História Das Histórias Da Filosofia
-
Upload
abimael-borges -
Category
Documents
-
view
240 -
download
1
description
Transcript of História Das Histórias Da Filosofia
História das Histórias da Filosofia
Olavo de Carvalho
(Transcrito por Abimael Borges)
O propósito desta primeira aula é descrever qual o programa a cumprir,
mostrar quais são os limites, o perfil, do campo abrangido e dá uma ideia dos
fundamentos da ciência que nos ocupa no momento: História das Histórias da
Filosofia.
O título deste curso já é de algum modo o enunciado do problema que
nós trataremos de resolver no curso dessas aulas. Esse título contém duas
expressões que enunciam, por assim dizer, polos opostos duma realidade:
quando nós falamos de história essencial, por um lado nos referimos a algo
que é a história e por outro lado a algo que é essência.
Essência, como se sabe, é aquilo que uma coisa é conforme a sua
natureza, ou a sua constituição íntima, considerado desde o ponto de vista
lógico e independentemente das transformações temporais que ela possa
sofrer e independentemente até da sua existência ou não.
Então, considerado desde o ponto de vista essencial, Napoleão
Bonaparte já era Napoleão Bonaparte antes de nascer, continua sendo
enquanto viveu e é Napoleão Bonaparte até hoje, ou seja, a morte de Napoleão
Bonaparte não o transformou em outra pessoa. Então o ponto de vista da
essência é, por excelência, um ponto de vista supratemporal, portanto, supra
Histórico.
A palavra história, ao contrário, ela designa várias coisas: designa,
desde logo, a sucessão temporal dos acontecimentos, considerada
materialmente; designa, em segundo lugar, a ciência que estuda esta
sucessão; designa a própria dimensão temporal da vida humana e designa,
enfim, as obras, os livros escritos com a narrativa dos acontecimentos
históricos. Em todos esses casos, é evidente, há referência à ideia de que algo
sucede no tempo e o suceder é, necessariamente, um mudar, é o
aparecimento de fatores que não existiam e a desaparição de outros que
existiam, portanto uma dimensão de mutação estranha à esfera da essência a
qual nos referimos anteriormente.
Eu escolhi propositadamente a expressão História Essencial justamente
para dar a ideia dessa tensão entre dois polos, a tensão que nos mostra de um
lado algo que permanece irredutivelmente àquilo que era no começo e que por
outro lado muda de aparência, muda de figura e quase que, poderíamos dizer
com um pouco de exagero, muda de identidade ao longo dos tempos.
Essa tensão, a meu ver, é insolúvel. É uma das muitas tensões que
definem polarmente a existência humana. Existem inúmeras dessas tensões, e
nós veremos no próprio curso da história da filosofia que muitas filosofias, às
vezes, procuram resolvê-la mediante a amputação de um dos polos, criando
uma visão um pouco artificial ou exagerada de uma faceta da existência, e todo
nosso esforço será, ao contrário, para conservar todos os polos opostos cuja
tensão nós não possamos resolver, por que, às vezes, é essa tensão mesma
que os coloca de pé, nos faz ir pra frente e, em última análise, marca toda a
dignidade e força da inteligência humana.
Uma vez explicado, mais ou menos, este título, nós temos que ver que
esta disciplina “História da Filosofia” ela tem sido tratada de um número
definido de maneiras ou estilo, e nós vamos fazer uma breve resenha desses
estilos para mostrar por que eles não nos satisfazem e, portanto, porque que
eu achei que deveria narrar a história da filosofia de acordo com uma outra
maneira que não se enquadra em nenhuma das três modalidades costumeiras
que eu vou passar.
A primeira amostra da história da filosofia que nós temos está nas obras
de Aristóteles. Ele nunca escreveu uma obra chamada “História da Filosofia”,
mas cada problema filosófico que ele atacou ele sempre começou por abordá-
lo desde a narrativa das tentativas anteriores feita pelos seus antecessores.
Com isso, evidentemente quase que sem querer, ele inaugurou a disciplina
“História da Filosofia”.
O modo como Aristóteles fazia essa resenha história dos problemas
antes de oferecer a solução que ele próprio achava mais adequada pra eles,
consistia em colocar todas as doutrinas e alternativas à mesa, uma ao lado da
outra, como se fossem contemporâneas, são várias respostas possíveis ao
mesmo problema e podem ser, do ponto de vista Aristotélico, comparadas
umas com as outras, armando-se, portanto, uma dialética e uma discursão.
Destes primeiros esboços Aristotélicos, da história da filosofia, surge,
bem mais tarde (século XVII e XVIII) algumas resenhas narrativas da história
da filosofia