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DELIBERADOR, M. S.; KOWALTOWSKI, D. C. C. K. Importância dos agentes para a arquitetura escolar: aplicação de jogo de apoio ao processo participativo. Ambiente Construído, Porto Alegre, v. 18, n. 2, p. 273-288, abr./jun. 2018. ISSN 1678-8621 Associação Nacional de Tecnologia do Ambiente Construído.
http://dx.doi.org/10.1590/s1678-86212018000200254
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Importância dos agentes para a arquitetura escolar: aplicação de jogo de apoio ao processo participativo
The importance of stakeholders for school architecture: a game to support participatory processes
Marcella Savioli Deliberador Doris Catharine Cornelie Knatz Kowaltowski
Resumo iscutir a melhoria na educação significa trabalhar em uma abordagem
multidisciplinar que inclua os diversos agentes, cada um contribuindo
em sua área para que sejam repensados os novos modelos
educacionais. Os processos de projetos escolares deveriam incluir não
só especialistas diversos da área de educação, como também profissionais de
projeto, consultores de várias áreas e a comunidade escolar. Para isso, este artigo
discute os processos participativos e apresenta uma ferramenta de suporte ao
programa arquitetônico aplicada com a metodologia dos grupos focais. Em termos
metodológicos, essa pesquisa fundamentou-se em revisão bibliográfica, no
desenvolvimento de ferramenta em formato de jogo, nos testes realizados por meio
de grupo focal, na elaboração do programa arquitetônico e na avaliação dos
resultados. O jogo, definido como um baralho, está dividido em quinze naipes,
cada um representando uma temática importante para a arquitetura escolar. A
inclusão dos diversos agentes garantiu que as diversas vozes fossem ouvidas e
proporcionou um novo olhar sobre o edifício. Entende-se que esse tipo de processo
busca o desenvolvimento de meios que visem à ampliação da qualidade do projeto
e da educação.
Palavras-chaves: Agentes. Arquitetura escolar. Processo participativo de projeto.
Programa arquitetônico. Jogos de apoio.
Abstract
In order to improve education many steps and actions are necessary. New schools have an impact on society and the buildings need to express environmental, social, technical and economical values. Several different stakeholders should be involved in the discussion of new educational models. The physical environment must be included in the debates and the design process of new schools should include educational specialists, design professionals and the school community. The methodological question here is how to make the participation of such a diverse group of people feasible. This article discusses different stakeholders that should be involved in a participatory design process at the briefing phase. The methodology used in this study is based on a literature review of architectural programming tools and design parameters for school buildings. A game was developed to function as a support tool. A focus group methodology was used to test the tool for briefing. The tool, similar to a deck of cards, is divided into fifteen suites, which represent essential topics related to school architecture. The application of this game structures the debate in the focus group. A simulation of that participatory process is described. The inclusion of the different stakeholders ensured that the different voices were heard and the results show that each stakeholder has his or her individual contribution to the debate. A participatory design process supported by this type of tool can aid in the development of ways to improve the quality of school buildings, as well as the quality of education as a whole by giving support to better learning environments.
Keywords: Stakeholders. School architecture. Participatory design process. Briefing. Support games.
D
Marcella Savioli Deliberador Universidade Estadual de Campinas
Campinas – SP - Brasil
Doris Catharine Cornelie Knatz Kowaltowski
Universidade Estadual de Campinas Campinas – SP - Brasil
Recebido em 03/03/17
Aceito em 12/08/17
Ambiente Construído, Porto Alegre, v. 18, n. 2, p. 273-288, abr./jun. 2018.
Deliberador, M. S.; Kowaltowski, D. C. C. K. 274
Introdução
Diversas são as abordagens importantes ao se
discutir a necessária melhoria na educação,
especialmente no caso de países em
desenvolvimento como o Brasil. A
multidisciplinariedade das propostas deve incluir os
diversos agentes em um esforço conjunto, em que
cada um contribui para serem pensados novos
modelos educacionais para a realidade atual. Isso
significa que se deve refletir sobre as importantes
questões envolvidas com a educação, tais como as
pedagogias, a formação dos professores e outros
profissionais da área, bem como a infraestrutura
física necessária. Essa última inclui a arquitetura
escolar de qualidade.
As pesquisas vêm demonstrando que existe relação
entre a qualidade espacial e a capacidade de
aprendizado dos alunos (BARRETT et al., 2015).
Garantir essa qualidade implica processos de
projeto bem estruturados e com o suporte adequado.
Esse apoio não depende somente das equipes de
profissionais de projeto, mas também de outros
agentes. Nesse sentido, deveriam ser incluídos tanto
os especialistas diversos da área de educação
(pedagogos, psicólogos, sociólogos, representantes
dos órgãos governamentais) quanto profissionais de
projeto (arquitetos, engenheiros, paisagistas,
urbanistas) e consultores de várias áreas (conforto
ambiental, sustentabilidade, psicologia ambiental,
saúde e segurança), entre outros. A comunidade
escolar deveria participar e ser representada por
diferentes tipos de alunos, por pais, professores,
diretores e outros funcionários, bem como por
membros da vizinhança. Existem ainda
especificidades de cada local que devem ser
incorporadas.
A partir do cenário acima descrito, destaca-se a
importância em conduzir processos capazes de
incluir esses diversos agentes envolvidos com a
comunidade escolar. Desse modo pode-se
contribuir para um processo que resulte na
proposição de soluções que atinjam o cerne das
questões educacionais, mas que também seja
adequado às questões atuais, como as ambientais,
técnicas, culturais, sociais, entre outras. O mundo
da educação está em constante mudança, os espaços
escolares apresentam dificuldades em acompanhar
tal processo, e sabe-se que no Brasil poucos são os
ambientes que tiveram sua natureza física
influenciada por novos métodos de ensino. Muitas
das avaliações pós-ocupação (APO) indicam
diversos tipos de problemas no ambiente escolar,
desde questões relacionadas ao conforto até aquelas
relativas à adequação dos espaços às atividades
realizadas (ELALI, 2002; FUNARI;
KOWALTOWSKI, 2005; ORNSTEIN, 2005;
DELIBERADOR, 2010; KOWALTOWSKI,
2011).
Deliberador (2010) apresentou a caracterização dos
processos de projeto dos arquitetos que
desenvolvem projetos para a Fundação para o
Desenvolvimento da Educação (FDE), órgão
responsável pela construção e manutenção dos
edifícios escolares públicos do Estado de São Paulo.
Mesmo partindo da particularidade da FDE, essa
caracterização pode refletir a realidade dos
processos brasileiros de projetos de escolas
públicas, que enfrentam dificuldades similares por
todo o país. Os projetos conduzidos pela FDE, ainda
que passíveis de críticas, apresentam um padrão de
qualidade superior quando comparados aos
descritos no panorama nacional. A FDE é uma
importante referência de processo de projeto,
construção e manutenção de escolas no âmbito
nacional. Tal caracterização, realizada a partir de
entrevistas com os arquitetos e com a FDE, indicou
que um dos problemas está relacionado com o fato
de o programa arquitetônico ser rígido, padronizado
e com pouco espaço de manipulação para que sejam
atendidas demandas específicas de cada projeto.
A falta da participação da comunidade em uma
reflexão sobre parâmetros de projeto, considerada
essencial à arquitetura escolar de qualidade, foi
outra característica destacada na literatura
específica e ausente no processo atual (AZEVEDO,
2002; WOOLNER, 2009). Novas metodologias
pedagógicas vêm sendo desenvolvidas, e torna-se
necessário repensar os espaços da arquitetura
escolar, o que também indica a necessária
participação da comunidade (DELIBERADOR,
2010; TAYLOR; ENGGASS, 2008). Por outro
lado, tal caracterização indicou caminhos
interessantes de serem explorados visando à
melhoria do ambiente escolar construído. Um deles
foi a criação de ferramentas de apoio ao processo de
projeto em diversas etapas (DELIBERADOR;
KOWALTOWSKI, 2015).
Pensando a realização de um novo projeto escolar,
outras questões tornam-se relevantes. A integração
entre os diversos agentes deve enriquecer o
processo de projeto, mas, ao mesmo tempo, torna a
tarefa de programar as necessidades arquitetônicas
ainda mais complexa e desafiante aos profissionais
envolvidos. A partir dessa premissa, o objetivo
deste artigo é discutir o papel dos agentes em um
processo participativo de projeto de arquitetura
escolar e demonstrar a importância de estruturação
desse processo através de ferramentas de apoio. O
enfoque é demonstrar a importância da participação
dos diversos agentes para a construção de um
programa arquitetônico que discute e define os
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diversos desafios da arquitetura escolar. Uma
ferramenta de apoio é apresentada em forma de
jogo. Tal ferramenta aborda as temáticas
consideradas essenciais à arquitetura escolar e
estrutura o debate no processo participativo.
Metodologia
Quando se trata de um projeto arquitetônico a ser
apropriado por diversas pessoas, como é o caso de
edifício escolar, a questão metodológica é como
viabilizar a participação efetiva do coletivo
(MORGAN, 1997). Nesta pesquisa, as etapas
metodológicas abaixo foram seguidas:
(a) análise da literatura, cujos resultados
indicaram:
- a importância do programa arquitetônico (fase
analítica) para a elaboração do projeto e a
relevância do processo participativo como
elementos essenciais para o desenvolvimento de
um projeto de qualidade;
- a necessidade da aplicação de métodos para a
elaboração de programa arquitetônico completo;
- o conteúdo do programa arquitetônico,
especificamente em razão da dinâmica da
educação que impacta o ambiente escolar e sua
configuração espacial; e
- os tipos de agentes que deveriam participar, sua
importância na discussão do conteúdo e os
métodos que permitem a efetiva colaboração
desses agentes.
(b) desenvolvimento de ferramenta de apoio ao
debate dos agentes, em forma de jogo;
(c) teste com os agentes, na forma de um grupo
focal, para aplicação do jogo;
(d) elaboração do programa arquitetônico a partir
das informações obtidas no grupo focal, com o
preenchimento de fichas desenvolvidas baseadas
no Problem Seeking (PEÑA; PARSHALL, 2012) e
disponíveis em Deliberador (2016); e
(e) análise da experiência do grupo focal e do
resultado obtido na forma de um programa
arquitetônico.
Arquitetura e processo de projeto escolar
Muitos são os aspectos considerados essenciais para
a obtenção de uma arquitetura escolar de qualidade,
os quais precisam estar em acordo com as realidades
em que serão inseridos, respeitando as
peculiaridades inerentes a cada processo. A
possibilidade de uma arquitetura de qualidade para
a tipologia escolar depende de focar a configuração
dos ambientes nos alunos e usuários, sendo as
soluções apropriadas a cada faixa etária e geradoras
de ambientes seguros, confortáveis, acessíveis,
flexíveis e equipados, além de aplicar
adequadamente os recursos financeiros disponíveis
(LACKNEY, 2000). Muito se discute sobre as
tendências pedagógicas e as respostas
arquitetônicas a elas oferecidas, o que significa que
as soluções propostas devem estar adequadas às
atividades previstas no ensino, de acordo com a
proposta pedagógica que a escola pretende
implantar (HILLE, 2011; KOWALTOWSKI, 2011;
WOOLNER, 2010; BARRETT et al., 2015; UCCI
et al., 2015).
Os espaços devem ser projetados para que
estimulem a curiosidade natural, transformando a
arquitetura em uma ferramenta de aprendizado
(TAYLOR; ENGGASS, 2008). A bibliografia
sobre metodologias pedagógicas sinaliza novos
paradigmas que pressupõem maior flexibilidade de
uso dos espaços, com presença de maior variedade
de configurações (HIGGINS et al., 2005; DEED;
LESKO, 2015). Assim, edifícios escolares não
podem se resumir a um conjunto de salas de aula,
sendo necessário incluir espaços de estudo
individuais e em grupo, laboratórios específicos,
espaços de convívio diversos, entre outros que
possibilitem a experiência de aprendizado em sua
plenitude.
As práticas pedagógicas vigentes demandam
aprendizados baseados em projetos, ou seja,
trabalhos multidisciplinares e integrados, que aliam
teoria e prática. Geralmente, apresentam resultados
com maquetes, cartazes ou outros meios capazes de
divulgar o trabalho desenvolvido em determinado
período. Isso exige maior espaço e suporte
arquitetônico para os diferentes usos e para as
diferentes relações entre professores, alunos, pais e
comunidade que se estabelecem no ambiente
escolar (TAYLOR; ENGGASS, 2008). A inclusão
desses agentes no processo de projeto pode
significar melhor adequação dos espaços propostos,
de acordo com a necessidade de cada local e de cada
comunidade que irá receber o novo edifício escolar.
Com relação ao processo do projeto escolar, não se
pode deixar de mencionar a importância do
processo de projeto integrado. Esse processo
pressupõe algumas características metodológicas,
como trabalho multidisciplinar, base consensual de
projeto, participação e motivação do cliente,
inclusão de especialistas em energia, conforto e
sustentabilidade, uso de ferramentas de simulação,
engenharia de valor, banco de dados e APO. Nesse
processo, a fase do programa ganha destaque,
incluindo a participação dos clientes, futuros
usuários e os especialistas que devem estar
envolvidos em todas as etapas de projeto e
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construção (FIGUEIREDO, 2009; NEGENDAHL,
2015).
A partir dos argumentos apresentados, evidencia-se
a necessidade de estudos aprofundados sobre as
etapas do processo de projeto consideradas ainda
distantes do processo de referência indicado pela
literatura (KOWALTOWKI; DELIBERADOR,
2014), sendo o programa arquitetônico uma dessas
fases. O desafio é conduzir a etapa de programação
visando a um produto que alimente o processo
criativo de projeto e ainda controle, com a eficiência
e a produtividade desejáveis, possíveis processos de
projeto participativos.
Programa arquitetônico escolar
A reflexão sobre uma arquitetura escolar de
qualidade inicia-se a partir da premissa de que o
pensamento qualitativo e o planejamento devem
começar antes do projeto propriamente dito. O
planejamento da etapa de programação ganha
importância à medida que afeta diretamente o
processo de projeto (ZHANG; LIU, 2014). Muitas
novas propostas de projetos escolares, pressionadas
para economizar tempo e dinheiro, dispensam essa
importante etapa. No entanto, cada solicitação para
um novo projeto deveria ser entendida como um
novo problema a ser resolvido, com características
e demandas próprias a serem consideradas.
Ao se lidar com problemas de projeto com soluções
previamente desenvolvidas, limitam-se as
possibilidades criativas e impossibilita-se a
participação dos usuários, ambos aspectos
importantes quando se trata do ambiente escolar
(TAYLOR; ENGGASS, 2008). Perde-se a
oportunidade de refletir sobre antigos hábitos e de
analisar sua eficácia ante as metodologias atuais.
Além disso, os níveis qualitativos para o suporte
correto dos ambientes escolares não são
necessariamente encontrados em códigos ou
especificações escolares (TAYLOR; ENGGASS,
2008), o que incrementa a importância da etapa do
programa, em que devem ser reunidas as
informações para a etapa do projeto.
O programa articula valores aos quais o arquiteto
deverá responder em seu projeto (crenças,
filosofias, ideologias, propósitos e ideias), que são
a razão de ser do edifício, devendo, portanto,
influenciar o modo como ele será projetado
(HERSHBERGER, 1999). Nesse sentido, destaca-
se a importância do processo participativo que
permite a inclusão de aspectos típicos de cada
localidade. Sabe-se da dificuldade de conduzir esse
tipo de participação em função de razões
econômicas, políticas e de organização social.
Entretanto, ela vem sendo cada vez mais valorizada
como uma maneira de, por um lado, enriquecer o
processo criativo dos arquitetos e, por outro,
aumentar o sentimento de pertencimento e inclusão
da comunidade envolvida (DELIBERADOR,
2016).
O processo de projeto de escolas deve incluir
alunos, pais, professores, funcionários, arquitetos,
construtores, pedagogos, consultores de várias áreas
e também os membros da comunidade, pois estes
são considerados os agentes responsáveis por um
novo empreendimento escolar (DUDEK, 2000;
COMMISSION..., 2004). A falta de um programa
arquitetônico completo pode prejudicar o resultado,
inclusive porque, na realidade das escolas públicas
brasileiras, não se dá prazo suficiente ao
desenvolvimento do processo de modo a
possibilitar que os profissionais busquem as
informações faltantes e necessárias durante o
próprio desenvolvimento do projeto. Nesse
processo podem, portanto, faltar dados,
necessidades e referências, o que pode resultar em
uma solução final pouco amadurecida com relação
aos parâmetros considerados essenciais à realidade
específica que está sendo trabalhada.
Agentes envolvidos no processo participativo
O processo de projeto participativo é uma
metodologia que se aplica a algumas etapas do
processo de projeto arquitetônico e consiste na
aplicação de atividades colaborativas em que
futuros usuários (ou usuários “tipos”) atuam
oferecendo opiniões e pontos de vista que poderão
influenciar as definições acerca do projeto final
(LUCK, 2007; DEL RIO; IWATA; SANOFF,
2000).
A prática do processo participativo foi desenvolvida
a partir dos anos 60. Entretanto, muitas vezes esse
direito de participar acaba sendo limitado por
pressões financeiras ou de tempo, o que inviabiliza
uma atuação eficaz pelos participantes (REICH et
al., 1996; SANDERS; BRANDT; BINDER, 2010).
Deve-se frisar que, sem abrir mão do conhecimento
técnico e científico do arquiteto, a atividade de
projeto deve se constituir em um processo
democrático e construtivo, por incluir a participação
de futuros usuários para gerar espaços melhores,
mais adequados e agradáveis (DEL RIO; IWATA;
SANOFF, 2000).
O estímulo à participação desde as primeiras fases
do projeto vem sendo uma tendência indicada pela
literatura, uma vez que possibilita a adequação do
próprio programa às necessidades de determinado
público. A condução desses processos, de forma
ética e de forma a realmente considerar os aspectos
levantados pelos participantes, não é tarefa simples.
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Existem abordagens desses processos que apenas
visam ao levantamento de algumas informações
objetivas e ao apaziguamento dos envolvidos, que
se constituem em abordagens que levam, na
realidade, a uma pseudoparticipação, e não à
participação genuína (WOOLNER, 2009),
devendo, portanto, ser evitadas.
O objetivo primordial de um processo participativo
é que se reconheçam mecanismos de aprendizado
em duas diferentes vias: por um lado, futuros
usuários que irão aprender mais sobre determinado
projeto e sobre os eventos a ele relacionados, e, por
outro, arquitetos e demais profissionais envolvidos
que deverão aprender mais sobre a situação
específica trazida pelos participantes (LUCK, 2007;
WOOLNER, 2009).
A implementação desse tipo de processo demanda a
aplicação de uma dinâmica de suporte por meio de
ferramentas de apoio que busquem viabilizar a
participação do coletivo, desde as etapas iniciais do
processo de projeto. O grupo deve ser composto por
todos os agentes capazes de contribuir com o
planejamento de uma nova escola. A participação
de alunos é fundamental, entretanto, dependendo da
idade, devem participar em atividades planejadas
exclusivamente para eles, com menor duração,
especialmente no caso de crianças menores. Nesse
sentido podem-se utilizar metodologias como
“Poemas de Desejo”, em que as crianças
manifestam seus desejos para um novo ambiente
escolar ou com “Walkthrough” (“passeio” em uma
edificação escolar típica) especialmente
desenvolvidos para serem realizados com crianças
(SANOFF, 2001). Já para escolas de ensino médio,
os alunos podem ser incluídos como integrantes dos
processos participativos que utilizam técnicas como
questionários, avaliação de satisfação, debates e
outras metodologias.
Como se trata de diferentes usuários, com diferentes
formações, culturas e personalidades, a condução
adequada da discussão é essencial para o sucesso da
realização do processo de projeto participativo, o
que implica a necessidade de aplicação de
metodologias específicas para cada grupo. A
definição do grupo inclui o conhecimento de quem
são os agentes que devem ser incluídos no processo.
A seguir, uma breve descrição desses agentes da
tipologia escolar para reflexão sobre como cada um
pode contribuir para tornar o processo mais rico e
completo.
Especialistas diversos da área de educação: pedagogos, psicólogos,
sociólogos, representantes dos órgãos governamentais
Aos educadores cabe a reflexão sobre quais
atividades serão desenvolvidas nos espaços, quais
as necessidades pedagógicas da escola e como essas
se refletem na organização espacial do ambiente
escolar. Esses profissionais trazem informações
essenciais sobre as novas metodologias
pedagógicas. Também se pode refletir sobre como
o espaço pode influenciar o comportamento das
crianças e jovens e quais são as configurações
consideradas ideais para a aplicação dos conceitos e
teorias pedagógicas no cotidiano escolar.
Profissionais de projeto (arquitetos, engenheiros, paisagistas, urbanistas) e consultores de várias áreas (conforto ambiental, sustentabilidade, psicologia ambiental, saúde e segurança)
Esses profissionais devem traduzir todas as
informações conceituais definidas por suas áreas de
atuação, assim como pela comunidade, para a
constituição espacial do edifício escolar. Cabe a
discussão da qualidade espacial e de sua capacidade
de adaptação para os novos usos, fruto das novas
modalidades pedagógicas e das mudanças sociais
vividas. Embora nem sempre incluída nas
discussões sobre a melhoria educacional, a
qualidade espacial vem se mostrando cada vez mais
relacionada à capacidade de aprendizado dos alunos
(SANOFF, 2001; TARALLI, 2004;
COMMISSION..., 2009). Os conceitos, desejos e
necessidades devem ser expressos em termos das
atividades a serem realizadas e, consequentemente,
em espaços, traduzidos em áreas, índices de
desempenho, características desejadas, etc. Os
consultores têm papel essencial desde o início do
processo de projeto, agindo para potencializar as
decisões tomadas e indicando os melhores partidos
para que todos os conceitos possam ser atendidos,
respeitando as normas mínimas e também os índices
desejáveis de conforto e sustentabilidade para os
espaços. Quanto mais cedo esses consultores
estiverem inseridos no processo de projeto através
do projeto colaborativo, maiores serão as
possibilidades de soluções que abranjam os
diversos aspectos importantes de forma ideal.
Comunidade escolar: alunos, pais, funcionários, professores, diretores e membros da vizinhança
A inclusão da comunidade traz aos programadores
uma visão essencial daqueles que vivem ou viverão
a realidade do novo edifício escolar. Isso significa
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que esse grupo trará informações sobre como
funciona aquele grupo de pessoas, quais são suas
necessidades reais e também seus desejos. Todos
esses agentes participam ativamente do dia a dia
escolar e possuem características bastante
peculiares, que devem fazer parte do programa das
escolas. Nesse sentido, alunos de diversas idades
que serão atendidas pelo edifício escolar devem
fazer parte do processo, ainda que para isso sejam
necessárias metodologias adequadas, tais como
jogos e outras dinâmicas. Os pais, por serem parte
importante do cotidiano, devem participar trazendo
um olhar relacionado com suas expectativas sobre o
ambiente escolar. Além disso, funcionários
diversos, incluindo professores, diretores, da área
de manutenção, da cozinha, etc., têm contribuição
essencial ao processo, dada sua experiência com o
funcionamento e com a rotina da escola em seu
todo. A comunidade do entorno é bastante
impactada pelo projeto de novas escolas, devendo
também fazer parte dessa discussão.
A organização da colaboração entre diferentes
pessoas, com diferentes competências e interesses é
um desafio aos arquitetos, que necessitam de
sistemas específicos que ofereçam suporte a esse
tipo de processo (BRANDT, 2006; SANDERS;
BRANDT; BINDER, 2010). A inclusão desses
agentes traz dificuldades relacionadas com as
expectativas criadas, que nem sempre podem ser
atendidas em sua totalidade. Assim, ferramentas de
apoio à participação podem colaborar para
direcionar as discussões e organizar as informações
obtidas de modo a estarem sustentadas na realidade
possível de ser obtida pelo projeto final. Nesse
sentido, a seguir se apresenta a metodologia dos
grupos focais que pode ser utilizada e uma
ferramenta de apoio desenvolvida para a etapa do
programa arquitetônico participativo.
Método do grupo focal para o processo de projeto participativo
Diversos são os métodos indicados pela literatura
para a realização de processos participativos. Uma
das metodologias indicadas são os grupos focais
(VILLA; ORNSTEIN, 2016). Existem diversas
definições para “grupo focal”, mas, de modo geral,
pode-se afirmar ser esta uma metodologia de
investigação e coleta de dados adequada à pesquisa
qualitativa (ELALI; PINHEIRO, 2016;
KRUEGER; CASEY, 2000). É realizada a partir de
entrevistas em grupo, mas não no sentido de
alternarem-se perguntas dos pesquisadores com
respostas dos entrevistados, mas sim focada na
interação do grupo como um todo (PUCHTA;
POTTER, 2006). A discussão deve ser conduzida
em torno de tópicos sugeridos pelo pesquisador,
que, geralmente, assume o papel de moderador da
discussão. A marca do grupo focal é o uso explícito
da interação do grupo com a intenção de produzir
dados e insights que poderiam ser menos acessíveis
sem a interação proposta por essa metodologia
(MORGAN, 1997). Templeton (1994) destaca que
os grupos focais são pequenas comunidades
temporárias, formadas com o propósito de realizar
descobertas em conjunto sobre determinado
assunto.
O planejamento de um grupo focal inclui a
definição sobre como serão coletados os dados,
quais serão os instrumentos necessários, assim
como a definição sobre como serão estruturados os
grupos, incluindo o nível de interação do
moderador. Também deve ser definido o tamanho
de cada grupo e o número de sessões que deverão
ser realizadas. Além do moderador, que conduz a
discussão, deve-se contar com o observador, que faz
as anotações e não deve interferir, para não misturar
os papéis (MORGAN, 1997; GOMES; BARBOSA,
1999; KRUEGER; CASEY, 2000; FARBSTEIN;
WENER; MCCUNN, 2016). Para garantir a
eficiência de um grupo focal, sabe-se que ele deve
abranger o maior número de temáticas relevantes ao
assunto em questão e buscar os dados mais
específicos possíveis. Muitas vezes os dados
produzidos podem ser vagos caso as temáticas não
sejam bem explicadas aos participantes (PUCHTA;
POTTER, 2006). Também se deve buscar
identificar os sentimentos dos participantes e
considerar o contexto utilizado por eles para
elaborar suas respostas, garantindo um grupo focal
realmente efetivo (MORGAN, 1997).
O início da sessão deve ocorrer com a introdução do
tópico de maneira direta e sem grandes
aprofundamentos, para não direcionar a
participação dos envolvidos. A seguir se
apresentam as regras de trabalho, e o moderador
descreve como deverá ser sua própria atuação
durante a sessão. No caso de haver também um
observador, que ficará responsável pela coleta dos
dados e observação da interação dos envolvidos, a
função dele também deve ser brevemente indicada.
Deve-se apresentar a questão a ser discutida e
algumas ideias iniciais que ajudem na discussão. O
moderador deve seguir a orientação das questões
previamente elaboradas e trabalhar para incentivar
a participação de todos ao longo das discussões.
Diferentemente de outras técnicas de reunião, seu
objetivo é geralmente a sinergia entre as pessoas:
quanto mais ideias surgirem, melhor.
A análise dos resultados não é tarefa fácil. Após
cada sessão, os pesquisadores devem reunir as
anotações do trabalho, os sumários e qualquer outro
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dado relevante para analisar tendências e padrões
(GOMES; BARBOSA, 1999).
A utilização da metodologia participativa por meio
do grupo focal foi utilizada nesta pesquisa como
forma de testar a ferramenta desenvolvida, descrita
mais adiante. A metodologia se mostrou adequada,
especialmente por ajudar na organização das
discussões realizadas nos testes, que incluíram
grupos formados pelos diversos agentes envolvidos
na prática escolar.
Jogos como ferramentas de apoio ao processo de projeto participativo
Os jogos são técnicas que podem ser utilizadas para
apoiar o processo de projeto participativo e facilitar
a decisão sobre as características indispensáveis a
determinado projeto. Na prática, o programa é uma
atividade cujo objetivo é desenvolver e avaliar
diversas opções para a organização do espaço de um
edifício e de seu entorno e descobrir relações entre
funções e espaços, testando conceitos
programáticos (PEÑA; PARSHALL, 2012). Os
jogos podem ser usados de duas maneiras: por
equipes compostas apenas por especialistas ou em
processos de projeto participativos, que incluem
futuros usuários nas etapas de programação e de
concepção do projeto. Eles permitem que sejam
estudadas ações de projeto e que se providencie um
ambiente manipulável e bem definido
(HABRAKEN; GROSS, 1987).
De forma geral, os jogos são descritos como
atividades de competição, com regras específicas,
em que a força, a técnica, o acaso ou uma
combinação desses fatores atua para definir o
vencedor. Eles possibilitam o isolamento de certos
conceitos ou aspectos de determinado projeto para
que sejam minuciosamente estudados
(HABRAKEN; GROSS, 1987; BRANDT;
MESSETER, 2004). No caso dos jogos como
ferramentas de apoio ao processo de projeto, o
objetivo não é obter um jogador vencedor, e sim
tirar vantagem das diferentes habilidades e
interesses dos participantes, sejam eles especialistas
ou futuros usuários, estabelecendo diferentes
cenários de projeto possíveis, simulados em um
ambiente de jogo (BRANDT, 2006). Os critérios e
os conjuntos de regras para a aplicação dos jogos,
além de uma razoável compreensão dos objetivos
por parte dos participantes, são aspectos essenciais
para o sucesso das atividades (PEÑA; PARSHALL,
2012). Diversos são os tipos de jogos que a
literatura apresenta como apoio aos processos de
projeto, dependendo da etapa e dos objetivos que se
pretende alcançar. Pode-se mencionar como
exemplos o Workplace Game (DE BRUYNE; DE
JONG, 2008), no qual a ideia é a discussão sobre
propostas inovadoras para os ambientes de trabalho
em escritório, e o “DCBA” (AALBERS; KONING;
TEEUW, 2010), que é um método de avaliação e
tomada de decisão sobre estratégias de
sustentabilidade dos edifícios desenvolvido a partir
de um jogo de cartas.
No caso da tipologia escolar brasileira, o apoio no
formato de jogos ainda não é comum em processos
de projeto, mesmo que possa se constituir em um
suporte adequado à etapa de programação. A
ferramenta de apoio desenvolvida nesta pesquisa
estimula os debates dessa etapa, de forma a garantir
maior qualidade das informações obtidas, assim
como colaborar para a condução ética nos processos
de projeto participativos (DELIBERADOR;
KOWALTOWSKI, 2015). A ética no processo
participativo é indispensável para que os
compromissos firmados com os envolvidos estejam
de acordo com as possibilidades reais do projeto e
para que todos tenham voz e direito de expor suas
opiniões. Para isso, acredita-se serem importantes
novas metodologias apoiadas em ferramentas com
imagens que traduzam os parâmetros previamente
estudados. O objetivo é que tais parâmetros sejam
facilmente compreendidos pelos participantes,
assim como funcionem como indicadores aos
próprios arquitetos já na fase de projeto,
estimulando, em ambos os casos, reflexões
aprofundadas sobre o ambiente escolar.
Resultados
Baralho da Escola
A criação de uma ferramenta no formato de um jogo
foi definida a partir das vantagens apresentadas pela
literatura e por ser um modelo bastante adequado
para aplicação em processos participativos, como
mencionado na metodologia. A ferramenta de apoio
para o processo de projeto apresentada aqui é um
jogo de cartas, no formato de um baralho, chamado
Desembaralhando a Arquitetura Escolar
(DELIBERADOR, 2016). Ele está dividido em
quinze naipes, e cada um representa uma temática
importante nas discussões participativas. O
conteúdo dos naipes foi levantado na literatura,
incluindo estudos nacionais e internacionais, que
indicaram os temas e os parâmetros a serem
discutidos. A definição das cartas de cada naipe,
assim como a configuração delas foi baseada nos
conceitos dos parâmetros de projeto
(ALEXANDER; ISHIKAWA; SILVERSTEIN,
2013; NAIR; FIELDING; LACKNEY, 2009). A
opção por trabalhar com parâmetros de projeto com
base no trabalho desses autores justifica-se por se
tratar de um de formato adequado para a concepção
Ambiente Construído, Porto Alegre, v. 18, n. 2, p. 273-288, abr./jun. 2018.
Deliberador, M. S.; Kowaltowski, D. C. C. K. 280
de conceitos de projeto, o que justifica sua
utilização para o desenvolvimento de uma
ferramenta de apoio à etapa de programa
arquitetônico (LASEAU, 2001). Um parâmetro de
projeto deve descrever um problema que se repete
no ambiente e propor uma solução conceitual que
pode ser utilizada diversas vezes, sem resultar na
mesma solução física (ALEXANDER;
ISHIKAWA; SILVERSTEIN, 2013; WALDEN,
2015). Parâmetros não implicam verdades
absolutas, mas sim descrevem um conjunto de
relações que respondem a dada situação ou
circunstância e que, por sua natureza, estão em
constante mudança (WALDEN, 2015). A
informação básica de um parâmetro inclui uma
necessidade programática e um contexto, uma
afirmação concisa verbal e gráfica de uma possível
resposta ao problema e uma descrição mais
detalhada da proposta ou discussão do parâmetro,
que pode ser opcional.
Os naipes que compõem o jogo estão apresentados
no Quadro 1. Um exemplo de naipe do jogo pode
ser visualizado na Figura 1. O desenvolvimento
completo da ferramenta, com a justificativa da
escolha dos naipes e dos parâmetros de projeto,
pode ser conhecido em Deliberador (2016). Optou-
se aqui por apresentar de forma resumida a versão
final do jogo, pois o foco deste artigo é a discussão
sobre a aplicação do jogo com foco na participação
dos diversos agentes para a etapa de programação.
Aplicação do Baralho da Escola através do grupo focal
A ferramenta do jogo de cartas Baralho da Escola
foi aplicada diversas vezes como teste para orientar
as adaptações necessárias. Para a aplicação do
projeto participativo, focado na inclusão dos
diversos agentes, o método escolhido foi a
realização de um workshop no formato de um grupo
focal, que simulou um processo de projeto
participativo. A preparação desse grupo focal
incluiu a fase de planejamento, na qual se definiram
suas características, como duração, número e tipo
de participantes, atuação da mediadora, etc. Em
termos gerais, planejou-se um período de trabalho
de três horas e meia aproximadamente para o grupo
focal. A formação deveria incluir a maior variedade
possível de agentes, desde os relacionados à equipe
de projeto (arquitetos, engenheiros, construtores,
etc.) até aqueles da área de pedagogia e os usuários-
tipo (pais, alunos, professores, diretores).
O grupo focal foi criado com o objetivo de simular
a programação de uma escola pública de ensino
fundamental I e II. Esse grupo focal foi formado por
duas professoras e uma diretora de escolas públicas,
uma pedagoga (professora universitária especialista
em políticas públicas na educação), um pai de aluno
de escola pública, um engenheiro de obra que
trabalha em empreiteira que mantém contratos de
projetos escolares públicos da FDE e um arquiteto.
Não foram incluídos alunos, uma vez que a escola
em questão se destinava a um público de crianças
menores, cuja participação deve ser considerada por
meio de outras metodologias. Além disso, o grupo
focal ainda incluía um observador e um mediador
da discussão (Figuras 2 e 3). A mediadora não
necessitou de treinamento prévio, pois a função foi
exercida pela própria pesquisadora. O observador e
o arquiteto que conduziu a discussão foram
informados previamente para que conhecessem o
conteúdo do jogo e pudessem conduzir o grupo
focal adequadamente.
Quadro 1 - Naipes do jogo
Naipe 1 Aspectos pedagógicos Naipe 9 Espaços de serviços dos alunos
Naipe 2 Modalidades de ensino Naipe 10 Áreas sociais
Naipe 3 Público-alvo Naipe 11 Circulação
Naipe 4 Inserção urbana Naipe 12 Conforto ambiental
Naipe 5 Espaços de ensino Naipe 13 Conceitos
Naipe 6 O pátio escolar Naipe 14 Psicologia ambiental
Naipe 7 Ambientes especiais Naipe 15 Aspectos comportamentais típicos do ambiente escolar
Naipe 8 Ambientes de apoio
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Importância dos agentes para a arquitetura escolar: aplicação de jogo de apoio ao processo participativo 281
Figura 1 - Exemplo de cartas de um naipe do jogo “Desembaralhando a Arquitetura Escolar”
Figura 2 - Grupo focal em andamento 1
Figura 3 - Grupo focal em andamento 2
Para início dos trabalhos, a pesquisadora (aqui
chamada de mediadora) iniciou o grupo focal
descrevendo o local que serviria de referência para
a simulação de um projeto de escola pública. A
escolha do local foi feita com o critério de ser uma
área onde exista um projeto escolar público, em
bairro periférico e situação semelhante à da maioria
dos processos de projeto de escolas públicas. O pai
e a diretora presentes manifestaram que conheciam
o local escolhido para a implantação do projeto.
Foi destacado pela mediadora que o projeto deveria
ser de uma escola pública, de ensino fundamental I
e II, uma vez que nem todas as escolas públicas dos
estados ou municípios são separadas por fase única,
com pedagogia livre a ser escolhida pelo grupo. A
escola deveria atender 500 alunos em período
integral. O grupo iniciou a discussão com a escolha
da pedagogia, indicada como alternativa, mas não
se especificou qual, pois se desejava uma mistura de
conceitos que resultassem em uma proposta
inovadora. Definiu-se que todos os parâmetros do
naipe 2 (Modalidades de Ensino: Ensino ao Redor
de uma Figura Central; Ensino Individual; Ensino
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Deliberador, M. S.; Kowaltowski, D. C. C. K. 282
por Projetos; e Ensino Informal) deveriam ser
considerados no novo projeto.
Os demais naipes do jogo de cartas foram
brevemente apresentados, assim como os
parâmetros que os representavam. Naipes e
parâmetros foram discutidos com ampla
participação dos agentes envolvidos, especialmente
uma interação clara entre o arquiteto e o grupo da
área da educação. Todos os naipes despertaram o
interesse dos participantes, tendo havido ampla
discussão, sem que se possa destacar quanto a esse
aspecto qualquer deles. O arquiteto se incumbiu de
explicar questões espaciais e a implicação de
algumas decisões para o projeto como um todo. Os
pedagogos, por sua vez, esforçaram-se para definir
os conceitos importantes do projeto e explicar como
as metodologias pedagógicas deveriam ser
aplicadas para potencializar as ações de ensino e
aprendizagem do ambiente escolar. Exemplos de
tabuleiros preenchidos, após a sessão do grupo
focal, encontram-se nas Figuras 4 e 5.
Figura 4 - Tabuleiro I – preenchido na simulação do processo participativo (Naipes 1, 2, 3 e 4)
Figura 5 - Tabuleiro III – Os espaços – preenchido na simulação do processo participativo (Naipes 8, 9 e 10)
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Importância dos agentes para a arquitetura escolar: aplicação de jogo de apoio ao processo participativo 283
Avaliação da participação dos agentes do grupo focal
Após o encerramento do grupo focal, que durou
aproximadamente três horas e meia, solicitou-se aos
participantes a realização da avaliação do jogo. A
avaliação geral de todos foi muito positiva.
Questionou-se se os processos participativos
poderiam colaborar com a melhoria da qualidade
dos edifícios escolares, e 100% dos participantes
responderam que sim. Comentários muito
interessantes completaram as respostas: “A
interação entre os diversos tipos de profissionais
(projetistas, professor, diretor, gestor da obra) faz
com que todos os pontos sejam vistos por cada
ângulo em particular, identificando necessidades
que o projetista sozinho poderia não pensar” e “É
muito importante a troca de ideias. Foi possível
perceber como cada ‘ator’ enxerga a escola de
maneira diferente. Somando cada experiência, com
certeza a escola seria melhor”.
Os depoimentos e a aderência dos integrantes desse
grupo focal demonstram que a participação nesse
processo simulado funcionou no sentido de alertar
sobre como são diferentes as visões, mas, de outro
lado, como todas elas são importantes ao se pensar
um projeto escolar de maior qualidade. Com relação
à necessidade de ferramentas de apoio, o grupo
mostrou-se bastante favorável à criação de suportes
aos processos participativos. Um participante
destacou que as ferramentas eram importantes uma
vez que “a participação sem planejamento pode
perder o foco ou objetivo, importantes para atingir
um resultado exequível e condizente com a
realidade. O jogo direciona o grupo diversificado
para um objetivo, sem ignorar as várias
perspectivas”. Outro destacou que “[...] o jogo
favoreceu a reflexão. A situação de jogar colocou
todos em igualdade, favorecendo a colaboração e a
troca de experiências de todos os envolvidos”.
Desse modo, constatou-se que a ferramenta cumpre
com seu objetivo inicial, de estimular os debates e
incentivar a participação dos diversos agentes. O
grupo da área de educação incumbiu-se de
apresentar e discutir questões relativas às
metodologias pedagógicas e também da rotina
escolar. Arquitetos e engenheiros manifestaram-se
traduzindo tais questões para o ambiente construído
escolar. Funcionários e professores preocuparam-se
em adequar tais ideias à rotina escolar, que eles
conhecem na plenitude. E, por fim, membros da
comunidade apresentaram desejos e necessidades
práticas das pessoas que receberiam a futura escola.
Elaboração do programa arquitetônico a partir das informações do grupo focal
A sessão do grupo focal não encerra em si a
elaboração do programa arquitetônico. Ela é, em
verdade, uma etapa na qual os profissionais obtêm
mais dados para tornar o programa mais completo,
rico e principalmente em acordo com os reais
desejos e necessidades da comunidade que irá
receber esse novo projeto. Nesse sentido, após a
sessão participativa, os agentes que compõem o
grupo “profissionais de projeto” devem se reunir
para a etapa de condensação das informações
obtidas no grupo focal e para a elaboração do
documento do programa arquitetônico, geralmente
coordenados pelo arquiteto responsável. No caso do
teste realizado pela pesquisa, em razão da
indisponibilidade circunstancial do arquiteto que
coordenou a sessão, o programa foi realizado pela
equipe de pesquisadores, que, com o documento
pronto, apresentou-o ao arquiteto para validação. O
arquiteto validou o documento e afirmou que
certamente representa as discussões realizadas na
sessão do grupo focal e configura-se como
importante documento de suporte para o processo
de projeto.
A elaboração desse documento foi feita com fichas
desenvolvidas a partir do Problem Seeking (PEÑA;
PARSHALL, 2012), que são parte do manual de
instruções do jogo, disponível em Deliberador
(2016). O programa completo foi elaborado com
base nas discussões documentadas pelas imagens
do tabuleiro realizadas após o grupo focal.
Exemplos desse material podem ser vistos na Figura
6.
Observou-se que diretrizes de projeto foram
traçadas a partir de questões levantadas no grupo
focal. O atendimento das diversas modalidades de
ensino do naipe 2, por exemplo, surgiu em razão da
ampla discussão sobre sua importância pelo grupo
da área de educação. Por outro lado, a tradução dos
ambientes onde elas poderiam aparecer vem como
resposta do arquiteto a essas discussões, que deve
ser posteriormente validada pelos pedagogos e
professores. Questões problemáticas da rotina
escolar, como fechamentos, acessos e entrada, que
haviam sido amplamente discutidas, aparecem com
destaque no programa arquitetônico, o que sugere
que seriam adequadamente consideradas na etapa
seguinte de projeto.
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Deliberador, M. S.; Kowaltowski, D. C. C. K. 284
Figura 6 - Exemplos da compilação do programa arquitetônico
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Importância dos agentes para a arquitetura escolar: aplicação de jogo de apoio ao processo participativo 285
Com o programa arquitetônico elaborado e o
levantamento das questões acima, agendou-se uma
nova reunião com a equipe de projeto que havia
participado da sessão do grupo focal para que o
programa fosse analisado. A avaliação foi favorável
por se acreditar que as fichas sintetizam as
discussões ocorridas no grupo focal. No entanto,
questionou-se como se criam “compromissos” com
o grupo participante para garantir que os desejos
solicitados na sessão participativa se mantenham ao
longo do processo, sem mudanças radicais.
Esclareceu-se que geralmente esses processos não
se resumem a uma única reunião. Sugere-se que,
após a sistematização do programa, uma nova
reunião seja feita para verificar com os participantes
se todas as questões foram adequadamente
compreendidas e tratadas. Esse momento pode
também ser utilizado para firmar as metas traçadas
para o desenvolvimento do projeto arquitetônico.
Conclusões
O jogo de cartas Baralho da Escola ‒
Desembaralhando a Arquitetura Escolar ‒
possibilitou a criação de um novo método de
realização de um processo de projeto participativo,
por meio da utilização de um jogo com o objetivo
de fundamentar a fase de programa arquitetônico de
projetos de novas escolas. A realização desse tipo
de processo, que inclui diversos agentes do
processo de projeto escolar, garante que as várias
vozes sejam ouvidas e que haja um novo olhar sobre
o edifício a ser elaborado.
A definição dessa ferramenta como um jogo
confirmou as vantagens que a literatura havia
indicado, ao favorecer a participação dos agentes.
Além dos depoimentos colhidos na última sessão do
grupo focal, na qual a maioria dos participantes
manifestou-se favorável à utilização desse tipo de
ferramenta, durante todas as aplicações observou-se
que o formato possibilitava maior engajamento e
interação entre os envolvidos (BRANDT;
MESSETER, 2004; BRANDT, 2006). Além disso,
estimulava a participação de todos com debates
construtivos sobre a tipologia escolar, incentivando
a reflexão sobre as necessárias mudanças espaciais
em conjunto com as alterações pedagógicas. O jogo
possibilitou, em todas as sessões, a criação de uma
atmosfera divertida e favorável à criatividade, ainda
que houvesse momentos difíceis de se obter
consenso. A utilização do grupo focal como método
de organização da aplicação do jogo também se
mostrou muito adequada às sessões participativas.
A figura do mediador e do observador é essencial
para o andamento dos trabalhos e para a
documentação das informações relevantes de cada
uma das sessões.
O apoio do processo participativo com ferramentas,
como o jogo criado nesta pesquisa, é essencial: os
resultados demonstraram a relevância de incluir os
agentes no processo, mas também indicaram as
dificuldades de condução do processo participativo,
que lida com diversas personalidades, com
interesses e formação diferentes. Nesse sentido, o
jogo se mostrou muito útil: ele estrutura as reflexões
e induz um debate mais aprofundado e baseado em
parâmetros de qualidade para o projeto. Também
contribui para aproximar o programa das novas
escolas e a realidade em que serão construídas.
O jogo se mostrou uma ferramenta que auxilia no
gerenciamento de um grupo e pode ser utilizado de
diversas maneiras, sempre buscando enriquecer o
processo de projeto, vislumbrando a melhoria dos
espaços escolares brasileiros. Sua utilização
implicou uma nova etapa ao processo de projeto,
investindo-se mais tempo na elaboração do
programa arquitetônico, com, no mínimo, duas
reuniões participativas: a primeira, no formato do
workshop do grupo focal; e uma ou mais
subsequentes para apresentar o programa final,
verificar se está de acordo com as possibilidades e
expectativas, e criar compromissos com a
comunidade envolvida no processo.
O desenvolvimento do programa completo
demonstrou como as questões levantadas no grupo
focal se tornaram presentes e parte integrante das
discussões, o que indica que seriam diretrizes
projetuais importantes a serem seguidas nas etapas
seguintes. Nesse sentido, a ferramenta mostrou-se
capaz de agregar os diversos agentes em um
processo de projeto participativo. Sua utilização
possibilitou aprofundar a discussão da nova escola
e seu impacto sobre a sociedade, incorporando
questões ambientais, técnicas, sociais e econômicas
ao programa e também dando voz aos diversos
agentes de maneira produtiva. Entende-se que esse
tipo de apoio é uma iniciativa na direção de buscar
o desenvolvimento de meios que visem ampliar a
qualidade do projeto e do espaço, avaliado a partir
da satisfação dos usuários e da melhoria da
educação, focados nos parâmetros específicos da
arquitetura escolar.
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Agradecimentos
As autoras agradecem à Fundação de Amparo à
Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) pelo
financiamento da pesquisa que originou esse artigo
(Fapesp 2013/00993-0 e 2017/05699-3).
Ambiente Construído, Porto Alegre, v. 18, n. 2, p. 273-288, abr./jun. 2018.
Deliberador, M. S.; Kowaltowski, D. C. C. K. 288
Marcella Savioli Deliberador Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo | Universidade Estadual de Campinas | Av. Albert Einstein, 951 | Cidade Universitária Zeferino Vaz | Caixa Postal 6021 | Campinas – SP - Brasil | CEP 13083-852 | Tel.: (19) 99140-0230 | E-mail: [email protected]
Doris Catharine Cornelie Knatz Kowaltowski Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo | Universidade Estadual de Campinas | Tel.: (19) 3521-2390 | E-mail: [email protected]
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Ambiente Construído, Porto Alegre, v. 18, n. 2, p. 273-288, abr./jun. 2018.
Importância dos agentes para a arquitetura escolar: aplicação de jogo de apoio ao processo participativo 289
Errata
No artigo "Importância dos agentes para a arquitetura escolar: aplicação de jogo de apoio ao processo
participativo", com número de DOI: <http://dx.doi.org/10.1590/s1678-86212018000200254>,
publicado no periódico Ambiente Construído, 18(2):273-288.
Na página 273:
Onde se lia (filiação e autoria):
"Doris Catherine Cornelie Knatz Kowaltowski"
Leia-se:
"Doris Catharine Cornelie Knatz Kowaltowski"
Na página 288:
Onde se lia:
"Doris Catherine Cornelie Knatz Kowaltowski"
Leia-se:
"Doris Catharine Cornelie Knatz Kowaltowski"