HISTÓRIA DO PARANÁ: FORMAÇÃO E PRÁTICA DOCENTE … · 4 Saviani “as fontes estão na origem,...

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1 HISTÓRIA DO PARANÁ: FORMAÇÃO E PRÁTICA DOCENTE NO ENSINO FUNDAMENTAL I Carla Michele Ramos Torres (IFPR - Campus Irati) Resumo Nos anos iniciais do ensino fundamental público, os professores geralmente possuem muitas dificuldades na compreensão dos conteúdos de História, principalmente devido ao fato de não terem graduação nesta área de conhecimento. Essa afirmativa, constatada na rede municipal de educação de Irati-PR, deu origem ao Curso de Extensão: Ensino e História do Paraná, promovido em 2015, pelo Instituto Federal do Paraná, para o público docente do 4º ano. Esse curso consistiu em aulas teóricas sobre conteúdos específicos da história paranaense; visitas- guiadas em parques históricos e museus; leitura e análise de fontes e bibliografia; e finalmente a elaboração de materiais pedagógicos ou atividades educacionais a partir da temática. No intuito de divulgar essa formação docente, este artigo pretende apresentar detalhadamente as diferentes etapas desse trabalho e de modo especial os seus resultados práticos a fim de compreender os limites e avanços no que diz respeito à pedagogia histórico-crítica, fundamentação teórica que orienta a proposta curricular de ensino da cidade. O projeto permitiu concluir a imensa necessidade de formação continuada em história para professores da primeira etapa do Fundamental; bem como a potencialidade interdisciplinar na produção de saberes, tendo como área central a História; e finalmente os principais entraves internos e externos à promoção de atividades de ensino-aprendizagem diferenciadas na educação pública. Palavras-chave: Ensino Fundamental; História do Paraná; Formação Continuada; Prática Docente. 1 Introdução Uma das missões do Instituto Federal do Paraná (IFPR) é a promoção da educação profissional e tecnológica, pública e de qualidade, do ensino básico ao ensino superior atendendo também áreas de formação inicial e continuada em diferentes áreas do conhecimento. Por meio do ensino, da pesquisa e da extensão a instituição pretende colaborar com os arranjos produtivos, sociais e culturais locais

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HISTÓRIA DO PARANÁ: FORMAÇÃO E PRÁTICA DOCENTE NO ENSINO FUNDAMENTAL I

Carla Michele Ramos Torres (IFPR - Campus Irati)

Resumo

Nos anos iniciais do ensino fundamental público, os professores geralmente possuem muitas dificuldades na compreensão dos conteúdos de História, principalmente devido ao fato de não terem graduação nesta área de conhecimento. Essa afirmativa, constatada na rede municipal de educação de Irati-PR, deu origem ao Curso de Extensão: Ensino e História do Paraná, promovido em 2015, pelo Instituto Federal do Paraná, para o público docente do 4º ano. Esse curso consistiu em aulas teóricas sobre conteúdos específicos da história paranaense; visitas-guiadas em parques históricos e museus; leitura e análise de fontes e bibliografia; e finalmente a elaboração de materiais pedagógicos ou atividades educacionais a partir da temática. No intuito de divulgar essa formação docente, este artigo pretende apresentar detalhadamente as diferentes etapas desse trabalho e de modo especial os seus resultados práticos a fim de compreender os limites e avanços no que diz respeito à pedagogia histórico-crítica, fundamentação teórica que orienta a proposta curricular de ensino da cidade. O projeto permitiu concluir a imensa necessidade de formação continuada em história para professores da primeira etapa do Fundamental; bem como a potencialidade interdisciplinar na produção de saberes, tendo como área central a História; e finalmente os principais entraves internos e externos à promoção de atividades de ensino-aprendizagem diferenciadas na educação pública.

Palavras-chave: Ensino Fundamental; História do Paraná; Formação Continuada; Prática Docente.

1 Introdução

Uma das missões do Instituto Federal do Paraná (IFPR) é a promoção da

educação profissional e tecnológica, pública e de qualidade, do ensino básico ao

ensino superior atendendo também áreas de formação inicial e continuada em

diferentes áreas do conhecimento. Por meio do ensino, da pesquisa e da extensão a

instituição pretende colaborar com os arranjos produtivos, sociais e culturais locais

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visando a transformação social. No sentido de cooperar com a rede municipal de

educação de Irati no Paraná (PR), no que diz respeito à capacitação docente do

Ensino Fundamental I, o IFPR-Campus Irati ofertou em 2015 o curso de extensão

Ensino e História do Paraná para professores do quarto ano.

A oferta do curso de extensão citado foi desdobramento de uma parceria

entre IFPR-Campus Irati e Secretaria Municipal de Educação que vem se

fortalecendo ao longo dos últimos três anos na cidade, principalmente com a

proposição de formação continuada nas áreas de interesses e necessidades

levantadas pelos educadores da rede educacional do município. No intuito de

divulgar o trabalho realizado no universo acadêmico, o presente artigo apresenta as

diferentes etapas desse projeto de capacitação, bem como alguns resultados

práticos construídos pelos professores à luz dos pressupostos teóricos da pedagogia

histórico-crítica que fundamenta a Proposta Curricular de Ensino da cidade.

As instituições de ensino públicas federais, situadas em regiões interioranas

como é o caso do IFPR-Campus Irati, devem estabelecer parcerias com as

secretarias de educação para promover espaços de interação de conhecimentos

científicos. Os cursos de capacitação docente só serão eficazes para professores e

alunos se a instituição formadora buscar conhecer a realidade dos sujeitos

envolvidos e isso significa elaborar estratégias baseadas nos fundamentos teóricos

e metodológicos da proposta curricular de ensino institucional, na prática docente e

nas particularidades dos espaços escolares. Desse modo, acredita-se que essa

discussão no espaço acadêmico pode suscitar novos olhares para o processo de

ensino e aprendizagem histórico nas séries iniciais do Ensino Fundamental, tanto no

campo da formação docente como no campo da prática profissional.

2 Ensino e História do Paraná: da teoria à prática

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O curso de extensão Ensino e História do Paraná foi concebido a partir dos

pressupostos teóricos da Pedagogia Histórico-Crítica, fundamentação presente na

proposta curricular de ensino do município de Irati-PR. Primeiramente o projeto

concebe a educação como uma das mediações do trabalho e acredita que a

educação tem um papel fundamental no processo de transformação social apesar

de não ser capaz de isoladamente revolucionar as estruturas econômicas e sociais

existentes. Em relação à ciência História, esta é compreendida como a área do

conhecimento que estuda o homem no seu tempo e espaço. Mas o que está em

foco não é o homem singular, exclusivamente masculino, político e abastado

economicamente, como muitas vezes a corrente filosófica positivista do século XIX

priorizou, e sim os sujeitos em suas múltiplas atividades sociais, nos seus diferentes

espaços geográficos e temporais, em esferas privadas e públicas, observados

historicamente e materialmente pelas lentes dos pesquisadores e através da maior

variedade de fontes.

O historiador ao situar-se diante do passado nada mais pretende que ser

membro de uma comunidade, pois, o “passado é, portanto, uma dimensão

permanente da consciência humana, um componente inevitável das instituições,

valores e outros padrões da sociedade humana” (HOBSBAWM, 1998, p. 22).

Portanto, as contradições do tempo presente levam o historiador a inclinar-se para

um instante do passado na busca de analisar a relação do ontem e do hoje e

identificar as transformações ocorridas e as possibilidades atuais de mudança. O

professor em sala de aula, ao selecionar um conteúdo de história do Paraná, por

exemplo, o faz a partir de suas problemáticas contemporâneas e por acreditar que

esse conteúdo poderá de alguma forma ajudar no processo de construção do sujeito

histórico. Nesse processo é necessário que o profissional da educação tenha amplo

conhecimento desses conteúdos, da historiografia e da realidade educacional em

que os seus alunos estão inseridos. Para tal empreendimento, o docente precisa

selecionar também as fontes históricas e não utilizá-las como verdades em si e sim

historicizá-las em consonância com o objeto de estudo e os objetivos da aula. Para

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Saviani “as fontes estão na origem, constituem o ponto de partida, a base, o ponto

de apoio da construção historiográfica que é a reconstrução, no plano do

conhecimento, do objeto histórico estudado” (2004, p. 5). Logo, a seleção de fontes

a serem trabalhadas em sala de aula deve ser realizada a partir da acessibilidade,

da funcionalidade e da relação teoria e prática.

A proposta curricular da rede de educação municipal de Irati-PR assume

enquanto concepção teórica a Pedagogia Histórico-Crítica, que segundo o

documento supera e resiste a ideologia dominante e assegura aos seres humanos a

“apropriação dos conhecimentos sistematizados, bem como o desenvolvimento de

uma concepção mais elaborada de mundo para que o indivíduo possa atuar na sua

transformação e, consequentemente, na transformação social” (2009, p. 35).

Observa-se que a prática social é historicamente situada no processo de ensino-

aprendizagem, portanto, a ciência história torna-se conhecimento fundamental na

formação política e cultural desses sujeitos.

Para Gasparin “o professor e o aluno são mediadores fundamentais entre

aprendizagem escolar e o desenvolvimento intelectual do aluno” (2002, p. 27).

Portanto, a aprendizagem ocorre através da interação social no momento em que

tanto professores quanto alunos estão ligados diretamente ao processo de ensino e

aprendizagem. Assim, a prática social se coloca como início e fim da prática

educativa. Logo, a ciência história ganha profundas dimensões, pois o professor ao

trabalhar com a realidade local, com os vestígios históricos do universo do estudante

e por meio da problematização pode concretizar uma educação que seja

efetivamente histórica, crítica e transformadora.

O planejamento do curso de extensão, Ensino e História do Paraná, ocorreu

a partir das concepções teóricas descritas, pois entre os objetivos estava conhecer a

história paranaense, analisar como essa história está sendo escrita ao longo do

tempo, refletir como esses conteúdos são trabalhados em sala de aula e finalmente

elaborar estratégias de ensino e aprendizado histórico com base na realidade

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escolar. O projeto teve a duração de 120 horas, distribuídas em encontros

presenciais com aulas sobre História do PR; orientação in loco para planejar ações

de ensino; visitas guiadas em museus, galerias e espaços históricos em Curitiba,

Castro, Carambeí e Lapa; leitura e análise de bibliografias e fontes históricas;

confecção de materiais pedagógicos e atividades educacionais apresentados no III

Seminário de Educação de Irati-PR. O curso teve a participação de 29 profissionais,

sendo 27 docentes de 18 unidades escolares municipais de Irati1 e duas servidoras

lotadas na Secretaria de Educação Municipal.

Os encontros presenciais ocorreram mensalmente e os conteúdos

ministrados, por meio de aulas expositivas-dialogadas e análise de fontes históricas

e leituras prévias de bibliografias históricas, versaram sobre a colonização europeia

do território paranaense nos séculos XVI e XVII; populações indígenas e africanas

no PR; imigração europeia e asiática; processo de emancipação do PR e os anos de

província; aspectos econômicos e sociais do PR entre os séculos XVI ao XX; cultura

e política no PR no século XX e finalmente os aspectos contemporâneos do nosso

estado.

A maioria dos professores-cursistas são licenciados em pedagogia e muitos

relataram que os conhecimentos históricos que dominavam advinham do

planejamento de aulas com base nos livros didáticos. Esse foi um dos maiores

desafios durante a exposição e debates dos conteúdos, pois boa parte dos

professores da rede municipal não tinha acesso a alguns conceitos e metodologias

específicos da ciência história, como, por exemplo, o trabalho com fontes históricas

e a prática de relacionar o passado e o presente.

Durante o projeto verificou-se que o livro didático é a matriz do

conhecimento das aulas ministradas e raras são as vezes que os docentes

introduzem outros materiais de apoio. Os livros de História do Paraná possuem

1 A participação das escolas no Curso de Extensão correspondeu cerca de 60% das unidades escolares municipais de Irati.

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várias imagens e textos, que podem ser explorados como vestígios históricos,

porém, devido a falta de noções específicas do manejo de fontes historiográficas,

essas mesmas imagens e textos, muitas vezes são tratados como ilustrações sem

nenhum tipo de questionamento em relação ao contexto de sua produção e aos

indivíduos retratados ou ausentes nesses documentos. No que diz respeito à relação

passado-presente, os acontecimentos históricos geralmente são abordados

cronologicamente sem problematização e análise das permanências e rupturas.

A partir destas constatações, priorizou-se no curso de formação o trabalho

com fontes históricas nos encontros presenciais e levantamento de material

bibliográfico (artigos, dissertações e livros) como material complementar para o

planejamento de atividades educacionais. O uso de instrumentos audiovisuais, como

cenas de filmes e documentários, reportagens jornalísticas e músicas também fez

parte da metodologia do curso. Uma das propostas era romper com a transmissão

de conhecimento, com a ideia de decorar datas e nomes e com o isolamento

científico. Ao contrário disso, o projeto pretendeu capacitar os docentes para

proporem aulas mais dialogas e dinâmicas, levando em consideração o contexto dos

alunos, bem como a busca pela interdisciplinaridade, uma vez que o currículo dos

anos iniciais do Ensino Fundamental proporciona tal prática.

Além das aulas teóricas os docentes da rede municipal realizaram três

saídas de campo para conhecer espaços culturais e o patrimônio histórico

paranaense. Na primeira viagem em Curitiba tiveram a oportunidade de visitar o

Museu Paranaense, Museu Oscar Niemeyer, Museu do Expedicionário e o Mercado

Municipal. Nesses locais observaram diferentes fases da história regional e nacional

e apreciaram obras artísticas. A segunda excursão ocorreu em Carambeí e Castro,

cidades em que puderam conhecer maiores detalhes da imigração europeia, como

no caso do Parque Histórico de Carambeí e Memorial de Imigração Holandesa na

colônia Castrolanda; do tropeirismo na Casa de Sinhara, Igreja Matriz e Museu do

Tropeiro no município castrense e por fim a história da Fazenda Capão Alto,

marcada pelo sincretismo religioso e étnico do período colonial e imperial brasileiro.

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Na viagem em Lapa, os professores constataram elementos da cultura tropeira e da

revolução federalista, ainda vivas nos monumentos e na memória da população.

As saídas de campo promoveram intercâmbio cultural e o contato direto com

os vestígios históricos e culturais relacionados à história brasileira. Segundo relatos

dos participantes, essa foi uma rica experiência de aprendizado e uma oportunidade

de refletir sobre a história paranaense para além do livro didático. Percebeu-se que

nessa etapa da formação ocorreu entre os cursistas uma maior valorização do

patrimônio local como objeto de estudo em sala de aula. Logo compreenderam o

sentido da pedagogia-histórico crítica ao privilegiar o contexto social dos estudantes

e ao estabelecer um processo de ensino que resgata os saberes sistematizados ao

longo dos tempos, no sentido de definir os saberes escolares.

3 Produção de saberes históricos na prática docente

No intuito de incentivar a elaboração de materiais pedagógicos e atividades

educacionais relacionadas com a história paranaense e servindo de apoio para

futuros educadores como metodologias de ensino, o curso de extensão Ensino e

História do Paraná proporcionou aos professores municipais do quarto ano do

Ensino Fundamental oficinas didáticas para a construção dessas práticas. Os

docentes receberam orientação in loco para discutir algumas possibilidades de

metodologias, a partir da realidade social, econômica e cultural da escola e dos

estudantes, pois esses elementos interferem no sucesso de qualquer prática de

ensino e aprendizagem que se propõe transformar o indivíduo e a sociedade. No

total de treze práticas educacionais, o presente artigo selecionou as ações em que

mais podem sem evidenciadas a interdisciplinaridade e a interação entre professor e

aluno no processo de construção dos saberes históricos.

A escola Antonina Panka através do Projeto Patrimônio Histórico de Irati,

promoveu um trabalho interdisciplinar entre História, Artes e Matemática, além de

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interagir com a comunidade externa. Os estudantes conheceram espaços da cidade

e foram incentivados a observar estes por meio do olhar histórico e não de turistas,

como estavam acostumados. Ao terem contato com essa variedade histórico-

cultural, partiram para a segunda etapa do trabalho que consistia em pesquisar os

principais grupos étnicos paranaenses e depois selecionar as etnias de suas

famílias. A montagem de gráficos sobre a descendência dos alunos e a

representação visual do patrimônio visitado expressou a possibilidade de

materializar a interação entre diferentes áreas do conhecimento. A finalização do

projeto ocorreu no pátio da instituição, local do jantar italiano oferecido aos pais e

aos alunos em que o cardápio, eleito pela turma a partir da etnia mais presente na

sala de aula, foi acompanhado de exposições artísticas e declamações poéticas.

Imagem 01: Fotos do Projeto Patrimônio Histórico de Irati. 2015. Acervo: Escola Antonina Panka, Irati, PR.

As professoras da escola Padre Wenceslau montaram um sarau e museu

móvel durante a VI Noite Cultural da instituição. O público apreciou dramatizações

sobre a cultura paranaense e exposição de objetos antigos selecionados pelos

alunos para compor o museu da turma. Além disso, os visitantes degustaram um

típico chimarrão da comunidade. Como o evento é de práxis, a atividade histórica se

alinhou a temática cultural e o planejamento e execução ocorreu com bastante

facilidade, segundo as cursistas.

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Imagem 02: Foto do Museu Itinerante. 2015. Acervo: Escola Padre Wenceslau, Irati, PR.

Na escola João Paulo II, os alunos das duas turmas de quarto ano foram

divididos em grupos para estudaram temas direcionados pelos professores. O

material de leitura consistiu em textos dos livros didáticos e sites de pesquisas,

atividades elaboradas nas aulas e em horários extras, pois a escola é de tempo

integral. Após os estudos e a descrições dos alunos, os textos foram reestruturados

e complementados pelos docentes. A coletânea que versa sobre diferentes períodos

históricos do Paraná, também possui ilustrações dos estudantes, uma prática que

expressa a produção coletiva do conhecimento.

Imagem 03: Páginas da obra: Coletânea de Textos da História do Paraná. 2015. Acervo: Escola João Paulo II, Irati, PR.

A escola Matilde Araújo do Nascimento elaborou um jogo de dominó,

enfatizando a história paranaense em ordem cronológica, informações geográficas e

literárias. Esse trabalho foi um desafio, pois nas primeiras orientações a professora

responsável selecionou imagens e dados de uso rotineiro nos livros didáticos e

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dessa maneira o dominó só se diferenciaria devido à metodologia e a concepção de

história narrativa, contemplativa e hierarquizada permaneceria. Portanto, uma das

propostas foi rever as imagens e procurar outras que ofertariam o mesmo conteúdo

e que tivesse relação com o contexto social da turma e que de certa maneira

problematizaria alguns assuntos a serem esmiuçados posteriormente em sala de

aula, como os direitos indígenas por educação, desmatamento, comunidades

quilombolas e cultura do mate.

Imagem 04: Peças do dominó histórico. 2015. Acervo: Escola Matilde Araújo do Nascimento, Irati, PR.

Os alunos das escolas João Maria Pedroso e João Batista Anciutti,

construíram um Dicionário de Palavras Indígenas e Africanas, atividade que

possibilitou conhecimento histórico sobre esses dois grupos étnicos e seu legado à

nossa sociedade, bem como maior desenvolvimento da oralidade e escrita na

Língua Portuguesa. Essa prática desenvolveu-se por meio de pesquisa, debates,

representações visuais, exposição oral e finalmente na sistematização das palavras

num dicionário ilustrativo. A preservação e valorização da cultura indígena e africana

foi o foco desse projeto, algo que precisa ser mais presente nas salas de aula em

qualquer período letivo, indo além da obrigatoriedade da Lei nº 11.645 de 2008. Vale

ressaltar que é fundamental os docentes rever o estudo das populações nativas e

dos povos africanos e seus descendentes numa comunidade marcada pela grande

presença de imigrantes europeus, como é o caso de algumas localidades da cidade

iratiense, principalmente nas regiões interioranas do município.

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Imagem 05: Páginas do Dicionário Ilustrativo. 2015. Acervo: Escolas João Maria Pedroso e João

Batista Anciutti, Irati, PR.

As práticas de ensino apresentadas demonstram a capacidade de

integração entre diversas áreas do conhecimento com a História, em especial com

Artes, Geografia e Língua Portuguesa. A interdisciplinaridade permite ao aluno

perceber os elementos comuns entres as ciências humanas, naturais e exatas,

potencializando suas inúmeras capacidades mentais e físicas. Os professores da

rede municipal de Irati lecionam nas turmas de quarto ano diferentes disciplinas,

exceto em alguns casos Artes e Educação Física, portanto, precisam ser

incentivados a integrar os conteúdos revelando a relação entre eles.

A pedagogia histórico-crítica fundamenta-se na concepção da educação

como um processo de trabalho, logo a escola tem a função de transmitir e assimilar

o saber sistematizado, algo imprescindível à sociedade (SAVIANI, 2000). Ao

compreender a educação como algo processual, os docentes passam a conceber os

alunos como seres ativos na construção dos saberes e desse modo podem elaborar

estratégias em que a participação desses sujeitos seja essencial. As leituras em sala

de aula, trabalhos coletivos entre professores e alunos, debates, confecção de

material pedagógico em que o estudante observa a materialidade de sua produção,

são práticas extremamente ricas na consolidação de uma educação alicerçada na

perspectiva da transformação.

Haja vista às condições de estrutura física das escolas municipais, limites de

materiais pedagógicos disponíveis aos docentes, planos de ensino fundamentados

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em teorias pragmáticas e a insuficiência de formação profissional específica aos

licenciados em pedagogia, verificou-se durante o curso de extensão Ensino e

História do Paraná a combinação de muitos esforços na produção de saberes

históricos alinhados aos pressupostos teóricos da pedagogia histórico-crítica.

Destaca-se, por exemplo, o papel da Secretaria de Educação Municipal em liberar

os professores para participar exclusivamente do curso no período escolar e no

custeio de transporte para as saídas de campo; também a dedicação dos docentes

na realização das atividades propostas e dos diretores de suas instituições que

ajudaram na efetivação dessas ações educacionais junto à comunidade escolar.

Finalmente o apoio do IFPR-Campus Irati, ao disponibilizar a docente de história

para a execução do projeto, bem como o financiamento de materiais pedagógicos2.

4 Considerações Finais

O curso de extensão Ensino e História do Paraná foi uma demanda

levantada pela Secretaria de Educação Municipal de Irati a fim de capacitar os

docentes da rede de ensino municipal do quarto ano do Ensino Fundamental em

relação aos conteúdos da história paranaense. Durante o desenvolvimento das

atividades, os professores foram desafiados a compreender o conhecimento

histórico a partir de outros parâmetros, como por exemplo, o trabalho com fontes e a

sistematização processual dos saberes. Vale ressaltar que somente a formação não

é capaz de efetivar uma mudança de postura profissional dos educadores, portanto,

concomitante a isso é fundamental que os mesmos tenham noções básicas dos

pressupostos teóricos da proposta curricular institucional, bem como condições

mínimas para concretização de práticas educacionais inovadoras, como

2 O IFPR-Campus Irati financiou a aquisição de seis banners ilustrativos sobre a história paranaense, entre os séculos XVI e XXI que constitui a exposição itinerante intitulada: Projeto de Extensão Ensino e História do Paraná. Esse material foi doado à Secretaria de Educação Municipal de Irati, a fim de

ser utilizado pelos professores como metodologia de ensino e percorrerá todas as escolas da cidade.

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disponibilidade de materiais pedagógicos, carga horária para tal empreendimento e

um currículo mais integrado ao contexto escolar.

Por meio desse projeto, concluiu-se que a rede municipal de educação de

Irati possui demanda de formação específica em diversas áreas do conhecimento,

uma vez que a maioria dos professores possui licenciatura em pedagogia e na sala

de aula há cada vez mais a necessidade de saberes específicos. Além disso, se

evidenciou a potencialidade interdisciplinar nos anos iniciais do ensino fundamental,

sendo a História como área central, principalmente com a área de Artes, Geografia e

Língua Portuguesa. Durante o curso de extensão, verificou-se vários entraves à

promoção de atividades de ensino e aprendizagem diferenciadas na educação

pública, sendo os principais: o monopólio do livro didático no planejamento e

execução das aulas; a escassez de capacitações que vinculem teoria e prática; a

dupla jornada de serviço; uma cultura escolar ainda muito enraizada na transmissão

dos conteúdos; um currículo bastante descontextualizado; carência de políticas

públicas na atualização dos educadores; e a precária infraestrutura de algumas

instituições no que diz respeito ao acervo bibliográfico, espaços de estudo e

laboratório de informática.

Entre os maiores resultados desse projeto de formação docente foi a nova

postura dos professores do quarto ano da rede municipal de Irati-PR na revisão de

suas metodologias de ensino e na seleção dos conteúdos históricos do Paraná.

Ademais, as práticas construídas e aplicadas em sala são exemplos concretos de

que é possível uma educação pública, de qualidade, fundamentada na pedagogia

histórico-crítica e voltada para a transformação do ser e da sociedade. Em relação

ao IFPR-Campus Irati, a instituição concretizou seu compromisso com a comunidade

local, intensificando parcerias educativas e cooperando na melhoria do ensino

público municipal. Por fim, conclui-se que cursos de capacitação profissional para

educadores estreitam as relações entre a escola e o mundo acadêmico, dando

sentido a este último como catalisador das reais exigências da prática docente e

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fomentador de ações pedagógicas alinhadas à realidade institucional e efetivas em

seus propósitos políticos-educacionais.

5 Referências

BRASIL. Lei 11.645, de 10 de março de 2008. Disponível em: ˂http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2008/lei/l11645.htm˃. Acesso em: 28 Jun. 2016. GASPARIN, J.L. Uma didática para a pedagogia histórico-crítica. Campinas, S.P.: Autores Associados, 2002. HOBSBAWM, Eric. Sobre História. São Paulo: Companhia das Letras, 1998. SAVIANI, Dermeval. Breves considerações sobre fontes para a história da educação. In. LOMBARDI, José Claudinei; NASCIMENTO, Maria Isabel Moura. Fontes, história e historiografia da educação. Campinas (SP): Autores

Associados, 2004, p. 1‐12. _______________. Pedagogia Histórico-Crítica: primeiras aproximações. 7 ed. Campinas, SP: Autores Associados, 2000. SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO DE IRATI. Proposta Curricular da rede municipal de ensino de Irati. Irati, 2009.