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Metta Cursos SUSPEIÇÃO DA TESTEMUNHA QUE LITIGA OU QUE LITIGOU CONTRA O MESMO EMPREGADOR Juliana Maroja Ribeiro Ramos Rio de Janeiro 2015 DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL

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SUSPEIÇÃO DA TESTEMUNHA QUE LITIGA OU QUE LITIGOU CONTRA O MESMO EMPREGADOR

Juliana Maroja Ribeiro Ramos

Rio de Janeiro

2015

DOCUMENTO PROTEGID

O PELA

LEI D

E DIR

EITO AUTORAL

JULIANA MAROJA RIBEIRO RAMOS

SUSPEIÇÃO DA TESTEMUNHA QUE LITIGA OU QUE LITIGOU CONTRA O MESMO EMPREGADOR

Artigo Científico apresentado como exigência de conclusão de Curso de Pós-Graduação Lato Sensu em Direito do Trabalho e Direito Processual do Trabalho. Professor Orientador: Cláudia Pisco.

Rio de Janeiro 2015

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SUSPEIÇÃO DA TESTEMUNHA QUE LITIGA OU QUE LITIGOU CONTRA O MESMO EMPREGADOR

Juliana Maroja Ribeiro Ramos Graduada pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro – PUC-RIO. Advogada. Pós-graduada em Direito Público pela Universidade Católica de Petrópolis.

Resumo: As demandas trabalhistas se proliferam país afora se tornando, dia após dia, desafiador aos magistrados oferecerem uma boa prestação jurisdicional às partes. Além disso, o juiz deve sempre conduzir o processo de forma que busque evitar a conduta desleal dos litigantes. Nesse contexto é que se torna fundamental a discussão acerca da prestabilidade da prova testemunhal daquele que litiga contra o mesmo empregador, de forma que seja evitado o tratamento desproporcional entre as partes. Palavras-chaves: Suspeição. Testemunha. Processo do Trabalho. Sumário: Introdução. 1. Breves Considerações Acerca da Prova Testemunhal 2. Da Suspeição de Testemunhas 3. Da Testemunha que Litiga em Face do Mesmo Empregador. Conclusão. Referências. INTRODUÇÃO

O presente trabalho enfoca a análise da ocorrência de suspeição de testemunha que litiga

contra o mesmo reclamado. O instituto da suspeição tem natureza processual e determina que

algumas pessoas não poderão prestar testemunho, por conta de determinadas razões legalmente

instituídas. Em outras palavras, sempre que o depoimento deste indivíduo não puder transmitir

credibilidade e imparcialidade, o mesmo estará maculado por uma suspeita, desconfiança de que

poderá estar sendo usado como forma de beneficiar um dos litigantes.

No que tange especificamente à suspeição da testemunha que possui ou já possuiu ação

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em face do mesmo reclamado, cumpre dizer que esse artigo visa avaliar se, neste caso, será

aplicado o inciso III e/ou o IV do artigo 405 do Código de Processo Civil, considerando-se que

esta pessoa seria inimiga do reclamado ou teria interesse no litígio. Isto porque a Consolidação

das Leis do Trabalho trata do instituto da suspeição de forma breve e superficial, e sabe-se que a

Lei n. 5.869/73 é aplicada, em determinadas situações, de forma subsidiária ao Processo do

Trabalho. Para isso, serão analisados os entendimentos da doutrina e da jurisprudência.

Cumpre destacar que, inobstante ser consenso geral a fragilidade da prova testemunhal,

a mesma se tornou o meio mais utilizado no Processo Trabalhista. Em muitas situações este é,

inclusive, o único mecanismo usado para reforço da tese sustentada por cada uma das partes

litigantes. A insegurança inerente a esta prova se dá considerando que os fatos comportam

inúmeras versões e, normalmente, as testemunhas prestam depoimento eivado de subjetividade.

Diante desse contexto, se torna de suma importância a avaliação, caso a caso, de quem

pode prestar testemunho, de forma que se resguarde a credibilidade na condução da demanda

laboral. Todo litígio pressupõe a existência de um conflito de interesses e, especificamente no

Processo do Trabalho, se supormos, por exemplo, que a testemunha arrolada possui ou possuiu

processo idêntico ao em que irá prestar depoimento, verifica-se claramente neste caso que há

interesse da mesma no resultado da demanda.

Desta forma se busca destacar aos leitores o quanto é relevante que os magistrados

entendam a importância da análise apurada acerca da prestabilidade do depoimento testemunhal

nos casos em que a testemunha litiga contra o mesmo empregador. O presente trabalho procura

demonstrar que o juiz deve entender que deverá usar de muita prudência ao avaliar se uma pessoa

pode ou não atuar como testemunha.

Será discutida a melhor interpretação da Súmula n. 357 do Tribunal Superior do

Trabalho, que diz que o simples fato da testemunha estar litigando contra o mesmo empregador

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não a torna suspeita. Destacar-se-á o entendimento da doutrina acerca deste tema, bem como

sobre a aplicação subsidiária das normas processuais civis. Além disso, será apresentado o

entendimento do Supremo Tribunal Federal.

Assim pretende esta obra contribuir de forma eficaz para uma melhor prestação

jurisdicional, afastando a proteção desproporcional da parte obreira em prejuízo à empresa

reclamada. Será demonstrado que a prova testemunhal deverá provir de uma terceira pessoa, que

não as partes litigantes, que não deverá possuir interesse no resultado da demanda em que irá

depor. Somente desta maneira estará assegurada a verdade real no depoimento.

O direito processual é dotado de mecanismos punitivos para a parte que faltar com a

lealdade processual, mas é sabido que muitas vezes há uma grande dificuldade em se comprovar

tais situações. Assim sendo, fundamental pensar em meios para que o magistrado possa evitar a

conduta desleal de quaisquer das partes litigantes. Nesse contexto é que se pretende demonstrar

que, em muitas situações, poderá ser evitada a oitiva de testemunha com demanda contra o

mesmo reclamado, ainda que sua ação não seja idêntica à qual presta testemunho, de forma que

não seja incentivado o comportamento em desconformidade com os preceitos éticos e morais.

1. BREVES CONSIDERAÇÕES ACERCA DA PROVA TESTEMUNHAL

Testemunha é toda pessoa, distinta das partes processuais, chamada a juízo para prestar

depoimento acerca de fato relacionado ao objeto da demanda em questão. A prova testemunhal é

o meio de prova mais antigo de que se tem notícia. Isto porque a prova documental e a prova

pericial exigem certo desenvolvimento cultural e, por conta disso, surgiram apenas a partir do

momento em que a escrita foi se generalizando.

O testemunho consiste no relato daquilo que foi percebido pela testemunha por meio de

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qualquer um dos seus sentidos. Por conta disso, somente pessoas naturais podem ser testemunhas.

As pessoas jurídicas prestam apenas informações. Não cabe à testemunha fazer juízo de valor

sobre fatos e, nem muito menos, enquadrá-los juridicamente.

Como a Consolidação das Leis do Trabalho não regulamenta todo o instituto da prova

testemunhal, os artigos 400 a 419 do Código de Processo Civil são aplicáveis ao Processo do

Trabalho, naquilo que com ele não conflitarem.

Em regra geral, a prova testemunhal é admissível. Somente não será admitida para a

comprovação de fatos já provados por documento ou por confissão da parte ou que só por

documento ou por exame pericial puderem ser provados, conforme dispõe o artigo 400, em seus

incisos I e II do Código de Processo Civil. Na seara trabalhista, a prova testemunhal não será

admitida quando houver arguição de insalubridade e periculosidade, nos termos do artigo 195 da

CLT, e quando houver prova escrita do pagamento dos salários (artigo 464 da CLT).

Além disso, o ordenamento jurídico pátrio prevê limitações à capacidade de

testemunhar. Existem regras no Código Civil e no Código de Processo Civil, sendo que o

primeiro diploma legal, por ser lei posterior, revoga o segundo naquilo que houver contrariedade.

No âmbito trabalhista temos ainda o artigo 829 da Consolidação das Leis do Trabalho, que trata

brevemente de casos de suspeição e de impedimento de testemunhas. Como este dispositivo legal

não esgota todas as possibilidades de perda de isenção da testemunha é que se aplica o Código de

Processo Civil de forma subsidiária, seguindo a regra do artigo 769 da CLT.

No Código Civil temos o artigo 228 que estabelece que não podem ser admitidos como

testemunhas:

[...] I – os menores de dezesseis anos; II – aqueles que, por enfermidade ou retardamento mental, não tiverem discernimento para a prática dos atos da vida civil; III – os cegos e surdos, quando a ciência do fato que se quer provar dependa dos sentidos que lhes faltam; IV – o interessado no litígio, o amigo íntimo ou o inimigo capital das partes; V –

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os cônjuges, os ascendentes, os descendentes e os colaterais, até o terceiro grau de alguma das partes, por consaguinidade, ou afinidade. [...]1

Acerca do inciso II do dispositivo legal acima transcrito, o Código de Processo Civil faz

uma ressalva destacando ser necessária a lucidez do depoente apenas na ocasião em que ocorreu

o fato relacionado ao litígio e no momento em que for prestar o testemunho.

De forma mais clara, dispõe o artigo 405 do Código de Processo Civil que podem depor

como testemunhas todas as pessoas, exceto as incapazes, as impedidas e as suspeitas, dividindo

assim em três grupos aqueles impossibilitados de atuar como testemunhas. Tal dispositivo traz

ainda, em seus parágrafos, quais as situações em que as pessoas serão consideradas como

enquadradas numa dessas três exceções. Por fim, o parágrafo quarto deste mesmo artigo

possibilita que, nos casos em que seja estritamente necessário, o juiz possa ouvir testemunhas

impedidas ou suspeitas, destacando que os seus depoimentos serão prestados independente de

compromisso. Nestes casos, o magistrado lhes atribuirá o valor que possam merecer.

O Código de Processo Civil estabelece que no procedimento ordinário as partes devem

apresentar em juízo, no prazo em que o juiz fixar ao designar data para a audiência de instrução e

julgamento, o rol de suas respectivas testemunhas, informando o nome das mesmas, a profissão, a

residência e o local de trabalho. Caso o juiz se omita em definir prazo, o rol deverá ser

apresentado até dez dias antes da audiência. Tal prazo visa com que a parte contrária tenha

conhecimento prévio de quem serão as testemunhas de seu ex adverso, possibilitando assim a

preparação de eventual contradita. No procedimento sumário autor e réu deverão trazer este rol

na petição inicial e na defesa, respectivamente.

No Processo do Trabalho, o que predomina na doutrina é que as partes não precisam

1 Artigo 228 do Código Civil

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apresentar rol de testemunhas, pois estas devem comparecer à audiência independente de

notificação, por força dos artigos 825 e 845 da Consolidação das Leis do Trabalho. No entanto,

há autores que defendem ser necessária a apresentação deste rol, justamente para facilitar a

contradita.

Caso a testemunha não compareça de forma independente, estabelece o parágrafo único

do artigo 825 da CLT, que ela seja intimada, de ofício pelo juiz ou a requerimento da parte. Se

intimada, ainda assim a testemunha deixar de comparecer injustificadamente, nesses casos será

conduzida coercitivamente, além de ter que pagar multa, nos termos do artigo 730 da CLT.

Se a parte na audiência de prosseguimento se comprometer a trazer a testemunha

espontaneamente, sem a necessidade de notificação judicial, caso a testemunha novamente deixe

de comparecer, haverá a preclusão desta prova, sendo considerado que diante da ausência,

ocorreu uma desistência tácita da oitiva.

Cumpre ainda mencionar que no direito pátrio é o juiz quem interroga as testemunhas,

nos termos do artigo 416 do Código de Processo Civil, cabendo primeiro à parte que a arrolou, e

depois à parte contrária, formular perguntas tendentes a esclarecer ou completar o depoimento.

Antes de iniciar o depoimento, toda testemunha presta compromisso em dizer a verdade, sob

pena de sofrer sanção penal, conforme previsão do artigo 415 do mesmo código supracitado e o

seu depoimento deverá ser registrado por método idôneo de documentação.

A inquirição das testemunhas será feita de forma separada e sucessiva, sendo

primeiramente ouvidas as do autor e depois as do réu e de forma que uma não ouça o depoimento

das outras. A parte que quiser poderá contraditar testemunha da outra parte, arguindo-lhe a

incapacidade, o impedimento ou a suspeição. O doutrinador Carlos Henrique Bezerra Leite

esclarece que, embora a Consolidação das Leis do Trabalho seja omissa quanto ao tema, a parte

deverá contraditar a testemunha logo após a sua qualificação e antes que preste o compromisso de

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dizer a verdade sobre o que sabe e lhe for perguntado, sob pena de preclusão.

Arguída a contradita, o processo é paralisado até que se resolva este incidente. Caso a

testemunha negue os fatos, a parte poderá prová-los com documentos ou com testemunhas, até o

máximo de três, que serão apresentadas no ato e inquiridas em separado. Sendo provados ou

confessados os fatos, o juiz irá dispensar a testemunha, ou lhe tomará o depoimento lhe

atribuindo o valor que possa merecer, conforme estabelecido no artigo 414 do Código de

Processo Civil.

2. DA SUSPEIÇÃO DE TESTEMUNHAS

A suspeição é instituto de direito processual, prevista no artigo 405 §3º do Código de

Processo Civil e, no âmbito trabalhista, no artigo 829 da Consolidação das Leis do Trabalho. Em

verdade, a norma consolidada, desprovida de qualquer tipo de metodologia, trata, ao mesmo

tempo, da suspeição e do impedimento da testemunha, além disso, não esgota todas as

possibilidades de perda de isenção da testemunha. Devido a isto é que se torna imperiosa a

aplicação subsidiária do Código de Processo Civil. Neste sentido defendem os doutrinadores

Carlos Henrique Bezerra Leite, Francisco Antonio de Oliveira, Amauri Mascaro Nascimento e

Wilson de Souza Campos Batalha.

A distinção entre a suspeição e o impedimento é relevante, sendo as causas deste último

muito mais graves. A suspeição será sempre analisada de forma subjetiva, enquanto que o

impedimento se verifica de forma objetiva.

O jurista Fredie Didier assim nos ensina acerca da suspeição:

A análise da suspeição deve ser feita, sempre, in concreto, diante das peculiaridades do caso, que podem reclamar a ouvida de pessoas que, a princípio, poderiam ser vistas

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como inidôneas. Todo aquele que possa contribuir para o esclarecimento dos fatos, e não tenha, em relação à causa ou às pessoas envolvidas, algum tipo de interesse ou vínculo, pode e deve ser ouvido.2

Posto isso, o professor Marcelo Moura destaca que são considerados suspeitos para

figurarem como testemunha no litígio trabalhista: o amigo íntimo ou inimigo das partes (artigo

829 da CLT e artigo 405, §3º, inciso III do CPC), o condenado por crime de falso testemunho

após o trânsito em julgado da sentença (artigo 405, §3º, inciso I do CPC), quem por seus

costumes não for digno de fé (artigo 405, §3º, inciso II do CPC) e quem tiver interesse no litígio

(artigo 405, §3º, inciso IV do CPC).

As hipóteses de suspeição acima elencadas são objeto de muita controvérsia. Apesar

disso, no presente trabalho focaremos apenas em analisar se a testemunha que litiga contra o

mesmo empregador pode ou não ser considerada como suspeita. Para isso iremos enquadrar esta

situação ora no artigo 405, §3º, inciso IV do CPC (quem tiver interesse no litígio), ora nos artigos

829 da CLT e 405, §3º, inciso III do CPC (amigo íntimo ou inimigo das partes).

O tipo legal do inciso IV do §3º do artigo 405 do Código de Processo Civil é muito

subjetivo e, por conta disso, gera interpretações diversificadas. Assim ele dispõe:

Artigo 405 – Podem depor como testemunhas todas as pessoas, exceto as incapazes, impedidas ou suspeitas. (...) §3º - São suspeitos: (...) IV – o que tiver interesse no litígio. [...]3

Manoel Antonio Teixeira Filho sugere que se dê mais objetividade à interpretação do

artigo acima mencionado, devendo o candidato a depoente demonstrar o interesse concreto na

2 JÚNIOR, Fredie Didier, BRAGA, Paula Sarno, OLIVEIRA, Rafael. Curso de Direito Processual Civil. 4ª ed. Salvador: Editora Jus Podium, 2009, p. 209. 3 Artigo 405, § 3º, inciso IV do Código de Processo Civil.

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demanda.

Já o inciso III do §3º do artigo 405 do CPC e o artigo 829 da CLT, preveem o seguinte:

Artigo 405 - Podem depor como testemunhas todas as pessoas, exceto as incapazes, impedidas ou suspeitas. (...) §3º - São suspeitos: (...) III – o inimigo capital da parte, ou o seu amigo íntimo.[...]4 Artigo 829 – A testemunha que for parente até o terceiro grau civil, amigo íntimo ou inimigo de qualquer das partes, não prestará compromisso, e seu depoimento valerá como simples informação.5

Estes dispositivos legais também geram muita polêmica, não havendo consenso sobre o

que seria um amigo íntimo ou um inimigo das partes.

Analisando os posicionamentos da doutrina trabalhista acerca de ser considerada

suspeita a testemunha que litiga contra o mesmo empregador, verifica-se que alguns autores

entendem pela suspeição com base no artigo 405, §3º, inciso IV do CPC. Já outros, como

Valentin Carrión, sustentam que nesses casos, a testemunha deve ser equiparada ao inimigo

capital da parte aplicando, portanto, os artigos 405, §3º, inciso III do CPC e 829 da CLT. No

entanto, a doutrina majoritária entende que o simples fato da testemunha ter demanda em face do

mesmo empregador não é motivo suficiente para que a mesma seja considerada suspeita.

3. DA TESTEMUNHA QUE LITIGA EM FACE DO MESMO EMPREGADOR

Conforme mencionado acima, há grande discussão na doutrina e na jurisprudência sobre

a ocorrência ou não do instituto da suspeição para a testemunha que litiga em face do mesmo

4 Artigo 405 § 3º, inciso III do Código de Processo Civil. 5Artigo 829 da Consolidação das Leis do Trabalho.

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empregador.

A Consolidação das Leis do Trabalho não trata da suspeição de maneira satisfatória.

Desta forma essa questão deverá ser dirimida com base na doutrina e na jurisprudência.

A Súmula n. 357 do TST estabelece que: “não torna suspeita a testemunha o simples

fato de estar litigando ou de ter litigado contra o mesmo empregador”. Em outras palavras, se o

empregado demandar em face de seu empregador, este fato, por si só, não tem o condão de torná-

lo suspeito para prestar testemunho em outro processo também ajuizado contra o seu empregador.

Reforçando esse entendimento, segue abaixo decisão de Recurso de Revista em que foi

reconhecido o cerceio de defesa por conta do indeferimento de oitiva de testemunha que litiga

contra o mesmo empregador. Importante destacar ainda que neste caso os pedidos de ambas as

demandas eram idênticos e o Tribunal Superior do Trabalho entendeu que a troca de favores não

pode ser presumida. Vejamos:

RECURSO DE REVISTA. CERCEAMENTO DE DEFESA. INDEFERIMENTO DE OITIVA DE TESTEMUNHA QUE LITIGA CONTRA O MESMO EMPREGADOR. PRESUNÇÃO DE TROCA DE FAVORES. A existência de ação ajuizada pela testemunha, contra o mesmo empregador, com pedidos idênticos e até mesmo o fato de terem figurado – reclamante e testemunha – como testemunhas recíprocas não revela, por si só, interesse na solução do litígio, nem significa ser amigo íntimo do autor ou inimigo capital do réu. Se ambas litigam contra o mesmo empregador em ações com identidade de pedidos, é até natural que uma seja testemunha na ação ajuizada pela outra. A troca de favores não pode ser presumida e deve estar devidamente comprovada para caracterizar a contradita por interesse na causa (inteligência da Súmula nº 357/TST). Precedentes. Recurso de Revista conhecido e provido.6

Com isso, verifica-se que o posicionamento do TST sustenta que não gera a suspeição o

fato da testemunha estar litigando ou ter litigado com o mesmo empregador, ainda que as

demandas sejam idênticas. Para que ocorra a suspeição deverá ser comprovada a troca de favores

e o real interesse no resultado do litígio.

6 BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. Recurso de Revista n. 51-17.2011.5.03.0131, Relator Ministro Aloysio Corrêa da Veiga. Disponível em: <http://www.tst.jus.br/consulta-unificada>. Acesso em: 14 de fev. 2015.

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No passado, o Supremo Tribunal Federal, quando instado a se manifestar sobre o tema

se posicionou favorável à suspeição da testemunha nos casos em que as ações fossem idênticas.

Vejamos:

PROVA TESTEMUNHAL. SUSPEIÇAO. TESTEMUNHAS EM LITIGIO COM A PARTE CONSIDERADO O OBJETO DO PROCESSO. As testemunhas arroladas pelos autores que demandam contra o réu, considerando o objeto do processo, têm interesse no desfecho desta última devendo serem tidas como suspeitas. PROVA TESTEMUNHAL. ARCABOUÇO. Inexiste vício a revelar transgressão ao devido processo quando a sentença condenatória lastreia-se em depoimento de testemunha do próprio réu muito embora fazendo alusão, também, aos depoimentos de testemunhas que demandam, considerando o mesmo objeto do processo.7

No entanto, o entendimento atual de nossa Corte Suprema é no mesmo sentido do

Tribunal Superior do Trabalho, conforme jurisprudência a seguir:

CONTRADITA DE TESTEMUNHA QUE MOVEU AÇAO COM IDENTICO OBJETO DA AÇAO MOVIDA PELA RECLAMANTE. SUSPEIÇAO. NAO CONFIGURAÇAO. I - No que tange à pretensa má-aplicação da Súmula nº 357, veiculada em razão de o objeto da ação movida pela testemunha ser idêntico ao da ação proposta pela recorrida, tem-se entendido ser imprescindível à caracterização da suspeição prova concludente de haver troca de favores entre elas. II - Por isso mesmo é que a jurisprudência desta Corte vem afastando a suspeição de testemunha que litiga contra o mesmo empregador, em reclamação com idêntico objeto, situação na qual tem-se aplicado a Súmula nº 357, de acordo com precedentes da SBDI-1, atraindo-se o óbice da Súmula nº 333. III - Recurso não conhecido.8

Apesar do Tribunal Superior do Trabalho ter pacificado o seu entendimento a respeito

deste assunto, parte da doutrina entende que o fato de estar demandando ou de ter demandado o

7 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário n. 220329. Relator Ministro Marco Aurélio. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28testemunha+e+arcabou%E7o%29+%28%28MARCO+AUR%C9LIO%29%2ENORL%2E+OU+%28MARCO+AUR%C9LIO%29%2ENORV%2E+OU+%28MARCO+AUR%C9LIO%29%2ENORA%2E+OU+%28MARCO+AUR%C9LIO%29%2EACMS%2E%29&base=baseAcordaos&url=http://tinyurl.com/n9nsfok>. Acesso em: 02 de abril de 2015. 8 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Agravo de Instrumento n. 844733. Relatora Ministra Carmen Lúcia. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28%28contradita+e+testemunha%29%28%28C%C1RMEN+L%DACIA%29%2ENORL%2E+OU+%28C%C1RMEN+L%DACIA%29%2ENPRO%2E+OU+%28C%C1RMEN+L%DACIA%29%2EDMS%2E%29%29+NAO+S%2EPRES%2E&base=baseMonocraticas&url=http://tinyurl.com/p3jmoqn>. Acesso em 02 de abril de 2015.

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empregador em juízo comprova a inimizade, sendo esta geradora de suspeição. Nesse sentido o

ilustre Valentin Carrión:

A testemunha que está em litígio contra a mesma empresa deve ser equiparada ao inimigo capital da parte; o embate litigioso é mau ambiente para a prudência e isenção de ânimo que se exigem da testemunha; entender de outra forma é estimular as partes à permuta imoral de vantagens em falsidades testemunhais mútuas, mesmo sobre fatos verdadeiros; extremamente fácil: “reclamante de hoje, testemunha de amanhã. É ingênuo o argumento contrário de que o litigante deve ser aceito como testemunha (e não como informante) porque tem direito de ação; se assim fosse, a suspeição da esposa para depor contrariaria o direito de casar. O impedimento não é à ação, mas à credibilidade. Também não se trata de violação ao princípio constitucional do direito de defesa; a CF admite os meios lícitos, mas não atribui força probante ao incapaz, impedido ou suspeito.9

Conforme esse entendimento, o fato da testemunha litigar contra o mesmo empregador

gera a sua suspeição com base no artigo 405, §3º, inciso III do CPC, pois isso fará com que o seu

depoimento seja desprovido de isenção de ânimo. Além disso, há uma grande possibilidade das

partes estarem prestando favor à outra, uma depondo em favor desta hoje para que posteriormente

a outra testemunhe a seu favor.

Uma corrente mais moderada da doutrina defende que nesses casos a testemunha será

considerada suspeita por ter interesse no litígio, fundamentando assim a suspeição no artigo 405,

§ 3º, inciso IV do CPC. Para essa caracterização nos adverte Manoel Antônio Teixeira Filho:

[…] Temos para conosco que o interesse, como causa de suspeição do indivíduo, deve ser objetivo, palpável, real; importa dizer: não se deve presumir a existência de um interesse; ou se prova, in concreto, que existe, ou suspeição não há. Seria muito cômodo para a parte alegar abstratamente que a testemunha da adversa tem interesse no objeto do litígio e, com isso, desqualificá-la.10

Por fim, a doutrina majoritária está em consonância com o que dispõe a Súmula n.

357/TST. Temos, a título de ilustração, o doutrinador Mauro Schiavi, que afirma que se a

9 CARRION, Valentin. Comentários à Consolidação das Leis do Trabalho. 30ª ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 630 10 FILHO, Manoel Antonio Teixeira. A Prova no Processo do Trabalho. São Paulo: LTr, 1997. p. 318

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testemunha do reclamante move processo em face da reclamada, tal fato não se constitui em

causa de suspeição. Sustenta seu posicionamento com base no artigo 5º, inciso XXXV da

CRFB/88, que assegura o direito de ação, defendendo ainda que a testemunha presta

compromisso de dizer a verdade antes de iniciar o seu depoimento e, menciona também a

dificuldade que o reclamante encontra para conseguir testemunhas e provar suas alegações em

juízo.

Mauro Schiavi prossegue destacando que há peculiaridades no Processo do Trabalho que

dificilmente são encontradas nos demais ramos do direito processual, uma vez que, regra geral, as

testemunhas do reclamante são ex-empregados do reclamado e as testemunhas do empregador

são os seus próprios empregados. Além disso, defende que o juízo dificilmente dará credibilidade

a testemunhas que não trabalharam junto com o reclamante, devido ao fato da relação laboral se

dar intuito personae com relação ao trabalhador e, normalmente, no local da prestação dos

serviços se encontram outros trabalhadores. Por fim, menciona que o direito de ação do

empregado, para ver atendidos os direitos que entende que foram violados, é dirigido contra o

Estado, e não contra o empregador. Este último argumento, data vênia, não faz o menor sentido,

pois o processo nada mais é do que uma pretensão resistida. Assim sendo, não há como sustentar

que o direito de ação é dirigido contra o Estado. Este figura como mero viabilizador do direito de

ação.

Na prática, o mais aconselhável é que o juiz avalie o caso concreto e, se perceber que

exista a possibilidade de troca de favores, que deixe de lado o depoimento, inobstante à existência

da Súmula n. 357 do TST. Nesses casos, não cabe falar em violação ao princípio constitucional

do direito de defesa, pois nossa lei maior não atribui força probante ao incapaz, impedido ou

suspeito. O magistrado deve verificar se há identidade de objeto e de causa de pedir entre a

reclamação da testemunha e a da parte. Caso isso se verifique, deverá ser mais cauteloso ao

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analisar e valorar o depoimento, uma vez que há uma grande possibilidade do depoente, nesses

casos, ter interesse real no resultado da demanda.

Nos casos em que a testemunha que depõe foi parte em processo anterior em que o

reclamante foi sua testemunha, Schiavi esclarece que, nessas situações, se apresenta a chamada

“troca de favores”, que configura a falta de isenção de ânimo da testemunha, sendo, desta forma,

suspeita a testemunha. No entanto, ressalva que caso seja necessário, esta pessoa deverá ser

ouvida como informante.

CONCLUSÃO

O juiz trabalhista, como condutor do processo, deve, ao se deparar com testemunha que

litiga em face do mesmo empregador sempre se resguardar de que não haja outra pessoa

habilitada a funcionar como testemunha da parte autora. O fato de se ter demanda em face de

uma das partes já denota, no mínimo, antipatia para com esta. Assim sendo, dificilmente o

depoimento desta testemunha estará desprovido de um ânimo em prejudicar a parte contrária.

Quando as ações judiciais do obreiro e da testemunha que demandam contra o mesmo

empregador forem idênticas, nestes casos deverá ser considerada a suspeição da testemunha,

sobretudo se o autor desta ação já funcionou como testemunha no outro processo. Nestes casos

manifesta a troca de favores entre as partes.

Caso seja inviável a oitiva de outra pessoa, o magistrado, para evitar alegações de

nulidade do processo, deve estar muito atento às atitudes da testemunha ao colher o seu

depoimento. Deverá ainda analisar se não estão presentes outras causas de suspeição.

A justiça laboral é conhecida por adotar uma posição pró-empregado. Em que pese a

hipossuficiência financeira dos obreiros com relação às empresas contra as quais litigam, os

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juízes devem sempre garantir um tratamento equânime entre as partes. Uma das maneiras de se

fazer isso é evitar a oitiva de testemunha que litiga em face do mesmo empregador, considerando

que nesse caso há um interesse no resultado da demanda. Não podemos nos olvidar também que,

por vezes, as testemunhas são instruídas a mentir em juízo, em prol do ganho fácil e do

enriquecimento ilícito. Tal prática deve ser veementemente combatida.

Desta forma, os magistrados devem estar sempre atentos em assegurar um

comportamento ético das partes, garantindo assim um processo justo.

REFERÊNCIAS

BATALHA, Wilson de Souza Campos. Tratado de Direito Judiciário do Trabalho. São Paulo: LTr, 1995.

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