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MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO PROCURADORIA REGIONAL DO TRABALHO – 4ª REGIÃO PROCURADORIA DO TRABALHO NO MUNICÍPIO DE SANTA CRUZ DO SUL EXMO. SR. DR. JUIZ DA VARA DO TRABALHO DE ESTRELA - RS. O MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO, com sede na Rua Marechal Deodoro, 110, Santa Cruz do Sul, CEP 96810-110, pela Procuradora do Trabalho que abaixo subscreve, vem à presença de V. Excelência, com fulcro na Constituição da República, artigos 127 e 129; na Lei Complementar n. 75, de 20.05.1993, artigo 83, inciso III; e, na Lei n. 7.347, de 24.07.1985, arts. 1 º , IV, e 3 º , propor a presente AÇÃO CIVIL PÚBLICA, COM PEDIDO LIMINAR EM FACE DE 1. TRÂNSITO ADMINISTRAÇÃO E COBRANÇA LTDA., pessoa jurídica de direito privado inscrita no CNPJ sob o nº 06.049.417/0001-25, com sede na na Rodovia 386 km 354, pavilhão 2, Linha Santa Rita, município de Estrela/RS, CEP 95.880-000; 2. CHTRANS TRANSPORTES RODOVIÁRIOS LTDA. - TRANSPORTES TRÂNSITO, pessoa jurídica de direito privado inscrita no CNPJ sob n.º 73.202.640/0001-58, devendo ser notificada no endereço da primeira ré; 3. RODOVIÁRIO DIPLOMATA LTDA., pessoa jurídica de direito privado inscrita no CNPJ sob n.º 93.693.208/0001-14, a receber intimação no mesmo endereço da primeira ré; 4. HB COMÉRCIO E TRANSPORTE LTDA., pessoa jurídica de direito privado inscrita no CNPJ sob o nº 95.528.538/0001-91, a receber intimação no mesmo endereço da primeira ré; 5. COPERMAX TRANSPORTES RODOVIÁRIOS LTDA., pessoa jurídica de direito privado inscrita no CNPJ sob o nº 05.545.354/0001-35, a receber intimação no mesmo endereço da primeira ré; 1

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PROCURADORIA DO TRABALHO NO MUNICÍPIO DE SANTA CRUZ DO SUL

EXMO. SR. DR. JUIZ DA VARA DO TRABALHO DE ESTRELA - RS.

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO, com sede na Rua Marechal Deodoro, 110, Santa Cruz do Sul, CEP 96810-110, pela Procuradora do Trabalho que abaixo subscreve, vem à presença de V. Excelência, com fulcro na Constituição da República, artigos 127 e 129; na Lei Complementar n. 75, de 20.05.1993, artigo 83, inciso III; e, na Lei n. 7.347, de 24.07.1985, arts. 1º, IV, e 3º, propor a presente

AÇÃO CIVIL PÚBLICA,

COM PEDIDO LIMINAR EM FACE DE

1. TRÂNSITO ADMINISTRAÇÃO E COBRANÇA LTDA., pessoa jurídica de direito privado inscrita no CNPJ sob o nº 06.049.417/0001-25, com sede na na Rodovia 386 km 354, pavilhão 2, Linha Santa Rita, município de Estrela/RS, CEP 95.880-000;

2. CHTRANS TRANSPORTES RODOVIÁRIOS LTDA. - TRANSPORTES TRÂNSITO, pessoa jurídica de direito privado inscrita no CNPJ sob n.º 73.202.640/0001-58, devendo ser notificada no endereço da primeira ré;

3. RODOVIÁRIO DIPLOMATA LTDA., pessoa jurídica de direito privado inscrita no CNPJ sob n.º 93.693.208/0001-14, a receber intimação no mesmo endereço da primeira ré;

4. HB COMÉRCIO E TRANSPORTE LTDA., pessoa jurídica de direito privado inscrita no CNPJ sob o nº 95.528.538/0001-91, a receber intimação no mesmo endereço da primeira ré;

5. COPERMAX TRANSPORTES RODOVIÁRIOS LTDA., pessoa jurídica de direito privado inscrita no CNPJ sob o nº 05.545.354/0001-35, a receber intimação no mesmo endereço da primeira ré;

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I – INTRODUÇÃO

Estão anexados à presente ação excerto do autos do Inquérito Civil nº 000109.2012.04.007/0 – Volumes I e II , instaurados no âmbito da Procuradoria do Trabalho no Município de Santa Cruz do Sul.

Os referidos procedimentos serão mencionados nesta peça de ingresso e suas folhas numeradas serão indicadas como referência aos documentos citados e destacados, tudo como forma de facilitar a compreensão e o convencimento desse D. Juízo.

II- DOS FATOS

O Ministério Público do Trabalho recebeu cópia da sentença prolatada nos autos da ação trabalhista nº 0000021-89.2011.5.04.07331, a qual tramita na Vara do Trabalho de Estrela/RS, dando conta de vítima fatal de motorista da empresa, quando estava dirigindo veículo, a serviço. Nesse aspecto, resultou a necessidade de apurar a possível existência de jornadas excessivas a causar a fadiga dos trabalhadores na estrada, colocando em risco a segurança dos próprios motoristas e das demais pessoas que trafegam nas rodovias.

Dessa forma, a investigação levada a efeito pelo Ministério Público do Trabalho visou à apuração da ocorrência de possíveis ilicitudes, sob o enfoque dos direitos coletivos dos trabalhadores. A instrução do Inquérito Civil consistiu em requisição de documentos, audiência administrativa com as empresas e fiscalização dos Auditores-Fiscais da Gerência Regional do Trabalho e Emprego.

O resultado desvelado foi o de que, na realidade, as empresas rés incorrem na exigência e/ou tolerância de jornadas desumanas, através de trabalho em horário extraordinário comprovadamente de até dezoito horas em um único dia, assim como ausência ou concessão a menor de intervalos intrajornada e interjornada, incorrendo em descumprimento da legislação aplicável.

A seguir demonstrar-se-á, detidamente, todos os elementos de fato que corroboram a conclusão já apresentada.

Inicialmente, contudo, merece destaque que as empresas rés integram grupo econômico, nos moldes do art. 2º, § 2º, da CLT. As demandadas estão localizadas no mesmo endereço e representadas pela mesma preposta, Daiane Krieger2, conforme relatório de fiscalização3. Ademais, restou reconhecido o grupo econômico na

1  Doc. 12  Doc. 4, fls. 97, 98, 99, 1003  Doc 4, fls. 96

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sentença que originou o inquérito civil neste órgão, embasado, inclusive, em inspeção judicial4. Portanto, justificada a inclusão de todas as empresas no polo passivo da presente demanda. Note-se que, com exceção da primeira reclamada, todas exercem atividades de transporte, denotando-se a coordenação dessas empresas em razão da unidade de objeto econômico. A primeira reclamada, ao que indica as provas dos autos é quem mantém direção, controle ou administração das demais.

Outrossim, necessário ressaltar que a situação em tela demanda a atuação do Ministério Público do Trabalho, tendo em vista o direito transindividual envolvido e pelo fato de o trabalho em jornada excessiva estar inserido no âmbito do meio ambiente do trabalho, a implicar medidas de segurança dos motoristas submetidos à jornada abusiva e riscos nas rodovias.

Pois bem. Nos autos do processo originário da investigação, encontra-se o depoimento de testemunhas, que desde já, requer seja recebido como prova emprestada5.

Na ocasião, informou a testemunha das então reclamadas, Carlos Alberto da Silva Santos Junior, “que não há horários determinados aos motoristas, apenas a exigência de que cumpram o trajeto São Paulo-Estrela em 36 horas, que na verdade isso é apenas uma orientação; que os veículos tem rastreamento via satélite e isso permite verificar a posição do carro (...) que os relatórios de rastreamento permitem identificar com relativa precisão o horário do acidente”.

Assim sendo, das informações se infere que a empresa mantém sistema de rastreamento a propiciar o controle de jornada dos motoristas. Por outro lado, verifica-se que, em que pese a afirmação de que o tempo de trajeto seja mera orientação, a situação de subordinação jurídica e dependência econômica é suficiente a compelir os empregados ao seu fiel cumprimento, sob pena de sanções disciplinares, embora revestidas de eventuais despedidas sem justa causa.

Já a testemunha Paulo Norberto Nicareta Junior disse que: “trabalhou para a empresa Rodoviário Diplomata por aproximadamente um ano e meio a 2 anos, entre 2007 e 2009, na função de motorista; que o depoente foi colega do falecido e fazia as mesmas rotas deste último, a única diferença é que o depoente dirigia caminhão "carreta" e o falecido "duas carretas" (maior); que precisavam fazer a rota em menos de 24 horas, de modo que conduziam os caminhões entre 21 e 23 horas seguidas, com 3 ou 4 paradas para consumir algum alimento, em não mais de 15 minutos (…) que faziam de 5 a 7 viagens por mês, envolvendo o eixo Rio-São Paulo; que sempre procuravam descansar quando o caminhão estava parado, mas dormir mesmo, somente quando estavam em casa ou no intervalo entre um carregamento e outro; que havia 5

4  Doc. 1, fls. 145  Doc. 3

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motoristas reservas em São Paulo, mas o número de caminhões era muito grande, de modo que, às vezes, podiam dormir enquanto um reserva fazia entregas, mas outras vezes precisava, o próprio motorista, fazer a entrega; que não consegue estabelecer uma média de quanto tempo poderia dormir em São Paulo, pois isso dependia muito da disponibilidade de motorista reservas e poderia ser tanto de 5 a 7 horas de sono, como apenas 1 hora (…) que tomavam o medicamento desobesi (rebite) para inibir o sono (…) que o depoente não sabe se o rastreador era colocado pela ré ou por seguradora”.

Portanto, o depoimento confirma a jornada excessivamente longa, que, inegavelmente, contribui para a ocorrência de acidentes, muitas vezes com vítimas fatais ou com sequelas gravíssimas, envolvendo, inclusive, motoristas de outros veículos. A jornada apontada, confirmando a exigência da realização da rota Estrela-São Paulo em menos de 24 horas, além de atentar contra a segurança de todos que trafegam nas rodovias, é desumana e degradante, gerando inúmeros danos à saúde do trabalhador.

No âmbito administrativo, na oportunidade da audiência na Procuradoria do Trabalho no Município de Santa Cruz do Sul com as empresas6, foi informado que as mesmas seguiam o regime do art. 62 da CLT. Todavia, conforme adiante explanado, verificar-se-á que a alegada incidência do disposto no citado artigo não se aplica aos motoristas, tendo em vista a possibilidade do controle da jornada.

Afirmaram, ademais, que pretendiam se adequar à nova legislação após o prazo de suspensão de fiscalizações. Pela signatária, à época, foi alertado que a nova legislação já estava em vigor, obrigando, assim, o seu imediato cumprimento, independentemente da suspensão das fiscalizações. Ainda assim, após cerca de seis meses da reunião, foi constatada a ausência de regularização, uma vez que confirmadas a continuidade das ilicitudes por ocasião de ação fiscal.

Com efeito, a fiscalização realizada pelos auditores-fiscais da Gerência Regional do Trabalho e Emprego de Lajeado, consoante relatório anexo7

traduz a inércia das demandadas em regularizar o controle e a jornada dos motoristas, na forma prevista em lei.

Segundo o relatório de fiscalização, notificadas pela primeira vez, as empresas não apresentaram os documentos relativos a registros de horário de trabalho e descanso efetivamente praticado pelos motoristas. Conforme a informação prestada pela preposta das empresas, Sra. Daiane Kriger, a mesma afirmou que as empresas não mantinham controle de jornada dos empregados motoristas. Notificadas novamente a apresentar os diários de bordo, a fiscalização constatou a ausência de repouso diário de 11 (onze) horas a cada 24 (vinte e quatro) horas e a 6  Doc. 27  Doc. 4

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prorrogação da jornada de trabalho do motorista profissional por tempo muito superior a duas horas extraordinárias.

Foram expedidos Autos de Infração em face de todas as rés na ocasião, diante das irregularidades constatadas relativas à jornada praticada. Conforme relatado, quanto ao Rodoviário Diplomada, a título apenas exemplificativo, o motorista Vateli, no dia 05.04.2013 deixou o trabalho às 23h50min, retornando no dia seguinte às 06h50min, desfrutando de um curto intervalo de cerca de seis horas 8

entre as jornadas. Quanto à extensão da jornada, os auditores-fiscais verificaram a prestação de trabalho por mais de 16 (dezesseis) horas, a exemplo do empregado Edemir9. Também o empregado LEUR FALEIRO VIANA, no dia 10/02/2013 teve um intervalo de apenas seis horas, saindo às 5h56min e retornando às 12horas do mesmo dia 10 . E mais, restou apurado que o dito trabalhador excedeu a jornada em mais de 2 (duas) horas por mais de 10 (dez) dias em um único mês (abril/2013). E, ainda pior, o motorista Leandro Ely trabalhou, no dia 04/04/2013 por mais de 18 (dezoito) horas e no dia 15/04/2013 por mais de 15 (quinze) horas11. Também foi comprovada a ausência de intervalo para repouso e alimentação12. Além disso, conforme o Anexo 01 do Auto de Infração nº 200.101.633, estão elencadas situações cuja jornada de trabalho foi superior a 11 horas diárias.

A jornada demasiadamente extensa e falta de intervalo interjornada de 11 horas também foi constatada nas demais empresas demandadas.

A empresa CHTRANS TRANSPORTES RODOVIÁRIOS também foi autuada, sendo que constatada jornada superior a 15 horas diárias13 e intervalo interjornada de apenas 1 hora, com relação ao empregado Douglas Fernandes da Silveira, no dia 23/07/201214. Às fls. 194 do relatório fiscal15, encontra-se auto de infração por descumprimento de concessão de intervalo para repouso e alimentação.

Com relação à empresa HB COMÉRCIO E TRANSPORTE LTDA, foram lavrados vários autos de infração. Quanto à prorrogação de jornada ficou comprovado pela fiscalização o cumprimento de jornada superior a 17 horas , não concessão mínima de intervalo de 11 horas entre duas jornadas, conforme histórico

8  Doc. 4, fls. 1089  Doc. 4, fls. 11210  Doc. 4, fls. 15311  Doc. 4, fls. 11212  Doc. 4, fls. 14013  Doc. 4, fls. 186 e 20014  Doc. 4, fls. 192,20315  Doc. 4

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lançado às fls. 244 e não concessão de intervalo para alimentação e repouso16.

A COPERMAX TRANSPORTES RODOVIÁRIOS LTDA, da mesma forma, cometeu as irregularidades acima. Nesse ponto, vê-se a prorrogação superior a duas horas diárias, a exemplo do trabalhador Edinei de Freitas, que cumpriu jornada de 16 horas e Alessandro Azevedo dos Santos, que, no dia 01/02/2013 trabalhou por mais de 16 horas. A ausência de concessão de intervalo mínimo de uma hora para repouso e alimentação foi apontado às fls. 287. O intervalo interjornada foi igualmente desrespeitado, sendo que desfrutado em pouco mais de três horas pelo empregado Oldair Talamini Santos17.

Com relação à empresa Trânsito Administração e Cobrança Ltda não se verificou o exercício da função de motorista. Todavia, as mesmas irregularidades foram constatadas quanto aos seus empregados. Veja-se às fls. 312 a irregularidade narrada quanto à extrapolação da jornada, mediante realização de até 15 horas diárias, bem como ausência de intervalo para repouso e alimentação e descanso de onze horas a cada duas jornadas cumpridas18.

As extensas jornadas realizadas e ausência de intervalos permitem concluir que as rés refutam, por completo, assegurar e fazer valer os direitos trabalhistas dos seus empregados quanto à limitação de jornada.

Desse modo, tendo em vista que as empresas praticaram e praticam todas as irregularidades acima narradas, bem como a ausência de interesse em adequar sua conduta, não restou alternativa senão a busca da tutela jurisdicional efetiva para impedir a continuidade delituosa e impor a sua adequação, no intuito de propiciar a segurança dos motoristas e demais empregados que laboram para as rés.

III – DOS FUNDAMENTOS

III-I – DA DURAÇÃO DO TRABALHO – DO EXCESSO NA JORNADA

A fixação de limites razoáveis para a duração do trabalho é medida de proteção da saúde e segurança do trabalhador, ou seja, direito social fundamental constitucional (art. 7º, XIII, XIV e XVI), indisponível e irrenunciável.

A preocupação em determinar um parâmetro temporal máximo de utilização da mão-de-obra pelo capital possui amparo, inclusive, por toda comunidade internacional e pelas agências de proteção do trabalhador. O Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, ratificado pelo Brasil,

16  Doc. 4, fls. 221, 246, 24917  Doc. 4, fls. 276, 282, 287, 29318  Doc. 4, fls. 312, 314, 322

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reconhece expressamente o direito de toda pessoa humana a condições justas e favoráveis de trabalho, com garantia de descanso, lazer e limitação razoável de horas de trabalho (art. 7º, d).

A Constituição Federal, seguindo essa orientação, estabelece o limite máximo de 08 (oito) horas para a duração diária do trabalho e 44 (quarenta e quatro) horas semanais (art. 7º, XIII).

Por sua vez, a Consolidação das Leis do Trabalho autoriza o acréscimo de horas suplementares à jornada normal de trabalho em número não excedente a 02 (duas), mediante acordo escrito, na forma de seu artigo 59, caput.

De acordo com as premissas acima levantadas, verifica-se que as rés descumprem os preceitos insculpidos nas normas legais citadas.

A própria evolução legislativa demonstra, com a promulgação recente da lei 12619/2012, que dispõe sobre o exercício da profissão de motorista, regulando sua jornada de trabalho e o tempo de direção do motorista profissional, que a tese defendida pela ré vai de encontro ao intuito protetivo legislativo e imposição do limite da jornada de tais profissionais.

O interesse das normas trabalhistas em tutelar a duração da jornada de trabalho dos trabalhadores se justifica no plano da preservação e prevenção da saúde da pessoa que trabalha, conforme ensinamento do jurista Maurício Godinho:

“(...) a modulação da duração do trabalho é parte integrante de qualquer política de saúde pública, uma vez que influencia, exponencialmente, a eficácia das medidas de medicina e segurança do trabalho adotadas na empresa. Do mesmo modo que a ampliação da jornada (inclusive com a prestação de horas extras) acentua, drasticamente as probabilidades de ocorrência de doenças profissionais o

u acidentes do trabalho, sua redução diminui, de maneira significativa, tais probabilidades da denominada 'infortunística do trabalho'” (sem grifos no original).

Por este motivo, a Constituição da República realçou o direito fundamental à limitação da duração do trabalho no art. 7º incisos XIII, XIV, XV e XVI.

O trabalho em regime de sobrejornada deve ser combatido porque é maléfico para o trabalhador, prejudicando sua saúde, seu convívio familiar e social, bem como inviabilizando o seu crescimento pessoal, impedindo-o de fazer cursos de aperfeiçoamento profissional ou cultural. E o mais grave: o regime de horas extraordinárias não estimula a abertura de novos postos de trabalho, tão necessário nesta

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época de intenso desemprego.

Nessa seara, estudos científicos de autoria conjunta de Marcelo Néri, Wagner L. Soares, Christiane Soares e Alexandre Pinto relatam expressamente os malefícios que o meio ambiente de trabalho pode produzir ao empregado motorista, valendo destacar o seguinte trecho:

“O crescimento da frota de veículos, não acompanhado do aumento do sistema viário e do planejamento urbano, têm sido responsável pelo aumento do percurso das vias, e, por sua vez, pela crescente agressividade dos motoristas. Segundo Alves Junior (1996), “a sensação de perda da liberdade sofrida pelo cidadão é capaz de levar-lhe a distúrbios de comportamento de consequências imprevisíveis”.

Somando-se a isso, as preocupações e horários a ser cumpridos conduzem o indivíduo à irritabilidade e à agressividade. Outrossim, além de constituírem um risco potencial aos acidentes de trânsito, esses fatores também podem gerar consequências nocivas na saúde como, por exemplo, o stress. Muitas pesquisas associam os congestionamentos do tráfego com a incidência de doenças como a taquicardia, a hipertensão arterial, a epigastralgia e o aumento do débito cardíaco, provenientes de descargas adrenérgicas. Santos Júnior & René (1999) citam estudos que associam o trabalho de motorista profissional e a prevalência de infarto agudo no miocárdio e, outras doenças cardiovasculares como a hipertensão arterial.

A incidência de infarto do miocárdio entre o grupo de motoristas de ônibus atingiu níveis superiores aos do resto da população de Estocolmo, Suécia, e distritos adjacentes. Resultado do trabalho implementado por Gustavsson et ali (1196), do Departamento de Saúde Ocupacional de Estocolmo, a pesquisa detectou uma proporção bastante alta, maior que 80%, de motoristas urbanos que relatam uma combinação de altas demandas psicológicas e baixo controle de seu trabalho.

A saúde física e mental do motorista é sem dúvida reflexo das condições de trabalho vivenciadas pela categoria. Tais condições geram, ainda, consequências não somente na vida dos condutores (distúrbios físicos e emocionais), como também, promovem impactos negativos no plano organizacional da empresa e em toda a sociedade.” (in Saúde Ocupacional no Setor de Transporte, UFRJ:2001, pág. 4).

Ademais, é notório o uso de anfetaminas (popular “rebite”) e outras drogas pesadas, como artifício utilizado pelos motoristas de transportes para su-portar as longas jornadas de trabalho impostas pelas empresas de transporte, comprome-tendo, inegavelmente sua integridade física e psíquica.

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III.II - DA OBRIGATORIEDADE DE EFETUAR O CONTROLE DA JORNADA DOS MOTORISTAS

Muito embora todo o expendido demonstre que a ré não cumpre as disposições quanto aos limites de jornada, a mesma sustenta que os seus motoristas exercem atividade externa nos moldes do art. 62, I da CLT.

Todavia, pela forma mediante a qual a prestação de serviço ocorre, com total controle de rota, de horários, com rastreamento dos veículos, impossível enquadrar o trabalho executado pelos motoristas aos ditames do referido dispositivo, qual seja, atividade incompatível com a fixação de horário de trabalho.

A legislação vigente, visando a possibilitar o efetivo controle da jornada dos trabalhadores, determina que os estabelecimentos que contam com mais de dez funcionários devem realizar a anotação de suas jornadas.

É cediço, ainda, que o art. 62, inc. I da CLT consiste em ex-ceção a esta regra, pois prevê que o controle de jornada não se aplica aos trabalhadores que exercem atividade externa incompatível com a fixação de horário de trabalho. Nada obsta, consoante dispõe o §3º do art.74, que se o trabalho for executado fora do estabele-cimento, o horário dos empregados conste, explicitamente, de ficha ou papeleta em seu poder, sem prejuízo de anotação de horário de trabalho no registro do empregado (§ 1º do art. 74). É evidente que não é a ATIVIDADE EXTERNA que exclui o trabalhador o direito de limitação de sua jornada de trabalho, mas sim a ATIVIDADE EXTERNA IN-COMPATÍVEL COM A FIXAÇÃO DE HORÁRIO.

Desatenta a esta norma de interesse público, a ré alega que deixa de promover o controle da jornada dos trabalhadores que exercem a função de motorista, porque se trata de atividade exercida externamente, aduzindo, por isso, a impossibilidade de realização do referido controle.

Porém, esse entendimento não resiste à análise mais detida, razão pela qual está obrigada a efetuar o controle da jornada de todos os seus trabalhadores, inclusive daqueles que exercem a função de motorista.

Muitas vezes, a empresa dispõe de inúmeros dispositivos que podem ser utilizados, dentre outras finalidades, para o controle da jornada de traba-lho, senão vejamos:

a) tacógrafo - relatórios sintéticos extraídos dos tacógrafos demonstram o tempo de movimentação do veículo e suas interrupções, data e hora de início da operação; identificação do veículo e identificação dos condutores. Embora os relatórios dos tacógrafos indiquem o tempo parado do veículo, não esclarecem se este

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tempo corresponde a horas de descanso ou horas de espera de carga e descarga, ou tem-po parado no trânsito em virtude de congestionamentos e acidentes.

Tal equipamento é de uso obrigatório para a maioria dos veí-culos de transporte de carga, nos termos do art. 105, II do Código de Trânsito, verbis: “Art. 105. São equipamentos obrigatórios dos veículos, entre outros a serem estabeleci-dos pelo CONTRAN: (...) II - para os veículos de transporte e de condução escolar, os de transporte de passageiros com mais de dez lugares e os de carga com peso bruto total superior a quatro mil, quinhentos e trinta e seis quilogramas, equipamento registrador instantâneo inalterável de velocidade e tempo”.

b) rastreadores por satélite - através dos rastreadores de satélite a empresa controla o percurso do veículo e pode verificar on-line se o caminhão ou carreta estão parados ou em movimento; pode enviar e receber mensagens dos moto-ristas através do rastreador. Tal equipamento funciona 24 horas por dia.

Segundo informado pelas testemunhas judiciais, inclusive a indicada pela reclamada, as mesmas confirmaram que as demandadas possuem veículos com rastreamento via satélite. Assim, o empregador pode acompanhar todo o percurso do veículo, saber quando o motorista desacelerou, freou, onde e quanto tempo parou, se está na rota inicialmente determinada, pode bloquear seu combustível, comunicar-se com o motorista, entre outros recursos.

c) rotas programadas - controle dos horários de saída e de entrega (considerando-se o trajeto a ser executado), que pode ser feito por meio da pape-leta de controle de horário externo (CLT, art.74, §3º).

d) CTF - Soma-se a todas essas ferramentas que, direta ou indiretamente, possibilitam pleno controle da jornada, o CTF (Controle Total de Frotas).

Conforme informação disponível no “site” da Petrobrás (www.br.com.br), o CTF é um sistema de abastecimento totalmente automatizado que visa a agilizar e otimizar o processo de abastecimento de frotas. O CTF funciona da se-guinte forma: todos os veículos da frota são equipados com um dispositivo (UVE - Uni-dade de Veículo) interligado ao hodômetro ao bocal do tanque. Os postos, por sua vez, são dotados de unidades controladoras interligadas aos bicos das bombas onde são insta-ladas antenas e um sistema de envio de dados. Quando um veículo credenciado posicio-na-se para o abastecimento, sua UVE automaticamente se identifica com a antena do bico da bomba. No momento do abastecimento, a antena registra na unidade controlado-ra do posto todas as informações sobre o abastecimento (veículo, quilometragem, com-bustível, litragem, valor). Quando o bico da bomba é afastado, automaticamente a comu-nicação é interrompida e o motorista pode seguir viagem sem ter que preencher ou assi-nar qualquer documento. Os dados coletados pela antena da bomba são armazenados na

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unidade computadorizada do posto que, ao final do dia, os envia, através da Internet, para uma central de processamento de dados. Posteriormente o posto envia por correio a nota fiscal para a frota. Todas as informações coletadas podem ser consultadas via Inter-net. O banco de dados é atualizado diariamente. Segundo, destacado pela Petrobrás, um dos benefícios do CTF é a detecção de eventuais desvios de rotas.

A jurisprudência e a doutrina são pacíficas ao concluir que a regra exceptiva contida no art. 62, da CLT somente se aplica para aqueles casos em que ao empregador, não tem meios disponíveis para realizar o controle da jornada de seus empregados, conforme já asseverado.

Sobre este assunto, aliás, já foi editada a Orientação Jurisprudencial n.º 332 da Subseção I Especializada em Dissídios Individuais do TST. Pede-se venia para aqui transcrevê-la:

“MOTORISTA. HORAS EXTRAS. ATIVIDADE EXTERNA. CONTROLE DE JORNADA POR TACÓGRAFO. RESOLUÇÃO Nº 816/1986 DO CONTRAN. DJ 09.12.2003 - O tacógrafo, por si só, sem a existência de outros elementos, não serve para controlar a jornada de trabalho de empregado que exerce atividade externa.”

Esta Orientação Jurisprudencial do TST, interpretada a contrario sensu, porém, permite concluir que a existência do tacógrafo aliada à concorrência de outros equipamentos que controlam a atividade dos motoristas autoriza, sim, a verificação de suas jornadas de trabalho. Este, inclusive, é o entendimento pacífico dos Tribunais:

“EMBARGOS. RECURSO DE REVISTA. NÃO-CONHECIMENTO. VIOLAÇÃO DO ARTIGO 896 DA CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS DO TRABALHO NÃO CARACTERIZADA. MOTORISTA. ATIVIDADE EXTERNA. CONTROLE DA JORNADA. USO DE EQUIPAMENTOS ELETRÔNICOS. A alegação de ofensa ao artigo 896 da CLT não respalda a pretensão deduzida pela Reclamada nas razões de embargos, no sentido de ver modificada a decisão da Turma quanto ao não-conhecimento do seu Recurso de Revista. O Tribunal Regional, decidiu em perfeita consonância com a jurisprudência atual e pacífica do Tribunal Superior do Trabalho a respeito da não aplicabilidade à hipótese do entendimento consagrado da Orientação Jurisprudencial n.º 332 da Subseção I Especializada em Dissídios Individuais do TST e do artigo 62, inciso I, da Consolidação das Leis do Trabalho, na hipótese de o controle da jornada de motorista se dar mediante uso de equipamento eletrônico - tacógrafo associado ao uso do REDAC (computador de bordo) e do AUTOTRAC (controle à distância por satélite). No caso de a decisão impugnada revelar consonância com jurisprudência iterativa e atual do Tribunal Superior do Trabalho, disposição legal expressa contida no § 4.º do artigo 896 do texto consolidado

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autoriza o não-conhecimentodo Recurso de Revista. Embargos não conhecidos.” (TST-E-RR-719.289/2000.8, Rel. Min. Lelio Bentes Corrêa, DJ de 24/11/2006.) (sem grifos no original).

“RECURSO DE EMBARGOS. MOTORISTA DE CAMINHÃO. TACÓGRAFO. EXISTÊNCIA DE OUTRAS PROVAS QUE EVIDENCIAM A JORNADA EXTRAORDINÁRIA. ART. 62, I, DA CLT. INAPLICABILIDADE. PROVIMENTO. Consignado pelo Regional que o Reclamante trabalhava em sobrejornada, não apenas com base no uso do tacógrafo, mas também em outras provas aferidas nos autos, não tem aplicação à hipótese dos autos o art. 62, I, da CLT, destinado aos empregados que exercem atividade externa incompatível com a fixação da jornada de trabalho.” (TST-E-RR-693.014/2000.9, Rel. Min. Maria de Assis Calsing, DJ de 19/10/2007) (sem grifos no original).

Nos Tribunais Regionais há diversas decisões no sentido de garantir o direito constitucional ao controle e limitação de jornada de trabalho, que se exemplifica com as ementas abaixo transcritas:

“EMENTA: MOTORISTA CARRETEIRO. TRABALHO EXTERNO. POSSIBILIDADE DE CONTROLE DE JORNADA. HORAS EXTRAS DEVIDAS O trabalho externo não importa, por si, só, em ausência do controle de jornada. A moderna dourina trabalhista tem entendido que o art. 62, I da CLT deve ser interpretado como um dever social do empregador em controlar a jornada de trabalho, porque a mera condição de ser humano obriga à limitação de tempo de trabalho, mormente no caso dos autos, em que o reclamante exerce a função de motorista carreteiro, cujo trabalho excessivo potencializa sobremaneira o risco de acidente. Outros entendem que é inconstitucional a exclusão de trabalhadores da proteção legal de limite de tempo de trabalho, pois referida disposição celetista não estaria recepcionada pelo disposto no art. 7º, XIII, da CF, que se impõe a todos os trabalhadores sem exceção. Registre-se, por oportuno, o Enunciado 17 da 1ª Jornada de Direito Material e Processual na Justiça do Trabalho: E. Nº 17. LIMITAÇÃO DA JORNADA. REPOUSO SEMANAL REMUNERADO. DIREITO CONSTITUCIONALMENTE ASSEGURADO A TODOS OS TRABALHADORES. INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 62 DA CLT. A proteção jurídica ao limite da jornada de trabalho, consagrada nos incisos XIII e XV do art. 7º da Constituição da Republica, confere, respectivamente, a todos os trabalhadores, indistintamente, os direito ao repouso semanal remunerado e à limitação de jornada de trabalho, tendo-se por inconstitucional o art. 62 da CLT. Desse modo, entendo que a reclamada, independentemente do trabalho externo, deveria ter realizado o controle da jornada de trabalho desempenhada pelo requerente e, consequentemente, tê-lo apresentado em juízo. Não se desincumbiu a ré, no entanto, desse ônus. (TRT 17 ª Região – RO 0084800-14.2009.5.17.0012, Rel. Des. Cláudio Armando Couce de Menezes, certidão de julgamento em 06/12/2011).

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“EMENTA: JORNADA DE TRABALHO. MOTORISTA CARRETEIRO. Se há possibilidade de controle da jornada, segundo evidenciado pela prova testemunhal, faz jus o trabalhador a horas extras, sendo inaplicável o art. 62, I, da CLT. Recurso provido. ( TRT 4ª Região – RO 27500.71.2009.5.04.0751, Rel. Juíza Inês MARIA INÊS CUNHA DORNELLES Órgão julgador 6a. Turma. Acórdão lavrado em 14/12/2011).

O voto condutor deste último julgamento trouxe como fundamento da necessidade de controle de jornada tanto a própria atividade profissional do trabalhador, quanto à inexistência da possibilidade autonomia do empregado na organização do próprio horário, em razão das tarefas diárias a serem desempenhadas de forma subordinada, conforme excerto do voto condutor do julgamento, abaixo transcrito:

“O reclamante era motorista carreteiro, realizando, normalmente, viagens interestaduais (a preposta disse que as viagens eram de São Borja, Uruguaiana ou Itaqui “para cima” em direção a Belo Horizonte a São Paulo – fl. 159), tendo também realizado algumas viagens para a Argentina. A exceção à regra geral de registro e controle de jornada só é admitida em casos bastante específicos, em que impossibilitado o controle de horários em razão da própria atividade desenvolvida, o que não é o caso dos autos. Não há confundir jornada não controlada com jornada incontrolável, esta que foge ao talante do empregador identificar em que horário é iniciada a jornada e em que momento é encerrada. Estas hipóteses, de fato, estão reservadas para atividades em que o trabalhador é quem detém autonomia na organização de seu próprio horário em razão das tarefas diárias a serem desempenhadas.”

Pois além do dever constitucional imposto às rés de promover o controle de jornada em razão de direitos indisponíveis do empregado que exerce trabalho subordinado, ao repouso, ao descanso e à preservação e prevenção da saúde, revelam as provas produzidas no procedimento investigatório que fundamenta a presente demanda, que os caminhões da ré, além de equipados obrigatoriamente com tacógrafos, os veículos são monitorados por meio de rastreador.

No caso trazido a juízo, o exame atento do conjunto probatório permite a verificação de que os motoristas estão sujeitos a longas jornadas. Atente-se, neste ponto, ao fato de que a jornada de trabalho dos trabalhadores abrange não somente as horas em que o trabalhador efetivamente dirige o veículo, como também aquele período em que se mantém à disposição da empresa. Portanto, o tempo em que os motoristas aguardam a carga/descarga dos caminhões, deve, sim, ser computado em sua jornada, para efeito de avaliação de riscos de acidente.

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II.III - A LIMITAÇÃO DO TEMPO DE TRABALHO DOS MOTORISTAS PROFISSIONAIS COM O ADVENTO DA LEI 12619/2012

Atento à fundamentação quanto ao necessário controle de jornada para os motoristas profissionais, o legislador promulgou a citada lei no intuito não só de resguardar os trabalhadores motoristas, mas também, toda a sociedade que trafega nas rodovias brasileiras.

É notório que o Brasil é um país que apresenta altíssimo índice de acidentes de tráfego. Por isso, a adoção de medidas governamentais para tutelar a vida dos cidadãos brasileiros. Nesse sentido, se buscou a implementação da “Lei Seca”, visando a impedir que condutores de veículos trafeguem embriagados; adotou a providência de delimitar os horários de tráfego dos caminhões nas estradas, para que não se impusesse a direção por longas horas e limitasse a exposição aos riscos inerentes à condução do veículo por motoristas profissionais sonolentos, dentre outras, medidas políticas a resguardar a segurança no tráfego. E, nessa linha, foi publicada a lei 12619/2012, que impôs modificações na CLT e no Código de Transito Brasileiro.

Nesse sentido, a fim de não apartar o rumo político tutelar, quer ao trabalhador, quer à sociedade, necessário impor seu estrito cumprimento, no sentido de compelir as rés à adoção das providências elencadas em seu art. 2º, V, que dispõe:

Art. 2º: São direitos dos motoristas profissionais, além daqueles previstos no Capítulo II do Título II e no Capítulo II do Título VIII da Constituição Federal: (...) V - jornada de trabalho e tempo de direção controlados de maneira fidedigna pelo empregador, que poderá valer-se de anotação em diário de bordo, papeleta ou ficha de trabalho externo, nos termos do § 3º do art. 74 da CLT da Consolidaçãodas Leis do Trabalho aprovada pelo Decreto-Lei 5.452, de 1º de maio de 1943, ou de meios eletrônicos idôneos instalados nos veículos, a critério do empregador.

A fim de implementar as providências de limitação da jornada dos motoristas foi alterada a CLT, regendo o art. 235-C, §§ 1º ao 5º, que será admitida a prorrogação da jornada de trabalho diária do motorista profissional em até 02 (duas) horas extraordinárias, com adicional de ao menos 50%, sendo considerado trabalho efetivo o período em que o trabalhador estiver à disposição do empregador, sendo-lhe assegurado o intervalo de no mínimo 01 (uma) horas para repouso e alimentação e os intervalos interjornada de 11 horas, bem como, o descanso semanal remunerado de 24 horas. Faz jus, também, ao adicional noturno previsto no art. 73 da CLT.

No que concerne às viagens de longa distância, consideradas assim, aquelas em que o motorista permanece fora da base da empresa empregadora por

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mais de 24 (vinte e quatro) horas, impõe-se uma jornada diferenciada, na forma da lei, devendo ser concedido intervalo de 30 (trinta) minutos de descanso a cada 04 (quatro) horas de tempo ininterrupto de direção, na forma do art. 235-D da CLT.

Regra especial deverá ser observada no caso de viagens com duração superior a 01 (uma) semana, em que o descanso semanal será de 36 (trinta e seis) horas por semana, devendo ser usufruído no retorno do motorista à base da empresa (matriz ou filial) ou em seu domicílio, salvo quando oferecidas condições adequadas para o efetivo gozo do referido descanso, na forma do art. 235-E, § 1º da CLT.

Na adoção do trabalho dos motoristas em regime de revezamento, o repouso diário mínimo de 06 (seis) horas consecutivas é garantido, na forma do novel art. 235-E, § 7° da CLT.

Cabe frisar, ademais, que a prática da remuneração comissionada restou vedada expressamente, conforme se aduz pelo texto do art. 235-G da CLT, in verbis: É proibida a remuneração do motorista em função da distância percorrida, do tempo de viagem e/ou da natureza e quantidade de produtos transportados, inclusive mediante oferta de comissão ou qualquer outro tipo de vantagem, se essa remuneração ou comissionamento comprometer a segurança rodoviária ou da coletividade ou possibilitar violação das normas da presente legislação. (grifo nosso).

Dessa forma, por todo o exposto, comprovadas as irregularidades referentes à jornada dos motoristas das rés, cabível a tutela inibitória ora pleiteada, de forma a coibir as mesmas ao cumprimento da lei, através de comando judicial.

III.III. DAS DEMAIS IRREGULARIDADES CONSTATADAS

Conforme apurado em fiscalização dos srs. Auditores-fiscais do trabalho, foi constatado o descumprimento de normas relativas à jornada, incluídos os intervalos, também com relação aos demais empregados das empresas, que não motoristas, em violação a todas as normas relativas acima referidos19.

Por outro lado, restou também comprovada a falta de pagamento dos salários dos seus empregados até o 5º dia útil do mês subsequente ao vencido, em claro descumprimento ao art. 459, § 1º, da CLT. Como é sabido, o pagamento de salários no prazo estipulado em lei é obrigação contratual do empregador e direito indisponíveis do trabalhador, devido ao seu caráter alimentar e necessário ao

19  Doc. 4, fls. 97

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seu sustento e de sua família20.

De acordo com os autos de infração, foi constatado que o pagamento dos 126 trabalhadores em atraso, sendo realizados apenas no sexto dia útil.

Por fim, foram lavrados autos de infração decorrentes de ausência de identificação dos riscos na etapa de reconhecimento dos riscos do Programa de Prevenção de Riscos Ambientais (PPRA). Conforme o histórico do auto não restou identificado o agente físico “vibração” a que os motoristas estão expostos durante toda sua jornada de trabalho. Continua o relato que, nesses casos de vibração de corpo-inteiro pode acarretar efeitos adversos na coluna vertebral, tais como lombalgia, degeneração precoce da região lombar e hérnia de disco. Portanto, na forma dos art. 157, inciso I, da CLT, c/c item 9.3.3, alínea “a” da NR-9, com redação da Portaria nº 25/11994, deve a empresa ser condenada a promover o Programa de Prevenção de Riscos Ambientais (PPRA), prevendo a identificação do risco acima relatado21.

Outra irregularidade constatada no PPRA, quanto à ré Trânsito Administração e Cobrança Ltda, diz respeito à ausência de etapa de reconhecimento dos riscos, a identificação das funções e a determinação do número de trabalhadores expostos22.

Quanto a esta ré, outrossim, foi constatado o início das atividades dos empregados sem a realização do exame médico admissional, a exemplo da empregada Cláudia Adriana dos Santos, que iniciou suas atividades em 01.10.2010 e somente foi submetida à avaliação clínica em 27.10.2010. Tal conduta traduz descumprimento ao disposto no art. 157, I, da CLT, c/c item 7.4.3.1 da NR 7, com redação da Portaria 24-199423.

IV- DO DANO DE NATUREZA COLETIVA

Demonstrado o reiterado descumprimento da legislação ora vigente a causar inúmeros prejuízos à saúde e segurança dos trabalhadores motoristas pelas rés e demais empregados, bem como a resistência em ajustar a conduta de forma espontânea na seara administrativa, necessária a indenização a título de danos morais coletivos por todos os réus, com finalidade repressiva e pedagógica.

Por todo o exposto, os fatos narrados possuem amparo na

20  Doc. 4, fls. 232, 235, 258, 339,115, 120, 125, 173-1, 177, 18121  Doc. 4, fls 16322  Doc. 4, fls. 32523  Doc. 4, fls. 332

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lesão provocada pela ré à coletividade de trabalhadores e à própria sociedade, frente ao seu descaso com o ordenamento jurídico, sobretudo no que se refere aos direitos fundamentais.

Com efeito, a ordem jurídica vem sendo reiteradamente maltratada e descumprida, acintosamente, pelos demandados, que se sentem à vontade para dessa forma continuar agindo pela falta de efetiva coercitividade da legislação.

Destarte, através do exercício da ação civil pública, pretende o Ministério Público do Trabalho a definição da responsabilidade por ato ilícito que causou danos morais ou patrimoniais a interesses difusos ou coletivos. A questão está assim definida pelo art. 1º da Lei n. 7.347/85: “Art. 1º. Regem-se pelas disposições desta lei, sem prejuízo da ação popular, as ações de responsabilidade por danos morais e patrimoniais causados: V – a qualquer outro interesse difuso ou coletivo”.

A fim de coibir a continuação e a repetição do ilícito, tem-se como mecanismo a tutela inibitória. Todavia, quanto à reparação da lesão ocorrida no passado, que ainda repercute em toda a sociedade, é necessária a tutela ressarcitória, a fim de que os infratores suportem o custo do dano.

A possibilidade de condenação em danos morais coletivos encontra-se em consonância com o movimento mais recente do Direito, no sentido de sua coletivização ou socialização.

O dano moral coletivo, portanto, desponta como sendo a violação em dimensão transindividual dos direitos da personalidade.

Se o particular sofre uma dor psíquica ou passa por uma situação vexatória, a coletividade, vítima de dano moral, sofre de desapreço, descrença em relação ao poder público e à ordem jurídica. Padece a coletividade de intranquilidade e insegurança.

Justifica-se a reparação genérica, não só pela transgressão ao ordenamento jurídico vigente, com a qual a sociedade não se compadece, mas também pelo caráter pedagógico da sanção indenizatória, além de permitir, ao menos de forma indireta, o restabelecimento da legalidade pela certeza de punição do ato ilícito a irradiar sobre as demais empresas descumpridoras da ordem jurídica.

Dizer que tal conduta não gera dano coletivo, impõe chancela judicial a todo tipo de desmando e inobservância da legislação trabalhista, que põem em risco, coletivamente, trabalhadores indefinidamente considerados.

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Entende o Ministério Público do Trabalho que a indenização a título de dano moral coletivo deve ser fixada em valor não inferior a R$ 300.000,00 (trezentos mil reais).

Trata-se de indenização compatível com os critérios básicos de orientação para fixar-se o quantum da reparação, a saber: a) a extensão do dano; b) a natureza da conduta; c) a gravidade e a repercussão da ofensa; c) a situação econômica do ofensor; d) o grau de culpa presente em sua conduta; e) a intensidade e dimensões do efeito negativo do dano à coletividade; f) o caráter pedagógico ao desestímulo a condutas assemelhadas, como sinal da função preventiva que, na espécie, exsurge nitidamente do sistema de responsabilidade civil.

Esses valores devem ser revertidos em prol da coletividade, a um fundo destinado à reconstituição dos bens lesados, conforme previsto no artigo 13 da Lei n. 7.347/85.

No caso de interesses difusos e coletivos na área trabalhista, esse fundo é o FAT – Fundo de Amparo ao Trabalhador, instituído pela Lei n. 7.998/90, resguardada a possibilidade de o valor receber destinação social a entidades públicas e privadas com atuação na defesa dos direitos sociais.

V – TUTELA ANTECIPADA

Examinando-se as normas de proteção aos direitos coletivos e difusos, verifica-se que o art. 12, caput, da Lei nº 7.347/85, autoriza o juiz a conceder mandado liminar. Os artigos 19 e 21, desse diploma, por sua vez, autorizam a aplicação do Código de Processo Civil e do Código de Defesa do Consumidor, respectivamente, à ação civil pública.

Do até aqui fundamentado, bem como das provas colaciona-das, vislumbra-se o procedimento lesivo dos réus, deixando ver que, até a solução final da presente ação, continuará colocando em risco à saúde e a vida dos seus empregados motoristas, sem falar do risco a terceiros que utilizam as rodovias.

Portanto, cumpre, desde logo, impedir que danos continuem acontecendo, diante das exaustivas jornadas de trabalho, por meio da concessão de tutela antecipada, através da tutela inibitória, sob pena de astreintes.

Trata-se, assim, a antecipação em apreço de medida de cará-ter satisfativo, fulcrada no disposto nos artigos 461, § 3º e 4º, e 84 § 3º e 4º, do Código

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de Processo Civil e da Lei nº 8.078/91, respectivamente, desde que presentes os pressu-postos específicos, a saber, a relevância do fundamento da demanda e o justificado re-ceio de ineficácia do provimento final.

A relevância do fundamento, na hipótese aqui versada, en-contra-se inequivocamente demonstrada pelos documentos coletados no decorrer da in-vestigação realizada, que indiciam fortemente a prática da jornada desumana e degra-dante a que submetidos os trabalhadores. O justo receio de dano, a seu turno, verifica-se frente à real possibilidade da continuidade dos graves riscos à vida dos motoristas.

No caso dos autos está evidente a urgência da antecipação dos efeitos da tutela pelos seguintes motivos:

a) a prova inequívoca da ilicitude, consistente em exigir lon-gas jornadas de trabalho aos motoristas e ausência das pausas e descansos previstos em lei;

b) a grande probabilidade de continuidade destas condutas que colocam em risco a saúde e segurança dos empregados, tornando o dano de difícil reparação.

Nessas circunstâncias, a antecipação dos efeitos da tutela é medida que naturalmente se impõe.

VI - DOS PEDIDOS:

i) Do pedido liminar:

Por todo o exposto, requer, com fulcro nos artigos 11 e 12, da Lei n.º 7.347/85, c/c com o artigo 461, do Código de Processo Civil, a concessão de antecipação dos efeitos da tutela a fim de determinar que as rés cumpram as seguintes obrigações, sob pena de multa diária de R$ 500,00, reversível ao FAT ou outra destina-ção diversa a critério deste juízo, em caso de descumprimento de qualquer obrigação:

a) Proceder ao controle da jornada dos seus empregados motoristas, especificamente considerados, de modo fidedigno, valendo-se de anotação em diário de bordo, papeleta ou ficha de trabalho externo, sem prejuízo de outros meios eletrônicos idôneos instalados no veículo;

b) abster-se de prorrogar a jornada normal de trabalho dos seus empregados, inclusive dos motoristas , além do limite de duas horas diárias;

c) conceder aos seus empregados motoristas, dentre eles os motoristas, o descanso semanal remunerado de 35 horas consecutivas, nele computado o intervalo interjornada;

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d) Conceder aos seus empregados, inclusive motoristas, intervalo interjornada de no mínimo 11 (onze) consecutivas para descanso entre duas jornadas de trabalho, nos moldes determinados pelo art. 66 e art. 235-C, §3º, ambos da CLT;

e) Conceder aos seus empregados, inclusive motoristas, intervalo intrajornada de no mínimo 01 (uma) hora consecutivas para descanso e alimentação, nos moldes determinados pelo art. 71 c/c art. art. 235-C, §3º da CLT;

f) Conceder aos empregados motoristas intervalo de 30 (trinta) minutos de descanso a cada 04 (quatro) horas de tempo ininterrupto de direção, nas viagens de longa duração, consideradas aquelas em que o motorista permanecer fora da base empresarial e/ou de sua residência por período superior a 24 (vinte e quatro) horas, sem prejuízo do intervalo intrajornada para alimentação, na forma do art. 235-D daCLT;

g) Conceder descanso semanal remunerado de 36 (trinta e seis) horas, por semana laborada, nas viagens com duração superior a 01 (uma) semana, devendo seu gozo ocorrer no retorno do motorista à base da empresa (matriz ou filial) ou no domicílio do empregado, na forma do art. 235- E, § 1º da CLT;

h) abster-se de efetuar o pagamento do salário dos motoristas profissionais em forma de comissão ou outro valor fixo, ou em função da distância percorrida, do tempo de viagem e/ou pela natureza do produto transportado, na forma do art. 235-G da CLT;

ii – Dos pedidos definitivos:

No mérito, em tutela definitiva, requer sejam as rés condenadas às seguintes obrigações, de fazer e de não fazer, sob pena de multa pecuniária de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) por trabalhador em situação irregular, reversível ao FAT, ressalvada destinação diversa a critério deste Juízo, além de obrigação de pagar ao final postulada: a) Proceder ao controle da jornada dos seus empregados motoristas, especificamente considerados, de modo fidedigno, valendo-se de anotação em diário de bordo, papeleta ou ficha de trabalho externo, sem prejuízo de outros meios eletrônicos idôneos instalados no veículo;

b) abster-se de prorrogar a jornada normal de trabalho dos seus empregados, inclusive dos motoristas , além do limite de duas horas diárias;

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PROCURADORIA DO TRABALHO NO MUNICÍPIO DE SANTA CRUZ DO SUL

c) conceder aos seus empregados motoristas, dentre eles os motoristas, o descanso semanal remunerado de 35 horas consecutivas, nele computado o intervalo interjornada;

d) Conceder aos seus empregados, inclusive motoristas, intervalo interjornada de no mínimo 11 (onze) consecutivas para descanso entre duas jornadas de trabalho, nos moldes determinados pelo art. 66 e art. 235-C, §3º, ambos da CLT;

e) Conceder aos seus empregados, inclusive motoristas, intervalo intrajornada de no mínimo 01 (uma) hora consecutivas para descanso e alimentação, nos moldes determinados pelo art. 71 c/c art. art. 235-C, §3º da CLT;

f) Conceder aos empregados motoristas intervalo de 30 (trinta) minutos de descanso a cada 04 (quatro) horas de tempo ininterrupto de direção, nas viagens de longa duração, consideradas aquelas em que o motorista permanecer fora da base empresarial e/ou de sua residência por período superior a 24 (vinte e quatro) horas, sem prejuízo do intervalo intrajornada para alimentação, na forma do art. 235-D da CLT;

g) Conceder descanso semanal remunerado de 36 (trinta e seis) horas, por semana laborada, nas viagens com duração superior a 01 (uma) semana, devendo seu gozo ocorrer no retorno do motorista à base da empresa (matriz ou filial) ou no domicílio do empregado, na forma do art. 235- E, § 1º da CLT;

h) abster-se de efetuar o pagamento do salário dos motoristas profissionais em forma de comissão ou outro valor fixo, ou em função da distância percorrida, do tempo de viagem e/ou pela natureza do produto transportado, na forma do art. 235-G da CLT;

i) efetuar o pagamento dos salários dos empregados até o 5º (quinto) dia útil;

j) elaborar o Programa de Prevenção de Riscos Ambientais (PPRA), de forma a identificar o agente físico vibração a que os motoristas estão expostos durante toda sua jornada de trabalho, bem como identificar etapa de reconhecimento dos riscos, a identificação das funções e a determinação do número de trabalhadores expostos;

l) abster-se de exigir que o trabalhador assuma suas atividades antes de ser submetido à avaliação clínica, integrante do exame médico admissional.

m) Requer, ainda, a condenação das rés , solidariamente, ao pagamento de indenização por dano moral coletivo de R$ 300.000,00 (trezentos mil reais).

VII- DOS DEMAIS REQUERIMENTOS:

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1) a citação dos réus para, querendo, contestar a presente ação, sob pena de revelia e confissão ficta (Enunciado nº 74, TST);

2) a intimação pessoal e nos autos do Ministério Público do Trabalho, nos termos do contido nos artigos 18, II, alínea “h”, e 84, IV, da Lei Complementar nº 75/93, art. 43, da Consolidação dos Provimentos da CGJT, e artigo 236, § 2º, do CPC;

3) provar o alegado por todos os meios de prova em direito admitidos.

Atribui-se à causa o valor de R$ 300.000,00.

Santa Cruz do Sul, 08 de julho de 2013.

ENÉRIA THOMAZINI

Procuradora do Trabalho

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