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COLUNA/COLUMNA. 2008;7(4):315-323 Instrumentação seletiva na escoliose idiopática em curvas com modificador lombar B e C Selective fusion on idiopathic scoliosis in curves with B and C lumbar modifiers Instrumentación selectiva en la escoliosis idiopática en curvas con modificador lumbar B y C Roberto Sakamoto Falcon 1 Cristiano Magalhães Menezes 2 Marcos Antônio Ferreira Júnior 2 Daniel de Abreu Oliveira 3 Saulo Garzedim Freire 4 ABSTRACT Objective: to assess the surgical cor- rection of Adolescent Idiopathic Sco- liosis (AIS) with Selective fusion of the thoracic curves with pedicle screws in patients with B and C Lumbar Modi- fier and to verify the magnitude of correction and safety of the technique. Methods: prospective non random- ized case series study of patients with AIS, with Lenke curves 1B, 1C, 2B and 2C treated with selective fusion of the thoracic curves. The variables were: sex, age, levels of the scolio- sis, levels fused, number of screws. Lenke’s classification, pre-op Cobb’s angles and pos-op Cobb’s angles. Fif- ty-one patients with AIS were surgical treated from August, 2004 to October, 2007. Twenty of those fulfilled the cri- teria and were included in the study. Results: preoperative Cobb’s angle mean was 51.2º and was correct to and was correct to 17.8º. The average of correction was 65.4%. Spontaneous correction of the compensatory curves was observed ARTIGO DE ORIGINAL / ORIGINAL ARTICLE Trabalho realizado no Hospital Ortopédico de Belo Horizonte (MG), Brasil. 1 Chefe do Serviço de Cirurgia Espinhal do Hospital Ortopédico - Belo Horizonte (MG), Brasil. 2 Cirurgião do Serviço de Cirurgia Espinhal do Hospital Ortopédico - Belo Horizonte (MG), Brasil. 3 Cirurgião de Coluna do NOT – Núcleo de Ortopedia e Traumatologia - Bela Horizonte (MG), Brasil. 4 Residente de terceiro ano do REIOT – Hospital Ortopédico - Belo Horizonte (MG), Brasil. Recebido: 19/06/2008 Aprovado: 12/09/2008 RESUMO Objetivo: analisar as correções obti- das por meio da instrumentação seg- mentar seletiva torácica, utilizando-se parafusos pediculares em pacientes portadores de escoliose idiopática com ênfase nos modificadores lombares B ou C. A finalidade é avaliar as carac- terísticas do método, verificar o grau de correção obtido das curvas, assim como a segurança da técnica. Métodos: estudo prospectivo, não randomiza- do e tipo série de casos de pacientes portadores de escoliose idiopática com curvas 1B, 1C, 2B e 2C segundo Lenke, submetidos ao tratamento ci- rúrgico por via posterior. As variáveis analisadas foram as seguintes: sexo, idade, níveis acometidos na escolio- se, níveis instrumentados, número de parafusos pediculares utilizados, clas- sificação segundo Lenke, ângulos de Cobb pré-operatório coronal e sagital (incluindo inclinações) e ângulos de Cobb pós-operatório. Um total de 51 pacientes portadores de doenças va- RESUMEN Objetivo: bjetivo: analizar las correcciones obtenidas por medio de la instrumen- tación segmentar selectiva torácica utilizándose tornillos pediculares, en pacientes portadores de escoliosis idiopática con foco en los modifica- dores lumbares B o C. La finalidad es evaluar las características del méto- do, verificar el grado de corrección derivado de las curvas, también la seguridad de la técnica. Métodos: estudio prospectivo, no randomizado y tipo de serie de casos de pacientes portadores de escoliosis idiopática con curvas 1B, 1C, 2B y 2C según Lente, sometidos al tratamiento qui- rúrgico por vía posterior. Las varia- bles analizadas fueron: sexo, edad, niveles comprometidos por la esco- liosis, niveles instrumentados, núme- ro de tornillos pediculares utilizados, clasificación según Lente, ángulos de Cobb preoperatorio coronal y sagital (incluyendo inclinaciones) y ángulos de Cobb postoperatorio. Un total de

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COLUNA/COLUMNA. 2008;7(4):315-323

Instrumentação seletiva na escoliose idiopática em curvas com modificador lombar B e C

Selective fusion on idiopathic scoliosis in curves with B and C lumbar modifiers

Instrumentación selectiva en la escoliosis idiopática en curvas con modificador lumbar B y C

Roberto Sakamoto Falcon1

Cristiano Magalhães Menezes2

Marcos Antônio Ferreira Júnior2

Daniel de Abreu Oliveira3

Saulo Garzedim Freire4

ABSTRACTObjective: to assess the surgical cor-rection of Adolescent Idiopathic Sco-liosis (AIS) with Selective fusion of the thoracic curves with pedicle screws in patients with B and C Lumbar Modi-fier and to verify the magnitude of correction and safety of the technique. Methods: prospective non random-ized case series study of patients with AIS, with Lenke curves 1B, 1C, 2B and 2C treated with selective fusion of the thoracic curves. The variables were: sex, age, levels of the scolio-sis, levels fused, number of screws. Lenke’s classification, pre-op Cobb’s angles and pos-op Cobb’s angles. Fif-ty-one patients with AIS were surgical treated from August, 2004 to October, 2007. Twenty of those fulfilled the cri-teria and were included in the study. Results: preoperative Cobb’s angle mean was 51.2º and was correct toand was correct to 17.8º. The average of correction was 65.4%. Spontaneous correction of the compensatory curves was observed

ARTIGO De ORIGINAL / ORIGINAL ARTICLe

Trabalho realizado no Hospital Ortopédico de Belo Horizonte (MG), Brasil.

1Chefe do Serviço de Cirurgia Espinhal do Hospital Ortopédico - Belo Horizonte (MG), Brasil.2Cirurgião do Serviço de Cirurgia Espinhal do Hospital Ortopédico - Belo Horizonte (MG), Brasil.3Cirurgião de Coluna do NOT – Núcleo de Ortopedia e Traumatologia - Bela Horizonte (MG), Brasil. 4Residente de terceiro ano do REIOT – Hospital Ortopédico - Belo Horizonte (MG), Brasil.

Recebido: 19/06/2008 Aprovado: 12/09/2008

ReSUMOObjetivo: analisar as correções obti-das por meio da instrumentação seg-mentar seletiva torácica, utilizando-se parafusos pediculares em pacientes portadores de escoliose idiopática com ênfase nos modificadores lombares B ou C. A finalidade é avaliar as carac-terísticas do método, verificar o grau de correção obtido das curvas, assim como a segurança da técnica. Métodos: estudo prospectivo, não randomiza-do e tipo série de casos de pacientes portadores de escoliose idiopática com curvas 1B, 1C, 2B e 2C segundo Lenke, submetidos ao tratamento ci-rúrgico por via posterior. As variáveis analisadas foram as seguintes: sexo, idade, níveis acometidos na escolio-se, níveis instrumentados, número de parafusos pediculares utilizados, clas-sificação segundo Lenke, ângulos de Cobb pré-operatório coronal e sagital (incluindo inclinações) e ângulos de Cobb pós-operatório. Um total de 51 pacientes portadores de doenças va-

ReSUMeNObjetivo:bjetivo: analizar las correcciones obtenidas por medio de la instrumen-tación segmentar selectiva torácica utilizándose tornillos pediculares, en pacientes portadores de escoliosis idiopática con foco en los modifica-dores lumbares B o C. La finalidad es evaluar las características del méto-do, verificar el grado de corrección derivado de las curvas, también la seguridad de la técnica. Métodos: estudio prospectivo, no randomizado y tipo de serie de casos de pacientes portadores de escoliosis idiopática con curvas 1B, 1C, 2B y 2C según Lente, sometidos al tratamiento qui-rúrgico por vía posterior. Las varia-bles analizadas fueron: sexo, edad, niveles comprometidos por la esco-liosis, niveles instrumentados, núme-ro de tornillos pediculares utilizados, clasificación según Lente, ángulos de Cobb preoperatorio coronal y sagital (incluyendo inclinaciones) y ángulos de Cobb postoperatorio. Un total de

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riadas na coluna vertebral incluindo casos de escoliose idiopática foram submetidos ao tratamento cirúrgico de agosto de 2004 a outubro de 2007. Destes pacientes, 20 eram portadores de escoliose idiopática e preencheram os critérios de inclusão no trabalho. Resultados: a média do ângulo de Cobb pré-operatório foi de 51,2º e no pós-operatório de 17,8º com uma média de correção de 65,4%. Obteve-se uma correção espontânea média de 62,2% nas curvas compensatórias não instrumentadas. Não ocorreram com-plicações neurológicas, infecciosas ou descompensações das curvas lom-bares. Conclusão: todos os pacientes apresentaram uma melhora importante do aspecto estético, clínico e radioló-gico, com correção parcial das curvas estruturadas e compensatórias no pla-no coronal. Manteve-se o equilíbrio sagital na totalidade dos casos. Este trabalho mostra indícios de eficácia e segurança do tratamento cirúrgico se-letivo da escoliose idiopática utilizan-do-se parafusos pediculares.

DESCRITORES: Escoliose; Fu-são vertebral; Instrumentos cirúrgicos; Parafusos ósseos; Rotação; Doenças da coluna vertebral

with an average of 62.2%. Neither neurologic nor infectious complica-tions were observed on as no lumbar decompensation. Conclusion: all pa-tients showed clinical, radiological and aesthetical improvement with partial corrections of both structural and com-pensatory curves. Good sagital balance was observed on all. This study suggests selective fusions are safe and effective for AIS treatment.

KEYWORDS: Scoliosis; Spinal fusion; Surgical instruments; Bone screws; Rotation; Spinal diseases

51 pacientes portadores de patologí-as variadas en la columna vertebral incluyendo casos de escoliosis idiopá-tica fueron sometidos al tratamiento quirúrgico de Agosto/2004 a Octu-bre/2007. De estos, 20 eran portado-res de escoliosis idiopática y llenaron los criterios de inclusión en el traba-jo. Resultados: la media del ángulo de Cobb preoperatorio fue de 51.2º y en el postoperatorio de 17.8º con un pro-medio de corrección de 65.4%. Hubo una corrección espontánea promedio de 62.2% en las curvas compensato-rias no instrumentadas. No ocurrie-ron complicaciones neurológicas, in-fecciosas o descompensaciones de las curvas lumbares. Conclusión: todos los pacientes presentaron una mejo-ría importante del aspecto estético, clínico y radiológico, con corrección parcial de las curvas estructuradas y compensatorias en el plano coronal. Se mantuvo el equilibrio sagital en todos los casos. Este trabajo muestra indicios de la eficacia y seguridad del tratamiento quirúrgico selectivo de la escoliosis idiopática utilizándose tor-nillos pediculares.

DESCRIPTORES: Escoliosis; Fusión vertebral ; Instrumentos quirúrgicos; Tornillos óseos; Rotación; Enfermedades de la columna vertebral

INTRODUÇÃOA escoliose idiopática é a forma mais frequente de es-coliose estruturada e apresenta grande prevalência nos consultórios de ortopedia. Trata-se de uma condição pas-sível de tratamento conservador, porém em certas situa-ções o tratamento cirúrgico se torna necessário. Embora os valores angulares sejam utilizados como parâmetros de tratamento não há um consenso que oriente o médi-co assistente quanto à definição da melhor conduta. Para tal, faz-se extremamente importante o reconhecimento da deformidade como tridimensional e o entendimento de sua história natural. O tratamento cirúrgico da escoliose idiopática encontra-se em constante evolução. Até a dé-cada de 50, o princípio desse tratamento baseava-se na realização de artrodese posterior seguida de repouso no leito e imobilização. Harrington foi o primeiro a associar a instrumentação da coluna1-2. Em 1977, foi introduzido o

Sistema de Luque com a utilização de fios sublaminares, bilateralmente em cada segmento vertebral e seqüencial-mente apertados às hastes3. A instrumentação posterior de terceira geração foi desenvolvida por Cotrel-Dubousset, na década de 80, utilizando-se hastes associadas a gan-chos e parafusos pediculares4 e seus benefícios têm sido demonstrados principalmente em relação à maior corre-ção nos planos frontal, sagital e na rotação vertebral5-6. Existe, entretanto, o temor de possíveis complicações neuro-vasculares com a técnica7. Na literatura existem vários trabalhos que consideram a técnica segura e com poucas complicações6,8. Atualmente, maior ênfase é dada à preservação do maior número de segmentos móveis possível, limitando-se a realização da artrodese às curvas consideradas estruturadas, porém ainda existe o receio de descompensação das curvas lombares compensatórias.

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O objetivo deste trabalho é analisar as correções ob-tidas por meio de instrumentação segmentar seletiva das curvas torácicas utilizando-se parafusos pediculares em pacientes portadores de escoliose idiopática, com a fina-lidade de avaliar as características do método e verificar o nível de correção obtido das curvas torácicas e lombares, bem como a segurança e eficácia da técnica.

MÉTODOSForam estudados, prospectivamente, de forma não randomi-zada, pacientes portadores de escoliose idiopática submeti-dos ao tratamento cirúrgico com a realização de artrodese e instrumentação posterior no período de agosto de 2004 a outubro de 2007, com seguimento médio de 22 meses (seis a 42 meses) até abril de 2008. Avaliações foram realizadas no pós-operatório imediato, após um mês, após seis meses e anual após essa última. Utilizou-se a classificação proposta por Lenke9 e colaboradores para orientação do procedimen-to cirúrgico. Por meio de estudos radiográficos nos planos

sagital, frontal e frontal com inclinações, foram determina-das quais as curvas eram estruturadas e quais eram compen-satórias, permitindo a fusão seletiva das primeiras e preser-vação das últimas. Os critérios de inclusão foram: pacientes portadores de escoliose idiopática com curvas tipo 1, 2 da classificação de Lenke9-10 e modificadores lombares B e C submetidos ao tratamento cirúrgico por via posterior, com nível caudal instrumentado até ou acima de L1.

Os resultados foram submetidos à analise estatística com aplicação de parâmetros radiológicos, determinando-se a magnitude das curvas pelo método de Cobb nos planos frontal e sagital pré e pós-operatórios, descompensações do tronco após a cirurgia e pela análise da melhora estética das curvas. Utilizou-se o programa SPSS para tais análises com aplicação do teste “t de Student”.

Foram avaliados 51 pacientes submetidos à instrumentação de terceira geração por uma mesma equipe cirúrgica. Destes, 20 preenchiam os critérios de inclusão no trabalho. As característi-cas gerais dos pacientes são apresentadas na Quadro 1.

QUADRO 1 – Características gerais dos pacientes

Nome Idade Sexo Extensão Lenke Cobb frontal Cobb sagital Risser Cur comp

MMG 13 F T5T12 1 B N 50 (23) 20 5 29

DJS 26 F T5L1 1BN 51(41) 25 5 41

CMF 14 F T1T6 T6T12 2 B N 50 (30)

32 (21) 20 4 5

RGAS 30 M T5T12 1 B - 62 (39) 5 5 37

MFAD 14 F T4T12 1 B N 42 (29) 20 4 28

RSG 15 F T6T11 1 B N 51(38) 20 4 38

APD 19 F T5T12 1 B N 55(38) 30 5 45

ML 14 F T6T11 1 B N 38(15) 30 2 30

JSP 14 F T6T12 1 B N 38 (20) 25 1 38

AB 13 F T5T12 1 B - 50 (16) 4 2 28

LAC 10 F T5L1 1 B N 66 (28) 10 0 50

SAO 13 F T5T12 1BN 57 (24) 14 4 36

CMG 14 F T5T11 1BN 54 (21) 12 3 34

NGC 14 F T5T12 1BN 55 (30) 20 3 40

JR 12 F T4T10 1CN 47 (34) 27 0 37

TPN 12 F T1T5 T6T12 2CN 49 (24)

68 (37) 36 2 51

PB 12 F T5T11 1BN 52 (20) 31 1 33

BBCC 13 F T4T11 1CN 57 (32) 18 4 45

CCCP 14 F T6T12 1BN 49 (23) 30 4 36

CCA 17 F T5T11 1C+ 50 (22) 41 4 42NOME = iniciais do nome dos pacientes; Idade = idade do paciente no momento da cirurgia; Sexo = F = feminino, M = masculino; Extensão = extensão das curvas estruturadas na coluna vertebral; Lenke = padrão de curvas segundo a classificação de Lenke; Cobb frontal = ângulo de Cobb no plano frontal pré-operatório das curvas estruturadas e entre ( ) a correção obtida com inclinação lateral; Cobb sagital = ângulo de Cobb no plano sagital pré-operatório T5 a T12; Risser = sinal de Risser no momento da cirurgia; Cur comp = ângulo de Cobb no plano frontal pré-operatório das curvas compensatórias não estruturadas

O sexo feminino representou 95% dos casos e o sexo mas-culino 5%. A idade variou de 10 a 30 anos (média etária de 15 anos) (Gráfico 1). De acordo com a classificação de Lenke9, dois

pacientes apresentavam curva do tipo 1B- (10%), 13 do tipo 1BN (65%), dois do tipo 1CN (10%), um do tipo 1C+ (5%), um do tipo 2BN (5%), um do tipo 2CN (5%) (Gráfico 2).

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No pré-operatório, a média do ângulo de Cobb co-ronal torácico foi de 51,2º (extremos de 32º a 68º), com a média do ângulo de inclinação corrigido de 27,5º. A média do ângulo de Cobb coronal lombar compensató-

ReSULTADOSO tempo cirúrgico médio foi de 3h 50min (variação de 3h a 6h 30min) e a média do tempo de internação foi de 3,5 dias. No pós-operatório, a média do ângulo de Cobb coronal obtido foi de 17,8º (extremos de 7º a 30º). A média do ângulo de Cobb sagital obtido foi de 23,7º (extremos de 12º a 44º) (Gráfico 4).

Os resultados dos ângulos de Cobb no plano coronal das curvas estruturadas pré e pós-operatórios estão repre-sentados pelo Gráfico 5.

Gráfico 3 – Valor pré-operatório do ângulo de Cobb no plano sagital

Gráfico 1 – Distribuição dos pacientes por idade

Gráfico 2 – Porcentagem dos pacientes por tipo de curva de Lenke

rio foi de 36,2º. A média do ângulo de Cobb sagital foi de 21,9º (extremos de 4º a 41º) sendo que dois pacien-tes apresentavam hipocifose (ângulo de Cobb < 10º) (Gráfico 3).

A média de correção do ângulo de Cobb no plano co-ronal foi de 65,4% (extremos de 47,4% a 88,23%) [p = 0.0001] enquanto a correção média pré-operatória com as inclinações laterais foi de 45,7% [p= 0.0001]. Conforme o padrão de curva de Lenke, as correções médias obtidas foram de: 56,25% no padrão 1B-, 68% no padrão 1BN, 54,5% no padrão 1CN, 56% no padrão 1C+, 65,5% no pa-drão 2BN, 72% no padrão 2CN (Gráfico 6).

Gráfico 4Valor pós-operatório do ângulo de Cobb no plano sagital

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Gráfico 7 – Porcentagem média de correção das curvas em cada tipo de curva de acordo com a classificação de Lenke

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Levando-se em consideração apenas o tipo das curvas, foi conseguida uma média de correção de 64,6% nas cur-vas tipo 1 e 68,8% nas curvas tipo 2 (Gráfico 7).

Em relação ao modificador lombar, obteve-se uma mé-dia de correção de 67% com modificador B e 58,9% com modificador C (Gráfico 8).

Não ocorreram lesões neurovasculares, infecções pós-operatórias ou outras complicações possíveis como: tromboembolismo, pneumotórax, falhas do material de síntese ou pseudartroses. Nesta série, foram colocados um total de 279 parafusos pediculares. Utilizou-se em média 14 parafusos pediculares por caso, com extre-mos de 11 a 19 parafusos. Ocorreu quebra do pedículo de T5 à esquerda em dois pacientes durante a punção e

instrumentação dos pedículos, sendo os parafusos retirados e os pedículos deixa-dos sem instrumentação. Esses eventos não tiveram repercussões neurovascula-res e tão pouco comprometeram as fixa-ções ou o grau de correção das curvas. Foram observadas correções espontâne-as das curvas lombares compensatórias com média de 62,2% de correção (ângulo de Cobb médio pré-operatório de 36,2º e pós-operatório de 13,7º) (Figuras 1 a 6). As medidas das curvas compensatórias

pré e pós-operatórias estão representadas no Gráfico 9.

As correções obtidas nas curvas estrutura-das após a instrumentação foram em média 19,7% superiores às obtidas nas radiogra-fias com inclinação lateral pré-operatórias (Gráfico 10).

Todos os pacientes apresentaram me-lhora estética importante das curvas e mostraram-se satisfeitos com o resultado. Nenhum paciente necessitou de revisão cirúrgica do procedimento. Os dados pós-operatórios obtidos são apresentados na Quadro 2.

Gráfico 5 – Valor pré e pós-operatório do ângulo de Cobb no plano frontal das curvas estruturadas

Gráfico 6 – Porcentagem média de correção das curvas em cada padrão de curva de acordo com a classificação de Lenke

Gráfico 8 – Porcentagem média de correção das curvas conforme o modificador lombar

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Gráfico 9 – Valor angular pré e pós-operatório das curvas compensatórias

Figura 1Paciente de nove anos e seis meses com deformidade evidente, desnivelamento de ombros, sinal do talhe e teste de Adams +

Figura 2Radiografias mostrando padrão de curva 1BN de Lenke. Neste paciente foi realizado tratamento ortótico sem sucesso

Figura 3Per-operatório (A) após colocação dos parafuros pediculares e (B) correção após colocação das hastes e dos conectores

Figura 4Radiografias pós-operatórias

Figura 5Radiografias pré-operatórias de paciente com 12 anos de idade e padrão de curva 2CN de Lenke (dupla torácica) Figura 6

Radiografias pós-operatórias da mesma paciente com correção espontânea da compensatória lombar

A B

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Gráfico 10 – Comparação entre o ângulo de Cobb das curvas estruturadas obtido no pré-operatório, com as inclinações laterais, e no pós-operatório, com a instrumentação das curvas

QUADRO 2 – Características dos valores angulares das curvas no pós-operatório e parâmetros relacionados com o tratamentoNome Cobb cor pós Cobb sag pós Instrum Temp cir Temp inter (dias) Cobb cur comp pós

MMG 22 25 T5T12 (11 paraf) 3h30min 4 2

DJS 21 33 T5T12 (16 paraf) 4h 3 20

CMF 22 e 8 22 T1T12 (13 paraf) 4h 4 3

RGAS 27 12 T4L1 (19 paraf) 6h 5 22

MFAD 7 25 T4T12 (14 paraf) 4h 3 4

RSG 20 20 T5L1 (14 paraf) 3h30m 3 20

APD 18 16 T5T12 (13 paraf) 3h15min 4 12

ML 9 28 T6T12 (12 paraf) 3h30min 4 13

JSP 18 28 T6L1 (12 paraf) 3h 4 18

AB 22 28 T5T12 (13 paraf) 3h 3 8

LAC 18 15 T5L1 (14 paraf) 4h 4 12

SAO 11 15 T5L1 (14 paraf) 3h 3 2

CMG 14 16 T5T12 (13 paraf) 4h30min 3 5

NGC 19 25 T5T12 (13 paraf) 4h30min 3 19

JR 18 44 T4T11 (13 paraf) 5h 3 20

TPN 13 e 20 30 T1T12 (19 paraf) 6h30min 4 22

PB 14 37 T4T12 (15 paraf) 3h30min 4 9

BBCC 30 22 T4T12 (14 paraf) 3h45min 4 24

CCCP 18 12 T5T12 (14 paraf) 3h 15min 3 18

CCA 22 22 T5T12 (13 paraf) 4h 7 22

NOME = iniciais dos nomes dos pacientes; Cobb cor pós = ângulo de Cobb frontal; Cobb sag pós = ângulo de Cobb sagital; Instrum = área de instrumentação; Temp cir = tempo de cirurgia; Temp inter = tempo de internação; Cobb cur comp pós = ângulo de Cobb da curva compensatória

DISCUSSÃOEm 2001, uma nova classificação de escoliose idiopática foi proposta por Lenke et al.9 permitindo a avaliação tridi-mensional da deformidade. Trata-se de uma classificação que utiliza três componentes (tipo da curva, modificado-res lombares e modificadores torácicos). Esta classificação leva em conta a deformidade em dois planos, orientando o cirurgião quanto às curvas principais e compensatórias, e, portanto, quanto à abordagem mais precisa e seletiva da deformidade, o que possibilita a fusão seletiva da curva to-

rácica, preservando a curva lombar compensatória até em pacientes com modificador lombar do tipo C10-12. Em nossa série, foram obtidas as correções das curvas compensató-rias com a artrodese seletiva apenas das curvas estrutura-das (Gráfico 9).

Kim Yongjung J. et al. demonstraram que com o uso de parafusos pediculares foi possível uma melhor correção da curva e melhora da função pulmonar comparando-se com a instrumentação híbrida (ganchos e parafusos)5.

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Os graus de correção obtidos nesta série estão de acordo com a literatura que aborda o tema13-17, sendo observados altos índices de correção das curvas no plano coronal, as-sim como de correção e manutenção do equilíbrio sagital.

Apesar da manobra derrotatória ser utilizada de modo rotineiro neste serviço para correção das curvas instrumen-tadas, não foram observados descompensações das curvas lombares decorridas dessa conduta; risco citado por Bri-dwell15 e por Lenke10, porém não observado na série de Suk14.

Newton analisou 203 pacientes com curvas de padrão 1B e 1C em um estudo multicêntrico17. Dividiu-os em dois grupos: os submetidos à fusão seletiva da curva torácica e os submetidos à fusão não seletiva. Seu objetivo foi anali-sar as características radiográficas pré-operatórias que in-fluenciariam os diversos cirurgiões a realizar, ou não, uma artrodese seletiva. Ele observou que 8% dos pacientes com curvas padrão 1B e 32% dos pacientes com curvas padrão 1C foram submetidos a fusões não seletivas. Diante dis-so, Newton descreveu alguns aspectos que influenciavam a escolha dos cirurgiões pelo uso de fusões mais extensas, dentre elas: uma curva compensatória lombar maior do que 40o a 45o; grau de rotação vertebral dominante do ápice da curva lombar em relação ao da curva torácica; diferença entre a magnitude das curvas torácica e lombar inferior a 20%, assim como uma diferença entre o desvio da linha

média das mesmas curvas inferior a 20%. Em nossa série, quatro casos possuíam curvas compensatórias iguais ou maiores que 45o. Todas foram submetidas à fusão seleti-va da curva torácica com cuidado especial em relação à hipercorreção e descompensação do tronco, sendo obtidos bons resultados. Concordamos com Newton que o grau de rotação da curva lombar dominante em relação ao da curva torácica e uma diferença entre o desvio da linha média das curvas inferior a 20% pode predispor à descompensação da curva lombar e observamos estes aspectos de rotina.

CONCLUSÃOTodos os 20 pacientes apresentaram melhora importante do aspecto estético, clínico e radiológico com correção signi-ficativa das curvas estruturadas e compensatórias no plano coronal, sem descompensações.

Além disso, conseguiu-se a manutenção do equilíbrio sagital na totalidade dos casos, aspecto de suma importân-cia devido à tendência natural da escoliose idiopática a uma hipocifose. Esse trabalho mostra indícios de eficácia e segu-rança do tratamento cirúrgico da escoliose idiopática, uti-lizando-se apenas parafusos pediculares, de forma seletiva nas curvas estruturadas. Não ocorreram lesões neurovascu-lares associadas à técnica. Estudos prospectivos com longo tempo de seguimento são necessários para a comprovação definitiva desta abordagem.

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Page 9: Instrumentação seletiva na escoliose idiopática em curvas ... · Instrumentación selectiva en la escoliosis idiopática en curvas con modificador lumbar B y C ... escoliosis idiopática

COLUNA/COLUMNA. 2008;7(4):315-323

323Instrumentação seletiva na escoliose idiopática em curvas com modificador lombar B e C

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Correspondência

Cristiano Magalhães Menezes

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