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NARRATIVA HISTÓRICA E SUBJETIVIDADE: A TRAJETÓRIA HISTÓRICO- POLÍTICA DE LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA ATRAVÉS DO SEU DISCURSO. FLÁVIO JOSÉ DALAZONA * HEITOR ALEXANDRE TREVISANI LIPINSKI ** Introdução Este ensaio pretende, por meio de entrevistas produzidas pelos veículos do jornalismo, trabalhar alguns aspectos referente à materialidade do discurso do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva neste momento em que se encontra prisioneiro em Curitiba. A partir da chave analítica proposta pela História Oral, objetiva-se destacar alguns aspectos de como o personagem atribui sentido às suas experiências temporais inclusive àquelas em que foi integrante e partícipe. Lula, no cenário nacional e internacional tem importância singular, visto como um dos grandes representantes da esquerda mundial, por isso, não existe pretensão de atribuir juízo de valor quanto ao processo que o condenou, ainda que em suas falas possam inquirir margens a interpretações. Para contribuir com as análises, além dos aspectos da matriz metodológica da história oral, trabalha-se também com aspectos da construção do discurso de Michel Focault (1996), e a partir do constructo narrativo, onde Jörn Rüsen (2010, 2016) fornece importantes premissas para pensar a relação: sujeito narrativa tempo. Dessa forma, procura-se destacar dentro desse espaço político-discursivo, inferências da geopolítica mundial e a formação da consciência brasileira, a ordem burguesa capitalista de origem das revoluções liberais e os avanços e fracassos da história do Brasil, além do sentimento de avaliação da contemporaneidade. Lula, uma breve biografia * Mestrando do Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Estadual do Centro Oeste (UNICENTRO) [email protected] ** Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Estadual do Centro Oeste (UNICENTRO) [email protected]

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NARRATIVA HISTÓRICA E SUBJETIVIDADE: A TRAJETÓRIA HISTÓRICO-

POLÍTICA DE LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA ATRAVÉS DO SEU DISCURSO.

FLÁVIO JOSÉ DALAZONA*

HEITOR ALEXANDRE TREVISANI LIPINSKI**

Introdução

Este ensaio pretende, por meio de entrevistas produzidas pelos veículos do jornalismo,

trabalhar alguns aspectos referente à materialidade do discurso do ex-presidente Luiz Inácio

Lula da Silva neste momento em que se encontra prisioneiro em Curitiba. A partir da chave

analítica proposta pela História Oral, objetiva-se destacar alguns aspectos de como o

personagem atribui sentido às suas experiências temporais inclusive àquelas em que foi

integrante e partícipe.

Lula, no cenário nacional e internacional tem importância singular, visto como um dos

grandes representantes da esquerda mundial, por isso, não existe pretensão de atribuir juízo de

valor quanto ao processo que o condenou, ainda que em suas falas possam inquirir margens a

interpretações. Para contribuir com as análises, além dos aspectos da matriz metodológica da

história oral, trabalha-se também com aspectos da construção do discurso de Michel Focault

(1996), e a partir do constructo narrativo, onde Jörn Rüsen (2010, 2016) fornece importantes

premissas para pensar a relação: sujeito – narrativa – tempo.

Dessa forma, procura-se destacar dentro desse espaço político-discursivo, inferências

da geopolítica mundial e a formação da consciência brasileira, a ordem burguesa capitalista de

origem das revoluções liberais e os avanços e fracassos da história do Brasil, além do

sentimento de avaliação da contemporaneidade.

Lula, uma breve biografia

* Mestrando do Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Estadual do Centro Oeste

(UNICENTRO) – [email protected] ** Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Estadual do Centro Oeste

(UNICENTRO) – [email protected]

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Ao atrever-se a realizar uma análise da oralidade de uma personagem histórica, é

necessário recorrermos às suas inferências, experiências e relevância na participação efetiva na

linha do tempo. Lula é uma figura de biografia ímpar. Nascido em 1945, é o penúltimo de uma

prole de oito filhos de um casal de agricultores nordestinos, pouco recordando da infância pobre

em Caetés, interior do estado de Pernambuco, tempos em que para comer arroz era somente

quando adoecia. (MARKUN, 2004). Em busca de uma vida melhor, a família se muda para São

Paulo, mas os entraves financeiros foram ainda somados à violência familiar e às tragédias

ocorridas pelas más condições da periferia em que residia.

Quando jovem, trabalhou como metalúrgico em São Bernardo do Campo, assinando a

inscrição com o sindicado em 1968 e em 1969 já era suplente. Demorou a se acostumar com o

sindicato, tanto que quando alguém fazia uma pergunta, ele anotava, consultava o advogado

para aí então, responder. “Era tão inibido que, quando citavam meu nome numa assembleia, eu

já ficava vermelho. Eu jamais me imaginei sendo presidente de sindicato” (fala de Lula em

MARKUN, 2004, P.80).

Casou-se nesse mesmo ano, e em 1971, grávida de sete meses, a esposa Maria de

Lourdes foi diagnosticada com hepatite. Presenciou então, o sofrimento da esposa, a falta de

atendimento médico, o diagnostico tardio, o que infelizmente levou ao óbito a esposa e a

criança. Abalado, voltou a morar com a mãe por três anos.

Aos 25 anos de idade largou o trabalho de metalúrgico para se dedicar ao sindicato, teve

uma filha com Miriam Cordeiro e na mesma época casou-se com Marisa. Tiveram seu primeiro

filho nove meses após o casamento. No sindicado, assumiu a presidência mesmo sem

experiência, mas a cada dia ia se despontando um talento próprio para a política.

[...] Lula não tinha qualquer interesse no jogo político partidário. Ele tampouco se

sensibilizava pela anistia, uma das bandeiras da esquerda na época. Sempre que lhe

perguntavam sobre o assunto, dizia ser contra a prisão de qualquer cidadão por sua

ideologia, mas deixava claro que aquea não era uma preocupação dos trabalhadores: _ um homem levanta às quatro e meia da manhã e dorme às dez da noite para ganhar

três mil cruzeiros é um eterno presidiário. (...) Resolvendo apenas o problema dos

cassados, os trabalhadores ficarão do mesmo tamanho: F...e mal pagos. Como

sempre estiveram. Os cassados um dia já tiveram liberdade. (MARKUN, 2004, p.119)

Nesse trecho, podemos perceber que Lula já envolvido com política, ainda não somava

todos os anseios da esquerda brasileira, mas percebendo sua origem, deixa claro o que

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primeiramente deveria defender, seu foco, ainda que já estivesse com um nome relevante no

cenário brasileiro, era o trabalhador.

Em 1980, Lula com companheiros de esquerda, unem-se a comunidades de base,

inspirados pela Filosofia da Libertação1, e esboçam um princípio de partido político. Agora

suas funções passavam por uma dupla tarefa: reivindicar melhorias para os trabalhadores na

representatividade sindical e na composição política de um partido, visto que o ideal era levar

os ganhos dos trabalhadores do ABC paulista para todo o Brasil. Ganhos esses que passaram a

ser refinados, impensados até mesmo na Europa. Sua força se tornou grande e não demoraria

para que as elites tentassem derrubá-lo.

Ainda assim, no mesmo ano, é lançado as bases para o Partido dos Trabalhadores,

defendendo o pluripartidarismo, e a luta contra a tirania da burguesia nacional. Durante a

redemocratização, Lula foi uma das lideranças de maior prestígio na campanha pelas Diretas

Já2, e em 1986 se elegeu deputado federal.

Não se adaptou a função como parlamentar, votava de acordo com o que era acertado

no partido, junto com a bancada do PT, mas julgava haver dentro da câmara uma guerra de

egos, no qual a individualidade e a vaidade imperavam em detrimento do que ocorria no Brasil

real. Pensou na renúncia, mas foi impedido para não estragar sua imagem para a corrida

presidencial.

Em 1989, durante as eleições presidenciais, se torna candidato, concorrendo com nomes

consolidados na memória popular como Leonel Brizola e Mário Covas, mas ainda assim, os

dois candidatos que apareciam como novos, foram para o segundo turno: Lula e Collor. Foi

vencido nas eleições, mesmo com o apoio que para hoje seria inusitado de Fernando Henrique

Cardoso, Miguel Arraes e Mário Covas.

Collor eleito, muitas medidas equivocadas afundaram ainda mais a frágil economia

brasileira daqueles tempos, o plano cruzado, confisco das poupanças, denúncias de corrupção,

culminaram na queda do presidente eleito apenas com pouco mais de dois anos exercendo o

mandato. Seu vice, Itamar Franco, assume, e nomeia Fernando Henrique como ministro da

1 Da filosofia da Libertaçao deriva a teleologia da libertação, uma corrente dentro do catolicismo onde advoga o

compromisso do evangelho para com os mais pobres. Tal corrente de pensamento, resgata teorias dentro das

ciências sociais e dialoga com algumas vertentes do marxismo. 2 Movimento civil organizado que reivindicava eleições presidenciais diretas no Brasil, entre 1983 e 1984.

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fazenda. Juntos criam o Plano Real, que dá força à moeda nacional, fato que será usado como

campanha para derrotar Lula nas eleições futuras em 1994 e 1998.

Esse período foi marcado pela política neoliberal, buscando enxugar o estado,

privatizando estatais e eximindo o Estado de responsabilidades. Como era de se esperar, o PT

fez larga oposição no período e se destacou expondo irregularidades no governo. Dessa forma,

em 2002, nas eleições, conquistou, em segundo turno, a presidência da república.

A maior nação latino-americana embarcou numa ambiciosa experiência política e

social ontem, quando Luiz Inácio Lula da Silva, líder do esquerdista Partido dos

Trabalhadores e ex-operador de torno mecânico e líder sindical, tomo posse como

presidente do Brasil, prometendo “um novo estilo de governo” e uma cruzada contra a fome, a injustiça e a corrupção. (...)

Não há precedentes na história brasileira para a chegada ao poder de Lula, que

concluiu apenas o ensino fundamental, perdeu parte de um dedo num acidente na

fábrica e, como ele relembrou em seu discurso, vendeu amendoins nas ruas quando

criança para ajudar a mãe divorciada a pagar as contas. Ele é o primeiro membro

da classe trabalhadora a se tornar presidenta aqui e o primeiro candidato de um

partido de esquerda a vencer uma eleição presidencial. O novo presidente atribuiu

seu triunfo retumbante à rejeição da política de mercado livre do antecessor,

Fernando Henrique Cardoso. (ROTHER, Larry. The New York Times. 02 de janeiro

de 2003)

As promessas de campanha e anseios da população, criaram expectativas diversas do

novo governo. Houveram ganhos e perdas, como uma balança econômica superavitária, no

entanto a dívida interna aumentou, compensando com a dívida externa que diminuiu. A

implementação de programas sociais, a acessibilidade ao ensino superior, a política de cotas

raciais e sociais, favoreceram a ascensão social das classes mais empobrecidas. No entanto,

para aprovação de muitos desses projetos, o governo passou a fazer o mesmo jogo político de

seus antecessores, criando esquemas de corrupção para a compra de votos na câmara e no

senado federal, que ficaram conhecidos como Mensalão.

Ainda na sombra desses escândalos, Lula venceu a reeleição em 2006, com uma imagem

desgastada, mas com energia para se reerguer e ansiando por um legado na história do país.

Assim, fez alianças comerciais com diversos países, elevou a representatividade do Brasil na

ONU (Organização das Nações Unidas) e nos encontros internacionais. Estimulou a economia

com interferência na taxa de juros, o que fez o país passar ao largo pela crise mundial ocorrida

em 2008 e encerrar o mandato com a maior aprovação popular da história do país, elegendo

como sucessora, Dilma Roussef, também do Partido dos Trabalhadores.

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Nos anos fora da presidência, Lula fundou um instituto e realizou inúmeras palestras em

universidades e empresas pelo mundo. Tornando-se uma sumidade em referência de

distribuição de renda e politicas publicas aplicadas para as pessoas em situação de risco.

No entanto, na esteia da primavera árabe ocorrida em 2011 quando um jovem tunisiano

ateou fogo ao próprio corpo em protesto pelas más condições de vida no país, que fomentou

protestos em diversos países do Oriente Médio, derrubando governos, o Brasil, em 2013,

recebeu as Jornadas de Junho, que reivindicavam diversas mudanças nas políticas

governamentais do país. Aliado à investigação de esquemas de corrupção conhecida como Lava

Jato, passou a desmoralizar a imagem do Partido e dos seus principais representantes, Lula e a

atual presidente Dilma.

A instabilidade se intensificou com a condução coercitiva de Lula para prestar

esclarecimentos em esquemas de corrupção que envolviam a suspeita de reforma em imóveis

atribuídos aos ex-presidentes e sua nomeação para ministro chefe da Casa Civil do governo.

Em seguida houveram o vazamento áudios obtidos irregularmente pelo juiz Sérgio Moro, a

impugnação da nomeação de Lula para ministro e a abertura do processo de impeachment de

Dilma, sob a justificativa de irregularidades em pedaladas fiscais3. A saída da presidente foi

efetivada e em seguida a prisão de Lula em um julgamento contestado internacionalmente. (O

GLOBO, 2017)

Nos últimos anos a configuração mundial se modificou, com regimes de governos de

direita ou extrema direita. Lula participou de um período de transição de governos neoliberais

para os mais à esquerda, optando pela distribuição de renda e políticas inclusivas, no entanto,

no mundo, os países agora voltam para governos que buscam o outro extremo, uma

administração protecionista, enraizada em valores tidos como conservadores nos costumes e

liberais na economia. Essas experiências vividas, as leituras de mundo, as informações atuais

entrelaçadas com o passado, serão escopo para as análises das falas de Lula nas entrevistas que

veremos adiante.

Narrativa Histórica e oralidades

3 Operações orçamentárias não previstas na legislação e faz com que o Tesouro Nacional atrase o repasse de verbas

aos bancos no intuito de equilibrar, em determinado período, a situação fiscal do governo.

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Compreende-se que oralidade e constructo narrativo, são aspectos intrinsecamente

ligados, e que compõem diversas possibilidades de se compreender a produção do

conhecimento histórico, e a assimilação dos processos temporais em que o sujeito histórico está

inserido. Nesse sentido;

A passagem da experiência – daquilo que foi vivenciado – em linguagem recebe

muitas vezes o nome de narrativa, entendendo-se narrativa como a organização dos

acontecimentos de acordo com determinado sentido que lhes é conferido.

Evidentemente a experiência sozinha, pura e simples, não é capaz de ser comunicada;

comunicar experiências pressupões sua organização de acordo com um sentido.

(ALBERTI, 2004, p. 92).

Se tomarmos a narrativa em sua forma mais elementar, como um ato de linguagem ou

ato da palavra, ela nada mais é do que atribuir sentido às experiências do mundo interiorizadas

pelo sujeito. O universo da linguagem e comunicação, configura-se, ao lado das capacidades de

produção da vida material do ser humano, um salto ontológico na espécie. Contudo, as relações

histórico-sociais pelas quais o ser passa no decorrer do tempo precisam ser encaradas,

interpretadas, a fim de que o indivíduo possa se situar no decorrer do curso histórico no qual

está inserido.

O campo teórico-metodológico da História oral, se dá a partir de uma proposta

investigativa, pela qual as narrativas produzidas por sujeitos possam ser tomadas como fonte

histórica a fim de complementar o escopo documental na construção do conhecimento histórico.

Para Verena Alberti (2011, p. 155)

A História oral é uma metodologia de pesquisa e de constituição de fontes para o

estudo da história contemporânea surgida em meados do século XX, após a invenção

do gravador de fita. Ela consiste na realização de entrevistas gravadas com

indivíduos que participam de, ou testemunharam, acontecimentos e conjunturas do

passado e do presente (2011, p. 155)

Nesse sentido, no percurso metodológico que perpassa a história oral, um dos seus

principais alicerces é a elaboração de uma narrativa.

Um acontecimento ou uma situação vivida pelo entrevistado não pode ser transmitido

a outrem sem que seja narrado. [...] Ao contar suas experiências, o entrevistado

transforma aquilo que foi vivenciado em linguagem, selecionando e organizando os

acontecimentos de acordo com determinado sentido (ALBERTI, 2004, p. 77).

Jörn Rüsen é um dos principais teóricos a pensar a construção narrativa, e a atribuição

de sentido que o sujeito produz narrativamente a partir da assimilação do tempo histórico. Para

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ele, a narrativa (histórica), configura-se enquanto uma capacidade de atribuir sento às

experiências do tempo, mediada pela consciência histórica.

Recuperar o passado, (seja ele qual for) por meio de uma narrativa, direciona tal

processo cognitivo para uma ação: deve possuir sentido e significado para a vida prática do ser

em sociedade. O narrar submete a singularidade de interpretação do tempo através da

linguagem, necessária à comunicação e transmissão de saberes através das gerações. A

construção narrativa pressupõe uma racionalidade que lhe é particular e própria, uma narrativa

que pressupõe uma estrutura cognitiva de transmissão de saberes:

O pensamento histórico, em todas as suas formas e versões, está condicionado por

um determinado procedimento mental de o homem interpretar a si mesmo e a seu

mundo: a narrativa de uma história. Narrar é uma prática cultural de interpretação

no tempo, antropologicamente universal (RÜSEN, 2010, p. 149).

Deste modo, narração e constituição de sentido estão intrinsecamente ligados. A

“história” enquanto experiência humana no tempo, deve ser interpretada, e materializada

mediante a narrativa. O conhecimento histórico, confere dessa forma, orientação às ações do

sujeito no tempo, produzindo sentido às experiências do passado.

A narração, portanto, é o processo de atribuir sentido à experiência do tempo. [...] A

narração é um processo de poiesis, de fazer ou produzir uma estrutura de experiência

temporal tecida de acordo com a necessidade de orientar-se no curso do tempo. O

produto desse processo de narração, a estrutura capaz de tal orientação, é “uma

história”. (RÜSEN, 2016, p. 47)

Contar histórias “é operar por exclusão, é selecionar e ordenar os acontecimentos de

acordo com o sentido que se lhes conferir e que se quer conferir à própria história” (ALBERTI,

2004, p. 69). A narrativa surge, como um elo de ligação entre o conhecimento histórico

propriamente dito, e a ‘vida prática’.

É preciso dessa forma, categorizar no que consiste a particularidade do narrar

historicamente:

A especificidade da narrativa histórica está em que os acontecimentos articulados

narrativamente são considerados como tendo ocorrido realmente no passado. Além

disso, sua coesão interna é concebida como uma representação da evolução temporal

vinculada à experiência e como significativa para o auto entendimento e para a

orientação dos sujeitos narradores (RÜSEN, 2010, p. 155).

Compreende-se em síntese que, é através da condição de narrativa histórica que são

instituídas as “representações da continuidade da evolução temporal dos homens e de seu

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mundo, instituidoras de identidade, por meio da memória, e inseridas, como determinação de

sentido, no quadro de orientação da vida prática humana” (RÜSEN, 2010, p. 67).

Dessa maneira, a reconstituição do tempo mediante a narrativa é um constructo das três

dimensões temporais (passado, presente e futuro) expressas no ato da fala, ou da escrita;

Narrar a partir do tempo faz sentido na medida em que a sequência temporal dos

acontecimentos (na maior parte ocorrências ou conteúdos empíricos de tipo

estrutural) é situada no contexto próprio a esses mesmos acontecimentos. [...] A

reconstituição mental da mudança temporal atribui a esta significado para a

compreensão e para a interpretação dos processos de evolução no tempo, no qual

vivem os sujeitos da narrativa ou, dito de outra forma, no qual o próprio processo

comunicativo da narrativa se dá (RÜSEN, 2010, p. 155).

Por conseguinte, o conhecimento histórico materializado pela narrativa, precisa estar

ligado às necessidades práticas e temporais do presente. Pode-se pensar então, que o saber

histórico, em seu processo de constituição narrativa, opera nos processos comunicativos da vida

humana prática.

A arte de contar e transmitir as histórias diretamente do passado, atravessaram gerações

e como sempre cada uma com sua particularidade na transmissão de conhecimentos. Seja ela

escrita, oral, através de figuras, sendo relembrada pelas práticas memorialistas, a substância do

passado precisa fazer algum sentido prático àqueles que dela se assenhoram.

Discussões

O conjunto das fontes utilizadas na discussão, tangenciam a metodologia recorrente na

história oral. As entrevistas selecionadas para a discussão foram as primeiras concedidas após

a prisão decretada pelo então Juiz Sérgio Moro. Não se trata, portanto, de uma entrevista

pessoal, sendo que a oralidade das respostas foram produzidas a partir de um trabalho

jornalístico-midiático para canais de comunicação, após uma liminar da justiça permitir as

entrevistas.

Procurou-se, portanto, destacar aspectos de cunho mais significativo-temporal, no qual

o ex-presidente Lula, enquanto sujeito da história, atribui sentido aos processos históricos em

que esteve inserido desde sua infância, posteriormente enquanto sindicalista, e também como

presidente da república. Dessa forma, como aponta Verena Alberti (2012, p. 163) “o

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conhecimento histórico é condicionado pelas fontes que temos – ou melhor, pelas perguntas

que fazemos às fontes que temos”.

As entrevistas, de modo geral, foram estruturadas a partir de três eixos de discussão:

acerca de seu processo de condenação, o momento político atual, e a sua percepção histórica

enquanto um indivíduo político de grande magnitude dentro da esquerda latino-americana.

Talvez o ponto de partida que se deve atentar para análise das narrativas produzidas pelo

ex-presidente Lula, é compreender o lugar de fala, não agora como um estadista, mas um ex-

chefe da nação que está submetido à prisão, o que afeta diretamente seu discurso. Para Michel

Focault todo discurso está atrelado a própria interioridade do sujeito e na construção do seu

processo subjetivo de interpretação de mundo. Para o autor, um discurso nada mais é do que

A reverberação de uma verdade nascendo diante de seus próprios olhos; e, quando

tudo pode, enfim, tomar a forma do discurso, quando tudo pode ser dito e o discurso

pode ser dito a propósito de tudo, isso se dá porque as coisas, tendo manifestado e

intercambiado seu sentido, podem voltar à interioridade silenciosa da consciência de

si. (FOCAULT, 1996, p. 49)

A produção do discurso está em constante busca por legitimação dentro da estrutura

social. Tal seria o aspecto originário de sua produção: a condição de uma vontade de verdade.

Isso se traduz nas lutas em torno da monopolização e no maniqueísmo presente, principalmente

em práticas discursivas em torno da dimensão política. Um discurso “não é simplesmente aquilo

que traduz as lutas ou os sistemas de dominação, mas aquilo por que, pelo que se luta, o poder

do qual nos queremos apoderar” (FOCAULT, 1996, p. 10).

Sentenciado a cumprir pena na sede da Polícia Federal em Curitiba, nota-se que no

discurso impera um tom combativo. Fato salientado no início de uma de suas falas em que diz,

“quem nasceu em Pernambuco, e não morreu de fome até os cinco anos de idade sabe, não se

curva mais a nada” (LULA, 2019, TV FOLHA). Nesse aspecto, “é preciso saber ‘ouvir’ o que

a entrevista tem a dizer tanto no que diz respeito às condições de sua produção quanto no que

diz respeito à narrativa do entrevistado” (ALBERTI, 2011, p. 185).

Observa-se que dentro de seu discurso está transposto os processos histórico-sociais de

sua trajetória de luta em movimentos sindicalistas desde os anos finais da ditadura militar:

Então o povo tem que saber o seguinte: o otimismo está dentro de nós. A gente tem

que saber [...] que esse cara ganhou as eleições, a gente goste ou não goste sabe. A

gente tem que saber que ele pode imprimir o jeito dele governar, cabe a gente aceitar ou não. Se a gente não aceita tem que lutar (LULA, 2019, TV FOLHA)

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Ao mesmo tempo em que ele recorre à memória das suas lutas sociais, reitera seu

compromisso com um projeto de nação como objetivo de sua trajetória de vida, dialogando com

três dimensões temporais da produção de sentido (o passado rememorado no presente e

direcionando ações futuras): “O que me mantém vivo? E é isso que ele tem que saber. Eu tenho

um compromisso com esse país. Eu tenho compromisso com esse povo” (LULA, 2019, TV

FOLHA).

Podemos também traçar um paralelo dos processos históricos em que esteve inserido,

bem como dos signos atribuídos a tais acontecimentos. Ao referenciar, por exemplo, sobre a

importância de Getúlio Vargas no cenário nacional, menciona que:

[...] eu nasci no movimento sindical contra o Getúlio. Eu radicalizava muito contra o

Getúlio por causa da estrutura sindical, que era a cópia fiel da Carta de Lavoro de Mussolini. Então. Depois, o tempo vai passando, a gente vai ficando velho e vai

compreendendo determinadas coisas. Depois eu li a biografia do Lira Neto sobre o

Getúlio e efetivamente eu passei a defender o Getúlio. Getúlio foi um entre 1930-1945

e foi outro entre 1950 -1954. Eu passei a perceber as coisas boas que o Getúlio fez

nesse país. Na verdade, com todo o defeito que a gente possa achar, ele tirou o povo

trabalhador de quase uma vida de escravidão, para dar a ele o sentido de

trabalhador. Então eu passei a admirar o Getúlio Vargas nesse período. (LULA,

2019, TUTAMÉIA TV)

Nota-se que ele atribui significados próprios à sua dimensão temporal. Estabelece um

movimento entre os acontecimentos vividos pelo sujeito, e a sua interpretação da história,

podendo assim, alinhar relações significativas entre um sujeito historicamente situado e a

estrutura a qual está inserido.

Lula esboça um quadro histórico do que significou sua trajetória na política brasileira,

desde sua inserção no movimento sindical até a consolidação como presidente da república.

Relembra que no início não desejava participar da vida política, e ao mencionar a fundação do

Partidos dos Trabalhadores, diz:

Eu cheguei à conclusão que se nós quiséssemos mudar a história do Brasil, nós temos

que criar um partido político. Criar um partido político em que a classe trabalhadora dirigisse esse partido político. Que a classe trabalhadora junto com outras pessoas

fizesse o programa desse partido. E aí foi importante porque a gente juntou, não

apenas o que tinha de melhor no movimento sindical, a gente juntou o que tinha de

melhor na esquerda brasileira, o que tinha de melhor na intelectualidade, o que tinha

de melhor na igreja, sabe, progressista, sobretudo o pessoal da teologia da libertação

e a gente juntou muitos estudantes e o PT virou, sabe, o maior partido de esquerda

da América Latina. (LULA, 2019, OPERA MUNDI)

Para ele, sua trajetória é atribuída como um marco nas políticas sociais na história do

Brasil. Seguindo a mesma linha, também revela sua visão do que foi o impacto da ascensão da

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esquerda na América-Latina, um continente marcado por lutas, mas dependente do capital

estrangeiro e subserviente aos interesses estadunidenses. Segundo ele,

Nós tivemos um período muito extraordinário na América Latina. O período de mais

crescimento, de mais distribuição de renda, de mais inclusão social na América

Latina aconteceu de 2000 a 2014 com a eleição de Kirchner, Lagos, a Cristina, Lula,

Evo Morales, Chaves, Rafael Corrêa… foi um momento de ouro da América Latina.

Agora você está vivendo um momento da extrema direita que está fracassando de forma absurda. O Macri é um desastre na Argentina e ele era a solução (LULA, 2019,

THE INTERCEPT BRASIL).

Em seguida na mesma entrevista recorre à estrutura temporal do continente, para

produzir um sentido paralelo à trajetória de contestação das políticas públicas, e de indignação

de setores da sociedade que se rebelaram contra a ascensão de camadas populares. Frisa o ex-

presidente que:

[...] na América Latina, toda vez que apareceu um presidente que tentou fazer política

social, ele foi derrubado, todas as vezes. [...]. Então, o PT conseguiu fazer – isso não

é dito por mim, é dito pela ONU – o PT conseguiu fazer a maior política de inclusão

social da história deste país. É importante lembrar que o nosso governo foi o único

momento na história em que os mais pobres tiveram um crescimento percentual acima

dos mais ricos. Não que os ricos não ganharam, mas que os pobres cresceram

percentualmente mais. Foi a única vez e começou a incomodar (LULA, 2019, THE

INTERCEPT BRASIL)

Tomando então a história do Brasil, analisa que todas as grandes “revoluções” na

verdade foram “contrarrevoluções” e realizadas hierarquicamente pelas classes dirigentes do

país. Para tanto, ele atribui sua eleição como um marco na ascensão das camadas populares, o

que gerou a necessidade de ser combatida por uma elite que não aceita a alteração no status quo

brasileiro.

O ex-presidente salienta que se tomarmos como objeto de análise a história do Brasil

“toda vez que o povo esteve em ascensão ‘pa’ chegar perto, houve um acordão. Assim foi a

independência do Brasil, assim foi a proclamação da república, assim foi na eleição de Tancredo

Neves, assim foi na constituinte [...] e assim foi na anistia” (LULA, 2019, OPERA MUNDI).

Nesse fragmento podemos perceber mais uma inferência clara de que a oralidade produzida

pelo ex-presidente Lula, está relacionada diretamente a acontecimentos históricos e a sua

atribuição de sentido mediante sua narrativa e um discurso matizado por uma percepção de um

líder da esquerda que dirigiu o país por 8 anos.

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Segundo ele “no governo do PT, nós fizemos a maior política de inclusão social da

história de 500 anos do Brasil” (LULA, 2019, THE INTERCEPT BRASIL). Talvez aí situe sua

tecla mais batida ao longo de todas as suas entrevistas, ao lado é claro dos méritos de sua

condenação que, todavia, não é o objeto da presente discussão. Para ele, tal mobilidade das

classes inferiores na escala social, é um marco e uma verdade histórica inegável na trajetória

política do Estado brasileiro:

Mas a verdade [...] é que as pessoas mais pobres subiram um degrau na escala social.

E, na medida que os mais pobres começaram a entrar em universidade, na medida

que começaram a frequentar teatro, na medida que começaram a frequentar

restaurante, na medida que começaram a frequentar aeroporto, isso começou a

incomodar uma parte da elite brasileira (LULA, 2019, THE INTERCEPT BRASIL)

Dessa forma ele estabelece claramente que o objetivo que norteava a construção das

suas políticas públicas, e as intervenções do Estado eram as camadas mais pobres. Frisando que

o “pobre não é problema, pobre é solução, quando você inclui ele e transforma ele em sujeito

da história” (LULA, 2019, OPERA MUNDI). Traçando um paralelo acerca desse período de

aumento da seguridade social, principalmente das classes trabalhadoras, ele estabelece um

quadro temporal em que expõe:

Antigamente você tinha os europeus perdendo ‘direito’, perderam muito direitos os

europeus. E o Brasil ganhando direitos. Nós nem chegamos aos direitos que eles

chegaram, e já perdemos. Porque eles estão desmontando tudo o que nós

conquistamos. Desmontando. Simplesmente destruindo. Quando eles falam de reforma política, eles são demolidores, destruidores do futuro de nossos velhinhos

(LULA, 2019, TV FOLHA)

Por fim, questionado na última entrevista selecionada sobre os desafios da esquerda

no Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva direciona seu discurso para a história, fundamentando sua

percepção de mundo, combativo e de lutas:

Eu primeiro queria dizer ao povo brasileiro de que não há na história da

humanidade sociedade que consiga vencer os obstáculos se ela se encolher, se ela

se acovardar, se ela deixar de brigar diante das adversidades. Eu sei que tem

muita gente assustada com o tipo de governo que o Bolsonaro “tá” fazendo. E

acho que a única coisa que pode consertar isso é o povo brasileiro não permitir

que eles destruam aquilo que o povo brasileiro construiu ao longo de 500 anos” (LULA, 2019, REDE TVT).

Percebe-se por algumas falas destacadas nas discussões que o discurso produzido está

pautado fundamentalmente em uma estrutura histórica que o precede. Também, de que o sujeito

atribui sentido às suas experiências temporais singulares.

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Desse modo, as discussões apontadas, objetivam colaborar para compreensão da

produção de discursos e a relação que se estabelece entre a narrativa e o tempo, produzida e

intrinsecamente ligada à produção de sentido, a qual o sujeito atribui ao se deparar com

processos históricos. Em toda essa relação está intercalada a metodologia de análise da história

oral, que se constitui como um importante campo de abordagem e resgate das oralidades que

perpassam o cotidiano e podem ser importantes fontes de análises para se produzir uma outra

história.

Considerações Finais

A breve pesquisa procurou trabalhar com a narrativa autobiográfica do ex-presidente

Luiz Início Lula da Silva, produzida por sua oralidade em um conjunto de entrevistas

disponíveis na plataforma virtual do YouTube. O cenário é a sede da Polícia Federal em que o

ex-presidente está condenado a cumprir pena de detenção provisoriamente, pois aguarda

revisão de seu processo. Percebe-se, portanto, que a condição discursiva do ex-presidente está

circunscrita nos padrões judiciais, um fator de suma importância para a elaboração do seu

discurso combativo.

Fundamentado teoricamente a partir de três eixos analíticos: a) a metodologia da história

oral, na qual se pode tomar a oralidade do ex-presidente destacando aspectos de sua própria

trajetória de vida; b) a construção narrativa de sentido expressada a partir da interpretação e

assimilação de processos temporais que o sujeito se encontra inserido c) a construção de uma

ordem do discurso pautada a partir de sua trajetória e lugar social em que possui um destaque

no poder político atual.

Nesse sentido, pode-se estabelecer que “uma das principais riquezas da História oral

está em permitir o estudo das formas como pessoas ou grupos efetuaram e elaboraram

experiências, incluindo situações de aprendizado e decisões estratégicas” é assim que “entender

como pessoas e grupos experimentaram o passado torna possível questionar interpretações

generalizantes de determinados acontecimentos e conjunturas” (ALBERTI, 2011, p. 165) o que

é expressado através das falas de Lula.

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Em síntese, o objetivo geral da discussão era apresentar um panorama histórico e alguns

aspectos da fala de um personagem direcionou esforços por uma sociedade brasileira diferente

daquilo que se propunha a 500 anos.

Talvez uma das perguntas mais significativas, feita por um dos entrevistadores do canal

Tutaméia TV, expressava a relevância emblemática do ex-presidente para o processo histórico

brasileiro. Em dado momento da entrevista direcionam questão: “Eu queria perguntar para o

senhor. O senhor sabe a dimensão da sua importância histórica. O senhor trabalha com a

história. O tempo do senhor é a história, não é hoje, não é amanhã.”

Como qualquer ser humano, suas ações repetem equívocos e acertos, que pesaram nas

relações de causa e efeito nas circunstâncias históricas. Resgatar a fala do ex-presidente Lula,

é pensar a trajetória do Brasil cuja curvatura foi significativa para as classes populares.

Atualmente o cenário político condiciona uma série de indagações em relação aos caminhos

para trilhar, no entanto um aspecto se mantém atual: a luta diária do seu povo, que se transporta

e reacende a eterna luta de classes, quiçá um dia encontremos a superação dessa sociedade, da

ordem estabelecida de concentração do poder político e econômico da classe burguesa em

detrimento de toda uma massa de trabalhadores pobres, que infelizmente a ineficiência das

políticas públicas, historicamente tendem a reproduzir

Referências

ALBERTI, Verena. De “versão” a “narrativa” no Manual de história oral. História Oral, Rio

de janeiro, v. 15, n. 2, p. 159-166, 2012.

__________. Histórias dentro da História. In: PINSKY, Carla Bassanezi. Fontes Históricas. 3.

Ed. São Paulo: Contexto, 2011. p. 155 – 202.

___________. Ouvir contar: textos em história oral. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2004.

FOCAULT, Michel. A ordem do discurso. São Paulo: Loyola, 1996.

MARKUN, Paulo. O sapo e o príncipe: Personagens, fatos e fábulas. Objetiva. São Paulo,

2004.

MATOSO, Filipe. Presidente do PT chama condução coercitiva de Lula de ‘sequestro’.

Publicado em 7 de março de 2016. Disponível em: <http://g1.globo.com/politica/operacao-

lava-jato/noticia/2016/03/presidente-do-pt-chama-conducao-coercitiva-de-lula-de-

sequestro.html>. Acesso em 19 set. 2019.

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OPERA MUNDI. Veja íntegra da entrevista de Lula a Kennedy Alencar. (1h 50m 33s). 13

de maio de 2019. Disponível em: < https://www.youtube.com/watch?v=nR7YV9jwN1A >.

Acesso em: 16 de maio de 2019.

REDE TVT. Entrevista do Lula na TVT – 13.06.2019. (2h 16s). 13 de junho de 2019.

Disponível em: < https://www.youtube.com/watch?v=da0VMPvf3cI >. Acesso em: 14 de

junho de 2019.

ROTHER, Larry. The New York Times. 02 de janeiro de 2003

RÜSEN, Jörn. Narração Histórica: fundações, tipos, razão. In: MALERBA, Jurandir. (Org).

História & Narrativa: a ciência e a arte da escrita histórica. Petrópolis, RJ: Vozes, 2016.

____________. Razão Histórica: teoria da História: fundamentos da ciência histórica.

Brasília: Editora Universidade de Brasília, 2010.

THE INTERCEPT BRASIL. Glenn Greenwald entrevista Lula: entrevista completa. (59m

58s). 21 de maio de 2019. Disponível em: <

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TUTAMÉIA TV. Íntegra da entrevista de Lula ao TUTAMÉIA e ao DCM. (1h 55m 05s).

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Acesso em: 8 de junho de 2019.

TV FOLHA. EXCLUSIVO. Íntegra de entrevista de Lula à Folha. (1h 55m 22s). 27 de abril

de 2019. Disponível em: < https://www.youtube.com/watch?v=zCzco42kRAg >. Acesso em:

30 de abril de 2019.