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Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13 th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos), Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X MULHERES E SINDICALISMO: AS RELAÇÕES DE DESIGUALDADE NOS SINDICATOS Priscila Moreira Borges 1 Resumo: Este artigo analisa uma das questões centrais das desigualdades que as mulheres brancas e negras enfrentam em graus diferentes - na sociedade: a escassa participação feminina nos postos de poder e na política. A sociedade capitalista e patriarcal presente no século XXI ainda coloca obstáculos ao pleno exercício do acesso ao poder pelas mulheres. E o mundo do trabalho não é diferente. As trabalhadoras, engajadas nas lutas feministas e sindicais, tem travado árduas disputas no interior do movimento sindical para inserir na pauta suas reivindicações específicas relativas à conciliação trabalho, família e a partilha dos postos de comando das direções. Esta pesquisa analisa a participação das mulheres numa das principais organizações sindicais brasileiras: a Central Única dos Trabalhadores (CUT) nos anos de 2003 à 2014. O artigo faz um sucinto diagnóstico do trabalho remunerado feminino no período, utilizando os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicilio (PNAD). O engajamento político dessas trabalhadoras no sindicalismo será pesquisado através da documentação, atas, resoluções dos congressos e plenárias nacionais da CUT. A variável central da análise foi a divisão entre homens e mulheres dos postos de direção da entidade. Palavras-chave: mulheres, trabalho, sindicalismo, cargos de direção. 1. INTRODUÇÃO Este artigo tem como objetio compreender se o aumento da presença das mulheres no mercado de trabalho ocasionou maior participação “delas” nas diretorias sindicais. Mas como estes dois fatores estariam ligados? A resposta a esta pergunta vem através de outros questionamentos: 1) quais as principais dificuldades das mulheres na política sindical? 2) existem políticas que garantam maior participação feminina nas diretorias? 3) estão essas organizações atentas às transformações da realidade do trabalho feminino no Brasil? 4) houve mudanças estruturais nas direções desses sindicatos no intervalo pesquisado? Para este trabalho, delimitou-se como objeto de análise da participação política das mulheres nos sindicatos, a Central Única dos Trabalhadores, CUT nacional. Por ser esta a maior central sindical do país e a pioneira na discussão de gênero em suas instâncias (FERREIRA, 2009). Este trabalho se estruturará da seguinte forma: No primeiro capítulo buscar-se-á confrontar e compreender o que a teoria feminista apresenta como marco inicial para as estruturas patriarcais da sociedade. Buscando aprofundar a discussão acerca da divisão 1 Graduada em Ciência Política na Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro; Mestranda em Política Social, na área de Sujeitos e Proteção Social na Universidade Federal Fluminense como bolsista da CAPES, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.

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Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos), Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X

MULHERES E SINDICALISMO: AS RELAÇÕES DE DESIGUALDADE NOS

SINDICATOS

Priscila Moreira Borges1

Resumo: Este artigo analisa uma das questões centrais das desigualdades que as mulheres brancas e negras

enfrentam – em graus diferentes - na sociedade: a escassa participação feminina nos postos de poder e na

política. A sociedade capitalista e patriarcal presente no século XXI ainda coloca obstáculos ao pleno exercício

do acesso ao poder pelas mulheres. E o mundo do trabalho não é diferente. As trabalhadoras, engajadas nas lutas

feministas e sindicais, tem travado árduas disputas no interior do movimento sindical para inserir na pauta suas

reivindicações específicas relativas à conciliação trabalho, família e a partilha dos postos de comando das

direções. Esta pesquisa analisa a participação das mulheres numa das principais organizações sindicais

brasileiras: a Central Única dos Trabalhadores (CUT) nos anos de 2003 à 2014. O artigo faz um sucinto

diagnóstico do trabalho remunerado feminino no período, utilizando os dados da Pesquisa Nacional por Amostra

de Domicilio (PNAD). O engajamento político dessas trabalhadoras no sindicalismo será pesquisado através da

documentação, atas, resoluções dos congressos e plenárias nacionais da CUT. A variável central da análise foi a

divisão entre homens e mulheres dos postos de direção da entidade.

Palavras-chave: mulheres, trabalho, sindicalismo, cargos de direção.

1. INTRODUÇÃO

Este artigo tem como objetio compreender se o aumento da presença das mulheres no

mercado de trabalho ocasionou maior participação “delas” nas diretorias sindicais. Mas como

estes dois fatores estariam ligados? A resposta a esta pergunta vem através de outros

questionamentos: 1) quais as principais dificuldades das mulheres na política sindical? 2)

existem políticas que garantam maior participação feminina nas diretorias? 3) estão essas

organizações atentas às transformações da realidade do trabalho feminino no Brasil? 4) houve

mudanças estruturais nas direções desses sindicatos no intervalo pesquisado?

Para este trabalho, delimitou-se como objeto de análise da participação política das

mulheres nos sindicatos, a Central Única dos Trabalhadores, CUT nacional. Por ser esta a

maior central sindical do país e a pioneira na discussão de gênero em suas instâncias

(FERREIRA, 2009). Este trabalho se estruturará da seguinte forma: No primeiro capítulo

buscar-se-á confrontar e compreender o que a teoria feminista apresenta como marco inicial

para as estruturas patriarcais da sociedade. Buscando aprofundar a discussão acerca da divisão

1 Graduada em Ciência Política na Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro; Mestranda em

Política Social, na área de Sujeitos e Proteção Social na Universidade Federal Fluminense como bolsista da

CAPES, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.

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sexual do trabalho, a divisão social do espaço entre público e privado, e a baixa participação

política das mulheres. Em seguida será abordado através de números e revisão bibliográfica o

que mudou na realidade do trabalho feminino no Brasil de 2003 à 2014. A escolha deste

período se dá pelo fato deste ser o de maior crescimento proporcional de população ocupada

no país (POCHMANN, 2015).

Depois será apresentada uma análise da participação política das mulheres nas

diretorias da CUT nacional no intervalo preestabelecido. Para isso, usamos o método de

análise documental de resoluções, deliberações, atas e documentos dos Congressos e Plenárias

Nacionais da CUT no período estudado. Por fim, serão apresentados as conclusões finais

desta pesquisa.

2. A TEORIA FEMINISTA: DIVISÃO SEXUAL DO TRABALHO, DIVISÃO SOCIAL DO

ESPAÇO, PARTICIPAÇÃO POLÍTICA E O LUGAR DA MULHER

Se fosse necessário resumir brevemente a luta do movimento feminista poderia se

dizer que esta é uma busca por igualdade. Historicamente, essas organizações trazem

marcadas em suas bandeiras pautas como a legalização do aborto e o fim da violência contra a

mulher por exemplo. Contudo, um tema que transversa a história deste movimento, tornando-

se estruturante para uma concepção feminista, é a divisão sexual do trabalho (KERGOAT,

2009). Tal discussão passa, necessariamente, por um viés estrutural que envolve uma análise

sobre o patriarcado enquanto sistema (SAFFIOTI, 2015). Mas também cumpre observar

elementos específicos como a invisibilidade do trabalho doméstico e a realidade de que são as

mulheres as responsáveis prioritárias por este trabalho (BANDEIRA E MELO, 2013). A

distinção entre os trabalhos a partir do sexo é o que se chama de divisão sexual do trabalho

(KERGOAT, 2009; MELO E CASTILHO, 2009). Segundo muitas estudiosas feministas essa

divisão é socialmente construída, ao contrário do que é indicado com frequência pelo senso

comum como sendo “natural”, ou seja, que mulheres são biologicamente preparadas para

trabalhos distintos dos homens. Homens e mulheres estariam inseridos em uma relação social

específica, a de sexo, e a base material desta relação social seria o trabalho. Este seria,

portanto, o arcabouço estrutural e teórico em que se sustenta a divisão sexual do

trabalho.(KERGOAT, 2009)

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Paralelamente ao conceito de divisão sexual do trabalho circulam outros aspectos

importantes como a divisão social do espaço entre o público e o privado e, consequentemente,

entre o trabalho de produção e reprodução. No espaço público estão historicamente

representados os homens, com um trabalho de produção e de maior valor agregado. Enquanto

o espaço privado fica destinado às mulheres, responsáveis pelo trabalho de reprodução e

menor, ou nenhum, valor agregado (OKIN, 2008). É a partir da divisão do trabalho e do

espaço que se evidencia a hierarquização do trabalho do homem sobre o da mulher (FARIA e

NOBRE, 1997; KERGOAT, 2009).

A luta das mulheres para ocupar o espaço público, que inclui vida social, direitos e

participação política e acesso aos estudos e emprego inaugura novos capítulos de conquistas

sociais pelo mundo (FREITAS, 2008). A entrada das mulheres no mercado do trabalho,

todavia, chega cercada de contradições, limites e estruturada nas bases patriarcais

(BANDEIRA E MELO, 2009). Essa esrutura fez com que ao longo do curso histórico as

mulheres tivessem pouca inserção na vida pública e na vida política, e consequentemente

ficassem de fora do centro das disputas por esses espaços de representação (ARAÚJO, 2011).

Segundo Araújo (2011), a política é exercida na esfera pública atrelada a uma necessidade de

desprendimento para esta vida, ou até mesmo a uma ideia de necessidade de alienação de

questões privadas e particulares. E portanto, como as mulheres são as maiores responsáveis

pelo trabalho doméstico e de cuidados, tornam-se incapacitadas de ocupar tais espaços. A

divisão sexual do trabalho e a dicotomia entre o público x privado e suas consequências na

vida das mulheres são as bases teóricas de onde parte a argumentação deste artigo.

3. A REALIDADE DA OCUPAÇÃO E DESOCUPAÇÃO NO BRASIL NO PERÍODO DE

2003 À 2014: E AS MULHERES TRABALHADORAS?

O marco histórico desta sessão foi definido a partir da constatação – através de análise

de dados e revisão bibliográfica – de que de 2003 à 2014, nos dois governos de Luis Inácio

Lula da Silva e no primeiro governo de Dilma Roussef, houve no Brasil um aumento

significativo da população ocupada e uma diminuição da população desocupada

(POCHMANN, 2015). Como “ocupada” e “desocupada” vamos considerar os conceitos do

IBGE que assim definem:

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“População ocupada - aquelas pessoas que, num determinado período de

referência, trabalharam ou tinham trabalho mas não trabalharam (por exemplo,

pessoas em férias). População Desocupada - aquelas pessoas que não tinham trababalho, num

determinado período de referência, mas estavam dispostas a trabalhar, e que, para

isso, tomaram alguma providência efetiva (consultando pessoas, jornais,

etc.).”(NOTAS METODOLÓGICAS, IBGE)

Este capítulo vai apresentar de maneira breve como a alteração nas taxas de ocupação

e desocupação neste período está relacionada com a realidade das mulheres trabalhadoras.

Serão apresentados nesta sessão dados retirados do relatório do Instituto de Pesquisa

Econômica Aplicada (IPEA) intitulado: “Retrato das desigualdades de gênero e raça”. Ele

fornece indicadores provindos da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), do

IBGE. Em 2003, no primeiro ano do primeiro governo Lula havia no Brasil uma taxa de

ocupação da população brasileira com 16 anos ou mais, de 90,4%. Em 2012, já no governo

Dilma este número chega a atingir 94% - seu ápice no período pesquisado- e em 2014 ele cai

um pouco para 93,3%. A taxa de ocupação da população brasileira cresce 2,9 pontos

percentuais proporcionalmente ao seu crescimento absoluto. Este dado para os homens

maiores de 16 anos ocupados é de 92,4% em 2003, em 2012 atinge 95,5% e em 2014 chega a

94,8%. Há, portanto, no período estudado um crescimento de 2,4 pontos percentuais na taxa

de homens ocupados. Já para as mulheres brasileiras ocupadas com 16 anos ou mais este dado

parte de 87,9% em 2003, alcança 92% em 2012 e em 2014 atinge 91,3%. Neste período há um

crescimento de 3,4 pontos percentuais na taxa de mulheres ocupadas. É possível perceber um

crescimento um pouco maior na taxa de ocupação da população brasileira no segmento

feminino em relação ao masculino.

A taxa de desocupação da população brasileira com 16 anos ou mais no ano de 2003

era de 9,6%, esta taxa tem sua menor escala em 2012 quando chega a atingir 6,1%, e em 2014

alcança 6,7%. Uma queda de 2,9 pontos percentuais na taxa de desocupação da população

brasileira no intervalo analisado. Para os homens este índice é de 7,7% em 2003, chega a

atingir 4,5% em 2012 e termina o ano de 2014 em 5,2%. Uma queda de 2,5 pontos

percentuais neste período. Entre as mulheres os dados são ainda mais intrigantes. Em 2003 a

taxa de mulheres desocupadas era de 12,2%, em 2012 esse índice alcança 8,1%, e finaliza o

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ano de 2014 com 8,7%. Logo, neste período há uma diminuição de 3,5 pontos percentuais na

taxa de desocupação das mulheres brasileiras.

É importante perceber que há um crescimento proporcional um pouco maior em

relação à população ocupada e uma diminuição mais significativa da população desocupada

se observarmos mulheres em relação aos homens. Ou seja, apesar de ainda ser atual a análise

teórica apresentada sobre a divisão sexual do trabalho, a dicotomia entre o espaço público e

privado, e por consequência a dificuldade da inserção da mulher no mercado de trabalho, é

possível afirmar que, mesmo ainda distante de alcançar patamares de igualdade, verifica-se,

no período pesquisado, um fenômeno de maior ocupação e menor desocupação proporcional

das mulheres trabalhadoras. A partir deste breve panorama buscaremos analisar nesta última

sessão se a CUT esteve atenta a estas transformações no período analisado. Buscando

responder, quando possível, às perguntas apresentadas no início deste artigo.

4. A CENTRAL ÚNICA DOS TRABALHADORES E A PARTICIPAÇÃO DAS

MULHERES

A divisão sexual do trabalho e a divisão social do espaço entre público e privado,

como já vimos, ocasionaram uma dificuldade estrutural para a mulher participar da vida

política. Nos sindicatos esta realidade não é diferente. (FERREIRA, 2009) A entrada da

mulher no mercado de trabalho acontece em meio a muitos conflitos. As duplas ou triplas

jornadas de trabalho exigem da mulher trabalhadora uma carga horária exaustiva o que

dificulta sua participação mais ativa na vida política. (ARAÚJO,2011). Além das discussões

sobre demandas relativas às mulheres trabalhadoras no mundo trabalho, é possível também

encontrar em resoluções das plenárias congressos da CUT, frequentes apontamentos

relacionados à baixa participação das mulheres nos sindicatos, apontando a necessidade de

promover condições estruturais e políticas para gerar mais participação feminina nas

instâncias da central :

“O 8º CONCUT orientou, também, que em cada instância e entidade orgânica e/ou

filiada à CUT, seja designada uma mulher que faça parte da direção, com liberação

plena, para que coordene a elaboração e implementação de ações sindicais voltadas

para a promoção da igualdade de oportunidades para as mulheres trabalhadoras e

contribua para que o conjunto das políticas sindicais das respectivas instâncias e

entidades considerem a especificidade da situação vivida pelas mulheres.” (11ª

PLENÁRIA NACIONAL DA CUT, 2005 p.48)

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Levando em consideração os questionamentos que norteiam esta pesquisa e tentando

apresentar respostas, buscou-se analisar documentos e resoluções da CUT nos congressos de

2003 à 2012 e das plenárias nacionais de 2005-20142, bem como uma avaliação da

composição das diretorias eleitas nos congressos cutistas do período pesquisado. Os

documentos usados neste capítulo estão referenciados de maneira específica ao longo do texto

e todos foram encontrados no sítio do CEDOC- Centro de Documentação e Memória Sindical

da CUT.3

A CUT desde sua fundação traz em seus documentos e resoluções uma preocupação

com a realidade da mulher trabalhadora (FERREIRA, 2009). Alguns elementos materiais

encontrados na história da central sindical dão bases para esta afirmação. Em um texto de

balanço apresentado em 02/08/2016 intitulado “30 anos de política de gênero: a história de

luta das mulheres no movimento sindical” (BATISTA, 2016), a então Secretária Nacional da

Mulher Trabalhadora da CUT, apresenta uma linha do tempo das principais ações realizadas

na entidade em relação às questões de gênero, como a criação da secretaria nacional da

mulher trabalhadora, defesa pela legalização e descriminação do aborto e a aprovação de

cotas e paridade na entidade.

Numa análise ampla dos documentos é possível perceber um destaque para a questão

de gênero. Nos textos há frequentemente um apontamento da preocupação com a mulher

trabalhadora e sua maior inserção no mercado de trabalho ao longo dos anos, bem como

abordagens sobre a questão da participação da mulher nos espaços de direção sindical. Como

pode-se constatar através deste trecho do documento da Plenária nacional da CUT de 2011:

“As mulheres têm que ter condições objetivas de tocar seu trabalho, estar nos

espaços de poder, principalmente da Central. Significa garantir condições para que

as mulheres, além de estarem presentes em Secretarias/Diretorias de Mulheres,

também ocupem os cargos com mais poder de decisão: presidência, secretaria geral

e tesouraria. Garantir mecanismos que viabilizem a participação das mulheres como,

por exemplo, creches em todos os espaços e atividades da CUT.”(13ª

PLENÁRIA NACIONAL DA CUT, 2011 p.57)

2 Como os congressos e plenárias nacionais da CUT ocorrem trienalmente analisou-se apenas os

documentos dos congressos e plenárias que ocorreram no período delimitado pela pesquisa

3 http://cedoc.cut.org.br/ - acesso em 26/06/2017

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Em junho de 2003, ocorreu em São Paulo o 8º Congresso Nacional da CUT, é neste

espaço que são criadas as secretarias nacional e estaduais da Mulher Trabalhadora. Com o

objetivo de verificar a participação das mulheres nos espaços da direção cutista foi possível

analisar nas páginas 84 e 85 da Resolução deste congresso, a composição da Executiva

Nacional e Diretoria Executiva da entidade. Dos 13 membros da executiva Nacional deste

ano, apenas 4 eram mulheres (aproximadamente 30%), para 9 homens. Já na Diretoria

Executiva, de 18 membros, 7 eram mulheres e 11 homens. Se somadas, há um total de 31

membros, em que 11 são mulheres e 20 homens, onde a participação feminina na direção fica

em torno de 35,48%. (RESOLUÇÕES DO 8º CONCUT, 2003) Vale ressaltar que em 1993

foi aprovada na 6ª Plenária Nacional da CUT, a cota mínima de 30% e máxima de 70% de

cada sexo, porém apenas como recomendação e não como resolução. Somente em 2008 esta

regra entra para o estatuto da entidade.(BATISTA, 2016) Portanto, mesmo que apenas como

recomendação a entidade cumpria a orientação política proposta até o momento em 2003.

Em 2006, no 9º CONCUT, de 14 membros da Executiva Nacional, 5 eram mulheres e

9 homens, ou seja, 35,7% é a representação feminina. Das 18 pessoas que compunham a

Diretoria Executiva, 4 eram mulheres (22,22%) e 14 homens. De um total de 32 membros da

direção executiva nacional, as mulheres são apenas 9 neste ano, o que significa 28,12% .

(RESOLUÇÕES DO 9º CONCUT, 2006) Na plenária nacional da CUT de 2008, dois anos

após o resultado da composição da direção de 2006, há uma enfática afirmativa da dificuldade

de incorporação efetiva das cotas:

“Nesses 25 anos da fundação da Central Única dos Trabalhadores e 15 anos da

implementação da política de cotas segue como um grande desafio para o conjunto

da CUT assumir uma plataforma feminista capaz de transformar a realidade da

classe trabalhadora e, em particular, a vida das mulheres. Apresentamos, assim, uma

plataforma para as mulheres que possa ser um eixo orientador para a construção e

fortalecimento de políticas que avancem neste sentido, a partir de ações no mundo

sindical, no mercado de trabalho e na sociedade.” (12ª PLENÁRIA

NACIONAL DA CUT,2008 p.54)

No 10º CONCUT, em 2009, de 15 membros da Executiva Nacional, 6 eram mulheres

(40%) e 9 homens. Na Diretoria Executiva de 12 pessoas, 2 eram mulheres (16,66%), para 10

homens. Somando toda a direção executiva nacional temos um total de 27, em que 8 são

mulheres, totalizando apenas 29,62%, e o restante de homens, que sequer chega a alcançar a

cota de 30%. A falta de efetividade da política de cotas não passa sem ser notada nos

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documentos oficiais da entidade.(RESOLUÇÕES DO 10º CONCUT, 2009) Dois anos após

este congresso, na Plenária nacional da CUT de 2011 podemos encontrar o seguinte trecho

que enfatiza a necessidade de garantia desta política:

“Avançar na organização das mulheres trabalhadoras CUTistas, garantindo as cotas

de gênero de no mínimo 30% em todos os espaços da Central: nas direções

nacionais, estaduais, em atividades de formação, de representação e de delegação.

Atualizar o debate de cotas com o objetivo de criar mecanismos que garantam a

plena aplicação desse critério como também garantir a presença e a manutenção das

mulheres CUTistas em todos os espaços. Ampliar essa política em todas as

estruturas horizontais e verticais e exigir que seja cumprida como princípio

estatutário.” (13ª PLENÁRIA NACIONAL DA CUT, 20011 p.58)

Por fim, no último congresso analisado, o de 2012, em que ocorreu o 11º CONCUT,

que prevê o triênio 2012-2015, é aprovada a paridade (RESOLUÇÕES DO 11º CONCUT,

2012). Contudo, das 22 pessoas que foram eleitas para a Executiva Nacional da CUT neste

anos, apenas 7 eram mulheres (31,81%), para 15 homens. Na Diretoria Executiva, de 9

eleitos, 2 eram mulheres (22,22%) e 7 homens. De um total de 31 cadeiras de toda a direção

executiva eleita neste congresso, apenas 9 foram ocupadas por mulheres, gerando um total de

29,03%, que não alcança sequer a cota anterior de 30%, e nem se aproxima da paridade

aprovada neste ano. A análise destes dados faz perceber a dificuldade de inserir mulheres

efetivamente nas direções sindicais. Nas resoluções da plenária nacional da CUT de 2014 –

dois anos após o último CONCUT analisado - é possível encontrar o seguinte trecho que

reforça esta afirmação:

“Atuar para eliminar práticas que excluem ou dificultam a participação de mulheres

no movimento sindical, tais como machismo e horário de reuniões e colocar em

prática políticas para incentivar a participação de mulheres nos lugares de decisão e

representação e dar-lhes apoio material e político à sua organização. É necessário

que a CUT e seus sindicatos filiados, viabilizem creches para que os/as participantes

possam fazer parte das diversas atividades sindicais, auxiliando os mesmos na

aquisição do conhecimento e crescimento social e político-sindical.”(14ª

PLENÁRIA NACIONAL DA CUT, p.49)

5. CONCLUSÃO

Vimos inicialmente a discussão teórica ampla sobre a divisão social do espaço entre o

público e o privado, bem definido por Okin (2008), em que mulheres estão historicamente

relacionadas ao espaço privado, enquanto homens estão no espaço público. Isto assim

definido, é possível perceber a discussão que se entrelaça a este debate: o da divisão sexual do

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trabalho. Apresentado de maneira central nas obras de Kergoat, 2009; Melo e Castilho, 2009;

Saffioti, 2015; Araújo, 2011, em que mulheres estão majoritariamente associadas a trabalhos

de reprodução, cuidados e muitas vezes invisíveis, enquanto homens ficam a cargo de

trabalhos de produção e com visibilidade.

Foi apresentado também através de Araújo (2011) que estas estruturas sociais

causaram ao longo do curso da história a baixa participação política das mulheres. Uma vez

que a inserção na vida pública – já dificultada por toda a estrutura apresentada nos conceitos

de divisão sexual do trabalho e divisão social do espaço entre público e privado – também

está condicionada a uma determinação social em que agentes públicos devem estar alheios a

tarefas e preocupações do ambiente privado, destinadas historicamente às mulheres.

Observamos no capítulo 3 que o crescimento da taxa de ocupação no Brasil de 2003-2014 foi

proporcionalmente maior entre as mulheres do que entre os homens. Ao longo da análise

documental explicitada no capítulo 4 foi possível perceber uma determinação da entidade em

elaborar políticas internas que problematizem a questão da participação das mulheres nos

espaços da CUT, porém uma nítida dificuldade de implementar tais políticas.

Apesar de aprovações de cota estatutária de 30% em 2008 e paridade em 2012, é

possível perceber que a CUT em 2003 tinha em sua direção executiva nacional um total de

35,48% de mulheres, enquanto em 2012, teve 29,03% da direção executiva nacional composta

por mulheres e sequer alcançou o patamar de cota de 30%. Houve, apesar da criação de

mecanismos institucionais para diminuir a desigualdade de participação das mulheres nos

cargos de direção da entidade, um aumento desta desigualdade.

Percebe-se, portanto, no período analisado, um crescimento das mulheres ocupadas no

mercado de trabalho, ao mesmo tempo em que há uma crescente produção de políticas para

maior participação feminina na CUT – mesmo que não estabelecida nitidamente a relação

desses dois fatores- contudo, na realidade prática, há uma diminuição da participação de

mulheres na diretoria da central sindical. Uma das hipóteses para este fenômeno -baseado nos

textos apresentados nos congressos e plenárias da CUT- é de que as duplas jornadas, e a falta

de condições para que as mulheres possam viver a vida pública impedem que elas tenham

capacidade plena de exercer suas funções políticas. Ou seja, mesmo com a criação de

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mecanismos que busquem aumentar tal participação, a realidade estrutural do trabalho

feminino no Brasil não permite que elas tenham pleno acesso e direito à atuação política. É

uma necessidade ainda investigar quais foram os trabalhos em que houve maior inserção das

mulheres no período pesquisado e atualizar o debate acerca da realidade do trabalho feminino

no Brasil, bem como aprofundar através de estudos e entrevistas, os debates sobre a realidade

da mulher no meio sindical.

REFEÊNCIAS

11ª PLENÁRIA NACIONAL DA CUT, Resoluções da. 2005. Disponível em:

<fhttp://cedoc.cut.org.br/cedoc/resolucoes-de-plenarias/122> acesso em: 03/07/2017

12ª PLENÁRIA NACIONAL DA CUT, Resoluções da. 2008. Disponível em:

<http://cedoc.cut.org.br/cedoc/resolucoes-de-plenarias/123 > acesso em 03/07/2017

13ª PLENÁRIA NACIONAL DA CUT, Resoluções da. 2011. Disponível em:

<http://cedoc.cut.org.br/cedoc/resolucoes-de-plenarias/124 > acesso em: 03/07/2017

14ª PLENÁRIA NACIONAL DA CUT, Resoluções da. 2014. Disponível em:

<http://cedoc.cut.org.br/cedoc/resolucoes-de-plenarias/125> acesso em: 03/07/2017

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Women and Unionism: The relations of inequality in Unions

Abstract: This article analyses one of the central questions of the inequalities which white

and black women face – to different degrees – in society: rare female participation in politics

Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos), Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X

and in positions of power. In the twenty-first century, capitalist and patriarchal society still

places obstacles to the full exercise of access to power by women. The world of labor is no

different. Female workers, engaged in feminist and trade union struggles, have fought arduous

battles within the trade union movement to have their specific demands related to the

conciliation of work, family, and the sharing of officer positions in trade unions. This research

analyses the participation of women in one of the principal Brazilian trade unions

organizations: the Single Trade Union Congress (Central Única dos Trabalhadores – CUT)

between 2003 and 2014. A succinct diagnosis will be made of paid female labor in the period,

using data from the National Household Sample Survey (PNAD). The political engagement of

these workers in trade unionism will be researched through documentation, minutes, congress

resolutions, and the national plenaries of CUT. The central variable of analysis is the division

between men and women in officer positions of the entity.

Keywords: women, labor, trade unionism, leadership positions.