JOAQUIM MURTINHO - Dois Relatórios

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  • 7/25/2019 JOAQUIM MURTINHO - Dois Relatrios

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    M N I S T B R I O D A I N D U S T R I A , V I A O E O B R A S P U B L I C A S

    R E L A T O R I O

    AP RE SE NTADO

    AO

    P R E S I D E N T E 0 1 R E P U B L I C A D O S E S T A D O S U N I D O S 0 0 B R A S I LP B L O

    l i . U S T R O D E E S T A D O D O S 5 E G 0 C I 0 S D A I M I S T R I A , V U W E O I f f L A S K B L i f A S

    E M M A I O D E 1897

    9o DA RE P U B LI CA

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    Pags.

    Introduco............................................... ............................... XI a XLUI

    P r i m e ir a p a r t e I n d u str ia ^ A g r i c u l tu r a e C om m ercio

    Industria pastorial. ............................................................................... 3*

    Marca e registro de anim aes .......................................... 4

    Herva-matle ............................................................................

    Engenhos centraes . . .................................................................... 6

    Jardim Botnico ..

    ............................................... " . . . . . 6

    Patentes de invenSo......................................................... 8

    Marcas de fabrica e de commercio.................................... 30

    Sociedades anonymas . . . . . . . . . . . . . . 30

    S e g u n d a p a r t e I m m ig r a o e C o lo n iz a o

    Introdiico de immigrantes . . . . . . . . . . . . 35

    Ncleos coloniaes.........................................................

    T e r c eir a p a r te M e lh o r am e n to s d e P o rto s e R i o s

    Portos e canaes maritimos. ............................................................... 47

    Porto do Par. .......................................................................... 50

    Porto do M a ra n M o ............................................... 51

    Porto do Cear...........................................................

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    M I N I S T R I O D A I N D U S T R I A , V I A O E O B R A S P U B L I C A S

    C^ eco&nfe d a < 3$e/ia d /cca .

    apresentar-vos o relatorio dos servios a cargo do Ministrio

    cuja direco me foi confiada, seja-me permittido fazer algu

    mas consideraes geraes, antes de trata r detalhadamente de

    cada uma das seces em que se subdivide este ramo da administrao

    publica.

    A nossa organisao industrial tem seguido nestes ltimos

    tempos uma marcha anmala, irregular e profundamente viciosa.

    Duas grandes causas teem contribudo para esse resultado: uma

    comprehenso falsa do patriotismo e uma plethora no menos falsa de

    capitaes.

    A ida errnea e anti-social de que a grandeza industrial de nossa

    patria depende sobretudo da nossa libertao, cada vez mais completa,

    dos productos da industria extrangeira, foi provocando a aspirao de

    estabelecer emprezas industriaes de todos os generos, para se conseguir

    realisar aquelle desideratuni pseudo patriotico

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    XIV

    Confundindo o bilhete de emisso convertivel, precioso instrumento

    de credito, com o bilhete inconvertivel, simples instrumento de dieta-

    dura economica, organismos os nossos bancos emissores, pensando

    por esta frma dar ao nosso credito expanso sufficiente para satisfazera todas as nossas phantasias patriticas.

    A emisso de bilhetes convertiveis sempre solicitada por neces

    sidades sociaes verdadeiras e regulada em suas oscillaes pelo credito,

    que se manifesta pela maior ou menor frequncia da converso.

    No regimen do curso forado, porm, como entre ns, no ha

    instrumento algum para regular os movimentos da emisso ; o credito

    no mais o seu regulador ; ella se faz, por isso, s cegas, impellida

    pela especulao, pelo jogo e por todas as loucuras da bolsa.

    Dahi essa massa colossal de papel-moeda inconvertivel, invertendo

    os laos que ligam a industria ao credito; no sendo mais a necessidade

    social de uma industria que provoca a emisso, mas a emisso que

    solicita a creao de industrias sem razo de ser.

    Esta solicitao dos pseudo-capitaes procurando collocao a todo

    transe, reunida ao esforo pseudo-patriotico para a nossa emanci

    pao industrial absoluta, gerou a estruetura actual da organisao

    da nossa industria, organisao viciosa, porque ella daria como re

    sultado a extineo do commercio internacional e o isolamento dos

    povos e porque nenhum povo dispe nem das aptides, nem dos

    elementos naturaes, nem dos recursos economicos para realisar seme

    lhante aspirao.O resultado dessa politica industrial ns a conhecemos de uma

    frma bem dolorosa.

    Antes que a emisso desordenada e louca de papel tivesse mani

    festado seus effeitos completos, durante o tempo em que o valor e o cre

    dito se diluam na massa geral do papel-moeda; antes que a baixa do

    cambio viesse mostrar aos mais cegos que o sueco era o mesmo e que

    s o bagao havia augmentado, manifestou-se a illuso da abundancia

    quasi inexgottavel de ca pita es.

    Organisaram-se emprezas de todas as especies e a esperana de

    que immediatamente o Brasil se tornaria um grande paiz industrial

    parecia transformar se em realidade

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    XV

    Em breve tempo, porm, a illusfio dissipou-se, deixando ver bem

    claro que os capitaes no se haviam multiplicado, que o credito

    havia cahido desastradamente e que os recursos distribuidos a cada uma

    das emprezas eram absolutamente insufflclentes para seu desenvolvi

    mento.

    Verificou-se e j tarde que tinha bavido disperso excessiva do

    capital e comeou-se entfio o trabalho de sua concentrao.

    Uma grande somma, porm, de capital circulante havia sido trans

    formada em capital fixo, immobilisando-se em mnchinas e edifcios,

    ficando assim improductivo durante muito tempo ou inutilisando-separa sempre.

    Essa immobilisao improductiva e essa inutilisao definitiva de

    capitaes acarretaram, como consequncia, o empobrecimento do paiz

    e perturbaes graves nas nossas condies financeiras.

    Ainda mais, o trabalho reparador se faz no em favor de industrias

    naturaes, que teem condies de vida prpria, mas em favor das que

    por causas variadas teem merecido a proteco dos poderes pblicos.

    Essa proteco consiste na elevao de tarifas das alfandegas, ta

    rifas que, em muitos casos, quasi se tornaram prohibitivas.

    Por esta frma tornou-se o Estado o agente principal da seleco

    das industrias que procuram desenvolver-se no paiz.

    Julgando tudo priori, procurou-se organisar ao mesmo tempo um

    sem numero de industrias, dispersando-se de um modo exagerado o

    capital social, diluindo por essa frma o seu poder 1ecundante.

    Sem a sensibilidade bastante delicada para perceber quaes as indus

    trias mais naturaes, agindo sob a presso de interesses polticos va

    riados, o Estado desvia o elemento de vida de industrias naturaes e j

    existentes para outras que so puramente parasitarias.

    Dahi resulta que deixamos de importar produclos que s podemosfabricar com grande esforo e por alto preo, para importarmos pro-

    ductos que poderiamos fabricar com pequeno esforo, por preo baixo

    e com lucros reaes para os capitaes nelles empregados.

    Augmentamos o preo dos objectos de consumo, tornando a vida

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    XVI

    exercer uma funco antipathica para aqueUes que so victimas da

    carestia da vida.

    Importamos eereaes para no importarmos phosphoros; impor

    tamos gado para no importarmos sedas.O nosso patriotismo exulta com esta politica industrial curiosa:

    Importamos caro aquillo que podamos produzir barato e produzimos

    caro aquillo que podamos importar barato, frmula que representa

    degradao economica, pois que ella se traduz no emprego dos nossos

    capitaes e do nosso esforo para elevar o preo dos objectos de consumo,

    tornando a vida cada vez mais dura e mais difficil.Ora, a industria no constitue um fim a que se deve procurar

    attingir custa de todos os sacrifcios, mas simplesmente um meio

    de tornar mais facil, mais confortvel e mais feliz a vida humana.

    E como a amplitude e a intensidade da vida se traduzem pelo

    consumo, o fim da industria tornar possvel o mximo de consumo,

    o que se consegue augmentando o poder acquisitivo do homem e

    diminuindo o preo dos productos.

    Para obter-se esse resultado necessrio procurar-se o trabalho

    que d o mximo de producto com o minimo de esforo, o que se

    traduz por grandes lucros para o productor, coincidindo com preos

    baixos para o consumidor.

    K nesta harmonia entre dous elementos, que parecem irreconci-

    Haveis, que est a soluo do problema industrial e economico.

    Para attingir-se a esse desideratum duas so as condies neces

    srias :

    A primeira no perder de vista que, sendo ainda muito limitado o

    nosso capital social e o nosso credito, somos forados a limitar tambm

    a esphera de nossa vida industrial, para evitarmos a disperso e a con

    sequente esteriiisao dos nossos recursos.

    A segunda ter sempre em mente que o capital no precisa de guia,

    nem de mentor governamental para chegar ao ponto em que elle encon

    tra maior renda, determinando assim a industria que convm fundar.

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    x v n

    por longos annos de pratica, dividem a soluo de um problema destes

    em milhares de problemas parciaes, a que cada um pde, pela com

    petncia adquirida, pelo estudo e experiencia de muitos annos em uma

    esphera determinada, dar a melhor soluo possivel.

    Nem se diga que este modo de resolver o problema industrial pde

    muitas vezes, satisfazendo a interesses individuaes, no attender ao

    interesse publico.

    O interesse publico est sempre na satisfao das necessidades mais

    urgentes da sociedade ; e, como essas so sempre as mais bem retri

    budas, como o capital procura expontaneamente a maior retribuio,elle pr-se-ha ao servio das necessidades mais urgentes da sociedade

    e sem a aco governmental satisfar aos interesses pblicos ao mesmo

    tempo que aos interesses individues.

    Subordinemos paciente e corajosamente a nossa expanso industrial

    pequenhez dos nossos recursos economicos, e limitemos a aco

    governamental ao que ella pde offerecer de mais util e de mais salutarao desenvolvimento industriai de nossa patria : a Ordem por meio da

    Liberdade, mantendo a paz a todo transe e fazendo desapparecer todas

    as pas regulamentares que entorpecem os movimentos da actividade;

    individual.

    Depois, devemos reflectir que o proteccionismo contribuiria talvez

    para o desenvolvimento exagerado de grandes fortunas, que, entrens, poderam crear uma especie de aristocracia do dinheiro.

    E como no maior numero de casos as emprezas industriaes pro-

    ductoras de grandes fortunas s se poderiara manter custa da pro

    teco pelas tarifas, as lutas partidarias, entre ns, poderiam ser .

    dominadas pelos interesses dos industriaes poderosos e no pelas

    grandes idas polticas.

    A supremacia do industrialismo podera trazer-no3 grandes m ales

    sociaes, deixando-nos talvez a frma, mas fazendo-nos perder com

    certeza a substancia de nossa liberdade.

    No podemos, como muitos aspiram, tomar os Estados Unidos da

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    XVIII

    devemos considerar o proteccionismo como agente exclusivo, nem

    mesmo principal, do progresso industrial da America do Norte,

    pois a industria de transportes por caminhos de ferro, que jamais

    alli gosou de proteco official, representa, entretanto, a maiorvletoria industrial dos Americanos sobre todos os outros povos do

    mundo.

    Seja, pois, esta a frmula da nossa poltica industrial:

    - Produzir barato aquillo ques podemos importar caro, e im

    portar barato aquillo que s podemos produzir caro .

    Por esta frma teremos o mximo de produco com o mnimo

    de esforo, o que se traduz por grandes lucros para os produetores

    e preos baixos para os consumidores, isto , riqueza e vida facil e

    confortvel.

    A crise financeira e a febre industrial de que acabamos de faltar

    acarretaram para a agricultura perturbaes de tal ordem que essa fonte

    principal de nossas riquezas est sob a aco de uma crise profunda e

    de difficil soluo.

    A attraco que a vida das cidades exerce sobre os operrios, a aco

    que os lucros grandes e rpidos das industrias protegidas exercem sobre

    os capitaes e sobre os braos, a desconfiana caracterstica das pocas

    de crises financeiras so outras tantas causas de drenagem que soffre

    a agricultura em seus elementos mais importantes de produco.

    Accrescente-se a isto a elevao de salarios produzida entre outras

    causas pela ca rstia de vida e pelo habito de uma existncia mais con-

    f>rtavel e por isso mesmo mais dispendiosa por parte dos operriose ver-se-ha facilmente uma das faces mais importantes de nossa crise

    agrcola.

    Si em condies financeiras normaes os defeitos intrnsecos do cre

    dito agrcola constituem uma das grandes diflculdades da lavoura

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    XIX

    Alm destas causas geraes, outras individuaes actuam no mesmo

    sentido: a falta de instruco, de previdncia, de energia, de acthidade

    e sobretudo de economia da parte de muitos dos nossos agricultores.

    Sem duvida o Estado contribue de certo modo para formao de

    algumas daquellas causas geraes. E, pois, do dever delle procurar

    removel-as.

    Chagente principal da nossa-situao financeira a desvalorisao

    da nossa moeda, consequente emisso exagerada de papel-moeda

    inconvertivel.

    O resgate real desse excesso de papel , pois, para a agricultura,como para todas as outras actividades nacionaes, o rimeiro dos de

    veres do Governo.

    No pensam assim aquelles que acreditam ser a baixa do cambio

    um elemento favoravel aos agricultores do caf.

    Antes que o estado cambial tenha exercido sua influencia malfica

    sobre todas os relaes econmicas do paiz, certo que essa crena

    tem alguma cousa de real; desde, porm, que a baixa do cambio tenha

    elevado o preo de todos os elementos que contribuem para a produco

    do caf, o excesso do preo de renda calculado em papel-moeda neu-

    tralisado pelo excesso no custo de produco.

    A renda liquida ser, verdade, expressa por um numero maior,

    mas a unidade ser menor, porque o poder acquisitivo da nossa

    moeda estar diminuido e o valor real da renda liquida em nada ter

    augmentado.

    Reduzam-se as fraces ao mesmo denominador, traduzam-se todas

    as operaes em linguagem ouroe ter-se-ha facilmente a verdade

    do que asseveramos.

    Si no lia vantagem nem prejuzos directos debaixo do ponto de

    vista que acabamos de considerar, certo que a cultura do caf soffreindirectamente, como todas as actividades sociaes, com a crise finan

    ceira, que, abalando o credito e deslocando oscapitaes, difficulta as

    operaes econmicas necessrias a todo o trabalho humano na so

    ciedade.

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    mentos de proiuco para muitas industrias artificiaes por meio de

    tarifas ultra-proteccionistas.

    Moderar o proteccionismo industrial , pois, outro dever do Estadopara com a agricultura.

    Outra causa de caracter geral, que eontribue para a crise da lavoura,

    a que se manifesta na organisao do credito agricola.

    Legislar, pois, no s para fazer desapparecer tudo o que possa

    estorvar a constituio de estabelecimentos de credito agricola, e, mais

    ainda, estimular por todos os meios indirectos a creao destas insti

    tuies, procurando sempre assimilar o mais possvel o credito agricola

    ao credito commercial e industrial, ainda outro dever do Estado para

    com a lavoura.

    O systema Torrens que realisa esse desideratum e que tem dado

    resultados brilhantes nos paizes em que tem sido applicado, nenhum

    resultado deu entre ns.

    Convm indagar a causa desse desastre e remover, tanto quanto

    possvel aos poderes pblicos, as difflculdades com que essa bellis-

    sima instituio est lutando em nosso paiz.

    A instruco agricola, no smente a que se ensina nas escolas su

    periores, como acontece entre ns, mas a que se dirige s classes mdias

    e populares; as conferncias, os artigos, no em jornaes especiaes, mas

    na prpria imprensa poltica, que conta um circulo de leitores maior

    e mais certo ; os concursos, no smente esses que se realisam pelas

    exposies em que causas accidentaes e artificiaes do muitas vezes a

    victoria quelles que menos a merecem, mas o concurso real em que

    os juizes, visitando os estabelecimentos em occasio inesperada, podem

    apreciar o estado verdadeiro e real dos trabalhos agrcolas ; todos esses

    agentes, todos esses elementos impulsivos de industria agricola so a

    obra por excellencia das sociedades de agricultura, s quaes em um

    paiz como o nosso, em que a iniciativa particular to fraca, o Estado

    deve fornecer todos os meios de prosperidade, sem entretanto nunca

    b tit i ll d di t t f

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    A imprevidencia, o amor ociosidade e a dissipao sovicios que

    s podem ser curados pelos males e soffrimentos que elles acarretam*

    Procurar afastar esses soffrimentos de um modo absoluto perpe

    tuar aquelles vicios, destruir o unico agente natural e efficaz de

    regenerao.

    Quando se manifesta uma crise no trabalho, dever do Estado

    afastar todas as causas com que elle tenha contribudo para aquelle

    m a l; mas seria contra os princpios de justia proteger os ineptos,

    os imprevidentes, os viciosos, com o sacrifcio daquelles que lutam,

    que se esforam e que vencem com os elementos proprios da energia individual.

    A frma mais aguda que tomou ultmamente a crise da lavoura

    foi devida, como se sabe, baixa forte que soffreu o preo do caf.

    Sem fallar nas especulaes commerciaes que podem alterar mo

    mentaneamente os preos deste importante producto, duas causas

    mais notveis e mais graves, esto actuando no sentido de prcduziraquelle resultado.

    O desenvolvimento, cada vez mais extenso, que tem tido em nosso

    paiz a cultura do caf, sem que se manifeste desenvolvimento corres

    pondente no consumo desse producto, alterou profundamente as re

    laes antigos entre a offerta e a procura em favor do primeiro des

    ses dous elementos e a baixa do preo foi a consequncia natural einevitvel.

    Nestas condies, nenhuma aco podia ter o Estado sobre essa

    manifestao de crise agricola; nenhum poder humano pde alterar as

    leis naturaes, e toda a tentativa que se fizesse nesse sentido s servi

    ra para tornar a situao mais angustiosa.

    A unica soluo do problema em taes casos , submettendo-se a

    essas leis, proceder de accordo com ellas.

    Restringir a cultura de caf aos pontos mais productivos, pro

    curando outras culturas dentre tantas que podemos explorar ccm gran

    des vantagens, o que de um modo lento e gradual se ha de dar

    XXI

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    XXII

    Mas, como outros paizes se esto entregando tambm em escala

    ascendente cultura do caf, teremos que lutar no s com o ex

    cesso da nossa prpria procluco, mas ainda com a concurrencia des

    ses paizes.

    Nessa luta s poderemos vencer pela superioridade do nosso pro-

    ducto, o que s conseguiremos com o aperfeioamento do seu

    preparo.

    Limitao no desenvolvimento da produco do caf, de modo a

    acompanhar o desenvolvimento do seu consumo, que se deve procurar

    ampliar, e aperfeioamento do preparo d sse f roduc o, so os nicosmeios de evitar a aggravao da crise actual e o apparecimento de

    crises iguaes no futuro.

    Si estes dons resultados s podem ser obtidos pela aco particular,

    si o Estado nada pde influir de um modo efficaz sobre o preo do

    caf, elle pde entretanto, modificando certos factores que oneram esse

    producto, augmentar a renda liquida do productor.Esses factores so o custo de transporte e os impostos de ex

    portao.

    Os deficitsenormes das estradas de ferro mostram de um modo

    bem claro que a Unio j foi alm do que era rasoavel nesse sentido; os

    Estados, porm, que teem interesses directos na cultura do caf, podem

    auxilial-a com a reduco dos impostos que a oneram, e que diminuem

    a renda liquida des lavradores.

    No penso, porm, que essa aco estadoal deva ser indefinida, pois

    que ella podera contribuir artificialmente para maior desenvolvimento

    da produco do caf, mas que ella se deve exercer to smente o tempo

    necessrio para a multiplicao das nossas culturas. ,

    Confesso, porm, que tenho mais confiana na soluo da crise do

    caf pela aco individual de que acima fallei, l o que pela nterveno

    governamental que acabo de indicar.

    O Ministrio da Industria, entre ns, no presta agricultura os

    servios que presta o de Washington, na America do Norte.

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    constante com o ministro federal, tornando assim o servio central

    mais completo e mais u ti l; entre ns o isolamento torna impossvel toda

    a cooperao efficiente* em beneficio da principal industria da nossa

    patria, pois que no se pude agir sem conhecer.

    As causas econmicas e financeiras que teem actuado de um modo

    to deplorvel na nossa industria e agricultura no podiam deixar de

    exercer sua influencia, e de modo intenso, sobre o nosso commercio.O retrahimento extraordinrio dos capitaes e o abalo profundo do

    credito arrancaram ao negociante os seus principaes instrumentos de

    produco.

    A baixa feroz do cambio, ligada ao proteccionismo, no menos feroz,

    elevaram por tal frma o preo dos objectos, que o consumo soffreu uma

    forte depresso, obrigando o commerciante a no exigir grandes lucros

    para no ougmentar ainda mais aquella depresso.

    Por esta frma o campo da actividade commercial ao mesmo tempo

    que se restringiu soffreu uma grande esterilisao.

    Em luta com todos estes embaraos, as mais importantes praas

    commerciaes da Republica teem desenvolvido uma viriiidade, uma

    energia e sobretudo uma honestidade que faz honra nossa patria e que

    constitue um motivo de justo orgulho para o Brasil.

    Com a extinco do servio de immigrao feito pelo Unio, a

    corrente immigratoria para o Brasil dever soffrer uma diminuio

    sensvel.

    No considero este facto um mal, debaixo de todos os pontos de

    vista, para o nosso paiz, mesmo porque o considero transitrio, de

    vendo desapparecer quando estiver definitivamente estabelecida a

    i i t

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    XXIV

    ser a despeza para o Thesouro, de modo que os sacrifcios impostos 6

    Nao no correspondiam ao povoamento do nosso territrio.

    Depois, havendo uma grande differena entre diversos Estados da

    Unio quanto ao poder attrahente sobre os immigrantes, differenarelativa ao clima, salarios, meios de transporte, costumes e outras cir-

    cumstancias, a corrente se estabelecia fatalmente para certos Estados

    em detrimento de outros, quaesquer que fossem os meios empregados

    para evitar esse inconveniente.

    Desta frma o servio ia, a pouco e pouco, perdendo o seu caracter

    federal ; os Estados ricos iam augmentando a sua prosperidade custa

    dos Estados pobres, e comeava-se a observar na Republica Federativa

    o mesmo phenomeno que no Imprio Unitrio, embora devido a causas

    diversas.

    Para accentuar ainda mais este facto, a Unio via-se forada al

    gumas vezes a fazer tambm despezas avultadas com a localisafio de

    immigrantes, como sconteceu ultimamente no Estado do Paran.

    Debaixo do ponto de vista federativo, a cessao do servio demmigrao por conta da Unio foi, pois, uma medida acertada.

    Sobre o ponto de vista economico, si incontestvel que esse sys-

    tema de immigrao fornecia agentes de trabalho para agricultura e

    industria , desenvolvendo as nossas produes e as nossas riquezas, no

    menos verdade que, alm de excessivamente dispendioso, esse ser

    vio trazia-nos sobretudo homens sem tendencia para se fixarem defini

    tivamente em nosso solo, augmentando o nosso capital social com os

    lucros do seu trabalho.

    Ao contrario, esses lucros, sendo enviados em grande parte para

    fra do paiz, pesam na balana commercial como um augmento de

    importao, e, entrando no mercado cambial, influem de modo desas

    trado sobre a baixa do nosso cambio.

    Debaixo do ponto de vista poltico, esse systema derramava em

    nosso territrio grandes massas de homens que, em virtude da fraqueza

    do nosso poder assimilador/permaneciam por muito tempo como corpos

    extranhos no nosso organismo social.

    P f d b h d

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    XXV

    pouco dominando pela sua massa a nossa evoluo social e atirando

    para segundo plano os attributos que possuamos como Nafio.

    A grandeza e a felicidade de um povo nfio estfio simplesmente na

    sua grandeza numrica, nem nas suas riquezas materiaes.

    Os attributos moraes da raa, a indole pacifica, o amor s insti

    tuies polticas livres, a tolerncia religiosa e outras qualidades

    deste genero, sfio para mim, muito mais importantes ; e eu prefiro sem

    hesitar para a minha patria a felicidade da Suissa, grandeza da Rssia

    ou da Allemanha.

    Nfio devemos, pois, sacrificar a um desenvolvimento matria 1rpidoa perda doslgrandes attributos de nossa nacionalidade, alguns dos quaes

    devem constituir motivo de justo orgulho de nossa parte.

    Nfio defendo, nem sustento o nativismo intolerante; precisamos

    de elemento extrangeiro, para povoar o nosso paiz, para fecundar*

    as nossas riquezas naturaes / melhorando as condiCes de nossa vida

    material, mesmo para ceder-nos algumas qualidades moraes que nfiopossumos em quantidade sufificiente; mas devemos ter sempre em

    mente que o nosso poder assimilador fraco e que, si nosso esforo

    pelo progresso material nfio for reflectido e moderado, a nossa naciona

    lidade soffrer golpes profundos e irreparveis.

    Em alguns pontos do Brasil esse phenomeno j comea a reve

    lar-se de um modo inquietador e basta o apparecimento, entre ns,

    embora confuso ainda do socialismo, essa volta da sociedade escra-

    vidfo primitiva, para nos fazer ver o perigo que pde trazer-nos um

    desenvolvimento precipitado e imprudente.

    Os povos nfio so constitudos por unidades homogneas, de tal

    sorte que um delles possa crescer instantaneamente custa do outro.

    O crescimento de cada nafio est sujeito a leis natu raes; como

    todos os seres vivos, os povos precisam de um tempo determinado

    por uma serie de circumstancias para seu crescimento.

    Quando um povo qualquer procura infringir essas leis, em logar de

    / absorver e crescer, elle absorvido em seus elementos de nacionalidade.

    Nfi i it t b t t E t d U id

  • 7/25/2019 JOAQUIM MURTINHO - Dois Relatrios

    16/37

    XXVI

    Ele pde quasi sem esforo digerir, absorver, assimilar e aprovei

    ta r para seu crescimento essa grande massa de alimentos que lhe vai

    chegando todos os annos de todos os pontos do terra .

    Xas mesmas condies ns seriamos digeridos, absorvidos e assimilados pelo elemento extrangeiro.

    O paiz crescera, mas o fundo de nossa nacionalidade teria desap-

    parecido.

    No desejo este futuro para a minha patria.

    Com a immigrauo expontnea, cessaro todos os inconvenientes

    que acabo de apontar. Relativamente fraca, a principio, ella ir augmen-

    tando gradual e progressivamente.

    A distribuio far-se-ha ainda desigualmente pelos Estados; mas a

    Unio no contribuir para exagerar essa desigualdade pelo povoamento

    brusco dos Estados -prosperos.

    Cada um delles procurar, custa dos seus proprlos esforos, fazer

    desapparecer a causa de sua inferioridade, e o equilbrio tanto quanto

    possvel dar-se-ha de modo mais regular e harmonico.Sem solicitao artificial o immigrante s deixar a sua patria, im-

    pellido pela necessidade real de procurar em nosso paiz condies de

    vida mais prosperas e mais felizes; vindo sem illuses e sem promessas,

    s vezes phantasticas, no ter as decepes que o levem a uma volta

    immediata, ou a uma fixao temporria com a tendencia e a aspirao

    constante de regresso sua patria.A sua situao ser a de um equilbrio estvel, que crear para seu

    espirito a necessidade de fixar aqui os seus capitaes, de estudar a nossa

    lingua, adquirir os nossos costumes, amar as nossas liberdades,nacionalisar-se emfim.

    O escoamento de suas economias para sua antiga patria no se

    far em to grande escala que venha perturbar as nossas condies

    econmicas, e a adaptao ao nosso meio ser mais um elemento para

    sustentao de nossa nacionalidade.

    O nosso crescimento ser lento e gradual, mas ser um verdadeiro^

    crescimento orgnico, um desenvolvimento, isto , uma ampliao

    d ld t t li h i

  • 7/25/2019 JOAQUIM MURTINHO - Dois Relatrios

    17/37

    XXVII

    assimiladora absorver o elemento exranho fazendo delle parte consti

    tuinte do nosso organismo social.

    Teremos assim, no to smente augmentado o nosso paiz, mas

    feito crescer e desenvolver a nossa patria como Nao.A mudana de systema no serviD de immigrao foi, pois, um

    progresso e nem podia deixar de sel-o, porque representamma inter

    veno de menos por parte do Estado.

    Esforcemo-nos, pois, para assegurar e fortalecer a corrente do

    immigrao expontnea ; empreguemos no aperfeioamento de nosso

    meio social, tornando-o cada vez mais atlrahente, a avultada sommaconsumida at aqui na caa dos immigrantes.

    Cortemos o nosso territrio de estradas de ferro, procuremos

    desenvolver o nosso servio postal e telegraphico e ampliar a navega

    o dos nossos rios sem numero, facilitando por esta frma o com-

    mercio, a industria e a agricultura ; valorisemos a nossa moeda, firme

    mos o nosso credito e sobretudo faamos reinar entre ns a paz, a

    ordem e a liberdade para todos as crenas e para todas as opinies e-

    no teremos necessidade de nada despender para chamar a ns o*

    extrangeiro em busca do que no encontrar em sua patria .

    No teremos necessidade de impulso, quando tivermos a attrac-

    o real.

    Os nossos trabalhos pblicos foram em grande parte suspensos por

    auctorisao legislativa, de que o Poder Executivo se viu forado a usar

    por falta absoluta de recursos.

    Si essa suspenso foi devida s nossas condies financeiras, no

    menos verdade que para a produco do nosso estado economico precrio muito contribuiram esses trabalhos pblicos.

    Antes de tudo necessrio observar que as leis oramentarias da

    Republica encerram grande quantidade de verbas destinadas a obras es-

    tadoaes e s vezes puramente municipaes.

  • 7/25/2019 JOAQUIM MURTINHO - Dois Relatrios

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    XXVIII

    Os liabitos polticos, porm, teem tido mais fora que as leis consfci-

    tucionaes e a estructura do oramento da Republica Federativa traz o

    cunho evidente da aco do Imprio Unitrio sobre a poltica re

    publicana.Defendendo com zelo e intransigncia muito louvvel a renda dos

    Estados, os nossos homens pblicos em geral no sentem grandes escr

    pulos em atirar sobre os hombros da Unio despezas pertencentes por

    sua natureza ao dominio privativo dos Estados.

    Nestas condies as rendas federaes no podem supportar a sobre

    carga inconstitucional, e o desequilbrio cada vez maior no oramentoda Unio a consequncia inevitvel e fatal.

    A outra frma pela qual os trabalhos pblicos teem contribudo para

    nossas tristes condies financeiras est no modo pelo quil esses tra

    balhos teem sido emprehendidos.

    Desde que os recursos federaes so limitados, devamos escolher as

    obras mais urgentes e mais uteis realisando-as no menor prazo de tempo

    possvel, sem nos preoccuparmos em saber quaes os Estados que vflo

    tirar vantagem dos melhoramentos realisados.

    Entretanto assim no tem acontecido: cada Estado julga-se com

    direito de exigir todos os annos a execuo de obras federaes em seu

    territrio, e solicitada ou antes arrastada por todos os lados, a Unio

    divide, retalha a verba destinada a essas obras em uma infinidade de

    parcellas s vezes ridculas com o fim de satisfazer s exigncias de

    diversos Estados.

    Procurando satisfazer a todos, no satisfaz realmente a nenhum.

    Estas pequenas verbas so ento empregadas em obras, que no

    teem mais fim, que nunca mais attingem ao seu termo^

    Imagine-se quando podero ficar promptos portos para cujo melho-.ri

    ramento se votam 100 ou 200 contos ao cambio actual, como se nota nooramento vigente.

    Imaginem-se as sommas enterradas e paralysadas nessas obras sem

    termo, e os juros que se perdem desses capitaes empregados em obras

    que nada produzem, porque nunca esto acabadas*

  • 7/25/2019 JOAQUIM MURTINHO - Dois Relatrios

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    XXIX

    adiantados e calculem-se as som mas avultadissimas que ahi ficam per

    didas em obras abandonadas.

    E nem se pense poder evitar esta situao dolorosa, pois, quando

    no ha absolutamente recursos as obras so fatalmente suspensas,quaesquer que sejam os prejuzos que semelhante Tacto acarrete.

    Gapitaes immobilisados em obras que nunca se completam, capi

    tes que por isso mesmo no podem dar lucro, capitaes perdidos pelo

    abandono de obra s: eis o resultado dessa disperso antieconomi2a de

    rendas da Unio destinadas a obras federaes, disperso que esteri-

    lisa os capitaes, esterilisao que constitue um dos innumeros factoresde nossa situao economica.

    Outro modo ainda pelo qual os nossos trabalhos pblicos teem

    infludo para o empobrecimento do paiz est na applicao dos dous

    systemas seguidos entre ns pra a realisao desses trabalhos: o

    custeio directo pelo Estado e 'o auxilio a companhias' particulares.

    No primeiro caso, quando as obras so feitas por administrao

    directa, o abuso de excesso de pessoal difficil de ser cortado diante da

    presso politica ; quando por empreitada, a fiscalisao officiai, j em si

    muito dispendiosa, nem sempre consegue evitar a pratica escanda

    losa de inventar obras inteis com o fim de augmentar os lucros dos

    empreiteiros.

    Apezar, porm, de todos estes inconveniente?, o systema de custeio

    directo das obras por parte do Estado sem duvida prefervel ao

    de auxilio por meio de garantias de juros.

    Todas as vantagens que se apresentam na administrao par

    ticular derivam-se directamente do interesse individual, que se traduz

    pelas rendas dos capitaes empregados.

    E este grande estimulo que torna essa administrao muito supe

    rior administrao official.A renda dos capitaes que se destinam satisfao dos interesses

    individuaes s assegurada por ura conjuncto de elementos : escolha

    das obras a realisar, activldade, zelo, economia e honestidade.

    So estes os elementos, que s podem ser obtidos custa de muito

  • 7/25/2019 JOAQUIM MURTINHO - Dois Relatrios

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    XXX

    -erapregadGS nas emprezas particulares, que vivem sem auxilio e sem

    tutela do Estado.

    Si vem, porm, o Governo e garante os juros dos capitaes em

    pregados, cessa ento immediatamente a necessidade daquelles elementos de successo, e no ha mais razo de ser no esforo por parte dos

    em prezar ios.

    Todas aquellas grandes foras sociaes e econmicas, todos aquel-

    les elementos de successo so postos margem, como instrumentos

    inteis. Xinguem luta, quando pde attingir ao mesmo fim sem

    -esforo.Este systema, pois, de garantia de juros por parte do Estado an-

    nulla todas as grandes vantagens inlierentes administrao part-

    -cular. sobrecarregando o paiz com grandes onus, de que s com muita

    difficuldade e no fim de muitos annos consegue libsrtar-se.

    Xo param, porm, ahi os seus inconvenientes.

    O auxilio dado pelo Governo gera um contracto que por sua vez

    exige uma fiscalisao e uma interveno de que se pde usar e abusar;

    dahi lutas entre a companhia e a administrao publica, lutas que

    quasl sempre redundam em prejuzos avultadissimos para os cofres p

    blicos, sem vantagem alguma correspondente para o paiz.

    Ahi esto, para s fallar nos casos mais recentes, as companhias

    E. de Ferro do Chopim, a do Rio Bonito e a das obras do porto do

    Cea r para demonstrar evidencia a nossa assero.

    Tenho sempre defendido na minha vida publica o principio de re-

    luco ao minimo da interveno do Estado em questes desta natureza.

    Um porto cujo commercio, uma estrada de ferro cujo trafego no

    podem fornecer renda para os capitaes nelles empregados no me

    recem uma ser construda, outro que se lhe faam melhoramentos.

    E de aceordo com este principio e com disposio legislativa, quevo ser offerecidos explorao particular os portos de Pernambuco

    c do Par, e que se esperam obter para elles e para o do Rio de Janeiro

    os grandes melhoramentos cb porto de Santos, que uma grande fonte

    de renda para o seu emprezario um auxilio poderosssimo para o

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    XXXI

    pios de liberdade indutrial, e emquanto por systema ou por neces

    sidade o Estado tiver de intervir na construco de certas obras, convm

    que elle o faa directamente como nos servios dos melhoramentos

    da barra do Rio Grande do Sul.Assim, eliminao das obras de caracter estadoal do oramento da

    Unio, concentrao dos recursos do paiz em um pequeno numero de

    obras federaes, naturalmente as consideradas mais importantes e,

    finalmente, execuo directa por parte do Estado e consequente aban

    dono do systema de garantia de juros, systema hybrido que, no apre

    sentando as vantagens nem de administrao particular nem de administrao publica, tem, entretanto, os defeitos inherentes a ambas:

    taes suo os princpios que devem servir de guia administrao

    neste ramo do servio publico.

    E preciso, porm, observar que o Poder Executivo pouco poder

    fazer nesse sentido, si o Congresso Nacional, nico competente para

    crear servios e distribuir por elles as rendas da Unio, no imprimir

    esta direco nova marcha dos negocios pblicos neste ramo im

    portante de administrao.

    Si 11a execuo das obras publicas encontramos causas que teem

    contribudo para o desequilbrio oramentrio e para a nossa crise

    financeira, na explorao de servios custeados pela Unio, as mesmas

    causas apparecem de um modo ainda mais notvel.

    A ida socialista est se infiltrando em nossa organisao social

    de um modo insidioso; no temos partido socialista arregimentado,

    mas 0 socialismo est invadindo 0 espirito dos homens pblicos do

    nosso paiz.

    O principio, hoje corrente, de que os servios de correios, telegra-

    phos, estradas de ferro e fornecimento de agua devem ser feitos quasi

    que s a expensas do Estado uma manifestao clara e evidente da

    conquista que aquella escola retrograda vai fazendo no Brasil.

    O que no se comprehende da parte daquelles que acceitam esse

  • 7/25/2019 JOAQUIM MURTINHO - Dois Relatrios

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    XXXTI

    iando a sua applicao em certos casos e repellindo-a em casos per

    feita mente semelhantes.

    Si fosse apresentada a ida de em pocas normaes se estabele

    cerem servios de fornecimento de generos alimentcios por preo inferior ao custo de produco a quem o solicitasse, devendo os grandes

    dejlcitsprovenientes dessa operao serem pagos pelo Thesouro Federal,

    essa ida seria repellida sem exame e sem hesitao.

    Si, porm, se estabelecem servios para a transmisso do pensa

    mento por cartas ou telegraminas, para transporte de passageiros ou

    cargas por linhas ferreas, tudo por preo inferior ao custo de produco, correndo os respectivos deficits por conta do Estado, quasi todos

    applaudem a ida e a defendem com calor e intransigncia contra

    aquelles que combatem to grande inconsequencia.

    Entretanto o primeiro desses servios satisfaz as necessidades mais

    urgentes, mais imperiosas e mais importantes que as que so satisfei

    tas pelos segundos.E pela applicao daquelle principio socialista que estamos a re

    duzir todos os annos as taxas telegraphicas e de estradas de ferro.

    Xo servio dos correios a renda representa metade da despeza ;

    no dos telegraplios nem chega a alcanar esse nivei; no das estradas

    de ferro e fornecimento de agna os dejicits sobem invariavelmente

    todos os annos attingindo j a milhares de contos de ris.

    E, quand> se agita a questo de augmento ligeiro de taxas,

    a ida repellida como odiosa e inqua, como si no fosse da

    mais rigorosa justia pedir-se por um objecto, ao menos, o custo

    de sua produco, e como si a justia fosse algum dia odiosa e

    inqua.

    E nem se attende, que o que se pede muitas vezes nem au

    gmento real da taxa primitiva, mas simples augmento do seu valor

    nominal, considerando a depreciao de nossa moeda, pois que a taxa

    de 200 ris para transporte de uma carta hoje inferior na reali

    dade a 100 ris em outros tempos.

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    x x x r n

    prios funccionarios obtiveram dos poderes pblicos augmento de ven

    cimentos, allegando a desvalorisao de nossa moeda.

    S o Estado est fra da proteco das leis econmicas e tem de fazer

    hoje os mesmos servios pelo tero do preo pelo qual os fazia outrora.Mas no so s as taxas mesquinhas que geram os dejicits

    daquelles servios que golpeam fundo as rendas da Unio, porque os

    deficiisque se manifestam clara e evidentemente pela differena entre

    a renda bruta e a despeza no constituem os deficiis reaes e totaes

    dos mesmos servios.

    Alm da insufficiencia das taxas, ha outras causas menos visiveis,

    que ficam mascaradas no oramento pela necessidade de manter certa

    ordem na classificao das despezas publicas.

    Refiro-me s aposentadorias, aos monte-pios e instituio de

    funccionarios extinctos.

    0 numero de aposentados cresce de um'modo espantoso, e a verba

    que a elle se refere no oramento avoluma-se de um modo aterrador

    para aquelles que estudam os meios de melhorar os nossas condies

    financeiras.

    Sem duvida que a precocidade da invalidez no nosso clima e nosso

    tempo contribue de alguma frma para aquelle resultado; mas pre

    ciso ter coragem de dizer que a aposentadoria constitue hoje uma

    das exploraes mais lucrativas dos cargos pblicos.

    Centenares de aposentados por invalidez entregam-se a trabalhos

    rendosos e que exigem grande octividade; e a mo vigorosa que tra

    balha activamente nos servios particulares, ganhando honradamente

    o fructo do seu esforo, muitas vezes a mesma que se estende in

    valida para receber, menos honradamente, dos cofres pblicos, aquillo

    a que s teem direito os que a velhice ou a molstia tornaram verda

    deiramente incapazes.

    Melhor seria que o Estado retribusse mais generosamente os seus

    funccionarios, deixando-lhes a tarefa de cuidarem elles proprios, como

  • 7/25/2019 JOAQUIM MURTINHO - Dois Relatrios

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    XXXIV

    Mas, no so s as aposentadorias; os monte-pios representam

    tambm factor importante na parte occulta dos deficis daquelles

    servios.

    Sabe-se que a instituio do monte-pios pde existir e produzir

    os seusefeitos quando em sua organisao soattendidos certos prin-

    c pios fundomentaes, de modo que o servio das penses possa ser

    feito custa da quota dos contribuintes.

    Pois bem: na organisao do nosso monte-pio de Estado nem se

    pensou na existncia desses princpios.

    Assim a idade eo estado cie saude, dous elementos capitaes na orga

    nisao de instituies desta ordem, so factos absolutamente indifferentes

    no monte-pio actual do Estado.

    Dous funccionarios de igual calhegoria, um velho ou gravemente

    doente e outro moo ou de perfeita saude, contribuem com a mesma

    quota.

    Ora um monte-pio que no se basea na probabilidade do tempo de

    vida uma instituio cmdemnacla a perecer.

    No fim de algum tempo as penses no podero mais ser custeadas

    palas quotas dos contribuintes; e, para que ellas possam continuar a ser

    distribudas, ser necessrio que o servio seja feito custa dos cofres

    pblicos.

    Desta sorte no teremos mais diante de ns pensionistas de uma

    instituio mantida custado proprio funccionalismoe apenas dirigida

    pelo Estado, mas na realidade pensionistas directos do proprio The-

    souro.

    Accrescente-se a isto que, como a aposentadoria, o monte-pio con-

    stitue outra explorao lucrativa dos cargos pblicos; reflicta-se que ha

    indivduos alguns velhos outros doentes, que s entram para o servio

    publico por alguns mezes para adquirir o direito ao monte-pio e ver-

    se-ha sem difficuldade que no fim de no muitos annos no haver The-

    souro capaz de supportar semelhante carga.

    Melhor ser recuar em tempo restituindo gradualmente aos funccio

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    XXXV

    Desapparecer deste modo uma instituio que, si 6 bella quando

    expontnea, pois que a manifestao da previdncia, uma das mais

    elevadas faculdades do homem, ao contrario degradante quando obri

    gatria, pois que ento ella exprime a acceitauo por parte do contribuinte da affirmauo, por parte do governo, de imprevidncia e de

    incapacidade dos funccionarios pblicos para tratar do futuro dos seus.

    Cessar assim a tutela otrophiante do Estado e a grande e a nobre

    faculdade de previdncia poder se desenvolver livremente pelo exercicio,

    augmentando-se assim com um elemento precioso o nosso patrimnio

    moral.A instituio da classe dos extinctos no funccionalismo publico

    outra causa productora de dejicits nos servios da Nao, causa que,

    entretanto, como as duas ultimas, so pouco visveis por figurar nas

    despezas de outro ministrio.

    Ningum contesta que os cargos pblicos so creados para satis

    fazer necessidades publicas e no para garantir interesse individual.Parece, pois, que, extincto um servio publico e com elle os cargos

    creados para realisalo, desapparece ao mesmo tempo a razo de ser

    dos empregados que desempenhavam as funees daquelles cargos.

    Entretanto assim no : o funccionario que j ento tiver dez annos

    de servio com direito aposentadoria continua a ser funccionario,

    mas sem funeo, ou antes com a de augmentar improduetivamenteas reparties publicas.

    E como ahi no ha nem pde haver trabalho para elles, inven

    ta-se alguma cousa para que ao menos na apparencia possam fazer

    jus aos vencimentos que continuam a receber.

    E uma especie de aposentadoria sem invalidez, gosada dentro da

    repartio e sem reduco dos vencimentos.Ainda mais: esses homens, cujo trabalho principal, salvo raras

    excepes, receber os vencimentos, contampara a sua aposentadoria

    futura o tempo em que realisam aquelle esteril servio; de modo

    que a aposentadoria no to smente um prmio para aquelles que

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    XXXVI

    Nas cm pizzas particulares uni indivduo entra quando seus ser

    vios so neces-or os c sahc quando clles no teeni mais razo

    de ser: si 6 previdente, prepara o futuro para si e para os seu s;

    si imprevidente, soffre, como de justia, as consequncias desua falta.

    Xo servio publico, porm, logo que entra o funccionrio, comeam

    a desenvolver-se nelle 03 orguos parasitarios, e no fim de dez annos

    esses orgcs esto completos e promptos para entrar em exerccio.

    Ejpor que se excita por esta forma o appetitedos brasileiros para os

    cargos pblicos ?No de certo pela difficuldade que se encontra em achar quem os

    queira.

    Dada uma voga, os que pretendem preenchel-a constituem legio..

    Em todas as secretarias ha indivduos que esperam pacientemente

    rnezes e at annos por uma collocoo, onde, enLretanto, no podem

    ter as vantagens que encontrariam em tantos outros servios, que se

    podem constituir neste paiz.

    O que ha, pois, a teudencia exagerada para o funccionalismo e,

    longe de procurarmos cxcital-a ainda mais, devemos, ao contrario,

    empregar todos os nossos esforos para restringil-a.

    Essa tendncia para o funccionalismo j tem acarretado entre ns

    um desenvolvimento burocrtico extraordinrio, um dos nossos grandes

    males.

    Esta hypertrophia burocrtica produz em nosso meio uma organi-

    sao social desgraada quanto ao trabalho.

    E* assim que de um lado temos um sem numero de fontes de pro-

    dueOes e de riqueza, sem encontrar quem as queira fecundar, do outro

    lado vem os homens que, surdos s silicitaes to ottrahentes do tr a

    balho particular, pedem, supplicam um logar no funccionalismo publicoe atiram-se ao desanimo e ao desespero quando perdem a esperana de

    obter essa, para elles, unica taboa de salvao.

    Dir-se-hia que o servio publico, como a morphina e outros venenos,

    produzem com a intoxicao chronica uma verdadeira m ania; dir-se-hia

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    X x x v il

    Ambos perdem a fora de vontade, a coragem, a iniciativa, a energia

    moral para a luta .

    Alm dos grandes prejuzos trazidos ao Thesouro por esses favores

    concedidos aos empregados dos servios custeados pela Unio, outros

    no menos importantes produzidos pela mesma causa perturbam a boa

    marcha da administrao publica.

    Assim, foroso confessar que esses trabalhos no suo feitos com a

    regularidad e perfeio que seria para desejar-se.

    Nesses servios, que so chamados pblicos simplesmente por serem

    custeados pelo Estado, devia-se tanto quanto possvel opproximar aadministrao publica do typo da administrao particular.

    S assim teriamos a rapidez e preciso, a simplicidade e a energia

    de aco to necessrias na direco de servios dessa ordem.

    Entretanto, exactamenle o contrario o que se d : a machina

    administrativa ahi to vagarosa, to pesada, to complicada e to dura

    em seus movimentos como a da administrao dos verdadeiros serviospblicos.

    Com a organisao actuai os servios dos correios, telegraphos,

    estradas de ferro e fornecimento de agua sero todos elles mal feitos,

    qualquer que seja a competncia dos homens que os dirijam.

    Dada uma falta em uma dessas reparties, o director respectivo

    quasi sempre impotente para punir efficazmente o delinquente, a suaaco annulia-se ou pelo menos restringe-se diante de tantas regalias,

    tantos privilgios, que cercam o pessoal sob sua direco.

    No fim de alguns annos o funccionario medocre galga posies

    elevadas e com o seu direito de antiguidade pe de Jado a outros,

    que pela competncia e actividade exerceram as funces do cargo com

    mais proveito para o paiz.n'\.

    Com alguns annos de servio o funccionario cerca-se de laes

    immunidades, a sua dispensa do servio exige processos to diffi-

    ceis e complicados, que o Governo v-se muitos vezes na contingncia

    de arcar perante a Nao com a responsabilidade de faltas de muitos

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    XXXVIII

    podem dar em resultado trabalhos que deixam muito a desejar, e com-

    prehender-se-ha a razo pela qual ha um grupo de homens que se

    batem pelo principio da entrega dc todos aquellcs servios ao trabalho

    particular.Emquanto, porm, se espera por esse desidcratum, que no poder

    ser obtido sem grande resistncia, procuremos ao menos desde j

    attenuar quanto possvel os inconveirentes do custeio desses servios

    pelo Estado, adoptando taxas razoavels, sufficienles ao menos para

    evitar deficits e reduzhido os favores to dispendiosos para os cofres

    pblicos com que se teem cercado os empregados nesses servios.J o Congresso deu, felizmente, o primeiro passo nesse sentido

    quanto segunda parte, declarando na lei do oramento vigente que

    os empregados de emprezus custeados pela Unio no so empregados

    pblicos .

    Esta sabia e patritica disposio applicada pelo Governo aos

    empregados nos trabalhos de estrados de ferro e portos, que foram

    suspensos, trouxe para o Thesouro econonva considervel, evitando

    que homens fortes, robustos c de perfeita saude viessem como em

    pregados extinetos exercer uma funco parasitaria encostados s repart

    ties publicas e percebendo vencimentos.

    Como entretanto a applicauo dessa disposio legal, alis to

    clara, despertou duvidas da porte de alguns membros do Congresso,

    convm que o Poder Legislativo defina de modo ainda mais cate

    grica o seu pensamento neste sentido, afim de habilitar o Executivo o

    estender com firmeza a applicauo da me-ma determinao legal a outros

    servios do mesmo genero. Dado este primeiro passo, os outros seguir-

    se-ho logicamente.

    Assim, si os empregados das emprezas custeadas pela Unio no

    so empregados pblicos e como taes no podem ficar addidos como

    extinetos, claro que no podero, pela mesma razo, gosar dos fa

    vores de aposentadoria e monte-pio, favores esses que so dispensados

    aos empregados pblicos.

    Uma disposio legislativa respeitando os direitos adquiridos si

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    aposentadoria e monte-pio emquanto existirem s so applicaveis aos

    empregados pblicos e no aos empregados das emprezas custeadas

    pela Unio, que no devem ser considerados taes, seria a meu ver um

    acto acertado e patritico de parte do Congresso.

    A classe dos verdadeiros funccionarios pblicos tem ottributos

    muito differentes da dos empregados das emprezas custeadas pela

    Unio.

    A fixidez, a estabilidade e a estructura de uma secretaria de

    estado contrastam de um modo notvel e singular com a variabilidade

    a instabilidade dos trabalhos de uma estrada de ferro, cujo trafego

    pde crescer indefinidamente e cuja construco pde progredir ou

    ser suspensa de accordo cum os recursos do paiz.

    Nas reparties publicas o pessoal mais ou menos determinado,

    a sua renovao si faz com certa regularidade e lentido; pde-se,

    pois, at certo ponto, cohibindo os abusos, calcular os sacrifcios que o

    Estado precisa impr-se para conceder aquelles favores.Nos estradas de ferro o pessoal variavel, a renovao se faz

    rapida e irregularmente, em poucos onnos uma immensidade de

    homens pde ter atravessado esses servios, e se todos elles sahirem

    carregados daquelies favores, ningum mais poder calcular no fim

    de algum tempo a quanto montar a responsabilidade do Thesouro

    na satisfao daquelies compromissos.Precisamos resistir com coragem e tenacidade a esta onda que

    tende a alargar e ampliar cada vez mais o quadro das classes dos

    empregados pblicos e dos favores que lhes so concedidos.

    Do contrario, no fim de algum tempo, em vez de uma classe

    de funccionarios trabalhando para a Nao, teremos a Nao tra

    balhando para a classe dos funccionarios e por um effeito de dege-nerescencia social teremos voltado ao typo primitivo dos sociedades

    aristocrticos.

    No uma hypothese fantastica esta que acabo de fazer; em

    nosso proprio paiz, no momento actual, lia zonas em que as rendas

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    XL

    conservados, dando-lhe assim o direito de retirar esses favores que

    constituem pesado e incalculvel onus para o Thcsouro, melliorando

    ao mesmo tempo as condies do servi) publico.

    Taes so, Sr. Presidente, as consideraes geraes que enlendi dever

    fazer, antes da apresentar-vos noticias mais detalhadas sobre cada um

    dos ramos da administrao, que me foi confiada.

    Elias apontam de modo bem claro algumas das causas que commais intensidade trabalham para a nossa decadncia economica.

    As fontes primitivas de riquezas de um povo veem, em sua origem,

    dos servios que em seu conjuncto constituem a espliera do ramo de

    administrao publica, que tenho sob minha direco.

    Pois bem : entre ns, quasi todos esses servios nada produzem de

    rea l; quasi todas as fontes nada fornecem, ao contrario absorvem;

    no so fontes de riqueza, mas de empobrecmentj para o paiz.

    A agricultura, a industria e os servios custeados pela Unio deviam

    ser as tres arvores productoras da nossa riqueza.

    S a agricultura, porm, produz na realidade; os servios custeados

    pela Unio de um lado, e a industria do outro lado, tranformaram-se

    em parasitas, um sob a aco do socialismo, a outra pela influencia do

    protcccionismo.

    Por esta frma a industria passa a ser simplesmente uma explo

    rao do paiz em proveito de alguns industriaes e os servios custeados

    pela Unio transormaram-se em verdadeiras instituies de caridade.

    E esses parasitas que se enfeitam com as cores svnipathicas, um

    do patriotismo, outro da beneficencia, sugam sem piedade a seiva com

    que s a agricultura procura alimentar o nosso organismo depauperado.

    A causa de todos esses males, o inimigo a combater o ideal

    socialista, que, infiltrando-se em nossa sociedade, transfoima cada um

    de ns em um mendigo do Estado.

    E a confraria de pedintes que se estende por todo nosso territrio

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    XLI

    individualista, ideal de energia, idal de trabalho, idal de indepen

    dncia, a que o povo inglez deve toda a sua enorme grandeza.

    E? preciso convencermo-nos de que o Estado no tem o dever nem

    o poder de dar-nos directameute a felicidade sem esforo de nossa

    parte, mas to simplesmente a liberdade para o trabalho e a ordem

    e a justia para garantia do produeto do nosso esforo.

    A cada um de ns compele Ler confiana o f em si mesmo, tra

    balhar e lutar contra todos os concurrentes pelo esforo, pela perse

    verana e pela competncia.

    So estes os princpios liberoes, que se firmam pela pratica leale sincera da liberdade.

    Todas as liberdades se ligam umas s outros; destruindo uma

    dellas, compromettemos a existncia das outras, e por isso que a

    liberdade politica no pde ser completa sem a liberdade economica.

    Entretanto, doloroso dizer-se que muitos doquelles que se batem

    com dedicaao pelas nossos liberdades polticos defendendo o Republica, sSo os mesmos que sustentam o proleccionismo na industria

    e o socialismo em todos os servios custeados pela Unio, como si

    a Republica pudesse ser um mixto liybrido de liberdade politica e de

    despotismo economico.

    Toda a proteco a alguns traduz-se em aggresso pelo menos

    indirecta o outros ; e aquelies que sustentam que o Estado tem o deverde proteger a indivduos ou a classes, s veem uma parte da sociedade,

    fechando os olhos para no ver a outra.

    Teem elles o corao terno para aquelies que solicitam a proteco,

    e duro e insensvel para aquelies a cjuem so arrancados os meios, para

    proteger os primeiros.

    A generosidade sem duvida um sentimento elevado, pois que ella

    pde remediar os males presentes; mas a Justia, que tem por fim realisar

    as condies necessrias para que esses males no se reproduzam,

    sentimento muito mais elevado.

    A verdadeira generosidade s pde ser bem praticada pela aco

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    XLII

    0 Estado no pde nem deve proteger a indivduos ou classes, mas

    sim aos direitos de cada um, no os falsos direitos creados por leis, que

    por serem decretadas por Governos Republicanos, nem por isso deixam

    de ser algumas vezes despticas, mas aos direitos que so a emanao

    do Justia.

    E como esses direitos no suo mais que corollarios da Lei de igual

    liberdade, em torno dessa Lei que devem girar todos os aclos dos

    Governos Republicanos.

    Bem sei que ha quem encolha os hombros, ouvindo fallar na pre-

    teno de dirigir a poltica por meio de principios, que, si nem sempre

    podem ser seguidos em absoluto, nunca devem, entretanto, ser perdidos

    de vista.

    Riem-se do que elles em sua ignorncia chamam theoriase pre

    tendem remediar todos os males pblicos com medidas palliativas que,

    si conseguem attenuar os males no presente, preparam o desenvolvi

    mento de maiores desgraas no futuro.

    Penso de modo diverso e entendo que as sociedades s se governam

    por grandes principios e que cada homem publico tem o dever de com

    lealdade, franqueza e sinceridade dizer quaes as idas que formam o

    seu programma, qual o caminho que pretende percorrer.

    E por: isso, Sr. Presidente, que julgo dever asseverar que o despo

    tismo economico a causa das difficuldades financeiras com que luta a

    Republica; despotismo economico, impondo curso forado ao papelmoeda emittido por Bancos; despotismo economico, impondo a todo o

    paiz contribuies para sustentar industrias artificiaes; despotismo

    economico, impondo a muitos ramos de commercio pas e embaraos

    com o fim illusorio de evitar factos naturaes; despotismo economico.

    impondo a toda a Nao contribuies para offerecer a alguns indivduos

    servios quasi gratuitos, sacrificando assim a justia, a generosidade; e

    tantos e tantos outros despotismos que seria longo enumerar e que

    constituem a substancia do grande numero de leis decretadas pela

    Republica.

    S a pratica franca, decidida e sem hesitao dos principios de liber

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    x l i h

    problemas polticos no no5 merecem confiana na soluo dos pro

    blemas economicos, ento 6 foroso confessar que no merecemos o

    nome de republicanos.

    E por isso que convm dizer bem alto que consolidar a Republicano simplesmente defendel-a contra os actos de aggresso violenta

    dos seus inimigos, mas , sobretudo, e principalmente, impregnar, em

    beber no smente a nossa politicn, mas a nossa administrao e os

    nossos costumes nos princpios de liberdade.

    E necessrio, Sr. Presidente, republicanisar a Republica.

  • 7/25/2019 JOAQUIM MURTINHO - Dois Relatrios

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    MINISTRIO DA FAZENDA

    7

    RELATORIO&

    R E S t t N T A D D J.V;

    A O- 0 C O N S

    IB D U IBM KSn MIS D) MlP E L O

    MINISTRO DE ESTADO DOS NEGOCIOS DA TAZKNDA

    u t m izyfiiU im fM L

    NO ANNO DE 1899

    1 1 D A R E P U B L I C A

  • 7/25/2019 JOAQUIM MURTINHO - Dois Relatrios

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    Estudado o mecanismo pelo qual as emisses desvalorizaram a nossa

    circulao, no difcil compreender-se como por um mecanismo semelhante

    desvalorizaram a nossa produo.

    A pseudo abundncia de capitais por elas produzida promoveu a criao de

    um sem nmero de indstrias e desenvolveu de modo extraordinrio a atividade

    agrcola.

    Como todo o desenvolvimento precipitado, ele se fez sem ordem, sem calma

    necessria ao estudo, sem estudo indispensvel previso.

    Da o estabelecimento de indstrias artificiais e a organizao agrcola para

    produo exagerada do caf, os dois fatores da desvalorizao da nossa produo.

    O emprego de capitais e operrios em indstrias artificiais representa um

    verdadeiro esbanjamento da fortuna nacional.

    A renda dos produtos dessas indstrias s se faz afastando-se

    artificialmente do mercado produtos similares estrangeiros.

    O custo de produo nessas indstrias, sendo muito alto em relao ao dos

    que nos vm do exterior, eleva, por meio de taxas ultra-protecionistas nas tarifas

    da Alfandega, o preo dos produtos estrangeiros, criando assim um mercado

    falso, em que os produtos internos vencem na concorrncia os produtos do

    exterior.

    Todo consumidor , pois, lesado, e a diferena entre o que ele paga pelos

    objetos nesse regmen e o que pagaria em um regmen livre representa um

    imposto que lhe arrancado para manuteno daquelas indstrias.

    E, como o plantador de caf e o produtor de borracha, de mate, de algodo,

    ipecacuanha e outros gneros, que constituem nossa riqueza de exportao, so

    tambm consumidores, no difcil ver-se que no custo de produo de todos

    esses gneros entra como elemento de depreciao esse imposto em favor das

    indstrias artificiais.

    Os nossos produtos exportados levam, pois, consigo a taxa parasitria que

    faz diminuir de modo notvel a riqueza nacional.

    Nem se alegue que algumas dessas indstrias esto nacionalizadas, por ser

    toda a matria prima por elas empregada extrada do pas, pois que uma

  • 7/25/2019 JOAQUIM MURTINHO - Dois Relatrios

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    indstria nacional pode no ser natural.

    O que caracteriza uma indstria natural no o fato de ter sua matria

    prima importada ou no, mas o de ter capacidade de produzir o mximo

    resultado possvel em relao ao capital empregado com o mais baixo preo em

    um regmen de livre concorrncia.

    Uma indstria em que a mo de obra representa o papel principal no custo

    de produo deve ser considerada atualmente artificial no Brasil, mesmo quando

    toda a matria prima exista entre ns. A indstria de artefatos de borracha

    estaria evidentemente neste caso.

    Nem se diga ainda, Sr. Presidente, que essas indstrias, contribuindo para a

    diminuio da nossa importao nos trazem o benefcio do equilbrio da balana

    comercial.

    O ideal econmico de um pas no deve ser importar pouco, mas importar e

    exportar muito.

    Os capitais empregados nas indstrias artificiais que contribuem para

    reduo da nossa importao, se fossem empregados em indstrias naturais,

    deveriam produzir na exportao renda suficiente para cobrir essa diferena na

    importao e ir ainda alm, colocando a balana comercial em melhores

    condies.

    Assim, Sr. Presidente, a produo das indstrias artificiais no representa

    um resultado econmico; os seus lucros exprimem apenas impostos sobre as

    outras produes; os capitais nelas empregados no so fatores, mas antes

    agentes parasitrios da riqueza pblica.

    Eis como as emisses, criando indstrias artificiais, contriburam para a

    diminuio da riqueza nacional.

    Uma balana [comercial] desfavorvel nem sempre sinal de decadncia

    econmica em pas em que ela se manifesta.

    Um excesso de importao representa muitas vezes, no objeto de consumo,

    mas agentes de produo, que no fim de algum tempo pode dar resultado capaz

    de cobrir a differena manifestada na balana comercial no momento da

    importao e apresentar ainda um saldo.

  • 7/25/2019 JOAQUIM MURTINHO - Dois Relatrios

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    por isso que se deve considerar prspero o pas que, tendo todos os anos

    balana comercial desfavorvel, apresenta, entretanto, aumento constante em

    sua produo anual, o que quer dizer que contrai todos os anos novos

    compromissos, mas que esses compromissos so empregados no aumento de sua

    produo e de sua riqueza.

    o que se nota em todos os pases novos em estado de progresso

    econmico.

    Ainda mais, o equilbrio da balana comercial exprime apenas a relao

    entre a exportao e a importao, de sorte que dous pases podem ter a balana

    comercial equilibrada, tendo um deles importao e exportao muito pequenas e

    o outro os mesmos elementos muito grandes.

    Evidente mente, o segundo desses pases muito mais rico e sua potncia

    emissora de papel-moeda no pode deixar de ser muito maior, de forma que, se

    ambos tiverem a mesma quantidade de papel-moeda em circulao, o papel do

    segundo ter, sem dvida, maior valor, isto : o cmbio estar nele em melhor

    situao, apesar da igualdade das condies da balana comercial.