LONG PIECE: o tempo de uma imagem -...

52
UNIVERSIDADE DE LISBOA FACULDADE DE BELAS ARTES LONG PIECE: o tempo de uma imagem Luísa Baeta MESTRADO EM ARTE MULTIMÉDIA - FOTOGRAFIA 2013

Transcript of LONG PIECE: o tempo de uma imagem -...

Page 1: LONG PIECE: o tempo de uma imagem - repositorio.ul.ptrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/8459/2/ULFBA_TES 558.pdf · sendo convocados, sendo David Campany, Laura Mulvey, Jacques Rancière,

UNIVERSIDADE DE LISBOA FACULDADE DE BELAS ARTES

LONG PIECE: o tempo de uma imagem

Luísa Baeta

MESTRADO EM ARTE MULTIMÉDIA - FOTOGRAFIA

2013

Page 2: LONG PIECE: o tempo de uma imagem - repositorio.ul.ptrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/8459/2/ULFBA_TES 558.pdf · sendo convocados, sendo David Campany, Laura Mulvey, Jacques Rancière,

UNIVERSIDADE DE LISBOA FACULDADE DE BELAS ARTES

LONG PIECE: o tempo de uma imagem

Luísa Baeta

MESTRADO EM ARTE MULTIMÉDIA - FOTOGRAFIA

Dissertação orientada pela Prof. Doutora Maria João Gamito

2013

Page 3: LONG PIECE: o tempo de uma imagem - repositorio.ul.ptrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/8459/2/ULFBA_TES 558.pdf · sendo convocados, sendo David Campany, Laura Mulvey, Jacques Rancière,

RESUMO

LONG PIECE - o tempo de uma imagem é uma dissertação de mestrado em

Arte Multimédia, de natureza teorico-prática, em que se analisa o que é longo no tempo

de uma imagem. Partindo dos conceitos de tempo e de imagem como elementos,

abordam-se as relações que se estabelecem entre ambos no plano, no movimento e na

observação, no contexto da fotografia, do filme e do vídeo.

Diferentes aceções de tempo são enunciadas, de modo a permitir uma ampla

interpretação desse tempo longo que se identifica na imagem: o tempo de exposição,

estrutural, físico, real, representado, cinemático, de duração, a imagem-tempo, o tempo

contextual e relacional.

Recorrendo a peças de artistas como Tacita Dean, Michael Snow, Hiroshi

Sugimoto e Andrei Tarkovsky observam-se diversas abordagens possíveis sobre o uso

do conceito de tempo, com recurso aos media definidos como contexto desta pesquisa.

São ainda incorporados os conceitos de retorno, suspensão e recomeço, três

figuras de esquecimento definidas por Marc Augé, formas de expressão de possíveis

relações entre tempo e imagem, que estão na base da criação de Long Piece, a parte

prática desta dissertação, composta por uma série de quatro vídeos em que se exploram

o tempo longo de uma imagem, diferentes relações entre vídeo e fotografia e entre o

tempo longo e a memória: o retorno a um lugar, a uma paisagem, a suspensão de um

longo plano e o recomeço de uma relação com esse lugar e com a imagem em si .

PALAVRAS-CHAVE

tempo de uma imagem / tempo longo / fotografia / vídeo / memória

I

Page 4: LONG PIECE: o tempo de uma imagem - repositorio.ul.ptrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/8459/2/ULFBA_TES 558.pdf · sendo convocados, sendo David Campany, Laura Mulvey, Jacques Rancière,

ABSTRACT

LONG PIECE - the time of an image is a theoretical and pratical masters

dissertation on Multimedia Art, that analyses what is long in the time of an image. It

approaches the relations between the concepts of time and image, as elements, within

the shot, the movement and the observation, in the context of photography, film and

video

Different meanings of time are enunciated, in order to allow a broad interpretation

of this long time identified in the image: the exposure time, the structural time, the

physical time, the real time, the represented time, the duration time, the cinematic time,

the time-image, the contextual time and relational time.

Pieces by artists such as Tacita Dean, Michael Snow, Hiroshi Sugimoto and

Andrei Tarkovsky are brought into the analysis as different possible approaches on the

use of the concept of time, within the media set as the context of this research.

The concepts of return, suspension and restart, three figures of oblivion defined by

Marc Augé, forms of expression of possible relationships between time and image, are

also incorporated as the basis of the creation of Long Piece, the practical part of this

dissertation, composed of a series of four videos that explore the long time of an image,

different relationships between video and photography and between long time and

memory: the return to a place, a landscape, the suspension of a long shot and the restart

of a relation with this place and with the image itself.

KEY WORDS

time of an image / long time / photography / video / memory

II

Page 5: LONG PIECE: o tempo de uma imagem - repositorio.ul.ptrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/8459/2/ULFBA_TES 558.pdf · sendo convocados, sendo David Campany, Laura Mulvey, Jacques Rancière,

AGRADECIMENTOS

A todos os que me acompanharam neste período de pesquisa e criação que deu

origem a Long Piece: à minha família e aos meus amigos, pela permanência, paciência,

observação, inspiração e colaboração; ao Carlos, por tudo isso e por tudo o mais, todos

os dias. Muito obrigada.

III

Page 6: LONG PIECE: o tempo de uma imagem - repositorio.ul.ptrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/8459/2/ULFBA_TES 558.pdf · sendo convocados, sendo David Campany, Laura Mulvey, Jacques Rancière,

ÍNDICE

Índice de figuras ........................................................................................... V

Introdução ..................................................................................................... 1

1. O elemento tempo e a sua relação com a imagem ................................ 4

1.1. O tempo da imagem ............................................................................... 5

1.2. O tempo na imagem e a imagem-tempo ................................................ 9

1.3. O tempo para além da imagem ............................................................ 11

2. O que é longo no tempo de uma imagem ............................................ 14

2.1. O plano ................................................................................................. 15

2.2. O movimento ....................................................................................... 17

2.3 A observação ......................................................................................... 20

3. Long Piece .............................................................................................. 26

Conclusão ................................................................................................... 38

Bibliografia ................................................................................................ 39

Webgrafia ................................................................................................... 40

Anexo de imagens ...................................................................................... 42

IV

Page 7: LONG PIECE: o tempo de uma imagem - repositorio.ul.ptrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/8459/2/ULFBA_TES 558.pdf · sendo convocados, sendo David Campany, Laura Mulvey, Jacques Rancière,

ÍNDICE DE FIGURAS

Figuras em anexo

Fig.1 - Andrei Tarkovsky (1932-1986). Nostalghia, 1983. Filme. 120’ ................. 2Fig.2 - Chris Marker (1921-2012). Une journée d’Andrei Arsenevich, 1999. Filme.

55’ .............................................................................................................. 2Fig.3 - Hiroshi Sugimoto (1948-). “Tri City Drive-In”, 1993, da série Theatres,

1976 - 1999. Série fotográfica .................................................................. 7Fig.4 - David Claerbout (1969-). The Long Goodbye, 2007. Vídeo. 13’44’’.......... 7Fig.5 - Michael Snow (1928-). Condensation: A Cove Story, 2009. Vídeo.

10’28’’ ...................................................................................................... 8Fig.6 - Tacita Dean (1965-). Stillness, 2007. Série de 6 filmes, 5’ cada .............. 15Fig.7 - Hiroshi Sugimoto (1948-). Seascapes, 1890 -. Série fotográfica ............. 16Fig.8 - Tacita Dean (1965-). Film, 2011. Filme. 11’ ............................................ 16Fig.9 - Tacita Dean (1965-). Palast, 2004. Filme. 10’30’’ .................................. 17Fig.10 - Tacita Dean (1965-). Géllert, 1998. Filme. 6’ ....................................... 17Fig.11 - Michael Snow (1928-). Solar Breath (Northern Caryatids), 2002. Filme.

62’ ........................................................................................................... 17Fig.12 - Michael Snow (1928-). Wavelength, 1966. Filme. 45’ .......................... 19Fig.13 - Uta Barth (1958-). Field #14, 1996. Fotografia. ................................... 21Fig.14 - Uta Barth (1958-). “Untitled (act 5)”, da série From... and of Time, 2000.

Fotografia. .............................................................................................. 22Fig.15 - Uta Barth (1958-). ...And to draw a bright white line with light (Untitled

11.5), 2011. Fotografia. .......................................................................... 22Fig.16 - David Claerbout (1969-). Sunrise, 2009. Vídeo. 18’.............................. 22Fig.17 - David Claerbout (1969-). The Bordeaux Piece, 2004. Vídeo. 13h43’... 22

Figuras no texto

Fig.18 - Luísa Baeta (1972-). “Janela_1” da série Long Piece, 2013. Vídeo. 3’.. 28Fig.19 - Luísa Baeta (1972-). “Casa” da série Long Piece, 2013. Vídeo. 36’...... 30Fig.20 - Luísa Baeta (1972-). “Rio” da série Long Piece, 2013. Vídeo. 3’.......... 33Fig.21 - Luísa Baeta (1972-). “Janela_2” da série Long Piece, 2013. Vídeo. 3’.. 35

V

refª na p.

Fig. na p.

Page 8: LONG PIECE: o tempo de uma imagem - repositorio.ul.ptrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/8459/2/ULFBA_TES 558.pdf · sendo convocados, sendo David Campany, Laura Mulvey, Jacques Rancière,

Introdução

A presente dissertação, de natureza teórico-prática, desenvolve-se em torno da

seguinte questão central - o que é longo no tempo de uma imagem? - e tem como

objectivo analisar diferentes formas de tempo longo presentes em diferentes espécies de

imagens, privilegiando um tempo de captação, materialização e observação suficientes

para a imagem se revelar, se dar a ver. A questão decorre de algumas experiências que

fui fazendo, durante os últimos dois anos, com planos contínuos de vídeo e fotografia,

em que as imagens se tornaram longas.

No primeiro capítulo - “O elemento tempo e a sua relação com a imagem” - são

apresentados os elementos tempo e imagem e descritas várias aceções temporais e

relações possíveis entre esses dois elementos no âmbito da fotografia, do filme e do

vídeo; no segundo capítulo - “O que é longo no tempo de uma imagem” - analisam-se

três formas de expressão de tempo longo - o plano, o movimento e a observação, através

da obra de três artistas contemporâneos e enunciam-se os pontos de ligação com Long

Piece, a parte prática desta dissertação; no terceiro capítulo é descrito e analisado o

projecto artístico Long Piece.

A pesquisa teórica desta dissertação inicia-se em Deleuze, filósofo incontornável

no que diz respeito à imagem cinematográfica. A “imagem-tempo” é um dos parâmetros

orientadores de Long Piece. A partir deste autor e deste conceito, outros autores vão

sendo convocados, sendo David Campany, Laura Mulvey, Jacques Rancière, Raymond

Bellour, Victor Burgin ou Georges Didi-Huberman algumas das referências teóricas

principais no que se refere à análise da relação entre tempo e imagem. Mas era também

importante trazer para este cenário algumas referências da antropologia, disciplina que

estudei e que recorrentemente atravessa o meu trabalho. Assim, para além de Edward T.

Hall, com o seu estudo do tempo através das culturas1, Marc Augé é um autor também

presente, através da sua pesquisa sobre a dinâmica entre memória e esquecimento e

recorrendo às três figuras de esquecimento que define: o retorno, o suspenso e o re-

começo2 que serão conceitos associados ao plano, movimento e observação para a

identificação do tempo longo das imagens.

1

1 Em referência ao livro A Dança da Vida - a outra dimensão do tempo.2 in As formas do Esquecimento.

Page 9: LONG PIECE: o tempo de uma imagem - repositorio.ul.ptrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/8459/2/ULFBA_TES 558.pdf · sendo convocados, sendo David Campany, Laura Mulvey, Jacques Rancière,

Vários artistas, cujas obras se desenvolvem no âmbito de um pensamento sobre o

tempo e peças específicas foram surgindo como referências, em diferentes momentos.

Andrei Tarkovsky, Hiroshi Sugimoto, Michael Snow e Wim Wenders - servem de base,

criando o cenário em que todos vêm confluir e, a partir deles, surgem outros

fundamentais como Chris Marker, Chantal Akerman, Agnés Varda, Yasujiro Ozu, Jeff

Wall, Michael Wesely, Tacita Dean, David Claerbout, Ute Barth, entre outros. Apesar de

não serem todos incluídos no texto, são referências implícitas nesta pesquisa e que se

relacionam diretamente com as peças de vídeo que apresento como parte prática desta

dissertação.

Durante vários meses fui criando diferentes vídeos e fotografias, experimentando

o tempo longo, observando, registando momentos, ainda sem ter uma noção da forma

final dos objectos que viria a apresentar.

Em novembro de 2011, vi, pela primeira vez no cinema, o filme Nostalghia

(1983) de Andrei Tarkovsky durante o ciclo Esculpir o tempo que o CCB dedicou ao

autor. Durante todo o filme e sob diversas formas, o tempo surge como parte da imagem

e permanece nas imagens que também permanecem desse filme ainda hoje, na minha

memória. Uns dias antes tinha assistido a uma conferência proferida pelo seu filho,

sobre o trabalho do pai, seguida de uma projecção de Une journée d’Andrei Arsenevich

(1999), um filme de Chris Marker3 sobre o seu amigo Tarkovsky. Ambos nos permitem

entrar na vida e obra do cineasta, misturando momentos intensamente pessoais com

processos de filmagem e de montagem. Esta sequência de eventos foi determinante na

decisão de tornar o tempo o elemento essencial desta dissertação.

A dimensão pessoal do meu trabalho foi-se revelando nas imagens, como uma

necessidade de criar e preservar memórias e, simultaneamente, como um tributo que

presto à minha família. Não tenho muitas recordações de infância. Lembro-me de

instantes muito indefinidos ou então memórias substitutas que criei mais recentemente,

visualizando imagens - fotografias, filmes - ou mesmo criando imagens a partir das

histórias que a minha família me vai contando. A minha irmã, que tem uma memória

especialmente precisa, diz-me como era, o que aconteceu e eu faço uma memória - a cor

2

3 Realizador de La Jetée(1962), filme composto por uma sequência de fotogramas de imagem fixa, incluindo apenas uma cena em que a imagem em movimento permite visualizar um momento específico. Estranhamente a memória que tenho sempre deste filme não é de imagens fixas, mas de um decorrer cinematográfico.

Page 10: LONG PIECE: o tempo de uma imagem - repositorio.ul.ptrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/8459/2/ULFBA_TES 558.pdf · sendo convocados, sendo David Campany, Laura Mulvey, Jacques Rancière,

do sofá da sala da primeira casa onde vivemos, um vestido de mangas de balão, uma

brincadeira no colchão estendido sobre o cimento do quintal4, são algumas dessas

imagens. Depois, há fotografias que vejo tantas vezes, são-me tão familiares, em todos

os sentidos que penso que me lembro daquele momento em movimento - andar de

triciclo no quintal - mas de que na realidade não me lembro. Essa possibilidade de

passar de uma fotografia a uma memória, de uma imagem fixa a um plano fixo, é o que

transporto dessa experiência para este trabalho, utilizando a transposição da fotografia

para o vídeo, integrando a fotografia no vídeo, tornando o vídeo fotográfico e a

fotografia videográfica, através de uma relação de tempos que são ambos cinemáticos.

Como em Je me souviens de Georges Perec, texto criado a partir de fotografias, em que

a fotografia está na base de uma outra espécie de imagem, em Long Piece crio

memórias, num tempo suficientemente longo para as preservar.

A pesquisa bibliográfica e de referências artísticas inicial deu origem aos objectos

artísticos e foi a partir da continuação de um pensamento sobre eles que se iniciou uma

segunda fase de pesquisa bibliográfica, abrindo campo para outras referências que se

juntaram às iniciais.

As obras consultadas foram, quando possível, as versões originais ou as traduções

portuguesas existentes.

As traduções incluídas em corpo de texto são da responsabilidade da autora, sendo

incluídas em nota de rodapé as citações originais ou as traduções consultadas.

Algumas expressões, como loop foram mantidas no idioma original, por serem as

mais correntes para designar aquilo a que se referem.

Esta dissertação é escrita segundo as regras no novo acordo ortográfico.

34 em casa dos meus avós, onde agora vivo e onde foram filmadas parte das imagens de Long Piece.

Page 11: LONG PIECE: o tempo de uma imagem - repositorio.ul.ptrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/8459/2/ULFBA_TES 558.pdf · sendo convocados, sendo David Campany, Laura Mulvey, Jacques Rancière,

1. O elemento tempo

Nem tudo se adapta a uma simples descrição linear. É o caso do tempo. (...) o tempo é um agregado de conceitos, de fenómenos e de ritmos que recobrem uma muito ampla realidade. (Hall, 1996: 23)

Para Aristóteles “O tempo é aquilo em que se desenrolam os acontecimentos.”5

Não definindo nesta frase aquilo, o autor faz derivar a definição de tempo para uma

dimensão em que os acontecimentos se passam, ou seja, apresenta o tempo como um

elemento que viabiliza o que vai acontecendo.

Enquanto escrevo e tento definir o elemento tempo em si ou no âmbito desta

investigação, o tempo decorre, um tempo para além da dissertação, mas que a contém

como uma partícula na imensidão de partículas no universo. Cada frase tem um tempo,

esta frase decorre num tempo. Decorreu. Passou. Mas a cada vez que for lida retorna,

repete-se, num tempo diferente. Ao longo destas frases apenas descrevo a minha

perceção do tempo, mas não o tempo em si ou será essa a forma de o descrever e

analisar? Heidegger, em O conceito de tempo enuncia essa possibilidade:

A pergunta ‘o que é o tempo?’ transformou-se na pergunta ‘quem é o tempo?’ Mais precisamente: o tempo somos nós mesmos? Ou ainda mais precisamente: serei eu o meu tempo? É assim que mais perto dele chego a estar, e, se bem entendo a pergunta, com ela chegamos ao mais sério. Esta questão é, pois, a que constitui a via de acesso mais adequada ao tempo, enquanto este é sempre em cada caso o meu. Então, é que o ser-aí é ser-em-questão. (Heidegger, 2008: 71, 73)

O tempo existe sob uma multiplicidade de formas e experienciamo-lo, na nossa

vida, nessa multiplicidade em simultâneo, o que faz deste elemento um complexo

objecto para ser descrito. Ou seja, dificilmente descrevo o conceito tempo mas

apercebo-me da sua existência em tudo, a todo e qualquer momento.

O tempo tem uma qualidade de intangibilidade, uma vida intermédia fugidia, emitindo, apenas na passagem ou na transformação de objectos e eventos, as suas partículas de duração, apagando-se assim como tal, enquanto se abre ao movimento e mudança. Tem uma evanescência, uma fugacidade, uma ‘identidade’ altamente precária que resiste à concretização, indicação ou representação direta. O tempo é mais intangível que qualquer outra coisa, menos susceptível de ser compreendido,

45 Heidegger, 2008: p.27 (citando Aristóteles, Física, IV, cap.II, 219 seg.).

Page 12: LONG PIECE: o tempo de uma imagem - repositorio.ul.ptrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/8459/2/ULFBA_TES 558.pdf · sendo convocados, sendo David Campany, Laura Mulvey, Jacques Rancière,

conceptual ou fisicamente.6 (Grosz, 1999, 1)

Essa intangibilidade existe também na relação entre o tempo e a imagem, naquilo

que uma imagem nos revela, nos deixa perceber sobre o tempo.

Cada imagem que descrevo, cada imagem que refiro ou que mostro tem também

um tempo que se desdobra em diferentes dimensões simultâneas, que permitem diversas

perceções. O tempo real e o tempo em imagens decorrem em paralelo, entrecruzando- -

se continuamente. O tempo visível, através de imagens que são representações, mas

também objectos, cria o cenário desta dissertação.

A imagem é um conceito, tal como o tempo, com uma multiplicidade de

interpretações e formas possíveis, entre as quais a fotografia, o vídeo e o filme, que são

as que integram esta análise, especificamente quando entram em relação, dando origem

a objectos híbridos, quer em termos de forma quer em termos de interpretação.

A imagem, entendida quer como representação quer como objecto, implica tempo

e diferentes modos de ver7. O tempo e as diferentes perceções que temos dele, quando

entendido como componente da imagem visual, é multifacetado e permite diferentes

interpretações, diferentes direções de criação e de observação.

1.1. O tempo da imagem

Consideraremos, inicialmente, o tempo da imagem como elemento técnico

(tempo de exposição) e como elemento material (tempo estrutural, que torna a imagem

em movimento visível e tempo físico, definido pelos limites do meio utilizado para a

captação).

O tempo de exposição é uma das variáveis que está na base da fotografia ou do

filme. Permite que a quantidade de luz que passa através do diafragma para a superfície

sensível seja a adequada para a imagem que queremos fazer e, perante um objecto em

5

6 “Time has a quality of intangibility, a fleeting half-life, emitting its duration-particles only in the passing or transformation of objects and events, thus erasing itself as such while it opens itself to movement and change. It has an evanescence, a fleeting of shimmering, highly precarious ‘identity’ that resists concretization, indication or direct representation. Time is more intangible than any other ‘thing’, less able to be grasped, conceptually or physically.” (Grosz, 1999, 1)7 Expressão que implica uma referência ao livro com o mesmo título de John Berger.

Page 13: LONG PIECE: o tempo de uma imagem - repositorio.ul.ptrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/8459/2/ULFBA_TES 558.pdf · sendo convocados, sendo David Campany, Laura Mulvey, Jacques Rancière,

movimento, mostrar um momento desse movimento, um instante, um fragmento, num

snapshot 8 , ou o tempo do movimento sob a forma de um arrastamento, de uma

continuidade, de uma condensação, numa longa exposição. A decisão do tempo de

exposição determina o que vamos ver representado na imagem que criamos e como.

Thierry de Duve estabelece uma dicotomia entre a imagem como acontecimento,

como instante, por um lado, e como quadro e longa exposição, por outro,

correspondendo ao paradoxo da fotografia enquanto forma de representação da

realidade e na sua relação com o tempo. O autor refere, no texto Time exposure and

snapshot: the photograph as paradox (1978):

A fotografia é normalmente entendida numa de duas formas: como um acontecimento, porém de aparência estranha, um momento congelado que transmite muito pouco, se alguma coisa, da fluência das coisas que acontecem na vida real.; ou como um quadro, uma representação autónoma que pode ser emoldurada e pendurada, mas que curiosamente deixa de se referir ao acontecimento específico do qual emergiu. (...) o tempo de exposição é típico de um modo de perceber a fotografia ‘como quadro’, enquanto que a fotografia instantânea é típica de um modo de a entender ‘como acontecimento’.9 (Campany, 2007: 52)

Ao definir uma relação directa entre acontecimento e instantâneo e entre quadro e

tempo de exposição (subentendido, no seu texto, como longo) de Duve refere-se ao

acto, ao objecto fotográfico e à fotografia enquanto forma de representação. Nesse

sentido, como acontecimento, a fotografia dá-nos o momento em que algo se passou e

foi captado, um instante retirado da sequência do tempo real e trazido para um presente

que imediatamente refere o passado em que esse acontecimento se deu. Como quadro, a

fotografia deixa de se referir necessariamente a um acontecimento, a um instante e

passa a apresentar uma interpretação visual em que o tempo de exposição inclui uma

duração visível na imagem.

O tempo de exposição, nos seus limites leva-nos à ausência de imagem, quer por

insuficiência quer por excesso de luz, mas também aí existe uma leitura temporal.

6

8 instantâneo.9 “Photography is generally taken in either of two ways: as an event, but then as an odd looking one, a frozen gestalt that conveys very little, if anything at all, of the fluency of things happening in real life; or it is taken as a picture, as an autonomous representation that can indeed be framed and hung, but which then curiously ceases to refer to the particular event from which it was drawn. (...) the time exposure is typical of a way of perceiving the photograph as ‘picture like’, whereas the instantaneous photograph is typical of a way of perceiving it as an ‘event like’.” (Campany, 2007: 52)

Page 14: LONG PIECE: o tempo de uma imagem - repositorio.ul.ptrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/8459/2/ULFBA_TES 558.pdf · sendo convocados, sendo David Campany, Laura Mulvey, Jacques Rancière,

Quando Hiroshi Sugimoto10, em “Tri City Drive-In” (1993), da série Theatres (1976 -

1999) mostra o branco do écran de cinema, por acumulação da luz, o que está a mostrar

é, na realidade, o tempo de exposição que, ali, é o tempo de duração de um filme.

Passando da fotografia para o vídeo, o tempo de exposição complexifica-se no

sentido em que, apesar de a lógica (de quantidade de luz a afetar a superfície sensível)

ser a mesma, no vídeo existe uma outra aceção temporal que se relaciona com esta, que

é definida pela quantidade de fotogramas por segundo que se decide captar, dependendo

do medium, uma vez que o tempo de exposição vai-se repetir em cada um desses

fotogramas até surgir a imagem final visível. Esse tempo, como parte da estrutura do

objecto visual, parte da sua materialidade, na medida em que define a cadência do

movimento da própria imagem e a torna visível será definido como o tempo estrutural

da imagem. E, enquanto uma fotografia existe a partir de um tempo de exposição de

uma superfície sensível à luz e de uma possibilidade de preservar essa interacção, um

filme ou um vídeo existem apenas quando a esse fenómeno acresce um tempo próprio,

uma sequência ritmada e constante que nos permite visualizar a imagem em movimento,

a x fotogramas por segundo. Se este tempo não existir, estamos perante uma sequência

de fotogramas inertes, ou stills, numa ausência de movimento, percecionada como uma

pausa, uma interrupção.

O tempo estrutural, entendido como compasso, como na música, pode ser diverso

e dar origem a outros tempos, como a câmara lenta, em que se altera a perceção do

tempo real, permitindo observar cada imagem durante um intervalo de tempo maior,

porque se têm muitos mais fotogramas para observar, distendidos ao longo do tempo. A

captação é feita com uma frequência de fotogramas muito superior àquela a que a

imagem é posteriormente observada. Em The Long Goodbye11(2007) de David

Claerbout12, o tempo existe simultaneamente distendido e acelerado, entre a câmara

lenta em que uma mulher acena e a luz do sol que percorre as paredes da mansão atrás

dela, durante o tempo desse movimento, como se um dia inteiro entretanto passasse.

Aqui o tempo estrutural duplica-se em diferentes camadas, referindo essa característica

inicialmente descrita do tempo que é a sua multiplicidade.

7

10 n. 1948, Tóquio. Vive e trabalha em Nova Iorque e Tóquio.11 Vídeo, a cores, 13’44’’.12 n. 1969, Kortrijk, Bélgica. Vive e trabalha em Antuérpia, Bélgica.

Page 15: LONG PIECE: o tempo de uma imagem - repositorio.ul.ptrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/8459/2/ULFBA_TES 558.pdf · sendo convocados, sendo David Campany, Laura Mulvey, Jacques Rancière,

O time-lapse, outra forma de tempo estrutural, consiste num processo de

interrupções precisas e repetitivas, de momentos matematicamente seleccionados, entre

os quais se suprime o tempo e imagens do tempo real. Uma vida pode demorar apenas

alguns minutos ou segundos, captando uma imagem por hora, ao longo de anos.

Este é um processo que apesar de ser feito a partir de uma sequência de

fotografias, dá origem a um vídeo como Condensation: A Cove Story (2009) de Michael

Snow13.

Condensation: A Cove Story mostra, em time-lapse, uma paisagem do Norte do Canadá que se oferece como pano de fundo para um jogo de interacção entre a luz e o clima. Durante dois Verões, Michael Snow tirou uma fotografia a cada dez segundos com uma máquina fotográfica digital (uma time-lapse still camera), compondo depois um vídeo com milhares de fotos comprimidas num filme de dez minutos. (Meschede, 2011: p. 6)

A relação entre fotografia e imagem em movimento (vídeo e filme), em termos

temporais, é uma relação que nos leva continuamente à essência de uma e outra formas

de expressão. Se, por um lado, o movimento ou tempo estrutural de uma sequência de

fotogramas nos permite distinguir entre elas, por outro, ao inserirmos fotografias numa

sequência de imagens em movimento, qualquer coisa se altera na natureza dessas

imagens: a fotografia interrompe esse tempo, a sequência fílmica ou videográfica insere

pausas, que não correspondem necessariamente a paragens, podem até passar

despercebidas ao olhar do observador. São intervalos, que, como silêncios, fazem parte

de uma linguagem.

Entre o vídeo e o filme existe ainda uma diferença temporal, de tempo físico, que

depende do sistema de captação e montagem que utilizamos ser em película ou digital.

Na captação em película existe uma dimensão temporal, definida pela bobina, pelo

tempo que é possível filmar seguido e pela linearidade do tempo que se filma, enquanto

no vídeo, o tempo de captação é variável, dependendo do tipo de equipamento que se

usa. Na edição, por outro lado o tempo é muito diferente entre o vídeo e a película. O

que se filma uma vez só se pode utilizar uma vez. Em vídeo, o que se filma uma vez

pode ser utilizado e repetido quantas vezes se quiser. Tacita Dean, em Film14, refere esta

distinção:

8

13 n. 1928, Toronto. Vive e trabalha em Toronto.14 Dean, 2011: p.19.

Page 16: LONG PIECE: o tempo de uma imagem - repositorio.ul.ptrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/8459/2/ULFBA_TES 558.pdf · sendo convocados, sendo David Campany, Laura Mulvey, Jacques Rancière,

O tempo, nos meus filmes, é o tempo do filme em si. Implícito nisto está o que o filme continua a ter para além do digital, e que o digital precisa de encontrar para si, sob pena de se perder numa eternidade de opções, isto é a decisão (...) Todos os elementos, ao fazer um filme, são decisivos. Toda a bobine de filme tem uma extensão, determinada pela metragem e custo, e essa limitação leva à decisão: dois minutos e meio são 100 pés (cerca de 30,5 m) de película de 16mm; 1000 pés (cerca de 305m) são onze minutos de película de 35mm, a extensão física do tempo. (...) Para mostrar uma cena em tempo real, seja qual for a sua extensão, é sempre necessário recorrer à ficção e à ilusão, uma vez que no filme o tempo real é editado. No digital, claro, pode-se filmar o tempo continuamente, sem paragens. Na edição (em película), não se pode repetir um plano ou invertê-lo de cima para baixo ou da frente para trás se não se tiver a película filmada. Repetir o que não se tem ou mostrar o que não se filmou, implica fazer um novo negativo.15. (Dean, 2011: 19)

Apesar das diferenças entre ambos os processos, o limite temporal e a linearidade

do tempo físico podem, de certo modo, ser transpostos para o digital, sem com isso se

pretender afirmar que um processo substitui o outro, mas somente que essas

características materiais podem tornar-se parte de um método e subsistir para além da

materialidade do medium. Em Long Piece, não só existe um limite temporal na captação

de cada plano, análogo ao limite da bobina, devido à especificidade da câmara utilizada

que, de origem, permite apenas filmar cerca de 11 minutos seguidos, como se manteve

uma linearidade na montagem, não se introduzindo repetições do mesmo material, mas

sim uma sensação de repetição que advém de diferentes planos, em que se captam

momentos idênticos, ou mesmo da introdução de fotografias entre o filme, em que o

enquadramento é o mesmo de um plano filmado.

1.2. O tempo na imagem e a imagem-tempo

O tempo na imagem será o tempo que essa imagem representa e relaciona-se

inicialmente com a captação, mas também com a edição, a montagem e a pós-produção.

9

15 “The time in my films is the time of film itself. Implicit in this is what film continues to hold over digital, and which digital needs to find for itself or be lost in an eternity of options, and that is decision. (...) Every element in the making of a film is decisive. Every roll of film has a length: length determined by footage and expense, and finite length makes for decision: two and a half minutes is a 100 feet of 16mm film; 1000 feet is eleven minutes of 35mm: the physical length of time. (...) To show a scene in real time of any length, one must always resort to fiction and illusion, for in film, real time is edited. With digital, of course, one can record continuous time without break. When editing, you cannot repeat a shot or turn it upside down or run it backwards if you do not have the footage. To repeat what you do not have, or to show it doing what it does not do, means making a new negative” (Dean, 2011: 19)

Page 17: LONG PIECE: o tempo de uma imagem - repositorio.ul.ptrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/8459/2/ULFBA_TES 558.pdf · sendo convocados, sendo David Campany, Laura Mulvey, Jacques Rancière,

Consideremos então o tempo cinemático, o tempo de duração e a imagem-tempo como

as formas temporais visíveis na imagem, numa relação contínua entre tempo real e

tempo representado.

O tempo real é o referente da imagem, o tempo de tudo o que está à nossa volta,

susceptível de ser observado. É simultaneamente o passado, o presente, o futuro, ou

seja, a imensidão temporal e o momento específico. É multiplicidade de tempos

diversos, individuais e plurais. Tudo existe num tempo que se refere à realidade, até o

próprio tempo. Quando criamos uma imagem, o tempo representado é a forma ou

formas como mostramos o tempo numa imagem ou numa sequência de imagens, quer

em termos de tempo linear quer em termos de experiência temporal, desde a captação à

exibição, independentemente do medium que se escolhe.

A fotografia e o filme, enquanto meios inicialmente difundidos como expressão da

relação mais directa entre real e representação, foram-se emancipando e integrando a

ficção como uma das suas apetências. O tempo real e o tempo representado deixaram de

ser necessariamente literais e coincidentes e dessa não coincidência surgem diferentes

leituras possíveis, até simultâneas de uma mesma imagem ou sequência de imagens.

Essa dimensão ficcional da imagem atribui-lhe uma aceção temporal diegética que

definiremos como o tempo cinemático. Este existe na temporalidade representada em

cada imagem ou no intervalo entre imagens e para além das imagens, sendo a base da

narrativa visual numa fotografia, num fotograma, numa série fotográfica, num filme, ou

na relação entre imagens e texto ou som. Consideraremos então o tempo cinemático

como uma “pulsação”16 que permite a relação entre realidade, ficção e representação.

Este é o tempo que permite a associação e a memória na imagem.

Na fotografia, a temporalidade cinemática revela-se a partir e para além da

imagem, através do instante, do intervalo e da duração. Não existe movimento real e o

tempo parece parado, mas também aí a relação entre realidade, ficção e representação é

necessária e a associação e a memória parecem desencadear narrativas para além da

imagem.

Na imagem em movimento, o tempo cinemático é revelado pela sequência de

planos, pelo tempo de cada plano e pelo tempo entre planos. No contexto do tempo

como elemento de linguagem, o tempo de duração corresponde a uma relação

1016 Cullinan, Nicholas in Dean, Tacita Film (2011): p. 13.

Page 18: LONG PIECE: o tempo de uma imagem - repositorio.ul.ptrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/8459/2/ULFBA_TES 558.pdf · sendo convocados, sendo David Campany, Laura Mulvey, Jacques Rancière,

essencial entre a captação e a montagem. Relaciona-se directamente com o tempo

físico, mas reflete simultaneamente uma decisão do autor, ou seja, o tempo de captação

de um plano pode ter uma duração pré-definida materialmente, pode também ser

definido por aquilo que se está a captar ou pode até ser um decisão do autor, dependente

de outros fatores. Esses serão os limites que inicialmente definem um princípio e um

fim do plano e que podem ou não coincidir com os da sua versão final, depois da

montagem, como refere Chantal Akerman em “In Her Own Time”, uma entrevista de

Miriam Rosen, publicada na Artforum em 2004:

Quando se está em montagem, algo acontece que nos diz que este é o momento para cortar. Não é teórico, é algo que sinto. Depois, explicá-lo é sempre muito difícil. (...) Não quero que “pareça real”, não quero que pareça natural, mas quero que as pessoas sintam o tempo que demora, que não é o tempo que realmente demora, percebe? 17 (Campany, 2007: 195)

Considerando o tempo como um elemento passível de ser apreendido e

transmitido através de imagens, refere-se também necessariamente a imagem-tempo18,

como um conceito a integrar esta descrição temporal. Deleuze associa na imagem-

-tempo o presente e a memória, a imagem real e virtual, o puramente visual e o

puramente sonoro, espaços vazios, silêncios longos, relações mentais. A imagem-tempo

será, então, uma imagem que existe para além do movimento daquilo que se passa no

plano e do movimento do medium fílmico em si, em que o movimento existe, mas na

perspectiva do tempo. Nesse sentido, o plano que permanece, que dura não persiste para

registar um movimento, mas regista esse movimento num tempo que o revela, tornando

o próprio tempo visível, como elemento base da imagem.

1.3. O tempo para além da imagem

Definidos os parâmetros temporais observáveis numa imagem, consideremos

ainda um tempo que, apesar de ser exterior à imagem, determina a sua observação, o

11

17 “When you’re editing, something happens that tells you this is the moment to cut. It’s not theoretical, it’s something I feel. Afterwards explaining it is always very difficult. (...) You see, I don’t want it to “look real”, I don’t want it to look natural, but I want people to feel the time that it takes, which is not the time that it really takes.” (Campany, 2007: 195)18 Em referência à obra de Gilles Deleuze, A Imagem-Tempo, Cinema 2.

Page 19: LONG PIECE: o tempo de uma imagem - repositorio.ul.ptrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/8459/2/ULFBA_TES 558.pdf · sendo convocados, sendo David Campany, Laura Mulvey, Jacques Rancière,

tempo contextual, que terá a ver com o espaço e a situação específica em que se

observa a imagem.

Um filme projetado numa sala de cinema ou num espaço similar implica

geralmente uma decisão de entrar e sair, tal como de permanecer, desde um início a um

fim de sessão. Esse lugar não é de passagem, mas de permanência. Normalmente, ali o

tempo que se está a observar o filme coincide com a sua duração completa. Por outro

lado, numa galeria, num espaço de passagem, numa sala sem assentos, o espaço sugere

um tempo mais livre e presumivelmente mais curto de observação. Nesse espaço, a

observação de um filme pode ser muito semelhante à de uma fotografia, no sentido em

que o tempo pode ser indeterminado. O observador não terá necessariamente que

começar num princípio e terminar num fim, até porque muitas vezes esses limites não

existem ou não são considerados determinantes para a observação.

Este tempo contextual é, no entanto, dependente da nossa decisão e atitude, sendo

suscetível de se tornar irrelevante. Michael Tarantino descreve, em A Few Brief

Moments of Cinematic Time, as suas primeiras idas ao cinema e essa irrelevância de um

tempo exterior face a um tempo individual:

Ia normalmente com o meu pai que, por alguma razão, nunca tinha em consideração o tempo de início (do filme). Ir ao cinema era apenas isso... uma espécie de experiência genérica em que o filme era sempre diferente e o momento de chegada e de partida deviam encaixar no horário diário [no tempo do meu pai] e não no tempo fixo da narrativa do filme.19 (Campany, 2007: 36-37)

Para a fotografia o tempo contextual é também relevante, sendo talvez um dos

seus parâmetros principais o ambiente em que se observa uma imagem. Recorrendo

novamente à galeria como espaço de exibição, poderemos imaginar duas situações

diferentes que alteram este tempo associado ao espaço: num dia de inauguração, um

visitante percorre uma exposição e o tempo de que dispõe para observar cada imagem

exposta será diferente do tempo, num qualquer dia seguinte em que pode percorrer,

isolado, o mesmo espaço. Por outro lado, uma sequência fotográfica observada nesse

espaço ou num livro altera a nossa observação, especialmente pela relação física que

estabelecemos com o objecto-imagem, pelas dimensões que as imagens apresentam e

12

19 “I usually went with my father, who, for some reason, never took account of the starting times. Going to the movies was just that... a kind of generic experience in which the film would be different each time and the moment of arrival and departure was meant to fit into the day’s schedule (my father’s time) rather than the fixed narrative time of the film.” (Campany, 2007: 36-37)

Page 20: LONG PIECE: o tempo de uma imagem - repositorio.ul.ptrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/8459/2/ULFBA_TES 558.pdf · sendo convocados, sendo David Campany, Laura Mulvey, Jacques Rancière,

pelas relações e associações que nos é facilitado fazer nestes dois contextos.

Em conjugação com esta aceção contextual está um outro tempo que definiremos

como tempo relacional, ou seja o tempo que estamos perante uma imagem e em que a

podemos observar, dependendo, por um lado, da nossa disponibilidade, do tempo de que

dispomos ou que nos deixamos dispor para observar uma imagem e que permite que a

imagem se dê a ver e, por outro, da acessibilidade da imagem, que pode ter um tempo

pré-determinado em que é visível - um plano de um filme ou um loop - ou pode estar

permanentemente acessível emoldurada sobre uma parede. Algumas imagens requerem

um tempo relacional longo, contemplativo, outras necessitam apenas de instantes para

serem observadas e se darem a ver.

13

Page 21: LONG PIECE: o tempo de uma imagem - repositorio.ul.ptrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/8459/2/ULFBA_TES 558.pdf · sendo convocados, sendo David Campany, Laura Mulvey, Jacques Rancière,

2.O que é longo no tempo de uma imagem

O título desta dissertação LONG PIECE - o tempo de uma imagem, que implica

necessariamente analisar o que é longo no tempo de uma imagem, surgiu a partir de

uma intervenção de Merce Cunningham20 no simpósio Time and Space Concepts in

Music and Visual Art, organizado pela Pleiades Gallery e pela Association of Artist-Run

Galleries, em Nova Iorque, em 1978. Cunningham refere, acerca do tempo longo:

(...) a ideia de fazer uma peça longa interessa-me bastante, neste momento, porque penso que é possível... (é claramente possível, já que tantos o fazem) fazer peças longas, agora, sem problema algum. (...) Recordo-me do primeiro ballet que fiz, The Seasons, (As Estações) que o John Cage e eu fizemos (...) e recordo-me de estar bastante nervoso porque iria ter 15 minutos. Como iria eu lidar com isso? (...) Como lidar com esse tipo de extensão? Dividia-se numa estrutura muito clara, mas de qualquer forma, ainda tinha que inserir a dança nessa estrutura e isso era, para mim, um problema muito complicado. Agora pareço fazer peças... Não quero dizer que seja necessariamente mais fácil, mas não me perturba nada fazer algo com uma hora ou duas de duração. Essa ideia não me desagrada. Qualquer coisa no tempo mudou completamente. Sei que no meu trabalho isso sucede porque não penso em tempo métrico, mas no... tempo: quantos segundos ou minutos qualquer coisa pode ter, e em vez de pensar que tem que caber num batimento métrico, posso usar um espaço de tempo.21 (Cunningham, 1978)

Este tempo longo descrito por Cunningham era o tempo que eu tinha começado a

filmar e a expressão Long Piece passou a fazer parte do meu trabalho, sem mais

hesitações, assumindo, em cada peça, o tempo necessariamente longo que as imagens

me sugeriam. E é esse tempo que nesta dissertação se analisa, tentando identificar o que

é longo no tempo de uma imagem, recorrendo ao plano, ao movimento e à observação

como elementos e momentos essenciais do processo de criação.

14

20 coreógrafo, n. 1919, Washington, EUA.21 “(...) the idea about doing a long piece, that interests me very much now, because I think it is possible to... (it’s quite possible obviously, since so many people do it) to make long pieces now with no problem at all. (...) I can remember the first ballet I did, The Seasons, that John Cage and I did (...) and I can remember being very nervous because it was going to be 15 minutes long. And how would I deal with that? (...) And how to deal with that kind of length? It was divided in a structure which was very clear, but just the same, I still had to put dancing within that structure and it was, to me, a very complicated problem. Now I seem to make pieces... I don’t mean it’s easier necessarily, but I have no trepidation about making something which is an hour or even two hours long. That idea doesn’t put me off. Something about time has totally shifted. I know that in my work I think that’s come about because I don’t deal in metric time but in... time: how many seconds or minutes something may be, and rather than thinking that it has to fit a metric beat, I can use a space of time.” (Cunningham, 1978). Transcrição da autora, a partir de um vídeo do simpósio.

Page 22: LONG PIECE: o tempo de uma imagem - repositorio.ul.ptrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/8459/2/ULFBA_TES 558.pdf · sendo convocados, sendo David Campany, Laura Mulvey, Jacques Rancière,

2.1. O plano

O plano, como espaço de tempo captado, “o mais pequeno enunciado narrativo”22,

parece tornar o tempo da imagem longo, sob diferentes formas: pela imobilidade da

câmara, pela imobilidade daquilo que se capta, pela repetição e pela lenta passagem

entre imagens de diferentes planos.

Como no início da história do cinema, o fascínio da duração do plano faz com que

muitas vezes seja difícil a decisão de quando iniciar e quando terminar, de o determinar.

A esse propósito Wim Wenders refere: “Mesmo no começo - e muito dele restou - , para

mim, fazer filmes era: colocar a câmara algures e dirigi-la para alguma coisa muito

concreta, e depois não fazer mais nada, deixá-la apenas correr.” (Wenders, 2000: p. 11).

Nos seus filmes, continuam a existir momentos que se relacionam com esta descrição e

que nos podem facilmente transportar para outros cineastas, que são também referências

suas, como Ozu, que Deleuze também refere na sua análise da imagem-tempo,

relativamente ao plano fixo: “Os movimentos de câmara tornam-se cada vez mais raros

(...) A imagem acção desaparece em benefício da imagem puramente visual (...) É

evidente que este método coloca tempos mortos, desde o início, e fá-los proliferar no

decurso do filme.” (Deleuze, 2006: 27) O tempo do plano é acentuado pela opção de

manter o plano fixo, demorar a imagem sobre o que há para ver.

Em Stillness23 (2007) de Tacita Dean24, o plano fixo é um dos elementos que

define a peça em termos temporais. A artista filma Merce Cunningham que executa seis

vezes uma performance, com a composição musical de John Cage 4’33’’. O som desta

obra de Cage, composta por três andamentos de silêncio, integra o som ambiente do

local onde decorre a apresentação. A quase imobilidade de Cunningham decorre ao

longo também de três movimentos, filmados em planos contínuos, de câmara fixa.

Stillness é a simbiose de todas estas formas - quietude, calma, silêncio - que são

diferentes aceções desta palavra. O plano fixo leva a essa leitura, de tempo longo, mais

facilmente do que um plano em que existe movimento de câmara. Existem menos

distrações para o nosso olhar e temos que manter-nos dentro de um limite visual que

15

22 Deleuze, 2006: 41.23 Um conjunto de 6 filmes em 16mm, a cores, som, 5’ cada, em 6 projeções simultâneas, em loop.24 n. 1965, Canterbury, Reino Unido.

Page 23: LONG PIECE: o tempo de uma imagem - repositorio.ul.ptrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/8459/2/ULFBA_TES 558.pdf · sendo convocados, sendo David Campany, Laura Mulvey, Jacques Rancière,

não se altera. O espaço de representação é aquele e é ali que o que quer que seja que se

passe decorrerá. Se não acontece nada, então o plano torna-se longo, por ser um plano

de um não-acontecimento. A repetição de uma mesma cena, que se apresenta sob

diferentes enquadramentos em cada plano, gerando assim uma diferença que sustenta a

sua coexistência, é outro dos aspectos que neste contexto ajuda a criar esse tempo

longo. Vemos uma mesma cena várias vezes e de cada vez vamos vendo mais qualquer

coisa diferente, para além de tudo o que permanece idêntico, adensando o tempo.

O tempo longo do plano fixo de um filme, em que temos a sensação de estar

perante uma fotografia, ou seja o tempo de um filme fotográfico e o de uma fotografia

cinemática, em que a possibilidade de narrativa é tão presente que a torna fílmica, são

idênticos, no sentido em que lado a lado as semelhanças temporais entre estas duas

imagens serão evidentes (ambas são quadros em que o nosso olhar permanece), mas

também aquilo que as distingue será definitivo da essência de cada uma. Ou seja, entre

Stillness de Tacita Dean e Seascapes25 de Hiroshi Sugimoto há uma semelhança

temporal, que se relaciona com este paradoxo entre dois meios passíveis de criar um

quadro, em que a ausência de movimento intensifica a possibilidade da permanência de

quem observa.

Na instalação Film (2011)26 é a repetição da forma inserida no plano e a repetição

da peça num todo que enfatiza o tempo. Esta peça é uma declaração clara e imensa da

importância que a película tem, como elemento determinante e insubstituível, para a

artista, sintetizando em imagens o que tem vindo continuamente a afirmar acerca desse

meio que privilegia. Film, criado para a Tubine Hall da Tate Modern em Londres, é uma

sequência de 11’ em filme, de 35mm, que nos mostra, em loop, a própria película

verticalmente a ser preenchida por imagens que vão passando, se vão sobrepondo, vão

criando relações, associações, dissociações, sobre uma superfície em que a parede do

espaço preenche também a imagem. Nesta peça interessa-me também destacar, por um

lado o enquadramento vertical que normalmente associamos à fotografia, no âmbito dos

meios aqui abordados, e por outro lado o tempo de cada plano e a sua relação com os

outros que simultaneamente ou sucessivamente formam a imagem total da tira de

película, em cada momento, criando, também aqui uma imagem-quadro ou “quadros no

16

25 Série fotográfica, 1980 - ...26 Projecção em loop sobre um monolito de 13m de altura.

Page 24: LONG PIECE: o tempo de uma imagem - repositorio.ul.ptrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/8459/2/ULFBA_TES 558.pdf · sendo convocados, sendo David Campany, Laura Mulvey, Jacques Rancière,

quadro”27. Um tempo mais longo mantém-se, como uma base do plano, sobre o qual

outros tempos vão surgindo. Existe uma sensação de plano longo e de instante,

simultaneamente, na imagem.

Em Palast28 (2004), é a cadência dos planos que cria uma monotonia e um tempo

longo. A sequência de planos fechados do Palast der Republik, em Berlim, dirige-nos o

olhar para um detalhe e dá-nos um tempo determinado para o observar e logo se segue

outro detalhe e depois outro e outro, sempre com esse tempo a pautar a sucessão de

imagens e relações. Um tempo que vai permitindo que a observação seja estimulada e

que o observador permaneça. A imagem torna-se longa pela repetição de um tempo

semelhante em cada plano, que é, de certa forma, longo.

Para além do plano fixo, da imobilidade e da repetição, o intervalo entre planos, a

passagem entre imagens é uma outra forma que me interessa identificar para a análise

do que é longo no tempo das imagens. Em Gellért29(1998) um tempo longo é criado a

partir de planos fixos que, muito lentamente, vão passando de uns para os outros. Um

grupo de mulheres, nas termas de Budapeste, surge num tempo fílmico paradoxal, que

enfatiza o ambiente do lugar e o movimento lento dos corpos dentro e fora da água. As

imagens foram captadas ao longo de uma hora e são exibidas durante 6 minutos, mas

são tão longas as passagens entre si que a sensação da passagem de uma hora persiste.

O espaço de tempo captado ou o intervalo entre sucessivos espaços de tempo são

as superfícies nas quais este tempo longo decorre.

2.2. O movimento

Como elemento temporal de uma imagem, o movimento pode acontecer no plano,

na forma como se capta a imagem, na montagem e na exibição e tornar longo o tempo

de uma imagem.

Em Solar Breath (2002), de Michael Snow30, a câmara permanece durante todo o

tempo da peça, num plano fixo de uma janela em que uma cortina é continuamente

17

27 Deleuze, 1984:28.28 Filme de 16 mm, a cores, som, 10’30’’, loop.29 Tacita Dean, filme em 16mm, cor, som ótico, 6’, retro-projecão, loop.30 n. 1929, Toronto, Canadá

Page 25: LONG PIECE: o tempo de uma imagem - repositorio.ul.ptrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/8459/2/ULFBA_TES 558.pdf · sendo convocados, sendo David Campany, Laura Mulvey, Jacques Rancière,

abanada pelo vento. O movimento é contínuo, criando uma composição em que a

aleatoriedade e um minimalismo repetitivo estão presentes e são fruto de uma longa

observação de um fenómeno que recorrentemente acontece numa determinada altura do

ano, no local onde o artista vive parte do ano. A repetição e o tempo longo são ainda

enfatizados pelo loop.

Solar Breath... é um loop de 62’ de cortinas esvoaçantes que revelam e ocultam uma paisagem rural idílica em Newfounland. O trabalho resulta da observação, pelo artista, de uma janela na sua cabana de verão, no Canadá. Ao longo dos anos, segundo o artista, “uma misteriosa performance de vento tem lugar numa das janelas, aproximadamente uma hora antes do pôr-do-sol.” O artista procura captar, neste filme, os vários movimentos e dobras que a cortina cria contra o vidro da janela, por interação com o vento. Este trabalho, de acordo com o autor, pertence a um grupo de obras em filme e fotografia, que não são objectos considerados como “arte”, mas foram “apanhados de surpresa” pelo artista. Num texto sobre esta peça, Snow escreve: “O que vi nos eventos de sol e vento foi o seu potencial enquanto arte. Não captei estes eventos para partilhar estes modestos fenómenos do meu quotidiano com os outros. Não, o jogo de luz, superfícies e duração disse-me: este evento real, não-encenado, contem os elementos essenciais para uma obra de arte contemplativa, do tempo, luz e movimento, uma imagem em movimento, com valores plásticos e associações reverberantes, que irão recompensar muitas visualizações.”O artista acrescenta: “Se, por um lado, Solar Breath é meramente uma gravação documental com uma câmara fixa, é também o resultado de anos de atenção... Solar Breath (Northern Caryatids) são 62 minutos dos mais belos e eloquentes movimentos e dobragens que o sol, o vento, uma janela e uma cortina jamais compuseram. O acaso e a escolha coexistem.31 (Shainman, 2006)

A simplicidade aparente desta peça é uma das referências que quero também

destacar. Por um lado, o vento, uma janela, um efeito atmosférico são os elementos que

estão na base de uma contemplação necessária para que tudo se revele e esse momento

seja escolhido como objecto; por outro lado essa simplicidade é acrescida, por haver

uma exposição de um espaço que é a casa, o espaço mais simples, porque mais

18

31 Solar Breath... is a 62’ loop of fluttering curtains that reveal and conceal an idyllic landscape in rural Newfounland. The work is a result of artist’s observations of a window of his summer cabin in Canada. Over the years, according to him, “a mysterious wind performance takes place in one of the windows, about an hour before sunset”. The artist seek to capture in the film the various movements and folds that the window’s curtain creates against the window’s screen, with the interaction of the wind.This work, according to the artist himself, belongs to a group of film and photographic works who take subjects that were not formed by the artist as “art”, but rather were “taken-by-surprise” by the artist. In a text about this work, the artist writes:“What I saw in these sun-and-wind events was their potential as art. I did not record these "events" to share this modest phenomenon from my daily life with others. No, the rich play of light, surfaces and durations said to me: this real, un-staged event contains the elements which are essential for a contemplative time-light-motion work of art, a "motion picture" with "plastic" values and reverberant associations which will reward many viewings.”The artist adds: “While on one level, Solar Breath is merely a fixed-camera documentary recording, it is also the result of years of attention....Solar Breath (Northern Caryatids) is 62 minutes of the most beautiful, eloquent movements and pliages that the sun, wind, windows and curtain have yet composed. Chance and choice co-exist.” (Shainman, 2006)

Page 26: LONG PIECE: o tempo de uma imagem - repositorio.ul.ptrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/8459/2/ULFBA_TES 558.pdf · sendo convocados, sendo David Campany, Laura Mulvey, Jacques Rancière,

quotidiano, mais presente e que o artista torna simultaneamente cenário de uma

pesquisa e objecto fílmico.

Na fotografia, captar o movimento num plano pode tornar a imagem longa, por

suspensão ou por acumulação desse movimento. Neste sentido, o snapshot e a longa

exposição serão duas formas possíveis de criar tempo longo numa imagem. A suspensão

de um movimento permite que a sua observação seja mais minuciosa. É o tempo

cinemático que se revela longo, enquanto que a acumulação acrescenta à imagem,

tempo de duração. Comparando duas séries de Sugimoto anteriormente citadas,

Seascapes e Theatres, é possível observar esta dicotomia do movimento. Seascapes é

uma série fotográfica em que o tempo é visível, como tempo cinemático que prevalece

em cada imagem ou numa sequência. São imagens que transpõem os limites do medium

e nos levam para além, numa contemplação, numa divagação em que a fotografia quase

se torna um longo plano fixo de um filme. Nestas imagens, podemos observar

repetidamente a linha do horizonte separando o oceano do céu, a água do ar, dividindo

de um modo mais ou menos nítido, a imagem em duas áreas. Em algumas fotografias a

longa exposição torna a imagem mais abstrata32, noutras a definição é tal que o tempo

remete para o instante e a imagem apenas permanece longa na sua aceção cinemática,

suspendendo o contínuo movimento do oceano. Por outro lado, em Theatres é a longa

exposição que permite captar o movimento longo da cena, acumulando todos os planos

de um filme num só plano fotográfico. É a duração do filme que determina a imagem,

mas é também essa duração que sugere uma observação longa.

Um outro modo de percecionar o tempo longo através do movimento será pelo

movimento da câmara. Em Wavelength33 (1966), durante 45’, a câmara move-se

lentamente num plano contínuo de aproximação, em direcção a uma fotografia do mar

que está na parede oposta. Esse movimento de aproximação é longo, porque

aparentemente impercetível. Durante algum tempo, parece-nos que nada acontece

naquela imagem para além dos efeitos que se vão sucedendo sobre o plano de base da

sala. Mas alguns episódios marcam momentos do contínuo de aproximação: as pessoas

19

32 A Pace Gallery, em Londres, exibiu, entre 4 de outubro e 17 de novembro de 2012, a exposição Rothko/Sugimoto: Dark Paintings and Seascapes, onde se estabelecem relações importantes para a perceção das obras dos dois artistas. A referência a esta exposição permite enfatizar a relação entre a abstração das formas e a leitura temporal possível na obra de ambos artistas. 33 Michael Snow, filme em 16 mm, a cores, som, 45’.

Page 27: LONG PIECE: o tempo de uma imagem - repositorio.ul.ptrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/8459/2/ULFBA_TES 558.pdf · sendo convocados, sendo David Campany, Laura Mulvey, Jacques Rancière,

que entram, a mobília que é movida, um homem que cai aparentemente inanimado.

Como se fossem inícios ou fins de atos. O som é também claramente um elemento que

cria o tempo longo nesta peça: o movimento das ondas sonoras, que se vai

intensificando desde um som mais grave ao mais agudo, cria uma expectativa, um

crescendo que parece distender o tempo em que a ação decorre.

Numa fotografia em que a captação de um movimento implica a deslocação da

câmara, a leitura de tempo longo, uma vez mais, relaciona-se com a suspensão e com a

acumulação, mas numa mesma imagem, em que é possível suspender e

simultaneamente criar um arrastamento. O tempo de exposição e o tempo cinemático

são então ambos longos.

Segundo Deleuze “A imagem-movimento tem duas faces: uma em relação aos

objectos de que ela faz variar a posição relativa, a outra em relação a um todo de que ela

exprime uma mudança absoluta. As posições estão no espaço, mas o todo que muda está

no tempo. (...) chama-se enquadramento a primeira face do plano voltada para os

objectos, e a montagem a outra face voltada para o todo.” (Deleuze, 2004: 53) No plano

e no enquadramento observámos já esse movimento, sendo a montagem a fase seguinte

em que a repetição e a interrupção são dois aspectos possíveis de análise.

A repetição contínua ou loop de uma imagem ou sequência de imagens será mais

uma forma de tornar longo o tempo, considerando que deixamos de perceber os limites,

ou seja, é uma forma de deixar de ter referências e de o tempo se tornar mais ambíguo e

possivelmente longo. Mesmo que nessa repetição sejam incluídos alguns planos

diferentes em cada loop ou, no extremo, a sequência se torne repetitivamente aleatória,

o tempo longo persiste.

A interrupção do movimento do plano ou do objecto, por um still34, será também

uma espécie de intervalo que altera o tempo da imagem e o torna mais longo, pela sua

imobilidade.

2.3 A observação

A observação, entendida como uma ação, uma relação activa e interativa entre o

2034 fotograma sem movimento estrutural.

Page 28: LONG PIECE: o tempo de uma imagem - repositorio.ul.ptrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/8459/2/ULFBA_TES 558.pdf · sendo convocados, sendo David Campany, Laura Mulvey, Jacques Rancière,

observador e a imagem é o que se pretende analisar neste momento da dissertação.

Partindo do tempo relacional e do tempo contextual anteriormente definidos como

tempo para além da imagem, abordaremos agora a observação como um aspecto do

tempo longo de uma imagem.

Considerando a imagem sob a forma de uma fotografia, um filme com um tempo

definido ou um loop num tempo infinito, a sua observação pode demorar o mesmo

tempo, quer porque a imagem assim o requer, quer porque a nossa disponibilidade

assim o determina, quer ainda porque o contexto em que é exibida assim o permite. Ou

seja, ao demorar um longo tempo na observação é possível atribuir esse longo tempo à

imagem sem que esse tempo corresponda necessariamente ao seu tempo de duração,

mas a outras aceções temporais, como o tempo cinemático.

Uta Barth35 explora a dimensão temporal das suas fotografias e a perceção dos

observadores, recorrendo a imagens em que a pouca nitidez, a abstração das formas e os

efeitos da luz são os principais elementos a que a imagem se refere, tornando-se longa

na observação, por esses elementos conduzirem o observador a uma permanência, a

uma persistência que permita a sua perceção.

A um nível óbvio, todos esperamos que a fotografia seja uma imagem de algo. Partimos do princípio que o fotógrafo observou um lugar, um indivíduo, um acontecimento no mundo e quis captá-lo, apontar para ele. Há sempre qualquer coisa que o motivou a tirar a fotografia. O problema, no meu trabalho, é que estas imagens não são realmente de nada, nesse sentido. Registam apenas o que é sugerido acidental e perifericamente. Há somente alguns indícios de que o que estamos a ver é a informação circundante. (...) Lentamente torna-se claro que estamos perante uma espécie de contentor vazio e é nessa altura que as pessoas começam a “projetar” naquele espaço. Começa a ser lido como um écran vazio. (Barth, 1996) 36

Em Field #14 (1996)37, Barth serve-se de um desfoque absoluto para criar uma

imagem quase impenetrável, mas que simultaneamente parece pedir ao observador que

fique mais algum tempo até que se aperceba de uma interpretação possível, de uma

21

35 Artista visual, n. 1958, em Berlim. Vive em Los Angeles.36 “On the most obvious level, we all expect photographs to be pictures of something. We assume that the photographer observed a place, a person, an event in the world and wanted to record it, point at it. There is always something that motivated the taking of a photograph. The problem with my work is that these images are really not of anything in that sense, they register only that which is incidental and peripheral implied. Instead, there are some clues to indicate that what we are looking at is the surrounding information. (...) Slowly it becomes clear that what we are presented with is a sort of empty container and it is at that point that people begin to "project" into this space. It begins to read as an empty screen.” in http://www.jca-online.com/barth.html37 Fotografia, a cores.

Page 29: LONG PIECE: o tempo de uma imagem - repositorio.ul.ptrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/8459/2/ULFBA_TES 558.pdf · sendo convocados, sendo David Campany, Laura Mulvey, Jacques Rancière,

associação, uma memória, uma analogia que decifre de alguma forma o que há para ver.

Em “Untitled (act 5)”38 da série From... and of Time (2000), tal como em ...And to

draw a bright white line with light (Untitled 11.5)39 (2011) a luz é o elemento que a

artista refere como tema. São imagens de um tempo cinemático longo que, uma vez

mais, sugerem uma longa observação. E também por serem imagens mais facilmente

identificáveis como espaços do quotidiano, com que facilmente nos relacionamos, aqui

a memória e a associação são mais facilmente convocados para a análise. A artista tem

vindo a desenvolver várias imagens em sua casa, convidando o observador a um olhar

diferente sobre aspectos correntes, efémeros ou que passam despercebidos, se não os

isolarmos no espaço de representação de uma fotografia, mas também num tempo

específico de observação.

O tempo longo de observação pode, em algumas imagens, ser coincidente com a

duração de uma peça. Em Sunrise (2009)40, de David Claerbout41, os 18’ de duração são

mais facilmente observados, porque a peça é preferencialmente mostrada como num

cinema e isso cria uma certa inibição de entrar e sair entre o princípio e o fim do

vídeo.42 A nossa experiência temporal inicia-se com a necessidade de um tempo para

que os nossos olhos consigam distinguir uma imagem. Depois, a narrativa decorre quase

sempre com uma luminosidade e uma sonoridade muito ténues, terminando no nascer

do sol, com uma luz e uma música43 repentinas e intensas. Por outro lado, Bordeaux

Piece (2004)44 é um vídeo de 13 horas e 43 minutos, em que o tempo longo de

observação sugerido pela peça não é necessariamente o tempo que o observador demora

a vê-la. Pode permanecer ou ver apenas uma parte e experienciar o tempo longo por

sugestão, ao saber a sua duração. Este é um vídeo composto pela repetição de uma

sequência de 10’, filmada 70 vezes por dia durante um mês e depois montada de forma

a que cada vez que a sequência se repete é composta por partes filmadas à mesma hora

em diferentes dias. Essa repetição implica assim diferenças mais ou menos visíveis: nos

22

38 Tríptico, fotografia, a cores.39 Tríptico, fotografia, a cores.40 Projeção de vídeo, cor, som41 artista visual, n. 1969, Kortrijk, Bélgica. Vive e trabalha em Antuérpia e em Berlim.42 Também Michael Snow, para a exibição de Wavelength tem esta preferência contextual que se reflete claramente na forma como se observam as peças e no tempo de observação.43 Vocalise de Rachmaninov44 Instalação de vídeo, 576 x 720 PAL progressivo, cor, dual mono, auscultadores e altifalantes

Page 30: LONG PIECE: o tempo de uma imagem - repositorio.ul.ptrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/8459/2/ULFBA_TES 558.pdf · sendo convocados, sendo David Campany, Laura Mulvey, Jacques Rancière,

gestos, nas expressões, nas nuances de luz, a cada vez que se repete.

Numa instalação em loop, com um tempo de duração mais curto, muitas vezes o

longo tempo de observação relaciona-se com um interesse de voltar a ver e perceber

melhor a imagem. Ou seja, é pela repetição da observação que aqui se prolonga o tempo

da imagem.

A nossa relação com as imagens passa, portanto, pela nossa capacidade e

disponibilidade de observação. Esta observação implica uma atitude ativa e uma

reciprocidade. Ou seja, o observador não é um elemento passivo que absorve a imagem,

mas um sujeito de uma interação em que a imagem suscita estímulos, associações e

relações em que ele se envolve, acrescentando com a sua observação significados,

leituras, dimensões, interpretações possíveis e diversas. “A emancipação começa

quando se compreende que olhar é também uma acção (...) O espectador também age

(...) Observa, selecciona, compara, interpreta. Liga o que vê com muitas outras coisas

que viu.” (Rancière, 2010: 22).

Ainda segundo Rancière “uma imagem pensativa é uma imagem que contém

pensamento não pensado, um pensamento que não é susceptível de ser atribuído à

intenção daquele que a produz e que causa um efeito naquele que a vê, sem que este a

ligue a um objecto determinado.” (Rancière, 2010: p. 157). Essa imagem implica um

tempo longo que permita derivações, declinações sobre o seu referente e significado.

Quando, a ver um filme, nos deixamos levar, a partir de uma imagem, por

sucessivas associações, perdemos parte desse filme, da sua narrativa. A não ser que o

filme inclua imagens com o tempo suficientemente longo para permitir a contemplação

e essa associação. Voltamos passado um tempo e alguma coisa se passou que não vimos,

nem ouvimos. Continuamos a ver e entretanto fizemos desse filme um objecto um

pouco diferente, pela nossa observação. A cada vez que o voltamos a ver vamos ver

mais ou outras imagens e criar talvez novas associações, porque a nossa observação não

é independente da nossa mudança, dos nossos contextos, das nossas experiências.

Segundo Bergson, referido por Deleuze: “... nós não apreendemos a coisa ou a imagem

inteira, apreendemo-la sempre menos, apreendemos só aquilo que estamos interessados

em apreender, ou melhor, o que temos interesse em apreender, em função dos nossos

interesses ...”.45

2345 Deleuze, 2006: 35

Page 31: LONG PIECE: o tempo de uma imagem - repositorio.ul.ptrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/8459/2/ULFBA_TES 558.pdf · sendo convocados, sendo David Campany, Laura Mulvey, Jacques Rancière,

A observação de uma imagem pode também criar uma memória, misturar-se com

as nossas outras memórias e mesmo substituir uma memória ausente. Ao olhar para uma

fotografia em que ando de triciclo no quintal, substituo a ausência dessa memória que

realmente não tenho por essa imagem e pela memória longa que tenho dela, por a ver

recorrentemente em casa dos meus pais.

Uma imagem com que não tenho essa relação afectiva evidente, como seja um dos

mares de Seascapes de Sugimoto, pode fazer-me lembrar o mar na Azarujinha, uma

paisagem atlântica que fez parte do meu dia a dia durante o tempo que vivi com os meus

pais, ou mesmo a imagem onde termina Wavelength de Michael Snow, uma fotografia

de mar pendurada na parede do fundo da sala. Como quando vejo as paisagens do

nevoeiro em Nostalghia de Tarkovsky não posso dissociá-las das brumas densas, a

partir de novembro, na lezíria onde vivo agora. São associações que cada observador

fará, que o autor das imagens também, ele mesmo, fará e que prolongam o tempo da

imagem, indefinidamente.

Maya Deren clarifica esta dimensão da observação, recorrendo a uma metáfora

visual: “Quando vemos um filme, o acto contínuo de reconhecimento em que nos

envolvemos é como uma fita de memória que se desenrola sob as imagens do filme em

si, formando uma camada invisível de uma implícita dupla exposição.” 46 (Campany,

2007: 172).

O tempo longo de uma imagem poderá também advir da observação de uma

interrupção, da inserção de pausas, imagens fixas, imagens-tempo ou de uma

expectativa que deixa o observador suspenso num tempo que demora a passar. Ao

inserir uma fotografia numa sequência fílmica, o tempo de observação altera-se e, de

acordo com Raymond Bellour: “Ao criar uma distância, um outro tempo, a fotografia

permite-me refletir sobre o cinema. (...) a presença da fotografia permite-me investir

mais livremente no que estou a ver. Ajuda-me a fechar os olhos, mas mantendo-os

completamente abertos.47 (Campany, 2007: 120).

Podemos também parar um filme, num fotograma específico ou distendê-lo de tal

24

46 “As we watch a film the continuous act of recognition in which we are involved is like a strip of memory unrolling beneat the images of the film itself to form the invisible underlayer of an implicit double exposure.” (Campany, 2007: 172).47 “Creating a distance, another time, the photograph permits me to reflect on cinema. (...) the presence of the photo permits me to invest more freely in what I am seeing. It helps me to close my eyes, yet keep them wide open.” (Campany, 2007: 120).

Page 32: LONG PIECE: o tempo de uma imagem - repositorio.ul.ptrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/8459/2/ULFBA_TES 558.pdf · sendo convocados, sendo David Campany, Laura Mulvey, Jacques Rancière,

maneira que, ao olharmos a imagem, podemos relacionar-nos com ela como se fosse

uma fotografia. Essa interrupção ou alteração é outra forma de tempo longo de

observação, que diversas vezes tem surgido na arte contemporânea.

25

Page 33: LONG PIECE: o tempo de uma imagem - repositorio.ul.ptrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/8459/2/ULFBA_TES 558.pdf · sendo convocados, sendo David Campany, Laura Mulvey, Jacques Rancière,

3. Long Piece

É mais o olhar do que o transformar, ou mover, ou encenar que me fascina na realização. (...)Que possamos descobrir alguma coisa, que nos possa ocorrer alguma coisa. (...)Quando a imagem não muda, quando as pessoas julgam que já viram o suficiente e ela, apesar de tudo, permanece, reagem de um modo estranhamente colérico. Pensam que teria de haver uma razão, mas não pensam, de modo nenhum, que, para razão, chega perfeitamente que nos agrade o que há para ver.48 (Wenders, 2010: 11)

O que é longo no tempo de uma imagem? Esta pergunta marca o início desta

pesquisa. Foi a partir dela que as primeiras filmagens e fotografias decorreram e as

peças foram surgindo, numa sequência de experiências, de hipóteses de revelação desse

tempo, no plano, no movimento e na observação.

Long Piece é composto por quatro peças de vídeo, em que o tempo longo da

imagem, a relação entre o vídeo, a fotografia e a memória são os temas abordados,

relacionando-se entre si de diferentes formas. São vídeos que pretendem preservar uma

memória e nesse sentido partem de uma característica associada à ontologia da imagem

fotográfica.

A partir da enunciação de Marc Augé das três figuras do esquecimento - retorno,

suspensão e recomeço -, e estabelecendo uma relação entre essas figuras e os elementos

e momentos essenciais do processo de criação e existência de uma imagem, é possível

fazer uma análise das peças que fazem parte desta dissertação, relacionando o tempo

longo com a memória: o retorno a um lugar, a uma paisagem, através de imagens que

suspendem o tempo em longos planos de vídeo e fotografias, criando memórias,

permitindo a análise e um recomeço de relação com esse lugar e com a imagem em si.

Este lugar é composto por uma casa (onde viveram os meus avós maternos, onde

nasceu e viveu a minha mãe e onde eu e a minha irmã passávamos parte das férias

grandes, desde sempre), um quintal e alguns edifícios contíguos à casa. Para além destes

espaços incluí a paisagem do rio que faz também parte deste lugar.

Estas imagens foram sendo filmadas e fotografadas ao longo de dois anos, durante

um período de mudança e obras em casa. Queria registar momentos, espaços, detalhes,

26

48 in entrevista com Heiko R. Blum, setembro de 1971, publicada a primeira vez na revista Filmkritik, 1972, caderno 2.

Page 34: LONG PIECE: o tempo de uma imagem - repositorio.ul.ptrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/8459/2/ULFBA_TES 558.pdf · sendo convocados, sendo David Campany, Laura Mulvey, Jacques Rancière,

sons, criar memórias deste processo e deste lugar que íamos modificando, porque era

um lugar com um tempo longo, um tempo de família.

O som foi sendo captado simultaneamente, no entanto todo o audio destas quatro

peças foi modificado, criando-se um som por camadas sobrepostas, como uma síntese

de vários dias que se mostram em cada imagem. Esta é uma outra forma de criar nas

imagens uma densidade temporal que pode passar despercebida, mas está lá.

O tempo de cada peça é um tempo relativamente longo, mas essa sensação surge a

partir de indícios diferentes: uma imagem fixa que permanece entre imagens em

movimento, como uma pausa; uma imagem em que o movimento é quase impercetível e

nos parece fixa mas em que o tempo nos permite ver que qualquer coisa mudou; a

repetição de um som ou de uma imagem que marca uma cadência e talvez uma

monotonia; um cenário onde nada acontece a não ser uma alteração lumínica discreta,

mantendo uma expectativa que expande o tempo; uma imagem ou um som distendidos

no tempo que convidam a uma observação mais minuciosa ou ao devaneio; o tempo real

de qualquer coisa que não tem princípio nem fim.

27

Page 35: LONG PIECE: o tempo de uma imagem - repositorio.ul.ptrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/8459/2/ULFBA_TES 558.pdf · sendo convocados, sendo David Campany, Laura Mulvey, Jacques Rancière,

Janela_1

Luísa Baeta (1972-), da série Long Piece, 2013. Vídeo HD, PAL. 3’

28

Page 36: LONG PIECE: o tempo de uma imagem - repositorio.ul.ptrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/8459/2/ULFBA_TES 558.pdf · sendo convocados, sendo David Campany, Laura Mulvey, Jacques Rancière,

É preciso saber esquecer para saborear o gosto do presente, do instante, da espera, mas a própria memória tem necessidade de esquecimento: é preciso esquecer o passado recente para reencontrar o passado antigo. (Augé, 2001: 7)

Quando nos mudámos, ficámos durante uns meses na casa que era dos meus avós,

enquanto fazíamos obras no espaço onde ficaríamos até podermos voltar para essa casa.

O quarto dos meus avós tem uma luminosidade muito particular e uma capacidade

de criar uma projecção interna de uma janela, que diariamente atravessa as paredes

durante a manhã, com a luz do sol e permanece numa das paredes, durante a noite, com

a luz de um candeeiro da rua. Essa era a primeira imagem que via quando acordava e a

que me fazia adormecer, a partir do momento em que fizemos daquele espaço o nosso

quarto e era simultaneamente uma das memórias que tinha daquele lugar.

Nesta peça, a fotografia aparece ao lado do vídeo, com uma imagem semelhante,

do mesmo sítio, no mesmo dia, feita durante a filmagem do vídeo, estabelecendo uma

relação de comparação constante entre as duas imagens, desafiando a nossa perceção e

o pressuposto de que a fotografia se relaciona com a memória, com o passado e o vídeo

com o acontecimento, com o presente.

Um reflexo move-se, quase impercetivelmente, ao longo de um momento definido,

como o tempo que, por vezes, passa sem darmos por isso. A imagem forma-se e

deforma-se como uma metáfora visual do esquecimento.

A imagem é dupla (memória e esquecimento), composta por dois momentos que em

certa altura, no tempo, são simultâneos: um momento contínuo e um outro suspenso.

Esta duplicidade permite uma observação da imagem em que retorno, suspensão e

recomeço se interrompem.

29

Page 37: LONG PIECE: o tempo de uma imagem - repositorio.ul.ptrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/8459/2/ULFBA_TES 558.pdf · sendo convocados, sendo David Campany, Laura Mulvey, Jacques Rancière,

Casa

Luísa Baeta (1972-), da série Long Piece, 2013. Vídeo HD, PAL. 36’

30

Page 38: LONG PIECE: o tempo de uma imagem - repositorio.ul.ptrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/8459/2/ULFBA_TES 558.pdf · sendo convocados, sendo David Campany, Laura Mulvey, Jacques Rancière,

Aprendo a ver. Não sei por que motivo, tudo penetra em mim mais profundamente e não se imobiliza no ponto em que se costumava extinguir. Tenho uma interioridade que desconhecia. Tudo agora para aí se encaminha. Não sei o que aí se passa. (Rilke, 2004: 37)

Nesta peça, o vídeo e a fotografia estabelecem uma relação de sinergia,

completam-se. A imagem que vemos é composta, no tempo, por uma sequência de

fotogramas e fotografias cuja natureza se torna quase indistinta, uma vez que, entre

longos planos de câmara fixa que filma um espaço onde não existe ou quase não existe

movimento, e uma fotografia inserida na linha de tempo49 do vídeo, não existem

interrupções, mas sim continuidades. O prolongar do tempo de cada imagem, a sua

duração e persistência é a forma encontrada para dar tempo à possibilidade de observar

e reter cada momento, como uma memória. A memória de um espaço que se tornou a

nossa casa.

Os espaços captados eram dois armazéns de pó e objectos acumulados ao longo

de muitos anos, espaços escuros onde quase não se entrava, que recuperámos e se

tornaram a nossa casa, até agora. Pensámos, desde o início, que estes seriam os nossos

futuros ateliers. Fizemos os planos, infinitos desenhos e o projecto, mas como era

necessário começar as obras por estes dois edifícios, adaptámos o espaço para ser a

nossa casa nos primeiros tempos, até podermos fazer as obras necessárias para voltar à

casa dos avós.

Esta é a peça mais longa, em termos de duração. No início da sua montagem,

comecei por unir trechos de vídeo, fotografias e sons desfasados, mantendo uma

essencialidade lenta, de imagens fixas.

O objecto fílmico tornou-se longo, a partir da utilização extensiva do material

captado, da repetição, da citação sob a forma de repetição ou mesmo de uma relação

entre diferença e repetição, de uma reverberação, num processo que muitas vezes se

aproxima mais de uma não-montagem.

Precisava de uma ligação, mais ou menos narrativa. Inseri então o texto. Pequenos

31

49 Mantive a expressão traduzida à letra a partir de timeline. Não é uma expressão que se utilize no contexto videográfico normalmente, mas aqui pareceu-me ainda mais significativa esta expressão de tempo.

Page 39: LONG PIECE: o tempo de uma imagem - repositorio.ul.ptrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/8459/2/ULFBA_TES 558.pdf · sendo convocados, sendo David Campany, Laura Mulvey, Jacques Rancière,

apontamentos que acompanham as imagens, num percurso diário, mas intermitente.

Na sequência dos dias, o vazio permanece, mas altera-se. O interior e o exterior

vão-se alternando e misturando, até que, em determinados momentos-espaços, não se

percebe onde estamos.

Quando observamos qualquer coisa continuamente, algumas alterações

progressivas tornam-se impercetíveis e é preciso deixar de olhar para nos apercebermos

do que aconteceu. Neste vídeo acontece isso mesmo. Algumas imagens, em planos fixos

vão-se alterando lentamente e às vezes nem conseguimos perceber quando estamos a

observar um plano fixo ou uma imagem fixa, uma fotografia. Há imagens que se

repetem, sob formas diferentes - plano fixo ou imagem fixa, enfatizando a fragilidade da

nossa perceção.

A continuidade dos planos denota a continuidade de um olhar e procura a

continuidade de outros olhares, do olhar dos outros.

32

Page 40: LONG PIECE: o tempo de uma imagem - repositorio.ul.ptrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/8459/2/ULFBA_TES 558.pdf · sendo convocados, sendo David Campany, Laura Mulvey, Jacques Rancière,

Rio

Luísa Baeta (1972-), da série Long Piece, 2013. Vídeo HD, PAL. 10’

33

Page 41: LONG PIECE: o tempo de uma imagem - repositorio.ul.ptrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/8459/2/ULFBA_TES 558.pdf · sendo convocados, sendo David Campany, Laura Mulvey, Jacques Rancière,

Alguma coisa acontece, vemo-la acontecer, filmamo-la enquanto acontece, a câmara observa-a, conserva-a, podemos contemplá-la mais uma vez. A coisa já não está lá, mas a contemplação é possível; a verdade da existência dessa coisa, essa, não se perdeu.50 (Wenders, 2010: 10)

No cenário deste lugar, na minha memória, o rio é um elemento necessário.

Simultaneamente é um símbolo da passagem do tempo.

A alegoria do rio e do nevoeiro, onde uma imagem lentamente aparece e se torna,

por um instante, nítida e desaparece novamente deixando apenas um vestígio, quase

invisível é a paisagem em que o tempo longo decorre.

Nesta peça não existe fotografia, mas uma alusão à imagem fotográfica. O vídeo

distende-se ao longo de três momentos: o primeiro podia ser uma fotografia, porque é

uma imagem opaca e cinzenta, sem que nada visivelmente se passe nela; o segundo é

uma imagem que se revela, que se dá a ver, lentamente; o terceiro é um

desvanecimento, um retorno a uma superfície não impressa.

A densidade do ar não deixa ver para além de imagens que se formam e dissipam,

fugazes, indiciando uma paisagem, mas o som contextualiza-nos no limite de uma

superfície, entre diferentes espécies de espaços51, informa-nos de possíveis

proximidades e distâncias, direções e permanências, dimensões, sem desfazer

completamente a indefinição visual do lugar onde estamos.

Uma pausa no movimento 52 , esse lugar reaparece cada vez mais visível, para

desaparecer em vazio, pelo silêncio. “(...) o lugar é a pausa; cada pausa no movimento

torna possível ao local transformar-se em lugar.” (Tuan, 1977: 6)

34

50 in “Pourquoi filmez vous? 700 cinéastes de Monde entier répondent” Libération, caderno especial de abril de 198751 Em referência a Espèces d’Espaces de Gerges Perec52 Em referência à definição de lugar de Yi-Fu Tuan “ (...) if we think of space as that which allows movement, than place is pause; each pause in movement makes it possible for location to be transformed into place.” (Tuan, 2003: 6)

Page 42: LONG PIECE: o tempo de uma imagem - repositorio.ul.ptrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/8459/2/ULFBA_TES 558.pdf · sendo convocados, sendo David Campany, Laura Mulvey, Jacques Rancière,

Janela_2

Luísa Baeta (1972-), da série Long Piece, 2013. Vídeo HD, PAL. 3’

35

Page 43: LONG PIECE: o tempo de uma imagem - repositorio.ul.ptrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/8459/2/ULFBA_TES 558.pdf · sendo convocados, sendo David Campany, Laura Mulvey, Jacques Rancière,

Absorvi esse espaço, a ambiguidade de ser simultaneamente aberto e fechado, e ainda o facto de haver passagens, de implicar tempo, cadências e percursos. A última porta dava para o mar.53 (Vieira, 2011)

O elemento janela repete-se continuamente ao longo da memória das minhas

casas. Lembro-me sempre da luz e das janelas.

Esta janela é de uma casa no rio, que não é a minha casa, mas onde vou

recorrentemente. É uma casa vazia e através dela vejo a paisagem. Esta é a última janela

que dá para o rio.

Uma outra alegoria, desta vez do dispositivo fotográfico, a câmara escura. Um

quarto, uma janela e o que se vê é a imagem que a janela revela: a paisagem do rio ao

fundo. O vídeo permanece um plano fixo e longo o suficiente, para se aproximar de uma

fotografia que está disponível o tempo que a quisermos ver.

Numa espécie de síntese, em que o tempo longo é o tempo real, tal como em

Janela_1, mas já sem a necessidade de comparação.

36

53 in publicação online do Centro de Arte Moderna da exposição Muros de Abrigo de Ana Vieira, que ali decorreu de14 de janeiro a 27 de março de 2011, com curadoria de Paulo Pires do Vale.

Page 44: LONG PIECE: o tempo de uma imagem - repositorio.ul.ptrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/8459/2/ULFBA_TES 558.pdf · sendo convocados, sendo David Campany, Laura Mulvey, Jacques Rancière,

Em Long Piece, a possibilidade de repetição e alteração temporal do que filmei e

fotografei é determinante, concreta e conceptualmente. As peças que constituem a parte

prática desta dissertação baseiam-se nessa característica específica do medium para criar

um tempo que se aproxime da indefinição da minha própria memória. Quero que se

perceba o tempo de um momento sem que esse seja, na realidade, todo o tempo desse

momento, ou seja, um longo plano de um momento permite que o tempo que decorre

seja percebido como o tempo real, não como a duração real, porque não é da duração

que se trata, mas sim da sensação que aquele tempo específico pode transmitir, um

longo tempo cinemático.

Um dos objectivos de Long Piece é abrandar o tempo. Criar um espaço de

contemplação onde o tempo longo decorre e não damos por ele. E isso pode ser

insuportável. Pode colidir de tal forma com o ritmo diário que se torna inconcebível

ficar a olhar durante um longo tempo para uma imagem que não aparece ou que não

muda, ou que parece a mesma. Pode, por outro lado ser cativante e, nesse caso o

observador permanecerá o tempo que for necessário, numa acção continuada de

observação. Enfatiza-se a observação do movimento, sem distrações, sem artifícios, sem

desvios de olhar. Observar o movimento, por mais impercetível que seja, sem outra

razão que não essa observação é um fim em si mesmo.

Em Long Piece, o tempo longo da imagem, seja ela um plano contínuo de vídeo

ou uma fotografia, é uma sugestão para que o observador se torne participante, no

sentido de permanecer numa relação com essa imagem, durante o seu tempo, definido

essencialmente pelo tempo do plano e pelo tempo do movimento que decorre ou não na

imagem.

37

Page 45: LONG PIECE: o tempo de uma imagem - repositorio.ul.ptrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/8459/2/ULFBA_TES 558.pdf · sendo convocados, sendo David Campany, Laura Mulvey, Jacques Rancière,

CONCLUSÃO

Passaram-se vários meses, desde que iniciei esta dissertação e volto, agora já com

a distância temporal suficiente para que a memória permita esse retorno, a reler as

várias versões por que passei neste processo e a rever as imagens, para escrever esta

conclusão. Muitas foram as referências que fui acumulando e as relações que fui

estabelecendo entre elas. Muitas ligações entretanto foram também desaparecendo do

texto e volto agora a recolhê-las como possíveis indícios para uma possível continuação

desta pesquisa.

Aos vídeos criados inicialmente adicionei um, filmado já em meados de 2012 -

Janela_2. Era o que faltava para concluir visualmente o que me tinha proposto como

aspectos a desenvolver nesta dissertação e que faz a ligação entre todos os outros, como

uma síntese.

Acerca do tempo longo das imagens interessa-me validar a ideia de que é pela

captação, pela montagem e pela exibição que me parece acontecer essa possibilidade de

introdução de um tempo longo. O plano, o movimento e a observação são disso

expressão. Interessa-me ainda frisar a necessidade de dar tempo às imagens em todo

esse processo. Permanecer na captação o tempo que for preciso para distinguir um ténue

movimento ou mudança de luz, deixar que as imagens permaneçam num processo de

quase não-montagem e, no fim, ter a disponibilidade para ver.

Em fevereiro recomeçamos as obras que entretanto estiveram suspensas. Deverão

demorar mais uns meses e esse é o meu pretexto para dar continuidade não só ao registo

e à memória destas casas, mas também à pesquisa sobre as relações que nesta

dissertação se enunciam.

38

Page 46: LONG PIECE: o tempo de uma imagem - repositorio.ul.ptrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/8459/2/ULFBA_TES 558.pdf · sendo convocados, sendo David Campany, Laura Mulvey, Jacques Rancière,

BIBLIOGRAFIA GERAL

Augé, 2001Augé, Marc (1998). Les formes de l’oublie. Paris: Payot & Rivages [(2001) As Formas do Esquecimento. Tradução portuguesa de Ernesto Sampaio. Almada: Íman Edições; 106 p.]

Aumont, 2009Aumont, Jacques (1990). L’Image. Paris: Nathan [(2009) A Imagem. Tradução portuguesa de Marcelo Félix. Lisboa: Edições Texto & Grafia, Lda; 247 p.]

Barthes, 1998Barthes, Roland (1980). La Chambre Claire (Note sur la photographie). Cahiers du Cinéma/ Gallimard/ Seuil. [(1998) A Câmara Clara. Tradução portuguesa de Manuela Torres. Lisboa: Edições 70; 172 p.]

Campany, 2007Campany, David (coordenação) (2007). The Cinematic. London: Whitechapel Gallery; Cambridge, The MIT Press; 221 p.

Chiaramonte; Tarkovsky, 2004Chiaramonte, Giovanni; Tarkovsky, Andrey A. (2002). Instant Light. Milan: Ultreya [(2004) Instant Light. London: Thames & Hudson; 135 p.

Cotton, 2009Cotton, Charlotte (2004). The Photograph as Contemporary Art. London: Thames & Hudson [(2009) nova edição; 248 p.]

Deleuze, 2004Deleuze, Gilles (1983). L’Image-mouvement, Cinéma 1. Paris: Éditions de Minuit [(2004). A Imagem-Movimento, Cinema 1. Tradução portuguesa e introdução de Rafael Godinho. Lisboa: Assírio & Alvim; 292 p.]

Deleuze, 2006Deleuze, Gilles (1985) L’Image-temps, Cinéma 2. Paris: Éditions de Minuit [(2006). A Imagem-Tempo, Cinema 2. Tradução portuguesa e introdução de Rafael Godinho. Lisboa: Assírio & Alvim; 367 p.]

Dean, 2011Dean, Tacita (2011). Film, London: Tate Publishing, The Unilever Series, editor Nicholas Cullinan, pp. 7 - 44.

Hall, 1996 (a)Hall, Edward T. (1983). The Dance of Life - The Other Dimention of Time. New York: Anchor Press/ Doubleday [(1996). A Dança da Vida - A Outra Dimensão do Tempo. Tradução portuguesa de Manuel Alberto. Lisboa: Relógio D’Água; 260 p.]

Hall, 1986 (b)Hall, Edward T. (1966). The Hidden Dimension. New York: Anchor Press/ Doubleday [A Dimensão Oculta (1986). Tradução portuguesa de Miguel Serras Pereira. Lisboa: Relógio D’Água; 230 p.]

Heidegger, 2008Heidegger, Martin (1995). Der Begriff der Zeit. Tübingen: Max Niemeyer Verlag [(2008). O Conceito de Tempo, 2ª edição, bilingue. Prólogo, tradução e notas de Irene Borges-Duarte. Lisboa: Fim de Século - Edições, colecção Caleidoscópio]

39

Page 47: LONG PIECE: o tempo de uma imagem - repositorio.ul.ptrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/8459/2/ULFBA_TES 558.pdf · sendo convocados, sendo David Campany, Laura Mulvey, Jacques Rancière,

Mulvey, 2006Mulvey, Laura (2006). Death 24x a Second - Stillness and the Moving Image. London: Reaktion Books; pp. 7 - 30, 161 - 196

Rancière, 2010Rancière, Jacques (2008). Le Spectateur Emancipé. Paris: La Fabrique-Éditions [(2010). O Espectador Emancipado. Tradução portuguesa de José Miranda Justo. Lisboa: Orfeu Negro; 192 p.]

Rilke, 2004Rilke, Rainer Maria (1910). Die Aufzeichnungen des Malte Laurids Brigge. Leipzig: Insel Verlag [(2004). As Anotações de Malte Laurids Brigge. Prefácio e tradução portuguesa de Maria Teresa Dias Furtado. Lisboa: Relógio D’Água; 240 p.]

Sánchez, 2010Sánchez, Pilar (coord.) (2010). El tiempo expandido. Madrid: PHE Books, La Fabrica; 283 p.

Salcedo, (?)Salcedo, Doris (?). “Interview with Charles Merewether” in HARRISON, CHARLES & WOOD, PAUL (1992). Art in Theory, 1900 - 2000: An Anthology of Changing Ideas. London, Blackwell Publishing, [(2003) nova edição; pp. 1180 - 1183]

Wall, 1990Wall, Jeff (1990). “From a discussion” in HARRISON, CHARLES & WOOD, PAUL (1992). Art in Theory, 1900 - 2000: An Anthology of Changing Ideas. London, Blackwell Publishing, [(2003) nova edição; pp. 1158 - 1161

Wenders, 2000Wenders, Wim (1988) Logik der Bilder. Frankfurt am Main: Verlag der Autoren [(2000) A Lógica das Imagens. Tradução portuguesa de Maria Alexandra A. Lopes. Lisboa: Edições 70; 174 p.]

Tuan, 2003Tuan, Yi-Fu (1977) Space and Place - The perspective of experience. Minnesota: University of Minnesota Press [(2003) Space and Place - The perspective of experience. Minnesota: University of Minnesota Press; 237 p.]

WEBGRAFIA

Barth, 1996Entrevista de Sheryl Conkelton a Uta Barth, Journal of Contemporary Art, 1996, [in http://www.jca-online.com/barth.html em linha, acedido a 18-01-2013]

Cunningham, 1978Simpósio organizado pela Pleiades Gallery e pela Association of Artist-Run Galleries. Debate moderado por Dore Ashton, com John Cage, Merce Cunningham, Richard Kostelanetz e Nam June Paik, 1978, [in http://www.ubu.com/film/cunningham_time.html em linha, acedido a 18-01-2013]

Deren, 1978Deren, Maya (1978). “Cinematography: the creative use of reality”, in Sitney, P. Adams. (1978) The Avant-Garde Film: a reader of theory and criticism, New York: New York University Press, Anthology Film Archives, pp. 60 - 72, [ in http://evergreen.loyola.edu/rjcook/www/uf/pdf/deren.pdf, em linha, acedido a 18-01-2013]

40

Page 48: LONG PIECE: o tempo de uma imagem - repositorio.ul.ptrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/8459/2/ULFBA_TES 558.pdf · sendo convocados, sendo David Campany, Laura Mulvey, Jacques Rancière,

Meschede, 2011Meschede, Friedrich (2011). “1+1+1=3 Pitz, Snow e Voita, Ou o jogo das afinidades”. Lisboa: Culturgest. [publicação da exposição, em linha, acedida a 04-12-2012]

Shainman, 2006Shainman, Jack (2006). “Michael Snow / February 9, 2006 – March 11, 2006”, [ in http://www.jackshainman.com/exhibition76.html, em linha, acedido a 18-01-2013]

Vieira, 2011Texto do Centro de Arte Moderna da exposição “Muros de Abrigo” de Ana Vieira, que ali decorreu de14 de Janeiro a 27 de Março de 2011, com curadoria de Paulo Pires do Vale [in http://www.cam.gulbenkian.pt/index.php?article=71190&visual=2, em linha, acedido a 18-01-2013]

41

Page 49: LONG PIECE: o tempo de uma imagem - repositorio.ul.ptrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/8459/2/ULFBA_TES 558.pdf · sendo convocados, sendo David Campany, Laura Mulvey, Jacques Rancière,

ANEXO I

42

Fig.1 - Andrei Tarkovsky (1932-1986). Nostalghia, 1983. Filme. 120’

Fig.2 - Chris Marker (1921-2012). Une journée d’Andrei Arsenevich, 1999. Filme. 55’

Fig.3 - Hiroshi Sugimoto (1948-). “Tri City Drive-In”, 1993, da série Theatres, 1976 - 1999. Fotografia.

Fig.4 - David Claerbout (1969-). The Long Goodbye, 2007. Vídeo. 13’44’’

Fig.5 - Michael Snow (1928-). Condensation: A Cove Story, 2009.

Vídeo. 10’28’’

Page 50: LONG PIECE: o tempo de uma imagem - repositorio.ul.ptrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/8459/2/ULFBA_TES 558.pdf · sendo convocados, sendo David Campany, Laura Mulvey, Jacques Rancière,

43

Fig.6 - Tacita Dean (1965-). Stillness, 2007. Série de 6 filmes, 5’ cada

Fig.7 - Hiroshi Sugimoto (1948-). Seascapes, 1890 -. Série fotográfica

Fig.8 - Tacita Dean (1965-). Film, 2011. Filme. 11’

Fig.9 - Tacita Dean (1965-). Palast, 2004. Filme. 10’30’’

Page 51: LONG PIECE: o tempo de uma imagem - repositorio.ul.ptrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/8459/2/ULFBA_TES 558.pdf · sendo convocados, sendo David Campany, Laura Mulvey, Jacques Rancière,

44

Fig.10 - Tacita Dean (1965-). Géllert, 1998. Filme. 6’

Fig.13 - Uta Barth (1958-). Field #14, 1996. Fotografia

Fig.11 - Michael Snow (1928-). Solar Breath (Northern Caryatids), 2002.

Filme. 62’

Fig.12 - Michael Snow (1928-). Wavelength, 1966. Filme. 45’

Page 52: LONG PIECE: o tempo de uma imagem - repositorio.ul.ptrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/8459/2/ULFBA_TES 558.pdf · sendo convocados, sendo David Campany, Laura Mulvey, Jacques Rancière,

45

Fig.17 - David Claerbout (1969-). The Bordeaux Piece, 2004.

Vídeo. 13h43’

Fig.16 - David Claerbout (1969-). Sunrise, 2009.

Vídeo. 18’

Fig.15 - Uta Barth (1958-). ...And to draw a bright white line with light (Untitled 11.5), 2011. Fotografia

Fig.14 - Uta Barth (1958-). “Untitled (act 5)”, da série From... and of Time, 2000. Fotografia