Manual de Sobrevivencia

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MARILIACOUTINHO.COM Corpo, Força e Movimento E-books Manual de sobrevivência na selva das academias Volume 6

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Manual de sobrevivencia em Academias

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  • MARILIACOUTINHO.COM

    Corpo, Fora e Movimento E-books

    Manual de sobrevivncia na selva

    das academias

    Volume

    6

  • M A R I L I A C O U T I N H O . C O M

    Manual de sobrevivncia na selva das academias

    U M G U I A P A R A J O V E N S E N O T O J O V E N S E N T R A N D O N A S A C A D E M I A S T R A D I C I O N A I S

    mariliacoutinho.com http://www.mariliacoutinho.com

    Coutinho, M. Manual de sobrevivncia na selva das academias / Marilia Coutinho 1a edio So Paulo, Brasil Como citar: COUTINHO, M. Manual de sobrevivncia na selva das academias. So Paulo: Mariliacoutinho.com, 2013.

  • Table of Contents

    Introduo ................................................................................ 4 O que uma academia? ........................................................ 4 Treino: afinal, o que isso? ..................................................... 6 Resultado: defina o seu ............................................................ 7 Tomar coisas: o que, quando e de que jeito .......................... 9 Aquilo que ningum fala a si mesmo: o que voc est fazendo ali? ......................................................................................... 14 Fora, hipertrofia, definio e emagrecimento: est na hora de voc entender o que isso .................................................... 15 Sua nica arma: a INFORMAO ......................................... 17 Armadilhas: fruns com gente com Nicks esquisitos, receitas milagrosas e gente muito enturmada ..................................... 17 O tempo, esse mistrio .......................................................... 18 Leia mais ................................................................................ 19 Referncias bibliogrficas ...................................................... 19

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    Introduo

    Autora, antes que vocs perguntem: Dra. Marlia Coutinho, campe e recordista mundial de levantamento de peso bsico (powerlifting), vrias vezes lesionada por porra-louquice, portadora de piercings variados, conhecedora profunda de ambientes de treinamento de todos os tipos (em vrios pases), biloga, bioqumica, doutora em sociologia da cincia, professora, me, irm, tia, filha, amiga, ex-atleta de outras modalidades esportivas, ex-usuria de vrias coisas que fazem mal e atual usuria de vrias coisas que fazem bem, tais como comida e bons suplementos.

    u ia escrever molecada, mas achei que vocs ficariam ofendidos. No tem por que: quem escreve isso para vocs no nenhum sujeito careto sem experincia. Primeiro, por definio, eu j tive a idade de vocs. Segundo, este ambiente onde vocs esto entrando agora, eu conheo do avesso e do

    direito, na prtica e na teoria.

    O motivo de eu escrever esta srie porque vocs esto fazendo isso errado. Esto entrando no lugar errado, com a idia errada do que ele seja, com a perspectiva errada e com expectativas erradas. Minha misso mostrar para vocs que isso no incuo. Tudo tem conseqncias, ou, como dizem os americanos, no existe almoo de graa. O risco que vocs correm ao fazer as coisas erradas imprevisvel. Pode ser pequeno, mas pode ser grande.

    O estopim foi o ltimo e-mail do ltimo garoto desinformado e apressado, frustrado por no ver resultados que ele nem mesmo sabe para quando e como deveria esperar. Sigam a srie, comentem, peam mais informao e me ajudem a ajudar vocs a no se meter em encrenca.

    O que uma academia? Academia est entre aspas porque um termo errado.

    Segundo a Wikipdia, Academia (do grego antigo , transl. Akadmeia, derivao de , transl. Akdmos, "Academo") um termo que designa instituies para o ensino e promoo de atividades artsticas, literrias, cientficas e fsicas, sobretudo Universitrias. O nome "academia" provm da escola que o filsofo grego Plato fundou em 387 a.C. junto a um jardim a noroeste de Atenas, em terreno

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    dedicado deusa Atena, que segundo a tradio pertenceria a uma personagem mitolgica, Academo.

    Temos a Academia Brasileira de Cincias, a Academia Brasileira de Letras e, em geral, dizemos que a pessoa que optou por uma vida universitria, dedicada ao ensino e pesquisa, atravs da clssica seqncia do mestrado e doutorado, tem uma carreira ACADMICA.

    Por que cargas dgua os centros de treinamento de prticas de treinamento fsico, apenas no Brasil, receberam o nome de academias, ningum sabe explicar.

    O pior disso a expresso que se fixou no lxico destes ambientes, fazer academia. Isso no significa mais ou menos nada. Apenas que o indivduo freqenta um destes ambientes e que alguma coisa faz l dentro.

    As academias mainstream (padro, comuns, convencionais) oferecem vrias atividades muito mais para entreter o praticante do que para trein-lo: h uma variedade das ginsticas da moda e uma sala de musculao. Musculao outro termo complicado, pois refere-se ao treinamento que desenvolve fora (em suas diversas expresses) e hipertrofia muscular.

    O que ningum conta a vocs que a hipertrofia muscular um efeito colateral do processo fisiolgico do estmulo de fora. Fora a funo primria a ser desenvolvida. Hipertrofia muscular, mudanas na composio corporal, perda de gordura sub-cutnea e visceral so resultados morfolgicos do ganho de FORA associado a uma dieta.

    Isso tudo faz parte do mercado de fitness. Vocs sabem o que fitness? Fitness quer dizer APTIDO. a capacidade de realizar bem alguma tarefa. estar apto a fazer algo.

    O que elas deveriam oferecer CONDICIONAMENTO FSICO e TREINAMENTO DE FORA (e, no, isso no fui eu que inventei, a rea tem o nome de Strength and Conditioning fora daqui).

    Condicionamento o processo pelo qual, atravs de exerccios sistematicamente planejados, adquire-se APTIDO para algo. Em geral para realizar bem as tarefas fsicas do dia-a-dia.

    Este processo de exerccios sistemticos chama-se TREINAMENTO.

    Assim, a ficha que vocs recebem numa academia um PROGRAMA DE TREINAMENTO.

    Infelizmente, poucas vezes o profissional que atende vocs sabe qualquer um destes conceitos.

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    Treino: afinal, o que isso? Treino, ou treinamento, o programa de exerccios sistemticos voltados aquisio de APTIDO para algo. voc que define o que quer adquirir. Em geral, voc sequer conscincia tem do que quer adquirir, de modo que o profissional que lhe atende lhe d uma mozinha. Quase todos vocs chegam l expressando de alguma forma o desejo por esttica.

    Esttica, para ns, profissionais da atividade fsica, chama-se MODIFICAO DA COMPOSIO CORPORAL. Essas modificaes podem ser obtidas at certo ponto. E s na composio. No podemos mudar sua altura, a largura do seu quadril ou da sua distncia bi-acromial (largura do seu ombro), nada disso. Isso veio de fbrica. Aprenda a viver com isso.

    Em geral, as mudanas em composio corporal podem transformar to dramaticamente a aparncia de um individuo que a mudana em si se torna uma mercadoria, uma coisa que a academia vende. E como ela vende isso? Com fotos de mulheres quase peladas, bundudas e com peitos de silicone, e homens com visual de propaganda de cueca.

    Estes indivduos no apenas so geneticamente favorecidos, como so profissionais (modelos) e altamente Photoshopados. E voc, bobo, engole essa mentira.

    Engolindo a mentira, voc d menos ateno nica coisa que importa no ambiente ftil e confuso onde voc entrou: SEU TREINO, que est numa planilha qual voc no deu a ateno devida.

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    Um treino feito dos seguintes elementos:

    1. Exerccios

    2. Ordem de execuo dos mesmos

    3. Intervalos de execuo

    4. Forma de execuo correta

    5. Freqncia semanal

    6. Tempo para substituio do programa

    No dar ateno e executar o programa segundo estes componentes o mesmo que no execut-lo.

    Resultado: defina o seu O e-mail do moo apressado que me motivou a comear esta srie dizia que ele estava frustrado porque no tinha resultados. Perguntei a ele sobre seu treino, onde treinava, h quanto tempo treinava e, principalmente, quais eram seus objetivos.

    Essa pergunta final a mais importante: o resultado est relacionado com seu objetivo inicial. O objetivo diferente da expectativa, que algo mais profundo, e que vamos ver a seguir. O objetivo do garoto era, como no podia deixar de ser, ficar mais gostoso. Certamente ele queria ganhar massa magra e perder gordura sub-cutnea.

    No caso das garotas, o resultado pode ser ainda mais complicado: ela quer ficar magra, mas no seca; gostosa, mas no gorda, com a bunda grande, independente de sua estrutura ssea e distncia bi-ilaca; com os braos torneados e delicados e uma coxa grande e dura (desproporo gritante).

    Enfim, vamos ver o que esse famoso resultado.

    Se o resultado o ganho de massa magra, um ms no um prazo pequeno, ridculo. Vamos ver mais adiante a obrigao que vocs tm de conhecer pelo menos as bases mnimas do que so os processos fisiolgicos envolvidos no treinamento. Afinal, vocs sabem que tm um corao s, um fgado s e dois rins, no sabem? Por que no devem saber que msculos aumentam em tamanho em resposta a estmulos para tanto? to bsico quanto.

    O aumento de massa muscular, ou hipertrofia, um processo dinmico que acontece a vida toda. Sua av hipertrofia. Mas atrofia tambm voc e a sua av. Por que? Dinmico quer dizer isso mesmo: no um ganho permanente. O ganho se d quando o corpo responde a um ESTMULO HIPERTRFICO e a perda se d quando no h ESTMULO HIPERTRFICO.

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    Vamos ver se j ficou bvio: o que o estmulo hipertrfico? Comea com for e acaba com a. Mataram? Beleza. O msculo responde ao estmulo da fora atravs de um aumento de elementos contrteis (aumentam as miofibrilas com o aumento de sarcmeros dentro da clula muscular, mas deixe isso para l por enquanto) ou pelo contedo no contrtil da clula (hipertrofia sarcoplasmtica). O que um profissional responsvel deseja para seu aluno a primeira forma de reao fisiolgica, ou seja, a resposta hipertrfica como resultado de um aumento de capacidade de exercer fora.

    Voc vai dizer: mas estou pouco ligando para a fora, quero ficar bombadinho. Depois de vomitar com essa resposta ftil, eu calmamente respondo: menino, ficar bombadinho com hipertrofia sarcoplasmtica tem durao menor do que aumentar seus msculos densamente com hipertrofia miofibrilar, ou seja, FICANDO FORTE!

    Independente da minha profunda rejeio e desprezo pelo bombadinho fracote, por motivos exclusivamente estticos e de sade, voc deveria focar em ganhar fora e seu professor tambm.

    Isso NO rpido dentro do seu cronograma de baladas. Em um ms, no tem nem cheiro de hipertrofia. Com dois meses, dependendo da sua gentica, determinao, dieta e outros fatores que com o tempo vamos abordar, voc pode ver algum resultado, ou seja: um DISCRETO aumento na sua massa magra e certamente uma reduo da gordura. Mas no espere algo de claramente visvel antes de seis meses de treino srio.

    Voc, garota, primeiro precisa curar sua sndrome de pra, que quer uma bunda e coxas hipertrofiadas e aquela aspecto vulnervel e frgil nos membros superiores. Perdo, querida, mas o corpo humano integrado: voc nasceu integrada, vai morrer integrada. Tentar picotar seu corpo uma estratgia intil e perigosa. o equivalente aos sabirilas, conhece? O moleque com tronco de gorila e perninha de sabi?

    No seja uma pra.

    Ningum est querendo que voc seja uma fisiculturista, mas at para brincar no facebook dos amigos voc precisa de fora na regio dorsal e membros superiores para no morrer de dor nas costas e arrumar um pinamento de nervo. Fora que, espero, voc esteja estudando. E , portanto, passando horas sentada numa cadeira, o que em si j anti ergonmico e negativo para sua sade articular.

    Treine feito ser humano: o corpo todo.

    Deixe eu adivinhar: voc quer perder peso, aquela barriguinha e ficar definida? Wow! Eu devo ser adivinha.

    Esquea a balana. Seu peso no significa NADA. O que importa o percentual de gordura e msculo (chama-se composio corporal). Duas pessoas podem ter o mesmo peso e altura e uma tem uma aparncia gostosrrima, a outra esquisitona (no

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    seu ponto de vista, porque eu no partilho dessas idias). timo: passamos pela parte mais chata, a de desconstruir a idia de peso.

    A barriguinha uma questo fisiolgica: se voc acumula gordura, ela vai preferencialmente para certas regies do corpo onde ela fica esperando a prxima glaciao para se tornar necessria. Pois de onde voc acha que herdou a capacidade de ficar gorda? Dos seus ancestrais, que fixaram estes genes durante duros perodos de adversidade ambiental!

    Sem glaciao l fora, com uma educao corporal show de bola em que voc praticamente no saiu da frente da TV, voc ficou gordinha.

    Seus problemas acabaram! Faa FORA e seus msculos vo cuidar de tudo para voc. Eles consomem muito mais substrato energtico, ou seja: o que voc come eles absorvem e transformam em gostosura, e no na gelatina sub-cutnea que tanto incomoda seu espelho.

    Finalmente, assim que se cuida da tal definio. Definio, por definio, a perda de gordura sub-cutnea que recobre uma musculatura hipertrofiada. Por hipertrofiada eu quero dizer de bom tamanho, e no uma fisiculturista. Mas, minha querida, os fiapos de msculo que voc tem no podem ser definidos. Se voc definir isso, vira um fantasma anorxico e isso nenhum de ns quer.

    Treine! Exatamente como os meninos!

    Faa fora!

    O famoso resultado vir. Em no menos de seis meses. At l, leia, entenda-se consigo mesma, aproveite o tempo para refletir sobre futilidade, a ditadura da indstria da beleza e aumente sua auto-estima. Tudo isso junto s pode lhe fazer bem.

    Tomar coisas: o que, quando e de que jeito Agora entramos na verdadeira rea complicada para este segmento de jovens que entram na academia, no tm claro suas expectativas, tm perspectivas no-realistas sobre os objetivos e nasceram e cresceram sob a hegemonia da indstria farmacutica.

    Mas o que uma coisa tem a ver com a outra? Tudo. A indstria farmacutica do ps-guerra doutrinou as geraes desde ento numa f quase religiosa quanto s solues medicamentosas para tudo. Paralelamente, a medicina evoluiu pela via da patologizao de tudo. Casamento perfeito: tudo pode ser doena e tudo pode ser farmacologicamente tratado. Inclusive desejos, sonhos, medos.

    Mas no s isso! Assim como na Polishop, tudo vem com um brinde. O brinde do desenvolvimento das novas tecnologias farmacuticas do ps-guerra trouxe junto o filhote dela com a tambm lucrativssima e hipertrofiada indstria alimentcia. Surgiu a

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    indstria NUTRICUTICA. Trata-se dos alimentos com efeito biologicamente ativo sobre alguma condio (alimentos-remdio).

    Os suplementos alimentares, entre eles sua linha mais rentvel, a dos suplementos esportivos, pertence indstria nutricutica.

    O sujeito jovem que est frustradssimo com sua falta de resultados em um ms de treino mal feito (sim, porque s depois de muito aprendizado ele far a coisa bem feita) quer tomar coisas. Ele nem sabe muito bem o que, mas ouviu dizer que tem coisas que ele pode tomar para acelerar a obteno dos resultados to desejados.

    Ele est atrs de duas classes de coisas: suplementos esportivos e ergognicos. Vejamos o que cada um deles.

    Suplementos esportivos so substncias utilizadas por praticantes de atividade fsica (supostamente todo ser humano), certamente por atletas, para garantir o aporte adequado de nutrientes que nem sempre possvel suprir apenas pela matria prima dos alimentos. As principais classes de suplementos so:

    Macronutrientes (protenas, carboidratos e lipdeos)

    Micronutrientes (vitaminas, minerais)

    Xenobiticos (substncias que foram produzidas por outros organismos, como plantas ou outros animais, ou sintetizadas em laboratrio, que no so naturalmente parte do metabolismo humano e so utilizadas como frmacos)

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    Acho que a maioria das pessoas j ouviu falar de whey protein. Whey protein um produto da classe dos suplementos de protenas (macro-nutriente), tirado do soro do leite. No UMA protena: um produto que contm uma mistura das protenas solveis do soro do leite.

    macronutrientes

    micronutrientes

    xenobiticos

    Macronutrientes so utilizados pelos seguintes motivos:

    Para complementar o que a dieta no supre

    Para garantir fontes diferentes daquelas proporcionadas pela dieta

    De modo a produzir propores entre os macro-nutrientes que a dieta no proporciona

    A manipulao nutricional com vistas a produzir resultados teraputicos, em performance ou estticos envolve tudo isso. s vezes importante garantir ao organismo o aporte de substratos para a sntese de metablitos anti-inflamatrios que a comida sozinha no d. Usa-se um suplemento. s vezes um atleta necessita de protena de muito rpida absoro, ento se prescreve whey protein. s vezes o contrrio: preciso garantir uma certa estabilidade do perfil aminoacdico da pessoa, por infinitos possveis motivos, ento se busca um conjunto de protenas de digesto e absoro mais lenta.

    A dieta que se adota, seja num tratamento ou na busca de performance (ou de resultado esttico) uma parte fundamental da estratgia, to importante quanto o planejamento do treino.

    Tambm existem os micronutrientes. Quem j no ouviu o famoso vitamina C e cama como prescrio para gripe? anedtico, mas no deixa de ter fundamento: a vitamina C, ou cido ascrbico, tem uma controvertida relao com a resposta imunolgica. O repouso incontestavelmente tem. A prescrio de micro-nutrientes se justifica pelos seguintes motivos:

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    Carncias

    Alguns micro-nutrientes, em doses muito diferentes das RDAs, modulam respostas metablicas de maneira a otimizar um efeito (teraputico ou de performance)

    Se eles realmente podem aumentar substancialmente a performance de um atleta (ou de um praticante qualquer), no h evidncia consensual. Quase todo atleta toma.

    Os xenobiticos so as coisas de fora, aquelas que no fazem parte do metabolismo humano. Entram aqui os fitoterpicos, os nutricuticos derivados de animais (como a quitosana, de crustceos, ou a controitina e glucosamina, que eram retiradas de cartilagem de tubaro), entre outros. As justificativas so:

    Tm efeito teraputico

    Otimizam alguma atividade biolgica

    Minimizam algum efeito negativo causado por doena ou condio crnica ambiental

    At aqui, no h problemas. A questo que boa parte destes suplementos so comprados e utilizados pelo seu efeito ERGOGNICO. O que ergogenia? Ergogenia vem de ERGO + GENIA, que produz TRABALHO. Ergo deriva da palavra grega ERGON, que significa TRABALHO.

    O que a molecada quer tomar coisas que ajudem a anabolizar, ou fazer msculo (na cabea deles, porque anabolismo um fenmeno bem mais complexo).

    A que a porca torce o rabo, pois tudo ergognico: suplemento, comida (sim! Comida o maior ergognico que existe!) e tambm drogas que estimulam certas funes ligadas performance fsica. Vejamos quais so:

    Esterides anablicos andrognicos

    Drogas anti-estrognicas

    Hormnio do crescimento e drogas peptdicas

    Termognicos (queimadores de gordura)

    Outras drogas otimizadoras de performance

    Estas substncias foram orginalmente produzidas para objetivos no esportivos, porm certamente para melhorar funes metablicas e tratar condies patolgicas. A realidade a seguinte:

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    1. Elas existem, so produzidas por indstrias nacionais e multinacionais legais e tambm de forma artesanal, ilegalmente

    2. Representam um mercado de bilhes de dlares em vendas legais e ilegais no mundo todo

    3. So comercializadas de inmeras formas, desde as mais legais e formais (prescrio e farmcia) at o mercado negro stricto sensu

    Classe Principais substncias Principais fabricantes

    legais

    Esterides anablicos

    andrognicos*

    Nandrolona, Oximetolona, metandrostenolona, boldenona, oxandrolona, cipionato de testosterona,

    undecanoato de testosterona, enantato de

    trembolona, stanozolol

    Sintex (Brasil), Unimed Pharm (USA), Biomax Labs, Bio-Technology

    General Corp, Searle, Ciba-Geigy,

    Roussel Uclaf, Organon

    Drogas anti-

    estrognicas

    Anastrozol, citrato de clomifeno, citrato de

    tamoxifeno

    Merck, Medley, Sandoz, Eurofarma ,

    Aventis

    Hormnio do

    crescimento e drogas peptdicas

    GHRP-6, HGH, IGF1, IGF-BP3 complex, insulina,

    MGF (mechano growth factor), PGF2A

    Genentech, Eli Lilly

    Termognicos

    (queimadores de

    gordura)

    Albuterol, cafeina, clenbuterol, liotironina, DNP,

    efedrina, T3 , T4

    Glenmark, Pharmascience,

    Glaxosmithkline,

    Outras drogas

    otimizadoras de

    performance

    Isotretinoin, dutasteride, tadalifil, selegiline, EPO,

    vardenafil, sildenafil

    Pfizer, Eli Lilly

    Quem me conhece sabe da minha posio radicalmente crtica hipocrisia do anti-doping. No entanto, sou igualmente crtica quanto ao uso indiscriminado e o mau uso de substncias ergognicas. Minha preocupao no , nem nunca foi, o atleta. Atleta tem mdico e sabe o que est fazendo. Representam menos de 6% das vtimas de mau uso destas substncias em qualquer estudo feito no mundo.

    Quem realmente paga o pato da desinformao sobre substncias ergognicas promovida pelas agncias governamentais e mdia, com sua caa s bruxas, o praticante recreacional, em especial os jovens. So estes meninos que, com dois meses de academia, sem ter se transformado no outdoor da Calvin Klein, aceitam a generosa oferta do vendedor de bomba de planto e socam stanozolol na bunda sem o menor critrio. So as meninas vidas pela barriguinha seca que se entopem de estimulantes e vo parar no hospital, nas clinicas psiquitricas ou no necrotrio.

    De novo, o problema de informao: enquanto o uso de um shake de whey s vai beneficiar o garoto ou garota, inclusive melhorando sua sade geral, seu rendimento na escola e sua imunidade, o uso de uma droga ergognica pode destruir sua vida.

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    Para quem conhece, o mesmo que falar sobre vertebrados e gimnospermas (pinheiros e outras plantas sem flores): uma classe de coisas no tem NADA a ver com a outra. Mas o menino ou menina, na mo de um vendedor de bomba oportunista, no sabe isso.

    Os emails que eu recebo tm o mesmo contedo: voc pode me indicar alguma coisa para tomar que me ajude a crescer/definir/emagrecer?.

    Minha resposta invariavelmente : NO. No posso indicar por inmeros motivos. O primeiro legal: quem prescreve dieta um nutricionista. O segundo que, se eu fosse nutricionista, continuaria no indicando: s se prescreve qualquer coisa conhecendo a individualidade biolgica do paciente. Em terceiro lugar, no prescreveria por bom senso: o que que um moleque com um ms de treino mal-feito pensa da vida para querer tomar um ergognico perigoso e que no far efeito NENHUM no chassis de borboleta (ou corpinho de gelatina) dele?

    Resumo da pera:

    1. NO TOME COISAS. Coma adequadamente, tome gua e siga as orientaes de bom senso. A embaixo vai a recomendao do melhor livro sobre o assunto, produzido quase que sob medida para voc, que no tem informao e precisa dela.

    2. No enfie nada que no seja comida ou gua pela boca sem consultar um nutricionista ou mdico.

    3. Aprenda a treinar direito, espere o tempo necessrio para que algum resultado aparea para ento pensar em tornar mais complexa sua estratgia nutricional.

    Tem uma ltima coisa que deve convencer todo mundo: coisas, tomadas por quem no sabe treinar, no causam nada exceto fazer voc ficar doente. Coisas funcionam, mas s em atletas ou praticantes com nvel de atleta. Coisas que emagrecem piram sua cabea.

    Aquilo que ningum fala a si mesmo: o que voc

    est fazendo ali? Uma coisa o resultado que voc deseja num prazo conhecido: isso o seu objetivo. Outra coisa a sua relao com o treinamento em si. No muito diferente de comer: voc pode ter um objetivo determinado com um programa de dieta, que reduzir sua gordura corporal em x%, reduzir suas medidas para ficar bem no vestido de formatura ou entrar na categoria de peso da sua competio de boxe. Isso o OBJETIVO. A relao com a dieta outra coisa: como voc configura no seu sistema a relao com o ato de comer. Se voc tem uma configurao ruim, assim que voc cumprir um objetivo, voc se perde de si mesmo e fica insatisfeito

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    novamente. O motivo simples: tanto com treinamento como com dieta, o ESTADO ATINGIDO dinmico. Sua gordura corporal desejada (o objetivo) pode ser alcanada num momento qualquer, mas se modificar logo em seguida.

    No diferente com o treinamento. O treinamento, tanto quanto e junto com a dieta, promovem modificaes na composio corporal. Se o seu objetivo ficar grando e rasgado ou gostosona, no momento em que voc achar que ele foi atingido, o que voc tem pela frente? O que voc tem para fazer numa academia?

    Algumas pessoas acham sua configurao depois que comeam a treinar com um objetivo e descobrem que a expectativa que tm, o que elas realmente querem com o treinamento, vai muito alm do objetivo. Estas pessoas ficam, em geral para sempre.

    Outras pessoas se do conta de que seus objetivos so inatingveis. , caro leitor, a verdade que provavelmente voc se encaixa nesta categoria. So rarssimas as pessoas cuja gentica os favorece a ponto de que um bom treino e dieta lhes garanta cumprir com um objetivo em geral estabelecido sobre uma imagem photoshoppada de capa de revista. Os demais, em dois, seis ou doze meses, percebem que o objetivo era ilusrio, se frustram, se desencantam e largam o treino.

    O problema que eles s tinham esse objetivo, e no uma idia do que estar ali para treinar.

    A no ser que voc descubra em si mesmo uma motivao fundamental para integrar seu corpo atravs dos movimentos de fora, voc ser mais um nas estatsticas da baixa taxa de reteno que descrevem a realidade das salas de peso do Brasil (talvez do mundo) todo.

    Fora, hipertrofia, definio e emagrecimento:

    est na hora de voc entender o que isso A esmagadora maioria de vocs, leitores deste e-book, tem anseios estticos e foram eles que os levaram at a academia. Em outras palavras, querem se enquadrar mais num padro de beleza que valoriza, no caso dos homens, uma certa hipertrofia muscular (o look sarado), e, no caso das mulheres, ser magra e gostosa. Certas expresses muito mal compreendidas e muito empregadas em qualquer site de curiosos pairam no mar de dvidas que vocs devem ter. Entre elas, ganha disparado a expresso definio. Dez entre dez iniciantes nas academias tradicionais dizem que querem ficar definidos. Destes, os que mais freqentaram sites bobos respondem que querem crescer e secar (de preferncia ao mesmo tempo). Dez entre dez mulheres quer emagrecer.

    Ento vamos l. Ficar sarado ganhar massa muscular. O outro termo para isso hipertrofia muscular. Definir significa reduzir a proporo de gordura sub-cutnea de maneira a evidenciar a musculatura subjacente. Ou seja: por definio, necessrio

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    que haja musculatura subjacente, concorda? Portanto, chegar no pobre professor e dizer eu quero definir o abdmen sendo que voc no tem musculatura desenvolvida ali meio sem sentido, concorda at aqui?

    Como se ganha msculo (hipertrofia), ento? At que inventem alguma interface em realidade virtual que substitua o treino, ganhar msculo implica, necessariamente fazer e GANHAR fora. A hipertrofia a adaptao morfolgica ao estmulo proporcionado pela execuo de fora contra uma resistncia externa. Independente de toda a controvrsia sobre os protocolos ideais no treinamento resistido, se voc quer ganhar msculo, tem que fazer FORA. E o que fora?

    Fora definida como qualquer ao que promova acelerao, ou mudana de velocidade, num objeto com massa. A fora muscular, a capacidade de exercer fora atravs da contrao muscular. Muitas expresses de movimento humano se enquadram na categoria de fora, causando alguma confuso conceitual. As definies mais consensuais so as que apontam para a fora como uma capacidade. Assim, a fora muscular pode ser entendida como a capacidade do sistema neuromuscular para produzir fora contra uma resistncia externa (Stone et al 2007, Siff 2001, Stone 1993). At aqui, chegamos na idia de que fora no algo que simplesmente mora dentro do msculo, e sim depende da capacidade do indivduo de fazer com que esse msculo se contraia em determinada circunstncia. Fatores neurais e hormonais so determinantes sobre a fora.

    Hipertrofia muscular o aumento da massa muscular como resultado do estmulo da execuo de fora. O aumento da massa do msculo se deve principalmente ao aumento de tamanho de fibras individuais, e no ao aumento do nmero de fibras. As fibras podem aumentar de tamanho pela contribuio maior ou menor de componentes contrteis (miofibrilas). Isso diferencia a hipertrofia sarcoplasmtica da hipertrofia miofibrilar (Zatsiorsky & Kraemer 2006). Em termos gerais, quanto maior o msculo, ou sua seco transversa, maior a fora. Mas agora sabemos que alm dos fatores neurais e hormonais mencionados acima, fatores histolgicos (composio do tecido) tambm influem.

    Assim, um indivduo que sofra hipertrofia muscular ter mais capacidade de exercer fora atravs da musculatura hipertrofiada do que tinha antes de t-la. Neste sentido, vale a relao positiva direta entre hipertrofia e fora. No entanto, a coisa se complica se tentarmos comparar dois indivduos de mesmo peso corporal ou mesma rea de seco transversa de msculos-alvo, treinando de forma diferente, e suas respectivas foras. Um indivduo pode ter musculatura mais desenvolvida do que outro e ter menos fora; um indivduo j treinado pode aumentar sua fora sem mudar substancialmente seu peso ou composio corporal. Isto ocorre porque a expresso de fora, principalmente de fora mxima e potncia, so resultado de adaptaes que vo alm das morfolgicas. As adaptaes neurais e hormonais relacionadas fora so o complicador deste quadro.

    Esta relao no linear entre fora e hipertrofia fica bvia quando observamos os esportes do fisiculturismo e do powerlifting (levantamento bsico). comum que

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    powerlifters de mesmo peso corporal que fisiculturistas sejam mais fortes. Tambm comum que powerlifters com menor massa muscular que fisiculturistas sejam mais fortes.

    Ambos fazem fora em seu treinamento. No entanto, o objetivo do powerlifter aumentar sua capacidade de executar esforos mximos enquanto o objetivo do fisiculturista aumentar sua massa muscular.

    Sua nica arma: a INFORMAO Sobreviver na selva das academias tradicionais significa continuar l, treinando e obtendo resultados. O mais comum no sobreviver: a frustrao leva desistncia. Anos e anos de observao nas salas de musculao me levaram a uma concluso que resiste ao tempo: o nico fator comum entre aqueles que continuam nestes ambientes a INFORMAO. Aqueles que encontraram informao sbria e factual, ficaram. Aqueles que no foram atrs de informao nenhuma ou se embrenharam no mar de informao falaciosa, acabaram desistindo.

    A informao que realmente pode proteger voc das inmeras armadilhas que comprometem sua sade, seus resultados e sua alimentao aquela disponibilizada em fontes minimamente seguras. O jornal de domingo no uma fonte segura: pelo fato de ser informao de consumo imediato e rapidamente obsoleta, a notcia ou reportagem nos cadernos de sade almeja mais entreter do que informar. Fuja das revistas do tipo Boa Forma, que veiculam contedo de marketing da indstria da beleza e nada mais.

    Revistas sobre treinamento podem ter informao de melhor qualidade. Livros para leigos escritos por autores vinculados a boas universidades tambm. Websites mais tradicionais, ligados a rgos de sade e universidades, podem ter informao de qualidade.

    Seguramente existem mais fontes de informao fidedigna em ingls do que em portugus: a lngua cientfica moderna, queiramos ou no.

    Armadilhas: fruns com gente com Nicks

    esquisitos, receitas milagrosas e gente muito

    enturmada As armadilhas mais perigosas so os fruns de marombeiro. Embora existam alguns de excelente qualidade, com membros bem informado e boa formao educacional, muito difcil um iniciante distinguir um frum com bom contedo de um com porcaria. Alm disso, pelo fato de que praticamente qualquer pessoa pode criar um perfil nestes sites e uma parte significativa cria perfis fakes para proteger sua identidade,

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    mais difcil ainda para o iniciante distinguir uma postagem bem fundamentada de outra sem fundamento.

    exatamente assim que iniciantes ingnuos acabam consumindo produtos que vo do desnecessrio ao letal. Eu j li tpicos inteiros sobre uma substncia chamada DNP (2,4 dinitrofenol), um composto termognico proibido nos Estados Unidos no final dos anos 1930s. O DNP um desacoplador de fosforilao oxidativa, um potente veneno que matou inmeras pessoas. Como possvel que hoje, em pleno sculo XXI, seja possvel encontrar recomendaes para seu uso em fruns sobre treinamento?

    Mas quem faz estas recomendaes no precisa se preocupar com responsabilidade legal: esto protegidos pelo anonimato dos perfis fakes.

    Meu conselho a voc: jamais confie em algum que no assume publicamente sua identidade, seja pessoal ou digitalmente.

    O tempo, esse mistrio Entre os treinadores e at mesmo professores de academia, circula uma informao, impossvel de se comprovar cientificamente, de que a mdia de tempo de treino para que um usurio de esterides procure pela primeira vez estas substncias de seis meses. Quando ouvi este relato pela primeira vez, fiquei perplexa: seis meses? Mas em seis meses no houve tempo nem mesmo para o mais disciplinado aluno observar resultados substanciais!

    Pois , esse o problema: muitas pessoas esperam que os resultados apaream num piscar de olhos. No entanto, para que um programa de treinamento e dieta tenham resultados importantes, so necessrios alguns anos.

    Claro que em seis meses possvel observar e medir resultados interessantes. S que no isso que o iniciante desinformado espera: a garota espera que em seis meses consiga ver uma cintura fina e um bundo. Se isso no acontecer, o treino no funcionou e ela quer um termognico para emagrecer. O menino quer se transformar no pster de desodorante da noite para o dia, com tanquinho e bceps marcado. Claro que no isso que ele ver no espelho. a que ele decide tomar coisas.

    Ento, leitor, a chave do sucesso entender o TEMPO. No se trata de uma recomendao genrica de pacincia. Sim, preciso pacincia, mas antes de mais nada preciso ter um entendimento realista do tempo em que ocorrem os fenmenos envolvidos nos objetivos de cada um.

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    Leia mais Marilia Coutinho. Powerlifting: de volta ao bsico. So Paulo, Editora Phorte, 2011.

    Rodolfo Peres . Viva em Dieta, Viva Melhor. So Paulo, Editora Phorte, 2012.

    Marco Carlos Uchida, M Charro, R Bacurau, Francisco Navarro, FL Pontes Jnior. Manual de musculao: uma abordagem terico-prtica ao treinamento de fora. So Paulo, Editora Phorte, 2003.

    Referncias bibliogrficas Stone, M.H. et al. Principles and practice of resistance training. Champaign, IL: Human Kinetics, 2007

    Siff, M. Biomechanical foundations of Strength and power training In: V. Zatsiorsky ed. Biomechanics in Sport London, Blackwell Scientific Ltd., pp. 103139, 2001.

    Stone, M.H. Position/policy statement and literature review for the National Strength and Conditioning Association on explosive exercise. National Strength and Conditioning Association Journal 15: 7-15, 1993

    Zatsiorsky, V.M., Kraemer, W.J. Science and practice of strength training. Human Kinetics, 2006