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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM INTEGRAÇÃO DA AMÉRICA LATINA LÍDIA DOMINGUES PEIXOTO PRADO Soy loco por ti, América A integração regional como prioridade da política externa brasileira na era Lula (2003-2010) São Paulo 2012

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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM INTEGRAÇÃO DA AMÉRICA LATINA

LÍDIA DOMINGUES PEIXOTO PRADO

Soy loco por ti, América A integração regional como prioridade

da política externa brasileira na era Lula (2003-2010)

São Paulo

2012

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LÍDIA DOMINGUES PEIXOTO PRADO

Soy loco por ti, América A integração regional como prioridade

da política externa brasileira na era Lula (2003-2010)

Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Integração da América Latina (PROLAM) da Universidade de São Paulo para obtenção do título de Doutor em Integração da América Latina.

Área de Concentração: Práticas Políticas e Relações Internacionais

Orientador: Prof. Dr. Sedi Hirano

São Paulo

2012

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Autorizo a reprodução e divulgação total ou parcial deste trabalho, por qualquer meio convencional ou eletrônico,

para fins de estudo e pesquisa, desde que citada a fonte.

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PRADO, Lídia Domingues Peixoto. Soy loco por ti, América : a integração regional como prioridade da política externa brasileira na era Lula (2003-2010). Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Integração da América Latina (PROLAM) da Universidade de São Paulo para obtenção do título de Doutor em Integração da América Latina

Aprovado em: _______________________________________________________

Banca examinadora

Prof. Dr. __________________________ Instituição: ________________________

Julgamento: _______________________ Assinatura: _______________________

Prof. Dr. __________________________ Instituição: ________________________

Julgamento: _______________________ Assinatura: _______________________

Prof. Dr. __________________________ Instituição: ________________________

Julgamento: _______________________ Assinatura: _______________________

Prof. Dr. __________________________ Instituição: ________________________

Julgamento: _______________________ Assinatura: _______________________

Prof. Dr. __________________________ Instituição: ________________________

Julgamento: _______________________ Assinatura: _______________________

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Para o Theo, cuja chegada

só fortaleceu o meu amor pela ciência

e a vontade de aprimorar

meus conhecimentos.

E para Daniel, o meu parceiro,

meu companheiro fiel.

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AGRADECIMENTO

A finalização desse trabalho simboliza a concretização de mais uma etapa

acadêmica cumprida. O processo de desenvolvimento da tese de doutorado

correspondeu a um momento de amadurecimento intelectual importante, e eu não

poderia deixar de agradecer àqueles que, de alguma maneira, tornaram esse

momento ainda mais especial.

Agradeço primeiramente à Universidade de São Paulo, e ao Programa de Pós-

Graduação em Integração da América Latina (PROLAM), por possibilitar a

realização de um sonho.

Gostaria de agradecer em especial ao meu orientador, professor Sedi Hirano, pela

sua grande amizade e por sempre ter acreditado no meu trabalho.

Com especial atenção, destaco o agradecimento aos professores Ana Paula Hey e

Márcio Bobik Braga pelas contribuições especiais durante o exame de qualificação.

Sou imensamente grata às sugestões e críticas recebidas.

Finalmente, agradeço aos amigos que me auxiliaram nessa jornada, dando-me

apoio nos momentos críticos. G6, muito obrigada pelo companheirismo.

À minha família, que sempre esteve presente apesar da distância: nada seria

suficiente para agradecer todo o apoio que vocês me dão. A chegada do Theo, que

tanto nos alegra, foi mais um motivo de união e de pedidos de socorro quando a

falta de tempo não me permitia seguir sozinha.

E, como não poderia deixar de ser, por último gostaria de agradecer o carinho, o

amor, a compreensão e a amizade dos meus dois meninos: Daniel e Theo, esse

trabalho é dedicado a vocês.

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RESUMO

PRADO, Lídia Domingues Peixoto. Soy loco por ti, América: a integração

regional como prioridade da política externa brasil eira na era Lula (2003-2010) .

2012. 144 f. Tese (Doutorado) – Programa de Pós-Graduação em Integração da

América Latina (PROLAM), Universidade de São Paulo, São Paulo, 2012.

A presente tese tem como objetivo analisar a política externa brasileira para a

América do Sul durante os governos Lula (2003-2010), a fim de entender porque a

integração regional foi a prioridade da política externa brasileira durante esse

período. Nesse sentido, a hipótese a ser avaliada é que a atuação diplomática

pragmática na América do Sul tem como objetivo a legitimação da posição de líder

regional do Brasil, o que garantiria ao país a proeminência no cenário global, que

corresponderia, por sua vez, ao percurso mais favorável para angariar uma posição

de destaque no sistema internacional vigente. Para tanto, o trabalho contará com

três momentos: a revisão histórica do tema (a integração regional como prioridade

da política externa brasileira); a análise da atuação brasileira para a América do Sul

durante os governos Lula; e a comprovação teórica da hipótese a partir de uma

modelagem que categoriza o Brasil como um país intermediário.

Palavras chave: Política externa brasileira – Governos Lula – Integração regional

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ABSTRACT

PRADO, Lídia Domingues Peixoto. Soy loco por ti, América: regional integration

as a priority of Lula’s foreign policy (2003-2010) . 2012. 144 p. Thesis (Doutorado)

– Programa de Pós-Graduação em Integração da América Latina (PROLAM),

Universidade de São Paulo, São Paulo, 2012.

This thesis aims to analyze the Brazilian foreign policy for South America during the

Lula government (2003-2010) in order to understand why regional integration is the

priority of Brazilian foreign policy during this period. The hypothesis being evaluated

is that this pragmatic diplomatic performance in South America aims to legitimize the

position of regional leader from Brazil, which would guarantee the country’s

prominence in the global scenario, generating a shortcut to have a more favorable

position in the international system. The document will have three stages: the

historical review of the subject (regional integration as a priority to Brazilian foreign

policy); the Brazilian performance analysis for South America during the Lula

government; and the theoretical proof of the hypothesis suggested using a modeling

that classifies Brazil as a middle power.

Keywords: Brazilian’s foreign policy – Lula’s governments – Regional integration

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RESUMEN

PRADO, Lídia Domingues Peixoto. Soy loco por ti, América: La integración

regional como una prioridad de La política exterior de Lula (2003-2010) . 2012.

144 f. Tesis (Doutorado) – Programa de Pós-Graduação em Integração da América

Latina (PROLAM), Universidade de São Paulo, São Paulo, 2012.

Esta tesis tiene como objetivo analizar la política exterior brasileña para América del

Sur durante el gobierno de Lula (2003-2010) con el fin de entender por qué la

integración regional es la prioridad de la política exterior de Brasil durante este

período. En este sentido, la hipótesis que se evalúa es que la actuación pragmática

diplomática en América del Sur tiene como objetivo legitimar la posición de líder

regional de Brasil, lo que garantizaría la prominencia del país en el escenario

mundial, generando un acceso directo para tener una posición más favorable en el

sistema internacional. Con este fin, el documento tendrá tres etapas: la revisión

histórica del tema (la integración regional como una prioridad de política exterior de

Brasil); el análisis del desempeño de Brasil para América del Sur durante el gobierno

de Lula; y la prueba teórica de la hipótesis mediante un modelo que clasifica a Brasil

como un país intermedio.

Palabras clave: Política exterior brasileña – Gobiernos Lula – Integración regional

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LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS

ALADI Associação Latino-Americana de Integração

ALALC Aliança Latino-Americana de Livre Comércio

ALCA Área de Livre Comércio das Américas

ALCSA Área de Livre Comércio Sul-Americana

BID Banco Interamericano de Desenvolvimento

CAN Comunidade Andina de Nações

CASA Comunidade Sul-Americana de Nações

CEPAL Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe

CSAN Comunidade Sul-Americana de Nações

EUA Estados Unidos da América

FARC Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia

FHC Fernando Henrique Cardoso

FOCEM Fundo para a Convergência Estrutural do MERCOSUL

IIRSA Iniciativa para a Integração da Infra-estrutura Regional Sul-

Americana

MERCOSUL Mercado Comum do Sul

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NAFTA North American Free Trade Agreement

(Tratado Norte-Americano de Livre Comércio)

OEA Organização dos Estados Americanos

ONU Organização das Nações Unidas

OPA Operação Pan-Americana

PI Países intermediários

PIB Produto Interno Bruto

PSDB Partido da Social Democracia Brasileira

PT Partido dos Trabalhadores

PVDSA Petróleo da Venezuela S.A.

SDN Sociedade das Nações

TEC Tarifa Externa Comum

TIAR Tratado Interamericano de Assistência Recíproca

UNASUL União das Nações Sul-Americanas

URSS União das Repúblicas Socialistas Soviéticas

YPFB Yacimientos Petrolíferos Fiscales Bolivianos

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 17

2 O PAPEL DA AMÉRICA DO SUL NA DIPLOMACIA BRASILEIRA: UMA

ANÁLISE HISTÓRICA ................................. ......................................................... 22

2.1 Poder ou não poder? O espaço do Brasil na América do Sul ......................... 24

2.2 Avanços e limites da atuação diplomática brasileira na América do Sul:

revisão historiográfica ..................................................................................... 33

3 A ERA LULA E A INTEGRAÇÃO REGIONAL: DE LÍDER REGIO NAL A

PLAYER GLOBAL ............................................................................................... 62

3.1 A política externa do primeiro governo Lula para a América do Sul: contendas

e desafios à liderança regional ....................................................................... 63

3.2 O segundo governo Lula e a América do Sul: recuo à liderança regional ou

mudança de postura? ..................................................................................... 90

3.3 O poder econômico do Brasil na América do Sul nos governos Lula: fonte de

legitimidade da liderança ou interdependência? ........................................... 102

4 DE PAÍS INTERMEDIÁRIO A LÍDER REGIONAL: A ESTRATÉGI A

DIPLOMÁTICA BRASILEIRA ............................ ................................................ 114

4.1 A lógica da Ação Coletiva e os países intermediários: um modelo de análise

de política externa ........................................................................................ 115

4.2 O Brasil como país intermediário: atuação diplomática atual na América do

Sul e liderança regional ................................................................................ 121

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4.3 As iniciativas regionais como base para a inserção internacional nos

governos Lula: um modelo de interpretação ................................................. 124

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................. .................................................. 141

6 REFERÊNCIAS .................................................................................................. 147

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Divisão territorial da América Latina ........................................................ 26

Tabela 2 – População da América Latina nos anos 2000 (em porcentagem) ........... 27

Tabela 3 – Divisão do PIB na América Latina nos anos 2000 (em dólares) .............. 28

Tabela 4 – Produto Interno Bruto da América Latina em 2010 ................................. 29

Tabela 5 – Principais parceiros comerciais da Venezuela (2008) ............................. 67

Tabela 6 – Principais parceiros comerciais da Argentina (2008) ............................... 70

Tabela 7 – Principais parceiros comerciais da Bolívia (2008) ................................... 79

Tabela 8 – Principais parceiros comerciais do Paraguai (2008) ................................ 99

Tabela 9 – Financiamento externo do BNDES (2008-2009) ................................... 106

Tabela 10 – Resultados comerciais Brasil – MERCOSUL (2002-2010) .................. 107

Tabela 11 – Principais países fornecedores ao Brasil em 2008 .............................. 108

Tabela 12 – Principais destinos das exportações brasileiras em 2008 ................... 109

Tabela 13 – Principais países compradores do Brasil em 2008 .............................. 109

Tabela 14 – Importância do comércio intramercosul (% das exportações totais).... 110

Tabela 15 – PIB dos países-membros da UNASUL em 2008 ................................. 112

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Mapa da UNASUL: Geografia e População em 2010 .............................. 73

Figura 2 – Dimensões de poder segundo Joseph Nye (2004) ................................ 133

Figura 3 – Modelo representativo da atuação diplomática regional na era Lula ..... 136

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LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1 – UNASUL: Evolução das exportações intra-regionais em milhões de dólares (1990-2008) ................................................................................................ 111

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1 INTRODUÇÃO

“Como maior economia, com a maior população, como país de maior potencial científico e tecnológico, nós temos obrigação de dar condições para que esse crescimento não se dê apenas dentro do Brasil, mas para que ele se dê também nos países, sobretudo os que fazem fronteira conosco” (LULA DA SILVA, 2008)

Em janeiro de 2003, dava início no Brasil uma nova fase política, com a eleição de

Luiz Inácio Lula da Silva para a presidência. O governo se destacou, desde o início,

pelo caráter pragmático (mesmo que teórico) em vários setores. No âmbito da

política externa, podemos observar tal caráter inovador, indicado desde a campanha

eleitoral em 2002.

Já nos primeiros meses de mandato, Lula buscou dinamizar o modelo de inserção

internacional do Brasil, através de um maior ativismo em foros internacionais,

principalmente em negociações comerciais e na busca da ativa coordenação política

com atores importantes do cenário global, como Índia, África do Sul e China, além

dos países da América do Sul. Tal protagonismo se repetiu no segundo mandato,

dando à política externa de Lula um caráter extremamente pragmático, considerado

por muitos, inclusive, um novo paradigma implementado: a política externa “altiva e

ativa”, nas palavras do chanceler Celso Amorim, sinalizou ventos de mudança na

diplomacia brasileira.

Em discurso de posse, apresentado no Congresso Nacional, em Brasília, no dia 1º

de janeiro de 2003, Lula propôs, para o âmbito externo, alternativas baseadas no

aumento de poder e influência mundial, com a ampliação da inserção brasileira no

cenário internacional (LULA DA SILVA, 2003a). Entre essas medidas constavam: a

busca da vaga permanente no Conselho de Segurança da Organização das Nações

Unidas (ONU); a revitalização do Mercado Comum do Sul (MERCOSUL); a

aproximação econômica e comercial com médias e grandes potências, além da

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atuação ativa do país em negociações com a Área de Livre Comércio das Américas

(ALCA) e União Europeia.

O governo Lula sugeriu, ainda, a proximidade com países semelhantes ao Brasil no

que se refere ao nível de desenvolvimento socioeconômico e sua posição no

sistema internacional. Esse aspecto foi definido como um universalismo de ação:

almejou-se expandir a política exterior, estabelecendo alianças multilaterais com

diferentes nações, com a intenção de ampliar as relações entre o Brasil e países em

desenvolvimento, como África do Sul; China; Índia; Sudeste Asiático e Oriente

Médio, e com grandes potências, representadas pelos EUA e o bloco europeu

(CERVO, 2005). Tal medida, proposta na consolidação da nova geografia comercial,

correspondeu a um dos sustentáculos do comércio exterior brasileiro durante os dois

mandatos de Lula.

Outra questão da política externa de Lula correspondeu ao ativismo internacional,

através da participação de autoridades, como o ministro Celso Luiz Nunes Amorim,

o secretário geral Samuel Pinheiro Guimarães Neto e o assessor Marco Aurélio

Garcia, em eventos que interessaram ao país (VILLA, 2005, p.16), em busca de

novas alternativas diplomáticas. É bem verdade que, durante algum tempo,

sobretudo no início do governo, criou-se uma dubiedade sobre quem efetivamente

coordenaria as relações exteriores do país. Porém, a pluralidade de representantes

acabou contribuindo para o tom ativo da política externa brasileira desse período.

A política externa de Lula possui uma postura mais enfática a respeito da defesa da

soberania nacional e dos interesses do país, buscando, para isso, alianças

privilegiadas na América do Sul, almejando a efetivação do processo de integração

regional (a partir da revitalização de blocos já existentes, como o MERCOSUL, e

com a criação de novos regimes, como a União das Nações Sul-Americanas –

UNASUL).

Dentro desse contexto, a política externa do governo Lula tem como um dos grandes

objetivos políticos projetar a liderança do Brasil, não só no âmbito regional, mas

também em todo sistema internacional. Acredita-se que esse objetivo pode ser

conquistado por meio do ativismo diplomático e de alianças estratégicas com os

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parceiros supracitados, recuperando, assim, o universalismo tradicional da política

externa brasileira.

Já outras parcerias, estratégicas para o país, são prioritárias, como a China e o

Japão (Ásia), África do Sul, Angola e Nigéria (África), Rússia (Leste Europeu) e

outros países que, em função da utilidade estratégica, reforçam o bilateralismo

brasileiro.

Essas ações estariam de acordo com a proposta de reorganização do status quo em

um mundo multipolar: um sistema composto de polos de equilíbrio onde certos

países teriam o papel de catalisador. Essa nova ordem internacional, mais justa para

as nações em desenvolvimento, reforçaria a capacidade de intervenção do Brasil no

mundo e permitiria a consecução dos objetivos nacionais relacionados ao

desenvolvimento.

Com o intuito de dinamizar tal proposta, os governos Lula apontaram a integração

dos países sul-americanos como fundamental para a articulação de interesses

comuns no sistema internacional. A América do Sul é vista como espaço de

afirmação dos interesses brasileiros, por ser o Brasil o mais importante polo

econômico da região. Assim sendo, age-se no sentido de compor uma plataforma

econômica e política que aja conjuntamente nos foros internacionais.

Nesse contexto de priorização da esfera regional, os dois mandatos foram

importantes para o processo de integração sul-americana, uma vez que valorizaram

a atuação regional: Lula e sua chancelaria declararam, em diversas ocasiões, tal

objetivo como prioridade máxima da política externa brasileira.

A América do Sul, portanto, foi o tema central da política exterior de Lula, durante os

dois mandatos. Desde o primeiro discurso de posse, em 1º de janeiro de 2003, o

governante já deixava claro que o propósito fundamental de sua diplomacia seria a

integração regional, seja através da revitalização do MERCOSUL ou da ampliação

das relações com os países vizinhos (LULA DA SILVA, 2003a).

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É certo que o foco regional da diplomacia brasileira do período tem um interesse

específico: para que houvesse liderança sul-americana, o objetivo principal para a

região, o Brasil precisaria fundamentalmente conquistar a legitimidade desse papel

de líder pelos outros países. Assim, logo no início do primeiro mandato, Lula

estabeleceu ações que poderiam confirmar a capacidade brasileira para representar

os vizinhos diplomaticamente: em vários momentos, o governo optou por medidas

que garantissem a imagem positiva do Brasil regionalmente.

A liderança sul-americana, no entanto, faz parte de um projeto diplomático mais

amplo, que teria como intuito máximo a conquista de melhor posição no sistema

internacional. O principal objetivo da política externa do primeiro governo Lula foi

galgar posição na disputa hierárquica por poder no cenário global (o que, de acordo

com os desdobramentos diplomáticos, se repetiu durante o segundo mandato). Para

concretizar tal propósito, o governo se utilizou da supremacia regional para angariar

melhores possibilidades no sistema internacional, representando, através da suposta

liderança, os interesses comuns dos países vizinhos.

Dessa forma, a relação existente entre o interesse maior da política externa do

governo Lula (garantir melhores possibilidades ao Brasil no sistema internacional) e

a atuação intensa na América do Sul indica que a conquista da liderança regional

garantiria ao país a proeminência no cenário global, se tornando o percurso mais

favorável ao governo brasileiro para angariar uma posição de destaque no sistema

internacional.

Para comprovar a hipótese acima, o presente trabalho está dividido em três

capítulos. No primeiro, será feita uma revisão histórica sobre a América do Sul na

diplomacia brasileira, a fim de destacar as principais iniciativas e demonstrar que as

relações internacionais com os países vizinhos sempre existiram, ainda que não

fizessem parte de um projeto organizado de política externa, como um meio para a

conquista de determinado objetivo, como o que se vê durante os governos Lula.

Através da análise histórica será possível entender que faz parte da tradição

diplomática brasileira, até mesmo por fatores geográficos, o olhar sobre a América

do Sul.

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Porém, essa preocupação se reveste de uma estratégia política durante a era Lula,

e isso se torna nítido no segundo capítulo, em que será apresentada a política

externa do período em questão para o entorno regional. A partir de exemplos de

atuação diplomática envolvendo os países vizinhos, o capítulo visa demonstrar a

vinculação direta entre as escolhas diplomáticas do governo brasileiro para a

América do Sul e a busca incessante pela liderança regional. Pretende-se identificar,

nas principais investidas do país, o interesse maior de angariar respaldo político

para consolidar a posição de líder regional, tendo em vista a necessidade de

apresentar aos países vizinhos as condições efetivas que o Brasil teria de

representá-los no sistema internacional.

O terceiro capítulo tem como objetivo realizar um esforço teórico na tentativa de

corroborar a hipótese de que o Brasil almeja a liderança regional como um meio

para atingir uma melhor posição no sistema internacional. Para isso serão utilizados

conceitos e definições como país intermediário e lógica da ação coletiva. Dessa

forma a presente tese contará com três momentos: a revisão histórica do tema; a

análise da atuação brasileira para a América do Sul durante os governos Lula e a

comprovação teórica da hipótese aventada.

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2 O PAPEL DA AMÉRICA DO SUL NA DIPLOMACIA BRASILEIR A: UMA ANÁLISE HISTÓRICA

“A América do Sul, que constitui a área geográfica imediata de inserção internacional do Brasil e de ação da política externa brasileira, dos interesses econômicos brasileiros e da estratégia de segurança brasileira, apresenta óbvias (...) peculiaridades para o Brasil” (GUIMARÃES, 2005, p.272)

A política externa de um país corresponde a uma área de atuação em que os

interesses nacionais1 são mesclados aos propósitos dos outros países (com os

quais se mantêm relações diplomáticas), além de adequados ao contexto

internacional vigente para ampliar as condições de sucesso de determinada ação.

Por esse motivo, ao se analisar a política externa de um país, deve-se ter em mente

que as variáveis envolvidas precisam ser identificadas, a fim de evitar possíveis

erros de percepção (misperception) que acarretam estudos incompletos e sem

referenciais específicos.

De acordo com Deutch (1982, p.119),

a política externa de cada país diz respeito, em primeiro lugar, à manutenção de sua independência e segurança e, em segundo lugar, à promoção e proteção de seus interesses econômicos sobretudo os de seus grupos mais influentes. Profundamente ligados a esses interesses – pelo menos no caso das grandes potências – estão a preocupação de resistir a qualquer penetração e manipulação por parte de países e ideologias estrangeiras e um imprudente esforço para conseguir certo grau de penetração e manipulação em outros países. Finalmente, intimamente relacionadas com a segurança nacional, bem como com os interesses econômicos e militares – inclusive clandestinos – de cada grande potência, estão suas diretrizes políticas de ajuda econômica a nações estrangeiras, assim como seus esforços para difundir sua própria propaganda nacional e ideológica em países estrangeiros e seu apoio a missões de intercâmbio cultural e científico que favorecem àquele objetivo.

1 Por interesse nacional entende-se os objetivos diplomáticos de um país: os permanentes e os mutáveis.

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Dessa forma, percebe-se que o estudo da política externa de determinado país

envolve tanto elementos permanentes quanto mutáveis, definidos de acordo com

suas necessidades (interesses nacionais) e possibilidades perante o sistema

internacional. Variáveis como segurança nacional e economia (ampliação da pauta

de exportação; desenvolvimento econômico nacional e comércio com vários países)

são consideradas permanentes nos interesses diplomáticos de um país, uma vez

que independem da conjuntura interna e externa, por serem fundamentais à sua

manutenção. Outros elementos, como propaganda ideológica internacional e

inserção em blocos econômicos, por exemplo, são considerados adaptáveis e

provisórios, já que se tornam intuitos diplomáticos em determinados momentos ou

governos, de acordo com os interesses do Estado e as possibilidades no cenário

internacional.

Sendo assim, ao analisar a política externa de um país, deve-se partir das variáveis

permanentes e mutáveis para entender o papel de cada uma na diplomacia

nacional. Para introduzir o debate acerca da importância da América do Sul2 na

política externa brasileira, os elementos considerados são a tradição diplomática

brasileira e a postura adotada ao longo dos anos em relação à integração regional,

que – a partir da redemocratização e a criação da Constituição de 1988 – passa a

ser prioridade máxima da diplomacia.

A política externa brasileira pode ser entendida como uma política de Estado,

definida tanto por aspectos governamentais (ou seja, determinados pelo governo e

seu partido de base) quanto pela tradição diplomática nacional, traduzida como os

interesses permanentes do Ministério das Relações Exteriores, como a busca pela

pacificação de conflitos, a posição contrária às intervenções sem o consentimento

dos países e a democratização do sistema internacional de poder. Sendo assim, é

interessante fazer uma revisão historiográfica do tema, a partir da fase imperial do

Brasil, a fim de demonstrar cronologicamente a relevância da América do Sul para a

história diplomática brasileira.

2 A expressão América do Sul compreende todos os países situados no hemisfério sul do continente americano: Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Equador, Guiana, Paraguai, Peru, Suriname, Uruguai e Venezuela.

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A relevância política regional para a diplomacia brasileira pode ser analisada de

acordo com fases, que simbolizam as aproximações entre os países vizinhos, as

contendas e a consolidação da integração regional como prioridade máxima da

política exterior brasileira.

Inicialmente é interessante verificar o espaço ocupado pelo Brasil no seu entorno

regional, a partir da sua capacidade de interagir e influenciar diplomaticamente a

América do Sul, para, assim, entender como o país se relaciona, desde o século

XIX, com seus vizinhos.

2.1 Poder ou não poder? O espaço do Brasil na Améri ca do Sul

“O poder simbólico é, com efeito, esse poder invisível o qual só pode ser exercido com a cumplicidade daqueles que não querem saber que lhe estão sujeitos ou mesmo que o exercem” (BORDIEU, 2010, p.7-8).

O Brasil possui, tradicionalmente, uma posição de destaque na América do Sul. Seja

por elementos geográficos, econômicos e até mesmo militares,3 o país é

responsável por parcela estratégica da importância sul-americana no sistema

internacional. Pode-se afirmar, assim, que o país detém poder sobre os vizinhos, já

que, historicamente, tem capacidade de alterar o status quo vigente no subsistema

de acordo com seus interesses particulares, que não se limitam apenas às questões

financeiras e estão relacionados aos anseios de fazer do Brasil um país capaz de

exercer influência sob os demais:

Por “poder” entendemos, aqui, genericamente, a probabilidade de uma pessoa [no caso, país] (...) impor (...) a vontade própria, mesmo contra a oposição de outros (...). Naturalmente, o poder

3 Weber, ao analisar o poder a partir do conceito de dominação, indica a variedade de elementos que o representam: “dominação, no sentido muito geral de poder, isto é, de possibilidade de impor ao comportamento de terceiros a vontade própria, pode apresentar-se nas formas mais diversas” (WEBER, 1999, p.188).

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“economicamente condicionado” não é idêntico ao “poder” em geral. O surgimento do poder econômico pode, antes pelo contrário, ser consequencia de um poder já existente por outros motivos. E o poder, por sua vez, não é buscado exclusivamente para fins econômicos (de enriquecimento), pois o poder, também o econômico, pode ser apreciado “por si mesmo”, e, com muita frequencia, o empenho por ele está também condicionado pela “honra” (...) que traz consigo (WEBER, 1999, p.175-176).

Os elementos de poder4 nacional que conferem ao Brasil essa preponderância

podem ser resumidos em alguns fatores. Geograficamente, o território brasileiro

corresponde a 8.514.876,599 km²,5 o que lhe garante ser o quinto maior país do

mundo, com o tamanho equivalente a 1,6% da superfície terrestre; 20,8% do

continente americano e quase metade do território sul-americano.6 O Brasil possui

fronteira com praticamente todos os países do continente – exceto Equador e Chile

–, o que lhe confere, ainda mais, importância estratégica na região. Conforme a

tabela 1, o país se destaca de maneira absoluta em termos territoriais no

subcontinente, ocupando, inclusive, a quinta posição no ranking mundial:

4 Entende-se por poder a capacidade que um país possui de influenciar e definir a conduta de outros países e/o status quo do sistema internacional vigente. (MORGENTHAU, 2003, p.49). Segundo Stoessinger (1978, p.48), poder é “a capacidade que uma nação tem de influir no comportamento de outras”.

5 Dados disponibilizados pelo IBGE. Disponível em http://www.ibge.gov.br/paisesat/main.php. Acesso em 08/07/2011.

6 Dados disponibilizados pela CIA/World Factbook. Disponível em https://www.cia.gov/library/publications/the-world-factbook/geos/br.html. Acesso em 14/07/2011.

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Tabela 1 – Divisão territorial da América Latina

País Área (Km²) Distribuição no

continente Posição no mundo

Argentina 2.780.400 15,60% 8

Bolívia 1.098.581 6,16% 27

Brasil 8.514.876 47,78% 5

Chile 756.096 4,24% 37

Colômbia 1.138.914 6,39% 25

Equador 283.561 1,59% 72

Guiana Francesa 90.000 0,51% -

Guiana 214.969 1,21% 82

Paraguai 406.752 2,28% 58

Peru 1.285.216 7,21% 19

Suriname 163.820 0,92% 89

Uruguai 175.016 0,98% 88

Venezuela 912.050 5,12% 32

Fonte: CIA World Factbook. Disponível em: https://www.cia.gov/library/publications/the-world-factbook/ Acesso em 03/02/2012

Em relação à população, o país possui praticamente metade da população sul-

americana, como pode ser visto na tabela 2.7 Ainda que um país não seja

considerado uma potência por conta do tamanho de sua população, esse fator pode

contribuir para a economia nacional, como parte de um mercado consumidor interno

consolidado. Além disso, o território ocupado por uma vasta população corre menos

risco de ser cobiçado por países vizinhos que necessitem de maior porção territorial

para conquistar status.

7 Dados disponibilizados pela CIA/World Factbook. Disponível em https://www.cia.gov/library/publications/the-world-factbook/geos/br.htm. Acesso em 14/07/2011.

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Tabela 2 – População da América Latina nos anos 200 0 (em porcentagem)

País População nos anos 2000 (porcentagem regional)

Argentina 10%

Bolívia 3%

Brasil 49%

Chile 4%

Colômbia 12%

Equador 4%

Guiana 0%

Paraguai 3%

Peru 7%

Suriname 0%

Uruguai 1%

Venezuela 7%

Fonte: Fundo Monetário Internacional. Elaboração própria. Disponível em http://www.imf.org/external/data.htm. Acesso em 10/02/2012

A capacidade econômica do Brasil corresponde a um elemento nacional que garante

posição de destaque por gerar poder econômico (assunto que será aprofundado no

próximo capítulo). Nos últimos trinta anos a América do Sul tem visto a consolidação

do Brasil como maior economia regional. É clara a preponderância econômica do

Brasil em relação aos outros países sul-americanos: o parque industrial brasileiro e a

variada pauta de exportações do país lhe garantem o papel de líder financeiro do

subcontinente, o que nem sempre é sinônimo de bom relacionamento regional. A

tabela 3 mostra a divisão em porcentagem do PIB na América Latina durante os

anos 2000, e o Brasil responde por 57% do PIB regional, o que representa sua

preponderância sobre os demais países.

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Tabela 3 – Divisão do PIB na América Latina nos ano s 2000 (em dólares)

País PIB nos anos 2000 (porcentagem na América do Sul)

Argentina 9%

Bolívia 1%

Brasil 57%

Chile 5%

Colômbia 8%

Equador 2%

Guiana 0%

Paraguai 0%

Peru 4%

Suriname 0%

Uruguai 1%

Venezuela 12%

Média total PIB América do Sul nos anos 2000 (em US$ bilhões)

3.401,236

Fonte: Fundo Monetário Internacional. Elaboração própria. Disponível em http://www.imf.org/external/data.htm. Acesso em 10/02/2012

A tabela 4 mostra os números absolutos do PIB dos países latino-americanos no

ano de 2010. Conforme pode ser observado, o Brasil detém a liderança econômica

da região, o que garante ao país um status diferenciado dos demais, além de

relações comerciais assimétricas com os países vizinhos; sendo, inclusive, o

principal destino de países como o Paraguai e Uruguai.

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Tabela 4 – Produto Interno Bruto da América Latina em 2010

País PIB em 2010 (em milhões de dólares)

Argentina 351.000

Bolívia 19.180

Brasil 2.090.000

Chile 199.200

Colômbia 283.100

Equador 61.490

Guiana 2197

Paraguai 17.170

Peru 153.500

Suriname 3297

Uruguai 40.710

Venezuela 285.200

Fonte: CIA World Factbook. Elaboração própria. Disponível em: https://www.cia.gov/library/publications/the-world-factbook/index.html. Acesso em 07/02/2012

Por fim, em relação à capacidade militar, o Brasil também se destaca na América do

Sul. Já que, de acordo com Morgenthau (2003), um dos fatores que confere

importância a um país é o grau de sua preparação militar, o Brasil pode ser

considerado o mais preparado também no campo militar, representando mais da

metade dos gastos em defesa da região, o que estaria em consonância com suas

aspirações de liderança e suas necessidades em função da extensão territorial

(INSTITUTO NUEVA MAYORIA, 2008). A Estratégia Nacional de Defesa8, documento

formulado pelas três forças armadas, tem como objetivo fortalecer o aparato militar

brasileiro através de uma estratégia de segurança calcada em investimentos e

8 ESTRATÉGIA NACIONAL DE DEFESA. Comitê Ministerial de Formulação da Estratégia Nacional

de Defesa. Brasília, 18 de dezembro de 2008. DECRETO 6.703. Disponível em http://www.fab.mil.br/portal/defesa/estrategia_defesa_nacional_portugues.pdf. Acesso em 07/02/2012

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defesa da soberania nacional. Tal estratégia foi decretada em 2008, durante o

governo Lula, e

determina a reestruturação das Forças Armadas, a revisão da política de composição dos efetivos militares e a reorganização da indústria de defesa. Por sua vez, assume o compromisso de prover ao braço militar os meios necessários ao cumprimento de suas tarefas. A estratégia define ainda diretrizes para o desenvolvimento científico e tecnológico e para a política industrial do setor, integrando estruturas civis e militares no esforço de desenvolvimento do país (JOBIM, 2009).

Um dos passos desse plano é a compra de veículos aéreos para reestruturar a

Força Aérea Brasileira, pendendo entre três fornecedores: EUA, França e Suécia.

O maior gasto do Brasil é justificado pelo seu maior peso econômico na região, e

devido a uma dupla estratégia: assegurar o controle de áreas desprotegidas (como a

Amazônia) e fortalecer o hard power perante seus vizinhos, o que já foi constatado

pelos mesmos, de acordo com estudo sobre gastos militares na América do Sul:

Brasil representa más del 50% de los gastos em defensa de la región,lo que no solo estaría em consonancia com sus necesidades en función de extensión, espacios vacíos, población y economia, sino además con sus aspiraciones de liderazgo ante el concierto de las naciones (INSTITUTO NUEVA MAYORIA, 2008)

De acordo com o mesmo estudo, apesar do Brasil se situar na sexta posição

(juntamente com a Bolívia) entre a relação de gastos militares em comparação ao

PIB – 1,58% em 2007 – o Brasil totaliza 87% dos gastos em defesa dos países-

membros do MERCOSUL e é o único país da UNASUL situado entre os 15 do

mundo que mais gastam no campo militar (1,5% do total). Essa preponderância é

realçada pelo fato do país ter gasto US$ 9,5 bilhões em suas forças armadas em

2004 e ter saltado em níveis de investimento a US$ 27, 5 bilhões em 2007.

Devido a todos esses fatores, o Brasil pode ser considerado o país mais estratégico

(e importante) do seu entorno regional. No entanto, a América do Sul só passou a

fazer parte da diplomacia brasileira como estratégia em meados dos anos 1980,

especialmente a partir do processo de redemocratização. É certo que historicamente

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esses países mantêm relações diplomáticas entre si, mas não como parte de um

projeto de política externa, que só foi delineado a partir da década de 1980.

Ao analisar a política externa brasileira, percebe-se que a América do Sul9 é uma

prioridade na diplomacia nacional e está relacionada aos interesses brasileiros de

integração regional. Nesse sentido, têm-se alusões da importância da América do

Sul na política externa do país que remetem ao início do século XIX. Durante toda a

história diplomática brasileira, os países vizinhos tiveram influência nas decisões e

interesses dos governantes.

Iniciativas como a Organização dos Estados Americanos (OEA), fundada em 1948,

além da extinta Associação Latino-Americana de Livre Comércio (ALALC),10 e a

Associação Latino-Americana de Integração (ALADI)11 criada em 1980 para

substituir a ALALC, demonstraram à sua época as intenções de integração por parte

dos governos sul-americanos e ilustram o histórico comprometimento dos países

com essa temática.12

A criação do MERCOSUL, na década de 1990, consolidou a aproximação dos

países vizinhos, nos moldes de um bloco comercial regional, tendência do sistema

internacional do período. Assim, ao mesmo tempo em que surgiu como uma

alternativa à integração da América do Sul, possibilitou à região uma adequação

(embora de maneira limitada) às transformações internacionais, caracterizadas pela

globalização econômica e a crescente interdependência dos países. Originado de

uma iniciativa bilateral entre Argentina e Brasil para consolidar negociações

comerciais, o regime de livre comércio regional idealizado pelos países-membros

tornou-se prioridade nas suas políticas exteriores e, independente dos resultados

9 Ao especificar as relações diplomáticas do Brasil com a América do Sul, pode-se apreender tanto o bilateralismo com algum dos países que compõem o continente sul-americano quanto o multilateralismo regional, que engloba todos os países.

10 A ALALC tinha como membros a Argentina, o Brasil, o Chile, o México, o Paraguai, o Peru e o Uruguai.

11 A ALADI tem como membros, além daqueles componentes da ALALC, a Bolívia, Colômbia, Equador, Venezuela e Cuba.

12 Para maiores informações sobre as organizações internacionais americanas, consultar o capítulo 8 – “As organizações de cooperação econômica nas Américas” – do livro de Ricardo Seitenfus (2003a, p.233).

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práticos do bloco, sua criação foi de grande importância para a integração dos

países vizinhos.13

A partir da consolidação do MERCOSUL, o poder do Brasil em relação aos países-

membros foi institucionalizado, como lembra Bourdieu (2010, p.117) ao afirmar que

o poder sobre o grupo que se trata de trazer à existência enquanto grupo é, a um tempo, um poder de fazer o grupo, impondo-lhe princípios de visão única da sua identidade, e uma visão idêntica da sua unidade.

Por ser a principal economia do bloco, que surgiu a partir de interesses econômicos,

o Brasil possui posição de destaque e consegue projetar, na medida do possível,

seus interesses diante da dependência comercial dos outros membros.

Dessa forma, a América do Sul, por ser locus do protagonismo diplomático brasileiro,

sempre estivera presente nos objetivos da política exterior do país, mesmo que a

intensidade das investidas regionais tenha se alterado ao longo dos mandatos. Os

governos brasileiros, particularmente no período pós-democratização, se voltaram

intensamente à esfera regional, seja por motivos econômicos (os países sul-

americanos passavam por crises pós-década perdida) e/ou políticos, já que a

regionalização e criação de blocos regionais estava em voga. Ou seja, a partir de

meados dos anos 1980, os países envolvidos passaram a adquirir vantagens

coletivas a partir da organização institucional do subcontinente.14

No entanto, a atuação do país na região até o início do primeiro governo Lula, em

2003, foi marcada por episódios pontuais, geralmente de conflito ou mediação entre

terceiros países, porém sem uma estratégia específica nas ações de política

exterior. O alcance do poder regional brasileiro não foi utilizado como um meio para

conquistar um papel mais relevante no sistema internacional. Isso só foi possível

graças a um projeto de tornar o Brasil uma liderança na América do Sul, ao

instrumentalizar o poder brasileiro na região para integrar os países. De acordo com

documento oficial do Partido dos Trabalhadores – PT (2010, § 59), 13 Confira o capítulo 2 – “Integração, cooperação e negociação no MERCOSUL: interesses e

orientações de política exterior” – do livro de Alcides Costa Vaz (2002, p.71).

14 Conceito de regionalismo desenvolvido por BOURDIEU (2010, p.124).

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a integração regional (...) possui uma dimensão estratégica, pois a formação de um bloco sul-americano, integrado economicamente e com capacidade política, vai melhorar a situação socioeconômica de seus povos, integrar a infra estrutura (sic) e ampliar o poder e o espaço destes países no cenário internacional.

Sendo assim, é interessante entender como se deu o processo histórico que

possibilitou a execução desse projeto mais amplo de busca da liderança regional. A

partir de um resgate histórico, é possível delinear os obstáculos e limites e como o

Brasil pode se tornar a principal referência na América do Sul, para almejar

atualmente um espaço de liderança.

2.2 Avanços e limites da atuação diplomática brasil eira na América do Sul: revisão historiográfica

“Somos da América e queremos ser americanos” (MINISTÉRIO DAS RELAÇÕES EXTERIORES apud SANTOS, 2005, p.3).15

A história da diplomacia brasileira se entrelaça, desde o início, aos movimentos

diplomáticos dos países vizinhos, e mesmo da metrópole Portugal, responsável

durante o período de colonização pela política externa do país. Por motivos diversos,

o subcontinente sempre esteve presente nas políticas internacionais brasileiras, o

que gerou conflitos e desconfianças em alguns momentos, mas culminou na

integração entre os países vizinhos, sendo essa, inclusive, uma prioridade da

política externa brasileira nos últimos anos.

No entanto, os primórdios das relações internacionais da América do Sul não foram

amistosos. Como demonstram Cervo e Bueno (1986, p.34),

15 MINISTÉRIO DAS RELAÇÕES EXTERIORES. Manifesto Republicano de 1870. In: Relatórios da Secretaria de Estado dos Negócios Estrangeiros – 1830/1888. (RSNE). Apud SANTOS, Luís Claudio Villafañe. A América do Sul no discurso diplomático brasileiro. Revista Brasileira de Política Internacional . Brasília, v.48, n.2, 2005.

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a extensa fronteira entre o Brasil, as colônias europeias do Norte e os Estados hispano-americanos foi um dos grandes desafios para a política externa brasileira, no século XIX, e um dos domínios de maior esforço da diplomacia.

Danese (2009, pp.165-166) completa o argumento afirmando:

Império escravocrata e estável em meio a uma América Hispânica republicana e instável, país continental com fronteiras solidamente estabelecidas diante de vizinhos que sofreram alguma forma de “síndrome de território minguante”, único país lusófono em um continente de fala castelhana, cioso dos seus direitos e orgulhoso dos seus vínculos especiais – reais ou imaginários – com a Europa ou os Estados Unidos, país de economia dinâmica, mas ao mesmo tempo subdesenvolvido, atrasado, emperrado e sem maior integração social ou política interna, o Brasil enfrentou desde sempre a resistência dos seus vizinhos (...) a (...) qualquer tipo de liderança ou papel de preeminência ou mesmo de primus inter pares na sua região.

Sendo assim, o país, por suas características geográficas (faz divisa com Argentina,

Bolívia, Colômbia, Guiana Francesa, Guiana, Paraguai, Peru, Suriname, Uruguai e

Venezuela),16 políticas (ex-colônia de Portugal, vivendo o período imperial) e

econômicas (transações comerciais basicamente com as grandes potências –

Portugal, Grã-Bretanha e Estados Unidos da América – EUA) teve dificuldades de se

consolidar como líder na região, em um primeiro momento. No entanto, conforme

explicita Guimarães (2007),

o desenvolvimento de todas as potencialidades decorrentes da população numerosa e de território extenso traria efeito notável sobre a capacidade econômica e o potencial militar e, em consequência, sobre a capacidade de exercer influência política nos âmbitos regional e mundial.

Tendo isso em vista, pode-se afirmar que a primeira fase da diplomacia regional

brasileira se deu a partir do processo de colonização portuguesa no país, cujo

interesse primordial na época era a conquista de território pela colônia. No entanto,

não se pode analisar esse período como parte da diplomacia brasileira, já que na

realidade eram ações diplomáticas portuguesas. Após a independência brasileira de

Portugal, o objetivo diplomático do Brasil Império foi constituir as fronteiras territoriais

16 Dados disponíveis em: http://www.ibge.gov.br/paisesat/main.php. Acesso em 01/10/2009.

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do país, o que deu origem a conflitos envolvendo países vizinhos, como o conflito

cisplatino e a Guerra do Paraguai. Nesses incidentes, os interesses dos países

envolvidos eram garantir ou conquistar território, o que caracteriza a diplomacia no

período pós-colonização.

Em termos históricos, o processo de colonização do Brasil pelo império português se

diferencia dos demais países da América do Sul, de colonização espanhola. De

acordo com Fernandes (2008),

enquanto no processo de emancipação política as colônias hispano-americanas tornaram-se independentes brandindo a bandeira republicana após uma luta sangrenta, o Brasil emergiu como monarquia, com a elevação do herdeiro do trono português ao título de imperador do novo Estado. Edificou-se, nesse ponto, um momento que iria gerar grandes querelas e um isolamento do Brasil no cenário sul-americano por todo o século XIX. Diante de sua monarquia detentora de um poder centralizado, muito embora não apaziguadora de conflitos, os “outros” eram vistos como o âmago da desordem, da fragmentação e da beligerância. O Império Brasileiro, fomentado pela união, deveria combatê-los, tornar-se a oposição mais rígida contra o ideal republicano, enquanto para os hispano-americanos o inimigo não era o povo brasileiro, mas sim a monarquia e o imperador. Era contra eles que a guerra deveria apontar. Para os argentinos, por exemplo, o Império Brasileiro possuía uma identidade europeia e antiamericana.

Nesse sentido, o aspecto histórico da colonização brasileira, a partir de Portugal, foi

o diferencial para que o país conquistasse maior grau de independência, ainda

durante a fase imperial, já que as colônias hispânicas eram controladas de maneira

mais incisiva, e não puderam alcançar papel relevante em seu entorno regional,

visto que dependiam do controle espanhol. Esse motivo constitui um dos diferenciais

brasileiros em relação aos seus vizinhos: a colonização portuguesa permitiu ao

Brasil alçar voos em direção a políticas territoriais na América do Sul, aproveitando-

se do momento político de dependência e lutas das colônias hispânicas contra o

controle monárquico.

Esse fator de diferenciação é delineado por Prado (2001) sob outro aspecto:

As metrópoles ibéricas desenharam limites não apenas geográficos, mas também culturais e políticos que dividiram suas colônias e criaram interesses econômicos e sociais específicos para cada

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região. E as independências não solucionaram esse impasse e não promoveram a tão proclamada necessidade de união entre todos os americanos do Sul.

Nesse sentido, aspectos culturais,17 políticos e econômicos distintos entre os países

sul-americanos podem ser explicados através dos processos históricos de

colonização, o que indica o fator como crucial para entender o papel do Brasil em

seu entorno geográfico, dadas as melhores condições econômicas e sociais em

comparação com os demais.

As constantes disputas fronteiriças (territoriais e manutenção do escoamento ao mar

platino), desencadeadas no século XIX, demonstram o caráter competitivo dos

países, que buscavam os mesmos objetivos: expansão territorial e hegemonia na

região. Tais disputas ilustraram as relações diplomáticas regionais do Brasil durante

o período imperial e contribuíram para o caráter americanista e de distanciamento

dos países vizinhos, adotado na política externa brasileira do período republicano.

Para Moniz Bandeira (2006b, p.269),

o entendimento do Brasil era de que havia duas Américas, distintas não tanto por suas origens étnicas ou mesmo pela diferença de idiomas, mas, principalmente, pela geografia, com as implicações geopolíticas, e esse foi o parâmetro pelo qual se orientou a política exterior do Brasil, que, no curso do século XIX, absteve-se de qualquer envolvimento na América do Norte, Central e Caribe, enquanto resguardava a América do Sul como sua esfera de influência. Na América do Sul, porém, o interesse fundamental do Brasil desde os tempos da colonização, cingiu-se, particularmente, aos países da Bacia do Prata – Argentina, Uruguai, Paraguai – e, de certo modo, Bolívia, o que amplificou ainda mais a importância geopolítica da região.

A partir da constatação de Moniz Bandeira, pode-se inserir o debate do lugar da

América do Sul para a política externa brasileira. O início da preocupação

diplomática do Brasil com o entorno regional, e com as relações internacionais em

geral, data do período imperial durante a colonização portuguesa, a partir de 1822.

Naquele momento não existia um órgão como o Ministério das Relações Exteriores

– que só foi institucionalizado no primeiro governo Vargas, a partir da reformulação

17 Sobre esse aspecto, Bourdieu (2010, p.115 [nota de rodapé]) afirma que “a diferença cultural é sem dúvida produto de uma dialéctica (sic) histórica da diferenciação cumulativa. (...) O que faz a região não é o espaço, mas sim o tempo, a história”.

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das carreiras públicas e da criação de um concurso diferenciado para admissão,

através do Instituto Rio Branco (BARROS, 1986, p.29-42) –, uma vez que a

chancelaria era responsabilidade de D. Pedro I. Nesse sentido, a primeira atitude

verdadeiramente nacional em política externa, ou seja, a primeira ação diplomática

do país foi a promulgação do Manifesto às Nações Amigas, em 1822, um documento

redigido por José Bonifácio, então ministro do Reino e dos negócios estrangeiros, e

dirigido aos diplomatas brasileiros no exterior e aos representantes de outros países

situados no Brasil: esse documento é uma justificativa de D. Pedro I ao rompimento

do Brasil com a Corte Portuguesa, afirmando ser um processo de independência

amigável, sendo Brasil e Portugal, a partir de então, países irmãos (CERVO;

BUENO, 1986, p.10).

A partir desse momento, durante o período imperial – de 1822 a 1889, quando

houve a proclamação da República –, a política externa brasileira foi fundamentada

através do intuito máximo de expansão territorial e comercial, haja vista a situação

política do país (colônia de Portugal). Além disso, havia a preocupação em garantir o

apoio das grandes potências – em especial da Grã-Bretanha e EUA – ao processo

de descolonização brasileiro, o que obrigou o país a conceder baixas tarifas de

importações e pagamento de indenizações a países como Portugal, Grã-Bretanha e

EUA, devido à cláusula da “nação mais favorecida” utilizada por esses países.

Em relação aos países vizinhos, a diplomacia durante o período imperial não pode

ser considerada amistosa, uma vez que o conflito cisplatino de 1825 demonstrou

claramente o aspecto hostil das relações entre os países, marcadas por disputas

territoriais e de hegemonia regional.

A Guerra Cisplatina se estendeu de 1825 a 1828, e correspondeu ao primeiro

conflito em que países sul-americanos lutaram pela preponderância regional, em

termos de poder. O Império brasileiro exigia a continuidade da posse territorial da

região, importante para o acesso ao mar via Bacia do Prata (COSTA, 1996, p.86).

É interessante notar que a região foi palco de disputas entre Portugal e Espanha,

desde o século XVII, sendo colonizada pelo reino espanhol após negociações entre

os países. Entretanto, a partir de 1811 se iniciam as invasões brasileiras no território

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uruguaio, culminando em sua anexação em 1821 (COSTA, 1996, p.85), o que

desagradou líderes cisplatinos, descontentes com a situação política da região

(agora anexada ao Brasil) e com os interesses hegemônicos do império vizinho.

Dessa forma, o conflito eclodiu em 1825, quando as províncias se uniram e

declararam guerra ao Brasil, numa tentativa de restabelecer sua independência.

Apesar de contar com o auxílio de Portugal – visto que o Brasil não possuía um

Exército consolidado –, o império liderado por D. Pedro I não conseguiu manter o

território sob sua hegemonia, sendo obrigado a aceitar a independência do Uruguai

em agosto de 1828 (COSTA, 1996, p.89).

Ainda que o conflito tenha gerado insatisfação popular internamente – o que refletiu

na diminuição da popularidade de D. Pedro I no país, que tentava garantir sua

hegemonia na região platina –, sob o ponto de vista regional a declaração de

independência das províncias contribuiu para o processo de pacificação da região,

marcada por conflitos territoriais e disputas por poder durante o século XIX.

No entanto, as disputas entre os países sul-americanos se estenderam por todo o

século, culminando com a Guerra do Paraguai a partir de 1864, quando as antigas

províncias do Rio da Prata se uniram ao Brasil, através da criação da Tríplice

Aliança, contra o Paraguai de Solano López. Para Doratioto (2006, p.253),

a Guerra do Paraguai foi o conflito internacional de maior duração e, possivelmente, o mais mortífero travado na América do Sul. Teve características inéditas, quer devido às condições geográficas (...), quer pelas condições políticas em que se desenvolveu a guerra.

Inicialmente o conflito era bilateral, e envolvia Brasil e Paraguai, insatisfeito com a

intervenção brasileira na guerra civil uruguaia (antiga província platina, juntamente

com a Argentina). A crise se alarmava no país vizinho, e a chancelaria brasileira, já

na figura de D. Pedro II, optou pela intervenção para evitar que o conflito se

alastrasse pelo sul do Brasil, região instável naquele momento. Além disso, o

principal objetivo diplomático na região era manter a navegação livre pelos rios

platinos, o que estava sendo prejudicada pelo Uruguai.

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Essa atitude causou descontentamento do governo paraguaio que, por sua vez,

declarou guerra ao Brasil com o objetivo de defender o território uruguaio, já que

temia pelo expansionismo brasileiro. O Paraguai, assim, se preparava para a guerra

com seu vizinho, ao passo que o Brasil acreditava que em sua incursão no Uruguai

apenas teria de enfrentar os enfraquecidos grupos políticos que estavam em

confronto naquele país (DORATIOTO, 2002, p.64).

Em novembro de 1864, Solano López ordena, dessa forma, a captura do vapor

brasileiro Marquês de Olinda que aportou em Assunção e partia para o Mato Grosso

levando o novo governador dessa província. Ao protestar contra o aprisionamento

do navio, a delegação brasileira recebeu uma nota do presidente na qual rompia as

relações do Paraguai com o Brasil e proibia o trânsito de navios com essa bandeira

pelo rio Paraguai. Dessa maneira se inicia a guerra (DORATIOTO, 2002, p.66-67).

O Brasil teve apoio da Argentina e do Uruguai no conflito, a partir da criação da

Tríplice Aliança: “os ataques paraguaios (...) viabilizaram a formalização da aliança

argentino-brasileira, à qual aderiu o Uruguai” (DORATIOTO, 2002, p.156). Esses

países temiam o expansionismo paraguaio e anexação territorial pelo Paraguai. O

conflito perdurou até 1870, quando as tropas brasileiras18 derrotaram e invadiram o

território paraguaio, dominando o país e deixando-o totalmente destruído. No

entanto, o conflito culminou no esfriamento das relações entre os países envolvidos,

tendo em vista as consequências de disputas territoriais e de hegemonia regional. A

consolidação das fronteiras brasileiras foi palco de intenso desgaste diplomático na

América do Sul e demarcou a primeira fase da política externa brasileira em relação

aos países vizinhos.

O segundo momento da diplomacia brasileira tem início com a proclamação da

República, em 1889, e a instauração de uma política externa movida pelos

interesses econômicos oligárquicos, numa espécie de continuidade às políticas

adotadas no plano interno. Dessa forma, o alinhamento comercial aos EUA ampliou

18 É interessante constatar que o Exército brasileiro não estava consolidado quando o Paraguai declarou guerra ao Brasil, em 1864. Os combatentes recrutados eram ex-escravos e moribundos, os quais eram obrigados a participar do embate (sendo, inclusive, acorrentados para não fugirem), e ficaram conhecidos com os “voluntários da Pátria”, numa alusão ao caráter coercitivo do recrutamento.

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o distanciamento do Brasil dos países vizinhos, o que tornou as relações ainda mais

complexas, já que se iniciava um novo momento da diplomacia brasileira: passado o

período imperial, cujos interesses estavam relacionados à delimitação de fronteiras e

conquista da preponderância entre os vizinhos, o Brasil tinha como interesse

primordial o comércio internacional, como forma de incrementar a economia nacional

e possibilitar ao país melhores condições no sistema internacional, caracterizado

pela primazia norte-americana (BURNS, 2003, p.252).

Por sua vez, os EUA visualizavam nas relações amistosas com o Brasil a

possibilidade de manter a órbita sul-americana sob controle, além de trocas

comerciais favoráveis. Assim, a partir de 1902, com a chancelaria sob

responsabilidade do Barão do Rio Branco,19 teve início na política externa brasileira

um novo paradigma, conhecido como americanismo, cuja característica principal era

a priorização das relações diplomáticas com os EUA como estratégia para

conquistar um espaço mais importante no sistema internacional (cuja grande

potência em ascensão era os EUA). Para Lima (2000, p.290),

ele [o Barão do Rio Branco] percebeu a tendência da última década do século XIX e acelerou-a, com a intenção de utilizar o poder e o prestígio dos Estados Unidos, que o mundo começava a respeitar, para atingir determinados objetivos no campo da política externa.

Em relação à América do Sul, objeto do presente trabalho, Rio Branco enxergava

um papel diferenciado do Brasil perante os países vizinhos, decorrente de sua

preponderância geográfica, demográfica e econômica (DORATIOTO, 2000, p.130).

As relações estavam estremecidas por conta dos intensos conflitos ocorridos no

século anterior, e o objetivo da política externa para a região platina se baseava na

tentativa de restabelecer a estabilidade política entre os países. No entanto, essa

política de prosperidade não impediu a intervenção do Brasil em crises no Uruguai e

19 José Maria da Silva Paranhos Junior, conhecido como Barão do Rio Branco, contribuiu para a modernização da política externa brasileira. Foi chanceler durante os governos de Hermes da Fonseca, Rodrigues Alves, Nilo Peçanha e Campos Sales. Adotou como estratégia, durante o período em que ocupou a chancelaria brasileira (1902-1912), a aproximação econômica e política dos EUA. Com isso, planejou não um alinhamento automático à potência norte-americana, e sim a posição de país amigo da grande potência mundial que surgia no sistema internacional, a fim de conquistar um papel relevante ao Brasil nesse cenário. Para mais informações sobre os feitos diplomáticos do Barão do Rio Branco, consultar: RICUPERO, Rubens. José Maria da Silva Paranhos, Barão do Rio Branco: uma biografia fotogr áfica . Brasília: FUNAG, 1995.

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no Paraguai, quando o país enviou tropas aos vizinhos para evitar que os conflitos

internos transbordassem para as regiões fronteiriças (no caso, o próprio território

brasileiro).

A questão diplomática regional mais emblemática envolvendo o Brasil, nesse

período, foi a negociação do território do Acre com a Bolívia (e também o Peru, que

tinha interesse, assim como o Brasil, de incorporar a região ao seu território). Essa

região pertencia, até o início do século XX, à Bolívia, porém a população era

composta por brasileiros, que exploravam seus seringais. No entanto, o Bolivian

Syndicate – corporação de origem mista (capital alemão, inglês e norte-americano),

“que se erigiu em um novo obstáculo a ser superado pela diplomacia brasileira”

(DANESE, 1984, p.57) –, passou a controlar a região, exigindo a expulsão dos

brasileiros, que se revoltaram. O conflito se estendeu por negociações complexas, já

que envolvia capital de diferentes países e delimitação de fronteiras.

Após infrutíferas tentativas de acordos diplomáticos com a Bolívia, o país resolveu

(...) o problema do arrendamento ao Bolivian Syndicate (...) com a cessão ao Brasil, pelos norte-americanos, partes do consórcio, dos direitos de arrendamento comprados à Bolívia, evitando-se dessa forma trunfo boliviano oriundo do envolvimento de terceiras potências no litígio (DANESE, 1984, p.57).

O Brasil, na figura de Rio Branco, optou pela negociação financeira da região,

oferecendo, com a assinatura do Tratado de Petrópolis, 2 milhões de libras

esterlinas e a promessa da construção da ferrovia Mamoré-Madeira.20

Conforme Lins (apud MONIZ BANDEIRA, 2000, p.156),21

no início de 1903, a guerra prevista desde que o Brasil vedara à Bolívia a navegação no Amazonas, impedindo qualquer tentativa do Bolivian Syndicate de instalar-se no Acre, afigurou-se inevitável e próxima. Contudo, o propósito de Rio Branco fora compelir a Bolívia

20 Informações disponíveis no Tratado de Petrópolis, assinado entre Brasil e Bolívia, que marca o fim do conflito fronteiriço. Disponível em: http://www2.mre.gov.br/dai/b_boli_11_927.htm. Acesso em 09/01/2009.

21 LINS, Álvaro. Rio Branco. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1965, p.279-280. Apud MONIZ BANDEIRA, Luiz Alberto. O Barão de Rothschild e a questão do Acre. Revista Brasileira de Política Internacional . Brasília, v.43, n.2, jul.-dez. 2000, p.156.

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a negociar e, em tais circunstâncias, ofereceu-lhe a compra do Acre pelo Brasil, que assumiria o compromisso de entender-se com o Bolivian Syndicate, ou a permuta de territórios.

O litígio fronteiriço foi marcante na chancelaria de Rio Branco devido ao sucesso de

suas negociações e a capacidade que teve de conquistar uma área importante para

o território brasileiro. Ao mesmo tempo, o incidente contribuiu para o temor dos

países vizinhos de que o Brasil possuía uma política imperialista na região.

O interesse maior da diplomacia do Barão era conseguir uma posição de destaque

para o Brasil tanto em âmbito regional quanto internacional. Conquistando a

hegemonia sul-americana, o país certamente conseguiria ascensão do seu papel no

cenário mundial, aliado à postura amigável com os EUA (RICUPERO, 1995, p.93).

Para Doratioto (2000, p.144),

José Maria da Silva Paranhos Júnior obteve sucesso em restabelecer o peso brasileiro no contexto internacional e, ainda, em criar um clima de concórdia com as nações vizinhas. Não conseguiu, porém, alcançar para o Brasil a liderança da América do Sul (...). Rio Branco postulava uma hegemonia brasileira defensiva nessa parte do continente.

A estratégia brasileira de conquistar a liderança regional devido à superioridade

nacional perante os vizinhos (em termos geográficos, demográficos e econômicos,

conforme já citado) não foi consolidada, ainda que as trocas comerciais com os EUA

possibilitassem relações promissoras com a grande potência. Os países da região

não permitiriam a hegemonia brasileira por temerem os interesses imperialistas do

país, o que culminou no fracasso das políticas de reaproximação com a América do

Sul durante a gestão de Rio Branco.

Com a morte de Rio Branco, em 1912, a diplomacia brasileira tomou novos rumos. O

chanceler inaugurou um novo paradigma, que marcou profundamente a diplomacia

nacional, possibilitando certa continuidade do seu caráter estratégico até o primeiro

governo Vargas (1930-1945), quando há alterações na lógica americanista devido a

fatores de desestabilização do sistema internacional, como a Segunda Guerra

Mundial entre 1939 e 1945.

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Os conflitos fronteiriços entre os países vizinhos foram cessados, e as políticas

territoriais dos países deram lugar ao início do processo de desenvolvimento

econômico, quando foi necessário buscar novos parceiros e relações comerciais

favoráveis com as grandes potências.

Até os anos 1930, a política externa brasileira adota a linha estratégica inaugurada

pelo Barão do Rio Branco, e o americanismo era demonstrado em ações como a

participação do país na Primeira Guerra Mundial (aliás, o único país sul-americano a

participar do conflito, ainda que de maneira limitada) na defesa dos EUA. Como

consequência, o Brasil se torna membro da extinta Liga das Nações e tenta, sem

sucesso, uma posição mais relevante no organismo (um cargo permanente no

Conselho) como representante dos países americanos. Com a ausência dos EUA na

Liga, o Brasil se tornou o único país americano a participar do Conselho, ainda que

no cargo rotativo (GARCIA, 1994, p.6). No entanto, os vizinhos, com exceção do

Chile,22 não aceitam a proposta, o que demonstra, mais uma vez, a não aceitação

da preponderância brasileira no subcontinente. Para Garcia (1994, p.8),

a tese central (para a participação no Conselho como membro permanente) era a da representação continental no quadro permanente do Conselho: na ausência dos Estados Unidos, o Brasil seria o candidato da América Latina melhor qualificado, dadas as dimensões de sua população e de seu território, o volume de sua contribuição financeira à Liga (a 7ª em importância) e sua política de filiação aos ideais da organização [grifo nosso].

Porém, frustradas as tentativas de ingressar como membro permanente, o Brasil se

retirou da Liga em 1926, após o episódio do veto à entrada da Alemanha ao

organismo já como membro permanente do Conselho. Para Hilton (apud SANTOS,

2003, p.104),23 o exemplo claro do desgaste diplomático provocado por tal atitude foi

a substituição do Brasil pela vizinha Argentina, após a saída brasileira do organismo:

22 Em 1921 o Chile propôs o apoio à entrada do Brasil no Conselho da liga das Nações como membro permanente desde que também fosse beneficiado com uma vaga permanente (GARCIA, 1994, p.20).

23 HILTON, Stanley. Afrânio de Melo Franco e a diplomacia brasileira, 1917-1943. Revista Brasileira de Política Internacional , Brasília, v.29, n.1, 1986, p.21-22 Apud SANTOS, Norma Breda dos. Diplomacia e fiasco. Repensando a participação brasileira na Liga das Nações: elementos para uma nova interpretação. Revista Brasileira de Política Internacional . Brasília, v.46, n.1, 2003.

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Com seus olhos na opinião pública brasileira, [Arthur Bernardes, presidente do Brasil] foi intransigente (...). O que tornou ainda mais amarga a derrota brasileira foi a atitude dos delegados hispano-americanos, que, mostrando (nas palavras de Mello Franco) “mal disfarçada hostilidade ao Brasil”, enviaram um apelo coletivo a Bernardes pedindo que suspendesse o veto e até manifestaram ao Conselho seu desacordo com a atitude adotada pelo Rio de Janeiro. (...) A humilhação final veio quando o Conselho, face à intransigência de Bernardes, nomeou uma comissão para estudar a reorganização do Conselho – ou seja, para encontrar um meio de remover o Brasil – e colocou nela a Argentina [grifo nosso].

Fica claro, nesse contexto, que as relações bilaterais envolvendo Brasil e Argentina

são marcadas pelo descaso argentino em apoiar o Brasil em sua investida pela vaga

permanente no Conselho da extinta Liga das Nações. O Chile tenta um apoio tímido

logo no primeiro ano de tentativa do Brasil, mas não suficiente para abarcar a

aceitação de todo o subcontinente à representação diplomática via Brasil.

O próximo momento diplomático vivenciado pelo Brasil tem início com o golpe de

1930, dando início à era Vargas, quando o governo inaugura um novo paradigma na

política externa brasileira, já que o alinhamento aos EUA fora substituído por uma

barganha desenvolvimentista envolvendo as duas grandes potências do sistema

internacional vigente: Alemanha e EUA (a estratégia diplomática conhecida como

diplomacia pendular).

No que diz respeito às relações diplomáticas regionais, a política externa do primeiro

governo Vargas opta pelo continuísmo, ou seja, o americanismo e a estratégia de

conquistar a liderança regional devido às características preponderantes do Brasil

perante seus vizinhos, numa espécie de representação, por parte do país, da

América do Sul no sistema internacional.

De acordo com o Ministério das Relações Exteriores (apud SANTOS, 2005, p.10),

com Vargas, a despeito da “barganha nacionalista” para extrair maiores concessões e apoio de Washington, houve continuidade no discurso americanista brasileiro. Sob a direção dos Estados Unidos, o pan-americanismo foi paulatinamente dirigido para a defesa contra ameaças extracontinentais, movimento que contou com o suporte brasileiro. Desde a gestão de Macedo Soares no Itamaraty, pode-se observar claramente a adesão brasileira a essa concepção de identidade americana. Veja-se, por exemplo, o que o chanceler

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brasileiro diz em seu Relatório referente ao ano de 1934: “Política de solidariedade continental e fraternidade americana, ela está baseada numa colaboração efetiva com todos os povos da América e entendimento íntimo com os Estados Unidos, aos quais estamos ligados por velha amizade que vem dos primórdios da Independência. Embora sem traduzir em atos solenes essa orientação, não deixei de velar sempre para que os rumos tradicionais dessa política se conservassem sempre na mesma direção franca e clara”.24

Como se pode observar, a diplomacia conciliatória para a América foi conservada, o

que contribuiu para o resgate das relações amistosas entre os países, estremecidas

devido aos conflitos fronteiriços e intervenções em crises internas. Houve até

mesmo, nesse período, a tentativa de assinatura de um tratado envolvendo Brasil,

Argentina e Chile, o chamado Tratado de 1941, para a criação de um acordo de livre

comércio entre os países, que se desenvolveria em uma união aduaneira.

Entretanto, às vésperas de sua assinatura ocorreu o ataque japonês à base

americana de Pearl Harbor, o que desencadeou o envolvimento dos países na

Segunda Guerra Mundial e o desvio do foco (MONIZ BANDEIRA, 2006b, p.272).

Porém, a política pan-americanista inaugurada por Vargas vai gerar uma posição

favorável ao Brasil, ao conseguir mediar diplomaticamente conflitos envolvendo

países vizinhos, como a questão de Letícia, quando Peru e Colômbia entraram em

litígio fronteiriço pela região supracitada, “território que para o governo de Bogotá era

colombiano” (CERVO; BUENO, 2011, p.260), mas ocupado por peruanos em 1932,

ainda que já houvesse delimitação judicial da fronteira em um tratado de 1922. O

Brasil, nesse momento, se ofereceu para mediar o conflito, o que ocorreu de fato em

1934, pondo fim ao imbróglio a partir de negociações no Rio de Janeiro (CERVO;

BUENO, 2011, p.261).

Além da questão de Letícia, o Brasil mediou, durante o primeiro governo Vargas, a

Guerra do Chaco, entre Bolívia e Paraguai, que ocorreu a partir de 1932 entre os

países pela disputa daquela região fronteiriça. Em 1935, devido ao intenso trabalho

diplomático de mediação, o Brasil formalizou o fim do conflito armado, garantindo a

posição de mediador da contenda regional (CERVO; BUENO, 2011 p.263-264).

24 MINISTÉRIO DAS RELAÇÕES EXTERIORES. Relatórios do Ministério das Relações Exteriores. 1890/1969. (RMRE). Apud SANTOS, Luís Cláudio Villafañe G.. A América do Sul no discurso diplomático brasileiro. Revista Brasileira de Política Internacional . Brasília, v.48, n.2, 2005.

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Para Seitenfus (2003b, p.6), a mediação das rusgas diplomáticas do entorno

regional, durante o período analisado, permitiu ao Brasil reconfigurar sua posição na

América do Sul, após sucessivas pressões de países vizinhos a partir da barganha

pendular de Vargas durante a Segunda Guerra Mundial:

(...) elemento importante da política externa brasileira foi o pan-americanismo, num sentido que excede o âmbito restrito traçado pelas diferentes conferências pan-americanas. O Brasil desenvolveu uma política de aproximação com o Novo Mundo desde o fim do século XIX. Mais do que nunca, possuindo limites fronteiriços com quase todos os países da América do Sul, não se podiam ignorar os problemas postos ao conjunto da América. A tendência pan-americanista da política do Itamaraty durante os primeiros anos do governo Getúlio Vargas reforçou-se ainda mais diante do fracasso sofrido pela diplomacia brasileira na Sociedade das Nações (SDN) em 1926. O pan-americanismo brasileiro apresenta (...) uma política de mediação diante dos conflitos entre os países da região.

No entanto, o cenário favorável à integração regional será consolidado, de fato, após

o segundo governo Vargas (1951-1954), a partir do governo de Juscelino Kubitschek

(1956-1961). Até esse período, a diplomacia brasileira estava guiada em prol do

interesse nacionaldesenvolvimentista.

A política externa brasileira durante o segundo governo Vargas foi caracterizada,

mais uma vez, pela barganha pendular, em especial entre a aproximação à América

do Sul e uma provável distensão da política externa brasileira da Guerra Fria; e ao

alinhamento aos EUA, num período da Guerra Fria. O perigo comunista preocupava

o governo norte-americano, que intensificava seu controle (e eventuais

investimentos financeiros) sobre o Brasil quando o governo demonstrava interesse

em se aproximar dos países vizinhos, principalmente a Argentina, cuja política

externa peronista da Terceira Posição25 trazia desconfianças quanto ao caráter de

não alinhamento durante o bipolarismo da época. No entanto, a aproximação

diplomática entre os dois países não foi concretizada, uma vez que, na prática,

25 A Terceira Posição, presente na política externa de Perón durante a Guerra Fria, tinha como ideais a consolidação de uma posição de não alinhamento dos países latino-americanos a um dos polos de poder (EUA e União Soviética). Essa posição de neutralidade seria soberana a partir da união dos países do subcontinente, não só politicamente, como também economicamente, a partir de um eixo financeiro formado pela Argentina, Brasil e Chile. (HIRST, 2003, p.95). Para maiores informações sobre a política externa de Perón e o relacionamento diplomático com o Brasil de Vargas consultar: CERVO, Amado Luiz. Relações internacionais da América Latina: velhos e novos paradigmas . São Paulo: Saraiva, 2007, p.72.

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(...) o Brasil procurou acompanhar com fidelidade, em alguns momentos até excessiva, a cartilha ideológica dos Estados Unidos. Já a Argentina tratou de maximizar uma posição equidistante dos dois polos de poder internacional que se cristalizavam com a Guerra Fria (HIRST, 2003, p.94).

Na realidade, Vargas tinha como interesse, em relação à política externa, garantir o

apoio dos EUA e manter a órbita norte-americana no subcontinente americano

graças ao apoio brasileiro. Como demonstra Vizentini (2003, p.16),

a diplomacia pendular do Brasil, entre Washington e Berlim, buscava, em essência, reativar a velha “aliança privilegiada” com os Estados Unidos, inovando-a com outras formas de cooperação econômica. Em suma, Vargas ensaiava uma nova política externa em uma situação ainda dominada por velhas estruturas, de alcance regional.

Ainda a respeito da limitada aproximação com os países vizinhos durante o segundo

governo Vargas, Hirst (2003, p.92) indica que

no âmbito latino-americano, o quadro de instabilidade política e a forte presença dos Estados Unidos no continente foram fatores que, direta ou indiretamente, condicionaram as relações do Brasil com seus vizinhos (...). A opção do governo Vargas de manter uma política alinhada a Washington transformou-se, portanto, na principal variável a demarcar os limites e fronteiras da parca e fragmentada política externa brasileira para a América Latina.

Dessa forma, não se tem, de fato, uma aproximação regional consolidada no

período supracitado, ainda que tenha feito parte da barganha da política exterior

brasileira em relação ao alinhamento a Washington. A partir do governo Juscelino

Kubitschek (1956-1960) e a abertura multilateral da política comercial brasileira a

integração regional inaugura um novo momento, que dará sustentação ao projeto de

universalização da diplomacia nacional: a consolidação da Operação Pan-

Americana (OPA), que foi lançada em 1958 (OLIVEIRA, 2005, p.82).

Considerada um marco da diplomacia regional do governo Kubitschek, a OPA foi

criada pelo próprio presidente brasileiro, a partir do envio de correspondências ao

presidente norte-americano Dwight Eisenhower com o intuito de denunciar o

possível surgimento de influências soviéticas na América Latina, que estariam

relacionadas com a falta de investimentos norte-americanos durante a Guerra Fria.

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A proposta seria a criação de cooperação hemisférica para evitar a disseminação

comunista na América (CERVO; BUENO, 2011, p.311-312).

Conforme explicitado na primeira correspondência a Eisenhower, as relações

diplomáticas entre o subcontinente e os EUA estariam ameaçadas pelo interesse

soviético em financiar levantes revolucionários na América Latina:

Senhor Presidente, não é possível esconder que, diante da opinião mundial, a ideia da unidade pan-americana sofreu sério prejuízo. Não pode deixar de resultar – das desagradáveis ocorrências, que tanto deploramos – a impressão de que nos desentendemos no nosso continente. A propaganda dos interessados no antiamericanismo, naturalmente, procura agora converter esses supostos desentendimentos numa incompatibilidade, mesmo numa inimizade entre os países livres da comunidade americana (KUBITSCHEK, 1958).

Além de corresponder a uma tentativa de viabilizar a articulação latino-americana

para atrair investimentos norte-americanos, baseados na lógica da segurança

hemisférica (contra a entrada soviética nos países latino-americanos), a OPA servia

aos interesses brasileiros de atração de capital estrangeiro para financiar o Plano de

Metas de Kubitschek. Para Vizentini (1994, p.27-28),

a OPA pretendia incrementar os investimentos nas regiões economicamente atrasadas do continente, compensando a escassez de capitais internos, promover a assistência técnica para melhorar a produtividade e garantir os investimentos realizados, proteger os preços dos produtos primários exportados pela América Latina, bem como ampliar os recursos e liberalizar os estatutos das organizações financeiras internacionais. (...). A OPA enfatizava a utilização de capitais públicos e a multilateralização das relações interamericanas.

Ainda que a iniciativa não tenha sido suficiente para desviar os olhares da grande

potência capitalista dos problemas enfrentados pelos países do sul da América, foi a

partir da criação da OPA que o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) foi

criado, no mesmo ano, além de servir como pano de fundo para a consolidação da

ALALC em 1960 (que foi substituída pela ALADI em 1980), uma tentativa de criar

uma área de livre comércio abrangendo países latino-americanos (CERVO; BUENO,

2011, p.314).

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Dessa forma, percebe-se que o entorno geográfico teve importância na diplomacia

de Kubitschek, no momento em que o Brasil passou a buscar a diversificação dos

parceiros comerciais, em prol do multilateralismo como forma de angariar ao país

melhor posição no sistema internacional e consolidar o projeto de industrialização

nacional.

A política externa independente, que teve início nos governos de Jânio Quadros

(1961) e João Goulart (1961-1964), inaugurou um novo marco paradigmático na

política exterior brasileira, a partir da percepção de que o país necessitava de novas

parcerias comerciais e diplomáticas, além da defesa de ideais de democracia no

sistema internacional. Para Vizentini (2003, p.27),

ela pode ser considerada uma resposta da diplomacia brasileira às aceleradas transformações internacionais, em particular o surgimento de novos atores e a modificação do caráter de outros, cujas necessidades e cujos anseios se posicionavam fora da política dos centros dominantes. A orientação diplomática da PEI [política externa independente] respondia à atitude dos Estados Unidos com relação à América Latina até a Revolução Cubana, percebida como um “descaso” caracterizado pela ausência de investimentos públicos norte-americanos para a área de infraestrutura e de bens de capital.

A política externa independente, assim, correspondeu a uma reação – já que não foi

um projeto, e sim um processo de adaptação da diplomacia brasileira às

transformações internacionais26 – às relações desiguais entre a potência norte-

americana e os países latino-americanos, em especial o Brasil. O governo brasileiro

passou a adotar uma política externa engajada com o discurso terceiro-mundista em

voga na década de 1960, denunciando os problemas existentes no mundo

subdesenvolvido.

A partir desse paradigma, o Brasil norteou a política externa regional do período,

tendo como grande corolário a defesa de Cuba após a revolução cubana de 1959 e

as tentativas de conter o avanço dos ideais comunistas pelos EUA, através de

intervenções na América Latina e a proposta de sanções políticas e comerciais ao

26 Política externa independente: um balanço. Revista Civilização Brasileira . Rio de Janeiro, mar. 1965, p.67. DANTAS, Francisco Clementino de San Tiago. Política exterior e desenvolvimento. Discurso de paraninfo. Revista Brasileira de Política Internacional . Brasília, v.27, set. 1964, p.533. Apud BUENO, Clodoaldo; CERVO, Amado. História da política exterior do Brasil . Brasília: Editora Universidade de Brasília, 2011, p.331.

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governo revolucionário cubano, em 1962, na VIII Reunião dos Ministros das

Relações Exteriores da OEA, também conhecida como Conferência de Punta Del

Este (FRANCHINI NETO, 2005, p.1-2). De acordo com Franchini Neto (2005, p.1),

a Conferência focava-se na situação política do governo de Cuba, cujo líder – Fidel Castro – declarara adesão ao marxismo-leninismo, e nas alegadas ações contra países vizinhos. Após dez dias de discussões, em 31 de janeiro, Cuba foi suspensa da Junta Interamericana de Defesa e da OEA.

Durante a conferência da OEA, o governo brasileiro demonstrou estar disposto a

defender Cuba com bases nos princípios da política externa independente de não

intervenção e autodeterminação (WROBEL, 1993, p.13). Nesse momento o Brasil

manifestou-se contrariamente ao isolamento de Cuba, às sanções econômicas e

diplomáticas (OLIVEIRA, 2005, p.99). No entanto, após as negociações e

discussões, a posição do Brasil foi de abstenção, o que correspondeu, em última

instância, à aprovação da exclusão de Cuba da Junta Interamericana de Defesa,

mas a não aceitação da expulsão do país da OEA (DANTAS apud OLIVEIRA, 2005,

p.99).27

A posição diplomática brasileira, de tentar mediar a contenda entre o regime

revolucionário cubano e a política de defesa hemisférica adotada pelos EUA contra o

avanço soviético no subcontinente, foi o exemplo clássico da adoção dos princípios

da política externa independente para a América Latina.

Entretanto, os efeitos da política externa independente (entre outros fatores)

desencadearam o golpe militar no Brasil, em 1964, quando os militares tomaram o

poder e implantaram o Regime Militar, que perdurou até 1984.

Em relação à política externa, os governos militares implantaram mudanças

significativas em relação aos moldes diplomáticos da política externa independente,

vigente no período anterior ao golpe. A diplomacia dos círculos concêntricos, criada

pela Escola Superior de Guerra, tinha como objetivo central projetar o país no

27 DANTAS, Francisco Clementino de San Tiago. Política externa independente. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1962. Apud OLIVEIRA, Henrique Altemani. Política externa brasileira . São Paulo: Saraiva, 2005.

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mundo, adaptando as possibilidades externas às necessidades internas (de

desenvolvimento econômico), através de um jogo dúbio entre o alinhamento aos

EUA e um multilateralismo caracterizado pela visão dos militares de ser o Brasil o

elo entre as grandes potências e os países subdesenvolvidos (GONÇALVES;

MIYAMOTO, 1993).

Os governos tinham como estratégia diplomática, portanto, a lógica dos círculos

concêntricos, que pressupõe que existem prioridades diplomáticas que devem ser

alcançadas para que as próximas tenham sucesso, culminando no objetivo central

de tornar o Brasil uma potência no sistema internacional. Dessa forma, o primeiro

círculo constituía a América Latina; o segundo era os EUA e o terceiro o Ocidente,

com foco no Atlântico Sul. Para que se conquistasse a posição de potência mundial,

o Brasil precisaria, primeiramente, conquistar papel preponderante na região, para

em seguida manter relações especiais com os EUA e se tornar um player no sistema

internacional.

Castelo Branco (apud GONÇALVES; MIYAMOTO, 1993, p.6)28 sintetiza a lógica dos

círculos concêntricos:

O interesse do Brasil coincide, em muitos casos, em círculos concêntricos, com o da América Latina, do continente americano e da comunidade ocidental. Sendo independentes, não teremos medo de ser solidários. Dentro dessa independência e dessa solidariedade, a política exterior será ativa, atual e adaptada às condições de nosso tempo bem como aos problemas de nossos dias. Será esta a política externa da Revolução.

Em relação ao entorno regional, a diplomacia militar ficou marcada pelos traços de

aproximação com os países vizinhos e pela intervenção em prol dos interesses

norte-americanos, como no caso da República Dominicana29 no governo Castelo

28 Discurso proferido pelo presidente Castelo Branco em 31 de julho de 1964 no Instituto Rio Branco, em solenidade de formatura de diplomatas. Apud GONÇALVES, Williams e MIYAMOTO, Shiguenoli. Os militares na política externa brasileira: 1964-1984. Revista Estudos Históricos . Rio de Janeiro, v.6, n.12, 1993.

29 Uma junta interamericana foi composta por EUA, Brasil, Paraguai, entre outros países, para conter um levante de militantes contra a situação política instável em vigor no país desde 1961, quando o então presidente Rafael Trujillo foi assassinado. O Brasil acatou o pedido dos EUA de auxiliar a intervenção com tropas e proteção territorial (cedendo território para os aviões norte-americanos).

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Branco (1964-1967) e no apoio ao golpe chileno para derrubar o governo de

Allende,30 em 1973, no governo Médici (1969-1974).

No que diz respeito às ações em prol da integração regional, havia entre os países

vizinhos ao Brasil o receio de que a política externa militar fosse voltada para

interesses imperialistas para a região, devido à aproximação quase automática do

país aos interesses norte-americanos. No entanto, em 1973 o Brasil assinou, com o

Paraguai, o Tratado de Itaipu, que deu origem à usina hidrelétrica binacional

existente entre os dois países.

Nesse processo, a Argentina reivindicou sua participação, tendo em vista os

interesses energéticos e um acordo já em andamento com o Paraguai (antes da

proposta brasileira de construir Itaipu). Como indicam Saraiva e Almeida (1999,

p.33-34),

durante os anos 70, a construção da hidrelétrica de Itaipu opôs fortemente os dois países, com a Argentina esgrimindo contra o governo brasileiro as regras do Direito Internacional referentes ao uso de rios internacionais. A obstinação do governo militar aqui instalado, porém, tratava o empreendimento conjunto com o Paraguai como essencial ao projeto então vigente de transformar o Brasil em potência mundial até o fim do século. A colossal usina prestava-se, também, a intentos geopolíticos, com a virtual anexação da economia paraguaia. Brasília comprometeu-se a financiar a parte que caberia a Assunção no investimento e, concluídas as obras, a comprar o excedente da energia destinada ao sócio menor que, evidentemente, não teria como consumi-la. Apenas em 1979, os argentinos, já bem mais conscientes da inexorável perda de posição de sua economia frente à brasileira, viriam a aceitar o fato consumado da represa. Haviam perdido em todas as suas argumentações.

A disputa entre Brasil e Argentina pela parceria energética com o Paraguai acirrou o

ímpeto nacionalista dos mesmos, gerando mal-estar diplomático e a tentativa de

denúncia do governo argentino à barganha adotada pelo Brasil (cedeu mais ao

Paraguai, conquistando o tratado bilateral), de acordo com o Direito Internacional. A

Argentina, insatisfeita com a decisão paraguaia de optar pelo acordo com o Brasil,

30 O golpe, apoiado pelos EUA, colocou Pinochet no poder, implantando uma ditadura autoritária no Chile.

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chegou a declarar que poderia entrar em guerra com os países envolvidos na

contenda.

O Tratado e a construção de Itaipu contribuíram, apesar do desgaste diplomático

com a Argentina, para a aproximação entre Brasil e Paraguai, gerando um novo

padrão de relações com os países vizinhos que perdura até os dias atuais.

Durante o governo Figueiredo as relações amistosas entre Brasil e Argentina foram

retomadas, durante o conflito envolvendo o país vizinho e a Inglaterra: a Guerra das

Malvinas, em 1982. Souza Neto (2007, p.113) resume a importância do apoio

brasileiro aos vizinhos argentinos durante o impasse a respeito da soberania do

arquipélago, que foi mantida, ao fim do conflito, pela Inglaterra (que contava com o

apoio dos EUA):

Talvez o marco inicial tenha sido o apoio do Brasil à Argentina na Guerra das Malvinas em 1982, apoio não apenas retórico, mas concreto. O Brasil passaria a representar os interesses da Argentina junto ao Reino Unido quando foram rompidas as relações diplomáticas entre os dois países, fato diplomático de importância histórica.

O governo brasileiro optou pelo apoio à Argentina, atuando diretamente no conflito

pela justificativa de defender o país vizinho e não aceitar a desobediência dos EUA

ao Tratado Interamericano de Assistência Recíproca (TIAR), quando a potência

decidiu apoiar a Inglaterra.31 A atitude brasileira ia ao encontro dos ideais

universalistas e de não alinhamento presente na política externa de Figueiredo,

numa tentativa de reabrir o país em prol da redemocratização.

A estratégia diplomática brasileira de aproximação com os países sul-americanos

durante a fase de redemocratização foi crucial para a adaptação do Brasil ao novo

contexto internacional de fim da Guerra Fria e transformações em curso no sistema

internacional: a integração regional correspondia a essas modificações no mundo e,

a partir do governo Sarney, a prioridade da política externa brasileira passou a ser

finalmente seu entorno geográfico. Dessa forma, em um contexto de

31 Para mais informações sobre o episódio, consultar GUERREIRO, Ramiro Saraiva. Lembranças de um empregado do Itamaraty . São Paulo: Siciliano, 1992.

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transformações, “quanto mais se estreitavam as possibilidades de atuação do Brasil

no plano global, mais a América do Sul era valorizada como alternativa estratégica”

(VIZENTINI, 2003, p.69)

A partir do governo Sarney, em 1985, as transformações na política externa

brasileira deram o tom do processo de redemocratização. A prioridade da diplomacia

nacional passou a constar na Constituição de 1988, e a América do Sul seria, a

partir daquele momento, o grande objetivo da política exterior do país: “a República

Federativa do Brasil buscará a integração econômica, política, social e cultural dos

povos da América Latina, visando à formação de uma comunidade latino-americana

de nações”.32 De acordo com Mariano e Vigevani (2006, p.337-338),

a integração no Cone Sul, além de servir de base para uma melhor inserção internacional, era também entendida como um instrumento de fortalecimento das democracias recém-ressurgidas. Havia o interesse mútuo dos governos em reduzir as possibilidades de retrocesso autoritário, além do entendimento de parte das burocracias estatais de que a integração regional poderia contribuir para uma nova etapa de desenvolvimento econômico (...).

Nesse sentido, a integração regional era pensada como uma alternativa à

consolidação da democracia no entorno regional, além da adaptação desses países

às transformações econômicas internacionais. Ainda que na arena diplomática o

governo Sarney tenha traços de continuidade ao Regime Militar (por ser um

momento de transição, que combina novos elementos àqueles vigentes no período

imediatamente anterior), a aproximação com o os países vizinhos correspondeu à

principal mudança, uma vez que a partir desse momento a integração regional

passou a ser a prioridade brasileira, em termos econômicos e políticos. Segundo

Cervo e Bueno (2011, p.450),

a aproximação com a América Latina e o Caribe foi determinada por fatores endógenos e exógenos: a função da política externa para a região, como para o resto do mundo, permanecer com o fim de viabilizar o setor ante as demandas do desenvolvimento e da segurança nacionais, mediante o incremento das exportações, de ações cooperativas bilaterais e multilaterais e da boa convivência. A

32 Trecho da Constituição da República Federativa do Brasil. Parágrafo único. Disponível em: http://www.mp.sp.gov.br/portal/page/portal/chefia_gabinete/legislacao/CONST%20FEDERAL%20COMPLETA.pdf. Acesso em 13/01/2009.

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crise da dívida externa, a esterilização do diálogo Norte-Sul, a intervenção norte-americana na América Central e no Caribe, a contraofensiva inglesa sobre as Malvinas com o apoio dos Estados Unidos, as retaliações econômicas impostas pelo Norte contra a Argentina, entre outros elementos, contribuíram para unir o continente latino-americano.

As relações diplomáticas com a Argentina durante o governo Sarney foram cruciais

para o estabelecimento do MERCOSUL, uma vez que se consolidou uma prévia do

Tratado de Assunção, em 1988 (CORREA, 1996, p.373). Aliás, o relacionamento

diplomático com o país vizinho se estruturou a partir de necessidades comuns entre

os mesmos, dadas as condições de redemocratização interna e a exigência de

retomar o crescimento econômico. De acordo com Vizentini (2003, p.69),

quanto mais se estreitavam as possibilidades de atuação do Brasil no plano global, mais a América do Sul era valorizada como alternativa estratégica, tendo seu eixo centrado na cooperação e integração com a Argentina, que vivia problemas semelhantes aos do Brasil.

Um marco importante da política externa de Sarney foi a criação em 1986 do Grupo

do Rio, que corresponde a um mecanismo de consulta regional, abrangendo países

latino-americanos e do Caribe. Para Correa (1996, p.373), o grupo é “um canal

autônomo de ação diplomática, habilitado a discutir e influenciar políticas sobre as

principais questões regionais sem a participação ou a tutela dos EUA”.

A iniciativa da consolidação do Grupo do Rio, além do reatamento de relações

diplomáticas com Cuba de Fidel Castro, foi emblemática para demonstrar o

rompimento ao alinhamento com os EUA e a consolidação de uma nova fase na

diplomacia brasileira, que se estendeu aos governos posteriores, ainda que com

algumas modificações conjunturais. De acordo com Oliveira (2005, p.233), tal

inovação gerou resultados interessantes de cooperação entre os países vizinhos:

(...) nos anos 1990 destaca-se o surgimento de uma ênfase nova na política externa brasileira, o regionalismo, expresso pela atuação brasileira nos processos de integração sub-regional (MERCOSUL), de integração regional, representada especialmente pela proposta brasileira de criação da Área de Livre Comércio Sul-Americana (ALCSA) e de integração hemisférica (Área de Livre Comércio das Américas – ALCA).

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Dessa forma, dando início a essa nova fase da política externa brasileira, o breve

governo Collor (1990-1992) foi crucial para a concretização dos ideais diplomáticos

de integração regional. Nesse sentido, essa

(...) mudança aconteceu (...) a partir da avaliação de que a integração regional deveria servir ao objetivo prioritário de assegurar mais poder e autonomia ao Brasil em sua ampla estratégia de inserção na economia global e projeção no sistema internacional (SORJ; FAUSTO, 2011, p.10).

O ápice da nova estruturação da diplomacia regional brasileira foi a criação do

MERCOSUL, em 1991, unindo Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai em um bloco

econômico cujo objetivo é a consolidação de uma Tarifa Externa Comum (TEC)

rumo a uma área de livre comércio entre os países-membros.33 De acordo com

Onuki (2006, p.300), a partir desse momento

seria impossível, para o Brasil, ignorar seus vizinhos após anos de isolamento marcado pelos regimes autoritários, até porque o acordo de integração econômica passou a ser visto como uma fonte de estabilidade para as democracias recém-construídas e um processo de consolidação desde meados da década de 1980.

A política externa de Collor correspondeu ao reflexo de sua política econômica de

abertura comercial e adoção dos pontos do Consenso de Washington, uma

tendência seguida pelos países latino-americanos em prol da adaptação ao novo

contexto internacional de fim de Guerra Fria e da bipolaridade EUA versus União

das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS). A desregulamentação econômica

possibilitou a adoção do multilateralismo e a consolidação do MERCOSUL,

uma obra de engenharia diplomática concebida a um tempo como um campo de provas para a globalização e como uma nova etapa no projeto econômico dos países que o integram (DANESE, 2009, p.56).

Pode-se afirmar que a integração regional passa a ser realidade no governo Collor

devido aos ganhos comerciais que os países-membros do MERCOSUL, em especial

o Brasil, obtiveram após a assinatura do Tratado de Assunção. Segundo Hirst e

Pinheiro (1995, p.15),

33 Informações coletadas em http://www.mercosur.int/. Acesso em 19/10/2011.

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com respeito ao MERCOSUL, vale chamar atenção para a importância que as transações com a sub-região assumiram para o Brasil, principalmente para a colocação de seus produtos industrializados. No período 1991-1994, a participação nos países do MERCOSUL das exportações brasileiras, no volume total das vendas externas do país, saltou de 4% à quase 14%.

Dessa forma, percebe-se que o incremento comercial adquirido com a criação do

MERCOSUL contribuiu para o fortalecimento da integração dos países vizinhos, o

que contribuiu para o retorno da estratégia diplomática brasileira da liderança

regional como pano de fundo para se tornar um global player de peso no sistema

internacional. Durante o governo Collor essa estratégia veio à tona através do

incremento do MERCOSUL e as tentativas de exercer um papel ativo no cenário

mundial, como a participação ativa nos organismos internacionais e o

multilateralismo.

O governo posterior, de Itamar Franco (1992-1994), deu continuidade à abertura

econômica do país, embora tenha suspendido algumas privatizações e diminuído o

ritmo das políticas neoliberais. Devido aos incidentes políticos que caracterizaram o

impeachment de Collor, “o governo Itamar teve início sem dar prioridade à agenda

externa, mostrando pouco interesse em dedicar-se a uma diplomacia presidencial”

(HIRST; PINHEIRO, 1995, p.10).

Em relação à diplomacia regional, o governo Itamar Franco deu prosseguimento à

integração via bloco, e o MERCOSUL, já em 1994, estava em funcionamento pleno,

graças aos benefícios econômicos trazidos aos países-membros nos primeiros anos

de existência.

Para ilustrar a prioridade à integração regional pela política externa brasileira após

redemocratização, é interessante notar que, durante o governo Itamar, foi proposta a

criação de uma área de livre comércio sul-americana denominada ALCSA (que

correspondeu a um plano de união comercial em um prazo de dez anos):

O Brasil lançou o projeto de criação de uma Área de Livre Comércio Sul-Americana (ALCSA), que visava congregar os países do MERCOSUL, do Grupo Andino e o Chile, mediante a negociação de uma rede de acordos de livre comércio. À época, por ter sido apresentada aos países da região sem que os sócios do

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MERCOSUL fossem previamente consultados, a proposta da ALCSA gerou reações contrárias entre os vizinhos do Brasil no Cone Sul (MELLO, 2002, p.38-39).

Ainda que não tenha sido concretizada, devido aos incidentes causados pela atitude

brasileira de não convocar os países-membros do MERCOSUL para discutir a

criação da ALCSA antes de seu anúncio, a iniciativa demonstra os interesses

diplomáticos do Brasil em ampliar a integração via bloco, já que para alcançar a

liderança regional seria necessária uma rede maior de países envolvidos no

processo de integração. Além disso, o Brasil já se constituía no principal membro do

MERCOSUL: ou seja, a preponderância já estava garantida dentro do bloco.

Os mandatos de Fernando Henrique Cardoso (FHC) – 1995-1998 e 1999-2002 –

dão continuidade ao caráter regional da política externa brasileira após a

redemocratização. Após iniciativas como o Grupo do Rio, MERCOSUL e ALCSA, o

país continuou investindo na integração regional durante os governos FHC. No

entanto, a estratégia passou a ser a delimitação do entorno de influência da política

externa brasileira, devido à conjuntura regional em vigor e as possibilidades de

sucesso das investidas brasileiras em prol da liderança entre os países vizinhos:

A gestão de Fernando Henrique Cardoso no Itamaraty deu início à substituição do termo “América Latina” pelo “América do Sul” no discurso diplomático brasileiro, no qual excluía explicitamente o México e qualquer relação de proximidade com o NAFTA [North American Free Trade Agreement], delimitando a nova esfera geográfica da estratégia regionalista brasileira. Na política externa do governo Itamar Franco, a nova prioridade conferida à América do Sul seria também articulada com o objetivo de promover uma atuação internacional protagônica para o Brasil nos foros multilaterais, em particular no contexto da perspectiva de ampliação do Conselho de Segurança da ONU. A ideia do Brasil como global trader foi então ampliada para a de global player, ao qual não caberia confinar suas relações econômicas e políticas a um único parceiro ou bloco (MELLO, 2002, p.40).

Em relação à política externa, FHC deu continuidade às escolhas de Collor e Itamar

Franco para a região, com o intuito de desenvolver o MERCOSUL e as relações

interblocos entre União Europeia e uma possível ALCA, intensamente negociada

durante os dois mandatos. De acordo com Vigevani, Oliveira e Cintra (2003, p.15),

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na gestão FHC consolidou-se a política já praticada nos governos Collor de Mello e Itamar Franco, pela qual o MERCOSUL seria prioritário na agenda brasileira por constituir uma proposta inédita na América do Sul e, ao mesmo tempo, ter caráter de regionalismo aberto, sem exclusão de outros parceiros.

A questão da ALCA merece uma análise a respeito das intenções brasileiras por se

tratar de um acordo que, se consolidado, alteraria a estratégia brasileira de

conquistar a posição de país líder no sistema internacional através da liderança

regional, uma vez que a tendência, com a assinatura do acordo, seria a substituição

do MERCOSUL, ou mesmo o seu enfraquecimento como bloco regional. O livre fluxo

de mercadorias (de acordo com as negociações), serviços e capital englobando os

países do continente americano (exceto Cuba, por uma exigência dos EUA) foi uma

das pautas de discussão mais importantes da política externa de FHC, já que, para o

Brasil, seria necessário ajustar as exigências norte-americanas aos interesses dos

países sul-americanos. Para Mariano e Vigevani (2006, p.327),

os custos potenciais para o Brasil na integração do MERCOSUL já são altos, devido à própria composição do bloco e à realidade doméstica dos países participantes. A ação dos Estados Unidos para o hemisfério faz que estes custos aumentem ainda mais, agindo indiretamente para as dificuldades.

A partir da proposta dos EUA de formar área de livre comércio, os países-membros

do MERCOSUL, coordenados pelo Brasil, propuseram, a partir do fim do segundo

governo FHC, um acordo entre os quatro países do bloco e os EUA (chamado 4+1 –

mas essa proposta só foi oferecida durante o governo Lula), para que a ALCA

pudesse ser mais equilibrada em termos dos interesses dos países envolvidos. No

entanto, a ideia não foi aceita pelos EUA, e o acordo foi cancelado, apesar de todo o

debate que gerou durante os mandatos de FHC.

Iniciou-se também, durante esse período, a negociação em torno de um acordo

envolvendo o MERCOSUL e a União Europeia; porém nada se concretizou, devido

às dificuldades de conseguir atender os interesses de todos os países envolvidos. A

criação do Acordo-Quadro de Cooperação Inter-regional, em 1995, logo no início do

primeiro mandato de FHC, demonstra o esforço diplomático para a criação de

alternativas à ALCA, já que a tendência seria a competição dos dois grandes polos

de poder econômico mundial pela consolidação de acordos comerciais com o bloco

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sul-americano (MARIANO; VIGEVANI, 2006, p.328). Tal iniciativa brasileira

demonstra a preocupação diplomática em envolver o bloco sul-americano em outras

investidas, para desenvolvê-lo e ampliar a legitimidade perante o sistema

internacional.

As ações diplomáticas em prol da integração regional, durante os governos FHC,

demonstram que as investidas a partir do governo Sarney foram desenvolvidas

durante todo o processo de redemocratização, e seguidas por Collor, Itamar e os

governos posteriores, de FHC. O interesse diplomático em se tornar líder regional e,

a partir disso, conquistar melhor posição no cenário mundial se estendeu ao

MERCOSUL, a partir de sua criação, e corresponde ainda hoje ao principal objetivo

da política externa brasileira. Para Spektor (2011, p.141),

animados pelo progresso do programa de integração regional iniciado entre Brasil e Argentina no governo de José Sarney, os governos de Fernando Collor de Mello e Itamar Franco avançaram em direção a doses inéditas de aproximação política, diplomática e comercial com os países do entorno geográfico mais imediato. Pouco tempo depois, no início do governo de Fernando Henrique Cardoso, começaram a circular documentos oficiais na Esplanada dos Ministérios nos quais se advogava uma transformação profunda na atitude brasileira em relação aos vizinhos: a “América do Sul” (em oposição a “América Latina”) deveria ocupar lugar de precedência no horizonte estratégico do Brasil.

Portanto, a partir do governo FHC o horizonte regional do Brasil foi relativizado: a

América do Sul passaria a ser a tônica da política externa, embora ainda sob o

prisma de interesses mais gerais, especialmente econômicos, por ser a maior

economia da região.

Percebe-se, então, que a estratégia brasileira de priorizar os laços diplomáticos com

a América do Sul foi aos poucos sendo moldada pela política externa e pelo contexto

regional de aproximação entre os países. Com a consolidação do MERCOSUL a

integração regional atingiu seu ápice, uma vez que os países conseguiram seguir a

tendência de criação dos blocos econômicos, adaptando a região à realidade do

cenário internacional.

Sob essa óptica, Danese (2009, p.121) explicita que

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(...) a diplomacia regional brasileira responde de maneira bastante satisfatória ao postulado napoleônico segundo o qual “os países devem fazer a política da sua geografia”. Essa política sul-americana do Brasil responde hoje a várias orientações que asseguram a sua centralidade no conjunto de políticas públicas do Brasil e do projeto nacional de desenvolvimento brasileiro.

Portanto, o papel da América do Sul na política externa brasileira foi sendo

construído de acordo com os interesses do Brasil na região, além das possibilidades

de conduzir relações amistosas com os países vizinhos (o que nem sempre foi

possível), tornando-se uma prioridade diplomática, de fato, apenas no período de

redemocratização, a partir do governo Sarney, em 1985. Os governos subsequentes

deram continuidade às investidas regionais, desembocando nos governos de Luiz

Inácio Lula da Silva – 2003-2006 e 2007-2010 –, os quais têm como característica

principal uma política externa engajada com os propósitos sul-americanos e o

objetivo nacional de se tornar uma liderança regional.

No próximo capítulo será analisada a instrumentalização da América do Sul nos

governos Lula a partir das investidas em prol da integração regional como estratégia

para garantir a liderança regional brasileira e, assim, conquistar um papel mais

atuante para o Brasil no sistema internacional. Esse objetivo, como pode ser

observado, já fazia parte da tradição diplomática brasileira (porém, não havia um

projeto partidário claro relacionando tais objetivos), e tem sido perseguido nos

últimos anos de maneira enfática.

Cabe lembrar, porém, que tais investidas só foram possibilitadas graças ao

desenvolvimento, ao longo da história, de relações diplomáticas amistosas com os

países vizinhos. Além da aproximação via convergência de interesses, como no

caso do MERCOSUL, houve o fim de conflitos territoriais e a delimitação espacial do

subcontinente, o que também facilitou o diálogo dos países. Concluindo, é

interessante notar também que o Brasil alcançou, a partir de uma política externa

baseada em paradigmas, um espaço mais amplo no sistema internacional, desde

sua independência, o que lhe rendeu a posição estratégica que ocupa, hoje, na

América do Sul.

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3 A ERA LULA E A INTEGRAÇÃO REGIONAL: DE LÍDER REGIONAL A PLAYER GLOBAL

“Às vezes nos perguntam se o Brasil quer ser líder. Nós não temos pretensão à liderança, se liderança significa hegemonia de qualquer espécie. Mas, se o nosso desenvolvimento interno, se nossas atitudes (...) de respeito ao direito internacional, da busca de solução pacífica para controvérsias, de combate a todas as formas de discriminação, de defesa dos direitos humanos e do meio ambiente, se essas atitudes geram liderança, não há por que recusá-la. E seria, certamente, um erro, uma timidez injustificada” (AMORIM, 2003)

Aproveitando-se de fatores que garantem a superioridade do país em relação aos

países vizinhos, que foram salientados no capítulo anterior, a política externa

adotada durante a era Lula (2003-2010) conferiu grande importância estratégica ao

entorno regional, que corresponde à máxima prioridade diplomática brasileira desde

os anos 1980, mais especificamente após a promulgação da Constituição de 1988, a

qual estabelece como prioridade da diplomacia brasileira, no artigo quatro (parágrafo

único):

a República Federativa do Brasil buscará a integração econômica, política, social e cultural dos povos da América Latina, visando à formação de uma comunidade latino-americana de nações (BRASIL, 1988).

Dessa maneira, fica claro que a integração regional faz parte historicamente dos

anseios nacionais, sendo expressa como lei a partir de 1988. E, portanto, conforme

salienta Reis (apud FONSECA JUNIOR; NABUCO DE CASTRO, 1994),

a partir do texto constitucional, estas páginas procuraram mostrar que, para a nossa política externa, a América Latina não é uma prioridade excludente, mas é certamente uma prioridade diferente, catalisadora, nervosa. Transita por ela a possibilidade de criar e de operar outras prioridades. Para estar bem com o resto do mundo, o Brasil precisa – primeiro – estar bem com seus vizinhos sul-americanos.

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Essa assertiva também é válida para a política externa dos governos Lula. Durante

os oito anos de mandato, a América do Sul foi prioridade máxima, não só como um

fim, mas também como uma maneira de demonstrar capacidade de liderança

regional e alcançar, com isso, um status mais relevante no sistema internacional, de

representante da América do Sul. A atuação pragmática da chancelaria nacional em

contendas envolvendo os países vizinhos (ou mesmo o próprio Brasil) caracteriza a

hipótese de que o Brasil se utilizou, durante esse período, da política externa para a

América do Sul como um instrumento de viabilização de poder do país no cenário

internacional.

A proposta do capítulo é avaliar, a partir de exemplos de casos envolvendo a

diplomacia brasileira e os países sul-americanos, se houve a tentativa de conquistar

a liderança regional como meio para alcançar a possível representatividade desses

países nos foros internacionais. Para Danese (2009, p.153), a própria Constituição,

cujo trecho foi transcrito anteriormente, indica a posição diplomática brasileira a ser

seguida no entorno regional. De acordo com o autor,

a própria Constituição Federal (...) parece dar um mandato claro aos governantes para procurar exercer alguma liderança regional.

Assim, será feita uma breve exposição dos fatos e a argumentação dos objetivos por

trás das atitudes e escolhas brasileiras para avaliar a hipótese exposta.

3.1 A política externa do primeiro governo Lula par a a América do Sul: contendas e desafios à liderança regional

“(...) sei da expectativa que a América do Sul tem no governo brasileiro” (LULA DA SILVA, 2003b)

A política externa do primeiro governo de Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2006) teve

seu foco voltado para o Cone Sul. Esta diretriz pode ser constatada ao longo dos

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primeiros quatro anos de governo. A concretização desta proposta de estreitamento

de laços com a região foi viabilizada com iniciativas brasileiras em política externa.

Dentre estas iniciativas, analisaremos o papel desempenhado pelo governo Lula

bem como pela postura assumida em contendas na América do Sul, objetivando

uma melhor projeção internacional do Brasil a partir da posição de líder regional.

A primeira iniciativa a ser analisada ocorreu em 2002, antes mesmo de Lula assumir

o poder (em dezembro de 2002 Lula já havia sido eleito, mas não empossado) e

envolve o chamado Grupo de Amigos da Venezuela. O grupo foi criado após a

frustrada tentativa de golpe pela oposição do governo, gerando uma greve nacional

geral que colocava em risco a estabilidade da Venezuela. Além do envio de petróleo

devido à crise que se encontrava o país, a iniciativa brasileira foi a criação do grupo,

que pretendia ajudar na estabilização política do país. Além do Brasil, faziam parte

do Grupo, Chile, Espanha, EUA, México e Portugal (VIZENTINI, 2003, p.105). A

posição do Brasil mostrou, ainda que sutilmente, a intenção de liderança regional

brasileira, uma vez que o país agiu como o mediador da situação. (SARAIVA, 2007,

p.48)

O conflito instalado no país teve origem nos grupos opositores ao governo de Hugo

Chávez que, através de uma greve civil, reivindicavam a renúncia deste, bem como

a realização de eleições democráticas para presidente. Além disso, a oposição

exigia também um referendo sobre a satisfação da população em relação ao

governo Chávez, que chegou a ocorrer em 2004. Vale destacar que a greve causou

grandes impactos no setor petrolífero do país, que é a máquina movedora da

economia venezuelana. A paralisação incluiu também os trabalhadores da empresa

Petróleo da Venezuela S.A. (PVDSA), e como efeito, a produção desta chegou a

apenas 25% da sua capacidade total.34

Além disso, a greve tomou grandes proporções, dado os embates entre a

população, gerando violência e sete mortes em conflitos entre opositores ao governo

e “chavistas” (LULA DA SILVA, 2003b).

34 Disponível em http://www1.folha.uol.com.br/folha/mundo/ult94u50787.shtml. Acesso em 25/03/2011.

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Visando solucionar esta crise, foi proposta a criação de uma emenda constitucional

que permitisse a realização de um referendo sobre o governo Chávez, ou mesmo a

antecipação das eleições presidenciais. Vale destacar que este grupo se formou,

teoricamente, a partir da preocupação dos seus membros com a situação

venezuelana. De modo a discutir as questões levantadas pela oposição do governo,

foi enviada a Caracas uma missão composta por representantes dos países

integrantes do “Grupo de Amigos”, que visava colocar um fim na situação de greve

em que a Venezuela se encontrava. Nas palavras de Celso Amorim, Ministro das

Relações Exteriores de Lula, “a missão vai discutir medidas concretas como, por

exemplo, a diminuição do risco de violência (...) e o processo de moderar a

retórica”.35 A postura brasileira ao imbróglio venezuelano é evidenciada pelas

palavras de Amorim “o problema da Venezuela é um problema de grande urgência

que requer que ajamos imediatamente”.36 De acordo com Moniz Bandeira (2008),

o Brasil tinha investimentos na Venezuela, interesses econômicos, políticos e estratégicos, e não podia permitir a desestabilização do governo de Chávez, que fora eleito duas vezes e obtivera 60% dos votos, conforme o presidente Lula salientou. E daí porque propôs a formação de um grupo dos amigos da Venezuela (não só de Chávez) (...) com a finalidade de intermediar uma solução pacífica, legal e constitucional para o impasse que perdurava havia vários meses.

O envolvimento brasileiro neste conflito demonstra a postura pragmática que o

governo brasileiro visava assumir perante os países vizinhos. As diretrizes políticas

de ambos os chefes de Estado tanto brasileiro quanto venezuelano permitiram maior

diálogo entre estes. A similaridade entre ambos os governos é evidenciada em José

Vicente Rangel, então vice-presidente de Chávez:

Brasil e Venezuela têm uma longa tradição de cooperação e entendimento que transcende a simples boa vizinhança. A longa fronteira que compartilhamos simboliza a união dos nossos países. Nunca tivemos dúvida de que as questões que afligem as nossas sociedades só podem ser resolvidas por brasileiros de um lado e venezuelanos de outro, sem qualquer tipo de ingerência externa. Isto não significa de modo algum recusa da nossa parte à ajuda

35 Disponível em http://noticias.terra.com.br/mundo/noticias/0,,OI82919-EI1193,00-Grupo+de+Amigos+envia+missao+a+Venezuela.html. Acesso em 27/03/2011.

36 Disponível em http://www.itamaraty.gov.br/sala-de-imprensa/notas-a-imprensa/2004/08/16/comunicado-do-grupo-de-amigos-do-secretario-geral/?searchterm=amigos%20da%20venezuela. Acesso em 24/03/2011.

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internacional e à solidariedade. É com esse mesmo espírito que o governo brasileiro tem reiterado ao venezuelano que estará sempre à disposição para colaborar no que for necessário na busca de uma solução pacífica e legalmente cabível para a crise que atingiu a Venezuela.37

O engajamento brasileiro na solução da crise interna venezuelana reforça as

diretrizes da política externa do primeiro governo Lula para o entorno regional.

Durante todo processo de negociação liderado pelo Brasil havia a preocupação em

manter o princípio da não intervenção e da não ingerência. Nesse sentido, as

palavras do embaixador Gilberto Sabóia evidenciam claramente os objetivos e a

postura brasileira:

Queria salientar primeiro a finalidade com que foi constituído o Grupo: trata-se, essencialmente, de um grupo de países que se dispôs a prestar apoio ao processo de facilitação do diálogo político na Venezuela. Esse processo de facilitação e de apoio por parte do Grupo de Amigos se processa dentro do princípio de respeito à soberania do país e à ideia de que a solução a ser encontrada cabe aos venezuelanos.38

No entanto, embora a diplomacia brasileira tenha defendido os valores de não

intervenção na criação do Grupo de Amigos da Venezuela, o presidente Hugo

Chávez se mostrou insatisfeito com a atitude dos países-membros. Após ser solto e

por fim na crise política interna, o presidente venezuelano exigiu que outros países,

como Cuba e França, também fizessem parte do grupo. Pouco tempo depois ele

exigiu a extinção do mesmo, alegando que o Brasil havia tomado uma atitude

imperialista e desrespeitado a soberania da Venezuela em prol de seus interesses

diplomáticos de garantir a liderança regional. No entanto, cabe ressaltar que

liderança é objetivamente um excedente de poder que extravasa de forma organizada, sistemática – mesmo que a percepção não indique claramente essa forma. (...). De qualquer forma, o líder precisa ter recursos suficientes – próprios ou daquilo que representa, um grupo, um país, uma entidade, uma instituição – que lhe permitam tomar as

37 Disponível em http://www.itamaraty.gov.br/sala-de-imprensa/notas-a-imprensa/2003/03/18/visita-a-brasilia-do-vice-presidente-da-venezuela/?searchterm=amigos%20da%20venezuela. Acesso em 24/03/2011.

38 Disponível em http://www.itamaraty.gov.br/sala-de-imprensa/notas-a-imprensa/2003/03/11/entrevista-concedida-por-ocasiao-da-reuniao-do/?searchterm=amigos%20da%20venezuela. Acesso em 23/03/2011.

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iniciativas e enfrentar os custos, ônus ou resistências próprios de todo processo em que ocorre liderança (DANESE, 2009, p.147).

A busca pela liderança regional, assim, exigiu do Brasil o papel de mediador, ainda

que sob forte pressão contrária à atitude brasileira, o que demonstra o ônus dessa

estratégia de atuar em conflitos e tensões envolvendo países vizinhos almejando o

papel proeminente no subcontinente. A atuação brasileira pode ser resumida em

dois aspectos: o lado político, como foi explicitado, e o interesse econômico na

neutralização da greve venezuelana. Conforme indicam os dados da tabela abaixo,

o Brasil é o terceiro principal exportador da Venezuela, o que garante o saldo

comercial positivo e a preponderância econômica ao Brasil nas relações

diplomáticas entre os dois países.

Tabela 5 – Principais parceiros comerciais da Venez uela (2008)

Parceiros de Exportação (2008) Parceiros de Importação (2008)

Estados Unidos 41,2% Estados Unidos 24,4%

Antilhas Holandesas 7,9% Colômbia 13,9%

China 4,9% Brasil 9,6%

Outros 46,0% China 6,5%

Total (US $ bilhões) 93,54 México 5,3%

Produtos: petróleo, bauxita e alumínio, aço, produtos químicos, produtos agrícolas, produtos manufaturados.

Panamá 5,1%

Outros 35,2%

Total (US $ bilh ões) 48,1

Produtos: matérias-primas, máquinas e equipamentos, equipamentos de transporte, materiais de construção.

Fonte: CIA World Factbook. Disponível em: https://www.cia.gov/library/publications/the-world-factbook/index.html. Acesso em 07/02/2012

Outra iniciativa brasileira em conflitos envolvendo países na América do Sul que

merece destaque é a questão das papeleras (ALMEIDA, 2007), que envolve

Argentina e Uruguai. O conflito entre os países ocorre desde 2002, e teve início com

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a construção de duas usinas de celulose em território uruguaio, localizado na

fronteira entre os dois países. A contenda se desenvolveu porque a Argentina não

se mostrou favorável à construção das usinas, já que se encontram em região

fronteiriça do rio Uruguai, o que poderia gerar impacto ambiental devastador na

região, que prejudicaria não somente o Uruguai, como também a Argentina. De

acordo com Almeida (2007),

a empresa espanhola ENCE S.A. (ENCE) e a finlandesa Oy Metsä-Botnia Ab (Botnia) foram autorizadas a iniciar a construção de dois projetos de fábricas de papel e celulose: “Celulosas de M’Bopicuá (CMB)” e “Orion”, em outubro de 2003 e fevereiro de 2005, respectivamente. Entretanto, tais usinas serão implantadas às margens do Rio Uruguai, cujas águas são geridas conjuntamente por Argentina e Uruguai, no âmbito da Comissão Administradora do Rio Uruguai (CARU), nos termos do Estatuto do Rio Uruguai, assinado em 1975. No referido documento, consta a obrigação das partes de estabelecer comunicação prévia acerca da realização de eventuais obras que possam prejudicar a navegação, o regime ou a qualidade das águas. Ocorre que, ao receber os estudos de impacto ambiental das aludidas usinas, o governo uruguaio houve por bem autorizar sua instalação, sem seguir o procedimento previsto pelo Estatuto do Rio Uruguai de 1975, conforme a argumentação argentina.

O Uruguai, desde a década de 1990, promove políticas de incentivo a indústrias de

celulose, despertando interesse de fábricas bem como os investimentos

provenientes destas. No entanto, a Argentina também tinha interesse pelo

investimento direto externo, o que acirrou a disputa entre os países. Porém, o

Uruguai ganha o direito de construir as usinas, o que desagradou o governo

argentino, que passou a utilizar a questão ambiental para impedir a implantação das

duas usinas.

Uma vez iniciada a contenda, a Argentina e o Uruguai cobram uma atitude brasileira,

uma vez que os três países fazem parte do MERCOSUL, onde não havia, até o

momento, um mecanismo permanente de solução de controvérsias. De um lado o

governo uruguaio pressiona o Brasil em busca de apoio para a construção das

usinas; de outro a Argentina tenta impedir uma ação brasileira, posicionando-se

contra a intervenção do país que busca se tornar liderança sul-americana. Conforme

salienta Magalhães (2006, p.10),

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enquanto, de um lado, a chancelaria uruguaia passou a cobrar um posicionamento concreto do bloco sobre a contenda das papeleras, especialmente do Brasil, de outro, o governo argentino intensificou seu diálogo com o Ministério das Relações Exteriores brasileiro, reafirmando a bilateralidade do contencioso e deixando clara sua contrariedade a qualquer interferência direta do Itamaraty no assunto.

O caso foi destinado ao Tribunal de Haia, uma vez que a Argentina alega não haver

no MERCOSUL um órgão capaz de solucionar o conflito. No entanto, o Uruguai se

beneficia da avaliação do Tribunal, que não vê impactos ambientais gerados pelas

usinas (essa era a justificativa argentina).

Neste caso, o Brasil optou por adotar a postura de mediador do conflito, almejando

colocar o país em posição de líder na região. O país não quis se envolver no

imbróglio envolvendo os vizinhos; porém, ao ser solicitado formalmente via

MERCOSUL para auxiliar no conflito das papeleras, já que o país ocupava no

momento a presidência pro tempore do bloco, o governo Lula coloca em prática a

iniciativa de criação de um Parlamento do MERCOSUL. Este órgão, que será

analisado mais detalhadamente a seguir, é criado a partir da necessidade de

soluções de questões como essa, envolvendo países-membros do bloco.

O conflito das papeleras, que até hoje convive com o impasse, mesmo com a

construção de uma das usinas, teve desdobramento importante não apenas ao

MERCOSUL e aos seus membros, e ao Brasil na área de política externa. Os países

foram beneficiados com a criação do Parlamento do MERCOSUL, e o governo Lula

fortaleceu a presença brasileira no Cone Sul, alcançando, desta maneira, uma

imagem positiva no cenário internacional, ainda que sem o aval da Argentina.

No entanto, embora a Argentina critique e até mesmo se posicione contrariamente à

liderança regional brasileira, os países são grandes parceiros comerciais, sendo o

país vizinhos dependente das exportações e importações do Brasil, já que o país

ocupa a primeira posição como comprador e importador da Argentina. O país

responde por 22, 3% das importações argentinas, e garante 32,7% das compras do

país. A tabela 6 explicita a interdependência dos países e a superioridade

econômica do Brasil perante o seu vizinho, o que tem gerado, inclusive, discussões

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dentro do MERCOSUL a respeito das medidas de salvaguardas adotadas pela

Argentina:

Tabela 6 – Principais parceiros comerciais da Argen tina (2008)

Parceiros de Exportação (2008) Parceiros de Impor tação (2008)

Brasil 22,30% Brasil 32,70%

China 11,40% Estados Unidos 15,30%

Chile 7,60% China 11,50%

Espanha 4,10% Alemanha 5,50%

Outros 54,60% Outros 35,00%

Total (US $ bilhões) 70,59 Total (US $ bilhões) 54,55

Produtos: soja e derivados, petróleo e gás, veículos, algodão, trigo.

Produtos: máquinas, veículos automotores, petróleo e gás natural, produtos orgânicos, plásticos.

Fonte: CIA World Factbook. Disponível em: https://www.cia.gov/library/publications/the-world-factbook/index.html. Acesso em 07/02/2012

Seguindo a análise da atuação do governo na América do Sul, de modo a enfatizar a

postura adotada objetivando a conquista de uma suposta liderança regional, cabe

aqui uma análise acerca da Comunidade Sul-Americana de Nações (CASA) que

atualmente é denominada UNASUL. Desta maneira, é possível analisar mais uma

das iniciativas do governo Lula para promover não apenas uma melhor posição no

cenário internacional, bem como estreitar laços diplomáticos entre o Brasil e os

vizinhos sul-americanos.

A CASA surge inicialmente como possível locus de confluência dos diversos

processos de integração que existem na América do Sul (SEITENFUS, 2005). Visa a

integração total dos membros seguindo os moldes da União Europeia. Ou seja, uma

integração econômica, política e física. Para tanto, seria necessária a união entre

MERCOSUL e a Comunidade Andina, além da possível criação de uma moeda

comum, bem como a criação de um Banco do Sul (GARZÓN, 2007).

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A instituição foi criada em uma reunião em Cuzco, a partir de uma proposta do

Brasil. Neste momento foi estabelecido um programa de ação em que deveria dispor

o novo arranjo subcontinental. As principais metas são destacadas por Seitenfus

(2005):

(...) posições comuns, frente às situações de crise institucional na região; intervenções conjuntas; constituição de um embrião de coordenação política entre todos os países da América do Sul; isenção de visto de turista e passaporte para os nacionais dos Estados membros.

De modo geral, a reunião se ocupava inicialmente com projetos de ordem

econômica, bem como com os instrumentos que fossem capazes de tornar

compatíveis os distintos processos de integração em curso na região. Visava-se,

naquele momento, a formação de uma zona de livre comércio sul-americana para

promover melhorias nos acordos de contemplação econômica entre os países-

membros, bem como integração da produção, desenvolvimento das regiões e

facilitação do comércio. Porém, ao longo das discussões, surge a necessidade de

uma união política que garantisse esses objetivos. Anos mais tarde, em 2008, os

países se reuniram para ratificar a assinatura da CASA. No entanto, nesse momento

a consolidação da integração política e econômica da América do Sul passa a ser

contestada por alguns países, em especial a Venezuela, de Hugo Chávez, a Bolívia,

de Evo Morales, e o Equador, de Rafael Correa. Esses países formam um eixo

contrário à possível “hegemonia regional brasileira”, e conseguiram, a partir da

CASA, reverter os louros de sua criação, deixando ao Brasil uma posição

marginalizada no bloco. O nome foi alterado para UNASUL por sugestão de Hugo

Chávez e conta, conforme o tratado originário de 23 de maio de 2008, com os

seguintes países: Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Equador, Guiana,

Paraguai, Peru, Suriname, Uruguai e Venezuela.39 De acordo com o tratado,

a União de Nações Sul-Americanas tem como objetivo construir, de maneira participativa e consensual, um espaço de integração e união no âmbito cultural, social, econômico e político entre seus povos, priorizando o diálogo político, as políticas sociais, a educação, a energia, a infraestrutura, o financiamento e o meio ambiente, entre

39 Ministério das Relações Exteriores. UNASUL. Disponível em: http://www.itamaraty.gov.br/temas/america-do-sul-e-integracao-regional/unasul. Acesso em 15/05/2011.

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outros, com vistas a eliminar a desigualdade socioeconômica, alcançar a inclusão social e a participação cidadã, fortalecer a democracia e reduzir as assimetrias no marco do fortalecimento da soberania e independência dos Estados.40

As diretrizes da UNASUL evidenciam o interesse de integração econômica e política

da América do Sul, na política externa brasileira do governo Lula. No entanto, esta

iniciativa coloca mais uma vez em evidência as consequências negativas da

ambição da liderança regional, ou o ônus dessa liderança. Os países vizinhos não

desejam e não se sentem representados pelo Brasil, gerando contendas e disputas

por espaço no subcontinente. O mapa representativo da instituição nos dá um

panorama do tamanho e relevância da UNASUL, tanto em termos geográficos

quanto populacionais. A UNASUL integra a América Latina, a partir da união dos

dois blocos econômicos regionais.

40 Disponível em http://www.itamaraty.gov.br/temas/america-do-sul-e-integracao-regional/unasul/tratado-constitutivo-da-unasul/?searchterm=UNASUL. Acesso em 30/04/2011.

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Figura 1 – Mapa da UNASUL: Geografia e População em 2010

Fonte: Sítio da UNASUL. Disponível em http://www.unasursg.org. Acesso em 08/02/2012

Seguindo a ordem cronológica das ações diplomáticas na América do Sul, podemos

citar um evento envolvendo diretamente os interesses brasileiros: o contencioso com

o Equador de Rafael Correa, ocorrido a partir de 2005.

Em meio a uma crise política vivenciada pelo Equador naquele ano, o então

presidente Lucio Gutierrez dissolveu a Corte Suprema do país e decretou estado de

emergência na capital, Quito, restringindo assim a livre circulação da população e da

mídia, tendo como objetivo garantir a segurança nacional em um período

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conturbado. A iniciativa de Gutierrez revolta a população, uma vez que o presidente

era acusado de corrupção, e via na manobra política uma tentativa de se manter no

poder. Sendo assim, saíram às ruas exigindo a renúncia. Os protestos da população

tornaram a situação insustentável, e Lucio Gutierrez se instala na embaixada

brasileira de Quito e pede o asilo político ao Brasil, que acompanha a crise política

do país vizinho já que ambos possuem, até então, laços diplomáticos estabelecidos.

De acordo com Lula, em pronunciamento durante visita oficial do presidente Lucio

Gutierrez ao Brasil,

tenha no Brasil um verdadeiro parceiro, não apenas para o processo de integração, mas para as discussões econômicas, para as discussões políticas e, sobretudo, para a troca de experiências nas políticas públicas bem-sucedidas que estamos implantando no Brasil e que, certamente, Vossa Excelência está implantando no Equador. O que for bom para o Equador será bom para o Brasil e o que for bom para o Brasil certamente poderá ser bom para o Equador.41

Essa relação entre os países foi favorável à iniciativa brasileira de concessão de

asilo político ao presidente equatoriano. De acordo com nota publicada pelo

Itamaraty, em abril de 2005,

o Senhor Lucio Gutierrez encontra-se na Embaixada do Brasil em Quito, onde solicitou asilo diplomático. A concessão de asilo político é tradição regional e instituto do Direito Internacional Público regulado pela Convenção sobre Asilo Diplomático, assinada em Caracas, em 28 de março de 1954, e promulgada, no Brasil, pelo Decreto 42.628, de 13 de novembro de 1957. O governo brasileiro está tomando as providências cabíveis para a concessão do asilo. (...) O governo brasileiro acompanha, com preocupação, o quadro político constitucional no Equador e reitera a expectativa de uma solução pacífica que assegure a normalidade institucional (MINISTÉRIO DAS RELAÇÕES EXTERIORES, 2005).

A concessão de asilo político a Gutierrez por parte do governo brasileiro evidencia

certo exagero em demonstrar a capacidade de liderança brasileira na região. A

ingerência na crise política do Equador não faz parte das tradições diplomáticas

brasileiras, e não repercutiu de maneira positiva no país vizinho. A população se

mostrou contrária à concessão de asilo político ao presidente, que se instalou dias

41 Disponível em http://www.itamaraty.gov.br/sala-de-imprensa/discursos-artigos-entrevistas-e-outras-comunicacoes/presidente-da-republica-federativa-do-brasil/921720173174-declaracao-do-senhor-presidente-da-republica-luiz. Acesso em 23/04/2011.

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depois (mais precisamente a partir de 1° de maio de 2005) na cidade do Rio de

Janeiro e só renunciou ao asilo em janeiro de 2010.

Anos mais tarde, mais precisamente em 2008, já no segundo governo Lula, o então

presidente do Equador Rafael Correa provocou novo incidente diplomático

envolvendo os dois países, com a expulsão da empreiteira brasileira Norberto

Odebrecht.42 No próximo item do presente capítulo tal episódio será descrito,

demonstrando as consequências da concessão ao asilo a Gutierrez em 2005. A

demonstração de poder político do Brasil nesse momento foi justificativa para o

levantamento de dados e a condenação da empresa brasileira três anos depois.

Ainda no primeiro mandato, em maio de 2006, outra contenda envolvendo

diretamente o Brasil, e que pode ser analisada como um ônus da liderança, foi a

decisão do governo Evo Morales na Bolívia de nacionalizar o setor de

hidrocarbonetos no país, o que prejudicou as reservas da Petrobras que se

encontram no país.

Historicamente, a Bolívia é dependente do seu setor de gás natural, que era vendido

aos países vizinhos, em especial à Argentina, até o início da década de 1990,

quando o país se tornou autossuficiente (com a descoberta de jazidas) e reduziu

drasticamente a demanda do gás boliviano. Nesse momento, o Brasil passa a

negociar seu fornecimento via Bolívia, o que gerou uma relação de dupla

dependência entre os países, já que enquanto a Petrobras representa cerca de 18%

do Produto Interno Bruto (PIB) boliviano,43 o gás natural da Bolívia é responsável por

75% do uso nas indústrias do estado de São Paulo (DUARTE; SARAIVA; BONÉ,

2008). Além disso, em 1997 os países firmaram acordo para a construção do

gasoduto ligando a Bolívia (Santa Cruz de La Sierra) ao Rio Grande do Sul, no

Brasil.

Apesar de possuir uma pequena reserva petrolífera, a Bolívia conta com a segunda

maior reserva de gás natural da América do Sul. Nas palavras de Carra e Cepik

(2006) fica evidente a importância deste setor na economia da Bolívia:

42 ODEBRECHT tem pressa para deixar o Equador. Folha de S. Paulo. São Paulo, 24/11/2008

43 LESSA, C. Petrobras, soberania e política. Valor Econômico. São Paulo, 10/05/2006

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A economia boliviana contemporânea tornou-se crescentemente centrada no gás natural, sendo que os investimentos estrangeiros no setor representam cerca de 50% da formação bruta do capital no país entre 1997 e 2000. Em 2002, suas reservas de gás representavam 1% das reservas mundiais e 11% das reservas da América Latina.

As eleições presidenciais de 2005 deram a Evo Morales a presidência da Bolívia. O

candidato foi amplamente apoiado por bases esquerdistas, pela população indígena

e por camponeses pobres, sob a promessa de reverter a privatização das empresas

bolivianas que exploram hidrocarbonetos (ocorrida em 1999), estando entre as

compradoras a estatal brasileira Petrobras (DUARTE; SARAIVA; BONÉ, 2008).

Sob o Decreto Supremo 28701, intitulado “Heroes del Chaco”, o presidente boliviano

nacionalizou a 16 de maio de 2006 as propriedades das empresas que atuavam no

país:

Que em históricas jornadas de luta o povo tem conquistado a custa de seu sangue, o direito de que nossa riqueza hidrocarbonífera volte às mãos da nação e seja utilizada em benefício do país (...) nacionalizam-se os recursos de hidrocarbonetos do país. O Estado recupera a propriedade, a posse e o controle total e absoluto destes recursos (...) A YPFB [Yacimientos Petrolíferos Fiscales Bolivianos], em nome e em representação do Estado, no exercício pleno da propriedade de todos os hidrocarbonetos produzidos no país, assume a sua comercialização, definindo as condições, volumes e preços tanto para o mercado interno como para a exportação e a industrialização. (AYMA, 2006)

Vale destacar que o Decreto de 2006 foi pautado em diversos dispositivos legais. O

presidente Evo Morales cita no documento:

Os hidrocarbonetos são bens nacionais de domínio originário, direto, inalienável e impreterível do Estado, razão pela qual se constituem propriedade pública inviolável (AYMA, 2006).

É importante frisar que o lucro da Petrobras na Bolívia foi prejudicado; porém, a forte

dependência da indústria nacional forçou o governo brasileiro a ceder às exigências

bolivianas. Nesse momento, o país recebe críticas tanto da população, descontente

com os rumos que a política externa estava tomando quanto da mídia e academia,

que não aceitavam a posição subserviente a um país extremamente pobre e pouco

significativo para a América do Sul em termos econômicos. O fato é que a potência

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regional viu suas refinarias sendo expropriadas sem direito à negociação, posto que

a dependência do gás boliviano nos impedia tomar alguma atitude nesse sentido.

Aliado a isso havia a necessidade de demonstrar ao subcontinente que o Brasil

estava preparado para arcar com os desafios e ônus que a liderança traria. Para o

Partido dos Trabalhadores (2010, § 122),

uma política deste tipo, baseada na ideia de que o desenvolvimento do Brasil está vinculado ao desenvolvimento dos países vizinhos, é a melhor forma de superar os temores e preconceitos existentes em alguns países vizinhos.

No entanto, quando se observa as consequências da nacionalização dos

hidrocarbonetos percebe-se que a Bolívia foi ainda mais prejudicada que o Brasil. As

empresas internacionais deixaram o país, restando a Petrobras como polo

negociador:

O litígio com a Petrobras afetará seus interesses, pois a Bolívia lhe destina 24 milhões de metros cúbicos de gás consumidos, na proporção de 80%, na geração de energia das empresas industriais e também no abastecimento da frota de veículos movidos a Gás Natural Veicular (GNV), bem como das termoelétricas. O maior prejuízo, porém, será da Bolívia. Além do enorme desgaste político internacional, a Bolívia perde o mercado natural para suas exportações e não terá alternativa, senão negociar condições aceitáveis pela Petrobras. Se não vender o gás ao Brasil, vai vendê-lo a quem? Vai escavar um túnel ou exportá-lo de avião, pois nem portos lhe restam? (MONIZ BANDEIRA, 2006a)

Além da situação diplomática delicada para a Bolívia, o país teve que ceder nas

negociações após a descoberta de grandes depósitos de gás natural na Bacia de

Santos, um ano e meio após o início da contenda (que teve início no dia 1° de maio

de 2006):

Se a Petrobras continuar do jeito que está, vai chegar um dia em que eu vou chegar para o meu amigo Evo Morales e vou [dizer]: “olha, queridos, nós agora queremos deixar você livre para vender o gás para quem quiser. O Brasil tem autossuficiência, o Brasil não precisa [mais importar gás]”. [Mas é] lógico que o Brasil vai comprar também, porque estrategicamente é importante o Brasil ajudar a Bolívia a se desenvolver.44

44 PAÍS importará gás mesmo se autossuficiente. Folha de S. Paulo. São Paulo, 07/03/2009.

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Enfim, a medida da nacionalização acabou sendo negativa para a Bolívia, visto que

o empresariado adaptou sua matriz energética para o óleo (o preço internacional

estava reduzido devido à queda do preço do barril de petróleo) e a crise econômica

mundial reduziu o ritmo das indústrias, diminuindo assim a quantidade de gás

necessária para manter a maquinaria funcionando.45 A Petrobras acatou o direito da

Bolívia de possuir 50 + 1% de suas ações, além da maquinaria, mas os valores do

metro cúbico do gás não foram alterados.

Para o governo brasileiro, o contencioso envolvendo a Petrobras e a Bolívia se

caracterizou como uma consequência natural da liderança que o país ocupa

regionalmente. Como potência regional, o Brasil precisou acatar a situação e aceitar

as condições impostas pelo governo Evo Morales como forma de demonstrar

superioridade econômica e capacidade de absorção dos problemas internos dos

países vizinhos. Além disso, a dependência brasileira em relação aos

hidrocarbonetos bolivianos exigiu medidas mais cautelosas, uma vez que o governo

brasileiro entendeu que uma política externa agressiva poderia causar problemas no

abastecimento de gás no país. Conforme a tabela 7, a Bolívia depende do Brasil,

assim como o Brasil é dependente da Bolívia: somos os principais compradores e

vendedores, o que garante, inclusive, uma saldo comercial positivo ao país vizinho

(a Bolívia é o único país da América Latina a ter superávit nas relações comerciais

com o Brasil).

45 BOLÍVIA afirma que Brasil não cumpre acordo do gás. Folha de S. Paulo. São Paulo, 20/03/2009.

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Tabela 7 – Principais parceiros comerciais da Bolív ia (2008)

Parceiros de Exportação (2008) Parceiros de Importação (2008)

Brasil 60,0% Brasil 27,8%

Estados Unidos 8,3% Argentina 14,8%

Japão 4,1% Estados Unidos 10,9%

Outros 27,6% Chile 9,9%

Total (US $ bilhões) 6,494 Peru 7,4%

Produtos: gás natural, soja e derivados, petróleo cru, minério de zinco, estanho.

China 5,1%

Outros 24,1%

Total (US $ bilhões) 4,674

Produtos: plásticos, papel, aviões e peças de aviões, alimentos preparados, automóveis, inseticidas, soja, produtos petrolíferos.

Fonte: CIA World Factbook. Disponível em: https://www.cia.gov/library/publications/the-world-factbook/index.html. Acesso em 07/02/2012

Seguindo na análise das iniciativas de política externa do primeiro governo Lula,

podemos passar para uma importante atuação que também ocorreu, de fato, no ano

de 2006, último do mandato, ainda que as iniciativas tenham sido propostas desde

2004, quando o Brasil ocupou a presidência pro tempore do bloco.46 Desta maneira,

partiremos para a análise das tentativas de revitalização do MERCOSUL, a partir do

MERCOSUL Político, que objetivava a criação de um Parlamento do MERCOSUL e

do Fundo para a Convergência Estrutural do MERCOSUL (FOCEM); além da

absorção de novos membros, como a Venezuela. Vale destacar que estas iniciativas

visam à revitalização do bloco, onde o Brasil se destaca como membro mais forte, e

poderia se utilizar da posição para angariar a liderança regional.

O governo brasileiro tinha objetivos específicos em relação ao MERCOSUL, que

ficaram claros quando o país assumiu os dois mandatos pro tempore do bloco (em

2004 e 2006), fazendo seus discursos em prol da consolidação do MERCOSUL

46 O Brasil ocupou a presidência pro tempore do MERCOSUL, durante o primeiro mandato de Lula, no segundo semestre de 2004 e no segundo semestre de 2006.

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Político e dirigindo seu foco para esse plano. A ideia não era deixar de lado o plano

econômico, mas sim dar um foco mais significativo no plano político. Nesse sentido,

[uma das] metas do Brasil na presidência pro tempore do MERCOSUL diz respeito à efetivação do chamado “MERCOSUL político”: um projeto de natureza político-estratégica que busca e integração política e social dos países-membros do bloco. Tal projeto corresponde a uma tentativa de unir os interesses nacionais semelhantes dos países em projetos comuns, como a criação de um Parlamento do MERCOSUL, gerando a possível cooperação política entre eles e o fortalecimento desses interesses no cenário internacional (PRADO, 2006).

Dessa forma, a criação de mecanismos como o Parlamento do Sul e o FOCEM,

ambos em 2006, institucionalizaram o ideal de revitalização do MERCOSUL pelo

viés político, por parte do Brasil. Conforme citam Cristina Alexandre e Iara Leite

(2007),

as duas presidências pro tempore do MERCOSUL exercidas pelo Brasil durante o governo Lula avançaram propostas fundamentais para o desenvolvimento institucional do bloco, com destaque para a implementação do Parlamento do MERCOSUL e do Fundo de Convergência Estrutural (FOCEM).

O FOCEM corresponde a um fundo que tem como objetivo financiar programas que

promovam a convergência estrutural dos países, além de desenvolver a

competitividade e a coesão social visando o fortalecimento do processo de

integração. Este órgão foi criado e aprovado pelo Conselho do Mercado Comum e é

constituído, em dados oficiais, por contribuições anuais que somam o valor de

US$100 milhões.47 Este valor é dividido entre os membros através de uma lógica

estabelecida pelas possibilidades econômicas dos países; ou seja: US$70 milhões

do Brasil, US$27 milhões da Argentina, US$2 milhões do Uruguai e US$1 milhão do

Paraguai. Já a destinação dos recursos obedece a uma lógica inversa: as duas

menores economias do bloco, que contribuem menos para o fundo, são as maiores

beneficiadas por ele. O Paraguai, por exemplo, é destino de 48% dos recursos

obtidos pelo FOCEM, e o Uruguai é contemplado por 32% do total de recursos. Os

demais 20% são destinados a projetos apresentados pelo Brasil e Argentina. Os

projetos concentram-se nas áreas de educação, biossegurança, capacitação

47 Dados disponíveis em http://www.mercosur.int/focem/. Acesso em 23/04/2011.

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tecnológica, incentivos a microempresas, habitação, transportes, aspectos

institucionais do MERCOSUL e temas sanitários (MERCOSUL, s.d.).

O fundo foi criado para tentar, ao menos simbolicamente, diminuir as disparidades

entre os países-membros do MERCOSUL, bem como financiar projetos que visam a

diminuição da pobreza. Ainda que pouco efetiva, essa iniciativa é uma importante

conquista para o MERCOSUL, consolidando e organizando ainda mais sua estrutura

política.

Outra iniciativa importante dentro do projeto de MERCOSUL Político é a criação do

Parlamento do MERCOSUL, também em 2006, quando o Brasil ocupava a

presidência do MERCOSUL. A ideia era atender, em termos jurídicos, as contendas

envolvendo os países-membros do bloco, já que até então não existia um órgão

dessa competência, levando os países a procurar outras esferas, como o Tribunal

de Haia, no exemplo das papeleras (Argentina e Uruguai).

Os principais fundamentos que levam a constituição do Parlamento são resumidos

no Protocolo Constitutivo:

(...) A instalação do Parlamento do MERCOSUL, com uma adequada representação dos interesses dos cidadãos dos Estados-partes, significará uma contribuição à qualidade e equilíbrio institucional do MERCOSUL, criando um espaço comum que reflita o pluralismo e as diversidades da região, e que contribua para a democracia, a participação, a representatividade, a transparência e a legitimidade social no desenvolvimento do processo de integração e de suas normas.48

Quando inaugurado, o Parlamento “visava acelerar o processo de

internacionalização das normas do bloco e a harmonização de legislações”

(COUTINHO, 2009). Seu objetivo é colaborar com a incorporação das normas do

bloco, além de ser um mecanismo para a solução de problemas de âmbito jurídico

(SARTI, 2009).

A importância da criação desse espaço o coloca como um locus de discussão de

eventuais controvérsias, bem como possível origem de instituições comuns, que

48 Disponível em http://www2.mre.gov.br/dai/m_6105_2007.htm. Acesso em 29/04/2011

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promova políticas de modo a encaminhar o bloco para uma integração mais

dinâmica. Nas palavras de Lula em discurso durante a Reunião da Cúpula do

MERCOSUL:

Neste momento em que estamos fazendo um pouco da história da nossa região e criando o espaço do Parlamento do MERCOSUL, queria que houvesse a compreensão de que a integração é um momento extraordinário. Devemos debater as nossas divergências, as nossas convergências, e precisamos ter consciência de que um país do tamanho do Brasil, que é a maior economia do bloco, precisa ter políticas generosas com os países economicamente menores na região.49

Assim, tanto o Parlamento quanto o FOCEM são iniciativas que reforçam a

preocupação do governo brasileiro em revitalizar o MERCOSUL, em crise devido

aos sucessivos problemas financeiros de seus membros, além da falta de objetivos

em comum. Através do viés político, com o estabelecimento de um fundo para a

convergência estrutural dos países e um Parlamento, com normas jurídicas comuns

mínimas, o bloco adquiriu maior efetividade, o que deixou o Brasil em situação

favorável por ser o principal país do MERCOSUL. A liderança natural que o país

ocupa na instituição permite a consolidação de iniciativas que interessem

diretamente a nós, o que em grande medida fortalece ainda mais o objetivo do

governo de tornar o Brasil um líder sul-americano. De acordo com documento

divulgado em 2010 pelo Partido dos Trabalhadores (2010, § 107),

(...) o governo Lula trabalhou para manter o MERCOSUL e cooperar com os outros acordos sub-regionais. Se nos anos 1990 a dinâmica do bloco foi dominada pela abertura comercial, atualmente tem prevalecido a integração política, social e produtiva. A criação do Parlamento do MERCOSUL, a implementação do Fundo de Convergência Estrutural (...) são algumas instituições criadas nesta nova fase da integração regional.

Ainda na perspectiva de reformulação do MERCOSUL, o Brasil defendeu a adesão

de novos membros ao bloco, para que o mesmo fosse fortalecido. Nesse sentido,

em 2006, também durante o período de presidência pro tempore do Brasil, teve

início o processo de entrada da Venezuela no bloco (ainda não se consolidou até o

49 Disponível em http://www.itamaraty.gov.br/sala-de-imprensa/discursos-artigos-entrevistas-e-outras-comunicacoes/presidente-da-republica-federativa-do-brasil/451339769221-discurso-do-senhor-presidente-da-republica-luiz. Acesso em 30/04/2011.

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presente momento, pois o senado paraguaio não ratificou sua adesão como membro

pleno),50 o que gerou reações negativas por parte da academia e mídia brasileira,

que alegaram suposta competição entre a Venezuela de Hugo Chávez em relação à

liderança regional brasileira.

A cerimônia de ingresso da Venezuela ao MERCOSUL, em 04 de julho de 2006, foi

realizada em uma conferência em Caracas, com a assinatura de um Protocolo de

Adesão, e a discussão da temática ocorreu na Cúpula de Presidentes do bloco,

alguns dias depois (20 de julho), em Córdoba. Na ocasião, o Brasil ficou responsável

pelo período de adaptação da Venezuela ao bloco. Decidiu-se pelo prazo de quatro

anos para a adaptação plena do país às regras exigidas aos membros do bloco. De

acordo com o Protocolo de Adesão, em 2010 Brasil e Argentina deixariam de cobrar

as tarifas de importação de produtos venezuelanos (com exceção dos chamados

produtos sensíveis). Em 2012, as mercadorias brasileiras e argentinas passariam a

entrar sem impostos na Venezuela. No caso do Uruguai e Paraguai, que são países

mais restritos em relação ao desenvolvimento econômico, as tarifas já seriam

zeradas, desde o momento da adesão da Venezuela ao MERCOSUL, o que

facilitaria o comércio entre os mesmos.

Durante o evento em Córdoba, na estreia das atividades venezuelanas como

membro do bloco sul-americano, questões de cunho político foram levantadas: o

acesso de um país que possui uma forma de governo distinta dos demais membros

(o chamado socialismo do século XXI) suscita uma série de incertezas acerca do

futuro do bloco, que já vive uma situação delicada com contendas entre os membros

devido às assimetrias e impasses internos. As sucessivas crises vivenciadas no

MERCOSUL geraram o desgaste do bloco, que sofreu, nos últimos anos, as

implicações de ser constituído por países em desenvolvimento, o que restringe as

possibilidades de desenvolvimento da união aduaneira.

No caso da Venezuela, um dos principais empecilhos da adesão permanente ao

MERCOSUL refere-se à cláusula democrática, a qual estabelece, de acordo com as

normas do bloco, a vigência plena da democracia nos países-membros. No entanto,

50 REJEIÇÃO de paraguaios pode impedir o ingresso da Venezuela no MERCOSUL. Agência Senado . Brasília – DF, 18/08/2010.

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o governo venezuelano é considerado, por alguns analistas, antidemocrático, o que

sugere as tendências do país e os problemas que sua adesão ao bloco poderia

causar, uma vez que o governo de Chávez posiciona-se contrário ao

estabelecimento desse tipo de regras no bloco. As atitudes ditas antidemocráticas51

do governante venezuelano impediriam a entrada do país no MERCOSUL, mas não

foram questionadas no momento de adesão.

Outra questão controversa na adesão venezuelana ao MERCOSUL diz respeito ao

antiamericanismo propagado por Hugo Chávez. Tal componente, de fato, pode

depreciar as relações do bloco com os EUA, importante parceiro econômico dos

países sul-americanos. A reação negativa do governo norte-americano à decisão de

aceitar a Venezuela como membro pleno do bloco indica as consequências que o

ingresso do país pode trazer às negociações econômicas com as grandes potências.

Já no momento de formalização da entrada da Venezuela no bloco, o país passou a

influenciar e participar de todas as negociações comerciais do MERCOSUL. Para

alguns analistas, Chávez tem por objetivo utilizar-se do espaço e relevância do

MERCOSUL para divulgar seu projeto bolivariano, em prol da integração sul-

americana, para criar uma nova ordem internacional (MAGNOLI, 2006b).

Por outro lado, justificou-se o consentimento da inserção venezuelana ao

MERCOSUL (por parte dos países-membros) como uma tentativa de influenciar o

governante e, dessa maneira, atenuar suas polêmicas. Nesse sentido, Antônio

Ledezma, prefeito de Caracas e opositor ao presidente Hugo Chávez, clamou pela

entrada do país no bloco, visto que

não é só a importância do intercâmbio comercial: a incorporação vai permitir que essa organização [MERCOSUL] exija do governo venezuelano o respeito aos protocolos relacionados com as regras de ouro da democracia.52

51 O princípio da cláusula democrática detém-se nas medidas ameaçadoras da liberdade, as quais são tomadas por Hugo Chávez, como no caso do fechamento da rede de televisão Radio Caracas Televisión – RCTV, em maio de 2007. Mais informações em FAXINA, Elson. Telesur e as mentiras da imprensa privada. Le monde diplomatique Brasil . Curitiba, ano 3, n.25, ago. 2009.

52 RIVAL político de Chávez quer país no bloco. Folha de S. Paulo. São Paulo, 27/10/2009

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Nitidamente tal justificativa é ilusória, já que a Venezuela tornou-se membro do bloco

sul-americano por decisão própria, e interesses fundamentalmente políticos, a fim de

utilizar o espaço para angariar apoio às suas prédicas revolucionárias. Isso pode ser

evidenciado nas contínuas demonstrações do governo venezuelano as quais

conservaram os ideais revolucionários de Chávez, mesmo depois do ingresso do

país ao MERCOSUL.

Em relação aos impactos econômicos que a entrada da Venezuela traria ao

MERCOSUL, Batista Jr. (2006) afirma:

Com a adesão desse país a união aduaneira, o MERCOSUL passa a constituir um bloco de mais de 250 milhões de habitantes, com uma área de 12,7 milhões de km2. O PIB do bloco supera US$1 trilhão, correspondente a cerca de 3/4 do PIB sul-americano. (...) Em se tratando de um país importante em termos econômicos, comerciais e energéticos, a adesão da Venezuela aumenta o peso do MERCOSUL e fortalece seu poder de barganha em relação a outros países ou blocos comerciais.

Além dos aspectos econômicos, vale a análise das repercussões políticas da

adesão venezuelana para o Brasil: a entrada da Venezuela pode prejudicar um dos

principais objetivos da política externa de Lula. A liderança regional, como já foi

elucidado, tem como um dos instrumentos para sua efetivação o papel de destaque

do país no MERCOSUL. Entretanto, as intenções de Chávez também estão

relacionadas à consolidação de um papel relevante na América do Sul, a fim de

conduzir os governos vizinhos para uma colisão regional em prol dos ideais

revolucionários. Nesse sentido, o governante venezuelano pretende se fortalecer ao

angariar apoio dos países-membros do MERCOSUL. A integração bolivariana

projetada por Hugo Chávez reserva à Venezuela o papel de liderança política, o que

prejudica as pretensões brasileiras. O poder venezuelano na região está relacionado

ao petróleo existente no país, mas a radicalização de Chávez não agrada a todos os

setores, o que limita a expansão dos seus ideais esquerdistas.

As demonstrações ditas revolucionárias da Venezuela, ao afetarem praticamente

toda a região, deixam clara a capacidade do país de envolver os países vizinhos em

suas investidas, como no exemplo do apoio dado à Bolívia no caso na

nacionalização das reservas de gás natural, que prejudicou o Brasil. Por esse

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motivo, o governo brasileiro passou a agir com o intuito de dificultar a aspirada

liderança regional, e ao mesmo tempo evitar criar impedimentos nas relações

bilaterais entre os países. As declarações de Lula se mostraram favoráveis à adesão

da Venezuela pelo MERCOSUL, através da justificativa da integração política da

América do Sul. Dessa forma, ficou evidente que o interesse brasileiro em apoiar

Chávez pautou-se nas aspirações do governo em aperfeiçoar o chamado

MERCOSUL político: o ingresso venezuelano ao bloco o tornaria uma realidade

continental, além de auxiliar na integração política da região.

O incentivo brasileiro, assim, atenuou os eventuais problemas que poderiam ser

gerados pela competição pela liderança regional entre os dois países. Obviamente,

as consequências econômicas da entrada da Venezuela no MERCOSUL são

favoráveis ao fortalecimento do bloco: o presidente venezuelano ofereceu como

contrapartida à sua adesão o financiamento de projetos na região - na oficialização

da assinatura do protocolo de adesão, Hugo Chávez anunciou a possibilidade de

investimentos na ordem de US$6,2 bilhões, aos países-membros do bloco

(MAGNOLI, 2006b). Além disso, a Venezuela propôs a facilitação do comércio com

Uruguai e Paraguai, países insatisfeitos com os privilégios de acesso garantidos ao

novo membro. Contudo, a questão política foi ressaltada como fundamental para a

escolha do associado, que vislumbrou na integração maiores possibilidades de

apoio dos países vizinhos às pretensões de criar uma nova ordem internacional,

com o fim do domínio unilateral norte-americano e a intensa participação dos países

em desenvolvimento no sistema global.

A aspiração de Hugo Chávez de liderar a região sul-americana, sobretudo

politicamente, esbarra justamente nos objetivos da política externa de Lula, uma vez

que o governante também insiste no projeto de dispor o país como líder regional.

Nesse sentido, a adesão da Venezuela como membro pleno do MERCOSUL pode

trazer consequências negativas para os interesses nacionais brasileiros, quando a

finalidade de Chávez é justamente angariar apoio para a liderança venezuelana, em

troca dos petrodólares investidos nos países sul-americanos, especialmente os

membros do bloco.

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O Brasil, para evitar constrangimentos diplomáticos, optou pela manutenção de

relações estáveis com a Venezuela: é necessário exibir a capacidade brasileira de

respeitar as ideologias de cada país sul-americano, ao mesmo tempo em que busca

manter a integração regional e impedir o descontentamento das grandes potências,

que por sua vez prejudica a imagem do MERCOSUL e dos países da região.

O governo Lula buscou, desse modo, atuar como moderador da Venezuela,

aceitando certas posições, propondo medidas de integrar o país à região, e

concomitantemente tolher as ações intempestivas de Chávez, já que as reações

internacionais poderiam trazer sérias consequências ao bloco regional, do qual

agora faz parte. Durante todo o primeiro mandato de Lula, o governante teve como

uma das principais atribuições regionais atenuar os rumores causados pela política

externa de Hugo Chávez. Assim, quando a Venezuela aderiu ao MERCOSUL, o

Brasil não poupou esforços no sentido de promover tal evento como uma

oportunidade de demonstrar ao sistema internacional a harmonia existente no

processo de integração da América do Sul.

Pode-se notar que com estes episódios, em que o governo brasileiro liderou e

intermediou conflitos, o foco da política externa no período analisado era a atuação

pragmática no entorno regional para conquistar a posição de líder e assim se

projetar no sistema internacional como uma potência.

O Brasil, ao se projetar na América do Sul como mediador de conflitos, mesmo que

muitos não lhe fossem diretamente relacionados, lança o país em maior projeção

regional, justamente como um mecanismo de promover a imagem internacional do

Brasil. Foram significativos os esforços para se colocar como mediador de possíveis

crises e conflitos latentes no subcontinente, uma vez que, como cita Lula,

é preciso que o Brasil cresça, se desenvolva e que os países vizinhos também cresçam e se desenvolvam, porque aí nós iremos criar um continente altamente desenvolvido com o povo tendo uma qualidade de vida extraordinária. (...) A um país como o Brasil não interessa ser apenas um país grande, economicamente forte, com

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um monte de gente pobre do seu lado. É preciso que todos cresçam, que todos tenham condições de se desenvolver.53

Ou seja, o foco da política externa do primeiro governo Lula visou uma inserção no

sistema internacional a partir de um bom relacionamento com os países vizinhos, já

que depende do consentimento dos mesmos para representá-los como líder sul-

americano.

Porém, percebe-se que houve, nesse período, a resistência dos países, que foram

contrários à liderança brasileira da região. Há, claramente, uma preponderância do

país no subsistema sul-americano, e consequentemente a reação a essa posição é

comprovada a partir das inúmeras contendas envolvendo o Brasil direta ou

indiretamente. Nesse sentido, destaca-se o desgaste com a Argentina:

o governo de Lula adotou comportamento proativo de construção de uma liderança brasileira na América do Sul, assim como um comportamento de maior projeção internacional (...). Em pouco tempo, esta política proativa brasileira entrou em choque com percepções no interior da Argentina que a identificaram como imposição de uma liderança individual do Brasil, e inaugurou-se um período complicado nas relações de ambos que ainda não foi superado (SARAIVA, 2008).

Ainda a respeito da resistência argentina à liderança regional brasileira, tem-se que

apesar do sucesso brasileiro no cenário internacional poder significar projeção para a região (...), esse não encontra apoio da Argentina que, aparentemente, estaria buscando desempenhar o mesmo papel que o Brasil, ao almejar maior participação internacional e a liderança sul-americana (TELES e CANÊDO, 2006, p. 3).

Além da Argentina, outros países divulgaram a insatisfação com a política externa

brasileira, como o Peru, sob a voz do então Ministro do Exterior José Antónia Garcia

Belaunde: “eu acho que o Brasil tem o papel de grande integrador (...). O país

poderia fazer mais (…) com mais iniciativa e, obviamente, mais investimento” (BBC,

2008). Neste mesmo tom, o Ministro da Defesa da Colômbia avaliou:

53 LULA diz que integração da América do Sul depende de gesto do Brasil. Agência Brasil . Brasília – DF, 21/07/2008.

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francamente [as aspirações de liderança brasileira] deveriam ser mais ativas. A idéia da união sul-americana ficou débil, o Brasil parece ter perdido o entusiasmo em relação a essa idéia, e acho que é necessário entusiasmo para a América do Sul ter um processo de integração mais dinâmico do que o tem tido até agora (BBC, 2008).

O Paraguai e a Venezuela também adotaram a postura reativa, assim como os

demais países vizinhos, por estarem insatisfeitos com as atitudes brasileiras. Além

da insatisfação, a competição pela liderança levou a Venezuela de Hugo Chávez a

contestar a posição almejada pelo governo brasileiro.

Na medida em que não recebe a devida atenção de seus principais parceiros, nesse caso Brasil e Argentina, o Paraguai busca fortalecer suas relações com países de fora da região, o que representa forte ameaça à integração sul-americana e aos objetivos de liderança regional do Brasil. Isso porque, além de enfrentar problemas para consolidar seu principal instrumento de liderança – o Mercosul – o Brasil passou a ter um concorrente ao posto de líder regional. Hugo Chavés não só rivaliza com o Brasil, como se utiliza de meios completamente divergentes dos brasileiros para conquistar a liderança da região (TELES e CANÊDO, 2006, p. 4).

Assim, restou à chancelaria brasileira recuar em seu projeto de tornar as iniciativas

brasileiras na região uma porta de acesso a essa liderança. O governo brasileiro

passou a participar apenas das contendas envolvendo o Brasil, o que será

evidenciado no próximo item. Para tanto, a chancelaria passou a evitar a utilização

da expressão “liderança regional”, além de negar, sempre que possível, em foros e

discursos regionais, que o país tenha galgado algum interesse nacional a partir de

intervenções em conflitos e problemas envolvendo países vizinhos.

Nesse sentido,

a diplomacia brasileira tem negado uma intenção explícita de liderar a região – uma ideia que poderia desagradar a vizinhos e atrapalhar o processo. Hoje (...) Lula evita qualquer menção a uma liderança

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brasileira e sempre que pode repete que a América do Sul “não precisa de um líder”.54

Assim, o ativismo diplomático para a América do Sul, do primeiro mandato, foi

substituído por ações mais moderadas (o que não significa que os ideais de líder

tenham cessado; ao contrário, permaneceram latentes, já que os países vizinhos

continuaram a cobrar do Brasil uma postura de líder regional), que se endereçavam

diretamente ao Brasil, no segundo governo Lula. Isso foi necessário porque,

(...) como sabem os vizinhos do Brasil, o compromisso de Brasília com a região tende a ser seletivo e segue apenas um estrito cálculo de interesse nacional em vez de seguir a lógica dos interesses regionais quando estes entram em choque com os primeiros. Na leitura da maioria de seus vizinhos, o Brasil joga duro e, apesar de responder por mais da metade da riqueza, população e território da região, não tem um programa amplo ou sistemático para ganhar a aceitação de sua ascensão (SPEKTOR, 2011, p.144-145).

O segundo mandato do presidente Lula, portanto, teve de ser adaptado, no que diz

respeito à política externa, aos resultados poucos producentes da atuação intensa

nos contenciosos e problemas de países vizinhos. Do ponto de vista do apoio

regional, o projeto de tornar o Brasil uma liderança não alcançou resultados

satisfatórios, embora as escolhas diplomáticas tenham demonstrado aos demais

países do sistema internacional a preponderância brasileira na América do Sul.

3.2 O segundo governo Lula e a América do Sul: recuo à liderança regional ou mudança de postura?

“O portador do carisma assume as tarefas que considera adequadas e exige obediência e adesão em virtude de sua missão. Se as encontra, ou não, depende do êxito. Se aqueles aos quais ele se sente enviado não reconhecem sua missão, sua exigência fracassa. Se o reconhecem, é o senhor deles enquanto sabe manter seu reconhecimento mediante ‘provas’”. (WEBER, 1999, p.324)

54 PARA América do Sul, liderança brasileira ainda é promessa. BBC Brasil . São Paulo, 10/03/2008.

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Após quatro anos no poder, o então presidente Lula concorre ao segundo mandato,

nas eleições realizadas em 2006, e vence o candidato Geraldo Alckmin, do Partido

da Social Democracia Brasileira (PSDB), no segundo turno, com 60,83% dos votos

válidos.55

Em relação à política externa, o segundo governo Lula manteve as principais

diretrizes do primeiro mandato, tendo como objetivo final o alcance da posição de

potência no sistema internacional, a partir de iniciativas como a preponderância

regional, a participação pragmática em foros multilaterais e a consolidação de laços

diplomáticos para além dos países tradicionais na diplomacia brasileira.

No entanto, a reeleição exigiu, para o entorno regional, um menor pragmatismo na

atuação de um país líder, que almeja representar seus vizinhos no mundo. Alguns

países, como Argentina, Venezuela, Bolívia e Equador, não estavam satisfeitos com

o discurso da chancelaria brasileira que envolvia a posição preponderante do país

no subcontinente, o que exigiu que a liderança regional passasse a ser um objetivo

menos evidente, ao menos na retórica, para evitar a consolidação de iniciativas que

contrapusessem a ascendência do Brasil na região. Tais iniciativas iriam de encontro

à clássica lógica indicada por Weber (1999, p.163):

(...) toda manifestação de pretensões de prestígio, em algum lugar – em regra, consequência de uma aguda ameaça política à paz –, provoca, em virtude de uma inevitável “dinâmica de poder”, a reação imediata da concorrência de todos os demais portadores possíveis de prestígio.

Como salientado no final do primeiro item, com o passar dos anos a atuação

regional ficou restrita apenas a contenciosos que envolviam diretamente os

interesses brasileiros. Isso fica claro quando analisamos os exemplos de atuação

sul-americana no segundo governo Lula: a tentativa de intervenção no conflito

envolvendo a Colômbia, Equador e Venezuela (questão das Forças Armadas

Revolucionárias da Colômbia – FARC), quando mais uma vez ficou evidente que os

países vizinhos não estão interessados na liderança brasileira; e na contenda

envolvendo o Paraguai, pela atualização dos valores pagos pelo Brasil em Itaipu.

55 Dados disponíveis em http://www.tse.gov.br/internet/eleicoes/2006/result_eleicao.htm. Acesso em 26/07/2011.

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O primeiro caso diplomático do subcontinente que teve a participação do Brasil, no

segundo governo Lula, foi o conflito envolvendo a Colômbia, o Equador e a

Venezuela, que teve início com a morte de importante militante das FARC em solo

equatoriano pelo exército colombiano no dia 1° de m arço de 2008. Como resume

Romero (2008, p.47):

A América do Sul assistiu (...) ao que teria sido uma das piores crises diplomáticas na sub-região andina. Em apenas 48 horas, as relações entre Colômbia, Equador e Venezuela deterioraram-se substancialmente: a intervenção do exército colombiano, realizada na província equatoriana de Sucumbíos, em 1º de março deste ano, resultou não somente na morte do segundo comandante das Forzas Armadas Revolucionarias de Colombia (FARC), Luis Edgar Devia Silva – vulgo “Raúl Reyes” –, mas também na execução de outras vinte e cinco pessoas, dentre as quais um cidadão equatoriano e cinco mexicanos. O governo equatoriano teria sido notificado por Álvaro Uribe algumas horas depois da intervenção, o que desencadeou uma crise diplomática que culminou com o corte de relações entre os dois países, a mobilização de tropas venezuelanas ao longo da fronteira com a Colômbia e uma série de acusações e denúncias abertas entre os três governos.

Após a invasão do território equatoriano pela Colômbia, os problemas diplomáticos

começaram. Apesar de argumentar que havia exterminado o número dois das

FARC, conhecido como Raúl Reyes, o governo colombiano não teve contrapartida

positiva do Equador, que optou por romper relações diplomáticas com o país vizinho.

Nesse momento, Hugo Chávez intervém na contenda e apoia o Equador, também

rompendo relações com a Colômbia, já que o país violou a soberania do território

equatoriano e passou a criticar a atitude do governo Rafael Correa de denunciar a

invasão, alegando inclusive que o Equador seria conivente com os militantes das

FARC, mantendo-os escondidos em seu território. Assim, a invasão de território do

Equador pela Colômbia para o combate a guerrilheiros da FARC provocou grave

crise diplomática entre esses países, com o rompimento das relações por parte do

Equador. A Venezuela agravou a situação ameaçando intervir militarmente

(BARBOSA, 2008). Segundo D’Araujo (2008), a violação do território equatoriano foi

rapidamente confirmada e reconhecida por vários países, entre eles o Brasil. A

Colômbia, pela voz de seu presidente, Álvaro Uribe, reconheceu a violação do

território, mas reafirmou a necessidade da operação.

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Porém, ainda que a Colômbia tenha sido pressionada a pedir desculpas formais pela

violação de soberania, isso não ocorreu, e Uribe passou a condenar qualquer apoio

ao Equador como um suposto apoio aos paramilitares das FARC, agravando a

situação. Como consequência,

a rapidez e dimensão da reação venezuelana tornam a análise da crise ainda mais complexa. Já no dia seguinte à divulgação da morte de Raúl Reyes, Chávez ameaçou o governo colombiano de que qualquer ação de natureza semelhante perpetrada em território venezuelano seria causa bellis e, no dia seguinte, ordenou o envio de batalhões blindados para a fronteira colombiana, acusando Uribe de “paramilitar e narcotraficante”. A rápida escalada da crise teria ocorrido em resposta ao comunicado do Ministério das Relações Exteriores colombiano, que negava que tivesse havido violação de soberania e afirmava que o exército colombiano havia agido em legítima defesa (ROMERO, 2008, p.49).

A atitude colombiana desagradou os países vizinhos, como Argentina e Brasil, que

passaram a exigir o pedido de desculpas ao Equador. Assim, o país também passou

a fazer parte do incidente, quando o governo colombiano alegou ter provas

concretas do apoio de Lula e do PT às FARC, através de documentos resgatados

dos computadores dos mortos no Equador. De acordo com a revista colombiana

Cambio, foram encontrados 85 e-mails trocados entre os representantes máximos

da milícia (conhecidos como Manuel Marulanda, o Tirofijo, e Luis Edgar Devia, o

Raúl Reyes) e políticos de alta patente, todos filiados ao PT.56

Após essas denúncias, o governo brasileiro passou a intervir no conflito, já que a

Colômbia envolveu o país. Alguns dias após o incidente, o presidente do Equador,

Rafael Correa, visitou o Brasil para agradecer o apoio na defesa da soberania

equatoriana. Na ocasião, declarou:

Todos sabemos do peso diplomático que tem o Brasil. A sua postura na crise é muito importante e eu só tenho palavras de agradecimento ao presidente Lula, ao chanceler Celso Amorim, porque eles têm defendido princípios. O princípio de que a soberania é sagrada e nenhum governo – por predestinado ou divino que se creia, por

56 REVISTA: FARC tentam influenciar alto escalão do governo Lula. Terra . São Paulo, 31/07/2008.

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supostas lutas antiterroristas que acredita estar levando a efeito –, tem o direito de agredir outro país soberano.57

A postura adotada pelo governo brasileiro foi de denúncia da atitude colombiana, o

que causou mal-estar diplomático entre os países. Uribe chegou a afirmar que, além

das provas que possuía sobre a relação entre o PT e as FARC, considerava a

possibilidade do Brasil apoiar o grupo paramilitar devido à insistência brasileira em

não considerá-lo um grupo terrorista desde 2003, ano em que Lula chega ao poder

(INACIO, 2008). No entanto, após as negociações envolvendo os países

supracitados, além da OEA e o Grupo do Rio, o clima hostil foi sendo minimizado. O

assunto entrou em pauta novamente quando a ex-senadora colombiana Ingrid

Betancourt, refém das FARC por seis anos, foi libertada, juntamente com outros

reféns, graças a uma missão comandada pelo exército colombiano e francês, em

julho de 2008. De acordo com a chancelaria brasileira, o governo francês chegou a

solicitar o auxílio do Brasil na investida, mas sem sucesso, já que o Brasil recuou

para evitar problemas diplomáticos, alegando que não tinha contato com os

paramilitares. O governo brasileiro felicitou a Colômbia pelo sucesso na operação, e

na ocasião, Celso Amorim afirmou: “esperamos que esse fato contribua para uma

rápida pacificação da Colômbia. Está muito claro que não há futuro para essa luta

armada”.58

Ainda em 2008, mais precisamente em agosto, o Brasil se envolveu em uma

contenda diplomática com o Equador devido a problemas gerados na hidrelétrica de

San Francisco, reformada com empréstimo do BNDES, que condiciona todo

empréstimo feito a outros países ao emprego de companhias brasileiras ou compra

de componentes brasileiros para a realização das obras, que, no caso, foi financiada

com US$243 milhões provenientes do banco brasileiro.59 A empreiteira brasileira

responsável pela obra foi a Norberto Odebrecht, que já trabalhava há mais de vinte

anos no Equador. O conflito se iniciou quando

57 “PROVAVELMENTE, há base das FARC no Brasil”, diz presidente do Equador. Jornal da Globo . São Paulo, 05/03/2008.

58 PARA Amorim, resgate de Betancourt mostra enfraquecimento das FARC. Folha Online . Brasília, 02/07/2008.

59 ODEBRECHT tem pressa para deixar o Equador. Folha de S. Paulo. São Paulo, 24/11/2008.

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(...) o presidente do Equador ameaçou expulsar a firma brasileira do seu país, as relações entre Equador e Brasil entraram em um movimento sutil de escalada de tensões. Na ocasião, apenas uma semana depois de Quito anunciar que investigaria problemas na hidrelétrica San Francisco, Correa determinou que a brasileira Odebrecht restaurasse problemas encontrados na usina (MACHADO, 2008, p.32).

Além dos problemas na estrutura da hidrelétrica, o presidente do Equador, Rafael

Correa, decidiu expulsar a empresa brasileira devido a alguns problemas técnicos. A

primeira foi a não adequação das obras, resultando no desgaste das turbinas e do

desabamento de um túnel de 11 km que levava água ao equipamento. O outro

problema encontrado na obra foi o superfaturamento de peças (ANTUNES, 2009).

Como resultado da insatisfação de Correa, a construtora foi expulsa do Equador, os

diretores da Odebrecht tiveram seus vistos de viagem retidos e o empréstimo feito

ao BNDES não foi pago.

O presidente, ainda, colocou em dúvida os contratos relativos à extração de petróleo

pela Petrobras. Correa afirmou que pretendia negociar e atingir 100% de direito da

extração petrolífera pela estatal brasileira, dando em troca a liquidação de qualquer

custo de produção e o repasse de uma margem de lucro à empresa.60

Como resposta, o Brasil retirou seu embaixador do Equador, Antonio Marques Porto,

e cancelou a visita de uma missão cujos projetos eram: a construção do eixo

hidroviário Manta-Manaus (orçado em US$1,5 bilhões); licitação para exploração de

petróleo na região amazônica e no mar equatorianos pela Petrobras; e compra de

mais de vinte aviões brasileiros supertucanos pelo governo equatoriano (JARDIM,

2009).

Após a retaliação brasileira, Rafael Correa se pronunciou defendendo a medida

tomada pelo presidente Lula:

Se querem converter um problema comercial e financeiro num incidente diplomático, isso é responsabilidade exclusiva do Brasil. Sempre teremos os braços abertos para o embaixador do Brasil,

60 EQUADOR pede que caso da Odebrecht não prejudique relação com Brasil. Folha de S. Paulo. São Paulo, 10/10/2008

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para o povo do Brasil e para o querido presidente Lula da Silva (MAISONAVE; SANDER, 2008).

A crise diplomática envolvendo os dois países cessou meses mais tarde, quando o

Equador optou por continuar pagando as parcelas do empréstimo feito ao país, via

BNDES. Porém, o contencioso envolvendo uma empresa privada brasileira e o

governo equatoriano evidenciou o desgaste bilateral devido à preponderância

econômica brasileira na América do Sul.

E, por fim, o Paraguai também foi alvo de contenda diplomática envolvendo o

governo Lula, a partir do ano de 2008. Durante a campanha para as eleições

daquele ano, Fernando Lugo, presidente do Paraguai eleito em 20 de abril de 2008,

prometeu rever a questão agrária do país, além de renegociar as condições do

Tratado de Itaipu, que rege a hidrelétrica com o mesmo nome, binacional,

juntamente com o Brasil. Essa negociação traria benefícios à população paraguaia,

em teoria. Assim, com a eleição de Lugo, os movimentos sociais no país passaram a

pressionar o governo em busca dos resultados esperados. Essa pressão se deu em

forma de protestos e invasões de propriedades dos brasiguaios, que são fazendeiros

brasileiros que residem no Paraguai e lucram com a soja em território vizinho.

Nesse momento, o governo paraguaio inicia as negociações com o Brasil, a partir da

aproximação diplomática, buscando a renegociação dos preços cobrados pelo Brasil

ao Paraguai, além do fim da obrigatoriedade de vender o excedente energético ao

Brasil. No entanto, Celso Amorim, chanceler brasileiro, foi enfático:

Não, essa proposta não pode ser aceita. O Brasil não aceita o argumento do Paraguai de que a dívida de Itaipu é espúria, nem concorda com a definição de que a venda da energia de Itaipu a terceiros países é uma questão de soberania do Paraguai (MARIN, 2008).

A revisão do Tratado de Itaipu, exigida pelo governo paraguaio, daria melhores

condições de acesso à hidrelétrica, que, por diversos fatores, é mais bem

aproveitada pelo Brasil em termos de segurança energética. Porém,

(...) faz parte da filosofia, da tradição e dos princípios da diplomacia brasileira jamais colocar em questão os termos dos tratados fronteiriços. Além disso, como se trata de acordo bilateral, ele

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somente pode ser objeto de alteração caso ambos signatários concordem. O Brasil não somente discorda da modificação de tais acordos como também se recusa a entabular negociações com esse objetivo (SEITENFUS, 2008, p.50-51).

Dentre os fatores que o Paraguai entendia como justificativas para a possível

alteração do tratado estavam, de acordo com Seitenfus (2008), o momento histórico

da assinatura do documento, em que ambos os países eram governados por

ditaduras militares (nesse caso o tratado poderia ser questionado em termos de

legitimidade); e o elevado valor da dívida paraguaia aos cofres brasileiros (na ordem

de US$19,6 bilhões), que impedia o país de usufruir economicamente da usina

hidrelétrica. A proposta do governo paraguaio, nesse sentido, era a revisão dos

valores e o pagamento de US$600 milhões, anulando o restante da dívida

(SEITENFUS apud MENEZES, 2010, p.136).61

O Paraguai esperava, com a atuação enérgica nas discussões, que o Brasil, como

país líder do bloco sul-americano, aceitasse as condições do vizinho “menos

favorecido” e optasse pela aceitação da revisão do Tratado de Itaipu, já que o Brasil

é dependente da energia proveniente da usina e abriu mão, em exemplos

diplomáticos já citados, de vantagens expressivas em prol da aceitação regional do

país como líder, a partir da ideia do ônus da liderança.

No entanto, o governo Lula entendeu que a proposta do Paraguai não era

condizente com a realidade do tratado, que havia definido, desde 1973, que o Brasil

custearia cerca de 99,2% da obra, o que totaliza US$27 bilhões. Com essa situação,

o preço da energia pago ao excedente paraguaio foi reduzido como forma de quitar

a dívida do Paraguai em relação ao Brasil. Tal prática seria utilizada até 2023,

quando a dívida estaria quitada, o que desobrigaria o Paraguai de vender sua

energia excedente obrigatoriamente ao Brasil (GUIMARÃES, 2009a).

Nesse caso, a contraproposta brasileira foi oferecer créditos via BNDES para o

financiamento de obras de infraestrutura no Paraguai, no valor de US$1 bilhão. Os

61 SEITENFUS, Ricardo. Líder solitário ou potência egoísta? Os dilemas do Brasil frente ao novo Paraguai. Revista Interesse Nacional , out/dez 2008. Apud MENEZES, Roberto. A liderança brasileira no marco da integração sul-americana . 2010. Tese (Doutorado) - Universidade de São Paulo, São Paulo, 2010.

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serviços seriam realizados por empresas brasileiras (SCHÜFNNER, 2008). Isso,

segundo o governo brasileiro, auxiliaria o governo Lugo na contenção das pressões

internas. A oferta brasileira irritou o diretor paraguaio da usina de Itaipu, que afirmou

que “o Paraguai não está pedindo caridade, está pedindo mercado” (GUIMARÃES,

2009b). Após a resposta paraguaia, Celso Amorim finalizou a contenda com a

seguinte conclusão: “essas pretensões são irrealistas. Mas o Brasil tem interesse em

manter uma relação saudável e em contribuir para o desenvolvimento do Paraguai”.

(GUIMARÃES, 2009b)

O impasse foi resolvido quando o Brasil optou por ceder, em 2009, às propostas

paraguaias de extensão do prazo máximo do pagamento de sua dívida, que seria

2023. Diante disso, o governo brasileiro também aceitou triplicar o valor pago

anualmente ao Paraguai pelo uso do seu excedente energético (luva), passando de

US$120 milhões para US$360 milhões. Ademais, financiou uma linha de

transmissão ligando a capital paraguaia, Assunção, à usina de Itaipu, no valor de

US$450 milhões (GUIMARÃES, 2009a). O Brasil optou por essa postura devido a

interesses econômicos, embora a política de prestígio também tenha sido

empregada nesse imbróglio. Quando se observa a balança comercial paraguaia,

percebe-se que o Brasil é o principal exportador do Paraguai, enquanto ocupa a

segunda posição em relação às compras provenientes do país vizinho. De acordo

com a tabela 8, o Brasil compra o equivalente a 17,7% da pauta de exportação

paraguaia, além de ser responsável por 28,3% das importações do Paraguai.

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Tabela 8 – Principais parceiros comerciais do Parag uai (2008)

Parceiros de Exportação (2008) Parceiros de Importação (2008)

Argentina 23,90% Brasil 28,30%

Brasil 17,70% Estados Unidos 22,90%

Uruguai 13,00% Argentina 12,70%

Chile 7,10% China 11,20%

Rússia 6,30% Outros 24,90%

Espanha 4,40% Total (US $ bilhões) 9,172

Outros 27,60% Produtos: veículos automotores, bens de consumo, tabaco, produtos petrolíferos, máquinas elétricas, tratores, produtos químicos, peças automotivas. Total (US $ bilhões) 8,152

Produtos: soja, alimentos, algodão, carne, óleos comestíveis, eletricidade, madeira, couro.

Fonte: CIA World Factbook. Disponível em: https://www.cia.gov/library/publications/the-world-factbook/index.html. Acesso em 07/02/2012

Tendo os dados econômicos em vista, a preocupação do governo brasileiro em

manter as relações diplomáticas estáveis com o Paraguai gerou a postura

benevolente do país. Em contrapartida, o governo do Paraguai registrou a abertura

brasileira nas negociações como um avanço na aliança diplomática entre os dois

países, prometendo regulamentar a situação dos brasiguaios e evitando a

hostilidade dos mesmos pelos movimentos sociais paraguaios:

Os chamados brasiguaios já são paraguaios, porque tiveram seus filhos aqui, há quase uma terceira geração onde estão então. Eles apostaram no país. E, se existem situações irregulares agora, em propriedade de terra ou documentação, vamos fazer tudo o que for possível para as regularizações (PONT, 2008).

A saída diplomática encontrada pelo Brasil vai de encontro às outras resoluções

envolvendo países sul-americanos durante os governos Lula. A necessidade de

ceder nas negociações em prol da posição preponderante no subcontinente, ainda

que desagrade a opinião pública, é fundamental para sustentar o projeto de

liderança regional buscado durante o período. De acordo com Marco Aurélio Garcia

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(apud MENEZES, 2010, p.140),62 o peso que o Brasil exerce na América do Sul

exige uma postura mais cautelosa:

O fato de ser maior impõe ao Brasil maiores responsabilidades. Por ter compreendido e assumido essas responsabilidades diferenciadas é que o governo brasileiro se portou adequadamente em seus relacionamentos com a Bolívia, quanto à questão do gás, ou com o Paraguai, a respeito do uso da energia elétrica, para citar dois episódios com grande repercussão e alvos da incompreensão e da oposição de alguns.

Após a exposição dos principais momentos da política externa brasileira envolvendo

os países sul-americanos no segundo governo Lula, faz-se necessário retomar a

análise das contendas do primeiro mandato, para perceber a adoção de uma

postura mais conciliadora e menos agressiva na atuação diplomática regional. O

caráter pragmático da liderança brasileira ao se envolver em questões referentes a

outros países, como ocorreu nos primeiros anos do período analisado, é substituído

pela postura defensiva, coordenando suas decisões a partir da ideia de ser o Brasil o

país mais importante e forte da região, o que lhe dá a obrigação de arcar com os

problemas que esse papel de destaque gera nos países vizinhos. A legitimidade das

exigências dos países é justificativa para uma maior flexibilidade nas decisões, ainda

que tenha gerado desconfianças e insatisfação interna.

Dessa forma, ao perceber que a posição de liderança poderia ser comprometida

pelo fortalecimento de movimentos de contra-hegemonia brasileira no subcontinente

(como Argentina, Venezuela, Equador, Bolívia), o governo brasileiro alterou a

estratégia diplomática regional, ao não relacionar a atuação nas contendas à

pretensão de exercer o papel de líder. Lula, já em 2010, chega a mencionar que

(...) queriam que eu partisse para a garganta do Evo Morales, que esganasse ele quando ele disse que o gás era dele. E eu não fiz porque achei que o gás era dele mesmo, e que nós tínhamos que pagar o preço justo pelo gás. Todo mundo queria que eu pulasse na garganta do Lugo e esganasse ele quando ele queria um pouco mais de dinheiro de Itaipu. E eu acho que eles precisam. E por que eu

62 GARCIA, Marco Aurélio. O lugar do Brasil no mundo. A política externa em um momento de transição. In: SADER, E. e GARCIA, M.A. (orgs.). Brasil: entre o passado e o futuro . São Paulo: Boitempo/Perseu Abramo, 2010, p.163. Apud MENEZES, Roberto. A liderança brasileira no marco da integração sul-americana . 2010. Tese (Doutorado) - Universidade de São Paulo, São Paulo, 2010.

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acho que eles precisam? Porque um país como o Brasil, que é a maior economia desse continente, o Brasil tem que ser o lado generoso. O Brasil tem que ser aquele que estende a mão, aquele que ajuda, aquele que permite que haja um avanço dos outros. O Brasil não pode ser o grande país e os outros os pequenos países (LULA DA SILVA, 2010).

Concluindo, a era Lula adotou como prioridade máxima a consolidação da postura

de líder regional ao Brasil. Para isso, o país se envolveu em contendas e disputas

com os países sul-americanos, seja para demonstrar a preponderância e

capacidade de estabilizar conflitos de interesse, ou para utilizar o discurso da não

indiferença perante as economias mais frágeis, a fim de expor o caráter positivo da

suposta liderança brasileira. Para Danese (2009, p.173), seria interessante, do ponto

de vista estratégico,

(...) saber convencer os nossos parceiros de que qualquer iniciativa que se assemelhe a um impulso de liderança brasileiro consulta também os interesses desses parceiros, e que o Brasil, por seu peso e a amplitude dos seus interesses, tem capacidade de impulsionar e sustentar processos de parceria com liderança sem hegemonia com seus vizinhos em nome desses interesses compartidos. Temos de convencê-los, quando for o caso, de que a ausência de uma liderança regional, na falta de uma liderança brasileira, não priva a região de hegemonias; ao contrário, torna-a mais vulnerável a hegemonias extrarregionais e a enfraquece com a sua pulverização, com o predomínio de forças centrífugas que lhe retiram peso e densidade.

No entanto, ainda que existam movimentos contrários à liderança regional brasileira,

que ficaram nítidos a partir da alteração da estratégia diplomática para conquistar a

preponderância regional no segundo governo Lula, o objetivo foi mantido, como

pode ser claramente observado na atuação durante o período, mesmo com a

insatisfação de países vizinhos à suposta hegemonia do Brasil no subcontinente.

Segundo Lima (2011, p. 60-61),

Assumir o papel de uma potência regional tem gerado demandas sem precedentes sobre o Brasil, e parece requerer capacidades que vão além das inquestionáveis habilidades diplomáticas do Itamaraty. Desde 2003 o Brasil interveio em crises políticas na Venezuela, Bolívia, Equador (...). A opinião doméstica sobre a política brasileira na região tem tendido a se dividir ao longo de linhas partidárias: a opinião conservadora tem, em geral, se oposto ao abandono da tradição de não-intervenção, enquanto círculos progressistas intelectuais e

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políticos têm apoiado um envolvimento maior e mais comprometido nos assuntos regionais.

Finalizando, para Rubens Barbosa (apud SPEKTOR, 2011, p.154-155), a liderança

regional brasileira já corresponde a uma realidade, e deve ser mantida como o

grande foco da política externa:

(...) tenho insistido muito nas minhas apresentações públicas no conceito de América do Sul... Está madura a ideia de o Brasil assumir, de fato, na América do Sul, um papel de liderança, o que já vem fazendo informalmente. A credibilidade, o respeito e os resultados alcançados pelo país nos últimos (...) anos, credenciam o Presidente do Brasil para propor algo concreto (não retórico) para consolidar nosso papel no subcontinente... Os EUA e os demais países da região esperam de nós uma atitude dessa natureza (que o Brasil assuma a liderança regional, com todo o ônus e responsabilidade que isso representa). Vai haver ciumeira? Vai. Vai haver desconfiança? Sempre houve. Temos de fazer política da nossa geografia. A América do Sul é o nosso “quintal” e onde se dará (já está se dando) a expansão capitalista das empresas brasileiras. Devemos ocupar esse espaço antes que outros (EUA, México, no contexto da ALCA, e alguns países europeus e Asiáticos) o façam.

A busca pela liderança regional, no entanto, precisa ter como um dos pilares o

fortalecimento das relações comerciais entre os países sul-americanos, para que

haja mais robustez no papel preponderante do Brasil, o país mais importante,

também em termos econômicos, da região.

3.3 O poder econômico do Brasil na América do Sul n os governos Lula: fonte de legitimidade da liderança ou interdependência?

An important underlying dimension of economic power behavior is to make others more dependent on you than you are on them (NYE, 2011, p. 54)

A partir das ações diplomáticas do Brasil na América do Sul, durante os governos

Lula, pode-se afirmar que o país buscou, nesse período, fortalecer as relações entre

os vizinhos, para conquistar a base de legitimação da sua liderança regional. No

entanto, a posição pacífica em contendas, ou mesmo a atuação intensa na região,

não são elementos suficientes para garantir o objetivo final da política externa de

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Lula para o subcontinente. De acordo com Nye (2011), o aspecto econômico é

fundamental para demonstrar o poder de um país, o que já foi apresentado no

presente capítulo, mas de maneira pouco sistemática. Assim, o objetivo desse

subitem é discutir a variável econômica do poder regional brasileiro.

De acordo com Joseph Nye (2011), o poder econômico de um país pode ser medido

a partir de algumas variáveis, como a vulnerabilidade externa, a capacidade de

expansão de suas empresas, e até mesmo a possibilidade de adotar sanções

econômicas a terceiros países para demonstrar força política em relações

assimétricas. Assim, o poder econômico é utilizado pelos países como uma

demonstração de força política no sistema internacional, já que “economic and

political power tend to go hand in hand in a world that is insecure and at the same

time places a high value on security and growth” (JAMES, 2009, p. 211apud NYE,

2011, pp. 58-59).

Nesse sentido, um estudo da CEPAL apontou que

O Brasil é um parceiro extremamente importante para a Argentina, Bolívia, Uruguai e Paraguai. Em 2005, a participação brasileira chegou a 36% do total exportado pela Bolívia e 18% do Paraguai. Contudo, é bastante reduzido o comércio intra-setorial, e as pautas de exportações de alguns parceiros se mostram muito concentradas em uns poucos produtos. É digno de destaque o fato de as indústrias de maior conteúdo tecnológico apresentarem uma participação maior nas exportações dos parceiros para o Brasil do que nas vendas para os demais parceiros. Na direção oposta, são na maioria provenientes de terceiros mercados as importações das indústrias de alta tecnologia realizadas pelos países da América do Sul. O grande desafio é buscar um aumento do intercâmbio, o que implica ampliar as importações brasileiras provenientes da América do Sul. Como foi apontado, entre 2000 e 2005, houve uma redução de mais de US$ 100 milhões no valor das compras externas do Brasil procedentes da América do Sul. A identificação de gargalos, de deficiências de infra-estrutura, sobretudo de transporte, além de itens com potencial de comércio, é fundamental para permitir um aumento do intercâmbio entre o Brasil e seus parceiros da América do Sul (MOREIRA, 2007).

Dessa forma, a balança comercial brasileira (cujos números indicam o poder

econômico do país) na América do Sul é extremamente favorável ao país, além de

privilegiar setores tecnológicos, cujo valor agregado das exportações se torna maior.

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Porém, o desafio, como analisado pela CEPAL, é garantir canais de escoamento

para os países do subcontinente, que ainda são precários, embora haja iniciativas

como o projeto IIRSA (Iniciativa de Integração da Iinfra-estrutura Regional Sul-

americana) que se iniciou durante os governos Fernando Henrique Cardoso, mais

precisamente em 2000. Em termos gerais,

(...) foi pensado e articulado um mega-plano de exploração do continente Sul-americano que se denominou Iniciativa de Integração da Infra-Estrutura Regional Sul-americana (IIRSA). Para gerenciar este ambicioso plano a coordenação ficou a cargo dos doze governos latinoamericanos, contando com o apoio técnico-financeiro de grandes bancos multilaterais da região, de bancos nacionais (como o BNDES, no caso brasileiro) e com a iniciativa privada. Foi elaborado conjuntamente pelo BID, CAF e FONPLATA um Plano de Ação visando concretizar a integração do continente em apenas uma década (CARRION e PAIM, 2006, p. 4)

Retomando a análise acerca das possibilidades de ampliação do comércio regional,

seria necessário mais investimento no setor de transportes da América do Sul, uma

vez que o projeto IIRSA é limitado, e a crise financeira mundial de 2008 exige a

retomada da América do Sul como parceira comercial do Brasil. Devido às

limitações, percebe-se que

as exportações intrarregionais apresentam pequena queda em sua participação no total das exportações sul-americanas, passando de 22,6%, em 2000, para 18,6%, em 2006; tal redução se deve ao incremento na participação das exportações para outras regiões, inclusive para outros países da América Latina e Caribe (...) (DELGADO, 2010, p. 5)

Portanto, a partir de 2006, outros países passaram a fazer parte da rota de

exportações do Brasil, incluindo países da América Latina e Caribe, o que

demonstra a preocupação brasileira em garantir o status de potência regional. Mas a

queda na participação da balança comercial dos países vizinhos é preocupante, e

tem como principal argumento a presença cada vez maior da China no

subcontinente.

Aliada à entrada dos produtos chineses na pauta de importação dos países vizinhos

está a complexa crise mundial que atingiu o sistema internacional a partir de 2008,

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levando a uma gradual perda de espaço das grandes potências e ao crescimento do

potencial de países emergentes, como o Brasil, China e Índia. Porém, junto a isso se

soma a perda relativa do valor das commodities agrícolas, principal pauta de

exportação do Brasil para o mundo (exceto para a América do Sul, como foi

evidenciado acima):

O crescimento da economia mundial, com base nas projeções recentes dos organismos multilaterais, dependerá fortemente da capacidade dos governantes de promover a recuperação das suas respectivas economias, nos próximos anos. Sabe-se, de antemão, que esta não é uma tarefa fácil, especialmente para o Brasil. Os preços das “commodities” agrícolas e minerais, por exemplo, grandes responsáveis pela melhora no desempenho da economia do país nos últimos anos estão em queda acentuada (PEREIRA, 2009).

Sendo assim, através das análises de conjuntura de organismos como a CEPAL,

fica claro que o incremento das relações comerciais entre o Brasil e os países

vizinhos contribuiria não apenas para consolidar a liderança regional, mas também

para assegurar uma pauta de exportação com maior valor agregado e garantir o

escoamento em um mundo incerto após a crise que atingiu, principalmente, as

grandes potências (que são os maiores compradores do Brasil). Segundo Lima

(2011, p. 58), “o governo Lula tem dado grande ênfase à expansão das relações

econômicas dentro da região, envolvendo iniciativas públicas e privadas”.

Para João Carlos Nogueira63, diretor de negócios da Odebrecht, a situação é

favorável para as empresas brasileiras, já que o mercado latino-americano é

dominado pelo Brasil. Assim,

A maior parte das nossas exportações para Europa e Estados Unidos é de commodities. Para a América Latina, é o inverso, vendemos mais bens industrializados, portanto nossa situação regional é favorável. Estamos avançando (...).

63 INTEGRAÇÃO da América do Sul é saída para vencer crise econômica, afirmam empresários.

Agência Senado , 27/09/2011. Disponível em http://www.senado.gov.br/noticias/integracao-regional-da-america-do-sul-e-saida-para-vencer-a-crise-economica-afirmam-empresarios.aspx. Acesso em 24/01/2012

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Além da participação intensa da empresas brasileiras nos países vizinhos, o governo

brasileiro demonstra poder econômico através de financiamentos pelo BNDES, que

chegaram ao ápice, em termos de valor, em 2009, no fim do segundo mandato de

Lula. Conforme mostra a tabela abaixo, as cifras são consideráveis, sendo

utilizadas, em sua maioria, em projetos de infra-estrutura e interligação de fronteiras.

Nesse ano o gasto total do BNDES com os financiamentos externos totalizaram US$

441.732.000,00, e o principal país beneficiado foi a Argentina.

Tabela 9 – Financiamento externo do BNDES (2008-200 9)

País US$

Argentina 430.951.000,00

Chile 5.526.000,00

Venezuela 3.201.000,00

Paraguai 1.219.000,00

Equador 395.000,00

Uruguai 350.000,00

Peru 90.000,00

Total 441.732.000,00

Fonte: BNDES. Elaboração própria. Disponível em: http://www.bndes.gov.br/SiteBNDES/bndes/bndes_pt/Institucional/Publicacoes/Consulta_Expressa. Acesso em 10/02/2012

O BNDES tem sido uma ferramenta importante para articular os interesses

brasileiros às necessidades dos países vizinhos, que vêem nos financiamentos a

oportunidade de usufruir da posição secundária ocupada no continente:

O BNDES busca reduzir custos de comércio exterior, aumentar o intercâmbio comercial entre os países sulamericanos, promover maior integração regional e adicionar competitividade comercial à América do Sul, ao financiar as exportações de produtos e serviços de engenharia brasileiros, para aprimorar as conexões físicas da região (BNDES, 2004, p.1).

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Assim, através de empréstimos às empresas brasileiras e financiamentos de obras

nos países sul-americanos o BNDES é um elemento fundamental para a política

externa brasileira, quando a variável econômica precisa ser utilizada como

mecanismo de força política.

Outra esfera de análise do poder econômico do Brasil são as relações comerciais

com os países da América do Sul, em especial no âmbito do MERCOSUL, que

obteve papel de destaque na agenda diplomática durante os governos Lula. Os

números, conforme a tabela abaixo, indicam o crescimento da corrente de comércio

com os países-membros do bloco, desde 2002 (ainda no governo Fernando

Henrique Cardoso) até 2010. O desenvolvimento das relações comerciais foi intenso

até 2009, quando o bloco sofreu as conseqüências indiretas da crise financeira

mundial, aliado à entrada da China como parceira estratégica do MERCOSUL.

Tabela 10 – Resultados comerciais Brasil – MERCOSUL (2002-2010)

Período Saldo (US$ FOB) Corrente de Comércio (US$ FOB)

2002 -2.293.044.947 8.930.395.501

2003 -919.243 11.369.538.701

2004 2.544.409.016 15.325.394.972

2005 4.692.312.142 18.799.710.686

2006 5.018.441.634 22.953.215.052

2007 5.728.824.133 28.978.328.821

2008 6.803.196.310 36.671.419.752

2009 2.721.505.073 28.936.388.473

2010 5.981.515.189 39.221.486.729

Nota: Critério de cálculo: saldo = exportações – importações Critério de cálculo: corrente de comércio = exportações + importações Fonte: Relatório do Ministério de Indústria e Comércio Exterior. Disponível em http://www.mdic.gov.br//sitio/interna/interna.php?area=5&menu=2081>. Acesso em 03/02/2012

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O saldo comercial positivo do Brasil, em relação aos países-membros do bloco,

demonstra a importância do MERCOSUL para o comércio exterior brasileiro. De

acordo com os dados abaixo, percebe-se que a Argentina é o terceiro principal

fornecedor do Brasil, com a participação de 7,7% das importações brasileiras. Já em

relação às exportações, a América Latina e o Caribe, seguidos do MERCOSUL, são

os terceiros na lista dos principais compradores dos produtos brasileiros. Esses

dados, referentes ao ano de 2008, demonstram a importância do bloco econômico

para a balança comercial brasileira, principalmente no que se refere às exportações

do país.

Tabela 11 – Principais países fornecedores ao Brasi l em 2008

País Valor (em milhões de dólares) Participação (%)

Estados Unidos 25.810 14,9

Argentina 20.040 11,6

China 13.258 7,7

Alemanha 12.025 6,9

Japão 6.807 3,9

Fonte: MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO, INDÚSTRIA E COMÉRCIO EXTERIOR. Balança comercial brasileira – dados consolidados 2008. Disponível em http://www.mdic.gov.br/arquivos/dwnl_1275504684.pdf. Acesso em 08/02/2012

Assim, a Argentina exportou o equivalente a US$ 13.258.000,00 ao Brasil no ano de

2008, ocupando a terceira posição no ranking de fornecedores ao país, e

corresponde ao principal parceiro latino-americano do Brasil.

Os principais destinos das exportações brasileiras em 2008 demonstram a

importância da América Latina e do MERCOSUL para a balança comercial brasileira.

Conforme a tabela abaixo, a América Latina e Caribe foram os principais

importadores dos produtos brasileiros nesse ano; o MERCOSUL aparece em quarto

lugar, e seu mercado representou 14,9% das exportações do Brasil.

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Tabela 12 – Principais destinos das exportações bra sileiras em 2008

Mercados Participação (% total )

América Latina e Caribe 25,9

União Européia 23,4

Ásia 18,9

MERCOSUL 14,9

Estados Unidos 14

África 5,1

Fonte: MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO, INDÚSTRIA E COMÉRCIO EXTERIOR. Balança comercial brasileira – dados consolidados 2008. Disponível em http://www.mdic.gov.br/arquivos/dwnl_1275504684.pdf. Acesso em 08/02/2012

Já em relação às exportações brasileiras para os países, a tabela abaixo demonstra

a importância da Argentina para as vendas brasileiras, já que o país vizinho ocupa a

segunda posição no ranking de compradores do Brasil:

Tabela 13 – Principais países compradores do Brasil em 2008

País Valor (em milhões de dólares ) Participação (%)

Estados Unidos 27.648 14

Argentina 17.606 8,9

China 16.404 8,3

Países Baixos 10.483 5,3

Alemanha 8.851 4,5

Fonte: MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO, INDÚSTRIA E COMÉRCIO EXTERIOR. Balança comercial brasileira – dados consolidados 2008. Disponível em http://www.mdic.gov.br/arquivos/dwnl_1275504684.pdf. Acesso em 08/02/2012

Em contraposição aos dados explicitados acima, os outros países-membros do

MERCOSUL são mais dependentes das exportações para os demais que o Brasil.

No caso do comércio intrabloco, o Brasil responde por apenas 9,4% (em 2004, de

acordo com a tabela abaixo) das exportações totais. O Paraguai e o Uruguai são os

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países mais dependentes do mercado interno do MERCOSUL, o que os torna,

consequentemente, mais vulneráveis em relação aos compradores, que, no caso,

ficam fortalecidos:

as states become connected by market forces, they seek to structure their interdependence both to achieve joint gains and to create asymmetries that provide a larger share of the gain and power for others purposes. “Interdependence” involves short-run sensitivity and long-term vulnerability (NYE, 2011, p. 74).

Como o Brasil responde pela maior parcela de importações dos países-membros do

MERCOSUL, o país fortalece o seu poder econômico ao tornar os vizinhos

dependentes do seu mercado, além de ampliar as assimetrias comerciais no bloco,

tendo o Brasil a posição de destaque.

Tabela 14 – Importância do comércio intramercosul ( % das exportações totais)

País 1990 2004

Argentina 14,8 % 19,9%

Brasil 4,2% 9,4%

Paraguai 27,4% 32,9%

Uruguai 35,1% 26,5% Fonte: BAUMANN, Renato e MUSSI, Carlos. Mercosul: então e agora. CEPAL, LC/BRS/R.159, maio de 2006. Disponível em http://www.eclac.org/publicaciones/xml/1/24531/LCBRSR159MercosulEntaoeagoraRBCM.pdf. Acesso em 03/02/2012

Desta maneira, é interessante notar a importância do MERCOSUL para o Brasil, seja

no aspecto político, como foi retratado no capítulo, ou no aspecto econômico, ao

possibilitar a interdependência comercial dos membros e a garantia da

preponderância brasileira também nessa área, uma vez que os países são

beneficiados com as exportações ao Brasil, mas ao mesmo tempo se tornam

vulneráveis ao seu poder econômico.

Além do MERCOSUL, outro bloco regional é responsável pelo fortalecimento do

poder brasileiro: a UNASUL, que tem gerado crescentes saldos comerciais na

região:

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El comercio entre los países de la UNASUR desde 2003 viene creciendo enormemente en términos absolutos. En el año de 2003 el comercio intrarregional representaba menos de 40.000 millones de dólares y en 2008 alcanzó los 110.000 millones de dólares (CONFEDERACIÓN SINDICAL DE TRABAJADORES DE LAS AMÉRICAS, 2010, p. 42).

Como pode ser observado no gráfico abaixo, a criação da UNASUL contribuiu para o

inicio do incremento das relações comerciais entre os países-membros, uma vez que

a união institucional gera interesses comuns e novas parcerias. Nota-se que durante

a década de 1990 os países mantiveram relações comerciais importantes, que foram

diminuindo ao longo dos anos, evoluindo novamente apenas após a criação da

UNASUL.

Gráfico 1 – UNASUL: Evolução das exportações intra- regionais em milhões de dólares (1990-2008)

Fonte: CONFEDERACIÓN SINDICAL DE TRABAJADORES DE LAS AMÉRICAS, 2010, p. 41

Além do incremento nas exportações, a UNASUL promove o desenvolvimento da

liderança regional brasileira, uma vez que o país ocupa, também nesse bloco,

posição de destaque em termos econômicos, como pode ser observado na tabela

15, que demonstra o PIB dos países-membros no ano de 2008:

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Tabela 15 – PIB dos países-membros da UNASUL em 200 8

País PIB em 2008 (bilhões de dólares)

Argentina 328.555

Bolívia 16.602

Brasil 1.635.521

Chile 170.797

Colômbia 240.200

Equador 54.686

Guiana 1.916

Paraguai 16.905

Peru 127.406

Suriname 3.058

Uruguai 31.178

Venezuela 319.443

Total/ UNASUL 2.946.267

Fonte: CONFEDERACIÓN SINDICAL DE TRABAJADORES DE LAS AMÉRICAS, 2010, p. 41

O Brasil tem o maior PIB da UNASUL, além de ser o país idealizador da instituição,

o que lhe garante status de potência econômica do bloco. Assim como no

MERCOSUL, o Brasil consegue transformar o poder econômico em benefícios

políticos, como a conquista de parceiros para a legitimação da liderança regional.

Nye (2011) afirma que o país detentor de poder econômico deve transformá-lo em

poder político, para criar as assimetrias de poder e com isso garantir sua

preponderância sobre os demais.

Porém, o poder econômico é apenas uma ferramenta para demonstrar a capacidade

de liderança regional que o Brasil possui, pois existe uma limitação quanto ao uso do

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poder econômico atualmente, já que o Estado não controla o mercado,

interdependente e globalizado. De acordo com Nye,

the diffusion of power to nonstate actors, including transnational corporations, sets limits on state strategies to use economic instruments. States will often find economic power difficult to control and because market conditions are variable. But (…) is (...) important to understand the full range of economic policy instruments (NYE, 2011, p. 80).

Concluindo, a busca pela liderança regional do Brasil, agora um meio para

conquistar outros interesses, como um espaço maior ao país no sistema

internacional, consegue ser provada através dos exemplos diplomáticos de atuação

intensa do governo brasileiro no entorno geográfico. A questão econômica também é

um elemento que contribui para a legitimação do papel de líder, embora ainda

encontre limitações de ordem física (infra-estrutura) e conjuntural (crise mundial).

Mas além dos estudos de caso, é interessante comprovar tal suposição a partir de

uma elaboração teórica do tema, o que será feito no próximo capítulo, aproveitando-

se de algumas ações aqui descritas.

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4 DE PAÍS INTERMEDIÁRIO A LÍDER REGIONAL: A ESTRATÉGIA DIPLOMÁTICA BRASILEIRA

“Liderança não se apregoa, se exerce. Porque, qualquer que seja a forma que assuma, é um ato de poder – poder que decorre da força militar ou econômica, da criatividade, da capacidade de articulação, de persuasão, de sedução; poder, enfim, em qualquer das múltiplas formas que ele pode assumir nas relações entre Estados (...). Poder, e não simplesmente vontade, embora a vontade também entre em grandes doses na composição da liderança” (DANESE, 2009, p. 12).

A análise da política externa de determinado país, como está sendo feito no

presente trabalho, supõe, para o seu aprimoramento, o desenvolvimento de uma

modelagem acadêmica, a fim de averiguar as hipóteses preestabelecidas e garantir

a validade científica dos argumentos expostos. Para isso, considera-se para um

estudo analítico sobre política externa tanto a esfera internacional quanto a

doméstica, além de suas relações, de forma a estabelecer análises mais robustas.

Dessa forma, vários tipos de análise são desenvolvidos ao longo dos anos pelos

estudiosos das relações internacionais. Um deles, particularmente, vem sendo

utilizado por alguns autores no Brasil, como Maria Regina Soares de Lima, Mônica

Herz e Ricardo Sennes: a utilização do conceito de país intermediário para avaliar os

padrões de comportamento internacional brasileiro, inserindo o país em um modelo

e explicando, a partir do mesmo, as escolhas e possibilidades do Brasil no sistema

internacional.

Tal modelo de análise não possui tradição relevante no campo de estudo das

relações internacionais no Brasil, por conter limitações conceituais (ou seja, não é

simples definir o que seria um país intermediário) e de padronização de conduta

desses países em âmbito externo, uma vez que a mesma depende de variados

fatores, como contexto internacional vigente ou mesmo os interesses nacionais, os

quais alteram, inclusive, as estratégias de ação. As análises de política externa

relacionadas à definição de país intermediário precisam se valer de outros modelos

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de estudo, como a análise cognitiva,64 para garantir maior robustez e atenuar

possíveis falhas geradas pela limitação teórica. Mas o objetivo do presente capítulo

é apenas sugerir uma estruturação conceitual que também respalde a hipótese

defendida ao longo dos capítulos: a busca pela liderança regional, durante os

governos Lula, faz parte de um interesse diplomático mais amplo de conquistar um

papel mais ativo do país no mundo, sendo o representante do subcontinente

americano.

Nesse capítulo, portanto, pretende-se aplicar a ideia de país intermediário para

analisar a política externa do governo Lula para a América do Sul, através do

fortalecimento do MERCOSUL e criação da UNASUL. Para tanto, será feito um

estudo, através do padrão comportamental dos países intermediários, dos objetivos

do governo brasileiro e as reais motivações de priorizar a integração regional.

4.1 A lógica da Ação Coletiva e os países intermedi ários: um modelo de análise de política externa

“Quer se trate de reivindicações econômicas ou políticas, a organização se revela como o único meio de criar uma vontade coletiva. E, à medida que ela repouse sobre o princípio do menor esforço, isto é, da maior economia de forças, a organização é, nas mãos dos fracos, uma arma de luta contra os fortes” (MICHELS, 1982, p.15).

De acordo com a teoria da Ação Coletiva, criada por Mancur Olson em meados da

década de 1960, os indivíduos agem segundo seus próprios interesses, buscando

maximizá-los através de iniciativas como a participação em grupos e associações

organizadas. Porém, esse ideal de consolidação de grupos de interesse não está

relacionado com a vocação cooperativista desses indivíduos, uma vez que se unirão

em prol da maximização de interesses particulares (mesmo que sejam comuns a

64 Por análise cognitiva da política externa entende-se a utilização de elementos subjetivos, como “ambiente psicológico, groupthink, percepções e falsas percepções, lições da história, imagens, sistema de crenças, etc” (HERZ, 1994, p.75).

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todos os países, o que, aliás, corresponde ao fator de motivação para a criação dos

grupos e regimes), e não se esforçarão no sentido de promover o bem comum.

Nesse sentido, a consolidação de benefícios a todos os membros de determinado

grupo não depende da vontade de cooperar dos indivíduos, e sim da coincidência de

interesses envolvidos, pois

mesmo que todos os indivíduos de um grupo sejam racionais e centrados em seus próprios interesses, e que saiam ganhando se, como grupo, agirem para atingir seus objetivos comuns, ainda assim eles não agirão voluntariamente para promover esses interesses comuns e grupais (OLSON, 1999, p.14).

Essa vertente de análise foi muito difundida na ciência política, ao ser adaptada a

modelos ligados à teoria dos jogos, e também é largamente utilizada nas relações

internacionais, sob uma perspectiva utilitarista das relações entre os países. E,

nesse sentido,

a teoria dos jogos clássica provê uma abordagem rigorosa para modelar o comportamento de atores racionais que agem de acordo com interesses próprios e ordenam coerentemente todas as possibilidades, ao fazerem escolhas (ANDRADE; DIAS, 2002, p.4).

Adaptando, portanto, a ideia de Olson ao campo das relações internacionais, pode-

se dizer que os Estados agem de maneira semelhante aos indivíduos utilitaristas

descritos na lógica da ação coletiva: aqueles países que não possuem poder65

suficiente para alterar o status quo vigente no sistema internacional, de acordo com

seus interesses particulares, optam por adentrar nos regimes internacionais, que são

uniões institucionalizadas entre países em busca de interesses coletivos. Para

Wight, esses países são chamados de “potências menores”:

a grande maioria dos Estados não são grandes potências. (...) A pequenez que estamos nos referindo (...) é a relativa à sociedade internacional à qual pertencem (WIGHT, 1985, p.47).

65 Será adotado, também nesse capítulo teórico, o conceito de poder de Max Weber: “a probabilidade de um ator, dentro de uma relação social, estar em posição de realizar sua própria vontade, apesar da resistência de outro ator social e independentemente da base sobre a qual se apoie” (WEBER, 2004, p.53).

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Ou seja, esse grupo de países age segundo uma lógica cooperativista, embora seja

contraditório, com o objetivo de conquistar seus interesses próprios, de maneira

racional, ao angariar mais poder (com a união de vários países em busca de um

mesmo ideal) para tanto. O sentido utilitarista é dado da seguinte maneira:

(...) convencionalmente, um ato racional é um ato que foi escolhido porque está entre os melhores atos disponíveis para o agente, dadas as suas crenças e os seus desejos. Atos racionais maximizam preferências ou desejos, dadas determinadas crenças (FEREJOHN; PASQUINO, 2001, p.3).

Porém, ainda que adentrem em uma instituição de fins coletivistas, esses países não

se esforçarão no sentido de conquistar bens comuns, e sim seus objetivos

particulares, uma vez que estão interessados na união apenas em termos de

maximização das possibilidades de conquistar objetivos não alcançados de forma

independente. Eles só estão unidos institucionalmente porque possuem objetivos em

comum. No entanto, caso fossem detentores de poder e conquistassem sozinhos

seus interesses, a tendência seria o isolamento, e não a integração.

Essa categoria de países, que têm como uma das características da atuação no

sistema internacional a preferência pelos regimes internacionais,66 é conhecida

como países intermediários. Na realidade, tal definição não é consensual nas

relações internacionais, devido tanto aos critérios adotados quanto à nomenclatura

utilizada. De acordo com Sennes (2002),

várias denominações já foram utilizadas: Middle Power, Middle Ranged States, Great Regional Power, Secondary Power, Most Developed Developing Countries, Recently Industrialized Countries, Big Emergent Markets. Contudo, nenhum desses critérios foi capaz de criar um conceito preciso para essa categoria de países.

Dessa forma, a primeira função do presente capítulo consiste em precisar um

conceito comum para esses países intermediários, tendo em vista seus

comportamentos semelhantes no sistema internacional. Como características

comuns a esses países podem ser citados: o alto grau de integração comercial com

66 Segundo a definição de Krasner (1982), correspondem a “conjuntos de princípios implícitos ou explícitos, normas, regras e procedimentos em torno dos quais as expectativas dos atores convergem em uma dada área das relações internacionais” (tradução nossa).

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o mercado internacional, e a consequente dependência financeira da economia

mundial; o status de “aliado especial” das grandes potências (como foi estratégia do

Brasil, em relação aos EUA, em diversos momentos da política externa); posição

preponderante em relação aos seus vizinhos (LIMA, 1990, p.7-8), e a última, a ser

destacada: a preferência pelos regimes internacionais. Além disso, tal grupo de

países reconhece subjetivamente sua posição de intermediário, e se intitula como

tal, nos discursos diplomáticos ou nas justificativas de determinadas escolhas

estratégicas. Para A. Oliveira, Onuki e E. Oliveira (2006, p.25),

a despeito da inexistência de evidências empíricas que confirmem premissas sobre as especificidades comportamentais dos países intermediários – seja maior propensão, comparativamente a países de maior ou menor porte, a tendências coletivistas, como operar por meio de coalizões ou ser mais multilateralistas –, esta categoria ainda é amplamente usada como fator explicativo de opções ou padrões de inserção no plano internacional.

Portanto, ainda que as características dos países intermediários não tenham um

padrão, será através dessa categorização que relacionaremos os países

intermediários àqueles que possuem relevância internacional (pelo mercado

consumidor, ou mesmo pelas pautas de exportação), mas não conseguem se igualar

às grandes potências, uma vez que não possuem influência (leia-se poder) para

alterar o sistema internacional de acordo com seus interesses. Por esse motivo, o

padrão de escolhas diplomáticas desses países varia de acordo com as condições

de barganha e também com as noções de debilidade frente a determinados

assuntos. Isso significa que são países que guiam suas escolhas de acordo com as

possibilidades e interesses nos mais diversos temas. O Brasil, assim como o México

e a Argentina, são considerados países intermediários (LIMA, 1990, p.7).

De acordo com a teoria de Olson da ação coletiva, a autora propõe uma modelagem

para caracterizar os países intermediários, através do perfil comportamental dos

mesmos nas ações e escolhas diplomáticas. Para Lima (1990, p.17-18), esses

países possuem como padrão:

1) a preferência por ações unilaterais, desconsiderando os eventuais problemas

que tal atitude poderia gerar a um terceiro país (ou seja, busca por interesses

particulares) através de atuações utilitaristas;

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2) comportamento de free rider nas arenas internacionais, o que significa a

utilização de regimes e instituições para angariar benefícios, mas tentando arcar o

mínimo possível com os custos, como um “elemento carona”, se aproveitando da

integração de países com interesses em comum para atingir seus objetivos;

3) tentativa de exercer um papel de hegemon, quando possível (num ambiente

de preponderância perante os outros países, seja em um bloco, regime ou em uma

instituição), para adquirir benefícios devido à sua posição estratégica em relação aos

demais;

4) comportamento de liderança nos moldes do fator descrito anteriormente, com

o interesse final de conquistar poder para alterar o status quo do sistema

internacional de acordo com seus interesses;

5) um padrão comportamental mais reativo em relação às tentativas de

manipulação por parte das grandes potências, com a tendência de não aceitar as

condições e acordos propostos pelos grandes países em detrimento dos países sem

poder no sistema internacional.

Tendo esse modelo comportamental como base, e entendendo que os cinco

padrões não precisam, necessariamente, estar presentes nas políticas exteriores

dos países intermediários (dependem dos interesses do país, assim como das

possibilidades de acordo com a conjuntura específica), pode-se afirmar que a

postura adotada por essa categoria de países no sistema internacional busca

sempre a consolidação de interesses nacionais, através de uma visão extremamente

realista. Ou seja, os países intermediários, por não possuírem poder suficiente para

atingir seus objetivos, optam por estratégias cooperativistas para aumentar as

possibilidades de alcançá-los. No entanto,

há que se ajustar, neste sentido, a tese central de que os países intermediários teriam como traço distintivo, comparativamente às grandes potências ou aos países menores, o fato de priorizar “as arenas multilaterais e a ação coletiva entre países similares de forma a exercer alguma meta de poder e influenciar nos resultados internacionais” (KEOHANE apud SOARES DE LIMA, 2005, p.25). Na realidade, o traço distintivo dos PIs [países intermediários] pode estar na maior propensão, comparativamente a países de outro porte, em

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atuar como empreendedor político de coalizões no âmbito multilateral (OLIVEIRA; ONUKI; OLIVEIRA, 2006, p.19).

Assim, uma das estratégias dessa categoria de países corresponde à preferência

pelos regimes internacionais (SENNES, 2002) – nos quais, inclusive, conseguem

adotar os padrões de comportamento definidos por Lima (1990, p.7) –, uma vez que

determinam suas políticas internacionais em prol da ampliação de poder e

consolidação dos interesses nacionais (aqui entendidos como desenvolvimento

econômico e ampliação do papel no cenário internacional). Ao optarem pela

participação em regimes internacionais (ou seja, em instituições formalizadas por

normas e procedimentos das quais os países fazem parte com o objetivo de

consolidar interesses comuns a todos eles, dentro de um tema específico), esses

países têm como objetivos principais evitar o constrangimento internacional pela não

participação nas normas internacionais (dos regimes) e ampliar o poder de barganha

frente aos temas de interesse. Para Krasner (apud SENNES, 2002),67 esses regimes

são usados como recurso de poder pelos países com limitadas capacidades

nacionais. Os recursos dos atores não se alteram, mas sua habilidade de influenciar

comportamentos aumenta. Dessa maneira, os países intermediários conseguem

atingir seus interesses particulares, o que não o fariam caso não estivessem unidos

institucionalmente a outros países.

Portanto, temos que a preferência dos países intermediários pelos regimes

internacionais é explicada por dois fatores: o interesse (em ingressar em blocos

econômicos regionais, por exemplo) ou mesmo a situação confortável de usufruir os

benefícios das normas como um free rider, porém arcando com o ônus da liderança,

quando é interessante. Nesse caso,

os PIs [países intermediários] têm (...) interesse diferenciado e recursos para assumir o custo necessário para deflagrar e organizar a ação coletiva (OLIVEIRA, A.; ONUKI; OLIVEIRA, E., 2006, p.19)

Tendo isso em mente, passemos para o próximo item do presente capítulo: a

adaptação do conceito de país intermediário ao caso brasileiro. Para isso, será feita

67 KRASNER, Stephen. International Regimes . Ithaca and London: Cornell University Press,1983, p. 364 Apud SENNES, Ricardo. Países intermediários e fóruns multilaterais: algumas considerações. 3° Encontro Nacional da ABCP, Niteró i, 2002.

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uma análise da atuação regional do governo atual, por meio do MERCOSUL e de

iniciativas que desembocaram na criação da UNASUL, instituições que já foram

abordadas no capítulo anterior como exemplos da atuação intensa do Brasil no

subcontinente, já que

(...) a América do Sul converteu-se em uma frente de ação externa de Lula (...), não original, porquanto vinha das iniciativas de Cardoso, porém agora com nova intensidade. A ideia de construção de uma unidade (...) na América do Sul alçou-se ao nível máximo das preocupações do Ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim (CERVO, 2006, p.44).

Por meio da consolidação da UNASUL sob forte apoio brasileiro e das tentativas de

revitalização do MERCOSUL a partir da entrada da Venezuela e da formalização do

MERCOSUL Político é possível entender as escolhas diplomáticas do Brasil nos

governos Lula sob a lógica de um país intermediário.

4.2 O Brasil como país intermediário: atuação diplomática atual na América do Sul e lider ança regional

“Da perspectiva brasileira, essa orientação seria próxima ao que Morgenthau denomina ‘política de prestígio’, que corresponde a uma demonstração de poder, típica daqueles países que, por não disporem de recursos de poder suficientes, não podem almejar quer uma política revisionista da ordem mundial, quer uma política de manutenção do status quo” (LIMA, 2003, p.96).

A América do Sul foi o tema central da política exterior de Lula, durante os dois

mandatos. Essa assertiva foi desenvolvida ao longo dos capítulos anteriores. Desde

o primeiro discurso de posse, em 1º de janeiro de 2003, o governante já deixava

claro que o propósito fundamental de sua diplomacia seria a integração regional,

seja por meio da revitalização do MERCOSUL ou da ampliação das relações com os

países vizinhos. De acordo com Lula (2003),

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a grande prioridade da política externa durante o meu governo será a construção de uma América do Sul politicamente estável, próspera e unida, com base em ideais democráticos e de justiça social. Para isso é essencial uma ação decidida de revitalização do MERCOSUL, enfraquecido pelas crises de cada um de seus membros e por visões muitas vezes estreitas e egoístas do significado de integração.

Com a vitória de Lula nas eleições presidenciais de 2002, a temática da integração

regional foi ainda mais fortalecida, uma vez que a conjuntura regional e as diretrizes

diplomáticas tradicionais do Brasil favoreciam as investidas em prol da ampliação

das relações com os países vizinhos, as quais foram relacionadas a uma questão

polêmica: a liderança regional brasileira.

De acordo com Lima (1990, p.7), um padrão recorrente nas escolhas internacionais

dos países intermediários é a tentativa de adotar, quando possível, uma postura

preponderante perante os outros países, para se beneficiarem com a posição

estratégica, principalmente em blocos internacionais. Dessa forma, o Brasil tem se

comportado no plano regional como um país intermediário, uma vez que Lula expôs,

desde o início do primeiro governo, a intenção de conquistar a posição de destaque

regional, o que significaria a representação dos países vizinhos nos foros

internacionais, em busca de melhores condições para os países em

desenvolvimento, além de maior legitimidade e acordos econômicos favoráveis ao

MERCOSUL. Sintetizando, para Lopes e Vellozo Junior (2004, p.2), caso seja

interesse diplomático projetar a liderança regional do Brasil em termos globais, é

fundamental que se reafirme uma presença forte na América do Sul.

Entretanto, para que haja liderança sul-americana, o Brasil precisa,

fundamentalmente, conquistar a legitimidade desse papel de líder pelos países da

região. Assim, logo no início do primeiro mandato, Lula estabeleceu ações que

poderiam confirmar a capacidade brasileira para representar os vizinhos

diplomaticamente: em vários momentos, o governo optou por medidas que

garantissem a imagem positiva do Brasil regionalmente, como na iniciativa de

criação do Grupo de Amigos da Venezuela ou na adoção de postura neutra em

relação à contenda com a Bolívia, em 2006, quando o presidente Evo Morales

decidiu nacionalizar as reservas de gás natural, afetando o abastecimento do

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produto no Brasil. Esses exemplos já foram discutidos em capítulo anterior e

comprovam que

o Brasil adota diversas iniciativas que fazem parte da nova estratégia de atuação regional (porque dá estabilidade à região e cria laços de confiança entre os países vizinhos), estratégia de atuação condizente com um país que pretende se estabelecer como potência regional (OLIVEIRA; ONUKI. 2000).

Tal comportamento é caracterizado por Lima (1990, p.7) como o ônus da liderança,

quando o país intermediário garante benefícios a países terceiros para desfrutar da

posição hegemônica que essa postura o assegura (LIMA, 1990, p.14). Para Danese

(2009, p.149), ainda sobre o ônus da suposta liderança brasileira:

Liderança requer uma enorme legitimidade, a que decorre não apenas de atributos específicos ligados à identidade do líder e à sua capacidade de liderar, mas também do reconhecimento e da responsabilidade perante o grupo ou comunidade que é liderado.

Para que haja legitimidade nas ações do Brasil, em prol de garantir o status de líder

regional, o país precisa ter condições de arcar com a função, que exige basicamente

dois desafios: entender que os países vão se aproveitar da situação de “liderados”

para angariar apoio político e financeiro; e conseguir ter o aval desses países para

representá-los nos fóruns em que os objetivos são comuns a todos eles. Nem

sempre o país intermediário que busca a liderança consegue atender a essas

demandas, o que dificulta a consolidação do país como preponderante

regionalmente.

A liderança sul-americana faz parte de um projeto diplomático mais amplo, que tem

como intuito máximo conquistar melhor posição no sistema internacional. A respeito

dessa realidade, Lopes e Vellozo Junior (2004, p.28) destacam:

Somos um país sul-americano e não podemos fugir de nossas circunstâncias históricas e geográficas. Se nos compete um papel no ordenamento internacional hoje, esse papel é desempenhado regionalmente. Caso seja interesse diplomático projetar a liderança regional do Brasil em termos globais, é fundamental que se reafirme uma presença forte na América do Sul. Além disso, os interesses econômicos e estratégicos de tal investida são maiúsculos. Não é absurdo se supor que a legação do subsistema da América do Sul

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em níveis secundários de priorização, isto sim, implicaria graves custos à inserção internacional.

Sendo o principal objetivo da política externa atual galgar posição na disputa

hierárquica por poder no cenário global, o governo Lula pretende utilizar a

supremacia regional para angariar melhores possibilidades no sistema internacional,

representando, por meio da suposta liderança, os interesses comuns dos países

vizinhos. Nesse sentido, o governo brasileiro adota padrões de comportamento dos

países intermediários, citados anteriormente, para aliar interesses nacionais às reais

possibilidades de se tornar hegemon na América do Sul e com isso se beneficiar de

melhor posição no sistema internacional, usufruindo, para tanto, de blocos regionais,

como o MERCOSUL e UNASUL. Para Vitte e Senhoras (2006),

o papel de coordenador da integração sul-americana é uma função de liderança que o Brasil vem exercendo em duas frentes, em um primeiro plano com o processo de aprofundamento da integração do MERCOSUL e em um segundo plano com a aproximação junto à Comunidade Andina, o que resultou na convergência de ambos os planos na conformação de uma agenda de construção da CASA [atual UNASUL].

Portanto, a partir da concretização desse papel de coordenador da reforma do

MERCOSUL e da criação da UNASUL, o Brasil buscou a melhor inserção

internacional, durante os anos Lula. Isso fica claro quando observamos os dados e

as ações diplomáticas do período. Entretanto, para que a hipótese da tese seja

comprovada (a maior inserção internacional do Brasil a partir da instrumentalização

da posição de líder regional) o intuito do próximo item é formular um modelo, com

base no panorama conceitual que foi desenvolvido ao longo do presente capítulo,

que suporte a hipótese descrita acima.

4.3 As iniciativas regionais como base para a inser ção internacional nos governos Lula: um modelo de interpretação

A integração sul-americana é um objetivo estratégico da política externa brasileira, que tem no MERCOSUL e na UNASUL seus principais pilares (MINISTÉRIO DAS RELAÇÕES EXTERIORES, s.d.).

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A utilização do modelo comportamental dos países intermediários para analisar os

objetivos da política regional do governo brasileiro atual exige uma limitação

(temporal e temática) do tema, para facilitar a adequação das escolhas diplomáticas

ao padrão dos países intermediários. Dessa forma, serão utilizados os exemplos dos

objetivos brasileiros de integração regional por meio do fortalecimento do

MERCOSUL, cujas medidas são tomadas desde o início do primeiro governo Lula, e

da criação da UNASUL, em 2004.68 A partir da análise dessas investidas será

possível entender o porquê de algumas escolhas e os interesses nacionais

envolvidos nas mesmas.

A partir de 2003, tem-se o início de uma política externa brasileira extremamente

engajada com a sua prioridade, que é, como já foi exposto, a integração regional e o

alcance de uma posição de liderança pelo país em âmbito regional. Na realidade, o

objetivo máximo do governo Lula é conquistar uma posição mais atuante e plena

para o Brasil no sistema internacional, o que seria, no caso, a consequência natural

dessa posição preponderante frente aos vizinhos sul-americanos. Nesse contexto, a

alternativa mais viável para o interesse nacional do país seria, de acordo com uma

perspectiva utilitarista, a transferência do papel proeminente do Brasil no

MERCOSUL para além do bloco, ou seja, a manutenção do status de líder também

em perspectiva regional. Tal procedimento se revela adequado ao modelo proposto

por Lima (1990, p.7), o que mais uma vez justifica a caracterização do Brasil como

um país intermediário.

O interesse da diplomacia brasileira, ao se empenhar pelo fortalecimento do

MERCOSUL (por meio da adesão de novos membros e do desenvolvimento de

acordos comerciais, além da idealização do chamado MERCOSUL Político69) e pela

criação da CASA, que passou a se chamar UNASUL a partir de 2008, é garantir a

68 A carta de criação da CASA, que foi o protótipo da UNASUL, foi promulgada em 2004, mas o tratado constitutivo foi assinado apenas em 2008, já sob a nova nomenclatura.

69 O projeto MERCOSUL Político, como foi desenvolvido no capítulo anterior, foi idealizado pelo governo brasileiro e busca a integração política e social dos países-membros do bloco, a longo prazo, de forma espontânea. Tal projeto corresponde a uma tentativa de unir os interesses nacionais semelhantes dos países em pressupostos comuns, gerando a cooperação política entre eles e o fortalecimento desses interesses no cenário internacional.

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posição hegemônica nos regimes regionais (blocos e instituições), o que

corresponde a uma das principais estratégias dos países intermediários. O Brasil, ao

aliar as relações positivas com as grandes potências (principalmente com os EUA,

país com o qual possui, historicamente, relações “especiais”, e com a Europa) à

preponderância na América do Sul (por motivos geográficos e econômicos),

consegue desempenhar um papel importante no cenário internacional, apesar das

limitações em termos de poder (não possui poder suficiente para alterar o status quo

vigente de acordo com seus interesses) o que garante sua caracterização como país

intermediário. Nas palavras de Santos (2005, p.20), “mais do que a ‘circunstância do

Brasil’, a América do Sul é a referência para a inserção brasileira no mundo do

século que se abre”.

Tais iniciativas de revitalização do MERCOSUL puderam ser exibidas durante os

períodos em que o Brasil ocupou a presidência pro tempore do bloco, em 2004 e

2006. Para isso, o governo brasileiro dividiu seus objetivos para o MERCOSUL em

cinco pontos:70

1) Diminuição das assimetrias econômicas entre os países-membros a partir de

financiamentos de projetos de infraestrutura via BNDES, principalmente no Paraguai

e Uruguai, além da criação de um fundo de convergência estrutural (o que foi

consolidado em 2006, denominado FOCEM).

2) Aprofundamento das relações entre o bloco e outros países da América do

Sul (o passo mais importante deveria ser a consolidação de um tratado de livre

comércio com os países da Comunidade Andina de Nações – CAN, exatamente nos

moldes propostos pela UNASUL) e também com outros países e blocos do sistema

internacional, a partir de acordos estratégicos de livre comércio, dando credibilidade

ao bloco e aumentando sua área de influência no subcontinente.

3) Debate acerca da possível efetivação da ALCA a partir do acordo 4+1, ou

seja, ALCA/MERCOSUL, com o objetivo de fortalecer os interesses dos países-

membros do bloco sul-americano, a partir de negociações em que os quatro países

70 Informações disponíveis em http://www.mre.gov.br. Acesso em 09/07/2008.

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lutassem pelos mesmos objetivos.71 Sobre esse objetivo, Oliveira e Onuki (2000)

argumentam que

o significado político do MERCOSUL evidencia-se pelo modo como o Brasil instrumentaliza o bloco nas negociações internacionais. Sub-regionalmente, a integração no Cone Sul tem operado como o principal ativo que o Brasil possui para estender sua área de influência a todo o continente sul-americano. Em termos de negociações internacionais, por indução brasileira, as negociações com os demais polos internacionais têm sido feitas a partir de uma posição conjunta intrabloco.

4) Fortalecimento da integração econômica e comercial interblocos, dando

prioridade para a União Europeia. Nesse sentido, destaca-se o fortalecimento do

acordo-quadro MERCOSUL/União Europeia, consolidado durante a era Fernando

Henrique Cardoso. Para o governo brasileiro, esse tipo de parceria é interessante

para fortalecer a imagem do MERCOSUL no mundo, dando credibilidade ao bloco,

cuja imagem se encontra desgastada no sistema internacional graças aos

problemas estruturais e financeiros dos países-membros.

5) Discussão do projeto do MERCOSUL Político, que foi concretizado em 2006,

como apresentado no capítulo anterior. O objetivo do MERCOSUL Político é tentar

integrar os países do bloco em outra esfera, além da comercial, e com isso fortalecer

o MERCOSUL. A criação do FOCEM e do Parlamento do MERCOSUL, ambos em

2006, demonstram que os projetos sugeridos pelo Brasil na presidência pro tempore

foram levados adiante.

Por meio desses cinco princípios, o Brasil pretendia, durante o período de

presidência pro tempore, desempenhar um processo de revitalização do bloco, que

71 Nesse sentido, o governo brasileiro demonstra sua posição no discurso de encerramento da XXX Cúpula dos Chefes de Estado do MERCOSUL, em Córdoba (Julho 2006), quando o Brasil assumiu a segunda presidência pro tempore do bloco: “Nós, simplesmente, não falamos mais em ALCA (...). Hoje, quem quiser falar em ALCA, tem que falar primeiro em MERCOSUL. Tem que falar em MERCOSUL porque nós, a partir da nossa realidade, queremos construir acordos com todos os países do mundo, mas queremos que a nossa soberania seja respeitada, que a nossa agricultura seja respeitada, que a nossa indústria seja respeitada, e que os nossos países tenham soberania para decidir a hora de fazer, com quem fazer, em função do nosso interesse”. Disponível em http://politicos.br101.org/discurso-lula-cupula-dos-chefes-de-estado-do-mercosul.html. Acesso em 09/07/2008.

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passa por crises sucessivas desde a sua criação em 1991. Para Guimarães (2005,

p.387),

O MERCOSUL tem sido apresentado como um instrumento político do Brasil (...) para defender seus interesses e promover seus objetivos em uma nova (hostil, perigosa ou benigna, como prefira) ordem mundial.

Por meio dessa atuação ativa em busca do aprimoramento do MERCOSUL, tendo

em vista ainda os esforços brasileiros para a adesão plena da Venezuela a ele, em

2006, nota-se o interesse de manter a disposição atual do bloco, no qual o Brasil

ocupa a liderança, e garantir os benefícios advindos dela, mesmo tendo de arcar

com os custos de ser o ator preponderante (custos da liderança), uma vez que essa

estratégia seria a mais adequada para angariar maiores possibilidades no sistema

internacional. A atração de novos membros para o bloco é interessante para ampliar

o espaço de atuação do MERCOSUL, aumentando, em consequência, a

preponderância do Brasil na região, já que o país é o líder do bloco. Em suma,

o MERCOSUL é considerado um projeto de importância pivotal tanto para a liderança regional brasileira como para avalizar a inserção do Brasil na definição de uma política sul-americana, pois é através dele que o Brasil consegue instrumentalizar o seu papel de liderança e de potência regional, dando um significado político e geoestratégico que supera, em ampla medida, seu sentido econômico e comercial (VITTE; SENHORAS, 2006, p.6).

A partir da revitalização do MERCOSUL, via inovações como foi descrito acima, os

governos Lula tentaram projetar a liderança brasileira na América do Sul, como um

país intermediário, buscando a criação de regimes (no caso, o fortalecimento da

legitimidade de um bloco comercial que já existia) para se inserir como país

preponderante do mesmo, e assim representá-lo no sistema internacional, mesmo

que isso exija o ônus de arcar com problemas internos dos países-membros e até

mesmo com a eventual disputa pela liderança com a Venezuela de Hugo Chávez

caso o país se torne membro efetivo, de fato, no MERCOSUL.

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Já em relação à criação da CASA/UNASUL,72 a partir da Declaração de Cuzco em

2004, o governo Lula tem demonstrado interesse em desenvolvê-la, apesar dos

objetivos audaciosos e complexos que a envolvem. A finalidade do acordo, como já

foi exposto no capítulo anterior, é criar uma zona de livre comércio continental,

unindo os membros do MERCOSUL e da CAN, além de países como Chile, Guiana

e Suriname. Em longo prazo, pretende-se evoluir o bloco nos moldes da União

Europeia, com moeda única, articulando as economias sul-americanas para um

regime único. Para Moniz Bandeira (2006b, p.293-294),

o Brasil, ao encorajar o lançamento da Comunidade Sul-Americana de Nações (...), teve um objetivo estratégico, visando tornar (...) uma potência mundial, não só econômica mas também política. Sua dimensão ultrapassava, de longe, o caráter meramente comercial. O Brasil (...) compreendera que a consecução de tal objetivo passava pela sua integração com (...) todos os demais países da América do Sul. E a união dos demais países da América do Sul com o Brasil (...), em uma comunidade econômica e política, conformaria uma grande potência, com enorme peso no cenário mundial.

Os interesses brasileiros nesse bloco, que ainda não se consolidou em zona de livre

comércio, são semelhantes àqueles explicitados quando analisamos os objetivos do

governo Lula para o MERCOSUL, ou seja, conquistar posição preponderante

perante o bloco para afirmar a liderança regional brasileira. Nesse sentido, a busca

pela integração dos países via regimes internacionais (uma das características dos

países intermediários) é mais uma vez elucidada nos objetivos do governo Lula para

a América do Sul, o que corrobora a tese de Lima (1990, p.7) acerca do padrão de

comportamento desses países no sistema internacional. E, no caso específico da

UNASUL, o Brasil se aproveitou da existência prévia de dois blocos já consolidados

institucionalmente (o MERCOSUL e a CAN) para criar um terceiro arranjo, o que

facilita a sua concretização, uma vez que os países já se encontram integrados:

A existência de esquemas já estabelecidos de integração sub-regional parece prestar contribuição relevante à conformação da CSAN [Comunidade Sul-Americana de Nações – atual UNASUL]. A integração regional por meio da articulação de processos menores consiste em uma abordagem prudente, que se beneficia de esforços anteriores e resultados já obtidos. A estratégia empregada pela

72 Em 2004, a partir da Declaração de Cuzco, foi firmado o acordo para a consolidação da CASA. Porém, em maio de 2008 a comunidade passou a se chamar UNASUL, por sugestão de Hugo Chávez, presidente da Venezuela.

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CSAN, dessa forma, parece adequada: caminhos sub-regionais (ou mesmo bilaterais na região) trilhados pela geografia, pela tradição, pela história, precisam ser explorados na conformação da integração regional (PRAZERES, 2006, p.50).

Portanto, o processo de criação da UNASUL é mais simples, do ponto de vista

institucional, que o processo de consolidação do MERCOSUL, que desde 1991

existe formalmente, mas até hoje enfrenta problemas estruturais como a tarifa

externa comum, por exemplo. No entanto, existe uma diferenciação clara entre os

dois blocos:

o Mercosul é um processo de integração que já se encontra em estágio mais avançado, mais profundo. Na América do Sul, nós temos o processo de integração possível, que parte do reconhecimento que os países têm políticas comerciais diversas. Não é que as políticas comerciais dos membros do Mercosul sejam idênticas. Mas a nossa estrutura tarifária, com algumas exceções, é razoavelmente homogênea. (...). Na Unasul, nós não temos isso, mas temos um acordo de livre comércio, temos a infraestrutura e temos uma estrutura política que permite também uma cooperação intensa em algumas áreas, como defesa, energia, saúde, educação, cultura, etc. (AMORIM, 2009, p. 19).

Para o Brasil, a iniciativa de lançar a UNASUL era menos custosa, portanto, do

ponto de vista do ônus da liderança de um bloco regional. A tentativa de se inserir

como um free rider, sempre que possível, é uma das características

comportamentais dos países intermediários. O Brasil, ao se posicionar como líder

também da UNASUL, garantiria a proeminência regional e poderia se lançar no

sistema internacional como o representante do novo bloco, o que lhe traria mais

poder. Sobre a UNASUL, Oliveira (2010, p.6) ainda argumenta que

o projeto da Comunidade Sul-Americana de Nações, hoje UNASUL, é o recurso mais relevante desse polo regional. Esta condição de liderança regional permitiria ainda ao Brasil um desempenho mais ativo nos foros internacionais e o exercício de um papel relevante (...) regional e global.

Há, nessa intensa preocupação brasileira em garantir a liderança regional, dois

fatores simbólicos: um deles corresponde à percepção subjetiva que os países têm a

respeito de seu papel no mundo. Para Sennes (2002), um instrumento de

caracterização dos países intermediários é a sua própria intuição, ou seja, os países

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intermediários se sentem como tal e, inclusive, justificam sua escolhas baseando-se

nessa premissa. Nesse sentido, o Brasil, ao se auto-caracterizar como país

intermediário, age de acordo com as possibilidades e interesses dessa categoria,

legitimando seu interesse de se tornar líder regional por meio de sua posição no

mundo.

O segundo elemento simbólico que contribui para a pretensão brasileira de exercer a

liderança regional para atingir melhor acesso no sistema internacional é a percepção

do país como hegemon da América do Sul, em termos de identidade. O Brasil, por

questões geográficas (tamanho do país e aspectos populacionais), históricas

(colonização portuguesa) e econômicas (o Brasil possui os melhores índices

econômicos da região, e os vizinhos dependem economicamente do país, o que

sugere sua preponderância financeira), se diferencia dos demais países sul-

americanos, o que, cognitivamente, lhe confere o status de líder “natural”, tanto pelo

Brasil quanto pelos países vizinhos. Esses aspectos já foram, inclusive, elucidados

na introdução do primeiro capítulo da tese.

Para Mello e Silva (1995, p.34), tal compreensão da liderança brasileira corresponde

a

uma determinada percepção da inserção regional e internacional do país, ou seja, do papel a ser desempenhado pelo Brasil no continente e no mundo (...). A aspiração de converter o país num ator relevante na política internacional e a crença em uma especificidade frente aos demais países latino-americanos têm-se apresentado como temas relativamente permanentes da cultura política das elites brasileiras. A isso acrescentaríamos que, de fato, em suas origens históricas estes dois temas se apresentaram de forma profundamente interligada, impondo uma dualidade constante entre uma identidade americana (outrora europeia) e uma identidade latino-americana, como também entre as alianças estratégicas a serem desenvolvidas seja com a potência hegemônica, seja com os vizinhos continentais.

Percebe-se, assim, que a identidade brasileira,73 desde o descobrimento do país,

está centrada na compreensão de que o país se diferencia dos demais vizinhos, em

vários fatores, o que sugere a superioridade e eventual liderança frente aos demais.

73 Santos (2005) faz uma análise minuciosa a respeito da relação entre identidade brasileira e espaço ocupado pelo país na América do Sul.

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Essa noção está presente na cultura política brasileira, e também na visão de alguns

países vizinhos, o que reforça essa liderança natural brasileira e favorece o anseio

do governo pela consolidação dessa posição. Para Lima e Hirst (2009, pp. 43-44),

(...) uma das maiores aspirações da política externa brasileira tem sido o reconhecimento internacional condizente com a crença de que o país deveria assumir seu papel ‘natural’ de ‘grande país’ nas questões mundiais. O anseio brasileiro por influenciar regras e regimes internacionais e ser considerado um ator importante encontrou expressão e formas brandas de poder (...). O pleito por maior influência está associado a outros atributos clássicos do poder, como território, população e perfil econômico. A localização do país em um ambiente regional relativamente pacífico, a solução antecipada de suas demandas territoriais e disputas fronteiriças, e sua consequente posição de defensor do status quo regional também ajudam a explicar a aspiração a um papel internacional de mediador.

Um conceito que pode ser empregado para analisar o desempenho da política

exterior dos governos Lula para a América do Sul é o de soft power, ou poder

brando, na tradução feita na citação acima. Esse poder, cuja conceituação foi feita, a

princípio, por Joseph Nye (1990), corresponderia à habilidade de alcançar objetivos

nacionais por meios não tradicionais, como a influência cognitiva, os padrões

culturais e de identidade. Em contraposição a esse poder brando está o hard power,

ou poder duro, que seriam as formas clássicas de um país exercer poder sobre

outro, como sanções econômicas ou coerção militar. Tal denominação, já difundida

nas relações internacionais, pode ser útil para avaliar a capacidade de liderança

regional pelo Brasil. Assim:

Fully defined, soft power is the ability to affect others through the co-optive means of framing the agenda, persuading, and eliciting positive attraction in order to obtain preferred outcomes (NYE, 2011, pp. 20-21).

Dessa forma, para Nye (2011, p. 23) o ideal é que os países consigam unir

elementos de poder brando e poder duro, formando assim o que denomina smart

power, definido pelo autor como sendo “the ability to combine hard and soft power

resources into effective strategies” (NYE, 2011, pp. 22-23). Segundo ele, potências

emergentes como o Brasil podem se utilizar desse artifício para conquistar mais

poder, o que é interessante do ponto de vista estratégico de angariar um papel mais

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relevante no sistema internacional. A partir da formulação de regimes, por exemplo,

um país intermediário como o Brasil consegue estabelecer normas comuns que

favoreçam seu poder brando, influenciando outros países sem a coerção pelas

armas ou via financiamentos. Nesse sentido, inclusive, Nye (1990) ressalta que o

poder brando poderia ser tanto ou mais importante que o poder duro. Esses regimes

podem ser tanto regionais, como os exemplos discutidos nesse capítulo

(MERCOSUL e UNASUL) quanto multilaterais, como o fórum IBAS (Índia, Brasil e

África do Sul, criado em 2003) e o G-20 (articulado para fortalecer o argumento das

economias emergentes, dependentes das exportações de suas commodities,

durante a Rodada Doha da OMC). O poder brando consegue, por meios

alternativos, legitimar um poder que não se exerce pelas vias tradicionais.

Um esquema adaptado de Nye (2004, p. 8) pode elucidar as diferenças entre o

poder duro e o poder brando, de acordo com o comportamento e os recursos

utilizados pelos agentes (países) para demonstrar poder:

Poder Duro

(hard power) Poder Brando (soft power)

Comportamento

Comando

Coerção

Indução

Cooptação

Formação de regimes

Atração

Recursos utilizados Força militar

Sanções

econômicas

Instituições Fóruns

Valores culturais

Figura 2 – Dimensões de poder segundo Joseph Nye (2 004)

Fonte: Elaboração própria baseada em NYE, Joseph. Soft Power- the means to success in world politics . New York: Public Affairs, 2004

Como pode ser observado, há diferenças claras entre as dimensões de poder de um

país. No caso do Brasil, que é um país intermediário, existe a possibilidade de unir

os dois tipos de recursos existentes, o que amplia a garantia de exercer liderança na

América do Sul. É interessante notar, além dessa possibilidade, que o poder brando

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é garantido exatamente pelos meios comportamentais buscados pelos países

intermediários: através da criação dos regimes internacionais.

Um exemplo interessante da utilização do poder brando brasileiro na América do Sul

é a criação, em 12 de janeiro de 2010, da Universidade Federal da Integração

Latino-Americana74 (UNILA). A universidade tem sede em Foz do Iguaçu, próximo à

Tríplice Fronteira, e recebe alunos brasileiros e dos demais países do subcontinente

para cursos superiores cujas aulas são oferecidas em português e espanhol, a fim

de facilitar a integração. Um segundo campus está sendo construído, com

financiamento brasileiro, o que indica o sucesso da iniciativa e a evolução do poder

brando a partir da educação superior sul-americana. Através da criação de

mecanismos de influência como esse, o Brasil aliou traços de poder brando e poder

duro, ao financiar obras de países vizinhos (pelo BNDES) e manter um comércio

superavitário com todos os países vizinhos (exceto Bolívia).

Outro exemplo de uso do poder brando para legitimar a liderança regional foi citado

no discurso da primeira reunião dos presidentes dos países-membros da UNASUL,

em 2005:

(...) Brasil tomou uma medida pioneira nessa direção, ao aprovar a lei que torna obrigatório o ensino do espanhol em nossas escolas. As gerações futuras de brasileiros terão o espanhol como segunda língua, assim como terão a América do Sul como nossa segunda pátria (LULA, 2005).

O governo brasileiro, ao propor a obrigatoriedade do ensino da língua espanhola nas

escolas, tenta administrar a barreira lingüística enfrentada pelo Brasil no

subcontinente, fazendo disso, aliás, um instrumento de aproximação dos países

vizinhos, ao afirmar que o país está interessado em integrar as futuras gerações ao

eliminar uma dificuldade existente, historicamente, pela colonização portuguesa. O

poder brando está presente na afirmação de que os brasileiros terão a América do

74Para mais informações, consultar http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2010/lei/L12189.htm Acesso em 20/01/2012

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Sul como segunda pátria a partir de políticas públicas internas que afetam

diretamente a integração regional.

Enfim, fica claro que o governo brasileiro tem se esforçado no sentido de garantir a

legitimação da posição de líder regional, seja a partir de iniciativas multilaterais,

envolvendo instituições, seja através do poder brando mesclado às possibilidades de

poder duro que o país possui.

Em suma, a política externa dos governos prioriza a integração regional, por meio da

reformulação do MERCOSUL (fortalecimento do bloco e apoio à entrada de novos

membros) e de iniciativas como a criação da UNASUL, em 2006, para unir países-

membros do MERCOSUL e da CAN, além de outros países sul-americanos que não

participam de nenhum bloco. Tais escolhas brasileiras estão vinculadas com a

posição que o país ocupa no sistema internacional, como país intermediário, e a

posição que pretende alcançar, ao se tornar a referência sul-americana para o

mundo (com a liderança regional). De maneira sucinta, Amorim (2009, p. 22)

argumenta que:

(...) há três níveis de integração: (1) o Mercosul, uma união aduaneira, com Parlamento, e já com políticas comuns em muitos aspectos; (2) a América do Sul, que vive um processo de integração bastante forte. Do ponto de vista da política externa (...) ela tem um papel tão grande (...) que o do Mercosul, porque os grandes temas que existem na região, em geral, transcendem o aspecto do Mercosul; e (3) em um nível um pouco menos cerrado, há o conjunto da América Latina e Caribe, em que se reconhece os diferentes graus de desenvolvimento entre os países.

A vinculação entre os objetivos regionais do governo brasileiro e o padrão

comportamental dos países intermediários permite a análise das reais intenções do

país, assim como define o Brasil como país intermediário, inserindo-o num modelo

explanatório utilizado nas análises de política externa. A inclusão do caráter

cognitivo da liderança regional contribui para uma análise mais robusta dos objetivos

brasileiros, que são definidos de acordo com os interesses do país e de fatores

subjetivos, como a cultura política e a visão de mundo a respeito de uma posição

preponderante “natural”, dentro da América do Sul.

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Certamente tal análise apresenta limitações, uma vez que a adequação de um

estudo de caso específico (política de integração regional dos governos Lula via

blocos) a um modelo conceitual complexo como os países intermediários não atende

plenamente a todos os aspectos de estudo. Porém, o objetivo central do presente

capítulo foi demonstrar a possibilidade de definir os interesses por trás da prioridade

de integração regional da política externa do governo atual por meio da utilização de

um modelo conceitual de análise. Os problemas e eventuais falhas contidas no

estudo supõem que as análises de política externa devem utilizar vários modelos e

tipologias, para se tornarem mais sólidas.

Entretanto, propõe-se uma representação esquemática da utilização do padrão

comportamental dos países intermediários como base explicativa da preferência da

política exterior brasileira atual pela consolidação de regimes na América do Sul,

tendo como fundamento o modelo proposto por Lima (1990), o qual registra a opção

pelos regimes internacionais por essa categoria de países, quando possível. Nesse

caso, adota-se a premissa de que o incentivo do governo brasileiro à integração sul-

americana via blocos, como o MERCOSUL e a UNASUL, é justificada pela

possibilidade de transpor a posição hegemônica que o Brasil ocupa nesses blocos

(basicamente por questões de natureza econômica, por se tratarem de blocos

econômicos) para além das fronteiras dos acordos, conquistando, assim, um papel

mais influente no sistema internacional graças à preponderância regional e

representação dos interesses dos países vizinhos nesse sistema. Deste modo, tem-

se:

� Consolidação de regimes na América do Sul

� � Liderança

regional do Brasil

� � Projeção no

sistema internacional

Figura 3 – Modelo representativo da atuação diplomá tica regional na era Lula

Fonte: Elaboração própria

No modelo, deduz-se que a ampliação do número de regimes (blocos) na América

do Sul implica na consolidação da liderança regional brasileira, ao transpor o poder

que possui em tais instituições para o nível global, aumentando assim a projeção do

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país no sistema internacional, graças à ratificação/aceitação, pelos países vizinhos,

da superioridade brasileira em representar os interesses regionais comuns. Tal

aprovação pode ser dada por diversos fatores, como o proveito do ônus da liderança

por parte daqueles países mais fracos (free riders), ou mesmo as garantias de

benefício que os vizinhos terão ao aceitar tal disposição de poder regional. A

preferência do Brasil, nesse caso, pode ser justificada pela estabilidade econômica

que o país pode conduzir. A teoria que comprova o argumento75 implica

que a concentração ou assimetria de poder conduz a uma maior estabilidade do sistema internacional; inversamente, a fragmentação do poder está associada ao declínio dos regimes internacionais (LIMA, 1990, p.14).

Inclusive, de acordo com esse preceito, a ausência de um membro preponderante

em um bloco como o MERCOSUL ou como a UNASUL pode levar ao fim do mesmo,

já que não interessaria, em termos de benefícios usufruídos, aos elementos caronas

e ao país dominante a participação no regime. A crise econômica mundial e as

consequentes crises internas enfrentadas pelos países-membros dos blocos sul-

americanos faz com que a tendência seja a execução de acordos bilaterais, sem o

envolvimento em regimes como o caso do MERCOSUL e UNASUL. Por que, então,

eles sobrevivem? A resposta seria o engajamento por conta dos benefícios

garantidos pelo líder, além do fortalecimento dos interesses comuns no sistema

internacional.

Por outro lado, é interessante para o Brasil manter e criar novos regimes no

subcontinente, já que o interesse primordial é a liderança regional. Mas ao analisar a

política externa dos governos Lula para a América do Sul, percebe-se que a

priorização da integração regional revela outras intenções, muito além da tentativa

de reformular o MERCOSUL e intensificar as relações entre os países vizinhos. O

governo brasileiro, ao pretender ampliar o espaço do país no mundo, em busca de

maior projeção internacional, encontra na consolidação da liderança regional a

maneira mais direta de galgar posições no sistema internacional, uma vez que o

75 Teoria da Estabilidade Hegemônica, desenvolvida por autores como KINDLEBERGER e KRASNER. Para mais informações, consultar KINDLEBERGER, Charles. Systems of international economic organization. In: CALLEO, David (org.). Money and the coming of world order . New York: New York University Press, 1976; e KRASNER, Stephen. State power and the structure of international trade. World Politics. New York, v. 28, n. 3, apr. 1976.

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poder de negociação do país seria maior, já que representaria os interesses sul-

americanos. Para isso, conta com a atuação regional como grande trunfo de sua

política externa. No entanto,

não é absurdo se supor que a legação do subsistema da América do Sul em níveis secundários de priorização, isto sim, implicaria graves custos à inserção internacional brasileira. No entanto, uma presença que seja percebida positivamente por nossos vizinhos deverá contornar alguns persistentes entraves. Nesse quesito, o trunfo maior com que conta o Brasil é o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, líder carismático, de grande apelo popular e ótimos relacionamentos pessoais com os seus homólogos por toda a América. O desafio, portanto, é não inspirar medo e desconfiança em nuestros hermanos sudamericanos (LOPES; VELLOZO JUNIOR, 2004, p.2).

Os países vizinhos, ao perceberem a instrumentalização do subcontinente para

angariar interesses terceiros por parte do Brasil (sendo o representante da América

do Sul, o país tem mais poder no sistema internacional), muitas vezes adotam uma

postura contrária ao apoio às instituições lideradas pelo Brasil, como foi o caso da

UNASUL, quando Venezuela, Equador e Bolívia, cujos representantes, insatisfeitos

com o papel preponderante do Brasil no bloco, não permitiram ao governo Lula

definir as bases do que viria a ser a união sul-americana de dois blocos

(MERCOSUL e CAN). Assim,

se por um lado o Brasil tem legitimidade na sua atuação regional, uma extrapolação do uso do seu poder hegemônico colocando em risco a soberania dos países vizinhos poderia ser limitada pela própria atuação internacional restrita. Ou seja, para nossos parceiros, haverá sempre a possibilidade de recorrer a órgãos multilaterais e instituições internacionais caso o exercício da hegemonia brasileira fira os seus interesses nacionais. Isso significa que a atuação restrita do Brasil no âmbito internacional dificulta o estabelecimento do mesmo tipo de legitimidade adquirida no plano regional (OLIVEIRA; ONUKI, 2000).

O maior desafio, portanto, é legitimar a liderança brasileira e garantir o apoio e

aceitação dos países vizinhos à preponderância brasileira. Para o PT, em

documento oficial, a união dos países em organizações regionais já seria suficiente

para alterar a tônica das relações de poder no mundo:

Embora frequentemente haja diferentes interesses entre este leque de países, a iniciativa de reuni-los para tratar de alguns temas e

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demandas em comum começa a contribuir para mudar o desenho do poder no sistema internacional (PARTIDO DOS TRABALHADORES, 2010, § 61).

Embora haja resistência, por parte de alguns governantes, em aceitar a liderança

regional brasileira, existe a comunhão de interesses comuns entre os países sul-

americanos, o que, de fato, pode contribuir para a integração dos mesmos (e o

consequente fortalecimento dos blocos, como MERCOSUL e UNASUL) e para um

espaço mais relevante da região no sistema internacional, por meio de instituições

fortes e na defesa da América do Sul como espaço importante da economia mundial.

A liderança do Brasil, assim, não é tida como um aspecto negativo. Nesse sentido,

a coincidência de percepções positivas, tanto no que diz respeito à participação do Brasil na criação de órgãos regionais, quanto na defesa dos interesses da região, e simultaneamente a percepção de que a ação do país no plano internacional é bastante restrita mostra que os vizinhos identificam na política externa brasileira, uma prioridade voltada ao subcontinente e, consequentemente, aprovam o teor dessa liderança, o que contribui para a sua legitimação (VITTE; SENHORAS, 2006).

Como já foi analisada, a liderança regional brasileira é importante para os países

vizinhos, principalmente aqueles que se aproveitam da situação de free riders para

apoiarem a posição do Brasil em busca de interesses próprios. É nesse sentido que

a política externa brasileira, nos governos Lula, foi conduzida, tentando, sempre que

possível, a legitimação do seu papel de líder. No entanto, uma das problemáticas

dessa atuação é que:

assumir o papel de uma potência regional tem gerado demandas sem precedentes sobre o Brasil, e parece requerer capacidades que vão além das inquestionáveis habilidades diplomáticas do Itamaraty (LIMA; HIRST, 2009, p. 60).

Um dos problemas enfrentados pela busca de legitimidade da liderança regional já

foi retratado no capítulo anterior: a cobrança, pelos países vizinhos, de uma postura

por parte do Brasil que os favoreça, seja em contendas ou em financiamentos de

obras internas. Porém, o ônus da liderança exige que o governo brasileiro ceda,

quando é interessante, para evitar movimentos contrários à posição preponderante

do Brasil.

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Assim, por meio da análise dos interesses regionais brasileiros a partir do padrão

comportamental dos países intermediários, tem-se que o governo Lula busca a

ampliação dos regimes na América do Sul para expandir sua preponderância, e

transferir a posição que neles ocupa para o plano global, buscando com isso

ultrapassar a posição de país intermediário e se tornar um global player mais

fortalecido no cenário internacional.

Embora seja complexo estabelecer um modelo analítico que comprove essa

hipótese, desenvolvida ao longo de toda a tese, a tentativa de envolver aspectos

históricos da importância da América do Sul na diplomacia do Brasil (para verificar

como foi sendo construído o papel preponderante do país na região), além da

análise das ações de política externa para os países vizinhos, nos governos Lula,

são componentes que respondem ao questionamento que foi feito. O interesse do

presente capítulo é demonstrar que a hipótese pode ser comprovada e ratificada

também por elementos teóricos clássicos da ciência política, como a lógica da ação

coletiva e a definição dos países intermediários, embora a última não seja difundida

nas relações internacionais.

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5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

“Sintetizando: em função da sua geografia, de sua experiência histórica e da linha de continuidade de sua ação diplomática, o Brasil está à vontade e em casa com o componente sul-americano de sua identidade internacional, que é uma ‘força profunda’, de natureza positiva, na sua política externa” (LAFER, 2001, p. 62).

Por meio da política externa, os países podem estabelecer relações de conflito e

cooperação entre eles, determinando seus papéis no mundo e estabelecendo as

suas ações no sistema internacional tendo em vista os interesses particulares.

Dessa forma, estudar como um determinado país se comporta no panorama

internacional é essencial para se entender o governo em sua totalidade, à medida

que a política externa faz parte de um projeto nacional mais amplo. Quando as

ações diplomáticas de um governo são analisadas, é possível verificar como seus

atores percebem o papel e a influência do país no sistema internacional. Assim, por

meio do estudo das políticas adotadas pelo Brasil em âmbito regional durante os

mandatos de Lula, foram constatados os reais interesses regionais, quando se

analisaram as medidas diplomáticas cujo interesse seria aumentar a influência

brasileira na América do Sul. A questão da liderança regional do Brasil é um dos

mais polêmicos temas da diplomacia do governo Lula, e a análise das ações do país

nesse sentido determinam como as possibilidades regionais são percebidas pelo

governo.

A análise da política externa dos governos Lula traz consigo alguns princípios a

serem estabelecidos durante a pesquisa, como o esclarecimento das intenções do

Brasil nas escolhas diplomáticas para a região, além da indagação a respeito dos

limites e possibilidades do Brasil no cenário internacional atual, de modo a

contextualizar as ações do país.

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Entretanto, essa realidade nem sempre esteve presente entre os interesses

diplomáticos brasileiros. A partir da análise da política externa brasileira a respeito

dos principais episódios envolvendo a América do Sul pode-se afirmar que os

objetivos do Brasil na região (e o papel que a América do Sul ocupou na diplomacia

brasileira) foram se desenvolvendo de acordo com as seguintes fases:

1) A primeira fase da diplomacia regional brasileira se deu a partir do processo

de colonização portuguesa, cujo interesse primordial na época era a conquista de

território pela colônia. No entanto, não se pode analisar esse período em termos de

diplomacia brasileira, já que na realidade eram ações diplomáticas portuguesas.

Após a independência brasileira de Portugal, o objetivo diplomático do Brasil Império

foi constituir as fronteiras territoriais do país, o que deu origem a conflitos

envolvendo países vizinhos, como o conflito cisplatino e a Guerra do Paraguai.

Nesses incidentes, os interesses dos países envolvidos eram garantir ou conquistar

território, o que caracteriza a diplomacia no período pós-colonização.

2) A segunda fase de investidas regionais da política externa brasileira teve

início com a proclamação da República, em 1889, e a chancelaria de Rio Branco

(1902-1912), cujos resultados moldaram a diplomacia brasileira e a influenciam

ainda hoje. Nesse período, os interesses brasileiros iam de encontro aos objetivos

das oligarquias nacionais (em especial a elite cafeeira) de desenvolvimento

econômico do país. Embora conflitos territoriais tenham ocorrido, como a questão do

Acre, a principal contribuição para a integração regional do período foi a tentativa de

estabelecer um acordo comercial envolvendo a Argentina e o Chile, conhecido como

Pacto ABC, mas que não foi consolidado. O período em questão não deu prioridade

às relações com os países vizinhos, ainda que a estratégia regional fosse realidade

na chancelaria de Rio Branco.

3) O terceiro momento da política externa brasileira corresponde à era Vargas,

em que a estratégia utilizada foi a adoção da diplomacia pendular como forma de

angariar os interesses desenvolvimentistas brasileiros no período de guerra

(primeiramente entre EUA e Alemanha, e depois durante a Guerra Fria, entre EUA e

URSS). O governo brasileiro adotou, para a América do Sul, o discurso conciliatório

de solidariedade entre os povos, cujo objetivo era representar os países da região

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no sistema internacional, como uma espécie de interlocução entre a América do Sul

e as grandes potências. Houve nova tentativa, em 1941, de resgatar o acordo

comercial entre Argentina, Brasil e Chile, que foi frustrada após os ataques

japoneses a Pearl Harbor.

4) A próxima fase da política externa brasileira, após o interregno Vargas e a

diplomacia pendular, foi a consolidação da política externa independente, a partir do

governo Jânio. Porém, no governo Kubitschek as iniciativas em prol da integração

regional merecem destaque: a tentativa de criação da OPA, em 1958, demonstra os

interesses brasileiros de desenvolvimento da América do Sul. Ainda que a OPA não

tenha sido concretizada, a iniciativa contribuiu para a criação do BID e da extinta

ALALC (substituída pela ALADI nos anos 80).

5) A política externa independente, cunhada no governo de João Goulart, a partir

de 1961, foi sendo aprimorada desde a diplomacia desenvolvimentista de

Kubitschek. As iniciativas regionais desse paradigma foram, mais uma vez, o papel

preponderante entre os países vizinhos, como uma estratégia para se tornar porta-

voz dos interesses conjuntos desses países, ainda que sem o consentimento dos

mesmos.

6) Durante o Regime Militar, a diplomacia brasileira foi pautada pela lógica dos

círculos concêntricos, numa alusão à Escola Superior de Guerra, cujo trampolim

inicial para a conquista de um papel preponderante no sistema internacional era a

liderança regional. Nesse sentido, a política externa militar foi caracterizada por

momentos de aproximação com os países vizinhos, como no caso da construção da

usina de Itaipu em 1973, e de iniciativas em prol dos EUA (alinhamento automático),

como a intervenção na República Dominicana e o apoio ao golpe que derrubou

Allende, no Chile.

7) Com a redemocratização, uma nova fase da política externa brasileira foi

inaugurada, com especial ênfase nas relações regionais, em um contexto

internacional marcado pelo fim da Guerra Fria e a transformação das relações de

poder. A América do Sul foi finalmente incorporada como prioridade máxima da

diplomacia nacional, presente inclusive na Constituição de 1985. A criação do

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MERCOSUL intensificou o mercado regional, o que integrou melhor os países, que

agora não disputavam territórios. A hegemonia brasileira na região possibilitou ao

país a posição de interlocutor entre o sistema internacional e os interesses sul-

americanos, o que contribuiu para a imagem do Brasil no mundo.

Portanto, uma das hipóteses que foi comprovada foi que a integração sul-americana

foi crescente nas últimas décadas, devido às investidas como a criação de

organismos regionais e aos interesses político-econômicos dos países, sobretudo

após a criação do MERCOSUL, na década de 1990, o que fortaleceu as relações

comerciais regionais e ampliou as possibilidades da América do Sul no sistema

internacional, com a consolidação de um bloco regional. Outra igualmente ratificada

foi que o Brasil, um dos países mais expressivos da América do Sul tem,

historicamente, a integração regional como um dos pilares de sua política exterior. E,

durante o período governado por Lula essa temática foi igualmente acentuada,

somada ao interesse de conquistar a liderança regional por meio de iniciativas

brasileiras na região, seja no empenho para revitalizar o MERCOSUL ou nas

relações com países vizinhos.

Assim, após a percepção de como e quando foi se formando a regionalização da

política externa brasileira, o segundo momento da presente tese teve como objetivo

demonstrar, na prática, como se deu a prioridade dada à integração regional durante

os dois governos Lula, por meio de estudos de caso envolvendo o Brasil e os países

vizinhos e as principais contendas entre os mesmos. Foi interessante notar o esforço

diplomático no sentido de manter a posição de neutralidade perante os problemas

regionais, com a intenção de preservar o papel de líder por fatores naturais

históricos, econômicos e políticos. Durante os dois mandatos, a liderança regional foi

mantida como grande prioridade da política externa brasileira, embora tenha

encontrado resistências por parte de governantes dos países vizinhos insatisfeitos

com a possível representação, por parte do Brasil, do subcontinente no sistema

internacional. Nesse sentido, tiveram destaque as iniciativas de criação ou mesmo

revitalização de regimes (blocos – MERCOSUL e UNASUL) na América do Sul, com

o intuito de ampliar a integração regional e fortalecer ainda mais a presença

brasileira na região.

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Durante os oito anos de mandato, a política externa para a América do Sul foi

priorizada com base no projeto de liderança regional. Para isso, as atitudes e

posições brasileiras foram tomadas tendo em vista os limites e as reais aspirações

do país. Em alguns momentos, como foi retratado, o governo brasileiro optou por

medidas que desagradaram a opinião pública interna, mas que regionalmente

contribuiram, ao menos em teoria, para uma maior aceitação da preponderância

brasileira por parte dos países vizinhos. Em outras ocasiões, os países exigiram uma

postura mais ativa do Brasil, a fim de provar a liderança e ao mesmo tempo

consolidar interesses particulares. Ou seja: a política externa brasileira dos governos

Lula foi voltada para a articulação do papel de líder regional para angariar ao país

mais relevância no sistema internacional por meio da representação da América do

Sul (os interesses comuns entre os países) no mundo.

Portanto, a última hipótese comprovada foi que governo brasileiro tentou constituir

uma base de legitimidade para a consolidação de uma posição de liderança na

América do Sul, aspirando, em última instância, a um papel mais relevante no

cenário internacional. As escolhas diplomáticas podem ser relacionadas ao propósito

político de angariar apoio à supremacia regional brasileira, o qual se relaciona à

pretensão de promover a imagem do país no sistema internacional.

Sob esse aspecto, o último capítulo correspondeu a uma análise do Brasil de Lula

sob a lógica de um país intermediário, utilizando-se de elementos teóricos para criar

uma espécie de modelagem para interpretar as hipóteses contidas na presente tese.

O objetivo foi validar os questionamentos resultantes da análise histórica e das

ações diplomáticas dos governos Lula para a América do Sul a partir da lógica da

ação coletiva aplicada aos chamados países intermediários. Nesse sentido, a

inserção internacional do Brasil foi analisada através das características conceituais

dos países intermediários, a fim de justificar e explicar as motivações das ações

diplomáticas do Brasil em relação, especificamente, ao projeto de reformulação do

MERCOSUL e da criação da UNASUL como forma de ampliar os regimes

internacionais sul-americanos e consequentemente transpor o papel que ocupa

neles para o cenário internacional, em forma de poder.

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Dessa maneira, os capítulos tiveram três diferentes tipos de análise, resultando em

um estudo que une interpretações diferentes, do ponto de vista metodológico,

acerca de uma mesma temática. Tendo em vista tais perspectivas de análise, pode-

se assegurar a validade da pesquisa e resultados coerentes com os seus propósitos.

Através do estudo pormenorizado das ações diplomáticas de Lula para a América do

Sul, é possível esboçar a relação entre as mesmas e o interesse nacional

fundamental do governo petista: a conquista de maior espaço no sistema global, por

meio da liderança regional e a consequente ampliação do papel do Brasil no mundo.

Esse interesse brasileiro precisa, no entanto, ser revestido de maior pragmatismo no

aspecto econômico, para que o país possa desfrutar da posição de líder regional

também pelo viés comercial. A crise financeira de 2008 ecoou na América do Sul,

uma vez que as os preços das commodities foram desvalorizados devido à perda de

dinamismo das grandes potências (EUA e União Européia), levando à entrada da

China no subcontinente, como importadora dos produtos agrícolas, o que foi

acompanhado do aumento da exportação de produtos de maior valor agregado

brasileiros aos países vizinhos. Porém, devido a problemas estruturais da região, a

integração física constitui no principal limitador da ampliação desse mercado, que

seria mais uma área de demonstração de liderança regional e, por conseguinte,

maior poder no sistema internacional.

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