Matéria de Compra e venda

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Notas Preliminares e Definição do Contrato de Compra e Venda - Parte 1 de 8 No Princípio... Comungamos com a afirmação de Will Durant no sentido de que a história sempre cambaleia, diante da questão das origens 1 Assim, é evidente, que não há possibilidade de datar o primeiro contrato de compra e venda firmado na aurora da humanidade. Contudo, em que pese as origens remotas do contrato de compra e venda estarem perdidas nas brumas da história, de nossa parte, temos a firme impressão de que não há como negar o fato de que o contrato de compra e venda surgiu com o instituto da propriedade. Desse modo, não sentimos temor em afirmar que o contrato de compra e venda encontra íntima relação com o instituto da propriedade. No entanto, modernamente, há de se ressaltar a máxima de que não se negocia somente a propriedade por meio do contrato de compra e venda. Neste sentido, a transmissão da posse é um exemplo clássico. Quando remontamos ao aspecto histórico da compra e venda, muito já se falou. Caio Mário da Silva Pereira, chega a afirmar que “não é preciso remontar à origem da compra e venda. No princípio era o roubo que provia às necessidades de cada um”. 2 Com o devido acatamento a este autor clássico, nada mais equivocado. Pela afirmação acima, é possível apreender que Caio Mário adota a teoria do estado de natureza de Hobbes em que se sustenta que, nos primórdios da humanidade, havia o caos do “todos contra um”, sendo que foi a constituição do Estado que surgiu para

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Notas Preliminares e Definição do Contrato de Compra e Venda - Parte 1 de 8

No Princípio...

Comungamos com a afirmação de Will Durant no sentido de que a história sempre cambaleia,

diante da questão das origens1 Assim, é evidente, que não há possibilidade de datar o primeiro

contrato de compra e venda firmado na aurora da humanidade.

Contudo, em que pese as origens remotas do contrato de compra e venda estarem perdidas nas

brumas da história, de nossa parte, temos a firme impressão de que não há como negar o fato de

que o contrato de compra e venda surgiu com o instituto da propriedade. Desse modo, não

sentimos temor em afirmar que o contrato de compra e venda encontra íntima relação com o

instituto da propriedade.

No entanto, modernamente, há de se ressaltar a máxima de que não se negocia somente a

propriedade por meio do contrato de compra e venda. Neste sentido, a transmissão da posse é um

exemplo clássico.

Quando remontamos ao aspecto histórico da compra e venda, muito já se falou. Caio Mário da

Silva Pereira, chega a afirmar que “não é preciso remontar à origem da compra e venda. No

princípio era o roubo que provia às necessidades de cada um”.2 Com o devido acatamento a este

autor clássico, nada mais equivocado.

Pela afirmação acima, é possível apreender que Caio Mário adota a teoria do estado de natureza

de Hobbes em que se sustenta que, nos primórdios da humanidade, havia o caos do “todos contra

um”, sendo que foi a constituição do Estado que surgiu para salvaguardar a propriedade privada e

a própria vida. A máxima de Hobbes era que o “homem é o lobo do homem”.

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Discordamos, com efeito, da doutrina acima, na medida em que não concordamos com a

afirmação de que, nos primórdios, toda a economia humana estava centrada na rapina e no roubo.

Com efeito, há forte disposição histórica de que os primeiros elementos econômicos da civilização

foram a caça, a agricultura e a produção rudimentar. A partir desses modelos, na ausência da

moeda, tinha-se o escambo.3

No mesmo compasso, afirma Carlos Roberto Gonçalves que “a origem remota do contrato de

compra e venda está ligada a troca. Efetivamente, numa fase primitiva da civilização,

predominava a troca ou permuta de objetos.

Notas Preliminares e Definição do Contrato de Compra e Venda - Parte 2 de 8

Trocava-se o que se precisava pelo que sobejava para o outro. Esse sistema atravessou vários

séculos como prática de negócio, até certas mercadorias passagem a ser usadas como padrão,

para facilitar o intercâmbio e o comércio de bens úteis aos homens”.4

“Desde as origens de Roma já se praticava a compra e venda. Antes dos primeiros monumentos

elaborados pelo seu senso jurídico, antes mesmo que se tivessem cunhado as primeiras moedas,

quando o libripens pesava em público uma porção de metal do pagamento, o romano já sabia

distinguir da permuta em espécie a emptio venditio. Depois que se distingui da permuta, a venda

caracterizou-se por ser um contrato translativo imediato da propriedade por operação

instantânea”.5

No Direito Hebraico, já encontramos a sua presença, vinculada a nobres sentimentos familiares de

afeto e ternura. A título de exemplo, vale citar o episódio do patriarca Abraão e a morte de sua

esposa Sara. Observemos, abaixo, os aspectos típicos de um contrato de compra e venda de um

bem imóvel.

“E foi a vida de Sara cento e vinte e sete anos; estes foram os anos da vida de Sara. E morreu Sara

em Quiriate-Arba, que é HEbrom, na terra de Canaã; e veio Abraão lamentar Sara e chorar por ela.

Depois se levantou Abraão de diante de sua morta, e falou aos filhos de Hete, dizendo: estrangeiro

e peregrino sou entre vós; daí-me possessão de sepultura convosco, para que eu sepulte a minha

morta de diante da minha face. E responderam os filhos de Hete a Abraão, dizendo-lhe: ouve-nos,

meu senhor; príncipe poderoso és no meio de nós; enterra a tua morte na mais escolhida de

nossas sepulturas; nenhum de nós te vedará a sua sepultura, para enterrar a tua morta. Então

levantou Abraão, inclinou-se Dante do povo da terra, diante dos filhos de Hete, e falou com eles,

dizendo: se é de vossa vontade que eu sepulte a minha morta de diante da minha face, ouvi-me e

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falai por mim Efrom, filho de Zoar, que ele me ê a cova de Macpela, que ele tem no fim do seu

campo; e que ma dê pelo devido preço em herança de sepulcro no meio de vós”.6

Notas Preliminares e Definição do Contrato de Compra e Venda - Parte 3 de 8

Ainda, na tradição jurídica hebraica, podemos citar a passagem em que Jeremias adquire a

propriedade de um bem imóvel. Observemos a narrativa exposta em primeira pessoa pelo referido

protagonista:

“Disse pois Jeremias: Veio a mim a palavra do Senhor, dizendo: Eis que Hanamel, filho de Salum,

teu tio, virá a ti, dizendo: Compra o meu campo que está em Anatote, pois tens o direito de

resgate; a ti compete comprá-lo. Veio, pois, a mim Hanamel, filho de meu tio, segundo a palavra

do Senhor, ao pátio da guarda, e me disse: Compra o meu campo que está em Anatote, na terra

de Benjamim; porque teu é o direito de herança e teu é o de resgate; compra-o para ti. Então

entendi que isto era a palavra do Senhor. Comprei, pois, de Hanamel, filho de meu tio, o campo

que está em Anatote; e pesei-lhe o dinheiro, dezessete siclos de prata. Assinei a escritura e a selei,

chamei testemunhas, e pesei-lhe o dinheiro numa balança. E tomei a escritura da compra, que

continha os termos e as condições, tanto a que estava selada, como a cópia que estava aberta, e

as dei a Baruque, filho de Nerias, filho de Maséias, na presença de Hanamel, filho de meu tio, e na

presença das testemunhas que subscreveram a escritura da compra, à vista de todos os judeus

que estavam sentados no pátio da guarda.

E dei ordem a Banique, na presença deles, dizendo: Assim diz o Senhor dos exércitos, o Deus de

Israel: Toma estas escrituras de compra, tanto a selada, como a aberta, e mete-as num vaso de

barro, para que se possam conservar muitos dias; pois assim diz o Senhor dos exércitos, o Deus de

Israel: Ainda se comprarão casas, e campos, e vinhas nesta terra.”

É curiosa a riqueza de detalhes expressa no texto acima transcrito. Neles temos os elementos do

contrato, a coisa, o preço e o consenso, bem como os elementos formais do contrato, a escritura e

as testemunhas que dela participaram. Isso reforça a nossa afirmação da antiguidade do contrato

de compra e venda, bem como a permanência dos seus elementos. Ressaltamos que o direito

moderno não apresenta muitas alterações nestes elementos constitutivos do contrato de compra e

venda, mas, por outro lado, apenas os reforça e, por que não dizer, os aprimora no sentido de

promover adaptação aos novos preceitos da tecnologia jurídica.

Notas Preliminares e Definição do Contrato de Compra e Venda - Parte 4 de 8

Importância Contrato de Compra e Venda

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Não há como negar que o contrato de compra e venda é um dos mais importantes nos

ordenamentos jurídicos modernos. Não poderia ser diferente, haja vista que é ele, nas palavras de

Ruggiero, “o mais frequente nas relações da vida cotidiana e um dos mais importantes também

pela riqueza das normas que o disciplinam”.7

É por meio do contrato de compra e venda que, diariamente, fortunas são movimentadas, tanto no

ocidente quanto no oriente. Em função disso, observamos que ele está enraizado no cotidiano

humano. Assim, referido contrato faz parte da vida em sociedade.

Ao discorrer sobre a importância do contrato de compra e venda, leciona Cunha Gonçalves que

“ele é o contrato principal na atividade mercantil de todos os países. Vender é o fim de todos os

produtores; comprar e vender é a tarefa profissional de todos os comerciantes; comprar é a

necessidade de todos os consumidores. Não é, por isso, de surpreender que nenhum outro

contrato haja suscitado tão numerosos problemas como a compra e venda, exigindo extensa

regulamentação legal, originando variados usos, provocando a criação de importantes instituições,

estabelecimentos e mercados públicos e privados, e inspirando vastíssima bibliografia, em direito

civil e comercial”.8

Clóvis Bevilaqua, por sua vez, afirma que “o Código Civil colocou o contrato de copra e venda à

frente de todas as relações obrigacionais, não somente pela sua importância e frequencia, na vida

social moderna, como, ainda, por ser o contrato oneroso por excelência.”9

O estudo do contrato de compra e venda não é de atenção apenas para o direito civil. Neste

senda, Fábio Ulhoa Coelho, ao discorrer sobre o referido contrato, chega a afirmar, com acerto,

que “o estudo da compra e venda mercantil, no contexto do direito comercial, reveste particular

relevância porque ele representa o tipo de contrato mais importante para a maioria das atividades

empresariais. O comércio, enquanto aproximação do produtor ao consumidor, poderia até mesmo

ser definido, pelo seu perfil jurídico, como uma sucessão de compra e venda mercantis."10

De fato, a vida em sociedade, tanto nas atividades empresariais, cíveis, consumeristas etc,

demonstram a frequência da formação de sucessivos contratos de compra e venda. Eles estão,

portanto, inseridos na praxe da vida.

Notas Preliminares e Definição do Contrato de Compra e Venda - Parte 5 de 8

Definição do Contrato de Compra e Venda

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Definir um instituto jurídico não é tarefa das mais simples quando não se delimita o campo de

atuação do pesquisador, mesmo por que, a definição dependerá do modelo jurídico em que o

operador do direito está filiado.

Quando estamos em busca da definição do contrato de compra e venda, nos deparamos com

definições diferenciadas, na medida em que há sistemas jurídicos que o compreendem como

instrumento de transmissão da propriedade, sendo que outros, como o nosso, apenas o

apresentam como um mecanismo de translativo da posse.

O direito positivo brasileiro, nos termos do artigo 481 do Diploma Civil (Lei 10.406/2002),

apresenta a seguinte disposição do contrato de compra e venda: “pelo contrato de compra e

venda, um dos contratantes se obriga a transferir o domínio de certa coisa, e o outro, a pagar-lhe

certo preço em dinheiro”.

Seguindo a definição legal, Carlos Roberto Gonçalves, doutrina que “denomina-se compra e venda

o contrato bilateral pelo qual uma das partes (vendedor) se obriga a transferir o domínio de uma

coisa à outra (comprador), mediante a contraprestação de certo preço em dinheiro”.11

Clóvis Bevilaqua, também com base no direito positivo então em vigor, ensina que “compra e

venda é o contrato pelo qual uma pessoa se obriga a transferir a outra o domínio de uma coisa

determinada, por preço certo em dinheiro ou em valor fiduciário equivalente.”12

Na mesma senda, porém com mais elementos constitutivos, perfilha Caio Mário da Silva Pereira:

“compra e venda é o contrato em que uma pessoa (vendedor) se obriga a transferir a outra pessoa

(comprador) o domínio de uma coisa corpórea ou incorpórea, mediante o pagamento de certo

preço em dinheiro ou valor fiduciário correspondente.”13

A vista do que acima expusemos, entendemos que não há necessidade da transcrição de mais

definições doutrinárias, haja vista que os escritores nacionais, ao definir o contrato de compra e

venda a partir da definição legal, não se afasta da anotação de Gonçalves. Desse modo, o contrato

de compra e venda no direito brasileiro, a partir de sua definição, vincula-se ao sistema de direito

romano.

Notas Preliminares e Definição do Contrato de Compra e Venda - Parte 6 de 8

Vídeo A Lamentável Natureza Meramente Obrigacional do Contrato de Compra e Venda no Sistema Jurídico Brasileiro

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Notas Preliminares e Definição do Contrato de Compra e Venda - Parte 7 de 8

Fortalecendo o que afirmamos no parágrafo acima, podemos apontar o conteúdo do artigo 1.226 e

1.227, in verbis: “Art. 1.226. Os direitos reais sobre coisas móveis, quando constituídos, ou

trasmitidos pro atos entre vivos, só se adquirem com a tradição. Art. 1.227. Os direitos reais sobre

imóveis constituídos ou transmitidos por atos entre vivos, só se adquirem com o registro no

Cartório de Registro de Imóveis...”.

A propósito, vale aqui registrar a doutrina de Carlos Roberto Gonçalves: “Filiou-se o nosso Código,

nesse particular, aos sistemas alemão e romano. O sistema francês, diferentemente, atribui

caráter real ao contrato; este, por si só, transfere o domínio da coisa ao comprador. De acordo

com o artigo 1.582 do Código Napoleão, o contrato cria o vínculo obrigacional e, simultaneamente,

transfere o domínio da coisa vendida (nudus consensus parit proprietatem). O aludido dispositivo

considera a transferência realizada por virtude do próprio contrato.

O sistema francês afastou-se, assim, da tradição romana, expressa pela máxima traditionibus et

usucapionibus dominia rerum, non nudis pactis, transferuntur, pois o próprio contrato transfere o

domínio, independentemente da tradição da coisa vendida, servindo o registro apenas como meio

de publicidade”.16

De nossa parte, entendemos lamentável o nosso sistema jurídico não ter aplicado natureza real

aos contratos de compra e venda, aplicando-lhe, ao contrário, uma natureza meramente

obrigacional.

Quando o nosso sistema doutrinário e legislativo adota, sem questionamentos, a natureza

meramente obrigacional do contrato de compra e venda, observamos o sentido extremamente

burocrático de nosso direito o que, aliás, é próprio dos ramos jurídicos filiados à tradição romana.

Como resultado, principalmente quando estamos diante da transmissão da propriedade imóvel,

encontramos uma realidade extremamente onerosa e, por conseguinte, uma série de contratos

não registrados que, em que pese a vontade das partes, não alcança o efeito translativo da

propriedade.

Vale aqui repetir a exaustão. Diante da realidade social em que estamos inseridos é lamentável

que o sistema jurídico brasileiro tenha imposto natureza obrigacional ao contrato de compra e

venda. Eis, neste sentido, uma questão legislativa, presente em nossa tradição, que merece

reforma para melhor adequação a realidade nacional. Essa opção legislativa presta-se,

exclusivamente, para onerar a transmissão da propriedade, notadamente, a propriedade de bens

imóveis. Isso é lamentável.

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Notas Preliminares e Definição do Contrato de Compra e Venda - Parte 8 de 8

Promessa de Compra e Venda

Interessa, neste momento preliminar, apresentar a promessa de compra e venda, também

denominada como compromisso de compra e venda e os seus efeitos no ordenamento jurídico

pátrio.

Vimos acima, quando da nossa exposição da definição do contrato de compra e venda, que ta

espécie diz respeito a modalidade de pacto principal em que uma das partes, o alienante, se

obriga a transferir o domínio de uma coisa à outra, o comprador, mediante o pagamento de preço

certo.

Por outro lado, “o contrato preliminar de compra e venda é um contrato preliminar que tem como

objeto um contrato futuro de venda e compra. Por meio dele, o vendedor continua titular do

domínio que somente será transferido após a quitação integral do preço, constituindo excelente

garantia para o alienante”.17

A promessa de compra e venda, nos termos do inciso VII, do artigo 1.225 do Código Civil, ganha

status de direito real e, neste sentido, para fazer vale o direito do promitente comprador, mostra-

se oponível erga omnes.

O contrato preliminar denominado promessa (ou compromisso) de compra e venda, está

disciplinado no artigo 1.417 e 1.418 do Código Civil. , senão vejamos:

“Art. 1.417. Mediante promessa de compra e venda, em que se não pactuou

arrependimento, celebrada por instrumento público ou particular, e registrada no Cartório

de Registro de Imóveis, adquire o promitente comprador direito real à aquisição do

imóvel.

Art. 1.418. O promitente comprador, titular de direito real, pode exigir do promitente

vendedor, ou de terceiros, a quem os direitos deste forem cedidos, a outorga da escritura

definitiva de compra e venda, conforme o disposto no instrumento preliminar; e, se

houver recusa, requerer ao juiz a adjudicação do imóvel.”

A partir dos artigos supracitados, há de se registrar as seguintes características da promessa de

compra e venda:

a. A sua incidência se dá sobre bens imóveis.

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b. Para a sua validade no sentido de transferência do domínio, deverá haver no instrumento, cláusula concernente a irretratabilidade das partes contratantes.

c. O direito do comprador tem natureza real, opondo-se a terceiros, mediante o competente registro no Registro de Imóveis.

d. O pacto poderá ser celebrado em instrumento público ou particular. e. Na recusa da transferência do domínio, o promitente comprador, em contrato de

compromisso de compra e venda, devidamente, registrado, poderá se valer da ação de adjudicação compulsória.

Elementos Essenciais do Contrato de Compra e Venda - Parte 1 de 22

Por elementos constitutivos do contrato de compra e venda nos referimos aos elementos

essenciais dessa modalidade contratual, sendo eles a coisa, a vontade e o preço. Essa tríade,

portanto, não poderá faltar para que o contrato de compra e venda esteja perfeitamente adequado

ao fim ao qual se propõe.

Na medida em que discorrermos sobre os elementos essenciais, não ganha importância neste

tópico a forma, visto que a forma, em nosso sentir, surge tão somente como elemento acidental no

contrato de compra e venda de imóveis acima do teto fixado na legislação em vigor.

Feitas estas considerações propedêuticas, voltemos nossa atenção abaixo para os três elementos

do contrato de compra e venda.

Elementos Essenciais do Contrato de Compra e Venda - Parte 2 de 22

Vídeo

A Coisa

Elementos Essenciais do Contrato de Compra e Venda - Parte 3 de 22

No contrato de compra e venda a coisa é o objeto da relação jurídica, sem a possibilidade, pelo

menos em potência, da existência da sua existência, não há de se falar em contrato de compra e

venda. Haja vista que é a respeito dela que recaem o preço e a vontade dos contratantes.

Na diretriz do artigo 481 do Código Civil, logo na definição do contrato, a coisa ganha elementar

importância. Não há como negar, sem a coisa, o contrato de compra e venda perde o seu sentido.

Na doutrina de Ruggiero, “o objeto da venda pode ser qualquer coisa, corpórea ou incorpórea,

desde que não esteja fora do comércio e seja certa e determinada, devendo além disso, em regra,

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existir de momento e pertencer ao domínio do vendedor.”18

Mas que a coisa esteja adequadamente descrita em um contrato de compra e venda é necessário

que a observância de alguns critérios, sendo eles, os seguintes: existência; individuação;

disponibilidade e transmissibilidade. Verifiquemos, pois, cada uma destas características

necessárias da coisa no contrato de compra e venda.

Existência

Incoerente um contrato de compra e venda que recaia sobre coisa inexistente. Em decorrência

disso, mostra-se de grande relevância reservarmos este item para discorrermos a respeito da

existência da coisa em contratos de compra e venda.

O contrato de compra e venda que não tenha menção a coisa é Nula, portanto, o contrato em que

ocorra a falta absoluta da coisa. No entanto, esta afirmação não pode levar ao engano de se

imaginar que o direito pátrio, a exemplo do direito comparado, não permita a compra e venda de

coisas futuras, ou seja, que ainda não existam, mas hão de existir. Assim, não é possível que, por

exemplo, em uma das cláusulas do contrato conste que o seu objeto é o nada absoluto.

Elementos Essenciais do Contrato de Compra e Venda - Parte 4 de 22

A propósito das particularidades do quesito existência de coisa futura, doutrina Caio Mário da Silva

Pereira: “não significa isto, entretanto, que somente possa haver contrato que verse sobre coisa já

conhecida e caracterizada no momento da celebração. Muito ao contrário, é fora de dúvida a

viabilidade do contrato incidente em coisa futura, o qual fica perfeitamente definido como

condicional – emptio rei speratae, que se resolve se a coisa não vier a ter existência, mas que se

reputa perfeito desde a data da celebração, com o implemento da conditio; ou, então, fica

identificado como contrato aleatório – emptio spei – válido como negócio jurídico, e devido o preço,

ainda que nada venha a existir (Código Civil, art. 458), pois que neste caso é objeto da venda a

spes (expectativa) e não a coisa ou sua transferência.”19

Nada impede, assim, que os contratantes fixem acordo de compra e venda sobre coisas que ainda

não existem ao tempo da celebração do contrato, mas, por questões diversas, venham a existir no

futuro. É o que denominados de contrato de compra e venda que tem como objeto coisa futura.

Contudo, é condição que tal coisa, mesmo sendo futura, seja determinada no sentido da

necessidade de sua individuação, conforme verificaremos no item abaixo.

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Com efeito, na exata dicção de Ricardo Negrão, “é possível que os contrantes acordem sobre a

entrega de produtos ainda não existentes, sujeitos à colheita futura, com os frutos agrícolas ou à

fabricação, quando se tratar de produção industrial, ou, ainda à manufatura. Se a coisa não chegar

a existir, o contrato é declarado sem efeito, salvo se as partes tinha intenção de concluir um

contrato aleatório (CC, art. 483).”20

Desse modo, há de se concluir que a coisa é elemento essencial do contrato, devendo ela existir

para que o contrato não seja eivado de nulidade. No entanto, a coisa poderá ser futura, ou no

mínimo, passível de existência por meio de forças naturais ou humanas.

Em resumo, a coisa pode existir ao tempo da celebração do contrato, ou, conforme o caso, contar

com potencialidade de existência. A propósito, reza o artigo 483 do Código Civil: “A compra e

venda pode ter por objeto coisa atual ou futura. Neste caso, ficará sem efeito o contrato se esta

não vier a existir, salvo se a intenção das partes era de concluir contrato aleatório.”

Nas palavras de Gagliano e Pamplona Filho, em comentário ao artigo 483 do Código Civil acima

transcrito, tem-se que “por coisa atual entende-se o objeto existente e disponível, ao tempo da

celebração do negócio; a coisa futura, por sua vez, é aquela que, posto ainda não tenha existência

real, é de potencial ocorrência. Imagine-se, por exemplo, a compra de uma safra de cacau que

ainda não foi plantada. Em tal caso, o contrato ficará sem efeito se a coisa não vier a existir,

consoante previsto no mesmo dispositivo, ressalvada a hipótese de as partes terem pretendido

pactuar contrato aleatório.”21

Elementos Essenciais do Contrato de Compra e Venda - Parte 5 de 22

Perecimento da Coisa Objeto do Contrato

É possível pensar em perecimento da coisa objeto de contrato de compra e venda. Tal hipótese,

perfeitamente possível de ocorrer na dinâmica contratual, merece ser abordada, uma vez que

poderá trazer severas consequências na relação obrigacional.

Já registrou Bevilaqua que “se ao tempo da conclusão do contrato, a coisa não existe mais, a

venda é nula por falta de objeto.”22 Exploraremos, mais este tópico quando discorrermos sobre os

direito e obrigações dos contraentes no item III, ao qual já fazemos referência.

Individuação

O objeto do contrato de compra e venda deve ser certo e determinado, haja vista que é sobre ele

que recairá a obrigação de dar do vendedor. Para tanto, é imprescindível a determinação da coisa.

Page 11: Matéria de Compra e venda

“A coisa vendida pode ser determinada de modo específico, ou de modo genérico. Para saber se a

coisa foi comprada in specie ou in genere há que se indagar da maneira por que ela foi designada

no momento do contrato: porque a coisa comprada in specie não pode ser confundida com outra

da mesma specie, nem substituída, ao passo que as compras in genere não tem identificação

precisa, sendo apenas designada pela qualidade ou quantidade.”23

Nas palavras de Caio Mário da Silva Pereira, há de se considerar que “gerando uma obrigação de

dar, o contrato de compra e venda terá de incidir sobre coisa caracterizada por seus elementos

identificadores. O seu objeto há, pois, de ser determinado. Não quer dizer seja mister a

determinação rigorosa, e contemporânea do ajuste. Pode sê-lo, e frequentemente o é. Mas, se na

falta de uma determinação inicial a coisa for determinável, isto é, suscetível de individuação no

momento da execução, o contrato forma-se desembaraçadamente.”24

A legislação em vigor permite, ainda, que a coisa objeto do contrato de compra e venda seja

expressa por meio de amostras, protótipos ou modelos e, a partir da exposição ao vendedor, o

negócio seja celebrado na expectativa de que a coisa futura a ser fabricada, colhida, produzida

etc, atenda ao padrão da oferta. Neste caso, atrela-se a compra e venda a máxima de que a oferta

tem efeito vinculante, na medida em que será de responsabilidade do vendedor atender a

amostra, o protótipo ou o modelo. A este reza artigo 484 do Código Civil: “se a venda se realizar à

vista de amostras, protótipos ou modelos, entender-se-á que o vendedor assegura ter a coisa as

qualidades que a elas correspondem. Parágrafo único. Prevalece a amostra, o protótipo ou o

modelo, se houver contradição ou diferença com a maneira pela qual se descreveu a coisa no

contrato.”

Elementos Essenciais do Contrato de Compra e Venda - Parte 6 de 22

Disponibilidade

Não basta que a coisa existe, seja existência atual ou futura, bem como a sua individuação, é

necessário que o objeto do contrato de compra e venda esteja disponível.

Vale, aqui, ressaltar a lição de Carlos Roberto Gonçalves concernente a disponibilidade da coisa: “a

coisa deve encontrar-se disponível, isto é, não estar fora do comércio. Considera-se nesta situação

as coisas insuscetíveis de apropriação (indisponibilidade natural) e as legalmente inalienáveis, seja

estas indisponíveis por força de lei (indisponibilidade legal) ou devido a cláusula de

inalienabilidade colocada em doação ou testamento (indisponibilidade voluntária). São igualmente

inalienáveis os valores e direitos da personalidade (CC, art. 11), bem como os órgãos do corpo

humano (CF, art. 199, § 4º).”25

Page 12: Matéria de Compra e venda

Compra a Non Domino

Quando nos envolvemos com a coisa, uma questão contravertida surge à baila. Quais as

consequências da coisa vendida que não seja de propriedade do vendedor? Essa hipótese costuma

ser identificada pela expressão compra a non domino, ou simplesmente venda de coisa alheia.

A indagação prática relativa a venda a non domino é se o negócio jurídico é nulo, anulável ou

ineficaz. Entendemos que esta é a questão crucial da venda de coisa alheia.

A princípio, pertinente fazer constar o teor do caput artigo 307 do Código Civil, in verbis: “só terá

eficácia o pagamento que importar transmissão da propriedade, quando feito por quem possa

alienar o objeto em que ele consistiu.” (grifamos).

É bem verdade que o dispositivo em tela não soluciona definitivamente a questão incidente sobre

a venda a non domino. Contudo, entendemos que o artigo em referência traz à discussão para o

campo da eficácia/ineficácia do negócio jurídico em que haja um vício relativo a propriedade do

vendedor. Da leitura do texto em destaque, caminhamos no sentido de que a venda não é nula ou

anulável, mas ineficaz. Sendo que para tanto, deve-se considerar, sobretudo, a boa-fé do

comprador.

Elementos Essenciais do Contrato de Compra e Venda - Parte 7 de 22

Quando estamos diante de um contrato de compra e venda que tenha por objetivo a

transmissibilidade do domínio e não somente a posse, há de se considerar regra elementar do

direito que segue no sentido de que ninguém poderá transferir mais direito do que tem. Assim, a

venda a non domino apresenta-nos uma problemática relevante e, em função disso, a doutrina

mostra-se dividida.

A respeito da venda a non domino, precisa é a síntese apresentada por Caio Mário da Silva Pereira:

“em consequência, três correntes há sustentado a ineficácia do contrato. Para uns (Orosimbo

Nonato), é ato inexistente em relação ao verus dominus. Para outros, é ato nulo em razão de faltar

o pressuposto fático essencial, que é o direito do alienante à coisa. Neste sentido, aliás, é a

doutrina na França, uma vez que ali o direito é expresso (Código Civil Francês, artigo 1.599) neste

sentido. Para outros, finalmente, o contrato é anulável, porque admite convalescimento. Na

verdade, se o alienante estiver de boa-fé, e ulteriormente vier a adquirir a propriedade da coisa

que vendeu, revalida-se a transferência, e retroage o efeito da tradição ao momento em que se

efetuou (Código Civil, art. 1.268, § 1º; por outro lado, a compra a non domino, desprovida de efeito

Page 13: Matéria de Compra e venda

translatício da propriedade, constitui título justo para operar o usucapião ordinário, quando aliada

aos demais requisitos destes. Daí sustentarmos a anulabilidade do contrato.”26

Como se verifica acima, o mestre em destaque considera que a venda a non domino é anulável,

dependendo da aquisição futura da coisa pelo alienante. Discordamos dessa posição, na medida

em que a anulabilidade dependerá do alvitre daquele que teve prejuízo, no caso o comprador, na

medida em que o alienante não poderá se beneficiar da sua própria torpeza.

No nosso entendimento, melhor caminho é considerar a venda a non domino ineficaz, pois ficará

na pendência da aquisição futura da coisa por parte da alienante. Todavia, um quesito inarredável

a eficácia do contrato será a condição de boa-fé do adquirente. Ao que parece é esta a posição

adotada por Carlos Roberto Gonçalves: “Nem sempre, porém, a coisa in commercium pode ser

transferida do comprador. Não o pode a coisa alheia (venda a non domino), salvo se o adquirente

estiver de boa-fé, e o alienante adquirir depois a propriedade.”27

Washington de Barros Monteiro, em sua cátedra, afirma, com acerto, que “a melhor doutrina,

todavia, é a que sustenta a admissibilidade do ato, cuja eficácia dependerá, naturalmente, de sua

ulterior revalidação pela superveniência do domínio”.28 Esta é, como dito acima, a linha doutrinária

que seguimos.

Observe-se, por fim, que a discussão da venda a non domino, não afeta a possibilidade de o objeto

do contrato de compra e venda ser coisa futura, neste particular, como vimos acima, há, inclusive,

previsão legal que o admite, conforme estabelece o artigo 483 do Código Civil.

Elementos Essenciais do Contrato de Compra e Venda - Parte 8 de 22

Vídeo: O Preço

Em decorrência de disciplina legislativa, o contrato de compra e venda tem o preço

como seu elemento essencial. Impõe-se, neste sentido comentários a respeito da

contraprestação do comprador da coisa.

Elementos Essenciais do Contrato de Compra e Venda - Parte 9 de 22

Preço em Dinheiro ou Valor Fiduciário Equivalente

A princípio, o preço da coisa deverá ser cumprido em dinheiro, no entanto, a doutrina abre espaço

para que o pagamento se dê em valor fiduciário equivalente. A respeito, vale fazer constar os

seguintes excertos doutrinário.

Page 14: Matéria de Compra e venda

Para Carvalho dos Santos, “o preço é objeto da obrigação do comprador e a causa da obrigação do

vendedor. Consiste em uma quantia em dinheiro, que o comprador se obriga a pagar ao vendedor

como equivalente da coisa vendida, seja de uma só, seja em prestações. Quando o preço não

consiste em um equivalente em dinheiro, há troca e não venda. Mas, admite-se que, ao invés de

dinheiro, pode o preço ser representado em valor fiduciário equivalente”.29

Na lição de Caio Mário da Silva Pereira: “em dinheiro o preço, pode ser represenda a quantia

correspondente por uma expressão fiduciária (nota promissória ou cheque de emissão do

comprador, letra de câmbio ou duplicata de seu aceite), representativa do preço em dinheiro. Há,

contudo, se trate efetivamente de um valo fiduciário, isto é, de um título representativo de

dinheiro. Se, ao revés, for um bem incorpóreo dotado de autenticidade própria (título da dívida

pública, ações de sociedade anônima etc.), o contrato deixa de ser de compra e venda, por não

haver preço em dinheiro”.30

Bevilaqua, em sua definição de preço, afirma o seguinte: “preço é a soma em dinheiro, que o

comprador se obriga a pagar ao vendedor. Deve ser verdadeiro, real, certo, determinado pelas

partes, por terceiro, ou pela referência a cotação de uma praça (...). Em vez de dinheiro, pode o

preço ser representado em valor fiduciário equivalente.”31

Não restam dúvidas, portanto, de que o preço deve ser em dinheiro, pois, caso contrário contrato

de compra e venda não há. Quando a contraprestação do comprador for representada por outro

tipo de bem, que não o dinheiro, estaremos diante de uma troca, mas não contrato de compra e

venda.

Contudo, quando o pagamento da coisa for realizado em parte em dinheiro, em parte em coisa

diversa, seguimos a compreensão de que a espécie de contrato, se troca ou compra e venda,

dependerá da vontade dos contratantes, sempre que a parte em dinheiro seja expressiva.

Elementos Essenciais do Contrato de Compra e Venda - Parte 10 de 22

Preço Sério

A partir da definição do preço exposta em Bevilaqua no sentido de que o preço deve ser

verdadeiro e real, importa destacar o requisito da seriedade do preço. Não é qualquer valor em

espécie, notadamente o irrisório, que preencherá o elemento necessário do preço nos contratos de

compra e venda.

Page 15: Matéria de Compra e venda

Com efeito, “o preço deve ser sério, traduzindo a intenção efetiva e real de constituir uma

contraprestação da obrigação do vendedor. Se for fictício, não há venda, porém, doação

dissimulada, aplicando-se o art. 167 do Código Civil, que determina a subsistência do negócio

jurídico que se dissimulou, se válido na substância e na forma e não violar direito de terceiro. Se

for irrisório, venda também não há, porque um contrato em que se presencia o contraste

aberrante entre valor da coisa e o preço nega-se a si mesmo.”32

No contrato de compra e venda é necessário que o preço seja certo. Por meio desta expressão,

entende-se que o pacto deverá constar o montante em dinheiro a ser desembolsado pelo

comprador como contraprestação da coisa por ele adquirida do alienante.

Desse modo, a regra é que o contrato apresente um preço certo, determinado em moeda corrente.

Essa diretriz, determinada que, inclusive, as condições do pagamento do preço devem ser

descritas no contrato de compra e venda. Destarte, o contrato deverá conter a data de vencimento

e, ainda, se à vista ou parcelado o pagamento do respectivo preço.

Contudo, há uma exceção. Há hipótese em que a legislação autoriza a existência validade de

contrato de compra e venda com a ausência de preço certo. É o que estabelece o artigo 488 do

Código Civil, in verbis:

Em comentário a disposição legal acima, firma Caio Mário da Silva Pereira: “a falta de estipulação

do preço nem sempre leva à inexistência do contrato de compra e venda por falta de um de seus

elementos essenciais. O art. 488 do Código admite a interpretação do contrato de compra e venda

sem preço, ou de qualquer critério de sua fixação, como se as partes se tivessem sujeitado ao

preço corrente nas vendas habituais do vendedor. Essa interpretação somente poderá ser

admitida nas hipóteses em que o vendedor habitualmente exerce o comércio e ainda assim o faz

tendo por objeto coisas cujo preço não é fixado em razão de uma qualidade especial, ou seja, bens

fungíveis por natureza. A prova da habitualidade e do preço de mercado do objeto do contrato é

essencial para a aplicação desta regra legal”.33

Page 16: Matéria de Compra e venda

Elementos Essenciais do Contrato de Compra e Venda - Parte 11 de 22

Determinação do Preço

Em regra, o preço deverá ser determinado pelas partes, em comum acordo, nos termos do artigo

482 do Código Civil: “a compra e venda, quando pura, considerar-se-á obrigatória e perfeita, desde

que as partes acordarem no objeto e no preço” (grifamos). O acordo quanto ao objeto já

discorremos em momento anterior. Desse modo, o que ressalta para nossa análise neste momento

é o fato de que as partes deverão, como regra, deliberarem a respeito do preço. Isso se dará em

decorrência do encontro de vontades entre o alienante e o comprador.

Não é permitido, portanto, que o preço seja fixado pelo alvitre, exclusivo, de uma das partes em

detrimento da outra. Neste sentido, impõe a legislação pátria, artigo 489 do Código Civil, que “nulo

é o contrato de compra e venda, quando se deixa ao arbítrio de uma das partes a fixação do

preço”.

Entretanto, há permissão legal no sentido de que o preço seja fixado por terceiro. Vale, entretanto,

ressaltar que a determinação do preço por terceiro não representa atentado ao artigo 489

supratranscrito, eis que tal hipótese será, naturalmente, deliberada pelos contratantes que, em

conjunto, farão constar nos termos do contrato cláusula específica.

A respeito da possibilidade jurídica de fixação do preço por terceira pessoa, alheia a obrigação

contratual, estabelece o artigo 485 do Código Civil que “a fixação do preço pode ser deixada ao

arbítrio de terceiro, que os contratantes logo designarem ou prometerem designar.

Se o terceiro não aceitar a incumbência, ficará sem efeito o contrato, salvo quando acordarem os

contratantes designar outra pessoa”.

Carlos Roberto Gonçalves, com acerto e juízo equilibrado, apresenta interessante discussão a

respeito do caráter obrigatório do preço fixado por terceiro, bem como a possibilidade de

discussão da correspondência deste com a coisa objeto do contrato. Verifiquemos, a propósito, as

ponderações do citado jurista:

“o terceiro age como mandatário destes [os contratantes], não se exigindo capacidade especial.

Não é ele propriamente um avaliador da coisa, mas um árbitro escolhido pelos interessados.

Se as partes expressamente convencionarem submeter-se ao preço ficado por terceiro que

escolherem, implicitamente renunciam ao direito de impugnar o laudo que este apresentar. Não

têm direito de repudiar a sua estimativa, que se torna obrigatória . Todavia, o preço não poderá

Page 17: Matéria de Compra e venda

ser desarrazoado, contrário às legítimas expectativas dos contratantes ou em desarmonia com as

circunstâncias que devam ser levadas em conta. Embora a estimação feita pelo terceiro não possa

ser reduzida, é ressalvado a qualquer dos contratantes o direito de demandar a nulidade do

contrato por dolo”.34

Elementos Essenciais do Contrato de Compra e Venda - Parte 12 de 22

Surge aqui uma questão importante, é possível que a deliberação sobre outro árbitro, em caso de

recusa deste, seja feita em instrumento contratual em apartado? Ou, em sentido diverso, somente

será possível a discussão da cláusula que estipula o árbitro no contrato originário?

Caio Mário da Silva Pereira procura responder os questionamentos acima, nos seguintes termos:

“se o terceiro não aceitar a incumbência ou morrer, ficará sem efeito o contrato, a não ser que as

partes acordem, no contrato mesmo, ou em ato subsequente, na designação de outro”.35

Em que pese a posição de Caio Mário, entendemos que para evitar celeumas futuras, por zelo,

mostra-se pertinente que os contratantes façam constar no instrumento primitivo do contrato de

compra e venda que, caso o terceiro não aceite a incumbência, a tarefa será designada a outrem.

É o que costumamos chamar de designação alternativa, com benefício de ordem. Assim, primeiro

um, na sua recusa outrem, e assim sucessivamente.

Há também a possibilidade de que o preço seja fixado por cotação de mercado ou de bolsa. Neste

compasso, reza o artigo 486 do Código: “também se poderá deixar a fixação do preço à taxa de

mercado ou de bolsa, em certo e determinado dia e lugar”.

Bolsa de Valores de Nova York

Page 18: Matéria de Compra e venda

Salta aos olhos, contudo, que a diretriz do artigo 486 poderá ser combinada com o artigo 485. Ou

seja, é possível considerarmos que na hipótese de recusa do árbitro determinado para a fixação do

preço, este poderá ser determinado por meio da cotação de mercado ou de bolsa.

Autoriza a lei também que o preço seja determinado por meio de índices ou parâmetros, desde

que sejam eles suscetíveis de objetiva determinação, conforme reza o artigo 487, senão vejamos:

“é lícito às partes fixar o preço em função de índices ou parâmetros, desde que suscetíveis de

objetiva determinação”.

Elementos Essenciais do Contrato de Compra e Venda - Parte 13 de 22

Vídeo: O Consenso

Elementos Essenciais do Contrato de Compra e Venda - Parte 14 de 22

Devido a sua importância, vale fazer constar, mais uma vez, o artigo 482 do Código Civil: “a

compra e venda, quando pura, considerar-se-á obrigatória e perfeita, desde que as partes

acordarem no objeto e no preço” (grifo nosso).

Pelo teor do artigo acima, observa-se que os contratantes deverão deliberarem (na dicção do

Código; acordarem) em relação ao preço e objeto. Essa deliberação pressupõe consenso.

O consenso (que também podemos denominar consentimento), por sua vez, é um elemento

subjetivo dos contratantes e, decorre, da autonomia da vontade. Contudo, há de se considerar,

desde já, que a autonomia da vontade não é absoluta em nosso sistema jurídico, há, pois,

restrições à vontade de comprar e vender alguma coisa.

Ensina Washington de Barros Monteiro que “o consentimento é a convergência da vontade sobre a

coisa, o preço e as demais condições do negócio.]Em primeiro lugar ele deve coincidir sobre a

coisa que forma o objeto do contrato. Não existe venda, se o vendedor crê alienar uma coisa, ao

passo que o comprador está convencido de que adquire objeto diferente. Eu, como vendedor,

penso alienar o fundo corneliano; tu, como comprador, pensas adquirir o fundo semproniano;

diante do erro dos contratantes o ato não subsiste, porque viciado se acha o consentimento. É o

chamado erro in ipso corpore rei (erro sobre o objeto principal da declaração)”.36

Entretanto, não é qualquer erro do consenso que irá viciar o contrato, por retirar-lhe um dos seus

elementos essenciais. Assim, por exemplo, o vício de qualidade previsto no artigo 18 do Código de

Page 19: Matéria de Compra e venda

Defesa do Consumidor não maculará o contrato, mas, ao contrário, imporá ao vendedor a

responsabilidade de sanar o vício, sob pena de arcar com as consequências de eventual inércia.37

A seu turno, destaca Gonçalves que “será anulável a venda, também, se houver erro sobre o

objeto principal da declaração ou sobre as suas qualidades essenciais (CC, art. 139). Não existe

venda se o vendedor julga estar alienando um coisa e o comprador acredita estar adquirindo

objeto diferente. No erro sobre o objeto principal, o consentimento recai sobre objeto diverso

daquele que o agende tinha em mente. Exemplo: o do indivíduo que se propõe a alugar a sua casa

da cidade e outro contratante entende tratar-se de sua casa de campo.

Ocorre erro sobre as qualidades essenciais do objeto quando o motivo determinante do

consentimento é a suposição de que este possui determinada qualidade que, posteriormente, se

verifica inexistir, como no caso da pessoa que adquire um quadro por alto preço, na persuasão de

se tratar de original quando não passa de cópia. Somente não vicia a manifestação da vontade o

erro acidental, de somenos importância, que não acarreta prejuízo.”38

Elementos Essenciais do Contrato de Compra e Venda - Parte 15 de 22

Autonomia Privada e os Limites da Vontade nas Relações Contratuais

Na medida em que a sociedade muda, o Direito e a sua interpretação também devem sofrer

mudanças, sob pena de experimentarmos terríveis anacronismos.

Nos dias contemporâneos, nos deparamos com novas cosmovisões jurídicas que surgem com

vistas a enfrentar as crises epistemológicas de nosso tempo. Neste compreensão, pretendemos

demonstrar neste tópico que a vontade dos contratantes, em sede de contratos de compra e

venda, encontra um conjunto de limitações, sejam elas de ordem principiológica, sejam por força

de comandos legislativos diretos e, por conta disso, expressos.

Page 20: Matéria de Compra e venda

Limitações Principiológicas da Vontade nos Contratos de Compra e Venda

Há princípios que limitam a vontade. Nessa linha, iniciaremos nossa a análise com a exposição dos

princípios que limitativos da vontade dos contratantes.

Em nossa obra, Curso Moderno de Filosofia do Direito, já tivemos a oportunidade de registrar que,

por questões relativas a limitação do poder da atuação humana nas sociedades contemporâneas,

nos deparamos com limitações diversas da autonomia privada.

Desse modo, “nas sociedades hodiernas a liberdade contratual, principalmente quando nos

deparamos com a figura dos contratos de adesão que representam a grande maioria das

contratações atuais da sociedade de consumo, está deveras limitada.”39

O Código Civil, em seu artigo 421, dispõe que “a liberdade de contratar será exercida em razão e

nos limites da função social do contrato”. Se não bastasse, o artigo 422, do mesmo diploma,

estabelece que “os contraentes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como

em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé”.

Engano quem imagina a existência de liberdade absoluta à vontade dos contratantes. Aliás,

“consoante se observa da legislação, há de se consignar que atualmente a liberdade de contratar

é relativa, haja vista que o seu limite é ditado pelo interesse social.

Elementos Essenciais do Contrato de Compra e Venda - Parte 16 de 22

Contudo, lembramos que desde os tempos pretéritos, a liberdade de escolher o contratante sofre

certas mitigações, de modo que, em alguns casos, tem-se subtraído de um dos contraentes até

mesmo a escolha do outro sujeito do contrato, como é evidente nos serviços públicos essenciais. O

cidadão não tem como, via de regra, escolher o concessionário de energia elétrica à sua residência

ou empresa, por exemplo”.40

Em discurso relacionado às modificações da vontade e as suas limitações, acentua Georges Ripert:

“para quem se lembra do culto da lei durante o período revolucionário esta fórmula parece

extraordinariamente forte. Para chegar a esta concepção da vontade soberana, criando ela própria

e unicamente pela sua força direitos e obrigações, foi preciso que na obra lenta dos séculos a

filosofia espiritualizasse o direito para desembaraçar a vontade pura das fórmulas materiais pelas

quais se dava, que a religião cristã impusesse aos homens a fé na palavra escrupulosamente

guardada, que a doutrina do direito natural ensinasse a superioridade do contrato, fundando a

Page 21: Matéria de Compra e venda

própria sociedade sobre o contrato, que a teoria do individualismo liberal afirmasse a concordância

dos interesses privados livremente debatidos sobre o bem público.”41

Há de se considerar que, atualmente, a autonomia da vontade, instituída como dogma supremo

das disposições contratuais, não guarda mais o mesmo sentido absoluto do passado. Desse modo,

falar em pacta sunt servanda, tal qual se entendia no passado, é prática e compreensão teórica

superadas. Esses temas presentes na teoria geral dos contratos, atualmente, são vistos com

muitas reservas e foram flexibilizados em prol da função social do contrato e da chamada boa-fé

objetiva.

Para Menezes Cordeiro, a boa-fé objetiva, “corresponde a um conceito fortemente indeterminado;

apenas no caso concreto seria possível preenchê-lo, com valores e argumentos, de modo a compor

os necessários modelos de decisão.”

Com efeito, a autonomia da vontade e vetusta pacta sunt servanda, devem ser observados pelo

intérprete do contrato e pelos contratantes, com as limitações da boa-fé objetiva e a função social

do contrato.

Ressalte-se: “reconhecer que a imposição de princípios isolados nos negócios bilaterais, sem

levam em consideração o contexto do próprio sistema jurídico, é um indicativo de anacronismos

indesejáveis em detrimento daqueles que estão presentes nos polos mais vulneráveis das relações

contratuais.”43

Modernamente, há, porém, doutrinadores que rejeitam a expressão autonomia da vontade, por

entenderem que a vontade não é soberana e, por conta disso, preferem o termo autonomia

privada. Grosso modo, entendemos que esta terminologia tem o mesmo significado da autonomia

da vontade relativizada atualmente considerada por grande parte da doutrina. A vantagem é que a

expressão autonomia privada não exige mais falar em limitação da vontade dos contratantes, pois

este termo já está esculpido no sentido de liberdade relativa da vontade das partes do contrato

que assim agem em decorrência da boa-fé e da função social dos contratos.”44

Elementos Essenciais do Contrato de Compra e Venda - Parte 17 de 22

Tem-se, assim, que orquestração dos princípios da autonomia privada, da função social dos

contratos e da boa-fé objetiva, a vontade dos contratantes encontra-se limitada por força de

paradigmas principiológicos.

Page 22: Matéria de Compra e venda

Disposições Legislativas Expressas Limitativas da Vontade nos Contratos de Compra

e Venda

É nossa empresa neste item destacarmos as mais relevantes limitações da vontade dos

contratantes nos contratos de compra e venda. Contudo, assim prosseguiremos a partir do direito

positivo em vigor.

a. Compra e Venda Realizada entre Ascendentes e Ascendentes

Observe a bela imagem acima. Pelo nosso sistema jurídico não é possível que o pai acima

representado, celebre contrato de compra e venda com o filho, sem que, para a sua validade,

sejam observados os preceitos legais, fora a representação. Observemos os pormenores dos

critérios legislativos para a compra e venda entre ascendente e descendente.

Com vistas à proteção da sociedade familiar, dispõe o artigo 496 do Código Civil, que é

anulável a compra e venda de ascendente a descendente que não conte com o

consentimento expresso dos demais descendentes e do cônjuge do vendedor (nesta

hipótese, a imposição legal dependerá do regime de bens adotado pelos cônjuges).

Observemos, nesta linha de raciocínio, a letra do texto invocado:

“Art. 496. É anulável a venda de ascendente a descendente, salvo se os outros descendentes

e o cônjuge do alienante expressamente houverem consentido.

Parágrafo único. Em ambos os casos, dispensa-se o consentimento do cônjuge se o regime

de bens for o da separação obrigatória.”

Embora o legislador tenha expresso interesse de proteger a igualdade entre a distribuição

dos quinhões hereditários entre os descendentes, a norma inquina de nulidade do negócio

jurídico. Assim, o interesse em alcançar a anulação do contrato de compra e venda fica,

resguardado, à esfera privada. Desse modo, o negócio poderá ou não ser questionado pelo

herdeiro prejudicado, ou seja, em última instância a decisão está no âmbito privado.

Page 23: Matéria de Compra e venda

Elementos Essenciais do Contrato de Compra e Venda - Parte 18 de 22

Com vistas à proteção da sociedade familiar, dispõe o artigo 496 do Código Civil, que é

anulável a compra e venda de ascendente a descendente que não conte com o

consentimento expresso dos demais descendentes e do cônjuge do vendedor (nesta

hipótese, a imposição legal dependerá do regime de bens adotado pelos cônjuges).

Observemos, nesta linha de raciocínio, a letra do texto invocado:

“Art. 496. É anulável a venda de ascendente a descendente, salvo se os outros descendentes

e o cônjuge do alienante expressamente houverem consentido.

Parágrafo único. Em ambos os casos, dispensa-se o consentimento do cônjuge se o regime

de bens for o da separação obrigatória.”

Embora o legislador tenha expresso interesse de proteger a igualdade entre a distribuição

dos quinhões hereditários entre os descendentes, a norma inquina de nulidade do negócio

jurídico. Assim, o interesse em alcançar a anulação do contrato de compra e venda fica,

resguardado, à esfera privada. Desse modo, o negócio poderá ou não ser questionado pelo

herdeiro prejudicado, ou seja, em última instância a decisão está no âmbito privado.

Precisa aqui é a doutrina de Caio Mário da Silva Pereira que, com acerto, afirma que “os

descendentes, cujo consentimento se requer, são os herdeiros necessários ao tempo do

contrato, vale dizer, os mais próximos em grau, salvo o direito de representação. Os não

reconhecidos no momento da venda não têm de ser ouvidos, porque somente o ato de

reconhecimento tem o efeito de converter a situação fática em status jurídico”.45

Por fim, há de se consignar que, nos termos do artigo 179 do Código Civil, o prazo para

anulação do contrato jurídico de compra e venda envolvendo ascendente e descendente sem

as anuências impostas pelo artigo 496 do mesmo Código é de 2 anos. Eis a letra da lei: “art.

179. Quando a lei dispuser que determinado ato é anulável, sem estabelecer prazo para

pleitear-se a anulação, será este de dois anos, a contar da data da conclusão do ato”.

Page 24: Matéria de Compra e venda

Fica, assim, demonstrada uma hipótese de limitação da vontade dos contratantes quando o

contrato envolver a compra e venda entre ascendentes e descendentes.

Elementos Essenciais do Contrato de Compra e Venda - Parte 19 de 22

b. Compra e venda de bens imóveis em que o alienante seja pessoa casada

Não basta a capacidade geral constante nos artigos 3º e 4º do Código Civil para que o

alienante esteja autorizada a entabular contratos de compra e venda. Nesse campo, por

expressa disposição legal, encontramos mais uma hipótese de limitação à vontade.

A respeito da limitação em tela, relevante transcrever abaixo o conteúdo dos artigos 1.647, I;

1.648 e 1.656 do Código Civil:

“Art. 1.647. Ressalvado o disposto no art. 1.648, nenhum dos cônjuges pode, sem

autorização do outro, exceto no regime de separação absoluta:

I – alienar ou gravar de ônus real os bens imóveis;

(...)

Art. 1.648. Cabe ao juiz, nos casos do artigo antecedente, suprir a outorga, quando um dos

cônjuges a denegue sem motivo justo, ou lhe seja impossível concedê-la.

Art. 1.656. No pacto antenupcial, que adotar o regime de participação final nos aquestos,

poder-se-á convencionar a livre disposição dos bens imóveis, desde que particulares”.

Pelo disposto nos textos legislativos acima, observa-se que há limitação da vontade na

compra e venda envolvendo pessoas casadas e, por outro lado, o objeto da venda for bem

imóvel. Não se reproduz, contudo, limitação desta natureza quando da reação jurídica de

compra e venda for um ou mais bens móveis.

Page 25: Matéria de Compra e venda

Pelo que observamos, a intenção do legislador foi a de preservar o patrimônio do casal.

Entretanto, entendemos que o ideal seria a limitação pelo valor do bem. Haja vista que,

atualmente, há bens móveis que superam o valor de determinados bens imóveis. Esta

limitação era compreensível no modelo econômico em que os bens imóveis reinavam

soberanos no cotidiano da economia familiar.

Com efeito, nos dias atuais, principalmente nos locais em que os imóveis são pouco

valorizados, é possível considerar a possibilidade de casais serem titulares de bens móveis

dotados de valores superiores ao bem imóvel da sociedade familiar.

Elementos Essenciais do Contrato de Compra e Venda - Parte 20 de 22

c. Compra e venda entre cônjuges

De igual modo, encontramos na legislação pátria limitação à vontade de contratar quando a

compra e venda envolver cônjuges. A respeito, impõe o artigo 499 do Código Civil: “é lícita a

compra e venda entre cônjuges com relação aos bens excluídos da comunhão”.

Ao discorrer sobre essa limitação, Maria Helena Diniz, ressalta que “os consortes não

poderão, em regra, efetivar contrato entre si, pois a compra e venda entre marido e mulher

está proibida; se o regime matrimonial for o da comunhão universal, ter-se-á uma venda

fictícia, pois os bens do casal são comuns e ninguém pode comprar o que já Le pertence.

Todavia, mesmo nesse regime, ou se outro for o regime matrimonial, tal venda, desde que

efetiva e real e que não venha a ferir direitos de terceiros, será lícita, relativamente aos bens

particulares (CC, arts. 499, 1.659 e 1.668)”.46

d. Compra e Venda entre Condôminos

Quando nos referimos a limitação da vontade relacionada ao condomínio de coisas

indivisíveis, imediatamente vem à mente o artigo 504 do Código Civil. Desse modo, vale

trazer à colação o referido comando normativo, conforme segue:

“Art. 504. Não pode um condômino em coisa indivisível vender a sua parte a estranhos, se

outro consorte a quiser, tanto por tanto. O Condômino, a quem não se der conhecimento da

Page 26: Matéria de Compra e venda

venda, poderá, depositando o preço, haver para si a parte vendida a estranhos, se o requerer

no prazo de cento e oitenta dias, sob pena de decadência.

Parágrafo único. Sendo muitos os condôminos, preferirá o que tiver benfeitorias de maior

valor e, a falta de benfeitorias, o de quinhão maior. Se as partes forem iguais, haverão a

parte vendida os comproprietários, que a quiserem, depositando previamente o preço.”

Elementos Essenciais do Contrato de Compra e Venda - Parte 21 de 22

Alerta Caio Mário da Silva Pereira que a regra do artigo 504 do Código Civil não se aplica ao

condomínio edilício. Observemos, neste sentido, as suas palavras:

“não se aplica o princípio ao caso de veda de unidade em edifício submetido ao regime de

condomínio edilício, porque,em tal sistema, o escopo preponderante é a propriedade

exclusiva da unidade, ao mesmo passo que o condomínio sobre o solo e partes comuns

somente existe em atenção ao objetivo de proporcionar a utilização efetiva da parte

exclusiva. E, como a co-propriedade é mero veículo de realização do direito individual, a

venda do apartamento, mesmo se a convenção do condomínio dispuser em contrário, pode

ser livremente feita, sem a restrição do artigo 504.”47

Portanto, nos termos da correta lição acima, a limitação da vontade não é absoluta quando

estivermos diante de condomínios edilícios.

No mais, aplica-se in totum o teor do artigo 504 do Diploma Privado.

e. A vedação da vontade na compra e venda realizada por gestores de coisas alheias

Eis mais uma hipótese legal de limitação do vontade nos contratos de compra e venda. Como

o título deste item está a demonstrar, trata-se, in casu, de vedação relacionada aos gestores

de coisas alheias. Recorramos à norma legal que, na espécie, encontra-se regulamentada

nos artigos 497 e 498 do Código Civil:

Page 27: Matéria de Compra e venda

“Art. 497. Sob pena de nulidade, não podem ser comprados, ainda eu em hasta pública:

I – pelos tutores, curadores, testamenteiros e administradores, os bens confiados à sua

guarda ou administração;

Elementos Essenciais do Contrato de Compra e Venda - Parte 22 de 22

II – pelos servidores públicos, em geral, os bens ou direitos da pessoa jurídica a que servirem,

ou que estejam sob sua administração direta ou indireta;

III – pelos juízes, secretários dos tribunais, arbitradores, peritos e outros serventuários u

auxiliares da justiça, os bens ou direitos sobre que se litigar em tribunal, juízo ou conselho,

no lugar onde servirem, ou a que se estender a sua autoridade;

IV – pelos leiloeiros e seus prepostos, os bens de cuja venda estejam encarregados.

Parágrafo único. As proibições deste artigo, estende-se à cessa de crédito. Art. 498. A

proibição contida no inciso III do artigo antecedente, não compreende os casos de compra e

venda ou cessão entre coerdeiros, ou em pagamento de dívida, ou para garantia de bens já

pertencentes a pessoas designadas no referido inciso.”

Pelo que se observa acima, a sanção para os contratos de compra e venda que não

observarem os preceitos de ordem pública contidos nos artigos 497 e 498 é a culminação de

nulidade ao negócio jurídico. Não há, portanto, de se falar em convalidação do ato. Desse

modo, tais contratos serão considerados nulos de pleno direito.

São estas as principais vedações relacionadas a limitação da vontade nos contratos de compra e

venda. Sugerimos que o operador do direito esteja atendo a cada uma delas, bem como, nos casos

de anulabilidade, os prazos decadenciais relacionados à espécie.

Diante das considerações acima, voltemos nossa atenção a classificação do contrato de compra e

venda, bem como a temática das obrigações geradas por essa modalidade contratual. São estes

os assuntos do capítulo abaixo.

Classificação dos Contratos de Compra e Venda - Parte 1 de 7

Page 28: Matéria de Compra e venda

Anotamos, a princípio, que o presente capítulo carrega em seu bojo uma dimensão prática

extremamente acentuada, na medida em que trabalharemos com a própria razão de ser o

contrato de compra e venda, sendo que assim faremos a partir de sua estrutura ontológica. Vale

assim, dizer quando nos ocupamos da classificação de um instituto jurídico, bem como dos direitos

e obrigações dele recorrentes, estamos nos referindo a sua própria estrutura. Ou seja, nos

lançamos no campo da exploração de seus pormenores mais relevantes.

Feitas as considerações acima, prossigamos para o nosso alvo.

De acordo com tradicional caracterização, os contratos de compra e venda são compreendidos

como i) bilaterais; ii) onerosos; iii) em regra, comutativos; iv) em regra, consensuais; e, v)

instrumento de natureza pessoal, não transferindo imediatamente o domínio da coisa. Seguem-se

os pormenores de cada uma destas características.

1. BILATERAIS

Entende-se que os contratos de compra e venda são bilaterais pelo fato de que é da sua

essência que cada um dos contratantes assumem obrigações recíprocas. De modo, que cada

uma delas assumirá direitos e obrigações a serem atendidas na execução do pacto. Essa

bilateralidade faz parte da própria estrutura do contrato, bem como da sua disposição

legislativa elementar.

Encontramos nos contratos de compra e venda a obrigatoriedade de duas partes distintas,

não sendo necessariamente duas pessoas na somatória dos sujeitos participantes do pacto.

Assim, é perfeitamente possível que em ambos os polos haja uma ou mais pessoas.

Classificação dos Contratos de Compra e Venda - Parte 2 de 7

A bilateralidade está estampada no artigo de abertura às normas legislativas a respeito dos

contratos de compra e venda. Segue-se, neste sentido, o teor do artigo 481 do Código Civil,

já comentado em momento anterior. “Pelo contrato de compra e venda, um dos contratantes

se briga a transferir o domínio de certa coisa, e o outro, a pagar-lhe certo preço em

dinheiro”.

Page 29: Matéria de Compra e venda

Em comentário a bilateralidade dos contratos em geral, Barros Monteiro, apresenta os

seguintes argumentos, senão vejamos:

“contratos bilaterais são aqueles que criam obrigações para ambas as partes e essas

obrigações são recíprocas; cada uma das partes fica adstrita a uma prestação (ultro citroque

obligatio). É o que acontece com a compra e venda, em que o vendedor fica obrigado a

entregar alguma coisa ao outra contratante, enquanto este, por seu turno, se obriga a pagar

o preço ajustado. Como bem se percebe, as obrigações criadas pelo contrato bilateral

recaem sobre ambos os contratantes; cada um destes é ao mesmo tempo credor e devedor;

o vendedor deve a coisa alienada, mas é credor do preço; o comprador, por sua vez, é

devedor do preço, mas credor da coisa adquirida.”48

Ao comentar as consequências mais proeminentes da bilateralidade do contrato, continua

afirmando o mestre em referência que “a) qualquer dos contratantes pode utilizar-se, nos

contratos bilaterais, da exceção non adimpleti contractus, incabível, no entanto, em

contratos unilaterais; b) – nos primeiros, subentendida está a cláusula resolutiva tácita. Em

regra, só nos bilaterais tem cabimento a ação de resolução; c) – se ocorrer o perecimento da

coisa devida, sendo corpo certo, perece a obrigação de entregá-la, eliminando-se igualmente

a contraprestação”.49

2. ONEROSOS

Essa classificação está muito próxima ao que anotamos relativamente à condição de

bilateralidade dos contratos de compra e venda. Isso se dá pelo fato de que,

tradicionalmente, se entende que todo contrato bilateral é também oneroso.

Segundo pondera Venosa “nos contratos onerosos, pois, ambos os contratantes têm direitos

e deveres, vantagens e obrigações; a carga ou responsabilidade contratual está repartida

entre eles, embora nem sempre em igual nível.

Classificação dos Contratos de Compra e Venda - Parte 3 de 7

As partes concedem-se reciprocamente direitos e reciprocamente contraem obrigações. A

onerosidade identifica-se primordialmente pela contraprestação que se segue á prestação,

Page 30: Matéria de Compra e venda

pela vantagem que decorre de um sacrifício do contratante. Pode ocorrer que o dever de um

dos contratantes esteja em âmbito maior que o do outro. Como contratos onerosos temos a

permuta, a compra e venda, locação, empreitada etc.”50

A seu turno, Cunha Bueno leciona que o contrato de compra é venda é oneroso “pois cada

um dos contraentes tem de dar ao outro o equivalente do que recebe, sendo uma das

prestações, necessariamente, em dinheiro”.51

3. EM REGRA, COMUTATIVOS

O contrato de compra e venda é, a princípio, comutativa na medida em que as prestações e

contraprestação são certas e determinadas no momento da avença. Desse modo que os

contraentes, imediatamente, têm conhecimento da sua cota de sacrifício e participação no

pacto entre eles celebrado.

Na doutrina de Carlos Roberto Gonçalves, encontramos a seguinte assertiva: cumulativos são

os contratos “de prestações certas e determinadas. As partes podem antever as vantagens e

os sacrifícios, que geralmente se equivalem, decorrentes de sua celebração, porque não

envolvem nenhum risco. Na ideia de comutativadade está presente a de equivalência das

prestações, pois, em regra, nos contratos onerosos, cada contraente somente se sujeita a um

sacrifício se receber, em troca, uma vantagem equivalente.”52

E, no mesmo fôlego, continua o mestre: “todavia, pode não haver equivalência objetiva, mas

subjetiva, existente apenas no espírito dos contraentes, e não necessariamente na realidade,

visto que cada qual é juiz de suas conveniências e interesses. Assim, na compra e venda, por

exemplo, o vendedor sabe que irá receber o preço que atende aos seus interesses, e o

comprador, que lhe será transferida a propriedade do bem que deseja adquirir.”53

Classificação dos Contratos de Compra e Venda - Parte 4 de 7

As partes concedem-se reciprocamente direitos e reciprocamente contraem obrigações. A

onerosidade identifica-se primordialmente pela contraprestação que se segue á prestação,

pela vantagem que decorre de um sacrifício do contratante. Pode ocorrer que o dever de um

Page 31: Matéria de Compra e venda

dos contratantes esteja em âmbito maior que o do outro. Como contratos onerosos temos a

permuta, a compra e venda, locação, empreitada etc.”50

A seu turno, Cunha Bueno leciona que o contrato de compra é venda é oneroso “pois cada

um dos contraentes tem de dar ao outro o equivalente do que recebe, sendo uma das

prestações, necessariamente, em dinheiro”.51

3. EM REGRA, COMUTATIVOS

O contrato de compra e venda é, a princípio, comutativa na medida em que as prestações e

contraprestação são certas e determinadas no momento da avença. Desse modo que os

contraentes, imediatamente, têm conhecimento da sua cota de sacrifício e participação no

pacto entre eles celebrado.

Na doutrina de Carlos Roberto Gonçalves, encontramos a seguinte assertiva: cumulativos são

os contratos “de prestações certas e determinadas. As partes podem antever as vantagens e

os sacrifícios, que geralmente se equivalem, decorrentes de sua celebração, porque não

envolvem nenhum risco. Na ideia de comutativadade está presente a de equivalência das

prestações, pois, em regra, nos contratos onerosos, cada contraente somente se sujeita a um

sacrifício se receber, em troca, uma vantagem equivalente.”52

E, no mesmo fôlego, continua o mestre: “todavia, pode não haver equivalência objetiva, mas

subjetiva, existente apenas no espírito dos contraentes, e não necessariamente na realidade,

visto que cada qual é juiz de suas conveniências e interesses. Assim, na compra e venda, por

exemplo, o vendedor sabe que irá receber o preço que atende aos seus interesses, e o

comprador, que lhe será transferida a propriedade do bem que deseja adquirir.”53

Classificação dos Contratos de Compra e Venda - Parte 5 de 7

Afirmamos, outrossim, no título deste item que os contratos de compra e venda são, em

regra comutativos. Essa assertiva se refere ao fato de que a legislação em vigor permite que,

pelo alvitre das partes, o contrato de compra e venda, no que diz respeito coisa, carregue

natureza aleatória.

Page 32: Matéria de Compra e venda

Vale recordar que os contratos aleatórios são assim identificados em razão do fato de que

“as prestações de uma ou de ambas as partes são incertas, porque sua quantidade ou

extensão está na dependência de um ato futuro e imprevisível (alea) e pode redundar numa

perda, em vez de lucro”.54

Relativamente aos contratos de compra e venda, a sua condição aleatória ocorrerá na

hipótese em que o seu objeto for coisa incerta, ou coisa futura. Contudo, nos termos do

artigo 483 do Código Civil, mister considerar que “a compra e venda pode ter por objeto

coisa futura. Neste caso, ficará sem efeito o contrato se esta não vier a existir, salvo se a

intenção das partes era de concluir contrato aleatório”.

4. EM REGRA, CONSENSUAL

Interessa, de imediato, considerar que o contrato consensual é aquele em que basta a

vontade das partes para a sua perfeita formação. Desse modo, como regra, os contratos de

compra e venda apresentam natureza consensual.

Na lição de Fábio Ulhoa Coelho, podemos afirmar que consensuais “são os contratos para

cuja constituição não se exige nada além do encontro de vontade dos contratantes. A

generalidade dos contratos insere-se nessa categoria. A compra e venda em geral, por

exemplo, aperfeiçoa-se com o acordo, entre as partes, sobre preço e objeto”.55

Afirmamos que o contrato de compra e venda é, em regra, consensual pois, em alguns, casos

a lei exige uma forma específica. É o que ocorre nos pactos de compra e venda de bens

imóveis de montante acima de 30 vezes o maior salário-mínimo vigente. Neste sentido, reza

o artigo 108 do Código Civil:

“Art. 108. Não dispondo a lei em contrário, a escritura pública é essencial à validade dos

negócios jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de

direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário-mínimo vigente

no País”

Desse modo, sempre que o contrato de compra e venda de bem imóvel ultrapassar o valor

de trinta vezes o maior salário-mínimo vigente, ele assumirá natureza formal, pois, o seu

instrumento será por meio de escritura pública.

Page 33: Matéria de Compra e venda

Classificação dos Contratos de Compra e Venda - Parte 6 de 7

5. INSTRUMENTO DE NATUREZA PESSOAL

Tivemos a oportunidade de verificarmos que, em nosso ordenamento jurídico, o contrato de

compra e venda não é instrumento hábil para provocar, por si só, a transferência do domínio.

Isto porque, nas brumas do direito brasileiro, o legislador e a doutrina optaram pela adoção

do sistema de tradição germânico-romano. Em que, o contrato de compra e venda surge

como uma antessala para a transferência do domínio.

Podemos afirma a existência de três modelos contemporâneos a respeito da força do

contrato de compra e venda, concernente à transferência ou não do domínio da coisa

alienada. Temos assim o modelo francês, o alemão e o soviético.

De acordo com Washington de Barros Monteiro, o modelo francês, “inaugurado pelo Código

Napoleão, art. 1.582, o contrato cria ao mesmo temo o vínculo obrigacional e transfere o

domínio da coisa vendida (nudus consensus parit proprietatem). O sistema francês apartou-

se destarte da tradição romana, expressa pela máxima traditionibus et usucapinibus dominia

rerum, non nudis pactis, trasnferuntur.”56

Assim, no sistema francês, o contrato de compra e venda transfere, imediatamente o

domínio da coisa objeto do pacto. Portanto, não há necessidades de procedimentos outros

com para alcançar este propósito.

Por outro lado, no sistema alemão, há de se consignar que o contrato não transfere a

propriedade, mas gera apenas obrigações de natureza pessoal aos contraentes. Sobre este

sistema, socorremo-nos da precisa lição de Monteiro:

“para o sistema alemão (BGB, art. 433), que volveu à inspiração romana, o contrato gera

exclusivamente uma obrigação de dar, por ele assume o vendedor apenas obrigação ad

tradendum; a transferência do domínio depende de outro ato relevante, a tradição da coisa

vendida.

Page 34: Matéria de Compra e venda

Anote-se, no entanto, para logo, a existência de certa diferença entre o sistema germânico e

o romano; contentava-se este com a simples transferência da posse; o vendedor obrigava-se

a procurar para o comprador a vácua possiossionis da res, isto é, sua disponibilidade,

enquanto o alemão visa à transferência da propriedade”.57

Classificação dos Contratos de Compra e Venda - Parte 7 de 7

Por fim, o sistema soviético pode ser compreendido como uma estrutura híbrida. Nele, “que

não se prende nem ao contrato, nem à traditio, exclusivamente, como princípio geral

transmissor da propriedade. Por esse sistema, que, aliás, não é original, os dois modos de

aquisição são dotados de igual valor, porque tem cada um deles o próprio campo de

aplicação. Realmente, quanto às coisas individualmente determinadas, a propriedade se

adquire no momento em que se conclui o contrato; quanto às coias determinadas apenas

pelo gênero (que se contam, se pesam ou se medem), a aquisição é diferida para o instante

da tradição.”58

Há de se ressaltar, desde logo, que o sistema brasileiro adotou a tradição germânico-romana.

Sendo que, o contrato de compra e venda causa, no instante de sua celebração, uma

obrigação de dar. Ou seja, o contrato de compra e venda em nosso sistema, tem natureza de

direito pessoal, na medida que o direito real somente se concretizará por meio da tradição,

no caso de bens móveis, ou da transcrição do título, na hipótese dos bens imóveis.

Direitos e Obrigações Descorrentes dos Pactos de Compra e Venda - Parte 1 de 12

Dicotomia Elementar dos Direitos dos Contratantes

Os contratos, de um modo geral, são considerados fontes do Direito. Com o contrato de compra e

venda essa máxima não segue em sentido diverso, eis que este tipo contratual gera um conjunto

de direitos aos pactuantes.

Seguem-se, abaixo, os principais direitos decorrentes do contrato de compra e venda. Entendemos

que direitos outros, decorrentes, por exemplo, de cláusulas especiais, serão apenas acessórios aos

dois direitos elementares abaixo elencados.

a. Direito do Alienante ao Recebimento do Preço

Page 35: Matéria de Compra e venda

Sendo o contrato de compra e venda bilateral por natureza, podemos, desde logo, registrar o

direito do alienante ao recebimento do preço da coisa estipulado no contrato.

O direito de receber o preço da coisa é tão marcante no contrato de compra e venda que, em

regra, e somente estará obrigado a entregar a coisa quando esse seu direito for satisfeito pelo

comprador. A exceção encontra-se no artigo 491 do Código Civil que assim disciplina: “não sendo

a venda a crédito, o vendedor não é obrigado a entregar a coisa antes de receber o preço”.

Note-se, pela estrutura do artigo 491, que o direito do vendedor receber o preço não se esgota

pelo fato de a venda ter sido realizada a prazo (ou na dicção da norma, a crédito). Mesmo a prazo,

naturalmente, o seu direito ao recebimento do preço persiste, nos termos pactuados no contrato.

Há de se considerar que o direito do alienante ao recebimento do preço, abre a oportunidade para

a obrigação do comprado ao correspondente pagamento da importância estipulada em contrato.

Neste caso, a obrigação principal de pagar o preço por parte do comprador, impõe ao vendedor a

obrigação de recebê-lo.

b. Direito do Comprador ao Recebimento da Coisa

Na medida em que o alienante tem direito ao recebimento do preço, o comprador tem o direito de

receber a coisa objeto do contrato de compra e venda. Esse direito do comprador decorre da

própria estrutura do contrato.

A propósito, estampa Ricardo Negrão que “correlatamente aos direitos do vendedor, ao comprador

é atribuído o de receber a coisa no lugar e modo contratados, inclusive o de reter o preço no caso

de mudança do estado econômico-financeiro do vendedor que ainda não lhe entregou a coisa

contratada”.59

Direitos e Obrigações Descorrentes dos Pactos de Compra e Venda - Parte 2 de 12

Caso o alienante não entregue a coisa, por mera desídia, o comprador poderá, inclusive, se utilizar

de instrumento processual que forçará o cumprimento da obrigação específica com vistas ao

cumprimento do pacto contratual. É possível pensar ainda na consequência de resolução do

contrato. Nesta senda, precisa é a síntese e exemplo apresentados por Ulhoa Coelho:

“o descumprimento, pelo vendedor, de sua obrigação principal dá ao comprador o direito de optar

entre a entrega da coisa e a resolução do contrato, alternativas sempre acompanhadas de perdas

e danos (CC, art. 475). Desse modo, se Antônio vendeu seu equipamento de som a Benedito e

assumiu a obrigação de transferir o domínio em uma semana, configura-se o inadimplemento se

Page 36: Matéria de Compra e venda

transcorrer o prazo sem a tradição da coisa. Em decorrência, Benedito pode optar por demandam

em juízo a entrega do equipamento adquirido ou dar por resolvido o contrato e pleitear a

devolução da parte do preço que tiver pago, sem prejuízo da indenização pelos danos sofridos.”60

O direito elementar de o comprador receber a coisa, impõe, em sentido contrário, a obrigação de o

alienante a entregá-la.

É interessante observar que o direito elementar de uma das partes do contrato constitui a outra

uma obrigação recíproca. Esse fato é da natureza bilateral dos contratos de compra e venda.

Efeitos Jurídicos Decorrentes do Contrato: Aspectos Gerais

Quando anotamos que o contrato de compra e venda é bilateral, nos colocamos diante do fato de

que há obrigações recíprocas assumidas pelos contratantes.

Anotamos, a princípio, que não pretendemos repetir os direitos e obrigações relatadas no item

anterior. Isso seria contraproducente nesta fase de nossa análise do contrato de compra e venda.

Direitos e Obrigações Descorrentes dos Pactos de Compra e Venda - Parte 3 de 12

Efeitos Jurídicos Decorrentes do Contrato: Aspectos Gerais

Quando anotamos que o contrato de compra e venda é bilateral, nos colocamos diante do fato de

que há obrigações recíprocas assumidas pelos contratantes.

Anotamos, a princípio, que não pretendemos repetir os direitos e obrigações relatadas no item

anterior. Isso seria contraproducente nesta fase de nossa análise do contrato de compra e venda.

É evidente que, devido a autonomia privada da vontade, as partes podem criar obrigações das

mais diversas nos pactos que tenham por objetivo a compra e venda de uma coisa, sob certo

preço e condições. Como exemplo, podemos citar a hipótese de uma cláusula contratual que

imponha ao vendedor a obrigação de entregar o imóvel ao comprador pintado na cor amarela.

Essa obrigação decorrente da cláusula do contrato é, naturalmente, acidental e, como se nota,

decorrerá o arbítrio dos contratantes.

Contudo, há um conjunto de obrigações mais proeminentes que fluem do contrato de compra e

venda. Nosso objetivo neste tópico é apresentam um rol, não exaustivo, das obrigações mais

relevantes na espécie contratual em comento. Prossigamos, neste sentido.

Page 37: Matéria de Compra e venda

Transferência da Coisa na Venda ad corpus e ad mensuram

Como vimos é direito do comprador receber a coisa objeto do contrato, sendo que, por outro lado,

é responsabilidade do alienante promover a sua transferência conforme os termos constantes no

contrato. Assim, a obrigação de transferência da coisa trata-se de efeito elementar os contratos de

compra e venda.

No entanto, o contrato de compra e venda poderá conter a obrigação de entrega da coisa

configurada em duas espécies, quais sejam: ad corpus e ad mensuram.

Direitos e Obrigações Descorrentes dos Pactos de Compra e Venda - Parte 4 de 12

Esta questão é interessante na medida em que deverá haver correspondência da coisa contida no

contrato com a coisa entregue pelo alienante. Caso contrário, em regra, quedará ele em mora.

No Código Civil, as disposições normativas gerais da compra e venda ad corpus e ad mensuram

encontram-se reunidas nos artigos 500 e 501:

“Art. 500. Se, na venda de um imóvel, se estipular o preço por medida de extensão, ou se

determinar a respectiva área, e esta não corresponder, em qualquer dos casos, às dimensões

dadas, o comprador terá o direito de exigir o complemento da área, e, não sendo isso

possível, o de reclamar a resolução do contrato ou abatimento proporcional ao preço.

§ 1o Presume-se que a referência às dimensões foi simplesmente enunciativa, quando a

diferença encontrada não exceder de um vigésimo da área total enunciada, ressalvado ao

comprador o direito de provar que, em tais circunstâncias, não teria realizado o negócio.

§ 2o Se em vez de falta houver excesso, e o vendedor provar que tinha motivos para ignorar

a medida exata da área vendida, caberá ao comprador, à sua escolha, completar o valor

correspondente ao preço ou devolver o excesso.

§ 3o Não haverá complemento de área, nem devolução de excesso, se o imóvel for vendido

como coisa certa e discriminada, tendo sido apenas enunciativa a referência às suas

dimensões, ainda que não conste, de modo expresso, ter sido a venda ad corpus. Art. 501.

Decai do direito de propor as ações previstas no artigo antecedente o vendedor ou o

comprador que não o fizer no prazo de um ano, a contar do registro do título. Parágrafo

Page 38: Matéria de Compra e venda

único. Se houver atraso na imissão de posse no imóvel, atribuível ao alienante, a partir dela

fluirá o prazo de decadência.”

A partir dos preceitos dos artigos acima expressos, vamos, pois, à exposição das duas ad corpus e

ad mensuram formas de apresentação da coisa objeto do contrato de compra e venda:

a. Compra e venda ad corpus

Em muitos momentos quem adquire um terreno em um grande centro urbano, por exemplo, tem

uma preocupação considerável com as medidas do imóvel. Mas nem sempre é assim. Situações

diversas demonstram que o objeto do contrato não diz respeito diretamente as suas medidas e,

por conta disso, o pacto de compra e venda estará mais relacionado à coisa em si do que as suas

medidas. Esse é o cenário da compra e venda ad corpus.

Direitos e Obrigações Descorrentes dos Pactos de Compra e Venda - Parte 5 de 12

Estabelece o parágrafo 3º do artigo 500 do Código Civil que: “não haverá complemento de área,

nem devolução de excesso, se o imóvel for vendido como cosia certa e discriminada, tendo sido

apenas enunciativa a referências às suas dimensões, ainda que não conste, de modo expresso, ter

sido a venda ad corpus.”

Ao comentar a disposição legal acima, evidencia Gonçalves que “nessa espécie de venda o imóvel

é adquirido como um todo, como corpo certe e determinado (p. ex., Chácara Palmeiras),

caracterizado por suas confrontações, não tendo nenhuma influência na fixação do preço as suas

dimensões. Presume-se que o comprador adquiriu a área pelo conjunto que lhe foi mostrado e não

em atenção à área declarada. Certas circunstâncias, como a expressão ‘tantos alqueires mais ou

menos’, a discriminação dos confrontantes e a de se tratar de imóvel urbano totalmente murado

ou quase todo cercado, evidenciam que a venda foi ad corpus.”61

Alerta Monteiro que “na venda ad corpus, compreensiva de corpo certo e individualizado,

presume-se que o comprador examinou as divisas do imóvel, tendo intenção de adquirir

precisamente o que dentro delas se continha. A referência à metragem ou à extensão superficial é

meramente acidental e o preço é global, pago pelo todo, abrangendo a totalidade da coisa. (...) Em

se tratando de venda individuada, em que foi apenas enunciativa a referência à suas dimensões,

prevalece aquela presunção, que é júris et de jure; entende-se que o comprador percorreu o

imóvel, conheceu sua extensão, verificou as divisas. Comprou-o afinal, não em atenção à área

declarada, mas pelo conjunto que lhe foi mostrado, conhecido e determinado.”62

Page 39: Matéria de Compra e venda

Ademais, é relevante considerar o critério legislativo para a determinação se a venda, de fato, foi

ad corpus. A questão é significativa, na medida em que encontre-se na área diferença em suas

medidas e não haja disposição contratual a respeito da modalidade da compra e venda. Há, neste

sentido, presunção legal que dá luz ao tema, senão vejamos: “Presume-se que a referência às

dimensões foi simplesmente enunciativa, quando a diferença encontrada não exceder de um

vigésimo da área total enunciada, ressalvado ao comprador o direito de provar que, em tais

circunstâncias, não teria realizado o negócio” (art. 500, §1º).

b. Compra e Venda ad mensuram

Diferentemente da compra e venda ad corpus, em que não se dá atenção às proporções da coisa

como elemento essencial do negócio, na compra e venda ad mensuram, o cerne do pacto

contratual são as suas medidas.

Em sede de definição, vale destacar que “trata-se de venda ad mensuram, em que o preço é

estipulado com base nas dimensões do imóvel (p. ex., tal preço por alqueire). A venda é ad

mensuram, pois, quando se determina o preço de cada unidade, de cada alqueire, hectare ou

metro quadrado. Se se verifica, em posterior medição, que a área não corresponde às dimensões

dadas, tem o comprador o direito de exigir sua complementação. Somente se esta não for possível

(pois não se oferece uma tríplice alternativa), por não ter o vendedor área remanescente contígua,

é que se abre para aquele a opção de reclamar a resolução do contrato ou abatimento

proporcional ao preço”.63

Direitos e Obrigações Descorrentes dos Pactos de Compra e Venda - Parte 6 de 12

Pelo que se observa, salta aos olhos que a venda ad mensuram, diante da inadequação da coisa

entregue com os termos do contrato de compra e venda, abre-se ao comprador, a princípio, uma

entre as três alternativas abaixo:

Abatimento proporcional do preço;

Complementação da área;

Resolução do contrato.

Não é demais considerar que, em qualquer uma das hipóteses acima, em decorrência da

inadimplência obrigacional do alienante, o comprador terá também direito a reparação por perdas

e danos.

Ainda quanto as opções advindas do descumprimento do vendedor em entregar a coisas no exata

medida constante no contrato de compra e venda, vale aqui registrar a síntese de Ulhoa Coelho:

Page 40: Matéria de Compra e venda

“na venda ad mensuram, o objeto do contrato é uma determinada extensão de terra. Nesse caso,

se entre as dimensões referidas no instrumento e as entregues houver discrepância em prejuízo

do comprador, ele pode exigir a complementação da área, se for isso possível ao vendedor. Trata-

se da ação ex empto, cujo exercício deve ser feito no prazo decadencial de um ano a contar do

registro (CC, art. 501). Não dispondo o vendedor de terras contíguas suficientes a dar o

complemento, o comprador poderá optar entre a resolução do contrato e o abatimento

proporcional do preço (art. 500).”64

Prossegue, ainda, o citado doutrinador: “tolera-se no máximo uma diferença de 5% do total da

área mencionada no contrato ad mensuram. Nessa margem percentual, para ter direito à

complementação, resolução ou abatimento, o comprador deve provar que não teria realizado o

negócio se soubesse das reais dimensões do imóvel (§1º). Se, por outro lado, a divergência for em

prejuízo do vendedor, o comprador pode optar entre devolver o excesso e complementar o preço

(§2º)”.65

c. Pacto ad corpus ou ad mensuram: Critério Legal Objetivo Para Diferenciação

À guisa de parâmetro para diferenciação dos pactos de compra e venda em que não haja

designação expressa se o contrato apresenta manifestação ad corpus ou ad mensuram, vale

considerar os apontamentos abaixo.

Nos comentários do artigo 500 do Código Civil, com acerto, afirma Simão que “a lei traz

um critério para diferenciar a venda ad corpus da ad mensuram se o contrato não

indicar qual tipo foi celebrado. Se a diferença entre a área real do imóvel e a área

constante no contrato não for superior a 1/20 (5%), a venda é considerada ad corpus e

o comprador nada poderá reclamar. Já se a diferença for maior que 1/20, a venda

presume-se ad mensuram e o comprador terá direito de reclamar”.66

Direitos e Obrigações Descorrentes dos Pactos de Compra e Venda - Parte 7 de 12

Continua o citado autor, agora em sede de exemplo, que, pelo seu conteúdo merece

registro: “Do contrato de compra e venda consta a medida de uma fazenda como sendo

de 1.000 alqueires. Entretanto, a medida real da área da fazenda é de 950 alqueires.

Como a diferença não é superior a 1/20 da área constante do contrato, a venda é

considerada ad corpus e o comprador nada poderia reclamar (nota-se que 50 é

exatamente 1/20 de 1.000). Já se a área real medisse 949 alqueires ou menos, a lei

Page 41: Matéria de Compra e venda

presumiria tratar-se de venda ad mensuram e garantiria ao comprador o direito de

reclamar”.67

Obrigações do Alienante e do Vendedor até a Transferência da coisa: Despesas com

a Tradição e os Riscos da Coisa

Como vimos alhures, o comprador tem o direito de receber a coisa do alienante. Diante disso, por

outro lado, nos deparamos com a obrigação do alienante em transferir a coisa ao comprador. A

relação é circular, portanto. Em função disso, cumpre-nos abordar, inicialmente, como ficam as

despesas com a transferência da coisa.

A princípio, a questão concernente as despesas da tradição, caso não haja cláusula contratual,

correrão em detrimento do alienante, por força do artigo 490 do Código Civil.

A respeito do tema em tela, que envolve diretamente a sorte da coisa até o instante da

transferência ao comprador, o direito positivo brasileiro estabelece, ainda, que

“Art. 492. Até o momento da tradição, os riscos da coisa correm por conta do vendedor, e os do

preço por conta do comprador.

§1º Todavia, os casos fortuitos, ocorrentes no ato de contar, marcar ou assinalar coisas, que

comumente se recebem, contanto, pesando, medindo ou assinalando, e que já tiverem sido postas

à disposição do comprador, correrão por conta deste.

§2º Correrão também por conta do comprador os riscos das referidas coisas, se estiver em mora

de as receber, quando postas à sua disposição no tempo lugar e pelo modo ajustados.”

Pelo que se observa da norma em tela, em de regra, na hipótese de a coisa que existia no

momento da celebração do contrato, mas deixa de existir, a solução que se mostra plausível é

considerar que o vendedor que, pelo pacto, assumiu a obrigação de dar a coisa ao comprador,

responderá por perdas e danos, com as ressalvas expressas no artigo 492.

Uma questão merece atenção: qual a consequência do perecimento da coisa se ela

existia no tempo imediato à celebração do contrato, mas por razões diversas ela deixou

de existir?

Direitos e Obrigações Descorrentes dos Pactos de Compra e Venda - Parte 8 de 12

Page 42: Matéria de Compra e venda

Diante da questão do perecimento da coisa antes da perfeita celebração do contrato, adequada é

a posição de Caio Mário da Silva Pereira: “se a coisa existia antes do contrato; mas perecera ao

tempo deste, é ele nulo por falta de objeto; se a destruição é parcial, abre-se ao comprador uma

alternativa de abandonar o negócio (resolução e não nulidade do contrato) ou pedir abatimento do

preço. Se o vendedor tinha conhecimento da destruição, e mesmo assim contratou, agiu de má-fé,

e está sujeito à reparação de perdas e danos”.68

Após a celebração do contrato, impõe-se em seu desfavor a sorte pelos riscos da coisa. Maria

Helena Diniz, ao comentar tema afeto ao artigo 492, acima transcrito, doutrina que:

“responsabilidade pelos riscos (perda, deterioração, desvalorização, qualquer perigo que a coisa

pode sofrer desde a conclusão do contrato até a sua entrega) e despesas, ante o fato de que, em

nosso direito, sem tradição ou registro não se tem transferência da propriedade. Pelo Código Civil,

art. 492, antes da tradição, ou registro, os riscos da coisa correrão por conta do vendedor e, as do

preço, por conta do comprador. Assim, o se o bem vier a se perder ou a se deteriorar após a

tradição, sem culpa do vendedor, este terá direito ao preço, sendo que o comprador é quem

sofrerá as consequências, pois houve transferência da propriedade”.69

Importa, ainda, registrar que, nos contratos de compra e venda, o alienante, salvo cláusula

contratual em contrário, responde por todos os débitos que gravarem a coisa até o momento da

tradição (CC, art. 502). Ressaltamos, outrossim, que este dispositivo não tem força para

obrigações propter rem, a exemplo dos impostos. No entanto, essa ressalva é para terceiros, v. g.,

o Estado nas obrigações tributárias, mas é efetiva na relação obrigacional entre os contraentes no

contrato de compra e venda.

Vale dizer: caso o comprador efetive o pagamento dos tributos, terá ele direito de reaver os

valores em face do alienante. Este é a regra, podendo haver exceção nos termos do contrato,

conforme preceitua o artigo 502, já mencionado.

Page 43: Matéria de Compra e venda

Em suma, em regra, as despesas com a tradição correm às expensas do vendedor, porquanto as

despesas com escrituração e registro correm às em detrimento do comprador. Por outro lado,

celebrado o contrato, os riscos incidentes sobre a coisa correm em desfavor do alienante,

porquanto os riscos do preço pendem para o comprador.

No mais, é de relevo considerar que “Art. 237. Até a tradição pertence ao devedor a coisa, com os

seus melhoramentos e acrescidos, pelos quais poderá exigir aumento no preço; se o credor não

anuir, poderá o devedor resolver a obrigação.” Por outro lado, nos termos do parágrafo único do

mesmo dispositivo, Os frutos percebidos são do devedor, cabendo ao credor os pendentes.

Contudo, nada impede, porém, que os contratantes firmem posição em sentido diverso.

Feitos os apontamentos acima, resta-nos discorrer sobre as obrigações após a transferência da

coisa. Este será o nosso objeto de reflexão no item abaixo.

Direitos e Obrigações Descorrentes dos Pactos de Compra e Venda - Parte 9 de 12

Obrigações do Alienante Após a Transferência da Coisa: Vícios Redibitórios e

Evicção

As obrigações do vendedor não se encerram com a transmissão da coisa. Não, em verdade,

mesmo após a transferência do domínio (por meio da tradição, nos casos dos bens móveis, ou no

caso do registro do título translativo de propriedade, nas hipóteses de contratos de compra e

venda que envolvam bens imóveis) persiste a obrigação do comprador em garantir a coisa.

Desse modo, o alienante, após a transferência da coisa, continua como o seu garante. Surgem,

neste sentido, a garantia pelos vícios redibitórios e sobre a evicção que eventualmente recaiam

sobre a coisa objeto dos contratos.

Ressaltamos, ainda, que o tratamento legislativo dos vícios redibitórios e aplicação da

responsabilidade por evicção encontram-se na parte da teoria geral dos contratos do Código Civil

e, por conseguinte, são perfeitamente aplicáveis aos contratos de compra e venda.

Os vícios redibitórios estão regulamentados entre os artigos 441 a 446, porquanto, a evicção está

disciplinada do artigo 447 a 457, todos do Código Civil em vigor. Anotamos, desde já, que uma

leitura dos artigos em referência é de rigor.

a. Vicios Redibitórios

Page 44: Matéria de Compra e venda

Estabelece, a respeito, o artigo 441 do Código Civil: “a coisa recebida em virtude de contrato

comutativo pode ser enjeitada por vícios ou defeitos ocultos, que a tornem imprópria ao uso a que

é destinada ou lhe diminuam o valor.”

Desse modo, em decorrência do artigo supra, há uma espécie de garantia genérica sobre toda a

coisa objeto de contrato comutativo. Nesta senda, afirma Venosa: “a garantia refere-se a vícios

ocultos na coisa, ao tempo da transmissão. Presume-se que o negócio não teria sido realizado, ou

teria sido realizado de outra forma, se o adquirente soubesse da existência do defeito na coisa. A

lealdade contratual manda que o transmitente alerte o adquirente da existência do vício. No

entanto, ainda que o vício seja desconhecido do próprio titular, os efeitos da teria aplicam-se como

consequência do princípio do equilíbrio das relações negociais (art. 443). Evidente que, como em

toda situação em que existe culpa, esta acarreta a indenização por perdas e danos, afora o

desfazimento do negócio ou o abatimento do preço...”.70

Direitos e Obrigações Descorrentes dos Pactos de Compra e Venda - Parte 10 de 12

Concernente aos requisitos para a aplicação da teoria dos vícios redibitórios e as suas

consequências, vale trazer à colação os requisitos da para a compreensão de sua incidência sobre

a coisa objeto do contrato de compra e venda. Para tanto, nos valeremos da precisa doutrina de

Ricardo Negrão, que segue no sentido de que o alienante, em juízo, deverá comprovar:

“(a) o prejuízo: que o vício ou defeito tornam imprópria a coisa para o uso que é destinada

ou lhe diminuem o valor a preexistência do vício;

(b) a preexistência: é necessário demonstrar que os defeitos preexistiam no momento da

celebração da compra e venda;

(c) o elemento subjetivo: refere-se ao comportamento do vendedor, sua boa ou má-fé

quanto ao conhecimento vício. A lei trata de modo mais severo o vendedor que age com

culpa, impondo àquele que conhecia o defeito a restituição do que recebeu (o preço), mais o

pagamento de perdas e danos. Para o vendedor que ignorava, quando da venda, o defeito,

basta a restituição do que recebeu acrescido das despesas do contrato (CC, art.443).”71

Observa-se, com efeito, que o alienante responderá pelos vícios ocultos existentes no momento da

celebração do contrato e que se manifestam em momento posterior a tal ato.

Desse modo, o vendedor responde pelos vícios, mas não responderá pelo desgaste da coisa. É em

função disso, é que incide o ônus do comprador em demonstrar que o vício é pretérito à

celebração do contrato.

Page 45: Matéria de Compra e venda

Vale, ainda, enfatizar que “não é qualquer vício que traduz em redibitório, senão aquele que torna

a coisa imprópria para o uso colimado no contrato, ou diminua-lhe o valor. Quem compra um

cavalo de corrida portador de uma moléstia respiratória, que o impede de correr, recebe o

semovente com vício oculto que o torna impróprio para o uso pretendido. Quem compra um

animal para abate, por outro lado, não pode ver nessa moléstia um vício redibitório. Este deve ser

grave, de acordo com o caso concreto, oculto e existente ao tempo da transmissão.”72

Do ponto de vista etimológico, para facilitar a compreensão da conhecida expressão vício

redibitório, merece consignar que “o termo vem do brocardo latino ‘redhibere est facere rursus

habeat venditor quod habuerit, redhibitio est apellata, quase redditio’ (D. 12, 1, fr 21, pr.). Porém,

conforme leciona Serpa Lopes, o termo vício redibitório é incompleto, pois a consequência da

existência do vício oculto não é a simples redibição do contrato, mas a possibilidade de

abatimento do preço por meio da ação quanti minoris.”73

Diante do que observamos acima, há de se consignar que a processualística nos apresenta dois

instrumentos destinados à discussão judicial do vício oculto incidente sobre a coisa. Há, assim

duas ações, conforme segue.

Direitos e Obrigações Descorrentes dos Pactos de Compra e Venda - Parte 11 de 12

Cite-se a ação redibitória, que tem por objetivo redibir o contrato, ou seja, resolvê-lo, tornando

os contratantes a condição anterior ao pacto. Nesse caso, objetiva-se que a coisa seja devolvida ao

alienante e, por conseguinte, seja o preço devolvido ao comprador.

O fundamento material da ação redibitória no artigo 443 do Código Civil que assim estabelece: “se

o alienante conhecia o vício ou o defeito da coisa, restituirá o que recebeu com perdas e danos; se

o não conhecia, tão somente restituirá o valor recebido, mais as despesas do contrato”

Há, ainda, a ação quanti minoris. Esta via processual tem por objetivo alcançar o abatimento

proporcional da coisa. “Esta faculdade não pode ser levada ao extremo de criar para adquirente

uma fonte de enriquecimento, mas deve ser de damno vitando, limitada a proporcionar ao

adquirente uma solução equitativa, que o resguarde de pagar pela coisa defeituosa o preço de

uma perfeita.”74

Por sua vez, o suporte de direito material para ação quanti minoris encontra-se no artigo 442 do

Código Civil, in verbis: “Em vez de rejeitar a coisa, redibindo o contrato (art. 441), pode o

adquirente reclamar abatimento no preço”.

Page 46: Matéria de Compra e venda

Assim, tanto a ação redibitória quanto a ação quanti minoris poderão ser movidas contra o

alienante após a transferência da coisa. Essa garantia está implícita, de modo acessório, nos

contratos de compra e venda.

Quanto a prescrição, há de se ressaltar o disposto no artigo 445 do Código Civil, in verbis:

“Art. 445. O adquirente decai do direito de obter a redibição ou abatimento no preço no

prazo de trinta dias se a coisa for móvel, e de um ano se for imóvel, contado da entrega

efetiva; se já estava na posse, o prazo conta-se da alienação, reduzido à metade.

§1º. Quando o vício, por sua natureza, só puder ser conhecido mais tarde, o prazo contar-se-á

do momento em que dele tiver ciência, até o prazo máximo de cento e oitenta dias, em se

tratando de bens móveis; e de um ano, para os imóveis.

§2º. Tratando-se de venda de animais, os prazos de garantia por vícios ocultos serão os

estabelecidos em lei especial, ou, na falta desta, pelos usos locais, aplicando-se o disposto no

parágrafo antecedente se não houver regras disciplinando a matéria.”

Para o artigo acima, adotamos, in totum, a lição de Venosa que assim se manifesta: “estabeleceu

o art. 445 o prazo de trinta dias para o adquirente obter a redibição ou abatimento do preço, se a

coisa for móvel, e de um ano se for imóvel, contado da entrega efetiva. O dispositivo acrescenta,

ainda, que se o adquirente já estava na posse da coisa, o prazo conta-se da alienação, mas

reduzido à metade”.75

Direitos e Obrigações Descorrentes dos Pactos de Compra e Venda - Parte 12 de 12

Continua, no mesmo fôlego, o mestre: “destarte, se o locatário, que já está na posse do imóvel,

vem a adquirir a coisa, seu prazo decadencial para a reclamação é reduzido para seis meses. Essa

inovação, contrariando a regra gral, não parece ser eficiente. Quem está na possa da coisa deve

conhecê-la devidamente e saber de seus vícios. Melhor seria que o legislador mantivesse os prazos

da regra geral nesses casos, computados, no entanto, desde o início efetivo da posse.”76

b. Evicção

De início, vale ressaltar que a termo evicção tem sua raiz do termo latino ex vincere que, em sua

acepção literal, significa vencer. Em decorrência disse, tem-se que evicção significa a perda da

coisa para o seu proprietário. Nesta dinâmica, tem-se manifesta irregularidade no domínio do

Page 47: Matéria de Compra e venda

alienante no contrato de compra e venda, de modo que ele obrigou-se a transferir direito além das

suas forças. Em outras palavras, o vendedor procurou transferir direito que, posteriormente,

verificou-se que ele não era detentor.

Em tais casos, o vendedor responde pelos efeitos da evicção que, eventualmente, recaia sobre a

coisa. A respeito, reza o artigo 447: “nos contratos onerosos, o alienante responde pela evicção.

Subsiste a garantia ainda que a aquisição se tenha realizado em hasta pública”.

Cláusula contratual poderá discutir os efeitos da evicção para o caso concreto. No entanto, o artigo

449 impõe regra em benefício do evicto, sempre que ele não tiver conhecimento exato de

eventuais litígios pendentes sobre a coisa objeto do contrato.

Verifique-se, neste sentido, a letra da norma em referência: “não obstante a cláusula que exclui a

garantia contra a evicção, se esta se der, tem direito o evicto a receber o preço que pagou pela

coisa evicta, se não soube do risco da evicção, ou, dele informado, não o assumiu”.

Nas palavras de Simão, na evicção há três partes diretamente envolvidas, a saber:

“evictor: o real proprietário que pretende reaver a propriedade perdida;

o evicto: aquele adquirente que tem a propriedade da coisa;

alienante: aquele que alienou o bem ao adquirente.”77

Como regra, nos termos do artigo 450 do Código Civil, salvo disposição contratual em contrário, o

evicto terá direito, além da restituição integral da quantia paga ou da quantia que pagou, a um

conjunto de reparações, quais sejam:

1. Indenização dos frutos que, em decorrência do comando judicial, tiver o dever de restituir ao evictor;

2. Indenização pelas despesas contratuais, bem como pelos prejuízos resultantes diretamente pela evicção;

3. Ao recebimento do valor correspondente aos honorários advocatícios e custas judiciais por ele suportados em decorrência do procedimento que originou a evicção.

Cláusulas Especiais nos Contratos de Compra e Venda - Parte 1 de 3

Além das cláusulas gerais, geradoras de direitos e obrigações aos contraentes, o Código Civil,

entre os artigos 505 a 532, prevê a possibilidade de cláusulas especiais nos contratos de compra e

venda. Analisaremos abaixo os principais tópicos relativos a esses pactos especiais.

Retrovenda

Page 48: Matéria de Compra e venda

A cláusula de retrovenda encontra-se regulamentada nos artigos 505 a 508 do Código Civil.

Por meio da cláusula de retrovenda “o vendedor de coisa imóvel pode reservar-se o direito de

recobrá-la no prazo máximo de decadência de três anos, restituindo o preço recebido e

reembolsando as despesas do comprador, inclusive as que, durante o período de resgate, se

efetuaram com a sua autorização escrita, ou para a realização de benfeitorias necessárias (CC, art.

505).

São as seguintes características do pacto de retrovenda:

a. É cláusula especial em contrato de compra e venda de bens imóveis, decorrente de autonomia privada.

b. O prazo máximo do pacto é de três anos, tornando-se sem efeito prazo maior.c. Trata-se de direito potestativo do alienante que, após o registro no Registro de Imóveis,

será oponível a terceiros.d. O direito de exercício da retrovenda (direito de resgate) é transmissível por disposição

causa mortis.e. Os lucros (frutos e rendimentos) do bem pertencem ao comprador.f. O perecimento do bem imóvel, por motivo de caso fortuito ou força maior, expira o

direito à retrovenda.

g. A recusa de cumprimento da cláusula, abre oportunidade de ação reivindicatória em faço de comprador renitente.

Venda a Contento e Sujeita a Prova

O Código Civil prevê dois tipos de cláusulas especiais entre os artigos 509 a 512. São elas a venda

a contento e a venda sujeita a prova. Ambas representam contrato de compra e venda sob

condição suspensiva, haja vista que a perfeição do contrato somente se dará em momento

posterior a sua celebração.

Na venda a contento, a perfeição do contrato somente ocorrerá após a manifestação do

comprador no sentido de que a coisa objeto da avença foi do seu agrado. Nesta modalidade de

condição suspensiva, o comprador não necessitará prestar esclarecimentos a respeito do seu

gosto. Ou a coisa foi do seu agrado ou não.

Por outro lado, a venda sujeita a prova é aquela em que haverá perfeição do contrato somente

após a constatação, por parte do comprador, de que a coisa apresente as qualidades informadas

pelo vendedor e, ainda, seja idônea para o fim a qual se destina.

Cláusulas Especiais nos Contratos de Compra e Venda - Parte 2 de 3

Page 49: Matéria de Compra e venda

Tanto na venda a contento quanto na venda sujeita a prova, por representarem pacto contratual

de natureza suspensiva, o comprador estará na condição de comodatário até que ocorra a

perfeição do contrato. Em ambas, a lei não estipula prazo para a manifestação do comprador. No

entanto, dispõe o artigo 512 do Código que “não havendo prazo estipulado para a declaração do

comprador, o vendedor terá direito de intimá-lo, judicial ou extrajudicialmente, para que o faça em

prazo improrrogável”.

Por força da estrutura das duas cláusulas, tem-se que o direito de manifestação do comprador

(seja na venda a contento, seja na venda sujeita a prova) é personalíssimo, não se transmitindo,

pois, aos seus sucessores.

Clássico a afirmação de que o artigo 49 do Código de Defesa do Consumidor apresenta uma

espécie de venda a contento. O quesito é que o negócio jurídico de consumo tenha sido realizado

fora do estabelecimento empresarial do fornecedor, sendo possível a entrega da coisa até o prazo

de sete dias, contados da assinatura do contrato ou do recebimento do produto ou serviço.

Preempção ou Preferência

A definição e estrutura desta cláusula especial encontram-se no artigo 513 do Código Civil, nos

termos seguintes: “a preempção, ou preferência, impõe ao comprador a obrigação de oferecer ao

vendedor a coisa que aquele vai vender, ou dar em pagamento, para que este use de seu direito

de prelação na compra, tanto por tanto”. São sinônimos de preempção os termos

preferência e prelação.

O prazo máximo para o exercício da preempção ou preferência está disciplinado no parágrafo

único do citado artigo 513, sendo ele cento e oitenta dias, se a coisa for móvel, ou a dois anos, se

imóvel.

Naturalmente, o vendedor que tenha garantido o direito de preempção ou preferência deverá

pagar o preço da coisa em condição iguais ao preço encontrado ou ajustado. O referido direito, no

entanto, é personalíssimo e, portanto, não se transfere aos herdeiros do vendedor, mas os

herdeiros do comprador deverão observar as imposições da cláusula.

Cláusulas Especiais nos Contratos de Compra e Venda - Parte 3 de 3

Com vistas a não ocorrer dificuldade de circulação da coisa, reza o artigo 571 que “inexistindo

prazo estipulado, o direito de preempção caducará, se a coisa for móvel, não se exercendo em três

dias, e, se for imóvel, não se exercendo nos sessenta dias subsequentes à data em que o

comprador tiver sido notificado o vendedor”.

Page 50: Matéria de Compra e venda

Caso não ocorra a intimação por parte do comprador, e o vendedor tiver conhecimento de que a

coisa será vendida, poderá este tomar a iniciativa intimando aquele.

Convém ressaltar que o pacto de preempção gera efeitos apenas entre as partes, de modo que a

desídia do comprador, gera, em benefício do alienante, o direito as perdas e danos. O estabelecido

entre as partes nesta modalidade de cláusula, não obriga terceiros a cumprir o pacto, dada a sua

natureza meramente obrigacional entre os que fizeram parte do contrato de compra e venda onde

constava a citada cláusula.

Venda com Reserva de Domínio e Venda Sobre Documentos

Nos contratos de compra e venda é possível que o vendedor reserve para si a propriedade da

coisa, até que o comprador efetive a integralidade do pagamento do preço. A esta modalidade

especial de cláusula denomina-se venda com reserva de domínio ou, ainda, pactum

reservati domini.

No Código Civil, art. 421, a venda com reserva de domínio somente recairá sobre coisa móvel e

infungível. Releva, ainda, anotar que esta modalidade de cláusula apresenta um compra sob

condição suspensiva, uma vez que ao vendedor tocará a propriedade resolúvel do bem, até que o

pagamento total do preço seja efetivado pelo comprador.

“Ocorrendo o inadimplemento do comprador cabe busca e apreensão para reaver a coisa móvel e

fungível ou ação de cobrança do valor do bem.

O vendedor continua com a disposição e a reivindicação e o comprador fica co o uso e o gozo. Se a

coisa perecer antes do pagamento do preço, quem suporta o prejuízo? O comprador terá direito de

uso e gozo, mas responderá pelos riscos da coisa, já que o art. 524 do CC criou exceção à regra

res perit domino.”78

A compra e venda com reserva de domínio somente terá efeitos contra terceiros após o

competente registro.

Feitas estas considerações, prossigamos para a venda sobre documentos.

A venda sobre documentos é modalidade de cláusula especial (CC, arts. 529 a 532) em que “a

tradição da coisa é substituída pela entrega do seu título representativo e dos outros documentos

exigidos pelo contrato ou, no silêncio deste, pelos usos” (art. 529).

Page 51: Matéria de Compra e venda

Nessa espécie de cláusula, a obrigação principal do vendedor será entregar o documento

representativo da coisa e não a coisa em si. A título de exemplo, podemos citar o contrato em que

o alienante se obriga a entregar ao comprador 300 cabeças de gado que se encontram em sua

fazenda, mas, ao contrário, por disposição contratual, a compra e venda se concretiza apenas com

a entrega de um documento que, mediante apresentação ao gestor da fazenda, garantirá a

transferência dos semoventes referenciados no contrato.

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