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propagação de clone e hormônios de plantas Opiniões hormônios e reguladores de crescimento: realidades e mitos na clonagem de eucalipto A produção de mudas florestais no Brasil presenciou inúmeros avanços tecnológicos durante as últimas déca- das, sendo o eucalipto (plantas dos gêneros Eucalyptus e Corymbia) o maior responsável por tal mérito. O desen- volvimento da clonagem e os primeiros plantios clonais visando à resistência a doenças e a melhoria da produ- tividade e da qualidade dos produtos obtidos foram um marco histórico empreendido no final da década de 1970. A partir de então, o desenvolvimento de novas técni- cas de produção de mudas teve grande impulso. A produ- ção de clones de eucalipto é rotina em grandes empresas florestais desde a década de 1980, mediante o uso da téc- nica de estaquia e, em pequenas e médias empresas, tem se tomado tecnologia comercial de grande utilidade desde 1990, com o advento da técnica de miniestaquia. artigo, será utilizado o termo "hormônio" aplicado pa- ra referência aos reguladores de crescimento aplicados previamente ao processo de enraizamento. A aplicação de hormônios em estacas de eucalipto vem sendo rea- lizada desde os primórdios da implementação da téc- nica de estaquia, sendo reconhecidamente uma prática indispensável para a melhoria do enraizamento, tanto em termos de percentuais quanto de velocidade para formação de raízes e vigor do sistema radicial forma- do. Inúmeros estudos foram desenvolvidos visando à definição dos tipos de horrnônios mais indicados, con- centrações e formas de aplicação adequadas ao proces- so de clonagem via estaquia, no qual, em geral, 6000 mg L-I (antigo ppm ou partes por milhão) do ácido in- dolbutírico (A1B) têm sido os mais recomendados, bem Hormônios são substâncias naturais produzidas pela própria planta, e reguladores de crescimento são produ- tos sintéticos aplicados nas plantas ou em partes dela, com ação similar aos hormônios naturais. No entanto, na prática de viveiros de propagação clonal, o termo "hormônio" é usado de forma generalizada também para substâncias aplicadas e, consequentemente, neste 32 como a aplicação via pó em vista das maiores facilida- des operacionais. No entanto variações de juvenilida- de do material propagado, principalmente referente à idade da planta matriz a ser clonada, podem ditar al- terações na concentração recomendada. Cabe ressaltar que, atualmente, a estaquia é somente utilizada para o resgate de material selecionado do campo, sendo a

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hormônios e reguladores de crescimento:

realidades e mitosna clonagem de eucalipto

A produção de mudas florestais no Brasil presenciouinúmeros avanços tecnológicos durante as últimas déca-das, sendo o eucalipto (plantas dos gêneros Eucalyptus eCorymbia) o maior responsável por tal mérito. O desen-volvimento da clonagem e os primeiros plantios clonaisvisando à resistência a doenças e a melhoria da produ-tividade e da qualidade dos produtos obtidos foram ummarco histórico empreendido no final da década de 1970.

A partir de então, o desenvolvimento de novas técni-cas de produção de mudas teve grande impulso. A produ-ção de clones de eucalipto é rotina em grandes empresasflorestais desde a década de 1980, mediante o uso da téc-nica de estaquia e, em pequenas e médias empresas, temse tomado tecnologia comercial de grande utilidade desde1990, com o advento da técnica de miniestaquia.

artigo, será utilizado o termo "hormônio" aplicado pa-ra referência aos reguladores de crescimento aplicadospreviamente ao processo de enraizamento. A aplicaçãode hormônios em estacas de eucalipto vem sendo rea-lizada desde os primórdios da implementação da téc-nica de estaquia, sendo reconhecidamente uma práticaindispensável para a melhoria do enraizamento, tantoem termos de percentuais quanto de velocidade paraformação de raízes e vigor do sistema radicial forma-do. Inúmeros estudos foram desenvolvidos visando àdefinição dos tipos de horrnônios mais indicados, con-centrações e formas de aplicação adequadas ao proces-so de clonagem via estaquia, no qual, em geral, 6000mg L-I (antigo ppm ou partes por milhão) do ácido in-dolbutírico (A1B) têm sido os mais recomendados, bem

Hormônios são substâncias naturais produzidas pelaprópria planta, e reguladores de crescimento são produ-tos sintéticos aplicados nas plantas ou em partes dela,com ação similar aos hormônios naturais. No entanto,na prática de viveiros de propagação clonal, o termo"hormônio" é usado de forma generalizada tambémpara substâncias aplicadas e, consequentemente, neste

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como a aplicação via pó em vista das maiores facilida-des operacionais. No entanto variações de juvenilida-de do material propagado, principalmente referente àidade da planta matriz a ser clonada, podem ditar al-terações na concentração recomendada. Cabe ressaltarque, atualmente, a estaquia é somente utilizada parao resgate de material selecionado do campo, sendo a

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miniestaquia a técnica de clonagem massal utilizadaapós aquela etapa. De maneira similar à estaquia, nosprimórdios do desenvolvimento da técnica de minies-taquia, uma série de estudos foram realizados visandoà definição de horrnônios e suas concentrações a seremaplicados em miniestacas. Inicialmente, havia certoconsenso de que dosagens variavam de O a 2000 mgL-I, dependendo, principalmente, do clone/espécie aser clonado(a).

Com o desenvolvimento científico e tecnológico,ficou claro que a necessidade de aplicação de horrnô-nios na técnica de miniestaquia é função do manejoadotado na produção e no enraizamento das miniesta-cas, ou seja, há grandes chances da não necessidadede sua aplicação quando as minicepas fornecedoras deminiestacas estão nutridas e manejadas corretamentee enraizadas em estruturas adequadas. Os sistemas demanejo de minicepas em sistema semi-hidropônicocom areia média foram decisivos para tal conquista.

Em outras palavras, nesses quase 15 anos de utiliza-ção comercial da técnica de miniestaquia, os sistemasde nutrição e manejo das minicepas e enraizamento dasminiestacas evoluíram de maneira a dispensar a apli-cação de horrnônios para melhorar o enraizamento.Exceções ainda valem para certos materiais genéticos,principalmente os subtropicais, com maior dificuldadenatural de enraizamento.

Em relação aos conteúdos hormonais internos (hor-mônios naturais) em estacas e miniestacas, a literaturae a crença popular consideram que altas concentra-ções de auxina, principalmente o ácido indolacético(AJA), forma natural do AIB, seriam necessárias parapromoção de enraizamento efetivo. No entanto estu-dos recentes (em fase de publicação) sobre híbridosde Corymbia citriodora x C. torelliana e Eucalyptuspellita, desenvolvidos pela Embrapa Florestas em par-ceira com pesquisadores da University of the SunshineCoast (Queensland, Austrália), demonstraram não serexatamente assim, ou seja, não' existe correlação dasconcentrações internas de AIA com enraizamento.

Naqueles estudos, as concentrações de AIA varia-ram significativamente entre clones, de 224 a 771 ngpor grama de matéria seca para Corymbia torellianax C. citriodora e de 200 a 840 ng g-I para Eucalyptuspellita. A resposta de tecidos à auxina pode ser regu-lada por fatores como a sensibilidade da célula àquelehormônio e a concentração de fatores inibitórios do en-raizamento na base do propágulo, o que pode explicaressa falta de correlação entre os conteúdos endógenosde hormônios naturais com a resposta ao enraizamento.

Esses resultados, de certa forma contraditórios, deconteúdos hormonais internos em propágulos de euca-lipto, indicam que ainda há necessidade de se avançarna compreensão fisiológica dos processos envolvidosna iniciação e no crescimento de raízes em propágu-los vegetativos, e, para tanto, novos estudos básicose aplicados serão imprescindíveis para a obtenção deavanços significativos nessa linha do conhecimento.Estudos de fisiologia básica serão base também para oefetivo desenvolvimento e/ou aprimoramento de outrastécnicas biotecnológicas, como a embriogênese somá-tica, por exemplo.