Humor e Língua Estrangeira -- Explorando Os Gêneros Humorísticos No Ensino de Inglês

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Humor e lingua estrangeira

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  • UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

    INSTITUTO DE LETRAS

    PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM LETRAS

    MESTRADO EM LETRAS

    DANIELA CHAVES BERNARDO

    HUMOR E LNGUA ESTRANGEIRA: EXPLORANDO OS GNEROSHUMORSTICOS NO ENSINO DE INGLS

    NITERI

    2012

  • DANIELA CHAVES BERNARDO

    HUMOR E LNGUA ESTRANGEIRA:

    EXPLORANDO OS GNEROS HUMORSTICOS NO ENSINO DE INGLS

    Dissertao apresentada ao curso de Ps-Graduao doInstituto de Letras da Universidade Federal Fluminense,como exigncia parcial para a obteno do Grau de Mestre.rea de Concentrao: Estudos da Linguagem.

    Orientador: Prof. Dr. FERNANDO AFONSO DE ALMEIDA

    NITERI

    2012

  • Ficha Catalogrfica elaborada pela Biblioteca Central do Gragoat

    B518 Bernardo, Daniela Chaves.Humor e lngua estrangeira: explorando os gneros humorsticos no

    ensino de ingls / Daniela Chaves Bernardo. 2012.112 f.Orientador: Fernando Afonso de Almeida.Dissertao (Mestrado) Universidade Federal Fluminense, Instituto

    de Letras, 2012.Bibliografia: f. 99-103.

    1. Didtica. 2. Humorismo. 3. Ensino da lngua estrangeira. 4. Ensinoda lngua inglesa I. Almeida, Fernando Afonso de. II. UniversidadeFederal Fluminense. Instituto de Letras. III. Ttulo.

    CDD 371.3

  • DANIELA CHAVES BERNARDO

    HUMOR E LNGUA ESTRANGEIRA:

    EXPLORANDO OS GNEROS HUMORSTICOS NO ENSINO DE INGLS

    Dissertao apresentada ao curso de Ps-Graduao doInstituto de Letras da Universidade Federal Fluminense,como exigncia parcial para a obteno do Grau de Mestre.rea de Concentrao: Estudos da Linguagem.

    Aprovada em fevereiro de 2012.

    BANCA EXAMINADORA

    _____________________________________________________________________

    Prof. Dr. Fernando Afonso de Almeida- Orientador- UFF

    _____________________________________________________________________

    Prof. Dr. Ricardo Luiz Teixeira de Almeida-UFF

    _____________________________________________________________________

    Prof. Dr. Letcia Couto Rebollo-UFRJ

    _____________________________________________________________________

    Prof. Dr. Ktia Valrio Modesto-UFF

    _____________________________________________________________________

    Prof. Dr. Victria Wilson-UERJ

  • Humor no um estado de esprito, mas uma viso de mundo.

    (Ludwig Wittgenstein)

  • AGRADECIMENTOS

    A Deus, por tudo.

    Aos meus pais, Teresinha e Adlio, pelo constante incentivo aos estudos.

    Ao Prof. Dr. Fernando Afonso de Almeida pela orientao e dedicao.

    Ao programa de ps-graduao da Universidade Federal Fluminense.

    Capes pela bolsa de estudos concedida.

    Ao Prof. Dr. Ricardo Almeida pelo parecer na defesa de projeto.

    Prof Dr Ktia Valrio pelos comentrios na defesa de projeto.

    s professoras Doutoras Letcia Rebollo e Victria Wilson por participarem da banca.

    Prof Dr Selma Borges pelo incentivo pesquisa nos tempos de bacharelado.

    Conceio, Letcia e Marina pelas contribuies durante as reunies de orientao.

    Ao Leonardo por estar ao meu lado e torcer por mim.

    coordenao do PROLEM.

    Aos alunos e professores que contriburam para o desenvolvimento desta pesquisa.

    Aos professores que ministraram as aulas durante o mestrado.

    s funcionrias da secretaria da ps-graduao.

    A todos que contriburam para a elaborao deste trabalho de alguma forma.

  • RESUMO

    O objetivo deste trabalho observar em que medida o discurso humorstico exploradoem livros didticos; verificar quais so os gneros apresentados e analisar a finalidade dasatividades propostas com base em textos ou cenas de humor. O nosso estudo inicia-se com asconsideraes de dois grandes tericos, mostrando que o discurso humorstico possui outrasintenes alm daquela de provocar o riso. Ademais, apresentamos as contribuies que o uso dehumor pode oferecer para as aulas de LE, defendendo que este pode ser inserido no ensino deingls desde estgios iniciais, levando-se em conta a existncia de trs tipos de humor:universal, cultural e lingustico (SCHMITZ;2002). Em seguida, tratamos das diferenas entretipos e gneros textuais e apresentamos as principais caractersticas de alguns gneroshumorsticos, tais como: a HQ, a tira, a charge, o cartum e a piada. Ainda, analisamos livrosdidticos de duas metodologias distintas a fim de verificar como o humor incorporado a esseslivros. Alm disso, a nossa pesquisa revela o resultado de um teste que aplicamos entreestudantes de ingls com o propsito de averiguar o tipo de humor mais transparente para osmesmos. Finalmente, expomos a viso dos professores de lngua inglesa de diferentes cursos deidiomas sobre a utilizao ou no dos gneros humorsticos em suas aulas.

    Palavras-chave: Didtica. Humorismo. Ensino de lngua estrangeira. Ensino de lnguainglesa.

  • ABSTRACT

    The aim of this work is to observe to what extent the humorous discourse is explored indidactic books; check which text genres are presented in these books and analyze the objective ofthe activities based on texts and scenes of humor. Our study begins with some considerationsmade by two important theorists, showing that there are other intentions beyond the one ofprovoking laughter. Then, we present the contributions that the use of humor can provide toforeign language classes, defending that humor can be incorporated into English lessons sinceelementary levels, taking into account the existence of three types of humor: universal, cultural

    and linguistic (SCHMITZ;2002). Besides, we highlight the differences between types and textgenres and point out the main features of some humorous genres, such as: the comics, the comicstrip, the political cartoon, the cartoon and the joke. Moreover, we examine didactic books oftwo different methodologies in order to verify how humor is incorporated into these books. Inaddition, our research presents the results of a test made by students to investigate which type ofhumor is the most transparent for them. Finally, we share the English teachers` views on the

    utilization or not of humorous genres in their classes.

    KEYWORDS: Didactics. Humorism. Foreing language teaching. English languageteaching.

  • SUMRIOINTRODUO...........................................................................................1

    Metodologia................................................................................................5

    CAPTULO 1

    ALGUMAS CONSIDERAES SOBRE O HUMOR............................8

    1.1 O Humor.................................................................................................8

    1.2 Bergson e o Cmico...............................................................................9

    1.3 Freud e Os Chistes...............................................................................12

    CAPTULO 2

    AS CONTRIBUIES DO HUMOR PARA AS AULAS DEINGLS(LE)..............................................................................................17

    2.1 Humor e Cultura.................................................................................19

    2.2 Humor e Lngua..................................................................................21

    2.2.1 Ambiguidade ...................................................................................21

    2.2.2 Os Implcitos....................................................................................25

    3.3 Humor , Leitura e Conversao........................................................27

    3.4 Humor e Compreenso......................................................................28

  • CAPTULO 3

    OS GNEROS TEXTUAIS......................................................................32

    3.1 Os Gneros Humorsticos....................................................................33

    3.1.1 As Histrias em Quadrinhos (HQs).................................................35

    3.1.1.1 A Linguagem das HQs...................................................................35

    3.1.1.2 Os Bales.........................................................................................37

    3.1.1.3 O Tempo..........................................................................................37

    3.1.1.4 O Enquadramento..........................................................................38

    3.1.1.5 As Cores..........................................................................................39

    3.1.1.6 As Onomatopeias...........................................................................39

    3.1.1.7 As Metforas visuais......................................................................40

    3.1.2 A Tira.................................................................................................41

    3.1.3 A Charge............................................................................................41

    3.1.4 O Cartum..........................................................................................42

    3.1.5 A Piada...............................................................................................42

    CAPTULO 4

    ANLISE DO MATERIAL DIDTICO.................................................46

    4.1 Material de Abordagem Comunicativa..............................................47

    4.1.1 Nvel Bsico.........................................................................................47

    4.1.2 Nvel Intermedirio............................................................................50

  • 4.1.3 Nvel Avanado.................................................................................53

    4.2 Material de Metodologia Audiolingual............................................59

    4.2.1 Nvel Bsico.......................................................................................59

    4.2.2 Nvel Intermedirio..........................................................................61

    4.2.3 Nvel Avanado.................................................................................62

    4.3 Concluso da Anlise...........................................................................64

    CAPTULO 5

    A COMPREENSO DO HUMOR..........................................................67

    5.1 Anlise do Desempenho dos Alunos ..................................................68

    CAPTULO 6

    A VISO DOS PROFESSORES..............................................................85

    6.1 Atrair a ateno dos alunos.................................................................86

    6.2 Explorar a estrutura da lngua e vocabulrio.................................87

    6.3 Trabalhar leitura, tratar de temas polmicos e aprofundar osestudos sobre os gneros............................................................................87

    6.4 Ensinar sobre a cultura da lngua-alvo.............................................88

    6.5 Propiciar maior contato com a LE e expor o aluno lngua autnticae a linguagem informal..............................................................................89

  • CONSIDERAES FINAIS....................................................................95

    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS.....................................................99

    ANEXO 1- Teste......................................................................................104

    ANEXO 2- Questionrio..........................................................................111

  • 1INTRODUO

    A motivao para esta dissertao surgiu ao notar, atravs de minha experincia comoprofessora de ingls de cursos de idiomas, a pouca ou nenhuma presena de humor em livrosdidticos, o que pode representar uma perda para o ensino de lngua inglesa.

    Apesar de o discurso humorstico no ser frequentemente trabalhado, h diversosmotivos para inclu-lo nos manuais de lngua estrangeira. Um deles que o humor estpresente em diversas situaes do cotidiano, como nas conversas, nas manifestaes culturaisem geral, na publicidade, e em diferentes gneros de discurso.

    Observando-se a questo sob outro aspecto, inegvel a incorporao cada vez maisintensa das imagens aos discursos circulantes, o que, em parte pelo menos, justifica ointeresse por gneros mistos (aqueles que aliam a imagem ao verbal) como a histria emquadrinhos (doravante HQ), a charge, o cartum, as tirinhas, no apenas por parte dosestudiosos, mas tambm pelo pblico em geral, principalmente pelas crianas e adolescentes.Ao se utilizar pedagogicamente a HQ, por exemplo, passa-se a incluir o universo do aluno nasala de aula e o aprendizado pode se tornar mais significativo para ele.

    A HQ no o nico gnero humorstico que fica fora da sala de aula, pois a charge, ocartum e a tira tambm costumam ser esquecidos. Ademais, no raro encontrar confuso emdiferenci-los. O desconhecimento das caractersticas dos gneros leva uma charge, porexemplo, a ser tratada como um cartum ou este ltimo a ser considerado uma tira, o que podeconstituir mais uma razo para explor-los no ensino.

    Alm dos gneros humorsticos mencionados, necessrio levar em conta o gneropiada, que pode at mesmo ser visto por alguns como um texto inapropriado para a sala deaula, pois muitas vezes apresenta cenas que evidenciam uma viso preconceituosa, alm defrequentemente explorar contedo sexual. Porm, as piadas, na verdade, servem paraevidenciar e discutir comportamentos sociais j que as mesmas relacionam-se a temaspolmicos ou proibidos (POSSENTI, 1998).

    Ao esclarecer as similaridades e as diferenas entre os gneros importante percebero quanto os mesmos podem contribuir para aulas, uma vez que eles permitem um estudo maiscompleto, tornando mais variada a escolha de materiais a serem utilizados pelo professor.Geralmente, so incorporados aos livros didticos sobretudo gneros como artigos derevistas, textos da internet, trechos de estrias de livros etc.

  • 2Alm disso, h autores que defendem o uso de humor no ensino de lngua como, porexemplo, Chiasson (2002) ao ressaltar que o humor apresenta um grande papel em nossainterao social diria. Por isso, no devemos ignor-lo, mas sim inseri-lo em todas as nossasaulas. Percebe-se, ento, que o discurso humorstico est presente nas trocas sociais e, poressa razo, no pode ser esquecido ao se tratar de aula de lngua estrangeira.

    Ainda, segundo Ketabi e Simim (2009, p. 439):

    o humor comum a todas as culturas e apreciado por quase todos.Logo, o mesmo pode representar um estmulo poderoso no ensinode lngua para motivar os alunos a participarem ativamente nasaulas. A utilizao do humor possibilitaria a combinao entreaprendizagem e entretenimento.1

    Atravs do humor, o aluno tem a oportunidade de vivenciar um aprendizado que lheproporciona tambm descontrao, diminuindo a sensao de estresse que alguns apresentamdiante do desafio de aprender uma nova lngua. Ademais, Askildson (2005, p.45) afirma queo humor de grande valia como uma ferramenta pedaggica para ilustrar e ensinar a

    estrutura lingustica assim como para trabalhar o aspecto cultural e pragmtico da lngua.

    Dessa forma, os recursos humorsticos so relevantes para chamar a ateno do alunopara aspectos lingusticos e culturais, uma vez que esse tipo de discurso costuma apresentarjogos com palavras, implicaes e elementos da cultura.

    Levando em conta que atravs do humor a lngua vista em situaes autnticas ereais (CHIASSON; 2002) nota-se que o uso do discurso humorstico retirado de fontesgenunas pode servir como exemplo de lngua produzida por seus falantes e, assim,possibilitar que o contato do aluno com a lngua acontea de forma mais diversificada.

    Logo, o material humorstico pode apresentar um contedo rico e instigante aoarticular conhecimento e entretenimento, alm de estabelecer uma ligao entre o discursoexistente fora e dentro da sala de aula.

    Desse modo, HQs, charges, cartuns, tiras e piadas tornam-se recursos para explorarvocabulrio, gramtica, leitura, conversao, bem como processos cognitivos depressuposio, implicitao, inferncia entre os outros. O humor que apresenta a

    particularidade de brincar com as palavras por meio de trocadilhos, duplos sentidos podechamar a ateno sobre aspectos de funcionamento da lngua, ampliando assim o vocabulrio

    1 Traduzimos para o portugus as citaes de textos em lngua estrangeira.

  • 3do aluno. Ainda, na linguagem dos gneros humorsticos h grande ocorrncia de expressesidiomticas e grias que favorecem a familiarizao dos alunos com a lngua do dia a dia. Noque diz respeito gramtica, atravs do humor ensina-se a lngua de maneira contextualizadae mostram-se diferentes formulaes e estruturas que caracterizam desde a norma culta at ofalar coloquial, j que as HQs, por exemplo, utilizam muitos elementos informais. O trabalhode leitura, por sua vez, pode tornar-se mais atraente, pois como os textos humorsticos sogeralmente curtos, podem ser integralmente explorados em uma mesma aula. Por outro lado,evita-se uma possvel resistncia por parte de alunos pouco dispostos a leituras extensas. E,ainda, por apresentarem tpicos polmicos, principalmente no caso das piadas, e suscitarem areflexo poltica, no caso das charges, a leitura desses gneros textuais favorece odesenvolvimento de pensamente crtico, o debate e a conversao.

    Ao privilegiar a utilizao de humor em sala de aula pode-se criar no aluno o interessepor uma busca de textos humorsticos tambm fora do contexto escolar, devido aoentendimento sobre alguns mecanismos que levam ao riso e ao fato de esses textosconduzirem descontrao, tornando-se, portanto, estimulante para o aluno perceber quepode rir e ao mesmo tempo refletir sobre o que est implcito no texto, alm de praticar alngua que est aprendendo.

    O tamanho dos textos em questo vantajoso tambm no que tange ao tempo para serealizar atividades e exerccios. Esses textos que, na maioria das vezes, no so muitoextensos, possibilitam trabalhar um determinado contedo utilizando uma pequena parte daaula, tendo em vista a preocupao dos professores para trabalhar um programa longo demaneira produtiva.

    Ao se falar de humor em lngua estrangeira esbarra-se no mito de que o humor estestritamente vinculado cultura de cada pas e, portanto, aquele que no tem conhecimentodos costumes de uma determinada nao no ter meios de entender seu discursohumorstico. Entretanto, existe a possibilidade de aproveitar a diferena de hbitos paraensinar sobre a cultura da lngua que se est lecionando. De qualquer modo, no coerenteafirmar que o humor absolutamente cultural, pois boa parte das piadas continua sendoengraadas e entendidas quando traduzidas. Alm disso, Schmitz (2002) apresenta umacategorizao para o ensino de humor em lngua estrangeira que considera a introduo dehumor universal em nveis bsicos, humor cultural em estgios intermedirios e humorlingustico entre alunos avanados.

    A preocupao em discutir o humor no ensino de lngua toca em vrias questes jmencionadas, mas no se pode deixar de levar em conta que o humor no deve ser utilizado

  • 4apenas como recurso para ensinar a lngua e outros aspectos que esta envolve. precisotambm que se explore sua dimenso humorstica, que seja lido enquanto texto de humor,que permite um tipo de fruio particular, e que o aluno possa reagir quilo que l.

    conveniente que o aluno tenha acesso aos diferentes tipos de humor durante oprocesso de aprendizagem de uma lngua estrangeira, para que no uso da mesma atravs deinteraes reais fora da sala de aula, o humor no seja uma barreira ou um motivo defrustrao na comunicao do aluno. Uma das dificuldades na compreenso pode serproveniente, primeiramente, do fato de o humor estar sendo produzindo em uma outra lngua,obstculo esse que se soma s caractersticas peculiares que um texto humorstico apresenta.Com sua insero gradual desde estgios iniciais, o humor pode deixar de ser um obstculoem potencial durante a interao, facilitando-se a captao do sentido humorstico.

    Assim, o objetivo desta dissertao observar em que medida o discurso humorstico explorado em livros didticos; verificar quais so os gneros apresentados e analisar afinalidade das atividades propostas com base em textos ou cenas de humor.

    No primeiro captulo, intitulado algumas consideraes sobre o humor,introduzimos a definio de humor e esclarecemos a diferena entre os conceitos de humor,cmico e dito espirituoso, muitas vezes, utilizados como equivalentes, alm de discorremossobre alguns mecanismos responsveis por desencadear o riso nos enunciados.

    No segundo captulo, as contribuies do humor para as aulas de lngua inglesa(LE), explanamos sobre o papel do humor no ensino de ingls, uma vez que este pode serutilizado de diferentes maneiras, como, por exemplo, para motivar e descontrair alunos e,principalmente, para enriquecer o ensino da lngua e sua cultura, o que pode, como,consequncia, auxiliar na compreenso do sentido humorstico.

    Tendo discutido a importncia da incluso de humor no ensino de LE, no terceirocaptulo, apresentamos definies e distines sobre os gneros e os tipos textuais e, emseguida, discorremos sobre os gneros humorsticos, ressaltando suas caractersticas, o queauxilia na fundamentao do desenvolvimento da anlise de atividades com humor emmateriais didticos, assunto do quarto captulo, cujo propsito averiguar como o humor apresentado nesses materiais.

    A concluso da anlise nos livros didticos revelou a subutilizao dos gneroshumorsticos, o que pode implicar pouca familiaridade dos alunos com tais gneros emingls, motivando-nos a aplicar um teste constitudo por seis textos humorsticos de cunhouniversal, cultural e lingustico em turmas de ingls de nvel bsico, intermedirio e avanadocom a finalidade de verificar a compreenso do humor por partes dos alunos. O resultado do

  • 5teste, por sua vez, encontra-se no quinto captulo a compreenso de humor e demonstravariaes quanto ao entendimento dos textos de acordo com o tipo de humor utilizado.

    Diante da anlise dos livros didticos e do desempenho dos alunos no teste,consideramos pertinente elaborar um questionrio sobre a utilizao dos gneroshumorsticos no ensino de LE destinado aos professores de ingls de cursos de idiomas. Nosexto captulo, expomos as declaraes dos docentes, que so relacionadas a afirmaes deestudiosos do assunto.

    No ltimo captulo, portanto, temos o panorama das fases que essa pesquisa percorreue a as consideraes finais, visando a contribuir para o ensino de lngua estrangeira.

    Metodologia

    Podemos afirmar que esta pesquisa insere-se no campo da Lingustica Aplicada, umavez que identificamos e analisamos um problema no ensino de lngua estrangeira, que dizrespeito ao tratamento dado humor nos livros didticos. A pesquisa tem um carterdescritivo, pois para comprovar a nossa hiptese de subaproveitamento do humor nosmateriais, descrevemos como se d a presena dos gneros humorsticos nos mesmos e, apartir disso, apontamos as vantagens que a incorporao do humor ao material didtico podeagregar ao ensino de LE, de acordo com a viso de professores e autores sobre o tema.

    A nosso estudo de cunho qualitativo, visto que a coleta de dados abrange livrosdidticos, um teste e um questionrio. Iniciamos a pesquisa analisando por volta de 10 (dez)livros, o que nos permitiu verificar uma presena significativa do humor em livros adotadospor apenas duas instituies. Uma delas segue a abordagem comunicativa e a outra ametodologia audiolingual.

    Aps a identificao da presena de gneros humorsticos nesses livros, o passoseguinte foi examinar como estes so apresentados nos materiais. Utilizamos a categorizaode humor no ensino de LE proposta por Schmitz (2002) para averiguar o(s) tipo(s) de humorpresente(s) nas atividades. De acordo com a proposta de Schmitz, o humor universal pode sertrabalhado em nveis bsicos, o humor cultural pode ser utilizado a partir do intermedirio e,finalmente, pode-se explorar humor lingustico em estgios avanados e, por conta disso,

  • 6houve interesse em avaliar se o humor ocorria de forma gradativa nos livros didticos e sehavia alguma predominncia quanto ao tipo de humor produzido.

    Alm de examinarmos os tipos de humor, durante a anlise investigamos o objetivoda presena dos textos humorsticos nos livros didticos, o que nos levou a estabelecer 3(trs) categorias s quais as atividades se relacionam, tais como:

    - exemplificao: o humor empregado para exemplificar tpicos ensinados,geralmente vocabulrio e estrutura gramatical.

    - ilustrao: os gneros humorsticos so utilizados apenas para mostrar uma situaoque diz respeito ao tema da unidade.

    -exerccio: atividades ou tarefas so elaboradas a partir de textos de humor.

    Ao discutir os objetivos das atividades, notamos a importncia tambm de explanarsobre os tipos de linguagens (verbal e no-verbal) e os desvios que desencadeiam o humor, afim de verificar se h nas atividades dos livros preocupao em explorar a complexidade queos textos humorsticos apresentam.

    No que diz respeito aos tipos de linguagem, utilizamos a classificao elaborada porMcCloud (2005) para apontar como ocorre a interao entre a linguagem verbal e a icnica,tendo em vista a existncia de diferentes nveis de combinao entre ambas. As combinaesentre a linguagem verbal e icnica segundo o referido autor so: combinaes especficas depalavras; de imagem; duo-especficos; aditiva; paralelas; montagem e interdependente2.

    J no que tange descrio dos desvios que causam humor no enunciado, recorremos Freud, que distingue jogo com as palavras e jogo com o pensamento. O primeiro relaciona-seao desvio gerado pela ambiguidade no material lingustico do enunciado, enquanto o segundorefere-se ao desvio de lgica no texto. Com base nisso, averiguamos o tipo de desvio maisrecorrente nos textos de humor nos livros didticos.

    Feita a anlise dos livros didticos, sentimos a necessidade da realizao de um testepara verificar a compreenso do humor pelos alunos. Esse teste foi confeccionado a partir daproposta de Schmitz (2002) com o trabalho de trs nveis de humor para o ensino de LE:universal, cultural e lingustico. Por conta disso, o teste formado por seis textos, sendo doisde carter universal, dois de contedo cultural e dois de cunho lingustico, a fim de verificar otipo de humor que apresenta maior transparncia no que diz respeito ao seu entendimento

    2 Maiores detalhes no captulo 3.

  • 7entre os estudantes de nvel bsico, intermedirio e avanado, tendo como pressuposto que osestudantes enfrentariam maiores dificuldades para compreender o humor cultural elingustico. No teste, optamos por no utilizar apenas os gneros cartum e tira, mas tambm ognero piada, menos encontrado nos livros didticos.

    O teste foi aplicado no primeiro semestre letivo de 2011, em um curso de extensoidiomas de uma universidade pblica do Estado do Rio de Janeiro, cujos alunos participantespertenciam a trs nveis: quarto perodo do nvel bsico, segundo perodo do nvelintermedirio e segundo perodo do mdulo avanado. O teste apresentou duas etapas derealizao para proporcionar uma maior clareza no momento da interpretao dos dados. Naprimeira, os alunos deveriam ler os textos humorsticos e apontar os mecanismosresponsveis por desencadear o humor nesses textos; j na segunda etapa, os alunos deveriamresponder a perguntas especficas sobre os mesmos textos lidos anteriormente. A anlise dosresultados, por sua vez, foi realizada por nveis, visando a identificar o tipo de humor quetrazia maiores dificuldades de compreenso para, ao final das anlises dos trs nveis, mostrarse os problemas de entendimento variam ou no de um nvel para outro. Alm disso, criamos4 (quatro) categorias nomeadas como entendimento total, entendimento parcial,entendimento na segunda etapa e no entendimento para verificao do desempenho dosestudantes em relao compreenso de cada texto.

    Por fim, um questionrio semi-estruturado foi elaborado e aplicado a professores deingls de diferentes cursos de idiomas. O teste foi realizado a fim de captar a viso dosprofessores quanto ao uso de humor no ensino de LE e discutir o fato de utilizarem ou noesse recurso, contrapondo ao que evidenciado nos livros didticos e proposto por estudiososdo assunto.

  • 8CAPTULO 1

    ALGUMAS CONSIDERAES SOBRE O HUMOR

    O ato de humor (intencionalidade de fazer rir) bem-sucedido, evoca a graa e provocao riso. Ao se falar de humor, portanto, necessrio tratar tambm da comicidade e dos ditosespirituosos, pois todos esses apresentam a caracterstica em comum do desencadeamento doriso, contudo o fazem de maneiras distintas. Por conta disso, neste captulo temos o objetivode ressaltar as diferenas entre os conceitos citados, iniciando pela definio de humor para,ento, apresentar as principais ideias de Bergson e Freud, dois grandes tericos que sededicaram aos estudos da comicidade e dos ditos espirituosos respectivamente.

    1.1 O Humor

    A palavra humor de origem latina, humore tinha o significado de lquido e erautilizado na rea mdica.

    Na antiguidade, o termo humor representava os quatro fluidos corporais tambmchamados de humores, que tinham a finalidade de regular a sade fsica ou emocional doindivduo.

    Somente quando os ingleses passam a utilizar a palavra humor para nomear o carterexcntrico dos personagens nas peas de teatro e, consequentemente, dos indivduos da vidareal, o significado de humor se associou ao riso. De acordo com Almeida (1999, p. 43)atravs de seu humor (temperamento) excntrico, os personagens tornavam-se muitas vezescmicos (enrijecidos).

    O prazer do humor decorre, muitas vezes, da observao crtica de um indivduo, queacaba se identificando com o indivduo observado. O sujeito, ao notar uma falha no outro,imagina-se em seu lugar e estabelecida uma relao de igualdade entre ambos. Alm disso,o humor no est ligado necessariamente a fatores externos, ou seja, pode acontecer em

    apenas uma pessoa, ao pensar em algo e obter prazer com algo divertido que lhe vm

  • 9cabea (Verrone, 2009, p. 66). J o prazer do cmico acontece quando se observa umindivduo e este colocado em uma situao de inferioridade. O observador distancia-se dosujeito em foco e sente prazer tambm por v-lo em uma condio depreciativa. A graaresulta de um desvio de comportamento de algum que ao mesmo tempo desvalorizado porisso. Ainda, o sujeito cmico apresenta um sentimento de prazer por no ser ele aquelerebaixado, considerando-se por essa razo superior. O cmico implica um distanciamentodaquilo que visto como ridculo.

    Enquanto o cmico pressupe a existncia de um observador e um observado, isto ,dois indivduos, no que diz respeito ao esprito, imprescindvel que haja a participao deum terceiro, pois neste caso o prazer do humor surge ao se fazer o outro rir. Bergson (2007,p.77) estabelece distino entre o cmico e o dito espirituoso afirmando que talvez achemosque o que se diz considerado cmico quando nos faz rir de quem o diz, e espirituosoquando nos faz rir de um terceiro ou de ns mesmos.

    No que se refere ao dito espirituoso, o observador transmite o que sabe sobre o observado(um fato ou algum) a uma terceira pessoa. Em ocasies, porm, que o dito espirituoso versesobre o prprio observador, sero a ele atribudas duas posies simultaneamente, de observadore de observado. Segundo Rosas (2003) o observador se torna, portanto, o emissor de umamensagem sobre a situao ou o indivduo cmico (observado) que visa a aliciar o receptor,provocando-lhe o riso atravs da identificao e da cumplicidade na observao compartilhada.Almeida (1999, p. 45) acrescenta que o comunicador e o ouvinte devem possuir mais ou menoso mesmo sistema de interdies; no sendo assim, o esprito se perderia. Aquele que ouve ochiste deve partilhar do contedo mobilizado, para que possa entender e, consequentemente,sentir prazer com o dito espirituoso.

    1.2 Bergson e O Cmico

    O termo cmico define-se como algo que prprio comdia. Logo, comdia, nasua origem grega, kmidia, significava cano de festa: d = ode, kmos = banquete, ecorrespondia s encenaes teatrais que apresentavam uma viso satrica. Com o passar dotempo, seu emprego se estendeu a qualquer atitude que provoque o riso.

    Segundo Bergson, o riso uma habilidade inquestionavelmente humana. O homem o nico animal que ri, e o riso possibilitado apenas pelo que humano, uma vez que no se

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    ri de um objeto ou de um animal simplesmente, mas sim das caractersticas humanas, quelhes so atribudas.

    No h comicidade fora daquilo que propriamente humano. Uma paisagempoder ser bela, graciosa, sublime, insignificante ou feia; nunca ser risvel.Rimos de um animal, mas por termos surpreendido nele atitude humana ouuma expresso humana. Rimos de um chapu; mas ento no estamosgracejando com o pedao de feltro ou de palha, mas com a forma que oshomens lhe deram, com o capricho humano que lhe serviu de molde. Comoum fato to importante, em sua simplicidade, no chamou mais ateno dosfilsofos? Vrios definiram o homem como um animal que sabe rir.Poderiam t-lo definido como um animal que faz rir... (BERGSON, 2007,p. 2).

    Apesar de o riso ser uma habilidade que compete somente ao homem, o mesmo no dotado de emoo, pois para que seja desencadeado fundamental que haja umdistanciamento em relao ao cmico. Segundo Bergson (2007, p.4) para produzir efeitopleno, a comicidade exige enfim algo como uma anestesia momentnea do corao. Ao veruma pessoa cair, por exemplo, o riso acontece ao se desconsiderar por alguns instantes oconstrangimento ou as consequncias causados pessoa pela queda. Esse distanciamento, noentanto, no implica uma diverso solitria, pois o riso precisa apresentar uma repercusso,um eco. O riso corresponde sempre ao riso de um conjunto. O riso oculta uma segundainteno de julgamento, isto , resulta de cumplicidade entre os ridentes.

    Para entender o riso, ento, necessrio inseri-lo na sociedade, apontando o papel queo mesmo representa. O riso deve atender s necessidades de um convvio entre pessoas de umgrupo, pois no h como conceb-lo sem considerar a sua relevncia social.

    Ainda, o riso resulta do cmico que se d de maneira inconsciente, o indivduo torna-se motivo de risos sem tomar conhecimento disso. Entretanto, se o indivduo perceber que halgo de errado em si mesmo, tentar se corrigir e, por isso, no se mostrar ridculo.

    Um indivduo que demonstre rigidez do corpo, do esprito ou do carter est seentregando ao automatismo dos hbitos e, portanto, torna-se motivo de risos. A vida emsociedade requer do ser humano ateno e flexibilidade para se adequar quando necessrio smudanas de situao. A falta de mobilidade do indivduo corresponde rigidez, gerando oriso, por parte de quem o percebe. Por essa razo, pode-se dizer que o riso funciona como umtipo de punio, fazendo com que o indivduo se ajuste aos costumes impostos pelasociedade.

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    Bergson apresenta a comicidade separando-a em trs tipos. Logo, o riso provocadopela comicidade nas formas, nas atitudes, nos movimentos em geral; comicidade de situaoe de palavras e comicidade de carter.

    A primeira diz respeito ao riso decorrente do corpo, da atitude e da expresso de umindivduo. A segunda refere-se ao riso fruto do contexto, de uma determinada situao ou dalinguagem propriamente dita, como um jogo de palavras. J a ltima corresponde ao cmicoproveniente de caractersticas em destaque de uma personalidade: um defeito como aavareza, ou at mesmo uma virtude, como a honestidade etc.

    Ademais, o filsofo francs procurou tambm identificar trs procedimentos queatuam na produo do cmico tais como: a repetio, a inverso e a interferncia das sries.

    A repetio corresponde a uma situao que acontece vrias vezes, desviando assimdo curso natural da vida ou de uma rotina. Isto exemplificado pelo autor da seguintemaneira: encontro um dia na rua um amigo que no vejo h muito tempo; a situao nada

    tem de comicidade, mas, se no mesmo dia eu o encontro de novo e mais uma terceira e umaquarta vez, acabaremos por rir juntos da coincidncia. (2007, p. 67).

    A inverso, por sua vez, remete troca de papis, isto , o cmico desencadeadoquando um indivduo age como se ocupasse a posio de um outro. Rimos do ru que duma lio de moral ao juiz, da criana que pretende dar lies aos pais, enfim daquilo que seclassifique sob a rubrica do mundo s avessas (BERGSON; 2007, p. 70), como Mafalda,personagem de Quino, que constantemente critica sua me.

    Finalmente, a interferncia de sries consiste num acontecimento que pertencesimultaneamente a duas sries de eventos independentes, cuja interpretao se d de duasformas diferentes. Bergson remete comdia e cita o quiproqu3 como exemplo, pois [...]uma situao que apresenta ao mesmo tempo dois sentidos diferentes: um simplesmentepossvel, que os atores lhe atribuem, e outro real, que o pblico lhe d. (2007, p. 73). Opblico pode interpretar a atuao dos atores de uma maneira distinta do que esses artistastinham como objetivo, havendo assim uma oscilao entre o sentido possvel e o real.

    De fato, no quiproqu cada uma das personagens inserida numa srie deacontecimentos que lhe dizem respeito, cuja representao exata ela tem, e apartir dos quais regula palavras e atos. Cada uma das sries que diz respeito acada uma das personagens se desenvolve de uma maneira independente, mas

    3 Qui pro qu latim, significando isto por aquilo, uma coisa pela outra. a situao cmica baseada emequvoco, em troca. ( Kuptas ,1992, p. 61 apud Carvalho, 2009.)

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    encontram- se em certo momento em condies tais que os atos e as palavrasque fazem parte de uma delas possam tambm convir outra. Da o mal-entendido das personagens, da o equvoco; mas esse equvoco no cmicopor si mesmo; s o porque manifesta a coincidncia das duas sriesindependentes. (Bergson, 2007, p. 73)

    O riso funciona ao mesmo tempo como uma repreenso social e um ato corretivo

    atitude de um indivduo e, portanto, no que se refere comdia, o riso do pblico o querevela a punio s desventuras dos personagens.

    A presente abordagem do cmico determina os procedimentos de produo do riso edestaca a inteno da sociedade ao rir. O riso, para Bergson, est vinculado ao social no quetoca adequao s normas sociais, apresentando um carter corretor, moralizante.

    1.3 Freud e Os Chistes

    Para Freud, o riso desencadeado como uma liberao de energia psquica. O autorassocia o riso a fatores psquicos e no ao social como Bergson. Freud (2006) afirma que oobjetivo dos chistes levar ao prazer fazendo uso da economia, para libertar o que estavasendo reprimido. A brevidade a caracterstica principal dos chistes. A mensagem, ento, transmitida usando um nmero de palavras reduzido se comparado s formas convencionaisde comunicao.

    Um chiste diz o que tem a dizer, nem sempre em poucas palavras, massempre em poucas demais, isto , em palavras que so insuficientes do pontode vista da estrita lgica ou dos modos usuais de pensamento e de expresso.Pode-se mesmo dizer tudo o que se tem a dizer nada dizendo. (Lipps, 1898apud Freud, 2006, p. 21).

    Os chistes apresentados por Freud, entretanto, podem no gerar prazer ou no sercompreendidos, se no forem levadas em conta questes histricas e culturais relativas suaorigem. Tambm, a traduo dos chistes mostra-se, em alguns casos, como mais umempecilho para o entendimento, pois nem sempre esta faz sentido para aqueles que no tmconhecimento da lngua alem, como explica Verrone (2009, p. 44):

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    [...]fator que deve ser levado em considerao para compreender a obra adistncia do observador atual dos chistes apresentados por Freud. Asreferncias histricas e culturais do autor so pouco familiares ao leitorcontemporneo. H a necessidade de se refletir sobre os chistes que Freudconta para poder compreend-los, o que de certa maneira invalida o princpiodo chiste enquanto tal. O mesmo vale para a questo da traduo, que tambminviabiliza uma aproximao geradora de riso, caracterstica fundamental paraa efetivao do chiste. Muitos exemplos de Freud so jogos de palavras eduplos sentidos s compreensveis para aqueles que detm o conhecimento dalngua germnica. Se existe a possibilidade de uma universalidade dastcnicas do chiste, os chistes em si no so nem universais nem atemporais.Eles so frutos de um contexto scio-cultural, e fazem mais ou menos sentidodentro de determinadas circunstncias.

    Aps salientar a existncia de fatores relevantes para a apreciao dos chistes, conveniente tratar do efeito que estes causam tendo em vista que Freud classifica os chistesem dois tipos, a saber: inocentes e tendenciosos. Os inocentes ou triviais so aqueles queprovocam um efeito moderado; um ntido sentido de satisfao, um leve sorriso, tudo o

    que em geral podem obter de seus ouvintes (Freud, 2006, p.97). J os chistes tendenciosos,caracterizados como obscenos, cnicos e hostis, so aqueles que produzem uma gargalhada eso irresistveis. Os chistes de carter hostil pretendem liberar agressividade, satirizar ou atmesmo criar um mecanismo de defesa, ao passo que os chistes obscenos apresentam umafuno de desnudamento, ou seja, levam excitao sexual.

    Tanto o riso tendencioso quanto o inofensivo desencadeado pelo uso dedeterminadas tcnicas. Algumas delas so: a condensao, o emprego do mesmo material, oduplo sentido, o trocadilho, o deslocamento, o nonsense e a unificao.

    A condensao uma tcnica, cuja finalidade fundir dois termos, criando assim umneologismo, como no caso da palavra famalionariamente citada por Freud: R. tratou-me

    como um seu igual bastante familionariamente (2006, p. 28). Logo, ocorre a juno defamillionr [familir] e Millionar [milionariamente].

    A tcnica da condensao pode apresentar tambm uma leve modificao como emviajei com ele tte--bte. Nesse caso, o chiste resulta da introduo da palavra bte, dofrancs (besta, em portugus) no lugar de tte, na expresso Tet--tet (cara a cara

    em portugus). Essa tcnica definida como condensao seguida de leve modificao.Freud (2006, p. 33) ressalta que quanto mais leve for a modificao melhor ser o chiste.

    A tcnica do trocadilho aquela elaborada com menor complexidade, que segundoFreud diferencia-se do jogo de palavras da seguinte maneira:

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    De fato, so eles que fazem menores solicitaes tcnica de expresso, tantoquanto os jogos de palavra propriamente ditos fazem as solicitaes mais altas.Enquanto nestes dois ltimos significados devem encontrar expresso namesma e idntica palavra, dita usualmente uma s vez, para um trocadilho bastaque dois significados se evoquem um ao outro atravs de alguma vagasimilaridade, seja uma similaridade estrutural geral, ou uma assonncia rtmica,ou o compartilhamento de algumas letras iniciais etc. (2006, p.51).

    Portanto, Freud cita um exemplo de trocadilho: Hevesi (1888,87) escreve sobre um

    poeta italiano contrrio ao imprio e no obstante obrigado a louvar hexmetros o Imperadoralemo: j que ele no podia exterminar os Csaren [Csares], eliminou ao menos asCsuren [Cesuras] (2006, p. 52).

    Na tcnica de deslocamento h uma mudana de nfase, a ateno do ouvinte pode serdeslocada de uma palavra para outra, de uma frase para outra ou para uma representaoindireta do que se pretende dizer. Dois judeus se encontram nas vizinhanas de umbalnerio. Voc tomou um banho?, pergunta um deles. O qu?, retrucou o outro, est

    faltando algum? FREUD (2006, p.55). Percebe-se que o deslocamento surge na mudanade nfase do elemento banho para tomou, como se a pergunta ao invs de ter sido: voc

    tomou um banho, tivesse sido: voc tomou um banho?.A tcnica do nonsense diz respeito falta de sentindo em uma declarao, como em

    um exemplo mencionado por Freud: Itzig fora declarado apto para prestar servio na

    artilharia. Ele era nitidamente um rapaz inteligente, embora intratvel e desinteressado noservio. Um dos oficiais seus superiores, que lhe voltava alguma simpatia, tomou-o de parte edisse-lhe: Itzig, voc no serve para nada. Vou lhe dar um conselho: compre um caminho efaa a sua independncia! (2006, p.63). O oficial aconselha Itzig de forma absurda com ainteno de faz-lo perceber a estupidez de seu comportamento.

    A tcnica do emprego do mesmo material pode se dar pelo uso de uma palavra queapresente sentido pleno e sentido esvaziado, pois h palavras que, quando usadas emdeterminados contextos, perdem o seu sentido original, mas o resgatam e em uma outraocasio, como no chiste em que apresenta uma conversa entre um coxo e um cego: Como

    que voc anda? - Perguntou um cego a um coxo. Como voc v. - Respondeu o coxo aocego (Freud, 2006, p.41).

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    As diferentes tcnicas responsveis por desencadear o elemento de ruptura nos chistestm a economia como um elemento em comum. Assim, nota-se que os chistes produzem asensao de prazer devido atuao de suas respectivas tcnicas.

    O alvio da despesa psquica j existente e a economia na despesa psquica quese h de requerer- destes dois princpios derivam todas as tcnicas dos chistes, econsequentemente todo o prazer que advm delas (2006, p. 124).

    As tcnicas descritas so consideradas como as responsveis por gerar a sensao deprazer dos chistes. Contudo, os chistes podem apresentar desvios de duas naturezas distintase que esto diretamente ligados s suas tcnicas, sendo, portanto, classificados em jogo comas palavras e jogo com o pensamento (FREUD; 2006).

    O jogo com as palavras diz respeito formao lingustica que gera ambiguidade aoenunciado. A expresso do pensamento se d no desvio da forma de uma palavra ou materiallingustico de um enunciado e, assim, a graa desencadeada pela estrutura fsica da(s)palavra(s). De acordo com isso, um trocadilho considerado um jogo com as palavras.

    J o jogo com o pensamento refere-se a um desvio comportamental. O riso resulta deuma ruptura ou surpresa na atitude de um personagem. Por essa razo, o deslocamento, arepresentao indireta, o nonsense etc. so tcnicas classificadas como jogo com opensamento.

    Em suma, a realizao do chiste exige o envolvimento de trs partes, a saber: aqueleque faz o dito, o que alvo ou objeto do chiste, e o ouvinte, aquele que obtm o prazer. Dessamaneira, percebe-se que quem ri no o autor do dito espirituoso, mas sim aquele que sedispe a ouvi-lo. No chiste, esta terceira pessoa indispensvel para a completao doprocesso de produo de prazer; entretanto a segunda pessoa pode estar ausente, excetoquando se trata de um chiste tendencioso, agressivo. (Freud, p. 171, 2006).

    Por fim, enquanto Bergson considera que o ato de rir expressa um sentimento desuperioridade, uma forma de punio aos desvios de comportamento na sociedade, Freudmostra que os chistes implicam uma socializao, h uma troca atravs de prazer. Comefeito, no cmico o fator principal est em rir do outro, estabelecendo uma hierarquia entreduas partes; no dito espirituoso, por sua vez, o mais importante despertar o prazer no outro.

    Tendo exposto as diferentes razes que levam ao desencadeamento do riso e suasconsequncias para o indivduo ou para a sociedade, vemos que o riso, na maioria das vezes,no um ato ingnuo, que reflete um mero prazer, mas que algo mais complexo e pode

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    esconder uma segunda inteno. O humor apresenta grande importncia para vida do serhumano e no deve deixar de fazer parte das aulas de LE, podendo contribuir em diferentesaspectos para o ensino, como ser discutido no prximo captulo.

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    CAPTULO 2

    AS CONTRIBUIES DO HUMOR PARA AS AULAS DELNGUA INGLESA (LE).

    Neste captulo, pretendemos tratar da relevncia do humor para o ensino de inglscomo LE e apontar algumas maneiras de explor-lo como, por exemplo, para motivar oaprendizado, trabalhar a lngua propriamente dita, explorar elementos culturais, pragmticosentre outros.

    De acordo com Raskin (1985, p. 2), situaes, estrias e at pensamentosengraados ocorrem a qualquer um todos os dias. Schmitz (2002, p. 90) acrescenta que ohumor parte da [...] maioria dos encontros sociais; o uso de humor e ditos espirituosos estintimamente ligado natureza humana. Isto remete grande ocorrncia do humor nocotidiano, o que aponta para a convenincia de se abrir espao para o seu uso na rotina desala de aula, incluindo-o no planejamento do ensino de lngua estrangeira.

    Ainda, Ross (1998, p.xi) afirma que o humor tem grande presena na sociedade,sendo altamente influente, uma vez que stiras polticas e piadas constituem meios deestabelecer ou at mesmo finalizar laos de relao entre as pessoas. A depender da maneiracomo for utilizado, o humor, por um lado, pode melhorar a comunicao e criar vnculosentre diferentes indivduos, mas pode tambm, em contrapartida, apresentar efeitos negativos,ou seja, ocasionar conflitos e afastar pessoas. No entanto, se explorado criteriosamente,possibilita o surgimento de efeitos muito positivos. De acordo com Baldwin (2007, p.13) ohumor um instrumento social que propicia uma maneira eficaz para reduzir o stresspsicolgico, comunicar uma srie de sentimentos e ideias alm de intensificar relaes. O

    humor pode favorecer o relacionamento entre os alunos, criar um ambiente descontrado emsala e ainda diminuir o sentimento de tenso, muito comum entre os participantes da aula delngua estrangeira.

    Ademais, para se manifestar enquanto tal, o humor requer um trabalho colaborativono qual o contador/escritor, com a ajuda do ouvinte/leitor, se engaja na produo do ditoespirituoso, o qual, por sua vez, assume uma funo scio-cultural. O humor exige que se

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    estabelea uma interao entre as duas partes para que haja a construo de significado, vistoque o sentido no humor no se mostra claramente, mas deve ser trabalhado atravs da

    cooperao entre ouvinte/leitor e aquele que produz o humor (Ageli, 2009, p. 2). Assim, ohumor serve tambm para promover a interao entre alunos ao trabalharem juntos naconstruo do sentido, indo alm do dilogo entre um emissor e um respectivo receptor daproduo humorstica.

    O fato de o humor poder causar descontrao no implica que se considere o seucontedo como de fcil entendimento. Para se perceber o humor em uma piada, por exemplo,pressupe-se um trabalho mental maior do que ao ler um texto no-humorstico, pois exige-se um dilogo entre conhecimentos de vrios tipos (lingustico e cultural), uma cognio bemdesenvolvida (processamento lgico), e sensibilidade para detectar ambiguidades[...] (Hsin,2006, p. 2). Se existe o risco da incompreenso do humor normalmente, em lnguaestrangeira tal dificuldade tende a aumentar e, consequentemente, o riso ou a gargalhadaentre alunos no nativos de uma determinada lngua pode no acontecer, como afirma Wulf(2010, p. 155 ): o humor em uma segunda lngua pode ser obviamente difcil at mesmopara aquele que possua um bom comando do mesmo na sua lngua materna. Apesar de, emalguns casos, j se possuir um razovel conhecimento da lngua estrangeira, o humor aindapode ser incompreendido e o aluno, ento, no considerar uma piada engraada. Bell (2002,p. 28) acrescenta que a compreenso de humor verbal em L2 constitui um grande desafio atmesmo para estudantes avanados de L2, visto que para se chegar a tal compreenso exige-seuma grande competncia lingustica, social e cultural. Hsin (2006, p. 2) ressalta que mesmoquando os alunos so proficientes em ingls, eles podem no entender o final das piadaslingusticas ou culturais.

    Vrios livros de ensino de lngua inglesa sequer apresentam algum texto humorsticoem suas atividades; em outros materiais, o discurso humorstico utilizado de formasecundria, para realizar atividades extras, exemplificar ou ilustrar o contedo trabalhado.Entretanto, segundo Askildson (2005, p. 49) o humor oferece significativamente maisbenefcios para o professor de lngua, funcionando como uma ferramenta lingustica,discursiva, e cultural de elementos da lngua ensinada.

    O texto de humor pode servir como material de base, enriquecendo o trabalhado emsala de aula, se no for utilizado apenas como uma simples ilustrao de importnciasecundria ou somente para entreter. Assim sendo, pretendemos apresentar possveismaneiras de incorporar o discurso de humor s atividades de ensino/aprendizagem de lnguaestrangeira.

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    2.1 Humor e Cultura

    Primeiramente, quanto sua introduo no ensino de lngua estrangeira, geralmenteacredita-se que o humor cultural e, como consequncia, pode constituir uma barreira para oaluno que, por no conhecer a cultura da lngua estrangeira, no consegue deleitar-se comuma piada ou um cartum. Dessa forma, o texto de humor pode provocar um sentimento defrustrao por parte do aprendiz.

    Entretanto, Mimois ( 2003 apud Possenti, 2010) mostra-se contrrio afirmao deque o humor cultural, apresentando duas teses: a) que os mesmos temas se repetem; b)que, com muita frequncia, h tambm uma repetio das tcnicas. Isso quer dizer que emboa parte das culturas costuma-se abordar temas como amor, sexo, casamento, preconceito,dinheiro, morte etc. e que o efeito humorstico desencadeado por tcnicas recorrentes como,por exemplo, ironia, aluso e quebra de expectativa, com exceo das tcnicas atreladas sparticularidades lingusticas como duplo sentido, manipulao do material fonolgico ousinttico, trocadilhos etc.

    Raskin (1985, p.5) tambm revela oposio ao humor unicamente cultural ao ressaltarque:

    muitos pesquisadores j discutiram sobre o fato de o humor sercompartilhado por aqueles que pertencem a determinado grupo social[...] e no h nenhuma razo para desconsiderar tal afirmao, mas pode-se considerar muito verdadeira a declarao de que a partilha de valoressociais, normas, etc., tornam o humor mais efetivo.

    Aprofundando a viso de Raskin, Dutra (2008) apresenta dois tipos de humor, ouniversal e o local. Para a autora, o humor universal engloba temas que dizem respeito aofuncionamento do mundo e que so, portanto, comuns entre os diferentes pases, enquanto olocal pe em jogo os costumes de um dado grupo ou de uma determinada regio.

    J Ageli, ao considerar o ensino de ingls como lngua estrangeira, defende que aapresentao do humor acontea nos seguintes termos:

    iniciar com humor culturalmente global, que seja familiar entre os alunos para,ento, dar continuidade a nveis avanados de uma cultura especfica. Este deveser introduzido em cursos avanados quando os alunos tero tido maior contatocom a lngua inglesa e sua cultura (2008, p.11).

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    O humor cultural apresenta, em alguns casos, um contedo muito complexo para osalunos e, por conseguinte, precisa ser inserido gradativamente nas aulas. Convm partir doque se conhece e, apenas quando o aluno j possuir um nvel de conhecimento maior dalngua e da cultura, utilizar o humor cultural. No caso da lngua inglesa so vrios pases quepossuem o ingls como lngua materna, alm do Reino Unido e dos Estados Unidos.

    J Schmitz (2002) apresenta uma proposta sobre como trabalhar como o humor noensino, classificando-o em trs categorias, a saber:

    -Humor Universal4: o autor afirma que o discurso humorstico deve ser trabalhado deacordo com o estgio no qual os alunos se encontram. Nos nveis elementares, eles devem serexpostos ao humor universal, de mais fcil compreenso para iniciantes.

    -Humor Cultural: em nveis intermedirios, pode-se trabalhar com humor cultural,particular ao modo de vida do povo da cultura da lngua-alvo. Como o aluno j ter tido umamaior exposio lngua estrangeira e sua cultura, consequentemente ele possuir um

    maior preparo para entender o humor cultural. Contudo, segundo Gardner (2008, p.12) aindaque uma piada contada em sala no faa sentido para o estudante, esta deve ser usada paraensinar sobre a cultura estranha. Nesse caso, o humor adquire a funo de facilitador paraensinar aspectos culturais, apresentando atitudes, hbitos e costumes dos falantes nativos doidioma estudado.

    -Humor Lingustico: em mdulos avanados, pode-se dar incio ao humor lingustico,o qual pode ser desencadeado por diferentes aspectos da lngua como, por exemplo, pelafonologia, morfologia, lxico ou pela sintaxe, que aparecem em trocadilhos, jogos depalavras ou no duplo sentido. Uma caracterstica peculiar ao humor lingustico est, muitasvezes, em sua intraduzibilidade.

    Diante disso, classificar o discurso humorstico apenas como cultural, por um lado,conduz excluso de outros fatores que colaboram para produo do sentido humorstico,como conhecimento geral de mundo e aspectos lingusticos e, por outro lado, o apresentacomo sendo mais difcil do que realmente . Em contrapartida, ao se desconstruir a ideia deque o humor absolutamente cultural, pode-se at mesmo motivar um maior trabalho comrecursos humorsticos no ensino de lngua estrangeira, considerando-se que o desencadear doriso pode acontecer ao se estudar um outro idioma.

    4 O humor universal baseia-se em temas recorrentes especialmente na cultura ocidental.

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    2.2 Humor e Lngua

    A comunicao atravs do uso da lngua est sujeita, devido ao emprego de certostermos ou determinadas estruturas, a apresentar ambiguidade que pode resultar em mal-entendidos. A ambiguidade um fenmeno ligado discursivizao de um enunciado. Essefenmeno se produz sempre que uma mesma frase apresente vrios sentidos e seja, ento,suscetvel de ser interpretada de diversas maneiras (CHARAUDEAU E MAINGUENAU;

    2008). O mal-entendido, por sua vez, designa uma divergncia de interpretao entrepessoas que acreditam se compreender (CHARAUDEAU E MAINGUENAU; 2008 APUD

    PETIT ROBERT, 2002 ).Levando-se em conta que a ambiguidade um dos mecanismos lingusticos

    frequentemente utilizados na produo de humor, nas aulas de LE os textos humorsticospodem constituir fontes para evidenciar recursos de funcionamento da lngua (TRAVAGLIA;1992) e aumentar a conscincia lingustica do aluno, contribuindo, por um lado, para que sepense sobre o emprego de certos termos a fim de evitar o desencadeamento de um mal-entendido; e, por outro lado, para que se saiba reconhecer elementos que eventualmenteapresentem dupla interpretao e, consequentemente, poupar-se de ser vtima de um mal-entendido.

    A seguir mostramos exemplos de como orientar os alunos atravs do humor quanto aodesencadeamento de ambiguidade pelo uso de vocbulos que apresentam pronnciasidnticas/similares ou que possuem mais de uma acepo e, tambm, pela distribuio depalavras em uma orao.

    2.2.1 Ambiguidade

    EXEMPLO 1:

    A: Waiter!

    B: Yes, sir!

    A: What`s this?

    B: It`s bean soup, sir.A: No matter what it`s been. What is it now?Lew 1997 apud Misztal 1990

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    O humor desencadeado pela homonmia lexical que atinge os vocbulos bean

    /bi:n/ e been /bi:n/. Trata-se de uma homofonia, uma vez que os dois termos possuempronncias idnticas, de acordo com o Cambridge International Dictionary of English(1997), mas pertencem a classes gramaticais distintas: bean um substantivo enquantobeen o particpio passado do verbo ser. Com efeito, a pronncia idntica dessaspalavras leva o cliente do restaurante a entender algo diferente do que pretendeu o garom,mostrando assim ao ouvinte/leitor duas interpretaes distintas, ou seja, uma economia.Contudo, a ambiguidade fonolgica desaparece na modalidade escrita.

    Esse exemplo serve para salientar que h na lngua em geral, e na lngua inglesa em

    particular, muitas palavras com sons similares ou idnticos, o que pode provocar problemasna compreenso durante a interao. Na comunicao no humorstica, via de regra, ocontexto orienta a interpretao do enunciado, eliminando sua ambiguidade.

    EXEMPLO 2:

    Clerk to a spinster : Are you unmarried, lady

    Spinster (with indignation): Unmarried? I have never been married!Servaiti, 2005, p. 82

    O emprego da palavra unmarried o elemento responsvel por gerar o humor, poiso prefixo un apresenta uma conotao negativa; possui valor de no, e, ao mesmo tempo,

    designa uma situao reversa, algo que volta ao normal. A formao da palavra-chave un +married, que segue o sistema morfolgico do ingls ao utilizar o prefixo un, possibilitaduas interpretaes quanto ao estado civil da mulher. Uma delas diz respeito a uma pessoaque nunca se casou, portanto, solteira; e a outra interpretao condiz com uma pessoa que jse casou, mas divorciou-se. A spinster, em portugus solteirona, entende que o clerk,funcionrio, a trata como divorciada, o que provoca sua indignao diante da pergunta.

    Nessa piada, temos o duplo sentido da palavra unmarried, que pode ser exploradoem aula, uma vez que palavras polissmicas podem dificultar o entendimento de textos,principalmente os mais curtos, em casos em que os alunos consideram apenas um dossignificados conhecidos por eles de um determinado vocbulo, no atentando para o fato deuma palavra poder ter mais de um significado.

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    EXEMPLO 3:

    An elevator operator kept calling every boy as 'Son'. Once a rude teenager tried totalk him back and said, "Do you remember that I am NOT your son and YOU are NOT myfather." The operator calmly said, I brought you up, didn't I?Fonte: http://aprilfool.fundootimes.com/funny-puns.html

    Nessa piada, o humor resulta do emprego de brought up, passado do verbo bringup, causa uma ambiguidade lexical ao enunciado, pois trata-se mais uma vez de umaexpresso polissmica. No contexto em questo dois significados de bring up so ativados:criar/ educar e mover para cima/levantar, quando o operador utiliza a expressobrought up (I brought you up, didn`t I?) para se defender da crtica do menino, ao enfatizarno ser seu filho, Do you remember that I am NOT your son and YOU are NOT my father?.

    Nesse exemplo, pode-se chamar ateno novamente para o duplo sentido, que nessecaso resulta do lxico, sentido da palavra, enquanto no exemplo anterior o duplo sentidodeve-se morfologia do vocbulo, maneira como a palavra constituda.

    EXEMPLO 4:

    Student 1: The dean announced that he is going to stop drinking on campus.

    Student 2: No kidding! Next thing you know hell want us to stop drinkingtoo.Askildson, p. 51, 2005

    Nessa piada, a produo do sentido humorstico se d pela ambiguidade estrutural e,mais especificamente, de homonmia estrutural (ZAVAGLIA; 2003), pois a composio doenunciado apresenta duas possibilidades de interpretao causando a seguinte dvida: o reitoranunciou que vai parar de beber ou anunciou que o campus o far?

    Esta piada demonstra que relevante enfatizar a importncia de haver clareza aoelaborar a estrutura de um enunciado, para que no haja dvidas sobre o que se pretendecomunicar e para que o interlocutor no seja levado a entender a mensagem incorretamente.

  • 24

    EXEMPLO 5:

    Q: How do you make a horse fast?A: Dont give him anything for a while.Deneire, 1995, p. 290

    Nesta piada, o humor resulta do emprego de fast, que devido sua posio noenunciado gera ambiguidade sinttico-lexical. O referido segmento representa umahomonmia total, pois sua forma, tanto grfica quanto sonora, remete a dois vocbulosdistintos: o adjetivo rpido e o verbo jejuar.

    Este exemplo pode alertar o aluno sobre vocbulos que funcionam tanto comosubstantivo, verbo, advrbio ou adjetivo a depender de como so posicionados em umaorao, pois se o estudante conhecer fast somente como um advrbio, ele no conseguirentender a piada. Porm, ao levar em conta que uma palavra pode apresentar mais de umaclasse gramatical, o estudante tem condies de, ao menos, tentar deduzir o sentido dapalavra no contexto.

    EXEMPLO 6:

    Departing traveller: Run upstairs, boy, and see if my umbrella is in room 483. I

    think I left it in the corner by the window.Boy (some minutes later): Quite right, sir, it`s exactly where you said it was.Lew 1997 apud Misztal 1990

    O humor, neste caso, resulta do fato de o Departing traveller comunicar ao meninoque a sombrinha foi deixada na sala 483 e, consequentemente, criar a expectativa de que ogaroto v at a tal sala para peg-la. Entretanto, o garoto faz literalmente o que lhe requerido e no pega a sombrinha. O menino no considera a inteno na fala do departingtraveller, ou seja, no interpreta a frase de acordo com o contexto.

    Esta piada deve ser analisada com base no ponto de vista da pragmtica, a qualsegundo Fiorin (2002, p.166) estuda a relao entre a estrutura da linguagem e seu uso. Ouso de uma lngua exige que se leve em conta tanto inteno do locutor quanto a situao naqual o enunciado produzido, pois para que a interao entre indivduos seja bem-sucedidageralmente preciso ir alm do sentido literal daquilo que proferido por um falante. E em

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    lngua estrangeira no se pode deixar de ressaltar a importncia do contexto para a produode sentido, para que o aluno consiga utilizar palavras, cujos significados correspondem circunstncia discursiva na qual so empregadas.

    As piadas apresentadas, que tm a ambiguidade como elemento responsvel porcausar o sentido humorstico, so muito pertinentes para trabalhar dvidas frequentementelevantadas pelos alunos em sala de aula que vo desde mal-entendidos causados por palavrasde sons semelhantes at problemas de significao atrelada ao contexto.

    Passemos, ento, a falar de mecanismos que tambm so muito recorrentes em textoshumorsticos, mas que atuam na produo de sentido de uma maneira menos evidente noenunciado, chamados de implcitos.

    2.2.2 Os Implcitos

    De acordo com Messias (2006, p.49) um texto pode apresentar muita coisa sem serexplcito. Cabe ao leitor detectar as informaes que no so veiculadas linguisticamente,mas que esto no texto sob aspectos subentendidos ou pressupostos. No que diz respeito ao

    texto humorstico, se os implcitos (subentendidos ou pressupostos) no forem entendidos, ointerlocutor no conseguir captar a graa do texto.

    Segundo Charaudeau e Maingueneau (2008, p.271) entre o conjunto de contedos

    implcitos, alguns so, portanto, marcados (possuindo no enunciado algum suporte lexical oumorfossinttico), enquanto outros no o so (ou o so menos claramente). Os marcados sochamados de pressupostos, e os no-marcados de subentendidos.

    O pressuposto, na perspectiva de Ducrot (1987), corresponde s informaes jdadas pelos itens gramaticais e lexicais nos enunciados atravs de uso de certos advrbios,conjunes subordinativas concessivas ou temporais; certos verbos em construessubordinadas; o uso de oraes adjetivas; partcula de realce etc. Segundo Messias (2006, p.51) essas informaes so importantes, pois permitem uma economia no texto, uma vez que

    ela a propriedade pela qual podemos usar um mnimo de palavras, sem que isso prejudiqueo ato comunicativo.

    A identificao de pressupostos se d no s por meio das pistas lingusticas, mastambm pelo fato de no haver possibilidade de uma informao ser negada aps declarada,pois os pressupostos so tidos sempre como verdadeiros e sua negao pode descaracterizar a

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    afirmao feita na interao. Em uma declarao como Joo no bebe mais, tem-se como

    pressuposto que Joo bebia.

    EXEMPLO 7:

    -I need a job. I have 15 children.-What else can you do?Magalhes, 2007, p. 30

    Nesta piada, o humor desencadeado pela pergunta What else can you do ?, emportugus, o que mais voc sabe fazer?. O uso da palavra else/ mais, pressupe que oentrevistado sabe fazer algo: muitos filhos, o que passa a ser uma habilidade considerada peloentrevistador.

    J no tocante aos subentendidos, pode-se afirmar que estes dependem apenas docontexto situacional para serem entendidos. Diferentemente dos pressupostos, no h marcaslingusticas que remetem aos subentendidos e, por isso, o sentido do enunciado resulta dainterpretao feita pelo interlocutor.

    EXEMPLO 8:

    A lawyer is standing in a long line at the box office. Suddenly, he feels a pair of handskneading his shoulders, back, and neck. The lawyer turns around. "What the hell do you thinkyou're doing?" "I'm a chiropractor, and I'm just keeping in practice while I'm waiting inline." "Well, I'm a lawyer, but you don't see me screwing the guy in front of me, do you?Fonte: http://www.101funjokes.com/lawyer_jokes.htm

    O ltimo trecho da piada Well, I`m a layer, but you don`t see me screwing of the guyin front of me, do you? / Bem, eu sou advogado, mas voc no me v prejudicando o caraque est na minha frente, v? veicula uma mensagem implcita de que os advogados soprofissionais de m ndole e que costumam tirar vantagem de seus clientes, colocando emfoco o esteretipo de que advogados no so confiveis. Isto no dito explicitamente,porm possvel ser inferido pela maneira como o prprio advogado fala de si mesmo,representando a sua classe profissional.

  • 27

    Assim sendo, as piadas que exemplificam o uso de pressupostos e de implcitospodem ser utilizados para fornecer ao aluno estratgias de entendimento de textos nosomente humorsticos, mas de qualquer natureza, iniciando-se pela procura por pistaslingusticas e passando para a busca de informaes implcitas no texto.

    2.3 Humor, Leitura e Conversao

    Nas aulas de LE comum encontrar resistncia de muitos alunos para realizar osexerccios de leitura. Shaughnessy e Stanley afirmam que fazer o aluno ler pode ser uma

    experincia cansativa e frustrante (1991, p.4). Por outro lado, Klasky 1972 ( apudShooshtari e Shakeri 2011, p. 653 ) aponta a relutncia dos leitores como um desafio para aaula de leitura e consideram o humor como uma soluo para esse desafio.

    H vrias razes para utilizar os textos de humor no ensino de LE. Uma delas dizrespeito ao tamanho desses textos, os quais so em sua maioria, curtos, diminuindo aindisposio para a leitura. E outra razo deve-se ao fato de os gneros humorsticosdespertarem, com o passar do tempo, a vontade de se saber mais sobre os temas que soabordados nesses textos, assim, ler humor pode aumentar o prazer pela leitura (p. 4, 1991).Ainda, o uso desses materiais possibilita o conhecimento de diferentes gneros humorsticosque normalmente no so explorados em livros didticos.

    Embora os textos humorsticos apresentem uma tendncia de se levar ao riso, a leituradestes no em aspecto algum ingnua. Os textos de humor costumam ser baseados emassuntos srios e, por isso, representam um material propcio para trabalhar tanto a leituraquanto a conversao em sala de aula, considerando-se tambm que o ensino de lnguainglesa no deve visar apenas capacidade de comunicao nessa lngua, mas tambm formao de um falante crtico.

    Portanto, os gneros humorsticos abordam de uma maneira engraada assuntos,questes ou problemas importantes veiculados na sociedade. Dentre esses gneros, as piadastalvez sejam o mais conhecido entre os estudantes, pois todo mundo j contou ou, pelomenos, ouviu uma famosa piada de loira ou de portugus, por exemplo. O gnero piada bastante popular, porm nem todos que a apreciam percebem o que est embutido em seudiscurso. Com efeito, segundo Pantarolli (2003, p.28) as piadas so um sintoma das doenas

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    sociais, operam esteretipos, veiculam discursos proibidos. Possenti(1998) deixa claro queas piadas giram em torno de:

    Sexo, poltica, racismo, (e variantes que cumprem um papel semelhante,

    como etnia e regionalismo), canibalismo, instituies em geral (igreja,escola, casamento, maternidade, as prprias lnguas), loucura, morte,desgraas, sofrimento, defeitos fsicos (para o humor, so consideradosdefeitos inclusive a velhice, a calvcie, a obesidade [...]

    Sendo assim, com uso da piada no exerccio de leitura pode-se promover umareflexo acerca do contedo e, em seguida, realizar uma discusso para que os alunos possamtrocar experincias sobre o que foi lido.

    J as HQs, as tiras e os cartuns so convenientes para trabalhar temas universais eatemporais, assim como para chamar ateno sobre a mensagem construda pela articulaodas linguagens verbal e icnica. A linguagem visual tem muito a acrescentar paraaprendizagem da interpretao alm de ser mais um atrativo para o desenvolvimento daleitura.

    As charges, por outro lado, propiciam o trabalho com fatos do momento, poisapresentam um material relacionado com o noticirio, objetivando criticar ou satirizar algum(geralmente um poltico) ou algum acontecimento atravs de caricaturas.

    Dessa forma, os gneros humorsticos favorecem um maior envolvimento com a

    leitura e segundo Magalhes contribuem para o desenvolvimento de um olhar mais crticosobre texto produzido em uma sociedade local ou estrangeira: a leitura dos textoshumorsticos deve objetivar a formao de cidados crticos e capazes de detectar a presenadas vrias formaes discursivas presas na teia scio-ideolgica materializada no texto [...](2010, p.135).

    2.4 Humor e Compreenso

    Segundo Ziyaeemehr; Kumar e Abdullah (2011, p.114) a competncia humorstica a habilidade dos indivduos de entender e usar humor em uma segunda lngua. Portanto, a

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    exposio aos gneros humorsticos durante a aprendizagem de LE pode facilitar acompreenso e/ou produo de humor. Os estudantes nem sempre adquirem competnciahumorstica em uma lngua estrangeira imediatamente, porm com insumo em forma detextos humorsticos essa competncia pode ser nutrida (Schmitz, 2002, p. 106).

    Em contraposio, ao evitar o humor no ensino pode-se privar o aluno de ter acesso[...] s nuances especficas de trocas humorsticas, as quais dificilmente podem serencontradas em contedos no-humorsticos. Em uma lngua estrangeira torna-se maiscomplexo perceber a articulao de elementos que geram humor como o jogo de palavras, oduplo sentido, pressupostos, implicitaes etc. Por essa razo, o desenvolvimento dacompetncia humorstica mostra-se necessrio, considerando-se tambm que na maioria dassociedades o humor ocorre em certos momentos ou situaes das interaes sociais(ZIYAEEMEHR; KUMAR; ABDULLAH, 2011), e que o aluno ir provavelmente, emdeterminadas ocasies, se deparar com uma piada, por exemplo.

    Apesar dos desafios, muito vlido para os alunos de LE atingir competnciahumorstica, cujo desenvolvimento no costuma ser levado em considerao no ensino deLE, pois os estudantes de uma segunda lngua no recebem o conhecimento nem aexposio necessrios para se tornarem competentes para e entender e criar humor (Vega1989 apud Wulf 2010).

    No h consenso entre os estudiosos sobre a competncia qual a compreenso dohumor est relacionada. Raskin (1985) defende que a capacidade de julgar um texto como dehumor ou no por um falante nativo est relacionada competncia lingustica. J Carrell(1997) trata de competncia piadista e competncia humorstica, que fazem parte dacompetncia lingustica de um falante nativo. A competncia piadista diz respeito capacidade do indivduo de reconhecer uma piada como tal, para, ento, apontar a piadacomo engraada ou no, de acordo com sua competncia humorstica. Carrell cita apenas apiada em seu artigo joke competence and humor competence, no mencionando outrosgneros humorsticos. Deneire (1995) cita que Vega (1989) considera a competnciahumorstica como um quinto componente da competncia comunicativa, que formada pelacompetncia lingustica, sociolingustica, estratgica e discursiva. J Ziyaeemehr; Kumar;Abdullah (2011) defendem que a habilidade do indivduo de entender e usar humor em umasegunda lngua resulta da sua competncia humorstica.

    Assim como um falante nativo pode avaliar um texto de humor enquanto tal, oestudante tambm precisa saber fazer esse tipo de avaliao, sendo capaz, at mesmo, deentender e elaborar humor e evitar situaes como esta: muitos de ns que falamos uma

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    segunda lngua j nos sentimos frustrados, estpidos ou at constrangidos por no captar umapiada, ou decepcionados por uma piada nossa ter ido por gua abaixo (Deneire 1995, apudWulf, 2010).

    Segundo Toebe e Flres (2009, p. 44) para a produo de humor faz-seimprescindvel uma capacidade extra de sacar ambiguidades, produzir inferncias[...],como tambm conhecimento prvio de tipo enciclopdico, conhecimento interacional e, claro conhecimento de lngua. Assim sendo, a incompreenso do humor deve-se falta deconhecimento lingustico ou de conhecimento de mundo.

    H casos em que um indivduo pode no identificar um texto de humor apesar delocalizar o desvio humorstico no enunciado. H a possibilidade tambm de no atribuir graaao texto por no entend-lo. Carrell (1997) aponta trs aspectos que comprometem o sucessode uma piada para o interlocutor, tais como: no compreender a piada imediatamente, o queleva o indivduo a pensar que no vale a pena reprocess-la, porque no engraada; jconhecer a piada, fazendo com que o elemento surpresa se perca; no identificar um dosscripts responsveis por desencadear a graa. Embora o falante reconhea o texto como umapiada, a eventual presena de um desses aspectos no permite que se tenha prazer com apiada.

    Carrell (1997) chama ateno para fatores que podem prejudicar a fruio de umapiada. Diferentes fatores como crenas religiosas, convices polticas, orientao sexual oucomplexos, e/ou recente ou longo envolvimento pessoal como, por exemplo, uma doena emparticular ou morte.

    Esses fatores podem influenciar a captao do sentido humorstico, o que mostra anecessidade de um cuidado com tratamento do humor, para que a sua utilizao ao invs defavorecer o ganho de conhecimento e de competncia humorstica no cause problemas ouconflitos em sala de aula.

    importante que o aluno desde cedo saiba o que provoca uma gargalhada ou um levesorriso em uma outra lngua (SCHMITZ; 2002) e, por isso, relevante o contato com textosde humor j nos primeiros nveis. Schmitz (2002) ressalta ainda que com pouco tempo emuito para aprender sobre a lngua e sua cultura, deixar para trabalhar com humor somenteem nveis avanados no algo sbio.

    O uso de humor pode contribuir para o aumento da proficincia do aluno(SCHMITZ; 2002, SOUZA; 2008) e, consequentemente, favorecer o desenvolvimento dacompetncia humorstica. Dessa forma, o falante da LE, se torna confiante para interagir deforma mais descontrada quando necessrio. Alm disso, ao tomar conhecimento da

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    complexidade envolvida no desencadeamento do sentido humorstico, o indivduo, diante deuma eventual incompreenso do humor, entender que isto normal durante o processo deseu amadurecimento como falante de uma LE e, que, aos poucos, a competncia humorstica construda.

    Aps apresentar as possveis vantagens que o humor pode propiciar ao ensino de LE,no prximo captulo, tratamos dos diferentes gneros que veiculam o discurso humorstico.

  • 32

    CAPTULO 3

    OS GNEROS TEXTUAIS

    Os estudos sobre o gneros textuais resultaram em grandes contribuies para oensino de lngua materna ou estrangeira, j que o propsito principal da linguagem acomunicao, que por sua vez ocorre sempre atravs de gneros. Segundo Marcuschi

    impossvel no se comunicar verbalmente por algum gnero, assim como impossvel no secomunicar verbalmente por algum texto (2002, p. 154).

    Considerando-se que a comunicao ocorre atravs dos gneros, pode-se afirmar queos mesmos so utilizados de acordo com a finalidade scio-discursiva a que servem.Quando dominamos um gnero textual, no dominamos uma forma lingustica e sim uma

    forma de realizar linguisticamente objetivos especficos em situaes sociais particulares.(Marcuschi, 2002, p.154).

    Ao se tratar de gnero textual torna-se importante discutir tambm o conceito de tipotextual, ressaltando a diferena entre ambos, uma vez que possvel encontrar a utilizaodesses termos como sinnimos, at mesmo, em livros didticos. De acordo com Marcuschi(2002, p.154), o gnero textual:

    refere a textos materializados em situaes comunicativas recorrentes. Osgneros textuais so os textos que encontramos em nossa vida diria e querepresentam padres sociocomunicativos caractersticos definidos porcomposies, objetivos enunciativos e estilos concretamente realizados naintegrao de foras histricas, sociais, institucionais e tcnicas.

    Enquanto o tipo textual:

    designa uma espcie de construo terica {em geral uma sequnciasubjacente aos textos} definido pela natureza lingustica de sua composio

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    {aspectos lexicais, sintticos, tempos verbais, relaes lgicas, estilo}. O tipocaracteriza-se muito mais como sequncias lingusticas (sequncias retricas)do que como textos materializados; a rigor, so modos textuais. Em geral, ostipos textuais abrangem cerca de meia dzia de categorias conhecidas como:narrao, argumentao, exposio, descrio, injuno. O conjunto decategorias para designar tipos textuais limitado e sem tendncia a aumentar.

    Os gneros textuais so influenciados por questes extrnsecas ao discurso tais como aproduo e veiculao dos textos. Devido sua natureza dinmica, os gneros textuais soinfinitos, pois surgem e modificam-se ao decorrer da histria. Para se destacar algunsexemplos de gneros textuais pode-se mencionar a receita, a bula, o rtulo, o artigo, o e-mail,a carta dentre outros. J no que diz respeito aos tipos textuais, pode-se citar a narrao, aexposio, a descrio, a argumentao e a classificao. Os tipos textuais so pr-estabelecidos e correspondem s estruturas gramtico-lexicais utilizadas no texto pararealizar os objetivos comunicativos traados pelo autor do texto.

    Desse modo, os gneros fazem parte das atividades comunicativas do cotidiano, sendoutilizados de maneira consciente ou no pelos falantes. Na aula de lngua estrangeira, otrabalho com gneros provenientes de fontes autnticas pode contribuir para uma maior visolingustica por parte do aluno assim como para circunstanciar e legitimar a prtica da lngua,tornando o ensino mais significativo. Faz-se necessrio o uso de gneros variados nas aulas,incluindo aqueles que so de natureza humorstica e que fazem parte do dia a dia dos alunoscomo histrias em quadrinhos, cartuns, tiras, charges e piadas.

    3.1 Os Gneros Humorsticos

    Apesar de HQs, cartuns, charges, tiras e piadas serem familiares ao universo dosalunos e muito utilizados no cotidiano, esses recursos nem sempre foram consideradosinteressantes para a sala de aula.

    As histrias em quadrinhos, por exemplo, durante muito tempo foram vistas com umcerto preconceito por se considerar que poderiam ser prejudiciais formao dos estudantescomo ressaltado por Srbek (2006, p.13): nos anos 50, os quadrinhos no eram aceitos no

    meio escolar; acreditava-se que, alm da "famosa preguia mental, eles poderiam causardanos irreparveis formao moral das crianas. Pensava-se tambm que as HQs nodeveriam ser utilizadas em sala de aula, tendo em vista que tinham o objetivo de proporcionardiverso, como menciona Mendona (2002, p. 202): de fato, o entretenimento como meta

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    principal e o humor como tom de boa parte das HQs podem ter levado negligncia dasHQs nas escolas. Ademais, a linguagem das histrias em quadrinhos era vista comoinapropriada para o ensino, acreditando-se que era simples e fcil. Mendona, contudo,afirma que a leitura de HQs pode apresentar um alto nvel de complexidade e ter tambmum carter didtico.

    Na verdade determinadas HQs demandam estratgias de leitura sofisticadas,alm de um alto grau de conhecimento prvio, sendo quase que destinadasapenas aos iniciados nos enredos de seus personagens. Em outros casos, aocontrrio, as HQs podem ter uma funo didtica, sendo utilizadas para darinstrues ou persuadir, em campanhas educativas. (2002, p. 202).

    Com o decorrer do tempo, pde-se perceber uma mudana de postura em relao sHQs, que passaram a ser includas em exames de concursos e vestibulares, alm de seremmencionadas nos PCN.

    V-se uma outra relao entre quadrinhos e educao, bem mais harmoniosa.A presena deles nas provas de vestibular, a sua incluso nos PCN(Parmetros Curriculares Nacionais) e a distribuio de obras ao ensinofundamental (por meio de Programa Nacional Biblioteca na Escola) levaramobrigatoriamente a linguagem dos quadrinhos para dentro da escola e pararealidade pedaggica do professor (RAMOS, 2009, p.13).

    Ao se trabalhar com gneros humorsticos na sala de aula necessrio deixar clarasas diferenas entre eles, assim, como afirma Santos (2010, p. 2), [...] para se ensinar umgnero, preciso antes de tudo ter clareza sobre o que diferencia esse gnero de outro, bemcomo as caractersticas particulares que o tornam passvel de ser apreendido.

    Existe muita confuso no tratamento dos gneros como, por exemplo, pode-seencontrar uma tira sendo classificada como cartum ou uma charge, como uma tira, uma vezque distinguir esses gneros difcil, mesmo para os profissionais da rea (MENDONA,

    2002, p.19). Ramos (2009) cita um exemplo da aplicao de uma prova da PUC-SP em quehouve o uso de uma histria em quadrinhos, porm em uma questo foi tratada como tira dequadrinhos enquanto em uma outra foi chamada de charge.

    Diante de problemas para definir os gneros humorsticos, pretendemos abordar asdiferenas principais entre eles e atribuir a cada um a sua devida denominao.

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    3.1.1 As Histrias em Quadrinhos (HQs)

    As HQs aparecem em revistas prprias, tm mais de quatro quadros e narrativasgeralmente longas. As HQs apresentam um discurso sequenciado, cujas histrias soconstitudas no s pelo texto verbal, mas tambm pelo icnico.

    3.1.1.1 A Linguagem das Histrias em Quadrinhos

    Ao levar em conta os elementos da linguagem em quadrinhos, Eco (2004) descreve asua semntica e a sua sintaxe. A semntica constituda pelo uso de bales, metforasvisuais, onomatopias, sequncias de quadrinhos, isto , tudo o que desencadeia a produode sentido na histria como um todo. A sintaxe, por sua vez, verificada na combinaoentre os quadros juntamente com a utilizao de elementos dentro deles, aquilo quepropicia a relao lgico-temporal dos itens dos quadrinhos.

    Ramos (2007) afirma que vrios gneros utilizam a linguagem dos quadrinhos; o

    caso da charge, do cartum, dos diferentes gneros autnomos das histrias em quadrinhos(entendidas aqui como um gnero integrante de um rtulo maior homnimo) das tiras (entreeles, as tiras cmicas). Portanto, a linguagem das HQs, que tambm utilizada em outrosgneros humorsticos, um tanto peculiar, pois resulta da mescla entre cdigos lingusticos eno lingusticos e, por isso, classificada em dois tipos: linguagem verbal e icnica. Essesdois tipos de linguagem enriquecem o contedo dos quadrinhos e facilitam o seuentendimento pelo leitor, como ressalta Borges (2001):

    nas histrias em quadrinhos, atravs da unio de elementos verbais eicnicos, podemos verificar uma dupla articulao da linguagem. Atcnica da narrativa da histria em quadrinhos envolve uma complexarelao entre dois canais, visuais e lingusticos, que permite ampliar aspossibilidades de encaminhamento da mensagem e as perspectivas derecepo pelo destinatrio.

    A linguagem verbal diz respeito ao texto escrito que aparece em bales e/ou em formade legendas, enquanto a linguagem icnica refere-se, por outro lado, aos elementosextralingusticos tais como formas, cores, sons, rudos, imagens, expresses faciais etc.

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    A interao entre o verbal e o no-verbal costuma atuar como umacomplementaridade entre ambos, pois o verbal tende a apresentar aquilo que no reveladonas imagens ou acrescenta alguma informao ao que est representado pelos desenhos,favorecendo a interpretao de elementos espaciais e temporais e, portanto, atribuindocoerncia narrativa da estria. Segundo Borges (2001): a mensagem icnica e a verbal nos

    quadrinhos no se excluem, mas interagem, combinando de tal forma a ponto de permitirnovas possibilidades de encaminhamento e de recepo da mensagem.

    Apesar de a interao entre a linguagem verbal e a icnica ser muito comum, emalguns casos, porm, h predominncia5 de uma linguagem sobre a outra, ou at mesmo apresena de apenas uma dessas linguagens. Isso pode ser visto nas histrias mudas, onde hsomente o recurso visual e, em certos momentos das histrias faladas pode-se encontrar o usode quadros somente com imagens, no utilizando o verbal.

    McCloud (2005) afirma que existem infinitas combinaes entre palavras e figuras,porm o autor tenta dividir essas combinaes em sete categorias distintas, a saber:

    Primeiramente, tem-se a combinao especfica de palavras, onde estas transmitema informao quase que total do texto, pois a figuras apenas ilustram e acrescentam pouco mensagem. Em seguida, h combinaes especficas de imagens, em que as palavras tm afuno de apenas representar uma trilha sonora da imagem da figura em questo, isto ,enquanto casais se beijam aparecem nos bales os sons de beijos MMM... ou quandoalgum bate porta, vemos toc-toc.

    J os quadros duo-especficos mostram figuras e palavras transmitindo a mesmamensagem. H tambm a combinao aditiva, em que as palavras so responsveis porampliar ou incrementar o sentido expresso pela figura, as palavras acrescentam informaoao que est sendo comunicado pela imagem. De acordo com essa combinao, a figurarecebe uma informao extra por meio do uso do verbal. Outro tipo de combinao chama-separalela. Nesse caso, as palavras e as imagens nada acrescentam uma outra, ao contrrio,mostram informaes distintas. Ademais, a combinao montagem remete s palavras queso partes integrantes das figuras. Por fim, McCloud apresenta a combinaointerdependente, em que h uma unio entre palavras e imagens, pois nenhuma das duaspode individualmente produzir o sentido pretendido.

    5 Nas HQs podemos encontrar quadros com a predominncia da linguagem verbal.

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    3.1.1.2 Os Bales

    Alm da combinao de imagens e palavras