Monteiro Lobato - Memorias Da Emilia

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8/20/2019 Monteiro Lobato - Memorias Da Emilia http://slidepdf.com/reader/full/monteiro-lobato-memorias-da-emilia 1/49 Editora Globo, 2007 Monteiro Lobato sob licença da Monteiro Lobato Licenciamentos, 2007 Todos os direitos reservados.  Nenhuma parte desta obra pode ser apropriada e estocada em sistema de banco de dados ou processo similar, em qualquer orma ou meio, se!a eletr"nico, de otoc#pia, $ravaç%o etc, sem a permiss%o dos detentores dos cop&ri$hts. Ediç%o' (r)ete (lonso *coordenaç%o+, ec)lia -assarani, Luciane rt)/ de astro Ediç%o de (rte' (driana -ertolla ilveira onsultoria epesquisa' Mareia amar$os, 1ladimir acchetra reparaç%o de te3to' Mar$" Ne$ro 4evis%o' M5rcio Guimar%es de (ra6!o e 5$ina )mpar roduç%o editorial' 2 Est6dio Gr5ico lustraç8es' aulo -or$es olori/aç%o das ilustraç8es' Eliana -or$es r9ditos das ima$ens' (cervo ia. da Mem#ria *capa :eca Tatu/inho,  p5$ina 7+; (cervo am)lia Monteiro Lobato *otos de Monteiro Lobato, p5$inas < e =, capa de (s 4einaç8es de Nari/inho, p5$ina =+; -iblioteca Monteiro Lobato > %o aulo *capa e p5$ina ilustrada de Nasino, p5$ina ? @ados nternacionais de atalo$aç%o na ublicaç%o *+ *Amara -rasileira do Livro, , -rasil+ Lobato, Monteiro, B==2>BCD=. Mem#rias da Em)lia Monteiro Lobato; ilustraç8es aulo -or$es. > %o aulo ' Globo, 2007. -N C7=>=?>2?0>DFC=>< B. Literatura inanto>!uvenil . -or$es, aulo. 07>CBB< @@>02=.? )ndices para cat5lo$o sistem5tico' B. Literatura inantil 02=.? 2. Literatura inanto>!uvenil 02=.? B Ediç%o > i mpress%o Ediç%o > mpress%o Monteiro Lobato :os9 -ento Monteiro Lobato *Taubat9, B=DB==2 > %o aulo, D7BCD=+. Escritor, !ornalista, editor, tradutor, empres5rio do erro e do petr#leo. Estudou @ireito, mas lo$o abandonou a proiss%o para se dedicar H literatura. Iundador da ind6stria editorial no a)s, tornou>se, com as hist#rias do )tio do icapau (marelo, um dos maiores autores inanto>!uvenis do -rasil. Editora Globo ( (v. :a$uar9. B.D=? > inventor do nosso a/>de>conta B=DB=22 BC0? inicia o namoro com Maria da ure/a Natividade, ure/inha,comquemse casa em BC0=. @urante sua inAncia, Monteiro Lobato passava horas brincando, subindo em 5rvores e pescando no riacho. Mas ele n%o dispensava um bom livro de aventuras, que lia

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Editora Globo, 2007Monteiro Lobatosob licença da Monteiro Lobato Licenciamentos, 2007Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser apropriada e estocada em

sistema de banco de dados ou processo similar, em qualquer orma ou meio, se!a eletr"nico, de otoc#pia, $ravaç%o etc,sem a permiss%o dos detentores dos cop&ri$hts.Ediç%o' (r)ete (lonso *coordenaç%o+,ec)lia -assarani, Luciane rt)/ de astroEdiç%o de (rte' (driana -ertolla ilveiraonsultoria epesquisa' Mareia amar$os, 1ladimir acchetrareparaç%o de te3to' Mar$" Ne$ro4evis%o' M5rcio Guimar%es de (ra6!o e 5$ina )mpar roduç%o editorial' 2 Est6dio Gr5icolustraç8es' aulo -or$esolori/aç%o das ilustraç8es' Eliana -or$esr9ditos das ima$ens' (cervo ia. da Mem#ria *capa :eca Tatu/inho, p5$ina 7+; (cervo am)lia Monteiro Lobato *otos de Monteiro Lobato, p5$inas< e =, capa de (s 4einaç8es de Nari/inho, p5$ina =+; -iblioteca MonteiroLobato > %o aulo *capa e p5$ina ilustrada de Nasino, p5$ina ?@ados nternacionais de atalo$aç%o na ublicaç%o *+ *Amara -rasileira do Livro, , -rasil+Lobato, Monteiro, B==2>BCD=.Mem#rias da Em)lia Monteiro Lobato; ilustraç8es aulo -or$es. > %o aulo ' Globo, 2007.-N C7=>=?>2?0>DFC=><B. Literatura inanto>!uvenil . -or$es, aulo.07>CBB< @@>02=.?)ndices para cat5lo$o sistem5tico'B. Literatura inantil 02=.?2. Literatura inanto>!uvenil 02=.?B Ediç%o > i mpress%o Ediç%o > mpress%oMonteiro Lobato:os9 -ento Monteiro Lobato *Taubat9, B=DB==2 > %o aulo, D7BCD=+.Escritor, !ornalista, editor, tradutor, empres5rio do erro e do petr#leo. Estudou @ireito, mas lo$oabandonou a proiss%o para se dedicar H literatura. Iundador da ind6stria editorial no a)s, tornou>se, com as hist#rias do )tiodo icapau (marelo, um dos maiores autores inanto>!uvenis do -rasil.Editora Globo ( (v. :a$uar9. B.D=? > inventor do nosso a/>de>contaB=DB=22BC0?inicia o namoro com Mariada ure/a Natividade, ure/inha,comquemsecasa em BC0=.@urante sua inAncia, Monteiro Lobato passava horas brincando, subindo em 5rvores e pescando noriacho. Mas ele n%o dispensava um bom livro de aventuras, que lia

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na biblioteca do seu av". @esde pequeno, escreveu para os !ornai/inhos dos col9$ios quereqJentou. ontinuou escrevendo depois de ormado em @ireito e, em ve/de trabalhar como advo$ado, tornou>se escritor, criando o )tio do ica>pau (marelo.Mas o que tinham os seus livros de t%o especial para transorm5>lo em um dos nossos maioresautores, inventor da pr#pria literatura inanto>!uvenil no a)sK ansado

de 5bulas importadas, ambientadas na Europa e tradu/idas para o portu$us de modo conuso,Monteiro Lobato ima$inou um cen5rio especial e bem brasileiro para seus persona$ens. E, para conquistar os leitores, contou hist#rias de maneira simples e direta, 5ceis decompreender.omo nossa l)n$ua est5 em constante mudança, certas palavras que utili/ou dei3aram de ser usadascom o passar do tempo.Mas todas elas continuam mantidas, tal qual ele escreveu em seus livros. uando voc n%oentender al$uma delas, pe$ue um dicion5rio e aça uma pesquisa como, ali5s,o pr#prio Lobato a/ia. Ele preocupava>se tanto com o uso correto das palavras que leu umdicion5rio in>teirinho, de ( a , anotando o que ia descobrindo para utili/ar depois em seus livros.Monteiro Lobato respeitava a inteli$ncia das crianças e dos !ovens. No )tio do icapau (marelotoda a turma tem ve/ e tem vo/. s netos de @ona -enta s%o sempreouvidos com carinho, convivendo com os adultos de i$ual para i$ual.omum nos dias de ho!e, essa atitude era impens5vel na 9poca de Lobato. uando ele criou suashist#rias, no começo do s9culo OO, os pais alavam e os ilhos obedeciamsem dar um pio. N%o questionavam os adultos, nem di/iam o que pensavam. Ioi ele quem ensinoucomo todo mundo podia sair $anhando com o di5lo$o. edrinho, Nari/inhoe a incr)vel boneca Em)>lia, PbocudaP e palpiteira como ela s#, conversam com os mais velhoslivremente. Talve/ por isso, desde o lançamento de ( menina do nari/inhoarrebitado, no inal de BC20, Lobato venha a/endo tanto sucesso. (s crianças adoram o espaço deliberdade e ima$inaç%o que o )tio representa, onde aprendem brincandosobre qualquer assunto.Monteiro Lobato $ostava muito de escrever para crianças e !ovense, com o p# de pirlimpimpim, soltou as amarras da antasia. Nas asas da ima$inaç%o seus leitoresvia!am com a turma do )tio atrav9s do tempo e do espaço. (uma velocidade superior H da lu/, voam ao passado ou ao uturo para voltar sempre cheios denovidades. Em suas aventuras encontram deuses $re$os, convivem com a-ranca de Neve, eter an, @om ui3ote, Gato I9li3... %o hist#rias que divertem e atiçam acuriosidade. N%o 9 H toa que sempre ica um $ostinho de quero mais...Mareia amar$os e 1ladimir acchettaBC27 Nomeado adido comercial em Nova QorR, muda>se para os Estados Snidos. 1olta ao -rasilem BCFB.BCF2 (s atividades de sua primeira empresa de peruraç%o de oços de petr#leo tm in)cio.BCD0 condenado a seis meses de pris%o.D7BCD= criador do )tio do icapau (marelo morre em %o aulo, !eito emiliano de ser Todo mundo concorda com a importAncia de recordar os atos da vida. em isso n%o saber)amosquase nada sobre o passado da humanidade. s $randes persona$ens da ist#ria,com mai6sculo, sempre tiveram o cuidado de dei3ar re$istradas suas $l#rias e conquistas para as$eraç8es uturas. (s pessoas comuns tamb9m tm muita coisa interessante

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a contar. or meio dos seus relatos, descobrimos detalhes e curiosidades sobre o cotidiano dos povos. Mas ser5 que al$u9m t%o no vinho quanto a Em)lia !5 tem assunto para um livro de mem#riasK Na verdade, a boneca !5 passou por tantas situaç8es surpreendentesque poderia encher uma estante inteira de volumes. ara n%o cansar as m%o/inhas delicadas, dita para o 1isconde de abu$osa suas proe/as !unto com a turma do )tio

do icapau (marelo. (o lon$o destas p5$inas, cheias de ilustraç8escoloridas, vamos acompanhando passo a passo as andanças da Marquesa de 4abic#, desde quePnasceuP do retalho de uma saia de Tia Nast5cia e $anhou o dom da ala.aciente, o sabu$o de milho toma nota de tudo e mostra que Monteiro Lobato antecipava o costumemoderno de dar depoimentos a !ornalistas e escritores. No inal, a pr#pria Em)lia pe$a a caneta para contar suas açanhas em oll&Uood, a amosa cidadedas estrelas de cinema, que ela visitou ao lado de eter an e da(lice do a)s das Maravilhas. omo se isso n%o bastasse, ainda ilosoa, e3pondo suas impress8essobre tudo e todos, sempre naquele seu !eito PemilianoP de ser eraciocinar.M. . e 1. .Em)lia resolve escrever suas Mem#rias.(s diiculdades do começo.@e tanto Em)lia alar em Pminhas Mem#riasP que uma ve/ @ona -enta per$untou'> Mas, ainal de contas, bobinha, que 9 que voc entende por mem#riasK> Mem#rias s%o a hist#ria da vida da $ente, com tudo o que acontece desde o dia do nascimento at9o dia da morte.> Nesse caso > caçoou @ona -enta >, uma pessoa s# pode escrever mem#rias depois que morre...> Espere > disse Em)lia. > escrevedor de mem#rias vai escrevendo, at9 sentir que o dia da mortevem vindo. Ent%o p5ra; dei3a o inal/inho sem acabar. Morre sosse$ado.> E as suas Mem#rias v%o ser assimK> N%o, porque n%o pretendo morrer. Iin!o que morro, s#. (s 6ltimas palavras tm de ser estas' PEent%o morri...P, com reticncias. Mas 9 peta. Escrevo isso, piscoo olho e sumo atr5s do arm5rio para que Nari/inho ique mesmo pensando que morri. er5 a 6nicamentira das minhas Mem#rias. Tudo mais verdade pura, da dura > alina batata, como di/ edrinho.@ona -enta sorriu.> 1erdade puraV Nada mais di)cil do que a verdade, Em)lia.> -em sei > disse a boneca. > -em sei que tudo na vida n%o passa de mentiras, e sei tamb9m que 9nas mem#rias que os homens mentem mais. uem escreve mem#rias arrumaas coisas de !eito que o leitor ique a/endo uma alta id9ia do escrevedor. Mas para isso ele n%o pode di/er a verdade, porque sen%o o leitor ica vendo que eraum homem i$ual aos outros. Lo$o, tem de mentir com muita manha, para dar id9ia de que est5alando a verdade pura.@ona -enta espantou>se de que uma simples bonequinha de pano andasse com id9ias t%oilos#icas.> (cho $raça nisso de voc alar em verdade e mentira como se realmente soubesse o que 9 umacoisa e outra. (t9 :esus risto n%o teve Animo de di/er o que era averdade. uando "ncio ilatos lhe per$untou' Pue 9 a verdadeKP, ele, que era risto, achoumelhor calar>se. N%o deu resposta.> ois eu seiV > $ritou Em)lia. > 1erdade 9 uma esp9cie de mentira bem pre$ada, das que nin$u9mdesconia. # isso.

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@ona -enta calou>se, a reletir naquela deiniç%o, e Em)lia, no maior assanhamento, correu em busca do 1isconde de abu$osa. omo n%o $ostasse de escrever com asua m%o/inha, queria escrever com a m%o do 1isconde.> 1isconde > disse ela >, venha ser meu secret5rio. 1e!a papel, pena e tinta. 1ou começar as minhasMem#rias.

sabu$uinho cient)ico sorriu.> Mem#riasV ois ent%o uma criatura que viveu t%o pouco !5 tem coisas para contar num livro demem#riasK sso 9 para $ente velha, !5 perto do im da vida.> Iaça o que eu mando e n%o discuta. 1e!a papel, pena e tinta. 1isconde trou3e papel, pena e tinta. entou>se. Em)lia preparou>se para ditar. Tossiu. uspiu een$as$ou. N%o sabia como começar > e para $anhar tempo veio come3i$ncias.> Esse papel n%o serve, enhor 1isconde. uero papel cor do c9u com todas as suas estrelinhas.Tamb9m a tinta n%o serve. uero tinta cor do mar com todos os seus pei3inhos. E quero pena de pato, com todos os seus patinhos. 1isconde er$ueu os olhos para o teto, resi$nado. @epois alou; e/>lhe ver que tais e3i$nciaseram absurdas; que ali no s)tio de @ona -enta n%o havia patos, nemo tal papel, nem a tal tinta.> Ent%o n%o escrevoV > disse Em)lia.> ua alma, sua palma > murmurou o 1isconde. > e n%o escrever, melhor para mim. W boaV...Em)lia, ainal, concordou em escrever as Mem#rias naquele papel da casa, com pena comum e tintade @ona -enta. Mas !urou que havia de imprimi>las em papel cor doc9u, tinta cor do mar e pena de pato. 1isconde disparou na $ar$alhada.> mprimir com pena de patoV W boaV... mprime>se com tipos, n%o com penas.> ois se!a > tornou Em)lia. > mprimirei com tipos de pato. 1isconde er$ueu novamente os olhos para o orro, suspirando.Estavam os dois echados no quarto dos badulaques. ervia de mesa um cai3%o/inho, e de cadeiraum ti!olo. Em)lia passeava de um lado para outro, de m%os Hs costas.a ditar.> 1amosV > disse ela depois de ver tudo pronto. > Escreva bem no alto do papel' PMem#rias daMarquesa de 4abic#P. Em letras bem $ra6das. 1isconde escreveu'MEMX4( @( M(4SE( @E 4(-X> ($ora escreva' ap)tulo rimeiro. 1isconde escreveu e icou H espera do resto.Em)lia, de testinha ran/ida, n%o sabia como começar.sso de começar n%o 9 5cil. Muito mais simples 9 acabar. in$a>se um ponto inal e pronto; ouent%o escreve>se um latin/inho' IN. Mas começar 9 terr)vel. Em)lia pensou, pensou, e por im disse'> -ote um ponto de interro$aç%o; ou, antes, bote v5rios pontos de interro$aç%o. -ote seis... 1isconde abriu a boca.> 1amos, 1isconde. -ote a) seis pontos de interro$aç%o > insistiu a boneca. > N%o v que estouindecisa, interro$ando>me a mim mesmaKE oi assim que as PMem#rias da Marquesa de 4abic#P principiaram de um modo absolutamenteimprevisto'ap)tulo rimeiro

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KKKKKKKEm)lia contou os pontos e achou sete.> orte um > ordenou. 1isconde deu um suspiro e riscou o 6ltimo ponto, dei3ando s# os seis encomendados.> -em > disse Em)lia. > ($ora ponha um... um... um... 1isconde escreveu trs uns, assim' B,B,B.

Em)lia danou.> edacinho de asnoV N%o mandei escrever nada. Eu ainda estava pensando. Eu ia di/er queescrevesse um ponto inal depois dos seis de interro$aç%o. 1isconde começou a assoprar e a abanar>se. or im disse'> abe que mais, Em)liaK melhor 9 voc icar so/inha aqui at9resolver deinitivamente o que quer que eu escreva. uando tiver assentado, ent%o me chame. @ocontr5rio a coisa n%o vai.> W que o começo 9 di)cil, 1isconde. 5 tantos caminhos que n%o sei qual escolher. osso começar de mil modos. ua id9ia qual 9K> Minha id9ia > disse o 1isconde > 9 que comece como quase todos os livros de mem#rias começam> contando quem est5 escrevendo, quando esse quem nasceu, em que cidadeetc. (s aventuras de 4obinson ruso9, por e3emplo, começam assim' PNasci no ano de B<F2, nacidade de QorR, ilho de $ente arran!ada etcP.> XtimoV > e3clamou Em)lia. > erve. Escreva' Nasci no ano de... *trs estrelinhas+, na cidade de...*trs estrelinhas+, ilha de $ente desarran!ada...> or que tanta estrelinhaK er5 que quer ocultar a idadeK> N%o. sso 9 apenas para atrapalhar os uturos historiadores, $ente muito me3eriqueira. ontinueescrevendo' E nasci duma saia velha de Tia Nast5cia. E nasci va/ia.# depois de nascida 9 que ela me encheu de p9talas duma cheirosa lor cor de ouro que d5 noscampos e serve para estuar travesseiros.> @i$a lo$o macela, que todos entendem.> -em. Nasci, ui enchida de macela que todos entendem e iquei no mundo eito uma boba, deolhos parados, como qualquer boneca. E eia. @i/em que ui eia que nemuma bru3a. Meus olhos Tia Nast5cia os e/ de linha preta. Meus p9s eram abertos para ora, como p9s de cai3eirinho de venda. abe, 1isconde, por que eles tm os p9s abertos para oraK> 5 de ser da raça > respondeu o 1isconde.> 4aça, nada. W o h5bito de icarem desde muito crianças $rudados ao balc%o vendendo coisas. Tmde abrir os p9s para melhor se encostarem no balc%o, e acabam icandocom os p9s abertos para ora. Eu era assim. @epois ui melhorando. o!e piso para dentro. Tamb9mui melhorando no resto. Tia Nast5cia oi me consertando, e Nari/inhotamb9m. Mas nasci muda como os pei3es. Sm dia aprendi a alar.> ei como oi a hist#ria > disse o 1isconde. > 1oc en$oliu uma alinha de papa$aio.> Est5 erradoV Nari/inho teve d# do papa$aio e n%o dei3ou que o matassem para tirar a alinha.Iiquei alante com uma p)lula que o c9lebre @outor aramu!o me deu. Nari/inho conta que a p)lula era muito orte de modo que iquei alante demais. (ssim que abri a boca, veio uma torrente de palavras que n%o tinha im. Todos tiveramde tapar os ouvidos. E tanto alei que es$otei o reservat#rio. ( ala ent%o icou no n)vel.> Tenha pacincia, Em)lia > disse o 1isconde. > Iicou muito acima do n)vel, porque a verdade 9 quevoc ainda ho!e ala mais do que qualquer mulher/inha.> Mas n%o alo pelos cotovelos, como elas. # pela boca. E alo bem. ei di/er coisas en$raçadas eat9 ilos#icas. nda h5 pouco @ona -enta declarou que eu tenho

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coisas de verdadeiro il#soo. abe o que 9 il#soo, 1iscondeK 1isconde sabia, mas in$iu n%o saber. ( boneca e3plicou'> W um bicho su!inho, caspento, que di/ coisas elevadas que os outros !ul$am que entendem e icamde olho parado, pensando, pensando. ada ve/ que di$o uma coisailos#ica, o olho de @ona -enta ica parado e ela pensa, pensa...

> Iicam pensando o qu, Em)liaK> ensando que entenderam. 1isconde enru$ou a testinha e quedou>se uns instantes de olho parado, pensando, pensando.(quela e3plicaç%o era positivamente ilos#ica.> E como sou il#soa > continuou Em)lia > quero que minhas Mem#rias comecem com a minhailosoia da vida.> uidado, MarquesaV Mil s5bios !5 tentaram e3plicar a vida e se estreparam.> ois eu n%o me estreparei. ( vida, enhor 1isconde, 9 um pis>ca>pisca. ( $ente nasce, isto 9,começa a piscar. uem p5ra de piscar, che$ou ao im, morreu. iscar 9 abrir e echar os olhos > viver 9 isso. W um dorme>e>acorda, dorme>e>acorda, at9 que dorme e n%oacorda mais. W, portanto, um pisca>pisca. 1isconde icou novamente pensativo, de olhos no teto. Em)lia riu>se.> Est5 vendo como 9 ilos#ica a minha id9iaK enhor 1isconde !5 est5 de olhos parados, er$uidos para o orro. uer di/er que pensa que entendeu... ( vida das$entes neste mundo, senhor sabu$o, 9 isso. Sm ros5rio de piscadas. ada pisco 9 um dia. isca emama; pisca e anda; pisca e brinca; pisca e estuda; pisca e ama; pisca e cria ilhos; pisca e $eme os reumatismos; por im pisca pela 6ltima ve/ e morre.> E depois que morreK > per$untou o 1isconde.> @epois que morre vira hip#tese. W ou n%o 9K 1isconde teve de concordar que era. 1isconde começa a trabalhar para Em)lia.ist#ria do an!inho de asa quebrada. Nesse ponto um urro veio distrair>lhes a atenç%o. Era uindim, chamando Em)lia para uma prosa.> Escute, 1isconde > disse ela. > Tenho coisas muito importantes a conversar com uindim. Iiqueescrevendo. 15 escrevendo. Iaça de conta que estou ditando. onteas coisas que aconteceram no s)tio e ainda n%o est%o nos livros.> ( hist#ria do an!inho de asa quebrada serveK > inda$ou o 1isconde.> XtimoV Nin$u9m l5 ora sabe o que aconteceu por aqui com o an!inho que cacei na 1ia L5ctea.onte isso e mais outras coisas. que quiser. 15 contando, contando.> Mas assim as Mem#rias icam minhas e n%o suas, Em)lia.> N%o se incomode com isso. No im dou um !eito; aço como na P(ritm9tica...P.@isse e saiu correndo. 1isconde icou de pena no papel, a pensar, a pensar. or im começou' (N:N @E (( SE-4(@((s crianças que leram 4einaç8es de Nari/inho com certe/a tamb9m leram a 1ia$em ao c9u, ondevem contadas as aventuras dos netos de @ona -enta, da Em)lia e tamb9mas minhas no pa)s dos astros. N%o recordarei, portanto, nada disso. # direi que houve l5 por cimatais estrepolias que os astr"nomos da Europa vieram quei3ar>sea @ona -enta das brincadeiras que estavam perturbando a harmonia celeste. @ona -enta, ent%o, noschamou para bai3o com um bom berro' P@esçam !5 da), cambadaVP.@escemos todos, e com $rande espanto @ona -enta viu que Em)lia tinha tra/ido o an!inho de asaquebrada, que descobrira, muito triste da vida, l5 entre as estrelas.

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 Nin$u9m descreve o rebuliço que houve na casa. ( vida parou. s pintos icaram sem quirera. (1aca Mocha icou sem palhas. ei!%o queimou na panela. Nin$u9m queriasaber de outra coisa sen%o ver, cheirar, apalpar e conversar com o an!inho.E havia ra/%o para isso, porque !amais descera ao mundo uma criatura t%o mimosa. W at9 di)cil dar id9ia da $alante/a daquela lor/inha das alturas. Muito louro,

cabelos cacheados, olhos a/uis, asas mais brancas que as do cisne. omo era lindoV neli/menteuma das asas se partira no ossinho do encontro, o que o impedia devoar. neli/mente para ele; para n#s oi eli/mente. e n%o osse o quebramento da asa, Em)lia n%oo pe$aria e n#s n%o ter)amos o $osto de conhecer em pessoa aquelemimo dos c9us.Sma criatura do c9u n%o pode saber nada das coisas da terra, de modo que o an!inho se mostrou deuma i$norAncia absoluta de tudo quanto aqui por bai3o a $ente sabeat9 de cor. Teve de ir aprendendo com Em)lia, a proessora.> PYrvore, sabe o que 9KP > per$untava ela.E como o an!inho arre$alasse os olhos a/uis esperando a e3plicaç%o, Em)lia vinha lo$o com umadas suas.> PYrvore > di/ia > 9 uma pessoa que n%o ala; que vive sempre de p9 no mesmo ponto; que em ve/de braços tem $alhos; que em ve/ de unhas tem olhas; que em ve/de andar alando da vida alheia e se implicando com a $ente *como os tais astr"nomos+ d%o lores erutas. Smas d%o pitan$as vermelhas; outras d%o laran!as docesou a/edas > e9 destas que Tia Nast5cia a/ doces; outras, como aquela enorme ali *as liç8es eram sempre no pomar+ d%o umas bolinhas pretas chamadas !abuticabas. 1amos, repita' !a>bu>ti>ca>ba...P an!inho atrapalhava>se e repetia errado' !a>ti>bu>ca>ba... a/endo Em)lia rolar de rir.(s per$untas do an!inho eram sempre de uma ininita in$enuidade.> PMas por que essas tais 5rvores nunca saem do mesmo lu$arKP> Porque tm ra)/es > e3plicava a Em)lia. > 4ai/ 9 o nome das pernas tortas que elas eniam pelaterra adentro. -em que querem andar, as pobres 5rvores, mas n%oconse$uem. # saem do lu$ar/inho em que nascem quando sur$e o machado.P> Pue animal 9 esseKP> PMachado 9 o mudador das 5rvores, muda a orma delas, a/endo que o tronco e os $alhos iquemcurtinhos. Muda>lhes at9 o nome. Yrvore machadada dei3a de ser 5rvore.assa a ser lenha. Lenha. 4epita.P> PW al$um deus esse machado t%o poderoso assimKP Em)lia ria>se, ria>se...> P@eus, nada, burrinhoV W antes um diabo malvad)ssimo, mas diabo sem chires, sem cauda, sem p9s de cabra, sem cabeça, sem braços, sem nada. # tem corte e cabo...P> Pue 9 caboKP> Pabo 9 uma perna s#, por onde a $ente se$ura. Iaca tem cabo. Garo tem cabo. -ule tem cabo *e bico tamb9m+. (t9 os pa)ses tm cabo, como aquele amoso abo da-oa Esperança que 1asco da Gama dobrou; ou aquele abo 4oque, da Guerra de anudos, um quemorreu e viveu de novo. s e39rcitos tamb9m tm cabos. Tudo tem cabo,at9 os tele$ramas. ara mandar um tele$rama daqui H Europa os homens usam o cabo submarino.P an!inho icava de boca aberta, sem entender coisa nenhuma.> PEnt%o o ZsubmarZ tamb9m tem caboKP> Pomo n%oK E comprid)ssimos, que v%o dum continente a outro.P> PE 9 por esses cabos que a $ente pe$a no marKP

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Em)lia ria>se, ria>se. pobre an!inho n%o tinha id9ia nenhuma das coisas da terra, porque semprevivera no c9u, l5 nas nuvens. Em)lia era obri$ada a e3plicar tudo,tudo...> Ph > disse ela > voc n%o ima$ina como 9 interessante a l)n$ua que alamos aquiV (s palavras danossa l)n$ua servem para indicar v5rias coisas dierentes, de

modo que saem os maiores embrulhos. tal cabo, por e3emplo. ra 9 isto, ora 9 aquilo. 5 oscabos de aca, de bule, de panela, como eu !5 disse, que s%o as pontas por onde a $ente pe$a nesses ob!etos. 5 os cabos da $eo$raia, que s%o terras que se pro!etam mar adentro. 5 os cabos do e39rcito, que s%o soldados. 5 os cabossubmarinos, que s%o uns ios de cobre comprid)ssimos por meio dos quais os homens passamtele$ramas dum continente a outro por dentro dos mares. E h5 um tal Zdar caboZ que 9 destruir qualquer coisa.P> PMas por que 9 assimKP> Para atrapalhar a $ente. Eu penso que todas as calamidades do mundo vm da l)n$ua. e oshomens n%o alassem, tudo correria muito bem, como entre os animais quen%o alam. (s ormi$as e as abelhas, por e3emplo. Esses bichinhos vivem na maior ordem poss)vel,com suas comidinhas a hora e a tempo > e que comidasV mel 9 uma pereiç%o que voc nem sonhaV E3atinho da cor de seus cabelos, mas sem cachos; em ve/ de cachostem avos. E qual o se$redo da elicidade desses animai>/inhosK Sms#' n%o alam. No dia em que derem de alar, adeus ordem, adeus pa/, adeus melV ( l)n$ua 9 ades$raça dos homens na terra.P> Pe 9 assim, por que eles n%o cortam a l)n$uaKP Em)lia ria>se, ria>se.> Portar a l)n$uaK Essa palavra l)n$ua quer di/er duas coisas' um #r$%o da boca, onde est5locali/ado o paladar e tamb9m a ala dos homens. 5 l)n$uas do 4io Grande,que vm em latas e servem para comermos e h5 as l)n$uas da alaç%o > a l)n$ua latina, a $re$a, a portu$uesa, a in$lesa. Estas n%o servem para comer > s# para armar  bate>boca...P> Pue 9 issoKP> P-ri$as sonoras. (ntes de bri$ar com socos e tapas e tiros, as criaturas bri$am com desaoros.P> Pue 9 desaoroKP> P@esaoro 9 a/er certos elo$ios a uma pessoa. 1ou dar um e3emplo. Temos por aqui um animalchamado cachorro ou c%o, bicho de muito bons sentimentos, o mais ami$odo homem. W t%o dedicado eamoroso, que o consideram o s)mbolo da idelidade. W o c%o que $uarda os quintais contra oshomens ladr8es. W o c%o que descobre a caça no mato. W o c%o que pu3aos tren#s nas re$i8es s# de $elo. W no c%o que o homem a/ e3perincias de laborat#rio. c%o 9 umcolosso. ois bem. uando um homem compara outro homem ao c%o,di/endo ZTu 9s um c%oZ, o outro pu3a aca. @esaoro 9 isso...P> PN%o estou entendendo > murmurou o an!inho. > e o c%o 9 um animal com tais qualidades,chamar c%o a um homem devia at9 ser uma honra.P> Pois 9 coisa de pu3ar aca ou dar tiro. utro e3emplo. 5 por aqui certo animal ainda mais precioso que o c%o > a vaca. ( maior maravilha de bondade e utilidadeque e3iste no mundo 9 a vaca. @5 leite para os ilhotes dos homens. @5 quei!o. @5 mantei$a. (l9mdisso d5 os be/erros, que crescem, viram bois e v%o pu3ar os carrosdos homens e os arados com que eles reme3em a terra para a/er suas plantaç8es. @5 a carne comque os homens a/em bies e picadinhos. @5 o couro com que os homens

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se calçam. @5 o mocot# com que as co/inheiras preparam as $el9ias, um doce $ostos)ssimo. @5 osossos com que se a/em bot8es e mil coisas.P> PEnt%o 9 a maravilha das maravilhasVP > observou o an!inho, entusiasmado com a vaca.> Pe 9V T%o maravilha que em certos pa)ses, como no E$ito, a vaca era adorada, virou deusa. (l9mdisso, a vaca 9 de uma docilidade ininita. -asta di/er que eu,

que sou deste tamanhinho, aço o que quero da 1aca Mocha de @ona -enta. (quele animal%o meobedece em tudo > vai para l5, vem para c5, vira para a esquerda, vira para a direita > 9 s# eu alar com ela. E de medo de mim n%o 9, porque com uma chirada a Mochame !o$a lon$e. or bondade apenas, por docilidade de $nio. oismuito bem. ( vaca 9 tudo isso que acabo de di/er e ainda muito mais. No entanto, se voc comparar a mais su!a ne$ra da rua com uma vaca, di/endo' Z1oc 9 uma vacaZ,a ne$ra rompe num escAndalo medonho e se estiver armada de rev#lver d5 tiro...P> Pue coisa interessanteVP > e3clamou o an!inho, assombrado.> PE vice>versa > continuou Em)lia. > 5 por aqui uns animais que s%o malvad)ssimos, umasverdadeiras pestes, como a tal cobra, que tem veneno nos dentes e o talti$re, que 9 est6pido e crudel)ssimo. Todos os homens tm tamanho #dio Hs cobras e aos ti$res quen%o podem ver um s# sem o destruir imediatamente. Mas se num versoum poeta compara uma mulher a uma cobra, di/endo, por e3emplo, que ela tem movimentos deserpente *serpente 9 o mesmo que cobra+, a Zelo$iadaZ rebola>se de $osto.E se um homem compara outro a um ti$re, este outro sorri.E3istiu na Irança um c9lebre lemenceau que oi apelidado o Ti$re. ensa que ele pu3ou acaK Nada disso. -abava>se todo quando o tratavam de ti$re. Mas osse al$u9mtrat5>lo de c%o ou vacaV... (h, vinha tiro na certa...P an!inho ouvia, ouvia e icava a cismar. 4ealmente, era>lhe imposs)vel entender as coisas da terra.> PTodo o mal vem da l)n$ua > airmava a boneca. > E para piorar a situaç%o e3istem mil l)n$uasdierentes, cada povo achando que a sua 9 a certa, a boa, a bonita.@e modo que a mesma coisa se chama aqui de um !eito, l5 na n$laterra de outro, l5 na (lemanhade outro, l5 na Irança de outro. Sma trapalhada inernal, an!inho.Puem icava atrapalhado era o an!inho. Em)lia tinha um modo desnorteado de pensar. (ssim, por e3emplo, as suas c9lebres PasneirinhasP. Muitas ve/es n%o eram asneiras,eram modos dierentes de encarar as coisas, como quando e3plicou ao an!inho o caso das rutas do pomar.> PIrutas s%o bolas que as 5rvores penduram nos ramos, para re$alo dos passarinhos e das $entes.@entro h5 caldos ou massas de todos os $ostos. (s maç%s usam massas.(s laran!as usam caldo. E as pimentas usam um ardor que queima a l)n$ua da $ente.P> PEnt%o tm o$o dentroK Io$o 9 que queima.P Em)lia ria>se.> P(h, an!inhoV 1oc vai custar a compreender os se$redos da l)n$ua humana. Este ZqueimaZ 9 outrocaso. ueimar 9 uma arte que s# o o$o a/, mas quando uma coisaarde na l)n$ua n#s di/emos que queima.P> PMas queima mesmoKP> PN%o queima, mas n#s di/emos assim. Sm 5cido que pin$amos na pele n#s tamb9m di/emos quequeima. Sma lo!a que est5 em liquidaç%o n#s di/emos que est5 ZqueimandoZas suas mercadorias. No brinquedo do esconde>esconde, quando o que est5 de olhos vendadosche$a perto do escondido, n#s di/emos que est5 ZqueimandoZ.P> PEnt%o... ent%o... ent%o > di/ia o an!inho > a trapalhada deve ser medonha.PEm)lia ria>se, ria>se.

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> PEu !5 estive no a)s da Gram5tica, onde todos os habitantes s%o palavras. E um dia hei de contar  por mi6do como a Gram5tica lida com elas e conse$ue dar ordemao pensamento.P> P@ar ordem n%o 9 mandar uma pessoa a/er uma coisaKP> PW e n%o 9. [s ve/es 9, outras ve/es n%o 9. @ar ordem pode ser mandar a/er uma coisa e tamb9m

 pode ser botar cada coisa no seu lu$ar.P> PE como a $ente sabe quando 9 de um !eito ou de outroKP> Pelo sentido.P> PE que 9 sentidoKPEm)lia desanimou. N%o h5 nada mais di)cil do que ensinar an!inhos.> PEscute c5, Ilor. uem entende bem disto de l)n$uas e $ram5ticas 9 o uindim. Tome umas aulascom ele.P> Pue 9 aulaKPEm)lia saiu correndo, sen%o icava louca...( hist#ria do an!inhocorre mundo. 4ei da n$laterra mandaao s)tio de @ona -enta um navio cheio de crianças.(s conversas de Em)lia com o an!inho n%o tinham im, e por mais que ela e3plicasse as coisas daterra ele cada ve/ as entendia menos. Sma terr)vel embrulhada oise ormando em sua cabecinha.Enquanto isso as duas velhas tratavam>lhe da asa quebrada com un$Jentos e emplastros. Em)lian%o $ostou daquilo.> Pe o an!inho sarar > disse ela >, 9 bem poss)vel que voe e u!a daqui, e como 9KP> PN%o voa, n%oV > sosse$ou Tia Nast5cia, que tinha muita pr5tica de criaturas que voam >, $alinhas,marrecos e patos. > orto a ponta de uma asa dele e quero ver.P( presença do an!inho no s)tio oi causa de muitas bri$as, porque a boneca se considerava donadele. Ela o descobrira' lo$o, era seu. @a) os terr)veis pe$as comedrinho e Nari/inho.> PEla est5 monopoli/ando o an!o, vov#V > quei3ava>se a menina. > N%o o lar$a, atropela o diainteiro o coitadinho com as tais ilosoias da vida. Eu, se osse asenhora, tomava o an!inho dela.PMas @ona -enta achava $raça naquilo e ia dei3ando.( hist#ria do an!inho começou a correr mundo. Toda $ente das redonde/as veio v>lo. s !ornaisderam not)cias. r5dio e o tel9$rao transmitiram essas not)cias para todos os pa)ses. E de tal modo a novidade se espalhou que as crianças do mundo inteiroicaram assanha>d)ssimas para conhecer o an!inho. ueriam H viva orçavir ao s)tio brincar com ele.Mas virem como, se as crianças do mundo s%o milh8esK s pais e as m%es e3plicavam aos ilhosque era o maior dos absurdos pensarem em semelhante coisa. (contece, por9m, que quando uma criança quer vivamente uma coisa e n%o conse$ue d5 de ema$recer, icadoentinha, cheia de bichas. E as crianças do mundo inteiro começarama icar doentinhas e lombri$uentas de tanto dese!o de virem ao s)tio.( situaç%o tornou>se t%o $rave que o 4ei da n$laterra, o residente 4oosevelt, o IJhrer da(lemanha, o @uce da t5lia, o mperador do :ap%o e o Ne$us da Eti#piase reuniram em conerncia para tratar do assunto. @epois de muita discuss%o icou assentado quetodas as crianças do mundo seriam levadas ao s)tio de @ona -enta.

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Mas por partes. rimeiro as de um pa)s; depois as de outro > e assim at9 o 6ltimo.ara saber quais iriam primeiro, oi preciso tirar a sorte. residente 4oosevelt escreveu o nomede cada pa)s num pedacinho de papel e os botou, bem dobrados,dentro do chap9u de dois bicos do mperador do :ap%o. Em se$uida pediu ao Ne$us, que era o maisvelho, para tirar um. ( sorte avoreceu as crianças da n$laterra.

uando saiu nos !ornais a not)cia desse ato, oi um hurra imenso no mp9rio -ritAnico e umachoradeira ainda maior nos outros pa)ses. 4ei da n$laterra, ent%o, mandou preparar um $rande navio cheio de doces, brinquedos e livrosde i$uras, e nele embarcou a criançada in$lesa sob as ordens deum dos seus melhores almirantes > o (lmirante -roUn. Ele iria lev5>las ao s)tio de @ona -enta.1ivaV 1ivaV 1ivaV ( criançada in$lesa, no dia marcado para o embarque, encheu o enormetransatlAntico \onderland, na maior al$a/arra e pinoteamento. Iicou aquiloque nem um enorme viveiro de periquitos louros. pobre (lmirante levava as m%os aos ouvidos,murmurando'> Per5 poss)vel que este barulho dure at9 che$armos ao s)tio de @ona -entaKPuase icou doido o pobre homem, porque, como era a 6nica $ente $rande de bordo *sem contar osmarinheiros da tripulaç%o+, tinha de atender a tudo, apa/i$uar asterr)veis bri$as que a cada instante sur$iam, por causa de um doce maior que outro ou de um livrode i$uras que v5rias crianças queriam ver ao mesmo tempo.Ieli/mente n%o houve temporal durante a via$em, de modo que as crianças n%o en!oaram,che$ando ao -rasil em pereito estado. momento da invas%o do s)tio de @ona -enta oi importante. ( boa senhora n%o ora avisada, demodo que teve a maior surpresa de toda a sua lon$a vida de mais desessenta anos.Estava @ona -enta na varanda, remendando umas meias uradas de edrinho, quando viu l5 lon$euma poeira na estrada.> PNast5cia > $ritou ela >, tra$a o meu bin#culo. Estou vendo uma poeira muito esquisita l5 lon$e.er5 boiadaKP( ne$ra trou3e o bin#culo. @e nada valeu. edrinho havia tirado os vidros para a/er aquele c9lebretelesc#pio com que espiou o dra$%o de %o :or$e na Lua. @ona-enta, que i$norava isso, olhou pelos canudos va/ios e icou na mesma.> PMinha vista est5 t%o cansada que nem com este bin#culo, que 9 e3celente, consi$o en3er$ar melhor. N%o est5 vendo uma poeirada, Nast5ciaKP> PEstou, sim, inh5. Mas boi n%o 9. or este caminho nunca passa boiada. oisas dos meninos,inh5 vai ver. (l$uma nova reinaç%o com o tal p# de pirlimpimpim. Elesn%o dormem...P Nisto apareceu Nari/inho, que estivera no pomar ensinando Ilor das (lturas *nome do an!o+ adescascar tan$erinas.> P1ov#V > $ritou ela assanhad)ssima. > 1em vindo um bando enorme de criançasV :uro quesouberam l5 ora do nosso an!inho e vm brincar com ele...P> PredoV > e3clamou Tia Nast5cia. > e aquilo tudo 9 criançada, onde vamos parar, inh5K ada um9 uma ome > e onde vou arran!ar bolinho para tanta omeK Nem uma barrica inteira de arinha d5 para contentar metade do povar9u que vem vindo...P@ona -enta começou a sentir palpitaç8es do coraç%o.> PN%o se ali!a, vov# > disse a menina. > avemos de dar um !eito. ( senhora bem sabe quesabemos dar !eito a tudo.P

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@isse e oi correndo conerenciar com edrinho e Emilia. Encontrou>os no alto da pitan$ueira,espiando a estrada.> PEstamos ritos, Nari/inhoV > $ritou o menino l5 do $alho. > 1em um tal bando de crianças, que seentenderem de nos urtar o an!o n%o haver5 meio de resistir,urtam mesmo...P

edrinho desceu da 5rvore. ( id9ia de que a criançada de ora vinha raptar o an!inho enchia>o deapreens8es. riança 9 criança. soladas ainda passam, mas em bandoss%o os bichos mais daninhos do mundo.> PE a$oraK > di/ia ele. > ue havemos de a/erKP Emilia meteu o bedelho.> P# h5 um !eito > disse ela >' escondermos o an!inho no oco da i$ueira e vestirmos o 1isconde dean!o. e a criançada o raptar, raptar5 um an!o also > o verdadeiroicar5 aqui.Pedrinho e Nari/inho entreolharam>se.> PN%o est5 m5 a id9ia da Emilia > disse o menino. > Tenho aquelas asas do $avi%o que o ompadreTeodorico matou outro dia. Temos a ca>misola nova que vov# e/ paraa Emilia. om isso e mais al$uma coisa aremos do 1isconde um an!o bem re$ular.P> PMas an!o tem asas brancas > ob!etou a menina >; as do $avi%o s%o pintadinhas.P> Pom arinha de tri$o eu aço asa de qualquer cor icar branca como neve > resolveu edrinho. > Wisso. 1amosV orra, Emilia, e pe$ue o 1isconde. E voc, Nari/inho,ve!a barbante para amarrar as asas e o resto. N%o temos um minuto a perder.P Nunca se viu no s)tio correria tamanha. an!inho verdadeiro, muito assustado sem compreender coisa nenhuma, oi escondido por edrinho no oco da i$ueira.> PIique aqui muito quietinho. N%o se me3a, n%o aça o menor barulho.P> PTenho medo deste escuro > disse ele. > (qui h5 ratos de asas.P> PE l5 h5 raptores, que vm vindo em bando enorme. > (ntes ratos do que raptores. Iiquequietinho, sen%o tudo est5 perdido.PLar$ou>o l5 bem no undo do oco e voltou correndo. Nari/inho !5 trou3era as asas do $avi%o, barbante e a camisola nova da Em)lia. # altava eu, 1isconde.> P@epressa, Em)liaVP > $ritou o menino.> PEle est5 resistindo > respondeu de lon$e a boneca. > @i/ que n%o tem vocaç%o para an!o...P> PTra$a>o H orçaV @epressaV N%o h5 tempo a perder.PEm)lia pu3ou>me pelo braço e eles me a$arraram, me eniaram na camisola, me pre$aram as asas e polvilharam tudo com uma nuvem de arinha de tri$o. Iiquei um an!oesquisit)ssimo, mas an!o.> PMuito bem > disse edrinho, aastando>se para apreciar o eeito. > arece um antasma, masserve. ($ora vou p">lo naquele $alho da pitan>$ueira. (ssim todos poder%ov>lo e nin$u9m poder5 pe$5>lo. Iicando embai3o, os in$lesinhos o espandon$am num minuto.riança 9 o diabo.PIui ent%o en$anchado numa orquilha da pitan$ueira, onde iquei suspirando. Era imposs)velima$inar>se an!o mais triste e c"mico. (s asas oram arrumadas com tanta pressa que uma lo$o pendeu.> PN%o a/ mal > disse edrinho. > Todos sabem que o an!inho tem uma asa quebrada. Escute,1isconde' saiba comportar>se como an!o, est5 entendendoK ru/e os braçosno peito, e quando as crianças che$arem aça carinha de riso celestial, com os olhos er$uidos. E n%ose meta a alar. uem ala somos n#s, aqui embai3o.P Nari/inho, que subira H pitan$ueira, berrou l5 de cima'> PEst%o che$ando, edrinhoV uase na porteira !5. W hora de ir receb>los.P

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edrinho oi. Trepou H porteira e icou H espera. [ rente do bando de crianças vinha um velhoardado, de $rande chap9u de dois bicos na cabeça. ( criançada parou. velho adiantou>se. Ie/ uma saudaç%o e disse'> Penhor, a not)cia da via$em ao c9u que os netos de @ona -enta i/eram che$ou at9 n#s l5 nan$laterra, e ua Ma!estade o 4ei Eduardo 1 houve por bem permitir 

que as crianças in$lesas, comandadas por mim, que sou o (lmirante -roUn, viessem visitar o an!oque a enhora Marquesa de 4abic# trou3e da 1ia L5ctea.Pedrinho correspondeu H saudaç%o do (lmirante e disse'> PTemos muita honra em receber no s)tio de vov# as crianças in$lesas comandadas pelo ilustre(lmirante -roUn. Estamos, entretanto, muito receosos de que no meiode tanta criança venham al$uns elementos perversos, que nos queiram a/er mal, raptando oan!inho. Em vistadisso resolvemos s# dar entrada a essas crianças se por acaso o enhor (lmirante nos entre$ar umre9m.P(quelas palavras, ditas em tom irme, aborreceram o velho (lmirante, que n%o havia pensado emsemelhante hip#tese.> P( sua desconiança, senhor > disse ele >, nos oende. s in$lesi>nhos que tra$o s%o todos da maisina educaç%o.P> Pei disso > tornou edrinho. > Mas como pode o enhor (lmirante provar que entre eles n%o seacha oculto al$um maleitorK Eis por que resolvemos e3i$ir um re9m,sem que isso queira si$niicar a menor oensa ao 4ei da n$laterra, nem a 1ossa onra, nem a todaesta criançada.P (lmirante pensou por uns instantes e disse'> PMuito bem. ompreendo tudo e aceito as condiç8es propostas. Eu mesmo oereço>me. Iicarei nasala, conversando com a sua e3celent)ssima av#, enquantoo meu bandinho de crianças se diverte no pomar.P> Pereitamente, enhor (lmirante > disse edrinho. > Est5 aceita a sua proposta. 1ou abrir a porteira.P@isse e, descendo da porteira, abriu>a.> Podem entrar...P(quilo oi o mesmo que er$uer a portinhola duma tulha de ca9 bem cheia. 4olou criança paradentro do terreiro como rolam $r%os de ca9 da tulha aberta. Lindas todas,de todos os louros poss)veis e de um corado de maç% ou psse$o. lhos a/uis, pele alv)ssima.omo s%o lindas as crianças in$lesasV ara transorm5>las em an!os bastariacolar nas costas de cada uma duas asinhas.Enquanto a onda de crianças inundava o terreiro, Nari/inho, l5 no pomar, me a/ia as 6ltimasrecomendaç8es, a mim, 1isconde.> PE comporte>se, heinK > di/ia ela. > M%os cru/adas no peito, olhos no c9u > assim... E levante um pouco a asa esquerda... Est5 muito ca)da. (ssim...PEm)lia veio com um cai3%o va/io, que colocou rente ao tronco da pitan$ueira.> Para que isso, Em)liaKP > inda$ou a menina.> Para $uardar os presentes. mposs)vel que n%o tra$am muitos presentes. Nin$u9m visita an!o comas m%os abanando.PL5 no oco o an!inho tremia de medo. Sm dos tais Pratos de asasP viera pendurar>se bem sobre suacabeça. Mesmo assim o an!inho n%o deu o menor $rito, nem e/ o menor movimento. Era obedient)ssimo.

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@ona -enta estava na varanda, muito bonitona no seu vestido preto de babados. edrinho condu/iu para l5 o (lmirante.> P1ov# > disse ele > tenho a honra de apresentar o enhor (lmirante -roUn, que ua Ma!estade o 4ei da n$laterra mandou comandando as crianças quemorriam de vontade de brincar com o an!inho. (lmirante concordou em icar 

como re9m a) na sua sala.P @ona -enta emperti$ou>se toda e respondeu'> PTenho imenso or$ulho em conhecer 1ossa onra, enhor (lmirante -roUn. # n%o estouentendendo essa hist#ria de re9m a que meu neto acaba de reerir>se...P.edrinho e3plicou rapidamente que era uma $arantia contra qualquer depredaç%o que as criançasi/essem no s)tio.> Pue absurdo, meu ilhoV > e3clamou @ona -enta. > # me admiro de o (lmirante n%o ter>sema$oado com uma desconiança dessa ordem. ( honra alt)ssima que nos a/o 4ei da n$laterra 9 a maior com que poder)amos sonhar, e se voc, edrinho, mostroudesconiança, a ponto de obri$ar o (lmirante -roUn a oerecer>se como re9m, bem triste id9ia icar5 ele a/endo da nossa hospitalidade...P> PTudo isso 9 muito lindo, vov# > respondeu edrinho >, mas a senhora bem sabe como s%ocrianças. odem revoltar>se contra o (lmirante e nos urtar o an!inho, ecomo 9K Ele 9 um e elas s%o muitas.P velho in$ls sorriu.> Pe osse assim, meu menino, n%o poderia haver e39rcitos no mundo, nem esquadras. s $eneraise almirantes, que comandam e39rcitos e esquadras enormes, n%o osmantm na disciplina por meio da orça )sica > sim da orça moral. om a orça moral, um homemso/inho domina milh8es.P> PEle 9 bobinho, (lmirante > e3plicou @ona -enta. > N%o aça caso do que disse. 15 entrando sema menor cerim"nia, porque esta casa 9 sua. E a criançada que v5com edrinho e brinque H vontade. Laran!as temos bastante.P (lmirante subiu os seis de$raus da varanda, com o chap9u de dois bicos debai3o do braço.(pertou a m%o de @ona -enta com tal orça que ela e/ uma careta.> Pueira sentar>se, enhor (lmirante > disse a boa velha disarçando a dor. E para dentro' > Nast5cia, ve!a depressa um cae/inho.P> PEu preeriria um u)sque, minha senhora > murmurou o (lmirante, que estava morto de sede, massede de in$ls, dessas que s# u)sque mata.P N%o havendo u)sque na casa, @ona -enta e/ sinal a edrinho para que mandasse buscar na vendado Elias Turco uma $arraa. E depois, para o ilustre persona$em'> Preia, (lmirante, que esta sua visita em nada me espanta. E sabe por quK orque estouacostumada aos maiores prod)$ios domundo. que acontece neste s)tio, meu @eus do c9uV, nem queira saber, (lmiranteV No começoest5 claro que muito nos assust5vamos, eu e Tia Nast5cia. Mas ho!e...(saventuras dos meus netos n%o tm conta. (t9 pelo c9u !5 andaram > pela 1ia L5ctea, ima$ine...P> Pei disso, minha senhora. s !ornais de Londres trataram do caso dos astr"nomos que aquiestiveram em comiss%o, e com o saudoso 4ei :or$e 1, que @eus ha!a, tiveense!o de conversar a respeito. Ele achava a Marquesa de 4abic# um ser/inho muito interessante,embora um tanto shocRin$ Hs ve/es...P> Pobre 4ei :or$eV > suspirou @ona -enta. > enti imensamente a morte sua. ue car$a pesada n%oh5 de ser a do rei dum $rande imp9rioV Eis uma vida que eu n%o inve!o.P> PNem eu > a!untou o (lmirante. > reiro comandar os meus cru/adores a reinar sobre o mundo.P

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> PE a 4ainha 1i6va, como vai indoK Mais consoladinha !5KP> P1ai vivendo, minha senhora. $olpe oi terr)vel.P @ona -enta suspirou.> PN%o valemos nada nesta vida, (lmirante. uando che$a o nosso dia, o $ancho da morte nos pesca, se!amos reis ou mendi$os. Mas... parece que est5 bem cansado, (lmirante...P> PMais que cansado, minha senhora. Estou meio morto. W ent%o brincadeira uma via$em destas, de

duas semanas no mar, lidando com um carre$amento de mil criançasendemoninhadasK SV...P> P4ealmenteV Eu aqui no s)tio, com dois netos apenas, Hs ve/es me ve!o doida. %o dois que valem por dois mil, tais as maluquices que inventam, ou as reinaç8es,como eles di/em. Mas n%o aça cerim"nia, (lmirante. Tenho ali a minha redinha. @eite>se e tire umcorte de sono.P (lmirante n%o esperou se$undo convite. (comodou>se como p"de na redinha de @ona -enta eoi echando os olhos.uando Tia Nast5cia apareceu com a bande!a de ca9, ele roncava.> PssiuV N%o o acorde... > sussurrou @ona -enta. > (lmirante est5 morto de canseira. ma$ineque passou duas semanas no mar, lidando com mil crianças, isso dan$laterra at9 aqui...P> PredoV > e3clamou a preta. > Esses in$leses tm cada umaV... -em di/ eu edrinho que eles s%oZcntricoZ.P> PE3cntricos, Nast5cia > corri$iu @ona -enta. > E a criançadaK omo est5 se comportando l5 no pomarKP> PNem sei, inh5. N%o espiei ainda > nem tenho cora$em de espiar. Estou s# ima$inando osZhorroresZ...P an!o also. rotesto das crianças in$lesas. (parece eter an. onversas com o an!inhoverdadeiro.( criançada in$lesa, depois que o (lmirante entrou na sala de @ona -enta, oi com edrinho para o pomar.> P an!oV an!oV > $ritavam todas. > ueremos ver o an!oV...P edrinho deteve>se diante da pitan$ueira e apontou para a estranha i$ura de m%os cru/adas no peitoe olhos no c9u, en$anchada na orquilha da 5rvore.> PL5 est5 eleV an!o 9 aquilo.PIe/>se $rande silncio. Milhares de olhos a/uis se enocaram na i$urinha. 6bito, uma dascrianças e3clamou' > Pue an!o eioVP, e a barulhada começou. PN%o valiaa pena virmos de t%o lon$e para vermos issoP, $ritou outra. E terceira' PEm qualquer casa de brinquedos em Londres temos coisa melhorP. E quarta' Parece an!o de pau... Nem se me3eP. Nari/inho me e/ sinal, a mim, 1isconde, para que me me3esse e i/ uns movimentos muitodesa!eitados.> PuK > berrou de repente uma menina. > (n!o de cartolaK nde !5 se viu issoKP@e ato. Na pressa da arrumaç%o os meninos esqueceram>se de tirar da minha cabeça a c9lebrecartolinha, de modo que l5 estava o an!o de cartola na cabeça, muito branca, porque tamb9m ora polvilhada de arinha de tri$o.Em)lia salvou a situaç%o. Trepando no cai3%o/inho, pediu silncio e disse'> P1ou e3plicar o motivo da cartola. @ona -enta nos contou quea cartola 9 uma invenç%o in$lesa; da) a nossa id9ia de botar uma car>tolinha na cabeça dele comohomena$em Hs crianças in$lesas que ovinham visitar.P

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s in$lesinhos entreolharam>se. ( e3plicaç%o era boa. Mas continuaram a estranhar o an!o.> Ps que conheço dos livros de i$ura > disse um > s%o muito mais bonitos. %o $ordinhos. Esse 9ma$ro como bacalhau.PEm)lia e3plicou'> PW que andou doente. pobre/inho quebrou a asa num tombo que deu l5 nas estrelas. Est5

sarando; lo$o ica t%o $orducho como antes. N%o notam que est5 com a asaesquerda ca)daK uebrou>a bem no encontro. Tia Nast5cia !5 botou cola>tudo.P> PMas a cara dele n%o 9 de an!o > observou outra criança. > arece cara eita com aca. 1erdadeiracara de pau...P> PW da doença > insistiu Em)lia. > 1ocs que n%o tm asas n%o ima$inam como quebradura de asaesquerda desi$ura um pobre an!o...P(pesar das belas e3plicaç8es as crianças in$lesas continuavam de nari/ torcido. N%o conse$uiamen$olir aquele an!o t%o eio.> PIrancamente, perdemos a nossa via$em > murmuraram diversas > e o melhor 9 levarmos de voltaos presentes tra/idos. Esse an!o n%o merece nenhum, nem merece que brinquemos com ele. # merece um pontap9...PE a vaia começou.> PIora o an!o ma$roV...P> PMorra o an!o eioV...P> PLincha o an!o cartoludoV...P berreiro tornava>se cada ve/ maior, e a coisa acabaria em desastre, se um lindo menino n%osur$isse berrando'> ParemV Nem mais uma palavraV uem vai a$ir a$ora sou eu.P> Peter anV.P > e3clamou edrinho, reconhecendo o amoso menino que !amais quis crescer.> Pim, sou eter an, e !5 sei de tudo. Esse an!o 9 also, 9 o tal 1isconde disarçado em an!o. an!inho verdadeiro est5 escondido em qualquer parte.P> PE se or assimKP > $ritou edrinho assustado.> Pe or assim > tornou eter an > ou vocs nos mostram o an!inho verdadeiro, ou n#s damos uma busca em re$ra neste s)tio at9 o descobrirmos.Pedrinho encheu>se de cora$em e disse com vo/ irme'> PN#s estamos em nossa casa e saberemos deend>la contra tudo e contra todos. Medo n%o temos >de nadaV uem manda aqui no s)tio sou eu > depois de vov#. or bema coisa vai, enhor an, mas por mala coisa n%o vai, n%oV Nem a pauV Nem a tiro de rev#lverV Lembre>se que o (lmirante -roUn est5como re9m l5 na sala de vov#. ( vida daquele velho nos oi coniadaem $arantia do bom comportamento de vocs...P eter an caiu em si. (l9m disso, n%o queria bri$ar; queria apenas ver o an!inho verdadeiro; de modo que perdeu a emp5iae disse conciliatoriamente'> P4econheço que est5 em sua casa, edrinho, mas voc h5 de admitir que 9 uma verdadeira !udiaç%o nos receberem deste modo. Ii/emos uma via$em lon$u)ssima, por ordemdo 4ei, para visitar o an!inho, e ao che$armos vocs nos impin$em um macaco de sabu$oV ra, 9 preciso concordar que isso 9 um pouco meio muito...P> PMacaco de sabu$o dobre a l)n$uaV > $ritou Em)lia. > 1isconde 9 um verdadeiro s5bio,estimad)ssimo de todos daqui, at9 de @ona -enta. 4etire o macacoV...Peter an, que n%o queria bri$ar, retirou o macaco e disse, voltan>do>se para edrinho'> P1amos. 4esponda H minha interpelaç%o.P edrinho conessou tudo.

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> Ilor/inha das (lturas para me servirV... E que idade tem, an!inhoKP> PN%o tenho idade > respondeu ele. > ou parado, n%o cresço. 5 s9culos que vivo sempre destemesmo tamanhinho...P> PEst5 vendo, eter anK > $ritou (lice. > Tal qual voc. W parado. N%o cresce...P> PW como eu tamb9m > !untou Em)lia. > Eu tamb9m n%o cresço. Nasci deste tamanho e deste

tamanho icarei sempre. abem que a proessora do an!inho sou euK Eu, simV...Tenho>lhe ensinado mil coisas. er$unte>lhe, por e3emplo, o que 9 lor.P(lice per$untou ao an!inho o que era lor.> PIlor > respondeu ele > 9 um sonho colorido e cheiroso, que com as ra)/es as plantas tiram doescuro da terra e abrem no ar. Ioi como Em)lia me ensinou.PTodos se admiraram da poesia daquela deiniç%o, mas (lice n%o queria ouvir o an!inho repisar ascoisas ensinadas pela Em)lia; queria saber como eram as coisas l5no c9u.> Ponte>nos como 9 l5. @eve ser lindo, n%oK onte a sua vidi>nha toda...P an!inho contou'> PN%o me lembro quando nasci. (cho que sou ilho das nuvens e das estrelas, porque sempre meachei rodeado de nuvens e estrelas. Meu principal brinquedo era a/er  bolinhos de massa c#smica para !o$5>los no 9ter. Esses bolinhos iam crescendo no espaço eviravam novas estrelas...P> PE os cometas de caudaK Ia/ia tamb9m bolinhos de cometasK > quis saber (lice.P> Pim. W muito 5cil. -asta a/er um bolinho redondo e depois dar um pu3o dum lado, dei3andoum começo de rabinho. uando a $ente !o$a esses bolinhos no espaço,a velocidade vai a/endo que o rabinho se encompride cada ve/ mais, e se abra todo, muito oo,adquirindo aquela orma de cauda de cometa que vocs aqui conhecem...P( criançada in$lesa estava maravilhada e doida por ir brincar de Pbolinhos de estrelasP no c9u.Em)lia torceu o nari/, e como uma das crianças lhe per$untasse setamb9m n%o estava doida por aquilo respondeu com ar de arta'> P:5 me en!oei disso. Ii/ tanto bolinho de estrela e cometa l5 na 1ia L5ctea que ho!e at9 preiroa/er bolinhos de barro. Estou arta...P(s crianças in$lesas olharam>na com prounda inve!a. (lice prosse$uiu nas per$untas.> PE as nuvensK Muito maciasKP> PMais que a paina daqui. N%o e3iste nada mais lindo que as nuvens, porque n%o param nunca demudar de orma e cor. Eu rolava por cima das redondas, como se ossemtravesseiros de sonho. (tirava>me de uma para outra, Hs ve/es de $rande altura. uando ca)a,mer$ulhava at9 ao meio. Sma $ostosuraV...P> PMas brincava so/inhoKP> PN%o. 5 l5 milh8es de an!inhos como eu. -rinc5vamos o dia todo. Ioi numa dessas brincadeirasque houve o desastre.P> Ponte como oi esse desastreP > pediu (lice.> PEu estava com os outros brincando de rolar de nuvem em nuvem. Nisto ormou>se embai3o den#s uma $rande. @ei um pulo. uando ca)a, aundei dentro da nuvem at9ao meio, $ostosamente. 6bito, um choque aqui no encontro da asa esquerda. @ei um $rito. Euhavia esbarrado num corpo estranho.P> Porpo estranhoK > e3clamou (lice. > ois h5 corpos estranhos nas nuvensKP> PN%o h5 > disse o an!inho >, mas nesse dia houve. @entro da nuvem estava um corpo estranho queeu s# en3er$uei no momento do choque. Tinha pernas e braços, cabeçae cartola...P

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> PEra o 1iscondeV > berrou Em)lia. > Na nossa via$em ao c9u ele caiu da Lua e icou $irando noespaço como sat9lite. Numa das voltas com certe/a esbarrou no an!inho.P> PE depoisKP > inda$ou (lice, cada ve/ mais curiosa.> P@epois perdi os sentidos. N%o vi mais nada. uando meus olhos se abriram, encontrei>me naimensa plan)cie da 1ia L5ctea, no colo de uma criaturinha estranha.

Era aqui a Em)lia...PEm)lia voltou>se para a criançada, radiante de or$ulho, para que todos vissem que era ela mesma.> PE que maisKP> PEm)lia me ninava, e quando abri os olhos me alou uma porç%o de coisas que n%o entendi.@epois vieram vindo os outros. (pareceu aquela l5 > e apontou para Nari/inho>; e aquele l5 > e apontou para edrinho.> E tamb9m um senhor muito s9rio, de $randes orelhas e olhar triste.P> P -urro IalanteVP > $ritou Em)lia.eter an cochichou para edrinho que a/ia muita quest%o de conhecer o burro.> PE depoisKP > volveu (lice.> P@epois descemos do c9u > disse o an!inho. > @ona -enta nos havia chamado com um berro' Z:5 para bai3o, cambadaVZ s astr"nomos estavam aqui neste s)tio, se quei3andodas reinaç8es eitas l5 nas alturas. uando che$uei e vi esses homens tive medo. Smas barbas$randes, #culos no nari/, carecas...P> PE como vai se dando por aquiKP> PtimamenteV > respondeu o an!inho. > Todos me querem muito e me tratam na palma da m%o. Nast5cia a/ uns quitutes que n%o e3istem l5 no c9u. W das pipocas queeu $osto mais. Tamb9m dos bolinhos...P> P-olinhos de estrelasKP> PN%o. @um p# branco...P> PIarinha de tri$oVP > berrou Em)lia.> PEla amassa esse p# com $ema de ovo e $ordura > continuou oan!inho. > Enrola os bolinhos entre as palmas brancas de suas m%os pretas e os p8e em lata num buraco muito quente chamado orno. assado al$um tempo os bolinhosicam no ponto > e 9 s# comer.P> Pue $alante/aV > e3clamou (lice. > ue amorV om que $raça ele conta uma simples receita de bolinhoV... E rutasK Tamb9m comeKP> Pe comeV > berrou Em)lia. > Gulos)ssimo, at9. ara devorar pitan$as, n%o h5 outro.P> Pim > conirmou o an!inho >, $osto muito de pitan$as, quando est%o com o vermelho !5 bemescuro. @as verdes, amarelas ou apenas um pouco vermelhas, n%o $osto.Muito a/edas. utra ruta de que $osto muito s%o as !atibucabas...P> P:a>bu>ti>ca>basV > emendou Em)lia. > N%o h5 meio de ele di/er certo...P> PTamb9m vocs aqui no -rasil arran!am cada nome para as rutasV > observou (lice, que nuncatinha visto !abuticaba. > Essa, a avaliar pelo nome, deve ser do tamanhode uma melancia.P> P(o contr5rio > disse Nari/inho. > nome 9 $rande, mas a ruta 9 das menores que temos.retinha e assin/inha...P> PE a$ora 9 tempoKP > quis saber eter an, !5 com 5$ua na boca.> P(ntes ZsesseZV > suspirou Em)lia. > ($ora s# temos laran!a. Gosta de laran!a>lima, eterKP> Pe $ostoV > respondeu ele. > 9lo>meV ual 9 o p9KP> P(quele bai3inho, perto da cerca. Tem caniveteKP

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eter an correu a apanhar meia d6/ia de laran!as, que veio chupar perto do an!inho. (o veremaquilo as outras crianças tamb9m icaram com 5$ua na boca. Ioi umacorreria.> Pran$es, oran$esVP > $ritavam em in$ls. avança oi tamanho que n%o icou no pomar uma s# laran!a para rem9dio. > PEu quero de cuiaVP >

di/ia uma. > PEu quero de $omoVP > di/ia outra. Sm amarelo tapetede cascas recobriu o ch%o.> Pue coisa $ostosa > murmurou (lice > chupar laran!a>lima ao lado de um an!inho do c9u queconta as coisas de l5V Estou mudando de opini%o, Em)lia. Estou achandoque esse s)tio de @ona -enta 9 ainda mais $ostoso que o nosso ]ensin$ton Garden l5 de Londres...P> PE 9 mesmo > observou Nari/inho. > N%o h5 lu$ar no mundo que valha o s)tio de vov#. uem o v pela primeira ve/, com estas 5rvores velhas, todo espandon$ado, n%od5 nada por ele. Mas depois que o conhece n%o troca nem pela ali#rnia, que 9 um para)so. s)tiode vov# 9 $ostoso como um chinelo velho.PE a menina p"s>se a contar as mil coisas passadas ali, as aventuras do p# de pirlimpimpim, oencontro do -urro Ialante l5 no a)s dasI5bulas, o casamento dela com o r)ncipe Escamado, a ida ao a)s da Gram5tica e outros epis#diosaventurescos.> P(t9 ao a)s da Gram5tica vocs oramKP > e3clamou (lice admirada.> PE saiba que nos divertimos muito. 1isconde raptou um diton>$o e Em)lia desmorali/oucompletamente uma velha coroca implican>t)ssima, chamada rto$raia Etimol#$ica.lhe, (lice, se voc passar dois dias aqui conosco, !uro que n%o quer mais saber da n$laterra.P> PEstou vendo > respondeu (lice. > sto aqui parece que vale a pena...P (lmirante assombra>se com o que v.L5 na sua salinha @ona -enta conversava com o (lmirante -roUn sobre a pol)tica do mp9rio-ritAnico. (lmirante !5 dormira uma boa soneca e a$ora, sentado na rede,ia bebendo o u)sque mandado vir da venda do Elias Turco. Era alsiicado. Mesmo assim o velhoin$ls o bebia, embora com caretas a cada $ole.> Pois 9 isso, minha senhora. 5 estou eito cap%o de pintos, a atravessar os mares com o meue39rcito de crianças. ( trabalheira que me deram na via$emV (t9 suos# de lembrar>me disso...P> PE por alar, (lmirante, como h5 de ser para enchermos tantas barri$uinhasK mantimento que h5aqui no s)tio n%o d5 para a d9cima parte.P velho in$ls sorriu.> PN%o se incomode, minha senhora. rovidenciei sobre tudo. @entro em pouco che$ar%o os meusmarinheiros com um $rande carre$amento de comedorias. oder5 a senhorater a bondade de levar>me ao pomarK reciso ver o an!inho. Mas aqui entre n#s' 9 mesmo uman!inhodo c9u ou trata>se de al$uma reinaç%o dos seus netos, um simples an!o de prociss%oKP> PW dos le$)timos, (lmirante, posso $arantir e o senhor o veriicar5 com os seus pr#prios olhos.or mais prodi$ioso que isto se!a, n%o passa da mais pura realidade.(h, (lmirante, 1ossa onra n%o ima$ina o que acontece neste s)tioV # vendo. Tanta e tanta coisa,que ho!e, como !5 disse a 1ossa onra, n%o me admiro de mais nada.e o ol aparecer ali na porteira e me disser' > Z-oa tarde, @ona -entaVZ > eu o recebo como se osseo ompadre Teodorico. > ZEntre, enhor ol. ( casa 9 sua.Zositivamente n%o me admiro de mais nada, nada, nada...P

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s dois velhos sa)ram de braços dados para a visita ao an!inho. Ioi di)cil abrir passa$em no bolode crianças apinhadas em redor dele. (o ver o an!inho, lindo,lindo de n%o poder mais, o (lmirante -roUn arre$alou os olhos e pu3ou os #culos. E3aminou oan!inho atentamente, sempre desconiado de al$um embuste; apalpou o encontrodas asas para ver se n%o eram asas de an!o de prociss%o.

Em)lia advertiu>o'> PN%o pe$ue com muita orça que quebra. Ele 9 um vidro.P (lmirante sacudia a cabeça, pensativo.> PW e3traordin5rio, n%o h5 d6vidaV Tenho setenta anos e !amais me derontei com um prod)$ioassim. uando che$ar a Londres e der ao rei o meu testemunho, 9 bem poss)vel que ua Ma!estade se assanhe e queira vir tamb9m, queira vir ver com os seus reais olhoseste assombroso prod)$io...P> PXtimoV > e3clamou @ona -enta. > ue venha, que venha sem a menor cerim"nia. ( 6nica pessoaque ainda n%o apareceu por aqui oi um rei de verdade. 4eis da 5bulae dos pa)ses maravilhosos, desses que usam coroinhas de ouro, temo>los tido aos montes.P (lmirante n%o cessava de assombrar>se.> Pue coisa e3traordin5riaV Sm an!inho ca)do do c9u...P> Pa)do n%o, (lmirante > corri$iu Em)lia. > Tra/ido. uem o trou3e ui eu.P> Puem 9 esta estranha senhoritaKP > inda$ou o (lmirante, pondo os olhos na boneca.> Pois 9 a Em)lia, n%o vK > disse @ona -enta. > @e ato oi ela quem trou3e o an!inho l5 da 1iaL5ctea, onde o ZcaçouZ, como costuma di/er.P> P(hnV ( Em)lia, sim, a enhora Marquesa de 4abic#V > disse o (lmirante recordando>se. > ei, sei.ua Ma!estade a 4ainha 1i6va !5 me alou das proe/as desta amosacriaturinha, mostrando at9 muito dese!o de conhec>la pessoalmente.P> PIoi pena eu n%o ter sabido disso antes > volveu @ona -enta. > :5 estivemos em Londres, na nossavia$em em torno do mundo para estudar $eo$raia. e eu soubessedo dese!o da rainha, teria eito uma visita a ua Ma!estade para a apresentaç%o da Em)lia...P@epois de bem visto o an!inho, e de uma prosa com ele, o (lmirante aastou>se, sempre de braçodado a @ona -enta. Ioram dar uma volta pelo s)tio.> PEstou achando tudo por aqui muito po9tico > disse o in$ls correndo os olhos pelas 5rvores. >ue lindo este imenso tapete amarelo com que a senhora orrou o pomarV...P@ona -enta riu>se. (lmirante tinha a vista ainda mais raca que a dela, de modo que tomou och%o orrado de cascas de laran!a por um imenso tapete amarelo. Nisto uma vaca mu$iu.> PW a Mocha > e3plicou @ona -enta >, uma vaca e3celente que temos aqui h5 !5 muitos anos.P> PMeu pai oi criador de vacas :9rsei > disse o (lmirante > e eu ainda conservo al$umas da suacriaç%o. uando voltar H n$laterra hei de mandar para aqui uma de presente. Leiteiras melhores n%o e3istem.P> Pois icarei imensamente a$radecida > respondeu @ona -enta. > ( pobre da Mocha est5 bastantevelha. Mal d5 o leite necess5rio ao consumo da casa.P No est5bulo a Mocha teve a honra de ser apresentada ao (lmirante -roUn, o qual oi saudado por um MuV especial, em portu$us, visto que a pobre vaca n%o sabia umas# palavra de in$ls, nem &es. (lmirante $abou os seus enormes olhos cheios de bondade.> P1>se que 9 uma vaca de muito bons sentimentos mas pouco leite > disse o velho maru!o. >uantos litros d5KP> PN%o che$a a trsP > respondeu @ona -enta. ilho do criador de vacas :9rsei riu>se.

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> P(s de meu pai davam de/ ve/es isso.P @ona -enta arre$alou os olhos.> P(hV Eu aqui com uma assim at9 montava uma 5brica de quei!o...P> P5 de t>la, minha senhora. 5 de t>la.P Nisto um /urro muito discreto soou.> Puem 9KP > quis saber o (lmirante.> PW o onselheiro, o nosso -urro Ialante > e3plicou @ona -enta. Nele 9 que os meninos oram

 para o c9u.P (lmirante -roUn sorriu, pensando l5 consi$o' > Pobre velhaV 1isivelmente est5 caducaP. Masquando oi apresentado ao -urroIalante e este murmurou, na sua vo/ $rave de burro da 5bula' > PTenho muita honra em conhecer 1ossa enhoriaP > o (lmirante quase caiu para tr5s. Teve de se$urar>seno rabo que o burro lhe estendeu.> PW espantoso, minha senhoraV Est5 aqui um en"meno que se eu contar ao 4ei Eduardo ele !ul$ar5que 9 caduquice minha. Sm burro alanteV sto positivamente me dei3acom as id9ias atrapalhadas...P@ona -enta $o/ou o atrapalhamento do in$ls.> PIoi o que me sucedeu no começo, (lmirante. Iiquei tamb9m atrapalhada, sem saber o que pensar. @epois ui me acostumando. o!e acho t%o natural que esse burroale, como acho natural que uma laran!eira produ/a laran!as. Todas as tardes che$o at9 aqui paradois dedos de prosa. (l9m de alante, o nosso onselheiro 9 um puroil#soo.P> P@e que escolaKP> PSm il#soo est#ico. ostumo ler>lhe trechos das Meditaç8es de Marco (ur9lio. s coment5riosque ele a/ mereciam ser escritos e publicados.P (lmirante n%o conse$uia voltar>se do assombro.> PMas... mas, @ona -enta, a senhora !5 reletiu que isto 9 um en"meno que contradi/ tudo quantoa cincia estabeleceu a respeito da ala e da inteli$ncia dosanimaisKP> P4eleti, sim. Eu sei o que tenho em casa, enhor (lmirante.P Sm tropel e uma al$a/arrainterromperam o di5lo$o. edrinho eeter an vinham correndo para ali, acompanhados de mais de cem crianças.> P burro que alaV burro que alaV > $ritavam todas. > 1amos conversar com o burro que alaV...Phe$aram. Em torno do e3celente animal ormou>se uma roda enorme. Todos alavam ao mesmotempo, per$untando mil coisas ao pobre onselheiro, que se via tonto paraatender a tantos clientes.@ona -enta e o (lmirante dei3aram>nos naquele divertimento que n%o e3istia na n$laterra erecolheram>se H salinha. Estavam l5, ainda comentando o prodi$ioso casodo -urro Ialante, quando Tia Nast5cia veio di/er que um $rupo de marinheiros se apro3imava. (lmirante sorriu.> P%o as comedorias que vm vindo > disse ele > e n%o 9 sem tempo. om o aperitivo das laran!asque chuparam, as crianças devem estar tinindo de ome.PE assim era. Mal avistaram os marinheiros do almoço, uma $ritaria atroadora encheu os ares.> P lancheV lancheV...P(bandonaram o an!inho, o -urro Ialante e as 5rvores em que estavam trepadas para s# cuidaremdos est"ma$os.ue suculento lanche oi aqueleV -em se via andar ali o dedo do 4ei da n$laterra. andu)ches detodas as qualidades, quei!os, $el9ias de rutas, maç%s e pras,cremes e p%e/inhos em quantidades enormes.

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Tia Nast5cia veio espiar. (quela abundAncia encantou>a.> Pra $raçasV > murmurou a velha preta. > e n%o che$asse esse reorço, isto por aqui icava comoa/enda por onde passou nuvem de $aanhotos. Nem a casca das 5rvoresse salvaria... redoVPedrinho insinuou>se entre os maru!os. ela primeira ve/ via os amosos mariners da maior 

esquadra do mundo. 1ermelhaços, louros e ruivos, com calças de boca>de>sino.E que caras havia entre elesV @e puros lobos>do>mar. Em dado momento, por9m, edrinhoempalideceu. Sm dos maru!os o impressionara proundamente.aiu dali e correu em procura de eter an, que estava atracado com um sandu)che de presunto deQorR.> PTenho uma coisa muito s9ria a di/er > murmurou>lhe edrinho a meia>vo/. > En$ula isso depressae apareça l5 no pomarP > e oi esper5>lo debai3o da pitan$ueira.eter an n%o tardou.> Pue h5KP > inda$ou, en$olindo o 6ltimo bocado do sandu)che.> P5 que descobri uma coisa muito s9ria' o apit%o Gancho2 est5 entre os marinheiros que vieramtra/er o almoço. 4econheci>o pereitamente.Peter an empalideceu.> PN%o pode ser, edrinhoV Naquela batalha no navio dos cors5rios bati>me a espada com essemonstro, e o ui apertando de $olpes e mais $olpes, e ele recuando, recuandoat9 que > tchibumV > caiu nZ5$ua, bem dentro da $oela do crocodilo. Ioi assim que o apit%oGancho morreu.P> PMorreu, nadaV Essa $ente n%o morre. om certe/a comeu o crocodilo, em ve/ de o crocodilocomer a ele. E a prova 9 que o vi no meio dos lobos>do>mar que vieramcom o lanche. 1i>o com estes meus olhos, eterV he$uei pertinho, cheirei. Ele mesmo, com a m%ode $ancho calçada numa luva e aquele edor de pirata...Peter an permaneceu uns instantes pensativo.2 ersona$em que aparece no livro eter an.> PE que querer5 por aquiKP> Pertamente que anda atr5s de vocP > su$eriu edrinho.> Pmposs)velV Nin$u9m sabia que eu vinha. Nada contei a nin$u9m > nem a \end&. 4esolviembarcar no momento de o navio sair. -asta di/er que ui a 6ltima pessoaque se meteu a bordo. N%o, edrinho. N%o oi por minha causa que o apit%o Gancho veio. Ioi por causa do an!inho, !uroV...P> PMas que h5 de querer com o an!inhoKP> PW boaV 4apt5>lo. 1oc n%o calcula que ne$#cio 9 um an!inho desses nas unhas de um e3plorador.:5 n%o di$o para trabalhar em circo, mas no cinema, edrinhoV NocinemaV Em oll&UoodV ara entrar nas itas das @iones, da hirle&, do :acR ooperV oisa derender milh8es. Nunca houve no mundo uma estrelinha an!o.P> P4ealmente > murmurou edrinho. > (t9 eu !5 havia pensado nisso...P> Pois !uro, edrinho, que o apit%o Gancho veio com essa id9ia na cabeça, e tamb9m !uro que !5est5 de plano ormado para urtar o an!inho.P> P(cha bom prevenirmos o (lmiranteKP> PNada disso. Eu n%o dou importAncia a $ente $rande. ostumo resolver todas as diiculdades por mim mesmo, com a meninada. Escute. E3istem armas por aquiK Espadas,lanças, pistolasKPedrinho suspirou.

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> P(h, eter anV e voc soubesse que boba e medrosa 9 a vov#... Tem medo de tudo, at9 das baratas. N%o pode ver um rev#lver. Iaca, s# admite essas de mesa, de ponta redonda. Em mat9ria de armas s# tenho uma espin$ardinha de cano de $uarda>chuva que eumesmo i/, e o meu velho bodoque...Peter an sorriu com superioridade.

> Pois l5 na Terra do Nunca temos um verdadeiro arsenal. @epois de bater o apit%o Gancho,iquei com todas as armas dos cors5rios. (t9 um canh%o/inho do navio pirata eu levei para a Terra do Nunca.P> PLevou um canh%oVK...P> P# n%o levei os $randes por serem muito pesados e consumirem muita p#lvora. 1oc n%oima$ina, edrinho, como canh%o $rande come p#lvoraV Mas espadas, pistolas,espin$ardas, lanças, machados e punhais, isso levamos tudo. Lembra>se daqueles lobos que nosrondavam por l5K ois ca)mos de tiros neles. N%o icou umV s que n%omorreram, u$iram com cem pernas, apavorad)ssimosV Nossa caverna l5 na Terra do Nunca est5ho!e como a ortale/a do Gibraltar' ine3pu$n5velVPedrinho remiu de entusiasmo; depois suspirou, pensando com raiva do paciismo de @ona -enta.> Pue penaV > e3clamou. > e vov# dei3asse, poder)amos tamb9m a/er disto aqui uma ortale/aine3pu$n5vel. Est5 vendo aquele cupim l5 no pastoK Tem um oco #timo para ninho de metralhadora.P> PTamb9m pelo alto destas 5rvores 9 poss)vel esconderem>se muitos atiradores > observou eter an correndo os olhos pelo pomar. > 1oc, n%o sei, mas eu sou capa/de transormar isto aqui numa tremenda ortale/a. lhe' daquele lado corro uma linha dupla detrincheiras. [ esquerda e H direita abro ossos intranspon)veis...P> Pom uma ponte levadiçaVP > a!untou edrinho, entusiasmado.> Psso s# em casteloP > volveu eter an em tom de despre/o ante os conhecimentos militares deedrinho. Nesse instante um vulto atraiu>lhes a atenç%o > um marinheiro que caminhava disarçadamente,repetidas ve/es olhando para tr5s.> PEleVP > cochichou edrinho.eter an, velho conhecedor do apit%o Gancho, concordou.> PTem ra/%o, edrinho. W ele mesmoV # que eniou a m%o de $ancho naquela luva para disarçar>se. nde est5 o an!inhoKP> PNo oco da i$ueira $rande, l5 onde o escondemos quando a criançada apareceu. @epois que osmarinheiros do almoço che$aram, dei ordem H Em)lia para que o $uardasseno oco novamente.P> Pnde 9 a i$ueiraKP> P(quela $randona, l5. W oca por dentro, como as 5rvores da Terra do Nunca.Ps dois meninos ocultaram>se atr5s da pitan$ueira para melhor se$uirem os movimentos do ladr%o. iname cors5rio, sempre na ponta dos p9s, olhava em todas as direç8es,are!ando qualquer coisa.> Parece que 9 pelo aro que esses monstros se $uiamP > observou eter an.> PMas com o an!inho n%o arran!a nada, ele 9 totalmente inodoro.P> Pue quer di/er issoKP> Pnodoro quer di/er sem cheiro nenhum, como a 5$ua. ( 5$ua 9 incolor, inodora e ins)pida.P> PMas 9 capa/ de descobri>lo por induç%oP > su$eriu eter an. Ioi a ve/ de edrinho per$untar oque era induç%o.

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> PW uma esp9cie de adivinhaç%o l#$ica > disse eter an. > :uro que assim que o apit%o Ganchoen3er$ar a i$ueira pensar5 em oco, porque quase todas as i$ueirasvelhas tm ocos; e pensando em oco, pensar5 no an!inho escondido l5 dentro. sso 9 que 9 induç%o.PE oi o que se deu. Mal o cors5rio en3er$ou a i$ueira, indu/iu lo$o e p"s>se a caminhar na direç%odela.

 Nisto apareceu, inesperadamente, um se$undo vulto.> PlheV... 1em vindo outro. ( coisa se complica...P edrinho n%o tardou a reconhec>lo.> Pope&eV marinheiro ope&e, eterL.P eter an n%o conhecia esse i$ur%o.> Puem 9 eleKP > per$untou.> PSm homen/inho terr)vel, eter. N%o h5 no mundo quem o vença. @errota tudo. er5 que 9c6mplice do apit%oKP N%o era. ( conversa entre ope&e e o cors5rio ia mostrar que n%o era. s meninos ouviram tudo pereitamente.> P1iva, enhor ope&eV > e3clamou o apit%o Gancho. > ue 9 que o tra/ por aquiKP> P mesmo que tra/ a voc, apit%oP > respondeu ope&e na sua vo/ rouqu)ssima.> P(cho que podemos nos entender e nos a!udar mutuamente > tornou Gancho. > 1ou contar tudo.1im entre os marinheiros do (lmirante -roUn com a id9ia de levar o an!inho para Londres. 4ender5 bom dinheiro num circo.Pope&e sorriu.> Pois saiba que tive a mesma id9ia e vim dos Estados Snidos para lev5>lo a oll&Uood. Nocinema esse an!o dar5 mais sorte do que em todos os circos do universo. N%o podemos, pois, nos entender, enhor apit%o Gancho.P> Pom seiscentos milh8es de colubrinasV > urrou o cors5rio. > ei que voc 9 valente, mas n%otenho medo de caretas. 1im para levar o an!inho e hei de lev5>lo.Pope&e n%o respondeu. Limitou>se a rir e soltar uma baorada do seu amoso cachimbo de apito>pulpuVendido por aquele despre/o, o apit%o Gancho oi descalçando a luva. horrendo $ancho deerro apareceu, de ponta aiad)ssima.s dois meninos, atr5s da pitan$ueira, começaram a sentir>se eletri/ados. eter an teve d# deope&e, achou que estava ali, estava escalavrado para o resto davida. edrinho, entretanto, apostou em ope&e.( luta rompeu. s dois marinheiros atracaram>se com a maior 6ria. Eram $olpes e mais $olpes,um em cima do outro. Sm soco de ope&e na quei3ada de Gancho o e/ bambear, como bbedo; orte, por9m, que era o pirata, lo$o se irmou nas pernas e avançou,deserindo uma $anchada contra o ombro de ope&e. que a este valeu oia a$ilidade. No momento em que o $ancho vinha descendo, ope&e quebrou o corpo. Mesmo assimoi riscado de leve. E a luta prosse$uia cada ve/ mais ero/, com rasteiras,munhecaços, pontap9s na barri$a. @urante minutos, nenhum levou vanta$em. s dois contendoresequivaliam>se em orça.> PEsse ope&e n%o 9 homem para medir>se com o apit%o Gancho. (cabar5 cansado e apanhandoP> murmurou eter an ao ouvido de edrinho.> PW que ope&e ainda n%o en$oliu o espinareP > e3plicou edrinho, dei3ando eter an na mesma.utra $anchada do cors5rio riscou o ombro do marinheiro. ope&e, ent%o, enureceu>se, aastando>se de/ passos, sacou do bolso a lata de espinare, cu!o conte6doen$oliu a meio.> P($ora voc vai verVP > cochichou edrinho.

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E eter an viu. 1iu ope&e avançar contra o cors5rio numa 6ria louca, com os m6sculos dos braços crescidos como bolas. (o primeiro soco dado nas uças do apit%o,este cambaleou e oi estatelar>se no ch%o a oito metros de distAncia.> PEst5 vendo o que 9 murroKP > murmurou edrinho entusiasmado.Mas o apit%o Gancho levantou>se e investiu mais uma ve/. oitadoV Levou tal roda de murros,

que icou como paçoca que sai do pil%o. ope&e amassou>o. Mas amassoumesmo, como quem amassa p%o. (massou>o de tal modo que o dei3ou transormado em pasta de$ente.eter an arre$alava os olhos, no maior dos assombros.> P(h, ope&e 9 assim > disse edrinho. > em espinare, n%o vale nada, apanha de qualquer pun$a.Mas quando en$ole uma dose de espinare, ah, n%o e3iste no mundoquem possa com eleVP barulho da luta atra)ra a atenç%o da criançada e do (lmirante. 1ieram todos correndo.> Pue oiK ue oiKPedrinho contou o que se havia passado.> P-andidosV > e3clamou o (lmirante -roUn. > Esses dois marinheiros vieram sem ser convidados. N%o i$uram na minha lista. 1ou p">los a erros nos por8es do \onderland.P> P">los 9 modo de di/er > advertiu edrinho. > # e3iste um. outro !5 virou pasta de $ente. que h5 a a/er 9 enterr5>lo, bem undo.P (lmirante apro3imou>se do marinheiro ca)do e e3aminou>o. 1iu que de ato era assim. Emse$uida voltou>se para ope&e.> PE vosmec, enhor ope&eV Estou reconhecendo>o muito bem. ue hist#ria 9 estaK omo semeteu na tripulaç%o do \onderland sem ter sido en$a!adoKPope&e, que estava bbedo como uma cabra, riu>se.> P(h, ah, ahV > e atirou umas baoradas do cachimbo antes de responder. ada baorada era umapitinho' puVpuV E na sua vo/ rouqu)ssima disse' >am a sailor man.P> Pei dissoV > berrou o (lmirante. > E sei tamb9m que vai passar uns tempos nos por8es do\onderland, com umas pulseirinhas de erro nas munhecas.P ultrabbedo ope&e respondeu com mais trs apitos de baroadas e um > P(h, ah, ahVP >rouqu)ssimo.ndi$nado com o desrespeito, o (lmirante -roUn $ritou para os maru!os'> PTodos aquiV ($arrem>me este bbedo e metam>no a errosVP ope&e continuava impass)vel. Ie/mais um >pul pul > e caiu em$uarda.( luta entre ope&e e os marinheiros do \onderland oi dessas coisas que s# $nios do tamanho dehaRespeare e @ante se atrevem a descrever > e mesmo assim descrevemmal. Nunca houve tanta pancada no mundo. e "ssemos !untar toda a imensa pancadaria que h5 no@om ui3ote de La Mancha e com ela orm5ssemos um monte, esse monteicaria pequeno diante da pancadaria que houve no pomar de @ona -enta. espinare in$erido pelosailor man era do bom, de modo que se tornaria imposs)vel venc>lo.Sm a um os maru!os do \onderland iam sendo postos ora de combate. uando caiu o 6ltimo,ope&e deu uma risada $rossa e e/ >pulpulpulpul... (lmirante, que esperava tudo menos quatro pus, icou seriamente atrapalhado. Toda a suamarinha$em estava ca)da e ele, so/inho. e ope&e tivesse a id9ia de esmo>lo,seria uma des$raça completa, e tamb9m uma enorme aronta para o almirantado britAnico. uea/erK (lmirante oi aconselhar>se com @ona -enta.

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> PMinha senhora > disse ele >, o desenlace desta luta me dei3ou completamente desarvorado.ositivamente n%o sei como a$ir...PTia Nast5cia apareceu nesse momento para per$untar se a/ia bolinhos ou rebentava pipocas.> P( situaç%o 9 muito s9ria, Nast5cia > respondeu @ona -enta. > 1enha per$untar isso mais tarde,depois de resolvido este horr)vel incidente.P

> P1amos, minha senhoraV > insistia o (lmirante. > ue acha que devo a/erKP@ona -enta, completamente tonta, mostrou>se incapa/ de uma su$est%o. Nisto apareceu Em)lia,muito lampeirinha.> PEu sei um !eito de arrumar tudo > disse ela >, e de acabar de uma ve/ para sempre com a prosadesse ope&e...P (lmirante, apesar da horr)vel situaç%o em que se encontrava, n%o p"de dei3ar de rir>se.> PN%o se ria, (lmirante > tornou @ona -enta. > 1ossa onra n%o conhece a Em)lia. Tem eito tantacoisa que n%o me admirarei se der uma boa sova no ope&e.P> Pue absurdo, minha senhoraV > e3clamou o (lmirante. > (pesar do muito respeito que a senhorame merece acho que est5 a abusar de mim. Essas suas palavras oendem>me,oendem o almirantado britAnico, oendem ua Ma!estade o 4ei Eduardo 1...Para acalm5>lo @ona -enta contou diversos epis#dios em que as coisas icaram em situaç%o deverdadeiro im de mundo e ainal tudo se resolveu com uma inesperadasaidinha da Em)lia. (lmirante, por9m, n%o quis saber de nada. Emburrou, oendid)ssimo com ahip#tese de que uma simples boneca de pano pudesse conse$uir o queos seus valentes lobos>do>mar n%o tinham conse$uido.Em)lia un$ou e disse'> P@ei3e tudo por minha conta, @ona -enta. :uro que dou uma arrumaç%o #tima. Enquanto isso asenhora v5 despe!ando pin$a dentro desse bie malpassadoP > concluiuela, olhando com despre/o para o (lmirante.> PEm)liaV > $ritou @ona -enta. > Mais respeito para com os mais velhos.P Mas Em)lia n%o quissaber de nada. -otou meio palmo de l)n$ua para o (lmirante e l5 seoi pisando duro.@ona -enta suspirou.Em)lia descobre o se$redo de ope&e.Em)lia oi H co/inha pedir a Tia Nast5cia que pusesse uma porç%o de olhas de couve no pil%o eamassasse tudo muito bem, a/endo uma pasta. Nast5cia per$untou paraqu.> PN%o 9 da sua contaP > respondeu a diabinha.Tia Nast5cia tamb9m suspirou. Mas e/ a pasta de couve pedida, com a qual a boneca encheu umalatinha. Embrulhou>a num !ornal e, muito se$ura de si, oi ter comope&e.> PEu sei do seu se$redo, enhor ope&e > disse ela inocentemente. > hama>se' espi>na>re. emespinare o senhor vale tanto como um homem qualquer.Pope&e e/ >puV puV> PMas eu tamb9m sei > continuou Em)lia > que o seu espinare s# a/ eeito por quin/e minutos.assados quin/e minutos o senhor est5 bambo outra ve/.Pope&e riu>se $rosso, rosnando'> P@obre os quin/e minutos e ter5 acertado. uVpuVPEm)lia aastou>se. Era !ustamente aquilo o que ela dese!ava saber' quanto tempo durava nosm6sculos do marinheiro o eeito do espinare. orreu a conerenciar comedrinho.

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> PEscute, edrinho. se$redo de ope&e 9 o espinare, mas o eeito do espinare s# dura meiahora, di/ ele. omo !5 se passaram vinte minutos desde que en$oliua dose, isso quer di/er que daqui a de/ minutos ele pode ser atacado.P> PMas ope&e n%o en$oliu a lata inteira, vi muito bem > observou o menino. > # metade.Escondeu o resto no oco da i$ueira. W por isso que n%o se arreda de l5.

(ssim que or preciso, en$ole o resto da lata e ica outra ve/ dono do mundo por mais meia hora.P> Pei disso > murmurou Em)lia >, mas vou tomar as minhas providncias. Garanto que daqui a de/ minutos ope&e poder5 ser atacado sem peri$o nenhum.P> P(tacado por quemKP > $ritou edrinho.> PomessaV or voc e eter an.P> P@eus me livreV > e3clamou o menino. > eria a maior das loucuras. Ele, que moeu o apit%oGancho e todos os marinheiros do \on>derland, tamb9m me moer5 enquantoo diabo esre$a um olho. ue id9iaV...PEm)lia a$arrou edrinho, >lo abai3ar>se e cochichou>lhe qualquer coisa ao ouvido. ( cara domenino e3pandiu>se.> P(hnV > e3clamou. > e 9 assim, ent%o !5 n%o est5 aqui quem alou. Tudo muda de i$ura. ueid9ia e3celente, Em)liaV ( melhor id9ia que voc teve em toda a suavida...PE $anhando cora$em'> Pois est5 combinado. Eu e eter an atacaremos ope&e daqui a de/ minutos.P@isse e oi comunicar a sua resoluç%o a @ona -enta e ao (lmirante. s dois velhos icaramassombrad)ssimos.> Pue loucura, meu ilhoV > e3clamou a boa senhora. > Nem pense nisso. ro)bo>o de pensar nisso.P> P4ealmente > acrescentou o (lmirante > o que este menino prop8e n%o passa de um desvario decriança. ue absurdoV (tacar um monstro de orça, que acaba de destruir com a maior acilidade todo um pelot%o de vi$oros)ssimos lobos>do>mar...Pedrinho cochichou no ouvido de @ona -enta o mesmo que Em)lia cochichara no seu. ( velhaarre$alou os olhos, com e3press%o de surpresa e ale$ria.> P-om. e 9 assim, ent%o tudo muda de i$ura. ( id9ia 9 e3celente...Puem icou bobo de uma ve/ ante aquela s6bita mudança de opini%o oi o (lmirante, e comonin$u9m lhe cochichasse nada aos ouvidos bobo icou e bobo continuou.> PN%o estou entendendo nada de tudo isto, minha senhoraP > disse ele.> PEntender5 daqui a pouco, enhor (lmiranteP > respondeu @ona -enta piscando o olho.PE $ritou para a co/inha'> PNast5cia, pode vir saber se o (lmirante preere pipocas ou bolinhos...Pope&e estava encostado ao tronco da i$ueira, de modo a echar com o corpan/il a abertura dooco. sso atrapalhava Emilia, cu!o plano era entrar na 5rvore paradi/er qualquer coisa ao an!inho. 1endo que pela rente n%o podia entrar, pensou em outra porta. tal ocotinha duas aberturas' aquela embai3o e outra em cima, na orquilhados primeiros $alhos > ou a Pchamin9P, como os meninos di/iam. Essa chamin9 li$ava o bo!o dooco H orquilha e, embora osse estreita, dava pereitamente passa$ema um corpinho seco e mi6do como o da boneca.Mas para subir H i$ueira era preciso empre$ar a ast6cia e Emilia empre$ou a ast6cia. Ioi conversar com ope&e.> Penhor ope&e > disse ela com o ar/inho de santa que sabia a/er nas ocasi8es $raves >, sabe queesta i$ueira d5 uns i$uinhos muito $ostososK s sanhaços e

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morce$os re$alam>se...P marinheiro olhou para cima e viu que realmente a i$ueira estava coberta de pequeninos i$os.> PuV puVP >e/ ele com o cachimbo. Emilia continuou'> Pe o senhor me a!udar a subir l5 em cima, posso colher uma quantidade, metade para mim,metade para o senhor...P

marinheiro sentiu 5$ua na boca, pois $ostava muito de i$os. 4espondeu com um puV puV, quequeria di/er sim, e a!udou Emilia a trepar H 5rvore. Lo$o que se pilhoul5 em cima, a espert)ssima boneca tratou de procurar a abertura da Pchamin9P. nstantes depoisestava no bo!o do oco, alando com o an!inho.> PNem queira saber, an!inho, o turumbamba que vai l5 por ora, tudo por sua causaV ope&e e osmarinheiros do navio se pe$aram H unha, e ope&e venceu. Escan$alhoucom todos eles. (lmirante est5 co^çando a cabeça. N%o sabe como a$ir. plano de ope&e 9urtar voc daqui. uer transormar voc em estrelinha de cinema, l5emoll&Uood.P> PIa/er de mim estrelinhaK > repetiu a mimosa criatura, com cara de surpresa. > Esse oll&Uood 9al$um c9uKP> PN%o, burrinhoV W a cidade do cinema. (s estrelas e estrelinhas de l5 s%o de carne e osso, comon#s. Mas depois eu e3plico isto. ($ora n%o h5 tempo. 1im s# parauma coisa. Est5 vendo esta lataK > e mostrou>lhe a lata de couve mo)da que trou3era embrulhadanum !ornal. > ois 9. 1oc vai pe$ar esta lata e troc5>la por aquelaque o marinheiro ope&e $uardou na beira do oco. # isso. Mas tem de o a/er com muito !eito, demodo que ope&e n%o perceba coisa nenhuma, est5 entendendoKP an!inho n%o estava entendendo nada, o que o n%o impediu de e3ecutar ielmente a ordem deEm)lia. e$ou a lata de couve, encaminhou>se na ponta dos p9s para a aberturado oco e, depois de espiar se o marinheiro estava olhando, e/ a troca na pereiç%o. Nem umaormi>$uinha que andava por ali percebeu a mudança.> PXtimoV > e3clamou Em)lia quando o viu voltar com a lata de espinare. > ($ora voc continuaaqui muito quietinho e sem receio de coisa nenhuma. :uro que tudoacabar5 bem.P> PMas estou com muito medo daquele rato de asa dependurado aliP > disse ele apontando com odedinho para o teto do oco.> PSm simples morce$o > e3plicou Em)lia. > Ieio s#. N%o morde an!o. 1ive de comer os i$uinhosdesta i$ueira. N%o se impressione. # n%o ique debai3o dele porqueos tais morce$os comem os i$uinhos e Hs ve/es os descomem em cima da cabeça da $ente...PIeita esta recomendaç%o, Em)lia es$ueirou>se pela chamin9 acima. aiu na orquilha. aminhouen$atinhando por um dos $alhos, at9 alcançar o ramo mais pr#3imo deope&e, o qual estava de cabeça er$uida e boca aberta, procurando en3er$ar a bonequinha.> PEstou aquiV > disse ela mostrando>se. > (para>me nos braços.P ope&e estendeu os braços peludos. em medo nenhum Em)liadeu um pulo > upaV> PE os i$osKP > per$untou o marinheiro assim que a dep"s em terra.> P1erdes, meu caro. N%o achei um s# maduro. s morce$os n%o dei3am. (ssim que v%oamadurecendo, eles > nhoqueVPope&e desapontou e Em)lia oi correndo conerenciar com edrinho e eter an.> ProntoV > $ritou ela ao che$ar. > (qui tm vocs a lata de espinare do ope&e. Troquei>a por umai$ual de couve mo)da. uem vai a$ora en$olir o espinare maravilhoso

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n%o 9 ele, s%o vocs. ope&e s# en$olir5 couve mo)da, e com aquela couve no papo icar5 bambocomo $el9ia. ue horas s%oK 1e!am se os de/ minutos !5 se passaram.Pedrinho correu H sala de !antar. 1iu no rel#$io da parede que s# altavam trs minutos paracompletar os de/. 1oltou correndo.> PIaltam s# trs minutosP > disse ele.

> PMuito bem > e3clamou Em)lia. > 1ocs podem ir en$olindo o espinare > metade cada um.Pedrinho tomou a lata e en$oliu metade, a/endo uma careta. e>ter an en$oliu o resto, a/endooutra careta.> Pode ser e3celente para dar orça > disse ele >, mas $ostoso n%o 9...P(lice, que andava em procura de Em)lia, apareceu nesse momento.> P(rre que a acheiVP > e3clamou.> Pue h5 de novoKP > quis saber Em)lia.> P5 que a criançada est5 num verdadeiro pavor, alando em u$ir do s)tio e outras coisas assim.Tenho eito tudo para sosse$5>las, mas n%o consi$o.P> Psso de criançada in$lesa 9 l5 com o (lmirante 4e9m -roUn. Ele que as trou3e, ele que searrume.P> P:5 alei com o (lmirante > tornou (lice >, mas n%o valeu de nada. pobre velho est5completamente bobo. N%o sabe o que a/er. Tenho at9 medo que de repente caiamorto de con$est%o cerebral.P> PN%o morre, n%o > $ritou Em)lia. > @aqui a minutos o problema estar5 completamente resolvido por n#s e voc vai ver a cara de riso do (lmirante.P> PMinutosKP > repetiu (lice, sem nada compreender.> PMinutos, sim, menina. N#s vamos dar um pe$a tremendo no tal ope&e.P(lice cada ve/ compreendia menos.> Pe$a tremendoK er5 que @ona -enta mandou vir al$um e39rcito com canh8es para atac5>loK N%o estou entendendo esse seu Zn#s vamosZ, Em)lia...P> Pois n#s somos n#s, eu, edrinho e eter an. 1amos dar cabo da prosa do ope&e, n#s trs. Wisso.P(lice !ul$ou que osse brincadeira.> PomoKP > per$untou.> Pomendo > respondeu Em)lia. > omendo espinare aqui e couve mo)da l5. (h, ah, ahV...P > Evendo a cara de boba de (lice'> PN%o pense mais nisto, minha cara. W ponto liquidado. 1amos H co/inha ver o que h5 de bom. Tia Nast5cia !5 deve ter uns bolinhos prontosP > e, a$arrando>a pelam%o, levou>a H co/inha. Nast5cia estava de ato ritando bolos. Em)lia e/ a apresentaç%o.> PEsta aqui, Tia Nast5cia, 9 a amosa (lice do a)s das Maravilhas e tamb9m do a)s do Espelho,lembra>seKPF> PMuito boas tardes, enhora Nast5ciaVP > murmurou (lice cumprimentando de cabeça.> PS9V > e3clamou a preta. > ( in$lesinha ent%o ala nossa l)n$uaKP> P(lice !5 oi tradu/ida em portu$us > e3plicou Em)lia. > E voltando>se para a menina' > Gosta de bolinhosKP Nast5cia apresentou>lhe um na ponta do $aro.> Prove, menina bonita.P(lice devorou o bolinho, arre$alando os olhos > e pediu a receita. Nast5cia riu>se.> P4eceita, dou; mas a quest%o n%o est5 na receita, est5 no !eitinho de a/er. utro dia esteve c5 aso$ra do Nh" Teodoro e tamb9m quis a receita. @ei. abe o que

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aconteceuK Ela e/ o bolinho pela receita e saiu uma borracha. Nin$u9m p"de comer. (h, ah, ahVsto de co/inhar, menina, tem seus se$redos. # mesmo para uma criaturacomo eu que nasci no o$%o e no o$%o hei de morrer...PF Em)lia a/ reerncia aos livros (lice no pa)s das maravilhas e (lice no pa)s do espelho.assados trs minutos, Em)lia voltou para onde estavam edrinho e eter an.

> ProntoV > disse ela. > @e a$ora em diante vocs podem atacar o monstro. :5 se passou a meiahora. (cabou o eeito do espinare que ope&e en$oliu.P> PE n#s !5 estamos sentindo o eeito do que en$olimosP >, disse eter an, e para o provar pe$ouuma erradura que estava no ch%o e partiu>a pelo meio, rindo.Entraram a combinar o plano de ataque.> PEu avanço > disse edrinho > e desaio ope&e. Ele ri>se. hupa o cachimbo e a/ >puVpuV>E nem pensa no espinare, vendo que somos dois crilas. 1ou eu ent%o eassento>lhe um p9>de>ouvido. 1oc do outro lado assenta>lhe um pontap9. ope&e, ent%o, percebendo que somos crilas especiais, volta>se para a lata de espinare een$ole a couve mo)da. E ica mais bambo ainda. E vou eu e...P(ssim combinado o ataque, os dois meninos encaminharam>se na direç%o da i$ueira, se$uidos daEm)lia. Enquanto isso, l5 na saleta @ona -enta caçoava com o (lmirante.> PTome este cae/inho > di/ia ela, apresentando>lhe uma 3)cara. > Nada melhor do que o ca9 paraestimular os nervos e levantar o moral.PMas o abatimento do (lmirante era enorme. Estava a pensar nas suas tremendas responsabilidades.ue conta iria dar ao reiK Iora escolhido como o homem de mais coniançade ua Ma!estade. Graças a issoos pais de toda aquela criançada lhe entre$aram os ilhos. ra, se acontecesse uma des$raça, seope&e na sua bebedeira investisse contra as crianças e as machucasse,que contas daria ele ao rei e aos paisK> PMinha senhora > disse o pobre (lmirante >, acho bom tele$raarmos ao $overno brasileiro pedindo a remessa imediata de tropas. # com um batalh%o bem servidode metralhadoras poderemos dar cabo desse monstro.P@ona -enta ria>se.> PN%o 9 preciso tanta coisa, (lmiranteV 1ossa onra n%o conhece o en$enho de meus netos. N%o h5o que eles n%o consi$am. ois se at9 ao c9u !5 oramV...P> Pei disso > respondeu o (lmirante. > Mas a via$em ao c9u oi eita $raças ao tal p# de pirlimpimpim, e a senhora mesma me disse que !5 o $astaram todo. e aindahouvesse al$um restinho poderia ser que...P> PEles h%o de arrumar>se, (lmirante. Mesmo sem o p# maravilhoso h%o de dar um !eitinho.P (lmirante n%o podia compreender a calma da velha.> P:eitinhoV :eitinhoV > e3clamou. > 5 de/ minutos que a senhora est5 a alar nisso. ue !eitinhoKomo pode haver !eitinhos contra o colosso que acaba de destroçar os melhores homens do \onderlandKP@ona -enta ria>se, ria>se.> PTome o seu ca9 sosse$ado, (lmirante, e dei3e tudo por conta da criançada. senhor n%oconhece meus netos...P (lmirante suspirou e assoprou.L5 no pomar edrinho e eter an pararam diante de ope&e.> P(mi$o ope&e > começou edrinho >, sabemos que voc 9 o rei dos valentes e que tem corridomundo a escan$alhar quantos inimi$os aparecem. o!e mesmo praticou

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uma $rande açanha com o amassamento do apit%o Gancho e dos marinheiros do \onderland. Ioiuma aventura ma$n)ica, n%o resta d6vida. Mas a$ora vai medir>se conosco.repare>se.Pope&e olhou bem para os dois crilas e nem sequer se di$nou a responder. hupou s# o cachimbo>puVpuV...

> PIaça pulpuV quanto quiser > disse eter an >, porque esses pu>pus ser%o os 6ltimos. ( sova quevamos dar em voc h5 de ser escrita em livros.Pope&e e/ mais dois pu>pus > os 6ltimos.nesperadamente edrinho avançou e assentou>lhe um murro no p9 do ouvido; eter an avançoudo outro lado e deu>lhe um tremendo pontap9 na barri$a.@ois $olpes s#, mas dois $olpes de tal ordem que ope&e arre$alou os olhos. 1iu que tinha pelarente contendores mais peri$osos que todosos marinheiros do \onderland. E n%o quis saber de hist#rias > correu para a lata de espinareescondida no oco. Tomou>a e en$oliu tudo, a/endo uma careta. Esre$oua barri$a e avançou contra os meninos.(hV ue tourada bonitaV s dois meninos espinarados ca)ram de murros em cima do marinheiroencouvado, como c%es amintos que se lançam ao mesmo osso. Ioi murrode todas as bandas, de todo !eito e de todos os calibres. ope&e virou peteca. Sm soco de edrinhoo !o$ava sobre eter an. 1inha o soco de eter an que o arremessavasobre edrinho. E naquele vaiv9m icou ope&e por dois minutos, enquanto a criançada em redor  batia palmas e $ritava'> PutroV utroV Sm murro nos quei3os a$oraV...Puem teve a honra de pre$ar o $rande murro nos quei3os, o murro que derruba nocaute, oiedrinho. (ssentou um murro debai3o para cima > baV ope&e deu duas voltasno ar e aplastou>se no ch%o, sem sentidos. edrinho a$arrou>o ent%o por uma perna e pu3ou>o para !unto da massa do apit%o Gancho.> ProntoVP > $ritou em se$uida, virando>se para a criançada.> Pocoricoc#V > cantou eter an.4omperam palmas e vivas. Sma $ritaria medonha.> P1iva edrinhoV 1iva eter anV...Puando o berreiro che$ou H sala, @ona -enta sorriu e disse a Mr. -roUn'> Pronto, (lmirante. ope&e !5 est5 nocaute.P> Pomo sabeKP> PN%o ouve os $ritos de vit#riaK Eu tinha certe/a de que ia ser assim e por isso n%o me incomodei.ope&e derrotou os marinheiros do \onderland, venceu o apit%oGancho, mas com os meus netos ele se estrepou. %o uns danadinhos...PTia Nast5cia apareceu nesse momento.> Porra, inh5V > di/ia ela. > 1enha verV eu edrinho e aquele outro deram uma tunda nomarinheiro do puV puV que o coitado virou massa de $ente. 1enha ver quecoisa linda, inh5...P@ona -enta e o (lmirante oram ver. E viram. 1iram ope&e sem sentidos, ao lado do corpoamassado do apit%o Gancho. E viram tamb9m uma coisa muito curiosa' os marinheirosdo \onderland, que pareciam mortos, começaram a ressuscitar. Er$ueram>se e vieram a/er rodaem torno das duas massas de $ente.> Pue 9 issoK > interpelou Mr. -roUn. > N%o estavam mortos, ent%oKP Sm deles respondeu por todos'

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> PTonteados apenas, (lmirante; mas como vimos que era imposs)vel vencer ope&e, icamosca)dos no ch%o, a in$ir de mortos.P> P-em > disse o (lmirante, satiseito de n%o ter perdido os seus homens. > Levem para o navioestes dois re$ueses, e, se voltarem a si, ponham>nos a erros. (:ustiça in$lesa os !ul$ar5.P

s marinheiros a$arraram as duas massas de $ente e se oram com elas para o caminh%o dossandu)ches.> PSV> e3clamou o velho in$ls. > ue susto raspeiV Nem o $rande (lmirante Nelson !amais se viunuma alhada semelhante. Mas muito eu dese!aria que a senhora mee3plicasse todo este mist9rio.P@ona -enta e3plicou.> PNada mais 5cil, (lmirante. Sma simples troca de latinhas que a Em)lia e/. pobre ope&e s# 9$ente depois que in$ere o tal espinare da lata. Mas Em)lia trocoua sua lata de espinare por uma de couve mo)da, e trou3e o espinare para os meninos. # isso...P> PE por que a senhora n%o me avisou h5 mais tempoK or que me e/ passar por tamanhasan$6stiasKP > quei3ou>se o coitado.> Para proporcionar a 1ossa onra o imenso pra/er que neste momento est5 sentindoP > respondeua velha. (lmirante chamou Em)lia para receber os seus cumprimentos.> PTudo dependeu da sua id9ia, enhora Marquesa > disse ele. > ( principal coisa oi trocar a lata deespinare pela de couve mo)da. abe>lhe, portanto, a $randehonra deste memorabil)ssimo eito, e estou certo de que ua Ma!estade britAnica saber5recompens5>la devidamente. Talve/ a aça baronesa do mp9rio.P> Preiro que ua Ma!estade britAnica me mande uma cai3a de latas de leite condensadoP >respondeu a boneca. maior pra/er de Em)lia era abrir dois uros na tampa duma lata de leite condensado para escorrer o io num prato, desenhando letras. @ois urinhos > um para asa)da do leite, outro para a entrada do ar. om um uro s# o leite n%o sai.Lo$o depois...Estava o 1isconde nesse ponto das Mem#rias, quando Em)lia entrou.> omo vai o serviçoK > inda$ou ela. > :5 escreveu al$uma coisaK> Sm colosso, Em)liaV ontei toda a hist#ria do an!inho, a vinda das crianças in$lesas, a luta deope&e com o apit%o Gancho, com os marinheiros do \onderland edepois com edrinho e eter an...> ontou que ui eu quem salvou tudoK ue se n%o osse a minha id9ia da couve a situaç%o teriasido um horrorK> ontei tudo direitinho.> Ent%o leia. 1isconde leu todos os cap)tulos !5 prontos, aos quais Em)lia aprovou e $abou, achando>os muito bem escritinhos.> Est5 bem > disse ela. > Minhas Mem#rias v%o a $alope. uero provar ao mundo que aço de tudo,que sei brincar, que sei aritm9tica, que sei escrever mem#rias...> abe escrever mem#rias, Em)liaK > repetiu o 1isconde ironicamente. > Ent%o isso de escrever mem#rias com a m%o e a cabeça dos outros 9 saber escrever mem#riasK> ereitamente, 1iscondeV sso 9 que 9 o importante. Ia/er coisas com a m%o dos outros, $anhar dinheiro com o trabalho dos outros, pe$ar nome e ama com a cabeça

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dos outros' isso 9 que 9 saber a/er as coisas. Ganhar dinheiro com o trabalho da $ente, $anhar nome e ama com a cabeça da $ente 9 n%o saber a/er as coisas. lhe,1isconde, eu estouno mundo dos homens h5 pouco tempo, mas !5 aprendi a viver. (prendi o $rande se$redo da vidados homens na terra' a esperte/aV er esperto 9 tudo. mundo 9 dos

espertos. e eu tivesse um ilhinho, dava>lhe um s# conselho' Pe!a esperto, meu ilhoVP> E como lhe e3plicar o que 9 ser espertoK > inda$ou o 1isconde.> Muito simplesmente > respondeu a boneca. > itando o meu e3emplo e o seu, 1isconde. uem 9que e/ a P(ritm9ticaPK 1oc. uem $anhou nome e amaK Eu. uem 9 queest5 escrevendo as Mem#riasK 1oc. uem vai $anhar nome e amaK Eu... 1isconde achou que aquilo estava certo, mas era um $rande desaoro.> E se eu me recusar a escreverK e eu dei3ar as Mem#rias neste ponto, que 9 que aconteceKEm)lia deu uma $rande risada.> -oboV e i/er isso, pensa que me apertoK orro l5 com uindim e ele me acaba o livro. -emsabe que uindim me obedece em tudo, ce$amente. W in6til, 1isconde,lutar contra os espertos. Eles acabam vencendo sempre. or isso, abai3e a crista e continue. pobre 1isconde deu um suspiro. Era assim mesmo...> E a$oraK > inda$ou. > ue mais quer que conteK> resto da hist#ria do an!inho. onte como oi a u$a do an!inho para o c9u. 15 escrevendo queeu !5 volto. Estou brincando de pe$ador com o uindim.@isse e saiu correndo. 1isconde tomou da pena e com toda a resi$naç%o continuou.@epois dos atos que acabamos de narrar, prosse$uiu o 1isconde no cap)tulo se$uinte, tudo correusem novidades no s)tio. (s crianças in$lesas passaram l5 trs dias, brincando de mil brinquedos, no maior contentamento poss)vel. s caminh8es do \onderlandvinham duas ve/es por dia, de manh% e H tarde, com o carre$amento de comedorias> e eram tantas que Tia Nast5cia descansou do o$%o. Ela e @ona -enta aderiram aos sandu)ches,$el9ias e quei!os do 4ei da n$laterra.# quem n%o $ostou da esta oi o an!inho. (s crianças o atropelavam demais. N%o havia para eleum s# momento de sosse$o. sso acabou dando>lhe uma id9ia' escapar,voltar para o c9u. No terceiro dia, Ilor das (lturas e3perimentou as asas. 1oou um bocadinho,como se osse para a criançada ver. entiu>se bem. ( quebradura estava pereitamente soldada. Ioi ent%o que resolveu u$ir para sempre.Mas como !5 estivesse $ostando dos meninos do s)tio n%o u$iu como um u!%o qualquer. @espediu>se, l5 do !eitinho dele. he$ando perto de Nari/inho, murmurou'> PNari/inho, dei3e>me dar um $rande abraço e um bei!o em voc. Gosto tanto da minha ami$a...P Nari/inho dei3ou>se abraçar e bei!ar in6meras ve/es. @epois oi ter com edrinho e alou em outrotom.> Pedrinho > disse ele >, ique certo de uma coisa' se al$um dia eu desaparecer *por morte, est5claro+, levarei uma lembrança eterna de todos daqui, e principalmentede voc.PE abraçou>o e bei!ou>o tamb9m. Em se$uida oi ter com a boneca.> PEmilinha, venha dar>me um abraço e um bei!o.P> Para que tanta coisa, meu an!oK er5 que quer dei3ar>nosKP> PN%o. (penas quero dar parab9ns pelo que voc e/.PEm)lia abraçou>o e bei!ou>o > mas desconiou, indo di/er H menina'

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> PEstou desconiada do an!inho. Esses abraços e bei!os parecem>me ora de prop#sito. ara mim,ele est5 pensando mais 9 em u$ir. :5 sarou. :5 voa. E se Tia Nast5cian%o cortar lo$o a ponta de uma das suas asinhas, prrrV... l5 se vai ele a qualquer momento.P> PN%o se!a boba, Em)liaV :uro que o an!inho n%o pensa mais no c9u. Est5 acostumad)ssimoconosco.P

> Pode ser > disse a boneca >, mas, por causa das d6vidas, vou insistir com Tia Nast5cia para quelhe corte a asinha, !5, !5. E se ela n%o tiver cora$em eu mesmaa cortarei.PEm)lia oi e intimou a preta a cortar a asa do an!inho naquele mesmo dia.> P@eus me livreV > respondeu Tia Nast5cia. > ortar a asa de um an!o do c9u, como se osse$alinhaK... @eus me livre de cometer semelhante sacril9$io. s an!oss%o criaturas celestes.P> Pois ent%o eu mesma corto > $ritou Em)lia. > Ele est5 mudado e ho!e me deu um abraço e um bei!o com cheirinho de despedida. E !5 voa pereitamente, sabeKP@isse e correu ao quarto de @ona -enta em procura da tesoura. Estava a reme3er na cesta decostura, quando um imenso berreiro se levantou no pomar. Em)lia correuH !anela.> P an!inho voouV > $ritava a criançada. > 1ai voando altoV 1ai sumindo no c9uV...PEm)lia ainda p"de v>lo nos ares. L5 se ia que nem uma $arça, subindo, subindo sempre. :5 era um ponto no espaço. or im desapareceu... Nin$u9m descreve o desespero das crianças. ch%o do pomar icou ensopado de l5$rimas.edrinho dava pontap9s raivosos nas cascas de laran!a. Nari/inho, no colode @ona -enta, soluçava com desespero. # Em)lia n%o chorou. (penas enureceu>se contra Tia Nast5cia.> P(quela burronaV rometeu que cortava a asinha dele e n%o cortou. ($ora, est5 a)...PIoi correndo H co/inha tomar satisaç8es.> P1iu o que a senhora e/K or causa da sua lerde/a, do seu medo, do tal Zsacril9$ioZ, perdemos onosso an!inho. 1oouV Ioi>se para sempre...P Nast5cia en3u$ou uma l5$rima na ponta do avental.> PMas eu n%o tinha cora$em de cortar a asinha dele, Em)lia. Tive medo. Essas criaturinhas do c9us%o as aves de @eus. @eus podia me casti$ar...P> Pasti$ar, nadaV > berrou Em)lia. > Todas as aves s%o de @eus e no entanto prendemos can5rios esabi5s nas $aiolas e comemos pombos assados sem que @eus se importe.ensa que Ele ica o tempo todo prestando atenç%o nas aves do quintal do c9uK Tem mais que a/er, boba. (l9m disso an!o 9 coisa que h5 l5 por cima aos milh8es. Smde menos, um de mais, @eus nem percebe. erdemos o an!inho por sua culpa s#. -urronaV Ne$ra beiçudaV @eus que te marcou, al$uma coisa em ti achou. uando ele prete!auma criatura 9 por casti$o.PTia Nast5cia rompeu em choro alto > t%o alto que @ona -enta veio ver o que era.Em)lia e3plicou'> PEsta burrona teve medo de cortar a ponta da asa do an!inho. Eu bem que avisei. Eu viviainsistindo. o!e mesmo insisti. E ela, com esse beiç%o todo' ZN%o tenhocora$em... W sacril9$io...Z. acril9$io 9 esse nari/ chato.P> PEm)liaV > repreendeu @ona -enta. > 4espeite os mais velhosV N%o abuseVP> P-olasVP > $ritou Em)lia retirando>se e batendo a porta.> Pomo est5 icando isolenteVP > murmurou @ona -enta.

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Era o dia da volta da criançada. Lo$o depois o (lmirante -roUn deu aos marinheiros as ordensnecess5rias e apitou. Todos se reuniram em torno dele.> PMeus meninos e meninas > disse o velho in$ls, de p9 no topo da escadinha da varanda. > ( nossaesta che$ou ao im. assamos neste s)tio trs dias ini$ual5veis,na companhia desta boa $ente e do an!inho que acaba de desaparecer nas nuvens, saudoso das

estrelas do c9u. 1amos reembarcar para a n$laterra. uero a$ora que vocsdesilem diante de @ona -enta e lhe a$radeçam com um bom shaRe>hands *aperto de m%o+ amaravilhosa hospeda$em que nos proporcionou. Mas antes disso v%o me acompanhar num hurra de saudaç%o.PE berrou'> PurraV urraV @ona -entaVP> PurraV...P > ecoaram as crianças num coro de vo/es que encheu os ares.eter an subiu H escadinha.> PurraV urraV edrinho...P > $ritou ele.E as crianças ecoaram' > PurraV urraV edrinhoVP(lice trepou H escada.> PurraV urraV Nari/inho e Em)lia.PE mil vo/es ecoaram' > PurraV urraV Nari/inho e Em)lia.P (o ouvir o berreiro, Tia Nast5cia, l5 noo$%o, murmurou consi$o'> Pomo estes in$lesinhos urram, meu @eusV...P.Em se$uida as crianças desilaram diante de @ona -enta, que teve a pachorra de apertar a m%o detodas, uma por uma.> PGoodb&eVP > iam elas di/endo a cada shaRe>hand. he$ou a ve/ de o (lmirante despedir>se.> PMinha senhora > disse ele >, n%o sei como a$radecer a boa acolhida que tivemos neste abençoados)tio. 1ou com recordaç8es que conservarei pelo resto da vida.E de tudo saberei dar boa conta a ua Ma!estade britAnica.P@ona -enta respondeu'> Penhor (lmirante, a honra que o 4ei da n$laterra nos e/ mandando aqui a lor da criançadain$lesa 9 dessas coisas que at9 dei3am uma pessoa com um n# na $ar$anta. N%o encontro palavras de a$radecimento. eço que apresente a ua Ma!estade as minhashomena$ens e di$a H 4ainha 1i6va que senti proundamente a morte de seu au$ustoesposo. (deus, enhor (lmirante -roUnV ue se!am muito eli/es na via$em, s%o os meus maissinceros votos. (deusV...P( criançada, com o velho (lmirante H rente, p"s>se em marcha. uando che$aram H porteira,Em)lia $ritou'> P(deus, (liceV (deus, eter anV (deus, (lmiranteV N%o se esqueça da minha cai3a de latas deleite condensado, nem da vaca prometida H @ona -enta...P Nari/inho danou.> PEsta siri$aitaV Numa hora assim a $ente comporta>se. W o momento solene. ue id9ia n%o ir5a/endo o (lmirante de voc, $ulosaKP> Pue bem me importaV > e3clamou Em)lia. > que quero 9 que venha a minha cai3a de leite.P@epois de tudo acabado, @ona -enta pediu H Tia Nast5cia que lhe trou3esse uma bacia de 5$ua desal.> Para qu, inh5KP> Para me curar, Nast5cia. s tais shaRe>hands desta in$lesada escan$alharam com a minha pobrem%o...P

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 Nesse ponto das Mem#rias o 1isconde lembrou>se de que ele tamb9m tinha m%os e parou paraesre$5>las. 4eleu o 6ltimo cap)tulo. Gostou. 4iu>se, pensando l5 consi$o'Pou um danadinho para escreverV Mas por muito que escreva !amais conquistarei ama de escritor.Em)lia n%o dei3a. (quela diaba assina tudo quanto eu produ/o...P>Muuuul... > soou um vo/eir%o na !anela do quarto.

1isconde voltou>se. Era uindim. rinoceronte eniara o oci>nho pela abertura da !anela.Em)lia, montada no chire dele, $ritou'> :5 acabou o serviço, 1iscondeK> (cabei a hist#ria do an!inho. ( criançada in$lesa l5 se vai embora, com o (lmirante na rente.ontei a hist#ria do leite condensado > aquela tremenda rata quevoc deu...Em)lia escorre$ou do chire do rinoceronte e entrou pela !anela. Ioi e3aminar a obra do 1isconde.I>lo ler a 6ltima parte escrita. @eu a sua aprovaç%o.> Est5 bem. Ialta a$ora aquele caso do eninha > disse ela. > -em sabe que depois do passeio aoa)s das I5bulas icamos aqui numa d6vida a respeito doeninha.Sns queriam que ele osse o eninha mesmo; outros achavam que era o pr#prio eter an. s doismeninos eram i$ualmente invis)veis, quando queriam ser invis)veis,e ambos cantavam cocoricoc#. meio de sair da d6vida, na minha opini%o, seria a/er umaconsulta a eter an > e lo$o que a criançada in$lesa partiu, com o (lmiranteH rente, eu me lembrei disso.> Pedrinho > disse eu > aproveite a ocasi%o para saber de eter an se o eninha 9 ele.PD Este persona$em aparece em 4einaç8es de Nari/inho, volume 2.> PXtima lembrançaVP > respondeu edrinho > e mandou 4abic# atr5s do bando !5 lon$e, com umrecado que me lembro muito bem. Sm recado assim' P(mi$o eter' aça oavor de responder se o eninha 9 ou n%o 9 voc. 5 muito tempo que andamos aqui na d6vida.Mas n%o minta. 4esponda a s9rio. eu ami$o edrinhoP.Esse recado oi escrito Hs pressas num dos pap9is que vinham embrulhando os sandu)ches de presunto de QorR. Lembro>me disso porque ui eu quem apanhou do ch%o o papel em que edrinho escreveu o recado. edrinho escreveu o recado, dobrou o papel muito bemdobradinho, e disse a 4abic#'> P15 correndo atr5s do bando e entre$ue isto a eter an. E espere a resposta.P Nesse ponto o 1isconde interrompeu Em)lia e continuou a hist#ria.> E3atamente > disse ele. > E 4abic# oi correndo, mas parou lo$o adiante da porteira, atr5s docupim. cheirinho a presunto de QorR daquele papel en$ordurado perturboua cabeça dele... 4abic#, ent%o, comeu o recado sem nem sequer ter a lembrança de ler o bilhete, demodo a poder dar o recado verbalmente. E meia hora depois...Em)lia tapou a boca do 1isconde.> @ei3e>me contar o resto. Meia hora depois 4abic# reapareceu, in$indo>se cansad)ssimo, comaquela cara de boi ladr%o que ele tem quando a/ al$umas das suas.> ProntoV > disse ele a edrinho. > :5 entre$uei o recado a eter an.P> PE qual oi a respostaKP > per$untou edrinho.> 4abic# atrapalhou>se, começou a mascar.> P( respostaK > repetiu. > ( resposta... a resposta oi que... que ele a$radecia muito as suas palavrasde despedida e que quando che$asse H n$laterra ia... ia...Pedrinho avermelhou de c#lera.

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> Palavras de despedidaK Eu l5 escrevi palavras de despedidaK Naquele bilhete eu apenas per$untava se o eninha era ou n%o era ele...P> PW verdadeV > e3clamou 4abic#. > N%o sei onde ando com a cabeça. sso mesmo. (ssim queentre$uei a eter an o papel, ele o leu, pensou um minutinho... e... erespondeu assim' Z@i$a ao enhor edro que... que pode ser que sim, pode ser que n%oZ. Ioi isso...P

> PIicamos na mesmaV > e3clamou edrinho, danado. > eter an est5 se a/endo de misterioso.PMas eu, que n%o sou tola, desconiei lo$o. (pro3imei>me disarça>damente da boca de 4abic# echeirei > e senti um cheirinho de bilhete comido.> P1oc devorou o bilhete, 4abic#V > ui $ritando. > Tanto devorou que est5 com cheiro de bilhetedevorado na bocaVP> PN%o devorei, Em)liaV :uro que n%o devorei...P > mentiu o miser5vel.> P@evorouV @evorouV @evorouV...P> 1oc, 1isconde, vinha entrando, lembra>seK, ainda de camisola branca e asas > isto 9, com uma asas#; a outra !5 havia ca)do. Eu, ent%o, disse'> P1isconde, o senhor que 9 um herlocR, venha resolver esse caso. (plique a sua cincia na bocade 4abic# e ve!a se ele devorou um recado escrito em papel de sandu)che,que edrinho mandou a eter an.P> 1oc, 1isconde, oi buscar a lente dos detetives e e3aminou todos os pelinhos do ocinho de4abic#. E disse'> Por aqui h5 sinais de ter andado um recado.P 4abic# deendeu>se'> PNada mais natural, visto que levei o recado na bocaP > disse ele.> 1oc, 1isconde, prosse$uiu na investi$aç%o, e3aminou>lhe os dentes e descobriu, entaladinhosneles, os sinais do crime. E $ritou'> P1e!o nos v%os dos dentes deste quadr6pede pedacinhos de papel mascadoP > n%o oi assimmesmo, 1iscondeKedrinho, ent%o, n%o quis saber de mais nada. re$ou no Marqus tamanho pontap9 que ele oi parar a cinco metros de distAncia, a/endo > coin, coin > e sumiu>se.> ( eterna $ulodice de 4abic# e/ que perdssemos a melhor oportunidade de saber se eninha erao mesmo eter an ou n%o.> Escreva este caso, 1isconde. E depois pode contar a hist#ria inteira do uindim aqui no s)tio. 15escrevendo, que eu !5 volto > concluiu Em)lia > e saiu correndo. 1isconde !5 estava com os dedos cansados de tanto escrever, e tamb9m revoltado contra ase3i$ncias de Em)lia. 6bito riu>se. P1ou pre$ar>lhe uma peçaP, pensoul5consi$o. P1ou escrever uma coisa e quando ela voltar e me mandar ler eu pulo o pedaço ou leiooutra. W isso...PE p"s>se a escrever contra a boneca, assim'PEm)lia 9 uma tirana sem coraç%o. N%o tem d# de nada. uando Tia Nast5cia vai matar um ran$o,todos correm de perto e tapam os ouvidos. Em)lia, n%o. Em)lia vaiassistir. @5 opini8es, acha que o ran$o n%o icou bem matado, manda que Tia Nast5cia o matenovamente > e outras coisas assim.PPTamb9m 9 a criatura mais interesseira do mundo. Tudo quanto a/ tem uma ra/%o e$o)stica. # pensa em si, na vidinha dela, nos brin>quedinhos dela. or isso mesmoest5 icando a pessoa mais rica da casa. Eu, por e3emplo, s# possuo um ob!eto > a minha cartola.:amais conse$ui ser propriet5rio de outra coisa, porque se arran!oqualquer coisa Em)lia encontra !eito de me tomar. (t9 aquele diton$uinho que raptei no a)s daGram5tica e escondi na boca a diaba descobriu e me e/ cuspir ora.P

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PEla, entretanto, possui um colosso de coisas. quartinho da Em)lia est5 cheio > mais ainda queeste quarto de badulaques. W dona de $rande n6mero de pernas e braçose cabeças de bonecas > das que Nari/inho quebrou. Tem uma coleç%o de panelinhas de barro, eoutra de caquinhos coloridos de louça. Sma ve/ quebrou de prop#sito umalinda 3)cara verde de @ona -enta s# para completar a sua coleç%o de caquinhos > porque estava

altando um caquinho verde...PPTem besouros secos, um morce$o seco, lores secas, borboletas secas e at9 um camar%o seco. Temcoleç%o de ios de cabelo, que elaenrola um por um como cordinhas. abelos de @ona -enta, de Nari/inho e edrinho, do apit%oGancho, do ope&e. Na sua coleç%o, di/ ela, s# alta uma coisa' io decabelo de um homem totalmente careca.PPE tem mais coisas. Tem uma coleç%o de selos, todos cortados. Em)lia recorta as cabecinhas e maisi$urinhas dos selos e pre$a>as num 5lbum. N%o h5 o que n%o ha!anaquele quarto. @urante uns tempos andou com mania de colecionar verru$as, das que tm um iode cabelo plantado no meio. sso por causa da so$ra do ompadre Teodorico,que veio um dia aqui. Essa velha possui uma verru$a na cara. Em)lia começou a namorar aquelaverru$a. or im oereceu H velha um tost%o por aquilo > ima$inemVPPEm)lia 9 uma criaturinha incompreens)vel. Ia/ coisas de louca, e tamb9m a/ coisas que at9espantam a $ente, de t%o sensatas. @i/ asneiras enormes, e tamb9m coisast%o s5bias que @ona -enta ica a pensar. Tem sa)das para tudo. N%o se aperta, n%o se atrapalha. Eem mat9ria de esperte/a n%o e3iste outra no mundo. arece que adivinha,ou v atrav9s dos corpos.PPSm dia, em que muito me impressionei com qualquer coisa que ela disse, propus>lhe esta per$unta'> Mas, ainal de contas, Em)lia, que 9 que voc 9KPPEm)lia levantou para o ar aquele implicante nari/inho de retr#s e respondeu'> ou a ndependncia ou Morte.PPIiquei pensativo. Na realidade, o que Em)lia 9, 9 isso' uma independencia/inha de pano >independente at9 no tratar as pessoas pelo nome que quer e n%o pelo nomeque as pessoas tm. ara ela eu sou o Milho; o (lmirante 9 o -ie...PP(qui no s)tio quem manda 9 ela. or mais que os meninos açam, no im quem conse$ue o quequer 9 a Em)lia com os seus amosos !eitinhos.erta ve/...PEm)lia entrou nesse momento.> omo v%o as Mem#rias, 1iscondeK Mais um cap)tuloK> im > respondeu o 1isconde, meio atrapalhado. > Escrevi mais um cap)tulo...> obre quK 1isconde, que n%o queria ler aquele cap)tulo contra ela, começou a inventar.> Escrevi > disse ele > sobre... sobre a nossa volta da via$em ao c9u. ontei o... o tombo que vocsderam de cima daquele cometa.Em)lia desconiou.> 1isconde, 1iscondeV senhor est5 me tapeandoV... Esse seu ar de cachorrinho que quebrou a panela est5 me di/endo que o senhor escreveu uma coisa e quer impin$ir outra. pobre 1isconde corou at9 a rai/ das palhinhas. mposs)vel en$anar aquele a/ou$ueV ( bonecaarrancou>lhe das m%os o cap)tulo. Leu>o... Mas com $rande assombro do1isconde n%o e/ a cena que ele esperava. Em)lia icou uns instantes meditativa. @epois disse'

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> senhor me traiu. Escreveu aqui uma porç%o de coisas perversas e desa$rad5veis, com o im deme desmorali/ar perante o p6blico. Mas, pensando bem, ve!o que souassim mesmo. Est5 certo.Leu mais uma ve/ o cap)tulo.> W isso mesmo. ou tudo isso e ainda mais al$uma coisa. ode icar como est5. ada um de n#s

dois, 1isconde, 9 como Tia Nast5cia nos e/. e somos assim ou assados,a culpa n%o 9 nossa > 9 da ne$ra beiçuda.ada ve/ que Em)lia alava na ne$ra lembrava>se do an!inho u$ido, de modo que naquelemomento esqueceu das Mem#rias para pensar nele.> N%o posso alar nessa ne$ra beiçuda sem que o san$ue n%o me venha H cabeça, 1iscondeVerdemos Ilor/inha das (lturas s# por causa de um tal Psacril9$ioP que a burrona inventouV mposs)vel conormar>me com a perda do meu an!inho...E depois de uns instantes de meditaç%o'> Estou a ver>me com ele em oll&Uood, no cinema... 6bito, teve uma id9ia.> ode ir embora, 1isconde. Eu mesma quero acabar estas Mem#rias. 1ou contar o que teriaacontecido se Tia Nast5cia houvesse cortado a ponta da asa do an!inho.Iomos para oll&Uood no \onderland, com toda a criançada in$lesa, eter an e o (lmirante. E(lice tamb9m. Iu$i do s)tio. Eu !5 andava en!oada de bolinhos, de pitan$ueira, de pa)ses>da>$ram5tica. Iu$i > u$i > u$i com o an!inho e o 1isconde.( via$em oi #tima, e3ceto para o 1isconde, que en!oou a ponto de deitar ao mar metade da suacincia. 1omitou lo$aritmos, An$ulos e triAn$ulos, leis de NeUton >uma trapalhada. Eu n%o en!oei coisa nenhuma, nem o an!inho. Em ve/ disso, aproveitei o tempo para estudar com o (lmirante a l)n$ua de (lice. No im da primeira semanao velho declarou a eter an'> PW e3traordin5ria a inteli$ncia desta criançaV :5 est5 alando in$ls sem o menor sotaqueVP N%o era elo$io, n%o. @e ato assimilei com tal pereiç%o aquela l)n$ua que che$uei at9 a corri$ir muitos erros de (lice.Em Nova QorR desembarcamos. ouve bri$a. (lmirante queria levar>me para \ashin$ton, a imde apresentar>me ao tal residente 4oosevelt. Eu s# queria saber do cinema.ueria oll&Uood, que 9 a cidade do cinema. N%o discuti. Iin$i que ia para \ashin$ton e ui parar em oll&Uood, de avi%o.> omo issoK > per$untar5 al$u9m; e eu responderei' PN%o me amolem com cornos. omi$o n%o h5como. Iui e acabou>se.PL5 che$ando, com o an!inho por uma das m%os e o 1isconde pela outra, ui lo$o em procura dahirle& Temple. -ati na porta da casinha dela. 1eio uma criada.> P@ona hirle& est5KP > per$untei.uando a criada nos viu, arre$alou os olhos e abriu uma boca deste tamanho.> Phirle&, corraV... 1enha ver trs en"menos > $ritou ela. > Sm an!inho, uma boneca e um sabu$ode cartola...Phirle& veio de $alope. Mas n%o mostrou o menor espanto. (braçou>me, di/endo'oll&Uood.> PEu sabia que voc acabava che$ando at9 aqui. (inda ontem disse H mam%e' Zualquer coisa est5me di/endo que Em)lia n%o tardaZ.Puem se admirou daquelas palavras ui eu.> PEnt%o... ent%o !5 me conheciaKP > per$untei.

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> Pra, Em)liaV uem n%o conhece a Marquesa de 4abic#K Iiquei sabendo que em oll&Uoodtodos sabemos de cor/inho aqueles livros onde vm contadas as suas hist#rias. caso da p)lula alante, da via$em ao a)s da I5bula, onde @ona -enta se sentou em cima do dedodo 5ssaro 4oca pensando que era rai/ de 5rvore... uem n%o sabeessas hist#riasKP

> Pois ent%o, minha cara hirle&, estamos mais do que pa$as > disse eu >, porque no -rasil n%o h5quem n%o conheça voc. (quela sua ita do tempo da $uerra, quandovoc oi pedir ao residente Lincoln que soltasse o prisioneiro, e começou a comer maç% no colodele > ZEste pedaço 9 meuZ > ZEste a$ora 9 o seuZ > n%o h5 por l5quem n%o conheça. abemos voc de cor, hirle&.P> PXtimoV > disse ela. > E que pretendem a/er por aquiKP> Pue per$untaV retendemos virar estrelas. Minha id9ia 9 empre$ar>me na aramount, eu e estescompanheirinhos. Iormaremos o mais estupendo trio que ainda houve.ue achaKP> P(cho que vai ser um sucesso louco, Em)liaV Nunca apareceu no cinema um an!o de verdade, nemuma boneca alante, nem um sabu$o cient)ico.P> P:5 n%o 9 maisP > murmurei olhando para o 1isconde com o meu ar compun$ido.> PN%o 9 mais o quKP> Pient)ico. Na via$em por mar o 1isconde en!oou e vomitou toda a cincia. Est5 va/io...P> Pue penaV > e3clamou hirle&. > E a$oraKP> Pavemos de dar um !eito. Tenho id9ia de lev5>lo a uma universidade para ench>lo de novo.Talve/ ha!a por l5 al$uma bomba de cincia, como as de $asolina.Phirle& reletiu uns instantes.> PN%o 9 preciso > declarou por im. > onheço $randes artistas do cinema que n%o possuem cincianenhuma. 4in>tin>tin, por e3emplo. ual a cincia deleK Nenhuma. N%o sabe nem o que 9 verbo. E quantos outrosV Mas, olhe, antes de vocs se apresentarem Haramount, podemos a/er um ensaio de ita aqui em casa. Tenho tudo o que9 necess5rio. Enredo, inventaremos um. uerKP> PXtimo, hirle&V > e3clamei entusiasmada. > E enredo !5 tenho um e3celente na cabeça. ( bordovim todo o tempo pensando nisso.P> Pual 9KP> PSma itinha tirada do @om ui3ote de La Mancha. onhece a hist#riaKP> Pe conheçoV W de todos os livros o de que $osto mais. :5 o li trs ve/es.P> Pois muito bem > disse eu. > 1isconde ser5 @om ui3ote. Eu serei o moinho de vento. an!inho ser5 ancho ança...P> Pue !udiaç%oV > e3clamou hirle& com os olhos em Ilor das (lturas. > Ia/er de um encantinhodestes um $orducho daqueles...P> PTudo por brincadeira, hirle&. uanto mais maluco, mais en$raçado. E voc ar5 o papel do curada aldeia.P> PN%oV > $ritou hirle&. > uero a/er o papel de 4ocinanteV ue amor de cavalo aqueleV...ProntoV Estava tudo resolvido. (rran!ar vestu5rios oi um instante. hirle& tinha um quarto cheio de brinquedos e coisas que lhe davam. rimeiro vestimos de @omui3ote o 1isconde, com uma tampa de lata na cabeça > o elmo de Mambrino. om a lata de unsva$8e/inhos quebrados i/emos a couraça; e com outra tampa de lata, oescudo. Iicou altando a lança.> PE lança, hirle&K > per$untei, n%o vendo por ali nada que pudesse espetar.P> Pabo de vassoura serveKP

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> PMuito $rande, muito pesado para ele.P> Pabo de vassourinha > e3plicou lo$o hirle&. > Tenho uma de um tamanho que serve pereitamente > e lo$o achou uma vassourinha sem vassoura, s# cabo. Ie/ ponta.> Est5 aqui uma lança boa para um espirro de $ente > disse ela dando>a ao 1isconde. > 1amos a$oraZsan>charZ o nosso an!o.P

Eu rolei de rir quando hirle& acabou de arrumar o an!inho com um pequeno travesseiro amarradona barri$a para servir de pança. E pendurado no ombrinho dele um alor!e.Iicou um amor de ancho ança. # altava o burrinho.> PE o burrinhoKP > per$untei.> Pavalos temos aqui em quantidade > disse hirle&, reme3endo num monte de brinquedos ondehavia de tudo. (chou lo$o um cavalo sem rabo, que icou sendo burro. an!inho montou.P> P1iva, viva ancho ançaV > $ritamos as duas dando um bei!o naquela $alante/a barri$uda. Ilor das (lturas e/ bico. Estava assustado de ver>se $ordo daquela maneira.P> PE como vai voc a/er o moinho de ventoKP > per$untou hirle&.> PNada mais simples > respondi. > Iico plantada ali naquele lu$ar, que 9 a estrada, ico $irando o braço direito como asa de moinho, assim...P> PXtimoV > e3clamou hirle&. > odemos ent%o começar.P E começamos.lantei>me H beira da estrada, muda como um pei3e, a $irar o braço, /unnn...L5 lon$e apareceu @om ui3ote, montado no 4ocinante>hirle&, com o an!inho>ancho atr5s.(ssim que me viu, @om ui3ote parou e disse'> Plha l5, ami$o anchoV Estou vendo H beira do caminho um terr)vel $i$ante. 1ou atac5>lo.P an!inho>ancho, que havia decorado mal o que tinha de di/er, respondeu'> PN%o 9 $i$ante, meu senhor. W a Em)lia in$indo de moinho.P> PTu 9s o rei dos patetas, anchoV > disse @om ui3ote. > :uro que 9 o tremendo $i$anteMilarrobas, o maior comedor de crianças que e3iste. Espera>me neste ponto.1ou atac5>lo. @epois de vencido, poder5s recolher os despo!os.PE @om ui3ote atacou, de lança em riste, a/endo 4ocinante disparar na minha direç%o num $alopelouco. 4ocinante>hirle& teve de se$urar as perninhas dele, paraque n%o ca)sse cem tombos.uando vi apro3imar>se de mim aquele cavaleiro andante de tampi>nha de lata na cabeça e lançaapontada, re$irei os braços com mais orça. E quando ele che$ou aomeu alcance dei>lhe tal peteleco que ele voou pelos ares, indo cair de ponta>cabeça dentro de umacai3a de bombons va/ia. Iicou l5 de pernas para o ar, mudo, sem poder di/er o que tinha de di/er. 4ocinante>hirle& oi tir5>lo da cai3a. # ent%o @om ui3otee3clamou'> P(cuda, anchoV maldito $i$ante dei3ou>me em pandarecos.P an!inho>ancho veio correndo,a pu3ar o seu burrinho>cavalo,que era de rodas. he$ou e esqueceu a alaç%o ensinada.> Pue 9 que eu di$o a$oraK > per$untou ele a 4ocinante>hirle& com aquela carinha linda de an!oca)do do c9u.P4ocinante>hirle& repetiu>lhe ao ouvido a r9plica, isto 9, o que ele tinha de di/er. E ele'> Penhor meu amo, bem eitoV Eu n%o disse que era moinhoK N%o quis acreditar, n%o 9K ois a$oraomente>se...P@om ui3ote respondeu'> PN%o era moinho, n%o, anchoV Era o $i$anteV Mas o maldito m5$ico Ireston o transormou emmoinho no momento em que o ataquei. ($ora estou aqui com as costelas

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quebradas, sem poder levantar>me...P> Pua alma, sua palma > disse ancho. > uem vai buscar l%, sai tosquiado. -oa romaria a/, quemem casa ica em pa/. ($Jente>se...P@om ui3ote $emia no ch%o. 4ocinante>hirle& tamb9m devia estar ca)do, a $emer, mas pulou esse pedaço. Estava, sim, a rir>se doidamente da atrapalhaç%o de ancho

com o travesseirinho da pança.> P travesseiro est5 caindoVP > murmurava ancho muito alito.> P@ei3e que caiaV > $ritei. > Ia/ de conta que voc ema$receu da dor de ver o seu amoespandon$ado. 1amos a$ora condu/ir @om ui3ote para a aldeia da Mancha.Phirle& lar$ou de ser 4ocinante e eu lar$uei de ser moinho. Levantamos @om ui3ote do ch%o parao arrumarmos em cima do burrinho>cavalo de ancho > e l5 omos paraa aldeia. (o atravessarmos a sala de !antar, vimos a m%e de hirle& arrumando a mesa para olanche.> Pue maluquice 9 essa, minha ilhaK > per$untou a boa senhora, que n%o sabia de nada. E vendo>me ali, mais o an!inho' > E que crianças esquisitas, hirle&V ndedescobriu issoKP> PN%o s%o crianças, mam%e. Esta 9 a Em)lia, a amosa boneca que a/ coisas do arco>da>velha nos)tio de @ona -enta, e este 9 o an!inho de asa quebrada que ela caçounas estrelas.P( m%e de hirle& abriu tamanha boca que tive medo que me en$olisse. ( coitada n%o entendeu patavina, pois nunca tinha ouvido alar de mim, nem do s)tio, nem do an!inho.uis mais e3plicaç8es.> Pmposs)vel, mam%eV > respondeu hirle&. > Estamos com pressa de che$ar H aldeia da Manchaonde mora este cavaleiro andante...P> Pue cavaleiro andante, minha ilhaKP > interrompeu a boa senhora espantada.> P@om ui3ote, mam%e, este de costelas quebradas que se$ue no burrinho>cavalo. E para mim' >@epressa, moinhoV N%o temos tempo a perder. nosso doente est5 desen$anado.P(travessamos a sala no trote e sa)mos para a rua, dei3ando a m%e de hirle& ainda de boca aberta eolhos arre$alados, sem entender cois)ssima nenhuma. Na rua chamamos um t53i. Entramos. usemos dentro o pandareco.> P@epressaV > $ritou hirle&. > Toque para a aldeia da Mancha onde mora este re$us.P homem do t53i n%o sabia onde era a tal aldeia.> PW em qualquer parteV > $ritou hirle&. > Toque depressa antes que ele morra.P t53i saiu na volada.Sma batida na porta veio interromper o trabalho de Em)lia em suas Mem#rias. Era @ona -enta.> Estou estranhando a sua quietura aqui neste quarto, Em)lia, e vim saber o que h5 > disse a boavelha.> N%o h5 nada, @ona -enta. W que estou escrevendo as minhas Mem#rias e acabo de che$ar a um ponto muito interessante. t53i vai numa volada louca para a aldeiada Mancha. cavaleiro andante $eme com trs costelas quebradas. ancho perdeu a barri$a detravesseiro. 4ocinante>hirle& dei3ou a mam%e na sala de !antar com umacara i$ual/inha H sua.@e ato, a cara de @ona -enta estava i$ual/inha H cara que a m%e da hirle& e/ na sala de !antar,quando viu aquele bando de louquinhos passar por l5.> Mas... > começou @ona -enta. > N%o estou entendendo nada de nada de nada, Em)lia. E3plique>se.> %o as minhas Mem#rias, @ona -enta.> ue Mem#rias, Em)liaK

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> (s Mem#rias que o 1isconde começou e eu estou concluindo. Neste momento estou contando oque se passou comi$o em oll&Uood, com a hirle&, o an!inho e o sabu$o.W o ensaio de uma ita para a aramount.> Em)liaV > e3clamou @ona -enta. > 1oc quer nos tapear. EmMem#rias a $ente s# conta a verdade, o que houve, o que se passou. 1oc nunca esteve em

oll&Uood, nem conhece a hirle&. omo ent%o se p8e a inventar tudo issoK> Minhas Mem#rias > e3plicou Em)lia > s%o dierentes de todas as outras. Eu conto o que houve e oque devia haver.> Ent%o 9 romance, 9 antasia...> %o mem#rias ant5sticas. uer ler um pedacinhoK> ($ora, n%o. Tenho de ir escolher a ran$a que Tia Nast5cia vai matar. uando o seu trabalhoestiver conclu)do, ent%o o lerei. Estou deveras curiosa de ver o quesai dessa cabecinha...> iolho 9 que n%o 9V@ona -enta retirou>se e Em)lia continuou. (ntes disso esteve uns instantes com os olhos no orro, pensando l5 consi$o' PEstas velhas s# servem para atrapalhar avida da $ente. N%o me lembro mais onde estava. (h, sim... Na volada do t53i. )amos para a aldeiada ManchaP.> P@epressa, driverlP > $ritou hirle& para o choer.> P:5 che$amos > disse ele > e parou.P> PW aqui ent%o a aldeia da ManchaKP > per$untou hirle&.> Pereitamente. ( senhorita n%o disse que era em qualquer parteK Lo$o, 9 tamb9m aqui.P> PEst5 certoP > aprovou hirle&, saltando do t53i comi$o e o an!inho. Nesse momento...> (), enhora Em)liaV > e3clamaram duas vo/es atr5s dela. Escrevendo suas Mem#rias, heinKEram Nari/inho e edrinho, aos quais @ona -enta havia contado tudo.> uero ler um pedaço > disse a menina. Em)lia escondeu a papelada.> N%o pode ainda. # depois que orem publicadas.> ara que esse en!oamentoK Tem medo que eu coma a sua literaturaK > e Nari/inho oi a$arrandonas Mem#rias H orça.Leu um pedaço. Gostou.> Est%o en$raçadas, sim, edrinho. 1enha ver.edrinho leu !unto com ela mais um pedaço e a conseqJncia oi icarem tamb9m assanhad)ssimos para escrever mem#rias.> 1ou começar as minhas !5 > disse Nari/inho, !o$ando a papelada e saindo a $alope.> E eu tamb9mV > $ritou o menino, saindo noutro $alope.> nve!ososV > murmurou Em)lia. > (ssim que me vem a/endo uma coisa, querem a/er o mesmo.:untou a papelada do ch%o. -oce!ou. E3aminou os dedos.> omo cansa escreverV Estou com a m%o doendo. melhor 9 continuar com a munheca do1isconde.Ioi H !anela. hamou'> W hora, 1iscondeV 1enha correndoV 1isconde veio correndo.> :5 estou com os dedos do)dos de tanto escrever > disse ela. > ontinue as Mem#rias.> Em que ponto est5K> Estou com a hirle& e o an!inho em oll&Uood, levando @om ui3o>te para a aldeia da Mancha,que pode ser em qualquer parte. ontinue. 1isconde abriu a boca, espantado. N%o estava entendendo coisa nenhuma.> 1amos, escrevaV > disse ela.

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> omo poderei escrever uma hist#ria que n%o seiK Nunca estive em oll&Uood, nem nunca vocme contou essa passa$em.> E que tem isso, boboK Eu tamb9m n%o estive l5 e estou contando tudo direitinho. uem tem miolon%o se aperta. 1isconde leu o pedaço escrito.

> ue horror, Em)liaV Eu transormado aqui em @om ui3ote, com trs costelas quebradas,moribundo... sto 9 abusar da humanidade.> ois abuse da humanidade e termine a hist#ria.> @a maneira que eu quiserK > inda$ou o 1isconde, !5 com um plano na cabeça.> im. @a maneira que quiser > respondeu Em)lia.> :ura que de qualquer modo serveK> :uroV(o ouvir o !uro, o 1isconde incou com tanta orça um ponto inal na hist#ria que at9 urou o papel.> rontoV Est5 conclu)da.Em)lia plantou>se diante dele, de m%o/inhas na cintura, danada.> im, senhorV :5 9 desaoro. re$ou>me uma peça, a/endo>me !urar. lhe, 1isconde, se me pre$aoutra assim, !uro que cumpro a minha palavra. @epeno>o, sabeKEm)lia !5 ameaçara o 1isconde de o PdepenarP, isto 9, de lhe arrancar as perninhas e os braços, e o1isconde icava branco de cera ao lembrar>se disso. Eis por quese apressou a p"r um rabinho naquele ponto inal, transormando>o em v)r$ula.> Eu estava brincando, Em)lia > disse ele. > N%o conclu) com ponto, e sim com v)r$ula. uer di/er que a coisa continua. 1ou contar o resto da hist#ria, pode icar sosse$ada.> ssoV E quando acabar me chame. Estou na salinha de costura de @ona -enta.Em)lia saiu e o 1isconde continuou as Mem#rias do ponto em que Em)lia parar5, assim'P...Nesse momento, v)r$ula, @om ui3ote aproveitou>se dum instante em que o Moinho se haviaaastado e disse para 4ocinante>hirle&'> (mi$o 4ocinante>hirle&, este Moinho 9 uma peste, vive atropelando a humanidade e sobretudo amim, que sou a maior das v)timas. (meaça>me sempre dum casti$o tremendo'depenar>me.P> Pomo, senhor cavaleiro da ManchaK omo pode o Moinho depenar 1ossa enhoria, se 1ossaenhoria s# possui penas l5 no seu escrit#rio, que 9 lon$e daqui, na aldeiada ManchaKP> Puando o Moinho ala em depenar>me, tem na cabeça uma id9ia horrenda, qual a de arrancar>meestas duas pernas e estes dois braços que Tia Nast5cia me deu.P4ocinante>hirle& horrori/ou>se com tamanha crueldade e disse'> PN%o tenha medo que tal aconteça, enhor @om ui3ote. e o Moinho tentar a/er isso,encarre$o>me de pre$ar>lhe uma valente pare>lha de coices. onie em mim en%o tenha medo de nada.P Nisto apareceu o Moinho, di/endo'> PEstamos e3traviadas, hirle&V Ialei com o pol)cia da esquina, com um vendedor de !ornais e como homem do arma/9m. Nin$u9m sabe da tal aldeia da Mancha.P@om ui3ote cochichou bai3inho para 4ocinante>hirle&'> Pabem, sim. Moinho est5 mentindo. Eu, se osse voc, pre$ava>lhe !5 a parelha de coices.P> Pacincia, @om ui3oteV > respondeu 4ocinante>hirle&, in$indo ter ouvido outra coisa. > -emsei que costela quebrada d#i muito, mas quem manda 1ossa enhoriaandar se pe$ando com moinhosK uem moinhos apetece 9 isso o que acontece.P

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@om ui3ote lançou um olhar de #dio contra o Moinho malvado que o tinha redu/ido Hquela tristesituaç%o. Nisto passou um auto, com um homem conhecido da hirle&.> P1iva Mr. :ohnV > $ritou ela. > Ioi #timo que nos encontr5ssemos. Eu ia !ustamente H sua procura, para apresentar trs novos artistas vindos da (m9rica do ul.P

> PN%o me ale em artistas novos > respondeu Mr. :ohn, que era o $overnador da aramount. > Estouarto. Tenho mais de mil propostas de artistas novos. mundo inteiroquer entrar para o cinema.P> PMas estes s%o especiaisP > disse hirle&.> PTodos s%o especiais > replicou o homem. > N%o h5 um que n%o di$a de si as maiores maravilhas.P Nesse momento o homem deu comi$o, 1isconde. Iicou lo$o de olho arre$alado.> Puem 9 esta estranha e interessante i$urinhaKP > inda$ou.> Pois 9 !ustamente um dos artistas novos sobre que alei > respondeu hirle&. > Estivemosensaiando uma ita tirada do @om ui3ote. Este 1isconde a/ o papel doher#i, e !5 levou o tranco da asa do moinho. Est5 em pandarecos, todo mo)do por dentro, com trscostelas partidas.PMr. :ohn assombrou>se. E3aminou>me de todos os lados, e/>me per$untas e acabou di/endo'> Pois, minha cara hirle&, acho que voc acertou. Este re$uesi>nho d5 uma estrela de cinema de primeir)ssima ordem. (s itas em que ele aparecer v%o causar umsucesso tremendo.P> PE nas em que este aparecerKP > per$untou hirle& apresentando o an!inho.Mr. :ohn tonteou. omeçou a $a$ue!ar.> Puem... quem 9... esta... maravilhosa criançaKP> PSm an!o de verdade, Mr. :ohnV 6nico que !5 desceu do c9u H terra. uer verK > e tirou ocapotinho que escondia as asas de Ilor das (lturas. > ode e3aminar as asinhas dele. 1e!a que s%o naturais e n%o amarradas, como as dos an!os de prociss%o.PMr. :ohn e3aminou, pe$ou, apalpou, p"s os #culos, e3aminou outra ve/ e por im nem p"de alar detanta $a$ueira. Sm an!o de verdade, ali em oll&Uood, positivamenteera coisa de revolucionar o mundo.> PE temos ainda o terceiro > continuou hirle& apresentando o Moinho. > Esta 9 a amosa Em)lia,que nasceu no c9lebre s)tio de @ona -enta.P> PN%o interessa > respondeu Mr. :ohn imediatamente, sem $a>$ueira nenhuma. > -onecas de panon%o valem nada.P> PMas esta 9 alante, Mr. :ohnVP > ale$ou hirle&.> Pior ainda > disse ele. > odemos a/er ne$#cio com @om ui3ote e o an!inho. Mas a tal bonecade pano pode limpar as m%os Hs paredes. 1ade retroV...P 1isconde estava nesse ponto, quando Em)lia entrou. (pavorado, escondeu as tiras.> uero ver issoV > $ritou a boneca. > :5V...> E eu n%o quero mostrar > respondeu o 1isconde. > N%o passa de simples borr%o. Est5 cheio deerros. 1ou passar a limpo. @epois mostrarei.Em)lia deu>lhe um peteleco e tomou>lhe as tiras. Leu>as. Iicou vermelhinha como as rom%s.> om que ent%o, enhor 1isconde, est5 me sabotando as Mem#rias, heinK 4isque !5 todas asimpertinncias e escreva o que vou di/er. 1isconde pe$ou da pena e com toda a humildade oi pondo no papel o que Em)lia quis.> PE ent%o > ditou ela > o tal Mr. :ohn aceitou como estrela da m53ima $rande/a no c9u deoll&Uood, primeiro Em)lia, Marquesa de 4abic#, depois o an!inho. (o 6ltimo,o tal 1isconde de abu$ueira ou abu$osa, recusou imediatamente, di/endo'

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> Zsto aqui n%o 9 cocho de vacas. ue id9ia, enhora hirle&V Era l5 poss)vel eu contratar para aaramount um sabu$o de perninhasK abu$os, minha cara, temos c5na ali#rnia aos milh8es. N%o 9 preciso que venha nenhum de oraZ.> PE !o$ando dali para bem lon$e aquele sabu$o bolorento, levou>nos em seu lindo autom#vel paraos est6dios da aramount.P

Em)lia parou nesse ponto, com os olhinhos duros is$ados no 1isconde.> ($ora, sim. ($ora a coisa est5 direita, e3atinho como se passou.> assou, nadaV > disse o 1isconde num resmun$o. > 1oc nunca esteve em oll&Uood...> Estive, sim > em sonho. E tudo quanto vi em sonho oi e3atamente como acabei de ditar. Eu e Ilor das (lturas viramos estrelas da tela. 1oc oi para uma lata deli3o.> sso n%o escrevoV > protestou o 1isconde.> Escreva ou n%o, oi o que aconteceu. ($ora, ruaV onha>se daqui para ora, seu pirata... 1isconde u$iu no trote, muito eli/ de ter escapado ao depenamento.Em)lia sentou>se e escreveu'P(cabo de contar as olhas de papel !5 escritas e ve!o que s%o muitas. 1ou parar. Este livro icasendo o primeiro volume das minhas Mem#rias. se$undo escrevereidepois que icar velha.(ntes de pin$ar o ponto inal quero que saibam que 9 uma $rande mentira o que anda escrito arespeito do meu coraç%o. @i/em todos que n%o tenho coraç%o. W also.Tenho, sim, um lindo coraç%o > s# que n%o 9 de banana. oisinhas H toa n%o o impressionam; masele d#i quando v uma in!ustiça. @#i tanto, que estou convencida deque o maior mal deste mundo 9 a in!ustiça.uando ve!o certas m%es baterem nos ilhinhos, meu coraç%o d#i. uando ve!o trancarem na cadeiaum homem inocente, meu coraç%o d#i. uando ouvi @ona -enta contar a hist#ria de @om ui3ote, meu coraç%o doeu v5rias ve/es, porque aquele homem icou loucoapenas por e3cesso de bondade. que ele queria era a/er o bem para oshomens, casti$ar os maus, deender os inocentes. 4esultado' pau, pau e mais pau no lombo dele. Nin$u9m levou tanta pancadaria como o pobre cavaleiro andante > eestou vendo que 9 isso que acontece a todos os bons. Nin$u9m os compreende. uantos homensn%o padecem nas cadeias do mundo s# porque quiseram melhorar a sorte dahumanidadeK (quele :esus risto que @ona -enta tem no orat#rio, pre$ado numa cru/, oi um. shomens do seu tempo que s# cuidavam de si, esses viveram ricos e eli/es.Mas risto quis salvar a humanidade e que aconteceuK N%o salvou coisa nenhuma e teve dea$Jentar o maior dos mart)rios.uando alo assim, Nari/inho me chama de il#soa e ri>se. N%o sei se 9 ilosoia ou n%o. # sei que9 como sinto e penso e di$o.Eu era uma criaturinha eli/ enquanto n%o sabia ler e portanto n%o lia os !ornais. @epois que aprendia ler e comecei a ler os !ornais, comecei a icar triste. omeceia ver como 9 na realidade o mundo. Tanta $uerra, tantos crimes, tantas perse$uiç8es, tantosdesastres, tanta mis9ria, tanto sorimento...or isso acho que o 6nico lu$ar do mundo onde h5 pa/ e elicidade 9 no s)tio de @ona -enta. Tudoaqui corre como num sonho. ( criançada s# cuida de duas coisas' brincar e aprender. (s duas velhas s# cuidam de nos ensinar o que sabem e de ver que tudo ande ahora e a tempo. uindim s# quer saber de capim e de recordar ostempos atormentados que passou em S$anda, em lutas constantes com as eras e os homenscaçadores. e ele escrevesse mem#rias, !uro que seriam mil ve/es mais interessantes

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que as minhas.( 1aca Mocha tamb9m vive bem quieta no seu pasto e na cocheira, onde nunca lhe altam boas palhas de milho. 1ai tendo seus be/errinhos e vai dando leite para todosn#s. Leite como o dela n%o h5 no mundo. ( Mocha capricha. -urro Ialante est5 bem velho, coitado. W do tempo de La Iontai>ne, aquele homem que passeava

no a)s das I5bulas, tomando nota do que ouvia aos animais, para escrever livros. Est5 t%o velho e ilos#ico que s# @ona -enta o compreende bem. onversa altas ilosoias.4abic#, esse n%o vale nada. ( $ula o perdeu. N%o sendo coisa de comer, n%o se interessa por nadamais no mundo. Nem vale a pena alar nele.s outros persona$ens do s)tio s%o inanimados, embora e3celentes pessoas. E3iste aquele :o%o Ia/>de>onta que por uns tempos oi animado, alou, a$iu e soube portar>set%o heroicamente nas nossas aventuras com apinha 1ermelha. Mas quebrou>se por dentro eumedeceu. Iicou um pedaço de pau H>toa.Entre os persona$ens inanimados $osto muito da porteira e da pitan$ueira.( porteira s# sabe a/er uma coisa' abrir>se e echar>se. ara abrir>se espera que as pessoasanimadas a a!udem. (bre>se, a pessoa animada passa e ela echa>se por si mesma, com o peso, a/endo nhem, nhem. -oa pessoa. @ali n%o vem mal ao mundo.( pitan$ueira, essa 9 importante. Est5 enorme. -ate em altura todas as 5rvores do pomar, e3ceto ai$ueira do oco, e tem casca sem nenhum mus$o, lisa. ada ano seenche de pitan$as, das bem doces, divididas em $omos. N%o $omos como os de laran!a, separadosuns dosoutros; os $omos das pitan$as s%o apenas para eneite, $rudadinhos. E outra e3celente pessoa, deonde tamb9m n%o vem mal ao mundo.onsidero todas as 5rvores do pomar como e3celentes criaturas. N%o alam, n%o saem do seulu$ar/inho, n%o se intrometem na vida alheia, s# tratam de preparar aslores e as rutas de todos os anos. ada qual abrica uma qualidade de ruta > e 9 o que maisadmiro, visto que a terra do pomar 9 a mesma para todas. (pesar disso,uma a/ laran!as>de>umbi$o, outras a/em laran!as>tan$erinas, ou limas, e h5 at9 as que a/em ostais lim8es a/ed)ssimos, que Tia Nast5cia corta em rodelas paraeneitar os leit8es assados.( que eu acho mais interessante 9 a !abuticabeira. Enorme e com uma copada bem redondinha emcima. (s olhas, muito !untas, n%o dei3am atravessar o menor raio desol. uando che$a certo ms, os seus $alhos cobrem>se de bot8e/inhos brancos, que v%oen$rossando e se abrem em pequenas lores. @epois as lores secam e caem eicam umas bolotinhas verdes do tamanho de $r%os de chumbo. Esse chumbinho verde vaicrescendo at9 icar a) do tamanho de uma no/. omeçam ent%o a mudar de cor.erdem o verde, icam pretas como Tia Nast5cia.(h, que esta 9 aqui no s)tio quando as !abuticabas prete!amV Nari>/inho, edrinho e 4abic#mudam>se para debai3o da !abuticabeira. Mas essas rutas duram pouco.@uas semanas no m53imo. uando acabam, 9 preciso que a $ente espere mais um ano para viremoutras.ada 5rvore d5 a sua ruta; mas sombra, todas d%o da mesma qualidade. ue coisa $ostosa umasombraV Nos dias quentes 9 na sombra da !abuticabeira que nos reunimos para ouvir as hist#rias e liç8es de @ona -enta.Tenho de di/er umas palavras sobre esta senhora. @ona -enta 9 uma criatura boa at9 ali. # isso deme aturar, quanto n%o valeK que mais $osto nela 9 o seu modo

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de ensinar, de e3plicar qualquer coisa. Iica tudo claro como 5$ua. E como sabe coisas, a diabaV @etanto ler aqueles livros l5 do quarto, icou que at9 brincando bate o 1isconde em cincia.Tia Nast5cia, essa 9 a i$norAncia em pessoa. sto 9... i$norante, propriamente, n%o. incia e maiscoisas dos livros, isso ela i$nora completamente. Mas nas coisas

 pr5ticas da vida 9 uma verdadeira s5bia. ara um tempero de lombo, um ran$o assado, um bolinho, para curar uma cortadura, para remendar meu p9 quando a macela est5u$indo, para lavar e passar roupa > para as mil coisas de todos os dias, 9 uma danadaVEu vivo bri$ando com ela e tenho>lhe dito muitos desaoros > mas n%o 9 de coraç%o. L5 por dentro$osto ainda mais dela do que dos seusaamados bolinhos. # n%o compreendo por que @eus a/ uma criatura t%o boa e prestimosa nascer  preta como carv%o. W verdade que as !abuticabas, as amoras, os maracu!5stamb9m s%o pretos. sso me leva a crer que a tal cor preta 9 uma coisa que s# desmerece as pessoasaqui neste mundo. L5 em cima n%o h5 essas dierenças de cor. ehouvesse, como havia de ser preta a !abuticaba, que para mim 9 a rainha das rutasK Nari/inho eu quero muito bem, porque 9 uma esp9cie de minha m%e. -ri$amos bastante, 9 verdade,e ela implica deveras comi$o quando Zme e3cedoZ. Mas !5 vi que bri$a9 prova de amor.uem n%o ama n%o bri$a. Gosto dela no undo do coraç%o, e n%o admito que ha!a outra menina quea valha. Nem (lice. Nem apinha 1ermelha. ara mim, a primeira meninado mundo 9 Nari/inho.E edrinhoK Sm e3celente rapa/. Muito s9rio, de muita coniança, menino de palavra. Tamb9mtemos bri$ado bastante, e havemos de bri$ar ainda; mas que ele 9 um meninoque vale a pena isso 9. E bem valente. # que icou um pouco prosa demais depois da surra que deuno ope&e, esquecido de que se n%o osse eu, com a minha id9iada couve, quem levava a surra era ele, e das $randes. Mas eu perd"o essas coisi>nhas. eter antamb9m era $abola e vaidoso > e \end& lhe perdoava o deeito.-om. 1ou acabar com estas Mem#rias. :5 contei tudo quanto sabia; !5 disse v5rias asneiras, !5 deiminhas opini8es ilos#icas sobre o mundo e as minhas impress8essobre o pessoal aqui da casa. 4esta a$ora despedir>me do respeit5vel p6blico.4espeit5vel p6blico, at9 lo$o. @isse que escreveria minhas Mem#rias e escrevi. e $ostaram delas,muito bem. e n%o $ostaram, p)lulasV Tenho dito.PEM_L(, Marquesa de 4abic#)tio do icapau (marelo, B0 de a$osto de BCF<.Este livro, composto nas ontes Nimrod MT e pumoni L,oi impresso em papel o>set C0 $m2 na rol Editora Gr5ica Ltda.%o aulo, -rasil, novembro de 2007.