Mass Communication Research · Curso: JORNALISMO e PUBLICIDADE Disciplina: Teoria da Comunicação...

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Curso: JORNALISMO e PUBLICIDADE Disciplina: Teoria da Comunicação Professor(a): Anna Paula Lemos (org) Conteúdo In: MATTELART, A. MATTELART M. História das Teorias da Comunicação. Mass Communication Research Objetivos de aprendizagem: Apresentar os estudos e a aprendizagem das Teorias pensadas pela linha de pesquisadores dos Meios de Comunicação em Massa. Nesta unidade veremos cada uma das teorias pensadas no Mass Communication Research: Teoria Hipodérmica ou Teoria da Bala Mágica Teoria Funcionalista Teoria Empírica de Campo Teoria da Persuasão Introdução: Desde a década de 1910, a comunicação nos Estados Unidos encontra-se ligada ao projeto de construção de uma ciência social sobre bases empíricas. A Escola de Chicago e sua sede. Seu enfoque microssociológico dos modos de comunicação na organização da comunidade harmoniza-se com uma reflexão sobre o papel da ferramenta cientifica na resolução dos grandes desequilíbrios sociais. A supremacia dessa escola durara ate as vésperas da Segunda Guerra Mundial. Os anos 40 veem instalar-se outra corrente: a Mass Communication Research, cujo esquema de analise funcional desloca a pesquisa para medidas quantitativas, mais aptas a responder a exigência proveniente dos administradores da mídia. Entre os membros da Escola de Chicago, uma figura se destaca, a de Robert Ezra Park (1864-1944). Autor de uma tese de doutorado, preparada em Heidelberg, sobre "a massa e o publico" (1903), repórter experimentado em grandes investigações jornalísticas, militante da causa negra, Park entra para a universidade apenas em 1913. Transforma sua pratica de jornalista e concebe como forma superior de reportagem as pesquisas sociológicas que irá realizar nos bairros da periferia. Seguiu o ensinamento de Georg Simmel, que se interroga sobre a cidade como “estado de espirito", e vê o fundamento psicológico da "personalidade urbana" na "intensificação do estimulo nervoso", na "mobilidade" e na "locomoção" [Simmel, 1903], e ainda um dos introdutores de Tarde nos Estados Unidos. Contrapondo-se a

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Curso: JORNALISMO e PUBLICIDADE Disciplina: Teoria da Comunicação

Professor(a): Anna Paula Lemos (org) Conteúdo In: MATTELART, A. MATTELART M. História das Teorias da Comunicação.

Mass Communication Research

Objetivos de aprendizagem:

Apresentar os estudos e a aprendizagem das Teorias pensadas pela linha de

pesquisadores dos Meios de Comunicação em Massa.

Nesta unidade veremos cada uma das teorias pensadas no Mass Communication

Research:

Teoria Hipodérmica ou Teoria da Bala Mágica

Teoria Funcionalista

Teoria Empírica de Campo

Teoria da Persuasão

Introdução:

Desde a década de 1910, a comunicação nos Estados Unidos encontra-se ligada ao

projeto de construção de uma ciência social sobre bases empíricas. A Escola de

Chicago e sua sede. Seu enfoque microssociológico dos modos de comunicação na

organização da comunidade harmoniza-se com uma reflexão sobre o papel da

ferramenta cientifica na resolução dos grandes desequilíbrios sociais. A supremacia

dessa escola durara ate as vésperas da Segunda Guerra Mundial. Os anos 40 veem

instalar-se outra corrente: a Mass Communication Research, cujo esquema de

analise funcional desloca a pesquisa para medidas quantitativas, mais aptas a

responder a exigência proveniente dos administradores da mídia.

Entre os membros da Escola de Chicago, uma figura se destaca, a de Robert Ezra

Park (1864-1944). Autor de uma tese de doutorado, preparada em Heidelberg, sobre

"a massa e o publico" (1903), repórter experimentado em grandes investigações

jornalísticas, militante da causa negra, Park entra para a universidade apenas em

1913. Transforma sua pratica de jornalista e concebe como forma superior de

reportagem as pesquisas sociológicas que irá realizar nos bairros da periferia. Seguiu

o ensinamento de Georg Simmel, que se interroga sobre a cidade como “estado de

espirito", e vê o fundamento psicológico da "personalidade urbana" na

"intensificação do estimulo nervoso", na "mobilidade" e na "locomoção" [Simmel,

1903], e ainda um dos introdutores de Tarde nos Estados Unidos. Contrapondo-se a

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sociologia especulativa da Europa de então, que procura edificar grandes sistemas,

Tarde e Simmel trazem aos americanos conceitos próximos de "situações

concretas", suscetíveis de ajuda-los a forjar ferramentas para a análise das "atitudes"

e dos "comportamentos".

A cidade como "laboratório social", com seus signos de desorganização, de

marginalidade, de aculturação, de assimilação; a cidade como lugar da

"mobilidade": tal e o terreno de observação privilegiado pela Escola de Chicago.

Entre 1915 e 1935, as contribuições mais importantes de seus pesquisadores são

consagradas a questão da imigração e da integração dos imigrantes na sociedade

americana. E a partir dessas comunidades étnicas que Park se interroga sobre a

função assimiladora dos jornais e, em particular, das inúmeras publicações em

língua estrangeira sobre a natureza da informação, o profissionalismo do jornalismo

e a diferença entre ele e a "propaganda social" ou publicidade municipal [Park,

1922]. Em 1921, Park e seu colega E. W. Burgess identificam sua problemática pela

denominação "ecologia humana", referencia ao conceito inventado em 1859 por

Ernest HaeckeL Esse biólogo alemão define a ecologia como a ciência das relações

do organismo com o ambiente, compreendendo, em sentido amplo, todas as

condições de existência. Com fartas citações de contribuições de botânicos e

zoólogos, referindo- se a Spencer, Park e Burgess apresentam seu programa como

uma tentativa de implicação sistemática do esquema teórico da ecologia vegetal e

animal ao estudo das comunidades humanas.

Três elementos definem uma comunidade: uma população organizada em um

território, em maior ou menor medida nele enraizado, cujos membros vivem numa

relação de interdependência mutua de caráter simbiótico. Nessa "economia

biológica" — termo que Park utiliza por vezes como sinônimo de ecologia humana

—, e a "luta pelo espaço" que rege as relações interindividuais. Essa competição é

um principio de organização. Nas sociedades humanas, competição e divisão do

trabalho resultam em formas não planificadas de cooperação competitiva, que

constituem as relações simbióticas, ou o nível "biótico" da organização humana.

Esse nível "subsocial" é a expressão dessa web of life, dessa rede de vida que "liga

as criaturas vivas do mundo todo num nexus vital". Essa "comunidade orgânica",

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cuja população distribui-se territorial e funcionalmente, entrando em concorrência,

pode ser observada em suas diferentes fases ou idades sucessivas [Park, 1936], Park

aplica esse esquema para explicar o "ciclo de relações étnicas" (competição,

conflito, adaptação, assimilação) nas comunidades de imigrantes.

Park contrapõe o "biótico" a um segundo nível, uma espécie de superestrutura

erguida sobre a "subestrutura biótica", e que a ela se impõe como "instrumento de

direção e controle": o nível social ou cultural. Esse nível é assumido pela

comunicação e pelo

consenso (ou ordem moral), cuja função é regular a competição, permitindo aos

indivíduos, desse modo, partilhar uma experiência, vincular-se à sociedade. A

cultura é ao mesmo tempo um corpo de costumes e de crenças e um corpo de

artefatos e utensílios ou dispositivos tecnológicos. Esse nível não deriva diretamente

da nova ciência ecológica.

A ecologia humana concebe toda a mudança que afeta uma divisão do trabalho

existente ou as relações entre a população e o solo no âmbito de um pensamento do

equilíbrio, da crise e do retorno ao equilíbrio; "Ela estuda os processos pelos quais

a 'balança biótica' e o 'equilíbrio social' mantêm-se uma vez conquistados, assim

como aqueles pelos quais, desde que um ou outro se ache perturbado, se opera a

transição de uma ordem relativamente estável a outra" [Park, 1936]. A dicotomia

original operada pela ecologia humana entre o biótico e o social suscitou numerosas

discussões no período entre a Primeira e a Segunda Guerra Mundial. Muitos lhe

censuraram o fato de ela separar o processo de competição da matriz sociocultural

que define suas regras e de sucumbir ao determinismo biológico. Park admite, aliás,

a dificuldade de estabelecer a linha demarcatória entre os dois planos em seus

estudos sobre a sociabilidade no "tecido da vida urbana". No próprio interior da

escola, para a qual convergem etnólogos, sociólogos, geógrafos e demógrafos,

exprimem-se posições diversas sobre o vínculo entre os dois níveis.

Diversidade e homogeneidade

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A metodologia etnográfica (monografias de bairros, observação participante e

análise das histórias de vida) proposta para estudar as interações sociais encontra-

se na base de uma microssociologia que parte das manifestações subjetivas do

ator. Está atenta à filosofia americana do pragmatismo, preconizada então, no

campo das ciências sociais, pelo pedagogo John Dewey (1859-1952) e pelo

psicossociólogo George Herbert Mead (1863-1931),

Se o pragmatismo marcou a Escola de Chicago como um todo, influenciou

sobretudo Charles Horton Cooley (1864-1929). Tendo precedido Park na análise

dos fenômenos e processos comunicativos, estudou primeiramente o impacto

organizacional dos transportes, dedicando-se depois, na esteira de Mead, à

etnografia das interações simbólicas dos atores. É Colley quem, pela primeira vez,

utiliza a expressão "grupo primário" para designar os grupos que "se caracterizam

por uma associação e cooperação íntimas entre si. São primários em vários

sentidos, sobretudo por se encontrar na base da formação da natureza social e dos

ideais do indivíduo" [Cooley, 1909]. Na tensão entre sociedade e indivíduo, esse

nível de análise já lhe parecia essencial para avaliar os efeitos da nova "ordem

moral", trazida pelas concentrações urbanas e industriais, e os novos meios de

organização que são os dispositivos da comunicação psíquica e física. Com isso ele

criticava as interpretações unilaterais do processo de urbanização, que levavam a

crer no desaparecimento dos grupos primários e faziam abstração das interações

entre as tendências uniformizantes da cidade e o efetivamente vivido por seus

habitantes.

A opção etnográfica é, por sua vez, comandada por uma concepção do processo

de individualização, da construção do self. O indivíduo é capaz de uma experiência

singular, única, que traduz sua história de vida, sendo ao mesmo tempo submetido

às forças de nivelamento e homogeneização do comportamento. Essa

ambivalência da personalidade urbana volta a aparecer na concepção de mídia da

Escola de Chicago, simultaneamente fator de emancipação, de aprofundamento

da experiência individual e precipitador da superficialidade das relações sociais e

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dos contatos sociais, da desintegração. Se existe comunicação é em virtude das

diversidades individuais. E se o indivíduo está submetido às forças da

homogeneidade ele é capaz de se subtrair a ela. Reencontramos aí a tensão que

percorre as pesquisas de Dewey,para quem a comunicação é ao mesmo tempo

causa de e remédio para a perda da comunidade social e da democracia política

(Dewey, 1927J. – In: História das Teorias da Comunicação – Armand e Michelle

Mattelart.

Conteúdo:

Harold Lasswell e o impacto da propaganda

A primeira peça do dispositivo conceitual da corrente da Mass Communication

Research data de 1927. É o livro de Harold D. Lasswell (1902-1978) Propaganda

Techniques in the World War, que extrai as lições da guerra de 1914-1918, a

primeira guerra "total". Os meios de difusão surgiram como instrumentos

indispensáveis para a "gestão governamental 'das opiniões'", tanto de populações

aliadas como de inimigas, e, de maneira mais geral, partindo das técnicas de

comunicação, do telégrafo e do telefone para o cinema, passando pela

radiocomunicação, deram um salto considerável.

Teoria Hipodérmica ou Teoria da Bala Mágica

Para Lasswell, propaganda rima, daí por diante, com democracia. A propaganda

constitui o único meio de suscitar a adesão das massas; além disso, é mais

econômica que a violência, a corrupção e outras técnicas de governo desse gênero.

Mero instrumento, não é nem mais moral nem mais imoral que "a manivela da

bomba d'água". Pode ser utilizada tanto para bons como para maus fins. Essa visão

instrumental consagra uma representação da onipotência da mídia, considerada

ferramenta de "circulação eficaz dos símbolos". A opinião comum que prevalece

no pós-guerra é a de que a derrota das forças alemãs deveu-se enormemente ao

trabalho de propaganda dos Aliados. A audiência é visada como um alvo amorfo

que obedece cegamente ao esquema estímulo-resposta. Supõe-se que a mídia aja

segundo o modelo da "agulha hipodérmica", termo forjado por Lasswell para

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designar o efeito ou impacto direto e indiferenciado sobre os indivíduos

atomizados.

Essa hipótese central vai ao encontro das teorias psicológicas em voga na época: a

psicologia das massas de Le Bon; o behaviorismo inaugurado desde 1914 por John

B. Watson; as teorias do russo Ivan P. Pavlov sobre o condicionamento; os estudos

de um dos pio neiros da psicologia social, o britânico WiDlam McDougall,

sustentando que somente certos impulsos primitivos, ou instintos, podem explicar

os atos, seja dos homens, seja dos animais, e estabelecendo o rol dessas forças

biológicas. Tais diferentes abordagens dotaram-se de meios metodológicos

empíricos inspirados nas ciências naturais.

Ao aproximar-se o segundo conflito mundial, numerosas obras contribuem para

alimentar a ideia da mídia e da propaganda todo-poderosas. Uma das mais famosas

é a do russo emigrado na França Serge Tchakhotine, cujo título bem ilustra o

horizonte mental de uma época: A violação das massas pela propaganda política

(1939). Essa obra, dedicada pelo autora I. P. Pavlov, seu "grande mestre", e a H. G.

Wells, seu "grande amigo" e "genial pensador do futuro", representa uma suma

dos conhecimentos sobre o assunto. Aliás, é um romance fantástico de Wells, A

guerra dos mundos, que Orson Welles apresentará na noite de 30 de outubro de

1938, nas ondas da CBS, aterrorizando milhares de americanos crédulos com esse

relato de ficção científica sobre a "invasão dos marcianos". Um fenômeno de

pânico que uma equipe de sociólogos da Universidade de Princeton se apressará a

estudar [Cantrill, Gaudet e Herzog, 1940].

Cientista político da Universidade de Chicago, Lasswell interessa-se

profundamente pelas questões de propaganda, opinião pública, negócios de

Estado e eleições. Seu segundo estudo, Psychopathology and Politics (1930), tem

por objeto a análise das biografias dos líderes reformadores e revolucionários, cuja

personalidade ele interpreta a partir do grau de rebelião contra o pai. Os anos 30

lhe oferecem um labo

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ratório seleto para o estudo da propaganda política. A eleição de F. D. Roosevelt

em 1932 inaugura o New Deal e as técnicas de formação da opinião pública. Trata-

se de mobilizar a população em torno dos programas do Welfare State, a fim de

sair da crise. Nas cem as sondagens de opinião como ferramentas da administração

cotidiana da coisa pública. As pesquisas pré-eleitorais de Gallup, Roger e Crossley

conseguem prever a reeleição do presidente Roosevelt, em 1936. Indício da

formação de um meio de pesquisas, em 1937, a American Association for Public

Opinion Research (AAPOR) cria a The Public Opinion Quarterly, primeira revista

universitária sobre as comunicações de massa.

Num segundo plano dos objetos de estudo de Lasswell aparece a ascensão, nos

anos 30, das estratégias de propaganda das potências do Eixo, de um lado, e da

União Soviética e do Komintern, de outro. Em 1935, em World Politics and Personal

Insecurity, propõe o estudo sistemático do conteúdo da mídia e a elaboração de

indicadores tendo em vista revelar as tendências (trends) da World Attention, isto

é, os elementos que moldam o "ambiente simbólico mundial", e elaborar políticas

(policy-making). Consegue imple mentar parcialmente esse projeto em 1940-1941,

quando lhe é confiada a tarefa de organizar a War Time Communication Study da

Biblioteca do Congresso.

Teoria Funcionalista

Segundo Lasswell, o processo de comunicação cumpre três funções principais na

sociedade; "a) a vigilância do meio, revelando tudo o que poderia ameaçar ou afetar

o sistema de valores de uma comunidade ou das partes que a compõem; b) o

estabelecimento de relações entre os componentes da sociedade para produzir uma

resposta ao meio; c) a transmissão da herança social" [Lasswell, 1948].

Lazarsfeld e o entretenimento

Dois sociólogos, Paul F. Lazarsfeld (1901-1976) e Robert K. Merton (nascido em

1910), acrescentam a essas três funções uma quarta, o entertainment ou diversão, e

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tornam o sistema mais complexo com o discernimento da possibilidade de

disfunções, bem como de funções latentes e manifestas. Aplicando as codificações

genéricas propostas por Merton em sua obra em defesa de uma sociologia de

inspiração funcionalista, Social Theory and Social Structure (1949), os dois autores

situam as funções como consequências que contribuem para a adaptação ou o ajuste

de um dado sistema; é como se as disfunções os incomodassem. O mesmo ocorre

com a "disfunção narcotizante" da mídia, que gera a apatia política das grandes

massas de população. As funções impedem que as disfunções precipitem a crise do

sistema. As funções manifestas são as compreendidas e desejadas pelos

participantes do sistema, ao passo que as latentes são aquelas nem compreendidas

nem buscadas enquanto tais. Por esse jogo de funções e disfunções, o sistema social

é apreendido em termos de equilíbrio e desequilíbrio, estabilidade e instabilidade.

Como observa o sociólogo Norbert Elias, "a noção de função repousa sobre um juízo

de valor subjacente às explicações da noção e à sua utilização. O juízo de valor

consiste em que se compreendam involuntariamente por funções as atividades de

uma parte que seriam 'boas' para o todo, pois contribuem para a manutenção e a

integridade de um sistema social existente... Ao que tudo indica, artigos de fé de tipo

social misturam-se aqui à análise científica" [Elias, 1970].

Essa visão, formalizada no pós-guerra por Mertone Lazarsfeld, situa-se na linhagem

funcionalista adotada no período entre guerras por biólogos como Ludwig von

Bertalanffy, um dos precursores da teoria dos sistemas, e por etnólogos britânicos

como A. R, Radcliffe-Brown e Bronislaw Malinowski, eles próprios fortemente

influenciados por Durkheim. A esses últimos, Merton toma de empréstimo o

postulado da unidade funcional da sociedade.

Uma clivagem teórica

Merton e Lazarsfeld lecionam na Universidade Columbia. Merton é sobretudo um

teórico do método sociológico e da sociologia das ciências, e suas incursões na

sociologia da mídia são mais raras do que as de seu colega, que, mesmo possuindo

igualmente outros focos de interesse, se embrenhou consideravelmente nesse setor

das ciências sociais. Emigrado para os Estados Unidos em 1935, a esse psicólogo

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austríaco, próximo do Círculo de Viena e com formação em pesquisa experimental,

viu-se confiar, a partir de 1938, a responsabilidade pelo Princeton Radio Project.

Financiado pelo (e com colaboração do) psicólogo e diretor de pesquisas da rede

radiofônica CBS, Frank Stanton (que na era da televisão se toma seu presidente e

diretor geral), esse projeto de pesquisa administrativa inaugurou uma linha de

estudos quantitativos sobre audiências.

O "duplo fluxo da comunicação"

Nos anos 40 e 50, a história da sociologia funcionalista da mídia situa, como

inovação, a descoberta de um elemento intermediário entre o ponto inicial e o ponto

final do processo de comunicação. Ela iria por em questão o princípio mecanicista

lasswelliano do efeito direto e indiferenciado e, além disso, o argumento tautológico

sobre o "efeito massificador" da "sociedade de massa". Duas pesquisas brilhantes

iluminam a emergência dessa nova teoria sobre os intermediários.

O primeiro estudo, The People's Choice, é publicado em 1944. Lazarsfeld e seus

colegas, Bernard Berelson e Hazel Gaudet, procuraram medir a influência da mídia

sobre seiscentos eleitores de Erie County, Ohio, por ocasião da campanha

presidencial de 1940. O segundo, Personal Influence: The Part Played by People in

the Flow of Mass Communication, co-assinado por Lazarsfeld e Elihu Katz, aparece

em 1955, mas explora pesquisas realizadas dez anos antes. Trata-se do

comportamento dos consumidores de moda e de formas de lazer, tomando-se em

especial a escolha de filmes. Ao estudar os processos de decisão individuais de uma

população feminina de oitocentas pessoas numa cidade de 60 mil habitantes

(Decatur, Illinois), redescobrem — como no estudo precedente— a importância do

"grupo primário". É o que lhes permite apreender o fluxo de comunicação como um

todo. Estudantes formados por Lazarsfeld tornam-se "gurus" da indústria

publicitária. Como Ernst Dichter, originário de Viena, considerado o pai da

"pesquisa de motivação", ou ainda a psicóloga Herta Herzog que, contratada por

uma grande agência de Nova York, se torna figura proeminente da pesquisa

motivacional do consumidor. Enfim, Lazarsfeld não hesita em discutir publicamente

com seus discípulos métodos a utilizar para explorar as condutas dos consumidores

[Lazarsfeld e Rosenberg, 1955]. Assim, Dichter censura-lhe a excessiva valorização

da pesquisa e do questionário estruturado composto de itens fixos, em detrimento

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dos procedimentos clínicos, da psicanálise (entrevistas aprofundadas ou depth

interviews, por exemplo) e da antropologia cultural, que segundo ele estariam em

melhores condições de apreender a "imagem do produto" e a "imagem da marca",

essa arte simbólica doato de compra. Censura-o, na verdade, por inscrever-se mais

na tradição matemática de Adolphe Quételet do que na de Freud. Lazarsfeld exerceu

considerável influência emoutros países. Concebeu seus laços cora a comunidade

internacional como uma "multinacional científica"

[Pollak, 1979J.

A decisão de grupo

Inédita para a análise funcional da mídia, a descoberta do grupo primário e do degrau

intermediário por Lazarsfeld e seus colaboradores não era uma novidade absoluta

para outras abordagens da comunidade.

Uma voz dissidente

É essa sociologia de "burocrata" ou de "funcionário da inteligência" que C. Wright

Mills (1916-1962J, docente da Columbia, toma como alvo de sua crítica radical a

partir dos anos 50. Essa voz isolada, anunciadora da rebelião dos campi da década

seguinte, dá a ouvir outro discurso sobre a comunicação "não-positivista, em

consonância com o ritmo, o batimento e as texturas da vida americana" [Carey,

1983]. A esse título Wright Mills, morto prematuramente, é considerado um dos

iniciadores dos american cultural studies, num período histórico em que se formam

as bases dos cultural studies britânicos (ver capítulo IV, 3).

Diante da supremacia de uma sociologia que, depois do final dos anos 30, perdeu

toda a intenção reformadora e desviou-se para a engenharia social, limitando-se a

"examinar problemas fragmentários e ligações causais isoladas" e a responder ao

comando do "triângulo do poder" (monopólios, forças armadas e Estado), que ele

minuciosamente examina em The Power Elite (1956), o sociólogo dissidente

reivindica um retorno à "imaginação sociológica", título de uma de suas obras,

publicada em 1959. Mesmo permanecendo fiel à tradição filosófica do pragmatismo

e a seu prolongamento no interacionismo simbólico, Mills mostra-se aberto às

contribuições de um marxismo crítico. Suas análises restabelecem a conexão entre

a problemática da cultura e a do poder, entre a subordinação e a ideologia,

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relacionando as experiências pessoais vividas na realidade cotidiana às questões

coletivas cristalizadas nas estruturas sociais.

Leituras indicadas:

DE FLEUR, Melvin. ROKEACH, Sandra B. Teorias da Comunicação de

Massa. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1993.

MARTIN B., Jesus. Dos meios às mediações: comunicação, cultura e

hegemonia. RJ: Ed. UFRJ, 2009.

COHN, Gabriel. (Org.) Comunicação e Industria Cultural. SP:

T.A.Queiroz, 1987.

MOLES, Abraham A.; ADORNO, Theodor et al. Organização: COSTA

LIMA, Luiz. Teoria da Cultura de Massa. São Paulo: Paz e Terra, 2000

PEREIRA, José Haroldo. Curso básico de teoria da comunicação. Rio de

Janeiro: Quartet, 2007.

Bibliografia recomendada:

MATTELART, Armand e Michelle. História das Teorias da Comunicação. São

Paulo: Edições Loyola, 1999.

TEMER, Ana Carolina Rocha Pessoa. Para entender as teorias da comunicação.

Uberlândia: Aspectus, 2004.

WOLF, Mauro. Teorias da Comunicação de Massa. São Paulo: Martins Fontes,

2003.