História Da Neurociência-Parte 1

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  • Histria da Neurocincia Parte 1 Localizacionismo Cerebral e Seus Fundamentos Histricos

    Organizado e ministrado por Pedro Carlos Primo: Psiquiatra, psicanalista e mestrando en Salud Mental, Cincias Humanas y Sociais pela Universidade de Len, Espaa e Alcione Candeloro Falco: Psicloga e psicoterapeuta.

    Na antiguidade, a mais remota, o ser humano j correlacionava a mente com a cabea (crebro), pois quando algum sofria uma pancada nessa rea do corpo e desmaiava a relao estava evidente. Entre os gregos, predominava a teoria de que os ventrculos cerebrais eram rgos sede dos humores e nos quais estava localizada tambm a capacidade intelectual do homem. Essa doutrina foi reforada por Galeno (177, DC), no segundo sculo do cristianismo, e somente foi refutada por Andreas Vesalius no sc. XVI, tambm j na era moderna. Vesalius afirmou que no podiam estar nos ventrculos capacidade intelectual do homem, pois os asnos possuam ventrculos e no tinham esta capacidade. At ento se considerava que a mente residia nos espaos ventriculares do crebro. Era a doutrina ventricular, iniciada no sculo 4d.C. quando a Igreja Catlica incorporou os ensinamentos anatmicos do romano Galeno (130-200 d.C.). Provavelmente considerando as partes slidas do crebro como sujas ou terrenas demais para agir como intermediaras entre o corpo e alma, enquanto as funes superiores eram atribudas aos ventrculos cerebrais, confundidos com espaos vazios e, portanto, mais "puros e nobres" para receber espritos etreos do que a carne da matria cerebral. Ao longo dos sculos, essa doutrina postulou para as funes cerebrais trs etapas sucessivas correspondendo aos trs ventrculos. A primeira etapa era a colheita de informaes do ambiente e correspondia s sensaes; a segunda, o processamento de informaes em imaginao ou pensamento e a terceira eram o seu armazenamento em memria. A doutrina ventricular coincidiu com a concepo que o crtex no possua uma estrutura ordenada, mas logo que se reconheceu que ele tem zonas anatomicamente definidas, passou-se a acreditar e at a defender e a propor que diferentes funes do crtex se localizam em regies diferentes. No perodo clssico da histria Antiga tivemos duas doutrinas com relao localizao da mente: a hipocrtica (de Hipcrates, considerado pai da medicina) que localizava a mente no crebro e que

  • se mostrou ser a verdadeira para os nossos tempos e a aristotlica que afirmava que a mente tinha a sua sede no corao, no atribuindo nenhum papel ao crebro, ao no ser o de esfriar o sangue. Para Aristteles a psique era uma entidade, ou "substncia", como os filsofos a chamavam, independente do corpo. Esta viso de uma psique no material e que governava o nosso comportamento foi adotada pelo o cristianismo disseminada por todo o Ocidente e que somente foi refutada com Descartes, j na era moderna (1649), ou seja, quase duzentos anos depois do trmino da Idade Mdia. Esse filsofo e matemtico francs um dos maiores nomes da histria da humanidade localizou a mente (Intelecto) no crebro. Sua sede seria na glndula Pineal. Ele props uma nova explicao para o comportamento, no qual o crebro tinha um papel importante, ao contrrio da teoria do mentalismo de Aristteles onde o papel do crebro era apenas de resfriar o sangue. Descartes localizou a mente no crebro e ligou-a ao corpo. Ele via a mente e o corpo como coisas separadas, mas interligadas. Escreveu no seu livro: Tratado do Homem, primeiro preciso descrever separadamente o corpo (queinclui o crebro) e, depois a mente, e por fim, devo mostrar como essas duasnaturezas teriam de ser ligadas e unidas para constituir as pessoas. Para Descartes a maioria das atividades do corpo, como sensao, movimento, digesto, respirao e sono, podem ser explicadas pelos princpios mecnicos, atravs dos quais o corpo fsico e o crebro funcionam. A mente, por outro lado, no material, separada do corpo, e responsvel pelo comportamento racional. Descartes que dissecava animais que vinham dos aougues, era considerado como um dos melhores anatomistas do seu tempo. Tambm conhecia muitas das mquinas que estavam em construo, como rodas hidrulicas e tinha contacto com essas engenhocas mecnicas em parques, como as exibidas publicamente nos jardins aquticos de Paris. Influenciado por esses dispositivos mecnicos ele sugeriu que as funes do corpo eram regidas por princpios semelhantes. Para explicar como a mente controla o corpo Descartes sugeriu que a mente estava inserida numa pequena parte do crebro denominada de glndula pineal, localizada no centro do crebro ao lado de cavidades cheias de lquidos- Os ventrculos cerebrais. Segundo Descartes o corpo pineal direciona lquido dos ventrculos por meios dos nervos que seriam ocos, at os msculos. Quando o lquido expande esses msculos o corpo se move. Na teoria de Descartes a mente (localizada na glndula Pineal) regula o comportamento direcionando o fluxo dos lquidos ventricular para os

  • msculos apropriados. Em sua teoria a mente e o corpo eram entidades separadas e que a Pineal era apenas uma estrutura atravs da qual a mente trabalhava. Na filosofia essa dualidade passou a se chamar de problema mente-corpo, ou apenas de dualismo, ou seja, como o comportamento pode ser regulado por uma mente no material e um corpo material. Descartes foi o primeiro props a idia de arco reflexo, e corretamente identificou seus componentes: a sensao de dor, a conduo da mesma pelos nervos que levam ao sistema nervoso central, os nervos motores sendo excitados e finalmente os msculos que so responsveis pela ao.

    Entretanto, ao propor um mecanismo para essa

    seqncia, Descartes foi constrangido pelo conceito medieval de que o sistema nervoso era um conjunto de tubos hidrulicos. Os sbios da poca ainda influenciados por Aristteles e Galeno acreditavam que a matria cerebral era menos importante do que os ventrculos, os quais eram imaginados como se fossem uma espcie de reservatrio de fludos e sede da mente racional. Galeno expandiu a teoria dos humores dos gregos antigos, e a combinou com o modelo aristotlico de alma, propondo que

    o crebro era a sede da alma racional. Ele recebia o esprito vital vindo do corao, e misturava com o humor sanguneo. O crebro separava o esprito animal dessa mistura e o armazenava nos ventrculos cerebrais, distribuindo para todo o corpo, atravs dos nervos Esse fludo viajava atravs dos nervos aos msculos e rgos, de maneira a controlar todas as atividades corporais. A alma racional era considerada a responsvel pela imaginao, pelo raciocnio e pela memria.

    Descartes props que os nervos conduziam o

    estmulo at o crebro graas a uma onda de propulso do fludo em seu interior oco. Bombeados com esse fludo os msculos se inflavam, levando contrao. Sua inspirao foi as maravilhosas fontes de Versailles. Em seu livro Traite de lHomme (1664): E verdadeiramente podemos comparar muito bem os nervos da mquina que estou descrevendo aos tubos dos mecanismos; seus msculos e tendes a vrios outros motores e molas que servem para mover esses mecanismos e seus espritos animais gua

    que os movimenta; sendo que o corao sua fonte, e as cavidades do crebro, seu encanamento principal de gua.

    O Modelo mecnico que entendia o crebro funcionando como um sistema hidrulico, conceito esse oriundo das fontes de Versailles, como j

  • vimos (os nervos eram ocos, por onde circulava o esprito animal e que a sede da mente estava na glndula Pineal) representou um avano em termos de localizacionismo cerebral, porque at ento predominava o modelo aristotlico que se referia mente como uma substncia totalmente imaterial e sem nenhuma localizao no corpo, mas que mesmo dessa maneira era responsvel pelos pensamentos, emoo e por outros processos como imaginao, dor, prazer, etc. (Para Aristteles o crebro somente servia para resfriar o sangue).

    Na atualidade, a informao de que determinadas funes cerebrais so desempenhadas por algumas estruturas e no por outras, de conhecimento da grande maioria das pessoas. Essa doutrina, chamada de localizacionismo cerebral, tem sido comprovada pela evoluo de exames de imagens como ressonncia magntica funcional (FMRI), tomografia por emisso de positron (PET), etc, que com preciso, visualizam funes cerebrais, quando as mesmas esto sendo realizadas pelo crebro.

    Essa comprovao, porm, recente. Durante sculos, a doutrina ventricular que propunha para as funes cerebrais trs etapas sucessivas correspondendo aos trs ventrculos, predominou. Essa predominncia coincidiu com a concepo de que o crtex no possua uma estrutura ordenada, mas logo que se reconheceu que ele tem zonas anatomicamente definidas, passou-se a acreditar que diferentes funes do crtex se localizam em diferentes regies.

    O primeiro a defender essas idias foi Franz Joseph Gall (1758-1822), mdico e neuroanatomista austraco, um dos primeiros a ilustrar com preciso as circunvolues corticais. Gall props trs idias radicais: a primeira, que todo comportamento

    emanava do crebro. A segunda, que

    determinadas regies do crtex cerebral controlavam funes especficas, sendo que o crtex cerebral no agia como um rgo nico, mas era dividido em pelo menos 27 rgos. Outros foram adicionados mais tarde por Johann Spurzheim, chegando a mais de 35. Cada um correspondendo a uma faculdade mental especfica. A terceira, que se mostrou totalmente sem comprovao cientfica, que o centro de cada funo, crescia com o uso, sendo que o crnio que o recobre incharia proporcionalmente, criando um padro de salincias e sulcos que indicariam quais regies do encfalo foram mais desenvolvidas. Na seqncia dessas idias que tambm se mostraram no cientficas, Gall procurou estabelecer uma base anatmica para descrever traos de carter,

  • correlacionando a personalidade dos indivduos com as salincias em seus crnios. Mesmo os comportamentos humanos mais abstratos como a religiosidade e generosidade, eram relacionados a uma determinada rea cerebral, incluindo at, um rgo da morte presente em assassinos.

    Gall teve em Johann Spurzheim (1776-1832), o discpulo e colaborador mais importante. Ele ampliou suas idias e as propagou na Inglaterra e EUA, para onde emigrou. Spurzheim chegou a fazer correlaes clnicas entre leses experimentais e estimulao localizada. A cabea de Spurzheim foi removida de seu corpo antes do enterro e seu crnio, descrito como raramente grande, est em exposio no Museu Anatmico de Warrem, da Universidade de Harvard em Boston.

    As questes levantadas por Gall no sculo XVIII, mais, precisamente em 1790, foram um marco na histria do localizacionismo cerebral. Ele chamou decrnioscopia, seu estudo de localizao cerebral. Em 1815, Thomas Foster chamou o trabalho de Gall e Spurzheim de frenologia (phrenos o termo grego para mente), nome que permaneceu.

    A

    estrutura lgica e fcil de aprender da teoria frenolgica rapidamente capturou a imaginao de milhares de seguidores. Gall ganhou o apoio, assim como as mentes, de muitas figuras cientficas e polticas importantes em muitas partes do mundo, e mesmo sem mrito cientfico, ainda tm defensores. Permaneceu popular, especialmente nos Estados Unidos ao longo do sculo 19 e deu origem a outras caracterologias pseudocientficas como acraniometria e a antropometria.

    A frenologia originou a inveno

    dopsicografo, por Lavery and White, uma mquina que podia fazer uma leitura frenolgica completa, e imprimir o resultado. Os inventores ganharam muito dinheiro com as avaliaes frenolgicas que a mquina fazia, na Exposio Mundial de Chicago, em 1934.

    Eventualmente, a frenologia foi atacada pela cincia oficial,

    que no pde corroborar a teoria de Gall com achados concretos. J em 1808, o Instituto da Frana reuniu um comit de sbios liderado

  • por Cuvier, que declarou que a frenologia no era confivel (alguns historiadores suspeitam que eles tambm no tinham evidncias cientficas para apoiar essa informao, e que a concluso foi forada por Napoleo Bonaparte, que estava furioso porque as interpretaes de Gall sobre seu crnio tinham esquecidas" algumas qualidades nobres que ele pensava que tinha...).

    Apesar das idias de Gall no serem de comprovao cientfica e

    terem sido usadas de maneira charlat por muitos profissionais, elas contriburam para que pesquisadores se interessassem pelo estudo das questes por ele levantadas. Comearam a realizar experimentos em laboratrios, fazendo leses em animais e verificando o que acontecia como conseqncia dessas leses. Essas pesquisas originaram a neurocincia experimental que conhecemos hoje, levando em considerao o conceito evolucionista de forma e funo. A Nova Frenologia, ou seja, doutrina da localizao cerebral que no contestada por nenhuma outra espcie de ramo cientifico postula o seguinte:

    a) Diferentes partes do sistema nervoso tm diferentes funes b) possvel mapear a correlao entre local e funo. c) E mais ainda: existe por detrs disso o conceito evolucionista de

    forma e funo. Conceitos que relacionam a forma do corpo com a funo so bem

    antigos, pois, j se sabia que a forma dos peixes, aves, etc. tem muito a ver com suas funes, como voar, nadar, etc. so conceitos gerais da biologia que permearam a anatomia dos sculos 16, 17,18. Mas foi o sculo 19 que presenciou o comeo de uma grande busca para se correlacionar forma com funo.

    Os Primrdios do Localizacionismo Cerebral O primeiro mdico que fez a correlao entre forma e funo foi

    Galeno. Os prprios filsofos gregos propuseram que as funes cerebrais estavam relacionadas aos ventrculos e que haveria uma distribuio de funo: -o primeiro ventrculo seria relacionado cognio, ao pensamento, e a motricidade -o segundo ventrculo seria relacionado emoo -o terceiro seria relacionado memria

    Conceitos que relacionam a forma do corpo com a funo so bem

    antigos, pois, j se sabia que a forma dos peixes, aves, etc. tem muito a ver com suas funes, como voar, nadar, etc. So conceitos gerais da biologia que permearam a anatomia dos sculos 16, 17,18. Mas foi o sculo 19 que

    presenciou o comeo de uma grande busca para se correlacionar forma com funo.

  • Muitas pesquisas srias se seguiram aos estudos de Gall, no

    campo do localizacionismo cerebral. Luigi Rolando descobriu uma fissura no crebro que depois recebeu o seu nome. Foi o responsvel pela primeira estimulao de um nervo no tecido cerebelar (1809).

    N

    a seqncia, Pierre Flourens (1823-1924) pesquisou o crebro de pombos e por isso foi considerado o pai da pesquisa experimental cerebral.

    Uma grande

    confirmao para as teorias que

    do sustentao s idias do localizacionismo cerebral veio com o caso Phineas Gage (1848), descrito por John Martyn Harlow. Pierre Floureans

    Gage tinha 25 anos, trabalhava com dinamite e sobreviveu a uma

    exploso que atirou uma barra de ferro (de 1 metro de comprimento por trs centmetros de largura) contra a parte frontal de sua cabea. Depois do acidente ele ainda viveu por muitos anos, mas o seu comportamento mudou completamente.

    Pierre Floureans

  • Entre 1860/1870 Pierre Broca faz as correlaes anatmicas da afasia e descobre uma rea no crebro que depois foi chamada de rea de Broca, relacionada com a expresso da fala. Na pesquisa clnica ele foi um dos que mais se destacou. Tambm famoso o estudo clnico de um paciente seu, afsico, que ficou conhecido como Tan, pois era a nica palavra que ele pronunciava. Depois da morte de Tan, Broca descobriu que ele tinha uma zona no crebro destruda por neurosfilis, e que era a causa de sua afasia.

    Pierre Broca

  • Em 1874, Carl

    Wernicke estudou uma

    rea do crebro que tem

    relao com um tipo de

    afasia, a compreenso

    da linguagem ( rea

    auditiva da linguagem)

    sendo que

    posteriormente esta rea

    ficou conhecida como

    rea de Wernicke.

    Carl Wernicke Contudo todo esse progresso no sentido de

    correlacionar funes do crebro com determinadas reas cerebrais, s foi possvel graas descoberta fundamental daeletricidade animal por Luigi

    Galvani (1737-1798). Ele estudava a anatomia das rs havia mais de dez anos quando, em 1786, uma tempestade mudou os rumos de sua

    pesquisa. Sem ligar para os raios l fora, ele dissecava um anfbio e, ao tocar com a tesoura numa das pernas da r, ela se mexeu. Galvani, que tambm era fsico imediatamente concluiu que a eletricidade do ar passara por meio da tesoura para o corpo da r, disparando o movimento.

  • Dias depois, no seu laboratrio, esbarrou com um bisturi na perna de outra r escalpelada enquanto mantinha ligada uma mquina que soltava fascas eltricas. O animal deu um chute de verdade. Isso bastou para que o italiano

    Resolvesse se dedicar eletrofisiologia. Em 1791, ele publicaria o trabalho em que explicaria para a posteridade que a contrao muscular,

    e conseqentemente

    o movimento, s acontece se houver estmulos eltricos.

    Novo paradigma Nascia: a eletricidade estava substituindo a mecnica de uma vez por todas como a principal explicao fsica para a funo do sistema nervoso. At ento o principal modelo da funo cerebral era baseado nas idias de Ren Descartes (1596-1650), um dos maiores filsofos ocidentais de todos os tempos. Ao analisar um fenmeno simples como o movimento involuntrio que ocorre em um membro quando algum queima sua mo ou o p em uma chama, Descartes props a idia de arco reflexo, e corretamente identificou seus componentes: a sensao de dor, a conduo da mesma pelos nervos que levam ao sistema nervoso central, os nervos motores sendo excitados e finalmente os msculos que so responsveis pela ao.

    O Modelo mecnico que entendia o crebro funcionando como um

    sistema hidrulico, conceito esse oriundo das fontes de Versailles, como j vimos (os nervos eram ocos, por onde circulava o esprito animal e que a sede da mente estava na glndula Pineal), representou um avano em termos de localizacionismo cerebral, porque at ento predominava o modelo aristotlico que se referia mente como uma substncia totalmente imaterial e sem nenhuma localizao no corpo, mas que mesmo dessa maneira era responsvel pelos pensamentos, emoo e por outros processos como imaginao, dor, prazer, etc. (Para Aristteles o crebro somente servia para resfriar o sangue).

    Com o novo paradigma trazido por Galvani, comearam pesquisas comprobatrias com relao eletricidade animal. Muitas observaes simples feitas por naturalistas mostravam isso. Sabia-se, por exemplo, que certos animais, como enguia e raia eltrica eram capazes de dar choque quando tocados, os quais eram muitos semelhantes aos efeitos de

  • outros choques eltricos dados por um jarro de Leyden. Ento estava claro quer animais eram capazes de gerar eletricidade em seus corpos.

    Luigi Galvani, mdico e anatomista italiano, foi um dos primeiros a investigar experimentalmente o fenmeno chamado bioeletricidade. Em uma srie de experimentos iniciados em 1780, Galvani, trabalhando na Universidade da Bolonha, Itlia, descobriu que a corrente eltrica liberada por um jarro de Leyden ou um gerador eletrosttico rotatrio causava a contrao dos msculos na perna de um sapo e de muitos outros animais, tanto ao aplicar a carga no msculo ou no nervo. Para ele a contrao muscular era uma prova de que os msculos do sapo estavam gerando eletricidade por si prprios. Era a eletricidade animal, um termo cunhado por ele, como um tipo de energia vital, a qual ele pensava que era similar, mas algo diferente da eletricidade natural gerada por mquina ou raios Ele comparou o msculo ao um pequeno jarro de Leyden, carregado com eletricidade.

    Ao lado de Galvani, outro grande pioneiro nessa rea da bioeletricidade foi Alessandro Volta (1745-1827 (as pilhas voltaicas, volts, tm esse nome em sua homenagem), conterrneo e contemporneo de Galvani, e com quem ele travou uma polmica sobre a bioeletricidade). Volta contestou as afirmaes de Galvani. Para ele o msculo do sapo funcionava to somente como um detector de pequenas diferenas no potencial eltrico externo, um tipo de eletroscpio, e que nada evidenciava a eletricidade animal

    postulada por Galvani.

    Volta, Um professor italiano da fsica, em 1791,

    estava experimentando com os metais e os cidos. Tocou em uma colher de prata e em uma parte de lata a sua lingeta (a saliva ligeiramente acida) conectada com uma parte do fio de cobre. Experimentou "sour" o gosto, e realizado experimentava um fenmeno eltrico.

    (toque nos dois terminais de uma bateria do rdio do transistor de 9 volts a sua lingeta para experimentar isto para you rself.)

    Aps mais experincias, Volta podia montar uma pilha das pilhas para dar forma a uma bateria. Cada pilha era um disco do zinco e um disco da prata,

  • separado por uma camada de pasteboard salmoura-embebido. Ns consultamos agora a essa bateria original como uma pilha de Voltaic. Na honra de Volta, ns consultamos presso eltrica como a "tenso" e ns medimos a quantidade de presso eltrica nas unidades de "volts".

    Os notveis experimentos de Galvani ajudaram a estabelecer as bases para o estudo biolgico da neurofisiologia e neurologia. A mudana de paradigma foi completa: os nervos no eram tubos de gua ou canais, como Descartes e seus contemporneos pensavam, mas condutores eltricos A informao no sistema nervoso era transmitida pela eletricidade gerada diretamente pelo tecido orgnico.

    A eletricidade animal, contudo, somente foi confirmada pelo

    naturalista alemo Alexander Von Humboldt, em 1797. Entre 1863 e 1875, J. Hughlings estuda a epilepsia motora. Em 1890, Friedisch Gortz faz experimentos com cachorros. Fazia

    leses localizadas no crebro dos cachorros e os mantinham vivos por longos perodos. Com estes experimentos ele queria provar a separao das funes de manuteno da vida das funes superiores.

    Em 1870, David Ferrier faz estimulao precisa no crtex de macacos.

    Tambm em 1870, dois fisiologistas alemes: Gustav Fritsch e Eduard Hitzig fazem estimulao eltrica do crtex de ces acordados.

    No final do sculo XIX, o conceito de localizao cerebral foi firmemente estabelecido nas neurocincias.

    Na seqncia destes estudos de localizacionismo cerebral Sherrington e Cushing fazem os mapeamentos corticais de gorilas e macacos, e Victor Horsley cria o mtodo estereotxico, inicialmente, utilizado experimentalmente em animais e posteriormente, como mtodo cirrgico em humanos, com grande sucesso na atualidade.

    Comea ento a transposio para o estudo de crebros humanos.

    O prximo sculo testemunharia o uso de tcnicas sofisticadas em

    animais e em humanos, as quais seriam capazes de construir mapas detalhados das funes cerebrais.

    Em 1902, Fedor Krauze publica 142 casos em humanos, e tambm publicada a citoarquitetura do crtex, com 47 reas.

    Os estudos de pesquisas na rea de bioeletricidade e do localizacionismo cerebrais se incrementaram com os avanos tcnicos, com a descoberta de novos aparelhos: como Eletrmetros, Galvanmetros, Comutadores e Indutores e tambm com avanos na microscopia, assunto para a prxima aula.

  • Histria da Neurocincia/ parte 2

    Pedro Carlos Primo: Psiquiatra/psicanalista e mestre em sade mental pela

    universidade de Len, Espanha, Alcione Candeloro Falco, psicloga/psicoterapeuta.

    Localizacionismo Cerebral e Bioeletricidade: Seus Fundamentos

    Histricos.

    A doutrina ventricular coincidiu com a concepo que o crtex no possua uma estrutura ordenada, mas logo que se reconheceu que ele tem zonas anatomicamente definidas, passou-se a acreditar e at a defender e a propor que diferentes funes do crtex se localizam em regies diferentes. O primeiro a defender essas idias foi Franz Gall (1758-1822), alis, um grande anatomista e um dos primeiros a ilustrar com preciso as circunvolues corticais.

    Gall acreditava que o crebro era uma mquina sofisticada e que produz comportamento, pensamento e emoo, e que o crtex cerebral , na verdade,

  • um conjunto de rgos com diferentes funes. Ele dividiu a mente em 27 faculdades localizadas em diferentes rgos. A questo levantada pelo mdico austraco Franz Gall, no sculo XVIII, mais precisamente, em 1790, ao dizer que determinadas funes corticais tinham sua sede em reas diferentes do crebro foi um marco na histria do localizacionismo cerebral. Ele chamou de crnioscopia, o seu estudo de localizao cerebral, sendo que o nome frenologia foi dado por seu discpulo, Johann Spurzheim que propagou a suas idias na Inglaterra e nos EUA, para onde emigrou. Spurzheim chegou a fazer correlaes clnicas entre leses experimentais e estimulao localizada. As idias de Gall, apesar dele mesmo ter desenvolvido formulaes no cientificas (ele prprio no era um experimentador) e terem sido usadas tambm posteriormente, at de maneira charlat, por muitos profissionais, contriburam para que pesquisadores se estimulassem, at mesmo, para provar que Gall estava errado, e ento comearam a fazer experimentos em laboratrios, fazendo leses em animais e verificar o que acontecia, isto , as conseqncias dessas leses, o que fez nascer, dessa forma, a neurocincia experimental que conhecemos hoje. A Nova Frenologia, ou seja, doutrina da localizao cerebral que no contestada por nenhuma outra espcie de ramo cientifico postula o seguinte:

    a) Diferentes partes do sistema nervoso tm diferentes funes b) possvel mapear a correlao entre local e funo. c) E mais ainda, que existe por detrs disto o conceito evolucionista de

    forma e funo. Conceitos que relacionam a forma do corpo com a funo so bem antigos, pois, j se sabia que a forma dos peixes, aves, etc. tem muito a ver com suas funes, como voar, nadar, etc. so conceitos gerais da biologia que permearam a anatomia dos sculos 16, 17, 18. Mas foi o sculo 19 que presenciou o comeo de uma grande busca para se correlacionar forma com funo.

    Os primrdios do Localizacionismo Cerebral.

    O primeiro mdico que fez esta correlao entre forma e funo foi Galeno. Os prprios filsofos gregos propuseram isso. Que haveria ventrculos e que as funes cerebrais esto relacionadas aos ventrculos e que haveria uma distribuio de funo:

    - O primeiro ventrculo seria relacionado cognio, ao pensamento, e a motricidade.

    - O segundo ventrculo seria relacionado emoo. - O terceiro seria relacionado memria

    Contudo todo esse progresso no sentido de correlacionar funes do crebro com determinadas reas cerebrais, s foi possvel graas descoberta fundamental daeletricidade animal por Luigi Galvani (1791). Um novo paradigma nascia: a eletricidade estava substituindo a mecnica de uma vez por todas como a principal explicao fsica para a funo do sistema nervoso. At ento o principal modelo da funo cerebral era baseado nas idias de Ren Descartes (1596-1650), um dos maiores filsofos ocidentais de todos os tempos. Ao analisar um fenmeno simples como o movimento involuntrio

  • que ocorre em um membro quando algum queima sua mo ou o p em uma chama Descartes props a idia de arco reflexo, e corretamente identificou seus componentes: a sensao de dor, a conduo da mesma pelos nervos que levam ao sistema nervoso central, os nervos motores sendo excitados e finalmente os msculos que so responsveis pela ao, isto , pela retirada da mo ou do p da chama . Entretanto, ao propor um mecanismo para esta seqncia, Descartes era constrangido pelo conceito medieval de que o sistema nervoso era um conjunto de tubos hidrulicos. Os sbios da poca ainda influenciados por Aristteles e Galeno acreditavam que a matria cerebral era menos importante do que os ventrculos, os quais se imaginava que fosse uma espcie de reservatrio de fludos e a sede da mente racional. Galeno expandiu a teoria dos humores dos gregos antigos, e a combinou com o modelo aristotlico da alma, propondo que o crebro era a sede da alma racional. Ele recebia o esprito vital vindo do corao, e misturava com o humor sanguneo. O crebro separava o esprito animal dessa mistura e o armazenava nos ventrculos cerebrais , distribuindo para todo o corpo atravs dos nervos Este fludo viajava atravs dos nervos, aos msculos e rgos de maneira a controlar todas as atividades corporais. A alma racional era considerada a responsvel pela imaginao, pelo raciocnio e pela memria. Descartes props que os nervos conduziam o estmulo at o crebro graas a uma onda de propulso do fludo em seu interior oco. Bombeados com esse fludo os msculos se inflavam, levando contrao. Sua inspirao eram as mavilhosas fontes de Versailles. Em seu livro Traite de lHomme (1664): E verdadeiramente podemos comparar muito bem os nervos da mquina que estou descrevendo aos tubos dos mecanismos; seus msculos e tendes a vrios outros motores e molas que servem para mover esses mecanismos e seus espritos animais gua que os movimenta; sendo que o corao sua fonte, e as cavidades do crebro, seu encanamento principal de gua. O Modelo mecnico que entendia o crebro funcionando como um sistema hidrulico, conceito esse oriundo das fontes de Versailles, como j vimos (os nervos eram ocos, por onde circulava o esprito animal e que a sede da mente estava na glndula Pineal), representou um avano em termos de localizacionismo cerebral, porque at ento predominava o modelo aristotlico que se referia mente como uma substncia, totalmente imaterial e sem nenhuma localizao no corpo, mas que mesmo dessa maneira era responsvel pelos pensamentos, emoo e por outros processos como imaginao, dor, prazer, etc. (Para Aristteles o crebro somente servia para resfriar o sangue).

    Com este novo paradigma trazido por Galvani comearam pesquisas comprobatrias com relao eletricidade animal. Muitas observaes simples feitas por naturalistas mostravam isso. Sabia-se, por exemplo, que certos animais, como enguia e raia eltrica eram capazes de dar choque quando tocados, os quais eram muitos semelhantes aos efeitos de outros choques eltricos dados por um jarro de Leyden. Ento estava claro quer animais eram capazes de gerar eletricidade em seus corpos.

    Luigi Galvani, mdico e anatomista italiano (1737-1798), foi um dos primeiros a investigar experimentalmente o fenmeno chamado bioeletricidade. Em uma srie de experimentos iniciados em 1780, Galvani, trabalhando na

  • Universidade da Bolonha Itlia, descobriu que a corrente eltrica liberada por um jarro de Leyden ou um gerador eletrosttico rotatrio causava a contrao dos msculos na perna de um sapo e de muitos outros animais, tanto ao aplicar a carga no msculo ou no nervo. Para ele a contrao muscular era uma prova de que os msculos do sapo estavam gerando eletricidade por si prprios. Era a eletricidade animal, um termo cunhado por ele, como um tipo de energia vital, a qual ele pensava que era similar, mas algo diferente da eletricidade natural gerada por mquina ou raios Ele comparou o msculo ao um pequeno jarro de Leyden, carregado com eletricidade.

    Ao lado de Galvani, outro grande pioneiro nessa rea da bioeletricidade foi Alessandro Volta (1745-1827 (as pilhas voltaicas, volts, tm esse nome em sua homenagem), conterrneo e contemporneo de Galvani, e com quem ele travou uma polmica sobre a bioeletricidade). Volta contestou as afirmaes de Galvani. Para ele o msculo do sapo funcionava to somente como um detector de pequenas diferenas no potencial eltrico externo, um tipo de eletroscpio, e que nada evidenciava a eletricidade animal postulada por Galvani.

    Os notveis experimentos de Galvani ajudaram a estabelecer as bases para o estudo biolgico da neurofisiologia e neurologia. A mudana de paradigma foi completa: os nervos no eram tubos de gua ou canais, como Descartes e seus contemporneos pensavam, mas condutores eltricos A informao no sistema nervoso era transmitida pela eletricidade gerada diretamente pelo tecido orgnico.

    A eletricidade animal, contudo, somente foi confirmada pelo naturalista alemo Alexander Von Humboldt, em 1797. A descoberta da bioeletricidade animal permitiu que os conhecimentos e pesquisas em frenologia avanassem.Porm, a frenologia experimental, cientfica, comeou mesmo com Pierre Flourens (1823-1924), considerado o pai da pesquisa experimental cerebral. Muitas pesquisas srias se seguiram aos estudos de Gall, no campo do localizacionismo cerebral, como foram as dos pioneiros Luigi Rolando que descobriu uma fissura no crebro que depois recebeu o seu nome e que tambm foi o responsvel pela primeira estimulao de um nervo no tecido cerebelar (1809) e as de Pierre Flourens, com pombos. Entre 1860/1870 Pierre Broca faz as correlaes anatmicas da afasia e descobre uma rea no crebro que depois foi chamada de rea de Broca, relacionada com a expresso da fala. Na pesquisa clnica ele foi um dos que mais se destacou. Tambm famoso o estudo clnico de um paciente seu, afsico, que ficou conhecido como Tan, pois era a nica palavra que ele pronunciava. Depois da morte de Tan, Broca descobriu que ele tinha uma zona no crebro destruda por neurosfilis, e que era a causa de sua afasia. Uma grande confirmao para as teorias que do sustentao s idias do localizacionismo cerebral veio com o caso Phineas Gage (1848), descrito por John M. Harhow. Gage tinha 25 anos, trabalhava com dinamite e sobreviveu a uma exploso que atirou uma barra de ferro (de 1 metro de comprimento por trs centmetros de largura) contra a parte frontal de sua cabea. Depois do

  • acidente ele ainda viveu por muitos anos, mas o seu comportamento mudou completamente. Em 1874, Carl Wernicke estudou uma rea do crebro que tem relao com um tipo de afasia, a compreenso da linguagem (rea auditiva da linguagem) sendo que posteriormente esta rea ficou conhecida como rea de Wernicke.

    A partir de ento, muitas pesquisas com animais se sucederam. Entre 1863 e 1875, J. Hughlings estuda a epilepsia motora. Em 1890, Friedisch Gortz faz experimentos com cachorros. Fazia leses localizadas no crebro dos cachorros e os mantinham vivos por longos perodos. Com estes experimentos ele queria provar a separao das funes de manuteno da vida das funes superiores. Em 1870, David Ferrier faz estimulao precisa no crtex de macacos. Tambm em 1870, dois fisiologistas alemes: Gustav Fritsch e Eduard Hitzig fazem estimulao eltrica do crtex de ces acordados. No final do sculo XIX, o conceito de localizao cerebral foi firmemente estabelecido nas neurocincias. Na seqncia destes estudos de localizacionismo cerebral Sherrington e Cushing fazem os mapeamentos corticais de gorilas e macacos, e Victor Horsley cria o mtodo estereotxico, inicialmente, utilizado experimentalmente em animais e posteriormente, como mtodo cirrgico em humanos, com grande sucesso na atualidade.

    Comea ento a transposio para o estudo de crebros humanos.

    O prximo sculo testemunharia o uso de tcnicas sofisticadas em animais e em humanos, as quais seriam capazes de construir mapas detalhados das funes cerebrais. Em 1902, Fedor Krauze publica 142 casos em humanos, e tambm publicada a citoarquitetura do crtex, com 47 reas. Os estudos de pesquisas na rea de bioeletricidade e do localizacionismo cerebrais se incrementaram com os avanos tcnicos, com a descoberta de novos aparelhos: como Eletrmetros, Galvanmetros, Comutadores e Indutores.