Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

354
UNIVERSIDADE DE LISBOA MODIFICAÇÕES NO CLIMA DE LISBOA COMO CONSEQUÊNCIA DO CRESCIMENTO URBANO VENTO,ILHA DE CALOR DE SUPERFÍCIE E BALANÇO ENERGÉTICO ANTÓNIO MANUEL SARAIVA LOPES DOUTORAMENTO EM GEOGRAFIA FÍSICA 2003

Transcript of Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Page 1: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

UNIVERSIDADE DE LISBOA

MODIFICAÇÕES NO CLIMA DE LISBOA COMOCONSEQUÊNCIA DO CRESCIMENTO URBANO

VENTO, ILHA DE CALOR DE SUPERFÍCIE E BALANÇO ENERGÉTICO

ANTÓNIO MANUEL SARAIVA LOPES

DOUTORAMENTO EM GEOGRAFIA FÍSICA

2003

Page 2: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

MODIFICAÇÕES NO CLIMA DE LISBOA COMOCONSEQUÊNCIA DO CRESCIMENTO URBANO.

VENTO, ILHA DE CALOR DE SUPERFÍCIE E BALANÇO ENERGÉTICO

TESE DE DOUTORAMENTO EM GEOGRAFIA FÍSICAAPRESENTADA À FACULDADE DE LETRAS DA UNIVERSIDADE DE LISBOA

SOB A ORIENTAÇÃO DOS PROFESSORES DOUTORES

MARIA JOÃO ALCOFORADOE

JORGE SARAIVA

Page 3: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Esta Tese de Doutoramento foi apoiada pelo projecto CLIMLIS,

Princípios Climáticos para o Planeamento Urbano. Aplicação a Lisboa,

Aprovado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia

(POCTI/34683/GEO/2000)

e comparticipado pelo fundo comunitário europeu FEDER

Page 4: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

A Beatriz e Rosa L.A meus pais

Page 5: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

i

PREÂMBULO

O meu interesse na climatologia urbana nasceu no princípio dos anos noventa,

quando iniciei o Mestrado em Geografia Física e Regional. Não foi o meu tema de

dissertação (porque me dediquei a estudar o clima local de Oeiras), mas depressa

compreendi a necessidade de conhecer melhor o clima de Lisboa. Entretanto chegavam-

-nos trabalhos feitos na Alemanha e na Suíça, que mostravam a aplicação prática dos

conhecimentos sobre o clima de uma região ao planeamento urbano.

Ainda sem ter a certeza sobre o tema que iria tratar, surgiram várias

oportunidades de visitar institutos de Geografia no estrangeiro, onde voltei a tomar

contacto com o clima urbano. Incentivado pela Professora Maria João Alcoforado, que

entretanto tinha aceite a tarefa de orientar da minha Tese, fiz o meu primeiro estágio,

em 1994, no Instituto de Geografia da Universidade de Berna, na Suíça. Aí tive o

contacto inicial com as imagens de satélite. No final desse ano, desloquei-me a

Marburg, na Alemanha, ao Departamento de Geografia da Philipps-Universität

Marburg. Entusiasmado com o que tinha aprendido, voltei no ano seguinte como

bolseiro da Deutscher Akademischer Austauschdienst (DAAD). Para além de ter

continuado a trabalhar em detecção remota com os jovens investigadores e estudantes

de Marburg, tive oportunidade de visitar vários institutos e departamentos de Geografia

Alemães e Suíços (Freiburg, Essen, Leipzig, Hannover e Basel), cujos responsáveis me

Page 6: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

ii

receberam de uma forma magnífica. Aprendi que a melhor forma de aprender, é

observando o que de melhor se faz noutros lugares.

Depois sucederam-se mais dois estágios em 1998: o primeiro em Abril, no

âmbito do projecto "ADVICE", na Météo France, em Toulouse, onde aprendi algumas

técnicas de homogeneização de longas séries de dados climáticos; o segundo, em

Novembro, no âmbito do projecto "Bioclimatologia Humana de Lisboa" no Instituto de

Meteorologia da Universidade de Freiburg, onde trabalhei na modelização do vento em

meio urbano.

Com o conhecimento de tantos trabalhos de referência, comecei a esboçar as

primeiras ideias sobre o tema da Tese que agora apresento. Os estágios que efectuei, não

só me deram uma visão mais clara sobre o papel da Europa no mundo científico, como a

possibilidade de aprender o que de melhor se faz nos Países com mais recursos

financeiros. Mesmo com poucos meios, consegui ter ideias claras sobre o que queria

fazer: conhecer as modificações climáticas induzidas pelo crescimento urbano.

Depois surgiram as ideias, os primeiros planos de trabalho, que se foram

avolumando, até que surgiu uma derradeira, mas fundamental oportunidade de

investigação: a colaboração com o Laboratório Nacional de Engenharia Civil e

particularmente com o Professor Engenheiro Jorge Saraiva. A minha recompensa foi o

trabalho no túnel aerodinâmico: muito vento nos “soprou” na cara, a mim e ao Hugo

Vieira, que “eolicamente” me acompanhou nos ensaios no LNEC, no início do Verão de

2002.

Comecei com um périplo pela Europa, mas terminei em Lisboa com as pessoas

que realmente me incentivaram a procurar o conhecimento e a concluir este trabalho.

Em primeiro lugar, quero agradecer à Professora Doutora Maria João Alcoforado

(minha orientadora), todos os ensinamentos, conselhos e ajudas que me deu, mesmo nos

momentos mais difíceis. Sem o seu incentivo nunca teria tido a audácia de tocar em

áreas do conhecimento, diferentes daquelas com que os Geógrafos lidam diariamente.

Ao Professor Engenheiro Jorge Saraiva, pela sua bondade em ter aceite co-orientar a

minha Tese e me ter aberto as portas a “outras ciências”. Com seu sorriso, sempre bem

humorado, lá me ia pacientemente dando magníficas lições de Física, Mecânica e

Page 7: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

iii

Matemática que eu, Geógrafo de formação, atentamente recebia. Aos dois dedico os

resultados obtidos.

À minha Família, que demasiadas vezes prescindiu de mim, para que eu pudesse

trabalhar, dedico esta Tese. À minha filha Beatriz, à minha esposa Rosa e a meus pais

que, numa altura em que a idade já avança, souberam compreender a minha ausência.

A todos aqueles que me abriram novos horizontes, especialmente Wilfried

Endlicher, na altura Professor na Universidade de Marburg e actualmente a leccionar na

Universidade de Humboldt de Berlim, os meus mais sinceros agradecimentos pela

oportunidade única que me deu de visitar os institutos geográficos Alemães. Também

uma palavra de agradecimento ao Prof. Matzarakis do Instituto de Meteorologia da

Universidade de Freiburg, aos Drs. Christophe Merlier e Olivier Mestre da Météo

France de Toulouse, ao Professor H. Wanner e ao Dr. M. Baumgartner do Instituto de

Geografia da Universidade de Berna, ao Professor Parlow, da Universidade de Basel, e

a tantos outros investigadores que marcaram, de forma indelével, a minha carreira

académica.

À Professora Maria Eugénia Moreira, pela leitura DO CAPÍTULO 7 e pelos

comentários e sugestões que permitiram melhorar o texto.

Um agradecimento especial aos meus amigos Dr. Henrique Andrade, colega de

vários anos e companhia indispensável pela constante troca de informações e opiniões e

Marcelo Fragoso, pelo apoio dado. Aos meus mais recentes colegas, amigos e antigos

alunos, Rute Vieira, João Vasconcelos e Hugo Vieira, pela companhia alegre e

permanente e a ajuda nos acabamentos finais da Tese. A todos os colegas do

Departamento de Geografia da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa.

E, finalmente, as instituições: ao Centro de Estudos Geográficos da

Universidade de Lisboa, pela lealdade e forma como me acolheu há 13 anos como

investigador; à Deutscher Akademischer Austauschdienst (DAAD) por ter financiado a

minha estadia na Alemanha, em 1995 e à Fundação Calouste Gulbenkian, por ter

custeado a minha participação num congresso em Regensburg, na Alemanha, em 2001;

ao CNIG por me ter fornecido imagens de satélite ao abrigo de um protocolo com o

CEG, e à CML a informação sobre a cidade, no âmbito do Projecto CLIMLIS.

Page 8: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

iv

Finalmente, o meu agradecimento à Fundação para a Ciência e a Tecnologia por ter

financiado o Projecto CLIMLIS “Princípios Climáticos para o Planeamento Urbano.

Aplicação a Lisboa”, que permitiu fazer grande parte da investigação apresentada nesta

Tese.

Este trabalho é uma tentativa de mostrar a minha visão da cidade e do seu clima.

Page 9: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

INTRODUÇÃO

1. ENQUADRAMENTO ESPACIAL E METODOLÓGICO

Muito do trabalho de investigação levado a cabo no desenvolvimento desta

dissertação assenta sobre a seguinte hipótese: o crescimento desordenado que tem

acompanhado algumas zonas de Lisboa, ainda não totalmente consolidadas nos últimos

anos, sobretudo no norte da cidade, pode fazer diminuir a velocidade média do vento,

com possíveis consequências negativas para o ambiente urbano, sobretudo no sul da

cidade. Localmente, os efeitos da diminuição do vento podem não ser uma limitação,

mas sim uma potencialidade, por exemplo ao nível do conforto mecânico. É do balanço

entre as limitações e potencialidades da redução da velocidade média do vento com o

crescimento da cidade de Lisboa (a várias escalas), que trata a PARTE I do trabalho.

O clima da cidade é a forma mais evidente de modificação climática

inadvertidamente provocada pelo Homem. A ilha de calor urbano é um dos padrões

térmicos mais evidentes do clima das cidades e ocorre praticamente em todo o Mundo.

Pode ser vista como uma potencialidade, porque a temperatura na cidade, ao não

diminuir tanto como nas áreas rurais envolventes, evita o consumo excessivo de energia

no Inverno, mas também como uma limitação nos locais onde o consumo de energia

suplementar utilizada na refrigeração dos ambientes interiores tem custos elevados.

Page 10: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

- 2 -

Na PARTE II do trabalho não se pretende provar que existe uma modificação

climática (porque já está comprovada), mas tenta-se demonstrar de que forma os

padrões térmicos das superfícies e radiativos poderão mudar com o futuro crescimento

urbano e quais as consequências para a região de Lisboa, que forma actualmente uma

metrópole policêntrica.

Através deste conhecimento, pretende-se dar um contributo a futuras acções de

planeamento urbano e ajudar os decisores a tomarem melhores opções.

1.1 APRESENTAÇÃO DO TRABALHO.

No final desta introdução refere-se o motivo por que se deve considerar o clima

urbano uma variável fundamental do desenvolvimento urbano sustentado.

A PARTE I deste trabalho é composta por dois conjuntos de textos: um teórico

(CAPÍTULOS 1 a 4) e outro de investigação aplicada (CAPÍTULOS 5 e 6).

No CAPÍTULO 1, apresenta-se um breve resumo das características da Camada

Limite Atmosférica (CLA), onde ocorre grande parte dos fenómenos climáticos em

estudo. O resumo que se apresenta é o necessário para enquadrar e entender o tema

tratado. Para outros assuntos, relativos a esta investigação, remete-se para a lista de

referências bibliográficas que representam o estado da arte em Climatologia Urbana.

A importância do vento nas cidades, suas limitações e potencialidades são

equacionados no CAPÍTULO 2, de forma a mostrar que as modificações dos campos de

vento pelo meio urbano não são apenas negativas, mas podem apresentar algumas

vantagens. No campo das limitações, apontam-se factores como o desconforto mecânico

dos indivíduos que se movimentam nas ruas da cidade, ou os riscos que correm na

presença de ventos violentos (em especial rajadas) superiores a determinados limiares

de velocidade. Os ventos podem criar, em certas situações, patologias associadas à

ansiedade, que naturalmente dependem de cada indivíduo, mas cujo estudo não têm tido

o relevo necessário.

Quando combinado com temperaturas baixas, o vento pode constituir um factor

importante do desconforto térmico, facto a que não estão alheios os habitantes das

Page 11: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Introdução

- 3 -

regiões mais frias do globo. Questiona-se também se, noutros locais, como por exemplo

algumas regiões mediterrâneas que experimentam curtos, mas rigorosos invernos, esse

desconforto não deverá também se equacionado. Agora que a propósito das alterações

climáticas se fala tanto do aumento de fenómenos climáticos extremos, não terão as

entidades competentes responsabilidades acrescidas no que se refere aos cidadãos

desprotegidos e sem abrigo que enfrentam vagas de frio no desconforto das ruas?

Mas há também as questões relacionadas com as potencialidades deste elemento

atmosférico. O vento é o mais importante dos agentes que dispersam os efluentes

gasosos produzidos nas grandes cidades, onde actualmente o automóvel é o principal

veículo de mobilidade do citadino e o principal responsável pela poluição atmosférica.

Esta questão relança o tema da degradação ambiental urbana que, no passado recente,

era devida às grandes indústrias que se localizavam junto às cidades.

A diminuição da velocidade do vento no seio de uma grande área urbana é um

fenómeno comprovado há várias décadas. Para estudar o papel do crescimento urbano

na modificação das condições do vento em Lisboa, é preciso conhecer dois factores: um

de natureza climática (os regimes de vento na região de Lisboa), outro de natureza

socioeconómica - a expansão da cidade e as suas tendências futuras. Quanto ao

primeiro, apresentam-se, no CAPÍTULO 3, os regimes do vento já estudados por outros

autores (FERREIRA, 1989 e ALCOFORADO, 1987, 1991 e 1992). Quanto à expansão da

cidade, apresentam-se algumas notas recolhidas de trabalhos historiográficos

Olisiponenses e uma reflexão própria sobre o crescimento da cidade de Lisboa nos

próximos vinte a trinta anos, baseado nas suas tendências expansivas actuais

(CAPÍTULO 4). Esta apresentação servirá de fundamento à tese de que o tipo de

crescimento actual, nas áreas ainda em construção no norte da cidade, poderá agravar as

condições atmosféricas ambientais em Lisboa.

Nos CAPÍTULOS 5 e 6, apresenta-se a investigação fundamental desenvolvida

para demonstrar a tese enunciada relativa ao vento em Lisboa. No CAPÍTULO 5, utilizou-

se a modelação numérica como suporte da metodologia usada para demonstrar as

modificações do vento que ocorrem à escala regional/local e no CAPÍTULO 6,

apresentam-se as actividades de experimentação realizadas no túnel aerodinâmico do

Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC), com uma maqueta de parte do

Page 12: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

- 4 -

bairro de Telheiras (escala local), que permitiram validar alguns dos resultados obtidos

com os modelos numéricos, conhecer os campos de vento em torno dos edifícios e os

perfis do vento em altura, em diversas tipologias urbanas desse bairro do norte da

cidade.

Na PARTE II deste trabalho, estudam-se as principais características térmicas das

superfícies de Lisboa, dando-se especial destaque à ilha de calor de superfície e ao

balanço energético em vários locais de Lisboa, a partir de imagens derivadas do satélite

NOAA AVHRR 14 e LANDSAT 5 TM. No capítulo 7, apresenta-se uma breve

introdução ao conceito de detecção remota dando uma visão pouco difundida , mas com

“força de lei internacional”, que é proposta numa resolução da ONU. Este texto destaca

a utilização das imagens da Terra obtidas a partir do Espaço, como forma de

melhoramento da gestão dos recursos naturais e do uso do solo e a protecção ambiental,

em benefício de todos os países, sobretudo os que se encontram em vias de

desenvolvimento, de acordo com as leis internacionais previstas na Carta das Nações

Unidas. De seguida recorre-se a vários conceitos físicos para enunciar as fontes de

energia, os modelos de radiação e regiões do espectro electromagnético mais utilizados

na detecção remota, para mostrar a natureza da informação utilizada, suas vantagens e

limitações. Termina-se o capítulo com um breve historial dos trabalhos de detecção

remota efectuados por geógrafos no domínio da climatologia de Portugal.

Depois de clarificar os vários conceitos e tipos de ilha de calor urbano, mostra-se

o ritmo da ilha de calor de superfície de Lisboa. O estudo foi efectuado a partir das

temperaturas de superfície bi-diárias (nocturnas e diurnas), obtidas no Instituto

Aeroespacial da Alemanha (DLR) referentes a um ano, entre Agosto de 1988 e Julho de

1999 (CAPÍTULO 8).

No CAPÍTULO 9, apresenta-se um esquema metodológico para a operacio-

nalização do balanço radiativo e energético a partir de imagens LANDSAT TM. Este

esquema compreende a utilização de diversos algoritmos para a determinação dos

termos do balanço energético em vertentes e superfícies planas (VDI, 1994) e os fluxos

de calor sensível, latente e calor armazenado num dia sem nuvens, correspondente à

hora da passagem do satélite sobre Lisboa (aproximadamente às 10:00 horas, tempo

local).

Page 13: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Introdução

- 5 -

No final apresentam-se as conclusões a que se chegou com esta dissertação,

enumerando algumas linhas de rumo a seguir em futuros trabalhos.

1.2 BREVE ENQUADRAMENTO GEOGRÁFICO DE LISBOA

Devido à sua posição privilegiada, no sul de uma península, e ao relevo, Lisboa

possui características que determinam um conjunto complexo de climas. O vento

depende das influências conjugadas de vários factores geográficos: para além da

proximidade do oceano Atlântico e do estuário do Tejo (fig. i), numerosos obstáculos se

interpõem-se entre o oceano e a cidade. A ocidente a serra de Sintra com uma altitude

que supera os 500 m e, a noroeste, a serra da Carregueira, com elevações mais baixas,

que pontualmente ultrapassam os 350 m e raramente atingem os 400 m. Bordejando a

cidade a norte, a vasta depressão de Loures com cerca de 50 km2 poderá também

modificar os campos de vento sobre a cidade, canalizando para sul e sudeste uma parte

do fluxo de ar à superfície através do rio Trancão até ao Tejo e para sudoeste para a

parte ocidental da cidade.

Já envolvido pela cidade em expansão, Monsanto (com 227 m de altitude

máxima), constitui outro importante obstáculo à penetração do ar marítimo. Apenas

separadas de Monsanto pelo "gargalo" do Tejo, as colinas de Almada contribuem

igualmente para o isolamento de Lisboa em relação ao oceano (ALCOFORADO, 1987).

No norte da cidade, desenvolve-se um nível de erosão entre 100 m e 160 m de

altitude (conhecido vulgarmente pelo planalto), local que foi aproveitado para construir

o aeroporto da Portela. A altitude diminui para sul, onde são conservados restos desta

antiga superfície na Penha de França (74 m), no Castelo de S. Jorge (106 m), Campolide

e Campo de Ourique (≈ 100 m e 120 m). Os vales que entalham esta superfície têm

geralmente uma orientação norte/sul, são profundos e de vertente inclinadas. Têm a

particularidade de serem ocupados pelas principais linhas de tráfego da cidade. De oeste

para leste encontramos sucessivamente: o vale de Algés, que limita Monsanto a

ocidente, o de Alcântara (onde actualmente passa a Av. de Ceuta), o de S. Bento (onde

desemboca a Rua D. Carlos I), o da Baixa que resulta da confluência de dois outros (que

são acompanhados pelas avenidas da Liberdade e Almirante Reis), o vale Escuro (cuja

Page 14: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

- 6 -

vertente nordeste é seguida pela rua Mouzinho de Albuquerque); e o de Xabregas. Mais

a oriente os vales de Chelas e de Cabo Ruivo (alguns troços deste dois últimos inflectem

para sudeste, em direcção ao Tejo). A norte de Monsanto, os vales de Benfica e da Luz

formam uma das recentes áreas de expansão da cidade (ALCOFORADO, 1992).

Nos CAPÍTULOS 4 e 5 e 9 serão dadas informações mais detalhadas sobre a

morfologia de Lisboa, nos locais objecto de estudo.

1.3 ESCALAS CLIMÁTICAS CONSIDERADAS NESTE TRABALHO.

As escalas climáticas foram já definidas por vários autores (YOSHINO, 1977,

OKE, 1987, ALCOFORADO, 1992, LOPES, 1994). Apresenta-se, portanto, um resumo da

classificação de alguns dos fenómenos meteorológicos e climáticos segundo as suas

escalas típicas de acção (alcance em altitude e extensão - fig. ii). A escala temporal será

revista apenas para o vento através do seu espectro1 (fig. iii).

Apesar da definição das escalas ser um tema de debate entre todos os que

estudam os fenómenos atmosféricos (Meteorologistas, Geógrafos/Climatologistas,

Físicos da Atmosfera, Engenheiros, etc.) e de difícil delimitação, a questão central

reside, na maior parte dos casos, na nomenclatura própria de cada ciência. No entanto,

dada a ausência de um critério único, cada autor vê-se na obrigação de esclarecer o seu

ponto de vista pessoal (ALCOFORADO, 1992), aumentando a lista de critérios e

subdivisões já existentes, apesar da unanimidade quanto a duas delas: macro e

microclima (YOSHINO, 1975), também designadas por macro e micrometeorológicas.

Nesta investigação, as escalas de análise correspondem às grandezas

apresentadas na figura ii entre os fenómenos 7 e 112. Englobam as escalas regional/local

(quando se estuda o conjunto da cidade de Lisboa, ou alguns locais característicos) e

microclimática (o estudo de uma parte do bairro de Telheiras em túnel aerodinâmico).

1 Mais precisamente da sua função de densidade espectral de potência. 2 Embora os exemplos apresentados na figura ii não sejam todos objecto de investigação, podem ser alvo de referência neste trabalho, como por exemplo as brisas marítimas e estuarinas, que têm uma importância fundamental no clima da cidade de Lisboa.

Page 15: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Introdução

- 7 -

0 5 km

Alt. (m)

Lisboa

S. de Sintra

S. da Carregueira

C. da Roca

Cascais

Monsanto

Aeroporto

Almada

Montijo

Estuário do Tejo

Loures

Sintra

Amadora

Oeiras

Atlâ

ntic

o

Ponte Vasco da Gama

rio Tejo

Áreas urbanas densas Áreas suburbanas "Matas" densas Áreas verdes menos densas Áreas de culturas

Exemplos: Lisboa Cascais Monsanto Carregueira Lezíria

Fig. i - Lisboa e os seus arredores. Em cima representação do relevo e alguns dos locais mais importantes da Área Metropolitana. Em baixo uma imagem SPOT2 HRV1 multi-espectral de 1 de Julho de 1991 (composição em falsa cor, com alguns exemplos de localidades e tipos de ocupação do solo).

Page 16: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

- 8 -

Na primeira dominam a topografia e o atrito provocado pela rugosidade da cidade3. As

escalas típicas horizontais atingem a dezena de quilómetros (complexo citadino e a sua

envolvente), enquanto em altura correspondem ao topo da camada limite (tipicamente

1 km). As características desta camada serão apresentadas mais adiante. O atrito da

superfície aos movimentos atmosféricos na cidade não deverão ser ignorados, já que são

a base de uma grande parte das modificações climáticas aí observadas.

Na escala microclimática impera, sobreposta ao escoamento médio, a

turbulência de pequena escala, com movimentos turbilhonares do fluxo que têm um

alcance típico limitado a algumas centenas de metros e uma duração na ordem das

dezenas de segundos (canto inferior esquerdo da figura).

Escala horizontal (m)

Alti

tude

(m)

Sinóptica e meso-escala

Influência térmica

Inf. Topografia

Influência do atrito da superfície

9

EXEMPLOS: Fenómenos tipicamente sinópticos 1- Depressões; 2- Furacões; 3-Ondas de leste, perturbações características das regiões intertropicais. Movimentos térmicos e perturbações do fluxo de mesoescala 4-Trovoadas; 5- Ondas de relevo; 6- Células convectivas da convergência intertropical; 7-Brisa do mar. Influência das cidades 8- Ilha de calor urbano; 9- Movimentos de fluxos devidos à rugosidade urbana. Influência térmica regional/local 10- Pequenos cumulus. Modificações locais da vegetação. 11 - Clima de floresta.

Fig. ii - Alcance típico (em altitude e extensão) de vários fenómenos meteorológicos e climáticos no globo (adaptado de BARRY e CHORLEY, 1992). O atrito da superfície na cidade não deve ser ignorado já que é a base de uma grande parte das modificações no movimento do fluxo. Por isso prolongou-se a mancha referente à influência do atrito da superfície até ao exemplo 9 (quadrados a cinzento).

Um processo conveniente de classificação das escalas temporais, associadas ao

vento, consiste em considerar este parâmetro meteorológico como a sobreposição de

movimentos independentes que vão desde alguns milhares de quilómetros, como os

3 Em trabalhos futuros pretende-se conjugar as questões térmicas com os resultados agora obtidos.

Page 17: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Introdução

- 9 -

associados a centros de baixa pressão e anticiclones, a alguns milímetros, como os

ocasionados pela rugosidade local (SARAIVA, 1983). A sua representação em termos de

duração temporal, baseada na teoria estatística de turbulência, constitui o chamado

espectro do vento atmosférico (fig. iii).

Fig. iii - Espectro do vento atmosférico (ver nota de rodapé 1) e escalas meteo-climáticas temporais

associadas a cada flutuação da função de densidade espectral de potência (extraído de SARAIVA, 1983).

A representação no domínio da frequências das flutuações da velocidade do

vento horizontal, primeiramente estabelecido por VAN DER HOVEN (fig. iii a), mostra

três picos de frequência bem marcados: um equivalente a aproximadamente 4 dias

(escala macrometeorológica ou sinóptica), outro cerca das 12 horas (escala

mesometeorológica) e um terceiro, inferior a uma hora e centrado no minuto (escala

micrometeorológica)4. O primeiro máximo está associado às mudanças dos sistemas

meteorológicos ligados à frente polar nos climas temperados, o segundo às variações

diárias do vento e o terceiro à turbulência atmosférica (regime de rajada) (INSTITUT FÜR

INDUSTRIEAERODYNAMIK GmbH, 1993). Entre as escalas meso e micrometeorológica

existe um vazio espectral, compreendido, em termos de escalas temporais, entre 1 e 8

horas.

4 Optou-se por incluir aqui a nomenclatura do autor citado (SARAIVA, 1983).

Page 18: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

- 10 -

Na figura aparecem dois outros picos, então considerados especulativos: um de

grande amplitude, centrado no ano e outro, mais pequeno, correspondendo a seis meses.

Não é difícil perceber estes picos se se considerarem os fenómenos naturais que afectam

o clima, o movimento de translação da Terra (um ano) e a inclinação do seu eixo (seis

meses). Facilmente se percebe o período das doze horas (sucessão dos dias e das noites),

mas a sucessão dos dias (24 horas) não é visível na figura iii a, porque as medições

foram efectuadas a uma altura em que esse efeito não se faz sentir. Medições mais

recentes (fig. iii b) confirmam a existência deste pico máximo diário e dos picos

semestral e anual (SARAIVA, 1983). Justificar o período em torno dos 4 a 6 dias para as

regiões temperadas é igualmente possível em termos físicos, mas entende-se estar para

além dos objectivos do presente trabalho, em que se consideraram duas escalas

climáticas: a escala regional/local (em certa medida encontram-se nos limiares da escala

mesoclimática) e a microclimática. Na primeira foram abordados os temas da

modificação dos campos de vento com o crescimento da cidade, o ritmo e intensidade

da ilha de calor de superfície e o balanço energético em vários locais de Lisboa

(CAPÍTULOS 5, 8 e 9), tendo a Microclimatologia do vento no bairro de Telheiras sido

estudada em túnel aerodinâmico e os seus resultados apresentados no CAPÍTULO 6.

2. CLIMA URBANO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTADO DAS CIDADES

O “Desenvolvimento Sustentado” (DS) tem sido um tema de debate nos últimos

anos. No entanto, este conceito nunca foi definido com precisão, embora seja

consensual que deve haver um compromisso de desenvolvimento (um conjunto de

objectivos desejados por uma sociedade), que se deve manter num nível tal que não

prejudique o ambiente natural. Este conceito tenta conciliar duas posições distintas na

sociedade (uma económica e outra ambiental), depois dos anos noventa do século XX

terem sido favoráveis às correntes ambientalistas. O despertar de alguns problemas

globais para a humanidade (a depleção do ozono estratosférico, o aumento dos gases de

estufa e as alterações climáticas, os efeitos da poluição na saúde humana, entre outros,)

tiveram repercussões na opinião pública mundial e levaram à assinatura de várias

Page 19: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Introdução

- 11 -

convenções e protocolos que tiveram uma mediatização sem precedentes (Rio de

Janeiro, 1992, Kyoto, 1997, etc.), mas cuja eficácia ainda não se fez notar.

O desenvolvimento sustentado sugere que as actividades económicas sejam

planeadas de modo a minimizar o impacte do excessivo uso dos recursos naturais a

longo prazo. O desafio é constante e deverá garantir que as gerações futuras tenham à

sua disposição, no mínimo, a mesma quantidade de recursos naturais que actualmente

existem (BREHENY, 1992).

Nos últimos anos o debate tem-se centrado nas questões dos ambientes naturais,

apesar das cidades serem um dos principais factores de degradação ambiental. Mas este

meio que o Homem constrói e constantemente modifica, também pode ser visto como

um importante recurso, que deve ser protegido. Se se transpuser a noção de DS para

“Desenvolvimento Urbano Sustentado” (DUS), deve-se manter a ideia da manutenção

dos recursos urbanos existentes. Há muitas actividades citadinas (indústria, habitação,

transporte, etc.), que consomem grandes quantidades de recursos naturais contribuindo

assim para a degradação ambiental. O grande desafio actualmente é conseguir manter o

desenvolvimento dessas actividades de uma forma sustentável, sem pôr em causa o

ambiente no seu todo, já que uma grande parte dos recursos consumidos pelas cidades

são externos. Serão as cidades dos futuro tecnologicamente auto-suficientes ao ponto de

não necessitarem de recursos naturais exteriores, que lhes degradam o ambiente?

Uma das questões essenciais da sustentabilidade urbana diz respeito à eficiência

energética, outra é a qualidade de vida dos seus habitantes. Para haver uma eficiência

energética, advoga-se frequentemente a redução do tráfego automóvel (e

consequentemente do consumo de combustível) e o aumento dos padrões de construção

de modo a reduzir o consumo doméstico e industrial de energia.

No caso da construção, muito há a fazer, não a nível legislativo, já que Portugal

tem uma regulamentação técnica suficiente no que diz respeito ao comportamento

térmico dos edifícios (D.G.E. 2000), mas ao nível de fiscalização, que parece ser pouco

eficaz. No momento em que escrevo estas linhas (Setembro de 2003), vem mais uma

notícia no jornal “Público on line” que refere um estudo elaborado por uma equipa do

University College de Dublin, na Irlanda, que analisou os índices de mortalidade de 14

Page 20: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

- 12 -

países durante dez anos. Nesse estudo, conclui-se que Portugal é o país da Europa onde

a mortalidade devida ao frio é mais elevada5. Uma parte será devida a condições do

estado de saúde da população, cada vez mais envelhecida, mas é certo que a larga

maioria das nossas habitações não estão preparadas para vagas de frio prolongadas. A

própria “Regulamentação das Características do Comportamento Térmico dos

Edifícios”, Decreto-Lei n.º 40/90, admite que “ os edifícios em Portugal são em geral

muito desconfortáveis: frios no Inverno e quentes no Verão” (DGA 2000). Falta a

confirmação científica.

Quanto ao tráfego automóvel, pode-se argumentar que o aumento de impostos

sobre os combustíveis e a introdução de reconversores catalíticos dos motores

automóveis terão maior impacto nos padrões de consumo do que o rearranjo urbano em

novas áreas de construção. As vantagens directas daquelas medidas seriam a diminuição

da poluição, nomeadamente dos gases que potencializam o efeito de estufa, e dos

consumos de energia. O aumento dos impostos poderia ser canalizado na investigação

de novas formas sustentadas de consumo urbano (seria politicamente possível canalizar

estes fundos na reconversão urbana?).

No entanto têm sido infrutíferas as tentativas de reduzir o transporte individual

automóvel, porque há uma grande resistência por parte dos citadinos (incluindo os que

vivem no subúrbios), com o argumento de que isso reduziria a sua mobilidade e que os

transportes públicos não respondem às sua necessidades. Os operadores de transportes

contrapõem, dizendo que com as condições de tráfego desordenado e caótico, que

actualmente se verificam nas cidades, os tempos de percurso entre dois pontos não

podem ser diminuídos. É um efeito “bola de neve”, com os decisores políticos

argumentando que são os habitantes dos subúrbios e não os da cidade quem mais polui e

congestiona o tráfego.

Um dos debates propostos para minimizar a crise energética foi promovida pela

Comissão Europeia através do “Livro Verde sobre o Desenvolvimento Urbano” de

1990. BREHENY (1992) comenta este documento, em que se advoga o aumento da

5 Como ainda não se teve acesso no referido artigo publicado no “Journal of Epidemiology and Comunity Health”, fica aqui a referência, não sendo utilizado como argumento científico. No entanto, já noutro trabalho se tinha abordado esta questão (LOPES, 1998), que se retoma, sob o ponto de vista teórico, no CAPÍTULO 2.

Page 21: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Introdução

- 13 -

densidade urbana e a compactação da cidade. Isto levaria ao encurtamento dos trajectos,

à menor ocupação dos terrenos dos subúrbios e à preferência dos transportes públicos

em detrimento dos de uso individual. O autor citado coloca, no entanto, algumas

reservas a esta ideia, argumentando que é difícil incrementar os transportes públicos no

centro das cidades, já que estes são os locais mais congestionados. O aumento do tempo

de permanência no transporte devido ao congestionamento do tráfego aumentaria o

consumo de combustível e consequentemente a emissão de dióxido de carbono e

poluentes gasosos. A questão da diminuição dos percursos em cidades “compactas”

também é questionada e a sua aplicação em certos países poderá não ser realista, porque

o aumento da mobilidade dos cidadãos se faz cada vez mais entre subúrbios e não só

para o centro da cidade.

Segundo o Livro Verde para o Desenvolvimento Urbano, as cidades não deverão

crescer para além das suas fronteiras. A curto prazo, não será possível remodelar as

áreas consolidadas, excepto pontualmente, podendo a possível compactação ocorrer nas

zonas em reconversão ou em restruturação urbana (expectantes), normalmente na

periferia. A cidade compacta e o desenvolvimento urbano sustentado, tal como foi

definido anteriormente, não são ideias incompatíveis, pelo menos até se provar o

contrário. É uma questão que se deve pesar no contexto do ambiente e especialmente do

clima urbano.

Outra questão fundamental é o crescimento populacional nas cidades. Segundo

um relatório da ONU (World Urbanization Prospects: the 1999 Revision), a maior parte

do crescimento populacional no mundo, entre 2000 e 2030, deverá ocorrer nas cidades,

onde se prevê que, no final deste período, existam mais dois mil milhões de pessoas.

Dos 2,9 mil milhões (m. M.) actuais em áreas urbanas, passar-se-á para 4,9 m. M. É

claro que o grande aumento será nas cidades dos países em vias de desenvolvimento, de

1,9 m. M em 2000 para 3,9 m. M. em 2030, enquanto nos países mais desenvolvidos o

crescimento durante esse período será mais lento (de 0,9 para 1,0 m. M.). Em termos

percentuais isto traduz-se num crescimento anual médio de cerca de 1,8%, o que, a este

ritmo, corresponde à duplicação da população urbana mundial ao fim de 38 anos. O

contraste é evidente com o crescimento da população nas áreas rurais dos países menos

desenvolvidos (0,1% no período considerado). Segundo dados do Population Reference

Page 22: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

- 14 -

Bureau, citados por ARNFIELD (2003), em 2007 é estimado que metade da população

mundial habite em áreas urbanas. Segundo o relatório da ONU, em 2030 a percentagem

de população a residir em áreas urbanas ultrapassará 81%. Serão estes números

realistas?

O mesmo relatório mostra as transformações ocorridas em Portugal nos últimos

50 anos. Passámos de um país marcadamente rural, que tinha 19,2% de habitantes

urbanos em 1950, para um “país urbano” com quase 47% em 1990. Esse valor subiu

para 63% em 1999, muito próximo do estimado para 2000 no sul da Europa (66,4%).

O último Recenseamento da População e Habitação (INE, 2001) refere que a

área de Lisboa (NUTS II) tem actualmente uma população de 1 947 261 habitantes e a

cidade 564 657 habitantes. Poderá a área urbana crescer ainda mais nos próximos anos?

Actualmente, as principais preocupações ambientais centram-se nos gases que

contribuem para o aumento do efeito de estufa (GEE), sobretudo o CO2. Discutem-se as

formas de implementação do protocolo de Quioto e escrevem-se relatórios

completíssimos sobre as alterações climáticas globais. Pode-se citar o exemplo recente

do relatório síntese do “Plano Nacional para as Alterações Climáticas” (INSTITUTO DE

AMBIENTE, 2003) onde estão inscritos os seus objectivos: a definição de cenários de

comportamento da economia e das emissões dos GEE para o período de cumprimento

do Protocolo de Quioto (2008-2012); o esforço de redução do CO2; identificação para

controlo e redução dos GEE, atendendo à eficácia económica, ambiental, incentivo à

inovação tecnológica, equidade de distribuição de rendimentos, políticas sectoriais,

exequibilidade política e administrativa e aceitação dos agentes envolvidos..... No que

diz respeito às necessidades de transformação em meio urbano, apenas são mencionados

os esforços nos transportes públicos, nomeadamente a construção do Metro do Porto, do

Sul do Tejo, do Mondego e a ampliação da frota de veículos movidos a gás natural nas

empresas de transportes de Lisboa e Porto, a eficiência energética dos edifícios e a

reciclagem dos resíduos urbanos. Em concreto pouco se sabe. As preocupações são

sobretudo sectoriais e não se observa uma preocupação global. Nenhuma menção é feita

directamente à estrutura da cidade, no seu todo, ou em partes, com factor modificador

do clima.

Page 23: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Introdução

- 15 -

Já se demonstrou claramente que as actividades humanas modificam a atmosfera

urbana e que se suspeita alterarem o estado global da atmosfera com possíveis impactos

nas alterações climáticas globais no futuro. A introdução de novos materiais de

construção, alteração de volumetrias, as emissões de calor, humidade e poluentes, são os

factores envolvidos mais importantes. Conjuntamente, criam novas condições

aerodinâmicas, térmicas, radiativas e higrométricas, numa camada limite atmosférica

carregada de aerossóis e gases. Estes modificam os fluxos de calor, de massa e

quantidade de movimento, balanços que possuíam características diferentes antes da

instalação da cidade. A atmosfera poluída interfere na transmissão de energia solar e de

radiação infravermelha. Os ventos são modificados pelo aumento da rugosidade. Devido

a múltiplos factores, a cidade encontra-se geralmente mais quente do que as áreas rurais

adjacentes, sobretudo durante a noite, originando aquilo a que vulgarmente chamamos

“ilha de calor urbano”. Em certos locais do globo, este padrão térmico pode ser uma

vantagem, noutros um inconveniente.

“O melhoramento local da qualidade do ar e o aumento da eficiência energética

e do uso da água nas cidades automaticamente contribui para a mitigação dos problemas

globais. De todos os argumentos apresentados é curioso que as cidades estejam ausentes

da discussão sobre as alterações globais e não constem dos exercícios de simulação do

IPCC (Intergovernmental Panel on Climate Change). Esta aparente miopia tem de ser

rectificada. As cidades não são somente as maiores fontes de problemas, também fazem

parte do processo e são consequência das alterações” (OKE, 1997).

O desenvolvimento sustentado da cidade de Lisboa, que todos desejamos, deverá

passar pelo conhecimento dos fenómenos que resultam da interacção entre as

superfícies e a atmosfera urbana. Conhecer as modificações produzidas nessa atmosfera

pelos espaços construídos é o modesto contributo que quero dar à cidade em que nasci.

Page 24: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

PARTE I

MODIFICA ES NOS CAMPOS DE VENTO DELISBOA

INDUZIDOS PELO CRESCIMENTO URBANO

Page 25: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

- 19 -

CAP TULO 1

O VENTO EM MEIO URBANO

1. INTRODU O

Os ventos s o movimentos de massas de ar na atmosfera. A varia o da

temperatura da atmosfera (seja devido latitude ou a efeitos locais) produz uma

varia o de massa vol mica do ar e, portanto, uma varia o de press o que , em

primeiro lugar, respons vel por esse movimento.

Entre este princ pio global e o movimento do ar junto superf cie sobre as

cidades (que o objecto de estudo neste trabalho), h todo um conjunto de fen menos

cuja descri o te rica tem sido suficientemente divulgada em variad ssimos manuais ,

para os quais se remete (por exemplo, BARRY e CHORLEY, 1992; MORAN e MORGAN,

1997; AHRENS, 2000; STULL, 2000; MIRANDA, 2001, s para citar alguns autores e

edi es mais recentes).

Neste cap tulo ir-se- o abordar alguns dos aspectos mais importantes

relacionados com o vento junto superf cie da Terra, numa camada onde os efeitos

dessa superf cie se fazem sentir de forma particular e que conhecida por Camada

Limite da Atmosfera (CLA).

Page 26: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I Modifica o nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 20 -

Faz-se ainda uma breve refer ncia s condi es de estabilidade atmosf rica

nesta camada (designada em ingl s por Atmospheric Boundary Layer), porque os

modelos num ricos utilizados no CAP TULO 5 pressup em determinadas condi es que

ser o referidas no momento pr prio.

2. CARACTER STICAS GERAIS DA CAMADA LIMITE ATMOSF RICA

2.1 CONCEITO, DEFINI O E ESTRUTURA DE CLA.

O conceito de camada limite atribu do a Froude6, que em 1870 levou a cabo

uma s rie de experi ncias para estudar as for as de atrito e resist ncia de um prato fino

e plano quando posto em movimento sobre uma superf cie de gua. O termo ter sido

introduzido tr s d cadas depois por Prandtl, ao estudar o escoamento de fluidos sobre

superf cies s lidas.

Uma defini o til de CLA identifica-a como sendo a camada de ar

imediatamente acima da superf cie da Terra, cujos efeito de atrito, aquecimento e

arrefecimento s o sentidos directamente escala temporal inferior a um dia e onde os

fluxos de quantidade de movimento, energia (nomeadamente calor) e massa s o

transportados e difundidos por movimentos turbulentos. A espessura da CLA definida

como a altura acima da superf cie terrestre onde a velocidade atinge 99% da velocidade

do escoamento n o perturbado.

Na maioria dos casos o topo da CLA, sob condi es convectivas, geralmente

bem definida pela exist ncia de uma camada est vel, abaixo de uma invers o t rmica,

que actua como tamp o dos movimentos turbulentos vindos de baixo. Estes s o

incapazes de penetr -la apesar de a continuarem a erodir, sobretudo quando o calor

latente libertado pelas part culas de ar que sobem.

6 Froude relacionou as for as de in rcia com as for as grav ticas terrestres atrav s de um par metroadimensional (segundo n mero de Froude), definido por

LguFr

2

2onde u a velocidade do fluxo, g a

gravidade e L um comprimento caracter stico (escala) (Eric Weisstein's World of Science,www.scienceworld.wolfram.com).

Page 27: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Cap tulo 1 O vento em meio urbano

- 21 -

A estrutura t pica da CLA (fig. 1.1), em condi es de estratifica o neutra

composta ( semelhan a dos que se observa experimentalmente num t nel

aerodin mico), por duas regi es distintas: a camada interna ou de superf cie (inner ou

surface layer) e a camada externa ou de Ekman (outer layer). Nesta, o fluxo apresenta

uma fraca depend ncia da natureza da superf cie e a rota o da Terra, que origina a

for a de Coriolis, bastante importante (GARRAT, 1994).

Camada Limite Atmosf rica

Camada de In rcia

Camada Externa

Camada Interna

Camada Rugosaz > z0

h

z 0,1 h

Fig. 1.1 - Estrutura da Camada Limite da Atmosfera (CLA) em condi es de estabilidade neutra.h corresponde altura total da CLA, z altura das diferentes sub-camadas e z0 rugosidade (ver 5.2.1)

(extra do de GARRAT, 1994).

2.2 AS CONDI ES DE ESTABILIDADE ATMOSF RICA NA CAMADA LIMITE

A estabilidade da atmosfera7 controla as caracter sticas da Camada Limite

Atmosf rica afectando nomeadamente os seus perfis de temperatura e velocidade.

Considere-se uma atmosfera standard representando ar ambiente e uma pequena parcela

de ar a uma determinada altura, com determinadas caracter sticas de press o,

temperatura e humidade. Nesse ponto, a parcela de ar tem a mesma temperatura da

atmosfera ambiente que a rodeia e n o sofre a influ ncia de for as de impuls o

7 A estabilidade est tica considera apenas as for as de impuls o para estimar a estabilidade do fluxo,enquanto a estabilidade din mica considera as for as de corte e as for as de impuls o. Assim um

Page 28: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I Modifica o nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 22 -

(buoyancy forces). Para se determinar as condi es de estabilidade est tica na atmosfera

tem de se observar o que aconteceria a essa parcela de ar se fosse for ada a movimentar-

-se para cima ou para baixo numa curta dist ncia. Quando movida da sua posi o

inicial, a parcela de ar e o ar ambiente podem diferir na temperatura, dando origem a

for as de impuls o8. Se essas for as actuarem no sentido de empurrarem a parcela de ar

para o seu ponto de partida, a atmosfera encontra-se estaticamente est vel. Na aus ncia

de qualquer outra for a, o fluxo tende a ser laminar e n o turbulento. A estabilidade

(nesse sentido) est associada a ventos fracos e uma superf cie mais fria que o ar. Isto

poder ocorrer em noites de arrefecimento radiativo, calmas e sem nebulosidade, ou

quando o ar mais quente passa sobre uma superf cie mais fria durante o dia ou a noite.

De noite as camadas de ar est vel junto superf cie t m menos espessura (20 a 500 m)

comparativamente com a instabilidade diurna.

Se a parcela de ar for impelida para longe do seu ponto inicial e continuar o seu

movimento ascensional, o ambiente atmosf rico estaticamente inst vel. As regi es

onde se forma a instabilidade s o turbulentas. O ar inst vel junto ao solo est associado

a ventos fracos e a uma superf cie mais quente que a atmosfera adjacente. Pode ocorrer

com frequ ncia em dias sem nebulosidade e com bom tempo, ou quando o ar frio

invade uma superf cie mais quente durante o dia, ou noite (STULL, 2000).

A instabilidade pode gerar uma CLA com 2 a 3 km de altura e mais de 5 km

sobre os desertos quentes no pico do Ver o quando o aquecimento da superf cie

enorme. Na presen a de nuvens do tipo cumulunimbos, onde a convec o intensa,

essa altura pode ser mesmo ser largamente ultrapassada (GARRAT, 1994).

A atmosfera diz-se neutra quando a varia o de temperatura entre dois pontos, a

alturas diferentes na atmosfera, for a mesma que se verifica na massa de ar que se

desloca entre esses dois pontos (SARAIVA, 1983). Ou seja, estaticamente neutra se a

temperatura da parcela de ar que se move for igual do ar ambiente que a rodeia.

Ocorre com nebulosidade e ventos moderados a fortes. A influ ncia da superf cie, em

ambiente estaticamente est vel pode-se tornar dinamicamente inst vel devido a mudan as na velocidade edirec o do vento em altura (STULL, 2000).8 Em termos simples, se uma part cula ou parcela de ar se encontrar mais quente do que o volume de arque a circunda mesma altura ou press o, tende a subir. Se se encontrar mais fria, tende a descer. Umapart cula ou parcela de ar que se encontre mesma temperatura do ar envolvente n o sofre flutua es.

Page 29: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Cap tulo 1 O vento em meio urbano

- 23 -

termos de arrefecimento ou aquecimento, m nimo. Os modelos num ricos utilizados

no CAP TULO 5 assumem esta condi o de atmosfera neutra.

As cidades s o fontes geradoras de energia antr pica e polui o, factores que

alteram o balan o energ tico e, por conseguinte, modificam facilmente as condi es de

estabilidade ou instabilidade atmosf rica na camada limite que se lhes sobrep e.

2.3 A CAMADA EXTERNA (OU DE EKMAN).

A estrutura da CLA fortemente influenciada pelo ciclo di rio do aquecimento e

arrefecimento da superf cie, da sua rugosidade e das nuvens presentes na atmosfera.

Uma CLA inst vel e fortemente estratificada (convectiva) ocorre em condi es de um

forte aquecimento da superf cie, que produz instabilidade atrav s de bolhas t rmicas

ascendentes, ou quando se gera um movimento convectivo descendente pelo

arrefecimento radiativo do topo das nuvens. A maior parte desta camada, que ocupa 90

% da altura total da CLA (fig. 1.1), dominada pela convec o livre, envolvendo

turbilh es de grande dimens o associados s bolhas t rmicas (GARRAT, 1994).

De dia, quando o aquecimento da superf cie cria condi es de instabilidade, a

camada externa de Ekman dominada por movimentos convectivos e tamb m

conhecida por camada de mistura. Quando se encontram na atmosfera grandes

quantidades de poeiras, esporos, poluentes, etc., essa mistura pode ser t o eficiente que

se forma uma n voa uniforme (OKE, 1987).

2.4 A CAMADA INTERNA OU DE SUPERF CIE

Na camada interna (ou de superf cie) o fluxo de ar depende das caracter sticas da

superf cie e pouco afectado pela rota o da Terra. Existe uma transi o entre a

camada interna e externa que n o abrupta, com caracter sticas aerodin micas das duas.

Page 30: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I Modifica o nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 24 -

A camada interna encontra-se dividida em duas sub-camadas:

a) Rugosa, interfacial ou roughness sublayer - sub-camada por cima da

superf cie terrestre onde se encontram os elementos rugosos, seja em terra

ou no mar (fig. 1.1). A influ ncia da superf cie faz-se sentir directamente no

fluxo de ar junto ao solo. A difus o molecular um processo importante

atrav s do qual fluxos de energia e massa s o trocados entre esses dois

meios. O vento e as for as de atrito apresentam uma rota o negligenci vel

com a altura (GARRAT, 1994).

Imediatamente acima da superf cie existe uma camada pelicular com uma

espessura de apenas alguns mil metros onde o ar adere a todas as superf cies

(escoamento laminar9).

Na restante camada rugosa os elementos de rugosidade existentes originam

fluxos complexos sua volta (v rtices e turbilh es). Estes movimentos

tridimensionais dependem da forma, densidade e flexibilidade desse

elementos (OKE, 1987).

b) Por cima da camada rugosa encontra-se a sub-camada de in rcia, cuja

caracter stica principal apresentar um perfil de vento logar tmico em

condi es de estabilidade neutra (GARRAT, 1994).

Em resumo, na camada interna dominam os movimentos turbulentos de pequena

escala e, por isso, o processo mais activo de transfer ncia de energia a difusividade

turbilhonar (eddy diffusivity).

2.5 A ESTRUTURA DA CAMADA DE AR SOBRE A CIDADE

As caracter sticas aerodin micas, radiativas e termo-higrom tricas da atmosfera

sofrem modifica es significativas junto das reas urbanas e, na perspectiva deste

trabalho, as primeiras merecem aqui uma refer ncia especial. medida que o fluxo de

ar escoa do campo para as reas urbanas vai encontrar um conjunto diferente de

9 Escoamento laminar Fluxo n o turbulento de um fluido definido por linhas (streamlines) que s oparalelas superf cie (OKE, 1987).

Page 31: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Cap tulo 1 O vento em meio urbano

- 25 -

condi es de fronteira ou camadas limite (fig. 1.2). As modifica es introduzidas pela

cidade, que ocorrem na camada interna, formam duas sub-camadas: uma que

comandada pela natureza da superf cie urbana, a Urban Boundary Layer ou Atmosfera

Urbana Superior e cujos fen menos atmosf ricos s o de natureza local/regional (ou de

meso-escala); uma segunda camada, localizada por baixo da linha dos topos dos

edif cios, chamada Urban Canopy Layer, ou Atmosfera Urbana Inferior (ALCOFORADO,

1992). Esta camada comandada por processos atmosf ricos de micro escala ao n vel

das ruas (espa os entre os edif cios), conjunto ao qual se atribui a designa o de

canyons urbanos.

Vento regional

Pluma urbana

Atmosfera urbana inferiorCamada limite rural

reas rurais

Atmosfera urbana superior

reas ruraisreas suburbanasreas suburbanas

Centro da cidade

Fig. 1.2 Estrutura da camada de ar sobre a cidade (extra do de OKE, 1987).

o conjunto dos microclimas, cada um influenciado pelas caracter sticas do seu

espa o adjacente, que formam o mosaico do clima urbano. Neste inv lucro

tridimensional, composto pela Atmosfera Urbana Exterior e Inferior, ocorrem as

principais trocas energ ticas em meio urbano, sendo por isso fundamental o seu estudo.

Do ponto de vista das actividades humanas sobretudo importante a camada de ar

abaixo dos edif cios pois a se concentram cerca de 50% da popula o mundial.

Page 32: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I Modifica o nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 26 -

3. OS PERFIS DO VENTO NA CAMADA LIMITE ATMOSF RICA E A SUA MODIFICA O

NAS CIDADES.

O campo de vento da camada limite atmosf rica controlado pelo balan o das

for as de atrito10, exercidas pela superf cie sobre o fluxo de ar e pelo gradiente de

press o atmosf rica11. O atrito retarda o fluxo de ar medida que se aproxima da

superf cie, diminuindo a sua velocidade m dia horizontal. Na aus ncia de efeitos

t rmicos, a influ ncia do atrito depende da rugosidade da superf cie. A turbul ncia

mistura continuamente o fluxo de ar das camadas mais baixas com o ar em movimento

mais r pido em toda a CLA, de modo que toda ela afectada pelo atrito da superf cie

(STULL, 2000).

A for a exercida pelo ar em movimento sobre a superf cie chamada tens o de

corte (surface shearing stress - ) e expressa como uma for a por unidade de

superf cie (N/m2 ou Pa). Esta for a oposta quela exercida pela superf cie na

atmosfera (princ pio da ac o e reac o).

Dado que se pretende descrever (modelar) o campo de velocidades do ar atrav s

da camada em que as tens es de atrito s o importantes, foi definida e correntemente

utilizada como escala, a velocidade de atrito u*,

/2*u (1.1)

onde a massa vol mica do ar (tamb m m , ver equa o 1.2). Valores t picos de u*

variam entre 0 (ventos muito fracos ou calma) e 1 a 2 m/s para ventos fortes. Valores

para ventos moderados rondam 0,5 m/s.

A tens o de corte actua apenas na camada inferior e n o no total da coluna de

atmosfera, devido tamb m condi o de fluidez do ar e transmitida para baixo sob a

10 For a tangencial que actua num objecto e que se op e ao escorregar desse objecto sobre uma superf cieadjacente, com a qual est em contacto. A for a de atrito paralela superf cie e no sentido oposto aomovimento, ou ao movimento eminente (BUECHE e HECHT, 2000).11 escala das grandes cidades as for as de Coriolis podem tamb m desempenhar um papel importante,n o na defini o de velocidade do vento, mas na sua direc o.

Page 33: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Cap tulo 1 O vento em meio urbano

- 27 -

forma de fluxo de quantidade de movimento (termo de transporte ou in rcia, do ingl s

momentum). A quantidade de movimento contido num corpo dado pelo produto da sua

massa pela velocidade sendo, para o caso de um fluido, expressa pelo seu fluxo:

Quantidade de movimento = um (1.2)

Para efeitos pr ticos pode-se considerar a massa vol mica do ar constante na

camada superficial e o perfil de quantidade de movimento m dio horizontal, em

diferentes camadas, proporcional ao quadrado da velocidade do vento, aumentando,

portanto, mais rapidamente com a altura.

Devido ao efeito da convec o for ada gerada pela rugosidade da superf cie e o

atrito entre camadas da atmosfera que se deslocam a diferentes velocidades, formam-se

turbilh es que se movem continuamente para cima e para baixo. Um turbilh o que se

desloca de um n vel superior na atmosfera para outro inferior provoca neste um

aumento da quantidade de movimento e, portanto, de velocidade. Um anem metro

registar um aumento de vento no n vel inferior sob a forma de rajada. Pelo contr rio,

uma subida turbilhonar de um n vel inferior na atmosfera para outro superior seria

observado como uma calma (quando registada a velocidade do vento horizontal).

Devido ao aumento da velocidade do vento em altura, estes movimentos ascendentes e

descendentes diferenciados traduzem-se num fluxo efectivo de quantidade de

movimento no sentido descendente, que compensa as for as de atrito e mant m a

estrutura da camada limite em termos m dios.

Numa camada de ar turbulenta, a varia o vertical do fluxo de quantidade de

movimento horizontal m dio dado por:

zuKM (1.3)

Page 34: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I Modifica o nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 28 -

em que KM a viscosidade turbilhonar (m2 s-1) e u a velocidade m dia12.

Em condi es de estabilidade neutra, onde as for as ascensionais s o pouco

importantes (as nuvens reduzem o aquecimento/arrefecimento radiativo da superf cie e

os ventos moderados a fortes promovem a mistura e n o permitem uma forte

estratifica o t rmica), a varia o da velocidade m dia do vento com a altura descrita

por uma fun o logar tmica:

ctezuku

u z *

*

ln1 (1.4)

O valor da constante (cte) depende da rugosidade da superf cie e dado que se

trata de uma fun o logar tmica pode demonstrar-se que poss vel rescreve-la como:

0ln

zz

kuuz

onde z a velocidade m dia do vento (m/s) na altura z, u a velocidade de atrito, k a

constante de VON KARMAN ( 0,40) e z0 o factor rugosidade (m). Este ltimo

par metro ser pormenorizadamente explicado mais adiante, por ser uma vari vel

fundamental nos modelos utilizados no CAP TULO 5.

Em condi es de atmosfera neutra, os perfis t picos em altura apresentam

diferen as consoante as superf cies que atravessam (fig. 1.3): em reas abertas e planas

o topo da camada limite (zg), altura acima da qual a velocidade m dia do vento ( ) se

mant m constante, inferior atingida nas reas rurais, ligeiramente mais rugosas. Nas

cidades, onde a rugosidade mais elevada, as for as de atrito s s o negligenci veis a

uma altura ainda mais elevada. H , portanto, uma rela o directa entre a rugosidade e a

espessura da camada definida por zg na atmosfera. O gradiente vertical da velocidade

m dia do vento ( zu ) diminui com o aumento da rugosidade. Durante a ocorr ncia de

12 A forma cl ssica de an lise de um escoamento turbulento consiste em consider -lo como asobreposi o ao escoamento m dio das flutua es ocasionadas por um movimento turbilhonar que se lhe

Page 35: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Cap tulo 1 O vento em meio urbano

- 29 -

ventos fracos, zg depende da quantidade de convec o t rmica gerada pela superf cie:

com o aquecimento da superf cie este valor aumenta, ocorrendo o oposto com o

arrefecimento.

Campo aberto(Alt. M)

reas rurais Cidades

Velocidade do vento

Fig. 1.3 Perfis t picos do vento em condi es de atmosfera neutra, sobre v rios tipos de superf cies

(extra do de OKE, 1987).

Os turbilh es gerados por convec o for ada devido ao atrito podem ser

concebidos como movimentos circulares que aumentam de di metro com a altura

(tridimensionais e com v rias formas na realidade). Em condi es de instabilidade, os

movimentos turbilhonares e o fluxo de quantidade de movimento aumentam. Junto

superf cie, os efeitos mec nicos dominam, mas a maior altura os efeitos t rmicos

tornam-se mais importantes, resultando num alongamento vertical dos turbilh es e

redu o do gradiente vertical do vento. Inversamente a estabilidade trava os

movimentos verticais na atmosfera e comprime os turbilh es (OKE, 1987).

Os perfis de vento, que se acabaram de descrever, correspondem a situa es

t picas de atmosfera neutra usadas nos modelos num ricos e respondem ao perfil

logar tmico do vento. No entanto, na realidade h um ciclo di rio de

estabilidade/instabilidade, que corresponde uma varia o da velocidade do vento junto

sobrep e. Desta forma corrente exprimir a velocidade instant nea u como a soma 'uuu , onde u ovalor m dio no tempo e u a flutua o. Note-se que por defini o u = 0.

Page 36: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I Modifica o nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 30 -

superf cie (fig. 1.4). Considerando uma rea plana e pouco rugosa, ap s o nascer do Sol

(9:00 h), h uma camada de mistura pouco espessa, onde os ventos s o uniformes em

altura. medida que o dia avan a esta camada de mistura aumenta (15:00 h). Depois do

p r do sol (21:00 h) a intensidade da turbul ncia diminui e reduz-se a velocidade do

vento junto ao solo, mas n o em altura porque diminui o atrito entre as camadas de ar.

Novamente com o nascer do Sol a turbul ncia aumenta a mistura vertical, iniciando-se

novo ciclo.

3 horas

9 horas

15 horas

21 horas

Velocidade do vento

Fig. 1.4 Perfis t picos do vento em condi es de bom tempo sobre a terra. G - Velocidade m dia dovento geostr fico; MBL- Velocidade m dia do vento na camada limite atmosf rica (CLA)

(adaptado de STULL, 2000).

4. MODIFICA ES DO VENTO DE SUPERF CIE DEVIDAS AO RELEVO E

PROXIMIDADE DE GRANDES MASSAS DE GUA.

O vento superf cie sofre a influ ncia de variad ssimos factores, como o relevo,

o contacto das grandes massas de gua com a terra, ou as cidades. Pequenas diferen as

na topografia podem gerar ventos bastante irregulares, ou canaliz -los quando surgem

vales encaixados. Como se viu anteriormente, Lisboa conjuga todos os elementos que se

acabou de referir. Por isso, conv m abordar estes temas para melhor se entender os

ventos na cidade.

Page 37: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Cap tulo 1 O vento em meio urbano

- 31 -

4.1 OS VENTOS MODIFICADOS PELA TOPOGRAFIA

Come a-se por apresentar as leis f sicas que regem o fluxo de ar, para

compreender as modifica es que aquele sofre quando encontra um obst culo (seja uma

montanha, uma colina, um pr dio ou uma rvore) ou canalizado por um vale, uma rua,

ou apenas por uma passagem inferior sob um edif cio.

An loga equa o horizontal do movimento, a segunda lei de NEWTON pode ser

usada para desenvolver uma equa o de movimento para obter a varia o da

componente vertical de velocidade.

mTDFg

zP

yWV

xWU

tW z1 (1.5)

Varia o local Advec o Gradiente Gravidade Atrito

de press o

O termo da direita corresponde acelera o, U, V e W s o as componentes

cartesianas da velocidade nas direc es x, y e z, P a press o, a massa vol mica do

ar, t o tempo, g a acelera o da gravidade e TDFz representa as for as de atrito por

unidade de massa m.

Considerando uma situa o estacion ria ( W/ t =0), sem atrito turbulento, a

equa o de movimento vertical (combinada com a correspondente equa o horizontal

de movimento), pode ser resolvida para determinar a velocidade do ar ao longo de uma

linha de corrente. A manipula o destas leis de movimento resulta na equa o de

Bernoulli:

zgPvCB2

21 (1.6)

em que CB constante ao longo de uma determinada linha de corrente, a velocidade

do fluxo, P a press o, g a acelera o da gravidade e z a componente direccional na

Page 38: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I Modifica o nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 32 -

vertical (altitude). O primeiro termo da direita corresponde energia cin tica13 por

unidade de massa, o do meio representa o trabalho14 efectuado no ar armazenado sob a

forma de press o e o ltimo a energia potencial15. importante notar que a equa o de

Bernoulli se baseia na conserva o da energia ao longo de uma linha de fluxo. Ao longo

desta, a energia pode ser convertida de uma forma para outra, desde que a soma do total

de energia seja constante.

Quando o vento se aproxima de um obst culo, uma parte do fluxo contorna o

obst culo. Se esse objecto for, por exemplo, uma parede, pelo menos uma das linhas de

fluxo que embate no obst culo desacelera at velocidade 0. Este ponto conhecido

por ponto de estagna o (voltar-se- a este tema mais adiante, com um exemplo do

vento com uma direc o normal a um edif cio). A press o neste ponto (chamada press o

total - Pt) mais elevada do que na parte do fluxo livre de obst culos (press o est tica -

Ps). Para um fluxo mesma altura, os nicos termos que se modificam na equa o de

Bernoulli s o a energia cin tica e a press o (STULL, 2000). A diferen a entre Pt e Ps

define a press o din mica de escoamento n o perturbado sendo f cil verificar que:

Pd = 1/2 2 (1.7)

Pt Ps = Pd (1.8)

2

2 sPsPt (1.9)

De notar que no caso da atmosfera a press o tem na realidade dois termos: a

atmosf rica propriamente dita e a associada ao escoamento. A atmosf rica compensa-se

com a componente potencial em condi es neutras.

13 A energia cin tica a energia que um corpo possui como consequ ncia do seu movimento, expressa emJoule. EC = m v2, ou seja, metade do produto da massa pelo quadrado da velocidade de um corpo(OKE, 1987).

14 O trabalho a for a que actua sobre um objecto que lhe causa movimento.15 A energia potencial a energia armazenada num corpo como consequ ncia da sua posi o no campo de

gravidade. Numericamente corresponde ao trabalho requerido para trazer um corpo de um n vel derefer ncia (n vel m dio do mar para a sua posi o actual (OKE, 1987). EP = m g h. Produto da massa(m), acelera o da gravidade (g) e altitude (h).

Page 39: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Cap tulo 1 O vento em meio urbano

- 33 -

Este o princ pio de medi o do fluxo de ar em t neis aerodin micos, com

tubos de Pitot-Prandtl, a que se far uma refer ncia mais pormenorizada no

CAP TULO 6.

Como se referiu anteriormente, cada elemento da paisagem, seja urbana ou n o,

modifica os campos de vento superf cie de modo que cada local possui as suas

pr prias condi es de ventila o. Por isso dif cil generalizar os movimento do fluxo

de ar em terrenos movimentados, podendo-se tipificar apenas alguns padr es de vento

em fun o de elementos espec ficos do terreno.

Sobre superf cies planas e sem a interfer ncia de outros elementos rugosos, o

fluxo de ar adere superf cie. Mas quando esse fluxo passa sobre uma irregularidade

n o se ajusta perfeitamente superf cie topogr fica e separa-se dela. criada uma

regi o de baixa press o que gera movimentos turbilhonares a sotavento do obst culo.

Os movimentos do ar em torno de elementos topogr ficos podem-se classificar

de acordo com a exist ncia ou n o da separa o do fluxo da superf cie e com a sua

inclina o.

At 17 de inclina o das vertentes n o ocorre a separa o do fluxo de ar na

superf cie. A acelera o do vento ocorre com o aumento da altitude devido contrac o

do fluxo na vertical. Junto do topo da eleva o a sua velocidade m xima (fig. 1.5).

Inversamente, uma diminui o da altitude do relevo resulta num abrandamento do

fluxo. Uma direc o coincidente com um "estreitamento topogr fico" tamb m pode

provocar um aumento da velocidade do ar, com um m ximo no centro desse

estreitamento.

O modelo que se acabou de apresentar explica o chamado efeito Venturi.

Quando o fluxo de ar for ado a passar por uma abertura (como apresentada na

figura, no canto inferior direito), sofre uma acelera o pois tem que conservar a

quantidade de massa que flui. Se houver uma invers o t rmica que impe a o aumento

da altura da camada de ar a que esse fluxo est sujeito, a conserva o do volume de ar

dado pela equa o:

sd

sd v

DDv . (1.10)

Page 40: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I Modifica o nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 34 -

Colina isolada (vista lateral) Vale (vista lateral)

Fluxo do ar a barlavento Fluxo do ar a Sotavento

Relevo isolado (vista em plano) Contri o do fluxo de ar (plano)

Fig. 1.5 - Fluxos de ar t picos em torno de relevos isolados em topografia moderada (declives inferiores a17 ). As setas indicam a direc o do fluxo. Os pontos a cheio mostram as reas onde a velocidade m dia

m xima e os pontos brancos onde m nima (extra do de OKE, 1987)

em que Ds um par metro que representa a dimens o horizontal do fluxo, Dd a

dimens o que sofre o estreitamento, e vs a velocidade do vento antes de atingir o

estreitamento. Para preservar a igualdade mostrada na equa o, se Ds for superior a Dd,

a velocidade dentro da rea de estreitamento maior do que sua entrada. Apresenta-se

um exemplo para se verificarem as grandeza envolvidas: sem considerar relevos

pr ximos que possam causar outras perturba es, se numa banda de 20 km se verificar

uma velocidade normal a um estreitamento do relevo com 10 km de largura na ordem

dos 5 m/s, a velocidade aumentaria para 10 m/s. Ou seja, um estreitamento na ordem de

metade da largura considerado na horizontal, provoca uma duplica o na velocidade do

vento.

Se, segundo a equa o de Bernoulli, a velocidade aumenta na rea onde o relevo

mais estreito, ent o a press o diminui se considerarmos n o haver altera es na altura

Page 41: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Cap tulo 1 O vento em meio urbano

- 35 -

que atinge a camada de ar desse fluxo. Poder-se- estimar a diferen a de press o P

(definida como Pt - Ps), combinando as equa o (1.9) e (1.10), resultando:

22 1

2 d

ss D

DvPsPt (1.11)

Resolvendo o problema posto anteriormente e assumindo uma massa vol mica do ar

constante de 1,2 kg/m3 (para uma temperatura do ar entre 10 e 20 C e uma press o

atmosf rica de 1000 hPa), obt m-se uma diminui o de press o na ordem de 45 Pa na

rea de estreitamento do relevo.

Quando n o ocorre separa o do fluxo em condi es de estabilidade neutra e a

sua direc o normal a formas topogr ficas simples, algumas experi ncias levaram

TAYLOR E LEE (1984) a deduzir a m xima amplifica o da velocidade do vento

(citados por Oke, 1987):

max/ up = 1 + b (H/X) (1.12)

onde up a velocidade m dia do vento que ascende uma colina num determinado ponto

da superf cie de refer ncia; max a velocidade do vento no topo da colina; H a altura da

colina; X corresponde a metade da altura da colina medida na horizontal a partir do topo

da colina; b um valor obtido empiricamente: 2,0 para a acelera o do vento

considerando apenas duas dimens es (vista na vertical); 1,6 para o c lculo de valores

em v rias locais da colina (vista tridimensionalmente); e 0,8 considerando apenas o

sector ascendente do relevo (figura 1.5).

Para reas topograficamente deprimidas (por exemplo vales), utiliza-se a

formula o inversa (m xima diminui o da velocidade do vento):

min/ up = 1 + b (H/X) (1.13)

onde H, neste caso, um valor negativo (figura 1.5).

Page 42: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I Modifica o nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 36 -

A varia o da velocidade do vento sobre colinas de fraco declive foi tamb m

demonstrada a partir dos resultados obtidos em experi ncias internacionais, efectuadas a

partir de conjunto elevado de esta es anemom tricas colocadas a 10 m do solo, na

colina de Askervein na Ilha de South Uist (situadas no arquip lago das H bridas) na

Esc cia (MORTENSEN, 1993). Os dados experimentais permitiram esclarecer essa

rela o atrav s de um par metro que constitui a acelera o relativa do vento ( S). Esta

definida como:

1

12

uuuS (1.14)

sendo u2 as velocidades de vento no topo e u1 as velocidades medidas nas esta es

anemom tricas colocadas ao longo da colina. Na figura 1.6 encontram-se representados

alguns dos resultados das medi es dos ventos comparados com os dados obtidos com

modelos num ricos. A figura mostra que, no topo da colina, h uma varia o positiva de

cerca de 80% em rela o velocidade m dia nas reas planas adjacentes.

Imediatamente a barlavento existe uma varia o negativa na velocidade m dia do vento

de cerca de 20% e 40% a sotavento. Estes resultados est o de acordo com os trabalhos

de refer ncia de JACKSON e HUNT (1975), que referem que the greatest increases in the

velocity very close to the ground and in the surface shear stress occur on the upper

windward slope, close to the top of the hill (as one finds walking over hills). Downwind

of the peak the velocity in the inner region decreases fairly rapid . Esta diferen a

poder ficar a dever-se, provavelmente, diverg ncia horizontal do fluxo de ar a

sotavento (BARRY E CHORLEY, 1992).

Na figura 1.7 os perfis logar tmicos do vento sobre a colina Askervein mostram

como s o distintas as velocidades acima do solo e a sua rela o com as dimens es do

relevo . Note-se que a linha da direita (que representa as medi es no topo da colina),

apresenta valores mais elevados de velocidade at ao ponto l, altura t pica da m xima

velocidade relativa devida converg ncia vertical.

Page 43: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Cap tulo 1 O vento em meio urbano

- 37 -

Fig. 1.6 - Acelera o relativa do vento medido a 10 m de altura do solo nas experi ncias de Askervein. Ospontos representam os valores medidos, enquanto os quadrados e as linhas resultam de modelos

num ricos, entre eles o modelo utilizado no programa WASP(extra do de MORTENSEN, 1993).

Fig. 1.7 - Perfis de vento obtidos nas experi ncias de Askervein. A linha da esquerda representa o perfildo sector barlavento da colina e a da direita representa as medi es no topo da colina

(extra do de MORTENSEN, 1993).

Page 44: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I Modifica o nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 38 -

No caso apresentado o valor m ximo de velocidade ocorre a 4 m do solo (cerca

de 16 m/s - fig. 1.8). Acima desta altura o perfil constante at tomar o mesmo valor de

velocidade do perfil de vento na vertente a barlavento.

Fig. 1.8 - Perfis de vento obtidos nas experi ncias de Askervein (extra do de Barry e Chorley, 1992).

A acelera o do vento em certas reas do relevo pode diminuir em condi es de

instabilidade, ou quando o fluxo n o incide perpendicularmente s linha de maior

declive. Em condi es de estabilidade a acelera o/desacelera o podem ser

amplificados por causa do fluxo ser restrito a uma camada de ar uniforme e menos

espessa sobre o solo. A altura da camada de invers o t rmica tamb m pode ser

importante porque o fluxo comprimido entre o topo do relevo e a base da invers o.

(Oke, 1987).

Se o fluxo de ar escoa sobre uma superf cie que excede os 17 de inclina o,

ent o ocorre a separa o do fluxo da superf cie, que acompanhado por outras

movimenta es do ar secund rias (Fig. 1.9).

medida que o fluxo se aproxima do relevo gera-se uma aumento de press o na

vertente a barlavento (fig. 1.9 a), sendo m xima na sua parte superior. A maior parte do

fluxo de ar tende a contornar o relevo, movimentando-se para a rea de menor press o.

Como h aproxima o das linhas de corrente no topo do relevo ocorre um aumento da

velocidade do vento. No entanto, uma pequena parte desse mesmo fluxo de ar

deflectido e desce a vertente a barlavento (tamb m no sentido das baixas press es),

formando um turbilh o a barlavento (Bolster eddy) junto base. Nesta rea, o vento

Page 45: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Cap tulo 1 O vento em meio urbano

- 39 -

fraco, turbulento e inconstante, e ocorre uma mudan a de rumo junto superf cie,

contr rio ao fluxo de ar dominante. No topo do relevo ocorre uma nova separa o do

fluxo de ar, com a forma o de novo turbilh o a sotavento, com as mesmas

caracter sticas do anterior.

Fig. 1.9 - Fluxos de ar t picos em torno de relevos isolados com declives superiores a 17 . As setasindicam a direc o do fluxo. (extra do de OKE, 1987)

O fluxo de ar que atravessa perpendicularmente um pequeno vale encaixado

pode n o sofrer uma separa o acima da superf cie, mas desencadear um fluxo

secund rio (lee eddy), caracterizado por um vento vari vel ou semi-estagnado no fundo

do vale (fig. 1.9 b). Num vale aberto de maiores dimens es (c), a movimenta o do ar

no seu interior pode resultar da combina o dos fluxos gerados nas vertentes (fig. 1.9 d

e e): o que embate na vertente produz um movimento turbilhonar do tipo bolster, com

aumento da velocidade no topo e eventual forma o de outro turbilh o mais adiante na

a) b)

c) d)

e) f)

g)

Turbilh o a barlavento(Bolster eddy) Turbilh o a sotavento

(Lee eddy)

HorseshoeMovimentoturbilhonar emferradura

Lee eddy

BolsterLee eddy

Lee eddy

Page 46: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I Modifica o nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 40 -

parte superior - d); por seu lado o fluxo descendente forma uma movimento do tipo lee

eddy, mais pronunciado - e).

Como as colinas n o s o figuras bidimensionais, os movimentos de ar que se

geram em seu torno s o muito mais complexos do que os apresentados em a). Um

relevo isolado (fig. 1.9 f), quando observado em plano, origina separa es laterais e no

topo, provocando a sotavento grande turbul ncia que origina uma forma complexa de

escoamento conhecida por movimento em ferradura (horseshoe).

Na contrac o do fluxo devido ao estreitamento do relevo (g) o escoamento

id ntico quele onde n o ocorre a separa o do fluxo, excepto na forma o de

movimentos turbilhonares nas partes laterais das vertentes.

Os exemplos apresentados s o apenas para condi es de estabilidade neutra e

assume-se que a separa o do fluxo ocorre quando este normal ao eixo mais longo dos

relevos. Quando lhe paralelo os efeitos s o atenuados. A separa o favorecida pela

instabilidade e reduzida em condi es de atmosfera est vel (OKE, 1987).

A separa o do fluxo n o um fen meno que ocorra de uma forma constante.

Em investiga es conduzidas em t nel aerodin mico, foi identificada uma caracter stica

temporal do escoamento numa colina com declive m ximo de 26%

(aproximadamente 15 ). Essa caracter stica consiste na intermit ncia entre per odos em

que surge a separa o do fluxo, alternando com outros onde h recolagem do fluxo

superf cie. Tomando como refer ncia as dimens es do modelo usado no t nel (fig. 1.10:

altura=0,1 m; L=0,25 m e total de extens o 1,2 m) e uma rugosidade de 0,02 m, a

separa o (com uma espessura cerca de 1/3 da altura da colina - 3 cm) desenvolve-se na

vertente sotavento dist ncia horizontal de cerca de 25 cm do topo, enquanto a

recolagem se d a uma dist ncia de 70 cm (7 vezes a altura da colina ).

A figura 1.11 mostra os resultados obtidos em t nel aerodin mico da diminui o

do fluxo de ar a sotavento do mesma modelo (tal como foi referido anteriormente nas

experi ncias de Askervein). Verifica-se uma menor diminui o do fluxo de ar a partir

de 1/10 da espessura da camada limite ( z/ =0,10) e clara simetria dos perfis em ambas

as vertentes a partir de 0,20.

Page 47: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Cap tulo 1 O vento em meio urbano

- 41 -

Topo da camada limite

Camada interna

Camada externa

Elementosrugosos

Velocida

de

Fig. 1.10 Modelo f sico de colina para simula o dos escoamentos do fluxo de ar, utilizado em t nelaerodin mico. Do lado esquerdo est representado um perfil logar tmico do vento. As dimens es do

modelo encontram-se no texto (extra do de BRITTER et al., 1981).

Dist ncia ao topo da colina (m)

Ve locida d

e

Fig. 1.11 Velocidade m dia sobre uma colina (ensaios em t nel aerodin mico). z/ representa umaunidade de dist ncia em rela o espessura da camada limite ( ). As dist ncias positivas no eixo das

ordenadas representam o fluxo de ar descendente e vice-versa (extra do de BRITTER et al., 1981).

Por outro lado a intensidade da turbul ncia aumenta nas camadas de ar junto ao

solo. Na figura 1.12, observa-se uma importante distin o entre a regi o onde ocorre a

separa o do fluxo de um modo intermitente e outra cuja espessura da ordem de h,

onde as flutua es das velocidades de turbul ncia aumentam mais de 50% (tr s

primeiras curvas na parte superior do gr fico) (BRITTER et al., 1981).

O trabalho a que se acabou de fazer refer ncia, conjuntamente com outros n o

citados mas igualmente importantes (LETTAU, 1969; JACKSON e HUNT, 1975; TAYLOR,

et al., 1983; TROEN e. PETERSON, 1989; TROEN, 1990 e outros16), contribu ram com as

16 Para a lista completa das contribui es veja-se a bibliografia citada por MORTENSEN et al. (1993).

Page 48: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I Modifica o nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 42 -

suas bases te ricas e experimentais para a elabora o de um conjunto de modelos

num ricos, que deram origem ao programa WASP (a que se far refer ncia mais

detalhada no CAP TULO 5) e que foi a ferramenta essencial para parte desta investiga o

Dist ncia ao topo da colina (m)

Fig. 1.12 Raz o da intensidade de turbul ncia e a velocidade do fluxo no topo da camada limite U s/U(eixo das ordenadas), sobre uma colina (ensaios em t nel aerodin mico). z/ representa uma unidade dedist ncia em rela o espessura da camada limite ( ). As dist ncias positivas no eixo das ordenadasrepresentam o fluxo de ar descendente e vice-versa (extra do de BRITTER et al., 1981).

4.2 OS VENTOS NA PROXIMIDADE DE GRANDES MASSAS DE GUA.

O fluxo de ar que atravessa superf cies com rugosidades diferentes tamb m sofre

altera es na velocidade e direc o predominante. S o exemplos dessas modifica es a

passagem do vento por uma extensa superf cie de gua para entrar de seguida em terra,

de uma superf cie rural, para uma floresta densa e alta, ou para uma cidade.

Quando o fluxo de ar passa de uma superf cie rugosa para outra pouco rugosa,

no hemisf rio norte, tende a acelerar e sofrer um desvio para a direita (fig. 1.13 a), e

Page 49: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Cap tulo 1 O vento em meio urbano

- 43 -

vice-versa (b). No primeiro caso, poder-se- considerar como um exemplo t pico do

vento que sopra da terra para o mar e no segundo do mar para a terra.

Vento de gradiente

Sup. rugosa

Sup. pouco rug.

Sup. rugosa

Sup. pouco rug.

Sup. rugosa

Sup. pouco rug.

Ventode gradiente

Converg ncia Diverg ncia

Sup. rugosa

Sup. pouco rug.

Fig. 1.13 - Desvios t picos do fluxo de ar superf cie decorrentes da passagem de superf cies poucorugosas para rugosas e vice-versa. As setas indicam a direc o do fluxo de superf cie, enquanto as setas abranco indicam o vento de gradiente ( g). (extra do de OKE, 1987).

Quando os ventos s o praticamente paralelos charneira entre estes dois meios

podem ocorrer dois casos (fig. 1.13 c e d): quando a superf cie com maior rugosidade se

apresenta direita do fluxo (c), poder ocorrer uma converg ncia de ventos ao longo da

descontinuidade, criando uma faixa de aumento da sua velocidade. No caso contr rio

(d), que um exemplo representativo da situa o do litoral a ocidente de Lisboa (por

causa da predomin ncia de ventos de norte e noroeste), poder ocorrer uma zona de

diverg ncia com desacelera o do fluxo ao longo da descontinuidade e uma acentua o

do desvio em rela o ao vento de gradiente (OKE, 1987).

A partir de um estudo sobre as rvores deformadas no litoral ocidental da

Pen nsula de Lisboa entre o Guincho e Cascais (ALCOFORADO, 1984), concluiu-se que o

esquema apresentado em d) explica a deflec o lateral dos ventos dominantes de norte e

Page 50: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I Modifica o nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 44 -

noroeste no sentido cicl nico (para a esquerda), acentuado pela presen a da serra de

Sintra, que o vento tende a contornar.

Quando os ventos s o fracos e se formam brisas de origem t rmica (como as

brisas de terra e do mar), poder-se- o esperar direc es distintas das apresentadas

anteriormente, porque o fluxo resultante ser composto por dois vectores, os desvios

esperados mais a direc o predominante da brisa (OKE, 1987).

5 O VENTO NAS CIDADES (ESCALAS REGIONAL E LOCAL).

5.1 INFLU NCIA URBANA NA DIREC O E VELOCIDADE DOS VENTOS QUE

ATRAVESSAM A CIDADE.

H v rias d cadas que reconhecida a influ ncia da cidade na modifica o, n o

apenas, dos campos de vento, mas tamb m de outros fen menos clim ticos como a

humidade e a temperatura (ilha de calor urbano), podendo ainda ter uma fun o

importante no aumento das precipita es convectivas (CHANDLER, 1965; ATKINSON,

1975).

LEE (1977) verificou as v rias rota es do vento ocasionadas pela rea urbana de

Londres, que estariam de acordo com outros estudos efectuados para cidades t o

distantes como Nova Iorque e Columbus, no interior do estado do Ohio. Nas principais

conclus es desse estudo sugere-se a exist ncia de duas situa es distintas. Durante o

dia, por causa da pequena diferen a nas condi es de estabilidade atmosf rica entre o

ambiente urbano e rural e a influ ncia dominante das for as de atrito derivadas da maior

rugosidade na cidade, ocorre um desvio da direc o do vento no sentido cicl nico, em

resposta desacelera o do vento. "sa da" da cidade, o vento tende a tomar uma

direc o contr ria, no sentido anticicl nico, devido diminui o da rugosidade. Este

modelo, que se apresenta na figura 1.14, foi tamb m proposto por OKE (1987). Para

al m das mudan as nas direc es e velocidades, formam-se zonas de converg ncia e

diverg ncia do fluxo de ar. A primeira (na parte esquerda da figura) pode favorecer a

intensidade do fluxo e a ascend ncia do ar, enquanto na zona de diverg ncia ocorre uma

diminui o do fluxo ao longo da "margem direita" da cidade.

Page 51: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Cap tulo 1 O vento em meio urbano

- 45 -

Ventodegradiente

Sup. rugosa(cidade)

Sup.pouco rug.

Fig. 1.14 - Desvios t picos do fluxo de ar sobre uma cidade. As setas indicam a direc o do fluxo desuperf cie, enquanto a seta a branco indica o vento de gradiente ( g). (extra do de OKE, 1987).

Durante a noite, a situa o poder ser inversa: o fluxo de ar encontra diferen as

substanciais de estabilidade atmosf rica entre o centro da cidade (geralmente mais

quente e inst vel) e as reas rurais, onde a atmosfera geralmente mais est vel. Quando

o vento fraco entra na cidade, toma um rumo anticicl nico, e sa da roda para o sentido

cicl nico.

Em resumo, os padr es do vento di rios dependem das for as de atrito que, por

sua vez, resultam da rugosidade da cidade e das diferen as na estabilidade atmosf rica

urbana/rural provocadas pela ilha de calor urbana (ICU) sobretudo de noite.

CHANDLER (1965) demonstrou que as diferen as de velocidade do vento em

Londres e nas reas circundantes, dependem tamb m de factores sazonais, da hora do

dia e da velocidade com que o vento chega cidade quando prov m de reas rurais.

Quando a ICU se desenvolve intensamente, a velocidade do vento na cidade de Londres

maior do que nas reas rurais, facto que pode decorrer de duas situa es:

a) A estabilidade da atmosfera urbana, reduzida durante a noite, aumenta o

fluxo de quantidade de movimento descendente que passa sobre a cidade,

aumentando a velocidade do ar.

b) As temperaturas mais elevadas na cidade criam uma circula o do tipo das

brisas, com uma c lula de converg ncia, onde a direc o do fluxo conflui

para a parte mais quente da cidade, sobrepondo-se a qualquer outro fluxo

existente (este efeito foi tamb m comprovado por outros trabalhos citados

por BORNSTEIN et al., 1977).

Page 52: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I Modifica o nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 46 -

Estas brisas do campo que normalmente conduzem o ar mais arrefecido e

eventualmente menos polu do, s o mais frequentes durante a noite, altura em que a ICU

mais intensa. Para as cidades europeias foi estimada uma probabilidade de ocorr ncia

de 50 % quando o vento (medido a 10 m) inferior a 2 m/s. H algumas evid ncias que

estas brisas de campo s o duas vezes mais frequentes no Ver o que no Inverno

(INSTITUT F R INDUSTRIEAERODYNAMIK GmbH, 1993).

Investiga es realizadas com sondagens verticais na atmosfera na cidade alem

de Freiburg v m confirmar alguns destes resultados. Em noites de forte irradia o

terrestre, calmas e sem nebulosidade, foram observadas velocidades de vento mais

elevadas na parte oriental daquela cidade: O aquecimento da superf cie torna o ar

inst vel e permite trocas verticais de quantidade de movimento horizontal e o aumento

da velocidade do vento junto ao solo (ERNST, 1995).

Estudos efectuados em Frankfurt (GEORGII, 1968, citado por BORNSTEIN, et al.,

1977) e Londres (CHANDLER, 1965), apontam para velocidades do vento regional

inferiores a 5 m/s, para que se desenvolvam circula es de ar nocturno na cidade (altura

em que, teoricamente, a ICU mais se desenvolve) com velocidades mais elevadas do

que nos campos sua volta.

Ao estudarem as caracter sticas do vento em Nova Iorque, BORNSTEIN et al.,

(1977) chegaram a conclus es semelhantes quanto componente que diferencia as

velocidades de vento entre o meio rural e urbano, mas acrescentam que depende

tamb m da direc o do vento regional e dos sistemas de brisas do mar que se formam

em cidades costeiras, como aquela grande metr pole americana, neste caso alterando

tanto a direc o como a velocidade do vento sobre a cidade.

Em cidades como Lisboa, que apresenta um relevo movimentado e um

enquadramento geogr fico complexo entre o oceano e um estu rio suficientemente

largo para se formarem sistemas de circula o locais complexos (ALCOFORADO, 1984 e

1987), est o por confirmar os factos que se apresentou para outras cidades europeias e

norte-americanas. Comprovar o aumento da velocidade do vento devido a causas

t rmicas em Lisboa poder ser uma tarefa dif cil, j que se poder o formar n o uma,

mas v rias ilhas de calor urbano (ALCOFORADO, 1992) e os ventos, frequentemente de

Page 53: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Cap tulo 1 O vento em meio urbano

- 47 -

norte, poder o ser canalizado e acelerados pelos vales da cidade, contorn -la seguindo o

tra ado do rio Tejo, ou contornar os relevos dentro e fora da cidade (OLIVEIRA, 2002).

5.2 PAR METROS AERODIN MICOS E CLASSES DE RUGOSIDADE.

5.2.1 PAR METROS AERODIN MICOS PARA A ESTIMA O DOS CAMPOS DE VENTO

NAS CIDADES.

As cidades s o possivelmente as superf cies mais rugosas e complexas que

podemos encontrar superf cie da terra e as suas caracter sticas aerodin micas s o

imprescind veis para descrever, modelar e prever o comportamento dos vento urbanos.

No entanto, os v rios elementos rugosos t m comportamentos aerodin micos diferentes.

S o v rios os par metros necess rios modela o num rica do vento em meio

urbano e a sua parametriza o dificultada pelos variad ssimos arranjos e disposi es

desses elementos.

Dois desses par metros s o a rugosidade (roughness lengh - z0) e o zero plane

displacement- zd. Formalmente, z0 corresponde altura a partir do solo, onde a

velocidade do vento igual a zero, se o perfil do vento tiver uma varia o logar tmica

com a altitude. Esta situa o ocorre em situa es de velocidade de vento moderado a

forte (MORTENSEN et al., 1993). um par metro relacionado com a forma, altura e

densidade de distribui o dos elementos na superf cie.

O zero plane displacement- zd outro dos par metros que tamb m depende da

volumetria dos elementos urbanos. Por defini o, representa o n vel onde o fluxo m dio

de quantidade de movimento absorvido (ROTACH, 1994). Uma forma expedita de

determinar este factor numa rea de edif cios calculando a m dia das alturas dos

pr dios. Considerando apenas um objecto que se interp e ao fluxo, localiza-se

geralmente a 2/3 da sua altura.

N o ser o apresentados aqui outros par metros aerodin micos, por serem

espec ficos de modelos n o utilizados neste trabalho. Para uma consulta mais completa

Page 54: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I Modifica o nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 48 -

sobre esses modelos e uma vasta bibliografia sobre este assunto veja-se o trabalho de

GRIMMOND e OKE (1999).

S o poss veis duas formas de abordagem ao problema da estima o de z0 e zd.

Os m todos morfom tricos (ou geom tricos) usam algoritmos que relacionam os

par metros aerodin micos com a volumetria da cidade. T m a vantagem de se poder

estimar os valores de z0 e zd onde n o h esta es anemom trica urbanas (que implicam

a instala o de instrumenta o em torres elevadas), numa malha suficientemente fina,

com resultados para determinadas direc es do vento. A sua desvantagem de serem

derivados, geralmente, de formula o obtida em t neis de vento, em condi es ideais de

fluxo sobre elementos rugosos simples (as cidades reais s o muito mais complexas).

Os m todos micrometeorol gicos (ou anemom tricos) recorrem a observa es

de velocidade do vento e turbul ncia na cidade. N o necess ria a modela o da

superf cie (os elementos rugosos podem ter v rios arranjos e padr es). A sua grande

desvantagem consiste em operacionalizar e manter uma ou v rias torres anemom tricas

dentro da malha urbana.

A rela o dos dois par metros referidos (z0 e zd), com a disposi o e altura dos

elementos e com os regimes de fluxo, s o apresentados na figura 1.15. Esta tamb m nos

oferece uma vis o geral sobre as modifica es do fluxo de vento com a densifica o da

cidade.

O aumento da densidade de constru o ( P), acompanhado pela crescente

rugosidade relativa (z0/zH), at a um ponto em que e exist ncia de mais elementos reduz

o atrito devido ao efeito de abrigo m tuo. Ou seja, passa-se de um regime de fluxo

isolado (em que cada elemento actua individualmente) para um regime de esteira, onde

os elementos est o suficientemente perto para interferirem no efeito de esteira que cada

um produz, refor ando os movimento do ar no seu interior. A partir de um valor de

densidade de constru o ( P) superior a 0,38 a nova superf cie deixa de ser rugosa

medida que diminui o espa amento entre os elementos, passando o fluxo a ser do tipo

skimming.

O fluxo passa sobre os elementos como se tratasse de uma superf cie lisa.

Inicialmente, com o aumento da densidade, a superf cie a principal respons vel pela

Page 55: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Cap tulo 1 O vento em meio urbano

- 49 -

descida do fluxo de quantidade de movimento horizontal. Entre o fluxo isolado e o

efeito de esteira uma grande parte do atrito passa a ser exercido pelos elementos rugosos

e n o pela superf cie, o que implica que aumente a altura em que o fluxo de quantidade

de movimento desce. Por isso, o valor de zd aumenta, acompanhando a altura de

quantidade de movimento descendente. WIERINGA (1993), citado por GRIMMOND e OKE

(1999), argumenta que este ponto cr tico, em que zd come a a aumentar

significativamente, ocorre quando a separa o do fluxo nos edif cios falha a recolagem,

porque entretanto reage ao novo obst culo. Este esquema, embora te rico e sobretudo

observado em conjuntos de elementos espa ados regularmente, pode ser

substancialmente diferente com outros arranjos urbanos, mais pr ximos da cidade real.

Fig. 1.15 - Rela o entre os valores normalizados de rugosidade (z0/zH) e zero plane displacement (zd/zH)e a densidade dos elementos rugosos (com zH, a altura desses elementos). P corresponde raz o entre area ocupada por cada elemento e o total da rea dispon vel ( TP AA ) e F a raz o entre a rea exposta ao

vento e o total da rea dispon vel ( TF AA ). 0f e df s o coeficientes derivados empiricamente, querelacionam z0 e zd com a altura dos elementos rugosos, sendo o primeiro 0,10 e o segundo 0,67(extra do de GRIMMOND e OKE, 1999).

Page 56: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I Modifica o nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 50 -

5.2.2 AS CLASSES DE RUGOSIDADE NAS CIDADES.

Os par metros aerodin micos que descrevem a rugosidade das cidades podem

ser calculados com mais ou menos facilidade e os resultados podem ser melhores ou

piores consoante os m todos utilizados. Mas s o descritores pontuais de certos padr es

urbanos (escala microclim tica), sendo dif cil a sua generaliza o para o conjunto da

cidade (escala regional). Efectivamente, a sua estima o para um conjunto urbano

complexo d ainda os primeiros passos com o recurso a Sistemas de Informa o

Geogr fica. Por isso, em termos pr ticos, quando se trabalha escala da cidade (com

uma multiplicidade de formas, volumetrias e padr es urbanos), o meio mais expedito

para determinar os par metros aerodin micos utilizar valores j publicados e testados,

semelhantes aos padr es urbanos procurados.

Para o caso de Lisboa, objecto de investiga o no CAP TULO 5, os modelos que

se utilizou, integrados no programa WASP, apenas necessitam do par metro z0. Por isso

compilou-se em dois quadros (1.1 e 1.2) grande parte da informa o necess ria,

utilizada nesta investiga o.

Inicialmente existe uma dificuldade que reside no facto de muitas das classes

n o apresentarem os mesmos valores consoante os autores. Note-se por exemplo os

valores de z0 para as florestas (1,0 a 2,0 m na classifica o de DAVENPORT-WIERING e

0,7 m atribu do pelo Danish Wind Industry Association, quadro 1.1). Por outro lado, a

variedade de padr es morfol gicos urbanos (densidade, porosidade, tamanho m dio das

rvores), tamb m s o factores que contribuem para o aparecimento de valores distintos.

Muitos dos trabalhos t m origem em cidades norte americanas, que s o

morfologicamente muito diferentes da maioria das cidades europeias, especialmente

Lisboa. Valores t picos de z0 no centro das cidades podem variar entre 1 m (na maior

parte dos trabalhos analisados) at valores 7 a 10 vezes superiores, como o caso de

Vancouver no Canad .

No quadro 1.1 apresenta-se uma compila o dos valores mais vulgarmente

referidos por diversos autores: as classifica es de Davenport-Wiering, do Danish Wind

Industry Association e do Ris National Laboratory, estas duas ltimas elaboradas por

Page 57: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

- 51 -

Quadro 1.1 - Valores mais utilizados nas classes de rugosidade (z0)

Davenport-Wiering Danish Wind Industry Association Risø National Laboratory (Dinamarca)

z0(m) Características da superfície Classif. Características da superfície

Classes derugosidade(EuropeanWind Atlas)

Características da superfície

2,0 Centros de grandes cidade, florestas muitoirregulares com clareiras dispersas. Caótico.

1,6 Grandes cidades com edifícios altos. 4

1,0

Cobertura regular com obstáculos degrande dimensão intercalados por espaçosabertos cujo tamanho é da ordem degrandeza da altura dos obstáculos, áreassuburbanas com edifícios, florestas emestado de maturidade.

Fechado. . Cidades.

0,8 Cidades com edifícios altos. 3,50,7 Floresta.

0,5Campos agrícolas mistos, ou grupos deárvores e arbustos isolados, pomares eprédios dispersos.

Muitorugoso. Subúrbios.

0,4Pequenos núcleos urbanos e áreasrurais com sebes altas, florestas e

terreno acidentado.3

0,3 Áreas com protecções arbustivas.

0,25Culturas agrícolas de altura variável(cereais) Obstáculos dispersos (comosebes arbustivas e vinhas).

Rugoso.

0,2

Áreas rurais com muitas casas, comarbustos e sebes arbustivas com maisde 8 metros de altura, com distâncias

de cerca de 250 metros entre si.

2,5 Áreas com muitas árvores e bosques (excepto florestas degrande densidade).

Page 58: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

- 52 -

Quadro 1.1 (continuação) - Valores mais utilizados nas classes de rugosidade (z0)

Davenport-Wiering Danish Wind Industry Association Risø National Laboratory (Dinamarca)

z0(m) Características da superfície Classif. Características da superfície

Classes derugosidade(EuropeanWind Atlas)

Características da superfície

0,10 Áreas agricultadas de culturas baixas eobstáculos ocasionais (arbustos isolados).

Rugoso/Aberto.

Idêntico à classe de rugosidade (z0)0,2 com excepção do números de

casas que diminui e a distância dassebes de aproximadamente 500

metros.

Áreas rurais de aspecto fechado.

0,055Igual aos anteriores, com menos casase distâncias das sebes de aprox. 1250

metros.1,5

0,05 Áreas rurais com aspecto aberto.

0,03 Pradarias, tundra e aeroportos. Aberto.

Áreas rurais abertas, com poucosedifícios e campos circundados porcercas e sebes arbustivas. Colinas

formando um relevo poucopronunciado.

1,0 Áreas rurais com poucos edifícios e árvores.Áreas aeroportuárias.

0,020,01 Pistas de aeroportos e áreas com relva aparada.

0,005 Praias, gelo compactado, pântanos, áreascobertas de neve.

RelevoSuave. Solo desocupado de relevo plano.

0,0024Terreno completamente aberto com a

superfície plana (áreas asfaltadas,pistas de aeroportos, relva aparada).

0,5

0,001 Áreas de relevo plano com neve.0,0003 Superfícies planas de areia.

0,0002Oceano, áreas planas cobertas de neve,

áreas planas de deserto.

Mar eoutrassup.

Planas.

Superfícies de água. 0

0,0001 Superfícies de água (lagos, fiordes e mar alto).

Page 59: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Cap tulo 1 O vento em meio urbano

- 53 -

institui es dinamarquesas. Nesse quadro, mostram-se tamb m as caracter sticas das

superf cies e a sua ocupa o.

Sendo o DWIA um padr o na ind stria ligada produ o de energia e lica, nota-

se uma preocupa o em detalhar o mais poss vel os valores para as reas rurais, n o o

fazendo com o mesmo pormenor nas reas urbanas. Isto evidencia dois factos: em

primeiro lugar, o interesse nas metodologias de estima o de valores m dios da

velocidade do vento para a estima o do potencial e lico para produ o de energia.

Evidentemente o potencial e lico maior nas reas n o constru das; em segundo lugar a

preocupa o de alguns pa ses (como os do Norte da Europa, sobretudo escandinavos)

em utilizar a energia e lica como alternativa sustentabilidade das suas unidades

agr colas. Na classifica o DWIA mostra-se igualmente as correspondentes classes de

rugosidade do European Wind Atlas, por constituir um padr o europeu na determina o

dos campos de vento em toda a Europa17.

No quadro 1.2 apresentam-se alguns valores de z0 mais frequentemente

utilizados em reas urbanas. A diversidade de valores de rugosidade nestas reas, que

v o de 0,8 metros classifica o DWIA at 10m (OKE, 1987), mostra a diversidade de

padr es urbanos.

Outros par metros aerodin micos e v rias fotografias de reas t picas nas

cidades podem ser consultados em GRIMMOND e OKE (1999).

Quadro 1.2 - Valores t picos de z0 em meio urbano

Caracter sticas da superf cie z0 (m)

Povoamento dispersoAldeias, quintas, com rvores e sebes 0,2 a 0,6

reas suburbanas residenciais de baixa densidade 0,4 a 1,2

reas suburbanas residenciais de alta densidade 0,8 a 1,8

reas urbanas de grande densidade de constru o,de edif cios com cerca de 5 andares 1,5 a 2.5

reas urbanas de grande densidade de constru o,com v rios andares > 2,5

17O European Wind Atlas publicado pela Comiss o das Comunidades Europeias e cont m, para al m deoutras informa es, uma base de dados de estat sticas do vento em mais de 200 esta es meteorol gicaseuropeias e os recursos e licos de cada estado.

Page 60: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I Modifica o nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 54 -

Por causa da dificuldade em obter os par metros aerodin micos numa malha

suficientemente fina para o conjunto de uma cidade, aconselha-se a estima o em

algumas reas amostra, t picas de determinados padr es urbanos.

Neste trabalho utilizou-se um algoritmo simples do c lculo das rugosidades para

alguns locais em Lisboa, para confirmar alguns dos valores atribu dos s classes, ou em

s tios onde persistia alguma d vida. Esse algoritmo o de LETTAU (1969), descrito

pelos autores do programa WASP:

HAShz 5,00

Sendo um m todo morfom trico, relaciona a rea exposta direc o do vento (h

a altura m dia dos edif cios considerados e S a sec o exposta), com a rea dispon vel

para cada elemento (AH). Segundo MORTENSEN et al. (1993), esta f rmula produz boas

estima es de z0 quando a rea dispon vel (AH) maior do que a rea exposta (S) e

sobrestima a rugosidade quando as duas reas s o id nticas.

Este algoritmo assume uma porosidade igual a 0, porque a maioria dos

elementos rugosos nas cidades s o s lidos. Para locais com porosidade superior, como

por exemplo uma floresta ou mata, dever ser aplicado um factor de porosidade.

6 O VENTO EM TORNO DOS EDIF CIOS E OUTROS ELEMENTOS URBANOS (ESCALA

MICROCLIM TICA).

O fluxo de ar em torno dos edif cios uma quest o, em primeiro lugar, de

an lise microclim tica usando-se, como t cnicas privilegiadas, o t nel aerodin mico de

simula o da camada limite e modelos num ricos. Por isso s o vulgarmente utilizadas

para resolverem quest es de ordem pr tica, como o efeito do vento sobre as estruturas

(cargas e vibra es) ou determinar as ac es sobre os materiais que as revestem.

Quest es ambientais, como a dispers o de poluentes em torno dos edif cios, tem

merecido uma aten o especial, n o s para conhecimento das suas causas e efeitos,

Page 61: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Cap tulo 1 O vento em meio urbano

- 55 -

mas tamb m para delinear normas de constru o preventivas desses efeitos (HOSKER,

1985).

Actualmente a modela o num rica debate-se com alguns problemas: se se

consegue facilmente modelar um par metro meteorol gico, como o vento, s com um

elemento prism tico (que representa, por exemplo, um edif cio), j se torna bastante

dif cil conseguir bons resultados com v rios elementos que podem mudar de forma e

dimens o. Por ter de se recorrer a modelos demasiadamente complexos e que requerem

recursos inform ticos pesados , uma rea de investiga o ainda em fase embrion ria,

que ainda n o est pronta para substituir os estudos em t neis aerodin micos

(PATERSON et al., 1989).

Quando se considera um elemento isolado, v rias reas s o identificadas (em

termos de direc es, velocidades e intensidade de turbul ncia) quando o fluxo encontra

um obst culo imperme vel18 (fig. 1.16): uma (A), onde o fluxo n o perturbado

(undisturbed flow) e portanto n o sofre a influ ncia do obst culo; outra (B), uma zona

de deslocamento do ar (displacement zone) que come a antes dele atingir o obst culo

por causa do aumento de press o sobre a parede.

Fig. 1.16 Movimentos t picos do fluxo de ar normal a um obst culo. (extra do de OKE, 1987).

Considerando h a altura t pica desse obst culo, esta zona tem uma dimens o

horizontal de aproximadamente 3h para montante do obst culo.

Enquanto uma parte do fluxo de ar que embate no obst culo tende a descer,

outra tende a contorn -lo (pelas laterais e por cima), atingindo a altura correspondente a

3h. Um m ximo de press o ocorre na parte superior do obst culo exposta a barlavento,

18 A impermeabilidade de um obst culo definida pela raz o entre reas abertas exposta ao vento emrela o ao total de rea. Uma barreira totalmente imperme vel, como uma parede de um edif cio, expostaao vento, tem uma impermeabilidade de 100%.

Page 62: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I Modifica o nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 56 -

diminuindo consideravelmente a velocidade do vento (facilmente demonstr vel pela

equa o de Bernoulli). Este local da parede conhecido como ponto de estagna o (fig.

1.19). Imediatamente acima dessa barreira aproxima o das linhas de corrente e o

fluxo sofre uma acelera o, mas em seguida expande e desacelera. Depois de

ultrapassada a barreira, o fluxo de ar encontra espa o dispon vel para expans o, que n o

consegue imediatamente preencher. Com a separa o do fluxo forma-se uma zona de

esteira (wake - D), com o fluxo a tomar uma direc o descendente. Neste espa o, 10 a

15 vezes superior a h aumenta a turbul ncia. Imediatamente a sotavento do obst culo a

press o diminui e tende a sugar o ar, formando-se um turbilh o a sotavento ou lee eddy

(zona de cavidade - C).

Nas partes laterais de obst culos de formas angulosas (fig. 1.17), ocorre a

separa o do fluxo, tal como nos topos. Considerando um edif cio isolado, as paredes

laterais e a sotavento s o reas de suc o (porque o ar tende a movimentar-se das altas

para as baixas press es), onde se d a dupla invers o das direc es (formando um

padr o em ferradura). Este facto respons vel pelo aparecimento de movimentos

turbilhonares no sector C (cavidade).

Fig. 1.17 Movimentos t picos do fluxo de ar normal ao obst culo (vistos no plano)(extra do de OKE, 1987).

Os perfis verticais de vento associados a este elemento simples mostram as

varia es da velocidade do ar em altura e ajudam a compreender o esquema descrito

(fig. 1.18). Antes de atingir o obst culo, o perfil logar tmico e tem a sua forma t pica

(1), que se altera substancialmente quando o fluxo passa sobre esse elemento (2).

Page 63: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Cap tulo 1 O vento em meio urbano

- 57 -

Fig. 1.18 Perfis de vento e zonas de fluxo normal a um obst culo. (extra do de OKE, 1987).

A distor o apresentada consiste num aumento significativo da velocidade

imediatamente acima do obst culo, atingindo um m ximo entre a zona de cavidade e de

deslocamento, que corresponde maior converg ncia das linha de corrente. Se

imaginarmos este bloco como sendo um edif cio, junto ao telhado h uma pequena

invers o do perfil, que corresponde a uma rea de abrandamento da velocidade. A

sotavento do edif cio (3) as linhas de fluxo divergem e a velocidade abranda. O retorno

do fluxo junto ao solo vis vel neste perfil, que corresponde sec o de maior

turbul ncia. Em (4) e (5), medida que se afasta do obst culo verifica-se um

reajustamento progressivo ao perfil pouco perturbado pelo elemento de rugosidade.

Outras formas e orienta es dos obst culos podem produzir varia es ao padr o

apresentado, tanto na simetria como na intensidade e turbul ncia do fluxo. Essas

varia es dependem da geometria dos edif cios (sobretudo da rela o entre H - a altura

e W o espa o entre os edif cios). Se a rela o H/W for inferior a 0,4 para formas c bicas

e 0,3 para edif cios alinhados, o fluxo gerado semelhante ao descrito para edif cios

isolados (isolated roughness flow). Em espa os mais fechados (H/W=0,7) geram-se

padr es mais complexos, porque a zona de esteira (Wake) de um elemento interfere com

o seguinte a sotavento. Numa rua estreita de sentido perpendicular ao fluxo dominante,

pode-se formar um turbilh o a sotavento (lee vortex) dentro da camada inferior urbana

(abaixo do n vel de topo dos pr dios), refor ada pela deflec o descendente do fluxo

que embate nas paredes a barlavento do pr dio que fecha o canyon urbano.

Movimentos ainda mais complexos podem ser gerados quando n o h um

padr o definido na malha urbana.

Page 64: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I Modifica o nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 58 -

Na figura 1.19 apresenta-se um esquema t pico, onde se verifica que em certas

sec es, como as laterais dos edif cios e as passagens inferiores a velocidade do vento

pode aumentar (chegando mesmo a triplicar) em rela o ao fluxo que passaria sobre

uma superf cie pouco rugosa, na aus ncia desse edif cio.

Fig. 1.19 Zonas de aumento da velocidade do vento ao n vel do solo, resultante da combina o deelementos urbanos com caracter sticas volum tricas distintas.

No caso em que os elementos da paisagem urbana n o t m uma permeabilidade

total, como por exemplo as zonas verdes, o efeito de barreira depende da porosidade

desses elementos (OKE, 1987).

GANDEMER (1975) apresentou uma sistematiza o da movimenta o dos fluxos

de ar sobre v rios conjuntos arquitect nicos e as suas implica es no conforto mec nico

dos indiv duos. Essa s ntese, ainda hoje largamente utilizada em manuais de

planeamento urbano, foi efectuada com modelos de situa es reais em t neis

aerodin micos. O seu intuito foi o de generalizar esses conhecimentos e evitar situa es

de desconforto por vezes esquecidas pelos arquitectos.

As imagens da figura 1.20 s o t o sugestivas que n o necessitam uma explica o

pormenorizada (remete-se para a refer ncia bibliogr fica do autor). Apenas se ret m

alguns dos aspectos mais relevantes, porque alguns dos esquemas mostrados

verificaram-se nas experimenta es efectuadas em t nel aerodin mico como o modelo

de Telheiras (CAP TULO 6) e ajudam a entender a movimenta o do fluxo de ar naquele

bairro Lisboeta.

Ponto de estagna o

Page 65: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Cap tulo 1 O vento em meio urbano

- 59 -

O efeito de barra, poder ocorrer em reas onde o vento incide num ngulo de

cerca de 45 em edif cios com uma forma de paralelep pedo extenso. Uma parte do

fluxo passa sobre o edif cio e provoca um movimento turbilhonar a sotavento, onde

poder ocorrer um aumento da velocidade do vento. Esta solu o ser , portanto, de

evitar porque pode diminuir o conforto mec nico dos indiv duos.

Em ruas onde ocorre o efeito Venturi poder verificar-se localmente um

aumento do vento (sobretudo no estreitamento da passagem). O espa o onde este efeito

se inicia dever conter elementos como rvores que reduzam a velocidade do vento e

diminuam este efeito, por vezes indesej vel.

Consoante a forma e rea do edif cio exposta ao vento formam-se sempre nas

zonas de embate anomalias positivas de press o (representadas com um sinal (+) na

figura) e negativa ( reas de suc o a sotavento). Consequentemente, em edif cios

expostos perpendicularmente ao vento podem formar-se correntes transversais na ruas

em direc o s press es mais baixas. Estes movimentos poder o ser mais complexos em

reas onde existem edif cios com diversas alturas. Os impactos negativos podem ser

minimizados se se escolher a forma do conjunto urbano de modo a que a direc o

predominante do vento n o lhe seja perpendicular.

Espa os fechados com pequenas aberturas poder o ser prop cios a circula es de

ar que n o promovem a renova o completa do ar no seu interior.

Outros efeitos, como por exemplo a abertura de passagens inferiores, ou ruas

paralelas ao vento predominante (que promovem a canaliza o do fluxo de ar e o

aumento da velocidade do vento, ou da turbul ncia) dever o ser objecto de estudo

pr vio. Tamb m os conjuntos que efectuam o efeito de abrigo, devem ser pensados em

termos de condi es de ventila o, prevendo-se espa os suficientemente amplos para

uma ventila o mais adequada.

Conjuntos arquitect nicos de geometria aerodin mica como o que apresentado

no efeito de pir mide, n o oferecem uma forte resist ncia ao vento e dissipam a energia

em v rias direc es. Apenas apresentam zonas cr ticas junto dos elementos angulosos.

Com os devidos cuidados na sua constru o s o estruturas particularmente aconselhadas

GANDEMER (1975).

Page 66: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I Modifica o nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 60 -

Efeito de barra Efeito de Venturi

h8 h

2 hAngulo deincid ncia dovento = 45

L1 L2

L1+L2>100m

h>15m

Efeito de liga es de press o

(+) (+)

(+)

(- )

Altura crescente econt nua de edif cios

Efeito armadilha

(- )

(- )

(- )

(+)

h

l < 25% doper metrol

Efeito de passagens inferiores

Efeito de canaliza o

*d

h

2 d

Efeito de esquina

e < 3 h

Efeito de pir mide

Efeito de esteira

Efeito de abrigo

z > 25 m

h

Fig. 1.20 V rios efeitos do vento em torno de conjuntos de edif cios (GANDEMER, 1975).

Page 67: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

- 61 -

CAPÍTULO 2

A IMPORTÂNCIA DO VENTO NA CIDADE: POTENCIALIDADES E LIMITAÇÕES

1. INTRODUÇÃO

O vento é um importante factor no que diz respeito à qualidade do ar, ao

conforto e à saúde humana, sendo fundamental proceder-se à avaliação dos riscos

decorrentes desta variável meteorológica no contexto urbano. Quanto à qualidade do ar

o vento é o principal factor de dispersão actuando como meio de transporte e difusão de

poluentes e componentes alérgicas (por exemplo certo tipos de pólens para alguns

indivíduos) contidas na atmosfera. As condições de maior estabilidade atmosférica são

particularmente favoráveis à concentração de emissões nocivas junto ao solo,

provenientes dos veículos automóveis, situação que actualmente é a principal fonte

geradora de poluição na cidade (ANDRADE, 1996).

No que diz respeito ao conforto e saúde humana, a influência do vento pode

fazer-se sentir como factor térmico e/ou mecânico:

a) É um elemento que atenua ou intensifica situações de conforto/desconforto

térmico, sendo a relação entre a fisiologia do indivíduo com este elemento

atmosférico dependente da época do ano, da região da Terra e do seu clima

predominante. A resposta do ser humano depende sempre da capacidade de

Page 68: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I – Modificação nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 62 -

aclimatização dos indivíduos (culturais ou naturais), que depende da raça,

da idade e do seu estado de saúde e condição física.

b) O vento actua também mecanicamente sobre os indivíduos, podendo

influenciar o seu estado psicológico, mas pode também afectar a locomoção,

sobretudo quando o ar escoa com intensidades muito fortes. Os factores de

risco e perigosidade aumentam em locais de aceleração do vento, mas

dependem também da resistência física dos indivíduos, sendo mais

vulneráveis os fisicamente menos capacitados, sobretudo crianças, idosos e

deficientes motores.

Assim, afigura-se fundamental a avaliação dos riscos decorrentes desta variável

atmosférica para a cidade e seus habitantes, sejam as condições propícias à acumulação

de poluentes (velocidades fracas) ou à queda tanto de objectos, como dos próprios

indivíduos (velocidades muito fortes, ou regime de rajadas). Se, no caso da poluição e

do conforto térmico, algum trabalho tem sido desenvolvido, o mesmo já não se pode

afirmar sobre o conforto mecânico. Não são conhecidos, até hoje, na cidade de Lisboa,

os locais críticos, ou mais propensos à queda dos múltiplos elementos que constituem o

meio físico urbano. As novas construções (sobretudo edifícios, pontes e outras

instalações temporárias, como as gruas de obras) são projectadas para poderem suportar

intensidades de vento forte sem daí advir perigo para os habitantes. Mas o mesmo já não

se poderá dizer de todas as edificações mais antigas (algumas centenárias e que

constituem a maior parte da cidade), que não são obrigadas a nenhum tipo de protecção

especial aos ventos fortes, para não falarmos daqueles que não cumprem a

regulamentação. Também não é conhecido o "estado de saúde" da vegetação arbórea da

cidade, que como se verá adiante, é um dos elementos de maior perigo para as pessoas e

bens em caso de tempestade.

Page 69: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 2 – A importância do vento na cidade: potencialidades e limitações

- 63 -

2. VENTO, QUALIDADE DO AR E POLUIÇÃO NAS CIDADES

2.1 VELOCIDADE, DIRECÇÃO DO VENTO E QUALIDADE DO AR

O movimento do ar na atmosfera ajuda a transportar e difundir os poluentes. A

difusão ocorre no sentido do escoamento do fluxo e também na direcção vertical através

da difusão turbilhonar.

A velocidade do vento condiciona o volume de ar em que os poluentes se vão

difundir e a distância de transporte. Quanto maior a velocidade do vento, maior é o

volume de ar que passa pela fonte emissora por unidade de tempo e menor a

concentração de poluentes por unidade de volume; no entanto, um aumento demasiado

da velocidade pode ter um efeito negativo na qualidade do ar ao reduzir a altura efectiva

das emissões.

A direcção do vento é o factor que determina quais os locais mais afectados

pelas emissões de diferentes fontes. Quando “observado” em plano, o vento possui

características que se traduzem em variações periódicas de direcção e velocidade.

Durante um período de uma ou mais horas, o movimento “serpenteante” do fluxo de ar

traduz-se no transporte dos poluentes, que se espalham num arco de 30 a 45º, centrado

na direcção média do vento (fig. 2.1).

Fig. 2.1 – Características das plumas de fumo observadas instantaneamente, obtidas a partir de médias de 10 minutos, e 2 horas, vistas no plano (extraído de OKE , 1987).

Page 70: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I – Modificação nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 64 -

Uma determinada direcção de vento, quando alinhada com várias fontes

poluidoras, pode ser particularmente perigosa, por dois motivos: por um lado porque

pode ocasionar um efeito cumulativo em áreas densamente povoadas e por outro porque

pode provocar reacções químicas que dão origem a poluentes secundários (OKE, 1992).

2.2 VENTILAÇÃO E TURBULÊNCIA

A dispersão dos poluentes depende também da altura e tipo da fonte emissora,

da temperatura do poluente da altura da emissão e da turbulência19 da baixa atmosfera.

Com uma maior estabilidade atmosférica (que se gera, por exemplo, com fortes

inversões térmicas) a turbulência diminui, aumentando a concentração de poluentes.

Com o aumento da velocidade do vento aumenta também a actividade turbulenta na

camada limite.

A dispersão não depende tanto das condições meteorológicas do momento mas

da sua evolução temporal. É portanto essencial considerar as condições de ventilação

como um fenómeno evolutivo, que condiciona os processos dinâmicos de dispersão e

transporte das substâncias nocivas determinando elas próprias os estados sucessivos da

qualidade do ar (BUMAN-RUFFIEUX, 1994).

Este mecanismo de melhoramento da qualidade do ar deve ser considerado a

várias escalas (global, regional e local). Os agentes susceptíveis de melhorar a qualidade

do ar são consideravelmente diferentes consoante a escala considerada, e a sua acção

pode ir no sentido do melhoramento da qualidade do ar que respiramos ou apenas numa

pequena alteração dessa qualidade.

19 A turbulência consiste na flutuação aleatória da velocidade de um fluido em torno do valor médio obtido num dado intervalo de tempo (DOMINGOS et al., 1980).

Page 71: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 2 – A importância do vento na cidade: potencialidades e limitações

- 65 -

2.3 O TRANSPORTE DE POLUENTES DE LONGO E MÉDIO CURSO.

À escala global o vento actua apenas como um redistribuidor de poluentes, já

que não elimina definitivamente as substâncias nocivas, podendo eventualmente

diminuir bastante as concentrações para níveis insignificantes (OKE, 1992). A nível

regional, o vento constitui um factor mais eficiente de transporte, uma vez que as

substâncias nocivas poderão viajar ao sabor das correntes dominantes, modificando a

qualidade do ar das regiões visitadas. A esta escala, os impactos podem-se alternar,

podendo ser positivos ou negativos consoante a direcção predominante do vento

(BUMAN-RUFFIEUX, 1994). Na região de Lisboa, tal como na totalidade do território

português, a predominância das correntes de oeste transportam geralmente “ar limpo”

do oceano. Eventualmente algumas situações de trajectória “continental” poderão

transportar alguns poluentes de origem industrial, das fontes ainda existentes sobretudo

a norte (eixo Vilafranca de Xira Carregado), a nordeste (Barreiro), ou ainda de sudeste,

proveniente da região de Setúbal.

2.4 O TRANSPORTE LOCAL DE POLUENTES.

Quanto ao transporte local de poluentes, a ventilação tem um papel muito mais

importante quando se considera a proximidade imediata das fontes de emissão. Por

exemplo as emissões devidas ao tráfego automóvel traduzem-se localmente por um

aumento das concentrações. Se, durante o período de maiores emissões, o local for bem

ventilado o efeito do vento poderá melhorar consideravelmente a qualidade do ar, ou

poderá mesmo remover as substâncias nocivas para outros locais, onde os seus efeitos

não sejam tão maléficos.

Mas a qualidade do ar depende sobretudo, como se viu, da velocidade do vento.

Os sistemas de circulação locais (brisas de mar, de montanha, drenagem do ar frio e

sistemas de ventos gerados pelas cidades) são geralmente desfavoráveis ou pouco

eficazes na remoção de poluentes, basicamente por três motivos:

Page 72: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I – Modificação nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 66 -

a) Em primeiro lugar, porque as velocidades características destes sistemas são

sempre fracas, geralmente inferiores a 4 m/s.

b) Em segundo lugar, porque constituem sistemas de circulação fechados, ou

seja uma determinada direcção do fluxo à superfície pode ser compensada

em altura por um fluxo de direcção oposta, perpetuando o transporte dos

poluentes apenas dentro desse sistema, não renovando o ar.

c) Em terceiro lugar, porque normalmente existem ritmos cíclicos diurnos e

nocturnos de direcções opostas.

Note-se que se ocorrer drenagem nocturna do ar frio que desce ao longo das

vertentes, dos locais mais elevados para os locais deprimidos (LOPES, 1994), durante o

dia o ar mais aquecido nos fundos dos vales pode ter um movimento ascendente (ventos

anabáticos).

Isto significa que, com os sistemas de brisas, as trocas de ar mais poluído com ar

limpo serão bastante reduzidas. As brisas geradas pela cidade em condições de grande

estabilidade sinóptica (em condições anticiclónicas com ventos regionais fracos),

também podem ser prejudiciais para a qualidade do ar. Neste caso, a cidade está mais

aquecida do que o campo que a circunda (ilha de calor urbano), o que induz a que os

ventos locais convirjam para o centro da cidade, um local normalmente mais poluído. A

instabilidade local provocada pelo aquecimento da cidade leva a uma circulação

tridimensional em altura dos poluentes que, à superfície, tornam a entrar na cidade. Ao

contrário dos outros sistemas de brisas, não há um movimento contrário durante uma

parte do dia, porque a cidade tem tendência a estar permanentemente mais quente.

2.5 CONDIÇÕES DE VENTILAÇÃO E QUALIDADE DO AR EM LISBOA

Numa cidade costeira e de relevo movimentado como Lisboa todos os efeitos

locais anteriormente referidos poderão coexistir. Os fenómenos de dispersão resultantes

da interacção dos fluxos atmosféricos com a superfície à escala microclimática podem

ser particularmente importantes e os seus efeitos acumulados. O núcleo mais antigo da

Page 73: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 2 – A importância do vento na cidade: potencialidades e limitações

- 67 -

cidade de Lisboa, “com um grande número de ruas estreitas, ladeadas por edifícios,

dificultam a dispersão dos poluentes, mesmo no caso em que as condições

meteorológicas o facilitam. Nos casos em que os rumos do vento e a orientação das ruas

coincidem, pode a canalização, e consequente aumento da velocidade do vento,

favorecer o transporte de poluentes” (ALCOFORADO, 1992).

No início dos anos 80, num estudo conduzido por DOMINGOS et al., determinou-

se a ocorrência média anual das classes de estabilidade atmosférica para o território

Português. Esse estudo foi baseado no método de PASQUILL-GIFFORD (posteriormente

modificado por TURNER), assente nas observações meteorológicas correntes -

velocidade do vento, insolação diurna e nebulosidade nocturna, com base em dados de

observações diárias de 4 anos. Os autores concluíram que, em Lisboa, ocorrem 58 %

casos de atmosfera neutra (geralmente correspondem a ventos fortes, que ocasionam o

transporte lateral, mas não necessariamente a dispersão), 28 % de casos de estabilidade

e 14 % de casos de atmosfera instável, situação esta claramente favorável à dispersão de

poluentes.

Em Lisboa, o Inverno é a estação do ano em que ocorrem as maiores

concentrações de poluentes, sobretudo quando a atmosfera é estável. O aumento da

nebulosidade associada a ventos fortes e precipitação correspondem a diminuição da

poluição. No Verão os valores críticos ocorrem em situações de estabilidade

atmosférica, precedidas por situações de calma nas 24 horas antecedentes.

Noutro estudo sobre a poluição na cidade de Lisboa, é evidente a relação entre

níveis elevados de poluição atmosférica e valores baixos de velocidade do vento

(inferior a 2 m/s na estação de Lisboa/Portela) em situações de maior estabilidade

vertical da atmosfera. Apesar dos níveis de poluição referentes ao período de 1989/93,

não terem sido muito elevados em Lisboa, há fortes possibilidades de ocorrência de

picos de poluição que ultrapassam os limites legais, situação que se deverá ter vindo a

agravar nos últimos anos, pelo aumento incontrolado do tráfego automóvel na cidade

(ANDRADE, 1996).

Page 74: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I – Modificação nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 68 -

3. O VENTO COMO REGULADOR DO CONFORTO TÉRMICO HUMANO

O conforto pode ser definido como o conjunto de condições em que a mente

humana expressa satisfação pelo ambiente térmico (ASHRAE- American Society of

Heating, Refrigerating and Air-Conditioning Engineers, 1984, citado por PARSONS,

1993), ou como o estado mental de um indivíduo, quando os seus mecanismos

fisiológicos e termorregulatórios estão minimamente activos e quando psicologicamente

se considera satisfeito com o ambiente térmico (AULICIEMS, 1997).

O vento é uma das variáveis meteorológicas que mais influenciam o conforto

humano. No entanto, não pode ser avaliado isoladamente e o modo como actua sobre o

conforto dos indivíduos é muito diferente consoante a fisiologia de cada um, e o clima

do local.

3.1 ALGUNS ASPECTOS DA FISIOLOGIA HUMANA E O CONFORTO TÉRMICO.

A condição primordial de saúde e bem estar do ser humano é a manutenção de

uma temperatura corporal constante, cerca de 37ºC. Para isso, é necessário manter o

equilíbrio energético do corpo humano, à custa das variáveis que caracterizam a

envolvente ambiental dos seres vivos, sobretudo a temperatura do ar, a humidade, a

radiação e a velocidade do vento (FERNÁNDEZ GARCIA, 1996).

A entrada básica de energia no sistema corpo/ambiente é a produção metabólica

de calor (taxa metabólica20 menos a eficiência mecânica21), enquanto as restantes

variáveis que actuam sobe o corpo humano22 correspondem a vias de transferência de

calor entre o corpo humano e a atmosfera. A termorregulação controla este sistema com

vista a manter a temperatura corporal constante. A temperatura corporal é,

normalmente, mais elevada do que a temperatura ambiente e o equilíbrio do sistema é

mantido através de transferências de calor para a atmosfera por convecção, radiação e

20 Referente à produção de energia por via metabólica. 21 Consumo de energia para a execução do trabalho físico, 22 Balanço de radiação, fluxos turbulentos de calor (sensível e latente por difusão do vapor de água a partir da pele e evaporação do suor) e fluxo respiratório de calor.

Page 75: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 2 – A importância do vento na cidade: potencialidades e limitações

- 69 -

evaporação (ANDRADE, 1998). Quando a temperatura ambiente é mais elevada do que a

temperatura corporal, a termorregulação é efectuada sobretudo pela dilatação dos vasos

sanguíneos (que aumentam o fluxo de sangue junto à pele) e pela sudação (libertação de

água na pele disponível para evaporação, dependente das condições ambientais). As

perdas por evaporação podem efectuar-se ao nível pulmonar ou através da pele. Quando

a evaporação é muito rápida, a quase totalidade do calor latente de evaporação provém

do interior do organismo o que pode determinar a perda de grandes quantidades de calor

e um arrefecimento corporal. Se a quantidade de suor for superior à água que se

evapora, o líquido fica retido na pele, o que dificulta a transferência de calor do interior

do corpo para a superfície e parte do calor necessário para evaporação provém do ar em

contacto com o corpo e não deste, o que dificulta o arrefecimento corporal. A

capacidade de evaporação e arrefecimento através da sudação corporal depende da

roupa que o indivíduo veste (que reduz ou aumenta a superfície evaporativa), da

humidade e da velocidade do ar, que aumenta a dissipação de energia (acelerando a

evaporação e a convecção), sempre que a temperatura da pele é inferior à do ambiente.

Quando a temperatura do ar é superior a 40ºC a movimentação do ar pode aumentar a

sensação de calor (FERNÁNDEZ GARCIA, 1996).

Uma das reacções termorregulatórias de resposta ao frio é a vasoconstrição dos

vasos sanguíneos, de modo a reduzir o fluxo de sangue junto à pele. De um modo geral,

o abaixamento da temperatura dos tecidos provoca entorpecimento corporal e um

decréscimo da destreza e da força. Ao frio, o corpo responde com arrepios (resposta

apenas temporária), e mais eficazmente com o aumento da produção de calor

metabólico - dependente da nutrição e do desenvolvimento de mecanismos de

isolamento da pele. Mostram-nos isso estudos com povos índios do Norte da América e

Esquimós que têm uma taxa metabólica maior que os Caucasianos. Em relação a este

grupo, os Aborígenes Australianos possuem uma pele mais isolada, com propriedades

que permitem reduzir em cerca de 30 % a perda de calor do interior do corpo. A

capacidade de aclimatização deste grupo ao calor é extraordinária, já que consegue ter

taxas de sudação duas vezes superiores aos Europeus (ROSEMBERG, 1983). A influência

da velocidade do vento sobre o conforto térmico é assim um factor bastante complexo e

difícil de interpretar no contexto do conforto térmico e depende não só da interacção

Page 76: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I – Modificação nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 70 -

com outras variáveis climáticas, mas também da capacidade de resistência física dos

indivíduos, do seu estado de saúde e da sua origem.

3.2 O VENTO E O CONFORTO TÉRMICO EM AMBIENTES QUENTES: DOIS EXEMPLOS

MEDITERRÂNEOS

Num estudo sobre o conforto térmico de Verão em Lisboa (ANDRADE, 199823),

foi observado que a elevada frequência de ventos de Norte nesta altura do ano é um

importante factor de limitação do desconforto devido ao calor, tanto diurno como

nocturno. As elevadas velocidades de vento poderão, no entanto, originar algumas

situações de desconforto associadas a valores de temperatura fisiológica relativamente

baixos (desconforto moderado). Nos casos em que em que a temperatura elevada se

associa à baixa velocidade do vento, verifica-se a ocorrência de valores elevados de

temperatura fisiológica, antes da influência moderadora da brisa, que transporta ar mais

fresco do estuário do Tejo ou do oceano para a cidade. O estudo das brisas do Tejo e do

Oceano e as áreas da cidade que afectam torna-se assim importante, sobretudo para o

reconhecimento dos locais que, do ponto de vista térmico, são mais confortáveis no

Verão.

No final da tarde desses dias de Verão a aceleração do vento, geralmente de

Norte, provoca uma diminuição acentuada da temperatura fisiológica.

As situações nocturnas de maior desconforto devido ao calor ocorreram também

em situações de calma, ou vento muito fraco de Norte (ANDRADE, 1998).

Na Grécia, outro país mediterrâneo onde se tem estudado a influência das

variáveis ambientais no conforto humano e onde ocorrem frequentes vagas de calor no

Verão, todas as regiões que se situam abaixo dos 600m de altitude possuem elevados

23 Nesse trabalho foi utilizada a PET (Physiological Equivalent Temperature ou temperatura fisiológica), para caracterizar bioclimaticamente 17 Verões (entre 1981 e 1997) em Lisboa. A temperatura fisiológica permite avaliar através de uma escala em graus centígrados, o efeito das variáveis atmosféricas sobre o conforto e é definida como a temperatura do ar que, numa situação de interior, com um conjunto de condições atmosféricas, resulta na mesma resposta fisiológica que um dado ambiente térmico exterior. Os valores são calculados para um indivíduo padrão com um fato completo (isolamento térmico de 0,9 clo) e uma actividade ligeira, com uma produção metabólica de 80 W m-2(ANDRADE e LOPES, 1999).

Page 77: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 2 – A importância do vento na cidade: potencialidades e limitações

- 71 -

valores de stress térmico (desconforto fisiológico devido ao calor, ou ao frio) no mês de

Julho. No entanto, as ilhas do mares Egeu e Jónico possuem comparativamente valores

mais baixos, devido respectivamente aos ventos Etésios24, e aos sistemas regionais de

ventos que se desenvolvem no mar Jónico (MATZARAKIS et al., 1999).

3.3 O VENTO E O CONFORTO TÉRMICO EM AMBIENTES FRIOS.

Se nos ambientes quentes (ou em locais com uma estação quente) a humidade, a

radiação solar e o vento são os factores mais importantes para o conforto humano, nos

ambientes frios (ou com uma estação fria) as baixas temperaturas e o vento são

determinantes.

Um dos índices mais utilizados em ambientes frios é o Wind Chill. Obtido

experiementalmente pela primeira vez em 1945 por SIPLE E PASSEL a partir da perda de

calor de um recipiente de água não isolado, em condições “Antárticas”, este índice

relaciona a temperatura com a velocidade do ar e exprime a perda de calor corporal por

unidade de superfície de pele, estimando a taxa de arrefecimento do corpo humano,

naquelas condições. Segundo a equação proposta, a perda de calor corporal atinge um

máximo com uma velocidade de vento cerca dos 25 m/s.

Pelas condições em que foi obtido, apenas tem sido utilizado com algum sucesso

em países com estações frias, intensas e prolongadas, do Norte da Europa e da América,

onde é diariamente divulgado. Várias adaptações a este índice tem sido propostas ao

longo dos anos, sendo actualmente o Wind Chill Equivalent Temperature o mais

utilizado para exprimir a sensação de desconforto. Com este índice pretende-se fazer

uma correcção para um valor de temperatura equivalente à que seria necessária para

manter as capacidades térmicas de um indivíduo, mas sem movimento do ar. Por

exemplo, para uma taxa metabólica de 2 W m-2 e um vento de 0,28 m s-1, o decréscimo

24 Ventos frescos e relativamente secos que têm origem na confluência entre o movimento ciclónico da depressão asiática, por vezes centrada no planalto Tibetano e as altas pressões subtropicais com limite oriental na região Balcânica, conferindo uma trajectória ao vento de Norte e Noroeste sobre o Mar Egeu.

Page 78: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I – Modificação nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 72 -

térmico devido ao vento é de cerca de 7,2ºC. Uma pessoa que sinta conforto ao ar livre,

em condições de ausência de vento e a uma temperatura de 20ºC, sentir-se-ia

desconfortável se o vento aumentasse para um valor tal que permitisse a perda de 1

W m-2 de taxa metabólica corporal e assim a temperatura equivalente descesse para

12ºC. Este índice é considerado mais correcto do que o Wind Chill porque é tomado em

conta o factor de isolamento da roupa. No entanto, a sua operacionalização não tem sido

efectivada por ser mais complexa que o original. Outros índices têm aproveitado os

conceitos da Wind Chill Equivalent Temperature, embora incluindo outros parâmetros

como a radiação solar (PARSONS, 1993).

Na interpretação dos valores destes índices deve ter-se em conta que a perda de

calor por uma pessoa exposta ao frio depende também do tipo e quantidade de roupa

que se usa. O conforto humano depende assim mais da sensação térmica nas

extremidades expostas do que do balanço energético total do corpo. Mesmo quando o

corpo está protegido, o calor é mais rapidamente dissipado a partir dos dedos do que do

interior do corpo.

3.4 O VENTO E O CONFORTO TÉRMICO DE INVERNO NUM VALE A NORTE DE LISBOA

Apesar de na região de Lisboa não se registarem períodos longos de frio intenso,

podem ocorrer alguns episódios frios, devidos normalmente a advecções de ar polar ou

árctico sobre a Península Ibérica. Em Lisboa, as temperaturas mínimas mais baixas

registadas nos meses mais frios de Dezembro a Fevereiro podem descer a 4 ºC,

enquanto a mediana das temperaturas mínimas ronda os 8 ºC (RAMOS, 1986). No

princípio do mês de Janeiro, a mediana tem 15% de probabilidade de ultrapassar os

10ºC e a mesma probabilidade de ser inferior a 4ºC (ALCOFORADO, 1992). Na presença

destes valores e de vento relativamente forte não serão de excluir situações em que na

cidade possam ocorrer sequências de dias em que o desconforto térmico devido ao frio e

ao vento seja de negligenciar.

Numa área urbanizada a Norte de Lisboa (Caneças), foi realizado um estudo

sobre a influência da radiação e do vento no conforto térmico humano, durante uma

Page 79: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 2 – A importância do vento na cidade: potencialidades e limitações

- 73 -

noite de Inverno (13 de Fevereiro de 1999), tendo-se utilizado a já referida temperatura

fisiológica (ANDRADE e LOPES, 1999). Durante a noite (típica de arrefecimento

radiativo, sem nebulosidade, e vento moderado de Nordeste), foi verificado que a

temperatura fisiológica foi sempre inferior à temperatura do ar, devido ao vento e às

temperaturas de superfície. O centro da localidade apresentou a temperatura fisiológica

mais elevada, tendo contribuído para isso os baixos valores de radiação em ondas

longas e a diminuição do vento com a rugosidade do casario.

4. OS VENTOS MUITO FORTES COMO FACTOR CLIMÁTICO DE RISCO NAS CIDADES

Os órgãos de comunicação social, sobretudo a imprensa escrita constituem na

nossa sociedade um meio privilegiado de difusão de informação, sobretudo porque ela é

dada a cada momento, mantendo os cidadãos informados sobe o que se passa no mundo.

As grandes catástrofes naturais e, no caso que nos interessa, as adversidades causadas

por uma atmosfera global em nítida mudança, detêm um espaço cada vez maior nos

meios de comunicação, ao ponto de por vezes serem banalizadas ou, pelo contrário,

incessantemente noticiadas. Com a banalização da Internet os principais jornais

portugueses e mundiais disponibilizam gratuitamente toda a informação essencial, nos

momentos imediatos à ocorrência de fenómenos atmosféricos extremos. Durante alguns

anos (entre Outubro de 1999 e Janeiro de 2002) foi recolhida a informação de última

hora sobre os eventos atmosféricos extremos que por esse Mundo acontecem. Neste

capítulo, apresentam-se alguns factos noticiados nas edições electrónicas dos jornais

mais prestigiados tanto a nível nacional, como por exemplo o “Público”, o “Diário de

Notícias” e o “Jornal de Notícias”, como internacional, - “Le Monde Edition

Electronique”, “New York Times on the Web”, “El Pais Digital”. Também foram

recolhidos algumas reportagens de outros media, como a “TSF online” e a “BBC News”.

Este tipo de informação, bastante sujeita a timings apertados, que nem sempre

permitem a sua confirmação por parte do jornalista (que tem pouco interesse em fazê-lo,

depois da notícia deixar de ter interesse para o grande público), deve ter um tipo de

tratamento cuidado, confirmando-se a fidedignidade das fontes e dos factos em si

Page 80: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I – Modificação nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 74 -

(filtrando-se aquilo que não parece verosímil), de modo a que ela se torne uma

importante matéria de reflexão.

4.1 AS TEMPESTADES QUE "CHOCARAM" A EUROPA EM DEZEMBRO DE 1999

“Uma tempestade com algumas características muito semelhantes às dos

trópicos atravessou o Norte da Europa, do Reino Unido à Alemanha, causando mais de

50 mortos, centenas de feridos e imensos estragos materiais. A região de Paris foi a que

mais sofreu, com rajadas que em alguns pontos atingiram os 200 quilómetros por

hora”. Foi com esta manchete que a edição electrónica do jornal “Público” fazia a sua

edição de 27 de Dezembro de 1999, aludindo a uma aldeia gaulesa da ficção desenhada,

e comparando-a à cidade de Paris: “os parisienses vão ter dificuldade em esquecer o

que aconteceu na noite de sábado e ontem de manhã, quando o céu lhes caiu

literalmente sobre a cabeça”. E a notícia avançava com algumas estatísticas sobre as

consequências da tempestade, que os meteorologistas da Météo France qualificaram de

“histórica e excepcional”: após o primeiro dia registaram-se 27 mortos, 20 feridos

graves, milhares de árvores centenárias literalmente arrancadas e uma estimativa entre

800 mil e 1,5 milhões de lares sem energia eléctrica. O tráfego aéreo, ferroviário e

rodoviário foi completamente parado durante vários dias. Seis dos feridos muito graves

encontravam-se em bungalows instalados no “Parque Euro Disney”, que foram

“esmagados” por árvores que se abateram sobre eles.

Fig. 2.2 – Paris depois da tempestade de Dezembro de 1999. "Milhares de árvores foram literalmente

arrancadas pelo vento".

Page 81: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 2 – A importância do vento na cidade: potencialidades e limitações

- 75 -

“Na Normandia, não tinham conta as habitações sem telhados, as estradas

cortadas, as áreas inundadas e as árvores derrubadas. Na região leste do país, o

tráfego ferroviário foi também interrompido entre Nancy e Estrasburgo, e três aviões

de pequeno e médio porte foram virados pelo vento no aeroporto de Metz” (Jornal

“Público” de 27 de Dezembro de 1999).

Mas a tempestade fez numerosas vítimas noutros países. Na Suíça as autoridades

confirmaram 11 mortos, muitos deles automobilistas esmagados pela queda de árvores.

Nas áreas montanhosas, os ventos atingiram velocidades entre 180 e 220 km/h. Na

Alemanha a tempestade fez 15 mortos e numerosos feridos “nas regiões de Baden-

Würtemberg (na região sudoeste), Baviera (no sul) e Renânia-Palatinado (no oeste),

quase todos também atingidos por árvores arrancadas pelo vento, que chegou a atingir

213 km/h na região da Floresta Negra. Muitas linhas de alta tensão foram cortadas por

árvores e o fornecimento de electricidade foi interrompido em várias zonas. Um Natal

“negro”, sobretudo para os habitantes das localidades por onde esta forte tempestade

passou.

A maior parte das vítimas tiveram, como principal causa de morte, o

esmagamento devido a queda de árvores, mas foram também noticiadas algumas

vítimas devido a queda de chaminés, gruas e andaimes de obras, elementos

preponderantes nas cidades por onde passava a tempestade.

“Na Suíça, uma mulher faleceu depois de ter sido atingida por uma árvore, no

cantão de Berna, e uma outra morreu também atingida por uma árvore, no cantão de

Appenzell. Duas outras pessoas faleceram no cantão de Zurique, uma das quais

apanhada no interior do seu carro, que foi atingido por uma árvore....Em França, o

número de mortes poderá ainda aumentar, mas a região mais afectada foi a de Paris,

onde dois automobilistas morreram devido à queda de árvores sobre os seus carros. O

corpo de um homem foi encontrado nos escombros de uma casa, depois da queda de

uma chaminé causada pela tempestade...Um outro homem foi morto nos lagos Suíços,

em Versalhes, por detrás do palácio, devido à queda de uma árvore. Nos jardins do

Palácio de Versalhes, um dos locais turísticos mais visitados da região de Paris, quatro

mil árvores foram arrancadas pela tempestade. No total o “Office national des forêts”

Page 82: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I – Modificação nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 76 -

estimava 60 00025 caídas naquela cidade (Le Monde édition électronique de 28 de

Dezembro de 1999). A violência dos ventos...atingiram velocidades entre os 140 e os

160 quilómetros/hora...” (“Público” de 27 de Dezembro de 1999).

A edição electrónica do jornal “Le Monde” fazia uma resenha ainda mais

dramática sobre os acontecimentos que devastaram parte da Europa Ocidental e Central:

“Le vent est arrivé par l'ouest, samedi 25 décembre. Les départements

normands (Manche, Calvados, Orne, Eure, Seine-Maritime) ont été les premiers

touchés. Toits arrachés dans des hangars agricoles, des fermes, des habitations, arbres

déracinés : la région offrait, lundi 27 décembre, un spectacle de désolation. Sur le pont

de Normandie, les bourrasques de vent ont atteint la vitesse de 216 kilomètres à

l'heure“…. Les réseaux électriques ont été les premiers à souffrir : 30 000 foyers ont été

privés d'électricité dans la Nièvre, 60 000 dans l'Yonne, 30 000 en Côte d’Or et 16 000

dans le Jura, où le préfet a déclenché le plan « électro-secours ». Un peu plus au nord,

c'est le plan Orsec qui a été mis en oeuvre dans quatre départements du Grand Est :

Meurthe-et-Moselle, Marne, Haute-Marne, Vosges, où 40 à 80 % des foyers ont été

privés de courant, et la majeure partie du réseau routier a été endommagée. Dans les

Vosges, 18 des 21 postes de haute tension étaient hors d'usage dimanche soir. Ces

coupures ont provoqué des pannes dans certaines stations de pompages et privé d'eau

plusieurs agglomérations. Des trains sont restés bloqués sur les voies. Des maisons de

retraite et des maternités se sont trouvées privées de chauffage“.

No Sul da França também se fizeram sentir os efeitos nefastos desta tempestade

excepcional: “Si le nord du pays a été le plus dévasté, la tempête a été ressentie

jusqu'au sud. Arbres déracinés dans les Alpes-Maritimes, voitures renversées et pylônes

arrachés en Corse” (Le Monde, de 27 de Dezembro de 1999).

No dia 28 de Dezembro a imprensa dava conta de mais uma dezena de mortos

em França sobretudo devidas a árvores "que esmagam as pessoas nas ruas ou desabam

sobre os telhados de casas menos resistentes. As obras são áreas de grande risco.

Gruas de obras desabaram; dois trabalhadores da construção civil morreram

esmagados por uma parede. Até foi relatada a morte de uma pessoa atingida em

25 Número talvez inicialmente exagerado pelos meios de comunicação, mas que mostram o dramatismo decorrente desta situação.

Page 83: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 2 – A importância do vento na cidade: potencialidades e limitações

- 77 -

cheio por um capacete de protecção usado pelos trabalhadores da construção. A

devastação de cidades como Paris é quase total.” ("Público" de 28 de Dezembro de

1999).

O balanço final das vítimas era catastrófico: aos cinquenta mortos em França,

dever-se-iam adicionar trinta e um no resto da Europa.

Na origem desta tempestade (uma das mais intensa que assolaram a Europa nos

últimos 100 anos), estão efectivamente duas depressões: a primeira (a 26 de Dezembro

de 1999) que atravessou rapidamente o Norte do território Francês ao longo do paralelo

49º N. “Cette dépression qui touche le Finistère le 26 décembre vers 2 h locales se situe

sur Strasbourg aux environs de 11 h, elle s'est donc déplacée à environ 100 km/h”.

Outre les vents exceptionnellement fort mesurés dans l'intérieur des terres, cet ouragan

est exceptionnel par le creusement de la dépression qui s'est accentué sur terre, en

raison probablement d'une interaction forte avec les courants jets d'altitude qui étaient

proches de 400 km/h à 9000 m d'altitude.” (Página Internet da Météo France).

Uma segunda depressão surgiu no sul da Bretanha na manhã do dia 27 com um

núcleo central com 965 hPa. A Météo France dava conta de alguns valores de

velocidade de vento registados durante os dias das tempestades. Dia 26 a estação de

Paris/Montsouris registou 169 km/h; Orly: 173 km/h; Colmar: 165 km/h; Estrasburgo:

144 km/h. No dia 27: La Rochelle: 151 km/h; Biscarosse: 166 km/h; Cap Ferret: 173

km/h; Bordéus: 144 km/h; Clermont-Ferrand: 159 km/h.

4.2 BALANÇO ECONÓMICO, SOCIAL E AMBIENTAL DAS TEMPESTADES DE

DEZEMBRO DE 1999 EM FRANÇA

É impressionante: só na região de Paris e Ile-de-France foram confirmados 11

mortos e uma centena de feridos. O património cultural foi bastante afectado e a

reconstrução de alguns monumentos (Petit Palais, Notre Dame e a Casa de Balzac)

iriam consumir qualquer coisa como 450 milhões de Francos. Para reparar o Palácio de

Versalhes estimaram-se gastos na ordem 230 milhões. Oitenta lugares de cultura e 520

Page 84: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I – Modificação nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 78 -

estabelecimentos escolares ficaram seriamente danificados. Os maiores estragos

estenderam-se a 540 parques e jardins, aos aeroportos de Orly e Roissy, às redes

ferroviárias e de auto-estradas que ficaram impraticáveis. Várias centenas de milhares

de habitantes de Paris e arredores ficaram privados de rede eléctrica e telefones. Na

cidade, 6000 árvores arrancadas e 7492 em Versailles (Geo, nº253 de Março de 2000).

Para termos uma ideia da frequência deste tipo de tempestades na Europa,

refiram-se as palavras do meteorologista norte americano Todd Miner, da Pennsylvania

State University citado pelo New York Times de 29 de Dezembro de 1999 (ed. elec.):

“Sunday's storm, in terms of wind strength and damage inflicted, was a "one-in-50-year

event," but that its quick succession by an equally powerful storm in nearly the same

area could be expected only "once in a hundred" years”.

4.3 BREVE BALANÇO DAS TEMPESTADES NA EUROPA NOS ÚLTIMOS 20 ANOS

Esta situação de fortes tempestades não foi única: na sua edição electrónica de

27 de Dezembro de 1999, o jornal "Le Monde" publicava um resumo das mais nefastas

dos últimos 20 anos.

“Dans la nuit du 15 au 16 octobre 1987, les côtes ouest de l'Europe avaient été

balayées par une tempête qualifiée de séculaire. Les vents avaient atteint 220 km/h à la

pointe du Raz (Finistère). Cinq jours plus tard, 100 000 foyers de Bretagne et de Basse-

Normandie étaient toujours privés d'électricité. Le bilan s'élevait à quatre morts. Plus

meurtrières furent les tempêtes qui frappèrent l'Europe durant l'hiver 1989-1990. On

dénombrait 20 morts et disparus après un premier épisode dépressionnaire en

décembre. Le 25 janvier 1990, une nouvelle tempête, accompagnée de rafales de vent

dépassant 180 km/h, causait une centaine de morts. Le 3 et le 14 février, puis du 26

février au 1er mars, l'Europe était à nouveau balayée. Au total, on comptait près de 200

morts en Europe, dont plus de 80 en France“.

Page 85: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 2 – A importância do vento na cidade: potencialidades e limitações

- 79 -

4.4 OS VENTOS MUITO FORTES NOS EUA: UM PAÍS HABITUADO AOS FENÓMENOS

CLIMÁTICOS EXTREMOS

As catástrofes naturais relacionadas com os ventos extremamente fortes

provocadas por furacões e outras tempestades tropicais, e tornados nos EUA têm

ocorrido com grande frequência e intensidade. “Extreme winds are responsible for this

country’s highest average annual loss of life from natural hazard incidents, far

surpassing earthquakes and other natural hazards.” (AMERICAN ASSOCIATION FOR WIND

ENGINEERING, 1997). Só o furacão Andrew (um dos mais devastadores da história

daquele país em 1992), causou perdas na ordem dos US$30,000,000,000, dos quais,

metade foram perdas directas pagas pelas companhias de seguros. O mesmo relatório da

AAWE refere que, em média, perdem-se cerca de 350 vidas por ano nos EUA,

considerando os valores desde que há registos até ao final dos anos oitenta. Prevê-se que

as perdas por causa dos ventos fortes “deverão aumentar devido à percentagem

crescente de área ocupada pelo Homem e ao facto das suas estruturas continuarem

também a crescer; o uso de novas técnicas de projecto e o recurso a novos materiais

resulta em estruturas e edifícios maiores, mais leves e com amortecimentos mais

pequenos; o vidro e os materiais plásticos cobrem áreas cada vez maiores das novas

construções e o número de casas pré-fabricadas (segundas residências) tem crescido em

flecha” (CERMAK, citado por SARAIVA, 1983).

4.5 TEMPESTADES E VENTOS FORTES EM PORTUGAL

Embora o nosso clima seja “bem comportado”, têm também ocorrido alguns

episódios de ventos fortes com consequências graves para as populações urbanas. Está

bem presente na memória de todos o vendaval dos últimos dias de Dezembro de 1981,

com velocidades de rajada na ordem dos 100 a 120 km/h, responsável por elevados

prejuízos materiais e por uma dezena de vidas humanas (SARAIVA, 1983).

Mais recentemente ocorreram também outros eventos graves: por exemplo entre

os dias 20 e 24 de Outubro de 1999, as rajadas de vento atingiram os 90 km/h. No dia

Page 86: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I – Modificação nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 80 -

24, uma árvore caiu em cima de uma viatura ligeira ferindo duas mulheres (Diário de

Notícias).

Na sua edição de 26 de Junho 2000 o jornal “Público” noticiava com a manchete

“Minitornado Varre Grande Lisboa”, a ocorrência de vento muito forte com rajadas de

80 km/h que, para “além de assustarem muita gente e de terem levado ao encerramento

temporário do tráfego de motorizadas na Ponte 25 de Abril, provocaram um ferido em

estado grave. A queda de uma pernada de uma árvore atingiu uma mulher provocando-

lhe fracturas múltiplas”. Nestes dois últimos casos, as rajadas máximas de 80 a 90 km/h

são valores que têm um período de retorno inferior a 2 anos na cidade de Lisboa,

enquanto o episódio de 1981 esse período estatístico é de cerca de 7/8 anos (BORGES,

1971, p.273). Não estamos, portanto, a citar eventos absolutamente excepcionais.

Em Fafe, no dia 5 de Novembro de 2000, um automobilista morreu na sequência

de uma queda de uma árvore, devido aos de ventos fortes e à chuva intensa que assolou

o norte e o centro do País. Em Viseu ocorreu um acidente com dois feridos ligeiros

consequência da queda de duas árvores ("Público" de 7 de Novembro de 2000).

Dezembro de 2000: rajadas de vento de 120 km/h e chuvas intensas fizeram

estragos um pouco por toda a região algarvia, com especial incidência na zona do

sotavento. “Os fortes ventos, para além de derrubarem árvores, também arrancaram

telhas em quatro habitações em Tavira.” (“Público” de 23 de Dezembro de 2000).

Em Outubro de 2001, o vento forte provocou também a queda de cerca de uma

dezena de árvores, sobretudo na “zona alta” da cidade de Lisboa, nomeadamente nas

avenidas de Roma, do Brasil, Rio de Janeiro e Estados Unidos da América, com danos

em diversos automóveis (“Público” de 29 de Outubro de 2001).

4.6 E SE UM DIA O “CÉU NOS CAIR EM CIMA DA CABEÇA”?

É claro que as escalas de intensidade dos fenómenos climáticos extremos que

ocorrem no continente americano, sobretudo o vento forte, é muito superior às

produzidas pelas depressões associadas à passagem da frente polar, que assolam a

Europa Ocidental. Mas o clima também está a mudar prevendo, todos os estudos, um

Page 87: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 2 – A importância do vento na cidade: potencialidades e limitações

- 81 -

aumento na frequência e intensidade dos fenómenos extremos nas latitudes médias

(IPCC 1997) e também no território de Portugal Continental (SANTOS et al., 2001), fruto

do suposto aquecimento global.

E se as depressões que provocaram a devastação na Europa em Dezembro de

1999 descessem 8º em latitude? Não estaremos nós também, tal como o resto do

Planeta, a verificar a concentração de população em torno das grandes cidades, no nosso

caso junto do litoral, criando-se novas urbanidades construídas com materiais menos

resistentes devido à forte pressão do mercado urbanístico, em muitos casos desregrado?

Os ventos extremos, entendidos aqui como fenómenos atmosféricos anormais e

cuja velocidade atinge valores absolutamente excepcionais - como aqueles que

sopraram na Normandia e em Paris em Dezembro de 1999, na ordem dos 200 km/h, são

pouco frequentes. No entanto, pelo rasto de devastação que deixam atrás de si merecem

um estudo aprofundado, não só porque as cidades são locais particularmente vulneráveis

a este tipo de fenómeno atmosférico, mas também porque elas são “pensadas” para

situações “estáveis”, sem terem em conta possíveis riscos climáticos extremos, do tipo

dos que aqui se abordaram.

5. O VENTO MUITO FORTE: FACTOR DE ANSIEDADE

Desde Hipócrates que se tem tentado demonstrar a influência do tempo na saúde

e na disposição humana (PARSONS, 1993). Alguns autores têm sugerido que certos

parâmetros climáticos são factores de ansiedade, influenciando as taxas de suicídio e

induzindo o aparecimento de psicoses, alcoolismo e aporte calórico. Tempestades e

ventos fortes podem produzir irratibilidade, impaciência, nervosismo e pessimismo

(MILLS, 1939 e LYNN, 1991, citados por PARSONS, 1993). Alguns “ventos quentes”, do

tipo “Föhn” que ocorre em vários locais do mundo, como por exemplo em Innsbruck,

na Suíça, têm sido associados ao aumento das taxas de suicídio, sendo a causa provável

o aumento de iões positivos na atmosfera. Este fenómeno parece desencadear outros

sintomas menos graves nalgumas pessoas, como dores de cabeça, obstrução nasal, dores

de garganta, rouquidão e tonturas. Quando é restabelecido o valor normal de iões

Page 88: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I – Modificação nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 82 -

positivos na atmosfera estes sintomas desaparecem (RICHARDSON et al., 1968, citado por

ROSEMBERG, 1983).

Mas apesar destes factores serem empiricamente reconhecidos, testar estas

hipóteses e reconhecer os mecanismos atmosféricos, que alteram a fisiologia e o

comportamento humano é uma tarefa muito difícil. De qualquer modo, nas relações

entre os parâmetros atmosféricos, nomeadamente os ventos fortes e certas atitudes

comportamentais (depressão, agressão e outras reacções psicológicas), terão maior

importância as características dos indivíduos do que o efeito do tempo atmosférico por

si só (PROVINS, 1966, citado por PARSONS, 1993).

O vento muito forte poderá ser um factor de ansiedade para a maior parte dos

habitantes das cidades, sobretudo se outros factores condicionarem a atitude das pessoas

perante as intempéries. No dia 7 de Dezembro de 2000, era noticiado que “Lisboa e

Porto viveram um pesadelo como há muito tempo não lhes acontecia. Os repetidos

avisos de mau tempo e de agravamento da situação ao longo de todo o dia e a

expectativa de que tudo se poderia acentuar com a chegada da noite deixaram a

população em estado de compreensível ansiedade... Instalado o alarme no país, o

Grande Porto passou uma tarde de expectativa...Um boato, lançado a meio da tarde,

fez com que a cidade tivesse conhecido um monumental engarrafamento, com todas as

saídas bloqueadas a partir das 18 horas com os motoristas apostados em chegar a casa

antes que a borrasca se desfizesse sobre as cabeças de cada um...Ora, esta informação

não era de todo verdade. Aconteceu que o Serviço Nacional de Protecção Civil (SNPC),

difundira algumas recomendações genéricas, nomeadamente quanto aos cuidados a ter

com os materiais "mal fixados para que, face à força do vento não possam ser

projectados" (Jornal de Notícias). Afinal as rajadas de vento não ultrapassaram 80

km/h, não se tendo justificado a situação de “pânico” nas principais cidades

portuguesas. Não estariam as pessoas apenas com medo que as grandes filas nas auto-

estradas, ou eventuais cortes de trânsito nas pontes que ligam as margem das cidades

lhes eternizassem a chegada a casa depois de um longo dia de trabalho?

Page 89: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 2 – A importância do vento na cidade: potencialidades e limitações

- 83 -

6. O VENTO E AS ACTIVIDADES DE LAZER AO AR LIVRE

Sob o ponto de vista de algumas actividades humanas, o vento pode ser um

factor limitante, até por vezes indesejável, sobretudo quando é muito forte. Não é

desconhecido o descontentamento de alguns prestadores de serviços do sector da

hotelaria que, durante os meses de Verão, criam expectativa no sentido de tentar atrair

clientes para as esplanadas da zona oriental da cidade, junto ao rio Tejo e vêm goradas

algumas oportunidades de negócio. Foi-nos dito pessoalmente pela responsável dos

locais de lazer da Marina da EXPO que frequentemente as festas programadas nessa

zona da cidade são canceladas em certas noites de Verão, devido ao vento que por vezes

é demasiadamente forte para que se possa permanecer nos espaços exteriores.

Estudos recentes sobre o efeito do vento nos transeuntes no actual Parque das

Nações - EXPO 98 (SARAIVA et al., 1997), mostraram que uma velocidade efectiva

(índice que combina a velocidade média com as rajadas de vento) superior a 9 m/s pode

afectar significativamente a marcha de um indivíduo, enquanto que valores superiores a

20 m/s podem ser perigosos para as pessoas fisicamente mais debilitadas. Foi

determinado que alguns locais do recinto da EXPO 98 eram mais susceptíveis do ponto

de vista do conforto mecânico, tendo sido estimado que, anualmente, podem ocorrer

mais de 43 horas com velocidades de vento efectivo superior àquele limiar crítico de 20

m/s.

No litoral ocidental da Península de Lisboa também é conhecido o desconforto

por excesso de vento provocado pela Nortada no Verão. No Guincho foi estimado que

nos dias que as pessoas consideraram mau tempo de praia, 60% das observações

correspondem a situações de vento forte de Norte e noroeste a meio do dia. “Na maior

parte dos dias e desde que a humidade relativa não seja muito elevada, o bem estar do

veraneante parece poder ser apenas perturbado pelo vento, que actua como factor

limitante das actividades ao ar livre (ALCOFORADO, 1992).

Page 90: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I – Modificação nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 84 -

7. SÍNTESE DAS LIMITAÇÕES E POTENCIALIDADES DO VENTO EM MEIO URBANO

A partir da informação exposta, tentou fazer-se uma síntese das questões mais

importantes, apresentando-se no quadro 3.1 um resumo das principais vantagens e

inconvenientes ambientais do vento em meio urbano.

Quadro 3.1– Síntese de limitações e potencialidades do vento em meio urbano

Inconvenientes ambientais do ponto de vista do conforto térmico, mecânico,

segurança e comportamento dos indivíduos.

Vantagens ambientais do vento do ponto de vista do conforto térmico e da saúde

Arrefecimento do ar no Inverno (Windchill) O vento forte pode ser inconveniente para certas

actividades de lazer ao ar livre, podendo inviabilizar a permanência de pessoas em certos

locais.

Dispersão de poluentes, eventualmente para locais menos densamente povoados.

Vento efectivo muito forte (superior a 9 m/s) pode afectar a locomoção dos indivíduos.

Regulação dos padrões térmicos desfavoráveis diminuindo, por exemplo, a ocorrência das vagas

de calor extremo.

Vento com rajadas superiores a 20 m/s pode ser perigoso para indivíduos mais debilitados, ou pode

haver perigo de queda e consequente choque de vários elementos (chaminés, telhas, etc.), contra os

indivíduos.

Melhoria dos factores ambientais que condicionam a saúde e o conforto humano, sobretudo em

indivíduos fisicamente mais debilitados (idosos e crianças).

Factor de ansiedade

As consequências do vento aqui apresentadas dependem das características de

cada indivíduo e da sua capacidade de tomar medidas (adaptações locais, ou integradas

em acções concretas de planeamento urbano de escala regional), que se realizem para

mitigar os efeitos do vento.

A descrição mais ou menos exaustiva, que se acabou de efectuar, serve antes do

mais para levantar uma questão: quais serão as consequências na cidade de Lisboa se

um dia for atingida por uma tempestade com a mesma escala de intensidade e

devastação das que atingiram a Europa Ocidental em 1999. Neste domínio pouco se tem

feito para estudar os riscos que cidadãos de Lisboa correm ao habitarem em áreas mal

projectadas e degradadas, tornando-se assim isso urgente conhecerem-se as áreas

Page 91: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 2 – A importância do vento na cidade: potencialidades e limitações

- 85 -

mais expostas aos ventos muito fortes. Deixam-se aqui algumas sugestões para estudos

futuros:

a) avaliar o estado de conservação dos equipamentos urbanos de Lisboa;

Segundo julgamos saber, ainda não foi feito qualquer inventariação dos

elementos urbano construídos, que tem um maior risco de serem destruídos

pelo vento e causarem estragos em bens e pessoas. Veja-se a título de

exemplo as quantificações efectuadas desde 1962 pelo “Building Research

Establishment” (fig. 2.3).

Fig. 2.3 – Número de acidentados por queda de elementos urbanos com vento forte (Saraiva, 1983).

b) avaliar o “estado de saúde” do parque verde da cidade; para tal seria

necessário estimar “onde” e “quantas” árvores seriam arrancadas no caso de

ocorrerem fortes vendavais e que prejuízos poderiam causar à população.

c) incrementar os estudos sobre a análise dos riscos catastróficos devidos aos

ventos fortes; essa avaliação deve ser feita pelas companhias seguradoras, ou

pelo Instituto de Seguros de Portugal, entidade que detém uma função

normativa e que colabora na elaboração de diplomas legais que regulam o

acesso e exercício da actividade seguradora no nosso País. Por serem pouco

181

194

0 20 40 60 80 100 120 140

Chaminés e decorações

Coberturas

Empenas e fachadas

Paredes internas

Vidros

Andaimes

Letreiros e sinalização

Não especificados

Soprados

Soprados e atropelados

MortosFeridos gravesFeridos ligeiros

Page 92: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I – Modificação nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 86 -

frequentes, os riscos envolvidos são de difícil quantificação, uma vez que o

mesmo evento origina normalmente perdas em riscos abrangidos por vários

ramos. Têm, no entanto, um custo médio bastante elevado, aumentando com

a concentração e aumento da população e a riqueza das comunidades

(ABRASSART, 1997).

Page 93: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

- 87 -

CAPÍTULO 3

BREVE REFERÊNCIA AOS REGIMES DE VENTO NA REGIÃO DE LISBOA

1. O VENTO NA REGIÃO DE LISBOA.

Neste ponto pretende-se mostrar quais as principais características dos ventos

junto à superfície em Lisboa. Dá-se maior destaque aos regimes de Verão porque eles

serão motivo de estudo mais aprofundado em capítulos posteriores. A priori, tudo leva a

supor que os principais problemas ambientais poderão ter uma maior incidência na

época mais quente do ano, a verificar-se a conjugação da redução da velocidade do

vento por causa do crescimento da cidade (como se demonstrará mais adiante), com

temperaturas mais elevadas e os elevados valores de radiação solar. Não se deixará de

fazer uma referência às brisas que poderão atenuar os efeitos desagradáveis e nocivos

para os habitantes da cidade.

O regime anual do vento na região de Lisboa é bem conhecido e está

suficientemente documentado: à altitude de 500 hPa (aproximadamente 5575 m,

considerando a atmosfera standard), livre dos efeitos perturbadores do relevo, o fluxo

provém, quase todo o ano, do quadrante oeste. No Inverno, a segunda componente é o

noroeste. Depois do quadrante oeste, ainda em altitude, o sudoeste tem mais

importância no Verão. Àquela altitude o fluxo de leste é raro.

Page 94: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I – Modificação nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 88 -

À superfície a frequência de ocorrência do vento de Norte atinge quase 50%.

Nos meses de Verão, o fluxo é geralmente de norte no litoral junto a Lisboa, quando

existe um anticiclone Atlântico, eventualmente prolongado em crista segundo os

meridianos, ou uma depressão (que pode ou não ser de origem térmica) sobre a

Península Ibérica ou a oriente desta. No Inverno, não existe uma direcção predominante,

podendo o vento soprar de sudoeste, oeste e mais raramente de noroeste, ou, pelo

contrário de nordeste ou de este.

1.1 REGIMES DE VERÃO

1.1.1 A NORTADA: O VENTO DOMINANTE DO VERÃO LISBOETA

O regime do vento no Verão na Região de Lisboa é dominado pela Nortada, um

vento relativamente forte que ocorre em toda o litoral ocidental da Península Ibérica,

entre Maio e Setembro/Outubro.

Este vento regional ocorre quando existe um forte gradiente de pressão

atmosférica entre o interior da península aquecido, onde por vezes se mantém uma

depressão térmica e o oceano com uma temperatura mais baixa, sobre o qual está

normalmente o anticiclone dos Açores. C’est que l’accumulation de chaleur sur les

hauts plateaux de Castille (altitude moyenne de 600 m) entretient des dépressions

d’origines variées qui, associées aux cellules anticycloniques atlantiques, déclenchent

une circulation régionale de nord sur le Portugal (FERREIRA, 1984).

A diminuição da pressão entre o centro do anticiclone e o interior da Península

pode, por vezes, ser superior a 12 hPa e as diferenças entre o oceano e o interior do País

podem atingir 4 hPa.

Num estudo sobre as interacções entre os regimes de vento de Verão e as brisas

do oceano e do estuário do Tejo, ficou demonstrado que as direcções mais frequentes do

vento são o norte e o noroeste na região de Lisboa (ALCOFORADO, 1987). Durante o

período estudado (Verões de 1973 a 77, 81, 83 e 84), o vento soprou de Norte em 45%

dos casos, na estação meteorológica de Cabo-Ruivo, na zona oriental da cidade. Em

Page 95: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 3 – Breve referência aos regimes de vento na região de Lisboa

- 89 -

27% destes dias de Junho a Setembro, a Nortada foi considerada forte (velocidade

médias horárias ≥ 15 km/h – aproximadamente 4,2 m/s). A velocidade do vento pode

atingir 50 km/h (13,8 m/s) no início da tarde e 70 km/h (19,4 m/s) antes do anoitecer. O

máximo número de dias com vento de Norte ocorre no final de Julho e durante o mês de

Agosto.

A sul do Tejo as condições de ventilação parecem reforçam-se, a tal ponto que

os ventos de Norte representam 80% das observações de Julho e Agosto no Cabo de S.

Vicente. As velocidades mais elevadas correspondem, em exclusividade, aos ventos de

norte, cujas rajadas ultrapassam por vezes os 60 km/h (16,7 m/s) em Agosto.

(FERREIRA, 1989).

1.1.2 A INFLUÊNCIA DAS BRISAS DO OCEANO E DO ESTUÁRIO DO TEJO.

As brisas do mar e/ou do estuário são ventos de "origem térmica", que se

desencadeiam quando as diferenças de temperatura e pressão entre as atmosfera

continental e marítima atingem valores elevados e teoricamente cessam quando as

temperaturas desses dois ambientes se igualam (ALCOFORADO, 1987).

Nos dias de vento muito forte e contínuo em Lisboa não se costuma observar

fenómenos de brisa (ou, melhor dizendo, não se conseguem detectar facilmente caso

tenham uma direcção próxima do vento de gradiente), embora possa ocorrer durante a

tarde uma inflexão do fluxo para oeste.

Foram já identificados vários regimes de brisas em Lisboa (cerca de 30% dos

dias de Verão); estes têm como principal característica uma rotação na componente

direccional do vento: em 8 % dos casos o vento sopra no início da tarde de leste, depois

de sudeste e às vezes ainda de sul; noutros casos (11%) o vento norte ou nordeste roda

para sudeste trazendo ar mais fresco e húmido do Tejo. Em ambos os casos verifica-se

um atraso na ocorrência das temperaturas máximas em Lisboa.

Em 11% dos casos as brisas podem rodar mais de 270º para a direita: vários

exemplos estudados por ALCOFORADO (1987) mostram que, de manhã, o vento pode

soprar de este ou sudeste, nuns casos, ou de norte noutros, depois vai rodando durante o

Page 96: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I – Modificação nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 90 -

dia, atingindo no final da tarde o rumo de sudoeste ou mesmo oeste. As causas da

rotação das brisas, sobretudo as observadas na zona oriental da cidade, continua por se

esclarecer, embora já tenham sido apontadas duas hipóteses que não se excluem, antes

podem actuar conjuntamente:

a) a brisa do oceano, ainda fraca de manhã seria canalizada pelo Tejo,

divergindo onde o estuário alarga tomando a componente de sudeste;

b) de manhã a própria brisa seria um fenómeno localizado, induzido pelas

diferenças de temperatura entre o estuário mais fresco e a cidade mais

aquecida.

Estes ventos que transportam ar marítimo ou fluvial e que normalmente

refrescam a cidade podem impedir a subida de temperatura que marca o ritmo térmico

diário e atrasar a descida da humidade relativa. Quando é restabelecida a Nortada, com

o consequente aumento da velocidade do vento, verifica-se geralmente uma subida da

temperatura e uma descida da humidade relativa.

Nos restantes dias (24% dos casos) o vento ou sopra de sul (14%) ou tem

direcções bastante variáveis (10% que não se enquadram nos esquemas atrás citados

pela autora) devido a raras situações depressionárias associadas ou não à passagem da

frente polar, que ocorrem sobretudo no início e no fim da estação quente. Nestes dias as

amplitudes térmicas diurnas são fracas e a humidade relativa elevada.

Durante as noites de Verão em situações de calma e sem vento (23% dos casos),

é provável que ocorra uma diminuição da temperatura da periferia para o centro da

cidade (ALCOFORADO, 1991).

1.2 REGIMES DE INVERNO.

Segundo ALCOFORADO (1992), a rosa dos ventos invernal na região de Lisboa

apresenta-se alongada no sentido sudoeste/nordeste. Isto resulta da elevada frequência

de perturbações de sudoeste, oeste, ou mais raramente de noroeste, enquanto massas de

ar frias e secas têm trajectórias de nordeste ou de este, o que explicaria o sentido deste

eixo predominante (fig. 3.1).

Page 97: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 3 – Breve referência aos regimes de vento na região de Lisboa

- 91 -

Fig. 3.1 – Rosa de ventos de Inverno (Dezembro a Fevereiro 1978/1983), em Lisboa. (Extraído de

ALCOFORADO, 1992).

Observando mais atentamente três meses de Inverno do período 1971-1980 da

estação de Lisboa/Portela (fig. 3.2) (utilizam-se os mesmos meses para complemento da

informação dada por ALCOFORADO, 1992), verifica-se uma maior predominância da

direcção de nordeste e és-nordeste no mês de Dezembro (30 %), enquanto a direcção

norte detém cerca de 13 % das ocorrências). Em Janeiro a direcção norte reparte com o

és-nordeste e o oeste as predominância do vento (11 a 13 %), enquanto o norte já é

claramente dominante a partir do mês de Fevereiro (17 %), perdendo esse “estatuto” só

no final do Verão.

Dezembro Janeiro Fevereiro

Fig. 3.2 – O vento à superfície na estação de Lisboa/Portela, no Inverno (1971-80).

1.3 REGIMES DAS ESTAÇÕES INTERMÉDIAS

Entende-se aqui por estações intermédias os regimes de vento que transitam do

Inverno para o Verão e vice-versa. Nos meses de Primavera verifica-se um acentuar da

predominância do vento de norte e de nor-noroeste que, no mês de Maio, atinge quase

52% das frequências na estação de Lisboa/Portela (fig. 3.3).

Page 98: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I – Modificação nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 92 -

Março Abril Maio

Fig. 3.3 – O vento à superfície na estação de Lisboa/Portela, na Primavera (1971-80).

Segundo ALCOFORADO (1992), a quase “ausência” de ventos de este e sudeste

que impera no Verão, só lentamente se vai modificando. A principal diferença entre o

Verão e o Outono (período de Setembro a Novembro26) consiste na diminuição da

percentagem e da velocidade de ventos provenientes de norte e de noroeste, no aumento

da frequência dos ventos de nordeste, [...] de este, sudeste e sul.

2. CONCLUSÕES

Do que ficou atrás dito, verifica-se claramente que a Primavera e, sobretudo o

Verão são estações do ano claramente dominadas pelos ventos dos quadrantes de norte e

noroeste, apenas interrompidos pelas brisas que sopram ora do estuário ora do oceano.

No Inverno, a direcção norte reparte com o nordeste e com o oeste a predominância em

termos de direcções. Tomando em conta as médias horárias dos ventos que sopraram

entre 1971 e 1980 na estação de Lisboa/Portela, verificamos exactamente a importância

dos ventos de norte e nor-noroeste no regime anual, que se traduz em mais de 41 % dos

registos naqueles 10 anos de observações (fig. 3.4).

26 Em termos de regimes de vento (definidos pelos parâmetros de Weibull, explicados mais adiante), a definição desta estação não é clara como se irá demonstrar.

Page 99: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 3 – Breve referência aos regimes de vento na região de Lisboa

- 93 -

Os resultados deste estudo, aqui deliberadamente bastante reduzidos, indicam

que é o vento dominante de norte que mais se poderá alterar devido aos actuais padrões

de expansão da cidade, apresentados no próximo capítulo.

Fig. 3.4 - Rosa do ventos anual, do período 71/80 (Lisboa/Portela).

Page 100: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

- 95 -

CAPÍTULO 4

EXPANSÃO URBANA E PROBLEMAS AMBIENTAIS EM LISBOA

1. TRAÇOS DA EXPANSÃO URBANA NA ÁREA METROPOLITANA DE LISBOA.

Neste capítulo, pretende-se fundamentar a tese de que alguns dos problemas

ambientais na cidade poderão decorrer do modelo de crescimento urbano vigente. É

pois necessário percorrer o longo “trajecto” da cidade que nasceu “do seu sítio

admirável e das suas características de natureza aquática” (GASPAR, s/d a) e que se

prolonga pelo tempo e pelo espaço até ao “cerzir da malha já existente” (SILVA, 1994),

espaços construídos e destruídos, pouco planeados nas últimas décadas e com poucas

preocupações ambientais, que deveriam ser o nosso legado para o futuro. Estaremos a

criar uma cidade insustentável?

Para fundamentar esta tese, de difícil demonstração, começa-se por se mostrar

que Lisboa já foi uma cidade “bem arejada” e que actualmente está a ser ameaçada pela

construção de uma barreira arquitetónica que impede os ventos predominantes de Norte

de limparem a baixa atmosfera urbana “carregada” de poluentes emitidos pelas diversas

actividades humanas. Não se pretende, portanto, fazer a história do urbanismo da cidade

(que outros tão bem já fizeram), mas antes mostrar os principais transformações que a

cidade sofreu nas últimas décadas e a sua relação com alguns dos problemas ambientais

que poderão ocorrer relacionados com o vento, que serão fundamentados nos capítulos

subsequentes.

Page 101: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I – Modificação nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 96 -

1.1. UM SÍTIO “APEGADO” AO TEJO. DOS PRIMÓRDIOS À LISBOA DO SÉC. XIX.

Para se observarem essas linhas de expansão urbana é necessário recuar aos

finais do Paleolítico, em que já havia uma densa ocupação do território, ligada ao rio e

ao mar, que se estendia das praias de Sintra-Cascais e Caparica-Cabo Espichel, até aos

concheiros de Muge, sensivelmente o actual limite de maré.

A segurança do Império Romano, que conferia ao município de Olissipo o

privilégio de ser regido pelo mesmo direito de Roma, permitiu que a nova urbe fosse

fundada sobre os povoados castrejos da colina do actual Castelo. A urbe volta-se para o

“Mar da Palha” e espalha-se pelas encostas da colina até à praia e aos fundos dos vales,

numa ocupação esparsa, mas onde já se vislumbravam as infra-estruturas que mais

marcavam essa civilização: “as termas, junto aos esteiros da Baixa, o teatro na encosta

que olhava o rio, a fortificação principal no cimo da colina original. A partir deste

núcleo organiza-se um espaço mais densamente ocupado. Depois do período visigótico,

que pouco acrescentou ao desenvolvimento do local, é com os Muçulmanos que a

cidade conhece novos contornos, embora de um modo diferente do período romano. Ora

empurrados pelos cristão, ora pelos normandos, a cidade muçulmana vai cerrar-se mais

e envolve-se numa poderosa muralha que envolve a medina e o alcácer. Este espaço

confinado, rapidamente cede à crescente população que tem uma vida activa, baseada

no comércio com o Mediterrâneo e o Norte de África, crescendo extra muros para a

Alfama, a nascente, e para o que é actualmente a Baixa, futuro centro da cidade”

(GASPAR, s/d, b).

A Lisboa Portuguesa tem início com a reconquista de D. Afonso I em 1147. É

esta cidade essencialmente ligada ao rio e ao mar, mas com um campo, onde funciona

uma importante economia agrícola, que os fundadores da nossa nacionalidade

conheceram no Sec. XII. O tecido urbano é formado por malhas irregulares, com ruas

estreitas e escadinhas, fruto da topografia acidentada e da tradição urbana muçulmana e

que subsiste “fazendo parte do pitoresco de Lisboa antiga” (SALGUEIRO, 2001).

“Os novos conquistadores empurraram os muçulmanos para um vale a norte do

castelo, que ainda hoje perdura com o nome de Mouraria. Estrategicamente os

Page 102: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 4 – Potenciais problemas ambientais devidos à modificação dos campos de vento com o crescimento da cidade nas próximas décadas

- 97 -

portugueses ocupam as outras "colinas" com estabelecimentos religiosos que são os

embriões dos futuros bairros da Graça, S. Vicente, Santana, S. Francisco..." (GASPAR,

s/d, b).

Com a estabilização do território Português no Sec. XIII, Lisboa torna-se num

dos centros mais importantes do Oeste Peninsular. Fazem-se grandes investimentos no

campos a poente, no que será a futura Baixa, área de expansão e "interface entre a

cidade, o porto, o mundo rural e o estrangeiro. Para lhe aumentar a segurança, são

construídas novas fortificações (primeiro a muralha da Ribeira, mandada erigir por D.

Dinis e depois a muralha Fernandina). O perímetro das novas fortificações (5350 m),

que encerra uma área de 100 hectares, dá-nos uma ideia do quanto a cidade crescera em

dois séculos. Esse crescimento foi maior a poente do que a nascente, mas bastante

acentuado se considerarmos os 16 ha do período mourisco.

No século XVI, a cidade vocacionada para o comércio apresenta uma mancha

urbana quase contínua entre Xabregas e a Madragoa. Para o interior a cidade desenvolve

eixos de comunicação de acesso ao centro. Apesar de se "urbanizarem" algumas aldeias

na periferia (atraindo gente abastada que construía belos palácios), e do enriquecimento

da capital no Sec. XVIII, o núcleo urbano mantém a sua dimensão ribeirinha (GASPAR,

s/d, b).

Com os grandes terramoto e maremoto de Novembro de 1755 e o incêndio que

se lhes seguiu, a cidade viu serem destruidas cerca de três mil das vinte mil casas

existentes, sobretudo na Baixa, no Castelo e no Carmo. Tamanha destruição fez surgir a

oportunidade de renovação urbana, que seria impulsionada pelo Marquês de Pombal

(Primeiro Ministro de D. José I) e levada a cargo pelos arquitectos/engenheiros Manuel

da Maia (que elaborou o plano da reconstrução da cidade ) e Eugénio dos Santos de

Carvalho e Carlos Mardel, a quem se deveu o levantamento da planta de reconstrução

de Lisboa. A reconstrução da Baixa seguia um rigor geométrico baseada na estrutura de

aquartelamento, porque os reconstrutores eram oficiais do exército. O plano pombalino

anteviu a produção industrializada em série, “sistematizando e normalizando os

elementos construtivos para os edifícios [...] dada a quantidade que se torna necessário

pôr de pé uma cidade arruinada [...], não se permitindo mais do que rés-do-chão, três

andares e águas furtadas e um pioneiro sistema anti-sísmico" (SANCHEZ, 1994).

Page 103: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I – Modificação nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 98 -

No início do Séc. XIX, a cidade já ocupava 9,47 km2, verificando-se um

substancial alargamento do território delimitado pela estrada da circunvalação, para

12,24 km2. "Mas a cidade mantinha-se agarrada ao rio, pois o comprimento máximo no

sentido E-W era de 5,6 km, contra 3,3 km no sentido Norte-Sul" (SALGUEIRO, 1992).

1.2. UMA CIDADE PLANEADA E "AREJADA": O CRESCIMENTO URBANO DOS FINAIS

DO SEC XIX A MEADOS DO SÉC. XX.

Nos finais do século XIX, com a abertura da Av. da Liberdade, a consequente

urbanização dos terrenos adjacentes e, numa segunda fase, com as Avenidas Novas,

altera-se a forma da cidade para uma estrutura radiocêntrica, que começou então a sua

galopante caminhada para norte (SILVA, 1994). A Av. Fontes Pereira de Melo e o seu

seguimento (Av. da República) levou a expansão da cidade desde o parque Eduardo VII

(então Parque da Liberdade) até ao Campo Grande (local para passeio aos domingos),

num conjunto planificado de ruas paralelas e perpendiculares de desenvolvimento

ortogonal. Este tipo de urbanismo progressista que define "uma estrutura urbana

flexível, traçada a partir do centro representativo da cidade, segundo conceitos correntes

na Europa", foi levado a cabo pelo Eng.º. Ressano Garcia, um observador atento da

Transformation de Paris levada a cabo por Napoleão III e executada pelo Barão de

Haussmann. Aliás, foi como comissário da Exposição Universal de Paris de 1900 que o

próprio Ressano Garcia publicitou os projectos para a expansão de Lisboa, que

anunciavam a modernidade da capital.

O perímetro do concelho de Lisboa ficou definitivamente estabelecido em 1903,

delimitando uma área de 83,8 km2. Esses limites foram traçados apenas tendo em vista

um aumento da tributação fiscal, sem aumentar a área efectivamente construída

(processo designado de expansão urbana sem urbanização - SALGUEIRO, 1992). No ano

seguinte (1904), Ressano Garcia vê aprovado pela Câmara Municipal de Lisboa27 o

anteprojecto do seu plano. O seu pensamento urbanístico era baseado em grandes eixos

estruturantes, direccionados para as saídas da capital (Sintra, Queluz Mafra, Porto), em

27 No que diz respeito às obras de construção, a CML assumia de novo as suas competências que lhe tinham sido retiradas, por decreto, pelo Marquês de Pombal em 1758.

Page 104: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 4 – Potenciais problemas ambientais devidos à modificação dos campos de vento com o crescimento da cidade nas próximas décadas

- 99 -

ligação com o da a linha férrea de cintura; as malha urbanas deveriam ser ortogonais e

hierarquizadas; os espaços verdes (jardins públicos e privados) seriam incrementados e

os alinhamentos arbóreos deveriam ser plantados paralelamente às vias de tráfego, ou

em passeios centrais; o crescimento contínuo da cidade dever-se-ia fazer a partir dos

vales da Avenida e do Intendente em direcção às saídas da capital; novas estradas

deveriam ser construídas, integradas nos campos circundantes, reinterpretando os

desenhos dos traçados recentes, que se reajustariam aos novos saberes (RODRIGUES,

2000 a).

Todo este plano foi assente na autonomização da disciplina urbana e

arquitectónica que o liberalismo concedeu ao poder público municipal. A edificação das

"Avenidas Novas" prolongou-se por mais de meio século, desde o decreto de 1864, que

ordenava a execução do primeiro plano geral de melhoramentos da cidade. Este plano,

não tendo certamente em mente as questões ambientais que hoje a todos preocupam,

continha algumas normas que defenderam a cidade do ritmo alucinante de crescimento

da segunda metade do séc. XX: essas normas faziam depender a altura dos edifícios da

largura das ruas. "Em ruas de largura superior a 18 m, os edifícios não devem exceder

os 19 m, medidos da calçada ou passeio até à parte superior da cornija". Três anos mais

tarde (1867), novo decreto torna menos exigente essa relação, permitindo a construção

de edifícios de 20 m em ruas de largura superior a 7 m. O Regulamento de Salubridade

das Edificações Urbanas (RSEU de 1903) impõe normas "higiénicas nos edifícios", mas

fixa a altura máxima de 20 m exclusiva a ruas de largura superior a 18 m. (Rodrigues,

2001). Mesmo que não fosse esse o seu objectivo, este normativo referente à relação

entre a largura das ruas e a altura dos edifícios, manteve a cidade de Lisboa, até meados

do século XX, com condições aceitáveis de ventilação. Havia, apesar disso, a

preocupação de manter a salubridade de Lisboa, devida aos recentes surtos de cólera

(1856) e de febre amarela (1857). Impunha-se assim o reforço do saneamento público e

a modernização do sistema de abastecimento de água à capital (RODRIGUES, 2000 b).

No final do Séc. XIX, desde o Tejo até à nova circunvalação, em parte traçada

pela estrada militar, a cidade apresentava já um maior desenvolvimento no sentido

Norte-Sul (12,2 km) do que no sentido Oeste-Leste (que se ficara em 8,5 km).

Page 105: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I – Modificação nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 100 -

Até à I Grande Guerra (1914-1918) Lisboa pouco cresceu para fora da primeira

circunvalação. Para além da área construída, estendiam-se territórios que abasteciam a

cidade em víveres, e matérias primas e eram também usados como locais de lazer:

quintas em Belém e Benfica, praias em Pedrouços, Algés e Cruz-Quebrada (SALGUEIRO,

1992). O crescimento muito rápido, depois da Segunda Guerra Mundial, traz para a

capital muitos rurais em busca de melhores condições de vida que, com o

desenvolvimento de transportes públicos para a periferia, aí se instalam em novos

bairros que mudaram uma paisagem rural e bucólica (que nos habituámos a reconhecer

em filmes como "A Aldeia da Roupa Branca"28), em centro suburbanos de habitações

multifamiliares.

A cidade cresce então num padrão digitiforme ao longo de eixos ferroviários e

rodoviários (SALGUEIRO, 1992 - fig. 4.1). A seguir à ditadura militar de 1926, o

crescimento populacional era feito à custa da imigração rural, uma população não

especializada que auferia salários baixos e ia ocupando os interstícios devolutos com

bairros da lata nalguns casos, noutros em bairros provisórios, construções precárias que

o Estado Novo ia construindo. Muitos destes bairros chegaram aos nossos dias

totalmente degradados, sendo depois o espaço radicalmente transformado.

Fig. 4.1 - Evolução da expansão urbana entre 1850 e 1980 (segundo FRANCÊS, 2000).

Com o período de Duarte Pacheco (presidente da Câmara de Lisboa e Ministro

das Obras Públicas, entre 1930-43), Lisboa voltava a conhecer um projecto global que

pretendia pôr cobro aos contratos de urbanização, que interesses particulares impunham

28 Filme realizado em 1938 por Chianca de Garcia, com Beatriz Costa no papel de uma lavadeira de Caneças e que relatava a vida destas gentes que se ocupavam de lavar a roupa dos habitantes da capital.

Page 106: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 4 – Potenciais problemas ambientais devidos à modificação dos campos de vento com o crescimento da cidade nas próximas décadas

- 101 -

à forma de crescimento da cidade. Prolongou-se o crescimento da cidade para Norte e

nordeste com o prolongamento da Av. Almirante Reis, desde a Alameda até ao Areeiro

e abriu-se a Avenida do Aeroporto, eixos de orientação geral sul/norte. O município

decide-se pela criação do Parque Florestal Ocidental da cidade (Monsanto), que seria o

pulmão verde de Lisboa.

"A cidade de 40 [do Sec. XX] era ordenada e funcionalmente segregada".

(SALGUEIRO, 1992). É a época de blocos residenciais livres e separados por zonas

verdes procurando uma maior exposição solar e um melhor arejamento.

A passagem da uma cidade "ruralizada" e bucólica para uma cidade moderna de

ruas largas e homogeneidade nas fachadas (o então designado "estilo Português Suave",

simbólica da cidade do Estado Novo), é-nos transmitido pelo escritor José Rodrigues

Miguéis, numa passagem de um seu romance onde retrata a Avenida Almirante Reis, no

início do século XX:

Saudades para a Dona Genciana

"Ponho-me a olhar a Avenida cá de cima da minha água-furtada e meu refúgio e, digo-lhe, seu Apolinário: tudo isto levou uma grande volta. Antigamente vivia-se aqui num céu aberto[...]. Foi nos começos da República, e eu, de calção, com os sapatos nas poças da chuva, travava os primeiros corpo a corpo com a gramática latina e o verbo Amar. A Avenida era então novinha em folha, como o regime. Começava lá em baixo, num boqueirão sinistro, um rio de lama onde às vezes havia inundações e gritos, entre ribanceiras e prédios esguios, e ia-se perder ao alto, nas quintas e azinhagas. As casas, modestas e limpinhas, tinham fachadas de azulejo de mau gosto, outras eram pintadas a cor. Havia as "terras", lotes vagos de barro viscoso onde a gente ia "reinar", e as carroças se atolavam até aos eixos, com muitas pragas dos carroceiros. As árvores eram frágeis e verdes, de mocidade e esperança. Que sossego o desses dias agitados! Isso não era Avenida, era a Rua do Lá-Vai-Um. O mundo acabava-se ali no redondel da praça: um muro decrépito e, para além dele, era a poesia, o silêncio, o bucolismo e a Perna-de-Pau. As noites uma paz. A brisa trazia lá de cima um cheiro fresco de húmus, de estrumes, de águas e verduras[...] "Ó pálida madrugada, já tenho saudades tuas..."

José Rodrigues Miguéis, Léah e Outras Histórias, Editorial Estampa, 1958.

Page 107: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I – Modificação nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 102 -

1.3. TENDÊNCIAS FUTURAS DO CRESCIMENTO URBANO EM LISBOA

Actualmente a Área Metropolitana de Lisboa (AML) encontra-se em franco

desenvolvimento urbano, mostrando sinais de maior vitalidade demográfica do que

outras regiões no País, sobretudo após o decénio da emigração, que foram os anos 60 do

século XX (SALGUEIRO, 1992).

Criada em 1991, a AML é uma extensa “cidade metrópole/conurbação” com

3 128 km2 e mais de 2,5 milhões de habitantes, que agrega 19 municípios. A cidade de

Lisboa está no centro da área metropolitana “...Vista de longe, do espaço ou

simplesmente de outro país,..., aparece hoje como uma mancha difusa, em que se

integram Arrábida e Sintra e o Tejo é o elemento central” (GASPAR, s/d, b). A cidade

espraia-se no Tejo, que a separa da “Margem Sul”, através do “Gargalo”, um

estreitamento do rio com cerca de 2 km entre as duas margens. É um limite natural que

separa a cidade do aglomerado urbano do norte da península de Setúbal. A leste a

cidade encontra um regolfo - o Mar da Palha, um “pequeníssimo mediterrâneo na costa

Atlântica” (GASPAR, s/d, a), com uma área de cerca de 325 km2. A cidade encontra-se

naturalmente limitada na sua expansão por esta massa de água, a sul e a leste, não

deixando ela própria de ser decisiva na criação de condições particulares que formam

um clima urbano complexo, como foi demonstrado por ALCOFORADO (1987 e 1992), e

cujo tema será retomado mais adiante neste trabalho.

Os subúrbios a oeste da cidade encontram-se numa fase de consolidação em

termos de áreas construídas, não se prevendo uma modificação nos índices de

construção. Entre a área urbanizada de Lisboa e o Concelho de Oeiras e Amadora existe

também a grande mancha verde de Monsanto, considerada como o “pulmão de Lisboa”,

que não se deverá modificar nas próximas décadas.

As grandes áreas de expansão e modificação dos padrões urbanos de Lisboa

encontram-se assim, de certa forma, limitados ao norte e noroeste da cidade, onde se

inclui a sua extensão para o concelho de Loures. Se não ocorrerem operações

urbanísticas integradas e a manter-se o "caos urbano" e a ocupação indiscriminada dos

terrenos sem a lógica que caracterizou a cidade até aos anos 40, tudo aponta para o

Page 108: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 4 – Potenciais problemas ambientais devidos à modificação dos campos de vento com o crescimento da cidade nas próximas décadas

- 103 -

aumento dos índices de construção, sobretudo baseados no aumento da altura dos

prédios.

A compra de casa nas áreas suburbanas tornou-se relativamente mais fácil do

que no centro de Lisboa (que se transformou num enorme centro comercial e

empresarial), devido à banalização do recurso ao crédito bancário, que atraiu as novas

famílias para a periferia. A especulação levada a cabo pelos promotores imobiliários e

um certo alheamento dos municípios levaram à construção de um parque habitacional

desarticulado e sem qualidade, onde se anularam elementos urbanos como as praças e os

jardins. A construção recorreu com frequência a imóveis altos, em áreas que

permaneceram espectantes durante muito tempo, procurando minimizar a subida do

preço dos terrenos e a obtenção de maiores lucros (SALGUEIRO, 1992). Em vez de

surgirem arruamentos largos e espaçosos, como os que se construíram no princípio do

século no centro da cidade, foram surgindo amontoados de prédios mais ou menos

elevados, onde os lotes foram ocupados à medida que os promotores imobiliários

adquiriam licenças de construção. Salvo raras excepções, não se planeiam as novas

áreas urbanas, surgindo um "caos urbanístico" e um emaranhado de prédios, muitas

vezes sem volumetrias adaptadas às áreas onde se inserem, levando ao “desordenamento

periférico” reinante no norte da cidade nas últimas décadas (CONSIGLIERI, 1993 a).

1.4 ALGUNS EXEMPLOS DE TRANSFORMAÇÕES RECENTES DO ESPAÇO OCUPADO

PELOS EDIFÍCIOS, COM MUDANÇA DOS ÍNDICES DE RUGOSIDADE

As transformações recentes, ou as que estão previstas num futuro não muito

longínquo (mesmo que apenas no aspecto político), podem ser de natureza diversa mas

conduzem, segundo a minha perspectiva, apenas a um caminho: a reocupação dos

espaços devolutos, ou onde foram demolidos vários bairros degradados, que tinham

índices de rugosidade baixa, irão ser transformados em áreas com índices de construção

elevados (aumento da rugosidade). Apresentam-se de seguida algumas das

transformações já ocorridas, ou que se prevêem para as próximas décadas:

Page 109: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I – Modificação nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 104 -

1) As transformações mais recentes dizem respeito aos realojamento de muitos

milhares de famílias que habitavam bairros "de lata" ou provisórios,

construídos durante o Estado Novo, cujas condições eram muito

degradantes para os moradores, mas que mantinham os terrenos com índices

de rugosidade baixa. Os PER (Planos Especiais de Realojamento), com os

últimos executivos camarários, apesar de louváveis, transformaram

radicalmente a paisagem como se mostra na fig. 4.2.

A Quinta dos Cravos, um bairro de barracas, já extinto e que se situava na freguesia de Marvila (Zona J de Chelas)

O Bairro do Condado, começado a implantar-se no final da década de 70 do Séc. passado, no mesmo local.

Fig. 4.2 – A transformação do espaço construído: os bairros de barracas deram lugar, em Chelas, a uma malha urbana densa, com alturas de prédios que variam dos 4 (os mais antigos) aos 14 pisos, “onde se articulam quase sem interrupção bandas e torres...com um total de 2250 habitações para um universo

estimado de cerca de 10 000 pessoas” (FRANCÊS, 2000)

2) Outro exemplo tem ocorrido especialmente a norte da “Segunda Circular” -

Av. Gen. Norton de Matos - (fig. 4.3), onde se verificou-se um crescimento

análogo, com a implantação de uma autêntica barreira à penetração dos

vento de norte. Actualmente o crescimento do bairro de Telheiras

(concebido para uma certa “classe média-alta”) tornou-se num emaranhado

de ruas, sem fio condutor.

Page 110: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 4 – Potenciais problemas ambientais devidos à modificação dos campos de vento com o crescimento da cidade nas próximas décadas

- 105 -

Fig. 4.3 – Vista do norte de Lisboa a partir da Segunda Circular (Av. General Norton de Matos). À esquerda uma paisagem ainda “intocada” no enfiamento do Colégio Militar. À direita a construção do “Parque dos Príncipes”, uma barreira arquitectónica de progressão ao vento de Norte, que “promete”

estender-se para leste, até ao Aeroporto de Lisboa (pelo menos até à sua relocalização).

3) Com a já anunciado relocalização do Aeroporto da Portela, toda a área da

infra-estrutura aeroportuária será um apetecível local para se construir

segundo os moldes actuais e prolongar-se para leste a barreira à progressão

do vento dominante.

Fig. 4.4 – “Alta de Lisboa” uma superfície de cerca de 300 ha a oeste do actual Aeroporto da Portela: uma promessa dos promotores construírem avenidas “largas e arejadas”, ainda não visíveis na sua fase inicial

(fotos extraídas da Internet do sítio do promotor imobiliário: www.altadelisboa.com).

4) A norte de Lisboa, o Concelho de Loures é um prolongamento natural do

tipo de urbanizações que se tem vindo a construir nos últimos anos na AML

(densificação da construção com forte crescimento em altura). A Carta de

Ordenamento do PDM (Plano Director Municipal) de Loures mostra

claramente uma dissimetria norte/sul, com o norte do concelho mais “verde”

onde predominam as zonas florestais e agrícolas, enquanto o sul, junto dos

limites do norte de Lisboa, os espaços urbanos ou urbanizáveis e industriais.

Page 111: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I – Modificação nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 106 -

Será pois de prever o extravasamento dos elevados índices de rugosidade

para fora dos limites da cidade.

5) Em Setembro de 2002 a imprensa escrita noticiava a vontade do actual

executivo camarário em apresentar ao governo as alterações ao RGEU

(Regime Geral das Edificações Urbanas), no sentido de permitir aumentar

ainda mais a altura dos prédios e alterar a “linha de 45 graus”, traçada a

partir do alinhamento da edificação fronteira (vulgarmente conhecida pelas

cérceas). Os argumentos foram publicados no Jornal “Público” da seguinte

forma:

"A proibição genérica de construir edifícios com mais de 25 metros de altura e em alguns casos 30, o equivalente a dez andares, deverá desaparecer proximamente do Plano Director Municipal (PDM) de Lisboa[...]. A ser aprovada, a medida aplicar-se-á a toda a cidade, com excepção das áreas históricas, das áreas consolidadas de moradias e da áreas consolidadas industriais. Para justificar a proposta, [o actual Presidente da Câmara] afirma que os actuais limites máximos das cérceas foram estabelecidos "há mais de oito anos" sem uma fundamentação coerente e "têm-se revelado extremamente inadequados e profundamente impeditivos do desenvolvimento urbanístico, económico e social de Lisboa e restritivos para a renovação urbana e inovação da arquitectura da cidade".... Essas restrições radicam numa "visão incompatível com a concepção de uma cidade metrópole, afastando Lisboa ainda mais de outras grandes capitais europeias ... onde a construção em altura é comum... O texto propõe recomendar ao Governo a "alteração urgente" da regra do RGEU segundo a qual a altura dos prédios não pode ultrapassar "o limite definido pela linha recta a 45 graus, traçada a partir do alinhamento da edificação fronteira". Para fundamentar esta recomendação, sem a qual, em alguns casos, a suspensão das normas do PDM relativas às cérceas não teria eficácia, a proposta refere que a norma dos 45 graus está ultrapassada pelas "actuais concepções" e pelas "modernas técnicas de construção"29.

De realçar que as pretensões dos responsáveis pelo executivo camarário foram

objecto de oposição por parte dos outros partidos e de alguns especialista em Urbanismo

e Arquitectura Paisagística, que consideram que "uma alteração do PDM que autorize o

aumento da altura dos edifícios é perigosíssima, porque permitirá a anarquia total no

29 Texto de J. CEREJO, jornal " Público" de dia 25 de Setembro de 2002.

Page 112: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 4 – Potenciais problemas ambientais devidos à modificação dos campos de vento com o crescimento da cidade nas próximas décadas

- 107 -

urbanismo da cidade" (Arq. Ribeiro Telles, Jornal de Notícias de 26 de Setembro 2002).

A questão não suscita pois consensos, uma vez que é apoiada pelas associações de

Mediação Imobiliária.

2. POTENCIAIS PROBLEMAS AMBIENTAIS DEVIDOS À MODIFICAÇÃO DO VENTO

Uma particular reflexão sobre os problemas ambientais devidos ao vento em

Lisboa decorre exactamente da conjugação de dois factores:

a) o forte crescimento urbanístico nos últimos anos no norte, noroeste e este da

cidade, com o aparecimento de urbanizações mais ou menos implantadas

segundo um modelo caótico”, sem um fio condutor, onde o espaço vai

sendo ocupado aos poucos, criando por vezes um emaranhado compacto de

prédios que surgem como “cogumelos”.

b) Por outro lado, esta área de maior intensidade na expansão urbana coincide

com as direcções dominantes do vento na região de Lisboa.

Na falta de eixos estruturantes, largos e “arejados”(de que o eixo Norte/Sul é

apenas uma excepção), que criem caminhos de ventilação de forma a permitir que o

vento dominante de norte possa continuar a “limpar” a cidade, poder-se-á criar

condições para que no futuro surjam alguns problemas ambientais que prejudiquem a

saúde dos Lisboetas. Pelos motivos atrás apontados, uma menor ventilação no sul da

cidade poderá, numa primeira análise, aumentar os picos de poluição em certos locais, e

o desconforto térmico, sobretudo no Verão, ou ainda fazer incrementar a intensidade de

vagas de calor, com as conhecidas consequências na saúde geral da população (LOPES,

2002).

Page 113: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

- 109 -

CAPÍTULO 5

MODIFICAÇÕES NOS CAMPOS DE VENTO INDUZIDOS PELO CRESCIMENTO

DE LISBOA E IMPLICAÇÕES NO AMBIENTE URBANO

1. OBJECTIVOS DESTE CAPÍTULO

A forma como os campos de vento se vão modificando com o crescimento

urbano é um tema que não tem tido a atenção devida, sobretudo por parte daqueles que

têm a obrigação de planear a “cidade do futuro”. E a importância desta questão prende-

se, como se viu anteriormente, com as condições de ventilação no espaço urbano e,

consequentemente, com as condições de conforto e saúde dos citadinos.

Nesta fase do estudo tenta-se mostrar como a expansão de Lisboa pode alterar o

vento regional em meio urbano e propõem-se alguns cenários que mostram as diferentes

consequência futuras nas condições de ventilação da cidade.

Os resultados foram obtidos com recurso a diferentes tipos de programas,

nomeadamente o “WASP”, criado pelo Wind Energy Department - Risø National

Laboratory da Dinamarca, com o qual se efectuou toda a modelação do vento (direcções

e velocidades), e o “Idrisi V.32” (um Sistema de Informação Geográfico e de

processamento automático de imagens concebido pela Universidade de Clark, sediada

Page 114: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I – Modificação nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 110 -

em Worcester, nos EUA), que serviu para proceder a todas as operações com alguma da

informação saída do WASP, nomeadamente a espacializada.

Com este e outros tipos de programas como folhas de cálculo, pode-se produzir

grandes quantidades de informação a partir apenas de uma série de dados, como

aconteceu no presente caso. Tentou-se ser o mais objectivo possível no trabalho

realizado, fugindo da “tentação” de produzir informação que não conduzisse

directamente às questões que se levantaram inicialmente. Mesmo assim, foram

produzidas “centenas de imagens” que não se apresentam, por questões de espaço, de

eficácia e racionalidade.

Para se preverem as modificações dos ventos devidas ao crescimento de Lisboa,

fez-se uma abordagem temporal, tendo em conta três momentos da evolução do sítio

onde está implantada a cidade:

1) Em primeiro lugar estimou-se o comportamento dos ventos no sítio onde se

encontra a cidade, mas sem a ocupação humana, ou seja, considerando

apenas a topografia da região como o principal factor de modificação do

vento;

2) Num segundo momento, conheceram-se as características do vento tendo

em conta não só o relevo, mas também a rugosidade do meio urbano. Para

tal elaborou-se um mapa com as rugosidades de Lisboa na década de oitenta

do século XX, que se apresenta mais adiante. Para calcular a rugosidade em

meio urbano é necessário ter informação sobre a altura das edificações.

Quando se iniciou este estudo, a informação existente era referente àquela

época e apenas existia para a cidade. Não foi possível incluir, portanto, esta

informação para as áreas limítrofes, o que condicionou certos resultados. Os

anos 70 e 80 representam, por outro lado, uma época de franca expansão do

norte da cidade e, como tal, constituiu um excelente exemplo para verificar

as modificações que se queriam demonstrar. Por último, a série de dados do

ventos de Lisboa mais completa e pormenorizada que foi possível utilizar,

data da década de setenta (Estação de Lisboa/Portela 1971/1980), o que

Page 115: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 5 – Modificações nos campos de vento induzidos pelo crescimento de Lisboa e implicações no ambiente urbano

- 111 -

compatibilizou toda a informação necessária à exactidão dos resultados

obtidos.

3) Finalmente, baseado nas tendências futuras da expansão de Lisboa,

apresentadas no CAPÍTULO 4, modelaram-se vários cenários com o fim de se

preverem as modificações dos campos de ventos nas próximas décadas em

diversos bairros de Lisboa, esboçando-se algumas possíveis implicações

ambientais, sobretudo no sul da cidade.

A influência da cidade nos campos de vento à superfície é analisada também

numa perspectiva espacial:

a) A partir da série de Lisboa/Portela e tendo em conta a rugosidade e o relevo,

foram calculados vários parâmetros de vento numa grelha de 250 por 250 m,

para as alturas de 10, 50, 100, 150, 200, 250, 300 e 500 m30. Pretende-se

assim dar uma imagem tridimensional dos campos de vento sobre a cidade

nos três momentos anteriormente descritos.

b) Foram também calculados os perfis de vento em altura (para os anos oitenta

e para as próximas décadas), em oito bairros de Lisboa: Baixa, Amoreiras,

Benfica, Monsanto, Restelo, Lumiar, Chelas e Oriente (fig. 5.1). Os locais

foram escolhidos tendo em atenção a sua posição geográfica na cidade e a

morfologia dominante, do ponto de vista da rugosidade, e com o intuito de

mostrar maior pormenor na análise. Uma descrição mais detalhada de cada

local é apresentada mais adiante.

30 Alguns autores, (PETERSEN et al., 1997) que colaboraram, ou pertencem ao laboratório que produziu o programa WASP, utilizaram-no para estimar valores até 1000 m de altura. Preferiu-se, neste trabalho, não exceder os 500 m, para centrar os resultados essencialmente sobre a influência da cidade nos campos de vento, altura acima da qual a urbe não deverá ter um grande contributo nas suas modificações.

Page 116: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I – Modificação nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 112 -

Fig. 5.1 – Imagem tridimensional da cidade de Lisboa. Em cima mostram-se os locais onde foram estimados os perfis de vento e a posição da estação de Lisboa/Portela, localizada no Aeroporto. As cores correspondem a grandes áreas com diferentes índices de rugosidade e que serviram de bases ao mapa da fig. 5.4. Em traços gerais, a cor verde corresponde aos espaços verdes, o vermelho ao núcleo central e mais denso da cidade e o amarelo às áreas cujo índice de ocupação é menor. Mais pormenores serão

dados no ponto 3 deste capítulo. Em baixo mostra-se o relevo simplificado da cidade.

2. NATUREZA DA INFORMAÇÃO UTILIZADA: APLICAÇÃO DAS ESTATÍSTICAS DE WEIBULL ÀS SÉRIES DE DADOS METEOROLÓGICOS DA ESTAÇÃO DE LISBOA/PORTELA.

2.1 MODELOS, PROGRAMAS E DADOS UTILIZADOS

Para estimar os perfis em altura e os campos de vento à superfície nos três

momentos “históricos” utilizou-se o programa WASP. Este software utiliza modelos

“diagnóstico” (do tipo linearised models conhecido por BZ-Model, - TROEN, 1990) e

resolvem as equações de quantidade de movimento, mas não de conservação de energia

(MONTAVON, 1998). Os modelos, elaborados a partir dos trabalhos de JACKSON e HUNT

(1975) e BRITTER, et al., (1981) e TAYLOR et al., (1983), utilizam princípios físicos do

escoamento na camada limite da atmosfera e permitem estimar as influências locais de

pequenas colinas e obstáculos (prédios, árvores e outros elementos que constituem a

rugosidade da superfície sobre o vento (FRANK et al., 2001). Não são pois apropriados

Page 117: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 5 – Modificações nos campos de vento induzidos pelo crescimento de Lisboa e implicações no ambiente urbano

- 113 -

para condições particulares em que o fluxo é conduzido por aspectos térmicos

(estratificação térmica e situações de brisas). É baseado numa solução que descreve a

perturbação do fluxo através de função conhecida como “perfil logarítmico do vento”.

Devido à característica de linearidade das funções, estes modelos estão restringidos a

áreas com declives inferiores a 30 % (MONTAVON, 1998). Estimou-se que menos de

10% da área de Lisboa não se enquadra neste contexto (áreas que se restringem a

vertentes de alguns vales da cidade). O WASP assume, portanto, condições de atmosfera

neutra, um estado em que a atmosfera não se encontra estável nem instável. Neste caso,

o gradiente térmico da atmosfera ambiente equivale ao gradiente adiabático não

saturado. Ocorre com ventos moderados a fortes e quando a superfície aquece ou

arrefece muito fracamente a camada limite. Com nebulosidade esse aquecimento ou

arrefecimento da atmosfera pela superfície é limitada, minimizando qualquer

estratificação térmica horizontal. O vento, por seu lado tende a homogeneizar a estrutura

térmica (OKE, 1987). É o estado que melhor caracteriza padrões atmosféricos médios

em longos períodos de tempo, sem entrar em conta com situações particulares de

estabilidade ou instabilidade, que podem ocorrer ciclicamente em curtos períodos de

tempo.

Para além de uma série alargada de dados de vento (no mínimo aconselhado de

10 anos de direcções e velocidades), o programa utiliza outros tipos de input, como a

superfície topográfica e as rugosidades características do terreno. Os dados utilizados

foram os da estação meteorológica de Lisboa/Portela31 (estação n.º 536 da rede do

Instituto de Meteorologia) formando uma base de dados contendo valores horários da

velocidade e direcção do vento no período de 1971/1980. Depois de se efectuarem

alguns testes de homogeneidade, verificou-se não existirem rupturas na série, pelo que

não foi necessário proceder-se a correcções. Para este trabalho, a série utilizada

(1971-1980) é a mais adequada, porque é correlativa da restante informação (rugosidade

nos anos 80).

Para proceder à estimação dos parâmetros do vento para outra época fora do

período 71/80 (por exemplo nas modificações com o crescimento da cidade nas

31 No início dos anos 80 do século XX esta estação foi substituída pela estação de Lisboa Gago/Coutinho.

Page 118: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I – Modificação nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 114 -

próximas décadas, partiu-se do pressuposto que o regime de ventos na estação de

referência não sofreu alterações significativas.

A topografia utilizada foi extraída da Carta Militar de Portugal na escala

1:25 000. Esta informação estava disponível no LNEC e serviu anteriormente outros

trabalhos (SARAIVA et al., 1997).

2.2 ESTATÍSTICA DE WEIBULL APLICADA AO VENTO

Como estimador de parâmetros do vento o programa WASP transforma e resume

a informação inicial (neste caso os dados horários dos dez anos, cerca de 173 000

valores) numa matriz que contém, para cada direcção, as frequências da velocidade do

vento, para cada rumo pretendido (Quadro 5.1).

Quadro 5.1 – Exemplo de uma matriz transformada pelo WASP referente ao Verão 1971/1980

N NNE NE ENE E ESE SE SSE S SSW SW WSW W WNW NW NNW

Freq.

total 36.12 3.72 2.06 2.13 2.31 1.2 0.61 0.64 0.89 0.92 2.46 4.56 5.52 4.05 6.46 26.34

1 5 38.5 74.1 71.6 70 127.1 234.9 224.9 165.9 155.3 58.4 31.4 29.3 38.8 23.6 6.1

2 38.1 115.8 167.5 170.3 267.4 313.7 245.1 170.7 208.5 98.2 75.7 103.4 187.4 189.3 109.7 37.2

3 52.5 171.8 207.2 193.8 263.5 336.3 319.4 270.2 172.9 127.7 99.7 95.5 134.8 133.3 108.3 54.8

4 197.7 320.5 315.2 272.6 314.6 207.8 193.1 248.9 289.9 270.1 252.9 248.6 295.9 305.8 272.7 154.7

5 33.5 36.6 39.7 49 11.8 0 7.4 28.4 20.3 44.2 40.6 40.8 46 28 48.5 28.4

6 156 128 127.9 146.9 47.2 7.6 0 42.7 106.8 108 164.3 169 157.8 182.6 170.8 144.7

7 185.7 103.6 46.3 80.9 21.6 3.8 0 7.1 30.5 98.2 140.3 198.9 111 105.3 163.8 193.4

8 103.8 36.6 17.6 6.4 3.9 3.8 0 0 0 39.3 66.5 48.7 26.3 11.2 58.3 134.9

9 112.4 30.5 4.4 8.5 0 0 0 0 5.1 29.5 48 41.8 9.9 5.6 28.1 117.1

10 40.7 11 0 0 0 0 0 0 0 0 25.8 13.9 1.6 0 6.3 54.4

11 46.2 3.7 0 0 0 0 0 7.1 0 19.6 16.6 7 0 0 7 50

12 20.9 3.7 0 0 0 0 0 0 0 9.8 7.4 1 0 0 1.4 18.4

13 4.3 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1.8 0 0 0 1.4 4.3

14 2.5 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1.8 0 0 0 0 1.4

15 0.5 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0

Freq

. por

cla

sse

vel

ocid

ade

x10

16 0.1 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0.2

Page 119: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 5 – Modificações nos campos de vento induzidos pelo crescimento de Lisboa e implicações no ambiente urbano

- 115 -

Fig. 5.2 - Rosa de ventos e distribuição de Weibull (com o respectivo histograma de frequências) produzidas automaticamente pelo programa WASP, referentes ao período de Verão de 1971 a 1980.

Apesar da natureza dos sistema de medição de grandezas atmosféricas

arredondarem as quantidades para valores discretos (no presente caso com médias

horárias), as séries de dados são normalmente suficientemente grandes e podem ser

tratadas como quantidades contínuas. As séries de vento são estatisticamente

assimétricas positivas, sendo a distribuição de Weibull uma das funções mais utilizadas

na sua representação por se ajustarem facilmente a este parâmetro (PETERSEN et al.,

1997). A sua função de densidade de probabilidade é:

(5.1)

em que k e A são, respectivamente os parâmetros de forma e escala, notação que se

utiliza neste trabalho, por ser a apresentada no WASP. Também são utilizadas as siglas

β (escala) e α (forma), como parâmetros da função de Weibull32. A resposta do

parâmetro de forma para diferentes valores de k é mostrada na fig. 5.3. Note-se que para

valores de k inferiores a 1 a forma da curva ajustada assemelha-se a um J invertido

formando uma forte assimetria positiva, que é exponencialmente reduzido para valores

próximos de 1. Os locais representados por uma tal distribuição possuem frequências

elevadas de ventos fracos. Para valores próximos de 4, a função de Weibull assemelha-

se mais a uma distribuição normal (Gaussiana). 32 Refere-se aqui, esporadicamente, α e β como parâmetros de forma e escala, por ser a notação comum nos manuais de estatística mais utilizados.

0,,,exp)(1

>

=

AkxAx

Ax

Akxf

kk

Page 120: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I – Modificação nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 116 -

O parâmetro de escala actua como "alongamento e compressão" da forma da

curva, (WILKS, 1995), aparentando-se, por analogia à curtosis estatística, a uma

distribuição leptocúrtica para valores baixos do factor de escala e a forma platicúrtica

para valores elevados. Neste último caso é maior a dispersão em torno dos valores

“médios”; no primeiro caso (forma leptocúrtica), quanto mais baixos forem estes

valores, maior a concentração em torno de velocidades de vento mais baixas.

Fig. 5.3 - Exemplos de distribuições da função da densidade de probabilidade de Weibull para: a) diferentes valores de k e um valor A constante (5); b) diferentes valores de A e um k constante (4).

Os valores de forma são adimensionais e o factor de escala representa um valor

proporcional à velocidade média do vento (STULL, 2000). Por questões práticas, é

referenciada por vezes neste trabalho apenas por velocidade média. Todas as análises e

resultados serão apresentados sob a forma de parâmetros de Weibull.

A partir das frequências das séries o programa determina o melhor ajustamento à

função de Weibull para cada direcção e os respectivos valores A e k. Com esta

informação, gerada a partir dos dados da série meteorológica de referência, o programa

estima o regime de vento para qualquer local, desde que seja conhecida a topografia e a

classe de rugosidade. As estimativas mais fidedignas com o WASP deverão seguir as

seguintes regras (FRANK et al., 2001):

a) A estação meteorológica de referência (neste caso Lisboa/Portela) e o local

onde se quer estimar o regime de vento devem estar em regiões onde se

façam sentir os mesmos "tipos de tempo".

k=0,5 k=1

k=2

k=4

A =5 A=3

A=5

A=10 A=20

k=4 b)

Variação do parâmetro de forma (k) Variação do parâmetro de escala (A)

Page 121: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 5 – Modificações nos campos de vento induzidos pelo crescimento de Lisboa e implicações no ambiente urbano

- 117 -

b) Deve-se assumir a estabilidade neutra atmosférica e que não se entra em

conta com os movimentos ascendentes ou descendentes de origem térmica

na camada limite da atmosfera.

c) A série de dados meteorológicos e o modelo topográfico deverão ser os

mais adequados e fidedignos possível.

d) A área a analisar deverá ser suficientemente "suavizada", para assegurar a

não separação do fluxo.

Todas estas condições estão presentes em Lisboa, para o total da áreas onde se

procederam as estimações. Apenas nos limites da cidade, por falta de informação,

sobretudo a norte, os comentários serão evitados nas análises apresentadas adiante.

2.3 QUALIDADE DO MODELO UTILIZADO

O risco que se corre ao se utilizar a modelação de dados, mesmo a partir de

séries “reais” (porque se desconhece parte dos erros), é largamente compensado pela

profusão de informação gerada. Por vezes, cai-se na tentação de explicar fenómenos

singulares, como se de dados observados se tratasse, provavelmente interessantes sob o

ponto de vista da investigação, mas por vezes inexplicáveis, por mais que o nosso

raciocínio, ou a nossa imaginação, nos incentive a elaborar complicadas teses para os

aclarar. Por esse motivos, neste trabalho, tentou-se ser o mais objectivo possível,

respondendo-se apenas às questões que se propõem como tese inicial.

Na impossibilidade de verificar a precisão dos resultados obtidos em todos os

locais, tentou-se avaliar os erros decorrentes da estimação dos valores no Aeroporto e

compará-los com os dados observados. Os resultados encontram-se representados no

quadro 5.2. Os valores positivos correspondem a sobre-estimações do modelo e vice

versa.

De um modo geral o modelo mostra erros bastante aceitáveis, sobretudo nos

meses de Verão, onde ocorre uma subestimação nas velocidade do vento na ordem dos

0,3 m/s e inferior a 0,4 no valor k de Weibull.

Page 122: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I – Modificação nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 118 -

Quadro 5.2 –Qualidade do modelo de estimação das séries de velocidade de vento da estação de Lisboa/Portela para o período de 1971-80 (valores estimados – observados)

Estações do ano (agrupadas como foi

determinado no ponto 4) Parâmetros de Weibull

A (m/s) k (adimensional)

Primavera + 0,7 + 0,06

Verão - 0,3 - 0,38

Outono/Inverno + 0,7 + 0,26

Na Primavera e no Outono/Inverno as estimações do parâmetro k são

ligeiramente melhores, mas as velocidades do vento são sobrestimadas em cerca de 0,7

m/s. Resta saber se os erros associados a este local (uma área plana e relativamente

extensa) têm uma tão boa correspondência onde o relevo é mais movimentado, ou onde

existem outras classes de rugosidade. Estes erros coincidem aproximadamente com os

obtidos noutros locais, onde erros inferiores a 2% são apontados (FRANK et al., 2001).

3. AS CLASSES DE RUGOSIDADE DE LISBOA NOS ANOS 80

A rugosidade é um dos principais factores que modificam os campos de vento,

diminuindo a velocidade de escoamento do ar junto à superfície. Como, nas cidades,

este factor é de difícil determinação, pelos motivos apresentados anteriormente (ver o

CAPITULO 1), é no mapa das rugosidades de Lisboa que se torna necessário um maior

rigor na definição das classes. Por esse motivo, apresentam-se aqui os critérios da sua

elaboração.

Como a escala de análise deste estudo é regional/local, a principal informação é

a altura dos prédios, sendo a largura das ruas apenas tomada em conta em casos

pontuais, sobretudo na definição de limites de áreas. Foi utilizada uma base de dados já

construída para outro trabalho (ANDRADE e LOPES, 1998), que contém a altura média

dos prédios na cidade, sendo esta informação representativa da década de 80 e, portanto,

mais ou menos correlativa dos dados do vento.

Com base na informação apresentada nos quadro 1.1 e 1.2 (CAPÍTULO 1), na

altura dos prédios da cidade nos anos 80 e numa imagem do satélite SPOT2 de 1 de

Page 123: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 5 – Modificações nos campos de vento induzidos pelo crescimento de Lisboa e implicações no ambiente urbano

- 119 -

Julho de 1991, consideraram-se as classes de rugosidade, que se apresentam no Quadro

5.3.

As classes 2 (Aeroporto) e 6 (Parque Florestal de Monsanto) foram obtidas a

partir de uma imagem multi-espectral do satélite SPOT 2 de 1 de Julho de 1991.

O Parque Florestal de Monsanto, larga mancha verde com cerca de 1000 ha, é

composta essencialmente por vegetação arbórea, e foi florestado a partir dos anos 30 do

século passado, por decisão do Eng.º Duarte Pacheco, na altura Ministro das Obras

Públicas.

Na delimitação do Parque de Monsanto foi utilizado um índice de vegetação

normalizado - NDVI (LOPES, 1998). Este índice é baseado na diferença dos valores

entre o canal próximo infravermelho, caracterizado por níveis elevados de reflectância33

e fraca absorção das plantas verdes, e o canal vermelho, onde a reflectância espectral é

baixa e dominada pela absorção (BELWARD, 1990). O valor limiar do índice para a

delimitar o parque florestal foi definido por ANDRADE E LOPES (1998).

As classes 5 e 7 correspondem a áreas urbanas consolidadas que, nos próximos

anos, pouco ou nada se irão modificar nos seus padrões de volumetria, e portanto

rugosidade.

As principais razões para lhes atribuir as rugosidades 0,5 e 1 m, respectivamente,

são as seguintes:

a) Estes valores são vulgarmente atribuídos às cidades europeias (1,0) e

subúrbios (0,5). Veja-se a propósito a classificação apresentada no

CAPÍTULO 1.

b) A partir da informação do número médio de pisos na cidade e considerando

o valor médio de 3 m por piso, estimaram-se alguns valores em áreas

amostra (Baixa, Avenidas Novas), que revelam valores de z0 próximos de

1,0 m e de 0,5 no Restelo e Encarnação.

33 Reflectância espectral (ρλ=ERλ/EIλ) – Relação entre a energia reflectida (ER) e incidente (EI) no terreno num determinado comprimento de onda (λ), expressa normalmente em percentagem (LILLESAND E KIEFER, 1994).

Page 124: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I – Modificação nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 120 -

Quadro 5.3 - Classes de rugosidade e características dos locais.

Classes z0 (m) Locais Observações

1 0,0) Rio Tejo

Apesar de este não ser o valor z0 típico das superfícies de água, foi necessário dar um input nulo ao programa para distinguir o rio Tejo da

cidade (MORTENSEN, 1993).

2 0,01 Aeroporto de Lisboa Apenas se considerou a área das pistas

3 0,02 Clareira central de Monsanto

Áreas ribeirinhas do oriente da cidade e docas Outros espaços parcialmente devolutos, como o vale de Chelas.

Áreas de muito fraca densidade urbana Note-se que a informação se reporta aos anos 80

4 0,03 Áreas do norte da cidade, que até aos anos 70/80 do Séc. XX mantinham fortes características “rurais”. Misto de áreas verdes e fraca densidade urbana

5

0,5

Bairros de Chelas, Encarnação Beato na zona Oriental Bairros periféricos de Monsanto, Restelo e Belém no Sudoeste da

cidade.

Bairros onde predominam as construções com 3 ou menos pisos

6 0,7 Parque florestal de Monsanto Zona com características de floresta

7

1,0

Núcleo central da cidade: zonas que se desenvolveram a partir das envolventes dos dois principais eixos: Av. da Liberdade, Campo

Grande; Av. Almirante Reis/Avenidas Novas. Para oeste prolonga-se até ao Vale de Alcântara e para Este até Chelas. O Aeroporto limita

esta área a Norte. Existem outros núcleos com as mesmas características mas que não contactam com a área nuclear da cidade:

Belém/Alcântara, Olivais e Benfica/Sete Rios

Bairros onde predominam as construções com mais de 3 pisos

Page 125: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 5 – Modificações nos campos de vento induzidos pelo crescimento de Lisboa e implicações no ambiente urbano

- 121 -

Fig. 5.4 – Mapa das rugosidades de Lisboa: à esquerda, a informação utilizada para a zonação das classes.

Á direita encontra-se mapa final com as rugosidades que serviram com um dos inputs no WASP (ver explicação no texto).

c) Na perspectiva a que estamos a “observar” a cidade (escala regional) e

considerando um padrão regular dos edifícios, a largura das ruas não

influencia grandemente o índice de rugosidade e, portanto, qualquer

classificação a esta escala passa essencialmente pela quantificação da altura

dos prédios. O facto de o índice de rugosidade ter em conta a área de

exposição ao vento, não é impeditivo do resultado final, já que a esta escala

é impossível de calcular, devido ao grande conjunto que forma a cidade. Por

isso, a generalização que se fez, para grandes áreas, não acarreta grandes

desvantagens à análise regional. Conclui-se que qualquer classificação da

rugosidade a esta escala, passa essencialmente pela quantificação da altura

dos prédios. O resultado final é apresentado na figura 5.4.

4. CLASSIFICAÇÃO DOS REGIMES DE VENTO EM LISBOA PARA O PRESENTE

ESTUDO.

De modo a estudar-se a influência do crescimento da cidade nos vários regimes

estacionais de vento, procedeu-se à classificação dos dados da estação meteorológica de

Lisboa/Portela, no período de 1971/1980. A base de dados possui cerca de 173 000

valores horários da velocidade e direcção do vento. A metodologia seguida para tratar

um tão grande conjunto de informação foi o seguinte:

Classes de rugosidade z0 (m)

Elevada densidade urbana Fraca densidade urbana Áreas Verdes Muito fraca dens. urbana Rio Tejo 0 1 km

Page 126: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I – Modificação nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 122 -

1) Em primeiro lugar, dividiu-se a base de dados em meses. De seguida

procedeu-se a uma primeira transformação da informação através do

programa WASP, passando os dados das direcções e velocidades médias

horárias para as séries de Weibull. Foram extraídos os parâmetros que

caracterizam as séries (A e k) para cada direcção e mês, construindo-se

várias matrizes com esta informação (ver exemplo no quadro 5.1).

2) Para evitar a fastidiosa descrição dos resultados mensais, preferiu-se a sua

apresentação em regimes estacionais, em conjuntos de meses que

apresentassem características semelhantes nos parâmetros de Weibull. Para

tal foram elaboradas várias classificações automáticas das séries mensais, a

partir das matrizes de dados referidas no ponto anterior.

O primeiro ensaio exploratório dos dados consistiu numa “análise em

componentes principais”, com rotação “varimax”, que permite uma definição mais clara

dos loadings obtidos e, consequentemente, uma melhor interpretação dos resultados,

(STATSOFT, INC., 1998). A projecção dos scores definidas pelos dois primeiros factores,

que representam 95,6% da variância total (fig. 5.5), evidenciam uma clara dicotomia

entre os meses de Verão e de Inverno. Dos meses de Verão, Setembro é o que, em

termos de regime de vento definido pelos parâmetros de Weibull, menos semelhanças

apresenta com os restantes, pelo que foi excluído deste grupo.

Fig. 5.5 – Análise em componentes principais (com rotação varimax normalizada) das séries de Weibull características do vento na estação de Lisboa/Aeroporto, no período 1971-80. Os dois primeiros factores representam 95,6% da variância total.

Page 127: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 5 – Modificações nos campos de vento induzidos pelo crescimento de Lisboa e implicações no ambiente urbano

- 123 -

Dois exemplos extremos (Dezembro e Julho) mostram as principais diferenças

nos regimes de vento: em Julho existem duas direcções dominantes (norte e nor-

noroeste com uma velocidade "média" (A de Weibull) superior a 6 m/s e k ≈ 2,5. As

velocidades mais elevadas são assim bastante mais frequentes do que Dezembro onde as

velocidades mais frequentes correspondem a valores mais baixos (curva com simetria

positiva).

Por último procedeu-se a uma classificação hierárquica do tipo "árvore de

ligações", para tentar clarificar a posição dos meses em cada regime estacional. Março,

Abril e Maio foram classificados como meses de Primavera e Outubro a Janeiro como

regime de Outono/Inverno, por estes meses apresentarem as mesmas características nos

parâmetros de escala/velocidade (A) e forma (k).

Parâmetros K e A de Weibulldas séries do vento

Lisboa/Portela

0

1

2

3

4

5

6

7

Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez

K (adimens.)

0

1

2

3

4

5

6

7

A (m/s)

A (m/s)K

Fig. 5.6 - Exemplos de distribuições de Weibull e rosas dos ventos de Dezembro e Julho (à esquerda) e

ritmo anual dos parâmetros A e k de Weibull (à direita), na estação de Lisboa/Portela para o período 1971-80.

Os agrupamentos utilizados neste trabalho são os que se mostram na figura 5.7,

passando a apresentar-se os resultados nestes três regimes anuais: de Verão, definido

pelos meses de Junho, Julho e Agosto; Outono/Inverno, definido pelos meses de

Outubro a Janeiro e Primavera de Março a Maio. Setembro e Fevereiro não foram

incluídos em nenhum dos grupos, por apresentarem comportamentos distintos dos

Page 128: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I – Modificação nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 124 -

outros meses. Setembro é um mês em que decrescem ambos os parâmetros, não

acrescentando nada ao Verão (efectivamente a velocidade do vento decresce bastante,

bem como o k), mas também não é tipicamente um mês de Outono. O Fevereiro

apresenta um pico no valor de k, que o separa dos conjuntos que o enquadram.

Fig. 5.7 - Árvore de ligações dos parâmetros A e k de Weibull, para classificação dos meses neste trabalho.

5. MODELIZAÇÃO DOS REGIMES DE VENTO EM LISBOA.

Como já se fez notar anteriormente, nesta parte da investigação pretende-se

responder a várias questões relacionadas com o crescimento da cidade e a sua influência

na modificação dos campos de vento.

Em primeiro lugar fez-se o estudo do vento regional tendo em conta apenas a

topografia de Lisboa, mostrando-se os traços gerais da relação entre os valores A (m/s) e

k de Weibull, dos grupos de meses obtidos no ponto anterior, reconhecendo-se assim as

características dos ventos antes do estabelecimento da cidade de Lisboa.

A primeira questão metodológica é saber até que ponto a série de Lisboa/Portela

traduz alguma influência da envolvente urbana ou se pelo contrário é representativa do

clima de ventos regional. A figura 5.8 mostra a posição daquela estação meteorológica

Page 129: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 5 – Modificações nos campos de vento induzidos pelo crescimento de Lisboa e implicações no ambiente urbano

- 125 -

em relação à cidade verificando-se que, na altura a que dizem respeito os dados, se

encontrava dentro das pistas do Aeroporto, longe de qualquer estabelecimento urbano.

Parte-se do pressuposto que as características do vento regional não se terão

alterado significativamente, desde antes da instalação da cidade até à actualidade.

Fig. 5.8 – Localização da estação meteorológica de Lisboa/Portela na cidade. Mostram-se ainda os locais onde se efectuaram estimações da velocidade do vento.

5.1 A INFLUÊNCIA DA TOPOGRAFIA NO VENTO REGIONAL: O SÍTIO DE LISBOA

Nesta parte do trabalho, estimou-se o comportamento dos ventos no sítio da

cidade, mas sem a ocupação humana, ou seja, considerando apenas a topografia da

região como principal factor de modificação do vento. Os resultados que se apresentam

correspondem aos valores estimados nos locais apresentados na figura 5.8.

Lisboa/Portela

Page 130: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I – Modificação nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 126 -

5.1.1 VELOCIDADE "MÉDIA" E REGIME FREQUENCIAL DOS VENTOS: RELAÇÃO

ENTRE OS PARÂMETROS A E k DE WEIBULL À SUPERFÍCIE E EM ALTITUDE.

Os parâmetros de escala e de forma da função de Weibull representam, como já

se referiu, as velocidade "médias" e a forma da distribuição de cada série de vento. O

factor de escala A é um valor proporcional à média (representado em m/s) e o k traduz a

forma da série: quanto mais baixo o valor, mais frequentes são as velocidades baixas;

quanto mais elevado for, maior a dispersão dos valores em torno de um valor médio

também mais elevado.

Combinando graficamente estes dois factores, mostra-se a sua variação em altura

(fig.5.9). Como se utilizaram os dados estimados até 500 m, a leitura do gráfico deve ser

feita como é indicado no canto superior direito.

Verifica-se que existe uma variação estacional dos parâmetros de Weibull. O

Verão é claramente a estação em que as velocidades do vento são as mais elevadas, ao

contrário do Outono/Inverno, onde apenas a cerca de 100 m de altura se igualam as

velocidade do vento estival à superfície. Em todas aos regimes estacionais o parâmetro

de forma (k) aumenta até aproximadamente aos 100 m, o que mostra a influência da

superfície na diminuição da velocidade média do vento e no aumento das frequências

das velocidades baixas. Na figura 5.10, mostram-se as curvas ajustadas de Weibull para

três alturas sobre Lisboa no Verão, que ilustram o que se acabou de expor. A partir dos

100m metros de altura esta relação altera-se: a velocidade média do vento continua a

aumentar com a altura, segundo a lei do perfil logarítmico do vento, mas o valor de k de

Weibull praticamente mantém-se, ou até diminui ligeiramente, devido a uma maior

constância nas velocidades em altitude. Este facto é comprovado por outros autores

(PETERSEN, 1997).

Na figura 5.9, nota-se uma semelhança entre os regimes de Primavera e Verão

no que diz respeito às velocidades do vento, sendo a ruptura mais clara com os regimes

de Outono/Inverno, sobretudo nas características frequenciais (k). Embora nestas

estações do ano, as velocidades médias sejam apenas ligeiramente inferiores às outras

(por exemplo verifica-se uma redução de cerca de 2 a 3 m/s à superfície em relação à

Page 131: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 5 – Modificações nos campos de vento induzidos pelo crescimento de Lisboa e implicações no ambiente urbano

- 127 -

Primavera ou ao Verão) os valores de k são substancialmente mais baixos (1,5 no

Outono/Inverno; 2,2 no Verão junto à superfície).

Também as características da camada limite se distinguem sazonalmente: nas

estações mais quentes do ano (Primavera e Verão) as diferenças de k são maiores entre a

superfície e os 100 m de altura (0,63 período estival), enquanto no Inverno/Outono a

diferença é menor (0,47).

Fig. 5.9 - Relação entre os parâmetros A e k de Weibull nos vários regimes estacionais do vento. Em

cima, à direita, apresenta-se uma ajuda à interpretação da gráfico: as alturas, em metros, expressam a sua posição aproximada nas curvas ajustadas.

R2 = 0.90

R2 = 0.88

R2 = 0.82

1

1.5

2

2.5

3

0 2 4 6 8 10 12 14 16 18 20

Weibull A (m/s)

Wei

bull

K (a

dim

ensi

onal

)

Outono/Inverno

Primavera

Verão

50 m

10 m

100 m 250 m

500 m

dif.=4,4 m/s

dif.=3,1 m/s

dif.=

0,47

di

f.=0,

63

Page 132: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I – Modificação nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 128 -

Junto à superfície

Características: A=6 (m/s) k=2,1

≈ 50 m de altura Características: A=8 (m/s)

k=2,4

≈ 100 m de altura Características: A=12 (m/s)

k=2,6 Fig. 5.10 - Curvas de Weibull características para regimes de vento a diferentes alturas do solo, no Verão,

sobre o sítio de Lisboa (sem a influência da cidade).

5.1.2 VARIAÇÕES ESTACIONAIS DOS PERFIS DE VENTO SEM A INFLUÊNCIA DA

CIDADE.

Nos locais indicados na figura 5.8, foram estimados os perfis médios da

velocidade do vento até à altura de 500 m, que se apresentam na fig. 5.115. Confirma-se

um aumento estacional ligeiro da velocidade média do vento da Primavera para o Verão

0

50

100

150

200

250

300

350

400

450

500

0 5 10 15

A de Weibull (m/s)

alt. (m)

out/invernoverãoprimavera

Fig. 5.11 - Perfis de vento estacionais estimados para Lisboa, integrados para todas as direcções, tomando

só a topografia em conta. Os valores correspondem às médias estimadas nos locais apresentados na figura 5.8.

5 Os perfis correspondem às médias de todos os locais.

Page 133: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 5 – Modificações nos campos de vento induzidos pelo crescimento de Lisboa e implicações no ambiente urbano

- 129 -

(de 5,5 para 5,9 m/s à superfície), com uma redução do período mais quente do ano para

o Outono/Inverno (4,2 m/s). Os valores estimados para a altura de 500 m traduzem-se

numa redução do vento do Verão para o Inverno de 15 para 11 m/s.

5.1.3 CONCLUSÃO SOBRE A INFLUÊNCIA DA TOPOGRAFIA NO VENTO EM LISBOA

Os valores apresentados6 mostram as características dos principais regimes de

vento dominantes em Lisboa:

a) A Nortada (62,5 % no período 1971-80), que sobretudo ocorre com maior

intensidade e persistência a partir do início do Verão, tem uma maior

amplitude de valores de k (0,63) e de velocidade (A=4,4 m/s) entre a

superfície e os 100 m de altura.

b) A Primavera é, em termos de velocidade de vento, uma verdadeira estação

de transição (fig. 5.12), com características semelhantes ao Verão, embora

com velocidades médias inferiores. Os rumos de norte e nor-noroeste são

"reduzidos" a 43,1 % das observações no período 1971/80.

c) Os regimes de Outono/Inverno onde predominam os ventos de norte e nor-

noroeste, marcados por uma maior frequência da passagem da frente polar

sobre o nosso território (26 % das ocorrências no período 1971/80). Este

regime é marcado por uma menor diferença de velocidade de vento entre a

superfície e os 100 m (3,1 m/s), bem como uma menor amplitude nos ventos

mais frequentes entre estas duas camadas atmosféricas (dif. k=0,47). A

passagem da estação quente para a estação mais fria do ano é "abrupta",

sobretudo em termos de frequências onde os maiores valores ocorrem nas

classes de vento mais baixas (à superfície k=1,5).

d) Em todos os regimes estacionais, junto à superfície, os valores mais

frequentes da velocidade do vento são as velocidades mais baixas, próximo

dos 100 m de altura a velocidade do vento continua a aumentar segundo o 6 Alguns dos valores foram obtidos por inquirição directa ao programa WAsP e poderão não constar no texto.

Page 134: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I – Modificação nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 130 -

perfil característico do vento na camada limite e, acima desta altura, os

valores de k mantêm-se, ou decrescem ligeiramente, o que mostra o efeito

da turbulência mecânica da superfície.

Fig. 5.12 - Rosas dos ventos estacionais e distribuições frequenciais no período 1971/80.

5.2. MODIFICAÇÕES NOS REGIMES DE VENTO COM O CRESCIMENTO DE LISBOA NOS

ANOS 80 DO SÉC XX

Nesta parte do trabalho, tentou avaliar-se as modificações nos campos de vento

originadas pela cidade de Lisboa. Em primeiro lugar, apresentam-se a relação entre os

valores A e k de Weibull calculados para os locais escolhidos, mas desta vez entrou-se

em conta com as rugosidades características de cada um nos anos 80. Mostram-se

também as diferenças dos valores estimados só com a topografia e depois com a

instalação da cidade.

5.2.1 VARIAÇÕES ESTACIONAIS DOS PARÂMETROS DE WEIBULL COM O

CRESCIMENTO DE LISBOA

As variações estacionais dos parâmetros podem ser observadas na figura 5.13,

verificando-se que, de um modo geral, existe uma redução significativa em ambos os

parâmetro de Weibull. Os resultados estimados para duas alturas (10 e 100 m) são

apresentados no Quadro 5.4, onde se observa claramente essa redução, o que mostra a

influência do crescimento urbano nos ventos na camada limite atmosférica.

Primavera Verão Outono/Inverno

Page 135: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 5 – Modificações nos campos de vento induzidos pelo crescimento de Lisboa e implicações no ambiente urbano

- 131 -

Quadro 5.4 – Reduções da velocidade do vento em Lisboa com o crescimento da cidade

Altura do solo (m)

Primavera Verão Outono/Inverno

A (%) k (%) A (%) k (%) A (%) k (%)

10 27,7 4,9 29,8 1,9 25,7 3,8

100 15,1 14,7 18,8 9,8 13,8 15,1

As maiores reduções relativas de velocidade do vento ocorreram junto à

superfície (cerca de 30 % de redução no A de Weibull no Verão, 28 % na Primavera e

26 % no Outono/Inverno). Pelo contrário a redução de k é maior à altura de 100m: ou

seja a forma das distribuições, sofrem um desvio para a esquerda, correspondendo

percentualmente, a uma maior concentração nas classes de velocidades baixas a essa

altura. Estes dois factos permitem considerar que a influência do crescimento da cidade

na baixa atmosfera urbana actua de duas formas distintas:

R2 = 0.90

R2 = 0.56

R2 = 0.88

R2 = 0.65

R2 = 0.82

R2 = 0.62

1

1.5

2

2.5

3

0 5 10 15 20

Weibull A (m/s)

Wei

bull

K (a

dim

ensi

onal

)

Primavera (Infl. só topog.)

Primavera (Rug. Anos 80)

Outono/Invero (Infl. só topog.)

Outono/Inverno Rug. A80

Verão (Infl. só topog.)

Verão (Rug. Anos 80)

50 m

1 0 m

1 00 m 2 50 m

5 00 m

Fig. 5.13 – Modificações estacionais dos parâmetros A e k de Weibull com o crescimento da cidade de

Lisboa nos anos 80. Veja-se a explicação na figura 5.9.

Page 136: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I – Modificação nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 132 -

Por um lado, reduz-se a velocidade média do vento junto ao solo, porque

aumenta a rugosidade. Mas pouco se alteram os regimes frequenciais daquela variável

meteorológica porque as classes de frequência já se encontravam centradas em torno

dos ventos mais fracos.

Sensivelmente a 100 m acima do solo, a rugosidade provoca uma redução da

velocidade média semelhante ao que acontece junto ao solo (de cerca de 2 m/s), mas

existe uma menor diminuição relativa (14 a 19 % de redução efectiva, enquanto à

superfície essa redução da velocidade do vento é de 26 a 30% - quadro 5.4 e 5.5).

5.2.2 MODIFICAÇÕES NOS CAMPOS DE VENTO: ANÁLISES PONTUAIS EM OITO

BAIRROS DE LISBOA.

A influência do crescimento de Lisboa nos regimes estacionais do vento foram

até aqui observadas no conjunto da cidade, sem se distinguirem, especificamente, a

posição e a morfologia (quantificada pelo parâmetro de rugosidade) de cada local. Os

critérios que levaram à escolha destes tiveram como base dois princípios, que são os que

se poderão melhor relacionar e interpretar com os valores estimados da velocidade do

vento:

a) o índice de rugosidade;

b) a posição geográfica do local na cidade;

Assim, o ponto é não só representativo do local em si, mas de uma área que tem

uma certa homogeneidade de morfologia “urbana” e topográfica.

Com base nestes critérios foram escolhidos (fig. 5.14):

1) Três pontos em índices de rugosidade de 1 m: dois no núcleo central da

cidade (a Baixa numa posição de fundo de vale e Amoreiras num topo) e um

terceiro ponto em Benfica, uma área plana do noroeste de Lisboa;

Page 137: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 5 – Modificações nos campos de vento induzidos pelo crescimento de Lisboa e implicações no ambiente urbano

- 133 -

Quadro 5.5 - Modificações nos parâmetros A e k de Weibull com o crescimento da cidade, nas séries de vento estimadas a 10 e 100 m de altura

do solo.

Altura do solo

Antes da cidade Depois da cidade anos 80 do século XX

Principais modificações

Vel. A Weibull = 9,9 Verão

(m/s) 8,6 Prim.

6,9 Out/Inv.

Vel. A Weibull = 8.0 Verão

(m/s) 7,3 Prim.

5,9 Out/Inv.

Menor diminuição do vento em relação à

superfície - 14-19% (em termos absolutos a

diminuição é semelhante, ≈ 1 a 2 m/s). 100 m

Par. k Weibull = 2,7 Verão

2,4 Prim.

1,9 Out/Inv.

Par. k Weibull = 2,4 Verão

2,1 Prim.

1,6 Out/Inv.

A diminuição dos valores de k implica o

aumento da frequência de vento mais fracos.

Vel. A Weibull = 6,3 Verão

(m/s) 5,5 Prim.

4,2 Out/Inv.

Vel. A Weibull = 4,4 Verão

(m/s) 3,9 Prim.

3,1 Out/Inv.

Maior redução percentual da velocidade do

vento (26-30%)

10 m

Par. k Weibull = 2,2 Verão

2,0 Prim.

1,5 Out/Inv.

Par. k Weibull = 2,2 Verão

1,9 Prim.

1,5Out/Inv.

Fraca ou nula diminuição do parâmetro de

forma de Weibull (k)

Page 138: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I – Modificação nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 134 -

2) Um ponto na grande “mancha verde” da cidade, num topo do Parque

Florestal de Monsanto (rugosidade=0,7);

3) Um ponto no Restelo, um bairro de características suburbanas, não com o

significado que é geralmente atribuído no nosso país, de aglomeração

“caótica” com prédios de apartamentos multifamiliares que ocupam

desordenadamente o tecido urbano intercalar, mas como no norte da Europa

e América, espaços de habitações unifamiliares, ajardinadas, localizadas nos

arredores dos grandes centros urbanos. Preferiu-se assim o conceito

“suburbano” tal como é referido na bibliografia estrangeira, por ser o que

corresponde índices de rugosidade atribuídos a esta classe em Lisboa

(rugosidade 0,5 m).

4) Um ponto no Lumiar, no norte da cidade, local que até aos anos

sessenta/setenta do século passado era povoado por quintas, olivais e vinhas,

plantadas no Sec. XVIII. No início do século XX os moradores do Lumiar

viam a velha aldeia transformar-se “num bairro da capital... cheio de

palacetes e cortado de eléctricos, carruagens e automóveis” . A partir da

década de sessenta assistiu-se a um forte aumento populacional. “A antiga

aldeia do Lumiar perdeu quase definitivamente as suas características nas

últimas décadas, especialmente depois da via rápida, Avenida Padre Cruz. O

núcleo antigo de Telheiras está cada vez mais reduzido e, no Paço do

Lumiar, até uma espécie de «Bunker» foi construído na zona histórica”

(CONSIGLIERI, 1993). No início dos anos 80, esta área da cidade era um

misto de paisagem bucólica e núcleos onde ocorre um forte e rápido

crescimento urbano (rugosidade=0,03 m). Mas o norte da cidade tem vindo

a crescer a um ritmo veloz, incrementando não só a sua área, como a

volumetria. É muito provável que a rugosidade, nos próximos anos,

ultrapasse largamente 1 ou mesmo 2m. Esta caracterização permite

atribuir-lhe, sem dúvida, a rugosidade 0,3 m.

5) Dois pontos na parte oriental da cidade, um num interflúvio entre o vale de

Chelas e o vale da Montanha, outro próximo do local onde se realizou a

EXPO 98. O valor de rugosidade atribuído (0,02 m), corresponde a áreas

Page 139: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 5 – Modificações nos campos de vento induzidos pelo crescimento de Lisboa e implicações no ambiente urbano

- 135 -

devolutas, (no caso de Chelas), ou áreas portuárias/industriais em situação

de desinstalação. Conjuntamente com o norte da cidade, estes dois pontos,

poderão servir para determinar quais os principais impactes ambientais para

o sul de Lisboa, devidos ao aumento da rugosidade e consequente redução

da velocidade do vento.

Na figura 5.14 apresentam-se as principais características topográficas, da

morfologia urbana e da posição de cada local escolhido na cidade.

Apresentam-se os resultados estimados para várias alturas, de A e k de Weibull

para cada um dos locais escolhidos7. Seria demasiado exaustivo enunciar todas as

pequenas alterações em cada local, por isso se apresentam apenas os casos mais

singulares. Relembre-se que os valores calculados integram todas as direcções.

Antes da implantação da cidade (curvas a cinzento na figura 5.15) verifica-se

uma certa homogeneidade acima dos 100 m de altura nos valores de A e k de Weibull. A

500 m de o relevo não influencia o vento geral (fig. 5.15 a , b e c). O topo da camada

turbulenta, deverá localizar entre 100 e 200 m (altura em que a influência da cidade

deixa de fazer sentir), mantendo-se ou mesmo diminuindo o valor de k. Dentro da

cidade, k pode ser mais variável de local para local no topo da camada turbulenta,

porque as velocidades médias são mais elevadas no Verão (fig. 5.15 d).

Com o crescimento e expansão da cidade até aos anos 80, as alterações nos

regimes de vento foram significativas. A “homogeneidade” da relação A e k de Weibull

desvanece-se e individualizam-se locais com características singulares. A Baixa, as

Amoreiras e Benfica (todas com rugosidade típica de 1,0 m) viram reduzir

significativamente a velocidade média do vento (fig. 5.15 e), especialmente no Verão. É

no entanto na Baixa, localizada num fundo de vale, onde o valor de k de Weibull mais

se reduz, o que significa um aumento das classes de vento mais fraco. Nos restantes

locais este parâmetro mantêm-se, o que significa que a turbulência se mantém mais

activa (curvas com simetria mais positiva do que na Baixa).

7 De referir que estes valores são exactamente os mesmo apresentados nos pontos anteriores, só que aqui são apresentados isoladamente.

Page 140: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I – Modificação nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 136 -

Local ORIENTE Posição

Geográfica em relação à cidade

Parte oriental da cidade, a oeste do Tejo, em frente ao “Mar da Palha”

Altitude aproximada ≈ 15 m

Posição topográfica

Área plana, litoral, sem exposição dominante; a ocidente existe uma vertente que culmina na área do Aeroporto de Lisboa). A Este, o “Mar da Palha” forma um "pequeníssimo mediterrâneo" na costa atlântica" (Gaspar, s/d)

Morfologia urbana dominante

Antiga zona portuária/industrial, durante os anos 80 esta parte da cidade era constituída essencialmente por áreas devolutas, depósitos de contentores, alguns armazéns e pela Refinaria Nacional de Petróleos da SACOR, encerrada em 1994.

Rugosidade da área onde se

insere 0,02 m

Local CHELAS

Posição Geográfica na

cidade

Parte oriental da cidade, mas numa posição de maior interioridade em relação ao ponto anterior

Altitude aproximada ≈ 80 m

Posição topográfica

Vertente exposta a sudeste; superfície rasgada pelo vale de Chelas no sentido noroeste/sudeste. O ponto onde formam estimados os ventos encontra-se num interflúvio entre o vale de Chelas e o Vale da Montanha

Morfologia urbana dominante Maioritariamente constituída por áreas devolutas até aos anos 80.

Rugosidade da área onde se

insere 0,02 m

Local BAIXA

Posição Geográfica na

cidade

Sul/centro; localiza-se, tal como os pontos anteriores, junto do rio Tejo (a sul)

Altitude aproximada ≈10 m

Posição topográfica

Fundo de vale, aberto a noroeste ao eixo da avenida da Liberdade e a nor-nordeste ao eixo da Av. Almirante Reis

Morfologia urbana dominante

A Baixa Pombalina é o exemplo do período urbanístico que surgiu durante a reconstrução da cidade após o terramoto de 1755, caracterizado por ruas traçadas e planeadas geometricamente, formando um conjunto com as ruas ortogonais, orientadas umas nor-noroeste/su-sudeste e outras perpendicularmente. A altura dos prédios ronda os 25-30 m e a largura das ruas varia entre 8 e 14 m.

Rugosidade da área onde se

insere 1 m

Local AMOREIRAS

Posição Geográfica na

cidade

Localizado numa das “colinas” da cidade; cuja vertente sul desce suavemente cerca de 2,5 km até ao Tejo (Alcântara).

Altitude aproximada ≈100 m

Posição topográfica

Interflúvio entre a cabeceira do vale da Avenida da Liberdade/Parque Eduardo VII e o vale de Alcântara.

Morfologia urbana dominante

As Amoreiras, formam um conjunto bastante heterogéneo, com um núcleo mais antigo de prédios baixos (associados a uma antiga área industrial), quarteirões de traçado rectilíneo (Bairro de Campo de Ourique) e torres de ≈50 m que datam dos anos 80

Rugosidade da área onde se

insere 1 m

Fig. 5.14 a – Breve caracterização morfológica e urbana dos locais escolhidos, relativa aos anos 80.

Page 141: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 5 – Modificações nos campos de vento induzidos pelo crescimento de Lisboa e implicações no ambiente urbano

- 137 -

Local LUMIAR

Posição Geográfica na

cidade

Interior/norte da cidade, imediatamente a sul da grande depressão de Loures, orientada nordeste/sudoeste

Altitude aproximada ≈100/130 m

Posição topográfica

Superfície suave e aplanada, a ocidente do aeroporto, com alguns “cabeços” a ondularem ligeiramente o relevo.

Morfologia urbana dominante

Até aos anos 80 o norte da cidade tinha um povoamento disperso, com alguns núcleos urbanos mais antigos de casario baixo (Carnide e Lumiar), salpicada por quintas e palácios. A partir da década de 80 sofreu um forte impulso de construção surgindo, desordenadamente, novos bairros um pouco por todo o lado. O aeroporto, inaugurado em 1942, tem mantido o norte/oriental da cidade com a sua função de corredor de ventilação do vento dominante. Até quando?

Rugosidade da área onde se

insere 0,03 m

Local BENFICA

Posição Geográfica na

cidade Extremo ocidental/interior da cidade.

Altitude aproximada ≈70/80 m

Posição topográfica

Área plana, sem exposição dominante, localizado imediatamente a norte da colina de Monsanto.

Morfologia urbana dominante

Construído a partir de um núcleo antigo dos “arredores” da cidade, foi aumentado e estruturado a partir de 1947 em torno da estrada com o mesmo nome. Nos nossos dias constitui um aglomerado populacional denso, que prolonga o eixo Pr. de Espanha/Sete Rios até às portas de Benfica, local de contacto com o município da Amadora. As alturas médias dos prédios variam entre aproximadamente os 6 e 30 m e a largura das ruas entre 15 e 25m.

Rugosidade da área onde se

insere 1,0 m

Local MONSANTO Posição

Geográfica na cidade

Parte ocidental da cidade, enquadrado pelo vale de Campolide/Alcântara a oriente, pela ribeira de Algés a ocidente e a norte pelo bairro de Benfica. Cerca de 2 km separam o parque florestal do Tejo, a sul.

Altitude aproximada ≈160 m

Posição topográfica Topo de colina

Morfologia urbana dominante

Parque florestal, actualmente com cerca de 1000 ha, foi florestado a partir dos anos 30 do século passado. É composto essencialmente por vegetação de porte arbóreo. Possui uma clareira no seu interior com alguns equipamentos prisionais e judiciais; rugosidade 0,02 m.

Rugosidade da área onde se

insere 0,7 m

Local RESTELO

Posição Geográfica na

cidade Localizado a Sudoeste de Monsanto a um escasso quilómetro do Tejo.

Altitude aproximada ≈ 10 a 40 m

Posição topográfica

Vertente exposta a sul e sudoeste, com declives suaves que raramente ultrapassam 15º.

Morfologia urbana dominante

Este bairro é predominantemente constituído por moradias de 1 ou 2 andares, normalmente ajardinadas. As ruas são largas (≈20 m) e formam arcos concêntricos, cuja convexidade aponta para sul, para o rio Tejo. Os prédios não excedem 6 m de altura. Os espaços são abertos e arejados.

Rugosidade da área onde se

insere 0,5 m

Fig. 5.14 b – Breve caracterização morfológica e urbana, dos locais escolhidos, relativa aos anos 80

Page 142: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I – Modificação nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 138 -

5.2.3. A VELOCIDADE DO VENTO ESTIMADA PARA A SUPERFÍCIE (10 m DE ALTURA) NOS BAIRROS ESCOLHIDOS: ANÁLISE DOS VALORES DE A E K DE WEIBULL

As alterações nos parâmetros A e k de Weibull a 10 m de altura durante o

Verão, antes e depois da instalação da cidade, são representadas através de setas na fig.

5.16. Não se apresentam os resultados para as outras estações do ano porque o período

estival é o mais expressivo nas características apresentadas. As principais diferenças

com as restantes estações do ano parecem depender apenas de um factor de escala, tal é

a semelhança das curvas observadas anteriormente.

No Verão, notam-se claramente três situações distintas: 3 locais (Baixa,

Amoreiras, e Monsanto) onde se verificaram as maiores reduções na velocidade média

do vento (entre 2,7 e 3 m/s). São os locais de maior rugosidade, excepto Monsanto

(rugosidade 0,7) que era um local bem ventilado no topo de uma colina, antes da sua

florestação, mas cuja arborização fez diminuir a velocidade do vento. Num segundo

grupo surgem dois locais, na parte ocidental da cidade, com reduções ligeiramente

inferiores aos grupo anterior (Restelo com 1,9 m/s e Benfica com 2,0 m/s).

Por último, um grupo de 3 locais (Lumiar, Chelas e Oriente), inseridos em

áreas de fraca rugosidade dentro da cidade (respectivamente 0,03 m, e 0,02 m), onde a

redução estimada do vento é fraca (0,5 a 1,2 m/s). Este facto explica-se pela fraca

densidade de ocupação até aos anos 80.

5.3. MODIFICAÇÕES NOS REGIMES DE VERÃO (ANOS 80 DO SÉC. XX).

Do que foi exposto, é claro que o Verão é a estação do ano em que as variações

de vento com o crescimento da cidade poderão ser ambientalmente mais desfavoráveis.

Por este facto, centrar-se-á a investigação nesta estação do ano, apesar de já se ter

mostrado o exemplo das variações de A e k de Weibull, estimadas a 10 m de altura nesta

estação do ano. Não será inserida neste capítulo, porque aqui se dará maior ênfase à

análise espacial das modificações nos campos de vento e dos perfis em altura sobre a

cidade.

Page 143: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 5 – Modificações nos campos de vento induzidos pelo crescimento de Lisboa e implicações no ambiente urbano

- 139 -

Outono/Inverno

1.2

1.4

1.6

1.8

2

2.2

2.4

2.6

2.8

0 5 10 15 20

A de Weibull (m/s)

K d

e W

eibu

ll

primavera

1.2

1.4

1.6

1.8

2

2.2

2.4

2.6

2.8

0 5 10 15 20

A de Weibull (m/s)

K de

Wei

bull

verão

1.2

1.4

1.6

1.8

2

2.2

2.4

2.6

2.8

0 5 10 15 20

A de Weibull (m/s)

K d

e W

eibu

ll

Fig. 5.15 - Relação entre os parâmetros estacionais A e k de Weibull, nos locais escolhidos. As curvas a cinzento cheio representam a situação em que se estimaram os parâmetros A e k de Weibull tomando em

conta só a topografia. As outras, mais finas, representam as modificações dos anos 80.

50 m

10 m

100 m 250 m

500 m

a

b

c

d

e

d

Baixa

Diminuição vel. vento

k diminui

Amoreiras » k mantém-se Benfica » » Restelo » »

Baixa Amoreiras Benfica Monsanto Restelo Lumiar Chelas Oriente Baixa Amoreiras Benfica Monsanto Restelo Lumiar Chelas Oriente

Só in

fluên

cia

da to

pogr

afia

R

ugos

idad

e an

os 8

0

Page 144: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I – Modificação nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 140 -

Fig. 5.16 - Relação entre os parâmetros A e k de Weibull calculados para 10 m de altura, no Verão. Os vectores representam a deslocação dos valores entre os duas situações consideradas: só a topografia

(início do vector) e os anos 80 (fim)

Expõem-se as modificações do vento no Verão, induzidas pelo crescimento da

cidade sob duas perspectivas, começando por se mostrar o seu efeito na coluna

atmosférica, através de perfis de vento, e só depois as variações espaciais, a vários

níveis de altura.

Numa primeira abordagem espacial analisam-se as diferenças da velocidade

"média " do vento na alturas estimadas no programa WASP a 10, 50, 100, 150, 200, 250,

300 e 500 m. Mais adiante mostrar-se-á a desnecessidade de analisar todos estes níveis

em pormenor, limitando a investigação aos primeiros 150 m da camada limite

atmosférica.

Salienta-se ainda o exemplo das modificações do vento muito forte

(frequentemente Nortada) com o crescimento da cidade, a partir dos valores estimados a

10 m de altura.

Introduz-se este tema com a influência do relevo nos campos de vento no Verão

sobre a cidade, a partir das rosas dos ventos estimadas nos vários locais escolhidos.

Necessariamente mais descritivo, este próximo ponto servirá para fazer a ligação com

Verão

1.8

2

2.2

2.4

3 3.5 4 4.5 5 5.5 6 6.5 7 7.5 8

A de Weibull (m/s)

K d

e W

eibu

ll

Baixa

Amoreiras

Benfica

Monsanto

Restelo

Lumiar

Chelas

Oriente

Redução da

velocidade do vento à

superfície (m/s)

3,0

3,0

2,0

2,7

1,9

0,5

1,2

0,7

Page 145: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 5 – Modificações nos campos de vento induzidos pelo crescimento de Lisboa e implicações no ambiente urbano

- 141 -

os seguintes (onde se introduzem as rugosidades típicas de Lisboa), para se

compreenderem melhor as modificações dos campos de vento no Verão.

Toda a análise espacial baseou-se numa grelha de 250x250 m já utilizada

noutros trabalhos com resultados satisfatórios (LOPES, 1998 e ANDRADE e LOPES, 1998).

5.3.1 O EFEITO DO RELEVO SOBRE OS CAMPOS DE VENTO NO VERÃO (DIRECÇÕES E VELOCIDADES MÉDIAS).

Convirá referir que as conclusões apresentadas são baseadas em valores

estimados, não entrando, por exemplo, em conta com as brisas que se fazem sentir nesta

época do ano. Os resultados correspondem a situações médias de Verão, quando a

Nortada é preponderante na cidade (fig. 5.17). A máxima frequência estimada tem lugar

na Baixa (41 %), influenciada pela canalização do vale percorrido pela Av. Almirante

Reis. A segunda direcção neste local (27%) ocorre de nor-noroeste, aproveitando a

direcção do vale da Av. da Liberdade.

Em Monsanto e no Restelo a direcção mais frequente, segundo o modelo (que

toma em conta a rugosidade e a topografia) é nor-noroeste, o que significa que os ventos

contornam a colina e convergem na zona ribeirinha, entre Algés e Alcântara. A

confluência de ventos poderá deixar de ocorrer para oriente, já que no centro da cidade

(Amoreiras), as direcções predominantes apresentam praticamente a mesma ocorrência

(24 e 25 %).

Quando analisadas as velocidades médias estimadas de Verão, sem a influência

da cidade, tendo em conta todas as direcções (fig. 5.18), verifica-se que junto à

superfície (10 m) o modelo sugere as velocidades mais elevadas na colina de Monsanto

(com velocidades médias de cerca de 7 a 8 m/s, fig. 5.18 a), com acelerações pontuais

no sul da cidade - cerca dos 6 m/s), onde o relevo desce do planalto para o Tejo (b) e no

reverso da costeira de Loures(c), num eixo nítido paralelo à depressão como mesmo

nome. Sem a influência da cidade, o planalto do norte de Lisboa é ainda assim um local

onde as velocidades estão limitadas a valores mais fracos, rondando os 6 m/s (d). Por

entrar em linha de conta com todas as direcções do vento o modelo estima as

velocidades mais fracas (inferiores a 5m/s) nos fundos dos vales, sobretudo na

Page 146: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I – Modificação nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 142 -

depressão de Loures (e), a norte, no vale de Alcântara (f), Baixa (g), nos vales de Chelas

(h) e faixas ribeirinhas do Tejo, a sul e a este.

Em altitude (sobretudo a 500 m) as diferenças nas velocidade médias esbatem-

se, facto que se verifica num desvio-padrão de 0,22 m/s e uma amplitude de apenas 1,4

m/s em toda a área de Lisboa (Quadro 5.6), ao passo que a 10 m estes valores são de

0,62 m/s e 5,7 m/s.

Quadro 5.6 - A de Weibull (m/s) a diversas alturas (só relevo).

Alt. (m) 10 250 500 Velocidade média

(m/s) 5,96 12,8 15,2

Desvio-padrão (m/s) 0,62 0.29 0.22

Amplitude de vel. médias (m/s) 5,7 2,0 1,4

5.3.2 OS PERFIS VERTICAIS DE VENTO COM AS RUGOSIDADES TÍPICAS DA CIDADE NOS

ANOS 80.

A partir dos locais escolhidos na cidade foram estimados os perfis médios das

velocidades dos ventos (A de Weibull) até à altura de 500 m no Verão. Foram

introduzidas no modelo as rugosidades típicas da cidade de Lisboa nos anos 80.

Relembre-se que estes perfis correspondem às médias de todos os locais escolhidos e

integradas todas as direcções do vento.

Observa-se, mais uma vez, uma redução geral na velocidade do vento com a

instalação da cidade de Lisboa, que se traduz em cerca de 2 m/s junto à superfície (a 10

m de altura corresponde a cerca de 30% de redução na velocidade do vento) e cerca de

3m/s a 250 m de altura (fig. 5.19).

Page 147: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 5 – Modificações nos campos de vento induzidos pelo crescimento de Lisboa e implicações no ambiente urbano

- 143 -

Fig. 5.17- Direcções do vento e respectivas curvas de Weibull estimadas para o Verão nos bairros escolhidos em Lisboa. Note-se que a rosa dos ventos da

estação de Lisboa/Portela foi elaborada a partir dos valores horários registados nos meses definidos no ponto 4, para o período 1971-1980.

Page 148: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I – Modificação nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 144 -

A de Weibull (m/s)

altu

ra

Velocidade do vento (m/s) al

tura

Velocidade do

vento (m/s) altu

ra

Velocidade do vento (m/s)

10 m

50 m

100

m

150

m

200

m

250

m

300

m

500

m

Nota: as escalas de valores de velocidades e as cores respectivas não são iguais em todas as figuras, não reflectindo, portanto, a mesma

amplitude em todos os mapas.

Figura 5.18. – Velocidades do vento estimadas para várias alturas acima do solo (situação de Verão, só com o relevo).

(a)

(b)

(c)

(d)

(e)

(f) (g)

(h)

Page 149: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 5 – Modificações nos campos de vento induzidos pelo crescimento de Lisboa e implicações no ambiente urbano

- 145 -

Verão

0

100

200

300

400

500

0.0 5.0 10.0 15.0

A Weibull (m/s)

Alt. (m)

Só topograf ia

rugosidade anos 80

Fig. 5.19 - Perfis de vento estivais estimados para Lisboa, integrados para todas as direcções. A tracejado

representa-se o perfil de vento estimado sobre Lisboa sem a influência da cidade. A curva a cheio, as velocidades nos anos 80. Os valores correspondem às médias estimadas nos locais escolhidos.

5.3.3 MODIFICAÇÕES DOS CAMPOS DE VENTO COM O CRESCIMENTO DA CIDADE NOS

ANOS 80.

Analisam-se de seguida as principais diferenças espaciais nos regimes das

velocidades médias dos ventos de Verão na cidade de Lisboa, nas várias altitudes

estimadas no programa WASP. Compararam-se os valores estimados só com o relevo e

os resultados obtidos com o crescimento da cidade nos anos 80. A técnica é simples e

consiste na subtracção das velocidades do vento (A) e dos valores de k de Weibull, entre

os dois períodos (EASTMAN, et al., 2000), às várias alturas. Os valores positivos

representam uma diminuição da velocidade do vento com a instalação da cidade.

Analisaram-se apenas os primeiros 150 m acima da superfície porque acima desta

camada atmosférica os valores estimados são semelhantes em toda a cidade denotando o

limite da influência da rugosidade em altura. Quanto ao valor de k de Weibull é apenas

visivelmente variável nas camadas mais baixas da atmosfera, pelo que se apresentam

Page 150: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I – Modificação nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 146 -

apenas os resultados a 10 e 50 m. Conjuntamente com as rugosidades apresentam-se os

principais resultados na figura 5.20, para se ter uma melhor percepção dos locais onde

ocorreram as maiores modificações nos campos de vento.

A 10 m de altura, o modelo mostra-nos uma maior redução da velocidade do

vento no núcleo central da cidade (rugosidade 1,0 m) , sendo essa redução da ordem dos

3 m/s, sobretudo na Baixa. Junto dos grandes eixos, que correspondem em regra geral

aos fundos dos vales, ocorreram as maiores reduções nos valores de k. Apesar da colina

de Monsanto atingir uma altitude maior do que cidade (a sua cota máxima ronda 216 m

de altitude enquanto a cidade tem uma altitude média de cerca de 70 m) e portanto

poder esperar-se velocidades mais elevadas, a redução do vento é significativa (cerca de

2,5 m/s) devido à rugosidade típica do parque florestal com as suas árvores de alto porte

(z0=0,7 m).

Em toda a envolvente deste núcleo, que é composta pelos Bairros do Restelo,

Belém, Benfica e nas áreas construídas das zona oriental da cidade (onde se incluem

uma parte da zona de Chelas, Olivais e Encarnação), estimou-se uma redução da

velocidade do vento na ordem dos 2 a 2,5 m/s.

No norte da cidade, pelo contrário, onde a rugosidade até aos anos 80 era mais

baixa (0,03 m), a redução do vento foi evidentemente muito menor, traduzindo-se num

valor médio inferior a 1 m/s. Esta dicotomia norte/sul resultante sobretudo da diferente

ocupação do solo na redução do vento médio, e bem nítida no histograma apresentado

na figura 5.20, verificando-se um aspecto bimodal nas frequências daquele parâmetro.

Os valores de k de Weibull têm variações pouco significativas à superfície,

notando-se uma ligeira diminuição, nomeadamente ao longos dos principais eixos da

cidade, tal como já se tinha mostrado anteriormente.

A 50 m de altura os valores de k são praticamente semelhantes em toda a cidade,

o que significa que a esta altura deixa-se de fazer sentir o efeito da turbulência mecânica

produzida pelas edificações. Atenuam-se os contrastes na redução da velocidade média

do vento entre as várias áreas urbanas, notando-se o aparecimento nítido de uma coroa

de transição (com reduções na ordem dos 1,5 m/s), entre o sul da cidade, onde as

reduções continuam a ser na ordem dos 3 m/s e o norte da cidade.

Page 151: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 5 – Modificações nos campos de vento induzidos pelo crescimento de Lisboa e implicações no ambiente urbano

- 147 -

DIMINUIÇÃO DA VELOCIDADE DO VENTO - A (m/s) E VARIAÇÕES DE k DE WEIBULL COM O CRESCIMENTO DE LISBOA NOS ANOS 80 DO SÉC. XX (VER TEXTO PARA EXPLICAÇÕES ADICIONAIS).

Histograma de frequências da imagem da velocidade do vento a 10 m de altura

Variações no k de Weibull (adimensional)

Diminuição na velocidade do vento (m/s)

Os valores de k são praticamente invariantes a 500m de altura (a amplitude de k para toda a cidade de Lisboa é de 0,1) e pouco significativo à superfície nos dois mapas em baixo (1,1 e 0,4 respectivamente a 10 e 50 de altura).

altu

ra -

10 m

altu

ra -

10 m

altu

ra -

50 m

altu

ra -

50 m

0 2 km

Page 152: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I – Modificação nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 148 -

altu

ra

Diminuição na velocidade do vento (m/s)

100

m

A partir dos 100/150 m de altura as diferenças nas velocidades entre os valores estimados só com a topografia e com as rugosidades dos anos 80 não têm expressão, sendo essas variações na ordem dos 1,0 m/s, enquanto a 10 m de altura (página anterior) a amplitude de valores atinge os 3,3 m/s.

150

m

Nota: Para efeitos de comparação, as escalas de valores de velocidades e as cores respectivas são iguais em todas as

figuras, reflectindo, portanto, a mesma amplitude em todos os mapas. A equidistância das isolinhas é de 0,5 m/s

Histograma de frequências da imagem da velocidade do

vento a 150 m de altura

Fig. 5.20 – Diminuição da velocidade do vento a diversas alturas e variação do k de Weibull no Verão, em Lisboa, devido ao efeito da rugosidade.

A 100 m, a redução do vento no sul da cidade apresenta já valores semelhantes

ao norte (com excepção de um núcleo centrado na Baixa) e, a 150 m de altura, o efeito

urbano é pouco significativo, não havendo praticamente diferenças entre o norte e o sul

da cidade na redução na velocidade do vento, sendo esta inferior a 1 m/s. Isto é nítido

no histograma de frequências das diminuições das velocidades médias do vento, que

apresenta apenas um pico acima dos 2 m/s (fig. 5.20).

DIMINUIÇÃO NA VELOCIDADE DO VENTO - A DE WEIBULL (m/s) COM O CRESCIMENTO DE LISBOA NOS ANOS 80 DO SEC. XX

Page 153: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 5 – Modificações nos campos de vento induzidos pelo crescimento de Lisboa e implicações no ambiente urbano

- 149 -

Confirma-se a influência da cidade até aos 100/150 m de altura, sendo a partir

daí pouco influente nos ventos gerais que passam sobre Lisboa.

5.3.4 MODIFICAÇÕES EM OCASIÕES DE NORTADA FORTE.

Depois de observadas as principais modificações do vento no Verão com o

crescimento da cidade, integrando todas as direcções e velocidades, tentou perceber-se

as diferenças nos dias com velocidades de vento extremos, caracterizados pela

predominância do quadrante de norte e velocidades média iguais ou superiores a 5 m/s

(valor aproximado daquele definido por ALCOFORADO (1987) para a "Nortada forte", de

20 km/h ≈ 5,56 m/s).

Para o efeito, foi construída uma nova série de dados, a partir da original

(Lisboa/Portela 1971-80), mantendo-se intactos todos os valores iguais ou superiores a

5 m/s que proviessem de um azimute inferior a 35º ou superior a 325º (valores

característicos da "Nortada forte"). Para todos os restantes valores foram mantidas as

direcções, mas substituídas as velocidades reais por 0,001 m/s, com o fim de manter o

funcionamento do WASP.

Com este procedimento,foi obtida uma nova tabela contendo as frequências, e os

parâmetros A e k de Weibull, sem se perder a informação fundamental característica da

dominância do vento forte de norte. Os resultados, que a seguir se apresentam, resultam

das diferenças entre a diminuição da velocidade média do vento, estimada tendo em

conta todas as direcções e velocidades, e a diminuição do vento tendo em conta só o

vento forte (superior a 5 m/s) de norte. O efeitos da Nortada praticamente não se

distingue das restantes componentes direccionais do vento no norte da cidade, entre

Benfica e o Aeroporto. Três vias de "penetração" são visíveis para sul: uma em

Campolide até às Amoreiras (fig. 5.21 a), uma segunda que se estende pelas zonas ainda

pouco urbanizadas de Chelas (b) (nos anos 80) e toda a parte oriental da cidade,

posteriormente ocupada pela zona da Expo (c). Correspondem a áreas com rugosidades

baixas (<0,03 m), constituindo, na altura, barreiras pouco eficientes à penetração do

Page 154: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I – Modificação nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 150 -

A DIMINUIÇÃO DA VELOCIDADE DO VENTO EM DIAS DE NORTADA FORTE

Diferença entre a diminuição da velocidade do vento tendo

em conta todas as direcções e velocidades e os dias de Nortada forte (velocidade média superior a 5 m/s) no

Verão.

Altu

ra -1

0 m

O histograma de frequências da figura, mostra dois

conjuntos distintos: um no norte da cidade, cujo padrão da diminuição do vento não se altera quando a "Nortada

é forte" e outro, no sul da cidade onde essa diminuição

é mais acentuada. A informação é referente à

velocidade do vento estimada a 10 m de altura.

As isolinhas a branco

representam o relevo e as linhas azuis os limites das rugosidades (figura 5.4)

Fig. 5.21- Redução da velocidade do vento a 10 m de altura, em situações de Nortada forte (velocidade superior a 5 m/s), no Verão.

vento para sul. As zonas mais afectadas pelo abrandamento da Nortada são os vales do

sul e as zonas ribeirinhas da cidade onde, em média, as reduções da velocidades do

vento forte de norte acrescem mais 1 m/s à já observada com o crescimento da cidade.

5.3.5 CONCLUSÃO SOBRE AS MODIFICAÇÕES NOS REGIMES DE VENTO NOS ANOS 80

Com o crescimento da cidade até aos anos 80 do século passado, verificou-se

uma alteração significativa nos campos de vento, tanto na forma como se escoam à

superfície, como em altitude. O aumento da rugosidade com a expansão urbana reduziu

a velocidade média do vento junto ao solo em cerca de 26 a 30%, sobretudo no Verão,

onde em termos absolutos se traduziu numa redução de cerca de 3 m/s.

Ficou demonstrado que é durante a estação estival que a redução da velocidade

do vento devido ao crescimento da cidade é maior, podendo contribuir para um

(m/s)

a b

Page 155: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 5 – Modificações nos campos de vento induzidos pelo crescimento de Lisboa e implicações no ambiente urbano

- 151 -

ambiente mais desfavorável. No Verão, é na Baixa que se verificam as maiores

reduções na velocidade média do vento (cerca de 3 m/s), com uma predominância do

vento de norte e nor-noroeste (68% das ocorrências estimadas).

Na parte ocidental da cidade, a redução da velocidade do vento é ligeiramente

inferior (2,0 m/s), devido à rugosidade mais baixa. No entanto, verificam-se

escoamentos que contornam a colina de Monsanto e convergem na zona ribeirinha,

entre Algés e Alcântara.

No norte de Lisboa, caracterizada por predominância de áreas de fraca

rugosidade (0,02 m a 0,03 m), a redução da velocidade do vento quase não tem

expressão (0,5 a 1,2 m/s), quando comparada com o atrito provocado pela topografia.

Este facto explica-se pela fraca densidade de ocupação até aos anos 80.

Esta dicotomia norte/sul junto à superfície (fraca redução da velocidade do vento

a norte e forte a sul), resulta sobretudo da diferente ocupação do solo, mas vai-se

atenuando em altitude, a tal ponto que, a 100 m de altura, a redução do vento no sul da

cidade apresenta já valores semelhantes ao norte (com excepção de um núcleo centrado

na Baixa). Ficou demonstrado que, a 150 m de altura, o efeito urbano é pouco

significativo, não havendo praticamente diferenças entre o norte e o sul da cidade na

redução da velocidade do vento. Isto leva a apresentar a hipótese de que o topo da

camada turbulenta, ou seja até onde se faz sentir mais a influência da cidade, deve

localizar-se entre 100 a 200 m, facto aliás confirmado pela homogeneidade dos valores

de k sobre toda a cidade.

Em situações de Nortada forte (predominância insistente de ventos do quadrante

de norte com velocidades médias iguais ou superiores a 5 m/s), verificou-se que o seu

abrandamento ocorre predominantemente nos vales do sul e nas zonas ribeirinhas da

cidade onde, em média, as reduções acrescem mais 1 m/s à já observada com o

crescimento da cidade. No norte de Lisboa, a Nortada não se distingue dos outros

regimes, ou seja o fluxo de vento não é mais reduzido do que durante a ocorrência de

outras componentes direccionais.

Page 156: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I – Modificação nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 152 -

5.4 MODIFICAÇÕES PREVISÍVEIS NOS CAMPOS DE VENTO NO VERÃO, NAS PRÓXIMAS

DÉCADAS.

Mais uma vez, o Verão será a estação do ano privilegiada neste estudo. Baseado

no modelo "empírico" de expansão urbana de Lisboa, que se apresentou no CAPÍTULO 4,

foi efectuada uma tentativa de previsão das modificações dos campos de vento do Verão

nas próximas décadas, no centro sul da cidade (Baixa). Este modelo tem os seguintes

pressupostos:

a) Os vento regionais não se irão alterar significativamente nas próximas

décadas. Supõe-se, portanto, que os parâmetros de Weibull obtidos com as

séries de Lisboa/Portela da série de 1971/80 poderão ser usados para gerar

novas séries de ventos e que elas continuarão a ser representativas dos

regimes regionais do vento no norte da cidade.

b) Se a actuação, mais que previsível, de quem tem por missão "expandir a

cidade", se pautar por uma atitude que poderíamos apelidar de "business as

usual" (por analogia com um dos cenários das alterações climáticas globais),

deixando, muitas vezes, ao critério dos promotores imobiliários, a

construção de novas urbanizações sem o necessário planeamento de

conjunto, o norte da cidade irá constituir uma importante barreira compacta

à progressão dos ventos dominantes de norte. Supõe-se, assim, que nenhuma

medida de planeamento para as áreas expectantes da cidade será tomada,

visando permitir uma melhor ventilação para o sul da cidade. Nesse caso é

previsível o aumento do índice de rugosidade actual para 1,5 ou 2 m.

Correspondendo o vento no Verão a um constante vector resultante norte/sul,

que iria encontrar uma barreira perpendicular, cada vez mais impenetrável, pretende-se

determinar até que ponto esta condicionante faria diminuir as velocidades médias no sul

da cidade. Como se verificou, a Baixa é um dos locais mais afectados, sendo aí

estimadas as possíveis alterações nos regimes de vento.

Page 157: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 5 – Modificações nos campos de vento induzidos pelo crescimento de Lisboa e implicações no ambiente urbano

- 153 -

5.4.1 DOIS CENÁRIOS PROPOSTOS.

Com os pressupostos enunciados, elaboraram-se dois tipos de cenários, cada

uma com duas modalidades:

CENÁRIO A) Mais realista, este cenário consiste no aumento da rugosidade no norte de

Lisboa com duas modalidades: a rugosidade no Aeroporto passaria do

valor actual de 0,01m (dados originais) para 1,5 m (cenário A1) ou mais

drasticamente para 2,0 m (valores típicos de uma cidade que cresce em

altura e volumetria - cenário A2). As novas série de dados estimados

serão representativas das novas áreas construídas no norte da cidade.

Para estimar as modificações do vento na Baixa, nas próximas décadas, em

função do aumento da rugosidade no norte da cidade, foram criadas novas séries de

dados a partir da série original de Lisboa/Portela de 1971/80, mas com os parâmetros de

rugosidade referidos. Não se reconstruíram as séries completas, mas apenas os

parâmetros de Weibull (frequências para cada quadrante e classe de velocidade de vento

e valores A e k). Esses dados foram refeitos para o local onde actualmente se encontra o

Aeroporto de Lisboa. Os valores de z0 escolhidos (1,5 e 2,0 m) assumem o aumento da

volumetria. A partir das novas séries de vento obtidas a partir dos parâmetros de

Weibull (frequências, A e k) para as rugosidades 1,5 e 2,0 m, procedeu-se à estimação

da velocidade dos ventos na Baixa.

Apresenta-se na figura 5.22 o esquema metodológico para a obtenção de novas

séries de vento (cenários A1 e A2).

CENÁRIO B) O segundo cenário consiste num exercício “puramente teórico” e

pressupõe a densificação da construção a tal ponto que se mantém a

rugosidade actual (0,01 m na aérea do Aeroporto), mas com sobrelevação

da superfície topográfica dos actuais cerca de 100 m para 130 (Cenário

B1) e 150 m de altitude (Cenário B2), correspondente ao topo da nova

Page 158: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I – Modificação nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 154 -

Fig. 5.22 - Modelo proposto para a estimação das velocidades dos ventos de Verão na Baixa, a partir do aumento da rugosidade no norte de Lisboa.

Novas séries estimadas a partir dos parâmetros de Weibull obtidos com o modelo resultante da modificação das rugosidades

Rugosidade 1,5 m Rugosidade 2,0 m

Baixa

Apl

icaç

ão d

a sé

rie d

e ve

nto

com

ru

gosi

dade

1,5

m

Aplicação da série de vento com

rugosidade 2,0 m

Velocidade do vento a várias alturas, considerando uma rugosidade de 1,5 m e 2,0 m no norte da cidade.

Estação meteorológica de

Lisboa/Portela Criaram-se dois mapas de rugosidade, fazendo variar o valor do polígono de rugosidade no aeroporto: um com 1,5m e outro com 2,0 m usados, para estimar as novas série de dados.

Polígono original com a rugosidade atribuída ao aeroporto (0,01 m)

Parte do mapa topográfico (1:25 000) do norte de Lisboa e polígonos com as rugosidades usadas para estimar os ventos no programa WASP.

Ve r ão

0

50

100

150

200

2 . 0 4 . 0 6 . 0 8 . 0 10. 0 12 . 0 14 . 0A W e i b u l l ( m / s )

Alt . ( m)

Cenário mais provável Cenário mais pessimista

Page 159: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 5 – Modificações nos campos de vento induzidos pelo crescimento de Lisboa e implicações no ambiente urbano

- 155 -

estrutura construída. Seria o equivalente a uma nova cidade virada para o

seu interior, como se tratasse de um único edifício, onde todos os

elementos que compõem o espaço urbano se encontrariam quase isolados

da atmosfera urbana exterior. Esta cidade “utópica” servirá mais para

discutir o efeito do vento sobre novos conceitos urbanos, do que propor

soluções imediatas para a cidade (fig. 5.23).

Para implementar este cenário, procedeu-se à "elevação" de uma parte do

planalto no sítio onde actualmente se encontra o aeroporto de Lisboa, transformando-se

a isoípsa dos 100 m de altitude respectivamente para 130 m (Cenário B1) e 150 m

(Cenário B2). Foi usada a série original do vento do Verão para o período 1971/80.

Estimou-se de seguida os valores na Baixa, nas alturas definidas como padrão (10, 50,

100, 150, 200, 250, 300 e 500 m), que serviram para construir os perfis de vento.

5.4.2 PRIMEIROS RESULTADOS: O EFEITO DO AUMENTO DA RUGOSIDADE NO NORTE

DA CIDADE E AS PREVISÍVEIS MODIFICAÇÕES NA BAIXA DE LISBOA

Apresentam-se os resultados estimados para a Baixa nas figuras 5.24 e 5.25 e

comparam-se com os perfis em que se considera só a topografia e em que se entra

também com as rugosidades de Lisboa nos anos 80 (média dos locais escolhidos, para

todas as direcções e só a Baixa).

De um modo geral, verifica-se uma redução na velocidade dos ventos nos

cenários onde se prevê o aumento da rugosidade no norte da cidade (Cenários A). Os

dois cenários, em que se considerou o levantamento da superfície em 30 e 50m

mantendo a rugosidade (B), não se apresentam grandes diferenças entre si, sendo os

valores estimados praticamente semelhantes junto ao solo.

Cenários A: nas camadas mais baixas da atmosfera urbana (sobretudo nos

primeiros 200 m - fig. 5.25), verifica-se claramente que as modificações poderão

ocorrer com aquilo a que se chamou anteriormente a grande barreira ao vento de norte

que se está a desenvolver no norte da cidade. Quando comparado com os valores

estimados nos anos 80 da século passado e considerando um aumento da rugosidade

Page 160: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I – Modificação nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 156 -

para 1,5 m, verifica-se uma redução de 0,7 m/s a 10 m de altura (correspondendo a uma

perda de velocidade do vento de cerca de 22 % junto ao solo), valor que é apenas

Di

o

rec

ã

çã

Ver

o do no

minante o vento d

A B

A

1000 m

/

Cota 100 m

Duas modalidades: Sobrelevação de 30 e 50 m

Rugosidade (0,01m)

B

Fig. 5.23 – Modelo conceptual para a estimação da velocidade do vento na Baixa, com sobrelevação da superfície no norte de Lisboa, mantendo a rugosidade fraca.

ligeiramente agravado (redução de 0,8 m/s), quando se considera uma rugosidade de

2,0 m no norte da cidade (Quadro 5.7). Ou seja, a situação mais desfavorável na Baixa

ocorrerá em breve, com as actuais expectativas e tendências de construção no norte da

cidade (maiores reduções na velocidade do vento na passagem de uma rugosidade fraca

de 0,01 m para 1,5 m). Se se atingir os 2,0 m de rugosidade, ou eventualmente valores

mais elevados, as alterações serão semelhantes.

Page 161: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 5 – Modificações nos campos de vento induzidos pelo crescimento de Lisboa e implicações no ambiente urbano

- 157 -

Quadro 5.7 – Velocidades de vento (A de Weibull) estimadas para os anos 80 e com os vários cenários.

Cenário A Cenário B Altura (m)

Valores estimados para

os anos 80 (1) Rugosidade

1,5 m

(2) Rugosidade

2,0 m

(1) Sobrelevação

de 30m

(2) Sobrelevação

de 50m

10 3.2 2.5 (-0,7)* 2.4 (-0,8)* 3.4 3.4 50 5.5 4.9 4.5 5.8 5.7

100 7.0 6.6 6.1 7.3 7.3 150 8.3 8 7.4 8.7 8.6 200 9.3 9 8.4 9.7 9.6 250 10.1 9.8 9.2 10.5 10.4 300 10.5 10.3 9.6 11 10.9 500 11.8 11.5 10.9 12.3 (+0,5) 12.1 (+0,3)

* Comparação com os valores estimados para os anos 80.

A 200 m de altura (fig. 5.25), no entanto, a redução do vento com o cenário A2 é

maior, verificando-se um decréscimo de quase 1 m/s em média em relação aos anos 80,

correspondendo a cerca de 10% de redução da velocidade do vento em relação àquela

época (Quadro 5.7). Se o aumento da rugosidade do cenário A1 para A2 tem pouco

significado à superfície (fig. 5.25) em altitude poderá ter como consequência um

agravamento das condições de circulação das atmosfera urbana, piorando as condições

de renovação do ar sobre a Baixa nas camadas superiores da atmosfera urbana.

Cenários B: as reduções de velocidade de vento são análogas aos valores

estimados para os anos 80 junto à superfície. No entanto à altura de 500m as

velocidades do vento são ligeiramente mais elevadas (0,5 e 0,3 m/s, respectivamente

nos cenários B1 e B2 - quadro 5.7) Assim, o cenário B poderia representar uma solução

com vantagens, por não reduzir as velocidades do vento à superfície e poderia estimular

os sistemas de circulação a maior altitude, que se produzem nas camadas mais elevadas

da atmosfera urbana, com o aumento da velocidade do vento. Os benefícios poderiam

passar pela melhoria (embora ligeira) dos sistemas de dispersão de poluentes àquela

altitude.

Page 162: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I – Modificação nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 158 -

Verão

0

50

100

150

200

2.0 4.0 6.0 8.0 10.0 12.0 14.0

A Weibull (m/s)

Alt. (m)

Só topografia (médiatodos locais)

rugosidade anos 80(média todos locais)

Baixa Anos 80

Baixa próximas décadasrug 1,5m norte Lisboa

Baixa próximas décadasrug 2,0m norte Lisboa

Fig. 5.24 – Perfis de vento de Verão estimados até 200 m de altura.

Apresenta-se apenas os cenários A (1 e 2)

5.4.3 CONCLUSÃO SOBRE AS MODIFICAÇÕES DOS REGIMES DE VENTO NAS PRÓXIMAS

DÉCADAS EM LISBOA

Dos cenários propostos para estimar as modificações nos regimes de vento nas

próximas décadas, usaram-se dois tipos de abordagens.

Numa perspectiva do tipo business as usual, propôs-se um cenário com duas

variantes: uma em que a rugosidade no norte de Lisboa passaria do valor actual para

1,5 m e outra um pouco mais drástica, para 2,0 m (valores típicos de uma cidade que

cresce em altura e volumetria - cenário A2).

Numa perspectiva mais “utópica” e meramente académica, propôs-se que se

elevasse a superfície topográfica da actual cota 100 para 130 ou 150m (duas variantes),

que coincidiria com o topo de novas construções compactas e extensas, de tal modo que

se manteria o actual factor de rugosidade baixo. Esta nova cidade serviu para lançar a

CE

RIO

A

Page 163: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 5 – Modificações nos campos de vento induzidos pelo crescimento de Lisboa e implicações no ambiente urbano

- 159 -

discussão sobre novos conceitos urbanos e seus efeitos nos campos de vento, mas

também para, depois de ponderadas as diferenças na escala de observação, se poderem

observar as modificações num local a sotavento, mediado por um declive que

corresponde à descida do planalto para o Tejo.

Verão

0

100

200

300

400

500

0.0 2.0 4.0 6.0 8.0 10.0 12.0 14.0 16.0

A Weibull (m/s)

Alt. (m)

Só topografia(média todoslocais)

rugosidade anos 80(média todoslocais)

Baixa Anos 80

Baixa próximasdécadas rug 1,5m norte Lisboa

Baixa próximasdécadas rug 2,0mnorte Lisboa

nível compacto deedificações 30 m(rug. 0,01m)

nível compacto deedificações 50 m(rug. 0,01m)

Fig. 5.25 – Perfis de vento de Verão estimados. Apresentam-se todos os cenários até 500 m de altura.

CE

RIO

A

CE

RIO

B

Page 164: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I – Modificação nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 160 -

Com os cenários do tipo A, onde se considera que a expansão de Lisboa

continuará para norte, caótica e sem planeamento de corredores de ventilação para o sul

da cidade, constituindo uma barreira efectiva ao vento de norte que se está a

desenvolver no norte da cidade, demonstrou-se que, quando comparada com os valores

estimados para os anos 80, poderá haver ainda uma redução maior da velocidade do

vento, traduzida em cerca de 0,7 m/s a 10 m de altura (correspondendo a uma perda de

velocidade do vento de cerca de 22 % junto ao solo). Esse valor seria apenas

ligeiramente agravado, quando considerada uma rugosidade de 2,0 m no norte da

cidade. Na Baixa, essa redução seria de 0,8 m/s em relação aos anos 80.

Com os cenários do tipo B (utópicos), as velocidades do vento não sofreriam

significativas alterações junto à superfície, sendo ligeiramente mais elevadas à altura de

500 m. Neste caso não ocorreria uma redução, mas sim uma aceleração do vento, em

cerca de 0,5 m/s.

Provou-se que este tipo de solução seria vantajosa para a cidade, pois poderiam

estimular os sistemas de circulação a maior altitude, o que beneficiaria ligeiramente os

sistemas de dispersão de poluentes em altitude.

Page 165: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

-161 -

CAP TULO 6

MODIFICA ES NOS CAMPOS DE VENTO NO BAIRRO DE TELHEIRAS (NORTE

DE LISBOA): ENSAIOS EM T NEL AERODIN MICO

1. OBJECTIVOS DESTE CAP TULO

Entre a multiplicidade de impactos do vento ao n vel do solo nas cidades, o

efeito sobre os transeuntes provavelmente um dos mais importantes (WU e

STATHOPOULOS, 1993). Os ventos gerados em alguns locais onde os cidad os habitam

ou circulam com frequ ncia, como a entrada de edif cios expostas aos ventos intensos e

dominantes, passagens inferiores, etc., podem incorrer em danos pessoais e materiais

graves. Estes dependem, n o s da intensidade e rumo dos ventos, mas sobretudo da

arquitectura das edifica es e da sua disposi o no terreno. Em projectos de grande

dimens o de algumas cidades alem s, como por exemplo em Karlsruhe, obrigat ria a

inclus o de estudos de pormenor sobre os efeitos do vento em torno dos edif cios e suas

consequ ncias sobre os indiv duo (LOHMEYER, et al., 1988).

A maior parte dos trabalhos sobre este tema mostram, sobretudo, os efeitos

mec nicos e t rmicos do vento, tanto sobre os edif cios como, ao n vel do solo, sobre os

cidad os. Mas h uma quest o por resolver que tem a ver com o problema da

Page 166: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I Modifica o nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 162 -

diminui o do vento devido ao crescimento da cidade. No cap tulo anterior analisou-se

este problema escala regional. Mas escala microclim tica, pouco se sabe sobre os

efeitos do vento que podem degradar ambientes urbanos (seja ao n vel do bairro, do

quarteir o, da rua, ou da praceta), devido ao crescimento da cidade em altura a

barlavento dessas reas.

Uma das formas mais correctas de avaliar os campos de vento e as suas

modifica es ao n vel dos edif cios atrav s da utiliza o de t neis aerodin micos (ou

t neis de vento). As simula es do escoamento do ar em t neis aerodin micos t m sido

usadas sobretudo para o "estudo de for as em ve culos e estruturas, do potencial e lico

de determinados locais, da dispers o de diferentes tipos de gases, etc." (COSTA et al.,

1994), problemas sobretudos ligados Engenharia Mec nica e Civil. Em Portugal, t m

sido muito raras as parcerias entre os Ge grafos que estudam os climas locais e urbanos,

e os cientistas ligados Engenharia. As experi ncias que aqui se apresentam t m um

significado especial, porque juntam a F sica e a Engenharia, que dominam o

conhecimento e as t cnicas da din mica dos flu dos e da aerodin mica, com a

experi ncia da "Geografia Clim tica", cujos resultados se apresentam neste trabalho.

sempre necess rio validar os resultados obtidos com modelos num ricos,

como os que se apresentaram no cap tulo anterior. No entanto, esta tarefa de dif cil

concretiza o porque, no caso do ambiente urbano, os dados de vento n o abundam.

Para isso contribuem v rias condicionantes:

a) O vento um par metro meteorol gico de dif cil medi o. Al m de variar

constantemente no tempo, o rumo e a velocidade alteram-se muito no espa o

urbano, onde abundam elementos que o modificam;

b) Nem sempre os dados s o compat veis no tempo e no espa o com os

resultados obtidos com os modelos, de modo a serem compar veis

c) A rede meteorol gica pouco densa na cidade, sobretudo para avaliar os

regimes mais frequentes;

A medi o da velocidade do vento, por exemplo, atrav s de campanhas de

medi o itinerantes , na maioria das vezes, uma tarefa imposs vel, por muito bem

Page 167: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Cap tulo 6 Modifica es nos campos de vento no bairro de Telheiras:ensaios em t nel aerodin mico

- 163 -

escolhidos que sejam os pontos de medi o. S o bem conhecidos os efeitos que os

edif cios e outros elementos urbanos t m na modifica o instant nea da velocidade e

rumo dos ventos ao n vel do solo, como foi mostrado no primeiro cap tulo desta parte.

Lisboa apenas recentemente foi servida por uma rede de 5 novas esta es

meteorol gicas urbanas (RUEMA Rede Urbana de Esta es Meteorol gicas

Autom ticas34), instaladas pelo Instituto de Meteorologia (I.M.), que se vieram juntar s

j existentes Lisboa/Gago Coutinho e Lisboa/Geof sico. Contam-se nos objectivos desta

rede, a melhoria da vigil ncia meteorol gica nas reas urbanas, a descri o das

condi es meteorol gicas locais e apoiar a previs o do estado do tempo, a emiss o de

avisos para a protec o civil, a partir do I.M., os estudos de polui o e planeamento

urbano e a investiga o e estudos sobre o clima em reas urbanas .

Devido escassez actual de dados de vento na cidade e sua dif cil recolha,

validar os resultados obtidos com os modelos num ricos uma tarefa que poder ser

desempenhada, com algum sucesso, atrav s da constru o de modelos f sicos e a sua

inclus o em t neis aerodin micos que reproduzem fielmente as situa es do

escoamento do ar em meio urbano.

Esta tecnologia importante, n o s , para validar os modelos num ricos, mas

sobretudo para persuadir quem exerce a fun o do planeamento urbano, cuja pr ticas,

sob o ponto de vista t cnico, podem ser correctas, mas que poder o deixar muito a

desejar sob o ponto de vista ambiental. Nenhum argumento pode ser mais persuasivo do

que a visualiza o dos fluxos de ar em torno dos edif cios com experi ncias em t nel

aerodin mico (BORGES E SARAIVA, 1987).

Pelos motivos enunciados, os principais objectivos deste cap tulo s o claros:

a) Validar (ou n o) a tese defendida anteriormente, de que o aumento da

rugosidade a barlavento pode provocar modifica es nos campos de vento;

34 No in cio de 2003 o seu funcionamento est ainda em fase experimental. Das novas esta es instaladas(Benfica, Estef nia, Alvalade, Estrela e Baixa), apenas as duas primeiras fazem o registo do vento (rumoe intensidade). No total, da cidade de Lisboa ter quatro locais (Benfica, Estef nia, Gago Coutinho eGeof sico) onde essa informa o ser actualizada diariamente. Fonte: Instituto de MeteorologiaPortugal, Minist rio da Ci ncia e do Ensino Superior, www.meteo.pt/RUEMA/historial.htm, actualiza ode 17-1-2002.

Page 168: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I Modifica o nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 164 -

b) Observar as principais modifica es do vento em torno dos edif cios de um

bairro no norte de Lisboa (Telheiras) e tentar generalizar alguns dos

resultados obtidos, que poder o ser aplicados a outras reas urbanas.

Pretende-se assim dar um mais um pequeno contributo ao planeamento urbano

de Lisboa, divulgando os resultados obtidos com uma vari vel ambientalmente t o

importante como o vento.

2. O T NEL AERODIN MICO DE CAMADA LIMITE DO LNEC.

Um t nel aerodin mico uma instala o geradora de uma corrente de ar

artificial, destinada simula o experimental de certo tipos de escoamentos reais

(BORGES, 1968). Actualmente o LNEC possui dois t neis situados nas suas instala es:

um mais antigo projectado nos anos 60 do s culo passado e outro mais recente e de

maiores dimens es (fig. 6.1), onde poss vel introduzir maquetas de maiores

dimens es. Os ensaios foram efectuados no t nel mais recente, por causa do tamanho da

maqueta escala de 1:500.

2.1 CARACTER STICAS DO T NEL AERODIN MICO ONDE FORAM REALIZADOS OS

ENSAIOS.

O t nel aerodin mico de camada limite do LNEC um t nel de aspira o de

descargas atmosf ricas e c mara de ensaios fechada. A sua sec o de 2 x 3 m2 e o seu

comprimento atinge 10 m. A velocidade do escoamento na c mara de ensaios

regul vel em cont nuo, em escal es de cerca de 3 m/s, que correspondem entrada em

funcionamento dos seis ventiladores (fig. 6.1), que t m uma pot ncia de 11 kW cada.

Est o instalados, de forma sim trica, a jusante na c mara de pleno, sendo dois deles

controlados por variadores de frequ ncia (fig. 6.2, em cima direita35).

35 Informa o pessoalmente transmitida pelo Eng. Jorge Saraiva.

Page 169: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Cap tulo 6 Modifica es nos campos de vento no bairro de Telheiras:ensaios em t nel aerodin mico

- 165 -

2.2 SIMULA O DA CAMADA LIMITE ATMOSF RICA

A simula o da camada limite atmosf rica dentro do t nel aerodin mico

produzida por dois conjuntos conhecidos por elementos de separa o (fig. 6.3),

colocados a barlavento da sec o de ensaios onde se instala a maqueta: o conjunto fixo

(a), composto por elementos de madeira tipo barbatana de tubar o , o gerador de

vorticidade, enquanto o conjunto m vel (b), simula a rugosidade da superf cie

Fig. 6.1 Vista exterior da c mara de pleno do t nel aerodin mico do LNEC. direita um pormenor deum ventilador, com 11 kW de pot ncia.

Fig. 6.2 Vista do interior das instala es do t nel aerodin mico do LNEC. direita, em cima, umpormenor dos pain is de controlo das turbinas, com os quais se alteram as condi es de ventila o dentrodo t nel. direita, em baixo, os instrumentos de medi o da velocidade do vento: microman metros dotipo Betz.

Page 170: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I Modifica o nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 166 -

A sua mobilidade permitiu experimentar v rias rugosidades (combinando os elementos,

como se mostra na figura 6.13), condi o necess ria para se reconhecerem as principais

diferen as nos campos de vento em torno dos edif cios.

Fig. 6.3 Vista do interior do t nel aerodin mico. esquerda, em primeiro plano (a), as barbatanas detubar o , seguindo-se as fiadas de blocos que simulam a rugosidade e que no seu conjunto reproduzem ascondi es da camada limite atmosf rica. Ao fundo as turbinas e o maqueta (c). direita a abertura deentrada do ar do exterior. As setas indica a direc o do ar dentro do t nel.

3. CARACTERIZA O DE UMA PARCELA DO BAIRRO DE TELHEIRAS ( REA DE

ESTUDO).

No mbito do Projecto CLIMLIS, e de acordo com as outras equipas de

investiga o, decidiu-se que a rea de pormenor a estudar seria no norte da cidade, onde

o crescimento urbano t m sido mais acelerado. Foi escolhida uma parte do Bairro de

Telheiras (fig. 6.4), onde conjuntamente com o estudo do vento se efectuariam outros

estudos de climatologia e arquitectura ligados ao mesmo projecto (PINHO, 2002).

A delimita o da rea escolhida para a elabora o da maqueta teve em conta o

seu tamanho e o espa o dispon vel no t nel aerodin mico. Por ser uma rea

relativamente plana, apresenta vantagens evidentes porque os fluxos de ar resultam

apenas da sua interac o com os edif cios, o que simplifica as conclus es e as

extrapola es dos resultados para reas semelhantes. A rea estudada ligeiramente

inclinada para sudeste, apresentando um desn vel de apenas 10m. A superf cie apresenta

(a)

(b)

(c)

Page 171: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Cap tulo 6 Modifica es nos campos de vento no bairro de Telheiras:ensaios em t nel aerodin mico

- 167 -

apenas uma sobreleva o de cerca de 5 a 10 m numa estreita faixa, que corresponde ao

aterro constru do para implanta o do eixo vi rio Norte-Sul (fig. 6.4).

Segundo os levantamentos da equipa do n cleo de arquitectura do LNEC que

integra o projecto CLIMLIS, a leste do eixo Norte-Sul existem quatro tipos de

implanta o (fig. 6.5): A c lula A, constitu da por tr s conjuntos de edif cios que

formam uma banda em L, outra em Z e outra em banda simples . Esta tipologia gera

dois conjuntos de espa os interiores: um de configura o fechada (L e Z) e outro de

configura o linear. As alturas dos edif cios neste conjunto rondam 25 m. Os espa os

exteriores e interiores s o arborizados. A sul deste conjunto, formado pelas ruas Prof.

Eduardo Cortes o e Prof. Ant nio Jos Saraiva, existe um outro fechado, apenas com

uma abertura a nordeste, na Rua Prof. Dias Amado.

A c lula B (R. Prof. Mark Athias) constitu da por edif cios isolados de

implanta o livre relativamente s ruas, n o delimitando o espa o exterior. Os

parqueamentos entre o eixo Norte-Sul e este conjunto de edif cio arborizado com duas

fiadas de arvores de pequeno porte. Os edif cios variam entre 20 m de altura (fiada

lateral e sul) e 35 m das torres.

O espa os laterais deste dois conjuntos (c lula E) formam uma via de orienta o

norte-sul (R. Prof. Jo o Barreira), sendo conjuntamente com o Eixo Norte-Sul, as nicas

vias completamente abertas penetra o do vento de norte.

As c lulas C e D s o constitu das por edif cios mais baixos, que n o excedem os

15 m no primeiro caso e 9 m no segundo. Formam espa os interiores mais ou menos

fechados (c lula C), ou conjuntos unifamiliares agrupados em banda (PINHO, 2002,

2003).

De constru o mais recente uma grande parte do conjunto arquitect nico a

oeste do Eixo Norte-Sul, constitu do maioritariamente por edif cios alinhados norte-sul

(R. Prof. Sim es Raposo), que rondam 30 m de altura.

Page 172: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I Modifica o nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 168 -

Fig. 6.4 Em cima, uma vista a rea de parte do norte de Lisboa, onde se encontra Telheiras (o rect ngulodelimita a rea reproduzida na maqueta). Em baixo, uma redu o da planta originalmente elaborada naescala 1:500, que serviu de base constru o da maqueta que foi usado no t nel aerodin mico do LNEC.

4. CONDI ES EXPERIMENTAIS.

Neste ponto, especificam-se as condi es experimentais com que se abordou o

tema. Come a-se por referir as caracter sticas da maqueta da rea de trabalho e as v rias

t cnicas utilizadas no t nel aerodin mico. De seguida, apresentam-se as escolhas das

direc es do vento utilizadas e explica-se como decorreram as experi ncias para

Telheiras

0 100 m

115 m

110

m

100 m 100 m

0 100 m

Page 173: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Cap tulo 6 Modifica es nos campos de vento no bairro de Telheiras:ensaios em t nel aerodin mico

- 169 -

modificar as rugosidades a barlavento da maqueta (fig. 6.6). Apresentam-se as melhores

combina es encontradas para caracterizar cada rugosidade que se pretendia simular no

t nel.

Fig. 6.5- Excerto da localiza o das tipologias de implanta o urbana numa parte da rea de trabalhoescolhida em Telheiras. As letras correspondem s c lulas identificadas e estudadas pelo equipa doN cleo de Arquitectura do LNEC que integra o projecto CLIMLIS (Extra do de PINHO, 2002).

Apesar da multiplicidade de t cnicas que se utilizam em t neis aerodin micos

para observar os escoamentos do ar, apenas se descrevem com maior pormenor as que

foram utilizadas.

4.1 CARACTER STICAS DA MAQUETA DE TELHEIRAS.

A maqueta de Telheiras foi elaborada a partir de uma planta na escala 1:500 com

as alturas dos pr dios (dados cedidos pela CML) e com levantamento por n s efectuado

a oeste do Eixo Norte-Sul, numa rea de constru o recente, para a qual, n o foi

poss vel, em tempo til, encontrar informa o dispon vel. A base da maqueta foi

constru da em esferovite numa inclina o que simula o declive real (cerca de 3 ) e foi

revestida com um material preto para haver suficiente contraste com a areias utilizadas

na t cnica das figuras de eros o, explicada mais adiante. Os edif cios foram constru dos

Page 174: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I Modifica o nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 170 -

com blocos em madeira que encaixam na maqueta. Uma r gua, que simula o aterro e a

sobreleva o do Eixo Norte-Sul, foi feita com o mesmo material.

Fig. 6.6 - Vista completa de sul, da maqueta no t nel de vento. Em cima direita observa-se um quadradoonde se deposita a areia (a), para determinar a partir de que velocidade se inicia o movimento dos gr osde areia. Os fios que se observam, serviram para determinar a direc es dos vento em torno dos blocos.

Para simular cada direc o estudada, a maqueta foi rodada e solidamente colada

ao ch o do t nel. Por causa do desn vel que foi feito para simular o declive da rea de

estudo, eram colocadas placas de esferovite (poliuretano expandido), talhadas de forma

a assegurar a continuidade das superf cies, evitando o embate directo do escoamento

nos bordos da maqueta, afim de n o perturbar o fluxo (fig. 6.7).

Fig. 6.7 - Vista da maqueta de noroeste no t nel aerodin mico. Foi necess ria uma adapta o na maqueta,utilizando rampas de esferovite, para evitar o embate do escoamento do ar nos bordos, por causa dosdesn vel criado entre a parte norte e o sul.

a

Page 175: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Cap tulo 6 Modifica es nos campos de vento no bairro de Telheiras:ensaios em t nel aerodin mico

- 171 -

4.2 AS T CNICAS UTILIZADAS: FORMAS EROSIVAS, ESCOAMENTOS DIRECCIONAIS

COM FIO DE ALGOD O E PERFIS DE VENTO EM ALTURA

S o variad ssimas as t cnicas de medi o para determinar os fluxos de ar

(direc es, velocidades, intensidades de turbul ncia, etc.), em t neis aerodin micos.

Para uma revis o muito completa sobre este assunto veja-se WU E STATHOPOULOS

(1993). Foram utilizadas tr s t cnicas para se obter uma imagem tridimensional dos

escoamentos do vento em torno dos edif cios: figuras erosivas (formadas pela

movimenta o de gr os de areia), perfis de vento em altura (com as velocidades

medidas com tubos de Pitot-Prandtl) e direc es superf cie em torno dos edif cios,

determinadas visualmente com fios de algod o dispostos numa malha regular. A

filmagem em v deo de grande parte dos ensaios, que serviu sobretudo para completar o

reconhecimento do escoamento do ar em tornos dos edif cios em condi es

excepcionais (com tomadas de vista laterais da maqueta e acompanhamento das

direc es com fios de algod o). Para cada velocidade e direc o de vento escolhidos,

foram tiradas fotografias das figuras de eros o e posteriormente fez-se o seu tratamento

gr fico.

A t cnica das figuras de eros o usando areia com gr o de pequena dimens o,

geralmente de di metro inferior a 0,6 mm, constitui uma das solu es mais utilizadas

para a visualiza o e medi o da intensidade dos escoamentos horizontais em torno das

componentes da maqueta que simulam os elementos urbanos a uma determinada escala,

representando a intensidade do vento em tornos dos edif cios e outros elementos

urbanos. A t cnica consiste no espalhamento superficial e regular de uma fina camada

de areia sobre o ch o da maqueta (geralmente de 5 a 9 mg/cm2), como se mostra na

figura 6.8.

Page 176: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I Modifica o nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 172 -

Fig. 6.8 Pormenor da maqueta depois do espalhamento da areia, para obten o das figuras de eros o.

Experi ncias efectuadas por BORGES E SARAIVA (1979) mostraram que, quando

o fluxo sopra sobre a areia numa superf cie horizontal e plana, uma determinada

velocidade necess ria para iniciar a movimenta o dos gr o de areia. Na pr tica, para

determinar essa velocidade, deposita-se, numa rea fora da influ ncia dos elementos da

maqueta (fig. 6.6, quadrado a no canto superior direito), a mesma unidade de gr os de

areia por unidade de superf cie e observa-se, aumentando progressivamente a rota o

dos ventiladores e consequentemente a velocidade do fluxo de vento, a partir de que

velocidade se inicia a salta o dos gr os. Se ainda n o tiver ocorrido a salta o da areia

nessa rea, mas se se verificar a sua movimenta o junto dos elementos da maqueta, isto

significa que a proximidade desses elementos que faz aumentar a velocidade do ar.

Isto t pico aparecer nos rebordos dos edif cios expostos direc o dominante do fluxo

(fig. 6.17). A partir do momento em que os gr o de areia se deslocam na rea de teste,

as figuras de eros o resultam n o s das acelera es locais, mas tamb m do movimento

que se imprimiu no t nel. Com os sucessivos aumentos de velocidade nos ventiladores,

tra am-se isolinhas de igual varrimento, que nos mostram a direc o do escoamento do

ar na maqueta entre os valores reproduzidos (fig. 6.20).

Este m todo implica algumas limita es: por exemplo os padr es formados pela

eros o da areia serem dificilmente traduzidos em velocidades m dia ou intensidade da

turbul ncia; por outro lado, levanta-se o problema da subjectividade na escolha do

tamanho e geometria dos gr os, ou de como espalhar uniformemente esse material.

Apesar disso a grande vantagem desta t cnica, para al m do seu baixo custo face a

Page 177: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Cap tulo 6 Modifica es nos campos de vento no bairro de Telheiras:ensaios em t nel aerodin mico

- 173 -

outras, a cobertura cont nua de grandes reas e a sua enorme capacidade de

proporcionar a visualiza o dos campos de vento (WU e STATHOPOULOS, 1993).

medida que se anotavam os valores de press o de refer ncia (fluxo de ar n o

perturbado medido atrav s de uma tomada de press o - tubo de Pitot-Prandtl, colocado

na parte superior do t nel aerodin mico - fig. 6.12 direita), foram tiradas imagens

fotogr ficas das figuras de eros o com uma c mara digital colocada sobre um trip a

sotavento da maqueta afim de n o haver perturba es do fluxo superf cie pelos

aparelhos de registo.

Para obter as velocidades do escoamento do fluxo de ar (que simula a velocidade

do vento) a v rias alturas acima da maqueta de Telheiras utilizou-se uma t cnica que

consiste em medir as press es num, ou v rios tubos de Pitot-Prandtl e transformar os

valores obtidos de press o em velocidades atrav s da aplica o da equa o de Bernoulli

(equa o 1.6, no CAP TULO 1). importante notar que a equa o de Bernoulli se baseia

na conserva o da energia ao longo de uma linha de fluxo e a sua import ncia adv m do

facto de nos dar a rela o entre a press o, a velocidade e a altura.

Quando o fluxo mant m uma altura constante, os nicos termos da equa o de

Bernoulli que variam s o a energia cin tica e a press o. Assim, a equa o pode ser

transposta para o princ pio da medi o com um tubo de Pitot-Prandtl, baseando-se nas

diferen as de press o total e est tica como se mostra na figura 6.9.

Fig. 6.9 - Esquema de um tubo de Pitot-Prandtl para medi o da velocidade do vento em t nelaerodin mico. Extra do de NASA/Glenn Research Center (Glenn Learning Technologies Project,www.grc.nasa.gov).

Page 178: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I Modifica o nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 174 -

Quando as linhas de fluxo se aproximam perpendicularmente a um obst culo

que lhe op e transversalmente, uma parte desse fluxo contorna o objecto, mas a parte

que o atinge desacelera at ao ponto de estagna o, onde a velocidade igual a 0

(fig. 6.10). A press o neste ponto, designada de total, mais elevada do que no fluxo,

mesma altitude, mas livre do embate do obst culo (press o est tica) que neste caso

corresponde press o atmosf rica.

Vs V=0

Fig. 6.10 Linhas de fluxo de escoamento do ar e princ pio da medi o no tubo de Pitot-Prandtl

A press o que medida pela entrada frontal ao fluxo corresponde press o

total, enquanto a press o medida nos orif cios laterais onde o fluxo adere a press o

est tica. Da diferen a das duas press es (total e est tica), obt m-se a press o din mica

(ver equa es 1.7 a 1.9 no CAP TULO 1).

Para determinar a massa vol mica do ar ( ), foram medidas, 2 vezes por dia, a press o

atmosf rica e a temperatura num bar metro e num term metro de merc rio, instalados

no edif cio central do LNEC, sendo posteriormente os valores de press o corrigidos36

(Pc mm Hg).

CtPcmumm2,273

04737.0)/( 3 (6.1)

sendo t C a temperatura em cent grados.

36 Devido dilata o dos materiais e tendo em conta a for a correspondente acelera o centr fuga emLisboa, estes valores s o corrigidos atrav s de uma tabela fornecida pela f brica dos aparelhos.

Page 179: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Cap tulo 6 Modifica es nos campos de vento no bairro de Telheiras:ensaios em t nel aerodin mico

- 175 -

Dado que temos como sa da no aparelho a press o din mica, basta resolver a

equa o (1.9) para obter a velocidade do fluxo:

V2= )P-(P2 st ou V= dP2 , (m/s) (6.2)

Dois tubos de Pitot-Prandtl foram colocados no t nel aerodin mico: um, de 5

mm, fixo no tecto, com os pontos de tomada a cerca de 20 cm, medindo o fluxo n o

perturbado e servindo de valor de refer ncia (fig. 6.12) e outro de 3 mm, fixo a um

coordin metro (um aparelho de precis o, montado sobre uma estrutura met lica que

serve para medir a altura a que se encontram as tomadas de

press o fig. 6.11), que serviu para obter os dados, posteriormente transformados em

velocidades de vento, e construir os perfis em altura. Os tubos de Pitot-Prandtl s o

ligados atrav s de tubos de pl stico s tomadas de press o de microman metros do tipo

Betz, que permitem um erro absoluto de leitura inferior a 0,05 mm de coluna de gua.

Fig. 6.11 - Coordin metro montado sobre uma estrutura met lica que mede com precis o a altura a que seencontram as tomadas de press o sobre a maqueta.

Ao contr rio de outras t cnicas, como as anometrias t rmicas, ou os

anem metros Laser-Doppler, que exigem meios mais dispendiosos e s o mais dif ceis

Coordin metro

Page 180: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I Modifica o nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 176 -

de operar, os tubos de pitot s o apontados como mais robustos, f ceis de manejar e

econ micos (WU e STATHOPOULOS, 1993). A sua grande desvantagem consiste nos erros

obtidos quando se pretende medir a intensidade do vento por detr s dos obst culos, j

que muito dif cil procurar a direc o mais correcta, sendo usada apenas para

determinar velocidades horizontais. Por outro lado, uma t cnica desaconselhada para

simular ventos muito fracos ou com bastante turbul ncia.

Fig. 6.12 - Tubos de Pitot-Prandtl usados nos ensaios no t nel aerodin mico. esquerda encontra-se oque fez as medi es em altura, desde o n vel do solo at cerca de 500 mm (correspondente a cerca de 250m escala utilizada). direita o pitot, fixo no tecto do t nel que mede a press o da camada de ar n operturbada (ver explica o no texto).

Depois de efectuados todos os ensaios com as figuras de eros o e os perfis em

alturas, foram colocados pequenos fios de algod o presos maqueta, para registar as

direc es do vento em torno dos edif cios. Os fios foram colocados numa malha mais

ou menos regular, como se mostra na figura 6.6.

Dado que poss vel conduzir as experi ncias no t nel aerodin mico,

(controlando os valores lidos nas tomadas de press o do tubo de Pitot-Prandtl fixo no

tecto do t nel e a velocidade do fluxo n o perturbado), repetiram-se os ensaios com os

fios de algod o com as mesmas pot ncias imprimidas aos ventiladores, para as

direc es escolhidas. Todas as experi ncias foram filmadas em formato v deo VHS e

posteriormente digitalizadas. A vantagem deste processo de se conseguirem planos

Page 181: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Cap tulo 6 Modifica es nos campos de vento no bairro de Telheiras:ensaios em t nel aerodin mico

- 177 -

imposs veis de obter enquanto decorrem outras experi ncias (por exemplo as figuras de

eros o). A desvantagem foi a de se terem repetido os ensaios, aumentando o n mero de

horas de trabalho dentro do t nel.

Os resultados finais que se apresentam (velocidades e direc es dos ventos em

torno dos edif cio), decorreram de ensaios em momentos diferentes, mas em condi es

experimentais id nticas.

4.3 POT NCIAS DOS VENTILADORES, CORRESPONDENTES VELOCIDADES DE VENTO

E DIREC ES UTILIZADAS.

Como j foi referido, as condi es experimentais num t nel aerodin mico s o

controladas atrav s da pot ncia dos seus ventiladores. Para n o se multiplicarem as

experi ncias desnecessariamente e uniformizar todos os ensaios, foram testadas apenas

algumas velocidades que decorreram do uso isolado de um ventilador ou da combina o

de dois ou dos tr s ventiladores.

O procedimento adoptado para os ensaios das figuras de eros o e direc es de

vento foi o seguinte:

1) Iniciava-se o primeiro ventilador e anotava-se a press o de refer ncia (da

camada n o perturbada) desde as 1000 rota es por minuto (r/m), em

intervalos de 100/150 r/m at atingir as 1500 r/m.

2) Mantendo o primeiro ventilador nas 1500 rota es, ligava-se o segundo

subindo as rota es em intervalos de 100 ou 200 r/m at s 1500.

3) Mantendo os dois anteriores na sua rota o m xima, era finalmente ligado o

ltimo ventilador, procedendo de igual forma descrita em 2).

Este processo permite um aumento gradual de velocidades de vento entre 2,5 e

3,3 m/s, atingindo-se, no m ximo, cerca de 11 m/s, com os tr s ventiladores a trabalhar

em conjunto.

Page 182: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I Modifica o nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 178 -

Para determinar as velocidades nos perfis de vento usou-se apenas uma

velocidade de refer ncia na camada de ar n o perturbado (obtida com o Pitot-Prandtl

fixo no tecto do t nel) de cerca de 10 a 11 m/s.

Em ambos os ensaios anotavam-se regularmente os valores da temperatura

dentro do t nel com um term metro digital, para determinar a massa vol mica do ar ( )

dentro do t nel.

Para conciliar as solicita es e os compromissos do LNEC com a investiga o

em curso, tentou-se maximizar o tempo de trabalho de que se dispunha, utilizando o

t nel "a tempo inteiro" durante mais de 3 semanas. Por isso n o foi poss vel, nem se

tornava necess rio, proceder a todos os ensaios para todos os rumos de vento,

limitando-se as experi ncias s principais direc es que ocorrem em Lisboa: norte, que

conjuntamente com o noroeste e o oeste ultrapassam 78 % das observa es dos Ver es

do per odo de 1971 a 1980, na esta o meteorol gica de Lisboa/Portela.

Embora se reconhe a que poderia ter sido interessante fazer ensaios com outros

rumos de vento, sobretudo pela sua aplica o pr tica, tal n o se ter concretizou, n o s

por causa do tempo til de que se dispunha para efectuar os trabalhos, mas tamb m

porque a t cnica de determina o das velocidades do escoamento no t nel

aerodin mico, atrav s das press es medidas nos tubos de Pitot-Prandtl, n o a mais

aconselhada para velocidades fracas (STULL, 2000). De notar que as componentes

direccionais n o utilizadas nos ensaios no t nel aerodin mico (nordeste, leste, sudeste,

etc.), incluem, nalguns casos, uma elevada frequ ncia de brisas, ventos normalmente

caracterizados por baixas velocidades, que ocorrem sobretudo nos meses mais quentes

do ano (ALCOFORADO, 1987). A representatividade dessas componentes direccionais

seriam assim muito fracas, n o sendo razo vel prolongar o tempo de ocupa o do t nel

para obter tais resultados.

4.4 DETERMINA O DAS RUGOSIDADES PARA OS ENSAIOS.

Como j foi suficientemente enfatizado anteriormente, o principal objectivo

desta investiga o consistiu no reconhecimento das modifica es que os campos

Page 183: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Cap tulo 6 Modifica es nos campos de vento no bairro de Telheiras:ensaios em t nel aerodin mico

- 179 -

tridimensionais de vento sofrem com o aumento da rugosidade. Este factor (z0) pode ser

ajustado no t nel aerodin mico, consoante o n mero e a disposi o de elementos que

simulam a camada limite a barlavento da maqueta, usando-se blocos de madeira ligados

por uma r gua de contraplacado, colocados perpendicularmente direc o de

escoamento (fig. 6.13).

Antes de se iniciarem os ensaios sobre a maqueta, testaram-se v rios

esquemas/combina es de blocos e determinaram-se as respectivas rugosidades a partir

da intersec o dos perfis de vento em escala logar tmica (fig. 6.14).

Foram testados quatro esquemas:

A - "Blocos simples": as fileiras foram espa adas cerca de 20 cm entre si.

(fig. 6.13 - A).

B - Duas fiadas de blocos sobrepostos e espa ados de 20 cm ("blocos

duplos" - B).

C - "Blocos triplos" (tr s fiadas sobrepostas), intercaladas por fiadas de "blocos

duplos" espa ados cerca de 10 cm - C).

D - Quatro fiadas de blocos sobrepostos ("blocos qu druplos"), espa ados cerca

de 10 cm entre si (D).

A solu o de blocos simples representa uma rugosidade inferior a 0,02 m,

valor que se assemelha ao que se estimou para o norte da cidade de Lisboa e outras

reas devolutas antes dos anos 80 do s culo passado (ver CAP TULO 5). Este esquema

ali s o mais utilizado na maior parte de estudos que simulam o vento em torno dos

edif cios. A solu o de blocos qu druplos, ou seja quatro fiadas sobrepostas, espa adas

cerca de 10 cm entre si, a que melhor simula o crescimento da cidade porque

corresponde a uma rugosidade estimada de 1,5 m. Estas duas solu es (A e D) foram

as escolhidas para determinar as modifica es dos campos de vento sobre a maqueta de

Telheiras, porque verificam as condi es estudadas no cap tulo anterior significando

portanto, o crescimento de uma cidade em altura a barlavento do local onde se prev em

as maiores modifica es ambientais.

Page 184: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I Modifica o nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 180 -

A - Blocos simples espa ados cerca de 20 cm B- Blocos duplos espa ados cerca de 20 cm

C - Blocos triplos intercalados por blocos duplosespa ados cerca de 10 cm

D - Blocos qu druplos espa ados cerca de 10 cm

Fig. 6.13 - Combina es de blocos que simulam a rugosidade a barlavento da maqueta para determinar asrugosidades a utilizar.

As solu es interm dias de blocos duplos (fiadas sobrepostas e espa adas de 20

cm) ou intercaladas com blocos triplos espa adas de cerca de 10 cm entre si (B e C),

revelaram-se semelhantes, rondando valores de z0 pr ximos de 0,1 m. N o foram

utilizadas nos ensaios por, a priori, n o traduzirem a mudan a pretendida nas condi es

de ventila o.

5. RESULTADOS

Apresentam-se os resultados obtidos no t nel aerodin mico por componentes

direccionais do vento, iniciando-se com o rumo de norte por ser a direc o mais

frequente na regi o de Lisboa, como se viu sobretudo durante o Ver o, seguindo-se as

componentes de noroeste e oeste. Para cada direc o exp em-se primeiramente os

Page 185: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Cap tulo 6 Modifica es nos campos de vento no bairro de Telheiras:ensaios em t nel aerodin mico

- 181 -

ensaios das figuras de eros o e dos fios de algod o (componentes velocidade e

direc o). Seguir-se- a apresenta o dos perfis de vento com a rugosidade pr xima de

0,02 m (montagem composta por blocos simples a barlavento da maqueta), para depois

se verificarem as modifica es nos campos de vento em torno dos edif cios com o

aumento da rugosidade para 1,5 m (blocos qu druplos).

y = 0.0158e1.1640x

R2 = 0.98

y = 0.0898e0.9747x

R2 = 0.97

y = 0.1062e0.995x

R2 = 0.99

y = 1.1153e0.6861x

R2 = 0.99

0.01

0.1

1

10

100

1000

0 1 2 3 4 5 6 7 8 9

vel. (m/s)

alt. (m)

blocos simples

Blocos duplos

Blocos duplos x triplos

Blocos qu druplos

Fig. 6.14 - Velocidades do vento obtidos com as v rias combina es de blocos a barlavento da maqueta,para determina o das rugosidades (z0) a utilizar nos ensaios. Os valores correspondem intersec o dosperfis logar tmicos do vento com as altitudes. S o apresentadas as equa es das rectas e a qualidade dosajustamentos aos pontos (R2).

5.1 MODIFICA ES NAS VELOCIDADES DO VENTO JUNTO AO SOLO E EM ALTURA:

ENSAIOS COM A DIREC O NORTE.

Para se avaliarem as modifica es do vento ao n vel do solo da maqueta foram

analisados todas as figuras de eros o de areia que se formaram com as diferentes

velocidades de refer ncia nos dois ensaios (rugosidades 0,02 m e 1,5 m). Relembre-

se que essas velocidades foram as medidas pelo tubo de Pitot-Prandtl fixo no tecto do

Page 186: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I Modifica o nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 182 -

t nel aerodin mico. Cada foto tirada foi submetida a um tratamento gr fico, marcando-

se os limites da eros o da areia para cada velocidade de modo a ter-se uma imagem da

progress o das areias na maqueta com o aumento da velocidade do vento. As figuras

6.20 e 6.21 mostra essa progress o, bem como a superf cie coberta de areia no fim de

cada ensaio em cada rugosidade.

5.1.1 RUGOSIDADE 0,02 m

Na figura 6.17 mostram-se as fotos tiradas a velocidades de refer ncia

crescentes. Faz-se igualmente uma interpreta o de s ntese da desloca o da areia nos

v rios momentos, representando-se a areia que permaneceu na maqueta ap s a

velocidade de refer ncia m xima (cerca de 10,1 m/s). Consoante as tipologias de

implanta o (fig. 6.15), assim se notam padr es diferenciados no deslocamento das

areias, que mostram as reas onde ocorrem as acelera es do vento ou movimentos

turbilhonares sem direc o aparente.

Como se imp s um aumento de pot ncia aos ventiladores, tamb m a velocidade

foi aumentando medida que decorriam os ensaios. At velocidade de refer ncia de

4,1 m/s (fig. 6.17 a) n o ocorreu movimenta o das areias. A partir desse valor

come aram-se a verificar os primeiros movimentos das areias, podendo-se notar o efeito

em "ferradura" (b e c), desenho t pico das acelera es locais do fluxo de ar em torno dos

edif cios mais expostos a barlavento, nas tipologias 2 e 4. A partir de 5,8 m/s, a rua de

orienta o transversal oeste/este entre os sectores 4 e 5 (R. Prof. H. Vilhena), sofre uma

eros o continuada, decorrente do aumento da velocidade do vento, que canalizado

pela sa da da praceta a norte (fig. 6.15 A). As direc es do vento na figura 6.16,

ilustram o modo como a areia se movimenta nesse local.

At velocidade de refer ncia de 9,1 m/s, verifica-se uma maior eros o das

areias em todo o sector norte da maqueta, onde as tipologias s o prop cias penetra o

do vento, do que nas tipologias 3 e 5 (a sotavento). Estes conjuntos urbanos encontram-

se mais abrigados e protegidos do fluxo de norte porque constituem espa os mais ou

menos fechados. Por outro lado h uma maior reten o das areias n o s devido ao

maior efeito de abrigo proporcionado pelos edif cios orientados perpendicularmente

Page 187: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Cap tulo 6 Modifica es nos campos de vento no bairro de Telheiras:ensaios em t nel aerodin mico

- 183 -

direc o do vento, mas sobretudo por causa dos movimentos turbilhonares que mant m

as areias no seu interior (fig. 6.16).

Fig. 6.15 - reas de diferentes tipologias na maqueta. Os n meros correspondem aos do quadro 6.5, ondese faz a an lise da quantidade de areia retida no final dos ensaios. As letras mostram os locais onde seefectuaram os perfis de vento. A - rua Prof. Ant nio Jos Saraiva; B - praceta adjacente rua Prof. DiasAmado; C - rua Prof. Mark Athias; D - Eixo Norte/Sul.37

Na ltima etapa do ensaio, a uma velocidade de refer ncia de 10,1 m/s, as areias

mant m-se na praceta mais a sudeste, ltimo reduto semi-fechado.

Comparando os sectores 2 e 3, onde predominam as torres isoladas, tamb m se

verifica uma maior acumula o de areia no sector sul (fig. 6.15 - 3), por n o haver

escoamento suficiente devido ao fecho do sector por um bloco de edif cios

perpendiculares direc o norte.

O sector do Eixo Norte/sul (sector 1) um corredor de ventila o privilegiado

quando o vento sopra de norte. No seu sector oeste, onde nenhum obst culo impede a

livre circula o do ar, as areias s o constantemente removidas, verificando-se apenas

pequenas acumula es acima do valor de refer ncia de 7,6 m/s. A leste daquela via um

37 A parte oeste da maqueta n o se incluiu em nenhuma das tipologias porque foi imposs vel, com osmeios fotogr ficos dispon veis na altura, captar os extremos da maqueta nos ensaios das figuras deeros o. S o aqui apresentados porque a maqueta foi utilizada noutras experi ncias, nomeadamente nadetermina o das direc es com os fios de algod o.

Page 188: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I Modifica o nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 184 -

grupo de pequenas rvores retardam o fluxo de ar, sendo vis vel uma maior acumula o

de areia perto das torres, que permanece no local at pelo menos velocidade de

refer ncia de 10,1 m/s ( ltimo ensaio). Esta dissimetria nos flancos do Eixo Norte/sul,

levam a concluir que a vegeta o, mesmo de pequeno porte, pode retardar a progress o

do fluxo, sendo um factor ben fico local, se se quiser suster o mpeto do vento mais

forte, mas claramente um factor a evitar se se pretenderem formar corredores de

ventila o que possam eficazmente renovar o ar do centro da cidade.

As direc es do vento junto ao solo, com uma velocidade de refer ncia de

6,7 m/s (fig. 6.17), ajudam a explicar a movimenta o e acumula o de areia em certos

locais da maqueta. De um modo geral, verifica-se que as ruas mais estreitas (alinhadas

no sentido norte/sul) canalizam o fluxo naquela direc o. Nas pracetas abertas e, de um

modo geral em todas as sa das para sul, o padr o dominante resulta de um

escoamento para sudeste, ali s como era vis vel nalgumas figuras de eros o entre as

ruas Prof. Ant. Jos Saraiva e Prof. Dias Amado (fig. 6.17 d), e) e f). Este facto poder

estar de acordo com os estudos referidos no cap tulo I, em que diversos autores (citados

por LEE, 1977) chegaram conclus o que as for as de fric o imp em um desvio da

direc o do vento no sentido cicl nico, em resposta desacelera o do vento provocado

pela rugosidade.

Nas pracetas semi-fechadas, sobretudo no sector 5, nunca se verificou um

padr o de escoamento dominante, observando-se antes um movimento turbilhonar e

desordenado dos fios de algod o em torno da sua fixa o (fig. 6.16), o que resultou no

movimento das areias dentro desses espa os, explicando-se assim a sua maior

concentra o no final dos ensaios. De notar que este movimento desordenado dos fios

n o se verificou nos ensaios com velocidades de refer ncia inferiores a cerca de 4,3 m/s

(apenas observado nos v deos efectuados, que aqui obviamente n o se apresentam).

Nos sectores 2 e 3, onde predominam as torres isoladas, verifica-se um

escoamento do ar que tende a contornar estes edif cios, seguindo-se a barlavento o seu

cruzamento. Este facto explicaria a relativa limpeza das areias em torno destes edif cios

no final dos ensaios (fig. 6.17 f).

Page 189: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Cap tulo 6 Modifica es nos campos de vento no bairro de Telheiras:ensaios em t nel aerodin mico

- 185 -

Fig. 6.16 Direc es do fluxo em torno dos edif cios com vento de norte, a uma velocidade de refer nciade 6,4 m/s e uma rugosidade 0,2 m a barlavento da maqueta. Em cima apresenta-se a traject ria dovento observado durante os ensaios, esquematizado sobre dois conjuntos de edif cios. Em A observa-se o"efeito de barra" e em B o movimento ondulat rio do vento sobre uma praceta semi-fechada.

No sector 1 e reas adjacentes a oeste, notam-se algumas particularidades

interessantes. Entre duas fiadas de blocos, onde o estreitamento evidente (fig. 6.16),

verifica-se que o fio contorna os edif cios, rumando para norte, mantendo-se nessa

direc o continuamente (aqui fica exemplificado como dif cil medir no terreno a

direc o do vento).

P de-se observar o escoamento do ar sobre os edif cios da maqueta, usando um

fio de algod o de maior dimens o. Representados em corte transversal na fig. 6.16,

mostram-se duas modalidades distintas de como esse escoamento se pode efectuar

consoante a tipologia dos edif cios: o vento que sopra sensivelmente a meia altura dos

pr dios (A), tende a ultrapassar o seu topo e passar para o outro lado da rua, movimento

Page 190: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I Modifica o nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 186 -

conhecido por "efeito de barra" (GANDEMER, 1975) e continuamente observado nos

v deos efectuados. Este efeito, segundo aquele autor, ocorre quando os edif cios

apresentam uma forma paralelepip dica, ou em barra, e n o ultrapassam a largura de 10

m e altura de 30 m, sendo o seu comprimento nunca inferior a 8 vezes a sua altura.

Igualmente foi observado este efeito sobre o Eixo Norte/sul, o que pode constituir um

perigo para o tr fego em alturas em que as rajadas de vento possam soprar com maior

intensidade. Note-se que h um desn vel efectivo no terreno entre este eixo vi rio e as

reas circundantes, que forma uma barra com cerca de 6 m de altura por 16 m de

largura aproximadamente, o que o torna num elemento prop cio a este tipo de fen meno

de escoamento local.

Em B observa-se um movimento ondulat rio, do tipo "isolated roughness flow",

que ocorre quando a rela o entre a altura dos pr dios e a dist ncia entre si (H/W)

inferior a 0,4. No caso desta praceta essa rela o de 0,23.

5.1.2 RUGOSIDADE 1,5 m

Quando se utilizou uma rugosidade mais elevada a barlavento da maqueta

( 1,5 m), os padr es de eros o das areias s o id nticos aos verificados com a

rugosidade de 0,02 m, residindo apenas as diferen as no retardamento do

aparecimento das figuras de eros o.

As primeiras figuras de eros o, que surgem com mais nitidez, ocorrem em torno

das torres isoladas (sector 2). Quando se utilizou uma rugosidade aproximada de

0,02 m, a velocidade de refer ncia foi de 6,7 m/s, enquanto com a rugosidade de 1,5

m, as mesmas figuras surgiram apenas a 7,7 m/s.

Este retardamento (que representa 1 m/s) ainda mais n tido nos sectores a sul,

mais abrigados e onde os espa os s o semi-fechados (sectores 3 e 5), prova inequ voca

das velocidades mais baixas junto ao solo. Fora da influ ncia dos pr dios, o atraso no

aparecimento das primeiras figuras de eros o (traduzido pelo in cio da remo o dos

gr os de areia no quadrado livre da maqueta), ainda maior, tendo-se iniciado a uma

Page 191: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Cap tulo 6 Modifica es nos campos de vento no bairro de Telheiras:ensaios em t nel aerodin mico

- 187 -

Fig. 6.17 Ensaio das figuras de eros o, com vento de norte e rugosidade simples (z0 0,02m).esquerda os valores de press o din mica de refer ncia ( lidos pelo tubo de Pitot-Prandtl fixo no tecto dot nel durante o ensaio) e as correspondentes velocidades de vento calculadas.

DIREC O DO VENTO NORTERUGOSIDADE A BARLAVENTO (Z0 0,02m)

PRESS O DIN MICA DE REFER NCIA

1,1 mm coluna de H2OVelocidade do vento = 4,3 m/s

a)

2,05 mm coluna de H2O

Velocidade do vento = 5,8 m/s

b)

2,7 mm coluna de H2O

Velocidade do vento = 6,7 m/s

c)

3,5 mm coluna de H2O

Velocidade do vento = 7,6 m/s

d)

5,0 mm coluna de H2O

Velocidade do vento = 9,1 m/s

e)

6,2 mm coluna de H2O

Velocidade do vento = 10,1 m/s

f)

Page 192: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I Modifica o nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 188 -

velocidade de refer ncia de 5,8 m/s quando se utilizou a rugosidade de 0,02 m

e apenas a 7,7 m/s, quando se aumentou a rugosidade para 1,5 m (1,9 m/s de

diferen a). O nico sector onde a diferen a na velocidade a que ocorreu o in cio

m nima foi a oeste do eixo Norte/sul, onde as areias foram removidas ao mesmo ritmo

do ensaio anterior (z0 0,02 m). Este facto poder refor ar a import ncia dos corredores

abertos progress o do vento, como factores fundamentais de ventila o, mesmo na

presen a de um aumento da rugosidade a barlavento.

5.1.3 PRINCIPAIS MODIFICA ES DO VENTO JUNTO AO SOLO COM O AUMENTO DA

RUGOSIDADE DE 0,02 m PARA 1,5 m.

Analisam-se agora as principais diferen as entre os ensaios com as duas

rugosidades escolhidas. Para cada velocidade de refer ncia foram elaboradas isolinhas

tra adas a partir da correspondente figura de eros o (fig. 6.20 e 6.21). Os racios das

velocidades representam o aumento relativo em rela o isolinha anterior.

Mostram-se tamb m as velocidades de refer ncia registadas no tubo de Pitot-

Prandtl fixo no tecto, cujos valores n o s o influenciados pela rugosidade. O que j era

visualmente n tido nas fotos foi assim representado em conjunto, tendo-se uma imagem

mais precisa do desenrolar da movimenta o das areias conforme se ia aumentando a

velocidade de refer ncia.

Para simplificar a apresenta o dos resultados das principais modifica es entre

as duas rugosidades, foram calculadas as reas cobertas e livres de areia no final de cada

ensaio (quadro 6.1). Com o aumento da rugosidade (de 0,02 para 1,5 m), verifica-se

um aumento generalizado da rea ocupada pela areia em cerca de 12 % e igual valor de

diminui o das reas onde o fundo aparece a descoberto. Mantendo-se constante a

velocidade de refer ncia na camada de ar n o perturbado pela superf cie do t nel

aerodin mico, conclui-se que o aumento da rugosidade a barlavento (para os valores

apontados), diminui a capacidade de remo o dos gr os de areia e, consequentemente, a

velocidade do vento junto ao solo.

Page 193: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Cap tulo 6 Modifica es nos campos de vento no bairro de Telheiras:ensaios em t nel aerodin mico

- 189 -

DIREC O DO VENTO - NORTERUGOSIDADE A BARLAVENTO (Z0 1,5m)

PRESS O DIN MICA DE REFER NCIA

1,1 mm coluna de H2O

Velocidade do vento = 4,3 m/sa)

2,0 mm coluna de H2O

Velocidade do vento = 5,9 m/s

b)

2,7 mm coluna de H2O

Velocidade do vento = 6,8 m/s

c)

3,5 mm coluna de H2O

Velocidade do vento = 7,7 m/s

d)

5,1 mm coluna de H2O

Velocidade do vento = 9,3 m/s

e)

6,2 mm coluna de H2O

Velocidade do vento = 10,3 m/s

f)

Fig. 6.18 Ensaio das figuras de eros o, com vento de norte e rugosidade qu drupla (z0 1,5m).esquerda os valores de press o din mica de refer ncia ( lidos pelo tubo de Pitot-Prandtl fixo no tecto dot nel durante o ensaio) e as correspondentes velocidades de vento. direita as figuras de eros o.

Page 194: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I Modifica o nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 190 -

Fig. 6.19 Direc es do fluxo em torno dos edif cios com vento de norte, a uma velocidade de refer nciade 6,2 m/s e uma rugosidade 1,5 m.

Quadro 6.1 - Percentagem de rea edificada, coberta e descoberta de areia no fim decada ensaio (direc o norte).

Rugosidade (m) Velocidade de refer nciano final dos ensaios

(m/s)

reaedificada

(%)

Fundo da maquetasem areia

(%)

Areiaacumulada

(%)

0,02 10,1 72 7

1,5 10,321

60 19

diminui o aumento relativo de areia

No entanto, esta generaliza o n o suficiente para conhecermos quais as

tipologias mais prop cias acumula o de areia.

Page 195: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

0 100 m

Fig. 6.20 - Resultados dos ensaios das figuras de eros o, com a direc o norte e rugosidade a barlavento de 0,02 m.

Page 196: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

0 100 m

Fig. 6.21 - Resultados dos ensaios das figuras de eros o, com a direc o norte e rugosidade a barlavento de . Note-se o aumento da quantidade de areia acumulada em certos locais damaqueta em rela o aos ensaios com a rugosidade 0,02 m (ver explica o no texto).

1,5 m

Page 197: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Cap tulo 6 Modifica es nos campos de vento no bairro de Telheiras:ensaios em t nel aerodin mico

- 193-

No quadro 6.2 mostram-se as diferen as percentuais de acumula o das areias

no final de cada ensaio (z0 0,02 e 1,5 m). As maiores varia es (22,5 %), ocorrem nos

espa os semi-fechados, onde se forma escoamento turbilhonar que mant m as areias em

circula o dentro das pracetas e, ao mesmo tempo, poder ocorrer a diminui o da

velocidade do vento.

Quadro 6.2 - Percentagem de rea coberta de areia no fim de cada ensaio, por tipologiasurbanas (direc o norte).

Tipologias*Eixo

Norte/Sul(1)

Torresnorte(2)

Torressul(3)

Tipologiabanda,

abert. a norte(4)

Tip. banda,espa os rel.fechados.

(5)

Rugosidade (m) 0,02 1,5 0,02 1,5 0,02 1,5 0,02 1,5 0,02 1,5

Areia acumulada (%) 6,6 9,3 0,5 3,2 7,3 21,4 4,4 16,8 14,7 37,2

Varia o +2,7 +2,7 +14,1 +12,4 +22,5

* - Os n meros correspondes s tipologias apresentadas na figura 6.15

Com id nticas propor es de reten o de areias, com o aumento de z0 (12,4 e

14,1 %,) encontram-se as tipologias 4, formadas por pracetas abertas a norte e com

sa das de ventila o (embora ex guas) a sul, e as torres na parte sul da maqueta

(tipologia 3). Na verdade, estas torres embora com espa os intersticiais, s o fechadas a

sul por uma fiada de pr dios, que n o propicia os escoamentos nesta direc o.

As torres a norte (tipologia 2) e o eixo Norte/sul (1) s o as reas que apresentam

condi es de ventila o que pouco se alteram com o aumento de rugosidade, com

varia es de reten o de areia inferiores a 3%. A aparente contradi o de surgirem

valores ligeiramente mais elevados de percentagem de areia acumulada no Eixo

Norte/sul ( rea de elevado escoamento do ar), derivada do conjunto de rvores a leste

daquela via r pida que atravessa a cidade, que retarda ligeiramente o fluxo de ar.

Vejam-se a prop sito as figuras 6.20 e 6.21, onde se pode confirmar essa acumula o

causada pela vegeta o arb rea, que separa os edif cios daquela via. excep o desse

facto, verifica-se que o Eixo Norte/sul e as reas adjacentes a oeste s o os nicos locais

Page 198: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I Modifica o nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 194 -

onde praticamente n o restou areia depois de terminados os ensaios com os dois tipos

de rugosidades.

5.1.2 PRINCIPAIS MODIFICA ES DA VELOCIDADE DO VENTO EM ALTURA.

Come a-se por analisar os perfis do vento elaborados com os valores recolhidos

atrav s dos tubos de Pitot-Prandtl comandado pelo coordin metro (fig. 6.22). Quatro

desses perfis foram efectuados em locais sobre a maqueta, escolhidos em fun o das

diferentes tipologias. Para cada um destes locais foi calculada a rugosidade (z0),

segundo os par metros de LETTAU (1969)34, apresentados em MORTENSEN ET AL (1993).

O c lculo da rugosidade segundo este m todo adequado geometria e disposi o dos

edif cios neste local, porque d boas estimativas quando o par metro AH ( rea m dia

horizontal dispon vel para cada elemento de rugosidade), que largamente superior

sec o transversal direc o do vento que se considera (S). Na maqueta de Telheiras

AH 12,5 a 19 vezes superior a S, sendo portanto poss vel estimar correctamente a

rugosidade em cada local. Um quinto perfil apresentado tamb m na figura 6.22 tendo

sido elaborado a partir dos valores recolhidos a barlavento da maqueta com a

rugosidade aproximada de 0,02m. Comparam-se ainda os perfis de vento em dois locais

(A e D, fig. 6.22), com as rugosidades de 0,02 e 1,5 m, para observar as principais

modifica es do vento em altura com o aumento da rugosidade.

Perfis da velocidade do vento em quatro tipologias com a rugosidade a barlavento

de 0,02 m.

Os perfis verticais sobre os locais escolhidos na maqueta correspondem aos

fluxos nos primeiros 250 m de altura (valores convertidos a partir da escala da

maqueta), e mostram a influ ncia da geometria e da volumetria dos edif cios na camada

limite. A velocidade do vento (eixo das abcissas) foi substitu da pela raz o entre a

velocidade registada a cada altura (U) e a velocidade de refer ncia (Uref), medida na

parte superior do t nel. Admitindo que os perfis logar tmicos do vento dependem

34 Para uma explica o mais detalhada sobre a obten o deste par metro consultar o CAP TULO 1.

Page 199: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Cap tulo 6 Modifica es nos campos de vento no bairro de Telheiras:ensaios em t nel aerodin mico

- 195 -

apenas da rugosidade, este valor, que pode variar entre 0 e 1, permite conhecer, para

qualquer velocidade, o perfil correspondente em cada local da maqueta, apenas com o

valor de z0 e a velocidade de referencia no t nel.

Para mostrar as principais diferen as nos perfis de vento, calculou-se o gradiente

vertical da velocidade ( u/ z - quadro 6.3), na camada de ar imediatamente acima dos

edif cios (25 a 50 m).

Quadro 6.3 Gradiente vertical da velocidade do vento entre 25 e 50 m de altura( u/ z), nos locais onde foram elaborados perfis de velocidade ordenados por gradiente

crescente (ver significado no texto).

Locais onde foram elaborados osperfis de vento ( u/ z) Z0(m)

CRua Prof. Mark Athias 0,012 1,1

ARua Prof. Ant nio Jos Saraiva 0,020 0,9

DEixo Norte/Sul. 0,032 0,02

BPraceta adjacente rua Prof. Dias Amado 0,036 0,3

Este gradiente, que traduz uma rela o entre as diferen as de velocidade ( u),

para uma determinada espessura da camada de ar ( z), neste caso 25m, maior em

locais menos rugosos e menor onde a rugosidade aumenta (OKE, 1987). Como se

verifica no quadro 6.3 os locais C e A (ruas Prof. Mark Athias e Rua Ant nio Jos

Saraiva), que t m as rugosidades mais elevadas (respectivamente 1,1 e 0,9 m),

apresentam os valores mais baixos de gradiente vertical, enquanto os perfis B e D

(praceta adjacente Rua Prof. Dias Amado e Eixo Norte/sul), apresentam valores de

gradiente mais elevados.

At 50 m de altura, o perfil que mais semelhan as apresenta com o obtido a

barlavento da maqueta (a tracejado na fig. 6.22), o que se obteve sobre o local C (Rua

Prof. Mark Athias). Este local pertencente tipologia constitu da por torres isoladas e a

tomada de press o do tubo de Pitot-Prandtl estava suficientemente afastada para n o

sofrer a sua influ ncia directa. At aquela altura (50 m) o local onde a velocidade do

Page 200: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I Modifica o nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 196 -

vento mais elevada. As pracetas semi-fechadas a sul, onde j se tinha verificado uma

maior acumula o de areia (local B - Rua Prof. Mark Athias), s o as que apresentam um

perfil de vento onde a velocidade menor at 150 m de altura. Na camada de ar acima

dos pr dios (25 m) a velocidade 30% inferior ao n vel n o perturbado de refer ncia

(Uref). Em certas situa es de vento mais forte (como foi observado nos ensaios dos

fios de algod o, que se mantinham enrolados sobre si com velocidade superiores a 6

m/s) estas ruas, que na verdade s o pracetas que formam espa os semi-fechados, s o

locais onde ocorre a diminui o da velocidade do vento acima do n vel dos pr dios, mas

onde se acentua a turbul ncia e a recircula o do ar que tem dificuldade de sair para o

exterior da rea edificada. Estes factores podem reter elementos nocivos para o

ambiente urbano (detritos s lidos - lixos e poluentes gasosos) que normalmente se

encontram na via p blica. O seu efeito pode ser acentuado se, como se prev , verificar o

aumento da rugosidade para norte deste local.

Do ponto de vista ambiental, o exemplo a norte deste conjunto (local A - Rua

Prof. Ant nio Jos Saraiva) mais favor vel, j que n o se verificou uma t o intensa

reten o de areias (menor efeito de recircula o no interior do edificado) e as aberturas

existentes a norte e a sul permitem uma ventila o do ar mais eficaz. A velocidade do

vento acima dos pr dios (25 m) s compar vel ao Eixo Norte/sul, correspondendo a

cerca de 50 % da velocidade de refer ncia. Como sucede no local C, a maior velocidade

relativa do vento poder ser explicada pelo estreitamento do fluxo (efeito de Venturi),

denotando caracter sticas de boa ventila o, mesmo quando nos ensaios se aumentou a

rugosidade a barlavento.

Acima de 150 m de altura as diferen as nos perfis entre os v rios locais s o

m nimas, verificando-se apenas um aumento da velocidade do vento sobre o Eixo

Norte/sul.

Fora da influ ncia de qualquer elemento rugoso (acima do 100 m), a velocidade

relativa aumenta no eixo Norte/sul, o que confirma a sua voca o de "corredor de

ventila o" necess rio para o sul da cidade.

Page 201: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Cap tulo 6 Modifica es nos campos de vento no bairro de Telheiras:ensaios em t nel aerodin mico

- 197 -

0

50

100

150

200

250

0.0 0.1 0.2 0.3 0.4 0.5 0.6 0.7 0.8 0.9 1.0

U/Uref

alt. (m)

rua Prof. Mark Athias(Torres) (C)Eixo Norte/Sul (D)

rua Prof. Dias Amado(praceta) (B)rua Ant. Jos Saraiva (A)

Perfil a barlavento damaqueta (z0 0,02m)

0 100 m

LocalRugosidade

z0(m)

A - Rua Prof. Ant nio JosSaraiva

0,9

B - Praceta adjacente rua Prof.Dias Amado

0,3

C - Rua Prof. Mark Athias 1,1

D - Eixo Norte/Sul. 0,02

A tracejado, o perfil a barlaventoda maqueta

0,02

Fig. 6.22 - Perfis com vento de norte, obtidos sobre a maqueta nos locais representados na fig. direita.Representa-se tamb m, a tracejado, um perfil efectuado a barlavento da maqueta. A escala de velocidades(U/Uref) representa a rela o entre o escoamento do ar em cada n vel e a velocidade de refer ncia duranteo ensaio (ver explica o no texto).

Modifica es nos perfis de vento em dois locais, quando se introduziu uma

rugosidade de 1,5 m a barlavento da maqueta.

Os ensaios com os blocos "qu druplos", que simulam o aumento da rugosidade a

barlavento de aproximadamente 0,02 para cerca de 1,5m, mostram claramente a redu o

do vento em altura.

Para n o se multiplicarem casos semelhantes, apresenta-se o exemplo dos perfis

de vento em altura na rua Prof. Ant nio Jos Saraiva - local A. A redu o nas

velocidades de vento n o uniforme em todo perfil quando se utiliza uma rugosidade de

1,5m a barlavento da maqueta: imediatamente acima dos pr dios (a cerca de 25 m de

altura) a redu o mais elevada (46%), enquanto a 50 m de 30 % e 10% a 200 m (fig.

6.23). Acima desta altura a redu o do vento mant m-se constante.

25

B

D

C

A

Page 202: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I Modifica o nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 198 -

Para melhor se ter uma ideia das grandezas em jogo, apresenta-se na figura 6.24

as redu es de velocidade do vento na rua Prof. Ant nio Jos Saraiva, para dois valores

de refer ncia (Uref= 10,9 e 6,8 m/s).

Uma diminui o de 4,1 m/s na velocidade do vento na camada n o perturbada,

sobre uma superf cie de fraca rugosidade (por exemplo 0,02m), equivale ao decr scimo

da velocidade do vento, na mesma ordem de grandeza, devida apenas ao aumento da

rugosidade de 0,02 m para 1,5m nos n veis mais baixos da atmosfera urbana (50 metros

de altura topo da rea marcada a ponteado na figura). Isto mostra que o aumento de

rugosidade prevista para o norte de Lisboa equivale sempre a uma diminui o da

velocidade do vento na atmosfera urbana inferior.

0

25

50

75

100

125

150

175

200

225

250

0.0 0.1 0.2 0.3 0.4 0.5 0.6 0.7 0.8 0.9 1.0

U/Uref

alt. (m)

Rug. 0,02 m

Rug. 1,5 m

Fig. 6.23 - Perfis de vento de norte obtidos sobre a rua Prof. Ant nio Jos Saraiva (fig. 6.22 A). A curvaa cheio representa o perfil de rugosidade (z0) aproximada de 0,02 m e a linha a tracejado a rugosidade de

1,5 m. A escala de velocidades (U/Uref) representada pelo rela o entre a velocidade do escoamentodo ar em cada n vel de altura e a velocidade de refer ncia durante o ensaio (ver explica o no texto).

Page 203: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 6 – Modificações nos campos de vento no bairro de Telheiras:ensaios em túnel aerodinâmico

- 199 -

0

50

100

150

200

250

0.0 2.0 4.0 6.0 8.0 10.0

vel. (m/s)

alt. (m)

Rug. 1,5 m / U (m/s) - 10,9

Rug. 1,5 m / U (m/s) - 6,8

Rug. 0,02 m / U (m/s) - 10,9

Rug. 0,02 m / U (m/s) - 6,8

Fig. 6.24 - Perfis de vento de norte correspondentes à figura anterior, com duas velocidades de referênciaA cheio encontram-se as curvas com uma velocidade de referência (Uref) de 10,9 m/s e a tracejado de 6,8m/s. Ver explicação no texto sobre a área a ponteado.

Comparando os efeitos de mudança de rugosidade em dois lugares (fig. 6.25)

cujos perfis apresentam comportamentos semelhantes nos perfis de vento (Eixo

Norte/Sul - linhas a vermelho e rua António José Saraiva, a preto), verifica-se que as

maiores reduções na velocidade ocorrem no Eixo Norte/sul, acima do nível dos prédios

(cerca de 20/25 m). Isto significa que são as áreas melhor ventiladas aquelas onde

poderão ocorrer as maiores modificações, sendo portanto necessário não ocupar

densamente os espaços a montante dos corredores de ventilação, que são fundamentais

para o arejamento do sul da cidade.

5.2 MODIFICAÇÕES NAS VELOCIDADES DO VENTO JUNTO AO SOLO: ENSAIOS COM A

DIRECÇÃO NOROESTE.

Depois do trabalho no túnel aerodinâmico com a direcção norte, incluindo os

ensaios das figuras de erosão, as experiências com os fios de lã, para verificar as

Page 204: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I Modifica o nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 200 -

direc es em torno dos edif cios, e os perfis de vento sobre v rios locais de tipologias

diferentes, verificou-se que seria uma tarefa infind vel e pouco produtiva, de repetir

todas as experi ncias com outras direc es. Muitos dos resultados n o serviriam para

explicar as modifica es com o aumento da rugosidade a barlavento, tese que se prop s

decifrar no in cio deste trabalho. Repetir, por exemplo, todos os perfis para outras

direc es, seria n o s extremamente repetitivo, como os resultados n o seriam muito

diferentes dos j obtidos para a direc o norte, pois o fluxo de ar acima dos pr dios

afectado pela rugosidade a barlavento da maqueta, e n o pela mudan a de direc o.

Apenas localmente e na vizinhan a do abrigo de certos blocos na maqueta se poderiam

esperar pequenas altera es aos resultados que j se tinham obtido.

Por outro lado, o tempo de trabalho de disponibilidade do t nel chegava ao fim.

Por isso, apenas se repetiram alguns ensaios (figuras de eros o e direc es em torno dos

edif cios) para as direc es noroeste e oeste, pois reconhecidamente, em Lisboa, s o

dois dos rumos mais frequentes a seguir ao norte.

Apresenta-se, nas figuras 6.26 e 6.27 os ensaios das figuras de eros o com a

direc o noroeste e, mais adiante com o oeste. Tentou-se que as velocidades de

refer ncia fossem aproximadas dos ensaios com a direc o norte, facto que poss vel

controlando as velocidades dos ventiladores no t nel.

Ao contr rio dos ensaios com o vento norte, onde se verificou uma intensa

eros o das areias nas ruas orientadas na direc o do escoamento do ar (norte/sul) e os

restantes espa os, sobretudos os mais confinados, revelaram-se bons receptores das

areias que circulavam nos seus interiores, as figuras de eros o com fluxo de noroeste

v o-se formando primeiramente junto das fachadas expostas a esta direc o e

acumulando-se junto aos blocos a oeste (veja-se por exemplo a sequ ncia c, d, e e f),

sobretudo nas tipologias 4 e 5.

Page 205: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Cap tulo 6 Modifica es nos campos de vento no bairro de Telheiras:ensaios em t nel aerodin mico

- 201 -

0

50

100

150

200

250

0.0 0.1 0.2 0.3 0.4 0.5 0.6 0.7 0.8 0.9 1.0

U/Uref

alt. (m)

Eixo Norte/sul (z0 1,5 m)

R. Ant. Jos Saraiva (z0 0,02 m)

Eixo Norte/sul (z0 0,02 m)

R. Ant. Jos Saraiva (z0 1,5 m)

Fig. 6.25 - Compara o dos perfis de vento de norte obtidos na maqueta sobre o Eixo Norte/Sul (linha avermelho) e na rua Ant nio Jos Saraiva (curvas a preto). As curvas a cheio representam os perfis derugosidade (z0) aproximada de 0,02 m e a tracejado a rugosidade de 1,5 m.

Esta forma de progress o das areias propiciada pela pr pria arquitectura dos

edif cios, cujas ruas ou pracetas em "L" dirigem o escoamento no sentidos

noroeste/sudeste (fig. 6.28), acentuando-se o desvio cicl nico j anteriormente notado

com a direc o norte. Na reas da torres isoladas (tipologia 2 e 3) o vento tende a

contornar os edif cios, mas a direc o dominante acompanha o alinhamento da ruas e do

Eixo Norte/sul. A oeste n o h uma direc o predominante, verificando-se que o

escoamento do fluxo aproveita as aberturas existentes.

Comparando a areia acumulada no final dos dois ensaios com as rugosidades de

0,02 e 1,5m, verifica-se uma diminui o de 5 % (de 26 para 19% - quadro 6.4), ao

contr rio das experi ncias com a direc o norte. Esta mudan a de comportamento do

vento ao n vel do solo deve-se sobretudo aos valores observados no final dos ensaios

com a rugosidade mais baixa (0,02m), onde se verificou que 7% de areia ficou

acumulada com o rumo de norte e 26% com o noroeste. Conclui-se que localmente a

Rugosidade1,5 m

Rugosidade0,02 m

Page 206: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I Modifica o nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 202 -

redu o da velocidade do vento poder ocorrer tamb m devido ao ngulo que o vento

dominante forma com a orienta o predominante dos edif cios norte/sul (45 ).

Quadro 6.4 - Percentagem de rea edificada, coberta e descoberta de areia no fim decada ensaio (direc o noroeste).

Rugosidade (m)Velocidade de refer ncia

no final dos ensaios(m/s)

reaedificada

(%)

Fundo da maquetasem areia

(%)

Areiaacumulada

(%)

0,02 10,2 55 26

1,5 10,419

61 19

diminui o aumento relativo de areia

Comparando a percentagem de rea coberta de areia nas v rias tipologias, no

final de cada ensaio com as direc es norte e noroeste (quadro 6.5), verifica-se que as

maiores modifica es ocorrem nas torres Sul (tipologia 3), que ret m eficazmente as

areias, mesmo com a rugosidade mais baixa (z0 0,02 m). Como se observa na figura

6.26 (f), n o existem sa das eficazes do escoamento do ar, o que facilita essa reten o.

Quadro 6.5 - Percentagem de rea coberta de areia no fim de cada ensaio, por tipologiasurbanas (compara o das direc es norte e noroeste).

TipologiasEixo

Norte/Sul(1)*

Torresnorte(2)

Torressul(3)

Tipologiabanda,

abert. a norte(4)

Tip. banda,espa os rel.fechados.

(5)Rugosidade (m) 0,02 1,5 0,02 1,5 0,02 1,5 0,02 1,5 0,02 1,5

Areia acumulada (%)Direc o Norte

6,6 9,3 0,5 3,2 7,3 21,4 4,4 16,8 14,7 37,2

Varia o (Norte) +2,7 +2,7 +14,1 +12,4 +22,5

Areia acumulada (%)Direc o Noroeste

31,7 33,5 22,6 16,6 47,2 27,5 20,7 15,5 34,1 22,1

Varia o (Noroeste) +1,9 -6,0 -19,7 -5,2 -12,1

* - Os n meros correspondes s tipologias apresentadas na figura 6.15

Page 207: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Cap tulo 6 Modifica es nos campos de vento no bairro de Telheiras:ensaios em t nel aerodin mico

- 203 -

Fig. 6.26 Ensaio das figuras de eros o com vento de noroeste e rugosidade simples (z0 0,02m).esquerda os valores de press o din mica de refer ncia ( lidos pelo tubo de Pitot-Prandtl fixo no tecto dot nel durante o ensaio) e as correspondentes velocidades de vento. direita as figuras de eros o.

DIREC O DO VENTO NOROESTERUGOSIDADE A BARLAVENTO (Z0 0,02m)

PRESS O DIN MICA DE REFER NCIA

1,1 mm coluna de H2OVelocidade do vento = 4,3 m/s

a)

2,1 mm coluna de H2O

Velocidade do vento = 6,0 m/s

b)

2,6 mm coluna de H2O

Velocidade do vento = 6,6 m/s

c)

3,5 mm coluna de H2O

Velocidade do vento = 7,7 m/s

d)

4,7 mm coluna de H2O

Velocidade do vento = 8,9 m/s

e)

6,2 mm coluna de H2O

Velocidade do vento = 10,2 m/s

f)

Page 208: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I Modifica o nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 204 -

Fig. 6.27 Ensaio das figuras de eros o com vento de noroeste e rugosidade qu drupla (z0 1,5m).esquerda os valores de press o din mica de refer ncia ( lidos pelo tubo de Pitot-Prandtl fixo no tecto dot nel durante o ensaio) e as correspondentes velocidades de vento. direita as figuras de eros o.

DIREC O DO VENTO NOROESTERUGOSIDADE A BARLAVENTO (Z0 1,5m)

PRESS O DIN MICA DE REFER NCIA

1,1 mm coluna de H2OVelocidade do vento = 4,3 m/s

a)

2,1 mm coluna de H2O

Velocidade do vento = 5,9 m/s

b)

2,6 mm coluna de H2O

Velocidade do vento = 6,6 m/s

c)

3,5 mm coluna de H2O

Velocidade do vento = 7,6 m/s

d)

5,1 mm coluna de H2O

Velocidade do vento = 9,2 m/s

e)

6,5 mm coluna de H2O

Velocidade do vento = 10,4 m/s

f)

Page 209: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Cap tulo 6 Modifica es nos campos de vento no bairro de Telheiras:ensaios em t nel aerodin mico

- 205 -

Fig. 6.28 Direc es do fluxo em torno dos edif cios com vento de noroeste a uma velocidade derefer ncia de 6,2 m/s e uma rugosidade 0,02 m.

Nalguns casos mant m-se as mesmas caracter sticas de circula o fechada

observadas com os ensaios da direc o norte e que mant m as areias em circula o

dentro dos espa os semi-fechados.

Conclui-se que a falta de aberturas nos conjuntos dos edif cios s o pouco

eficazes na ventila o dos espa os, independentemente do aumento da rugosidade a

barlavento e da diminui o da velocidade do vento. Os movimentos turbilhonares s o

prop cios concentra o de poluentes e lixos, como j foi referido anteriormente.

No Eixo Norte/sul, a reten o de areias mais eficaz no final dos dois ensaios

com o rumo noroeste, porque a exist ncia de uma fiada de edif cios altos a oeste

daquele eixo vi rio interp e-se na progress o do vento, diminuindo a sua velocidade, e

piorando as condi es de ventila o. Confirma-se este facto verificando as direc es

dos fios, que confluem junto dos taludes formados por aquele eixo vi rio (fig. 6.28).

Page 210: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I Modifica o nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 206 -

A necessidade de implementar corredores de ventila o que sigam esta

orienta o (noroeste/sudeste), em reas urbanas ainda n o consolidadas, seria uma

medida que ajudaria a cidade a n o perder algumas das suas boas caracter sticas

ambientais que ainda se mant m.

5.3 ENSAIOS COM A DIREC O OESTE.

O ensaio com a direc o oeste (fig. 6.29) foi o ltimo a ser efectuado, tendo sido

realizado apenas com a rugosidade de 0,02m.

De todos as experi ncias efectuadas no t nel aerodin mico, os ensaios com a

direc o oeste foram os que apresentaram um padr o menos definido nos escoamentos

em torno dos edif cios (fig. 6.30). Apesar da componente de oeste/leste ser dominante,

no interior dos quarteir es as direc es do escoamento tendem a seguir o sentido das

aberturas para sul, ou no caso do Eixo Norte/sul o escoamento tende a fluir de sul para

norte. Junto aos taludes deste eixo vi rio, aumentam os movimentos turbilhonares, que

nunca foram observados noutras direc es. A exist ncia de uma fiada de blocos

compactos, com mais de 25 m de altura perpendiculares ao fluxo de oeste, causam estes

movimentos turbilhonares, fazendo aumentar a percentagem de areia acumulada no

final do ensaio (quadro 6.6). Igualmente junto s Torres Norte (tipologia 2) a

acumula o evidente, significando uma diminui o do vento em espa os que, na

presen a de outros rumos de vento (norte e noroeste), tem boas condi es de ventila o.

Nas Torres Sul (tipologia 3) a acumula o de areia n o t o evidente porque o

fluxo ruma para norte e leste. Note-se que as aberturas existentes entre as ruas Prof.

Mark Athias e Jo o Barreira s o essenciais para o escoamento das areias para leste.

Com estes exemplos mostra-se como s o ambiental e urbanisticamente

importantes as aberturas em fiadas longas de pr dios, para a exist ncia de boas

condi es de ventila o e um ambiente livre de poluentes.

Concluindo, se considerarmos a reten o das areias no final de ensaios como

indicador das condi es de ventila o, usando apenas o valor de rugosidade mais baixa

(z0 0,02 m), os espa os semi-fechados (tipologias 3 e 5) s o os mais penalizados nas

Page 211: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Cap tulo 6 Modifica es nos campos de vento no bairro de Telheiras:ensaios em t nel aerodin mico

- 207 -

direc es norte e noroeste (valores inscritos a negro no quadro 6.6). Com a direc o

oeste, pelo contr rio, as condi es de ventila o agravam-se no Eixo Norte/sul e nas

Torres Norte (tipologia 2), por causa dos obst culos perpendiculares ao escoamento do

vento. Sob o ponto de vista deste indicador das condi es de ventila o, h um

agravamento n tido nas direc es oeste e noroeste (maior percentagem de areia

acumulada), o que vem corroborar aquela ideia. No entanto h uma diferen a

significativa neste dois rumos: considerando cada tipologia individualmente e a situa o

de agravamento das condi es de ventila o (leitura em coluna no quadro 6.6, traduzida

por cinzentos mais escuros), verifica-se que as locais ambientalmente menos vantajosos

com o fluxo de noroeste s o as tipologias (3, 4 e 5), o que vem confirmar a ideia que os

espa os semi-fechados (sobretudo a sul), s o inibidores de escoamento, enquanto para a

direc o oeste s o os locais da tipologia 1 os mais "prejudicados", por causa da barreira

perpendicular ao vento dominante. No caso da tipologia 3 (Torres sul) o fluxo de oeste

tem tend ncia para contornar os obst culos rumando para norte, movimentando as

areias que se v o acumular nessa direc o (tipologia 2).

Quadro 6.6 - Percentagem de rea coberta de areia no fim de cada ensaio, por reasid nticas sob o ponto de vista da ventila o, rugosidade (z0 0,02m)

(compara o das direc es norte, noroeste e oeste).

TipologiasEixo

Norte/Sul(1)

Torresnorte(2)

Torressul(3)

Tipologiabanda,

abert. a norte(4)

Tip. banda,espa os rel.fechados.

(5)

Rugosidade (m) 0,02

Areia acumulada (%)

Direc o Norte 6,6 0,5 7,3 4,4 14,7

Direc o Noroeste 31,7 22,6 47,2 20,7 34,1

Direc o Oeste 34,0 30,7 16,7 11,7 19,1

Os cinzentos correspondem, para cada tipologia, ao grau de agravamento das condi es de ventila o(quanto maior a acumula o de areia, mais escuro o cinzento).

Page 212: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I Modifica o nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 208 -

Fig. 6.29 Ensaio das figuras de eros o, com vento de oeste e rugosidade simples (z0 0,02m).esquerda os valores de press o din mica de refer ncia ( lidos pelo tubo de Pitot-Prandtl fixo no tecto dot nel durante o ensaio) e as correspondentes velocidades de vento. direita as figuras de eros o.

DIREC O DO VENTO OESTERUGOSIDADE A BARLAVENTO (Z0 0,02m)

PRESS O DIN MICA DE REFER NCIA

1,1 mm coluna de H2OVelocidade do vento = 4,3 m/s

a)

2,1 mm coluna de H2O

Velocidade do vento = 5,9 m/s

b)

2,7 mm coluna de H2O

Velocidade do vento = 6,7 m/s

c)

3,6 mm coluna de H2O

Velocidade do vento = 7,8 m/s

d)

5,2 mm coluna de H2O

Velocidade do vento = 9,3 m/s

e)

6,6 mm coluna de H2O

Velocidade do vento = 10,5 m/s

f)

Page 213: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Cap tulo 6 Modifica es nos campos de vento no bairro de Telheiras:ensaios em t nel aerodin mico

- 209 -

Fig. 6.30 Direc es do fluxo em torno dos edif cios com vento de oeste a uma velocidade de refer nciade 6,6 m/s e uma rugosidade 0,02 m.

6 CONCLUS ES

Lisboa tem-se expandido, nas ltimas d cadas, sobretudo para norte e noroeste.

Fora das reas mais perif ricas da cidade, os ltimos redutos desocupados no interior do

seu espa o territorial situam-se na zona oriental da cidade (entre Chelas e o Tejo na

antiga zona da Expo 98). Deram lugar a novas reas urbanas, caracterizadas por

edif cios cada vez mais altos que, na presen a de ventos fortes, podem criar ambientes

in spitos ou mesmo perigosos.

O planeamento urbano n o tem tido em conta algumas vari veis, das quais se

destacam os corredores de ventila o, que proporcionam a necess ria qualidade

ambiental na cidade. Por variad ssimos motivos, o di logo entre t cnicos, cientistas e

decisores pol ticos tamb m n o tem sido uma constante, exemplo que n o exclusivo

Page 214: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I Modifica o nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 210 -

do nosso pa s, como nos d conta OKE (1984), no seu trabalho de reflex o sobre este

tema.

Em Lisboa, d o-se agora os primeiros passos neste sentido, com a inten o de

incluir no futuro Plano Director Municipal as vari veis ambientais e clim ticas, tratadas

de acordo com metodologias e normas testadas e estabelecidas noutros pa ses europeus,

como a Alemanha e a Su a. Mas para aplicar o conhecimento cient fico e convencer

os decisores pol ticos, necess rio conhecer os v rios fen menos clim ticos locais e

encontrar uma solu o para que possam ser generalizados para outras reas.

No CAP TULO 5 reconheceram-se alguns dos factores que provocam mudan as

nos campos de vento escala regional, resultados que foram obtidos com os modelos

num ricos. No presente cap tulo, pretendeu-se validar a tese defendida anteriormente de

que o aumento da rugosidade a barlavento da cidade pode provocar modifica es nos

campos de vento, com consequ ncias para o ambiente urbano s escalas local

microclim tica. Observaram-se as principais modifica es do vento em torno dos

edif cios numa parte do bairro de Telheiras (no norte da cidade) com v rias

caracter sticas urban sticas diferentes: torres isoladas, espa os abertos, semi-fechados e

um corredor de ventila o importante (o Eixo Norte/sul).

Foi constru da uma maqueta na escala 1:500 da rea escolhida e testadas v rias

combina es de blocos que simulam a rugosidade a barlavento da maqueta.

Numa primeira montagem (arranjos dos blocos), simulou-se a rugosidade

anterior d cada de 80 do s culo passado (0,02 m) e com outro arranjo simulou-se a

rugosidade t pica de uma cidade que cresce em altura e densidade (1,5 m).

Estudaram-se as direc es e velocidades dos ventos em torno dos edif cios para

tr s direc es em Lisboa (norte, noroeste e oeste) e elaboraram-se perfis em altura,

t cnicas que proporcionaram uma imagem tridimensional dos campos de vento. Sempre

que poss vel compararam-se os resultados obtidos com a simula o da rugosidade de

0,02m a barlavento da maqueta com o os obtidos com a rugosidade de 1,5 m.

De um modo geral, com o aumento da rugosidade a barlavento da maqueta

(de 0,02 para 1,5 m), verifica-se um aumenta da percentagem de areia acumulada em

Page 215: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Cap tulo 6 Modifica es nos campos de vento no bairro de Telheiras:ensaios em t nel aerodin mico

- 211 -

cerca de 12 %, o que demonstra uma significativa diminui o da velocidade do vento

junto ao solo.

As diferentes tipologias urban sticas da maqueta (definidas a partir dos estudos

efectuados pela equipa de arquitectos do LNEC, envolvidos no projecto CLIMLIS),

apresentam caracter sticas distintas na reten o das areias, diferencia o sobretudo

evidente entre os espa os abertos ou semi-fechados. As maiores varia es com o

aumento da rugosidade ocorrem nos espa os semi-fechados (tipologia 5 - 22,5 % de

reten o de areias), enquanto o Eixo Norte/sul e as torres norte (tipologias 1 e 2) apenas

ret m pouco mais de 3 % com o aumento de z0. Nos espa os edificados em banda, com

aberturas a norte e a sul, que permitem a passagem do ar, a reten o das areias apresenta

um padr o interm dio, com pouco mais de 12 %.

O caso do Eixo Norte/sul um bom exemplo a explorar em termos de aplica o

dos resultados a outros locais. Com a direc o norte, esta via r pida foi o nico local

onde o ritmo de remo o das areias foi semelhante em ambas as experi ncias (com

rugosidades de 0,02 m e 1,5 m).

Considerando que se trata de um corredor de ventila o fundamental para o sul

da cidade, n o deve no entanto ser o nico, porque manifestamente insuficiente para o

conjunto da Lisboa. Localmente, as quest es que se levantam com este eixo rodovi rios

s o de outra natureza: como foi verificado nos ensaios com a direc o norte, devido ao

desn vel que apresenta em rela o s reas envolventes (o seu piso est sobrelevado em

cerca de 6 m), pode ocorrer, na presen a de ventos fortes, o chamado "efeito de barra",

em que o vento transp e o obst culo fazendo um angulo de cerca de 45 com a direc o

predominante do objecto, criando movimentos turbilhonares e possivelmente o aumento

de velocidade do vento e da turbul ncia, que se poder o traduzir em perigo acrescido

para a circula o rodovi ria. Demonstrou-se tamb m que a exist ncia de rvores a leste

daquele eixo vi rio retardam o fluxo de ar, ocasionando uma redu o local da

velocidade do vento. Plantadas no flanco oposto do eixo, nos locais potencialmente

geradores do aumento da turbul ncia, as rvores poderiam atenuar esse efeito, sobretudo

na presen a da Nortada (ventos fortes de norte e noroeste predominantes em todo o

Ver o nesta regi o).

Page 216: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte I Modifica o nos campos de vento em Lisboa induzidos pelo crescimento urbano

- 212 -

As pracetas semi-fechadas (tipologia 5) n o apresentam condi es de

escoamento do ar para sul, originando movimentos turbilhonares junto ao solo, que

facilitam a reten o de poluentes, lixo e outros materiais nocivos no seu interior.

Onde h pr dios altos, muito pr ximos entre si, e a sua orienta o coincide com

rumo do vento, o escoamento do ar tende a inverter o seu rumo na sa da das ruas,

originando uma deflex o de 180 . A acelera o do vento, observado na zona a oeste do

Eixo Norte/sul, poder acentuar o desconforto mec nico, ocorrendo mesmo o perigo de

queda de indiv duos mais d beis.

Os perfis de vento efectuados num dos locais sobre a maqueta, (local

A - tipologia 4), permitiram concluir que o aumento da rugosidade (de 0,02 para

1,5 m), se traduz em redu es da velocidade do vento diferenciadas consoante a altura

acima dos pr dios. A cerca de 25 m a redu o a mais elevada (46%), enquanto esse

valor de 30 % a 50 m e 10% a 200 m de altura.

Comparando os efeitos de mudan a de rugosidade sobre dois locais que

apresentam perfis semelhantes com a rugosidade de 0,02m (Eixo Norte/Sul e rua

Ant nio Jos Saraiva), verifica-se que as maiores redu es na velocidade do vento

ocorrem sobre o Eixo Norte/sul, sendo portanto necess rio n o ocupar densamente os

espa os a montante dos corredores de ventila o.

Os ensaios com a direc o noroeste mostraram que a redu o da velocidade do

vento poder ocorrer n o s devido ao aumento da rugosidade mas tamb m devido ao

angulo de 45 , que o vento forma com a orienta o predominante norte/sul dos

conjuntos arquitect nicos. Por exemplo, no Eixo Norte/sul a reten o de areias maior

do que com o rumo norte, por causa da exist ncia de uma fiada de edif cios altos

(com cerca de 25 m de altura), a oeste daquele eixo vi rio, que se interp e-se

progress o do vento, diminuindo drasticamente a sua velocidade e piorando as

condi es de ventila o.

Com a direc o de oeste, a exist ncia da barreira arquitect nica compacta

justifica que exista um padr o menos definido no escoamento do ar em torno dos

edif cios e se verifique um aumento dos movimentos turbilhonares junto aos taludes do

eixo Norte/sul. Tamb m a maior acumula o de areias junto das torres norte (tipologia

Page 217: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Cap tulo 6 Modifica es nos campos de vento no bairro de Telheiras:ensaios em t nel aerodin mico

- 213 -

2) representa o empobrecimento das condi es de ventila o deste local em rela o s

outras duas direc es. Para melhorar essas condi es de ventila o seria necess rio a

exist ncia de aberturas de escoamento do ar, neste tipo de conjuntos arquitect nicos de

"barreira".

Page 218: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

PARTE II

ILHA DE CALOR URBANA DE SUPERFÍCIE

E BALANÇO ENERGÉTICO EM LISBOA

Page 219: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

- 217 -

CAPÍTULO 7

CLIMATOLOGIA E DETECÇÃO REMOTA

1. INTRODUÇÃO

A segunda parte deste trabalho utiliza dados provenientes de imagens dos

satélites NOAA-AVHRR e LANDSAT TM. Pretendeu explorar-se as potencialidades

deste tipo de informação e testar alguns algoritmos que permitam evoluir no

conhecimento do clima regional e local de Lisboa. Como se utilizaram dados de parte

do espectro visível, no infravermelho térmico e imagens derivadas do AVHRR

(temperaturas de superfície), houve a necessidade de clarificar alguns dos conceitos

associados a esta tecnologia espacial. A apresentação que se segue pretende, assim,

referir apenas os conceitos básicos necessários que dizem respeito, sobretudo, à

natureza da informação apresentada.

Discute-se, brevemente, o conceito de detecção remota através de uma definição

poucas vezes citada e oriunda de um anexo a uma resolução da ONU, que traduz

verdadeiramente o espírito da observação da Terra a partir do Espaço. Também é

referida a forma actual de obtenção e tratamento da informação derivada de satélite,

através das Agências aero-espaciais na Internet. A forma revolucionária como

Page 220: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte II – Ilha de calor urbana de superfície e balanço energético em Lisboa

- 218 -

actualmente certos “produtos” são difundidos pela comunidade científica, tem um

significado nunca antes atingido pelas sociedades Humanas.

Este capítulo de introdução termina com um breve historial sobre a importância

e influência que as imagens de satélite, neste caso na banda do infravermelho térmico,

têm tido na comunidade geográfica nacional. Pretende-se distinguir o mérito de alguns

dos investigadores que nos inspiraram a continuar o seu trabalho. É devido e aqui fica

feita a referência.

Pretende-se mostrar a complexidade e, especialmente, a morosidade que certos

procedimentos podem acarretar, desafio que, no final, é bastante compensador do

trabalho efectuado.

2. PRINCÍPIOS DE DETECÇÃO REMOTA NO INFRAVERMELHO TÉRMICO

2.1 BREVE SÍNTESE DE DEFINIÇÕES E CONCEITOS.

A origem do termo “Teledetecção” deriva do grego "tele" (à distância) e do

latim "detegere" (descobrir), sendo hoje empregue exclusivamente para as técnicas que

utilizam a difusão electromagnética (BOISSIN, 1990). Teledetecção ou Detecção Remota

(Remote Sensing), termo preferido neste trabalho, é a aquisição de dados sobre objectos

ou fenómenos que se encontram afastados dos aparelhos de observação utilizados. Os

sensores remotos detectam as radiações electromagnéticas reflectidas ou emitidas pela

superfície da Terra ou pela atmosfera, podendo os resultados ser registados e

apresentados, quer sob a forma digital, quer sob a forma analógica, em imagens ou

fotografias (HENRIQUES, 1982). BARIOU (1978) centra a sua definição na natureza da

informação e amplitude do espectro utilizado, referindo que agrupa um conjunto de

técnicas capazes de fornecer, à distância, as informações relativas a um objecto,

utilizando-se o conhecimento sobre a emissão e reflexão das radiações

electromagnéticas, desde os comprimentos de onda ultravioletas às hiperfrequências.

Estas definições incorporam apenas conceitos técnicos e não os objectivos gerais

desta tecnologia. Um dos textos mais importantes sobre o assunto é apresentado em

“Principles Relating to Remote Sensing of the Earth from Outer Space”, um anexo da

Page 221: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 7 - Climatologia e Detecção Remota

- 219 -

resolução da Organização das Nações Unidas 41/65, de 3 de Dezembro de 1986, que

contém os princípios relativos à Detecção Remota da Terra por satélites, incluindo os

objectivos fundamentais para o progresso da Humanidade:

“Remote sensing means the sensing of the Earth’s surface from space by making

use of the properties of electromagnetic waves emitted, reflected or diffracted by sensed

objects, for the purpose of improving natural resources management, land use and

protection of the environment”.

Esta resolução da ONU é o corolário de um trabalho iniciado em 1974,

efectuado pelo UN Committee on Peaceful Uses of Outer Space (COPUOS) e que

envolveu outros tratados, nomeadamente o “Treaty on Principles Governing the

Activities of States in the Exploration and Use of Outer Space, including the Moon and

other Celestial Bodies” de 13 Dezembro 1966, Resolução 2222 (XXI), e a “Declaration

of Legal Principles Governing the Activities of States in the exploration and use of

Outer Space”, United Nations, 1986). Estes textos debruçam-se sobre as implicações

legais e obrigações dos Países que utilizam a detecção remota terrestre e podem ser

consultados no sítio Internet da United Nations Office for Outer Space Affairs

(www.oosa.unvienna.org/index.html).

O texto da ONU dá destaque à utilização que se deve dar às imagens da Terra

obtidas a partir do Espaço, como o melhoramento da gestão dos recursos naturais e do

uso do solo e a protecção ambiental, enunciando alguns princípios como a beneficiação

de todos os países (sobretudo os que se encontram em vias de desenvolvimento),

assente no respeito da soberania dos Estados, independentemente do seu grau de

desenvolvimento económico, social, técnico ou científico, de acordo com as leis

internacionais previstas na Carta das Nações Unidas. São ainda apontados alguns

princípios de cooperação internacional, nomeadamente através da instalação de estações

de recepção de dados e investimento em infra-estruturas de processamento e tratamento

das imagens. O texto contempla ainda duas referências importantes dirigidas à

protecção do ambiente Natural da Terra e à prevenção de desastres naturais que

envolvam o Homem:

"Remote sensing shall promote the protection of the Earth's natural

Page 222: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte II – Ilha de calor urbana de superfície e balanço energético em Lisboa

- 220 -

environment.... [and] the protection of mankind from natural disasters. States

participating in remote sensing activities that have identified processed data and

analysed information in their possession that may be useful to States affected by natural

disasters, or likely to be affected by impending natural disasters, shall transmit such

data and information to States concerned as promptly as possible.

2.2 A NATUREZA DA INFORMAÇÃO QUE É DETECTADA PELOS SATÉLITES.

A visão e o cérebro humanos formam o sistema mais sofisticado e completo de

detecção remota no visível. Muitas vezes as imagens que se formam no nosso cérebro

parecem-nos diferentes da realidade, consoante as condições atmosféricas presentes. O

conteúdo da camada gasosa que nos envolve (vapor de água, gases, poeiras, fumos, etc.)

é um dos principais obstáculos à nitidez com que os objectos são observados a uma

determinada distância. Por exemplo, as miragens a que os seres humanos estão sujeitos

nos desertos quentes e que são provocadas pela subida do ar muito aquecido pela

superfície e que os faz imaginar objectos que realmente não existem. A energia que é

transportada pela radiação electromagnética e que é medida remotamente pelos sensores

sofre diversos tipos de modificações, tal como acontece com a visão humana.

A radiação electromagnética, ao atravessar a atmosfera, fica sujeita a efeitos

perturbadores que resultam de fenómenos de reflexão, refracção, difracção, dispersão e

absorção. A atmosfera é um meio atenuador e simultaneamente uma fonte de radiações

electromagnéticas. Mas não é só a atmosfera que se interpõe entre a fonte e o sensor. Se

se tratar de um objecto terrestre, a energia pode ser transmitida, absorvida, reflectida ou

emitida. O que é medido pelo sensor é a energia reflectida ou a que é emitida pelo

própria superfície. É com base no conhecimento das características de reflexão dos

diferentes materiais que constituem a superfície terrestre e das suas propriedades de

emissão, que se pode proceder à identificação dos objectos por detecção remota, tendo

em conta as condições atmosféricas, e de luminosidade existentes no momento em que

os dados foram adquiridos (HENRIQUES, 1982).

Page 223: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 7 - Climatologia e Detecção Remota

- 221 -

2.3 FONTES DE ENERGIA, MODELOS DE RADIAÇÃO E REGIÕES DO ESPECTRO

ELECTROMAGNÉTICO MAIS UTILIZADAS

Existem duas fontes de energia que pode ser detectada por sensores: natural,

como o Sol, a Terra ou a Lua e a artificial, utilizada por detectores de radar ou laser. Os

sistemas que utilizam fontes naturais de energia designam-se de passivos e são a maior

parte dos detectores que operam nos comprimentos de onda dos espectros visível (VIS),

infravermelho próximo (IVP) e térmico (IVT). Os que utilizam fontes de energia

própria, chamam-se activos. Estes são os mais comuns para detectar micro-ondas e,

neste caso, os satélites ou aviões transportam uma antena que emite o sinal. Este sinal é

reflectido pelo objecto e detectado novamente pela antena. O radar meteorológico é

igualmente um sistema activo de detecção remota, normalmente fixo na superfície

terrestre, sendo normalmente utilizado para estimar a precipitação e a velocidade dos

sistemas pluviogénicos. Destaca-se ainda a sua importância na previsão, a curto e médio

prazos, de episódios de precipitação intensa, potencialmente causadores de cheias

rápidas e intensas (FRAGOSO, 1996).

Nos comprimentos de onda do VIS e IVP, os sensores passivos detectam a

radiação solar que é reflectida no objecto observado. No IVT o objecto é a fonte de

radiação e o sensor a bordo do satélite, ou outro meio, detecta a radiação por ele emitida

(BIRD, 1990a).

O conceito de radiação electromagnética descreve o modo como a energia é

transferida de um objecto para outro, através do espaço. Todos os corpos com

temperatura acima do zero absoluto irradiam energia sob a forma electromagnética.

Existem dois modelos que nos ajudam a descrever as características dessa energia: o

modelo da onda electromagnética e o modelo da partícula.

A radiação electromagnética pode ser vista como uma torrente de pequenos

corpúsculos (fotões) que transportam uma quantidade de energia electromagnética em

função da sua vibração. As radiações electromagnéticas provenientes do espectro de

energia solar propagam-se no vácuo a uma velocidade constante, igual à velocidade da

luz (HENRIQUES, 1982).

Page 224: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte II – Ilha de calor urbana de superfície e balanço energético em Lisboa

- 222 -

A luz visível é apenas uma modalidade de energia electromagnética. Outras

formas são, por exemplo, as ondas rádio, os raios X, os ultravioletas, etc. Na figura 7.1

observa-se um modelo conceptual do movimento da energia electromagnética

representada através de um movimento harmónico sinusoidal, à velocidade da luz (c). A

distância entre dois “picos” sucessivos chama-se comprimento de onda ( ) e o número

de picos que passam por um ponto fixo no espaço, por unidade de tempo, é a sua

frequência ( ). O seu movimento obedece à equação:

c = (7.1)

Fig. 7.1 - Esquema conceptual de uma onda electromagnética (extraído de LILLESAND E KIEFER, 1994).

Como c é uma constante (3 x 108 m/s), a frequência e o comprimento de onda

estão relacionados inversamente e cada um pode ser usado para caracterizar uma onda.

A unidade mais utilizada para caracterizar esse comprimento de onda é o micrómetro

(m). Um micrómetro equivale a 1 x 10-6 m.

Outro modelo da radiação electromagnética descreve o movimento de um feixe

de partículas. A energia, transportada por cada uma dessas partículas, depende da fonte

electromagnética que a produziu.

Campo eléctrico ( )E

Campo magnético ( )M

Distância

E

M

= Frequência (número de ciclospor segundo que passamnum ponto fixo)

= Comprimento de onda(distância entre dois picosDe onda sucessivos

C =Velocidade da luz

Page 225: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 7 - Climatologia e Detecção Remota

- 223 -

A energia de um fotão pode ser expressa por:

Q = h (7.2)

onde h é a constante de PLANK (6,626 x 10-34 Js).

É comum caracterizar uma onda electromagnética pelo seu comprimento

dentro do espectro electromagnético (fig. 7.2). As regiões do espectro mais utilizadas

são o ultravioleta (aproximadamente entre 0,29 e 0,4 m), o visível (0,4 e 0,7 m), o

infravermelho (0,7 e 15 m) e as micro-ondas ou hiperfrequências). Os ultravioletas

(UV) são menos utilizados porque são mais susceptíveis de serem absorvidos durante a

sua transmissão através da atmosfera.

InfravermelhoUltravioletas

Azul

Verd

e

Verm

elho

VisívelComprimentode onda

( m)

Raios cósmicos

Raios

Raios X

Ultravio leta

Infravermelho

próximo

Infravermelho

médio

Infravermelho

térmico

Microondas

Televisãoe

rádio

( m)

Fig. 7.2 – O espectro electromagnético (extraído de LILLESAND E KIEFER, 1994).

A região do espectro electromagnético do visível corresponde aos

comprimentos de onda aos quais o olho humano é sensível e compreende três bandas:

sensivelmente entre 0,4 e 0,5 m (cor azul); 0,5 a 0,6 m - verde; e entre 0,6 e 0,7 m

detectado pelo olho humano como vermelho (fig. 7.2). Na região dos infravermelhos

(IV) destacam-se os próximos (0,7 a 1,3 m), os médios (1,3 a 3 m) e os térmicos

acima de 3 m. Estes limites podem variar consoante os autores: HENRIQUES, (1982)

refere que os IV médios correspondem a uma intervalo de banda entre 3 e 5,5 m e os

Page 226: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte II – Ilha de calor urbana de superfície e balanço energético em Lisboa

- 224 -

térmicos entre 8 e 15 m. Entre 1 mm e 1 m situam-se as microondas (por exemplo o

radar meteorológico).

Combinando as equações 7.1 e 7.2 obtemos:

hcQ (7.3)

Desta equação poder-se-á concluir que quanto maior o comprimento de onda,

menor a quantidade de energia transmitida, o que explica a maior dificuldade técnica de

detectar no infravermelho térmico do que no visível (BIRD, 1990).

2.4 INTERACÇÃO DA ENERGIA COM A ATMOSFERA E A SUPERFÍCIE TERRESTRE.

A atmosfera pode afectar a intensidade e a composição espectral na radiação que

é detectada por um sensor. As alterações produzidas são causadas principalmente pela

dispersão e absorção. A absorção da atmosfera resulta numa perda efectiva de energia

num determinado comprimento de onda. Os principais absorventes da radiação solar

são, entre outros, o vapor de água, o dióxido de carbono e o ozono.

A figura 7.3 mostra a relação entre as principais fontes de energia usadas em

detecção remota (a), as características da absorção atmosférica (b, a sombreado) e o

campo de actuação dos vários sistemas de sensores no espectro electromagnético (c). A

aquisição de dados pelos sensores está limitada às regiões espectrais onde a transmissão

é maior, chamadas janelas atmosféricas. O espectro sensível pelo olho humano (visível)

coincide com uma janela atmosférica e com o máximo da energia solar. A energia

emitida pela Terra pode ser detectada pelos sensores térmicos através das janelas

atmosféricas entre 3 e 5 m e 8 a 14 m.

A dispersão é um processo de difusão da energia electromagnética pelas

partículas existentes na atmosfera (gases, fumos e poeiras). O tipo de dispersão pode-se

classificar em função do tamanho das partículas existentes. Quando é originada por

moléculas de dimensões insignificantes quando comparadas com o comprimento de

Page 227: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 7 - Climatologia e Detecção Remota

- 225 -

onda das radiações é denominada dispersão de Rayleigh. A dispersão de Rayleigh é

umas das principais causas da perda de contraste e boa acuidade dos objectos

observados nas imagens de satélite (efeito do tipo névoa).

Quando a dimensão da partícula é da mesma ordem de grandeza do

comprimento de onda, designa-se dispersão de Mie, e é devida à existência de vapores e

aerossóis. A teoria deste tipo de dispersão é complexa, correspondendo a uma situação

intermédia entre a lei de Rayleigh e uma lei segundo a qual a dispersão é independente

do comprimento de onda.

Fig. 7.3 – Fontes de energia (a), efeitos atmosféricos (b) e amplitude de actuação dos sensores remotos (c)(extraído de LILLESAND E KIEFER, 1994).

No caso das partículas terem uma dimensão muito superior ao comprimento de

onda com que interagem, ocorre a dispersão não selectiva. Neste caso, a dispersão é

independente do comprimento de onda, dependendo apenas das dimensões e do número

de partículas por unidade de volume. Para comprimentos de onda inferiores a 15m, as

únicas partículas susceptíveis de causar este tipo de dispersão são as do vapor de água.

A dispersão depende assim das condições da atmosfera, da altura do Sol, da época do

ano, e da hora (HENRIQUES, 1982).

Umas das formas de um satélite detectar as características dos objectos à

Page 228: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte II – Ilha de calor urbana de superfície e balanço energético em Lisboa

- 226 -

superfície terrestre ocorre quando uma fonte de energia (por exemplo o Sol) envia

radiação electromagnética para a Terra que é depois reflectida pela superfície e chega

por fim ao sensor a bordo.

Quando a energia electromagnética incide sobre qualquer superfície (E I), pode

interagir com ela de três modos: a energia pode ser absorvida (E A), transmitida (E T) ou

reflectida (E R). De acordo com o princípio da conservação da energia, a soma destas

três fracções deverá ser igual ao valor total da energia incidente, para um determinado

comprimento de onda ( ).

A equação que expressa esta relação pode ser escrita:

EI ( )= ER ( ) + EA ( ) + ET ( ) (7.4)

A quantidade de energia reflectida por uma superfície, e detectada pelos

sensores, depende da sua estrutura, do ângulo de incidência e da reflectância39. A forma

como se processa a reflexão depende sobretudo da rugosidade do objecto. As

superfícies reflectoras especulares (lisas e planas), têm um comportamento idêntico aos

espelhos: O ângulo de reflexão é igual ao ângulo de incidência. Este tipo de reflexão

ocorre raramente na natureza, apenas nas superfícies aquáticas muito calmas, em

algumas áreas geladas e muito ocasionalmente noutras superfícies (HOWARD, 1991).

Quando uma superfície reflecte a energia incidente uniformemente em todas as

direcções (independentemente do ângulo de incidência), a reflectância denomina-se

difusa. Também a maior parte das superfícies naturais raramente apresentam

características de reflexão difusa (também conhecida por Lambertiana). Na verdade,

elas têm geralmente um comportamento misto, apesar de um maior número de

superfícies se aparentarem mais com as que têm comportamento difuso. Assim torna-se

mais fácil estabelecer uma relação entre a reflectância (que caracteriza fisicamente a

39 Quociente entre a radiação total hemisférica reflectida por um corpo e a radiação incidente nesse corpo.Se a reflectância é restrita a um ângulo de vista fixo deve-se utilizar o termo reflectância direccional. Se aobservação é feita para vários ângulos fixos de incidência a reflexão designa-se de bi-direccional(HOWARD, 1991).

Page 229: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 7 - Climatologia e Detecção Remota

- 227 -

superfície) e a radiância40 medida pelo sensor do satélite (BIRD, 1990).

As características da reflectância das superfícies podem ser quantificadas

medindo a porção de energia incidente que é reflectida, em função de um determinado

comprimento de onda (reflectância espectral - ). Este valor é normalmente expresso

em percentagem:

100))

(E (E

I

R (7.5)

Em que ER ( ) é a energia reflectida no comprimento de onda ( ) e EI ( ) é a

energia incidente no comprimento de onda ( ).

A função dos sensores a bordo dos satélites é a de converter a radiância que

chega de um determinado ponto da superfície terrestre num sinal eléctrico e

quantificá-lo através de um valor digital que é representado através de um pixel (picture

element, ou elemento de imagem). Normalmente cada sensor inclui separadores de

radiação (beam splitter), que isolam as componentes da radiância medida nas várias

bandas do espectro electromagnético (visível, infravermelho próximo, infravermelho

térmico, etc.). Cada uma destas bandas origina um sinal electrónico, que depois de

digitalizado se converte no valor do canal. As imagens são formadas por matrizes de

valores de radiância que correspondem a vários pontos da superfície detectados pelo

satélite.

No comprimento de onda dos infravermelhos térmicos obtém-se a radiação

emitida pelas superfícies. Para se descrever as características radiativas do sistema terra

atmosfera é necessário recorrer ao conceito de corpo negro. Este corpo é definido como

sendo um absorsor e reflector perfeito, com uma emissividade41 espectral igual à

unidade, em todo o espectro. Isto implica que ele absorve toda a energia radiante e que a

radiação que emite numa direcção particular depende unicamente da sua temperatura e

40 Quociente entre a intensidade (razão entre o fluxo e o ângulo sólido de origem ou destino) observadanum elemento da superfície, numa direcção e a área de projecção ortogonal desse elemento num planoperpendicular àquela direcção (PLANA-FATTORI et al., 1997).41 A emissividade é a razão entre a energia emitida por um corpo a uma determinada temperatura e aradiação emitida por um corpo negro à mesma temperatura (VAN DE GRIEND et al., 1993).

Page 230: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte II – Ilha de calor urbana de superfície e balanço energético em Lisboa

- 228 -

que pode ser descrita segundo a lei da radiação de Plank (VOGT, 1996).

)1(2

/5

2

kThce

hcTB (7.6)

B (T) = fluxo espectral emitido pelo corpo negro (Wm-2 m-1)

c = Velocidade da luz no vácuo (2,997 924 580 x 108 ms-1)

h = Constante de Plank (6,626 076 x 10-34 Ws-2)

k = Constante de Boltzmann (1,380 658 x 10-23 JK-1)

T = Temperatura (K)

= Comprimento de onda (m)

O conceito de corpo negro é apenas teórico e a maior parte das superfícies não se

comportam como tal. Por isso é necessário considerar a emissividade das superfícies.

Varia com o comprimento de onda ( ) e a direcção ( ) com que a superfície é medida e

caracteriza a eficiência com que uma superfície é capaz de irradiar. A emissividade de

um corpo pode escrever-se:

)()(

,

,

TBTM

(7.7)

, = emissividade espectral

M , = fluxo espectral emitido (Wm2m-1sr-1)

B , = fluxo espectral emitido pelo corpo negro (Wm2m-1sr-1)

Na realidade todas as superfícies naturais têm uma emissividade inferior à

unidade. No infravermelho térmico varia entre 0,91 para as areias secas e 0,98 para a

vegetação densa. Este parâmetro pode variar com diferentes rugosidades do terreno,

com a estrutura e composição dos solos, quantidade de matéria orgânica, humidade e

com as características clorofilinas das espécies e com a estrutura do coberto vegetal. Os

locais completamente cobertos de vegetação têm uma emissividade “térmica” entre 0,97

e 0,98, devido ao conteúdo de água nas folhas. A emissividade medida nas copas das

Page 231: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 7 - Climatologia e Detecção Remota

- 229 -

formações vegetais densas pode ser ligeiramente superior à medição efectuada em

folhas, devido a reflexões múltiplas resultantes da geometria e arranjo da copa das

árvores. Os materiais mineralizados apresentam valores de emissividade entre 0,893 nas

areias até 0,97 nas argilas e margas. Normalmente a emissividade aumenta com a

humidade, entre 0,88 nos solos secos e 0,94 nos húmidos. A água apresenta os valores

mais elevados, entre 0,97 em lagos até 1,0 para a água no estado mais puro (VAN DE

GRIEND et al., 1993).

Qualquer corpo à superfície, com uma emissividade diferente de 1, emite apenas

uma parte da energia que recebe. Se não considerarmos a influência da atmosfera, o

sinal medido pelo sensor do satélite contém uma mistura de radiação reflectida e

emitida pela superfície. A parte da energia reflectida é negligenciável entre 8 e 13 m,

mas corresponde até 50% do sinal medido pelo sensor na janela entre 3 e 7 m.

Outro factor a ter em conta, no sinal medido pelos satélites, é a interferência da

atmosfera. A relação entre a radiância reflectida ou emitida pelas superfícies e a

reflectância medida pelos sensores dos satélites é bastante complexa. Em primeiro

lugar, porque a radiância emitida pela superfície terrestre tem de atravessar a atmosfera

até chegar ao sensor. Na sua trajectória até ao satélite, a energia electromagnética pode

ser absorvida e dispersa pelos gases e aerossóis existentes na atmosfera. A atmosfera

também emite energia, em função da sua temperatura, que pode chegar ao sensor

directamente (direcção ascendente) ou através da sua componente descendente, que é

reflectida pela superfície, contribuindo assim, nos dois casos, para o sinal medido pelo

sensor do satélite (VOGT, 1996).

Para além dos efeitos da atmosfera, a radiância que é medida tem de atravessar

as várias componentes ópticas dos sensores e sofre amplificações eléctricas nos

circuitos dos aparelhos, o que poderá degradar, com o tempo, a qualidade dos dados

obtidos. As imagens obtidas pelos sistemas a bordo dos satélites podem também ser

distorcidas geometricamente pelas componentes ópticas e pelo superfície esférica

terrestre. Por todos estes motivos, a informação que chega às estações de recepção

terrestres deve ser calibrada, pre-processada e corrigida, antes de ser utilizada

(WILKINSON, 1990).

Page 232: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte II – Ilha de calor urbana de superfície e balanço energético em Lisboa

- 230 -

Pela inversão da lei da radiação de Plank (equação 7.6) pode obter-se a

temperatura equivalente à do corpo negro com as mesmas características de radiância do

objecto medido. Esta temperatura é denominada temperatura de brilho (brightness

temperature), por vezes designada por temperatura aparente. Esta temperatura não é

corrigida da influência da atmosfera nem da emissividade da superfície, podendo

divergir em alguns graus da temperatura de superfície real (VOGT, 1996). Vários

métodos para obter as temperaturas de superfície serão abordados no próximo capítulo.

3. PRINCIPAIS SATÉLITES METEOROLÓGICOS OU COM SENSORES DE IV TÉRMICO

Um historial de todos os sistemas que incluem sensores térmicos, ou que

detectam parâmetros físicos com interesse para a climatologia, seria um trabalho

infindável de compilação de características técnicas, com pouco interesse para este

trabalho. Apenas são mencionadas algumas etapas na observação dos climas da Terra a

partir de sensores a bordo de satélites. É também interessante conhecer a evolução que

acompanhou este tipo de tecnologias, para melhor interpretar a informação que se

utiliza nos estudos de climatologia.

As primeiras experiências em detecção remota remontam à segunda metade do

século XIX, quando se realizaram as primeiras fotografias aéreas. Foi em 1858 que o

fotógrafo parisiense GASPARD FELIX TOURNACHON, conhecido por NADAR, obteve a

primeira fotografia aérea a partir de um balão que sobrevoou a região de Bièvre (em

França), a 80 m de altitude.

No final dos anos 40 do século XX, os países tecnologicamente mais avançados

desenvolveram o conhecimento e as técnicas de detecção remota no infravermelho

próximo, exclusivamente para fins militares (visão nocturna, controlo de mísseis, etc.).

Mas os conhecimentos e as tecnologias avançaram de tal modo que não tardou a tornar-

se economicamente viável noutras actividades humanas.

Os sistemas meteorológicos de detecção remota começaram a enviar

regularmente imagens da Terra e da atmosfera no início da década de sessenta.

Desenhados especificamente para ajudar as previsões meteorológicas, os sensores

Page 233: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 7 - Climatologia e Detecção Remota

- 231 -

meteorológicos sempre tiveram uma resolução mais grosseira que os restantes sensores.

Têm a vantagem de serem sistemas globais de observação da Terra e da atmosfera, com

uma alta resolução temporal.

Vários satélites experimentais transportaram sensores térmicos: os da série

NIMBUS (NASA), foram usados para testar técnicas de recolha de parâmetros

ambientais, tendo-se iniciado o programa em Agosto de 1964. Em 1969, o NIMBUS 3

incorporou sensores IV térmicos e em 1978 foi lançado o último da geração (7); O

satélite SEASAT, que apenas esteve no activo entre Julho e Outubro de 1978, estava

destinado a sondar a superfície dos oceanos. Para além de outros canais, nomeadamente

no visível e micro-ondas, estava munido de sensores IV térmico. Ainda em 1972 surge

outro scaner multiespectral (s-192) a bordo do SKYLAB que adquiria imagens diurnas

num canal térmico (10,2-12,5µm) com a óptima resolução de 79 m.

O programa SMS/GOES (Synchronous Meteorological Satellites/Geostationary

Operational Environmental Satellites), iniciado em 1975 envolve uma rede global de

satélites meteorológicos, espaçados cerca de 70º de Longitude, que orbitam a Terra a

uma altitude aproximada de 35 800 km, sincronizados com a rotação do Equador. A

vantagem destes satélites é a de captar um disco hemisférico da Terra duas vezes por

hora.

Convencidos pelo programa espacial americano, os meteorologistas europeus

decidiram iniciar um programa semelhante. Em 1977 era lançado pela França o

programa METEOSAT (posteriormente o programa operacional passaria para a

Agência Espacial Europeia). Continha dois canais adjacentes do visível (0,5 e 0,9) e

dois no infravermelho, o primeiro entre 5,7 e 7,1 m e o segundo entre 10,5 e 12,5 m.

A resolução variava entre 5 km (térmico) e 2,5 km (no visível). Devido à curvatura da

Terra esta resolução desce para 4,5 km nos bordos da imagem. A sua fraca resolução é

uma das suas principais desvantagens para o estudo dos climas locais, embora a sua

principal função seja cumprida (previsão meteorológica).

Em 1978, era iniciada pela NASA a missão HCMM (Heat Capacity Mapping

Mission), que foi uma das que primeiro contribuíram para a modelação dos processos

térmicos na superfície terrestre. Lançado em Abril de 1978, transportava um radiómetro

Page 234: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte II – Ilha de calor urbana de superfície e balanço energético em Lisboa

- 232 -

que adquiria informação em duas bandas espectrais: uma de 0,5 a 1,1 µm e outra entre

10,5 e 12,5 µm. A resolução era de 600 m no nadir, no canal IV, e 500 m no visível. A

sua órbita heliossíncrona e quase polar a 620 km de altitude, tinha passagens duas vezes

por dia, perto das horas das temperaturas máximas e mínimas da superfície. Apenas 5

estações de recepção terrestres cobriam parte dos EUA, Europa e Austrália. Dois anos

depois terminou a sua missão.

Entre os sensores mais utilizados contam-se, sem dúvida, os que têm operado a

bordo dos satélites NOAA (National Oceanic and and Atmospheric Administration),

POES (Polar Orbiting Environmental Satellites). Concebido para fins meteorológicos,

foi lançado pela primeira vez em 1970. A partir de 1978 incluíram o sensor de

varrimento multiespectral AVHRR (Advanced Very Hight Resolution Radiometer),

cujos dados foram e continuam a ser usados em variadíssimas áreas de ciências da terra

e do espaço. Estes satélite efectuam 14 órbitas à volta da Terra, por dia, a uma altitude

média de 833 km, com uma resolução de 1,1 km no nadir e 6 km nos bordos laterais da

imagem. Actualmente o NOAA 17 AVHRR/3 (lançado em Junho de 2002) recolhe

imagens de todo o globo em seis canais espectrais: um no visível (canal 1 de 0.580 a

0.68 m); dois no IV próximo (canal 2 de 0,725 a 1,00 e canal 3A de 1,58 a 1,64 m);

um no IV médio (canal 3B de 3,55 a 3,93 m); e dois no IV térmico (canal 4 de 10,3 a

11,3 e canal 5 de 11,5 a 12,5 m). Estes geração de satélites transporta ainda uma série

de instrumentos que sondam a atmosfera e elaboram perfis de humidade, temperatura,

ozono, etc. Apesar de não ser o ideal nos estudos de climatologia local, o sistema

AVHRR oferece diversas potencialidades, porque cobre, espacial e temporalmente,

grandes áreas terrestres com características espectrais adequadas a muitas aplicações. O

seu baixo custo, a disponibilidade de grandes séries de dados e o sua fácil obtenção, são

igualmente factores que tornam os seus dados talvez os mais utilizados em várias

disciplinas associadas às ciências da terra e do espaço (D’SOUZA et al., 1996).

Sejam geossíncronos ou heliossíncronos, os satélites meteorológicos têm em

comum uma resolução bastante baixa, devido à elevada altitude a que operam. Sem

função de apoio à meteorologia, existe outra categoria de satélites cuja resolução é

muito maior e que pretende medir grandezas físicas como a temperatura da superfície.

Em 1968 foi lançado um programa de sucesso (ERTS 1 Earth Resources Technology

Page 235: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 7 - Climatologia e Detecção Remota

- 233 -

Satellite) que previa o lançamento do primeiro satélite comercial para o espaço. Em

1972 foi substituído pelo programa LANDSAT. Mas só em 1978 o LANDSAT 3

(MSS – Multi Spectral Scanner) passou a incluir uma banda térmica (10.4µm a

12,6µm). Este sensor deixou de operar por causa de uma anomalia no final de 1980,

sendo lançado em 1982 o LANDSAT 4 que passou a transportar um scaner

multiespectral avançado, o TM (Thematic Mapper). Para além das bandas do visível e

do infravermelho próximo, o TM possuía um canal térmico (10,4-12,5 m), com a

melhor resolução até então alcançado por um satélite (120 m). Actualmente a nova

geração LANDSAT 7 ETM + (lançado em 1999) possui um canal térmico (banda 6)

com uma resolução espacial de 60 m, muito aceitável para estudos de clima local. O

maior inconveniente das suas imagens é ter um tempo de passagem sobre o Equador

entre as 10:00 e as 10:15 (tempo local). Mais pormenores sobre a geração de satélites

LANDSAT serão dados no CAPÍTULO 9.

A U. S. Air Force também tem o seu programa de satélites meteorológicos

chamado DMSP (Defense Meteorological Satellite Program). Os dados têm sido

cedidos para fins civis desde 1973. Os sensores produzem imagens no visível e no IV

próximo (0,4 a 1,1 m) e no IV térmico (8 a 13 m). A sua órbita polar heliossíncrona

permite obter imagens diurnas e nocturnas com uma resolução de 3 km. Seria apenas

mais uma referência, se não fosse a sua capacidade de obter imagens nocturnas no

visível, através de amplificação do sinal em condições de baixa luminosidade. Esta

capacidade, durante a noite, permite avaliar a área de ocupação humana especialmente

através das luzes produzidas nas cidades (também chamada “pluma luminosa urbana”).

Alguns autores têm utilizado esta informação para determinar a intensidade da ilha de

calor urbano (GALLO e OWEN, 1998). Será um tipo de informação a explorar em futuros

trabalhos.

Novas missões têm proliferado nos últimos anos. Para além das novas gerações

NOAA AVHRR e LANDSAT 7, têm sido lançados novos satélites que transportam

sensores que trarão novos produtos para determinar o conteúdo em vapor de água e

propriedades ópticas da atmosfera, aerossóis, propriedades físicas e radiativas das

nuvens, temperaturas de superfície da Terra e dos oceanos, índices de vegetação, etc.

Como exemplos referem-se os da nova geração de satélites da NASA (ASTER e

Page 236: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte II – Ilha de calor urbana de superfície e balanço energético em Lisboa

- 234 -

TERRA, lançados em 1999 e AQUA em 2002) e os europeus ERS 2 (1995) e

ENVISAT (2002), que transportam vários instrumentos, cada um especializado em

obter informação específica, de modo que se tornaram verdadeiramente multitemáticos.

Também a Índia (com o programa INSAT), o Japão (GMS-5) e a Rússia (GOMS) têm

os seus programas aeroespaciais em expansão42. Estamos a presenciar uma nova corrida

às “estrelas”, desta vez por uma boa causa: a observação e monitorização da Terra e dos

problemas ambientais. Esperemos que, num futuro próximo, as novas gerações de

satélite combinem duas condições essenciais para os estudos de climatologia local e que

até agora têm faltado: grande resolução espacial (abaixo dos 50 m) e boa repetição

temporal (com passagens, pelo menos, duas vezes por dia).

4. ESTUDOS DE CLIMATOLOGIA COM IMAGENS DE SATÉLITE EM PORTUGAL.

Quinze anos depois do lançamento do primeiro satélite artificial meteorológico

americano que obtinha imagens da Terra (TIROS 1 - Television Infrared Observation

Satellite), surge um dos primeiros textos geográficos em que se mostrava o interesse

que poderia ter a tecnologia associada aos satélites, nos estudos climáticos em Portugal.

“L´étude de la climatologie d’après les satellites est encore dans l’enfance. De

nouvelles méthodes d’analyse et de présentation des données doivent être imaginées et

progressivement améliorées pour permettre de tirer le meilleur parti des potentialités

d’un instrument d’observation d’une puissance et d’une généralité absolument

révolutionnaires” (DAVEAU, 1975). Esta tecnologia, era um domínio bastante promissor

nos estudos geográficos, sobretudo através das imagens fornecidas pelos satélites

meteorológicos que tinham a grande vantagem de apresentarem grande homogeneidade

espacial. O seu grau de resolução (alguns quilómetros) ficava abaixo do desejável para a

caracterização do clima local, mas as imagens permitiram consideráveis progressos no

conhecimento dos aspectos e mecanismos do clima, dependentes das vastas unidades

que são as massas de ar e os grandes conjuntos geográficos (DAVEAU, 1976). Neste

trabalho publicado no primeiro “Seminário sobre detecção remota e sua aplicação ao

42 Pode-se obter uma referência bastante completa e actualizada de todos os satélites e sensores através doCEOS Yearbook (Committee on Earth Observations Satellites) em www.ceos.org.

Page 237: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 7 - Climatologia e Detecção Remota

- 235 -

estudo dos recursos naturais e às actividades do Homem”, a autora enumera as

características, vantagens e limitações das imagens ERTS (Earth Resources Technology

Satellite43). Faz acompanhar estas preciosas informações (ainda hoje válidas em certos

aspectos) com a análise de duas imagens, uma de Inverno e outra de Verão, onde são

descritos os primeiros fenómenos climáticos observados em Portugal através de

imagens de satélite. Concluía que “as imagens ERTS parecem constituir um

instrumento muito válido para o progresso da Climatologia regional, ramo da ciência

que tinha ficado atrasada pela pouca adaptação escalar da documentação [até então]

disponível”.

Apesar de não se dedicar ao estudo da Climatologia, M. E. MOREIRA também

divulga estas “novas tecnologias” e os seus métodos, acabando por dar um contributo

decisivo na área da detecção remota aplicada ao ambiente geográfico natural (MOREIRA,

1976; 1977; 1986; 1995, só para citar alguns trabalhos).

Esta primeira fase de estudos é caracterizada sobretudo pela divulgação das

metodologias e potencialidades das imagens de satélite, que começavam a ser vistas

com outros olhos, com a euforia da corrida ao espaço, que entretanto estava no seu

auge.

Os primeiros trabalhos estimulam os investigadores a procurar oportunidades em

laboratórios nacionais e internacionais com capacidade de aquisição e tratamento das

imagens. S. DAVEAU e D. B. FERREIRA deslocam-se ao ORSTOM - “Bureau de

Télédétection de l’Office National de la Recherche Scientifique et Technique

d’Outre-Mer” em França e M. E. MOREIRA, através de um convénio entre o Centro de

Estudos Geográficos (CEG) e o Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC),

encontra uma parceria que lhe permite estudar, a partir de imagens LANDSAT, várias

zonas húmidas.

Este período de aprendizagem para os geógrafos portugueses culminaria na

colecção “Cadernos de Teledetecção”, publicados pelo Centro de Estudos Geográficos

(DAVEAU, 1980 a, b e c; FERREIRA, 1980, 1981). Nessa fase são analisadas visualmente

imagens Landsat, Meteosat e HCMM (Heat Capacity Mapping Mission).

43 O primeiro satélite foi lançado 1972 pela NASA e posteriormente renomeado Land Remote-Sensing

Page 238: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte II – Ilha de calor urbana de superfície e balanço energético em Lisboa

- 236 -

Os conhecimentos adquiridos dão lugar ao primeiro Seminário de Teledetecção,

inserido na Licenciatura de Geografia da Faculdade de Letras da Universidade de

Lisboa e são elaborados textos de apoio ao ensino da detecção remota (DAVEAU, 1981).

Surgem as primeira referências ao clima da região de Lisboa (DAVEAU, 1980),

embora ainda não se observe a influência da cidade, sendo os estudos de cariz

puramente regional. São, no entanto, de uma riqueza de informação tal que permitem

observar particularidades do clima de Portugal, nunca antes documentados. Foram estas

publicações que serviram, ainda que sob a forma de iniciação, de primeiro contacto que

tivemos com a detecção remota.

Seguem-se-lhes outros estudos com uma menor componente divulgadora, mas

que permitiram grandes avanços nos conhecimentos sobre o clima da Península Ibérica,

tirando partido das imagens nos canais visíveis e infravermelho térmico. São

observados contrastes térmicos, tipos de cobertura florestal, áreas cobertas de neve, etc.,

sempre acompanhados de uma interpretação “clássica” do clima, com recurso a

sondagens aerológicas, cartas meteorológicas e dados de superfície. É uma Geografia

Física renovada pelas novas tecnologias, mas ainda qualitativamente descritiva e

baseada em estudos de caso (DAVEAU, 1982, 1988 a e b).

Muitas das técnicas ainda hoje utilizadas para o melhoramento das imagens,

classificação e obtenção de índices de vegetação são descritas nestes trabalhos

(MOREIRA, 1989; MOREIRA et al., 1989). No entanto, esta fase muito produtiva de

trabalho parece ter entrado em “stand by” no final da década de oitenta. SUZANNE

DAVEAU antecipa os principais problemas que se levantariam, mais tarde, na década de

noventa e que levaram os investigadores a “suspender” tão promissora técnica de

análise: “L’acquisition des enregistrements de satellites n’est pas facile. Même dans le

cas des données Landsat dont la diffusion n’était soumise à aucune restriction et dont le

prix de vente était fixé très bas, ce sont des efforts persistants qui devaient être déployés

par un particulier ou par un petit centre de recherche isolé pour parvenir à les acheter.

Quant aux produits des autres satellites, ils ne sont le plus souvent diffusés que sur

convention. Les images [...] analysées ont été obtenues, […], d’une façon indirecte et

grâce à la générosité individuelle des responsables des organismes qui les détenaient. Il

Satellite (LANDSAT).

Page 239: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 7 - Climatologia e Detecção Remota

- 237 -

s’agit là d’un problème grave, qui peut freiner considérablement la recherche dans un

domaine encore en phase exploratoire. […] Il ne s’agit d’ailleurs pas seulement d’une

difficulté d’accès aux documents à traiter, mais aussi aux techniques et instruments

permettant le traitement et, même, aux indispensables «données de référence» qui ne

sont actuellement fournies par certains organismes”. Neste texto crítico antevê-se a

dificuldade que se viria a sentir para a continuação da investigação, não só devido à

difícil aquisição de imagens, mas sobretudo ao seu tratamento por causa da inexistência

dos meios computacionais necessários.

O aparecimento de programas de tratamento de imagens pouco dispendiosos, a

banalização dos computadores pessoais e o advento da Internet foram três factores que

determinaram a renovação do interesse na utilização de imagens de satélite nos estudos

de Climatologia em Portugal. O encontro de investigadores do Centro de Estudos

Geográficos e do Instituto de Geografia da Universidade de Berna, na Suíça (através do

Professor Wanner e do Dr. Baumgartner), no início dos anos noventa, originou uma

parceria da qual resultou a minha participação no “2nd Snowmelt Runoff Model (SRM)

Workshop", que se realizou no referido instituto. Apesar do tema em si não estar

directamente relacionado com o trabalho que posteriormente desenvolvi, permitiram-me

ter contacto com os métodos e técnicas necessários ao tratamento de imagens de satélite.

Foram-nos cedidas algumas imagens NOAA AVHRR recolhidas através da antena do

Instituto de Geografia de Berna, que foram posteriormente tratadas, já com uma das

primeiras versões do software Idrisi. Dessa parceria resultou um pequeno estudo sobre

os padrões térmicos em Portugal, em colaboração com um dos investigadores Suíços

(ALCOFORADO et al., 1995). A análise já não era simplesmente qualitativa, tendo-se

ensaiado a primeira correlação entre os padrões da temperatura do ar e da superfície.

Mais tarde, em 1995 em Marburg, na Alemanha, tratei as primeiras imagens térmicas de

Lisboa do satélite LANDSAT 5, sob a coordenação do Prof. WILFIRED ENDLICHER.

Relacionado com o meu objecto de estudo – a cidade, é realizado anualmente um

encontro de detecção remota em meio urbano, no qual já participei com uma modesta

contribuição (LOPES et al., 2001). Nele tive oportunidade de debater muitas das questões

que, nos próximos capítulos, irão ser espostas.

Foram estes os meus primeiros passos no domínio do conjunto de técnicas que

Page 240: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte II – Ilha de calor urbana de superfície e balanço energético em Lisboa

- 238 -

permitiram chegar aos resultados que apresento nos próximos dois capítulos, e que

marcaram esta nova fase no interesse da aplicação das imagens de satélite ao clima de

Portugal.

As novas tecnologias parecem ser “contagiantes” e outro investigador do CEG

(MARCELO FRAGOSO) também se iniciou nos estudos da detecção remota, aplicando os

seus conhecimentos na identificação dos sistemas pluviogénicos. Primeiro as imagens

de RADAR (Radio Detection and Ranging) meteorológico (FRAGOSO, 1996), depois de

um estágio na Université des Sciences et Technologies de Lille, e no Centre

International de l’Eau em Nancy, na França. Também as chuvas torrenciais seriam

estudadas por este autor através de imagens METEOSAT e NOAA (FRAGOSO, 1999).

Actualmente prepara uma Tese de Doutoramento (em fase de conclusão), tendo

utilizado imagens de RADAR meteorológico para reconstituir campos pluviométricos

associados a alguns eventos chuvosos torrenciais e imagens METEOSAT (Visível,

Vapor de água e Infra Vermelho), para analisar a evolução de sistemas nebulosos de

tipo convectivo e identificar sistemas de meso-escala, através da classificação das

temperaturas do topo das nuvens. Esperemos que esta terceira fase de estudos prossiga

com os esperados avanços tecnológicos e traga novas formas de observação dos

fenómenos climáticos.

Não se pretendendo fazer aqui o historial das aplicações da detecção remota à

Climatologia de Portugal, apenas se citam outros trabalhos fora do Centro de Estudos

Geográficos de que se dá conhecimento. É o caso do Departamento de Física da

Universidade de Évora, que tem publicado vários trabalhos nesta área. Citam-se, por

exemplo, os estudos de M. COSTA e A. SILVA sobre a avaliação do albedo e das

temperaturas de superfície (COSTA et al., 1998) e numerosos trabalhos sobre a presença

dos aerossóis na atmosfera. Uma vasta lista destes trabalhos pode ser encontrada no

sitio Internet da Universidade de Évora (www.cge.uevora.pt).

Estão lançadas as bases para uma nova fase nos estudos de Climatologia com

recurso a imagens de satélite. Para isso, poderá contribuir a disciplina de “Teledetecção”

na recente variante de Cartografia e Sistemas de Informação Geográfica na Licenciatura

de Geografia, que funciona pela terceira vez no ano lectivo de 2003/2004. Nela se

poderá, e deverá, criar o gosto pela observação da Terra e da Atmosfera a partir do

Page 241: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 7 - Climatologia e Detecção Remota

- 239 -

espaço, tendo em conta o futuro promissor da disciplina no mercado de trabalho e na

investigação, que espera os futuros licenciados em Geografia. Não abandonando a

análise rigorosa da observação directa dos fenómenos na tradição da foto-interpretação,

nela poderão ser ministrados os ensinamentos que permitem criar novos modelos para a

estimação de grandezas atmosféricas.

No campo da climatologia urbana devemos continuar a centrar a nossa atenção

nos seguintes aspectos:

a) Continuar a procurar o melhor método de representação do volume da

cidade, sendo portanto necessário utilizar imagens de grande resolução

espacial. Os mapas de ocupação do solo obtidos com classificações

automáticas (assistidas ou outras), representam unidades bidimensionais que

não incluem a volumetria da cidade e portanto não se adequam

completamente aos estudos do clima urbano. Isto porque as variáveis

atmosféricas não respondem só à capacidade térmica e energética das

superfícies, mas sobretudo dos volumes.

b) Explorar os novos sistemas de satélites que possuam canais térmicos de

maior resolução temporal e espacial.

c) Operacionalizar, através de software criado especificamente para o efeito,

todo o conjunto de procedimentos para a obtenção das grandezas físicas

necessárias (albedo, temperaturas de superfície e restantes termos a incluir

no balanço radiativo das superfícies). Só com este procedimento se poderá

aumentar o número de casos estudados e criar bases de dados

verdadeiramente climáticos.

d) Continuar o esforço de sintetizar os resultados em mapas de média e grande

escala, de modo a que a informação seja facilmente utilizada por técnicos e

decisores. Só assim fará sentido a aplicação que se pretende dar aos

conhecimentos adquiridos.

Page 242: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

- 241 -

CAPÍTULO 8

A ILHA DE CALOR URBANO DE SUPERFÍCIE DE LISBOA

1. AS ILHAS DE CALOR URBANO: PERSPECTIVAS SEGUNDO AS ESCALAS DE

ANÁLISE

A ilha de calor urbano (ICU), segundo OKE (1995), é o exemplo mais evidente

de mudança climática provocada inadvertidamente pelo homem. Tem sido um dos

temas de climatologia urbana mais abordado nos últimos anos, porque ocorre

praticamente em todas as cidades do Mundo. É vista por uns como uma potencialidade,

porque a temperatura na cidade não diminui tanto, evitando o consumo excessivo de

energia no Inverno e, por outros, como uma limitação nos locais onde o consumo de

energia suplementar na refrigeração dos ambientes tem custos elevados. Uma

contradição aparente que tem de ser observada à escala local.

ARNFIELD (2003) publicou recentemente um estudo revendo os artigos mais

importantes das duas últimas décadas sobre climatologia urbana, em língua Inglesa.

Nessa revisão, o autor dá-nos conta dos variadíssimos exemplos de estudos em climas

equatoriais, tropicais, subtropicais, desérticos, de montanha, mediterrâneos, até às

cidades de altas latitudes. Em todos elas, se provou existirem ilhas de calor urbano,

embora algumas com características muito diversas. Essa distinção é devida,

obviamente, às diferenças climáticas e às condições locais como a posição topográfica,

Page 243: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte II – Ilha de calor urbana de superfície e balanço energético em Lisboa

- 242 -

proximidade do mar, ou de outra grande massa de água, tipo e dimensão da cidade, etc.

Mas há outro conjunto muito importante de factores, que determinam que não haja uma

concordância de resultados, que decorre da própria definição de ICU, da forma como se

aborda o problema, da escala de análise e da extensão tridimensional e temporal dos

padrões térmicos.

Na sua definição tradicional, este termo, que aparece na literatura científica de

língua inglesa no final dos anos 50 do século XX44 (LANDSBERG, 1981), sugere a

existência de uma cidade “quente” rodeada pelo campo mais fresco e corresponde a

uma integração da totalidade dos microclimas originados pela urbanização. Para

quantificar a intensidade ou magnitude da ICU, generalizou-se a expressão ∆ Tu-r, como

sendo a máxima diferença de temperatura entre as áreas urbanizadas e rurais ou, sendo

mais preciso, as diferenças entre a temperatura registada no local mais quente da cidade,

num dado momento e a temperatura mais baixa de todos os locais com características

rurais que envolvem a cidade, registada à mesma hora (vários autores citados por

ALCOFORADO, 1992). Todas as definições são, no entanto, pouco precisas e propícias à

confusão entre as escalas local e microclimática.

OKE (1995) apresenta uma clarificação dos conceitos, escalas e formas de

abordagem ao estudo das ICU, que importa aqui salientar. As ICU podem resultar:

a) Das diferenças de temperatura do solo, da superfície e do ar. Estando

relacionadas entre si, têm processos físicos, génese, e dinâmicas temporais

bastante distintas. As ilhas de calor observadas a partir de registos térmicos

do ar são mais intensas durante a noite, podendo mesmo ser negativas

durante o dia (neste casos são ilhas de frescura), enquanto as da superfície

(ICUsup) são geralmente mais intensas durante o dia. No entanto, há casos

em que têm um comportamento semelhante à ilha de calor do ar.

b) Da comparação entre as temperaturas do ar medidas abaixo (atmosfera

urbana inferior - urban canopy layer) e acima do nível dos telhados

(atmosfera urbana superior - urban boundary layer). Estão intimamente

relacionadas entre si mas também possuem magnitude e processos distintos.

44 Embora Luke Howard tenha obtido as primeiras evidências da ICU no final do séc. XIX, em Londres.

Page 244: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 8 –A ilha de calor de superfície de Lisboa

- 243 -

As primeiras podem ser observadas a partir de medições da temperaturas do

ar em estações meteorológicas padronizadas sobre superfícies relvadas, ou

em estações não estandardizadas para medir especificamente a temperatura

do ar nas ruas ou nos telhados dos edifícios. Outro método frequente é

efectuar perfis de temperatura com registos obtidos em aparelhos montados

em viaturas automóveis. A importância do estudo das características da

atmosfera urbana inferior e da determinação dos parâmetros do conforto

humano parece óbvia, pois é aí que residem e trabalham a maior parte dos

habitantes (ALCOFORADO, 1992).

Acima dos nível dos telhados registam-se valores da temperatura do ar a

várias alturas com aparelhos fixos em torres, ou através de perfis com os

aparelhos lançados em balões ou aeronaves.

c) De diferentes esquemas de amostragem das temperaturas e plataformas de

observação. Por exemplo um perfil de temperaturas feito a partir de

medições itinerantes de automóvel é um esqueleto das temperaturas na

atmosfera urbana inferior, representativa dos canhões urbanos e das ruas,

mas é diferente das temperaturas registadas numa rede de pontos de

observação localizados em espaços urbanos abertos.

Neste trabalho a ilha de calor (ICUsup) é definida pelas temperaturas das

superfícies estimadas a partir de imagens de satélite NOAA-AVHRR, referidas por

Land Surface Temperatures. Sobre a sua natureza e utilização se dá conta mais adiante.

2. A ILHAS DE CALOR DE LISBOA MEDIDA COM A TEMPERATURA DO AR A 2 M DO

SOLO

Os primeiros estudos dedicados exclusivamente ao clima de Lisboa remontam

ao princípio do século XX, depois de algumas medições pontuais efectuadas por M.

FRANZINI (1816-1856). SOUSA MACHADO, ao analisar as variações seculares da

temperatura em Lisboa, é o primeiro autor a referir-se à ilha de calor de Lisboa nos anos

setenta. Em 1982, A. de AZEVEDO conclui que a ICU detectada por S. MACHADO se

Page 245: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte II – Ilha de calor urbana de superfície e balanço energético em Lisboa

- 244 -

prolonga para noroeste, para Odivelas, Amadora e Belas, fazendo ainda referência a

Cascais no litoral ocidental Atlântico (ALCOFORADO, 1992).

Mas foi durante a década de oitenta que se iniciou o estudo aprofundado do

clima de Lisboa, com a tese de M. J. ALCOFORADO “O Clima da Região de Lisboa.

Vento, Insolação e Temperatura” (1988), que serviria de modelo a outros trabalhos

sobre os climas urbanos noutras cidades portuguesas (MONTEIRO no Porto, em 1993;

GANHO em Coimbra em 1998; ALCOFORADO E TABORDA, 1998, em Évora45). M. J.

ALCOFORADO dedica três capítulos do seu trabalho à descrição pormenorizada da ilha

de calor de Lisboa em situações de Verão e Inverno, utilizando dados observados nas

estações meteorológicas da rede nacional do I. M. e em campanhas de medições

itinerantes, registando a temperatura do ar a cerca de 2 m do solo. Foram ainda lançados

balões estabilizados para verificar a estrutura vertical da atmosfera.

A partir de dados das estações meteorológicas, a autora identificou uma

anomalia positiva na cidade de cerca de 0,5 a 1,1 ºC, nas temperaturas mínimas médias

no Inverno, enquanto nas máximas médias não observou grandes diferenças térmicas

nas estações meteorológicas dentro e fora da cidade. No Verão, a temperatura mínima

média na estação do interior da cidade (Lisboa/Geofísico) é mais elevada do que no

Aeroporto. Globalmente as diferenças na temperatura máxima são negativas, indicando

uma cidade mais fresca no Verão. A partir de medições itinerantes de temperatura a

autora conclui que a intensidade média da ilha de calor urbano de Lisboa não ultrapassa

2 a 3 ºC.

Nesse estudo, são indicados os principais factores que influenciam os padrões

térmicos de Lisboa, constatando a autora que a complexidade de interacções entre o

tecido urbano, o tipo de tempo, determinado pela nebulosidade e pela frequência e

intensidade dos ventos, são os factores que mais contribuem para a configuração da ilha

de calor urbano e para o aparecimento de ilhas de frescura. Nos dias de Nortada o sul da

cidade, junto ao Tejo, permanece invariavelmente mais quente. Nestas situações a ilha

de calor é devida ao efeito de abrigo originado pelo tecido urbano a norte e ocorre em

cerca de 40 % das tardes de Verão. Nos dias em que a intensidade do vento é fraca os

45 Um breve resumo sobre os climas urbanos destas cidades pode ser encontrado em ALCOFORADO (1998).

Page 246: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 8 –A ilha de calor de superfície de Lisboa

- 245 -

padrões térmicos variam constantemente. Os locais onde chega a brisa do Tejo ou do

Atlântico estão mais frescos (2 a 7ºC) do que o norte da cidade, onde se centra a ilha de

calor (39 % das tardes de Verão). O lançamento de balões estabilizados permitiu

concluir que a ilha de calor, nos bairros setentrionais da cidade, tem cerca de 400 m de

espessura.

Durante as noites de Verão, observa-se um aumento da temperatura em direcção

ao centro/sul da cidade. Com vento de norte, as temperaturas mais altas encontram-se

nas áreas deprimidas da Baixa, sendo o vento o responsável pelo abaixamento da

temperaturas nos interflúvios. Nas noites sem vento, mas com humidade elevada, os

interflúvios estão mais quentes. O ar marítimo ou estuarino relativamente fresco e

húmido, circula preferencialmente pelos vales ocasionando a diminuição da temperatura

do ar. Nestas situações, a ilha de calor urbano tem uma forma tentacular e o litoral

oriental da cidade é mais quente que o litoral sudoeste.

Nos dias de Inverno sem nebulosidade coexistem dois padrões térmico distintos:

em dias de vento fraco de norte ou noroeste há um ligeiro aumento de temperatura em

direcção ao centro sul da cidade (2ºC). Na presença de ar frio e húmido estuarino, por

vezes acompanhado com nevoeiro, são as áreas ribeirinhas as mais frias, aumentando a

temperatura com a distância ao Tejo. Podem-se registar diferenças de 10 ºC entre e o

litoral e as zonas onde o nevoeiro não chega.

Num trabalho posterior, a autora concluiu que em 78% das noites de Inverno e

em 63 % das noites de Verão existe um aumento da temperatura em direcção ao

centro/sul da cidade (ALCOFORADO E ANDRADE, 2003). A interpretação de uma

termografia da parte oriental de Lisboa numa noite de Inverno (ALCOFORADO, 1985) e,

posteriormente, um estudo sobre um modelo de estimação de temperaturas em meio

urbano com um SIG (ANDRADE E LOPES, 1985), permitiram confirmar os resultados das

medições.

ALCOFORADO concluiu que a ICU é mais frequente e bem marcada durante a

noite, tanto de Inverno como de Verão, não se manifestando tão nitidamente durante o

dia. Nalguns sectores de grande densidade de construção na coroa periférica (por

exemplo em Carnide e na Pontinha), a temperatura pode ser semelhante à da Baixa

Page 247: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte II – Ilha de calor urbana de superfície e balanço energético em Lisboa

- 246 -

apesar da sua distância ao centro da ICU, o que mostra que a sua génese se encontra

associada aos padrões urbanos mais densos e acompanha a tendência policêntrica da

área metropolitana.

3. TEMPERATURAS DE SUPERFÍCIE DERIVADAS DOS CANAIS TÉRMICOS DOS

SATÉLITES NOAA-AVHRR (LAND SURFACE TEMPERATURES - LST)

3.1 DEFINIÇÃO E ASPECTOS METODOLÓGICOS

Neste trabalho parte-se das temperaturas de superfície estimadas a partir dos

canais térmicos do satélite NOAA-AVHRR 14, para determinar a intensidade e ritmo

estacional da ICUsup de Lisboa, entre Agosto de 1998 e Julho de 1999. Foram utilizados

dados diurnos e nocturnos, correspondentes a seis passagens diárias do satélite sobre a

Península. Os dados foram inicialmente tratados pelo Deutschen Zentrum für Luft- und

Raumfahrt (DLR). Os processos utilizados por este centro Alemão de detecção remota

na transformação dos dados do satélite em temperaturas de superfície são enunciados

mais adiante.

A Land Surface Temperature (LST), também denominada neste trabalho

temperatura da superfície (Ts), é uma temperatura estimada a partir dos valores de

radiância detectados pelo sensores térmicos a bordo de satélites e outras aeronaves. A

LST não é uma medição física directa, mas sim uma temperatura modelizada a partir do

registo do sensor. Apesar de ser diferente da temperatura da atmosfera, normalmente

medida a dois metros do solo, vários estudos têm mostrado a forte correlação entre estas

duas grandezas físicas. No entanto, as Ts modificam-se mais rapidamente no tempo e no

espaço, porque são dependentes das características biofísicas do terreno, que variam

bastante em pequenas distâncias

A Ts é um dos parâmetros chave para compreendermos o balanço energético da

superfície terrestre. Controla o fluxo de energia em grande comprimento de onda para a

atmosfera e depende de outros parâmetros como o albedo, a humidade da superfície e a

vegetação. Conhecer a distribuição da temperatura de superfície e a sua evolução

temporal é importante para uma correcta modelização dos fluxos energéticos entre a

Page 248: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 8 –A ilha de calor de superfície de Lisboa

- 247 -

superfície e a atmosfera (VOGT, 1996).

Extrair as temperaturas da superfície a partir de imagens no infravermelho

térmico é um trabalho exigente e demorado, sobretudo se se pensar em tratar um grande

conjunto de informação. No caso das temperaturas do oceano ou de outras massas

líquidas, essa tarefa é menos complexa devido à fraca variabilidade dos valores da

emissividade da água (≈ 0,99) e os algoritmos são de aplicação relativamente simples

(BECKER e LI, 1990; VOGT, 1996). Segundo estes autores, a temperatura da superfície do

oceano pode ser obtida com uma precisão de 1 K através de uma relação linear.

No caso dos continentes, a temperatura de superfície depende de muitos

factores, como o tipo de superfície, o seu conteúdo em humidade, a textura dos solos, a

rugosidade dos terrenos e a estrutura, tipo e estado fenológico da vegetação, tornando-se

muito mais difícil estimar os seus valores. Essa dificuldade decorre de vários factores:

a) A emissividade dos materiais à superfície terrestre varia consideravelmente

no tempo e no espaço (tipicamente entre 0,91 e 0,98) e é dependente do

canal espectral. Apesar das diferenças das emissividades espectrais nos

canais 4 e 5 do AVHRR serem relativamente fracas (<0,01), produzem

diferenças significativa nos valores finais das LST obtidas.

b) A emissividade observada pelos sensores depende do ângulo de visão do

satélite e da anisotropia da superfície.

c) As temperaturas podem ser consideravelmente mais elevadas em Terra do

que no mar. A função de PLANK, originalmente desenvolvida para as

temperaturas do oceano, pode não ser absolutamente adequada para a

superfície dos continentes. Por outro lado, a saturação dos sensores do

AVHRR a 320 K (47ºC) pode causar problemas de estimação de

temperaturas em ambientes extremamente quentes.

d) As temperaturas de superfície podem variar bastante na área coberta pelo

pixel do sensor AVHRR (1,1 km2), não se sabendo, com precisão, que valor

é realmente medido.

e) As LST podem sofrer variações diurnas fortes, o que levanta a questão da

melhor hora para a passagem do satélite e a sua representatividade no clima

Page 249: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte II – Ilha de calor urbana de superfície e balanço energético em Lisboa

- 248 -

desse local.

f) Nos continentes, a temperatura atmosférica pode ser consideravelmente

diferente da temperatura de superfície.

g) Devido às diferenças de altitude, a distância entre a superfície e o sensor

podem variar consideravelmente e os modelos de atenuação atmosférica,

estabelecidos para uma determinada altitude, podem não ser os mais

correctos para outra.

De todas as limitações expostas, a questão da emissividade espectral é a que

levanta maiores problemas metodológicos, não havendo ainda uma solução totalmente

satisfatória. A utilização de dados de radiossondas, que registam perfis de temperatura e

humidade atmosférica (como, por exemplo, os obtidos pelo TIROS Operational Vertical

Sounder - TOVS, a bordo dos satélites NOAA), em modelos de transmissão atmosférica,

constituem tentativas que não tem dado os melhores resultados (VOGT, 1996).

As metodologias, que utilizam modelos do tipo split window, são as que se têm

mostrado mais realistas, porque são simples e dão os resultados mais fiáveis, quando

existe informação sobre a emissividade. Estes modelos são possíveis porque, desde

Junho de 1981 com o NOAA-7, os sensores detectam a radiação em duas bandas

relativamente próximas no espectro: canal 4 (10,30 a 11,30 µm) e canal 5 (11,50 a

12,50µm). O princípio reside na diferença das características da transmitância46 nestes

dois canais do infravermelho térmico.

O método assenta em vários pressupostos que devem ser equacionados:

a) Em primeiro lugar, pressupõe que as medições efectuadas nas duas

amplitudes espectrais permitam expressar linearmente uma função

(linearização da função de Plank).

b) Em segundo lugar, assume-se que todas as temperaturas envolvidas (de

brilho, atmosférica e de superfície) têm uma magnitude semelhante, o que

permite eliminar a contribuição atmosférica na radiação que chega ao

46 Fracção do fluxo incidente sobre um sistema que consegue atravessá-lo. É numericamente igual à soma da transmitância directa (associada à atenuação do fluxo incidente) com a transmitância difusa (PLANA-FATTORI e CABALLOS, 1997).

Page 250: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 8 –A ilha de calor de superfície de Lisboa

- 249 -

sensor. Este pressuposto é verdadeiro na maior parte das condições

atmosféricas.

c) O terceiro pressuposto consiste em assumir a invariância espectral da

emissividade da superfície.

d) O último pressupõe um fraco conteúdo de vapor de água na atmosfera, de

modo a que haja uma relação linear entre a absorção total do vapor de água

e a diferença de temperatura de brilho nos dois canais.

Este método poderá não ser o mais apropriado nas latitudes baixas onde existe

uma atmosfera muito húmida e nas imagens obtidas através de elevados ângulos de

visão (VOGT, 1996).

Num estudo realizado por BECKER (1987), foram estimados os erros das

temperaturas de superfície, obtidas em função das diferenças das emissividades

espectrais do sensor AVHRR e o desvio entre a emissividade média utilizada e a real. O

autor concluiu que, para uma emissividade real de 0,96, um erro de emissividade média

de 0,02 pode provocar um desvio de 1,09 K na temperatura de superfície estimada. Em

casos extremos os erros podem ascender a 7 K. Outros estudos feitos para o sudeste da

França mostraram que as diferenças na emissividade dos dois canais não são muito

importantes naquela região, quando se trata de solos com um forte coberto vegetal. No

entanto, em áreas de vegetação esparsa, ou solos nus, os erros podem ser maiores

(VOGT, 1996). Os autores não fazem referências às áreas urbanas.

Existem vários algoritmos para obter as temperaturas de superfície em meio

terrestre. Neste trabalho faz-se menção a dois deles: o primeiro desenvolvido por COLL

et al. (1994) foi utilizado para estimar as temperaturas de superfície na Andaluzia

(VOGT et al., 1997). Esta aplicação é interessante pela proximidade geográfica da área

de estudo; o segundo (BEKER et al., 1990) porque foi o algoritmo aplicado pelo

Deutschen Zentrum für Luft- und Raumfahrt (DLR) aos dados NOAA-AVHRR 14,

utilizados neste trabalho.

No primeiro, as temperaturas de superfície são obtidas através da seguinte

formulação:

Page 251: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte II – Ilha de calor urbana de superfície e balanço energético em Lisboa

- 250 -

TS = T4 + A (T4-T5) +B (8.1)

A = 1,0+0,58 (T4-T5),

B = 0,51 + 40 (1-ε) - β∆ε,

T4 e T5 e ε4 e ε5 são, respectivamente, as

temperaturas de brilho e as

emissividades espectrais nos canais 4 e

5,

ε = (ε4+ε5)/2

∆ε = (ε4-ε5)

ε4 e ε5, são os coeficientes de emissividade do canais 4 e 5

50 K para as latitudes tropicais

β = 75 K para as latitudes médias no Verão

150 K para as latitudes médias no Inverno

A varia em função da diferença das temperaturas de brilho e depende do

conteúdo de vapor de água na atmosfera e do ângulo de vista do sensor. O seu valor

varia no mesmo sentido daqueles dois parâmetros. B varia com a emissividade média da

superfície, com a diferença das emissividades nos dois canais e com o coeficiente β.

Este diminui com o aumento de vapor de água na atmosfera. Por causa da difícil

obtenção dos valores de β e ε, o valor de B pode ser parametrizado usando o NDVI

(Normalized Difference Vegetation Index). VOGT et al., (1997) apresentam valores de B

obtidos empiricamente para o sul de Espanha:

Page 252: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 8 –A ilha de calor de superfície de Lisboa

- 251 -

B = 0,51 + C

0 para superfícies de água.

C = 1,16 para áreas com NDVI ≥ 0,6047

2,98 para solos sem vegetação (NDVI ≤ 0,15)

O NDVI48 é baseado na diferença dos valores entre o próximo infravermelho,

caracterizado por níveis elevados de reflectância e fraca absorção das plantas verdes, e o

canal vermelho, onde a reflectância espectral é baixa e dominada pela absorção

(BELWARD, 1990).

12

12 AVHRR NDVICanalCanalCanalCanal

+−

= (8.2)

Este índice varia entre -1 e 1 e apresenta valores típicos de 0,20 para solos sem

vegetação e 0,70 para áreas densamente povoadas por espécies vegetais. Os valores são

mais elevados nos locais onde a biomassa vegetal é maior, indicando forte actividade

fotossintética e coberto vegetal denso. As nuvens, a água e a neve surgem com valores

negativos. Os solos e as rochas tem valores próximos de zero (GREENLAND, 1994). A

utilização deste índice deve-se a dois motivos: primeiro porque há uma forte correlação

entre os seus valores e a emissividade e, em segundo lugar, porque é facilmente

derivado a partir das reflectâncias obtidas nos canais vermelho e infravermelho próximo

pelos sensores a bordo de vários satélites (VAN DE GRIEND et al., 1993).

A fidelidade das temperaturas de superfície obtidas por este método depende da

percentagem de coberto vegetal: erros maiores ocorrem em solos sem vegetação e

menores em áreas com bastante vegetação. A precisão das temperaturas pode também

variar com a estação do ano, sobretudo em áreas agrícolas, onde o estado fenológico das

47 Segundo os autores, os limites de NDVI usados para áreas com forte vegetação e solos sem vegetação foram determinados por inspecção visual dos máximos e mínimos daquele índice durante o ano de 1992. Valores entre 1,16 e 2,98 podem ser obtidos por interpolação linear. 48 Ver mais informações sobre este índice no CAPÍTULO 9.

Page 253: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte II – Ilha de calor urbana de superfície e balanço energético em Lisboa

- 252 -

culturas pode influenciar os valores obtidos em áreas costeiras e de elevada altitude

(VOGT et al., 1997). Nada é referido para as áreas urbanas. No entanto por se tratarem

de superfícies artificializadas, muitas vezes com pouca vegetação, podem-se esperar

erros maiores.

As temperaturas de superfície difundidas pelo Deutschen Zentrum für Luft- und

Raumfahrt (DLR), utilizadas neste trabalho, foram estimadas pelo algoritmo de BECKER

e LI (1990). Trata-se também de uma técnica do tipo split window para corrigir a

influência da atmosfera nos valores registados a bordo dos satélites NOAA.

TS = A0 + P (T4+T5)/2 +M (T4+T5)/2 (8.3)

A0 = 1,274

P = 1 + 0,15616 [(1-ε)/ε] – 0,482 (∆ε/ε2)

M = 6,26 + 3,989 [(1-ε)/ε] +38,33 (∆ε/ε2)

ε = (ε4+ε5)/2

∆ε = (ε4-ε5)

ε4 e ε5 são coeficientes de emissividade dos canais 4 e 5.

Para determinar a emissividade das superfícies foi utilizada a formulação de

VAN DE GRIEND et al (1993), em que:

ε4 = 1,0094 + 0,047 ln (NDVI)

ε5 = ε4 + 0,01

O NDVI utilizado é o valor máximo composto em 10 dias, gerado pela DLR

desde 1994.

Page 254: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 8 –A ilha de calor de superfície de Lisboa

- 253 -

3.2 VANTAGENS E LIMITAÇÕES DAS LST

Apesar do elevado número de estações nas várias redes meteorológicas

nacionais, a sua densidade espacial nem sempre é suficiente para os estudos de

climatologia regional e local. Os problemas da localização das estações (às vezes

rodeadas por vegetação alta e edifícios, em posições topográficas pouco representativas

do clima de uma região, etc.), nem sempre são fáceis de ultrapassar. A informação

proveniente dos satélites NOAA-AVHRR permite, pelo contrário, obter as temperaturas

da superfície com uma resolução apreciável (1,1 km), com uma óptima

representatividade temporal (situações diárias, diurnas e nocturnas) e uma grande

cobertura espacial. Apesar da resolução ser aceitável para a escala regional, a uma

escala mais fina torna-se um factor limitativo, já que a dimensão do pixel é demasiado

grosseiro para os estudos locais.

A cobertura de nuvens pode ser um factor limitativo da utilização das imagens

porque a reflectância lida pelo sensor é a das nuvens e não do solo, mas pode traduzir-se

numa vantagem se se pretender estudar a cobertura nebulosa durante um determinado

período (embora seja difícil separar os tipos de nuvens e nevoeiros).

Seja qual for o método utilizado para obter as temperaturas de superfície,

convém relembrar que derivam de uma modelização complexa a partir das reflectâncias

medidas pelos sensores do satélite. A sua interpretação depende não só dos algoritmos

que se descreveram, mas também de problemas específicos relacionados com factores

orbitais dos satélites NOAA.

3.3 TRATAMENTO DOS DADOS

Até há uma década atrás, o trabalho em Climatologia com recurso a imagens de

satélites, efectuado por Geógrafos, apenas era possível com a o apoio de grandes

laboratórios internacionais de detecção remota. Muitos dos investigadores que

trouxeram o seu conhecimento e experiência para a Portugal viam-se privados da

continuação dos seus estudos no nosso País, por carência de informação e meios

técnicos para a tratar. Nos últimos anos, com o advento dos computadores pessoais e de

Page 255: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte II – Ilha de calor urbana de superfície e balanço energético em Lisboa

- 254 -

software cada vez mais acessível, foi possível começar a tratar grandes quantidades de

informação proveniente de satélite. O esforço de alguns centros americanos e europeus

de detecção remota em disponibilizar informação através da Internet a partir das suas

bases de dados, permitiu aceder mais facilmente à informação necessária. Apesar dos

dados disponíveis ainda não serem os ideias para estudos dos climas locais podem ser

interessantes para estudos de Climatologia regional. Os dados NOAA-AVHRR são os

que, nesta altura, melhor servem os objectivos desta parte da investigação porque

combinam uma resolução aceitável (1,1 km) com um repetição bi-diária.

A Deutsches Zentrum für Luft- und Raumfahr (DLR) é uma das instituições que

disponibilizam à comunidade científica as temperaturas de superfície para toda a

Europa. A informação é facultada através do centro de dados de detecção remota

(Deutsches Fernerkundungsdatenzentrum (DFD) e as imagens podem ser acedidas

através de um interface gráfico, que permite seleccionar o tipo de dados pretendidos

(ISIS – Intelligent Satellite Data Information System). Esta informação tem a vantagem

de ser processada antes de ser posta à disposição da comunidade científica, o que liberta

os investigadores de uma infinidade de tratamentos iniciais.

a) O trabalho efectuado pela DLR

Esta instituição processa os dados originais que são recebidos na estação de

recepção de Oberpfaffenhofen, na Alemanha, fase que inclui a pré-navegação

automática e referenciação geográfica das imagens e a sua calibração. Segue-se a

detecção das nuvens e a derivação das temperaturas de superfície através dos algoritmos

de BECKER e LI (1990), para corrigir o efeito de atenuação atmosférica devido à

absorção do vapor de água e de VAN DE GRIEND e OWE (1993), para estimar a

emissividade das superfícies.

Finalmente, os dados são disponibilizados sob a forma de imagens LST numa

projecção estereográfica, com a resolução espacial de 1,1 km e temporal bi-diária,

semanal e mensal. As imagens diurnas são derivadas de três passagens consecutivas do

satélite NOAA-14 e 16 e compostas com os pixel que apresentam o máximo NDVI. As

imagens nocturnas são processadas da mesma forma, mas através da máxima LST das

Page 256: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 8 –A ilha de calor de superfície de Lisboa

- 255 -

três passagens nocturnas.

Os dados são transformados de 10 bits originais em 8 bits escalonados em

cinzentos de 0 a 255 da seguinte maneira: o valor 0 é indexado a superfícies de água e o

valor 255 é reservado para as nuvens ou ausência de dados. As LST mínimas começam

em -39.5 ºC e referem-se ao valor 1. A resolução radiométrica é de 0,5 ºC e o valor 254

corresponde a uma LST máxima de 87 ºC (http://isis.dlr.de). Para converter os valores

escalonados de cinzentos em temperaturas de superfície utiliza-se a fórmula:

LST = (valor de cinzento ⋅ 0,5) - 40 (8.4)

b) Importação e processamento dos dados

A importação dos dados é efectuada através de um interface disponibilizado pela

DFD (GISIS – Graphical Interface to the Intelligent Satellite Data Information System),

que permite escolher o tipo de imagem (LST, SST, NDVI, etc.), a área de interesse e o

período. Através do interface gráfico, pode-se obter informação sobre as características

técnicas das imagens e seu processamento.

Depois de escolhidas as imagens, segue-se o trabalho da sua importação, que é a

fase mais demorada deste processo de recolha. Para não se importar as imagens

completas de toda a Europa, recolheu-se apenas a área correspondente à Península

Ibérica. A projecção de origem é uma estereográfica que posteriormente se transformou

num sistema de coordenadas rectangulares para poderem ser utilizadas num SIG

(IDRISI v.32).

Foram recolhidas pouco menos de 700 imagens da Península Ibérica,

correspondentes ao período de Agosto de 1998 a Julho de 1999. Esta série temporal tem

algumas falhas de dados, por alguns dias não terem sido tratados pela DLR. Em cada

imagem foi extraída uma janela correspondente à Península de Lisboa (fig. 8.1).

Como as imagens utilizadas são compostas a partir de três passagens do satélite

NOAA 14, não é possível saber com exactidão a hora de cada uma. Por isso quando se

refere as imagens diurnas apenas se sabe que foi obtida no período de maior

Page 257: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte II – Ilha de calor urbana de superfície e balanço energético em Lisboa

- 256 -

aquecimento da superfície e as nocturnas de madrugada.

4. A ILHA DE CALOR DE SUPERFÍCIE DE LISBOA

Apresentam-se os primeiros resultados das diferenças das temperaturas de

superfície nocturnas (Tsnoite) e diurnas (Tsdia), em dois locais de Lisboa: o centro da

cidade, entre o Saldanha e a Baixa e o Aeroporto, por vezes designado neste trabalho

por “periferia”. Quando se referem estes dois locais subentende-se uma área de

1,1 x 1,1 km, correspondente ao pixel NOAA, centrado em cada local (fig. 8.1, em

baixo).

Fig. 8.1 – Três fases na importação e tratamento da informação da Deutsches Fernerkundungsdatenzentrum – DFD, entre Agosto de 1998 e Julho de 1999: em cima a janela contendo os dados da Península Ibérica (à esquerda a projecção original e à direita a transformação no sistema com coordenadas rectangulares). Em baixo, a janela já com as temperaturas de superfície da região de Lisboa.

Page 258: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 8 –A ilha de calor de superfície de Lisboa

- 257 -

Apesar do Aeroporto não ser representativo das áreas periféricas rurais (que aliás

são raras na região de Lisboa), foi utilizado como estação de referência para determinar

a ilha de calor de Lisboa (ALCOFORADO, 1992). Para comparação dos resultados entre a

ilha de calor da atmosfera urbana inferior e da superfície, manteve-se o Aeroporto como

local de referência.

Foram utilizadas 438 imagens (187 diurnas e 251 nocturnas), que correspondem

às situações sem nebulosidade no período estudado. A extracção dos valores de Ts foi

feita sistematicamente nos dois pixel representativos dos locais pretendidos.

4.1 AMPLITUDES ANUAIS E MENSAIS DAS TEMPERATURAS DE SUPERFÍCIE (TS)

Não existem grandes diferenças no ritmo anual das temperaturas de superfície

entre o centro da cidade e o Aeroporto (fig. 8.2). Essa diferença surge no ritmo anual

das temperaturas nocturnas e diurnas, em ambos os locais. Nas temperaturas nocturnas,

a amplitude é maior (40ºC), entre o máximo absoluto de 50 ºC, registado em Agosto no

centro e o mínimo de 10ºC em Dezembro. Nas situações nocturnas a amplitude anual é

bastante mais fraca (26ºC), entre o máximo de 25ºC em Agosto e –1ºC em Dezembro.

No período mais frio do ano, entre Novembro e Fevereiro, a amplitude mensal

das Ts diurnas é bastante menor nos dois locais (4 a 8 ºC), quando comparadas com o

período estival de 1998 e a Primavera e o início do Verão de 1999, onde no mesmo mês

podem ocorrer 20 a 24 ºC de diferença (por exemplo em Maio no Aeroporto, ou em

Junho no centro). Durante a noite, as amplitude mensais de Ts são fracas, nunca

ultrapassando 15º C em cada mês.

4.2 DIFERENÇAS NAS TEMPERATURAS DE SUPERFÍCIE (TS) ENTRE O CENTRO DA

CIDADE E O AEROPORTO

4.2.1 DIFERENÇAS DIURNAS (TsDIA)

Depois de extraídos e tratados os valores diurnos e nocturnos de Ts, foram

Page 259: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte II – Ilha de calor urbana de superfície e balanço energético em Lisboa

- 258 -

calculadas as diferenças diárias entre os valores do pixel do centro da cidade e no

Aeroporto. Quando se consideram as médias móveis de 10 dias no período diurno

(fig. 8.3), essas diferenças são pouco acentuadas, especialmente no período mais frio do

ano, de Outubro a Março. Na segunda quinzena de Abril há uma anomalia negativa, em

que as temperaturas no centro são inferiores no Aeroporto, tendência que se inverte no

final de Maio e princípio de Junho. No período mais quente do ano, entre o final de

Junho e Setembro, o centro volta a ter as Tsdia inferiores ao Aeroporto.

Tem

pera

tura

de

supe

rfíc

ie (º

C)

-5

0

5

10

15

20

25

30

35

40

45

50

55

Dia

-5

0

5

10

15

20

25

30

35

40

45

50

55

Centro

Tem

pera

tura

s de

sup

erfíc

ie (º

C)

-505

10152025303540455055

Ago1998

Set Out Nov Dez Jan1999

Fev Mar Abr Mai Jun Jul

Aeroporto

Noi

te

-505

10152025303540455055

Ago1998

Set Out Nov Dez Jan1999

Fev Mar Abr Mai Jun Jul

Fig. 8.2 – Ritmo anual das temperaturas de superfície (Ts) diurnas e nocturnas no centro da cidade e no Aeroporto, no período de Agosto de 1998 e Julho de 1999.

Pode-se concluir que, em termos médios, há dois comportamentos térmicos

distintos nas temperaturas de superfície diurnas: no período mais frio do ano as

superfícies no centro da cidade apresentam temperaturas semelhantes às estimadas no

Aeroporto de Lisboa. Isto resulta de uma alternância nítida de dias mais quentes no

centro outros de Ts superior no Aeroporto, mas são escassos os dias de diferenças muito

acentuadas (superiores a 2ºC). Há no entanto uma ligeira tendência para o norte da

cidade se encontrar mais frio do que o centro (média móvel geralmente inferior a

Page 260: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 8 –A ilha de calor de superfície de Lisboa

- 259 -

0,5ºC). Durante a Primavera as diferenças acentuam-se, ora com balanço positivo para o

Aeroporto em Abril, ora verificando-se o oposto em Maio e no início de Junho. Durante

os dias de Verão, as superfícies do centro da cidade encontram-se, em média, 2 a 4 ºC

mais frias do que na periferia, resultando numa ilha de frescura tal como acontece com a

temperatura do ar ALCOFORADO (1992).

-10

-8

-6

-4

-2

0

2

4

6

8

10

Ago-98

Set-98

Out-98

Nov-98

Dez-98

Jan-99

Fev-99

Mar-99

Abr-99

Mai-99

Jun-99

Jul-99

Dife

renç

as d

e te

mp.

Sup

erf.

Os valores negativos representam temperaturas de superfície no interior de Lisboa inferiores ao Aeroporto e vice-versa.

Média móvel de 10 dias

Fig. 8.3 – Diferença da temperatura de superfície diurna (Tsdia), entre o centro de Lisboa e o Aeroporto

4.2.2 DIFERENÇAS NOCTURNAS (TSNOITE)

Durante a noite, a situação é distinta da diurna. Praticamente durante todo o

período estudado há uma anomalia positiva, ou seja as superfícies encontra-se

normalmente mais quentes no centro da cidade. Apenas em 9 % das noites se verificou

um anomalia negativa (fig. 8.4). As maiores diferenças verificaram-se entre o final de

Novembro e o principio de Março, correspondendo, grosso modo, ao período mais frio

do ano. No período em que há um maior aquecimento da atmosfera as diferenças nas

temperaturas da superfície atenuam-se, poucas vezes excedendo ± 2ºC.

Fevereiro de 1999 foi o mês onde a anomalia positiva foi muito acentuada, com

um máximo de 9ºC de diferença (média móvel de 4ºC). Esta situação extrema será

analisada mais adiante, através de vários perfis térmicos na cidade.

Page 261: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte II – Ilha de calor urbana de superfície e balanço energético em Lisboa

- 260 -

Este ensaio permite confirmar que, de uma forma geral, os padrões térmicos das

superfícies assemelham-se aos das temperaturas do ar em Lisboa, como já tinha sido

referido por ALCOFORADO (1985), numa análise efectuada a partir de uma termografia

de alta resolução numa noite de Inverno.

Confirma-se a concordância entre o aumento das temperaturas mínimas médias

do ar no Inverno no centro da cidade, com o aumento das temperaturas de superfície

nocturnas naquele local e estação do ano. Também a anomalia negativa das temperatura

máximas do ar na cidade durante o Verão, encontra correspondência nas temperaturas

de superfície mais baixas

-10

-8

-6

-4

-2

0

2

4

6

8

10

Ago-98

Set-98

Out-98

Nov-98

Dez-98

Jan-99

Fev-99

Mar-99

Abr-99

Mai-99

Jun-99

Jul-99

Dife

renç

as d

e te

mp.

Sup

erf.

Os valores positivos representam temperaturas de superfície no interior de Lisboa superiores ao Aeroporto e vice-versa.

Média móvel de 10 dias

Fig. 8.4 – Diferença da temperatura de superfície nocturna (Tsnoite), entre o centro de Lisboa e o Aeroporto

A anomalia média positiva de Inverno (cerca de 2 a 3ºC), que revela uma cidade

mais quente do que os arredores, característica da ilha de calor urbana, é ultrapassada

pela anomalia das temperaturas de superfície. Nos três meses mais frios (Dezembro a

Fevereiro), a média das Ts nocturnas foi de 3,5 ºC. Esta diferença está de acordo com

resultados obtidos por LÓPEZ GARCÍA et al. (1991) na cidade espanhola de Valência,

embora neste caso as temperaturas de superfície sejam 1,8 a 2ºC mais elevadas do que

as temperaturas do ar.

Conclui-se que, no ano que se analisou, há uma forte correspondência entre os

padrões e ritmos da ilha de calor do ar e da superfície.

Page 262: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 8 –A ilha de calor de superfície de Lisboa

- 261 -

4.2.3 ANÁLISE ESTACIONAL DAS DIFERENÇAS DE TS ENTRE O CENTRO DA CIDADE E A

PERIFERIA

Na figura 8.5 apresenta-se a frequência de dias em que a temperatura de

superfície num dos locais escolhidos (centro ou Aeroporto) foi superior ao outro. No

Outono e no Inverno, predominam largamente as situações em que as Ts nocturnas são

superiores no centro (80 e 70% dos dias). Na Primavera inverte-se esta tendência com

uma diminuição acentuada daquele valor, verificando-se um ligeiro aumento em Abril

do número de noites em que a superfície do Aeroporto está mais quente do que o centro

da cidade.

Fig. 8.5 – Ajustamentos polinomiais da frequência de dias em que as temperaturas de superfície num dos

locais (centro da cidade ou Aeroporto) é superior ao outro, no período de Agosto de 1998 a Julho de 1999.

A percentagem de dias em que as superfícies do centro de Lisboa se encontram mais

quentes do que o Aeroporto ocorre na época mais fria do ano, com um máximo que

0

10

20

30

40

50

60

70

80

90

100

Ago-98 Set-98 Out-98 Nov-98 Dez-98 Jan-99 Fev-99 Mar-99 Abr-99 Mai-99 Jun-99 Jul-99

Verão Verão Outono Primavera Inverno

% de dias em que Ts no centro de Lisboa é superior ao Aeroporto.

% de noites em que Ts no centro de Lisboa é superior ao Aeroporto.

% de dias em que Ts no Aeroporto é superior ao centro de Lisboa.

% de noites em que Ts no Aeroporto é superior ao centro de Lisboa.

Page 263: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte II – Ilha de calor urbana de superfície e balanço energético em Lisboa

- 262 -

ultrapassa os 50% no final do Outono, mantendo-se com frequências superiores a 40%

no Inverno e na Primavera. Com alguma frequência as Ts diurnas no Aeroporto são

superiores ao centro, com um máximo no final do Inverno em mais de 30 % dos casos

observados.

No Verão estas relações alteram-se. O número de noites em que o centro de

Lisboa está mais quente é muito mais baixo do que na estação fria (com um mínimo de

cerca de 40 %). Durante o dia, é a periferia que frequentemente regista temperaturas

mais elevadas (cerca de 80% dos casos), mostrando novamente a tendência estival para

o aparecimento da ilha de frescura no tecido urbano. Esta situação mantém-se até ao

início de Outubro, altura em que se retoma a maior frequência de situações propícias à

ocorrência da ilha de calor de superfície em Lisboa.

Em conclusão, pode afirmar-se que se forma regularmente uma ilha de calor

urbano nocturno de superfície, especialmente durante o período mais frio do ano. São

pouco frequentes as situações em que as superfícies da periferia se encontram mais

quentes do que o centro da cidade. Durante o dia essa frequência é menor do que

durante a noite. No Verão há uma grande diminuição do número de noites em que

centro da cidade está mais quente, enquanto é mais frequente a periferia aquecer durante

o dia.

4.2.4 OS PERFIS DAS TEMPERATURAS DE SUPERFÍCIE EM FEVEREIRO DE 1999

As observações da ilha de calor urbano de superfície ficaria incompleta se

apenas se analisassem as características térmicas no Aeroporto e no centro da cidade.

Fizeram-se três perfis térmicos que atravessam a região de Lisboa de norte para sul e

dois de oeste para leste (fig. 8.6). Omitiram-se os pixel junto ao Tejo para evitar

qualquer “contaminação” das temperaturas da água do estuário, que poderiam distorcer

a análise. Escolheram-se as temperaturas de superfície nocturnas de Fevereiro de 1998

por ser o mês em que se observaram as maiores diferenças entre o centro da cidade e a

periferia (fig. 8.4).

Page 264: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

- 263 -

Perfil 1 NORTE/SUL

0

2

4

6

8

10

12

Norte Lisboa Monsanto Sul

média TS (ºC)

0.0

0.5

1.0

1.5

2.0

2.5

3.0

3.5

4.0

DP TS (ºC)

Perfil 4 OESTE/LESTE

0

2

4

6

8

10

12

Oeste Lisboa Leste

m édia TS (ºC)

0.0

0.5

1.0

1.5

2.0

2.5

3.0

3.5

4.0

DP TS (ºC)

Perfil 2

0

2

4

6

8

10

12

Norte Lisboa Tejo Sul

m é dia TS (ºC)

0.0

0.5

1.0

1.5

2.0

2.5

3.0

3.5

4.0

DP TS (ºC)

Perfil 5

0

2

4

6

8

10

12

Oeste Lisboa Monsanto Leste

m édia TS (ºC)

0.0

0.5

1.0

1.5

2.0

2.5

3.0

3.5

4.0

DP TS (ºC)

médiaDesvio padrãoAltitude

Perfil 3

0

2

4

6

8

10

12

Norte Lisboa Sul

m é dia TS (ºC)

0.0

0.5

1.0

1.5

2.0

2.5

3.0

3.5

4.0

DP TS (ºC)

Fig. 8.6 – Perfis das temperaturas de superfície nocturnas em Lisboa, em Fevereiro 1999. À direita encontra-se a localização dos perfis.

5

Perfil 1

2

3

4Aeroporto

Centro

Serra de Sintra

Monsanto

0 5 km

Alt. (m)

Depressãode Loures

Depressão de Loures

Tejo Depressão de Loures

Aeroporto

Depressão de Loures

Page 265: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte II – Ilha de calor urbana de superfície e balanço energético em Lisboa

- 264 -

O perfil 1 (norte/sul) situa-se na parte ocidentental da área em estudo. Nele se

observa uma tendência para a subida de Tsnoite para sul. Esta tendência é fortemente

incrementada no parque florestal de Monsanto, acentuando-se até ao rio Tejo. A

diferença de temperatura entre o norte da região e o sul da cidade é de cerca de 4 ºC. Na

margem sul do Tejo, ainda pouco urbanizada junto às colinas de Almada, a temperatura

é mais baixa do que nos bairros do sudoeste de Lisboa. Não parece existir uma relação

entre o aparecimento da ilha de calor e a variabilidade de Tsnoite. O desvio padrão apenas

aumenta ligeiramente nas áreas deprimidas, como é evidente na depressão de Loures.

Os fundos de vale estão assim sujeitos a maior variabilidade térmica devida a episódios

de acumulação de ar frio (LOPES, 1998).

O perfil 2 “atravessa” as áreas periféricas do norte de Lisboa, a depressão de

Loures e o centro da cidade. Nota-se claramente uma ilha de calor confinada à área

urbana, interrompida pelo Tejo. A diferença de temperatura entre a periferia e o centro

da cidade é de cerca de 5ºC.

Nos dois perfis analisados são evidentes as temperaturas de superfícies

nocturnas mais baixas na depressão de Loures (0,5 a 1 ºC), em relação às áreas

envolventes.

O perfil 3, localizado na zona oriental da cidade, junto ao estuário do Tejo,

continua a mostrar um forte aquecimento no sul, embora com um gradiente menos

acentuado do que a ocidente (≈ 3ºC). É de notar o aumento da Tsnoite numa elevação

entre a depressão de Loures e a zona do Aeroporto, acompanhado de uma menor

variabilidade térmica. Conclui-se que, se as superfícies das áreas deprimidas têm

temperaturas mais baixas, devido à acumulação de ar frio, o arrefecimento da atmosfera

nos topos não é causado pelo contacto com as superfícies frias, mas por outros factores,

como o vento.

Os dois perfis oeste/leste (4 e 5) mostram claramente as diferenças de

temperaturas de superfície entre o norte e o sul da cidade. No norte (perfil 4), não há

praticamente variações com a temperatura média em torno dos 6º C em toda a área. A

variabilidade no mês de Fevereiro é baixa, em torno de 1º C. No Sul da cidade a

temperatura aumenta para 8ºC, sendo a Ts mais elevada na zona oriental.

Page 266: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 8 –A ilha de calor de superfície de Lisboa

- 265 -

Em conclusão pode dizer-se que existem dois gradientes térmicos de superfície:

um norte/sul, que indica uma cidade com superfícies cada vez mais quentes à medida

que se “progride” para o centro; outro gradiente oeste/leste, apenas visível no perfil sul,

mostrando o sudeste da cidade ligeiramente mais quente.

Os padrões térmicos de superfície são semelhantes ao da ilha de calor do ar,

permitindo concluir que, no geral, as duas ilhas de calor têm ritmos e características

idênticas. Falta apurar se se mantêm as mesma características em função dos tipos de

tempo correspondentes ao período analisado. Em trabalhos futuros será necessário isolar

grupos de imagens segundo os tipos de tempo que se fizeram sentir, utilizando critérios

objectivos e utilizar outros locais dentro e fora da cidade que permitam reconhecer

melhor os gradientes das ICU.

5. CONCLUSÕES

A Ilha de calor urbano é um dos padrões térmicos característicos do clima das

cidades, reconhecido por ser uma das mais evidentes formas de alteração climática

provocada inadvertidamente pelo Homem. Têm sido identificadas, em todo o Mundo,

até em cidades pequenas com menos de 10 000 habitantes. No espaço construído, as

temperaturas são geralmente mais elevadas do que nos arredores, frequentemente áreas

agrícolas, florestais, ou apenas devolutos.

Nem sempre sobre as superfícies mais aquecidas se encontram as temperaturas

do ar mais elevadas, porque estas resultam da interacção complexa entre o balanço

radiativo, a energia disponível para os fluxos de calor turbulento e os ventos locais.

Alguns autores confundem a ilha de calor da atmosfera urbana inferior (ICUar) com a

ilha de calor da superfície (ICUsup), sem mostrar a relação entre ambas. Em algumas

cidades, estes dois padrões térmicos têm génese e ritmos distintos e por isso não se

devem confundir. Mas será que, à escala regional, essas diferenças existem, ou as

condições de cada cidade impedem uma generalização desta ideia?

As causas da ICU foram suficientemente descrita por diversos autores

(LANDSBERG, 1981; OKE, 1995; ALCOFORADO, 1992; ARNFIELD 2003). Neste capítulo,

tentou-se investigar as relações entre as “duas” ilhas de calor, comparando os resultados

Page 267: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte II – Ilha de calor urbana de superfície e balanço energético em Lisboa

- 266 -

do primeiro trabalho de fundo sobre a ilha de calor “do ar” em Lisboa (ALCOFORADO,

1988), com as temperaturas de superfície disponibilizadas através da Internet pelo

Deutschen Zentrum für Luft- und Raumfahrt (DLR), conhecidas por Land Surface

Temperatures (LST).

Mostraram-se alguns algoritmos para a estimação das temperaturas de superfície

(Ts), com num método conhecido por split window, baseado nas diferentes

transmitâncias dos canais 4 e 5 dos satélites NOAA-AVHRR. De entre as vantagens e

limitações das Ts (boa resolução temporal e aceitável resolução espacial em estudos de

clima regional, mas pouco adequadas para estudos locais), salientou-se o facto de se

tratar de um parâmetro físico modelado a partir das radiâncias registadas pelo sensor do

satélite e não uma grandeza física registada directamente, o que poderá ocasionar alguns

erros. Apesar disso a sua principal vantagem é, sem dúvida, o tratamento prévio

efectuado pelo DLR, que liberta o investigador das tarefas mais rotineiras, morosas e de

difícil implementação.

Em relação aos resultados obtidos neste trabalho realça-se, em primeiro lugar, a

concordância entre muitas das características da ICUar e da ICUsup. Estes resultados

estão de acordo com os obtidos por GALLO (1999), em várias cidades americanas.

A principal diferença no ritmo anual das Ts é entre as temperaturas diurnas e

nocturnas, sendo o comportamento dos dois locais (centro da cidade e Aeroporto)

semelhantes. Nas temperaturas diurnas, as amplitudes mensais são mais marcadas, do

que durante a noite, onde o ritmo é mais “suavizado”. A amplitude de Ts nocturna

mensal raramente atinge 15ºC.

Durante o dia, as superfícies têm um comportamento térmico distinto. Enquanto

no Inverno as amplitudes mensais são fracas, na Primavera e no Verão podem atingir

amplitudes mensais próximas dos 25º. Ou seja, é no período mais quente do ano que as

superfícies respondem com um forte aquecimento ou arrefecimento.

As diferenças diurnas entre o centro da cidade e o Aeroporto são mínimas, entre

Outubro e Março, raramente ultrapassando 2ºC. Nessa época do ano, há uma tendência

para a periferia da cidade se encontrar ligeiramente mais arrefecida (em média cerca de

0,5ºC), o que se traduz numa ténue ICUsup no centro. Durante o Verão, o centro

Page 268: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 8 –A ilha de calor de superfície de Lisboa

- 267 -

encontra-se mais fresco (em média 2 a 4 ºC) do que a periferia, originando uma ilha de

frescura, facto que será analisado no próximo capítulo.

De noite e praticamente em todo o período analisado, no centro da cidade existe

uma ilha de calor, com um máximo no meses de Inverno, especialmente em Fevereiro

(Δmédia móvel ≈ 4ºC), intensidade que se atenua no Verão. O número de noites em que a

cidade está mais quente que a periferia é sobretudo evidente no período mais frio do

ano, atingindo valores entre 70 a 80 % no Outono e Inverno. Este valor decresce

bruscamente na Primavera e no Verão. Nesta estação do ano, diminui o número de

noites e dias em que o centro está mais quente, aumentando a frequência dos dias em

que o aquecimento diurno na periferia ultrapassa o do centro da cidade.

A observação das características da ilha de calor urbano de superfície não ficaria

completa sem uma análise espacial mais detalhada. Foram efectuados três perfis

térmicos norte/sul e dois oeste/leste. Esses perfis permitiram identificar um gradiente

térmico de superfície norte/sul mais elevado no centro da cidade e outro oeste/leste, que

mostra a parte sudeste ligeiramente mais quente.

Conclui-se que, no ano que se analisou, há uma forte correspondência entre os

padrões e ritmos da ilha de calor do ar e da superfície. Em futuros trabalhos, será

necessário proceder a uma análise baseada em tipos de tempo, que permitam confirmar,

ou não, as restantes características das ilha de calor urbano de Lisboa.

As características térmicas diurnas das superfícies, no Verão, serão

equacionadas no próximo capítulo, onde se aborda o balanço energético em Lisboa.

Page 269: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

- 269 -

CAPÍTULO 9

O BALANÇO ENERGÉTICO EM LISBOA A PARTIR DE IMAGENS DO SATÉLITE

LANDSAT 5: UM CASO DE VERÃO (19 DE AGOSTO DE 1994)

1. DETECÇÃO REMOTA DAS CARACTERÍSTICAS TÉRMICAS E ENERGÉTICAS DAS

SUPERFÍCIES URBANAS

O estudo das interacções energéticas entre os espaços que compõem a cidade e a

camada limite atmosférica urbana é fundamental para conhecer o ritmo e repartição dos

padrões térmicos e, de um modo geral, o clima urbano.

O conceito de balanço energético foi a primeira vez utilizado no final do século

XIX, num estudo sobre o clima térmico do solo por HOMÉN na Finlândia e por KRAUSS

na Baviera. SUNDBORG, em Uppsala, na Suécia, foi o primeiro autor que levou este

conceito para a climatologia urbana em 1951. As primeiras observações e modelos

numéricos, ainda muito simples, mas intuitivos, surgem na década de setenta do século

XX (OKE, 1988).

Na actualidade, a medição sistemática das grandezas físicas que compõem o

balanço energético em meio urbano é praticada na maior parte dos países europeus, mas

ainda é pouco frequente em Portugal. Em meio urbano, a multiplicidade de diferentes

superfícies e volumetrias tornam qualquer medição apenas representativa do local onde

Page 270: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte II – Ilha de calor urbana de superfície e balanço energético em Lisboa

- 270 -

é efectuada, podendo os resultados serem transpostos, com algumas reservas, para áreas

com características semelhantes.

Um dos métodos para estimar todas as grandezas envolvidas no balanço

energético consiste na utilização de um Modelo Digital do Terreno (para o cálculo da

radiação recebida) e imagens de satélite que registem as características radiométricas,

que permitam avaliar a quantidade de radiação reflectida e emitida pela superfície.

Uma boa resolução espacial das imagens de satélite é a primeira condição

necessária para que seja possível identificar, com detalhe, as diferentes superfícies

urbanas. A segunda condição é ter uma série suficientemente longa de informação,

obtida por sensores a bordo de satélites, com uma boa resolução temporal. No entanto,

ainda não existe uma solução que contemple as duas condições.

A situação ideal seria a utilização rotineira de sensores aerotransportados (do

tipos Daedalus) em voos de baixa altitude, que permitissem uma grande resolução

espacial e temporal. Tal não é possível devido aos elevados custos deste tipo de acções,

que necessitam de meios (aeronaves e sensores) e de uma logística de difícil

operacionalização. Apenas pontualmente se têm efectuado alguns voos, de extrema

importância para estudos de casos de clima urbano em cidades da Península Ibérica

(ALCOFORADO, 1985, em Lisboa e LOPEZ GOMEZ et al., 1998, em Madrid).

Os satélites comerciais são, neste momento, a melhor alternativa, embora

tenham características que não se coadunam com todas as necessidades dos estudos de

clima urbano, por não possuírem as duas condições necessárias (boa resolução espacial

e temporal). Os satélites mais utilizados nesta área são os da série NOAA-AVHRR e os

LANDSAT (5 e 7), porque ambos possuem canais visíveis e térmicos. A informação

enviada para a Terra pelos primeiros permite uma análise temporal fina, já que os que se

encontram actualmente em órbita49 efectuam várias passagens diárias sobre o mesmo

local. A sua fraca resolução espacial (cerca de 1,1 km) não permite caracterizar

pormenorizadamente as várias superfícies urbanas. Os satélites LANDSAT 5 TM,

49 Em 2003 encontram-se operacionais os NOAA 14, 15 e 16 (Goddard Space Flight Center/NASA)

Page 271: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 9 – O balanço energético em Lisboa a partir de imagens do satélite Landsat 5

- 271 -

utilizado neste trabalho, e LANDSAT 7 ETM+50, têm uma boa resolução espacial, mas

a repetição de uma cena, no mesmo local, apenas ocorre num intervalo de 16 dias e

durante a fase de aquecimento matinal51 (cerca das 10:00 horas, tempo local52). Apesar

disso, por permitir a caracterização das superfícies urbanas, a sua utilização é

fundamental para estudar o comportamento térmico e energético da cidade.

O desafio que se coloca em futuros trabalhos é a combinação da boa resolução

espacial dos satélites LANDSAT ETM+ com a repetição diurna e nocturna das imagens

NOAA-AVHRR. A finalidade é criar séries espaço temporais suficientemente longas e

detalhadas, para que os estudos do clima urbano baseados neste tipo de informação não

sejam apenas casos pontuais, mas verdadeiramente climáticos.

2. O BALANÇO DOS FLUXOS RADIATIVOS E ENERGÉTICOS

Muitos dos conceito abordados neste trabalho encontram-se descritos em vários

manuais de Climatologia e Meteorologia (OKE, 1987; STULL, 2000, SCHNEIDER, 1996).

A breve apresentação, que seguidamente se inclui, pretende apenas formular os

conceitos básicos, necessários para a interpretação dos resultados obtidos.

Começa-se por apresentar o balanço energético num sítio ideal, ou seja, num

local onde as trocas de energia se fazem na vertical, sem a interferência de outros

factores, como a inclinação e azimute das superfícies, a proximidade de edifícios e de

árvores. Esta abordagem é claramente a mais adequada quando se utilizam imagens de

satélite, porque o balanço energético é o resultado de fluxos que atravessam

perpendicularmente a superfície da Terra. No entanto, não permite calcular os fluxos em

volumetrias, simplesmente porque elas não são vistas pelos satélites de média resolução,

50 O LANDSAT 5 TM (com uma resolução de 30 metros no visível) possui uma resolução mais grosseirado canal térmico (120 m) do que o actual ETM+ que, no modo multiespectral, mantém a resoluçãoespacial de 30 m nos canais do visível mas aumenta, para 60 m, no IV térmico.51 A aquisição de imagens térmicas nocturnas é feita por pedido, tornando onerosa e difícil a suaaquisição.52 O satélite, na sua órbita descendente, de norte para sul, em cada passagem sobrevoa a Terra a umaaltitude de 705 km entre as 10:00 h e as 10:15 h, a uma velocidade de 7,5 km/seg. Cada órbita demoracerca de 99 m. O satélite completa 14 órbita por dia, cobrindo a Terra entre 81º de latitude norte e sulcada 16 dias (Landsat 7 Science Data Users Handbook, NASA, http://ltpwww.gsfc.nasa.gov/IAS/handbook/handbook_toc.html, última actualização em 8 de Agosto de 2003).

Page 272: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte II – Ilha de calor urbana de superfície e balanço energético em Lisboa

- 272 -

como o utilizado neste trabalho (LANDSAT 5) e portanto o modelo Euleriano53 é

impraticável. Por isso, a superfície, elemento fundamental do sistema solo/atmosfera

urbana, tem uma “espessura zero”, onde os termos da equação do balanço energético se

anulam (Stull, 2000). Nesta perspectiva não se introduzem as modificações do balanço

com a ocultação do céu (Sky view factor), ou ainda outros factores importantes no

sistema como a advecção e a turbulência, o que só seria possível à escala

microclimática. Por este motivo, o estudo da repartição dos fluxos é feito à escala da

cidade (regional), comparando-se os resultados em vários bairros de Lisboa com outros

locais dentro e fora da cidade (escala local).

Também as modificações devidas à nebulosidade não são abordadas no ponto

seguinte, porque as nuvens se encontram ausentes nas imagens tratadas de 19 de Agosto

de 1994. No entanto, são indicadas várias fontes bibliográficas onde se questiona o

tema.

A morfologia do terreno é o outro factor importante na modificação do balanço

de radiação local. O problema resume-se a questões de geometria entre o feixe solar e as

vertentes (declives e azimutes). No quadro 9.3 e na figura 9.5 apresenta-se a resolução

do problema neste trabalho, com recurso a um Sistema de Informação Geográfico.

No final desta introdução, apresenta-se um esboço sobre os meios e formulação

a utilizar para, de futuro, validar os resultados obtidos com as imagens de satélite.

2.1 OS FLUXOS RADIATIVOS E ENERGÉTICOS NUM SÍTIO IDEAL

Se considerarmos uma superfície horizontal, homogénea e extensa, sem

influência de movimentos horizontais, os fluxos energéticos podem ser considerados

uniformes e reduzidos à condição de movimentos verticais. Neste caso, o balanço

energético da superfície pode ser escrito:

Q* = QH + QE + QG (9.1)

53 O conceito do balanço energético, nesta perspectiva, compreende o transporte de energia através deradiação, advecção, turbulência e condução num volume estacionário (perspectiva Euleriana). O climaurbano frequentemente utiliza esta abordagem quando a escala de análise é a microescala.

Page 273: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 9 – O balanço energético em Lisboa a partir de imagens do satélite Landsat 5

- 273 -

onde Q* é o balanço radiativo, QH e QE representam, respectivamente, os fluxos

turbulentos de calor sensível e latente e QG o fluxo de calor condutivo que entra ou sai

do material que constitui a superfície.

O balanço radiativo (Q*) é a componente mais importante de troca energética

porque, para a maior parte dos sistemas, representa a maior fonte de energia disponível.

Durante o dia, é a soma das fracções individuais de radiação em pequeno e grande

comprimento de onda:

(Q*) = K - K + L - L (W m-2) (9.2)

A radiação solar incidente (directa e difusa) ou global (K) é controlada pelos ângulos

de azimute ( ) e zénite solar ( )54. A radiação em pequeno comprimento de onda,

reflectida pela superfície (K), depende da quantidade de energia incidente (K), e do

albedo da superfície (alb)55:

K = K · alb (W m-2) (9.3)

Dado que a superfície é opaca à radiação em pequeno comprimento de onda, a

porção de K que não é reflectida é absorvida. O balanço radiativo de pequeno

comprimento de onda escreve-se:

K* = K - K = K · (1 – alb) (W m-2) (9.4)

54 O angulo solar zenital ( ) é o angulo formado pela direcção dos raios solares e a direcção zenital, sendoesta a extensão da linha imaginária que une o centro da Terra e um ponto à superfície. O seu angulocomplementar ( = 90º- ) é a altura solar (angulo formado entre o feixe de raios solares e o horizontelocal). O azimute solar ( ) é o angulo formado entre o feixe de raios solares e a direcção Norte,projectado no plano da horizontal do lugar. É medido no sentido dos ponteiros do relógio a partir doNorte (0-360º).55 O albedo é a razão entre a quantidade de radiação solar reflectida por um corpo e o total incidente sobreesse corpo.

Page 274: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte II – Ilha de calor urbana de superfície e balanço energético em Lisboa

- 274 -

Na ausência de nuvens, a radiação emitida pela atmosfera em grande

comprimento de onda e recebida pela superfície (L) depende da temperatura e da

emissividade56 da atmosfera de acordo com a Lei de Stefan-Boltzmann:

L = · ·Tatm4 (W m-2) (9.5)

onde é a emissividade, a constante de Stefan-Boltzmann = 5,67 · 10-8 (W m-2 K-4) e

Tatm a temperatura da atmosfera em K.

A radiação emitida pela superfície (L) é governada pela mesma lei e depende

portanto também da sua emissividade e temperatura. Deve-se tomar em conta que há

uma parte da radiação em grande comprimento de onda incidente (L) que é reflectida

pela superfície, levando a que:

L = · ·Ts4 + (1 - ) · L (W m-2) (9.6)

Como a emissividade das superfícies na cidade é tipicamente superior a 0,90 a

reflexão em grandes comprimentos de onda é muito fraca e portanto o segundo termo da

direita pode ser desprezado.

O balanço de radiação em grande comprimento de onda é então:

L* = L - L (9.7)

Devido à ausência de radiação solar durante a noite, o balanço radiativo

nocturno reduz-se a:

(Q*) = L - L = L* (9.8)

Num determinado local os termos da radiação que incide na superfície

(K e L) variam pouco espacialmente, porque dependem dos movimentos

56 A emissividade é a razão entre a energia radiante emitida pela superfície, num dado comprimento deonda e temperatura e a energia radiante emitida por um corpo negro nas mesmas condições.

Page 275: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 9 – O balanço energético em Lisboa a partir de imagens do satélite Landsat 5

- 275 -

atmosféricos de escala sinóptica57) e das relações geométricas entre a Terra e o Sol. Pelo

contrário, a reflexão terrestre (K) e a radiação emitida pela superfície (L) são

comandadas por factores locais, a primeira pelo albedo e a segunda pela temperatura de

superfície e emissividade.

Sendo o balanço radiativo a principal entrada de energia de um sistema, não é,

no entanto, o seu resultado final. É contrabalançado pelas trocas energéticas entre as

superfícies e a atmosfera efectuadas pelos fluxos convectivos de calor sensível (QH),

latente (QE) e pela condução de calor do, ou para o solo (QG).

O Fluxo de calor latente (QE) corresponde à quantidade de calor libertado ou

absorvido por um sistema na mudança de fase da água, por unidade de massa. Os

processos evaporativos de que depende QE, são o resultado da disponibilidade de água,

de energia para proceder à sua mudança de fase, da existência de uma gradiente de

vapor e da turbulência atmosférica para transportar o vapor.

As perdas evaporativas são intensas durante o dia, podendo continuar a um ritmo

reduzido durante a noite. Em certas circunstâncias, esta perda pode ser interrompida e a

água retorna à superfície sob a forma de orvalho, geada e obviamente, sob a forma de

precipitação.

O fluxo de calor latente pode escrever-se:

zvKvLvQE

(9.9)

onde Lv é o calor latente de vaporização58, Kv é a difusividade turbilhonar do vapor de

água (m2 s-1) e v é a massa volúmica do vapor (quantidade de vapor de água contida

no ar, ou humidade absoluta, em g m-3).

O fluxo de calor sensível (QH), está associado à mudança de temperatura do

termómetro seco e é normalmente descrito como o calor sentido pelos seres vivos.

57 Consultar a figura ii da Introdução.58 À temperatura de 0º C, a energia necessária para realizar a mudança de fase da água do estado líquidopara vapor de água ou vice versa (evaporação ou condensação), corresponde a 2,50 MJ kg-1 (7, 5 vezes

Page 276: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte II – Ilha de calor urbana de superfície e balanço energético em Lisboa

- 276 -

O fluxo de calor sensível pode escrever-se:

)(z

KCaQH H

(9.10)

em que Ca é a capacidade calorífica do ar, KH é a conductividade turbilhonar (m2 s-1) e

a temperatura potencial (K).

Uma forma eficaz de relacionar os dois fluxos de calor turbulento é através do

quociente de Bowen (BR, Bowen Ratio):

QEQHBR (9.11)

Se BR for superior à unidade, QH é mais eficiente a dissipar o calor. Isto ocorre

em superfícies onde a quantidade de água disponível é limitada, porque a maior parte do

calor libertado por convecção se faz sob a forma sensível, a atmosfera tende a aquecer.

Se QE for superior a QH (BR < 1), o input de calor para a atmosfera faz-se

predominantemente sob a forma latente. Pode não contribuir directamente para o

aquecimento da atmosfera junto ao solo, mas aumenta a sua humidade. A atmosfera

pode ficar mais “fresca” e húmida.

Valores negativo de BR indicam que os dois fluxos têm sinais diferentes. Isto

pode ocorrer durante a noite quando o fluxo de calor sensível é negativo (descendente)

mas evaporação da água a partir da superfície continua (QE > 0).

Alguns valores típicos deste quociente, em diferentes tipos de ocupação do solo,

são apresentados no quadro 9.5.

O fluxo de calor armazenado nas superfícies, ou fluxo de calor conductivo (QG),

é comandado por quatro propriedades térmicas: a conductividade, a capacidade

mais do que na mudança de fase do gelo para água). A 10 ºC necessita de 2,48 MJ kg-1 e a 30º C,2,43 MJ kg-1.

Page 277: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 9 – O balanço energético em Lisboa a partir de imagens do satélite Landsat 5

- 277 -

calorífica, a difusividade e a admissão térmica. O calor é conduzido para as superfícies

durante o dia e destas para a atmosfera durante a noite, podendo escrever-se:

)()(

12

12

zzTTk

zTkQG s

ss

(9.12)

onde ks é a conductividade térmica (W m-1 K-1) que é uma medida da capacidade de

uma substância conduzir calor. Os números subscritos indicam diferentes níveis no solo.

Sendo QG proporcional ao balanço de radiação, pode-se obter uma boa

aproximação utilizando:

QG = X ·Q* (9.13)

sendo X=0,1 durante o dia e 0,5 de noite.

Na figura 9.1, apresenta-se um esquema com as direcções das grandezas físicas

do balanço energético no seu ritmo diário. Embora este esquema seja elucidativo,

existem “várias” convenções59 para designar as mesmas direcções dos vários fluxos

envolvidos (através de sinais positivos e negativos dos termos), cabendo aqui deixar

claro o critério seguido neste trabalho.

É frequente o aparecimento de esquemas semelhantes ao da figura 9.1, para

mostrar que a radiação diurna tem duas componentes descendentes que incidem na

superfície (a radiação solar em pequeno comprimento de onda- K e a contrairradiação

atmosférica, em grande comprimento de onda - L ) e duas que a deixam (a reflexão -

K e emissão terrestre - L ). Como se sabe, durante a noite apenas ocorrem radiações

em grande comprimento de onda, por não existir radiação solar. Segundo OKE (1987), o

balanço radiativo Q* é positivo quando representa um ganho para a superfície (durante

o dia) e negativo quando representa uma perda (de noite). Os fluxos não radiativos do

lado direito da igualdade que saem da superfície são positivos, ou seja, quando

59 A existência de várias convenções reclamadas por diversos autores é uma contradição, porque porconvenção entende-se a uniformização de conceitos num único sistema. Veja-se, por exemplo, asdiferenças nos trabalhos de Oke (1987) e Stull (2000).

Page 278: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte II – Ilha de calor urbana de superfície e balanço energético em Lisboa

- 278 -

representam perdas de calor da superfície e negativos quando se traduzem em ganhos

energéticos para a superfície.

Fig. 9.1 – Balanço energético num sítio plano (extraído de OKE, 1987).

Quando os dois lados da equação são positivos, os valores descrevem o modo

como o superavit radiativo é repartido pelas perdas da superfície e da atmosfera, o que é

o caso mais comum da situação diurna. Quando os dois lados são negativos a equação

representa como o défice radiativo da superfície é repartido entre o calor ganho pela

superfície e pela atmosfera (situação nocturna).

STULL (2000) define o sinal dos termos do balanço energético segundo a sua

direcção na vertical: se são descendentes têm o sinal negativo (Q* e QG) e são positivos

no sentido ascendente, quando deixam a superfície. Assim a equação 9.1 pode ser

escrita da seguinte forma:

-Q*=QH+QE-QG (9.14)

O curso diário das grandezas atmosférica apresentadas graficamente através

destas duas versões são distintas, na medida em que OKE (e os outros autores que

seguem a sua metodologia de apresentação) representam os fluxos com valores

positivos durante o dia e negativos de noite (expecto nos casos em que QE continua a

Page 279: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 9 – O balanço energético em Lisboa a partir de imagens do satélite Landsat 5

- 279 -

ser libertado durante a noite, mantendo-se positivo). STULL prefere mostrar os fluxos

descendentes com valores negativos durante o dia (Q* e QG), e os restantes com o sinal

positivo e vice-versa durante a noite.

Tratando-se de fluxos, que podem sair ou entrar de um sistema para outro (da

atmosfera para o solo, ou vice-versa), a forma mais correcta de representação dos sinais

de todas as componentes da equação 9.14 é através deo símbolo (±).

Já que se trata de grandezas físicas em escala de razão, o importante é

compreender o sentido dos fluxos, e o seu curso diário. Neste trabalho, porque os dados

são referentes apenas às 10:00 horas, tempo local, aproximado da passagem do

LANDSAT 5, e não se representa o curso diário dos fluxos, todos eles são apresentados

como positivos, referindo-se sempre quando se tratam de perdas e ganhos para a

superfície, para se compreenderem as diferenças nos vários bairros da cidade e nos

diferentes tipos de ocupação.

2.2 PROPOSTA DE VALIDAÇÃO DE RESULTADOS COM MEDIÇÕES DOS TERMOS DO

BALANÇO ENERGÉTICO

Como se referiu anteriormente, em Lisboa não se efectuam medições

sistemáticas das grandezas físicas do balanço energético em meio urbano (com

excepção da radiação solar). O seu registo seria fundamental para compreender melhor

o clima urbano de Lisboa e para se validarem com maior segurança os resultados

obtidos. Por isso, apresenta-se um esquema sintético de como se poderiam

operacionalizar essas medições (fig. 9.2). Resumidamente, podem-se medir os fluxos de

calor sensível e latente com dois termo-higrógrafos (registadores da temperatura do

ar – T1 e T2 e da humidade – r1 e r2) colocados numa torre em alturas diferentes, um

prato sensor do fluxo de calor no solo e um piranómetro e um pirgeómetro para medir

os fluxos radiativos em pequeno e grande comprimento de onda.

Vários trabalhos foram já apresentados com o cálculo do balanço radiativo em

Lisboa (LOPES, 1999; ANDRADE E LOPES, 1999; ANDRADE, 2000). Remete-se para a sua

leitura para pormenores técnicos.

Page 280: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte II – Ilha de calor urbana de superfície e balanço energético em Lisboa

- 280 -

Muitas observações mostraram que o fluxo de calor sensível e a humidade são

proporcionais respectivamente ao gradiente vertical da temperatura potencial ( ) e ao

gradiente vertical da razão de mistura (r - gramas de vapor de água por kg de ar seco)

nos primeiros 20 m da CLA junto ao solo (STULL, 2000).

Fig. 9.2 – Esquema de medição das grandezas físicas para obtenção dos termos do balanço energético.

O quociente de Bowen pode ser rescrito:

rBR

(9.15)

onde é a constante psicrométrica,

= Cp/Lv = 0,4 (g vapor de água/kg ar) (9.16)

sendo Cp o calor específico do ar a uma pressão constante e Lv o calor latente de

condensação ou de vaporização. A temperatura potencial é dada pela seguinte equação:

= T2-T1 + (0,0098 K m-1) · (z2-z1) (9.17)

sendo o gradiente vertical da razão de mistura:

Prato sensor do fluxode calor condutivo

T1 , r1

T2 , r2

z 2

z 1

Termo-higrógrafo 1

Termo-higrógrafo 2

Piranómetro e pirgeómetro Q*

K , K L - L

Torr

e

Page 281: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 9 – O balanço energético em Lisboa a partir de imagens do satélite Landsat 5

- 281 -

r = r2-r1 (9.18)

Assim o fluxo de calor sensível pode rescrever-se:

1

*9,0

r

QQH (9.19)

e o fluxo de calor latente,

1

*9,0

r

QQE (9.20)

O fluxo de calor armazenado (QG) poder ser estimado a partir da equação 9.12,

se se conhecer a conductividade térmica do material que compõe a superfície e o

gradiente vertical da temperatura no solo. No entanto, a variabilidade da conductividade

dos materiais no local de medição poderá tornar este método impraticável. Medir o

fluxo directamente através de um sensor do fluxo de calor conductivo (soil heat flux

plate) será uma forma mais correcta de obter QG. Algumas questões práticas sobre a

utilização deste tipo de aparelhos aparelho podem ser consultadas em OKE (1987).

3. ASPECTOS TÉCNICOS E METODOLÓGICOS

A espacialização do balanço energético e de todas as suas componentes na

cidade e nas áreas suburbanas requer a utilização de diversos modelos, cuja formulação

se encontra reunida nos quadros 9.3 e 9.4 e a resolução prática com um SIG nas figuras

9.5 e 9.7. A modelização, já testada noutros locais da Europa (PARLOW, 1998, 1999), é

complexa e requer em cada passo uma reflexão sobre os resultados e a sua validação,

antes de se passar à etapa seguinte. Embora a validação ainda seja difícil de realizar,

Page 282: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte II – Ilha de calor urbana de superfície e balanço energético em Lisboa

- 282 -

porque não existem valores observados, é possível minimizar os erros de estimação

confrontando os resultados obtidos com os esperados e verificando-se, em cada

momento, se se encontram entre limiares lógicos e aceitáveis. No final do capítulo

propõem-se alguns caminhos a seguir em futuras investigações, para se poder dar um

passo qualitativo no estudo dos fluxos energéticos em Lisboa e explicar a repartição e

ritmos dos padrões térmicos já conhecidos, como a(s) ilha(s) de calor e/ou frescura

urbanas em Lisboa.

3.1 INFORMAÇÃO E MEIOS UTILIZADOS

A espacialização das grandezas físicas estimadas foi obtida com recurso a um

SIG (Idrisi 32 v. 2) e uma imagem de Verão do satélite LANDSAT 5 TM.

A. Informação de base:

a) Um Modelo Digital do Terreno com a resolução de 5,2 m. Todas as

variáveis morfométricas, necessárias ao cálculo do balanço radiativo

(declives e azimutes das vertentes), foram determinadas a partir deste MDT.

b) Uma imagem LANDSAT 5 TM (composta por 7 canais) de 19 de Agosto de

1994. No quadro 9.1, apresentam-se algumas das características deste satélite

e possíveis aplicações nas ciências da Terra.

As imagens LANDSAT 5 foram referenciadas para o sistema do MDT

(quadrícula UTM, zona 29 S, correspondente à Carta Militar de Portugal na escala

1:25 000), sendo linearmente transformadas com uma técnica de reamostragem do tipo

vizinho próximo (nearest neighbour). Esta operação foi necessária devido às diferentes

resoluções espaciais da informação de base (5,2 m do MDT e 30 m nos canais 1 a 5 e 7

e 120 m no canal 6 - IV térmico do LANDSAT 5 TM).

Page 283: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

- 283 -

Quadro 9.1 - Algumas características e possíveis utilizações dos canais dos satélites LANDSAT 4 e 5 TM

Canais Resoluçãoespacial

(m)

Comprimentode onda (m) Características Possíveis utilizações

1 30 0,45 - 0,52Regista a radiação azul do espectro,com maior poder de penetração naágua.

Boa diferenciação entre o solo e a vegetação. Cartografia das áreas costeiras. Diferenciação na turvação das águas estuarinas e marinhas.

2 30 0,52 - 0,60

Máxima reflexão do verde, notando-seas áreas cobertas de vegetação emcontraste com os espaços construídose as rochas e solos desnudados.

Este canal permite observar a vitalidade das plantas e identificar culturas. A turvação da água, junto aos estuários, ainda é bem visível . Nas áreas urbanas, boa distinção entre ruas e prédios.

3 30 0,63 - 0,69

Can

aisd

ovi

síve

lRegista a radiação vermelha. Mínimode reflexão do verde e da vegetaçãosaudável. Canal de absorçãoclorofilina.

Discriminação da vegetação e diferenciação entre as plantas. Identificação de culturas. Limites entre solos e unidades geológicas. Na faixa litoral, a areia seca das praias e das dunas brancas distinguem-se da areia molhada

dos bancos deltaicos e das dunas cinzentas. nitidez das formas lagunares.

4 30 0,76 - 0,90 Infravermelho próximo.Máximo de reflexão da clorofila.

Tipos de vegetação e sua vitalidade. Quantidade de biomassa. Diferenciação entre campos cultivados e terra/água. Boa definição das áreas húmidas (sapais), canais de maré , dos cursos de água e da linha de

costa. Humidade dos solos.

5 30 1,55 - 1,75Infravermelho médio 60

Algumas rochas têm a sua reflexãomáxima neste comprimento de onda.

Melhor definição da linha de costa pela absorção quase total deste comprimento de onda pelaágua.

Humidade na vegetação e no solo. Cartografia geológica. Útil para diferenciar as nuvens da neve.

7 30 2,08 - 2,35

Infravermelho médio.Elevada sensibilidade à humidade. Oslocais mais húmidos aparecem como sefossem superfícies aquáticas. Asdiferenças de humidade nas vertentessoalheiras e umbrias são acentuadas.

Normalmente oferece a melhor imagem da linha de costa. Diferenciação das rochas. Conteúdo de água no solo e na vegetação Diferenças de humidade nas vertentes.

6 120 10,40 - 12,50 Infravermelho térmico. Temperatura das superfícies. Stress da vegetação. Actividade geotérmica.

Baseado em Moreira (1986)

60 Segundo BIRD (1990), este canal pertence ao pequeno comprimento de onda infravermelho, situando-se o infravermelho médio entre 3 e 5 m.

Page 284: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte II – Ilha de calor urbana de superfície e balanço energético em Lisboa

- 284 -

B. O mapa das “estruturas” urbanas e uso do solo para aplicação ao clima de

Lisboa:

A complexidade do meio urbano é devida a múltiplos padrões morfológicos

constituídos por diferentes formas, volumetrias, cores, materiais, etc., que interagem

com a atmosfera urbana. É dessa interacção que resultam os vários padrões climáticos,

por vezes tão distintos das áreas rurais adjacentes à cidade. O estudo do clima urbano

requer, por isso, uma atenção cuidada na concepção de uma ferramenta essencial como

é a caracterização da ocupação do solo urbano. Imagens de satélite e fotografias aéreas

são frequentemente utilizadas para produzir mapas conhecidos como de uso do solo. O

resultado final deste tipo de mapas representa a descrição física de um campo

bidimensional e não tem em conta o volume da cidade, entre o solo e o topo dos

edifícios que, como se viu na PARTE I, é um espaço de extrema complexidade. Por isso,

é difícil incluir a atmosfera urbana, que tem determinadas características volumétricas,

numa representação bidimensional. Mas é essencial que se procure incluir a estrutura da

cidade nesse tipo de mapas, sem a qual os resultados serão apenas representativos do

nível do solo e não desse espaço tridimensional, que só à escala microclimática pode ser

completamente definido.

Apesar de, neste momento, se avançar rapidamente para encontrar a forma mais

adequada de se incluir a volumetria da cidade nos estudos de clima urbano de Lisboa

(uma das questões centrais no projecto CLIMLIS, actualmente em fase de conclusão), a

metodologia que aqui se apresenta foi uma das primeiras tentativas efectuadas e por isso

tem um valor relativo, mas que pretende contribuir para trabalhos futuros.

A metodologia, que se seguiu, para incluir a tridimensionalidade no mapa de

ocupação do solo urbano (fig. 9.3) consistiu na utilização dos valores de rugosidade (z0)

de Lisboa (PARTE I, fig. 5.4) e das imagens dos satélites LANDSAT e SPOT. Em vez

das “tradicionais” classes obtidas, através das características espectrais dos canais

visíveis desses satélites, foram as classes de rugosidade que serviram de áreas-amostra,

cada uma correspondente a esse parâmetro aerodinâmico, para efectuar várias

classificações assistidas. Foi utilizada a classificação que apresentou menos erros,

Page 285: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 9 – O balanço energético em Lisboa a partir de imagens do satélite Landsat 5

- 285 -

traduzindo o mapa final uma combinação entre as características espectrais de Lisboa

com as rugosidades típicas (LOPES E VIEIRA, 2001).

Nesse mapa, as densidades urbanas (médias e altas) correspondem,

respectivamente, às classes de rugosidade 0,5 e 1 m. Para a definição das áreas verdes foi

utilizado um índice de vegetação (NDVI), baseado na diferença dos valores entre o canal

próximo infravermelho, caracterizado por níveis elevados de reflectância e fraca absorção

das plantas verdes e o canal vermelho, onde a reflectância espectral é baixa e dominada pela

absorção. Este índice varia entre -1 e 1: os valores positivos mais elevados indicam um

aumento da actividade fotossintética e da densidade da vegetação. Os limiares das

classes de vegetação foram já testados e utilizados noutros trabalhos (LOPES, 1998;

ANDRADE e LOPES, 1998). As classes obtidas foram utilizadas na estimação do fluxo de

calor armazenado (QG).

C. Formulação dos parâmetros físicos:

a) Morfologia do terreno.

Os declives e os azimutes das vertentes foram calculados automaticamente a

partir do MDT com os algoritmos integrados no programa Idrisi v.32. Todas questões

técnicas envolvidas podem ser consultadas em EASTMAN (1997).

b) Grandezas físicas componentes dos balanços radiativo e energético.

Os algoritmos utilizados para a estimação destas grandezas foram obtidos de

diversas fontes. Para os valores de radiação utilizou-se a formulação publicada por

VEREIN DEUTCHER INGENIEURE (1994). O Factor de Turbidez Atmosférica de LINKE

(TL) de Lisboa, em Agosto, foi obtido com os valores publicados no sítio Internet do

Page 286: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte II – Ilha de calor urbana de superfície e balanço energético em Lisboa

- 286 -

η± Ì»¶±ß»®±°±®¬±

Íñ±½«°ò ܱ³·²¿²¬»`®»¿­ ª»®¼»­ ÒÜÊ× ðôïëóðòíð

_®»¿­ ª»®¼»­ ÒÜÊ×âðòíï

_®»¿­ «®¾ò ³7¼·¿ ¼»²­·¼¿¼»

_®»¿­ «®¾ò ¿́ ¬¿ ¼»²­·¼¿¼»

³

Fig. 9.3 – Grandes estruturas urbanas de Lisboa para aplicação climática.

Fig. 9.4 – Imagem de Lisboa em falsa cor, composta a partir dos canais 4, 5 e 7 (RGB) do satéliteLANDSAT 5 TM, de 19 de Agosto de 1994.

Page 287: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 9 – O balanço energético em Lisboa a partir de imagens do satélite Landsat 5

- 287 -

Groupe Télédétection et Modélisation, Centre d'Energétique de l’Ecole des Mines de

Paris (www-helioserve.cma.fr61).

Todos os parâmetros necessários para a calibração radiométrica dos canais

Landsat 5 foram obtidos da publicação Landsat Technical Notes (CLARK, 1986). Os

restantes algoritmos para a estimação das componentes do balanço energético foram

obtidos em OKE (1987) e PARLOW (2000).

Com a preocupação de limitar os erros de estimação e a dificuldade em obter

todos os parâmetros para o dia desejado, os valores de radiação solar obtidos com o

modelo utilizado foram confrontados com outros modelos (SBDART62, RayMan63 e

HELIOSERVE64). Os resultados parecem ser coerentes com os obtidos neste trabalho

(quadro 9.2). A maior diferença regista-se nos valores estimados para a emissão

terrestre com o RayMan, porque este programa assume uma temperatura de superfície

de 38,5º C, superior à média observada no canal térmico (305 K - 31,9 ºC). A

sobrestimação da radiação difusa no modelo utilizado é compensada pela substimação

da radiação directa, resultando num valor de radiação global aceitável em relação aos

outros modelos.

61 O programa Helioserve foi recentemente remodelado, estando agora integrado no projectoSoDa - Integration and exploitation of networked solar radiation databases for environment monitoring,supportado pela Comissão Europeia através do Information Society Technologies Research Programme(www.soda-is.com).62 O modelo SBDART (Santa Barbara DISORT Atmospheric Radiative Transfer - Tool for ComputingRadiative Transfer in the Earth's Atmosphere), é um programa desenvolvido pelo Institute forComputational Earth System Science da Universidade da Califórnia em Santa Barbara. Permite calcularos fluxos radiativos ascendentes e descendentes, num sítio plano, em qualquer ponto terrestre, dia do ano,hora (GMT) e altitude. É baseado em vários modelos mundialmente testados (LOWTRAN-7,MODTRAN-3) para vários tipos de atmosfera standard. A última versão data de 1998. Vejam-se outrascaracterísticas do programa em: http://arm.mrcsb.com/sbdart.63 O RayMan é um programa concebido para estimar parâmetros de conforto térmico dos indivíduos apartir do balanço radiativo (RUTZ, MATZARAKIS e MAYER, 2000).64 HELIOSERVE - Groupe Télédétection et Modélisation, Centre d'Energétique de l’Ecole des Mines deParis.

Page 288: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte II – Ilha de calor urbana de superfície e balanço energético em Lisboa

- 288 -

Quadro 9.2 – Comparação dos resultados obtidos neste trabalho com o SBDART,RayMan e HELIOSERVE, na altura da passagem do satélite LANDSAT 5 TM

( 10:00 h tempo local), em 19 de Agosto de 1994.

Modelo Radiação solar (pequeno comprimento de onda)W m-2

Rad. grandecomprimento onda

W m-2

Balançoradiativo

W m-2

Global (K) Directa Difusa Reflectida(K)

Atmosfera(L)

Terrestre(L) Q*

Utilizado 760 525 235 170 387 440 537

RAYMAN753

(- 0,9 %)

545

(+ 3,6 %)

208

(- 13 %)nc

360

(-7,5 %)

525

(+16,2 %)nc

HELIOSERVE730

(- 4,1 %)

526

+ 0,2 %)

204

(-15 %)nc nc nc nc

SBDART nc537

(+ 2,2 %)nc nc nc nc

488

(- 10 %)

No modelo utilizado, os valores correspondem a um local fora da cidade. Os valores entre parêntesisindicam as diferenças percentuais em relação ao modelo utilizado. As maiores diferenças, escritas anegrito, são explicadas no texto.

nc – valores não calculados pelo programa.

3.2 CONCEPTUALIZAÇÃO DO MODELO ENERGÉTICO EM MEIO URBANO

Devido à complexidade do modelo, é conveniente enunciar detalhadamente a

sua formulação. Nos quadros 9.3 e 9.4, é apresentado o formulário. As figuras 9.5 e 9.7

mostram o vasto trabalho prático realizado, que resultou num Sistema Informação

Geográfico/climático que se pretende continuar.

Por se considerar que o essencial se encontra nos quadros, apenas se fazem

breves referências metodológicas, que não se incluíram nos quadros ou figuras por falta

de espaço, ou para não tornar a sua leitura demasiado complexa.

A conceptualização do modelo resulta da combinação dos modelos clássicos de

transferência de energia com a informação contida nos canais do satélite LANDSAT 5

TM. Note-se que a utilização com os satélites mais recentes (neste momento o

Page 289: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 9 – O balanço energético em Lisboa a partir de imagens do satélite Landsat 5

- 289 -

LANDSAT 7 ETM+, que foi lançado em Abril de 1999), deverá ser acompanhada com

a actualização das constantes de calibração radiométrica publicadas pela NASA65.

Têm sido feitas algumas tentativas para estimar o albedo a partir de imagens de

satélite (BREST e GOWARD, 1987). No entanto, por causa da complexidade do problema,

a sua modelização merece uma nota explicativa: a utilização das reflectâncias

exoatmosféricas registadas pelos sensores (in-band planetary albedo), como medida

equivalente do albedo da superfície, carece de algum cuidado, na medida em que é

importante uma correcção para retirar o efeito de atenuação atmosférica, devido à

dispersão e absorção pelos gases e partículas que a compõem66. Para estimar o albedo

neste trabalho, foram utilizados os seis canais entre os 0,45 a 2,35 m (1 a 5 e 7). A

opção de utilizar os canais infravermelhos próximo e médio, conjuntamente com o

espectro visível, foi tomada por causa da grande área ocupada pela vegetação (cerca de

32 km2, considerando um NDVI superior a 0,15 – fig. 9.3). Esta tem valores baixos de

reflectância entre 0,3 e 0,7 m e um pico entre 0,7 - 1,3 m. Omitir esta parte do

espectro origina valores de albedo muito elevados nas áreas verdes, enquanto nos solos

sem vegetação ocorre uma substimação do albedo (CARLETON, 1991, confirmado

pessoalmente por BARNABY ROCKWELL, do United States Geological Survey).

Os resultados obtidos para o centro da Lisboa (entre 10 e 25%, com uma média

de 16,7% - fig. 9.6) estão de acordo com os valores apresentados para muitas outras

cidades (OKE, 1988), assemelhando-se por exemplo às norte americanas (12 a 23% e

16 % de média) e a Southampton e Portsmouth, no Reino Unido, que apresentam

valores médios cerca dos 17%.

65 Consultar a publicação electrónica “Landsat 7 Science Data Users Handbook” da NASA emhttp://ltpwww.gsfc.nasa.gov/IAS/handbook/handbook_toc.html.66 Existem vários modelos, como por exemplo os do tipo “Radiative Transfer Code” para corrigir asimagens (UNESCO, 2003).

Page 290: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

- 290 -

Quadro 9.3 – Formulação do balanço de radiação em condições atmosféricas sem nebulosidade, a partir de imagens LANDSAT 5 TM

Radiação solar em pequeno comprimento de onda (p.c.o) Radiação em grande comprimento de onda (g.c.o)

Global, incidente na superfícieK

Reflectida pela superfícieK

Atmosférica, ou contra irradiaçãoL

Emitida pelas superfíciesL

1. Conversão de radiância espectral (L ) emtemperaturas de superfície (K) (canal 6):

11ln

2

LKKTs

onde K1 e K2 são constantes de calibração(valores publicados para o canal 6 em CLARK,1986)

2. L = · T4 + (1 - ) · L

onde = Emissividade das superfícies,= Constante de Stefan-Boltzmann e

K = S + D

S é a radiação directa e D a radiação difusa.

K = 0,84 · I0 ·sen· exp[-0,027 · (p/p0) · TL sen ]

(0I = constante solar = 1367 W m-2 ),

I0 = 0I · 2)( rr2)( rr = 1+0,03344· cos(0,9856º · Dia Juliano - 2.72º)

(p/p0)= exp(-z/8434,5 m), z = altitude lugarTL Lisboa (Agosto)=5,4

= ângulo solar zenital= 90º- (valor angular da altura do sol)

S = I · cos = I · sen

Numa superfície horizontal:

I = I0 exp[-TL · (p/p0) / (0,9 + 9,4 sen )]

Numa superfície inclinada:

I ( , ) = I · cos

cos = sen · cos + cos sen · cos ( - )

= inclinação da superfície= azimute da superfície= azimute solar

D(0) = K - S= K - I · sen

Numa superfície inclinada:

D ( , ) = D(0) [ · cos / sen + (1- )cos2 ( /2)

= I / I0

1. Conversão de valores DN (Digital Number)dos canais 1 a 5 e 7, para a radiânciaespectral no sensor (L ) – Calibraçãoradiométrica:

L = LMIN + (LMAX - LMIN /QCALMAX) · QCAL

QCAL =DN, QCALMAX=255 e LMAX e LMIN sãovalores publicados em CLARK (1986), para cadaum dos canais.

2. Correcção atmosférica.

3. Conversão das radiâncias espectrais para areflectância no satélite, ou albedo planetárioem cada banda:

pp = · L · d2/ESUN · cos s

d é a distância Terra/Sol em unidadesastronómicas, ESUN é a radiânciaexoatmosférica média (valores publicados paracada canal em CLARK, 1986) e s é o angulosolar zenital em graus (também representadopor ).

4. “Albedo” (alb) = média das reflectânciasnos canais visíveis e IV próximo e médio(pp dos canais 1 a 5 e 7).

5. K = K · alb

L = eff T42m

eff = Emissividade hemisférica efectiva

= 9,9 · 10-6 · (T2m/K)2

= Constante de Stefan-Boltzmann

= 5,67 · 10-8 W m-2 K-4

T42m = Temperatura, em K, observada a 2

m do solo (no modelo utilizaram-se osdados de Lisboa/Aeroporto).

Nota: (1 - ) · L , representa a radiaçãotérmica da atmosfera que é reflectida pelasuperfície. Normalmente os valores queapresenta são muito baixos (OKE, 1987), peloque se usa normalmente apenas a equação:

L = · T4

com um erro típico inferior a 2% (VDI, 1994).

Balanço de radiação em pequeno comprimento de onda: K* = K - K Balanço de radiação em grande comprimento de onda: L* = L - L

(ver siglas no texto) Balanço de radiação Q* = K* + L* (ver figura 9.5)

Page 291: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Ý¿²¿´ ê ø×Ê ¬7®³·½±÷

Õ

Ì»³°»®¿¬«®¿ ¼» ­«°»®º3½·» øÕ÷

ã Ì ìÔ

Õ

Û²»®¹·¿ »³·¬·¼¿ °»´¿ ¿¬³±­º»®¿ øÉ ³ ÷óî

Ì»³°»®¿¬«®¿ ¼± ¿® ¿ î ³ ¼± ­±´± øÕ÷

Ô ã Ì »ºº î³

ì

Û²»®¹·¿ »³·¬·¼¿ °»´¿ ­«°»®º3½·» øÉ ³ ÷óî

Ô ã ÔÓ×Ò õ øÔÓßÈ ó ÔÓ×Ò ñÏÝßÔÓßÈ÷ i ÏÝßÔ

°° ã i Ô i ¼ ñÛÍËÒ i ½±­ î

­

n

xx

k

ii

1

=

ο¼ò ¼·º«­¿ ø ÷Ü

ß´¾»¼±

=

Ô Ô

Õ

+

Ô

ߦ·³«¬»­ ´±½¿·­ ø ÷ Ü»½´·ª»­ ø ÷

Ñ«¬®±­ °¿®>³»¬®±­²»½»­­?®·±­

×

®ñ®

×°ñ° ÌÔ

ð

ð

ο¼ ¼·®»½¬¿ ø ÷ò Í

ß´¾»¼±Î¿¼ ø ÷ò ¹´±¾¿´ ·²½·¼»²¬» Õ

ݱ²ª»®­=± ¼¿­ ®¿¼·>²½·¿­»³ ®»º´»½¬>²½·¿­

íò

Ô

îò

Ó±¼»´± Ü·¹·¬¿´ ¼± Ì»®®»²± ø¦÷ïò

Û­¬·³¿9=± ¼¿ ·®®¿¼·¿9=± ¬»®®»­¬®»

ïòݱ²ª»®­=± ¼±­ ÜÒ ø÷ »³ ®¿¼·>²½·¿­

ø½¿²¿·­ ï ¿ ë » é÷

Ü·¹·¬¿´Ò«³¾»®­

ïò ݱ²ª»®­=± ¼± ½¿²¿´ ê »³¬»³°»®¿¬«®¿ ¼± ½±®°± ²»¹®± øÕ÷

îò

Û­¬·³¿9=± ¼¿ ½±²¬®¿ ·®®¿¼·¿9=±¿¬³±­º7®·½¿

ïò

îò ݱ®®»½9=±¿¬³±­º7®·½¿

X

ݱ³¿²¼± ×ÜÎ×Í× íî

ݱ®®»½9=±¿¬³±­º7®·½¿

Ó¿° ¿´¹»¾®¿ ¿²¼ ´±¹·½ ³±¼»´»®

Fig. 9.5 –Esquema da modelação dos termos do balanço de radiação, com recurso a um SIG (Idrisi v.32).

Page 292: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte II – Ilha de calor urbana de superfície e balanço energético em Lisboa

- 292 -

Quadro 9.4 – Formulação das componentes do balanço energético a partir de imagensLANDSAT 5 TM

QG (calor armazenado) QH (calor sensível) QE (calor latente)

QH = BR · (Q* - QG) / (1 + BR) QE = (Q* - QG) / (1 + BR)QG(rural) = (0,3673 - 0,3914 · NDVI) · K* · (-0,8826 · ln(K*) + 5,0967)

QG(urbano) = -(0,3673 - 0,3914 · NDVI) · Q*

QG(florestal)= -0,5 · (0,3673 - 0,3914 · NDVI) · Q*

NDVI (Normalized Difference Vegetation Index) =

NDVI Landsat =3434

canalcanalcanalcanal

BR (Quociente de Bowen) = QH/QE

(fonte: OKE, 1987)

Ver figura 9.7 e siglas no texto

Quadro 9.5 – Alguns valores típicos do quociente de Bowen - BR (PARLOW, 2000)

Tipos de ocupação do solo BR

Alta densidade urbanaMédia densidade urbanaBaixa densidade urbanaÁreas industriais

Florestas coníferasFloresta mistaFloresta decídua

Terrenos em pousioHorticulturas e vinhasVegetação rasteiraTerra arável

1,51,00,81,8

0,70,50,4

0,50,50,60,7

Fig. 9.6 – Albedo estimado para o centro de Lisboa. Média = 16,7 %, desvio padrão = 2,9 %

Page 293: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

ÏÙ

íò ÏÙ ¬±¬¿´

Ó¿°¿­ ¼¿­®«¹±­·¼¿¼»­ ¼»

Ô·­¾±¿ ø¿²±­ èð÷

_®»¿­ó¿³±­¬®¿

Ý¿²¿·­ ÔßÒÜÍßÌ ë ÌÓ

Ý´¿­­·º·½¿9=± ¿­­·­¬·¼¿ø ÷³¿¨·³«³ ´·µ»´·¸±±¼

ÒÜÊ×

_®»¿­ º´±®»­¬¿¼¿­ ±«¿®¾±®·¦¿¼¿­

_®»¿­ �®«®¿·­�

_®»¿­ «®¾¿²¿­

ø«®¾¿²±÷ õ øº´±®»­¬¿´÷ÏÙ ÏÙÏÙø®«®¿´÷ õ

Ó?­½¿®¿­ ¼¿­ ¬·°±´±¹·¿­

ã

õ

ïò Ó¿°¿ ¼¿­ »­¬®«¬«®¿­ «®¾¿²¿­

îò Ú´«¨± ¼» ½¿´±® ¿®³¿¦»²¿¼± øÏÙ÷»³ ª?®·¿­ ¬·°±´±¹·¿­

ݱ³¿²¼± ×ÜÎ×Í× íî

Ý´¿­­·º·½¿9=±¿­­·­¬·¼¿

Ó¿° ¿´¹»¾®¿ ¿²¼ ´±¹·½ ³±¼»´»®

ÏØ

ÏØ ø®«®¿´÷ ã ðôê øÏö ó ÏÙ÷ ñ øï õ ðôê÷

Ó?­½¿®¿­ ¼¿­ ¬·°±´±¹·¿­

ÏØ ø«®¾¿²±÷ ã ïôî øÏö ó ÏÙ÷ ñ øï õ ïôî÷

ÏØ øº´±®»­¬¿´÷ ã ðôë øÏö ó ÏÙ÷ ñ øï õ ðôë÷

ÏØ ÏØø«®¾¿²±÷ õ øº´±®»­¬¿´÷ÏØø®«®¿´÷ õ

ÏÛ

Ó?­½¿®¿­ ¼¿­ ¬·°±´±¹·¿­

ÏÛ ø«®¾¿²±÷ ã øÏö ó ÏÙ÷ ñ øï õ ïôî÷

ÏÛ øº´±®»­¬¿´÷ ã øÏö ó ÏÙ÷ ñ øï õ ðôë÷

ÏÛ ø®«®¿´÷ ã øÏö ó ÏÙ÷ ñ øï õ ðôê÷

ÏÛ ÏÛø«®¾¿²±÷ õ øº´±®»­¬¿´÷ÏÛø®«®¿´÷ õ

Fig. 9.7 – Esquema da modelação dos fluxos de turbulentos de calor latente (QE), sensível (QH) e armazenado no solo com recurso a um SIG (Idrisi v.32).

Page 294: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte II Ilha de calor urbana de superf cie e balan o energ tico em Lisboa

- 294 -

Toda a formula o que se apresenta indicada para uma atmosfera sem

nebulosidade. No caso de se utilizarem imagens de sat lite com uma pequena

percentagem de nuvens dever-se- o utilizar factores de correc o (consultar VEREIN

DEUTCHER INGENIEURE, 1994).

Como se utilizaram v rias fontes, algumas das grandezas ou componentes s o

frequentemente referenciadas por siglas diferentes. No quadro 9.3, por exemplo, o

angulo solar zenital vem referido por s ou . Unicamente neste caso, optou-se por

manter as duas siglas, para se tornar mais f cil a sua localiza o nas refer ncias de

origem. Noutros casos, optou-se por utilizar as siglas mais correntemente citadas. Para

identificar os termos mais comuns, como por exemplo os dos balan os radiativo e

energ tico (K, L, Q, QG, QE, QH), utilizaram-se trabalhos de refer ncia como OKE

(1987), por se ter generalizado o seu emprego entre os Climatologistas e Ge grafos.

Conv m introduzir uma breve reflex o sobre as principais limita es do modelo

apresentado, incidindo sobre os aspectos que se pretendem melhorar no futuro. Em

primeiro lugar, citem-se as quest es do albedo e da correc o atmosf rica das imagens,

j que os valores registados pelos sensores dos sat lites cont m ru dos atmosf ricos,

devido dist ncia consider vel entre eles e a superf cie da terra (705 km no caso dos

LANDSAT). A atenua o da radia o em pequeno comprimento de onda ocorre devido

a variados factores: reflex o das nuvens, vapor de gua, aeross is, dispers o pelas

mol culas de ar de tamanho inferior ao comprimento de onda da radia o (Rayleigh) e

pelas part culas de tamanho id ntico ao comprimento de onda (dispers o de Mie), pela

absor o do ozono em comprimentos de onda inferiores a 0,3 m e vapor de gua em

comprimento de onda superior a 1 m (CARLETON, 1991). A nica atenua o importante

no IV t rmico deve-se absor o atmosf rica.

Os modelos de correc o atmosf rica ainda s o instrumentos de dif cil

manuseamento e da sua correcta utiliza o depende a precis o da informa o obtida.

Outra quest o fundamental a cria o de uma base de dados das emissividades

t picas dos materiais utilizados nas nossas cidades, de modo a melhorar a qualidade dos

valores das temperaturas de superf cie que s o, conjuntamente com o albedo, as

vari veis locais que mais influenciam os valores do balan o de radia o.

Page 295: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Cap tulo 9 O balan o energ tico em Lisboa a partir de imagens do sat lite Landsat 5

- 295 -

A estima o do fluxo de calor armazenado (QG) foi testado em cidades da

Europa Central, nomeadamente na Su a, Alemanha e este da Fran a, no projecto

REKLIP (PARLOW, 1996 a, b e 2000). A sua aplica o na cidade de Lisboa carece de

mais estudos, para averiguar a sua rela o com o ndice de vegeta o (NDVI) e com os

termos do balan o radiativo. A sua utiliza o prov m de uma ideia chave: a densidade

de vegeta o, directamente relacionada com o NDVI, actua como factor de resist ncia

ao fluxo de calor armazenado (PARLOW, 2000). Esses estudos s ser o poss veis quando

se adquirir a instrumenta o necess ria para o seu registo sistem tico, facto que n o

acontece actualmente.

Quanto s classes de uso do solo utilizadas, preferiu manter-se a nomenclatura

original - QG(urbano), QG (rural) e QG florestal), apesar de, nos arredores de Lisboa, j n o

existirem reas verdadeiramente rurais e a nica rea florestal ser Monsanto. Para se

poder aplicar a formula o apresentada no quadro 9.4, adaptaram-se as classes a tr s

grandes tipos de ocupa o do solo na cidade: a parte urbana edificada que se definiu

como QG(urbano); as reas arborizadas - QG(florestal) foram identificadas a partir do NDVI

superior a 0,15 ( reas verdes no Mapa das grandes estruturas urbanas de Lisboa para

aplica o clim tica , fig. 9.3); finalmente o QG(rural) corresponde, no mesmo mapa, s

reas sem ocupa o dominante. Estas s o as reas devolutas em torno e dentro da

cidade, caracterizadas por uma miscel nea de vegeta o rasteira e solos nus que, sob o

ponto de vista energ tico, mais se assemelham s reas rurais. Tamb m aqui se dever o

desenvolver novos estudos para melhorar a qualidade do modelo.

O balan o global da metodologia proposta resume-se finalmente a tr s quest es

essenciais. Em primeiro lugar, esta tentativa parece ser um bom ponto de partida para

atingir os fins propostos, enunciados no in cio do trabalho. A estima o de grandezas

f sicas s o essenciais para aprofundar os nossos conhecimento sobre o ritmo e

distribui o dos padr es t rmicos na cidade, que s assim se poder o explicar

convenientemente. A previs o das componentes energ ticas, a partir desta metodologia,

poder tamb m ser uma campo de aplica o importante no futuro. A condi o de

sustentabilidade urbana determina que a aplica o destes estudos ao conforto humano,

polui o, etc., seja outro dom nio importante, tornando-se necess rio elaborar um

Atlas clim tico de Lisboa para o planeamento estrat gico da cidade.

Page 296: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte II Ilha de calor urbana de superf cie e balan o energ tico em Lisboa

- 296 -

Em segundo lugar deve-se real ar a investiga o necess ria neste dom nio da

modeliza o clim tica, nomeadamente tentando superar a limita o das imagens de

sat lite de m dia resolu o espacial, cuja passagem matinal sobre o territ rio em estudo

apenas permite a caracteriza o de uma parte do dia, sobretudo de forte aquecimento. A

sua integra o com informa o de outros sat lites de menor resolu o mas com duas,

ou mais, passagens di rias (como os da fam lia NOAA), pode ser uma boa hip tese de

trabalho.

Por fim necess rio validar os resultados com dados observados no terreno.

Alguns podem ser empiricamente validados, mas carece-se de valores registados

sistematicamente por inexist ncia de instrumenta o em meio urbano.

4. RESULTADOS: OS BALAN OS RADIATIVO E ENERG TICO EM LISBOA, A 19 DE

AGOSTO DE 1994 (APROXIMADAMENTE S 10:00 H, TEMPO LOCAL)

A an lise efectuada aos resultados obtidos estrutura-se sob duas formas:

1) uma an lise espacial geral, onde se mostram as grandes diferen as

energ ticas na cidade e a sua compara o com as reas suburbanas menos

densamente ocupadas pelo homem

2) Uma an lise de pormenor atrav s de casos que representam locais bem

distintos (fig. 9.8). Os valores m dios de todos os termos do balan o

energ tico nesses locais (quadrados com 635 m de lado) s o apresentados,

no final do cap tulo, sob a forma de resumo (quadro 9.9). Da confronta o

de resultados dentro e fora da cidade, resulta uma compara o que permitir

avaliar, com alguma certeza, as modifica es energ ticas que dever o

ocorrer na cidade com a sua expans o.

Page 297: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Cap tulo 9 O balan o energ tico em Lisboa a partir de imagens do sat lite Landsat 5

- 297 -

1

2

3

4

5

6

7

89

10

11

12

13

635

Fig. 9.8 Locais onde foram extra dos os valores m dios das componentes do balan oenerg tico (ver tamb m o quadro 9.9, no final do cap tulo). 1 Baixa; 2 Marqu s; 3 Saldanha;

4 Campo Grande; 5 Alc ntara; 6 Benfica; 7 - Bel m; 8 Lumiar; 9 Expo; 10 Chelas;11 Aeroporto; 12 Monsanto; 13 Odivelas/Loures.

Nota: n o se apresenta a forma mais correcta de escala gr fica do mapa, porque ela pretende mostrar amedida lateral de cada quadrado.

No dia da passagem do sat lite sobre Lisboa o estado do tempo superf cie era

influenciado pelo anticiclone dos A ores, que se prolongava at ao mediterr neo

ocidental e por uma depress o de origem t rmica sobre a Pen nsula Ib rica, sendo por

isso a nebulosidade fraca (1/8). s 12 horas, o vento de este observado na esta o de

Lisboa/Gago Coutinho no norte da cidade junto ao Aeroporto- era fraco (cerca de 2,5

m/s), a temperatura de 27 C e a humidade relativa de 53%. Na esta o meteorol gica de

Lisboa/Geof sico (no centro/sul de Lisboa), a temperatura do ar a 2 m do solo registou

um valor m ximo de 32 C, enquanto junto ao solo a temperatura m nima na relva foi de

14,4 C (fig. 9.9). A figura mostra que o dia 19 de Agosto de 1994 culmina um dos

per odos mais quentes do m s (e do ano), com uma sequ ncia de cinco dias com

temperaturas m ximas superiores 27 C.

Page 298: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte II Ilha de calor urbana de superf cie e balan o energ tico em Lisboa

- 298 -

0

5

10

15

20

25

30

35

1 3 5 7 9 11 13 15 17 19 21 23 25 27 29 31

Dias

Temp.

(C)

Temp. m ximaTemp. m dia

Temp. mnimaTemp. mn. na relva

Fig. 9.9 Temperaturas do ar na esta o meteorol gica de Lisboa/Geof sico em Agosto de 1994(fonte: Instituto Geof sico do Infante D. Lu s)

4.1 BALAN O DE RADIA O (Q*).

Como foi referido, as principais grandezas f sicas que comandam o balan o de

radia o local (Q*) s o o albedo (alb) e a temperatura de superf cie (Ts). sobre estes

par metros que ir recair a primeira an lise.

4.1.1 ALBEDO.

O albedo, estimado durante a passagem do sat lite (fig. 9.10), mostra uma

cidade com tr s grandes conjuntos de superf cies em termos de propriedades reflectivas:

o parque florestal de Monsanto e pequenas manchas de arvoredos com valores na ordem

dos 8 a 10 %, o n cleo central da cidade entre 10 e 25% (com uma m dia de

16,7% - fig. 9.6) e o norte (Lumiar e Concelho de Loures) e nordeste da cidade (Expo),

com uma maior heterogeneidade de valores, predominantemente superiores a 22%.

Toda a coroa suburbana composta por uma diversidade de tipos de ocupa o do solo,

que caracterizam o crescimento da a rea metropolitana em torno de Lisboa: expans o de

novos n cleos habitacionais, muitas reas onde dominam os terrenos devolutos (

espera de serem urbanizados), normalmente ocupados por vegeta o rasteira e ainda

algumas manchas verdes, sobretudo matas, res duos de uma actividade

predominantemente agr cola, que entrou em decl nio na primeira metade do s culo

passado.

Page 299: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Cap tulo 9 O balan o energ tico em Lisboa a partir de imagens do sat lite Landsat 5

- 299 -

Estes valores diferenciados do albedo devem-se mais s propriedades reflectivas

das superf cies do que radia o incidente. Esta depende sobretudo de factores

astron micos e de propriedades da atmosfera (dist ncia entre a Terra e o Sol, altura e

azimute solar, esta o do ano, propriedades pticas e turbidez da atmosfera, etc.,) e de

factores locais, como a altitude, o declive e exposi o das vertentes. Como a rea de

estudo relativamente limitada no espa o, n o h uma

Fig. 9.10 Albedo em Lisboa

grande heterogeneidade nos factores locais, a radia o global ao in cio da manh neste

dia de Ver o tem uma fraca amplitude de valores, que oscilam entre 75467 e 762 W m-2

(com uma m dia de 761 e um desvio padr o de 0,47 W m-2). Assim, o albedo varia

essencialmente com a radia o reflectida que, em Monsanto, inferior a 80 W m-2

contrastando, por exemplo, com os 230 W m-2 reflectidos nas superf cies desocupadas

de Chelas, ou os 160 W m-2 na rea das pistas do Aeroporto. Note-se que a fraca

rugosidade pode explicar estes valores elevados de reflex o.

Page 300: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte II Ilha de calor urbana de superf cie e balan o energ tico em Lisboa

- 300 -

A baixa reflex o nas matas (cujo complexo foliar uma armadilha da radia o

incidente) determina valores fracos de albedo, caracter stico das reas ocupadas por

florestas68. Note-se que a clareira de central de Monsanto contrasta com o conjunto do

parque, porque n o ocupado por vegeta o de alto porte, mas sim por um misto de

reas desocupadas com vegeta o rasteira e alguns edif cios que comp em o complexo

prisional/judicial.

A uma escala mais fina podem observar-se as diferen as entre os materiais que

comp em o n cleo central da cidade, no eixo entre a Baixa e o Campo Grande

(fig. 9.11).

Parque Eduardo VII

Saldanha

Cemit rio

JardimBot nico

Fig. 9.11 Albedo no centro de Lisboa.

S o vis veis tr s classes distintas: com albedo inferior a 15 % encontramos as

principais vias de comunica o, os passeios ajardinados do Parque Eduardo VII e v rios

jardins, como o Bot nico a oeste da Avenida da Liberdade; outra classe com valores

entre 16 e 20 % (65 % do total da rea), que corresponde aos telhados da cidade; e,

finalmente, uma terceira classe com valores superiores a 21 %, que ocorre sobretudo a

leste da Av. Almirante Reis (cemit rio do Alto de S. Jo o) e tamb m em zonas

desocupadas em 1994, a norte do Parque Eduardo VII, onde actualmente existe um

67 Valores observados sobretudo na vertente exposta a noroeste da depress o de Odivelas-Loures.68 Valores semelhantes de albedo foram estimados a partir de imagens LANDSAT TM (10 a 12%) nasflorestas de con feras que envolvem a cidade de Karlsruhe, na Alemanha, em Julho de 1984.

Page 301: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Cap tulo 9 O balan o energ tico em Lisboa a partir de imagens do sat lite Landsat 5

- 301 -

centro comercial. O valor mais baixo das ruas e avenidas, pavimentadas com alcatr o,

deve-se s sua eficiente capacidade de absorverem energia (e serem fracas reflectoras,

com cerca de 80 a 90 W m-2 e albedo inferior a 15%, valores estimados, por exemplo,

na Av. da Liberdade entre a Baixa e o Marqu s). As superf cies envolventes,

essencialmente os telhados e espa os interiores dos edif cios, reflectem cerca de 120 a

130 W m-2. Os jardins e outros espa os verdes formam pequenas manchas com albedos

inferiores a 12%.

4.1.2 TEMPERATURAS DE SUPERF CIE (TS)

Como j foi notado por outros autores (OKE, 1995, PARLOW 1998), as

temperaturas mais elevadas das superf cies (Ts) s o erradamente usadas como indicador

da ilha de calor urbano (medida a 2 metros do solo), o que n o absolutamente correcto

porque as temperaturas do ar resultam da interac o entre v rias grandezas f sicas como

a radia o, a energia dispon vel para os fluxos de calor turbulento e armazenado, ou os

ventos locais que comandam os fluxos verticais e a advec o.

O mapa da figura 9.12 mostra as temperaturas de superf cie hora da passagem

do sat lite. O n cleo urbano central de Lisboa apresenta temperaturas entre os 303,6 K,

(Saldanha) e 306,4 K (Benfica) inferiores s reas suburbanas de Loures (309,5 K).

Neste Concelho, apenas as vertentes expostas a noroeste, que recebem a esta hora uma

menor quantidade de energia incidente, t m um temperatura inferior (303 K). Dentro da

cidade, Bel m (302, 9 K) e a Encarna o (entre a Expo e o Aeroporto, com 302 K) s o

dois n cleos com temperaturas ligeiramente inferiores. Na origem deste facto est a sua

estrutura com bastantes espa os verdes (fig. 9.13). Veja-se o contraste da Encarna o

com Chelas, imediatamente a sul (304,8 K) e com a zona da actual Expo (305,9 K). Os

locais onde Ts mais elevada eram, em 1994, constitu das predominantemente por

devolutos, praticamente sem os espa os verdes, que outrora dominavam o termo de

Page 302: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte II Ilha de calor urbana de superf cie e balan o energ tico em Lisboa

- 302 -

Fig. 9.12 Temperaturas de superf cie (Ts) em Lisboa.

Fig. 9.13 NDVI (Normalized Difference Vegetation Index) estimado a partir dos canais 3 e 4 do sat liteLandsat 5 TM em Lisboa.

Page 303: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Cap tulo 9 O balan o energ tico em Lisboa a partir de imagens do sat lite Landsat 5

- 303 -

Lisboa. A superf cie mais quente dentro do per metro da cidade o Aeroporto de Lisboa

(307,7 K). O parque florestal de Monsanto apresenta os valores de Ts mais baixos de

toda a cidade (300,8 K). Relembre-se que os valores de reflect ncia observados pelo

sat lite correspondem copa das rvores, sendo portanto a temperatura de superf cie

representativa da parte superior desta estrutura vegetal.

4.1.3 COMPARA O DO BALAN O DE RADIA O EM V RIOS LOCAIS DE LISBOA E

NOS ARREDORES

A distribui o espacial do balan o de radia o (Q*), no momento da passagem

do sat lite sobre Lisboa (fig. 9.14), o resultado das v rias combina es entre as

grandezas f sicas anteriormente descritas. S o identificadas tr s grandes reas de

caracter sticas distintas:

a) Q* inferior a 590 W m-2 - Os exemplos mais evidentes s o as reas com

albedo elevado, superior a 17% (perda radiativa de pequeno comprimento

de onda) e temperaturas de superf cie elevadas, superiores a 305 K (perda

radiativa de grande comprimento de onda). Correspondem aos locais

desocupados, devolutos ou de vegeta o rasteira (Chelas, Expo, noroeste da

cidade, entre o Lumiar Benfica e a oeste da depress o de Odivelas/Loures) e

s superf cies boas reflectoras de baixa rugosidade que comp em o

Aeroporto de Lisboa.

b) Q* entre 590 e 640 W m-2 - Corresponde a grande parte da estrutura urbana

e s vertentes da depress o de Odivelas/Loures expostas a noroeste e ao vale

anaclinal da Cal ada de Carriche (prolongamento do eixo Campo Grande

Loures). Combina as temperaturas de superf cie na ordem dos 302 a 305 K

com albedo inferior a 17%.

c) reas com valor de (Q*) superior 640 W m-2 Grandes manchas verdes do

parque florestal de Monsanto e Campo Grande e arvoredos a Oeste do

Page 304: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte II Ilha de calor urbana de superf cie e balan o energ tico em Lisboa

- 304 -

Aeroporto. O balan o radiativo mais elevado resulta de uma albedo fraco

(cerca de 10 %) e as mais baixas temperaturas de superf cie observadas

( 301 K).

Conforme foi tamb m observado na regi o su a de Basileia e alem de

Karlsruhe (PARLOW 1998), as reas urbanas t m a esta hora no Ver o uma menor

quantidade de radia o dispon vel, quando comparadas com as reas florestadas (quadro

9.6). Nos exemplos citados, as reas rurais que circundam as cidades apresentam

valores mais elevados de Q* do que as reas urbanas. Em Lisboa as reas suburbanas

com ocupa o diversa (que de alguma forma se tentou equiparar a reas rurais) t m,

pelo contr rio, um valor inferior de Q*.

Quadro 9.6 Valores m dios do balan o radiativo em tr s grandes tipos de

ocupa o do solo, em Lisboa.

reas Q*m dia (W m-2)

urbanas 591Suburbanas comocupa o diversa 581

florestadas 610

Pode concluir-se que, em termos radiativos, estas reas suburbanas n o t m as

mesmas caracter sticas rurais que dever o ter tido h algumas d cadas atr s, por

serem superf cies com pouca vegeta o (por vezes nenhuma), boas reflectoras e com

temperaturas de superf cie elevadas.

Page 305: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Cap tulo 9 O balan o energ tico em Lisboa a partir de imagens do sat lite Landsat 5

- 305 -

4.2 BALAN O ENERG TICO

Apesar do inconveniente das reas suburbanas n o terem caracter sticas

marcadamente rurais (ao contr rio das cidades onde foram testados os algoritmos

utilizados), manteve-se a formula o apresentada no ponto 3.2 para estimar o fluxo de

calor armazenado (QG). Apesar da metodologia parecer adequada aos fins a que se

destina, necessitar de alguns acertos futuros regi o de Lisboa . Os valores do Bowen

Ratio utilizados baseiam-se na rela o entre o fluxo de calor sens vel e latente nas

latitudes m dias: reas urbanas (1,2), valor entre a m dia e alta densidade urbana; reas

florestadas (0,5); reas suburbanas com ocupa o diversa (predominando a vegeta o

rasteira ou solos desocupados - 0,55), valor interm dio entre os terrenos em pousio e a

vegeta o rasteira quadro 9.5).

Fig. 9.14 Balan o de radia o (Q*) em Lisboa.

Page 306: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte II Ilha de calor urbana de superf cie e balan o energ tico em Lisboa

- 306 -

4.2.1 FLUXO DE CALOR ARMAZENADO (QG).

O histograma de frequ ncias bimodal desta vari vel em Lisboa mostra

claramente a dicotomia entre as reas urbanas e os restantes tipos de ocupa o (fig.

9.15). Dentro da cidade, a classe modal situa-se a cerca de 200 W m-2, contrastando com

os 91 W m-2 de Monsanto e os 130 W m-2 de Loures.

QG

Fig. 9.15 Frequ ncias dos valores de calor armazenado (QG) em Lisboa.

Os valores mais elevados foram estimados na Baixa (230 W m-2), decrescendo

para a periferia (Campo Grande 160 W m-2; Bel m 110 W m-2; Lumiar 138 W m-2),

acompanhando os principais eixos da cidade (fig. 9.16).

PARLOW (2000) utilizou a raz o entre o fluxo de calor conductivo e o balan o de

radia o (QG/Q*) como indicador da energia dispon vel nas superf cies (fig. 9.17). As

reas urbanas e o Aeroporto possuem, em m dia, mais de 33 %, enquanto o parque

florestal de Monsanto apenas armazena 14% da energia radiativa e Loures 24%.

Mantendo-se a proporcionalidade do calor dispon vel para ser libertado durante a noite,

poder estar encontrada a verdadeira raz o da exist ncia da ilha de calor urbano, mesmo

no per odo estival. Futuros trabalhos com imagens, noutros per odos do ano, poder o

dar indica es mais precisas sobre o ritmo estacional da ICU.

Na figura 9.18, apresenta-se a rela o entre o calor acumulado e o total de

energia radiativa dispon vel (QG/Q*), as temperaturas de superf cie (Ts) e o

Page 307: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Cap tulo 9 O balan o energ tico em Lisboa a partir de imagens do sat lite Landsat 5

- 307 -

Fig. 9.16 Fluxo de calor armazenado em Lisboa (QG).

Fig. 9.17 Raz o entre o fluxo de calor armazenado e o balan o de radia o (QG/Q*) em Lisboa. Asduas linhas indicam a localiza o do perfis das figuras 9.18 e 9.19.

Page 308: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte II Ilha de calor urbana de superf cie e balan o energ tico em Lisboa

- 308 -

albedo, em dois perfis (NNW/SSE e W/E) em Lisboa. Na fig. 9.17, encontra-se a

localiza o desses perfis.

No perfil NNW/SSE, verifica-se a descida da temperatura de superf cie (embora

ocorra uma pequena inflex o positiva na Baixa) e do albedo para Sul. Se n o forem

compensadas pela radia o global incidente e/ou pela contra irradia o atmosf rica (que

a condi o que se verifica, j que este balan o instant neo e os factores que

comandam aquelas grandezas apenas variam com o decorrer do dia ou com a

modifica o dos factores atmosf ricos), a diminui o do albedo e de Ts implicam uma

menor perda de energia reflectida (pequeno comprimento de onda) e t rmica (grande

comprimento de onda) e portanto o aumento da energia radiativa total (Q*). No presente

caso esse aumento de cerca de 12,5 % na Baixa em rela o ao norte da cidade

(quadro 9.7).

Apesar deste aumento, o fluxo de calor armazenado no sul da cidade muito

maior e portanto a rela o entre estas duas grandezas aumenta no sul. Ou seja, n o

considerando outros fluxos, a energia armazenada nas superf cies urbanas do n cleo

central de Lisboa (34 a 38%) maior do que nos sub rbios n o urbanizados, ou menos

densos (cerca de 24%). Pelo contr rio, as reas do norte da cidade t m mais energia

dispon vel para ser libertada atrav s dos fluxos de calor turbulento.

Fig. 9.18 Energia dispon vel (QG/Q*), temperaturas de superf cie (Ts) e albedo, num perfil NNW/SSEem Lisboa.

294

296

298

300

302

304

306

308

310

312

0

5

10

15

20

25

30

35

40

45

Odivelas/Loures

Baixa

QG/Q* (%)

Ts (K)

NNW SSE

Albedo (%)

Page 309: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Cap tulo 9 O balan o energ tico em Lisboa a partir de imagens do sat lite Landsat 5

- 309 -

Quadro 9.7 Varia o norte /sul dos termos do balan o radiativo e do calorarmazenado em Lisboa (valores aproximados)

Norte da cidade

K (W m-2) 760,0 L (W m-2) 390,0K (W m-2) 150,0 L b(W m-2) 440,0Albedo (%) 19,7 Ts (K) 309,0K* (W m-2) 610,0 L* (W m-2) -50,0Q* (W m-2) 560,0QG (W m-2) 130,0QG/Q* (%) 23,2

Sul da cidade

K (W m-2) 760,0 L (W m-2) 390,0K (W m-2) 100,0 L b(W m-2) 420,0Albedo (%) 13,2 Ts (K) 305,0K* (W m-2) 660,0 L* (W m-2) -30,0Q* (W m-2) 630,0QG (W m-2) 230,0QG/Q* (%) 36,5

Na figura 9.19, claro o contraste entre Monsanto e o centro de Lisboa

(Marqu s de Pombal). Nota-se, mais uma vez, a copa do arvoredo de Monsanto como a

superf cie mais fria de toda a rea (excepto uma pequena clareira que interrompe esta

tend ncia), que associada a uma fraca reflex o (albedo 10%) determina um Q*

bastante elevado (662 W m-2). Como QG baixo, Monsanto apenas armazena cerca de

15 % do total de energia recebida, enquanto o centro da cidade armazena 34 a 38%. Os

bairros que constituem excep es s o aqueles onde a componente vegetativa

importante, como o Campo Grande (27,5%) e Bel m (18,4%).

Page 310: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte II Ilha de calor urbana de superf cie e balan o energ tico em Lisboa

- 310 -

Fig. 9.19 Energia dispon vel (QG/Q*), temperaturas de superf cie (Ts) e albedo, num perfil oeste/esteem Lisboa (a sua localiza o encontra-se na fig. 9.17).

Conclui-se que, j no in cio da manh , h uma maior quantidade de calor

acumulado no solo da cidade, calor esse dispon vel para ser libertado para a atmosfera

urbana durante a noite, podendo assim contribuir para o aquecimento do ar. Os bairro

cuja componente verde maior, t m menores possibilidades de formar ilhas de calor.

4.2.2 FLUXOS DE CALOR SENS VEL (QH) E LATENTE (QE)

Devido pouca vegeta o na cidade, o fluxo de calor latente obviamente

bastante baixo, quando comparado com os sub rbios de Loures ou o parque florestal de

Monsanto. A amplitude de valores entre estes tipos de ocupa o elevada, indo de

177 W m-2 na Baixa at a 377 W m-2 estimados em Monsanto (fig. 9.21). A amplitude

de valores pode ascender a mais de 270 W m-2 (fig. 9.20). Dentro da cidade, os locais

mais arborizados possuem valores mais elevados de QE, como o Campo Grande (236

W m-2) e Bel m (310 W m-2), enquanto o n cleo mais antigo (eixo Baixa, Marqu s69,

Saldanha) regista os valores mais baixos, n o ultrapassando 190 W m-2.

69 Note-se que o baixo valor estimado junto Pr. Marqu s de Pombal, tamb m conhecida por Rotunda,n o inclui o parque Eduardo VII. Neste local, o fluxo de calor latente ascende a 360 W m-2.

294

296

298

300

302

304

306

308

310

312

0

5

10

15

20

25

30

35

40

45

Monsanto Marqu s

QG/Q* (%)

Ts (K)

Oeste Este

Albedo (%)

Page 311: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Cap tulo 9 O balan o energ tico em Lisboa a partir de imagens do sat lite Landsat 5

- 311 -

QE

Fig. 9.20 Frequ ncias do fluxo de calor latente (QE) em Lisboa.

Considerando toda a rea de estudo, a amplitude de valores do fluxo de calor

sens vel ( 130 W m-2) menor do que a amplitude de QE (fig. 9.20).

Os valores mais baixos de QH s o estimados em Loures (158 W m-2), enquanto

Monsanto e o centro de Lisboa registam valores semelhantes ( 195 e 205 W m-2). Esta

semelhan a entre reas urbanas e florestadas, tamb m notada em Basileia por PARLOW

(2000), pode ser explicada por um balan o radiativo inferior na cidade, compensado por

um forte armazenamento de calor durante o dia. Por outro lado, o calor latente diminui

fortemente (-200 W m-2 no centro do que em Monsanto) devido quase aus ncia de

vegeta o. Veja-se um exemplo demonstrativo no quadro 9.8: no interior da cidade Q*

60 W m-2 inferior a Monsanto e o calor sens vel (QH) semelhante nos dois locais

essencialmente a rela o entre calor latente e armazenado, (maior o primeiro na rea

florestal e o segundo na malha urbana) que contrapesa o balan o radiativo. Sendo este

mais elevado em Monsanto, conclui-se que a liberta o de calor latente para a atmosfera

em meio florestal relativamente mais importante do que a absor o de calor pelas

superf cies em meio urbano, o que determina climas locais diferentes nestas duas reas.

Quadro 9.8 Compara o do balan o energ tico entre reas florestadas e o centro dacidade (valores em W m-2).

Monsanto Interior da cidade

Q* QG QE QH Q* QG QE QH

660 90 370 200 600 230 170 200

QG + QE = 460 QG + QE = 400

660 - 460 = 200 600 - 400 = 200

Page 312: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte II Ilha de calor urbana de superf cie e balan o energ tico em Lisboa

- 312 -

Fig. 9.21 Fluxo de calor latente (QE) em Lisboa.

Fig. 9.22 Fluxo de calor sens vel (QH) em Lisboa.

Page 313: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Cap tulo 9 O balan o energ tico em Lisboa a partir de imagens do sat lite Landsat 5

- 313 -

QH

Fig. 9.23 Frequ ncias do fluxo de calor sens vel em Lisboa.

5 CONCLUS ES

Apesar das imagens do sat lite LANDSAT 5 TM n o serem as mais adequadas

para o estudo do clima urbano, sobretudo por causa da sua passagem matinal

(aproximadamente s 10:00 horas tempo local, numa altura em que ocorre um forte

aquecimento da atmosfera), continuam a ser a nica fonte de informa o dispon vel a

uma escala suficientemente detalhada para identificar as principais caracter sticas f sicas

das cidades.

Como ficou demonstrado, o balan o energ tico de Lisboa claramente

modificado pela cidade, quando comparado com as raras reas suburbanas ainda n o

ocupadas por espa os constru dos, ou com a rea florestal de Monsanto. A cidade

assim um dos principais factores modificadores dos climas a v rios n veis de an lise, da

escala regional microclim tica.

Antes da instala o da cidade, as massas de ar que invadem um territ rio,

conjuntamente com a topografia e as caracter sticas da superf cie, definem os seus

climas regional e local. Quando o Homem edifica , tudo se altera: a rugosidade

aumenta, fazendo diminuir a intensidade m dia do vento (ou acelerando-o

pontualmente), e as suas actividades lan am para atmosfera energia suplementar

proveniente da combust o e v rias subst ncias, muitas delas nocivas e poluentes quando

atingem determinados limites que j n o s o aceit veis para vida humana. Assim, o

clima regional o somat rio dos climas locais, que dependem da topologia dos bairros

Page 314: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte II Ilha de calor urbana de superf cie e balan o energ tico em Lisboa

- 314 -

(diferentes arranjos dos quarteir es, ruas, jardins, etc.), das reas florestadas, e da

quantidade de espa os devolutos ou temporariamente desocupados. A modifica o

destes espa os de extrema import ncia porque, ao serem constru dos, ir o ver o seu

clima local alterado e a ambi ncia atmosf rica que ir ser sentida pelos novos

ocupantes.

V rios autores j sintetizaram o papel dos diversos factores na modifica o do

balan o energ tico em meio urbano (ALCOFORADO, 1992; ARNFIELD, 2003). Foi

enfatizada a influ ncia da quantidade de poluentes (sobretudo emitidos pelos

autom veis), na diminui o da radia o global. A radia o total incidente, que se

supunha diminuir cerca de 10% (at 20% em certos casos) no final dos anos setenta do

s culo passado (LANDSBERG, 1981; OKE, 1988 b) v -se, em estudos recentes, reduzida

para valores de 20 a 30% em cidades como Hong Kong ou Cidade do M xico (v rios

trabalhos citados por ARNFIELD, 2003).

Pelo contr rio, a componente radiativa que chega superf cie em grande

comprimento de onda aumenta nas cidades (tipicamente inferior a 10 %), devido ao

aquecimento da atmosfera urbana e ao aumento da emissividade atmosf rica causada

pela presen a de maior quantidade de part culas e gases poluentes. O maior fluxo

descendente de radia o em onda longa largamente suficiente para compensar a

atenua o da radia o solar devida ao domo de poeiras urbano (ALCOFORADO, 1992).

As sa das radiativas dependem muito da morfologia urbana. Como se viu, o

albedo, conjuntamente com as temperaturas de superf cie, s o os principais factores

locais que modificam o balan o radiativo. No centro de Lisboa, o albedo reduzido em

cerca de 28 %, em rela o s reas perif ricas suburbanas (tomando como exemplo a

diferen a entre a Baixa e Loures), mas a redu o ainda maior na rea florestal de

Monsanto (47 % em rela o ao centro da cidade). No eixo entre a Baixa e o Campo

Grande as ruas e os jardins s o as superf cies que t m um albedo mais baixo (11 a

12 %), devido elevada capacidade de absor o dos pavimentos alcatroados e fraca

reflectividade das reas verdes (80 a 90 W m-2). A diminui o do albedo deve-se

tamb m ao facto da radia o sofrer reflex es m ltiplas ficando prisioneira entre os

pr dios, sobretudo quando a inclina o dos raios solares maior (ALCOFORADO, 1992),

como na hora da passagem do sat lite sobre Lisboa. As restantes superf cies

Page 315: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Cap tulo 9 O balan o energ tico em Lisboa a partir de imagens do sat lite Landsat 5

- 315 -

(essencialmente os telhados e espa os interiores abertos) reflectem cerca de 120 a 130

W m-2 (albedo 17%).

As superf cies mais reflectoras s o as pistas do aeroporto e as reas devolutas e

desocupadas, com albedos superiores a 20%, atingindo pontualmente valores superiores

a 30 %.

A temperatura das superf cies, que comandam a energia emitida, tem sido

erradamente confundida e utilizada como indicador da ilha de calor urbano na camada

limite inferior (urban canopy layer). No entanto n o h uma correspond ncia directa

entre as duas, j que a temperatura do ar o resultado de uma interac o complexa entre

todos os termos do balan o energ tico e, portanto, da energia dispon vel para aquecer

ou arrefecer a atmosfera junto ao solo (PARLOW, 1998).

hora da passagem do sat lite, as superf cies mais quentes encontravam-se a

noroeste da cidade, no Concelho de Loures ( 309K), enquanto as Ts do centro da

cidade eram ligeiramente mais baixas (304 a 306K). As copas do arvoredo de Monsanto

eram as superf cies menos quentes com cerca de 301K.

Apesar de todos os fluxos radiativos em pequeno e grande comprimento de

onda, que entram e saem do sistema, serem modificados pelas urbaniza es corrobora-

se, at certo ponto, a ideia de OKE (1974) e ARNFIELD (1982), de que o balan o radiativo

varia pouco entre as reas urbana e rurais (ou no caso de Lisboa, as reas devolutas).

Veja-se por exemplo os valores m dios de Q* no centro da cidade ( 590 W m-2) e as

reas devolutas com valores ligeiramente inferiores que rondam 580 W m-2. As maiores

diferen as encontram-se nas reas florestadas (610 W m-2), atingindo em Monsanto os

valores mais elevados (660 W m-2 quadro 9.9). A menor perda radiativa em grande e

pequeno comprimento de onda (Ts mais baixas e fraco albedo) justifica o elevado

balan o radiativo deste conjunto florestal, tal como foi observado em florestas junto a

outras cidades europeias (PARLOW, 2000).

O que se poder esperar em termos de modifica o dos termos do balan o

radiativo nos pr ximos anos em Lisboa, nas reas ainda n o urbanizadas? Com os dados

de que se disp e actualmente, espera-se uma diminui o da rea com superf cies

melhores reflectoras e forte albedo (Chelas, Loures, Lumiar, Expo e o Aeroporto, se for

Page 316: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte II Ilha de calor urbana de superf cie e balan o energ tico em Lisboa

- 316 -

removido da sua localiza o actual e substitu do por novas urbaniza es) e a diminui o

das temperaturas de superf cie em cerca de 2/3 K. Nestas reas, isto traduzir-se- num

acr scimo do input radiativo total em cerca de 10 a 30 W m-2 que, pontualmente, como

no caso do Aeroporto, poder chegar a um aumento de 100 W m-2.

Visto provar-se aqui que, tamb m para Lisboa, as diferen as no balan o

radiativo s o fracas, o que poder explicar os diferentes padr es t rmicos na cidade s o

os restantes fluxos de calor conductivo, latente e sens vel. De um modo geral e

salvaguardando varia es peri dicas e aleat rias, o aquecimento urbano pode em parte

ser explicado pela maior e mais prolongada transfer ncia de calor sens vel e pela menor

perda de calor latente. Para auxiliar a interpreta o dos resultados elaborou-se, a partir

dos valores do quadro 9.9, uma classifica o hier rquica ascendente, com o fim de

determinar as semelhan as das caracter sticas energ ticas dos v rios locais analisados.

A resultante encontra-se na figura 9.24

Num n vel de agrupamento mais elevado (dist ncia de corte superior a 80)

observam-se dois conjuntos: Monsanto e Bel m por um lado e os restantes locais pelo

outro. A um n vel interm dio (50) o parque florestal de Monsanto j surge separado de

Bel m. Este bairro composto por casas residenciais, geralmente baixas de dois pisos

(fig. 9.25), envolvidas por quintais e reas verdes com vegeta o arb rea. Um terceiro

local com caracter sticas energ ticas diferentes de todos os outros o Aeroporto de

Lisboa que, como vimos, na hora da passagem do sat lite tem temperaturas de

superf cie e albedo elevados.

Destacam-se, por ltimo, dois agrupamentos, ali s esperados: o centro sul da

cidade entre a Baixa, o Marqu s de Pombal e o Saldanha, composto essencialmente por

edif cios de 4 a 6 pisos e os restantes locais que, em termos urban sticos, s o mais

heterog neos. A um n vel baixo de liga o (cerca de 10) destaca-se ainda o noroeste da

cidade (Lumiar) e Loures com caracter sticas energ ticas muito semelhantes.

Page 317: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Cap tulo 9 O balan o energ tico em Lisboa a partir de imagens do sat lite Landsat 5

- 317 -

Fig. 9.24 - rvore de liga es elaborada a partir das caracter sticas energ ticas de v rios locais em Lisboae seus sub rbios (quadro 9.9), com a dist ncia de Chebychev.

escala regional est o sempre presentes os tr s grandes conjuntos com

caracter sticas energ ticas distintas: o n cleo central da cidade caracterizado por um

balan o radiativo superior ao das reas n o urbanizadas, com superf cies muito

reflectivas e quentes, mas inferior a Monsanto que caracterizado por albedos e

temperaturas de superf cie baixos.

As reas urbanas consolidadas e o Aeroporto, s o as que ret m maior quantidade

de calor em rela o energia solar recebida (QG/Q* superior a 30%), enquanto

Monsanto apenas ret m cerca de 14%. O parque florestal distingue-se das outras reas

pela maior quantidade do fluxo de calor latente libertado durante o dia ( 380 W m-2),

contrastando com a Baixa, que liberta menos de metade desse valor ( 180 W m-2). As

restantes reas encontram-se numa fase de transi o entre as reas rurais do termo de

Lisboa e a urbaniza o compacta, armazenando uma m dia de 25 % do total de radia o

recebida. Loures, como se fez refer ncia, o local que apresenta temperaturas de

superf cie mais elevadas. Esta grandeza f sica negativamente correlacionada com o

fluxo de calor sens vel (o coeficiente de correla o de Pearson de -0,64 quadro

9.10), o que significa que QH tende a diminuir com o aumento das temperaturas de

superf cie.

Page 318: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

- 318 -

Quadro 9.9 – Resumo dos valores dos termos do balanço radiativo em 19 de Agosto de 1994 ( 10:00 h, tempo local)

Áreas urbanas (da esquerda para a direita, ordenadas por ordem decrescente de z0) Florestal “Rural”Classe de Rugosidade (z0) (m)

1,0 1,0 1,0 1,0 1,0 1,0 0,5 0,03 0,02 0,02 0,01 0,7 0,03

Baixa Marquês Saldanha CampoGrande Alcântara Benfica Belém Lumiar Expo Chelas Aeroporto Monsanto Loures

Albedo (%) 13,5 16,0 16,1 17,6 16,4 18,7 16,5 20,7 19,6 17,8 21,1 10,1 18,8

Ts (K) 305,3 303,6 304,7 304,9 305,3 306,4 302,9 307,4 305,9 304,8 307,7 300,8 309,5

Q* (W m-2) 612,2 602,7 596,1 583,2 590,5 567,3 601,9 545,0 562,2 582,7 540,0 662,0 546,3

QG (W m-2) 231,6 212,9 202,1 160,2 180,4 173,0 110,2 138,4 155,8 145,7 177,8 91,1 130,4

QE (W m-2) 177,5 180,7 186,9 235,6 211,0 213, 309,7 244,2 230,9 250,5 180,8 376,3 257,4

QH (W m-2) 203,0 209,0 207,1 187,2 199,0 180,8 181,8 162,3 175,4 186,5 181,3 194,6 158,4

Term

odo

bala

nço

ener

gétic

o

QG/ Q* (%) 37,8 35,3 33,9 27,5 30,6 30,4 18,4 25,3 27,7 25 32,9 13,8 23,8

Quadro 9.10 –Matriz de correlações entre as grandezas energéticas analisadas.

Alb Ts Q* QG QE QH QG/Q*Alb 1.00Ts 0.79 1.00Q* -0.97 -0.91 1.00QG 0.06 0.19 -0.10 1.00QE -0.43 -0.49 0.46 -0.92 1.00QH -0.64 -0.64 0.68 0.58 -0.28 1.00

QG/Q* 0.24 0.35 -0.28 0.98 -0.98 0.43 1.00

Nota: o valor mínimo significativo é de 0,63 para uma margem de erro de 0,02 e 0,47 para um erro de 0,10.

Page 319: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 9 – O balanço energético em Lisboa a partir de imagens do satélite Landsat 5

- 319 -

Fig. 9.25 – Número de pisos dos edifícios de Lisboa na década de 80 (fonte: CML).

Embora estatisticamente menos significativa, existe também uma correlação negativa,

entre as Ts e o fluxo de calor latente (r = 0,49). Isto significa que não há uma resposta

instantânea do fluxo de calor libertado para atmosfera quando aumenta Ts, porque a

energia fica acumulada no solo sob a forma de QG. Embora, no conjunto, não haja uma

correlação linear significativa entre estas duas variáveis, em certos locais como na

Baixa, no Lumiar, em Loures e no Aeroporto a resposta às Ts elevadas traduz-se num

aumento de calor condutivo (fig. 9.26).

90

140

190

240

290

340

390

440

W/m2

300

301

302

303

304

305

306

307

308

309

310

K

Calor latente (QE)

Calor sens ível (QH)

Calor armazenado (QG)

Temp. Sup (Ts)

Fig. 9.26 – Fluxos de calor e temperatura de superfície em Lisboa.

Page 320: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Parte II – Ilha de calor urbana de superfície e balanço energético em Lisboa

- 320 -

Conclui-se que o fluxo de calor latente é a forma mais eficiente de arrefecimento

das áreas com temperaturas de superfície baixas. Isto verifica-se tanto no parque

florestal de Monsanto, como no bairro residencial de Belém, locais onde a vegetação é

dominante, ou abundante. Note-se que são os locais com menor calor armazenado e

maior fluxo de calor latente as áreas mais frescas da cidade. Como refere OKE (1989), a

massa térmica dos edifícios é muito maior do que o mesmo volume de árvores,

providenciando uma reserva maciça de calor armazenado que é libertado durante a

noite, originando a ilha de calor urbano.

No caso do Inverno, nas regiões temperadas e frias, isto pode constituir uma

vantagem energética e mesmo económica. No nosso Verão mediterrâneo uma das

condições necessárias ao conforto humano é a frescura e portanto há que incrementar o

plantio de espécies arbóreas em meio urbano, com as devidas precauções (ver

CONCLUSÕES FINAIS). A utilização de vegetação de alto porte na cidade deve ser sempre

ponderada, porque existem alguns inconvenientes, que deverão ser pesados (OKE,

1989).

As modificações do balanço energético não deverão acompanhar uniformemente

a expansão de Lisboa. Poderão aparecer vários núcleos urbanos, onde essas

modificações serão mais acentuadas, acompanhando a tendência actual da metrópole

policêntrica (BARATA SALGUEIRO, 1997, 1999). É essencialmente na coroa periférica

entre Loures e a Expo, e no oriente, em Chelas, que deverão ocorrer as maiores

modificações por haver muitas áreas na expectativa de serem urbanizadas.

As novas práticas arquitectónicas e as regras de planeamento são factores a ter

em conta para prever essas modificações. Se forem planeados novos centros urbanos

com bastantes áreas verdes e jardins, o balanço radiativo terá a tendência a ter

características semelhantes a bairros como o de Belém, e o balanço energético reflectirá

essa proximidade. Se se mantiver a tendência actual de construção sem preocupações

ambientais, certamente os espaços exteriores dos novos centros urbanos serão

termicamente mais desconfortáveis, como já se verifica actualmente no norte da cidade.

Page 321: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Capítulo 9 – O balanço energético em Lisboa a partir de imagens do satélite Landsat 5

- 321 -

No futuro, dever-se-á continuar a procurar novas formas de validação dos

resultados, nomeadamente através da medição dos termos dos balanços radiativo e

energético nos vários locais da cidade de Lisboa, onde foram identificadas

comportamentos energéticos distintos. Também o tratamento de outras situações

estacionais (nomeadamente o Inverno) deverão ser ponderadas, para avaliar melhor

padrões térmicos como as ilhas de calor urbano. Para isso, dever-se encontrar novas

metodologias de fusão de informação dos satélites LANDSAT com outros mais

regulares, como os NOAA.

Também a perspectiva microclimática deve ser considerada, não só através das

superfícies “vistas” de cima, mas na sua dimensão tridimensional, incluindo-se outras

componentes como o calor antrópico e o efeito de advecção.

Page 322: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

- 323 -

CONCLUSÕES FINAIS

O clima da cidade é a forma mais evidente de modificação climática

inadvertidamente provocada pelo Homem. A sustentabilidade urbana passa pelo uso

racional da energia disponível a pela qualidade de vida dos seus habitantes. Discute-se

actualmente a forma mais inteligente de criar ambientes urbanos sustentados e

agradáveis. Algumas teses, que predominaram nos anos noventa do século XX,

advogavam o aumento da densidade urbana e a compactação da cidade. Os efeitos,

ainda não conhecidos, destas medidas visam fazer face ao acentuado crescimento

populacional nas cidades. O Population Reference Bureau estima que, em 2007, metade

da população mundial habitará em áreas urbanas e um relatório da ONU indica uma

percentagem de população a residir em áreas urbanas que ultrapassará 81% da

população mundial em 2030. É óbvio que esse aumento será mais acentuado nos países

menos desenvolvidos. Em Portugal, verificou-se um forte crescimento urbano nos

últimos 50 anos, e passou-se de um país “rural”, que tinha apenas 19,2% de população

citadina, em 1950, para um país “urbano” com 63%, em 1999.

Apesar de todos os problemas ambientais nas cidades, e de ser reconhecida a sua

influência na modificação dos campos de vento, dos padrões térmicos e energéticos (dos

quais o mais estudado tem sido claramente a ilha de calor urbano), da humidade e da

precipitação, o clima urbano tem estado ausente da discussão sobre as alterações

globais. Alguns autores sustentam que os fenómenos climáticos extremos têm vindo a

aumentar de intensidade e frequência. Ainda estão vivas na nossa memória as

Page 323: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

- 324 -

tempestades de Dezembro de 1999, que assolaram a Europa Central, especialmente a

França, que provocaram centenas de mortos e elevados gastos financeiros na

recuperação de áreas devastadas. Também, em Portugal, se têm verificado

ocasionalmente alguns fenómenos extremos, com notícia de vítimas, sobretudo por

causa da queda de árvores e outros elementos urbanos fracamente consolidados. Será

que estes fenómenos extremos estão a ser mais frequentes e intensos e serão fruto das

alterações globais, que tanto se anunciam?

Salientaram-se, propositadamente, os aspectos negativos dos ventos fortes,

porque falta fazer a avaliação dos riscos que lhes estão associados nas cidades

portuguesas.

A dissertação que se apresentou está dividida em duas partes: Na PARTE I,

estuda-se a influência do crescimento de Lisboa na modificação dos campos de vento.

Parte-se da hipótese que o crescimento desordenado, que tem acompanhado algumas

zonas de Lisboa ainda não totalmente consolidadas, nos últimos anos, sobretudo no

norte da cidade, pode fazer diminuir a velocidade média do vento, com possíveis

consequências negativas para o ambiente urbano, sobretudo no sul da cidade.

Localmente os efeitos da diminuição do vento podem não ser uma limitação, mas sim

uma potencialidade, por exemplo ao nível do conforto mecânico. É do balanço entre as

limitações e potencialidades da redução da velocidade média do vento com o

crescimento da cidade de Lisboa (a várias escalas) que trata a PARTE I do trabalho.

Utilizou-se a modelação numérica para mostrar as modificações do vento que

ocorrem à escala regional/local (conjunto da cidade) e ensaios realizados no túnel

aerodinâmico do Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC), com uma maqueta

de parte do bairro de Telheiras (escala local/microclimática), que permitiram validar

alguns dos resultados obtidos com os modelos numéricos e conhecer os campos de

vento em torno dos edifícios e os perfis do vento em altura, em diversas tipologias

urbanas desse bairro do norte da cidade.

Page 324: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Conclusões

- 325 -

Na segunda parte do trabalho, estudaram-se as principais características térmicas

das superfícies de Lisboa, dando-se especial destaque à ilha de calor de superfície e ao

balanço energético em vários locais de Lisboa, a partir de imagens derivadas do satélite

NOAA AVHRR e LANDSAT TM. Não se pretendeu provar que existe uma

modificação climática (porque já está comprovada), mas tenta-se demonstrar de que

forma os padrões térmicos das superfícies e energéticos poderão mudar com o futuro

crescimento urbano e quais as consequências para a região de Lisboa.

A expansão de Lisboa teve várias fases, desde a sua implantação até aos dias de

hoje. Os últimos cem anos foram marcados por políticas bem distintas, que levaram a

padrões de crescimento desiguais. Com o período de Duarte Pacheco, Lisboa conheceu

um projecto global, que pretendia pôr cobro aos contratos de urbanização, que interesses

particulares impunham à forma de crescimento da cidade. A cidade cresceu para norte e

nordeste. O município decide-se pela criação do Parque Florestal de Monsanto, que

seria o pulmão verde de Lisboa. A cidade dos anos 40 do Sec. XX era ordenada e

funcionalmente segregada. É a época de blocos residenciais livres e separados por zonas

verdes procurando uma maior exposição solar e um melhor arejamento.

Actualmente, a Área Metropolitana de Lisboa (AML) encontra-se em franco

desenvolvimento urbano, mostrando sinais de maior vitalidade demográfica do que

outras regiões no País. As grandes áreas de expansão e modificação dos padrões

urbanos de Lisboa encontram-se limitados ao norte e noroeste da cidade, com uma

extensão para o concelho de Loures. Actualmente propõe-se o aumento dos índices de

construção, baseados no aumento da altura dos edifícios.

Neste trabalho, apontaram-se alguns exemplos de crescimento desordenado: o

realojamento de muitas famílias que habitavam bairros clandestinos ou “provisórios”,

construídos durante o Estado Novo, cujas condições eram muito degradantes para os

moradores, mas que mantinham os terrenos com índices de rugosidade baixa. Os Planos

Especiais de Realojamento, apesar de louváveis, transformaram radicalmente a

paisagem criando índices de rugosidade muito elevada. Uma grande parte da zona de

Chelas conheceu este modelo de crescimento. Também a norte da “Segunda Circular”

Page 325: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

- 326 -

se verificou um crescimento desordenado, com a implantação de uma autêntica barreira

à penetração dos vento de norte. Actualmente, o crescimento do bairro de Telheiras,

concebido para uma classe média-alta, tornou-se num emaranhado de ruas, sem grandes

vias estruturantes, excepto as que levam a população para os subúrbios, como por

exemplo o Eixo Norte/sul. A oriente desta barreira encontra-se o actual Aeroporto de

Lisboa. Se for relocalizado, como tudo indica, poderá ser uma extensa área apetecível

para se construir segundo os moldes actuais e prolongar-se para leste a barreira. O

Concelho de Loures, a norte de Lisboa pode bem ser outro exemplo de “compactação”

urbana.

Porque é que esta barreira é ambientalmente tão importante? Porque os vento

dos quadrantes de norte e noroeste, são claramente dominantes na região. Durante a

Primavera e o Verão, a Nortada apenas é interrompida pelas brisas que sopram estuário

do Tejo e do oceano, enquanto. no Inverno, a direcção norte reparte com o nordeste e

com o oeste a predominância em termos de direcções. Na estação de Lisboa/Portela, no

período entre 1971 e 1980, verificaram-se 41 % dos registos de norte e noroeste. A

barreira, que actualmente constitui o norte da cidade, é assim uma importante limitação

à progressão do vento dominante, modificando as condições de ventilação na cidade e

seu arejamento e podendo contribuir para o aumento da frequência de episódios de

poluição excessiva (numa cidade congestionada pelo tráfego automóvel), e para o

aumento das temperaturas nas vagas de calor.

Pelos motivos anteriormente expostos, apresentou-se uma hipótese de trabalho,

para tentar determinar, com rigor, qual será a redução da velocidade média do vento, em

vários locais da cidade, se se aumentar a rugosidade para valores acima dos que se

verificam actualmente.

Para validar esta hipótese, fez-se uma abordagem temporal, tendo em conta três

momentos da evolução de Lisboa: em primeiro lugar, estimou-se o comportamento dos

ventos no sítio da cidade sem a ocupação humana, ou seja, considerando apenas a

topografia da região; num segundo momento, estimaram-se as velocidades médias do

vento com as condições dos anos oitenta do século XX, tendo em conta não só o relevo,

Page 326: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Conclusões

- 327 -

mas também a rugosidade do meio urbano; por último e baseado nas tendências futuras

da expansão de Lisboa, elaboraram-se vários cenários com o fim de se preverem as

modificações dos campos de ventos nas próximas décadas.

Utilizaram-se dados horários da velocidade e direcção do vento de

Lisboa/Portela (do período 1971 a 1980), no programa WASP, que representa os estado

da arte na estimação do vento com modelos numéricos. O estudo foi pensado e

elaborado à escala regional, ou seja, tomando a cidade no seu conjunto.

Ficou provado que o crescimento da Lisboa para norte altera significativamente

os campos de vento. O aumento da rugosidade, com a expansão urbana, reduziu a

velocidade média do vento junto ao solo em cerca de 26 a 30%, no Verão. É

precisamente nesta estação do ano que a diminuição da velocidade do vento poderá ser

ambientalmente mais desfavorável, devido ao possível aumento de episódios intensos

de poluição e ao aumento da frequência de vagas de calor. Esta estação do ano foi, por

isso, estudada com maior pormenor.

Estimaram as maiores reduções na velocidade média do vento (cerca de 3 m/s)

na Baixa de Lisboa. Na parte ocidental da cidade, essas reduções são ligeiramente

inferiores (2 m/s) devido, em parte, à rugosidade mais baixa. No entanto, verificaram-se

aqui fluxos de ar que contornam a colina de Monsanto e convergem na zona ribeirinha,

entre Algés e Alcântara.

No norte de Lisboa, devido à predominância de áreas de fraca rugosidade

(0,02 m a 0,03 m), a redução da velocidade do vento quase que não tem expressão (0,5 a

1,2 m/s). Este facto explica-se pela fraca densidade de ocupação até aos anos 80. No

futuro, a concentração urbanística poderá mudar completamente os campos de vento

actuais, estimando-se valores de redução das velocidades para níveis semelhantes aos

estimados na Baixa.

As actuais diferenças norte/sul à superfície (fraca redução da velocidade do

vento a norte e forte a sul) resultam sobretudo da diferente ocupação do solo, mas vai-se

atenuando em altitude, a tal ponto que, a 100 m de altura, a redução do vento no sul da

cidade apresenta já valores semelhantes ao norte. Concluiu-se que a influência da cidade

se faz sentir até aproximadamente 200 m de altura.

Page 327: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

- 328 -

Em situações de Nortada forte (predominância insistente de ventos do quadrante

de norte com velocidade média igual ou superior a 5 m/s), o abrandamento da

velocidade ainda é maior e ocorre predominantemente nos vales do sul e nas zonas

ribeirinhas da cidade, por se encontrarem aí as maiores densidades de construção.

Propuseram-se dois cenários para estimar as modificações dos regimes de vento

nas próximas décadas. O primeiro (cenário A) conserva as tendências actuais da

expansão da cidade, com duas variantes: considerando o aumento da rugosidade no

norte de Lisboa do valor actual para 1,5 m e 2,0 m (valores típicos de uma cidade que

cresce em altura e volumetria). Numa perspectiva meramente académica (cenários B),

propôs-se que se elevasse a superfície topográfica da actual cota 100 para 130 ou 150m

(duas variantes), que simula uma cidade bastante compacta e uniforme, de tal modo que

a superfície dos topos dos edifícios teria um fraco índice de rugosidade. Este conceito

de “cidade utópica” serviu para lançar a discussão sobre novos conceitos urbanos e seus

efeitos nos campos de vento.

Com os cenários do tipo A, em que se considera a expansão de Lisboa para

norte, caótica e sem corredores de ventilação, demonstrou-se que, quando comparada

com os valores estimados para os anos 80, poderá haver ainda uma redução maior da

velocidade do vento, traduzida em cerca de 0,7 m/s a 10 m de altura, correspondendo a

uma perda de velocidade do vento de cerca de 22 % junto ao solo. Esse valor seria

apenas ligeiramente agravado, quando considerada uma rugosidade de 2,0 m no norte da

cidade. Ou seja, pouco se alterariam as velocidades média do vento com índices de

rugosidade acima de 1,5m.

Com os cenários do tipo B, as velocidades do vento não sofreriam alterações

significativas junto à superfície, podendo mesmo não ocorrer redução do vento. Este

tipo de solução poderia melhorar a circulação do ar em altitude, o que beneficiaria os

sistemas de transporte e dispersão de poluentes.

Com vista a estudar a modificação dos campos de vento em torno dos edifícios

(escala microclimática) e validar alguns dos resultados obtidos com os modelos

numéricos, construiu-se uma maqueta na escala 1:500 de uma parte do bairro de

Page 328: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Conclusões

- 329 -

Telheiras (a norte da segunda circular). A maqueta serviu para efectuar ensaios no túnel

aerodinâmico do Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC). Tentou mostrar-se

de que modo o aumento da rugosidade pode alterar as condições de ventilação em várias

tipologias desse bairro (torres isoladas, espaços abertos, semi-fechados e um corredor de

ventilação importante, o Eixo Norte/sul).

Foram testadas várias combinações de blocos a barlavento da maqueta que

simulam diferentes rugosidades. Dois arranjos de blocos são representativos de

rugosidade aproximada de 0,02 m e 1,5 m, situações típicas do norte da cidade antes dos

anos 80 do século XX e nas próximas décadas.

Estudaram-se as direcções e velocidades dos ventos em torno dos edifícios para

as três direcções predominantes em Lisboa (norte, noroeste e oeste). Neste estudo,

utilizaram-se várias técnicas: figuras de erosão com areia, anemometria baseada em

tubos de Pitot-Prandtl para obtenção de perfis de vento em altura e fios de algodão

dispostos numa malha regular, para determinar as direcções do vento à superfície, em

torno dos edifícios.

Os resultados permitiram confirmar os que foram obtidos com os modelos

numéricos, verificando-se que o aumento da rugosidade a barlavento da maqueta

de ≈0,02 para ≈1,5 m, implica uma significativa diminuição da velocidade do vento

junto ao solo. As maiores variações ocorrem nos espaços semi-fechados (22,5 % de

retenção de areias), enquanto o Eixo Norte/sul e as torres isoladas apenas retêm pouco

mais de 3 % com o aumento de z0. Os espaços edificados em banda, com aberturas a

norte e a sul, que permitem a passagem do ar, sofrem um agravamento intermédio,

retendo cerca de 12 % das areias inicialmente colocadas no chão da maqueta.

Os perfis de vento efectuados sobre a maqueta, permitiram concluir que o

aumento da rugosidade de ≈0,02 para ≈1,5 m se traduz em reduções da velocidade do

vento, diferenciadas em altura. A 25 m observa-se uma redução na velocidade do vento

em cerca de 46%, reduzindo 30 % a 50 m e 10% a no correspondente a 200 m de altura.

Os ensaios com as direcções de norte e noroeste permitiram verificar que as

pracetas semi-fechadas (com abertura para norte, mas tapadas a sul) não apresentam

Page 329: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

- 330 -

condições de escoamento do ar originando movimentos turbilhonares junto ao solo, que

facilitam a retenção de poluentes, lixos e outros materiais nocivos no seu interior.

O caso do Eixo Norte/sul é um bom exemplo a explorar em termos de aplicação

dos resultados a outros locais. Considerando que se trata de um corredor de ventilação é

fundamental para o sul da cidade. No entanto, a sua construção no local estudado

levanta alguns problemas. Como foi verificado nos ensaios com a direcção noroeste,

devido ao desnível que apresenta em relação às áreas envolventes (o seu piso está

sobrelevado em cerca de 6 m), pode ocorrer, na presença de ventos fortes, o chamado

"efeito de barra". O vento de noroeste, que incide a 45º com aquela via (neste troço tem

uma direcção norte/sul), transpõe o obstáculo, formando movimentos turbilhonares que

se poderão traduzir em perigos acrescidos para a circulação rodoviária. Mostrou-se

igualmente a existência de árvores a leste daquele eixo viário retardam o fluxo de ar,

ocasionando uma redução local da velocidade do vento. Se forem plantadas no flanco

oposto (a oeste do talude), nos locais potencialmente geradores de turbulência, as

árvores poderiam atenuar este efeito e evitar possíveis ocorrências de acidentes,

sobretudo na presença da Nortada forte.

Onde há prédios altos, muito próximos entre si e a sua orientação coincide com

rumo do vento, o escoamento do ar tende a inverter o seu rumo na saída das ruas,

originando uma deflexão de 180º. Este fenómeno de aceleração da velocidade do vento,

observado no túnel aerodinâmico na zona a oeste do Eixo Norte/sul, poderá acentuar o

desconforto mecânico, ocorrendo mesmo o perigo de queda de indivíduos fisicamente

mais debilitados.

Os ensaios com a direcção noroeste mostraram que a redução da velocidade do

vento poderá ocorrer, não só devido ao aumento da rugosidade, mas também devido ao

angulo de 45º que o vento forma com a orientação predominante norte/sul dos conjuntos

arquitectónicos. Por exemplo, no Eixo Norte/sul, a retenção de areias é maior do que

com o rumo norte, por causa da existência de edifícios altos (com cerca de 25 m de

altura) em implantação linear a oeste daquele eixo viário, que se interpõe-se à

progressão do vento, diminuindo drasticamente a sua velocidade e piorando as

condições de ventilação.

Page 330: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Conclusões

- 331 -

Com a direcção de oeste, a existência desta barreira arquitectónica compacta

implica um padrão menos definido nos escoamento do ar em torno do edifícios e um

aumento dos movimentos turbilhonares junto aos taludes do eixo Norte/sul. Também a

maior acumulação de areias, junto das torres isoladas, representa o empobrecimento das

condições de ventilação deste local em relação às outras duas direcções. Para melhorar

essas condições de ventilação seria necessário a existência de aberturas de escoamento

do ar, neste tipo de conjuntos arquitectónicos de "barreira".

A partir da identificação dos problemas anteriormente expostos, apresenta-se um

conjunto linhas condutoras com interesse para o planeamento urbano, nas áreas ainda

não completamente consolidadas do norte e nordeste de Lisboa.

À escala regional os princípios climáticos são as seguintes:

1) Incrementar os corredores de ventilação de orientação (norte/sul ou

noroeste/sudeste, direcções dominantes do vento na cidade), sobretudo em

áreas urbanas ainda não consolidadas: esta medida, a longo prazo, ajudaria o

sul da cidade a não “sufocar” com a diminuição da velocidade do vento, que se

demostrou já existir.

2) Abrandar o crescimento em altura dos edifícios e travar a barreira

arquitectónica existente que retarda a circulação do vento de norte, criando-se

simultaneamente com os corredores de ventilação, “aberturas” para não

impedir a progressão do vento daquele vento dominante.

3) Consertar estas medidas com os municípios a norte de Lisboa, de modo a que a

barreira de penetração ao vento não se densifique a barlavento da cidade (o

clima urbano não é propriedade de uma região administrativa).

À escala do bairro também se provou que certas arranjos arquitectónicos são

ambientalmente mais correctos (escala microclimática):

Page 331: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

- 332 -

4) Evitar a construção de tipologias fechadas, porque incrementam a recirculação

do ar no seu interior. A inexistência de saídas de escoamento do ar pode levar à

permanência de lixos e outros elementos nocivos, que degradam os espaços.

5) Prever entradas e saídas nas tipologias em banda, de modo a não reterem o

escoamento do ar e não aumentarem os movimentos turbilhonares.

6) Construir ruas amplas para evitar efeitos de aceleração local do fluxo de ar

(efeito Venturi). Sobretudo na presença de ventos fortes, podem provocar

desconforto mecânico nos indivíduos e acidentes em indivíduos fragilizados.

7) Evitar a construção de grandes conjuntos urbanísticos em implantação linear,

sem passagem de escoamento do ar. O fluxo quando incide a 45º pode passar

por cima dos edifícios, criando movimentos turbilhonares a sotavento junto ao

solo, aumentando o risco para os transeuntes (efeito de barra).

8) Não construir grandes vias e circulação (tipo Eixo Norte/sul) com desníveis em

relação às envolventes. No caso do Eixo Norte/sul, que no troço estudado está

sobrelevado cerca de 6 m, pode ocorrer, na presença de ventos fortes, o "efeito

de barra". Quando o vento transpõe o obstáculo fazendo um angulo de cerca de

45º com a direcção predominante da via, criando movimentos turbilhonares e

possivelmente o aumento de velocidade do vento e da turbulência, que se

poderão traduzir em perigo acrescido para a circulação rodoviária.

9) Planear cuidadosamente o plantio de árvores. Onde ocorrem acelerações do

vento podem ajudar a suster o seu ímpeto, criando ambientes mais agradáveis,

sobretudo durante o Verão, quando a vida ao ar livre é mais intensa. Copas

densas são propícias a esse efeito.

Mas as árvores não devem formar conjuntos compactos nos corredores de

ventilação pois, apesar da sua permeabilidade ao fluxo, retardam-no.

Demonstrou-se que a existência de árvores a leste do Eixo Norte/sul retarda o

fluxo de ar, ocasionando uma redução local da velocidade do vento. Plantadas

Page 332: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Conclusões

- 333 -

no flanco oposto do eixo, nos locais potencialmente geradores do aumento da

turbulência, as árvores poderiam atenuar esse efeito, sobretudo na presença da

Nortada.

A segunda parte do trabalho foi dedicada ao estudo da ilha de calor urbano de

superfície (ICUsup) e ao balanço energético em Lisboa, a partir de imagens dos satélites

NOAA AVHHRR e LANDSAT TM. Pretendeu-se explorar as potencialidades deste

tipo de informação e testar alguns algoritmos, que permitiram evoluir no conhecimento

do clima regional e local de Lisboa.

A ilha de calor urbano é um dos padrões térmicos característicos do clima das

cidades, reconhecido por ser uma das mais evidentes formas de alteração climática

provocada inadvertidamente pelo Homem. Tem sido identificadas em todo o Mundo,

até em cidades pequenas, com menos de 10 000 habitantes. No espaço construído as

temperaturas são geralmente mais elevadas do que nos arredores, frequentemente áreas

agrícolas, florestais, ou apenas devolutos.

A ilha de calor urbano de Lisboa começou a ser estudada por M. J. ALCOFORADO

na década de oitenta. A autora identificou uma anomalia positiva na cidade de cerca de

0,5 a 1,1ºC nas temperaturas mínimas de Inverno, enquanto nas máximas médias não se

observaram grandes diferenças térmicas nas estações meteorológicas dentro e fora da

cidade. As diferenças na temperatura máxima de Verão são negativas, indicando uma

cidade mais fresca nesta estação do ano. A intensidade da ilha de calor urbano de Lisboa

não deve ultrapassa 2 a 3º C. Em 78% das noites de Inverno e em 63 % das noites de

Verão há sempre um aumento da temperatura em direcção ao centro/sul da cidade.

Este padrão térmico foi identificado por M. J. ALCOFORADO, a partir das

temperaturas do ar medido a 2 m do solo e é representativo da camada atmosférica

urbana inferior. No presente trabalho, a ilha de calor estudada é a que corresponde às

temperaturas, não do ar, mas das superfícies, estimadas a partir de imagens do satélite

NOAA AVHRR. Nem sempre sobre as superfícies mais quentes se encontram as

temperaturas do ar mais elevadas, porque estas resultam da interacção complexa entre o

balanço radiativo, a energia disponível para os fluxos de calor turbulento e os ventos

locais. Em algumas cidades, a ilha de calor da atmosfera urbana inferior e a ilha de calor

Page 333: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

- 334 -

da superfície têm génese e ritmos distintos e, por isso, não se devem confundir. Neste

trabalho, pretendeu-se saber se há coincidência nos ritmos e intensidades entre aqueles

dois padrões térmicos.

Foram utilizadas 438 imagens NOAA (187 diurnas e 251 nocturnas), que

correspondem às situações sem nebulosidade no período de Agosto de 1998 a Julho de

1999. As diferenças das temperaturas de superfície nocturnas e diurnas, foram obtidas

através da extracção dos valores dos pixel (área de 1,1 x 1,1 km) das temperaturas de

superfície em dois locais de Lisboa: um no centro da cidade, entre o Saldanha e a Baixa

e outro no Aeroporto, que foi utilizado como referência da periferia.

Concluiu-se que as diferenças diurnas entre o centro da cidade e o Aeroporto são

mínimas entre Outubro e Março, sendo raramente superiores a 2º C. Nessa época do ano

há uma ligeira tendência para a periferia da cidade se encontrar ligeiramente mais fria

(em média cerca de 0,5º C), o que traduz uma ténue ICUsup no centro. Durante o

Verão, o centro encontra-se mais fresco (em média 2º C) do que a periferia, originando

uma ilha de frescura.

Durante a noite, e praticamente em todo o período analisado (mais de 90% dos

casos), no centro da cidade existe uma ilha de calor, com um máximo nos meses de

Inverno, especialmente em Fevereiro (Δ média móvel ≈ 4º C), intensidade que se atenua no

Verão.

Confirmou-se a concordância entre o aumento das temperaturas mínimas médias

do ar no Inverno no centro da cidade, com o aumento das temperaturas de superfície

nocturnas naquele local e estação do ano. Também a anomalia negativa das temperatura

máximas do ar na cidade, durante o Verão, encontra correspondência nas temperaturas

de superfície mais baixas.

O número de noites em que a cidade está mais quente que a periferia é sobretudo

evidente no período mais frio do ano, atingindo valores entre 70 a 80 % no Outono e

Inverno, mostrando uma ICUsup frequente. Este valor decresce bruscamente na

Primavera e no Verão. Nesta estação do ano, diminui o número de noites e dias em que

o centro está mais aquecido, aumentando a frequência dos dias em que o aquecimento

diurno na periferia ultrapassa o do centro da cidade.

Page 334: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Conclusões

- 335 -

Cinco perfis de temperaturas de superfície (três de orientação norte/sul e dois

oeste/leste) permitiram identificar um gradiente térmico norte/sul, mais elevado no

centro da cidade, e outro oeste/leste, que mostra a parte sudeste de Lisboa ligeiramente

mais quente.

Conclui-se há uma forte correspondência entre os padrões e ritmos da ilha de

calor do ar e da superfície. Em futuros trabalhos, será necessário proceder a uma análise

baseada em tipos de tempo, que permitam confirmar, ou não, as restantes características

das ilha de calor urbano de Lisboa.

O estudo das interacções energéticas entre os espaços que compõem a cidade e a

camada limite atmosférica urbana é fundamental para conhecer as causas da ilha de

calor de superfície. Foi levado a cabo, a partir de uma imagem do satélite LANDSAT 5

TM, de um Modelo Digital do Terreno e vários algoritmos, a estimação dos termos dos

balanços radiativos e energéticos em Lisboa num dia de Verão (19 de Agosto de 1994).

Demonstrou-se que o balanço energético é claramente modificado pela cidade

quando comparado com as poucas áreas suburbanas ainda não construídas, ou com a

área florestal de Monsanto.

As “saídas radiativas” dependem muito da morfologia urbana. O albedo,

conjuntamente com as temperaturas de superfície, são os principais factores locais que

modificam o balanço radiativo. No centro de Lisboa, o albedo é reduzido em cerca de

28 %, em relação à periferia suburbana, mas a redução ainda é maior em Monsanto

(47 % em relação ao centro da cidade).

À hora da passagem do satélite (aproximadamente 10:00, tempo local), as

superfícies mais quentes encontravam-se a noroeste da cidade, no Concelho de Loures,

enquanto o centro de Lisboa estava ligeiramente mais frio. As copas das árvores de

Monsanto eram as superfícies menos quentes.

Apesar de todos os fluxos radiativos em pequeno e grande comprimento de onda

que entram e saem do sistema serem modificados pelas urbanizações, o balanço

radiativo varia pouco entre as áreas urbanas e a periferia, porque a diminuição da

radiação global é compensada pelo aumento da componente radiativa que chega à

superfície em grande comprimento de onda. Isto é devido ao aquecimento da atmosfera

Page 335: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

- 336 -

urbana e ao aumento da emissividade atmosférica causada pela presença, em maior

quantidade, de partículas e gases poluentes.

Em termos de modificação dos termos do balanço radiativo, em Lisboa, nos

próximos anos, poder-se-á esperar uma diminuição da área com superfícies boas

reflectoras e albedo elevado e a diminuição das temperaturas de superfície em cerca de

2 a 3 K. Nestas áreas, isto traduzir-se-á num acréscimo do input radiativo total em cerca

de 10 a 30 W m-2 que, pontualmente, como no caso do Aeroporto, pode chegar a um

aumento de 100 W m-2.

Visto que as diferenças no balanço radiativo são mínimas, o que poderá explicar

os diferentes padrões térmicos na cidade são os restantes fluxos de calor condutivo,

latente e sensível. De um modo geral e salvaguardando variações periódicas e aleatórias,

o aquecimento urbano pode ser explicado pela maior e mais prolongada transferência de

calor sensível e pela menor perda de calor latente.

A área urbana consolidada, conjuntamente com o Aeroporto, são as que retêm

maior quantidade de calor em relação à energia solar recebida (superior a 30%),

enquanto Monsanto apenas retém cerca de 14%. O parque florestal distingue-se das

outras áreas pela maior quantidade do fluxo de calor latente libertado durante o dia

(≈ 380 W m-2) contrastando com a Baixa, que liberta menos de metade desse valor

(≈ 180 W m-2).

Conclui-se também que os locais com menos calor armazenado e maior fluxo de

calor latente (traduzida numa maior quantidade de energia absorvida pela atmosfera

urbana) são as áreas mais frescas da cidade. A massa térmica dos edifícios é muito

maior do que o mesmo volume de árvores, providenciando uma reserva maciça de calor

armazenado, que é libertado durante a noite originando a ilha de calor da atmosfera

urbana inferior.

As modificações previstas para os próximos anos do balanço energético na

cidade deverão ocorrer nas áreas que formarão novos núcleos urbanos, acompanhando a

tendência policêntrica actual. Se esses núcleos urbanos forem planeados de acordo com

regras ambientais, de modo a sustentabilizar o sistema urbano da AML, ou seja

incluindo espaços verdes (com as condicionantes que atrás se apontou para o vento), o

Page 336: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Conclusões

- 337 -

balanço radiativo terá a tendência a ter características semelhantes a bairros como o

Belém. Se se mantiver a tendência actual de construção sem preocupações ambientais,

certamente os espaços exteriores serão termicamente mais desconfortáveis, como os que

já verificam em certas zonas da cidade. Isto leva-nos novamente à questão da

racionalização do consumo de energia e à sustentabilidade urbana no futuro.

Conclui-se com algumas linhas de rumo a seguir no futuro para melhorar e

estimular os estudos de clima urbano:

a) Dever-se-á criar novas metodologias de fusão de informação dos satélites

LANDSAT com os que obtêm imagens mais regularmente (como os de

NOAA), de modo obterem-se séries de dados representativas de mais

situações estacionais.

b) Operacionalizar todo o conjunto de procedimentos para a obtenção das

grandezas físicas necessárias à estimação do balanço radiativo das

superfícies.

c) Explorar os novos sistemas de satélites que possuam canais térmicos de

maior resolução temporal e espacial.

d) Continuar a procurar o melhor método de representação do volume da

cidade, utilizando imagens de grande resolução espacial

e) Incluir nos modelos outras componentes como o calor antrópico e o efeito

de advecção.

Sintetizar os resultados da investigação que se desenvolveu nestes últimos

anos, em mapas de média e grande escala, de modo a que a informação seja facilmente

utilizada por técnicos e decisores, será uma forma de dar sentido à aplicação da

climatologia urbana. Por isso, divulgar os trabalhos que se tem efectuado, no projecto

CLIMLIS, será um dos nossos objectivos principais de investigação futura.

Page 337: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

- 343 -

BIBLIOGRAFIA

ABRASSART, E. (1997) - Les risques liés au climat: point de vue d'un réassureur. Les

risques liés au climat. Publication de l'Université de Bourgogne, Dijon, LXXXVII: 135-140.

AHRENS, C. (1999, 6ª ED.) - Meteorology Today. An Introduction to Weather, Climate, and the Environment. Brooks/Cole, Pacific Grove: 528.

ALCOFORADO, M. J. (1984) - Os ventos dominantes em torno da serra de Sintra. CEG-Linha de Acção de Geografia Física. Relatório nº 20, Lisboa: 73.

ALCOFORADO, M. J. (1985) - Dois exemplos de utilização de termografias obtidas de avião. Primeiro Seminário sobre Cartografia Temática e Cadastral, LNEC, Lisboa, 12: 23.

ALCOFORADO, M. J. (1986) - Contribution to the study of Lisbon's heat island. Analysis from an infra-red image. Freiburger Geographische Hefte, 26: 165-176.

ALCOFORADO, M. J. (1987) - Brisas estivais do Tejo e do Oceano na região de Lisboa. Finisterra - Revista Portuguesa de Geografia, Lisboa, XXII(43): 71-112.

ALCOFORADO, M. J. (1988) - O clima da região de Lisboa. Vento, insolação e temperatura. Dissertação de Doutoramento em Geografia Física, apresentada à Universidade de Lisboa: 568 (polic.).

Page 338: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

- 344 -

ALCOFORADO, M. J. (1991) - Influence de l'advection sur les champs thermiques urbains à Lisbonne. Publications de l´Association Internationale de Climatologie, 4: 29-34.

ALCOFORADO, M. J. (1992) - Lisbon's thermal patterns. Pre-congress meeting of the Comission on Climatology, 27th International Conference of the IGU, Pennsylvania: 101-108.

ALCOFORADO, M. J. (1992) - O clima da região de Lisboa. Contrastes e ritmos térmicos. Memórias do Centro de Estudos Geográficos, vol. 15, CEG, Lisboa: 347.

ALCOFORADO, M. J. (1998) (FERNANDEZ GARCIA et al., ED.) - Estudos de clima urbano em Portugal. Clima y ambiente urbano en ciudades Ibéricas e Iberoamericanas. Ed. Parteluz. Madrid: 41-66.

ALCOFORADO, M. J.; A. LOPES (2003) - Wind Fields and Temperature Patterns in Lisbon (Portugal) and Their Modification Due to City Growth. Fifth International Conference on Urban Climate, University of Lodz, Poland:(ed. cd-rom).

ALCOFORADO, M. J.; A. LOPES; H. ANDRADE (1999) – Cartes thermiques et cartes du “risque” d´occurrance de basses températures en milieu urbain a Lisbonne. Publications de l’Association Internationale de Climatologie, 12:433-441.

ALCOFORADO, M. J.; A. LOPES; H. ANDRADE (2000) – A ilha de calor de Lisboa. Aspectos e problemas da sua representação cartográfica. Jornadas sobre Clima e aplicações, Bragança: 9-10.

ALCOFORADO, M. J.; H. ANDRADE (2003) - Nocturnal urban heat island in Lisbon (Portugal): main features and modelling attempts. Fifth International Conference on Urban Climate, University of Lodz, Polónia: (ed. cd-rom).

ALCOFORADO, M. J.; J. TABORDA (1998) - O clima de Évora. Contrastes térmicos locais. A cidade de Évora. Boletim de Cultura da Câmara Municipal. II série: 507-531.

ALCOFORADO, M. J.; S. DAVEAU; A. LOPES, M. BAUMGARTNER (1996) - Regional thermal patterns in Portugal using satellite images (NOAA AVHRR). Finisterra - Revista Portuguesa de Geografia. Lisboa, XXX(59-60): 123-138.

AMERICAN ASSOCIATION FOR WIND ENGINEERING (1997) - Wind engineering: new opportunities to reduce wind hazard losses and improve the quality of life in the USA: 25. (ed. elec.).

AML-INE (2001) - Área Meteopolitana de Lisboa em Números, AML: 64.

ANDRADE, H. (1996) - A qualidade do ar em Lisboa. Valores médios e situações extremas. Finisterra - Revista Portuguesa de Geografia. Lisboa XXXI(61): 43-66.

Page 339: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Bibliografia

- 345 -

ANDRADE, H. (1998) - O desconforto térmico estival em Lisboa. Uma abordagem bioclimática. Finisterra - Revista Portuguesa de Geografia. Lisboa XXXIII(66): 41-58.

ANDRADE, H. (2000) - The thermal comfort in the green spaces of Lisbon: the garden of the Gulbenkian Foundation. Book of abstracts 4-th Conference on Contemporary Topoclimatic Research, Varsóvia: 89-90.

ANDRADE, H., A. LOPES (1998) (FERNANDEZ GARCIA et al., ED) - A utilização de um SIG para a estimação de temperaturas em Lisboa. Clima y ambiente urbano en ciudades Ibéricas e Iberoamericanas. Ed. Parteluz, Madrid: 85-91.

ANDRADE, H.; A. LOPES (1999) - A influência da radiação e da velocidade do vento no conforto térmico na área suburbana a norte de Lisboa (Caneças). VIII Colóquio Ibérico de Geografia, actas do Vol. I., Lisboa: 24-30.

ANDRADE, H.; LOPES, A. (1998) - A utilização de um SIG para a estimação de temperaturas em Lisboa. Clima e ambiente urbano em cidades ibéricas e iberoamericanas,. Parteluz, Madrid:85-91.

ARNFIELD, A. J. (1982) - An approach to the estimation of the surface radiative properties and radiation budgets of cities. Physical Geography, 3(2): 97-122.

ARNFIELD, A. J. (2003) - Two decades of urban climate research: a review of turbulence, exchanges of energy and water, and the urban heat island. International Journal of Climatology, 23: 1-26.

ATKINSON, B. W. (1975) - The mechanical effect of an urban area on convective precipitation. Occasional Papers Department of Geography, Queen Mary College, University of London: 3.

AULICIEMS, A. (1997) - Comfort, clothing and health. Applied climatology. Principles and practice. R. Thompson, Allen Perry, Ed. (Ed.)., Routledge, Londres: 155-174.

BARATA SALGUEIRO, T. (1992) - A cidade em Portugal. Uma Geografia Urbana, Edições Afrontamento, Lisboa : 439.

BARATA SALGUEIRO, T. (1997) - Lisboa, metrópole policêntrica e fragmentada. Finistera - Revista Portuguesa de Geografia. Lisboa, XXXII(63): 179-190.

BARATA SALGUEIRO, T. (1999) - Ainda em torno da fragmentação do espaço urbano. Inforgeo, Lisboa, 14: 65-76.

BARATA SALGUEIRO, T. (2001) - Lisboa, periferia e centralidades. Celta, Oeiras: 230.

BARIOU, R. (1978) - Manuel de télédétection. Edition Sodipe, Paris, 349 p.

BARRY, R.; R. CHORLEY (1992, 6ª ed.) - Atmosphere, Weather & Climate. Routledge. London:392.

Page 340: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

- 346 -

BECKER (1987) - The impact of spectral emissivity on the measurements of land surface temperature from satellite. International Journal of Remote Sensing, 8:1509-1522.

BECKER, F.; Z. LI (1990) - Towards a local split window method over land surface. International Journal of Remote Sensing, 11(3):369-393.

BELWARD, A. S. (1990) (BELWARD E VALENZUELA ED.) - Spectral characteristics of vegetation, soil and water in the visible, near-infrared and middle-infrared wavelengths. Remote sensing and Geographical Information Systems for resource management in developing countries, Remote sensing, I, Kluwer Academic Publishers:31-53.

BELWARD, A. S.; C.VALENZUELA, (ED.) (1990) - Remote sensing and Geographical Information systems for resource management in developing countries. Euro courses, Remote sensing, Vol. I, Kluwer Academic Publishers.

BIRD, A. (1990) (BELWARD E VALENZUELA ED.) - Principles of remote sensing: electromagnetic radiation, reflectance and emissivity. Remote sensing and Geographical Information Systems for resource management in developing countries, Remote sensing, I, Kluwer Academic Publishers: 1-15.

BIRD, A. (1990a) (BELWARD E VALENZUELA ED.) - Principles of remote sensing: interaction of electromagnetic radiation with the atmosphere and the earth. Remote sensing and Geographical Information Systems for resource management in developing countries, Remote sensing, I, Kluwer Academic Publishers:17-30.

BOISSIN, B. (1990) - La télédéteccion por satellite. Ciudad y Território, Madrid 84:169-183.

BORGES, A. (1968) - O túnel aerodinâmico do Laboratório Nacional de Engenharia Civil. Lisboa, LNEC. Memória Nº 319:6.

BORGES, A.; J. SARAIVA (1979) - An erosion technique for assessing ground level winds. Proc. Fifth International Conference on Wind Engineering, Fort Collins, Colorado, USA, Pergamon Press, Colorado, Vol. I.:235-242.

BORNSTEIN, R. D.; D. S. JOHNSON (1977) - Urban-rural wind velocity differences. Atmospheric Environment, 11: 597-604.

BREHENY, M. J. (1992) (MANNION e BOWLBY ED.) - Towards sustainable urban development. Environmental Issues in the 1990s. John Wiley & Sons, New York, Cap. 17: 277-290.

BREST, C.; S. GOWARD (1987) - Deriving surface albedo measurements from narrow band satellite data. International Journal of Remote Sensing, 8(3): 351-367.

BRITTER, R., J. HUNT E K. J. RICHARDS (1981) - Air flow over a two-dimensional hill: studies of velocity speed-up, roughness effects and turbulence. Q. J. R. Meteol. Soc., 107: 91-110.

Page 341: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Bibliografia

- 347 -

BUECHE, F.; E. HECHT (2000) - Física - Schaum's Easy Outlines (ver. Port.) Mc Graw Hill. Lisboa:138.

BUMAN-RUFFIEUX, A.-M. DE (1994) - Régimes de vents et qualité de l'air en Valais. Fribourg, Tese apresentada na Universidade de Fribourg (CH):149.

CÂMARA MUNICIPAL DE LISBOA (S/D) - História da cidade de Lisboa. Data de acesso: Novembro de 2002.http://www.cm-lisboa.pt/turismo.

CÂMARA MUNICIPAL DE LOURES (1999) - Urbanismo Loures Habitação. Loures: 144.

CARLETON, A. M. (1991) - Monitoring the Earth radiation budget and surface variables important to climate. Satellite Remote Sensing in Climatology. Belhavens Press/London CRC Press, Londres: 205-244.

CARLETON, A. M. (1991) - Principles of satellite remote sensing applied to climate studies. Satellite Remote Sensing in Climatology. Belhavens Press/London CRC Press, Londres: 39-75.

CARLETON, A. M. (1991) - Satellite Remote Sensing in Climatology. London, Belhavens Press / London CRC Press, Londres: 291.

CASELLES, V.; LÓPEZ GARCIA; J. MELIÁ; PÉREZ. CUEVA (1991) - Analysis of the heat-island effect of the city of Valencia, Spain, through air temperature transects and NOAA satellite Data. Theor. Appl. Climatology, (43): 195-203.

CEAUX, P., NATHANIEL HERZBERG (1999) - La tempête qui a traversé la France a fait trente et un morts. Le Monde édition électronique de 28 de Dezembro de 1999. Paris.

CERMAK, J. E. (ALAN DAVENPORT, ERICH PLATE, DOMINGOS X. VIEGAS, ED.) (1995) - Wind climate in cities. NATO ASI Series E: Applied Sciences, Kluwer Academic Publishers.

CHANDLER, T. J. (1965) - The Climate of London. Hutchinson, London: 285.

CLARK, B. (1986) - New look-up tables. EOS - Landsat Technical Notes, 1:7.

COLL, C., V. CASELLES; J.A. SOBRINO; E. VALOR (1994) - On the atmospheric dependence of the split window equation for land surface temperature. International Journal of Remote Sensing, 15(1):105-122.

CONSIGLIERI, C., F. RIBEIRO, et al. (1993 b) - Pelas freguesias de Lisboa. Volume 2. Lisboa, CML: 166.

CONSIGLIERI, C.; F. RIBEIRO et al. (1993 a) - Pelas freguesias de Lisboa. O termo de Lisboa. Lisboa, CML: 142.

COSTA, M. J. et al. (M. J. ALCOFORADO, et al., ED.) (1998) - Land surface temperature

Page 342: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

- 348 -

and albedo evaluation from AVHRR data on clear sky days. Climate and Environmental Change - Pre-regional Conference Meeting of the Commission on Climatology, Évora. Ed. Colibri, Lisboa: 191-192.

COSTA, M..; M. RIETHMULLER; C. BORREGO (1994) - Simulação do escoamento atmosférico em túnel de vento. 4ª Conferência Nacional sobre a Qualidade do Ambiente, Lisboa, 2:220-229.

COTONN, W.; PIELKE (1995) - Human impacts on weather and climate. University Press, Cambridge: 287.

D’SOUZA G.; A. BELWARD; J.-P. MALINGREAU (ED.) (1996) - Advances in the use of NOAA AVHRR data for land Applications. Kluwer Academic Publishers, Euro Courses, Remote Sensing, Dordrecht, Vol. 5: 479.

DAVEAU, S. (1975) - La Climatologie d'après les satellites. Finisterra - Revista Portuguesa de Geografia. Lisboa, X(19): 152-154.

DAVEAU, S. (1976) - O interesse das imagens dos satélites ERTS para o estudo do clima às escalas regional e local em Portugal. Seminário sobre detecção remota e sua aplicação ao estudo dos recursos naturais e às actividades do Homem, Lisboa:1-10.

DAVEAU, S. (1977 a) - O interesse das imagens dos satélites ERTS para o estudo do clima às escalas regional e local em Portugal. Finisterra - Revista Portuguesa de Geografia. Lisboa, XII(23):148-156.

DAVEAU, S. (1977 b) - Um exemplo de aplicação da teledetecção à investigação geográfica. Finisterra - Revista Portuguesa de Geografia. Lisboa, XII(23): 156-159.

DAVEAU, S. (1980 a) - Rapport préliminaire sur ma participation au stage organisé par le bureau de teledetection de l'Office National de la Recherche Scientifique et Tecnique d' Outre-Mer. Cadernos de Teledetecção 1, CEG, Lisboa: 17.

DAVEAU, S. (1980 b) - Première lecture des images concernant le nord-ouest de la Péninsule Iberique recueillies le 22 Septembre par le satellite HCMM. Cadernos de Teledetecção 2, CEG, Lisboa: 30.

DAVEAU, S. (1980 c) - A utilização possível dos registos de satélite em infravermelho térmico na Climatologia Regional. Cadernos de Teledetecção 4, CEG, Lisboa: 12.

DAVEAU, S. (1981) - Utilização pedagógica das imagens do satélite Meteosat. Finisterra - Revista Portuguesa de Geografia. Lisboa, XVI(1981): 381-401.

DAVEAU, S. (1982) - Interpretação climatológica das imagens de satélite. Exercícios de iniciação. Cadernos de Teledetecção 7, CEG, Lisboa: 34.

DAVEAU, S. (1982) - Les températures des 3 et 4 juillet au Portugal et dans l'ouest de

Page 343: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Bibliografia

- 349 -

l'Espagne, d'après les satellites Météosat et HCMM. Finisterra - Revista Portuguesa de Geografia. Lisboa, XVII(33): 53-96.

DAVEAU, S. (1988 a) - Thermographies HCMM de la Péninsule Ibérique de nuit et de jour. Photo-interpretation, 2(2): 11-20.

DAVEAU, S. (1988 b) - La Péninsule Ibérique dans l'infrarouge thermique et dans le visible. Photo-interpretation, 2(3): 21-30.

DAVEAU, S.; E COL. (1985) - Mapas climáticos de Portugal. Nevoeiro e Nebulosidade. Contrastes térmicos. Lisboa, CEG, Memórias do Centro de Estudos Geográficos, nº 7:84.

DIRECÇÃO GERAL DE ENERGIA (2000) - Regulamento das características de comportamento térmico dos edifícios. Decreto-Lei n.º 40/90 de 6 de Fevereiro, M.O.P.T.C., Lisboa:27.

DOMINGOS, J. D.; M. F. PINTO; M. T. PONTES (1980) - Ocorrência média anual no território Português das classes de estabilidade atmosférica Pasquill-Gifford. Revista de Engenharia Técnica. Lisboa, XLII(460): 27-41.

EASTMAN, J. R.; J. MCKENDRY; M. FULK (2000) - Change and time series analysis. Geneva, UNITAR - United Nations Institute for Training and Research, I: 28.

EASTMAN, R. (1997) - Idrisi for Windows user's guide e Tutorial exercises, Clark Labs for Cartographic Technology and Geographic Analysis, Clark University, USA.

ENDLICHER, W. (1998) – Geographie von ganz oben – Entwicklungen und Perspektiven der Erderkundung mit Satelliten. Geographische Rundschau, 50: 66-70.

ENDLICHER, W.; B. FLECHTKER (1997) - La Presqu'île de Setúbal en Image Satellitaire LANDSAT TM. Finisterra - Revista Portuguesa de Geografia. Lisboa, XXXII(64): 3-14.

ERNST, S. (1995) - Influence of urban structures on local wind systems in Freiburg i. Br. (Germany). Climatology and Air Pollution, Mendoza, Argentina, 73-81.

FERNÁNDEZ GARCIA, F. (1996) - Manual de climatología aplicada. Clima, medio ambiente y planificación., Editorial Sintesis, Madrid: 285.

FERREIRA, D. DE BRUM (1984) - Le système climatique de l’upwelling ouest ibérique. Relatório19 Linha de Acção de Geografia Física - CEG, Lisboa: 91.

FERREIRA, D. DE BRUM (1989) - Le climat de l’Atlantique oriental des Açores aux îles du Cap Vert. Contribution à l’étude du système océan-atmosphère. Thèse de Doctorat d’État, Université de Paris- Sorbonne, IV, 3 v.;1657.

FERREIRA, D. B. (1980) - Étude des reflectances de quelques cultures de la région d'Ermenonville (France): analyse photochimique et numérique des images

Page 344: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

- 350 -

Landsat. Cadernos de Teledetecção 3, CEG, Lisboa: 31.

FERREIRA, D. B. (1981) - Contribution des images infrarouges du satellite METEOSAT à la connaissance des conditions thermiques du proche Atlantique au large de l'Afrique du Nord. Cadernos de Teledetecção, 5, CEG, Lisboa. 5: 17.

FONSECA, A. (1994) - Utilização de imagens obtidas por satélites de detecção remota no planeamento e ordenamento do território. Cartografia e Cadastro,Lisboa, 1:29-34.

FRAGOSO , M. (1996) - A utilização de imagens de radar meteorológico em Climatologia. Finisterra - Revista Portuguesa de Geografia. Lisboa, XXXI (61): 29-42.

FRAGOSO, M. (1995) - Analyse spatio-temporelle de deux épisodes pluvieux dans l'agglomération urbaine de Nancy - Contribution des images du radar météorologique. Rapport de stage ERASMUS, réalisé à l'Université des Sciences et Technologies de Lille/D.A.N. Nancy (inédito).

FRAGOSO, M. (1996) - A utilização das imagens de radar meteorológico em climatologia. Finisterra - Revista Portuguesa de Geografia. Lisboa, XXXI(61): 29-42.

FRAGOSO, M. (1999) - As chuvas torrenciais de 26 de outubro de 1997, na área da Serra de Monchique: contribuição para o estudo de uma situação de tipo convectivo. VIII Colóquio Ibérico de Geografia, Universidade Nova de Lisboa: 37-44.

FRANCÊS, B. (1999) - Os Provisórios do Estado Novo. Lisboa - O outro Bairro I(1): 66.

FRANCÊS, B. (2000) - Cravos, Olaias, Malápios. Lisboa - O outro Bairro, I(2): 70.

FRANK, H., O. RATHMANN, N. MORTENSEN, L. LANDBERG (2001) - The Numerical Wind Atlas - the KAMM/WAsP Method. Roskilde, Dinamarca, Risø National Laboratory, Roskilde: 60.

GALLO, K. et al. (1993) - The use of a vegetation index for assessment of the urban heat island effect. International Journal of Remote Sensing, 14(11): 2223-2230.

GALLO, K. et al. (1995) - Assessment of urban heat islands: a satellite perspective. Atmospheric Research, (37): 37-43.

GALLO, K. et al. (1999) - Temperature trends of the U. S. historical climatology network based on satellite-designated land use/land cover. Journal of Climate, 12: 1344-1348.

GALLO, K..; T. OWEN (1999) - Satellite-based adjustments for the urban heat island temperature bias. Journal of Applied Meteorology, 38: 806-813.

GALLO, K.; T. OWEN (1998) - Assessment of urban heat islands: a multi-sensor

Page 345: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Bibliografia

- 351 -

perspective for the Dallas-Ft. Worth, USA region. Geocarto International 13(4): 35-41.

GALLO, K.; T. OWEN (2002) - A sampling strategy for satellite sensor-based assessments of the urban heat-island bias. International Journal of Remote Sensing, 23(09): 1935-1939.

GANDEMER, J. (1975) - Wind environment around buildings: aerodynamic concepts. Proceeding of the Fourth International Conference on Wind Effects on Building and Structures, Heathrow, Cambridge University Press, Cambridge: 423-432.

GANHO, N. (1995) - La isla de calor de Coimbra bajo diferentes condiciones de tiempo de verano. Estudios Geográficos. Madrid, LVI(219): 285-317.

GANHO, N. (1998) - O clima urbano de Coimbra: estudo de climatologia local aplicada ao ordenamento urbano. Dissertação de Doutoramento em Geografia Física, Instituto de Estudos Geográficos, Universidade de Coimbra:551 (polic.).

GARRATT, J. R. (1994) - The atmospheric boundary layer, Cambridge University Press:316.

GASPAR, J. (s/d a) - Da Lisboa Oriental, o Oceano, o Tejo e o Mar da Palha: três entradas para explicar Lisboa. Scripta Vetera - Edición Electrónica de Trabajos Publicados sobre Geografía y Ciencias Sociales.

GASPAR, J. (s/d b) - O sítio: ocupação e organização do território. Scripta Vetera - Edición Electrónica de Trabajos Publicados sobre Geografía y Ciencias Sociales.

GEIGER, R. (1980) - Manual de Microclimatologia. O clima da camada de ar junto ao solo. (tradução da 4ª edição de 1961), Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa: 556.

GEIGER, R.; R. ARON; P. TODHUNTER (1995) - The climate near the ground. Friedr. Vieweg & Sohn Verlag, Wiesbaden: 528.

GREENLAND, D. (1994) - Use of satellite-based sensing in land surface climatology. Progress in Physical Geography, 18(1):1-15.

GRIMMOND, C. S.; T. OKE (1999) - Aerodynamic properties of urban areas derived from analysis of surface form. Journal of Applied Meteorology, 38:1262-1292.

GRIMMOND, S.; T. OKE (1995) - Comparison of heat fluxes from summertime observations in the suburbs of four north american cities. Journal of Applied Climatology, 34: 873-889.

HENRIQUES, R. G. (1982) - Técnicas de detecção remota. LNEC, Memória n.º 573, Lisboa:35.

Page 346: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

- 352 -

HOSKER, R. (1985) - Flow around isolated structures and building clusters: a review. ASHRAE Transactions, 91(1 - Part 2 B): 1671-1692.

HOWARD, J. (1991) - Remote sensing of forest resources. Theory and application. Kuwer Academic Plublishers, Dordrecht: 432.

INE (2002) - Censos 2001 - XIV Recenseamento Geral da População. IV RecenseamentoGeral da Habitação. INE, Lisboa.

INSTITUT FÜR INDUSTRIEAERODYNAMIK GmbH (1993) - Fundamentals of Fluid Dynamics and Meteorology. In: A Acção do Vento e o Planeamento Urbano (Lição 3). Associação para o Desenvolvimento da Aerodinâmica Industrial. Departamento de Engenharia Mecânica. Universidade de Coimbra: 1-20.

INSTITUTO DO AMBIENTE (2003) - Plano Nacional para as Alterações Climáticas. cenários e esforço de redução. I.A., Volume Síntese: 24.

IPCC (1997) - The Regional Impacts of Climate Change: An Assessment of Vulnerability. (Summary for Policymakers). A special Report of IPCC Working Group II, WMO/UNEP: 17.

JACKSON, P. (1977) - A theory for flow over escarpments. Proceeding of the Fourth International Conference on Wind Effects on Building and Structures, Cambridge University Press, Cambridge: 33-40.

JACKSON, P.;J. HUNT (1975) - Turbulent wind flow over a low hill. Q. J. R. Meteol. Soc. 101: 929-955.

JÁUREGUI, E.; E. Luyando (1999) - Global radiation attenuation by air pollution and its effects on the thermal climate in Mexico City. International Journal of Climatology, 19: 683-694.

JONES, P.; M. LARRINAGA; C. WILSON (1971) - The urban wind velocity profile. Atmospheric Environment, 5: 89-102.

KONDO, J.; H. YAMAZAWA (1986) - Aerodynamic roughness over an inhomogeneous ground surface. Boundary Layer Meteorology, 35: 331-348.

KRIEBEL, K. T. (1996) (D’SOUZA G. ET AL, ED.) - Cloud detection using AVHRR data. Advances in the use of NOAA AVHRR data for land Applications, Kluwer Academic Publishers, Dordrecht: 195-210.

LAMARRE, D. (1997) - Le concept de risque lié au climat: une tentative de clarification. Les risques liés au climat. Publication de l'Université de Bourgogne, Dijon, LXXXVII:7-28.

LAMARRE, D., ED. (1997) - Les risques liés au climat. Publication de l'Université de Bourgogne, Dijon, LXXXVII:215.

Page 347: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Bibliografia

- 353 -

LANDSBERG, H. E. (1981) - The urban climate. International Geophys, Series, Londres XXVIII: 275.

LEE, D. O. (1977) - Urban influence on winds directions over London. Weather, 32: 162-170.

LETTAU, H. (1969) - Note on Aerodynamic Roughness-Parameter Estimation on the Basis of Roughness Element Description. Journal of Applied Meteorology, 8: 828-83.

LILLESAND, T.; R. KIEFER (1994) - Remote sensing and image interpretation. John Wiley & Sons, New York, Inc.:750.

LOHMEYER, A.; H. FASSLRINNER; H. SCHMITT ; K. FEHRENBACH (1988) - Case study: Quantitative determination of the pedestrian comfort near a high-rise building. Energy and Buildings, 11: 149-156.

LOPES, A. (1994) - Padrões Térmicos do Clima Local na Região de Oeiras. Mestrado em Geografia Física e Regional apresentado à Universidade de Lisboa:220 (polic).

LOPES, A. (1995) Drenagem e acumulação de ar frio em noites de arrefecimento radiativo. Um exemplo no vale de Barcarena (Oeiras), Finisterra - Revista Portuguesa de Geografia, Lisboa, XXX(59-60):149-164.

LOPES, A. (1998 a) - Contrastes térmicos nocturnos e acumulação de ar frio em áreas urbanas do sul da península de Lisboa. Finisterra - Revista Portuguesa de Geografia, Lisboa, XXXIII(66):25-40.

LOPES, A. (1998 b) – Modelling night temperatures in the south of Lisbon Peninsula with a GIS. Pre-Regional Conference Meeting on the Commission on Climatology, Évora. Ed. Colibri, Lisboa: 25-26.

LOPES, A. (1999) - O balanço de radiação e as temperaturas num vale da Região de Lisboa (Barcarena): elementos para o planeamento urbano. VIII Colóquio Ibérico de Geografia, Lisboa: 45-51.

LOPES, A. (2002) - The influence of the growth of Lisbon on summer wind fields and its environmental implications. Tyndall/CIB International Conference on Climate Change and the Built Environment, UMIST, Manchester.

LOPES, A. (2003)- Local wind changes with different roughness simulated in a wind tunnel: an example of application to a city district in the north of Lisbon (full paper aceite para publicação nos Proceedings da Fifth International Conference on Urban Climate, ICUC-5, de 1 a 5 de Setembro de 2003 em Lodz, Polónia).

LOPES, A.; H. Vieira (2002)- A utilização de balões cativos para o estudo microclimático do bairro lisboeta de Telheiras. Finisterra - Revista Portuguesa de Geografia, Lisboa, XXXVII(74):119-128. (no prelo).

Page 348: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

- 354 -

LOPES, A.; H. VIEIRA, (Ed. CARSTEN JÜRGENS) (2001) - Heat fluxes from Landsat images: a contribution to Lisbon urban planning. Regensburg Geographische Schriften., Institut für Geographie an der Universität Regensburg: 169-176.

LÓPEZ GARCÍA, M.; V. CASELLES; J. MELIÁ; J. CUEVA (1991) - NOAA-AVHRR Contribution to the analysis of urban heat islands. Proceedings of the 5th Int. Colloqium - Physical Measurements and Signatures in Remote Sensing, Courchevel, França: 501-504.

LÓPEZ GÓMEZ, A.; F. FERNANDEZ GARCIA et al. (1998) - Temperaturas nocturnas y diurnas en Madrid a partir de teledetección aeroportada. Instituto de Economia y Geografia - CSIC, Editorial Parteluz, Madrid: 83.

LÓPEZ GÓMEZ, A.; F. GARCÍA; F. ILERA (1995) - Teledetección y clima urbano. Variaciones nocturnas y diurnas de la isla de calor en Madrid. Instituto de Economía y Geografia, C. S. I. C., Madrid: 75.

LÓPEZ GÓMEZ, A.; J. GOMEZ; F. GARCÍA et al. (1993) - El clima urbano. Teledetección de la isla de calor en Madrid. MOPT. Secretaría de Estado para las Políticas del Agua y el Medio Ambiente, Madrid:157.

MATZARAKIS, A.; H. MAYER (1996) - Another kind of environmental stress: thermal stress. Newsletter of the WHO Collaborating Centre for Air Quality Management and the Air Pollution Control, 18: 7-10.

MATZARAKIS, A.; H. MAYER; M. IZIOMON (1999) - Applications of a universal thermal index: physiological equivalent temperature. International Journal of Biometeorology, (43): 76-84.

MERLIER, C.; M. J. ALCOFORADO; A. LOPES; O. MESTRE, (1998 f) – Homogénéisation des longues séries de températures portugaises. Publications de l’Association Internationale de Climatologie, 11:284-290.

MIRANDA, P. (2001) - Meteorologia e ambiente. Universidade Aberta, Lisboa: 321.

MONTAVON, C. (1998) - Simulation of atmospheric flows over complex terrain for wind power potential assessment. PhD thesis no 1855, EPFL, Lausanne, Switzerland:144.

MONTEIRO, A. (1993) - O Clima Urbano do Porto : Contribuição para a Definição das Estratégias de Planeamento e Ordenamento do Território. Dissertação de Doutoramento em Geografia Física, FLUP,Porto: 436.

MORAN, J.; M. MORGAN (1997, 5ª ed.) - Meteorology: the atmosphere and the science of weather. Prentice-Hall, Inc. London:530.

MOREIRA, M. (1991) (A. SCHEGGI et al. ED.) - Satellite remote sensing of Portuguese coastal wetlands. Bioptics: Optics in Biomedicine and Environmental Sciences. Porto. SPIE 1524: 328-344.

Page 349: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Bibliografia

- 355 -

MOREIRA, M. E. (1976) - O interesse dos documentos obtidos por teledetecção no estudo do ambiente geográfico natural. Seminário sobre detecção remota e sua aplicação ao estudo dos recursos naturais e às actividades do homem, Lisboa: 18.

MOREIRA, M. E. (1977) - O interesse dos documentos obtidos por teledetecção no estudo do ambiente geográfico natural. Finisterra - Revista Portuguesa de Geografia, Lisboa, XII(23): 133-145.

MOREIRA, M. E. (1986) - Imagens da Baía de Lagos obtidas pelos sensores TM do satélite LANDSAT 4. Apreciação crítica. Finisterra - Revista Portuguesa de Geografia, Lisboa, XXI(41): 121-130.

MOREIRA, M. E. (1989) - Cartografia temática do arrozal nos cursos inferiores de alguns rios portugueses, LNEC, Lisboa, XXI: 43.

MOREIRA, M. E. (1995) - O limite marítimo do estuário do Sado a partir de imagens satelitais. Finisterra - Revista Portuguesa de Geografia, Lisboa, XXX(59-60): 139-148.

MOREIRA, M. E. (1997) - Cartografia e Teledetecção na obra científica de S. Daveau. Finisterra - Revista Portuguesa de Geografia. Lisboa, XXXII(63): 63-65.

MOREIRA, M. E. et al. (1989) - Litoral do Algarve: interpretação de imagens digitalizadas obtidas por satélite Landsat, LNEC, Lisboa XXI: 43.

MOREIRA, M.; E. OLIVEIRA (1987) - Classificação da cobertura biofísica da Ria Formosa. LNEC, Lisboa, 29: 37.

MORTENSEN, N.; L. LANDBERG;I. TROEN; E. PETERSEN (1993) - Wind Atlas Analysis and Application Program (WAsP) (Vol. I and II). Roskilde Dinamarca. Risø National Laboratory: 29 e 133.

MULDERS, M. A. (1987) - Remote sensing in soil science. Developments in soil science 15, Elsevier: 288-313.

OKE, T. R. (1974) - Review of urban climatology, 1968-1973. W.M.O. Technical Note n.º 134:1-132.

OKE, T. R. (1984) - Towards a prescription for the greater use of climatic principles in settlement planning. Energy and Buildings, 7: 1-10.

OKE, T. R. (1987) - Boundary layer climates. Routledge, London: 435.

OKE, T. R. (1988 a) - Street Design and Urban Canopy Layer Climate. Energy and Buildings, 11: 103-113.

OKE, T. R. (1988 b) - The urban energy balance. Progress in Physical Geography, 12(4): 471-508.

Page 350: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

- 356 -

OKE, T. R. (1989) - The micrometeorology of the urban forest. Phil. Trans. R. Soc. Lond. B(324): 335-349.

OKE, T. R. (1995) (Ed. J. CERMAK et al) - The heat island of the urban boundary layer: characteristics, causes and effects. Wind Climate in Cities: 81-107.

OKE, T. R. (1997) (THOMPSON e PERRY ED.) - Urban climates and global environmental change. Applied Climatology., Routledge, London: 273-287.

OLIVEIRA, M. (2002) - Avaliação do comportamento térmico das habitações urbanas na cidade de Lisboa. Mestrado em Engenharia Mecânica, IST, Lisboa: 162.

OLIVER, H. R. (1992) - Studies of surface energy balance of sloping terrain. International Journal of Climatology, 12: 55-68.

OWEN, T. et al. (1998) - Using DMSP-OLS light frequency data to categorize urban environments associated with US climate observing stations. International Journal of Remote Sensing, 19(17): 3451-3456.

PARLOW, E. (1996 a) - Net radiation in the REKLIP-area - A spatial approach using satellite data. Progress in environmental remote sensing research and applications: 429-435.

PARLOW, E. (1996 b) - The regional climate project REKLIP - An Overview. Theoretical and Applied Climatology, 53: 03-07.

PARLOW, E. (1998) - Analyse von Stadtklima mit Methoden der Fernerkundung, Geographische Rundschau, Heft, 2:89-93.

PARLOW, E. (1998) (GUDMANDSEN ED.) - Net radiation of urban areas. Future trends in remote sensing. MCR Lab. Balkema Roterdão: 221-226.

PARLOW, E. (2000) (ED. DE DEAR; KALMA; OKE; AULICIEMS) - Remotely sensed heat fluxes of urban areas. Biometeorology and urban Climatology at the turn of the millennium - Selected papers from the conference ICB-ICUC'99, WMO/TD Nº. 1026:523 - 528.

PARLOW, E.; D. SCHERER; U. FEHRENBACH; H. BEHA (1997) - Satellite-based climate analysis of Basel/Switzerland. Proc. 3rd ERS Symp. on Space at the service of our Environment (ESA SP-414), Florença, Itália: 271-274.

PARLOW, E.;D. SCHERER;H.-D. BEHA et al. (1995) - Urban climatological parameters derived from multisensor satellite data of ERS-1 and LANDSAT-TM. Proceedings of the Second ERS Applications Workshop, ESA SP-383, Londres: 173-178.

PARSONS, K. C. (1993) - Human thermal environments. Taylor & Francis, Londres: 359.

PATERSON, D.; C. APELT (1989) - Simulation of wind flow around three-dimensional buildings. Building and Environment, 24(1): 39-50.

Page 351: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Bibliografia

- 357 -

PEDRO, J. B. (1999) Programa habitacional. Vizinhança próxima, LNEC, Lisboa: 161.

PEREIRA, E. (1998) - Modelização e securitização de riscos catastróficos. Revista do ISP (Instituto de Seguros de Portugal), Lisboa, A.2(7): 7-18.

PESSOA, C. (1999) - Violenta Tempestade Atravessou a Europa. O Público edição electrónica de 27 de Dezembro de 1999. Lisboa.

PETERSEN, E.;N. MORTENSEN;L. LANDBERG;J. HØJSTRUP AND P. FRANK (1997) - Wind power Meteorology. Roskilde, Dinamarca, Risø National Laboratory: 45.

PINHO, A. (2002). Bairro de Telheiras - Tipologias de implantação. LNEC - Núcleo de Arquitectura. Relatório CLIMLIS, Lisboa: 9.

PINHO, A. (2003). Aplicação de Príncipos Climáticos à Arquitectura. LNEC - Núcleo de Arquitectura. Relatório CLIMLIS, Lisboa: 215.

PLANA-FATTORI, A.; J. CABALLOS (1996) - Glossário de Termos Técnicos em Radiação Atmosférica. Contribuições do Instituto Astronômico e Geofísico da Universidade de São Paulo, S. Paulo, No.004: 14.

PLATE, E. J.; A. G. DAVENPORT (1995) - The risk of wind effects in cities. Wind climate in cities. J. E. Cermak, Alan Davenport, Erich Plate, Domingos X. Viegas (Ed.), Kluwer Academic Publishers. 277: 1-20.

POPULATION REFERENCE BUREAU (2001) - 2000 World Population Data Sheef. Population Reference Bureau. Internet: www.prb.org

RAMOS, C. (1986) - Tipos de anticiclone e ritmo climático em Portugal. Lisboa, CEG – Linha de Acção de Geografia Física. Relatório nº 25, Lisboa: 236.

RICCHIAZZI, P.; S. YANG; C. GAUTIER (1998) - SBDART: A Practical Tool for Plane-Parallel Radiative Transfer in the Earth's Atmosphere. Earth Space Research Group, Institute for Computational Earth System Science, University of California. Santa Barbara (software).

ROBINSON, A.; MORRISON, J.; MUEHRCKE, P.; KIMERLING, A.; GUPTILL, S. (1995) - Elements of Cartography (sixth ed.). New York: 674.

RODRIGUES, I. M. (2000 a) - As avenidas de Ressano Garcia (I). Boletim Lisboa Urbanismo,13: 20-23.

RODRIGUES, I. M. (2000 b) - As avenidas de Ressano Garcia (II). Boletim Lisboa Urbanismo, 14.

RODRIGUES, I. M. (2001) - Edificação das avenidas de Ressano Garcia (I). Boletim Lisboa Urbanismo,15.

Page 352: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

- 358 -

ROSEMBERG, N.; B. BLAD; S. VERMA (1983) - Microclimate. The biological environment. John Wiley & Sons, New York: 495.

ROTACH, M. W. (1994) - Determination of the zero plane displacement in an urban environment. Boundary Layer Meteorology, 67: 187-193.

RUTZ, F.; A. MATZARAKIS; H. MAYER (2000) - Modelling the mean radiant temperature in urban structures. Calculation of thermal indices. Meteorological Institute, University of Freiburg (software, V. 1.2).

SANCHEZ, S. F. (1994) - Baixa Pombalina. Dicionário da História de Lisboa. Lisboa, C.Q.&A.-C.: 135-136.

SANTAMOURIS, M., ED. (2001) - Energy and climate in the urban built environment. James and James, Atenas:402.

SANTANA, F.; E. SUCENA., (Dir.) (1994) - Dicionário da História de Lisboa. Lisboa, C.Q.&A.-C.: 992.

SANTOS, F. et al., Eds. (2001) - Mudança climática em Portugal. Cenários, impactes e medidas de adaptação - SIAM. Sumário executivo e conclusões. Gradiva, Lisboa:24.

SARAIVA, J. (1996) - Acção do vento e nível de conforto em espaços urbanos. Seminário "A cidade e o clima", DGOTDU, Lisboa.

SARAIVA, J. G. (1983) - Aerodinâmica dos edifícios altos: características do escoamento e resposta à turbulência de formas prismáticas. Tese de Doutoramento, LNEC Lisboa.

SARAIVA, J.; F. MARQUES DA SILVA; F. G. DA SILVA (1997) - O vento, a cidade e o conforto. IV National Meeting on Comfort in Built Environments, Bahia, Brasil.

SCHNEIDER, S. (1996) - Encyclopedia of climate and weather. Oxford University Press, New York: 929.

SILVA, C. N. (1994) - Política urbana em Lisboa. 1926-1974. Livros Horizonte Lisboa:231.

SILVA, F.; J. SARAIVA (2002) - Acção do Vento na Cobertura do Novo Estádio do Futebol Clube do Porto (Relatório Final). Nota Técnica n.º 10/02-NDA, LNEC, Lisboa:34.

SILVA, F.; J. VIEGAS.; F. GONÇALVES DA SILVA; P. SANTOS; J. SARAIVA (1998) - Assessing natural urban ventilation through an integrated model. Proceedings of the 19th Annual AIVC Conference - Ventilation Technologies in Urban Areas: 372-379.

Page 353: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

Bibliografia

- 359 -

SIMPSON, J. E. (1994) - Sea breeze and local winds. Cambridge University Press, Cambridge: 234.

STATSOFT, INC. (1998) - STATISTICA for Windows [Computer program manual]. Tulsa, OK.

STULL, R. (2000) - Meteorology for Scientists and Engineers. Brooks/Cole: 502.

TAL, A. (Ed. CARSTEN JÜRGENS) (2001) - Surface temperatures and urban land-use from satellite imagery - the case of TEL AVIV - JAFFA. Regensburg Geographische Schriften., Institut für Geographie an der Universität Regensburg:169-176.322-329.

TAYLOR, P.; J. WALMSLEY; J. SALMON (1983) - A simple model of neutrally stratified boundary-layer flow over real terrain incorporating wavenumber-dependent scaling. Boundary-Layer Meteorology, 26:169-189.

TAYLOR, P.; R. LEE (1984) - Simple guidelines to estimating wind speed variations due to small scale topographic features. Climatological Bulletin, 18: 3-32.

THOMPSON, R.; A. PERRY, ED. (1997) - Applied climatology. Principles and practice. Routledge, Londres: 351.

TROEN, I. (1990) - A high resolution spectral model for flow in complex terrain. Ninth Symposium on Turbulence and Diffusion. Roskilde: 417-420.

TROEN, I.; E. L. PETERSEN (1989) - European Wind Atlas. Roskilde: 656.

UNESCO (2003) A. J. EDWARDS (Ed.) - Radiometric correction of satellite images: when and why radiometric correction is necessary. The Unesco-Bilko project -Applications of satellite and airborne image data to coastal management. Seventh Computer-based learning module: 79-101.

VAN DE GRIEND, A. A.; OWE, M. (1993) - On the relationship between thermal emissivity and the normalized difference vegetation index for natural surfaces. International Journal of Remote Sensing, 14(6):1119-1131.

VDI VEREIN DEUTCHER INGENIEURE (1994) - Environmental Meteorology, Interactions between Atmosphere and Surfaces; Calculation of the short- and long wave radiation. VDI 3789, Part 2 Dusseldorf: 52.

VOGT, J. V. (1996) - Land surface temperature retrieval from NOAA AVHRR data. In D’SOUZA G.; BELWARD, A.; MALINGREAU, J.-P. (ED.), Advances in the use of NOAA AVHRR data for land Applications, Kluwer Academic Publishers, Dordrecht: 125-151.

VOGT, J. V.; A VIAU; F. PAQUET (1997) - Mapping regional air temperature fields using satellite-derived surface skin temperatures. International Journal of Climatology, 17:1558-1579.

Page 354: Modificações no Clima de Lisboa Como Consequência do ...

- 360 -

WILKINSON, G. (1990) (BELWARD E VALENZUELA (Ed.)) - The processing and interpretation of remotely-sensed satellite imagery – a current view. Remote sensing and Geographical Information Systems for resource management in developing countries, Remote sensing, I, Kluwer Academic Publishers: 71-97.

WILKS, D. (1995) - Statistical methods in the atmospheric sciences. Academic Press, San Diego: 467.

WU, H.; T. STATHOPOULOS (1993) - Wind-tunnel techniques for assessment of pedestrian-level winds. Journal of Engineering Mechanics, 119: 1920-1936.

YOSHINO, M. (1975) - Climate in a small area. A introduction to local Meteorology. Uni. of Tokyo Press, Tokyo:549.