Modelo de Registro de Desempenho I

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A AVALIAO EM CLASSES DE ALFABETIZAO: REGISTROS DESCRITIVOS POSSIBILITAM SUPERAO DA AVALIAO CLASSIFICATRIA E EXCLUDENTE?

Leonete Luzia Schmidt

Rosicler Schafaschek

Resumo

O texto resulta de reflexo sobre relatrios de avaliao descritiva que professores alfabetizadores fazem atualmente para documentar o processo de apropriao da escrita e da leitura de seus alunos. questionado se a forma como vem sendo realizada a avaliao descritiva possibilita superao da avaliao classificatria e excludente. Este estudo situa-se no mbito de um projeto de pesquisa sobre alfabetizao e letramento, formao inicial e continuada e trabalho docente financiado pela Capes/Observatrio da Educao. O objetivo analisar registros descritivos de avaliao elaborados por professores alfabetizadores. Foram analisados registros descritivos referentes a crianas de turmas de 1 e 2 ano do Ensino Fundamental e excertos de depoimentos de professoras alfabetizadoras das escolas da referida pesquisa. As anlises evidenciam que a avaliao descritiva realizada pelas professoras vem apresentando impresses gerais sobre os alunos com foco em atitudes, ficando ausentes os dados sobre o aprendizado da leitura e escrita.

Palavras-chave: Avaliao descritiva, reorganizao curricular, professores alfabetizadores.

1 INTRODUOA escola para todos, mas no tem conseguido garantir o aprendizado de todos que nela ingressam. Nos anos 80 eram altos os ndices de fracasso escolar, logo no incio da escolaridade ocorria repetncia e evaso, especialmente nas classes de alfabetizao. Pesquisas revelam que 52,5% das crianas matriculadas no sistema regular de ensino repetiam a primeira srie a cada ano e em torno de 2% evadia-se j nesta fase da escolarizao. Alm disso, uma parcela significativa das crianas no tinha nem mesmo seu ingresso escola assegurado.

No incio do sculo XXI, do ponto de vista do ingresso, o problema da escolarizao estava resolvido no Brasil, pois praticamente todas as crianas de 7 anos estavam matriculadas na escola. No entanto, indicadores do SAEB de 2003 apontam que 24.8% dos alunos do Ensino Fundamental eram reprovados, sendo 13.3% entre a 1 e a 4 sries e 11.5% entre a 5 e a 8. E a taxa de abandono nas quatro primeiras sries atingia os 7,5% e, nas sries finais do Ensino Fundamental, os 12%. Atualmente as crianas tm-se mantido na escola, entretanto, o problema da no alfabetizao pode ser encontrado ao longo do Ensino Fundamental. Temos, portanto, um problema que persiste.

A ampliao do Ensino Fundamental a partir de 2006, com um ano a mais no perodo de alfabetizao, criou possibilidades de reorganizao curricular das escolas e, aps seis anos desta medida, podemos nos perguntar: O que mudou com este novo tempo de trabalho na alfabetizao?

Como uma das orientaes para reorganizao curricular se deu sobre a avaliao, com a substituio de notas por registros descritivos - na busca de superao do carter excludente que esta prtica pode apresentar - este artigo procura analisar os relatrios de avaliao que professores alfabetizadores fazem atualmente para documentar o processo de apropriao da escrita de seus alunos.

O debate sobre a avaliao foi vigoroso na ltima dcada do sculo XX e, desde l, est colocada a necessidade de superao da avaliao classificatria e excludente por um modo de avaliar que tenha, como inteno, diagnosticar o processo de ensino/aprendizado para promover e manter o aluno includo num grupo que aprende e avana no desenvolvimento de suas capacidades intelectuais.

Naquela discusso, entre vrios conceitos e ideias debatidas, estava a questo da necessidade de acompanhar a construo do conhecimento do aluno enfatizando dados qualitativos deste processo. Desde ento, colocava-se que o registro de avaliao em um parecer descritivo do aprendizado/desenvolvimento da criana, seria uma alternativa para superar menes numricas ou referncia a graus de aprendizado.

A avaliao descritiva foi recentemente oficializada para as escolas pblicas estaduais de Santa Catarina e, consequentemente, para muitas redes municipais. Sendo esta forma de registro avaliativo colocada pelo poder pblico como prtica a ser consolidada nas escolas, como esta vem sendo efetivada? Como os professores respondem a esta demanda?Buscando responder a estas perguntas, esta questo foi inserida numa pesquisa iniciada em 2011, vinculada ao Programa Observatrio da Educao, que se realiza na regio sul de Santa de Catarina, microrregio da AMUREL - Associao dos Municpios da Regio de Laguna. Nosso objetivo, aqui, analisar registros descritivos de avaliao e a forma como as escolas vm efetivando esta prtica na regio.

Foram analisados documentos de seis escolas do campo da pesquisa: registros descritivos de avaliao referentes a turmas de 1 e 2 anos do Ensino Fundamental e excertos de depoimentos de professoras alfabetizadoras das referidas escolas. Em relao aos registros de avaliao, foram solicitados, a cada escola, registros avaliativos dos alunos das referidas classes do primeiro bimestre de 2012 no intuito de analisar as mais recentes prticas de registro desenvolvidas. Os depoimentos das professoras foram obtidos atravs de entrevista semiestruturada realizada no encontro de estudo e discusso sobre alfabetizao e letramento ocorrido em maio de 2012. Aps a compilao dos dados, os mesmos foram analisados com base nas leituras de autores que discutem avaliao, ensino e aprendizagem, entre eles Esteban (2003), Hoffmann (2008), Freitas (2004) e Smolka (2003).2 COMO VEM SE EFETIVANDO A PRTICA DA AVALIAO DESCRITIVA Acompanhar a aprendizagem de cada aluno de forma descritiva possibilita a memria do processo de alfabetizao dando visibilidade ao movimento em direo a aprendizagens cada vez mais complexas. Da interao que o professor mantm com os alunos cotidianamente, destacam-se situaes vividas ou questes significativas do processo de aprendizado/desenvolvimento da criana. Estas, registradas, constituem-se em dados da histria vivida por aluno e professor na instituio escolar.

Contudo, realizar o registro escrito do aprendizado dos alunos tem evidenciado a complexidade da questo quando a organizao curricular se mantm a mesma, isto , objetivando o alcance de resultados pr-fixados pelos educadores num tempo comum a todos os alunos. Considerando-se que os objetivos da alfabetizao no so alcanados a partir de algumas atividades realizadas, mas, ao longo de um tempo de trabalho com a linguagem escrita, atravs de um conjunto de aes e reflexes do aluno sobre este objeto de conhecimento, coloca-se a necessidade de apresentar o movimento do aluno neste processo.

importante ressaltar que o registro descritivo que o professor faz sobre seu aluno no consegue explicitar toda a riqueza da realidade vivida, pois os dados recolhidos resultam de um crivo de seleo subjetiva. Isto no invalida esta ao, pois nenhum dado, mesmo que se pretenda objetivo, deixa de estar marcado por um olhar mais ou menos reflexivo, mais ou menos fundamentado numa ou noutra teoria.Neste sentido, um parecer descritivo de avaliao revela tanto os objetivos do professor quanto sua concepo metodolgica de ensino. Vejamos registros do 1 bimestre de dois alunos de uma mesma turma de 1 ano escolar:

Aluno Y timo aluno. Demonstra interesse em participar das aulas e realiza as atividades propostas com facilidade e capricho.

Na linguagem oral, se expressa com clareza. Na linguagem escrita, consegue ler e escrever palavras e frases.Participa com entusiasmo de atividades ldicas e brincadeiras.

Relaciona-se bem com a turma.

Aluna X

boa aluna. Realiza as atividades propostas com lentido, demonstrando dificuldade e insegurana. Distrai-se com facilidade.

Seus desenhos so bem definidos. Adora desenhar e pintar.Relaciona-se bem com os colegas.

Fonte: Registros avaliativos de alunos da 1 ano do Ensino Fundamental de uma escola municipal, 1 bimestre de 2012. Arquivo do GEPALE.So muitas as reflexes que estes registros descritivos possibilitam. Considerando que so dois alunos de uma mesma turma, h que se questionar por que para Y aparece referncia leitura e escrita (entretanto, nenhuma referncia a diferentes gneros textuais), enquanto na avaliao de X estes itens fundamentais no so mencionados. No processo de apropriao da leitura e da escrita, no caso de X, a aluna compreende histrias lidas pela professora ou colegas? Demonstra interesse por livros? Interpreta atravs de desenhos, narrativas ouvidas? O desenho mencionado, por exemplo, uma importante linguagem grfica quando realizado no sentido de expressar algo. Os desenhos de X realizam-se em que contexto? Em relao linguagem escrita especificamente, ela utiliza letras do alfabeto e faz tentativas de escrita? Escreve seu nome e identifica o nome dos colegas? A resposta a estas perguntas indicariam questes relevantes do caminho que X faz no seu aprendizado da linguagem escrita. Mas nenhuma referncia encontra-se a estes pequenos, mas, importantes passos dados por quem se alfabetiza. Podemos inferir que, para o professor, descrever a situao de aprendizagem de um aluno que est em processo de apropriao da escrita mais difcil em relao quele que j evidencia este aprendizado. Lendo relatrios de avaliao, observamos que escritas iniciais (aquelas mais distantes da conveno) no esto sendo consideradas ou interpretadas. Ao registrar uma histria, por exemplo, o menino escreve EA1VE, querendo expressar ERA UMA VEZ; preciso considerar esta compreenso que a criana est apresentando sobre o escrever. Esta escrita, embora distante da conveno, revela que o aluno j aprendeu que a escrita representa a fala, o que um aprendizado complexo e importante para quem est em processo de alfabetizao. a partir deste conhecimento que o aluno poder chegar a uma escrita corrente e uma leitura fluente.

Considerando que o conhecimento novo se d a partir do prvio, h a necessidade de o aluno se expressar e de o professor acompanhar essa expresso para poder com ela interagir, favorecendo sua elaborao em nveis mais abrangentes e complexos. A avaliao vai se incorporando no prprio trabalho de sala de aula, pois o melhor mtodo de avaliao o mtodo de ensino (Vasconcellos, 1998, p.79).Na avaliao de X estas questes no so consideradas, h apenas referncia a sua suposta dificuldade. As dificuldades geralmente se apresentam quando o foco est apenas no que se ensina, sem considerar o movimento daquele que aprende. Quando no se leva em conta o ponto de partida da criana, o seu conhecimento inicial ao entrar na escola, comum o professor comparar o desenvolvimento dos alunos entre si, o que provoca rtulos negativos entre colegas. Certamente Y entrou na escola com conceitos que a aluna X ainda no tinha elaborado; assim, no faz sentido comparar a aprendizagem de um com a de outro, evidenciando a lentido de X. Conforme Hoffmann:O processo de aprendizagem do aluno no segue percursos programados a priori pelo professor. no cotidiano escolar que os alunos revelam tempos e condies necessrias ao processo. O tempo de avaliao decorrente de suas demandas e estratgias de aprendizagem e no do curso de atividades inicialmente previstas pelo professor. Uma tarefa igual no cumprida ao mesmo tempo por todos, porque no representa o mesmo desafio [...] (Hoffmann, 2008, p. 41).H intenes de ensino/aprendizado sendo perseguidas pelo professor e estas so referncias para a avaliao. Contudo, em um currculo organizado numa perspectiva processual de aprendizagem, a avaliao um acompanhamento do processo de reflexo e reelaborao do conhecimento pelo aluno. Nesta forma de pensar, propor atividade de ensino ou avaliao fazer um questionamento espreitando o incerto, o indito ou o diferente, j que diversos so os pontos de partida e o tempo dos alunos na elaborao de conceitos.

Os registros sobre Y e X evidenciam que a avaliao do professor est considerando s o lado do ensino. Aqueles que no apresentam um ritmo compatvel com o esperado no tm espao para evidenciar seu pensamento e sua aprendizagem desconsiderada. Consequentemente, a percepo sobre este aluno ser no sabe ou tem dificuldade. Com este sentido, a avaliao vai definindo um lugar para cada aluno e acaba isolando uns dos outros, dificultando a interlocuo. Com isso, perde-se a potencialidade da prtica pedaggica, pois

[...] a colaborao entre sujeitos com conhecimentos diferentes potencializa a aprendizagem e o desenvolvimento. A diferena nos ajuda a compreender que somos sujeitos com particularidades, com experincias prprias, constitudas nos processos coletivos de que participamos, dentro e fora da escola; posta em dilogo enriquece a ao pedaggica [...] (Esteban, 2003, p. 87).Os professores pesquisados evidenciam, em seus registros, a dificuldade em lidar com as diferenas de ritmo de aprendizado dos alunos e, sem uma anlise crtica, ao longo da escolaridade, estas diferenas transformam-se em desigualdades ou simplesmente corroboram com ela. Conforme FreitasOs professores tendem tratar os alunos conforme os juzos de valor que vo fazendo deles. Aqui comea a ser jogado o destino dos alunos para o sucesso ou para o fracasso. As estratgias de trabalho do professor em sala de aula ficam permeadas por tais juzos e determinam, consciente ou inconscientemente, o investimento que o professor far neste ou naquele aluno. nessa informalidade que se joga o destino das crianas mais pobres (Freitas, 2004, p. 20).Para que todos os alunos se mantenham includos no processo de ensino/aprendizagem, a mediao do professor fundamental, promovendo um ambiente de confiana onde avanos e dificuldades so tomadas como parte do processo de ensinar e aprender e repercutem em aes pedaggicas desencadeadoras de novos conhecimentos. Na perspectiva histrico-cultural de educao evidencia-se, ainda, a mediao que ocorre nas situaes de interlocuo entre o aluno e seus pares - as demais crianas da turma em processo de apropriao da linguagem escrita - que, em situaes significativas de troca de experincias, desencadeiam o desenvolvimento uns dos outros.

Vygotsky, em seus estudos, observou que temos considerado como aprendizado apenas as questes que j se consolidaram no desenvolvimento da criana, enquanto precisamos aprender a ver o desenvolvimento prospectivamente, isto , considerar aqueles conceitos que esto em desenvolvimento, mas que o sujeito s manifesta com a ajuda de outro. Por exemplo: o aluno, ao fazer uma lista de equipamentos observados numa imagem de pescadores, escreve ECATA para REGATA, mas, com interferncia do professor, que pronuncia pausadamente a palavra para a criana, esta percebe as letras que faltam e reescreve a palavra de forma mais elaborada ou mais prxima da escrita padro. Conforme Vygotsky (1988) observou, aquilo que o sujeito faz com ajuda do outro um indicador importante de desenvolvimento futuro, pois o que se faz hoje com ajuda, amanh ser feito com autonomia.

O conhecimento do professor sobre o contedo trabalhado na alfabetizao, sobre o desenvolvimento infantil e o contexto social em que est inserido o aluno, fundamental para uma avaliao qualitativa. Distanciado de uma perspectiva investigativa, de reflexo e discusso sobre estes aspectos, os registros tornam-se vazios e sem significado e, frequentemente, evidenciam apenas as atitudes dos alunos ou procedimentos escolares: Fulano Acompanha os contedos, porm se distrai com facilidade e demora para concluir as atividades.Beltrana uma aluna desatenta, tem dificuldade para se organizar no caderno. Tem potencial, mas precisa estar mais concentrada.Ciclano Muito educado, calmo e vem demonstrando bom nvel de aprendizado. Fonte: Registros descritivos de uma turma de 2 ano escolar de uma escola da rede estadual 1 bimestre de 2012. Arquivo GEPALE. Dada a dificuldade em descrever o processo de aprendizagem, muitas escolas ou mesmo redes de ensino tm construdo fichas de avaliao ou de desempenho dos alunos. Nestas fichas so arrolados os contedos trabalhados ou os objetivos da alfabetizao e, a partir destes, o professor assinala o que foi aprendido ou desenvolvido pelo aluno.

Figura 1 - Ficha de desempenho dos alunos do 1 ano de uma escola municipal 2012.

Fonte: Arquivo GEPALE. So diversas as fichas de avaliao elaboradas pelas redes de ensino ou escolas. No entanto, o contedo aparece sempre em uma linearidade que no corresponde realidade da aprendizagem. Alm disso, estas fichas de avaliao teriam que ser muito extensas para dar conta da complexidade da alfabetizao e, mesmo assim, aspectos fundamentais do processo de desenvolvimento das crianas ou das relaes de ensino ficariam de fora. Para as escolas da rede estadual de educao da regio Sul de Santa Catarina, segundo depoimento de uma professora, professores alfabetizadores elaboraram em conjunto - durante um curso de capacitao - um modelo de ficha de avaliao a ser seguido. Entretanto, ao colocar em prtica tal modelo, perceberam que o mesmo no atendia a sua finalidade. Os pais reclamavam da quantidade de itens e da complexidade das expresses, ficando sem poder acompanhar o desenvolvimento de seus filhos na escola. Os professores tambm no ficaram satisfeitos e vm reelaborando este modelo por considerar que no atende s finalidades da avaliao. As fichas como documento de avaliao no satisfazem, mas os professores precisam de referncias para ter um olhar cuidadoso ao acompanhar o processo de aprendizado da linguagem escrita de seus alunos. Neste sentido, caberia um roteiro de observao a partir dos novos pressupostos de aprendizagem, de linguagem e de alfabetizao. Ana L. Smolka observa que um bom roteiro de observao contribui tambm com a autoavaliao de quem avalia. Esta autora observa:[...] medida que a professora se apia em alguns parmetros para avaliar as crianas, ela necessria e simultaneamente levada a refletir sobre e avaliar tambm o seu trabalho e sua relao de ensino na escola (SMOLKA, 2003, p. 132).Com a avaliao pode-se, dadas as condies de interlocuo entre os educadores, construir momentos de produo de conhecimento sobre os problemas vividos pelos professores com vistas melhora da atuao profissional e da coletividade do grupo, favorecendo um trabalho contnuo e compartilhado pelos educadores da escola. 3 A AVALIAO DESCRITIVA NUMA PERSPECTIVA FORMATIVAMudanas na prtica de avaliao deveriam ocorrer como consequncia de reorganizao curricular, de transformao do ensino, da compreenso de que o aprendizado no ocorre de modo mecnico e linear ou, ainda, de nossa preocupao e cuidado com as subjetividades que formamos. Contudo, em educao difcil definir um ponto comum de preparao para, ento, mudar ou transformar o que preciso. Estamos continuamente nos formando e educando ao mesmo tempo. As professoras queixam-se do trabalho que esto tendo com os registros descritivos. Uma delas desabafa [...] mais um trabalho para o professor. Certamente, esta uma prtica pedaggica que s ter valor e compensar a dedicao de tempo e reflexo que exige se as professoras a vivenciarem de forma significativa. Do contrrio, se constituir numa tarefa burocrtica, que no traz nenhuma contribuio para a ao pedaggica.Outra professora queixa-se [...] o professor que assume a turma no ano subsequente (srie escolar seguinte) no l o que o professor do ano anterior registrou sobre os alunos. Ser mesmo esta a interlocuo necessria para os registros de avaliao? A importncia destes registros descritivos sua perspectiva formativa de professores e alunos, seu carter investigativo, diagnstico, indicativo do processo de aquisio de conhecimento do aluno. Conforme a perspectiva de avaliao mediadora:A avaliao, enquanto mediao, significa encontro, abertura ao dilogo, interao. Uma trajetria de conhecimento percorrida num mesmo tempo e cenrio por alunos e professores. Trajetos que se desencontram, por vezes, e se cruzam, por outras, mas seguem em frente, na mesma direo (Hoffmann, 2008, p. 40).Dessa forma, vivenciar os registros de forma significativa trazer a riqueza e complexidade da prtica de ensino/aprendizagem, a qual suscita perguntas, provoca a teorizao e, assim, contribui para a reelaborao do pensamento e da ao. A avaliao no prioriza o resultado ou o processo. Como prtica de investigao, interroga a relao ensino-aprendizagem em sua complexidade e busca identificar os conhecimentos e desconhecimentos que esto em dilogo (Esteban, 2003, p. 91).A avaliao uma forma de investigao cujos dados possibilitam descrever o percurso de aprendizagem do aluno de forma significativa. Sendo assim, uma ao formativa tambm para o professor, pois mediados por nossos registros, reflexes, tecemos o processo de apropriao de nossa histria, a nvel individual e coletivo (Freire, 1996, p. 41). Se buscarmos uma prtica de avaliao formativa de professores e alunos, h que ocorrer uma reorganizao curricular, pois esta forma de conceber a avaliao no faz sentido num currculo organizado a partir da racionalidade tcnica, um currculo constitudo apenas por dados e informaes a serem ensinadas por professores e aprendidas pelos alunos num determinado tempo. Nesta lgica, os professores no tm oportunidade de reconstruir o seu pensar e seu fazer pelo exerccio disciplinado da escrita e reflexo. Estaro ocupados em cumprir o programa de ensino.Medidas polticas nunca deveriam sobrepor-se s propostas educativas. Como recurso paliativo e sem fundamento pedaggico, algumas vezes, ocorre interferncia administrativa nas escolas, desconsiderando sua histria e atropelando a participao dos educadores na reconstruo de seu Projeto Poltico e Pedaggico.Neste sentido, os educadores precisam perguntar-se: Por que, afinal, deixar de registrar a avaliao atravs de menes numricas ou conceitos e passar a fazer um parecer descritivo de avaliao de cada aluno? Se a resposta a esta questo no vem da necessidade de criar e se manter vivo na docncia, se no vem do prazer de construir seu processo de reflexo, da necessidade de formao pedaggica e poltica, no valer pena. 5 CONCLUSO Constatamos que o registro de avaliao escrito por alfabetizadores vem mantendo a mesma perspectiva classificatria e excludente que se pretende superar. Trazem impresses gerais sobre os alunos com inconsistncia de dados a respeito da progresso no aprendizado da leitura e escrita, com a nfase recaindo sobre atitudes e comportamento dos alunos.O processo de aprendizagem ainda visto numa sequncia linear com as definies e objetivos dos professores sobrepondo-se ao processo de aprendizado do aluno, pois o currculo escolar mantm o foco no processo de ensino, consequentemente, a avaliao segue este vis, pois ensino/aprendizado/avaliao so indissociveis. A continuidade na perspectiva de avaliao numa outra roupagem lembra que no se abandona uma perspectiva pedaggica atravs de portarias ou normatizaes. O novo em educao construdo pelos educadores a partir de questionamento e inquietude que emergem da prtica cotidiana. Para isso, o currculo escolar precisa ser reorganizado numa perspectiva processual, no qual se busca, sobretudo, o desenvolvimento contnuo das capacidades intelectuais dos educandos. Evaluation in literacy class: do descriptive records enable the overcoming of classificatory and exclusive evaluation?

Abstract

The text results on a reflection about descriptive evaluation reports, that literacy teacher currently do to document the appropriation process of writing and reading by the students. It is questioned if the way the descriptive evaluation that has been used allows the overcome of the classificatory and exclusive one. This study is part of a research Project about literacy, initial and continuous formation of Teaching work, funded by Capes/Observatrio da Educao. The aim is to reflect the role of descriptive records in the process of teaching and learning in literacy classes. It was analyzed the descriptive records related to children that attend 1st and 2nd year of elementary school and teachers testimonials excerpts from schools used for that research. The analyze shows that descriptive evaluation conducted by teachers has shown general impressions about students focusing on attitudes, but it misses data about the reading and writing learning. Key-words: Descriptive Evaluation. Literacy Teachers. Paths of Learning.

Notas Doutora em Educao pela PUC/SP. Professora do Programa do Ps Graduao em Educao da Universidade do Sul de Santa Catarina Unisul, na linha de pesquisa Educao, Histria e Poltica no Brasil e na Amrica Latina. Coordenadora do Projeto de Alfabetizao com letramento: a formao inicial e continuada e trabalho docente nas escolas da rede pblica da regio sul de Santa Catarina vinculado ao Programa Observatrio da Educao CAPES/OBEDUC; [email protected]

Mestre em Educao pela UFSC. Professora dos Cursos de Pedagogia da UNISUL e da UDESC e integrante do Projeto de Pesquisa Alfabetizao com letramento: a formao inicial e continuada e trabalho docente nas escolas da rede pblica da regio sul de Santa Catarina vinculado ao Programa Observatrio da Educao CAPES/OBEDUC; [email protected]

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Em 2008, o Conselho Estadual de Educao de Santa Catarina, pela Resoluo n 158, coloca oficialmente o parecer descritivo como uma possibilidade para as escolas adotarem como registro avaliativo dos alunos em alfabetizao. Posteriormente, no ano de 2010, a Portaria n 20 da Secretaria da Educao do Estado determina, em seu artigo 5, que nas cinco sries dos anos iniciais do Ensino Fundamental, o registro da avaliao ser descritivo, no decorrer do ano letivo [...]. Assim como o Estado, tambm muitos municpios definiram a avaliao descritiva como a prtica a ser realizada pelos professores das escolas da rede de ensino, principalmente nas classes de alfabetizao.

Pesquisa: Alfabetizao com Letramento: a formao inicial e continuada e trabalho docente nas escolas da rede pblica da regio sul de Santa Catarina, aprovada pelo edital 38/2010, Programa Observatrio da Educao, CAPES/INEP.

Estes encontros ocorrem mensalmente na UNISUL - campus de Tubaro - contando com a participao de um professor de bloco alfabetizador de cada escola campo da pesquisa.

GEPALE Grupo de Pesquisa e Estudos sobre Alfabetizao e Letramento do PPGE/Unisul.

REFERNCIAS

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