Fundamentos do sindicalismo 1858 1930
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Fundamentos da luta sindical
Mirza Pellicciotta
1858/1930
Em seu curso, o Brasil viu nascer às
primeiras indústrias metalúrgicas e
manufatureiras como a fabrica de ferro de
Sorocaba (1801), a fabrica de armas de
Minas (1811), a indústria Mauá, em Niterói
(1845).
Uma vagarosa industrialização se
estendeu por todo o século XIX...
Em 1851, havia cerca de 200
estabelecimentos indústrias, entre
fábricas de tecidos, alimentação,
metalurgia e produtos químicos.
Em 1889, contabilizava-se mais de 500
estabelecimentos industriais
De 1890 a 1895 seriam fundadas mais
425 fábricas
normas internas:
início do trabalho ao nascer do sol, almoço das 8 às 8 e meia,
jantar ao meio-dia, e mais trabalho até depois do sol posto –
hora e meia além durante o verão e uma hora no inverno... e
―que cada um trabalhe conforme as suas forças e préstimo‖.
―O regime na fábrica era tão ou mais severo que no campo, sob
pena dos mesmos castigos físicos. Os escravos trabalhavam até
14 horas por dia junto ao alto-forno, que é o inferno na terra‖
Num requerimento de 1828 enviado ao governo provincial, um
grupo de escravos - com algum letramento - afirmava: ―...nos é
penoso trabalharmos sem falha do serviço só por moléstia, e
não recebermos os munícios que nos é prometido, tem sucedido
pararmos semanas inteiras sem comermos e continuando
sempre o serviço‖.
No mesmo requerimento, os escravos listavam a cota de feijão,
toucinho e carne a que tinham direito e denunciavam que não
recebiam cobertores novos havia oito ou nove anos.
―Raras vezes algum administrador reclamou que os cativos
fossem incapazes ou inadaptados e por isso prejudicassem a
produção‖.
Em 1821, 66 escravos, com diferentes ofícios,
trabalhavam na Fábrica de Ferro São João de
Ipanema, entre eles: Antonio Francisco, idade
estimada de 28 anos, refinador e fundidor;
Salvador dos Santos, 25 anos presumíveis,
moldador; José de Santa Anna, 12 anos,
aprendiz de ferreiro.
historiador Mário Danieli Neto
Fábrica de Ferro São João de Ipanema, Sorocaba (1801)
A classe operária brasileira se forma...
....em meio a uma lenta e gradual transformação social,
econômica, política... que pouco a pouco imprime
fundamentos urbanos e industriais numa sociedade rural e
escravocrata
Independência
política do Brasil
(1822)
fim do tráfico de
escravos (1850)
abolição da escravatura
(1888)
acumulação de capital no interior de
um novo complexo agro-industrial, a
cafeicultura
imigração em massa (a partir da
República)
Fábrica de Cerveja Poço Rico, 1881, criada
por Herr Kunz, na colonia de São Pedro, MG
Fábrica Otto e Irmão, MG
Nas proximidades da ferrovia D. Pedro II, década de 1880, RJ
Henrique Surerus e Irmãos, artigos de construção, oficina,
serraria e fábrica de carroças, 1886, MG
Estes imigrantes vão desempenhar
um papel central na introdução de
idéias socialistas no Brasil e na
criação das primeiras associações
de classe
http://www.youtube.com/watch?v=qh3H8mtFe6U
... começam a chegar ao Brasil (em
maior parte, na província/Estado de
São Paulo, no início da República)
fugindo da perseguição política ou
da miséria que na Europa
ameaçavam os trabalhadores,
principalmente aqueles que
tivessem participação ativa nas lutas
sociais.
Trabalhadores assalariados
e escravos italianos, espanhóis e portugueses, além
de alemães, russos, suíços e de outras
nacionalidades
Tecelagem Bernardo Mascarenhas, 1889
Fábrica de Louças Santa Catharina, em 1913
Fábrica de Sabão Unilever
Em 1889, começa a industrialização do Brás. Na antiga "Chácara do Menezes" seria instalada a fábrica
"Sant'Anna", pertencente à "Companhia N. de T. de Juta" cujo proprietário era o fazendeiro Antonio Alvares
Penteado. Foram erguidos, na Rua Flórida - na verdade uma travessa que unia a Rua (de) Monsenhor
Andrade ao leito da estrada de ferro São Paulo Railway - diversos salões assobradados e galpões contando,
inicialmente, com 12 mil m2 de área construída e, posteriormente, chegando à cerca de 45 mil m2. A
proximidade com a ferrovia tinha uma razão prática: facilitar o embarque e o desembarque de mercadorias .
Alguns anos depois, com a ampliação dos serviços de transporte público – via bondes – uma linha iria ligar a
fábrica à cidade. Seria uma das maiores tecelagens da época. Seus motores hidráulicos eram propulsionados
por água advinda de reservatórios localizados a quatro quilômetros de distância, então em áreas periféricas,
situadas na atual Moóca. A fábrica produzia, em seus albores, aniagens, lonas cobertores, tapetes, baixeiros,
etc. – destinados ao consumo interno - com juta importada da Índia, via Inglaterra. Trabalhavam nela por volta
de 800 operários que eram, já no começo, majoritariamente italianos.
Por volta de 1898, o proprietário fez construir, em área contígua, novos pavilhões onde foi instalada também
outra tecelagem que ocupou mais 150 operários. Chegou a fabricar, nessa época, tecidos de lã, cuja matéria
prima era importada diretamente da Europa.
―questão social como caso de polícia‖
em 1907, contabiliza-se 3.258
estabelecimentos industriais no Brasil,
empregando 15.841 operários (33% no
Rio de Janeiro, 16% em São Paulo e
15% no Rio Grande do Sul) 4% na indústria de madeira,
3,5% em vestuário e 3% na
metalurgia. posições mantidas
nas décadas seguintes
10% em produtos químicos
15% na alimentação
60% na indústria têxtil
A hegemonia industrial do Rio de Janeiro cederia para
São Paulo no período entre 1920-1938.
1858: tipógrafos do Rio de Janeiro fazem a primeira
greve contra as injustiças patronais reivindicando
aumentos salariais
1892: empregados se unem no I
Congresso Socialista Brasileiro com o
objetivo de criar o Partido Socialista
Brasileiro, que tem vida efêmera
1902: sob a influência de Marx e Engels
empregados se unem no II Congresso Socialista
Brasileiro . Surge, em São Paulo, o segundo
Partido Socialista Brasileiro. Daí em diante,
surgiram outros partidos, todos com vida curta.
1906: I Congresso Operário Brasileiro - 32
delegados (maioria de São Paulo e Rio de
Janeiro) lançam as bases para a fundação da
Confederação Operária Brasileira (C.O.B.).
Congresso com duas tendências: Anarco-
Sindicalismo e Socialismo Reformista
Sindicalismo
construção de uma perspectiva de
autonomia pelos trabalhadores
construção de uma cultura alternativa operária
fundada na liberdade, na igualdade e na
solidariedade - valores contrapostos ao capitalismo
e caros a um projeto de socialismo libertário
―O anarquismo não visa
apenas a emancipar os
trabalhadores, pretende
emancipar os homens‖
Socialismo reformista: propõe uma transformação
gradativa da sociedade
capitalista através da
organização dos trabalhadores
em partidos; integra as lutas
parlamentares
Anarquismo: começa a se desenvolver
entre 1906 e se mantém forte
até 1924.
Sindicatos Amarelos: lideranças sindicais que
conciliavam com o Estado,
mostrando-se obedientes à
ordem burguesa, mesmo que
a frente de categorias
combativas (ferroviários,
marítimos)
Anarco-Sindicalismo: em lugar da luta política, a luta
dentro da fábrica; luta por ação
direta. A greve seria tomada
como efrentamento da ordem
capitalista, em si mesma,
rejeitando a necessidade de
partido político pela classe
operária. Viam nos sindicatos o
modelo de organização para a
sociedade anarquista
Emma Goldman, Militante anarquista russa,
migrou para os EUA em 1882 e acompanhou o
movimento operário pelas oito horas de trabalho;
foi presa e deportada.
Edgard Leuenroth
Francisco Ferrer,
inspirador de uma
educação libertária,
aplicada nas ―Escolas
Modernas‖
Domingos Passos
(União dos Operários em
Construcção Civil,/RJ):
grande referência da
militância libertária e
social do período
Extensa produção de material impresso. Jornais como A Pátria (RJ), A
Vida (RJ), A Luta (RS), O Libertário (SP), O Despertar (RJ), A Plebe
(SP), Voz do Povo (PE), Vanguarda (SP), A Lanterna (SP), e revistas
como Kurtur (RJ), Renascença (SP), Remodelações (RJ) e Revista
Liberal (RS) remontam à numerosa atuação dos anarquistas no âmbito
da divulgação de suas idéias. No campo da literatura ainda aparecem,
Edgar Leunroth, Fábio Luz (autor dos livros ―Os emancipados‖ e ―O
ideólogo‖, 1906) e especialmente Lima Barreto.
Anarquismo
Estas lutas custaram a muitos trabalhadores a prisão, deportação e a morte.
Lutas e algumas vitórias
contra o trabalho infantil, a
favor de salários iguais
para homens e mulheres e
pela construção de
creches.
Anarco sindicalismo / Sindicalismo revolucionário:auto-organização e autonomia + estratégia de ação direta coletiva +
recusa a formação de burocracias sindicais e sujeição de lutas
operárias a interesses exteriores a dos trabalhadores.
Conquista de alguns
direitos básicos como a
liberdade de expressão e
organização dos
trabalhadores
vitórias expressivas no campo
econômico (aumentos salariais,
redução do horário de trabalho, maior
segurança, limitação do trabalho
infantil, etc.)
Lutas e algumas vitórias contra
a carestia de vida, aumento de
aluguéis, falsificação dos
gêneros alimentícios,
promoverm escolas livres nos
sindicatos, organizam debates
sistemáticos sobre temas como livre-
pensamento, combate ao alcoolismo,
a situação da mulher. Realizam
festivais de solidariedade e
representações de teatro social,
criam centros de cultura
II Congresso Operário (1912) tem
como presidente honorário o próprio
presidente da República Sr. Hermes
da Fonseca.
III Congresso Operário
(1920): intenção de reavivar a
Confederação Operária
Brasileira
A Primeira Guerra Mundial (1914-
1918) dá grande impulso à indústria
nacional, com a diminuição da
importação dos países envolvidos no
conflito e também com a diminuição
da concorrência estrangeira, devido à
forte queda do câmbio
Governo tenta controlar
o movimento sindical a
partir da década de 1910
De 1917 a 1920,
houve grande
quantidade de greves
em várias cidades e
Estados
Greve de 1917 SPGreve de
1918/1919 RJ
Greve de 1906/RS
Federação Operária do
Rio Grande do Sul.
F. Matarazzo & Cia.: 1 e 2) Moinho de Trigo; 3, 4 e 6) A fábrica de
algodão Mariangela; 5) Na fábrica de azeite
Morte de José Martinez, militante anarquista em SP, 07/1917
"O enterro dessa vitima da reação foi uma das mais
impressionantes demonstrações populares até então verificadas
em São Paulo. Partindo o féretro da rua Caetano Pinto, no Brás,
estendeu-se o cortejo, como um oceano humano, por toda a
avenida Rangel Pestana até a então Ladeira do Carmo em
caminho da Cidade, sob um silencio impressionante, que
assumiu o aspecto de uma advertência. Foram percorridas as
principais ruas do centro. Debalde a Policia cercava os
encontros de ruas. A multidão ia rompendo todos os cordões,
prosseguindo sua impetuosa marca até o cemitério. À beira da
sepultura revezaram os oradores, em indignadas manifestações
de repulsa à reação (...) No regresso do cemitério, uma parte da
multidão reuniu-se em comício na Praça da Sé; a outra parte
desceu para o Brás, até à rua Caetano Pinto, onde, em frente à
casa da familia do operário assassinado, foi realizado outro
comício."—Edgard Leuenroth[1]
http://www.youtube.com/watch?v=LuyozCk93VM&feature=related
http://www.youtube.com/watch?v=6wTNxqBbsCc&feature=related
Os representantes das ligas operárias, das corporações em greve e das associações político-sociais que compõem o Comitê de Defesa Proletária, reunidos na noite de 11 de junho, depois de consultadas as entidades de que fazem parte, expondo as aspirações de toda a população angustiada por prementes necessidades; considerando a insuficiência do Estado no providenciar de outra forma que não seja pela repressão violenta, tornam públicos os fins imediatos que a atual agitação se propõe, formulando da maneira que segue as condições de trabalho que, oportunamente, serão examinadas nos seus detalhes:
1º - Que sejam postas em liberdade todas as pessoas detidas por motivo de grave;2º - Que seja respeitado do modo mais absoluto o direito de associação para os trabalhadores;3º - Que nenhum operário seja dispensado por haver participado ativa e ostensivamente no movimento grevista;4º - Que seja abolida de fato a exploração do trabalho de menores de 14 anos nas fábricas, oficinas etc.;5º - Que os trabalhadores com menos de 18 anos não sejam ocupados em trabalhos noturnos;6º - Que seja abolido o trabalho noturno das mulheres;7º - Aumento de 35% nos salários inferiores a 5$000 e de 25% para os mais elevados;8º - Que o pagamento dos salários seja efetuado pontualmente, cada 15 dias, e, o mais tardar, 5 dias após o vencimento;9º - Que seja garantido aos operários trabalho permanente;10º - Jornada de oito horas e semana inglesa;11º - Aumento de 50% em todo o trabalho extraordinário.
1917, SP
Mesmo sob influencia da Revolução Russa, que apontava o caminho da organização do proletariado enquanto partido político
independente, a greve de 1917 em São Paulo representou o ápice do anarquismo no movimento operário brasileiro.
Manifestação operária em 1º de Maio de 1919 no Rio de
Janeiro. Reproduzida da Revista da Semana, 10 de maio de
1919
1918/1919, RJ
mas não conseguiu penetrar de forma mais profunda
no mundo do trabalho brasileiro
O anarco-sindicalismo exerceu papel muito
importante ....
nas especificidades
das regiões
interioranas
no enfrentamento das
questões étnicas que
sujeitavam os
trabalhadores negros a
uma maior exploração e
dominação)
na manutenção - de forma
continua – de uma
associação e coordenação
confederada do movimento
seu projeto social organizativo
sucumbiria à violência repressiva
(em especial, do governo Artur
Bernardes), a perda de poder dos
sindicatos e a expansão dos
fundamentos comunistas, no curso
dos anos 1920
Entre 1871 e 1920, 3.390.000 imigrantes
chegam ao Brasil. 1.373.000 são
italianos, 901.000 portugueses e 500.000
espanhóis. A maioria se estabelece na
área agricultura Província/ Estado de São
Paulo, mas grandes parcelas buscam os
grandes centros urbanos e sua nascente
industrialização (em parte financiada
pelos próprios fazendeiros)
Em 1922, sob influência da Revolução Russa,
alguns dissidentes do Anarco-Sindicalismo
fundam o PCB - Partido Comunista Brasileiro.
O partido seria mantido na ilegalidade, mas
permaneceria editando a revista Movimento
Comunista, Manifesto Comunista e a partir de
1925 o jornal A Classe Operária, (com tiragem
inicial de 5.000 exemplares).
Para o PCB, as lutas operárias se constituiam, boa
medida, espontâneas e isoladas; os trabalhadores
possuiam a necessidade de contar com um centro
coordenador, uma direção política, que só um
partido independente de classe poderia imprimir ia a
todo o movimento.
A onda de terror desencadeada pelo Estado e pelos
empresários mostrava que o anarquismo e o
socialismo reformista – que direcionavam o
movimento operário –eram incapazes de oferecer
uma saída aos problemas, isto é, transformar as
lutas de fundo econômico e as mobilizações
espontâneas num movimento político organizado.
Partido revolucionário
Para Astrogildo Pereira:
os movimentos ocorridos no Brasil entre 1917 e 1920 por
aumento de salários e por melhores condições de trabalho
foram influenciados pela combatividade e pela ideologia da
Revolução Russa que, segundo ele, impulsionou o
movimento operário não só no Brasil, mas em todos os
países.
O comunismo, com base na atuação de um partido revolucionário,
imprime lentamente, novas configuração às lutas operárias
Pouco tempo após ser criado
é jogado na ilegalidade. Ao
mesmo tempo, trava uma luta
político-ideológica com o
anarquismo, que condenava o
esforço do partido em unificar
as ações dos sindicatos
Em 1923, no II Congresso, expressa
sua leitura sobre a situação nacional: a
luta entre o capitalismo agrário
semifeudal e o capitalismo industrial
moderno consistiam na contradição
fundamental da sociedade brasileira
republicana
O PCB defende a formação de um Bloco Operário (frente única)
para disputar as eleições de fevereiro de 1928, procurando dar
unidade à classe operária baseada também num programa
unitário. O secretário-geral Astrojildo Pereira busca contato com
Luís Carlos Prestes, líder da Coluna e figura de grande
expressão popular, visando coordenar as ―forças em vista de
objetivos comuns‖. Em 1928, o Bloco Operário é transformado
no Bloco Operário e Camponês – BOC para ser utilizado como
alternativa legal, depois da volta à clandestinidade.
No III Congresso, (virada do ano de
1928/1929), o PCB dá continuidade à
política de unidade sindical e busca
organizar uma entidade central que unisse
todos os trabalhadores brasileiros. Num
primeiro momento são criadas
Federações Operárias Regionais em
vários estados e, em abril de 1929,
realiza-se o Congresso Sindical Nacional,
reunindo 50 organizações sindicais,
ocasião em que se funda a Confederação
Geral dos Trabalhadores do Brasil.