadoria Regional de Desenvolvimento da Educaccedilatildeo (Crede) 17 ndash Icoacute vincu-

lada agrave Secretaria Estadual de Educaccedilatildeo A demarcaccedilatildeo temporal estabelecida para o desenvolvimento

da investigaccedilatildeo foi o segundo semestre do ano de 2008

1 Professora da Rede Oficial de Ensino do Cearaacute ProfessoraTeacutecnica na Secretaria da Educaccedilatildeo do Cearaacute Mestranda em Educaccedilatildeo pela Universidade Estadual do Cearaacute E-mail nahir701hotmailcom

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

446

Assim na primeira parte do trabalho destacamos a formaccedilatildeo docente sobretudo a formaccedilatildeo

continuada apontando os caminhos trilhados e as perspectivas que transitam por esse campo de

discussatildeo haja vista os debates em torno da formaccedilatildeo dos professores e da especificidade da accedilatildeo

docente Em seguida discutimos acerca do uso da educaccedilatildeo a distacircncia na formaccedilatildeo docente depois

apresentamos a descriccedilatildeo do curso de Disseminadores da Educaccedilatildeo Fiscal apontando objetivos me-

todologia e estrutura bem como para a uacuteltima parte do trabalho objetivamos descrever a formaccedilatildeo

em disseminaccedilatildeo fiscal na Crede 17

Por fim informaremos o resultado da pesquisa em que os professores mostram suas percep-

ccedilotildees sobre o Curso de Disseminadores da Educaccedilatildeo Fiscal dos conteuacutedos trabalhados da metodo-

logia empregada das atividades desenvolvidas da mediaccedilatildeo do tutor das ferramentas utilizadas e

aplicaccedilatildeo dos conhecimentos adquiridos com os estudantes

1 A FORMACcedilAtildeO CONTINUADA CAMINHOS E PERSPECTIVAS

A discussatildeo sobre a formaccedilatildeo de professores no Brasil e no mundo iniciou na deacutecada de 1980

levando agrave intensificaccedilatildeo das discussotildees em torno do papel da instituiccedilatildeo escola No Brasil a referida

discussatildeo intensificou-se nos anos de 1990 suscitando reflexotildees contradiccedilotildees e embates Nesse cam-

po destacam-se as contribuiccedilotildees de estudos e pesquisas desenvolvidos que abordam a temaacutetica em

torno da formaccedilatildeo dos professores e da especificidade da accedilatildeo docente Desde a deacutecada de 1980 satildeo

apresentadas propostas para a formaccedilatildeo de professores e muitos de seus conceitos satildeo incorporados

aos textos oficiais e adentram nas escolas e instituiccedilotildees formadoras que se encontram diante dos pro-

blemas apelos e interesses de diferentes ordens

Acerca da formaccedilatildeo Antonio Noacutevoa afirma que

A formaccedilatildeo deve estimular uma perspectiva criacutetico- reflexiva que forneccedila aos profes-sores os meios de um pensamento autocircnomo e que facilite as dinacircmicas de autofor-maccedilatildeo participada Estar em formaccedilatildeo implica um investimento pessoal um trabalho livre e criativo sobre os percursos e os projetos proacuteprios com vista agrave construccedilatildeo de uma identidade que eacute tambeacutem uma identidade profissional (NOacuteVOA 1995 p 25)

Para Isabel Alarcatildeo o paradigma do professor reflexivo pode ser mais bem compreendido

se o transportar do niacutevel da formaccedilatildeo dos professores individualmente para o niacutevel de formaccedilatildeo

situado no coletivo dos professores no contexto da escola na qual ele estaacute inserido e no exerciacutecio da

sua atividade evidenciando sua praacutetica pedagoacutegica a partir do processo educativo que acontece no

interior da escola bem como pela praacutetica social relacionada agrave formaccedilatildeo do homem em suas rela-

ccedilotildees poliacuteticos-culturais Na perspectiva de ldquouma formaccedilatildeo que transforme a experiecircncia profissional

adquirida e valorize a reflexatildeo formativa e a investigaccedilatildeo conjunta em contexto de trabalhordquo (ALAR-

CAtildeO 1998 p118)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

447

Na acepccedilatildeo de Rosa Maria Torres

[] a experiecircncia mostra que o professor com iniciativa e boas ideias sem uma ins-tituiccedilatildeo e equipe escolar que o respaldem termine em geral absorvido pela loacutegica escolar dominante A experiecircncia mostra tambeacutem que o professor capacitado de for-ma individual e isolado quando regressa a sua escola fica segregado e termina por retomaras suas praacuteticas em pouco tempo Hoje eacute urgente superar esse esquema tra-dicional altamente individualizado de capacitaccedilatildeo Apontasse a equipe escolar como sujeito privilegiado da capacitaccedilatildeo E isso se complementa com a proposta de que tal capacitaccedilatildeo seja feita na proacutepria escola (TORRES 1998 p 185)

No tocante agrave formaccedilatildeo inicial de professores evidencia-se a criacutetica acerca da oferta de um

ensino desarticulado das reais necessidades teoacuterico-metodoloacutegicas dos professores bem como pelo

distanciamento e estranhamento docente em funccedilatildeo da realidade vivenciada pelas escolas configu-

rando-se uma dicotomia teoria-praacutetica na constituiccedilatildeo do conhecimento consequentemente provo-

cando nos professores uma accedilatildeo pedagoacutegica limitada e inconsistente em razatildeo da formaccedilatildeo recebida

ldquoNa formaccedilatildeo de professores ensinam-se teorias [] histoacutericas pedagoacutegicas etc que foram concebi-

das a maioria das vezes sem nenhum tipo de relaccedilatildeo com o ensino nem com as realidades cotidianas

do oficio de professorrdquo (TARDIF 2012 p 241) Nessa perspectiva na medida em que os cursos natildeo

se apresentam eficazes amplia-se a discussatildeo em torno das abordagens teoacuterico-metodoloacutegicas dos

processos de formaccedilatildeo continuada como possibilidade de qualificaccedilatildeo da praacutetica docente

Nesse contexto a formaccedilatildeo continuada possui um caraacuteter permanente e extrapola os limites

formais de ensino Vale ressaltar que a literatura educacional registra que o discurso dos oacutergatildeos que

gerenciam a educaccedilatildeo ao longo do tempo trata as accedilotildees relativas agrave formaccedilatildeo contiacutenua de professo-

res como reciclagem treinamento aperfeiccediloamento capacitaccedilatildeo entre outros Atualmente surge

uma nova nomenclatura que demonstra mudanccedilas que ampliam o campo conceitual expressas nos

termos formaccedilatildeo em serviccedilo formaccedilatildeo continuada educaccedilatildeo permanente formaccedilatildeo contiacutenua fruto

de cada momento histoacuterico designando concepccedilotildees e demonstrando ideologias objetivos e linhas

de accedilotildees nesse campo

Haacute de se considerar tambeacutem que a temaacutetica da formaccedilatildeo continuada natildeo eacute algo novo no Brasil

mas se intensificou a partir da deacutecada de 1990 com as reformas educacionais apresentando novas

concepccedilotildees e abordagens para se adaptar agraves novas exigecircncias do mundo produtivo

Nessa perspectiva Imbernoacuten (2010 p 55) evidencia que

Na atualidade temos certeza de que a educaccedilatildeo soacute mudaraacute se os professores mu-darem mas os contextos em que esses interagem tambeacutem deveratildeo fazecirc-lo Se o contexto natildeo muda podemos ter professores mais cultos e com mais conhecimento pedagoacutegico mas natildeo necessariamente mais inovadores jaacute que o contexto pode im-possibilitar-lhes o desenvolvimento da inovaccedilatildeo ou pode levaacute-los a se recolherem em seus microcontextos sem repercutirem com sua praacutetica uma inovaccedilatildeo mais institu-cional

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

448

Atualmente o cenaacuterio da educaccedilatildeo brasileira convive com uma diversidade de opccedilotildees de ensi-

nar aprender e formar professores que iratildeo mediar o processo ensino-aprendizagem na Escola Baacutesica

o que nos remete aos estudos de Maurice Tardif focalizados em saber docente e suas interferecircncias

na praacutetica pedagoacutegica Esse autor identifica e caracteriza diferentes tipos de saberes e aborda a rela-

ccedilatildeo que o professor estabelece com esses saberes pois ldquosaber docente eacute um saber plural formado

pelo amaacutelgama mais ou menos coerente de saberes oriundos da formaccedilatildeo profissional e de saberes

disciplinares curriculares e experienciaisrdquo (TARDIF 2012 p 36) O autor reconhece a pluralidade e a

heterogeneidade do saber docente no entanto destaca a importacircncia dos saberes da experiecircncia

abordando que

Surgem como nuacutecleo vital do saber docente a partir do qual o (a)s professor (a)s tentam transformar suas relaccedilotildees de exterioridade com os saberes em relaccedilotildees de in-terioridade com sua proacutepria praacutetica Nesse sentido os saberes da experiecircncia natildeo satildeo saberes como os demais eles satildeo ao contraacuterio formados de todos os demais poreacutem retraduzidos ldquopolidosrdquo e submetidos agraves certezas construiacutedas na praacutetica e no vivido (TARDIF 2012 p 234)

Para Tardif (2012 p 39) o professor eacute ldquoalgueacutem que deve conhecer sua mateacuteria sua disciplina e

seu programa aleacutem de possuir certos conhecimentos relativos agraves ciecircncias da educaccedilatildeo e agrave pedagogia

e desenvolver um saber praacutetico baseado em sua experiecircncia cotidiana com os alunosrdquo

Sendo assim existe um ldquolugarrdquo onde se aprende a teoria a praacutetica e ambas se entrelaccedilam

cujo encontro ocorre de forma dinacircmica Nessa direccedilatildeo Tardif (2012) em seu ldquoSaberes docentes e

formaccedilatildeo profissionalrdquo sugere que a formaccedilatildeo profissional e a formaccedilatildeo docente ocorram de forma

separada mencionando que a formaccedilatildeo profissional eacute aquela que se processa por meio da formaccedilatildeo

inicial do aluno no acircmbito da universidade e a formaccedilatildeo docente eacute concretizada no exerciacutecio da

profissatildeo propriamente dita isto eacute durante o exerciacutecio da praacutetica docente Os saberes dos professo-

res satildeo constituiacutedos e mobilizados cotidianamente para desenvolver as tarefas subjacentes agrave accedilatildeo

no espaccedilo escolar

Pelo exposto percebe-se que a formaccedilatildeo continuada dos professores natildeo deve ser entendida

como um processo cumulativo de informaccedilotildees bem como de conhecimentos mas deve buscar o de-

senvolvimento profissional e pessoal com foco no processo de desenvolvimento das competecircncias

poliacuteticas teacutecnicas e humanas do professor tendo em vista a melhoria da praacutetica profissional Antonio

Noacutevoa ensina que a formaccedilatildeo assume uma dimensatildeo maior que a realizaccedilatildeo de cursos quando afirma

que

A formaccedilatildeo natildeo se constroacutei por acumulaccedilatildeo (de cursos de conhecimentos ou de teacutecnicas) mas sim atraveacutes de um trabalho de reflexividade criacutetica sobre as praacuteticas e de (re)construccedilatildeo permanente de uma identidade pessoal Por isso eacute tatildeo importante investir a pessoa e dar um estatuto ao saber da experiecircncia (NOacuteVOA 2005 p25)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

449

Assim umas das criacuteticas feitas agrave formaccedilatildeo continuada concerne aos cursos pontuais geralmen-

te de curta duraccedilatildeo distantes das reais necessidades formativas do professor das demandas da sala de

aula dos desafios da praacutetica docente e desarticulados da formaccedilatildeo inicial do professor Essa questatildeo

estaacute expressa conforme a seguir

As praacuteticas de formaccedilatildeo continuada tecircm se configurado predominante em eventos pontuais ndash cursos oficinas seminaacuterios e palestras que de modo geral natildeo respon-dem agraves necessidades pedagoacutegicas mais imediatas dos professores e nem sempre se constituem num programada articulado e planejado como tal (MEC 1999 p 41)

Na perspectiva da formaccedilatildeo docente Yeda da Silva Porto realizou um estudo sobre as dife-

rentes concepccedilotildees sobre a formaccedilatildeo em geral e a formaccedilatildeo continuada e suas relaccedilotildees com a praacute-

tica pedagoacutegica Para essa autora a educaccedilatildeo eacute uma praacutetica social estruturada sob um novo tempo

repleto de mudanccedilas epistemoloacutegicas sociais e tecnoloacutegicas que impotildeem novas exigecircncias Diante

dos dilemas que o professor vivencia na sociedade contemporacircnea faz-se necessaacuterio que ele esteja

em constante formaccedilatildeo

Segundo a pesquisadora

[] a formaccedilatildeo continuada eacute importante condiccedilatildeo de mudanccedila das praacuteticas pedagoacutegi-cas entendida a primeira fundamentalmente como processo crescente de autonomia do professor e da unidade escolar e a segunda como processo de pensar-fazer dos agentes educativos e em particular dos professores com o propoacutesito de concretizar o objetivo educativo da escola (PORTO 2000 p 15)

Nesse sentido os dilemas presentes na sociedade e vivenciados pelo professor na escola tecircm

demandado a participaccedilatildeo dos docentes em alguns cursos para responder a sua situaccedilatildeo concreta de

ensino e uma das formas de realizaccedilatildeo da formaccedilatildeo continuada tem sido por meio da modalidade de

educaccedilatildeo a distacircncia

2 A EDUCACcedilAtildeO A DISTAcircNCIA NA FORMACcedilAtildeO DOCENTE

A introduccedilatildeo da EAD no Brasil remete ao uso do raacutedio que corresponde ao marco histoacuterico da

implantaccedilatildeo das primeiras raacutedios no paiacutes No entanto a primeira e mais longa geraccedilatildeo de EAD no

Brasil assim como no mundo se deu por meio do uso de material textual impresso e foi sucedida

por geraccedilotildees que ao longo do tempo acrescentaram o uso de elementos audiovisuais (televisatildeo e

viacutedeo) raacutedio e telefone Posteriormente veio a geraccedilatildeo das telecomunicaccedilotildees e o uso da informaacuteti-

ca inicialmente sem ligaccedilatildeo agrave rede ateacute chegar a geraccedilatildeo na qual haacute a criaccedilatildeo de ambientes virtuais

de aprendizagem com processos de ensino - aprendizagem multimidiaacuteticos e multilaterais (GARCIA

ARETIO 2001)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

450

Nesse sentido Garcia Aretio (2001) menciona a existecircncia de etapas ou fases distintas da EAD

sendo elas o ensino por correspondecircncia que surge com o desenvolvimento da impressatildeo e dos ser-

viccedilos postais o ensino multimiacutedia o ensino telemaacutetico e por uacuteltimo uma quarta geraccedilatildeo a do ensino

mediado por computador e com uso da internet

Observa-se que essa classificaccedilatildeo se fundamenta na abordagem didaacutetica bem como na tipifi-

caccedilatildeo do material e da comunicaccedilatildeo utilizado em cada periacuteodo A literatura registra que na deacutecada de

1990 surgiram as primeiras ferramentas de apoio a aprendizagem virtual no Brasil oferecendo assim o

suporte da tecnologia digital possibilitando maior interaccedilatildeo entre os sujeitos de forma natildeo presencial

desenvolvendo a EAD on-line

A legitimidade e regulamentaccedilatildeo da EAD no Brasil estatildeo expressas no Decreto nordm 249498 Art

1ordm levando a Educaccedilatildeo a Distacircncia ter uma definiccedilatildeo oficial

A Educaccedilatildeo a Distacircncia eacute uma forma de ensino que possibilita a autoaprendizagem com a mediaccedilatildeo de recursos didaacuteticos sistematicamente organizados apresentados em diferentes suportes de informaccedilatildeo utilizados isoladamente ou combinados e vei-culados pelos diversos meios de comunicaccedilatildeo

Assim o Governo procurou criar condiccedilotildees para a viabilizaccedilatildeo de cursos utilizando a modalida-

de EAD o que proporcionou o crescimento e o interesse em adotar essa modalidade de ensino tendo

em vista alguns fatores que a EAD apresenta como a possibilidade de fazer chegar o conhecimento

de modo simultacircneo a um grande nuacutemero de pessoas independente do espaccedilo geograacutefico a accedilatildeo

pedagoacutegica permitida pela sofisticaccedilatildeo dos instrumentos didaacuteticos utilizados para o desenvolvimento

do processo ensino-aprendizagem mediante o uso das tecnologias digitais a flexibilidade de tempo e

espaccedilo permitida possibilitando a formaccedilatildeo para aqueles que estavam agrave margem das accedilotildees formati-

vas existentes proveniente da falta de tempo ou pela distacircncia dos espaccedilos educacionais

O crescimento da Educaccedilatildeo a Distacircncia nos dias atuais tem provocado muitas mudanccedilas nos

processos formativos do professor como a criaccedilatildeo da Universidade Aberta do Brasil (UAB) em 2005

em decorrecircncia do Foacuterum de Educaccedilatildeo das Secretarias de Estado que busca uma integraccedilatildeo articu-

laccedilatildeo e experimentaccedilatildeo de um Sistema Nacional de Educaccedilatildeo Superior Nesse contexto o modelo de

implementaccedilatildeo da UAB tambeacutem conta com a utilizaccedilatildeo de recursos televisivos e radiofocircnicos aulas

complementares transmitidas por meio de viacutedeo conferecircncia encontros presenciais contato telefocircni-

co e a utilizaccedilatildeo da internet bem como o apoio da tutoria presencial que auxilia os alunos nos seus

estudos nos momentos presenciais e a distacircncia mediada pelos recursos tecnoloacutegicos de acordo com

o Decreto nordm 5800 de 8 junho de 2006

Mediante a implementaccedilatildeo da UAB o Ministeacuterio da Educaccedilatildeo (MEC) lanccedilou o Plano Nacional

de Formaccedilatildeo de Professores da Educaccedilatildeo Baacutesica utilizando uma plataforma especiacutefica para esse fim

a Plataforma Freire envolvendo a Coordenaccedilatildeo de Aperfeiccediloamento de Pessoal de Niacutevel Superior

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

451

(Capes) e as Diretorias de Educaccedilatildeo Baacutesica Presencial e de Educaccedilatildeo a Distacircncia Os cursos destina-

dos aos professores satildeo ofertados pelas instituiccedilotildees formadoras respaldadas pelos Foacuteruns Estaduais

Permanentes de Apoio agrave Formaccedilatildeo Docente com base legal apoiada no Decreto ndeg 6755 de 29 de

janeiro de 2009

Sendo assim a EAD adquire cada vez mais espaccedilo como modalidade de ensino capaz de pro-

porcionar a oferta de cursos a um maior nuacutemero de pessoas democratizando o conhecimento tendo

em vista a necessidade de desenvolver novas praacuteticas formativas

3 O CAMPOLOCUS DA PESQUISA

O locus dessa investigaccedilatildeo foi o municiacutepio de Icoacute localizado na regiatildeo centro-sul do estado do

Cearaacute que foi a terceira vila instalada no Cearaacute e possui um siacutetio arquitetocircnico datado do seacuteculo XVIII

A povoaccedilatildeo foi elevada agrave terceira vila do Cearaacute em 1738 logo apoacutes Aquiraz e Fortaleza Em 1842 ob-

teve a categoria de cidade ldquodevido agrave sua importacircncia econocircmica Icoacute foi uma das cidades que tiveram

projetos urbaniacutesticos planejados na corte de Lisboardquo (OCEANOS 2000 p105)

Os estudos desenvolvidos por Studart sobre a vila do Icoacute evidenciam que esta ldquoteve precoce de-

senvolvimento e alcanccedilou raacutepida hegemonia sobre os demais povos do interior cearense em razatildeo de

sua posiccedilatildeo privilegiadardquo (2002 p 44) Desse modo os avanccedilos no desenvolvimento da Vila em pleno

ciclo do gado e do algodatildeo ganharam expressatildeo no cenaacuterio da proviacutencia do Cearaacute transformando-se

em entreposto comercial decorrente da localizaccedilatildeo de grandes fazendas no seu acircmbito territorial

Dessa forma surgiu a Vila de Icoacute que no final do seacuteculo XVIII e iniacutecio do seacuteculo XIX atingiu seu

auge como Vila colonial cearense Embora decorridos seacuteculos ainda hoje satildeo visiacuteveis as marcas desse

periacuteodo de esplendor e riquezas sobretudo na arquitetura sobrados igrejas teatro e outras edifi-

caccedilotildees que pela importacircncia histoacuterica e cultural receberam tombamento do Instituto do Patrimocircnio

Histoacuterico e Artiacutestico Nacional (Iphan)

O Largo do Themberg patrimocircnio nacional abriga algumas das principais manifestaccedilotildees reli-

giosas em torno da Igreja do Senhor do Bonfim haacute seacuteculos ruas largas igrejas sobrados e casarotildees

bem como as manifestaccedilotildees culturais e artiacutesticas em torno do Teatro da Ribeira dos Icoacutes construiacutedo

no seacuteculo XIX

Caracterizado o campolocus da investigaccedilatildeo apresentamos os sujeitos da pesquisa que foram

formados por 14 professores das escolas dos sete municiacutepios de abrangecircncia da 17ordf Coordenadoria

Regional de Desenvolvimento da Educaccedilatildeo (Crede Icoacute) que integra as 20 regionais da Secretaria de

Educaccedilatildeo do Estado do Cearaacute As Credes abrangem um conjunto de municiacutepio por regiatildeo geograacutefica

e suas escolas sendo responsaacutevel pela gestatildeo e desenvolvimento das poliacuteticas educacionais estaduais

Os sujeitos natildeo seratildeo identificados pelo nome mas por nuacutemeros de 01 a 14

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

452

Os questionaacuterios aplicados continham questotildees fechadas e abertas que abordavam sobre o

Curso de Disseminadores da Educaccedilatildeo Fiscal

4 O CURSO DE DISSEMINADORES DE EDUCACcedilAtildeO FISCAL

Como parte integrante do Programa Nacional de Educaccedilatildeo Fiscal (PNEF) o Curso Dissemina-

dores da Educaccedilatildeo Fiscal ofertado pela Escola de Administraccedilatildeo Fazendaacuteria (Esaf) foi pensado com

o objetivo de contribuir com a formaccedilatildeo dos sujeitos com foco na participaccedilatildeo nos processos de

geraccedilatildeo aplicaccedilatildeo e fiscalizaccedilatildeo dos recursos puacuteblicos cujo objetivo principal eacute a realizaccedilatildeo de leitu-

ras e estudos sobre a temaacutetica O referido curso oferecido na modalidade de EAD inicialmente tinha

uma carga horaacuteria de 80 horas posteriormente ofereceu aos participantes a opccedilatildeo de ampliaccedilatildeo da

carga horaacuteria para 120 horas mediante a elaboraccedilatildeo de um projeto na temaacutetica da Educaccedilatildeo Fiscal Eacute

importante ressaltar que a execuccedilatildeo do projeto pedagoacutegico natildeo era obrigatoacuteria bastava apenas a sua

elaboraccedilatildeo para a certificaccedilatildeo de 120ha A carga horaacuteria atual do curso eacute de 160h

A realizaccedilatildeo do curso conta com a parceria da Secretaria da Fazenda do Estado do Cearaacute (Se-

faz) e Secretaria da Educaccedilatildeo (Seduc) e destina-se aos servidores de ambas as secretarias bem como

para a Secretaria Municipal de Educaccedilatildeo de Fortaleza (SME) Na Seduc o curso eacute destinado preferen-

cialmente aos professores em funccedilatildeo docente podendo tambeacutem contemplar gestores e professores

lotados nos Centros de Multimeios das escolas laboratoacuterio escolar de informaacutetica e servidores da

Crede e Seduc Atualmente o curso eacute aberto ao puacuteblico em geral tendo sido bastante procurado por

universitaacuterios Outro aspecto a considerar eacute a tutoria do curso a Esaf realiza uma consistente formaccedilatildeo

dos seus tutores bem como acompanhamento e cursos de aperfeiccediloamento

Nesse contexto a experiecircncia do curso de Disseminadores da Educaccedilatildeo Fiscal traz em sua pro-

posta uma formaccedilatildeo para os professores com o intuito de que os conhecimentos adquiridos sejam

disseminados com os estudantes na escola e com a comunidade

O nuacutemero de estudantes por turma depende do nuacutemero de vagas destinadas para cada Estado

que de acordo com as vagas recebidas distribui para as instituiccedilotildees parceiras Nas Credes apoacutes a for-

maccedilatildeo da turma o tutor que a acompanha efetua a matriacutecula no ambiente virtual e informa os nomes

dos inscritos para a coordenaccedilatildeo para que as inscriccedilotildees sejam validadas

Durante o curso satildeo trabalhados cinco moacutedulos especiacuteficos sendo quatro de conteuacutedo e um

sobre elaboraccedilatildeo de projetos pedagoacutegicos e planos de accedilatildeo Sendo que o primeiro traz como tema

a Educaccedilatildeo Fiscal no Contexto Social cujo conteuacutedo versa sobre o processo de criaccedilatildeo do programa

missatildeo valores princiacutepios norteadores diretrizes objetivos valores Faz ainda uma retrospectiva his-

toacuterica da educaccedilatildeo no Brasil (BRASIL 2008)

O moacutedulo dois trata da relaccedilatildeo Estado-Sociedade apresentando conteuacutedos que buscam com-

preendecirc-la assim como a evoluccedilatildeo histoacuterica do conceito de Estado e Sociedade (BRASIL 2008)

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

453

O moacutedulo trecircs traz uma discussatildeo sobre o Sistema Tributaacuterio Nacional fazendo um aprofunda-

mento sobre o conceito de Estado trata dos serviccedilos puacuteblicos apresenta a histoacuteria do tributo no Brasil

conceituando tributo e mostrando as obrigaccedilotildees tributaacuterias (BRASIL 2008)

O quarto moacutedulo aborda conteuacutedos tocantes agrave gestatildeo democraacutetica dos recursos puacuteblicos

dessa forma eacute estudado nesse moacutedulo orccedilamento puacuteblico gestatildeo financeira contabilidade das

despesas puacuteblicas oacutergatildeos fiscalizadores das contas puacuteblicas Lei de Responsabilidade Fiscal Lei de

Responsabilidade Social e situa o programa de educaccedilatildeo fiscal dentro no contexto do controle social

(BRASIL 2008)

E por fim haacute um quinto moacutedulo referente a Projeto Pedagoacutegico tendo em vista que o aluno

deveraacute apresentar um projeto pedagoacutegico relacionado aos temas estudados ou um Plano de Accedilatildeo em

Educaccedilatildeo Fiscal a ser desenvolvido

A formaccedilatildeo conta com momentos de estudos presenciais e a distacircncia Para os estudos a dis-

tacircncia utiliza-se o ambiente virtual de aprendizagem que conta com a sala de aula destinado ao es-

tudo do conteuacutedo realizaccedilatildeo das postagens dos foacuteruns de discussatildeo sendo um foacuterum relativo a cada

moacutedulo realizaccedilatildeo de exerciacutecios troca de experiecircncias bem como para acesso a biblioteca virtual

com a disponibilidade de artigos textos leis e informaccedilotildees para aprofundamento das discussotildees Na

mediaccedilatildeo a tutoria conta com utilizaccedilatildeo de ferramentas siacutencronas utilizadas em tempo real ou seja

ao mesmo tempo como chat mensagens instantacircneas telefone e assiacutencronas utilizadas em tempo

diferente como foacuterum de discussatildeo e e-mail

Com base nos conhecimentos adquiridos na formaccedilatildeo os professores participantes trabalha-

ram os conteuacutedos do curso com os alunos como tema transversal e interdisciplinar Assim foram de-

senvolvidas atividades com os estudantes do Ensino Meacutedio inserindo a temaacutetica da Educaccedilatildeo Fiscal

mediante a realizaccedilatildeo de atividades como Leitura e interpretaccedilatildeo de textos sobre a importacircncia dos

tributos Visitaccedilatildeo agrave Cacircmara de Vereadores em audiecircncias puacuteblicas (planejamento orccedilamentaacuterio pres-

taccedilatildeo de contas) Acesso ao siacutetio Leatildeozinho (wwwleaozinhoreceitafazendagovbr) interpretaccedilatildeo do

coacutedigo do consumidor realizaccedilatildeo de pesquisas sobre o haacutebito de exigir a nota fiscal

As atividades enfatizaram ainda o acompanhamentomonitoramento dos recursos financeiros

recebidos pela escola destinados para o consumo serviccedilo e capital aplicaccedilatildeo planejamento operacio-

nal participaccedilatildeo da comunidade escolar na definiccedilatildeo de prioridades e supervisatildeo dos cronogramas de

desembolso avaliaccedilatildeo dos projetos baacutesicos e prestaccedilatildeo de contas

Os professores utilizaram tambeacutem as contas de aacutegua luz e telefone levadas pelos alunos para

a sala de aula como subsiacutedios para anaacutelises e estudos de aspectos especiacuteficos fraccedilotildees e operaccedilotildees

de nuacutemeros decimais ndash contribuiccedilotildees impostos e taxas que incidem sobre esses serviccedilos informaccedilotildees

teacutecnicas sobre monitoramento e controle do consumo

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

454

5 A FORMACcedilAtildeO EM DISSEMINADORES DE EDUCACcedilAtildeO FISCAL NA CREDE 17

Para analisar a formaccedilatildeo na Crede 17 foi aplicado um questionaacuterio com os professores envol-

vidos na formaccedilatildeo com o intuito de investigar a percepccedilatildeo dos professores sobre o Curso de Dissemi-

nadores da Educaccedilatildeo Fiscal

Os sujeitos envolvidos nessa pesquisa foram 14 professores em funccedilatildeo docente nas 14 escolas

puacuteblicas estaduais que compotildeem os 07 municiacutepios da 17ordf Crede - Icoacute (Coordenadoria Regional de

Desenvolvimento da Educaccedilatildeo) sendo um professor de cada unidade escolar cursistas da turma 269

ndash DEF2ordm semestre ndash 2008 ndash CE 33 do curso de Disseminadores da Educaccedilatildeo Fiscal Todos os partici-

pantes da pesquisa estatildeo em funccedilatildeo docente possuem licenciatura plena e possuem carga horaacuteria na

escola de 40 horas semanais

No decorrer do estudo verificou-se o interesse dos professores participantes do curso ao de-

senvolverem atividades na escola como confecccedilatildeo de cartazes encenaccedilatildeo de peccedilas paroacutedias ativida-

des executadas no laboratoacuterio de informaacutetica no centro de multimeios e na comunidade

Sendo assim o Curso de Disseminadores da Educaccedilatildeo Fiscal realizado na Crede 17 provocou

mudanccedilas na atuaccedilatildeo do professor que passou a trabalhar a temaacutetica com os alunos em sala de aula

bem como a desenvolver atividades envolvendo a comunidade escolar e a local no tocante agrave sensibi-

lizaccedilatildeo conscientizaccedilatildeo e participaccedilatildeo do cidadatildeo mediante os recursos puacuteblicos

De acordo com a pesquisa 100 dos entrevistados disseram ter tomado conhecimento do

curso por meio da Crede e consideraram baacutesicos o seu conhecimento de Informaacutetica ao ingressar

no curso

Quando perguntados se jaacute tinham realizado curso na modalidade de EAD antes 60 dos pro-

fessores disseram que sim Isso revela que a maioria dos professores participantes do curso em epiacute-

grafe e envolvidos na pesquisa jaacute participa de cursos de formaccedilatildeo continuada na modalidade de EAD

mediante a utilizaccedilatildeo das ferramentas tecnoloacutegicas No tocante ao conteuacutedo do curso 100 avaliaram

como excelente o que revela que os professores sentem a necessidade da formaccedilatildeo continuada prin-

cipalmente na temaacutetica da Educaccedilatildeo Fiscal com o intuito de atender as novas demandas e viabilidade

de dialogar com as mudanccedilas do tempo presente

O Curso Disseminadores da Educaccedilatildeo Fiscal se desenvolveu com o uso de ferramentas variadas

o que motivou a participaccedilatildeo e a realizaccedilatildeo das atividades de todos os envolvidos na formaccedilatildeo O

curso contou com a utilizaccedilatildeo de ambiente virtual de aprendizagem bem como o uso de ferramentas

siacutencronas e assiacutencronas Sobre essa questatildeo 100 dos professores responderam que acharam exce-

lente o AVA bem como os materiais impressos O que revela que o uso das miacutedias integradas favorece

o sucesso dos cursos ofertados na modalidade de EAD

No tocante ao conteuacutedo do curso os professores apontam que eacute muito significativo e de fun-

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

455

damental importacircncia para a compreensatildeo da Educaccedilatildeo Fiscal bem como para o exerciacutecio da cida-

dania Dos 14 professores envolvidos na pesquisa quando perguntados sobre o conteuacutedo do curso

apontaram como positivos os conteuacutedos estudados bem como seu aprendizado em relaccedilatildeo agrave temaacute-

tica Transcrevemos alguns argumentos por eles apresentados da seguinte maneira

O conteuacutedo do curso me trouxe grandes aprendizados ajudou a enxergar coisas que antes eu natildeo enxergava jaacute no estudo do Moacutedulo 1 (Educaccedilatildeo Fiscal no Contexto So-cial) percebi que precisamos exercer a cidadania frente os serviccedilos puacuteblicos ofereci-dos agrave populaccedilatildeo (Professor 01)O conteuacutedo do curso eacute uma leitura obrigatoacuteria para o professor porque provoca uma reflexatildeo sobre a relaccedilatildeo estado-sociedade frente agrave carga tributaacuteria cobrada pelo es-tado e de outro lado a qualidade dos serviccedilos puacuteblicos oferecidos agrave sociedade E a tutoria eacute fundamental para nos acompanhar (Professor 02)O conteuacutedo do curso foi excelente principalmente porque a metodologia do curso eacute muito boa natildeo sobrecarrega o cursista com atividades o tutor acompanha bem as discussotildees nos foacuteruns provoca a leitura e noacutes natildeo temos desculpas de falta de com-putador Internet pois aleacutem do conteuacutedo no ambiente virtual recebemos tambeacutem os moacutedulos impressos o que facilita bastante o estudo (Professor 03)

Dessa forma 100 dos professores envolvidos na pesquisa apresentaram satisfaccedilatildeo com

os conteuacutedos trabalhados no curso em depoimento de igual teor dos depoimentos transcritos

dos professores 01 e 03 que revelam em suas falas a importacircncia da formaccedilatildeo realizada como o

significado dos conteuacutedos trabalhados no processo formativo e o atendimento agraves necessidades do

exerciacutecio da docecircncia

No caso especifico que estamos estudando o uso das miacutedias integradas favoreceu a aprendiza-

gem e consequentemente o sucesso do curso como revelam os professores em suas falas Vale des-

tacar tambeacutem o papel fundamental da tutoria nos cursos de EAD como mediaccedilatildeo e interaccedilatildeo entre os

cursistas e apoio no desenvolvimento das atividades A importacircncia do tutor foi destacada por todos

os pesquisados e estaacute expressa na fala dos docentes Vejamos alguns dos depoimentos

O tutor ajudou muito a nos situar no curso tirar duacutevidas e a participar das discussotildees nos foacuteruns (Professor 06)A resposta do tutor aos e-mails era quase imediata sem duacutevida foi de suma impor-tacircncia o acompanhamento do tutor [] Aprendi sobre usuaacuterios de EAD no encontro presencial e o perfil do aluno de EAD (Professor 11)Destaco o tutor no acompanhamento incentivo e contribuiccedilatildeo nas discussotildees do foacute-rum e durante todo o curso e o encontro presencial onde o tutor mostrou a proposta do curso o ambiente a sala de aula o perfil do aluno de EAD (Professor 13)

Vale salientar que o Curso de Disseminadores da Educaccedilatildeo Fiscal contou com chats foacuteruns

contato por telefone material impresso e o acompanhamento do tutor A turma investigada teve

100 de acesso e conclusatildeo do curso (BRASIL Relatoacuterio ESAF 2008) o que mostra que a EAD eacute uma

modalidade de ensino que pode se adaptar com facilidade ao universo do aluno adulto cujos fatores

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

456

motivacionais satildeo autogerenciados podendo ser aplicada em larga escala considerando o desenvol-

vimento de uma estrutura que flexibilize o diaacutelogo e a interaccedilatildeo

Os foacuteruns foram avaliados pelos professores como positivos por propiciar uma ampla discus-

satildeo em torno da temaacutetica Sobre essa questatildeo os professores assim se pronunciam

Eu demorei muito a acessar o primeiro foacuterum soacute depois de ler o moacutedulo 01 todo reler e refletir eacute que fui participar das discussotildees e aprendi muito sobre o assunto na inte-raccedilatildeo com os colegas Participei de um chat pela primeira vez foi muito bom A ajuda do tutor foi fundamental para superar as dificuldades que surgiram (Professor 07)Eu me viciei no curso vivia acessando o conteuacutedo dos moacutedulos para participar das discussotildees dos foacuteruns que foram muito boas Como soacute eacute um foacuterum para cada moacutedulo a gente natildeo fica carregada de atividade fazendo de qualquer jeito apenas para cum-prir a tarefa o que ajuda bastante (Professor 08)O ambiente virtual eacute muito praacutetico com boa distribuiccedilatildeo das ferramentas os foacuteruns nos ajudaram a refletir sobre os conteuacutedos trabalhados nos 4 moacutedulos Os telefone-mas do tutor tambeacutem ajudava a gente a cumprir o cronograma e a comunicaccedilatildeo via e-mail foi muito eficiente (Professor 09)O que eu achei mais significativo no curso foi o material impresso pois eu natildeo tenho Internet em casa entatildeo estudava o material no moacutedulo impresso e acessava na es-cola para responder os foacuteruns e fazer as avaliaccedilotildees Destaco nos foacuteruns agrave mediaccedilatildeo do tutor motivando a participaccedilatildeo de todos incentivando a leitura comentando as respostas e incentivando a disseminaccedilatildeo dos conteuacutedos na escola (Professor 10)

A narrativa dos professores revela que os foacuteruns contribuiacuteram para a constituiccedilatildeo do conheci-

mento sobre a temaacutetica estudada Na concepccedilatildeo dos professores a formaccedilatildeo continuada eacute importan-

te e necessaacuteria pois quando indagamos sobre esse aspecto podemos extrair das falas dos professores

que o exerciacutecio da docecircncia exige um constante aperfeiccediloamento fazendo dos professores ldquoeternos

aprendizesrdquo Essa percepccedilatildeo eacute evidenciada no discurso dos professores aqui transcrevemos alguns

Quando eu fiz o Normal (Curso Pedagoacutegico ndash Profissionalizante) a gente era profes-sora diplomada e isso era suficiente Mas hoje a gente precisa da Licenciatura da poacutes-graduaccedilatildeo e de aperfeiccediloamento constante (Professora 05)A gente precisa de uma formaccedilatildeo como essa que nos ajude a lidar com certos temas que estatildeo presentes na sociedade e portanto na escola Trabalhando com os alunos ateacute peccedila eles criaram e apresentaram na escola (Professora 04)[] Natildeo temos como fugir da formaccedilatildeo continuada o nosso ofiacutecio exige As atividades realizadas com os alunos envolvendo a temaacutetica da Educaccedilatildeo Fiscal foram significa-tivas para os alunos por juntar teoria e praacutetica entre outras mudanccedilas no compor-tamento dos alunos destaco o zelo pelo patrimocircnio da escola e a exigecircncia da nota fiscal no comeacutercio local (Professora 14)

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Por meio da realizaccedilatildeo deste trabalho esperamos oferecer subsiacutedios teoacutericos e praacuteticos que

contribuam para o significado da formaccedilatildeo continuada sobretudo na modalidade de Educaccedilatildeo a

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

457

Distacircncia uma vez que o movimento de introduccedilatildeo da EAD com a utilizaccedilatildeo das tecnologias digitais

tem atingido vaacuterios segmentos educacionais em diferentes niacuteveis e complexidades O resultado da

pesquisa revelou que os professores compreendem a necessidade da formaccedilatildeo continuada conforme

expresso em seus depoimentos Mostra que a maioria dos professores jaacute havia realizado algum curso

na modalidade de EAD e que os professores que fizeram o curso pela primeira vez utilizando a moda-

lidade de EAD ficaram entusiasmados com o ambiente virtual de aprendizagem com as ferramentas

de interaccedilatildeo utilizadas e com a mediaccedilatildeo do tutor superaram suas dificuldades iniciais A pesquisa

evidenciou que o uso das miacutedias integradas favoreceu o aprendizado e propiciou o sucesso no curso

Na anaacutelise da pesquisa verificou-se que a tutoria foi fundamental para o incentivo ao acesso

do curso a participaccedilatildeo nas atividades a motivaccedilatildeo para superar as dificuldades bem como para o

processo de constituiccedilatildeo da aprendizagem Considerando a proposta do Curso de Disseminadores

da Educaccedilatildeo Fiscal que visa agrave contribuiccedilatildeo com a formaccedilatildeo permanente dos sujeitos com foco na

participaccedilatildeo nos processos de geraccedilatildeo aplicaccedilatildeo e fiscalizaccedilatildeo dos recursos puacuteblicos os professo-

res ao participar do curso realizam atividades com os alunos abordando a temaacutetica Ressaltamos

a importacircncia do trabalho de investigaccedilatildeo para o contexto educacional envolvendo a formaccedilatildeo

continuada de professores na modalidade de EAD sobretudo na temaacutetica da Educaccedilatildeo Fiscal por

propiciar a participaccedilatildeo dos sujeitos da sociedade na fiscalizaccedilatildeo dos recursos puacuteblicos o que vem

ao encontro de recentes movimentos em prol da democratizaccedilatildeo da informaccedilatildeo da transparecircncia e

do combate agrave corrupccedilatildeo

Os achados da pesquisa revelam que a sensibilizaccedilatildeo e a mobilizaccedilatildeo dos cursistas contribuem

de forma significante para o sucesso da formaccedilatildeo ou seja a maneira como a turma eacute formada incide

sobre os resultados de conclusatildeo do curso Eacute portanto relevante o papel da tutoria para ajudar na

superaccedilatildeo das dificuldades dos cursistas bem como na aprendizagem dos conteuacutedos estudados

Observamos a relaccedilatildeo de identificaccedilatildeo e cumplicidade estabelecida entre os professores e o

curso Os professores perceberam no curso uma possibilidade de formaccedilatildeo continuada para atualiza-

ccedilatildeo e ressignificaccedilatildeo dos seus conhecimentos A identificaccedilatildeo com o curso proporcionou a motivaccedilatildeo

para aplicar as temaacuteticas estudadas por meio de atividades realizadas com a comunidade escolar e

local Portanto no desenvolvimento desta pesquisa nos deparamos com a execuccedilatildeo dos projetos

pedagoacutegicos quando a obrigatoriedade era apenas para a elaboraccedilatildeo no entanto a percepccedilatildeo dos

professores de pertinecircncia do curso e dos temas estudados levou-os a serem disseminadores dos co-

nhecimentos adquiridos

15 anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal do Estado do Cearaacute

458

REFEREcircNCIAS

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COMISSAtildeO NACIONAL PARA AS COMEMORACcedilOtildeES DOS DESCOBRIMENTOS PORTUGUESES Cearaacute no seacuteculo XVII Icoacute Aracati e Sobral Revista Oceanos n 41 Lisboa 2000 p 105-108

GARCIA ARETIO Lourenzo Educacioacuten a la Distancia la teoria y la pratica Espantildea UNED 2001

IMBERNON Francisco Formaccedilatildeo Continuada de Professores Traduccedilatildeo Juliana dos Santos Padilha Porto Alegre Artmed 2010

NOacuteVOA Antoacutenio (Coord) Os professores e sua formaccedilatildeo Lisboa Dom Quixote 1995

PORTO Yeda da Silva Formaccedilatildeo continuada a praacutetica pedagoacutegica recorrente In MARIN Alda J(Org) Educaccedilatildeo continuada Campinas Papirus 2000

STUDART FILHO Carlos Paacuteginas de histoacuteria preacute-histoacuteria do Cearaacute Fortaleza Instituto do Cearaacute 1966

TARDIF Maurice Saberes docentes e formaccedilatildeo profissional Petroacutepolis Vozes 2012

TORRES Rosa Maria Tendecircncias da formaccedilatildeo docente nos anos 90 In WARDE Mirian J (Org) Novas poliacuteticas educacionais criacuteticas e perspectivas Satildeo Paulo Programa de Estudos Poacutes-graduados em Educaccedilatildeo Histoacuteria e Filosofia da Educaccedilatildeo da Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica de Satildeo Paulo p 173-191 1998

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Posfaacutecio Em 1998 o Governo do Estado do Cearaacute reconhecendo a relevacircncia de disseminar informaccedilotildees

relativas agrave importacircncia social do tributo instituiu o Programa Estadual de Educaccedilatildeo Tributaacuteria Decorri-

dos quinze anos e observando o passado verifica-se que muito foi realizado mas muitos passos ainda

precisam ser concretizados A sociedade cearense como as das demais unidades regionais ainda natildeo

reconhece em sua plenitude os malefiacutecios causados pela sonegaccedilatildeo fiscal Apesar dos esforccedilos das

administraccedilotildees tributaacuterias a praacutetica de evadir tributos ainda eacute socialmente tolerada natildeo gerando o

estigma social provocado por outros atos criminosos

Natildeo podemos classificar nosso paiacutes como uma naccedilatildeo pobre De fato comparaccedilotildees interna-

cionais indicam que o Brasil eacute um paiacutes de renda per capita meacutedia Natildeo obstante somos um paiacutes com

milhotildees de pessoas em situaccedilatildeo de fragilidade social principalmente na Regiatildeo Nordeste Nosso paiacutes

de renda meacutedia soacute possui muitos pobres porque eacute o paiacutes das desigualdades apresentando uma das

maiores taxas de concentraccedilatildeo de renda do mundo Os resultados negativos da desigualdade satildeo bem

conhecidos violecircncia conflitos sociais baixo crescimento econocircmico elevados gastos com atividades

de poliacutecia e carceragem

A reduccedilatildeo da desigualdade de renda em ambiente democraacutetico soacute eacute possiacutevel por dois meios

Primeiro por um sistema de transferecircncias diretas de recursos aos estratos inferiores da piracircmide de

renda Segundo por meio de uma tributaccedilatildeo justa que arrecade os tributos de forma progressiva

cobrando impostos mais elevados das pessoas com maior renda e patrimocircnio

O Sistema Tributaacuterio Brasileiro eacute fortemente regressivo porque utiliza prioritariamente a tribu-

taccedilatildeo indireta Por tradiccedilatildeo e por opccedilatildeo dos Poderes Legislativo e Executivo impostos sobre a renda e

sobre o patrimocircnio nos quais a progressividade pode ser utilizada com facilidade satildeo pouco explo-

rados no paiacutes Um elemento necessaacuterio para o desenvolvimento econocircmico brasileiro eacute sem duacutevida

a correccedilatildeo do nosso Sistema Tributaacuterio direcionando-o para um modelo progressivo Desta forma a

Educaccedilatildeo Fiscal deve ir aleacutem da simples conscientizaccedilatildeo da sociedade quanto agrave importacircncia do tributo

e aos malefiacutecios da sonegaccedilatildeo fiscal devendo tambeacutem agir de modo a conscientizar o cidadatildeo-eleitor

a exigir dos seus representantes as mudanccedilas legislativas que conduzam agrave justiccedila fiscal

A sonegaccedilatildeo fiscal intensifica o problema da desigualdade Os agentes econocircmicos que se

beneficiam do crime tributaacuterio em sua maior parte satildeo aqueles que possuem maior renda Assim as

poliacuteticas de desincentivo agrave evasatildeo fiscal indiretamente atuam no sentido de obtermos uma sociedade

com mais equidade

Evidentemente a oposiccedilatildeo inicial agrave sonegaccedilatildeo eacute feita pelos aparelhos coercitivos das admi-

nistraccedilotildees tributaacuterias Entretanto natildeo satildeo apenas a detecccedilatildeo da infraccedilatildeo a aplicaccedilatildeo da multa e a

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execuccedilatildeo do creacutedito tributaacuterio as accedilotildees governamentais que devem ser adotadas para inibir a evasatildeo

Apesar da importacircncia talvez primazia da possibilidade de puniccedilatildeo como elemento incentivador do

cumprimento das obrigaccedilotildees tributaacuterias a sonegaccedilatildeo eacute impactada por aspectos culturais bem como

pela forma como os recursos arrecadados satildeo gastos

Existe um alto grau de toleracircncia cultural em relaccedilatildeo agrave sonegaccedilatildeo fiscal em nosso paiacutes Apesar

dessa constataccedilatildeo isso natildeo deve ser entendido como um elemento determiniacutestico e imutaacutevel A cul-

tura eacute dinacircmica a exemplo das grandes transformaccedilotildees culturais em relaccedilatildeo ao papel da mulher na

sociedade e a uma melhor aceitaccedilatildeo da orientaccedilatildeo sexual do indiviacuteduo a caracterizaccedilatildeo cultural da

sonegaccedilatildeo como crime social importante pode ser efetivada Neste contexto as accedilotildees de Educaccedilatildeo

Fiscal satildeo elementos catalisadores dessa bem vinda transformaccedilatildeo cultural futura

A transparecircncia na utilizaccedilatildeo dos recursos arrecadados e a participaccedilatildeo ampla da sociedade

no estabelecimento de gastos prioritaacuterios tambeacutem satildeo determinantes do grau de evasatildeo fiscal Nessa

linha as poliacuteticas de Educaccedilatildeo Fiscal devem fomentar a participaccedilatildeo popular tanto no controle social

dos governos como na elaboraccedilatildeo de orccedilamentos participativos

Os problemas existentes satildeo muitos como falta de equidade do Sistema Tributaacuterio baixa puni-

ccedilatildeo aos indiviacuteduos que praticam a evasatildeo fiscal pouca transparecircncia nos gastos e orccedilamentos imposi-

tivos Entretanto esses entraves ao desenvolvimento satildeo um grande desafio sendo a Educaccedilatildeo Fiscal

certamente indispensaacutevel para a superaccedilatildeo desses problemas

Este livro intenciona contribuir com o debate sobre Educaccedilatildeo Fiscal apresentando a visatildeo e

experiecircncia de diversos pesquisadores de vaacuterias aacutereas do conhecimento Apesar do caraacuteter multidis-

ciplinar da Educaccedilatildeo Fiscal os artigos que compotildeem este livro foram apresentados em cinco eixos

temaacuteticos que buscaram agrupar os trabalhos correlatos O livro eacute editado pela Fundaccedilatildeo Sintaf em

parceria com a Secretaria da Fazenda do Estado do Cearaacute como uma das accedilotildees comemorativas dos

quinze anos do Programa de Educaccedilatildeo Fiscal no Cearaacute

Fortaleza 17 de marccedilo de 2014

Carlos Eduardo dos Santos Marino

Diretor Teacutecnico-Cientiacutefico da Fundaccedilatildeo Sintaf

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