Neoplasia Do Pancreas

download Neoplasia Do Pancreas

of 8

Transcript of Neoplasia Do Pancreas

INTRODUOO cncer de pncreas altamente letal, talvez porque tem incio muito insidioso e, portanto, j tarde demais quando em geral feito o seu diagnstico. Em 1899, Halsted descreveu a primeira resseco local para o carcinoma periampular. Embora os resultados tenham sido bons a curto prazo, o paciente logo faleceu de recidiva da leso. Em 1935, Alan Oldfather Whipple e associados descreveram uma tcnica para exciso radical do carcinoma periampular, marcando o incio de uma nova era para o tratamento dos tumores periampulares. A cirurgia era realizada em dois estgios:

1. Colecistogastrostomia para descompresso da via biliar e gastrojejunostomia paradescomprimir o estmago. Algumas semanas depois seria realizada a segunda parte.

2. Resseco em bloco da segunda poro do duodeno e um pequeno fragmento dacabea do pncreas, sem o restabelecimento de uma comunicao pancreticoentrica. A radioterapia e a quimioterapia tm ao muito limitada, podendo em alguns casos selecionados oferecer no mximo uma paliao moderada. Mais de cem anos depois da primeira tentativa descrita de se curar o cncer periampular, a cirurgia continua sendo o nico tratamento com possibilidade curativa oferecida pela medicina, ainda assim, com resultados que no podem ser considerados bons, com taxas de sobrevida de 6 a 28% em 5 anos em cirurgias que foram consideradas curativas, como mostra o quadro abaixo:

Autor Satake Nagakawa Grace Trede Cameron Yeo Braasch Ishikawa Tashiro

No. de pacientes 57 61 13 133 81 201 14 59 17

Sobrevida em 5 anos 28% 26% 25% 24% 21% 21% 17% 9% 6%

O prognstico para o cncer de corpo e cauda ainda pior, com rara ressecabilidade e cura ainda menor. A gastroduodeno-pancreatectomia tem uma taxa de mortalidade considerada alta, que varia de 0 a 10% nos grandes centros, com uma morbidade de 25 a 35%. Por tudo isso h autores que questionam o valor da resseco do cncer de pncreas, ainda mais nos casos considerados avanados, como nos casos em que h acometimento vascular, que uma ocorrncia freqente e pode ser o nico fato que impede a resseco do tumor com radicalidade oncolgica. Esta monografia tem o objetivo de revisar a literatura no que se refere

resseco vascular no cncer de pncreas, avaliando sua indicao e influncia no prognstico desses tumores.

EPIDEMIOLOGIAOs tumores de pncreas so raros antes dos 30 anos de idade e mais comuns na sexta e na stima dcadas de vida. Segundo dados da Unio Internacional Contra o Cncer (UICC) as taxas de incidncia aumentam bastante com o avano da idade, sendo de 10/100.000 casos entre 40 e 50 anos, 40/100.000 aos 60 anos e 116/100.000 aos 80-85 anos, como mostra o grfico abaixo.

H um discreto predomnio da ocorrncia da doena em homens do que em mulheres. Representam 3% de todos os canceres e 5% de todos os bitos por cncer, sendo a terceira maior causa de bito por cncer nos EUA, depois do cncer de pulmo e clon.

ETIOLOGIAO tabagismo um fator de risco bem estabelecido, aumentando o risco em duas a trs vezes tanto para homens quanto para mulheres. O mecanismo pelo qual o tabaco leva ao cncer de pncreas parece estar relacionado a nitrosaminas tabaco-especficas que chegam ao pncreas tanto pelo sangue quanto pela bile, que entra em contato com o ducto pancretico. Outro fator de risco que parece estar associado a ingesta de gordura animal e carne. Supe-se que uma dieta rica em gordura pode estimular a liberao de colecistoquinina que pode causar hiperplasia e hipertrofia das clulas acinares pancreticas. Fato semelhante pode ocorrer com o consumo excessivo de protenas, uma vez que a presena de grande quantidade de tripsina na luz intestinal pode estimular a produo de colecistoquinina. Aparentemente no h correlao entre o cncer de pncreas e a pancreatite aguda ou crnica ou suas seqelas, mas h uma correlao entre o cncer pancretico, os clculos biliares e a cirrose heptica. No foi comprovada nenhuma associao com o consumo de lcool. Outras associaes ocorrem com doenas como a sndrome de Gardner, a polipose familial, a

pancreatite hereditria, sndrome de von Hippel-Lindau, sndrome de Lynch II e ataxiatelangectasia. Anormalidades moleculares relacionadas ao cncer de pncreas incluem o gene K-ras no codon 12 (>85%) e a mutao do gene p53 no cromossomo 17 (50 a 70%). Uma expresso exacerbada do receptor de EGF e a produo de EGF-alfa tm sido tambm relacionadas ao cncer de pncreas.

PATOLOGIAO tipo histolgico mais freqente o adenocarcinoma de origem ductal, ocorrendo na cabea, colo e processo uncinado do pncreas em mais de 2/3 dos casos. Metastatizam precocemente para os linfonodos regionais (90%) e para os linfonodos mediastinais e supra-claviculares. Por ocasio do diagnstico, mais da metade dos pacientes j apresenta metstase heptica, mais de um quarto dos casos tm disseminao peritoneal e a invaso do duodendo j est presente em um tero dos casos. Devido estreita relao entre a cabea do pncreas e os vasos mesentricos superiores, freqentemente h comprometimento vascular sem, no entanto, haver disseminao distncia.

Classificao TNM (1997) T 0 N Ausncia de linfonodos Linfonodos regionais acometidos. N1a: linfonodo reginal solitrio; N1b: mltiplos linfonodos regionais; M Ausncia de metstases distncia Metstase distncia -

1

Tumor limitado ao pncreas R 2cm no maior dimetro Tumor limitado ao pncreas > 2cm no maior dimetro Extenso direta do tumor no duodeno, ducto biliar comum ou tecido peripancretico Invaso do estmago, bao, clon ou grandes vasos

2

3

-

-

4

Estadio TNM T I II 1 2-3 N M 0 0 1 1 0 0 0 0

-

III 1-2 IVa 3

IVb 1-4 1-4 1

AVALIAO DO ACOMETIMENTO VASCULARA avaliao do acometimento vascular na fase intra-operatria classicamente descrita na manobra de Whipple (liberao da face posterior do pncreas em contato com a face anterior da veia mesentrica superior), que hoje sabidamente no significa que o tumor seja ressecvel, pois freqentemente o local da invaso vascular situa-se junto ao processo uncinado do

pncreas e nesta localizao o comprometimento da confluncia venosa mesentrico-portal ocorre na parede lateral ou posterior da veia. A avaliao pr-operatria da invaso vascular da confluncia venosa mesentrico-portal ou da artria mesentrica superior com o emprego de diversos mtodos de imagem extensamente relatada na literatura mdica. A presena de trombose venosa portal ou o envolvimento circunferencial da artria mesentrica superior e/ou da confluncia venosa mesentrico-portal so considerados critrios de irressecabilidade. Quando este diagnstico estabelecido na avaliao pr-operatria em um paciente que apresente obstruo biliar, realizado somente a drenagem biliar endoscpica com a colocao de prtese plstica como tratamento definitivo. A identificao de acometimento vascular, por outro lado, sem trombose, permite ao cirurgio a definio de uma ttica prvia ao procedimento cirrgico, possibilitando a obteno de melhores resultados. A avaliao do acometimento vascular no cncer de pncreas pode ser realizada atravs de vrios exames como: ultra-som; ultra-som com color doppler; ultra-som endoscpico; ultra-som endovascular intraportal; tomografia computadorizada; tomografia computadorizada helicoidal; ressonncia nuclear magntica; angio-ressonncia; arteriografia; arteriografia digital.

A todos esses exames ainda podem ser associados uma sria de melhoramentos.

USG e tomografia computadorizada mostrando a proximidade do tumor com os vasos

Ishikawa e cols. classificaram o acometimento vascular da confluncia venosa mesentricoportal em cinco grupos atravs de arteriografia, como ilustra o esquema abaixo:

Tipo I Tipo II Tipo III Tipo IV Tipo V

I. II. III. IV. V.

normal; discreto deslocamento, sem estreitamento; estreitamento unilateral; estreitamento bilateral; estreitamento bilateral c/ presena de circulao colateral.

Ueno e cols. relatam uma sensibilidade de 73.7%, 73.7% e 73.6% para o diagnstico de acometimento portal em pacientes com diagnstico de tumor de pncreas com o emprego de ultra-som com color doppler, tomografia computadorizada e angiografia, respectivamente, com uma especificidade de 95.1%, 95.5% e 90.9%, e uma acurcia de 84.1%, 88.9% e 85.7%, respectivamente, como mostra o quadro abaixo:

Mtodo US com doppler Tomografia Angiografia

Sensibilidade Especificidade Acurcia 73.7 73.6 73.6 95.1 95.5 90.9 88.9 88.9 85.7

De acordo com esses autores no h diferena estatisticamente significante entre os trs mtodos, de forma que o ultra-som com doppler pode ter um papel de grande importncia, devido ao seu custo relativamente mais baixo e por ser um exame no-invasivo. A ressonncia nuclear magntica ou a angio-ressonncia tambm parece no conseguir demonstrar o

acometimento vascular de forma estatisticamente significante em relao aos mtodos descritos.

O PAPEL DA RESSECO VASCULARA invaso da veia porta ou da veia mesentrica superior pode representar o nico empecilho realizao de uma cirurgia com radicalidade oncolgica e obteno de margens cirrgicas livres de doena. Uma vez que o acometimento venoso parece estar mais relacionado localizao do tumor do que sua agressividade biolgica, a resseco vascular recomendada, parecendo no haver aumento significativo do risco cirrgico, com a obteno de uma elevao da qualidade de vida e do ndice de sobrevida. Estudando 35 casos em que se realizou pancreatectomia com resseco da veia porta ou da veia mesentrica superior e do tecido conjuntivo peripancretico, incluindo os linfonodos regionais, Ishikawa e cols. sugerem que o prognstico ps-operatrio dos pacientes com leses vasculares do tipo IV e V, ou com acometimento vascular com extenso maior que 1,2 cm pior. Por outro lado, pacientes sem leso vascular ou com leses do tipo II ou III, com extenso de acometimento vascular menor que 1,2cm tiveram um melhor prognstico, chegando a atingir uma sobrevida de 60% em 3 anos. Nakao e cols., em um trabalho semelhante, correlacionaram os achados angiogrficos com o tipo histolgico das peas cirrgicas, obtendo o quadro abaixo:

Grau histolgico Angiografia (Ishikawa) 0 Tipo I (n=22) Tipo II (n=25) Tipo III (n=27) Tipo IV (n=27) 22 0 20 3 0 2 I II

2 11 14

0= sem invaso; I= invaso da tnica adventcia ou mdia; II= invaso da tnica ntima (Nakao e cols. - Surgery, 1995; 117(1):50-5)

Esses autores observaram aumento estatisticamente significante nos pacientes submetidos a resseco vascular, quando as leses eram do tipo I (p