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DOIS JOES E O CARRO DE BOIS: INTERVENO ARQUITETNICA NA PAISAGEM CULTURAL DO SERTO BRASILEIRO
Lus Antnio Jorge
Arquiteto e urbanista. Professor Doutor, Departamento de Projeto. Faculdade de Arquitetura e Urbanismo. Universidade de So Paulo
RESUMO
O artigo uma breve apresentao do projeto arquitetnico da Casa da Cultura do Serto, uma interveno em patrimnio histrico que partiu de uma pesquisa sobre cultura imaterial do serto brasileiro, na regio do Alto do Rio So Francisco, no Estado de Minas Gerais. Tomando o carro-de-bois como de objeto de estudos e engenho emblemtico e representativo da cultura local, desenvolveu-se um mtodo de abordagem da realidade do lugar tendo a literatura como guia, precisamente, a obra do escritor brasileiro Joo Guimares Rosa.
Palavras chave: patrimnio, projeto arquitetnico, cultura imaterial, Minas Gerais
Vista geral da Casa da Cultura do Serto: casa restaurada com a construo do anexo protegido por muro de conteno feito com a pedra tapiocanga, tpica da regio. Foto de Lus Antnio Jorge
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RESUMEN
El artculo es una presentacin del diseo arquitectnico de la Casa da Cultura do Serto, una intervencin en el patrimonio histrico que resulta de la investigacin sobre la cultura inmaterial del interior de Brasil, en la regin de Alto do Rio So Francisco, en el estado de Minas Gerais. Tomando el carro-de-bois como objeto de estudio y artefacto emblemtico y representativo de la cultura local, hemos desarrollado un mtodo de acercamiento a la realidad del lugar a travs de la literatura, concretamente la de la obra del escritor brasileo Joo Guimares Rosa.
Palabras clave: patrimonio, projecto arquitectnico, cultura immaterial, Minas Gerais
ABSTRACT
The article is a presentation of the architectural design of the Casa da Cultura do Serto, an intervention in historic heritage that results of research about immaterial culture of the Brazilian hinterland, in the region at So Francisco River, in the state of Minas Gerais. Taking the carro-de-bois as object of studies and emblematic and representative artifact of local culture, we developed a method of approach the reality of the place having the literature as a guide, precisely, the Brazilian writer Joo Guimares Rosas work.
Keywords: heritage, architectural design , immaterial culture, Minas Gerais
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va ueiro edro ranciano u ac o ue ele ueria era ficar sabendo o tudo e o mido
va ueiro adeu o gente, min a gente ue n o era o tudo e o mido
O vaqueiro Pedro Franciano: Pois ento?
O vaqueiro Tadeu: ...Queria era que se achasse para ele o quem das coisas!
Guimares Rosa (Cara-de-Bronze)
1. INTRODUO
O poeta Joo Cabral de Melo Neto conta que seu tio-av um dia lhe disse que, em
Pernambuco, os carros de boi so puxados por duas juntas (ou pares) de bois e no Rio de
Janeiro, so puxados por trs juntas. Isso o levou a pensar em distinguir as personalidades
dos bois de carro, caracterizando os comportamentos dos que vo frente e dos que vo
atrs, buscando motivao para um poema que abordaria os tipos de personalidades
artsticas nos homens. Os bois de cambo so os que puxam o carro, os de coice so
os que o freiam, quando ele est descendo uma ladeira... Manuel Bandeira um boi de
cambo, o Schmidt um legtimo boi de coice. Sartre um boi de cambo, o Camus um
boi de coice. No h superioridade de um sobre o outro... No uma questo de valor, mas
de approach da realidade1.
O escritor Joo Guimares Rosa, no seu conto Conversa de Bois2, penetra neste universo
temperamental dos bois de carro, dando voz e distinguibilidade aos bois: Ns somos bois...
ois de carro s outros, ue v m em manadas, para ficarem um tempo das guas
pastando na invernada, sem trabalhar... Eles no sabem que so bois... Orgulhosos e
cientes da sua importncia, conviventes com o homem no seu trabalho, os bois vo sendo
apresentados, um a um, de acordo com a funo que desempenham na conduo de um
carro.
1 Cadernos de literatura brasileira: Joo Cabral de Melo Neto. So Paulo, Instituto Moreira Salles. 1996. p. 23.
2 ROSA, Joo Guimares. Sagarana. Rio de Janeiro. Livraria Jos Olympio Editora. 1968. 10a. ed.
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Dois dos mais geniais joes do Brasil observaram o comportamento do boi de carro,
dialogando com a cultura e as artes populares onde o boi se faz presena constante: na
msica, na dana, na literatura ou no artesanato.
Joo Guimares Rosa, segundo estes pitorescos critrios cabralinos, foi um genuno boi
de cambo, ou melhor, boi de guia, nome utilizado para este mesmo boi em Minas Gerais.
Em sua obra, Rosa elaborou uma geografia fantstica dos lugares do serto mineiro:
ora apoiando-se na paisagem localizvel e reconhecvel, guisa de um cartgrafo, ora
revelando lugares de memria, onde sua imaginao redesenhava os contornos do visto e
do vivido, com palavras que no se limitaram descrio das coisas e sim a transcende-las,
reapresentando-as como signos de algo que requer e solicita decifrao.
Identificar esta paisagem cultural na obra de Rosa aceitar o convite do autor para buscar
o quem das coisas expresso (im)precisa de quem realizou uma das mais profundas
interpretaes do Brasil. Opinio corroborada por Willi Bolle3 ao analisar o Grande Serto:
Veredas - o romance e obra-prima de Guimares Rosa, publicado em 1956 - como um
dos livros formadores do Brasil pela interpretao seminal da nossa realidade scio-
cultural nele contida. Bolle exalta a necessidade de descobrirmos a ualidade especfica
do con ecimento proporcionado pela fic o, em compara o com o dos estudos istrico
sociolgicos. Esta provocao especialmente estimulante para fundamentarmos o dilogo
visado neste trabalho, entre os campos do conhecimento da arquitetura e da literatura: o
conhecimento ficcional, a inveno e a criao sobre a realidade dada, palpvel, de se
pegar4, so comuns em ambos, pois fazem coexistir a realidade observada (e portanto,
processada, interpretada) e a realidade imaginada (escrita, desenhada, projetada). Para
as analogias aqui permitidas, partimos do reconhecimento de que a obra de Guimares
Rosa revelaria um mtodo de abordagem da realidade brasileira, onde a funo potica
desta literatura assume a tarefa de aprofundar a dimenso interpretativa e significativa da
realidade complexa e de difcil decifrao.
3 grandeserto.br. O romance de formao do Brasil. So Paulo. Livraria Duas Cidades. Editora 34. 2004.
4 Trecho do poema-homenagem Um Chamado Joo, de Carlos Drummond de Andrade, publicado no jornal Correio da Manh, em 22 de novembro de 1967, logo aps a morte do escritor.
Ficamos sem saber o que era Joo, e se Joo existiu, de se pegar.
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A realizao artstica uma forma de sondagem da dimenso indizvel da realidade: a
escrita potica ou, mais precisamente neste caso, a escritura roseana revela uma meta-
realidade, calculadamente distante do real, ao retratar aspectos escandidos de um real lido,
reapresentado como reconhecimento e descoberta.
Tendo o conto roseano Conversa de Bois como cartografia, traamos a travessia em
busca do quem das coisas, com especial interesse pela cultura material, pelos artefatos
ou coisas construdas para servir o homem na lida da vida. Deste imaginado dilogo sobre o
carro de bois entre o poeta Joo Cabral e o escritor Joo Guimares Rosa e, sobretudo, do
nosso interesse em documentar ofcios e engenhos do Brasil, formulamos a hiptese de que
um carro de bois um artefato que fala dos temperamentos dos bois e das madeiras. Cabe
ainda citar que este interesse pela documentao dos ofcios tradicionais responde uma
conhecida convocao da arquiteta Lina Bo Bardi para que se realizasse, no Brasil, uma
ampla pesquisa sobre o artesanato popular ou, nas palavras da arquiteta, sobre a mo do
povo brasileiro5. Certa vez, Lina, comentando, admirada, o trabalho txtil dos pescadores
na beira do Rio So Francisco, em Propri, na divisa dos Estados de Alagoas e Sergipe, ela
nos convocou: isso no artesanato nem coisa nostlgica, coisa do povo, um convite a
um grande levantamento nacional para se pesquisar as nossas verdadeiras necessidades6.
Estabelecer relaes entre Guimares Rosa e Lina Bo Bardi, dois dos maiores autores
da cultura brasileira da segunda metade do sculo XX, foi uma forma de orientar uma
experincia que buscou o confronto entre obra e lugar ou, o dilogo entre literatura e
realidade e cultura material, tendo o ofcio da construo de um carro-de-bois como objeto
de estudo. O carro de bois um engenho emblemtico da paisagem material deste lugar
- o serto retratado por Rosa onde realizamos um projeto de interveno em um imvel
tombado como patrimnio cultural pelo Municpio de Morro da Gara (MG), lugar onde vive
o mestre Manuel Alexandre, conhecido construtor de carro de bois, naquela ocasio com
80 anos7.
5 A Mo do Povo Brasileiro ttulo de uma exposio realizada em 1969, no Museu de Arte de So Paulo, por ela concebida e projetada.
6 Depoimento no livro Lina Bo Bardi, S. Paulo, Instituto Lina Bo e P. M. Bardi, 1993, p.203.
7 2005
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2. A LEITURA DO CONTO CONVERSA DE BOIS: OS BOIS, AS MADEIRAS E O CARRO
2.1. Os bois
Em consulta aos arquivos do IEB8 pudemos constatar que Guimares Rosa fez uma seleo
entre os muitos nomes de bois e de rvores recolhidos no projeto deste conto, demonstrando
seu intenso trabalho de pesquisa e elaborao literria. Ao conto: o desenho abaixo serve
para acompanhar as falas de cada um dos bois, reconhecendo a sua funo na conduo
do carro. A junta da guia formada por Namorado e Buscap, a do coice, por Canind e
Realejo. Estes so os dois plos antagnicos que definem os temperamentos dos bois, o
cu e a terra, a conduo e o freio: boi que nasce para guia, jamais ser coice. As juntas
intermedirias se definem por proximidade a estes dois temperamentos. Habilidades em
gestao. Manuel Alexandre, mestre carreiro e construtor, diz que o boi acostuma: o boi
velho ensina o novo, para ser guia ou ser de coice.
Vamos, ento, aos bois personagens, suas funes e os sinais dos seus respectivos
temperamentos, na prosa-poesia de Rosa:
8 No Instituto de Estudos Brasileiros, da Universidade de So Paulo (USP), est o Acervo Joo Guimares Rosa que, entre outras preciosidades, guarda suas cadernetas de anotaes e originais datiloscritos de seus livros.
Desenho de Lus Antnio Jorge sobre os personagens do conto Conversa de Bois de Guimares Rosa
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2.2. Buscap e Namorado, bois da guia:
a dois palmos da sua cabe a, avan avam os bel os babosos dos bois da guia uscap ,
bi-amarelo, desdescendo entre mos a grossa barbela plissada, e Namorado, caracu
sapiranga, castanho vinagre tocado a vermelho que, a cada momento, armavam modo de
querer chifrar e pisar.
Que santos de grandes, e cheirando forte a bondade, bois companheiros, que no fazem
mal a ningu m cria o certa de eus, ol ando com os ol os uietos de pessoa amiga da
gente!... E Tiozinho corre os dedos pelo cenho de Buscap, e passa tambm mo de mimo
no pesco o de amorado imveis, os dois
2.3. Capito e Brabagato, p-da-guia:
Segue seguindo, a ativa junta do p-da-guia: Capito, salmilhado, mais em branco que em
amarelo, dando a direita a Brabagato, mirim-malhado de branco e de preto: meio chitado,
meio chumbado, assim cardim. Ambos maiores do que os da junta da guia.
2.4. Danador e Brilhante, p-do-coice:
asso aps, a junta, mestra, do p do coice an ador, todo branco, ebuno cambraia,
a endo o caval eiro e, servindo l e de dama, ril ante, de pelagem brana, retinto, liso
concolor. Ainda maiores do que os seus dianteiros da contra-guia.
2.5. Realejo e Canind, bois do coice:
, atr s ladeando o cabe al o con ormes, enormes, t o taman es o uanto bois
podem ser, os sisudos scios da junta do coice: Realejo, laranjo-botineiro, com polainas l
de brancas, e Canind, bochechudo, de chifres semilunares, e, na cor, jaguans.
Vo descer uma rampa de grande declive, e os bufales destamanhos da junta do coice
aguentam o peso do carro, fazendo freio e firmando no cho os cascos, fendidos como
enormes gros de caf.
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Em qualquer descida mais pior, era s eu mostrar a vara pra os dois, e eles, que so bois-
mestres de coice, iam sentando, e a canga jogando a junta pra riba! Por mesmo que as
outras rela assem, estava tudo firme em casa
A metfora cabralina ficava cada vez mais clara: as palavras de Rosa tornam vvidos os
temperamentos dos bois aludidos por Joo Cabral na sua tipologia das personalidades
poticas no mbito da literatura. Em chave potica, foi possvel aprender a observar as
sutis diferenas que expressam as maneiras cerimoniosas que o mestre Manoel Alexandre
realiza ao conduzir os seus bois aos seus respectivos postos na formao do seu carro de
bois. Aos olhos de um observador que no est afeito a este universo, os trabalhos so
lentos, ou melhor, aparentemente lentos. Na prtica, aprenderamos que a economia dos
gestos o segredo da rapidez dos resultados.
3. AS MADEIRAS
Todas as rvores, em Conversa de Bois, so citadas pelos seus nomes populares. Identific-
las nos manuais de plantas arbreas brasileiras tarefa quase impossvel, pois, no Brasil,
so muitas as espcies com as mesmas alcunhas. As caractersticas geogrficas da regio
orientaram a primeira seleo que se mostrou insuficiente. Da linguagem cientfica para
exposio literria de Rosa, os nomes das rvores incorporam marcas definitivas, jeitos,
portes e formatos que avanam sobre os prprios significados do lugar. Da mesma forma
como faz com os bois, a poesia aprofunda a predicao, guiando a nossa viagem de
reconhecimento.
Assim, pudemos identific-las, uma a uma, na ordem em que comparecem no conto:
1 timbabas de copas noturnas
2 bra adas branas
3 jequitibs esmoitados...
4 colher-de-vaqueiro em pirmides verdes...
5 lan o gigante de um angico verdadeiro
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6 pared o dos a oita cavalos, escuros
7 enfezadas arvorezinhas: muricis de pernas tortas, manquebas...
8 mangabeiras pedidoras-de-esmola...
9 barbatimos de casca rugosa e ramos de ferrugem...
10 no raro, um araticum teimoso, que conseguiu enfolhar e engordar...
11 e 12 se, para cantar direito, oi eita de madeira de jacar ou peroba da mida, tirada no
espigo...
A literatura coloca as rvores no lugar, no campo sentipensamental do encontro com o
quem das coisas: as mangabeiras pedidoras-de-esmola so, precisamente, aquelas ali,
identificadas no serto mineiro por um escrutnio to preciso quanto uma poesia capaz de
ser, ao comunicar uma qualidade que nos fala de to perto.
Desenho de Guimares Rosa, em carta tradutora para lngua inglesa, do conto Conversa de bois, recolhido no acervo do IEB/USP
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4. O CARRO
Procedendo da mesma maneira, recolhemos os nomes dos componentes do carro de bois,
na ordem em que aparecem no conto:
1 cintas ferradas das rodeiras
2 culos de tirar barro
3 tiradeiras
4 argola
5 soga
6 cingis
7 ajoujo
8 coco
9 chumao
10 eixo
11 chaveta
12 cantadeira
13 chifre do unto
14 sedenhos
15 fueiros
16 cheda
17 esteira de cani o
18 vara
19 canga
20 canzis
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21 brocha
22 cilhador
23 pigarro
24 chavelha
25 cabe al o
26 tabuleiro
27 sola
28 sovela
29 tamoeiros
30 rodeira ferrada e chapeada nas bandejas
Os nomes dos componentes ou peas do carro, como as rvores, variam de acordo com
as regies do Brasil e Guimares Rosa estava atento aos nomes utilizados no serto. Os
carros de bois tambm se distinguem regionalmente, mas, sobretudo, resultam da qualidade
dos seus mestres construtores. No inverno de 2005, iniciamos, na Fazenda Capivara, no
municpio de Morro da Gara (MG), uma longa temporada de documentao do trabalho de
construo de um carro de bois pelo mestre carreiro Manuel Alexandre, registrando cada
etapa, na sua devida poca do ano, de fatura de todos os seus componentes e respectivas
madeiras nele empregadas. O carro do mestre Manuel identificado e muito valorizado
pelos carreiros da regio e leva mais de um ano para ser construdo, pois emprega nove
tipos de madeira, cada uma colhida no seu tempo justo, na estao adequada, algumas nos
meses que tem r, outras nos meses que no tem r no nome. O tempo das coisas regido
por uma plena adeso s lies da natureza. O trabalho no serto, definitivamente, no
obedece aos preceitos e valores da reproduo dos bens (e do capital) tpicos da cidade.
Trata-se do tempo ditado pelos ciclos de vida e pela natureza das madeiras. Artifcios
naturalmente concebidos no tempo do serto.
Demos incio ao trabalho de documentao na poca de seca no serto e o p da estrada,
ainda preso pelo sereno da noite, ameno e no incomoda aos viajantes extasiados pela
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Os componentes principais da mesa: cabealho central, chedas laterais, recavm na traseira e os encaixes das cadeias
Desenho de Andrs Sandoval
imagem indita e grandiosa paisagem do Morro9. A famlia de Manuel Alexandre nos recebe
com leite, caf e biscoito de polvilho - tudo quentinho para combater o frio da manh. Ritual
que se repetir, dia aps dia, com a simpatia hospitaleira de sempre.
A leitura do Conversa de Bois nos levou pesquisa sobre um determinado ofcio, sobre
um saber fazer, um como fazer, com que meios fazer, em inequvoca extino no nosso
pas. Queramos achar o quem-destas-coisas-to-nossas, este conhecimento capaz de
expressar uma chave de leitura do lugar.
A primeira tarefa do mestre Manuel foi o corte do cabealho, espcie de espinha dorsal do
carro, extrado de um ip roxo (nessa poca, esto todos floridos), criteriosamente escolhido
por ele em terra de terceiros. - u ten o uma maldi o eu vi um pau d al o, eu ten o ue
chegar no p dele, revela Manuel Alexandre, sobre seu peculiar inventrio sobre rvores da
paisagem do serto. Acompanhamos toda a negociao para a aquisio da rvore e que
comeou com a seguinte frase: Vocs tm um pau que eu t precisando dele...
O ip lhe rendeu duas peas a um custo de R$ 300,00. O cabealho, dele extrado, excede
os 4,50m de comprimento pretendidos para a pea finalizada.
Em seguida, acompanhamos o corte e a montagem das peas que compem a estrutura da
mesa do carro: o cabealho, as chedas - atreladas ao primeiro pelas cadeias e o recavm.
As chedas so as duas peas laterais cujas curvaturas devem ser naturais, conforme
explica o mestre, ao alertar que no se lavra a madeira para chegar na curva requerida sob
pena de comprometer a estrutura e a resistncia da mesa do carro (- Um pau de cheda
duro de achar!). Portanto, aquela sinuosa dupla curvatura reconhecida ainda em estado
de rvore, por um olhar experiente e preciso: h que render duas peas espelhadas, num
perfeito sentimento de simetria que vigia a alma de um carreiro condutor. O desenho das
chedas uma marca registrada de um Manuel Alexandre: alongada, a elipse faz o carro
e a ponta do cabealho penetrar pela junta do coice, aproximando os bois do carreiro. A
colocao das chedas parece fazer crescer o carro e mestre Manuel sentencia, riscando
com a unha um lugar preciso onde a curva ideal (numa demonstrao de puro sentimento
esttico) deveria terminar como quem desenha a elipse vislumbrada na mente.
9 Morro que d nome ao municpio de Morro da Gara cenrio do clebre conto Recado do Morro, de Guimares Rosa, publicado pela primeira vez no livro Corpo de Baile (Rio de Janeiro, Jos Olympio, 1956).
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Desenho de Andrs Sandoval
Aps uma longa espera pelo tempo das guas, voltamos ao serto para acompanhar
a construo dos demais componentes principais: o eixo, feito de sucupira, e as rodas,
feitas de blsamo. E em seguida, a construo de componentes secundrios utilizados
para encaixe, fixao e ajustes entre eles e a mesa j construda. So eles: os coces, o
chumao, os fueiros, a chaveia e o pigarro, alm de outros acessrios prprios da amarrao
dos bois (cangas, canzis, brocha, soga).
Esquema de fixao do eixo na mesa, mostrando os dois tipos de coces (o fixo e o
cunhado), ambos feitos de blsamo, o chumao, a cheda e os fueiros de marmelo
(desenho: Andrs Sandoval).
O coco encunhado e a marca gordurosa da banha (sem sal) na madeira do eixo. O meio
da roda tangencia os culos, nome do par de furos redondos cuja funo deixar um
acesso para retirada do barro acumulado, mas tambm, oferecer uma sada para o canto
do carro, para o som fluir melhor, sendo por isso, construdos de forma a haver um giro de
90o de uma roda em relao outra). O Chumao a pea do canto do carro que, no do
Manuel Alexandre, feito de pau-terra ou amargoso.
O eixo oitavado e feito de sucupira e exige muita destreza para manter, em corte cnico,
uma linha reta passando pelo centro da pea. Os trs rebaixos, dois nas laterais e um
no centro, formam um canal circular onde se assentam os chumaos e so chamados
de cantadeiras. Mestre Manuel explica que o do centro que faz o carro cantar grosso
(ou grave). Os carros com dois chumaos (s os laterais) s cantam fino (ou agudo). -O
c uma o do meio muda a cantiga. Perguntamos sobre a funo do canto na conduo do
carro. um sei n o sei ue assim boi n o gosta s do canto fino as n o sei a
e plica o ue a o carro cantar o peso recisa es uentar, pra cantar
Guimares Rosa em Conversa de Bois:
Tu Tio, diabo! Tu apertou demais o coco... No v que a gente carreando defunto-morto,
com essa cantoria, at eus castigo, si
ai botar a eite no c uma o, ue sen o agorin a mesmo pega ogo no ei o, pega ogo em
tudo, com o diabo prajudar!...
Vista inferior da mesa do carro com o encaixe do coco no eixo de conexo das rodas. Foto de Lus Antnio Jorge
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O coco removvel feito de blsamo e untado pela banha (gordura) de porco para o atrito
entre as peas de madeira no atear fogo ao carro.
A roda feita em blsamo formada por cinco pranchas (com o centro mais espesso e que
vo afinando em direo s bordas): o meio e duas cambas (ou cambotas) para cada lado,
at formar o crculo. O agulhamento metlico para enfeitar a roda. Caprichos do ofcio.
A espiga do eixo atravessa o centro da roda e presa por cavilha. O anel de metal que
reveste a roda esquentado, dilatado e, quando preso, rapidamente esfriado com gua.
Mestre Manoel utiliza um rudimentar instrumento para medir o tamanho do anel metlico
que reveste a roda de blsamo: um conta-giros feito por uma pequena roda metlica presa
a um cabo de madeira. Mais uma lio de simplicidade saber a medida do permetro, sem
relacion-lo com a medida do raio de um crculo e o nmero .
Carinhoso e Serto so os nomes dos bois de coice do mestre Manuel que, ajustando a
canga do coice e os canzis (par de peas de jacarand muxiba que trespassam a canga
para prender a cabea de cada boi) diz que um carreiro no ensina o boi, s o aperfeioa. A
curvatura da canga do coice diferente da curvatura da canga da guia: aquela permite que
o boi ajoelhe para frear o carro e puxar os que vo frente; esta impede este movimento
dos bois e evita que a guia seja atropelada pelos que vm atrs. Correntes de segurana
so presas na canga do coice, atravessam por baixo da mesa e prendem o argolo, quando
a descida de respeito. A chavelha e a orelha prendem a canga-do-coice e o pigarro
para proteger o cabealho quando os bois so retirados do carro e ele fica diretamente em
contato com o solo. Quando o carro desengatado, os bois acompanham mestre Alexandre
at o lugar da guarda das cangas. S quando se retira a soga, o boi sabe que est livre. Eles
so leais e pacientes e esperam o tempo que for preciso.
5. A PALAVRA NO SEU LUGAR
Guimares Rosa foi um designer da linguagem. A sua imensa obra est marcada por uma
potica profundamente comprometida com a inveno do mundo, por meio da ampliao
da linguagem, pelo alargamento de fronteiras, sejam cognitivas, sejam sensveis, isto ,
sua escritura promove um intenso intercmbio entre os nossos sentidos, acionados para
alcanar um outro patamar de conscincia.
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Ao recuperar a tradio das fbulas infantis onde geralmente os bichos falam, Guimares
Rosa, em Conversa de Bois, apresenta um tema recorrente na sua obra: a comparao
entre a linguagem pura, despojada, espontnea, desavisada, iletrada a dos bois e a
linguagem armada, eivada de intenes retricas, que caracteriza o mundo dos homens
- tudo, pensado, pior...
O mundo dos bois de carro no est imune ao mundo dos homens, pois so realidades
conviventes, mas distintos como Rosa aprecia frisar. O mundo dos homens o mundo
do pensamento que se distancia da natureza das coisas. O mundo dos bois o mundo
espontneo onde a linguagem e as coisas que ele designa ainda so coincidentes. Esta
uma das lies morais desta fbula, La Fontaine, que Rosa narra quando retrata o
acontecido com o boi Rodapio, um boi dado ao pensamento, demasiadamente humano
para um boi:
(...) S falava artes compridas, idia de homem, coisas que boi nunca conversou.
(...) nt o, boi odapi o ainda ficou mais engra ado de todo alava oc s n o a em
como eu, s porque so bois bobos, que vivem no escuro e nunca sabem porque que
est o a endo coisa e coisa preciso pensar cada peda o de cada coisa, antes de
cada come o de cada dia
E ns no respondamos nada, porque no sabemos falar desse jeito, e mesmo porque,
cada horinha, as coisas pensam pra gente...
Lio moral de uma histria que pode ser interpretada como a evidncia das limitaes
do pensamento contido na linguagem diante dos sortilgios da sorte e do destino. O conto
narrado aponta para a falibilidade que caracteriza a condio humana, ao mesmo tempo
em que observa a sabedoria existencial (de boi) de reconhecer, nas coisas, as suas lies.
Engolfados no viver de cada dia, em cada momento encontramos os nossos rumos. Assim,
a fala do boi no se basta em si mesma e sempre menor que a vida. Vida que, no entanto,
susceptvel de leitura. Argumento anlogo foi apresentado pelo filsofo Bento Prado Jr.
na sua brilhante anlise sobre a obra de Rosa, onde conclui que... o mundo um livro e
nele est depositada, anterior a toda escrita, uma Escritura primordial que preciso dizer
novamente. Tarefa insuperada da literatura de Rosa. Seriam estas as lies de sua poiesis?
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O mundo redescoberto pela poesia est fartamente disseminado neste conto. Guimares
Rosa oferece pistas, mas nunca explicaes definitivas. Vejamos algumas declaraes
suas sobre a lngua e a linguagem, para reprteres de revistas no especializadas:
idioma a nica porta para o infinito, mas in eli mente est oculto sob montan as de
cinza ...
screvendo, descubro sempre um novo peda o de infinito ivo no infinito o momento n o conta10.
...
No Brasil a linguagem ainda no se libertou. Est virgem. H um campo imenso para
e plorar, novas ormas, maior e ibilidade, maior e pressividade m suma preciso
cultivar a expressividade da lngua.
Eu no crio palavras. Elas todas esto nos clssicos, esto nos livros arcaicos portugueses.
o e press es de muito valor ue eu pretendo salvar m ert o veredas palavras ue
nem em Portugal se falam mais. Mas existem. Para determinadas passagens, entretanto,
no existem palavras. Ento preciso cri-las, ou redescobri-las atravs de sons que a
correspondam11.
Em Conversa de Bois, este exerccio de libertao pela poesia j est anunciado com
grandeza, riqueza e profundidade. O quem das coisas. Uma potica que domina a palavra
em todas as suas dimenses sensitivas antes de virar significado, a palavra ocupa o
espao sonoro, convidando o leitor a l-la em voz alta para apreender melhor a paisagem
sonora do serto:
O rechinar, arranhento e fanhoso, enchia agora a estrada, estridente.
Mas o caminho vai. E alongam-se para diante, na paisagem luminosa, as sombras songas
dos bois.
Os bois tafulham as munhecas, com cloques sonoros; quando desatolam, para outra
passada, a gua suja escorre, chorrilhando, para encher os moldes dos cascos, e, no mais
mole, as bainhas as fundas cisternas cavadas pelos mocots.
10 Viagens imaginrias O serto e as veredas de G. Rosa - Revista Manchete, 20.07.1991
11 Guimares Rosa fala aos jovens - Revista O Cruzeiro, 23.12.1967
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Tranco... tranco... Bate o carro, em traquetreio e solavanco. Mas, no caminho escabroso,
com brocots e buracos por todos os lados, Tiozinho no cai nem escorrega, porque no
est de todo adormecido nem de todo vigilante ormir com eu oron o, escanc ado
beato, logo atrs do pigarro.
Ao final do conto, desenha-se o espao do possvel dilogo entre boi e o menino, entre
a conversa dos bois e o sonho do menino, pois a linguagem dos sonhos mais livre,
espontnea e natural do que a linguagem pensada. O dilogo entre a fala/pensamento dos
bois e o sonho/pensamento do menino-guia expressa a metafsica potica de Rosa, nas
palavras de boi:
O bezerro-de-homem sabe mais, s vezes... Ele vive muito perto de ns, e ainda bezerro...
em oras em ue ele fica ainda mais perto de ns uando est meio dormindo, pensa
quase como ns bois... Ele est l adiante, e de repente vem at aqui... Se encosta em ns,
no escuro... No mato-escuro-de-todos-os-bois... Tenho medo de que ele entenda a nossa
conversa...
Croqui do conjunto arquitetnico. Lus Antnio Jorge
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A derradeira lio do conto para o efeito deste trabalho entender a conversa do
mestre carreiro Manuel Alexandre na sua atividade: escolha das madeiras, o fabrico dos
componentes do carro, os encaixes prprios dos materiais empregados, as ferramentas, o
labor e o tempo de cada etapa, o aprendizado experimental do ofcio e das suas tcnicas. No
mato-escuro de um conhecimento, cabe indagar se este saber no poder ser empregado
em outros objetos ou tecnologias, restabelecendo o elo entre tradio e inveno, vital para
o reconhecimento de uma cultura afirmativa, como vislumbrava a arquiteta Lina Bo Bardi.
Este trabalho de pesquisa, documentao e reflexo orientou a elaborao do projeto de
arquitetura para a Casa da Cultura do Serto, construdo em 2008 que, sumariamente,
apresentaremos a seguir.
6. A CASA DA CULTURA DO SERTO EM MORRO DA GARA (MG)
A Casa da Cultura do Serto ocupa um casaro tombado pelo municpio e reabilitado como
rea de exposio. O edifcio fica na rea central deste povoado, no caminho de acesso
ao Morro que d nome ao municpio (Morro da Gara), principal referncia na paisagem
Casa da Cultura do Serto, com o imvel tombado frente e o Morro da Gara ao fundo
A estrutura de madeira que sustenta a varanda foi inspirada nos componentes do carro-de-bois, para enquadrar a silhueta do Morro que aparece ao longe, no horizonte. Foto: Lus Antnio Jorge
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daquela regio de Minas Gerais. A pequenina Morro da Gara tem suas origens no sculo
XVII, como parada no caminho boiadeiro que ligava a Bahia at a Vila de Sabar.
O conto O Recado do Morro, publicado pela primeira vez no livro O corpo de baile (1956) de
Joo Guimares Rosa, faz referncia direta a este Morro e a paisagem do lugar:
estava o orro da ar a solit rio, escaleno e escuro, eito uma pir mide
(...)
E assim seguiam de um ponto a um ponto, por brancas estradas calcreas, como por uma
linha v, uma linha geodsica. Mais ou menos como a gente vive. Lugares
(...)
Queriam subir, e ver. O mundo disforme, de posse das nuvens, seus grandes vazios.
(...)
m cada momento espiava de rev s, para o orro da ar a, posto l , a nordeste,
testemunho. Belo como uma palavra.
Pavilho tcnico, implantado na cota mais baixa do terreno. Foto: Lus Antnio Jorge
Interior da casa restaurada, com a exposio sobre brinquedos e bonecas tradicionais no serto. Foto: Lus Antnio Jorge
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A idealizao da Casa de Cultura do Serto se justifica, em grande parte, por se situar
neste Morro, personagem de um dos contos mais celebrados de Guimares Rosa, fato
que tem levado, j h muito tempo, a realizao de eventos regulares dedicados ao autor.
O projeto responde a estas demandas e serve para expor acervos relativos cultura local,
reunir pesquisadores e promover aes educativas e de difuso cultural sobre o universo do
escritor Guimares Rosa. E cada vez mais, recebe, tambm, turistas atrados pelo programa
oficial do Estado de Minas Gerais que instituiu o Circuito Turstico Guimares Rosa.
O projeto elaborou o restauro do casaro, eliminando interferncias posteriores que feriam
as caractersticas originais, mas tambm props novo arranjo espacial interno, conectando
espaos segregados. Da mesma forma, realizou ampliaes e um anexo. O quintal da antiga
casa tornou-se um largo que orienta o acesso principal ao conjunto, feito por um espao
avarandado, onde foi construda uma cozinha caipira. Ele funciona como trio e elemento de
conexo entre o casaro e o novo pavilho tcnico. Foi a partir do conhecimento do processo
de construo de um carro de bois que idealizamos a estrutura de madeira sobretudo, as
tesouras - que sustenta essa varanda. A estrutura faz referncia s chedas da mesa do carro
de bois e forma uma moldura para a silhueta do Morro, uma espcie de homenagem quele
que funciona como um farol, orientando as travessias dos viajantes do serto.
O pavilho tcnico, de linguagem contempornea, fica em cota inferior do terreno. O muro de
conteno que o protege foi construdo com tapiocanga, uma pedra local. O volume possui cobertura
ajardinada pelo capim que nasce entre as pedras do calamento da cidade. O projeto tambm
definiu novo acesso pela rua lateral, a partir da loja que vende produtos artesanais da comunidade.
A cobertura da loja uma extenso do ateli do casaro, no nvel do peitoril das janelas, projetado
como um lugar tambm integrado ao nico espao expositivo ou de encontros e convvio.
Internamente as paredes so caiadas e pelo lado de fora foram pintadas com pigmentos
terrosos da regio, retomando antiga tcnica de pintura a cal. Toda a construo valeu-se
da mo de obra e dos materiais locais, sendo alguns, reciclados. A Casa da Cultura do
Serto foi inaugurada com uma exposio denominada Brinquedos para meninos quietos,
cujos trabalhos foram fruto de um conjunto de oficinas educativas e artstico-culturais
realizadas em vrias comunidades da regio. Os participantes, na maioria, idosos e crianas
produziram brinquedos tradicionais ou inventaram novos brinquedos com os materiais mais
singelos disponveis nos lugares: tudo aquilo que fantasia dado ver.
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Crditos:
Pesquisa e Projeto Arquitetnico: Lus Antnio Jorge
Arquitetos colaboradores: Flvia Zelenovsky, Cssio Castro e Pedro Britto
Casa Cultura Serto, planta e corte do Projeto Arquitetnico