Livro entulho bom

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RECICLAGEM DE ENTULHO PARA A PRODUÇÃO DE MATERIAIS DE CONSTRUÇÃO PROJETO ENTULHO BOM

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RECICLAGEM DE ENTULHO

PARA A PRODUÇÃO DE

MATERIAIS DE CONSTRUÇÃO

PROJETO ENTULHO BOM

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JOSÉ CLODOALDO SILVA CASSA1946 - 1999

Criador e coordena-

dor do Projeto Entulho

Bom, Prof. Cassa foi um

brilhante pesquisador.

Dinâmico e empreen-

dedor, criou e coorde-

nou Projetos e Grupos

de P&D, contribuindo

na formação de diver-

sos pesquisadores. Foi

autor de mais de 150

trabalhos técnico-científicos sobre reciclagem e

aproveitamento de resíduos sólidos industriais, mate-

riais cerâmicos, ciência dos materiais, planejamento

de experimentos, metodologia da pesquisa, adminis-

tração de ciência e tecnologia, redes neurais artifi-

ciais, estatística multivariada, química, engenharia quí-

mica, tecnologia mineral, entre outros temas.

Engenheiro Químico pela Universidade do Brasil

(1969) e Mestre em Metalurgia Extrativa e Ciência dos

Materiais pela COPPE (1975), em 1977 foi para o

Imperial College – University of London, onde obteve

o título de Ph.D na área de Metalurgia e Ciência e Enge-

nharia dos Materiais (1981). Completou a sua forma-

ção na University of Florida, onde realizou Pós-Dou-

torado em Ciência e Engenharia dos Materiais (1992).

A partir de 1970, passou a integrar o quadro docen-

te da UFBA, onde foi professor do MEAU e do DCTM

da Escola Politécnica. Foi Professor visitante dos Cur-

sos de Pós-Graduação em Metalurgia e Ciência e En-

genharia dos Materiais – COPPE/UFRJ (1984/85) e

Ciência e Engenharia de Materiais – IME (1988).

Nesse período, orientou diversos trabalhos de dou-

torado e de mestrado.

Bolsista do CNPq desde 1967, foi coordenador

do Comitê Assessor (CA) de Geociências e Tecnologia

Mineral do PADCT/CNPq, membro do CA de Minas,

Metalurgia e Materiais do CNPq e membro do CA de

Ciência e Tecnologia para o Setor Mineral da Secre-

taria de Minas e Energia do Estado da Bahia.

Foi, também, consultor ad hoc para avaliação de

projetos de pesquisa do PADCT, CNPq, FINEP, CADCT,

FEP, FAPEX, UFBA, entre outras instituições, e consul-

tor independente em diversos projetos de P&D do Cen-

tro de Pesquisas e Desenvolvimento do Estado da Bahia

CEPED, na área de Tecnologia Química e Mineral.

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RECICLAGEM DE ENTULHO

PARA A PRODUÇÃO DE

MATERIAIS DE CONSTRUÇÃO

PROJETO ENTULHO BOM

Premiado pela

ONU100 MELHORES PRÁTICAS

para a melhoria da qualidade de vida

REDUZIR, RECICLAR E REAPROVEITAR SÃO MAIS QUEATOS DE CONSCIENTIZAÇÃO: SÃO ATOS DE CIDADANIA

Premiado pela

CAIXA10 MELHORES PRÁTICAS

para o desenvolvimento urbano

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CAIXA ECONÔMICA FEDERAL

Presidente

Emílio CarazzaiDiretor de Desenvolvimento Urbano

Aser CortinesSuperintendente Nacional de Parcerias

Jorge Arraes

FUNDAÇÃO ESCOLA POLITÉCNICA

Secretário Executivo

Carlos Emílio de Menezes Strauch

UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA

Reitor

Heonir RochaVice-Reitor

Othon Jambeiro

EDITORA DA UFBA

Diretora

Flávia Garcia RosaConselho Editorial

Antônio Virgílio Bittencourt Bastos, Arivaldo Leão Amorim,Aurino Ribeiro Filho, Cid Seixas Fraga Filho,

Fernando da Rocha Peres, Mirella Márcia Longo Vieira LimaSuplentes

Cecília Maria Bacelar Sardenberg, João Augusto de Lima Rocha,Leda Maria Muhana Iannitelli, Maria Vidal de Negreiros Camargo,Naomar Monteiro de Almeida Filho, Nelson Fernandes de Oliveira

PARCERIA

LIMPURB - Empresa de Limpeza Urbana do SalvadorPMS - Prefeitura Municipal do Salvador

APOIO

CADCT - Superintendência de Apoio ao Desenvolvimento Científico e TecnológicoSEPLANTEC - Secretaria do Planejamento, Ciência e Tecnologia

Governo do Estado da Bahia

Superintendente de Negócios

Samuel RochaGerente de Desenvolvimento Urbano

Beatriz Cerqueira Lima

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RECICLAGEM DE ENTULHO

PARA A PRODUÇÃO DE

MATERIAIS DE CONSTRUÇÃO

Organizado por

José Clodoaldo Silva Cassa (em memória)Alex Pires Carneiro

Irineu Antônio Schadach de Brum

Textos de

Alex Pires CarneiroAna Maria Vieira de Oliveira

Bárbara Elizabete Correia QuadrosCélia Maria Martins Neves

Dayana Bastos CostaElaine Pinto Varela Alberte

Irineu Antônio Schadach de BrumJosé Clodoaldo Silva Cassa (em memória)

Marcos Jorge Almeida SantanaPaulo César BurgosTaís Santos Sampaio

Tarcísio de Paula PintoVanderley Moacyr John

SALVADOR2001

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Direitos desta edição cedidos à Caixa Econômica Federal e à Editora da Universidade Federal da Bahia.Permitida a transcrição ou reprodução parcial, desde que seja citada a fonte.

EQUIPE TÉCNICA PROJETO ENTULHO BOM

COORDENAÇÃO

Prof. José Clodoaldo S. Cassa (Coordenador- DCTM / UFBA)Engº. Alex P. Carneiro (Coordenador- MEAU / UFBA)Prof. Irineu S. de Brum (Pesquisador- DCTM / UFBA)

COLABORADORES E CONSULTORES

Prof. Antônio Sérgio R. da Silva (DCTM / UFBA), Engª. Célia Maria M. Neves (CEPED)Prof. Emerson de A. M. Ferreira (MEAU / UFBA), Prof. Enric Vázquez (UPC / Barcelona – Espanha)

Dr. Francisco O. Neto (Bolsita DCR-CNPq / UFBA), Dr. Giovanni Floridia (Bolsista DCR-CNPq / UFBA)Prof. Luis Edmundo P. de Campos (GEOTEC / UFBA), Prof. Marcos Jorge A. Santana (MEAU / UFBA)

Eng. Paulo César Burgos (GEOTEC / UFBA), Engª. Solange B. Costa (DERBA)Dr. Tarcísio de P. Pinto (I&T), Prof. Vanderley M. John (PCC / USP)

LIMPURB (Parceria)

Arqtª. Ana Maria V. de Oliveira, Arqtª. Bárbara Elizabete C. Quadros, Arqtª. Laís AlvesCAIXA ECONÔMICA FEDERAL

Antônio Triana Filho, Adriana S. de Almeida, Econ. Augusto César A. de Souza JúniorEng. Carlos Eduardo Guimarães , Adm. Cláudio M. Silva , Econ. Francisco Liguori

Econ. Júlio M. Neto , Eng. Oswaldo S. de Oliveira, Eng. Raul S. de MouraAdm. Sávio Marcos Garbin, Eng. Tácito Q. Maia

BOLSISTAS DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA (UFBA)

Aledson D. Costa , André R. R. de Souza , David A. Fortuna , Dayana B. Costa , Elaine P. V. AlberteEnéas B. da Silva Júnior, Eric dos Santos , Fábio J. S. Carneiro , Fernanda C. Nascimento

Geison dos S. Pereira, Rafael M. Mota, Rodrigo T. de Oliveira, Taís S. SampaioREVISÃO TÉCNICA

Dra. Luciana Amaral de Lima, Engª. Solange Bastos Costa (Capítulo VI), Engª. Telma Catarina C. PiresDESIGN GRÁFICO

Maria Helena Pereira da SilvaREVISÃO REDACIONAL

Prof ª Ana Maria de C. LuzNORMALIZAÇÃO BIBLIOGRÁFICA

Maria de Fátima C. Botelho (CBR-5/908)FOTOGRAFIA

Ana Carolina Castilho, Projeto Entulho Bom e Autores

Reciclagem de entulho para produção de materiais de construção / Organizado por Alex Pires Carneiro, Irineu Antônio Schadach de Brum e José Clodoaldo da Silva Cassa. _ Salvador: EDUFBA; Caixa Econômica Federal, 2001. 312 p. ; il.

Realização: Projeto Entulho Bom ISBN 85-232-0226-9

1. Reciclagem 2. Resíduos Sólidos 3. Construção Civil – Materiais de Construção I. Carneiro, Alex Pires. II. Brum, Irineu Antônio Schadach de. III. Cassa, José Clodoaldo da Silva. IV. Título.

CDU: 691.002.8

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Este livro é dedicado ao Professor José Clodoaldo

Silva Cassa, criador do Projeto Entulho Bom,

brilhante pesquisador, cuja contribuição às

atividades de ensino, pesquisa e extensão no

país, em especial na Escola Politécnica da UFBA

representa um exemplo memorável de competência

e dedicação acadêmica. O Prof. Cassa será sempre

lembrado pelo seu senso crítico apurado, seu

dinamismo, principalmente pelo entusiasmo

com que trabalhava e estimulava o crescimento

intelectual de todos que tiveram o privilégio de

com ele compartilhar desafios e superar obstáculos,

em nome da produção do conhecimento científico

para um mundo melhor, mais digno, mais humano.

Seu exemplo permanecerá, perene e multiplicador.

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APRESENTAÇÃO

A Caixa Econômica Federal, como principal agênciado Governo Federal para o financiamento dossetores de habitação, saneamento e infra-estruturaurbana, colabora para o aprimoramento técnico einstitucional desses setores, apoiando projetosde inovação tecnológica ou de gestão que tragamalternativas de melhoria das condições dehabitabilidade da população de mais baixa renda.Nesse contexto, a Universidade Federal da Bahia,em parceria com a CAIXA, desenvolveu o ProjetoEntulho Bom, cujo foco principal é a reciclagem eo reaproveitamento de entulho para materiais deconstrução, buscando minimizar os impactossocioambientais causados pelo descarteinadequado de resíduos, preservar recursosnaturais e melhorar a qualidade de vida naRegião Metropolitana de Salvador.Acreditamos que a tecnologia aqui apresentadapoderá contribuir significativamente para amelhoria da gestão dos resíduos sólidos, visto que

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a sua aplicação impacta na redução da quantidadede materiais dispostos nos aterros sanitários,aumentando a sua vida útil. Além disso, a adoçãodessa alternativa poderá baratear o custo deprodução de moradia destinada a famílias de menorrenda, minimizando, assim, o problema habitacionalnas cidades brasileiras.Vale ressaltar que, em conseqüência do excelentetrabalho realizado, essa iniciativa foi selecionadapelo Programa CAIXA Melhores Práticas, que pre-miou casos de sucesso em desenvolvimento urbanono Brasil, e representou o País no Programa Best

Pratices and Leadership Programme, realizado pelaONU no ano 2000, em nível mundial, para premiaras melhores experiências em gestão urbana.Boa leitura!

Emílio Carazzai

Presidente

Caixa Econômica Federal

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PREFÁCIO

A sociedade está se tornando cada vez mais exigente em rela-ção à questão ambiental. O entulho, resíduo das atividades deconstrução e demolição, apresenta-se como um dos principaisproblemas nas áreas urbanas, pois sua geração e descarte inade-quado causam diversos impactos ambientais, sociais e econômi-cos. As soluções para esses problemas passam por desenvolvi-mento e implantação de tecnologias adequadas, que busquem aredução, reutilização e reciclagem desse resíduo.

Com o objetivo de contribuir para a minimização desses im-pactos, a preservação de recursos naturais e a melhoria da quali-dade de vida, foi concebido pelo Prof. José C. Cassa, em 1997, oProjeto Entulho Bom, inicialmente denominado de “Aproveita-mento de Resíduos Sólidos para a Produção de Materiais de Cons-trução de Baixo Custo – Região Metropolitana de Salvador (RMS)”.

Os estudos desenvolvidos nesse projeto de pesquisa visaramao aproveitamento seguro e racional dos resíduos sólidos dispo-níveis na RMS para a produção de materiais de construção, incluin-do seus aspectos tecnológicos, econômicos e ambientais. Na etapainicial, foi realizado o diagnóstico dos setores produtores de resí-duos da região, o qual identificou o entulho como resíduo de in-teresse para o projeto. Foram, então, realizadas pesquisas experi-mentais para a reciclagem do entulho de Salvador na produção demateriais de construção (camadas de pavimentos, argamassas e tijo-los), buscando-se o manuseio ambientalmente adequado desses ma-teriais e a ampliação da oferta de habitação e infra-estrutura urbana,de forma a contribuir para o desenvolvimento sustentável local.

A Caixa Econômica Federal (CAIXA) foi a primeira instituiçãoa apoiar a pesquisa, disponibilizando recursos financeiros e

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humanos fundamentais para a sua realização, administrados pelaFundação Escola Politécnica (FEP). O projeto, desenvolvido na Es-cola Politécnica da Universidade Federal da Bahia (UFBA), contoucom a importante parceria da Empresa de Limpeza Urbana doSalvador (LIMPURB) nos estudos do entulho de Salvador. A Su-perintendência de Apoio ao Desenvolvimento Científico eTecnológico do Estado da Bahia (CADCT), por sua vez, apoiou apesquisa, viabilizando os recursos necessários para a realizaçãode diversas atividades a ela vinculadas.

O Projeto Entulho Bom, sendo reconhecido pela relevânciado trabalho e dos resultados positivos que obteve ao longo doseu desenvolvimento, foi consagrado, em 2000, com o prêmio10 Melhores Práticas do Brasil para o desenvolvimento susten-tável do Programa CAIXA Melhores Práticas. O projeto também foiescolhido como uma das 100 Melhores Práticas do Mundo, en-tre cerca de 700 concorrentes, no Best Practices and Local Leader-

ship Programme, promovido, no mesmo ano, pela Organização dasNações Unidas.

No âmbito local, os estudos realizados contribuíram, de formasignificativa, para a questão do aproveitamento de resíduos comomateriais de construção na região de Salvador e para o desenvol-vimento das atividades de pesquisa da UFBA. O projeto subsidioua elaboração da dissertação “Reciclagem de Entulho de Salvadorpara a Produção de Materiais de Construção”, de autoria do pesqui-sador Eng. Alex Carneiro no mestrado em Engenharia AmbientalUrbana - UFBA. Além disso, contribuiu para a formação acadêmicade mais de 10 alunos de iniciação científica dos cursos de gradua-ção em Engenharia da UFBA. Consolidou, ainda, um grupo de pes-quisa sobre materiais de construção e criou uma rede cooperativade pesquisa na área de aproveitamento de resíduos no DCTM - UFBA.

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Os resultados alcançados na transferência de conhecimentopodem ser avaliados pela boa repercussão dos eventos promovi-dos pelo projeto: o Workshop “Reciclagem de Resíduos SólidosIndustriais e Urbanos na Construção Civil” e o Curso Internacional“Aproveitamento de Resíduos Sólidos na Construção Civil”, am-bos realizados em 1998, na Escola Politécnica da UFBA.

Além disso, a qualidade e quantidade das publicações desenvol-vidas pela equipe (mais de 25 artigos publicados em anais de con-gressos nacionais e internacionais e revistas indexadas) e a boa acei-tação dos trabalhos apresentados em eventos técnico-científicoscontribuíram, também, para a transferência de conhecimento.

A publicação deste livro é uma das formas mais eficientes detransferência de conhecimento do Projeto Entulho Bom. Aqui sãoapresentados seus principais resultados, consolidando o conhe-cimento adquirido e disponível durante o desenvolvimento des-sa pesquisa. Esta publicação consiste num conjunto de textos coma valiosa contribuição de diversos pesquisadores que são referên-cia sobre o tema.

Na introdução, o Prof. Enric Vázquez prepara os leitores paraum melhor entendimento das questões apresentadas no livro,contribuindo, assim, com sua experiência de mais de 10 anos de-senvolvendo estudos sobre o tema. São abordadas questões comoa geração de resíduos na construção, a reciclagem de entulho, opanorama da reciclagem na Europa, entre outras.

Os aspectos relacionados com o desenvolvimento sustentávele os impactos ambientais causados pela construção civil são deta-lhadamente abordados pelo Prof. Vanderley John no capítulo I.Nesse capítulo, é destacada a importância da reciclagem de resí-duos sólidos na produção de materiais de construção e a necessi-dade de desenvolver estudos multidisciplinares.

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No capítulo II, é apresentado o diagnóstico dos setores produ-tores de resíduos da Região Metropolitana de Salvador. Esse diag-nóstico possibilitou a identificação e a caracterização das princi-pais ocorrências de resíduos sólidos que ofereciam condições deutilização como materiais de construção da região, selecionandoo entulho como resíduo de interesse para o projeto.

A gestão adequada dos resíduos sólidos de construção e de-molição é o tema abordado pelo Dr. Tarcísio Pinto no Capí-tulo III, onde é dada uma atenção especial às questões da efi-ciência e sustentabilidade da gestão diferenciada versus a ges-tão corretiva.

No Capítulo IV, as arquitetas Ana Vieira e Bárbara Quadrosapresentam o Plano de Gestão Diferenciada do Entulho que estásendo implantado em Salvador pela LIMPURB (Empresa de Lim-peza Urbana do Salvador). Nesse capítulo, são expostos os obje-tivos, a concepção, a estratégia de implantação e os benefíciosdesse plano.

No capítulo V, são apresentadas as características do entulho eas propriedades dos agregados reciclados produzidos a partir desseresíduo, incluindo-se os resultados obtidos com a experiência re-alizada em Salvador para a caracterização desses materiais.

Os capítulos VI, VII e VIII abordam, respectivamente, a utiliza-ção de agregado reciclado em pavimentos, tijolos e argamassas.Nesses capítulos, além da fundamentação teórica sobre o tema,são relatadas as experiências realizadas em Salvador sobre o de-sempenho dos materiais produzidos com agregado reciclado.

Por fim, no capítulo de considerações finais, é apresentada asíntese das vantagens da reciclagem do entulho e discutida anecessidade de estudos complementares e de mecanismos paraa sua efetiva implantação.

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Pioneiro no país sobre o tema, este livro deverá contribuir paraa difusão de práticas e técnicas para a reciclagem do entulho epara a minimização dos impactos causados pela sua geração. Eleé dirigido a empresas de construção civil, indústrias geradoras deresíduos, empresas de tratamento e disposição final de resíduos,empresas de gestão de resíduos, instituições do setor de habita-ção popular, fabricantes de materiais de construção, Secretariasde Governo e Prefeituras, organizações ambientais, universida-des, instituições de pesquisa e demais profissionais, pesquisado-res e estudantes interessados no tema. Espera-se que a sua leitu-ra contribua para a conscientização do meio técnico sobre a ne-cessidade de reduzir, reutilizar e reciclar resíduos.

Os organizadores

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AGRADECIMENTOS

Durante os últimos três anos e meio em que desenvolvemos oProjeto Entulho Bom, diversas instituições e pessoas contribuíram, deforma significativa e valiosa, para os trabalhos que culminam com estapublicação, às quais expressamos nosso profundo agradecimento:

À Caixa Econômica Federal, pelo apoio pioneiro e irrestrito aesta atividade de pesquisa, viabilizando o alcance de resultadostão relevantes; especialmente a Beatriz Lima, Osvaldo Serrano,Jorge Arraes, Augusto César de Souza Jr., Telma Pires, FranciscoLigouri, Tácito Maia, Raul de Moura e demais dirigentes e técni-cos, que se dedicaram efetivamente para o sucesso do projeto.

À Fundação Escola Politécnica, pela eficiente administraçãofinanceira dos recursos e ao seu Secretario Executivo, CarlosEmílio Strauch, e à sua equipe, pelo apoio nos momentos em quemais precisamos.

À Empresa de Limpeza Urbana do Salvador, na figura do seu pre-sidente, Dr. Jalon Oliveira, pela parceria fundamental e indispen-sável ao projeto, e a Ana Vieira, Bárbara Quadros, Rilda Bloise edemais funcionários dessa instituição envolvidos com o ProjetoEntulho Bom, pelo afinco com que se dedicam ao tema.

À Superintendência de Apoio ao Desenvolvimento Científico eTecnológico, na pessoa de sua diretora, Dra.Cleilza Andrade, peloapoio financeiro, essencial às diversas atividades desenvolvidaspelo Projeto Entulho Bom; e a Ana Oliveira, pela presteza e dispo-sição em colaborar para o êxito deste projeto.

À Universidade Federal da Bahia, que possibilitou o desen-volvimento desta pesquisa, em especial ao Magnífico Reitor,Prof. Heonir Rocha, aos Profs. Caiuby Alves, Luis Edmundo Campose demais professores, pesquisadores, funcionários e alunos da

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Escola Politécnica, que nos deram o apoio decisivo para conti-nuarmos o trabalho, sobretudo, após a prematura partida do Prof.José Clodoaldo Cassa.

Ao Mestrado em Engenharia Ambiental Urbana da UFBA, emespecial a Emerson Ferreira, Marcos Jorge Santana e demais pro-fessores, funcionários e alunos, que nos deram suporte e deposi-taram confiança neste trabalho.

À Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação da UFBA, espe-cialmente a Caio Mário Castilho, Maria do Carmo Cabanelas eMaria Letícia Senna, pelo apoio e pela concessão de bolsas deIniciação Científica.

Ao Núcleo de Tecnologia de Preservação e Restauro da UFBA,particularmente a Mário Mendonça e Allard do Amaral, pelacolaboração ao projeto.

À Editora da UFBA, em especial à sua diretora, Flávia Rosa, peloapoio e orientação para a elaboração deste livro.

Ao Departamento de Infraestrutura e Rodagens da Bahia – Setorde Pesquisa Tecnológica, em especial a Solange Costa e a UbirajaraSouza, e ao Centro de Pesquisa e Desenvolvimento do Estado da Bahia,em especial a Célia Neves, pelas significativas contribuições ao pro-jeto, materializadas na transferência de conhecimento para a equi-pe e na realização de ensaios laboratoriais indispensáveis à pesquisa.

Às diversas instituições e empresas da Região Metropolitana deSalvador – CONDER, CRA, FIEB, SIC, SEPLANTEC, SGM, SINDUSCON,SUDIC, UEFS, Aratu, Ciminas, Concremassa, Concreta, Drescon,Microssílica, Nassau, Poty, Sika, Vedacit – que contribuíram paraa realização do diagnóstico dos resíduos e para as atividadesexperimentais do projeto.

A Ana Luz, pela paciência e dedicação na revisão redacional, aMaria de Fátima Cleomenis, pela normalização bibliográfica, e a

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Maria Helena Pereira da Silva, pela sensibilidade e criatividade naconcepção do design gráfico deste livro.

A Luciana Amaral de Lima, pela motivação e apoio decisivos naelaboração deste livro e que, com o seu conhecimento, ajudou aenriquecer a publicação.

Aos professores e pesquisadores Enric Vázquez, Tarcísio Pinto eVanderley John que, além de parceiros desta publicação, são tam-bém idealizadores de uma nova mentalidade na área de resíduos.

Às pesquisadoras Elaine Alberte, Dayana Costa e Taís Sampaio,pela dedicação, perseverança, competência e entusiasmo com quedesenvolveram as atividades do Projeto Entulho Bom, tornando-se peças fundamentais para o êxito deste trabalho.

Aos professores e pesquisadores Paulo Burgos, Antônio Sérgioda Silva, Giovanni Floridia e Francisco Oliveira Neto, que colabo-raram de forma significativa para o desenvolvimento do projeto.

Aos bolsistas de iniciação científica da Escola Politécnica daUniversidade Federal da Bahia, Aledson Costa, André Rodamilans,David Fortuna, Fábio Carneiro, Geison Pereira, Rafael Mota,Rodrigo Tejo, que tanto contribuíram nas atividades iniciais desteprojeto, e aos bolsistas Eric dos Santos, Fernanda Calmon e Enéasda Silva Jr., pelo apoio na conclusão deste livro.

Aos técnicos laboratoriais Armando José da Silva, Emanoel doNascimento, Ivo Oliveira, José Renato da Silva, Júlio Muniz, Luís Or-lando Lima e Paulo César Santana, dos Laboratórios de Materiais deConstrução e de Geotecnia do DCTM - UFBA e do Laboratório de En-genharia Civil do CEPED, pela dedicação na realização dos ensaios.

Por fim, a todos aqueles que não foram citados, mas que con-tribuíram, de alguma maneira, para o sucesso na concretizaçãodeste trabalho.

Os organizadores

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃOEnric Vázquez

CAPÍTULO I

APROVEITAMENTO DE RESÍDUOS SÓLIDOS COMO

MATERIAIS DE CONSTRUÇÃOVanderley M. John

DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

A CONSTRUÇÃO CIVIL E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

RECICLAGEM E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

Vantagens Ambientais da ReciclagemRiscos da Reciclagem

RECICLAGEM PRIMÁRIA VERSUS SECUNDÁRIA

RECICLAGEM DE RESÍDUOS E MULTIDISCIPLINARIDADE

CONCLUSÃO

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CAPÍTULO II

DIAGNÓSTICO DOS SETORES PRODUTORES DE RESÍDUOS

NA REGIÃO METROPOLITANA DE SALVADOR/BAJosé Clodoaldo S. Cassa, Irineu Antônio S. de Brum,

Alex Pires Carneiro, Dayana Bastos Costa

DIAGNÓSTICO DO SETOR QUÍMICO

Complexo Petroquímico de Camaçari – COPECCentro Industrial de Aratu – CIAIndústria Cerâmica da RMS

DIAGNÓSTICO DOS SETORES DE MINERAÇÃO E METALURGIA

DIAGNÓSTICO DO SETOR DE LIMPEZA URBANA

DIAGNÓSTICO DO SETOR DE CONSTRUÇÃO CIVIL

CONCLUSÃO

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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CAPÍTULO III

GESTÃO DOS RESÍDUOS DE CONSTRUÇÃO E DEMOLIÇÃO

EM ÁREAS URBANAS – DA INEFICÁCIA A UM MODELO DE

GESTÃO SUSTENTÁVELTarcísio de Paula Pinto

IMPACTOS DOS RESÍDUOS DE CONSTRUÇÃO E DEMOLIÇÃO (RCD)

POTENCIAL DE RECICLAGEM DOS RESÍDUOS DE CONSTRUÇÃO

E DEMOLIÇÃO

A GESTÃO DIFERENCIADA DOS RESÍDUOS DA CONSTRUÇÃO E

DEMOLIÇÃO

Facilitação da DisposiçãoSegregação na CaptaçãoReciclagem para Alteração da Destinação

BASES LEGAIS PARA UMA NOVA GESTÃO

CUSTOS OPERACIONAIS E INVESTIMENTOS PARA A GESTÃO

DIFERENCIADA

COMENTÁRIOS FINAIS

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CAPÍTULO IV

GESTÃO DIFERENCIADA DO ENTULHO NA CIDADE

DE SALVADORBárbara Elizabete C. Quadros, Ana Maria V. de Oliveira

INTRODUÇÃO

A Cidade de SalvadorA LimpurbO Modelo de Gestão de Resíduos Sólidos

EVOLUÇÃO DA GESTÃO DO ENTULHO

PROJETO DE GESTÃO DIFERENCIADA DE ENTULHO

ConcepçãoEstratégia de Implantação

CONCLUSÃO

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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CAPÍTULO V

CARACTERÍSTICAS DO ENTULHO E DO AGREGADO RECICLADOAlex Pires Carneiro, Bárbara Elizabete C. Quadros,

Ana Maria V. de Oliveira, Irineu Antônio S. de Brum

Taís Santos Sampaio, Elaine Pinto V. Alberte, Dayana Bastos Costa

CARACTERÍSTICAS DO ENTULHO

CARACTERÍSTICAS DO AGREGADO RECICLADO

PROCESSOS DE PRODUÇÃO DO AGREGADO RECICLADO

RECICLAGEM DE ENTULHO E ECONOMIA

EXPERIÊNCIA REALIZADACARACTERIZAÇÃO DO ENTULHO E DO AGREGADO RECICLADODE SALVADOR

CARACTERIZAÇÃO DO ENTULHO

Apresentação e Análise dos ResultadosCARACTERIZAÇÃO DO AGREGADO RECICLADO

Apresentação dos ResultadosAPLICAÇÕES DO AGREGADO RECICLADO

AVALIAÇÃO ECONÔMICA

CONCLUSÃO

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

NORMAS TÉCNICAS CITADAS

CAPÍTULO VI

USO DO AGREGADO RECICLADO EM CAMADAS DE BASE

E SUB-BASE DE PAVIMENTOSAlex Pires Carneiro, Paulo César Burgos, Elaine Pinto V. Alberte

CONSIDERAÇÕES GERAIS SOBRE PAVIMENTOS

MateriaisPropriedades e Especificações dos Materiais

DIMENSIONAMENTO DE PAVIMENTOS

Métodos TradicionaisMétodos MCT (Miniatura, Compactado, Tropical)

UTILIZAÇÃO DE AGREGADO RECICLADO EM PAVIMENTOS

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EXPERIÊNCIA REALIZADA

USO DO AGREGADO RECICLADO DE SALVADOR EM CAMADASDE BASE E SUB-BASE DE PAVIMENTOS

MATERIAIS UTILIZADOS

MÉTODOS DE AVALIAÇÃO

APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS

Método TradicionalMétodo MCT (Miniatura, Compactado, Tropical)Avaliação Econômica

CONCLUSÃO

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

NORMAS TÉCNICAS CITADAS

CAPÍTULO VII

USO DO AGREGADO RECICLADO EM TIJOLOS DE SOLO

ESTABILIZADO COM CIMENTOCélia Maria M. Neves, Alex Pires Carneiro, Dayana Bastos Costa

USO DO SOLO COMO MATERIAL DE CONSTRUÇÃO

TIJOLOS E BLOCOS DE SOLO ESTABILIZADO

FABRICAÇÃO DE TIJOLOS E BLOCOS DE SOLO ESTABILIZADO

Equipamentos de fabricação de tijolos e blocosCRITÉRIOS PARA SELEÇÃO DE SOLO E DOSAGEM DE TRAÇO

REQUISITOS PARA CONTROLE DE QUALIDADE

EXPERIÊNCIA REALIZADA

O USO DO AGREGADO RECICLADO DE SALVADOR EM TIJOLOSDE SOLO-CIMENTO

MATERIAIS UTILIZADOS

APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS

CONCLUSÃO

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

NORMAS TÉCNICAS CITADAS

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CAPÍTULO VIII

USO DO AGREGADO RECICLADO EM ARGAMASSAS

DE REVESTIMENTOMarcos Jorge A. Santana, Alex Pires Carneiro, Taís Santos Sampaio

UTILIZAÇÃO DO AGREGADO RECICLADO EM ARGAMASSAS

AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO DAS ARGAMASSAS DE

REVESTIMENTO

Propriedades da Argamassa no Estado FrescoPropriedades da Argamassa no Estado Endurecido – Argamassasem Corpos-de-ProvaPropriedades da Argamassa no Estado Endurecido – Argamassasem PainéisCritérios de avaliação das argamassas de revestimento

EXPERIÊNCIA REALIZADA

USO DO AGREGADO RECICLADO DE SALVADOR EMARGAMASSAS DE REVESTIMENTO

MATERIAIS UTILIZADOS

MÉTODO DE PRODUÇÃO E DE AVALIAÇÃO DAS ARGAMASSAS

APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS

Argamassas no Estado FrescoArgamassas no Estado Endurecido – corpos-de-provaArgamassas no Estado Endurecido – Painéis de revestimentoAvaliação Subjetiva das ArgamassasAvaliação Econômica

CONCLUSÃO

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

NORMAS TÉCNICAS CITADAS

CONSIDERAÇÕES FINAIS

REDUÇÃO, RECICLAGEM E REAPROVEITAMENTO –

AÇÕES DE CIDADANIAAlex Pires Carneiro

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276

277

278

283

292

295

297

300

Page 24: Livro entulho bom

24

INTRODUÇÃO

Em 1987, o Relatório Brundtland “Our Common future” diziaque “o desenvolvimento é sustentável quando satisfaz às necessi-dades das gerações atuais, sem hipotecar a capacidade das gera-ções futuras de satisfazer às suas próprias”. Tratava-se de uma cha-mada a estender a solidariedade até as gerações futuras. Ao pro-blema ético clássico da distribuição eqüitativa dos recursos soma-va-se a questão sobre que recursos, em que forma e a que veloci-dade distribuir e usar. A resposta geral não é outra senão que “emum mundo finito, o crescimento não pode ser sustentado e odesenvolvimento tem que ser sustentável, ou não será”.

Concretamente, torna-se imprescindível o uso mais racionaldos recursos tais como a energia e as matérias primas naturais,bem como a implantação de uma gestão de resíduos mais lógica.A indústria da construção origina uma enorme corrente de re-síduos dos processos de demolição e construção, e usa e abusadas matérias primas naturais como os agregados. Só na UniãoEuropéia, os resíduos da construção estão entre 221-334 mi-lhões de toneladas por ano, o que significa de 607 a 918 kg/pessoa/ano, frente a uma média de 390 kg/pessoa/ano deresíduos sólidos urbanos (lixo doméstico). Em recente publica-ção, pesquisadores do Projeto Entulho Bom da UniversidadeFederal da Bahia mostram que a evolução da coleta de resí-duos da construção, na cidade de Salvador, passou de 200.000t/ano, em 1996, para mais de 500.000 t/ano, em 1998. A caracte-rização realizada detectou um alto potencial de reciclabilidadedesses resíduos.

Não cabe dúvida de que a importância dessa reciclagem nãoescapou ao Brasil.

22

Page 25: Livro entulho bom

25

A Construção Sustentável baseia-se na prevenção e redução dosresíduos pelo desenvolvimento de tecnologias limpas no uso demateriais recicláveis ou reutilizáveis, no uso dos resíduos comomateriais secundários e na coleta e deposição inerte. Portanto,devem ser tomadas medidas que transformem as correntes deresíduos em recursos reutilizáveis. A maior parte da investigaçãodirigiu-se aos resíduos de construção e demolição. Quando essesresíduos são selecionados, graduados e limpos adequadamente,tornam-se um agregado secundário, cuja utilização, em função daorigem e tratamento, cobrem desde um aterro até um concreto.

Na Holanda, Alemanha, Dinamarca e Bélgica, as primeirasusinas de reciclagem entraram em serviço há 15 anos. No ReinoUnido, França e Espanha, a experiência ainda não cumpriu umadécada. As usinas estão sempre concentradas em áreas urbanas,pois é onde ocorre a máxima produção de resíduos e tambémonde se apresenta a maior e mais constante demanda de mate-riais. A maior parte do material secundário, obtido nas usinas detratamento, vai para os pavimentos como material de sub-base oubase, simplesmente compactado ou tratado com algum ligantepara aumentar sua coesão e capacidade portante.

Em 1999, o Relatório Symonds concluiu que o nível médio dereciclagem, na construção européia, era somente de 28%, e a de-molição seletiva ainda era pouco freqüente. Essa é a causa do pre-domínio das aplicações nas bases e sub-bases de pavimentos e deum limitado uso no concreto. A situação pode ser decepcionante, senão se impulsar a atividade a partir do setor público, através de umsistema de impostos. Em nosso país, como provavelmente em mui-tos lugares do Brasil, a competição do agregado natural primário éferoz e, até muito recentemente, não se havia adequado as taxasde deposição, nem aplicado com rigor a lei de aterros sanitários

23

Page 26: Livro entulho bom

26

especiais. O voluntariado de investigadores, os técnicos e os impor-tantes investimentos de empresas do setor reciclador não tiverammais que um modesto reflexo na prática construtiva cotidiana.

O principal obstáculo estava na crença de que um material se-cundário não pode ter constância na qualidade. Além disso, osmateriais secundários estão constantemente sujeitos aos mesmosrequerimentos dos primários, por falta de normas adequadas. Aprodução de materiais secundários de alta qualidade, comparáveisaos primários, é possível, porém os custos de produção de taismateriais tendem a ser algo maiores. De uma forma clara, só sepode competir em aplicações “low-tech”, como as já citadas, na-quelas em que o nível de exigência rebaixa os custos de produ-ção. Por isso, o papel estratégico dos governos ou das autoridadesdo estado é decisivo, guiando economicamente as reciclagens edeposições, exigindo o cumprimento das leis, cobrando os impos-tos e depósitos e orientando os processos de reciclagem. Não sepode esquecer, além disso, que existem situações particulares emque a produção de agregados reciclados de alta qualidade para oconcreto pode ser claramente competitiva.

Na Catalunha, no último ano, conseguimos dar um passo de gi-gante, que abre, por fim, as portas ao uso desses materiais secundá-rios de uma forma massiva e programada. O GERD (Demolition Re-cycling Companies Guild) preparou e pactuou, em conjunto com ogoverno catalão, um programa 2001-2006 de “Construção com Ma-teriais Residuais”. Esse programa é, ao mesmo tempo, um impor-tante documento para a planificação territorial de infraestruturasque incluirão materiais secundários. O programa integra as realidadesdo setor industrial, as realidades da produção de materiais secundá-rios e os deveres impostos pela convergência européia. Os pontosdesse programa estão contidos nos três objetivos fundamentais:

24

Page 27: Livro entulho bom

27

1. O desenvolvimento de mecanismos administrativos eficientes2. A introdução de um novo modelo de aterro sanitário (Clas-

se I), a modificação das taxas de deposição e outras medidaseconômicas para tornar atrativa a reciclagem.

3. O desenvolvimento das atividades recicladoras e o uso realdesses produtos na construção.

A Administração Catalã de Pavimentação já autorizou o usodesses materiais em suas obras, e a Instituição Espanhola para oConcreto iniciou o caminho sem retorno da mesma autorização,pela mão do nosso Departamento Universitário.

Em toda Espanha, o objetivo é alcançar 40% de reciclagem em6 anos. Em nosso Estado isso será possível.

O caminho da aceitação desses materiais é longo, cheio de obs-táculos e de desencorajadores passos atrás. Porém uma modestaexperiência de 10 anos e os últimos êxitos nos permitem animaros companheiros brasileiros a continuar nesse caminho tambéminiciado e a perseverar na aplicação dos logros e estratégias quese apresentam neste livro. Em qualquer caso, sempre estaremosdispostos a colaborar no progresso do querido Brasil que, paramim, já é uma segunda pátria.

O exemplo do professor e amigo J. Cassa fica como guia e, paranós, a lembrança de sua humanidade, inteligência e gentileza per-durará o resto de nossas vidas.

Prof. Dr. Enric Vázquez

Universidade Politécnica da Catalunha - Barcelona / Espanha

Departamento de Engenharia da Construção

Traduzido pela Dra. Luciana Amaral de Lima

25

Page 28: Livro entulho bom

26APROVEITAMENTO DE RESÍDUOS SÓLIDOS COMO MATERIAIS DE CONSTRUÇÃO

CAPÍTULO I

Page 29: Livro entulho bom

27

Vanderley M. John

APROVEITAMENTO DERESÍDUOS SÓLIDOS COMO

MATERIAIS DE CONSTRUÇÃO

Page 30: Livro entulho bom

28APROVEITAMENTO DE RESÍDUOS SÓLIDOS COMO MATERIAIS DE CONSTRUÇÃO

DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVELAo longo da história da humanidade, a visão de progresso vem

se confundindo com um crescente domínio e transformação da

natureza. Nesse paradigma, os recursos naturais são vistos como

ilimitados. Resíduos gerados durante a produção e ao final da vida

útil dos produtos são depositados em aterros, caracterizando um

modelo linear de produção. A preservação da natureza foi vista

de forma geral como antagônica ao desenvolvimento. Neste con-

texto, a preservação da natureza significou a criação de parques,

áreas especiais destinadas a preservação de amostras da natureza

para as gerações futuras, evitando-se a extinção de espécies.

O primeiro alerta dos limites desse modelo foi a poluição do ar

e da água, que levou à geração do conceito de controle ambiental

da fase de produção industrial, com o estabelecimento de rígida

legislação limitando a liberação de poluentes e com a criação de

Agências Ambientais. Em grande medida, essa visão ainda está

presente no movimento ambiental, algumas vezes denominado

de preservacionista, e na ainda limitada consciência ambiental dos

brasileiros. Preservação ambiental é, antes de tudo, preservação

de espécies em extinção, de áreas de matas nativas e rios.

A visão de desenvolvimento sustentável surge como decorrêcia

da percepção sobre a incapacidade desse modelo de desenvolvi-

mento e de preservação ambiental se perpetuar e até mesmo ga-

rantir a sobrevivência da espécie humana. O avanço do conheci-

mento sobre os efeitos de poluentes orgânicos biopersistentes, as

catástrofes planetárias como a destruição da camada de ozônio por

gases produzidos e liberados pelo homem e o conhecido efeito

estufa demonstram que a preservação da natureza vai exigir uma

reformulação mais ampla dos processos produtivos e de consu-

mo. Isso implica uma reformulação radical da visão de impacto

Page 31: Livro entulho bom

29

ambiental das atividades humanas, que passa também a incorpo-

rar todos os impactos das atividades de produção e de consumo,

desde a extração da matéria prima, os processos industriais, o

transporte e o destino dos resíduos de produção e também o do

produto após a sua utilização. Além dos regulamentos que limi-

tam a poluição do ar e da água e protegem vegetação e espécies

naturais, é evidente a necessidade de uma análise crítica dos pro-

cessos de produção e de consumo. Nesse sentido, a proteção am-

biental deixa de ser uma preocupação de ambientalistas e funcio-

nários de órgãos ambientais, para entrar no mundo dos negócios.

A série de normas ISO 14000 é a parte mais visível de um movi-

mento empresarial que envolve, pela primeira vez, organizações

não-governamentais integradas por empresas.

A Conferência sobre Desenvolvimento e Meio Ambiente das

Nações Unidas (Rio 92) consolida através da AGENDA 21, a visão

de que desenvolvimento sustentável não apenas demanda a pre-

servação dos recursos naturais, de modo a garantir para às gera-

ções futuras iguais condições de desenvolvimento — a equidade

entre gerações — mas também uma maior equidade no acesso

aos benefícios do desenvolvimento — a igualdade intrageração.

Esse último postulado tem conseqüências sociais importantes.

A CONSTRUÇÃO CIVIL EDESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

Nenhuma sociedade poderá atingir o desenvolvimento susten-

tável sem que a construção civil, que lhe dá suporte, passe por

profundas transformações.

A cadeia produtiva da construção civil, também denominada

construbusiness, apresenta importantes impactos ambientais em

Page 32: Livro entulho bom

30APROVEITAMENTO DE RESÍDUOS SÓLIDOS COMO MATERIAIS DE CONSTRUÇÃO

todas as etapas do seu processo: extração de matérias primas,

produção de materiais, construção, uso e demolição. Qualquer

sociedade seriamente preocupada com esta questão deve colo-

car o aperfeiçoamento da construção civil como prioridade.

Esse grande impacto decorre de diferentes fatores, entre os

quais, o enorme peso do macrocomplexo da construção civil na

economia. No Brasil, o construbusiness corresponde a 14% da

economia. Qualquer atividade humana necessita de um ambiente

construído adequado para sua operação, e, os produtos da cons-

trução civil são sempre de grandes dimensões.

O macrocomplexo da construção civil é um dos maiores consu-

midores de matérias-primas naturais. Estima-se que a construção

civil utiliza algo entre 20 e 50% do total de recursos naturais con-

sumidos pela sociedade (Sjöström, 1992). O setor consome, por

exemplo, enormes quantidades de materiais com significativo

conteúdo energético (Tabela 1), que necessitam ser transporta-

dos a grandes distâncias. Estima-se que cerca de 80% da energia

utilizada na produção de um edifício é consumida na produção e

transporte de materiais (Construction..., 1996).

TABELA 1- CONSUMO DE ENERGIA (GJ/ton) PARA A PRODUÇÃO DEDIFERENTES MATERIAIS NOS PAÍSES BAIXOS NO ANO DE 1990(BASEADO EM CONSTRUCTION..., 1996)

MATERIALMATERIAL

Alumínio

Plásticos

Cobre

250

E

75

> 100

MATERIAL

Aço

Vidro

Cimento

30-60

E

12

6

Cal

Cerâmica

Madeira

3-5

E

2-7

0,1-5

MATERIAL

Agregados

Cinza vol.

Solo

< 0,5

E

< 0,5

< 0,5

Page 33: Livro entulho bom

31

O consumo de agregados, na construção civil, também é muito

grande (Tabela 2). Algumas reservas de matérias-primas estão,

atualmente, bastante limitadas, a exemplo das reservas mundiais

de cobre, com vida útil estimada em pouco mais de 60 anos

(Construction..., 1996). Numa cidade como São Paulo, o esgota-

mento das reservas próximas da capital faz com que a areia natural

já seja transportada de distâncias superiores a 100 km, implicando

enorme consumo de energia e geração de poluição.

TABELA 2 - PRODUÇÃO ANUAL DE AGREGADOS EMDIVERSOS PAÍSES, NO ANO DE 1988, (CONSTRUCTION..., 1996)E ESTIMATIVA PARA O BRASIL.

� Estimativa do autor, que considera a produção de cimento dos últimos anos em

aproximadamente 36 Mton, uma proporção média cimento: agregados 1:5,5 e uma populaçãode 160 milhões de habitantes. A esse valor devem ainda ser somados os agregados utilizadosna construção de rodovias, entre outros.

As atividades de produção de matérias-primas, de canteiro e até

mesmo de manutenção e demolição geram impactos ambientais,

como resíduos, ruído, poeira, além dos poluentes industriais. A

produção de cimento e cal, por exemplo, envolve a calcinação

de calcário, lançando grande quantidade de CO2 na atmosfera:

CaCO3

1000g

+ energia CaO

560g

+ CO2

440g

PAÍS

França 138

Mton Mton per capita

2,45

Japão 1,90

Coréia do Sul 46

Reino Unido 319

USA 1937

Brasil (concreto e argamassas)� ~ 200 ~ 1,24

1,54

1,07

5,56

7,74

Page 34: Livro entulho bom

32APROVEITAMENTO DE RESÍDUOS SÓLIDOS COMO MATERIAIS DE CONSTRUÇÃO

Isso significa que, para cada tonelada de cal virgem, são produ-

zidos 785 kg de CO2, ou mais de 590 kg de CO

2 para uma tonelada

de cal hidratada. No Brasil, a indústria cimenteira é responsável

por mais de 6% do CO2 gerado ( John, 2000). O CO

2 é o principal

gás responsável pelo efeito estufa.

O macrocomplexo da indústria da construção civil é a principal

geradora de resíduos da economia. Os resíduos produzidos nas

atividades de construção, manutenção e demolição têm estimativa

de geração muito variável (John, 2000). Os valores encontrados, na

bibliografia internacional, variam de 163 a mais de 3000 kg/hab. ano.

No entanto, os valores típicos encontram-se entre 400 e 500 kg/ hab.

ano, valor igual ou superior à massa de lixo urbano. Parte signifi-

cativa desses resíduos são depositados ilegalmente, acumulam-se

nas cidades, gerando custos e agravando problemas urbanos, como

enchentes e tráfego (Pinto, 1999). A produção dos materiais que

a construção consome também gera resíduos, como as escórias

de alto forno e de aciaria, resíduos cerâmicos, etc. Pelo menos,

parte desses resíduos já é reciclada pela construção civil. De

maneira geral, estima-se que o construbusiness seja responsável

por cerca de 40% dos resíduos gerados na economia.

A fase de uso dos edifícios e de outras construções também pos-

sui impacto ambiental significativo, especialmente se considerar-

mos o estoque de produtos da construção civil em uso. Os edi-

fícios são responsáveis por cerca de 50% do consumo de energia

elétrica no Brasil (Lamberts & Westphal, 2000). A sua operação

consome água, tanto em suporte às atividades desenvolvidas

quanto em limpeza. Atividades de manutenção e de demolição

geram resíduos, poeira e ruído. Durante a vida útil de um edifício,

as atividades de manutenção consomem recursos em volume

aproximadamente igual aos despendidos na fase de produção

Page 35: Livro entulho bom

33

( John, 1988). O interior de edifícios é, de maneira geral, sempre

mais poluído que o ar exterior, tanto pela geração de poeiras e

proliferação de micro-organismos quanto pela liberação de com-

postos orgânicos voláteis, nocivos à saúde dos usuários.

Esse significativo impacto ambiental da construção civil tem leva-

do diferentes países a adotarem políticas ambientais específicas

para o setor. Conseqüentemente, a agenda ambiental é priori-

dade em muitas regiões do mundo. A Civil Engineering Research

Foundation (CERF), entidade dedicada a promover a moderniza-

ção da construção civil dos Estado Unidos, realizou uma pesquisa

entre 1500 construtores, projetistas e pesquisadores de todo o

mundo (Bernstein, 1996), visando a detectar quais as tendências

consideradas fundamentais para o futuro do setor. Nessa pesquisa,

a “questão ambiental” foi considerada a segunda tendência mais

importante para o futuro (Figura 1). Com base nesses resultados,

a entidade definiu 38 propostas diferentes de pesquisa.

FIGURA 1GRAU DE IMPACTO DE DIFERENTES TENDÊNCIAS NAS ATIVIDADESDA CONSTRUÇÃO CIVIL (BERNSTEIN, 1996)

Respostas (%)

Page 36: Livro entulho bom

34APROVEITAMENTO DE RESÍDUOS SÓLIDOS COMO MATERIAIS DE CONSTRUÇÃO

Essa tendência à regulamentação tem causado mobilização in-

ternacional do construbusiness. A European Construction Industry

Federation possui, desde 1996, agenda específica para o tema

(Construction..., 1996). O CIB (lnternational Council for Research

and Inovation in Building and Construction) colocou, entre suas

prioridades de pesquisa e desenvolvimento, o desenvolvimento

sustentável. A entidade produziu a Agenda 21 para a construção

civil, agora traduzida para o português pelo PCC USP.

De um modo geral, a redução do impacto ambiental da cons-

trução civil é tarefa complexa, sendo necessário agir em várias

frentes de maneira combinada e simultânea (Kilbert, 1994):

1. Minimizar o consumo de recursos (conservar)

2. Maximizar a reutilização de recursos (reutilizar materiais e

componentes)

3. Usar recursos renováveis ou recicláveis (renovar / reciclar)

4. Proteger o meio ambiente (proteção da natureza)

5. Criar um ambiente saudável e não tóxico (utilizar não tóxicos)

6. Buscar a qualidade na criação do ambiente construído

(aumentar a qualidade)

Para a Agenda 21 do CIB (International Concil for Research and

Inovation in Building and Construction, CIB, 2000), essas ações

deverão considerar os seguintes aspectos: (a) organizacionais e

de gestão; (b) design de componentes e de edifícios, incluindo

aspectos relativos a reciclabilidade; (c) conservação de recursos

naturais; (d) desenvolvimento urbano; (e) outros impactos am-

bientais relacionados a atividades do setor; ( f ) aspectos sociais,

culturais e econômicos (CIB, 2000).

Essas diretrizes gerais devem se manifestar em preocupações

técnicas específicas. Por exemplo, a durabilidade deixa de ser um

aspecto importante apenas do ponto de vista econômico e passa

Page 37: Livro entulho bom

35

a significar o tempo em que as atividades que implicaram deter-

minado impacto ambiental cumprem sua função social (Sjöström,

1996), minimizando o consumo de recursos, preservando a natu-

reza e minimizando o impacto ambiental. O aumento da durabili-

dade vai exigir alterações no design e em procedimentos organi-

zacionais e de gestão. É necessário perceber que o aumento da

durabilidade, expresso em termos de vida útil, depende não ape-

nas da taxa de degradação física de materiais e componentes —

determinada pela interação entre os materiais selecionados e os

macro e microclimas —, mas também da degradação social (John,

1987), que pode ser entendida como conseqüência de mudanças

nas necessidades dos usuários com o decorrer do tempo. Essas

mudanças são um reflexo cultural das transformações que a soci-

edade sofre, seja em termos de tecnologia ou de mudança de po-

der aquisitivo, e inclui aspectos de cunho eminentemente social,

como o gosto ou a moda. A durabilidade, pois, deve ser controla-

da pela possibilidade de readequação às mudanças nas necessi-

dades dos usuários ( John; Kraayenbrink; Van Wamelen, 1996).

A seleção de materiais deixará de ser feita apenas com base em

critérios estéticos, mecânicos e econômicos, mas estará condicio-

nada a diferentes questões como contaminação do ar interno —

considerando as taxas de ventilação ambiental —, durabilidade no

ambiente a que os mesmos serão expostos, possíveis impactos

ambientais da sua deposição e possibilidades de reciclagem. Esses

critérios constituirão parte integrante das atividades diárias dos

engenheiros e arquitetos.

RECICLAGEM E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVELOs resíduos são subprodutos gerados pelos processos econô-

micos, que incluem atividades extrativistas, produção industrial

Page 38: Livro entulho bom

36APROVEITAMENTO DE RESÍDUOS SÓLIDOS COMO MATERIAIS DE CONSTRUÇÃO

e de serviços, bem como do consumo, até mesmo de preserva-

ção ambiental, como a microssílica e a escória de sinterização de

resíduos urbanos, ambos com emprego na construção civil.

O macrocomplexo da construção civil é o maior responsável

pela reciclagem no Brasil e na maioria dos países. A quase totali-

dade das armaduras para reforço passivo de concreto e do cimento

Portland, comercializados no Brasil, contém elevado teor de resí-

duos, com grandes benefícios ambientais para a sociedade.

VANTAGENS AMBIENTAIS DA RECICLAGEM

As possibilidades de redução dos resíduos gerados nos diferen-

tes processos produtivos apresentam limites técnicos objetivos.

Os resíduos, portanto, sempre existirão. A política de proteção am-

biental hoje vigente é voltada quase que exclusivamente para a depo-

sição controlada desses resíduos. Essa política apresenta limites

diversos. Um óbvio limite é que os aterros controlados constituem

desperdício, por tempo indefinido, de um recurso limitado, o solo,

além de concentrarem enormes quantidades de resíduos perigo-

sos e sempre estarem sujeitos a acidentes de graves conseqüências.

Para controlar o risco de acidentes, a normalização desses aterros

tem recebido aperfeiçoamentos constantes, os quais têm elevado

o preço desses serviços a valores muitas vezes insuportáveis. Na

grande São Paulo, esses valores facilmente ultrapassam a US$ 100/

ton. Esses custos representam um fator de limitação para qualquer

política, por várias razões, dentre as quais se destaca o fato de tor-

nar as empresas geradoras de resíduos “inimigas” dessas políticas.

A reciclagem, por outro lado, é uma oportunidade de transfor-

mação de uma fonte importante de despesa numa fonte de fatu-

ramento ou, pelo menos, de redução das despesas de deposição.

Uma grande siderúrgica, por exemplo, produz mais de 1 milhão

Page 39: Livro entulho bom

37

de toneladas de escória de alto forno por ano. A reciclagem desse

material na indústria cimenteira, entre outras, mesmo se comer-

cializado a baixo preço, é um excelente negócio, pois elimina as

despesas com o gerenciamento e deposição do resíduo.

Se, na ponta geradora do resíduo, a reciclagem significa redu-

ção de custos e até mesmo novas oportunidades de negócios, na

outra ponta do processo, a cadeia produtiva que recicla reduz o

volume de extração de matérias-primas, preservando recursos

naturais limitados.

A incorporação de resíduos na produção de materiais também

pode reduzir o consumo de energia, não apenas pelo fato de esses

produtos freqüentemente incorporarem grandes quantidades de

energia, mas, também, porque podem-se reduzir as distâncias de

transporte de matérias-primas. No caso das escórias e pozolanas,

é esse nível de energia que permite produção de cimentos sem a

calcinação da matéria prima, permitindo uma redução de consu-

mo energético de até 80% (John, 1995a). Finalmente, a incorpo-

ração de resíduos no processo produtivo, muitas vezes, permite a

redução da poluição gerada. Por exemplo, a incorporação de escó-

rias e pozolanas reduz substancialmente a produção de CO2 no

processo de produção do cimento. A Tabela 3 resume o impacto

ambiental da reciclagem em alguns materiais de construção civil.

Finalmente, a incorporação de resíduos permite muitas vezes a

produção de materiais com melhores características técnicas,

como é o caso da adição de microssílica, que viabiliza concretos

de alta resistência mecânica, e da escória de alto forno, que me-

lhora o desempenho do concreto frente à corrosão por cloretos.

O incentivo à reciclagem deve ser, então, uma parte importante

de qualquer política ambiental. (Proposal to European Community

Brite Euram Program, ENBRI, 1994; John, 2000).

Page 40: Livro entulho bom

38APROVEITAMENTO DE RESÍDUOS SÓLIDOS COMO MATERIAIS DE CONSTRUÇÃO

RISCOS DA RECICLAGEM

A reciclagem de resíduos apresenta, também, dois tipos de risco.

O primeiro é o risco associado a qualquer inovação tecnológica

na construção civil, pois a natureza empírica do conhecimento e

a falta de tradição em inovação tecnológica, aliadas à longa du-

rabilidade requerida, têm significado desempenho inadequado

de muitas novas tecnologias introduzidas no mercado (John,

1995b). A esse problema soma-se o risco inerente à própria

reciclagem, pois muitos resíduos são considerados perigosos,

pois possuem elevadas concentrações de espécies químicas

perigosas ( John, 2000).

TABELA 3 - REDUÇÃO DO IMPACTO AMBIENTAL (EM %) DARECICLAGEM DE RESÍDUOS NA PRODUÇÃO DE ALGUNS MATERIAISDE CONSTRUÇÃO CIVIL (A PARTIR DE UDAETA & KANAYAMA, 1997)

1 Substituição por 50% de escória de alto forno2 Produção de CO2

IMPACTO AMBIENTAL

Consumo de Energia 74

AÇO

Consumo de Matéria Prima

Consumo de Água 40

Poluentes Atmosféricos 86

Poluição Aquática 76

Resíduos em Geral 105

Resíduos Minerais

90

97

6

VIDRO

50

22

54

54

79

40

CIMENTO 1

< 50 2

50

Page 41: Livro entulho bom

39

RECICLAGEM PRIMÁRIA VERSUS SECUNDÁRIAAs possibilidades de reciclagem de resíduos, dentro do pró-

prio processo responsável por sua geração, são limitadas ou,

muitas vezes, de alto custo. Assim, a reciclagem secundária dos

resíduos é alternativa que deve ainda ser explorada.

A reciclagem primária, definida como a reciclagem do resíduo

dentro do mesmo processo que o originou, é muito comum e

possui grande importância na produção do aço e do vidro, embo-

ra seja, muitas vezes, técnica ou economicamente inviável (All...,

1993). Dificuldades com a pureza, a necessidade de controle

estreito da uniformidade das matérias-primas e a concentração

de plantas industriais em determinadas regiões, tornando neces-

sário o transporte de resíduos a longas distâncias, são fatores que

diminuem a competitividade da reciclagem primária.

Já a reciclagem secundária, definida como a reciclagem de um

resíduo em outro processo produtivo, diverso daquele que o ori-

ginou, apresenta inúmeras possibilidades, particularmente no

macrocomplexo da construção civil.

Como já foi dito, a construção civil utiliza grandes volumes de

diferentes materiais. Diferentemente de outras indústrias, os ma-

teriais utilizados, em sua maioria, são de composição e produção

simples — especialmente os componentes que fazem uso do ci-

mento Portland —, toleram variabilidade razoável e exigem baixas

resistências mecânicas. Finalmente, atividades de produção rela-

cionadas ao macrocomplexo estão presentes em todas as regiões

de qualquer país.

Muitos dos produtos da construção civil estarão protegidos do

contato direto com as intempéries. Este aspecto pode ser inte-

ressante ao encapsulamento de resíduos industriais perigosos.

Muita pesquisa tem sido feita nesse sentido, infelizmente sem se

Page 42: Livro entulho bom

40APROVEITAMENTO DE RESÍDUOS SÓLIDOS COMO MATERIAIS DE CONSTRUÇÃO

RECICLAGEM DE RESÍDUOS E MULTIDISCIPLINARIDADEJohn (2000) apresenta uma proposta de metodologia para

pesquisa e desenvolvimento de reciclagem de resíduos com mate-

riais de construção civil.

Resumidamente, a reciclagem de resíduos como material de

construção envolve:

1. a caracterização física e química e da microestrutura do resí-

duo, incluindo o seu risco ambiental;

2. a busca de possíveis aplicações dentro da construção civil,

considerando as características do resíduo;

3. o desenvolvimento de diferentes aplicações, incluindo seu

processo de produção, com base em ciência dos materiais;

4. a análise de desempenho frente às diferentes necessidades

dos usuários para cada aplicação específica;

5. a análise do risco ambiental do novo produto, incluindo conta-

minação do lençol freático, do ar interno e dos trabalhadores;

6. a análise do impacto ambiental do novo produto, numa abor-

dagem “do berço à sepultura”, como está sendo chamada, que

necessariamente deve envolver avaliação de riscos à saúde dos

trabalhadores e dos usuários;

7. a análise da viabilidade econômica;

8. a transferência da tecnologia.

O desenvolvimento dessas atividades exige a capacidade de inte-

gração de conhecimentos vinculados a diferentes especializações,

num trabalho multidisciplinar típico, com profissionais de áreas

tão diversas como Ciências da Vida (Medicina, Biologia), Química,

Marketing e Engenharia de Materiais. Todas elas são igualmente

atentar para eventuais problemas de saúde dos trabalhadores e

dos usuários das construções.

Page 43: Livro entulho bom

41

importantes na viabilização de uma reciclagem. A Tabela 4 apresen-

ta algumas das atividades envolvidas em cada etapa do processo.

TABELA 4 - CONHECIMENTOS ENVOLVIDOS EM UM ESTUDO DERECICLAGEM. NA ÚLTIMA LINHA, ESTÃO DESTACADOS OSCONHECIMENTOS TÍPICOS DA CONSTRUÇÃO CIVIL.

É recomendável que participe do processo um especialista da

indústria que produz o resíduo, pois somente esse profissional

pode trazer informações sobre a exata composição do resíduo,

amplitude da variabilidade de sua composição química e até mes-

mo julgar a possibilidade de alteração de algum aspecto do pro-

cesso produtivo gerador do resíduo, de forma a tornar a reciclagem

mais competitiva.

A integração dos conhecimentos e do universo da construção

civil com os conhecimentos da área das Ciências da Vida é indis-

pensável quando se investiga a reciclagem ou encapsulamento de

resíduos potencialmente nocivos. Apesar desta importância até o

momento não existe metodologia satisfatória disponível.

MA

TE

RIA

IS

CARACTERIZAÇÃO

SELEÇÃO DE APLICAÇÕES

DESENVOLVIMENTO

DESEMPENHO

IMPACTO AMBIENTAL

ATIVIDADES TÍPICASDA ENGENHARIA CIVIL

FIN

AN

ÇA

S

QU

ÍMIC

A

CIÊ

NC

IAS

DA

VID

A

MA

RK

ET

ING

PR

OD

ÃO

AM

BIE

NTA

L

PR

OD

UT

OR

DO

RE

SÍD

UO

Page 44: Livro entulho bom

42APROVEITAMENTO DE RESÍDUOS SÓLIDOS COMO MATERIAIS DE CONSTRUÇÃO

A integração de conceitos de marketing e finanças talvez seja a

menos compreendida entre os pesquisadores, mas, nem por isso,

deixa de ser uma das mais importantes. Qualquer produto, con-

tendo resíduos ou não, precisa ser adequado ao mercado. Num

setor conservador como a construção civil, com pouca experiência

em inovação tecnológica, a introdução de um novo produto no

mercado necessita ser realizada de acordo com um plano previa-

mente estudado e definido.

A viabilidade financeira é certamente fundamental em to-

das as etapas, e deve ser avaliada em função do valor de mer-

cado do produto, dos custos do processo de reciclagem e do

custo da disposição em aterro. Uma metodologia específica

precisa ser desenvolvida. A importância desse aspecto é facil-

mente percebida pela verificação que muitos produtos, tecni-

camente viáveis e plenamente desenvolvidos, nunca chegam

ao mercado.

Esta abordagem multidisciplinar, necessária ao desenvolvi-

mento do processo de reciclagem, vai requerer habilidades adi-

cionais dos engenheiros civis envolvidos no processo.

A complexidade e a multiplicidade de pessoas e aspectos en-

volvidos no projeto exigem o desenvolvimento de uma aborda-

gem sistêmica, em que o impacto de cada decisão ou resultado

experimental seja avaliado simultaneamente em todas as demais

atividades que estão sendo desenvolvidas.

São também necessários o reconhecimento da importância das

demais disciplinas e uma compreensão mínima ou entendimen-

to da linguagem de cada uma delas, o que exige um nível mínimo

de conhecimento técnico sobre cada uma. Este nível de conheci-

mento somente poderá ser obtido a partir de uma formação

holística do profissional.

Page 45: Livro entulho bom

43

CONCLUSÃOO conceito de desenvolvimento sustentável está criando pro-

fundas raízes na sociedade e, certamente, deverá atingir as ativida-

des do macrocomplexo da construção civil, da extração de maté-

rias primas, da produção de materiais de construção, estendendo-

se do canteiro às etapas de operação / manutenção e demolição.

A partir desse conceito, a reciclagem de resíduos de outras indús-

trias é uma tendência que deverá ser aprofundada no setor. O desen-

volvimento de produtos contendo resíduos, alguns deles perigo-

sos, é atividade multidisciplinar. Os engenheiros civis deverão estar

preparados para o desenvolvimento dessas atividades e utilização

dos resíduos.

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Page 47: Livro entulho bom

45

Vanderley M. John - Eng. Civil, M. Eng. (NORIE-UFRGS, 1987), Dr. Eng. (PCC/USP, 1995), Livre

Docente (PCC USP, 2000), Professor Associado PCC USP

Para a realização do trabalho apresentado neste capítulo o autor contou com o financiamento da

FINEP (Financiadora de Estudos e Projetos) através do programa HABITARE e da FAPESP

(Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo).

Page 48: Livro entulho bom

46DIAGNÓSTICO DOS SETORES PRODUTORES DE RESÍDUOS NA RMS / BA

CAPÍTULO II

Page 49: Livro entulho bom

47

José Clodoaldo Silva Cassa (em memória)

Irineu Antônio Schadach de Brum

Alex Pires Carneiro

Dayana Bastos Costa

DIAGNÓSTICO DOS SETORESPRODUTORES DE RESÍDUOSNA REGIÃO METROPOLITANA

DE SALVADOR/BAHIA

Page 50: Livro entulho bom

48DIAGNÓSTICO DOS SETORES PRODUTORES DE RESÍDUOS NA RMS / BA

Um dos principais problemas que afeta a qualidade de vida,

nos grandes centros urbanos, é o volume de resíduos gerado diaria-

mente. Aspectos técnicos e operacionais envolvidos nessa ques-

tão são bastante conhecidos e estão relacionados à quantidade e

à diversidade dos materiais descartados pela sociedade. Atualmen-

te, os resíduos sólidos constituem um dos maiores problemas para

as empresas e administrações públicas, visto que seu gerencia-

mento adequado acarreta custos elevados. Nas grandes cidades,

o problema é ainda mais grave, devido à quantidade de resíduos

gerados e à falta de áreas adequadas, próximas e disponíveis para

deposição desses materiais.

Conforme apresentado no capítulo anterior, a reciclagem e o

reaproveitamento de resíduos sólidos como matéria-prima para a

construção civil assumem significativa importância para a

minimização dos problemas ambientais causados pela geração de

resíduos de atividades urbanas e industriais.

A construção civil é atualmente o grande reciclador de resíduos

provenientes de outras indústrias. Resíduos como a escória granu-

lada de alto forno, as cinzas volantes, a sílica ativa, entre outros, são

incorporados rotineiramente nas construções, embora esse setor

tenha um potencial consumidor ainda maior (Cassa et al, 1998).

Portanto, a realização de um diagnóstico, para identificar os prin-

cipais resíduos gerados numa região, avaliando o conhecimento

disponível sobre cada um e analisando o seu potencial de aprovei-

tamento na construção civil, é uma atividade fundamental para o

desenvolvimento de ações de gestão ou de pesquisa visando à reci-

clagem ou aproveitamento de resíduos na produção de materiais

de construção.

Neste capítulo, é apresentado o diagnóstico dos resíduos sólidos

dos setores de química, mineração, metalurgia, limpeza urbana e

Page 51: Livro entulho bom

49

construção civil, produzidos na Região Metropolitana de Salvador

(RMS). Esse diagnóstico, realizado em 1998, identificou e locali-

zou as principais ocorrências, incluindo a quantificação e a avalia-

ção do conhecimento disponível, bem como o potencial de apro-

veitamento desses resíduos como matéria-prima para produção

de materiais de construção.

O levantamento dos dados foi realizado através de visitas às

indústrias, aplicação de questionários, informações obtidas em

órgãos ambientais, Secretarias e Superintendências de Governo,

Federação das Indústrias, associações de classe, instituições de

pesquisa, órgãos da Prefeitura, entre outros.

O nível de conhecimento dos resíduos identificados foi avaliado

e classificado como: pouco ou nenhum conhecimento; pesquisa

básica em andamento ou concluída; pesquisa aplicada em anda-

mento ou concluída; produção comercial; prioridades, recomen-

dações e oportunidades. A partir dessa avaliação foi possível identi-

ficar os resíduos de maior potencial para a produção de materiais e

contribuir para a definição de linhas prioritárias de Pesquisa &

Desenvolvimento na região.

DIAGNÓSTICO DO SETOR QUÍMICOA indústria química e petroquímica representa atualmente um

expressivo setor da economia nacional, com importante partici-

pação no Produto Interno Bruto. Contudo, diversos processos de

produção da indústria química são geradores de resíduos sólidos,

classificados como desde inertes até altamente perigosos. Na Bahia,

a implantação tanto do Complexo Petroquímico de Camaçari —

COPEC quanto do Centro Industrial de Aratu — CIA consolidou a

presença de empresas do setor químico na RMS.

Page 52: Livro entulho bom

50DIAGNÓSTICO DOS SETORES PRODUTORES DE RESÍDUOS NA RMS / BA

A riqueza natural da região onde está instalado o COPEC e o CIA

é muito vasta. A região de Camaçari, sede do COPEC, está locali-

zada entre dois importantes rios, o rio Jacuípe e rio Joanes, e sobre

o maior reservatório de água subterrânea do Estado (formação

São Sebastião). A avaliação da qualidade dos recursos ambientais

do Complexo Petroquímico de Camaçari indicou a ocorrência de

significativos impactos ambientais em vários locais dessa área (Cen-

tro de Recursos Ambientais, CRA, 1985).

O Centro de Recursos Ambientais do Estado da Bahia — CRA

(1985), encontrou indústrias com resíduos sólidos depositados de

forma inadequada nos terrenos das empresas, em tanques, bacias

e pilhas, constituindo fontes potenciais de contaminação dos recur-

sos hídricos da região. Atualmente a CETREL S/A — EMPRESA DE

PROTEÇÃO AMBIENTAL é responsável pelo tratamento e disposição

final de significativa parte dos resíduos sólidos gerados pelo COPEC.

A apresentação do diagnóstico dos resíduos do setor químico

está dividida entre os setores industriais já consolidados: Comple-

xo Petroquímico de Camaçari — COPEC e Centro Industrial de

Aratu — CIA. Nesse item, também é apresentado o diagnóstico da

Indústria de Cerâmica Vermelha, que gera uma quantidade

significativa de resíduos e possui mais de 30 empresas dispersas

nos municípios da RMS.

COMPLEXO PETROQUÍMICO DE CAMAÇARI - COPECUsualmente chamado de Pólo Petroquímico de Camaçari, o

COPEC iniciou suas operações em 1978, sendo o maior e mais

completo complexo industrial da América do Sul, considerando

não somente a quantidade de indústrias instaladas, mas também a

quantidade de resíduos industriais gerados por essas instalações.

Esse complexo está voltado para a produção de petroquímicos

Page 53: Livro entulho bom

51

de primeira, segunda e terceira gerações (Superintendência de

Desenvolvimento Industrial e Comercial, SUDIC, 1997b). A econo-

mia da Região Metropolitana de Salvador, bem como a do próprio

Estado, é influenciada pelas suas atividades, através do recolhimen-

to de impostos, da geração de empregos, da atração de investi-

mentos, do crescimento populacional, dentre outros aspectos.

Suas indústrias estão localizadas a cerca de 50 quilômetros de

Salvador, nas proximidades do litoral norte do Estado da Bahia,

entre as cidades de Camaçari e Dias D’Ávila. Estão situadas na área

do Complexo Básico e nas áreas industriais Norte, Leste e Oeste.

São mais de 50 empresas, em sua maioria químicas ou petro-

químicas, incluindo-se outros segmentos industriais, como a me-

talurgia, celulose, manutenção industrial e bebidas. Os resíduos

gerados pelas empresas do setor químico do COPEC são apresen-

tados na Tabela 1. Essas informações foram obtidas no “Guia de

Compra e Venda de Sobras Indústriais” publicado pela Bolsa de

Resíduos, programa da Federação das Indústrias do Estado da Bahia,

que promove a troca de informações entre as empresas geradoras

de resíduos e potenciais usuários (Federação das Industrias do

Estado da Bahia, FIEB, 1997).

De um modo geral, os resíduos do setor químico da COPEC são

gerados em pequenas quantidades, que, sem tratamento prévio,

não apresentam potencial para o aproveitamento direto na cons-

trução civil.

Alguns resíduos com potencial energético poderão ser usados

como combustível no cozimento de cerâmica vermelha. Outros

não-inertes poderão ser adicionados, em pequenas quantidades,

na massa cerâmica, pois, após o cozimento, estarão vitrificados e,

portanto, inertizados. De fato, apesar do pouco conhecimento

disponível sobre a maioria desses resíduos, algumas experiências

Page 54: Livro entulho bom

52DIAGNÓSTICO DOS SETORES PRODUTORES DE RESÍDUOS NA RMS / BA

já estão sendo feitas, inclusive com atividades de pesquisa desen-

volvidas pelo CEPED (Centro de Pesquisa e Desenvolvimento do

Estado da Bahia), destacando-se o trabalho recente do pesquisa-

dor Eng. Francisco Nascimento, “Blocos Cerâmicos com Lama de

Fluoreto de Cálcio - Avaliação das Propriedades e Comportamento

Ambiental” (Nascimento, 2001). Esse trabalho foi realizado em

parceria com a DETEN QUIMICA S. A. — geradora do resíduo — e a

Cerâmica Poty — produtora do bloco cerâmico.

TABELA 1 - PRINCIPAIS RESÍDUOS GERADOS PELASINDÚSTRIAS DO SETOR QUÍMICO NO COPEC (FIEB, 1997)

TIPO

Sucata de papel

RESÍDUO

0,1

QUANTIDADE (t/mês)

Inertes

Não-inertesou

perigosos

GERADOR

0,3

1,0

15,0

50,0

1,5

0,2

20,0

1,7

60,0

6,0

30,0

1,7

0,7

1,2

5,1

800,0

0,8

80,0

2.500,0

Polímero mod. de impacto p/PVC

Sucata plástica

Formiato de sódio

Fibra acrílica

Borras úmidas de borracha SBR

Catalizador exausto P. A. Ni

Cinza de caldeira

Óleo lubrificante

Óleo residual

Lama de Fluoreto de Cálcio

Óleo leve

Carvão semi-saturado c/etilenoglicol

Carvão ativo

Catalisador C-12-3-04

Óleo exausto

TAR de TDI

Pó de catalisador

Borra de enxofre (D-002/003)

Lama de ilmenita

CARBONOR

CARBONOR

COPENOR PETROQUÍM. DO ND

SUDAMERIC. DE FIBRAS BRASIL

CENTRAL DE POLÍM. DA BAHIA

CIQUINE PETROQUÍMICA

COPENE

COPENE

DETEN QUÍMICA S. A.

DETEN QUÍMICA S. A.

EMP. CARIOCA DE PROD. QUÍM.

OXITENO

PETROBRÁS — FAFEN

PETROBRÁS — FAFEN

PETROBRÁS — FAFEN

PRONOR PETROQUÍMICA S. A.

TIBRÁS

TIBRÁS

TIBRÁS

CENTRAL DE POLÍM. DA BAHIA

Page 55: Livro entulho bom

53

CENTRO INDUSTRIAL DE ARATU - CIAO Centro Industrial de Aratu, criado na década de 60, é consi-

derado um dos importantes distritos industriais da região, dada a

sua grande influência no espaço socioeconômico da Bahia e, prin-

cipalmente, da Região Metropolitana de Salvador. Ao longo de

sua existência, o CIA tem passado por fases de crescimento e es-

tagnação, acompanhando as oscilações econômicas do país. Em

1998, período de realização do diagnóstico, o CIA apresentava bom

ritmo de crescimento dos investimentos e de mão-de- obra, 91%

e 19%, respectivamente (SUDIC,1997a).

A área total do Centro Industrial de Aratu é de aproximada-

mente 200 Km2, limitando-se com duas áreas adjacentes, a Área

Industrial Norte, no Município de Candeias, e a Área Industrial

Sul, no Município de Simões Filho.

As indústrias que compõem o CIA, cerca de 200, enquadram-se

nos setores: químico, minerais não metálicos, metalurgia, material

elétrico e de transporte, madeira e mobiliário, têxtil e vestuário,

bebidas e produtos alimentícios. Dessas, 49 indústrias fazem par-

te do setor químico, aproximadamente 25% do total (Centro das

Indústrias do Estado da Bahia, CIEB, 1995/1996). Os resíduos ge-

rados pelas empresas do setor químico do CIA são apresentados

na Tabela 2 (FIEB, 1997).

Os dados desta tabela indicam que, de um modo geral, os resíduos

são gerados em pequenas quantidades e que, sem tratamento pré-

vio, não apresentam potencial para o aproveitamento direto na cons-

trução civil (exceção do pó de areia da SIKA e do filer asfáltico da

FAVAB). Da mesma forma que no COPEC, alguns resíduos energéticos

produzidos no CIA poderão ser usados como combustível para for-

nos na fabricação de cerâmica vermelha, e outros resíduos poderão

ser adicionados, em pequenas quantidades, à massa cerâmica.

Page 56: Livro entulho bom

54DIAGNÓSTICO DOS SETORES PRODUTORES DE RESÍDUOS NA RMS / BA

TABELA 2 - PRINCIPAIS RESÍDUOS GERADOS PELASINDÚSTRIAS DO SETOR QUÍMICO NO CIA (FIEB, 1997)

INDÚSTRIA CERÂMICA DA RMSA indústria cerâmica é geralmente dividida segundo os tipos de

produtos fabricados: cerâmica vermelha ou estrutural, cerâmica de

revestimento, cerâmica branca e refratários. O setor da cerâmica

vermelha destaca-se entre os demais, pois tem como uma de suas

características o volume considerável de resíduos gerados na fa-

bricação de suas peças (material quebrado ou defeituoso). Sua

produção abrange blocos furados, tijolos, telhas e manilhas. Essas

indústrias têm seu mercado limitado ao âmbito regional, já que o

frete encarece de forma significativa o preço do produto final,

para longas distâncias de transporte.

A indústria de cerâmica vermelha constitui um representati-

vo setor industrial da RMS. São cerca de 30 fábricas, distribuídas

TIPO

Filler asfáltico

RESÍDUO

100,0

QUANTIDADE (t/mês)

Inertes

Não-inertesou

perigosos

GERADOR

0,2

0,1

0,1

1,0

0,1

3,0

3,0

0,5

10,0

0,1

0,3

Sucatas

Pó de areia

Limalha

Plástico

Frascos vazios de reagentes

Big-bags usados

PVC composto de 2ª qualidade

Aparas de borracha vulcanizada

Resíduo de Toner

Tolueno

Metil-etil cetona

FAVAB

SIKA

TEC. AVANÇADA GARANTIDA

XEROX

XEROX

XEROX

DECARTO DO NORDESTE

IPB - IND. DE PROD. BORRACHA

XEROX

XEROX

XEROX

TEC. AVANÇADA GARANTIDA

Page 57: Livro entulho bom

55

pelos municípios da região, produzindo blocos para a indústria

da construção civil local. Existem desde fábricas automatizadas a

olarias artesanais, que produzem tijolos sem controle de qualida-

de. Tradicionalmente, o mercado consumidor das peças de cerâ-

mica vermelha da RMS não é exigente com a qualidade dos pro-

dutos adquiridos, o que tem propiciado o surgimento de indús-

trias sem instalações adequadas para a produção de blocos.

Um estudo recente do Instituto Euvaldo Lodi — IEL (1998) ava-

liou a qualidade e a produtividade do setor da Indústria Cerâmica

da RMS. A produção anual das indústrias desse setor é da ordem

de 21 milhões de blocos, e a geração de resíduos representa, em

média ,14 % desse valor, ou seja: cerca de 3 milhões de blocos por

ano, o que corresponde a aproximadamente 7.500 toneladas de

resíduos — cacos cerâmicos — provenientes das perdas do pro-

cesso de produção. Esses resíduos são depositados nos terrenos

adjacentes às empresas.

Ainda segundo esse estudo, metade das empresas opera com

grande índice de perdas, entre 15 e 20 % (essas empresas não regis-

tram lucro), cujas principais causas são:

• falta de conhecimento das características tecnológicas das

matérias-primas utilizadas;

• deficiência de estoques intermediários de matéria-prima, com

qualquer variação refletindo-se no processo;

• maquinário e manutenção inadequados;

• problemas com a secagem e/ou cozimento;

• alta de controle de processo;

• recursos humanos com pouco treinamento.

De um modo geral, as empresas com alto índice de perdas apre-

sentam blocos sem dimensões padronizadas, fora de esquadro,

com baixa resistência mecânica ao choque ou à compressão e sem

Page 58: Livro entulho bom

56DIAGNÓSTICO DOS SETORES PRODUTORES DE RESÍDUOS NA RMS / BA

uniformidade de coloração. Essa última característica não limita a

utilização do bloco, mas demonstra a falta de uniformidade e con-

trole no processo produtivo (IEL, 1998).

Entretanto, existem fábricas que, pelo seu porte de produção

ou pela aplicação de conhecimentos tecnológicos modernos, con-

seguem atenuar o problema e reduzir a geração de resíduos a

índices aceitáveis.

Segundo Fonseca; Costa; Conciani (1998), algumas alterna-

tivas de aproveitamento dos resíduos da indústria da cerâmica

vermelha são:

• reincorporação à massa cerâmica do resíduo, que, após tritu-

rado, produz um pó com propriedades pozolânicas, que me-

lhora a composição da mistura;

• a transformação do resíduo em agregado para a fabricação

de concretos, com desempenho semelhante ao do concreto

convencional.

A indústria cerâmica vem assumindo um importante papel no

aproveitamento racional de resíduos sólidos provenientes da in-

dústria química. No seu processo de produção, a cerâmica é sub-

metida a elevadas temperaturas, que acabam por vitrificar os

materiais componentes. Assim, existe a possibilidade da incorpo-

ração de resíduos a esses materiais, melhorando algumas proprie-

dades do produto final.

O emprego de resíduos de natureza orgânica ou de materiais

combustíveis misturados às argilas para a fabricação de cerâmica

vermelha (principalmente de blocos) é uma alternativa tecnológica

de grande interesse. A adição de resíduos combustíveis à massa

cerâmica pode reduzir o consumo da energia necessária para o cozi-

mento (Instituto Nacional de Pesquisa, INP, 1993). Essa redução

pode variar em função da eficiência e do tipo de forno utilizado,

do conteúdo energético, do poder calorífico do resíduo, do tipo

Page 59: Livro entulho bom

57

de argila utilizada, entre outros fatores. Os resíduos com proprie-

dades energéticas também podem servir de combustíveis para

alimentar os fornos dessas fábricas.

É necessário ressaltar, entretanto, que, no caso da incorpora-

ção de rejeitos industriais à massa cerâmica, algumas questões

que transcendem às normas específicas sobre o assunto devem

ser levadas em consideração. Os materiais com resíduo incorpo-

rado devem ser desenvolvidos com base em pesquisa científica e

tecnológica, para avaliação rigorosa do risco de contaminação

ambiental ( John, 1996). Nesse sentido, o CEPED vem desenvol-

vendo, nas últimas décadas, estudos sobre o aproveitamento se-

guro de resíduos industriais na fabricação de blocos cerâmicos.

Esses trabalhos são desenvolvidos em parceria com a indústria

cerâmica e o gerador do resíduo, o que contribui para a difusão

dessa prática na região.

DIAGNÓSTICO DOS SETORES DE MINERAÇÃOE METALURGIA

A mineração e a metalurgia são historicamente atividades que

produzem impactos ambientais considerados significativos pelos

mais diversos segmentos sociais. Contudo, com o desenvolvimen-

to tecnológico e o maior rigor dos órgãos ambientais, essas indús-

trias passaram a introduzir modificações em seus sistemas produ-

tivos, objetivando o controle e a minimização da poluição gerada

(Brum et al, 2000).

A mineração é uma atividade estratégica para o Estado da Bahia,

que se destaca no cenário nacional como o 4o produtor de bens

minerais e detentor de expressivo potencial. São cerca de 400

empresas que exploram minerais metálicos, energéticos, indus-

triais, materiais para construção, pedras preciosas, entre outros

Page 60: Livro entulho bom

58DIAGNÓSTICO DOS SETORES PRODUTORES DE RESÍDUOS NA RMS / BA

minerais (Brum et al, 1996). Na região de Salvador, são aproximada-

mente 30 empresas concentradas na extração de matéria-prima para

a construção civil local. As empresas de mineração identificadas na

RMS e os respectivos resíduos gerados são apresentados na Tabela 3.

TABELA 3 - PRINCIPAIS RESÍDUOS IDENTIFICADOS NO SETORDE MINERAÇÃO DA RMS.

� Fonte: SGM, 1997

MINERAL �

Agapito e Gomes LTDA

Areia

Argila

RESÍDUOGERADOR �

Pedra

Caulim

Const.Garrido Leite LTDA

Líder Mineração e Serviços LTDA

Ottomar Mineração

Palmeiras & CIA LTDA

Itaporanga Mineração LTDA

Weber Comércio e Terraplanagem LTDA

Cêramica Central LTDA

Cerâmica Ourem Indústria & Comércio LTDA

Cerâmica São Remo Indústria LTDA

Cerâmica Abrantes LTDA

Cerâmica Biribeira LTDA

Cerâmica Bloco Forte LTDA

Cerâmica Igarapé LTDA

Cerâmica Peres LTDA

CERNE - Cerâmica Reunidas LTDA

Itaporanga Minerado LTDA

Oliveira & Sampaio LTDA

Cerâmica Rodax LTDA

Civil Comercial LTDA

Pedreira Carangi LTDA

Pedreira Limoeiro LTDA

Pedreira Aratu LTDA

Pedreira Valéria S/A

Pedreira Omacil

Itaporanga Mineração LTDA

Empresa Indústria Lucaia

Material areno-argiloso(Arenoso)

Pó de pedra

Argilas inadequadas paracerâmica vermelha

Areia contaminada c/ argila

Page 61: Livro entulho bom

59

O setor metalúrgico, na RMS, apresenta indústrias de grande e

médio porte. Os resíduos sólidos resultantes dos processos meta-

lúrgicos, usualmente denominados escórias, apresentam compo-

sições químicas variadas, dependendo basicamente da matéria-

prima utilizada e do processo de produção das ligas ou metais

(Cassa & Carneiro, 1998).

A geração de volumes consideráveis de resíduos sólidos é uma

característica dos processos utilizados atualmente no setor de

metalurgia. A base tecnológica desses processos necessita ser alte-

rada para reduzir a geração de resíduos que, estocados em áreas

próximas às indústrias, podem causar impactos ambientais, como

a contaminação do solo e dos cursos de água.

As principais indústrias metalúrgicas da RMS e os respectivos

resíduos gerados são apresentados na Tabela 4.

TABELA 4 - OS PRINCIPAIS RESÍDUOS IDENTIFICADOS NO SETORDE METALURGIA DA RMS

Dentre os resíduos do setor de mineração, destacam-se o pó

de pedra e o arenoso, que, apesar de serem largamente utilizados

pela indústria da construção civil em pavimentação e argamassa,

respectivamente, têm seu estudo limitado apenas à pesquisa

GERADOR

ALCOA

RESÍDUO

CARAÍBAMETAIS

FERBASA

SIBRA

USIBA

Resíduos de demolição de fornos (refratários)

Escórias de Cobre

Lama de Gesso

Escórias de Ferro-Cromo

Escórias de Ferro-Liga

Escórias de Aciária

Page 62: Livro entulho bom

60DIAGNÓSTICO DOS SETORES PRODUTORES DE RESÍDUOS NA RMS / BA

básica. Por sua vez, as argilas inadequadas para a cerâmica verme-

lha e as areias contaminadas com argila são resíduos sem aceita-

ção no mercado local.

Entre os resíduos do setor de metalurgia, as escórias de ferro-

cromo, geradas pela FERBASA, e as de cobre, da CARAÍBA, apre-

sentam grande potencial para uso como material de construção.

As escórias de ferro-cromo têm sido comercializadas pela BMN

— Construção e Comércio Ltda., com a marca de fantasia BRITAFER.

Pesquisas básicas e aplicadas sobre essa escória foram realizadas

por diversos pesquisadores nas décadas de 80 e 90 (CEPED, 1981;

CONCRETA, 1993; Valois & Teixeira, 1995; Cassa & Carneiro, 1998).

Esses estudos obtiveram êxito em caracterizar e avaliar o desem-

penho mecânico da escória de Fe-Cr britada, em substituição ao

agregado graúdo, na produção de concretos.

A recente pesquisa “Avaliação do Desempenho de Concreto

Produzido com Agregado Graúdo de Escória de Ferro-Cromo”

(Silva Filho, 2001), desenvolvida pelo Eng. Antônio Freitas da Silva

Filho, Professor da UFBA e da UEFS (Universidade Estadual de Feira

de Santana), contribuiu para completar esses estudos, uma vez que a

avaliação de materiais produzidos com resíduos desse tipo envol-

vem questões complexas, como, por exemplo, a avaliação de risco de

contaminação ambiental e da saúde dos usuários e trabalhadores.

Quanto às escórias de cobre, o recente estudo “Utilização de

Escória de Cobre como Adição e como Agregado Miúdo para Con-

creto” (Moura, 2000), do Professor da UEFS, Dr. Washington

Almeida Moura, indica o comportamento adequado desse resíduo

para a produção de concreto, inclusive com a constatação de que

a escória de cobre da CARAÍBA não apresenta risco ambiental.

As escórias de aciaria, geradas pela USIBA em forno de arco

elétrico, são resíduos que também apresentam potencial para uso

Page 63: Livro entulho bom

61

na construção civil. Entretanto, pouco conhecimento sobre essas

escórias está disponível, sendo necessário o desenvolvimento de

estudos similares ao de Lima, “Hormigones com escorias de horno

eléctrico como áridos: propiedades, durabilidad y compor-

tamiento ambiental” (Lima, 1999). Nesse trabalho, Lima avalia o

desempenho e o risco ambiental de escórias de aciaria produzidas

em Barcelona, Espanha, para utilização em concretos.

Há pouco conhecimento disponível ainda sobre as escórias de

ferro-liga da SIBRA, sendo necessário o desenvolvimento de ati-

vidade de pesquisa básica, para avaliação de seu potencial de uso

na construção.

Sobre os demais resíduos do setor de metalurgia — lama de ges-

so e resíduos de demolição de fornos — também há pouco ou ne-

nhum conhecimento desenvolvido, necessário para sua utilização

na construção. Contudo, de forma geral, eles não apresentam po-

tencial de uso direto como matéria-prima para a construção civil.

DIAGNÓSTICO DO SETOR DE LIMPEZA URBANAO aumento contínuo da produção de resíduos sólidos, nos

centros urbanos, decorrente de um conjunto de fatores vem

agravando os problemas com o manejo, tratamento e disposição

final desses resíduos. Esses fatores envolvem o aumento popula-

cional, o aumento da geração de resíduos sólidos por habitan-

te, a intensificação das atividades industriais, o surgimento de

novos materiais e a crescente tendência de os consumidores

optarem pela “comodidade” das embalagens descartáveis

(Castro, 1996).

O lixo urbano, ou resíduo sólido urbano, é aquele proveniente

das atividades urbanas, gerado por residências, comércio, serviços

Page 64: Livro entulho bom

62DIAGNÓSTICO DOS SETORES PRODUTORES DE RESÍDUOS NA RMS / BA

de saúde, serviços do município (varrição, podas, etc.), portos, ae-

roportos e atividades produtivas localizadas na malha ur-

bana (pequenas indústrias, construção, reformas, etc.). No

Brasil, a coleta e a destinação final desses resíduos são ativi-

dades desenvolvidas pelo poder municipal, constituindo um

dos maiores problemas para essas administrações, devido ao

elevado custo.

A Cidade de Salvador produz, diariamente, cerca de 5.500

toneladas de resíduos sólidos urbanos, o que representa mais

de 90% dos resíduos sólidos urbanos produzidos e coletados na

RMS (Empresa de Limpeza Urbana do Salvador, LIMBURB, 2000;

Companhia de Desenvolvimento da Região Metropolitana de

Salvador, CONDER, 1997).

Uma parte dos resíduos sólidos do setor de limpeza urbana

da RMS é disposta nos aterros sanitários da região. No entanto,

outra parte desses resíduos acaba sendo depositada em aterros

clandestinos, lixões, terrenos baldios, acostamento de vias ur-

banas e estradas, praias, valas, córregos, encostas, entre outros

locais inadequados.

Essas formas de disposição geram uma série de problemas

ambientais e sociais, dentre os quais se destacam: poluição dos

mananciais (inclusive do lençol freático), contaminação do solo,

poluição visual, proliferação de vetores de doenças, obstrução dos

sistemas de drenagem (provocando enchentes), entre outros pro-

blemas relevantes.

Diante desse quadro, a LIMPURB — Empresa de Limpeza Urba-

na do Salvador e a CONDER — Companhia de Desenvolvimento

Urbano do Estado da Bahia desenvolveram, em Salvador e na sua

Região Metropolitana, o Programa de Destinação Final de Resí-

duos Sólidos. Esse programa implantou quatro aterros sanitários

Page 65: Livro entulho bom

63

integrados para a destinação do lixo urbano, buscando eliminar a

disposição inadequada em lixões e, assim, minimizar os impactos

ambientais causados.

O conhecimento da natureza do lixo urbano, através de dados

referentes à sua composição qualitativa e quantitativa, serve de

ponto de partida para os estudos de reaproveitamento e de

potencialidades econômicas, tais como recuperação de papéis,

papelão, metais, plásticos, vidros e a transformação da matéria

orgânica em adubo para o solo (CONDER, 1994).

A composição gravimétrica, que define o percentual da mas-

sa de cada material componente do resíduo sólido urbano, é a

primeira e mais importante etapa para qualquer trabalho refe-

rente a tais resíduos, quer seja para planejamento da limpeza

urbana, quer para orientação e determinação de sistemas mais

eficientes de tratamento, disposição e reciclagem (Castro, 1996).

Segundo Andrade (1992, citado por Castro, 1996), os resíduos

sólidos domiciliares possuem composição heterogênea, que

varia em função de fatores, como o nível socioeconômico da po-

pulação que o produz, as estações do ano, os costumes e hábitos

da população, os dias da semana e a situação econômica da re-

gião. Além disso, na determinação da composição gravimétrica,

deve-se observar que, dentro de uma mesma comunidade, esses fa-

tores vão se modificando com o decorrer dos anos, evidenciando-

se, portanto, a necessidade de levantamentos periódicos, visando

à atualização desses dados.

Na análise dos resíduos sólidos urbanos de Salvador, rea-

lizada pela LIMPURB (2000), verifica-se que, das 5.517 to-

neladas coletadas diariamente, o lixo domiciliar representa

46,04% e o entulho representa 49,77%, conforme apresentado

na Tabela 5.

Page 66: Livro entulho bom

64DIAGNÓSTICO DOS SETORES PRODUTORES DE RESÍDUOS NA RMS / BA

TABELA 5 - RESÍDUOS SÓLIDOS URBANOS COLETADOS EM SALVADOR(LIMPURB, 2000)

NOTA: RSS- Resíduos provenientes dos estabelecimentos prestadores de serviço de saúde.Os recicláveis são segregados pela COOPCICLA - Cooperativa dos Agentes Autônomos da Reciclagem.Domiciliar - Resíduos gerados nas residências, estabelecimentos comerciais, praias e logradouros.

O entulho, resíduo gerado pelo setor da construção civil, apre-

senta um alto potencial de reciclagem, com excelentes oportuni-

dades de aproveitamento. Por isso, é analisado detalhadamente,

no item a seguir.

Na composição gravimétrica do lixo domiciliar de Salvador, rea-

lizada pela LIMPURB, verifica-se a presença de 46,85% de matéria

orgânica. Em segundo lugar, verifica-se a presença do plástico,

com 17,11%, e, em seguida, o papel e o papelão aparecem, repre-

sentando 16,18% da amostra, conforme Figura 1.

De uma forma geral, os componentes do lixo domiciliar não

apresentam potencial de aproveitamento como matéria-prima para

a produção de materiais de construção. Entretanto, existem ou-

tros processos de reciclagem já estabelecidos para esses resíduos.

Por exemplo, a compostagem de matéria orgânica pode produzir

adubo para melhorar as características do solo. A reciclagem de

vidro, plástico, metal, papel e papelão possibilita reduzir o volu-

me de lixo depositado nos aterros, economizar recursos naturais

e gerar emprego e renda.

TIPO

Domiciliar

Entulho

RSS

Recicláveis

Total

64.135 2.540 46,04

Poda e Feira

MÉDIA MENSAL (t) MÉDIA DIÁRIA (t) %

69.337 2.746 49,77

4.545 180 3,26

884 35 0,63

404 16 0,30

139.305 5.517 100

Page 67: Livro entulho bom

65

FIGURA 1 - COMPOSIÇÃO GRAVIMÉTRICA DO LIXO DOMICILIAR DOMUNICÍPIO DE SALVADOR (LIMPURB, 1999)

DIAGNÓSTICO DO SETOR DE CONSTRUÇÃO CIVILUma das atividades que mais contribui com ações que alteram

o meio ambiente é a construção civil. Essas alterações ocorrem

na fase de implantação da obra, execução dos serviços, confecção

de artefatos, limpeza da obra, etc. Além disso, são gerados resíduos

em toda a vida útil da construção: execução, manutenção, reforma,

desocupação e demolição.

A grande quantidade de resíduos da indústria da construção

civil é proveniente da perda de materiais de construção nos cantei-

ros de obras, resultante dos materiais desperdiçados durante o pro-

cesso de execução de um serviço. Outras fontes geradoras são as

demolições e as reformas, que promovem a eliminação de diversos

componentes durante a utilização ou após o término do serviço.

Na fase de construção, o entulho gerado numa edificação é cons-

tituído pelas sobras dos materiais adquiridos e danificados ao longo

do processo produtivo, tais como restos de concretos e argamassa

produzidos e não utilizados, ao final do dia de trabalho, alvenaria

demolida, argamassa que cai durante a aplicação e não é reaprovei-

tada, sobras de tubos, aço, eletrodutos, entre outros.

Page 68: Livro entulho bom

66DIAGNÓSTICO DOS SETORES PRODUTORES DE RESÍDUOS NA RMS / BA

Dentre os vários fatores que contribuem para a geração do

entulho, vale citar:

• definição e detalhamento insuficientes, em projetos de arqui-

tetura, estrutura, formas, instalações, entre outros;

• qualidade inferior dos materiais e componentes de construção

disponíveis no mercado;

• mão-de-obra não qualificada;

• ausência de procedimentos operacionais e mecanismos de

controle de execução e inspeção.

Deve-se também considerar que o crescimento populacional

dos centros urbanos e o alto déficit habitacional pressionam a

sociedade a expandir o número de habitações, contribuindo tam-

bém para a geração de mais entulho.

A maior parte desse resíduo é gerada pelo setor informal da

construção (pequenas reformas, autoconstrução, “construtor formi-

guinha”, ampliações, etc.). Estima-se que apenas 1/3 do entulho

seja gerado pelo setor formal, ou seja, pela indústria da constru-

ção civil (Lima & Tamai, 1998).

Se, por um lado, o entulho acarreta perda de recursos para o

gerador, por outro lado acarreta também gastos para o setor pú-

blico, que, por sua vez, acaba arcando com os custos de disposição

final e, em alguns casos, de transporte desse resíduo.

Um dos maiores problemas enfrentado pelo município é a gran-

de quantidade de pontos clandestinos de descarga de entulho,

espalhados pela cidade, devido à dispersão geográfica e temporal

da geração desse resíduo pelo setor informal.

Das diversas destinações clandestinas do entulho, duas podem

ser bastante preocupantes:

• lançamento em encostas, gerando depósitos instáveis, que

podem causar deslizamentos;

Page 69: Livro entulho bom

67

• lançamento em baixadas, junto a redes de drenagem, ou mes-

mo diretamente no leito dos canais, levando à obstrução do

escoamento pluvial e provocando inundações.

Além disso, a dificuldade em coletar o entulho através do mesmo

sistema operacional utilizado para a coleta domiciliar também con-

tribui para agravar a situação das disposições irregulares. Finalmen-

te, as grandes distâncias, e por conseqüência, os altos custos de

transporte para os aterros oficiais dificultam a iniciativa do pequeno

gerador em dar destino adequado ao entulho por ele produzido.

Em Salvador, são coletadas, atualmente, cerca de 2.750 t/dia de

entulho. Esse valor representa 50% dos resíduos coletados pela

limpeza urbana, embora não abranja a totalidade do entulho pro-

duzido na cidade (LIMPURB, 2000). No momento, a situação da

coleta de entulho, em Salvador, reflete o desempenho dinâmico

do serviço de limpeza urbana da atual administração da LIMPURB.

Entre 1996 e 2000 o recolhimento de entulho passou de 219.169

mil toneladas / ano para 832.044 mil toneladas / ano, ou seja, au-

mentou aproximadamente 280%, conforme a Figura 2.

FIGURA 2 - EVOLUÇÃO DO ENTULHO RECOLHIDO EM SALVADOR(LIMPURB, 2000)

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Page 70: Livro entulho bom

68DIAGNÓSTICO DOS SETORES PRODUTORES DE RESÍDUOS NA RMS / BA

Boa parte da melhoria de coleta ocorreu após a realização de

um levantamento dos pontos de descarte clandestino de entu-

lho em Salvador. Nesse trabalho, realizado pela LIMPURB em

junho de 1996, foram identificados 420 pontos clandestinos de

deposição de entulho. Diante disso, a empresa elaborou e

vem implantando, desde 1997, o Projeto Gestão Diferenciada

de Entulho de Salvador, apresentado no capítulo IV deste livro.

Esse plano foi baseado no modelo de Gestão Diferenciada

do Entulho, proposto pelo Dr. Tarcísio Pinto, apresentado no

capítulo III.

Algumas medidas, implantadas nesse período pelo Projeto

de Gestão do Entulho de Salvador — a remoção de entulho

nos pontos de descarte, a sinalização, a fiscalização e a punição

dos lançamentos clandestinos, além da criação de locais ade-

quados para recebimento de entulho —, reduziram para 160

o número de pontos clandestinos de descarga de entulho espa-

lhados pela cidade.

Diante dessas considerações, torna-se evidente a importância

da implantação do Projeto de Gestão Diferenciada de Entulho

em Salvador e a demonstração de que as soluções para os proble-

mas gerencias do resíduo passam pela elaboração e implemen-

tação de um plano de gestão específico.

Por outro lado, apesar do grande potencial de reciclagem, o

nível de conhecimento sobre entulho de Salvador era ainda limi-

tado, no período de realização do diagnóstico. Diante dessa ne-

cessidade de pesquisa, o Projeto Entulho Bom realizou estudos,

em parceria com instituições como a CAIXA e a LIMPURB, buscan-

do produzir conhecimento que permitisse otimizar os processos

de gestão e reciclagem desse resíduo, como matéria-prima para

construção civil.

Page 71: Livro entulho bom

69

CONCLUSÃOO diagnóstico dos setores produtores de resíduos da Região Me-

tropolitana de Salvador permitiu a identificação e a caracterização

das principais ocorrências de resíduos sólidos que ofereciam pos-

sibilidades de utilização como materiais de construção na região.

A avaliação do nível de conhecimento disponível sobre esses

resíduos permitiu a criação de um quadro síntese sobre o seu

potencial de aplicação na construção civil (Tabela 6). Além disso,

esse levantamento indicou as necessidades de pesquisa e desenvol-

vimento, as prioridades e as oportunidades comerciais de recicla-

gem para os principais resíduos estudados como matéria-prima

para a construção.

De modo geral, as indústrias químicas do COPEC e do CIA produ-

zem pequenas quantidades de resíduos sólidos constituídos de

materiais complexos e apresentando baixo potencial de aproveita-

mento direto na construção. Entretanto, existem algumas possibili-

dades de utilização, como o aproveitamento de certos resíduos pela

indústria cerâmica, tanto como combustível para fornos quanto para

adição direta na massa cerâmica.

Por outro lado, o setor da cerâmica vermelha da RMS apre-

senta significativo índice de perdas no processo de produção —

14%, ou seja, 7.500 t/ano de resíduos com alto potencial de reci-

clagem. Algumas alternativas de reaproveitamento desses resíduos

podem ser a transformação em agregado para fabricação de con-

creto, ou a reincorporação à massa cerâmica, com melhoria de

suas propriedades.

Dentre os resíduos do setor de mineração, destacam-se o pó de

pedra e o arenoso, que, apesar de serem largamente utilizados pela

indústria da construção civil, em pavimentação e argamassa respec-

tivamente, têm seu estudo limitado apenas à pesquisa básica.

Page 72: Livro entulho bom

70DIAGNÓSTICO DOS SETORES PRODUTORES DE RESÍDUOS NA RMS / BA

Entre os resíduos do setor de metalurgia, as escórias de ferro-

cromo, geradas pela FERBASA, e as de cobre, da CARAÍBA, apre-

sentam grande potencial para uso como material de construção,

ambas com recentes estudos realizados por pesquisadores da re-

gião. As escórias de aciaria, apesar de apresentarem potencial de

uso na construção, necessitam de estudos para garantia de uso

seguro na produção de materiais de construção.

No ambiente urbano, a grande quantidade de resíduos, prin-

cipalmente de lixo domiciliar e de entulho, e a progressiva restrição

de áreas para destinação impõem a busca de soluções rápidas e efi-

cazes, por parte da Administração Municipal, para prover a adequa-

da gestão de cada um dos resíduos urbanos, através de elaboração

de programas específicos, que visem à minimização dos impactos

ambientais e sociais causados.

Os componentes do lixo domiciliar, resíduo de responsabilidade

do setor de limpeza urbana, não apresentam potencial para o apro-

veitamento na construção civil. Contudo, existem outros processos

de reciclagem já estabelecidos para esses resíduos.

Por outro lado, o entulho (resíduo gerado pelo setor da constru-

ção civil) apresenta excelentes oportunidades para a reciclagem,

como matéria-prima para produção de materiais de construção,

uma vez que é gerado em grande quantidade, apresenta caracterís-

ticas adequadas e está localizado próximos aos centros urbanos.

Além disso, sua reciclagem é viável tanto pelos aspectos técnicos

— simplicidade operacional e grande aplicabilidade —, quanto

pelos aspectos econômicos, uma vez que os investimentos para

implantação de um programa de reciclagem de entulho são rela-

tivamente pequenos.

Por fim, sugere-se a realização de um inventário, buscando

complementar e detalhar o diagnóstico. Essa atividade seria de

Page 73: Livro entulho bom

71

grande importância para o controle ambiental e para a gestão ade-

quada dos resíduos gerados pelas atividades industriais e urba-

nas. O inventário, além de ampliar o número de resíduos identifi-

cados, deverá avaliar também o impacto que esses resíduos cau-

sam ao meio ambiente, contribuindo para ações de fiscalização e

incentivando, ainda, o gerador a reduzir ou a aproveitar esses re-

síduos em outros processos produtivos.

Page 74: Livro entulho bom

72DIAGNÓSTICO DOS SETORES PRODUTORES DE RESÍDUOS NA RMS / BA

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QUÍMICOMINERAÇÃO E METALURGIAL.U.C.C.

Page 75: Livro entulho bom

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José Clodoaldo Silva Cassa - Engenheiro Químico, PhD, DIC, MSc, Professor Escola Politécnica -

UFBA, Coordenador do Projeto Entulho Bom (Dez / 97 a Maio / 99)

Irineu Antônio Schadach de Brum - Engenheiro de Minas, Msc, Doutorando em Metalurgia Extrativa -

UFRGS, Professor DCTM/UFBA, Pesquisador do Projeto Entulho Bom

Alex Pires Carneiro - Engenheiro Civil, Mestrando em Engenharia Ambiental Urbana - UFBA,

Coordenador do Projeto Entulho Bom (Maio / 99 a Junho / 01)

Dayana Bastos Costa - Estudante de Engenharia Civil - UFBA, Pesquisadora do Projeto Entulho Bom

Page 78: Livro entulho bom

76GESTÃO DOS RESÍDUOS DE CONSTRUÇÃO E DEMOLIÇÃO EM ÁREAS URBANAS

CAPÍTULO III

Page 79: Livro entulho bom

77

Tarcísio de Paula Pinto

GESTÃO DOS RESÍDUOS DECONSTRUÇÃO E DEMOLIÇÃO

EM ÁREAS URBANAS – DAINEFICÁCIA A UM MODELODE GESTÃO SUSTENTÁVEL

Page 80: Livro entulho bom

78GESTÃO DOS RESÍDUOS DE CONSTRUÇÃO E DEMOLIÇÃO EM ÁREAS URBANAS

A aceleração do processo de urbanização e a estabilização da

economia, nos últimos anos, colocaram em evidência o enorme

volume de resíduos de construção e demolição que vem sendo

gerado nas cidades brasileiras, à semelhança do que já era observa-

do em regiões densamente povoadas de outros países, demons-

trando que as municipalidades não estão estruturadas para o

gerenciamento de volume tão significativo de resíduos e para o

gerenciamento dos inúmeros problemas por eles criados.

As soluções atualmente adotadas, na imensa maioria dos municí-

pios, são sempre emergenciais e, quando se tornam rotineiras, têm

significado sempre atuações em que os gestores se mantêm como

coadjuvantes dos problemas. Num ou noutro caso, caracterizam

uma prática que pode ser denominada de “Gestão Corretiva”.

A Gestão Corretiva caracteriza-se por englobar atividades não

preventivas, repetitivas e custosas, que não surtem resultados ade-

quados, e são, por isso, profundamente ineficientes. A Gestão Cor-

retiva se sustenta na “inevitabilidade” de áreas com deposições

irregulares degradando o ambiente urbano, e se sustenta enquanto

houver a disponibilidade de áreas de aterramento nas proximida-

des das regiões fortemente geradoras de Resíduos de Construção

e Demolição (RCD).

Além disso, a gestão corretiva acarreta efeitos “perversos” uma

vez que a prática contínua de aterramento, nos ambientes urbanos,

com volumes tão significativos, elimina, progressivamente, as áreas

naturais (várzeas, vales, mangues e outras regiões de baixada),

que servem como escoadouro dos elevados volumes de água con-

centrados nas superfícies urbanas impermeabilizadas.

Assim, a pressão da alta geração de RCD encontra municipa-

lidades desaparelhadas, que só têm a ineficácia da Gestão Corre-

tiva como solução, e não podem contar com o suporte de políticas

Page 81: Livro entulho bom

79

centrais de saneamento, as quais só recentemente vêm buscando

incorporar preocupações com os resíduos sólidos (não-inertes),

mas ainda não detectaram a extensão da geração de resíduos iner-

tes na construção e na demolição.

Por todos esses aspectos, pode-se caracterizar a Gestão Corre-

tiva como uma prática sem sustentabilidade. Sua ineficiência im-

põe a necessidade de traçar novas políticas específicas para o do-

mínio dos resíduos de construção e demolição, ancoradas em es-

tratégias sustentáveis, como o correto envolvimento dos agentes

atuantes e a intensa reciclagem dos resíduos captados.

IMPACTOS DOS RESÍDUOS DE CONSTRUÇÃO EDEMOLIÇÃO (RCD)

São várias as conseqüências do grande volume de RCD gerado

nos centros urbanos. Elas advêm do fluxo irracional e descontro-

lado dos resíduos, típico do processo que se denominou de Gestão

Corretiva, e das características dos agentes envolvidos, pequenos

ou grandes geradores, pequenos ou grandes coletores.

É significativa a geração de pequenos volumes de RCD em ser-

viços quase sempre qualificáveis como construção informal, por

serem constituídos, predominantemente, de atividades de refor-

ma e ampliação.

Inexistindo soluções para a captação dos RCD gerados nessas

atividades construtivas, seus geradores, ou os pequenos coletores

que os atendem, buscarão, inevitavelmente, áreas livres nas pro-

ximidades para a deposição dos resíduos. Havendo ou não a acei-

tação da vizinhança imediata, essas áreas acabam por se firmar

como sorvedouros dos RCD, num pacto local que termina por

atrair todo e qualquer tipo de resíduo para o qual não se tenha

Page 82: Livro entulho bom

80GESTÃO DOS RESÍDUOS DE CONSTRUÇÃO E DEMOLIÇÃO EM ÁREAS URBANAS

solução de captação rotineira. A inexistência de solução impõe a

rotina da correção pela administração pública, num processo cíclico,

impossível de ser interrompido nos marcos da Gestão Corretiva.

A característica típica das deposições irregulares, resultantes

da inexistência de soluções para a captação dos RCD, é a conjun-

ção de efeitos deteriorantes do ambiente local: comprometimen-

to da paisagem, do tráfego de pedestres e de veículos e da drena-

gem urbana, atração de resíduos não-inertes, multiplicação de

vetores de doenças e outros efeitos.

Tais efeitos danosos se multiplicam pelo espaço urbano, e a Ges-

tão Corretiva, no extremo, consegue deslocar os problemas de de-

terminadas regiões das cidades para outras, sendo comum, nos

municípios, a presença constante e mais acentuada desses efeitos

nos bairros periféricos, ocupados por população de menor renda.

É interessante notar que, se, em alguns locais de deposição ir-

regular de pequenos volumes de RCD, seus usuários revelam um

descompromisso com a qualidade ambiental, a consolidação de

alguns outros revela os condicionantes desses mesmos usuários

(geradores ou coletores) quanto às suas possibilidades de deslo-

camento para a disposição dos resíduos. A percepção desses

condicionantes é importante ferramenta para a definição de no-

vas práticas de gestão que visem à superação dos problemas que

vêm sendo detectados nos maiores municípios brasileiros.

Já para os grandes volumes de RCD, o quadro mais comumente

encontrado, nos municípios de médio e grande porte, é a sua

adequada disposição em aterros de inertes, também denomina-

dos de “bota-foras”, muitas vezes oferecidos por particulares com

o intuito de planificá-los, visando à sua valorização. Constitui o

problema mais significativo, na destinação dessa parcela dos resí-

duos, o inexorável e rápido esgotamento das áreas designadas

Page 83: Livro entulho bom

81

para disposição, pois muitas delas são de pequeno porte, inseridas

integralmente na malha urbana, nas proximidades das regiões

geradoras dos RCD.

A designação contínua de novas áreas faz parte do cotidiano

dos gestores de RCD nos municípios de médio e grande porte,

num processo incessante e infrutífero, pois são poucas as áreas,

nos municípios, que resistem a prazos maiores que um ano de

deposição dos resíduos gerados. O acelerado processo de adensa-

mento urbano dos últimos anos fez com que as áreas mais próxi-

mas se esgotassem rapidamente e se criasse a necessidade de re-

curso a áreas cada vez mais periféricas.

O distanciamento crescente dos bota-foras é mais perceptível nas

zonas metropolitanas. O percurso típico dos coletores paulistanos,

entre a coleta dos resíduos e os poucos bota-foras disponíveis, é

da ordem de 25 km. O mesmo percurso, em Jundiaí / SP e São José

do Rio Preto / SP, é da ordem de 3 km.

O distanciamento e o esgotamento crescentes dos bota-foras é

fator complicador para as ações corretas de coleta e disposição dos

RCD, pois o componente custo de deslocamento é parcela impor-

tante do custo de coleta, mesmo em cidades onde os percursos

sejam extremamente menores que em regiões metropolitanas.

Soma-se a isso o fato de que, nas regiões metropolitanas, o

rareamento das áreas de bota-fora introduz, nas áreas ativas, a co-

brança de taxa para o descarte de resíduos. Nas regiões metropoli-

tanas de São Paulo, Belo Horizonte e Rio de Janeiro, praticamente

todos os bota-foras mais centrais fazem cobrança de taxas para o

descarte de resíduos. Já nas regiões de Salvador, Recife e Brasília,

a cobrança é menos presente.

A cobrança de taxas de descarte nos sistemas de aterro varia

em função de uma série de fatores, e, entre eles, certamente

Page 84: Livro entulho bom

82GESTÃO DOS RESÍDUOS DE CONSTRUÇÃO E DEMOLIÇÃO EM ÁREAS URBANAS

devem ser inseridas as características dos resíduos (serem ou não

inertes) e a sua periculosidade. Na região metropolitana de São

Paulo, são freqüentes custos da ordem de R$ 30,00 por tonelada

de resíduo domiciliar disposta, R$ 40,00 a R$ 150,00 por tonelada

de resíduo industrial, e R$ 3,00, em média, para a disposição da

tonelada de RCD.

A obrigatoriedade de maiores deslocamentos para os coletores

também introduz maiores custos e preços, o que se reflete na redu-

ção da parcela dos geradores que aderem às remoções corretas

e induz a maior incidência de deposições irregulares, quer por

geradores, quer por coletores.

Ocorre, no entanto, que grandes parcelas dos RCD continua-

rão sendo inevitavelmente geradas nas áreas urbanas centrais, por

processos de renovação de espaços e edificações, tornando cada

vez mais custosa e complexa a Gestão Corretiva. É, portanto, ine-

rente à Gestão Corretiva a existência de áreas de deposição irre-

gular, como “solução” para o descarte de pequenos volumes de

RCD, e o esgotamento dos bota-foras em função da disposição in-

cessante de grandes volumes. Inevitáveis, também como conse-

qüência desse processo, quase sempre emergencial, são os

impactos significativos em todo o ambiente urbano.

Alguns desses impactos são plenamente visíveis e revelam um

extenso comprometimento da qualidade do ambiente e da paisa-

gem local, embora dificilmente possam ser quantificados e ter seu

custo historiado, como no caso dos prejuízos às condições de

tráfego de pedestres e veículos (Figuras 1 e 2).

Page 85: Livro entulho bom

83

FIGURA 1 - DEPOSIÇÃO IRREGULAR AO LADO DE CURSO D’ÁGUA EM

BELO HORIZONTE / MG

FIGURA 2 - ATERRAMENTO DE VÁRZEA NO CENTRO DE VITÓRIA DA

CONQUISTA / BA

Page 86: Livro entulho bom

84GESTÃO DOS RESÍDUOS DE CONSTRUÇÃO E DEMOLIÇÃO EM ÁREAS URBANAS

A análise dos problemas de enchentes nos municípios de mé-

dio e grande porte permite detectar que, com poucas exceções,

eles se devem à ocupação urbana das zonas de espraiamento de

importantes cursos d’água, sendo muito freqüente o pré-

aterramento dessas áreas, com a deposição de RCD e muito fre-

qüente o reconhecimento da concentração de deposições irregu-

lares ao longo de cursos d’água.

A irracionalidade da situação se revela mais fortemente em

municípios que passaram por processo intenso de urbanização

e se vêem obrigados a investir em custosas obras de contenção

e reservação temporária de elevados volumes de água (“pisci-

nões”), para suprir o papel que as áreas naturais anteriormen-

te cumpriam.

Há ainda um outro aspecto perverso da lógica atual de abas-

tecimento de matéria-prima e da Gestão Corretiva, decorrente

do mau uso de recursos naturais não renováveis, pois, simulta-

neamente ao comprometimento de valas, várzeas e áreas de

baixada no meio urbano, ocorre, nas regiões de jazida, a geração

de crateras e mais crateras, para a extração de recursos minerais

(Figura 3).

Há outros impactos significativos, decorrentes da elevada gera-

ção de RCD, de sua deposição irregular e da atração que as depo-

sições de RCD passam a exercer sobre outros tipos de resíduos

sólidos. São atraídos resíduos classificáveis como volumosos, para

os quais também não são oferecidas soluções aos geradores (re-

síduos vegetais e outros resíduos não-inertes), que aceleram a

deterioração das condições ambientais locais, muitas vezes ocor-

rendo ainda a deposição irregular de resíduos industriais e mes-

mo de resíduos domiciliares (Figura 4).

Page 87: Livro entulho bom

85

FIGURA 3 - EXPLORAÇÃO DE AREIA

DE CAVA EM GUARULHOS / SP

A presença dos RCD e de outros resíduos cria um ambiente

propício para a proliferação de vetores (insetos e roedores) pre-

judiciais às condições de saneamento e à saúde humana.

É intrínseca à Gestão Corretiva a ocorrência de fortes e descon-

trolados impactos no ambiente urbano, geradores de custos so-

ciais interligados, pessoais ou públicos, que demonstram a necessi-

dade de intervenção que introduza novos métodos para a gestão

pública dos resíduos de construção e demolição. Embora o caráter

não-preventivo e emergencial desse formato de gestão não permita

o acompanhamento preciso dos custos, informações coletadas em

alguns municípios brasileiros permitem concluir que os custos apro-

priáveis muitas vezes se aproximam ou ultrapassam o valor dos

materiais que estão sendo descartados (Tabela 1).

TABELA 1 - CUSTOS DA GESTÃO CORRETIVA EM ALGUNS MUNICÍPIOS

1 Pinto, 1999.2 PUB - pública; EMP - empreitada; MEC - carregamento mecânico; MAN - carga manual.

arq

uiv

o S

MM

A-P

MG

FIGURA 4 - BOTA-FORA DE RCD NA

ZONA URBANA DE JUNDIAÍ / SP

MUNICÍPIOS

CUSTO UNITÁRIO DAGESTÃO CORRETIVA

1

Características da remoção 2 PUB

MEC

Custo Unitário US$/t 10,65

Santo André(1996)

São JoséR. Preto(1996)

PUBMAN

14,78

EMPMEC

7,36

EMPMEC

11,78

PUBMAN

10,66

PUBMEC

5,37

PUBMEC

7,92

PUBMEC

8,41

São JoséCampos

(1995)

RibeirãoPreto(1995)

BeloHorizonte

(1993)

Vitória daConquista

(1997)

Page 88: Livro entulho bom

86GESTÃO DOS RESÍDUOS DE CONSTRUÇÃO E DEMOLIÇÃO EM ÁREAS URBANAS

Ressalta-se, ainda, que uma parcela significativa dos custos da

Gestão Corretiva dos RCD e de outros resíduos sólidos, comumente

com eles descartados, deve ser debitada ao uso de equipamentos

absolutamente inadequados, sendo usual gestores da limpeza pú-

blica recorrerem a equipamentos pesados, pás carregadeiras e ca-

minhões basculantes para a remoção de resíduos que, numa situa-

ção típica e prejudicial, apresentam miscigenação de diversos tipos

de materiais — baixa ou elevada densidade, pequeno ou grande

volume unitário.

A remoção dos RCD e de outros resíduos sólidos, na Gestão Correti-

va, pode ser feita ainda no âmbito de contratos de prestação de

serviços, que têm como foco central a coleta dos resíduos domiciliares

e, nesses casos, é comum o custo unitário (em tonelada) atingir valores

bastante elevados, como R$ 36,00 em São Paulo / SP (Brito Filho,

1998), R$ 25,00 em Recife / PE 1

e R$ 25,16 e R$ 13,50 para, respec-

tivamente, remoção manual ou mecânica em Salvador / BA. 2

No entanto, tais valores revelam apenas custos apropriáveis,

não expressando o fato de que “...a deterioração causada pelos

impactos ambientais não pode ficar fora do cálculo econômico

como uma externalidade, especialmente para fins de política de

governo, uma vez que a perda ambiental configura um prejuízo

real, físico” enquanto “...destruição do capital da natureza.”

(Cavalcanti et al., 1996)

1 Informação de coletores atuantes em Recife / PE.2 Informações recolhidas junto à LIMPURB – Empresa de Limpeza Urbana do Salvador / BA.

Page 89: Livro entulho bom

87

POTENCIAL DE RECICLAGEM DOS RESÍDUOS DECONSTRUÇÃO E DEMOLIÇÃO

A elevada geração de resíduos sólidos, determinada pelo acelera-

do desenvolvimento da economia, coloca como inevitável a ade-

são às políticas de valorização dos resíduos e sua reciclagem nos

países desenvolvidos e em amplas regiões dos países em desen-

volvimento. Os processos de gestão dos resíduos em canteiro, de

sofisticação dos procedimentos de demolição e de especialização

no tratamento e reutilização dos RCD vão conformando um res-

peitável e sólido ramo da engenharia civil, atento à necessidade

de usar parcimoniosamente recursos, que são finitos, e à necessi-

dade de não sobrecarregar a natureza com dejetos evitáveis.

Historicamente, a atividade construtiva sempre se caracterizou

como grande geradora de resíduos e também como potencial

consumidora dos resíduos gerados por ela mesma ou por outras

atividades humanas de transformação. As características dos resí-

duos removidos de obras ou recebidos de pequenos coletores reve-

lam uma grande predominância da fração mineral, viabilizadora

da introdução de processos sustentáveis, como a reciclagem

(Tabelas 2 e 3).

TABELA 2 - COMPOSIÇÃO DOS RESÍDUOS DE CONSTRUÇÃO REMOVIDOS DE

OBRAS CONVENCIONAIS EM S. CARLOS / SP E S. ANDRÉ / SP (PINTO, 1999)

1 Remoção após segregação de produtos comercializáveis: papel, plásticos, metais.

TIPOS DE RESÍDUOS REMOVIDOS (porcentagem da massa) 1

ARGAMASSAS

64% 29,1%

PRODUTOSCERÂMICOS

OUTROSMINERAIS REJEITOS

6,5% 0,4%

Page 90: Livro entulho bom

88GESTÃO DOS RESÍDUOS DE CONSTRUÇÃO E DEMOLIÇÃO EM ÁREAS URBANAS

TABELA 3 - COMPOSIÇÃO DOS RESÍDUOS SÓLIDOS RECEBIDOS EM

BELO HORIZONTE / MG (1996) 1

1 Estação Barão 300, média de 6 meses (SLU, 1999).

Em uma instalação de reciclagem de resíduos de construção e

demolição, os equipamentos trituradores são os mais importan-

tes na linha de produção. Geralmente são adotados britadores de

mandíbulas ou britadores de impacto. Os britadores de mandíbu-

las geralmente são considerados como os melhores produtores

de agregados para concreto, quando associados a um outro equi-

pamento para britagem secundária. São, no entanto, bastante sus-

cetíveis à presença de resíduos metálicos e de madeira, caso não

disponham de dispositivo de alívio para essas eventualidades. Os

britadores de impacto são menos sensíveis à presença desses

materiais, oferecem capacidade de redução de partículas muito

superior à do britador de mandíbula e são tidos como o melhor

equipamento para a produção de novos agregados destinados a

serviços de pavimentação (Institut de Tecnologia de la Construcció

de Catalunya, ITEC, 1995a).

A pequena intensidade da atividade de demolição, nas cidades

brasileiras, faz com que, tipicamente, os RCD gerados se apresen-

tem com pequena dimensão máxima (em torno de 300 mm), per-

mitindo, com isso, a utilização de equipamentos de menores di-

mensões, menor capacidade de produção, menores custos e com

TIPOS DE RESÍDUOS RECEBIDOS (porcentagem do volume)

RCD

81%

PODAS

9%

MADEIRA

4%

VOLUMOSOS

1%

EMBALAGENS

2%

REJEITOS

3%

Page 91: Livro entulho bom

89

capacidade de adequação à intensidade de geração nos municípios

de médio e grande portes. A partir da capacitação dos produtores

brasileiros (atualmente 7 empresas de capital nacional ou filiadas a

grupos internacionais), é possível afirmar-se não haver qualquer difi-

culdade tecnológica para a produção dos equipamentos típicos das

instalações de reciclagem.

Como todas as instalações de reciclagem brasileiras atualmen-

te existentes são controladas pelo poder público ou por autarquias

locais, torna-se complexa a determinação do custo operacional

em cada uma delas. No entanto, a consideração criteriosa dos com-

ponentes necessários — custos de manutenção e reposição, pro-

visão de água, força e luz, custos de mão-de-obra, juros, amortiza-

ção, equipamentos para manejo interno — tem apontado para

valores na ordem de R$ 5,00 por tonelada processada. A

viabilização da reciclagem dos RCD, num centro urbano, é resul-

tado de uma série de fatores, dos quais, certamente, um dos mais

importantes é sua viabilidade econômica em confronto com os

preços dos agregados naturais.

A tabela a seguir permite observar um diferencial muito ex-

pressivo entre os valores anunciados para os agregados natu-

rais de diversas regiões brasileiras e o custo de reciclagem, pos-

sibilitando a compreensão de que existe viabilidade econômi-

ca para a consideração da reciclagem dos RCD como platafor-

ma para a construção de novos métodos de sua gestão nos am-

bientes urbanos.

Page 92: Livro entulho bom

90GESTÃO DOS RESÍDUOS DE CONSTRUÇÃO E DEMOLIÇÃO EM ÁREAS URBANAS

TABELA 4 - PREÇOS MÉDIOS INDICATIVOS PARA OS AGREGADOS NATURAIS

EM REGIÕES BRASILEIRAS 1

1 Pesquisa junto a distribuidores locais, para vendas de carga fechada, material posto em obra.

CIDADES

SPorto Alegre / RS 11,00

REGIÃO DO PAÍSPREÇO MÉDIO PARA

AGREGADOS BRITADOS(R$/t)

SFlorianópolis / SC 15,80

SCuritiba / PR 11,44

SESão Paulo / SP 13,33

SESanto André / SP 13,33

SEJundiaí / SP 11,33

SESão José dos Campos / SP 11,36

SERibeirão Preto / SP 11,56

SESão José do Rio Preto / SP 12,00

SERio de Janeiro / RJ 11,00

SEBelo Horizonte / MG 11,00

COBrasília / DF 18,67

COGoiânia / GO 14,67

COCampo Grande / MS 12,33

NESalvador / BA 20,00

NEVitória da Conquista / BA 18,67

NERecife / PE 18,00

NEFortaleza / CE 12,67

NBelém / PA 30,00

Page 93: Livro entulho bom

91

A GESTÃO DIFERENCIADA DOS RESÍDUOS DACONSTRUÇÃO E DEMOLIÇÃO

A intensidade da geração de resíduos e a extensão dos impactos

por eles causados, nas áreas urbanas, apontam claramente para a

necessidade de ruptura com a ineficácia da Gestão Corretiva. A ges-

tão dos espaços urbanos em municípios de médio e grande porte não

mais comporta intervenções continuamente emergenciais e coadju-

vantes das reações de geradores e coletores à ausência de soluções.

No âmbito de um inventário preciso da composição e fluxo dos

Resíduos Sólidos Urbanos, o volume de RCD gerado precisa ser

reconhecido e assumido pelos gestores de limpeza urbana, assim

como precisa ser assumida a necessidade de soluções duráveis

para a absorção eficiente desses resíduos.

A proposição de uma gestão diferenciada dos resíduos de cons-

trução e demolição persegue a ampliação dos serviços públicos,

buscando constituir um modelo racional, eficaz, menos custoso

e, portanto, sustentável.

A Gestão Diferenciada dos resíduos de construção e demoli-

ção é constituída por um conjunto de ações que corporificam um

novo serviço público, visando à:

• captação máxima dos resíduos gerados, através da constitui-

ção de redes de áreas de atração, diferenciadas para peque-

nos e grandes geradores / coletores;

• reciclagem dos resíduos captados, em áreas perenes especial-

mente definidas para essa tarefa;

• alteração de procedimentos e culturas, no tocante à intensi-

dade da geração, à correção da coleta e da disposição e às

possibilidades de utilização dos resíduos reciclados.

A Gestão Diferenciada dos resíduos de construção e demoli-

ção tem como objetivos gerais:

Page 94: Livro entulho bom

92GESTÃO DOS RESÍDUOS DE CONSTRUÇÃO E DEMOLIÇÃO EM ÁREAS URBANAS

• redução dos custos municipais com a limpeza urbana, com a

destinação dos resíduos e com a correção dos impactos

ocorrentes na Gestão Corretiva;

• disposição facilitada dos pequenos volumes de RCD gerados;

• descarte racional dos grandes volumes gerados;

• preservação do sistema de aterros, como condição para a

sustentação do desenvolvimento;

• melhoria da limpeza urbana;

• incentivo à presença e à consolidação de novos agentes de

limpeza urbana;

• preservação ambiental, com a redução dos impactos por má

deposição, redução do volume aterrado e redução dos im-

pactos decorrentes da exploração de jazidas naturais de agre-

gados para a construção civil;

• preservação da paisagem e da qualidade de vida nos ambien-

tes urbanos;

• incentivo às parcerias para captação, reciclagem e reutilização

de RCD;

• incentivo à redução da geração nas atividades construtivas.

O modelo de Gestão Diferenciada dos RCD possibilita, em

contraposição a todas as deficiências diagnosticadas na Gestão Cor-

retiva, atingir a qualidade no serviço de limpeza urbana: satis-

fação dos munícipes como usuários dos serviços e dos espaços

urbanos e reconquista da qualidade ambiental desses espaços.

A Gestão Diferenciada dos RCD é a única forma de romper com a

ineficácia da Gestão Corretiva e com a postura coadjuvante dos ges-

tores dos resíduos sólidos, através da proposição de soluções sus-

tentáveis para espaços urbanos cada vez mais densos e complexos

de gerir. Deve ser vista como solução necessária, complementar

à gestão de outras parcelas dos resíduos sólidos urbanos.

Page 95: Livro entulho bom

93

A Gestão Diferenciada dos RCD deverá buscar, ainda, a exemplo

dos países mais desenvolvidos 3, a aprimoração de mecanismos re-

guladores e econômicos que responsabilizem os geradores,

desestimulem práticas agressivas e estimulem aquelas econômica e

ambientalmente sustentáveis (Brasil, 1996).

A Gestão Diferenciada dos RCD é sustentada por algumas dire-

trizes básicas, cuja implementação integrada é condição para a

consecução dos objetivos traçados. Tais diretrizes são oriundas

da própria observação e avaliação do modus operandi dos agentes

na Gestão Corretiva, pois são fartos os exemplos de regiões onde

as deposições irregulares se concentram nos locais que oferecem

as melhores condições para recepção, farta a demonstração de

como os RCD e outros resíduos sólidos são coletados e deposita-

dos de forma classificada e fartas as ocorrências de tentativas de

reutilização direta dos RCD em serviços diversos.

As diretrizes básicas da Gestão Diferenciada dos RCD são: a faci-

litação total da disposição dos RCD e outros resíduos sólidos que

comumente com ele transitam, a segregação integral dos resídu-

os sólidos captados e a reciclagem dos resíduos captados como

forma de alteração da destinação.

Uma característica intrínseca da Gestão Diferenciada dos RCD é

a integração na aplicação dessas diretrizes. Essa característica per-

mite a necessária integração entre resíduos que costumam ter des-

tinos comuns, a integração entre agentes (geradores e coletores,

públicos e privados), e a integração entre processos que devem ser

articulados: coleta extensiva de resíduos, reciclagem eficiente da

mais ampla gama possível de tipos e uso intenso de resíduos

reciclados em obras e serviços públicos e privados.

3 Podem ser consultadas, entre outras, a legislação do Japão (Hong Kong Polytechnic, 19930, daBélgica (Institut Bruxellois pour la Gestion de L’Environnement, 1995), da Catalunha (ITEC, 1995b)e da Suiça (Milani, 1990).

Page 96: Livro entulho bom

94GESTÃO DOS RESÍDUOS DE CONSTRUÇÃO E DEMOLIÇÃO EM ÁREAS URBANAS

FACILITAÇÃO DA DISPOSIÇÃO

A Gestão Corretiva constitui, em ampla maioria dos municí-

pios, um sistema de coleta “às avessas”, com os geradores e cole-

tores de pequeno porte muitas vezes definindo os locais onde é

mais racional a disposição dos RCD. Essas características são re-

conhecidas numa Gestão Diferenciada e, a partir delas, são defini-

das a logística e as estratégias para atração eficiente desses resíduos

(Figura 5).

A facilitação da disposição se realiza através da oferta mais

abrangente possível de áreas públicas de pequeno e de médio

porte para o descarte de resíduos sólidos não-domiciliares, não-

sépticos e não-industriais, constituindo-se numa rede ofertada aos

agentes para a disposição correta de RCD e de outros resíduos

sólidos comumente descartados em conjunto (Figura 6). Devem

ser especializadas as pequenas áreas para a recepção de peque-

nos volumes 4, limitados à quantidade transportável em veículos

particulares ou pequenos veículos de agentes informais de cole-

ta, e as áreas de médio porte para a recepção de volumes coletados

por agentes que operam com veículos maiores, dedicados exclu-

sivamente ao transporte de RCD. As pequenas áreas podem ser

escolhidas no “estoque” de áreas do município, constituído por

“retalhos” remanescentes de loteamentos, reorganização viária

ou outras intervenções. Deverão ser áreas de aproximadamente

300 m2, mesmo com formato irregular, e que não viabilizem a

construção de equipamentos sociais para serviços de saúde, edu-

cação ou outros.

4 Há exemplos, em outros países, da adoção de áreas para função assemelhada – dècheteriesna França, amenity sites no Reino Unido (Jardim, 1995), deixalleries na Catalunha (Catalunya,[1995]).

Page 97: Livro entulho bom

95

FIGURA 5 - A POLÍTICA DO NÃO, INERENTE

À GESTÃO CORRETIVA, JUNDIAÍ / SP

Pelo fato de o objetivo dessas áreas ser a atração de resíduos para

a correção de processos locais de degradação crescente, é possível,

em muitos casos, a utilização de parcelas de áreas verdes deteriora-

das (originalmente destinadas à implantação de praças ou equipa-

mentos similares), como ocupação provisória, remediadora de

situação local.

As áreas de médio porte, também escolhidas entre áreas públi-

cas, de 3.000 a 5.000 m2, são destinadas exclusivamente à recep-

ção dos maiores volumes de RCD, e, cumulativamente, à reci-

clagem dos resíduos ou à acumulação e transbordo para outra

área onde aconteça o processamento.

A definição da Rede de Atração com pequenas áreas deve ser

induzida pelas características operacionais dos agentes que ma-

nejam os pequenos volumes, sendo muitas dessas características

(raio de ação, tipo de veículo, etc.) reconhecíveis na análise da Ges-

tão Corretiva. São importantes para a definição e a operação dessas

áreas aspectos como o incentivo constante à entrega voluntária de

FIGURA 6 - A OFERTA DE

SOLUÇÕES, PELA GESTÃO

DIFERENCIADA, SALVADOR / BA

Page 98: Livro entulho bom

96GESTÃO DOS RESÍDUOS DE CONSTRUÇÃO E DEMOLIÇÃO EM ÁREAS URBANAS

resíduos, o nucleamento de pequenos coletores para atendimento

de geradores locais, a definição de bacias de captação de resíduos

que, a partir de informações relativas às características da popula-

ção e do sistema viário, altimetria, alcance dos coletores e outros

aspectos, conduzam à eficiência na captação dos resíduos.

A definição da Rede de Atração com áreas médias também deve

ser induzida pelas características operacionais dos agentes que ma-

nejam os grandes volumes, sendo novamente importante a consi-

deração dessas características (raio de ação, zonas de atuação, etc.) na

análise da Gestão Corretiva. Para o sucesso da adesão dos grandes

coletores aos novos procedimentos é essencial que as novas áreas

designadas para disposição sejam convenientes à sua lógica de mer-

cado e estejam estabelecidas em locais tão ou mais próximos que

os bota-foras existentes, que sejam definidas respeitando-se os

elementos estruturadores urbanos (rodovias, ferrovias, curso d’água,

vazios) e que componham uma Rede com opções descentralizadas.

A atração dos grandes volumes para as áreas de médio porte

deve culminar com o seu processamento em Centrais de Reci-

clagem instaladas no mesmo local, coerentemente com a lógica

da redução dos ciclos de transporte dos resíduos, ou, minima-

mente, possibilitar sua acumulação e transbordo para outros

locais de processamento.

SEGREGAÇÃO NA CAPTAÇÃO

A diferenciação integral dos resíduos sólidos captados é condi-

ção fundamental para a sustentação de uma gestão racional, para

a alteração da destinação atualmente adotada e para a introdução

da reciclagem.

A diferenciação é necessária porque, inevitavelmente, os RCD

são descartados com toda uma gama de outros resíduos. Consti-

tui uma sequência natural das etapas anteriores de geração e re-

Page 99: Livro entulho bom

97

moção, pois cargas compostas exclusivamente pelo material típico

da atividade geradora são francamente predominantes.

A diferenciação logo após captação permite interromper a

irracionalidade da Gestão Corretiva que, pela inexistência de solu-

ções de descarte, obriga a miscigenação dos resíduos sólidos, im-

possibilitando qualquer outro processo que não seu aterramento.

É condição para a diferenciação que as áreas de pequeno porte

da Rede de Atração estejam estruturadas para a recepção das car-

gas homogêneas que busca atrair. Para isso, torna-se necessária a

preparação de continentes específicos, adequados aos tipos e aos

volumes de resíduos ocorrentes na Bacia de Captação.

É necessária ainda a definição de espaços diferenciados para

a acumulação de materiais densos e de materiais leves, pois, com

a introdução da Gestão Diferenciada, deixa de ter sentido a re-

moção dos resíduos captados por um único tipo de transporte

(Tabela 5).

TABELA 5 - SEGREGAÇÃO, ORGANIZAÇÃO E REMOÇÃO ADEQUADA DE

RESÍDUOS SÓLIDOS NA REDE DE ATRAÇÃO COM PEQUENAS ÁREAS.

1 Comumente, os resíduos metálicos ferrosos ou não-ferrosos captados estão na forma deutensílios ou componentes, que, como tal, podem ser caracterizados como leves.

A facilitação da disposição induz à diferenciação dos resíduos,

o que, por sua vez, permite a introdução de equipamentos de

PLÁSTICO

E VIDRO

ORGANIZAÇÃO DOS RESÍDUOS PARA ACUMULAÇÃO E REMOÇÃO

SEGREGAÇÃO

Apresentação A granel

RCD

Característicasde massa

Características domeio de transporte

SOLO REJEITOS PODASVOLUMO-

SOSMADEIRA PAPEL METÁLICOS

Densos

Veículo para transportede elevada tonelagem

Limitar pelo peso

Em partículas maiores

Leves 1

Veículo para transporte de elevado volumeLimitar pelo volume

Page 100: Livro entulho bom

98GESTÃO DOS RESÍDUOS DE CONSTRUÇÃO E DEMOLIÇÃO EM ÁREAS URBANAS

remoção mais racionais e menos custosos que os inevitavelmente

utilizados na Gestão Corretiva. 5

A acumulação e a remoção diferenciadas, além de serem a se-

qüência lógica da geração de resíduos homogêneos nas ativida-

des urbanas, são a condição para a introdução de soluções de

destinação sustentáveis, adequadas a cada tipo de resíduo.

RECICLAGEM PARA ALTERAÇÃO DA DESTINAÇÃO

A sustentabilidade da Gestão Diferenciada de RCD é ditada pela

facilitação do descarte dos resíduos gerados, pela sua segregação

na captação e na remoção e pela radical alteração da solução de

destinação, interrompendo-se o contínuo aterramento de mate-

riais plenamente reaproveitáveis e o inexorável esgotamento das

áreas que dão sustentação ao desenvolvimento urbano.

A Gestão Diferenciada estrutura-se sobre a reciclagem intensa

dos RCD, mas também possibilita novas formas de destinação para

outros tipos de resíduos que com eles são descartados: reciclagem

de embalagens, compostagem de resíduos orgânicos e podas vege-

tais, desmontagem e reaproveitamento de resíduos volumosos, em

ações complementares à ação central desenvolvida com os RCD.

A atração dos grandes volumes de RCD e a centralização dos

pequenos volumes captados, em áreas onde seja estruturada a

reciclagem, permitem conferir perenidade a tais áreas, substituin-

do-se a solução dos bota-foras emergenciais por Centrais de

Reciclagem racionais e plenamente geríveis.

O processamento dos RCD nas Centrais de Reciclagem deve ser

bastante simplificado, cumprindo-se um fluxo de seleção e descon-

taminação, trituração (com possível classificação) e expedição,

5 A adoção de métodos mais eficientes de gestão de resíduos sólidos em países desenvolvidostem propiciado a oferta de equipamentos bastante específicos, desenvolvidos em função dascaracterísticas dos resíduos (Institut Bruxellois pour la Gestion de L’Environnement, 1995)

Page 101: Livro entulho bom

99

já transformados em nova matéria-prima a ser utilizada em servi-

ços e obras da construção civil.

Para a alteração da destinação dos RCD, demandada pela Ges-

tão Diferenciada, é necessária a delimitação de atividades consu-

midoras dos resíduos reciclados, atividades essas que passarão a

cumprir o papel de receptoras dos resíduos que o ambiente urba-

no precisa descartar, atuando como bota-foras “pulverizados”.

No modelo de Gestão Diferenciada, é importante a adoção de

um formato modular de Central de Reciclagem, menos custoso

que o das instalações comuns em outros países, que permita:

• priorização da reciclagem dos RCD gerados em pequenos

volumes e captados pela administração pública na Rede de

Atração, por repercutirem mais fortemente na qualidade da

limpeza urbana;

• implantação descentralizada das áreas de reciclagem, para

manutenção da facilitação da disposição dos grandes gerado-

res e coletores, e otimização da distribuição da nova matéria-

prima;

• ampliação do número de agentes possivelmente investidores;

• ocorrência do necessário tempo de maturação para os novos

procedimentos, com a conseqüente consolidação da nova

cultura de destinação.

Page 102: Livro entulho bom

100GESTÃO DOS RESÍDUOS DE CONSTRUÇÃO E DEMOLIÇÃO EM ÁREAS URBANAS

FIGURA 7 - PRIMEIRA INSTALAÇÃO DO SISTEMA DE UNIDADES DE

RECICLAGEM IMPLANTADO EM BELO HORIZONTE / MG

É importante observar que a geração de RCD, nos médios e

grandes municípios, é, de um modo geral, sensivelmente maior

do que a capacidade de consumo da administração pública, im-

possibilitando sua assimilação exclusivamente em obras públicas.

Por outro lado, os RCD gerados nesses municípios, transforma-

dos novamente em agregados utilizáveis, são apenas uma peque-

na parcela dos agregados demandados pelo conjunto das ativi-

dades construtivas privadas. Isso justifica o desenvolvimento de

esforços de construção de uma via para reciclagem e uso pela

iniciativa privada.

A proposta da Gestão Diferenciada dos RCD pressupõe — na

medida em que é da competência das municipalidades a defini-

ção da destinação dos resíduos sólidos urbanos — uma ação indu-

tora do poder público, de forma que, mesmo que a alteração da

destinação seja iniciada com investimentos públicos, permita-se a

evolução do processo com investimentos privados que cuidem

Page 103: Livro entulho bom

101

de canalizar os produtos para o consumo nas próprias atividades

construtivas geradoras dos resíduos. Será essa a forma de, pela

Gestão Diferenciada, avançar-se na perspectiva do “fechamento

do ciclo” para os materiais utilizados nas atividades construtivas,

tal como meta já definida nos países da Comunidade Européia

(Internationale Vereinigung Baustoff-Recycling, IVBR, 1995).

A busca de nova destinação para os RCD deve permitir flexibili-

dade de soluções, como a construção de parcerias entre poder

público e iniciativa privada, parcerias entre municípios conurbados,

recurso a equipamentos locados em municípios onde não se justi-

fique a imobilização de investimentos e o aproveitamento de an-

tigas instalações de mineração inseridas em áreas urbanas. 6

A necessidade de superação das limitações da Gestão Correti-

va e de dar sustentabilidade à Gestão Diferenciada dos RCD torna

necessárias e inevitáveis as articulações entre gestão pública de

resíduos e iniciativa privada, para que o máximo volume possível

de RCD seja reciclado e seja interrompido o desperdício de recur-

sos minerais nobres e o esgotamento continuado de áreas

crescentemente indisponíveis.

Para que a Gestão Diferenciada dos RCD permita a constituição

de um novo patamar de qualidade para o ambiente urbano, é im-

prescindível a implementação integrada das três diretrizes básicas

anunciadas, propiciando coleta extensiva, reciclagem eficiente e

uso intenso de resíduos como substitutos de agregados mais custo-

sos. E é necessária a extensão dessa integração a ações que visem

à alteração de cultura entre os agentes envolvidos nos processos

que não podem mais ser sustentados. Para isso, é extremamente

6 Há exemplos de cidades densas, como Chicago, onde extintas jazidas minerais são utilizadasatualmente para a acumulação e reciclagem de RCD.

Page 104: Livro entulho bom

102GESTÃO DOS RESÍDUOS DE CONSTRUÇÃO E DEMOLIÇÃO EM ÁREAS URBANAS

importante que esforços sejam dirigidos para a informação e a

educação ambiental, bem como para a redução da geração de

resíduos na fonte, através de estratégias como gestão e reciclagem

interna dos resíduos nos próprios canteiros e através de adoção

de técnicas como a da desmontagem seletiva, em substituição à

demolição indiscriminada.

BASES LEGAIS PARA UMA NOVA GESTÃOA proposição da Gestão Diferenciada dos RCD, um novo modelo

que objetiva a qualidade do serviço de limpeza e do próprio ambi-

ente urbano, altera o papel de alguns agentes, possibilita o exercí-

cio de competências que comumente são inviáveis de serem assu-

midas e introduz a necessidade de aprimorarem-se alguns instru-

mentos jurídicos para que os novos procedimentos se consolidem.

A Gestão Diferenciada dos RCD deve ser vista como uma ativi-

dade recuperadora e preservadora do meio ambiente local, como

o exercício efetivo das competências municipais previstas nas leis

maiores e em documentos recentes, como a Lei 9.605 — 12/02/98,

Lei do Meio Ambiente (Brasil, 1998).

A implementação da Gestão Diferenciada e das diretrizes para

facilitação e disciplinação dos agentes são expressões da com-

petência privativa do Poder Público municipal e do seu necessá-

rio papel regulador. Segundo Cavalcanti et al. (1996) “...para que

o mercado funcione a favor da sustentabilidade, uma regulação

com salvaguardas a favor da natureza deve ser introduzida, fixan-

do-se restrições a seu funcionamento naquilo que o mercado é

incapaz de enxergar (como o interesse das gerações futuras), jun-

tamente com critérios éticos e morais para a distribuição inter-

geracional de recursos”.

Page 105: Livro entulho bom

103

Há exemplos de legislação ambiental em diversos países que,

com êxito, avançaram nessa direção, como no Japão, com sua Lei

de Limpeza e Tratamento de Resíduos (formulada em 1960 e revi-

sada em vários outros anos) e a Lei de Reciclagem (de 1991), que

definem como objetivo geral a redução dos resíduos, a garantia

da saúde pública pela disposição adequada e a preservação de

recursos naturais, designando as obrigações dos responsáveis pela

promoção da reciclagem dos RCD — empreendedores, projetis-

tas, construtores, consumidores e agências públicas (Hong Kong

Polytechnic, 1993).

O papel regulador dos municípios é necessário, inclusive, para

a regulamentação da atividade dos agentes coletores, licencian-

do-os, definindo os procedimentos de coleta e o destino final dos

resíduos coletados, e é o motivador para a adoção da Gestão Di-

ferenciada dos RCD como novo serviço público destinado ao

cumprimento dos compromissos com a limpeza urbana e com a

preservação do meio ambiente.

O modelo de Gestão Diferenciada dos RCD, objetivando a alte-

ração de procedimentos de captação, remoção e destinação de

resíduos, pressupõe a evolução desses processos, de forma que a

iniciativa privada seja incentivada a processar os RCD e a canalizar

significativas parcelas dos produtos da reciclagem para o merca-

do de materiais e componentes para a construção. Essa participa-

ção privada pode acontecer sob a forma de concessão, permissão

ou autorização de serviço público, ou mesmo sob a forma de sim-

ples regulamentação das atividades que se deseja incentivar.

A parceria das municipalidades com a iniciativa privada pode se

dar nos investimentos para implantação das Centrais de Recicla-

gem e no próprio processo de remoção dos resíduos captados nas

pequenas áreas, que irão constituir a matéria-prima das Centrais.

Page 106: Livro entulho bom

104GESTÃO DOS RESÍDUOS DE CONSTRUÇÃO E DEMOLIÇÃO EM ÁREAS URBANAS

A introdução da Gestão Diferenciada dos RCD, como novo mo-

delo para a gestão eficiente desses resíduos induz o estabeleci-

mento de novos instrumentos legais, mais adequados às novas

tarefas que se impõem, e impulsiona alterações de alguns dispo-

sitivos que passam a não mais fazer sentido. Entre esses dispositi-

vos, está o compromisso assumido por muitas municipalidades,

na regulamentação de seu serviço de limpeza urbana, de promo-

ver, em conjunto com os resíduos domiciliares, a remoção dos

RCD descartados em volumes de até 50 litros, prática que não

pode coexistir com a necessidade de segregação integral dos resí-

duos sólidos urbanos.

O objetivo de consolidar nova fórmula de captação e destinação,

que supere os graves problemas hoje existentes, implicará aten-

ção especial ao incentivo e à indução de ações corretas dos agen-

tes envolvidos no fluxo dos resíduos e materiais reciclados. Esses

incentivos e essa indução têm seu nascedouro em ações do Po-

der Público, ente legalmente gestor dos RCD, e passam por ações

como a utilização do poder de compra da administração pública

(para que fornecedores prestem contas de seus resíduos 7, para

que resíduos sejam crescentemente utilizados em obras públicas)

e a responsabilização dos geradores. 8

7 O Ministério da Construção japonês orienta, desde a década de 80, as autoridades contratantesde obras públicas para que incluam cláusulas especiais sobre a gestão de RCD, contemplandodesde sua necessária diferenciação até as condições de transporte para locais predeterminados(Hong Kong Polytechnic, 1993).8 Na Catalunha, a normativa existente, desde 1994, estipula inclusive que determinadas obrasrecolham fiança ao estado, em função de seu porte e características, como condição para olicenciamento (ITEC, 1995a).

Page 107: Livro entulho bom

105

CUSTOS OPERACIONAIS E INVESTIMENTOS PARA AGESTÃO DIFERENCIADA

A Gestão Diferenciada dos RCD possibilita a eliminação dos

dispêndios emergenciais e não-preventivos, típicos da Gestão

Corretiva, por estar sustentada em ações menos custosas, defini-

das para a atração e o envolvimento dos diversos agentes inseri-

dos no fluxo dos RCD. São fatores redutores de custo a entrega

voluntária dos resíduos, a oferta da ação dos coletores nucleados, a

diferenciação dos resíduos e seu transporte especializado, a pere-

nidade conferida às áreas de atração dos grandes volumes e a subs-

tituição de agregados naturais por reciclados menos custosos.

A implantação da Gestão Diferenciada requer investimentos em

equipamentos, obras civis e montagem de equipe operacional

diferenciada. São investimentos e custos que irão ocorrer no qua-

dro de peculiaridades de cada municipalidade que aderir à Gestão

Diferenciada dos RCD. Os indicadores básicos dos investimentos,

apresentados nas próximas tabelas, devem ser considerados no

contexto das variáveis e condicionantes locais.

TABELA 6 - PARÂMETROS PARA OBRAS CIVIS EM ÁREAS DE ATRAÇÃO E

RECICLAGEM 1

1 Preços orçados para São Paulo / SP, 1998, incluso BDI - Bonificação e Despesas Indiretas.

INSTALAÇÃO

Área componente da Rede de Atração(Local de Entrega Voluntária)

ÁREA APROXIMADA (m2) CUSTO ESTIMADO (R$)

Central de Reciclagem

300

5.000

11.250

60.000

Page 108: Livro entulho bom

106GESTÃO DOS RESÍDUOS DE CONSTRUÇÃO E DEMOLIÇÃO EM ÁREAS URBANAS

TABELA 7 - PARÂMETROS DE CUSTO E CARACTERÍSTICAS DE

EQUIPAMENTOS PARA REMOÇÃO DE RESÍDUOS SEGREGADOS 1

1 Preços médios orçados para São Paulo / SP (1998).

O uso de equipamentos adequados para a remoção dos resíduos

permitirá que os equipamentos pesados, anteriormente utiliza-

dos, sejam preservados para utilizações mais corretas.

Os equipamentos e processos que podem ser utilizados na

reciclagem são oriundos das atividades de mineração, recebendo

as adaptações necessárias para a plena aceitação das Centrais de

Reciclagem em ambientes urbanos. A definição da tipologia dos

equipamentos, dos produtos viáveis e da produção requerida deve

ser feita em função das peculiaridades locais e respeitando-se a

intenção de conferir formato modular às Centrais de Reciclagem,

para que aspectos como descentralização da captação dos maiores

volumes sejam priorizados.

A tabela a seguir apresenta características e preços de conjun-

tos de equipamentos definidos para quatro cenários hipotéticos.

ITEM

Remoção deresíduos densos

CARACTERÍSTICAS PREÇO MÉDIO (R$)

Remoção deresíduos leves

450

9.500

Equipamento hidráulico, poliguindaste,instalado sobre chassis existente, com

capacidade nominal de 8 toneladas

Caçambas metálicaspara 4 metros cúbicos

8.500

Guindaste hidráulico 2 t/m dotado degarra, instalado internamente à carroceria

existente, com alcance de 3,5 metros,giro de 360 graus e capacidade nominal

de 450 quilos em extensão máxima.

Page 109: Livro entulho bom

107

TABELA 8 - PARÂMETROS DE CUSTO E CARACTERÍSTICAS DE

EQUIPAMENTOS PARA RECICLAGEM DE RESÍDUOS DE CONSTRUÇÃO E

DEMOLIÇÃO

1 Produção medida na britagem de entulho, em regime de 6,5 horas produtivas diárias.2 Preços médios orçados em 1998.3 É a designação corrente no mercado para equipamentos com boca retangular de alimentaçãonas medidas de 42 por 30 centímetros.4 É o produto primário da britagem, sem classificação granulométrica definida.5 Toneladas por hora – unidade de medida da produção em britagem.

Os novos procedimentos, inerentes ao modelo de Gestão Di-

ferenciada dos RCD, introduzem novos custos, oriundos da utili-

zação de equipamentos mais adequados, de operadores diferen-

ciados e da adoção da reciclagem em substituição ao aterramento

dos RCD. Na próxima tabela, estão lançados os custos unitários

básicos da Gestão Diferenciada, com inclusão de todos os com-

ponentes que precisam ser considerados, referenciados em valo-

res praticados em cidades do interior paulista.

CARACTERÍSTICAS DO CONJUNTODE RECICLAGEM

PREÇO ESTIMADO 2

(R$)

80.000Alimentador vibratório, britador

de mandíbulas “tipo 4230” 3

e transportador decorreia de ação radial

90 t/dia de“brita corrida”

4

Alimentador vibratório, britador demandíbulas “tipo 4230”, transportador de

correia de ação radial, moinho de martelos,peneira vibratória elevada sobre baias fixas

PRODUÇÃO NOMINAL 1

E PRODUTOS

Alimentador vibratório, britador deimpacto “tipo 20 TPH”

5,transportador de correia de ação radial

Alimentador vibratório, britador deimpacto “tipo 40 TPH”, transportador decorreia de ação radial, peneira vibratória

e transportadores auxiliares fixos

90 t/dia de“brita corrida” ou

agregadosclassificados

130 t/dia de“brita corrida”

260 t/dia de“brita corrida”,ou agregadosclassificados

170.000

130.000

90.000

Page 110: Livro entulho bom

108GESTÃO DOS RESÍDUOS DE CONSTRUÇÃO E DEMOLIÇÃO EM ÁREAS URBANAS

TABELA 9 - PARÂMETROS DOS CUSTOS OPERACIONAIS NA GESTÃO

DIFERENCIADA

1 Valores para remoção terceirizada.

Logicamente, devem-se considerar os valores indicados como

referências gerais, que podem ser alteradas por peculiaridades

locais.

FIGURA 8 - EXECUÇÃO DE ATERRO E PAVIMENTAÇÃO COM RECICLADOS

(B. HORIZONTE / MG)

ITEM CUSTO UNITÁRIO

R$ 1.100 / mêsCusto de operaçãodas pequenas áreasna Rede de Atração

Incluídos custos de manutenção,provisão de água, energia,

custos de mão-de-obra

Custo de remoçãode resíduos leves 1

DESCRIÇÃO

Custo de remoçãode resíduos densos 1

Custo de reciclagemdos RCD

Remoção por poliguindaste ecaçambas metálicas.Base 7 viagens/dia

Incluídos custos de manutenção,provisão de água, energia,

custos de mão-de-obra, juros, amortização,equipamentos para manejo interno

R$ 5,00 / ton

R$ 7,60 / ton

R$ 8,40 / tonRemoção por veículo dotado de carroceria

alta, guindaste e garra hidráulica.Base 3 viagens/dia

Page 111: Livro entulho bom

109

FIGURA 9 - PRODUÇÃO DE BLOCOS E GUIAS COM RECICLADOS

(B. HORIZONTE/MG)

A introdução da Gestão Diferenciada dos RCD e de seus novos

procedimentos propicia resultados economicamente expressivos

em cada um deles, permitindo visualizar-se que a junção de meno-

res custos de limpeza urbana com o benefício da substituição de

agregados convencionais por resíduos muito menos custosos

compõe a equação de sustentação do novo modelo, que o torna

extremamente atraente para municipalidades brasileiras de médio

e de grande porte.

A tabela a seguir indica tal sustentabilidade econômica, apresen-

tando, de forma comparativa, os parâmetros na Gestão Corretiva

e os propostos para a Gestão Diferenciada, numa situação hipoté-

tica, construída a partir de situação real e valores praticados nos

municípios de Santo André, Jundiaí e São José do Rio Preto, no

estado de São Paulo.

Page 112: Livro entulho bom

110GESTÃO DOS RESÍDUOS DE CONSTRUÇÃO E DEMOLIÇÃO EM ÁREAS URBANAS

TABELA 10 - INDICADORES DA SUSTENTABILIDADE DA GESTÃO

DIFERENCIADA 1

1 SANTO ANDRÉ, 1997; SÃO JOSÉ DO RIO PRETO, 1997; JUNDIAI, 1997.

PARÂMETROS DAGESTÃO CORRETIVA

PARÂMETROS PARAGESTÃO DIFERENCIADA

MUNICIPALIDADE EM SITUAÇÃO HIPOTÉTICA

População - 414.188 habitantes

Remoção Deposições Irregulares - 132 t/dia

Consumo típico agregados convencionais - 357 t/dia

Geração de RCD - 857 t/dia

Rede de Atração com 13 áreas

Central de Reciclagem - 01 (260 t/dia)

Custo Rem. Res. Densos R$ 7,60 / ton

Custo Rem. Res. Leves R$ 8,40 / ton

Custo Mensal Rede Atração R$ 14.300,00

Custo Mensal Gestão R$ 24.065,00

Custo Remoção R$ 11,22 / ton

Custo Mensal Correção R$ 38.373,00

Custo Mensal Aterramento R$ 1.560,00 Custo Mensal Aterramento R$ 125,00

Custo Aquisição Agregados R$ 12,51 / ton

Custo Mensal Agregados R$ 84.568,00

Custo Reciclagem R$ 5,00 / ton

Custo Mensal Reciclagem R$ 33.800,00

Despesas totais com Correção

R$ 124.501,00

Despesas totais com Gestão

R$ 72.290,00

Page 113: Livro entulho bom

111

COMENTÁRIOS FINAISA Gestão Diferenciada, como conjunto de soluções, alia à

atratividade econômica para os parcos recursos públicos a eficiên-

cia de soluções que podem imprimir qualidade ao ambiente e ao

sistema de limpeza urbanos.

A adoção da Gestão Diferenciada dos RCD permite resultados

concretos, inversão do papel coadjuvante imposto aos gestores

urbanos e amortização rápida dos investimentos necessários,

mesmo que só sejam considerados os resultados contabilmente

apropriáveis. No entanto, numa análise completa, não poderão

deixar de ser considerados os resultados conquistados em termos

de qualidade ambiental e redução dos costumeiros impactos em

outros aspectos da vida urbana — eficiência de drenagem e do

tráfego de pedestres e veículos, comprometimento da paisagem

urbana, entre outros.

Sendo uma ampliação dos serviços públicos necessários à sus-

tentação do desenvolvimento urbano, a Gestão Diferenciada dos

RCD possibilita aos municípios o exercício de competências que

lhe estão designadas por lei e que nunca puderam ser assumidas.

E impõe o exercício de seu papel regulador, aprimorando instru-

mentos jurídicos para que os novos procedimentos de gestão se

consolidem e todas as deficiências diagnosticadas na Gestão Cor-

retiva possam ser superadas.

A Gestão Diferenciada dos RCD propicia, pelo monitoramento

contínuo, flexibilidade de ação e possibilidades rápidas de altera-

ção de procedimentos e soluções, garantindo eficácia às ações do

Poder Público.

Constitui forte fator incentivador à adoção da Gestão Dife-

renciada por municípios brasileiros de médio e grande porte o

fato de o preço dos agregados naturais ser superior ao custo da

Page 114: Livro entulho bom

112GESTÃO DOS RESÍDUOS DE CONSTRUÇÃO E DEMOLIÇÃO EM ÁREAS URBANAS

reciclagem em todas as regiões mais densamente urbanizadas.

Cumprirá, portanto, à reciclagem um papel fundamental na sus-

tentação da nova solução, propiciando a contínua ampliação do

uso de resíduos reciclados e o atendimento de demandas sociais

muito freqüentes nos municípios brasileiros.

Da Gestão Diferenciada decorre a eficiência da gestão ambiental

e a poupança de recursos econômicos e naturais não-renováveis.

Em decorrência ainda das novas práticas, afloram possibilidades

de novos negócios, que permitirão, pela introdução de novos ato-

res, uma maior aproximação de um “sistema de ciclo fechado”

para os materiais da construção.

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Relatórios internos: programa correção das deposições e reciclagem do

entulho. 1996/1999. Belo Horizonte, 1999.

Tarcísio de Paula Pinto - Arquiteto, Mestre EESC-USP, Doutor EPUSP, Diretor Técnico da I&T -

Informações e Técnicas

Page 116: Livro entulho bom

114GESTÃO DIFERENCIADA DO ENTULHO NA CIDADE DE SALVADOR

CAPÍTULO IV

Page 117: Livro entulho bom

115

GESTÃO DIFERENCIADADO ENTULHO NA

CIDADE DE SALVADOR

Bárbara Elizabete Correia Quadros

Ana Maria Vieira de Oliveira

Page 118: Livro entulho bom

116GESTÃO DIFERENCIADA DO ENTULHO NA CIDADE DE SALVADOR

A solução dos problemas relacionados aos resíduos sólidos

e à limpeza urbana reveste-se de grande importância para a saú-

de pública, a conservação dos recursos naturais e a geração de

energia, refletindo-se, de modo positivo, na qualidade de vida

da população.

Coletar, transportar, tratar e dar o destino ambiental e sanita-

riamente adequado ao lixo é um trabalho relevante, considera-

do, hoje, um dos grandes desafios da administração pública, em

todo o mundo.

Esse problema assume uma dimensão mais grave, diante de

algumas situações desfavoráveis, presentes no trato do gerencia-

mento do lixo, comuns às cidades brasileiras, tais como:

• acelerado crescimento das populações urbanas;

• geração diária de enormes quantidades;

• alto grau de heterogeneidade da composição;

• mudança do perfil, gerando aumento das características de

periculosidade;

• ausência de política do governo federal para direcionar as

ações do município;

• escassez, cada vez maior, de áreas não urbanizadas com

aptidão física e ambiental para assentamento de atividades

de tratamento e disposição final;

• atitudes constantes e inconscientes da comunidade, incom-

patíveis com a garantia da qualidade da limpeza urbana;

• controle ambiental deficiente;

• elevados custos;

• capacitação técnica e profissional insuficiente;

• crônica falta de verbas.

Page 119: Livro entulho bom

117

INTRODUÇÃOA CIDADE DE SALVADOR

Situada na Região Nordeste do Brasil, a cidade de Salvador,

no âmbito microrregional, insere-se no conjunto do Recôncavo

Baiano, na extremidade sul da península que forma a Baía de

Todos os Santos. É constituída de uma parte continental e outra

insular, essa última compreendendo às ilhas dos Frades e de Maré.

Capital do Estado da Bahia, Salvador foi fundada há 451 anos

e ocupa uma área de 313km2, integrando a área Central da Região

Metropolitana, que engloba os municípios de Lauro de Freitas e

Simões Filho. O setor de comércio e serviços, com enfoque no

crescimento do turismo, é a vocação de sua economia.

Cercada de água por três lados, Salvador apresenta clima tro-

pical e úmido, temperatura média anual de 25ºC, umidade rela-

tiva do ar da ordem de 80% e índices pluviométricos superiores

a 1.900mm anuais, com precipitações intensificadas nos meses

de abril e maio.

Com topografia irregular e encostas com declividade acentua-

da, sua ocupação desenvolveu-se nas cumeadas e encostas, reser-

vando-se os vales como grandes espaços para drenagem e circu-

lação urbana.

Salvador é a terceira maior cidade do Brasil em população.

De acordo com dados do censo 2000 do IBGE, Salvador possui

2.440.886 habitantes, o que representa 18,68% da população do

Estado da Bahia. Sua população apresenta uma taxa de cresci-

mento anual de 2,50%, e 99,95% do seu contingente populacional

localiza-se em área estritamente urbana.

Quanto à distribuição de renda per capita, em 1995, o maior

contingente de sua população, 76%, era representado por famílias

com renda de até dois Salários Mínimos. Na faixa de 3 a 5 SM,

Page 120: Livro entulho bom

118GESTÃO DIFERENCIADA DO ENTULHO NA CIDADE DE SALVADOR

encontravam-se 16%, e apenas 7% tinham um rendimento supe-

rior a 5 SM.

A explosão demográfica, a mercantilização do solo, a expansão

das periferias, a topografia acidentada, os aspectos climáticos e o

nível de renda da população influenciaram na urbanização

desordenada da cidade, com reflexos diretos na questão da lim-

peza urbana, que demanda por soluções específicas, capazes de

propiciar a oferta dos diversos serviços solicitados pelos usuários,

observando-se sempre as questões referentes ao custo.

Para o sistema de limpeza urbana, Salvador está dividida em

17 Núcleos de Limpeza — NLs, cuja demarcação espacial corres-

ponde à distribuição das RAs (Regiões Administrativas). A Tabela 1,

apresenta algumas características desses NLs. Ressalte-se que a

maioria da população, aproximadamente 60%, reside em áreas

consideradas de baixa renda.

Page 121: Livro entulho bom

119

TABELA 1 - CARACTERIZAÇÃO DOS NÚCLEOS DE LIMPEZA NA CIDADEDE SALVADOR (1996)

Fonte: Estudo Demográfico – RMS – P&P,1999Padrão de Renda – Geohidro/92

NÚCLEODE

LIMPEZA(NL)

I Centro

REGIÃOADMINISTRATIVA

PADRÃODE

RENDA

POPULAÇÃOTOTAL(hab)

ÁREA(ha)

DENSIDADE(hab/ha)

NÚMERODE

DOMICÍLIOS(nº)

01 Média 84.923 693,11 122,52 25.942

II Itapagipe 02 Baixa 147.620 697,02 211,79 36.488

III São Caetano 03 Baixa 203.003 907,41 223,72 48.617

IV Liberdade 04 Baixa 178.357 674,57 264,40 44.317

V Brotas 05 Média 181.707 1.112,60 161,86 48.043

VI Barra 06 Alta 67.245 530,43 126,77 20.594

VII Rio Vermelho 07 Média 170.162 676,43 251,56 43.343

VIII Pituba 08 Alta 68.373 815,40 83,43 18.446

IX Boca do Rio 09 Baixa 92.882 1.324,16 70,14 24.272

X Itapuã 10 Média 158.521 8.293,53 19,11 38.831

XI Cabula 11 Média 121.186 1.010,72 119,90 31.080

XIITancredo

Neves 12 Baixa 169.043 1.423,87 118,72 42.330

XIII Pau da Lima 13 Baixa 164.804 2.338,12 69,01 41.005

XIV Cajazeiras 14 Baixa 114.990 2.248,47 51,14 28.271

XV Valéria 15 Baixa 54.095 2.288,32 23,64 13.135

XVI S. Ferroviário 16 Baixa 232.553 4.081,27 56,98 54.567

XVII Ilha 17 Baixa 2.075 2.252,49 0,92 456

TOTAL 2.211.539 31.427,92 70,37 559.787

Page 122: Livro entulho bom

120GESTÃO DIFERENCIADA DO ENTULHO NA CIDADE DE SALVADOR

A LIMPURB

A Empresa de Limpeza Urbana do Salvador, LIMPURB, criada

há 20 anos, é o órgão responsável pela gestão do sistema mu-

nicipal de limpeza urbana, vinculado à Secretária de Serviços

Públicos — SESP.

A coleta dos resíduos urbanos encontra-se terceirizada em

80%, a varrição em 65%, e os serviços congêneres (capina, roça-

gem, raspagem, pintura de meio-fio etc.) em 55%.

Os serviços públicos de transbordo, tratamento e destino final

dos resíduos sólidos urbanos foram revertidos para a adminis-

tração direta centralizada — SESP. Em janeiro / 2000, foi assina-

do o contrato da concessão, por 20 anos, dos serviços de Trata-

mento dos Resíduos de Serviços de Saúde, da Estação de Trans-

bordo de Resíduos e do Aterro Metropolitano Centro. À LIMPURB

foi delegada a fiscalização e o acompanhamento da execução

do contrato da concessão.

Verifica-se que a LIMPURB vive um processo de globalização

na qualidade do setor de serviços, adequando-se às novas di-

retrizes, com novas propostas de atuação. Vem se firmando, cada

vez mais, como órgão fiscalizador e desempenhando as funções

de planejamento e monitorização do sistema, ampliando a

terceirização, introduzindo, de forma pioneira, a concessão de

serviços de limpeza urbana e buscando parcerias importantes

na integração e realização de atividades com maior agilidade,

eficiência, eficácia e flexibilidade.

O MODELO DE GESTÃO DE RESÍDUOS SÓLIDOS

Através da aplicação de novos princípios, práticas e tecnologias,

a LIMPURB concebeu e adotou um Sistema Integrado de Manejo e

Tratamento dos Resíduos Sólidos gerados na Cidade de Salvador,

a partir de 1992, atualizado em 2000. Esse sistema se caracteriza

Page 123: Livro entulho bom

121

pela organização dos resíduos sólidos na origem, com o objetivo

de minimizar os problemas decorrentes de sua heterogeneidade,

promovendo o uso da coleta e do tratamento diferenciados e ade-

quados para cada uma das suas partes componentes (Figura 1).

➔➔ ➔ ➔

➔➔

➔➔

➔ ➔ ➔

➔ ➔➔ ➔ ➔ ➔➔ ➔➔

➔➔➔

➔➔

➔ ➔

➔ ➔➔

➔➔

➔➔

➔➔ ➔

➔➔

COLETA DIFERENCIADA

SEGREGAÇÃONA ORIGEM

INFORMAÇÃO EEDUCAÇÃO AMBIENTAL

ORIENTAÇÃOMONITORIZAÇÃOE FISCALIZAÇÃO

MUNÍCIPEGERAÇÃO DE RESÍDUOS SÓLIDOS

URBANOS(Res+Com+Público)

RSS ENTULHOFEIRA, MERCADOE PODA

OR

NIC

O/

OU

TR

OS

RE

CIC

VE

L

PE

RIG

OS

OC

EN

TR

AL

DE

RE

CE

ÃO

(Tra

tam

ento

Ger

ado

r)COOPCICLA/PEV E

OUTROS

COMERCIA-LIZAÇÃO

BOLSA DERESÍDUOSREJEITO

USOPÚBLICO

OUPRIVADO

UNIDADE DECOMPOSTAGEM

ATERROSANITÁRIO

RECICLAGEM

ES

PE

CIA

L

CO

MU

M

RA

DIO

TIV

O

BIO

GIC

O

PD

E

BD

E

TRANS-PORTE

PMSSÓ EMÁREA

PLANA

REUTILIZAÇÃO(Nivelamentode Terreno)

CNEN

TRATAMENTOINTERNO

UNIDADE DETRATAMENTO

(Vala Séptica)Canabrava

UNIDADE DETRATAMENTO

(Autoclave)AMC

REJEITO

USOPÚBLICO

OUPRIVADO

RECICLADONÃO

SIM

FIGURA 1 - MODELO TECNOLÓGICO

Page 124: Livro entulho bom

122GESTÃO DIFERENCIADA DO ENTULHO NA CIDADE DE SALVADOR

Para melhor fundamentar a operação da Gestão Diferenciada

dos Resíduos Sólidos gerados no município do Salvador e obter

parâmetros técnicos para a implantação de alternativas de redu-

ção, reutilização e reciclagem, foram realizados, em parceria com

a UFBA, estudos de caracterização dos resíduos sólidos domi-

ciliares e do entulho, nos seus aspectos quali-quantitativos.

A amostragem foi realizada em função do padrão de renda do

gerador e por Núcleo de Limpeza.

A coleta diferenciada encontra-se praticamente implantada. Os

estudos necessários à implantação do tratamento especializado

dos resíduos de serviços de saúde, da compostagem dos resíduos

orgânicos e da instalação da usina de reciclagem de entulho estão

em desenvolvimento, complementando a destinação final ade-

quada, em execução.

O município conta com dois aterros. O Aterro Controlado de

Canabrava, que possui área total de 66ha, funciona desde o

ano de 1974 e dista, em linha reta, cerca de 18 km do centro da

cidade. Atualmente, passa pela implantação do projeto de sanea-

mento socioambiental. Como sua vida útil está em fase de en-

cerramento, não mais recebe resíduos de origem domiciliar,

destinando-se, apenas, à disposição, em área específica, de resí-

duos provenientes da construção civil e podas, além dos resíduos

de serviços de saúde, o que corresponde a 51,91% do total dos

resíduos coletados.

O Aterro Sanitário Metropolitano Centro, AMC, com 250 ha,

opera desde outubro de 1997, em gestão compartilhada com

os municípios de Lauro de Freitas e Simões Filho. Atualmente,

recebe, em média, 2.788 toneladas/dia, sendo 94,58% dos resí-

duos oriundos de Salvador, 3,86% de Lauro de Freitas e 1,56% de

Simões Filho.

Page 125: Livro entulho bom

123

Em Canabrava, está sendo implantada uma Estação de Trans-

bordo, em função da distância de 30 km do centro de massa gera-

dor de resíduos sólidos até o AMC.

Em 2000, o montante da coleta de resíduos sólidos foi de 5.517

toneladas diárias. A maior parcela desses resíduos foi constituída

de entulho (49,77%), seguida dos resíduos urbanos (46,04%), poda

e feira (3,26%), resíduos de serviços de saúde (0,63%) e materiais

recicláveis (0,29%).

A fração dos materiais recicláveis, ainda muito pequena, é cole-

tada e comercializada pela COOPCICLA — Cooperativa de Agentes

Autônomos de Reciclagem. Essa atividade é desenvolvida tanto

na origem, através do sistema porta a porta, quanto no destino

final, em Canabrava, numa área específica, reservada para catação

dos materiais recicláveis, denominada CENBA — Central de

Badameiros. Outras iniciativas (catadores, associações, entidades

filantrópicas, ONGs, empresas e cooperativa) de coleta seletiva

também existem na cidade, embora a maioria se constitua de

atividades em pequena escala, limitadas a um tipo de material,

desconhecendo-se a estatística da produção.

A operação desse sistema tem como suporte dois instrumen-

tos principais: a educação ambiental e a fiscalização. Com base na

legislação existente e através de parcerias com outros órgãos afins,

realiza-se um programa de fiscalização, orientação e monitora-

mento, de modo a fazer cumprir as proposições e conter hábitos

inadequados da população.

Outro instrumento importante é o trabalho da Comissão Técni-

ca de Garantia Ambiental – CTGA, que respalda a Empresa na

implementação de medidas que reduzem ou eliminam a poluição e

os riscos ambientais. Essa Comissão foi criada em cumprimento

à Resolução Normativa CEPRAM nº 71.051, de 17 de maio de 1995.

Page 126: Livro entulho bom

124GESTÃO DIFERENCIADA DO ENTULHO NA CIDADE DE SALVADOR

As principais fontes de receita da Empresa são dotação orça-

mentária, cobrança de taxa e preço. Para o serviço de limpeza ur-

bana, foram destinados, no ano de 2000, R$ 84.000.000,00 (oiten-

ta e quatro milhões de Reais), o que representa 6,98% do orça-

mento municipal e se enquadra na média geral brasileira de 7%.

EVOLUÇÃO DA GESTÃO DO ENTULHOAo longo dos últimos dezenove anos, várias propostas foram

concebidas pela LIMPURB para a superação das condições inade-

quadas de gerenciamento dos resíduos originados em construções,

demolições, reformas, escavações e terraplanagem — o entulho.

As tentativas empreendidas e as medidas minimizadoras até então

implementadas haviam sido pontuais. Dentre as soluções experi-

mentadas, destacam-se:

1981 – Estabelecimento de pontos de descarga de entulho, des-

centralizados, operados em parceria com outros órgãos

de manutenção da cidade; coleta manual realizada pelo

grande gerador e pela própria LIMPURB; utilização do

DISK ENTULHO, um instrumento de comunicação com

a comunidade.

1992 – Criação de área específica para disposição do entulho, a

partir do modelo tecnológico, no destino final de Cana-

brava – a CENTRAL DE ENTULHO; coleta com carregamen-

to manual, realizada pela própria LIMPURB e pelo gerador.

1993 – Introdução da coleta mecanizada do entulho, através

do sistema comboio (uma pá carregadeira e 8 caçambas)

e disposição na central de entulho, desativada em 1994,

em razão de exaustão de sua vida útil, sendo Canabrava

utilizado como destino final.

Page 127: Livro entulho bom

125

Apesar da formulação de proposições em parcerias e de incluir

a recuperação de áreas degradadas, as ações careciam de um tra-

balho de manejo fundamentado.

Os equipamentos disponíveis para a coleta regular dos resíduos

domiciliares quase sempre apresentavam avarias, em função da

falta de uma segregação dos resíduos na origem, o que resultava

em prejuízo para a empresa.

Além de não impedir o descarte aleatório do entulho, provocar

impactos ambientais e acidentes, com escavações durante as ope-

rações de coleta, e do alto custo envolvido, o sistema Comboio1

contribui também para a não assunção da responsabilidade com

o entulho por parte do seu gerador.

Embora, nesse período, o gerador do entulho já participasse

da coleta, os resultados obtidos ainda eram insignificantes, repre-

sentando 6,99% do total do entulho coletado, em função, tam-

bém, da falta de um programa de educação ambiental.

Todas essas situações, aliadas à descontinuidade administrati-

va, constituíram os maiores entraves para resolver a questão do

entulho em Salvador.

A situação continuou problemática até 1996, atingindo o máxi-

mo de 420 pontos de disposição clandestina. Cada vez mais volu-

moso e heterogêneo, o entulho era depositado aleatoriamente

na cidade — em encostas, terrenos baldios, canteiros, córregos,

valas, praias, lagoas, laterais das estradas —, gerando, em associa-

ção com o lixo domiciliar, mau cheiro, doenças, obstrução do sis-

tema de drenagem, inundação, insegurança no trânsito, desliza-

mento e proliferação de insetos e animais nocivos.

1 Coleta mecanizada do entulho disposto aleatoriamente, através de um conjunto de equipamen-tos — uma pá carregadeira e seis caçambas —, de acordo com uma programação específica.

Page 128: Livro entulho bom

126GESTÃO DIFERENCIADA DO ENTULHO NA CIDADE DE SALVADOR

Diante desse cenário, a LIMPURB buscou o apoio da Universi-

dade Federal da Bahia, através do Departamento de Hidráulica e

Saneamento da Escola Politécnica, para, em conjunto, desenvol-

verem estudos sobre o assunto e definir ações adequadas para

questão. Foi, então, criado um grupo de estudos, que caracteri-

zou a situação do entulho no município de Salvador.

Em dezembro de 1996, a operação emergencial “FAXINAÇO”,

em conjunto com a Companhia de Desenvolvimento Urbano do

Estado da Bahia — CONDER, retirou das ruas de Salvador, 37.411t

de entulho, o que representa 37,83% do total de resíduos coletados

nesse mês, sem, contudo, solucionar a questão.

FIGURA 2 - MAPEAMENTO DE DEPOSIÇÃO ALEATÓRIA DE ENTULHO (1997)

REGIÃO METROPOLITANACAMAÇARISIMÕES

FILHOAMC

LAURO DEFREITAS

NL 10Itapuã

NL 14Cajazeiras

NL 15Valéria

NL 16SuburbioFerroviário

NL 13Pau da Lima

CANABRAVA

Baíade Todosos Santos

Oceano Atlântico

NL 12Tancredo

Neves

NL 11Cabula

NL 3São

CaetanoNL 2

Itapagipe

NL 4Liberdade

NL 1Centro

NL 5Brotas

NL 9Boca do Rio

NL 8Pituba

NL 7Rio Vermelho

NL 6Barra

PLATAFORMA

BOA VIAGEM

Page 129: Livro entulho bom

127

A participação do entulho no lixo urbano obteve um signifi-

cativo incremento na última década, representando 45,35%, como

pode ser observado na Tabela 2.

TABELA 2 - PARTICIPAÇÃO DO ENTULHO NO LIXO URBANO 1990/2000

Fonte: CON/DIRACNota: Operação Faxinaço – 13.12.96 a 17.03.97

Conforme levantamento realizado em junho de 1997 (Figura

2), existiam 220 pontos de descarte aleatório na cidade. Os custos

com a coleta desses resíduos atingiam, aproximadamente, um va-

lor mensal de R$ 558.754,00 (quinhentos e cinqüenta e oito mil,

setecentos e cinqüenta e quatro Reais) e anual de R$ 6.705.048,00

(seis milhões, setecentos e cinco mil e quarenta e oito Reais), além

ANO

1990

TOTAL RECOLHIDO (t)

638.848 28.264 4,42

1991 675.791 147.764 21,86

1992 682.085 185.415 27,18

1993 684.791 206.083 30,09

1994 732.665 226.083 30,86

1995 767.718 227.214 30,00

1996 845.403 249.445 29,71

1997 1.071.036 380.477 35,52

1998 1.278.126 530.324 41,49

1999 1.294.382 511.008 39,48

2000 1.671.683 832.007 49,77

LIXO ENTULHO %

Page 130: Livro entulho bom

128GESTÃO DIFERENCIADA DO ENTULHO NA CIDADE DE SALVADOR

da existência de outros de difícil mensuração, referentes a proje-

tos, programas e operações desenvolvidos para sanar as conse-

qüências negativas da gestão inadequada do entulho.

A situação inadequada da deposição de entulho no município e a

necessidade de agilizar as ações de melhoria na limpeza urbana indi-

cavam a necessidade de adoção de medidas que viessem a corrigir os

problemas gerados, trazer melhorias para o ambiente urbano, benefi-

ciar os pequenos geradores de entulho e reduzir os custos com a co-

leta, o transporte e a destinação final, prolongando, também, a vida útil

do aterro. Dessa forma, foi criado, por Decreto do Prefeito, um Grupo

de Trabalho interinstitucional, com a finalidade de viabilizar a opera-

ção do Projeto Gestão Diferenciada de Entulho na Cidade de Salvador.

PROJETO DE GESTÃO DIFERENCIADA DE ENTULHOCONCEPÇÃO

O Projeto de Gestão Diferenciada de Entulho na Cidade de Sal-

vador tem como objetivo transformar o descarte clandestino de

entulho em deposição correta, através da adoção de uma política

ordenadora, que busque a remediação da degradação ambiental

gerada, a integração dos agentes envolvidos com a questão, como

também a redução máxima da geração desse tipo de resíduos,

seu reaproveitamento e reciclagem. O modelo escolhido baseia-

se na descentralização do recebimento, do tratamento e do desti-

no final do entulho.

Áreas estrategicamente localizadas, selecionadas preferencialmen-

te entre aquelas utilizadas para disposição aleatória de entulho e pró-

ximas aos centros de sua geração, são preparadas, oficializadas e

disponibilizadas à população, com as denominações de Posto de

Descarga de Entulho (PDE) e de Base de Descarga de Entulho (BDE).

Page 131: Livro entulho bom

129

Dentre os critérios de seleção de terrenos para instalação de

PDE e BDE, encontram -se:

• localização geográfica no Município, de modo a permitir que

todos os pontos sejam atendidos com distância de transporte

inferior a 15 km do centro de geração de entulho;

• facilidade de acesso e boas condições de tráfego;

• possibilidade de compatibilizar o uso do solo com um novo

empreendimento, evitando-se incômodos ao bem-estar e à

saúde dos moradores da vizinhança;

• disponibilidade de infra-estrutura física;

• inexistência de habitações nas proximidades;

• vocação da área para recebimento de entulho, por apresentar-

se degradada, com necessidade de aterramento, ou ser local

que já recebe entulho de forma desordenada.

O projeto contempla a instalação de cinco BDEs, vinte e dois

PDEs, a intensificação da fiscalização da deposição clandestina, a

remediação de áreas degradadas, além de um amplo programa

de monitorização, educação ambiental e orientação à população

usuária, como medidas de estímulo à disposição correta de entu-

lho, conforme fluxograma da Figura 3.

➔MUNÍCIPE

GERAÇÃO DE ENTULHO• SEGREGAÇÃO• MEDIÇÃO• ACONDICIONAMENTO• ARMANEZAMENTO• TRANSPORTE

PEQUENAS QUANTIDADESATÉ 2m3

TRANSPORTE DO GERADOR

GRANDES QUANTIDADESACIMA DE 2m3

TRANSPORTE DO GERADOR

➔➔

PDEPOSTO DE DESCARGA

DE ENTULHO

BDEBASE DE DESCARGA

DE ENTULHO➔

TOPOGRAFIA ACIDENTADA OUDEGRADADA

REUTILIZAÇÃONIVELAMENTO DE TERRENO

TOPOGRAFIA ACIDENTADA OUDEGRADADA

REUTILIZAÇÃONIVELAMENTO DE TERRENO

RECICLAGEM

1ª FASE 2ª FASE

➔ ➔

➔TRANSPORTE DA PREFEITURA (SÓ EM ÁREA PLANA)

FIGURA 3 - FLUXOGRAMA DO MODELO DE GESTÃO DO ENTULHO

Page 132: Livro entulho bom

130GESTÃO DIFERENCIADA DO ENTULHO NA CIDADE DE SALVADOR

O órgão de controle ambiental do Estado aprovou o sistema de

gestão de entulho projetado e o subordinou a alguns condicio-

nantes mitigadores de impactos potenciais ao meio ambiente e à

saúde da comunidade.

Antes da instalação de PDEs e de BDEs, elabora-se um projeto

arquitetônico e paisagístico específico, fundamentado em Termos

de Referência, como alternativa de promover a integração do novo

equipamento ao sítio escolhido, evitar impactos visuais e esta-

belecer uma vizinhança harmoniosa com a comunidade local.

O mapeamento dos Postos e Bases de entulho na cidade do

Salvador por Núcleo de Limpeza encontra-se na Figura 4.

Baíade Todosos Santos

Oceano Atlântico

SIMÕES FILHO

LAURODE FREITAS

CAMAÇARI

REGIÃO METROPOLITANA

BAIRRO DA PAZ

NL 10Itapuã

SÃO CRISTÓVÃO

AMC

CAJAZEIRAS

NL 14Cajazeiras

DOM AVELAR

PERIPERI

NL 16S. FerroviárioIlha de Maré

PIRAJÁPLATAFORMA

NL 3São Caetano

SÃO CAETANO

SUSSUARANANL 13

Pau da Lima

NL 2Itapagipe

BOAVIAGEM

SANTA MÔNICA

S. GONÇALO RETIRO

IAPI

IMBUÍ

NORDESTE

ITAIGARA

LUIS ANSELMO

TORORÓ

NL 15Valéria

NL 9Boca do Rio

NL 8PitubaNL 6

Barra

NL 11Cabula

NL 7Rio Vermelho

FIGURA 4 - MAPEAMENTO DOS POSTOS E BASES DE DESCARGAS DE

ENTULHO

Page 133: Livro entulho bom

131

POSTOS DE DESCARGA DE ENTULHO (PDE)

Os Postos recebem, reutilizam ou transferem entulho oriun-

do de pequenos geradores, com um limite de recepção diária

de 2m3 por transportador. O funcionamento é diário, no horá-

rio de 7 às 18h.

Quando o montante de recepção diário atingir o limite total

estipulado, o controlador do PDE indicará ao transportador a BDE

mais próxima para a entrega do entulho, após efetuar a coleta de

todos os dados do usuário e do veículo. O controle de descarga

de entulho é feito através do formulário de Controle Diário de

Descarga de Entulho, preenchido pelo controlador do PDE.

BASES DE DESCARGA DE ENTULHO (BDE)

As Bases são grandes áreas que recebem, reutilizam, reciclam

ou destinam adequadamente o entulho proveniente de grandes

geradores e dos PDEs sem limite de recepção. A triagem ocorre

da seguinte forma:

• componente de entulho com valor agregado (plástico, papel,

papelão, vidro, metal, madeira e etc) — incorporação aos pro-

cessos de coleta seletiva;

• materiais que não entram no processo de reciclagem — enca-

minhamento ao destino final;

• entulho bruto (concreto, argamassa, rocha natural, etc.) —

encaminhamento ao núcleo de reciclagem.

SISTEMATIZAÇÃO DA COLETA E DO TRANSPORTE

DE ENTULHO

A Gestão Diferenciada de Entulho, na Cidade de Salvador, tem

como suporte legal específico o Decreto 12.133/98, além de ou-

tros dispositivos, como a lei de lançamento indiscriminado do

lixo, o regulamento de limpeza urbana e o decreto de padroniza-

ção de acondicionadores de resíduos sólidos.

Page 134: Livro entulho bom

132GESTÃO DIFERENCIADA DO ENTULHO NA CIDADE DE SALVADOR

Para realizar o transporte de entulho no município, é necessário

que pessoas físicas ou jurídicas estejam cadastradas no órgão de

limpeza urbana, através de processo em que se exige a apresenta-

ção de plano de trabalho e vistoria dos veículos e equipamentos

a serem utilizados. A renovação desse cadastramento é anual,

podendo ser suspenso ou extinto, ou sofrer penalidades decor-

rentes de infrações.

Ao proprietário ou ao responsável legal ou técnico por uma

obra de construção civil ou movimento de terra cabe a obrigação

de providenciar, às suas expensas, o transporte de entulho até os

locais autorizados para a sua recepção, bem como a aquisição dos

recipientes necessários e adequados para o seu acondicionamento,

no local da obra.

ESTRATÉGIA DE IMPLANTAÇÃO

A implantação e a operação do Plano de Gestão Diferenciada

de Entulho na Cidade de Salvador ocorre em duas fases distintas.

Na Fase I, a LIMPURB está executando as medidas relativas à trans-

formação do descarte clandestino em deposição correta e, na

Fase II, aquelas integrantes do processo de viabilização da reci-

clagem do entulho.

A estimativa de custos efetuada para a implementação, opera-

ção e manutenção da estrutura proposta para transformação do

descarte clandestino do entulho em deposição correta (Fase I),

quando confrontada com os custos disponíveis da gestão corretiva,

significou uma redução superior a 50%.

Os resultados obtidos na Fase I são bastantes significativos,

possibilitando a redução da disposição aleatória, a melhoria do

sistema de coleta dos resíduos sólidos, da qualidade ambiental e

da vida da população, contribuindo para o desenvolvimento sus-

tentável do município, conforme demonstração a seguir.

Page 135: Livro entulho bom

133

INSTALAÇÕES DE POSTOS DE DESCARGA DE ENTULHO

• Instalação de 06 dos 22 postos previstos, o que representa

27% da estrutura programada para os pequenos geradores.

• Recepção de 99,4 t/dia de entulho nos seis postos em funcio-

namento, conduzidas pela população usuária dos PDEs de

Itaigara, Anita Barbuda, Extra, Forno, Curralinho e Muriçoca.

• Realização de campanhas setoriais de conscientização, nas

áreas de abrangência de cada PDE, com utilização de carro

de som, distribuição de 15.600 folhetos e instalação de pla-

cas de sinalização e proibitivas.

• Instalação de 23 caixas estacionárias padronizadas, para rece-

ber entulho, em 21 pontos de deposição aleatória, até que

sejam implantados os PDEs nas áreas selecionadas.

• Redução da disposição clandestina de entulho em 61,66%,

passando de 420 pontos, em 1996, para 161 em 2000.

• Aumento da participação do entulho no montante total do

lixo coletado, transformando-se em seu maior componente, com

uma média de 2.746 t/dia, ou seja, 50%.

• Coleta de 508.732 t/ano (2000), realizada pelo próprio gera-

dor, resultando numa economia de R$ 10.528.717,00 (dez

milhões, quinhentos e vinte e oito mil e setecentos e dezes-

sete Reais).

• Eliminação de quatro dias de comboio/mês (uma pá carrega-

deira com 6 caçambas) na operação de limpeza corretiva, na

Gerência Operacional (GEROP I), o que representou uma eco-

nomia de R$ 15.940,00/mês (quinze mil e novecentos e qua-

renta Reais).

• Aumento da participação do gerador na coleta e transporte

do entulho, evoluindo de 3% em 1996 para 61% em 2000

(Figura 5).

Page 136: Livro entulho bom

134GESTÃO DIFERENCIADA DO ENTULHO NA CIDADE DE SALVADOR

FIGURA 5 - PARTICIPAÇÃO DO GERADOR NA COLETA DE ENTULHO

(1996-2000)

INSTALAÇÃO DAS BASES DE DESCARGA DE ENTULHO (BDE)

• Disponibilização de três áreas (Portoseco Pirajá, São Gonçalo

e Via Regional) em processo.

• Seleção de duas BDEs para o processo de reutilização (São

Gonçalo e Via Regional).

A Fase II teve início com a sensibilização de um grupo técnico,

através de palestras sobre a reciclagem, demonstração do Projeto de

Gestão Diferenciada de Entulho e dos resultados obtidos na Fase I.

Prosseguiu com a realização da caracterização do entulho bruto e

reciclado, em parceria com a UFBA / Escola Politécnica, ficando evi-

denciada a sua excelente qualidade para a reciclagem, com 53% de

concreto e argamassa em sua composição gravimétrica.

O projeto executivo da primeira unidade de reciclagem de en-

tulho e o anteprojeto da Fábrica de Componentes para a constru-

ção civil foram concluídos. Está prevista, para o primeiro semes-

tre de 2001, a implantação desses equipamentos.

A adesão da LIMPURB à Rede Cooperativa de Pesquisas para o

Aproveitamento de Resíduos como Materiais de Construção —

Reciclar Bahia foi uma das ações executadas nessa fase.

As atividades a serem desenvolvidas no Projeto de Reciclagem

de Entulho e na Fábrica de Componentes são:

Page 137: Livro entulho bom

135

Reciclagem do entulho:

• recepção e classificação dos resíduos da construção civil;

• descontaminação dos resíduos, com separação de impurezas

(folhas, plásticos, papel, etc);

• britagem e peneiração;

• expedição de entulho reciclado;

• armazenamento provisório.

Fabricação de componentes:

• recebimento e armazenamento de agregado reciclado;

• produção de concreto;

• fabricação de componentes de concreto;

• expedição de componentes de concreto;

• armazenamento provisório de artefatos de concreto.

A Fábrica de Componentes constitui uma solução integrada à

Base de Descarga de Entulho, produzindo blocos, tijolos e bri-

quetes em vibroprensa, bem como componentes como meio-fio,

lajota, vigota, mourão, etc. em mesa vibratória.

FISCALIZAÇÃO E MONITORIZAÇÃO

O Sistema de Fiscalização de entulho é formado por uma co-

missão composta de órgãos públicos, incumbidos de estabelecer

rotinas e procedimentos técnicos, tanto de caráter orientador

quanto repressivo, de treinar e capacitar os fiscais para aplicação

dos recursos instrucionais e da legislação pertinente, bem como

de monitorar todo o sistema.

O Programa de Fiscalização de entulho tem a pretensão de

observar tanto o acondicionamento, a coleta, o transporte e o

destino final de entulho, quanto os hábitos da população relati-

vos ao manejo dessa parcela de resíduos, buscando prevenir e

conter o descarte aleatório e propiciar a deposição correta no

âmbito do município.

Page 138: Livro entulho bom

136GESTÃO DIFERENCIADA DO ENTULHO NA CIDADE DE SALVADOR

Para isso, foi firmado um termo de cooperação técnica e admi-

nistrativa entre o Governo do Estado da Bahia, através do DETRAN,

Polícia Militar e CRA, e a Prefeitura Municipal de Salvador, atra-

vés da SESP - Secretária de Serviços Públicos, com a participação

da LIMPURB e SEPLAM - Secretaria de Planejamento Urbanismo e

Meio Ambiente, com a criação de uma unidade administrativa

na estrutura da SESP.

O trabalho de fiscalização é de caráter permanente e contínuo,

com respaldo simultâneo na legislação vigente em todos os níveis

(Federal, Estadual e Municipal).

EDUCAÇÃO AMBIENTAL

Instrumento fundamental para a viabilização do Projeto de

Gestão Diferenciada de Entulho, a educação ambiental permite a

formação e a informação social orientadas para o desenvolvimento

da consciência crítica sobre o estado do meio-ambiente em relação

ao manejo, à coleta, ao transporte, ao tratamento e à destinação do

entulho, conscientizando o cidadão quanto ao seu papel como

gerador de entulho.

A concepção do programa de educação ambiental pressupõe a

sensibilização da população para a importância do desenvolvimen-

to sustentável (social, econômico e ambiental), utilizando-se de

uma abordagem holística, que envolve:

• consciência (sensibilização);

• compreensão (conhecimento);

• habilidade;

• comportamento (atitudes e valores);

• ação participativa.

O público-alvo são os empresários de construção civil, pessoas e

comunidades organizadas, que geram entulho durante o serviço de

construção civil, demolição, reforma, escavação e terraplenagem,

Page 139: Livro entulho bom

137

alunos de escolas, pessoal dos depósitos de materiais de constru-

ção, agentes transportadores de entulho (pequenos e grandes) e,

no geral, toda a população do município de Salvador.

REMEDIAÇÃO DE ÁREAS DEGRADADAS

Trata-se da implementação de soluções mitigadoras, para possibili-

tar sustentação ao projeto, como a transformação de áreas degrada-

das em espaços com novos usos, definidos através de parcerias a co-

munidade local, dentro de uma compreensão da necessidade de mu-

dança na concepção do “espaço público, como espaço de ninguém”

para a consciência do “espaço público, como espaço de todos”.

As atividades pertinentes ao processo de remediação de áreas

degradadas incluem a limpeza, cercamento (quando necessário),

plantio de árvores, colocação de meio-fio, instalação de telefone

público, cesta coletora de lixo, quadras poliesportivas, praças e

outros equipamentos urbanos.

CONCLUSÃOA situação do entulho ainda é um desafio a ser vencido pela

administração municipal. Entretanto, a LIMPURB dispõe, hoje,

de um problema equacionado, cuja solução definitiva depende

da execução das ações programadas e necessárias à total opera-

ção do projeto.

Dentre as metas a serem atingidas, o aspecto mais crítico é a dis-

ponibilidade de recursos necessários à instalação das Bases de Des-

cargas de Entulho para possibilitar a reciclagem e a fabricação de

componentes para a construção civil.

O entulho proveniente dos grandes geradores ainda está sendo

transportado para a única área de recepção disponível no municí-

pio, que é o Aterro de Canabrava.

Page 140: Livro entulho bom

138GESTÃO DIFERENCIADA DO ENTULHO NA CIDADE DE SALVADOR

Esse aterro está passando por um processo de encerramento

de sua vida útil, ficando cada vez mais restritas as áreas disponíveis

para a disposição de entulho.

As medidas adotadas na Fase I, de implantação de Gestão Dife-

renciada de Entulho na Cidade de Salvador, trouxeram excelentes

resultados. Entre eles, o entendimento do gerador quanto à sua co-

responsabilidade na destinação do entulho gerado e a definição de

locais oficializados para recebimento desse material. O percentual

de 61% do entulho entregue em Canabrava pelo próprio produtor,

ou seja, 1.679 t/dia, demonstra isso.

Essa situação poderia ainda melhorar com a implantação das

BDEs descentralizadas, principalmente pela redução das distânci-

as entre o ponto de geração e o de recepção. O Aterro de Cana-

brava situa-se a uma distância média, em linha reta, de 11 km dos

Núcleos de Limpeza, e as Bases distam 4km, excetuando a do AMC,

que fica a aproximadamente 8km.

Por outro lado, foram realizadas atividades inéditas no município

de Salvador, como a realização do inventário quali-quantitativo de

entulho, com parâmetros técnicos locais, os estudos sobre a insta-

lação de usinas de reciclagem e sobre o uso desse resíduo na pro-

dução de agregado reciclado, o que permite, hoje, um traçado do

perfil do entulho e de escolha de tecnologias adequadas para o seu

tratamento — a reciclagem.

De acordo com a composição gravimétrica e a quantidade de

entulho depositado por dia, em Canabrava, é enterrada, por ano,

uma grande variedade de materiais reaproveitáveis, conforme se

demonstra na Tabela 3.

A introdução do processo de reciclagem, extremamente neces-

sária à cidade de Salvador, para redução da necessidade de áreas

para deposição final do entulho, aumento da vida útil dos aterros,

Page 141: Livro entulho bom

139

redução de custos e do consumo dos recursos naturais, tem, de

acordo com o projeto executivo e anteprojeto realizados, o custo de

R$ 450.500,00 (quatrocentos e cinqüenta mil e quinhentos Reais).

A implantação das metas do Projeto de Gestão Diferenciada de

Entulho foi prevista para três anos. Neste sentido, faltam serem im-

plantadas algumas medidas para solucionar as questões relativas à

coleta, ao transporte, ao tratamento e ao destino final desse material.

O processo de geração de entulho é sempre crescente e, sem

um programa de redução na origem, torna-se maior ainda. Nos

últimos três anos, verificou-se um acréscimo de 119% na coleta do

entulho, ou seja, 1.490 t/dia.

Se todas as BDEs forem implantadas como áreas para deposição

final do entulho, sem a introdução do processo da reciclagem, a estima-

tiva feita para a duração da sua vida útil é inferior a sete anos, o que

comprometeria a continuidade de todo o sistema.

ESPECIFICAÇÃO DO TIPO DE MATERIAIS

Concreto e Argamassa

TONELADAS/ANO

440.964 53,00

Solo e Areia 183.042 22,00

Cerâmica Vermelha 74.881 9,00

Cerâmica Branca 41.600 5,00

Rochas Naturais 41.600 5,00

Plástico 33.280 4,00

Outros Materiais 16.640 2,00

TOTAL 832.007 100

%

TABELA 3 - PARTICIPAÇÃO DOS MATERIAIS COMPONENTES DO ENTULHO

ENTERRADOS DIARIAMENTE

Fonte: Caracterização de Entulho Bruto / LIMPURB / 1999

Page 142: Livro entulho bom

140GESTÃO DIFERENCIADA DO ENTULHO NA CIDADE DE SALVADOR

Apesar das medidas educativas e corretivas em prática, torna-se

impossível evitar totalmente as ocorrências de deposições clandes-

tinas de entulho na cidade, se não houver a oferta de locais prepara-

dos e adequados para o recebimento do material coletado.

O estudo que monitoriza o número dessas deposições irregulares

mostra uma redução de aproximadamente 62% de descarte de entulho.

Os bons resultados obtidos, o aumento das deposições aleató-

rias em 2000, a quantidade de entulho depositada no Aterro de

Canabrava e o término do prazo previsto para a implantação da

Gestão Diferenciada de Entulho sinalizam para a aplicação imediata

das medidas propostas.

É importante considerar que a falta das Bases de Descarga de En-

tulho, estrutura para atendimento dos grandes geradores e de tra-

tamento e destino do entulho, significa um grande entrave na reso-

lução do problema, impedindo até um trabalho mais abrangente na

área de educação ambiental.

O atendimento da população aos apelos do poder público para

segregar o entulho na origem e transportá-lo às Bases, nesse caso,

trará a incapacidade de recepção do material, desde que as grandes

áreas com essa finalidade não estejam preparadas. O Aterro de

Canabrava, em sua fase final de vida útil, é hoje o único local de que

dispõe a LIMPURB para o destino final de entulho na Cidade.

A primeira Usina de Reciclagem de Entulho deverá ser um em-

preendimento modelar no Nordeste do Brasil, implantado pelo

poder público, e indutor da inserção da iniciativa privada no pro-

cesso, objetivando atingir 100% do entulho gerado no Município.

A construção de uma Base de Descarga de Entulho com Usina de

Reciclagem e Fábrica de Componentes para construção civil no Sítio

de Canabrava, região onde se manipula o entulho há muito tempo,

torna-se uma medida bastante favorável à otimização das ações do

Page 143: Livro entulho bom

141

projeto Criança Canabrava e à ampliação do sistema diferenciado do

entulho. A articulação entre esses dois projetos possibilitará o apro-

veitamento das crianças e adolescentes, ao atingirem a idade adulta,

no trabalho originado com a Usina de Reciclagem de Entulho e de sua

complementar Fábrica de Componentes, bem como de outras pes-

soas da comunidade local, criando-se multiplicadores do processo.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

EMPRESA DE LIMPEZA URBANA DO SALVADOR (LIMPURB). Plano de

entulho. Salvador, 1981. 19p.

EMPRESA DE LIMPEZA URBANA DO SALVADOR (LIMPURB). Proposta de

coleta de entulho. Salvador, 1991. 15p.

EMPRESA DE LIMPEZA URBANA DO SALVADOR (LIMPURB). Proposta para

a coleta diferenciada dos resíduos produzidos no Município de Salvador.

Salvador, 1992. 11p.

JARDIM, N. S. (Coord.). Lixo municipal: manual de gerenciamento

integrado. São Paulo, IPT, 1995. (Publicação IPT, 2163).

PINTO, T. P. Projeto Executivo da Unidade de Reciclagem de Entulho.

Salvador: BDE/Portoseco Pirajá, 1998.

SALVADOR. Decreto nº 10.869, de 14 de novembro de 1994. Dispõe sobre

manejo, coleta, transporte e destinação final de entulho e de graneis

sólidos para a construção civil e dá outras providências. Diário Oficial do

Município, Salvador, n.1379, 1994.

SANTO ANDRÉ (SP). Secretaria de Obras e Serviços Urbanos. Departamento

de Serviços Urbanos. Estação de Entulho. Santo André, 1990. 12p.

SUPERINTENDÊNCIA DE LIMPEZA URBANA DE BELO HORIZONTE (SLU).

Programa para correção das disposições e reciclagem de resíduos de Belo

Horizonte. Belo Horizonte, 1994. 8p.

Bárbara Elizabete Correia Quadros - Arquiteta, Técnica da ASPLA / LIMPURB

Ana Maria Vieira de Oliveira - Arquiteta, Técnica da ASPLA / LIMPURB

Page 144: Livro entulho bom

142CARACTERÍSITCAS DO ENTULHO E DO AGREGADO RECICLADO

CAPÍTULO V

Page 145: Livro entulho bom

143

CARACTERÍSTICASDO ENTULHO E DO

AGREGADO RECICLADO

Taís Santos Sampaio

Elaine Pinto Varela Alberte

Dayana Bastos Costa

Alex Pires Carneiro

Barbara Elizabete Correia Quadros

Ana Maria Vieira de Oliveira

Irineu Antônio Schadach de Brum

Page 146: Livro entulho bom

144CARACTERÍSITCAS DO ENTULHO E DO AGREGADO RECICLADO

Os resíduos provenientes das atividades de construção e demo-

lição, usualmente chamados de entulho, são geralmente considera-

dos como material inerte, constituindo, quase sempre, a maior par-

cela dos resíduos sólidos gerados no ambiente urbano. Nos países

da Europa Ocidental, a geração de entulho eqüivale a uma quanti-

dade entre 0,7 e 1,0 tonelada por habitante/ano, correspondendo,

assim, ao dobro dos demais resíduos sólidos urbanos gerados pela

sociedade (Pera, 1996). Segundo Pinto (1999), para 6 municípios

brasileiros pesquisados, o entulho corresponde a uma quantidade

entre 54% e 70% dos resíduos sólidos urbanos, representando uma

geração per capita entre 0,4 e 0,76 tonelada por habitante/ano.

Com a intensificação do processo de urbanização, a quantidade

de resíduos gerados pelas obras de construção é cada vez mais ele-

vada, quer pelas demolições decorrentes do processo de renovação

urbana, quer por novas edificações. Estimativas apontam para uma

produção mundial entre 2 e 3 bilhões de toneladas/ano. (Lauritzen,

1994). Considerando a geração de 0,4 tonelada por habitante/dia, são

produzidos, no Brasil, cerca de 68 milhões de toneladas/ano de

entulho. O crescimento populacional constitui um fator impor-

tante nessa geração, visto que contribui para o aumento da produ-

ção desses resíduos. Além disso, o déficit habitacional pressiona a

sociedade a expandir o número de habitações nos próximos anos,

o que contribui, também, para o aumento da geração de entulho.

O alto índice de perdas na construção também colabora nesse

aumento. Programas de redução de perdas e gestão da qualidade,

que algumas empresas do setor da construção civil no Brasil vem

recentemente implantando, contribuem para reduzir a geração do

entulho e permitem o seu gerenciamento adequado no canteiro.

Contudo, a implantação de tecnologias visando à reutilização e à

reciclagem desse material é fundamental num processo de gestão

Page 147: Livro entulho bom

145

adequada, pois a quantidade de entulho gerado pelas obras de

construção, demolição ou reformas continuará a ser significativa,

mesmo com a implantação de programas de redução de perdas.

As experiências européia, japonesa e americana demonstram

que o conhecimento existente apresenta base tecnológica suficien-

te para o desenvolvimento da reciclagem, de forma contínua, nas

áreas urbanizadas onde existam geração de entulho e demanda

por materiais de construção.

No Brasil, algumas Prefeituras, têm implantado usinas de

reciclagem de entulho, buscando alternativas para gestão desses

resíduos. Existem exemplos de sucesso, como o da cidade de Belo

Horizonte — MG, que desenvolve um programa de reciclagem de

entulho, incluindo a instalação de quatro usinas de reciclagem.

Além disso, Ribeirão Preto, São José dos Campos, Londrina, São

Paulo, entre outras cidades, também implantaram usinas de

reciclagem de entulho.

Devidamente reciclado o entulho apresenta propriedades físi-

cas e químicas apropriadas para o seu emprego como material de

construção. No entanto, é importante ressaltar que o entulho apre-

senta características bastante peculiares. Existe uma grande diver-

sidade de matérias-primas, técnicas e metodologias, empregadas

na construção civil, que afetam, de modo significativo, as caracterís-

ticas dos resíduos gerados, principalmente quanto à composição e

à quantidade. Portanto, o nível de desenvolvimento da construção

local reflete-se nas características dos materiais constituintes do

entulho, ou seja, a caracterização desse resíduo está condicionada a

parâmetros da região de origem (Carneiro, 2000a).

A caracterização do entulho, tanto na sua forma bruta quanto na

reciclada, constitui uma etapa imprescindível para estudos de al-

ternativas que visem à gestão e à reciclagem desse resíduo. Nesse

Page 148: Livro entulho bom

146CARACTERÍSITCAS DO ENTULHO E DO AGREGADO RECICLADO

sentido, o projeto Entulho Bom e a LIMPURB (Empresa de Limpeza

Urbana do Salvador) realizaram a caracterização do entulho e do

agregado reciclado de Salvador (agregado produzido pela reci-

clagem de entulho).

Essa caracterização (a primeira disponível no Nordeste) buscou

conhecer as propriedades do entulho e dos agregados reciclados

produzidos em Salvador, possibilitando a definição de padrões

mais eficientes para coleta, transporte, disposição e reciclagem des-

se resíduo, além de identificar formas de utilização segura do ma-

terial, visando suprir a falta de normalização e regulamentação. A

caracterização também contribuiu para combater o descrédito de

alguns setores sobre a viabilidade da reciclagem do entulho e da

utilização de agregados reciclados, em substituição à matéria-

prima convencional, na construção civil.

CARACTERÍSTICAS DO ENTULHOA maior parte do entulho é proveniente de obras e demolições,

além de desastres naturais e tecnológicos, como incêndios, falhas

estruturais, terremotos, furacões, guerras, entre outros. Contudo,

os resíduos gerados na produção dos materiais de construção, como,

por exemplo, cacos de blocos cerâmicos nas olarias, pó de pedra da

britagem de agregados, entre outros, não são considerados como

entulho e sim como resíduos industriais de setores específicos.

Os resíduos gerados nas atividades de construção e demolição,

etapas claramente distintas do ciclo de vida de uma edificação, são

geralmente constituídos de materiais similares e, portanto, igual-

mente chamados de entulho.

Nas atividades de construção, ou mesmo em reformas, o alto

índice de perdas e a ausência de procedimentos de reutilização e

Page 149: Livro entulho bom

147

reciclagem são as principais causas da geração do entulho. Entre-

tanto, nem toda a perda se transforma, efetivamente, em resíduo

— uma parte fica incorporada na própria obra. A quantidade de

entulho gerado corresponde, em média, a 50% do material des-

perdiçado (Pinto, 1995 citado por Zordan, 1997). A Tabela 1 apre-

senta índices médios de perdas de materiais de construção.

TABELA 1 - ÍNDICE DE PERDAS DE ALGUNS MATERIAIS NA INDÚSTRIA

DA CONSTRUÇÃO

1 SOUZA, 1998, citado por PINTO, 1999 (mediana de diversas obras – Brasil)2 PINTO, 1989 (valores de uma obra – São Carlos)3 SOILBELMAN, 1993 citado por PINTO, 1999 (média de 5 obras – Porto Alegre)

As demolições, na maioria dos casos, também se apresentam

como uma grande fonte geradora desse resíduo, uma vez que, de

um modo geral, vêm sendo realizadas com processos rudimenta-

res. Num contexto em que a demolição rápida e a retirada dos

escombros são os principais objetivos, gera-se uma grande quan-

tidade de entulho, com os diversos tipos de materiais misturados,

já que fatores como o tempo e as técnicas utilizadas não permi-

tem a separação desses materiais.

MATERIAIS (%)

Areia

PESQUISADORES

44

Cimento 56

Cal 36

Concreto 9

Aço 11

Blocos e Tijolos 13

SOILBELMAN 3SOUZA 1 PINTO 2

39

33

102

1

26

13

44

83

13

19

52

Page 150: Livro entulho bom

148CARACTERÍSITCAS DO ENTULHO E DO AGREGADO RECICLADO

Para reduzir a geração de resíduos de demolição, é necessária a

modificação dos métodos tradicionais e a adoção da demolição sele-

tiva. Essa técnica consiste em separar, in situ, as diversas categorias

de materiais à medida que o processo de demolição (ou “descons-

trução”) vai avançando, de forma a evitar a mistura de concretos, ar-

gamassas e outros materiais recicláveis com contaminantes como

madeiras, papéis, plásticos e gesso, entre outros. Deve ser desenvol-

vido um planejamento detalhado do processo de demolição, uma

vez que a demolição seletiva necessita de mais tempo que a tradicio-

nal. Nesse sentido, recomenda-se que os projetos de demolição se-

jam planejados e controlados em detalhes, como deveriam ser os

projetos de construção (Grupo Español del Hormigon, GEHO, 1997).

Os resíduos de construção e demolição são gerados por diversos

agentes, como empresas de construção, médios e pequenos pres-

tadores de serviços, órgãos públicos, autoconstrutores, entre ou-

tros. Ou seja, esses resíduos são produzidos tanto pelo pequeno

gerador quanto pelas indústrias da construção civil.

O entulho é um resíduo heterogêneo, basicamente composto por:

• concretos, argamassas e rochas que, em princípio, apresentam,

na sua totalidade, bom potencial para reciclagem;

• blocos, tijolos e cerâmicas, que apresentam também alto

potencial de utilização, sem necessitar de processo sofistica-

do de tratamento;

• solos, areia e argila, que podem ser facilmente separados dos

outros materiais por peneiramento;

• asfalto, material com alto potencial de reciclagem em obras

viárias;

• metais ferrosos, recicláveis pelo setor de metalurgia;

• madeiras, material apenas parcialmente reciclável, sendo que

madeiras com proteção impermeabilizante ou pinturas devem

Page 151: Livro entulho bom

149

ser consideradas como material poluente e tratadas como

resíduos químicos perigosos, devido ao risco de contamina-

ção (Laurizten, 1994);

• outros materiais (plástico, borracha, papel, papelão, etc.)

passíveis de reciclagem, embora esse processo nem sempre

apresente vantagens que possam ser suportadas pelo atual

estágio de desenvolvimento tecnológico; quando for o caso,

esses materiais devem ser tratados como resíduos e dispos-

tos de forma adequada.

O entulho, portanto, é apresentado sob forma sólida. Apesar

da diversidade de dimensões e formas dos materiais que o consti-

tuem, aproximadamente 90% apresentam potencial de reciclagem

(Laurizten, 1994).

Embora, de forma geral, esses materiais sejam considerados

pela NBR 10004 como resíduos inertes, a sua composição química

e o risco de contaminação ambiental estão relacionados direta-

mente com os materiais utilizados na obra que os originou. Por-

tanto, apesar de a maioria das obras produzirem resíduos inertes,

pode haver casos em que a matéria-prima utilizada altere a classi-

ficação do entulho. A reciclagem de concretos produzidos com

escórias com alto teor de metais pesados, que antes estavam

encapsuladas na matriz de cimento, por exemplo, pode gerar agre-

gados prejudiciais ao meio ambiente e à saúde dos trabalhadores

e usuários (Cassa; Valois; Carneiro, 1998).

O resíduo de construção e demolição, ou simplesmente entu-

lho, possui características bastante peculiares. Há uma gama muito

grande de aspectos que interferem na quantidade, composição e

características desse resíduo. Entre esses aspectos, destacam-se:

• o nível de desenvolvimento da indústria da construção local:

� qualidade e treinamento da mão de obra disponível;

Page 152: Livro entulho bom

150CARACTERÍSITCAS DO ENTULHO E DO AGREGADO RECICLADO

� técnicas de construção e demolição empregadas;

� adoção de programas de qualidade e redução de perdas;

� adoção de processos de reciclagem e reutilização no canteiro;

• os tipos de materiais predominantes e/ou disponíveis na região;

• o desenvolvimento de obras especiais na região (metrô, es-

gotamento sanitário, restauração de centros históricos,

entre outros);

• o desenvolvimento econômico da região;

• a demanda por novas construções.

Nesse sentido, as características do entulho estão condiciona-

das a parâmetros específicos da região geradora do resíduo e à

variação ao longo do tempo. Na construção de edifícios, nos países

desenvolvidos, por exemplo, geram-se altos percentuais de papel

e plástico, provenientes das embalagens dos materiais. No mesmo

tipo de obra, nos países em desenvolvimento, gera-se grande quan-

tidade de resíduos de concreto, argamassa, blocos, entre outros,

devido às altas perdas do processo.

Na Tabela 2, é possível perceber a variabilidade da composição

dos entulhos gerados em algumas regiões / países.

TABELA 2 - COMPOSIÇÃO, EM PORCENTAGEM, DO ENTULHO DE

DIVERSAS REGIÕES / PAÍSES

MATERIAL

Concreto e argamassa

ORIGEM

9

Solo e areia 75 �

Cerâmica 5

Rochas –

Outros 11

ReinoUnido

1HongKong

2SãoCarlos

3SãoPaulo

4RibeirãoPreto 6 Salvador

7SãoPaulo

5

17

19

12

23

28

69

29

1

1

12

82 �

3

3

33

32

30

5

59

23

18

53

22

14

5

6

Page 153: Livro entulho bom

151

� Solo, areia e rochas1 Construction…, 1996.2 Hong Kong Polytechnic, 1993, citado por Levy, 1997.3 Pinto, 1989.4 Castro, 1998 (amostragem no aterro de Itatinga).5 Brito Filho, 1999 citado por John, 2000.6 Zordan, 1997.6 Carneiro, 2000b.

Além dos fatores regionais, as diferenças observadas na compo-

sição do entulho podem ser atribuídas ao período de amostragem,

à técnica de amostragem utilizada e ao local de coleta da amostra

(canteiro / aterro). Por fim, os tipos de obras predominantes tam-

bém podem influenciar na composição do entulho, conforme é

demonstrado na tabela a seguir.

TABELA 3 - COMPONENTES DO ENTULHO EM RELAÇÃO AO TIPO DE

OBRA EM QUE FOI GERADO

Fonte: Hong Kong Polytechnic, 1993, citado por Levy, 1997.

COMPONENTES PRESENTES

Concreto 48,0

Tijolos –

Areia 4,6

Solo, poeira e lama 16,8

Rocha 7,0

TrabalhosRodoviários

(%)

Escavações(%)

Sobras deDemolição

(%)

ObrasDiversas

(%)

Sobras deLimpeza

(%)

Asfalto 23,5

Metais –

Madeira de Construção 0,1

Papel e matéria orgânica –

Outros –

6,1

0,3

9,6

48,9

32,5

0,5

1,1

1,0

54,3

6,3

1,4

11,9

11,4

1,6

3,4

7,2

1,6

0,9

17,5

12,0

3,3

16,1

23,1

6,1

18,3

2,7

0,9

18,4

5,0

1,7

30,5

23,9

0,1

4,4

10,5

3,5

2,0

Page 154: Livro entulho bom

152CARACTERÍSITCAS DO ENTULHO E DO AGREGADO RECICLADO

CARACTERÍSTICAS DO AGREGADO RECICLADOMateriais nobres podem ser facilmente reciclados, como as par-

celas de concreto, argamassa, solo, areia, cerâmicas e rochas, que

representam a maioria dos componentes do entulho.

Os materiais resultantes do processo de reciclagem dos resíduos

de construção e de demolição são denominados por diversos

autores e pela RILEM (Réunion Internationale des Laboratories

d’Essais et de Recherches sur les Matériaux et les Constructions)

de agregados reciclados (RILEM, 1994; Barra, 1996; Collins, 1996;

GEHO, 1997; Hendrix, 1998; Pera, 1996). Tal denominação é ade-

quada para o novo material produzido, uma vez que esse não é

mais considerado um subproduto (entulho), e sim um agregado

reciclado, a ser utilizado no mesmo processo em que foi gerado,

a construção civil.

De uma forma geral, os agregados obtidos na reciclagem do

entulho são mais porosos que os naturais, o que implica uma absor-

ção de água mais elevada. Por outro lado, os resíduos de constru-

ção reciclados apresentam componentes com algumas proprie-

dades relevantes para o desempenho de materiais de construção.

Segundo Pinto (1998), entre esses componentes, destacam-se as

partículas de cimento não-inertizadas, que ainda irão reagir, partí-

culas de cal, que estarão disponíveis para novas reações, partícu-

las já cristalizadas, que funcionarão como iniciador da cristaliza-

ção (acelerando a formação da nova rede cristalina), e partículas

finas de material cerâmico, com significativo potencial pozolânico,

que irão reagir com a cal hidratada.

O agregado reciclado é uma mistura de agregado graúdo e mi-

údo, gerado pela operação de britagem, em geral com britador

de mandíbulas. A porcentagem de cada agregado depende basi-

camente da granulometria e da composição do entulho, bem como

Page 155: Livro entulho bom

153

do diâmetro máximo do agregado graúdo reciclado, produzido

pelo equipamento de cominuição. A granulometria desejada pode

ser obtida mediante pequenos ajustes na abertura do britador.

O coeficiente de forma do agregado reciclado graúdo é similar

ao de um agregado graúdo obtido na britagem de uma rocha cal-

cária. Em geral, o agregado reciclado apresenta uma forma mais

irregular e uma textura superficial mais áspera e porosa. Segundo

GEHO (1997), a fração grossa possui uma distribuição granulo-

métrica adequada para quase todas as aplicações de agregados

em construções. Contudo, devem-se tomar algumas precauções com

relação à utilização da fração < 2 mm do agregado reciclado, bus-

cando evitar problemas relacionados com absorção de água, forma

e textura superficial. A utilização desse material pode influenciar

em algumas propriedades como o consumo de água e a resis-

tência mecânica.

Além disso, a presença, no entulho, de algumas substâncias

consideradas impurezas ou contaminantes pode prejudicar o de-

sempenho dos materiais produzidos com o agregado reciclado.

Por exemplo: as argilas e solos em geral, o betume e os polímeros

procedentes das selagens impermeabilizantes das juntas, os fíllers

expansivos, também procedentes de juntas, o gesso, a cerâmica

refratária, os cloretos, matéria orgânica, metais, vidros, agregados

leves, partículas de concretos danificadas em incêndios, diversas

substâncias reativas e concreto de cimento aluminoso são

contaminantes que, em determinadas quantidades, podem com-

prometer o desempenho de um concreto estrutural produzido

com agregado reciclado (GEHO, 1997).

Vale ressaltar que uma determinada substância pode ser con-

siderada como impureza ou contaminante para uma dada apli-

cação do agregado reciclado e como material inerte para outra

Page 156: Livro entulho bom

154CARACTERÍSITCAS DO ENTULHO E DO AGREGADO RECICLADO

aplicação. Por exemplo: agregados reciclados que contenham

partículas de gesso podem ser utilizados para execução de camadas

de pavimentos; contudo teores de cerca de 6% desse material po-

dem provocar redução de aproximadamente 15% na resistência do

concreto. A presença de gesso em materiais produzidos com Ci-

mento Portland pode provocar fenômenos expansivos (GEHO, 1997).

Dessa forma, a aplicação do agregado reciclado está condicio-

nada à sua composição, sendo necessária a caracterização sistemá-

tica dos agregados produzidos, buscando evitar a sua utilização em

aplicações que possam comprometer o desempenho do material e

prejudicar a aceitação da sociedade ou do meio técnico do uso

do agregado reciclado.

PROCESSOS DE PRODUÇÃO DO AGREGADORECICLADO

As características do agregado reciclado estão diretamente rela-

cionadas com o seu processo de produção. De modo geral, o pro-

cesso de reciclagem dos resíduos de construção é constituído das

etapas de limpeza e seleção prévia, homogeneização, trituração,

extração de materiais metálicos, eliminação de contaminantes e

estocagem para expedição (Pinto, 1998; GEHO, 1997).

Ainda segundo essas publicações, na reciclagem de entulho,

são utilizados equipamentos diversos como pá carregadeira,

alimentador vibratório, britador, eletroímã para separação das

ferragens, peneiras, mecanismos transportadores e, eventual-

mente, sistemas para eliminação de contaminantes. Esses equi-

pamentos devem permitir que o processamento ocorra com

minimização da geração de ruídos e material particulado. Além

disso, deve-se dispor de uma área suficientemente grande para

Page 157: Livro entulho bom

155

armazenar os diversos tipos de entulho recebido e os vários tipos

de agregados produzidos.

Existe bibliografia detalhada sobre a adequação dos equipamen-

tos e projetos para cada tipo de processo. De forma genérica pode-

se considerar que os processos de reciclagem têm equipamentos

similares aos utilizados na produção de agregados naturais. Con-

tudo, os sistemas de reciclagem de entulho podem ser classifica-

dos em função dos critérios e do rigor usados na eliminação dos

contaminantes, conforme apresentado a seguir (GEHO, 1997):

• Plantas de Primeira Geração – necessitam de elementos que

possam eliminar metais.

• Plantas de Segunda Geração – similares às de primeira gera-

ção, mas contendo sistemas preliminares (mecânicos ou ma-

nuais) de eliminação de contaminantes, como a limpeza e

classificação do material, por via seca ou úmida.

• Plantas de Terceira Geração – visam a remoção praticamente

integral de todos materiais secundários, considerados como

contaminantes dos agregados reciclados.

A seleção dos equipamentos e a operação do sistema de recicla-

gem dependem das características iniciais do entulho e do seu grau

de processamento, determinado pela aplicação específica do agre-

gado reciclado. Por exemplo, se o material reciclado for utilizado na

fabricação de concreto estrutural, o processo de reciclagem deverá

ser mais rigoroso, para permitir a produção de um agregado com

menor quantidade de contaminantes que o material produzido para

ser utilizado em camadas de pavimentos (para as quais podem ser

aceitos maiores teores de materiais cerâmicos polidos, solos, entre

outros materiais, inadequados para concreto estrutural).

Um dos principais condicionantes do processo de reciclagem é

a necessidade de gerar produtos homogêneos e de características

Page 158: Livro entulho bom

156CARACTERÍSITCAS DO ENTULHO E DO AGREGADO RECICLADO

adequadas, a partir de resíduos heterogêneos e de origem bas-

tante diversificada.

A maioria das plantas de reciclagem utilizadas no Brasil é de 1ª

geração. O processo utilizado nesse tipo de planta é o mais sim-

ples de todos. A eliminação de contaminantes em plantas de 2a e

3a geração, por sua vez, encarece o processo e pode tornar inviável

a reciclagem. Uma alternativa para as aplicações que necessitem

agregados reciclados com desempenho superior é buscar pro-

cessos de gestão do resíduo pelo gerador que permitam a separa-

ção preliminar dos contaminantes no canteiro, durante o processo

construtivo. A reciclagem de entulho é bastante favorecida quan-

do não há mistura significativa dos materiais. A separação prévia

de elementos como vidro, madeira, metais, plásticos, papelão é

recomendável, uma vez que existem processos específicos relati-

vamente simples, alguns inclusive já consolidados para reciclagem

desses materiais.

Quando o entulho é composto de diversos materiais mistura-

dos, deve-se adotar alguns procedimentos para recebimento e

reciclagem do material:

• não receber entulho que apresente quantidade visivelmente

significativa de contaminantes (podas, papel, papelão, ma-

deira, matéria orgânica, plásticos, solos, metais, entre outros);

• buscar a homogeneização do entulho;

• identificar aplicações que aceitem a presença dos contami-

nantes e variações nas características do agregado reciclado;

• analisar periodicamente as características do agregado reciclado.

Além da classificação por geração, as unidades de reciclagem

podem ser divididas em instalações fixas e plantas móveis (GEHO,

1997). As instalações fixas permitem um maior controle de seu

impacto ambiental e são preferíveis em relação às pequenas e

Page 159: Livro entulho bom

157

móveis. A geração de ruídos e a distância dos centros urbanos são

fatores que deverão se levar em conta na seleção da localização

das plantas. As plantas móveis, por sua vez, são utilizadas, preferen-

cialmente, em zonas onde a quantidade de material a reciclar, ainda

que constante, não alcance grandes montantes. A emissão de pó

e a geração de ruído também devem ser controladas.

As usinas de reciclagem, tanto fixas quanto móveis, constituem

o espaço mais adequado à destinação do entulho e à produção

de agregados reciclados para confecção de materiais de constru-

ção. A primeira usina de reciclagem a ser implantada em Salvador

pela LIMPURB será uma planta fixa de primeira geração, com capa-

cidade de processar 200 toneladas a cada 8 horas de operação.

RECICLAGEM DE ENTULHO E ECONOMIANa economia de mercado, a reciclagem de entulho será atrati-

va quando o produto reciclado apresentar qualidade e preço com-

petitivo em relação aos materiais naturais. Essa situação ocorre

em regiões próximas aos centros urbanos, onde as reservas de

matérias-primas estão se esgotando, ou os custos de disposição

em aterros são elevados.

Com a reciclagem do entulho, pode-se fazer economia dos cus-

tos de transporte de matérias-primas para longas distâncias, além

dos custos de deposição final em aterros e transporte do entulho.

Nesse sentido, destacam-se projetos com grande geração de resí-

duos, como renovação de centros urbanos, recuperação de vias e

rodovias, reconstrução após desastres naturais ou tecnológicos,

etc. Os custos relativos ao transporte do entulho ao aterro e ao

fornecimento de matérias-primas podem tornar a reciclagem eco-

nomicamente viável. Além disso, os eventuais custos com

Page 160: Livro entulho bom

158CARACTERÍSITCAS DO ENTULHO E DO AGREGADO RECICLADO

remediação de impactos ambientais e disposição no aterro po-

dem aumentar ainda mais as vantagens econômicas da reciclagem.

Para utilizar resíduos como matéria-prima, em substituição aos

materiais tradicionais, é necessário que esse insumo alternativo apre-

sente padrões de desempenho compatíveis com a sua utilização. O

material reciclado (uma vez que atenda aos critérios de desempe-

nho) será mais consumido caso o seu preço seja menor que o do

agregado natural. Nos casos em que o material reciclado e o natural

têm o mesmo custo, o diferencial será a qualidade ou a confiabilidade

do produto e a utilização de instrumentos de marketing, como selos

verdes, de forma a garantir que o produto é ambientalmente correto.

A reciclagem também pode ser incentivada através de instru-

mentos legais que promovam o interesse econômico do uso do

material reciclado. O governo da Dinamarca, por exemplo, ele-

vou a taxa de deposição de material potencialmente reciclável

em aterros controlados, tornando a reciclagem economicamente

viável (Lauritzen, 1994).

É fundamental difundir usos adequados para os produtos

reciclados, além de identificar e fomentar obras públicas e priva-

das nas quais eles possam ser introduzidos como alternativa viá-

vel, em substituição aos materiais convencionais.

Diversos estudos indicam que a reciclagem de entulho pode

gerar agregados com custo inferior ao custo médio dos agrega-

dos convencionais. Além disso, a utilização de agregado reciclado

permite produzir componentes de construção que, dependendo

da sofisticação tecnológica, terão custos significativamente infe-

riores ao preço de componentes disponíveis no mercado. Em Belo

Horizonte, por exemplo, verificou-se uma economia de 22% na

execução da pavimentação asfáltica, e é estimada uma economia

de 50% na produção de blocos de vedação (Pinto, 1997).

Page 161: Livro entulho bom

159

EXPERIÊNCIA REALIZADACARACTERIZAÇÃO DO ENTULHO E DO AGREGADORECICLADO DE SALVADOR

Em Salvador, são coletadas 2746 t/dia de entulho, o que

representa cerca de 50% dos resíduos sólidos urbanos. Confor-

me apresentado no capítulo anterior, a LIMPURB, visando à

gestão adequada desse resíduo, está implantando o Projeto de

Gestão Diferenciada de Entulho de Salvador. Esse plano tem

como objetivo transformar o descarte clandestino de entulho

da cidade em deposição correta, através da adoção de uma po-

lítica ordenadora, com a remediação da degradação ambiental

gerada e a integração dos agentes envolvidos com a questão.

Esse programa inclui, inicialmente, a instalação de uma usi-

na de reciclagem, que irá processar cerca de 200 t/dia do entu-

lho gerado em Salvador, transformando esse resíduo em agre-

gado reciclado, a ser utilizado para a produção de materiais

de construção.

Os estudos que possibilitaram a caracterização do entulho e

do agregado reciclado de Salvador foram realizados através da

análise de suas características físicas, químicas, mecânicas e

ambientais. Segundo Lima (1999) a possibilidade de utiliza-

ção de um resíduo se avalia não somente do ponto de vista das

características técnicas necessárias a aplicação que se deseja, mas

também da perspectiva do possível impacto ambiental que

possa causar.

Na caracterização do entulho, alguns aspectos importantes fo-

ram considerados para o desenvolvimento da metodologia, como:

a amostragem, os processos de recebimento, homogeneização e

quarteamento da amostra, a análise de suas características físicas

e a seleção do entulho a ser britado.

EX

PE

RIÊ

NC

IA R

EA

LIZ

AD

A

Page 162: Livro entulho bom

160CARACTERÍSITCAS DO ENTULHO E DO AGREGADO RECICLADO

A determinação das características do agregado reciclado (miú-

do e graúdo), por sua vez, consistiu na execução de ensaios de

laboratório, visando a um melhor aproveitamento em sua utiliza-

ção na construção civil.

A identificação de aplicações para o agregado reciclado e a ava-

liação preliminar dos aspectos econômicos da sua utilização foram

atividades que complementaram o estudo das características dos

agregados reciclados de Salvador.

CARACTERIZAÇÃO DO ENTULHOA grande quantidade de entulho gerado, a sua composição he-

terogênea e a diversidade de fatores que influenciam nas suas

características (tipo de obra, período de amostragem, etc.) tor-

nam a caracterização do entulho uma atividade fundamental para

gestão e reciclagem desse resíduo.

Como indicado anteriormente, a caracterização do entulho de

Salvador foi desenvolvida pela LIMPURB, em parceria com o Pro-

jeto Entulho Bom, conforme previsto no Plano de Gestão Dife-

renciada de Salvador e nas atividades do referido projeto. A

metodologia empregada consistiu na amostragem, recebimento,

homogeneização, quarteamento da amostra e realização de en-

saios para caracterização qualitativa e quantitativa desse resíduo.

A Figura 1 apresenta o fluxograma da metodologia utilizada.

EX

PE

RIÊ

NC

IA

RE

AL

IZA

DA

Page 163: Livro entulho bom

161

EX

PE

RIÊ

NC

IA R

EA

LIZ

AD

A

FIGURA 1 - FLUXOGRAMA DA METODOLOGIA DA CARACTERIZAÇÃO DOENTULHO DE SALVADOR

Classificação do entulho por gerador(pequeno gerador e grande gerador) ➥

Classificação do entulho porpadrão de renda (baixo, médio e alto) ➥

Escolha da amostra inicial por geradore por padrão de renda ➥

Pré-dimensionamento daamostra inicial ➥

Escolha e preparodo local de recebimento ➥

Levantamento das condições de tempo(sol e chuva) ➥

Identificação, pesagem e proteçãoda amostra inicial ➥

Homogeneização, quarteamento eobtenção da amostra final ➥

Análise da amostra, registro eanálise dos dados

Page 164: Livro entulho bom

162CARACTERÍSITCAS DO ENTULHO E DO AGREGADO RECICLADO

A caracterização do entulho foi realizada no período de setem-

bro / outubro de 1999, no aterro de Canabrava (local de descarga do

entulho de Salvador). Foram coletadas e analisadas 16 amostras

de aproximadamente 10 toneladas, o que correspondeu a cerca de

155.000t de entulho, provenientes de diferentes áreas de coleta.

Cada uma das amostras foi reduzida a cerca de 500 kg. A quanti-

dade de entulho analisada correspondia, na época, a cerca de 10%

do entulho gerado por dia na cidade de Salvador, apresentando

nível de confiabilidade estatística de 95%, adequado para este es-

tudo (Cochran, 1978, citado por Castro, 1998).

Foram analisadas amostras de entulho similar ao que será aceito

na usina de reciclagem. Ou seja, amostras em que predominam

contaminantes como, por exemplo, matéria orgânica, podas e mis-

turas com outros resíduos não foram consideradas para este estu-

do, uma vez que remessas com predomínio desses materiais não

serão aceitas na usina de reciclagem.

Diversos métodos para obtenção da amostra final foram anali-

sados (Gomes, 1989; Andrade, 1992; Grossi, 1993; Castro, 1996;

Castro et al., 1998). Os vários métodos utilizados para se obter a

amostra final possuem alguns pontos em comum. O quarteamento

sucessivo da amostra inicial, como forma de redução do volume

inicial de resíduos, é um desses pontos. Contudo esses métodos di-

vergem quanto ao dimensionamento da amostra inicial, à forma de

recebimento, à homogeneização e ao tamanho da amostra final.

O processo de homogeneização e quarteamento para caracteri-

zação do entulho de Salvador consistiu, inicialmente, em descar-

regar, dos caminhões basculantes, cerca de 10 toneladas de entulho

(amostra inicial), numa área pré-determinada do aterro de Cana-

brava. Uma retroescavadeira, por sua vez, realizava a operação de

homogeneização, seguida de quarteamentos sucessivos, até a

EX

PE

RIÊ

NC

IA

RE

AL

IZA

DA

Page 165: Livro entulho bom

163

obtenção de uma amostra com cerca de 500kg de entulho, con-

forme fluxograma apresentado na Figura 2. Como foram analisa-

das 16 amostras, a quantidade de material total destinado à amostra

final correspondeu a aproximadamente 7 toneladas de entulho.

Nesse processo, o operador da pá carregadeira deverá ter o cui-

dado de não misturar a amostra com o solo, ou perder material

durante o processo de homogeneização e quarteamento. Além

disso, o pátio de homogeneização e quarteamento deve ter super-

fície plana (preferencialmente pavimentada) e possuir área sufi-

ciente para as manobras dos equipamentos e a formação das

pilhas das amostras.

FIGURA 2 - FLUXOGRAMA DO PROCESSO DE OBTENÇÃO DA AMOSTRA

FINAL

Os processos de obtenção da amostra final seguiram algumas

recomendações da NBR 10007. A norma de amostragem de resí-

duos da ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas) não foi

utilizada na íntegra, uma vez que os procedimentos da “amostra-

gem em montes ou pilhas” e “amostragem de resíduos sólidos

heterogêneos” não se mostraram adequados às características do

entulho. O amostrador de pilhas e os pontos de amostragem

EX

PE

RIÊ

NC

IA R

EA

LIZ

AD

A

Page 166: Livro entulho bom

164CARACTERÍSITCAS DO ENTULHO E DO AGREGADO RECICLADO

estabelecidos na norma são adequados para resíduos granulares.

O entulho, no entanto, é composto por elementos de dimensões

bastante distintas (alguns maiores que 50mm, outros menores

que 5mm).

Além disso, o método da ABNT para amostragem de resíduos

heterogêneos estabelece que elementos maiores que 28 mm de-

vem ser quebrados, o que descaracterizaria o material em estudo.

Por fim, a norma estabelece que a amostra a ser analisada deve ter

o volume de aproximadamente 5 litros, quantidade insignificante

para caracterizar adequadamente o entulho.

A análise da amostra final consistiu em determinar a massa unitá-

ria no estado solto, a composição granulométrica e a composição

do entulho, no intuito de avaliar as suas principais características.

A determinação da massa unitária no estado solto consistiu

em determinar a massa de entulho que ocupa o volume de um

tonel (cerca de 70 litros) previamente pesado. Para a realização

desse ensaio, um tonel foi preenchido de forma aleatória, sem

vibração e compactação, segundo as recomendações da NBR 7251

— “Agregado em estado solto. Determinação da massa unitária”.

Na determinação da granulometria a amostra final foi peneira-

da manualmente, em peneiras de 50mm, 25mm e 4,8mm, visan-

do à separação do entulho em diversas frações granulométricas.

Cada fração retida foi pesada e, ao final, foi obtida a distribuição

granulométrica do entulho bruto. Esse procedimento foi basea-

do nas recomendações NBR 7217 — “Agregado - Determinação da

composição granulométrica”.

A determinação da composição do entulho foi realizada através

de seleção manual do material de cada uma das frações obtidas no

peneiramento. Os elementos compostos com mais de um tipo de

material foram classificados conforme o material predominante.

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Page 167: Livro entulho bom

165

A separação dos materiais para a determinação da composição foi

realizada conforme os seguintes grupos:

1. solo e areia;

2. cerâmica branca;

3. cerâmica vermelha;

4. asfalto;

5. concreto e argamassa;

APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS

A média da massa unitária das 16 amostras de entulho de Sal-

vador é de 1.345 kg/m3. Isso significa que Salvador necessita de

um espaço de cerca de 2044 m3 por dia para depositar todo o

volume de entulho gerado diariamente (volume maior do que

uma piscina olímpica). Ou seja, necessita-se de um espaço signifi-

cativo para armazenar um material inerte e, em boa parte, passí-

vel de reutilização e reciclagem. Por sua vez, depositar o entulho

em locais considerados adequados, como aterros, gera custos ele-

vados. Além disso, são cada vez mais escassas as áreas para dispo-

sição, pois, com o crescimento populacional, essas áreas estão desa-

parecendo ou se tornando distantes, o que aumenta os custos

operacionais de transporte do resíduo.

O entulho de Salvador apresentou distribuição granulométrica

com predominância de elementos maiores que 50mm (Figura 3).

Por outro lado, as demais partículas desse resíduo encontram-se

bem distribuídas nas faixas granulométricas restantes.

A análise granulométrica enfocou tanto os aspectos relacionados

ao local de recebimento do entulho (Postos de Descarga de Entu-

lho - PDEs e Grande Gerador — depositado no aterro de Canabrava)

quanto o nível de renda do local de geração do entulho (baixo,

médio e alto), conforme classificação adotada pela LIMPURB.

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6. rocha;

7. concreto armado;

8. metais ferrosos;

9. gesso;

10. espuma, couro e tecido;

11. plástico e borracha;

12. papel e papelão;

13. madeira de construção;

14. outros materiais.

Page 168: Livro entulho bom

166CARACTERÍSITCAS DO ENTULHO E DO AGREGADO RECICLADO

FIGURA 3 - VALORES MÉDIOS DA DISTRIBUIÇÃO GRANULOMÉTRICA DO

ENTULHO DE SALVADOR, EM FUNÇÃO DA ORIGEM

De uma forma geral, os valores médios das distribuições granu-

lométricas apresentam resultados similares em função da origem.

Entretanto, a granulometria do entulho gerado em locais de baixa

e de média renda apresenta distribuição mais similar ao material

recebido pelos PDEs, confirmando a estratégia de atuação desses

postos em captar os resíduos de pequenas reformas e ampliações

(atividades típicas de baixa e média renda). Devido ao alto custo

de transporte ao aterro, esse entulho era antes lançado em terre-

nos baldios e cursos d’água. Com a criação dos PDEs e a aplicação

de medidas educativas, punitivas e corretivas, houve uma redu-

ção significativa da disposição clandestina na região de Salvador

(Empresa de Limpeza Urbana do Salvador, LIMPURB, 1999).

Por outro lado, a granulometria do entulho gerado em local de

alta renda apresenta características mais similares às do entulho

do grande gerador. Essa semelhança é compreensível, uma vez

que a maior parte do entulho enviado pelo grande gerador ao

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ria

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Page 169: Livro entulho bom

167

aterro corresponde aos resíduos do setor formal da construção ci-

vil, representado, principalmente, por obras em áreas de alta renda.

O entulho de Salvador, apesar da sua heterogeneidade, apresen-

ta, na sua composição, 94% de materiais com alto potencial para

reciclagem na construção civil (Figura 4), constituindo, assim, uma

jazida de matérias-primas passível de ser explorada.

FIGURA 4 - COMPOSIÇÃO MÉDIA DO ENTULHO DE SALVADOR

A maior parte do entulho de Salvador é composta por restos de

concreto e argamassa (53%). A quantidade de material cerâmico

produzido na região também é significativa (14%). Esses elemen-

tos, juntamente com as rochas (5%), correspondem a 72% do en-

tulho estudado. Esses materiais, após passarem por um processo

de britagem, podem produzir agregados graúdos com alto poten-

cial de utilização na construção civil.

Outra parte significativa desse entulho é composta por solo e

areia (22%). Após a britagem, essa quantidade será ainda maior.

Nesse sentido, devem ser desenvolvidos estudos visando a pro-

mover a utilização dessa fração do entulho. Os outros grupos de

materiais, juntos, correspondem a apenas 2% do entulho.

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Page 170: Livro entulho bom

168CARACTERÍSITCAS DO ENTULHO E DO AGREGADO RECICLADO

CARACTERIZAÇÃO DO AGREGADO RECICLADOA caracterização do agregado reciclado de Salvador, realizada

pelo projeto Entulho Bom, buscou definir parâmetros adequa-

dos ao seu emprego na produção de materiais de construção e

identificar aplicações que maximizassem sua utilização na cons-

trução civil.

A produção do agregado reciclado utilizado neste estudo foi

realizada em condições similares às do processo de uma usina de

reciclagem. O entulho foi fragmentado por um britador de man-

díbula e separado granulometricamente numa peneira vibratória.

Foram produzidos dois tipos de materiais com granulometrias

distintas, o agregado reciclado miúdo — material passante na pe-

neira 4,8 mm — e o agregado reciclado graúdo — material passante

na peneira 19 mm. A amostragem dos agregados seguiu os proce-

dimentos da NBR 7216.

Os ensaios de caracterização foram realizados nos Laboratórios

de Materiais de Construção, Geotecnia e Restauração do Depar-

tamento de Ciência e Tecnologia dos Materiais da Escola Politéc-

nica da UFBA e no CEPED — Centro de Pesquisa e Desenvolvimen-

to do Estado da Bahia. Consistiram na realização dos seguintes

ensaios: análise granulométrica (NBR 7181), limites de liquidez e

plasticidade (NBR 6459; NBR 7180), teor de materiais pulveru-

lentos (NBR 7219), massa específica (NBR 9776; NBR 6508; NBR

9937; Neville, 1997), massa unitária (NBR 7251), inchamento

(NBR 6467), absorção de água (NBR 9937; NBR 9777; Leite, 2001),

índice de forma (NBR 7809), abrasão Los Angeles (NBR 6465),

impurezas orgânicas (NBR 7220), teores de cloreto, nitratos e

sulfatos (Teutonico, 1988) e lixiviação e solubilização (NBR 10005;

NBR 10006; NBR 10004).

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Page 171: Livro entulho bom

169

APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS

A distribuição granulométrica do agregado reciclado miúdo

(Figura 5) e sua classificação — de acordo com a ABNT (NBR 6502),

ASTM - American Society for Testing Material (1980) e DNER

(Caputo, 1998) (Tabela 3) — indicam tratar-se de um material pre-

dominantemente constituído de areia (grossa, média e fina), com

baixo percentual de argila e silte (18% ABNT e 20% DNER). Esse

resultado constata que o agregado reciclado miúdo apresenta uma

classificação granulométrica arenosa.

FIGURA 5 - CURVA GRANULOMÉTRICA DO AGREGADO

RECICLADO MIÚDO

TABELA 3 - CLASSIFICAÇÃO GRANULOMÉTRICA DO AGREGADO

RECICLADO MIÚDO

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Diâmetro da peneira (mm)

Pedregulho

ANÁLISE GRANULOMÉTRICA

0%

Areia Grossa

Areia Média

Areia Fina

Silte

Argila

DNERABNT ASTM

0% 0%

0% 6% 10%

10% 31% –

72% 2% 70%

2% 47% 4%

16% 14% 16%

Page 172: Livro entulho bom

170CARACTERÍSITCAS DO ENTULHO E DO AGREGADO RECICLADO

Pela classificação da AASHTO — American Association of State

Highway and Transportation Officials (1978), o agregado reciclado

miúdo é classificado como A-2-4, ou seja, material grosso, com

menos de 35% de partículas passando pela peneira de 0,075mm,

Pela USCS — Unified Soil Classification System (Casagrande, 1998),

esse material é classificado como SM, ou seja, material grosso, com

quantidade apreciável de partículas finas, no entanto não plástico.

A distribuição granulométrica do agregado reciclado graúdo

indicou uma predominância de pedregulho para todas as classifi-

cações (ABNT, ASTM e DNER), notando-se, ainda, uma fração sig-

nificativa de areia grossa, média e fina (Figura 6 e Tabela 4). Além

disso, o percentual de silte e argila é bastante baixo, indicando

que esse agregado tem pouca quantidade de material fino.

FIGURA 6 - CURVA GRANULOMÉTRICA DO AGREGADO RECICLADO

GRAÚDO DE SALVADOR

Pela AASHTO (1978), o agregado reciclado graúdo é classifica-

do como A-2-4, ou seja, material grosso, com menos de 35%

passante pela peneira de 0,075mm. Pela USCS, esse material é clas-

sificado como GP-GM, ou seja, como pedregulho mal graduado a

pedregulho siltoso, significando que possui partículas finas (mais

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pa

ssa

Diâmetro (mm)

Page 173: Livro entulho bom

171

de 7% passante na peneira 0,075mm). Essa quantidade de finos não

é suficiente para afetar as propriedades de resistência, deformabi-

lidade e permeabilidade, na medida que essas características são

influenciadas a partir de teores acima de 12% (Casagrande, 1998).

TABELA 4 - CLASSIFICAÇÃO GRANULOMÉTRICA DO AGREGADO

RECICLADO GRAÚDO

O agregado reciclado miúdo não apresentou limites de liquidez

e plasticidade, ou seja, esse material não apresenta características

de plasticidade, mesmo possuindo cerca de 18% de silte e argila,

segundo a classificação da ABNT.

A determinação do teor de materiais pulverulentos para agrega-

dos foi realizada segundo as recomendações da NBR 7219. O agre-

gado reciclado miúdo apresentou 13,5% de material pulverulento,

enquanto que o agregado reciclado graúdo apresentou 3,3%.

A determinação da massa específica do agregado reciclado miú-

do pelo método do frasco de Chapman (NBR 9776) não se apre-

sentou adequado. Apesar de o agregado reciclado miúdo ter per-

manecido imerso durante 24h, uma parte do material ficou flu-

tuando na superfície da água, formando uma camada de espuma

com cerca de 5ml. O que provocou alteração do resultado do

ensaio. Já o método do picnômetro (NBR 6508) não apresentou

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Pedregulho

ANÁLISE GRANULOMÉTRICA

50%

Areia Grossa

Areia Média

Areia Fina

Silte

Argila

DNERABNT ASTM

59% 59%

9% 8% 13%

13% 18% –

22% 2% 21%

3% 11% 4%

3% 2% 3%

Page 174: Livro entulho bom

172CARACTERÍSITCAS DO ENTULHO E DO AGREGADO RECICLADO

dificuldade, e o resultado da massa específica obtida para o agre-

gado reciclado miúdo foi de 2,59g/cm3, valor similar, segundo

Neville (1997), à massa específica para agregados naturais (2,6g/

cm3 a 2,7g/cm3).

A determinação da massa específica do agregado reciclado

graúdo, realizada segundo a especificação NBR 9937, apresentou

algumas dificuldades, sendo necessária a repetição do ensaio até

a obtenção de resultados confiáveis. Uma das dificuldades en-

contradas nesse ensaio foi ocasionada pelas características do ma-

terial, que apresenta alta porosidade. Esses problemas foram tam-

bém detectados em ensaios laboratoriais realizados pela Universi-

dade Federal do Rio Grande do Sul (Leite, 2001). Dessa maneira,

buscou-se a adequada execução, através do método de ensaio do

picnômetro proposto por Neville (1997). Esse ensaio apresentou

resultados mais confiáveis que o método recomendado pela ABNT.

O ensaio de determinação da massa unitária no estado solto

(NBR 7251), por sua vez, tem grande importância, na medida que

esse parâmetro é utilizado quando os materiais são quantificados

em volume, procedimento rotineiro na maioria das obras reali-

zadas no Brasil. A massa unitária do agregado reciclado miúdo e

do agregado reciclado graúdo foram de 1,30g/cm3 e 1,07g/cm3,

respectivamente.

O inchamento é o fenômeno dado pela variação, em função da

umidade, do volume aparente que incide sobre a massa unitária.

Através da representação gráfica do inchamento do agregado reci-

clado miúdo de Salvador, pode-se perceber que, à medida que fo-

ram acrescentados maiores teores de água, os espaços entre as par-

tículas aumentaram, de modo que o volume total do agregado

reciclado cresceu, até que, quando saturado, seu volume tendeu a

decrescer (Figura 7).

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Page 175: Livro entulho bom

173

FIGURA 7 - REPRESENTAÇÃO GRÁFICA DO INCHAMENTO DO

AGREGADO RECICLADO MIÚDO

A absorção de água é uma das diferenças mais marcantes en-

tre agregado natural e agregado reciclado. Essa propriedade

depende da composição do entulho que gera o agregado

reciclado. Assim sendo, é necessário o ajuste na produção de

materiais de construção, em função desse fator, de modo a não

alterar, de maneira significativa, as propriedades físicas e mecâ-

nicas dos novos materiais.

A norma NBR 9937 prescreve o método de determinação da

absorção de água para agregados graúdos, e a norma NBR 9777

prescreve o método para determinação da absorção de água para

agregados miúdos. Entretanto, para agregados reciclados, não é

adequado utilizá-las, pois o material é composto por significativa

parcela de material passante na peneira 0,15 mm, o que prejudica

a utilização da norma para determinar sua absorção. Quando o

material é submerso em água, uma parte dos materiais finos se

dissolve, tornando a água turva e alterando a amostra. Além

disso, quando é seco com pano absorvente, parte da amostra é

absorvida (Leite, 2001).

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Umidade (%)

Page 176: Livro entulho bom

174CARACTERÍSITCAS DO ENTULHO E DO AGREGADO RECICLADO

Portanto, deve-se buscar um método que permita avaliar, de

forma adequada, a absorção de água do agregado reciclado. Nes-

se sentido, optou-se pelo método desenvolvido por Leite (2001),

que adota procedimentos similares aos da NBR 9937, utilizando-

se um recipiente com as partes superior e inferior revestidas por

uma tela de malha 0,075.

Esse método permitiu obter resultados confiáveis, os quais com-

provam que os agregados reciclados de Salvador apresentam al-

tos valores de absorção de água (10,4% para o agregado reciclado

graúdo e 8,2% para o miúdo), quando comparados com a faixa de

absorção de água de agregados naturais (entre 0,2 e 3,4%, segun-

do Neville, 1997).

O índice de forma do agregado graúdo reciclado com di-

mensão máxima característica superior a 9,5mm foi de 2,6.

Além disso, o agregado reciclado graúdo apresenta-se não

lamelar, com irregularidades e com textura superficial áspera

e porosa.

O ensaio de abrasão Los Angeles, por sua vez, que tem o obje-

tivo de avaliar o desgaste do material, indicou um coeficiente de

45% para o agregado reciclado graúdo.

No ensaio de determinação de impurezas orgânicas, cujo ob-

jetivo é a determinação colorimétrica de impurezas orgânicas

húmicas do material, não foi detectada a presença significativa

de impurezas orgânicas. Além disso, os teores de impurezas or-

gânicas encontrados para o agregado reciclado (tanto miúdo

quanto graúdo) se apresentaram em quantidade inferior à apre-

sentada pelos materiais convencionais da região de Salvador.

Os agregados reciclados não apresentaram nitratos em sua

composição mineral, o que indica a ausência de rejeitos sanitá-

rios no material.

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Page 177: Livro entulho bom

175

Tampouco foi detectada a presença de sulfatos nos agrega-

dos reciclados, o que indica a ausência de partículas de gesso,

as quais, se presentes, poderiam provocar fenômenos expansi-

vos em materiais à base de Cimento Portland. A concentração

desse componente em partícula finas é mais prejudicial do que

em partículas grossas, devido à maior reatividade do mate-

rial fino.

Os agregados reciclados apresentam teor de cloretos similar

ao apresentado por agregados naturais utilizados na região de

Salvador. A presença de cloretos indica a exposição do material

analisado à ação salina.

O risco de contaminação ambiental do agregado reciclado

miúdo e graúdo pode ser avaliado através de análises químicas

em que é verificada a presença de metais pesados, em extratos

obtidos de uma amostra submetida a condições de lixiviação e

de solubilização.

O ensaio de lixiviação, tem como objetivo identificar a concen-

tração de substâncias que se separam do material por meio de

lavagem e percolação. O ensaio de solubilização, por sua vez, iden-

tifica a concentração de substâncias solúveis em água presentes

no material.

A determinação da concentração de metais foi realizada por

espectrometria de emissão atômica, espectrofotometria de ab-

sorção atômica em chama, geração de hidretos e vapor a frio.

De uma forma geral, os resultados se apresentaram de acordo

com os respectivos limites máximos, permitidos para resíduos

sólidos pela NBR 10004 (Tabelas 6 e 7), indicando portanto, que

o agregado reciclado (miúdo e graúdo) não apresenta riscos à

saúde pública, no que se refere à possível liberação desses me-

tais pesados para o meio ambiente.

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Page 178: Livro entulho bom

176CARACTERÍSITCAS DO ENTULHO E DO AGREGADO RECICLADO

TABELA 6 - CONCENTRAÇÃO DE METAIS OBTIDA NO ENSAIO

DE LIXIVIAÇÃO

TABELA 7 - CONCENTRAÇÃO DE METAIS OBTIDA NO EXTRATO DO TESTE

DE SOLUBILIDADE

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LIXIVIAÇÃO (mg/l) NBR 10005

Arsênio

AGREGADORECICLADO

GRAÚDO

< 0,005 < 0,005 5,0

AGREGADORECICLADO

MIÚDO

LIMITE MÁXIMONBR 10004

Bário < 1,0 < 1,0 100,0

Cádmio < 0,02 < 0,02 0,5

Chumbo < 0,2 < 0,2 5,0

Cromo 0,2 0,2 5,0

Mercúrio < 0,001 < 0,001 0,1

Prata < 0,1 < 0,1 5,0

Selênio < 0,002 < 0,002 1,0

METAL

LIXIVIAÇÃO (mg/l) NBR 10006

Arsênio

AGREGADORECICLADO

GRAÚDO

< 0,005 < 0,005 0,05

AGREGADORECICLADO

MIÚDO

LIMITE MÁXIMONBR 10004

Bário 0,5 0,5 1,0

Cádmio < 0,002 < 0,002 0,005

Chumbo < 0,02 < 0,02 0,05

Mercúrio < 0,001 < 0,001 0,001

Prata < 0,05 < 0,01 0,05

Selênio < 0,002 < 0,002 0,01

METAL

Cobre < 0,02 < 0,026 1,0

Ferro < 0,2 < 0,2 0,3

Manganês < 0,02 < 0,02 0,1

Sódio 75,7 94,1 200,0

Zinco < 0,1 < 0,1 5,0

Page 179: Livro entulho bom

177

A síntese dos resultados obtidos na caracterização do agregado

reciclado se encontra na Tabela 8.

TABELA 8 - RESUMO DOS RESULTADOS DA CARACTERIZAÇÃO DO

AGREGADO RECICLADO

APLICAÇÕES DO AGREGADO RECICLADOAs características apresentadas tanto pelo entulho quanto pelo

agregado reciclado de Salvador confirmaram o grande potencial

de utilização desse material reciclado para a produção de materi-

ais de construção. Sua fração graúda apresentou potencialidade

de uso na produção de camadas de pavimentos e concreto não-

estrutural, enquanto sua fração fina apresentou potencialidade

para o uso em camadas de pavimentos, argamassas, tijolos e blo-

cos. Esses agregados podem ser utilizados, também, no nivela-

mento de terrenos, em cascalhamento de vias, estacionamentos

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MATERIAL

Materiais pulverulentos (%)

AGREGADORECICLADO

GRAÚDO

NBR 7219 13,5 3,3

AGREGADORECICLADO

MIÚDO

MÉTODO UTILIZADO

Massa Específica (g/cm3) NBR 6508 / Neville, 1997 2,59 2,19

Massa Unitária (g/cm3) NBR 7251 1,30 1,07

Absorção de água (%) Leite, 2001 10,4 8,2

Índice de forma NBR 7809 – 2,6

Abrasão (%) NBR 6465 – 45

Impurezas orgânicas NBR 7220 Mais clara Mais clara

ENSAIOS

Teor de cloreto Teutonico, 1988 Pequena quantidade Pequena quantidade

Teor de nitrato Teutonico, 1988 Ausência Ausência

Teor de sulfato Teutonico, 1988 Ausência Ausência

Lixiviação NBR 10005 / NBR 10004 Inerte Inerte

Solubilidade NBR 10006 / NBR 10004 Inerte Inerte

Page 180: Livro entulho bom

178CARACTERÍSITCAS DO ENTULHO E DO AGREGADO RECICLADO

e pátios, em projetos de drenagem, entre outras aplicações

na construção.

No Brasil, a utilização de agregados reciclados, obtidos através

de operação de britagem, por sua vez, vem demonstrando, na

prática, a viabilidade técnica desse tipo de atividade. Estudos re-

centes desenvolvidos em várias universidades (Poli — USP, Escola

de Engenharia de São Carlos, Unicamp) confirmam a potenciali-

dade de uso do agregado reciclado na produção de materiais de

construção (Pinto, 1997).

A utilização em base e sub-base ou revestimento primário para

pavimentação é a forma mais simples de aproveitamento do en-

tulho como agregado, por exigir processos de reciclagem menos

sofisticados. O entulho processado pode também ser utilizado

como agregado para concreto não estrutural, a partir da substi-

tuição dos agregados convencionais (areia e brita). A aplicação do

agregado reciclado na produção de concreto apresenta algumas

vantagens semelhantes às da pavimentação, além de apresentar a

possibilidade de melhorias no desempenho do concreto em rela-

ção aos agregados convencionais, quando se utiliza baixo consu-

mo de cimento. Após o peneiramento, os finos gerados na brita-

gem, por sua vez, podem ser encaminhados para a fabricação de

blocos ou argamassas. Sua disponibilidade e viabilidade econômi-

ca sugerem utilização em programas de construções populares,

assentamento ou mutirão.

É importante ressaltar que as tecnologias empregadas na pro-

dução desses materiais devem apresentar compatibilidade en-

tre as características das matérias-primas, os componentes ge-

rados e os usos a serem estipulados. Essas preocupações devem

estar presentes na fabricação de qualquer tipo de material

de construção.

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Page 181: Livro entulho bom

179

AVALIAÇÃO ECONÔMICAAlém da viabilidade tecnológica e das vantagens sociais e am-

bientais apresentadas neste capítulo, os aspectos econômicos são

de fundamental importância para possibilitar o uso de agregados

reciclados em substituição aos agregados convencionais. Nesse sen-

tido, o Projeto Entulho Bom realizou uma análise preliminar dos

custos da reciclagem do entulho, buscando estimar o valor do agre-

gado reciclado a ser produzido na usina de reciclagem de Salvador.

Estudos anteriores vêm demonstrando que o agregado reciclado

apresenta viabilidade econômica, quando comparado aos agrega-

dos naturais. De acordo com informações da Prefeitura de São Pau-

lo, na Usina de Itatinga, o custo do primeiro ano de operação foi de

R$ 5,10 por tonelada. Considerando os descontos e a amortiza-

ção do capital investido, o preço do agregado reciclado para ven-

da chegou a valores de cerca de R$ 6,70 por tonelada (Coelho;

Chaves; Djanikian, 1998).

Por sua vez, Brito Filho (1999) indica que o custo de reciclagem

do entulho em São Paulo varia entre R$ 4,00 a R$ 6,00 por tonela-

da, ou, aproximadamente, R$ 5,20 a R$ 7,80 por metro cúbico.

Comparando-se esses valores com o preço dos agregados natu-

rais na região de São Paulo (R$ 20,00/m3 segundo Brito Filho, 1999),

o agregado reciclado apresenta uma economia de até 67%.

Segundo Pinto (1999), o custo de reciclagem do entulho é de

R$ 5,00 por tonelada, valor que inclui os gastos com manutenção

e depreciação de equipamentos, provisão de água, energia, mão-

de-obra, serviços de remoção, amortização dos investimentos,

despesas administrativas, entre outros gastos. Vale ressaltar que o

valor indicado é uma referência geral, baseada em valores pratica-

dos em cidades do interior paulista, podendo, portanto, ser alte-

rado conforme peculiaridades locais.

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Page 182: Livro entulho bom

180CARACTERÍSITCAS DO ENTULHO E DO AGREGADO RECICLADO

Com base nessa referência, o Projeto Entulho Bom realizou uma

estimativa preliminar do custo do agregado reciclado a ser pro-

duzido pela usina de reciclagem, na qual foram inclusos os gastos

com a reciclagem, o transporte do material e os impostos. Essa

estimativa indicou um valor de cerca de R$ 10,00 por tonelada.

Ao se comparar esse valor ao preço médio dos agregados natu-

rais comercializados na região de Salvador (R$ 20,00 por tone-

lada, segundo Pinto, 1999), nota-se uma economia de cerca de

50% com o uso de agregado reciclado, em relação ao agregado

convencional.

O menor preço do agregado reciclado em relação ao agregado

natural possibilita a redução dos custos e, conseqüentemente, a

ampliação da oferta pública de infra-estrutura urbana e habitação

popular, promovendo, portanto, benefícios sociais.

Assim, diante desses dados, a reciclagem de entulho no Brasil

e, em especial, em Salvador, pode ser considerada uma atividade

bastante atrativa. As condições do mercado da região tornam viá-

vel a reciclagem desse material, restando aos gestores urbanos

induzir processos e incentivar os agentes ligados a esse tipo de

atividade, para que o meio técnico adote o uso desse material

alternativo, incorporando-o ao mercado da construção civil local.

Neste sentido, torna-se fundamental uma análise econômica do

mercado local sobre a viabilidade financeira da produção de agre-

gados e materiais de construção a partir do entulho, incluindo a

quantificação das vantagens para os diversos agentes envolvidos

no processo (gerador do resíduo, responsável pela reciclagem,

produtor de materiais de construção, usuário do produto, poder

público), a identificação de oportunidades ou dificuldades de

comercialização, entre outras análises que busquem fomentar a

reciclagem do entulho.

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Page 183: Livro entulho bom

181

CONCLUSÃOA caracterização do entulho e do agregado reciclado de Salvador

constituiu uma etapa fundamental nos estudos para redução, reuti-

lização e reciclagem, possibilitando identificar meios de maximizar

a sua utilização para a produção de materiais de construção.

Entretanto, características como composição e quantidade pro-

duzida do entulho variam ao longo do tempo e estão condicionadas a

parâmetros específicos da região geradora do resíduo. Sugere-se, por-

tanto, a caracterização sistemática do entulho e do agregado recicla-

do, para avaliar a variação das propriedades e, assim, garantir a otimi-

zação do processo de reciclagem e a qualidade do agregado reciclado.

Através da caracterização do entulho de Salvador, foi possível ve-

rificar que a maior parte desse material é composta por restos de

concreto, argamassa, cerâmicas e rochas (72%). Esses materiais, após

passarem por um processo de britagem, produzem agregados com

alto potencial de utilização em pavimentos e concretos. Além disso,

parte significativa desse entulho é composta por solo e areia (22%),

elementos cuja quantidade será ainda maior após a britagem.

Algumas aplicações que podem valorizar a utilização desse mate-

rial são: a produção de camadas de pavimentos, tijolos, blocos,

argamassas e concreto não estrutural.

A caracterização do agregado reciclado, por sua vez, indicou

que o agregado reciclado miúdo é um material predominante-

mente arenoso, com partículas finas não plásticas, enquanto que

o agregado reciclado graúdo é constituído, principalmente, de

pedregulhos não lamelares, com formas irregulares e textura mais

áspera e porosa que o agregado graúdo convencional.

Além disso, uma das diferenças mais marcantes entre o agre-

gado reciclado e o agregado convencional é a absorção de água.

Tanto o agregado reciclado miúdo quanto o graúdo apresentaram

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Page 184: Livro entulho bom

182CARACTERÍSITCAS DO ENTULHO E DO AGREGADO RECICLADO

altos percentuais de absorção de água, quando comparados à

faixa de absorção dos agregados convencionais. Assim, é reco-

mendado o ajuste do teor de água na produção dos materiais, de

modo a não alterar, de maneira significativa, as propriedades dos

novos materiais de construção.

Os resultados de lixiviação e de solubilidade do agregado reciclado

miúdo e graúdo se apresentaram dentro dos limites especificados

por norma, o que indica a inexistência de riscos ambientais no uso

do agregado reciclado. No entanto, apesar de o agregado reciclado

ser classificado como inerte, deverão ser realizados ensaios com-

plementares e sistemáticos, de modo a garantir o seu uso seguro

em relação ao potencial de riscos à saúde e ao meio ambiente.

Com base nos resultados obtidos, o Projeto Entulho Bom desen-

volveu linhas de pesquisas relativas ao uso do agregado reciclado

em camadas de bases e sub-bases de pavimentos, em tijolos de solo

estabilizado com cimento e em argamassas de revestimento, apre-

sentadas, respectivamente, nos capítulos VI, VII e VIII deste livro.

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NBR 6508 - Grãos de solo que passam na peneira 4,8 mm: determinação da

massa específica: método de ensaio. 1984.

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NBR 7181 - Solo: análise granulométrica: método de ensaio. 1984.

NBR 7216 - Amostragem de agregados: método de ensaio. 1987

NBR 7217 - Agregado: determinação da composição granulométrica:

método de ensaio. 1987.

Page 189: Livro entulho bom

187

NBR 7219 - Agregado: determinação do teor de materiais pulverulentos:

método de ensaio. 1987.

NBR 7251 - Agregado em estado solto: determinação da massa unitária:

método de ensaio. 1982.

NBR 7220 - Agregados: determinação de impurezas orgânicas de naturezas

húmicas em agregado miúdo: método de ensaio. 1987.

NBR 7809 - Agregado graúdo: Determinação do índice de forma pelo

método do paquímetro: método de ensaio. 1983

NBR 9776 - Agregados: determinação da massa específica em agregado

miúdo por meio do frasco de Chapman: método de ensaio. 1987.

NBR 9777 - Agregados: Determinação da absorção de água em agregados

miúdos: método de ensaio. 1987.

NBR 9937 - Agregados: Determinação da absorção e da massa específica de

agregado graúdo: método de ensaio. 1987.

NBR 10004 - Resíduos sólidos: classificação. 1987.

NBR 10005 - Lixiviação de resíduos: procedimento. 1987.

NBR 10006 - Solubilização de resíduos: procedimento. 1987.

NBR 10007 - Amostragem de resíduos: procedimento. 1987.

1 Publicação ABNT - Associação Brasileira de Normas Técnicas, Rio de Janeiro.

Alex Pires Carneiro - Engenheiro Civil, Mestrando em Engenharia Ambiental Urbana - UFBA,

Coordenador do Projeto Entulho Bom

Barbara Elizabete Correia Quadros - Arquiteta, Técnica da ASPLA / LIMPURB

Ana Maria Vieira de Oliveira - Arquiteta, Técnica da ASPLA / LIMPURB

Irineu Antônio Schadach de Brum - Engenheiro de Minas, Msc, Doutorando em Metalurgia

Extrativa - UFRGS, Professor DCTM/UFBA

Taís Santos Sampaio - Engenheira Civil, Pesquisadora do Projeto Entulho Bom

Elaine Pinto Varela Alberte - Estudante de Engenharia Civil - UFBA, Pesquisadora do Projeto

Entulho Bom

Dayana Bastos Costa - Estudante de Engenharia Civil - UFBA, Pesquisadora do Projeto

Entulho Bom

Page 190: Livro entulho bom

188USO DO AGREGADO RECICLADO EM CAMADAS DE BASE E SUB-BASE DE PAVIMENTOS

CAPÍTULO VI

Page 191: Livro entulho bom

189

Alex Pires Carneiro

Paulo César Burgos

Elaine Pinto Varela Alberte

USO DO AGREGADORECICLADO EM CAMADAS

DE BASE E SUB-BASEDE PAVIMENTOS

Page 192: Livro entulho bom

190USO DO AGREGADO RECICLADO EM CAMADAS DE BASE E SUB-BASE DE PAVIMENTOS

A utilização de entulho como agregado reciclado, em cama-

das de pavimentos urbanos, é uma das formas de reciclagem mais

difundidas para esse resíduo. Com a evolução das técnicas de

pavimentação, que vem permitindo o aprimoramento de várias

alternativas para a execução de pavimentos, têm-se desenvolvido

estudos sobre formas de aproveitamento do entulho, sobretudo

em camadas de base e sub-base de vias urbanas.

O aproveitamento do agregado reciclado na pavimentação apre-

senta diversas vantagens:

• utilização de quantidade significativa de material reciclado

tanto na fração miúda, quanto na graúda;

• simplicidade dos processos de execução do pavimento e de

produção do agregado reciclado (separação e britagem pri-

mária), contribuindo para a redução dos custos e a difusão

dessa forma de reciclagem;

• possibilidade de utilização dos diversos materiais componen-

tes do entulho (concretos, argamassas, materiais cerâmicos,

areia, pedras, etc.);

• utilização de parte do material em granulometrias graúdas

reduzindo o consumo de energia necessário para a recicla-

gem do entulho.

O agregado reciclado apresenta propriedades interessantes para

utilização na construção de pavimentos. Do ponto de vista geo-

técnico, é considerado um material não plástico, o que permite sua

utilização em locais com presença de água, por gerar pouca ou

nenhuma lama. Pode, ainda, ser utilizado como redutor de

plasticidade, contribuindo, assim, na estabilização de solos. Apre-

senta, também, expansibilidade baixa ou nula, ou seja, mesmo

sob saturação, não ocorre a expansão das camadas compactadas

(Triches & Kryckyj, 1999).

Page 193: Livro entulho bom

191

A reciclagem do entulho também representa vantagens econô-

micas para a administração pública municipal (Triches & Kryckyj,

1999), tais como:

• redução dos custos com a remoção do material depositado

clandestinamente ao longo das vias públicas, terrenos baldios,

cursos d’água e encostas;

• aumento da vida útil dos aterros sanitários, reduzindo a neces-

sidade de áreas para a implantação de novos aterros;

• diminuição nos custos de operação dos aterros sanitários,

pela exclusão do entulho;

• diminuição nos custos de pavimentação e infra-estrutura

urbana.

Além das vantagens oriundas do baixo custo, da simplicidade do

processo executivo e dos bons resultados obtidos em experiências

anteriores, deve-se considerar, também, a preservação do meio

ambiente gerada pela reciclagem desse material, uma vez que a

sua disposição inadequada causa vários problemas urbanos (alaga-

mentos, deslizamentos de encostas, doenças, entre outros). Essa

forma de reciclagem do entulho contribui, ainda, para a preserva-

ção dos recursos naturais, reduzindo a degradação ambiental cau-

sada pela extração das matérias-primas convencionais. Por fim, o

uso do agregado reciclado em pavimentos apresenta-se como al-

ternativa interessante para os administradores públicos aumenta-

rem a oferta de vias necessárias ao desenvolvimento urbano.

Desta forma, o Projeto Entulho Bom desenvolveu estudos bus-

cando avaliar o desempenho do uso do agregado reciclado de

Salvador em camadas de bases e sub-bases de pavimentos. Foi inves-

tigado o comportamento do agregado reciclado graúdo e miúdo,

tanto misturados entre si, quanto com solos típicos da região de

Salvador. Os materiais foram avaliados pelo método tradicional e

Page 194: Livro entulho bom

192USO DO AGREGADO RECICLADO EM CAMADAS DE BASE E SUB-BASE DE PAVIMENTOS

pelo método MCT (Miniatura, Compactado, Tropical). Os resulta-

dos obtidos permitiram comprovar a viabilidade técnica e econô-

mica do agregado reciclado na execução de pavimentos e, assim,

contribuir para a difusão desta forma de reciclagem.

CONSIDERAÇÕES GERAIS SOBRE PAVIMENTOSAs camadas do pavimento têm como função oferecer resistên-

cia aos esforços oriundos do tráfego, distribuindo-os convenien-

temente ao subleito, além de melhorar as condições de rolamento

e garantir comodidade e segurança ao usuário. Essas camadas,

componentes da estrutura de um pavimento, podem variar quan-

to à espessura ou aos materiais utilizados.

Neste capítulo, serão abordados aspectos referentes às cama-

das de base e sub-base que compõem um pavimento granular

flexível, uma vez que é bastante difundido o uso do agregado

reciclado nesse tipo de pavimento.

MATERIAIS

As sub-bases ou bases granulares são constituídas de solos, arei-

as, seixos, pedregulhos, produtos de britagem de rochas ou de

resíduos sólidos (entulho, escórias, entre outros). Essas camadas

também podem ser constituídas, quando adequadamente com-

pactadas, por combinações de materiais que apresentem estabili-

dade e durabilidade adequadas para resistir às cargas do trânsito

e à ação dos agentes climáticos.

O solo é um material de fundamental importância, pois, mesmo

não sendo utilizado na constituição das camadas do pavimento,

na maioria das vezes, compõe a camada de suporte da estrutura.

Em várias regiões do Brasil, predominam os solos tropicais, que

apresentam propriedades e comportamentos diferenciados dos

Page 195: Livro entulho bom

193

solos temperados, devido à atuação de processos geopedoló-

gicos típicos de regiões tropicais úmidas. Para que um solo seja

classificado como tropical, não basta que tenha se formado numa

região desse clima. É essencial que apresente as peculiaridades

inerentes aos solos tropicais, caracterizados por apresentar dois

comportamentos predominantes (Nogami & Villibor, 1995):

• comportamento laterítico — que caracteriza, pedologicamente,

uma variedade de solo superficial pedogenético, típico das regiões

tropicais úmidas, podendo ser tanto residual quanto transportado;

• comportamento saprolítico — que é resultante da decompo

sição e/ou degradação in situ da rocha que deu origem ao

solo, cuja estrutura é mantida; assim, solos com comportamento

saprolítico são considerados genuinamente residuais.

Os agregados são elementos importantes no estudo de bases e

sub-bases, por corresponderem a mais de 90% do peso das diversas

misturas utilizadas em pavimentos. Podem ser classificados, inicial-

mente, em agregados naturais e artificiais:

• naturais — são agregados utilizados como se encontram na

natureza, salvo os procedimentos de britagem e lavagem, sen-

do a areia, a brita e o pedregulho seus exemplos mais comuns;

• artificiais — são agregados que se originam de alterações fí-

sicas e químicas de outros materiais, a exemplo do entulho,

da escória de alto forno, da argila expandida, entre outros.

PROPRIEDADES E ESPECIFICAÇÕES DOS MATERIAIS

Os solos e os agregados empregados na pavimentação devem

apresentar determinadas propriedades, para que possam ser uti-

lizados em bases, sub-bases ou reforços de subleito.

GRANULOMETRIA

Os solos e agregados são constituídos de partículas de diferentes

dimensões em proporções variadas. A determinação da dimensão

Page 196: Livro entulho bom

194USO DO AGREGADO RECICLADO EM CAMADAS DE BASE E SUB-BASE DE PAVIMENTOS

dessas partículas e das suas respectivas percentagens de ocorrên-

cia permite obter a sua distribuição granulométrica, ou seja, a dis-

tribuição percentual da massa que determinadas faixas de tama-

nho de grãos, especificadas pela NBR 7181, representam em rela-

ção à massa seca total. Através da representação gráfica desse re-

sultado, é obtida a curva granulométrica, cuja finalidade principal

é classificar texturalmente um solo ou agregado.

O sistema de classificação de solos e agregados proposto pela

AASHTO — American Association of State Highway and Transpor-

tation Officials (1978) — utiliza a curva granulométrica para avaliar

e classificar o material de acordo com sua aplicação (vias secundá-

rias, aterros, subleitos, bases e sub-bases de pavimentos flexíveis,

entre outros). O Índice de Grupo é um parâmetro utilizado no auxílio

dessa classificação, que depende dos resultados obtidos nos ensaios

de granulometria e de limites de consistência.

A distribuição granulométrica também permite calcular, atra-

vés da fórmula de Hazen, o coeficiente de permeabilidade do ma-

terial — capacidade drenante da amostra —, constituindo um

parâmetro complementar para a análise de desempenho de ma-

teriais para pavimentos.

A curva granulométrica de um solo ou agregado pode se apre-

sentar sob duas formas típicas: granulometria contínua e granulo-

metria descontínua.

Na granulometria contínua, estão presentes todos os tama-

nhos das partículas de um determinado intervalo granulométrico.

Isso permite que os grãos menores do material se encaixem nos va-

zios intergranulares dos maiores, constituindo, assim, um materi-

al bem compactado, ou seja, mais resistente e menos deformável.

A granulometria descontínua, por sua vez, apresenta-se quando

há uniformidade no tamanho dos grãos ou deficiência significativa

Page 197: Livro entulho bom

195

de uma faixa de diâmetro de grãos presentes no material. Essas

características impedem que os grãos se encaixem adequadamente

entre si, proporcionando, assim, um material mal graduado.

As especificações para materiais de base e sub-base de pavimen-

tos estabilizados granulometricamente são apresentadas pela NBR

11804, a qual indica a necessidade de a curva granulométrica ser contí-

nua e se enquadrar nas faixas granulométricas nela especificadas.

Ainda segundo essa norma, para a execução de camadas estabili-

zadas granulometricamente, a porcentagem de material que passa

pela peneira de 0,075 mm deve ser inferior a 2/3 da porcentagem

que passa pela peneira de 0,42 mm.

LIMITES DE CONSISTÊNCIA OU DE ATTERBERG

A influência das frações finas de um material não é definida ape-

nas pela granulometria, pois suas propriedades dependem também

do teor de umidade, da esfericidade, do arredondamento e da com-

posição química e mineralógica das partículas. Nesse sentido, os

ensaios de Limites de Consistência ou Limites de Atterberg (NBR 6459;

NBR 7180) são comumente utilizados na avaliação do material, obje-

tivando o estudo de seus diferentes estados em presença da água.

Nos ensaios de consistência, são obtidos os limites de liquidez

e de plasticidade, bem como o índice de plasticidade. O limite de

liquidez permite identificar a umidade de transição entre os esta-

dos líquido e plástico de um determinado material. Já o limite de

plasticidade indica a umidade de transição entre o estado plástico

e o semi-sólido. Por fim, o índice de plasticidade é obtido pela

diferença entre esses dois limites.

A NBR 11804 estabelece, para a execução de base e sub-base de

pavimentos, valores máximos admissíveis para o limite de liquidez

(< 25%) e o índice de plasticidade (< 6%), buscando evitar a per-

da de suporte ou a expansão excessiva da camada do pavimento.

Page 198: Livro entulho bom

196USO DO AGREGADO RECICLADO EM CAMADAS DE BASE E SUB-BASE DE PAVIMENTOS

Esses comportamentos são causados, geralmente, pelo aumento

de umidade ou pela infiltração de água, após o término da cons-

trução do pavimento.

EQUIVALENTE DE AREIA

O equivalente de areia é um ensaio que indica o teor de areia em

relação à fração argila presente em um material. Consiste na relação

volumétrica dada pela razão entre as alturas do nível superior da

areia e da suspensão argilosa de uma amostra de solo ou de agregado

miúdo, numa proveta, em condições estabelecidas pela NBR 12052.

A análise dessa propriedade passou a ser utilizada por algumas

instituições, no auxílio à estabilização de solos com agregados,

especialmente em solos agregados pobres em finos argilosos e/ou

siltosos (Nogami & Villibor, 1995).

A NBR 11804 estabelece que materiais para base e sub-base de

pavimentos devem apresentar equivalente de areia superior a 30%.

ABRASÃO LOS ANGELES

O ensaio de Abrasão Los Angeles tem o objetivo de avaliar o des-

gaste do material quando submetido a ações de impacto e de atrito.

A NBR 6465, que apresenta o ensaio para determinação dessa pro-

priedade, indica que a interpretação dos resultados deve conside-

rar a origem do material, sua estrutura mineralógica e a respectiva

aplicação. O valor máximo estabelecido pela NBR 11804 para base e

sub-base de pavimentos é de 55% de perda de material. Entretanto,

a AASHTO (1978) permite a utilização de agregados que possuam

Índice de abrasão Los Angeles superiores, nos casos em que a ex-

periência tem demonstrado comportamento adequado por parte

desse material. No Brasil, tem-se muitas vezes preferido, no caso de

materiais degradáveis, determinar as características após um certo

número de moldagens e remoldagens, no ensaio de determinação

de Índice de Suporte Califórnia (Souza, 1980).

Page 199: Livro entulho bom

197

MASSA ESPECÍFICA SECA MÁXIMA E UMIDADE ÓTIMA

A compactação é um método de estabilização obtido pela trans-

ferência de energia a solos e agregados, através de processos ma-

nuais ou mecânicos (impacto, vibração, compressão estática ou dinâ-

mica). Esses processos atuam conferindo ao material maior massa

específica seca máxima (massa do metro cúbico de material sujeito

a uma determinada compactação), aumentando sua resistência ao

cisalhamento e diminuindo o seu índice de vazios, sua permeabili-

dade e sua compressibilidade.

Através do ensaio de compactação descrito na norma NBR 7182,

é possível correlacionar o teor de umidade e a massa específica seca

do material. Essa relação é obtida ao se aumentar o teor de umida-

de do material para cada estado de compactação. A massa específi-

ca da amostra crescerá até um limite máximo, para, então, decrescer.

O teor de umidade correspondente ao valor de massa específica

seca máxima é, então, o que se denomina de teor de umidade ótima

e equivale ao teor de umidade do material, que proporciona ao

pavimento maior estabilidade.

O ensaio de compactação pode ser realizado utilizando-se diferen-

tes energias (Proctor Normal, Intermediário e Modificado). Quanto

menor a energia de compactação empregada, menor será o valor

do teor de umidade ótima, e maior será o valor de massa específica

seca máxima. A escolha da energia é feita em função do uso que será

dado ao material analisado.

ÍNDICE DE SUPORTE CALIFÓRNIA

Através desse ensaio (NBR 9895), é possível conhecer, anteci-

padamente, a expansão do material constituinte de um pavimen-

to submetido a um processo de saturação. O Índice de Suporte

Califórnia (CBR - California Bearing Ratio) expressa as caracterís-

ticas de deformabilidade e de resistência do material submetido a

carga estática, em condições saturadas.

Page 200: Livro entulho bom

198USO DO AGREGADO RECICLADO EM CAMADAS DE BASE E SUB-BASE DE PAVIMENTOS

Esse ensaio permite avaliar o desempenho dos materiais para

leito, subleito, sub-bases e bases de pavimentos. Segundo a NBR

11804, os valores exigidos, nesse ensaio, são de CBR maior ou igual

a 60% e expansão menor ou igual a 0,5%, para bases de pavimentos

(N<5x106), e CBR maior ou igual a 20% e expansão menor ou igual

a 1%, para sub-bases.

DEGRADAÇÃO

O ensaio de degradação tem como objetivo analisar o compor-

tamento do material em função do desgaste sofrido durante a

compactação. O procedimento desse ensaio é baseado no artigo

“Estudos dos solos lateríticos: índice de degradação e sua influência

na compactação e I.S.C” (Macêdo; Lima; Costa, 1986). Consiste na

análise das características granulométricas das misturas obtidas, com

a realização de ensaios de granulometria antes e depois do proces-

so de compactação. O índice de degradação é obtido através do

deslocamento médio da curva granulométrica da amostra degrada-

da pelo ensaio de compactação, em relação à amostra inicial, e apre-

senta-se como um parâmetro para avaliação, em laboratório, do de-

sempenho de materiais compactados. Segundo Macêdo; Lima; Costa

(1986), o valor crítico do índice de degradação ocorre quando a

curva granulométrica ultrapassa os limites especificados para a faixa

adotada, ou quando é possível identificar uma brusca inflexão da

curva granulométrica, causada por uma fratura mais significativa de

certo tamanho de partículas.

DIMENSIONAMENTO DE PAVIMENTOSDa mesma forma que em pavimentos convencionais, os pavimen-

tos que utilizam agregado reciclado deverão adotar procedimen-

tos de determinação das propriedades dos materiais, visando ao

dimensionamento e ao controle da execução.

Page 201: Livro entulho bom

199

MÉTODOS TRADICIONAIS

Com relação ao dimensionamento de pavimentos flexíveis, o mé-

todo empírico da HRB (Highway Research Board, também conheci-

do como método de Índice de Grupo), baseado na granulometria,

índice de plasticidade e limite de liquidez dos materiais, foi, duran-

te muito tempo, empregado no Brasil. Segundo Bodi; Brito Filho;

Almeida (1995), esse método, desenvolvido para regiões de climas

temperados, não se adapta aos solos tropicais, pois, eventualmen-

te, superdimensiona pavimentos executados com solos lateríticos

e subdimensiona pavimentos executados com solos saprolíticos.

Devido a isso, o método mais utilizado no Brasil é o do Índice

de Suporte Califórnia (ISC). Este método fornece a espessura de

material granular necessária para evitar a deformação plástica ou a

ruptura por cisalhamento da camada de subleito, durante a vida útil

do pavimento (Bodi; Brito Filho; Almeida, 1995).

MÉTODO MCT (MINIATURA, COMPACTADO, TROPICAL)Essa metodologia foi desenvolvida, inicialmente, com a intro-

dução do ensaio de Mini-CBR para solos tropicais, com base no

procedimento desenvolvido pelo Iowa State University. Posterior-

mente, foi ampliada, sobretudo para possibilitar o melhor apro-

veitamento de solos arenosos finos lateríticos em pavimentação,

considerando a capacidade de suporte em várias condições (inclu-

sive sem imersão em água) e outras propriedades consideradas

relevantes, tais como contração, permeabilidade e infiltrabilidade

(Nogami & Villibor, 1995).

A classificação geotécnica MCT, desenvolvida por Nogami &

Villibor (1981) especificamente para fins rodoviários, surgiu em

virtude das limitações dos procedimentos tradicionais de caracte-

rização e classificação dos solos tropicais, com o propósito de

corrigir as discrepâncias do método tradicional.

Page 202: Livro entulho bom

200USO DO AGREGADO RECICLADO EM CAMADAS DE BASE E SUB-BASE DE PAVIMENTOS

Vargas (1982) comenta que a ambigüidade da classificação tradi-

cional, quando aplicada aos solos tropicais, vem sendo constantemen-

te denunciada por vários autores, destacando-se Villibor e Nogami.

A classificação MCT constitui o exemplo mais bem sucedido das

novas propostas que enfocam adequadamente as características e

peculiaridades dos solos desenvolvidos em ambiente de clima tro-

pical (Burgos, 1997).

Esse método utiliza dois conjuntos de ensaios, um para a classi-

ficação do solo quanto ao comportamento laterítico e não laterítico

(Mini-MCV e associados) e o outro para a determinação das proprie-

dades mecânicas e hidráulicas (Mini-CBR e associados). Utilizam-se,

também, dois procedimentos diferentes de compactação: o mé-

todo Mini-MCV e o método Mini-Proctor, ambos compactados em

corpos de prova de dimensões reduzidas (Mini ou Subminiatura),

desenvolvidos especialmente para o estudo de solos tropicais.

MINI-MCV E ASSOCIADOS

O método Mini-MCV consiste na compactação, em diferentes

umidades, de mini corpos de prova, submetidos a energias suces-

sivamente crescentes, até o momento em que seja identificada a

falta de densificação do material. Após o término desse ensaio,

é obtida uma família de curvas de compactação. Através da ava-

liação de alguns índices característicos obtidos a partir da aná-

lise dessas curvas (coeficiente e’, coeficiente c’, entre outros),

é possível identificar as características lateríticas ou saprolíticas

do material.

Nesse processo, está inclusa a realização do ensaio de Perda de

Massa por Imersão (Pi), cujo objetivo é avaliar o efeito da imersão

em água de solos tropicais compactados e, conjuntamente com o

ensaio de Mini-MCV, classificar o material analisado quanto às suas

propriedades lateríticas ou saprolíticas.

Page 203: Livro entulho bom

201

MINI - CBR E ASSOCIADOS

Esse ensaio tem o objetivo de determinar o índice de suporte

Mini-CBR de corpos de prova compactados em laboratório, além de

determinar a expansão desse material, por imersão em água, e a con-

tração, por secagem ao ar. O procedimento de compactação Mini-

Proctor, utilizado nesse ensaio, é caracterizado por apresentar teor

de umidade que varia em torno da umidade ótima de compactação

do material e energia constante (Normal ou Intermediária).

UTILIZAÇÃO DE AGREGADO RECICLADOEM PAVIMENTOS

A utilização de resíduos de construção reciclados em várias das

camadas dos pavimentos tem-se mostrado viável na base tecnoló-

gica existente. Em várias cidades do Brasil (São Paulo, Belo Hori-

zonte, Ribeirão Preto, entre outras) e no exterior, tem-se utilizado

agregados reciclados em pavimentação, e seus resultados satisfa-

tórios vêm demonstrando a boa adequação desse material.

As experiências realizadas em países desenvolvidos vêm consoli-

dando o uso de agregado reciclado como material para nivelamento

de terrenos, para drenagem e para a sub-base de vias e estradas

(Hansen, 1996 citado por Pinto, 1999). Países em desenvolvimen-

to, como o Brasil, recentemente iniciaram suas experiências com

a reciclagem desse resíduo em pavimentação (Pinto, 1998).

A Prefeitura Municipal de São Paulo, pioneira no Brasil nesse

tipo de reciclagem, implantou, em 1991, a primeira usina de reci-

clagem do Hemisfério Sul, conhecida como usina de Itatinga. Essa

usina passou algum tempo desativada, voltando ao funcionamen-

to com produção abaixo do seu potencial máximo de 700 m3 de

agregado reciclado por dia (Laterza, 1998).

Page 204: Livro entulho bom

202USO DO AGREGADO RECICLADO EM CAMADAS DE BASE E SUB-BASE DE PAVIMENTOS

Essa experiência comprovou o potencial de reciclagem dos re-

síduos de construção. Em regime de plena utilização, o custo do

material produzido na usina de reciclagem chegou a ser 20 a 30%

do preço de mercado da pedra britada (Camargo, 1995).

Os estudos sobre o uso de agregado reciclado em obras de pavi-

mentação, desenvolvidos por técnicos da Usina de Asfalto da Pre-

feitura Municipal de São Paulo, basearam-se em metodologias ade-

quadas às características específicas dos solos tropicais típicos da

região estudada (solo laterítico e solo saprolítico). Os resultados

indicaram que, ao se utilizar o agregado reciclado em substituição

ao agregado convencional, foi possível reduzir a quantidade de

material necessário para atingir a mesma capacidade de suporte

(Pinto, 1998).

As pesquisas desenvolvidas nessa região mostraram ainda que,

em misturas de solo e agregado reciclado, a estabilização da ca-

mada com utilização de solo laterítico apresentou resultados

satisfatórios, com baixas adições de resíduo reciclado (20 a 30 %),

produzindo, assim, expressiva elevação da capacidade de suporte

(aumento de até 100% do CBR). No caso das misturas de solo e

agregado natural, houve aumento de suporte apenas para as adi-

ções a partir de 40%. Comportamento similar foi verificado com

adição do agregado reciclado aos solos saprolíticos (Bodi; Brito

Filho; Almeida, 1995).

Além dos bons resultados do CBR, foi verificado que o resíduo de

construção reciclado, sendo material não expansivo, ao ser adicio-

nado ao solo, contribui para a redução da taxa de expansão da mistu-

ra. A massa específica do material praticamente não se altera com a

mistura, diminuindo, assim, a possibilidade de segregação dos ma-

teriais. Os teores de umidade ótima do agregado reciclado também

apresentaram comportamento similar ao do solo, simplificando o

Page 205: Livro entulho bom

203

processo de execução da camada do pavimento, por possibilitar me-

lhor homogeneização dos materiais e menor dispersão da umidade

para qualquer teor da mistura solo / agregado reciclado (Pinto, 1998).

Em Belo Horizonte, desde 1993, a Prefeitura desenvolve um

programa de reciclagem de resíduos de construção que contem-

pla a instalação de quatro estações de reciclagem (duas já em fun-

cionamento), além de um amplo trabalho de fiscalização e edu-

cação ambiental. A Prefeitura, através da Superintendência de

Limpeza Urbana — SLU, visa à reciclagem de cerca de 8.800 t/mês

de resíduos, com produção de 5.500 m3 de agregados reciclados

(Pinto, 1995). O material reciclado nas usinas em operação tem

sido utilizado, principalmente, na execução de sub-bases e trata-

mentos primários de vias públicas em obras de órgãos da Prefei-

tura, entre os quais se destaca a SUDECAP — Superintendência de

Desenvolvimento da Capital.

Há, também, o exemplo do município de Ribeirão Preto, que,

com mais de 500 mil habitantes, produz cerca de 970 t/dia de

entulho. Sua usina de reciclagem de entulho, com capacidade de

reciclar 200 t/dia de material, entrou em operação no final de 1996.

Os agregados reciclados são produzidos sob a forma de bica cor-

rida e são destinados, em sua maioria, para recuperação de vias

públicas sem pavimentação asfáltica (Laterza, 1998).

Verifica-se, portanto, o grande potencial de utilização dos resí-

duos de construção civil na execução de camadas de pavimentos.

Esse potencial já é conhecido pelos gestores urbanos, sendo usu-

al, em várias cidades brasileiras, o lançamento de entulho bruto

para a regularização de camadas de vias periféricas e a manuten-

ção de condições mínimas de tráfego.

Apesar de as experiências realizadas em muitas cidades se mos-

trarem satisfatórias, as condições nas quais foram executadas e o

Page 206: Livro entulho bom

204USO DO AGREGADO RECICLADO EM CAMADAS DE BASE E SUB-BASE DE PAVIMENTOS

desempenho dos materiais utilizados apresentam variações signi-

ficativas, de acordo com cada região, o que indica a necessidade

de estudos regionais para a comprovação da viabilidade da utili-

zação do agregado reciclado ou do entulho bruto na execução de

pavimentos (Carneiro et al, 2000a).

EXPERIÊNCIA REALIZADAUSO DO AGREGADO RECICLADO DESALVADOR EM CAMADAS DE BASEE SUB-BASE DE PAVIMENTOS

Com a implantação, a partir de 1997, do projeto de gestão dife-

renciada do entulho de Salvador, promovido pela LIMPURB (apre-

sentado no capitulo IV), a partir da implantação da usina de reci-

clagem serão produzidos cerca de 200 t/dia de agregado reciclado.

Para viabilizar o uso desse material, foram desenvolvidos estu-

dos laboratoriais, pelo Projeto Entulho Bom, sobre o uso do agre-

gado reciclado de Salvador em pavimentos. Esses estudos buscam

contribuir para o aumento da oferta de pavimentação de vias ne-

cessárias à expansão urbana e à fundamentação do meio técnico /

empreiteiro a respeito dessa forma de reciclagem.

A avaliação da viabilidade do uso do agregado reciclado de Sal-

vador, em camadas de base e sub-base de pavimentos, consistiu na:

• determinação das características físicas dos solos e do agre-

gado reciclado de Salvador para utilização em base e sub-base

de pavimentos;

• avaliação das propriedades físicas e mecânicas dos materiais

produzidos;

• identificação das proporções mais adequadas dos materiais e

análise das diferentes situações em que é viável a utilização do

agregado reciclado de Salvador em pavimentação, de modo

que suas propriedades sejam maximizadas para esse uso.

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IZA

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Page 207: Livro entulho bom

205

MATERIAIS UTILIZADOSForam utilizados dois solos geneticamente distintos e típicos

da região de Salvador: um solo de comportamento laterítico, pro-

veniente da formação Barreiras, classificado pedologicamente

como latossolo amarelo de textura arenosa, e um solo de com-

portamento não laterítico, do horizonte pedológico C saprolítico,

de rocha metamórfica de fácil granulito.

Foi utilizado, também, entulho de Salvador reciclado (britado e

classificado) nas frações agregado reciclado miúdo (material pas-

sante na peneira 4,8 mm) e agregado reciclado graúdo (material

passante na peneira 19 mm).

As características e a classificação AASHTO — American Association

of State Transportation Highway Officials (1978) dos materiais

utilizados estão apresentados resumidamente, na Tabela 1.

TABELA 1 - CARACTERÍSTICAS DOS MATERIAIS UTILIZADOS

PROPRIEDADES

Massa específica dos sólidos

Abrasão Los Angeles

Massa unitária

Equivalente de areia

Índice de plasticidade

Limite de plasticidade

Limite de liquidez

Classificação AASHTO /HRB (Índice de grupo)

Coeficiente depermeabilidade

AnáliseGranulométrica

Pedregulho

Areia

Silte

Argila

AASHTO /HRB

Hazen

NBR 7181

NBR 6459

NBR 7180

NBR 7180

MÉTODOUTILIZADO

NBR 12052

NBR 7251

NBR 6508

NBR 6465

UNIDADESOLO

LATERÍTICO

g/cm3

%

g/cm3

%

%

%

%

%

%

%

A-2-4 (0)

19

1

80

0

20

5

15

14

1,27

2,59

SOLOSAPROLÍTICO

A-7-5 (15)

38

30

32

0

62

42

20

2

1,05

2,65

A-2-4 (0)

16

2

82

0

NL

NP

68

1,30

2,59

AG. REC.MIÚDO

AG. REC.GRAÚDO

A-2-4 (0)

2,22x10 -2

3

3

44

50

1,07

2,19

45

%

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LIZ

AD

A

Page 208: Livro entulho bom

206USO DO AGREGADO RECICLADO EM CAMADAS DE BASE E SUB-BASE DE PAVIMENTOS

O agregado reciclado miúdo e o agregado reciclado graúdo são

predominantemente constituídos de areia (grossa, média e fina)

e pedregulho, respectivamente, ambos apresentando baixos

percentuais granulométricos de argila e silte. Esse resultado

indica que o agregado reciclado apresenta-se como material ade-

quado para ser utilizado em base e sub-bases de pavimentos

(Carneiro et al, 2000b).

O agregado reciclado miúdo apresenta limites de consistên-

cia e equivalente de areia de acordo com as especificações da

NBR 11804. Devido à ausência de plasticidade, o agregado

reciclado apresenta comportamento adequado para a estabili-

zação de solos plásticos, como é o caso do solo saprolítico uti-

lizado neste trabalho. Suas características granulométricas e

seu coeficiente de permeabilidade também indicaram a possi-

bilidade de utilização desse material na execução de camadas

drenantes de pavimentos, ou em locais onde o lençol freático

é elevado.

O agregado reciclado graúdo apresentou 45% de desgaste no

ensaio de abrasão Los Angeles. Esse material atendeu às es-

pecificações da NBR 11804 para sub-base e base de pavimentos

(< 55%).

As proporções dos materiais adotadas neste estudo e apre-

sentadas na Tabela 2 foram definidas com o objetivo de anali-

sarem-se diferentes situações que permitam a utilização de agre-

gado reciclado na execução de camadas de base e sub-base.

As amostras que continham apenas solo (Am 0 e Am 1) servi-

ram de referência para a análise das demais amostras. Esse pro-

cedimento permitiu analisar e comparar o comportamento do

agregado reciclado, bem como o comportamento da sua mistu-

ra com dois solos típicos da região de Salvador.

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IZA

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Page 209: Livro entulho bom

207

TABELA 2 - PROPORÇÕES E MATERIAIS AVALIADOS

MÉTODOS DE AVALIAÇÃOOs métodos utilizados para avaliação das propriedades dos

materiais foram baseados em normas técnicas da ABNT — Asso-

ciação Brasileira de Normas Técnicas, procedimentos consolida-

dos no meio técnico e métodos específicos para a análise dos

solos tropicais. Assim, a caracterização e a avaliação dos materiais

foram realizadas de acordo com o Método Tradicional e MCT.

A avaliação pelo método tradicional visou à análise das pro-

priedades dos materiais e à compreensão do seu comportamen-

to mecânico. Além dos ensaios de caracterização dos materiais,

foram realizados ensaios para avaliação das misturas estudadas:

distribuição granulométrica (NBR 7181), compactação na energia

� proporção em massa de agregado reciclado graúdo na mistura

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IA R

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IDENTIFICAÇÃO DA AMOSTRA

Solo Laterítico

MATERIAIS

0

PROPORÇÃO EM MASSA DEAG. REC. NA MISTURA (%)

Am 0

Am 1

Am 2

Am 3

Am 4

Am 5

Am 6

Am 7

Am 8

Am 9

Am 10

Am 11

Am 12

Solo Saprolítico

Ag. Rec. Miúdo

Ag. Rec. Graúdo

Solo Laterítico / Ag. Rec. Miúdo

Solo Laterítico / Ag. Rec. Miúdo

Solo Laterítico / Ag. Rec. Miúdo

Solo Saprolítico / Ag. Rec. Miúdo

Solo Saprolítico / Ag. Rec. Miúdo

Solo Saprolítico / Ag. Rec. Miúdo

Solo Laterítico / Ag. Rec. Graúdo

Solo Saprolítico / Ag. Rec. Graúdo

Ag. Rec. Miúdo / Ag. Rec. Graúdo

0

100

100

30

50

70

30

50

70

70

70

70 �

Page 210: Livro entulho bom

208USO DO AGREGADO RECICLADO EM CAMADAS DE BASE E SUB-BASE DE PAVIMENTOS

intermediária (NBR 7182), Índice de Suporte Califórnia (NBR 9895)

e degradação (Macêdo; Lima; Costa, 1986).

A análise dos materiais realizada pelo método MCT teve por ob-

jetivo determinar a classificação geotécnica (Mini-MCV e ensaios

associados) e as propriedades mecânicas e hidráulicas (Mini-CBR

e ensaios associados) dos materiais utilizados, visando à avaliação

do seu uso em bases e sub-bases de pavimentos.

Para o método MCT, foram realizados ensaios com os solos

laterítico e saprolítico, com o agregado reciclado miúdo e com as

misturas constituídas de 50% de cada material (amostras Am 0,

Am 1, Am 2, Am 5 e Am 8). As misturas foram estudadas para aná-

lise e comparação das características e propriedades geotécnicas

obtidas pela junção desses materiais.

As atividades laboratoriais necessárias para o desenvolvimento

da pesquisa foram realizadas no laboratório de Geotecnia da Es-

cola Politécnica da UFBA e no Setor de Pesquisa Tecnológica do

Departamento de Infra-estrutura e Rodagens da Bahia (DERBA).

Foi realizada, ainda, a avaliação econômica preliminar da imple-

mentação dos processos de produção de bases e sub-bases de pa-

vimentos com utilização do agregado reciclado de Salvador. Essa

avaliação teve por objetivo analisar a viabilidade econômica dessa

forma de reciclagem e colaborar, assim, no desenvolvimento dos

processos de gestão de resíduos da construção civil.

APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOSMÉTODO TRADICIONAL

As curvas granulométricas das misturas dos dois solos estuda-

dos com o agregado reciclado miúdo não se enquadraram nas

faixas granulométricas especificadas pela NBR 11804 para pavi-

mentos produzidos com materiais convencionais (Figuras 1 e 2).

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Page 211: Livro entulho bom

209

Diâmetro (mm)

Ma

teri

al q

ue

pa

ssa

(%

)

FIGURA 1CURVAS GRANULOMÉTRICAS DO SOLO LATERÍTICO,DO AGREGADO RECICLADO MIÚDO E SUAS MISTURAS

Diâmetro (mm)

Ma

teri

al q

ue

pa

ssa

(%

)

FIGURA 2CURVAS GRANULOMÉTRICAS DO SOLO SAPROLÍTICO,DO AGREGADO RECICLADO MIÚDO E SUAS MISTURAS

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Page 212: Livro entulho bom

210USO DO AGREGADO RECICLADO EM CAMADAS DE BASE E SUB-BASE DE PAVIMENTOS

Contudo, a prática tem mostrado que, no caso de solo-agregado

que contém finos lateríticos, a deficiência granulométrica do ma-

terial fica compensada pela melhor qualidade das partículas finas

(Nogami & Villibor, 1995). Além disso, o agregado reciclado é um

material pouco estudado e com características diferentes dos agre-

gados naturais. Nesse sentido, as especificações desenvolvidas para

materiais tradicionais não devem ser consideradas como fatores

limitantes para utilização do material, e sim como referência para

a análise do desempenho desses insumos alternativos.

As curvas granulométricas das misturas contendo agregado

reciclado graúdo (Figura 3) apresentaram-se dentro do intervalo

das faixas granulométricas especificadas pela NBR 11804. Pode-se

perceber que os materiais estudados apresentam granulometria

contínua e as curvas não apresentaram patamares.

FIGURA 3CURVAS GRANULOMÉTRICAS DO AGREGADO RECICLADO GRAÚDOE SUAS MISTURAS COM OS SOLOS E O AGREGADO RECICLADO MIÚDO

Diâmetro (mm)

Ma

teri

al q

ue

pa

ssa

(%

)

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Page 213: Livro entulho bom

211

Além disso, as misturas estudadas (com exceção da Am 1) aten-

deram à especificação da NBR 11804 relativa à quantidade de ma-

terial passante na peneira 0,075 mm ser inferior a 2/3 do material

passante na peneira 0,42 mm.

A umidade ótima das misturas que continham agregado

reciclado miúdo e solo laterítico tenderam a crescer na medida

em que houve o aumento da proporção de material reciclado na

dosagem. Esse comportamento, apresentado na Figura 4, pode

ser justificado pela alta absorção de água das partículas do agrega-

do reciclado. Conforme exposto no capítulo anterior, o agregado

reciclado miúdo apresentou 10,4% de absorção de água, enquan-

to que o agregado reciclado graúdo apresentou 8,2%.

Nas misturas de agregado reciclado miúdo e solo saprolítico, o

comportamento foi inverso. Nesse caso, a redução da umidade

ótima pode ser atribuída ao decréscimo significativo de partículas

finas presentes na mistura, visto que o agregado reciclado apre-

senta partículas finas com melhor qualidade (não plásticas) e

FIGURA 4UMIDADE ÓTIMA DOS SOLOS LATERÍTICO E SAPROLÍTICO EDAS RESPECTIVAS MISTURAS COM AGREGADO RECICLADO MIÚDO

Teor de ag. rec. miúdo da mistura (%)

Um

ida

de

Óti

ma

(%

)

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Page 214: Livro entulho bom

212USO DO AGREGADO RECICLADO EM CAMADAS DE BASE E SUB-BASE DE PAVIMENTOS

menor quantidade que o solo saprolítico. Comparando-se, ainda,

as massas específicas secas máximas do solo saprolítico e suas

respectivas misturas, pode-se perceber que houve um ganho de

densificação até aproximadamente 70% de adição do agregado

reciclado miúdo, tendo um pequeno decréscimo a partir desse

referido ponto (Figura 5). As misturas contendo solo laterítico,

por sua vez, apresentaram tendência ao decréscimo nos valores

de massa específica seca máxima com o aumento da proporção

de agregado reciclado.

FIGURA 5MASSA ESPECÍFICA MÁXIMA SECA DOS SOLOS LATERÍTICO E SAPROLÍTICOE DAS RESPECTIVAS MISTURAS COM AGREGADO RECICLADO MIÚDO

Através da análise dos resultados de CBR obtidos para as mis-

turas de solo laterítico e saprolítico com agregado reciclado miú-

do (Figura 6), pode-se perceber que as misturas e materiais estu-

dados (com exceção da amostra Am 7) apresentaram-se adequadas

à utilização em sub-bases de pavimentos, visto terem sido obti-

dos valores de CBR acima de 20%, conforme a especificação da

NBR 11804.

Os valores de CBR obtidos para as misturas que continham solo

laterítico e agregado reciclado miúdo mostraram-se satisfatórios,

Teor de ag. rec. miúdo da mistura (%)

Ma

ssa

Esp

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ífic

aM

áxi

ma

Se

ca

(g

/cm

3)

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Page 215: Livro entulho bom

213

uma vez que todos se apresentaram acima de 60% (limite mínimo

exigido para bases de pavimentos de acordo com a NBR 11804).

Contudo, o aumento da proporção de agregado reciclado miúdo

nas misturas que continham solo laterítico mostrou uma tendên-

cia ao decréscimo desses valores de CBR. Essa redução pode ser

explicada pela diminuição da coesão das amostras, uma vez que

tanto o agregado reciclado miúdo quanto o solo laterítico são

materiais arenosos. As misturas que continham solo saprolítico,

por sua vez, aumentaram a resistência com o aumento da propor-

ção de agregado reciclado miúdo e passaram a apresentar valores

de CBR adequados às especificações da ABNT para bases de pavi-

mentos, a partir da adição de 70% de agregado reciclado.

A expansão das misturas que continham solo saprolítico dimi-

nuiu significativamente à medida que se aumentou o teor de

agregado reciclado miúdo na mistura (Figura 7). Tem-se, portan-

to, que a adição de agregado reciclado miúdo ao solo saprolítico

FIGURA 6RESULTADOS DE CBR DOS SOLOS LATERÍTICO E SAPROLÍTICO EDAS RESPECTIVAS MISTURAS COM AGREGADO RECICLADO MIÚDO

Teor de ag. rec. da mistura (%)

CB

R (

%)

EX

PE

RIÊ

NC

IA R

EA

LIZ

AD

A

Page 216: Livro entulho bom

214USO DO AGREGADO RECICLADO EM CAMADAS DE BASE E SUB-BASE DE PAVIMENTOS

utilizado neste trabalho melhora significativamente a estabilidade

do material. Além disso, a expansão das misturas que continham

solo laterítico e agregado reciclado miúdo foi praticamente nula,

confirmando a possibilidade de empregá-las em locais com

lençóis freáticos elevados.

FIGURA 7RESULTADOS DE EXPANSÃO DOS SOLOS LATERÍTICO E SAPROLÍTICO EDAS RESPECTIVAS MISTURAS COM AGREGADO RECICLADO MIÚDO

Adicionando-se agregado reciclado graúdo aos solos e ao agre-

gado reciclado miúdo, a maioria dos valores de umidade ótima e

CBR aumentaram (Tabela 3). A expansão nas misturas com agre-

gado reciclado graúdo se mostrou praticamente nula. Com base

nesses resultados, percebe-se o grande potencial de utilização do

agregado reciclado graúdo em pavimentos, visto que as misturas

se apresentaram adequadas à utilização em camadas de base

(com exceção da amostra Am 11) e sub-base (sem exceção).

Foram realizados ensaios de distribuição granulométrica antes

e após a compactação das amostras que continham agregado reci-

clado, com o objetivo de calcular o índice de degradação desse

material. Esse procedimento, baseado em Macêdo; Lima; Costa

(1986), tinha como objetivo analisar o comportamento do agregado

Teor de ag. rec. da mistura (%)

Exp

an

são

(%)

EX

PE

RIÊ

NC

IA

RE

AL

IZA

DA

Page 217: Livro entulho bom

215

TABELA 3 - COMPARAÇÃO DOS RESULTADOS DAS MISTURASCONTENDO AGREGADO RECICLADO GRAÚDO

reciclado miúdo e graúdo em função do desgaste sofrido durante

a compactação, além de comparar as características granulo-

métricas das misturas analisadas, antes e depois do processo

de compactação.

As amostras que continham agregado reciclado miúdo não apre-

sentaram índice de degradação significativo (Tabela 4). Por sua vez,

TABELA 4 - ÍNDICE DE DEGRADAÇÃO DAS AMOSTRASCONTENDO AGREGADO RECICLADO

AMOSTRA

100% Solo Laterítico

MATERIAIS

9,3

UMIDADEÓTIMA (%)

Am 0

Am 10

Am 1

Am 11

Am 2

Am 12

30% Solo Laterítico /70% Ag. Rec. Graúdo

100% Solo Saprolítico

30% Solo Saprolítico /70% Ag. Rec. Graúdo

100% Ag. Rec. Miúdo

30% Ag. Rec. Miúdo /70% Ag. Rec. Graúdo

MASSA ESPECIF.SECA (g/cm3)

CBR (%)

EXPANSÃO (%)

14,2

22,0

25,8

16,0

16,2

1,83

1,82

1,38

1,52

1,60

1,69

114,6

112,0

25,5

50,7

70,0

100,0

0,14

0

5,69

0,65

0

0

� Amostra modificada: agregado reciclado graúdo com 92 % de material retido na peneira 4,8 mm

AMOSTRA

Ag. Rec. Miúdo

MATERIAIS

ÍNDICE DE DEGRADAÇÃO (%)

Am 2

Am 4

Am 5

Am 6

Am 7

Am 8

Am 9

Am 3 �

Am 10 �

Am 11 �

Am 12 �

Solo Laterítico / Ag. Rec. Miúdo

Solo Laterítico / Ag. Rec. Miúdo

Solo Laterítico / Ag. Rec. Miúdo

Solo Saprolítico / Ag. Rec. Miúdo

Solo Saprolítico / Ag. Rec. Miúdo

Solo Saprolítico / Ag. Rec. Miúdo

Ag. Rec. Graúdo

Solo Laterítico / Ag. Rec. Graúdo

Solo Saprolítico / Ag. Rec. Graúdo

Ag. Rec. Miúdo / Ag. Rec. Graúdo

1,0

0,4

1,1

1,3

15,9

9,9

11,0

8,8

EX

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NC

IA R

EA

LIZ

AD

A

Page 218: Livro entulho bom

216USO DO AGREGADO RECICLADO EM CAMADAS DE BASE E SUB-BASE DE PAVIMENTOS

as amostras que continham agregado reciclado graúdo apresen-

taram valores altos nos índices de degradação, entre 8,8% e 15,9%.

É válido ressaltar que as amostras com agregado reciclado

graúdo, avaliadas nesse ensaio, foram compostas pelo material

retido na peneira 4,8 mm, ou seja, retirou-se a fração “areia” do

agregado reciclado graúdo. Esse procedimento contribui para

maximizar os resultados de degradação das misturas contendo

agregado reciclado graúdo.

Tem-se observado que os solos agregados, constituídos de pe-

dregulhos lateríticos e saprolíticos, que não satisfazem às condi-

ções impostas pelas especificações tradicionais, sobretudo no que

se refere à faixa granulométrica e à resistência dos grãos, têm apre-

sentado desempenho adequado para material de base de pavi-

mentos (Nogami & Villibor, 1995).

Os elevados índices de degradação das amostras com agrega-

do reciclado graúdo indicam a fragmentação parcial dos grãos

durante a compactação. Essa fragmentação pode ser percebida

analisando-se as curvas granulométricas das misturas com agre-

gado reciclado graúdo obtidas após a compactação (Figura 8),

que se apresentaram mais contínuas que as obtidas antes desse

procedimento. A quebra de grãos resultou numa mudança na

granulometria do material, possibilitando o aumento do grau de

entrosamento das partículas. O melhor entrosamento dos grãos

influi na coesão e resistência do material, melhorando as proprie-

dades da camada compactada.

MÉTODO MCT (MINIATURA, COMPACTADO, TROPICAL)Os resultados obtidos nos ensaios de classificação geotécnica

MCT (Figura 9) confirmaram o comportamento laterítico das pro-

porções que continham esse solo (LA — areias com baixo teor de

finos lateríticos, permeáveis, com baixa coesão e pouco contrácteis,

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IZA

DA

Page 219: Livro entulho bom

217

mas com características adequadas para sua utilização em bases e

sub-bases de pavimentos). A mistura do agregado reciclado miú-

do com o solo laterítico apresentou coeficiente e’ superior ao da

proporção de 100% de solo laterítico, indicando que a adição de

agregado reciclado miúdo reduz o seu comportamento laterítico.

O solo saprolítico foi classificado como NS’ (solos silto-areno-

sos saprolíticos com baixa capacidade de suporte e elevada

expansibilidade). Esse tipo de material apresenta características

FIGURA 8CURVAS GRANULOMÉTRICAS OBTIDAS ANTES E APÓS A COMPACTAÇÃODAS AMOSTRAS CONTENDO AGREGADO RECICLADO GRAÚDOA - 100% Ag. Rec. Graúdo (Am 3�)B - 30% Solo Laterítico / 70% Ag. Rec. Graúdo (Am 10�)C - 30% Solo Saprolítico / 70% Ag. Rec. Graúdo (Am 11�)D - 30% Ag. Rec. Miúdo / 70% Ag. Rec. Graúdo (Am 12�)

% q

ue

pa

ssa

diâmetro (mm)

% q

ue

pa

ssa

diâmetro (mm)

% q

ue

pa

ssa

diâmetro (mm)

% q

ue

pa

ssa

diâmetro (mm)

A B

C D

EX

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IA R

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LIZ

AD

A

Page 220: Livro entulho bom

218USO DO AGREGADO RECICLADO EM CAMADAS DE BASE E SUB-BASE DE PAVIMENTOS

inadequadas para sua utilização em bases e sub-bases de pavimen-

tos (Nogami & Villibor, 1995).

A mistura que continha solo saprolítico e agregado reciclado miú-

do apresentou comportamento laterítico (LA). Tem-se, portanto,

que a adição de agregado reciclado ao solo saprolítico melhora as

características relativas à aplicação do material em pavimentos.

FIGURA 9GRÁFICO DE CLASSIFICAÇÃO MCT CONTENDO A LOCALIZAÇÃO DOS MATERIAIS

Como esperado, a mistura que continha agregado reciclado mi-

údo e solo saprolítico apresentou maior valor de Mini-CBR (umida-

de de moldagem) que a mistura contendo apenas solo (Tabela 5).

As misturas que continham solo laterítico não apresentaram dife-

rença significativa de capacidade de suporte. Esse comportamento

mostra que a adição do agregado reciclado melhorou as proprie-

dades do material, no caso das misturas com solo saprolítico, e

não alterou significativamente suas propriedades, no caso das mis-

turas com solo laterítico, fato confirmado pelo método tradicional.

As amostras estudadas, com exceção da amostra Am 0 após

imersão, apresentaram-se adequadas à utilização em sub-bases de

co

efi

cie

nte

e’

coeficiente c’

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Page 221: Livro entulho bom

219

pavimentos, visto que seus valores de Mini-CBR se mantiveram

iguais ou acima de 20%, como estabelecem as especificações para

essa camada de pavimento (NBR 11804). A adição de agregado

reciclado miúdo melhorou significativamente a capacidade de su-

porte após imersão do solo laterítico, possibilitando a utilização

desse material também em bases de pavimento (Mini-CBR > 60%).

O RIS, parâmetro que indica a perda de resistência dos materiais

após a imersão, permitiu comparar os valores de Mini-CBR obtidos

antes e após a saturação das amostras analisadas. Como espera-

do, o solo saprolítico apresentou significativa perda de resistência

(RIS em torno de 10%), enquanto que o solo laterítico apresentou RIS

próximo de 45%. Nota-se, ainda, que as misturas de solo laterítico

e saprolítico com o agregado reciclado miúdo (Am 5 e Am 8) apre-

sentaram RIS em torno de 80%, evidenciando a estabilidade do

material proporcionada pela presença do material reciclado.

A amostra constituída apenas de agregado reciclado miúdo

(Am 2), um material bastante arenoso, não se mostrou adequada

para a realização do ensaio de Mini-CBR. Portanto, não foi possível

comparar os valores de Mini-CBR obtidos para esse material com

os obtidos para as demais amostras.

TABELA 5 - MINI-CBR MÁXIMO DAS MISTURAS ESTUDADAS

EX

PE

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IA R

EA

LIZ

AD

A

AMOSTRA

100% Solo Laterítico

MISTURASNA UMIDADE

DE MOLDAGEM

Am 0

Am 5

Am 1

Am 8

50% Ag. Rec. Miúdo /50% Solo Laterítico

100% Solo Saprolítico

50% Ag. Rec. Miúdo /50% Solo Saprolítico

80,5

78,0

33,9

46,0

RIS(%)

APÓSIMERSÃO

MINI-CBR (%)

35,4

63,1

3,5

38,5

43,97

80,90

10,32

83,70

Page 222: Livro entulho bom

220USO DO AGREGADO RECICLADO EM CAMADAS DE BASE E SUB-BASE DE PAVIMENTOS

AVALIAÇÃO ECONÔMICA

A avaliação de aspectos econômicos é de fundamental impor-

tância para promover a aceitação dessa forma de reciclagem do

entulho. Os aspectos tecnológicos, apresentados nos itens ante-

riores, comprovam que o agregado reciclado possui desempe-

nho adequado para utilização em camadas de pavimentos. Con-

tudo, a efetiva aplicação do material só será bem sucedida caso o

material apresente também competitividade no mercado.

Nesse sentido, foi realizada a avaliação preliminar dos aspectos

econômicos da utilização do agregado reciclado em base e sub-base

de pavimentos.

Comparou-se o custo de execução de pavimentos que utilizam

agregado reciclado com o daqueles que utilizam materiais conven-

cionais (solo, brita e brita graduada). A composição de custo foi basea-

da nas obras desenvolvidas pela Prefeitura de Salvador e expressa

em reais por metro cúbico de camada executada, pois a espessura

dos pavimentos varia em cada caso. As despesas com equipamen-

to, mão-de-obra e materiais foram cotadas no mercado de Salvador,

no período de abril / maio de 2000.

As camadas de base e sub-base produzidas com agregado reci-

clado apresentam custo de construção significativamente menor

que as camadas produzidas com brita graduada ou brita adiciona-

da ao solo (Figuras 10 e 11). Essa redução pode representar uma

economia entre 50% e 62% ao se utilizar o agregado reciclado em

substituição aos materiais convencionais.

Essa economia se deve ao menor preço do agregado reciclado (cerca

de R$ 11,00/m3), em relação à brita graduada (cerca de R$ 26,00/m

3) e

brita (cerca de R$ 35,00/m3). Contribuem para essa redução de custo:

• a menor distância de transporte — a brita é produzida em

locais distantes do centro, enquanto que as usinas que irão

reciclar o entulho estão localizadas na área urbana;

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IZA

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Page 223: Livro entulho bom

221

• a simplicidade do processo de produção — a produção do agre-

gado natural utiliza explosivos no desmonte da rocha e neces-

sita de diversas etapas de britagem para reduzir o tamanho das

partículas; a reciclagem do entulho não utiliza explosivos, a sua

britagem é feita em uma única etapa e a produtividade (t/hora)

pode ser maior, pois parte do entulho bruto já se encontra

com granulometria reduzida.

FIGURA 11COMPARAÇÃO DE CUSTO POR M3 DE SUB-BASE DE PAVIMENTOUTILIZANDO MATERIAL CONVENCIONAL E MATERIAL RECICLADOMISTURADOS COM SOLO DO PRÓPRIO LOCAL

Va

lor

(R$

/m3)

Proporção de agregado na mistura (%)

FIGURA 10COMPARAÇÃO DE CUSTO POR M3 DE BASE DE PAVIMENTOUTILIZANDO MATERIAL CONVENCIONAL E MATERIAL RECICLADOMISTURADOS COM SOLO DO PRÓPRIO LOCAL

Va

lor

(R$

/m3)

Proporção de agregado na mistura (%)

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Page 224: Livro entulho bom

222USO DO AGREGADO RECICLADO EM CAMADAS DE BASE E SUB-BASE DE PAVIMENTOS

Buscando compreenderem-se, efetivamente, os aspectos eco-

nômicos da reciclagem, deverão ser analisados, além dos custos

de execução, os custos de manutenção dos pavimentos. Deve-se

também acrescentar a essa análise as vantagens para a administra-

ção pública, pela redução dos custos de coleta, transporte e dis-

posição em aterro desse material com alto potencial de reciclagem.

A grande quantidade de entulho gerado tem reduzido significati-

vamente a vida útil dos aterros, e encontrar novas áreas para dis-

posição é uma tarefa cada vez mais difícil nos centros urbanos.

Além disso, a reciclagem de um resíduo que causa tantos pro-

blemas ao meio ambiente urbano contribui para a redução de

impactos ambientais e sociais tais como a degradação das áreas

de extração de matéria prima natural, o esgotamento de jazidas, o

consumo de combustíveis fosseis e a geração de poluição na pro-

dução e transporte dos materiais, além dos problemas causados

pela destinação inadequada dos resíduos de construção e demo-

lição (alagamentos, deslizamentos de encostas, proliferação de

vetores de doenças, entre outros). Esses impactos têm um custo

para a sociedade, nem sempre mensurado, mas que deve ser con-

siderado ao se fazer uma análise global dos aspectos econômicos

da reciclagem do entulho.

Estudos realizados em outras cidades também têm demonstra-

do que essa forma de reciclagem possibilita economia significa-

tiva à Prefeitura na execução de pavimentos (Pinto, 1997). Entre-

tanto, deve-se evitar a generalização dos resultados, uma vez que

os fatores que mais influem no custo (produção e distância de

transporte dos materiais, qualidade do solo, entre outros) variam

em cada caso.

Nos casos em que a utilização de agregado reciclado em pavi-

mentação não for economicamente atrativa aos empresários, a

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IZA

DA

Page 225: Livro entulho bom

223

administração pública deverá fazer uma análise dos custos de

gestão desse resíduo e avaliar as vantagens econômicas que a

reciclagem do entulho poderá proporcionar. Quando for o caso,

poderá introduzir benefícios fiscais para fomentar essa forma

de reciclagem.

CONCLUSÃOOs resultados obtidos comprovaram que o agregado reciclado

de Salvador, tanto na fração miúda quanto na graúda, apresentou-

se como material adequado para execução de bases e sub-bases

de pavimentos.

As misturas contendo solo laterítico, como era de se esperar, não

apresentaram ganhos de resistência com a adição de agregado re-

ciclado. Já para o solo saprolítico, que apresenta baixa capacidade

de suporte, houve significativos ganhos de resistência e redução de

expansão ao se adicionar o agregado reciclado. Portanto, o material

reciclado apresentou-se como um estabilizador de solos plásticos,

como é caso do solo saprolítico utilizado no Projeto Entulho Bom.

Além disso, o agregado reciclado graúdo apresentou abrasão

Los Angeles inferior ao limite especificado na NBR 11804 e o agre-

gado reciclado miúdo apresentou limites de consistência e equi-

valente de areia de acordo com as especificações dessa norma. As

amostras com teor de agregado reciclado igual ou superior a 70%

(exceto Am 11) apresentaram desempenho adequado, tanto para

base quanto para sub-base de pavimentos. Apesar de algumas amos-

tras com agregado reciclado miúdo não se enquadrarem nas faixas

granulométricas especificadas na NBR 11804, e as amostras com

agregado reciclado graúdo apresentarem índice de degradação

elevado, esses fatores não devem ser considerados como limitantes

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Page 226: Livro entulho bom

224USO DO AGREGADO RECICLADO EM CAMADAS DE BASE E SUB-BASE DE PAVIMENTOS

para a utilização do material, e sim como referência para a análise

do desempenho desses insumos alternativos.

A análise dos resultados obtidos pelo método MCT indicou uma

melhoria significativa do desempenho do material com a adição

do agregado reciclado miúdo ao solo saprolítico e a pouca influên-

cia ao adicioná-lo ao solo laterítico, confirmando, portanto, as

análises realizadas pelo método tradicional.

Estudos realizados em outras cidades também verificaram o bom

desempenho dessa matéria-prima alternativa em camadas de

pavimentos. Contudo, compreende-se a importância da reali-

zação de estudos específicos para os materiais regionais, visto que

tanto o solo quanto o agregado reciclado possuem características

próprias, que podem variar de acordo com cada região e, por-

tanto, as experiências realizadas em outras localidades não

podem ser generalizadas.

A execução de um pavimento experimental e de ensaios de

durabilidade é de significativa importância para se analisar o com-

portamento, em longo prazo, do uso do agregado reciclado em

pavimentos. Nesse sentido, torna-se fundamental a execução de

trechos de pavimentos-piloto em Salvador, buscando monitorar

propriedades relevantes e avaliar o desempenho do material em

condições de uso e ao longo do tempo.

O uso do agregado reciclado nas camadas de base e sub-base

pode proporcionar, ainda, uma economia significativa nos custos

de execução do pavimento, quando comparados com os de ma-

teriais convencionais.

A utilização do agregado reciclado em pavimentos pode apre-

sentar vantagens tanto em relação a aspectos técnico-econômicos,

quanto em relação a questões ambientais e sociais. Essa forma

de reciclagem do entulho contribui para o desenvolvimento

Page 227: Livro entulho bom

225

sustentável local, reduzindo a extração de matérias-primas não-

renováveis, otimizando o uso dos aterros e contribuindo para

aumentar a oferta de infra-estrutura urbana.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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and methods of sampling and testing. 12th ed. Washington, 1978. 2v.

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CARNEIRO, Alex P., et al. Geotechical properties of processed debris from

Salvador in application in bases and sub-bases of road. In:

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HANSEN, T.C. Recycling of demolished concrete and masonry. 2nd ed.

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LATERZA, Luciano M. Concreto com agregado graúdo proveniente da

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Escola de Engenharia de São Carlos, Universidade de São Paulo, 1998.

Page 228: Livro entulho bom

226USO DO AGREGADO RECICLADO EM CAMADAS DE BASE E SUB-BASE DE PAVIMENTOS

MACÊDO, J. A. G.; LIMA, R. C.; COSTA, C. R. V. Estudos dos solos

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NOGAMI, Job Shuji; VILLIBOR, Douglas Fadul. Pavimentação de baixo

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NOGAMI, Job Shuji; VILLIBOR, Douglas Fadul. Uma nova classificação de

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PINTO, T. P. De volta à questão do desperdício. Construção, São Paulo,

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SOUZA, Murillo L. de. Pavimentação rodoviária. 2. ed. Rio de Janeiro:

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São José dos Campos, 1999.

VARGAS, M. O uso dos limites de Atterberg na classificação dos solos tropicais.

In: CONGRESSO BRASILEIRO DE MECÂNICA DOS SOLOS E ENGENHARIA

DE FUNDAÇÕES,1992, Olinda. Anais... Olinda, 1982. v.5, p. 262-278.

Page 229: Livro entulho bom

227

NORMAS TÉCNICAS CITADAS1

NBR 6459 - Solo: determinação do limite de liquidez: método de ensaio.

1984.

NBR 6465 - Agregado graúdo: determinação da abrasão Los Angeles:

método de ensaio. 1984.

NBR 6508 - Grãos de solos que passam na peneira de 4,8 mm: determinação

da massa específica: método de ensaio. 1984.

NBR 7180 - Solo: determinação do limite de plasticidade: método de

ensaio. 1984.

NBR 7181 - Solo: análise granulométrica: método de ensaio. 1984.

NBR 7182 - Solo: ensaio de compactação: método de ensaio. 1982.

NBR 7251 - Agregado em estado solto: determinação da massa unitária:

método de ensaio. 1982.

NBR 9895 - Solo: índice de Suporte Califórnia: método de ensaio. 1987.

NBR 11804 - Materiais para sub-base ou base de pavimentos estabiliza-

dos granulometricamente: especificação. 1991.

NBR 12052 - Solo ou agregado miúdo: determinação de equivalente de

areia: método de ensaio. 1992.

1 Publicação ABNT - Associação Brasileira de Normas Técnicas, Rio de Janeiro.

Alex Pires Carneiro - Engenheiro Civil, Mestrando em Engenharia Ambiental Urbana - UFBA,

Coordenador do Projeto Entulho Bom

Paulo César Burgos - Engenheiro Civil, Mestre em Geotecnia - USP, Pesquisador do Laboratório

de Geotecnia, Escola Politécnica, UFBA

Elaine Pinto Varela Alberte - Estudante de Engenharia Civil - UFBA, Pesquisadora do Projeto

Entulho Bom

Page 230: Livro entulho bom

228USO DO AGREGADO RECICLADO EM TIJOLOS DE SOLO ESTABILIZADO COM CIMENTO

CAPÍTULO VII

Page 231: Livro entulho bom

229

Célia Maria Martins Neves

Alex Pires Carneiro

Dayana Bastos Costa

USO DO AGREGADORECICLADO EM TIJOLOSDE SOLO ESTABILIZADO

COM CIMENTO

Page 232: Livro entulho bom

230USO DO AGREGADO RECICLADO EM TIJOLOS DE SOLO ESTABILIZADO COM CIMENTO

No Brasil, o atendimento às necessidades mínimas de habita-

ção para as camadas de mais baixa renda ainda não foi equacio-

nado. A enorme demanda por moradias, no País, exige a constru-

ção de aproximadamente 6 milhões de unidades, sendo a maioria

destinada a famílias com renda mensal inferior a cinco salários-

mínimos (Watanabe, 2000). Apesar do esforço do Governo, a de-

manda por moradias populares continua crescendo, com veloci-

dade superior à capacidade de produção de novas unidades.

Alguns fatos incontestáveis, relativos à estruturação da política

habitacional, são apontados por Maffei (1992):

• cidades com mais de 5 milhões de habitantes apresentam graves

problemas de ordem econômica, administrativa e humana;

• a propriedade privada da terra urbana é fonte permanente

de especulação imobiliária;

• poucos são os planos de construção em massa de moradias

populares sem um forte subsídio do Estado;

• cada indivíduo necessita de, no mínimo, 10 m2 como espaço

interno útil para habitar.

A questão da habitação popular, no Brasil, exige soluções compa-

tíveis com a situação socioeconômica. Essas podem ser efetivadas

pelo emprego de tecnologias alternativas, que utilizem matérias-

primas naturais, renováveis ou não, e também resíduos sólidos

industriais e urbanos, abundantes na região (Calmon et al., 1998).

Programas para produção de habitações destinadas às popula-

ções de menor poder aquisitivo são realizados na maioria dos países

em desenvolvimento, notadamente nos do continente africano e da

América Latina. Esses programas geralmente adotam alternativas tec-

nológicas de menor custo, bem como regimes de auto-construção

ou de ajuda mútua, e são efetivados por iniciativas governamentais

associadas ou não à participação de entidades comunitárias.

Page 233: Livro entulho bom

231

Na década de 70, particularmente na sua segunda metade,

começaram a ser realizadas, no Brasil, diversas pesquisas e

experiências, na tentativa de viabilizar, do ponto de vista técnico e

econômico, a implantação de alternativas tecnológicas de me-

nor custo para produção de moradias populares (Centro de

Pesquisas e Desenvolvimento, CEPED, 1984; Instituto de

Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo, IPT, 1985;

Neves, 1989).

Dentre essas tecnologias, a produção de habitações populares

de tijolos de solo estabilizado foi uma das alternativas mais

freqüentemente adotadas, devido à facilidade de fabricação

desse componente e de execução da alvenaria, notadamente por

seu baixo custo (Banco Nacional da Habitação, 1985). Deve-se

ressaltar que o custo de fundações, paredes e piso da habi-

tação popular chega a alcançar 50% do custo da edificação

(Neves, 1988).

Outra vantagem do tijolo de solo estabilizado é a possibilida-

de de incorporar outros materiais na sua fabricação, de modo a

aproveitar recursos abundantes na região, como, por exemplo,

na área urbana, o agregado produzido com entulho reciclado, e

que também podem contribuir para a melhoria das caracterís-

ticas do produto.

O entulho, constituído de fragmentos ou restos de tijolos, con-

cretos, argamassas, madeiras e outros materiais usados na execu-

ção de obras de construção, é classificado como material inerte

segundo a NBR 10004, pois não apresenta risco de contaminação

para a saúde pública e para o meio ambiente, desde que sua desti-

nação seja adequada. Devidamente reciclado, o produto resultante

apresenta propriedades físicas e químicas apropriadas para seu em-

prego como material de construção de edificações (Pinto, 1997).

Page 234: Livro entulho bom

232USO DO AGREGADO RECICLADO EM TIJOLOS DE SOLO ESTABILIZADO COM CIMENTO

Vale ressaltar, no entanto, que o entulho apresenta características

variáveis, que dependem do tipo de obra, das técnicas construti-

vas, da fase em que se encontra a obra, das características socio-

econômicas da região, entre outros fatores.

O aproveitamento do entulho pelo setor que o gerou, a constru-

ção civil, facilita sua reciclagem, contribui para minimizar os efei-

tos prejudiciais dos descartes irregulares em cursos d’água ou vias

públicas e do esgotamento das áreas destinadas à sua deposição

(Pinto, 1997).

O agregado reciclado pode ser utilizado para produzir materiais

de construção mais baratos e de qualidade. Conforme apresenta-

do no Capítulo V, as aplicações mais indicadas para o agregado

reciclado incluem os materiais para base e sub-base de pavimentos,

aterros, agregados para concreto e argamassa, além de matéria-

prima para produção de tijolos e blocos.

O uso do agregado reciclado em tijolos de solo estabilizado

com cimento é também uma das soluções em que o entulho é

aproveitado pelo próprio setor que o produz e contribui tanto

para minimizar impactos ambientais como para reduzir o custo

da alvenaria. Contudo, para utilização como matéria-prima em

substituição à tradicional, é necessário que os resíduos apre-

sentem desempenho compatível com a sua aplicação.

Nesse sentido, o Projeto Entulho Bom investigou a utilização

do agregado reciclado de Salvador em tijolos prensados, com subs-

tituição total ou parcial do solo. Selecionou solos, elaborou traços,

fabricou tijolos e analisou propriedades físicas e mecânicas, de

modo a avaliar seu desempenho na alvenaria.

Page 235: Livro entulho bom

233

USO DO SOLO COMO MATERIAL DE CONSTRUÇÃOO uso do solo como material de construção pode ser distin-

guido em dois níveis: por um lado, pela utilização em sistemas

construtivos mais simples e de menor custo, gerados pela carên-

cia em que vivem algumas populações; por outro lado, pelo uso

de técnicas inovadoras, incentivadas pelas investigações nas uni-

versidades e instituições de pesquisas e caracterizadas pela sim-

plicidade, eficácia e baixo custo (Neves, 1993).

Segundo o Manual de Construção de Solo-Cimento (CEPED,

1984), o solo pode ser utilizado, basicamente, de dois modos:

• embebido em água, constituindo uma massa de consistência

plástica ou “argamassa de solo”;

• constituindo uma mistura úmida, compactada ou prensada,

de solo e água.

O solo embebido em água possui porosidade elevada, devido

à evaporação da água adicionada na preparação da massa. Além

disso, o mecanismo de evaporação pode provocar tensões capila-

res de retração no material, resultando em trincas que aceleram

sua deterioração.

Quando o solo é compactado ou prensado, sua umidade é muito

inferior à empregada para a massa plástica. Essa umidade, cha-

mada umidade ótima, varia para cada tipo de solo e caracteriza

as condições em que se pode obter melhor compactação (maior

massa específica). No solo compactado, devido à menor umida-

de, são menores a porosidade e os efeitos de retração, o que o

caracteriza como um material mais durável e de maior resis-

tência mecânica.

Ainda de acordo com o Manual de Construção de Solo-Cimento

(CEPED, 1984), em ambos os casos de utilização do solo, as proprie-

dades mecânicas e de permeabilidade podem ser melhoradas

Page 236: Livro entulho bom

234USO DO AGREGADO RECICLADO EM TIJOLOS DE SOLO ESTABILIZADO COM CIMENTO

significativamente pela adição de pequenas porcentagens de pro-

dutos estabilizadores. Desse modo, a mistura de pedaços de pa-

lha ou fibras reduz acentuadamente o efeito de retração por seca-

gem da massa plástica. A adição de óleos vegetais ou animais e

emulsões asfálticas, tanto na massa plástica como no solo

compactado, tem o efeito de aumentar significativamente a sua

impermeabilidade, melhorando as condições de durabilidade. A

mistura de cimento e/ou cal pode produzir aumentos considerá-

veis da resistência mecânica.

As reações que envolvem as mudanças de propriedades dos

solos por adição de cimento e/ou cal ainda não são plenamente

conhecidas. Sabe-se que, na fração arenosa do solo, a ação de

cimentação é a mesma que se processa nos concretos, desenvol-

vendo vínculos de coesão nos pontos de contato com os grãos.

Nos solos argilosos, há também reações entre a superfície dos

grãos de argila e a cal liberada na hidratação do cimento. Os prin-

cipais fatores que irão intervir nas características finais do solo

estabilizado correspondem ao teor de aglomerante, à natureza

do solo e à compacidade da mistura.

Quando o solo não apresenta propriedades adequadas para seu

uso na construção, pode-se melhorar suas características com a

adição de outro solo ou material, como, por exemplo, o agregado

produzido a partir de entulho. Por suas características de material

inerte, o agregado reciclado pode contribuir significativamente

na correção granulométrica do solo.

Page 237: Livro entulho bom

235

TIJOLOS E BLOCOS DE SOLO ESTABILIZADOOs tijolos e blocos de solo estabilizado são produzidos com o

material obtido pela mistura de solo, aglomerante (cimento ou

cal) e água, que, após compactada ou prensada em moldes espe-

cíficos, ganha resistência e durabilidade suficientes para diversas

aplicações, especialmente para a execução de alvenarias.

Os tijolos de solo estabilizado podem ser usados em qualquer

tipo de construção, para substituir os blocos cerâmicos convencio-

nais, seja em alvenaria simples de vedação, ou alvenaria estru-

tural, desde que atendam às resistências estabelecidas no projeto

(Carvalho & Poroca, 1995). As paredes tanto podem ser aparentes

como revestidas, podendo receber diversos tipos de pintura ou

revestimento cerâmico.

O sistema construtivo da parede é semelhante ao da alvenaria

convencional, sendo necessário apenas identificar as argamassas

de assentamento e revestimento mais adequadas às caracterís-

ticas do componente. Segundo Carvalho & Poroca (1995), as

paredes construídas com tijolos de solo estabilizado apresen-

tam comportamento térmico e durabilidade equivalentes às

construídas com blocos cerâmicos. Os critérios de projeto devem

ser iguais àqueles aplicados ao material tradicional, com os

cuidados e serviços de manutenção semelhantes aos de alvena-

ria convencional.

O processo de fabricação de tijolos e blocos de solo estabilizado

é bastante simples e adequado aos sistemas de produção automati-

zada. Utiliza-se um dispositivo mecânico com sistema de alavanca

para prensagem. O princípio fundamental desse equipamento con-

siste em submeter a mistura de solo, cimento e água a pressões

elevadas dentro de moldes metálicos, o que resulta em tijolos com

formas e dimensões desejadas.

Page 238: Livro entulho bom

236USO DO AGREGADO RECICLADO EM TIJOLOS DE SOLO ESTABILIZADO COM CIMENTO

Após pequeno período de cura, o tijolo fabricado apresenta

resistência à compressão similar à de bloco cerâmico, sendo sua

resistência tanto mais elevada quanto maior for a quantidade de

aglomerante empregada. No entanto, esse consumo deve ser

limitado a um teor ideal, que confira ao tijolo a resistência neces-

sária com o menor custo.

Entre as vantagens que apresentam os tijolos de solo estabiliza-

do, podem-se destacar (Associação Brasileira de Cimento Portland,

ABCP, 1988):

• utilização de solo do próprio local, reduzindo ou eliminando

o custo do transporte;

• manutenção da regularidade de suas formas com faces bastante

lisas e planas, implicando menor consumo da argamassa de

assentamento e revestimento;

• dispensa do revestimento do tijolo, quando a parede estiver

devidamente protegida da ação direta da água;

• redução do consumo de energia e, conseqüentemente, de

danos ambientais, por não ser necessário o cozimento

do tijolo.

Carvalho & Poroca (1995) ressaltam, também, que o processo de

moldagem em prensa permite, além da regularidade dimensional,

obter encaixes que podem reduzir o consumo de argamassa de

assentamento e proporcionar sistemas construtivos mais simples.

FABRICAÇÃO DE TIJOLOS EBLOCOS DE SOLO ESTABILIZADO

O processo de fabricação do componente da alvenaria —

tijolos e blocos de solo estabilizado — corresponde, basicamente,

às etapas apresentadas na Figura 1 (ABCP, 1988):

Page 239: Livro entulho bom

237

Após 6 horas de moldados e durante os 7

primeiros dias, os componentes devem

ser mantidos úmidos por meio de mo-

lhagens sucessivas; os tijolos ou blocos

podem ser acomodados em pilhas de

até 1,5 metro de altura.

PREPARAÇÃO DO SOLOConsiste em destorroar e peneirar, se

necessário, o solo seco. A secagem deve

ser feita ao ar livre. Recomenda-se usar

peneira com abertura de malha da ordem

de 5 mm.

PREPARO DA MISTURAAdiciona-se o cimento ao solo preparado,

na proporção previamente estabelecida.

Misturam-se os materiais secos, até obter-

se coloração uniforme; adiciona-se água

aos poucos, até que a mistura atinja a

umidade adequada para sua prensagem.

MOLDAGEM DE TIJOLOS E BLOCOSColoca-se a mistura no equipamento e

procede-se à prensagem e à extração do

tijolo ou do bloco, transportando-o em

bandeja e acomodando-o numa superfície

plana e lisa, em área protegida do sol, do

vento e da chuva.

FIGURA 1 - ETAPAS DO PROCESSO DE FABRICAÇÃO DOS TIJOLOS EBLOCOS DE SOLO ESTABILIZADO

CURA E ARMAZENAMENTO

Page 240: Livro entulho bom

238USO DO AGREGADO RECICLADO EM TIJOLOS DE SOLO ESTABILIZADO COM CIMENTO

A mistura de solos ou adição de outros materiais, como o agregado

reciclado, por exemplo, deve ser feita na etapa de preparação do solo.

A mistura dos materiais pode ser manual — pá e enxada — ou

mecânica, com equipamentos apropriados, em geral um mistu-

rador forçado de eixo vertical. Para solos muitos arenosos, com

teor de areia da ordem de 80%, pode-se utilizar a betoneira de

eixo inclinado com relativo sucesso. A quantidade a ser preparada

é determinada em função da capacidade de produção do equipa-

mento de prensagem. A publicação Fabricação de tijolos de solo-

cimento com a utilização de prensas manuais (ABCP, 1988)

recomenda dimensionar o volume da mistura numa quantidade

suficiente para a produção de tijolos ou blocos durante 1 hora de

funcionamento da prensa.

A umidade de conformação dos componentes está diretamen-

te relacionada com as características do solo ou da mistura utiliza-

da. Essa umidade pode ser determinada em laboratório, através

do ensaio de compactação, realizado de acordo com a NBR 7182.

No processo de fabricação, a umidade de conformação dos com-

ponentes pode ser verificada, com razoável precisão, da seguinte

forma (ABCP, 1988):

• toma-se uma porção da mistura e aperta-se fortemente entre os

dedos e a palma da mão; ao abrir a mão, o “bolo” deve ter a

marca deixada pelos dedos; se isso não ocorrer, a mistura está

muito seca;

• deixa-se o “bolo” cair de uma altura aproximada de um metro,

sobre uma superfície dura, de modo que deverá esfarelar-se

ao chocar-se com a superfície; se isso não ocorrer, a mistura

está muito úmida.

Os tijolos e blocos de solo-cimento devem ser utilizados dentro de,

no mínimo, 14 dias após a sua fabricação (NBR 10832; NBR 10833).

Page 241: Livro entulho bom

239

EQUIPAMENTOS DE FABRICAÇÃO DE TIJOLOS E BLOCOS

Os tijolos e blocos de solo estabilizado são moldados por

prensagem, em equipamentos com moldes, cujo formato possi-

bilite produzir componentes de formas e dimensões variadas. A

maquinaria disponível para sua fabricação é diversa e pode atender

às necessidades de produção para edificações de diferentes portes.

Podem ser utilizados desde um simples equipamento de prensa-

gem até complexas unidades de produção industrial — que englo-

bam pulverizador de solo, peneirador, misturador, dosador, prensa

e outros acessórios. O dimensionamento da maquinaria está relacio-

nado com a dimensão, produtividade e custo do empreendimento.

As prensas podem ser operadas manualmente ou com auxílio

de motor, que aciona um mecanismo, mecânico ou hidráulico, de

prensagem. Ferraz Junior (1995) apresenta um interessante estu-

do sobre as prensas disponíveis no mercado, ressaltando suas

principais características. A Tabela 1 apresenta a produtividade e a

energia de compactação das prensas estudadas.

TABELA 1 - PRODUTIVIDADE DAS PRENSAS PARA COMPONENTES DESOLO ESTABILIZADO

� corresponde à relação entre os volumes da mistura em estado solto e em estado compactado,

sendo proporcional à energia de compactação.

TIPO DE PRENSATAXA DE

COMPACTAÇÃO

DO SOLO �

Manual

Motorizada

Mecânica

ENERGIA DECOMPACTAÇÃO

(MPa)

PRODUÇÃO(tijolos/dia)

Hidráulica

Mecânica

Hidráulica

1,38

1,65

> 1,65

> 2,00

300 a 1.200

2.000 a 2.800

1.600 a 12.000

1,5 - 2,0

2,0 - 10,0

4,0 - 24,0

> 20,0

Page 242: Livro entulho bom

240USO DO AGREGADO RECICLADO EM TIJOLOS DE SOLO ESTABILIZADO COM CIMENTO

As prensas manuais geralmente requerem baixo capital para

sua aquisição e manutenção, além de serem leves, pequenas, fáceis

de usar e sem obviamente os custos inerentes ao consumo de ener-

gia. A baixa taxa de compactação, principalmente da prensa manual

mecânica, exige cuidados especiais na seleção e no preparo do solo,

para que os tijolos produzidos apresentem resistência à compressão

especificada pela norma.

Ferraz Junior (1995) ressalta que a taxa de produção real das

prensas manuais pode se diferenciar da taxa de produção nominal

fornecida pelos fabricantes, devido ao esforço necessário para sua

operação, ao longo de um turno completo de trabalho. Um sistema

eficiente de rodízio, na equipe de trabalho, pode evitar a queda

gradual de produtividade e eventuais prejuízos na qualidade do

componente produzido.

A instalação de pistão hidráulico na prensa aumenta significati-

vamente sua energia de compactação e diminui o esforço físico para

operá-la. Permite ainda obter componentes com melhor uniformida-

de dimensional, mais compactos e com maior resistência mecânica.

Nas prensas motorizadas, também denominadas automáticas,

a produtividade pode ser aumentada pelo acoplamento de um

sistema rotatório com moldes múltiplos, ao invés de uma plata-

forma fixa com moldes individuais (Ferraz Junior, 1995).

Alguns modelos possuem um dispositivo acoplado à prensa,

que realiza testes de resistência à compressão, para o controle de

qualidade dos tijolos produzidos.

Outro interessante estudo sobre equipamentos para produ-

ção desses tijolos e blocos foi realizado durante o desenvolvi-

mento do “tijolito”, bloco intertravado de solo-cimento, pela

Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais e a Construto-

ra Andrade Gutierrez S. A., visando à fabricação de blocos com

Page 243: Livro entulho bom

241

detalhes especiais, de modo a permitir a eliminação da argamassa

de assentamento (Assis, 1995). Foram projetadas e construídas

prensas manuais, pneumáticas e hidráulicas, para produção simul-

tânea de 1 a 3 componentes, com seção de 10 cm x 20 cm e com

carga de prensagem variando de 75 kN até 600 kN, o que equivale

a uma energia de compactação que varia de 1,5 MPa a 30 MPa.

Estudando a eficiência — definida como relação entre a produ-

ção do equipamento e seu custo —, Assis (1995) demonstra que

as prensas manuais são de menor eficiência, seguidas das pneu-

máticas, sendo de maior eficiência as hidráulicas. Os equipamentos

pneumáticos apresentaram desvantagens em relação aos hidrá-

ulicos, devido à elevada perda de energia e a limitações na carga de

prensagem. Outra observação importante de Assis (1995) refere-se

ao baixo custo da prensa em relação ao total do investimento, prin-

cipalmente para um sistema industrializado, com uso de equipa-

mentos para o preparo da mistura, cura e controle de qualidade.

As prensas que possuem pistão compactador em apenas um sen-

tido devem ser utilizadas basicamente para a produção de tijolos com

altura máxima da ordem de 8 cm. Acima desse valor e até a altura de

20 cm, são necessárias prensas com duplo sentido de compactação

(ABCP, 1989). Essa limitação não se deve à energia de compactação

do equipamento, mas à propriedade de compactação do solo.

A escolha do equipamento de prensagem deve ser apropriada

ao empreendimento e deve considerar, entre outros aspectos, a

produção desejada e o grau de automatização possível em relação

ao investimento. Programas habitacionais realizados (Neves, 1989)

comprovam que a técnica da produção de tijolos que utiliza siste-

mas manuais ou automatizados é muito simples e de fácil assimi-

lação pelos operadores, tanto em regime de mutirão como por

administração direta.

Page 244: Livro entulho bom

242USO DO AGREGADO RECICLADO EM TIJOLOS DE SOLO ESTABILIZADO COM CIMENTO

CRITÉRIOS PARA SELEÇÃO DE SOLO EDOSAGEM DE TRAÇO

O solo é o elemento que entra em maior proporção na mistu-

ra, devendo ser selecionado de modo a permitir o uso da menor

quantidade possível de estabilizante. Segundo a NBR 10832 e a

NBR 10833, os solos adequados para a fabricação de tijolos e blo-

cos de solo-cimento são os que possuem as características apre-

sentadas na Tabela 2.

TABELA 2 - CRITÉRIOS PARA SELEÇÃO DE SOLOS

Os limites de consistência (liquidez e plasticidade) são as variá-

veis que melhor expressam as condições de trabalhabilidade do

solo. O aumento dos valores desses limites gera maior dificuldade

no destorroamento, mistura e secagem (CEPED, 1984).

Quanto à granulometria, os solos mais adequados para estabili-

zação com cimento são os arenosos. Embora existam solos sem

uma distribuição granulométrica que permita a produção de tijo-

los, existe a possibilidade de misturá-los a outros solos para ob-

tenção de uma mistura de granulometria adequada (ABCP, 1988).

O Manual de Construção de Solo-Cimento (CEPED, 1984) co-

menta que o consumo de cimento depende fundamentalmente

CARACTERÍSTICA

% passando na peneira ABNT 4,8 mm (nº 4)

REQUISITOS (%)

% passando na peneira ABNT 0,075 mm (nº 200)

Limite de liquidez

100

10 a 50

≤ 45

Limite de plasticidade ≤ 18

Page 245: Livro entulho bom

243

do tamanho dos grãos e da sua uniformidade. O acréscimo de

silte e argila, ou a ocorrência de grãos muito uniformes, acarreta

um aumento no consumo de cimento. Por outro lado, a existên-

cia de grãos maiores, areia grossa e pedregulho é benéfica, pois

tais componentes atuam como enchimento, favorecendo a

liberação de uma maior quantidade de cimento para ligar os

grão menores.

Ainda segundo o CEPED (1984), os solos devem ter um teor

mínimo da fração fina, pois a resistência inicial do solo estabilizado

é devida à coesão da fração fina compactada, uma vez que ainda

não se processaram as reações de endurecimento do cimento. Essa

resistência permite desmoldagem e manuseio do solo estabilizado

após prensagem. Além disso, não devem ser utilizados solos que

contenham matéria orgânica, pois essa pode interferir na hidrata-

ção do cimento.

A publicação Fabricação de tijolos de solo-cimento com a utiliza-

ção de prensas manuais (ABCP, 1988) recomenda, para a escolha

do traço mais adequado, moldar tijolos com proporções, em vo-

lume, de cimento e solo de 1:10, 1:12 e 1:14. A proporção adotada

da mistura para a fabricação dos tijolos será a que apresentar menor

consumo de cimento e que atender aos critérios de resistência à

compressão e absorção de água estabelecidos pela NBR 8491.

REQUISITOS PARA CONTROLE DE QUALIDADEDeve-se assegurar que os tijolos e blocos de solo estabilizado

apresentem características adequadas para seu uso em fundações

e paredes de edificações. Nesse sentido, além das diversas reco-

mendações resultantes de projetos de pesquisas desenvolvidos,

apresentadas em publicações variadas, estão disponíveis documen-

Page 246: Livro entulho bom

244USO DO AGREGADO RECICLADO EM TIJOLOS DE SOLO ESTABILIZADO COM CIMENTO

tos que estabelecem requisitos para avaliação dos componentes

produzidos. Buscando estabelecer procedimentos de ensaios e

critérios para produção de tijolos e blocos de solo-cimento, a ABNT,

Associação Brasileira de Normas Técnicas, publicou as seguintes

normas técnicas:

• NBR 8491 — Tijolo maciço de solo-cimento. Especificação.

• NBR 8492 — Tijolo maciço de solo-cimento — Determinação

da resistência à compressão e da absorção de água. Método

de ensaio.

• NBR 10832 — Fabricação de tijolo maciço de solo-cimento

com a utilização de prensa manual. Procedimento.

• NBR 10833 — Fabricação de tijolo maciço e bloco vazado

de solo-cimento com a utilização de prensa hidráulica.

Procedimento.

• NBR 10834 — Bloco vazado de solo-cimento sem função

estrutural. Especificação.

• NBR 10835 — Bloco vazado de solo-cimento sem função

estrutural — Forma e dimensões. Padronização.

• NBR 10836 — Bloco vazado de solo-cimento sem função

estrutural — Determinação da resistência à compressão e da

absorção de água. Método de ensaio.

Para qualificar o tijolo de solo-cimento, a NBR 8491 estabelece a

verificação das suas características em pelo menos treze amostras,

retiradas aleatoriamente em lotes de 10000 a 25000 tijolos. Os

critérios estabelecidos para o controle de qualidade de tijolos de

solo-cimento estão apresentados na Tabela 3.

Esses limites, especificados para o tijolo de solo-cimento, ge-

ralmente são adotados também para avaliação de tijolos de solo

estabilizado, independentemente do tipo de aglomerante ou

material utilizado em substituição ao solo.

Page 247: Livro entulho bom

245

TABELA 3 - LIMITES ESPECIFICADOS PARA TIJOLOS DE SOLO-CIMENTO

EXPERIÊNCIA REALIZADAUSO DO AGREGADO RECICLADO DESALVADOR EM TIJOLOS DE SOLO-CIMENTO

O estudo sobre a utilização do agregado reciclado de Salvador

em tijolos de solo-cimento, desenvolvido pelo Projeto Entulho

Bom, busca contribuir para o atendimento à crescente deman-

da de habitação popular, através da implantação de uma al-

ternativa tecnológica apropriada ao meio urbano, além de

reduzir o impacto ambiental gerado pela própria indústria da

construção civil.

A metodologia adotada consistiu em selecionar um solo, identi-

ficar a proporção adequada de cimento para a fabricação do tijolo

de solo-cimento e, substituindo o solo por proporções variadas

de agregado reciclado, determinar a propriedade física, mecânica

e de durabilidade dos tijolos produzidos.

Para determinação do traço seguiu-se o procedimento indicado

na NBR 10823. Foram adotados traços com teores de 10%, 12% e

14% de cimento, em massa, e determinadas a resistência mecânica e

a absorção de água. Adotou-se o traço que atendesse às condições

Absorção de água

CARACTERÍSTICA

Variação dimensional

EXIGÊNCIA NBR 8491

Resistência à compressão

3 mm

valor médio

valor médio

Nº AMOSTRA

3

10valor individual

valor individual

≥ 2,0 Mpa

≤ 20 %

≥ 1,7 Mpa

≤ 22 %

-+

EX

PE

RIÊ

NC

IA R

EA

LIZ

AD

A

Page 248: Livro entulho bom

246USO DO AGREGADO RECICLADO EM TIJOLOS DE SOLO ESTABILIZADO COM CIMENTO

de resistência à compressão maior ou igual a 2,0 MPa e absorção de

água menor ou igual a 20% e com menor consumo de cimento. Os

traços de 12% e 14% atenderam a essas condições; por apresentar

menor consumo de cimento adotou-se o traço de 12%.

Em seguida, o solo foi substituído por agregado reciclado nas

proporções de 25%, 50%, 75%, 85% e 100% em massa, e determi-

nadas as propriedades dos tijolos produzidos de acordo com os

procedimentos estabelecidos em normas e em outras recomen-

dações técnicas indicadas neste capítulo.

Além da verificação das dimensões, da determinação da re-

sistência à compressão e da absorção de água, também foi ava-

liada a durabilidade dos tijolos. Essa foi determinada pela perda

de massa e resistência à compressão de tijolos submetidos a seis

ciclos de imersão em água e secagem em estufa a 70ºC, com

duração mínima de 24 horas para cada atividade do ciclo. O

ensaio adotado, realizado com base no procedimento estabele-

cido na NBR 13544, também mede a variação volumétrica e de

umidade. Por considerar que as solicitações de abrasão superfi-

cial em paredes são menos severas que as previstas para outros

usos do solo-cimento (em estradas, por exemplo), modificou-

se o procedimento de ensaio, não se empregando o processo

de escovação dos tijolos ao final de cada ciclo. Além disso, o

ensaio foi realizado em tijolos, em substituição aos corpos-de-

prova especificados na NBR 13544. Segundo o Manual de Cons-

trução de Solo-Cimento (CEPED, 1984), a Associação Brasileira

de Cimento Portland – ABCP recomenda, para dosagens de solo-

cimento, uma perda de massa inferior ou igual a 10%, após o 6º

ciclo de imersão e secagem em corpos-de-prova moldados por

compactação no cilindro de Proctor, de acordo com o procedi-

mento estabelecido na NBR 12024.

EX

PE

RIÊ

NC

IA

RE

AL

IZA

DA

Page 249: Livro entulho bom

247

Comparando-se os valores obtidos em tijolos com diferentes

proporções de agregado reciclado com os dos tijolos de solo-

cimento (sem material reciclado), foi possível avaliar a influência

do agregado reciclado nas propriedades dos tijolos de solo estabi-

lizado e o comportamento dos tijolos de solo-agregado reciclado-

cimento. Adotando-se os limites estabelecidos na Tabela 3 e

perda de massa máxima de 10%, determinaram-se as proporções

de agregado reciclado adequadas para serem adicionadas ao

solo selecionado.

Os tijolos foram fabricados numa prensa manual, com capaci-

dade para a moldagem simultânea de três unidades, com dimen-

sões de 22 cm x 11 cm x 5,5 cm. Para evitar a introdução de variá-

veis indesejáveis no estudo, os tijolos foram preparados por um

único operador.

A fabricação dos tijolos e os ensaios necessários ao desenvol-

vimento do trabalho foram realizados nos laboratórios do

Departamento de Ciência e Tecnologia dos Materiais da Escola

Politécnica da UFBA e no Centro de Pesquisa e Desenvolvimento

– CEPED.

MATERIAIS UTILIZADOSPara a fabricação dos tijolos foram utilizados:

• cimento Portland tipo CP II Z 32, marca Poty;

• água potável, fornecida pela concessionária;

• dois diferentes tipos de solos, denominados laterítico e sapro-

lítico, típicos da Região Metropolitana de Salvador;

• agregado reciclado miúdo da Região Metropolitana de Salvador.

As características dos dois solos e do agregado reciclado são

apresentadas na Tabela 4 a seguir:

EX

PE

RIÊ

NC

IA R

EA

LIZ

AD

A

Page 250: Livro entulho bom

248USO DO AGREGADO RECICLADO EM TIJOLOS DE SOLO ESTABILIZADO COM CIMENTO

TABELA 4 - CARACTERÍSTICAS DOS SOLOS E DO AGREGADORECICLADO MIÚDO

APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOSInicialmente foi selecionado o solo laterítico, pois atende aos

limites estabelecidos na NBR 10832, apresentados na Tabela 2. De

acordo com os critérios adotados para dosagem, determinou-se a

proporção de 12% de cimento para a fabricação do tijolo de solo-

cimento. A incorporação do agregado reciclado ao solo laterítico,

no entanto, não permitiu a fabricação de tijolos prensados, pois

diminuiu significativamente a quantidade de material fino, que é o

responsável pela resistência inicial necessária para o manuseio dos

tijolos recém-moldados. Tentou-se modificar esse comportamento

com a adição de cal, além da quantidade de cimento já estabelecida

PROPRIEDADE

Massa específica (g/cm3)

Compactação

• massa específica máx. (g/cm3)

• umidade ótima (%)

Limite de plasticidade (%)

Limite de liquidez (%)

Material que passa na peneira

• 4,8 mm (%)

• 0,075 mm (%)

Composição Granulométrica

• pedregulho (%)

• areia (%)

• silte (%)

• argila (%)

grossa (%)

média (%)

fina (%)

PROCEDIMENTOSOLO

LATERÍTICO

0

2

25

53

1

19

SOLOSAPROLÍTICO

AGREGADORECICLADO

NBR 7181NBR 6502

0

0

9

23

33

35

0

0

10

72

2

16

NBR 7181 100

20

100

68

100

18

NBR 6459 20 62 NL

NBR 7180 15 42

NBR 6508 2,55 2,60 2,59

NP

NBR 7182 1,83

9,3

1,38

21,6

1,86

13,8

EX

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RIÊ

NC

IA

RE

AL

IZA

DA

Page 251: Livro entulho bom

249

(Brum, et al., 2000). Entretanto, constatou-se ser essa uma solução

economicamente inviável, pois a quantidade de cal necessária para

permitir o manuseio do tijolo após prensagem, cerca de 10%,

aumentaria consideravelmente o seu custo.

Partiu-se, então, para o estudo do solo denominado saprolítico,

que apresentava maior teor de finos, permitindo, após a adição

do agregado reciclado, a obtenção de uma mistura com caracte-

rísticas adequadas à fabricação de tijolos prensados.

Os tijolos produzidos com o solo saprolítico e o agregado

reciclado foram submetidos à verificação dimensional e aos tes-

tes para determinação de suas características, de acordo com a

programação indicada na Tabela 5.

TABELA 5 - PROGRAMAÇÃO DE ENSAIOS INDICANDO A QUANTIDADE DETIJOLOS PARA CADA CARACTERÍSTICA ESTUDADA.

� ensaio modoficado, sem escovação

Para cada traço, foram moldados 70 tijolos, perfazendo um to-

tal de 350 unidades. O percentual de cimento de 12% permane-

ceu constante, independentemente da composição do solo e do

agregado reciclado.

Os resultados apresentados na Tabela 6 correspondem aos dos

tijolos preparados com solo saprolítico sem material reciclado e

EX

PE

RIÊ

NC

IA R

EA

LIZ

AD

A

Resistência à compressão

CARACTERÍSTICA

Verificação dimensional

NÚMERO DE TIJOLOS

Massa específica

PROCEDIMENTO

NBR 8492

Medida Individual

CETA nº 4

Durabilidade NBR 13554 �

5

24

5

5

10

Absorção de água

Page 252: Livro entulho bom

250USO DO AGREGADO RECICLADO EM TIJOLOS DE SOLO ESTABILIZADO COM CIMENTO

solo saprolítico com agregado reciclado, nas proporções de 25%, 50%,

75% e 85%. A substituição total do solo não foi estudada, pois os

tijolos moldados não apresentaram resistência inicial suficiente para

a desmoldagem imediata e transporte para área de cura e armaze-

namento. Essa tabela também apresenta os resultados obtidos com

os tijolos produzidos com solo laterítico, sem agregado reciclado.

Os ensaios foram realizados em tijolos com idade superior

a 14 dias.

TABELA 6 - CARACTERÍSTICAS DOS TIJOLOS DE SOLO-CIMENTO EDE SOLO-AGREGADO RECICLADO-CIMENTO

1 Tendência para tijolos com solo saprolítico2 Material que passa na peneira 0,075mm

EX

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NC

IA

RE

AL

IZA

DA

CARACTERÍSTICA

Tolerância nas dimensões (mm)

LATERÍTICO SAPROLÍTICO

TENDÊNCIA 1

TEOR DE AGREGADO RECICLADO

Solo-cimento

Solo-cimento Solo-agregado reciclado-cimento

0% 0% 25% 50% 75% 85%

20Teor de finos 2 (%)

Massa específica (g/m3)

Absorção de água (%)

Resistência àcompreensão (MPa)

Perda de massa (%)

natural

após ciclo

68 62 48 33 26 decrescente

3 3 3 3 3 3 estável

2,3 1,3 1,5 1,5 1,6 1,7 crescente

12 30 21 18 15 13 decrescente

2,1 1,5 2,5 3,0 3,0 3,6 crescente

— — 2,7 3,2 3,5 4,8 crescente

— — 8,7 9,3 9,5 11,8 crescente

-+ -+ -+ -+ -+ -+

Page 253: Livro entulho bom

251

Os resultados obtidos para os tijolos de solo-cimento compro-

vam a influência do tipo de solo empregado. Os resultados de

resistência à compressão e de absorção de água do tijolo de solo

saprolítico não atendem aos limites estabelecidos na NBR 8491

(Tabela 3). Tampouco atendem aos critérios para seleção de solos

(Tabela 2). Confirma-se, então, que os limites relativos à compo-

sição granulométrica e os índices de consistência (Tabela 2) são

adequados para seleção de solos.

As dimensões reais dos tijolos apresentaram pequena variação

em relação às dimensões do molde (22 cm x 11 cm x 5,5 cm), que

atendem à tolerância de 3 mm estabelecida na NBR 8491. Deve-se

ressaltar que a altura do tijolo é determinada pela energia de com-

pactação e pela quantidade de material introduzido no molde,

antes da prensagem. No processo de fabricação com prensa manual,

a altura do tijolo depende diretamente da atuação do operador.

Com exceção do aspecto dimensional, a proporção do agrega-

do reciclado influencia diretamente outras propriedades do tijolo

prensado. Maiores proporções do agregado reciclado aumentaram

o teor de material retido na peneira 0,075 mm, de natureza areno-

sa, e diminuíram o teor de finos. O aumento dos teores de agrega-

do reciclado proporciona tijolos mais compactos, com massa es-

pecífica mais elevada, e com valores decrescentes de absorção de

água por imersão. Além disso, obtêm-se tijolos mais resistentes à

compressão, porém menos resistentes às variações hidrotérmicas

e às intempéries, devido ao aumento na perda de massa.

Verifica-se que a perda de massa aumenta à medida que são

adicionados maiores teores de agregado reciclado. Entretanto, não

foram verificadas variações de volume e de umidade nos tijolos pro-

duzidos com diferentes teores de agregado reciclado, ao longo dos

seis ciclos de molhagem e secagem. Os resultados da resistência à

EX

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AD

A

Page 254: Livro entulho bom

252USO DO AGREGADO RECICLADO EM TIJOLOS DE SOLO ESTABILIZADO COM CIMENTO

compressão, ao final dos ciclos de imersão e secagem, são maio-

res que os dos tijolos em condição natural. Supõe-se que o pro-

cesso de imersão e secagem melhora a hidratação e modifica a

forma dos compostos hidratados do cimento, aumentando a

resistência dos tijolos.

As Figuras 2, 3 e 4 mostram que existe relação linear entre o

teor de finos e a resistência à compressão, absorção de água e

perda de massa dos tijolos com solo saprolítico e teor de agrega-

do reciclado utilizado.

FIGURA 2 - RELAÇÃO ENTRE O TEOR DE FINOS ERESISTÊNCIA À COMPRESSÃO

FIGURA 3 - RELAÇÃO ENTRE O TEOR DE FINOS E ABSORÇÃO DE ÁGUA

EX

PE

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NC

IA

RE

AL

IZA

DA

Teor de finos (%)

Re

sist

ên

cia

àc

om

pre

ssã

o (M

Pa

)

Teor de finos (%)

Ab

sorç

ão

de

ág

ua

(%

)

Page 255: Livro entulho bom

253

FIGURA 4 - RELAÇÃO ENTRE O TEOR DE FINOS E PERDA DE MASSAAPÓS SEIS CICLOS DE IMERSÃO E SECAGEM

As Figuras 5, 6 e 7 apresentam as médias dos valores de resis-

tência à compressão, absorção de água e perda de massa, respec-

tivamente, em função do teor de agregado reciclado de cada tra-

ço e dos limites adotados.

FIGURA 5 - RESISTÊNCIA À COMPRESSÃO DOS TIJOLOS EM FUNÇÃODA PROPORÇÃO DE AGREGADO RECICLADO USADO NO TRAÇO

EX

PE

RIÊ

NC

IA R

EA

LIZ

AD

A

Teor de finos (%)

Pe

rda

de

ma

ssa

(%

)

Re

sist

ên

cia

à c

om

pr e

ssã

o (M

Pa

)

Proporção de agregado reciclado (%)

Page 256: Livro entulho bom

254USO DO AGREGADO RECICLADO EM TIJOLOS DE SOLO ESTABILIZADO COM CIMENTO

FIGURA 6 - ABSORÇÃO DE ÁGUA DOS TIJOLOS EM FUNÇÃO DAPROPORÇÃO DE AGREGADO RECICLADO USADO NO TRAÇO

FIGURA 7 - PERDA DE MASSA DOS TIJOLOS EM FUNÇÃO DAPROPORÇÃO DE AGREGADO RECICLADO NO TRAÇO

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IZA

DA

Ab

sorç

ão

de

ág

ua

(%

)

Proporção de agregado reciclado (%)

Pe

rda

de

ma

ssa

(%

)

Proporção de agregado reciclado (%)

Page 257: Livro entulho bom

255

Os tijolos de solo-agregado reciclado-cimento atenderam ao

limite mínimo de resistência à compressão. Com teores de agre-

gado reciclado acima de 50%, atenderam ao limite máximo de

absorção de água; abaixo de 75%, atenderam ao limite máximo

para perda de massa.

A Tabela 7 indica as proporções de agregado reciclado adicionadas

ao solo estudado e que atendem a cada um dos critérios adotados.

TABELA 7 - TEOR DE AGREGADO RECICLADO APROVADO EMFUNÇÃO DOS REQUISITOS ADOTADOS

Dessa forma, pode-se considerar que, para o solo utilizado, a

proporção de agregado reciclado deve situar-se na faixa de 50% a

75%; o limite inferior é determinado pelo critério de absorção de

água, e o limite superior pela durabilidade (perda de massa). Essa

faixa também atende ao critério estabelecido na NBR 10832 para

seleção de solos adequados à fabricação de tijolos de solo-cimento,

relativo à percentagem de material com dimensão de grãos menor

que 0,075 mm (teor de finos).

EX

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IA R

EA

LIZ

AD

A

Resistência à compressão média

REQUISITO

Material menor 0,075mm

TEOR DE AGREGADO RECICLADO

Variação dimensional máxima

CRITÉRIO

≥ 2,0 MPa

10% a 50%

3 mm

Absorção de água ≤ 20%

Perda de massa

Especificação NBR 10832

Adotado na experiência de tijolos solo-agregado reciclado-cimento

≤ 10% —

0% 25% 50% 75% 85%

-+

Page 258: Livro entulho bom

256USO DO AGREGADO RECICLADO EM TIJOLOS DE SOLO ESTABILIZADO COM CIMENTO

Por fim, observa-se que a resistência à compressão dos tijolos

de solo-agregado reciclado-cimento, com proporção de 50% e 75%,

é superior ao resultado obtido com tijolos de solo-cimento de solo

laterítico (Tabela 6). Isso comprova que o desempenho do tijolo de

solo-agregado reciclado-cimento é semelhante ou superior ao do

tijolo de solo-cimento.

CONCLUSÃOO estudo realizado comprova que é possível utilizar o agregado

reciclado de Salvador em tijolos de solo-cimento. As características

do solo e do material reciclado são diferentes nas diversas regiões,

e as proporções adequadas para substituição do solo por agregado

reciclado devem ser analisadas em cada caso distinto.

Este estudo definiu uma metodologia fundamentada em ex-

periências anteriores e recomendações técnicas para fabricação de

tijolos de solo-cimento, assim como adotou critérios para avaliação

dos resultados que podem ser usados em estudos sobre a incor-

poração de outros materiais para fabricação de tijolos de solo esta-

bilizado prensado.

Através da experiência realizada, identificou-se, como propor-

ção adequada para a fabricação de tijolos de solo-agregado

reciclado-cimento, a faixa entre 50% e 75% do agregado reciclado

de Salvador, em substituição ao solo saprolítico estudado. As

demais proporções não atenderam aos critérios estabelecidos

neste estudo.

Deve-se ressaltar que o estudo utilizou apenas um tipo de

prensa manual. A utilização de outros tipos de prensa pode alte-

rar os resultados obtidos. Supõe-se que prensas mais eficientes

EX

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AL

IZA

DA

Page 259: Livro entulho bom

257

podem melhorar o comportamento dos tijolos de solo-agregado

reciclado-cimento.

A reciclagem do entulho na fabricação de tijolos de solo estabili-

zado promove o aproveitamento racional dos resíduos de constru-

ção e demolição, transformando-os em matéria-prima para obras

de construção, o que favorece, principalmente:

• o aproveitamento de resíduos pelo próprio setor que o produz;

• a minimização de uso de recursos naturais;

• a redução da área para descarte (disposição).

Além disso, a utilização do agregado reciclado em tijolos de solo

estabilizado amplia as possibilidades de reciclagem do entulho,

material considerado indesejável pela população.

O entulho, após devidamente reciclado, pode ser transformado

em matéria-prima para construção civil, pois melhora determina-

das características do solo, permitindo seu aproveitamento em

tijolos de solo-agregado reciclado-cimento. Desse modo, amplia

a oferta de alternativas tecnológicas simplificadas, para a fabricação

de moradias populares.

Estudos como este contribuem para o desenvolvimento de um

processo de edificação sustentável na Região Metropolitana de Sal-

vador, melhorando a qualidade de vida de sua população. Ademais,

buscou-se aqui analisar as características de um material reciclado,

desenvolvendo-lhe uma aplicação apropriada, proporcionando

ainda fundamentação ao meio técnico e, por fim, apresentando à

sociedade uma solução harmoniosa para o uso do entulho.

EX

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IA R

EA

LIZ

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A

Page 260: Livro entulho bom

258USO DO AGREGADO RECICLADO EM TIJOLOS DE SOLO ESTABILIZADO COM CIMENTO

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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de tijolos de solo-cimento com a utilização de prensas hidráulicas: prática

recomendada. São Paulo, 1989. 8p.

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE CIMENTO PORTLAND (ABCP). Fabricação

de tijolos de solo-cimento com a utilização de prensas manuais: prática

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ASSIS, João B.S. de. Bloco intertravado de solo-cimento “Tijolito”. In:

WORKSHOP ARQUITETURA DE TERRA, 1995, São Paulo. Anais... São Paulo:

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BRUM, Irineu A. S. et al. Recycling of Construction Waste from Salvador -

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SYMPOSIUM ON ENVIRONMENTAL GEOTHECNOLOGY AND GLOBAL

SUSTAINABLE DEVELOPMENT, 5., 2000, Belo Horizonte. Anais... Belo

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CALMON, João et al. Aproveitamento do resíduo de corte de granito para

produção de tijolos de solo cimento. In: ENTAC 98 - QUALIDADE NO

PROCESSO CONSTRUTIVO, 1998, Florianópolis. Anais... Florianópolis:

NPC/ECV/CPC/UESC, 1998. p.899-907.

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tijolos prensados de solo estabilizado. Brasília: IBICT, 1995. 38 p. (Banco de

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CENTRO DE PESQUISAS E DESENVOLVIMENTO (CEPED). Manual de

construção com solo-cimento. 3. ed. São Paulo: ABCP, 1984. 147 p.

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FERRAZ JUNIOR, Francisco de A.C. Equipamentos modernos para a

produção de tijolos de terra prensada. In: WORKSHOP ARQUITETURA DE

TERRA, 1995, São Paulo. Anais ... São Paulo: NUTAU-FAUUSP, 1995. p.163-

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INSTITUTO DE PESQUISAS TECNOLÓGICAS DO ESTADO DE SÃO PAULO

(IPT). Utilização de blocos vazados de solo-cimento na construção de

habitações. 2. ed. atual. Rio de Janeiro: BNH, 1985. 51 p.

MAFFEI, C. A. A. Casas baratas ou casas de baixo custo? Téchne, São Paulo,

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NEVES, Célia M. M. Habitação e saneamento com materiais alternativos. In:

SEMINÁRIO LATINO-AMERICANO ALTERNATIVAS TECNOLÓGICAS PARA

HABITAÇÃO E SANEAMENTO, 1987, Olinda. Anais... Brasília: MHU/PNUD,

1988. p. 273-282.

NEVES, Célia M. M. Inovações tecnológicas em construção com terra: o

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PRODUÇÃO DE EDIFICAÇÕES, 1993, São Paulo. Anais... São Paulo: EPUSP/

ANTAC, 1993. p. 221-230.

NEVES, Célia M. M. Tijolos de solo-cimento. In: DEZ ALTERNATIVAS

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PINTO, T. P. Resultados da gestão diferenciada. Téchne, São Paulo, n. 31.

p. 31-34, nov./dez., 1997. (Reciclagem).

WATANABE, Mário. O desafio de privatizar a moradia popular. Qualidade

na construção, São Paulo, n. 22, p.12-20, 2000. (Habitação).

Page 262: Livro entulho bom

260USO DO AGREGADO RECICLADO EM TIJOLOS DE SOLO ESTABILIZADO COM CIMENTO

NORMAS TÉCNICAS CITADAS1

NBR 6459 - Solo: determinação do limite de liquidez. Método de ensaio.

1984.

NBR 6502 - Rochas e solos: terminologia. 1995.

NBR 6508 - Grãos de solos que passam na peneira de 4,8 mm: determinação

da massa específica: método de ensaio. 1984.

NBR 7180 - Solo: determinação do limite de plasticidade: método de

ensaio. 1984.

NBR 7181 - Solo: análise granulométrica: método de ensaio. 1984.

NBR 7182 - Solo: ensaio de compactação: método de ensaio. 1982.

NBR 8491 - Tijolo maciço de solo-cimento: especificação. 1984.

NBR 8492 - Tijolos maciços de solo-cimento: determinação da resistência à

compressão e da absorção: método de ensaio. 1982.

NBR 10004 - Resíduos sólidos: classificação. 1987.

NBR 10832 - Fabricação de tijolo maciço de solo-cimento com a utilização

de prensa manual: procedimento. 1989.

NBR 10833 - Fabricação de tijolo maciço e bloco vazado de solo-cimento

com a utilização de prensa hidráulica: procedimento. 1989.

NBR 10834 - Bloco vazado de solo-cimento sem função estrutural:

especificação. 1994.

NBR 10835 - Bloco vazado de solo-cimento sem função estrutural: forma

e dimensões: padronização. 1994.

NBR 10836 - Bloco vazado de solo-cimento sem função estrutural:

determinação da resistência à compressão e da absorção de água: método

de ensaio. 1994.

NBR 12024 - Solo-cimento: moldagem e cura dos corpos-de-prova

cilindrícos: método de ensaio. 1992.

NBR 13554 - Solo-cimento: durabilidade por molhagem e por secagem:

método de ensaio. 1996.

1 Publicação ABNT - Associação Brasileira de Normas Técnicas, Rio de Janeiro.

Page 263: Livro entulho bom

261

Célia Maria Martins Neves - Engenheira Civil, Mestre em Engenharia Ambiental e Urbana -

UFBA, Pesquisadora do CEPED - Centro de Pesquisa e Desenvolvimento

Alex Pires Carneiro - Engenheiro Civil, Mestrando em Engenharia Ambiental e Urbana - UFBA,

Coordenador do Projeto Entulho Bom

Dayana Bastos Costa - Estudante de Engenharia Civil - UFBA, Pesquisadora do Projeto

Entulho Bom

Page 264: Livro entulho bom

262USO DO AGREGADO RECICLADO EM ARGAMASSAS DE REVESTIMENTO

CAPÍTULO VIII

Page 265: Livro entulho bom

263

USO DO AGREGADORECICLADO EM ARGAMASSAS

DE REVESTIMENTO

Marcos Jorge Almeida Santana

Alex Pires Carneiro

Taís Santos Sampaio

Page 266: Livro entulho bom

264USO DO AGREGADO RECICLADO EM ARGAMASSAS DE REVESTIMENTO

As grandes cidades apresentam, atualmente, processos de ur-

banização cada vez mais acelerados, que se caracterizam por não

obedecerem um plano de desenvolvimento adequado, gerando

uma ocupação desordenada. Esses processos atingem bastante a

população de baixa renda, que, na maioria dos casos, constrói

suas casas em áreas distantes do centro, ou em terrenos invadi-

dos, à beira de encostas ou em áreas chamadas de risco. Feitas

com diversos tipos de materiais ou em alvenaria de tijolos cerâ-

micos, quase sempre sem revestimento, essas habitações, no seu

conjunto, formam painéis de casas amontoadas e nuas.

O revestimento da habitação, além de contribuir para a harmo-

nia estética, assume um importante papel na melhoria da qualidade

de vida dessa população, pois promove a impermeabilização da al-

venaria, dificultando a infiltração de água, a proliferação de ácaros e

fungos, melhorando as condições respiratórias dos habitantes, bem

como impedindo o alojamento, em frestas, de insetos causadores

de doenças graves. Entretanto, para esse contingente da popula-

ção, carente de recursos financeiros, a questão mais urgente não é a

estética ou a possibilidade de problemas futuros de saúde, e sim a

alimentação e o abrigo imediato, mesmo que precário.

A utilização de agregados reciclados em argamassas de revesti-

mento surge como alternativa para atender à enorme demanda

por revestimentos, uma vez que esse material apresenta desem-

penho adequado, conforme vários trabalhos publicados sobre o

tema (Silva et al., 1997; Levy,1997; Pinto, 1998). Além disso, o seu

uso promove a diminuição de custos, ajuda a solucionar o proble-

ma de destinação do entulho e contribui para a melhoria das con-

dições das habitações populares.

A reciclagem do entulho na confecção de argamassa tem a sua

utilização mais frequente em canteiro de obras. Nos últimos anos,

Page 267: Livro entulho bom

265

diversas construtoras em atividade no país passaram a utilizar ar-

gamassas produzidas com agregado reciclado, em substituição às

adições e aos agregados convencionais (Levy, 1997). Desse modo,

materiais anteriormente considerados como perdas do processo

construtivo — pedaços de blocos e tijolos cerâmicos, argamassas

e concretos endurecidos, entre outros — passaram a ser reciclados.

As argamassas produzidas com agregado reciclado têm apre-

sentado desempenho significantemente superior ao das argamas-

sas convencionais. Contudo, a maioria dos estudos realizados so-

bre o tema avalia o desempenho do material reciclado no próprio

canteiro de obras. Outras alternativas, tais como a utilização de

agregados produzidos em usinas de reciclagem, permitem esten-

der os benefícios da reciclagem a um número maior de usuários,

tornando-os acessíveis à população de baixa renda.

Existem algumas diferenças entre os agregados reciclados no can-

teiro de obras ou em usina de reciclagem. A principal é que, dentro

do canteiro, pode-se facilmente separar os materiais que serão

reciclados. Por exemplo, durante a execução da obra, selecionam-

se, para reciclagem, os restos de concreto (na fase de estrutura), os

restos de blocos (na fase de levante) e os restos de argamassas (na

fase de acabamento), o que possibilita a produção de agregado

reciclado com composição mais homogênea. Já o entulho reciclado

em usina origina-se de diversas obras da região e, como apresenta-

do em capítulos anteriores, é constituído de diversos tipos de mate-

riais, cuja separação agrega custos ao processo, podendo tornar eco-

nomicamente inviável a reciclagem. Portanto, devem-se buscar apli-

cações que possibilitem a utilização desse material de origem hetero-

gênea e com características diferentes do reciclado em canteiro.

Nesse sentido, o Projeto Entulho Bom desenvolveu estudos

de laboratório sobre o uso do agregado reciclado de Salvador,

Page 268: Livro entulho bom

266USO DO AGREGADO RECICLADO EM ARGAMASSAS DE REVESTIMENTO

produzido de forma similar ao da usina de reciclagem, avaliando

o desempenho desse material em argamassas de revestimento,

em substituição total ou parcial da areia e do arenoso (material areno-

silto-argiloso). Esse estudo promoveu a elaboração e a seleção das

dosagens, a produção das argamassas e a análise de suas proprie-

dades físicas e mecânicas nos estados fresco e endurecido, tanto

em corpos-de-prova quanto em painéis de argamassas, aplicadas

sobre alvenaria.

UTILIZAÇÃO DO AGREGADO RECICLADOEM ARGAMASSAS

O reaproveitamento de resíduos na construção civil é uma ati-

vidade que já vem sendo desenvolvida há algum tempo. Subpro-

dutos de carvão e cinzas volantes têm sido utilizados, há aproxi-

madamente cinco décadas, em concretos de cimento Portland

(Kelly & Willians, 1995 citado por Zordan, 1997). Entretanto, a

reciclagem de entulho para a produção de materiais de construção

começa a despertar interesse no Brasil apenas na década de 80,

com os estudos iniciais de Pinto (1986).

Uma das formas de reciclagem desse resíduo destina-se à sua

utilização em argamassas. A fração fina do material reciclado ob-

tido da britagem ou moagem do entulho, a depender das suas

características, pode ser utilizada nas argamassas, em substitui-

ção às adições ou aos agregados convencionais. A granulome-

tria semelhante à da areia permite o seu uso como agregado

para argamassas de assentamento e revestimento, as quais têm

apresentado desempenho similar ou superior às convencio-

nais, tanto em ensaios de laboratório quanto em aplicações de

campo (Pinto, 1998).

Page 269: Livro entulho bom

267

Levy (1997) realizou experimentos utilizando quatro tipos de

materiais que compõem o entulho, processando-os em moinho

de rolo. Foram, então, produzidos 8 diferentes tipos de argamas-

sas com o material processado. A partir desses estudos, foi obser-

vado que a utilização de agregados reciclados permitiu uma redu-

ção de 30% no consumo de cimento da argamassa e um incre-

mento nas propriedades mecânicas, em função do teor de mate-

riais cerâmicos presentes no entulho. Os resultados desse traba-

lho demonstram que a utilização do agregado reciclado miúdo

para a produção de argamassas apresenta vantagens, principal-

mente pela redução no consumo de cimento.

Hamassaki; Sbrighi; Florindo (1996) avaliaram a influência do

agregado reciclado nas argamassas, partindo de um traço referência

1:6 (cimento:areia, em volume) com uso de cal. Esses estudos mos-

tram um incremento na resistência à compressão das argamassas

aos 28 dias, quando é usado o agregado reciclado. Não foi avaliada

a influência do agregado reciclado na retenção de água, uma vez

que a cal interfere significativamente nessa propriedade.

Silva et al. (1997) estudaram quatro traços experimentais de ar-

gamassas com adição de agregado reciclado numa obra de Salva-

dor. Essas argamassas apresentaram comportamento satisfatório

no estado fresco e endurecido, evidenciando uma redução no con-

sumo de cimento.

Recentemente, Miranda (2000) analisou parâmetros que po-

dem prevenir a fissuração de revestimentos de argamassas que

contêm agregado reciclado. Avaliou, para tal, fatores relativos ao

tipo de entulho, sua proporção nas argamassas e o tipo de técnica

construtiva utilizada para esses revestimentos. Nesse trabalho,

foram estudados doze traços de argamassas com diferentes com-

posições e proporções de entulho, feitas a partir da moagem de

Page 270: Livro entulho bom

268USO DO AGREGADO RECICLADO EM ARGAMASSAS DE REVESTIMENTO

blocos cerâmicos, blocos de concreto e argamassa de cimento,

cal e areia, em moinho tipo argamassadeira, e aplicados em pai-

néis de alvenaria de blocos de concreto com chapisco.

As argamassas com agregado reciclado vêm sendo utilizadas

nas últimas décadas em diversas obras de vários países como Israel,

Argentina e Brasil. Em São Paulo, são encontradas obras concluí-

das nas décadas de 80 e 90, onde foi usado esse tipo de argamas-

sa, sem apresentar manifestações patológicas (Levy, 1997). Em Sal-

vador, o melhor exemplo é o Edifício Mansão Bernardo Martins

Catarino, obra de padrão luxo, construída em meados da década

de 90, onde se reciclou o entulho no canteiro, produzindo arga-

massas com agregado reciclado sem que, até o momento, se apre-

sentem notícias de patologias.

O bom desempenho do agregado reciclado na aplicação em ar-

gamassas pode ser atribuído à presença de aglomerantes ainda

não inertizados e de resíduos cerâmicos com características pozolâ-

nicas, bem como à maior porosidade de suas partículas, o que

privilegia o início das reações químicas, incrementando as proprie-

dades mecânicas das argamassas, devido ao efeito pozolânico

normalmente apresentado pelo material reciclado (Pinto, 1998).

Dessa forma, podem ser definidas as proporções de materiais

para argamassas com agregado reciclado, as quais, além de apre-

sentarem desempenho adequado, promovem sensível redução

no preço do produto final. Essa redução pode ser obtida tanto

pelo baixo custo do agregado como pela redução do consumo de

cimento e cal (Pinto, 1998).

A utilização de agregado reciclado na produção de argamassas

apresenta outras vantagens, dentre as quais podem-se citar: a

diminuição dos impactos gerados pela disposição incorreta do

entulho, como enchentes e assoreamento de rios e córregos, a

Page 271: Livro entulho bom

269

preservação das reservas naturais, devido à substituição de matéria-

prima convencional por material reciclado, além da otimização

do uso de aterros, em função da conseqüente diminuição de resí-

duos descartados (Carneiro et al., 2000).

Apesar de a maior ênfase comercial voltar-se para a reciclagem

dentro do canteiro de obras, devido à inexistência de custos com

transporte do material reciclado, há grandes perspectivas para a

reciclagem de entulho nas centrais de reciclagem. Essas centrais,

além de processarem o entulho, podem produzir argamassas, blo-

cos, concretos, entre outros materiais, com controle tecnológico

adequado (Pinto, 1992).

Nesse sentido, Lima (1999a) apresentou diretrizes para a pro-

dução, normalização e uso do agregado reciclado em argamassas

e concretos. Também foram apresentados, nesse trabalho, textos

informativos dirigidos aos produtores e usuários de agregado reci-

clado, no intuito de auxiliá-los na correta utilização do material

reciclado nesses tipos de aplicações, levando-se em consideração

a segurança do usuário e a qualidade do produto.

O uso de agregado reciclado para a execução do revestimento,

importante elemento construtivo de edificações, contribui para a

maior aceitação do mercado consumidor do uso de materiais

reciclados de qualidade e bom desempenho, além de promover a

conscientização sobre a necessidade da reciclagem do entulho.

AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO DAS ARGAMASSASDE REVESTIMENTO

Algumas características básicas devem ser atendidas pelas arga-

massas de revestimento de edificações, como resistência mecânica,

durabilidade, baixa permeabilidade, pouca retração, isolamento

Page 272: Livro entulho bom

270USO DO AGREGADO RECICLADO EM ARGAMASSAS DE REVESTIMENTO

térmico e acústico — no estado endurecido — e trabalhabilidade,

plasticidade e retenção de água — no estado fresco. O completo

entendimento do comportamento das argamassas requer a avalia-

ção das condições de produção, de exposição do revestimento,

da ação dos usuários e do modo como essas condições influem

no seu desempenho (Cincotto; Silva; Cascudo, 1995).

O desempenho de um produto pode ser definido pelo grau de

satisfação das necessidades do usuário. Para a execução de reves-

timentos com bom desempenho, é preciso compreender as fun-

ções e propriedades das argamassas que os constituem e dos

substratos que lhes servem de base.

Segundo Cincotto; Silva; Cascudo (1995), para a análise do de-

sempenho de uma argamassa de revestimento, deve-se avaliar o

seu comportamento em três etapas distintas:

• durante o seu preparo e no período em que se encontra no

estado fresco;

• no período após a aplicação sobre o substrato, quando a ar-

gamassa se encontra em endurecimento;

• no período de uso da edificação, quando o revestimento (ar-

gamassa endurecida) sofre os efeitos provenientes da ação

dos usuários e das condições de exposição.

Dessa forma, as propriedades das argamassas são avaliadas tanto

no estado fresco quanto no endurecido, sendo que, nesse último, o

material é estudado tanto em corpos-de-prova quanto em painéis que

simulam a forma de utilização da argamassa de revestimento. Algumas

das principais propriedades das argamassas são descritas a seguir.

PROPRIEDADES DA ARGAMASSA NO ESTADO FRESCO

Conhecer o comportamento das argamassas no estado fresco é

fundamental, uma vez que boa parte das deficiências de qualidade

Page 273: Livro entulho bom

271

que o revestimento apresenta, no estado endurecido, é resultado

do comportamento inadequado da argamassa no estado fresco

(Gomes, 2000). A seguir, são descritos os principais ensaios utiliza-

dos para avaliar o comportamento da argamassa no estado fresco.

CONSISTÊNCIA

Essa propriedade é um indicador da trabalhabilidade, servindo

de parâmetro para a determinação da quantidade de água neces-

sária à mistura a fim de que a argamassa alcance uma trabalha-

bilidade desejável (ensaio descrito na NBR 13276). A consistência

pode ser alterada em função da relação água/aglomerante, da re-

lação aglomerante/agregado, da relação agregado/adição e da

natureza e qualidade do aglomerante ou da adição utilizada na

argamassa (Cincotto; Silva; Cascudo, 1995).

DENSIDADE DE MASSA E TEOR DE AR INCORPORADO

A densidade de massa das argamassas (também chamada de massa

específica real) e o teor de ar incorporado durante o processo de

mistura são determinados segundo o ensaio descrito na NBR 13278.

Conhecendo esses parâmetros, pode-se calcular o consumo real de

cimento por metro cúbico. A partir da avaliação do consumo de ci-

mento, é possível estimar o custo de produção das argamassas. Além

disso, o consumo de cimento é um dos principais fatores relaciona-

dos com as propriedades das argamassas no estado endurecido.

RETENÇÃO DE ÁGUA

A retenção de água é medida pela capacidade de a argamassa

fresca manter sua trabalhabilidade quando sujeita a solicitações

como evaporação e sucção, as quais provocam perda de água.

Essa propriedade, determinada segundo o ensaio descrito na NBR

13277, está relacionada à superfície específica dos materiais com-

ponentes da argamassa e à relação aglomerante/aglomerante,

entre outros fatores (Cincotto; Silva; Cascudo, 1995).

Page 274: Livro entulho bom

272USO DO AGREGADO RECICLADO EM ARGAMASSAS DE REVESTIMENTO

PROPRIEDADES DA ARGAMASSA NO ESTADOENDURECIDO – ARGAMASSAS EM CORPOS-DE-PROVA

As propriedades das argamassas determinadas em ensaios rea-

lizados em corpos-de-prova avaliam, em laboratório, o comporta-

mento do material, constituindo-se, basicamente, na análise da

resistência mecânica e da sua permeabilidade.

RESISTÊNCIA À COMPRESSÃO E RESISTÊNCIA À TRAÇÃO

POR COMPRESSÃO DIAMETRAL

A resistência mecânica é a propriedade de as argamassas endu-

recidas resistirem às tensões de tração, compressão ou cisalha-

mento a que o revestimento pode estar sujeito.

As argamassas de revestimento são usualmente solicitadas a re-

sistir a pequenos esforços de compressão. As solicitações à tração,

cisalhamento ou flexão têm ordem de grandeza muito maior. Os

esforços gerados por essas tensões provêm de cargas estáticas ou

dinâmicas decorrentes de fenômenos térmicos ou climáticos, ou,

ainda, das solicitações durante o período de uso da edificação

(Cincotto; Silva; Cascudo, 1995).

Os ensaios de determinação da resistência à compressão axial

e da resistência à tração por compressão são descritos na NBR

13279 e na NBR 7222, respectivamente.

PERMEABILIDADE

A permeabilidade é a propriedade da argamassa endurecida que

caracteriza a passagem de água através do material, por meio de

infiltração sob pressão, capilaridade ou difusão de vapor de água.

Os principais fatores que influenciam a permeabilidade de uma ar-

gamassa são a relação água / cimento, a granulometria do agregado,

a natureza e o teor do aglomerante. A percolação de água em um

revestimento também depende das características do substrato, ou

seja, da superfície onde a argamassa é assentada (Cincotto; Silva;

Cascudo, 1995).

Page 275: Livro entulho bom

273

A capacidade de proteção das argamassas de revestimento en-

durecidas, contra a ascensão capilar de água, é avaliada através do

ensaio de determinação da absorção de água por capilaridade,

descrito no procedimento CETA nº 5/98, baseado na NBR 9779

(Neves & Maciel, 1998a).

Por sua vez, o ensaio de determinação da absorção de água por

imersão, do índice de vazios e da massa específica, descrito na

NBR 9778, avalia a estrutura de poros da argamassa endurecida.

Os vazios encontrados na argamassa são formados por ar incor-

porado ou aprisionado, ou decorrentes da evaporação do exces-

so de água. O teor de ar tem influência na resistência dos revesti-

mentos e na absorção de água, limitando, assim, a dosagem de

aditivos incorporadores de ar (Cincotto; Silva; Cascudo, 1995).

PROPRIEDADES DA ARGAMASSA NO ESTADOENDURECIDO - ARGAMASSAS EM PAINÉIS

As propriedades das argamassas no estado endurecido estão

relacionadas às características do substrato e da interface revesti-

mento/substrato. Portanto, essas propriedades devem ser avalia-

das numa argamassa aplicada sobre um substrato. A alvenaria de

blocos cerâmicos é um dos substratos para aplicação da argamassa

mais utilizados no país. As principais propriedades avaliadas em

painéis de argamassa endurecida, aplicada sobre alvenaria, são

apresentadas a seguir.

RESISTÊNCIA DE ADERÊNCIA À TRAÇÃO – ARRANCAMENTO

A resistência de aderência à tração avalia a capacidade de as arga-

massas resistirem a esforços normais de tração. Essa propriedade é

significativamente influenciada por diversos fatores: absorção de

água, resistência mecânica, textura superficial, condições de execu-

ção do assentamento da base e natureza do aglomerante (Cincotto;

Silva; Cascudo, 1995).

Page 276: Livro entulho bom

274USO DO AGREGADO RECICLADO EM ARGAMASSAS DE REVESTIMENTO

Nas edificações, uma das maiores razões de falha das argamassas

de revestimento está relacionada com a perda ou a falta de ade-

rência ao substrato. Assim, a capacidade de a argamassa obter uma

aderência adequada, resistente e durável junto ao substrato, é uma

das mais importantes propriedades relativas ao comportamento

de um revestimento.

A NBR 13528 descreve o ensaio utilizado para a determinação

dessa propriedade. Os resultados obtidos nesse ensaio geralmen-

te são muito variáveis, devido ao fato de a resistência ao arran-

camento ser a medida da interação argamassa/substrato, depen-

dendo, portanto, das características de ambos.

DUREZA SUPERFICIAL

O ensaio para determinação da dureza superficial do revesti-

mento, descrito no procedimento CETA nº 6/98, deve ser realizado

antes de se submeter o painel aos ensaios de resistência de aderên-

cia à tração e de absorção de água (Neves & Maciel, 1998b). Os

valores de leitura são variáveis, de acordo com imperfeições loca-

lizadas no revestimento.

PERMEABILIDADE

A permeabilidade de uma argamassa já aplicada sobre um

substrato pode ser avaliada pelo ensaio de absorção de água por

sucção. Ainda não existe norma brasileira que estabeleça o ensaio

para a determinação dessa propriedade, sendo, portanto, utiliza-

do o procedimento CETA no 7/99 (Gomes, 1999). Esse ensaio ava-

lia a passagem de água através da argamassa por meio de infiltra-

ção sob pressão. Nesse ensaio, mede-se a quantidade de água

absorvida por uma superfície de argamassa em um determinado

tempo, simulando um revestimento submetido a chuva com

ventos fortes, de aproximadamente 140 km/h.

Page 277: Livro entulho bom

275

CRITÉRIOS DE AVALIAÇÃO DAS ARGAMASSASDE REVESTIMENTO

As propriedades que interferem no desempenho em serviço

das argamassas de revestimento são muitas, porém ainda são pou-

cos os indicadores estabelecidos para avaliar seu comportamento

em serviço. A Associação Brasileira de Normas Técnicas — ABNT,

apesar de apresentar diversos procedimentos de ensaio para ar-

gamassas de revestimento, estabelece apenas critérios para avaliar

a resistência de aderência à tração (NBR 13749).

A NBR 13749 estabelece os limites mínimos de resistência à tra-

ção para revestimentos de argamassas, conforme o local de apli-

cação e o tipo de acabamento (Tabela 1). Para que o revestimento

atenda a essa especificação, a argamassa deverá apresentar, pelo

menos, quatro valores, dentre os seis resultados do ensaio de resis-

tência de aderência à tração, superiores aos limites estabelecidos.

TABELA 1 - LIMITES DE RESISTÊNCIA DE ADERÊNCIA À TRAÇÃO (RA)PARA ARGAMASSAS DE REVESTIMENTO ESTABELECIDOS PELANBR 13749

Como ainda não existe norma brasileira que apresente critérios

para avaliação das demais propriedades, a análise comparativa com

LOCAL

Pintura ou base de reboco

Ra (MPa)

Cerâmica e laminado

Pintura ou base de reboco

≥ 0,15

≥ 0,30

≥ 0,25

Cerâmica ≥ 0,30

ACABAMENTO

≥ 0,20

Interna

Externa

Parede

Teto

Page 278: Livro entulho bom

276USO DO AGREGADO RECICLADO EM ARGAMASSAS DE REVESTIMENTO

argamassas de desempenho comprovado é utilizada por diversos

pesquisadores como parâmetro para avaliação do comportamento

do material (Hamassaki; Sbrighi; Florindo, 1996; Cavani; Antunes;

John, 1997; Silva et al., 1997 e Gomes, 2000).

Alguns países já estabeleceram indicadores, valores e parâmetros

de avaliação do comportamento das argamassas. Entretanto, como

os materiais utilizados para a produção de argamassas no Brasil

têm características diferentes, além das condições climáticas serem

distintas, não é adequado adotar, indiscriminadamente, tais

parâmetros para a análise das argamassas produzidas no país.

EXPERIÊNCIA REALIZADAUSO DO AGREGADO RECICLADO DE SALVADOR EMARGAMASSAS DE REVESTIMENTO

O estudo sobre a utilização do agregado reciclado miúdo de

Salvador em argamassas de revestimento busca desenvolver uma

alternativa tecnológica adequada aos centros urbanos que geram

significativa quantidade de entulho e apresentam grande deman-

da por revestimento, sobretudo em áreas carentes.

Com base na caracterização do agregado reciclado, foi observa-

do que ele se apresenta com elevado potencial para utilização em

argamassas. Assim, o Projeto Entulho Bom desenvolveu estudos de

laboratório nos quais foi analisada a influência do uso do agregado

reciclado de Salvador — processado de forma similar ao produzido

na usina de reciclagem — no desempenho dos revestimentos de

argamassa. Foi avaliado o processo de produção e o produto final,

tanto no estado fresco como no estado endurecido.

Foram analisadas as principais propriedades físicas e mecânicas

das argamassas preparadas com agregado reciclado em diferentes

EX

PE

RIÊ

NC

IA

RE

AL

IZA

DA

Page 279: Livro entulho bom

277

proporções. Essa experiência buscou desenvolver tecnologia ade-

quada para a utilização segura das argamassas de revestimento

produzidas com agregados reciclados.

MATERIAIS UTILIZADOSPara a produção das argamassas, foram utilizados os seguintes

materiais:

• cimento Portland composto com filer (CP II F-32);

• cal do tipo CH-I, cuja função é reter água e promover a tra-

balhabilidade em argamassas mistas;

• areia disponível na região de Salvador — usualmente empre-

gada em obras locais;

• arenoso — material areno-silto-argiloso, de cor rosada, cons-

tituído predominantemente por areia e com baixos teores

de silte e argila, prevalecendo a caulinita; melhora a traba-

lhabilidade em argamassas de cimento, sendo usualmente uti-

lizado na produção de argamassas na região de Salvador

(Gomes, 2000);

• agregado reciclado miúdo — material arenoso, predominan-

temente constituído de areia, com baixo percentual de argila

e silte e grande quantidade de partículas finas não plásticas

(as suas características são apresentadas no capítulo V);

• água proveniente do sistema de abastecimento da cidade de

Salvador;

• aditivo incorporador de ar — material que incorpora minús-

culas bolhas esféricas de ar às argamassas, melhorando a sua

trabalhabilidade; pode, contudo, reduzir a resistência mecâ-

nica da argamassa, se adicionado em teores elevados.

A Tabela 2, a seguir, apresenta as principais características da

areia, do arenoso e do agregado reciclado utilizados neste estudo.

EX

PE

RIÊ

NC

IA R

EA

LIZ

AD

A

Page 280: Livro entulho bom

278USO DO AGREGADO RECICLADO EM ARGAMASSAS DE REVESTIMENTO

TABELA 2 - CARACTERÍSTICAS DOS MATERIAIS UTILIZADOS

MÉTODO DE PRODUÇÃO E DE AVALIAÇÃODAS ARGAMASSAS

As argamassas produzidas com agregado reciclado foram com-

paradas com argamassas produzidas com arenoso (típicas da re-

gião de Salvador) e com cal (argamassa de referência). Para a de-

finição dos traços, foram realizadas misturas experimentais e, para

a avaliação do comportamento das argamassas, foram realizados

ensaios no estado fresco e no endurecido, tanto em corpos-de-

prova, quanto em painéis.

EX

PE

RIÊ

NC

IA

RE

AL

IZA

DA

PROPRIEDADESNORMAS

UTILIZADAS

0

AGREGADORECICLADO

Granulometria(material

retidoacumulado)

ARENOSO

00

AREIAUNIDADE

%

NBR 7181NBR 7217

000%

344%

7918%

142167%

616194%

8282100%

0,850,951,83—

1,21,21,2mm

NLNLNL%

NPNPNP%

2,592,602,64g/cm3

4,8 mm

2,4 mm

1,2 mm

0,6 mm

0,3 mm

0,15 mm

0,075 mm

Módulo de finura

Dimensão máximacaracterística

Limite de plasticidade

Massa específica

Massa unitária

Teor de materiaispulverulentos

Impurezas orgânicas

Coeficiente deinchamento

Limite de liquidez

1,301,231,56g/cm3

13,518,12,2%

Mais claraMais claraMais clara—

——1,34%

NBR 7217

NBR 7217

NBR 6459

NBR 7180

NBR 6508NBR 9776

NBR 7251

NBR 7219

NBR 7220

NBR 6467

Page 281: Livro entulho bom

279

A argamassa produzida com arenoso foi utilizada como base

para a adição do agregado reciclado, sendo, portanto, chamada de

argamassas ou traço base. A sua dosagem apresenta relação entre

cimento e materiais secos não cimentícios — areia e arenoso —

de 1:7,4 em massa, sendo que a proporção de arenoso, em rela-

ção à massa dos materiais secos não cimentícios, é de 30%.

A adição de agregados reciclados ocorreu nos teores de 30%,

50%, 75% e 100% em relação aos materiais secos não cimentícios.

A argamassa com 30% de agregado reciclado (AR 30) foi produzida

com a substituição de toda a massa do arenoso do traço base pelo

agregado reciclado. Para as argamassas com 50%, 75% e 100% de

agregado reciclado (AR 50, AR 75 e AR 100), a areia foi substituí-

da também pelo agregado reciclado. As argamassas com adição

de 100% de agregado reciclado têm como materiais constituintes

apenas cimento, agregado reciclado miúdo, água e aditivo, ou seja,

todo o agregado miúdo (areia) e toda a adição argilo-mineral

(arenoso) foram substituídos por agregado reciclado.

Essas dosagens foram determinadas com base nas característi-

cas dos materiais, nos resultados das misturas experimentais e

nos parâmetros definidos pelo Centro Tecnológico da Argamassa

(CETA) — centro formado pela parceria entre a Escola Politécnica

da UFBA e o Centro de Pesquisa e Desenvolvimento do Estado da

Bahia. As misturas experimentais permitiram ajustar as dosagens

e definir os traços. Nessas misturas, foram analisados o índice de

consistência, o teor de ar incorporado, o consumo real de cimen-

to e a massa específica prática das argamassas. Foram definidos os

teores de 0,15% de aditivo incorporador de ar, para a argamassa

com arenoso, e 0,10%, para as argamassas com agregado reciclado,

tendo em vista a especificação do CETA, quanto ao teor de ar

incorporado, entre 8 e 17%.

EX

PE

RIÊ

NC

IA R

EA

LIZ

AD

A

Page 282: Livro entulho bom

280USO DO AGREGADO RECICLADO EM ARGAMASSAS DE REVESTIMENTO

Nessa etapa, foram avaliadas argamassas com consumo de cimen-

to de 160, 180 e 200 kg/m3. O consumo de 180 kg de cimento por

m3 foi escolhido para o prosseguimento dos estudos, uma vez que

as argamassas com esse consumo apresentaram desempenho ade-

quado na mistura experimental, e, segundo o procedimento CETA

nº 1/99 (Neves & Maciel, 1999), esse consumo de cimento atende

a uma grande faixa de aplicações (Tabela 3), ampliando as possibi-

lidades de utilização das argamassas com material reciclado.

TABELA 3 - APLICAÇÕES INDICADAS PARA ARGAMASSAS DAREGIÃO DE SALVADOR, COM CONSUMO DE CIMENTO DE 180 Kg/m3

(NEVES & MACIEL, 1999)

Foi utilizada, como referência, a argamassa mista de cimen-

to e cal, visando à comparação do desempenho das argamas-

sas com agregado reciclado. Essa argamassa foi dosada segun-

do as especificações estabelecidas pela Americam Society for

Testing and Materials – ASTM C 91 para argamassa tipo O

(Gomes, 2000).

Os traços unitários, em massa seca, das argamassas utilizadas

neste estudo são apresentados na Tabela 4, a seguir.

APLICAÇÃO DA ARGAMASSA

150 – 180

CONSUMO DE CIMENTO (Kg/m3) EMFUNÇÃO DO TIPO DE APLICAÇÃO

Assentamento de blocos

INTERNA EXTERNA

Emboço

Reboco

Camada única

Base para cerâmica

160 – 190

160 – 180 180 – 210

160 – 170 170 – 190

160 – 180 180 – 210

180 – 210 190 – 220

EX

PE

RIÊ

NC

IA

RE

AL

IZA

DA

Page 283: Livro entulho bom

281

TABELA 4 - TRAÇOS UNITÁRIOS DAS ARGAMASSAS ESTUDADAS

� Argamassa de referência

As argamassas foram produzidas em betoneira de eixo inclina-

do, e o método de produção foi mantido constante. Antes da mis-

tura, o agregado reciclado foi umidificado dentro da betoneira,

durante 15 minutos, com parte da água de amassamento, tendo

em vista a sua elevada absorção de água.

As argamassas produzidas foram analisadas visando à sua aplica-

ção em revestimentos. Nesse sentido, foram realizados os seguin-

tes ensaios para a avaliação das propriedades das argamassas no

estado fresco e no estado endurecido, tanto em corpos-de-prova

cilíndricos quanto em painéis (1,00 x 1,20m) de alvenaria de blocos

cerâmicos chapiscada:

No estado fresco

• Determinação do teor de água para obtenção do índice de

consistência — padrão (NBR 13276).

DOSAGEM

NOMENCLATURA

—Teor de Agregado Reciclado

BASE AR 30 AR 50 AR 75 AR 100 REF �

30% 50% 75% 100% —

1,00 1,00 1,00 1,00 1,0 1,00

— — — — — 0,50

5,20 5,20 3,69 1,79 — 8,26

2,20 — — — — —

— 2,20 3,69 5,38 7,07 —

1,58 1,34 1,37 1,45 1,53 1,63

0,15 0,10 0,10 0,10 0,10 —

Cimento

Cal

Areia

Arenoso

Agregado Reciclado

Água

Aditivo

Traç

o U

nitá

rio

EX

PE

RIÊ

NC

IA R

EA

LIZ

AD

A

Page 284: Livro entulho bom

282USO DO AGREGADO RECICLADO EM ARGAMASSAS DE REVESTIMENTO

• Determinação da densidade de massa e do teor de ar incor-

porado (NBR 13278).

• Determinação da retenção de água (NBR 13277).

No estado endurecido — em corpos-de-prova

• Determinação da resistência à compressão (NBR 13279).

• Determinação da resistência à tração por compressão diame-

tral de corpos-de-prova cilíndricos (NBR 7222).

• Determinação da absorção de água por capilaridade (proce-

dimento CETA nº 5/98, com base na NBR 9779).

• Determinação da absorção de água por imersão: índice de

vazios e da massa específica (NBR 9778).

No estado endurecido — em painéis de revestimento

• Determinação da resistência de aderência à tração (NBR 13528).

• Determinação da dureza superficial do revestimento de arga-

massa (procedimento CETA nº 6/98).

• Absorção de água por sucção sob baixa pressão (procedimen-

to CETA nº 7/99).

Os ensaios foram realizados nos Laboratórios do Departamento

de Ciência e Tecnologia dos Materiais da Escola Politécnica da UFBA,

parte integrante do CETA. Os resultados apresentados para arga-

massas no estado endurecido correspondem ao ensaio realizado

aos 28 dias.

Uma vez que são poucos os critérios nacionais para avaliação de

desempenho disponíveis até o momento, neste estudo foram utili-

zados, para avaliação do comportamento do material, os seguintes

parâmetros, sugeridos pelo Centro Tecnológico da Argamassa —

CETA (Gomes, 2000):

• índice de consistência de 260 ± 10 mm (similar ao intervalo

estabelecido na NBR 13276);

• teor de ar incorporado entre 8 e 17%;

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Page 285: Livro entulho bom

283

• teor de retenção de água superior a 75%.

Adotou-se, também, o limite máximo de 2 ml de absorção de

água sob baixa pressão, aos 15 minutos de ensaio realizado no

painel, com 28 dias de idade. Esse parâmetro é resultado de estu-

dos sistemáticos das argamassas produzidas com os materiais dis-

poníveis na região de Salvador, obtidos de vários trabalhos de

pesquisa anteriores, desenvolvidos nos laboratórios do CETA.

Além disso, as propriedades das argamassas com agregado reci-

clado foram comparadas com as das argamassas base e referência.

Visando à complementação da análise, foi realizada uma avalia-

ção subjetiva de um pedreiro experiente sobre o comportamento

das argamassas produzidas com agregado reciclado. Essa avalia-

ção abordou o desempenho do material quanto a facilidade de

produção, manuseio, aplicação e acabamento, além da perda de

trabalhabilidade durante o período de aplicação da argamassa

sobre a alvenaria.

Foi realizada, ainda, a avaliação econômica preliminar da pro-

dução de argamassas de revestimento com utilização do agrega-

do reciclado de Salvador. Essa avaliação teve por objetivo analisar

a viabilidade econômica dessa forma de reciclagem e colaborar,

assim, para a sua difusão no meio técnico.

APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOSARGAMASSAS NO ESTADO FRESCO

O índice de consistência é uma das principais propriedades

utilizadas para avaliação da trabalhabilidade das argamassas. A boa

trabalhabilidade da argamassa é fundamental para que o revesti-

mento fique adequadamente aderido ao substrato e para que o

acabamento superficial esteja adequado à aplicação proposta.

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Page 286: Livro entulho bom

284USO DO AGREGADO RECICLADO EM ARGAMASSAS DE REVESTIMENTO

Conforme apresentado no item anterior, o índice de consistência

em todos os traços de argamassa analisada foi mantido na faixa de

260 ± 10 mm (Figura 1).

FIGURA 1 -ÍNDICE DE CONSISTÊNCIA DAS ARGAMASSAS ESTUDADAS

As argamassas com agregado reciclado apresentaram teores

de ar incorporado (Figura 2) superiores ao limite de 17%, indi-

cado pelo CETA para argamassas produzidas com arenoso. Nas

misturas experimentais, produzidas em argamassadeira de la-

boratório, o teor de ar incorporado encontrava-se dentro do

limite estabelecido pelo CETA. Contudo, ao se produzir a arga-

massa em betoneira, os valores tenderam a aumentar, indican-

do que esse equipamento provoca maior incorporação de ar.

Como os limites foram estabelecidos para argamassas produzi-

das com arenoso, esses foram utilizados como referência para a

análise do desempenho das argamassas com agregado reciclado

e não como fator limitante para utilização do material. A mesma

consideração é válida para a argamassa produzida com cal, cuja

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LIMITE MÁXIMO

LIMITE MÍNIMO

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Page 287: Livro entulho bom

285

dosagem não contém aditivo incorporador de ar, uma vez que a

cal já proporciona trabalhabilidade adequada. Observa-se, por-

tanto, que as argamassas com agregado reciclado podem uti-

lizar menor quantidade de aditivo incorporador de ar, mantendo-se

a trabalhabilidade adequada.

FIGURA 2 -TEOR DE AR INCORPORADO DAS ARGAMASSAS ESTUDADAS

As argamassas com agregado reciclado apresentaram valores

da densidade de massa entre 1,60 e 1,71 kg/dm3, sendo, por-

tanto, argamassas menos densas que as produzidas com areno-

so (1,85 kg/dm3) e com cal (2,06 kg/dm

3). Essa diferença pode

ser explicada pela maior quantidade de ar incorporado presen-

te nas argamassas com material reciclado e pela menor massa

específica apresentada pelo agregado reciclado em relação à areia

e ao arenoso. Com base na densidade de massa e no teor de ar

incorporado, foi calculado o consumo de cimento, verificando-

se uma tendência à sua redução, à medida que é aumentado o

teor de material reciclado nas argamassas (Figura 3).

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LIMITE MÁXIMO

LIMITE MÍNIMO

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Page 288: Livro entulho bom

286USO DO AGREGADO RECICLADO EM ARGAMASSAS DE REVESTIMENTO

FIGURA 3 - CONSUMO DE CIMENTO DAS ARGAMASSAS ESTUDADAS

As argamassas estudadas apresentaram valores para retenção

de água superiores a 75%, considerados pelo CETA como limite

mínimo para argamassas com arenoso (Figura 4). Pode-se obser-

var, também, que a retenção de água das argamassas diminui sig-

nificativamente quando se substitui o arenoso pelo agregado

reciclado e aumenta gradativamente à medida que se substitui

areia por agregado reciclado.

FIGURA 4 - RETENÇÃO DE ÁGUA DAS ARGAMASSAS ESTUDADAS

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LIMITE MÍNIMO

Page 289: Livro entulho bom

287

ARGAMASSAS NO ESTADO ENDURECIDO –CORPOS-DE-PROVA

As argamassas estudadas apresentaram resultados para resis-

tência mecânica a compressão entre 3,2 e 4,5 MPa, sendo que

os resultados das dosagens AR 30 e AR 50 foram superiores aos

da argamassa base. Os traços de argamassa com adição de agre-

gado reciclado apresentaram resistência à tração por compres-

são diametral entre 0,52 e 0,73 MPa. Destacou-se a argamassa

com 50% de agregado reciclado (AR 50), que apresentou re-

sistência à tração por compressão diametral superior às outras

argamassas estudadas e elevada resistência à compressão axial

(Tabela 5).

As argamassas produzidas com agregado reciclado apresen-

taram absorção de água por capilaridade inferior à das arga-

massas base e referência (Tabela 5). Portanto, os valores obtidos

para as argamassas com material reciclado se mostram adequa-

dos para argamassas de revestimento, uma vez que absorveram

menos água por capilaridade que as argamassas convencio-

nais. A argamassa com adição de 50% mostrou comporta-

mento superior, apresentando o menor coeficiente de absor-

ção de água.

Contudo, o uso de agregado reciclado em argamassas pro-

vocou um aumento na absorção de água por imersão, o que

pode ter sido causado pela grande absorção de água apresenta-

da pelo material reciclado. Houve, também, um progressivo

aumento da porosidade e do índice de vazios, confirmando a

maior incorporação de ar quando se utiliza o agregado recicla-

do. Com o aumento do teor de agregado reciclado, pode-se per-

ceber a tendência a redução das massas específicas seca e

saturada (Tabela 5).

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Page 290: Livro entulho bom

288USO DO AGREGADO RECICLADO EM ARGAMASSAS DE REVESTIMENTO

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72220,70

0,600,75

0,500,55

0,65

Kg/m

2. min

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nº 5/98

0,810,72

0,510,55

0,641,42

%14,70

12,9014,70

18,0021,40

12,80

%17,00

22,6025,10

29,9031,20

15,00

%24,60

20,6022,70

25,8030,70

23,90

%28,30

36,0038,70

43,0044,60

27,80

%N

BR

977832,70

25,9029,40

34,8044,20

31,40

%39,40

56,3063,30

75,4080,40

38,40

Kg/dm

31,66

1,601,54

1,441,43

1,85

Kg/dm

31,90

1,801,77

1,701,73

2,08

Kg/dm

32,31

2,502,52

2,522,56

2,56

Page 291: Livro entulho bom

289

ARGAMASSAS NO ESTADO ENDURECIDO -PAINÉIS DE REVESTIMENTO

As argamassas estudadas apresentaram resultados de resistên-

cia de aderência à tração significativamente superiores a 0,30 MPa,

limite estabelecido pela NBR 13749. A adição de 50% de agregado

reciclado (AR 50) aponta para uma melhoria da resistência de

aderência à tração, em comparação à das demais argamassas com

agregado reciclado e à da argamassa com cal, além de apresentar

valor similar ao obtido pela argamassa base (Figura 5).

FIGURA 5 - RESISTÊNCIA DE ADERÊNCIA À TRAÇÃODAS ARGAMASSAS ESTUDADAS

De um modo geral, as argamassas estudadas apresentaram re-

sultados similares para a dureza superficial, cerca de 45. Apenas

as argamassas AR 75 e AR 100 apresentaram valores inferiores,

40 e 42, respectivamente.

As argamassas com agregado reciclado obtiveram, aos 15 minu-

tos, valores de absorção de água sob baixa pressão inferiores a 1,0

ml, ou seja, menos da metade do valor máximo limite (Figura 6).

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LIMITE MÍNIMO

Page 292: Livro entulho bom

290USO DO AGREGADO RECICLADO EM ARGAMASSAS DE REVESTIMENTO

Desse modo, pode-se concluir que os revestimentos produzidos

com as argamassas estudadas atenderam à especificação quanto à

permeabilidade, apesar do aumento da absorção de água verificado

nos corpos-de-prova, para o ensaio de absorção por imersão.

FIGURA 6 - ABSORÇÃO DE ÁGUA POR SUCÇÃO DE BAIXA PRESSÃODAS ARGAMASSAS ESTUDADAS, AOS 15 MINUTOS DE ENSAIO.

AVALIAÇÃO SUBJETIVA DAS ARGAMASSAS

A argamassa base, com adição de arenoso, apresentou excelen-

te adesão ao substrato e nenhuma perda significativa de água, e,

desse modo, a trabalhabilidade se manteve constante durante o

período de aplicação. Essa argamassa permitiu um bom acaba-

mento com uso do sarrafo, resultando num revestimento liso.

Já a argamassa de referência mista, com cimento e cal, não apre-

sentou boa aderência inicial ao substrato. Por outro lado, a perda

de água dessa argamassa, ao longo do tempo, foi pequena, não pre-

judicando a trabalhabilidade. Essa argamassa permitiu excelente

acabamento, resultando num revestimento sem irregularidades.

As argamassas com o material reciclado, de uma maneira geral,

apresentaram consistência muito boa logo após o processo de

mistura. Entretanto, há uma significativa perda de água ao longo

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LIMITE MÁXIMO

Page 293: Livro entulho bom

291

do tempo, o que diminui a trabalhabilidade durante o processo

de aplicação e acabamento. Apesar de essas argamassas terem ex-

celente aderência inicial ao substrato, apresentaram, para teores ele-

vados de agregado reciclado, acabamento superficial áspero.

Por fim, na análise visual dos painéis, após 28 dias de executa-

dos, não foi verificado o surgimento de fissuras, indicando que as

argamassas estudadas não apresentaram retração por secagem,

apesar da significativa quantidade de partículas finas presentes

no agregado reciclado.

AVALIAÇÃO ECONÔMICA

Uma vez comprovada a viabilidade técnica do uso do agregado

reciclado em argamassas, a sua viabilidade econômica torna-se

um aspecto fundamental para a aceitação dos novos produtos pelo

mercado consumidor. A avaliação realizada pelo Projeto Entulho

Bom visou a uma análise preliminar da viabilidade econômica da

produção de argamassas de revestimento com o agregado reci-

clado, comparando-a com a das argamassas base (com arenoso) e

referência (com cal).

Os custos de equipamento, mão de obra e materiais foram co-

tados no mercado de Salvador no período de abril a maio de 2000.

A cotação de preços da areia e do arenoso utilizados na execução

desse serviço foi obtida de lojas de materiais de construção da

região, visto que esse tipo de comércio preenche as necessidades

de pequenas obras, reformas, ampliações e habitação popular.

O uso de agregado reciclado em argamassas proporcionou uma

redução de custos de produção de até 37%, quando comparados

com os da argamassa de cal (REF), e de até 16% quando compara-

dos com os da argamassa base, convencionalmente utilizada na

região de Salvador (Figura 7). Essa redução de custo se deve ao

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Page 294: Livro entulho bom

292USO DO AGREGADO RECICLADO EM ARGAMASSAS DE REVESTIMENTO

menor preço do agregado reciclado (cerca de R$ 11,00/m3) em re-

lação à areia (cerca de R$ 15,00/m3) e ao arenoso (cerca de 13,00/

m3), ao menor consumo de cimento das argamassas com agregado

reciclado e, no caso da argamassa de referência, ao elevado preço

da cal (cerca de R$ 5,00 por saco de 20 kg).

FIGURA 7 - CUSTO POR M3 DAS ARGAMASSAS ESTUDADAS

CONCLUSÃOA utilização do agregado reciclado de Salvador em substituição

à areia e ao arenoso, na produção de argamassas de revestimento,

apresentou-se como alternativa tecnicamente viável, proporcio-

nando, inclusive, redução significativa do custo do material.

O processo de produção das argamassas com agregado reciclado

não diferiu significativamente do das argamassas convencionais,

devendo-se, apenas, umedecer previamente o material reciclado.

Contudo, o modo de mistura influenciou o teor de ar incorporado

da argamassa, pois o uso da betoneira para misturas das argamassas

com agregado reciclado promoveu um aumento na quantidade

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Page 295: Livro entulho bom

293

de ar incorporado, quando comparado com a das argamassas pro-

duzidas na argamassadeira. Buscando evitar valores elevados de

ar incorporado, deve-se diminuir o teor de aditivo incorporador

de ar adicionado às misturas.

No estado fresco, as argamassas com adição de agregado reci-

clado apresentaram consistência adequada. Entretanto, à medida

em que se aumentou o teor de agregado reciclado, houve uma

significativa perda de água ao longo do tempo, o que diminuiu a

trabalhabilidade durante o processo de aplicação e acabamento.

No estado endurecido, as argamassas com agregado reciclado

apresentaram desempenho adequado, destacando-se a resistência

a tração, superior ao limite estabelecido na NBR 13749, e a absor-

ção de água por capilaridade e sob baixa pressão, inferior à das

argamassas base e referência e menor que a metade do limite ado-

tado pelo CETA para painéis de revestimento.

De um modo geral, a argamassa com 50% de agregado reciclado

apresentou o melhor desempenho na maioria das propriedades ava-

liadas, destacando-se como o teor mais indicado para a produção de

argamassas com os materiais utilizados pelo Projeto Entulho Bom.

Além disso, as argamassas com agregado reciclado apresenta-

ram comportamento semelhante ao das argamassas analisadas em

trabalhos sobre reciclagem de entulho em canteiro, indicando que

tanto o agregado reciclado produzido em canteiro quanto o pro-

duzido em usina de reciclagem podem apresentar comportamento

satisfatório para a sua utilização em argamassas de revestimento.

Contudo, as características do entulho, e, por conseqüência, dos

agregados reciclados, podem variar em cada região e ao longo do

tempo. Portanto, os resultados desta pesquisa não devem ser

generalizados, tornando-se necessária a realização de estudos

específicos para a análise de materiais de outras regiões.

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Page 296: Livro entulho bom

294USO DO AGREGADO RECICLADO EM ARGAMASSAS DE REVESTIMENTO

No caso dos revestimentos, uma das principais exigências de

desempenho é a durabilidade, que deve ser entendida como a

capacidade de suportar, durante a vida útil para o qual foram pro-

jetados, as condições físicas e químicas, às quais estão expostos e

que podem provocar sua degradação (Comissíon Permanente del

Hormigón, 1999 citado por Lima, 1999b). Nesse sentido, buscando

o aprofundamento do conhecimento desenvolvido pelo Projeto

Entulho Bom, deverão ser realizados estudos sobre a durabilidade

das argamassas que contêm agregado reciclado e projetos-piloto

que avaliem esse material em uso. Nesses estudos, deverá ser ava-

liado o desempenho das argamassas de revestimento ao longo do

tempo e em utilização, além de ser analisada a adequação desse

novo material às necessidades do usuário.

Sugere-se, também, a avaliação do processo de incorporação

de ar da argamassa, ao se utilizar agregado reciclado, sobretudo

quando misturado em betoneira.

Futuras pesquisas poderão abordar, ainda, a influência do agre-

gado reciclado no comportamento das argamassas de assenta-

mento de blocos e de base para cerâmica, além da avaliação da

retração do material.

Para o desenvolvimento desses estudos, é de significativa im-

portância que sejam identificados critérios adequados para avali-

ação tanto das argamassas convencionais quanto das argamassas

produzidas com agregado reciclado.

A produção de argamassas com agregado reciclado é simples

e resulta num produto final de qualidade, possibilitando o seu

uso como revestimento de moradias. A produção de materiais de

construção que utilizam agregado reciclado surge, assim, como

uma alternativa acessível de melhoria e ampliação da oferta

de habitações.

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Page 297: Livro entulho bom

295

O drama da habitação popular ainda se constitui num grande

desafio, não só para os agentes governamentais incumbidos desses

problema, como para os pesquisadores de um modo geral. De

forma independente, a população pobre avança sobre a cidade,

construindo os seus casebres, num verdadeiro cinturão de po-

breza, usando os seus parcos recursos para vencer os obstáculos.

A produção de agregados de baixo custo para a habitação po-

pular e o aproveitamento de resíduos dispostos, de forma inde-

vida, em diversos espaços da cidade são ações de significativa

importância na busca de soluções para a recuperação de áreas

urbanas degradadas.

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production of recycled aggregate - Salvador/Brasil. In: SCIENCE AND

ENGINEERING OF RECYCLING FOR ENVIROMENTAL PROTECTION,

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LIMA, José Antonio Ribeiro de. Proposição de diretrizes para produção e

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Engenharia Civil da Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 1997.

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NBR 6467 - Agregados: determinação de inchamento de agregado miúdo

método de ensaio. 1987.

NBR 6508 - Grãos de solos que passam na peneira de 4,8 mm: determinação

da massa específica: método de ensaio. 1984.

NBR 7180 - Solo: determinação do limite de plasticidade: método de

ensaio. 1984.

Page 300: Livro entulho bom

298USO DO AGREGADO RECICLADO EM ARGAMASSAS DE REVESTIMENTO

NBR 7181 - Solo: análise granulométrica: método de ensaio. 1984.

NBR 7217 - Agregados: determinação da composição granulométrica:

método de ensaio. 1987.

NBR 7219 - Agregados: determinação do teor de materiais pulverulentos:

método de ensaio. 1987.

NBR 7220 - Agregados: determinação de impurezas orgânicas húmicas em

agregado miúdo: método de ensaio. 1987.

NBR 7222 - Argamassas e concretos: determinação da resistência à tração

por compressão diametral de corpos-de-prova cilíndricos: método de

ensaio. 1983.

NBR 7251 - Agregado em estado solto: determinação da massa unitária:

método de ensaio. 1982.

NBR 9776 - Agregados: determinação da massa específica de agregados

miúdos por meio do frasco de Chapman: método de ensaio. 1987.

NBR 9778 - Argamassa e concreto endurecidos: determinação da absorção

de água por imersão: índice de vazios e massa específica: método de

ensaio. 1987.

NBR 9779 - Argamassa e concreto endurecidos: determinação da absorção

de água por capilaridade. 1987.

NBR 13276 - Argamassa para assentamento de paredes e revestimento de

paredes e tetos: determinação do teor de água para obtenção do índice de

consistência-padrão: método de ensaio. 1995.

NBR 13277 - Argamassa para assentamento de paredes e revestimento de

paredes e tetos: determinação da retenção de água: método de ensaio. 1995.

NBR 13278 - Argamassa para assentamento de paredes e revestimento de

paredes e tetos: determinação da densidade de massa e do teor de ar

incorporado: método de ensaio. 1995.

NBR 13279 - Argamassa para assentamento de paredes e revestimento de

paredes e tetos: determinação da resistência à compressão: método de

ensaio. 1995.

Page 301: Livro entulho bom

299

NBR 13528 - Revestimento de paredes e tetos de argamassas inorgânicas:

determinação da resistência de aderência à tração: método de ensaio.

1995.

NBR 13749 - Revestimento de paredes e tetos de argamassas inorgânicas:

especificação. 1996.

1 Publicação ABNT - Associação Brasileira de Normas Técnicas, Rio de Janeiro.

Marcos Jorge Almeida Santana - Engenheiro Civil, PhD, MSc, Professor do MEAU / UFBA,

Consultor do Projeto Entulho Bom

Alex Pires Carneiro - Engenheiro Civil, Mestrando em Engenharia Ambiental Urbana - UFBA,

Coordenador do Projeto Entulho Bom

Taís Santos Sampaio - Engenheira Civil, Pesquisadora do Projeto Entulho Bom - Universidade

Federal da Bahia - UFBA

Page 302: Livro entulho bom

300REDUÇÃO, RECICLAGEM E REAPROVEITAMENTO – AÇÕES DE CIDADANIA

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Page 303: Livro entulho bom

301

REDUÇÃO, RECICLAGEME REAPROVEITAMENTO –

AÇÕES DE CIDADANIA

Alex Pires Carneiro

Page 304: Livro entulho bom

302REDUÇÃO, RECICLAGEM E REAPROVEITAMENTO – AÇÕES DE CIDADANIA

Conforme abordado nos capítulos anteriores, a geração de gran-

des quantidades de resíduos sólidos é um dos principais problemas

enfrentados pelas áreas urbanas. O crescimento populacional, o de-

senvolvimento econômico e a utilização de tecnologias inadequadas

têm contribuído para o aumento crescente dessa quantidade.

Dentre os diversos tipos de resíduos gerados no ambiente ur-

bano, destaca-se o entulho, resíduo das atividades de construção

e demolição. A quantidade expressiva desse resíduo e o seu des-

carte inadequado causam graves impactos socioambientais, impon-

do a busca de soluções rápidas e eficazes para sua gestão adequa-

da, através da elaboração de programas específicos, que visem à

minimização desses impactos.

Contudo, o entulho tem uma grande vantagem, apresenta eleva-

do potencial de reciclagem, podendo ser utilizado como matéria-

prima para produção de materiais de construção. Reciclar o en-

tulho, independentemente do uso que lhe for dado, apresenta

vantagens, tais como:

• redução dos impactos ambientais e sociais do descarte inade-

quado e de suas conseqüências negativas (alagamentos, des-

lizamento de encostas, proliferação de vetores de doenças,

poluição, entre outras);

• otimização do uso dos aterros;

• transformação de uma fonte de despesa numa fonte de fatura-

mento ou, pelo menos, de redução das despesas de deposição;

• redução de custos no orçamento municipal, pois um progra-

ma de gestão e reciclagem, geralmente, apresenta custos in-

feriores aos da gestão corretiva;

• substituição, em grande parte, dos agregados naturais em-

pregados na produção de concreto, argamassa, blocos, tijo-

los, pavimentos, entre outras aplicações;

Page 305: Livro entulho bom

303

• redução dos custos de aquisição de matéria-prima e preser-

vação das reservas naturais, devido à substituição de materiais

convencionais — areia e rocha britada;

• criação de uma alternativa para mineradoras, que estão, cada

vez mais, sujeitas a restrições ambientais, tendo de se instalar

em locais distantes dos centros urbanos;

• geração de emprego e renda e criação de novas oportunidades

de negócios;

• redução do consumo de energia e da geração de CO2 na pro-

dução e transporte dos materiais;

• produção, em muitos casos, de materiais com melhores carac-

terísticas tecnológicas;

• produção de materiais de menor custo, com redução do preço

final das habitações e de obras de infra-estrutura (vias, drena-

gem, elementos pré-moldados, etc.).

• contribuição no desenvolvimento de ações dirigidas à mini-

mização dos resíduos e ao gerenciamento ambiental;

• vinculação a ações de educação ambiental e participação

comunitária, necessárias para a implantação da reciclagem.

Assim, dentro de uma visão holística de equacionamento dos

problemas urbanos gerados pelo gerenciamento inadequado do

entulho, a reciclagem desse material assume grande importância

ao proporcionar tantos benefícios.

A prática da reciclagem do entulho é um processo já consolidado

em vários países. Nos Estados Unidos, esse procedimento é utiliza-

do há mais de 30 anos, na produção de agregados para base e sub-

base de pavimentos. Em algumas regiões da Europa, a reciclagem

é uma questão cultural, decorrente da dificuldade de obtenção

de matéria-prima natural (areia e brita) e da pouca disponibilidade

de locais para deposição. Na Holanda, por exemplo, cerca de 70%

Page 306: Livro entulho bom

304REDUÇÃO, RECICLAGEM E REAPROVEITAMENTO – AÇÕES DE CIDADANIA

do entulho é reciclado; na Alemanha, cerca de 30% e, na cidade

de Copenhague, na Dinamarca, aproximadamente 25%.

Vários países da Comunidade Econômica Européia estabelece-

ram metas ambiciosas para reciclagem. A Holanda e a Alemanha

estabeleceram metas de reciclar 90% do entulho, enquanto que a

Dinamarca definiu um percentual de 60% até o ano 2000. Outras

metas também devem ser alcançadas como, por exemplo, a redu-

ção das distâncias de transporte do entulho e do material reciclado.

Segundo o EC Council Directive (conselho que estabelece as

diretrizes para os países da Comunidade Européia), para atingir

essas metas, algumas medidas devem ser tomadas, entre elas:

• a prevenção e a redução da geração de entulho e de seus

impactos ambientais diretos, através da redução das perdas,

da implementação de tecnologias limpas e do reaprovei-

tamento do resíduo;

• o estabelecimento de incentivos econômicos para a reciclagem;

• a implementação de projetos para gestão de resíduos;

• a aplicação da política de responsabilidade (sobretudo finan-

ceira) do produtor do resíduo.

Buscando a efetiva implantação de políticas para a reciclagem

de entulho, todas as barreiras e obstáculos devem ser detectados.

As soluções para essas questões devem ser planejadas e execu-

tadas como ações de longo prazo, combinadas com pesquisa e

desenvolvimento.

As experiências européias demonstram que as ações de longo

prazo têm apresentado bons resultados no que se refere ao alcan-

ce das metas de reciclagem. Essas ações devem ser freqüentemente

revisadas, de acordo com a situação política e econômica, e pau-

tadas em legislação e regulamentação específicas. Os aspectos le-

gais, econômicos e técnicos dependerão da iniciativa das partes

Page 307: Livro entulho bom

305

envolvidas, sendo necessária a criação de leis e normas específicas

em todos os níveis — nacional, regional e municipal.

No Brasil, pouca quantidade de entulho é reciclada, e ainda

não se dispõe de políticas públicas estaduais e federais eficientes

sobre o tema. O Governo Federal lançou, em 1999, o Programa

Brasileiro de Reciclagem, embora ainda não tenham sido implan-

tadas ações consistentes para a reciclagem e o aproveitamento de

resíduos na construção. Atualmente, o CONAMA (Conselho Nacio-

nal do Meio Ambiente) está elaborando a sua primeira resolução

que trata especificamente dos resíduos da construção civil. Alguns

municípios, como Belo Horizonte, Ribeirão Preto, Londrina, São

Paulo, entre outros, já possuem usinas de reciclagem. Além disso,

outros municípios vêm implantando ações para reciclagem do

entulho, pautados em legislação municipal adequada, como é o

caso do município de Salvador.

Os programas de gestão diferenciada do entulho, como o que

está sendo implantado pela LIMPURB (Empresa de Limpeza Urbana

do Salvador), surgem para dar o respaldo necessário ao processo

de reciclagem. A gestão diferenciada apresenta-se como um con-

junto de soluções cujo objetivo é viabilizar e sustentar esse siste-

ma, através da constituição de uma rede eficiente de captação de

resíduos, da consolidação de um sistema de reciclagem e da rea-

lização de programas informativos e educacionais. A gestão dife-

renciada alia, assim, a atratividade econômica desse processo à

qualidade ambiental e à eficiência do sistema de limpeza urbana.

A minimização da produção e a reciclagem de resíduos estão

profundamente ligadas à compreensão dos diferentes problemas

relativos à gestão e, nesse sentido, a educação e a informação das

partes envolvidas, em todos níveis, tornam-se necessidades fun-

damentais. Além disso, a aplicação de mecanismos de apoio à

Page 308: Livro entulho bom

306REDUÇÃO, RECICLAGEM E REAPROVEITAMENTO – AÇÕES DE CIDADANIA

reciclagem é fundamental para a consolidação e conscientização

da sociedade quanto à necessidade de reciclar resíduos.

Um problema bastante grave que uma cidade como Salvador

enfrenta é a falta de programas integrados de educação ambiental,

a partir do qual as comunidades possam relacionar boas práticas

ambientais com a qualidade de vida e sua própria segurança. A

participação da população é fundamental no processo de reci-

clagem de entulho, pois ela é a geradora do resíduo e consumi-

dora dos materiais provenientes da reciclagem. Nesse sentido, está

sendo muito importante a implantação do programa de gestão

para o entulho de Salvador, a partir do qual a comunidade é ins-

truída sobre a importância da prática do descarte adequado.

Dando respaldo ao Plano de Gestão Diferenciada do Entulho

de Salvador, o Projeto Entulho Bom buscou contribuir desenvol-

vendo tecnologia e conhecimento necessários para a utilização

dos materiais reciclados, visando à melhoria da qualidade am-

biental, das condições de vida da população e o desenvolvimento

sustentável da região.

A realização do diagnóstico dos setores produtores de resídu-

os da região foi fundamental para a identificação e a caracteriza-

ção das principais ocorrências de resíduos sólidos, visando ao seu

uso na construção civil. A avaliação do nível de conhecimento

disponível, bem como a caracterização do resíduo, permitiram

identificar o seu potencial de aplicação em materiais de construção,

indicando as necessidades de pesquisa e desenvolvimento, as

prioridades e as oportunidades comerciais de reciclagem do

material na construção civil.

A utilização do entulho como matéria-prima para a execução

de camadas de base e sub-base de pavimentos, a fabricação de

tijolos e a produção de argamassas foram identificados pelo

Page 309: Livro entulho bom

307

Projeto Entulho Bom como aplicações prioritárias e apresenta-

ram desempenho adequado em testes de laboratório. Vale ressaltar

que essa experiência, desenvolvida em Salvador, pode ser repro-

duzida em qualquer centro urbano, desde que seja adaptada às

características e aspectos locais.

Além das linhas de pesquisa já desenvolvidas pelo Projeto, exis-

tem outras formas de aproveitamento do entulho para a produção

de materiais de construção, destacando-se a sua utilização na pro-

dução de concreto não estrutural. Independentemente da aplica-

ção escolhida, a utilização de materiais de construção com incor-

poração de resíduos deve ser acompanhada de controle tecno-

lógico adequado, incluindo a avaliação de riscos ambientais e à

saúde dos usuários.

O preconceito quanto à utilização de materiais reciclados geral-

mente está relacionado à falta de informações e estudos que de-

monstrem ao usuário o desempenho do produto, garantindo, as-

sim, o seu uso seguro. Com o objetivo de superar esse problema,

torna-se necessário o desenvolvimento de projetos-piloto que

comprovem, em condição de uso, o seu desempenho, permitin-

do, ainda, a avaliação da satisfação das necessidades do usuário

do material reciclado e possibilitando o monitoramento das suas

propriedades ao longo do tempo.

Embora a reciclagem de entulho não seja uma atividade nova, a

adequação desse processo a uma atividade econômica é bastante

recente. Fatores como envolvimento da iniciativa privada e boa

aceitação do mercado podem ser decisivos para o sucesso de uma

linha de atuação como essa.

Estudos econômicos preliminares demonstram que os agrega-

dos reciclados apresentam custos inferiores aos agregados con-

vencionais, embora esses estudos devam ser aprofundados para

Page 310: Livro entulho bom

308REDUÇÃO, RECICLAGEM E REAPROVEITAMENTO – AÇÕES DE CIDADANIA

atender à economia de mercado. Portanto, torna-se fundamental

o desenvolvimento de pesquisas de mercado, para a análise da

viabilidade econômica da reciclagem do entulho e dos materiais

de construção produzidos a partir desse resíduo, incluindo o ma-

peamento dos possíveis parceiros e concorrentes e a quantificação

das vantagens para os diversos agentes envolvidos no processo (ge-

rador do resíduo, responsável pela reciclagem, produtor de ma-

teriais de construção, usuário do produto, poder público, entre ou-

tros). Além disso, aspectos de marketing devem ser introduzidos

no processo, buscando-se a aceitação do uso do material reciclado

e a sua valorização como material ambientalmente correto.

O recente destaque que o conceito de qualidade vem tendo

nas empresas deve ser efetivamente aplicado através da redução

de perdas, da gestão adequada dos resíduos e da sua reciclagem.

Reduzir a geração do entulho no canteiro reafirma e fortalece o

conceito de desenvolvimento sustentável na construção civil. A

sustentabilidade das atividades do macrocomplexo da constru-

ção civil envolve desde a extração de matérias-primas e a produ-

ção dos materiais, até as etapas de construção, manutenção e

demolição do empreendimento. Portanto, é de fundamental im-

portância o gerenciamento adequado do canteiro, a otimização

das matérias-primas e dos materiais de construção utilizados, bem

como dos resíduos gerados nesses processos.

Os profissionais do setor da construção civil deverão estar cada

vez mais preparados para o desenvolvimento dessas atividades.

Nesse sentido, publicações como esta contribuem para a transfe-

rência ao meio técnico e aos gestores urbanos de conhecimento

fundamental para a implantação da reciclagem.

Necessário se faz o apoio às atividades de pesquisa e desen-

volvimento, como o da CAIXA ao Projeto Entulho Bom, para

Page 311: Livro entulho bom

309

consolidar a cultura da reciclagem de resíduos em materiais

de construção.

Por fim, vale ressaltar que a redução, a reciclagem e o rea-

proveitamento do entulho beneficiam a sociedade como um todo,

especialmente a população de baixa renda, que é a mais atingida

pela questão da disposição inadequada de resíduos e a que mais

necessita de materiais de construção de baixo custo. Desse modo,

essas ações, mais que atos de conscientização, constituem atos

de cidadania.

Alex Pires Carneiro - Engenheiro Civil, Mestrando em Engenharia Ambiental Urbana - UFBA,

Coordenador do Projeto Entulho Bom

Page 312: Livro entulho bom

310REDUÇÃO, RECICLAGEM E REAPROVEITAMENTO – AÇÕES DE CIDADANIA

Page 313: Livro entulho bom

311

Este livro foi composto pela Azeviche Comunicação Visual

em Helvetica e Apple Garamond.

O fotolito foi executado por P&H Fotolito, em Salvador, BA.

Foram impressos 3.000 exemplares deste livro,

na Gráfica da Caixa, Brasília - DF,

sobre papel pólen print 120 g/m2 da Cia Suzano

e capa em papel supremo 240g/m2,

em maio de 2001.

CAIXA ECONÔMICA FEDERAL

Gerência de Desenvolvimento Urbano

Av. Sete de Setembro, 955 - 2º Andar - Mercês - CEP 40.060-000 - Salvador - BA

Tel: (71) 329-8200 / Fax: (71) 329-6934 / e-mail:[email protected]

EDITORA DA UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA

Rua Augusto Viana, 37 - Canela - CEP 40.110-060 - Salvador - BA

Telefax: (71) 235-8991 / e-mail: [email protected]

www.entulhobom.org

O PAPEL UTILIZADO FOI FEITO A PARTIR DE RECURSOS RENOVÁVEIS.CADA ÁRVORE UTILIZADA FOI PLANTADA PARA ESTE FIM.

Page 314: Livro entulho bom

312REDUÇÃO, RECICLAGEM E REAPROVEITAMENTO – AÇÕES DE CIDADANIA

REDUZIR, RECICLAR E REAPROVEITAR SÃO MAIS QUEATOS DE CONSCIENTIZAÇÃO: SÃO ATOS DE CIDADANIA

Page 315: Livro entulho bom

313

IRINEU ANTÔNIO SCHADACH DE BRUM

Professor do Curso de

Engenharia de Minas da

Escola Politécnica da

UFBA, com atividades

didáticas na área de

tratamento de minérios.

Mestre em Metalurgia

Extrativa (UFRGS)

e Especialista em

Gerenciamento e Tecnologias Ambientais na In-

dústria (UFBA). Doutorando no Programa de Pós-

Graduação em Engenharia de Minas, Metalúrgica e

de Materiais da UFRGS.

Atua e publica nas seguintes áreas: tratamento de

minérios (metálicos e minerais industriais), reciclagem

de resíduos sólidos, meio ambiente e recuperação

de áreas degradadas por atividades de mineração.

ALEX PIRES CARNEIRO

Pesquisador,

formado em

Engenharia Civil

(1998) e

Mestrando em

Engenharia

Ambiental Urbana

na UFBA, recebeu

o desafio de

coordenar e

concluir o Projeto

Entulho Bom.

Foi agraciado com 14 prêmios, concedidos por

instituições como ABPv, COPMAT, IBRACON e PIBIC/

CNPq. É autor de mais de 30 artigos publicados em

anais de congressos nacionais e internacionais e

revistas técnicas indexadas sobre: reciclagem de

entulho, meio ambiente, aproveitamento de re-

síduos sólidos e materiais de construção. Atual-

mente, é diretor técnico da Viez Consultoria e Meio

Ambiente Ltda.

Page 316: Livro entulho bom

314REDUÇÃO, RECICLAGEM E REAPROVEITAMENTO – AÇÕES DE CIDADANIA

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