MIOLO guia cineclubismo - Oficina de...

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Perguntaram ao Paulo Lins, autor do livro “Cidade de Deus”, que deu origem ao filme homônimo, se ele, por ser artista, se considerava um tipo especial de pessoa. Lins respondeu que todos nós somos um tipo especial de artista, pois todo mundo já foi criança um dia e desenhou.

Algumas crianças cresceram e continuaram desenhando. Outras fazem samba, rap, grafitam, escrevem livros, produzem filmes... Temos diversas formas de nos expressar. Fazer com que as obras de arte circulem, construir pontes entre os artistas e o público, é tão importante quanto a própria produção artística. Essa é a essência de um cineclube.

As pessoas que criam um cineclube têm um importante papel cultural, e podemos dizer que o cineclubismo é também uma forma de expressão artística.

Dessa forma, este Guia de Cineclubismo nasce do desejo de fomentar o surgimento de novos cineclubes. Ele é uma das ações previstas no projeto Cineclubes em Conexão, iniciativa que integra a proposta do Cineclube Sabotage e conta com o apoio do Fundo Estadual de Incentivo à Cultura. O Sabotage é realizado desde 2009 pela Oficina de Imagens na Escola Estadual Alcida Torres, no Bairro Taquaril, em Belo Horizonte.

Neste guia você encontrará algumas das motivações que levam à criação de um cineclube, os passos iniciais para realizar a primeira sessão, formas de obtenção de filmes, a importância da relação do cinema com a educação e outros tópicos ligados ao universo cineclubista.

Boa leitura!

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Umas das primeiras palavras que podem vir à cabeça quando se pensa nessa pergunta é: liberdade. Um cineclube, como veremos, coloca em circulação filmes que não temos acesso facilmente no circuito comercial, mais preocupado com a lucratividade do que com a qualidade dos produtos que veicula.

Quando observamos a programação de filmes dos canais abertos de televisão, por exemplo, nos deparamos na maioria das vezes apenas com filmes hollywoodianos ou então, de uns anos pra cá, com algumas comédias brasileiras, sucessos no cinema, produzidas e/ou distribuídas por uma empresa que pertence ao maior canal de televisão do Brasil. Quando muito, tal emissora propicia ao espectador a chance de votar para escolher o próximo filme. No entanto, essas opções são restritas entre dois filmes enlatados, muito comerciais. Tem-se, assim, apenas a ilusão de escolha, afinal, o espectador se vê diante de duas opções extremamente parecidas. Salvo exceções, como algumas emissoras públicas, os demais canais abertos seguem o mesmo esquema.

E nos cinemas, podemos escolher? À exceção de algumas salas em cidades maiores ou capitais brasileiras, que optam por exibir filmes alternativos ou de arte, a rede de exibição cinematográfica é gerenciada por grandes grupos multinacionais. Tais grupos são fortemente ligados às distribuidoras internacionais e têm um número insuperável de cópias que preenchem as telas dos

Por que criar um cineclube?

1 Em português, “arrasa quarteirão”. Signifi ca que o fi lme é um grande sucesso de bilheteria.2 Ver Instrução Normativa nº 88, de 2010, da Ancine.

cinemas brasileiros com os últimos blockbusters1. O governo brasileiro2 vem tentado fortalecer as cotas de telas para os fi lmes nacionais, mas os grandes lançamentos estrangeiros ainda predominam.

COTAS DE TELAS. . . . . . . . . . . . . . . . . . .A Cota de Tela é um mecanismo regulatório, com previsão legal no artigo 55 da Medida Provisória nº 2228-1/2001, que visa assegurar uma reserva de mercado para o produto nacional frente à maciça presença do produto estrangeiro nas salas de cinema. Ao permitir um escoamento mínimo da produção brasileira, ela amplia o acesso ao público e promove a diversidade dos títulos em cartaz. Trata-se de uma ferramenta adotada em diversos países para promover o aumento da competitividade e a sustentabilidade da indústria cinematográfi ca nacional. No Brasil, a “reserva de dias” foi empregada pela primeira vez na década de 1930.

Os requisitos e condições de validade para o cumprimento da Cota de Tela são defi nidos pela Instrução Normativa 88 da ANCINE, atualizada pelas instruções normativas 113, de 18 de dezembro de 2013, e 117, de 31 de dezembro de 2014.Fonte: Ancine

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Nada contra o cinema dos Estados Unidos, que volta e meia nos oferece bons filmes, mas a maior parte das produtoras desse país encara o cinema meramente como um negócio - uma produção em escala industrial voltada a atender a um mercado global. Para nós, espectadores, o que fica muitas vezes é a sensação de estar revendo pela enésima vez o mesmo filme.

Moldando subjetividades

O que está em jogo não é apenas o lucro com a venda de ingressos, mas também a construção da subjetividade das pessoas. O cinema é uma poderosa ferramenta de modulação de desejos, e o mercado se aproveita dele para disseminar formas de vidas (que tipo de casa queremos ter, qual o carro do momento, o que consumir etc).

Como a moeda sempre tem dois lados, o cinema pode ir além do mero entretenimento e ter fun-ção relevante na ampliação de nossa percepção de mundo. Mas, para isso, temos que ter acesso a filmes de diretores que entendem que cada pessoa é única e há beleza na diferença, ou seja, que estão ligados na diversidade cultural e na multiplicidade de desejos, interesses e visões de mundo. Assim como os bons livros, os filmes são capazes de nos fazer refletir e sonhar, de abalar nossas concepções de mundo e contribuir para transformar nossa forma de viver coletivamente.

Como defende o cineasta e escritor Jean-Louis Comolli, o cinema pode ter um importante potencial transformador e libertador para os espectadores, principalmente quando não estamos falando de filmes comerciais, voltados exclusivamente para a indústria da diversão.

“Libertado das cadeias capitalistas, libertado da dupla precaução do roteiro e do estúdio, como do controle suplementar a posteriori da estreia nas salas comerciais, o cinema torna-se perigoso. Ao menos, ele pode sê-lo.”3, escreve Comolli

Livres para escolher

O cineclubismo é uma forma de alcançar a liberdade de programar e exibir um cinema livre das amarras comerciais. Participar de um cineclube é participar de um grande movimento autônomo de difusão cultural que abre fissuras no modelo de produção e distribuição do cinema comercial. É a possibilidade de assistir e conversar coletivamente sobre filmes que dificilmente podem ser vistos em salas comerciais ou na televisão.

Além da liberdade de escolha, temos a possibilidade de vivermos a cidade sob outra perspectiva que não a da troca financeira: o cineclube não visa ao lucro. Assim, se afasta da lógica monetária e se aproxima de outras formas de se relacionar com as pessoas, os bens culturais e os espaços.

3 COMOLLI, Jean-Louis. O desvio pelo direto. In: Forum.doc. Belo Horizonte: Filmes de Quintal, 2010.10

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A possibilidade de criar ou participar da gestão de um cineclube é uma das formas que temos para contribuir com a transformação social no campo da micropolítica, ou seja, com o que cada um de nós pode fazer diariamente para influenciar de forma positiva a vida em sociedade. Nossa participação política não precisa ser apenas no dia das eleições e deve ir além da mera escolha de representantes por meio do voto.

Espacos de experimentacao

Por fim, o cineclube pode ser visto como um espaço autônomo de experimentação, perspectiva defendida, por exemplo, pelo cineasta Adirley Queirós em relação à circulação dos filmes.

“Todos os filmes que a gente fez percorreram todas as escolas públicas da Ceilândia. Temos quase que uma obrigação de exibir em escolas públicas. Eu moro numa cidade que não tem uma sala de cinema. Isso é um absurdo. O que a gente faz? Lá tem um outdoor enorme da Companhia de Água e Esgoto de Brasília. A gente faz uma coisa chamada “Cinema na Placa”: mobilizamos 10 a 15 pessoas, colocamos o projetor em cima do carro, tampamos a placa – de vez em quando fazemos uns gatos, apagando a luz rapidinho – e fazemos uma sala de cinema. É uma intervenção. E tem o cineclube. Nossa grande reflexão é: estamos fazendo filme pra quem?“, questiona Queirós4.

4 https://www.youtube.com/watch?v=-DdjXBQeZSI

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como montar um cineclube?

A equipe

O primeiro momento da criação de um cineclube começa com a reunião de pessoas que compartilham o desejo comum de assistir e debater bons fi lmes. Se você está com o comichão da agitação cultural, não espere! Chame amigos, colegas de escola ou trabalho, parentes, vizinhos e comece o processo.

Autogestao. . . . . . . . . . . . . . .O processo de concepção, criação e manutenção de um cineclube quase sempre é realizado de forma colaborativa, sem hierarquias ou sem uma pessoa ou grupo de pessoas que assume a função de chefe. Chamamos de autogestão o processo de gerenciamento das ações baseado em formas mais colaborativas e horizontais de organização. Na autogestão, as pessoas compartilham responsabilidades e funções, sempre tendo em mente os benefícios a serem gerados para o coletivo.

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O local

Depois de formada a equipe do cineclube, o próximo passo é escolher o local das sessões. Para a definição do espaço, podem-se buscar parcerias locais no município ou na comunidade, com isso começa-se a construir a rede de colaboradores do cineclube. Pode ser a casa de alguém do grupo, o auditório de um sindicato, uma sala de aula, um centro cultural, uma praça, um muro, uma sede de associação ou quaisquer outros espaços que uma mente criativa puder levantar.

Os equipamentos

Precisamos pensar nos equipamentos agora. Não há um padrão a ser seguido e o importante é começar, mesmo que seja com uma TV de tubo antiga e um DVD player. TVs de telas maiores possibilitam que mais pessoas assistam à sessão e podemos considerar que um projetor (data show) seria o sonho de todo cineclube. Quando for possível ter boas caixas de som também é legal. Os realizadores audiovisuais normalmente têm muito cuidado com a qualidade da imagem e do som e, por isso, o cineclube deve assegurar que as exibições veiculem esse trabalho estético, uma vez que ele faz parte da construção dos filmes, dos seus jogos de sentidos.

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Busque parceiros. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .Associações, sindicatos, escolas e centros culturais podem ter os equipamentos necessários e podem ser receptivos à ideia de acolher o cineclube que está para nascer. Mas, se ouvir uma negativa, não desanime. Pense num plano B. Quando uma porta se fecha, outras se abrem.

Os filmes

Hora de conseguir os fi lmes! Há muitas formas de se fazer isso. Através da biblioteca da escola ou do centro cultural, da internet ou comprando o DVD – muitos realizadores audiovisuais comercializam seus fi lmes, e parte do seu sustento vem dessa receita. É o caso, por exemplo, do diretor Carlos Pronzato5, que possui mais de 60 títulos em sua fi lmografi a e distribui de forma independente seus fi lmes. Comprar os fi lmes, portanto, também é uma forma de estimular a produção. Na página 19 daremos mais dicas sobre formas de obtenção de fi lmes.

5 http://lamestizaaudiovisual.blogspot.com.br

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Curadoria. . . . . . . . . . . . .O processo de escolha dos fi lmes é chamado de curadoria. No cineclube ela pode ser feita pelo grupo de organizadores, por pessoas convidadas ou também de forma horizontal, num diálogo entre os organizadores e o público, de maneira que todos possam participar da seleção dos fi lmes a serem vistos.

A divulgacao

A divulgação das sessões pode ser feita de diversas maneiras. Cartazes na escola ou no bairro, redes sociais, rádio comunitária, anúncio na missa, no culto, etc. Divulgue as informações essenciais da sessão: local, data, horário, título do fi lme e informações como o ano de produção, país, duração, diretor, gênero e sinopse. É importante observar a classifi cação etária dos fi lmes e também programar sessões especiais para as crianças. Que tal criar uma página na internet para o cineclube?

de maneira que todos possam participar da seleção dos fi lmes a serem vistos.

A divulgacao

A divulgação das sessões pode ser feita de diversas maneiras. Cartazes na escola ou no bairro, redes sociais, rádio comunitária, anúncio na missa, no culto, etc. Divulgue as informações essenciais da sessão: local, data, horário, título do fi lme e informações como o ano de produção, país, duração, diretor, gênero e sinopse. É importante observar a classifi cação etária dos fi lmes e também programar sessões especiais para as crianças. Que tal criar uma página na internet para o cineclube?

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O dia ''D''

Equipe formada, local da sessão determinado, equipamentos a postos, filme escolhido e sessão divulgada... Tudo pronto para a grande estreia do cineclube! Não se esqueçam da pipoca!

O debate apos o filme

Assistir filmes junto com outras pessoas é quase um ritual da nossa sociedade. Apesar da proliferação das telas pessoais (notebooks, celulares e tablets), do acesso à internet e do aumento da oferta de canais de TV, assistir filmes em grupo propicia algo muito interessante: poder debater o filme após a sessão. Sempre que possível estimule essa prática. Uma parte da equipe do cineclube pode ficar responsável em coordenar o debate. E é importante que essas pessoas assistam ao filme antes da sessão, pois terão tempo para se preparar, podendo, por exemplo, pesquisar sobre o diretor do filme, sua trajetória e outros temas que se conectam à obra.

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Atividades alem dos filmes

Como veremos no histórico do cineclubismo no Brasil, desde o início, além de exibir filmes, alguns cineclubes também ofereciam atividades de formação. Essa prática persiste nos dias de hoje e nos cineclubes podem ser organizadas oficinas de produção de vídeos, de documentário ou ficção, por exemplo. A produção textual também pode ser incentivada, a partir da escrita de análises críticas sobre os filmes e relatos das sessões, contendo informações sobre o filme do dia e um resumo do debate. Convidar diretores de filmes para as sessões também é muito legal. Não tem nenhum diretor morando na sua cidade? Que tal convidar o realizador do filme a ser exibido para conversar com o público em um hangout via Youtube ou um chat com câmera via Skype?

Ampliacao do cineclube

Com o tempo, a equipe do cineclube pode sentir também necessidade de ampliação do espaço e do público, aquisição de equipamentos e acervo, dentre outras melhorias. As leis de incentivo à cultura (municipal, estadual ou federal), editais de incentivo, vaquinhas, financiamento coletivo6, entre outros, são opções para se levantar recursos.

6 Também conhecido como crowdfunding. Existem algumas plataformas na internet que prestam esse serviço em troca de uma porcentagem do valor arrecado.

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Gratuidade. . . . . . . . . . . . . .É bom lembrar que o cineclubismo é uma atividade sem fi ns lucrativos, portanto não deve haver cobrança de ingressos. Caso seu objetivo seja comercial, procure saber das políticas de incentivo do Ministério da Cultura para abertura de salas de cinema.

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Conseguindo os filmes

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Cinema feito com recursos publicos

Atualmente, no Brasil, a maior parte dos filmes é produzida com recursos públicos por meio de leis de incentivo e políticas de fomento. Uma das possíveis formas para esse investimento retornar à população seria a disponibilização gratuita dessas obras à sociedade, para exibição em escolas públicas e cineclubes, por exemplo. Mas não há uma regulamentação nesse sentido e, geralmente, filmes realizados com verba pública entram numa cadeia de distribuição que visa apenas ao lucro e não a uma contrapartida social de ampliação de acesso aos bens culturais.

No entanto, segundo levantamento realizado em 2014 pelo Cineclube Sabotage junto a cineclubistas de Minas Gerais, há cineclubes que abrem mão de pedir autorização para exibir seus filmes. Quase todos defendem que sejam criadas plataformas de compartilhamento de filmes e que as produções realizadas com recursos públicos tenham sua liberação para exibições em sessões gratuitas por meio de uma regulamentação legal.

Por outro lado, a maior parte dos diretores quer que seu filme seja exibido o maior número de vezes, e compreendem que o cineclubismo é uma atividade sem fins lucrativos e, por isso, liberam tranquilamente seu filme para sessões. Vão ficar inclusive felizes de saber que seu trabalho está circulando por aí! O documentário “Terra deu, terra come”, de Rodrigo Siqueira, foi lançado simultaneamente no circuito comercial e em cineclubes7. A iniciativa demonstra que as possibilidades do universo cineclubista são inúmeras.

7 http://terradeuterracome.com.br/cineclubes

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Cinema feito para o publico

Alguns diretores já utilizam licença copyleft em seus filmes, o que deixa pré-autorizado sua exibição em cineclubes, por exemplo. A licença creative commons8 (CC), alternativa ao copyright, nasce do desejo de que a produção cultural da humanidade possa circular mais livremente, sem estar incondicionalmente vinculada à economia e ao lucro. Um músico, fotógrafo, escritor ou cineasta, dentre outros, pode, por meio desse tipo de licença, definir quais modalidades de uso e acesso que sua obra permite. Pode, por exemplo, autorizar que a obra seja exibida sem custo algum. Pode permitir que seja remixada, ou seja, reeditada, dando origem a outras obras e pode inclusive autorizar que a obra seja usada para fins comerciais.

8 No site http://www.creativecommons.org.br é possível obter mais informações sobre essa licença e suas diferentes combinações.

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alguns exemplos. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .Vejamos algumas das possibilidades de combinações de permissões da licença creative commons:

O autor permite que sua obra seja compartilhada, executada e exibida livremente. Também permite que seja utilizada para dar origem a novas obras ou utilizada comercialmente. “BY” (atribuição) indica que o nome do

autor deve ser sempre citado, inclusive nas obras derivadas (por exemplo, um fi lme licenciado dessa maneira pode ser refi lmado por outro diretor ou transformado em livro, etc).

O autor permite que sua obra seja compartilhada, executada e exibida livremente. “NC” - (não comercial) indica que o autor não permite uso comercial de sua obra (por exemplo, no caso de uma música, ela não poderia

ser utilizada em um comercial de TV, mas num curta-metragem sim). “SA”(compartilha igual) indica que as obras derivadas devem ser compartilhadas com a mesma licença da obra inicial.

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Fontes de filmes

Os sites de compartilhamento de vídeos, como o Youtube e o Vimeo, já possibilitam ao realizador do filme disponibilizar sua obra com a licença creative commons, de forma que o filme pode ser baixado9 e exibido em um cineclube sem restrições de ordem legal.

A plataforma Freenet?10, por exemplo, é uma via de mão-dupla. Tanto distribui, quanto recebe filmes com a temática da internet livre. Estimula que as pessoas assistam aos filmes lá hospedados e produzam novos vídeos para o site.

O Banco Audiovisual de Frentes Socioambientais11 é outra comunidade online que reúne filmes e possibilita que eles sejam utilizados gratuitamente por exibidores não comerciais, vale a pena con-ferir. Se o seu cineclube tem vídeos prontos de temática socioambiental ou pretende filmar, pode cadastrar a obra no banco de maneira que outros exibidores possam acessá-la.

9 Sites como o www.keepvid.com baixam vídeos do Youtube10 http://www.freenetfilm.org11 www.facebook.com/bancoaudiovisual

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Conheca algumas plataformas citadas. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .www.keepvid.com (baixa vídeos do Youtube)www.freenetfi lm.org vimeo.com/groups/bancoaudiovisual www.videonasaldeias.org.brwww.portacurtas.org.br/curtanaescola/

Existem projetos como o Vídeo nas Aldeias, que além de disponibilizar seus fi lmes12 online gratuitamente, preparam material13 para auxiliar nos debates ou atividades escolares. Exibir fi lmes de cineastas indígenas é contribuir para que as várias vozes sejam ouvidas, combatendo a predominância de discursos únicos, totalitários, ou seja, temos acesso sem intermediários às histórias das nações indígenas, que normalmente têm sido escritas por homens brancos, ou simplesmente ignoradas. Pode se dizer o mesmo quando exibimos fi lmes quilombolas, de temática LGBT, população negra... Assim, os cineclubes cumprem seu importante papel na construção de uma sociedade mais justa e igualitária.

12 https://www.youtube.com/user/VideoNasAldeias13 http://www.videonasaldeias.org.br/downloads/vna_guia_prof.pdf14 http://www.portacurtas.org.br/curtanaescola/

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Outra fonte interessante é o projeto Curta na Escola14, que possui mais de 500 fi lmes classifi cados de acordo com as disciplinas escolares e com o espaço, para que os professores possam postar relatos das sessões.

Vale citar ainda o programa Filme em Minas15, que disponibiliza seu acervo para sessões sem fi ns lucrativos. O mesmo ocorre com o Festival Internacional de Curtas16 de Belo Horizonte.

14 http://www.portacurtas.org.br/curtanaescola/15 http://www.cultura.mg.gov.br16 http://www.festcurtasbh.com.br/acoes/itinerancia/

Essas são apenas algumas das

formas de se obter fi lmes, que tal

descobrir novas possibilidades?

Cinema e educacaoCinema e educacao

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A interface entre a produção cinematográfica e a educação está diretamente relacionada à formação política e cultural das pessoas. Como já afirmado anteriormente, a partir do cinema, os indivíduos podem alterar e construir modos de perceber o mundo, analisando a própria realidade. Ver filmes pode então ser um modo de intervenção política, ao estimular construções de novos olhares na realidade. Para o filósofo francês Jacques Rancierè17 que, entre outros temas, escreve sobre a importância das artes na política, a “política se ocupa do que se vê e do que se pode dizer sobre o que é visto, de quem tem competência para ver e qualidade para dizer (…)”. Sob essa perspectiva, é importante que se estimule a produção de novos modos de ver o mundo e também de dizê-lo, para que haja maior participação política e ampliação da democracia.

Na democracia brasileira, que pode ser considerada relativamente jovem em uma perspectiva histórica, a política tradicionalmente vem sendo ocupada por integrantes da elite cultural e eco-nômica, que cooptam para si os filtros que definem quais assuntos podem ser discutidos e quem pode falar sobre eles. O processo secular de resistência no qual nos encontramos como parte de uma grande engrenagem sempre encontrou no campo das artes um forte arsenal de construção de uma narrativa alternativa ao discurso apresentado como único pelos que detém o poder.

Vejamos o exemplo dos cantos de capoeira, vissungos e candombes de resistência à escravidão; a literatura, o teatro, a música e o cinema de resistência à ditadura civil-militar brasileira; o pixo; o rap e todas as outras expressões artísticas contemporâneas. Produzir, difundir ou consumir arte é uma forma de proporcionar que mais pessoas participem da vida política, rompendo com a invisibilidade e o com controle sobre o que pode ser dito e sobre quem pode dizer.

17 RANCIÈRE, Jacques. A partilha do sensível: estética e política. São Paulo: Eixo experimental org.; Ed. 34, 2005.

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Cultura negra e indigena, educacao e cinema. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .Foram necessárias as leis federais 10.639/03 e 11.645/08, criadas nos mandatos do Presidente Lula, para que fosse instituída a obrigatoriedade do estudo da história afro-brasileira e indígena em estabelecimentos de ensino fundamental e de ensino médio, públicos e privados. Tal medida se fez necessária para que possamos conhecer nosso passado, com ele apreender as origens da desigualdade social no Brasil e, a partir dessa compreensão, podermos lutar com mais efi ciência para promover a igualdade e a justiça. A versão tradicional da História nos livros didáticos era incapaz de lançar luz em parte da nossa história ou foi propositalmente criada para ocultar a versão que desinteressava aos poderosos.

Com as leis ou sem elas, o cinema tem potencial para subverter a lógica dominante. Apresenta pontos de vistas diferentes dos que vigoram, por exemplo, nos meios de comunicação de massa ou, muitas vezes, nos livros didáticos. Por que nos livros de História a referência aos quilombos muitas vezes se resume ao de Palmares, sendo que até hoje existem remanescentes quilombos e o maior deles é o Kalunga, em Goiás, com milhares de moradores? Por que os livros não dão a devida impor-tância à resistência afro-brasileira à escravidão? Seriam estratégias conscientes para não estimular a rebeldia e a insurgência popular? Leis e fi lmes podem gradualmente mudar esse panorama.

Cinema e eSCOLA

Cezar Migliorin, professor da Universidade Federal Fluminense (UFF), considera que “o cinema é uma transformação contínua do que há”18, no sentido de que ele não é uma ferramenta de ensino e sim uma forma de viver novas experiências. Professores e alunos, organizadores do cineclube e espectadores, todos na mesma condição, ao assistir um bom filme, se permitem pensar o impensável juntos. Cinema é possibilidade, ou seja, pode ser mais a interrogação do mundo do que sua explicação. O cinema faz circular singularidades. Expande a multiplicidade que todos nós trazemos por dentro. O cinema pode ser uma ponte entre almas.

É nesse sentido que o Cineclube Sabotage busca propiciar o acesso à produção cinematográfica brasileira do circuito não comercial, articulando cinema e educação com foco na promoção dos direitos humanos. Desde sua criação, a iniciativa já promoveu mais de 400 encontros de exibição. A sessão sobre ocupações urbanas realizada pelo cineclube é um exemplo de articulação do cinema, educação e questões contemporâneas. Na época havia uma grande ameaça de despejo dos moradores da ocupação do Izidora, em Belo Horizonte – MG. Foi exibido o filme “A cidade é uma só”, de Adirley Queirós. Cerca de 60 alunos participaram da sessão, seguida de debate com o tema “direito à moradia”. Vale ressaltar que o bairro Taquaril, onde fica a escola, surgiu de uma ocupação. É o cinema operando conexões.

Então, você é professora ou professor? É pai ou mãe de estudantes? É aluno ou aluna? Que tal criar um cineclube na escola?

18 http://www.revistacontemporanea.fe.ufrj.br/index.php/contemporanea/article/view/106

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Breve historico do cineclubismo no Brasil

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As primeiras práticas cineclubistas no Brasil datam de 1917, com o Grupo Paredão, formado por amigos que se reuniam para ir aos cinemas Íris e Pátria, no Rio de Janeiro, e depois discutir os filmes. O grupo deu inicio às primeiras publicações sobre cinema na imprensa. Assistir, conversar e escrever sobre os filmes são atividades que sempre andaram juntas. O Chaplin Club, fundado em 1928, é considerado o primeiro cineclube brasileiro. Em 1941 o cineclube Clube de Cinema, formado na Universidade de São Paulo (USP), foi fechado pelo governo Vargas. Primeiros sinais no Brasil de que arte, política e cidadãos pensantes começavam a se tornar um incômodo às ditaduras. Ainda assim os membros do cineclube continuaram a se reunir na casa de Paulo Emílio Salles Gomes.

A resistência é uma das características do movimento cineclubista. Em 1942, empolgado com a visita a um cineclube paulista, Vinícius de Moraes fundou o Clube de Cinema do Rio de Janeiro. Vinícius também foi roteirista, produtor e chegou a estudar cinema com Orson Welles em 1947.

Desde o início, muitos cineclubes incluíram atividades de formação, oferecendo cursos, discussões, etc, pois não havia faculdades de cinema no país.

Na ditadura civil-militar, que se iniciou em 1964, a vigilância e o fechamento de cineclubes aumentaram. Apesar disso, estes seguiam existindo, muitas vezes clandestinamente, e tornaram-se espaços de encontros e discussões políticas, além de exibição de filmes nacionais do Cinema Novo. A presidenta Dilma Rousseff, por exemplo, era uma das frequentadoras do cineclube da Faculdade de Economia da UFMG, em Belo Horizonte.

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Distribuidoras costumavam procurar os cineclubes para realizar lançamentos de filmes e, após os participantes escreverem sobre a obra, lançavam nos cinemas para o grande público. Isso se dava pela influência que os cineclubistas e suas publicações possuíam. O Centro de Estudos Cinematográficos, em Belo Horizonte, além das sessões de cinema, promovia cursos e editava a Revista de Cinema, que circulava pelo país e que inclusive atraiu Glauber Rocha à capital mineira em 1956. Glauber procurou o grupo para que criassem juntos o Cinema Novo. Porém o cineasta baiano não encontrou parceiros dispostos a levar a empreitada adiante em terras mineiras e retornou à Bahia.

Em 1968, com a instituição do AI 5 e o aumento da perseguição política, quase todos os 300 cineclubes do Brasil à época interromperam suas atividades. Mas dois anos depois iniciaram uma retomada. Também tiveram papel importante na preservação das películas frente à censura. Um exemplo é o curta “Manhã cinzenta”, de Olney São Paulo, que teve cópias apreendidas e destruídas pela ditadura. Se hoje podemos assistir ao filme é porque algumas cópias foram distribuídas para cineclubes e salvas da destruição pela censura.

Com o fim da ditadura, em 1985, e a retomada da liberdade plena de expressão, os cineclubes passam a poder exercer suas atividades livremente. Nessa década houve uma cisão do modelo de gestão entre grupos que acreditavam que deveria ser uma atividade sem fins lucrativos e outros que eram favoráveis à cobrança de ingresso. No Conselho Nacional de Cineclubes (CNC) sempre prevaleceu o pensamento em torno do aspecto não comercial do movimento.

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Cineclubismo hoje

De acordo com levantamento do CNC, em 2013, havia 1370 cineclubes em atividade no Brasil. Tal número prova que apesar das salas comerciais, das TVs aberta e fechada, dos DVDs e da internet, o cineclubismo continua formando público e mais pessoas dispostas a promover sessões compartilhadas de cinema.

Conselho Nacional de Cineclubes Brasileiros. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .O CNC - Conselho Nacional de Cineclubes Brasileiros - é uma entidade cultural civil, sem fi ns lucrativos, de abrangência nacional e representativa dos cineclubes e e das entidades estaduais cineclubistas brasileiros fi liados.

Fundada em 1961 e reorganizada em 2001, tem como principais objetivos a organização do públi-co e a defesa de seus direitos; o fomento, apoio e fortalecimento de atividades de caráter cineclu-bista; a defesa das identidades e diversidades culturais; a universalização do acesso à informação, à cultura e aos bens culturais e a defesa dos direitos humanos e do pleno exercício da cidadania.Fonte: www.culturadigital.br/cineclubes/comunidades-cineclubistas/cnc-entidades-festivais-parceiros/cnc-conselho-nacional-de-cineclubes-brasileiros/

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Vida longa ao bom cinema!. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .Este guia, outros materiais de referência e fi lmes liberados para sessões de cineclube podem ser encontrados no site www.ofi cinadeimagens.org.br.

Assim que seu novo cineclube estiver funcionando, faça o cadastro no site, que também é um guia da programação cineclubista de Minas Gerais.

Boas sessões!

Uma forma de fortalecer a prática é participar das discussões cineclubistas. O Conselho Nacional de Cineclubes (CNC) promove reuniões bienais. Eventos como o Festival Taguatinga de Cinema, por exemplo, realizam encontro de cineclubes, para possibilitar a troca de experiê ncias e consolidar politicamente o movimento.

OFICINA DE IMAGENS COMUNICAÇÃO E EDUCAÇÃO

DIRETORIA EXECUTIVAAndré Hallak e Elizabeth Gomes

COORDENAÇÃO INSTITUCIONAL Adriano Guerra e Bernardo Brant

NÚCLEO DE APOIO A PROJETOS Vander Maciel

EQUIPE CINECLUBE SABOTAGE Luisa Helena RibeiroNádia Rodrigues Pereira Tayrone Paschoal Alves

DESENVOLVIMENTO DO GUIA DE CINECLUBISMO

PRODUÇÃO DE CONTÉUDO Cardes Monção Amâncio

SUPERVISÃO DE CONTEÚDO Nádia Rodrigues Pereira e Bernardo Brant

PROJETO GRÁFICOMariana Fonseca

REVISÃOMariana Di Salvio

ILUSTRAÇÃOLuisa Helena Ribeiro

Tiragem: 1000 unidadesPublicação: Maio/2015

APOIO:REALIZAÇÃO:

FUNDO ESTADUAL DE CULTURA