Historia Do Pens Reformado - Calvino 500 Anos(Comentarios)

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    UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE

    CEFT – Centro de Educação, Filosofia e Teologia

    Curso de “Validação dos Créditos Cursados em Cursos Superiores: Bacharelado e Licenciatura em Cursos Livres de Teologia” 

    Paulo Américo Lopes (41379896)

    HISTÓRIA DO PENSAMENTO CRISTÃO REFORMADO

    Prof. Dr. Hermisten Maia Pereira da Costa 

     Artigo sobre a obra João Calvino – 500 anos: Introdução ao seu pensamento e obra, de Hermisten Maia Pereira da Costa. São Paulo: Cultura Cristã, 2009.

     A espada de Dâmocles pesa sobre mim!  – eis-me diante de um gigante, adiscorrer sobre a vida do maior baluarte da Reforma Protestante do século XVI. Agrandeza de João Calvino, decorridos agora, 504 anos de seu nascimento, ainda

    não foi devidamente mensurada. A influência de seu pensamento sobre a civilizaçãoocidental ainda se faz presente, notadamente na teologia, mas também na política,na economia e na filosofia, entre outras esferas.

    O Dr. Hermisten, com a competência que lhe é peculiar, e sua vastaexperiência magisterial teológica, além de autor consagrado e respeitadíssimo,brindou o público evangélico brasileiro, com esta compreensiva opus magnum davida de Calvino.

    Quem compulsar esta notável obra, verificará o ingente esforço despendidopelo autor, o qual reconhece que, ela demandou, nada menos que 26 anos, depacientes pesquisas e estudos “não patrocinados”, em razão da admiração quenutre pelo reformador genebrino.

    O aparato bibliográfico acessado pelo autor é opulento, o que demonstra,  perse, que não nos deparamos com uma obra qualquer; antes, o valor da obra pode seraquilatado não só pela profusão das fontes consultadas, mas, sobretudo, pelaqualidade seleta delas – o melhor do melhor!

    Eis diante de nós, indiscutivelmente, a mais abrangente pesquisa sobre aobra e o pensamento de Calvino, pelo menos em português, recheada com notasbiográficas densas, historicamente precisas, que lhe servem como áurea moldura.

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     A sucessão de eventos históricos não se dá nem se consuma, numavacuidade abstrata  –  antes se interpenetram, se inter-relacionam factual econcretamente, como uma extensa cadeia de elos intermináveis. Ipso facto, há dese reconhecer que a Reforma Protestante do século XVI foi o clímax de um elencode anseios progressistas e libertários, acalentados há muito.

    Savonarola, Wicliff e John Huss, foram três dos muitos precursores solitários,que se arvoraram como porta-vozes de milhares de europeus - oprimidos pelasarbitrariedades caudilhescas do prepotente clero romanista e pelo engessado eretrógrado sistema político feudalista.

    Coube à Renascença acender esse fogo, que havia de incendiar as mentesdos mais preclaros pensadores, e promover a mais radical mudança nos paradigmasde pensamento ocidentais.

     Alguns dos antecedentes históricos da Reforma reconhecidos são: aingerência do clero nos negócios, visto que a economia gravitava em torno das“igrejas paroquiais”; o sentimento anticlerical motivado pela corrupção da igrejacatólica nas esferas moral, política e econômica; os rigores da “confissão auricular”induzindo à prática meritória das “boas obras”, que não conseguiram dissipar o“sentimento de culpa latente”. 

    Os pré-reformadores - católicos piedosos e outros insurgentes - que tentaram“implementar reformas”, foram barbaramente executados nas fogueiras da

    Inquisição. O culto estava inçado de superstições, enquanto “o politeísmo e aidolatria inundavam a igreja”. 

    Paul Tillich sintetiza, de modo preciso, a precariedade religiosa quecaracterizava aquela época: “Sob tais condições, jamais alguém poderia saber seseria salvo, pois jamais se pode fazer o suficiente; ninguém podia receber dosessuficientes do tipo mágico de graça, nem realizar número suficiente de méritos e deobras de ascese. Como resultado desse estado de coisas, havia muita ansiedade nofinal da Idade Média”. 

    O termo “protestante” teve sua origem na Segunda Dieta de Spira (abril de1529), quando os cristãos se arrogaram a faculdade de continuarem reafirmando asuficiência suprema da Bíblia, como única norma e regra de fé  –  D.F. Wrightsumariza: “O „protesto‟ era, ao mesmo tempo, uma objeção, um apelo e umaafirmação”. 

    Portanto, à luz dessas considerações preliminares, fica claro que a Reformado século XVI veio a reboque da insatisfação de muitos milhares, cujasnecessidades espirituais jamais foram atendidas pelo clero romano.

    O sentimento norteador desse movimento religioso e teológico, orquestradopor parte dos “católicos piedosos”,  não era de natureza cismática, antes,objetivavam revitalizar, renovar, fazer com que a Igreja retornasse aos princípios

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    apostólicos. Essa foi a motivação, intramuros, da Reforma, enquanto que, no âmbitoexterno, dois outros eventos foram determinantes, a saber: a eclosão do Humanismoe do Renascentismo.

     A observação de Alain Peyrefitte vem a calhar: “(...) entendemos que aReforma foi um movimento de grande alcance cultural, institucional, social e políticona História da Europa e, posteriormente, em todo o Ocidente”. 

     Alister E. McGrath entende que “a Reforma ocupou, e deve continuar aocupar, um legítimo e significativo lugar na História das ideias”. Não menos contundente, é o testemunho dos católicos Abbagnano e Visalberghi: “a contribuiçãofundamental à formação da mentalidade moderna foi a reforma religiosa de Lutero eCalvino”. 

    No âmbito externo a Renascença incumbiu-se de promover transformaçõesradicais que assinalaram a transição da Idade Média para a Idade Moderna (fins doséculo XIV ao XVI). Tais mudanças evidenciaram-se na cultura, sociedade,economia, política e na religião. A ruptura da arcaica estrutura medieval feudalistapropiciou o surgimento do capitalismo.

    Essencialmente, o Renascimento preocupou-se com a redescoberta e arevalorização das referências culturais da antiguidade clássica e concentrou-se,mais intensamente, na Itália, donde irradiou-se para a Inglaterra, Alemanha e PaísesBaixos.

    O eixo teocêntrico foi suprimido, sendo substituído por uma cosmovisãoantropocêntrica que identificava o homem como o “centro e a medida de todas ascoisas”.

    Uma das contribuições mais significativas do humanismo renascentista foi asua insistência ao retorno “às fontes primárias”, fator que deflagrou, nos humanistascristãos, o despertamento e o renovado interesse pelo estudo dos textos originais daBíblia. As diferenças observadas pelos princípios do NT e a praxe incongruente dareligião romana redundaram no agravamento das tensões.

    Em 1516 veio a lume, por obra e graça do humanista Desidério Erasmo, oTextus Receptus, a primeira edição do Novo Testamento Grego.

    Lutero, Zuínglio e Calvino, contudo, não se aferraram a uma visão humanistaestrita, e, a despeito “das disparidades de compreensão, de ênfase e de estilo,estavam de acordo quanto à centralidade da Palavra de Deus, como fonte para sepensar acerca de Deus”.

    Costa conclui, que embora afinizados e conectados por pressupostos muito

    semelhantes, “a Reforma e  a Renascença ofereceram respostas completamentediferentes. Enquanto os humanistas partiam de perspectiva secular, oProtestantismo tinha perspectiva e caráter religiosos. (...) Na Reforma, o ponto de

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    partida não é o homem; ele não é considerado „a medida de todas as coisas‟; antes,a sua dignidade consiste em ter sido criado à imagem de Deus. Portanto adissociação entre Renascença e Reforma teria de ser como foi: inevitável”. 

    Outro objetivo primordial da Reforma foi o retorno às Escrituras como marcoregulatório da vida cristã; Colin Brown, citado por Costa enfatizou “que apreocupação dos reformadores era principalmente „a reforma da vida, da adoração eda doutrina, à luz da Palavra de Deus‟”.

     A Vulgata só era lida por um seleto grupo clerical que tinha acesso àsbibliotecas de manuscritos das abadias e mosteiros  –  numa época em que livros,transcritos à mão eram tão raros quanto, caros. Os ofícios da igreja romana eramrealizados todos em latim; o mesmo ocorria na cultura secular.

    Os reformadores estabeleceram o desiderato de traduzir as Escrituras para alíngua do povo, a partir dos originais grego-hebraicos e não meramente, como umaversão de segunda mão da Vulgata. O “Texto Recebido” de Erasmo, publicado em1516, foi justamente aclamado e muito útil como texto-fonte primário para se atingiresse fim.

    John Wycliff, Nicholas de Hereford e John Purvey (1382-1384) legaram aopovo inglês a primeira tradução da Bíblia em sua própria língua. Ainda que fosseuma versão da Vulgata, o povo inglês podia, finalmente, ler as Escrituras em seupróprio vernáculo.

    Lutero, por sua vez, bafejou a Alemanha com uma primorosa tradução  – concluída em 1534 e, “marco inicial da literatura alemã; Febvre reconheceu que otrabalho de Lutero consistiu „(...) em uma assombrosa ressurreição da Palavra‟”. 

    O valor de um livro manuscrito era absolutamente proibitivo, porém, graças àprovidência divina, o gênio de Guttenberg com sua prensa de tipos móveis resolveu,parcialmente, o problema, desonerando, sensivelmente, o custo de produção doslivros.

    Outro obstáculo a ser vencido pelos reformadores foi o analfabetismogeneralizado, que inviabilizava a leitura das Escrituras e a faculdade do “livreexame”. 

    Neste contexto buliçoso do século XVI, marcado por céleres e radicaistransformações em todos os âmbitos, nasce João Calvino, a 10 de julho de 1509,numa cidadezinha da Picardia, chamada Noyon. Seu pai, Gérard Cauvin, era deorigem humilde e sua mãe, Jeane Lefranc, de família abastada, faleceu quandoCalvino contava apenas seis anos.

    O visionário Gérard  –  secretário apostólico de Charles de Hangest, bemrelacionado com famílias nobres da região, procurou, dentro de suas limitações,encaminhar da melhor maneira possível, a educação dos filhos.

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    com o professor Pierre Danes e aprender hebraico (1531-1533) com FrançoisVatable”. 

     Acredita-se que Calvino tenha colaborado com Nicolás Cop, na preparação

    de seu discurso de posse da Reitoria da Universidade de Paris. Após a prolação dodiscurso, que reclamava por reformas na igreja romana, a 1º de novembro de 1533,Calvino e Cop tiveram de fugir, diante da repercussão negativa  –  a perseguiçãoestava começando. Seriam indícios de que Calvino já se convertera? Talvez.

    Em 1534, aos vinte cinco, Calvino alcançou a idade legal para ser ordenado;contudo, a 4 de maio de 1534 declinou de seus “benefícios eclesiásticos”. Asperseguições intensificaram-se e, para sobreviver, Calvino peregrinou: Paris, Angoulême, Poitiers, depois Itália, Estrasburgo e Basileia (1535). Em que pontoexato teria Calvino sido convertido? Conforme o autor, presume-se que a conversão

    dele tenha ocorrido entre 1532 e 1534 – em Orléans ou Paris.

    Na percepção de Philip Schaff, a conversão de Calvino “foi umatransformação do Romanismo para o Protestantismo, da superstição papal para a féevangélica, do tradicionalismo escolástico para a simplicidade bíblica”. Já Félicechega a afirmar que “a Bíblia que recebeu das mãos de um de seus paren tes, PierreRobert Olivétan, o arrebatou do catolicismo”. 

     A descrição sucinta da sua própria conversão revela um Calvino discreto,como era de seu feitio: “Contrariado com a novidade, eu ouvia com muita má

    vontade e (...) resisti com energia e irritação (...) foi com a maior dificuldade, que fuiinduzido a confessar que, por toda minha vida, eu estivera na ignorância e no erro(...) Deus, por um ato súbito de conversão, subjugou e trouxe minha mente a umadisposição suscetível, a qual era mais empedernida em tais matérias, do que sepoderia esperar de mim (...)”. 

    Calvino é filho do humanismo renascentista e, portanto delimitado peloscontornos de sua própria época. Costa define que, na realidade, o Renascimento e oHumanismo, “são dois momentos interligados, tendo em comum os seus caracteresprincipais, como: a sustentação da dignidade da natureza humana e a livre pesquisana área científica, sem os limites impostos pela autoridade de Aristóteles (...). ORenascentismo interessava-se, primariamente, pela literatura e pela eloquência (...)Nesses projetos, o Renascimento desejava se libertar das „fantasias‟ medievais –  pedagógicas, estilísticas, filosóficas, científicas e religiosas; para isso, elegeu aantiguidade clássica, como guia de sua libertação e busca”. 

    Sumarizando, era necessário voltar a viver “as glórias da civilização grego-romana”, segundo Francesco Petrarca (1304-1374), admirador de Agostinho edenominado “pai do novo humanismo”. Noutras palavras, era imperioso permutar os

    paradigmas teocêntricos medievais pelo padrão normativo do Classicismo. Rouanetacrescenta que outro objetivo era “diminuir a importância da cultura hebraica e,portanto, do AT”. 

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    Conforme o católico - Nicola Abbagnano  –  “ os renascentistas rejeitaram ofiltro medieval por onde passava a cultura antiga; e Paul Kristeler remata: “em outrostermos, libertar-se da superestrutura e do contexto da Teologia Escolástica”. 

    Na expressão do tomista, Pedro Dalle Nogare (1913-1990): “O Renascimentofoi o „Pentecostes da civilização ocidental‟”. 

    Em alguns círculos acenou-se com a possibilidade de haver uma “identidadequase essencial” entre a Filosofia e a religião – o Verbo Encarnado dos Evangelhosequivaleria ao “Logos” dos filósofos gregos, especialmente de Heráclito. Tal sínteseadviria da harmonização entre a Filosofia e a Teologia dos Pais da Igreja,especialmente de Agostinho, e representava a contracultura, oposta ao sistematomista-aristotélico.

    Como os erros históricos tendem a repetir-se, o paradoxal sincretismoteologia/filosofia malogrou de novo e, conforme o entendimento de FrancisSchaeffer: “A tentativa do homem no início da Renascença, de sincretizar ocristianismo com o pensamento aristotélico havia fracassado. Daí em diante, ohomem da Renascença passou a sincretizar o cristianismo e o Platonismo  –  efracassou do mesmo jeito”. 

    No quinto século a.C., o sofista Protágoras, já havia declarado: “O homem é amedida de todas as coisas, da existência das que existem e da não existência dasque não existem”. Em seu afã de se contrapor à cultura medieval, os renascentistas

    perpetraram o mesmo equívoco.

    Costa afirma que “esse antropocentrismo refletido é visto no homemrenascentista, profundamente otimista no que se refere à sua capacidade. Ele se julga em plena condição de planejar o seu próprio futuro, sua existência individual, eaproximar-se da perfeição; tudo está em suas mãos, nada lhe escapa”. Pondera oautor sobre a falácia desse falso pressuposto: “a valorização do homem pelo homemtornou-se, de modo paradoxal, a destruição da sua própria dignidade como seressencial que é, resultante da imagem de Deus”. 

    Calvino compreende que a verdadeira antropologia deve ser teocêntrica, ohomem só pode se realizar em plenitude, se submisso a Deus: “Os homens jamaisencontrarão um antídoto para suas misérias, enquanto, esquecendo-se de seuspróprios méritos, (...) não aprenderem a recorr er à misericórdia gratuita de Deus”. 

    É inegável o fato de que o conhecimento humanístico absorvido por longosanos de estudo meticuloso e acurado, moldaram em Calvino, o refinadocomentarista e teólogo sistemático, em que se tornou.

    Calvino exibiu seu gênio precoce e consumado, aos 23 anos, quando

    publicou a edição comentada do livro de Sêneca  – De Clementia  – a 4 de abril de1532. McNeill opina a respeito: “o principal monumento dos conhecimentoshumanísticos do jovem Calvino”. A ousadia incipiente demonstrada, corajosamente,

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    na tessitura da obra, antecipa, de certa forma, a audácia que caracterizou a vida deCalvino, enquanto pregador, escritor e administrador.

    Humanistas conspícuos como Guillaume Budé, Erasmo e Juan Luís Vives  – 

    “o triunvirato do humanismo europeu” – integraram o amplo círculo de amizades deCalvino. Outro preclaro amigo, a quem dedicou seu Comentário da Primeira Epístolaaos Tessalonicenses, foi Maturinus Corderius - seu mestre de Gramática e Retórica,e, grandemente, responsável por seu apurado estilo literário. Após converter-se aoProtestantismo, foi convidado por Calvino, a lecionar na Academia de Genebra,onde permaneceu até sua morte, em 08.09.1564.

    Melchior Wolmar, humanista de influência luterana, lecionou grego a Calvinoe seu amigo Beza; Calvino reputou-o como “o mais distinguido dos mestres degrego”. 

    Enquanto humanista de formação, Calvino sempre recomendou irenidade etolerância, nas pendências que podiam, eventualmente, fragmentar o corpo deCristo ou mesmo, promover indisposições pessoais. Enfatizava que a unidade sópode ser construída com atitudes de humildade, evitando os cristãos, a todo custo,agradarem-se a si próprios.

    Calvino foi pertinaz e intransigente, na defesa da unidade da Igreja e napreservação da sã doutrina; em 1554 exortou aos seus conservos calvinistas,refugiados em Wezel, Alemanha, a “não abandonarem a Igreja por pequenas

    divergências nas práticas cerimoniais, sendo tolerantes a fim de preservar aunidade. Contudo, os exorta a jamais, fazerem acordos em pontos doutrinários”. 

     A 20.03.1552, Thomas Cranmer (1489-1556) convidou Calvino, Melanchton eBulinger, com o desiderato específico de prepararem um “credo que fosseconsensual para as Igre jas Reformadas”. Calvino encorajou seu colega inglês aperseverar nesse objetivo, ponderando que: “Estando os membros da Igrejadivididos, o corpo sangra. Isso me preocupa tanto que, se pudesse fazer algo, nãome recusaria a cruzar até dez mares, se necessário fosse, por essa causa”. 

     A prática pastoral de Calvino estava solidamente assentada na suficiênciainfalível das Escrituras. A seriedade com que defrontava o texto sagrado revela queo gênio exegético de Calvino foi forjado, mediante a assimilação dos clássicos daexegese bíblica, notadamente, Crisóstomo, Agostinho e Bernardo de Claraval  – amplamente citados em seus escritos.

    Contudo, manteve esses clássicos da exegese a uma distância segura,preferindo, antes, “interpretar a Escritura por meio da própria Escritura” –  princípioque seria mais tarde consagrado pelos Símbolos de Westminster e de Heidelberg,entre outros.

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    No campo teológico, Calvino nunca negou a influência de Bucer, Bulinger ede Melanchton, o qual considera “um homem de „incomparável conhecimento nosmais elevados ramos da literatura‟, profunda piedade e outros dons”. 

     A noção de uma suposta “insuficiência” das Escrituras tem sido recorrente nahistória da Igreja. A propósito, por volta de 1520, surgiu na culta e próspera Zwickau,um grupo de “iluminados” a quem Lutero denominou “profetas de Zwickau”. Essessectários exibiam uma veia adventista, crendo que o “o fim estava próximo”.

     Alegavam uma suposta “revelação interior do Espírito”, preterindo a revelaçãoescriturística objetiva, em favor de uma aproximação subjetiva: “(...) Se Deus tivessetencionado ensinar-nos, por meio de um livro, não nos seria mandado do céu umaBíblia? Somente pelo Espírito é que poderemos ser iluminados. O próprio Deus faladentro de nós.  Deus em pessoa revela aquilo que devemos fazer e aquilo que

    devemos pregar (grifo meu)”. 

    Nem mesmo Wittenberg, berço da Reforma, foi poupada dos devaneiosmirabolantes de pretensos profetas. Nicolas Storch, apoiado por “outros profetas”,encaminhou-se a Wittenberg, para ali pregar “a verdadeira religião cristã”. 

     A cidade que já enfrentava distúrbios provocados por Gabriel Zwilling e por Andreas B. von Carltadt, viu-se em polvorosa. A fim de debelar a revolta (1522),Lutero teve de abandonar a segurança de seu “castelo forte” em Warteburgo, pararestabelecer a ordem  – o que fez com firmeza e espírito pastoral. Lutero advertiu:

    “Onde ... não se anuncia a Palavra, ali a espiritualidade está deteriorada”. 

    Costa intervém com muita pertinência e equilíbrio: “Essa forma de misticismoainda está presente na Igreja, e tem sido prejudicial para o povo de Deus,acarretando desvio espiritual e teológico, deslocando o “eixo hermenêutico” daPalavra para a experiência mística, afastando-nos da Palavra e, consequentementedo Deus da Palavra”. 

    Durante séculos, a hermenêutica e a exegese haviam permanecido sob ocabresto do clero romano. A única interpretação válida, de caráter dogmático e

    privativo, era aquela oferecida pela síntese das elocuções, e x-cathedra,  do santopadre, acrescidos da tradição da Igreja e do próprio texto. A bem da verdade, olaicado sequer possuía acesso à Bíblia, e mesmo se a tivesse, de nada lheadiantaria, visto que sua esmagadora maioria era constituída de analfabetos.

    Na contramão, a Reforma subverteu esse discricionário paradigma do “filtroeclesiástico romanista”, ao desfraldar a bandeira do “sacerdócio universal doscrentes” e o princípio do “livre exame” das Escrituras. 

    Para Calvino, a revelação “é um ato de condescendência divina”. Ele entendia

    que Deus, na Sua Palavra, “se acomodava à nossa capacidade”, balbuciando a SuaPalavra a nós como as amas fazem com as crianças (...) ou seja, Deus adapta-se àlinguagem humana e ao „nível humano de compreensão‟”. 

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     A eficácia da Palavra de Deus só se efetiva na vida do crente, se associadaao Espírito Santo – seu autor primário. A respeito dessa combinação imprescindívelPalavra/Espírito, Calvino se pronuncia: “Todos são incapazes de entender os„mistérios de Deus‟, até que Ele, por sua graça nos ilumine. A Palavra de Deus éuma espécie de sabedoria oculta, cuja profundidade, a frágil mente humana nãopode alcançar. Assim, a luz brilha nas trevas até que o Espírito abra os olhos aocego. Assim, „de nenhum efeito é a Palavra, sem a iluminação do Espírito Santo‟”. 

    Segundo Barth “a Teologia nunca é a causa primeira; sempre é o efeito daação de Deus em revelar-se”. Brunner avança um pouco além do conceito barthiano,e dimensiona a Teologia, a partir da práxis eclesiológica: (...) Conhecer a Deus éobedecer a seus mandamentos. A Teologia não pode ser um estudo semcompromisso, feito por um transeunte acadêmico (grifo meu).Ela é função da Igreja

    cristã, dentro da qual estamos inseridos”. “(...) O interesse puramente acadêmicopela Teologia é incapaz de contribuir para a solidificação da Teologia e da fé daIgreja. A Teologia é uma expressão de fé da Igreja, amparada nas Escrituras. TodaTeologia é, portanto, apaixonada” – Alister MacGrath.

    Excetuando o livro do Apocalipse, Calvino comentou cada um dos outros 65livros da Bíblia, sempre atento aos princípios diretrizes da clareza, da brevidade e dasimplicidade. Esgueirando-se das questões nebulosas e especulações estúpidas,deixou-nos o precioso legado  –  de pregar e de ensinar tão-somente o que sejarelevante e pertinente para a edificação da Igreja.

    Eruditos de proa têm reconhecido as competências hermenêutico-exegéticasde Calvino, suas incríveis habilidades expositivas e capacidade de sistematizar adoutrina cristã, de forma magistral, como se vê nas Institutas. Destarte, Schaffobserva que seria mui apropriado reconhecê-lo como “pai da Teologia e daexposição bíblica moderna” –  aliás, seus comentários exibem uma frescura eatualidade tais, que impressionam até ao mais desatento.

     Até liberais, como Ludwig von Diestel, admitem que Calvino foi o “criador dagenuína exegese”. Costa realça que nos comentários de Calvino encontramos:

    “profundidade exegética, firmeza doutrinária, objetividade e piedade que brota comnaturalidade de sua pena, como resultado de seu apego irrestrito ao texto sagrado”. 

    Jacobus Arminius, aluno de Beza - sucessor de Calvino – testemunha sobrea competência expositiva de Calvino a seus alunos: “Exorto aos estudantes que,depois das Sagradas Escrituras, leiam os „Comentários de Calvino‟, pois lhes digoque ele “é incomparável na interpretação da Escritura” (grifo meu).

    Calvino sempre reconheceu que o “fundamento da verdadeira Teologia e dagenuína exegese estava no ofício pastoral (...) a sua preocupação estava longe de

    ser meramente acadêmica (...) a pregação é um instrumento para a consecução dasalvação dos crentes (...) porque, sem a eficácia do Espírito, a pregação doevangelho de nada adiantará, mas permanecerá estéril. (...) Quão perigoso para a

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    Igreja é esse conhecimento que conduz às controvérsias, ou seja, o conhecimentoque ignora a piedade e se preocupa só com ostentação pessoal”. 

     A lucidez e proficiência cognitivo-teológica de Costa, fruto do seu longo e

    abençoado ministério magisterial, fica mais evidente em suas digressões sobrepredestinação e eleição  –  temas cruciais da soteriologia calvinista. O enfoque doautor não se subordina a um viés abstrato-acadêmico, antes privilegia a exposiçãodo ângulo prático da práxis pastoral e da vivência eclesial.

    Costa fundamenta a predestinação em três pressupostos, amplamentereconhecidos pelo calvinismo clássico, quais sejam: a depravação total do homem, aliberdade soberana de Deus e a existência de um plano divino.

    Conforme elucida o autor, o homem, desde a queda, encontra-se sob o

    domínio do pecado e incapacitado radicalmente em responder ao chamamentoexterno do evangelho. Costa assevera que “o pecado corrompeu o intelecto, avontade e a faculdade moral, de toda a raça humana; por conseguinte, o homemestá morto espiritualmente, sendo escravo do pecado (Gn 6.5; 8.21; Is 59.2; Jo8.34,43-44; Rm 3.9-12,23; Ef 2.1,5; Cl 1.13; 2.13), e nada pode fazer  –  e, narealidade, nem sequer deseja  –  para retornar à comunhão perdida (...) agora ohomem peca com o consentimento de uma vontade pronta e disposta.

    Prossegue argumentando: “a depravação total é justamente isto: acontaminação pelo pecado, de todas as nossas faculdades. Perdemos, totalmente, a

    nossa capacidade de percepção espiritual. As coisas de Deus soam como loucura(1ª Co 1.18-21; 2.6-8,12-16). Nossa lógica tão hábil para desvendar mistérios dosaber e derrubar sofismas, mostra-se totalmente inadequada e incapaz de percebera realidade da Palavra, que nos fala de Deus e do que somos”. 

    Calvino remata: “o intelecto do homem está de fato cegado, envolto eminfinitos erros e sempre contrário à sabedoria de Deus; a vontade, má e cheia deafeições corruptas, odeia a justiça de Deus; a força física, incapaz de boas obras,tende furiosamente à iniquidade (...) todo o seu ser está contaminado pelo pecado.O pecado nos domina completamente (...) Não teremos uma ideia adequada dodomínio do pecado, a menos que nos convençamos dele como algo que se estendea cada parte da alma e reconheçamos que tanto a mente quanto o coraçãohumanos se têm tornado completamente corrompidos (...) Observemos aqui que avontade humana é, em todos os aspectos, oposta à vontade divina”. 

    O segundo pressuposto explorado por Costa é o da liberdade soberana deDeus; ele reconhece que “Deus não sofre a influência de ninguém, de nenhumacausa externa – tudo faz conforme o conselho da sua vontade (Sl 106.8; Is 40.13-14;Dn 3.17-18; 4.35; Rm 9.15; 11.34-36; Ef 1.5, 11)”. 

    O autor evoca o testemunho de Bavinck: “O poder de Deus é soberanamentelivre. Deus não tem compromissos com terceiros; em outras palavras, Deus é

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    soberano em si mesmo, a onipotência faz parte da sua essência; por isso, para elenão há impossíveis. Apesar de qualquer oposição, ele executa seu plano (Mt 19.26;Jó 23.13).

    Fechando a tríade de pressupostos, nos deparamos com a existência de umplano divino. Charles Hodge (1797-1878) interpreta que um plano supõe, “a seleçãode um fim definido, ou objetivo a ser realizado, a seleção de meios apropriados, e,finalmente, no caso de Deus, a aplicação efetiva e controle desses meios, para arealização do fim projetado”. 

    Costa define que a eleição foi determinada, obedecendo a “um propósitoespecífico”, elaborado na eternidade, e orientado por Deus – o Senhor da História.

    Conforme registra a Confissão de Westminster “pelo  fato de Deus ser Todo-

    Poderoso, pode determinar livremente as suas ações, o que faz manifestando talpoder nos seus decretos”. 

    Costa conclui: “A sabedoria de Deus se revela na escolha dos melhores fins(...). O plano de Deus é sempre o melhor, porque foi ele quem, sábia e livremente, oescolheu e ele mesmo levará a cabo todo o seu propósito”. 

    Quer reconheçamos ou não, da doutrina da predestinação se depreendeminferências duríssimas, impopulares e muito embaraçosas, tais como “a condenaçãode todos os homens inocentes que morreram sem conhecer a Cristo”, “a eleição de

    uns para a salvação, em detrimento de outros”, “o quase silêncio dos Evangelhossobre os 30 primeiros anos de Cristo” entre outras semelhantes. 

     A seguir, Costa realça as manobras e subterfúgios que empregamos, na vãexpectativa de tentar justificar o agir soberano de Deus, procurando “uma maneirade torná-lo apetecível à mentalidade e aos valores pós-modernos”. Calvino, segundoo autor, registrou que “devemos aprender, se ainda não o fizemos, a nos calar diantedo silêncio de Deus, sabendo que o som de nossa voz petulante e „lógica‟ – em taiscircunstâncas – por si só seria uma „heresia‟”. 

    Para Spurgeon “o que nos compete é procurar entender, por meio do estudoe da oração, o que Deus quer nos ensinar em „toda a Escritura‟ e, em cada partedela”. 

    Berkhof insiste na importância de se reconhecer o grau de imperfeição denosso conhecimento de Deus, nos seguintes termos: “ A Teologia Reformadasustenta que Deus pode ser conhecido, mas que ao homem é impossível ter umexaustivo e perfeito conhecimento de Deus (...). Ter esse conhecimento de Deusseria equivalente a compreendê-lo e isto está completamente fora de questão:„Finitum non possit capere infinitum – o finito não pode conter o infinito‟”. 

    Calvino, ao tratar da predestinação, não o faz a partir de pressuposiçõesespeculativas, “fruto de abstrações desprovidas de sustentação concreta. O seu foco

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    é existencial – os fatos compartilhados por todos nós; a sua abordagem, no entanto,é soteriológica e pastoral. Calvino, como nós, hoje, indagamos: por que nem todoscreem?”. 

    Na percepção acurada de McGrath, “longe de ser uma uma especulaçãoteológica árida e abstrata, a análise de Calvino sobre a predestinação se inicia apartir de fatos empíricos (...) Para Calvino, a predestinação é apenas um exemploadicional do mistério da existência humana, por meio do qual alguns sãoinexplicavelmente favorecidos por dons materiais e intelectuais, os quais sãonegados a outros”. Aliás, Calvino observa que “a experiência ensina que Deus nãotoca todo o coração”.

     A definição clássica da doutrina da eleição, formulada no Sínodo de Dort(1618-1619), é reverberada por Spurgeon com os seguintes termos: “Podemos dizer

    que eleição é o ato eterno de Deus, por meio do qual Ele decretou  – livre, soberanae misericordiosamente  –  salvar em Cristo Jesus um determinado número dehomens, dentre toda a raça humana voluntariamente caída, aplicando, no decorrerda História, a sua graça redentora, capacitando-os, pelo Espírito Santo, aresponderem, com fé, à mensagem redentora de Cristo, sendo preservados, assim,até o fim”.

    Outras aproximações relevantíssimas, exploradas pelo autor, focam aspectosbíblico-teológicos da doutrina. Em primeiro lugar a eleição se alicerça na vontade

    livre e soberana de Deus. Valendo-se da prerrogativa exclusiva da onipotência,Deus faz tudo conforme a sua vontade (Sl 115.3; 135.6; Is 46.10; Dn 4.35; Ef 1.11).Calvino pondera que “Deus se mostra coerente com as suas demais perfeições, ouseja, Deus exercita o seu poder em harmonia com todas as perfeições de suanatureza (2ª Tm 2.13); sua vontade é eticamente determinada. O poder de Deus seharmoniza perfeitamente com a sua vontade (...) procurar relacionar nossa eleição acausas externas é tentar a Deus”. 

    Em segundo lugar, nossa eleição é eterna e imutável. Deus nos escolheu naeternidade a fim de conceder-nos uma eterna e inamissível salvação. Spurgeon se

    pronuncia a este respeito: “Quão doce é crer que nossos nomes estavam nocoração do Senhor e gravados nas mãos de Jesus muito antes que o mundoexistisse. Não seria este motivo suficiente para fazer-nos transbordar de gozo eencher-nos de alegria?”. 

     A convicção da absoluta inamissibilidade da nossa salvação descansa sobreo imutável caráter de Deus. De conformidade com os cânones de Dort “nossasalvação não depende de nossa obediência incerta. Ela tem a garantia do propósitoimutável de Deus que se revelará em nossa obediência; por isso, podemos ter acerteza de nossa salvação” (Mt 24.22,24; Rm 8.29,30; 9.11; Ef 1.4-5; 2ª Tm 2.19; Hb

    6.17).

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    Declinei de minha formação arminiana no ano de 1986, quando realizei umestudo independente do loci “soteriologia” –  sem o filtro dogmático de minhadenominação (Assembleia de Deus)  –  perturbado pelas implicações teológicasadvindas da adoção do semisinergismo. Ou seja, como permanecer numadenominação com estreita afinidade com os postulados de uma salvação amissívelque caracterizam o romanismo?

     A antropologia adotada pela dogmática pentecostal retrata o homem, de umaperspectiva tão mais elevada e otimista, que quase seria possível equipará-lo àconfiguração que lhe atribui a Renascença (medida de todas as coisas) e depois,aos paradigmas do Iluminismo (paixão pela suficiência da natureza humana).

     A posição monergista, dogmatismos à parte, parece espelhar fidedignamente,o ensino bíblico, lastreado nos fundamentos da fé apostólica e nos diversos

    símbolos da fé reformada. Por motivos óbvios, tal convicção foi determinante parameu desligamento daquela denominação, e posterior adesão de outra grei, decaráter calvinista.

    Especialmente Berkhof e Alfredo Borges Teixeira influíram, decisivamente namudança de minha postura. A literatura do teólogo batista, Dr. Anibal Pereira Reis,contribuiu, também para consolidar minha convicção monergista, notadamenteatravés de duas obras, a saber: O crente pode perder a salvação? e Católicos pentecostais e pentecostais católicos – essa não!

    Em terceiro lugar, nossa salvação se efetiva, exclusivamente na pessoa deJesus Cristo. Agostinho entende que “à parte do Filho, ninguém seria digno daeleição. Por isso, Jesus Cristo é o eleito de Deus”. Comentando o texto de Ef 4.12,Calvino escreveu: “Uma evidência da eleição repousa em nossa comunhão comCristo; a garantia de nossa eleição está nele, na sua obra eficaz: „nossa verdadeiraplenitude e perfeição consiste em estarmos unidos no Corpo de Cristo‟”. 

    Em quarto lugar a salvação é graciosa e incondicional. Na interpretação deCalvino “a eleição não é condicionada ou dependente de „boas obras‟ nossas, de féou mesmo da previsão da fé, mas do beneplácito de Deus que se opõe totalmenteàs obras praticadas por nós” (At 13.48: Rm 9.11,16,23; 11.4-7; Ef 1.7,12; 2ª Tm 1.9;1ª Pd 1.2).

    Em quinto lugar, Costa assevera que “Deus determina os fins e os meios: eleelege os seus e, no tempo próprio, os regenera, dando-lhes um novo coração;atraindo-os, de forma graciosa e irresistível, para si; capacitando-os a respondercom fé à sua vocação”. Calvino ensina que “o Senhor chama eficazmente só oseleitos” – grifo meu.

    Em sexto lugar, a salvação é pessoal e concreta e não se enquadra nacategoria do abstrato. A propósito, Calvino registrou: “a eleição de Deus é pessoal eintransferível, conduzindo cada eleito à transformação espiritual pelo Espírito (...).

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    Portanto, a Igreja é a comunidade daqueles que foram eleitos por Deus, tendo seusnomes escritos no livro da vida” (Is 4.3; Dn 12.1: Lc 10.20; Fp 4.3; Ap 3.5).  

    Em sétimo lugar, a salvação é perfeitamente justa. Tendo em vista a

    universalidade do pecado e a voluntariedade do pecador, Deus poderia aplicar aSua justiça e condenar a todos. Para Calvino “Deus não devia misericórdia aninguém”. Ele não é obrigado a ser misericordioso: Deus olha para nossa miséria enos ajuda, porque assim decidiu fazer. E Agostinho acrescenta: “Se todosrecebessem a punição, ela não seria injusta”. 

    Os propósitos da eleição começam pela “fé na verdade” (Ef 1.13) , a qualredunda em serviço ao próximo e a Deus (Ef 2.10; 2ª Tm 2.21; 1ª Pd 1.2). Aevidência da eleição pode ser vislumbrada no amor abnegado e laborioso em prol dopróximo (Ap 14.13) e na humildade que reconhece a total dependência de Deus, no

    tocante a nossa salvação; a este respeito, Spurgeon pondera: “Desconheçoqualquer outra coisa que nos possa humilhar tão profundamente quanto a doutrinabíblica da eleição (...). Aquele que se sente orgulhoso de sua eleição é porque não éum dos eleitos do Senhor” (Ef 2.9; 1ª Co 4.7; 2ª Co 3.5). 

    Outros objetivos da eleição são o nosso amor a Deus que se revela mediantenossa obediência aos seus preceitos (Jo 14.21,23) e a santificação (transformaçãomoral e metafísica do ser), a qual visa produzir em nós a imagem de Deus (Rm 8.29;Ef 1.4), tornando-nos irrepreensíveis em santidade.

    Visando à consumação da eleição, é concedida aos santos a graça daperseverança, para promover a glória de Deus. Jesus, o grande Pastor, não perderá,sequer , uma de Suas ovelhas (Jo 10.28,29).

    Três das principais objeções, levantadas pelos que contraditam a doutrina dapredestinação, tem a ver com o antinomismo, como prática de vida, a negligênciadas disciplinas cristãs e do esforço evangelístico. Tais impressões são infundadas eembasadas em preconceitos teológicos míopes. Calvino observa que “nenhumanação da Terra e nenhuma classe social são excluídas da salvação, visto que Deusquer oferecer o evangelho a todos sem exceção”, enquanto Kuyper acrescenta: “Aeleição requer a evangelização (...)”. 

    Quanto a afirmação de que, a doutrina acarreta um viver licencioso edesregrado, Paulo a refuta em Ef 1.4, onde explicita que o propósito da eleição étornar-nos “santos e irrepreensíveis”. 

    Rematando, devemos reconhecer, como Calvino o fez, que esta doutrina daeleição é uma das mais consoladoras!: “Deste modo, a doutrina da eleição (...)configura-se um meio eficaz para o nosso fortalecimento na fé, na certeza de que,apesar de nossas fraquezas e de nossas deficiências, Deus nos elegeu antes dostempos eternos e nos confirmará até o fim, em santidade ( grifo meu). Nossa eleiçãodescansa em Deus, e isto nos basta”. 

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    Costa explora o pensamento calvinista sobre a grandeza e a dignidade dohomem, como contraponto às deturpações da imagem do homem, consolidadas naRenascença e no Iluminismo, os quais quase chegam ao absurdo de “deificar ohomem” –  centro e medida de todas as coisas. Dessa cosmovisão totalmenteabrangente e contextualizada, emerge uma antropologia bíblica e equilibrada.

    Destarte, apesar, da radical corrupção decorrente do pecado, o homem, napercepção de Sófocles “é o milagre mais portentoso de todos”, e, segundo Calvino:“a obra-prima de Deus. (...) Deus nos criou e „pôs neste mundo para ser glorificadoem nós‟. E é coisa justa que toda nossa vida se destine à sua glória”.

     A Renascença foi o “tempo do homem” tanto quanto a Idade Média foi “otempo de Deus”, e, a seguir, irrompeu a era do Iluminismo, que durou 150 anos(1650-1800). Uma das características fundamentais do Iluminismo foi o retorno à

    razão, preterindo a revelação.

    O “homem racional” é o centro do universo, “a medida de todas as coisas” e,“a  razão é o seu instrumento de medição e cânon da verdade”. Segundo Costa, oIluminismo invadiu “os domínios” da ética, da epistemologia, da política e da religião,tendo como “elemento aferidor” a razão autônoma. 

    O homem moderno, em sua pretensa autossuficiência, pensa que podecontrolar todas as coisas. No lugar, antes ocupado por Deus, agora estãoentronizadas a razão e a ciência. Deus se torna uma “hipótese desnecessária” e, até

    mesmo incômoda”, percebe Costa. 

    Para Francis Schaeffer, “a Reforma  foi revolucionária porquanto se apartoutanto do Humanismo católico-romano como do secular”. 

     A história revela que Calvino teve formação humanista primorosa, mas não sedeixou secularizar. A visão antropológica de Calvino se consuma a partir daperspectiva bíblico-teológica: “é evidente que o homem jamais chega ao puroconhecimento de si mesmo até que haja, antes, contemplado a face de Deus, e davisão dEle, desça a examinar a si próprio”. 

     A dignidade e a beleza do homem residem no fato de ter sido “criado  àimagem e semelhança de Deus (...) no homem, a imagem e a glória de Deus,peculiarmente, brilham – diz Calvino”. 

     A Teologia Reformada concebe que os termos “imagem” e “semelhança” sãointercambiáveis, e se referem aos atributos comunicáveis que Deus, na criação,compartilhou com o homem. Tão sublime foi a criação do homem, que exigiu um“conselho privado da Trindade” - explícito no “façamos”. 

    Mesmo após a queda, o homem irregenerado preserva, ainda quecorrompida, a imagem de Deus: “Pelo que, embora concedamos que a imagem de

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    Deus não tenha sido nele aniquilada e apagada de todo, foi, todavia, corrompida atal ponto que, o que quer que reste, é horrenda deformidade – Calvino”. 

    No bojo da perspectiva iluminista surge uma religião humanista, limitada pelo

    concreto, e, centralizada na ideia do homem dotado de inerentes potencialidades.Deus é representado pelo estereótipo de um “sentimento teísta  autoritário (...) nosecularismo, a criatura assume o lugar de Criador (Rm 1.25). Deus é descartado ou,no mínimo, colocado em lugar decorativo, onde Sua presença não é notada nem suafalta sentida; temos, assim, um ateísmo prático”. 

    “(...) O Iluminismo, sob muitos aspectos, trouxe não a luz, mas as trevas. Elepropôs uma autonomia que jamais poderia ser alcançada, pois a genuína  autonomiaexige a coragem da “teonomia”, a submissão aos princípios de Deus, expressos emSua Palavra. Sem o discernimento concedido por Deus, não temos condições de

    avaliar nossa época e apresentar a resposta cristã ao desespero do homem semDeus e sem valore definidos (...) Portanto, a esperança para o mundo, em últimainstância, não está na ciência, mas nos homens fieis a Deus (...) Deste modo, aIgreja, como luz do mundo e sal da Terra, se constitui em uma bênção inestimávelpara toda a humanidade”. 

    Outro campo em que a influência de Calvino ainda se faz sentir, em todo oOcidente, é a revolução pedagógica da educação. Mas foi com a fundação da Academia de Genebra, em 5 de junho de 1559, com apenas cinco professores – um

    deles o próprio Calvino  – que a Reforma obliterou, definitivamente as metodologiasarcaicas do escolasticismo. Mais tarde, os pioneiros puritanos, 6 anos após suachegada à América, fundaram em Massachussets a Escola, hoje Universidade deHarvard, demonstrando a visão holística que Calvino incutiu nos reformados.

    Segundo o autor “a ignorância era algo extremamente temido dentro domodelo educacional reformado-puritano. O estudo era amplo, oferecendo uma visãoabrangente de todos os ramos do saber, evitando a dicotomia entre o saber religiosoe o não-religioso, o espiritual e o natural. (...) o Estado de Massachussets decretou aobrigatoriedade de uma escola primária, sempre que uma povoação agrupasse mais

    de 50 lares (...) Por trás desse ardor pedagógico e social da Reforma, estava umfirme fundamento teológico. Esta perspectiva ampara-se em um conceito de Deus,do homem e do propósito do homem nesta vida (...)”. 

    Na frente germânica, Lutero empenhou-se a convencer as autoridades paraque criassem escolas, com vistas à educação secular e eclesiástica. Melanchton – obraço direito de Lutero é considerado, por muitos o “preceptor da Germânia”, e seuMinistro da Educação.

    Um dos desideratos do Evangelho era o de educar crianças e jovens; Lutero

    insistiu que “a instrução é bem-vinda, tanto no reino de Deus como no reino domundo”. Num sermão pregado em 1530, Lutero exortou o Estado a obrigar ascrianças a irem à escola: “Se podem obrigar os súditos capazes de carregar lanças

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    e arcabuzes (...) quanto mais podem e devem obrigar os súditos a mandarem osfilhos à escola. Porque aqui se trata de uma guerra pior, a guerra contra o diabo,cujo propósito é sugar cidades e principados, esvaziando-os das pessoascapacitadas, deixando apenas uma casca vazia de pessoas inúteis, as quais podemanipular e usar a seu bel-prazer”. 

     Antes de ser um teólogo, Calvino fora um humanista – e dos refinados! Costadiz-nos que “a sua filosofia de ensino reflete sua apurada formação e maturidadeintelectual, dentro de um referencial que partia das Escrituras, tendo a soberania deDeus como princípio orientador e a glória de Deus, como o fim de todas as coisas,inclusive de nosso saber”. Assim como Lutero, em 1536 Calvino apresentou umprojeto educacional gratuito, obtendo grande apoio popular (...) Calvino nãoconcebia uma Academia distante da Igreja; antes, sustentava dois princípios

    fundamentais: a unidade da Academia e a união íntima dela com a Igreja.O historiador Charles Borgeaud registrou: “esta (a Academia) foi a primeira

    fortaleza da liberdade nos tempos modernos”. A Academia contribuiu para fazer deGenebra “um dos faróis do Ocidente”, admite Daniel-Rops (...) “Deus fez deGenebra, sua casa do pão”. 

    Calvino, indubitavelmente, foi quem melhor compreendeu a abrangência dasimplicações do Evangelho, nas diversas facetas da vida humana (...) Por isso, eleexerceu poderosa influência sobre a Europa e Estados Unidos; Schaff arrisca dizer

    que “Calvino de certo modo, pode ser considerado o pai da Nova Inglaterra e daRepública Americana”. 

    Outro expoente de primeira grandeza, na área da educação, foi o imortal João Amós Comênio (1592-1670), nascido na Morávia. Sua vida atribulada não pôdebarrar-lhe o ímpeto criativo e inovador. Perdeu os pais e as irmãs aos doze anos,tendo sido criado por uma tia paterna. Sua esposa grávida e seus dois filhos foramvitimados pela peste.

    Considerado o “Pai da didática Moderna” e da gênese do método audiovisual ,escreveu mais de 140 tratados, voltados para a educação, um deles a DidáticaMagna - é a sua opus magnum.

    Costa sumariza a singular envergadura e a relevância de Comênio, nosseguintes termos: “Sua grandeza se manifesta também no fato de ser um espí ritoluminoso em uma época trágica. (...) Em um tempo histórico tão carregado detensões e destruições, Comênio empenhou-se na renovação da cultura e dasociedade, colocando no centro o papel criativo da educação”.

    Prossegue o autor em seu relato: “Foi o filósofo da educação e o educadormais importante do século XVII, e, um dos mais importantes de toda a história. Suaobra exerceu grande influência, durante sua vida, e, especialmente nos séculosposteriores, sendo um dos incentivadores da Escola Pública. Ele buscou

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    fundamentar a educação de forma científica, conseguindo, pela primeira vez, comque tivesse autonomia em relação à Filosofia e à Teologia”. 

     A utopia que inspirou sua vida foi o sonho de ver toda humanidade unida

    como uma grande família, tendo em comum, língua, educação e governo.

     A cosmovisão teológica de Comênio é que fundamentava sua perspectivapedagógica - ele entendeu que fomos criados para a eternidade: “Porquepertencemos à eternidade é necessário que esta vida seja apenas uma passagem”. 

    Um dos pontos nevrálgicos do Calvinismo é a ética do trabalho, o qual, porsua vez é a mola propulsora determinante do progresso, onde quer que oProtestantismo se tenha radicado.

     A contundência histórica do Protestantismo reside no fato de que, enquantofenômeno histórico-cultural multifacetado, o mesmo representa um fermento queleveda, globalmente, a massa social, na qual se haja inserido. Funciona como umcatalisador que acelera e aprofunda, de modo radical a transformação dassociedades, representando um sine qua non do progresso.

    Equivocadamente, muitos intelectuais, dos mais diversos matizes do saber,têm conferido a Calvino o estigma de “pai do capitalismo”. Delumeau capta o essedesvio conceitual, pervertedor do propósito original do reformador, ao afirmar: “Naverdade, o Protestantismo não engendrou em seus fieis a mentalidade capitalista, a

    não ser na medida em que perdeu seu tônus religioso e se tornou infiel a Calvino”. 

    Costa sumariza o pensamento ético dos reformadores da seguinte forma: “Naética do trabalho, Lutero e Calvino estavam de acordo quanto à responsabilidade dohomem de cumprir sua vocação por meio do trabalho. Não há lugar paraociosidade”. O autor pinça uma citação, ipsis litteris, de Calvino, que vem validarsua afirmação: “Quando quis Deus que o homem se aplicasse a cultivar a terra, napessoa do homem, condenou Deus a ociosidade e a indolência. Portanto, nada émais contrária a ordem da natureza que consumir a vida, comendo, bebendo edormindo”. Costa conclui: “Com isto, não se quer dizer que o homem deva ser um

    ativista, mas que o trabalho é uma „bênção de Deus‟”. 

    Costa importa de Raymond Ruyer a noção de que “o trabalho deve tersempre um sentido axiológico”, explicitando que “o ser, como não pode se limitar aosimples fazer, está sempre à procura de novas criações, que envolvem trabalho. Notrabalho, o homem concretiza a sua liberdade de ser (...) o homem foi criado para otrabalho, não para permanecer na inatividade e na indolência (...) No trabalho,expressamos e aperfeiçoamos nossa humanidade. Deixar de trabalhar significadeixar de utilizar parte da sua potência” – pondera o autor. E acrescenta: “Em outraspalavras, seria uma desumanização”. 

    Foi num 27 de janeiro; o ano: 1983. Pouco antes da meia-noite, Deus,graciosamente, presenteou-nos, com o nascimento de nosso primeiro filho. Pernoitei

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    na Maternidade São Paulo, para ajudar minha esposa no que preciso fosse,inebriado com a imagem do André, enfeitiçando meus olhos de pai. Solícito, nãopreguei os olhos, apesar do dia intenso de trabalho. Tinha em mãos, um livro,adquirido com meus parcos recursos, na Casa da Bíblia: “João Calvino era assim”de Thea B. Van Hanselma.

    Li com sofreguidão a primeira página, a segunda, a terceira...quando meapercebi, já estava para além da metade, enquanto as primeiras luzes da aurorarabiscavam o céu, de dourado. Aprouve à graça de Deus, colocar aquela biografia,tão despretensiosa, em minhas mãos – a paixão decorrente fulminou-me, foi amor àprimeira vista. Naquela madrugada Deus plantou uma “sede de Calvino” emminh‟alma.

    Hanselma convenceu-me do “quem” seria Calvino, mas uma irrefreável

    indagação me permeou, a partir dessa percepção inicial  – a grandeza de Calvino éaxiomática – mas, por que nunca ouvi a seu respeito nas ministrações oferecidas emminha Igreja? Calvino, de fato, teria sido tão relevante quanto, o declarava o autordaquele livro?

     Ao concluir a leitura de João Calvino  –  500 anos: introdução ao seu  pensamento e obra, do eminente e preclaro Dr. Herminsten Maia Pereira da Costa,vejo-me tão deslumbrado quanto a rainha de Sabá, na corte do rei Salomão: “(...)não me contaram nem metade da tua grandeza...”. 

     Apesar do curto convívio com Costa (apenas uma semana), eu e meuscolegas, pudemos constatar que a grandeza se faz, na forja da humildade.

     Afloram as minhas deficiências e limitações intelectuais, decorrentes deminha formação precária; a despeito disso, agradeço a meu Salvador, o privilégio deter aprendido com Dr. Herminsten e de poder oferecer, essa curta digressão sobre avida, obra e pensamento do reformador de Genebra.

    Prefiro, porém,, que outros pensadores, de melhor quilate testemunhem sobreo peso e a relevância do pensamento de Calvino para a civilização ocidental: “É

    evidente que o Calvinismo é um sistema perfeito, com ensino sobre todos osaspectos da verdade” – D. M. Lloyd-Jones;

    “O Calvinismo deixou uma marca profunda mesmo naqueles que contra elese revoltaram” – J. D. Douglas;

    “Calvino pertence, incontestavelmente, ao pequeníssimo grupo de mestres que, nodecorrer dos séculos, moldaram com suas mãos o destino do mundo” –  Daniel-Rops.

    Costa sumariza a essência do pensamento reformado nos seguintes termos:“O pensamento reformado reafirma como ponto de partida o Deus soberano etranscendente que se revela na Escritura; somente, a partir dessa compreensão,

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    podemos entender a chamada realidade e atuar, de forma criativa, para a glória deDeus e o bem-estar da humanidade (...) Desta forma, o Calvinismo tem uma fé que,por graça, ultrapassa em muito os limites de nossa racionalidade; mas também éuma fé operante que crê, que somos os instrumentos ordinários de Deus, paraconstruir, transformar e aperfeiçoar a cultura”. 

    Tauney (1880-1962) observa: “O Calvinismo foi uma força ativa e radical. Eraum credo que buscava não meramente purificar o indivíduo, mas reconstruir a Igrejae o Estado, e renovar a sociedade, permeando todos os setores da vida, tantopúblicos como privados, com a influência da religião”. 

    H. Richard. Niebuhr assevera: “O Cristianismo conforme entende o calvinista – não é acomodação na cultura; antes, é formação e transformação por meio demudança de perspectiva da realidade, que redunda, necessariamente, em mudança

    nos cânones de comportamento, alterando sensivelmente as suas agendas epraxes. Assim sendo, nossa fé tem compromissos existenciais inevitáveis. Serreformado não é apenas um status nominal vazio de sentido, mas reflete nossa féem atos de formação e de transformação”. 

    Se Calvino pudesse visitar nossas igrejas, investigar as praxes dos EstadosDemocráticos atuais, os vieses ideologizados que orientam a educação de nossosfilhos, a decadência ético-moral de muitos “membros de igreja”  –  inclusive “algunsministros venais” e a avassaladora corrupção e dissipação de valores da sociedade

    pós-moderna, o que diria ele? É imperioso, pois, retornar aos princípios da boa féreformada; haverá ainda tempo? Ou já estaremos sob o inexorável juízo divino?