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IBM: O DESAFIO DA MUDANÇA Isabella Francisca Freitas Gouveia de Vasconcelos Graduada em Direito pela USP, Doutoranda na EAESP/FGV na área de Organizações, Recursos Humanos e Planejamento Estratégico. * PALAVRAS-CHAVE: Market Driven Quality, interacío- nismo simbólico, mudança organizacional, cultura organi- zacional. This article discusses the concepts of "Mar- used by IBM as a tool for organiza tio- The discussion focuses the IBM practices point of view of organizational culiure bolic interactionism presenting the that this company must face in the specially in the Brazilian subsidiary. * RESUMO: O presente artigo conceitua o Quality, política de qualidade' IBM em seu processo de mudança nal, em uma reação às atuais vem enfrentando. A mudança é ponto de vista da cultura nronnrmt do interacionismo simbólico, alguns dos desafios que esta enfrentar no futuro. A análise do fere-se à subsidiária brasileira da WORDS: Market Driven Quality, interactionism, organizational and change. 84 Revista de Administração de Empresas São Paulo, 33(3):84-97 Mai./Jun. 1993

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IBM:O DESAFIODA MUDANÇA

• Isabella Francisca Freitas Gouveia de VasconcelosGraduada em Direito pela USP, Doutoranda naEAESP/FGV na área de Organizações, RecursosHumanos e Planejamento Estratégico.

* PALAVRAS-CHAVE: Market Driven Quality, interacío-nismo simbólico, mudança organizacional, cultura organi-zacional.

This article discusses the concepts of "Mar-used by IBM as a tool for organiza tio-

The discussion focuses the IBM practicespoint of view of organizational culiure

bolic interactionism presenting thethat this company must face in the

specially in the Brazilian subsidiary.

* RESUMO: O presente artigo conceitua oQuality, política de qualidade'IBM em seu processo de mudançanal, em uma reação às atuaisvem enfrentando. A mudança éponto de vista da cultura nronnrmtdo interacionismo simbólico,alguns dos desafios que estaenfrentar no futuro. A análise dofere-se à subsidiária brasileira da

WORDS: Market Driven Quality,interactionism, organizational

and change.

84 Revista de Administração de Empresas São Paulo, 33(3):84-97 Mai./Jun. 1993

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De acordo com uma abordagem cognitivista, a mudança culturalnão ocorre somente devido às mudanças ambientais, mas sim devi-do à ação gerencial, pois são os indivíduos que definem os novosrumos e cursos estratégicos da empresa a partir de paradigmas.Neste sentido, paradigmas são meca-nismos cognitivos, ou seja, um con-junto de pressupostos e crenças inti-mamente ligados à realidade organi-zacional e normalmente aceitos, quemoldam a visão da organização so-bre suas relações internas com o am-biente. Eles são filtros da realidade.Dificuldades podem surgir quandoas mudanças ambientais não estãoalinhadas com os padrões culturais,sociais e políticos da organização. 1

Dentro desta mesma linha, define-se mudança como um esforçopara al-terar as formas vigentes de cognição eação, de maneira a capacitar a organi-zação a adequar-se às condições am-bientais e tirar proveito das oportuni-dades surgidas. É a constante reinter-pretação da realidade e a definição de significados que serão com-partilhados por todo o grupo organizacional dentro de uma visão co-mum, correspondente ao paradigma ou visão gerencial dominante. 2

Este paradigma ou visão gerencial dominante é representadopelo conceito de cultura organizacional, retomado brevementenesta análise.

Segundo Schein3, a fim de perpetuar-se, o grupo organizacionaldesenvolve um conjunto de premissas básicas que foram estabele-cidas, descobertas ou desenvolvidas no processo de aprendizagemde solução de problemas de adaptação externa e de integraçãointerna.

Quando as soluções fornecidas pelo paradigma cultural domi-nante não corresponderem mais às necessidades impostas pelomeio ambiente, cabe à liderança fornecer novas diretrizes de ação.Os elementos formadores da identidade organizacional e assimila-dos profundamente pelo grupo são reinterpretados no processo demudanças. A cultura organizacional é, pois, fruto de um sistema deinterações simbólicas, constituída por formas de expressão de umdeterminado grupo social, tais como a produção de signos, lingua-gem, mitos, rituais, cerimônias, tabus, heróis, histórias, valores, ar-te, formas de comportamento, hábitos etc., representativos da "vi-são de mundo" ou do paradigma predominante na organização. 4

A GESTÃO ESTRATÉGICA DA QUALIDADE COMO PARADIGMADE AÇÃO GERENCIAL

Nas décadas de 70/80, surge uma nova atitude por parte das em-presas com relação à questão da qualidade, antes vista apenas co-mo um controle a mais, uma garantia dada ao cliente. A qualidadepassa a envolver a preocupação dos níveis superiores da organiza-ção, da alta gerência, por ter-se tornado uma questão de impactoestratégico, abrangendo a imagem, a participação no mercado e arentabilidade das empresas. Oferecendo-se ao consumidor um pro-

© 1993, Revista de Administração de Empresas / EAESP / FGV, São Paulo, Brasil.

1. JOHNS, G. Managing Strate-gic Change-Strategy, Cultureand Action. Great Britain: LongRange Planning, 1991; WOOD,JR. lhamas. Mudança Organi-zacional, Ciência ou Arte? SãoPaulo: EAESP/FGV, 1993. (Dis-sertação de Mestrado).

2. GIOIA; CHiTIlPEODI. Sense-making and Sensegiving in stra-tegic change iniciation. Strate-gic JournaJ. Chichester. Sep.1991.

3. SCHEIN, E. Coming to a NewAwareness of a OrganizationalCulture. Sloan ManagementReview, Winter, 1984; FREi-TAS, Maria Esther. Cultura Or-ganizacional, Grandes Temasem Debate. São Paula:EAESP/FGV, 1989. (Disserta-ção de Mestrado). Traduçãoem português: "A CulturaOrganizacional - grandestemas em debate". Revista deAdministração de Empresas, v.31, n. 3, jul./set., 1991.

4. BERGER, Peter; LUCHK-MANN, Thomas. A Construçãosocial da Realidade. Petrópolis:Vozes, 1989; WEXLER, M.Pragmatism, inleractionism anddramatism: interpreting thesyrnbols in organizations. Orga-nizationaJSymbolism, Pondy, L.(Org.), JAI, Greenwich, 1983, p.237-57; SMIRCICH, Linda. or-ganizations as Shared Mea-nings. Organizational Symbo-lism, PONDY, L. (org.), Green-wich, JAI, 1983, p. 55-65.

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duto melhor dos que existem no mercado, a menores custos, nãoapenas satisfazendo-o, mas seduzindo-o, encantando-o, pretende-se, neste contexto, atingir objetivos estratégicos fixados pelaorganização. 5

A busca da qualidade passa a ser considerada um compromissode toda a organização. A "cultura de qualidade 11 passa a constituir acultura organizacional, com valores que lhe são próprios e que de-vem ser partilhados por toda a empresa, em um processo de sociali-zação interno. A qualidade inscreve-se de uma vez por todas na es-tratégia empresarial.

5. SCHOLTES, Peter. Times deQualidade. Rio de Janeiro: Qua-limarty, 1992.

6. Idem, ibidem.

7. CHANLAT, Jean-François.Vers une Nouvelle Éthique desRelations dans les Organisa-tions. In: L 'Individu dans I'Orga-nisation: Les DimensionsObliées, Québec: Presses Uni-versitaires de l'Université de La-vai, ESKA, 1990. Tradução emportuguês: "A caminho de umanova ética das relações nasorganizações". Revista deAdministração de Empresas, v.32, n. 3, jul./ago. 1992.

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A GERÊNCIA DA QUALIDADE

Scholtes" descreve a gerência da qualidade representando-a atra-vés de um triângulo equilátero. Seu primeiro vértice equivaleria àqualidade, ou o atendimento às necessidades dos clientes. O segun-do significaria a abordagem científica no estudo dos processos, ou aabordagem baseada em dados estatísticos e técnicas e ferramentas demelhoria contínua. O terceiro, por fim, significaria os empregadostrabalhando em equipes. As três linhas formam um plano quandojuntas, mas, na falta de um dos elementos, o resultado é o desequilí-brio do sistema.

Esta abordagem critica a gerência tradicional afirmando que estadedica pouca ou nenhuma atenção aos processos e sistemas - a capa-cidade real da organização como um todo baseando-se em padrões equotas que nada mais são que metas numéricas arbitrárias. Este mo-delo argumenta ainda que o uso de metas numéricas, para julgar oudirigir a performance, causa uma série de problemas como os que sãolistados a seguir:

a. pensamento a curto prazo;b. conflitos internos por falta de comunicação e coordenação entre as

diversas partes da empresa;c. falseamento nos números;d. sistema rígido e baseado no temor.

Na política de recursos humanos participativa, proposta pelagerência da qualidade, pressupõe-se uma nova visão da relaçãohomem-trabalho, uma vez que o indivíduo, possuidor de um cabe-dal de conhecimentos específicos, adquiridos pelo exercício de suaatividade profissional, é chamado a participar, a fim de contribuirpara o aperfeiçoamento da organização. Esta, por sua vez, é vistacomo uma comunidade de trabalho. Trata-se da retomada de umaética coletiva, onde o potencial individual é canalizado para o apri-moramento do sistema, gerando benefícios para todos e fugindo-sedo individualismo exarcebado que passou a caracterizar as rela-ções de trabalho há alguns anos". Utiliza-se o termo cidadania nasorganizações.

Com a diminuição das chamadas causas da não-qualidade, au-mentar-se-ia a produtividade e a eficiência. O pagamento por pro-dutividade é um dos incentivos propostos. Por fim, ao contrário dagerência tradicional, que enfocaria os lucros e perdas e o retornodo investimento, a gerência de qualidade visaria a satisfazer e ex-ceder as necessidades dos clientes. O retorno seria automático aoreconhecimento por parte dos mesmos da excelência de produtos eserviços.

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IBM: O DESAFIO DA MUDANÇA

A VISÃO DA ORGANIZAÇÃO

A organização, além de ser considerada uma comunidade de tra-balho, é vista como um conjunto de processos-chave organizados,compostos, por sua vez, de subprocessos, atividades e tarefas, que apermeiam desde o topo da pirâmide funcional até sua base. Os pro-cessos-chave da organização teriam um executivo da alta gerênciacomo proprietário, ou seja, responsável pela supervisão do trabalhode melhoria e aprimoramento contínuo do mesmo.

Esta seqüência de atividades (processo) une várias áreas que nãoestariam necessariamente interligadas na estrutura interna da orga-nização, mas do ponto de vista docliente, ao lidar com a empresa, e par-tindo de uma visão horizontal, estasáreas estão relacionadas em uma se-qüência lógica, e devem ser integra-das. A colocação do anúncio do pro-duto, o processamento do pedido docliente, a gestão de estoques, o fatura-mento e cobrança, a instalação e ma-nutenção são um exemplo possível deum processo a ser integrado. Estastécnicas são utilizadas dentro de umavisão sistêmica da empresa e permi-tem a identificação e integração declientes e fornecedores internos.

A teoria da contingência, que utili-za também este paradigma, atravésdos trabalhos de Burns e Stalker", re-conhecem dois tipos "ideais" de orga-nização que devem ser entendidos como uma evolução. O primeiroseria o sistema mecânico, ou um sistema adequado às situações está-veis de tecnologia e mercado, caracterizando-se por uma divisão rígi-da de trabalho, por uma nítida hierarquia de controle, pela concen-tração de autoridade de linha na cúpula administrativa, pela concen-tração de informações e de conhecimento no mesmo nível, pela valo-rização das comunicações e interações verticais entre superiores e su-bordinados, pela obediência e pela exigência estrita de lealdade daorganização.

O segundo tipo, ou orgânico, caracterizaria-se pelo ajustamentocontínuo às mudanças ambientais, pela redefinição continuada de ta-refas correspondentes, pela valorização do saber especializado e dascomunicações horizontais e verticais exigidas pelo processo de traba-lho bem como por um alto grau de engajamento com os fins da orga-nização como um todo. 9

chairman, lonh f\kers, são fatos quevêm provocando inúmeras

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ALGUNS SíMBOLOS DA QUALIDADE E A SUA IMPORTÃNCIA

A criação do "Malcolm Baldridge National Quality Award", prê-mio de qualidade americano criado em 20.08.87,mostra a importân-cia da gestão estratégica da qualidade como paradigma gerencial dosanos 80. Seu objetivo é premiar as empresas americanas que pos-suam o melhor programa de qualidade, a partir de uma avaliaçãofeita com base nas técnicas e programas considerados como os maisavançados, a fim de incentivar investimentos na área e a divulgaçãode informações e de estratégias que tiveram sucesso, em uma reação

8. VER MOTTA, Fernando Pres-tes. Teoria das organizações,evolução e crítica. São Paulo:Pionei ra, 1986.

9. Idem, ibidem.

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à invasão das empresas japonesas no mercado americano. Para com-petir, a empresa deve preencher formulários e fazer minuciosos rela-tórios descrevendo seus programas de qualidade de acordo com oscritérios preestabelecidos, em categorias definidas, sofrendo visitasde avaliação posteriores. A cada ano, a competição processa-se a umnível mais alto, pois os critérios são atualizados e novas exigênciassão feitas. A empresa que ganha este prêmio tem reconhecida a exce-lência de seu produto ou serviço, tendo direito de usar o símbolo doprêmio associado à sua marca durante um determinado período. Oscritérios do prêmio renovados a cada ano, permitem também umaauto-avaliação das empresas do nível atingido por seus programasde qualidade.

O Brasil criou o Prêmio Nacional de Qualidade, baseado no mo-delo do prêmio americano, a fim de incentivar os investimentos naárea nas empresas brasileiras. A IBM, em sua fábrica de Sumaré,Campinas, foi premiada em 1992, primeiro ano da premiação. Ba-seada nos critérios do "Prêmio Qualidade Malcolm Baldridge" e nosseus objetivos e nas normas ISO 9000, a IBM criou o Prêmio de Qua-lidade IBM-MDQ, a fim de promover sua avaliação interna em ter-mos de qualidade.

DESCRiÇÃO DO CASO

o caso a ser apresentado aborda a tentativa da IBM (Inter-national Business Maclíines) de iniciar uma mudança organiza-cional profunda, como reação aos prejuízos que têm ocorridona empresa, mudanças estas baseadas no conceito Market Dri-ven Quality, sua, política de qualidade.

Há alguns anos, a IBMvein enfrentando dificuldades bemgrandes: 1991-foi apTimeiroai.lo d-esde 1946 em que a empresanão cresceu, suas vendas caíram mais Çie5%, sendo este o pri-meiro déficit de sua história. «

Habituada durante anos a ser uma empresa que tinha ql.la-se o monopólio de sua área de atuação, sendo líder dos- merca-dos em queparticipava, a IBM desenvolveu uma cultura orga-nizacional extremamente forte" sendo uma organização cons-ciente de seu poder no mercado" da força de sua imagem. A sig-nificativa queda de suas vendas, bem como o grande prejuízode 1992, acima de 4 bilhões de dólares, provocando inclusive asaída de seu chairman, Jonh Akers, são fatos q~e vêm provocan-do inúmeras modificações na empresa, inclusive em seus valo-res organizacionais. Este estudo de caso analisa algumas dasmudanças organizacionais propostas desde 1991, ainda na pre-sidência de Akers, ou seja, a criaçã-p da mamada "Nova IBM"com a implementação da políticaMarket Drioen Quality. A análi-se dos fatos baseou-se em uma pesquisa realizada na rBM Brasilpela autora para elaboração de dissertação de mestrado,

CARACTERíSTICAS DA JBM

A cultura da IBM é fundamentada em três credos básicoscriados por Thomas Watson, a fundador. Eles estão presentesem toda a organização em placas estrategicamente dispostas

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em todas as salas, em muitas publicações internas e sempre sefaz referência aos mesmos para embasar a maioria das decisõese atividades organizacionais, uma vez que eles constituem aprópria identidade da empresa.

O primeiro credo, "Respeito. ao Indivíduo", oficialmentenorteia a política de recursos humanos da organização. A em-presa possui mecanismos de comunicação interna que se funda-mentam no mesmo.

Um destes mecanismos, denominado de "Política de Por-tas Abertas", permite ao funcionário que se sente injustiçadopor seus superiores imediatos le-var suas questões diretamente àgerência superior, que as apre·ciará novamente de uma formaimparcial. A esta política inter-na, os funcionários chamam de"escalar". O Programa "FaleFrancamente" ou Speak Up per-mite ao funcionário que temuma queixa ou uma dúvida a so·lucionar relatá-las de forma anô-nima, tendo suas questões res-pondidas pelas autoridadesad-ministrativas encarregadas. Aempresa possui assim uma "jus-tiça interna" para resolução deconflitos, os quais absorve a fimde manter o sistema coeso. O se-gundo credo da empresa, "Pres-tar o Melhor Serviço ao Cliente",e, () terceiro, a "Busca da Exce-lência", ou seja, a busca de umaforma superior de realizar o trabalho, fundamentam a gestãoestratégica da qualidade a ser realizada através da implementa-ção do Market Driven Quality, sua política de Qualidade.

Os credos da IBM são constitutivos de sua identidade enão mudaram desde sua criação, estando assimilados profun-damente na organização. Sendo genéricos, podem ser constan-temente interpretados para fundamentarem as novas políticasde gestão adotadas pela empresa, em uma nova criação de sig-nificados que coaduna com o novo paradigma a ser adotado.São plenamente compatíveis com as propostas de implementa-ção do Mllrket Drioen Quality, ou seja, a implementação da ge-rência de qualidade anteriormente definida, tendo como basenão só a satisfação dos desejos do cliente, mas o seu "encanta-mente)" através da criação de produtos que contribuam para oseu sucesso.

A gestão de recursos humanos participativa é justificadapelo credo "Respeito ao Indivíduo".

A criação da "Nova IBM" é assim legitimada pelos mes-mos princípios que mantinham o antigo modelo organizacio-nal proposto, princípios estes, no entanto, reinterpretados nacriação de um novo paradigma, que pretende ser uma respos-ta organizacional às dificuldades do ambiente, para fugir à

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"morte", reproduzindo as palavras dos próprios estrategistasinternos, em uma visão sistêmica.

A "Nova IBM", na realidade, é uma evolução de um mo-delo de organização "mecanicista" para um orgânico, na termi-nologia de Burns e Stalker.

De acordo com sua proposta oficial, a IBM quer tornar-se uma companhia que influencia as mudanças do mercado enão apenas uma empresa que reage às mesmas. Para issopretende ser uma companhia dirigida para o mercado (mar-ket-driven), através de uma cultura "obcecada pela qualida-de". Os argumentos estratégicos para a implementação dagerência do processo dentro do MDQ (Market Drioen Quality)são: abordagem gerencial que melhor faz frente a um am-biente competitivo, com objetivos de negócios crescentes ecada vez mais complexos, o aumento do nível de exigênciados clientes, os recursos limitados e a enorme carga de traba-lho existente.

A "Nova IBM" pretende ser uma companhia capaz deassumir riscos, estar continuamente aprendendo, desenvol-vendo novas habilidades e conhecimento, criando valor paraseus clientes, empregados, acionistas, comunidade e nosmercados onde atua (em uma reação à sua atitude de seruma empresa "fechada em si própria", devido à sua constan-te liderança anterior nos mercados, atitude esta muito critica-da, como sendo uma das causas de seus atuais prejuízos).Seus objetivos são ambiciosos - quer ser a líder mundial nosmercados globais onde atua, ou uma empresa world class.Quando esta proposta foi feíta, na gestão de Akers, em 1991,isso significava reagir aos prejuízos e lutar pelo atingimentodo "zero defeito" ou "perfeição". A própria IBM, reconhe-cendo ser uma empresa gigante, com uma enorme burocra-cia, com problemas de integração interna, e com uma culturamuito forte e cristalizada, com resistências à mudança, pro-pôs, nesta época, reformular-se totalmente, a fim de enfren-tar estes desafios. A fim de conseguir flexibilidade e rápidareação às mudanças do mercado, a empresa subdividiu-seem treze subáreas com autonomia crescente, pretendendocortar custos e implementar o MDQ, inserindo-o em sua cul-tura organizacional a fim de obter uma melhor performancede seus empregados. Pretendeu transformar-se em uma "fe-deração de companhias" com objetivos comuns, mas com in-dividualidade para explorarem novas oportunidades de ne-gócio. Cada uma delas tem compromissos de atingir objeti-vos de crescimento em vendas, lucro, retorno de investimen-to, fluxo de caixa, satisfação de clientes, qualidade e moraldos empregados. Estas treze divisões são nove unidades denegócio voltadas para produção e desenvolvimento de pro-dutos e serviços (manufacturing and deoelopmenii e mais qua-tro unidades geográficas voltadas para áreas de Marketing eServiços.

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o novo sistema de gerência proposto visa a manter as unida-des com um mínimo de conflito, introduzindo leis de mercadoreal dentro da companhia. Os "Princípios de Operação" defi-nem um conjunto de diretrizes com papéis e responsabilida-des, estabelecendo modelos de contratos internos e definindoos padrões de avaliação financeira das unidades de negócio edas unidades geográficas.

Cada uma delas é avaliada pelo seu desempenho "dentrodos três aspectos do sistema de valores da IBM: MDQ, Satisfa-ção do Cliente e Moral dos Empregados".

Cada "ibmista ", ou empre-gado da IBM, deve sentir-se in-timamente relacionado aos re-sultados da divisão onde traba-lha e luta pelos objetivos damesma em uma atitude compe-titiva. Descentraliza-se a empre-sa, devendo o empregado inse-rir-se totalmente na divisão on-de trabalha. A fim de estimular-se esta inserção, bem como a ab-sorção de novos valores e a cria-ção de novas atitudes, como aparticipativa, a "obsessão inter-na pela qualidade", assumir ris-cos, a implementação do MDQ,para superar-se resistências amudanças, como o fim do estilode gerência paternalista, utili-zam-se de elementos da cultura organizacional da empresa,em um processo de re-socialização dos empregados, a partirde novos significados que foram estabelecidos na mudança deparadigma.

Desde a criação da proposta da "Nova IBM" e de sua di-fusão, em 1991, em cerimônias públicas, em discursos oficiais,em ritos como encontro de comitês executivos, apresentações,entregas de prêmios, a gerência e os executivos manifestam-seexplicita e simbolicamente na colocação dos novos valores daempresa.

A título de exemplo pode-se citar o caso do encontroanual de acionistas, em abril de 1992.

O chairman (Akers, na ocasião) perguntou a um emprega-do se ele era um "ibmista". O empregado respondeu que emprimeiro lugar trabalhava e lutava pela ISSC - IntegratedSystems Solution, uma das novas subdivisões da empresa, oubaby blue. Tal atitude foi elogiada em público entusiastica-mente pelo então presidente como a postura correta do funcio-nário da "Nova IBM", que, antes de ser "ibmista ", lutava pe-los resultados da divisão a que pertencia.

O antigo presidente tinha como estratégia fazer de pes-soas que tiveram iniciativas "heróis" dentro da empresa, di-fundindo suas histórias a fim de criar um "clima" propício àaceitação dos novos valores, incentivando a mudança de com-portamento e a internalização da cultura MDQ, delegando ta-

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refas e fazendo os funcionários assumirem riscos, agindo co-mo se fOSSelTI"donos do negócio".

A liderança dos executivos da alta gerência, ou seja, dossetores envolvidos com o poder de decisão, era e é ainda vistacomo decisiva para a implementação das mudanças.

Com a escolha de Louis Gerstner para a presidência daIBM, a nível mundial, deve-se aguardar como o mesmo con-duzirá estas mudanças iniciadas por seu antecessor.

Sediada no Rio de Janeiro, a IBM Brasil - Indústria deMáquinas e Serviços Ltda: - foi fundada em 1917, totalizandoatualmente quase 5.000 funcionários. Possui várias filiais em to-do o país, dois centros de suporte aos consumidores, um noRio, onde fica sua sede, e outro em São Paulo, onde tambémpossui um grande prédio na rua Tutóia. Além disso, dispõe deuma fábrica em Sumaré, perto de Campinas, estado de São Pau-lo, fundada em 1972, que fabrica computadores de médio portee discos rígidos. Possui, ainda, um enorme centro educacionalna Gávea, Rio de Janeiro; seu Diretor-Presidente desde 1986 éRudolf Hohn.

Devido à lei brasileira de informática, vigente de 1984 a1992, a IBM Brasil fabricava somente computadores de médioporte, sendo necessários grandes investimentos por parte dosclientes. Ela possui, no entanto, uma divisão denominada GBSou General Business Systerns, através da qual aliou-se ao grupoVillares constituindo a IVIX, empresa que fabrica e comercializaa workstation rise 6.000. Através de sua política de estar presentetambém neste mercado, cedeu àITAUTEC, do grupo ITAÚ,também seu maior cliente, o direito de fabricação e comerciali-zação de seu produto AS~400, um minicomputador, no Brasildenominado S-400. Constituiu também uma ioiru-uenture com aCID Informática para fabricação de microcomputadoresPS ouPersonal System. Seu principal concorrente no mercado de com-putadores de médio porte é o sistema Unisys, e empresas comoa Fujitsu e Amdahl.

Canhou o Prêmio Nacional de Qualidade para sua fábricade Suma ré este ano e obteve também a certificação das normasISO 9000, ou Iniernaiional Stanâarâs Organization, que permitema exportação para todos os países da Comunidade EconômicaEuropéia.

Como a IB.M americana, no entanto, implementá mudan-ças a fim de fazer face ao mercado brasileiro, que neste momen-to, com o término da lei de informática, gera novas oportunida-des de negócios.

A IBM Brasil é uma organização grande e complexa, pos-suindo empregados de diversas faixas etárias, com mentalida-des diversas, originando, pois, subgrupos culturais, que reagemde modo diverso às novas propostas. A forte socialização queos "ibmistas" sofrem para internalizar esta "cultura de qualida-de" sem dúvida homogeiniza em muito seu comportamento,mas esta internalização varia nos diversos subgrupos, sendomais questionada em alguns e mais aceita em outros.

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IBM O DESAFIO DA MUDANÇA-A fábrica de Sumaré emprega um grande número de especia-listas com estudos pós-graduados (entre eles o pessoal doILAT- Instituto Latino Americano de Tecnologia, órgão de es-tudo e treinamento da IBM), e o relacionamento do pessoaltende a ser pouco rígido, mais informal. Alguns estudos mos-tram ser mais fácil a implementação deste tipo de cultura e acriação de "espírito de equipe" nas fábricas que adotam siste-mas produtivos por processo. Elas constituem unidades pro-dutivas de tecnologia capital intensiva avançada, tendem aexibir hierarquias alongadas,onde predomina a administra"ção por comitês, mais do que aautoridade de linha. Os traba-lhadores diretos são relativa-mente poucos se comparadoscom o pessoal qualificado, ha-vendo mais trabalhadores demanutenção e controle do queadmin istr ativos (burocratiza-dos). O sistema de controle ten-de a ser unitário e predominan-temente impessoal. Grande nú-mero de instrumentos de con-trole são mecânicos ou automá-ticos.J? É o caso da fábrica deSumaré. De modo geral, a polí-tica MDQ permeia com menosentusiasmo o pessoal adminis-trativo e burocrata do que O

pessoal da fábrica,

OS SUBGRUPOS EXISTENTES NA ORGANIZAÇÃO

Observa-se a tendência de divisão em cinco grupos no in-teriorda empresa diferenciados em termos de organização tra-balhista no que se refere ao vínculo empregatício.

Em primeiro lugar, existem os estagiários, sem vínculoempregatício. Em segundo lugar, os contratados por um deter-minado período de tempo, os "ibmistaslf.temporários. Temos,é claro, os funcionários efetivos. Outra categoria, os "subcon-tratados", são trabalhadores q-uefreqiientam diariamente osprédios da empresa e trabalham em conjunto com os outros,mas que têm vinculo empregatício com uma outra empresaque a IBMcontrata (terceirização). Existem ainda os chamadosvendors, ou trabalhadores mais especializados como consulto-res, que permanecem na empresa pOr período predetermina-do, executando trabalho específico.

Referindo-se aos três primeiros grupos, percebe-se umacerta seqüência lógica para o ingresso na empresa ~ o indiví-duo é admitido na empresa como estagiário, se aprovado, écontratado temporariamente e, em seguida, caso haja interessee uma boa avaliação, efetivado.

Neste processo, o "ibmista" ou efetivado é visto como umprivilegiado, pois já superou três etapas, com as inseguranças

10. Ver MODA, Fernando Pres-tes. Op. cit. p. 31-33, ao referir-se aos estudos de Joan Wood-ward, representante da teoriacontingencial ista.

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'--------------------------------------------------------------e obstáculos naturais a transpor em cada uma delas ser acei-to como estagiário, conseguir o contrato temporário e, porfim, a almejada contratação, coroação de seus esforços.

Os estagiários que trabalham na Divisão de Informática,localizada à avenida Presidente Vargas, Rio de Janeiro, porexemplo, possuem a mesma faixa etária e são recrutados ge-ralmente no mesmo tipo de universidades e escolas seleciona-das pela IBM. Costumam vestir-se de uma maneira informal eter uma atitude "questionadora", porém prudente, pois alme-jam a contratação efetiva. São provenientes da classe médiacarioca, pelo que se pode observar, e têm mais ou menos omesmo poder aquisitivo, recebendo salários similares, fre-qüentando o mesmo gênero de ambientes fora da empresa,tendo o mesmo tipo de gostos e valores, formando um grupotípico.

Os jovens efetivos da mesma divisão, que trabalham emgrupos para a implantação de projetos, também desenvolvemesta atitude questionadora, mais de um modo mais abertoque os estagiários, pois gozam de mais garantias no trabalho.

Em outros grupos, como o de gerentes de nível médio,cuja maioria moram em condomínios da Barra da Tijuca (con-domínios fechados, com facilidades como piscinas, saunasetc.), indivíduos que costumam ter pelo menos cinco anos naIBM, alguns dos quais há 20, 30 anos na empresa, pode-se ob-servar uma atitude menos entusiástica e mais crítica em rela-ção às mudanças. Normalmente, a resistência à mudança e aintrodução de novos valores encontra-se na gerência média,que sente-se mais ameaçada com as mesmas.

Há, no entanto, jovens executivos, treinados nos EstadosUnidos e ocupando posições de gerência, com uma mentali-dade mais aberta à mudanças e um perfil mais dinâmico. Per-cebe-se neste segmento as futuras elites empresariais da IBM.

Os subcontratados (IBM Rio de Janeiro) que trabalhamem serviços como cafeteria, ajudantes de secretárias, contí-nuos etc., têm mais ou menos a mesma forma de vestir-se eexpressar-se, pertencem às classes sociais mais baixas, moramna zona norte carioca ou em bairros pobres, e provavelmentetendem a perceber e interpretar a realidade que os cerca, este"universo IBM", de forma semelhante, com base nos mesmosvalores. Observando-se este grupo, nota-se sua insatisfaçãopor portarem um tipo de crachá que os identifica como nãopertencentes ao grupo IBM, por não poderem desfrutar dosbenefícios e vantagens dos indivíduos que trabalham na em-presa, vistos como privilegiados, "eleitos". Eles sentem-seuma "minoria" dentro da organização, não tendo real acessoà mesma.

Os "ibmistas" temporários, apesar de serem funcioná-rios, com garantias, usufruindo dos benefícios da organiza-ção, têm os sentimentos próprios à sua situação: a incertezade serem ou não posteriormente efetivados. No término deseu contrato, (normalmente de dois anos) poderão encontra-rem-se desempregados em um mercado como o brasileiro,onde um bom emprego em uma empresa multinacional quetenha benefícios é cada vez mais difícil. Sentem-se também

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18M: O DESAFIO DA MUDANÇA

discriminados pelo uso do crachá que os identifica como tem-porários. Um dos funcionários chegou a solicitar, em nome doprincípio ou credo "Respeito ao Indivíduo", a adoção de umnovo tipo de identificação interna que não o crachá, por sen-tir-se discriminado pela cor do mesmo. Ele expressou seu sen-timento, em nome dos temporários, no "Fale Francamente",mecanismo de comunicação interna já descrito. A direção daempresa respondeu. na época, que um novo tipo de identifi-cação estava sendo estudado para evitar esta situação.

Em uma empresa que lida com segredo de informações,como a IBM, o vínculo empregatício ou não do funcionárioassume U).1l caráter fundamental no seu acesso às informa-ções, pois a pressão por se-gurança neste sentido éenorme.

Os estagiários e tempo-rários têm acesso diferencia-do às informações, dada asua falta de vínculo empre-gatício ou a limitação da du-ração do mesmo. A cor docrachá permitia o acessotambém ou não a certos be-nefícios da empresa, comouso de microônibus, quadrade esportes etc., o que gera-va estas reações por partedos funcionários. Neste sen-tido, os subcontratados sen-tem-se excluídos do univer-so organizacional, onde, noentanto, trabalham -e convi-vem diariamente.

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MODOS DE SOCIALIZAÇÃOUTILIZADOS PELA ORGANIZAÇÃO E

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir da liderança dos executivos pertencentes à alta dire-ção, os valores e significados que compõem a "Nova IBM" são di-fundidos, em um processo de sense making, ou difusão de signifi-cados a serem compartilhados por toda a organização e que deve-rão nortear seus rumos, possibilitando a coordenação da ativida-de conjunta.

Esta socialização é feita na IBM Brasil através de cursos etreinamentos especiais onde os empregados são sensibilizados pa-ra os valores que compõem o Market Drioen Quality e onde apren-dem técnicas de melhoria contínua de processos a partir da cons-tituição de grupos para análise de seu trabalho, objetivando a di-minuição das causas da não-qualidade. Nestes cursos e no desen-volvimento desta análise, processa-se a internalização da "culturade qualidade",

Através de publicações internas, da criação de prêmios e

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11. Ver BERGER, P.; LUCK-MANN, T. Op. cit.

12. Ver VASCONCELOS, Isabel-la. O Market Driven Quality. Acultura organizacional e a políti-ca de qualidade da IBM. SãoPaulo: EAESP/FGV, 1993. (Dis-sertação de Mestrado).

13. Idem, ibidem.

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símbolos de qualidade, nas comunicações verbais e não verbaisdos principais executivos, verifica-se o esforço concentrado pa-ra a difusão desta cultura.

Já se descreveu a complexidade da organização e alguns deseus subgrupos no Brasil. São pessoas de diferentes idades, cor,sexo etc, que convivem em um mesmo "universo simbólico". Aoentrar em contato com a cultura organizacional, o indivíduo,que já foi alvo de uma socialização primária anterior, internalizaos símbolos e padrões existentes e, em uma relação dialética, ex-pressa-se no mundo social, reinterpretando e recriando estessímbolos, em um processo dinâmico. 11 Pessoas que pertencem àmesma classe social tendem a ter o mesmo tipo de visão demundo, por freqüentarem os mesmos ambientes, portarem cer-tos símbolos distintivos de classe, bem como gostos e padrõesde comportamento e valores.

A organização possui subculturas referentes aos subgruposque a constituem, que são permeados de modo diferente pelacultura organizacional, à qual percebem e reagem de modo di-verso. As subculturas divergentes (que não coadunam com oparadigma dominante, que resistem a ele) são incorporadas, senão destruídas, dentro do processo de mudança organizacional,na implementação de um novo paradigma.

Em uma cultura cristalizada e "fechada", em uma empresacaracterizada pela estabilidade de seus empregados, de suas po-sições de mercado e de sua forte imagem, fala-se subitamenteem romper tabus, mudar paradigmas, reformular-se a culturainterna, requestionarem-se processos e alocação de recursosatravés de procedimentos radicais como a reengenharia (redesignradical) de seu sistema de negócios, se necessário P, enfrentan-do-se resistências à mudança. Uma das armas a ser utilizada afim de quebrar estas resistências, como as da média gerência,por exemplo, segundo estrategistas internos, é a política de revi-talização ou aposentadoria antecipada da empresa, que permiteo acesso de pessoas mais jovens à posições de poder e decisão.Pessoas com muitos anos de empresa, céticas em relação às mu-danças propostas, cedem espaço para os jovens executivos for-madores da futura elite "ibmista". Esta possibilidade de acesso aposições gerenciais motiva elementos deste grupo, normalmentemais abertos.

Para os indivíduos que vêem dificuldades na implantaçãoda nova estrutura proposta mas que pretendem permanecer noemprego (não irão se aposentar), a empresa, nos cursos e treina-mentos, deixa claro que apesar das dificuldades serem com-preensíveis, uma nova atitude e adaptação às mudanças serãocobradas - uma nova IBM, corresponde um "novo ibmista", em-preendedor, que assuma riscos e seja participante.

A difusão de técnicas como a "reengenharia do sistema denegócios - Reengineering e o benchmarking 13 como metodologia aser seguida facilita o processo de mudança, pois obriga os indi-víduos a "olharem para fora", comparando os procedimentos daIBM aos dos concorrentes, fugindo à antiga atitude "fechada",característica de sua cultura organizacional.

A empresa, apesar de pretender implementar um estilo degerência participativa, fugindo aos antigos padrões de gerênciapaternalista, como total estabilidade no emprego, complacênciacom a performance etc., tem um longo caminho a enfrentar para

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IBM: O DESAFIO DA MUDANÇA

implementar esta nova visão. Ela tende a reproduzir a divisãosocial por classes.

Já se demonstrou como subculturas divergentes podemser eliminadas, seja por processos de aposentadoria antecipa-da, ou pela exclusão do indivíduo do ambiente organizacional,com o fim da complacência própria ao estilo "paternalista" degerência.

A colaboração dos indivíduos questionadores, que gostamde propor novas estratégias, como os jovens analistas de siste-mas ou estagiários, pode ser obtida a partir de sua participaçãonas técnicas de melhoria de processos ou de "reengenharia dosistema de negócios".

A conclusão deste estudo decaso é parcial, dado o caráter pro-fundo da reestruturação propostapela IBM, cujos resultados só po-derão ser apreciados dentro dealguns anos.

A situação atual da IBM é de-licada e muitos indivíduos estãocéticos em relação à capacidade dereação da empresa.

Por mais forte que sejam osmecanismos de socialização da or-ganização, as suas crenças e valo-res permearão de forma diferenteseus diversos ambientes.

Pode-se atingir, no entanto,um alto grau de aceitação das nor-mas e proposições organizacionais. Quanto maior for esta acei-tação e a internalização dos valores da cultura MDQ e da "cultu-ra de qualidade", em geral, mais próxima a empresa deve che-gar dos resu Irados pretendidos.

Como exemplo, cita-se o caso da fábrica de Sumaré, em SãoPaulo, e de Rochester, nos Estados Unidos, que ganharam o Prê-mio Nacional de Qualidade (1992) e o "Prêmio Malcolm Bal-dridge" (1990), respectivamente, além de terem bons resultadosoperacionais.

Verifica-se nestes dois exemplos que existe a possibilidadede atingir-se diversos objetivos propostos utilizando-se o MDQ,apesar das dificuldades existentes e da complexidade da organi-zação. O futuro da empresa é, no entanto, uma incógnita.

É necessário ir-se além dos métodos propostos para melho-ria dos processos-chave da organização (métodos fundamenta-dos na teoria racional-instrumental de Max Weber ou adequa-ção meios-fins ).14 Somente quando consideram-se também ou-tras dimensões do indivíduo, como a dimensão simbólica, a psi-cológica, a comportamental etc. 15, pode-se conseguir êxito emobter-se uma mudança de atitude face a determinada realidade,obtendo-se o compromisso e a participação.

Watson, o fundador da IBM, já compreendia isso ao afir-mar que "é preciso levar os negócios ao coração das pessoas e o cora-ção das pessoas aos negócios". Reconhecer a validade dos métodosnão significa deixar-se aprisionar pelos mesmos, pois, como di-zia George Bernard Shaw: "todo o progresso depende de homens nãorazoáveis". O

14. Ver VASCONCELOS, Flávio.Direito. trabalho e burocracia.São Paulo: EAESP/FGV, 1989.(Dissertação de Mestrado).Conclusão.; WATSON Jr.; PE-TRE, Peter. Pai. filho e cts, mi-nha vida na IBM. São Paulo:Nova Cultural. 1991.

15. Ver CHANLAT, Jean-Fran-çoís. O indivíduo na organiza-ção-Dimensões esquecidas.São Paulo: Atlas, 1992; BATE-SON, Gregory. Mente e nature-za - a unidade necessária. Riode Janeiro: Francisco Alves.1986.

Artigo recebido pela Redação da RAE em novembro/92, aprovado para publicação em abril/93. 97