Memória_ Veja as Recentes Descobertas Da Biologia - Resumo Das Disciplinas - UOL Vestibular
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Memória: Veja as recentesdescobertas da biologiaAndréia Martins
Da Novelo Comunicação 05/06/2015 07h00
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Christopher Silas Neal/The New York Times
"A memória não é nem sensação nem julgamento, é um estado ou qualidade de um
deles, quando o tempo já passou". A ideia de memória descrita na frase era o
conceito que Aristóteles (385 a.C. - 322 a.C.) tinha de memória. O filósofo grego
dividia a memória em duas: havia a memória consciente, que conservava o passado
(amenem), e a memória de reminiscência (amamnesi), inconsciente. Fundamental
para ele era o tempo. Toda a memória implicava a passagem do tempo.
Talvez este seja um dos únicos pontos inquestionáveis da memória desde então.
Nos últimos anos, novas tecnologias permitiram descobertas sobre o funcionamento
do cérebro, entre elas, como a memória opera.
Memória é a capacidade humana de reter fatos e experiências do passado, é o
mecanismo com o qual o nosso cérebro adquire e armazena informações. É com ela
que nos lembramos de pessoas, experiências, nos adaptamos a hábitos rotineiros e
não conseguimos esquecer situações desagradáveis, devido ao seu impacto
emocional.
Quando falamos sobre formas de memória, podemos dividi-la em duas: a memória
de procedimento ou declarativa. A primeira guarda informações através da repetição
de hábitos ou atividades (motoras, sensitivas e intelectuais) que seguem sempre o
mesmo padrão. Nesse caso, a memória adquirida não depende da consciência.
Já a memória declarativa, esta armazena informação de fatos e de dados levados ao
nosso conhecimento através dos sentidos e de processos internos do cérebro. Ela
inclui ainda a memória de fatos vivenciados pela pessoa e de informações adquiridas
pela transmissão de conhecimento, como em livros, filmes, música e outros. Em
casos de depressão e amnésia, esta é a memória mais prejudicada.
Foi no final do século 19 que Santiago Ramón descobriu que para se constituírem,
as memórias obedecem a modificações das sinapses, a ligação de um neurônio com
o outro e que possibilita a passagem do impulso de uma célula à outra.
A relação entre sinapse e memória foi comprovada décadas depois. As sinapses
(http://educacao.uol.com.br/disciplinas/ciencias/sistema-nervoso-e-encefalo-
3-neuronios.htm)liberam os neurotransmissores, que desempenham em geral
funções moduladoras relacionadas com as emoções, o alerta e o estado de ânimo.
Tanto a lembrança quando a formação da memória declarativa é sensível a esses
fatores. Durante a transmissão do impulso nervoso, haveria uma alteração na função
sináptica, criando novos circuitos neuronais. Segundo essa hipótese, esses circuitos
seriam os responsáveis pela decodificação das informações.
Sob o aspecto da função e duração, a memória pode ser classificada em memória
de trabalho (que mantém a informação viva durante segundos enquanto ela está
sendo processada pelo cérebro), de curto prazo (de 5 a 6 horas) e de longo prazo,
que pode durar horas, dias ou anos.
Os processos bioquímicos para a formação da memória de longa duração ocorrem
sempre no hipocampo e foram descritas em um estudo recente feito pela equipe do
professor Iván Antonio Izquierdo, professor de Neurologia na PUC-RS e especialista
no assunto.
Esses processos envolvem a ativação de numerosas enzimas que regulam a
atividade de proteínas preexistentes no cérebro, e a produção por elas de ativação
gênica e síntese proteica. Uma dessas proteínas é o fator neurotrófico derivado do
cérebro (BDNF), que atua na formação de memórias. Ao ser liberado no hipocampo,
essa proteína determina por quanto tempo aquela memória permanecerá no cérebro.
Vale destacar que esses processos não são sempre perfeitos. Podem sofrer
alterações e falhas durante as etapas. Entre os fatores que interferem estão o
conteúdo emocional vinculado à experiência que deixou a memória. Quanto maior a
emoção, maior será a ativação na memória.
Sobre a memória de curta duração, descobriu-se que ela é processada em paralelo à
de longa duração e ocorre também no hipocampo e córtex entorrinal, zona associada
à memória e que ganhou recentemente o apelido de GPS do cérebro. Clinicamente,
essa descoberta explica porque em casos de demência ou delírio na velhice há
perda, principalmente, da memória de curta duração.
Aliás, a descoberta do GPS do cérebro (http://vestibular.uol.com.br/resumo-
das-disciplinas/atualidades/nanoscopia-gps-cerebral-e-led-azul-qual-o-papel-
dos-vencedores-do-nobel-no-nosso-dia-a-dia.htm) deu o prêmio Nobel de Medicina
de 2014 ao trio de pesquisadores John O’Keefe, Edvard e May-Britt Moser. Eles
identificaram um tipo de neurônio chamado de “células de grade”, situado próximo do
hipocampo, no córtex entorrinal. Essas células eram ativadas quando os animais
repetiam uma trajetória, gerando um sistema de coordenadas que permitiam a
localização precisa dos animais, ou seja, formando uma memória de lugares.
Outras descobertas recentes apontaram que as recordações, ao contrário do que se
imaginava, podem ser mudadas. Neste caso, trata-se da alteração de memórias
consideradas negativas. Elas podem ganhar uma nova roupagem do cérebro se
passarem por uma etapa chamada "recall" ou "recuperação". Nessa etapa,
memórias anteriores vêm à tona. Um novo desfecho para uma mesma situação, e
armazenado pelo cérebro, pode gerar uma nova lembrança, eliminado a anterior.
Estudos feitos na New York University, nos Estados Unidos, comprovaram que a
manipulação da memória é eficaz quando aplicada logo após a lembrança ser
resgatada. Os cientistas chamam o tempo para que a mudança ocorra de janela de
oportunidade, e todo o processo é coordenado pelo córtex pré-frontal.
Essa intervenção sobre o conteúdo da memória levanta discussões na comunidade
científica. No caso de lembranças ruins, eliminar traumas e o sofrimento das
pessoas é sem dúvida um ponto positivo. No entanto, ainda não se tem completa
noção do impacto dessa alteração em outras memórias. Ao mesmo tempo em que
você pode apagar uma memória ruim de uma situação vivida em uma viagem, por
exemplo, essa substituição pode apagar também uma boa lembrança.
Outras descobertas recentes são a comprovação de que é possível memorizar
quando se está dormindo e que, durante uma palestra ou evento com alta carga de
transmissão de informação, fazer uma pausa ajuda o cérebro a absorver melhor o
que foi passado.
O sono (http://educacao.uol.com.br/disciplinas/biologia/sono-o-que-acontece-
enquanto-dormimos.htm), aliás, tem papel primordial para a boa memória. Voltando
às sinapses, para que elas transmitam as informações recebidas de forma eficiente é
preciso que os neurônios estejam saudáveis. E isso é obtido com uma boa
alimentação e boas noites de sono, quando o cérebro repassa o que foi absorvido e
elimina as toxinas de um dia mentalmente exaustivo.
Essas descobertas mostram que o funcionamento da memória não é um processo
fechado e definido. Está sujeito a estímulos externos, internos (do organismo) e de
ordem emocional, e mesmo uma memória já arquivada pelo cérebro pode ser
alterada.
Hoje, apoiadas em aplicativos e mecanismos de buscas online, dormindo cada vez
menos e com uma capacidade de concentração menor, as novas gerações não
recorrem mais tanto ao que está guardado na mente ou não conseguem processar
os dados e arquivá-los devido ao excesso de informação a que somos expostos
diariamente.
Em 2012, três pesquisadores realizaram um estudo na Universidade de Columbia
com estudantes. Uma parte do grupo receberia informações e poderiam salvá-las no
computador, e a outra receberia as informações e, em seguida, elas seriam
apagadas. O grupo que não podia contar com os arquivos salvos no computador se
lembrava mais facilmente das informações passadas, ao contrário do outro.
Essa espécie de bengala que a internet nos oferece na hora de pesquisar ou lembrar
uma informação recebeu o nome de "Efeito Google" (http://www2.uol.com.br
/vivermente/artigos/efeito_google_no_cerebro.html). O cérebro é constantemente
modificado por todas as experiências que se passam com o indivíduo, inclusive seu
pensamento. Na era da informação instantânea essa perda de concentração,
cansaço da mente e “brancos”, mesmo em pessoas mais jovens, parecem normais.
A questão talvez não seja tanta nossa perda de concentração, e sim o fato de que
nossa atenção esteja cada vez menos seletiva. A perda desse poder de seleção nas
sociedades atuais vem sendo chamada por profissionais da informação de
"sociedades do esquecimento".
Trata-se de uma oposição à ideia de sociedades da memória, que existiam no
passado e hoje ainda podem ser encontradas em regiões isoladas da África, América
do Sul e até Europa. Nesses grupos, a memória tinha papel crucial na transmissão
da cultura e da história de gerações antigas para as mais novas.
Atualmente nosso cérebro vive sobrecarregado. Queremos fazer várias coisas ao
mesmo tempo, sem nos concentrarmos em uma tarefa principal. Cuidar da mente
deve ser uma de nossas tarefas principais. Afinal, se tem uma coisa que os
mecanismos de busca online não podem dizer por nós são quais memórias importam
mais do que outras e quais podemos apagar da nossa lembrança.
Andréia Martins
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