Materializações formais e compositivas no design gráfico voltado à cultura

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538 Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, São Paulo, Brasil. 9 , 10, 11 de outubro de 2012 ISBN: 978-85-62309-06-9 MATERIALIZAÇÕES FORMAIS E COMPOSITIVAS NO DESIGN GRÁFICO VOLTADO À CULTURA Jade Samara Piaia 1 Resumo: Este artigo apresenta parte dos estudos da pesquisa de mestrado defendida em agosto/2012, orientada pelo Prof. Dr. Edson do Prado Pfutzenreuter, na qual estuda-se os elementos gráficos que compõe a materialidade das mensagens visuais de três estudos de caso distintos. A investigação, voltada ao design gráfico que veicula um conteúdo cultural, visa desvendar uma suposta aproximação entre as diferentes expressões culturais como a música, a dança, a literatura e as teorias das artes visuais e do design. Os projetos observados veiculam um conteúdo cultural artístico e condensam materializações, através da composição gráfica, que representam visualmente alguns aspectos significantes das manifestações culturais em questão. Três estudos de caso foram aprofundados, correspondentes aos designers Kiko Farkas doze cartazes para a OSESP, Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo; Rico Lins livros coleção Ponta-de-lança, Editora Língua Geral ; e Vicente Gil identidade visual para a SPCD, São Paulo Companhia de Dança. Ressaltando a questão das formas como elementos de materialização visual, a análise dos aspectos formais procede, em sua maior parte, através do sistema de técnicas visuais proposto por DONDIS (2003). Assim, foi possível isolar algumas características visuais que se sobrepõem, interagem e se reforçam em uma análise da composição formal. Os cartazes para a OSESP são representações visuais que se referem a apresentações, concertos, peças, turnês e mensagens institucionais. Neste artigo serão exemplificados os estudos das formas através de cinco dos cartazes analisados de Farkas para a OSESP. Palavras-chave: Design gráfico. Cultura. Arte. Abstract: This article presents part of the research studies in Masters defended 2012, August, oriented by Prof. Dr. Edson do Prado Pfützenreuter, in which one studies the graphics elements that compose the materiality of visual case studies of three distinct. The research focused on graphic design that conveys a cultural content, aims to unveil a supposed approach between the different cultural expressions such as music, dance, literature and theories of visual arts and design. The projects observed convey cultural content artistic and condense materializations by the graphic composition, which visually represent some significant aspects of cultural manifestations in question. Three case studies were detailed, corresponding to the designers Kiko Farkas -twelve posters for OSESP, State Symphony Orchestra of São Paulo-; Rico Lins -books collection Ponta-de-lança, Língua Geral Editor, and Vicente Gil -branding for SPCD, São Paulo Dance Company. Emphasizing the question of forms as elements of visual materialization, the analysis proceeds formal aspects, for the most part, through a system of visual techniques proposed by DONDIS (2003). Was therefore possible to isolate some visual characteristics that overlap, interact and reinforce in a formal composition analysis. The posters for OSESP are visual representations that refer to performances, concerts, plays, tours and institutional messages. This article will be exemplified studies of the forms through five posters of Farkas for OSESP analyzed. Key words: Graphic Design. Culture. Art. Em sua configuração exterior, “a forma, no sentido estrito da palavra, não é nada mais que a delimitação de uma superfície por outra superfície” (KANDINSKY, 1996, p. 76), sendo 1 Universidade Estadual de Campinas UNICAMP.

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Resumo: Este artigo apresenta parte dos estudos da pesquisa de mestrado defendida em agosto/2012, orientada pelo Prof. Dr. Edson do Prado Pfutzenreuter, na qual estuda-se os elementos gráficos que compõe a materialidade das mensagens visuais de três estudos de caso distintos. A investigação, voltada ao design gráfico que veicula um conteúdo cultural, visa desvendar uma suposta aproximação entre as diferentes expressões culturais como a música, a dança, a literatura e as teorias das artes visuais e do design. Os projetos observados veiculam um conteúdo cultural artístico e condensam materializações, através da composição gráfica, que representam visualmente alguns aspectos significantes das manifestações culturais em questão. Três estudos de caso foram aprofundados, correspondentes aos designers Kiko Farkas – doze cartazes para a OSESP, Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo–; Rico Lins – livros coleção Ponta-de-lança, Editora Língua Geral– ; e Vicente Gil –identidade visual para a SPCD, São Paulo Companhia de Dança. Ressaltando a questão das formas como elementos de materialização visual, a análise dos aspectos formais procede, em sua maior parte, através do sistema de técnicas visuais proposto por DONDIS (2003). Assim, foi possível isolar algumas características visuais que se sobrepõem, interagem e se reforçam em uma análise da composição formal. Os cartazes para a OSESP são representações visuais que se referem a apresentações, concertos, peças, turnês e mensagens institucionais. Neste artigo serão exemplificados os estudos das formas através de cinco dos cartazes analisados de Farkas para a OSESP. Palavras-chave: Design gráfico. Cultura. Arte.

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    MATERIALIZAES FORMAIS E COMPOSITIVAS

    NO DESIGN GRFICO VOLTADO CULTURA

    Jade Samara Piaia1

    Resumo: Este artigo apresenta parte dos estudos da pesquisa de mestrado defendida em

    agosto/2012, orientada pelo Prof. Dr. Edson do Prado Pfutzenreuter, na qua l estuda-se os

    elementos grficos que compe a materialidade das mensagens visuais de trs estudos de caso

    distintos. A investigao, voltada ao design grfico que veicula um contedo cultural, visa

    desvendar uma suposta aproximao entre as diferentes expresses culturais como a msica, a

    dana, a literatura e as teorias das artes visuais e do design. Os projetos observados veiculam um

    contedo cultural artstico e condensam materializaes, atravs da composio grfica, que

    representam visualmente alguns aspectos significantes das manifestaes culturais em questo.

    Trs estudos de caso foram aprofundados, correspondentes aos designers Kiko Farkas doze cartazes para a OSESP, Orquestra Sinfnica do Estado de So Paulo; Rico Lins livros coleo

    Ponta-de-lana, Editora Lngua Geral ; e Vicente Gil identidade visual para a SPCD, So Paulo Companhia de Dana. Ressaltando a questo das formas como elementos de

    materializao visual, a anlise dos aspectos formais procede, em sua maior parte, atravs do

    sistema de tcnicas visuais proposto por DONDIS (2003). Assim, foi possvel isolar algumas

    caractersticas visuais que se sobrepem, interagem e se reforam em uma anlise da composio

    formal. Os cartazes para a OSESP so representaes visuais que se referem a apresentaes,

    concertos, peas, turns e mensagens institucionais. Neste artigo sero exemplificados os estudos

    das formas atravs de cinco dos cartazes analisados de Farkas para a OSESP. Palavras-chave: Design grfico. Cultura. Arte.

    Abstract: This article presents part of the research studies in Masters defended 2012, August,

    oriented by Prof. Dr. Edson do Prado Pftzenreuter, in which one studies the graphics elements

    that compose the materiality of visual case studies of three distinct. The research focused on

    graphic design that conveys a cultural content, aims to unveil a supposed approach between the

    different cultural expressions such as music, dance, literature and theories of visual arts and

    design. The projects observed convey cultural content artistic and condense materializations by

    the graphic composition, which visually represent some significant aspects of cultural

    manifestations in question. Three case studies were detailed, corresponding to the designers Kiko

    Farkas -twelve posters for OSESP, State Symphony Orchestra of So Paulo-; Rico Lins -books

    collection Ponta-de-lana, Lngua Geral Editor, and Vicente Gil -branding for SPCD, So Paulo

    Dance Company. Emphasizing the question of forms as elements o f visual materialization, the

    analysis proceeds formal aspects, for the most part, through a system of visual techniques

    proposed by DONDIS (2003). Was therefore possible to isolate some visual characteristics that

    overlap, interact and reinforce in a formal composition analysis. The posters for OSESP are

    visual representations that refer to performances, concerts, plays, tours and institutional

    messages. This article will be exemplified studies of the forms through five posters of Farkas for

    OSESP analyzed. Key words: Graphic Design. Culture. Art.

    Em sua configurao exterior, a forma, no sentido estrito da palavra, no nada mais

    que a delimitao de uma superfcie por outra superfcie (KANDINSKY, 1996, p. 76), sendo

    1 Universidade Estadual de Campinas UNICAMP.

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    a forma uma manifestao exterior do contedo de seu interior. A configurao exterior de

    uma forma pode pertencer a duas classes distintas: a das formas figurativas, que representam

    objetos reconhecveis de alguma maneira, seja esta bem prxima do real, idealizada ou

    estilizada, e a das formas abstratas, que no representam objetos reconhecveis, como, por

    exemplo, as formas geomtricas e as formas bsicas como o ponto e a linha.

    As imagens figurativas so construdas com os mesmos elementos visuais das imagens

    abstratas, o que as diferencia uma inteno figurativa. A imagem abstrata tem cor, textura,

    forma, composio, diferenas de claro e escuro, e o mesmo acontece com as figurativas;

    nesse sentido, so os mesmos elementos visuais. O conceito de abstrao pode ser entendido,

    segundo DONDIS (2003), como a reduo de tudo aquilo que vemos aos elementos visuais

    bsicos e mais profundos, onde a subestrutura abstrata a composio, o design. Para que

    haja compreenso, o abstrato transmite o significado essencial ao longo de uma trajetria que

    vai do consciente ao inconsciente, da experincia da substncia no campo sensrio

    diretamente ao sistema nervoso, do fato percepo (DONDIS, 2003, p. 102).

    Sobre a aproximao das diferentes artes e da tendncia para o abstrato, na viso de

    Kandinsky, naturalmente, que os elementos de uma arte vem-se confrontados com os de

    uma arte diferente (KANDINSKY, 1996, p. 57) e as mais ricas de ensinamentos so as

    aproximaes das artes visuais com a msica.

    A anlise dos aspectos formais dos estudos de caso procede, em sua maior parte, do

    sistema de tcnicas visuais proposto por DONDIS (2003), a partir das quais foi possvel isolar

    algumas caractersticas visuais que se sobrepem, interagem e se reforam em uma anlise da

    composio formal. DONDIS (2003, p. 139-160) define cada tcnica e seu oposto, em termos

    de polaridades, antagnicas, mas que no precisam necessariamente serem excludentes,

    podem ser combinveis e interatuantes entre si, mas deve atentar-se para o cuidado com

    ambiguidades. As peas grficas foram analisadas uma a uma, em um extenso estudo sobre o

    qual cabe neste breve artigo exemplificar e aprofundar atravs de um recorte de cinco cartazes

    criados por Farkas para a OSESP 2 , por apresentarem uma estrutura compositiva similar.

    Inicialmente foi criado uma tabela na qual os aspectos visuais que mais se enquadravam nas

    2 Farkas trabalhou para a OSESP entre os anos de 2003 e 2007, perodo no qual criou aproximadamente 300 cartazes. O tamanho original em que os cartazes foram impressos de 0,84 x 1,26 metros. A numerao dos

    cartazes neste artigo foi mantida corresponde s do recorte de cinco dentre os doze cartazes analisados no total.

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    relaes de sintaxe propostas por DONDIS (2003) foram relacionados s respectivas peas

    grficas. A seguir, a relao da sintaxe grfica auxiliada pela observao da composio

    formal atravs de grids geomtricos, baseados nos estudos de ELAM (2001).

    TABELA 1: Anlise de sintaxe grfica - DONDIS (2003) - cartazes da OS ESP designer Kiko Farkas

    Cartaz 4 Cartaz 5 Cartaz 6 Cartaz 7 Cartaz 8

    equilbrio equilbrio equilbrio equilbrio equilbrio

    simetria simetria assimetria simetria simetria

    irregularidade irregularidade regularidade regularidade regularidade

    complexidade complexidade complexidade complexidade complexidade

    fragmentao fragmentao fragmentao fragmentao fragmentao

    profuso profuso profuso profuso profuso

    exagero exagero exagero exagero exagero

    espontaneidade espontaneidade espontaneidade espontaneidade espontaneidade

    atividade atividade atividade atividade atividade

    ousadia ousadia ousadia ousadia ousadia

    opacidade opacidade opacidade transparncia opacidade

    nfase - - - -

    variao estabilidade estabilidade variao estabilidade

    planura profundidade profundidade profundidade profundidade

    sobreposio sobreposio sobreposio sobreposio sobreposio

    sequencialidade sequencialidade sequencialidade sequencialidade sequencialidade

    episodicidade episodicidade episodicidade episodicidade episodicidade

    agudeza agudeza agudeza agudeza agudeza

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    A anlise se inicia pelos cartazes 4, 5, 7 e 8, isolados no detalhe a seguir, por

    apresentarem um equilbrio simtrico com relao s formas que os estruturam, nas quais de

    ambos os lados da composio existe a presena de um equivalente formal3.

    FIGURA 1: Cartazes 4, 5, 7 e 8 com demarcao de equivalentes formais simtricos atravs das linhas

    vermelhas horizontais e verticais

    Nestes exemplos, o equilbrio simtrico nem sempre fica to evidente, como em um

    caso de simetria clssica no qual geralmente a composio consiste em um conjunto de

    formas baseada em um eixo central, com igual equilbrio de elementos de ambos os lados

    (HURLBURT, 2002). Nestes casos, o equilbrio se apresenta de uma maneira dinmica,

    expresso por variaes dos elementos formais, tonais e tipogrficos. possvel considerar a

    existncia desse equivalente formal que confere a simetria, mesmo que, em alguns casos, a

    visualizao desse elemento esteja obscurecida pela semelhana cromtica da figura com o

    fundo, mas, verificando atravs de uma lgica de repetio e estruturao guiada pelas linhas

    vermelhas nas imagens acima, pode-se considerar que o equivalente formal est presente.

    3 A fim de isolar a observao da estrutura formal e compositiva, as imagens dos estudos de caso foram obtidas atravs de impressos, escaneados, e foram convertidas para tons de cinza. Ao utilizar a v isualizao das imagens

    sem cor, neutras, em tons de branco, preto e cinza, enfatiza-se a fo rma em detrimento da cor.

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    A observao fica evidente ao se

    traar um grid vermelho sobre a imagem

    do cartaz 4, identificando e posicionando

    os crculos e os quadrados presentes, em

    dois exemplos separados. A mesma grade

    foi usada nestes dois exemplos, mas foi

    necessrio um deslocamento da mesma

    para um dos lados e para cima ou para

    baixo, de uma medida equivalente a meio

    quadrado (estipulado na grade) em cada

    direo.

    Na sequncia, foi observado que os cartazes 5 e 8 apresentam a mesma estrutura

    compositiva, utilizando o elemento circular, disposto em um grid de propores idnticas ao

    mostrado anteriormente no cartaz 4.

    FIGURA 4: Cartaz 5 com grid estruturando a

    composio

    FIGURA 5: Cartaz 8 com grid estruturando a

    composio

    FIGURA 2: Cartaz 4 com

    grade estruturando os

    quadrados da composio.

    FIGURA 3: Cartaz 4 com

    grade estruturando os

    crculos da composio.

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    No cartaz 7, coexistem ambos os grids, que sustentam os crculos e os quadrados.

    Porm, nesta composio todos os

    quadrados e crculos apresentam

    alguma variao tonal, o que permite a

    identificao e a diferenciao de um

    quadrado para o outro, dos quadrados

    que esto deslocados e posicionados

    sobre os crculos, e os quadrados que

    aparecem exatamente abaixo de alguns

    crculos, diferenciando tonalmente

    tambm o plano de fundo.

    O cartaz 6 mostrado com o mesmo grid quadriculado sobreposto em vermelho.

    possvel identificar as unidades circulares, na mesma quantidade e no mesmo posicionamento

    dos cartazes 4, 5, 7 e 8, mas, neste caso, as formas circulares seguem outro padro visual e

    esto unidas atravs da semelhana do preenchimento de um grupo de formas circulares e

    tambm de outras unidades existentes no fundo, posicionadas entre os crculos. Esses grupos

    formais no apresentam transparncia e se repetem matematicamente, como um padro, uma

    estampa.

    Uma estrutura musical composta de elementos que, dentro de uma grade rtmica, so

    combinados e alterados; o cartaz na sua estrutura de grids e variaes configura-se como uma

    metfora da msica em termos de organizao.

    Um grid consiste num conjunto especfico de relaes de alinhamento que

    funcionam como guias para a distribuio dos elementos num formato. Todo grid

    possui as mesmas partes bsicas, por mais complexo que seja. Cada parte

    desempenha uma funo especfica; as partes podem ser combinadas segundo a

    necessidade, ou omitidas da estrutura geral a critrio do designer, conforme elas

    atendam ou no s exigncias informat ivas de contedo (SAMARA, 2007, p. 24).

    FIGURA 6: Cartaz 7 com

    grid estruturando os crculos

    e quadrados na composio.

    FIGURA 7: Cartaz 6 com

    grid estruturando os crculos

    na composio.

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    O grid ou diagrama que orienta estes cartazes possibilita ao

    designer organizar o contedo em relao ao espao a ocupar, permite

    inmeros leiautes com a variao dos elementos sem fugir da estrutura;

    o diagrama confere a possibilidade de explorar uma sequncia mesmo

    com variaes no contedo de cada cartaz, distinguindo o todo atravs

    da padronizao (HURLBURT, 2002). Cabe dizer que o grid linear

    amarra a estrutura da composio como um todo, permitindo variaes

    dos elementos grficos sobre uma mesma base, funo similar de um

    metrnomo, instrumento que mede o andamento do tempo, do

    compasso musical, constituindo uma base, um ritmo para que as

    variaes das notas musicais aconteam.

    Ns estamos familiarizados com o ritmo graas ao mundo do som. Em msica, a

    base rtmica muda no tempo. Camadas de repetio ocorrem simultaneamente na

    msica, sustentando-se e conferindo contraste acstico. Na mixagem sonora, os

    sons so amplificados ou diminudos para criar um ritmo que varia e evolui no

    decorrer de uma obra.

    Designers grficos empregam, visualmente, estruturas similares. A repetio dos

    elementos, tais como crculos, linhas e grids, cria ritmo, enquanto a variao de

    seu tamanho ou intensidade gera surpresa (KLEE, 2001, p. 45).

    Relacionando composies formais s musicais,

    KANDINSKY (1996) chama de composio 'sinfnica' uma

    composio complexa, onde se combinam diversas formas,

    enquanto que uma composio simples e clara, ele denomina

    como 'meldica'. Sobre o aumento quantitativo de formas

    repetidas, pontua, em outro estudo sobre o mesmo tema, que a

    multiplicao um fator poderoso para aumentar a emoo

    interior e, ao mesmo tempo, cria um ritmo primitivo que , de

    novo, um meio para obter uma harmonia primitiva, em qualquer

    arte (KANDINSKY, 1997, p. 30). Estas tcnicas de composio

    foram amplamente exploradas por Farkas em diversos cartazes

    da srie, inclusive nos exemplos que so mostrados neste estudo.

    FIGURA 8: Grid

    utilizado nos cartazes.

    FIGURA 9: Cartaz 6 com

    linha vermelha na vertical

    mostra uma div iso do

    espao em um eixo central.

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    Entre os exemplos mostrados, o cartaz 6 apresenta um equilbrio assimtrico, no qual

    a sensao de equilbrio mais difcil de se atingir. Um eixo na vertical foi destacado em

    linha vermelha para facilitar a visualizao da diviso assimtrica do espao compositivo.

    No design assimtrico as mltiplas opes e tenses provocadas pela inexistncia de um

    centro definido requerem considervel habilidade (HURLBURT, 2002, p. 62), porm o

    resultado, quando acertado, adquire caracterstica intrigante, tornando-se visualmente

    interessante.

    A regularidade formal dos elementos visvel nos cartazes 6, 7 e 8, nos quais a

    recorrncia ou a continuidade da repetio formal pode ser prevista, configurando um padro,

    uma textura.

    A tcnica de profuso, que representa um enriquecimento visual atravs de elementos

    e detalhes, muito utilizada por Farkas na grande maioria dos cartazes. Embora apaream os

    exemplos de economia formal, atravs de quantidades reduzidas de elementos, a

    minimizao, que poderia se mostrar pelo tamanho reduzido de tais elementos, no ocorre.

    Em contrapartida, seu inverso, o exagero, pode ser observado em toda a srie de cartazes

    analisados.

    A tcnica de estabilidade, embasada pelos grids de repeties com uma ordenao

    uniforme e coerente, est presente nos cartazes, mas perturbada pelas variaes tonais

    recorrentes. As caractersticas previsveis e estveis presentes na srie so diminudas pela

    diversidade tonal existente, que reala as caractersticas de espontaneidade e variao. Os

    cartazes 4 e 7, mesmo sustentados pelo grid, apresentam a caracterstica de variao devido a

    evidenciao de dois tipos de formas geomtricas, os crculos e os quadrados.

    FIGURA 10: Cartazes 6, 7, e 8 que apresentam regularidade formal.

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    A sequencialidade sugerida nos cartazes atravs dos mesmos artifcios de grid e

    repeties formais explicados anteriormente.

    A tcnica denominada por Dondis como atividade pode representar ou sugerir o

    movimento em uma composio. Farkas a utiliza em toda a srie de cartazes analisados;

    movimento e energia esto presentes, enriquecem os leiautes e deixam de lado qualquer

    evocao de estase ou repouso. A presena de caractersticas como a atividade, var iao,

    repetio e sequencialidade pode conferir ritmo s composies visuais.

    O ritmo um padro forte, constante e repetido [] Um d iscurso, uma msica, uma dana, todos empregam o ritmo para expressar uma forma no tempo.

    Designers grficos usam o ritmo na construo de imagens estticas, bem como

    em livros, rev istas e imagens animadas que possuam uma durao e uma

    sequncia. Embora o design de padronagens empregue, habitualmente, uma

    repetio contnua, a maioria das formas no design grfico buscam rit mos que so

    pontuados por mudanas e variaes (LUPTON; PHILLIPS, 2008, p. 29).

    A composio ousada atravs dos arranjos formais pode conferir boa visibilidade

    distncia e foi utilizada nestes exemplos de cartazes. Segundo DONDIS (2003), alguns

    estmulos visuais podem ser conseguidos atravs do xito e da audcia, aguando a estrutura

    da mensagem. A tcnica de neutralidade, com relao s formas, parece ter sido deixada de

    lado por Farkas.

    No cartaz 4, a composio d nfase a um agrupamento de elementos comuns,

    diferenciando-os e destacando-os, formal e tonalmente, com relao ao plano de fundo liso. O

    contraste pode ser expresso atravs das tonalidades de preenchimento, uma vez que h dois

    fatores de percepo visual que intensificam a efetividade do contraste: a iluso de que um

    objeto escuro nos parece mais prximo do que um objeto claro; e o modo pelo qual um objeto

    escuro parece ainda mais escuro numa superfcie clara, e um

    objeto claro ainda mais claro numa superfcie escura

    (HURLBURT, 2002, p. 64-65).

    Em outros exemplos, observam-se alguns detalhes que

    induzem percepo da transparncia das formas, como no cartaz

    7, com a transparncia das formas quadradas e circulares

    modificando a tonalidade de preenchimento de cada parte

    sobreposta, criando desnveis, camadas de formas umas sobre as

    FIGURA 11: Cartaz 7,

    detalhe.

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    outras. Quando um crculo transparente, ou cortado por outra forma como os quadrados

    tambm transparentes, deixando aparente a imagem de outros crculos e/ ou quadrados ao

    fundo, revela camadas sobrepostas de elementos formais, o que pode remeter

    metaforicamente aos mltiplos sons emitidos pelos instrumentos musicais, pois em alguns

    tipos de composies musicais quase sempre tem-se um instrumento de fundo, um outro

    fazendo solo por exemplo. Poderiam ser ento interpretados como uma analogia formal da

    sobreposio de diversos sons que ocorrem ao mesmo tempo, cada qual em sua escala e fora

    vibracionais. Os demais cartazes apresentam a caracterstica de opacidade, que resulta no

    ocultamento de partes dos elementos que so sobrepostos por outros tambm opacos. A

    dimenso, sugerida pelos elementos sobrepostos uns aos outros, confere caractersticas visuais

    de profundidade s composies.

    Farkas comenta sobre seu modo de atuao na criao dos cartazes musicais e traz um

    exemplo interessante de estrutura musical relacionado ao jazz que cabe citar:

    No jazz, por exemplo, voc tem os standards, que so msicas que todo mundo

    conhece, populares. Voc apresenta essas msicas e depois destri aquilo que elas

    tm. Mantm os elementos bsicos e, a partir da, voc comea a propor

    novidades, improvisa, muda andamento, faz novas orquestraes, uma srie de

    coisas. Depois voc volta, e isso faz com que a percepo do ouvinte se amplie,

    porque ele pensa que est ouvindo o conhecido e, na verdade, j est ouvindo um

    pouco do conhecido e do desconhecido. Voc usa aquilo que voc tem de memria

    e fica o tempo todo comparando, s vezes conscientemente, s vezes no, com

    aquilo que voc no conhece. Esse o campo no qual eu procuro atuar. Eu no sou

    um cara de romper, de quebrar, de chutar, de ficar introduzindo coisas novas. Mas

    se fizer isso consistentemente, a gente eleva um pouco o padro, altera a percepo

    (MALERONKA; COHN. Entrevista, 2010).

    Estes exemplos dos cartazes de Farkas compreendem mensagens visuais abstratas no

    uso de formas geomtricas bsicas, no relacionadas a uma representao direta de algo. O

    designer padroniza os elementos obrigatrios em todos os cartazes, como os logos da OSESP,

    de patrocinadores, apoiadores, da Sala So Paulo e da Fundao OSESP, deixando o mximo

    de rea livre para compor. Busca o ritmo atravs da construo abstrata, utilizando-se de grids

    geomtricos e repeties formais. As caractersticas em comum entre os cartazes deste recorte

    so o que confere visibilidade e unidade, o que os caracteriza como uma srie e no como

    cartazes soltos no tempo e no espao, estes possuem uma ligao fortemente estabelecida

    atravs das tcnicas visuais. Utiliza os recursos disponveis ao design para atingir uma gama

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    Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista Jlio de Mesquita Filho, So Paulo, Brasil. 9 , 10, 11 de outubro de 2012 ISBN: 978-85-62309-06-9

    diversificada de composies visuais norteadas por um elemento comum, um fio condutor da

    mensagem imagtica, que se transforma de um cartaz para o outro.

    Contudo, os cartazes criados por Farkas fazem referncia orquestra. Muito

    indiretamente eles parecem a OSESP e, de uma maneira abstrata, eles parecem-se mais com a

    msica propriamente, devido s qualidades e associaes exploradas. A organizao da

    estrutura visual lembra algum tipo de organizao musical.

    Referncias Bibliogrfica

    DONDIS, Donis A. Sintaxe da linguagem visual. So Paulo : Mart ins Fontes, 2003.

    ELAM, Kimberly. Geometry of design: studies in proportion and composition. New York: Princeton

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    _____. Ponto e linha sobre o plano. Traduo Eduardo Brando. So Paulo : Mart ins Fontes, 1997.

    KLEE, Paul. Sobre a arte moderna e outros ensaios. Traduo: Pedro Sutssekind. Rio de Janiero: Zahar, 2001

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    Paulo: Cosac Naify, 2008.

    MALERONKA, Fab io; COHN, Sergio. Entrevista: Kiko Farkas, Designer Grfico. Taddei, Roberto; Milani,

    Aloisio, coordenao. Produo Cultural no Brasil, vol. 3. So Paulo, 14 de junho de 2010. Disponvel em:

    . Acesso em 31, mar. 2012.

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