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Muito Além do Jardim do Bem e do Mal: Um ensaio sobre o medo, a mídia e a cidade Cláudio Cardoso de Paiva * Índice 1 Introdução ............. 1 2 Por que tanto medo? ........ 3 3 Estilhaços do cotidiano na idade mídia ............... 4 4 O medo e a ironia hipermídiatica . 6 5 Os clichês do fim do mundo na te- levisão ............... 8 6 Alteridades do medo no cinema e na televisão ............ 9 7 Perversidades e perplexidades do mundo ............... 10 8 As torres fulminadas na aldeia global 11 9 A inversão do medo no país do carnaval .............. 13 10 O medo tupiniquim e a ira antro- pofágica .............. 14 11 O som e a fúria e das massas no cotidiano da cidade ........ 15 12 Estado da arte tecnológica sobre o medo ................ 19 13 Referências Bibliográficas .... 20 Resumo Um estudo sobre o medo e a cidade no con- texto da mídia é pertinente por várias razões: * Professor adjunto do Departamento de Comuni- cação - UFPB Cria a oportunidade de atualizarmos uma re- flexão acerca do modo como os meios de co- municação estruturam o imaginário. Leva a pensar porque as imagens e figuras do social não cessam de estruturar a imaginação mi- diática. Sinaliza os caminhos para um debate sobre o simbolismo das sensações, afetos e sentimentos, que irradiam uma estética do medo no século XXI. Instiga a discutirmos como os atores sociais (e suas tribos) encon- tram modos de identificação face às imagens e figuras do medo. E alerta para as alterida- des do medo, pela via da coragem e da es- perança, mas também do humor e da ironia. Tudo isso se exibe fartamente nas mídias im- pressas, visuais e sonoras, exigindo o rigor de novas leituras e interpretações. 1 Introdução O título deste texto deve funcionar como uma espécie de epígrafe, cujas idéias gerais se desdobram em várias referências do ci- nema, televisão, artes e invenções do cotidi- ano. Inicialmente, fazemos uma alusão ao filme norte-americano O videota, Muito além do jardim (Hal Ashby, 1979), que coloca em cena, um jardineiro solitário (na pele do ator Peter Sellers). As suas formas de contato

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Muito Além do Jardim do Bem e do Mal:Um ensaio sobre o medo, a mídia e a cidade

Cláudio Cardoso de Paiva∗

Índice

1 Introdução. . . . . . . . . . . . . 12 Por que tanto medo?. . . . . . . . 33 Estilhaços do cotidiano na idade

mídia . . . . . . . . . . . . . . . 44 O medo e a ironia hipermídiatica. 65 Os clichês do fim do mundo na te-

levisão . . . . . . . . . . . . . . . 86 Alteridades do medo no cinema e

na televisão . . . . . . . . . . . . 97 Perversidades e perplexidades do

mundo . . . . . . . . . . . . . . . 108 As torres fulminadas na aldeia global119 A inversão do medo no país do

carnaval . . . . . . . . . . . . . . 1310 O medo tupiniquim e a ira antro-

pofágica . . . . . . . . . . . . . . 1411 O som e a fúria e das massas no

cotidiano da cidade. . . . . . . . 1512 Estado da arte tecnológica sobre o

medo. . . . . . . . . . . . . . . . 1913 Referências Bibliográficas. . . . 20

Resumo

Um estudo sobre o medo e a cidade no con-texto da mídia é pertinente por várias razões:

∗Professor adjunto do Departamento de Comuni-cação - UFPB

Cria a oportunidade de atualizarmos uma re-flexão acerca do modo como os meios de co-municação estruturam o imaginário. Leva apensar porque as imagens e figuras do socialnão cessam de estruturar a imaginação mi-diática. Sinaliza os caminhos para um debatesobre o simbolismo das sensações, afetos esentimentos, que irradiam uma estética domedo no século XXI. Instiga a discutirmoscomo os atores sociais (e suas tribos) encon-tram modos de identificação face às imagense figuras do medo. E alerta para as alterida-des do medo, pela via da coragem e da es-perança, mas também do humor e da ironia.Tudo isso se exibe fartamente nas mídias im-pressas, visuais e sonoras, exigindo o rigorde novas leituras e interpretações.

1 Introdução

O título deste texto deve funcionar comouma espécie de epígrafe, cujas idéias geraisse desdobram em várias referências do ci-nema, televisão, artes e invenções do cotidi-ano.

Inicialmente, fazemos uma alusão ao filmenorte-americanoO videota, Muito além dojardim (Hal Ashby, 1979), que coloca emcena, um jardineiro solitário (na pele do atorPeter Sellers). As suas formas de contato

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com o mundo real se fazem por meio da te-levisão, a sua experiência social é quase nulae o seu repertório lingüístico e imagináriose organiza a partir do universo limitado dojardim em que trabalha. Após um acidente,por acaso, as suas idéias servirão como ferra-mentas de consultoria para os políticos pro-fissionais, ligados ao Presidente dos Esta-dos Unidos.O videotatem traços psicológi-cos do personagem do romanceO Idiota, deDostoiévsky, sua impureza é dissonante emmeio à trama social de Nova Iorque e elaborasuas idéias sobre política, de modo poucoconvencional. Isto impressiona um amigodo Presidente, que perde o medo da mortequando passa a encarar a vida por uma ou-tra perspectiva. O filme interessa na medidaem que as suas imagens instigam a uma lei-tura da condição humana na civilização pós-industrial. Ali se inscreve um estilo de vidaintimista e se exibem as formas de estranha-mento do Ser numa polis que assume as apa-rências hostis de um labirinto.O videotanosserve de pretexto para a sustentação de umargumento - a partir de registros inusitados -sobre a solidão, a mídia e o medo na cidade.

Em seguida, relembramos uma análise crí-tica da televisão, no livroMuito Além do Jar-dim Botânico, de Carlos Eduardo Lins daSilva (1985). O autor, com o pretexto de es-tudar a audiência do Jornal Nacional da RedeGlobo, composta pelos trabalhadores rurais,mostra como o Brasil real é mais complexodo que aquele simulado pelo telejornal daRede Globo, cuja sede se situa no bairro doJardim Botânico, no Rio de Janeiro. O li-vro de Lins da Silva mostra os diferentes ti-pos de mediação das mensagens realizadaspelos habitantes de uma pequena cidade dointerior paulista. Seu texto é pertinente por-que remete a uma outra visão da cidade (e do

país) no contexto da “aldeia global” e discuteo modo como interagem os indivíduos e gru-pos, longe da realidade forjada pela indústriacultural do Jardim Botânico.

Encontramos inspiração para o nosso temano filme Meia noite no jardim do bem e domal (Jim Williams, 1997), uma película queassume a forma de alegoria para descreveruma cidade no sul dos Estados Unidos, habi-tada pelos personagens de um contexto quebeira o realismo fantástico. Um jornalistachega a cidade para cobrir a tradicional festade natal na mansão de um milionário, mas ascoisas tomam um rumo diferente quando oanfitrião (na pele de Kevin Spacey), mata oseu amante no calor da noite. O filme, ani-mado por uma estética da cultura pop, servede pretexto para uma contemplação do co-tidiano dos indivíduos, cujo imaginário seorganiza a partir de um código de morali-dade alternativa. Ali se inscrevem formasestranhas de subjetividade e de tribalização,num universo marcado pela excentricidade.Neste ambiente, um transeunte passeia noparque com a coleira do seu cão imaginário,um outro circula feliz pela cidade acompa-nhado pelas suas moscas de estimação. Tra-vestis, debutantes e feiticeiras se confrater-nizam, exercendo suas liberdades individu-ais e o direito à diferença, num mundo queparece de cabeça para baixo. Espantando omedo e a melancolia, o segredo da narrativaconsiste em fisgar a atenção do espectadorpelo viés do absurdo, da ironia e da carnava-lização, como uma estratégia de negação domedo da morte e afirmação da vida.

Finalmente, a acepção nietzscheana explí-cita na obraPara além do bem e do mal(Ni-etzsche, 1885/86) parece-nos aqui estimu-lantemente provocante como um “insight”para refletirmos sobre os códigos de conver-

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sação e de conduta, os tipos de exclusão einteração social e os estilos prevalentes demoralidade, numa civilização cujos procedi-mentos éticos se esgarçaram e já não podemgarantir a segurança, o conforto e a tranqüi-lidade dos cidadãos.

Um olhar apressado, não percebe afinida-des entre esses diferentes tipos de narrati-vas que enunciamos. Entretanto, partindo deum recurso aparentemente aleatório, perce-bemos uma certa regularidade discursiva en-tre elementos que se mostram díspares, masque nos levam a pensar sobre os níveis dealienação, retraimento e exclusão dos atoressociais em meio à desordem do mundo atual.A aproximação entre as instâncias aparente-mente incongruentes nos alerta para perce-bermos os estilos de existência e de vincu-lação comunitária numa paisagem insólita,marcada pela injustiça e segregação. A jus-taposição dessas experiências recolhidas “aoacaso” incita-nos a observarmos como fun-cionam - por meio de diferentes registros -as estratégias de sobrevivência, comunica-ção e sociabilidade, num ambiente minadopela solidão, insegurança geral, violência ur-bana e medo globalizado.

2 Por que tanto medo?

O desafio que se impõe aqui é examinar asformas que o medo assume na era das cultu-ras neoliberais ou globalizadas. E em tempo,relembramos que tratando das questões dosexo, o filósofo Michel Foucault, no livroAordem do discurso(1971), dizia que quandofalamos demais sobre alguma coisa é porquea coisa não está mais lá. Neste sentido, pa-rece de bom agouro dedicar uma argumen-tação sobre o medo, senão para esconjurá-lo ou exorcizá-lo, mas para explorar as suas

modulações, suas alteridades, os seus níveisde contágio e de irradiação, ou ainda paraperceber os seus efeitos afirmativos e regres-sivos.

Este texto originalmente consiste na ver-são escrita e atualizada de uma fala arti-culada no colóquio intituladoO medo e acultura, realizado no primeiro semestre de2003, pela Faculdade de Comunicação daUFPB, por iniciativa do sociólogo Welling-ton Pereira. Tal iniciativa se mostrava entãoprovocante e apropriada, quando a nossa tra-gédia cotidiana aparecia amenizada pela pro-pagação dos discursos de esperança, na es-teira dos novos processos de gestão na Pre-sidência da República, após a eleição de umrepresentante das classes trabalhadoras.

Sem pessimismo, nem ressentimento, masao contrário, examinando as dobras do ladode dentro e do lado de fora do medo, um de-bate sobreO medo e a culturaé oportunona partilha de idéias e argumentações, queem última instância podem servir para apro-ximar um pouco as nossas fronteiras, de olhonas frestas do amor ao próximo, do altruísmoe da solidariedade.

Coincidentemente, o projeto de Ri-cardo Freitas e Rafael Nacif (professores-pesquisadores da UERJ), empenhado emapreciar os temas referentes àComunicaçãoe Cidade, numa perspectiva multidisplinar,constitui uma estratégia inteligente por vá-rios motivos:

Primeiramente porque sinaliza novas di-reções e estratégias para compreendermos aforma e o sentido das subjetividades e soci-abilidades experimentadas pelos indivíduose tribos no ambiente das cidades no séculoXXI, que se caracterizam pelas marcas deum passado recente - dos militares a Col-lor - pleno de crises, contradições e resistên-

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cias. O presente é marcado pela emergênciade novos acontecimentos locais e globais quedesenham uma imagem assustadora do fu-turo. Mas é interessante perceber nesse con-texto, que historicamente todos os sustos esurtos cotidianos sempre foram, assistemati-camente, driblados pelas multidões solitáriasque souberam reinventar engenhosamente assuas experiências vivenciais.

Uma mirada sobrea comunicação e a ci-dade, é relevante porque cria a oportunidadede definirmos os termos de um debate acercados atos de fala, enunciados e ações, comoformações discursivas e processos de signi-ficação, que abrem espaços para uma inter-pretação das práticas sociais, políticas e cul-turais, com tudo que elas têm de provisó-rio, nômade e transitório. Faz-se necessária aeleição de categorias mais modestas (e dinâ-micas) para uma investigação do cotidiano -e nessa direção - acidadeaparece como umacategoria que talvez possa, mesmo proviso-riamente, indicar as pistas, indícios e sinaispara uma apreensão do sentido de uma histó-ria do cotidiano. Suspeitamos que essa podeser uma estratégia inteligente para decifrar-mos a alma atômica dos indivíduos e tribosdispersos na imensidão das cartografias ur-banas.

Desde o período colonial, passando peloBrasil Imperial e pela República até os nos-sos dias, considerando-se as tensões e confli-tos urbanos, são inúmeras as formas de resis-tência e enfrentamento das crises. Passandopela revoltas coloniais, Conjuração Mineira,Palmares, Canudos e os diversos modos deresistência ao autoritarismo até hoje, no Mo-vimento dos Sem Terra, encontramos modosinéditos de lutas sociais, formas distintas dedesterritorialização e reterritorialização quedefinem os estilos de nossa urbanidade e mo-

dernização. Tudo isso se presta a um en-foque que se nutre das experiências triviaisdo cotidiano, ou seja, dos fatos corriqueirosque, em sua aparente banalidade nos permi-tem descrever os domínios de uma comuni-cação em interface com uma antropologia ur-bana (isto é, com o homem, seus modos devida, trabalho, linguagem e sua condição nosespaços da grande cidade). Logo, seguimosas pistas deixadas historicamente pelas ex-periências urbanas e as contextualizamos nocampo formado pelos meios de comunica-ção, colocando em perspectiva o homem, acidade e a luta.

Um eixo temático abrangendo aComuni-cação e a Cidadeinstaura a oportunidadepara atualizarmos as noções de região, terri-tório, nação, identidade, cidadania entre ou-tras, que podem ser rediscutidas no contextodos processos midiáticos e comunicacionais.

Quando a mídia fabrica o acontecimento,redefinindo o que é público e o que é privado,mostra-se estratégico reterritorializar as no-ções de cidade (e de cidadania) e isto - desaída - implica um novo tipo de politizaçãoe participação nas ações do cotidiano. Nachamada Idade Mídia, presenciamos a inter-penetração das histórias reais e histórias fic-cionais. Isto traduz um hibridismo que ex-prime a conjugação do simbolismo das “ci-dades urbanas” (em sua concretude históricacom sangue, calor e vitalidade) e das “ci-dades imaginárias” (virtualizadas pelo rádio,cinema, televisão e internet).

Em suma, assistimos a emergência de umahiperrealidade cotidiana que apresenta no-vos desafios, exigindo novas interpretações.Neste “novo mundo”, a realidade histórica ea realidade simbólica interagem de maneiradinâmica, assinalando uma ruptura de sen-tido no que concerne ao imaginário social

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contemporâneo, que se mostra bem distintodo imaginário de pelo menos duas ou trêsgerações que nos precederam. Diante disso,cumpre examinar os tipos possíveis de iden-tificação e participação dos indivíduos e gru-pos humanos. Mudou o sentido da taba, mu-dou também o sentido da oca: na dita “era dacomunicação” (Vattimo, 1991), novas estra-tégias de ação (e de intervenção) são experi-mentadas no plano da vida pública e da vidaprivada.

3 Estilhaços do cotidiano naidade mídia

Apostamos numprincípio dialógico(Todo-rov, 1981) cuja dinâmica pode favorecer umaapreciação crítica do medo, da mídia e da ci-dade. Examinamos como as mensagens damídia, contextualizadas, podem gerar inter-venções coletivas, colocando em cheque omedo cotidiano.

Pressupomos que a mídia, genericamente,derrapa no desconcerto global, fazendo ojogo das estratégias de marketing, e assimfica presa aos esquemas de produção mas-siva e do consumo globalizado. Mas é pre-ciso reconhecer que os melhores talentos nocampo da criação estão também na mídia.Logo, convém aceitar o fato de que grandeparte das nossas artes, sensivelmente e inte-ligentemente, passa pelo crivo dos processosmidiáticos e comunicacionais.

As nossas melhores ficções seriadas - in-cluindo as telenovelas e minisséries - têm umpapel importante na formação do imagináriocoletivo. Em suas versões cômicas, épicasou trágicas a teledramaturgia coloca em cenaas experiências vivenciais dos atores sociaise suas tribos. A televisão nos faculta uma

certa visão de cidade e nos permite percebermuito além da sua mera visibilidade mate-rial. Mostra-nos a dimensão orgânica, sen-sível e vitalista do coletivo com toda a suaporção de dor e sofrimento, mas também dealegria e felicidade.

Tudo isso aparece, em diversas modula-ções, por exemplo, em telenovelas comoOFim do Mundo(Dias Gomes, 1996),Torrede Babel (Hugo de Abreu, 1998/99),OClone (Glória Perez, 2001),Porto dos Mi-lagres(Aguinaldo Silva e Ricardo Linhares,2001) eEsperança(Benedito Ruy Barbosa,2002/2003) e, nas minissériesHilda Fura-cão (Glória Perez, 1998),Chiquinha Gon-zaga (Lauro César Muniz, 1999),O Autoda Compadecida(Adriana Falcão, Guel Ar-raes e João Falcão, 1999),Aquarela do Bra-sil (Lauro César Muniz, 2000) ePresença deAnita (Manoel Carlos, 2001) entre outras.

Por sua vez, a ressurreição do cinema na-cional no Brasil, com o fim da política cul-tural do Governo Collor, é profícua tam-bém porque se realiza se debruçando sobreas chagas e flores do nosso cotidiano. En-contramos produções cinematográficas queregistram a sua importância pelo fato deredimensionar os pequenos detalhes afeti-vos e sentimentais das pessoas simples, nacomplexidade de suas atitudes perversas egenerosas, gerando narrativas e oralidadesque nos fazem redescobrir a organicidade doBrasil contemporâneo. A articulação e inter-textualidade das imagens e sons do cinematêm favorecido um desaprisionamento de fa-las, discursos e ações entre os indivíduos etribos urbanas, sem precedentes na vida cul-tural, gerando uma pedagogia eficiente pormeio dos audiovisuais.

A título de exemplificação, citaríamos al-gumas dessas produções:Central do Bra-

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sil (Walter Salles, 1998),Bicho de Sete Ca-beças(Lais Bodanzky, 2000),Cronicamenteinviável (Sérgio Bianchi, 2000),Copaca-bana (Carla Camurati, 2001),Domésticas(Nando Olival e Fernando Meirelles, 2001),Madame Satã(Karim Aïnouz, 2002),Ôni-bus 174(José Padilha, 2002),Abril despeda-çado(W. Salles 2002),Cidade de Deus(Fer-nando Meirelles, 2002) eCarandiru(HectorBabenco, 2003). São produtos da novíssimasafra do cinema, cujas imagens e sons seprestam aqui para um debate sobre o medo,a mídia e a cidade. São importantes princi-palmente porque têm a coragem de tocar nasferidas do Brasil, transformando o grotescoem sublime e instigando à formação de umanova consciência estética e afetiva do Brasil.

4 O medo e a ironiahipermídiatica

Verificamos que diversas experiências cul-turais na era da informação têm se proces-sado com agilidade e em profusão, solici-tando o rigor de olhar mais detido. Taisfatos têm modificado consideravelmente ocontexto das tramas da realidade histórica,simbolicamente e nos diferentes níveis daação pragmática. As noções de tempo, es-paço, beleza, justiça, transcendência, ação eparticipação social hoje têm um sentido dis-tinto daquelas que vigoraram há duas ou trêsdécadas, o que exige uma reflexão mais apu-rada.

O regime dos afetos, as formas da ira, sim-patia, rebeldia e participação se projetam nasnarrativas dos audiovisuais, do cinema con-temporâneo e da televisão, enunciando umanova estética da cidade, que demanda a ado-

ção de uma razão sensível a essas formasemergentes.

Para desvelarmos o sentido das novas ex-periências que afloram na materialidade docotidiano, convém recorrer a alguns auto-res, cujas noções e conceitos podem nos aju-dar na fundamentação dos nossos discursose argumentações sobre a nova configuraçãosócio-cultural.

A reconstrução da história pelo viés dasalegorias (Benjamin, 1985), a atenção paracom as formas emergentes, a mulher, a eco-logia, a cidade (Simmel, 1989), o imaginá-rio dotado de materialidade simbólica (Ba-chelard, 1990), as raízes, os rizomas e os ter-ritórios da cultura (Deleuze, 1985 e Guattari,1991/92), as aventuras e invenções do coti-diano (Maffesoli, 1996 e Certeau, 1993), asformas da oralidade e da visibilidade (Bar-béro, 2001) e os hibridismos culturais (Can-clini, 1989) nos aparecem como pistas paradecifrar uma história do cotidiano que podeser captada pela estética dos meios de massa.Embora situados num plano de abstraçãoteórica mais rigorosa, suas releituras podemser úteis na compreensão das práticas cul-turais emergentes. Mesmo partindo de ver-tentes distintas nos campos da filosofia, dasociologia, ou da psicologia, podem forne-cer novos aportes para o diálogo intertex-tual e intersemiótico no campo da comunica-ção e suas interfaces pedagógicas, políticas esócio-culturais.

Escapando dos modelos etnocêntricos,metafísicos e positivistas, o século XX,deixou-nos o legado de uma contribuiçãomuito rica em termos de “filosofia da vidacotidiana”, preocupada no ativismo de uma“ciência com consciência”, em moldes decrítica e autocrítica dos saberes e das suas

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aplicabilidades, como escreve Edgar Morin(1998).

Os meios analógicos e digitais criaram umcenário hipermidiático, caracterizado pelasnovas redes de comunicação, que propiciamo refinamento estético na criação das formase uma nova dinâmica no campo de recepçãodos bens culturais. A nova interconexão dosmeios de comunicação nos leva a experimen-tar outros níveis de percepção, decifração eintervenção na realidade histórica. Este ce-nário, formado pelos impressos, audiovisu-ais e meios interativos, nos remete a compre-ender os indivíduos, enquanto cidadãos quese reconhecem e se identificam nas represen-tações e simulacros gerados por essas novasredes de comunicar.

Quando a cidade sente medo e se trancatristemente em seus interiores, a intercone-xão entre os discursos e narrativas da televi-são, do cinema e da internet podem levar ossujeitos formarem uma consciência crítica edescobrirem novos meios de participação darealidade objetiva. Por esse viés, na cidadeassolada pelo medo se abrem espaços para aproliferação das formas sábias de autonomia,descontração e liberdade.

Prestando atenção à polifonia da televisãoencontramos formas equivocadas de infor-mação, mas também formas lúcidas de re-presentação das visões de mundo e experiên-cias existenciais (Bakhtin, 1981). Para evi-tar mal-entendidos conviria aqui distinguir osentido do simplesmente midiático e o co-municacional. Um processo simplesmentemidiático se expressa através dos programasespetaculares e sensacionalistas, mais ligadoà lógica das atividades publicitárias e merca-dológicas que sustentam a mídia. Enquantoisso, o processo comunicacional, em sua di-mensão “lato sensu” derivado de “communi-

tas” (Sodré, 2002). Implica em ações prag-máticas que traduzem os vínculos afetivos,sensoriais e lingüísticos entre homens, gru-pos e máquinas. Mas aceitamos os ter-mos designados pelos processos midiáticos,abrangendo a criação dos autores, a perfor-mance dos meios e as estratégias de media-ção pelos usuários: assim, assumimos os ris-cos de situar a mídia num posto nobre ondese realiza a “economia de trocas simbólicas”(Bourdieu, 1974), como espaço de territori-alidade que traduz uma versão atualizada da“esfera pública” (Habermas, 1984) e comoextensão de nossas corporeidades orgânicas,sensoriais e simbólicas (McLuhan, 1974). Oque está em jogo aqui é detectar os níveis decomunicabilidade e de sociabilidade dos in-divíduos e grupos.

No contexto do “apartheid cultural” doBrasil, persiste uma divisão absurda que se-grega os consumidores dos programas dasTVs pagas e das TVs abertas, em segmentosdiferentes. Mas, conviria salientar que ge-nericamente vivenciamos o império de uma“estética do grotesco” (Sodré; Paiva, 2002),em ambas as modalidades televisivas. Sãoprocessos midáticos cujos agentes, de ma-neira populista, assumem o papel de justi-ceiros, mas reforçam as atitudes de segrega-ção, violência e medo na cidade. Nessa clas-sificação incluiríamos oPrograma do Rati-nho(SBT),Brasil Urgente(RECORD) eLi-nha Direta(Rede Globo), como exemplos deuma pedagogia às avessas, reespaldando asatitudes anômicas e excludentes.

Num sentido totalmente oposto, encon-tramos os processos comunicacionais quese distinguem pela contextualização histó-rica dos acontecimentos. Oportunamente,assinalamos alguns programas de TV, exibi-dos pela Rede Cultura, que têm provado ser

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possível criar vida inteligente na televisão.Neste sentido, destacaríamos os programasVitrine, Provocações, Roda Viva, Arte comSérgio Britto e Observatório da Imprensa(em versão analógica e digital). São propos-tas televisuais, em diferentes formatos, que -como diria Arlindo Machado (2001) - mos-tram que a televisão deve ser levada a sério.O debate, a interatividade, a crítica e a auto-crítica, característicos nestes tipos de progra-mas, asseguram a otimização de uma agendacomunicativa de qualidade e principalmenteinstigam a coragem de criar num ambientesaturado pelas repetições e atemorizado pelaqueda dos índices no IBOPE.

Conviria estender aqui o sentido da comu-nicação em suas interfaces com os procedi-mentos educacionais, apoiados nos princípiodialógicos e comunitários. E neste fim, umadas estratégias eficazes rumo a uma comuni-cação educativa consiste em fazer recorrên-cia aos processos intertextuais: o livro, o rá-dio, o vídeo, a internet e o DVD entram aquicomo suportes que - em interconexão simul-tânea - podem fazer proliferar experiênciasmuito ricas.

Num tempo marcado pelas complexida-des, surge (dentro e fora dos espaços midiá-ticos) uma diversidade importante de afetos,sensações e sentimentos (nem sempre bemvindos), que nos autorizam a falar de umaestética do medo. Este sentimento aparececotidianamente nos contexto dos telejornais,telenovelas, filmes, vídeos e sites que mo-vidos pela função de informar, muitas vezesdeformam a realidade através de uma hiper-trofia dos acontecimentos.

Logo, é necessário problematizar as ma-neiras como os meios de comunicação (emseus diversos formatos) assimilam, reelabo-ram e irradiam a estesia do medo que se

espraia pela cidade. É pertinente observarcomo se inscrevem as formas do medo queafloram na “sociedade em rede”, no terceiromilênio, em níveis globais e locais.

5 Os clichês do fim do mundo natelevisão

Ocorre-nos lembrar que o medo no começodo novo século e do novo milênio se inten-sificou bastante por meio da imagem arque-típica do Apocalipse (e do fim do mundo).É fato que as comunidades crentes – em to-dos os seus matizes – geralmente se assom-bram durante a virada do tempo. Mas, emverdade, as mídias globais se incumbiram deespecular, redimensionar e hiperbolizar estemedo ancestral, que se intensifica sob a égidedos décimos, no fim de século e fim de milê-nio. Contudo, os efeitos do Apocalipse eva-nesceram sintomaticamente no contexto am-nésico da cultura sensacionalista e espetacu-lar forjado pela mídia. Relembramos que asimagens do medo - na estranha cronologiamidiática - se fizeram sentir outra vez coma explosão das torres gêmeas, e numa outramodulação, reapareceram sob o efeito tecno-lógico, militar e midiático, na guerra no Ira-que. Persiste a sensação de que aguardamosos próximos capítulos de uma guerra anunci-ada nas remotas regiões do planeta: na Síria,Coréia do Norte, Irã, América do Sul...

É interessante notar que a produção dosdiscursos no contexto dos meios de comuni-cação, apesar dos efeitos de autismo e tauto-logia (Sfez, 1992), desrealização da história(Baudrillard, 1981) e intensificação das ca-madas narcisistas (Muniz Sodré, 1984), noentrecruzamento intertextual e semiótico quepropiciam, os processos midiáticos nos le-

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vam a aprender a rir dos nossos medos e con-tradições. Esta é uma dimensão positiva damídia.

Mas num ambiente que se tornou hiper-midiático, as surpresas se fazem tambémcomo válvulas de escape para as tensõesdiárias. Assim, há programas humorísticosque “distraidamente” têm invertido os sen-tido da agenda oficial, familiar, política e so-cial, destravando os sentimentos de medo eas sensações de mal-estar. Por meio de umaestética do riso, satirizam as estruturas me-cânicas da vida cotidiana, desarticulando osdiscursos opressivos e excludentes. São im-portantes ainda porque promovem a uma au-tocrítica do jornalismo, da indústria culturale do culto às celebridades. Como exemplo,citamos os programasComédia da Vida Pri-vada, TV Pirata, Casseta e PlanetaeOs nor-mais, que caracterizam o chamado “humorinteligente”, exibido pela Rede Globo, desdea década de 1990.

6 Alteridades do medo nocinema e na televisão

O medo é uma paixão que se impõe tantopela presença quanto pela ausência de dife-rentes emoções, afetos e sensações que ga-nham corporeidade na espessura do mundosensível. Neste sentido encontramos diver-sos estudos buscando entender essa geogra-fia de sensações, em que o medo se faz pre-sente em variadas modulações. O historiadorJean Delumeau (1978) buscou decifrar a ana-tomia do medo investigando o mar, a noite, amulher, Deus, o diabo e a peste deixando-nosum repertório formidável de signos para umareflexão. Por sua vez, na filosofia morenade Marilena Chauí (1987), encontramos uma

atualização refinada das formas do medo esuas alteridades, num ensaio que se tornoucélebre. Mais recentemente o psicanalistabrasileiro Jurandir Freire Costa (1989) nãotem cessado de fustigar as dobras do medonas esferas do cotidiano, apontando para ostipos de narcisismo e de violência numa so-ciedade excludente que assusta. No campodas ciências da comunicação, relembramosum autor como Henri-Pierre Jeudy, que ar-dilosamente tem espreitado o medo com re-lação à mídia (1984), enfrentado o pânico(1986) e se empenhado com inteligência emdecifrar a sua alteridade pelo viés da ironia(2001). Ainda no terreno da comunicologia,entre nós, um pensador como Muniz Sodrétem enfrentado o medo em várias obras, de-nunciando com firmeza as variações de ra-cismo, violência e segregação (Sodré, 1984,1992, 2002).

A sabedoria popular costuma imaginar aoposição ao medo através da bravura, cora-gem e valentia, mas talvez fosse preciso refi-nar os sentidos para compreendermos os mo-dos distintos de desarmamento do medo pormeio da astúcia, humor, ironia, sagacidade.

As instâncias do Ser e o Tempo (tão carasa Heidegger) nos aparecem fenomenologica-mente como um par filosófico-conceitual efi-ciente para enunciar o tema do medo vincu-lado à questão da finitude, ou seja, o maisantigo de todos os medos, o medo da morte,um assunto investigado à exaustão por EdgarMorin, na obraO homem e a morte(1997).

Este tipo de medo se inscreve na socie-dade de consumo em sua forma mais aca-bada, pois condensa uma temporalidade emque o egoísmo, o individualismo e o narci-sismo se mostram de maneira mais intensa eexacerbada. Aliás, a este respeito, já dedi-camos um estudo do tema tratando do nar-

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cisismo infanto-juvenil, enfatizando o estilode sensibilidade das crianças e as suas expe-riências face ao programaSítio do PicapauAmarelo(Paiva, 2001a).

Estendendo a análise do narcisismo, numaoutra oportunidade focalizamos o tema, exa-minando as suas formulações no programaMalhação (da Rede Globo). Então, verifi-camos que o culto do corpo, as clínicas derejuvenescimento, as academias de ginásticatraduzem de maneira saudável uma celebra-ção da vida que exibe a dimensão afirmativados sujeitos diante da existência. Mas comoquase tudo em nossa idade mídia, a repeti-ção, o excesso e a saturação dessa moda tra-zem consigo um paradoxo: a ansiedade noculto da juventude e a busca desenfreada pelalongevidade conduzem a um apagamento dosentido da morte como um componente es-sencial na complexidade da vida. O maisgrave na cultura da malhação é a lei crueldo corpo malhado como signo imprescindí-vel, como uma senha de acesso à felicidadee a idéia de que sem ela estaríamos predes-tinados à solidão, ao fracasso e à exclusãosocial, num mundo regido pelo princípio damaterialidade, aceleração e eterna juventude.(Paiva, 2001b).

7 Perversidades e perplexidadesdo mundo

A mídia muitas vezes nos aborrece pela his-teria, repetição e fabricação das notícias, masnão podemos deixar de reconhecer, podemnos abrir janelas para uma pedagogia da in-dignação diante das modulações horrendasda violência - mesmo que, em sua diver-sidade, os próprios meios de comunicação

também sejam geradores de estranhas for-mas de violência.

Numa perspectiva dialógica, reconhe-cendo o papel dos produtores, a natureza dosveículos e as estratégias dos receptores noprocesso da comunicação, buscamos explo-rar o modo como a mídia mimetiza as formasde atração dos indivíduos pelos fenômenosdo horror. Notamos que, historicamente, ocinema e a televisão com astúcia e experiên-cia encontraram meios eficazes de catalisar omedo e sua irradiação sobre os afetos sociais.

Há momentos em que a mídia revela cons-truções sofisticadas sobre o medo, respon-dendo de maneira “equilibrada” às deman-das da afetividade coletiva. Isto se expressaem numerosos filmes que se tornaram céle-bres na cidade imaginária do cinema, e aquilistaríamos alguns deles:Nosferatu(Mur-nau, 1922 e Herzog, 1979),Psicose(Hit-chcock, 1960),O Bebe de Rosemary(Po-lansky, 1967),O Exorcista(William Fried-klin, 1973), Carrie, a estranha(Brian dePalma, 1976),A Profecia(Richard Donner,1976),O iluminado(Stanley Kubric, 1980),Poltergeist (Tobe Hooper, 1982),Drácula(Coppola, 1992). São filmes que, movidospela função de assustar, lançam mão dos re-cursos tecnológicos para operacionalizar acarga de terror das narrativas, atendendo asescolhas e desejos dos telespectadores quequerem sentir o medo em diferentes configu-rações. Considerando o refinamento na ela-boração destes produtos, que colocam a téc-nica a serviço do medo (e não ao contrário),reconhecemos que ali, então, o medo é posi-tivo, pois promove a experiência de catarsedos espectadores.

Recorrendo às imagens geniais do cinema,a figura do homem como predador, comoo lobo do próprio homem, pode ser con-

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Ensaio sobre o medo, a mídia e a cidade 11

templada nas imagens especulares do filme2001, Uma Odisséia no espaço(Stanley Ku-bric, 1969). Há uma cena antológica na aber-tura desse filme, antecipando as melhoreselipses do cinema, em que o primata desco-bre o osso como ferramenta de dominaçãosobre os semelhantes e inicia o processo deevolução a partir de um grotesco assassinato.Da imagem do primata pré-histórico até asimagens noturnas da violência no cotidianode nossa condição pós-moderna (graças tam-bém aos audiovisuais) temos um farto reper-tório de signos que tem muito a dizer sobre otema do medo nas sociedades e culturas.

Na história da inteligência ocidental, Ho-mero, Dante, Shakeaspeare, Dostoievsky,dentre outros homens de gênio, mostrarambem as afecções da alma, as razões e paixõesdos humanos nos dias de dor e nos dias defesta. Uma arqueologia orientada pelo es-pírito livre e investigativo, como propunhaFoucault (1966), pode encontrar nos discur-sos dos loucos, videntes e artistas as reve-lações que nos permitiriam conhecer o hu-mano mirando a cultura de natureza selva-gem que rege as estranhezas do ser. Nos in-terstícios de uma longa tradição, que com-preende Artaud, Sade, Bataille, entre outros,achamos as pistas para um entendimento dasimbricações entre o humano e as modulaçõesdo mal e da violência.

Nessa direção, Nietzsche, talvez o mais ra-dical dos filósofos, seja esclarecedor, comsua idéia perturbadora de que o homem émovido pela vontade de poder. O pensadordas alturas e profundidades, aqui nos ajudaa pensar sobre as tramas que englobam a mí-dia, o medo e a cultura no contexto de violên-cia das cidades. Nietzsche ajuda, sobretudo,a refletirmos sobre o inferno do lado de forae do lado de dentro de todos nós.

Os leitores, ouvintes, televidentes e inter-nautas se regozijam também, na quebra darotina diária, quando os seus anseios e pre-ocupações se diluem durante a exibição dasnotícias de horror pelos diferentes processosmidiáticos. Os telespectadores, como “con-sumidores e cidadãos”, perversamente e sa-dicamente também são cúmplices na exalta-ção do horror pelas redes de comunicação.Caberia nos questionarmos em que medidaa repetição insistente das cenas de explosãodas torres gêmeas em Manhattan seria causaou conseqüência dos altos índices de audi-ência durante e após o episódio do 11 desetembro. Permanece atual o argumento deMarcondes Filho (1986) ao perguntar sobre“quem manipula quem”, para refletirmos so-bre o fascínio dos iconofílicos durante à exi-bição das cenas de violência ao vivo eonline.

Apostamos na intuição de que aí impera a“lógica do pior”, ou seja, nos sentimos me-lhor diante do quadro de umoutro (que nosaparece como estranho, como rival), numasituação aparentemente pior do que a nossa.Existe aí, um nível de gratificação perversadiante da dor e da desgraça dooutro, que ex-pressa o avesso da nossa herança iluminista,liberal e social-democrata e os seus reflexosnum contexto que não pode eliminar a vai-dade, o narcisismo e o individualismo exclu-dente.

8 As torres fulminadas na aldeiaglobal

A explosões das torres de Nova Iorque epi-fanizou em escala planetária as emanaçõesdo arquétipo ancestral da torre fulminada dascartas do Tarô. A utilização feita pelas tele-

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visões do mundo sobre o sinistro americanohiperbolizou uma experiência que os audi-ovisuais realizam permanentemente, isto é,um certo controle do imaginário pelas ima-gens e figuras do medo.

No caso específico do Brasil, uma naçãosimultaneamente pacífica e à beira da guerracivil, a televisão interage junto à percepçãopública modulando as formas da representa-ção e regulando os modos de simulação dasimagens do horror. Isto aparece de manei-ras diferentes nas imagens e nos discursosdos telejornais, filmes, videoclipes, progra-mas de auditório, publicidade e ficções seri-adas. Partimos da hipótese que a sensação demedo dos telespectadores assegura uma certalucratividade simbólica, política e financeira.

Na antiguidade, Cerberes, o cão do in-ferno, as gorgonas, as fúrias, os seres fantás-ticos e inanimados constituíam uma rede deentidades configurando o “mal”, e isto ser-via para identificá-lo, mantê-lo à distância,exorcizá-lo. Outrora o medo tinha a face doLeviatã (o monstro mitológico do imaginá-rio medieval) e assumia a corporeidade doEstado absoluto, o que num regime autori-tário fazia estremecer a microfísica da vidapública e da privada.

Num “outro” registro, em nome das pala-vras da fé, a Igreja Católica conseguiu im-primir uma dimensão particular à fisiologiado medo: a fogueira da Inquisição, interiori-zada, consumiu o espírito moralista dos fiéis,de maneira fulminante e quase irreversível,e séculos após a sua extinção, a sombra doscarrascos permaneceria no inconsciente co-letivo das almas “culpadas” da América Ca-tólica. Dante Alighieri, do alto de sua mediu-nidade e sabedoria, reconstruiu todo um có-digo de imagens grotescas incorporando asformas do medo da humanidade: o inferno

dantesco define um tipo de bálsamo mora-lista para a cristandade assombrada com aparte desconhecida do outro lado da vida.Goethe, ao seu modo, radicalizou o senti-mento de medo e de impotência dos indiví-duos face às leis do destino: a figura diabó-lica do Mefistófeles nesse sentido fixa umaimagem incontornável. O pacto maldito en-tre o Fausto e o mal traduz com clareza o pâ-nico do seres humanos diante das turbulên-cias do desejo, da falta e da finitude. DomQuixote (e seu escudeiro Sancho Pança), emsuas alucinações e utopias inscreveu um tipode transcendência do medo, ultrapassando ogênero de narrativa de seu tempo e inaugu-rou um estilo de experiência, cujos matizesde ética, linguagem e sociabilidade sinaliza-ram novos referenciais para a compreensãodo mundo em permanente estado de trans-formação. Dostoiévsky, por sua vez, foi in-cisivo na construção imaginária da culpa e domedo, na obraCrime e Castigo(1866): aquiencontramos os melindres de uma anatomiado sujeito, no poço profundo de suas emo-ções e sentimentos mais extremos. Rasko-nikof encarna o arquétipo do homem comopecador angustiado, assassino com remorsoe amedrontado perante a lei de Deus e a leidos homens. A polifonia dos discursos tra-mada pelo escritor russo, desnudando a di-mensão intra-psíquica, o monólogo interiore a pluralidade de vozes, na enunciação deCrime e Castigo, apresenta as pistas para en-tendermos as ramificações do medo no dorsoda cultura.

No século XX, os tiranos, como Hitler,Stalin, Mussolini, Salazar, Pinochet, Médici,atualizaram o espectro da personalidade au-toritária, identificando uma concretude visí-vel do medo dos homens face à violência e àarbitrariedade. Isso, de algum modo se re-

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Ensaio sobre o medo, a mídia e a cidade 13

faz atualmente nas figuras midiatizadas deSadam Hussein e George Bush - mas talvezdevêssemos aqui “dar um desconto”, per-cebendo que os homens políticos, na IdadeMídia, disputam os espaços da comunica-ção eletrônica com os comediantes do horá-rio nobre. No Brasil, particularmente, tal-vez esse seja um traço fundamental em nossacultura carnavalesca, que nos leva a rir daspequenas trapaças, tropeços e misérias docotidiano.

Hoje, na era das máquinas de visão, omundo real causa medo e o mundo simu-lado da mídia eletrônica aparece enquantoum lugar de refúgio, segurança e aparênciade felicidade. Talvez aí resida o sucesso damídia: a sua metamorfose em algo que pa-rece tranqüilo, harmônico, caloroso e quenos abriga da violência, da doença, da soli-dão, das dívidas, da morte, enfim, parece noslivrar do mal absoluto.

O nosso argumento se apóia na idéia deque a mídia nos olha e nos vê, assim comonós a vemos. Sendo - simultaneamente - pro-dutos do imaginário industrial-tecnológico esocial, os audiovisuais participam das tramasdo consciente e do inconsciente coletivo. Osseus agentes conhecem as dimensões da ra-zão e da paixão que os humanos experimen-tam. Logo, sabem da porção de medo quehabita a alma e a imaginação dos homens.Reconhecemos que os audiovisuais tambémfabricam, ideologicamente e esteticamente,modalidades de medo que se irradiam por to-das as camadas do social. Entretanto aposta-mos na idéia de que os espectadores, comoleitores, críticos e hermeneutas em poten-cial, adeqüam as projeções das imagens domedo, de acordo com suas referências ima-ginárias, ou seja, sem assimilar passivamenteas mensagens, pois enquanto elas têm a força

de persuasão, os receptores têm suas resis-tências e suas estratégias de carnavalização(Bakhtin, 1987).

9 A inversão do medo no país docarnaval

Em sua múltipla dimensão industrial, tec-nológica, crítica e performativa, a comuni-cação se configura como um novo campo,que atinge os diferentes domínios da ativi-dade humana. Os seus limites e níveis deabrangência são imprecisos, como em todotrabalho do conhecimento que se predispõea perseguir a história em curso e não podeprescindir das formas intuitivas e dedutivas.Abarcando os aspectos micrológicos e ma-crológicos da vida vivida este novo campo sedefine pelo seu caráter interdisciplinar. As-sim, apoiando-se na perspectiva de um saberhumanístico, livre dos condicionamentos elimitações positivistas, o nosso argumento sepreocupa com as sensações, emoções e sen-timentos. Tais experiências emanam um tipode estesia que nos permite enxergar os ter-mos de uma estilística da existência.

Os processos midiáticos resultam de umconjunto de operações cuja função é instigaro fascínio da novidade, pela surpresa e pelasuposta atualização permanente. Seguindoa trajetória de sua performance, encontra-mos os sintomas de uma displicência histó-rica que pode gerar efeitos amnésicos. Naconstrução do acontecimento pela mídia háum preço caro a ser pago pela eterna vontadede atualidade, transparência e objetividade.Na pressa em construir um discurso porta-dor de credibilidade, legítimo e fidedigno natradução da realidade, a mídia derrapa nosparadoxos, contradições complexidades do

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real. Assim, as experiências realizadas pe-los meios de informação e de comunicaçãosofrem também dos problemas genéricos danossa época, ou seja, a síndrome da acelera-ção, ubiquidade e velocidade.

Precavendo-nos contra o esquecimento e -ao mesmo tempo - contra a tirania de um his-toricismo viciado no culto dos personagensilustres, das celebridades e na oficialidadedos marcos cronológicos que excitam as nar-rativas midiáticas, procuramos nos orientarrecuperando os modos possíveis de atualiza-ção da memória, pelo viés das reminiscên-cias históricas atentas ao “vivo do sujeito”,na materialidade dos seus discursos, ações esensibilidades.

Em nossa tradição brasileira (mesmo decontradição), encontramos sinais emblemáti-cos para tematizar os regimes de afetividade,inclusão e exclusão social, os modos de sub-jetividade e de intersubjetividade que equaci-onam os níveis das ações individuais e cole-tivas no cotidiano da cidade. Neste sentido, acompetência comunicativa consistiria em seassegurar o poder de diálogo com as dimen-sões da história da cultura, respeitando a his-tória das mentalidades, das idéias e das estra-tégias. Aqui, nos voltamos para uma históriado cotidiano (em sua acepção pública e pri-vada, individual e coletiva), uma história dopresente, compreensiva e rigorosa em seusencadeamentos na atualização da memória.

10 O medo tupiniquim e a iraantropofágica

Uma genealogia da história do medo no Bra-sil poderia ser construída seguindo-se os ras-tros e pistas deixados pelos homens de Pin-dorama. As imagens e simulacros que nos

chegam do nosso passado colonial, por meiodos textos literários, científicos, historiográ-ficos, dramatúrgicos e midiáticos, alertam-nos para a estrutura e funcionamento donosso medo cotidiano, ao mesmo tempo,exibe formas vigorosas de enfrentamento dasadversidades através de estratégias surpreen-dentes. Apostamos na idéia de que a com-preensão do medo cotidiano nos espaços etempos das cidades se viabiliza por meio deuma relação sagital com as reminiscências,ou seja, revisitando a história não como elasupostamente teria se realizado, mas comoela poderia ter se cumprido. Aprendendocom o filósofo Walter Benjamin, recupera-mos o antigo para pensar o novo e, igual-mente, o novo nos estimula a uma compre-ensão do antigo.

Assim, nos precavendo das súmulas e dostratados explicativos, e caminhando às aves-sas dos itinerários oficiais e dominantes, re-cuperamos as imagens provocantes do “ca-nibalismo” e da “antropofagia” tão caros aosmodernistas, no começo do século XX. Estarecorrência estética e filosófica certamenteconsiste numa das maiores intervenções etransgressões construtivas na história da cul-tura, cujos louros são recolhidos até hoje nosdiferentes modos de contemplação e reinven-ção do Brasil.

No imaginário antropofágico (comOswald e principalmente Mário de Andrade)prevalecem uma ética e estética da inversão(Teles, 1976). A alegoria de uma culturaque devora antes de ser devorada é funda-mental no simbolismo modernista e traduzum instante de auto-afirmação do ethosbrasileiro. Simbolicamente a metáfora da“antropofagia” inscreve os termos de umaauto-estima sem precedentes no campo daimaginação criadora dos trópicos.

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A recorrência às nossas raízes, ao estilode vida dos tupiniquins é um recurso quepode ser conseqüente. Existe algo de pro-vocante na construção conceitual dos mo-dernistas que evidentemente se nutre do pa-vor dos europeus. Mas a chave de sentidoque pulsa mais forte no movimento antro-pofágico reside no seu poder de transforma-ção radical dos valores estéticos, morais elingüísticos, libertando a consciência cultu-ral de sua condição colonizada.

Desdobrando a idéia antropofágica, en-contramos a imagem especular do indío bra-sileiro, como elemento forte e corajoso, nofilme de Nelson Pereira dos Santos,Comoera gostoso o meu francês(1971). O cineastalivra a imagens do Brasil da zona sombre-ada pela colonização ocidental e as iluminano fogo restaurador das lentes e câmeras docinema a serviço da beleza, autonomia e li-berdade.

O tema do canibalismo amoroso, estéticoe cultural é revisitado mais recentemente,pela estética da Rede Globo, sob a direçãode Guel Arraes, emCaramuru, A Invençãodo Brasil (2000). Numa sintaxe bem hu-morada e afinada com a linguagem do seutempo, Arraes leva o espectador a rir da tra-gédia causada pela colonização, evocando oespírito altivo, nobre e destemido dos ante-passados. É uma produção muito rica pelouso de diferentes suportes midiáticos (livro,filme, minissérie de TV, CD ROM e DVD);mas, sobretudo, é “revolucionário” pela pos-tura minimalista como celebra a antropofa-gia estética

Outras configurações dramatúrgicas ga-nham relevo no repertório de ficções se-riadas da Rede Globo e surpreendemente,aqui nos aparecem como empiricidades queinstigam reflexões sobre as interações en-

tre os processos historiográficos e os pro-cessos informativo-comunicacionais. Na se-rialidade dinâmica que caracteriza as adap-tações dos textos literários para a televisão,podemos apreender as gêneses do medo, daira, da indignação e revolta numa formaçãosócio-cultural marcada pela exploração, vio-lência e aviltamento.

Este é o caso da versão do livroA Mura-lha, de Dinah Silveira de Queiroz, adaptadapara a linguagem do vídeo e DVD, por MariaAdelaide Amaral (2000). Por essa via, en-contramos as formas da graça, malícia e as-túcia, estratégias que mostram como perma-nentemente foram superaradas as situaçõesde medo e de pânico. Os homens no Brasil,no passado, encontraram - em meio ao caos- as chances e oportunidades para a rever-são das adversidades. De algum modo istonos reaparece hoje, pelos recursos intermi-diáticos (e intersemióticos), como dispositi-vos pedagógicos, para a compreensão, inter-venção e participação nos negócios da vidapública.

Na história da teledramaturgia brasileira,encontramos diversas ficções que funcio-nam como tipos de experimentações histo-riográficas, que busca, por meio de suasformas de oralidade, visibilidade e sono-ridades, resgatar e reconstruir a memória.Nesta perspectiva se inscrevem narrativas di-ferenciadas comoAs Minas de Prata(IvaniRibeiro, 1966/67),Fogo sobre Terra(Ja-nete Clair, 1974/75),Aritana (I. Ribeiro,1978/79), Pantanal (Wilson Aguiar Filho,1990), O Tempo e o Vento(Doc Compa-rato, 1985),O Rei do Gado(Benedito RuyBarbosa, 1996/97). Estas narrativas, tendosido formatadas em diversos suportes, queincluem o gênero televisivo, o cinema, ovídeo-cassete, o CD ROM e o DVD, além

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de se constituir em fontes de informação his-tórica e em dispositivos eficazes de educaçãoestética, consistem em instrumentos vigoro-sos e competentes também para as atividadeslúdicas, estéticas e cognitivas.

11 O som e a fúria e das massasno cotidiano da cidade

Após 500 anos, já é possível falar nos ter-mos de uma “moderna tradição brasileira”(Ortiz, 1988) e a rigor, os termos do de-bate cultural, incontornavelmente, perpas-sam pelo crivo dos intérpretes e explicado-res do Brasil. Nessa esteira, encontramos asanálises de Paulo Prado (1928), Roland Cor-bisier (1958), (Dante Moreira Leite (1969),que em seus diferentes registros estabelece-ram os marcos para uma historiografia bra-sileira. As contribuições de Sérgio Buar-que de Holanda (1936), Caio Prado Júnior(1942) e Gilberto Freyre (1933) se inscre-vem como os arcanos maiores na construçãode uma história da cultura. Outros estudostêm se redimensionado e encontramos no-vas perspectivas dialógicas, que inserem au-tores clássicos, recentes e veteranos. Nessefilão, Florestan Fernandes (1975), AntonioCândido (1975), Alfredo Bosi (1992), DarcyRibeiro (1980) aparecem multiplicando a di-versidade de prismas criando a possibilidadede apreciarmos as “nervuras do real”, pelosenfoques históricos, sociológicos, literáriose antropológicos. A perspectiva de se cons-truir uma releitura intertextual, a partir dosdiferentes discursos sobre o Brasil, desenha-se com vigor na conexão de textos dos es-critores barrocos (como Gregório de Matos),românticos (como José de Alencar), realis-tas (como Machado de Assis) e naturalis-

tas (como Lima Barreto). Este expedientemostra-se fecundo também na revisitação“pós-moderna”, que pode agregar diferen-tes autores como Euclides da Cunha, Guima-rães Rosa e os modernistas (como Oswald eMário de Andrade) e contextualizá-los numailuminação do presente, desvelando novassignificações.

Após tantas sínteses, balanços, reconstru-ções e redescobertas, temos avançado con-sideravelmente e apostamos na idéia de queas gerações mais recentes têm sabido reinter-pretar e reinventar o Brasil a partir de dife-rentes modalidades discursivas e apoiando-se em distintos suportes de informação ecomunicação (Cf. Mota, 1977; Machado,1996; Madeira & Veloso, 2001). Partindodo pressuposto de que cada um dos intér-pretes e historiadores se empenhou - de al-gum modo - numa explicação global, o desa-fio que se apresenta é recolher as sombras esobras do legado modernista e na materiali-dade das construções históricas, apreciar domicro, do residual, do emergente e do provi-sório.

Num balanço dos balanços encontramoslacunas sintomáticas que revelam um certopurismo dos intelectuais na apreciação dasculturas populares (Canclini, 1989). Osmeios de comunicação de massa - há maisde meio século - evidenciaram a expansãode uma cultura de massa que confere um ou-tro sentido ao contexto brasileiro. No con-certo geral das culturas globalizadas, as to-talizações - no fim das contas - terminarampor reativar o interesse pelos saberes locais(Geertz, 1997). Há um novo desenho nacartografia contemporânea em que fervilhaa dita “cultura das mídias” (Santaella, 1996)e suas conseqüências não podem ser ignora-das. Pressupomos que, no contexto histórico

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atual, o rádio, o cinema, a televisão e a inter-net conectados intermidiaticamente, têm co-locado em cena os homens comuns, suas for-mas de medo e de coragem, o que se expressana modulação das imagens, oralidades e so-noridades (Barbéro; Réy, 2001).

Diante desse quadro, o campo interdis-ciplinar constituído pela Comunicação semostra apto para uma abordagem compe-tente. O domínio composto pelos saberesque informam o campo da comunicação, emsuas interfaces com a história, sociedade,economia, cultura e política, presta-se en-quanto uma área do conhecimento conexoque pode compreender, interpretar e descre-ver as estruturas elementares da vida coti-diana. Sem querermos prolongar um argu-mento que pode ser recuperado posterior-mente, apontaríamos aqui alguns elementosque podem servir de base para um estudomais rigoroso sobre a comunicação e o co-tidiano, e que ora enunciamos sob a formado diálogo entre a comunicação e a cidade.

Sendo preciso delimitar o nosso argu-mento e em se tratando de um tema especí-fico que busca discutir a mídia, o medo e a ci-dade, situamos um lugar de fala que se ocupaem perceber as imagens e sons irradiados pe-los meios de comunicação. Particularmente,dedicamos-nos a contemplar e compreenderas visibilidades e sonoridades brasileiras, emsuas diferentes modalidades e configurações,prestando atenção para a maneira como asimagens, sons, ritmos e musicalidades par-ticipam da estesia irradiada nos diversos es-paços e tempos da cidade.

Exploramos aqui o medo, as suas formasde negação e de afirmação, assim como ex-ploramos as formas do bem e do mal na vidacotidiana, e daí, parece ser apropriado resga-tar o adágio popular que alerta para o fato

de que “quem canta seus males espanta”.Buscamos vislumbrar as modalidades sono-ras, rítmicas, tácteis e musicais que conce-dem forma e conteúdo aos aspectos híbridos,mestiços, dionisíacos, barrocos da nossa for-mação cultural.

É interessante observar como as corporei-dades e sonoridades nos através dos africa-nos, com as danças, os jogos de capoeira, osrituais do candomblé. Por essa via são abo-lidos os sentimentos de saudade, tristeza emelancolia. Assim são exorcizados as sen-sações, emoções e sentimentos avizinhadosdo medo, mesmo porque este não é o nossosigno dominante.

A sonoridade brasileira consiste num tipode expressão estética e afetiva que absorvea riqueza e exuberância dos trópicos, sendoresponsável também pelo entusiasmo e es-pontaneidade que revitalizam a organicidadedas experiências cotidianas no Brasil. E,pensando no imaginário coletivo brasileiro,aludimos também às imagens acústicas queanimam as corporeidades do país e das cida-des, em seus diversos recortes locais.

No Brasil do século XXI, os estratos popu-lares, em suas diferentes modulações mesti-ças, nômades e migratórias redefinem os ní-veis de urbanidade, contaminando a estéticacotidiana com as diversidades de sons e rit-mos que se nutrem das experiências popu-lares - deslocando-se das esferas mais inti-mistas para a esfera pública. Neste sentido,o samba, o chorinho, os formatos do rap,house, rock, funk, pagode irrigam as viasacústicas da cidade, fortalecendo os elos deidentificação com os indivíduos, cujas tribosse incumbem de reterritorializar o meio am-biente através das ondas sonoras: assim, nastrilhas da cidade se constrói uma ecologiapermanentemente revigorada pelas sonorida-

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des. Este expediente funciona como válvulade escape para uma realidade social à beirada guerra civil. Mas principalmente, des-perta as percepções e as sensibilidades esti-mulando o esforço de superação da tragédiasocial.

O ritmo, a sonoridade, a batida deste novogênero híbrido constituído pela música ur-bana, irradiam uma ética-estética que res-ponde ao medo global. Essa nova sonoridadeagenciada tanto pelo samba, quanto pelofunk e pelo pagode contém signos agressi-vos e provocadores. A sua assimilação é di-fícil para as gerações educadas por uma esté-tica apolínea e conformista. Existe uma par-cela de ira e rebeldia na música urbana, quepossui sua positividade, distinguindo-se ra-dicalmente das melodias forjadas pelo mer-cado fonográfico, cujo modelo se apóia noprolongamento das vogais, repetição autistados fonemas e tendências acústicas regressi-vas.

Convém se apreciar a música urbana comouma nova modalidade discursiva, cujas for-mas e conteúdos podem exorcizar o medoem meio ao caos das cidades contemporâ-neas. Os estilos das novas manifestaçõesmúsicais - com todas as suas mixagens ehibridações - traduzem os novos modos desubjetividade e de territorialização das tri-bos: como o rock dos anos 60, elas atualizamas imagens acústicas em suas versões globaise locais.

Assim, é possível entrever as frestas numcotidiano minado pelo espectro do medo eperceber como a vibrante organicidade cul-tural brasileira se deixa perceber através dasimagens, oralidades e sonoridades. Isso éapreendido com sensibilidade e inteligência,por exemplo, nos textos de autores comoWisnick (1999), Luis Tatit (2001) Muniz So-

dré (1979), Tupã Correia (2000), Ruy Castro(1990), Caetano Veloso (1997), entre outros.

Entretanto, as imagens acústicas assumemuma corporeidade mais vibrante na medidaem que se justapõem às imagens visíveis docinema, da publicidade e da televisão. As-sim, os audiovisuais têm gerado uma cul-tura de massa, que absorve, desmonta e ultra-passa a agonia do social, gerando uma novaforma de êxtase das massas, tal experiênciaredefine a estesia das cidades. Tudo isso, deum modo geral, desvela as características docotidiano em que se mesclam as representa-ções das cidades reais e os simulacros dascidades virtualizadas pelas redes de comuni-cação.

No que concerne ao medo no cotidianodo Brasil, encontramos configurações espe-cíficas se nos voltarmos para a estética dasimagens e sons do cinema e da televisão,que encontram os seus estímulos na pró-pria carnavalização coletiva (Bakhtin, 1987).No campo da teledramaturgia, talvez já sejalugar comum apontar para a estesia lacri-mejante deEscrava Isaura(Daniel Filho,1976), contudo a telenovelaPorto dos Mi-lagres (A. Silva e J. Linhares, 2001) con-siste certamente num dos signos mais im-portantes para uma exemplificar os sintomasde uma educação estética que tem inverte eironiza as representações racistas do Brasil,pelo viés da televisão. No cinema,Xica daSilva(Cacá Diegues, 1976) com toda a graçae estética do grotesco, ainda continha algode reticente na figuração do medo e da con-dição escravocrata no Brasil colonial. E ofilme Orfeu (Cacá Diegues, 1999) por suavez distingue uma referência importante dealegoria no país do carnaval, com a repre-sentação dos negros e mestiços no cotidianobrasileiro, suas idiossincrasias e complexi-

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dades, atualizando o mito da alma musicalque rege a sensibilidade nacional. A novaestesia audiovisual propiciada porCidade deDeuseCidade dos Homens(ambos exibidosem 2002), no entrecruzamento das informa-ções midiáticas forjadas pelo cinema, televi-são, internet e CDV, seguramente, elevou ostermos educativos para um debate sobre osproblemas relativos à mídia e o consumo, aomedo, à violência e à exclusão social. Mas,sobretudo, instiga os espectadores a refleti-rem sobre como se orientar no pensamentocom relação aos problemas de ética, solida-riedade e participação.

12 Estado da arte tecnológicasobre o medo

Nas tramas em rede do capitalismo global,constatamos a proliferação de novas imbri-cações coletivas, no contexto das culturas lo-cais, que perfazem novos estilos de comuni-cabilidade e sociabilidade. Tele-guiadas pe-las mídias visuais e sonoras, afugentando omedo e a solidão das cidades, as massas rein-ventam permanentemente os seus modos detribalização. Hoje, nos espaços urbanos, aomesmo tempo em que se expandem as re-des cruéis do narcotráfico, são tecidas novasredes de solidariedade, reafirmando os laçosorgânicos da comunidade (Castells, 1999).

Em suas dimensões “reais” ou virtuais osnovos meios de integração se realizam peloviés das sensações, afetos e sentimentos, istoé, por meio de uma estética cuja origem éantiga, mas se atualiza nos tempos de in-teração com os audiovisuais. Logo, paro-diando Arlindo Machado, partimos de umolhar sobre “a mídia levada a sério”. Ouseja, por meio da intertextualidade que se

realiza entre os livros, filmes, canções, te-lejornais e telenovelas podemos nos guar-necer para uma compreensão do cotidiano,desarmando-nos dos pré-conceitos e das cer-tezas estabelecidas. Então, podemos visu-alizar as figurações camufladas do medo,suas deturpações e fabricações mercadológi-cas. Certamente o terreno da imaginação te-levisiva funciona como massagem, tornandoos televidentes mais dóceis e domesticados,confortavelmente assentados em suas poltro-nas domésticas. Por esse prisma, McLuhanmostra como “os meios são as massagens”(McLuhan & Quentin Fiori, 1969).

Todavia, hoje, quando se fala em “culturadas redes”, é preciso ampliar os horizontese compreender a televisão em suas múlti-plas conexões interativas. Considerando ovídeo cassetes, os satélites, as parabólicas, osDVDs e as ramificações da internet, percebe-mos que a tele-visão, enquanto motor de umaarte tecnológica, consiste num veículo im-portante de representações e simulações denossa vida cotidiana.

Nesse contexto, as imagens e sons domedo na televisão, como expressões da“grande arte” têm modulações diferencia-das. E quando tratamos da mídia, insistimos:convém atentar para as suas mediações (por-que cada telespectador assiste TV de acordocom o seu repertório).

No concerto hiperreal da ficção seriadabrasileira nos deparamos com modulaçõesdiversas em que cintilam as expressões dealtruísmo e de egoísmo, de exclusão e de so-lidariedade, de segregação e pertencimento.Em quase um meio século de exibição dastelenovelas, podemos detectar algumas sé-ries de imagens que já se tornaram clássicaspelo seu enraizamento no imaginário populare aqui - especificamente - mostram-se opor-

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tunas numa apreciação do medo, suas zonasde parentesco, semelhanças, alteridades e di-ferenças.

O medo das mulheres, dos escravos, dosvelhos, dos gays, dos pobres, dos índios, dascrianças, dos adolescentes, dos pobres, dosmigrantes, dos loucos, dos ciganos, dos vici-ados, dos muçulmanos e dos burgueses, tudoisso faz parte das formas de segregação e ex-clusão social, compondo uma matéria explo-siva que se projeta no universo simbólico damídia, através dos diversos tipos de carnava-lização social. O caráter dionisíaco da pai-sagem étnica brasileira estrutura a forma e osentido da literatura, música, programas derádio, cinema e televisão.

As imagens e sons dos audiovisuais àsvezes camuflam os medos, outras vezes osrevelam. Há momentos em que os ocul-tam, há outros, porém, que os atravessam,transfigurando-os por meio dos recursos dalicença poética. As formas de beleza, inte-ligência e justiça, presentes nas representa-ções midiáticas do medo, permitem-nos emdesvelar a sua anatomia, situar o seu con-texto histórico e moral, e desmontar os seusmecanismos. A arte tecnológica gerada pelamídia tem a chance de instigar uma transcen-dência do medo, situando-o na sua contra-partida formalizada pelas imagens de cora-gem e esperança. E numa perspectiva nietzs-cheana, encontramos aí um princípio afirma-tivo que neutraliza as imagens e metáforasdo medo pelos signos de altivez, confiança,entusiasmo e alegria.

Numa última palavra uma reflexão sobreo medo leva a pensar também sobre as re-lações entre a imaginação eficiente e utilitá-ria (da ciência) e a imaginação espontâneada sabedoria popular (que inclui as mitolo-gias); esta temática - em última instância -

remete às ligações entre a ciência e a filo-sofia, que transcende a metáfora do Pensa-mento na passagem pela caverna da espe-culação (em Platão), como um exercício deaprendizagem à experiência do morrer (comMontaigne) e como vigor e exaltação do mi-lagre da vida (através de Nietzsche).

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