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Informativo 588-STJ (17/08 a 31/08/2016) Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 1 Márcio André Lopes Cavalcante Todos os julgados foram comentados. ÍNDICE DIREITO CIVIL NOME Alteração de registro civil após aquisição de dupla cidadania. PRESCRIÇÃO Prazo de 3 anos para pretensão de entidade de previdência privada complementar de reaver verbas relativas a benefício indevidamente apropriadas por terceiro CONDOMÍNIO Não se pode proibir o condômino inadimplente de usar as áreas comuns do condomínio. DIREITOS AUTORAIS Responsabilidade pelo pagamento de direitos autorais decorrentes de evento executado por sociedade empresária contratada mediante licitação. PARENTESCO SOCIOAFETIVO (I)legitimidade do filho pedir que sua falecida mãe seja reconhecida como filha dos pretensos avós. DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL Não é possível a partilha de lucros de sociedade empresária quando estes estão destinados à conta de reserva. DIREITO DO CONSUMIDOR PLANO DE SAÚDE Não se aplica o CDC ao contrato de plano de saúde administrado por entidade de autogestão. É abusiva cláusula que autoriza plano de saúde a indeferir procedimentos médico-hospitalares solicitados por médicos não integrantes do plano. Direito de o ex-empregado continuar beneficiário em plano de saúde coletivo empresarial. BANCOS DE DADOS E CADASTROS DE CONSUMIDORES O prazo máximo de 5 anos que o nome do consumidor pode permanecer negativado inicia-se no dia seguinte ao vencimento da dívida. ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE ADOÇÃO Não é possível que a adoção conjunta seja transformada em unilateral post mortem caso um dos autores desista e o outro morra sem ter manifestado intenção de adotar unilateralmente. DIREITO PROCESSUAL CIVIL FAZENDA PÚBLICA EM JUÍZO Interpretação extensiva do art. 19, § 1º, I, da Lei nº 10.522/2002.

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Informativo 588-STJ (17/08 a 31/08/2016) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 1

Márcio André Lopes Cavalcante Todos os julgados foram comentados.

ÍNDICE

DIREITO CIVIL

NOME Alteração de registro civil após aquisição de dupla cidadania. PRESCRIÇÃO Prazo de 3 anos para pretensão de entidade de previdência privada complementar de reaver verbas relativas a

benefício indevidamente apropriadas por terceiro CONDOMÍNIO Não se pode proibir o condômino inadimplente de usar as áreas comuns do condomínio. DIREITOS AUTORAIS Responsabilidade pelo pagamento de direitos autorais decorrentes de evento executado por sociedade empresária

contratada mediante licitação. PARENTESCO SOCIOAFETIVO (I)legitimidade do filho pedir que sua falecida mãe seja reconhecida como filha dos pretensos avós. DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL Não é possível a partilha de lucros de sociedade empresária quando estes estão destinados à conta de reserva.

DIREITO DO CONSUMIDOR

PLANO DE SAÚDE Não se aplica o CDC ao contrato de plano de saúde administrado por entidade de autogestão. É abusiva cláusula que autoriza plano de saúde a indeferir procedimentos médico-hospitalares solicitados por

médicos não integrantes do plano. Direito de o ex-empregado continuar beneficiário em plano de saúde coletivo empresarial. BANCOS DE DADOS E CADASTROS DE CONSUMIDORES O prazo máximo de 5 anos que o nome do consumidor pode permanecer negativado inicia-se no dia seguinte ao

vencimento da dívida.

ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE

ADOÇÃO Não é possível que a adoção conjunta seja transformada em unilateral post mortem caso um dos autores desista e

o outro morra sem ter manifestado intenção de adotar unilateralmente.

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

FAZENDA PÚBLICA EM JUÍZO Interpretação extensiva do art. 19, § 1º, I, da Lei nº 10.522/2002.

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CUMPRIMENTO DE SENTENÇA Inexigibilidade de obrigação fundada em lei não recepcionada pela Constituição.

DIREITO PENAL

GESTÃO TEMERÁRIA Dolo no crime de gestão temerária. Análise das circunstâncias judiciais.

DIREITO PROCESSUAL PENAL

FIXAÇÃO DO VALOR MÍNIMO PARA REPARAÇÃO DOS DANOS É possível que o juiz fixe valor mínimo para indenização de danos morais sofridos pela vítima de crime.

DIREITO TRIBUTÁRIO

ICMS Base de cálculo de ICMS/ST no caso de venda de medicamentos de uso restrito a hospitais e clínicas. IPVA Termo inicial do prazo prescricional para cobrança de IPVA.

DIREITO PREVIDENCIÁRIO

PREVIDÊNCIA PRIVADA COMPLEMENTAR Prazo de 3 anos para pretensão de entidade de previdência privada complementar de reaver verbas relativas a

benefício indevidamente apropriadas por terceiro.

DIREITO CIVIL

NOME Alteração de registro civil após aquisição de dupla cidadania

O brasileiro que adquiriu dupla cidadania pode ter seu nome retificado no registro civil do Brasil, desde que isso não cause prejuízo a terceiros, quando vier a sofrer transtornos no exercício da cidadania por força da apresentação de documentos estrangeiros com sobrenome imposto por lei estrangeira e diferente do que consta em seus documentos brasileiros.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.310.088-MG, Rel. Min. João Otávio de Noronha, Rel. para acórdão Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 17/5/2016 (Info 588).

Imagine a seguinte situação hipotética: Francisco Rodrigues Bernardes é brasileiro nato, mas filho de italianos. Ele obteve a nacionalidade italiana, passando a ter dupla cidadania. Segundo a legislação italiana, os descendentes são registrados com o nome paterno. Assim, na Itália, nos documentos do autor consta seu nome como "Francisco Tristão Bernardes". No Brasil, todos seus documentos são como "Francisco Rodrigues Bernardes". Essa divergência de nomes nos documentos tem gerado vários transtornos. Diante disso, ajuizou ação de retificação de registro civil pedindo para que seu nome, no Brasil, mude para Francisco Tristão Bernardes, ficando igual ao nome utilizado na Itália. A questão chegou até o STJ? O pedido foi aceito pelo Tribunal? SIM.

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O brasileiro que adquiriu dupla cidadania pode ter seu nome retificado no registro civil do Brasil, desde que isso não cause prejuízo a terceiros, quando vier a sofrer transtornos no exercício da cidadania por força da apresentação de documentos estrangeiros com sobrenome imposto por lei estrangeira e diferente do que consta em seus documentos brasileiros. STJ. 3ª Turma. REsp 1.310.088-MG, Rel. Min. João Otávio de Noronha, Rel. para acórdão Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 17/5/2016 (Info 588). Flexibilização dos arts. 56 e 57 da LRP As hipóteses de alteração do nome estão elencadas nos arts. 56 e 57 da Lei nº 6.015/73. O pedido formulado pelo autor não está previsto expressamente em nenhuma das hipóteses elencadas nesses dois artigos. Vale ressaltar, no entanto, que o STJ tem flexibilizado a interpretação dos arts. 56 e 57 da Lei dos Registros Públicos para permitir a alteração de nome desde que haja um "justo motivo" (art. 57, caput). Alguns exemplos de situações em que se admitiu a modificação de nome: a) inclusão do patronímico de companheiro (REsp 1206656/GO,); b) acréscimo do patronímico materno (REsp 1256074/MG); c) substituição do patronímico do pai pelo do padrasto (Ag 989812/SP); d) inclusão do patronímico do padrasto (REsp 538187/RJ); e) alteração da ordem dos apelidos de família (REsp 1323677/MA); f) inclusão do nome de solteira da genitora, adotado após o divórcio (REsp 1041751/DF). Retificação de nome para possibilitar a obtenção de outra nacionalidade Importante destacar que o STJ já entendeu que é possível a retificação de nome para possibilitar a obtenção de outra nacionalidade. No caso concreto, o sobrenome do autor era "Barticiotto" e assim constava em seus documentos no Brasil. Ocorre que ele era descendente de italianos e lá esse sobrenome é escrito corretamente como "Bartucciotto". Quando a família veio para o Brasil, houve um erro de grafia e, por conta disso, o sobrenome ficou diferente daquele adotado na Itália. Em virtude disso, o autor ajuizou ação para modificar seu sobrenome, já que, sem essa providência, ele não conseguiria adquirir a cidadania italiana. O STJ concordou com o pedido considerando haver justo motivo (STJ. 4ª Turma. REsp 1138103/PR, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 06/09/2011). Se pode alterar o nome para a pessoa obter a nacionalidade, com mais razão pode-se alterar depois que a pessoa adquiriu dupla nacionalidade Se o STJ permite a mudança do nome para que o indivíduo possa requerer a cidadania italiana (REsp 1138103/PR), com maior razão deve permitir a alteração para a pessoa que já obteve a dupla nacionalidade, prestigiando, assim, o princípio da simetria, da uniformidade, da verdade real e da segurança jurídica, que norteiam o sistema registral brasileiro. A posição mais flexível do STJ sobre a imutabilidade do nome civil tem por objetivo sobretudo assegurar o exercício da cidadania, ou seja o próprio papel que o nome desempenha na formação e consolidação da personalidade de uma pessoa. A situação narrada pelo autor configura justo motivo? SIM. A apresentação de documentos contendo informações destoantes dificulta, na prática, a realização dos atos da vida civil, além de gerar transtornos e aborrecimentos desnecessários.

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PRESCRIÇÃO Prazo de 3 anos para pretensão de entidade de previdência privada complementar de reaver

verbas relativas a benefício indevidamente apropriadas por terceiro

É de 3 anos o prazo prescricional de ação proposta por entidade de previdência privada complementar contra terceiro que se apropriou indevidamente de verbas relativas a benefício previdenciário.

Não há previsão específica para este caso na LC 109/2001, razão pela qual se aplica o art. 206, § 3º, IV, do Código Civil (pretensão de ressarcimento de enriquecimento sem causa).

Ex: o segurado morreu e, como a entidade de previdência não foi informada, continuou a depositar, todos os meses, o valor da aposentadoria; tais quantias foram sacadas indevidamente da conta bancária por uma sobrinha do falecido; a entidade terá o prazo de 3 anos para reaver os valores.

STJ. 4ª Turma. REsp 1.334.442-RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Rel. para acórdão Min. Raul Araújo, julgado em 7/6/2016 (Info 588).

Veja comentários em Direito Previdenciário.

CONDOMÍNIO Não se pode proibir o condômino inadimplente de usar as áreas comuns do condomínio

Importante!!!

O condomínio, independentemente de previsão em regimento interno, não pode proibir, em razão de inadimplência, condômino e seus familiares de usar áreas comuns, ainda que destinadas apenas a lazer.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.564.030-MG, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 9/8/2016 (Info 588).

Imagine a seguinte situação hipotética: João mora no condomínio de apartamentos "Viva la Vida". Em virtude de dificuldades financeiras, ele se encontra devendo três meses da cota condominial. Diante disso, o síndico proibiu que João e seus familiares utilizem o centro recreativo do condomínio. João foi reclamar com o síndico e este mostrou o regimento interno do condomínio que, expressamente, proíbe os condôminos inadimplentes de utilizarem as áreas comuns. Não satisfeito, João propôs ação declaratória de nulidade da cláusula do regimento interno cumulada com indenização por danos morais. Indaga-se: o regimento interno poderá determinar que o condômino inadimplente fique proibido de utilizar as áreas comuns do condomínio? Esta previsão é válida? NÃO. O condomínio, independentemente de previsão em regimento interno, não pode proibir, em razão de inadimplência, condômino e seus familiares de usar áreas comuns, ainda que destinadas apenas a lazer. STJ. 3ª Turma. REsp 1.564.030-MG, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 9/8/2016 (Info 588). Direito ao uso das áreas comuns decorre do direito de propriedade O direito do condômino ao uso das partes comuns, seja qual for a destinação a elas atribuídas, não

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decorre de ele estar ou não adimplente com as despesas condominiais. Este direito provém do fato de que, por lei, a unidade imobiliária abrange não apenas uma fração ideal no solo (unidade imobiliária), mas também as outras partes comuns. Veja o que diz o Código Civil:

Art. 1.331. Pode haver, em edificações, partes que são propriedade exclusiva, e partes que são propriedade comum dos condôminos. (...) § 3º A cada unidade imobiliária caberá, como parte inseparável, uma fração ideal no solo e nas outras partes comuns, que será identificada em forma decimal ou ordinária no instrumento de instituição do condomínio.

Em outras palavras, a propriedade da unidade imobiliária abrange a correspondente fração ideal de todas as partes comuns. O proprietário do apartamento também é "dono" de parte das áreas comuns. Dessa forma, a proibição de que o condômino tenha acesso a uma área comum (seja qual for a sua destinação) viola o que se entende por condomínio, limitando, indevidamente, o direito de propriedade. Punições para o condômino inadimplente Os condôminos possuem o dever de contribuir para as despesas condominiais, conforme determina o art. 1.336, I, do CC. No entanto, as consequências pelo seu descumprimento devem ser razoáveis e proporcionais. No caso de descumprimento do dever de contribuição pelas despesas condominiais, o Código Civil impõe ao condômino inadimplente sanções de ordem pecuniária. Em um primeiro momento, a lei determina que o devedor seja obrigado a pagar juros moratórios de 1% ao mês e multa de até 2% sobre o débito:

Art. 1.336 (...) § 1º O condômino que não pagar a sua contribuição ficará sujeito aos juros moratórios convencionados ou, não sendo previstos, os de um por cento ao mês e multa de até dois por cento sobre o débito.

Se o condômino reiteradamente apresentar um comportamento faltoso (o que não se confunde com o simples inadimplemento involuntário de alguns débitos), será possível impor a ele outras penalidades, também de caráter pecuniário, nos termos do art. 1.337:

Art. 1.337. O condômino, ou possuidor, que não cumpre reiteradamente com os seus deveres perante o condomínio poderá, por deliberação de três quartos dos condôminos restantes, ser constrangido a pagar multa correspondente até ao quíntuplo do valor atribuído à contribuição para as despesas condominiais, conforme a gravidade das faltas e a reiteração, independentemente das perdas e danos que se apurem. Parágrafo único. O condômino ou possuidor que, por seu reiterado comportamento anti-social, gerar incompatibilidade de convivência com os demais condôminos ou possuidores, poderá ser constrangido a pagar multa correspondente ao décuplo do valor atribuído à contribuição para as despesas condominiais, até ulterior deliberação da assembleia.

Dessa forma, a lei confere meios coercitivos, legítimos e idôneos, à satisfação do crédito, descabendo ao condomínio valer-se de sanções outras que não as pecuniárias expressa e taxativamente previstas no Código Civil para o específico caso de inadimplemento das despesas condominiais. Em outros termos, não existe margem discricionária para a imposição de outras sanções que não sejam as pecuniárias estipuladas na Lei. Veja um julgado que espelha esse entendimento:

(...) 1. De acordo com o art. 1.336, § 1º, do Código Civil, o condômino que não pagar a sua contribuição ficará sujeito aos juros moratórios convencionados ou, não sendo previstos, os de 1% (um por cento) ao mês e multa de até 2% (dois por cento) sobre o débito. 2. O condômino que deixar de adimplir reiteradamente a importância devida a título de cotas condominiais poderá, desde que aprovada a sanção em assembleia por deliberação de 3/4 (três quartos) dos condôminos, ser obrigado a pagar multa em até o quíntuplo do valor atribuído à contribuição para as

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despesas condominiais, conforme a gravidade da falta e a sua reiteração. 3. A aplicação da sanção com base no art. 1.337, caput, do Código Civil exige que o condômino seja devedor reiterado e contumaz em relação ao pagamento dos débitos condominiais, não bastando o simples inadimplemento involuntário de alguns débitos. 4. A multa prevista no § 1º do art. 1.336 do CC/2002 detém natureza jurídica moratória, enquanto a penalidade pecuniária regulada pelo art. 1.337 tem caráter sancionatório, uma vez que, se for o caso, o condomínio pode exigir inclusive a apuração das perdas e danos. (...) STJ. 4ª Turma. REsp 1247020/DF, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 15/10/2015.

Vedar acesso às áreas comuns viola o princípio da dignidade da pessoa humana Além das sanções pecuniárias, a lei estabelece em favor do condomínio instrumentos processuais efetivos e céleres para se cobrar as dívidas condominiais. A Lei nº 8.009/90, por exemplo, autoriza que a própria unidade condominial (apartamento, casa etc.) seja penhorada para o pagamento dos débitos, não podendo o condômino devedor alegar a proteção do bem de família. O CPC/2015, por sua vez, prevê que as cotas condominiais possuem natureza de título executivo extrajudicial (art. 784, VIII), permitindo, assim, o ajuizamento direto de ação executiva, tornando a satisfação do débito ainda mais célere. Desse modo, diante de todos esses instrumentos colocados à disposição pelo ordenamento jurídico percebe-se que não há razão legítima para que o condomínio se valha de meios vexatórios de cobrança. A proibição de que o devedor tenha acesso e utilize as áreas comuns do condomínio pelo simples fato de que ele está inadimplente acaba expondo ostensivamente a sua condição de inadimplência perante o meio social em que reside, o que, ao final, viola o princípio da dignidade humana. STJ avança no tema Vale ressaltar que o presente julgado representa um avanço na proteção da dignidade do condômino inadimplente. Isso porque o STJ possuía um entendimento anterior que dizia o seguinte: a assembleia geral de condôminos não pode proibir o condômino inadimplente de usar os serviços essenciais do condomínio (ex: elevador); por outro lado, segundo esta posição anterior, seria possível que se restringisse o acesso do devedor a bens e serviços de caráter supérfluo, tais como piscina, sauna, salão de festas etc. O julgado a que me refiro é o Resp 1.401.815-ES, Min. Rel. Nancy Andrighi, julgado em 03/12/2013. Dessa forma, o STJ abandona esta distinção e afirma agora que não se pode negar o direito do condômino inadimplente de ter acesso às áreas comuns do condomínio independentemente de sua finalidade, ou seja, ele terá direito de usar tais partes comuns, sejam elas de caráter essencial, sejam apenas destinadas ao lazer.

DIREITOS AUTORAIS Responsabilidade pelo pagamento de direitos autorais decorrentes de evento executado

por sociedade empresária contratada mediante licitação

Se o Município contratou, mediante licitação, uma empresa para a realização do evento, será dela a responsabilidade pelo pagamento dos direitos autorais.

Exceções: esta responsabilidade poderá ser transferida para o Município em duas hipóteses:

1) se ficar demonstrado que o Poder Público colaborou direta ou indiretamente para a execução do espetáculo; ou

2) se ficar comprovado que o Município teve culpa em seu dever de fiscalizar o cumprimento do contrato público (culpa in eligendo ou in vigilando).

Em síntese: no caso em que sociedade empresária tenha sido contratada mediante licitação para a execução integral de evento festivo promovido pelo Poder Público, a contratada - e não

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o ente que apenas a contratou, sem colaborar direta ou indiretamente para a execução do espetáculo - será responsável pelo pagamento dos direitos autorais referentes às obras musicais executadas no evento, salvo se comprovada a ação culposa do contratante quanto ao dever de fiscalizar o cumprimento dos contratos públicos (culpa in eligendo ou in vigilando).

STJ. 3ª Turma. REsp 1.444.957-MG, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 9/8/2016 (Info 588).

Imagine a seguinte situação hipotética: Determinado Município do interior queria fazer a festa de carnaval da cidade. Para isso, contratou, mediante licitação, uma empresa privada produtora de eventos. A empresa realizou a festa de carnaval da cidade, que teve a participação de algumas bandas musicais. Diante disso, o Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (ECAD) ajuizou ação de cobrança contra o Município alegando que não foram pagos os valores relativos aos direitos autorais das músicas executadas durante a festa. Em resposta, o Município alegou que: 1) o evento era público, na rua, e que não havia intuito de lucro; logo, não seria possível a cobrança de direitos autorais. 2) foi contratada uma empresa privada para a realização de todo o evento, tendo ela recebido para isso; desse modo, ela é que seria responsável pelo pagamento dos direitos autorais, caso se considere que estes são devidos. 1) O ECAD poderia cobrar direitos autorais relacionados com a realização deste evento? SIM.

É possível a cobrança de direitos autorais, pelo ECAD, na hipótese de execução de obras musicais protegidas em eventos realizados por entes públicos, independentemente da existência de fins lucrativos. A utilização de obras musicais em espetáculos carnavalescos gratuitos promovidos pela municipalidade enseja a cobrança de direitos autorais à luz da Lei nº 9.610/98, que não mais está condicionada à auferição de lucro direto ou indireto pelo ente promotor do evento. STJ. 3ª Turma. REsp 1.444.957-MG, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 9/8/2016 (Info 588).

A Lei nº 9.610/98 (Lei de Direitos Autorais), em regra, não exige que o evento tenha finalidade lucrativa (direta ou indireta) para que seja obrigatório o pagamento dos direitos autorais. Em outras palavras, em regra, mesmo que a exibição da obra não tenha objetivo de lucro, ainda assim é devido o pagamento da retribuição autoral. O fato gerador do pagamento dos direitos autorais é a exibição pública da obra artística, em local de frequência coletiva. 2) Em princípio, a responsabilidade pelo pagamento dos direitos autorais era do Município? NÃO.

Se o Município contratou, mediante licitação, uma empresa para a realização do evento, será dela a responsabilidade pelo pagamento dos direitos autorais. Exceções: esta responsabilidade poderá ser transferida para o Município em duas hipóteses: 1) se ficar demonstrado que o Poder Público colaborou direta ou indiretamente para a execução do espetáculo; ou 2) se ficar comprovado que o Município teve culpa em seu dever de fiscalizar o cumprimento do contrato público (culpa in eligendo ou in vigilando). STJ. 3ª Turma. REsp 1.444.957-MG, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 9/8/2016 (Info 588).

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Por que o dever de pagar os direitos autorais é da empresa contratada para realizar o evento? De acordo com o § 4º do art. 68 da Lei nº 9.610/98, antes da realização do evento em que haverá a execução pública de obras musicais, o "empresário" deve apresentar ao ECAD a comprovação dos recolhimentos relativos aos direitos autorais. Se houver o descumprimento desta obrigação, cabe ao ECAD cobrar a dívida, judicial ou extrajudicialmente. Desse modo, quando o § 4º do art. 68 fala em "empresário", entende-se a pessoa responsável pela realização do evento. E qual é o fundamento para não se cobrar, a princípio, do Município? O fundamento para esta conclusão encontra-se no art. 71 da Lei nº 8.666/93:

Art. 71. O contratado é responsável pelos encargos trabalhistas, previdenciários, fiscais e comerciais resultantes da execução do contrato. § 1º A inadimplência do contratado, com referência aos encargos trabalhistas, fiscais e comerciais não transfere à Administração Pública a responsabilidade por seu pagamento, nem poderá onerar o objeto do contrato ou restringir a regularização e o uso das obras e edificações, inclusive perante o Registro de Imóveis. § 2º A Administração Pública responde solidariamente com o contratado pelos encargos previdenciários resultantes da execução do contrato, nos termos do art. 31 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991.

A doutrina assevera ao comentar o tema: "(...) quando a Administração contrata e paga a empresa ou o profissional para o fornecimento de bens, para a prestação de serviços ou para a execução de obras, ela transfere ao contratado toda e qualquer responsabilidade pelos encargos decorrentes da execução do contrato. Ao ser apresentada a proposta pelo licitante, ele, portanto, irá fazer incluir em seu preço todos os encargos, de toda e qualquer natureza. Desse modo, quando o poder público paga ao contratado o valor da remuneração pela execução de sua parte na avença, todos os encargos assumidos pelo contratado estão sendo remunerados. Não cabe, portanto, querer responsabilizar a Administração, por exemplo, pelos encargos assumidos pelo contratado junto aos seus fornecedores. (...)" (FURTADO, Lucas Rocha. Curso de licitações e contratos. 6ª ed., Belo Horizonte: Fórum, 2015, p. 599). A única exceção está expressamente prevista no § 2º do art. 71 da Lei nº 8.666/93, segundo o qual a Administração Pública responde solidariamente com o contratado pelos encargos previdenciários resultantes da execução do contrato. Fora dessa específica hipótese, não há que se falar em responsabilidade solidária do ente público. No julgamento da ADC nº 16/DF, o STF declarou a constitucionalidade do referido art. 71. Desde então, a jurisprudência entende que o ente público, em regra, não responde pelos débitos da empresa contratada, salvo se provado que contribuiu culposamente para o resultado danoso. Confira:

(...) Na ADC 16, este Tribunal afirmou a tese de que a Administração Pública não pode ser responsabilizada automaticamente por débitos trabalhistas de suas contratadas ou conveniadas. Só se admite sua condenação, em caráter subsidiário, quando o juiz ou tribunal conclua que a entidade estatal contribuiu para o resultado danoso ao agir ou omitir-se de forma culposa (in eligendo ou in vigilando). (...) STJ. 1ª Turma. Rcl 16.846 AgR, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 19/5/2015.

Os valores pagos a título de direito autoral estão incluídos nos encargos de que trata o art. 71? SIM. Os direitos autorais cobrados pelo ECAD possuem natureza jurídica eminentemente privada e, portanto, consideram-se inseridos no conceito de "encargos comerciais".

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ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA Na ação de busca e apreensão fundada no DL 911/69, o prazo de 15 dias para resposta

deve ser contado a partir da juntada aos autos do mandado de citação cumprido

Importante!!!

Atualize seus livros!

Em ação de busca e apreensão de bem alienado fiduciariamente, o termo inicial para a contagem do prazo de 15 dias para o oferecimento de resposta pelo devedor fiduciante é a data de juntada aos autos do mandado de citação devidamente cumprido (e não a data da execução da medida liminar).

O mandado de busca e apreensão/citação veicula, simultaneamente, a comunicação ao devedor acerca da retomada do bem alienado fiduciariamente e sua citação, daí decorrendo dois prazos diversos:

a) de 5 dias, contados da execução da liminar, para o pagamento da dívida; e

b) de 15 dias, a contar da juntada do mandado aos autos, para o oferecimento de resposta.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.321.052-MG, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 16/8/2016 (Info 588).

CONCEITO DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA

“A alienação fiduciária em garantia é um contrato instrumental em que uma das partes, em confiança, aliena a outra a propriedade de um determinado bem, ficando esta parte (uma instituição financeira, em regra) obrigada a devolver àquela o bem que lhe foi alienado quando verificada a ocorrência de determinado fato.” (RAMOS, André Luiz Santa Cruz. Direito Empresarial Esquematizado. São Paulo: Método, 2012, p. 565). REGRAMENTO

O Código Civil de 2002 trata de forma genérica sobre a propriedade fiduciária em seus arts. 1.361 a 1.368-B. Existem, no entanto, leis específicas que também regem o tema: • alienação fiduciária envolvendo bens imóveis: Lei nº 9.514/97; • alienação fiduciária de bens móveis no âmbito do mercado financeiro e de capitais: Lei nº 4.728/65 e Decreto-Lei nº 911/69. É o caso, por exemplo, de um automóvel comprado por meio de financiamento bancário com garantia de alienação fiduciária. Nas hipóteses em que houver legislação específica, as regras do CC-2002 aplicam-se apenas de forma subsidiária:

Art. 1.368-A. As demais espécies de propriedade fiduciária ou de titularidade fiduciária submetem-se à disciplina específica das respectivas leis especiais, somente se aplicando as disposições deste Código naquilo que não for incompatível com a legislação especial.

Resumindo:

Alienação fiduciária de bens MÓVEIS fungíveis e

infungíveis quando o credor fiduciário for instituição

financeira

Alienação fiduciária de bens MÓVEIS infungíveis

quando o credor fiduciário for pessoa natural ou jurídica (sem

ser banco)

Alienação fiduciária de bens IMÓVEIS

Lei nº 4.728/65 Decreto-Lei nº 911/69

Código Civil de 2002 (arts. 1.361 a 1.368-A)

Lei nº 9.514/97

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ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA DE BENS MÓVEIS A espécie mais comum de alienação fiduciária é a de automóveis. Ex: Antônio quer comprar um carro de R$ 30 mil, mas somente possui R$ 10 mil. Antônio procura o Banco “X”, que celebra com ele contrato de financiamento com garantia de alienação fiduciária. Assim, o Banco “X” empresta R$ 20 mil a Antônio, que compra o veículo. Como garantia do pagamento do empréstimo, a propriedade resolúvel do carro ficará com o Banco “X” e a posse direta com Antônio. Em outras palavras, Antônio ficará andando com o carro, mas no documento, a propriedade do automóvel é do Banco “X” (constará: “alienado fiduciariamente ao Banco X”). Diz-se que o banco tem a propriedade resolúvel porque, uma vez pago o empréstimo, a propriedade do carro pelo banco “resolve-se” (acaba) e o automóvel passa a pertencer a Antônio. O que acontece em caso de inadimplemento do mutuário (em nosso exemplo, Antônio)? Havendo mora por parte do mutuário, o procedimento será o seguinte (regulado pelo DL 911/69): 1) Notificação do devedor No contrato de alienação fiduciária, a mora decorre do simples vencimento do prazo para pagamento, mas a lei exige que o credor (mutuante) demonstre a ocorrência desse atraso, notificando o devedor. Assim, o credor deverá fazer a notificação extrajudicial do devedor de que este se encontra em débito, comprovando, assim, a mora. Essa notificação é indispensável para que o credor possa ajuizar ação de busca e apreensão. Confira:

Súmula 72-STJ: A comprovação da mora é imprescindível à busca e apreensão do bem alienado fiduciariamente.

Pergunta importante: como é feita a notificação do devedor? Essa notificação precisa ser realizada por intermédio do Cartório de Títulos e Documentos? NÃO. Essa notificação é feita por meio de carta registrada com aviso de recebimento. Logo, não precisa ser realizada por intermédio do Cartório de RTD.

Essa foi uma das mudanças operadas pela Lei n. 13.043/2014 no § 2º do art. 2º do DL 911/69.

NOTIFICAÇÃO DO DEVEDOR NA ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA

Antes da Lei n. 13.043/2014 ATUALMENTE

O credor deveria demonstrar a mora do devedor por duas formas: a) por carta registada expedida por intermédio de

Cartório de Títulos e Documentos; ou b) pelo protesto do título, realizado pelo

Tabelionato de Protesto.

Ficou mais fácil. O credor pode demonstrar a mora do devedor por meio de carta registrada com aviso de recebimento. Não mais se exige que a carta registrada seja expedida pelo Cartório de Títulos e Documentos. É dispensável que haja o protesto do título.

O objetivo da alteração foi o de reduzir o custo da notificação, permitindo que seja feita por mera emissão de carta via Correios, evitando, assim, que a instituição financeira tenha que pagar os emolumentos para os titulares de Cartórios. O aviso de recebimento da carta (AR) precisa ser assinado pelo próprio devedor? NÃO. A Lei nº 13.043/2014 alterou o § 2º do art. 2º do DL 911/69, deixando expresso que não se exige que a assinatura constante do aviso de recebimento seja a do próprio destinatário.

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Obs: apesar de não estar expressamente prevista no DL 911/69, a jurisprudência do STJ já entendia que a notificação não precisava ser pessoal, bastando que fosse entregue no endereço do devedor:

(...) Esta Corte consolidou entendimento no sentido de que, para a constituição em mora por meio de notificação extrajudicial, é suficiente que seja entregue no endereço do devedor, ainda que não pessoalmente. (...) STJ. 4ª Turma. AgRg no AREsp 419.667/MS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 06/05/2014.

Portanto, a alteração legislativa confirma a solução que já havia sido dada pelo STJ ao tema. 2) Ajuizamento da ação Após comprovar a mora, o mutuante (Banco “X”) poderá ingressar com uma ação de busca e apreensão requerendo que lhe seja entregue o bem (art. 3º do DL 911/69). Essa busca e apreensão prevista no DL 911/69 é uma ação especial autônoma e independente de qualquer procedimento posterior. 3) Concessão da liminar O juiz concederá a busca e apreensão de forma liminar (sem ouvir o devedor), desde que comprovada a mora ou o inadimplemento do devedor (art. 3º do DL 911/69). A concessão liminar da busca e apreensão pode ocorrer no plantão judiciário (art. 3º do DL 911/69):

Art. 3º O proprietário fiduciário ou credor poderá, desde que comprovada a mora, na forma estabelecida pelo § 2º do art. 2º, ou o inadimplemento, requerer contra o devedor ou terceiro a busca e apreensão do bem alienado fiduciariamente, a qual será concedida liminarmente, podendo ser apreciada em plantão judiciário.

4) Inserção de restrições sobre o veículo Se o bem objeto da alienação fiduciária for um veículo, caso seja concedida a liminar na busca e apreensão, uma medida de grande eficácia para conseguir localizar e recuperar o bem é inserir uma restrição judicial no “registro” do veículo. Pensando nisso, o § 9º do art. 3º do DL 911/69 estipula que o juiz, ao decretar a busca e apreensão de veículo, deverá inserir uma restrição judicial na base de dados do Renavam. Renavam significa Registro Nacional de Veículos Automotores e consiste em um banco de dados que funciona como um registro de todos os veículos existentes no Brasil. Cada veículo recebe um número identificador que é chamado de “código renavam” e lá são registradas todas as informações sobre a “vida” do automóvel, desde o momento da sua fabricação ou importação, passando pelo emplacamento, mudanças de proprietário, alterações em sua cor e características, até o instante em que o veículo sai de circulação. O Poder Judiciário mantém convênio com o DENATRAN por meio do qual os magistrados possuem acesso ao sistema informatizado do Renavam. Assim, o juiz pode digitar seu login e sua senha, entrar na página interna do Renavam e inserir restrições judiciais incidentes sobre os veículos objeto do processo. Assim, quando o carro for parado em uma blitz ou for realizar uma inspeção de rotina no DETRAN, aparecerá aquela informação no sistema e o veículo será apreendido e entregue à Justiça. Dessa forma, quando o juiz decreta a busca e apreensão, ele próprio, com sua senha, deverá inserir diretamente a restrição judicial no RENAVAM. Caso ele não tenha acesso à base de dados, deverá expedir um ofício ao DETRAN para que: I - registre o gravame referente à decretação da busca e apreensão do veículo; e II - retire o gravame após a apreensão do veículo. 5) Apreensão do bem Caso o bem seja localizado em comarca diferente da qual onde está tramitando a ação (ex: o processo tramita em Belo Horizonte e o carro foi encontrado em Lavras), a parte interessada poderá requerer diretamente ao juízo desta comarca pedindo a apreensão do veículo, bastando que em tal requerimento conste a cópia da petição inicial da ação e, quando for o caso, a cópia do despacho que concedeu a busca e apreensão do veículo (§ 12 do art. 3º do DL 911/69).

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A apreensão do veículo será imediatamente comunicada ao juízo, que intimará a instituição financeira para retirá-lo do local depositado no prazo máximo de 48 horas (§ 13 do art. 3º). O devedor, por ocasião do cumprimento do mandado de busca e apreensão, deverá entregar o bem e seus respectivos documentos (§ 14 do art. 3º). 6) Possibilidade de pagamento integral da dívida No prazo de 5 dias após o cumprimento da liminar (apreensão do bem), o devedor fiduciante poderá pagar a integralidade da dívida pendente, segundo os valores apresentados pelo credor fiduciário na inicial, hipótese na qual o bem lhe será restituído livre do ônus (§ 2º do art. 3º do DL 911/69). Veja o dispositivo legal:

Art. 3º (...) § 1º Cinco dias após executada a liminar mencionada no caput, consolidar-se-ão a propriedade e a posse plena e exclusiva do bem no patrimônio do credor fiduciário, cabendo às repartições competentes, quando for o caso, expedir novo certificado de registro de propriedade em nome do credor, ou de terceiro por ele indicado, livre do ônus da propriedade fiduciária. (Redação dada pela Lei 10.931/2004) § 2º No prazo do § 1º, o devedor fiduciante poderá pagar a integralidade da dívida pendente, segundo os valores apresentados pelo credor fiduciário na inicial, hipótese na qual o bem lhe será restituído livre do ônus. (Redação dada pela Lei 10.931/2004)

O que se entende por “integralidade da dívida pendente”? Para que o devedor tenha de volta o bem, ele deverá pagar todo o valor do financiamento ou somente as parcelas já vencidas e não pagas (purgação da mora)? Ex: Antônio financiou o veículo em 60 parcelas. A partir da 20ª prestação, ele começou a não mais pagar. Estão vencidas 5 parcelas. Para ter de volta o bem, ele terá que pagar somente as 5 parcelas vencidas (purgação mora) ou todo o financiamento restante (40 parcelas)? Todo o débito. Segundo decidiu o STJ, a Lei nº 10.931/2004, que alterou o DL 911/69, não mais faculta ao devedor a possibilidade de purgação de mora, ou seja, não mais permite que ele pague somente as prestações vencidas. Para que o devedor fiduciante consiga ter o bem de volta, ele terá que pagar a integralidade da dívida, ou seja, tanto as parcelas vencidas quanto as vincendas (mais os encargos), no prazo de 5 dias após a execução da liminar. Em nosso exemplo, Antônio terá que pagar, em 5 dias, as 40 parcelas restantes. O devedor purga a mora quando ele oferece ao devedor as prestações que estão vencidas e mais o valor dos prejuízos que este sofreu (art. 401, I, do CC). Nesse caso, purgando a mora, o devedor consegue evitar

as consequências do inadimplemento. Ocorre que na alienação fiduciária em garantia, a Lei n. 10.931/2004 passou a não mais permitir a purgação da mora. Vale ressaltar que o tema acima foi decidido em sede de recurso repetitivo, tendo o STJ firmado a seguinte conclusão, que será aplicada em todos os processos semelhantes: Nos contratos firmados na vigência da Lei 10.931/2004, compete ao devedor, no prazo de 5 (cinco) dias após a execução da liminar na ação de busca e apreensão, pagar a integralidade da dívida - entendida esta como os valores apresentados e comprovados pelo credor na inicial -, sob pena de consolidação da propriedade do bem móvel objeto de alienação fiduciária. STJ. 2ª Seção. REsp 1.418.593-MS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 14/5/2014 (recurso repetitivo) (Info 540).

Nos contratos anteriores à vigência da Lei n. 10.931/2004 é permitida a purgação da mora?

SIM. Antes da Lei n. 10.931/2004 era permitida a purgação da mora, desde que o devedor já tivesse pago no mínimo 40% do valor financiado. Tal entendimento estava, inclusive, consagrado em um enunciado do STJ:

Súmula 284-STJ: A purga da mora, nos contratos de alienação fiduciária, só é permitida quando já pagos pelo menos 40% (quarenta por cento) do valor financiado.

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A súmula 284-STJ ainda é válida? • Para contratos anteriores à Lei 10.931/2004: SIM. • Para contratos posteriores à Lei 10.931/2004: NÃO. 7) Resposta No prazo de 15 dias, o devedor fiduciante apresentará resposta (uma espécie de contestação). Obs1: a resposta poderá ser apresentada ainda que o devedor tenha decidido pagar a integralidade da dívida, caso entenda ter havido pagamento a maior e deseje a restituição. Obs2: nesta defesa apresentada pelo devedor, é possível que ele invoque a ilegalidade das cláusulas contratuais (ex: juros remuneratórios abusivos). Se ficar provado que o contrato era abusivo, isso justificaria o inadimplemento e descaracterizaria a mora. Importante. Qual é o termo inicial para a contagem deste prazo de 15 dias: o dia em que for executada a medida liminar (apreensão do bem) ou a data da juntada do mandado de citação cumprido? Data da juntada aos autos do mandado de citação cumprido. Foi o que decidiu o STJ:

Em ação de busca e apreensão de bem alienado fiduciariamente, o termo inicial para a contagem do prazo de 15 dias para o oferecimento de resposta pelo devedor fiduciante é a data de juntada aos autos do mandado de citação devidamente cumprido (e não a data da execução da medida liminar). STJ. 3ª Turma. REsp 1.321.052-MG, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 16/8/2016 (Info 588). A redação do DL nº 911/1969 dá a entender que o prazo para a resposta será contado da execução da liminar. Veja:

Art. 3º (...) § 3º O devedor fiduciante apresentará resposta no prazo de quinze dias da execução da liminar.

O STJ, contudo, afirma que este prazo de resposta não pode ser contado a partir da execução da liminar. Isso porque o juiz concede a busca e apreensão de forma liminar, ou seja, sem ouvir o devedor.

Desse modo, é indispensável que seja realizado um ato formal de citação do devedor, sendo isso imprescindível ao desenvolvimento válido e regular do processo, visto que somente a perfeita angularização da relação processual é capaz de garantir à parte demandada o pleno exercício do contraditório.

Assim, concedida a liminar inaudita altera parte, cumpre ao magistrado expedir um mandado, que tem dupla finalidade: 1) autorizar a busca e apreensão do bem; 2) promover a citação do réu. Assim, depois de executada a liminar, ou seja, depois de o bem ter sido apreendido, deverá o réu ser citado. No mandado constará o prazo de 15 dias, que começará a ser contado da sua juntada aos autos.

O entendimento do STJ encontra respaldo na doutrina especializada:

"(...) juntamente com a expedição inicial do mandado de busca e apreensão, em cumprimento aos comandos da medida liminar deferida initio litis, segue-se a expedição do mandado de citação, uma vez que o ato processual de citação deverá ser realizado tão logo seja consumado o ato processual anterior, qual seja, a busca e apreensão da garantia fiduciária. Note-se, no tocante à citação, que a Lei nº 10.931/04, ao modificar a redação dos parágrafos do art. 3º do Decreto-lei nº 911/69, acabou por omitir nas novas disposições a referência antes existente relativa ao ato citatório, em especial ao momento de sua realização. Todavia, apesar da omissão da legislação quando do estabelecimento dos novos contornos para o procedimento da ação de busca e apreensão ora sob enfoque, de todo razoável admitir-se que esse ato processual de chamamento do réu a juízo deve ocorrer imediatamente após o cumprimento da medida liminar, tal como era previsto na revogada redação do art. 3º do Decreto-lei nº 911/69. Essa redação anterior tinha uma razão de ser, que em nada se modificou com a mudança legislativa." (ASSUMPÇÃO, Márcio Calil de. Ação de busca e apreensão: alienação fiduciária. 2ª ed., São Paulo: Atlas, 2003, p. 99)

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"(...) o termo inicial para a contagem do prazo de 15 dias não é a 'execução da liminar', tendo-se em conta a necessidade de interpretar-se o art. 3º, § 3º do Dec.-lei 911/1969 sistematicamente com as regras insculpidas no Código de Processo Civil (macrossistema instrumental), (...) Conclui-se, portanto, que a contagem do prazo de quinze dias para oferecimento de resposta, em ação especial de busca e apreensão fundada em propriedade fiduciária tem o dies a quo a partir da juntada aos autos do mandado liminar (e citatório) devidamente cumprido, excluindo-se, para tanto, o dia do começo (primeiro dia útil após), incluindo o do vencimento." (FIGUEIRA JÚNIOR, Joel Dias. Ação de busca e apreensão em propriedade fiduciária. São Paulo: RT, 2005, p. 153-154).

Existe outro precedente do STJ, da 4ª Turma, no mesmo sentido:

(...) O mandado de busca e apreensão/citação veicula, simultaneamente, a comunicação ao devedor acerca da retomada do bem alienado fiduciariamente e sua citação, daí decorrendo dois prazos diversos: (i) de 5 dias, contados da execução da liminar, para o pagamento da dívida (art. 3º, §§ 1º e 2º, do Decreto-Lei n. 911/1969, c/c 240 do CPC); e (ii) de 15 dias, a contar da juntada do mandado aos autos, para o oferecimento de resposta (...) STJ. 4ª Turma. REsp 1.148.622/DF, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 1º/10/2013.

PARENTESCO SOCIOAFETIVO (I)legitimidade do filho para pedir que sua falecida mãe

seja reconhecida como filha dos pretensos avós

O filho, em nome próprio, não tem legitimidade para deduzir em juízo pretensão declaratória de filiação socioafetiva entre sua mãe - que era maior, capaz e, ao tempo do ajuizamento da ação, pré-morta (já falecida) - e os supostos pais socioafetivos dela.

Obs: o filho teria legitimidade para propor ação pedindo o reconhecimento de sua relação de parentesco socioafetivo com os pretensos avós. Aí, contudo, seria outra ação, na qual se buscaria um direito próprio (e não de sua mãe).

STJ. 3ª Turma. REsp 1.492.861-RS, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 2/8/2016 (Info 588).

Imagine a seguinte situação hipotética: Francisca foi criada, desde os 3 anos de idade, por João e Maria, que a tratavam como se fosse filha, apesar de não haver nenhum vínculo biológico entre eles. Muitos anos se passaram, Francisca cresceu e teve um filho (Pedro). Aos 45 anos de idade, Francisca faleceu em virtude de um ataque cardíaco. Alguns meses após a morte da mãe, Pedro, que é advogado, ajuizou ação declaratória de paternidade socioafetiva contra João e Maria, pedindo que sua falecida mãe (Francisca) seja reconhecida, post mortem, como filha socioafetiva do casal. A ação proposta terá êxito? NÃO. O filho, em nome próprio, não tem legitimidade para deduzir em juízo pretensão declaratória de filiação socioafetiva entre sua mãe - que era maior, capaz e, ao tempo do ajuizamento da ação, pré-morta (já falecida) - e os supostos pais socioafetivos dela. STJ. 3ª Turma. REsp 1.492.861-RS, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 2/8/2016 (Info 588).

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O Código Civil prevê quem é legitimado para propor ação pedindo o reconhecimento do vínculo de parentesco:

Art. 1.606. A ação de prova de filiação compete ao filho, enquanto viver, passando aos herdeiros, se ele morrer menor ou incapaz. Parágrafo único. Se iniciada a ação pelo filho, os herdeiros poderão continuá-la, salvo se julgado extinto o processo.

A partir da análise deste dispositivo podemos extrair as seguintes regras:

Se a pessoa estiver viva, ela é quem deverá propor a ação;

Se a pessoa tiver morrido menor ou incapaz, os herdeiros poderão iniciar a ação;

Se a pessoa tiver proposto a ação quando estava viva e no curso do processo tiver falecido, os herdeiros poderão continuar o processo.

O autor ingressou com a ação, em nome próprio, pedindo que a sua falecida mãe fosse reconhecida como filha de João e Maria. Ocorre que sua mãe, quando em vida, não propôs a demanda. Além disso, ela morreu maior e capaz. Logo, não se enquadra em qualquer das hipóteses do art. 1.606 do CC, até porque o estado de filiação é considerado como um direito personalíssimo. Observação: Vale ressaltar que, no caso concreto acima explicado, o autor não ingressou com uma ação de reconhecimento de parentesco avoengo. Em outras palavras, ele não ajuizou a ação pedindo que fosse reconhecido como neto de João e Maria. Seu pedido foi para que sua falecida mãe fosse declarada como filha do casal. Isso é que foi analisado e julgado pelo STJ, encontrando óbice no art. 1.606 do CC. Nada impede que o autor ajuíze ação pedindo o reconhecimento de sua relação de parentesco socioafetivo com os pretensos avós. Aí, contudo, será uma outra ação, na qual se buscará um direito próprio (e não da falecida mãe). Esta outra ação seria, em tese, processualmente viável, conforme entendimento da doutrina majoritária. Nesse sentido:

Enunciado 521-CJF/STJ: Qualquer descendente possui legitimidade, por direito próprio, para propor o reconhecimento do vínculo de parentesco em face dos avós ou de qualquer ascendente de grau superior, ainda que o pai não tenha iniciado a ação de prova da filiação em vida.

DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL Não é possível a partilha de lucros de sociedade empresária

quando estes estão destinados à conta de reserva

Algumas vezes, uma empresa apura lucro, mas decide que não irá distribuí-los aos acionistas, retendo esses lucros com o objetivo de incrementar o seu capital social.

O lucro destinado à conta de reserva, ou seja, que não é distribuído aos sócios, continua pertencendo à sociedade empresária (e não ao sócio). Em razão disso, essa quantia não será partilhada caso um dos sócios termine a união estável que mantinha.

Em outras palavras, os lucros de sociedade empresária destinados a sua própria conta de reserva não são partilháveis entre o casal no caso de dissolução de união estável de sócio.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.595.775-AP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 9/8/2016 (Info 588).

Imagine a seguinte situação hipotética: Em 2012, João passou a viver em união estável com Maria. Antes de iniciar o relacionamento com Maria, João já era sócio de 50% de uma sociedade empresária. Em 2015, a sociedade empresária teve lucro líquido de R$ 1 milhão.

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Ocorre que esse dinheiro não foi distribuído aos sócios, tendo sido integralmente mantido na própria conta da empresa como reserva para novos investimentos. No começo de 2016 chegou ao fim o relacionamento entre João e Maria. Maria ajuizou ação de dissolução de união estável pedindo a partilha dos bens adquiridos durante a relação. Dentre os bens, ela pediu que fossem pagos a ela R$ 250 mil referentes ao lucro líquido da sociedade empresária em 2015. O raciocínio da autora foi o seguinte: a empresa lucrou R$ 1 milhão; metade é de um sócio e a outra metade de João (R$ 500 mil); ocorre que metade do que é de João pertence a Maria; logo, ela teria direito a R$ 250 mil. O pedido de Maria para divisão do lucro da empresa que está na conta de reserva deve ser aceito? Os lucros apurados de uma empresa criada antes da união estável e não revertidos para o sócio por ausência de distribuição de lucros no exercício contábil devem ser partilhados com a ex-companheira? Em outras palavras, integra o acervo comum do ex-casal o lucro destinado à conta reserva de empresa constituída anteriormente à relação? NÃO. Os lucros de sociedade empresária destinados a sua própria conta de reserva não são partilháveis entre o casal no caso de dissolução de união estável de sócio. STJ. 3ª Turma. REsp 1.595.775-AP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 9/8/2016 (Info 588). Quando uma empresa apura lucro, existe a necessidade de decidir o que será feito com essa quantia. Existem, basicamente, duas possibilidades: a) distribuição de dividendos aos acionistas; ou b) a retenção dos lucros para constituir reservas ou compensar prejuízos anteriores. Os lucros retidos consistem em lucros obtidos pela sociedade e que se decidiu manter na própria empresa, não distribuindo como dividendos. Normalmente, as empresas retêm os lucros com o objetivo de financiar suas operações futuras. Ao deixar de distribuir os lucros a seus acionistas, a empresa se capitaliza, ou seja, torna o seu capital próprio maior, melhora sua estrutura de capitais e financia seu crescimento com recursos próprios. Se os dividendos não foram distribuídos aos sócios, tendo permanecido retidos na empresa para reinvestimento, isso significa dizer que tais valores continuam pertencendo à pessoa jurídica. Nesse sentido é o que diz a doutrina especializada: "(...) O Jurista Erymá Carneiro, mestre em contabilidade, conceitua que 'juridicamente reserva nada mais é do que o lucro não distribuído, conceito que vamos encontrar confirmado na jurisprudência dos Tribunais judiciários e fiscais do País. Verifica-se que nossa lei adotou o conceito contábil de reserva, que assim passa a ter conteúdo também de direito, princípio, aliás, que tem sido adotado nas legislações modernas'. A finalidade jurídica das reservas, continua aquele autor, é servir de garantia e reforço do capital social, garantia dos credores. 'São adiantamentos ao capital das empresas', expõe ele, 'ao qual servem de reforço. Daí dizer-se que as reservas pertencem à sociedade e não ao sócio'". (REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial. 25ª ed. São Paulo: Saraiva, v. 2, 2007. p. 245) Logo, não houve acréscimo patrimonial para o sócio e esta quantia não integrou o patrimônio do casal. No caso concreto, o que aconteceu foi a valorização das cotas sociais pertencentes unicamente ao ex-companheiro. "A valorização patrimonial das cotas sociais de sociedade limitada, adquiridas antes do início do período de convivência, decorrente de mero fenômeno econômico, e não do esforço comum dos companheiros, não se comunica." (STJ. 3ª Turma. REsp 1.173.931/RS, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 22/10/2013).

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DIREITO DO CONSUMIDOR

PLANO DE SAÚDE Não se aplica o CDC ao contrato de plano de saúde administrado por entidade de autogestão

Não se aplica o CDC às relações entre as operadoras de planos de saúde constituídas sob a modalidade de autogestão e seus filiados.

Assim, os planos de saúde de autogestão podem ser considerados como uma exceção à Súmula 469 do STJ: "Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde."

A operadora de plano privado de assistência à saúde na modalidade de autogestão é pessoa jurídica de direito privado sem finalidades lucrativas que, vinculada ou não à entidade pública ou privada, opera plano de assistência à saúde com exclusividade para um público determinado de beneficiários.

A constituição dos planos sob a modalidade de autogestão diferencia, sensivelmente, essas pessoas jurídicas quanto à administração, forma de associação, obtenção e repartição de receitas, dos contratos firmados com empresas que exploram essa atividade no mercado e visam ao lucro.

Em razão disso, não se aplica o CDC ao contrato de plano de saúde administrado por entidade de autogestão, por inexistência de relação de consumo.

STJ. 2ª Seção. REsp 1.285.483-PB, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 22/6/2016 (Info 588).

Plano de saúde de autogestão Planos de saúde de autogestão (também chamados de planos fechados de saúde) são criados por órgãos, entidades ou empresas para beneficiar um grupo restrito de filiados com a prestação de serviços de saúde. Tais planos são mantidos por instituições sem fins lucrativos e administrados paritariamente, de forma que no seu conselho deliberativo ou de administração, há representantes do órgão ou empresa instituidora e também dos associados ou usuários. O objetivo desses planos fechados é baratear para os usuários o custo dos serviços de saúde, tendo em vista que não visam ao lucro. Exemplo: CASSI (Caixa de Assistência dos Funcionários do Banco do Brasil). Segundo a Resolução Normativa 137, da ANS, de 14/11/2006, a operadora de autogestão é...

(...) a pessoa jurídica de direito público ou privado que, diretamente ou por intermédio de entidade pública ou privada patrocinadora, instituidora ou mantenedora, administra plano coletivo de assistência à saúde destinado exclusivamente a pessoas (e seus dependentes) a ela ligadas por vínculo jurídico ou estatutário, ou aos participantes (e seus dependentes) de associações, fundações, sindicatos e entidades de classes, nos termos dos incisos I, II e III e § 2º, do art. 2º.

A relação entre a empresa de plano de saúde constituída sob a modalidade de autogestão e os seus filiados é regida pelo Código de Defesa do Consumidor? NÃO.

Não se aplica o CDC às relações existentes entre operadoras de planos de saúde constituídas sob a modalidade de autogestão e seus filiados. STJ. 2ª Seção. REsp 1.285.483-PB, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 22/6/2016 (Info 588).

As operadoras de planos de saúde constituídas sob a modalidade de autogestão possuem inúmeras diferenças em relação às operadoras comerciais de plano de saúde. Confira as principais distinções:

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Planos de saúde comerciais (inclui-se aqui as cooperativas

Planos de saúde de autogestão

Operam em regime de mercado. Não operam em regime de mercado.

Buscam auferir lucro com as contribuições vertidas pelos participantes (proveito econômico).

Não têm objetivo de lucro.

Os assistidos não participam da gestão do plano. Os assistidos participam da gestão do plano.

São comercializados para o público em geral. São disponibilizados para um grupo restrito de pessoas que possuem alguma relação com o plano.

Por conta dessas diferenças, os atos regulamentares da ANS conferem tratamento diferenciado para os planos de saúde de autogestão, com a finalidade de atender às características próprias dessa modalidade de operadora, possibilitando a redução dos custos de sua manutenção, cujos serviços são prestados, não mediante contraprestação pecuniária com a finalidade de obtenção de lucro, mas a partir de contribuições dos participantes calculadas, em regra, com base nos seus salários/aposentadorias etc., observando-se, com isso, os princípios do mutualismo e da solidariedade. Por essas razões, as regras do CDC não se aplicam às relações envolvendo entidades de planos de saúde constituídas sob a modalidade de autogestão. Isso porque tais entidades não oferecem serviços no mercado e não exercem empresa com o intuito de lucro, razão pela qual não se lhes aplica o conceito de fornecedor estabelecido no art. 3º, § 2º do CDC. O tratamento legal a ser dado na relação jurídica entre os associados e os planos de saúde de autogestão, os chamados planos fechados, não pode ser o mesmo dos planos comuns, sob pena de se criar prejuízos e desequilíbrios que, se não inviabilizarem a instituição, acabarão elevando o ônus dos demais associados, desrespeitando normas e regulamentos que eles próprios criaram para que o plano se viabilize (STJ. 3ª Turma. REsp 1121067/PR, Rel. Min. Massami Uyeda, julgado em 21/06/2011). Exceção à súmula 469 do STJ O enunciado 469 do STJ preconiza o seguinte:

Súmula 469-STJ: Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde.

Dessa forma, pela decisão acima explicada, pode-se concluir que as operadoras de planos de saúde constituídas sob a modalidade de autogestão representam uma exceção à regra da súmula 469 do STJ, considerando que para elas não se aplica o CDC.

PLANO DE SAÚDE É abusiva cláusula que autoriza plano de saúde a indeferir procedimentos

médico-hospitalares solicitados por médicos não integrantes do plano

O plano de saúde não pode se recusar a custear exames, internações e tratamentos hospitalares usando como único argumento o fato de que tais procedimentos foram solicitados por médico não integrante da rede de atendimento do plano.

A cláusula contratual que prevê o indeferimento de quaisquer procedimentos médico-hospitalares, se estes forem solicitados por médicos não cooperados, deve ser reconhecida como cláusula abusiva, nos termos do art. 51, IV, do CDC.

STJ. 4ª Turma. REsp 1.330.919-MT, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 2/8/2016 (Info 588).

Informativo 588-STJ (17/08 a 31/08/2016) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 19

Imagine a seguinte situação hipotética: João é cliente do plano de saúde Unimed. O cardiologista de confiança de João não está entre os médicos cadastrados no plano de saúde. Mesmo assim, João faz questão de se consultar com ele, pagando diretamente ao profissional pelo atendimento. O médico passou uma série de exames para João, tendo o paciente, de posse do receituário, procurado o escritório da Unimed para pegar uma “guia de autorização”, que seria levada ao laboratório credenciado. Ocorre que a Unimed recusou-se a autorizar os exames alegando que, no contrato assinado, existe uma cláusula prevendo que o plano de saúde somente irá custear exames e procedimentos que tenham sido solicitados pelos médicos integrantes da cooperativa. Em outras palavras, a referida cláusula prevê que somente serão autorizados exames prescritos pelos médicos do plano de saúde. A recusa do plano de saúde é legítima? Esta cláusula contratual é válida? NÃO.

Em contrato de plano de assistência à saúde, é abusiva a cláusula que preveja o indeferimento de quaisquer procedimentos médico-hospitalares quando solicitados por médicos não cooperados. STJ. 4ª Turma. REsp 1.330.919-MT, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 2/8/2016 (Info 588).

A referida previsão é abusiva, nos termos do art. 51, IV, do CDC:

Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que: (...) IV - estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade;

Não há razão que justifique esta cláusula. Se o paciente se consulta com médico de sua confiança e procura realizar os exames por ele solicitados em laboratório credenciado ao plano de saúde, não há prejuízo algum para a cooperativa, considerando que o valor da consulta foi arcado exclusivamente pelo usuário, sem pedido de reembolso. Seria muito mais custoso para o plano de saúde se, além dos exames, a consulta também tivesse sido realizada em um médico credenciado. Isso porque o plano de saúde teria que pagar a consulta mais os exames. No caso concreto, ele só terá que arcar com os exames. Desse modo, percebe-se que indeferir a solicitação do procedimento requerido pelo médico não cooperado não encontra justificativa no princípio do equilíbrio contratual. Na verdade, trata-se de uma violação pelo plano de saúde do princípio da boa-fé objetiva. Exames, internações e demais procedimentos hospitalares não podem ser vedados aos usuários cooperados exclusivamente pelo fato de terem sido solicitados por médico não credenciado porque isso configura discriminação com os galenos (médicos) não cooperados, tolhe o direito do consumidor de usar o plano de saúde e restringe a sua liberdade de escolher o profissional que lhe aprouver. Vale ressaltar que, além de ser nula com base no CDC, esta cláusula também é vedada pela Resolução do Conselho de Saúde Suplementar - CONSU nº 8, de 3 de novembro de 1998. Confira:

Art. 2º Para adoção de práticas referentes à regulação de demanda da utilização dos serviços de saúde, estão vedados: (...) VI - negar autorização para realização do procedimento exclusivamente em razão do profissional solicitante não pertencer à rede própria ou credenciada da operadora.

Informativo 588-STJ (17/08 a 31/08/2016) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 20

Não confundir. Alguns planos de saúde permitem que o usuário se consulte com médicos não credenciados e depois solicitem o reembolso da quantia paga (total ou parcialmente). Outros planos de saúde não oferecem isso. Se o plano de saúde disser no contrato que não irá reembolsar o paciente por consultas realizadas com médicos não cadastrados, esta previsão é considerada válida? SIM. Essa limitação contratual não se mostra abusiva, uma vez que é razoável e busca resguardar a operadora de fortes e imprevisíveis impactos econômico-financeiros do contrato.

PLANO DE SAÚDE Direito de o ex-empregado continuar beneficiário em plano de saúde coletivo empresarial

É assegurado ao trabalhador demitido sem justa causa ou ao aposentado que contribuiu para o plano de saúde em decorrência do vínculo empregatício o direito de continuar no plano durante certo período com as mesmas condições de cobertura assistencial de que gozava quando da vigência do contrato de trabalho, desde que assuma o seu pagamento integral (arts. 30 e 31 da Lei nº 9.656/98).

Para isso, no entanto, é necessário que, durante o vínculo empregatício, ele contribuísse para o pagamento do plano.

Quando se fala em "contribuição" para o plano, isso significa pagamento de mensalidade.

Assim, se apenas a empresa contribuía para o plano, o ex-empregado não terá direito de continuar nele mesmo que este plano fosse sob a modalidade de coparticipação (quando o usuário, apesar de não pagar contribuição mensal, paga uma parte do tratamento/consulta).

Resumindo: o empregado que for aposentado ou demitido sem justa causa não terá direito de ser mantido em plano de saúde coletivo empresarial custeado exclusivamente pelo empregador - sendo irrelevante se houver coparticipação no pagamento de procedimentos de assistência médica, hospitalar e odontológica -, salvo disposição contrária expressa em contrato ou em convenção coletiva de trabalho.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.594.346-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 9/8/2016 (Info 588).

Situação 1: Antônio era empregado de um banco e possuía plano de saúde oferecido aos funcionários da instituição. O custeio do plano era mantido da seguinte forma: o empregador arcava todos os meses com R$ 100,00 e o empregado pagava outros R$ 100,00. Antônio foi demitido sem justa causa e deseja continuar no plano de saúde com as mesmas condições de cobertura assistencial que gozava. Para tanto, ele se compromete a pagar mensalmente R$ 200,00 (sua parte e a do antigo empregador). Ele possui esse direito? SIM. Tal possibilidade encontra-se prevista na Lei nº 9.656/98 (que trata sobre os planos de saúde):

Art. 30. Ao consumidor que contribuir para produtos de que tratam o inciso I e o § 1º do art. 1º desta Lei, em decorrência de vínculo empregatício, no caso de rescisão ou exoneração do contrato de trabalho sem justa causa, é assegurado o direito de manter sua condição de beneficiário, nas mesmas condições de cobertura assistencial de que gozava quando da vigência do contrato de trabalho, desde que assuma o seu pagamento integral.

Repare que, para o trabalhador continuar tendo direito, deverão ser atendidas três exigências: a) durante o vínculo empregatício, ele contribuía para o pagamento do plano; b) ele foi demitido sem justa causa; c) ele se compromete a assumir o pagamento integral das parcelas.

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O trabalhador terá direito de continuar com o plano de saúde por um tempo máximo de 24 meses, conforme prevê o § 1º do art. 30 da Lei nº 9.656/98. Se antes de completar os 24 meses, o consumidor for admitido em um novo emprego, também perderá o direito de continuar com as mesmas condições no plano de saúde (§ 5º do art. 30). Situação 2: João era empregado de um banco e possuía plano de saúde oferecido aos funcionários da instituição. O custeio do plano era mantido integralmente pelo empregador, ou seja, todos os meses o banco pagava R$ 200,00 para manutenção do plano de saúde e João não precisava arcar com nada. Vale ressaltar, contudo, que o plano de saúde era regido pelo sistema de coparticipação, ou seja, sempre que João iria se submeter a uma consulta ou tratamento, o plano pagava 70% e ele deveria arcar com os 30% restantes. João foi demitido sem justa causa e deseja continuar no plano de saúde com as mesmas condições de cobertura assistencial que gozava. Para tanto, ele se compromete a pagar mensalmente R$ 200,00 que eram pagos pelo antigo empregador. Ele possui esse direito? NÃO. Isso porque o art. 30 acima transcrito afirma que o ex-empregado só tem direito de manter o plano de saúde se, durante o contrato de trabalho, ele contribuía para o pagamento do plano. Veja novamente trecho da redação:

Art. 30. Ao consumidor que contribuir para produtos de que tratam o inciso I e o § 1º do art. 1º desta Lei (...)

João alegou que contribuía para o plano de saúde, considerando que o plano era do tipo coparticipação, de forma que todas as vezes que usava, ele tinha que pagar uma parte do tratamento. Essa tese foi aceita? A coparticipação pode ser considerada como contribuição do ex-empregado para os fins do art. 30 da Lei nº 9.656/98? NÃO. O § 6º do art. 30 é expresso ao negar essa possibilidade:

§ 6º Nos planos coletivos custeados integralmente pela empresa, não é considerada contribuição a co-participação do consumidor, única e exclusivamente, em procedimentos, como fator de moderação, na utilização dos serviços de assistência médica ou hospitalar.

Para os fins do caput do art. 30 da Lei nº 9.656/98, contribuir para o plano de saúde significa pagar uma mensalidade, independentemente de se estar usufruindo dos serviços de assistência médica. Essas mesmas regras acima expostas valem também para o empregado que tinha o plano de saúde da empresa, mas teve seu contrato extinto porque se aposentou? SIM, porém, existem algumas peculiaridades relacionadas com o tempo mínimo em que ele deve ter contribuído. Veja:

Art. 31. Ao aposentado que contribuir para produtos de que tratam o inciso I e o § 1º do art. 1º desta Lei, em decorrência de vínculo empregatício, pelo prazo mínimo de dez anos, é assegurado o direito de manutenção como beneficiário, nas mesmas condições de cobertura assistencial de que gozava quando da vigência do contrato de trabalho, desde que assuma o seu pagamento integral. § 1º Ao aposentado que contribuir para planos coletivos de assistência à saúde por período inferior ao estabelecido no caput é assegurado o direito de manutenção como beneficiário, à razão de um ano para cada ano de contribuição, desde que assuma o pagamento integral do mesmo. § 2º Para gozo do direito assegurado neste artigo, observar-se-ão as mesmas condições estabelecidas nos §§ 2º, 3º, 4º, 5º e 6º do art. 30. § 3º Para gozo do direito assegurado neste artigo, observar-se-ão as mesmas condições estabelecidas nos §§ 2º e 4º do art. 30.

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BANCOS DE DADOS E CADASTROS DE CONSUMIDORES O prazo máximo de 5 anos que o nome do consumidor pode permanecer negativado

inicia-se no dia seguinte ao vencimento da dívida

Importante!!!

O termo inicial do prazo de permanência de registro de nome de consumidor em cadastro de proteção ao crédito (art. 43, § 1º, do CDC) inicia-se no dia subsequente ao vencimento da obrigação não paga, independentemente da data da inscrição no cadastro.

Assim, vencida e não paga a obrigação, inicia-se no dia seguinte a contagem do prazo de 5 anos previsto no §1º do art. 43, do CDC, não importando a data em que o nome do consumidor foi negativado.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.316.117-SC, Rel. Min. João Otávio de Noronha, Rel. para acórdão Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 26/4/2016 (Info 588).

Como se sabe, se o consumidor está inadimplente, o fornecedor poderá incluí-lo em bancos de dados de proteção ao crédito (exs.: SPC e SERASA). Existe um prazo máximo no qual o nome do devedor pode ficar negativado? SIM. Os cadastros e bancos de dados não poderão conter informações negativas do consumidor referentes a período superior a 5 anos. É o que prevê o § 1º do art. 43 do CDC:

§ 1º - Os cadastros e dados de consumidores devem ser objetivos, claros, verdadeiros e em linguagem de fácil compreensão, não podendo conter informações negativas referentes a período superior a 5 (cinco anos).

Passado esse prazo, o próprio órgão de cadastro deve retirar a anotação negativa, independentemente de como esteja a situação da dívida (não importa se ainda está sendo cobrada em juízo ou se ainda não foi prescrita).

Súmula 323-STJ: A inscrição do nome do devedor pode ser mantida nos serviços de proteção ao crédito até o prazo máximo de cinco anos, independentemente da prescrição da execução.

A partir de quando se começa a contar este prazo de 5 anos: após a data em que houve o vencimento da dívida ou após o dia em que o nome do devedor foi inserido no SPC/SERASA? Ex: João deixou de pagar a conta do celular que venceu em 01 de março 2015; em 01 de julho 2015, a operadora incluiu o devedor no SERASA; caso não pague, o nome de João sairá do cadastro negativo em 02 de março 2020 ou em 02 de julho de 2020? Em 02 de março de 2020. O STJ decidiu que:

O termo inicial do prazo de permanência de registro de nome de consumidor em cadastro de proteção ao crédito (art. 43, § 1º, do CDC) inicia-se no dia subsequente ao vencimento da obrigação não paga, independentemente da data da inscrição no cadastro. Assim, vencida e não paga a obrigação, inicia-se, no dia seguinte, a contagem do prazo de 5 anos previsto no §1º do art. 43, do CDC, não importando a data em que o nome do consumidor foi negativado. STJ. 3ª Turma. REsp 1.316.117-SC, Rel. Min. João Otávio de Noronha, Rel. para acórdão Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 26/4/2016 (Info 588). O § 1º do art. 43 não diz expressamente qual deverá ser o termo inicial da contagem do prazo de 5 anos. No entanto, é possível concluir que esta contagem deverá levar em consideração a data do vencimento da obrigação (e não o dia de inclusão no cadastro de inadimplentes). Existem duas razões para isso:

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1ª) Interpretação mais favorável ao consumidor O CDC, não possuindo regra expressa, deve ser interpretado sempre de maneira mais favorável ao consumidor. Assim, a interpretação que mais se coaduna com o espírito do Código e, sobretudo, com os fundamentos para a tutela temporal do devedor, aí incluído o direito ao esquecimento, é aquela que considera como termo a quo do prazo a data do fato gerador da informação arquivada. Por isso, o prazo começa a fluir após o vencimento da obrigação, não importando o dia em que houve a comunicação ao SPC/SERASA ou o dia em que o nome do devedor foi efetivamente registrado. 2ª) O critério deve ser objetivo, evitando o prolongamento indevido da manutenção Se o termo inicial do prazo de 5 anos fosse a data do registro, estaria sendo autorizado que as anotações fossem "perpétuas", pois bastaria que elas passassem de um banco de dados para outro ou para um banco de dados novo para se reiniciar este prazo, até que ocorresse a prescrição. Haveria, portanto, uma burla ao prazo máximo de 5 anos, que poderia ser prolongado indevidamente. Desse modo, o critério de início de contagem do prazo deve ser objetivo, não podendo "ficar submetido à vontade do banco de dados ou do fornecedor, sob pena de esvaziar, por completo, o propósito legal de impedir consequências negativas, como a denegação do crédito, em decorrência de dívidas consideradas – legalmente – antigas e irrelevantes" (BESSA, Leonardo Roscoe. Manual de Direito do Consumidor 3ª ed., São Paulo: RT, 2011, p. 311).

ECA

ADOÇÃO Não é possível que a adoção conjunta seja transformada em unilateral post mortem caso um dos

autores desista e o outro morra sem ter manifestado intenção de adotar unilateralmente

Se, no curso da ação de adoção conjunta, um dos cônjuges desistir do pedido e outro vier a falecer sem ter manifestado inequívoca intenção de adotar unilateralmente, não poderá ser deferido ao interessado falecido o pedido de adoção unilateral post mortem.

Tratando-se de adoção em conjunto, um cônjuge não pode adotar sem o consentimento do outro. Assim, se proposta adoção em conjunto e um dos autores (candidatos a pai/mãe) desiste da ação, a adoção deve ser indeferida, especialmente se o outro vem a morrer antes de manifestar-se sobre a desistência.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.421.409-DF, Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 18/8/2016 (Info 588).

Imagine a seguinte situação hipotética: Paulo e Cristina cuidam de Luisa, filha de uma ex-empregada doméstica, desde que ela era um bebê. A ex-empregada sumiu e deixou a filha com o casal. Diante disso, eles ajuizaram ação de adoção. Durante a tramitação do processo de adoção, Paulo ficou muito doente. Cristina protocolizou petição de desistência da adoção, explicando que seu esposo encontrava-se muito enfermo, prestes a falecer, e afirmando que não queria assumir a responsabilidade por tal ato sozinha. Antes que a petição de Cristina fosse analisada, Paulo morreu, tendo sido sucedido no polo processual pelo espólio. O juiz proferiu sentença decidindo o seguinte: a) no que se refere a Cristina, extinguiu o processo sem resolução do mérito, homologando a desistência formulada (art. 485, VIII, do CPC); b) quanto a Paulo, deferiu a adoção post mortem, de forma que Luisa tornou-se sua filha para todos os efeitos legais.

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O magistrado argumentou que se o pai/adotante morre no curso do processo, prevalece a sua vontade de adotar manifestada na petição inicial, não podendo os familiares/herdeiros desistirem da ação proposta pelo falecido. Invocou, para tanto, o art. 42, § 6º do ECA:

Art. 42 (...) § 6º A adoção poderá ser deferida ao adotante que, após inequívoca manifestação de vontade, vier a falecer no curso do procedimento, antes de prolatada a sentença.

O espólio de Paulo interpôs recurso e a questão chegou até o STJ. A sentença foi mantida? NÃO. Se, no curso da ação de adoção conjunta, um dos cônjuges desistir do pedido e outro vier a falecer sem ter manifestado inequívoca intenção de adotar unilateralmente, não poderá ser deferido ao interessado falecido o pedido de adoção unilateral post mortem. STJ. 3ª Turma. REsp 1.421.409-DF, Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 18/8/2016 (Info 588). O § 5º do art. 42 do ECA prevê a chamada adoção póstuma, que ocorre quando o pretenso adotante morre no curso do processo, antes de proferida a sentença, sendo permitida a finalização do processo. Para isso, no entanto, é indispensável que o de cujus tenha manifestado inequivocamente sua de vontade de adotar. No caso em tela, a adoção foi proposta pelo casal, tratando-se de adoção conjunta, prevista no § 2º do art. 42 do ECA:

§ 2º Para adoção conjunta, é indispensável que os adotantes sejam casados civilmente ou mantenham união estável, comprovada a estabilidade da família.

Como um dos autores (a mulher) desistiu, o juiz não poderia ter deferido a adoção post mortem apenas em relação ao falecido porque o pedido inicial foi de adoção conjunta e um dos requisitos exigidos para este tipo de adoção é a necessidade de concordância do casal para adotar. Tratando-se de adoção em conjunto, um cônjuge não pode adotar sem o consentimento do outro. O consentimento deve ser mútuo. Vale ressaltar, ainda, que quando Cristina desistiu da adoção, seu esposo já não tinha condições de expressar sua real vontade, de forma que jamais se saberá se manteria a adoção, mesmo sob a desistência da esposa. O magistrado, sem pedido expresso, transformou a adoção bilateral, em conjunto, em adoção póstuma isolada de pessoa que era casada, sem que haja indício de que o falecido quisesse realmente a adoção unilateral.

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

FAZENDA PÚBLICA EM JUÍZO Interpretação extensiva do art. 19, § 1º, I, da Lei nº 10.522/2002

Aplica-se a dispensa de condenação em honorários advocatícios prevista no art. 19, § 1º, I, da Lei nº 10.522/2002, na hipótese em que a Fazenda Nacional contesta a demanda, mas, ato contínuo, antes de pronunciamento do juízo ou da parte contrária, apresenta petição em que reconhece a procedência do pedido e requer a desconsideração da peça contestatória.

STJ. 2ª Turma. REsp 1.551.780-SC, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 9/8/2016 (Info 588).

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Art. 19 da Lei nº 10.522/2002 O art. 19 da Lei nº 10.522/2002 traz uma regra muito interessante e eficiente para a atuação judicial da PFN. Este dispositivo prevê que, se a Fazenda Nacional estiver em um processo judicial e o Procurador perceber que a causa envolve determinadas matérias nas quais a jurisprudência é manifestamente contrária às pretensões da União, será possível que a Fazenda não conteste, não interponha recurso ou, se já tiver interposto, desista. Como "recompensa" por assumir esta postura de lealdade processual, a União não será condenada a pagar honorários advocatícios. Leia com atenção o dispositivo e veja as peculiaridades envolvendo o tema:

Art. 19. Fica a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional autorizada a não contestar, a não interpor recurso ou a desistir do que tenha sido interposto, desde que inexista outro fundamento relevante, na hipótese de a decisão versar sobre: I - matérias de que trata o art. 18; II - matérias que, em virtude de jurisprudência pacífica do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça, do Tribunal Superior do Trabalho e do Tribunal Superior Eleitoral, sejam objeto de ato declaratório do Procurador-Geral da Fazenda Nacional, aprovado pelo Ministro de Estado da Fazenda; III - (VETADO). IV - matérias decididas de modo desfavorável à Fazenda Nacional pelo Supremo Tribunal Federal, em sede de julgamento realizado nos termos do art. 543-B da Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973 - Código de Processo Civil; V - matérias decididas de modo desfavorável à Fazenda Nacional pelo Superior Tribunal de Justiça, em sede de julgamento realizado nos termos dos art. 543-C da Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973 - Código de Processo Civil, com exceção daquelas que ainda possam ser objeto de apreciação pelo Supremo Tribunal Federal.

§ 1º Nas matérias de que trata este artigo, o Procurador da Fazenda Nacional que atuar no feito deverá, expressamente: I - reconhecer a procedência do pedido, quando citado para apresentar resposta, inclusive em embargos à execução fiscal e exceções de pré-executividade, hipóteses em que não haverá condenação em honorários; ou II - manifestar o seu desinteresse em recorrer, quando intimado da decisão judicial.

§ 2º A sentença, ocorrendo a hipótese do § 1º, não se subordinará ao duplo grau de jurisdição obrigatório. (...)

Feitas estas considerações, imagine a seguinte situação hipotética: Determinado contribuinte ajuizou ação anulatória de débito tributário alegando que a contribuição "X" foi declarada inconstitucional pelo Plenário do STF. A Fazenda Nacional apresentou contestação no dia 10/02, defendendo a constitucionalidade do tributo. Em ato contínuo, sem que houvesse pronunciamento nem da parte contrária nem do Juízo, a Fazenda Nacional apresentou, em 15/02, petição reconhecendo a procedência do pedido e requerendo a desconsideração da contestação outrora apresentada.

Neste caso, o juiz deverá condenar a União ao pagamento de honorários advocatícios? NÃO.

Aplica-se a dispensa de condenação em honorários advocatícios prevista no art. 19, § 1º, I, da Lei nº 10.522/2002, na hipótese em que a Fazenda Nacional contesta a demanda, mas, ato contínuo, antes de pronunciamento do juízo ou da parte contrária, apresenta petição em que reconhece a procedência do pedido e requer a desconsideração da peça contestatória. STJ. 2ª Turma. REsp 1.551.780-SC, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 9/8/2016 (Info 588).

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Segundo o STJ, deve-se fazer uma interpretação extensiva do § 1º do art. 19 da Lei nº 10.522/2002 para abranger o presente caso, tendo em vista que, mesmo tendo sido apresentada contestação, houve o reconhecimento da procedência do pedido em momento oportuno, de forma que não houve qualquer prejuízo à parte contrária pelo fato de ter sido proposta inicialmente a contestação. Com a atitude processual da Fazenda ficou claro o desinteresse em resistir à pretensão formulada pela parte autora, o que resultou em uma prestação jurisdicional célere, pois não foi mais necessária qualquer providência processual ou probatória para solução da lide.

CUMPRIMENTO DE SENTENÇA Inexigibilidade de obrigação fundada em lei não recepcionada pela Constituição

Ainda que tenha havido o trânsito em julgado, é inexigível a obrigação reconhecida em sentença com base exclusivamente em lei não recepcionada pela Constituição.

Fundamento: art. 475-L, II e § 1º, do CPC/1973 (art. 525, § 1º, III e § 12 do CPC/2015).

Obs: existe uma inovação trazida pelo CPC/2015 que é importante ser ressaltada e que geraria solução diferente ao caso concreto apreciado. Para que o devedor possa alegar a inexigibilidade da obrigação argumentando que o título é baseado em lei incompatível com a Constituição, exige-se que a decisão do STF seja anterior à formação da coisa julgada. Se for posterior, a matéria não poderá ser alegada em impugnação, devendo ser proposta ação rescisória. É isso que se extrai do art. 525, §§ 14 e 15 do CPC/2015.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.531.095-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 9/8/2016 (Info 588).

Imagine a seguinte situação hipotética: Em 2008, o jornal "XX" publicou uma reportagem ofensiva à honra de João. O ofendido ajuizou ação contra o periódico, tendo este sido condenado a: a) pagar indenização por danos morais, com fundamento no art. 5º, V e X, da CF/88; b) publicar no jornal a íntegra da sentença condenatória, conforme autorizava o art. 75 da Lei nº 5.250/67 (Lei de Imprensa):

Art. 75. A publicação da sentença cível ou criminal, transitada em julgado, na íntegra, será decretada pela autoridade competente, a pedido da parte prejudicada, em jornal, periódico ou através de órgão de radiodifusão de real circulação, ou expressão, às expensas da parte vencida ou condenada.

Houve trânsito em julgado. A partir daí João iniciou o cumprimento de sentença, considerando que o jornal não cumpriu voluntariamente as obrigações impostas. Lei de imprensa declarada não recepcionada Ocorre que, em 2009, antes de o jornal cumprir a obrigação, o STF decidiu que a Lei de Imprensa, em sua inteireza, não foi recepcionada pela CF/88, sendo, portanto, inválida: STF. Plenário. ADPF 130, Rel. Min. Carlos Britto, julgado em 30/04/2009. Desse modo, a partir do julgamento do STF, a jurisprudência passou a entender que o art. 75 da Lei de Imprensa é inaplicável:

(...) A partir do julgamento definitivo da ADPF nº 130/DF, pelo Supremo Tribunal Federal, restou reconhecida a não recepção da Lei nº 5.250/1967 (Lei de Imprensa) pela Constituição Federal de 1988 e, com isso, a inaplicabilidade do art. 75 daquele diploma legal, que estabelecia que a sentença cível (ou criminal), transitada em julgado, deveria ser publicada, a pedido do interessado e por determinação da autoridade competente, em jornal, periódico ou através de órgão de radiodifusão de real circulação, ou

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expressão, às expensas da parte vencida ou condenada. (...) STJ. 3ª Turma. REsp 1297426/RO, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 03/11/2015.

Voltando ao caso concreto: O jornal pagou a indenização. No entanto, diante da decisão do STF, apresentou impugnação na qual argumentou que não pode mais ser obrigado a publicar a sentença condenatória porque o título judicial que a obrigava se fundou em dispositivo legal (art. 75 da Lei de Imprensa) incompatível com a CF/88, sendo, portanto, inexigível neste ponto. João refutou a argumentação afirmando que houve trânsito em julgado e que, portanto, isso não poderia mais ser questionado. A tese do jornal foi acolhida pelo STJ? SIM. Ainda que tenha havido o trânsito em julgado, é inexigível a obrigação reconhecida em sentença com base exclusivamente em lei não recepcionada pela Constituição. STJ. 3ª Turma. REsp 1.531.095-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 9/8/2016 (Info 588). Lei de Imprensa é inválida desde a promulgação da Constituição A Lei de Imprensa foi declarada não recepcionada (ADPF 130). O STF não modulou os efeitos desta decisão. Isso significa dizer que a citada norma legal deve ser considerada inteiramente inválida desde a promulgação da CF/88. Daí porque, desde 05/10/1988, o art. 75 da Lei de Imprensa não é válido. Título foi fundado unicamente na lei inválida Se o título judicial foi fundado (baseado) exclusivamente na aplicação ou interpretação da lei ou ato normativo tidos pelo STF como incompatíveis com a Constituição Federal, será permitido o reconhecimento da inexigibilidade da obrigação na própria fase de execução. Se a sentença tivesse se baseado no art. 75 da Lei de Imprensa e em outros dispositivos ainda válidos (ex: no Código Civil ou na CF/88), a obrigação continuaria sendo exigível. No caso concreto, contudo, a sentença, na parte que condenou o jornal a publicar a decisão na íntegra, foi fundada unicamente (exclusivamente) no art. 75. Previsão legal para esta alegação do executado O CPC, tanto o revogado, como o atual, previram a possibilidade de o executado arguir, em impugnação ao cumprimento de sentença, a inexigibilidade do título judicial. Confira:

CPC/1973 CPC/2015

Art. 475-L. A impugnação somente poderá versar sobre: (...) II – inexigibilidade do título;

Art. 525. (...) § 1º Na impugnação, o executado poderá alegar: (...) III - inexequibilidade do título ou inexigibilidade da obrigação;

O caso em tela pode ser enquadrado como "inexigibilidade da obrigação"? SIM. Segundo o § 1º do art. 475-L, do CPC/1973 (§ 12 do art. 525 do CPC/2015), considera-se também inexigível a obrigação reconhecida em título executivo judicial quando este for fundado...

em lei ou ato normativo considerado inconstitucional pelo STF; ou

em aplicação ou interpretação da lei ou do ato normativo tido pelo STF como incompatível com a CF. ... em controle de constitucionalidade concentrado ou difuso.

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No caso concreto, a aplicação do art. 75 da Lei de Imprensa foi tida como incompatível com a CF/88 em controle concentrado de constitucionalidade. Peculiaridade envolvendo o novo CPC Como vimos acima, as redações do antigo e do novo CPC são muito semelhantes. No entanto, existe uma inovação trazida pelo CPC/2015 que é importante ser ressaltada e que geraria solução diferente ao caso concreto apreciado. Para que o devedor possa alegar a inexigibilidade da obrigação argumentando que o título é baseado em lei incompatível com a Constituição, exige-se que a decisão do STF seja anterior à formação da coisa julgada. Se for posterior, a matéria não poderá ser alegada em impugnação, devendo ser proposta ação rescisória. É isso que se extrai do art. 525, §§ 14 e 15 do CPC/2015:

Art. 525 (...) § 14. A decisão do Supremo Tribunal Federal referida no § 12 deve ser anterior ao trânsito em julgado da decisão exequenda. § 15. Se a decisão referida no § 12 for proferida após o trânsito em julgado da decisão exequenda, caberá ação rescisória, cujo prazo será contado do trânsito em julgado da decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal.

DIREITO PENAL

GESTÃO TEMERÁRIA Dolo no crime de gestão temerária

Está presente o dolo do delito de gestão temerária (art. 4º, parágrafo único, da Lei nº 7.492/1986) na realização, por alguma das pessoas mencionadas no art. 25 da Lei nº 7.492/1986, de atos que transgridam, voluntária e conscientemente, normas específicas expedidas pela CVM, CMN ou Bacen.

O agente pratica o crime de gestão temerária quando viola deveres impostos por normas jurídicas voltadas aos administradores de instituições financeiras e que prevêem limites de risco aceitáveis.

STJ. 6ª Turma. REsp 1.613.260-SP, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 9/8/2016 (Info 588).

O art. 4º da Lei nº 7.492/86 prevê dois crimes:

Caput: gestão fraudulenta;

Parágrafo único: gestão temerária.

Art. 4º Gerir fraudulentamente instituição financeira: Pena - Reclusão, de 3 (três) a 12 (doze) anos, e multa. Parágrafo único. Se a gestão é temerária: Pena - Reclusão, de 2 (dois) a 8 (oito) anos, e multa.

Em que consiste o crime de gestão fraudulenta (caput): O agente administra a instituição financeira (ou entidade equiparada) praticando atos fraudulentos, ou seja, atos que podem gerar engano e prejuízos aos sócios, clientes, investidores e empregados da instituição ou, então, aos órgãos de fiscalização (ex: Bacen). Ex: omissão intencional nos registros contábeis de empréstimos efetuados pelo banco.

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Em que consiste o crime de gestão temerária (parágrafo único): O agente administra a instituição financeira (ou entidade equiparada) praticando atos excessivamente ousados, atrevidos, irresponsáveis, inconsequentes. O sujeito arrisca além do que é permitido, mesmo para os padrões de um ambiente arriscado. Ex: empréstimo de vultosos valores a uma empresa já inadimplente e que está em situação pré-falimentar. Nem sempre é fácil identificar quando este crime ocorre ou não porque no mercado financeiro o risco é algo comum.

Temeridade da gestão O agente pratica o crime de gestão temerária quando viola deveres impostos por normas jurídicas voltadas aos administradores de instituições financeiras e que prevêem limites de risco aceitáveis. Como dito acima, o risco é algo comum nas atividades das instituições financeiras. No entanto, existem limites de risco que são disciplinados em regulamentos editados pelos órgãos competentes.

Gestão fraudulenta x gestão temerária Gestão fraudulenta: o sujeito age com fraude. Gestão temerária: o sujeito age de forma temerária.

Por que punir estas condutas como crime? As instituições financeiras captam, administram e aplicam recursos de terceiros, além de serem um importante instrumento de estímulo da economia do país. Logo, deve-se ter lisura e seriedade na gestão das atividades financeiras, sob pena de eventuais desvios ou imprudências causarem abalo nos recursos da população que estão ali investidos e na economia em geral.

Sujeito ativo Trata-se de crime próprio, considerando que só pode ser praticado por uma das pessoas elencadas no art. 25 da Lei nº 7.492/86. Assim, o agente deverá ser:

o controlador ou administrador de instituição financeira (diretores e gerentes);

equiparam-se aos administradores de instituição financeira o interventor, o liquidante ou o síndico.

Obs1: segundo a posição jurisprudencial majoritária, o gerente de agência bancária também pode responder por gestão fraudulenta ou temerária.

Obs2: a jurisprudência admite o delito no âmbito de instituição financeira clandestina (STF RHC 117270 AgR/DF, Rel. Min. Celso de Mello, julgado em 06/10/2015). Assim, se uma pessoa é administradora de uma instituição financeira clandestina, poderá responder por gestão fraudulenta ou temerária. O fato de o delito de gestão temerária ser crime próprio impede que outras pessoas (não previstas no art. 25) também pratiquem essa infração? NÃO. Porque o crime próprio admite tanto a figura do partícipe como do coautor. Assim, é possível a participação de terceiras pessoas que não integrem o rol taxativo previsto na lei na prática do delito, desde que se demonstre o nexo de causalidade entre a conduta dessa pessoa e a realização do fato típico. É necessária, ainda, a presença do elemento subjetivo, consubstanciado no ajuste de vontades entre os dois agentes, que desejam a ocorrência do resultado que a lei visa reprimir. Ex: é possível imputar àquele que emitiu parecer opinativo favorável à realização de determinado investimento a participação em crime de gestão temerária, desde que demonstrado o vínculo subjetivo entre o agente e o fato delituoso (STJ. 6ª Turma. RHC 18.667-DF, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 9/10/2012).

(...) O delito de gestão fraudulenta, capitulado no art. 4º da Lei 7.492/86, muito embora seja crime próprio, não impede que um terceiro, estranho à administração da instituição financeira, venha a ter participação no delito, desde que ancorado no art. 29 do Código Penal (...) (STJ. 5ª Turma. HC 292.979/DF, Rel. Min. Felix Fischer, julgado em 28/04/2015).

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Sujeito passivo O Estado. De forma secundária, são consideradas como vítimas a instituição financeira, os sócios, os investidores e outras pessoas eventualmente lesadas. Habitual impróprio Tanto a gestão fraudulenta como a gestão temerária são classificadas como crime habitual impróprio, de forma que basta uma única ação para que se configure (STJ. 5ª Turma. HC 284.546/SP, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 01/03/2016). Elemento subjetivo Os delitos do art. 4º são punidos a título de dolo. Não se exige elemento subjetivo especial ("dolo específico"). Mas vale ressaltar que, para configurar o delito de gestão fraudulenta há necessidade de que, na conduta do agente, haja a utilização de ardil ou de astúcia, imbricada com a má-fé, no intuito de dissimular o real objetivo de um ato ou de um negócio jurídico, cujo propósito seria o de ludibriar as autoridades monetárias ou mesmo aquelas com quem mantém eventual relação jurídica (v.g. investidores). Portanto, a má-fé é elemento essencial para a configuração da fraude (STJ. 6ª Turma. HC 285.587-SP, Rel. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 15/3/2016. Info 580). Não existe modalidade culposa O crime de gestão temerária, apesar de ser conceituado doutrinariamente como sendo o ato de gestão praticado de forma imprudente, irresponsável etc., não é considerado um delito culposo. Assim, tanto a gestão fraudulenta como a temerária são crimes dolosos. Na gestão temerária, para que se configure o dolo é necessário provar que o agente queria agir de forma temerária? NÃO. “Para a caracterização do elemento subjetivo do delito não é necessária a vontade de atuar temerariamente; o que se exige é que o agente, conhecendo as circunstâncias de seu agir, transgrida voluntariamente as normas regentes da sua condição de administrador da instituição financeira.” (Min. Maria Thereza de Assis Moura, REsp 1.613.260-SP). O que deve ser comprovado é a que ele sabe que está descumprindo regras do Banco Central, da CVM etc., ainda que ele ache que isso é correto e produtivo. Quem decide o que é temerário ou não são os atos normativos expedidos pelos órgãos competentes, não interessando o julgamento interno daqueles atos feito pelo próprio agente.

Está presente o dolo do delito de gestão temerária (art. 4º, parágrafo único, da Lei nº 7.492/1986) na realização, por alguma das pessoas mencionadas no art. 25 da Lei nº 7.492/1986, de atos que transgridam, voluntária e conscientemente, normas específicas expedidas pela CVM, CMN ou Bacen. STJ. 6ª Turma. REsp 1.613.260-SP, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 9/8/2016 (Info 588).

Consumação O crime é formal e de perigo concreto (STJ. 5ª Turma. AgRg no REsp 1133948/RJ, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 10/06/2014). Não se exige a efetiva ocorrência de dano ou de qualquer outro resultado material (STJ. 6ª Turma. REsp 1352043/SP, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 17/10/2013). Assim, mesmo que não haja prejuízo, é possível a condenação. Ao contrário do estelionato, na gestão fraudulenta e na gestão temerária não se exige a obtenção de vantagem ilícita nem o prejuízo de vítimas identificadas.

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Para a consumação do delito de gestão temerária, não se exige que tenha havido prejuízo à instituição financeira. No entanto, esta circunstância pode ser utilizada na 1ª fase da dosimetria para aumentar a pena-base, considerando que se trata de consequência negativa do crime. STJ. 6ª Turma. REsp 1.613.260-SP, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 9/8/2016 (Info 588).

Se o agente pratica vários atos de gestão fraudulenta, ele irá responder por vários delitos em concurso ou continuidade? NÃO. O crime de gestão fraudulenta pode ser visto como crime habitual impróprio, em que uma só ação tem relevância para configurar o tipo, ainda que a sua reiteração não configure pluralidade de crimes. Portanto, a sequência de atos fraudulentos perpetrados já integra o próprio tipo penal, razão pela qual não há falar, na espécie, em crime continuado (STJ. 6ª Turma. AgRg no AREsp 608.646/ES, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 20/10/2015). Princípio da insignificância Prevalece que não se aplica o princípio da insignificância, considerando que se trata de crime de perigo, que não exige dano para a sua configuração. Competência Trata-se de crime de competência da Justiça Federal (art. 109, VI, da CF/88 c/c art. 26 da Lei nº 7.492/86).

GESTÃO TEMERÁRIA Análise das circunstâncias judiciais

Conclusões do STJ sobre o que pode ou não ser utilizado para majorar a pena do crime de gestão temerária na 1ª fase da dosimetria:

1) Somente pode ser sujeito ativo do crime de gestão temerária de instituição financeira alguma das pessoas mencionadas no art. 25 da Lei nº 7.492/86. Por essa razão, não se pode aumentar a pena-base do delito argumentando que a culpabilidade do réu é elevada em virtude de ele ocupar umas das funções ali mencionadas. Essa condição é ínsita (própria) ao tipo penal praticado.

2) Na condenação pela gestão temerária, é vedado agravar a pena do réu alegando que ele agiu com ganância, que violou as regras regentes da atividade financeira ou que sua conduta abalou a credibilidade do sistema financeiro, pois essas circunstâncias são, todas elas, intrínsecas a esse tipo penal.

3) Para a consumação do delito de gestão temerária não se exige que tenha havido prejuízo à instituição financeira. No entanto, esta circunstância pode ser utilizada na 1ª fase da dosimetria para aumentar a pena-base, considerando que se trata de consequência negativa do crime.

STJ. 6ª Turma. REsp 1.613.260-SP, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 9/8/2016 (Info 588).

O juiz condenou o réu pela prática do crime de gestão temerária (art. 4º, parágrafo único, da Lei nº 7.492/86). Na 1ª fase da dosimetria da pena (circunstâncias judiciais), a pena-base foi aumentada com fundamento nos seguintes argumentos: O magistrado afirmou que a culpabilidade era elevada considerando que o réu ocupava a importante função de Diretor Superintendente da instituição financeira. Esta argumentação é válida? NÃO. A gestão temerária configura crime próprio, que somente pode ser cometido pelas pessoas que

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ocupam um dos cargos arrolados no art. 25 da Lei nº 7.492/86. Logo, não é legítimo o agravamento da pena baseado justamente na circunstância do exercício de uma dessas funções. Somente pode ser sujeito ativo do crime de gestão temerária de instituição financeira alguma das pessoas mencionadas no art. 25 da Lei nº 7.492/86. Por essa razão, não se pode aumentar a pena-base do delito argumentando que a culpabilidade do réu é elevada em virtude de ele ocupar umas das funções ali mencionadas. Essa condição é ínsita (própria) ao tipo penal praticado. STJ. 6ª Turma. REsp 1.613.260-SP, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 9/8/2016 (Info 588). O juiz afirmou também que a pena deveria ser majorada considerando que o réu agiu pautado pela ganância e que sua conduta se mostrou contrária às normas reguladoras do mercado de capitais, o que comprometeu a credibilidade e a confiabilidade do sistema financeiro. Esta argumentação é válida? NÃO. O agir ganancioso é característica típica de crimes econômicos, não sendo apto a justificar maior reprovabilidade (STJ. 5ª Turma. REsp 1290073/ES, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 13/05/2014). O fato de o sujeito ter agido de forma contrária às normas reguladoras do mercado de capitais é exatamente o que caracteriza o delito, de forma que não pode ser utilizado como um plus para aumentar a pena, já que é algo natural à gestão temerária. O comprometimento da credibilidade e da confiabilidade do sistema financeiro é também algo normal neste tipo de delito, sendo este o bem jurídico protegido pelo legislador e que já foi por ele considerado na fixação da pena em abstrato. Na condenação pela gestão temerária, é vedado agravar a pena do réu alegando que ele agiu com ganância, que violou as regras regentes da atividade financeira ou que sua conduta abalou a credibilidade do sistema financeiro, pois essas circunstâncias são, todas elas, intrínsecas a esse tipo penal. STJ. 6ª Turma. REsp 1.613.260-SP, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 9/8/2016 (Info 588). Por fim, o juiz asseverou que a pena deveria ser aumentada tendo em vista que a conduta criminosa gerou grave prejuízo no patrimônio da instituição. Esta argumentação é válida? SIM. O prejuízo acarretado à instituição financeira decorrente dos atos de gestão temerária é fundamento apto para justificar o aumento da pena em razão das consequências do crime. Para a consumação do delito de gestão temerária, não se exige que tenha havido prejuízo à instituição financeira. No entanto, esta circunstância pode ser utilizada na 1ª fase da dosimetria para aumentar a pena-base, considerando que se trata de consequência negativa do crime. STJ. 6ª Turma. REsp 1.613.260-SP, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 9/8/2016 (Info 588).

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DIREITO PROCESSUAL PENAL

FIXAÇÃO DO VALOR MÍNIMO PARA REPARAÇÃO DOS DANOS É possível que o juiz fixe valor mínimo para indenização

de danos morais sofridos pela vítima de crime

Importante!!!

O juiz, ao proferir sentença penal condenatória, no momento de fixar o valor mínimo para a reparação dos danos causados pela infração (art. 387, IV, do CPP), pode, sentindo-se apto diante de um caso concreto, quantificar, ao menos o mínimo, o valor do dano moral sofrido pela vítima, desde que fundamente essa opção. Isso porque o art. 387, IV, não limita a indenização apenas aos danos materiais e a legislação penal deve sempre priorizar o ressarcimento da vítima em relação a todos os prejuízos sofridos.

STJ. 6ª Turma. REsp 1.585.684-DF, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 9/8/2016 (Info 588).

A sentença penal condenatória, depois de transitada em julgado, produz diversos efeitos. Um dos efeitos é que a condenação gera a obrigação do réu de reparar o dano causado:

Código Penal Art. 91. São efeitos da condenação: I — tornar certa a obrigação de indenizar o dano causado pelo crime;

A sentença condenatória, inclusive, constitui-se em título executivo judicial:

Código de Processo Civil Art. 475-N. São títulos executivos judiciais: II — a sentença penal condenatória transitada em julgado;

Assim, a vítima (ou seus sucessores), de posse da sentença que condenou o réu, após o seu trânsito em julgado, dispõe de um título que poderá ser executado no juízo cível para cobrar o ressarcimento pelos prejuízos sofridos em decorrência do crime. Qual era, no entanto, a dificuldade antes da Lei nº 11.719/2008? Apesar de ser reconhecida a obrigação de indenizar (an debeatur), não era possível que a vítima (ou seus sucessores) executasse imediatamente a sentença, porque não havia sido definido ainda o valor da indenização (quantum debeatur). Em outras palavras, a sentença condenatória reconhecia que a vítima tinha direito à indenização a ser paga pelo condenado, mas não dizia o quanto.

Com isso, a vítima (ou seus sucessores) tinha ainda que tomar uma outra providência antes de executar: promover a liquidação (art. 475-A do CPC).

O legislador tentou facilitar a situação da vítima e, por meio da Lei nº 11.719/2008, alterou o CPP, prevendo que o juiz, ao condenar o réu, já estabeleça na sentença um valor mínimo que o condenado estará obrigado a pagar a título de reparação dos danos causados. Veja:

Art. 387. O juiz, ao proferir sentença condenatória: IV — fixará valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração, considerando os prejuízos sofridos pelo ofendido; (Redação dada pela Lei nº 11.719/2008)

Desse modo, se o juiz, na própria sentença, já fixar um valor certo para a reparação dos danos, não será necessário que a vítima ainda promova a liquidação, bastando que execute este valor caso não seja pago voluntariamente pelo condenado.

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Veja o parágrafo único do art. 63 do CPP, que explicita essa possibilidade:

Art. 63. Transitada em julgado a sentença condenatória, poderão promover-lhe a execução, no juízo cível, para o efeito da reparação do dano, o ofendido, seu representante legal ou seus herdeiros. Parágrafo único. Transitada em julgado a sentença condenatória, a execução poderá ser efetuada pelo valor fixado nos termos do inciso IV do caput do art. 387 deste Código sem prejuízo da liquidação para a apuração do dano efetivamente sofrido. (Incluído pela Lei nº 11.719/2008).

Algumas observações sobre o art. 387, IV do CPP: 1) Qual é a natureza jurídica dessa fixação do valor mínimo de reparação? Trata-se de um efeito extrapenal genérico da condenação. 2) A vítima poderá pleitear indenização maior no juízo cível? SIM. Na sentença penal, o juiz fixará um valor mínimo. Assim, a vítima poderá executar desde logo este valor mínimo e pleitear um valor maior que o fixado na sentença, bastando, para isso, que prove que os danos que sofreu foram maiores que a quantia estabelecida na sentença. Essa prova é feita em fase de liquidação pelo procedimento comum, regulado pelos arts. 509, I e 511 do CPC 2015. 3) Para que seja fixado o valor da reparação, deverá haver pedido expresso e formal do MP ou do ofendido? SIM. Para que seja fixado, na sentença, o valor mínimo para reparação dos danos causados à vítima (art. 387, IV, do CP), é necessário que haja pedido expresso e formal, feito pelo parquet ou pelo ofendido, a fim de que seja oportunizado ao réu o contraditório e sob pena de violação ao princípio da ampla defesa (STJ. 5ª Turma. HC 321.279/PE, Rel. Min. Leopoldo de Arruda Raposo (Des. Conv. do TJ/PE), julgado em 23/06/2015). 4) Deverá haver provas dos prejuízos sofridos O STJ já decidiu que o juiz somente poderá fixar este valor se existirem provas nos autos que demonstrem os prejuízos sofridos pela vítima em decorrência do crime. Dessa feita, é importante que o Ministério Público ou eventual assistente de acusação junte comprovantes dos danos causados pela infração para que o magistrado disponha de elementos para a fixação de que trata o art. 387, IV do CPP. Vale ressaltar, ainda, que o réu tem direito de se manifestar sobre esses documentos juntados e contraditar o valor pleiteado como indenização. Nesse sentido:

A fixação da reparação civil mínima também não dispensa a participação do réu, sob pena de frontal violação ao seu direito de contraditório e ampla defesa, na medida em que o autor da infração faz jus à manifestação sobre a pretensão indenizatória, que, se procedente, pesará em seu desfavor. (...) STJ. 5ª Turma. REsp 1236070/RS, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 27/03/2012.

5) O julgador penal é obrigado a sempre fixar esse valor mínimo? NÃO. O juiz pode deixar de fixar o valor mínimo em algumas situações, como, por exemplo: a) quando não houver prova do prejuízo; b) se os fatos forem complexos e a apuração da indenização demandar dilação probatória, o juízo criminal poderá deixar de fixar o valor mínimo, que deverá ser apurado em ação civil; c) quando a vítima já tiver sido indenizada no juízo cível. O exemplo citado nesta letra “b” foi justamente o que ocorreu no julgamento do “Mensalão”. O STF rejeitou o pedido formulado pelo MPF, em sede de alegações finais, no sentido de que fosse fixado valor mínimo para reparação dos danos causados pelas infrações penais, sob o argumento de que a complexidade dos fatos e a imbricação de condutas tornaria inviável assentar o montante mínimo. Assim, não haveria como identificar com precisão qual a quantia devida por cada réu, o que só seria possível por

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meio de ação civil, com dilação probatória para esclarecimento desse ponto (Plenário. AP 470/MG, rel. Min. Joaquim Barbosa, 17/12/2012). 6) Além dos prejuízos materiais, o juiz poderá também condenar o réu a pagar a vítima por danos morais? SIM. O juiz, ao proferir sentença penal condenatória, no momento de fixar o valor mínimo para a reparação dos danos causados pela infração (art. 387, IV, do CPP), pode, sentindo-se apto diante de um caso concreto, quantificar, ao menos o mínimo, o valor do dano moral sofrido pela vítima, desde que fundamente essa opção. STJ. 6ª Turma. REsp 1.585.684-DF, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 9/8/2016 (Info 588).

Isso porque o art. 387, IV, não limita a indenização apenas aos danos materiais e a legislação penal deve sempre priorizar o ressarcimento da vítima em relação a todos os prejuízos sofridos. 7) O art. 387, IV, com a redação dada pela Lei nº 11.719/2008, fez com que o Brasil passasse a adotar a chamada “cumulação de instâncias” em matéria de indenização pela prática de crimes? NÃO. A cumulação de instâncias (ou união de instâncias) em matéria de indenização pela prática de crimes ocorre quando um mesmo juízo resolve a lide penal (julga o crime) e também já decide, de forma exauriente, a indenização devida à vítima do delito. Conforme explicam Pacelli e Fischer, “por esse sistema, o ajuizamento da demanda penal determina a unidade de juízo para a apreciação da matéria cível” (Comentários ao Código de Processo Penal e sua Jurisprudência. São Paulo: Atlas, 2012, p. 769). No Brasil, não há unidade de instâncias porque o juízo criminal irá apenas, quando for possível, definir um valor mínimo de indenização pelos danos sofridos sem, contudo, esgotar a apreciação do tema, que ainda poderá ser examinado pelo juízo cível para aumentar esse valor. Assim, continuamos adotando o modelo da separação mitigada de instâncias.

8) A previsão da indenização contida no inciso IV do art. 387 surgiu com a Lei nº 11.719/2008. Se o crime ocorreu antes da Lei e foi sentenciado após a sua vigência, pode ser aplicado o dispositivo e fixado o valor mínimo de reparação dos danos? NÃO. A regra do art. 387, inciso IV, do CPP, que dispõe sobre a fixação, na sentença condenatória, de valor mínimo para reparação civil dos danos causados ao ofendido, é norma híbrida, de direito processual e material, razão pela qual não se aplica a delitos praticados antes da entrada em vigor da Lei n.º 11.719/2008, que deu nova redação ao dispositivo. STJ. 5ª Turma. REsp 1.193.083-RS, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 20/8/2013. STJ. 6ª Turma. AgRg no REsp 1.206.643/RS, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em 12/02/2015. STF. Plenário. RvC 5437/RO, Rel. Min. Teori Zavascki, julgado em 17/12/2014 (Info 772).

9) O condenado poderá impugnar o valor fixado na forma do art. 387, IV por meio de um habeas corpus? NÃO. A via processual do habeas corpus não é adequada para impugnar a reparação civil fixada na sentença penal condenatória, com base no art. 387, IV do CPP, tendo em vista que a sua imposição não acarreta ameaça, sequer indireta ou reflexa, à liberdade de locomoção (STJ. 6ª Turma. AgRg no AgRg no REsp 1519523/PR, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 01/10/2015).

10) Se a punibilidade do condenado for extinta pela prescrição da pretensão punitiva, haverá extinção também do valor de reparação imposto na sentença? SIM. Extinta a condenação pela prescrição, extingue-se também a condenação pecuniária fixada como reparação dos danos causados à vítima, nos termos do art. 387, IV do CPP, pois dela decorrente, ficando ressalvada a utilização de ação cível, caso a vítima entenda que haja prejuízos a serem reparados (EDcl no AgRg no REsp 1260305/ES, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 12/03/2013).

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DIREITO TRIBUTÁRIO

ICMS Base de cálculo de ICMS/ST no caso de venda de medicamentos

de uso restrito a hospitais e clínicas

No caso de venda de medicamentos de uso restrito a hospitais e clínicas, a base de cálculo do ICMS/ST é o valor da operação de que decorrer a saída da mercadoria (art. 2º, I, do DL n. 406/1968), e não o valor correspondente ao preço máximo de venda a consumidor sugerido por fabricante de medicamentos (Cláusula Segunda do Convênio n. 76/1994).

STJ. 1ª Turma. REsp 1.229.289-BA, Rel. Min. Olindo Menezes (Desembargador convocado do TRF da 1ª Região), Rel. para acórdão Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em 3/5/2016 (Info 588).

ICMS O ICMS é um imposto estadual previsto no art. 155, II, da CF e na LC 87/96:

Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre: II — operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior;

Principais características do imposto:

plurifásico: incide sobre o valor agregado, obedecendo-se ao princípio da não-cumulatividade;

real: as condições da pessoa são irrelevantes;

proporcional: não é progressivo;

fiscal: tem como função principal a arrecadação. Fatos geradores Eduardo Sabbag afirma que, resumidamente, o ICMS pode ter os seguintes fatos geradores (Manual de Direito Tributário. 4. ed., São Paulo: Saraiva, 2012, p. 1061):

circulação de mercadorias;

prestação de serviços de transporte intermunicipal;

prestação de serviços de transporte interestadual;

prestação de serviços de comunicação. Substituição tributária progressiva A substituição tributária progressiva, também chamada de substituição tributária “para frente” ou subsequente, é uma técnica de arrecadação de alguns impostos, em especial o ICMS. Na substituição tributária progressiva, a lei prevê que o tributo deverá ser recolhido antes mesmo que ocorra o fato gerador. Desse modo, primeiro há um recolhimento do imposto e o fato gerador se dará em um momento posterior. Diz-se, então, que o fato gerador é presumido porque haverá o pagamento do tributo sem ter certeza de que ele irá acontecer. A substituição tributária progressiva é prevista na própria CF/88:

Art. 150 (...) § 7º A lei poderá atribuir a sujeito passivo de obrigação tributária a condição de responsável pelo pagamento de imposto ou contribuição, cujo fato gerador deva ocorrer posteriormente, assegurada a imediata e preferencial restituição da quantia paga, caso não se realize o fato gerador presumido.

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Exemplo dado por Ricardo Alexandre: “A” é uma refinaria de combustíveis que vende a gasolina para os distribuidores (“B”), que revendem para os postos de gasolina (“C”), que, por fim, vendem ao consumidor final (“D”). Para o Estado é mais fácil cobrar de “A” todo o tributo que irá incidir sobre a cadeia produtiva. Assim, “A” pagará o imposto por ele devido como contribuinte e também os impostos que irão incidir sobre as vendas futuras (nesse caso, pagará como substituto tributário/responsável tributário). (ALEXANDRE, Ricardo. Direito tributário esquematizado. 10ª ed. São Paulo: Método, 2016, p. 317-319).

Veja como fica a cadeia de vendas e a incidência do imposto:

“A” vende para “B” (“A” paga o tributo como contribuinte e também já paga, como responsável tributário, o imposto relacionado com as vendas futuras).

“B” vende para “C” (“B” não pagará mais o imposto, uma vez que este já foi pago por “A”, como substituto tributário).

“C” vende para os consumidores (“C” não pagará o imposto, uma vez que este já foi pago por “A”, como substituto).

Assim, todo o tributo é pago de uma só vez por “A”, sendo calculado sobre o valor pelo qual se presume que a mercadoria será vendida ao consumidor. (ALEXANDRE, Ricardo, p. 319). Regime de valor agregado Esse cálculo do valor que se supõe que a mercadoria será vendida é feito mediante a aplicação do regime de valor agregado estabelecido no art. 8º da LC 87/96:

Art. 8º A base de cálculo, para fins de substituição tributária, será: I - em relação às operações ou prestações antecedentes ou concomitantes, o valor da operação ou prestação praticado pelo contribuinte substituído; II - em relação às operações ou prestações subsequentes, obtida pelo somatório das parcelas seguintes: a) o valor da operação ou prestação própria realizada pelo substituto tributário ou pelo substituído intermediário; b) o montante dos valores de seguro, de frete e de outros encargos cobrados ou transferíveis aos adquirentes ou tomadores de serviço; c) a margem de valor agregado, inclusive lucro, relativa às operações ou prestações subsequentes.

Feitas estas considerações, imagine a seguinte situação hipotética: A "Bioremédios" é uma distribuidora de medicamentos que vende remédios para hospitais e clínicas. A referida empresa vendeu centenas de remédios "Dorsem" para os hospitais e recolheu ICMS-ST, calculando o valor de cada medicamento por R$ 300,00. A empresa justificou que encontrou este valor pegando o preço que ela vende o remédio para os hospitais e adicionando a margem de valor agregado (MVA), nos termos do art. 8º, II, "c", da LC 87/96. Ocorre que o Fisco estadual não concordou e afirmou que a empresa, na condição de substituto tributário, deveria ter recolhido o imposto sobre R$ 500,00 por cada remédio, já este é o Preço Máximo de venda a Consumidor (PCM) sugerido pelo fabricante. Para o Fisco, a empresa violou a Cláusula Segunda do Convênio 76/94 e o art. 8º, § 2º da LC 87/96, que preconizam:

Cláusula Segunda - A base de cálculo do imposto para fins de substituição tributária será o valor correspondente ao preço constante da tabela sugerido pelo órgão competente para a venda a consumidor, e, na falta deste preço, o valor correspondente ao preço máximo de venda a consumidor sugerido ao público pelo estabelecimento industrial.

Art. 8º (...) § 3º Existindo preço final a consumidor sugerido pelo fabricante ou importador, poderá a lei estabelecer

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como base de cálculo este preço.

A questão chegou até o STJ. A posição defendida pelo Fisco foi acolhida pelo Tribunal? NÃO. PCM é legítima, no entanto, quando o medicamento será vendido para clientes em drogarias Mostra-se legítima a estipulação da base de cálculo do ICMS, com fundamento no Preço Máximo ao Consumidor (chamado de PMC) sugerido pelo fabricante de medicamentos e divulgado por revista especializada de grande circulação. No entanto, a fixação do PMC dirige-se ao comércio varejista, ou seja, farmácias e drogarias, hipótese diversa da presente situação, na qual os medicamentos destinavam-se exclusivamente ao uso hospitalar restrito, endereçados a clínicas, casas de saúde, hospitais e assemelhados, acondicionados em embalagens especiais, para atendimento dos pacientes, sem possibilidade de comercialização no comércio varejista, dirigido aos consumidores finais, em balcão. O preço praticado para os hospitais e clínicas é notadamente inferior àquele que é utilizado na venda em drogarias para os clientes, já que a quantidade comprada pelos hospitais faz com que o preço seja inferior. Resolução da Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos Vale ressaltar que a Resolução nº 3, de 04 de maio de 2009, da Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos, prevê em seu art. 2º que o Preço Máximo ao Consumidor - PMC será o "teto de preço a ser praticado pelo comércio varejista, ou seja, farmácia e drogarias". Além disso, esta resolução veda a sua utilização para medicamentos de uso restrito a hospitais e clínicas:

Art. 3º. Fica proibida a publicação de Preço Máximo ao Consumidor - PMC, em qualquer meio de divulgação, para medicamentos cujo registro defina ser "de uso restrito a hospitais e clínicas".

Assim, repetindo, o preço máximo de venda ao consumidor publicado em revistas e informativos de classes é até válido como forma de cálculo do ICMS-ST, no entanto, apenas para o comércio varejista praticado em farmácias e drogarias, não servindo para a venda de medicamentos de uso restrito a hospitais e clínicas. Resumindo:

No caso de venda de medicamentos de uso restrito a hospitais e clínicas, a base de cálculo do ICMS/ST é o valor da operação de que decorrer a saída da mercadoria (art. 2º, I, do DL nº 406/1968), e não o valor correspondente ao preço máximo de venda a consumidor sugerido por fabricante de medicamentos (Cláusula Segunda do Convênio nº 76/1994). STJ. 1ª Turma. REsp 1.229.289-BA, Rel. Min. Olindo Menezes (Desembargador convocado do TRF da 1ª Região), Rel. para acórdão Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em 3/5/2016 (Info 588).

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IPVA Termo inicial do prazo prescricional para cobrança de IPVA

O Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) é lançado de ofício no início de cada exercício e constituído definitivamente com a cientificação do contribuinte para o recolhimento da exação, a qual pode ser realizada por qualquer meio idôneo, como o envio de carnê ou a publicação de calendário de pagamento, com instruções para a sua efetivação.

A notificação do contribuinte para o recolhimento do IPVA perfectibiliza a constituição definitiva do crédito tributário, iniciando-se o prazo prescricional para a execução fiscal no dia seguinte à data estipulada para o vencimento da exação.

STJ. 1ª Seção. REsp 1.320.825-RJ, Rel. Min. Gurgel de Faria, julgado em 10/8/2016 (recurso repetitivo) (Info 588).

IPVA IPVA é a sigla de Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores. Trata-se de imposto estadual, previsto no art. 155, III, da CF/88. Regramento legal As normas gerais sobre o IPVA (fato gerador, base de cálculo, sujeito passivo etc.) deverão ser previstas em uma lei complementar nacional a ser editada pelo Congresso Nacional (art. 146, III, "a", da CF/88). Ocorre que esta lei ainda não existe. Em razão disso, os Estados-membros podem legislar sobre o tema, conforme autorizado pelo art. 24, § 3º da CF/88, desde que respeitadas as demais regras constitucionais. Fato gerador É a propriedade de veículo automotor. "Apenas a propriedade gera incidência de IPVA, e não a mera detenção do veículo, o próprio uso ou mesmo a posse." (SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. 8ª ed., São Paulo: Saraiva, 2016, p. 1317). O IPVA só incide sobre veículos automotores terrestres. Assim, é inconstitucional lei estadual que preveja pagamento de IPVA pela propriedade de embarcações ou de aeronaves. Nesse sentido: STF. Plenário. RE 379572, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 11/04/2007. Base de cálculo É o valor venal do veículo. Importante: o art. 150, § 1º da CF/88 prevê que a fixação da base de cálculo do IPVA não está sujeita ao princípio da anterioridade nonagesimal. Isso significa que é possível que o Estado, nos últimos dias do ano, altere a tabela de valor venal dos veículos e essa mudança já valha a partir de 1º de janeiro do ano seguinte. Alíquotas As alíquotas serão fixadas por meio de lei de cada Estado-membro. A CF/88, no entanto, determina que o Senado, mediante Resolução, defina alíquotas mínimas do IPVA a fim de evitar a guerra fiscal (art. 155, § 6º, II, da CF/88). Logo, a lei estadual não poderá estipular alíquotas menores que aquelas fixadas pelo Senado. Isso com o objetivo de evitar que os Estados começassem a colocar valores muito baixos de IPVA para "incentivar" os proprietários de carros a emplacarem seus veículos nesses locais. A Constituição autoriza que as leis estaduais prevejam alíquotas do IPVA diferenciadas segundo o tipo e a utilização do veículo. Exemplo quanto ao tipo: a lei poderá prever que veículos utilitários poderão pagar alíquotas menores que veículos de passeio. Exemplo quanto à utilização: táxis poderão pagar alíquotas menores que veículos particulares.

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O STF decidiu que é inconstitucional tributar diferentemente veículos nacionais e importados. Sujeito passivo É o proprietário do veículo. Lançamento do IPVA O IPVA é um imposto sujeito a lançamento de ofício. O lançamento de ofício (ou direto) é aquele no qual o Fisco, sem a ajuda do contribuinte, calcula o valor do imposto devido e o cobra do sujeito passivo. A Administração tributária já possui de antemão os elementos informativos para realizar a constituição do crédito tributário, não dependendo de nenhuma providência do contribuinte para isso. Em outras palavras, o próprio Fisco, sozinho, já calcula quanto o contribuinte deverá pagar e apenas o avisa: pague este valor de imposto até o dia XX. Além do IPVA, outro exemplo de imposto submetido a lançamento de ofício é o IPTU. Notificação do lançamento Após o Fisco realizar o lançamento, ele precisa comunicar que fez isso ao sujeito passivo para que este possa pagar o tributo ou impugná-lo, caso não concorde com o que está sendo cobrado. "É a notificação que confere efeitos ao lançamento realizado, pois antes daquela não se conta prazo para pagamento ou impugnação." (ALEXANDRE, Ricardo. Direito tributário esquematizado. 10ª ed., São Paulo: Método, 2016, p. 377). Forma de notificação do contribuinte O CTN não prevê a forma como o contribuinte deverá ser notificado de que houve o lançamento de ofício e de que ele deverá pagar o tributo. Diante dessa lacuna, a jurisprudência entende que a legislação que rege cada tributo poderá disciplinar o meio idôneo para essa notificação. No caso do IPTU, por exemplo, a maioria das leis municipais prevê que a notificação ocorre mediante o envio de uma correspondência ao sujeito passivo. Esse procedimento é considerado legítimo:

Súmula 397-STJ: O contribuinte do IPTU é notificado do lançamento pelo envio do carnê ao seu endereço.

Se o Estado-membro, no início do ano, divulga um calendário informando os proprietários dos veículos que deverão efetuar o pagamento do IPVA em cada data, este modo de notificação é válido? SIM. O envio do carnê é apenas uma modalidade, que não exclui outras eventualmente mais convenientes para a Administração, como é o caso da divulgação de um calendário de pagamento, com instruções para os contribuintes fazerem o pagamento. Nesse sentido:

A cientificação do contribuinte para o recolhimento do IPVA pode ser realizada por qualquer meio idôneo, como o envio de carnê ou a publicação de calendário de pagamento, com instruções para o pagamento. STJ. 1ª Seção. REsp 1320825/RJ, Rel. Min. Gurgel de Faria, julgado em 10/08/2016.

Vale ressaltar, no entanto, que o Min. Gurgel de Faria ressalvou que essa espécie de notificação pessoal presumida (por meio da divulgação de "calendário de pagamento") somente pode ser considerada válida em relação aos impostos reais, cuja exigibilidade por exercício é de notório conhecimento da população. Em outros termos, nos casos de IPTU e IPVA, por exemplo, todo mundo sabe que todo ano deverá pagar. Qual é a principal função da notificação do contribuinte do IPVA? A notificação do contribuinte para o recolhimento do IPVA perfectibiliza a constituição definitiva do crédito tributário. Em outras palavras, com a notificação do contribuinte para o recolhimento da exação (pagamento do tributo) ocorre a constituição definitiva do crédito tributário.

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Caso o contribuinte, mesmo depois de notificado, não pague o IPVA, o Fisco poderá ajuizar execução fiscal cobrando este imposto. A partir de quando é contado o prazo para o ajuizamento desta ação? O prazo prescricional para a execução fiscal inicia-se no dia seguinte à data estipulada para o vencimento do imposto. Isso porque, antes dessa data, o pagamento não é exigível do contribuinte. Assim, por exemplo, se o proprietário recebeu um carnê com data de vencimento para o dia 03/03, o prazo prescricional para o Estado-membro ajuizar execução fiscal iniciará no dia 04/03, caso o contribuinte não pague na data. Qual é o prazo que o Fisco estadual possui para cobrar judicialmente o imposto? O prazo prescricional é de 5 anos (art. 174 do CTN). Resumindo:

A notificação do contribuinte para o recolhimento do IPVA perfectibiliza a constituição definitiva do crédito tributário, iniciando-se o prazo prescricional para a execução fiscal no dia seguinte à data estipulada para o vencimento da exação. STJ. 1ª Seção. REsp 1320825/RJ, Rel. Min. Gurgel de Faria, julgado em 10/08/2016 (recurso repetitivo) (Info 588).

Releitura do art. 174 do CTN pelo STJ O art. 174 do CTN estabelece o seguinte:

Art. 174. A ação para a cobrança do crédito tributário prescreve em cinco anos, contados da data da sua constituição definitiva.

Para o STJ, a constituição definitiva do IPVA ocorre com a notificação do contribuinte para pagamento. Desse modo, se fossemos utilizar a redação literal do art. 174, o prazo prescricional teria início na data da notificação do sujeito passivo (constituição definitiva). Ex: no dia em que ele recebeu o carnê de pagamento ou na data em que foi divulgado o calendário de pagamentos. Ocorre que o STJ fez uma releitura dessa parte final do dispositivo e decidiu que o prazo prescricional deverá ser contado a partir do dia seguinte à data estipulada como vencimento do imposto. O STJ deicidiu assim porque antes de passar a data do vencimento do tributo, o Fisco ainda não poderá executar o contribuinte, que ainda nem pode ser considerado devedor. Até o último dia estabelecido para o vencimento, é assegurado ao contribuinte realizar o recolhimento voluntário, sem qualquer outro ônus, por meio das agências bancárias autorizadas ou até mesmo pela internet, ficando em mora tão somente a partir do dia seguinte. Desse modo, tem-se que a pretensão executória da Fazenda Pública (actio nata) somente surge no dia seguinte à data estipulada para o vencimento do tributo. Assim, o STJ "corrige" a parte final do art. 174, que deve ser lido da seguinte forma: a ação para a cobrança do crédito tributário decorrente de IPVA prescreve em cinco anos, contados do dia seguinte à data estipulada para o vencimento da exação. Em concursos, se for cobrada a redação literal do art. 174 em provas objetivas, essa alternativa está correta. No entanto, é possível que o entendimento do STJ seja exigido, especialmente em provas discursivas ou orais.

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DIREITO PREVIDENCIÁRIO

PREVIDÊNCIA PRIVADA COMPLEMENTAR Prazo de 3 anos para pretensão de entidade de previdência privada complementar de reaver

verbas relativas a benefício indevidamente apropriadas por terceiro

É de 3 anos o prazo prescricional de ação proposta por entidade de previdência privada complementar contra terceiro que se apropriou indevidamente de verbas relativas a benefício previdenciário.

Não há previsão específica para este caso na LC 109/2001, razão pela qual se aplica o art. 206, § 3º, IV, do Código Civil (pretensão de ressarcimento de enriquecimento sem causa).

Ex: o segurado morreu e, como a entidade de previdência não foi informada, continuou a depositar, todos os meses, o valor da aposentadoria; tais quantias foram sacadas indevidamente da conta bancária por uma sobrinha do falecido; a entidade terá o prazo de 3 anos para reaver os valores.

STJ. 4ª Turma. REsp 1.334.442-RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Rel. para acórdão Min. Raul Araújo, julgado em 7/6/2016 (Info 588).

Previdência complementar Previdência complementar é um plano de benefícios feito pela pessoa que deseja receber, no futuro, aposentadoria paga por uma entidade privada de previdência. A pessoa paga todos os meses uma prestação e este valor é aplicado por uma pessoa jurídica, que é a entidade gestora do plano (ex: Bradesco Previdência). É chamada de "complementar" porque normalmente é feita por alguém que já trabalha na iniciativa privada ou como servidor público e, portanto, já teria direito à aposentadoria pelo INSS ou pelo regime próprio. Apesar disso, ela resolve fazer a previdência privada como forma de "complementar" a renda no momento da aposentadoria. O plano de previdência complementar é prestado por uma pessoa jurídica chamada de "entidade de previdência complementar" (entidade de previdência privada). Imagine agora a seguinte situação hipotética: João é beneficiário de uma aposentadoria concedida por um plano de previdência privada complementar. Todos os meses, a entidade de previdência complementar deposita o valor da aposentadoria na conta bancária de João. Segundo o contrato, ele terá direito de receber esta aposentadoria até morrer, não podendo este benefício ser transferido para seus herdeiros. João morre. Sua sobrinha, Larissa, que morava com o tio, não comunica o falecimento à entidade de previdência, que continua, todos os meses, depositando o valor da aposentadoria na conta bancária do morto. Larissa tinha a posse do cartão do banco e a senha da conta e, com isso, todos os meses sacava o valor da aposentadoria que era depositado. Depois de alguns meses, a entidade de previdência descobre a situação e cessa os pagamentos. A entidade de previdência deseja agora ajuizar ação contra Larissa cobrando os valores que foram indevidamente apropriados por ela. Surgiu, no entanto, uma dúvida: qual é o prazo prescricional neste caso? 3 anos, nos termos do art. 206, § 3º, IV, do Código Civil:

Art. 206. Prescreve: (...) § 3º Em três anos: IV - a pretensão de ressarcimento de enriquecimento sem causa;

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Não existe previsão específica na LC 109/2001 A LC 109/2001 dispõe sobre o Regime de Previdência Complementar. Nela não encontramos um prazo prescricional que se amolda perfeitamente à situação acima narrada. O único prazo prescricional previsto neste diploma legal é o do art. 75, que tem a seguinte redação:

Art. 75. Sem prejuízo do benefício, prescreve em cinco anos o direito às prestações não pagas nem reclamadas na época própria, resguardados os direitos dos menores dependentes, dos incapazes ou dos ausentes, na forma do Código Civil.

Ocorre que este art. 75 se aplica apenas para as relações jurídicas existentes entre a entidade de previdência e o segurado/beneficiário. Ele não incide no caso de demandas envolvendo a entidade e um terceiro. Assim, se fosse uma ação proposta por João contra a entidade ou desta contra aquele segurado, aí sim seria utilizado o prazo de 5 anos da LC 109/2001. A situação, no entanto, envolve um terceiro, que não tinha qualquer relação jurídica com a entidade.

EXERCÍCIOS Julgue os itens a seguir: 1) O condomínio poderá proibir que o condômino inadimplente use as áreas comuns destinadas a lazer,

desde que haja previsão nesse sentido no regimento interno. ( ) 2) A responsabilidade pelo pagamento dos direitos autorais na hipótese de execução de obra musical em

evento realizado por empresa contratada para esse fim, mediante licitação, não pode ser transferida para a Administração, salvo se comprovada a ação culposa desta última quanto ao dever de fiscalizar o cumprimento dos contratos públicos (culpa in eligendo ou in vigilando). ( )

3) Na ação de busca e apreensão fundada no Decreto-Lei nº 911/1969, o prazo de 15 (quinze) para resposta deve ser contado a partir da juntada aos autos do mandado de citação devidamente cumprido. ( )

4) O direito ao reconhecimento judicial de vínculo paternal, seja ele genético ou socioafetivo, é pessoal, podendo ser transferido entre filhos e netos apenas de forma sucessiva, na hipótese em que a ação tiver sido iniciada pelo próprio filho e não houver sido extinto o processo. ( )

5) O lucro destinado à conta de reserva, que não é distribuído aos sócios, não integra o acervo comum do casal, tendo em vista pertencer apenas à sociedade e não ao sócio. ( )

6) Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor ao contrato de plano de saúde administrado por entidade de autogestão. ( )

7) Em contrato de plano de assistência à saúde, é abusiva a cláusula que preveja o indeferimento de quaisquer procedimentos médico-hospitalares quando solicitados por médicos não cooperados. ( )

8) Os cadastros e dados de consumidores devem ser objetivos, claros, verdadeiros e em linguagem de fácil compreensão, não podendo conter informações negativas referentes a período superior a 5 anos, contados da data da inclusão no cadastro. ( )

9) Se, no curso da ação de adoção conjunta, um dos cônjuges desistir do pedido e outro vier a falecer sem ter manifestado inequívoca intenção de adotar unilateralmente, não poderá ser deferido ao interessado falecido o pedido de adoção unilateral post mortem. ( )

10) (Promotor MPDFT 2015) No crime de gestão fraudulenta de instituição financeira (Lei 7.492/86), o prejuízo ao patrimônio da instituição financeira ou a investidores, poupadores e assemelhados, decorrente da gestão fraudulenta, é elemento do tipo. ( )

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11) Está presente o dolo do delito de gestão temerária (art. 4º, parágrafo único, da Lei nº 7.492/1986) na realização, por alguma das pessoas mencionadas no art. 25 da Lei nº 7.492/1986, de atos que transgridam, voluntária e conscientemente, normas específicas expedidas pela CVM, CMN ou Bacen. ( )

12) Não é possível que o juiz fixe valor mínimo para indenização de danos morais sofridos pela vítima de crime. ( )

13) (PGE/PR 2015) O IPVA terá alíquotas mínimas e máximas fixadas pelo Senado Federal. ( ) 14) (PGE/PR 2015) O IPVA incide sobre a propriedade de automóveis e lanchas, mas não de aeronaves,

ainda que de pequeno porte. ( ) 15) (PGE/PR 2015) O IPVA poderá ter alíquotas diferenciadas em função da marca e da utilização. ( ) 16) (PGE/PR 2015) O lançamento do IPVA dar-se-á anualmente por declaração. ( ) 17) (PGE/PI 2014 CESPE)No caso de veículo usado, a base de cálculo do IPVA será o valor venal de

mercado, facultada a adoção de valores previstos em tabela aprovada por protocolo entre estados, observado o princípio da anterioridade nonagesimal para sua aplicação. ( )

18) (PGE/PI 2014 CESPE) O IPVA tem como fato gerador a propriedade de veículos automotores, inclusive embarcações e aviões. ( )

19) A ação para a cobrança do crédito tributário prescreve em cinco anos, contados da data da sua constituição definitiva. ( )

20) A notificação do contribuinte para o recolhimento do IPVA perfectibiliza a constituição definitiva do crédito tributário, iniciando-se o prazo prescricional para a execução fiscal no dia seguinte à data estipulada para o vencimento da exação. ( )

Gabarito

1. E 2. C 3. C 4. C 5. C 6. E 7. C 8. E 9. C 10. E

11. C 12. E 13. E 14. E 15. E 16. E 17. E 18. E 19. C 20. C